delação premiada

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SUMÁRIO RESUMO............................................IX ABSTRACT...........................................X INTRODUÇÃO.........................................1 CAPÍTULO 1.........................................3 DELAÇÃO PREMIADA – ASPECTOS GERAIS.................3 1.1 O INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA: CONCEITO..............3 1.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA DELAÇÃO PREMIADA..................6 1.3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DA DELAÇÃO PREMIADA EM LEGISLAÇÕES ALIENÍGENAS...............................................10 1.3.1 NA ITÁLIA.............................................10 1.3.2 NOS ESTADOS UNIDOS..................................... 14 1.3.3 NA ESPANHA............................................16 1.3.4 NA ALEMANHA........................................... 18 1.3.5 NA COLÔMBIA........................................... 19 1.3.6 NO COMBATE DOS CRIMES TRANSNACIONAIS......................20 1.4 NATUREZA E CLASSIFICAÇÃO..............................23 CAPÍTULO 2........................................26 DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS TÉCNICOS............26 2.1 DISCIPLINAS NORMATIVAS................................26 2.2 BENEFÍCIOS E REQUISITOS PARA A CONCESSÃO..............27

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Page 1: Delação Premiada

SUMÁRIO

RESUMO.............................................................................................IX

ABSTRACT..........................................................................................X

INTRODUÇÃO......................................................................................1

CAPÍTULO 1.........................................................................................3

DELAÇÃO PREMIADA – ASPECTOS GERAIS..................................31.1 O INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA: CONCEITO..................................31.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA DELAÇÃO PREMIADA......................................61.3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DA DELAÇÃO PREMIADA EM LEGISLAÇÕES ALIENÍGENAS...........................................................................101.3.1 NA ITÁLIA......................................................................................................101.3.2 NOS ESTADOS UNIDOS...................................................................................141.3.3 NA ESPANHA.................................................................................................161.3.4 NA ALEMANHA...............................................................................................181.3.5 NA COLÔMBIA................................................................................................191.3.6 NO COMBATE DOS CRIMES TRANSNACIONAIS..................................................201.4 NATUREZA E CLASSIFICAÇÃO...................................................................23

CAPÍTULO 2.......................................................................................26

DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS TÉCNICOS.......................262.1 DISCIPLINAS NORMATIVAS.........................................................................262.2 BENEFÍCIOS E REQUISITOS PARA A CONCESSÃO.................................27

Page 2: Delação Premiada

2.2.1 LEI N. 8072/90 – LEI DOS CRIMES HEDIONDOS...............................................272.2.2 LEI N. 9034/95 – COMBATE AO CRIME ORGANIZADO......................................302.2.3 LEI N. 7492/86 - CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A LEI N. 8137/90 - CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA, ECONÔMICA E AS RELAÇÕES DE CONSUMO 322.2.4 DECRETO-LEI N. 2848/40 - CÓDIGO PENAL BRASILEIRO..................................332.2.5 LEI N. 9613/98 - LAVAGEM DE CAPITAIS.........................................................352.2.6 LEI N. 9807/99 - LEI DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS, TESTEMUNHAS E OUTROS COLABORADORES DA JUSTIÇA................................................................................362.2.7 LEI N. 11343/06 - LEI DE PREVENÇÃO E REPRESSÃO AO USO DE DROGAS.....412.3 MÍNIMO LEGAL E CONFRONTO ENTRE NORMAS.....................................422.4 MOMENTO DA DELAÇÃO.............................................................................442.5 A DELAÇÃO COMO MEIO DE PROVA.........................................................46

CAPÍTULO 3.......................................................................................49

DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS CRÍTICOS........................493.1 A ÉTICA E A DELAÇÃO PREMIADA............................................................493.2 A DEMONSTRAÇÃO DE INEFICÁCIA DO ESTADO NO COMBATE À CRIMINALIDADE..................................................................................................513.3 DOS VALORES E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS........................................533.4 CONSIDERAÇÕES FAVORÁVEIS A DELAÇÃO PREMIADA......................563.5 DA GARANTIA JURÍDICA NO PROCESSO..................................................613.6 A INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DO DELATOR E DE SUA FAMÍLIA................................................................................................................65

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................69

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS............................................72

AnexoS...............................................................................................79

Page 3: Delação Premiada

RESUMO

O Estado brasileiro, ao exemplo do direito alienígena

mundial, buscando a efetivação e a punição dos indivíduos e grupos de indivíduos

que ferem a ordem jurídica fundamental, regulamenta através de leis esparsas, o

instituto da delação premiada. Este instituto é um estímulo à colaboração com a

Justiça, para efetivar e viabilizar a persecução penal. Mas no tocante ao instituto,

depara-se com questões éticas e princípio lógicas. Com ele, incentiva-se a traição

e premia-se o indivíduo que rompe o contrato social, motivado pelo resultado em

solucionar crimes e desconchavar organizações criminosas. Consagra-se desta

forma, que o Estado é ineficaz no combate à criminalidade. Muito embora, ser

nobre a intenção do legislador, a viabilidade do instituto da delação premiada é

uma incógnita, pois muito se sabe que o Estado Brasileiro não tem estrutura para

garantir ao delator e a sua família proteção ao revés dos delatados. Ainda no

âmbito jurídico constitucional é proeminente o estudo do instituto da delação

premiada, por versar e mitigar princípios e normas fundamentais garantidoras da

liberdade individual do indivíduo.

Palavras-chave: Delação; Delação Premiada; Ética;

Benefício; Prova; Proteção; Testemunhas; Crime Organizado; Drogas; Crimes

Hediondos; Sistema Financeiro; Lavagem de Capitais; Perdão Judicial.

Page 4: Delação Premiada

ABSTRACT

The Brazilian State, to the example of world-wide the foreign

right, searching the permanent and punishment of the individuals and groups of

individuals that wound the basic jurisprudence, regulates through laws scattered ,

the institute of the disclosure award. This institute is one stimulates to the

contribution with Justice, to accomplish and to make possible the criminal

persecution. But in the moving one to the institute it is come across with ethical

questions and on principle natural. With the institute stimulates it treason and

reward the individual that breaches the social contract, motivated for the result in

solving crimes and disjointing criminal organizations. It is devoted of this form, that

the State is inefficacious in the combat to crime. Much even so, to be noble the

intention of the legislator, the viability of the institute of the disclosure award is an

incognito, therefore very it knows that the Brazilian State does not have structure

to guarantee to the tattletale and its family to opposite of the exposed ones. Still in

the constitutional legal scope it is prominent the study of the institute of the

disclosure award, for turning and mitigating principles and warranting basic norms

of the individual freedom of the individual.

Keywords : Tattletale ; Disclosure award; Ethics; Benefit;

Test; Protection witnesses; Organized crime; Drugs; Hideous crimes; Financial

System; Launder of capitals; Judicial pardon.

iv

Page 5: Delação Premiada

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto a pesquisa teórica e

jurídica do instituto da delação premiada, sobre o prisma da legislação pátria.

O seu objetivo é analisar o instituto da delação premiada

frente aos princípios éticos e constitucionais, verificando sua aplicabilidade no

sistema brasileiro, identificando assim os seus pressupostos e, por conseguinte,

as suas conseqüências, procedendo, para este fim, um estudo legal, doutrinário e

jurisprudencial.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando das

características gerais, uma análise dos elementos conceituais do instituto, sua

origem, evolução e classificação. Também sob linhas gerais, traçam-se

características básicas da delação premiada em algumas legislações alienígenas.

No Capítulo 2, tratando dos aspectos técnicos da delação

premiada, são analisadas todas as disciplinas normativas vigentes previstas no

ordenamento pátrio, exteriorizando suas peculiaridades. Por fim, embrenha-se

numa análise sistêmica do instituto, definindo seu mínimo legal, analisando-se a

aplicabilidade e sua valoração no sistema processual penal, como prova

inominada.

No Capítulo 3, tratando dos aspectos críticos, fomenta-se

uma análise ética e princípio lógica, verificando as ponderações arrazoadas pela

doutrina, em oposição e amparo ao instituto da delação premial. Sustenta-se ao

final, uma análise do desvairar do legislador a não tratar adequadamente o

instituto da delação premiada, substanciado a imperfeição legislativa e das

garantias ao delator.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre o instituto da delação premial no ordenamento brasileiro.

Page 6: Delação Premiada

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

O instituto da delação premiada possui traços antiéticos na sua

origem, pois pode apresentar-se como uma verdadeira traição

por parte do delator em busca de benefícios que satisfaçam

necessidades próprias em detrimento das do delatado. O que se

observa é que a delação surge quando há, na maioria das

vezes, um desajuste entre os envolvidos. Esta situação de

angústia e desespero, unida à intenção de beneficiar-se, é que

conduz o indivíduo a valer-se do referido instituto. Assim,

discutível é a intenção do agente em realmente colaborar com a

efetivação da Justiça.

A efetividade do instituto está ligada diretamente à observação das

garantias que o delator e sua família terão, contra o revés do

delatado.

Cabem as instituições estatais que manusearão diretamente o

instituto, o dever de agir com cautela e responsabilidade quanto

às informações recebidas, evitando incorrer em injustas

perseguições, satisfazendo interesses promíscuos de terceiros.

Delações infundadas, na seara social, prostituirão o instituto,

trazendo insegurança jurídica e sua dilapidação.

A mitigação de princípios em face de outros princípios, em casos

reais é muito empregado pela jurisprudência brasileira,

necessitando o operador jurídico ficar atento a não restringir

mortalmente direitos fundamentais, impondo ao processo vício

que determine sua nulabilidade.

Quanto à Metodologia empregada foi utilizado o Método

Indutivo. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do

Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.

2

Page 7: Delação Premiada

CAPÍTULO 1

DELAÇÃO PREMIADA – ASPECTOS GERAIS

1.1 O INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA: CONCEITO

Apesar dos questionamentos sobre os aspectos éticos e de

eficácia do Estado, a delação premiada é um instrumento extremamente

poderoso no combate a criminalidade, de uso muito comum nos sistemas

alienígenas, principalmente no Norte-Americano. 1

A palavra “delatar” significa denunciar, apontar, acoimar ou

acusar alguém, oferecendo ao delator, um prêmio (premiada) pré-estabelecido em

lei. No sentido processual, o delator é aquele que admite a prática de um crime,

revelando os demais agentes e partícipes que estão envolvidos no inter criminis.2

Segundo Wilson Alberto Zappa Hoog, delação premiada

significa:

[...] toda a conduta, colaboradora, do réu, co-autores ou partícipes

do crime, logo colaboradores consistentes em revelar a autoria de

um delito, portanto, são as informações prestadas por co-autor ou

participante do delito, com a finalidade de conseguir a extinção ou

diminuição de sua punibilidade. Portanto, as informações

prestadas pelo co-autor ou quinhoeiro de um delito no direito

penal brasileiro podem buscar a extinção da punibilidade, como

também a redução da pena [...] 3

Nas palavras de Gustavo Senna Miranda, delação premiada

ou colaboração processual é:

1 SOUZA, Sérgio Ricardo de. A Nova Lei Antidrogas. Niterói/RJ: Impetus, 2006. p. 62-63.2 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 675-676.3 HOOG, Wilson Alberto Zappa. Contador, o Crime e a Delação Premiada. Classe Contábil. Disponível em: < http://www.classecontabil.com.br/trabalhos/ZappaHoogDelacao.doc>. Acesso em 01 de junho de 2007.

Page 8: Delação Premiada

[...] a forma de contribuição voluntária do investigado/réu para

elucidação do crime, por meio da confissão de suas infrações

perante uma autoridade, bem como de delação em relação aos

eventuais cúmplices, tendo como contrapartida do Estado a

concessão de benefícios de ordem pessoal (como de garantia de

sua integridade física e psíquica e de sua família) e processual

(como redução de pena ou de isenção de responsabilidade penal

com a aplicação de perdão judicial).4

Importante é ressaltar os comentários do penalista Wilson

Lavorenti ao artigo 6º da Lei n. 9.034/95, esclarecendo que:

A delação ocorre quando o acusado confessa a prática do crime e

também o imputa a terceiros, facilitando a descoberta de delitos e

de seus autores. Passa a ser chamada de delação premiada

porque a delação pode redundar em diminuição ou isenção de

pena, a favor do delator. 5

Por fim, elucida Damásio de Jesus:

Delação é a incriminação de terceiro, realizada por um suspeito,

investigado, indiciado ou réu, no bojo de seu interrogatório (ou em

outro ato). “Delação premiada” configura aquela incentivada pelo

legislador, que premia o delator, concedendo-lhe benefícios

(redução de pena, perdão judicial, aplicação de regime

penitenciário brando etc.).6

Também conhecida como “imputação de co-réu”, “chamada

de co-réu”, “chamamento de cúmplice”, “pentitismo7”, “crom-witness8”; a delação

premiada, encontra muitos opositores na doutrina. Mas indiferente ao debate de

4 MIRANDA, Gustavo Senna. Primeiras Impressões sobre a nova Lei de Drogas. Ministério Público do Espírito Santo. Disponível em: <https://www.mpes.gov.br / anexos / centros_apoio / arquivos / 14_20891173123112006 _ PRIMEIRAS % 20IMPRESS % C3%95ES% 20SOBRE % 20A % 20NOVA%20LEI%20DE%20DROGAS%20-%201.doc >. Acesso em 01 de junho de 2007.5 LAVORENTI, Wilson. Leis Penais Especiais Anotadas, 3ª edição, São Paulo: Millennium, 2002, pág. 220.6 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo Jurídico. Disponível na Internet: <http://www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em 4 de abril de 2007.7 Expressão usada no Direito Italiano.8 Para os anglo-saxões.

4

Page 9: Delação Premiada

fundo ético, vem ganhando importante espaço no direito penal funcionalista,

utilitário e pragmático, sendo uma forma de fazer frente no combate ao crime.9

Distingui-se delação premiada de delação propriamente dita

(delatio criminis) e notitia criminis. Nas duas últimas o delator é informante, não se

achando envolvido na prática do ilícito, “porém da delatio criminis a delação é feita

pelo próprio ofendido ou seu representante legal, e a notitia criminis deve ser

levada a efeito por terceiros.” 10

A delação não se confunde com a confissão, sendo esta

abrangida pela delação. Na delação premiada, além de confessar a autoria ou a

participação, o delator igualmente atribue a um terceiro a autoria ou a participação

no crime, buscando um prêmio.11

A simples confissão espontânea reiterada em juízo da

autoria ou participação, configura como circunstância atenuante obrigatória na

aplicação da pena, prevista no artigo 65, III, “d”12, do Código Penal. 13

Já a confissão delatória, apesar da presença dos elementos,

auto-imputação e acoimação de terceiro, difere da delação premiada

fundamentalmente, no fato de seus efeitos positivos ao acusado não estarem

presentes, o que objetivamente é o prêmio pretendido. 14

Também não se pode confundir delação premiada com

prova testemunhal. A testemunha não figura nos pólos da ação penal, sendo esta

diferente das partes. 15

Assim delação premiada, trata-se de um estímulo à verdade

processual, na qual o agente que figura no pólo penal (inquérito ou na ação

9 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. São Paulo: Lemos & Cruz, 2006, p. 98-99.10 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 99.11 MIRABETE, Código de Processo Penal Interpretado. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 526.12 Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena: III – ter o agente: d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;13 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 131-132.14 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. p. 131-132.15 DELABRIDA, Sidney Eloy. Direito processual penal. Florianópolis/SC: Editora OAB/SC, 2006. p. 114.

5

Page 10: Delação Premiada

penal), confessa sua autoria ou participação, incriminando um ou mais terceiros, a

fim de obter as beneficies legais.

1.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA DELAÇÃO PREMIADA

Com origem na Idade Media, durante a Santa Inquisição, a

delação premiada era usada pela Igreja Católica, como meio de forçar os hereges

a confessarem espontaneamente seus pecados, obtendo como recompensa

penitências mais leves. Dentre as penitências mais leves, pode-se citar o

emprego do sambenito, que era uma espécie de hábito com um chapéu de burro

ou máscara de ferro. A confissão só era válida se fosse delatado outro herege.16

Completa José Alexandre Marson Guidi, que:

[...] na Idade Média distinguia-se os valores de delação feita sob

confissão espontânea do valor da delação feita na confissão

obtida sob tortura. Conjeturavam que aquele que confessasse

espontaneamente estava inclinado a mentir em prejuízo de

outrem, presumiam, ainda, que era mais fácil vir da boca do co-

réu a mentira do que a verdade.17

Modernamente o instituto da delação premiada foi adaptado

na legislação Italiana e Norte-Americana. No primeiro constituía arma ao combate

à máfia, na qual quem aceitava em colaborar no desmantelamento destas

organizações criminosas, era considerado como pentito ou arrependido,

recebendo pena menor. 18

Sobre o tema elucida o informativo do Ministério Público do

Estado do Paraná, número 33:

Foi a partir da delação premiada do famoso mafioso Tommaso

Buscetta, que a máfia italiana foi desmantelada e que se procurou

16 Pílulas do Direito para Jornalistas – n. 33. Ministério Público do Paraná. 1º de novembro de 2005. Disponível em: < http://www.mp.pr.gov.br/imprensa/pil0111.html>. Acesso em 25 de junho de 2007.17 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 98-99.18 Pílulas do Direito para Jornalistas – n. 33. Ministério Público do Paraná.

6

Page 11: Delação Premiada

institucionalizar a "delação premiada" naquele país. Buscetta

estava foragido no Brasil e, em 1984, foi preso pela polícia

brasileira e, em seguida, extraditado, para responder pelos delitos

de tráfico de entorpecentes perante as autoridades italianas.

Arrependido, colaborou na investigação de delitos da

máfia, levando à prisão toda a cúpula da organização mafiosa

italiana. 19

Já nos Estados Unidos, o instituto é conhecido como "plea

bargaining", na qual o Ministério Público tem total poder em transacionar com o

acusado, podendo modificar a pena e também a natureza do delito. No Brasil, não

é permitido no ordenamento à transação da natureza do delito, aproximando-se

do sistema Italiano, onde apenas é permitida a modificação da pena.20

No direito brasileiro, a origem da delação premiada, tem nas

Ordenações Filipinas, no Livro V, da parte criminal, vigorando de janeiro de 1603

até a entrada em vigor do Código Criminal de 1830.21

Segundo Damásio de Jesus:

O Título VI do “Código Filipino”, que definia o crime de “Lesa

Magestade”22 (sic), tratava da “delação premiada” no item 12; o

Título CXVI, por sua vez, cuidava especificamente do tema, sob a

rubrica “Como se perdoará aos malfeitores que derem outros á

prisão” e tinha abrangência, inclusive, para premiar, com o

perdão, criminosos delatores de delitos alheios.

19 Pílulas do Direito para Jornalistas – n. 33. Ministério Público do Paraná. 20 Pílulas do Direito para Jornalistas – n. 33. Ministério Público do Paraná.21 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo

Jurídico.22 O crime de Lesa-majestade significa “traição commettida contra a pessoa do Rei, ou seu Real

Stado, que he tão grave e abominável crime, e que os antigos Sabedores tanto estranhárão, que o comparávão á lepra; porque assi como esta enfermidade enche todo o corpo, sem nunca mais se poder curar, e empece ainda aos descendentes de quem a tem, e aos que com elle conversão, polo que he apartado da communicação da gente: assi o erro da traição condena o que a commette, e empece e infama os que de sua linha descendem, posto que não tenham culpa”. (ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. 2007. 78 p. Especialização em Direito Processual Penal. Universidade do Vale do Itajaí. Pro - Reitoria de pós-graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura, Florianópolis, p. 13.)

7

Page 12: Delação Premiada

Em função de sua questionável ética, à medida que o legislador

incentivava uma traição, acabou sendo abandonada em nosso

Direito, reaparecendo em tempos recentes.23

Esta legislação recente que remete Damásio,

especificamente, trata-se da lei n. 8072/90, que dispõe sobre os crimes hediondos

prevendo em seu artigo 8º, § único, que “o participante e o associado que

denunciar à autoridade o bando ou a quadrilha, possibilitando o seu

desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços”. 24

Posteriormente, no tocante à criminalidade organizada,

seguindo a mão transnacional, a Lei n. 9034/95, que dispõe dos meios

operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações

criminosas, descreve em seu artigo 6º que “nos crimes praticados em organização

criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços; quando a colaboração

espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua

autoria”.25 No mesmo ano, a Lei 9080/95, igualmente acrescentou nas Leis

8137/90 e 7492/86, dispositivos legais, prevendo a delação premiada em

“infrações praticadas por quadrilha ou em co-autoria, mediante a redução da pena

do partícipe que revelar espontaneamente à autoridade policial ou judicial toda a

trama delituosa.” 26

Referente à Lei n. 8137/90, que define crimes contra a

ordem tributária, econômica e relações de consumo, dispôs tratamento à matéria,

previsto em seu artigo 16, parágrafo único. Já a Lei 7492/86, que define crimes

contra o sistema financeiro nacional, foi disposta no artigo 25, § 2º. Em ambas as

Leis, restaram estabelecidas que aos crimes “cometidos em quadrilha ou co-

autoria, o co-autor ou partícipe que através da confissão espontânea revelar à

23 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo Jurídico.

24 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE. Disponível em: <http://jusonline.visaonet.com.br/artigos/traicao.doc> Acesso em 29 de setembro de 2005.

25 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE.

26 PEREIRA JOÃO, Giselle. Delação Premiada: O tratamento Jurídico Instituído pela Lei 9807/99 ao Réu Colaborador. Atuação: Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Santa Catarina, n. 7, p. 180, 2005.

8

Page 13: Delação Premiada

autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de

um a dois terços”. 27

A Lei n. 9269/96 tratou da delação premiada em relação ao

crime de extorsão mediante seqüestro, ao introduzir o §4º no artigo 159 do

Código Penal, prevendo a redução da pena de um a dois terços para aquele que

denunciar o crime à autoridade, facilitando a liberação do seqüestrado. 28

Em 1998, foi introduzida no ordenamento a Lei de lavagem

de capitais, Lei 9613/98, dispondo no artigo 1º. §5º:

A pena será reduzida de um a dois terços e começará a ser

cumprida em regime aberto, podendo o juiz deixar de aplicá-la ou

substituí-la por pena restritiva de direitos, se o autor, co-autor ou

partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades,

prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das

infrações penais e de sua autoria ou à localização dos bens,

direitos ou valores objeto do crime. 29

A Lei n. 9807/99 tentou uniformizar o tratamento dado à

delação, prevendo o legislador a possibilidade de concessão de perdão judicial ou

a diminuição da pena dos acusados que colaborarem de forma voluntária e

eficaz.30

Luiz Flávio Gomes, no artigo Corrupção Política e Delação

Premiada, ao tratar da uniformização no tratamento da delação premiada,

enfaticamente discorda, afirmando que cada uma das leis citadas apresenta suas

peculiaridades de concessão. 31

Ainda em recente obra, Luiz Flávio Gomes, Alice Bianchini,

Rogério Sanches Cunha e William Terra de Oliveira reafirmam:

27 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE.

28 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE.

29 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 192.

30 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE.

31 GOMES, Luiz Flávio. Corrupção Política e Delação Premiada. Instituto LFG. Disponível em: <http://www.proomnis.com.br/public_html/article.php?story=20050830151404903&query=delação% 20 premiada> Acesso em 30 de agosto de 2005.

9

Page 14: Delação Premiada

Cada uma das possibilidades de delação, como se vê, conta com

suas peculiaridades. Não existe um regramento único e coerente.

[...] deve-se cuidar dela com devida atenção, pondo em pauta

questões relevantes como: prêmios proporcionais, veracidade nas

informações prestadas, exigência de checagem minuciosa dessa

veracidade, eficácia prática da delação, segurança e proteção do

delator e, eventualmente, sua família, possibilidade da delação

inclusive após a sentença de primeiro grau, aliás, até mesmo após

o trânsito e julgado, envolvimento do Ministério Público e da

Magistratura no acordo, transformação do instituto da delação

numa espécie de “plea bargaining” etc.32

Por fim, destaca-se a hodierna Lei 11343/06, Lei de drogas,

que reza em seu artigo 41, que o delator voluntário, na investigação policial ou

processo criminal, ao identificar os co-autores e partícipes, recuperando

totalmente ou parcialmente o produto do crime, terá o benefício da redução da

pena de um terço a dois terços.33

1.3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DA DELAÇÃO

PREMIADA EM LEGISLAÇÕES ALIENÍGENAS

A delação premiada desde muito, está materializada no

direito alienígena. Constitue forte arma de combate ao crime, trazendo

características ímpares, que merecem uma breve análise.

1.3.1 Na Itália

O endurecimento das leis Italianas, sobretudo com a

Operazione Mani Puliti (Operação Mãos Limpas), provocou baixas na Máfia,

estimulando a colaboração, reduzindo a violência naquele país.34 O primeiro

32 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 193.

33 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 188.

34 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. Teresina, ano 10, n. 987, 15 mar. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8105>. Acesso em: 15 mar. 2007.

10

Page 15: Delação Premiada

mafioso a romper a Lei do Silêncio (omertá), dando inicio ao instituto do pentiti, foi

Tommaso Buscetta.35

Foram dos juízes Giannicola Sinisi e Giovanni Falcone, os

principais projetos de lei italianos contra associações criminosas, que estimularam

a participação dos chamados colaboradores da Justiça. 36

Em contra ataque, as organizações criminosas efetuaram a

execução de vários mártires, dentre estes o “general Carlos Alberto Dalla Chiesa

(comandante dos Carabiniere na Sicília e responsável por combater a Máfia de

forma heróica), e dos juízes antimáfia Giovanni Falcone e Paolo Borselino”.37

Na Itália, nos crimes em concurso com organizações

criminosas, o agente quando arrepende-se, empenhando-se para diminuir as

conseqüências do crime cometido, confessando-o ou impedindo o cometimento

de crimes conexos, terá a redução da pena na sentença condenatória de um

terço, ou a substituição da pena de prisão perpétua pela reclusão de quinze a

vinte e um anos.38

Segundo José Alexandre Guidi:

A lei italiana n. 82, de 15 de março de 1991, que resultou da

conversão do Decreto-lei n. 8, de 15 de janeiro de 1991,

especificamente em seu art. 6º, modificou o art. 289 bis do Código

Penal Italiano, estabelecendo pena menor para o co-autor de

seqüestro com fins de terrorismo ou subversão da ordem

democrática que libertar a vítima, isto é, pena de dois a oito anos

de reclusão; mas se o seqüestrado morrer em razão do seqüestro,

depois de libertado, a pena será de oito anos de reclusão. Vale

lembrar que a pena, excluindo tais benefícios, é de 25 a 30 anos,

se não houver morte; de 30 anos, quando a morte for por culpa

35 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

36 QUEIROZ, Carlos Alberto Marchi de. Crime organizado no Brasil, comentários à lei n. 9.034/95: aspectos policiais e judiciários: teoria e prática. São Paulo: Iglu, 1998. p. 87.

37 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 102.

38 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 102.

11

Page 16: Delação Premiada

em sentido estrito; ou prisão perpétua, quando a morte for

voluntariamente causada.39

Completa Ada Pellegrini Grinover:

Existe ainda, na legislação italiana, a figura do colaborador que, a

par de agir como dissociado ou arrependido, auxilia as

autoridades na elucidação da autoria de crimes cometidos pela

organização criminosa, permitindo a individualização da conduta e

a captura de outros criminosos.40

Neste caso, a pena “será reduzida pela metade ou haverá a

substituição de prisão perpétua por reclusão de dez a doze anos.” 41

A legislação antiterrorismo italiana, Decreto-lei n. 625/79

(convertido na Lei 15/80) e a Lei n. 304/82, criou três figuras importantes no

sistema penal italiano, aos quais são: o arrependido, o dissociado e o

colaborador.42

Nas palavras de Eduardo Araújo Silva, o primeiro instituto

trata-se de quando os criminosos, antes da sentença condenatória, saem da

associação e fornecem informações acerca da estrutura da organização. Sendo

comprovada a veracidade das denúncias, premia-se o arrependido com a

extinção da punibilidade e lhe proporcionando benefícios do Estado como salário,

moradia e plano de saúde. Além dos benefícios, o Estado passa a se tornar

responsável por sua integridade física, incluindo a de seus familiares mais

próximos. 43

39 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 102.

40 GRINOVER, Ada Pellegrini. O crime organizado no sistema italiano. volume 3: críticas e sugestões, o crime organizado (Itália e Brasil): a modernização da lei penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995b, p. 16.

41 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 103.

42 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 103.

43 SILVA, Eduardo Araújo. Da moralidade da proteção aos réus colaboradores. São Paulo. In: Boletim IBCCrim n. 85, dezembro de 1999, p. 4.

12

Page 17: Delação Premiada

Na figura do dissociado, o concorrente no delito, empenha-

se para, antes da sentença condenatória, elidir ou abrandar as conseqüências

danosas ou perigosas dos crimes, obtendo a redução de um terço da pena.44

Já sobre a figura do colaborador, conforme Ada Pellegrini

Grinover, é o concorrente que, antes da sentença condenatória, procede nos

mesmos comportamentos previstos para o dissociado, cumulados com o auxílio

às autoridades policiais e judiciárias na “colheita de provas decisivas para a

individualização e captura de um ou mais autores dos crimes, ou fornece

elementos de prova relevantes para a exata reconstituição dos fatos e a

descoberta dos autores”.45

O benefício da liberdade provisória somente é permitido,

para as figuras do dissociado e a do colaborador desde que não sejam para as

figuras típicas de terrorismo e de subversão, punidos com pena superior a quatro

anos. Também os institutos da suspensão condicional da pena e o livramento

condicional são facilitados para estes.46

O artigo 630, §5o, do Código Penal Italiano, traz a figura

típica do crime de extorsão mediante seqüestro, na qual, também se tem a ordem

premial, que se constitui na substituição da pena de prisão perpétua pela pena de

reclusão de doze a vinte anos, bem como diminui de um a dois terços, as demais

penas aos co-autores que evitarem que se produzam as conseqüências do delito

ou ajudar na colheita de provas decisivas para a individuação ou captura dos

demais concorrentes.47

Lembra Ada Pellegrini, que “tais medidas podem ser

dispostas em favor dos parentes próximos, dos conviventes e de quem esteja

exposto a perigo grave e iminente, por força das relações mantidas com o

preso”.48 

44 SILVA, Eduardo Araújo. Da moralidade da proteção aos réus colaboradores. p. 4.45 GRINOVER, Ada Pellegrini. O crime organizado no sistema italiano. p. 16.46 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p.

104.47 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito

brasileiro. Jus Navigandi.48 GRINOVER, Ada Pellegrini. O crime organizado no sistema italiano. p. 19.

13

Page 18: Delação Premiada

Por fim, conforme José Alexandre Guidi, o Decreto-lei n.

8/91 (convertido na Lei n. 82/91), dispõem sobre o crime de seqüestro,

estabelecendo normas para os colaboradores da justiça, “determinando a adoção

de medidas aptas a assegurar a incolumidade e, se necessário, a assistência das

pessoas presas, expostas a perigo grave e atual, em conseqüência de sua

colaboração.” 49

1.3.2 Nos Estados Unidos

A colaboração acusatória (conhecida como plea bargaining)

no sistema norte-americano, detém algumas características peculiares. A

iniciativa se dá exclusivamente ao órgão responsável pela acusação, tendo total

faculdade de negociar com o colaborador. Dentre as faculdades conferidas, pode

além de acordar a redução da pena, dispor da ação penal, cabendo apenas ao

magistrado a sua homologação.50

Neste sistema, o Ministério Público, tem a titularidade da

propositura da ação, além dos poderes de “condução da investigação policial, o

declínio da propositura da ação (sem qualquer interferência do judiciário) ou

prosseguimento, bem como a realização de acordos com a Defesa ou a condução

do feito a Juízo.” 51

  Wálter Fanganiello Maierovitch com propriedade destaca:

            [...] é largamente aplicada no Processo Penal norte-

americano, com os mais surpreendentes e espantosos acordos

(agreement). Inúmeros são os casos de avenças disparadas:

admite-se trocar homicídio doloso típico por culposo; tráfico por

uso de drogas; roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo

por furto simples. Para os críticos mais severos, trata-se de prática

lúdica, quando se nota que dez crimes variados são trocados pela

declaração de culpabilidade (plea of guilty) de apenas um, que

49 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 105.

50 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 105.

51 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 105.

14

Page 19: Delação Premiada

pode ser até o menos grave. A plea bargaining visa,

fundamentalmente, a punição, ainda que branda e socialmente

injusta. É justificada como poderoso remédio contra a impunidade,

diante do elevado número de crimes a exigir colheita de prova

induvidosa da autoria, coma conseqüente pletora de feitos e

insuportável carga de trabalho do judiciário.52

O método norte-americano constrói um sistema de culpados,

excluindo a absolvição. Trata-se de um sistema de barganha, zelando pelos

anseios sociais, mitigando o princípio da inocência, pois há um pré-julgamento

antes da instrução criminal. A parte acusatória detém reclamante poder, tornando

a relação desequilibrada, pois esta é quem “coordena, articula a coleta de provas

na fase do inquérito, e prossegue com a sustentação da acusação perante o

Poder Judiciário”, restando à outra parte ficar a mercê da julgadora. “Quando da

acusação formal, surge à possibilidade de acordo (se for a vontade do Acusador),

caso contrário, parte-se para o juízo (instauração do sumário)”.53

Assim tem-se a figura do inquisitor, dirigente da fase pré-

processual, que propõe o acordo ou em caso de impossibilidade, dá seguimento

com a acusação formal. Na forma que está moldado, claramente verifica-se com o

plea bargaining, a possibilidade de supressão do juízo.54

Está incluso também neste programa, além dos delatores, a

proteção de vítimas e testemunhas. 55

Cabe destacar o texto de José Alexandre Guidi, comentando

sobre o alcance do plea bargaining:

Quanto ao alcance prático do “plea bargaining” nos Estados

Unidos, observam-se que através dele são solucionados de 80 %

a 95 % de todos os crimes, por outro lado, inquéritos feitos por

52 MAIEROVITCH, Wálter Fanganiello. Política criminal e plea bargaining. São Paulo. In: Revista de Julgados e Doutrina do Tribunal de Justiça de São Paulo n. 4, out./nov./dez. de 1989. p. 15.

53 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 106.

54 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 106.

55 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

15

Page 20: Delação Premiada

uma amostragem significativa de promotores revelam que estes

consideram cerca de 85 % dos casos da sua experiência como

adequados a uma solução de “plea bargaining”.56

Apesar dos evidentes resultados práticos, este sistema sofre

grandes críticas dos juristas norte-americanos, principalmente no que tange ao

princípio da publicidade (pois os acordos sobre os fatos e direitos, são efetuados

em gabinete), ao princípio da igualdade (potencialização de tratamentos não

isonômicos em crimes de mesmo dano social) e também por permitir a ampliação

da injustiça.57

1.3.3 Na Espanha

A Espanha foi um dos países que importou a Lei dos

Arrependidos. Conhecida como delincuente arrepentido (delinqüente arrependido) 58, têm presente a figura do arrependimento processual que estabelece a

atenuação da pena.59

Conforme elucida Juliana Kobren:

Para isso, mister a presença de algumas condições: a) abandono

das atividades delituosas; b) confissão dos fatos delituosos nos

quais tenha participado; e c) ajuda a impedir a produção do delito

ou auxiliar na obtenção de provas para a identificação ou captura

dos demais, ou, ainda, cooperação eficaz para a consecução de

provas que impeçam a atuação ou desenvolvimento das

organizações criminosas em que tenha participado.60

56 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 106.

57 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 106.

58 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 107.

59 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

60 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

16

Page 21: Delação Premiada

Preenchidas estas condições, no tocante aos crimes de

terrorismo, é que se obtém a benesses, que podem ser a exclusão, a atenuação

ou a remissão da pena.61 Este modelo de sistema busca resultados de caráter

preventivos e repressivos, exigindo que a colaboração seja eficaz.62

Conforme José Alexandre, o novo texto do Código Penal

espanhol, contempla-se no artigo 579, encartado na Seção Segunda (delos

delitos de terrorismo) do Capítulo V, do Título XXII (delitos contra el orden público)

do Livro II, o seguinte:

Art. 579 – En los delitos previstos en esta Sección, los Jueces y

Tribunales, razonándolo en Sentencia, pódrán imponer la pena

inferior en uno o dos grados a la señalada por la Let para el delito

de que se trate, cuando el sujeito haya abandonado

voluntariamente sus actividades delictivas y se presente a las

autoridades confesando los hechos en que haya participado y,

además, colabore activamente con éstas para impedir la

producción del delito o coadyuve eficazmente a la obtención de

pruebas decisivas para la identificación o captura de otros

responsabels o para impedir la actuación o el desarrllo de bandas

armadas, organizaciones o grupos terroristas a los que haya

pertenecido o con los que haya colaborado.63

Por fim, presta-se lembrar o artigo 376 do mesmo diploma

penal espanhol, onde trata de organizações ou associações dedicadas ao tráfico

ilegal de drogas. Este artigo impõe condutas e benefícios idênticos ao artigo

supracitado.64

61 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 107.

62 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

63 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 108.

64 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 108.

17

Page 22: Delação Premiada

1.3.4 Na Alemanha

O sistema jurídico alemão, quanto a delação premiada,

adota a mesma linha dos sistemas europeus supracitados, onde o acusado que

colabora com a justiça, recebe os benefícios previstos em lei.65

Denominado Kronzeugenrelegelung ou a regulação dos

testemunhos, encontrar-se contemplado no artigo 129, alínea a, inciso V, do

StGB. O referido artigo faculta ao magistrado, discricionariamente diminuir a pena

ou deixar de “aplicá-la quando o agente se empenha séria e voluntariamente a

impedir a continuação da associação ou a prática de um crime fim desta”,

denunciando voluntariamente a uma autoridade. Se por circunstâncias alheias à

vontade, não se puder impedir o delito, o agente mesmo assim receberá as

benesses legais.66

Já em relação aos crimes de terrorismo, elucida Julio Díaz-

Maroto Villarejo, referindo-se a Lei 4 de 1989:

[...] no artigo 4º da Lei de 9 de junho de 1989, modificada pela Lei

de 16 de fevereiro de 1993, se prevê a possibilidade de se

dispensar a ação penal, arquivar o procedimento já começado,

atenuar ou dispensar a ação penal, arquivar o procedimento já

começado, atenuar ou dispensar a aplicação da pena. Tais

benefícios oferecidos ao investigado servem para evitar a prática

do crime, permitir sua apuração ou a captura dos demais

envolvidos. Estas disposições do artigo 4º da Lei 4 de 1989 são

normas especiais como as assinadas no StGB e, portanto, devem

ser aplicadas preferencialmente.67

Esta Lei (Lei 4 de 1989) contempla não só os crimes de

terrorismo, mas os que com ele estão conexos, na qual as benesses dispostas

65 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

66 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 109.

67 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. apud VILLAREJO, Julio Díaz-Maroto. Algunos aspectos jurídicos-penales y procesales de la figura del “arrepentido”, Revista Ibero-Americana de Ciências Criminais, ano 1, n. 0, maio-agosto, 2000. p. 186.

18

Page 23: Delação Premiada

facultam ao Estado abrir mão da persecução penal, desde que haja o

esclarecimento do delito ou captura dos autores.68

1.3.5 Na Colômbia

A Colômbia adotou, na mesma linha italiana, uma legislação

emergencial, profundamente voltada ao combate ao narcotráfico. 69

Este sistema que primordialmente voltado ao narcotráfico,

conforme Alexandre Guidi, permite a:

[...] redução da pena em um terço em caso de confissão do

imputado (art. 299). Por sua vez, o art. 369-A do CPP colombiano

possibilitou um acordo e concessão de benefícios, tais como

diminuição da pena, liberdade provisória, substituição de pena

privativa de liberdade, inclusão no programa de proteção a vítimas

e testemunhas, àquele que colaborar com a administração da

justiça.70

O sistema colombiano, diverso dos sistemas até agora

estudados, tem como característica marcante a ausência da necessidade de

confissão do concorrente do delito. 71

O concorrente do delito receberá os benefícios da Lei,

simplesmente se preencher comitantemente dois requisitos: a) acusar os demais

concorrentes e b) fornecer provas eficazes. 72

68 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud OLIVEIRA JUNIOR, Gonçalo Farias de. O direito premial brasileiro: breve excursus acerca dos seus aspectos dogmáticos. Presidente Prudente. In: Intertemas: Revista do Curso de Mestrado em Direito v. 2, 2001.

69 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 109-110.

70 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 110.

71 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 110.

72 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 110.

19

Page 24: Delação Premiada

Claramente deve-se observar que a delação só é valida, se

for de forma livre, desvirtuada de outras provas.73

.

1.3.6 No Combate dos Crimes Transnacionais

O crime não respeita fronteiras, sendo que cada vez mais as

organizações unem-se ou criam bases de multiplicação do poder, movimentando

e dispondo de estrondoso poderio bélico e econômico.

Wálter Fanganiello Maierovitch abordando a questão

escreve:

Em síntese e usando de uma imagem, o mapa-múndi é uma

grande cabeça tomada pelas metástases decorrentes de um

tumor maligno chamado crime organizado transnacional. E os

cancros proliferam pela incredulidade dos que não temem pela

perda da cidadania e da paz.74

É primordial a cooperação internacional no combate destas

organizações, principalmente por que muitas destas têm o poderio econômico

superior de grande parte das economias de países do terceiro mundo.

Sobre o tema pondera Geraldo Brindeiro:

O Ministério Público brasileiro, o interamericano e o internacional

[...] têm, nos últimos cinco anos, estreitado a cooperação no

interesse comum e discutido intensamente novas formas de

atuação no sentido do aprimoramento das investigações, da

persecução criminal e da cooperação internacional no combate à

criminalidade. Discussões, debates doutrinários e de direito

comparado, especialmente à luz dos modelos adotados nos

países de "common law" e de "civil law" (quanto a direção das

investigações, a inquéritos policiais e a juizados de instrução,

magistrados e Ministério Público), têm havido sobre a

73 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 110.

74 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud MAIEROVITCH, Wálter Fanganiello. As multinacionais do crime. Consciência. Disponível em: <http://www. consciencia .net /2003 /07 /13 / MAIEROVITCH .html>. Acesso em: 15 de julho de 2003.

20

Page 25: Delação Premiada

modernização da legislação nacional para fazer frente aos

presentes desafios.

Pretendemos ainda a institucionalização de novos instrumentos

jurídicos para a maior eficiência da ação da Justiça.

Em vários países, em alguns casos no Brasil, foram criados

programas de proteção a testemunhas, de formas de "plea

bargaining" com réus colaboradores, de agilização da quebra de

sigilo bancário e fiscal, de bloqueio de contas e de confisco de

bens em ações civis nas hipóteses de bens ou rendas de origem

não-comprovada.

Isso além da utilização informal de moderna tecnologia (fax,

telefonemas, e-mails, home pages), para maior comunicação

entre os membros do Ministério Público, e da formação de forças-

tarefa com agilidade no combate ao crime, nacional ou

transnacional, organizado.

A melhoria da cooperação internacional abrange também a

necessidade de aprimoramento e de inovações no uso tradicional

dos sistemas de extradição, de tratados de assistência jurídica

recíproca (mutual legal assistance treaties), considerando a

diversidade jurídica de modelos, e sua revisão, especialmente

quando há nacionais envolvidos em tráfico de drogas, além da

instalação - que se pretende no médio prazo, a despeito dos votos

contrários de dois membros do Conselho de Segurança da ONU:

Estados Unidos e China - do Tribunal Penal Internacional, cuja

criação foi aprovada, em julho de 1998, em Roma, na reunião dos

plenipotenciários das Nações Unidas, com voto favorável do

Brasil.

Em abril deste ano, em Viena, sob os auspícios das Nações

Unidas (United Nations Office for Drug Control and Crime

Prevention), foi elaborado o texto da Convenção Multilateral contra

o Crime Transnacional Organizado, que foi aprovado em

conferência da ONU realizada na semana passada na cidade de

Palermo, na Sicília (Itália).

Não há lugar nesse combate para a ação isolada individual: o

trabalho é de equipe e em parceria com outros órgãos

responsáveis. Além disso é indispensável a realização de

reformas no Judiciário, para evitarmos a lentidão da prestação

21

Page 26: Delação Premiada

jurisdicional, os recursos protelatórios, a prescrição e a

impunidade.

No Estado Democrático de Direito, todavia, não podem ser

violados princípios constitucionais para uma suposta maior

eficiência na luta contra o crime. 75

Os países europeus, através da União Européia já se

mobilizam para atuar frente ao combate dos crimes transnacionais, promovendo a

integração principalmente no campo da sociologia jurídica e do Direito. Um

exemplo prático é a recomendação de 20 de dezembro de 1996, do Conselho

Europeu, onde prevê a figura do colaborador da justiça no combate da

criminalidade internacional. Surge o Direito Comunitário, capaz de criar um direito

igual para toda a Europa, objetivando a superação das organizações

transnacionais. 76

1.4 NATUREZA E CLASSIFICAÇÃO

A delação premiada está intimamente ligada ao Princípio do

Consenso, que é uma variante do Princípio da Legalidade. Este princípio permite

que as partes possam ajustarem a despeito da situação jurídica do acusado.77

A disposição dessa variante do futuro do acusado é

estritamente limitada, sendo que o grau discricionariedade do operador do direito

deverá estar expresso em Lei. 78

75 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud BRINDEIRO, Geraldo. A justiça e a criminalidade contemporânea. In: Folha de São Paulo, Artigo/Opinião. Em: 21 Dez. 2000.

76 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

77 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 125.

78 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 125-126.

22

Page 27: Delação Premiada

O Princípio do Consenso não tem caráter absoluto no Brasil,

sendo claramente seus marcos determinados pela legislação. (Princípio da

Legalidade). 79

A finalidade do instituto da delação premiada é suprir uma

incapacidade estatal em buscar elementos para a persecução penal. Verifica-se

então que a delação premiada tem a natureza de prova. Prova esta inominada,

pois não se faz presente no rol do Diploma Processual Penal.80

No tocante a classificação da delação premiada, busca-se

na doutrina uma metodologia aplicável. Tema este, somente abordado, por José

Alexandre Marson Guidi.

O referido autor traz em sua obra a classificação de delação

aberta e fechada. Esta classificação, de fato é inaplicável à delação premiada

como se aparentemente pretendia. Primeiramente, delação, como já comentado

no item 1.1 deste trabalho, não é o mesmo que delação premiada.

Segundo Guidi, delação aberta é aquela que o delator é

identificado e delação fechada, ao contrário, é aquela em que o denunciante é

anônimo. 81 Obviamente o anonimato não se permite a confissão (premissa no

direito brasileiro) e muito menos imputar qualquer espécie de prêmio. Desta

forma, não poderá se falar no instituto da delação premiada, para a classificação

adotada por Alexandre Guidi.

Para contemplar o estudo, sugere-se (somente como meio

didático) abordar a delação sob dois enfoques para sua classificação.

Abordando a delação premial sob o enfoque do momento do

da atuação estatal, esta pode ser classificar como: a) investigatória (aquela que

se dá na fase policial) e b) processual (aquela que se dá após a instauração do

processo criminal).

79 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 125-126.

80 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 125.

81 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 119.

23

Page 28: Delação Premiada

Humildemente cabe tecer algumas linhas para caracterizar

esta classificação sugerida. A delação premiada investigatória, como já

mencionada, se perfaz na fase anterior ao recebimento da denúncia. Esta permite

que a autoridade investigadora promova a ocultação absoluta do delator. Isso é

permitido, pois na fase preparatória da denúncia, os Princípios Constitucionais da

Ampla Defesa e do Contraditório infringidos, não afetam a validade do

procedimento. O que se tutela é uma rápida atuação do poder de polícia e a

salvaguarda dos bens tutelados pela sociedade.

Já na delação processual, posterior ao recebimento da

denúncia, pelo atual sistema processual penal, é absolutamente proibido atuar de

forma a surpreender a defesa, devendo o processo ser desenrolado sob a sombra

do princípio do Contraditório e da Ampla Defesa. Destaca-se que a delação nesta

fase, muitas vezes o crime já ocorreu.

Em uma nova análise, poderia ser adotado o critério quanto

à extensão dos efeitos da delação premiada. Esta classificação estaria cingida ao

delinear os efeitos pretendidos na sentença penal. Assim, classificar-se-ia como;

a) delação premiada com efeitos absolvitórios e b) delação premiada com efeitos

circunstanciais. O primeiro permite ao delator o prêmio da não punibilidade, e o

segundo, a redução da pena final a cumprir. O problema de se adotar esta ultima

metodologia é a falta de clareza, proporcionalidade e objetividade dispostas nas

legislações que tratam do instituto no Brasil, ao qual será abordado em momento

oportuno no próximo capítulo.

24

Page 29: Delação Premiada

CAPÍTULO 2

DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS TÉCNICOS

2.1 DISCIPLINAS NORMATIVAS

No ordenamento brasileiro, a delação premiada é tratada de

forma dispersa. São várias Leis que regulam a matéria, compreendendo um

regramento particular para cada caso.

Tem-se hoje em vigor, na legislação pátria as seguintes Leis,

em ordem cronológica, que tratam sobre delação premiada:

Lei n. 8072/90, que dispõe sobre os crimes hediondos, previsto em

seu artigo 8º, § único;

Lei n. 9034/95, que dispõe sobre o combate ao crime organizado,

previsto no artigo 6º.

Lei n. 7492/86, que define crimes contra o sistema financeiro

nacional, foi disposta no artigo 25, § 2º (introduzido pela Lei n.

9080/95);

Lei n. 8137/90, que dispõe sobre crimes contra a ordem tributária,

econômica e contra as relações de consumo, previsto no artigo

16, parágrafo único (introduzido pela Lei n. 9080/95);

Decreto-lei n. 2848/40, Código Penal Brasileiro, previsto no artigo

159 §4º (introduzida pela Lei n. 9269/96);

Lei n. 9613/98, dispõe sobre lavagem de capitais, previsto no artigo

1º. §5º;

Lei n. 9807/99, dispõe sobre o programa especial de proteção a

vítimas e testemunhas ameaçadas e dá outras providências,

previstos no artigo 13 e seguintes;

25

Page 30: Delação Premiada

Lei n. 11343/06, dispõe sobre prevenção e repressão ao uso de

drogas, previsto no artigo 41.

2.2 BENEFÍCIOS E REQUISITOS PARA A CONCESSÃO

Apesar de a delação premiada ter para todo o ordenamento

jurídico a mesma finalidade, resguarda requisitos e efeitos específicos, aos quais

serão analisados, dentro de suas particularidades, nos tópicos a seguir:

2.2.1 Lei n. 8072/90 – Lei dos Crimes Hediondos

Previsto no artigo 8º, § único tem os seguintes dizeres:

Art. 8º [...]

Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à

autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu

desmantelamento, terá a pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois

terços) 82

São requisitos cumulativos para a delação premiada:

Ser concorrente (autor, co-autor ou partícipe) em quadrilha ou

bando. 83 Ainda sobre o tema elucida Damásio de Jesus:

Suponha-se que uma pessoa que não integre bando ou quadrilha

esteja sendo processada pela prática de determinado delito. Ao

ser interrogada, delate quadrilheiros co-autores de outro crime, do

qual não participara e que não se relaciona com o ilícito por ela

praticado. Sendo eficaz a colaboração, pode ser beneficiada pela

“delação premiada”?

Entendemos que não, uma vez que as normas relativas à matéria

exigem que o sujeito ativo da delação seja participante do delito

82 BRASIL, Lei n. 8072 de 25 de julho de 1990. Dispõe sobre crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 25 de julho de 1990.

83 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 313.

26

Page 31: Delação Premiada

questionado (co-autor ou partícipe). Em nosso ordenamento

jurídico, essa possibilidade somente era possível quando da

vigência das Ordenações Filipinas (título CXVI). Agora, não

mais.84

Prática de crimes hediondos ou equiparados. Não se aplica o

dispositivo ao delito de extorsão mediante seqüestro do artigo

7º, que já possui uma forma de delação específica, prevista no

Código Penal85·. No mesmo sentido, também não se aplica o

tipo ao crime de traficância de drogas.86;

Delação 87;

Eficácia da delação, ou seja, relação de causalidade entre a

delação (causa) e o desmantelamento (efeito) 88;

Endereçamento à autoridade, assim entendidos o Delegado de

Polícia, Juiz de Direito, Promotor de Justiça e etc.89;

Deve-se observar que os requisitos acima dispostos são

cumulativos, ou seja, a não tipificação de qualquer um dos elementos do tipo, não

permitirá a concessão da delação premiada. Então, se a reunião de quadrilha ou

bando for para práticas de crimes diversos dos entabulados, como hediondos ou

equiparados, aplicar-se-á o artigo 28890 do Código Penal (como regra se não

houver Lei específica tipificando a conduta), sem beneficie legal da Lei de crimes

hediondos.91

84 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo Jurídico.

85 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 313.86 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. 2005. 66

p. Especialização em Ciências Criminais. Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina. Núcleo de Pós-Graduação, Florianópolis. p. 16.

87 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 313.88 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial.

3ª Edição, São Paulo: Editora Premier, 2006, p.706.89 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial.

p.706.90 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial.

p.706.91 Art. 288. Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer

crimes: Pena- reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.

27

Page 32: Delação Premiada

Presente os requisitos, o delator “terá” o prêmio da redução

da pena de um ano a dois terços. O verbo “claramente” impõe a obrigatoriedade

do prêmio ao delator. 92

A intensidade da redução será moderada pela “maior ou

menor contribuição causal do delator para o desmantelamento da quadrilha”.93

Outro ponto importante que se deve trazer à luz deste

estudo, aplicável para todas as normas em comento, neste capítulo, é a

obrigatoriedade da fundamentação da decisão, quando não for aplicada a

redução máxima prevista no tipo. 94

Se não aplicar a redução máxima prevista na Lei, deve o juiz

fundamentar sob pena de nulidade. Neste sentido, elucida Delmanto ao tratar

sobre a Lei 7492/8695 e sobre o crime de extorsão mediante seqüestro.96 Preceito

este obrigatório por expressa imposição da Carta Constitucional, prevista em seu

artigo 93, IX.97

2.2.2 Lei n. 9034/95 – Combate ao Crime Organizado

Objetivando a maximizar os meios de combate das

organizações criminosas, a Lei n. 9034/95, também dispôs sobre o instituto da

delação premiada, em seu artigo 6º, trazendo os seguintes dizeres:

Art. 6º. Nos crimes praticados em organização criminosa, a pena

será reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços), quando a colaboração

92 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial. p.706.

93 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial. p.706.

94 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. p. 365.95 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de.

Leis Penais Especiais Comentadas. Rio de Janeiro: Renovar. 2006. p. 22396 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. p. 365.97 Art. 93. IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e

fundamentados todas as decisões, sob pena de nulidade [...] grifo nosso

28

Page 33: Delação Premiada

espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações

penais e sua autoria.98

São requisitos cumulativos:

Crime praticado por organização criminosa. O maior problema da

aplicação do benefício é a definição do que é organização

criminosa, já que a lei não o faz expressamente.99 Na concepção

de Marcelo Batlouni Mendroni, organização criminosa é o

“organismo ou empresa, cujo objetivo seja a prática de crimes

de qualquer natureza”. Sua existência sempre se justifica,

enquanto estiver voltada para a prática de atividades ilegais. “É,

portanto, empresa voltada à prática de crimes” 100;

Colaboração espontânea. Espontaneidade significa dizer que a

conduta do agente é “sinceramente desejada, fruto da aspiração

íntima de alguém.” 101 Completa Delmanto, ao comentar sobre

espontaneidade na Lei 8137/90:

A confissão há de ser espontânea, isto é, aquela cuja

voluntariedade não se encontra maculada. O agente, por sua livre

vontade, sem coação e tampouco induzimento em erro essencial,

decide espontaneamente confessar. É irrelevante à configuração

do motivo – mais ou menos nobre – que teria levado o agente a

confessar. Não se exige, pois, que a confissão seja fruto de

arrependimento.102

Ser concorrente (autor, co-autor ou partícipe);

Delação;

98 BRASIL, Lei n. 9034 de 03 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 03 de maio de 1995.

99 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 17.100 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. .apud

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado. Aspectos gerais e mecanismos legais. São Paulo: Juarez de Oliveira. 2002. p. 10.

101 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.102 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de.

Leis Penais Especiais Comentadas. p. 380.

Page 34: Delação Premiada

Ter como resultado esclarecimento de infrações penais e sua

autoria; Neste sentido o Tribunal de Justiça do Estado de Santa

Catarina já decidiu:

Não há como aplicar a redução de pena autorizada pelo art. 6º, da

Lei n. 9.034/95 (com similar no art. 8º, parágrafo único, da Lei n.

8.072/90), quando a delação não for suficiente para subsidiar o

desmantelamento da organização criminosa que se suspeitava

existir, até porque não se conseguiu comprovar sequer o crime de

quadrilha ou bando.103

Endereçamento à autoridade (Delegado de Polícia, Juiz de Direito,

Promotor de Justiça e etc.).

O benefício aplicado ao agente que praticar todos os

elementos do tipo é a redução da pena de um a dois terços.

Uma peculiaridade é que não há uma imposição normativa

(através do verbo – elemento essencial do tipo) de preenchimento dos requisitos,

sendo que, o delator obrigatoriamente desfruta do benefício legal. Mas seguindo o

entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, no trecho do

acórdão supracitado (Apelação Criminal 2002.018665-7), que reconhece a

similaridade do artigo 6º com o artigo 8º § único da Lei dos Crimes Hediondos, a

postura mais adequada é também aplicar a obrigatoriedade do benefício,

presentes os requisitos ou fundamentando em contrário.

Quanto à intensidade da redução da pena, da mesma forma

utilizada para dosada na Lei de Crimes Hediondos, será moderada pela maior ou

menor contribuição causal do delator para o desmantelamento da organização.

103 BRASIL. Tribunal do Estado de Santa Catarina. Apelação Criminal 2002.018665-7, da comarca de Içara, Florianópolis, SC, Disponível em: <www. tj.sc.gov.br>. Acesso em 12 de abril de 2007.

Page 35: Delação Premiada

2.2.3 Lei n. 7492/86 - Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional e a Lei n.

8137/90 - Crimes Contra a Ordem Tributária, Econômica e as Relações de

Consumo

Estas duas Leis, ao tratar da delação premiada, trazem

idêntica disposição legal, devendo ser analisadas conjuntamente. Os respectivos

artigos que tratam da delação premiada são: a) artigo 25 §2º da Lei n. 7492/86 e

b) artigo 16 § único da Lei n. 8137/90, explicitando a seguinte regulamentação:

Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou co-

autoria, o co-autor ou o partícipe que através de confissão

espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama

delituosa terá a sua pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).104

105

Observado o tipo penal, verificam-se os seguintes elementos

cumulativos:

Crimes previstos nos tipos penais definidos pela Lei específica.

Concorrência delituosa (autor, co-autor e partícipe) 106;

Confissão espontânea107;

Delação

Revelar a autoridade (policial ou judiciária);

Resultado. Para Germano Miranda é exigido que toda a trama seja

desvendada. Ainda sobre o tema, o referido autor, elucida que a

eficácia requerida no resultado fica prejudicada. Isto porque o

conhecimento dos aspectos do delito, “geralmente toca ao

principal autor e mentor, o que, por vezes, inviabiliza que

104 BRASIL, Lei n. 7492 de 16 de junho de 1986. Define crimes contra o sistema financeiro nacional e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 16 de junho de 1986.

105 BRASIL, Lei n. 8137 de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 27 de dezembro de 1990.

106 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 222-223.

107 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 223.

Page 36: Delação Premiada

partícipes ou meros executores venham a prestar informações

essenciais ao esclarecimento”.108 Em contra senso Delmanto

mais coerentemente dispõe que, para obter o benefício, toda a

trama delituosa deverá ser desvendada até onde for o

conhecimento do concorrente.109 A concessão do benefício

ficaria somente prejudicado, caso se prove que o delator tenha

maior ciência110.

Ao tratar dos crimes conexos, Germano Miranda, elucida

que “eles também devem ser revelados, já que os termos trama delituosa não nos

permite conceder o benefício se sobre todos eles não forem prestadas as

revelações necessárias”.111

Quanto ao benefício, prevê as duas Leis, a redução de um a

dois terços, da pena, aplicando-se, conforme prescreve o elemento essencial do

tipo, a obrigatoriedade do benefício. No tocante a dosagem da redução, segue a

mesma orientação das Leis anteriores comentadas.

2.2.4 Decreto-lei n. 2848/40 - Código Penal Brasileiro

Prevista no artigo 159 § 4º do Diploma Material Penal, traz o

seguinte preceito:

Art. 159 [...]

§ 4º. Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o

denunciar à autoridade, facilitando a liberdade do seqüestrado,

terá sua pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).112

108 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 18.109 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de.

Leis Penais Especiais Comentadas. p. 223.110 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de.

Leis Penais Especiais Comentadas. p. 380.111 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 18.112 BRASIL, Decreto-lei n. 2848 de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da

República Federativa do Brasil, Rio de Janeiro, RJ, 07 de dezembro de 1940.

Page 37: Delação Premiada

Do tipo penal, extraem-se os seguintes requisitos

cumulativos:

Concorrência no crime de extorsão mediante seqüestro. Comenta

Germano Miranda que a delação é prevista para todas as

modalidades de extorsão mediante seqüestro.113 Cabe aqui uma

ressalva não observada, referente ao artigo 159 §3º do Código

Penal, na qual a compatibilidade do instituto fica prejudicada

com a morte da vítima em cativeiro, permitindo somente a morte

a posteriori libertação;

Delação;

Levar ao conhecimento de autoridade;

Facilitação da libertação do seqüestrado. Segundo Delmanto, é

necessário que ocorra o efeito de haver facilitado a libertação.

Trata-se claramente de resultado.114 No mesmo sentido,

completa Damásio de Jesus: “Não basta à simples delação,

exigindo o tipo a efetiva liberação.” 115

Da mesma forma já comentada nas Leis anteriores, a

redução é de um a dois terços, com aplicação obrigatória (imposição do verbo) e

com a mensuração da dosagem de redução, compatível com a contribuição

causal do delator para a libertação da vítima.

2.2.5 Lei n. 9613/98 - Lavagem de Capitais

Nesta Lei, a delação premiada está prevista no artigo 1º §5º,

assim prescrevendo:

Art. 1 [...]

113 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 18.114 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. p. 365-366.115 JESUS, Damásio de. Código Penal Anotado. 11ª edição. São Paulo: Saraiva. 2001. p. 586.

Page 38: Delação Premiada

§5º. A pena será reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços) e

começará a ser cumprida em regime aberto, podendo o juiz deixar

de aplicá-la ou substituí-la por pena restritiva de direitos, se o

autor, co-autor ou partícipe colaborar espontaneamente com as

autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à

apuração das infrações penais e de sua autoria ou à localização

dos bens, direitos ou valores objeto do crime.116

Em análise ao tipo, extraem-se os seguintes requisitos

cumulativos:

Concorrência delituosa;

Tipo penal incriminador definido pela Lei de lavagem de capitais;

Delação;

Colaboração espontânea. Não necessita arrependimento;117

Levar ao conhecimento de autoridade;

Resultado. Sobre este requisito esclarece Delmanto:

Não são, contudo, quaisquer esclarecimentos que terão o condão

de beneficiar o agente, mas apenas aqueles que conduzam

(levem): a. à apuração das infrações penais e de sua autoria; ou

b. à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.118

No que contempla a aplicação, rege-se pelas mesmas

regras das Leis supracitadas, diferenciando especificamente no que tange a

substância do benefício.

116 BRASIL, Lei n. 9613 de 03 de março de 1998. Dispõe sobre crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para ilícitos previstos nesta Lei. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, de 03 de março de 1998.

117 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 565.

118 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 566

Page 39: Delação Premiada

Além da redução de um a dois terços da pena, pode ser

concedido ao delator o cumprimento da pena em regime aberto, ou a substituição

por pena restritiva de direitos e ou até a isenção do cumprimento da pena.119

2.2.6 Lei n. 9807/99 - Lei de Proteção a Vítimas, Testemunhas e outros

Colaboradores da Justiça

Tendo como objetivo principal aumentar a colaboração para

a solução de crimes, em 1999 foi publicada a Lei 9807. Mais especificamente

sobre a delação premiada, a Lei traz um capítulo à parte, tentando regulamentar

de forma geral a aplicação do instituto. Mas como já comentado (item 1.2 deste

trabalho), nas palavras de Luiz Flávio Gomes, Alice Bianchini, Rogério Sanches

Cunha, William Terra de Oliveira.120, reforçadas por Guilherme de Souza Nucci121,

a Lei não trouxe um regramento que consolidasse o instituto, deixando-o mais

confuso.

Preceitua a Lei em seu Capítulo II, Da Proteção aos Réus

Colaboradores:

Art. 13 Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes,

conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da

punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado

efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo

criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:

I – a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação

criminosa;

II – a localização da vítima com a sua integridade física

preservada;

III – a recuperação total ou parcial do produto do crime.

119 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 566

120 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 192.

121 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 680.

35

Page 40: Delação Premiada

Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta

a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias,

gravidade e repercussão social do fato criminoso.

Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente

com a investigação policial e o processo criminal na identificação

dos demais co-autores ou partícipes do crime, na localização da

vítima com vida e na recuperação total ou parcial do produto do

crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de 1 (um) a 2/3

(dois terços).

Art. 15 Serão aplicadas em benefício do colaborador, na prisão ou

fora dela, medidas especiais de segurança e proteção a sua

integridade física, considerando ameaça ou coação eventual ou

efetiva.

§1º. Estando sob prisão temporária, preventiva ou em decorrência

de flagrante delito, o colaborador será custodiado em dependência

separada dos demais presos.

§2º. Durante a instrução criminal, poderá o juiz competente

determinar em favor do colaborador qualquer das medidas

previstas no art. 8º desta Lei.

§3º. No caso de cumprimento da pena em regime fechado, poderá

o juiz criminal determinar medidas especiais que proporcionem a

segurança do colaborador em relação aos demais apenados.

Art. 19. A União poderá utilizar estabelecimentos especialmente

destinados ao cumprimento de pena de condenados que tenham

prévia e voluntariamente prestado a colaboração de que trata esta

Lei.122

122 BRASIL, Lei n. 9807 de 13 de julho de 1999. Estabelece normas para a organização e a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas, institui o Programa Federal de assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas e dispõe a proteção de acusados ou condenados que tenham voluntariamente prestado efetiva colaboração à investigação policial e ao processo criminal. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, de 14 de julho de 1999.

36

Page 41: Delação Premiada

Vislumbrando os artigos supracitados, dividir-se-á o estudo

em dois momentos, sendo o primeiro quanto aos beneficiários e benefícios

abrangidos pelo instituto e o segundo quanto às medidas de segurança.

Quanto aos beneficiários e benefícios abrangidos pelo

instituto, pode-se dizer que a Lei adotou dois tipos penais, sendo um especial,

com o prêmio do perdão judicial, e outro geral, que permite a redução da pena. 123

A norma especial terá sempre todos os elementos da geral e

mais algum elemento, denominado especializante. Havendo conflito entre uma

norma de caráter especial e outra de caráter geral, prevalece a norma de caráter

especial. Isso nada mais é do que a aplicação do Princípio da Especialidade, que

preenchido todos os elementos da norma mais restrita aplicar-se-á esta.124

Assim na conformidade da Lei, os requisitos para aplicação

da delação premiada restrita, nas conformidades dos artigos 13 caput e 13 §

único são:

Ser concorrente no crime;

Delação;

Primariedade. Trata-se de uma exigência específica não contida

em outras normas relativas à delação premiada. Primário,

segundo Guilherme de Souza Nucci, por exclusão é “o não

reincidente (quem, já tendo sido condenado anteriormente por

crime, comete outro delito no período de cinco anos,

computados a partir da extinção da pena anterior, conforme

dispõe o art. 64, I, CP125).” 126;

Colaboração efetiva. Requisito inútil, pois o importante é atingir os

resultados dos incisos;127

123 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 679.124 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. Volume 1. São Paulo: Saraiva, 2006.125 Art. 64. Para efeitos de reincidência: I – não prevalece a condenação anterior, se entre a data

do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação;

126 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.127 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.

37

Page 42: Delação Premiada

Voluntariedade. Segundo Guilherme de Souza Nucci:

Voluntariedade: é a ação ou omissão empreendida livre de

qualquer coação física ou moral. Difere da espontaneidade que,

em Direito Penal, significa a conduta sinceramente desejada. No

caso do artigo 13, exige-se apenas voluntariedade, pouco

importando se o agente atua com espontaneidade. 128

Colaboração dúplice. Entende-se que a colaboração deve se dar

tanto na fase policial como na judicial, ou no mínimo nesta última

fase;129

Endereçamento a autoridade;

Resultado alternativo ou cumulativo. Não é específica a Lei se o

resultado deve ser cumulativo ou alternativo. A melhor

interpretação é no sentido da alternatividade dos requisitos do

resultado, pois o posicionamento em contrário permitiria sua

aplicação apenas para o crime de extorsão mediante seqüestro.

Assim, atingindo qualquer um dos requisitos dos incisos do art.

13, permitirá ao delator o prêmio determinado pelo tipo legal130;

Requisitos de análise subjetiva. Por fim, deve o magistrado na

concessão do benefício, a observância dos requisitos

entabulados no parágrafo único, que são a personalidade, a

natureza, a circunstância, a gravidade e a repercussão social do

crime;

Presente todos os requisitos acima previstos, terá o acusado

o benefício do perdão judicial pelo crime praticado. Mas a ausência de qualquer

um dos requisitos prescritos, ainda permitirá a análise do tipo geral, previsto no

artigo 14, com os seguintes requisitos:

Delatar;

Ser concorrente em crime;

128 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.129 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.130 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 678.

38

Page 43: Delação Premiada

Voluntariedade;

Colaboração dúplice;

Levar ao conhecimento de autoridades;

Resultado.

Observa-se que apresenta os mesmos requisitos legais

previstos no artigo anterior, exceto a primariedade e os requisitos subjetivos do

parágrafo único.

Assim, presentes os requisitos do artigo 14, deverá o delator

ter a redução da pena no montante de um a dois terços, com as disposições da

obrigatoriedade, fundamentação e dosagem idênticas aos tipos das Leis

anteriores comentadas.

Por fim, não tão menos importante, a Lei trouxe medidas de

segurança para garantia da integridade física do delator. Trata-se de medidas

administrativas impostas nos artigos 15 caput e seus parágrafos e artigo 19 da

Lei. Sobre o tema descreve Guilherme de Souza Nucci:

[...] trata-se de medida adotada, há muitos anos, pelas

autoridades responsáveis ela administração dos presídios. Não se

pode misturar o preso que delata o companheiro ou o esquema

criminoso aos demais. Pela “lei da marginalidade” será,

consequentemente, morto.131

2.2.7 Lei n. 11343/06 - Lei de Prevenção e Repressão ao Uso de Drogas

Recentemente editada, trata da delação premiada em seu

artigo 41, trazendo os seguintes requisitos cumulativos:

Art. 41. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente

com a investigação policial e o processo criminal na identificação

dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação

131 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 683.

39

Page 44: Delação Premiada

total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá

pena reduzida de um terço a dois terços.132

Delação;

Crime tipificado pela Lei de drogas;

Voluntariedade;

Concorrência no delito;

Colaboração dúplice;

Levar ao conhecimento das autoridades;

Resultado;

Condenação criminal;

A única peculiaridade desta norma em relação às demais é

estar expressa a necessidade de condenação criminal. Defende com propriedade,

Guilherme de Souza Nucci, que se deve observar ao considerar a pena, o

quantum da redução, para fins de determinar se está será de menor potencial

ofensivo, sendo devido ao acusado os benefícios da Lei 9099/95.133

2.3 MÍNIMO LEGAL E CONFRONTO ENTRE NORMAS

Objetivando traçar linhas gerais para a delação premiada, ao

conjugar os 09 (nove) tipos penais estudados anteriormente, pode-se extrair como

regra mínima seguida pelo legislador brasileiro, o preenchimento dos seguintes

requisitos:

Concorrência;

132 BRASIL, Lei n. 11343 de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Política sobre Drogas. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, de 24 de agosto de 2006.

133 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 797.

40

Page 45: Delação Premiada

Delação;

Comunicação a autoridades;

Prática de crime;

Resultado.

Estes são os elementos básicos da delação premiada no

sistema pátrio, sendo o “mínimo legal” obrigatório, que deve ser observado para

obtenção do prêmio.

Claramente este mínimo legal, articulado ao prêmio,

corresponde ao conceito mais apropriado de delação premiada para o sistema

brasileiro.

Deve-se lembrar que a tipificação em si da conduta dentro

dos parâmetros mínimos expostos, não é garantia do agente, ao benefício. Por

mais clara que seja a idéia do legislador em traçar linhas gerais, para cada caso

em si deve ser observado as sua peculiaridades.

Assim, após ressalvar estas linhas gerais, tem-se a

necessidade de fomentar algumas considerações da aplicação do instituto da

delação premiada, principalmente no que compete ao confronto entre normas.

Com base em Guilherme de Souza Nucci, utilizando-se da

norma mais benéfica ao agente, 134 traça-se o seguinte quadro:

Confronto de Normas no Instituto da Delação Premiada

Conduta Típica

Norma Confrontada

Motivação

Extorsão mediante seqüestro

Art. 159 § 4º do CP. 1.Exclui-se a aplicação do art. 13 da Lei 9807, pois este estabelece além do tipo penal previsto no

134 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 680-683.

41

Page 46: Delação Premiada

art. 159 § 4º do CP, os requisitos subjetivos, primariedade e voluntariedade. Adotando o próprio critério de Guilherme Nucci, divergi-se de seu posicionamento, pois ocorrendo o preenchimento dos requisitos extras previstos na Lei, é mais benéfico ao agente a exclusão da punibilidade.

2.Exclui-se a aplicação do art. 14 da Lei 9807, pois estabelece além do tipo previsto no art. 159 § 4º do CP, o requisito da voluntariedade.

3.Outro posicionamento, não observado por Nucci, é a observância do Princípio da Especialidade. Conforme este Princípio, exclui-se o regramento dos crimes hediondos e por coerência, a exclusão da Lei 9807/99.

Crimes da Lei 7492/86 e 8137/90

Arts. 25 da Lei 7492/86 e 16 § único

da Lei 8137/90

1.Exclui-se a aplicação do art. 13 da Lei 9807, pois este estabelece além do tipo penal previsto nos arts. 25 da Lei 7492/86 ou 16 § único da Lei 8137/90 os requisitos subjetivos, primariedade e voluntariedade. Adotando o próprio critério de Guilherme Nucci, divergi-se de seu posicionamento, pois ocorrendo o preenchimento dos requisitos extras previstos na Lei, é mais benéfico ao agente a exclusão da punibilidade.

2.Exclui-se a aplicação do art. 14 da Lei 9807, pois este estabelece além dos tipos previstos nos arts. 25 da Lei 7492/86 ou 16 § único da Lei 8137/90, o requisito da voluntariedade. Neste ponto, deve trazer uma ressalva no critério, pois se estabelece o confronto entre espontaneidade e voluntariedade.

3.Como já comentado, também é coerente a adoção do Princípio da Especialidade.

Crimes hediondos, exceto extorsão

mediante seqüestro e tráfico

de drogas.

Art. 8º § único da Lei 8072/90

1.Em confronto com a Lei 9807/99, verifica-se no tipo do art. 8º § único não exige primariedade, nem análise subjetiva. Demanda por outro lado, o desmantelamento e outros dados ligados ao fato criminoso. Comparando estes motivos, Nucci considera mais benéfica a Lei de crimes hediondos. Também deve-se observar que quanto ao resultado, a Lei 9807/99 é mais benéfica, caso preenchido todos os requisitos legais.

2.Ainda, na mesma linha anteriormente comentada, deve-se observar o Princípio da Especialidade.

Crimes praticados por organizações

criminosasArt. 6º da Lei 9034/95

1.Confrontando-se com os artigos 13 e 14 da Lei 9807/99, observa-se que não exige a primariedade e os requisitos subjetivos, referindo-se a colaboração espontânea e não a voluntariedade. Na mesma forma, como já comentado anteriormente, Nucci não observa em seu critério o prêmio, tão pouco faz análise quanto ao Princípio da Especialidade.

Crimes de lavagem de

capitais

Art. 1º, § 5º da Lei 9613/98

1. Confrontando-se com os artigos 13 e 14 da Lei 9807/99, observa-se que não exige a primariedade e os requisitos subjetivos, referindo-se a colaboração espontânea e não a voluntariedade. Está Lei ainda permite a alteração do regime prisional, sendo de fato em

42

Page 47: Delação Premiada

qualquer hipótese, mais benéfica ao agente, pois além da redução do art. 14 da Lei 9807/99, permite o perdão judicial do art. 13.

2. Independentemente da análise pela norma mais benéfica ou pelo Princípio da Especialidade, indiscutivelmente deve-se aplicar a Lei 9613/98.

Crime de drogasArt. 41 da Lei

11343/06

1.Primeiramente além do Princípio da Especialidade, a Lei que regula o combate aos crimes de drogas, é mais recente que a Lei 9807/99. Também no mesmo sentido não se aplica à Lei dos crimes hediondos.

2.Também confrontando com os arts. 13 e 14 da Lei 9807/99, verifica-se a ausência dos requisitos de primariedade e análise subjetiva. Por fim, lembra-se que a análise de Nucci também neste ponto não leva em conta o prêmio ao agente.

2.4 MOMENTO DA DELAÇÃO

Como já se verificou, o momento oportuno da delação

premiada pode ser tanto na fase investigatória, como também na se fase judicial,

divergindo-se tão somente no plano do contraditório.

Segundo Juliana Kobren citando Gonçalo de Oliveira135,

corroborado por Germano Miranda136, a delação premiada, também poderia

proceder, mesmo após o trânsito em julgado da sentença condenatória, estando

ou não o condenado submetido à execução penal.

No mesmo sentido, conclui Damásio de Jesus:

Não se pode excluir, todavia, a possibilidade de concessão do

prêmio após o trânsito em julgado, mediante revisão criminal. Uma

das hipóteses de rescisão de coisa julgada no crime é a

descoberta de nova prova de “inocência do condenado ou de

circunstância que determine ou autorize diminuição especial de

pena” (art. 621, III, do CPP). Parece-nos sustentável, portanto,

que uma colaboração posterior ao trânsito em julgado seja

beneficiada com os prêmios relativos à “delação premiada”.137

135 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud OLIVEIRA JUNIOR, Gonçalo Farias de. O direito premial brasileiro: breve excursus acerca dos seus aspectos dogmáticos. Presidente Prudente. In: Intertemas: Revista do Curso de Mestrado em Direito v. 2, 2001, p. 281.

136 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 28.137 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo

Jurídico.

43

Page 48: Delação Premiada

A colaboração após o trânsito em julgado não encontra

assento na legislação pátria, sendo qualquer menção desta natureza,

obrigatoriamente uma interpretação analógica extensiva, de norma não-

incriminadora de caráter permissivo, em favor do condenado. 138

Sustenta-se ainda, que a possibilidade do uso da delação

premiada após o trânsito em julgado, estaria advindo com os objetivos do instituto

e que após a condenação, os vínculos e a solidariedade entre os agentes

estariam dissolvidos ou sucumbidos, facilitando a obtenção das informações

pertinentes.139

Seguindo a regra de que a delação premiada justifica-se

pelos fins, não estaria equivocada esta corrente. Mas não distante a realidade do

Poder Judiciário no país, ter-se-ia como frente a esta construção doutrinária, o

fator inequívoco da morosidade das condenações. Obviamente em muitos casos,

não se poderia fazer as persecuções pretendidas, pela prescrição dos delitos.

2.5 A DELAÇÃO COMO MEIO DE PROVA

A delação premiada, como já discorrido, tem natureza

jurídica de prova inominada.

Como toda a prova no sistema pátrio, não tem caráter

absoluto, tão pouco sua valoração definida em Lei. A delação como as demais

provas deverá ser valorada e sobrepesada, de acordo com os elementos

constantes nos autos, observando o Princípio do Livre Convencimento Motivado

ou da Persuasão Racional, por parte do juiz. 140

A força incriminadora da delação premial, será permitida

desde que esteja investida em uma narração completa, harmônica com o núcleo

138 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

139 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

140 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva. 2006.

44

Page 49: Delação Premiada

central acusatório. O fundamento condenatório deverá ser dado pelo conjunto de

provas articuladas com a delação.141

Corrobora Damásio de Jesus:

A delação (não-premiada) de um concorrente do crime por outro,

em sede policial ou em juízo, denominada “chamada de co-réu” ou

“confissão delatória”, embora não tenha o condão de embasar, por

si só, uma condenação, adquire força probante suficiente desde

que harmônica com as outras provas produzidas sob o crivo do

contraditório (STF, HC n. 75.226; STJ, HC n. 11.240 e n. 17.276).

[...] É mister que esteja em consonância com as outras provas

existentes nos autos para lastrear uma condenação, de modo a se

extrair do conjunto a convicção necessária para a imposição de

uma pena. 142

Além desse juízo motivado do valor probatório, também

deve-se observar Princípios basilares do Processo Penal. Qualquer prova nos

autos, que possa ser utilizada como motivo para incriminar, deve ser estruturada

sob os pilares do Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa. É premissa

fundamental do Devido Processo Legal, imposto pela Lei Maior, prevista no artigo

5º, LV. 143 A essência para a valoração da prova é o contraditório, em termos tais

que sem este, qualquer convicção formada será absolutamente ilegal.144

No mesmo sentido, elucida Torinho Filho:

Se a Lei Maior erigiu o contraditório à categoria de dogma de fé,

se o devido processo legal, outro dogma, pressupõe o

contraditório, o mesmo acontecendo com a ampla defesa, é

induvidoso que a “delation” de co-réu não pode ser tido como

prova, mas sim como um fato que precisa passar pelo crivo do

141 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 127-129.

142 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo Jurídico.

143 LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

144 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 129-131.

45

Page 50: Delação Premiada

contraditório, sob pena de absoluta e indisfarçável

imprestabilidade.145

Conveniente lembrar que delação não é testemunho, mas

sim, o reconhecimento do acusado em seu interrogatório, da sua culpa,

imputando a outrem a concorrência no delito, não podendo ser este

compromissado, contraditado ou sofrer qualquer pena, por afirmações não

verídicas. Destoa-se por excelência, devido a essa garantia absoluta do agente, a

obrigação do poder estatal operar com precaução, sob pena de cometer

atrocidades ao direito alheio.146

Neste sentido, alerta Ada Pellegrini:

Ademais, grandes são os perigos da indevida incriminação de

outras pessoas pelo imputado, pois pode muito bem acontecer

que um acusado, vendo-se perdido diante de provas contra ele

colhidas, procure arrastar consigo desafetos ou inimigos seus.147

Outrora verifica-se que o acusado não tendo repugnância

em admitir o próprio delito, “não terá temor também em apontar outrem

facilmente, até de modo injusto”.148

145 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 3. vol. 24ª ed. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 276.

146 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 132-133.

147 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. apud GRINOVER, Ada Pellegrini. O processo em evolução. São Paulo: Forense Universitária. 1996. p.352.

148 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 137.

46

Page 51: Delação Premiada

CAPÍTULO 3

DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS CRÍTICOS

3.1 A ÉTICA E A DELAÇÃO PREMIADA

Uma das maiores críticas da delação premiada é a premissa

da ausência de lealdade, objetivamente implícita no estímulo legal da traição. “A

traição não é uma virtude, não deve ser estimulada, entretanto, em termos

investigatórios não se pode deixar de reconhecer que ela eventualmente pode ser

útil”. 149

Este modelo legislativo, por óbvio, cunha sua legitimidade na

eficiência buscada na persecução penal, abandonado o campo da ética.150

O campo ético a que se abstrai a norma, no plasmar da

busca da verdade, claramente não se confunde com a “ciência jurídica, mas

também não pode ser dela separado, como se fossem incomunicáveis”.151

Ética, nas palavras de Jaques Camargo Penteado “é o

estudo da moralidade da conduta humana. Advém do grego Ethiké e deriva de

hêthos, que significa costume e se identifica com mos, gerando a expressão

moral”.152

Segundo Jaques Camargo Penteado, o grau de civilização

de um povo se mede no exame do direito positivo deste povo, aperfeiçoando-se

na análise no direito processual penal. A obtenção da verdade a qualquer custo é

149 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 191.

150 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 191.

151 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 95, vol. 848, p. 711 a 736, 2006. p. 719.

152 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 719.

47

Page 52: Delação Premiada

a submissão da pessoa humana ao poder do Estado, mitigando princípios

fundamentais republicanos.153

Completa Luiz Flávio Gomes:

Semelhante propósito configura a mais viva expressão política ou

instrumental do poder coativo da era pós-industrial que,

menosprezando valores fundamentais como “justiça” e “equidade”,

procura difundir e impor a cultura do “direito emergencial ou de

exceção”, pouco se importando com a “erosão” do direito liberal

clássico, voltado para a tutela do ser humano.

Na base da delação está a traição. A lei, quando concebe, está

dizendo: seja um traidor e receba um prêmio! Nem sequer o

“código” dos criminosos admite a traição, por isso, é muito

paradoxal e antiético que ela venha a ser valorada positivamente

na legislação dos “homens de bem”.154

O estímulo da delação premiada é o estímulo da antiética,

reflexo claro dos representantes populares, dissolvendo e fomentando na

sociedade a cultura que os fins justificam os meios.155

Cria-se o direito emergencial ou de exceção, fundada na

ética do resultado. As leis criadas emergencialmente refletem uma ética de

resultados, que conforme Choukr “apoiar-se-á em conceitos de segurança e

eficiência desprovidos de apegos aos princípios fundamentais, e justificará, em

muitas legislações, a criação de técnicas processuais aberrantes”.156

A subversão do processo pressupõe que as garantias

dificultam o funcionamento do sistema punitivo, como se delas decorresse a

falência estrutural do Estado.157

153 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 719-720.154 GOMES, Luiz Flávio. Seja um traidor e ganhe um prêmio, Folha de São Paulo de 12.11.1994,

p. 1-3, seção: Tendências e debates. 155 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 720.156 CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo penal de emergência. Rio de janeiro: Editora Lúmen Júris,

2002, p. 56.157 CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo penal de emergência. p. 46-48.

48

Page 53: Delação Premiada

Em verdade, não há como desmembrar o instituto da

delação premiada, da premissa antiética que ela comporta. 158

No mesmo sentido complementa Damásio:

A polêmica em torno da delação premiada, em razão de seu

absurdo ético, nunca deixará de existir. Se, de um lado,

representa importante mecanismo de combate à criminalidade

organizada, de outro, parte traduz-se num incentivo legal à

traição. 159

Apesar de direito e ética serem “realidades distintas, mas

não separadas, deve-se buscar a harmonia”.160

A carência da eticidade repercute nas garantias, nos valores

e nos princípios fundamentais161, sobrepesando a assunção e a avocação da

ineficácia dos aparatos Estatais.

3.2 A DEMONSTRAÇÃO DE INEFICÁCIA DO ESTADO NO

COMBATE À CRIMINALIDADE

A falência do Estado moderno, frente à criminalidade, pode

ser observada facilmente ao vislumbrar a inoperância dos sistemas de combate a

criminalidade. Não se tem um plano lógico, efetivo e prospectivo para a

segurança pública, consubstanciando a instalação de um caos total. Este estágio

caótico, não pode ser deflagrado, na falta de leis repressivas, tendo por única e

exclusiva decorrência a falta de inoperância do Poder. Neste sentido, elucida José

Alexandre Guidi:

Em nome da segurança pública, falida devido à inoperância social

do Poder e não por falta de leis repressivas, edita-se um sem

158 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 720.159 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo

Jurídico.160 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 720.161 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 721.

49

Page 54: Delação Premiada

número de novos comandos legislativos sem o necessário

cuidado com o que vai prescrever.162

Assim, a utilização dos institutos de persecução penal, que

pairam na conformidade da ética, hoje não são bem empregados pelo Estado,

tendo este, que na observância de sua incompetência, valer-se de ferramentas

criticáveis.163

Assevera Luiz Flávio Gomes:

Para o homem moderno, tido como racional, chegar ao ponto de

estabelecer em “lei” prêmios a um criminoso traidor só existe uma

explicação: é a prova mais contundente da pública e notória

ineficiência do Estado atual para investigar e punir os crimes e os

criminosos. É a falência estatal, sempre confessada, sem nenhum

escrúpulo!

Por falta de preparo técnico e de estrutura tecnológica, o Estado

se vê compelido a transigir com os mais elementares princípios

éticos. É forte e duro contra os mais fracos e flacidamente

indulgente e complacente com os que mais perturbam a

convivência social.164

A utilização do instituto da delação premiada, nada mais é

do que o reconhecimento do Estado de sua impotência, “tanto para investigar

quanto para punir a prática de crimes, necessitando, sobremaneira, da boa

vontade do investigado ou acusado em colaborar com a justiça”. 165

Utilizando-se das palavras de Carolina Antunes, conclui-se:

[...] nota-se que o instituto da delação legitima a incompetência do

Estado em sua ação persecutória, pois se serve de um criminoso

162 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 140.

163 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

164 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 142 apud GOMES, Luiz Flávio. Crime Organizado: o que se entende por isso depois da Lei n. 10217, de 11.04.2001? – Apontamentos sobre a perda de eficácia de grande parte da Lei n. 9034/95, Revista Síntese de Direito Penal e Processo Penal, n. 11, dez./jan. 2002. p. 119

165 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

50

Page 55: Delação Premiada

para buscar o que deveria conseguir com suas próprias armas.

Desvia-se de todo o fundamento do processo acusatório, o qual

se baseia em princípios constitucionais que impõem o respeito ao

devido processo legal e seus corolários. 166

3.3 DOS VALORES E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

A delação premiada é um conluio a apologia da deslealdade,

um golpe à construção de um Estado Democrático, por não se moderar em

fundamentos éticos. “Afronta-se, ainda, uma das finalidades da Constituição

Federal, que é justamente, solidificar uma sociedade justa e igualitária, sem o

desvirtuamento de valores”.167

Segundo Jaques de Carmargo Penteado:

A carência de eticidade repercute na juridicidade da delação

premiada, principalmente em face do fundamento republicano da

“dignidade da pessoa humana” (art. 1º, III, CF168) e das garantias

constitucionais da “liberdade” e do “devido processo legal”, formal

e substancial (art. 5º. Caput169 e inc. LIV170, CF).171

Deve-se sempre observar a relevância dos “reflexos que a

utilização de tal instituto pode causar quando se trata de sua aplicação em um

sistema legal construído com base na dignidade da pessoa humana”.172

166 ANTUNES, Caroline. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 35.

167 ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 34.

168 Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana;

169 Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

170 Art. 5º. [...] LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

171 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 721.172 ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise

do Direito Penal Constitucional. p. 35.

51

Page 56: Delação Premiada

Segundo Caroline Antunes, a delação premiada é um

mecanismo que abala um dos pilares sociais, a confiança173. Completa a referida

autora:

A ausência de confiança, causada entre outras razoes pela

traição, pode gerar uma série de moléstias sociais e contribuir

com a degradação moral da sociedade, transformando o homem

em simples meio para consecução de determinados fins, ao invés

de considerá-lo o fim de toda e qualquer ação.174

Segundo José de Alexandre Guidi, a delação premiada afeta

o princípio da igualdade, conferindo benefícios somente a crimes de relevante

periculosidade, não oportunizando aos criminosos de pequenos delitos. Alude

ainda, que também feri o princípio da proporcionalidade, pois “a pena deve ser

equivalente à culpabilidade de cada um e de cada caso. Crimes idênticos acabam

punidos com penas flagrantemente diferentes”.175

Firmando esse entendimento, elucida Eugenio Zaffaroni,

concluindo:

A impunidade de agentes encobertos e dos chamados

“arrependidos” constitui uma séria lesão à eticidade do Estado, ou

seja, ao princípio que forma parte essencial do Estado de direito: o

Estado não pode se valer de meios imorais para evitar a

impunidade [...] o Estado está se valendo da cooperação de um

delinqüente, comprada ao preço de sua impunidade para “fazer

justiça”, o que o Direito Penal liberal repugna desde os tempos de

Beccaria.176

Sabe-se ainda, que o instituto da delação premiada poderá

ser utilizado, como instrumento coativo ou degenerativo da imagem (direito

fundamental protegido pela Lei Maior). A mídia hoje detém uma força

173 ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 35.

174 ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 35.

175 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 142176 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Crime organizado: uma categorização frustrada. Rio de

Janeiro: Relume/Dumará, 1996, p. 45.

52

Page 57: Delação Premiada

massificante, podendo destruir em segundos, o que um cidadão de bem, levou

anos para construir.

Trata-se do denuncismo inconseqüente e irresponsável,

afastando-se do objetivo principal do instituto. Corrobora Alexandre Guidi, ao

suscitar o seguinte trecho:

É sabido que são inúmeros os casos em que a denúncia

irresponsável enxovalha pessoas de em (boa-fé), que, depois de

restabelecidas as verdades dos fatos, não conseguem restaurar a

sua credibilidade.177

Segundo Luiz Flávio Gomes, Alice Bianchini, Rogério

Sanches Cunha e William Terra de Oliveira, esse denuncismo é muito mais

preocupante quando o delator é político. Completa elucidando os referidos

autores:

Os políticos, em regra, contam com “ética” própria, interesses

específicos etc. O poder é a meta. E para se alcançar a meta (o

fim) às vezes não se preocupam com os meios, o que revela o

caráter maquiavélico das suas iniciativas. Delação de políticos ou

feita por interesses políticos deve ser vista com redobrado

cuidado.178

3.4 CONSIDERAÇÕES FAVORÁVEIS A DELAÇÃO

PREMIADA

Apesar de severamente criticada pela doutrina, o instituto da

delação premiada possui inúmeras vantagens, sendo um instrumento

poderosíssimo ao combate do crime.

Não obstante, às críticas de cunho ético e fundamentalista,

verifica-se que a delação premiada não é um instituto exclusivo de países

177 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 157.

178 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 191.

53

Page 58: Delação Premiada

subdesenvolvidos, com legislações atrasadas e Estados falidos. Grandes nações,

com Estados modernos, ricos e aparelhados, com cultura jurídica centenária, se

utilizam plenamente do instituto, dando para ele a devida e merecida valoração.

Completa Ada Pellegrini, ao comentar a delação premiada

contra o crime organizado italiano:

Foram muitas críticas feitas à delação premiada, mas acabou

estabelecendo-se um consenso em torno da necessidade de

medidas extremas, que representavam a resposta a um estado de

verdadeira guerra contra as instituições democráticas e a

segurança dos cidadãos.179

Segundo Alexandre Guidi, a delação premiada atinge

dimensões além da simples repressão, pois, ainda na fase policial, o colaborador

confessa o crime e evita à consumação de outras infrações, atuando de forma

preventiva.180

Corrobora Paulo José Freire Teotônio e Marcus Alvez

Nicolino, asseverando que a delação premiada:

[...] veio a ser um instrumento da maior utilidade e eficácia, não só

para as investigações, mas também para permitir uma melhora da

prova no processo penal, viabilizando condenações que outrora

seriam impossíveis ou muito pouco prováveis.181

Em outro enfoque ético, questiona-se a argumentação

adotada contra o instituto. A delação é uma necessidade do sistema penal, pela

existência de crimes e situações complexas, que não permite ao Estado a

manifesta contraposição de medidas repressivas.

Assim, a delação é fonte direta contra do crime, sendo ela a

subversão total da eticidade social. Inquestionavelmente, o crime não tem traços

179 GRINOVER, Ada Pellegrini. O crime organizado no sistema italiano. p. 76.180 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p.

146.181 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p.

146. apud TEOTÔNIO, Paulo José Freire, NICOLINO, Marcus Túlio Alves. Ministério Público e a colaboração premiada. Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal. n. 21, agosto-setembro, 2003. p. 26.

54

Page 59: Delação Premiada

ínfimos de eticidade e certamente se o agente permanecer ou ocultá-lo, ter-se-á

desenhado um paradoxo, tendo de um lado a conduta antiética da não lealdade,

confrontada com a conduta da permanência da quebra dos bens essenciais da

sociedade.

Logo, na mesma linha de raciocínio de Alexandre Guidi182 e

David Teixeira de Azevedo183, incorreto seria afirmar que o criminoso arrependido

ao delatar seus comparsas, estaria agindo contra a ética. Não existe ética dentro

da antiética.

No mesmo sentido ensina Marcus Cláudio Acquaviva:

Quando à justificação ética da delação premiada reside, a nosso

ver, na utilidade social. Afinal de contas, é notório na doutrina

clássica ou moderna que o Direito, enquanto instrumento de

realização da paz social, não é obra para santos, mártires ou

heróis. Se a delação premial merece reprovação absoluta, temos

que condenar, também, a estipulação de recompensa para quem

revela o local onde o criminoso se acha acoutado ou, ainda, o

instituto da anônima, que tem propiciado a solução de inúmeros

delitos. Além disso, embora a delação premial traga, consigo, a

precha de “alcagüete”ou “dedo-duro” para o delator que, forçoso

admitir, delata ou colabora apenas no intuito de se safar das

penalidades a que está sujeito, também é verdade que seus

comparsas não deixam de ser menos culpados quando supostas

“vítimas” de uma delação [...]184

Esse agir do delator em colaborar com a justiça, estaria

nestas linhas dentro da ética, fazendo jus a um diferencial. Essa colaboração,

permite um juízo de arrependimento do agente, reduzindo sua periculosidade.

Também nesse cenário, pode-se explicar a concessão dos prêmios, tendo em

vista de ser uma questão de política criminal orientada finalisticamente, e

representada por um merecimento a uma resposta menos severa. 185

182 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 147.

183 AZEVEDO, David Teixeira de. A colaboração premiada num direito ético. Boletim do IBCCrim,ano 7, n. 83, outubro, 1999. p. 7.

184 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Delação Premiada. Jurídica Online. Disponível em: <www.juridicaonline.com.br> Acesso em 21 de setembro de 2006.

55

Page 60: Delação Premiada

Sobre o fundamentalismo das garantias principiológicas,

deve-se analisar as expectativas e as garantias individuais, à luz do Estado

Democrático de Direito. O Estado Democrático de Direito inspira-se no poder

superior da coletividade, buscando a eqüidade social, mas sempre respeitando as

relações com as minorias. A delação premial de fato não desintegra o interesse

da comunidade, mas somente daqueles que sob o manto do poder, tentam

expurgar qualquer tentativa de aumentar a eficiência da persecução penal.

Prender “testas de ferro” e “ladrões de galinha”, não exige maior esforço dos

aparatos Estatais, mas quando dentro desta cadeia criminosa, buscam-se os

verdadeiros mentores da indústria do crime, deve-se sim valer-se de todos os

instrumentos jurídicos possíveis. 186

Por mais que se discuta sobre o instituto da delação

premiada, têm-se fortes argumentos doutrinários, no sentido de sua aprovação ou

reprovação. Consoante aos ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci187 traça -

se um quadro sobrepesando os principais pontos positivos e negativos do

instituto:

Instituto da Delação Premiada

Pontos Negativos Pontos Positivos

185 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 149-152.

186 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 162.

187 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 675-676.

56

Page 61: Delação Premiada

1. Oficializa-se, por lei, a traição,

forma antiética de comportamento

social;

1. No universo criminoso, não se

pode falar em ética ou em

valores moralmente elevados,

dada a própria natureza da

prática de condutas que rompem

com as normas vigentes, ferindo

bens jurídicos protegidos pelo

Estado;

2. Pode ferir a proporcionalidade da

aplicação da pena, pois o delator

receberia pena menor do que os

delatados, cúmplices que fizeram

tanto ou até menos que ele;

2. Não há lesão à

proporcionalidade na aplicação

da pena, pois esta é regida,

basicamente, pela culpabilidade

(juízo de reprovação social), que

é flexível. Réus mais culpáveis

devem receber penas mais

severas. O delator, ao colaborar

com o Estado, demonstra menor

culpabilidade, portanto, pode

receber sanção menos grave;

3. A traição, em regra, serve para

agravar ou qualificar a prática de

crimes, motivo pelo qual não

deveria ser útil para reduzir a

pena;

3. O crime praticado por traição é

grave, justamente porque o

objetivo almejado é a lesão a um

bem jurídico protegido; a delação

seria a traição de bons

propósitos, agindo contra o delito

e em favor do Estado

Democrático de Direito

57

Page 62: Delação Premiada

4. Não se pode trabalhar com a

idéia de que os fins justificam os

meios, na medida em que estes

podem ser imorais ou antiéticos;

4. Os fins podem justificar os

meios, quando estes forem

legalizados e inseridos no

universo jurídico;

5. A existente delação premiada

não serviu até o momento para

incentivar a criminalidade

organizada a quebrar a lei do

silêncio, que, no universo do

delito, fala mais alto;

5. A ineficiência atual da delação

premiada condiz com o elevado

índice de impunidade reinante no

mundo do crime, bem como

ocorre em face da falta de

agilidade do Estado em dar

efetiva proteção ao réu

colaborador;

6. O Estado não pode aquiescer

em barganhar com a

criminalidade;

6. O Estado já está barganhando

com o autor de infração penal,

como se pode constatar pela

transação, prevista na Lei

9099/95. A delação premiada é,

apenas, outro nível de transação;

58

Page 63: Delação Premiada

7. Há um estímulo a delações

falsas e um incremento a

vinganças pessoais.

7. O benefício instituído por lei,

para que um criminoso delate o

esquema, no qual está inserido,

bem como os cúmplices, pode

servir de incentivo ao

arrependimento sincero, com

forte tendência à regeneração

interior, o que seria um dos

fundamentos da própria

aplicação da pena. A delação

falsa deve ser severamente

punida.

Do exposto, conclui-se que a delação premiada é apenas

mais um instrumento útil a disposição do Estado, visando tutelar o Estado

Democrático de Direito.188

3.5 DA GARANTIA JURÍDICA NO PROCESSO

A segurança jurídica do delator é um tema ainda pouco

debatido na doutrina brasileira, sendo a espinha dorsal dos problemas do instituto.

O primeiro problema que se tem com o instituto pátrio da

delação premiada, é a própria sistemática penal. O Brasil adotou o sistema

acusatório189, tendo o magistrado à obrigação de permanecer-se inerte, deixando

ao crivo do Ministério Público e a autoridade Policial a investigação criminal.

188 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 676-677.189 Ainda sobre o tema: O processo é eminentemente contraditório. Não há a figura do juiz

instrutor. A fase processual propriamente dita é precedida de uma fase instrutória, qual seja, o inquérito policial. Com base nessa investigação, o acusador, seja o Ministério Público, seja a vítima, instaura o processo. Em juízo, nascida a relação processual, o processo torna-se eminentemente contraditório, público e escrito. (ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 30)

59

Page 64: Delação Premiada

Assim, partido da premissa que é o magistrado o único legítimo a homologar os

acordos e aplicar o prêmio, tem-se gerado um enorme problema da utilização do

instituto, principalmente na fase inquisitória. 190

No mesmo sentido, corrobora Alexandre Guidi, Paulo José

Freire Teotônio, Marcus Túlio Alves Nicolino, ao traçarem o seguinte

entendimento: “[...] o acordo de delação premiada necessitará de homologação

judicial, tendo em vista que ao juiz compete controlar a aplicação da lei e zelar

pela regularidade do processo.” 191

Também, ao analisar o modelo de acordo de delação

premiada anexo, do Ministério Público Federal do Paraná, observa-se as

cláusulas VIII e IX, que trazem os seguintes dizeres:

VIII - HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL

Para ter eficácia, a proposta será submetida a homologação

judicial, cabendo à autoridade judiciária preservar o sigilo do

ACORDO.

A avença será submetida a homologação, tão logo seja

assinada pelas partes, e produzirá efeitos de imediato.

IX - CONTROLE JUDICIAL

O presente ACORDO de delação premiada tramitará perante a

xxxxxxxxxxxx como procedimento criminal diverso (PCD) sigiloso,

não apenso mas vinculado a apelação mencionada, sem

referência explícita nos autos principais e sem menção de

tema e partes no sistema informático.

O controle da efetividade da colaboração será feito mediante

a apresentação de relatórios circunstanciados e periódicos à

autoridade judicial, com prévio pronunciamento do MPF.

190 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.191 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p.

166. Comungam desse entendimento: TEOTÔNIO, Paulo José Freire, NICOLINO, Marcus Túlio Alves. Ministério Público e a colaboração premiada. Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal.

60

Page 65: Delação Premiada

Os relatórios deverão ser apresentados ao juízo pelo

MINITERIO PÚBLICO ou pela Polícia Federal e serão encartados

no PCD.

A eficácia do ACORDO poderá ser sustada, com prévia ouvida

das partes, mediante ato judicial fundamentado.192 (grifo

nosso)

Trata-se primeiramente de uma incoerência legislativa,

provocando certa insegurança jurídica, que de fato irá coibir o maior uso do

instituto.

Assim, o Ministério Púbico propondo ou realizando o acordo

com o delator, poderá o acordo, não gerar o benefício pactuado. Juridicamente,

para este impasse entre o magistrado e o Ministério Público, não se tem uma

saída legislativa. Mas opera a doutrinária, a construção baseada no artigo 28 do

CPP193, conforme elucida Alexandre Guidi:

Entretanto, urge salientar que, caso o magistrado não concorde

com os termos do acordo, não poderá indeferir de plano ou

elaborar outro, mas deverá aplicar analogicamente o artigo 28 do

Código de Processo Penal.194

Outro ponto relevante, que deve ser analisado, decorre

quando, o agente contribui com as autoridades, de maneira plena, mas por

circunstâncias diversas, alheias a sua vontade (ex.: falta de provas), não tem o

resultado pretendido aos demais concorrentes.

Claramente é uma indesejável e colossal dor de cabeça para

a defesa. Poderá ocorrer após o delator, confessar, reiterar a confissão,

desembaraçar os fatos e no final não conseguir propiciar o resultado exigido pela

192 Ministério Público Federal – Acordo anexo ao trabalho.193 Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o

arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.

194 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 167.

61

Page 66: Delação Premiada

Lei. Estaria o agente em um caminho sem volta para a condenação, com o ônus

de não poder preitear o prêmio legal. Implicaria na produção de provas contra si,

mediante uma ilusão de um benefício que não virá.

Tanto isso é uma realidade, que ao analisar o modelo de

acordo de delação premiada do Ministério Público Federal encontra-se a seguinte

cláusula:

V - GARANTIA CONTRA A AUTO-INCRIMINACAO

Ao assinar o ACORDO DE DELAÇÃO PREMIADA, o acusado

xxxxxxxxxxxxxx está ciente do direito constitucional ao silêncio e

da garantia contra a auto-incriminação, renunciando

expressamente a ambos, estritamente no que tange aos

depoimentos necessários ao alcance dos fins da presente avença.

(grifo nosso) 195

Pela questão da falta de tipicidade, neste caso o magistrado

não poderá aplicar ao agente a norma premial, mas entende-se que no mínimo

esta colaboração, deve ser majorada como circunstância atenuante, conforme

previsto no artigo 65, III, “d” 196do Código Penal.

Afirma-se “no mínimo” não por acaso, pois cabe lembrar,

que o Estado deve ter a sensibilidade de promover as medidas necessárias para

a integridade física do delator e de sua família.

3.6 A INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DO

DELATOR E DE SUA FAMÍLIA

A integridade física do delator está prevista na Lei de

9807/99, Lei de proteção dos colaboradores da justiça, regulamentada, por meio

do Decreto n. 3.518, de 20 de junho de 2000. 197

195 Ministério Público Federal – Acordo anexo ao trabalho.196 Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena: III – ter o agente: d) confessado

espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;197 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 671.

62

Page 67: Delação Premiada

Este conjunto normativo visa o comprometimento do Estado,

com os colaboradores ameaçados, de forma a garantir a sua integridade “física e

mental, decorrente de um pacto de responsabilidade, no qual o cidadão deve

dizer a verdade e, em conseqüência, o Estado lhe concede toda a segurança

necessária”.198

A atribuição para a aplicação dessas medidas, dentro de sua

área de abrangência, está adstrita aos Estados e a União, podendo celebrar

convênios entre si.199

A Lei supracitada traz normas distintas de aplicação, que no

primeiro campo tem as testemunhas e as vítimas, e em outro os beneficiários do

instituto da delação premiada. Segundo Danilo Lovisaro do Nascimento, as

medidas previstas para os concorrentes no delito divergem das previstas para as

testemunhas e vítimas, sendo aplicáveis aos concorrentes, apenas medidas

especiais de proteção a integridade física. 200

Outrora, não existe fundamento lógico para a exclusão dos

delatores colaboradores e de suas famílias da proteção, nos moldes concedidos

às testemunhas e vítimas. O mais adequado é analisar esta norma de maneira

extensiva, sobre o manto da Lei Maior, que dentre seus princípios fundamentais,

impõe o dever de garantir a integridade e a vida de todos os cidadãos.

No mesmo sentido completa André Estefan Araújo Lima:

[...] a Lei permite a adoção de medidas especiais de segurança e

de proteção à integridade física. Tais medidas podem ser

aplicadas ao réu preso ou solto. Se preso provisoriamente,

permanecerá separado dos demais. Se se tratar de condenado

cumprindo pena em regime fechado, poderão ser efetuadas

medidas que garantam sua segurança dentro da prisão. As

medidas de proteção e segurança ao réu colaborador não vêm

198 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

199 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.

200 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. Apud NASCIMENTO, Danilo Lovisaro do. O tratamento jurídico instituído pela lei no 9.807/99 ao réu colaborador. CONAMP. Disponível em: <http://www.conamp.org.br/eventos/teses/tese153.htm> Acesso em: 16 de julho de 2003.

63

Page 68: Delação Premiada

especificadas no art. 15. Nada impede, ao que tudo indica, sejam

aplicadas a ele quaisquer das medidas de proteção previstas no

art. 7.º201 da Lei.202

A Lei 9807/99 em seu artigo 2º § 2º 203 traz outras duas

hipóteses de exceção à aplicação da proteção.

A primeira hipótese é a exclusão do sistema de proteção,

dos agentes que apresentarem personalidade ou conduta incompatível.

O motivo dessa exceção é coibir a indisciplina, exigindo-se

do agente o cumprimento de regras, de modo a não inviabilizar a guarda e colocar

em risco terceiros. Assim, de acordo com a norma, serão excluídas todas as

pessoas que tiverem comportamentos anti-sociais, promovendo a exposição de

terceiros que interagem com este. 204

A segunda hipótese de exclusão do sistema de proteção é

quando o indiciado ou o condenado estiver com a liberdade privada pelo Estado.

Sobre o tema sucintamente, elucida Guilherme Nucci ao transcrever os seguintes

dizeres:

201 Art. 7º. Os programas compreendem, dentre outras, as seguintes medidas, aplicáveis isoladas ou cumulativamente em benefício da pessoa protegida, segundo a gravidade e as circunstâncias de cada caso: I – segurança na residência, incluindo o controle de telecomunicações; II – escolta e segurança nos deslocamentos da residência, inclusive para fins de trabalho ou para a prestação de depoimentos; III – transferência de residência ou acomodação provisória em local compatível com a proteção; IV – preservação da identidade, imagem e dados pessoais; V – ajuda financeira mensal para prover as despesas necessárias à subsistência individual ou familiar, no caso de a pessoa protegida estar impossibilitada de desenvolver trabalho regular ou de inexistência de qualquer fonte de renda; VI – suspensão temporária das atividades funcionais, sem prejuízo dos respectivos vencimentos ou vantagens, quando servidor público militar; VII – apoio e assistência social, médica e psicológica; VIII – sigilo em relação aos atos praticados em virtude da proteção concedida; IX – apoio do órgão executor do programa para o cumprimento de obrigações civis w administrativas que exijam o comparecimento pessoal.

202 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud LIMA, André Estefan Araújo. Lei de proteção a vítimas e testemunhas - lei 9.807/99. Instituto Damásio de Jesus. Disponível em: http:// www.damasio.com.br. Acesso em 16 jul. 2003.

203 Art. 2º [...] §2º. Estão excluídos da proteção os indivíduos cuja personalidade ou conduta seja incompatível com as restrições de comportamento exigidas pelo programa, os condenados que estejam cumprindo pena e os indiciados ou acusados sob prisão cautelar em qualquer de suas modalidades. Tal exclusão não trará prejuízo a eventual prestação de medidas de preservação da integridade física desses indivíduos por parte dos órgãos de segurança pública.

204 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 670.

64

Page 69: Delação Premiada

[...] condenados a penas privativas de liberdade e pessoas presas

cautelarmente já se encontram sob tutela estatal, razão pela qual

espera-se que existam mecanismos suficientes para mantê-los

resguardados e separados dos demais detentos, assegurando-

lhes a integridade física e psicológica. Aliás, esse é o motivo da

afirmativa feita na parte final deste artigo, indicando que medidas

de proteção devem ser tomadas no interior do cárcere onde se

encontrem.205

Outro ponto criticável da Lei, diz respeito à imposição

normativa da aplicabilidade das medidas para segurança frente à disponibilidade

orçamentária. Sobre este tema, nada mais nítido do que o posicionamento de

Guilherme Nucci:

Disponibilidade orçamentária: está é outra disposição

inconcebível. Uma pessoa ameaçada, dentro de um sistema que

se pretenda sério e eficiente, não pode estar sujeita a

disponibilidade orçamentária. 206

Ainda, ao analisar a realidade dos estabelecimentos

prisionais, verifica-se que a regra para individualizar os presos de modo a separá-

los por categorias, atualmente seria impossível, por falta estrutura física, além do

número reduzido de agentes prisionais qualificados em atuação.207

Por fim, questiona-se muito a imposição do artigo 11, que

faz referência, ao tempo máximo de duração das medidas de proteção. Ao

analisar o artigo, verifica-se que qualquer programa sério não “tem teto para

expirar. Tudo está a depender da ameaça sofrida e do grau de sua duração, que

pode ser imponderável. Logo, inexiste razão lógica para o disposto neste

artigo”.208

Conclui Alexandre Guidi:

205 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 671.206 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 673.207 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito

brasileiro. Jus Navigandi.208 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 675.

65

Page 70: Delação Premiada

Contudo, apesar da inoperância dos programas de proteção de

delatores aqui no Brasil, existem muitos criminosos que mesmo

assim querem se utilizar do instituto da delação premiada e, por

isso, conclui-se que, se esses programas fossem eficazes, haveria

um grande incentivo para os criminosos colaborassem com a

justiça.209

De fato a delação premiada, não se sustentará somente no

prêmio. Devem-se combater os problemas estruturais e legais com veemência, de

modo a viabilizar a efetividade da proteção dos colaboradores, inspirando a plena

confiança daqueles que nela se escudam. A saúde do instituto depende das

medidas do Estado, no combate das penas capitais impostas pelos criminosos,

contra aquele que quebra a Lei do silêncio.

209 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 161.

66

Page 71: Delação Premiada

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar da maior parte da doutrina criticar o instituto da

delação premial, esta vem ao ordenamento jurídico pátrio, como uma forte

ferramenta no combate ao crime.

Método adotado em vários ordenamentos jurídicos

alienígenas, a delação premiada, se perfaz independente do meio, definindo sua

legitimidade na finalidade. Estados Modernos desenvolvidos, utilizam amplamente

o instituto da delação premial, legitimando o instituto, pela presteza e avanços no

combate a criminalidade.

O instituto da delação premiada permite que subversivos do

pacto social, de grande poderio, que nunca sentiram o punho pesado da justiça,

sofram as conseqüências legais, até pouco tempo imagináveis. O principal

objetivo da delação premial é trazer ao processo penal, o último degrau dos

liames criminosos, que flagelam a saúde social.

Por mais que a doutrina conservadora se assente em

paradigmas filosóficos, busca-se através da delação premiada trazer meios a

sobrepujar as superestruturas criminosas, vitalícias e intransponíveis pelos meios

habituais.

Nada versa em sustentar sua falta de eticidade, pois como

muito é sabido, ética é um conceito aberto, variável no tempo e espaço, sendo

que, na conjuntura prescrita se torna impraticável, pois estar-se-ia a tratar de uma

exigência de ética dentro da antiética.

A responsabilidade penal, como se sabe é fragmentada e

sustenta a busca de proteção jurídica de pequenas glebas num vasto oceano,

tratando-se ao tempo, do mínimo racional exigível para suportar o convívio social.

Numa base repugnante se alicerça o crime, que mesmo ínfimos traços éticos, se

encontram ao longo do infinito de alcance. Por mais que se admita a falta de boa-

67

Page 72: Delação Premiada

fé frente à lealdade, como preceito ético, em nada se compara aos efeitos da

manutenção da criminalidade.

Exorcizam a delação pemial, mas esta é uma ferramenta

Estatal relativa, com a finalidade incriminadora. Diz-se relativa, com plena

convicção, pois prova alguma se deve dar ao caráter absoluto, em respeito ao

devido processo legal. Em linhas gerais, a delação premiada, como prova

inominada, como é, deve estar aliada a toda uma estrutura acusatória para surtir

efeitos penais.

Observa-se com ironia, a hipócrita posição fielmente

combatente a aprimorar a persecução. Tão eficaz e reluzente são as

ponderações de Guilherme de Souza Nucci, firmando que outros institutos, na

mesma forma da delação premial, imputam a permitir que o Estado barganhe com

a criminalidade. Traduza-se esta posição numa mesquinhez tendenciosa, pois

claramente, estes institutos são idolatrados e propõem a facilitação para o

criminoso.

Ainda, persecuções a delação pela doutrina, se fazem com

fundamentos principio lógicos. Busca-se alinhavá-los aos princípios, dando ao

instituto ares de inconstitucionalidade, mas esquecem que o Estado Democrático,

constrói seus pilares não só em palavras, mas na justiça de fato. Também

esquecem neste ponto, que confronto entre princípios, já há muitos anos é tratado

pela hermenêutica, tendo no tempo e espaço, a mitigação de um princípio frente

ao outro, buscando sempre a proporcionalidade e o meta princípio da justiça.

Obviamente o instituto da delação premiada, nos moldes em

que foi introduzida no ordenamento brasileiro, apresenta problemas graves,

consoantes a sua aplicabilidade, razoabilidade e principalmente a sua eficácia

protetiva, devendo os pensadores do direito, sinergicamente congregar esforços

para propiciar a devida efetividade.

O direito na sua origem é abalizado como forma de ajustar o

convívio social, não podendo ser uma barreira para a evolução dos povos. Deve-

68

Page 73: Delação Premiada

se sempre buscar a progressividade do direito, equacionando-o de forma

isonômica e de maneira a permitir que de fato o interesse social se perpetue.

69

Page 74: Delação Premiada

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Delação Premiada. Jurídica Online. Disponível

em: <www.juridicaonline.com.br> Acesso em 21 de setembro de 2006.

ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro

Sob Análise do Direito Penal Constitucional. 2007. 78 p. Especialização em

Direito Processual Penal. Universidade do Vale do Itajaí. Pro - Reitoria de pós-

graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura, Florianópolis.

AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição

benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica).

JUSONLINE. Disponível em: <http://jusonline.visaonet.com.br/artigos/traicao.doc>

Acesso em 29 de setembro de 2005.

AZEVEDO, David Teixeira de. A colaboração premiada num direito ético.

Boletim do IBCCrim,ano 7, n. 83, outubro, 1999.

BRASIL, Decreto-lei n. 2848 de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário

Oficial da República Federativa do Brasil, Rio de Janeiro, RJ, 07 de dezembro

de 1940.

BRASIL, Lei n. 7492 de 16 de junho de 1986. Define crimes contra o sistema

financeiro nacional e dá outras providências. Diário Oficial da República

Federativa do Brasil, Brasília, DF, 16 de junho de 1986.

BRASIL, Lei n. 8072 de 25 de julho de 1990. Dispõe sobre crimes hediondos, nos

termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras

providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 25

de julho de 1990.

BRASIL, Lei n. 8137 de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem

tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências.

Page 75: Delação Premiada

Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 27 de dezembro

de 1990.

BRASIL, Lei n. 9034 de 03 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios

operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações

criminosas. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 03

de maio de 1995.

BRASIL, Lei n. 9613 de 03 de março de 1998. Dispõe sobre crimes de “lavagem”

ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema

financeiro para ilícitos previstos nesta Lei. Diário Oficial da República

Federativa do Brasil, Brasília, DF, de 03 de março de 1998.

BRASIL, Lei n. 9807 de 13 de julho de 1999. Estabelece normas para a

organização e a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a

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Testemunhas Ameaçadas e dispõe a proteção de acusados ou condenados que

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ANEXOS

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M I N I S T É R I O P Ú B L I C O F E D E R A L

PROCURADORIA DA REPUBLICA NO ESTADO DO

PARANÁ

78

Page 83: Delação Premiada

ACORDO DE DELAÇÃO PREMIADA

O MINISTÉRIO PUBLICO FEDERAL,

presentado pelo Procurador Regional da República com atuação

perante o Tribunal Regional Federal da 4a Região e pêlos

Procuradores da República integrantes da Força-Tarefa "CC-5", no

exercício das atribuições constitucionais e legais, nos autos de

xxxxxx, em trâmite perante a xxxxxxxxxxxxxxx, vem propor ao

acusado xxxxxxxxxxxxxxxxxxx a formalização de ACORDO DE

DELAÇÃO PREMIADA, nos seguintes termos.

I - BASE JURÍDICA

O presente ACORDO funda-se no artigo

129, inciso I, da Constituição Federal, nos artigos 13 a 15 da Lei n.

9.807/99, bem como no artigo 32, §§ 2° e 3°, e no artigo 37, inciso

IV, da Lei n. 10.409/2002, estes aplicados analogicamente, à luz do

artigo 3° do CPP. Tais dispositivos conferem ao MINITERIO

PÚBLICO o poder discricionário de propor ao acusado ACORDO de

redução da pena privativa de liberdade de 1/3 a. 2 /3 , ou o perdão

judicial.

O interesse público é atendido com a

presente proposta tendo em vista a necessidade de conferir

efetividade à persecução criminal de outros suspeitos e réus, bem

como de ampliar e aprofundar, em todo o País, as investigações em

torno de crimes contra a Administração Pública, contra o Sistema

Financeiro Nacional, contra a Ordem Tributária e de delitos de

Lavagem de Dinheiro, ligados ou não ao esquema "CC-5", inclusive

Page 84: Delação Premiada

no que diz respeito à repercussão desses ilícitos penais na esfera cível

(atos de improbidade administrativa), tributária e disciplinar.

II - DO OBJETO DO ACORDO - DOS CRIMES

ABRANGIDOS

O presente ACORDO versa sobre fatos

tipificados

criminalmente nos arts. nos artigos 4°,

caput, 6° e 22 da Lei 7.492/86, artigo 1° da Lei 8.137/90, bem como

artigos 288, 299 e 304 do Código Penal, na forma do artigo 69 desse

diploma legal, em virtude das irregularidades cometidas por

xxxxxxxxxxxx.

Em virtude desses fatos o acusado foi

condenado

pelo Juizo da xxxxxxxxxxxxxxxxxx a

pena de xxxxxxxxxxx, em regime semi-aberto, e xxx dias-multa, no

valor de xxxx salário mínimo à época dos fatos, pêlos crimes

descritos no artigos xx° e xx da Lei xxxx e artigo 288 do Código

Penal.

III - PROPOSTA DO MINISTÉRIO PUBLICO

FEDERAL

O MINISTÉRIO PÚBLICO

FEDERAL oferece ao acusado xxxxxxxxx, brasileiro, qualificação,

os seguintes benefícios legais:

A) A redução da pena privativa de

liberdade de xxxxxxxxxxx, em metade, quedando-se em xxx anos, xxxx

meses e xxxxx dias de reclusão, em regime aberto;

Page 85: Delação Premiada

B) A substituição, pelo período de xxxxx

anos, xxxx meses e xxxx dias, da pena privativa de liberdade,

definida no item anterior por duas penas restritivas de direitos, a

saber:

B.l) interdição de fim de semana,

consistente na permanência na residência do acusado das 20:00

horas às 08:00 horas nos sábados e domingos;

B.2) prestação de serviços à comunidade,

consistente no auxílio na implantação de rotinas e aulas de

informática aos servidores da instituição xxxxx, por duas horas

semanais.

C) o sobrestamento, até a prescrição da

pretensão punitiva em abstrato, no que diz respeito ao indiciado

xxxxxxxxxxxx,de todos os procedimentos investigativos em curso

vinculados à 2ª Vara Criminal Federal de Curitiba, no que concerne

especificamente ao seu envolvimento com xxxxxxxxxxxxx, tão-

somente no que diz respeito a fatos ocorridos até a data da

celebração do presente ACORDO;

D) A observância do artigo 20 do Código

de Processo Penal e art. 7° , IV, da lei n° 9.807/99, com a

observância pelo Poder Judiciário e autoridades policiais, da

emissão de certidão negativa de antecedentes criminais durante a

vigência deste acordo, limitado aos fatos nele abrangidos, salvo

através de requisição judicial.

III - CONDIÇÕES DA PROPOSTA

Para que do ACORDO proposto pelo

MPF possam derivar os benefícios elencados na cláusula II, a

colaboração do acusado xxxxxxxxxxxxxxxxxxx deve ser voluntária,

Page 86: Delação Premiada

ampla, efetiva, eficaz, obrigando-se, sem malícia ou reservas mentais,

a:

a) entregar de todo o material relativo a

transações de dólar-cabo envolvendo xxxxxxxxxxx, e outros dados

relacionados a evasão de divisas, que sejam ou que venham a ser do

seu conhecimento;

b) falar a verdade, incondicionalmente,

em todas as ações penais e inquéritos policiais, inquéritos civis e

ações cíveis e processos administrativos disciplinares, em que,

doravante, venha a ser chamado a depor na condição de

testemunha ou interrogado, nos limites deste ACORDO;

c) indicar pessoas que possam prestar

depoimento sobre os fatos em investigação, nos limites deste

ACORDO, propiciando as informações necessárias à localização de

tais depoentes;

d) cooperar sempre que solicitado,

mediante comparecimento pessoal a qualquer das sedes do MPF ou

da Polícia Federal, para analisar documentos e provas, reconhecer

pessoas, prestar depoimentos e auxiliar peritos do INC na análise de

registros bancários e transações financeiras, eletrônicas ou não;

e) entregar todos os documentos, papéis,

escritos, fotografias, bancos de dados, arquivos eletrônicos, etc., de

que disponha, estejam em seu poder ou sob a guarda de terceiros, e

que possam contribuir, a juízo do MPF, para a elucidação de

crimes contra a Administração Pública, contra a Ordem

Tributária, contra o Sistema Financeiro Nacional ou de crimes de

Lavagem de Dinheiro, em qualquer comarca ou subseção judiciária

federal do País;

f) cooperar com o MPF apontando os

nomes e endereços dos banqueiros, donos de casas de câmbio,

doleiros e operadores de câmbio, brasileiros ou estrangeiros, que

Page 87: Delação Premiada

concorreram para a evasão de divisas nacionais, esclarecendo onde

mantêm suas operações, depósitos e seu património;

g) não impugnar, por qualquer meio, o

ACORDO DE DELAÇÃO, em qualquer dos inquéritos policiais ou

procedimentos investigativos nos quais esteja envolvido, no Brasil ou

no exterior, salvo por fato superveniente à homologação judicial,

em função de descumprimento do ACORDO pelo MPF ou pelo juízo.

IV - VALIDADE DA PROVA

A prova obtida mediante a presente

avença de delação premiada poderá ser utilizada, validamente, pelo

MINISTÉRIO PÚBLICO para a instrução de inquéritos policiais,

procedimentos administrativos criminais, ações penais, ações cíveis e

de improbidade administrativa e inquéritos civis, podendo ser

emprestada também à Receita Federal e à Procuradoria da Fazenda

Nacional e ao Banco Central do Brasil, para a instrução de

procedimentos e ações fiscais, bem como a qualquer outro órgão

público para a instauração de processo administrativo disciplinar.

V - GARANTIA CONTRA A AUTO-

INCRIMINACAO

Ao assinar o ACORDO DE DELAÇÃO

PREMIADA, o acusado xxxxxxxxxxxxxx está ciente do direito

constitucional ao silêncio e da garantia contra a auto-incriminação,

renunciando expressamente a ambos, estritamente no que tange aos

depoimentos necessários ao alcance dos fins da presente avença.

VI - IMPRESCINDIBILIDADE DA DEFESA

TÉCNICA

Page 88: Delação Premiada

O ACORDO DE DELAÇÃO somente terá

validade se aceito, integralmente, sem ressalvas, pelo acusado

xxxxxxxxxxxxxx.

VII - CLAUSULA DE SIGILO

Nos termos do artigo 5°, inciso XXXIII, e

artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, combinados com a

artigo 7°, inciso VIII, da Lei n. 9.807/99, e com o artigo 20 do CPP, as

partes compro me tem-se a preservar o sigilo sobre a presente

proposta e o ACORDO dela decorrente.

VIII - HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL

Para ter eficácia, a proposta será

submetida a homologação judicial, cabendo à autoridade judiciária

preservar o sigilo do ACORDO.

A avença será submetida a homologação,

tão logo seja assinada pelas partes, e produzirá efeitos de imediato.

IX - CONTROLE JUDICIAL

O presente ACORDO de delação

premiada tramitará perante a xxxxxxxxxxxx como procedimento

criminal diverso (PCD) sigiloso, não apenso mas vinculado a apelação

mencionada, sem referência explícita nos autos principais e sem

menção de tema e partes no sistema informático.

O controle da efetividade da colaboração

será feito mediante a apresentação de relatórios circunstanciados e

periódicos à autoridade judicial, com prévio pronunciamento do

MPF.

Page 89: Delação Premiada

Os relatórios deverão ser apresentados

ao juízo pelo MINITERIO PÚBLICO ou pela Polícia Federal e serão

encartados no PCD.

A eficácia do ACORDO poderá ser

sustada, com prévia ouvida das partes, mediante ato judicial

fundamentado.

X – RESCISÃO

O ACORDO perderá efeito,

considerando-se rescindido, ipsó facto:

A) se o acusado descumprir,

injustificadamente, qualquer das cláusulas em relação às quais se

obrigou;

B) se o acusado sonegar a verdade ou

mentir em relação a fatos em apuração, em relação aos quais se

obrigou a cooperar;

C) se vier a recusar-se a prestar

qualquer informação de que tenha conhecimento;

D) se recusar-se a entregar documento

ou prova que tenha em seu poder ou sob a guarda de pessoa de

suas relações ou sujeita a sua autoridade ou influência;

E) se ficar provado que o acusado

sonegou, adulterou, destruiu ou suprimiu provas que tinha em seu

poder ou sob sua disponibilidade;

F) se o acusado vier a praticar outro

crime doloso, seja crime objeto deste acordo, bem como os crimes

antecedentes da Lavagem de Dinheiro, elencados no art. 1° da Lei

9.613/998, após a homologação judicial da avença;

G) se o acusado fugir ou tentar furtar-

se à ação da Justiça Criminal;

Page 90: Delação Premiada

H) se o sigilo a respeito deste ACORDO

for quebrado por qualquer das partes ou pela autoridade judiciária,

ressalvada a possibilidade de utilização dos depoimentos obtidos

em todos os inquéritos policiais, ações penais, inquéritos civis,

ações de improbidade, execuções fiscais e processos administrativos

disciplinares que tenham relação com o objeto do presente

ACORDO.

Em caso de rescisão do ACORDO, o

acusado xxxxxxxxxxx perderá automaticamente direito aos

benefícios que lhe forem concedidos em virtude da cooperação com o

MINITÉRIO PÚBLICO FEDERAL.

Se a rescisão for imputável ao MPF ou ao

Juízo Federal, o acusado poderá, a seu critério, cessar a cooperação,

ressalvado o artigo 342 do CP.

E, por estarem concordes, firmam as

partes o presente ACORDO de delação premiada, em três vias, de

igual teor e forma.

Curitiba, 11 de novembro de 2004.

Pelo MPF:

XXXXXXXXXX

PROCURADOR REGIONAL DA REPÚBLICA

XXXXXXXXXX

PROCURADOR REGIONAL DA REPÚBLICA

Pela defesa:

xxxxxxxxxxx

ACUSADO

xxxxxxxxxxxxxxxx

ADVOGADO