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ANAIS NESTLÉ VOLUME 50 1995 Deficiência Auditiva na Infância NESTLÉ NUTRITION SERVICES

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ANAIS NESTLÉVOLUME 50 1995

Deficiência Auditivana Infância

NESTLÉ NUTRITION SERVICES

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Revista editada por um Comitê Internacional de Pediatrase publicada por Nestlé Indl. e Coml. Ltda.

Endereço para correspondência:Av. das Nações Unidas, 12.495

CEP 04578-902, São Paulo, Brasil

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ANAIS NESTLÉ

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Deficiência Auditivana Infância

NESTLÉ NUTRITION SERVICES

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©1994 NESTEC Ltd., avenue Nestlé 55, CH-1800 Vevey, Suíça

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, armazenada em memóriaou transmitida seja qual for o meio utilizado (eletrônico, mecânico, por fotocópia ou outro qualquer) sem aautorização escrita do editor.

O material contido nesta publicação foi aceito na qualidade de inédito, exceto nos casos em que existemcréditos para a fonte da qual uma parte do material ilustrado se origina. A Nestec Ltd. e a Nestlé Indl. e Coml.Ltda. tiveram o cuidado de manter a exatidão da informação contida nessas publicações. Todavia, a NestecLtd. e a Nestlé Coml. e Indl. Ltda. não serão responsáveis por erros cometidos ou por omissões que possamadvir da utilização da informação aqui contida ou por quaisquer conseqüências decorrentes de sua utilização.

Citado na Excerpta-MedicaISSN 0168-213æ

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Índice

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EDITORIAL

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ARTIGOS ORIGINAISO desenvolvimento da comunicação de crianças surdas e a linguagem dos sinais,J. G. Kyle e B.Woll ............................................................................................................................... 1

As deficiências auditivas na infância - epidemiologia e etiologia,Agnette Parving .................................................................................................................................... 13

Triagem e tratamento da surdez na prática clínica,Sam M.Tucker ....................................................................................................................................... 18

RESUMOS DE ARTIGOS SELECIONADOS NA LITERATURA RECENTESOBRE A SURDEZ NA CRIANÇA

Emissões otoacústicas evocadas ............................................................................................................. 25

Prevenção para a surdez adquirida ......................................................................................................... 26

Diagnóstico da surdez na criança ........................................................................................................... 26

Tratamento médico dos problemas do ouvido médio ............................................................................ 28

Tratamento cirúrgico .............................................................................................................................. 29

Implantes cocleares ................................................................................................................................. 31

Auxílios para audição ............................................................................................................................. 31

Perda de audição unilateral ..................................................................................................................... 32

Aspectos educacionais ............................................................................................................................ 32

Aspectos psicológicos ............................................................................................................................. 35

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iv Anais Nestlé 1995;50:iv

Editorial

A instalação de uma rede internacional de correio eletrônico e de fax assinala um aumento no grau deimportância atribuído pela sociedade às comunicações instantâneas. Enquanto essas representações visuaistalvez substituam parcialmente o meio acústico do telefone, ainda dependem fundamentalmente doestabelecimento da linguagem no sentido mais amplo. Esta linguagem desenvolve-se e nutre-se a partir doinício da vida pós-natal e ao longo de toda a infância mas seu desenvolvimento depende, naturalmente, dacapacidade de ouvir da criança.

Este número dos Anais Nestlé contém três artigos definitivos e uma revisão detalhada da literatura recente,cobrindo os aspectos essenciais dos problemas associados à surdez na criança. Os assuntos tratados abrangemdesde as bases teóricas da aquisição da linguagem às possibilidades de intervenção no lactente e criança quesofrem de surdez grave, passando pela epidemiologia das deficiências auditivas e os meios de sua detecção.Trata-se tanto de linhas gerais para o clínico pediátrico na sua prática quotidiana quanto um desafio para ouniversitário e para os responsáveis pela saúde preocupados com o provável impacto da pesquisa e doprogresso clínico no campo dos distúrbios precoces da comunicação. Oferece-se assim a possibilidade de umavisão das complexidades e sutilezas lingüísticas do idioma e dos sinais; dos limites práticos e das vantagensdos aparelhos para a surdez e dos implantes cocleares; os problemas logísticos envolvidos na triagem em massada surdez congênita ou precocemente adquirida no curso da vida pós-natal.

Enquanto nos esforçamos para compreender as etiologias e trabalhamos no sentido de uma prevenção dasurdez na criança, devemos também fazer o possível para nelas desenvolver aptidões relativas à linguageme comunicação de tal modo que, seja qual for a modalidade, tenham condições de ingressar na sociedadecompetitiva do próximo século em condições de igualdade no tocante à comunicação.

Comitê Editorial dos Anais Nestlé

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Anais Nestlé 1995;50:1-12 1

Introdução

Houve um tempo em que se pensava que a perda daaudição significava a perda da linguagem e tambémque ao perderem a audição as crianças perdiam todaa capacidade de falar já adquirida. Acreditava-se queas crianças nascidas surdas nunca desenvolveriam alinguagem sem um intenso treinamento logopédico.Também se pensava que sem a fala seríamos subu-manos e assim, a criança surda corria o risco deafundar num estado desumano de gestos e mímica.Tais idéias, embora de tom vitoriano, prevaleciam nametade do século XX e somente nos últimos 20 anostornou-se evidente que a história toda era maiscomplexa do que nos faziam acreditar as opiniões depedagogos e médicos. Uma vez coligidos os fatosrelativos à linguagem dos sinais empregada pelaspessoas surdas (1) deparamo-nos com uma linguagemrica e complexa que existe na comunidade de surdoshá muitas centenas de anos [2] e que continua a sedesenvolver nas escolas para surdos e nos seus lares,independentemente do tratamento eventualmente emvigor [3].

É verdade que os avanços da medicina hojepermitem determinar, com segurança, não só apresença mas o grau da perda, podendo-se demonstraros benefícios dos aparelhos para a surdez nosportadores de deficiência parcial quando a perda édetectada precocemente. Simultaneamente, todavia,para as crianças com surdez absoluta e para os casosconstatados depois do primeiro ano precisamosdescobrir como se processa o desenvolvimento dalinguagem. Nessa crianças a linguagem talvez sedesenvolva de modo diferente mesmo quando hácontato estreito com pessoas que ouvem e falamnormalmente. Neste artigo, será explorada nossa

compreensão da linguagem dos sinais e debatidos odesenvolvimento, a aquisição da linguagem e educa-ção da criança surda.

A linguagem: quadro teórico

Modificações radicais ocorreram na abordagem àlinguagem da criança. De certa forma estas modifica-ções são o resultado do desenvolvimento em outrasáreas de pesquisa, principalmente em psicologia elingüística. Na verdade, nenhuma abordagem, isola-damente, ofereceu até agora uma visão completa dodesenvolvimento da criança. O leitor poderá consul-tar, a esse respeito, excelentes revisões gerais [4,5].

Well [6] sugere uma classificação determinadapelas características da linguagem que estiver sendoestudada ou seja, sintaxe, semântica, pragmática ediscurso. Assim fundamentado elaborou uma abor-dagem ainda mais aprofundada que se cruza com asua própria classificação inicial e que recorre, parti-cularmente, a seus dois últimos elementos: ele sugereque a linguagem existe e se desenvolve na conversa-ção. A conversação é significativa, pois permite quea criança tome a iniciativa, cabendo ao interlocutorapoiar e expandir o acesso da criança à linguagem.Somente quando esta conversação tiver êxito, assina-la Well, é que a criança será capaz de reagir àstentativas de seu interlocutor no sentido de expandiro assunto ou de introduzir material novo.

Em todas essas abordagens, o que era um estudode como as crianças adquirem a linguagem do adultotransformou-se no estudo da linguagem da própriacriança - uma importante mudança de enfoque em setratando do estudo de crianças surdas. O modo emque a criança constrói a elocução e utiliza as interações

O desenvolvimento da comunicação de criançassurdas com a linguagem dos sinais

J. G. Kyle e B. WollCentre for Deaf Studies, University of Bristol,

22 Berkeley SquareBristol BS8 1HP, Reino Unido

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torna-se mais importante do que a exatidão gramati-cal ou a precisão do vocabulário. Por outro lado,tornou-se evidente que a linguagem de quem cuida dacriança modifica-se segundo o nível de competênciada própria criança. A “fala de bebê”, utilizada pelamãe, estende-se bem além do primeiro ano graças àsvariadas estratégias de que ela se vale para manter ofluxo da conversação.

Segundo Wells [6], esta imagem completa dodesenvolvimento, abrangendo desde as conversa-ções pré-lingüísticas à interação lingüística é umprocesso contínuo de crescimento com certas carac-terísticas interligadas: “Primeiramente, o adulto deveinterpretar a contribuição da criança em função docontexto imediato e do objeto de interesse comum;em seguida, a fim de otimizar a compreensão, acontribuição do próprio adulto deve relacionar-seintimamente com a comunicação precedente da crian-ça e com seu interesse do momento. Finalmente,embora adaptadas ao ritmo, forma e conteúdo dascapacidades receptivas da criança, estas contribui-ções adultas também devem a ela fornecer os meiosde ampliar seus recursos lingüísticos e através deles,a compreensão do conteúdo da comunicação”.

Estas características e o padrão proposto de desen-volvimento têm orientado a pesquisa atual na área dasurdez. Interessamo-nos, particularmente, pelo modoem que as crianças surdas se deslocam da proto-conversação “pré-lingüística” para as interaçõesamplas, comparáveis às de pessoas que falam eouvem. A linguagem utilizada pela mãe altera-se àmedida que a criança progride, valendo-se, em suacomunicação, tanto do gestual quanto dos sinais.Para descrever este processo adequadamente neces-sitamos de noções suplementares sobre as interaçõesque nessa fase ocorrem na linguagem falada e portan-to, sobre os elementos que uma criança surda precisanela substituir para se comunicar.

Interação pré-verbal

Papousek e Bornstein [7] afirmam que existe “umaíntima relação entre a comunicação pré-verbal e odesenvolvimento da integração do bebê” e descre-vem a díade genitor-criança como “um sistema didá-tico por excelência”. Asseveram que os pais provêemformas básicas de interação que conduzem a criançade uma fase de “insuficiente controle da respiração”à formação das palavras. Também afirmam que essainteração tem natureza didática, embora praticamen-

te inconsciente no adulto e de caráter universal. Oelemento didático associa-se às capacidades deintegração que fazem parte da fase precoce do cres-cimento da criança. Tarter [8] enumera o choro, osarrulhos, os balbucios e a verdadeira fala comoelementos de uma série, associados a este período.No tocante à percepção, aos seis meses o bebê “... temaptidões aplicáveis à identificação do interlocutor, aoreconhecimento supra-segmental do idioma, à imita-ção das expressões faciais e da fala, além de reconhe-cer a correspondência entre os movimentos dos lábi-os e a palavra”. Na verdade, já nos deparamos comum participante sofisticado muito antes da fase emque normalmente começa a maioria dos estudossobre a fala da criança. Uma análise detalhada dosdados [9] identifica os variados contornos melódicospré-verbais das manifestações vocais da criança eindica como as respostas da mãe, fazendo-lhes eco emodelando-as, fornecem à criança informações críti-cas importantes para “... a regulação de seu estadovígil e a atenção; controle sobre a atitude visual, faciale vocal e prática na alternância dos papéis, nos jogose na imitação.”

Trevarthen e Marwick [10], no tocante à motivaçãopara a linguagem, consideram como inato este proces-so precoce. “Os bebês evidentemente nascem compercepções e maneiras de se mover especificamentepré-adaptadas para serem parte da linguagem. Sãoestas percepções e movimentos coordenados que con-sideramos como a principal prova direta da motivaçãopara a comunicação por parte da criança pequena.”

Esta motivação para a comunicação é fundamen-tal para o desenvolvimento da linguagem. Trevarthene Marwick [10] mostram o âmbito de capacidadesque até mesmo o recém-nascido emprega na convi-vência com outros. Os bebês talvez tenham aptidõesinatas para a fala e a percepção visual e seguramentedemonstram expressão facial num todo que poste-riormente será significativo na comunicação adulta.Com relação à atividade manual neste período quecompreende as cinco primeiras semanas o bebê jáexibe uma preensão primitiva coordenada com apercepção. Depois disso a criança ingressa numperíodo de intersubjetividade primária em que obje-tos e acontecimentos podem ser partilhados e jogos eriscos são apreciados. Existem argumentos que sus-tentam esta opinião sobre a importância da maisprecoce interação e mesmo, se não aceitarmos a tese

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de Chomsky sobre a existência de um recurso inatopara a aquisição da linguagem, Trevarthen defendeconvictamente a existência de uma motivação para ainteração, já presente no recém-nascido [11].

A partir da sensibilidade à expressão facial e àemoção a criança produz uma “forma de contatohumano” na intersubjetividade primária [12]. Essen-cialmente, trata-se de um mecanismo social queexiste antes de qualquer desenvolvimento lingüísticoou cognitivo. Sua descoberta focalizou a atençãosobre a conversação sem a palavra e sobre essaalternância precoce de intervenções. Bateson [13]falava de uma protoconversação. Bruner [14] tam-bém indicou a importância desse desenvolvimento nacriança. Collis [15], todavia, fez uma advertênciacontra interpretarem-se todas as alternâncias no rela-cionamento mãe-criança como intervenções alterna-das e Kaye [12] sustenta que a “interação” desenvol-ve-se graças à rica interpretação do desempenho dobebê pela mãe. Há concordância sobre estarem osfundamentos da linguagem nessas interações, sendoclaro que uma grande parte delas encontra-se no uso,pela mãe, da “fala de bebê”. Nossa pergunta é aseguinte: “O que acontece quando o bebê não percebeesta “fala” por causa de surdez ou, no caso de mãessurdas, porque não é usada”?

Além da motivação para a comunicação

Golinkoff e Gordon [17] consideram vital a sugestãode Chomsky sobre a existência na criança de umaprogramação biológica destinada a desenvolver apti-dões para a linguagem. Segundo essa visão a criançaage no mundo circunstante com o apoio de ummecanismo de aquisição que lhe permite encontrarum sentido em dados lingüísticos “inadequados” eassim formar a base de um sistema de linguagem.Com a adição de um conceito de período crítico [18]o estabelecimento de uma seqüência ordenada para aaquisição da linguagem parecia quase alcançada.

A observação de que o aporte no adulto é maisestruturado do que afirmava Chomsky e que as ma-nifestações vocais precoces da criança não refletemclaramente o modelo gramatical por ele proposto noqual o sentido da sentença se encontra no contexto,trouxe à tona as teorias semânticas e cognitivas. Nomodelo cognitivo o desenvolvimento cognitivo dacriança é um prognóstico do nível de comunicaçãoalcançado, afirmando-se que a competência cognitiva

leva diretamente à expressão da linguagem. Emboraesta abordagem se mantenha como uma das princi-pais teorias, foi de certa forma relegada a um segundoplano pelo interesse que despertou a significaçãopartilhada da interação mãe-criança. A exploração dapragmática como um meio de compreender a aquisi-ção conduziu à consciência da inextricável associa-ção entre a transmissão da cultura e conhecimentossociais e a partilha do significado entre responsável ecriança. Neste sistema, a força de locução de umaexpressão vocal é mais relevante para nossa com-preensão de como a interação é explorada pelosparticipantes para criar situações didáticas significa-tivas do que a extensão da expressão em si. A partirdessa perspectiva tornaram-se importantes as constan-tes modificações no modo de interagir da mãe e isto,por sua vez, despertou o interesse sobre as maneirasusadas pela mãe para se dirigir à criança. Formas comoa “fala de bebê” e a crescente complexidade e extensãodo aporte lingüístico do responsável para se adequar aonível da criança confirmam elementos ambientais einteracionais no processo de desenvolvimento.

A transição da pré-linguagem para a linguagem

Ao abrir o debate sobre a transição Golinkoff eGordon [17] afirmaram que “o enigma do período detransição da pré-linguagem para a linguagem temdois aspectos: o primeiro refere-se à natureza dodesenvolvimento da comunicação nesse período e osegundo à relação entre modificações nas aptidõespara a comunicação que ocorrem nesse momentocom o início da linguagem e a rapidez de seu desen-volvimento”. Identificam dificuldades, confusões epotencial nessa área, abordando a comunicação, asmodificações, o estabelecimento inicial da lingua-gem e seu desenvolvimento. O primeiro problema,naturalmente, está em decidir o que poderia ser operíodo de transição. Por um lado, é óbvio que acriança pode comunicar-se sem produzir linguagemfalada e numa fase mais tardia poderá comunicar-seproduzindo a linguagem falada; por outro lado, seestudarmos a linguagem falada da mãe ou se conside-rarmos as palavras faladas como as únicas de valorcorrente, a transição será a passagem da criança donão verbal para o verbal. A questão da descontinuidadepode não surgir quando a abordagem é a comunica-ção enquanto na abordagem lingüística a descon-tinuidade existe por definição.

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O desenvolvimento da comunicação de crianças surdas com a linguagem dos sinais

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A dimensão transcultural

Exatamente quando chegamos às conclusões finaissobre os papéis decisivos dos fatores sociais e cognitivosno desenvolvimento da linguagem da criança desco-brimos que não são universais. Pesquisadores têmencontrado problemas ao extrapolarem as conclu-sões de uma cultura para outra, evidenciando que opadrão da real emergência da linguagem pode serdiferente em diferentes comunidades do mundo.Podemos mostrar que mães ocidentalizadas, de clas-se média, tendem a atribuir intenção comunicativa acomportamentos pré-verbais e a encorajar a interaçãodesde os dias mais precoces. Todavia, esta condutaaparentemente “normal” nada tem de universal. Naverdade, existem amplas variações nos costumesrelativos à educação da criança [20]. Para Schieffeline Ochs [21] “a cultura não pode ser dissociada dascircunstâncias da interação entre responsável e crian-ça; é ela que organiza e confere significado a essainteração.”

Se tentarmos reunir as idéias principais destecapítulo, veremos que prevalece a tentativa de com-preender a interação entre criança e responsável. Nãosó é este um aspecto do contato baseado na fala maspode-se demonstrar sua presença muito antes que acriança seja capaz de produzir fala inteligível. Em certamedida constata-se que as mães utilizam a vocalizaçãoanterior à fala em padrões específicos para manter eampliar a proto-conversação da criança. No entanto,também é evidente que a interação precoce dependesubstancialmente do rosto e a preocupação da crian-ça, depois de alguns poucos meses é de explorar oespaço visual do mundo em que vive. Atenção,melhor dizendo, atenção dividida se faz necessáriapara que as referências se estabeleçam. Todas essasidéias apontam para uma conclusão: o desenvolvimen-to da linguagem de crianças surdas requer, como pré-requisito, o desenvolvimento de aptidões cognitivas;exposição a modelos de linguagem adulta e experiên-cias apropriadas de interação. Em todas as áreas, ascrianças surdas talvez requeiram uma abordagem di-ferente da usada com tanto sucesso (e sem planeja-mento consciente) pelos responsáveis por criançasque ouvem.

A linguagem dos sinais britânica e a comunidadede surdos

Antes de examinar a aquisição da linguagem dossinais é conveniente nos afastarmos um pouco paraconsiderar a questão da comunidade dos surdos, suacultura e sua linguagem. Tratando-se de uma lingua-gem que foi tão pouco pesquisada é de algumaimportância considerar suas raízes históricas, a situa-ção educacional dos que a utilizam e a descrição quedela fazem os lingüistas.

Entre os trabalhos de Tylor [22] e os de Stokoe[23] houve pouco interesse sério com a linguagemdos sinais. Os educadores, o principal grupo envolvi-do com as pessoas surdas, relutavam em utilizar ossinais e muitas vezes, em muitos países, tentaramerradicar a linguagem dos sinais por considerá-lauma forma mais baixa de comunicação do que alinguagem falada. Juntamente com este desprezoeducacional havia a indiferença social que originava-se, pelo menos parcialmente, na própria utilização dalinguagem dos sinais que seria, segundo opiniãogeneralizada, o maior problema das pessoas surdas.A linguagem dos sinais estigmatizava os surdos e eraa prova direta de seu insucesso em dominar umalinguagem “apropriada”. Os surdos eram vistos comopessoas deficientes e necessitadas de cuidados. Cui-dar de pessoas surdas significava tolerar sua forma decomunicação da qual se dizia que era concreta elimitadora. Na Grã-Bretanha de 1970 e início de 1980os assistentes sociais referiam-se às pessoas surdascomo “verbais retardados” caso usassem a lingua-gem dos sinais [24]. A concordância de opiniõesindicava a atmosfera na qual a Linguagem Britânicados Sinais sobreviveu desde sua primeira descriçãoem 1644 por Bulwer.

A linguagem

A Linguagem Britânica dos Sinais (LBS) é a lingua-gem escolhida pela comunidade de surdos na Grã-Bretanha de hoje. A LBS não é uma linguagemartificial inventada por educadores mas uma lingua-gem totalmente independente com sua própria gra-mática e vocabulário sem relação com o Inglês.Apesar de se ter desenvolvido num modo visual, nãose trata de uma linguagem icônica, baseada em ima-gens. A estrutura Britânica dos Sinais foi descrita emartigos recentes [25-27].

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Os sinais da LBS podem ser analisadas de modosemelhante às palavras do inglês falado. Isto significaque poderemos identificar as partes componentes dossinais e utilizá-las para descrever os próprios sinais.Foram consideradas, inicialmente, como um conjun-to de posições, formas, movimentos e orientações dasmãos mas a execução de um projeto [28] para aLinguagem Americana dos Sinais nos está conduzindoà identificação dos componentes seqüenciais que com-põem o sinal. Tais componentes seqüenciais (quepodem ser comparados à estrutura silábica das pala-vras) configuram uma nova organização cuja análisedeverá fornecer elementos a serem amplamente apli-cados à fonologia da LBS. Todavia, os sinais da LBSpode ser tratados, a partir de agora, de modo semelhan-te às palavras de uma língua falada [27].

A LBS é uma linguagem com muitas flexões(contrariamente ao Inglês) que são utilizadas nasmodificações da estrutura interna do sinal para criarsignificados sintáticos. Ainda mais interessante é ariqueza dos verbos da LBS na sua maneira de expri-mir a situação, o papel, o aspecto e o modo da ação.O inglês usa frases com advérbios ou adjetivos paraexprimir a mesma coisa. Somente na utilização dostempos do verbo o Inglês para mais complexo. Mes-mo a estrutura dos substantivos, na LBS, difereradicalmente da representação visual concreta quepoderíamos imaginar. As diferenças específicas en-tre a LBS e o inglês provocaram comentários iniciaissugerindo que a LBS tivesse vocabulário e gramáticalimitados. O estudo da aquisição de uma linguagemna qual as unidades são morfologicamente tão com-plexas suscita muitos problemas para o pesquisador,dentre os quais alguns que ainda não conseguimosresolver totalmente.

Os substantivos sofrem flexão na LBS diferente-mente dos substantivos em inglês (cuja única flexãoestá no número e na possessão) incorporando infor-mações sobre tamanho, forma, localização, número,possessão e modo. Esta complexidade faz com que asprimeiras tentativas das crianças surdas com a lingua-gem dos sinais seja muito difícil de descrever. Alémdisso, a associação entre sinal e gesto de um lado e apassagem do gesto ao sinal de outro, aumentam aindamais a dificuldade.

As linguagens dos sinais desenvolveram-se se-paradamente em todos os países do mundo. A Lin-guagem Americana dos Sinais é bastante diferenteda Linguagem Britânica apesar da língua faladacomum nos dois países. Uma pessoa inglesa surda

não compreenderia a conversa por sinais de doisamericanos, e vice-versa. Portanto, a LBS é umalíngua única que é usada pelos surdos do ReinoUnido. Trata-se de uma linguagem governada porregras complexas que difere acentuadamente do in-glês. Um estudo comparativo de outras linguagens desinais permite-nos constatar as semelhanças e asdiferenças.

A comunidade dos surdos que empregam a LBS

A própria surdez é condição para associar-se à comu-nidade dos surdos mas, apesar de condição necessárianão é suficiente, por si. É preciso optar pela condiçãode associado e optar pela associação com outraspessoas surdas. O grau de participação varia enorme-mente e enquanto alguns surdos freqüentam o clubequase diariamente outros que são membros ativos dacomunidade, raramente comparecem.

A Comunidade Britânica de Surdos tem sido des-crita em numerosos estudos [26,29,30]. Todavia, umaspecto importante que deve ser mencionado é ohábito de escolherem seus parceiros para o casamen-to na comunidade de surdos, com as conseqüênciasevidentes para as crianças. Pessoas surdas muitoprovavelmente casarão com outros surdos. Em nossoestudo da comunidade de surdos de determinada áreaconstatamos que isso acontecia em mais de 90% doscasos [31]. No entanto, mais de 90% das criançasnascidas de pais surdos têm audição normal. Criançassurdas em famílias de surdos são relativamente raras.Se invertermos a estatística e perguntarmos quantasdas crianças da escola nasceram em famílias desurdos a cifra situa-se ao redor de 6% de famílias emque ambos os pais são surdos, aumentando para 10%se forem incluídas as famílias em que somente umdos pais é surdo. A maioria das crianças surdas nasceem famílias sem qualquer contato prévio com asurdez e onde a reação mais comum é de choque eincerteza para o futuro. Somente nas famílias desurdos o nascimento de uma criança surda é saudadacom orgulho e congratulações. Se considerarmos quenasce uma criança surda a cada 2000 nascimentos (acifra seria maior se abrangesse crianças com audiçãoparcial mas esta baseia-se conservadoramente na-quelas profundamente surdas) e crianças surdas nas-cem em famílias de surdos uma vez a cada 20 nasci-mentos, o nascimento de uma criança surda de paissurdos ocorrerá uma vez a cada 40.000 nascimentos.

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O desenvolvimento da comunicação de crianças surdas com a linguagem dos sinais

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Assim, a oportunidade de estudar crianças surdas emfamílias de surdos é uma perspectiva rara e extraor-dinária que oferece a oportunidade de acompanhar odesenvolvimento de uma linguagem “normal” numcontexto em que a linguagem preferida dos pais éadequada à comunicação preferida pela criança.

A aquisição da linguagem dos sinais

Assim como os lingüistas inicialmente examinamestruturas e funcionamento de uma língua e depoisempreendem os estudos sobre seu modo de aquisi-ção, o estudo sobre a aquisição da linguagem dossinais seguiu-se aos estudos descritivos. O desenvol-vimento da técnica de gravação em vídeo possibilitouo estudo da aquisição da linguagem dos sinais. Aindanão existe uma teoria formal sobre a linguagem dascrianças surdas mas existem muitos estudos interes-santes que se basearam em teorias sobre a aquisiçãoda linguagem falada. A aquisição poderá variar decriança para criança mas uma diferença significativapode ser observada entre a criança surda de paissurdos e a criança surda de pais com audição normal.

Referencial recíproco

Para Bruner, a referência é a essência da comunica-ção interpessoal e da ação. Sem a certeza de estaremsendo compreendidas a informação e intenção deuma mensagem lingüística por um nosso interlocutor,não pode haver aprendizado, cooperação e lingua-gem. Portanto, o desenvolvimento de um referencialé crucial para o desenvolvimento da linguagem.Existem dois aspectos problemáticos no que concerneàs crianças surdas. Ao primeiro Bruner denomina“vocativos de chamada” e o segundo é a atençãodirigida que permite conversar sobre a atividade dacriança.

Passada a fase de contato “face a face” nos primei-ros meses de vida, a mãe começa a empregar umvocativo padronizado - geralmente o nome da criançacom uma intonação especial - sempre que quer aatenção da criança quando ela olha para outra coisaqualquer. Se a criança for surda esta estratégia dificil-mente terá êxito. Em substituição ao vocativo, asmães surdas abanam as mãos ou provocam umainterferência visual qualquer para trazer o olhar dacriança para si mesmas. Na verdade, crianças surdasem famílias surdas não têm experiência de seus

nomes usados como vocativos e aprendem seus no-mes falados e escritos só mais tarde.

A capacidade de ouvir um dos pais discutir umassunto ou acontecimento enquanto a criança a eleobserva é vital para o desenvolvimento da linguagemfalada: o genitor explica enquanto a criança examinao referente. Todavia, a situação complica-se quandoa criança é surda. Não só a criança é incapaz deefetivamente ouvir o que é falado mas, adicionalmen-te, quando uma criança surda se concentra numobjeto interrompe o canal visual de comunicação.Mães surdas contornam parcialmente este problemausando, comparativamente, menos sinais do que fa-lam as mães que ouvem mas também referindo-se aosobjetos antes de dirigir a atenção a eles. Assim, numepisódio em que se faz necessário captar o olhar dacriança as mães surdas caracteristicamente estabele-cem o contato visual, em seguida referem-se aoobjeto e depois apontam para ele. Isto dirige o olharda criança para um objeto já identificado. Enquantoa criança olha para o objeto a mãe surda interrompea comunicação e só quando se refaz o contato visualela volta a fornecer maiores informações [32].

O objetivo deste tipo de interação, que parece lentapelos padrões dos que ouvem e falam é de estabelecerhábitos para a atenção que permitam a ocorrência, nosegundo ano, de mais intensas interações e alternânciasdo papel do emissor. Trata-se de um processo quepode ser descrito como uma atenção partilhada, con-trolado muito mais pela criança do que pela mãe [33].Para que a criança seja capaz de dividir a atenção eladeve ser capaz de manipular o olhar da mãe e tambémde obter informações significativas durante ainteração. Uma interação insatisfatória em criançasmaiores que vivem nos institutos para surdos éindicativa de insucessos anteriores no manejo daatenção dividida. Observa-se que as mães audientesde crianças surdas não desenvolvem naturalmenteestas aptidões. As tentativas de desenvolver umaabordagem bilíngüe ou de introduzir precocemente asignagem nas famílias audientes têm de considerar ainteração tanto quanto a linguagem.

Vocalização pré-lingüística

Pensava-se, anteriormente, que as crianças surdasproduzissem sons espontâneos semelhantes aos decrianças audientes [34]. Imaginava-se que as crian-ças surdas estariam espontaneamente testando seus

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mecanismos da fala e este suposto balbucio eraconsiderado como indicativo de audição residual eum ensejo de explorar uma latente capacidade defalar. No entanto, detalhadas análises infrafonológicas[35] mostraram que as crianças surdas não atraves-sam uma fase de balbucio canônico nos dez primeirosmeses. As crianças tendem a produzir somente síla-bas únicas e não sílabas repetidas como fazem ascrianças audientes, além de maior proporção de se-qüências melódicas e laríngeas. Portanto, os sonsproduzidos por crianças surdas não são os mesmosque produzem as crianças audientes.

Registro ajustado à criança

Os adultos audientes utilizam um registro de lingua-gem específico ao falar com crianças audientes. Esteregistro varia conforme a idade e às vezes pensa-senuma coordenação em que a variação adotada prece-da o domínio, pela criança, dos componentes ouestruturas nela presentes. O registro precoce é carac-terizado por uma intonação rica, não se tratandoapenas de fala simplificada. Outros adultos podemnão entendê-lo. O objetivo do registro ajustado àcriança é ainda motivo de debate, embora talvez sejaa chave para o desenvolvimento de aspectos pragmá-ticos da interação. Exatamente agora quando detecta-mos um registro adaptado à criança na interaçãoouvir-ouvir, encontramos características semelhan-tes na interação da mãe com sua criança surda, cujopai também é surdo. Os sinais têm duração maior,maior amplitude, sendo manipulados no curso de suaexecução (talvez para aumentar a atenção); não sãoexecutados em seus locais habituais mas em locaisadaptados à atenção da criança (a mãe, por exemplo,demonstrará conceitos fundamentais sobre um livrode figuras ou perto de um objeto com que a criançabrinca).

Os sinais também poderão ser feitos “sobre a criança”e manipulados como num jogo. O sinal para PATO(que se faz abrindo e fechando a mão em imitação aobico do pato) pode ser usado como se um patoimaginário estivesse bicando a criança. Uma outracaracterística significativa é que a mãe não só modelao sinal para a criança, ela também pode modelar ossinais sobre a criança - ela toma as mãos da criança emove-as de modo apropriado para aquele sinal. Istopode ser feito quando a mãe está de frente para acriança e talvez mais comumente, também quando

estiver sentada ao lado da criança. Este arranjo mãe-criança, embora muito comum, é freqüentementeignorado por educadores que afirmam que a criançasurda tem de estar de frente para o genitor a fim demaximizar o aporte das informações visuais. Toda-via, esse posicionamento não é obrigatório no relaci-onamento da criança surda com pais surdos.

Ampliando a interação da mãe

No estudo de Nienhuys e Tikotin foram examinadasuma criança surda e uma audiente a partir de 33semanas até 43 semanas de vida. Emergiram algumasdiferenças entre as crianças mas as diferenças entre asmães são mais significativas. A mãe audiente dacriança surda passava muito mais tempo vigiando acriança e menos tempo brincando com ela como paraenfatizar sua necessidade de controlar o canal daatenção. Este achado é indiretamente confirmado[36] por um estudo que mostra como as mães surdasfazem mais mímica facial para as crianças de 3 mesesdo que as mães audientes.

Outro estudo sobre a interação da mãe surda ecriança surda mostrou que as mães surdas não utili-zam somente sua língua nativa na interação. Naverdade, inicialmente, excluem os sinais e tendemmais a usar a linguagem falada na interação muitoprecoce (nos primeiros meses). A freqüência dasexpressões de mães surdas, bem como sua diversida-de, parece menor do que das mães audientes, além deparecerem menos complexas do ponto de vistalingüístico. Isto se aplica seja para os sinais, seja paratodas as expressões. Embora a proporção total deexpressões ricas de informação tenha sido semelhan-te durante o primeiro ano de acompanhamento, háconsiderável variação no tipo da expressão. As mãessurdas questionam menos, relatam menos mas no-meiam muito mais e usam mais expressões semsentido [37].

Nas famílias de surdos os bebês são menos impli-cados nas manifestações da comunicação, sendo maisprovavelmente voltados para o objeto do que os bebêsde famílias que ouvem. Esta preponderância do modoprático descrita por Penman e cols. [38] confirma-seaos 9 meses de idade, embora em grau menor e compequena diminuição da preferência dada aos objetos.

Para compreender essas diferenças poderemossimplesmente recorrer às diferenças culturais exis-tentes entre surdos e audientes. Não esperamos que

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mães surdas se comportem como mães audientes euma vez que sua comunicação se baseia em outramodalidade poderemos até esperar diferenças maio-res do que as existentes entre duas culturas comexpressão oral. Poucas dúvidas existem quanto adesempenharem um papel importante, nessa diferen-ça, as disparidades culturais que se somam a umsistema de codificação insuficiente, originário deuma interação auditiva e que portanto, reflete maisesta modalidade de interação entre pessoas que ou-vem. Em particular, lembramos das ponderações demães surdas durante uma entrevista dizendo quemesmo com filhos que ouvem têm dificuldades em“falar” com eles quando não há contato visual com acriança. Esta é uma das explicações para as expres-sões vocais mais curtas produzidas pelas mães sur-das, pois é menor a informação que pode ser transmi-tida no período relativamente curto em que a criançatem um contato visual total com a mãe.

Todavia, existe outra explicação para estes acha-dos. As alterações promovidas pelo desenvolvimentomodificam o interesse da criança pelo rosto da mãe.Esse ativo interesse tem seu ápice aos 3 meses idade,aproximadamente, declinando rapidamente aos 5 ou6 meses, nivelando-se brevemente e sofrendo novodeclínio por volta de 9 meses de idade. Trevarthenressalta, além disso, que a acuidade visual aumentadurante os primeiros meses de vida, alcançando umpico aos 6 meses de idade aproximadamente [10].

Assim, a mãe surda que necessita captar o olhar dacriança terá dificuldades crescentes a partir dos 3meses quando a criança começa a se interessar maisativamente por objetos. Inicialmente será um interes-se visual que evoluirá para a preensão. Esta, por suavez, também evoluirá nos primeiros meses, chegandoa um pico por volta de 8 meses. A mãe surda terá entãode lidar com uma criança que não “atende” e queportanto, estará limitando a natureza e a extensão dasexpressões vocais que dela se originam. Ela entãoterá de recorrer a atividades visuais mais orientadasao objeto e mais evidentes para captar e manter aatenção da criança. Em apoio a esta análise encontra-mos freqüentes exemplos de signagem com um obje-to tal como um chocalho no sinal para RUÍDO. Maiscomum ainda é o uso simultâneo do objeto e o sinalquando, por exemplo, a mãe faz o sinal para PATOcom a mão direita enquanto exibe o pato de brinquedocom a mão esquerda.

São poucos os exemplos de um comentário damãe, por sinais, sobre um qualquer comportamento

da criança, pois a mãe não pode imitar as ações dacriança se ela não estiver olhando mas tem de inter-romper ostensivamente o olhar da criança e colocar-se na sua linha de visão. O “jogo”, portanto, édiferente: como fazer com que a criança olhe para suamãe e não como fazer para interessá-la em longasinterações. Aos 9 meses de idade da criança audiente,uma mãe audiente tenderá mais a criar olhares mútuose a desenvolver rotinas de alternância na intervençãopor meio de jogos “de perto e de longe”. São muitocomuns com as mães audientes e completamenteinexistentes com mães surdas, à mesma idade. Estesjogos compreendem o deslocamento gradativo de umobjeto para perto do rosto da criança com um som queacompanha sempre a atividade, freqüentemente frasesfaladas, repetidas ritmicamente. Por exemplo, a mãeaproxima o pato do rosto da criança dizendo “...bicarteu nariz ... vai bicar teu nariz... vai bicar teu nariz...vai bicar teu nariz ...aaaaa... pegou”. À medida que opato se aproxima do rosto da criança o olhar dacriança transfere-se do objeto para o rosto da mãe e acriança sorri ou ri para a mãe de modo que nomomento em que o objeto faz contato com o rosto dacriança ela está totalmente concentrada na mãe. Carac-teristicamente a mãe faz uma pausa e a criança reagecom sorrisos ou risadinhas e aí a mãe repete a brinca-deira. Um jogo equivalente da mãe surda explora oespaço visual, levando a criança a acompanhar o objetocom os olhos, com menores oportunidades de umaintervenção lingüística por parte da mãe.

Esta informação, todavia, nos leva a especularsobre a situação que surgiria caso uma criança surdafosse confrontada com o rico aporte lingüístico damãe audiente. Muito pouco da intonação que carac-teriza esta interação teria significado para a criançaque se desenvolveria praticamente sem comunica-ção, pois as tentativas de “conversar” sobre seusinteresses pelos objetos teriam pouco impacto. Estahipótese é apoiada pelas poucas atividades comunsentre a mãe que ouve e a criança surda [39].

Sinais emergentes

Analogamente ao desenvolvimento das crianças queouvem com relação às palavras, a criança surdacomeça a produzir sinais com regularidade a partir deum ano de idade. Enquanto existem múltiplos argu-mentos sobre a realidade da fase em que a criança sópronuncia uma palavra [40], constatamos considerá-vel variação na idade do primeiro sinal até mesmo nos

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poucos estudos apresentados sobre crianças surdas[37,41,42] e sobre uma criança audiente bilíngüe[43]. Existem casos de crianças surdas que produzemsinais com menos de 1 ano de idade e outras que nãoproduzem sinais antes de 17 meses. Em virtude dasrelativamente poucas situações domésticas que fo-ram estudadas não fica evidente se esta variação éaleatória no contexto da norma ou se existeminterações específicas em cada lar. Os primeirossinais tendem a designar objetos (surgem por volta de11 meses de idade) [44], embora na fase mais precocesejam difíceis de distinguir de simples gestos (evi-dentemente, as crianças que ouvem também gesticu-lam) [45].

Do gesto ao sinal

Um fato que torna problemática toda a análise léxicado desenvolvimento dos sinais é a dificuldade dedistinguir entre o sinal e o gesto simbólico. Asdiversas definições disponíveis são insatisfatórias.Para que um sinal seja qualificado como sinal oupalavra é preciso “a) que o sinal tenha sido usado(pelo menos uma vez) para designar um referenteausente do meio circunstante e b) que o sinal tenhasido usado em múltiplas intenções de comunicação(ou seja, mais de uma)” [46]. Goldin-Meadow eMylander, ao estudarem crianças surdas em famíliasaudientes decidiram que um gesto de comunicação“deve ser dirigido a outro indivíduo ... e que não deveser um ato direto aplicado sobre o parceiro ou sobreum objeto relevante” [47].

Acredolo e Goodwyn [45] definem os gesto decrianças audientes com os mesmos elementos queVolterra e Caselli [48] empregam para os sinais. Ogesto deve aparecer repetidamente sob a mesmaforma, generalizando-se além da situação específicana qual foi adquirido.

Na verdade, nenhuma das definições, nem outrascomparáveis para as palavras são particularmenteúteis, pois é improvável que registros periódicos emvídeo nos permitam verificar os requisitos de Volterrae Caselli quanto ao uso de um sinal num âmbito desituações e referindo-se a exemplares de uma mesmaclasse. A exigência menor, ou seja, de que venha a serusado para itens ausentes não ajuda, pois isso podeocorrer no contexto de um pedido rotineiro, comoaliás ocorre também com as crianças que ouvem. Eeste, talvez seja o ponto crucial do problema.

Uma distinção entre gestos e sinais requer a respostaà seguinte questão: estamos lidando com a prolifera-ção de sinais para objetos ou com uma série de gestossimbólicos? Trata-se simplesmente de problema aná-logo ao de determinar palavras? Algumas pesquisasfavorecem a idéia de os sinais indicadores de objetosemergirem de modo semelhante aos gestos significa-tivos das crianças audientes [44]. Isto condiz com aopinião de Nelson e Lucariello [48] sobre a existênciade uma fase pré-lexical na qual as crianças reagemcom sinais/gestos a situações inexplicadas por seremparte de uma rotina e não por terem desenvolvidoconceitos diferenciados.

Esta abordagem permite-nos examinar os sinais,os gestos significativos, simbólicos e as palavras semnos preocuparmos com sua condição final. McNeill[49] oferece uma análise útil das relações gesto-sinal,sugerindo que o continuum de Kendon [50], da ges-ticulação à pantomima e dos símbolos figurativos aossinais é mais um círculo. Com isto ele quer dizer queos sinais têm as mesmas utilidades características daspalavras e deveriam ser capazes de ocorrer juntamen-te com o gesto. Crianças que apreendem a se comu-nicar sem a presença de modelos de sinais (ou seja,crianças surdas que crescem em famílias audientessem contato com um adulto surdo) tendem a utilizaro gesto de forma estruturada como se um salto fossepossível do gesto ao uso gramaticalmente sistemáticodo sinal. Para que isto ocorra, o sinal deve relacionar-se com o gesto “nas duas pontas” o que torna extre-mamente difícil a distinção entre um e outro nas fasesprecoces do desenvolvimento.

Feyereisen e De Lannoy [51] vão mais longe aodeterminarem a importância da mais precoce fase dedesenvolvimento do gesto em todas as crianças,segundo o conceito dos esquemas de ação de Piaget.Estes esquemas de ação são as tentativas da criança deconfigurar, para si, o mundo dos objetos, ações eacontecimentos que se tornam ferramentas para acomunicação. Sabemos que apenas as crianças sur-das expostas ao contato de pessoas que utilizam ossinais chegam ao uso desses esquemas de ação emcombinação com gestos representativos que formama base da linguagem dos sinais que eventualmenteserão capazes de dominar.

Sinais precoces, tal como as palavras precoces, sãomal articulados no tocante à forma que as mãos lhesconfere, à localização e ao movimento. Os pais inter-pretam o sinal a partir do contexto e freqüentementefazem a correção. Parece que os sinais são pré-lexicais

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(assim como as palavras) até por volta dos 16 mesesde idade quando começam a se generalizar e quandoocorre utilização além de seu contexto inicial. Talcomo com as palavras, estes primeiros sinais tendema ocorrer durante os jogos (tal como “o que é isso”?)ou nas interações alternadas (quando a mãe cria umaexpectativa de reação pela criança apresentando-lheum objeto ou figura). O fato de a criança aprender aproduzir a mesma resposta em ocasiões diferentesnão significa que, neste ponto, ela tenha interiorizadoo verdadeiro significado léxico e conceitual.

Digna de nota, nesta pesquisa, é a análise do debatesobre continuidade ou descontinuidade da passagemdos gestos aos sinais (ou fala): seria um processo queleva naturalmente do gesto ao sinal (ou palavra) ouhaveria divergência entre ambos? [52]. Petitto [53]relatou o desenvolvimento do gesto representativo de“si mesmo” anterior ao desenvolvimento dos sinais“EU” e “VOCÊ”. Na fase gestual em que designa a simesma a criança geralmente faz uso correto do gestomas, em seguida, ela passa por um período em queatribui erradamente o sinal “EU” a outros e o sinal“VOCÊ” a si mesma. Só gradualmente a criançaemerge dessa “confusão” para produzir os sinaiscorretos para “EU” e “VOCÊ”.

Combinações de sinais

Assim como as palavras das crianças audientes, ossinais serão eventualmente combinados mas aparen-temente passam por uma fase intermediária antes dese combinarem dois a dois. Esta fase intermediária éuma fase de qualificação dos sinais. Nela, as criançassurdas de pais surdos combinam sinais isolados comPONTOS, ou seja, um gesto significando “locução”,geralmente feito com o dedo indicador como abaixo:PONTO sinal PONTO ou sinal PONTO sinal antesde progredir para SINAL

1 SINAL

2. Uma vez que

ainda não sabemos com certeza quando duas palavrascontíguas se tornam uma expressão de duas palavrasem vez de palavras individuais, este aspecto aindarequer melhor definição. À medida que a linguagemda criança se desenvolve surgem as expressões deduas e três palavras. Todavia, parece que as expres-sões por sinais tendem a ser mais curtas do que asfaladas. Isto pode ser devido, parcialmente, à maiorcomplexidade morfológica do sinal isolado.

Os sinais na escola

Além do período da aquisição precoce interessamo-nos também pelo campo da educação, pois a criançasurda ingressa em programas educacionais desde osdois anos de idade. Embora a criança surda nascidaem família audiente possa demonstrar um sofisticadouso dos sinais, podem surgir problemas significati-vos. O adulto audiente poderá utilizar a fala em apoioaos sinais para fazer contato com a criança surda.

Num estudo sobre a competência das criançassurdas com os sinais utilizados num programa esco-lar, Kyle [54] relata que elas dedicavam tempo exces-sivo ao aprendizado mas que o nível de conhecimentoda gramática do idioma dos sinais era desapontador.Aspectos como o emprego da gramática espacial(localização das ações, objetos e pessoas no espaço)e parâmetros do movimento (onde movimento edireção indicam as modalidades do verbo) não sãobem compreendidos pelas crianças surdas até a idadede 10 anos (embora isto não se aplique às criançassurdas de pais surdos). Uma vez que grande parte dasinterações na escola envolvem objetos e histórias istopode constituir um sério obstáculo ao aprendizado.Na verdade, nos programas estudados a aquisição dossinais pelas crianças não era adequada como resulta-do da natureza do aporte oferecido pelos adultos - umfato constatado por Johnson e cols. [55]. Loncke ecols. [56] também investigaram a apreensão da gra-mática por crianças surdas com pais audientes emcontraste com crianças surdas de pais surdos. Cons-tataram problemas da parte dos primeiros quanto aouso das operações morfossintáticas, enquanto estesúltimos conseguiam incorporá-las a seus sinais apartir de 6 anos de idade.

Conclusões

A linguagem dos sinais é uma nova área de estudo epode-se afirmar que o estudo sobre a aquisição dossinais encontra-se ainda no seu início. O que começa-mos a descobrir indica que o padrão da interaçãomãe-criança é diferente, no entanto, o nível de desen-volvimento nos sinais pode ser semelhante ao decrianças audientes na fala. Uma das maiores dificul-dades tem sido a de assegurar à criança surda nascidaem famílias audientes o acesso à linguagem dossinais. Programas bilíngües estão sendo experimen-tados na maioria dos países. São concebidos de modoa oferecer modelos de linguagem de sinais à criança

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surda como um meio de aproximá-la da linguagemfalada e escrita da maioria. Uma tal abordagem é novae pela primeira vez incorpora o conhecimento e aexperiência dos próprios adultos surdos.

No estudo da apreensão da linguagem dos sinaisentrevimos a importância das primeiras informaçõesvisuais na interação e pudemos determinar maisefetivamente as diferenças entre o gesto e a lingua-gem precoce. O que aprendermos com as criançassurdas poderá ser de grande importância na compre-ensão da linguagem em geral. Simultaneamente, oconhecimento dos padrões naturais de interação numlar de surdos oferece um modelo para a famíliaaudiente que tem uma criança surda. Até agora trata-mos a perda da audição como um desastre irreversívelpara a família. Ao verificarmos a vitalidade da lin-guagem dos sinais no lar, podemos começar a cons-truir uma visão mais positiva e genuína da criançasurda.

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Introdução

Na moderna audiologia pediátrica aceita-se, geral-mente, que a perda da audição é um sinal/sintoma eque este sinal/sintoma deve ser considerado comoresultado de um ou mais fatores lesivos que afetam oórgão da audição. Isto faz com que a avaliaçãodiagnóstica dos transtornos auditivos na criança com-preendam duas etapas principais: 1) identificação doprejuízo à audição, inclusive determinação dos limi-ares auditivos e local da lesão (ou seja: classificação)por meio do arsenal disponível para os testes auditi-vos; e 2) determinação dos fatores causadores dotranstorno auditivo [1]. Esta avaliação, em 2 tempos,das crianças com transtornos auditivos é geralmenterealizada no setor secundário dos centros de proteçãoà saúde, todavia, os métodos usados para detecção etriagem das crianças com problemas auditivos sãogeralmente estabelecidos no setor primário dos cen-tros de proteção à saúde.

Na maioria dos países industrializados o sistemade proteção à saúde infantil possibilita a monitorizaçãodo desenvolvimento do lactente/criança e ofereceprogramas de acompanhamento e reabilitação casoqualquer defeito auditivo ameace o desenvolvimentonormal da palavra e da linguagem [2]. Além dossistema de proteção à saúde, o sistema educacional,compreendendo diversos tipos de instituições pré-escolares diurnas também tem contato com a criança eem razão da experiência profissional da equipe e daatenta observação, acompanha o desenvolvimento dascrianças [3]. No entanto, são os pais com sua participa-ção essencial na rede que cerca a criança durante todoseu desenvolvimento que devem ser consideradoscomo os observadores mais importantes [4,5].

Uma perda de audição não identificada pode terconseqüências devastadoras sobre o desenvolvimento

da palavra e da linguagem da criança mas tambémsobre seu ajuste social. Por essas razões a detecçãoprecoce tem sido um desafio para o sistema deproteção à saúde em todo o mundo, durante as duasúltimas décadas, estabelecendo-se a necessidade dedesenvolver e implementar procedimentos de tria-gem da audição em caráter universal ou sob a formade triagem de grupos de lactentes/crianças de altorisco. Os diferentes procedimentos de triagem foramelaborados objetivando diferentes grupos etários,dependendo da epidemiologia dos fatores causadoresda diminuição da audição [6]. Nas crianças menores,com até 5 a 6 anos de idade, a causa mais comum daperda auditiva é a otite média com efusão, sejarecorrente, seja de longa evolução que, no entanto, sóserá brevemente descrita nesta revisão (para maioresdetalhes o leitor poderá consultar as referências [7,8]).Serão principalmente abordados os dados epidemio-lógicos e etiológicos relativos às incapacidades defi-nitivas da audição que requerem intervenção e in-gresso num programa de acompanhamento.

Dados epidemiológicas

As estimativas sobre a prevalência das incapacidadesauditivas da criança diferem entre os países o quepode ser atribuído às verdadeiras diferenças nosfatores endógenos e/ou exógenos causadores de audi-ção imperfeita [9,12]. As diferenças, todavia, tam-bém podem refletir inconsistências nas definiçõesdos defeitos auditivos, na escolha da amostra e noscritérios usados para o diagnóstico e classificação,resultando em comparações inverídicas. Além disso,no transcorrer dos anos foram demonstradas mudan-ças na prevalência das deficiências auditivas na criança[13] e pode-se prever que vários aspectos epidemio-

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As deficiências auditivas na infância-epidemiologia e etiologia

Agnete ParvingDepartment of Audiology, Bispebjerg Hospital,

2400 Copenhagen NV, Dinamarca

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lógicos sejam diferentes entre os países e até em umamesma região sanitária de um só país [14]. Assim, umregistro contínuo dos aspectos epidemiológicos dadeficiência auditiva infantil é essencial e constitui umpré-requisito para o planejamento e o ajuste dosserviços de saúde para a audição em pediatria.

Embora existam diferenças importantes quantoaos critérios e à amostragem, a prevalência geral dadeficiência auditiva na infância é estimada em 1,5/1000, com uma variação de 0,8 a 2/1000 em diferen-tes áreas do mundo industrializado. Entre criançascom incapacitações permanentes da audição cerca de90% sofrem de déficit neurossensório permanente,5% de deficiência na condução e 5% de deficiênciaauditiva mista por transtornos na condução eneurossensórios. O número estimado de criançascom deficiência auditiva congênita (ou seja, presen-tes ao nascimento ou adquiridas durante o períodoneonatal) é de 1,3/1000. Uma subestimativa de crian-ças com deficiência auditiva congênita em razão daidentificação tardia (veja adiante) pode afetar osdados epidemiológicos e assim a cifra de 1,3/1000deve ser considerada como um mínimo [14].

Detecção da perda auditiva

Durante muitos anos a detecção precoce da deficiên-cia auditiva foi um desafio para os centros pediátricosde saúde. Programas de triagem auditiva foram intro-duzidos na maioria dos países industrializados, poisa prevalência da deficiência auditiva congênita eraconsiderada freqüente o bastante para a introdução datriagem (particularmente dadas as devastadoras con-seqüências da deficiência auditiva não detectada ounão tratada) - seja sob a forma de uma triagemgeneralizada, seja dirigida a grupos definidos (p.ex.,crianças de alto risco). Apesar de tais programas detriagem, a identificação tardia da criança portadora dedeficiência auditiva foi constatada em muitos países[15-17]. O atraso pode ser atribuído a muitos fatores:à organização e estrutura dos sistemas de proteção àsaúde; à formação insuficiente do pessoal da saúde quetrata com crianças; à falta de conscientização dos paise à falta de recursos para diagnóstico e intervenção.Num grupo de crianças dinamarquesas nascidas em1980-90 somente 37% das crianças com deficiênciasauditivas congênitas foram identificadas e assim tra-tadas à idade de 1 ano [18]. Embora 37% representemuma melhoria sobre 21% de crianças nascidas em

1970-80, previamente identificadas, a idade medianana identificação era de 17 meses (intervalo de 1 a 99meses). Embora as crianças em risco [19] de sofrerdeficiência auditiva (Tabela I: Critérios de riscointernacionalmente aceitos) fossem identificadas antesdas crianças para as quais o risco inexistia, o atrasoainda é considerável, pois somente 18% foramidentificadas à idade de 6 meses e 40% à idade de 12meses - apesar de possível a identificação ao nasci-mento ou durante o período neonatal.

Comprovou-se que os pais são os primeiros asuspeitarem da deficiência auditiva da criança e as-sim representam um importante fator de triagem dapopulação como um todo [3,5]. Comprovou-se tam-bém que profissionais do sistema de saúde como osassistentes sociais, os clínicos gerais e os otorrinolarin-gologistas são os mais freqüentes causadores deatrasos na identificação de crianças com deficiênciaauditiva congênita [4]. Isto requer maior educação edivulgação dos fatores de risco e maior conhecimentodos sinais comportamentais apresentados pela crian-ça com deficiência auditiva. Deve-se acreditar sem-pre nos pais que suspeitam de deficiência auditiva dofilho até que essa deficiência seja convincentementeafastada ou que seja encontrada outra razão para ocomportamento anormal da criança.

Tabela I: Relação de fatores indicativos de alto risco dedeficiência auditiva em crianças_________________________________________________________________________

Ocorrência de surdez nos antecedentes

Infecções fetaisComplicações neonatais (Internação na Unidade Neonatal deTerapia Intensiva)

Anormalidades crânio-faciais_________________________________________________________________________

Epidemiologia dos fatores etiológicos

Sempre que for identificada uma deficência auditivapermanente, a criança deve ser matriculada numprograma multidisciplinar de acompanhamento quetenha qualificação suficiente em audiologia pediátrica.O programa deve basear-se no seguinte: verificaçãode alterações na sensibilidade auditiva; diagnósticoetiológico do defeito auditivo e acompanhamentolongitudinal da intervenção e do manejo.

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Foram relatadas diversas investigações da defi-ciência auditiva em crianças, com especial interessena etiologia. A classificação etiológica geralmentebaseia-se nos registros da audiologia clínica masvaliosa informação suplementar foi obtida de pesqui-sas oftalmológicas e genéticas e em alguns casos pelatomografia do ouvido interno [20,21]. Embora taispesquisas não-audiológicas ofereçam significativainformação ao audiologista, ainda existem proble-mas para a identificação precisa da deficiência audi-tiva na criança. Assim, é bastante comum constatarque nenhuma causa para a incapacitação auditivapermanente foi determinada, em séries diferentes,para 25 a 50% das crianças [22,23].

A hereditariedade é citada como o fator maisfreqüente de deficiência auditiva. Assim, em gruposbem definidos de crianças a hereditariedade respondepor 48% dos quais 36% não apresentam manifesta-ção associada do gene mutante em questão, enquantouma síndrome na qual se associa a surdez a outrasanomalias caracterizadas responde por cerca de 12%.Todavia, a classificação etiológica deve ser conside-rada um processo dinâmico e a proporção de criançasnas quais a deficiência auditiva pode ser atribuída àhereditariedade com ou sem anormalidades associa-das pode muito bem diferir, não somente com relaçãoa diferenças reais entre os indivíduos mas tambémcom respeito à idade e à avaliação.

Os transtornos herdados da audição são considera-dos como de origem pré-natal, contudo, uma impor-tante causa pré-natal são as infecções fetais. A maisconhecida infecção fetal causadora de deficiênciaauditiva é a rubéola mas, com a introdução dosprogramas de vacinação a incidência de rubéola fetalcomo causa de deficiência auditiva na criança sofreusignificativa redução nas duas últimas décadas [14,24].Todavia, a rubéola, a doença de inclusão citomegálicae outras infecções fetais devem ser sempre lembra-das na avaliação da etiologia da deficiência auditivacongênita na infância. Melhorias nos cuidadosneonatais intensivos permitem que sobrevivam be-bês de peso muito baixo ao nascimento (<1500g),inclusive os que sofreram complicações severasdurante o período neonatal. Tais sobreviventes po-dem apresentar deficiência auditiva com ou semincapacitações adicionais. No entanto, o número decrianças com deficiências permanentes da audiçãoque podem ser atribuídas a fatores perinatais perma-neceu inalterado durante as duas últimas décadas,

respondendo por cerca de 10-13% da deficiênciaauditiva na criança [14].

A meningite na segunda infância também deve sermencionada, pois pode causar grave deficiência au-ditiva e por isso todas as crianças devem ser subme-tidas a testes da audição logo que se recuperarem dameningite.

Um dos maiores desafios na otorrinolaringologiapediátrica está nos 20-40% dos casos de deficiênciaauditiva na infância sem etiologia reconhecida. Éimprescindível um minucioso interrogatório dos pais.Esta informação, associada ao exame audiológicopode estabelecer um diagnóstico etiológico da defi-ciência auditiva da criança. A inclusão de procedimen-tos não-audiológicos, tais como testes sorológicos,raios-X, exames oftalmológicos, avaliação genética,ou seja, uma ampla cooperação interdisciplinar, po-derá reduzir o número de etiologias desconhecidas[20]. Estes procedimentos não-audiológicos são designificativa importância para o diagnóstico etiológicodo sinal/sintoma da perda da audição em uma criança.No entanto, para obter informações válidas sobre aincidência e a distribuição dos fatores que causam aperda da audição - id est, do ponto de vistaepidemiológico - exames sistemáticos devem seraplicados a um número representativo de criançasportadoras de deficiência auditiva. Conseguem-se,assim, dados epidemiológicos precisos, não só sobrea prevalência e características dos transtornos daaudição, mas também sobre a etiologia dessa defi-ciência, das quais, em última análise, depende aprevenção primária.

Otite serosa

A otite serosa é a condição patológica mais freqüen-te nos ouvidos de crianças, seja como parte de umaotite média aguda ou como condição crônica. Nestetrabalho trataremos somente da otite serosa persis-tente, ou seja, na qual a efusão de muco no ouvidomédio é ≥ 3 meses (“glue ear”).

A otite serosa é mais freqüente nas crianças de 2a 4 anos, diminuindo de freqüência com o aumentoda idade, surgindo grande variação nos picos deprevalências em razão do clima e da estação, commaior prevalência nos países subdesenvolvidos com-parativamente aos industrializados [7]. Deve serconsiderada com seriedade, pois mobiliza uma quan-tidade enorme de recursos do sistema de saúde, tal

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como a cirurgia para a otite serosa, a mais comumrealizada em pediatria nos países industrializados.

Amplas pesquisas foram realizadas no âmbito daotite serosa para delinear os fatores de risco, o efeitodo tratamento médico, dos procedimentos cirúrgicos,o resultado e as complicações da cirurgia e a busca deevidência convincente de ser causa de transtornos nodesenvolvimento e do comportamento (para maioresdetalhes vide referências [7,8]). Embora existamcontrovérsias quanto aos resultados dessa ampla pes-quisa, os fatores de risco geralmente aceitos são osseguintes: anormalidade crânio-facial; síndrome deDown; fenda palatina; raça; prematuridade; rinite;otite média aguda; creche; tabagismo passivo; condi-ção socieconômica desfavorável. A falta de aleita-mento ao peito não parece ser um fator de risco [25].O restrito número de estudos controlados, bi-anôni-mos e aleatórios, sobre os efeitos do tratamentomédico não trouxeram evidência convincente de seusbenefícios a curto e longo prazo. Isto contrasta coma cirurgia e a inserção de drenos que imediatamenterestauram a audição (exceto no caso de presençasimultânea de perda neuro-sensória da audição) eprevinem complicações como o colesteatoma. Ainserção de drenos pode ser realizada em combinaçãocom a adenoidectomia ou adeno-tonsilectomia, em-bora tais intervenções complementares não pareçamoferecer benefícios para a audição no curto prazo.Drenos e adenoidectomia em estudos longitudinaisaleatórios demonstraram diminuição na duração daotite serosa para uma média de 3,3 anos. Deve-seobservar, todavia que, independentemente do trata-mento, 95% dos problemas das crianças com a otiteserosa resolvem-se espontaneamente num período dedez anos.

Os otorrinolaringologistas justificam a operaçãoem crianças com perdas mais leves da audição ale-gando que a cirurgia terá efeitos preventivos sobredistúrbios do desenvolvimento. O estudo longitudi-nal multidisciplinar de Dunedin sobre saúde e desen-volvimento [7], abrangendo um grupo de mais de1000 crianças acompanhadas regularmente, trouxealguma comprovação para essa assertiva. A cada 2anos, a partir de 5 anos de idade, as crianças passa-ram por exames otológicos, audiometria tonal emedida da impedância do ouvido médio. Alémdisso, foram realizados testes sobre o desenvolvi-mento e comportamentais a cada dois anos a partirde 3 anos de idade. Os exames demonstraram que ascrianças portadoras de otite serosa confirmada por

audiogramas planos ou pela inserção dos drenosapresentam déficit na compreensão e expressão aos3 e 5 anos de idade com menores quocientes deinteligência e resultados escolares medíocres aos 5anos de idade. No estudo longitudinal comprovou-searticulação e expressão deficientes juntamente comcapacidade de leitura e resultados escolares medío-cres ainda evidentes aos 9 anos de idade.

Num estudo mais recente [26] foram examinadosos efeitos da otite serosa durante os dois primeirosanos de vida sobre a capacidade de percepção auditi-va e competência para a leitura em dois grupos decrianças com 6 e 7 anos de idade, combinadas segun-do idade, sexo, condição socieconômica e nível decompreensão (léxico passivo). A comparação mos-trou que as crianças comprovadamente acometidaspor otite serosa em idade precoce tinham um desem-penho significativamente pior em todos os testesauditivos e de leitura. No entanto, isto não significaque essas capacidades não possam normalizar-seposteriormente.

Esta breve descrição de alguns dos problemas nocontexto da otite serosa e a incapacidade de resolvê-los, apesar do grande volume de pesquisas, pode seratribuído à falta de definições e critérios uniformes[27], à insuficiente definição das amostras e dosobjetivos dos estudos, falta de estudos longitudinaise medidas insuficientes para a palavra e a linguagem.Assim, se fazem necessárias, com urgência, maispesquisas de alto nível para que se encontrem respos-tas válidas às principais perguntas dessa área.

Conclusões

As cifras epidemiológicas relativas ao número decrianças com incapacitação auditiva congênita ouprecocemente adquirida originam-se de diversas par-te do mundo. Formam a base para o planejamento dosserviços de saúde otológicos que também deveriamfornecer maiores informações concernentes a etiologiada deficiência auditiva na infância, um pré-requisitopara a prevenção deste defeito incapacitante.

Apesar das mútiplas pesquisas sobre as otitesserosas crônicas não temos provas definitivas de quesejam responsáveis pelos distúrbios do desenvolvi-mento e do comportamento, embora certos estudosrealizados de maneira apropriada apontem para umefeito deletério sobre as capacidades auditivas ecompetência para a leitura.

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As deficiências auditivas na infância-epidemiologia e etiologia

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não capta ou ouve as freqüências sonoras da falahumana na intensidade normalmente usada não apreen-derá como outras crianças. A opinião dos psicólogossobre a necessidade da linguagem para o pensa-mento abstrato e a utilização de conceitos diferefreqüentemente; todavia, não há dúvida de que alinguagem facilita o processo tremendamente.

A surdez em recém-nascidos e crianças não é tãorara mas os número exatos variam de acordo com oscritérios usados nos diferentes relatos. A Comissãodas Comunidades Européias relatou, em 1979 [1] que1 criança em 1000 apresentava perda auditiva superiora 50 dB no ouvido com melhor audição aos o anos deidade. Isto coincide com a cifra freqüentemente usadasobre a existência de surdez neurossensória bilateralem 1 de cada 1000 nascimentos vivos.

Triagem

A surdez profunda deve ser identificada na infânciapara que se reduza a um mínimo a incapacitação peladeficiência auditiva. Para tanto, a implementação deprogramas de triagem logo após o nascimento é desuma importância. Em 1982, o Comitê Conjuntosobre a Audição do Recém-nascido [2] nos EstadosUnidos recomendou que a identificação da perda daaudição ocorresse aos 3 meses, sem nunca ultrapassaros 6 meses de idade. Ademais, sempre que possível, oprocesso diagnóstico deveria estar completo e a reabi-litação já iniciada aos 6 meses de idade. Uma revisãodos dados publicados nos EUA, Canadá e Europamostra que, infelizmente, este ideal raramente é alcan-çado. Com algumas exceções, a idade para o início deprogramas de terapia que consistem de atividadesestimuladoras da linguagem genitor/criança, forneci-mento de aparelhos para a surdez e aconselhamento

Introdução

“A primeira obrigação do homem é falar; esta é suaprincipal tarefa no mundo”, Robert Louis Stevenson(1850-1894). Foi o grande romancista, ensaísta epoeta escocês do século passado que fez esta argutaobservação sobre a importância da comunicaçãoenquanto capacidade individual. Conseqüentemen-te, o significado da surdez torna-se mais evidentequando nos vem à mente que os surdos têm grandesdificuldades para se comunicarem e que estas difi-culdades têm ramificações em todos os aspectos desuas vidas.

Os problemas da criança surda situam-se no usoda linguagem falada. A criança que perde a audiçãodepois da aquisição da linguagem tem problemasrelativos à conservação da capacidade de falar e aoisolamento social que são aspectos muito sérios. Acriança surda desde o nascimento ou desde uma faseprecoce da vida pós-natal não será capaz de aprendera falar normalmente; as implicações desta deficiên-cia são enormes. O grau de incapacitação destes doisgrupos dependerá de se tratar de uma perda modera-da (inferior a 85dB), quando a criança ouvirá mal, oude uma perda profunda (mais de 85dB).

A incapacitação de uma criança que nasce comsurdez profunda ou que se torna surda nos primeirosmeses de vida é particularmente severa porque, namelhor das hipóteses, o desenvolvimento normal dalinguagem falada sofre um atraso e na pior, torna-setotalmente impossível. As crianças audientes desen-volvem a fala segundo padrões surpreendentementeuniformes e empregam a audição para acompanharas atividades que as rodeiam. Durante o primeiro anode vida a criança torna-se receptiva à linguagem; elacompreende o significado do conceito que está portrás de palavras simples. Obviamente, a criança que

Triagem e tratamento da surdez na prática clínicaSam M. Tucker

Postgraduate Centre Hillingdon Hospital and Brunes University,Uxbridge, Middlesex, Inglaterra

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dos pais pode ocorrer, a qualquer momento, entre 1 e6 anos de idade, com uma média por volta dos 3 anos.Isto acontece, principalmente, porque a perda audi-tiva é um distúrbio silencioso e até recentemente nãoexistia a noção de procedimentos de triagem para umdiagnóstico precoce.

São muitos os fatores envolvidos num eventualaumento da porcentagem de crianças com deficiênciada audição levadas a tratamento com 6 ou mesmo 12meses de idade. Contudo, isso depende da constataçãoda perda da audição em uma triagem a ser realizadalogo que possível, após o nascimento (Tabela I). Taltriagem deve ser realizada, idealmente, antes da alta,especialmente em áreas urbanas metropolitanas ondea diversidade socieconômica e étnica dificultam atémesmo o retorno para uma avaliação rotineira dascondições de saúde.

Tabela I: Triagem para a perda da audição [2]_________________________________________________________________________Fatores de alto riscoHistória familial de deficiência auditivaInfecções perinataisAnomalias da cabeça e pescoçoPeso ao nascimento inferior a 1500gElevados níveis de bilirrubina neonatalAsfixia ou baixo índice de Apgar ao nascimentoMeningite

Outros fatores possíveisSepsis neonatalHipertensão pulmonar persistenteInternação na Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal_________________________________________________________________________

A maioria ou talvez todos os recém-nascidossurdos têm uma certa capacidade de audição chama-da residual ou útil. Esta audição residual tem sidousada, em grau variável, como um acessório aométodo dos sinais mas poucos usaram-na como ométodo principal de ensino da palavra às criançassurdas. O problema do recém-nascido surdo não estána ausência total da audição mas na negligência emrelação à audição presente, principalmente por nãosermos capazes de compreender que ouvir é umahabilidade que pode ser apreendida.

O termo "audição normal" não significa mera-mente que um som é audível mas abrange toda umasérie de habilidades que incluem detecção, reconhe-cimento e interpretação do significado do som. A

audição, nesse sentido, não existe ao nascimento mastrata-se de uma habilidade especial que depende doaprendizado.

Quando um recém-nascido nasce surdo ou setorna surdo em fase pós-natal precoce, condiçõesespeciais devem ser criadas para que aprenda a usara limitada audição que possui para compreender eproduzir a palavra falada. A incapacidade de ouvir oude compreender a palavra inevitavelmente conduz àincapacidade de falar. A criança surda fica reduzidaa gestos para indicar necessidades e expressar emo-ções, ocorrendo uma drástica redução nos meios deadquirir informação e de apreciar as reações emocio-nais dos outros. Como resultado, seu desenvolvimen-to emocional e intelectual sofre uma interrupção.Uma vez que a deficiência auditiva congênita gravetem baixa incidência, calculada em 1 para 2000 nasci-mentos vivos, a triagem de massa de todos os recém-nascidos é geralmente vista como muito dispendiosa,tanto em relação ao tempo quanto ao dinheiro. Por essarazão, os trabalhos de triagem têm sido aplicados abebês internados nas unidades de terapia intensivanos quais a freqüência da perda auditiva é muitasvezes maior do que no recém-nascido do berçário (até10% maior). Todavia, menos de 50% das criançassurdas registram um ou mais dos fatores “de risco”.Portanto, a seleção não deve restringir-se apenas aesse grupo “de risco”. A não ser que a triagemauditiva seja praticada em todos os recém-nascidosde forma rotineira, a identificação de surdez congêni-ta antes da alta com a subseqüente introdução precocede terapia não será possível para mais da metade dosrecém-nascidos afetados. O folheto intitulado “Seubebê pode ouví-la?” (“Can your baby hear you?”)empregado rotineiramente em Nottingham, no ReinoUnido desde 1982 e distribuído por conselheirossanitários durante a primeira visita aos lares, ajudoua trazer esses bebês com possíveis problemas auditi-vos à atenção dos clínicos. Esta abordagem do tipo“palpites para os pais” serve como valioso auxiliarpara outros métodos de triagem.

Um programa eficaz para a triagem de massa dosdistúrbios auditivos ao nascimento teria de ser válido,confiável rápido, eficaz em termos de custo eadministrável por pessoal inexperiente ou semiqua-lificado. Além disso, o programa deveria possuirrecursos adequados, pessoal e fontes de referênciapara os procedimentos de acompanhamento [3].

A determinação da eficiência do teste compreendea avaliação da sensibilidade (capacidade de um teste

Triagem e tratamento da surdez na prática clínica

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de fornecer resultado positivo quando o recém-nasci-do for realmente portador de déficit auditivo) e daespecificidade (capacidade do teste de fornecer resul-tado negativo quando o recém-nascido tiver audiçãonormal). O cálculo dessas porcentagens e, comple-mentarmente, o índice de falsos positivos e falsosnegativos requer que a deficiência auditiva sejadiagnosticada ou excluída a cada recém-nascido sub-metido a triagem.

Não há consenso quanto à melhor técnica de tria-gem. Três técnicas diferentes são atualmente emprega-das no Reino Unido: (i) Audiometria ComportamentalAutomatizada na qual é utilizado o “AuditoryResponse Cradle” (donde a sigla ARC) [3]; (ii)Potenciais Evocados Auditivos (ABR - sigla para“Auditory Brainstem Evoked Responses”) [4,5]; (iii)Otoemissões Acústicas Provocadas (EOAE - siglapara “Click Evoked Otoacoustic Emissions”)[6].Estes três métodos exploram formas diferentes dareação auditiva e fornecem informações sobre aintegridade de vários níveis do sistema acústico.

O método ARC estabelece o funcionamento cor-reto de todas as vias auditivas, avaliando os movi-mentos do berço (“cradle”) e conseqüentemente, asreações do corpo a um repentino e alto estímulosonoro. Para um único bebê esta técnica não requermais de 10 minutos e não é necessário que o operadorseja um técnico. O ARC foi planejado para ser usadocom bebês a termo saudáveis. Não é invasivo e éamigável com o paciente [3].

O método ABR é predominantemente uma ferra-menta diagnóstica para investigar a perda auditiva eoutros aspectos do funcionamento cerebral. Quandousado na triagem o teste requer cerca de 30 minutos.A parte que exige mais tempo e que pode apresentarproblemas é a aplicação dos eletrodos à pele. Aimaturidade do recém-nascido pode invalidar as res-postas e isto deve ser considerado [4,5]. Por questõestécnicas, é preciso que os que pretendem realizar umteste ABR estabeleçam suas próprias normas eparâmetros. Outra desvantagem está na necessidadede ser utilizada sedação pela duração do teste emcrianças de 12 meses a 4 anos de idade. Isto requer apresença de uma equipe médica por um períodomínimo de 1 hora para cada sessão. Os resultados dométodo ABR devem ser sempre interpretados à luz de

outras informações clínicas.A otoemissão acústica (EOAE) é uma resposta a

um estímulo acústico do ouvido e testemunha daspropriedades ativas da cóclea. Tais emissões consti-tuem um índice muito sensível da integridade dosmecanismos de audição periféricos eis que a respostadesaparece quando existe qualquer anomalia funcio-nal significativa no ouvido interno ou médio [6]. Umdos problemas com o EOAE é que os bebês comperdas na transmissão não têm emissões fortes. Estemétodo é capaz de detectar perdas unilaterais >20 dBtal como o ARC.

Independentemente do método escolhido o diag-nóstico de deficiência auditiva pode ser feito e confir-mado nos dias seguintes ao nascimento, seguindo-sea instituição da terapia apropriada. Esta detecçãoprecoce é hoje considerada fator crítico para osmelhores resultados da reabilitação. A realização detriagem neonatal requer recursos financeiros, tempoda equipe médica e seu comprometimento. É neces-sário um número suficiente de pessoas capazes deaplicar os testes para garantir sua continuidade alémde serviços de audiologia que assumam o cuidado dascrianças com resultado positivo. É preciso tambémressaltar que cada método tem seus próprios incon-venientes. A melhor combinação parece envolverinicialmente o ARC por sua sensibilidade, seguindo-se o ABR por sua especificidade. Caso o ARC falheduas vezes, a medição dos potenciais evocados au-ditivos (ABR) deve ser feita a seguir, automaticamen-te. Nossos resultados confirmam a eficácia e a confia-bilidade dessa combinação [3].

O ideal seria que todos as crianças fossem subme-tidas a triagem no período neonatal. Um teste poste-rior, denominado “de orientação-investigação” de-veria ser realizado dos 6 aos 9 meses de idade, porpessoal treinado [7]. Também chamado “teste dedistração”, consiste na produção de sons significati-vos para o bebê: normalmente o bebê detecta osestímulos sonoros e os localiza girando a cabeça emsua direção. Este teste deve ser sempre incorporado aqualquer avaliação do desenvolvimento da criança.A identificação de crianças com perdas progressivasou adquiridas da audição ressalta a importância de umbom acompanhamento, juntamente com o programade triagem neonatal (Tabela II).

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Tabela II: Testes disponíveis para a avaliação de bebês e crianças_________________________________________________________________________Teste Faixa de idades_________________________________________________________________________

Triagem neonatal dia 1 a 6 semanasTimpanometria/

medida da impedância acústica em qualquer idadeTeste de orientação-investigação 6-18 mesesAudiometria tonal a partir de 3 anosAudiometria com condicionamento visual a partir de 2 anosAudiometria vocal a partir de 7 anosMedição dos Potenciais Evocados em qualquer idade_________________________________________________________________________

A habilidade da criança em localizar o som torna-se evidente por volta dos 6 meses de idade. Além datécnica formal de orientação-investigação (teste dedistração) mencionada precedentemente, diversostestes de campo foram criados. A Audiometria comReforço Visual (Visual reinforcement audiometry -VRA) é semelhante mas as respostas são reforçadase condicionadas por um estímulo visual (destinado aprender a atenção da criança). Estas técnicas podemser usadas em crianças de 6 a 30 meses.

Até a idade de 18 meses os testes vocais com umabateria de sons musicais são realizados enquanto orecém-nascido está distraído brincando com cubosou outros brinquedos. Nessa idade a criança pode sercondicionada a executar pequenas atividades repeti-tivas simples, como empilhar cubos ou enfiar pinosnum quadro com furos, em resposta a um estímulosonoro. Uma vez condicionada, uma variedade deestímulos sonoros com diferentes tons e intensidadespoderá ser usada. Gradualmente, poderá ser determi-nado um limiar para as diferentes freqüências. O usode equipamento amplificador calibrado por compu-tador com alto-falantes assegurará a padronização doteste.

A partir dos 3 anos de idade é possível condicionara criança a executar gestos simples sempre que ouvirum som. Isto requer a participação ativa da criançadurante o teste.

Manejo e aparelhos para a surdez

Todos os recém-nascidos e crianças com deficiênciaauditiva neurossensória devem participar de um pro-grama de reabilitação abrangente e bem planejado[8]. Provavelmente, o mais importante passo desteprograma será a escolha de um aparelho para a surdez

adequado, pois a maioria dos estudos claramentedemonstra o benefício oriundo da amplificação [8].As crianças deverão ser submetidas a testes regularespara assegurar amplificação adequada às suas neces-sidades específicas.

O princípio básico é de fornecer ótima amplifica-ção, aproveitando alguma audição residual eventual-mente existente. Basicamente, os aparelhos para asurdez são dispositivos que contêm sofisticados emodernos amplificadores com sistemas pessoais deprocessamento do sinal, compreendendo não só oinstrumento auditivo mas também um elaboradosistema técnico de acoplagem acústica que desempe-nha um significativo papel no processamento e mo-dificação do sinal acústico além de conduzí-lo ámembrana do tímpano.

Tal foi o progresso alcançado na miniaturizaçãodos circuitos amplificadores que pais e crianças ge-ralmente podem escolher o tipo de aparelho com basenas necessidades sociais e estéticas e não somente emfunção da potência da amplificação, como aconteciaantes. Os aparelhos modernos são menores e cosme-ticamente mais aceitáveis. Além disso, hoje é possí-vel programar as próteses a partir de um computador.Novos progressos são esperados com impaciência.

A energia sonora é captada pelo microfone econvertida em energia elétrica. Estes sinais são am-plificados e reconvertidos em sinais acústicos poroutro transductor: o receptor. O som amplificado,devidamente modificado de acordo com as necessi-dades individuais é transmitido ao tímpano através domolde auricular. A energia para o amplificador éfornecida por uma pequena bateria.

Tipos de aparelhos para a surdez

Os aparelhos que se colocam atrás da orelha são osmais utilizados com seus invólucros leves e discretosmas suficientemente espaçosos para conter o micro-fone, o amplificador, o fone e a bobina bem comooutros opcionais. O sinal amplificado é transmitidopor condução aérea ao tímpano através do condutoauditivo externo.

Existem dois outros tipos: um que é colocado noconduto auditivo externo e outro na concha do pavi-lhão. Só podem ser utilizados quando o grau de defi-ciência auditiva for de leve a moderado uma vez queo microfone encontra-se muito próximo do fone e umganho excessivo de intensidade causará “feedback”acústico. Estes aparelhos são caros, pois devem ser

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fabricados sob encomenda e, além disso, são limita-das as modificações possíveis depois de colocado.

Os aparelhos que se portavam sobre o corpo eramincômodos mas constituiam a única ajuda para asdeficiências profundas da audição em anos passados.Foram grandes os progressos alcançados nos apare-lhos que se colocam atrás da orelha e que hoje ofe-recem um desempenho melhor em todos os aspectosgraças aos avanços na miniaturização e na melhorqualidade do som. Novas perspectivas se prenunciamcom os aparelhos controláveis à distância e sistemasauditivos programáveis.

O tratamento bilateral dos sinais sonoros oferecenumerosas vantagens sobre a aparelhagem monoau-ricular e parece lógico pressupor que o acesso àcorreção nos dois ouvidos oferecerá o máximo debenefícios às crianças portadoras de deficiência audi-tiva. As numerosas vantagens compreendem a me-lhor localização do som, melhor discriminação dapalavra num ambiente ruidoso, redução do ruído defundo na ausência de sinal, diminuição da ressonância,melhor qualidade do som, maior facilidade de escutabem como um efeito somatório acima do limiar queresulta num nível sonoro igual, com 6 dB a menos, aoque seria obtido com o uso de dois aparelhos. Estudosclínicos e pesquisas estão sendo realizadas para con-firmar os benefícios que podem ser obtidos pelo usodessas próteses biauriculares.

Caso uma adequada amplificação convencionalnão ofereça benefício significativo para uma criançacom grave deficiência auditiva o que mais existe paraajudá-la a desenvolver seus recursos auditivos e vocaispara a comunicação? Na verdade, existem grupos derecém-nascidos e crianças cuja deficiência auditiva étão grave que não obtêm benefícios dos aparelhospara a surdez mesmo depois destes anos de avança-dos estudos sobre a amplificação. Um deles é com-posto por crianças de 3 a 10 anos de idade que setornaram profundamente surdas depois de meningitee não obtêm qualquer benefício dos aparelhos para asurdez. Calcula-se que cerca de 30 novos casossurgirão a cada ano na Inglaterra e no País de Gales.Para cada criança totalmente surda existirão cerca de5 outras que necessitarão de recursos diferentes daamplificação.

Implante coclear

Este método é agora amplamente oferecido às crian-ças profundamente surdas que não se beneficiaram de

amplificação prolongada, associada a habilitação ereabilitação apropriadas. Embora os parâmetrosaudiológicos para possam variar em diferentes cen-tros, geralmente o implante é considerado indicadonos casos de crianças que, mesmo com aparelhosapresentam um limiar de audição superior a 80 dB nasfreqüências compreendidas entre 500 Hz e 4 kHz.

O debate, essencialmente, se fez em torno daseguinte questão: os implantes devem ser feitos emcrianças surdas antes da aquisição da linguagem oudevem ser reservados para as que têm uma certaexperiência da linguagem? Encorajados pelos resul-tados iniciais, muitos centros nos Estados Unidos,Austrália e Reino Unido já decidiram que todas ascrianças com menos de 5 anos acometidos por surdezcongênita seriam elegíveis [10].

O implante coclear é um recurso auditivo caro esofisticado que contorna os cílios das células auditi-vas do ouvido interno e estimula diretamente ascélulas ganglionares do VIII nervo craniano [11]. Oselementos básicos de todos os implantes de cócleacompreendem um microfone conectado a ummicroprocessador usado externamente que filtra apalavra e dela extrai a informação. Estes dados sãotransmitidos, em seguida, a uma série de eletrodosreceptores que constituem a parte implantada doconjunto.

Um implante pode ser extracoclear e pode ter 1 oudiversos canais. Os implantes intracocleares com múl-tiplos canais oferecem resultados melhores do que osde um só canal e são, atualmente, o método de trata-mento mais apropriado [12.13]. Na avaliação de umacriança para um possível implante coclear é precisoconsiderar as expectativas realistas dos pais. Pais ecrianças precisam de aconselhamento contínuo, poiso período de reabilitação pode ser muito longo. Aabordagem por equipe que inclui todas as especiali-dades associadas é essencial para o sucesso dessesimplantes. Deve sempre abranger tanto a criançaquanto sua família.

Os resultados publicados na literatura ainda sãomuito limitados para que se possam estabelecer con-clusões firmes. Brackett e cols. [15] da “Liga de NewYork para os Moucos” (New York league for theHard of Hearing) constataram que o progresso dascrianças portadoras de surdez congênita, depois decolocado o implante, era significativamente maislento do que o de crianças que se tornaram surdasapós o nascimento e que o período para a “recupera-ção” podia estender-se por 2 ou 3 anos embora os

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resultados gerais, à exceção do intervalo de tempo,fossem comparáveis. Todavia, é preciso continuar aoferecer informações e aconselhamento às famíliasque enfrentam a difícil tarefa de decidir se “naquelemomento” o implante é o tratamento de eleição(Tabela III).

Tabela III - Benefícios dos implantes cocleares_________________________________________________________

PrimáriosDetecção dos sons em níveis sonoros aceitáveisMelhora na identificação dos elementos da palavraMelhora na percepção dos fonemas abertos e fechadosAumento da capacidade de ler os lábios

SecundáriosMelhora na qualidade da vozMelhora na linguagem (precisão)Aumento do repertório fonéticoMelhora do vocabulário passivo________________________________________________________________________

Idade ideal para o tratamento com amplificador

Qual a idade mais precoce na qual uma amplificaçãopode ser benéfica para uma criança com deficiênciaauditiva? A audição tem um papel vital no contactodo recém-nascido com seu meio, sendo essencialpara o desenvolvimento da palavra e da linguagem.Grande parte do primeiro ano da criança é gasto emouvir os sons do mundo que o circunda e, nessemundo, a palavra reconfortante dos pais. Assim queos sons se tornam familiares para o recém-nascido eletenta reproduzi-los. Os arrulhos e os balbucios são oresultado logo seguidos pelas palavras e pelas frasesque se tornam sua linguagem para a comunicação.Assim, quanto mais precoce a identificação da de-ficiência mais precoce será o início do tratamento.Não há como exagerar a importância deste fato. Acriança com deficiência auditiva precisa ser encora-jada a apreender a falar normalmente: quanto maisprecoce a assistência, melhor será o resultado final.

A realização plena de um potencial intelectual eacadêmico depende da idade em que ocorreu a perdada audição e de quando foi aplicado um dispositivocorretor. De modo ideal, isto deveria ter ocorrido àidade de 6 meses caso o diagnóstico tenha sido feitono período neonatal [14]. Uma amplificação comple-ta, graças a aparelhos bilaterais para surdez melho-

ram tanto o treinamento auditivo quanto a função daaudição, facilitando a localização dos sons, o reco-nhecimento da palavra e a comunicação. Dois terçosdas crianças surdas são candidatos potenciais à am-plificação biauricular e, conseqüentemente, deveriamreceber o benefício dessa interação.

Depois de ajustados os aparelhos na criança poraudiologistas experimentados o pediatra, juntamentecom os pais, o otorrinolaringologista, o audiologista,o foniatra e o pedopsiquiatra escolherão o métodoapropriado às necessidades de comunicação da crian-ça. As decisões tomadas nesse momento terão influên-cia na posterior aquisição, pela criança, de competên-cia nesse domínio, sendo crítica a interação de todosesses profissionais.

Os pais de um lactente surdo são confrontadoscom numerosos obstáculos que impedem o desenvol-vimento normal da palavra e da linguagem, cabendoressaltar que a ansiedade e as frustrações podembloquear os liames afetivos normais entre os pais e acriança. Fischer [15] aponta quatro objetivos princi-pais para o desenvolvimento de interação positivaentre os pais e a criança: (1) a detecção precoce dadeficiência auditiva seguida da colocação de disposi-tivos apropriados de amplificação e início do trata-mento audiológico; (2) provisão de apoio efetivo aospais; (3) um programa terapêutico individualizadopara desenvolver as capacidades de comunicação dacriança e (4) a utilização de uma abordagem experi-mental à linguagem. Intercâmbios precoces entre ospais e a criança estimulam o desenvolvimento depadrões pessoais de interação e apego. A participaçãodos pais é vital para o progresso subseqüente dacriança. O primeiro ano é crítico para o desenvolvi-mento da linguagem, seguindo-se, depois, a aquisi-ção das habilidades cognitivas, sociais e emocionais.

Otite serosa

A otite serosa ou otite média com efusão é, de longe,a causa mais freqüente de deficiência auditiva nacriança. Trata-se de condição patológica flutuante eremitente cujo manejo se torna mais complicado porcausa de dúvidas relativas à necessidade de certostratamentos. Na questão de uma eventual triagem umbom argumento inicial está no grande número decrianças envolvidas e no fato de exigirem, cumulativa-mente, os caros recursos da otorrinolaringologia. Noentanto, a maior indefinição quanto ao tipo apropriadode intervenção, ao contrário do amplo consenso sobre

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a importância da identificação e da aplicação preco-ces de aparelhos no caso da surdez neurossensória[16], fazem com que as otites médias com efusãofujam dos princípios tradicionais da triagem. Toda-via, isto não impede que alguma forma de triagemseja apropriada e factível com os recursos específicosde cada localidade. No entanto, os dados cruciais paraque se definam as opções ainda não estão disponíveis.

Conclusão

A surdez limita a capacidade da criança de se comu-nicar e cria problemas que afetarão, em grau variável,cada momento de sua vida. Todavia, não é o fim detudo quando se perde a audição. Numerosas criançassurdas têm vidas plenamente satisfatórias e quando setornam adultas oferecem muito à sociedade. Emboratenha começado a perder a audição com a idade de 28anos, Beethoven continuou a compor mesmo quandocompletamente surdo, 20 anos mais tarde.

A maioria das crianças que ouve normalmentetermina de desenvolver a linguagem por volta de 4anos de idade. Como isto acontece? Pelo estímuloauditivo contínuo, pelo aporte constante de lingua-gem e pelo encorajamento dos pais. Esta aprendiza-gem é mais difícil para o recém-nascido ou criançacom grave incapacitação auditiva e, no entanto, é estacriança deficiente que se vê freqüentemente privadadesse estímulo que só ele torna a linguagem possível.

É preciso dar mais sons à criança surda, sons maisaltos, mais encorajamento, mais prática e se isto forfeito no momento adequado ela poderá apreender afalar e apreender seu idioma nativo. Caso consiga-mos isto a criança com deficiência auditiva terápercorrido um grande caminho no sentido de superara deficiência com a qual veio ao mundo. Temos deoferecer à criança surda uma linguagem que ela podereceber - seja falada ou por sinais.

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um limiar de PEA superior a 53 decibéis de nível deaudição [dBNA]). Os autores salientam que as razõespara a não-aprovação nestes testes podem ser outrasque não seja um dano permanente na audição. Portan-to, um acompanhamento cuidadoso destes recém-nascidos se torna imperativo [2]. Observações simi-lares foram relatadas por UZIEL e PIRON [3], quan-do compararam os limiares de detecção de EOE de 55recém-nascidos a termo e 40 bebês de uma unidade deterapia intensiva. Novamente, o percentual de crian-ças sem emissões detectáveis foi maior no grupoproveniente da unidade de terapia intensiva.

As EOE também estão presentes e podem serregistradas em bebês prematuros, embora a naturezadas emissões se altere com o aumento da idade pós-concepção. Isto foi mostrado por CHUANG e cols. [4]em bebês prematuros de 35 semanas. Foi ressaltadaa vantagem deste método de pesquisa (triagem) emrelação aos PEA evocados por ruído naquelas crian-ças que apresentam PEA anormais por razões diver-sas da disfunção coclear. Também foi anotado o casode 3 crianças (não aquelas do estudo) que apresenta-ram PEA anormais e EOE normais. Todas as trêshaviam sofrido asfixia de recém-nascido e duas delasapresentaram paralisia cerebral.

Além de determinar a função coclear normal emcrianças com PEA anormais decorrentes de danos nosistema nervoso central, as EOE também podem serúteis na avaliação da perda de audição funcional e emcrianças com sérias dificuldades de aprendizagem.De fato, o teste quanto a emissões otoacústicas nestascrianças identificará de forma confiável aquelas comfunções auditivas periféricas normais, reduzindo onúmero que requererá uma avaliação completa dodiagnóstico (BALDWIN e WATKIN [5]).

Emissões otoacústicas evocadas

As emissões otoacústicas evocadas (EOE) represen-tam um importante avanço na pesquisa da perda deaudição em recém-nascidos normais e bebês hospita-lizados em unidades de terapia intensiva. Este méto-do registra a energia sonora de intensidade muitobaixa emitida pela cóclea em resposta ao estímulosonoro (“eco coclear”). O dano ao mecanismo coclearou a presença de um problema no ouvido médioresultará na ausência de EOE.

BONFILS e cols. [1] registraram as EOE em 100recém-nascidos que ouviam normalmente a fim deestudar as suas propriedades básicas e os parâmetrosque as influenciavam. As EOE foram registradas em98% dos ouvidos testados. Não houve variaçõessignificativas nos limiares de detecção entre as idadesde 1 e 4 dias ou entre o sexo masculino e feminino. Osautores ressaltam a importância clínica deste testepara a pesquisa das disfunções auditivas periféricasem recém-nascidos.

Os limiares de detecção tanto para EOE como parapotenciais evocados auditivos (PEA) foram medidosem 40 bebês admitidos em uma unidade de terapiaintensiva para recém-nascidos (STEVENS e cols.[2]). Eles constataram que os níveis de estímulo emque as emissões foram pela primeira vez observadasapresentavam valor médio e distribuição semelhan-tes àqueles encontrados em recém-nascidos normais.Outrossim, a distribuição dos limiares de PEA foinovamente semelhante àqueles medidos em recém-nascidos normais. Entretanto, o número maior debebês na unidade de terapia intensiva não apresentouemissões detectáveis (16,7% em confronto com 3,9%no caso de recém-nascidos normais) e elevou oslimiares de PEA (8,1% dos ouvidos da unidade deterapia intensiva para recém-nascidos apresentavam

Revisão de artigos selecionados da literatura recentesobre perda de audição na infância

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Prevenção para a surdez adquirida

Em um artigo de revisão sobre danos à audição apósa meningite bacteriana, FORTNUM [6] salienta osbenefícios potenciais da vacina Haemophilusinfluenzae b na prevenção da meningite em criançase, conseqüentemente, na redução dos casos de surdezinfantil. A meningite responde por aproximadamente90% dos casos de perda de audição adquirida nainfância (DAVIS e WOOD [7]). Embora a meningitenem sempre seja causada pela H. influenzae b, aimunização contra este agente infeccioso específicocertamente ajudará a reduzir o número de casos deperda de audição adquirida na infância.

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Diagnóstico da surdez na criança

Existe uma variedade de parâmetros de diagnósticoutilizados na avaliação da surdez em crianças. Istopode incluir acumetria, otoscopia, testes comporta-

mentais, audiometria de tons puros (audiometria tonal)audiometria de impedância, audiometria da fala,audiometria de PEA, electrococleografia e potencialvagaroso cortical. Entretanto, a avaliação inicial nãodeve ser considerada definitiva. Um estudo por LEVIe cols. [8] ressalta a necessidade de avaliações perió-dicas da audição em crianças com perda de audiçãoneuro-sensorial. A perda de audição progressiva foidocumentada em 21 dentre 92 crianças submetidas aacompanhamento por um período de até 15 anosdesde o seu primeiro audiograma confiável. Em 62%dessas crianças a progressão da perda de audição foibilateral. Não foi encontrada qualquer relação evi-dente entre a probabilidade da progressão da perda deaudição e sua etiologia.

A questão de saber se a perda de audição neuro-sensorial pode ser uma seqüela da otite média adquiriunovo interesse com o estudo de MARGOLIS e cols. [9].Eles avaliaram a audição de alta freqüência em crian-ças com e sem históricos de otite média crônica ourecorrente, utilizando a audiometria de alta frequênciaampliada. Este procedimento foi considerado confiávelem crianças com idades de 3 a 10 anos. Os resultadosindicam que crianças com histórico de otite médiaapresentaram uma audição de alta frequência ampli-ada mais deficiente do que crianças sem otite média.Sugere-se que esta perda de audição de alta frequênciapode ter tanto uma componente do ouvido internocomo uma componente do ouvido médio.

Os testes de discriminação de fala, tais como ostestes de imagem, constituem ferramentas valiosaspara avaliar a audição em crianças novas. Conside-rando que para um grande número de crianças quefrequentam clínicas auditivas no Reino Unido, oinglês é a segunda língua, BELLMAN e MARCUSON[10] produziram e avaliaram duas listas de palavrasinglesas que previamente se demonstrou estarementre as primeiras palavras inglesas aprendidas porcrianças do subcontinente indiano. A lista final de 12palavras está atualmente sendo avaliada em um estu-do em grande escala envolvendo vários centros detodo o Reino Unido.

Nos anos recentes a audiometria de PEA se tornouuma valiosíssima ferramenta no diagnóstico da sur-dez infantil. O seu valor como um método de pesquisapode muito bem ser superado, no futuro, pelas técni-cas de emissão coclear. Entretanto, como um proce-dimento de diagnóstico, ela é ainda o teste não-invasivo mais útil que pode ser utilizado com bebêsmuito novos. Entretanto, é necessário ter cautela ao

Revisão de artigos selecionados da literatura recente sobre perda de audição na infância

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tentar estimar o grau de perda de audição e prever aeficácia da amplificação com base apenas nos primei-ros resultados da audiometria de PEA. BROOKHOUSERe cols. [11] revisaram os dados obtidos em um períodode nove anos de 119 crianças que não apresentaramrespostas auditivas evocadas por ruído do troncoencefálico a 100 dB de Nível de Audição. Subseqüen-temente, respostas comportamentais não ajudadas de100 dB de Nível de Audição ou melhores puderam serobtidas em 58% dos ouvidos a 250 Hertz, caindo para16% a 4000 Hertz. Este é um importante achado umavez que ele confirma que os limiares de PEA evoca-dos por ruído se correlacionam bem com limiarescomportamentais de tons puros na região de freqüên-cias de 2000-4000 Hz, porém não com aqueles de1000 Hz ou menos. Eles, além disso, demonstraramo limiar ajudado de 60 dB de nível de audição oumenos em 53% dos casos na média de tons puros de500 e 1000 Hz e em 42% dos casos para 500, 1000 e2000 Hz. Isto claramente enfatiza o ponto que aamplificação auditiva pode ser ainda de valor consi-derável em crianças que não apresentam respostacom audiometria do tronco encefálico evocada porruído.

Embora o teste de PEA em bebês a termo sejarazoavelmente direto para o audiologista treinado, oteste de bebês prematuros em Unidades de TerapiaEspecial para Bebês coloca alguns problemas. Estesincluem a possível interferência elétrica de outrosequipamentos, ruídos de fundo, dificuldade em obterboa impedância dos eletrodos na pele de bebês pre-maturos e mais altas taxas positivas falsas devido àimaturidade neurológica do trajeto auditivo. Em umatentativa para superar estas dificuldades, ROWE [12]pesquisou a viabilidade de um programa de pesquisa(triagem) post-neonatal reexaminando bebês de PEAa 46 semanas de idade pós-concepção (PCA: 6 sema-nas da data de parto esperada). Das 282 criançasnascidas durante 1986 em West Berkshire, Inglater-ra, 243 participaram do teste, o que dá uma taxa decobertura de 86%. Para cada bebê, uma determinaçãode limiar de PEA completa foi realizada em ambos osouvidos, sempre que possível. Trinta e sete bebês(15%) foram reconvocados para uma nova avaliação.As razões para a reavaliação foram a ausência de PEAa 30 dB de Nível de Audição em um ou ambos ouvidosou a dificuldade em obter resultados confiáveis devidoa bebês agitados. Apenas 25 (68%) participaram dosegundo encontro. Constatou-se que os bebês queinicialmente eram intestáveis apresentaram menor

probabilidade de retornar para um novo teste. A taxade prevalência estimada para a perda de audiçãoneurosensorial bilateral foi de 1,4% com 4 casosconfirmados. Embora algumas crianças deixassemde participar do teste quer no primeiro quer nosegundo encontro, nenhuma delas foi subseqüente-mente diagnosticada como tendo dano de audiçãopermanente. O autor concluiu que o teste de PEAapós a alta constitui uma alternativa funcional eviável para os programas de triagem de recém-nasci-dos anteriores à alta. A taxa de cobertura de 86%conseguida neste estudo é semelhante a coberturasrelatadas por outros autores para testes de PEA ante-riores à alta.

A despeito da ampla faixa de ferramentas dediagnóstico disponíveis, as tentativas de determinara causa do dano à audição ainda são infrutíferas namaioria dos casos. A varredura (“scanning”)tomográfica computadorizada é freqüentemente uti-lizada a fim de avaliar pacientes com perda deaudição neurosensorial de causa desconhecida.SHUSTERMAN e cols. [13] realizaram um estudoretrospectivo a fim de pesquisar a utilidade destemétodo de diagnóstico em crianças. Eles passaramem revista os filmes e gráficos de 70 crianças conse-cutivas vistas em seu departamento entre janeiro de86 e julho de 90. A faixa de idades foi de 1,0 a 21 anos,porém apenas 2 elementos ultrapassaram 16 anos.Eles observaram que apenas 9 dentre 70 varredurasapresentaram anormalidades significativas. Além domais, estes achados não contribuíram para diagnosti-car ou ter qualquer influência no tratamento dosdanos aos ouvidos. De acordo com estes autores, avarredura tomográfica computadorizada é útil princi-palmente para detectar tumores acústicos que são,entretanto, extremamente raros em crianças commenos de 16 anos de idade. Mesmo ao procurarfístulas perilinfáticas, o emprego da varredura podeser questionável devido ao alto número de imagensnegativas falsas nestes casos. Conclui-se que as des-vantagens da varredura computadorizada para crian-ças, ou seja, a exposição à radiação e a necessidade desedação juntamente com o baixo poder de diagnósti-co, não justifica seu emprego sistemático neste grupoetário.

A eletrococleografia constitui uma técnica útil pararegistrar os potenciais de ação do nervo auditivo, tendosensibilidade pelo menos tão alta quanto as respostasauditivas do tronco encefálico. Seu emprego emaudiologia pediátrica é limitado porque a maioria dos

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centros utiliza a abordagem transtimpânica de coloca-ção de eletrodos que requer uma anestesia geral. Istoa despeito de uma variedade de outras técnicas desen-volvidas nas duas últimas décadas que favorecem acolocação timpânica ou extra-timpânica de eletrodo,requerendo apenas uma sedação branda para crian-ças. NOWOSIELSKI e cols. [14] descreveram ummétodo extra-timpânico que proporciona um contatoelétrico estável e melhora a qualidade do registro.Eles alegam ter obtido bons resultados em criançasmuito novas.

Referências bibliográficas

08. Levi H, Tell L, Feinmesser M. Progressive hearing lossin hard-of-hearing children. Audiology 1993;32:132-6.

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12. Rowe SJ. An evaluation of ABR audiometry for screen-ing and detection of hearing loss in ex-SCBU infants. BrJ Audiol 1991;25:259-74.

13. Shusterman D, Handler SD, Marsh RR, Bilaniuk L, TomLWC. Usefulness of computed tomography scan in evalu-ation of sensorineural hearing loss in children. ArchOtolaryngol Head Neck Surg 1992;118:501-3.

14. Nowosielski JE, Redhead TJ, Kattula SP. Extratympanicelectrocochleography with a conductive fluid and flex-ible electrode. Br J Audiol 1991;25:345-9.

Tratamento médico dos problemasdo ouvido médio

Poucos temas na literatura médica foram tão ampla edetalhadamente estudados quanto o tratamento daotite média. Entretanto, conforme questionado porGRUNDFAST [15], com uma “tão grande abundânciade relatórios sobre todas as formas de tratamento daotite média, porque ainda enfrentamos tanta incertezaquanto aos métodos de tratamento “ Em seu interes-sante artigo sobre esta interminável controvérsia,Grundfast reflete sobre os diferentes aspectos desta

questão complexa: esteróides “versus” ausência deesteróides; procura do agente anti-microbiano maiseficaz; tratamento médico prolongado “versus” inter-venção cirúrgica; vantagens de uma abordagem cirúr-gica em relação a outra. Os relatórios publicados sobrequaisquer destas questões são muito freqüentementeconflitantes, senão contraditórios e “tem-se a sensaçãode que, a despeito de muitos relatórios de estudosclínicos e de ciência básica, não estamos próximos dechegar a um consenso”. O autor advoga que as pesqui-sas futuras devem se concentrar na identificação deparâmetros de resultados e avaliação da capacidaderelativa de diferentes métodos de terapia para conse-guir os resultados desejados. Dois anos mais tarde, oestado da pesquisa da otite média não se alterougrandemente e as opiniões divergentes são prova deque o interesse no tratamento da otite média e acontrovérsia em torno da mesma estão longe de teremsido concluídos.

A cefixima é uma cefalosporina de terceira gera-ção e foi avaliada por OWEN e cols. [16] para otratamento da otite média aguda em crianças. Umprojeto de estudo aleatório, não cego, foi empregadoem 201 crianças, com idades de 2 meses a 6 anos. Oestudo focalizou a eficácia do tratamento contrapatógenos bacterianos específicos no ouvido médio.Noventa e nove crianças receberam doses diárias de 8mg/kg de cefixima oral durante 10 dias e o outrogrupo de 102 crianças recebeu 40 mg/kg por dia, emtrês doses divididas a intervalos de 8 horas, deamoxicilina oral durante dez dias. Após um acompa-nhamento de 3-4 semanas, não se constatou qualquerdiferença estatisticamente significativa entre os doisgrupos para a taxa de melhoria clínica e taxa de erra-dicação da Haemophilus influenzae e Streptococcuspneumoniae. Entretanto, após combinar os resultadoscom dois outros estudos, os autores concluíram que acefixima é melhor para o tratamento da H. influenzaeenquanto que a amoxicilina é melhor para erradicar asinfecções da S. pneumoniae.

A ceftriaxona é a cefalosporina de ação maislonga. Um ensaio clínico prospectivo, aleatório du-plo cego realizado por GREEN e ROTHROCK [17]mostrou-se promissor como um tratamento de umasó dose de otite média aguda não complicada quandoaplicado de maneira intramuscular. O estudo foirealizado em 233 crianças, com idades de 5 meses a5 anos. Uma só injeção de ceftriaxona mais suspen-são oral do placebo durante 10 dias foram administra-das a 116 crianças, enquanto que o outro grupo de 117

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crianças recebeu uma injeção de placebo e suspensãooral de amoxicilina durante dez dias. O tratamento foibem sucedido em 91% dos casos em ambos osgrupos. Após o acompanhamento a 2 e 9 semanas, astaxas de recaída e recorrência foram também seme-lhantes. Concluiu-se que uma só injeção intramuscularde 50 mg/kg de ceftriaxona é tão eficaz quanto dezdias de amoxicilina oral para o tratamento da otitemédia aguda não complicada em crianças.

Com base em sua experiência clínica, BOLLAG ecols. [18] desenvolveram um protocolo em que defi-niram critérios para diagnóstico e tratamento da otitemédia aguda. Eles testaram este protocolo em umestudo de dois anos de 168 crianças com idades de 0a 16 anos e confirmaram os seus resultados com umgrupo de acompanhamento de 62 crianças que seapresentaram com otite média aguda no ano seguinte.Suas observações indicam que o diagnóstico pode serbaseado nos seguintes critérios: histórico de dor ouapresentação de dor no ouvido(s); evidência objetivaou observada de perda de audição e inflamação do(s)tímpano(s). Eles também concluíram que outros pro-cedimentos de diagnóstico tais como otoscopia pneu-mática, timpanometria ou reflectometria acústica nãosão aconselháveis uma vez que as informações queoferecem com muita frequência são imprecisas e nãoreproduzíveis em diferentes mãos. Outro achadoimportante foi que a infecção do trato respiratóriosuperior estava presente em 90% dos casos. A otorréiaesteve presente em 10% das crianças. Seu tratamentoda otite média aguda envolveu principalmente oemprego de analgésicos (dipirona e ácido mefena-mínico são recomendados ao invés da aspirina ouparacetamol), instilação de gotas nasais de soro fisio-lógico para a diluição de secreções nasais e umidificaçãoda mucosa respiratória superior. Os antibióticos sãorecomendados apenas nas seguintes circunstâncias:antecedentes de meningite purulenta aguda ou infec-ção bacteriana focal concorrente; uma evolução difí-cil (isto é, dor e um mal-estar geral, incluindo umafebre acima de 39°C durante mais de três dias); oumediante demanda dos pais. Os pacientes foramreexaminados duas semanas depois e novamenteapós dois meses no caso de perda de audição residualter sido encontrada na primeira verificação. Isto sóocorreu em quatro crianças do primeiro grupo e umado grupo de acompanhamento, mas todas apresenta-ram audição normal na segunda verificação. Nenhu-ma complicação séria da otite aguda média foi obser-vada neste estudo.

Referências bibliográficas

15. Grundfast KM. Management of otitis media: a contro-versial issue. Pediatr Infect Dis J 1991;10:269-74.

16. Owen MJ, Anwar R, Nguyen HK, Swank PR, BannisterER, Howie VM. Efficacy of cefixime in the treatment ofacute otitis media in children. Am J Dis Child 1993;147:81-6.

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18. Bollag U, Bollag-Albrecht E. Recommendations derivedfrom practice audit for the treatment of acute otitis me-dia. Lancet 1991;338:96-9.

Tratamento cirúrgico

A fim de avaliar a eficácia e as seqüelas dos túbulosde ventilação, LE e cols. [19] realizaram um acompa-nhamento de três anos de 57 crianças que receberaminserção de túbulo (“grommet”) unilateral em umouvido selecionado aleatoriamente. O ouvido contra-lateral foi tratado de forma randomizada, seja pormiringotomia ou sem cirurgia. A terapia médica e aprofilaxia antibiótica foram utilizadas conforme a ne-cessidade. A eficácia foi avaliada em termos de redu-ção do número de episódios de otite aguda média emelhoria da audição. Constatou-se que a inserção detúbulos de ventilação reduziu significativamente aincidência de otites e melhorou a audição enquantoforam deixados no lugar (o tempo médio de túbulos emfuncionamento foi de 10 meses); entretanto, a maioriados ouvidos tratados medicamente também apresen-tou melhora (não ficou claro quão grande é tal maioriae o que exatamente se quer dizer com a palavramelhoria); a miringotomia sem inserção de túbulo nãomelhorou a doença do ouvido médio quando compara-da com o tratamento médico apenas. Diz-se que nesteestudo a proporção de seqüelas cirúrgicas está deacordo com outros dados publicados que mostram quea timpanoesclerose está presente em 30 a 60% doscasos, a atrofia em 13 a 40%, a otorréia em 12 a 41%e a perfuração persistente em 4%. Tendo em vista estesresultados, os autores concluem que existe a necessi-dade de um emprego mais seletivo e cuidadoso dostúbulos para doenças do ouvido médio em crianças.Em casos onde o tratamento cirúrgico se justifica, ainserção unilateral de um túbulo (“grommet”) poderáser considerada uma vez que limita qualquer seqüelacirúrgica possível a um ouvido.

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SALAM e cols. [20] constataram que a presença decera sob pressão, por ocasião da inserção do túbulo,constituiu um fator de prognóstico deficiente. Em umestudo de acompanhamento de 113 crianças quesofriam de otite média com efusão que se submeterama uma miringotomia e inserção de túbulo, o grupo decrianças que apresentou cera sob pressão mostrou umataxa de recorrência de 64,3%, em comparação com7,8% naquelas com cera que não estava sob pressão.A fim de reduzir o número de reinserções, os autoresadvogam o emprego de túbulos suscetíveis de seremconservados por mais tempo.

A fim de avaliar os efeitos sobre a audiçãoda adenoidectomia com ou sem a inserção de túbulo,DEMPSTER e cols. [21] projetaram um estudoprospectivo, randomizado, de 78 crianças com efusãobilateral persistente e perda de audição associada de25 dB ou mais. Cada criança foi tirada ao acaso paraser submetida ou não à adenoidectomia. Outrossim,os ouvidos de cada criança foram então aleatoriamen-te randomizados para não serem submetidos à cirur-gia do ouvido ou para serem submetidos à inserção dotúbulo. Todas as crianças foram então reavaliadas 6e 12 meses após a cirurgia. Os resultados indicam queo efeito da cirurgia, quer se trate de adenoidectomia,inserção de túbulo ou ambas é sobretudo evidente 6meses após a cirurgia uma vez que a taxa de resoluçãoespontânea a 12 meses é tal que grandemente reduz osefeitos da cirurgia. A inserção do túbulo provou ser otratamento cirúrgico mais eficaz tanto para resoluçãoda efusão como para a melhoria na audição. Aadenoidectomia mais a inserção de túbulo parecem terum pequeno efeito aditivo. Um achado interessanteneste estudo é que os efeitos da cirurgia são restritosaos meninos apenas. Os autores acreditam que isto édevido ao fato de que as meninas apresentam umataxa de resolução natural muito melhor a 6 meses.Embora outras evidências se tornem necessárias, elessugerem que a cirurgia em meninas deve ser conside-rada com maior cautela devido à probabilidade de aresolução natural ocorrer mais rápido do que nosmeninos.

Uma das principais razões para tratar a otite médiaaguda recorrente é a prevenção de atrasos no desenvol-vimento da linguagem. HARSTEN e cols. [22] avalia-ram o desenvolvimento da linguagem em 4 e 7 anos deidade em dois grupos de crianças, um com episódiosrepetidos documentados de otite média aguda duran-

te os primeiros 3 anos de vida e outro sem quaisquerepisódios de otite média aguda. Não ocorreram dife-renças significativas no desenvolvimento da lingua-gem entre os dois grupos, nem em 4 nem em 7 anos.Entretanto, foi salientado que as crianças em talestudo tiveram a vantagem do tratamento médicoativo e foram expostas a um ambiente linguisticamenteestimulante. Quando o desenvolvimento da lingua-gem já corre riscos devido às circunstâncias ambientaisadversas, a otite média recorrente pode se constituirem um importante fator agravante.

O diagnóstico e tratamento da doença do ouvidomédio, embora seja importante em todas as crianças,são absolutamente vitais naquelas com perda auditi-va neurosensorial. Um grupo de 437 crianças foiacompanhado por um período médio de 3,2 anos porBROOKHOUSER e cols. [23]. A inserção de túbulofoi realizada em 35,2% daquelas crianças devido àgravidade da doença do ouvido médio e seu impactona acuidade auditiva. Quando a otite média comefusão provoca flutuações de limiares auditivos jádiminuídos, quaisquer benefícios de auxílio de audi-ção podem ser completamente anulados. Os autoressugerem que, especialmente durante os meses deoutono e inverno, uma timpanometria seja realizadapelo menos mensalmente em contextos educacionaisque sirvam a crianças surdas. Esta triagem regulardeve ser obrigatória na pré-escola.

Referências bibliográficas

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ros três anos de sua vida, não foi constatada qualquerdiferença significativa na percepção da fala. Istoimplica em que as experiências auditivas precocesnão proporcionam uma vantagem óbvia na aprendi-zagem da percepção e interpretação de informaçõestransmitidas por um implante coclear. Entretanto,para crianças cuja idade no início da surdez era decinco anos ou mais, foram obtidos registros significa-tivamente melhores do que para aquelas crianças comsurdez congênita ou precocemente adquirida.

Referências bibliográficas

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Auxílios para Audição

Os auxílios para a audição (aparelhos acústicos)requerem testes regulares a fim de assegurar que elesforneçam a amplificação esperada. Isto em geral éfeito com equipamentos especiais embora se saibaque o desempenho dos auxílios para a audição, quan-do no lugar atrás do ouvido, pode ser levementediferente. Um microfone de tubo-sonda colocado nocanal auditivo permite a medição do desempenho realdo auxílio para audição in situ, porém é consideradomuito difícil em crianças muito novas. WESTWOODe BAMFORD [29] realizaram medições em microfo-ne de tubo-sonda em 12 bebês não sedados commenos de seis meses de idade e constataram ser issoviável, repetível e prático. Também se constatou quea frequência de ressonância média nestes bebês ocor-reu em uma frequência significativamente mais alta

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Implantes Cocleares

As crianças com perda auditiva branda a grave po-dem ser tratadas com os auxílios de audição conven-cionais. Entretanto, até a última década, a criançaprofundamente surda recebia poucos benefícios daestimulação sonora (KVETON e BALKANY [24]). Odesenvolvimento do implante coclear alterou estasituação. O implante coclear é um dispositivo protéticoconsistindo de dois componentes, o interno sendocolocado cirurgicamente. O componente externoconsiste de um microfone que recebe o som externoe o transfere para o processador de sinais que otransforma e transmite para o transmissor externo. Osinal é então passado através da pele para o receptorinterno que é colocado no osso temporal acima e atrásda aurícula. Um ou mais eletrodos implantados nacóclea ou em torno da mesma, agora levam este sinalelétrico para estimular o nervo auditivo, produzindoassim uma sensação de som.

Este procedimento não pode ser utilizado em todasas crianças profundamente surdas e uma variedade defatores é considerada durante a avaliação do pré-implante. HELLMAN e cols. [25] desenvolveram umperfil a fim de selecionar sistematicamente os candi-datos. Eles levam em conta onze fatores,incluindo aidade, causa e duração da surdez, condições físicas epsicossociais, grau de surdez e habilidades de comu-nicação, apoio e expectativas da família, apoio pro-fissional e educacional. BROOKHOUSER e cols. [26]recomendam um mínimo de um ano de experimenta-ção supervisada com auxílios de audição convencio-nais antes de se chegar a uma decisão final comrespeito a um implante coclear. Uma vez que estadecisão tenha sido tomada e a criança atenda aocritério de seleção, a colocação cirúrgica do próprioimplante é relativamente fácil. A criança, pode, emgeral, ter alta no terceiro dia após a operação. Areabilitação após a operação é a etapa mais difícil e quemais consome tempo. O componente externo é insta-lado aproximadamente um mês após a operação a fimde permitir uma audição normal(HORN e cols. [27]) eo dispositivo é ligado e ajustado. Terão lugar freqüen-tes visitas de acompanhamento para reajuste dos ele-trodos e monitoramento do progresso da criança.

OSBERGER e cols. [28] pesquisaram o efeito daidade do início da surdez, em 37 crianças profunda-mente surdas com um implante coclear, sobre ascapacidades de percepção da fala. Para crianças quenasceram surdas ou adquiriram a surdez nos primei-

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do que a frequência de ressonância média para adul-tos. O tamanho do pico de ressonância foi mostradocomo variando positivamente com o volume do canalauditivo, o que tem implicações importantes para oajuste da resposta de frequência do auxílio para aaudição à medida que a criança cresce.

Referências bibliográficas

29. Westwood GFS, Bamford JM. Probe-tube microphonemeasurements with very young infants. Br J Audiol1992;26:143-51.

Perda de audição unilateral

Os mecanismos auto-imunes são suspeitos de consti-tuírem o fator etiopatogenético em alguns casos deperda de audição em progresso rápido e surdez repen-tina. VELDMAN e cols. [30] examinaram 15 pacien-tes com perda de audição neurosensorial idiopáticaem processo rápido e 31 com surdez repentina econstataram anticorpos de reação cruzada em ambosos grupos (73% e 65%, respectivamente). A terapiaimunosupressiva foi eficaz em apenas 50% dos casosno primeiro grupo. Nos casos de surdez repentina, aterapia esteróide foi mais eficaz no restabelecimentoda audição do que a ausência de tratamento, indepen-dentemente dos resultados da avaliação imunológica.Testes imunológicos ulteriores e mais específicosprecisam ser realizados para uma melhor compreen-são do processo imunológico subjacente a estas con-dições.

A perda de audição unilateral em crianças muitofreqüentemente é deixada desapercebida e, mesmoquando diagnosticada, não é normalmente considera-da detrimental para o desenvolvimento global dacriança e avanço nos estudos. BROOKHOUSER ecols. [31] revisaram uma série consecutiva de 324crianças e adolescentes com audição neurosensorialunilateral documentada e constataram que elas passa-ram por mais dificuldades nos estudos e manifesta-ram mais problemas comportamentais na escola doque crianças comparáveis com audição normal. Elesconcluíram que deveriam ser envidados esforços afim de obter medições precisas e precoces da acuidadeauditiva em crianças de alto risco. Os pais, professo-res e clínicos devem estar cônscios desta condição.As crianças com perda auditiva unilateral requeremum acompanhamento regular para documentação danatureza estável ou progressiva da surdez.

Referências bibliográficas

30. Veldman JE, Hanada T, Meeuwsen F. Diagnostic andtherapeutic dilemmas in rapidly progressive sensorineu-ral hearing loss and sudden deafness. A reappraisal ofimmune reactivity in inner ear disorders. Acta Otolaryngol(Stockh) 1993;113:3034.

31. Brookhouser PE, Worthington DW, Kelly WJ. Unilateralhearing loss in children. Laryngoscope 1991;101:1264-72.

Aspectos Educacionais

No decorrer de sua história, a educação dos surdossempre foi um tema de animadas e intensas discus-sões. Em seu artigo “Os grandes debates”, MOORE[32] resume três aspectos da educação do surdo quetêm sido fontes subjacentes constantes de tensão,atrito e controvérsias. Ele faz referência à colocaçãona escola, modalidade de comunicação e currículoescolar. Embora atualmente a maioria das criançassurdas seja colocada em escolas gerais, os benefíciosde uma tal mudança para o seu avanço educacionalainda é desconhecido. O autor expressa sua preo-cupação em relação à capacidade do jovem surdopara enfrentar um ambiente adverso, bem como acapacidade da escola de atender às necessidadeseducacionais e socio-emocionais das crianças surdas.Com respeito à modalidade de comunicação, a ten-dência atual é de mudar dos métodos orais apenaspara aquilo que vem sendo chamado de abordagem decomunicação total. Isto inclui uma variedade desistemas manuais que são utilizados em conjuntocom a língua falada. Mais recentemente, a aborda-gem bilingüe advoga a introdução de linguagem desinais (conforme utilizada pela comunidade de sur-dos) entre os jovens surdos desde o início do diagnós-tico. A finalidade é tornar a linguagem de sinais alíngua primeira ou língua-mãe da criança surda. Alíngua falada desta comunidade seria aprendida emum estágio posterior, como uma segunda língua. Aquestão do currículo escolar é sobretudo uma questãode quanto tempo dedicar às matérias das crianças queouvem, tais como matemática, ciência ou história, equanto tempo pode ser devotado às necessidadesparticulares das crianças surdas. Na opinião de Moore,“em uma situação ideal proporcionaríamos às crian-ças surdas um alto grau de habilidades em nossasáreas tradicionais de concentração enquanto simulta-neamente proporcionando a elas o mesmo nível derealização em áreas de conteúdo... e expondo-as a

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experiências culturais e lingüísticas singulares para asurdez”.

Um marco na controvérsia sobre os métodos edu-cacionais para crianças surdas é o trabalho deJOHNSON e cols. [33] “Desbloqueando o currículo”.Estes autores citam vários trabalhos e relatórios queprovam que, nos Estados Unidos, o progresso dascrianças surdas fica notavelmente atrás do progressodas crianças que ouvem em praticamente todas asáreas do currículo. As razões para este fracasso sãoexaminadas detalhadamente e tanto os programasorais apenas como os programas orais-manuais sãoseveramente criticados. Em resumo, o principal obs-táculo enfrentado pelas crianças surdas é a falta deacesso ao currículo. Nos programas orais “espera-seque as crianças recebam, processem e aprendam todoo conteúdo curricular através do inglês falado”, alíngua que eles supostamente deverão começar adominar. Esperava-se que a abordagem da comuni-cação total superasse aquele problema acrescentandosinais manuais à língua falada. Os seguidores destemétodo acreditavam que tornando a linguagem visí-vel, eles tornavam mais fácil para a criança surdadominar a gramática e a estrutura da língua falada.Com base em diferentes estudos e em seu própriotrabalho, os autores demostram que não é possívelfalar e fazer sinais corretamente ao mesmo tempo.Com muita frequência, ou a mensagem falada ou amensagem em sinais, quando não ambas, sofremdistorções ou ficam incompletas. Em alguns casos, aparte dos sinais se mostrou ser ininteligível, mesmopara emissores de sinais nativos. Isto ajuda a explicarporque o “método simultâneo” fracassou em conse-guir uma melhoria pronunciada no desempenho es-colar e lingüístico das crianças surdas. Na últimaparte de seu trabalho, os autores explicam a filosofiado bilingualismo e propõem um programa ou modeloa fim de colocá-lo em prática. Neste programa, ascrianças surdas devem ser expostas à linguagem desinais tão logo sejam identificadas. As famílias deve-riam receber ampla oportunidade e apoio para apren-derem a linguagem de sinais. Na escola, a modalidadebásica de comunicação deveria ser a linguagem desinais. O teor curricular também deveria ser apresen-tado em linguagem de sinais. O inglês deveria serensinado através da alfabetização (leitura e escrita)como uma segunda linguagem. A compreensãoe produção da fala são habilidades a serem desen-volvidas após a competência na linguagem ter sidoconseguida através da alfabetização.

Entretanto, alguns autores expressam reservasquanto à implementação de um programa bilingüe.STUCKLESS [34], embora apoiando a utilização desinais com a maioria das crianças surdas, discorda dafalta de ênfase no treinamento da fala nos primeirosanos. Em sua opinião, o atraso na introdução dalíngua falada pode prejudicar o desenvolvimento dacomunicação oral. Ele também se preocupa com apressão exercida sobre as famílias de crianças surdaspara aprender e utilizar a linguagem de sinais com acriança e questiona se esta é uma expectativa razoá-vel. Não se deve fazer com que os pais se sintamculpados caso prefiram não aprender a linguagem desinais.

A questão da comunicação total também é exami-nada por WOOD [35]. Após definir diferentes siste-mas de sinais utilizados em tais programas, o autorresume alguns dos argumentos mais importantes afavor e contra este método educacional. Além disso,ele analisa as pesquisas recentes focalizando mais oestilo da interação que a modalidade de comunicação.Alguns destes trabalhos parecem sugerir que, inde-pendentemente da modalidade de comunicação, ospais e professores que permitem que a criança inicieseus próprios temas de conversação têm crianças comhabilidades de comunicação aprimoradas. Infeliz-mente, a maioria dos pais e educadores se comportacom suas crianças surdas de uma forma um tantocontroladora, adotam um tom emocional menos po-sitivo e estão constantemente tentando corrigir aqualidade ou gramática da fala da criança.

CORNELIUS e HORNETT [36] estudaram o com-portamento lúdico de 20 crianças surdas com idadesde 5 a 6 anos. Dez crianças participaram de umprograma oral/auditivo enquanto que as outras dezparticiparam de uma classe em que um sistema desinais foi utilizado juntamente com a fala. Eles cons-tataram diferenças estatisticamente significativas entreos dois grupos de crianças em seus jogos, imitando ocomportamento dos adultos (tais como mamães epapais, doutores e enfermeiras), bem como seusníveis de agressão. As crianças na classe com baseoral se envolveram mais freqüentemente em jogossolitários, raramente vocalizados, fizeram poucosgestos e não demonstraram formas interativas oucooperativas de comportamento. O nível de agressãofoi bastante alto neste grupo. As crianças que utiliza-ram sinais brincaram em grupos de 3 a 5, demonstra-ram níveis mais altos de comportamento de açãosocial e níveis mais baixos de agressão. Os autores

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concluem que a comunicação física através de sinaise outras formas de movimento deve ser encorajadanas crianças surdas.

A despeito de todas as evidências sugerindo que ascrianças surdas apresentam melhor desempenho quan-do podem utilizar alguma forma de comunicaçãomanual, a abordagem oral/auditiva ainda é preferidaem muitas escolas. CONNOLLY e cols. [37] avalia-ram as habilidades de 31 crianças inscritas em umprograma oral/auditivo que não apresentaram res-postas à audiometria encefálica. O desempenho dascrianças foi classificado como excelente, bom, razo-ável ou deficiente. Os fatores associados ao melhordesempenho foram a idade de inscrição no programade habilitação, o grau de envolvimento dos pais e ograu de audição residual a 250 Hz. Entretanto, éimportante salientar que mesmo crianças no grupoexcelente tinham uma fala somente inteligível para“ouvintes familiares”. Outrossim, a causa da surdezem 6 destas crianças foi a meningite, o que levanta apossibilidade de que estas crianças poderiam tertido uma audição normal por um período de tempovariável antes da doença. Isto certamente influenciariaas suas habilidades de linguagem e fala de uma manei-ra positiva.

Através de um levantamento nacional realizado nosEstados Unidos, ROUSCH e cols. [38] tentaram exami-nar as atitudes e opiniões de profissionais sobre aparticipação dos pais no planejamento e implementaçãode métodos e serviços para crianças surdas e suasfamílias. No conjunto, os profissionais acreditavamque a participação da família deveria ter prioridademais alta do que recebia em seus contextos de empre-go correntes. Entretanto, seus programas de treina-mento escolar não os preparava para lidar com aparticipação da família que efetivamente tinha lugarnos seus contextos de emprego. Estes resultadossugerem que os praticantes que trabalham com crian-ças surdas novas atribuem um alto valor à necessida-de e à desejabilidade da intervenção centrada nafamília. Entretanto, devem ser esperadas dificulda-des tais como a falta de interesse e envolvimento dealgumas famílias, especialmente aquelas com condi-ções de vida difíceis. As discrepâncias entre as prio-ridades dos pais e dos profissionais também podemcausar situações de sério conflito. O progresso emtais casos só pode ser conseguido compartilhandocom as famílias as habilidades, conhecimentos ecompetência necessários para tomar decisões beminformadas.

A maneira como as mães que ouvem interagem comsuas crianças surdas e as conseqüências de suasformas particulares de interação sobre a linguagem edesenvolvimento geral da criança surda, constituemum tema de crescente interesse entre os pesquisado-res. SPENCER e GUTFREUND [39] analisaram ecompararam o comportamento interativo de mãesque ouvem, com suas crianças surdas pré-linguísticase aquelas que ouvem normalmente. Eles constataramque as mães não surdas de crianças surdas reagiamtão bem quanto as mães não surdas de crianças nãosurdas, porém tendiam a ser mais controladoras,escolhendo os temas de conversa e os jogos quequeriam jogar com a criança. Similarmente ao que foisugerido para as crianças de audição normal, estesmodelos de interação dominados pela mãe podem terefeitos negativos a longo prazo sobre o desenvolvi-mento da linguagem das crianças, o desenvolvimentode sua auto-estima e o seu grau de cooperação eparticipação.

Como um número cada vez maior de crianças estárecebendo implantes cocleares em idades muito ten-ras, os professores devem se preparar para as diferen-tes necessidades destas crianças em termos de habi-litação auditiva. Eles também precisam aprendercomo monitorar e cuidar de implantes. Com base emsua própria experiência de trabalho com crianças comimplante no Central Institute for the Deaf, MOOG eGEERS [40] produziram amplas informações sobrequestões tais como monitoramento e cuidados dosimplantes cocleares, diferenças a serem esperadas nodesenvolvimento de habilidades de percepção da falade crianças com implante e como tirar partido destasdiferenças. No mesmo trabalho, eles descrevem umestudo longitudinal, com o objetivo de avaliar oimpacto de implantes cocleares sobre o desenvolvi-mento da língua falada. As crianças que utilizamimplantes cocleares foram confrontadas com doisoutros grupos de crianças, um utilizando auxíliostácteis e e outro utilizando auxílios auditivos conven-cionais. Testes de percepção auditiva da palavra,reforço visual, produção da fala e linguagem oralestão sendo administrados a todas as crianças, aintervalos regulares. Resultados preliminares indi-cam que, 12 meses após o teste, ocorreram melhoriasem todas as áreas avaliadas, independentemente dodispositivo utilizado. Entretanto, as crianças comimplantes cocleares, apresentaram um maior índicede progresso na aquisição de atividades de percepçãoauditiva da fala e, 18 meses após o teste, exibiram

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progressos significativos no desenvolvimento dehabilidades de produção da fala. As diferenças nodesenvolvimento da linguagem entre os três gruposainda não se evidenciaram 18 meses após o teste. Osautores prevêem que a vantagem auditiva possibilita-da pelo implante coclear poderá não se evidenciar emuma linguagem falada significativamente aprimora-da antes de 2 ou 3 anos após o implante.

Referências bibliográficas

32. Moore DF. The great debates: where, how and what toteach deaf children. Am Ann Deaf 1991;136:35-7.

33. Johnson RE, Liddel SK, Erting CJ. Unlocking the Cur-riculum: principles for achieving access in deaf educa-tion. Gallaudet Research Institute. Working Papers 89-3.Washington D.C.: Gallaudet University, 1991;136;35-7.

34. Stuckless ER. Reflections on bilingual, bicultural educa-tion for deaf children. Am Ann Deaf 1991;136:270-2.

35. Wood D. Total communication in the education of deafchildren. Dev Med Child Neurol 1992;34:266-9.

36. Cornelius G, Hornett D. The play behavior of hearing-impaired kindergarten children. Am Ann Deaf 1990; 135:316-21.

37. Connolly PK, Stout GG, Williams ST, Jorgensen S, SmithRJH. Oral habilitation of the child with no response onbrainstem audiometry. Pediatrics 1990;86:217-20.

38. Roush J, Harrison M, Palsha S. Family-centered earlyinterventions: the perceptions of professionals. Am AnnDeaf 1991;136:360-6.

39. Spencer PE, Gutfreund M. Characteristics of "dialogues"between mothers and prelinguistic hearing-impaired andnormally-hearing infants. Volta Review 1990;92(7):351-60.

40. Moog JS, Geers AE. Educational management of chil-dren with cochlear implants. Am Ann Deaf 1991;136:69-76.

Aspectos Psicológicos

Em um passado recente, a maioria dos trabalhos depesquisa parecia determinada a caracterizar as crian-ças e adultos surdos como uma população de alto riscopara o desenvolvimento de distúrbios comportamentaise desajuste social-emocional. Entretanto, recentemen-te, esta tendência está mudando e vão se acumulandomais evidências que negam aqueles achados iniciais.Após passar em revista 20 anos de literatura sobre apsicologia dos surdos, LANE [41] compilou uma listade aproximadamente 70 traços atribuídos às pessoassurdas. A análise destes traços revelou sua inconsistên-

cia, uma vez que muitos são contraditórios (agres-sivos/submissos; ingênuos/perspicazes; explosivos/tímidos; suspeitosos/confiantes). Entretanto, elessão consistentemente negativos. Ao examinar ametodologia utilizada naqueles distúrbios, ele consta-tou que a administração dos testes não foi clara econfiável; a linguagem do teste é incompreensívelpara os testes; a pontuação dos testes não é confiávele radicalmente aberta ao viés do examinador, sola-pando a confiabilidade e validade do teste; o teor dostestes não está relacionado com a experiência eescolaridade dos surdos e as normas de testes estãoausentes ou são inapropriadas; finalmente, as popu-lações estudadas foram inadequadamente caracteri-zadas e controladas. Como resultado desta análise,ele descarta a existência de uma psicologia dos surdose considera tal conceito como representando apatologização de diferenças culturais, a interpretaçãode um desvio como diferença. Ele tenta explicar oacúmulo de tais pesquisas com falhas como represen-tando a atitude paternalista dos profissionais da audi-ção, ignorantes das instituições da linguagem, cultu-ra, história, hábitos e experiências das pessoas sur-das. O único remédio para evitar semelhantes falhasnas pesquisas futuras seria recrutar e treinar pessoassurdas para trabalhar como pesquisadores, conse-lheiros e colaboradores, lado a lado com pesquisado-res dotados de audição.

COLE e EDELMANN [42] pesquisaram as percep-ções próprias e as percepções de professores deadolescentes surdos em relação à identidade cultural.Os autores consideraram que a maior parte dos pro-blemas de comportamento e socio-emocionais atri-buídos na literatura às pessoas surdas poderia serapenas uma conseqüência da metodologia utilizada.As conclusões geralmente se baseiam nas percepçõesde outras pessoas e não naquelas das próprias pessoassurdas. Outrossim, as medidas de avaliação commuita frequência não são padronizadas e são apresen-tadas da forma escrita e não em forma de sinais. Emseu estudo, cinqüenta e um adolescentes surdos comidades de 14 a 16 anos concluíram uma escala deidentidade de surdos que os dividiu em grupos ouvin-tes, surdos e de identidade dupla, e a lista de perguntasde Porteous, um inventário dos problemas dos adoles-centes. Estas medidas foram apresentadas na modali-dade preferida de comunicação do estudante. Tambémfoi solicitado aos professores que respondessem auma lista de perguntas especialmente projetadas. Osresultados mostraram que os adolescentes surdos, em

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geral, não se percebem como tendo problemas signi-ficativamente maiores do que os dos seus colegas nãosurdos, exceto quanto às áreas de emprego e relaçãogaroto-garota. Curiosamente, não havia coincidênciaentre os alunos e seus professores quanto à maneiracomo esses problemas eram percebidos. Emborapesquisas anteriores indicassem que uma identidadede audição predominante estava associada com ajus-te socio-emocional reduzido, as diferenças e os pro-blemas auto-percebidos através da identidade não seapresentaram nestes estudo.

Os graus de atenção para estudantes surdos em uminternato foram determinados por KELLY e cols.[43], utilizando questionários que foram preenchidospor supervisores de dormitórios e professores. Du-zentos e trinta e oito estudantes com idades de 4 a 21anos, participaram no estudo. Contrariamente ao quecorrentemente se acredita, a prevalência geral deproblemas de atenção relatados no caso destes estu-dantes surdos foi comparável à de crianças sem perdade audição. Entretanto, quando os estudantes foramagrupados segundo a causa da surdez, um númeromais que duas vezes maior de estudantes com perdade audição adquirida foi classificado como tendoproblemas de atenção do que os seus colegas comcausas hereditárias. A consciência e identificaçãoprecoce de problemas de atenção ou aprendizagemem crianças surdas são importantes, especialmentenaquelas com surdez adquirida.

O reconhecimento de que a surdez em si, nãocausará necessariamente problemas emocionais nãosignifica que tudo está bem com a atual maneira de

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lidar com as crianças surdas. WATT e DAVIS [44]compararam 50 adolescentes profundamente surdosde um internato com 60 adolescentes não surdos quefreqüentavam uma pequena escola secundária comrespeito ao grau de depressão e tendência para oentediamento. Os instrumentos utilizados, emboraapresentados de uma forma escrita, foram revisadospara o que se considerou um nível de leitura adequa-do. Constatou-se que os alunos surdos eram signifi-cativamente mais deprimidos e com mais tendênciapara o entediamento do que os não surdos. Estesachados indicam a necessidade de identificar os alu-nos surdos (e os não surdos) que apresentam tendên-cia ao entediamento, a fim de evitar que eles avancempara níveis mais altos de depressão.

Referências bibliográficas

41. Lane H. Is there a "Psychology of the Deaf?" In: GregoryS, Hartley G (eds) Constructing deafness. Great Britain:The Open University, 1991;72-82.

42. Cole SH, Edelmann RJ. Identity patterns and self- andteacher-perceptions of problems of deaf adolescents: aresearch note. J Child Psychol Psychiat 1991;32:1159-65.

43. Kelly DP, Kelly BJ, Jones ML, Moulton NJ, VerhulstSJ, Bell SA. Attention deficits in children and adolescentswith hearing loss. A survey. Am J Dis Child 1993;147:737-41.

44. Watt JD, Davis FE. The prevalence of boredom prone-ness and depression among profoundly deaf residentialschool adolescents. Am Ann Deaf 1991;136:409-13.

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