Download - Delação Premiada
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................IX
ABSTRACT..........................................................................................X
INTRODUÇÃO......................................................................................1
CAPÍTULO 1.........................................................................................3
DELAÇÃO PREMIADA – ASPECTOS GERAIS..................................31.1 O INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA: CONCEITO..................................31.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA DELAÇÃO PREMIADA......................................61.3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DA DELAÇÃO PREMIADA EM LEGISLAÇÕES ALIENÍGENAS...........................................................................101.3.1 NA ITÁLIA......................................................................................................101.3.2 NOS ESTADOS UNIDOS...................................................................................141.3.3 NA ESPANHA.................................................................................................161.3.4 NA ALEMANHA...............................................................................................181.3.5 NA COLÔMBIA................................................................................................191.3.6 NO COMBATE DOS CRIMES TRANSNACIONAIS..................................................201.4 NATUREZA E CLASSIFICAÇÃO...................................................................23
CAPÍTULO 2.......................................................................................26
DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS TÉCNICOS.......................262.1 DISCIPLINAS NORMATIVAS.........................................................................262.2 BENEFÍCIOS E REQUISITOS PARA A CONCESSÃO.................................27
2.2.1 LEI N. 8072/90 – LEI DOS CRIMES HEDIONDOS...............................................272.2.2 LEI N. 9034/95 – COMBATE AO CRIME ORGANIZADO......................................302.2.3 LEI N. 7492/86 - CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A LEI N. 8137/90 - CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA, ECONÔMICA E AS RELAÇÕES DE CONSUMO 322.2.4 DECRETO-LEI N. 2848/40 - CÓDIGO PENAL BRASILEIRO..................................332.2.5 LEI N. 9613/98 - LAVAGEM DE CAPITAIS.........................................................352.2.6 LEI N. 9807/99 - LEI DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS, TESTEMUNHAS E OUTROS COLABORADORES DA JUSTIÇA................................................................................362.2.7 LEI N. 11343/06 - LEI DE PREVENÇÃO E REPRESSÃO AO USO DE DROGAS.....412.3 MÍNIMO LEGAL E CONFRONTO ENTRE NORMAS.....................................422.4 MOMENTO DA DELAÇÃO.............................................................................442.5 A DELAÇÃO COMO MEIO DE PROVA.........................................................46
CAPÍTULO 3.......................................................................................49
DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS CRÍTICOS........................493.1 A ÉTICA E A DELAÇÃO PREMIADA............................................................493.2 A DEMONSTRAÇÃO DE INEFICÁCIA DO ESTADO NO COMBATE À CRIMINALIDADE..................................................................................................513.3 DOS VALORES E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS........................................533.4 CONSIDERAÇÕES FAVORÁVEIS A DELAÇÃO PREMIADA......................563.5 DA GARANTIA JURÍDICA NO PROCESSO..................................................613.6 A INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DO DELATOR E DE SUA FAMÍLIA................................................................................................................65
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................69
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS............................................72
AnexoS...............................................................................................79
RESUMO
O Estado brasileiro, ao exemplo do direito alienígena
mundial, buscando a efetivação e a punição dos indivíduos e grupos de indivíduos
que ferem a ordem jurídica fundamental, regulamenta através de leis esparsas, o
instituto da delação premiada. Este instituto é um estímulo à colaboração com a
Justiça, para efetivar e viabilizar a persecução penal. Mas no tocante ao instituto,
depara-se com questões éticas e princípio lógicas. Com ele, incentiva-se a traição
e premia-se o indivíduo que rompe o contrato social, motivado pelo resultado em
solucionar crimes e desconchavar organizações criminosas. Consagra-se desta
forma, que o Estado é ineficaz no combate à criminalidade. Muito embora, ser
nobre a intenção do legislador, a viabilidade do instituto da delação premiada é
uma incógnita, pois muito se sabe que o Estado Brasileiro não tem estrutura para
garantir ao delator e a sua família proteção ao revés dos delatados. Ainda no
âmbito jurídico constitucional é proeminente o estudo do instituto da delação
premiada, por versar e mitigar princípios e normas fundamentais garantidoras da
liberdade individual do indivíduo.
Palavras-chave: Delação; Delação Premiada; Ética;
Benefício; Prova; Proteção; Testemunhas; Crime Organizado; Drogas; Crimes
Hediondos; Sistema Financeiro; Lavagem de Capitais; Perdão Judicial.
ABSTRACT
The Brazilian State, to the example of world-wide the foreign
right, searching the permanent and punishment of the individuals and groups of
individuals that wound the basic jurisprudence, regulates through laws scattered ,
the institute of the disclosure award. This institute is one stimulates to the
contribution with Justice, to accomplish and to make possible the criminal
persecution. But in the moving one to the institute it is come across with ethical
questions and on principle natural. With the institute stimulates it treason and
reward the individual that breaches the social contract, motivated for the result in
solving crimes and disjointing criminal organizations. It is devoted of this form, that
the State is inefficacious in the combat to crime. Much even so, to be noble the
intention of the legislator, the viability of the institute of the disclosure award is an
incognito, therefore very it knows that the Brazilian State does not have structure
to guarantee to the tattletale and its family to opposite of the exposed ones. Still in
the constitutional legal scope it is prominent the study of the institute of the
disclosure award, for turning and mitigating principles and warranting basic norms
of the individual freedom of the individual.
Keywords : Tattletale ; Disclosure award; Ethics; Benefit;
Test; Protection witnesses; Organized crime; Drugs; Hideous crimes; Financial
System; Launder of capitals; Judicial pardon.
iv
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto a pesquisa teórica e
jurídica do instituto da delação premiada, sobre o prisma da legislação pátria.
O seu objetivo é analisar o instituto da delação premiada
frente aos princípios éticos e constitucionais, verificando sua aplicabilidade no
sistema brasileiro, identificando assim os seus pressupostos e, por conseguinte,
as suas conseqüências, procedendo, para este fim, um estudo legal, doutrinário e
jurisprudencial.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando das
características gerais, uma análise dos elementos conceituais do instituto, sua
origem, evolução e classificação. Também sob linhas gerais, traçam-se
características básicas da delação premiada em algumas legislações alienígenas.
No Capítulo 2, tratando dos aspectos técnicos da delação
premiada, são analisadas todas as disciplinas normativas vigentes previstas no
ordenamento pátrio, exteriorizando suas peculiaridades. Por fim, embrenha-se
numa análise sistêmica do instituto, definindo seu mínimo legal, analisando-se a
aplicabilidade e sua valoração no sistema processual penal, como prova
inominada.
No Capítulo 3, tratando dos aspectos críticos, fomenta-se
uma análise ética e princípio lógica, verificando as ponderações arrazoadas pela
doutrina, em oposição e amparo ao instituto da delação premial. Sustenta-se ao
final, uma análise do desvairar do legislador a não tratar adequadamente o
instituto da delação premiada, substanciado a imperfeição legislativa e das
garantias ao delator.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre o instituto da delação premial no ordenamento brasileiro.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
O instituto da delação premiada possui traços antiéticos na sua
origem, pois pode apresentar-se como uma verdadeira traição
por parte do delator em busca de benefícios que satisfaçam
necessidades próprias em detrimento das do delatado. O que se
observa é que a delação surge quando há, na maioria das
vezes, um desajuste entre os envolvidos. Esta situação de
angústia e desespero, unida à intenção de beneficiar-se, é que
conduz o indivíduo a valer-se do referido instituto. Assim,
discutível é a intenção do agente em realmente colaborar com a
efetivação da Justiça.
A efetividade do instituto está ligada diretamente à observação das
garantias que o delator e sua família terão, contra o revés do
delatado.
Cabem as instituições estatais que manusearão diretamente o
instituto, o dever de agir com cautela e responsabilidade quanto
às informações recebidas, evitando incorrer em injustas
perseguições, satisfazendo interesses promíscuos de terceiros.
Delações infundadas, na seara social, prostituirão o instituto,
trazendo insegurança jurídica e sua dilapidação.
A mitigação de princípios em face de outros princípios, em casos
reais é muito empregado pela jurisprudência brasileira,
necessitando o operador jurídico ficar atento a não restringir
mortalmente direitos fundamentais, impondo ao processo vício
que determine sua nulabilidade.
Quanto à Metodologia empregada foi utilizado o Método
Indutivo. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do
Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.
2
CAPÍTULO 1
DELAÇÃO PREMIADA – ASPECTOS GERAIS
1.1 O INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA: CONCEITO
Apesar dos questionamentos sobre os aspectos éticos e de
eficácia do Estado, a delação premiada é um instrumento extremamente
poderoso no combate a criminalidade, de uso muito comum nos sistemas
alienígenas, principalmente no Norte-Americano. 1
A palavra “delatar” significa denunciar, apontar, acoimar ou
acusar alguém, oferecendo ao delator, um prêmio (premiada) pré-estabelecido em
lei. No sentido processual, o delator é aquele que admite a prática de um crime,
revelando os demais agentes e partícipes que estão envolvidos no inter criminis.2
Segundo Wilson Alberto Zappa Hoog, delação premiada
significa:
[...] toda a conduta, colaboradora, do réu, co-autores ou partícipes
do crime, logo colaboradores consistentes em revelar a autoria de
um delito, portanto, são as informações prestadas por co-autor ou
participante do delito, com a finalidade de conseguir a extinção ou
diminuição de sua punibilidade. Portanto, as informações
prestadas pelo co-autor ou quinhoeiro de um delito no direito
penal brasileiro podem buscar a extinção da punibilidade, como
também a redução da pena [...] 3
Nas palavras de Gustavo Senna Miranda, delação premiada
ou colaboração processual é:
1 SOUZA, Sérgio Ricardo de. A Nova Lei Antidrogas. Niterói/RJ: Impetus, 2006. p. 62-63.2 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 675-676.3 HOOG, Wilson Alberto Zappa. Contador, o Crime e a Delação Premiada. Classe Contábil. Disponível em: < http://www.classecontabil.com.br/trabalhos/ZappaHoogDelacao.doc>. Acesso em 01 de junho de 2007.
[...] a forma de contribuição voluntária do investigado/réu para
elucidação do crime, por meio da confissão de suas infrações
perante uma autoridade, bem como de delação em relação aos
eventuais cúmplices, tendo como contrapartida do Estado a
concessão de benefícios de ordem pessoal (como de garantia de
sua integridade física e psíquica e de sua família) e processual
(como redução de pena ou de isenção de responsabilidade penal
com a aplicação de perdão judicial).4
Importante é ressaltar os comentários do penalista Wilson
Lavorenti ao artigo 6º da Lei n. 9.034/95, esclarecendo que:
A delação ocorre quando o acusado confessa a prática do crime e
também o imputa a terceiros, facilitando a descoberta de delitos e
de seus autores. Passa a ser chamada de delação premiada
porque a delação pode redundar em diminuição ou isenção de
pena, a favor do delator. 5
Por fim, elucida Damásio de Jesus:
Delação é a incriminação de terceiro, realizada por um suspeito,
investigado, indiciado ou réu, no bojo de seu interrogatório (ou em
outro ato). “Delação premiada” configura aquela incentivada pelo
legislador, que premia o delator, concedendo-lhe benefícios
(redução de pena, perdão judicial, aplicação de regime
penitenciário brando etc.).6
Também conhecida como “imputação de co-réu”, “chamada
de co-réu”, “chamamento de cúmplice”, “pentitismo7”, “crom-witness8”; a delação
premiada, encontra muitos opositores na doutrina. Mas indiferente ao debate de
4 MIRANDA, Gustavo Senna. Primeiras Impressões sobre a nova Lei de Drogas. Ministério Público do Espírito Santo. Disponível em: <https://www.mpes.gov.br / anexos / centros_apoio / arquivos / 14_20891173123112006 _ PRIMEIRAS % 20IMPRESS % C3%95ES% 20SOBRE % 20A % 20NOVA%20LEI%20DE%20DROGAS%20-%201.doc >. Acesso em 01 de junho de 2007.5 LAVORENTI, Wilson. Leis Penais Especiais Anotadas, 3ª edição, São Paulo: Millennium, 2002, pág. 220.6 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo Jurídico. Disponível na Internet: <http://www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em 4 de abril de 2007.7 Expressão usada no Direito Italiano.8 Para os anglo-saxões.
4
fundo ético, vem ganhando importante espaço no direito penal funcionalista,
utilitário e pragmático, sendo uma forma de fazer frente no combate ao crime.9
Distingui-se delação premiada de delação propriamente dita
(delatio criminis) e notitia criminis. Nas duas últimas o delator é informante, não se
achando envolvido na prática do ilícito, “porém da delatio criminis a delação é feita
pelo próprio ofendido ou seu representante legal, e a notitia criminis deve ser
levada a efeito por terceiros.” 10
A delação não se confunde com a confissão, sendo esta
abrangida pela delação. Na delação premiada, além de confessar a autoria ou a
participação, o delator igualmente atribue a um terceiro a autoria ou a participação
no crime, buscando um prêmio.11
A simples confissão espontânea reiterada em juízo da
autoria ou participação, configura como circunstância atenuante obrigatória na
aplicação da pena, prevista no artigo 65, III, “d”12, do Código Penal. 13
Já a confissão delatória, apesar da presença dos elementos,
auto-imputação e acoimação de terceiro, difere da delação premiada
fundamentalmente, no fato de seus efeitos positivos ao acusado não estarem
presentes, o que objetivamente é o prêmio pretendido. 14
Também não se pode confundir delação premiada com
prova testemunhal. A testemunha não figura nos pólos da ação penal, sendo esta
diferente das partes. 15
Assim delação premiada, trata-se de um estímulo à verdade
processual, na qual o agente que figura no pólo penal (inquérito ou na ação
9 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. São Paulo: Lemos & Cruz, 2006, p. 98-99.10 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 99.11 MIRABETE, Código de Processo Penal Interpretado. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 526.12 Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena: III – ter o agente: d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;13 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 131-132.14 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. p. 131-132.15 DELABRIDA, Sidney Eloy. Direito processual penal. Florianópolis/SC: Editora OAB/SC, 2006. p. 114.
5
penal), confessa sua autoria ou participação, incriminando um ou mais terceiros, a
fim de obter as beneficies legais.
1.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA DELAÇÃO PREMIADA
Com origem na Idade Media, durante a Santa Inquisição, a
delação premiada era usada pela Igreja Católica, como meio de forçar os hereges
a confessarem espontaneamente seus pecados, obtendo como recompensa
penitências mais leves. Dentre as penitências mais leves, pode-se citar o
emprego do sambenito, que era uma espécie de hábito com um chapéu de burro
ou máscara de ferro. A confissão só era válida se fosse delatado outro herege.16
Completa José Alexandre Marson Guidi, que:
[...] na Idade Média distinguia-se os valores de delação feita sob
confissão espontânea do valor da delação feita na confissão
obtida sob tortura. Conjeturavam que aquele que confessasse
espontaneamente estava inclinado a mentir em prejuízo de
outrem, presumiam, ainda, que era mais fácil vir da boca do co-
réu a mentira do que a verdade.17
Modernamente o instituto da delação premiada foi adaptado
na legislação Italiana e Norte-Americana. No primeiro constituía arma ao combate
à máfia, na qual quem aceitava em colaborar no desmantelamento destas
organizações criminosas, era considerado como pentito ou arrependido,
recebendo pena menor. 18
Sobre o tema elucida o informativo do Ministério Público do
Estado do Paraná, número 33:
Foi a partir da delação premiada do famoso mafioso Tommaso
Buscetta, que a máfia italiana foi desmantelada e que se procurou
16 Pílulas do Direito para Jornalistas – n. 33. Ministério Público do Paraná. 1º de novembro de 2005. Disponível em: < http://www.mp.pr.gov.br/imprensa/pil0111.html>. Acesso em 25 de junho de 2007.17 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 98-99.18 Pílulas do Direito para Jornalistas – n. 33. Ministério Público do Paraná.
6
institucionalizar a "delação premiada" naquele país. Buscetta
estava foragido no Brasil e, em 1984, foi preso pela polícia
brasileira e, em seguida, extraditado, para responder pelos delitos
de tráfico de entorpecentes perante as autoridades italianas.
Arrependido, colaborou na investigação de delitos da
máfia, levando à prisão toda a cúpula da organização mafiosa
italiana. 19
Já nos Estados Unidos, o instituto é conhecido como "plea
bargaining", na qual o Ministério Público tem total poder em transacionar com o
acusado, podendo modificar a pena e também a natureza do delito. No Brasil, não
é permitido no ordenamento à transação da natureza do delito, aproximando-se
do sistema Italiano, onde apenas é permitida a modificação da pena.20
No direito brasileiro, a origem da delação premiada, tem nas
Ordenações Filipinas, no Livro V, da parte criminal, vigorando de janeiro de 1603
até a entrada em vigor do Código Criminal de 1830.21
Segundo Damásio de Jesus:
O Título VI do “Código Filipino”, que definia o crime de “Lesa
Magestade”22 (sic), tratava da “delação premiada” no item 12; o
Título CXVI, por sua vez, cuidava especificamente do tema, sob a
rubrica “Como se perdoará aos malfeitores que derem outros á
prisão” e tinha abrangência, inclusive, para premiar, com o
perdão, criminosos delatores de delitos alheios.
19 Pílulas do Direito para Jornalistas – n. 33. Ministério Público do Paraná. 20 Pílulas do Direito para Jornalistas – n. 33. Ministério Público do Paraná.21 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo
Jurídico.22 O crime de Lesa-majestade significa “traição commettida contra a pessoa do Rei, ou seu Real
Stado, que he tão grave e abominável crime, e que os antigos Sabedores tanto estranhárão, que o comparávão á lepra; porque assi como esta enfermidade enche todo o corpo, sem nunca mais se poder curar, e empece ainda aos descendentes de quem a tem, e aos que com elle conversão, polo que he apartado da communicação da gente: assi o erro da traição condena o que a commette, e empece e infama os que de sua linha descendem, posto que não tenham culpa”. (ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. 2007. 78 p. Especialização em Direito Processual Penal. Universidade do Vale do Itajaí. Pro - Reitoria de pós-graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura, Florianópolis, p. 13.)
7
Em função de sua questionável ética, à medida que o legislador
incentivava uma traição, acabou sendo abandonada em nosso
Direito, reaparecendo em tempos recentes.23
Esta legislação recente que remete Damásio,
especificamente, trata-se da lei n. 8072/90, que dispõe sobre os crimes hediondos
prevendo em seu artigo 8º, § único, que “o participante e o associado que
denunciar à autoridade o bando ou a quadrilha, possibilitando o seu
desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços”. 24
Posteriormente, no tocante à criminalidade organizada,
seguindo a mão transnacional, a Lei n. 9034/95, que dispõe dos meios
operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações
criminosas, descreve em seu artigo 6º que “nos crimes praticados em organização
criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços; quando a colaboração
espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua
autoria”.25 No mesmo ano, a Lei 9080/95, igualmente acrescentou nas Leis
8137/90 e 7492/86, dispositivos legais, prevendo a delação premiada em
“infrações praticadas por quadrilha ou em co-autoria, mediante a redução da pena
do partícipe que revelar espontaneamente à autoridade policial ou judicial toda a
trama delituosa.” 26
Referente à Lei n. 8137/90, que define crimes contra a
ordem tributária, econômica e relações de consumo, dispôs tratamento à matéria,
previsto em seu artigo 16, parágrafo único. Já a Lei 7492/86, que define crimes
contra o sistema financeiro nacional, foi disposta no artigo 25, § 2º. Em ambas as
Leis, restaram estabelecidas que aos crimes “cometidos em quadrilha ou co-
autoria, o co-autor ou partícipe que através da confissão espontânea revelar à
23 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo Jurídico.
24 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE. Disponível em: <http://jusonline.visaonet.com.br/artigos/traicao.doc> Acesso em 29 de setembro de 2005.
25 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE.
26 PEREIRA JOÃO, Giselle. Delação Premiada: O tratamento Jurídico Instituído pela Lei 9807/99 ao Réu Colaborador. Atuação: Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Santa Catarina, n. 7, p. 180, 2005.
8
autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de
um a dois terços”. 27
A Lei n. 9269/96 tratou da delação premiada em relação ao
crime de extorsão mediante seqüestro, ao introduzir o §4º no artigo 159 do
Código Penal, prevendo a redução da pena de um a dois terços para aquele que
denunciar o crime à autoridade, facilitando a liberação do seqüestrado. 28
Em 1998, foi introduzida no ordenamento a Lei de lavagem
de capitais, Lei 9613/98, dispondo no artigo 1º. §5º:
A pena será reduzida de um a dois terços e começará a ser
cumprida em regime aberto, podendo o juiz deixar de aplicá-la ou
substituí-la por pena restritiva de direitos, se o autor, co-autor ou
partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades,
prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das
infrações penais e de sua autoria ou à localização dos bens,
direitos ou valores objeto do crime. 29
A Lei n. 9807/99 tentou uniformizar o tratamento dado à
delação, prevendo o legislador a possibilidade de concessão de perdão judicial ou
a diminuição da pena dos acusados que colaborarem de forma voluntária e
eficaz.30
Luiz Flávio Gomes, no artigo Corrupção Política e Delação
Premiada, ao tratar da uniformização no tratamento da delação premiada,
enfaticamente discorda, afirmando que cada uma das leis citadas apresenta suas
peculiaridades de concessão. 31
Ainda em recente obra, Luiz Flávio Gomes, Alice Bianchini,
Rogério Sanches Cunha e William Terra de Oliveira reafirmam:
27 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE.
28 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE.
29 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 192.
30 AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Entendendo de uma vez por todas a traição benéfica (direito comparado, colaboração processual e traição benéfica). JUSONLINE.
31 GOMES, Luiz Flávio. Corrupção Política e Delação Premiada. Instituto LFG. Disponível em: <http://www.proomnis.com.br/public_html/article.php?story=20050830151404903&query=delação% 20 premiada> Acesso em 30 de agosto de 2005.
9
Cada uma das possibilidades de delação, como se vê, conta com
suas peculiaridades. Não existe um regramento único e coerente.
[...] deve-se cuidar dela com devida atenção, pondo em pauta
questões relevantes como: prêmios proporcionais, veracidade nas
informações prestadas, exigência de checagem minuciosa dessa
veracidade, eficácia prática da delação, segurança e proteção do
delator e, eventualmente, sua família, possibilidade da delação
inclusive após a sentença de primeiro grau, aliás, até mesmo após
o trânsito e julgado, envolvimento do Ministério Público e da
Magistratura no acordo, transformação do instituto da delação
numa espécie de “plea bargaining” etc.32
Por fim, destaca-se a hodierna Lei 11343/06, Lei de drogas,
que reza em seu artigo 41, que o delator voluntário, na investigação policial ou
processo criminal, ao identificar os co-autores e partícipes, recuperando
totalmente ou parcialmente o produto do crime, terá o benefício da redução da
pena de um terço a dois terços.33
1.3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DA DELAÇÃO
PREMIADA EM LEGISLAÇÕES ALIENÍGENAS
A delação premiada desde muito, está materializada no
direito alienígena. Constitue forte arma de combate ao crime, trazendo
características ímpares, que merecem uma breve análise.
1.3.1 Na Itália
O endurecimento das leis Italianas, sobretudo com a
Operazione Mani Puliti (Operação Mãos Limpas), provocou baixas na Máfia,
estimulando a colaboração, reduzindo a violência naquele país.34 O primeiro
32 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 193.
33 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 188.
34 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. Teresina, ano 10, n. 987, 15 mar. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8105>. Acesso em: 15 mar. 2007.
10
mafioso a romper a Lei do Silêncio (omertá), dando inicio ao instituto do pentiti, foi
Tommaso Buscetta.35
Foram dos juízes Giannicola Sinisi e Giovanni Falcone, os
principais projetos de lei italianos contra associações criminosas, que estimularam
a participação dos chamados colaboradores da Justiça. 36
Em contra ataque, as organizações criminosas efetuaram a
execução de vários mártires, dentre estes o “general Carlos Alberto Dalla Chiesa
(comandante dos Carabiniere na Sicília e responsável por combater a Máfia de
forma heróica), e dos juízes antimáfia Giovanni Falcone e Paolo Borselino”.37
Na Itália, nos crimes em concurso com organizações
criminosas, o agente quando arrepende-se, empenhando-se para diminuir as
conseqüências do crime cometido, confessando-o ou impedindo o cometimento
de crimes conexos, terá a redução da pena na sentença condenatória de um
terço, ou a substituição da pena de prisão perpétua pela reclusão de quinze a
vinte e um anos.38
Segundo José Alexandre Guidi:
A lei italiana n. 82, de 15 de março de 1991, que resultou da
conversão do Decreto-lei n. 8, de 15 de janeiro de 1991,
especificamente em seu art. 6º, modificou o art. 289 bis do Código
Penal Italiano, estabelecendo pena menor para o co-autor de
seqüestro com fins de terrorismo ou subversão da ordem
democrática que libertar a vítima, isto é, pena de dois a oito anos
de reclusão; mas se o seqüestrado morrer em razão do seqüestro,
depois de libertado, a pena será de oito anos de reclusão. Vale
lembrar que a pena, excluindo tais benefícios, é de 25 a 30 anos,
se não houver morte; de 30 anos, quando a morte for por culpa
35 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
36 QUEIROZ, Carlos Alberto Marchi de. Crime organizado no Brasil, comentários à lei n. 9.034/95: aspectos policiais e judiciários: teoria e prática. São Paulo: Iglu, 1998. p. 87.
37 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 102.
38 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 102.
11
em sentido estrito; ou prisão perpétua, quando a morte for
voluntariamente causada.39
Completa Ada Pellegrini Grinover:
Existe ainda, na legislação italiana, a figura do colaborador que, a
par de agir como dissociado ou arrependido, auxilia as
autoridades na elucidação da autoria de crimes cometidos pela
organização criminosa, permitindo a individualização da conduta e
a captura de outros criminosos.40
Neste caso, a pena “será reduzida pela metade ou haverá a
substituição de prisão perpétua por reclusão de dez a doze anos.” 41
A legislação antiterrorismo italiana, Decreto-lei n. 625/79
(convertido na Lei 15/80) e a Lei n. 304/82, criou três figuras importantes no
sistema penal italiano, aos quais são: o arrependido, o dissociado e o
colaborador.42
Nas palavras de Eduardo Araújo Silva, o primeiro instituto
trata-se de quando os criminosos, antes da sentença condenatória, saem da
associação e fornecem informações acerca da estrutura da organização. Sendo
comprovada a veracidade das denúncias, premia-se o arrependido com a
extinção da punibilidade e lhe proporcionando benefícios do Estado como salário,
moradia e plano de saúde. Além dos benefícios, o Estado passa a se tornar
responsável por sua integridade física, incluindo a de seus familiares mais
próximos. 43
39 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 102.
40 GRINOVER, Ada Pellegrini. O crime organizado no sistema italiano. volume 3: críticas e sugestões, o crime organizado (Itália e Brasil): a modernização da lei penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995b, p. 16.
41 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 103.
42 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 103.
43 SILVA, Eduardo Araújo. Da moralidade da proteção aos réus colaboradores. São Paulo. In: Boletim IBCCrim n. 85, dezembro de 1999, p. 4.
12
Na figura do dissociado, o concorrente no delito, empenha-
se para, antes da sentença condenatória, elidir ou abrandar as conseqüências
danosas ou perigosas dos crimes, obtendo a redução de um terço da pena.44
Já sobre a figura do colaborador, conforme Ada Pellegrini
Grinover, é o concorrente que, antes da sentença condenatória, procede nos
mesmos comportamentos previstos para o dissociado, cumulados com o auxílio
às autoridades policiais e judiciárias na “colheita de provas decisivas para a
individualização e captura de um ou mais autores dos crimes, ou fornece
elementos de prova relevantes para a exata reconstituição dos fatos e a
descoberta dos autores”.45
O benefício da liberdade provisória somente é permitido,
para as figuras do dissociado e a do colaborador desde que não sejam para as
figuras típicas de terrorismo e de subversão, punidos com pena superior a quatro
anos. Também os institutos da suspensão condicional da pena e o livramento
condicional são facilitados para estes.46
O artigo 630, §5o, do Código Penal Italiano, traz a figura
típica do crime de extorsão mediante seqüestro, na qual, também se tem a ordem
premial, que se constitui na substituição da pena de prisão perpétua pela pena de
reclusão de doze a vinte anos, bem como diminui de um a dois terços, as demais
penas aos co-autores que evitarem que se produzam as conseqüências do delito
ou ajudar na colheita de provas decisivas para a individuação ou captura dos
demais concorrentes.47
Lembra Ada Pellegrini, que “tais medidas podem ser
dispostas em favor dos parentes próximos, dos conviventes e de quem esteja
exposto a perigo grave e iminente, por força das relações mantidas com o
preso”.48
44 SILVA, Eduardo Araújo. Da moralidade da proteção aos réus colaboradores. p. 4.45 GRINOVER, Ada Pellegrini. O crime organizado no sistema italiano. p. 16.46 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p.
104.47 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito
brasileiro. Jus Navigandi.48 GRINOVER, Ada Pellegrini. O crime organizado no sistema italiano. p. 19.
13
Por fim, conforme José Alexandre Guidi, o Decreto-lei n.
8/91 (convertido na Lei n. 82/91), dispõem sobre o crime de seqüestro,
estabelecendo normas para os colaboradores da justiça, “determinando a adoção
de medidas aptas a assegurar a incolumidade e, se necessário, a assistência das
pessoas presas, expostas a perigo grave e atual, em conseqüência de sua
colaboração.” 49
1.3.2 Nos Estados Unidos
A colaboração acusatória (conhecida como plea bargaining)
no sistema norte-americano, detém algumas características peculiares. A
iniciativa se dá exclusivamente ao órgão responsável pela acusação, tendo total
faculdade de negociar com o colaborador. Dentre as faculdades conferidas, pode
além de acordar a redução da pena, dispor da ação penal, cabendo apenas ao
magistrado a sua homologação.50
Neste sistema, o Ministério Público, tem a titularidade da
propositura da ação, além dos poderes de “condução da investigação policial, o
declínio da propositura da ação (sem qualquer interferência do judiciário) ou
prosseguimento, bem como a realização de acordos com a Defesa ou a condução
do feito a Juízo.” 51
Wálter Fanganiello Maierovitch com propriedade destaca:
[...] é largamente aplicada no Processo Penal norte-
americano, com os mais surpreendentes e espantosos acordos
(agreement). Inúmeros são os casos de avenças disparadas:
admite-se trocar homicídio doloso típico por culposo; tráfico por
uso de drogas; roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo
por furto simples. Para os críticos mais severos, trata-se de prática
lúdica, quando se nota que dez crimes variados são trocados pela
declaração de culpabilidade (plea of guilty) de apenas um, que
49 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 105.
50 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 105.
51 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 105.
14
pode ser até o menos grave. A plea bargaining visa,
fundamentalmente, a punição, ainda que branda e socialmente
injusta. É justificada como poderoso remédio contra a impunidade,
diante do elevado número de crimes a exigir colheita de prova
induvidosa da autoria, coma conseqüente pletora de feitos e
insuportável carga de trabalho do judiciário.52
O método norte-americano constrói um sistema de culpados,
excluindo a absolvição. Trata-se de um sistema de barganha, zelando pelos
anseios sociais, mitigando o princípio da inocência, pois há um pré-julgamento
antes da instrução criminal. A parte acusatória detém reclamante poder, tornando
a relação desequilibrada, pois esta é quem “coordena, articula a coleta de provas
na fase do inquérito, e prossegue com a sustentação da acusação perante o
Poder Judiciário”, restando à outra parte ficar a mercê da julgadora. “Quando da
acusação formal, surge à possibilidade de acordo (se for a vontade do Acusador),
caso contrário, parte-se para o juízo (instauração do sumário)”.53
Assim tem-se a figura do inquisitor, dirigente da fase pré-
processual, que propõe o acordo ou em caso de impossibilidade, dá seguimento
com a acusação formal. Na forma que está moldado, claramente verifica-se com o
plea bargaining, a possibilidade de supressão do juízo.54
Está incluso também neste programa, além dos delatores, a
proteção de vítimas e testemunhas. 55
Cabe destacar o texto de José Alexandre Guidi, comentando
sobre o alcance do plea bargaining:
Quanto ao alcance prático do “plea bargaining” nos Estados
Unidos, observam-se que através dele são solucionados de 80 %
a 95 % de todos os crimes, por outro lado, inquéritos feitos por
52 MAIEROVITCH, Wálter Fanganiello. Política criminal e plea bargaining. São Paulo. In: Revista de Julgados e Doutrina do Tribunal de Justiça de São Paulo n. 4, out./nov./dez. de 1989. p. 15.
53 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 106.
54 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 106.
55 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
15
uma amostragem significativa de promotores revelam que estes
consideram cerca de 85 % dos casos da sua experiência como
adequados a uma solução de “plea bargaining”.56
Apesar dos evidentes resultados práticos, este sistema sofre
grandes críticas dos juristas norte-americanos, principalmente no que tange ao
princípio da publicidade (pois os acordos sobre os fatos e direitos, são efetuados
em gabinete), ao princípio da igualdade (potencialização de tratamentos não
isonômicos em crimes de mesmo dano social) e também por permitir a ampliação
da injustiça.57
1.3.3 Na Espanha
A Espanha foi um dos países que importou a Lei dos
Arrependidos. Conhecida como delincuente arrepentido (delinqüente arrependido) 58, têm presente a figura do arrependimento processual que estabelece a
atenuação da pena.59
Conforme elucida Juliana Kobren:
Para isso, mister a presença de algumas condições: a) abandono
das atividades delituosas; b) confissão dos fatos delituosos nos
quais tenha participado; e c) ajuda a impedir a produção do delito
ou auxiliar na obtenção de provas para a identificação ou captura
dos demais, ou, ainda, cooperação eficaz para a consecução de
provas que impeçam a atuação ou desenvolvimento das
organizações criminosas em que tenha participado.60
56 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 106.
57 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 106.
58 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 107.
59 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
60 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
16
Preenchidas estas condições, no tocante aos crimes de
terrorismo, é que se obtém a benesses, que podem ser a exclusão, a atenuação
ou a remissão da pena.61 Este modelo de sistema busca resultados de caráter
preventivos e repressivos, exigindo que a colaboração seja eficaz.62
Conforme José Alexandre, o novo texto do Código Penal
espanhol, contempla-se no artigo 579, encartado na Seção Segunda (delos
delitos de terrorismo) do Capítulo V, do Título XXII (delitos contra el orden público)
do Livro II, o seguinte:
Art. 579 – En los delitos previstos en esta Sección, los Jueces y
Tribunales, razonándolo en Sentencia, pódrán imponer la pena
inferior en uno o dos grados a la señalada por la Let para el delito
de que se trate, cuando el sujeito haya abandonado
voluntariamente sus actividades delictivas y se presente a las
autoridades confesando los hechos en que haya participado y,
además, colabore activamente con éstas para impedir la
producción del delito o coadyuve eficazmente a la obtención de
pruebas decisivas para la identificación o captura de otros
responsabels o para impedir la actuación o el desarrllo de bandas
armadas, organizaciones o grupos terroristas a los que haya
pertenecido o con los que haya colaborado.63
Por fim, presta-se lembrar o artigo 376 do mesmo diploma
penal espanhol, onde trata de organizações ou associações dedicadas ao tráfico
ilegal de drogas. Este artigo impõe condutas e benefícios idênticos ao artigo
supracitado.64
61 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 107.
62 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
63 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 108.
64 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 108.
17
1.3.4 Na Alemanha
O sistema jurídico alemão, quanto a delação premiada,
adota a mesma linha dos sistemas europeus supracitados, onde o acusado que
colabora com a justiça, recebe os benefícios previstos em lei.65
Denominado Kronzeugenrelegelung ou a regulação dos
testemunhos, encontrar-se contemplado no artigo 129, alínea a, inciso V, do
StGB. O referido artigo faculta ao magistrado, discricionariamente diminuir a pena
ou deixar de “aplicá-la quando o agente se empenha séria e voluntariamente a
impedir a continuação da associação ou a prática de um crime fim desta”,
denunciando voluntariamente a uma autoridade. Se por circunstâncias alheias à
vontade, não se puder impedir o delito, o agente mesmo assim receberá as
benesses legais.66
Já em relação aos crimes de terrorismo, elucida Julio Díaz-
Maroto Villarejo, referindo-se a Lei 4 de 1989:
[...] no artigo 4º da Lei de 9 de junho de 1989, modificada pela Lei
de 16 de fevereiro de 1993, se prevê a possibilidade de se
dispensar a ação penal, arquivar o procedimento já começado,
atenuar ou dispensar a ação penal, arquivar o procedimento já
começado, atenuar ou dispensar a aplicação da pena. Tais
benefícios oferecidos ao investigado servem para evitar a prática
do crime, permitir sua apuração ou a captura dos demais
envolvidos. Estas disposições do artigo 4º da Lei 4 de 1989 são
normas especiais como as assinadas no StGB e, portanto, devem
ser aplicadas preferencialmente.67
Esta Lei (Lei 4 de 1989) contempla não só os crimes de
terrorismo, mas os que com ele estão conexos, na qual as benesses dispostas
65 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
66 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 109.
67 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. apud VILLAREJO, Julio Díaz-Maroto. Algunos aspectos jurídicos-penales y procesales de la figura del “arrepentido”, Revista Ibero-Americana de Ciências Criminais, ano 1, n. 0, maio-agosto, 2000. p. 186.
18
facultam ao Estado abrir mão da persecução penal, desde que haja o
esclarecimento do delito ou captura dos autores.68
1.3.5 Na Colômbia
A Colômbia adotou, na mesma linha italiana, uma legislação
emergencial, profundamente voltada ao combate ao narcotráfico. 69
Este sistema que primordialmente voltado ao narcotráfico,
conforme Alexandre Guidi, permite a:
[...] redução da pena em um terço em caso de confissão do
imputado (art. 299). Por sua vez, o art. 369-A do CPP colombiano
possibilitou um acordo e concessão de benefícios, tais como
diminuição da pena, liberdade provisória, substituição de pena
privativa de liberdade, inclusão no programa de proteção a vítimas
e testemunhas, àquele que colaborar com a administração da
justiça.70
O sistema colombiano, diverso dos sistemas até agora
estudados, tem como característica marcante a ausência da necessidade de
confissão do concorrente do delito. 71
O concorrente do delito receberá os benefícios da Lei,
simplesmente se preencher comitantemente dois requisitos: a) acusar os demais
concorrentes e b) fornecer provas eficazes. 72
68 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud OLIVEIRA JUNIOR, Gonçalo Farias de. O direito premial brasileiro: breve excursus acerca dos seus aspectos dogmáticos. Presidente Prudente. In: Intertemas: Revista do Curso de Mestrado em Direito v. 2, 2001.
69 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 109-110.
70 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 110.
71 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 110.
72 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 110.
19
Claramente deve-se observar que a delação só é valida, se
for de forma livre, desvirtuada de outras provas.73
.
1.3.6 No Combate dos Crimes Transnacionais
O crime não respeita fronteiras, sendo que cada vez mais as
organizações unem-se ou criam bases de multiplicação do poder, movimentando
e dispondo de estrondoso poderio bélico e econômico.
Wálter Fanganiello Maierovitch abordando a questão
escreve:
Em síntese e usando de uma imagem, o mapa-múndi é uma
grande cabeça tomada pelas metástases decorrentes de um
tumor maligno chamado crime organizado transnacional. E os
cancros proliferam pela incredulidade dos que não temem pela
perda da cidadania e da paz.74
É primordial a cooperação internacional no combate destas
organizações, principalmente por que muitas destas têm o poderio econômico
superior de grande parte das economias de países do terceiro mundo.
Sobre o tema pondera Geraldo Brindeiro:
O Ministério Público brasileiro, o interamericano e o internacional
[...] têm, nos últimos cinco anos, estreitado a cooperação no
interesse comum e discutido intensamente novas formas de
atuação no sentido do aprimoramento das investigações, da
persecução criminal e da cooperação internacional no combate à
criminalidade. Discussões, debates doutrinários e de direito
comparado, especialmente à luz dos modelos adotados nos
países de "common law" e de "civil law" (quanto a direção das
investigações, a inquéritos policiais e a juizados de instrução,
magistrados e Ministério Público), têm havido sobre a
73 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 110.
74 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud MAIEROVITCH, Wálter Fanganiello. As multinacionais do crime. Consciência. Disponível em: <http://www. consciencia .net /2003 /07 /13 / MAIEROVITCH .html>. Acesso em: 15 de julho de 2003.
20
modernização da legislação nacional para fazer frente aos
presentes desafios.
Pretendemos ainda a institucionalização de novos instrumentos
jurídicos para a maior eficiência da ação da Justiça.
Em vários países, em alguns casos no Brasil, foram criados
programas de proteção a testemunhas, de formas de "plea
bargaining" com réus colaboradores, de agilização da quebra de
sigilo bancário e fiscal, de bloqueio de contas e de confisco de
bens em ações civis nas hipóteses de bens ou rendas de origem
não-comprovada.
Isso além da utilização informal de moderna tecnologia (fax,
telefonemas, e-mails, home pages), para maior comunicação
entre os membros do Ministério Público, e da formação de forças-
tarefa com agilidade no combate ao crime, nacional ou
transnacional, organizado.
A melhoria da cooperação internacional abrange também a
necessidade de aprimoramento e de inovações no uso tradicional
dos sistemas de extradição, de tratados de assistência jurídica
recíproca (mutual legal assistance treaties), considerando a
diversidade jurídica de modelos, e sua revisão, especialmente
quando há nacionais envolvidos em tráfico de drogas, além da
instalação - que se pretende no médio prazo, a despeito dos votos
contrários de dois membros do Conselho de Segurança da ONU:
Estados Unidos e China - do Tribunal Penal Internacional, cuja
criação foi aprovada, em julho de 1998, em Roma, na reunião dos
plenipotenciários das Nações Unidas, com voto favorável do
Brasil.
Em abril deste ano, em Viena, sob os auspícios das Nações
Unidas (United Nations Office for Drug Control and Crime
Prevention), foi elaborado o texto da Convenção Multilateral contra
o Crime Transnacional Organizado, que foi aprovado em
conferência da ONU realizada na semana passada na cidade de
Palermo, na Sicília (Itália).
Não há lugar nesse combate para a ação isolada individual: o
trabalho é de equipe e em parceria com outros órgãos
responsáveis. Além disso é indispensável a realização de
reformas no Judiciário, para evitarmos a lentidão da prestação
21
jurisdicional, os recursos protelatórios, a prescrição e a
impunidade.
No Estado Democrático de Direito, todavia, não podem ser
violados princípios constitucionais para uma suposta maior
eficiência na luta contra o crime. 75
Os países europeus, através da União Européia já se
mobilizam para atuar frente ao combate dos crimes transnacionais, promovendo a
integração principalmente no campo da sociologia jurídica e do Direito. Um
exemplo prático é a recomendação de 20 de dezembro de 1996, do Conselho
Europeu, onde prevê a figura do colaborador da justiça no combate da
criminalidade internacional. Surge o Direito Comunitário, capaz de criar um direito
igual para toda a Europa, objetivando a superação das organizações
transnacionais. 76
1.4 NATUREZA E CLASSIFICAÇÃO
A delação premiada está intimamente ligada ao Princípio do
Consenso, que é uma variante do Princípio da Legalidade. Este princípio permite
que as partes possam ajustarem a despeito da situação jurídica do acusado.77
A disposição dessa variante do futuro do acusado é
estritamente limitada, sendo que o grau discricionariedade do operador do direito
deverá estar expresso em Lei. 78
75 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud BRINDEIRO, Geraldo. A justiça e a criminalidade contemporânea. In: Folha de São Paulo, Artigo/Opinião. Em: 21 Dez. 2000.
76 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
77 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 125.
78 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 125-126.
22
O Princípio do Consenso não tem caráter absoluto no Brasil,
sendo claramente seus marcos determinados pela legislação. (Princípio da
Legalidade). 79
A finalidade do instituto da delação premiada é suprir uma
incapacidade estatal em buscar elementos para a persecução penal. Verifica-se
então que a delação premiada tem a natureza de prova. Prova esta inominada,
pois não se faz presente no rol do Diploma Processual Penal.80
No tocante a classificação da delação premiada, busca-se
na doutrina uma metodologia aplicável. Tema este, somente abordado, por José
Alexandre Marson Guidi.
O referido autor traz em sua obra a classificação de delação
aberta e fechada. Esta classificação, de fato é inaplicável à delação premiada
como se aparentemente pretendia. Primeiramente, delação, como já comentado
no item 1.1 deste trabalho, não é o mesmo que delação premiada.
Segundo Guidi, delação aberta é aquela que o delator é
identificado e delação fechada, ao contrário, é aquela em que o denunciante é
anônimo. 81 Obviamente o anonimato não se permite a confissão (premissa no
direito brasileiro) e muito menos imputar qualquer espécie de prêmio. Desta
forma, não poderá se falar no instituto da delação premiada, para a classificação
adotada por Alexandre Guidi.
Para contemplar o estudo, sugere-se (somente como meio
didático) abordar a delação sob dois enfoques para sua classificação.
Abordando a delação premial sob o enfoque do momento do
da atuação estatal, esta pode ser classificar como: a) investigatória (aquela que
se dá na fase policial) e b) processual (aquela que se dá após a instauração do
processo criminal).
79 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 125-126.
80 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 125.
81 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 119.
23
Humildemente cabe tecer algumas linhas para caracterizar
esta classificação sugerida. A delação premiada investigatória, como já
mencionada, se perfaz na fase anterior ao recebimento da denúncia. Esta permite
que a autoridade investigadora promova a ocultação absoluta do delator. Isso é
permitido, pois na fase preparatória da denúncia, os Princípios Constitucionais da
Ampla Defesa e do Contraditório infringidos, não afetam a validade do
procedimento. O que se tutela é uma rápida atuação do poder de polícia e a
salvaguarda dos bens tutelados pela sociedade.
Já na delação processual, posterior ao recebimento da
denúncia, pelo atual sistema processual penal, é absolutamente proibido atuar de
forma a surpreender a defesa, devendo o processo ser desenrolado sob a sombra
do princípio do Contraditório e da Ampla Defesa. Destaca-se que a delação nesta
fase, muitas vezes o crime já ocorreu.
Em uma nova análise, poderia ser adotado o critério quanto
à extensão dos efeitos da delação premiada. Esta classificação estaria cingida ao
delinear os efeitos pretendidos na sentença penal. Assim, classificar-se-ia como;
a) delação premiada com efeitos absolvitórios e b) delação premiada com efeitos
circunstanciais. O primeiro permite ao delator o prêmio da não punibilidade, e o
segundo, a redução da pena final a cumprir. O problema de se adotar esta ultima
metodologia é a falta de clareza, proporcionalidade e objetividade dispostas nas
legislações que tratam do instituto no Brasil, ao qual será abordado em momento
oportuno no próximo capítulo.
24
CAPÍTULO 2
DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS TÉCNICOS
2.1 DISCIPLINAS NORMATIVAS
No ordenamento brasileiro, a delação premiada é tratada de
forma dispersa. São várias Leis que regulam a matéria, compreendendo um
regramento particular para cada caso.
Tem-se hoje em vigor, na legislação pátria as seguintes Leis,
em ordem cronológica, que tratam sobre delação premiada:
Lei n. 8072/90, que dispõe sobre os crimes hediondos, previsto em
seu artigo 8º, § único;
Lei n. 9034/95, que dispõe sobre o combate ao crime organizado,
previsto no artigo 6º.
Lei n. 7492/86, que define crimes contra o sistema financeiro
nacional, foi disposta no artigo 25, § 2º (introduzido pela Lei n.
9080/95);
Lei n. 8137/90, que dispõe sobre crimes contra a ordem tributária,
econômica e contra as relações de consumo, previsto no artigo
16, parágrafo único (introduzido pela Lei n. 9080/95);
Decreto-lei n. 2848/40, Código Penal Brasileiro, previsto no artigo
159 §4º (introduzida pela Lei n. 9269/96);
Lei n. 9613/98, dispõe sobre lavagem de capitais, previsto no artigo
1º. §5º;
Lei n. 9807/99, dispõe sobre o programa especial de proteção a
vítimas e testemunhas ameaçadas e dá outras providências,
previstos no artigo 13 e seguintes;
25
Lei n. 11343/06, dispõe sobre prevenção e repressão ao uso de
drogas, previsto no artigo 41.
2.2 BENEFÍCIOS E REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
Apesar de a delação premiada ter para todo o ordenamento
jurídico a mesma finalidade, resguarda requisitos e efeitos específicos, aos quais
serão analisados, dentro de suas particularidades, nos tópicos a seguir:
2.2.1 Lei n. 8072/90 – Lei dos Crimes Hediondos
Previsto no artigo 8º, § único tem os seguintes dizeres:
Art. 8º [...]
Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à
autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu
desmantelamento, terá a pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois
terços) 82
São requisitos cumulativos para a delação premiada:
Ser concorrente (autor, co-autor ou partícipe) em quadrilha ou
bando. 83 Ainda sobre o tema elucida Damásio de Jesus:
Suponha-se que uma pessoa que não integre bando ou quadrilha
esteja sendo processada pela prática de determinado delito. Ao
ser interrogada, delate quadrilheiros co-autores de outro crime, do
qual não participara e que não se relaciona com o ilícito por ela
praticado. Sendo eficaz a colaboração, pode ser beneficiada pela
“delação premiada”?
Entendemos que não, uma vez que as normas relativas à matéria
exigem que o sujeito ativo da delação seja participante do delito
82 BRASIL, Lei n. 8072 de 25 de julho de 1990. Dispõe sobre crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 25 de julho de 1990.
83 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 313.
26
questionado (co-autor ou partícipe). Em nosso ordenamento
jurídico, essa possibilidade somente era possível quando da
vigência das Ordenações Filipinas (título CXVI). Agora, não
mais.84
Prática de crimes hediondos ou equiparados. Não se aplica o
dispositivo ao delito de extorsão mediante seqüestro do artigo
7º, que já possui uma forma de delação específica, prevista no
Código Penal85·. No mesmo sentido, também não se aplica o
tipo ao crime de traficância de drogas.86;
Delação 87;
Eficácia da delação, ou seja, relação de causalidade entre a
delação (causa) e o desmantelamento (efeito) 88;
Endereçamento à autoridade, assim entendidos o Delegado de
Polícia, Juiz de Direito, Promotor de Justiça e etc.89;
Deve-se observar que os requisitos acima dispostos são
cumulativos, ou seja, a não tipificação de qualquer um dos elementos do tipo, não
permitirá a concessão da delação premiada. Então, se a reunião de quadrilha ou
bando for para práticas de crimes diversos dos entabulados, como hediondos ou
equiparados, aplicar-se-á o artigo 28890 do Código Penal (como regra se não
houver Lei específica tipificando a conduta), sem beneficie legal da Lei de crimes
hediondos.91
84 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo Jurídico.
85 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 313.86 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. 2005. 66
p. Especialização em Ciências Criminais. Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina. Núcleo de Pós-Graduação, Florianópolis. p. 16.
87 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 313.88 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial.
3ª Edição, São Paulo: Editora Premier, 2006, p.706.89 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial.
p.706.90 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial.
p.706.91 Art. 288. Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer
crimes: Pena- reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
27
Presente os requisitos, o delator “terá” o prêmio da redução
da pena de um ano a dois terços. O verbo “claramente” impõe a obrigatoriedade
do prêmio ao delator. 92
A intensidade da redução será moderada pela “maior ou
menor contribuição causal do delator para o desmantelamento da quadrilha”.93
Outro ponto importante que se deve trazer à luz deste
estudo, aplicável para todas as normas em comento, neste capítulo, é a
obrigatoriedade da fundamentação da decisão, quando não for aplicada a
redução máxima prevista no tipo. 94
Se não aplicar a redução máxima prevista na Lei, deve o juiz
fundamentar sob pena de nulidade. Neste sentido, elucida Delmanto ao tratar
sobre a Lei 7492/8695 e sobre o crime de extorsão mediante seqüestro.96 Preceito
este obrigatório por expressa imposição da Carta Constitucional, prevista em seu
artigo 93, IX.97
2.2.2 Lei n. 9034/95 – Combate ao Crime Organizado
Objetivando a maximizar os meios de combate das
organizações criminosas, a Lei n. 9034/95, também dispôs sobre o instituto da
delação premiada, em seu artigo 6º, trazendo os seguintes dizeres:
Art. 6º. Nos crimes praticados em organização criminosa, a pena
será reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços), quando a colaboração
92 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial. p.706.
93 JUNQUEIRA, Gustavo O. Diniz; FULLER. Paulo Henrique Aranda. Legislação Penal Especial. p.706.
94 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. p. 365.95 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de.
Leis Penais Especiais Comentadas. Rio de Janeiro: Renovar. 2006. p. 22396 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. p. 365.97 Art. 93. IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentados todas as decisões, sob pena de nulidade [...] grifo nosso
28
espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações
penais e sua autoria.98
São requisitos cumulativos:
Crime praticado por organização criminosa. O maior problema da
aplicação do benefício é a definição do que é organização
criminosa, já que a lei não o faz expressamente.99 Na concepção
de Marcelo Batlouni Mendroni, organização criminosa é o
“organismo ou empresa, cujo objetivo seja a prática de crimes
de qualquer natureza”. Sua existência sempre se justifica,
enquanto estiver voltada para a prática de atividades ilegais. “É,
portanto, empresa voltada à prática de crimes” 100;
Colaboração espontânea. Espontaneidade significa dizer que a
conduta do agente é “sinceramente desejada, fruto da aspiração
íntima de alguém.” 101 Completa Delmanto, ao comentar sobre
espontaneidade na Lei 8137/90:
A confissão há de ser espontânea, isto é, aquela cuja
voluntariedade não se encontra maculada. O agente, por sua livre
vontade, sem coação e tampouco induzimento em erro essencial,
decide espontaneamente confessar. É irrelevante à configuração
do motivo – mais ou menos nobre – que teria levado o agente a
confessar. Não se exige, pois, que a confissão seja fruto de
arrependimento.102
Ser concorrente (autor, co-autor ou partícipe);
Delação;
98 BRASIL, Lei n. 9034 de 03 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 03 de maio de 1995.
99 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 17.100 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. .apud
MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado. Aspectos gerais e mecanismos legais. São Paulo: Juarez de Oliveira. 2002. p. 10.
101 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.102 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de.
Leis Penais Especiais Comentadas. p. 380.
Ter como resultado esclarecimento de infrações penais e sua
autoria; Neste sentido o Tribunal de Justiça do Estado de Santa
Catarina já decidiu:
Não há como aplicar a redução de pena autorizada pelo art. 6º, da
Lei n. 9.034/95 (com similar no art. 8º, parágrafo único, da Lei n.
8.072/90), quando a delação não for suficiente para subsidiar o
desmantelamento da organização criminosa que se suspeitava
existir, até porque não se conseguiu comprovar sequer o crime de
quadrilha ou bando.103
Endereçamento à autoridade (Delegado de Polícia, Juiz de Direito,
Promotor de Justiça e etc.).
O benefício aplicado ao agente que praticar todos os
elementos do tipo é a redução da pena de um a dois terços.
Uma peculiaridade é que não há uma imposição normativa
(através do verbo – elemento essencial do tipo) de preenchimento dos requisitos,
sendo que, o delator obrigatoriamente desfruta do benefício legal. Mas seguindo o
entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, no trecho do
acórdão supracitado (Apelação Criminal 2002.018665-7), que reconhece a
similaridade do artigo 6º com o artigo 8º § único da Lei dos Crimes Hediondos, a
postura mais adequada é também aplicar a obrigatoriedade do benefício,
presentes os requisitos ou fundamentando em contrário.
Quanto à intensidade da redução da pena, da mesma forma
utilizada para dosada na Lei de Crimes Hediondos, será moderada pela maior ou
menor contribuição causal do delator para o desmantelamento da organização.
103 BRASIL. Tribunal do Estado de Santa Catarina. Apelação Criminal 2002.018665-7, da comarca de Içara, Florianópolis, SC, Disponível em: <www. tj.sc.gov.br>. Acesso em 12 de abril de 2007.
2.2.3 Lei n. 7492/86 - Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional e a Lei n.
8137/90 - Crimes Contra a Ordem Tributária, Econômica e as Relações de
Consumo
Estas duas Leis, ao tratar da delação premiada, trazem
idêntica disposição legal, devendo ser analisadas conjuntamente. Os respectivos
artigos que tratam da delação premiada são: a) artigo 25 §2º da Lei n. 7492/86 e
b) artigo 16 § único da Lei n. 8137/90, explicitando a seguinte regulamentação:
Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou co-
autoria, o co-autor ou o partícipe que através de confissão
espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama
delituosa terá a sua pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).104
105
Observado o tipo penal, verificam-se os seguintes elementos
cumulativos:
Crimes previstos nos tipos penais definidos pela Lei específica.
Concorrência delituosa (autor, co-autor e partícipe) 106;
Confissão espontânea107;
Delação
Revelar a autoridade (policial ou judiciária);
Resultado. Para Germano Miranda é exigido que toda a trama seja
desvendada. Ainda sobre o tema, o referido autor, elucida que a
eficácia requerida no resultado fica prejudicada. Isto porque o
conhecimento dos aspectos do delito, “geralmente toca ao
principal autor e mentor, o que, por vezes, inviabiliza que
104 BRASIL, Lei n. 7492 de 16 de junho de 1986. Define crimes contra o sistema financeiro nacional e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 16 de junho de 1986.
105 BRASIL, Lei n. 8137 de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 27 de dezembro de 1990.
106 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 222-223.
107 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 223.
partícipes ou meros executores venham a prestar informações
essenciais ao esclarecimento”.108 Em contra senso Delmanto
mais coerentemente dispõe que, para obter o benefício, toda a
trama delituosa deverá ser desvendada até onde for o
conhecimento do concorrente.109 A concessão do benefício
ficaria somente prejudicado, caso se prove que o delator tenha
maior ciência110.
Ao tratar dos crimes conexos, Germano Miranda, elucida
que “eles também devem ser revelados, já que os termos trama delituosa não nos
permite conceder o benefício se sobre todos eles não forem prestadas as
revelações necessárias”.111
Quanto ao benefício, prevê as duas Leis, a redução de um a
dois terços, da pena, aplicando-se, conforme prescreve o elemento essencial do
tipo, a obrigatoriedade do benefício. No tocante a dosagem da redução, segue a
mesma orientação das Leis anteriores comentadas.
2.2.4 Decreto-lei n. 2848/40 - Código Penal Brasileiro
Prevista no artigo 159 § 4º do Diploma Material Penal, traz o
seguinte preceito:
Art. 159 [...]
§ 4º. Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o
denunciar à autoridade, facilitando a liberdade do seqüestrado,
terá sua pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).112
108 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 18.109 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de.
Leis Penais Especiais Comentadas. p. 223.110 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de.
Leis Penais Especiais Comentadas. p. 380.111 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 18.112 BRASIL, Decreto-lei n. 2848 de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil, Rio de Janeiro, RJ, 07 de dezembro de 1940.
Do tipo penal, extraem-se os seguintes requisitos
cumulativos:
Concorrência no crime de extorsão mediante seqüestro. Comenta
Germano Miranda que a delação é prevista para todas as
modalidades de extorsão mediante seqüestro.113 Cabe aqui uma
ressalva não observada, referente ao artigo 159 §3º do Código
Penal, na qual a compatibilidade do instituto fica prejudicada
com a morte da vítima em cativeiro, permitindo somente a morte
a posteriori libertação;
Delação;
Levar ao conhecimento de autoridade;
Facilitação da libertação do seqüestrado. Segundo Delmanto, é
necessário que ocorra o efeito de haver facilitado a libertação.
Trata-se claramente de resultado.114 No mesmo sentido,
completa Damásio de Jesus: “Não basta à simples delação,
exigindo o tipo a efetiva liberação.” 115
Da mesma forma já comentada nas Leis anteriores, a
redução é de um a dois terços, com aplicação obrigatória (imposição do verbo) e
com a mensuração da dosagem de redução, compatível com a contribuição
causal do delator para a libertação da vítima.
2.2.5 Lei n. 9613/98 - Lavagem de Capitais
Nesta Lei, a delação premiada está prevista no artigo 1º §5º,
assim prescrevendo:
Art. 1 [...]
113 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 18.114 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. p. 365-366.115 JESUS, Damásio de. Código Penal Anotado. 11ª edição. São Paulo: Saraiva. 2001. p. 586.
§5º. A pena será reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços) e
começará a ser cumprida em regime aberto, podendo o juiz deixar
de aplicá-la ou substituí-la por pena restritiva de direitos, se o
autor, co-autor ou partícipe colaborar espontaneamente com as
autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à
apuração das infrações penais e de sua autoria ou à localização
dos bens, direitos ou valores objeto do crime.116
Em análise ao tipo, extraem-se os seguintes requisitos
cumulativos:
Concorrência delituosa;
Tipo penal incriminador definido pela Lei de lavagem de capitais;
Delação;
Colaboração espontânea. Não necessita arrependimento;117
Levar ao conhecimento de autoridade;
Resultado. Sobre este requisito esclarece Delmanto:
Não são, contudo, quaisquer esclarecimentos que terão o condão
de beneficiar o agente, mas apenas aqueles que conduzam
(levem): a. à apuração das infrações penais e de sua autoria; ou
b. à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.118
No que contempla a aplicação, rege-se pelas mesmas
regras das Leis supracitadas, diferenciando especificamente no que tange a
substância do benefício.
116 BRASIL, Lei n. 9613 de 03 de março de 1998. Dispõe sobre crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para ilícitos previstos nesta Lei. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, de 03 de março de 1998.
117 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 565.
118 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 566
Além da redução de um a dois terços da pena, pode ser
concedido ao delator o cumprimento da pena em regime aberto, ou a substituição
por pena restritiva de direitos e ou até a isenção do cumprimento da pena.119
2.2.6 Lei n. 9807/99 - Lei de Proteção a Vítimas, Testemunhas e outros
Colaboradores da Justiça
Tendo como objetivo principal aumentar a colaboração para
a solução de crimes, em 1999 foi publicada a Lei 9807. Mais especificamente
sobre a delação premiada, a Lei traz um capítulo à parte, tentando regulamentar
de forma geral a aplicação do instituto. Mas como já comentado (item 1.2 deste
trabalho), nas palavras de Luiz Flávio Gomes, Alice Bianchini, Rogério Sanches
Cunha, William Terra de Oliveira.120, reforçadas por Guilherme de Souza Nucci121,
a Lei não trouxe um regramento que consolidasse o instituto, deixando-o mais
confuso.
Preceitua a Lei em seu Capítulo II, Da Proteção aos Réus
Colaboradores:
Art. 13 Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes,
conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da
punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado
efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo
criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:
I – a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação
criminosa;
II – a localização da vítima com a sua integridade física
preservada;
III – a recuperação total ou parcial do produto do crime.
119 DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; ALMEIDA DELMANTO, Fábio M. de. Leis Penais Especiais Comentadas. p. 566
120 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 192.
121 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 680.
35
Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta
a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias,
gravidade e repercussão social do fato criminoso.
Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente
com a investigação policial e o processo criminal na identificação
dos demais co-autores ou partícipes do crime, na localização da
vítima com vida e na recuperação total ou parcial do produto do
crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de 1 (um) a 2/3
(dois terços).
Art. 15 Serão aplicadas em benefício do colaborador, na prisão ou
fora dela, medidas especiais de segurança e proteção a sua
integridade física, considerando ameaça ou coação eventual ou
efetiva.
§1º. Estando sob prisão temporária, preventiva ou em decorrência
de flagrante delito, o colaborador será custodiado em dependência
separada dos demais presos.
§2º. Durante a instrução criminal, poderá o juiz competente
determinar em favor do colaborador qualquer das medidas
previstas no art. 8º desta Lei.
§3º. No caso de cumprimento da pena em regime fechado, poderá
o juiz criminal determinar medidas especiais que proporcionem a
segurança do colaborador em relação aos demais apenados.
Art. 19. A União poderá utilizar estabelecimentos especialmente
destinados ao cumprimento de pena de condenados que tenham
prévia e voluntariamente prestado a colaboração de que trata esta
Lei.122
122 BRASIL, Lei n. 9807 de 13 de julho de 1999. Estabelece normas para a organização e a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas, institui o Programa Federal de assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas e dispõe a proteção de acusados ou condenados que tenham voluntariamente prestado efetiva colaboração à investigação policial e ao processo criminal. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, de 14 de julho de 1999.
36
Vislumbrando os artigos supracitados, dividir-se-á o estudo
em dois momentos, sendo o primeiro quanto aos beneficiários e benefícios
abrangidos pelo instituto e o segundo quanto às medidas de segurança.
Quanto aos beneficiários e benefícios abrangidos pelo
instituto, pode-se dizer que a Lei adotou dois tipos penais, sendo um especial,
com o prêmio do perdão judicial, e outro geral, que permite a redução da pena. 123
A norma especial terá sempre todos os elementos da geral e
mais algum elemento, denominado especializante. Havendo conflito entre uma
norma de caráter especial e outra de caráter geral, prevalece a norma de caráter
especial. Isso nada mais é do que a aplicação do Princípio da Especialidade, que
preenchido todos os elementos da norma mais restrita aplicar-se-á esta.124
Assim na conformidade da Lei, os requisitos para aplicação
da delação premiada restrita, nas conformidades dos artigos 13 caput e 13 §
único são:
Ser concorrente no crime;
Delação;
Primariedade. Trata-se de uma exigência específica não contida
em outras normas relativas à delação premiada. Primário,
segundo Guilherme de Souza Nucci, por exclusão é “o não
reincidente (quem, já tendo sido condenado anteriormente por
crime, comete outro delito no período de cinco anos,
computados a partir da extinção da pena anterior, conforme
dispõe o art. 64, I, CP125).” 126;
Colaboração efetiva. Requisito inútil, pois o importante é atingir os
resultados dos incisos;127
123 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 679.124 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. Volume 1. São Paulo: Saraiva, 2006.125 Art. 64. Para efeitos de reincidência: I – não prevalece a condenação anterior, se entre a data
do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação;
126 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.127 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.
37
Voluntariedade. Segundo Guilherme de Souza Nucci:
Voluntariedade: é a ação ou omissão empreendida livre de
qualquer coação física ou moral. Difere da espontaneidade que,
em Direito Penal, significa a conduta sinceramente desejada. No
caso do artigo 13, exige-se apenas voluntariedade, pouco
importando se o agente atua com espontaneidade. 128
Colaboração dúplice. Entende-se que a colaboração deve se dar
tanto na fase policial como na judicial, ou no mínimo nesta última
fase;129
Endereçamento a autoridade;
Resultado alternativo ou cumulativo. Não é específica a Lei se o
resultado deve ser cumulativo ou alternativo. A melhor
interpretação é no sentido da alternatividade dos requisitos do
resultado, pois o posicionamento em contrário permitiria sua
aplicação apenas para o crime de extorsão mediante seqüestro.
Assim, atingindo qualquer um dos requisitos dos incisos do art.
13, permitirá ao delator o prêmio determinado pelo tipo legal130;
Requisitos de análise subjetiva. Por fim, deve o magistrado na
concessão do benefício, a observância dos requisitos
entabulados no parágrafo único, que são a personalidade, a
natureza, a circunstância, a gravidade e a repercussão social do
crime;
Presente todos os requisitos acima previstos, terá o acusado
o benefício do perdão judicial pelo crime praticado. Mas a ausência de qualquer
um dos requisitos prescritos, ainda permitirá a análise do tipo geral, previsto no
artigo 14, com os seguintes requisitos:
Delatar;
Ser concorrente em crime;
128 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.129 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 677.130 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 678.
38
Voluntariedade;
Colaboração dúplice;
Levar ao conhecimento de autoridades;
Resultado.
Observa-se que apresenta os mesmos requisitos legais
previstos no artigo anterior, exceto a primariedade e os requisitos subjetivos do
parágrafo único.
Assim, presentes os requisitos do artigo 14, deverá o delator
ter a redução da pena no montante de um a dois terços, com as disposições da
obrigatoriedade, fundamentação e dosagem idênticas aos tipos das Leis
anteriores comentadas.
Por fim, não tão menos importante, a Lei trouxe medidas de
segurança para garantia da integridade física do delator. Trata-se de medidas
administrativas impostas nos artigos 15 caput e seus parágrafos e artigo 19 da
Lei. Sobre o tema descreve Guilherme de Souza Nucci:
[...] trata-se de medida adotada, há muitos anos, pelas
autoridades responsáveis ela administração dos presídios. Não se
pode misturar o preso que delata o companheiro ou o esquema
criminoso aos demais. Pela “lei da marginalidade” será,
consequentemente, morto.131
2.2.7 Lei n. 11343/06 - Lei de Prevenção e Repressão ao Uso de Drogas
Recentemente editada, trata da delação premiada em seu
artigo 41, trazendo os seguintes requisitos cumulativos:
Art. 41. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente
com a investigação policial e o processo criminal na identificação
dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação
131 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 683.
39
total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá
pena reduzida de um terço a dois terços.132
Delação;
Crime tipificado pela Lei de drogas;
Voluntariedade;
Concorrência no delito;
Colaboração dúplice;
Levar ao conhecimento das autoridades;
Resultado;
Condenação criminal;
A única peculiaridade desta norma em relação às demais é
estar expressa a necessidade de condenação criminal. Defende com propriedade,
Guilherme de Souza Nucci, que se deve observar ao considerar a pena, o
quantum da redução, para fins de determinar se está será de menor potencial
ofensivo, sendo devido ao acusado os benefícios da Lei 9099/95.133
2.3 MÍNIMO LEGAL E CONFRONTO ENTRE NORMAS
Objetivando traçar linhas gerais para a delação premiada, ao
conjugar os 09 (nove) tipos penais estudados anteriormente, pode-se extrair como
regra mínima seguida pelo legislador brasileiro, o preenchimento dos seguintes
requisitos:
Concorrência;
132 BRASIL, Lei n. 11343 de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Política sobre Drogas. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, de 24 de agosto de 2006.
133 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 797.
40
Delação;
Comunicação a autoridades;
Prática de crime;
Resultado.
Estes são os elementos básicos da delação premiada no
sistema pátrio, sendo o “mínimo legal” obrigatório, que deve ser observado para
obtenção do prêmio.
Claramente este mínimo legal, articulado ao prêmio,
corresponde ao conceito mais apropriado de delação premiada para o sistema
brasileiro.
Deve-se lembrar que a tipificação em si da conduta dentro
dos parâmetros mínimos expostos, não é garantia do agente, ao benefício. Por
mais clara que seja a idéia do legislador em traçar linhas gerais, para cada caso
em si deve ser observado as sua peculiaridades.
Assim, após ressalvar estas linhas gerais, tem-se a
necessidade de fomentar algumas considerações da aplicação do instituto da
delação premiada, principalmente no que compete ao confronto entre normas.
Com base em Guilherme de Souza Nucci, utilizando-se da
norma mais benéfica ao agente, 134 traça-se o seguinte quadro:
Confronto de Normas no Instituto da Delação Premiada
Conduta Típica
Norma Confrontada
Motivação
Extorsão mediante seqüestro
Art. 159 § 4º do CP. 1.Exclui-se a aplicação do art. 13 da Lei 9807, pois este estabelece além do tipo penal previsto no
134 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 680-683.
41
art. 159 § 4º do CP, os requisitos subjetivos, primariedade e voluntariedade. Adotando o próprio critério de Guilherme Nucci, divergi-se de seu posicionamento, pois ocorrendo o preenchimento dos requisitos extras previstos na Lei, é mais benéfico ao agente a exclusão da punibilidade.
2.Exclui-se a aplicação do art. 14 da Lei 9807, pois estabelece além do tipo previsto no art. 159 § 4º do CP, o requisito da voluntariedade.
3.Outro posicionamento, não observado por Nucci, é a observância do Princípio da Especialidade. Conforme este Princípio, exclui-se o regramento dos crimes hediondos e por coerência, a exclusão da Lei 9807/99.
Crimes da Lei 7492/86 e 8137/90
Arts. 25 da Lei 7492/86 e 16 § único
da Lei 8137/90
1.Exclui-se a aplicação do art. 13 da Lei 9807, pois este estabelece além do tipo penal previsto nos arts. 25 da Lei 7492/86 ou 16 § único da Lei 8137/90 os requisitos subjetivos, primariedade e voluntariedade. Adotando o próprio critério de Guilherme Nucci, divergi-se de seu posicionamento, pois ocorrendo o preenchimento dos requisitos extras previstos na Lei, é mais benéfico ao agente a exclusão da punibilidade.
2.Exclui-se a aplicação do art. 14 da Lei 9807, pois este estabelece além dos tipos previstos nos arts. 25 da Lei 7492/86 ou 16 § único da Lei 8137/90, o requisito da voluntariedade. Neste ponto, deve trazer uma ressalva no critério, pois se estabelece o confronto entre espontaneidade e voluntariedade.
3.Como já comentado, também é coerente a adoção do Princípio da Especialidade.
Crimes hediondos, exceto extorsão
mediante seqüestro e tráfico
de drogas.
Art. 8º § único da Lei 8072/90
1.Em confronto com a Lei 9807/99, verifica-se no tipo do art. 8º § único não exige primariedade, nem análise subjetiva. Demanda por outro lado, o desmantelamento e outros dados ligados ao fato criminoso. Comparando estes motivos, Nucci considera mais benéfica a Lei de crimes hediondos. Também deve-se observar que quanto ao resultado, a Lei 9807/99 é mais benéfica, caso preenchido todos os requisitos legais.
2.Ainda, na mesma linha anteriormente comentada, deve-se observar o Princípio da Especialidade.
Crimes praticados por organizações
criminosasArt. 6º da Lei 9034/95
1.Confrontando-se com os artigos 13 e 14 da Lei 9807/99, observa-se que não exige a primariedade e os requisitos subjetivos, referindo-se a colaboração espontânea e não a voluntariedade. Na mesma forma, como já comentado anteriormente, Nucci não observa em seu critério o prêmio, tão pouco faz análise quanto ao Princípio da Especialidade.
Crimes de lavagem de
capitais
Art. 1º, § 5º da Lei 9613/98
1. Confrontando-se com os artigos 13 e 14 da Lei 9807/99, observa-se que não exige a primariedade e os requisitos subjetivos, referindo-se a colaboração espontânea e não a voluntariedade. Está Lei ainda permite a alteração do regime prisional, sendo de fato em
42
qualquer hipótese, mais benéfica ao agente, pois além da redução do art. 14 da Lei 9807/99, permite o perdão judicial do art. 13.
2. Independentemente da análise pela norma mais benéfica ou pelo Princípio da Especialidade, indiscutivelmente deve-se aplicar a Lei 9613/98.
Crime de drogasArt. 41 da Lei
11343/06
1.Primeiramente além do Princípio da Especialidade, a Lei que regula o combate aos crimes de drogas, é mais recente que a Lei 9807/99. Também no mesmo sentido não se aplica à Lei dos crimes hediondos.
2.Também confrontando com os arts. 13 e 14 da Lei 9807/99, verifica-se a ausência dos requisitos de primariedade e análise subjetiva. Por fim, lembra-se que a análise de Nucci também neste ponto não leva em conta o prêmio ao agente.
2.4 MOMENTO DA DELAÇÃO
Como já se verificou, o momento oportuno da delação
premiada pode ser tanto na fase investigatória, como também na se fase judicial,
divergindo-se tão somente no plano do contraditório.
Segundo Juliana Kobren citando Gonçalo de Oliveira135,
corroborado por Germano Miranda136, a delação premiada, também poderia
proceder, mesmo após o trânsito em julgado da sentença condenatória, estando
ou não o condenado submetido à execução penal.
No mesmo sentido, conclui Damásio de Jesus:
Não se pode excluir, todavia, a possibilidade de concessão do
prêmio após o trânsito em julgado, mediante revisão criminal. Uma
das hipóteses de rescisão de coisa julgada no crime é a
descoberta de nova prova de “inocência do condenado ou de
circunstância que determine ou autorize diminuição especial de
pena” (art. 621, III, do CPP). Parece-nos sustentável, portanto,
que uma colaboração posterior ao trânsito em julgado seja
beneficiada com os prêmios relativos à “delação premiada”.137
135 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud OLIVEIRA JUNIOR, Gonçalo Farias de. O direito premial brasileiro: breve excursus acerca dos seus aspectos dogmáticos. Presidente Prudente. In: Intertemas: Revista do Curso de Mestrado em Direito v. 2, 2001, p. 281.
136 MIRANDA, Germano Di Ciero. A Delação Premiada e o Direito Positivo Brasileiro. p. 28.137 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo
Jurídico.
43
A colaboração após o trânsito em julgado não encontra
assento na legislação pátria, sendo qualquer menção desta natureza,
obrigatoriamente uma interpretação analógica extensiva, de norma não-
incriminadora de caráter permissivo, em favor do condenado. 138
Sustenta-se ainda, que a possibilidade do uso da delação
premiada após o trânsito em julgado, estaria advindo com os objetivos do instituto
e que após a condenação, os vínculos e a solidariedade entre os agentes
estariam dissolvidos ou sucumbidos, facilitando a obtenção das informações
pertinentes.139
Seguindo a regra de que a delação premiada justifica-se
pelos fins, não estaria equivocada esta corrente. Mas não distante a realidade do
Poder Judiciário no país, ter-se-ia como frente a esta construção doutrinária, o
fator inequívoco da morosidade das condenações. Obviamente em muitos casos,
não se poderia fazer as persecuções pretendidas, pela prescrição dos delitos.
2.5 A DELAÇÃO COMO MEIO DE PROVA
A delação premiada, como já discorrido, tem natureza
jurídica de prova inominada.
Como toda a prova no sistema pátrio, não tem caráter
absoluto, tão pouco sua valoração definida em Lei. A delação como as demais
provas deverá ser valorada e sobrepesada, de acordo com os elementos
constantes nos autos, observando o Princípio do Livre Convencimento Motivado
ou da Persuasão Racional, por parte do juiz. 140
A força incriminadora da delação premial, será permitida
desde que esteja investida em uma narração completa, harmônica com o núcleo
138 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
139 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
140 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva. 2006.
44
central acusatório. O fundamento condenatório deverá ser dado pelo conjunto de
provas articuladas com a delação.141
Corrobora Damásio de Jesus:
A delação (não-premiada) de um concorrente do crime por outro,
em sede policial ou em juízo, denominada “chamada de co-réu” ou
“confissão delatória”, embora não tenha o condão de embasar, por
si só, uma condenação, adquire força probante suficiente desde
que harmônica com as outras provas produzidas sob o crivo do
contraditório (STF, HC n. 75.226; STJ, HC n. 11.240 e n. 17.276).
[...] É mister que esteja em consonância com as outras provas
existentes nos autos para lastrear uma condenação, de modo a se
extrair do conjunto a convicção necessária para a imposição de
uma pena. 142
Além desse juízo motivado do valor probatório, também
deve-se observar Princípios basilares do Processo Penal. Qualquer prova nos
autos, que possa ser utilizada como motivo para incriminar, deve ser estruturada
sob os pilares do Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa. É premissa
fundamental do Devido Processo Legal, imposto pela Lei Maior, prevista no artigo
5º, LV. 143 A essência para a valoração da prova é o contraditório, em termos tais
que sem este, qualquer convicção formada será absolutamente ilegal.144
No mesmo sentido, elucida Torinho Filho:
Se a Lei Maior erigiu o contraditório à categoria de dogma de fé,
se o devido processo legal, outro dogma, pressupõe o
contraditório, o mesmo acontecendo com a ampla defesa, é
induvidoso que a “delation” de co-réu não pode ser tido como
prova, mas sim como um fato que precisa passar pelo crivo do
141 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 127-129.
142 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo Jurídico.
143 LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
144 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 129-131.
45
contraditório, sob pena de absoluta e indisfarçável
imprestabilidade.145
Conveniente lembrar que delação não é testemunho, mas
sim, o reconhecimento do acusado em seu interrogatório, da sua culpa,
imputando a outrem a concorrência no delito, não podendo ser este
compromissado, contraditado ou sofrer qualquer pena, por afirmações não
verídicas. Destoa-se por excelência, devido a essa garantia absoluta do agente, a
obrigação do poder estatal operar com precaução, sob pena de cometer
atrocidades ao direito alheio.146
Neste sentido, alerta Ada Pellegrini:
Ademais, grandes são os perigos da indevida incriminação de
outras pessoas pelo imputado, pois pode muito bem acontecer
que um acusado, vendo-se perdido diante de provas contra ele
colhidas, procure arrastar consigo desafetos ou inimigos seus.147
Outrora verifica-se que o acusado não tendo repugnância
em admitir o próprio delito, “não terá temor também em apontar outrem
facilmente, até de modo injusto”.148
145 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 3. vol. 24ª ed. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 276.
146 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 132-133.
147 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. apud GRINOVER, Ada Pellegrini. O processo em evolução. São Paulo: Forense Universitária. 1996. p.352.
148 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 137.
46
CAPÍTULO 3
DA DELAÇÃO PREMIADA: ASPECTOS CRÍTICOS
3.1 A ÉTICA E A DELAÇÃO PREMIADA
Uma das maiores críticas da delação premiada é a premissa
da ausência de lealdade, objetivamente implícita no estímulo legal da traição. “A
traição não é uma virtude, não deve ser estimulada, entretanto, em termos
investigatórios não se pode deixar de reconhecer que ela eventualmente pode ser
útil”. 149
Este modelo legislativo, por óbvio, cunha sua legitimidade na
eficiência buscada na persecução penal, abandonado o campo da ética.150
O campo ético a que se abstrai a norma, no plasmar da
busca da verdade, claramente não se confunde com a “ciência jurídica, mas
também não pode ser dela separado, como se fossem incomunicáveis”.151
Ética, nas palavras de Jaques Camargo Penteado “é o
estudo da moralidade da conduta humana. Advém do grego Ethiké e deriva de
hêthos, que significa costume e se identifica com mos, gerando a expressão
moral”.152
Segundo Jaques Camargo Penteado, o grau de civilização
de um povo se mede no exame do direito positivo deste povo, aperfeiçoando-se
na análise no direito processual penal. A obtenção da verdade a qualquer custo é
149 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 191.
150 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 191.
151 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 95, vol. 848, p. 711 a 736, 2006. p. 719.
152 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 719.
47
a submissão da pessoa humana ao poder do Estado, mitigando princípios
fundamentais republicanos.153
Completa Luiz Flávio Gomes:
Semelhante propósito configura a mais viva expressão política ou
instrumental do poder coativo da era pós-industrial que,
menosprezando valores fundamentais como “justiça” e “equidade”,
procura difundir e impor a cultura do “direito emergencial ou de
exceção”, pouco se importando com a “erosão” do direito liberal
clássico, voltado para a tutela do ser humano.
Na base da delação está a traição. A lei, quando concebe, está
dizendo: seja um traidor e receba um prêmio! Nem sequer o
“código” dos criminosos admite a traição, por isso, é muito
paradoxal e antiético que ela venha a ser valorada positivamente
na legislação dos “homens de bem”.154
O estímulo da delação premiada é o estímulo da antiética,
reflexo claro dos representantes populares, dissolvendo e fomentando na
sociedade a cultura que os fins justificam os meios.155
Cria-se o direito emergencial ou de exceção, fundada na
ética do resultado. As leis criadas emergencialmente refletem uma ética de
resultados, que conforme Choukr “apoiar-se-á em conceitos de segurança e
eficiência desprovidos de apegos aos princípios fundamentais, e justificará, em
muitas legislações, a criação de técnicas processuais aberrantes”.156
A subversão do processo pressupõe que as garantias
dificultam o funcionamento do sistema punitivo, como se delas decorresse a
falência estrutural do Estado.157
153 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 719-720.154 GOMES, Luiz Flávio. Seja um traidor e ganhe um prêmio, Folha de São Paulo de 12.11.1994,
p. 1-3, seção: Tendências e debates. 155 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 720.156 CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo penal de emergência. Rio de janeiro: Editora Lúmen Júris,
2002, p. 56.157 CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo penal de emergência. p. 46-48.
48
Em verdade, não há como desmembrar o instituto da
delação premiada, da premissa antiética que ela comporta. 158
No mesmo sentido complementa Damásio:
A polêmica em torno da delação premiada, em razão de seu
absurdo ético, nunca deixará de existir. Se, de um lado,
representa importante mecanismo de combate à criminalidade
organizada, de outro, parte traduz-se num incentivo legal à
traição. 159
Apesar de direito e ética serem “realidades distintas, mas
não separadas, deve-se buscar a harmonia”.160
A carência da eticidade repercute nas garantias, nos valores
e nos princípios fundamentais161, sobrepesando a assunção e a avocação da
ineficácia dos aparatos Estatais.
3.2 A DEMONSTRAÇÃO DE INEFICÁCIA DO ESTADO NO
COMBATE À CRIMINALIDADE
A falência do Estado moderno, frente à criminalidade, pode
ser observada facilmente ao vislumbrar a inoperância dos sistemas de combate a
criminalidade. Não se tem um plano lógico, efetivo e prospectivo para a
segurança pública, consubstanciando a instalação de um caos total. Este estágio
caótico, não pode ser deflagrado, na falta de leis repressivas, tendo por única e
exclusiva decorrência a falta de inoperância do Poder. Neste sentido, elucida José
Alexandre Guidi:
Em nome da segurança pública, falida devido à inoperância social
do Poder e não por falta de leis repressivas, edita-se um sem
158 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 720.159 JESUS, Damásio de. Estágio atual da “delação premiada” no Direito Penal Brasileiro. Mundo
Jurídico.160 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 720.161 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 721.
49
número de novos comandos legislativos sem o necessário
cuidado com o que vai prescrever.162
Assim, a utilização dos institutos de persecução penal, que
pairam na conformidade da ética, hoje não são bem empregados pelo Estado,
tendo este, que na observância de sua incompetência, valer-se de ferramentas
criticáveis.163
Assevera Luiz Flávio Gomes:
Para o homem moderno, tido como racional, chegar ao ponto de
estabelecer em “lei” prêmios a um criminoso traidor só existe uma
explicação: é a prova mais contundente da pública e notória
ineficiência do Estado atual para investigar e punir os crimes e os
criminosos. É a falência estatal, sempre confessada, sem nenhum
escrúpulo!
Por falta de preparo técnico e de estrutura tecnológica, o Estado
se vê compelido a transigir com os mais elementares princípios
éticos. É forte e duro contra os mais fracos e flacidamente
indulgente e complacente com os que mais perturbam a
convivência social.164
A utilização do instituto da delação premiada, nada mais é
do que o reconhecimento do Estado de sua impotência, “tanto para investigar
quanto para punir a prática de crimes, necessitando, sobremaneira, da boa
vontade do investigado ou acusado em colaborar com a justiça”. 165
Utilizando-se das palavras de Carolina Antunes, conclui-se:
[...] nota-se que o instituto da delação legitima a incompetência do
Estado em sua ação persecutória, pois se serve de um criminoso
162 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 140.
163 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
164 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 142 apud GOMES, Luiz Flávio. Crime Organizado: o que se entende por isso depois da Lei n. 10217, de 11.04.2001? – Apontamentos sobre a perda de eficácia de grande parte da Lei n. 9034/95, Revista Síntese de Direito Penal e Processo Penal, n. 11, dez./jan. 2002. p. 119
165 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
50
para buscar o que deveria conseguir com suas próprias armas.
Desvia-se de todo o fundamento do processo acusatório, o qual
se baseia em princípios constitucionais que impõem o respeito ao
devido processo legal e seus corolários. 166
3.3 DOS VALORES E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
A delação premiada é um conluio a apologia da deslealdade,
um golpe à construção de um Estado Democrático, por não se moderar em
fundamentos éticos. “Afronta-se, ainda, uma das finalidades da Constituição
Federal, que é justamente, solidificar uma sociedade justa e igualitária, sem o
desvirtuamento de valores”.167
Segundo Jaques de Carmargo Penteado:
A carência de eticidade repercute na juridicidade da delação
premiada, principalmente em face do fundamento republicano da
“dignidade da pessoa humana” (art. 1º, III, CF168) e das garantias
constitucionais da “liberdade” e do “devido processo legal”, formal
e substancial (art. 5º. Caput169 e inc. LIV170, CF).171
Deve-se sempre observar a relevância dos “reflexos que a
utilização de tal instituto pode causar quando se trata de sua aplicação em um
sistema legal construído com base na dignidade da pessoa humana”.172
166 ANTUNES, Caroline. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 35.
167 ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 34.
168 Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana;
169 Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
170 Art. 5º. [...] LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
171 PENTEADO, Jaques Camargo. Delação Premiada. Revista dos Tribunais. p. 721.172 ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise
do Direito Penal Constitucional. p. 35.
51
Segundo Caroline Antunes, a delação premiada é um
mecanismo que abala um dos pilares sociais, a confiança173. Completa a referida
autora:
A ausência de confiança, causada entre outras razoes pela
traição, pode gerar uma série de moléstias sociais e contribuir
com a degradação moral da sociedade, transformando o homem
em simples meio para consecução de determinados fins, ao invés
de considerá-lo o fim de toda e qualquer ação.174
Segundo José de Alexandre Guidi, a delação premiada afeta
o princípio da igualdade, conferindo benefícios somente a crimes de relevante
periculosidade, não oportunizando aos criminosos de pequenos delitos. Alude
ainda, que também feri o princípio da proporcionalidade, pois “a pena deve ser
equivalente à culpabilidade de cada um e de cada caso. Crimes idênticos acabam
punidos com penas flagrantemente diferentes”.175
Firmando esse entendimento, elucida Eugenio Zaffaroni,
concluindo:
A impunidade de agentes encobertos e dos chamados
“arrependidos” constitui uma séria lesão à eticidade do Estado, ou
seja, ao princípio que forma parte essencial do Estado de direito: o
Estado não pode se valer de meios imorais para evitar a
impunidade [...] o Estado está se valendo da cooperação de um
delinqüente, comprada ao preço de sua impunidade para “fazer
justiça”, o que o Direito Penal liberal repugna desde os tempos de
Beccaria.176
Sabe-se ainda, que o instituto da delação premiada poderá
ser utilizado, como instrumento coativo ou degenerativo da imagem (direito
fundamental protegido pela Lei Maior). A mídia hoje detém uma força
173 ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 35.
174 ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 35.
175 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 142176 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Crime organizado: uma categorização frustrada. Rio de
Janeiro: Relume/Dumará, 1996, p. 45.
52
massificante, podendo destruir em segundos, o que um cidadão de bem, levou
anos para construir.
Trata-se do denuncismo inconseqüente e irresponsável,
afastando-se do objetivo principal do instituto. Corrobora Alexandre Guidi, ao
suscitar o seguinte trecho:
É sabido que são inúmeros os casos em que a denúncia
irresponsável enxovalha pessoas de em (boa-fé), que, depois de
restabelecidas as verdades dos fatos, não conseguem restaurar a
sua credibilidade.177
Segundo Luiz Flávio Gomes, Alice Bianchini, Rogério
Sanches Cunha e William Terra de Oliveira, esse denuncismo é muito mais
preocupante quando o delator é político. Completa elucidando os referidos
autores:
Os políticos, em regra, contam com “ética” própria, interesses
específicos etc. O poder é a meta. E para se alcançar a meta (o
fim) às vezes não se preocupam com os meios, o que revela o
caráter maquiavélico das suas iniciativas. Delação de políticos ou
feita por interesses políticos deve ser vista com redobrado
cuidado.178
3.4 CONSIDERAÇÕES FAVORÁVEIS A DELAÇÃO
PREMIADA
Apesar de severamente criticada pela doutrina, o instituto da
delação premiada possui inúmeras vantagens, sendo um instrumento
poderosíssimo ao combate do crime.
Não obstante, às críticas de cunho ético e fundamentalista,
verifica-se que a delação premiada não é um instituto exclusivo de países
177 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 157.
178 GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice; CUNHA, Rogério Sanches; OLIVEIRA, William Terra de. Nova Lei de Drogas Comentada. p. 191.
53
subdesenvolvidos, com legislações atrasadas e Estados falidos. Grandes nações,
com Estados modernos, ricos e aparelhados, com cultura jurídica centenária, se
utilizam plenamente do instituto, dando para ele a devida e merecida valoração.
Completa Ada Pellegrini, ao comentar a delação premiada
contra o crime organizado italiano:
Foram muitas críticas feitas à delação premiada, mas acabou
estabelecendo-se um consenso em torno da necessidade de
medidas extremas, que representavam a resposta a um estado de
verdadeira guerra contra as instituições democráticas e a
segurança dos cidadãos.179
Segundo Alexandre Guidi, a delação premiada atinge
dimensões além da simples repressão, pois, ainda na fase policial, o colaborador
confessa o crime e evita à consumação de outras infrações, atuando de forma
preventiva.180
Corrobora Paulo José Freire Teotônio e Marcus Alvez
Nicolino, asseverando que a delação premiada:
[...] veio a ser um instrumento da maior utilidade e eficácia, não só
para as investigações, mas também para permitir uma melhora da
prova no processo penal, viabilizando condenações que outrora
seriam impossíveis ou muito pouco prováveis.181
Em outro enfoque ético, questiona-se a argumentação
adotada contra o instituto. A delação é uma necessidade do sistema penal, pela
existência de crimes e situações complexas, que não permite ao Estado a
manifesta contraposição de medidas repressivas.
Assim, a delação é fonte direta contra do crime, sendo ela a
subversão total da eticidade social. Inquestionavelmente, o crime não tem traços
179 GRINOVER, Ada Pellegrini. O crime organizado no sistema italiano. p. 76.180 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p.
146.181 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p.
146. apud TEOTÔNIO, Paulo José Freire, NICOLINO, Marcus Túlio Alves. Ministério Público e a colaboração premiada. Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal. n. 21, agosto-setembro, 2003. p. 26.
54
ínfimos de eticidade e certamente se o agente permanecer ou ocultá-lo, ter-se-á
desenhado um paradoxo, tendo de um lado a conduta antiética da não lealdade,
confrontada com a conduta da permanência da quebra dos bens essenciais da
sociedade.
Logo, na mesma linha de raciocínio de Alexandre Guidi182 e
David Teixeira de Azevedo183, incorreto seria afirmar que o criminoso arrependido
ao delatar seus comparsas, estaria agindo contra a ética. Não existe ética dentro
da antiética.
No mesmo sentido ensina Marcus Cláudio Acquaviva:
Quando à justificação ética da delação premiada reside, a nosso
ver, na utilidade social. Afinal de contas, é notório na doutrina
clássica ou moderna que o Direito, enquanto instrumento de
realização da paz social, não é obra para santos, mártires ou
heróis. Se a delação premial merece reprovação absoluta, temos
que condenar, também, a estipulação de recompensa para quem
revela o local onde o criminoso se acha acoutado ou, ainda, o
instituto da anônima, que tem propiciado a solução de inúmeros
delitos. Além disso, embora a delação premial traga, consigo, a
precha de “alcagüete”ou “dedo-duro” para o delator que, forçoso
admitir, delata ou colabora apenas no intuito de se safar das
penalidades a que está sujeito, também é verdade que seus
comparsas não deixam de ser menos culpados quando supostas
“vítimas” de uma delação [...]184
Esse agir do delator em colaborar com a justiça, estaria
nestas linhas dentro da ética, fazendo jus a um diferencial. Essa colaboração,
permite um juízo de arrependimento do agente, reduzindo sua periculosidade.
Também nesse cenário, pode-se explicar a concessão dos prêmios, tendo em
vista de ser uma questão de política criminal orientada finalisticamente, e
representada por um merecimento a uma resposta menos severa. 185
182 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 147.
183 AZEVEDO, David Teixeira de. A colaboração premiada num direito ético. Boletim do IBCCrim,ano 7, n. 83, outubro, 1999. p. 7.
184 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Delação Premiada. Jurídica Online. Disponível em: <www.juridicaonline.com.br> Acesso em 21 de setembro de 2006.
55
Sobre o fundamentalismo das garantias principiológicas,
deve-se analisar as expectativas e as garantias individuais, à luz do Estado
Democrático de Direito. O Estado Democrático de Direito inspira-se no poder
superior da coletividade, buscando a eqüidade social, mas sempre respeitando as
relações com as minorias. A delação premial de fato não desintegra o interesse
da comunidade, mas somente daqueles que sob o manto do poder, tentam
expurgar qualquer tentativa de aumentar a eficiência da persecução penal.
Prender “testas de ferro” e “ladrões de galinha”, não exige maior esforço dos
aparatos Estatais, mas quando dentro desta cadeia criminosa, buscam-se os
verdadeiros mentores da indústria do crime, deve-se sim valer-se de todos os
instrumentos jurídicos possíveis. 186
Por mais que se discuta sobre o instituto da delação
premiada, têm-se fortes argumentos doutrinários, no sentido de sua aprovação ou
reprovação. Consoante aos ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci187 traça -
se um quadro sobrepesando os principais pontos positivos e negativos do
instituto:
Instituto da Delação Premiada
Pontos Negativos Pontos Positivos
185 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 149-152.
186 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 162.
187 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 675-676.
56
1. Oficializa-se, por lei, a traição,
forma antiética de comportamento
social;
1. No universo criminoso, não se
pode falar em ética ou em
valores moralmente elevados,
dada a própria natureza da
prática de condutas que rompem
com as normas vigentes, ferindo
bens jurídicos protegidos pelo
Estado;
2. Pode ferir a proporcionalidade da
aplicação da pena, pois o delator
receberia pena menor do que os
delatados, cúmplices que fizeram
tanto ou até menos que ele;
2. Não há lesão à
proporcionalidade na aplicação
da pena, pois esta é regida,
basicamente, pela culpabilidade
(juízo de reprovação social), que
é flexível. Réus mais culpáveis
devem receber penas mais
severas. O delator, ao colaborar
com o Estado, demonstra menor
culpabilidade, portanto, pode
receber sanção menos grave;
3. A traição, em regra, serve para
agravar ou qualificar a prática de
crimes, motivo pelo qual não
deveria ser útil para reduzir a
pena;
3. O crime praticado por traição é
grave, justamente porque o
objetivo almejado é a lesão a um
bem jurídico protegido; a delação
seria a traição de bons
propósitos, agindo contra o delito
e em favor do Estado
Democrático de Direito
57
4. Não se pode trabalhar com a
idéia de que os fins justificam os
meios, na medida em que estes
podem ser imorais ou antiéticos;
4. Os fins podem justificar os
meios, quando estes forem
legalizados e inseridos no
universo jurídico;
5. A existente delação premiada
não serviu até o momento para
incentivar a criminalidade
organizada a quebrar a lei do
silêncio, que, no universo do
delito, fala mais alto;
5. A ineficiência atual da delação
premiada condiz com o elevado
índice de impunidade reinante no
mundo do crime, bem como
ocorre em face da falta de
agilidade do Estado em dar
efetiva proteção ao réu
colaborador;
6. O Estado não pode aquiescer
em barganhar com a
criminalidade;
6. O Estado já está barganhando
com o autor de infração penal,
como se pode constatar pela
transação, prevista na Lei
9099/95. A delação premiada é,
apenas, outro nível de transação;
58
7. Há um estímulo a delações
falsas e um incremento a
vinganças pessoais.
7. O benefício instituído por lei,
para que um criminoso delate o
esquema, no qual está inserido,
bem como os cúmplices, pode
servir de incentivo ao
arrependimento sincero, com
forte tendência à regeneração
interior, o que seria um dos
fundamentos da própria
aplicação da pena. A delação
falsa deve ser severamente
punida.
Do exposto, conclui-se que a delação premiada é apenas
mais um instrumento útil a disposição do Estado, visando tutelar o Estado
Democrático de Direito.188
3.5 DA GARANTIA JURÍDICA NO PROCESSO
A segurança jurídica do delator é um tema ainda pouco
debatido na doutrina brasileira, sendo a espinha dorsal dos problemas do instituto.
O primeiro problema que se tem com o instituto pátrio da
delação premiada, é a própria sistemática penal. O Brasil adotou o sistema
acusatório189, tendo o magistrado à obrigação de permanecer-se inerte, deixando
ao crivo do Ministério Público e a autoridade Policial a investigação criminal.
188 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 676-677.189 Ainda sobre o tema: O processo é eminentemente contraditório. Não há a figura do juiz
instrutor. A fase processual propriamente dita é precedida de uma fase instrutória, qual seja, o inquérito policial. Com base nessa investigação, o acusador, seja o Ministério Público, seja a vítima, instaura o processo. Em juízo, nascida a relação processual, o processo torna-se eminentemente contraditório, público e escrito. (ANTUNES, Carolina. Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro Sob Análise do Direito Penal Constitucional. p. 30)
59
Assim, partido da premissa que é o magistrado o único legítimo a homologar os
acordos e aplicar o prêmio, tem-se gerado um enorme problema da utilização do
instituto, principalmente na fase inquisitória. 190
No mesmo sentido, corrobora Alexandre Guidi, Paulo José
Freire Teotônio, Marcus Túlio Alves Nicolino, ao traçarem o seguinte
entendimento: “[...] o acordo de delação premiada necessitará de homologação
judicial, tendo em vista que ao juiz compete controlar a aplicação da lei e zelar
pela regularidade do processo.” 191
Também, ao analisar o modelo de acordo de delação
premiada anexo, do Ministério Público Federal do Paraná, observa-se as
cláusulas VIII e IX, que trazem os seguintes dizeres:
VIII - HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL
Para ter eficácia, a proposta será submetida a homologação
judicial, cabendo à autoridade judiciária preservar o sigilo do
ACORDO.
A avença será submetida a homologação, tão logo seja
assinada pelas partes, e produzirá efeitos de imediato.
IX - CONTROLE JUDICIAL
O presente ACORDO de delação premiada tramitará perante a
xxxxxxxxxxxx como procedimento criminal diverso (PCD) sigiloso,
não apenso mas vinculado a apelação mencionada, sem
referência explícita nos autos principais e sem menção de
tema e partes no sistema informático.
O controle da efetividade da colaboração será feito mediante
a apresentação de relatórios circunstanciados e periódicos à
autoridade judicial, com prévio pronunciamento do MPF.
190 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.191 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p.
166. Comungam desse entendimento: TEOTÔNIO, Paulo José Freire, NICOLINO, Marcus Túlio Alves. Ministério Público e a colaboração premiada. Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal.
60
Os relatórios deverão ser apresentados ao juízo pelo
MINITERIO PÚBLICO ou pela Polícia Federal e serão encartados
no PCD.
A eficácia do ACORDO poderá ser sustada, com prévia ouvida
das partes, mediante ato judicial fundamentado.192 (grifo
nosso)
Trata-se primeiramente de uma incoerência legislativa,
provocando certa insegurança jurídica, que de fato irá coibir o maior uso do
instituto.
Assim, o Ministério Púbico propondo ou realizando o acordo
com o delator, poderá o acordo, não gerar o benefício pactuado. Juridicamente,
para este impasse entre o magistrado e o Ministério Público, não se tem uma
saída legislativa. Mas opera a doutrinária, a construção baseada no artigo 28 do
CPP193, conforme elucida Alexandre Guidi:
Entretanto, urge salientar que, caso o magistrado não concorde
com os termos do acordo, não poderá indeferir de plano ou
elaborar outro, mas deverá aplicar analogicamente o artigo 28 do
Código de Processo Penal.194
Outro ponto relevante, que deve ser analisado, decorre
quando, o agente contribui com as autoridades, de maneira plena, mas por
circunstâncias diversas, alheias a sua vontade (ex.: falta de provas), não tem o
resultado pretendido aos demais concorrentes.
Claramente é uma indesejável e colossal dor de cabeça para
a defesa. Poderá ocorrer após o delator, confessar, reiterar a confissão,
desembaraçar os fatos e no final não conseguir propiciar o resultado exigido pela
192 Ministério Público Federal – Acordo anexo ao trabalho.193 Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o
arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.
194 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 167.
61
Lei. Estaria o agente em um caminho sem volta para a condenação, com o ônus
de não poder preitear o prêmio legal. Implicaria na produção de provas contra si,
mediante uma ilusão de um benefício que não virá.
Tanto isso é uma realidade, que ao analisar o modelo de
acordo de delação premiada do Ministério Público Federal encontra-se a seguinte
cláusula:
V - GARANTIA CONTRA A AUTO-INCRIMINACAO
Ao assinar o ACORDO DE DELAÇÃO PREMIADA, o acusado
xxxxxxxxxxxxxx está ciente do direito constitucional ao silêncio e
da garantia contra a auto-incriminação, renunciando
expressamente a ambos, estritamente no que tange aos
depoimentos necessários ao alcance dos fins da presente avença.
(grifo nosso) 195
Pela questão da falta de tipicidade, neste caso o magistrado
não poderá aplicar ao agente a norma premial, mas entende-se que no mínimo
esta colaboração, deve ser majorada como circunstância atenuante, conforme
previsto no artigo 65, III, “d” 196do Código Penal.
Afirma-se “no mínimo” não por acaso, pois cabe lembrar,
que o Estado deve ter a sensibilidade de promover as medidas necessárias para
a integridade física do delator e de sua família.
3.6 A INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DO
DELATOR E DE SUA FAMÍLIA
A integridade física do delator está prevista na Lei de
9807/99, Lei de proteção dos colaboradores da justiça, regulamentada, por meio
do Decreto n. 3.518, de 20 de junho de 2000. 197
195 Ministério Público Federal – Acordo anexo ao trabalho.196 Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena: III – ter o agente: d) confessado
espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;197 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 671.
62
Este conjunto normativo visa o comprometimento do Estado,
com os colaboradores ameaçados, de forma a garantir a sua integridade “física e
mental, decorrente de um pacto de responsabilidade, no qual o cidadão deve
dizer a verdade e, em conseqüência, o Estado lhe concede toda a segurança
necessária”.198
A atribuição para a aplicação dessas medidas, dentro de sua
área de abrangência, está adstrita aos Estados e a União, podendo celebrar
convênios entre si.199
A Lei supracitada traz normas distintas de aplicação, que no
primeiro campo tem as testemunhas e as vítimas, e em outro os beneficiários do
instituto da delação premiada. Segundo Danilo Lovisaro do Nascimento, as
medidas previstas para os concorrentes no delito divergem das previstas para as
testemunhas e vítimas, sendo aplicáveis aos concorrentes, apenas medidas
especiais de proteção a integridade física. 200
Outrora, não existe fundamento lógico para a exclusão dos
delatores colaboradores e de suas famílias da proteção, nos moldes concedidos
às testemunhas e vítimas. O mais adequado é analisar esta norma de maneira
extensiva, sobre o manto da Lei Maior, que dentre seus princípios fundamentais,
impõe o dever de garantir a integridade e a vida de todos os cidadãos.
No mesmo sentido completa André Estefan Araújo Lima:
[...] a Lei permite a adoção de medidas especiais de segurança e
de proteção à integridade física. Tais medidas podem ser
aplicadas ao réu preso ou solto. Se preso provisoriamente,
permanecerá separado dos demais. Se se tratar de condenado
cumprindo pena em regime fechado, poderão ser efetuadas
medidas que garantam sua segurança dentro da prisão. As
medidas de proteção e segurança ao réu colaborador não vêm
198 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
199 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi.
200 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. Apud NASCIMENTO, Danilo Lovisaro do. O tratamento jurídico instituído pela lei no 9.807/99 ao réu colaborador. CONAMP. Disponível em: <http://www.conamp.org.br/eventos/teses/tese153.htm> Acesso em: 16 de julho de 2003.
63
especificadas no art. 15. Nada impede, ao que tudo indica, sejam
aplicadas a ele quaisquer das medidas de proteção previstas no
art. 7.º201 da Lei.202
A Lei 9807/99 em seu artigo 2º § 2º 203 traz outras duas
hipóteses de exceção à aplicação da proteção.
A primeira hipótese é a exclusão do sistema de proteção,
dos agentes que apresentarem personalidade ou conduta incompatível.
O motivo dessa exceção é coibir a indisciplina, exigindo-se
do agente o cumprimento de regras, de modo a não inviabilizar a guarda e colocar
em risco terceiros. Assim, de acordo com a norma, serão excluídas todas as
pessoas que tiverem comportamentos anti-sociais, promovendo a exposição de
terceiros que interagem com este. 204
A segunda hipótese de exclusão do sistema de proteção é
quando o indiciado ou o condenado estiver com a liberdade privada pelo Estado.
Sobre o tema sucintamente, elucida Guilherme Nucci ao transcrever os seguintes
dizeres:
201 Art. 7º. Os programas compreendem, dentre outras, as seguintes medidas, aplicáveis isoladas ou cumulativamente em benefício da pessoa protegida, segundo a gravidade e as circunstâncias de cada caso: I – segurança na residência, incluindo o controle de telecomunicações; II – escolta e segurança nos deslocamentos da residência, inclusive para fins de trabalho ou para a prestação de depoimentos; III – transferência de residência ou acomodação provisória em local compatível com a proteção; IV – preservação da identidade, imagem e dados pessoais; V – ajuda financeira mensal para prover as despesas necessárias à subsistência individual ou familiar, no caso de a pessoa protegida estar impossibilitada de desenvolver trabalho regular ou de inexistência de qualquer fonte de renda; VI – suspensão temporária das atividades funcionais, sem prejuízo dos respectivos vencimentos ou vantagens, quando servidor público militar; VII – apoio e assistência social, médica e psicológica; VIII – sigilo em relação aos atos praticados em virtude da proteção concedida; IX – apoio do órgão executor do programa para o cumprimento de obrigações civis w administrativas que exijam o comparecimento pessoal.
202 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi. apud LIMA, André Estefan Araújo. Lei de proteção a vítimas e testemunhas - lei 9.807/99. Instituto Damásio de Jesus. Disponível em: http:// www.damasio.com.br. Acesso em 16 jul. 2003.
203 Art. 2º [...] §2º. Estão excluídos da proteção os indivíduos cuja personalidade ou conduta seja incompatível com as restrições de comportamento exigidas pelo programa, os condenados que estejam cumprindo pena e os indiciados ou acusados sob prisão cautelar em qualquer de suas modalidades. Tal exclusão não trará prejuízo a eventual prestação de medidas de preservação da integridade física desses indivíduos por parte dos órgãos de segurança pública.
204 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 670.
64
[...] condenados a penas privativas de liberdade e pessoas presas
cautelarmente já se encontram sob tutela estatal, razão pela qual
espera-se que existam mecanismos suficientes para mantê-los
resguardados e separados dos demais detentos, assegurando-
lhes a integridade física e psicológica. Aliás, esse é o motivo da
afirmativa feita na parte final deste artigo, indicando que medidas
de proteção devem ser tomadas no interior do cárcere onde se
encontrem.205
Outro ponto criticável da Lei, diz respeito à imposição
normativa da aplicabilidade das medidas para segurança frente à disponibilidade
orçamentária. Sobre este tema, nada mais nítido do que o posicionamento de
Guilherme Nucci:
Disponibilidade orçamentária: está é outra disposição
inconcebível. Uma pessoa ameaçada, dentro de um sistema que
se pretenda sério e eficiente, não pode estar sujeita a
disponibilidade orçamentária. 206
Ainda, ao analisar a realidade dos estabelecimentos
prisionais, verifica-se que a regra para individualizar os presos de modo a separá-
los por categorias, atualmente seria impossível, por falta estrutura física, além do
número reduzido de agentes prisionais qualificados em atuação.207
Por fim, questiona-se muito a imposição do artigo 11, que
faz referência, ao tempo máximo de duração das medidas de proteção. Ao
analisar o artigo, verifica-se que qualquer programa sério não “tem teto para
expirar. Tudo está a depender da ameaça sofrida e do grau de sua duração, que
pode ser imponderável. Logo, inexiste razão lógica para o disposto neste
artigo”.208
Conclui Alexandre Guidi:
205 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 671.206 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 673.207 KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito
brasileiro. Jus Navigandi.208 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. p. 675.
65
Contudo, apesar da inoperância dos programas de proteção de
delatores aqui no Brasil, existem muitos criminosos que mesmo
assim querem se utilizar do instituto da delação premiada e, por
isso, conclui-se que, se esses programas fossem eficazes, haveria
um grande incentivo para os criminosos colaborassem com a
justiça.209
De fato a delação premiada, não se sustentará somente no
prêmio. Devem-se combater os problemas estruturais e legais com veemência, de
modo a viabilizar a efetividade da proteção dos colaboradores, inspirando a plena
confiança daqueles que nela se escudam. A saúde do instituto depende das
medidas do Estado, no combate das penas capitais impostas pelos criminosos,
contra aquele que quebra a Lei do silêncio.
209 GUIDI, José Alexandre Marson. Delação premiada: No combate do crime organizado. p. 161.
66
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar da maior parte da doutrina criticar o instituto da
delação premial, esta vem ao ordenamento jurídico pátrio, como uma forte
ferramenta no combate ao crime.
Método adotado em vários ordenamentos jurídicos
alienígenas, a delação premiada, se perfaz independente do meio, definindo sua
legitimidade na finalidade. Estados Modernos desenvolvidos, utilizam amplamente
o instituto da delação premial, legitimando o instituto, pela presteza e avanços no
combate a criminalidade.
O instituto da delação premiada permite que subversivos do
pacto social, de grande poderio, que nunca sentiram o punho pesado da justiça,
sofram as conseqüências legais, até pouco tempo imagináveis. O principal
objetivo da delação premial é trazer ao processo penal, o último degrau dos
liames criminosos, que flagelam a saúde social.
Por mais que a doutrina conservadora se assente em
paradigmas filosóficos, busca-se através da delação premiada trazer meios a
sobrepujar as superestruturas criminosas, vitalícias e intransponíveis pelos meios
habituais.
Nada versa em sustentar sua falta de eticidade, pois como
muito é sabido, ética é um conceito aberto, variável no tempo e espaço, sendo
que, na conjuntura prescrita se torna impraticável, pois estar-se-ia a tratar de uma
exigência de ética dentro da antiética.
A responsabilidade penal, como se sabe é fragmentada e
sustenta a busca de proteção jurídica de pequenas glebas num vasto oceano,
tratando-se ao tempo, do mínimo racional exigível para suportar o convívio social.
Numa base repugnante se alicerça o crime, que mesmo ínfimos traços éticos, se
encontram ao longo do infinito de alcance. Por mais que se admita a falta de boa-
67
fé frente à lealdade, como preceito ético, em nada se compara aos efeitos da
manutenção da criminalidade.
Exorcizam a delação pemial, mas esta é uma ferramenta
Estatal relativa, com a finalidade incriminadora. Diz-se relativa, com plena
convicção, pois prova alguma se deve dar ao caráter absoluto, em respeito ao
devido processo legal. Em linhas gerais, a delação premiada, como prova
inominada, como é, deve estar aliada a toda uma estrutura acusatória para surtir
efeitos penais.
Observa-se com ironia, a hipócrita posição fielmente
combatente a aprimorar a persecução. Tão eficaz e reluzente são as
ponderações de Guilherme de Souza Nucci, firmando que outros institutos, na
mesma forma da delação premial, imputam a permitir que o Estado barganhe com
a criminalidade. Traduza-se esta posição numa mesquinhez tendenciosa, pois
claramente, estes institutos são idolatrados e propõem a facilitação para o
criminoso.
Ainda, persecuções a delação pela doutrina, se fazem com
fundamentos principio lógicos. Busca-se alinhavá-los aos princípios, dando ao
instituto ares de inconstitucionalidade, mas esquecem que o Estado Democrático,
constrói seus pilares não só em palavras, mas na justiça de fato. Também
esquecem neste ponto, que confronto entre princípios, já há muitos anos é tratado
pela hermenêutica, tendo no tempo e espaço, a mitigação de um princípio frente
ao outro, buscando sempre a proporcionalidade e o meta princípio da justiça.
Obviamente o instituto da delação premiada, nos moldes em
que foi introduzida no ordenamento brasileiro, apresenta problemas graves,
consoantes a sua aplicabilidade, razoabilidade e principalmente a sua eficácia
protetiva, devendo os pensadores do direito, sinergicamente congregar esforços
para propiciar a devida efetividade.
O direito na sua origem é abalizado como forma de ajustar o
convívio social, não podendo ser uma barreira para a evolução dos povos. Deve-
68
se sempre buscar a progressividade do direito, equacionando-o de forma
isonômica e de maneira a permitir que de fato o interesse social se perpetue.
69
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS
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76
ANEXOS
M I N I S T É R I O P Ú B L I C O F E D E R A L
PROCURADORIA DA REPUBLICA NO ESTADO DO
PARANÁ
78
ACORDO DE DELAÇÃO PREMIADA
O MINISTÉRIO PUBLICO FEDERAL,
presentado pelo Procurador Regional da República com atuação
perante o Tribunal Regional Federal da 4a Região e pêlos
Procuradores da República integrantes da Força-Tarefa "CC-5", no
exercício das atribuições constitucionais e legais, nos autos de
xxxxxx, em trâmite perante a xxxxxxxxxxxxxxx, vem propor ao
acusado xxxxxxxxxxxxxxxxxxx a formalização de ACORDO DE
DELAÇÃO PREMIADA, nos seguintes termos.
I - BASE JURÍDICA
O presente ACORDO funda-se no artigo
129, inciso I, da Constituição Federal, nos artigos 13 a 15 da Lei n.
9.807/99, bem como no artigo 32, §§ 2° e 3°, e no artigo 37, inciso
IV, da Lei n. 10.409/2002, estes aplicados analogicamente, à luz do
artigo 3° do CPP. Tais dispositivos conferem ao MINITERIO
PÚBLICO o poder discricionário de propor ao acusado ACORDO de
redução da pena privativa de liberdade de 1/3 a. 2 /3 , ou o perdão
judicial.
O interesse público é atendido com a
presente proposta tendo em vista a necessidade de conferir
efetividade à persecução criminal de outros suspeitos e réus, bem
como de ampliar e aprofundar, em todo o País, as investigações em
torno de crimes contra a Administração Pública, contra o Sistema
Financeiro Nacional, contra a Ordem Tributária e de delitos de
Lavagem de Dinheiro, ligados ou não ao esquema "CC-5", inclusive
no que diz respeito à repercussão desses ilícitos penais na esfera cível
(atos de improbidade administrativa), tributária e disciplinar.
II - DO OBJETO DO ACORDO - DOS CRIMES
ABRANGIDOS
O presente ACORDO versa sobre fatos
tipificados
criminalmente nos arts. nos artigos 4°,
caput, 6° e 22 da Lei 7.492/86, artigo 1° da Lei 8.137/90, bem como
artigos 288, 299 e 304 do Código Penal, na forma do artigo 69 desse
diploma legal, em virtude das irregularidades cometidas por
xxxxxxxxxxxx.
Em virtude desses fatos o acusado foi
condenado
pelo Juizo da xxxxxxxxxxxxxxxxxx a
pena de xxxxxxxxxxx, em regime semi-aberto, e xxx dias-multa, no
valor de xxxx salário mínimo à época dos fatos, pêlos crimes
descritos no artigos xx° e xx da Lei xxxx e artigo 288 do Código
Penal.
III - PROPOSTA DO MINISTÉRIO PUBLICO
FEDERAL
O MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL oferece ao acusado xxxxxxxxx, brasileiro, qualificação,
os seguintes benefícios legais:
A) A redução da pena privativa de
liberdade de xxxxxxxxxxx, em metade, quedando-se em xxx anos, xxxx
meses e xxxxx dias de reclusão, em regime aberto;
B) A substituição, pelo período de xxxxx
anos, xxxx meses e xxxx dias, da pena privativa de liberdade,
definida no item anterior por duas penas restritivas de direitos, a
saber:
B.l) interdição de fim de semana,
consistente na permanência na residência do acusado das 20:00
horas às 08:00 horas nos sábados e domingos;
B.2) prestação de serviços à comunidade,
consistente no auxílio na implantação de rotinas e aulas de
informática aos servidores da instituição xxxxx, por duas horas
semanais.
C) o sobrestamento, até a prescrição da
pretensão punitiva em abstrato, no que diz respeito ao indiciado
xxxxxxxxxxxx,de todos os procedimentos investigativos em curso
vinculados à 2ª Vara Criminal Federal de Curitiba, no que concerne
especificamente ao seu envolvimento com xxxxxxxxxxxxx, tão-
somente no que diz respeito a fatos ocorridos até a data da
celebração do presente ACORDO;
D) A observância do artigo 20 do Código
de Processo Penal e art. 7° , IV, da lei n° 9.807/99, com a
observância pelo Poder Judiciário e autoridades policiais, da
emissão de certidão negativa de antecedentes criminais durante a
vigência deste acordo, limitado aos fatos nele abrangidos, salvo
através de requisição judicial.
III - CONDIÇÕES DA PROPOSTA
Para que do ACORDO proposto pelo
MPF possam derivar os benefícios elencados na cláusula II, a
colaboração do acusado xxxxxxxxxxxxxxxxxxx deve ser voluntária,
ampla, efetiva, eficaz, obrigando-se, sem malícia ou reservas mentais,
a:
a) entregar de todo o material relativo a
transações de dólar-cabo envolvendo xxxxxxxxxxx, e outros dados
relacionados a evasão de divisas, que sejam ou que venham a ser do
seu conhecimento;
b) falar a verdade, incondicionalmente,
em todas as ações penais e inquéritos policiais, inquéritos civis e
ações cíveis e processos administrativos disciplinares, em que,
doravante, venha a ser chamado a depor na condição de
testemunha ou interrogado, nos limites deste ACORDO;
c) indicar pessoas que possam prestar
depoimento sobre os fatos em investigação, nos limites deste
ACORDO, propiciando as informações necessárias à localização de
tais depoentes;
d) cooperar sempre que solicitado,
mediante comparecimento pessoal a qualquer das sedes do MPF ou
da Polícia Federal, para analisar documentos e provas, reconhecer
pessoas, prestar depoimentos e auxiliar peritos do INC na análise de
registros bancários e transações financeiras, eletrônicas ou não;
e) entregar todos os documentos, papéis,
escritos, fotografias, bancos de dados, arquivos eletrônicos, etc., de
que disponha, estejam em seu poder ou sob a guarda de terceiros, e
que possam contribuir, a juízo do MPF, para a elucidação de
crimes contra a Administração Pública, contra a Ordem
Tributária, contra o Sistema Financeiro Nacional ou de crimes de
Lavagem de Dinheiro, em qualquer comarca ou subseção judiciária
federal do País;
f) cooperar com o MPF apontando os
nomes e endereços dos banqueiros, donos de casas de câmbio,
doleiros e operadores de câmbio, brasileiros ou estrangeiros, que
concorreram para a evasão de divisas nacionais, esclarecendo onde
mantêm suas operações, depósitos e seu património;
g) não impugnar, por qualquer meio, o
ACORDO DE DELAÇÃO, em qualquer dos inquéritos policiais ou
procedimentos investigativos nos quais esteja envolvido, no Brasil ou
no exterior, salvo por fato superveniente à homologação judicial,
em função de descumprimento do ACORDO pelo MPF ou pelo juízo.
IV - VALIDADE DA PROVA
A prova obtida mediante a presente
avença de delação premiada poderá ser utilizada, validamente, pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO para a instrução de inquéritos policiais,
procedimentos administrativos criminais, ações penais, ações cíveis e
de improbidade administrativa e inquéritos civis, podendo ser
emprestada também à Receita Federal e à Procuradoria da Fazenda
Nacional e ao Banco Central do Brasil, para a instrução de
procedimentos e ações fiscais, bem como a qualquer outro órgão
público para a instauração de processo administrativo disciplinar.
V - GARANTIA CONTRA A AUTO-
INCRIMINACAO
Ao assinar o ACORDO DE DELAÇÃO
PREMIADA, o acusado xxxxxxxxxxxxxx está ciente do direito
constitucional ao silêncio e da garantia contra a auto-incriminação,
renunciando expressamente a ambos, estritamente no que tange aos
depoimentos necessários ao alcance dos fins da presente avença.
VI - IMPRESCINDIBILIDADE DA DEFESA
TÉCNICA
O ACORDO DE DELAÇÃO somente terá
validade se aceito, integralmente, sem ressalvas, pelo acusado
xxxxxxxxxxxxxx.
VII - CLAUSULA DE SIGILO
Nos termos do artigo 5°, inciso XXXIII, e
artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, combinados com a
artigo 7°, inciso VIII, da Lei n. 9.807/99, e com o artigo 20 do CPP, as
partes compro me tem-se a preservar o sigilo sobre a presente
proposta e o ACORDO dela decorrente.
VIII - HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL
Para ter eficácia, a proposta será
submetida a homologação judicial, cabendo à autoridade judiciária
preservar o sigilo do ACORDO.
A avença será submetida a homologação,
tão logo seja assinada pelas partes, e produzirá efeitos de imediato.
IX - CONTROLE JUDICIAL
O presente ACORDO de delação
premiada tramitará perante a xxxxxxxxxxxx como procedimento
criminal diverso (PCD) sigiloso, não apenso mas vinculado a apelação
mencionada, sem referência explícita nos autos principais e sem
menção de tema e partes no sistema informático.
O controle da efetividade da colaboração
será feito mediante a apresentação de relatórios circunstanciados e
periódicos à autoridade judicial, com prévio pronunciamento do
MPF.
Os relatórios deverão ser apresentados
ao juízo pelo MINITERIO PÚBLICO ou pela Polícia Federal e serão
encartados no PCD.
A eficácia do ACORDO poderá ser
sustada, com prévia ouvida das partes, mediante ato judicial
fundamentado.
X – RESCISÃO
O ACORDO perderá efeito,
considerando-se rescindido, ipsó facto:
A) se o acusado descumprir,
injustificadamente, qualquer das cláusulas em relação às quais se
obrigou;
B) se o acusado sonegar a verdade ou
mentir em relação a fatos em apuração, em relação aos quais se
obrigou a cooperar;
C) se vier a recusar-se a prestar
qualquer informação de que tenha conhecimento;
D) se recusar-se a entregar documento
ou prova que tenha em seu poder ou sob a guarda de pessoa de
suas relações ou sujeita a sua autoridade ou influência;
E) se ficar provado que o acusado
sonegou, adulterou, destruiu ou suprimiu provas que tinha em seu
poder ou sob sua disponibilidade;
F) se o acusado vier a praticar outro
crime doloso, seja crime objeto deste acordo, bem como os crimes
antecedentes da Lavagem de Dinheiro, elencados no art. 1° da Lei
9.613/998, após a homologação judicial da avença;
G) se o acusado fugir ou tentar furtar-
se à ação da Justiça Criminal;
H) se o sigilo a respeito deste ACORDO
for quebrado por qualquer das partes ou pela autoridade judiciária,
ressalvada a possibilidade de utilização dos depoimentos obtidos
em todos os inquéritos policiais, ações penais, inquéritos civis,
ações de improbidade, execuções fiscais e processos administrativos
disciplinares que tenham relação com o objeto do presente
ACORDO.
Em caso de rescisão do ACORDO, o
acusado xxxxxxxxxxx perderá automaticamente direito aos
benefícios que lhe forem concedidos em virtude da cooperação com o
MINITÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
Se a rescisão for imputável ao MPF ou ao
Juízo Federal, o acusado poderá, a seu critério, cessar a cooperação,
ressalvado o artigo 342 do CP.
E, por estarem concordes, firmam as
partes o presente ACORDO de delação premiada, em três vias, de
igual teor e forma.
Curitiba, 11 de novembro de 2004.
Pelo MPF:
XXXXXXXXXX
PROCURADOR REGIONAL DA REPÚBLICA
XXXXXXXXXX
PROCURADOR REGIONAL DA REPÚBLICA
Pela defesa:
xxxxxxxxxxx
ACUSADO
xxxxxxxxxxxxxxxx
ADVOGADO