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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Caroline Andressa da Silva DELAÇÃO PREMIADA NO TRÁFICO DE DROGAS – Lei nº 11.343/2006 CURITIBA 2011

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Caroline Andressa da Silva

DELAÇÃO PREMIADA NO TRÁFICO DE DROGAS – Lei nº

11.343/2006

CURITIBA

2011

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DELAÇÃO PREMIADA NO TRÁFICO DE DROGAS – Lei nº

11.343/2006

CURITIBA

2011

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Caroline Andressa da Silva

DELAÇÃO PREMIADA NO TRÁFICO DE DROGAS – Lei nº

11.343/2006

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador Professor Néfi Cordeiro.

CURITIBA

2011

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TERMO DE APROVAÇÃO

Caroline Andressa da Silva

DELAÇÃO PREMIADA NO TRÁFICO DE DROGAS – Lei nº

11.343/2006

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Bacharel em Direito no Curso de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ____ de __________________ de 2011.

__________________________________________. Professor Doutor Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografias

Bacharelado em Direito

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: Prof. Dr. Néfi Cordeiro

Prof. Dr. ____________________________.

Prof. Dr. ____________________________.

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Dedico o presente trabalho à minha mãe Maria de Fátima e ao meu tio Manoel, espelhos de caráter, honestidade e perseverança. Ao meu irmão Maicon, pois junto de minha mãe esteve ao meu lado nos momentos mais difíceis. À minha Manuella, meu amor maior.

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Agradeço à minha mãe, minha Manuella e meu irmão Maicon pelo amor, companheirismo, paciência e confiança durante esta caminhada. Aos amigos de longa data: Bruna Tatiane, Fabiana, Jair, Paula Carolina e Taylise por acreditarem tanto em mim desde o princípio. Ao Ilustre Professor Néfi Cordeiro por ter me concedido a honra de tê-lo como orientador.

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“Quando sentares à beira do caminho, senta-te de frente, para não ficares de costas por onde já percorreste". Autor Desconhecido

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RESUMO

O objeto do presente trabalho é analisar a incidência do instituto da Delação Premiada em seus aspectos gerais bem como sua aplicação na Lei 11.343/2006 a qual versa sobre o tráfico de drogas. Com análise da doutrina e jurisprudência, pode-se verificar que o instituto é alvo de grandes questionamentos éticos e jurídicos no que tange à sua existência no Processo Penal Brasileiro e ainda tamanha divergência de entendimento entre doutrinadores e estudiosos do tema. É relevante o estudo para que seja demonstrado que mesmo não sendo talvez, o caminho mais ético a ser seguido, o instituto está aí, sendo usado freqüentemente o que torna esta ferramenta importante no Direito Processual Penal Brasileiro para fins de se obter um maior êxito acerca da identificação de agentes criminosos e a partir disso trabalhar para a responsabilização e punibilidade destes. Palavras-chave: Delação Premiada, Lei 11.343/2006, Lei de Drogas, Colaboração, Instituto, Concessão, Benefício, Prêmio.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 09

2 DELAÇÃO PREMIADA....................................................................................... 11

2.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DO INSTITUTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO.................................................................................

11

2.2 CONCEITO....................................................................................................... 13

2.3 DELAÇÃO X COLABORAÇÃO........................................................................ 15

2.4 PREVISÃO LEGAL........................................................................................... 16

3 QUESTIONAMENTO ÉTICOS E JURÍDICOS À DELAÇÃO............................. 20

4 CARACTERÍSTICAS, REQUISITOS E PROCEDIMENTO................................ 25

4.1 VOLUNTARIEDADE X ESPONTANIEDADE................................................... 25

4.2 APLICAÇÃO DO BENEFÍCIO: OBRIGATÓRIO OU FACULTATIVO............... 26

4.3 REQUISITOS................................................................................................... 27

4.4 PROCEDIMENTO............................................................................................ 29

4.4.1 Momento e delação premiada após o trânsito em julgado da sentença....... 29

5 NATUREZA JURÍDICA E VALOR PROBATÓRIO............................................ 33

6 EFICÁCIA DA DELAÇÃO E FAVOR PROCESSUAL........................................ 36

7 QUESTIONAMENTOS ÉTICOS E JURÍDICOS À DELAÇÃO........................... 40

8 REFERÊNCIAS................................................................................................... 42

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1 INTRODUÇÃO

Difícil abordar a delação premiada sem se valer da sua finalidade maior que

é o combate às organizações criminosas. Embora, a delação premiada seja um dos

meios de combate ao crime organizado, este não é o foco principal do presente

estudo.

O Brasil de um modo geral possui fatores determinantes para a existência e

crescimento da criminalidade organizada, podendo ser citado alguns como, por

exemplo: a pobreza, a corrupção política, o território privilegiado que faz fronteira

com países que são rota de crimes preocupantes, dentre outros.

Somado a este cenário que propicia a origem do crime organizado, nos

deparamos com a deficiência do Estado em obter êxito no desempenho de sua

própria função.

Frisa-se, que a Polícia não consegue acompanhar as inovações, evoluções

e modernizações das organizações que operam diariamente em nosso país, tendo o

Poder Judiciário que se valer de instrumentos como o da delação premiada para

cooperar com os fins da Justiça e do Estado persecutor. É importante ressaltar, que

neste contexto, o Brasil tem no tráfico de drogas sua principal atividade na

criminalidade contemporânea.

O presente trabalho tem como escopo, apresentar aspectos gerais sobre o

instituto da delação premiada, a forma como a qual é empregada, embora não

sendo uma ferramenta fundada em cunho totalmente ético, a mesma, diante do

notório crescimento da criminalidade organizada e das inúmeras deficiências do

Estado para investigar e punir se tornou um mal necessário, bem como uma

explanação de como o instituto incide na atual Lei de Drogas 11.343/2006.

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Portanto, o instituto em comento, mesmo sendo alvo de críticas

brilhantemente fundamentadas, possui uma intenção positiva no ordenamento

jurídico brasileiro o qual também deve ser lembrado.

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2 DELAÇÃO PREMIADA

2.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DO INSTITUTO NO

ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

O instituto da delação premiada não é de origem recente no ordenamento

jurídico brasileiro, o mesmo se faz presente no Brasil desde as Ordenações

Filipinas.

Damásio de Jesus aclara esse surgimento, vejamos:

A origem da delação premiada no Direito brasileiro remonta às Ordenações Filipinas, cuja parte criminal, constante do Livro V, vigorou de janeiro de 1603 até a entrada em vigor do Código Criminal de 1830. O Título VI do “Código Filipino”, que definia o crime de “Lesa Magestade” (sic), tratava da delação premiada no item 12; o Título CXVI, por sua vez, cuidava especificamente do tema, sob a rubrica “Como se perdoará aos malfeitores que derem outros à prisão” e tinha abrangência, inclusive, para premiar, com o perdão, criminosos delatores de delitos alheios. (DAMÁSIO, 2006, p. 1).

Néfi Cordeiro traz mais detalhes acerca da delação premiada no “Código

Filipino” ao dizer que “já nas Ordenações Filipinas era perdoado não somente o

agente que confessasse a inconfidência, mas também aquele que a qualquer

momento a revelasse, enquanto ainda não descoberta, num juízo segundo o caso

merecesse, em típica hipótese de prêmio à delação.” (CORDEIRO, 2010, p. 2-3).

Quanto ao “Código Filipino” ambos os autores remetem aos Títulos que

abaixo seguem:

Título VI – Do Crime de Lesa Magestade. 12. E quanto ao que fizer conselho e confederação contra o Rey, se logo sem algum spaço, e antes que per outrem seja descoberto, elle o descobrir, merece perdão... TITULO CXVI - Como se perdoará aos malfeitores, que derem outros á prisão Qualquer pessôa, que der á prisão cada hum dos culpados, e participantes em fazer moeda falsa, ou em cercear, ou per qualquer artificio mingoar, ou corromper a verdadeira, ou em falsar nosso sinal, ou sello, ou da Rainha, ou do Príncipe meu filho, ou em falsar sinal de algum Védor de nossa fazenda,

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ou Dezembargador, ou de outro nosso Official Mor, ou de outros Officiaes de nossa Caza, em cousas, que toquem a seus Officios, ou em matar, ou ferir com bésta, ou espingarda, matar com peçonha, ou em a dar, ainda que morte delia se não siga, em matar atraiçoadamente, quebrantar prisões e Cadêas de fora per força, fazer furto, de qualquer sorte e maneira que seja, pôr fogo acinte para queimar fazenda, ou pessoa, forçar mulher, fazer feitiços, testemunhar falso, em soltar presos por sua vontade, sendo Carcereiro, em entrar em Mosteiro de Freiras com propósito deshonesto, ern fazer falsidade em seu Officio, sendo Tabellião, ou Scrivão; tanto que assi der á prisão os ditos malfeitores, ou cada hum delles, e lhes provar, ou forem provados cada hum dos ditos delictos, se esse, que o assi deu á prisão, participante em cada hum dos ditos malefícios, em que he culpado aquelle, que he preso, havemos por bem que, sendo igual na culpa, seja perdoado livremente, postoque não tenha perdão da parte...(CORDEIRO, 2010, p. 3)

Embora a origem do instituto tenha sido marcada por sua previsão no

“Código Filipino”, o Código Criminal do Império, por sua vez também versou sobre o

assunto, sendo que sua natureza jurídica de prova foi gradualmente reconhecida

através da jurisprudência conforme dispõe o autor supracitado:

Do Código Criminal do Império em diante, as legislações penais brasileiras limitaram-se a recompensar a colaboração apenas na forma da confissão, até hoje admitida como atenuante. Embora ainda discutível o prêmio ao particular em favor de mera facilidade propiciada ao estado-persecutor, ao menos ficavam os efeitos da confissão diretamente voltados ao próprio confessor. Gradualmente passou a jurisprudência a acolher como prova também a parte da confissão que acabava por tratar do crime de terceiros, co-réus. Era o início da figura da delação, que nesse limite ainda não gerava qualquer benefício ao confitente – a atenuação da pena restava vinculada à confissão exclusivamente das condutas criminosas próprias. Nos limites da confissão, não possuía a delação qualquer regra de sigilo, forma de processamento diferenciada, exigência de resultados ou recompensa específica. (CORDEIRO, 2010, p. 3-4).

Damásio em sua obra menciona que “Em função de sua questionável ética,

à medida que o legislador incentivava uma traição, acabou sendo abandonada em

nosso Direito, reaparecendo em tempos recentes.” (DAMÁSIO, 2006, p. 1).

O ressurgimento da delação premiada em nosso ordenamento jurídico foi

marcado pela Lei n. 8.072/1990 – Lei dos Crimes Hediondos, a qual previu o instituto

em seu artigo 8°1, para os crimes previstos nesta Lei bem como no artigo 7°2

prevendo a aplicação da delação nos crimes de extorsão mediante seqüestro.

1 Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de

crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.

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No que tange à existência do instituto para os crimes envolvendo

entorpecentes, este teve origem na revogada Lei Antitóxicos n. 10.409/2002 que

previa a aplicação em seu artigo 32 e §§.

Muitos os doutrinadores que vislumbravam inconstitucionalidade na referida

Lei bem como má elaboração dos dispositivos inclusive naqueles que versavam

sobre a delação premiada, que resultou em muitos questionamentos acerca de sua

aplicação e legalidade. (SILVA, 2002, p. 50-51).

Desta feita, houve a necessidade de nova previsão legal que versasse sobre

a matéria em comento, suprida com a promulgação da Lei n. 11.343/2006. A “nova

Lei” foi exaltada por estudiosos que conforme preconiza Guilherme de Souza Nucci,

“A previsão formulada no art. 41 da Lei 11.343/2006 possui redação muito superior à

anterior hipótese de delação premiada, feita no art. 32, §§2º e 3º, da Lei

10.409/2002, ora revogada.” (NUCCI, 2007, p. 344).

2.2 CONCEITO

O termo delação se origina do latim “delatione”, o qual, consoante Aurélio

Buarque de Holanda Ferreira, significa “denunciar, revelar (crime ou delito); acusar

como autor de crime ou delito; deixar perceber; denunciar como culpado; denunciar-

se como culpado; acusar-se”. (FERREIRA, 1999, p. 617).

Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando

seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços.

2 Art. 7º Ao art. 159 do Código Penal fica acrescido o seguinte parágrafo:

"Art. 159. .............................................................. ........................................................................ § 4º Se o crime é cometido por quadrilha ou bando, o co-autor que denunciá-lo à autoridade, facilitando a

libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços."

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O agente que delata, é também chamado de delator, co-réu, co-imputado,

co-participe, colaborador, dentre outras denominações utilizadas pelos autores que

trabalham o tema.

Segundo Adalberto José Q. T. De Camargo Aranha, o instituto da delação

consiste:

(…) na afirmativa feita por um acusado, ao ser interrogado em juízo ou ouvido na polícia, e pela qual, além de confessar a autoria de um fato criminoso, igualmente atribui a um terceiro a participação como seu comparsa. Afirmamos que a delação somente ocorre quando o acusado e réu também confessa, porque, se negar a autoria e atribuí-la a um terceiro, estará se escusando e o valor da afirmativa como prova é nenhum. (ARANHA, 1983. p. 73).

Ao conceituar o instituto Damásio de Jesus entende que a:

Delação é a incriminação de terceiro, realizada por um suspeito, investigado, indiciado ou réu, no bojo de seu interrogatório (ou em outro ato). Delação premiada é figura incentivada pelo legislador, que premia o delator, concedendo-lhe benefícios (redução de pena, perdão judicial, aplicação de regime penitenciário brando etc.). (JESUS, 2006, p. 09).

Assim vem esclarecer Gabriel César Zaccaria de Inellas quanto à delação:

(…) a afirmativa do co-réu, ao ser interrogado, pela qual, além de confessar a autoria de um fato antijurídico, igualmente atribui a um terceiro a participação, como seu comparsa. Só se pode falar em delação quando o réu também confessa (...) (INELLAS, 2000. p. 93).

Renata Jardim da Cunha Rieger define a delação premiada: “O verbo delatar

significa acusar, denunciar ou revelar. “Premiada”, porque o legislador concede

prêmios para o delator”. (RIEGER, 2008, p. 05).

Na concepção de Vanise Röhrig Monte, a delação refere-se “(…) a fatos

antijurídicos consumados, sobre os quais o agente presta informações para auxiliar

a colheita de provas, prisão dos demais envolvidos e libertação da vítima.” (MONTE,

2001, p. 244).

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A delação premiada possui uma definição geral não havendo distinção

acerca das Leis que a prevê.

Desta feita, a delação apenas poderá existir quando houver mais de um

agente envolvido no mesmo crime e ainda, o agente que o fizer deverá

necessariamente confessar também sua participação.

A delação consiste em premiada conforme linhas pretéritas, pelo fato de que

o delator faz jus a prêmio como a redução da pena ou até mesmo o perdão judicial

por praticar o referido ato. Na Lei 11.343/2006 que é também objeto do presente

estudo, não é permitido o perdão judicial, mas tão somente a redução da pena

conforme será abordado em momento oportuno.

2.3 DELAÇÃO X COLABORAÇÃO

A denominação do instituto da delação premiada também gera divergência

entre estudiosos e doutrinadores. Alguns autores utilizam o termo delação premiada

sem o distinguir de colaboração premiada, ou ainda, colaboração processual.

Outros, por sua vez, antes até de discorrer sobre o assunto já fazem

ressalva quanto à importância da distinção entre um termo e outro para que não

ocorra uso da expressão e interpretação de forma equivocada.

Luiz Flávio Gomes distingue as duas expressões de forma categórica:

Não se pode confundir delação premiada com colaboração premiada. Esta é mais abrangente. O colaborador da justiça pode assumir culpa, e não incriminar outras pessoas (nesse caso, é só colaborador). Pode de outro lado, assumir culpa (confessar) e delatar outras pessoas (nessa hipótese é que se fala em delação premiada). (GOMES, 2005, p. 18).

Já Frederico Valdez Pereira, referindo-se ao instituto, se vale da expressão

colaboração processual como sinônimo de delação premiada. Um exemplo claro é

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título de seu artigo publicado no ano de 2009: “Valor probatório da colaboração

processual (delação premiada).” (PEREIRA, 2009, p. 475).

No artigo 41 da Lei 11.343/2006 – Lei de Drogas, o legislador utilizou o

termo colaboração ao referir-se à delação premiada, não fazendo distinção do termo

e sua abrangência:

Art.41. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços. (Grifo meu)

Como os Tribunais têm tratado sem distinção as expressões delação e

colaboração premiada, aqui trataremos o assunto como delação ou ainda

colaboração quando assim se fizer necessário.

2.4 PREVISÃO LEGAL

O instituto da delação premiada está previsto de forma esparsa na legislação

pátria havendo assim, uma série de diplomas legais versando sobre ela.

A previsão do instituto de forma não concentrada no ordenamento jurídico

não agrada alguns doutrinadores e estudiosos que entendem causar incoerência e

confusão.

De acordo com Renato Marcão “Não há uma única lei regulando as

hipóteses de delação premiada, e não há padronização no tratamento do instituto,

do que decorrem inúmeros questionamentos.” (MARCÃO, 2005, p. 161).

Para Damásio de Jesus a forma esparsa de tratar a delação geram

dificuldades:

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A falta de harmonia em seu regramento, ademais, pode gerar alguma dificuldade na sua aplicação. Questões como a incidência do benefício quando a delação é sugerida por autoridades públicas, a viabilidade de sua aplicação em sede de revisão criminal, entre outras, mereciam um tratamento expresso em nosso Direito Positivo. Esses obstáculos poderiam ser ultrapassados mediante a elaboração de uma legislação específica, de modo a evitar discrepâncias normativas e suprir possíveis lacunas acerca do tema. (JESUS, 2006, p. 10).

Consoante Renata Jardim da Cunha Rieger “Nota-se que há uma série de

dispositivos que cuidam da delação premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro e

que eles formam um quadro assistemático e confuso.” (RIEGER, 2008, p. 06).

Partilha do mesmo entendimento Luiz Flávio Gomes ao dizer que “Não

existe um regramento único e coerente.” (GOMES, 2005, p. 19).

Verifica-se a previsão da delação nos seguintes diplomas legais:

Lei de Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional – Lei nº 7.492/1986,

Artigo 25º, §2º3;

Lei dos Crimes Hediondos – Lei nº 8.072/1990, Artigo 8º, Parágrafo Único;

Crimes Tributários – Lei nº 8.137/1990, Artigo 16º4;

Lei do Crime Organizado – Lei nº 9.034/1995, Artigo 6º5;

Código Penal – Artigo 159, § 4º6 que versa sobre o crime de extorsão

mediante sequestro;

3 Art. 25. São penalmente responsáveis, nos termos desta lei, o controlador e os administradores de instituição

financeira, assim considerados os diretores, gerentes (Vetado).

§ 2º Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe que através de

confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de

um a dois terços. (Incluído pela Lei nº 9.080, de 19.7.1995)

4 Art. 16. Qualquer pessoa poderá provocar a iniciativa do Ministério Público nos crimes descritos nesta lei,

fornecendo-lhe por escrito informações sobre o fato e a autoria, bem como indicando o tempo, o lugar e os

elementos de convicção.

Parágrafo único. Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe

que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua

pena reduzida de um a dois terços. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.080, de 19.7.1995)

5 Art. 6º Nos crimes praticados em organização criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços, quando a

colaboração espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua autoria.]

6 Art. 159 - Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou

preço do resgate:

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Lei de Lavagem de Capitais – Lei nº 9.613/1998, Artigos 1º7 e 5º8;

Lei de Proteção a Vítimas e Testemunhas – Lei nº 9.807/1999, Artigos 139 e

1410;

§ 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação

do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.

7 Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de

bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;

II – de terrorismo e seu financiamento; (Redação dada pela Lei nº 10.701, de 9.7.2003)

III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção;

IV - de extorsão mediante seqüestro;

V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de

qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;

VI - contra o sistema financeiro nacional;

VII - praticado por organização criminosa.

VIII – praticado por particular contra a administração pública estrangeira (arts. 337-B, 337-C e 337-D do

Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal). (Inciso incluído pela Lei nº 10.467, de

11.6.2002)

Pena: reclusão de três a dez anos e multa.

§ 1º Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores

provenientes de qualquer dos crimes antecedentes referidos neste artigo:

I - os converte em ativos lícitos;

II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou

transfere;

III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.

§ 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:

I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores que sabe serem provenientes de

qualquer dos crimes antecedentes referidos neste artigo;

II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária

é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei.

§ 3º A tentativa é punida nos termos do parágrafo único do art. 14 do Código Penal.

§ 4º A pena será aumentada de um a dois terços, nos casos previstos nos incisos I a VI do caput deste artigo, se o

crime for cometido de forma habitual ou por intermédio de organização criminosa.

§ 5º A pena será reduzida de um a dois terços e começará a ser cumprida em regime aberto, podendo o juiz

deixar de aplicá-la ou substituí-la por pena restritiva de direitos, se o autor, co-autor ou partícipe colaborar

espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais

e de sua autoria ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.

8 Art. 5º Quando as circunstâncias o aconselharem, o juiz, ouvido o Ministério Público, nomeará pessoa

qualificada para a administração dos bens, direitos ou valores apreendidos ou seqüestrados, mediante termo de

compromisso.

9 Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente

extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a

investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I - a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada; III - a recuperação total ou parcial do produto do crime. Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza,

circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.

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Revogada Lei Antitóxicos – Lei nº 10.409/2002, Artigo 32, § 2º;

Por fim, e mais importante para nós, a Lei de Drogas – Lei nº 11.343/2006

que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad) a qual

prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de

usuários e dependentes de drogas; estabelecem normas para repressão à produção

não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas, define crimes e também prevê e

regulariza a aplicação e benefício do instituto da delação premiada em seus Artigos

41 e 4911.

10

Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo

criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na

recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um a dois terços.

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3 QUESTIONAMENTOS ÉTICOS E JURÍDICOS À DELAÇÃO

Não são poucas as críticas que cercam o instituto da delação premiada. Há

posicionamentos e justificativas variadas e todos com plausíveis fundamentos éticos

bem como jurídicos.

Há quem aceite o instituto não vislumbrando qualquer cunho imoral ou

antiético, como veremos abaixo.

Ao citar Denise Frossard e Vanise Röhrig Monte, Renata Jardim da Cunha

Rieger diz que:

Para a magistrada aposentada Denise Frossard, a delação nada tem de sentido filosófico, político, teológico ou romântico. Trata-se, simplesmente, de um instrumento legal e democrático colocado pelo legislador à disposição do Estado. Para a juíza Vanise Röhrig Monte, o instituto consiste em uma técnica processual que busca abreviar a solução do processo sem romper com qualquer dogma do Direito Penal. Mais, representa um eficaz instrumento para atender ás necessidades do Estado Democrático de Direito está de acordo com os princípios constitucionais da segurança e da justiça. A magistrada aborda, ainda, que a delação traz o criminoso (suposto inimigo do sistema) novamente para comungar dos valores do Estado Democrático de Direito. Mais, diz que ele rompe com os elos da cumplicidade e com os vínculos do solidarismo espúrio, sendo merecedor do benefício do perdão ou a diminuição de sua pena. (RIEGER, 2008, p. 06).

No entanto, a própria Renata Jardim da Cunha Rieger se opõe ao instituto e

deixando cristalino seu posicionamento:

A maioria dos juristas reconhece, contudo, que a delação dá, sempre mostra da ausência de freis éticos. Apesar disso, alguns aceitam sua aplicação, pois a consideram um mal necessário. Em suma a delação premiada é um instituto polêmico. È inegavelmente antiético e imoral e não se coaduna com os princípios consagrados na Constituição da República. Deveria, portanto, ser expurgado do Ordenamento Jurídico Brasileiro. (RIEGER, 2008, p. 10).

Em defesa do instituto, parte também David Teixeira de Azevedo:

11

Art. 49. Tratando-se de condutas tipificadas nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 a 37 desta Lei, o juiz, sempre que

as circunstâncias o recomendem, empregará os instrumentos protetivos de colaboradores e testemunhas previstos

na Lei no 9.807, de 13 de julho de 1999.

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O agente que se dispõe a colaborar com as investigações assume uma diferenciada postura ética de marcado respeito aos valores sociais imperantes, pondo-se debaixo da constelação axiológica que ilumina o ordenamento jurídico e o meio social. Mostra o agente uma personalidade mais capaz de ser permeada pelos valores imantados nas normas jurídicas e imperantes no meio social. (AZEVEDO, 1999, p. 5-7).

No mesmo sentido, Diogo Willian Likes Pastre entende que tendo em vista o

nível de organização da criminalidade, o instituto da delação premiada é necessário

e válido, o qual, sendo bem aplicado, resulta em benefícios para a sociedade.

(PASTRE, 2008, p.75).

O autor Èlio Wanderley de Siqueira Filho vê a delação premiada com a ótica

de que a ferramenta será de grande utilidade sob a condição de que seja bem

empregada:

“A delação é uma figura jurídica que, caso bem empregada, muito auxiliará na busca da verdade material acerca das infrações penais, devendo o legislador procurar disciplinar a adoção de tal expediente em outras hipóteses, além das retro consignadas”. (SIQUEIRA FILHO, 1995, p. 83).

Não abordando o teor ético, mas tão somente a eficácia e a benesse do

instituto Vanise Röhrig Monte nos traz seu posicionamento favorável reconhecendo

a intenção positiva que teve o legislador ao inserir no ordenamento jurídico a

ferramenta a qual estamos discutindo:

“Procedendo à leitura dos artigos 13 e 14 da referida lei [Lei n. 9.807/99] pela filtragem constitucional, verificamos que são efetivos instrumentos para promover a segurança e a justiça, pois dá à persecução penal um concreto instrumento para que se busque a redução da impunidade no país e efetivo combate à criminalidade organizada.” (MONTE, 2001, p. 237).

Para outros autores, como Rômulo de Andrade Moreira e Luiz Flávio

Gomes, mesmo reconhecendo a deficiência e culpa do Estado, permanecem

contrários ao instituto e a forma com a qual vem sendo empregado no ordenamento

jurídico bem como nos casos em concreto. Vejamos:

Entendemos que o aparelho policial do Estado deve se revestir de toda uma estrutura e autonomia, a fim de poder realizar seu trabalho a contento, sem necessitar de expedientes escusos na elucidação dos delitos. O aparato

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policial tem a obrigação de, por si próprio, valer-se de meios legítimos para a consecução satisfatória de seus fins não sendo necessário, portamto, que uma lei ordinária use do prêmio ao delator (crownwitness), como expediente facilitador da investigação policial e da efetividade da punição. A traição demonstra a fraqueza de caráter, como denota fraqueza o legislador que dela abre mão para proteger seus cidadãos. A lei, como já foi dito, deve sempre e sempre indicar condutas sérias, moralmente relevantes e aceitáveis, jamais ser arcabouço de estímulo a perfídias, deslealdades, aleivosias, ainda que para calar multidão temerosa e indefesa (aliás, por culpa do próprio Estado) ou setores economicamente privilegiados da sociedade (no caso da repressão à extorsão mediante sequestro). Não podemos nos valer de meios esconsos, em nome de quem quer seja ou de qualquer bem, sob pena, inclusive, de sucumbirmos à promiscuidade da ordem jurídica corrompida. (MOREIRA, 2003, p. 28-29).

Extrai-se dos ensinamentos de Luiz Flávio Gomes:

Quanto ao colaborador da justiça, não existe nenhum questionamento ético. A mesma coisa não se pode afirmar em relação à delação, que implica traição, falta de lealdade etc. A traição não é uma virtude, não deve ser estimulada, mas em termos investigatórios pode (eventualmente) ser útil. O modelo eficientista de justiça na pós-modernidade está mais preocupado com sua eficácia prática que com pruridos éticos. Por isso é que o instituto da delação premiada tem futuro. Aliás, esse futuro torna-se mais promissor na medida em que se agrava a falência da máquina investigativa do Estado. Quanto mais o Estado é dotado de capacidade investigativa, menos necessita da delação dos criminosos, e vice-versa. Claro que o correto é o Estado se aparelhar cada vez mais para não necessitar da delação, mas enquanto isso não acontece, a prioridade deve ser um detalhado regramento desse instituto, para se evitarem denúncias irresponsáveis, o sensacionalismo da mídia, o vedetismo das CPIs, o afoitamento de autoridade da Polícia e da Justiça etc. O que não nos parece suportável é o atual nível da insegurança jurídica gerada pelas delações, que têm produzido efeitos muito mais midiáticos que práticos. (GOMES, 2005, p. 18-19).

Também em desfavor ao instituto, Juarez Cirino dos Santos assim se manifesta acerca da delação premiada:

“Negociação de impunidade ou vantagens pela delação de co-autores ou partícipes, constitui troca utilitária do juízo de reprovação por informações processuais que estimula o oportunismo egoísta do ser humano e amplia o espaço de provas duvidosas produzidas por ‘arrependidos’, que conservam o direito de mentir.” (CIRINO DOS SANTOS, 2001, p. 149-150)

Ainda contrário ao instituto, Raúl Cervini, Willian Terra de Oliveira e Luiz

Flávio Gomes afirmam que:

O Direito para ser duradouro, tem de se assentar em vigas éticas firmes. O direito é um conjunto normativo eminentemente ético, e é por isso que é acatado e respeitado. Ele existe em função de alguns valores, hoje expostos explicitamente no frontispício da nossa Constituição (dignidade do ser humano, justiça, igualdade, liberdade, segurança etc.). Em determinadas circunstâncias até se compreende o prevalecimento de um valor sobre outro, mas o que não dá para entender é a transformação do

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Direito em instrumento de antivalores. Colocar em lei que o traidor merece prêmio é difundir uma cultura antivalorativa. È um equívoco pedagógico enorme. (CERVINI; OLIVEIRA; GOMES, 1998, p. 347).

Em um panorama geral sobre o assunto, Renato Marcão o avalia na

atualidade como sendo um mal necessário, embora esteja nele inseridos valores

positivos e negativos:

Embora a legislação esteja sujeita a críticas variadas, a intenção revelada é positiva, não obstante a só adoção da delação premiada já exponha o reconhecimento da incapacidade do Estado frente as mais variadas formas de ações criminosas, e demonstre a aceitação de sua ineficiência ao apurar ilícitos penais, notadamente os perpetrados por associações criminosas, grupos, organizações criminosas, quadrilha ou bando alicerçados em complexidade organizacional não alcançada pelo próprio Estado. Em si mesma, premiada ou não, a delação dá mostras de ausência de frios éticos; pode apresentar-se como verdadeira traição em busca de benefícios que satisfaçam necessidades próprias em detrimento do(s) delatado(s), conduta nada recomendável tampouco digna de aplausos. Além das questões éticas, outros problemas podem ser identificados, e dentre eles podemos citar, por exemplo, a possibilidade de o instituto gerar “acomodação”, a apatia da autoridades incumbida da apuração, pois, passando a contar com a possibilidade de delação, não poderá deixar de dedicar-se com mais afinco na realização de seu ofício; é possível que a delação proporcione de forma proposital o desvio no rumo das investigações, ainda que temporário, porém com reflexos negativos à apuração da verdade etc. (MARCÃO, 2005, p. 160-161).

O mesmo autor, partindo da premissa que o instituto existe para beneficiar a

sociedade analisa a verdadeira intenção que parte do agente delator e conclui como

sendo a delação um mal necessário:

Em relação à delação premiada, o que se vê é seu surgimento quando há desajuste entre os envolvidos; quando um se sente prejudicado pela persecução penal (em sentido amplo) e desamparado pelo(s) comparsa(s). O desespero, a simples intenção de beneficiar-se, ou ambos, constitui o mote da delação. Não há qualquer interesse primário em colaborar com a Justiça; não há qualquer conversão do espírito e do caráter para o bem; não há preocupação com o que é realmente justo e verdadeiro; não há, enfim, motivo de relevante valor moral para a conduta egoísta. Observadas as variações no regramento, e por considerar a delação premiada um verdadeiro “mal necessário”, o que se espera é o aprimoramento das estruturas normativas, tanto quanto possível, buscando evitar resultados danosos à eficácia da justiça e proporcionar benefícios verdadeiros à sociedade. (MARCÃO, 2005, p. 160-163).

Acerca do valor moral que induz ou não o agente a delatar seus comparsas,

é conveniente mencionar o posicionamento de Néfi Cordeiro:

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Não é beneficiado o delator pelo valor moral de arrependimento ou regeneração de sua conduta, tendente à reinserção do agente no caminho do bem e da ordem social (favor de conduta). Tampouco é caso de menor culpabilidade do confitente pela delação realizada – o crime já estava consumado e por ser delator não é socialmente menos censurável sua conduta criminosa. Apenas se incentiva – com redução da pena – a colaboração ao estado-persecutor (o favor de resultado). (CORDEIRO, 2010, p. 18-19).

Em meios às críticas, faz jus concluirmos este capítulo com o entendimento

de autores que compreendem o instituto na sua intenção primordial de quando

inserido em nosso ordenamento jurídico:

“...veio a ser um instrumento de maior utilidade e eficácia, não só para as investigações, mas também para permitir uma melhora na prova no processo penal, viabilizando condenações que outrora seriam impossíveis ou muito pouco prováveis.” (TEOTÔNIO; NICOLINO, 2000, p. 26).

Diante de todo o exposto, verifica-se que independente da posição de cada

autor, estes se referem de um modo geral ao instituto não direcionando seu

posicionamento à incidência deste em determinada Lei, mas sim em todas elas

concomitantemente. Deste modo, a delação premiada na lei que versa sobre o

tráfico de entorpecentes está sujeita a essas mesmas opiniões sendo elas

favoráveis ou desfavoráveis.

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4 CARACTERÍSTICAS, REQUISITOS E PROCEDIMENTO

4.1 VOLUNTARIEDADE X ESPONTANEIDADE

Na doutrina, tamanha se faz a diferença entre os termos voluntariedade e

espontaneidade. Damásio de Jesus esclarece a distinção. Vejamos:

Voluntário é o ato produzido por vontade livre e consciente do sujeito, ainda que sugerido por terceiros, mas sem qualquer espécie de coação física ou psicológica. Ato espontâneo, por sua vez, constitui aquele resultante da mesma vontade livre e consciente, cuja iniciativa foi pessoal, isto é, sem qualquer tipo de sugestão por parte de outras pessoas. (JESUS, 2006, p. 09).

No mesmo sentido, Néfi Cordeiro enfatiza:

Tecnicamente espontaneidade indica a sincera conduta, sponte propria realizada, assim diferenciando-se da voluntariedade, onde o ato pode acontecer por provocação por terceiros, mas sempre decorrerá das opções do agente, que não as têm impedidas por coação. (CORDEIRO, 2010, p. 6).

Ao citar as Leis 9.034/95, 7.492/86, 8.137/90 e 9.613/98 que exigem

expressamente a espontaneidade, Renata Jardim da Cunha Rieger discorda deste

entendimento:

(…) é inaceitável a exigência de espontaneidade. Via de regra, os próprios agentes responsáveis pela persecução penal sugerem aos acusados os benefícios da diminuição e da extinção da pena, em troca da sua colaboração. (RIEGER, 2008, p. 09).

Mister se faz destacar, que no artigo 41 da Lei 11.343/2006 – Lei de Drogas

o legislador prevê expressamente que o requisito a ser preenchido para configurar e

validar o ato subjetivo de delatar e conseqüentemente fazer jus ao benefício é o da

voluntariedade:

Art.41. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços. (Grifo meu)

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Portanto, com relação à delação premiada na Lei 11.343/2006 não há o que

se falar em espontaneidade uma vez que o legislador deixou expresso o requisito da

voluntariedade de modo que não permite qualquer interpretação contrária.

4.2 APLICAÇÃO DO BENEFÍCIO: OBRIGATÓRIO OU FACULTATIVO?

A doutrina majoritária tem entendido que quando preenchidos os requisitos

exigidos para a concessão do benefício este se torna um direito subjetivo do réu, o

que vincula o magistrado a obrigatoriedade de cumprir a parte do Estado no acordo

firmado.

A parte final do Artigo 41 da Lei 11.343/2006 é clara ao dizer:

Art.41. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto dos crimes, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços. (Grifo meu)

Sendo assim, o legislador ao utilizar o termo terá pena reduzida garantiu ao

agente delator a concessão do benefício desde que cumpridos os requisitos e não

deixou tal concessão como mera faculdade do magistrado. O contrário ocorreria se

no dispositivo legal o legislador tivesse feito constar o termo poderá que poderia

gerar divergência de entendimento quanto a faculdade ou obrigatoriedade, ou até

mesmo causar um entendimento automático de faculdade do magistrado em

conceder o benefício. Dúvida esta que o legislador não permitiu ao redigir o artigo

ora analisado.

Sobre a obrigatoriedade dispõe com precisão Vilmar Pacheco Filho e

Gilberto Thums:

O indiciado não pode passar pela situação de, após ter traído seus companheiros, arriscando a sua vida e a de sua família, em busca do

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prêmio legal, ficar submetido à discricionariedade do Ministério Público. Se até o criminoso cumpriu sua parte no acordo, não pode o Estado se arrepender e o trair, inadimplindo sua parcela. (PACHECO FILHO; THUMS. 2004, p.155).

Com o mesmo entendimento do autor anterior, Renato Marcão Observa:

Com suas vantagens e desvantagens, a delação premiada vem sendo usada largamente, e muitas vezes com pouco ou nenhum critério técnico, tanto que se tem notícia de vários casos em que houve delação premiada, porém, nada ficou documentado visando à “segurança do delator”, e exatamente por isso nada foi comunicado nos autos do processo criminal a que se vê submetido, apesar do êxito das investigações realizadas a partir da delação. Em consequência, muitos delatores acabam colaborando com as investigações e depois não recebem os benefícios inicialmente apresentados na barganha que envolve a pretensão punitiva, a revelar, mais uma vez, condenável violação ética patrocinada pelo Estado; verdadeiro estelionato. (MARCÃO, 2005. p. 161).

No sentido de que é obrigatória a concessão e não uma faculdade do

magistrado, Rômulo de Andrade Moreira, fala rapidamente e com precisão sobre o

assunto: “(…) considera causa compulsória de diminuição de pena a delação de um

dos participantes na organização criminosa.” (MOREIRA, 2003, p. 26).

Referindo-se aos prêmios, mais especificamente ao perdão judicial, Renata

Jardim da Cunha Rieger ao citar Damásio de Jesus, diz que:

Damásio de Jesus é peremptório em afirmar que é um direito subjetivo público de liberdade do acusado e não um favor concedido pelo juiz. Salienta, ainda, qua a expressão “poderá”, prevista na lei, não tem natureza de simples faculdade, no sentido de o juiz dispensar ou não a pena. Satisfeitos os pressupostos legais, está o magistrado obrigado a declarar extinto o jus puniendi. (RIEGER, 2008, p. 09)

Diante do exposto, não nos resta dúvidas de que cumpridos os requisitos de

colaboração está sim o Estado obrigado a cumprir com sua parte do acordo qual

seja a concessão do benefício ora previsto na legislação.

4.3 REQUISITOS

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Como já mencionado em linhas pretéritas, o instituto da delação não possui

um regramento único, assim sendo, incide de forma diferente em cada lei que o

prevê. Aqui, vamos tratar do instituto no âmbito da Lei 11.343/06.

Primeiramente, vejamos os requisitos gerais segundo Adalberto José Q. T.

Camargo Aranha (ARANHA, 1993, p. 138-139).

a) Existência de concurso de pessoas;

b) Confissão da participação do agente delator;

c) Presença do elemento subjetivo: voluntariedade ou espontaneidade

em conformidade com o exigido em cada Lei de crime específico;

d) Eficácia da colaboração.

Agora, analisemos então os requisitos constantes no Artigo 41 da Lei

11.343/06 que na ótica de Ricardo Antonio Andreucci, diz que:

A redução da pena em razão da delação, entretanto, se subordina ao cumprimento dos seguintes requisitos: a) Colaboração voluntária do indiciado ou acusado; b) Identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime; c) Recuperação total ou parcial do produto do crime. (ANDREUCCI, 2007, p. 82).

Majoritária é a doutrina ao entender que todos os requisitos deverão ser

preenchidos para que o agente delator faça jus à concessão do benefício.

Neste sentido explica Diogo Willian Likes Pastre:

Destarte, para que o acordo de delação premiada seja proposto, o delator deve preencher todos os requisitos intrínsecos na legislação correspondente ao delito cometido, devendo confessar a autoria do delito e apresentar informações cruciais para o deslinde das investigações. È pacífico nos Tribunais pátrios, que para ser concedida a delação premiada o co-réu delator deve preencher todos os requisitos contidos na legislação correspondente ao fato a ele imputado(...) (PASTRE, 2008, p. 65-73).

A fim de demonstrar a necessidade de cumprimento de todos os requisitos

exigidos para concessão do benefício, cumpre colacionar o voto do Ministro Relator

Dias Toffoli, proferido no julgamento de Habeas Corpus, no qual cita decisão

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proferida pela Corte do Superior Tribunal de Justiça no qual não se vislumbrou o

preenchimento do requisito da eficácia:

HABEAS CORPUS. CRIME DE TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES – ART. 33, C/C ART. 40, INC. I, DA LEI Nº 11.343/06. CONDENAÇÃO. DELAÇÃO PREMIADA – LEI Nº 9807/99. REDUÇÃO DE PENA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. Ademais, conforme ressaltou o eminente Ministro Jorge Mussi, do Superior Tribunal de Justiça, em seu voto, “as informações prestadas pelo paciente não foram eficazes na indicação e localização dos demais integrantes da suposta organização criminosa, tendo o Tribunal a quo entendido que'(...) opera a lei com conceitos de efetividade ('tenha colabora[ção] efetiva') e também alude expressamente aos resultados da colaboração na identificação dos demais co-autores ou partícipes', ressaltando que'(...) não houve 'identificação' de demais agentes e o quer se verifica é a citação de terceiros desconhecidos que não vieram a ser localizados' (fls. 71). Além disso, o Juízo Singular menciona que 'o depoimento do réu indicando terceiro desconhecido e que não foi localizado não pode ser caracterizado como delação premiada, porquanto não foi eficaz no combate à organização criminosa' (fls. 29)” (fls. 10/11). Habeas Corpus nº 101.436 – São Paulo. Relator Ministro Dias Toffoli.

Ante o exposto, conclui-se que o instituto possui requisitos gerais a serem

atingidos bem como os requisitos peculiares a cada lei em que estiver inserido o

crime, o que no caso da Lei 11.343/2006 deverão ser preenchidos os requisitos

elucidados acima.

4.4 PROCEDIMENTO

4.4.1 Momento e delação premiada após o trânsito em julgado da sentença

As Leis em geral que trata da possibilidade de incidência do instituto em

comento não diz expressamente qual é o momento para a ocorrência da delação. A

Lei 11.343/2006 em sua parte final fala sobre “no caso de condenação” o que leva

alguns autores a pensar que a delação deveria ocorrer antes da sentença criminal

condenatória de 1º grau.

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Nesse entendimento, há quem afirme que a delação deve se dar na fase de

investigação policial ou durante o processo criminal, até que a sentença de 1º grau

seja prolatada. (BOMFIM; BOMFIM. 2005, p. 63).

Analisando a possibilidade de a delação ocorrer na fase da execução penal

Renato Marcão faz crítica quanto ao momento em que deverá se dar o referido

instituto:

Em consequência, muitos delatores acabam colaborando com as investigações e depois não recebem os benefícios inicialmente apresentados na barganha que envolve a pretensão punitiva, a revelar, mais uma vez, condenável violação ética patrocinada pelo Estado; verdadeiro estelionato. De tal situação, também decorre a necessidade de se pensar sobre a incidência dos efeitos da delação em sede de execução penal. (MARCÃO, 2005. p. 161).

Contrário a este entendimento, Américo Bedê Freire Júnior diz que:

Inicialmente é de se frisar pelo cabimento dos benefícios da delação premiada inclusive durante o processo de execução. Tal afirmação decorre da interpretação teleológica das normas instituidoras da delação premiada, afinal o objetivo precípuo do benefício para o Estado subsiste após a condenação do delator. Ademais, não tendo o legislador expressamente proibido a delação premiada na fase de execução, não caberia ao intérprete reduzir o alcance e eficácia do instituto. Sustento, então, que o meio processual adequado para o reconhecimento da delação premiada na fase de execução é simples petição para o juiz da vara de execuções penais, a semelhança dos demais incidentes na execução, bem como da aplicação de lei nova mais benigna, que em razão de se tratarem de institutos supervenientes não são tratados por revisão. (FREIRE JÚNIOR, 2006, p. 235-236).

Acerca do momento, Néfi Cordeiro se vale da regra da utilidade:

Não se faz, ainda, diferenciação acerca do momento da delação. Pode a delação dar-se em qualquer etapa da persecução criminal, dosado seu cabimento pela direta regra da utilidade: enquanto útil e aproveitada a delação ao resultado de eficácia típico, incidirá o favor legal, independente de autorização expressa para o ato em específica fase processual. (CORDEIRO, 2010, p. 19).

No entanto, a Lei 11.343/06 não expressa oposição no caso da ocorrência

de a delação vir a ser após a sentença de 1º grau.

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Parte da doutrina entende que a Lei não estabelece limite temporal podendo

a delação se dar a qualquer momento. Compartilham deste entendimento Luiz Flávio

Gomes e Raúl Cervini conforme segue:

A lei não estabeleceu qualquer limite temporal, logo, sempre será possível, mesmo após o trânsito em julgado da condenação (hipótese em que criar-se ia um incidente na Vara de Execuções Penais para aplicação do benefício legal. (GOMES; CERVINI. 1995, p. 135).

No mesmo sentido, leciona detalhadamente Damásio de Jesus:

A análise dos dispositivos referentes à delação premiada indica, em uma primeira análise, que o benefício somente poderia ser aplicado até a fase da sentença. Não se pode excluir, todavia, a possibilidade de concessão do prêmio após o trânsito em julgado, mediante revisão criminal. Uma das hipóteses de rescisão de coisa julgada no crime é a descoberta de nova prova de “inocência do condenado ou de circunstâncias que determine ou autorize diminuição especial de pena” (art. 621, III, do CPP). Parece-nos sustentável, portanto, que uma colaboração posterior ao trânsito em julgado seja beneficiada com os prêmios relativos à delação premiada. O argumento de que não seria cabível em fase de execução, por ser o momento da concessão dos benefícios (redução de pena, regime penitenciário brando, substituição de prisão por pena alternativa ou extinção da punibilidade) da sentença não nos convence. O art. 621 do CPP autoriza explicitamente desde a redução da pena até a absolvição do réu em sede de revisão criminal, de modo que este também deve ser considerado um dos momentos adequados para exame de benefícios aos autores de crimes, inclusive em relação ao instituto ora analisado. Exigir-se-á, evidentemente, o preenchimento de todos os requisitos legais, inclusive o de que o ato se refira à delação dos co-autores ou partícipes do(s) crime(s) objeto da sentença rescindenda. Será preciso, ademais, que esses concorrentes não tenham sido absolvidos definitivamente no processo originário, ma vez que, nessa hipótese, formada a coisa julgada material, a colaboração, ainda que sincera, jamais seria eficaz, diante da impossibilidade de revisão criminal pro societate. (JESUS, 2006, p. 10).

Segue com o mesmo entendimento Renata Jardim da Cunha Rieger:

Nos dispositivos legais, não há qualquer determinação quanto ao momento processual adequado para a concessão do benefício. Assim, parece-nos que a delação pode ser oferecida em qualquer fase da persecutio, sendo possível até mesmo depois do trânsito em julgado da sentença condenatória, estando ou não o condenado submetido à execução penal. Nesta situação, discute-se, na doutrina, se o meio adequado para o seu reconhecimento é a revisão criminal ou simples petição ao juiz da execução. Esta, por ser mais célere, parece o meio mais adequado. (RIEGER, 2008, p. 09-10).

Referindo-se diretamente ao Artigo 41 da Lei 11.343/06, Ricardo Antonio

Andreucci expõe de forma breve seu entendimento:

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Trouxe a nova lei, nesse artigo, a figura da delação premiada, em que o agente colaborador tem sua pena reduzida quando possibilita a identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e a recuperação total ou parcela do produto do crime. A colaboração poderá ocorrer na fase de inquérito policial ou no curso do processo criminal. (ANDREUCCI, 2007, p. 82).

Em suma, mais coerente dizer que o instituto pode ocorrer em qualquer

momento já que a Lei nada dispõe em contrário.

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5 NATUREZA JURÍDICA E VALOR PROBATÓRIO

A natureza jurídica da delação premiada é de prova, mas de natureza

anômala, que não encontra semelhança com nenhuma outra prova nominada

(ARANHA, 1983, p. 73-74).

Também definindo a natureza do instituto como diversa, Frederico Valdez

Pereira distingue e justifica da seguinte forma:

Do ponto de vista técnico, é incorreto estender o tratamento jurídico do testemunho, da confissão, ou de qualquer outro meio de prova a esse tipo de declaração, sem cautelas prévias. Isso porque não se está diante de testemunho, qualificado como um terceiro alheio ao objeto do processo. Também não se está diante de confissão pura e simples; sua natureza jurídica é diversa, havendo imputação de fatos a terceiros. (PEREIRA, 2009, p. 487-488).

José Alexandre Marson Guidi diferencia também a delação premiada de a

delação propriamente dita bem como notitia criminis:

Nas duas primeiras formas (delação propriamente dita e notitia criminis), o delator e o informante não se acham envolvidos na prática do ilícito, porém, na delation criminis a delação é feita pelo próprio ofendido ou seu representante legal, e a notitia criminis deve ser levada a efeito por terceiros (populares, agentes públicos ou meios de comunicação), Por sua vez, na delação premiada, o delator ou colaborador, além de participar da prática do crime, tem interesse imediato em colaborar com as autoridades, para obter benefícios legais decorrentes. (GUIDI, 2006, p. 99).

Portanto, quanto à natureza jurídica, a delação premiada não é confissão,

testemunho, delação propriamente dita ou notitia criminis, haja vista as

características peculiares de cada um dos atos mencionados.

Para não pairar dúvidas de que a delação é meio de prova cumpre

colacionar o voto do Ministro Relator Ricardo Lewandowski, proferido no julgamento

de Habeas Corpus:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ACORDO DE COOPERAÇÃO. DELAÇÃO PREMIADA. DIREITO DE SABER QUAIS AUTORIDADES DE PARTICIPARAM DO ATO. ADMISSIBILIDADE.

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PARCIALIDADE DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. SUSPEITAS FUNDADAS. ORDEM DEFERIDA NA PARTE CONHECIDA. Para o que interessa ao deslinde da presente questão, a delação premiada constitui um meio de prova introduzido na legislação brasileira por inspiração do sistema anglo-saxão de justiça negociada. A delação premiada constitui, pois, elemento de prova, que, como tal, nas palavras de Amilton Bueno de Carvalho “está a exigir, para ter acolhida no sistema, requisitos que lhe são indispensáveis – condições de validade: um – deve ser coletada perante autoridade equidistante – no modelo vigente, o juiz. Ou seja, sujeito imparcial – aquele que não tem interesse na produção probatória.” Habeas Corpus nº 90.688-5 – PR. Relator Ministro Ricardo Lewandowski.

No que tange ao valor probatório do instituto, entende Frederico Valdez

Pereira que:

O legislador brasileiro não se preocupou em estabelecer nenhum regramento de ordem processual para a cooperação premiada, o que cria dificuldades e incertezas, principalmente na solução de questões de práxis como o procedimento a ser utilizado e a valoração dos elementos de provas trazidos aos autos pelo colaborador. (PEREIRA, 2009, p. 476).

Ainda expõe: Fundamental conclusão extraída da singularidade desse meio de prova é a necessidade de corroboração das informações advindas da colaboração premiada por outros elementos objetivos e externos ao instituto. Significa que, como meio de prova, a colaboração premiada não basta por si só. O que importa neste momento é deixar claro que a especificidade deste meio de prova faz com que o colaborador não possa ser obrigado a responder a todas as perguntas formuladas pela defesa, pois não estará compromissado a dizer a verdade no processo. Não se deve tomar o compromisso de dizer a verdade do delator, que não se confunde com testemunha, resultando que ele não estará obrigado a responder todas as perguntas da defesa. No entanto, reafirme-se que quanto mais o arrependido processual se calar, evitando as perguntas da defesa, maior terão que ser os elementos de corroboração exigidos para conferir eficácia probatória à colaboração premiada. A valoração das informações do arrependido é complexa, depende de dados de confirmação. (PEREIRA, 2009, p. 488-489).

E conclui:

(…) o magistrado deve apresentar fundamentadamente o seu convencimento em torno da credibilidade da declaração do arrependido processual; e, essa justificativa não pode estar limitada somente a aspectos internos da colaboração, deve estar acompanhada de menção a elementos objetivos exteriores à delação. Não é suficiente na garantia dos princípios constitucionais processuais afirmar que a acusação oriunda de co-autor é lógica, espontânea, constante, coerente, detalhada etc. È preciso a referência à mínima corroboração por dados concretos, externos e objetivos que embasem a confiança do relato. (PEREIRA, 2009, p. 496).

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Fazendo uma comparação do valor probatório da delação (não premiada)

com a delação premiada, ensina Damásio de Jesus no mesmo sentido do autor

anterior que:

O mesmo raciocínio deve ser aplicado à delação premiada: não se pode dar a ela valor probatório absoluto, ainda que produzida em juízo. È mister que esteja em consonância com as outras provas existentes nos autos para lastrear uma condenação, de modo a se extrair do conjunto a convicção necessária para a imposição de uma pena. (JESUS, 2006. p. 09).

Renata Jardim da Cunha Rieger, vem para confirmar os posicionamentos

explicitados em linhas pretéritas:

Inicialmente, cumpre referir que, em regra, os tribunais só admitem valor probatório à delação quando o réu, além de indicar seus comparsas, ainda confessa a sua participação. Afora isso, importa destacar que os julgados exigem que a delação venha confirmada por outras provas. Em outras palavras, só servirá para condenar o co-réu delatado quando encontrar compatibilidade e concordância com o quadro probatório, formando um todo coerente e encadeado, designativo de culpa. Não basta, isoladamente, para a condenação do co-réu delatado. (RIEGER, 2008, p. 08-10).

Desta forma, entende-se que a delação premiada é um meio de prova de

natureza anômala, ou diversa e sua validade de acordo com o bom senso, é aceita

desde que não utilizada isoladamente, mas sim corroborada por outros meios. Na lei

de drogas não seria diferente, já que o legislador nada especificou ou dispôs em

contrário aplicando-se assim o mesmo entendimento e a mesma regra geral.

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6 EFICÁCIA DA DELAÇÃO E FAVOR PROCESSUAL

Neste capítulo veremos que não basta haver a delação, mas esta deverá ser

eficaz atingindo os objetivos vislumbrados pelo Estado e por consequência o favor

processual. Assim, o quantum de redução da pena está diretamente vinculado a

eficácia ora mencionada.

Na ótica de Isaac Sabbá Guimarães, a eficácia da delação se dá da seguinte

forma:

Para resultar no benefício, entendemos nós devam os indícios conter um aspecto de verossimilhança. Ou seja, devem, pelo menos, ser indícios idôneos para o desencadeamento da ação penal pública. (GUIMARÃES, 2008, p. 151).

Confirmando a idéia de que para a concessão do benefício a delação deve

alcançar objetivos de eficácia, Diogo Willian Likes Pastre ao citar Renato Marcão,

explica:

Desta forma, o Ministério Público somente irá firmar acordos com indiciados em casos específicos previstos em lei, e este somente terá direito aos benefícios desde que os objetivos do acordo tenham sido alcançados, vale dizer, desde que se consume a prisão de um ou mais integrantes da organização criminosa delatada, ou a apreensão de produtos, drogas, valores que sejam produtos de crime, ou na libertação de seqüestrados. Partindo deste pressuposto, será agraciado com os benefícios da delação premiada, o acusado que, voluntariamente, confessar a sua participação no delito, indicando os seus co-autores, bem como, narrando de forma clara todo funcionamento da organização criminosa. (PASTRE, 2008, p. 67-74).

Neste sentido, convém citar o voto do Ministro Relator Ricardo

Lewandowski, proferido no julgamento do seguinte Habeas Corpus:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ACORDO DE COOPERAÇÃO. DELAÇÃO PREMIADA. DIREITO DE SABER QUAIS AUTORIDADES DE PARTICIPARAM DO ATO. ADMISSIBILIDADE. PARCIALIDADE DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. SUSPEITAS FUNDADAS. ORDEM DEFERIDA NA PARTE CONHECIDA. Nele, por força de lei, o delator compromete-se a colaborar “efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I - A Identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; II – a localização da vítima com a sua integridade física preservada; III – a recuperação total ou parcial do produto

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do crime” (art. 13 da Lei 9.807/99). Habeas Corpus nº 90.688-5 – PR. Relator Ministro Ricardo Lewandowski.

Extrai-se ainda dos ensinamentos de Renato Marcão:

Não seria razoável exigir que, para a redução de pena, o delator tivesse que contar com a comprovação de evento futuro e incerto, e sendo assim, para usufruir o benefício, basta que as informações apresentadas sejam aptas à elucidação do emaranhado criminoso investigado, com resultado exitoso em termos de tornar possível a responsabilização penal. (MARCÃO, 2005, p. 162).

Atrelando diretamente a eficácia ao prêmio, Frederico Valdez Pereira aclara:

(...) o colaborador terá que depor em juízo confirmando as suas declarações para ter direito ao grau de benefício mais elevado, alcançando até o perdão judicial. Caberá ao juiz, no caso concreto, aferir essas circunstâncias e a recusa do colaborador em responder, para extrair os efeitos daí advindos à força probante da delação e ao prêmio ao colaborador. (PEREIRA, 2009, p. 489).

Cumpre ainda colacionar parte do voto do Desembargador Relator Márcio

Antônio Rocha, proferido no julgamento da Apelação Criminal de n° 5001673-

85.2010.404.7002/PR:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ARMAS E MUNIÇÕES. USO RESTRITO OU PROIBIDO. ARTIGOS 18 E 19 DA LEI Nº 10.826/2003. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. RECONHECIMENTO. DELAÇÃO PREMIADA. INOCORRÊNCIA DE REQUISITOS. CONCURSO FORMAL. O réu, em suas razões recursais, requer também a redução da pena nos termos do artigo 41 da Lei nº 11.343, de 2006: "Art. 41. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços." Quanto a esse benefício, o Juízo sentenciante entendeu não estar configurado nos termos da legislação, na medida que o réu apenas mencionou um nome de um suposto fornecedor da droga, afirmando em juízo que recebeu o veículo carregado com a droga de uma pessoa chamada Silmar Antônio, sem nenhum outro elemento probatório. De fato, as informações trazidas pelo réu foram superficiais, não fornecendo à investigação quaisquer subsídios que levassem à incriminação de outros criminosos, não fazendo jus ao benefício do artigo 41 da Lei nº 22.343/2006. Assim, improcedente a apelação neste tópico. Apelação Criminal nº 5001673-85.2010.404.7002/PR. Relator, Desembargador Federal Márcio Antônio Rocha.

Referindo ao Artigo 41 da Lei 11.343/06, na concepção de Ricardo Antonio

Andreucci, a delação atinge sua finalidade quando “(…) o agente colaborador tem

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sua pena reduzida quando possibilita a identificação dos demais co-autores ou

partícipes do crime e a recuperação total ou parcial do produto do crime.”

(ANDREUCCI, 2007, p. 82).

O mesmo autor, ainda faz menção ao favor processual da lei atual em face

da revogada Lei 10.409/2002:

Ressalte-se que o dispositivo não permite o perdão judicial, como fazia o art. 32, §3º, da Lei n. 10.409/2002, mas tão somente a redução da pena, em caso de condenação, de um terço a dois terços. (ANDREUCCI, 2007, p. 82).

Acerca da mesma Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006), Néfi Cordeiro nos

ensina:

Nos resultados de eficácia da delação exige-se a identificação dos integrantes e a recuperação do produto do crime (total ou parcial). Não existindo várias hipóteses de resultados, mas apenas dois sendo indicados, e sendo contatado o claro intento de restrição ao benefício na nova lei de drogas, parece que também aqui se realizou proposital limitação, através da partícula aditiva e, a exigir, pela primeira vez na delação premiada, duas frentes necessárias de resultado: na autoria e no produto do crime. Cabe aqui relembrar a observação feita quanto ao limite do possível; perdendo-se o produto do crime (gasto em bens consumidos, ou perdidos os bens por destruição de incêndios, desastres ou ação humana proposital), não há como deixar-se de conceder o favor legal à colaboração plena do confitente, que revela tudo sobre a autoria e o crime, e esclarece sobre o perecimento do produto do crime. O quantum de redução pela minorante merece ponderação pelos critérios estabelecidos como resultado de eficácia pelo legislador. Quanto mais completa a revelação, mais eficaz e amplos os resultados, mais se aproximará a redução de seu limite máximo; ao inverso, atingindo a delação o mínimo de resultado de eficácia, suficiente apenas para a concessão do benefício, tenderá a ponderação à redução menor da pena. (CORDEIRO, 2010. p. 15).

Em suma, volta-se a afirmar que o favor processual ocorrerá quando

preenchidos todos os requisitos.

Insta salientar que na lei atual e mais moderna, Lei 11.343/06, conforme já

mencionado anteriormente, não se admite o perdão judicial como previa a revogada

Lei de Tóxicos 10.409/2002, mas conforme expresso, somente a redução da pena

que varia de um a dois terços, entendendo grande parte da doutrina que esta

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variação do quantum da extensão do benefício é analisada de acordo com o grau de

eficácia e resultados obtidos com a delação consoante convencimento subjetivo do

Magistrado.

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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

É Notório que a existência do instituto da delação premiada no ordenamento

jurídico brasileiro não é recente, bem como, que este tem sido utilizado

cotidianamente no mundo dos operadores do Direito.

Acerca dos crimes envolvendo entorpecentes desde que previsto na

revogada Lei Antitóxico de 2002 o instituto tem sido invocado com freqüência.

Embora, venha carregado de defesas e críticas plausíveis, sendo a última o

entendimento majoritário até o presente momento, deve-se lembrar que o instituto se

vê amparado em lei, cada vez mais presente no ordenamento jurídico pátrio, o qual

o delator preenchendo os requisitos que configure a delação bem como sua eficácia

conforme exigido por cada Lei que o prevê, obriga o Magistrado a aplicar o benefício

cumprindo com a parcela do estado no “acordo” firmado.

Mesmo não havendo um único dispositivo legal versando sobre o assunto, a

Lei de Drogas de 2006 é específica no que diz aos requisitos, eficácia e benefício

decorrentes da delação premiada. Ainda, não paira dúvidas quanto ao seu valor

probatório.

Mister se faz ressaltar, de que, independentemente de como se conceitua ou

se denomina o instituto pelos doutrinadores (delação, colaboração, co-participação,

etc), ou ainda, a forma que o legislador o conceituou no texto legal, a utilização do

mesmo possui um único escopo que é:

Para o Estado, o importante é atingir uma maior eficácia nas investigações

obtendo êxito acerca do conhecimento das quadrilhas, bandos ou organizações

criminosas que atuam em prejuízo da justiça e paz social, permitir uma melhora na

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prova no processo penal viabilizando condenações que seriam até então

impossíveis ou muito pouco prováveis;

Enquanto para os delatores, estes têm como pretensão primordial o

benefício da redução de suas penas.

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