da intersubjetividade à intercorporeidade contribuições da filosofia fenomenológica ao estudo...

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  • Psicologia USP, 2003, Vol. 14, No.1, 185-209 185

    DA INTERSUBJETIVIDADE

    INTERCORPOREIDADE: CONTRIBUIES DA

    FILOSOFIA FENOMENOLGICA AO ESTUDO

    PSICOLGICO DA ALTERIDADE

    Nelson Ernesto Coelho Junior1

    Instituto de Psicologia - USP

    Este texto apresenta o questionamento filosfico sobre a

    intersubjetividade, nas teorias fenomenolgicas de Husserl, Scheler e

    Merleau-Ponty, considerando suas contribuies para o estudo

    psicolgico da alteridade. Apresentam-se formas de surgimento do outro

    para mim e de sua possvel presena como elemento constitutivo do

    mundo ao qual perteno e, acima de tudo, como elemento que me

    constitui. Para que o outro possa ser reconhecido em sua radical

    alteridade no posso nem institu-lo por comparao comigo mesmo, por analogia, nem por projeo ou introjeo e nem por processos de

    fuso afetiva. Estas so formas que excluem a possibilidade do

    reconhecimento do outro em sua diferena. Sugere-se que a partir da

    experincia sensvel/ perceptiva, na esfera prpria de um corpo vivido,

    que possvel o reconhecimento do outro como diferena por meio de

    suas formas expressivas. Conclui-se, assim, que a noo de

    intersubjetividade poderia ser substituda com vantagens pela de

    intercorporeidade.

    Descritores: Fenomenologia. Alteridade. Intersubjetividade. Intercorpo-

    reidade.

    psicologia confronta-se, cada vez mais, com as exigncias ticas colo-

    cadas pela necessidade de reconhecimento da alteridade como elemen-

    1 Endereo para correspondncia: Instituto de Psicologia. Av. Prof. Mello Moraes,

    1721, So Paulo - SP 05508-900. Endereo eletrnico: [email protected]

    A

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    186

    to constitutivo das subjetividades singulares. No so poucas as teorias, das

    scio-construtivistas s psicanalticas, que tm voltado sua ateno impor-

    tncia do reconhecimento da alteridade, valorizando em seus estudos a pes-

    quisa sobre as formas intersubjetivas de comunicao.2

    Essa situao contempornea ope-se a grande parte da tradio filo-

    sfica moderna, principalmente quela herdeira da filosofia cartesiana, que

    concebe o Eu como uma unidade auto- constituda, independente da existn-

    cia de um Outro. Cabe tambm fazer referncia clssica oposio sujei-

    to/objeto, marca epistemolgica do pensamento moderno, que fez com que a

    noo de intersubjetividade fosse recusada e, assim, fosse considerada sem

    interesse, principalmente para teorias como as psicolgicas, que pretendiam

    ser cincia.

    Por outro lado, a filosofia fenomenolgica caracterizou-se pelo estudo

    do conceito e da experincia da intersubjetividade, especialmente no que se

    refere a uma concepo de ser humano que integre em sua constituio a

    experincia da alteridade. Husserl, em seu pioneirismo, desenvolveu argu-

    mentaes centrais quanto fundamental importncia da experincia inter-

    subjetiva para toda e qualquer forma de conhecimento de si e do outro. E os

    trabalhos de seus sucessores, Scheler, Heidegger, Merleau-Ponty e Lvinas,

    fizeram da filosofia fenomenolgica uma referncia central para os interes-

    sados em estudar a intersubjetividade.

    Em alguns estudos recentes3 tm sido distinguidos ao menos trs sig-

    nificados para a noo de intersubjetividade, que com maior ou menor evi-

    dncia parecem remeter s indicaes originais das fenomenologias de Hus-

    serl e Scheler, embora nem sempre autores como Braten (1998) o indiquem.

    O primeiro significado, mais clssico, presente, por exemplo, na tradio da

    filosofia existencialista de Martin Buber e Gabriel Marcel, revelaria o senti-

    do de comunho interpessoal entre sujeitos que mutuamente esto sintoniza-

    dos em seus estados emocionais e em suas respectivas expresses. O segun-

    2 Ver, a esse respeito, Apprey e Stein (1993), Figueiredo (1994), Frayze-Pereira

    (1994), Ogden (1994) e Valsiner (1998).

    3 Ver, a esse respeito, Braten (1998).

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    187

    do significado, reconhecvel em estudos como os de Habermas (1970),

    compreende a intersubjetividade como aquela que define a ateno conjunta

    a objetos de referncia em um domnio compartilhado de conversao lin-

    gstica ou extra-lingstica. Como terceiro significado, indica-se a capaci-

    dade de se estabelecerem inferncias sobre intenes, crenas e sentimentos

    de outros, que envolveriam a simulao ou a capacidade de leitura de es-

    tados mentais e processos de outros sujeitos que, de alguma forma, nos re-

    meteria ao clssico conceito de empatia. Alm desses significados, a noo

    de intersubjetividade costuma ser definida, em termos da tradio psicolgi-

    ca, como sendo a situao na qual, por suas mtuas relaes, numerosos (ou

    apenas dois) sujeitos formam uma sociedade ou comunidade ou um campo

    comum e podem dizer: ns4. Pode ser definida, tambm, como sendo o que

    vivido simultaneamente por vrias mentes, surgindo, ento, a denomina-

    o experincia intersubjetiva.

    Feita essa apresentao inicial, entendo ser necessrio considerar indi-

    vidualmente as contribuies fundamentais de Husserl, Scheler e Merleau-

    Ponty ao tema.

    Husserl

    O interesse de Husserl pelo tema da intersubjetividade precoce, co-

    mo atestam os textos do perodo de 1905-1910, publicados no volume XIII

    da Husserliana5, desmentindo, assim, uma concepo difundida de que Hus-

    serl s teria se interessado por esse tema, tardiamente em sua obra, notada-

    mente no fim dos anos 20, perodo das Meditaes Cartesianas (1929). His-

    toriadores da filosofia e comentadores da obra de Husserl, cada vez mais

    concordam que a intersubjetividade no uma questo entre outras da fe-

    4 Ver, a esse respeito, Jolivet (1975, p. 128).

    5 Recebem o nome de Husserliana, os volumes de publicaes das Obras Completas

    de Husserl, editados por Walter Biemel, em Louvain, Blgica.

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    188

    nomenologia, mas sim, que recobre uma dimenso essencial para a sua

    compreenso.

    Na fenomenologia de Husserl, a noo de intersubjetividade ocupar

    lugar central em sua discusso sobre a possibilidade de se conhecer a expe-

    rincia que temos de um outro, assim como do mundo objetivo, em geral.

    Coerente com a recusa em conceber a fenomenologia como um simples

    idealismo, Husserl reconhece que o outro, uma outra conscincia, ou um

    outro ego, existem independentes de minha conscincia. Assim como o

    mundo fsico, objetivo, est a, antes de mim e de minha conscincia e

    independente dela, tambm um outro sujeito, uma outra subjetividade preci-

    saria ser reconhecida como possuindo uma existncia independente de mim.

    Por outro lado, em seu desenvolvimento da idia de uma fenomenologia

    transcendental, Husserl no tem como evitar a afirmao de que no h co-

    mo conhecer o outro diretamente, de forma imediata. S sei do outro, s

    conheo o outro, ou outra conscincia, outro ego, a partir de minha consci-

    ncia intencional (conscincia que , enquanto conscincia de algo). Assim,

    o outro s me aparece atravs dessa mediao, atravs das condies presen-

    tes de ter apenas conscincia de meu ego como pertena inequvoca, como

    presena imediata. O outro s existe, nesse sentido da conscincia intencio-

    nal, como uma experincia de meu ego. Desse modo, possvel afirmar que

    no plano da conscincia intencional, o mundo vivido sempre o mundo

    vivido de cada um, singularmente considerado, embora sempre intencional-

    mente dirigido a um outro objeto ou a uma outra conscincia. Portanto, a

    experincia de um sujeito no teria como ser remetida, enquanto condio

    constituinte, a um mundo vivido em comum, compartilhado com outros.

    Esse um dos problemas que se colocou desde o incio para a filosofia fe-

    nomenolgica de Husserl. Como veremos, no entanto, desenvolvimentos

    posteriores sugerem uma nova soluo para o problema, por meio de uma

    fenomenologia gentica (e no esttica), voltada para o tema da constituio

    das experincias vividas, no mundo da vida, fortalecidos com a publicao

    dos inditos de Husserl. Essa soluo aparecer atravs da investigao das

    experincias da corporeidade. Nesse plano, a subjetividade passaria esfera

    da intersubjetividade, atravs de uma experincia co-constituinte, que per-

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    189

    tence a todos e a ningum em particular, o que abrir o caminho para o tra-

    balho de vrios fenomenlogos posteriores. preciso reconhecer que, em

    seus textos tardios, principalmente naqueles localizados no horizonte da

    Krisis (1954/1976), Husserl aceita e faz a si mesmo as crticas que alguns de

    seus seguidores viriam a fazer s suas concepes sobre a intersubjetividade.

    1. Quinta Meditao Cartesiana (conjunto de conferncias realizadas

    na Sorbonne, em Paris, em fevereiro de 1929, publicadas pela primeira vez,

    j em traduo francesa, em 1931. As conferncias foram publicadas em

    alemo s em 1950, no volume I da Husserliana)

    A (epokhe) fenomenolgica desemboca, necessariamente, em

    uma posio solipsista? Ou seja, teramos por fim, aps as sucessivas redu-

    es, que o ego toda a realidade, e que os outros egos dos quais s possuo

    a representao, no possuem existncia independente, passvel de ser co-

    nhecida diretamente, sem mediaes? Em um primeiro momento, Husserl

    (1929/1969) afirma que os outros egos no so simples representaes e

    objetos representados em mim, mas que seriam justamente outros, en-

    quanto fatos transcendentais de minha esfera fenomenolgica. J no fim da

    quinta meditao, ele afirmar: ... pela e na minha experincia prpria, no

    me apreendo apenas eu prprio, mas tambm, graas a uma forma especial

    de experincia, apreendo tambm outrem. (p. 239). E ainda: A aparncia

    de solipsismo dissipada, ainda que permanea verdadeiro que tudo o que

    existe para mim s pode extrair o seu sentido existencial de mim, na esfera

    de minha conscincia. (p. 241) Trata-se de explicitar uma teoria transcen-

    dental da experincia do outro, uma teoria como a da empatia (Einfhlung).

    Vejamos como essa teoria se desenvolve.

    Como nos lembra Husserl (1929/1969) :

    necessrio inicialmente por em destaque o plano da constituio de outrem ou dos outros em geral, quer dizer, dos egos excludos do ser concreto que me per-tence (excludos do eu- ego primordial). (...) o outro, primeiro em si (o primeiro

    no-eu) outro eu. E isso torna possvel a constituio de um domnio novo e infi-

    nito do estranho a mim de uma natureza objetiva e de um mundo objetivo em ge-ral, ao qual pertencem os outros e eu prprio. (pp. 174-175)

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    190

    Para Husserl, h uma comunidade de mnadas formadas pelos vrios

    eus (outros e eu prprio), uma comunidade que constitui um s e mesmo

    mundo. No plano do que ele denomina de intersubjetividade transcendental,

    h uma esfera intersubjetiva de pertena, em que se constitui, de maneira

    intersubjetiva, o mundo objetivo. Mas esse , de fato, o ponto de chegada

    das meditaes. Antes, seria necessrio esclarecer os passos que me apresen-

    tam o outro, a experincia do outro, pelo que Husserl denomina apercep-

    o por analogia.

    O problema da experincia de outro

    Ao investigar a possibilidade de um indivduo ter a experincia de um

    outro, Husserl refere-se ao que denomina de esfera prpria ou primordial

    (Eigenheits- oder Primordialsphre). Essa esfera designaria, de um lado, a

    experincia da autodotao (Selbstgegebenheit) mais originria possvel e,

    de outro, pressuporia que a experincia da alteridade no pode se dar fora

    de uma auto- experincia. Com isso, Husserl procura apontar para o fato de

    que o outro, entendido como conscincia estrangeira (fremdes Bewwus-

    stsein), no nos dado nessa esfera de originalidade, nessa esfera inaugural.

    J que, se fosse o caso, o prprio outro seria acessvel de forma direta e seria

    meramente um momento de meu prprio ser e, desse modo, eu e o outro

    seramos o mesmo. O que pertence a essa esfera original apenas minha

    experincia do outro, as assim chamadas experincias de empatia (Ein-

    fhlungen). O interessante que, para Husserl, isso bastaria para mostrar que

    essa esfera prpria ou primordial no , de modo algum, uma esfera solipsista,

    j que inclui tambm as vivncias que o ego tem do outro, ou, ao menos, de

    um outro ego. Essa esfera original deve ser entendida como o conceito geral

    de tudo aquilo que dado de forma direta, auto-dado em forma originria

    em todas as experincias do ego. Para Husserl (1929/1969), trata-se de um

    Mit-da que no est presente (a), que no tem como chegar a ser um si-

    mesmo-a (Selbst-da-werden kann) (p. 187). possvel reconhecer uma

    apresentao do outro, mas nunca uma presentao. O exemplo clssico

    utilizado na fenomenologia o do cubo. Posso ter a frente do cubo como

    presentao, mas os lados que no vejo me aparecem por apresentao.

    O outro outro no somente porque suas vivncias no me podem ser dadas

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    191

    de forma original, mas tambm, principalmente, porque temos a experincia

    dele em uma situao subjetiva que, por princpio, no pode ser minha.

    O corpo do outro

    Husserl (1929/1969) sugere que um corpo exterior de um outro, por

    analogia, percebido como percebo meu prprio corpo. Motivado por essa

    semelhana, tendo a realizar uma transferncia aperceptiva (apperzeptive

    bertagung), pela qual concebo o corpo exterior como um corpo em analo-

    gia com meu prprio corpo (p. 188).

    Husserl chega a considerar a possibilidade do conhecimento do outro

    sem partir do cogito primordial, ou seja, a partir de uma conscincia que

    no nem o eu, nem o outro (Merleau-Ponty, 1988, p. 41). Mas considerar

    essa possibilidade no faz ainda com que Husserl consiga abandonar a con-

    cepo de uma subjetividade transcendental como nica referncia segura

    para o conhecimento do outro. Ser s em seus textos inditos dedicados ao

    tema da intersubjetividade (Husserliana XII, XIV e XV), que Husserl vir

    propor que a subjetividade transcendental intersubjetividade, mas como

    lembra Merleau-Ponty (1988), sem conseguir chegar a conciliar as duas

    exigncias, de um lado, a que afirma a anterioridade da subjetividade inter-

    subjetividade e, de outro, a que afirma a intersubjetividade como anterior

    subjetividade.

    Nas Ideen II (Husserliana IV), publicadas tambm postumamente, en-

    contra-se, pela primeira vez, em uma filosofia at ento profundamente mar-

    cada pela tradio das filosofias da conscincia, uma referncia clara im-

    portncia do corpo na relao com as coisas e com os outros. Apresenta-se,

    nesse texto, a idia de que a corporeidade e sua relao com os outros viabi-

    liza o mundo objetivo atravs de uma co-constituio. Esse ser o caminho

    aberto para as investigaes fenomenolgicas ps-husserlianas, como as de

    Scheler e Merleau-Ponty.

    2. Os textos inditos (Husserliana XIII, XIV e XV) sobre a Intersubje-

    tividade (conjunto de textos inditos divididos em trs perodos, 1905-1920;

    1921-1928 e 1929-1935, editados por Isso Kern, publicados em 1973, em

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

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    alemo. Traduo parcial para o francs, publicada em dois volumes, com a

    edio de Natalie Depraz, em 2001).

    Natalie Depraz opta, para a edio francesa, por uma diviso temtica

    e no cronolgica dos textos. Os temas escolhidos para organizar o volumo-

    so nmero de textos inditos de Husserl sobre o a intersubjetividade So os

    seguintes: a) Primordialidade; b) Analogizao; c) Reduo Intersubjetiva;

    d) Antropologia; e) Individuao. Para nossos propsitos, interessa funda-

    mentalmente o tema da analogizao.

    Husserl recusa a teoria do raciocnio por analogia proposta por Benno

    Erdman. Recusa uma teoria que parte da idia que se meu eu est ligado a

    meu corpo e o corpo de outro anlogo ao meu, logo um eu tambm deve

    estar ligado a ele. Husserl diz que essa construo um sofisma e s se sus-

    tenta se acrescentarmos a ela a noo de uma experincia que posso ter de

    mim mesmo e uma experincia que posso ter do outro. Mas, desde o incio,

    preciso reconhecer que h uma razo para distinguir uma experincia da

    outra. A experincia de meu corpo, eu a tenho imediatamente e a experin-

    cia do outro, como um outro, eu no a tenho, a no ser a partir de uma expe-

    rincia minha, portanto, atravs de uma mediao. (Husserl, 2001, v. 1, pp.

    283-286)

    Analogizao

    Vale lembrar que, ao final da Quinta Meditao Cartesiana, Husserl

    (1929/1969) afirmava que -me necessrio inicialmente explicitar, enquan-

    to tal, aquilo que me pertence como prprio, a fim de compreender que no

    prprio o no prprio adquire, ele tambm, o seu sentido existencial,

    nomeadamente por analogia. (p. 240). Em um texto indito, de 1934, Pro-

    blema da Empatia, Husserl (2001, v. 1) retoma alguns dos argumentos da

    quinta meditao, acrescentando algo novo por meio das noes de carne

    (Leib/chair) e de expresso (Ausdruck):

    Meus modos de apario me so dados de forma original, os do outro me so da-

    dos pela expresso enquanto presentificao (via empatia), portanto no de forma

    original... (...) O mesmo vale, inversamente, para eles, relativamente a seu mundo

    exterior, no qual minha carne (Leib/ chair) funciona ento enquanto expresso. No

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    193

    nosso ser em conjunto (Mit-sein), possumos o mundo enquanto mundo de questes que nos so comuns (mundo exterior), no qual as carnes aparecem en-

    quanto corpos que so capazes de funcionar como expresses. (pp. 379-380)

    Nesse momento de sua reflexo, Husserl sugere que o mundo que

    posso conhecer, que dotado de sentido, se d a partir de minha conscincia

    egica, concebida enquanto conscincia do mundo. um mundo de carnes,

    entre elas a minha, aquela sobre a qual eu reino de forma original e as outras

    carnes que eu compreendo como carnes, por meio de sua expressividade e, a

    partir disso, como sendo carnes de outros sujeitos egicos.

    Scheler

    Max Scheler (1971) considera o problema do conhecimento de um

    outro, inicialmente, a partir de uma constatao que Husserl no recusaria:

    necessrio levar em conta que, como sabemos, existem outros egos indi-

    viduais de natureza psquica, exteriores a ns, mas que somos incapazes de

    apreender de uma forma adequada naquilo que constitui a sua essncia. Isto

    algo absolutamente evidente (p. 353). Scheler, no entanto, toma como

    ponto de partida para suas investigaes sobre a possibilidade do conheci-

    mento do outro, a renncia de que o fundamento deva ser o cogito, ou seja,

    de que a conscincia deva ser, antes de tudo, conscincia de si. Como afirma

    Merleau-Ponty (1988), ele parte explicitamente da indiferenciao total

    entre eu e o outro (p. 42). Ou ainda, para Max Scheler, a conscincia

    inseparvel de sua expresso (em conseqncia do conjunto cultural de seu

    meio) e no h diferena radical entre conscincia de si e conscincia do

    outro (p. 43). Acima de tudo, com essa posio, Scheler procura escapar da

    principal soluo postulada por Husserl para o problema do conhecimento

    da existncia de um outro, ou seja, o raciocnio por analogia (ou por infern-

    cia analgica). Como vimos no item acima, essa posio, em Husserl, supe

    que o reconhecimento perceptivo em um outro corpo de aes anlogas s

    minhas, permite que eu conclua que, como em meu corpo, h um ego e uma

    conscincia habitando esse outro corpo. Scheler (1971), criticar, tambm, a

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

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    outra soluo j proposta para o problema, aquela que explica o conheci-

    mento de um outro por meio de fuses ou identificaes afetivas (tambm

    chamadas de intropatias), a partir da percepo do corpo de um outro. Nesse

    caso, afirmo que reconheo a existncia de um outro ego, j que posso expe-

    rimentar identificaes ou fuses afetivas com ele.

    As razes para a recusa das duas solues bastante contundente.

    Quanto soluo por inferncia analgica, Scheler argumenta que mesmo

    em animais e em bebs sem nenhuma capacidade de raciocnio analgico j

    possvel constatar o reconhecimento de outros (como, de resto, continuam

    confirmando estudos de Psicologia do Desenvolvimento, como os de Stern

    (1985)). E tambm, como lembra Figueiredo (1991),

    um outro argumento contra a teoria do julgamento por analogia diz que no haveria

    uma base suficiente para qualquer inferncia analgica j que inicialmente e a mai-

    or parte do tempo o que cada um percebe de si no coincide com o que percebe no

    outro. (p. 3)

    Quanto segunda teoria, Scheler (1971) a recusa por constatar que a

    identificao afetiva no se realiza com todos os outros e, para que fosse

    efetiva, deveramos antes ser capazes de discriminar os corpos aptos para

    uma tal identificao ou fuso afetiva. Para Scheler, alm disso,

    para se ter a convico da existncia de um ego individual no temos necessidade

    de conhecer qualquer tipo de dado relativo a seu corpo. Basta-nos alguns sinais ou

    indcios de uma atividade espiritual (uma obra de arte, por exemplo) ou voluntria,

    para concluir, sem hesitao pela existncia de egos individuais que deixaram seus

    vestgios ou imprimiram o selo de sua personalidade na realidade exterior. (p. 354)

    Contra as duas teorias, Scheler ainda argumenta que a partir delas ja-

    mais teramos de fato o conhecimento do outro em sua alteridade. O primei-

    ro caso, da analogia, estabeleceria o outro a partir de minha imagem e seme-

    lhana, em um claro processo de projeo, como apontar tambm Merleau-

    Ponty (1960). No segundo caso, o outro me apareceria em funo de sua

    semelhana (o que viabilizaria a identificao afetiva) comigo e no em fun-

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    195

    o da diferena. Assim, nos dois casos, s posso reconhecer o outro por

    identidade e semelhana e no por distino e diferena.

    Como alternativa s duas teorias, Scheler (1971) prope que a primei-

    ra coisa que percebemos de fato ao nosso redor so expresses. Um beb

    primeiramente sensvel a expresses de corpos vivos ao seu redor, em uma

    experincia que precisaria ser reconhecida como pr-pessoal. S mais tarde

    o beb seria capaz de perceber objetos particulares no animados e, assim,

    distinguir sua experincia de si da experincia que pode ter de um outro.

    Nesse sentido, no seriam os corpos ou os egos que percebemos inicialmen-

    te, mas sim totalidades indivisas que, segundo Scheler, seriam captadas in-

    tuitivamente, em uma plena indistino entre o que seria da esfera subjetiva

    e o que seria da esfera objetiva.

    A contribuio essencial de Scheler a noo de expresso; no h conscincia atrs das manifestaes, estas so inerentes conscincia, elas so a conscincia.

    em virtude de o outro estar presente inteiro nas suas manifestaes que posso p-

    lo; por sua prpria existncia e no por um raciocnio analgico. (p. 43)

    Dessa forma, se para Scheler ns no podemos conhecer o outro por

    seu corpo ou sua conscincia, poderemos conhec-lo e reconhec-lo atravs

    de suas expresses manifestas, que nos fazem um com ele, em um campo

    inaugural de indiferenciao primitiva. Mas, ainda segundo Merleau-Ponty

    (1960),

    permanece um problema: para Husserl, o problema passar da conscincia de si

    do outro. Nas concepes de Scheler, trata-se de compreender como a conscincia

    de si e a do outro podem surgir sobre esse fundo de indiferenciao primitiva. (p.

    42)

    Merleau-Ponty

    O tema da intersubjetividade e, at mesmo antes, a investigao de

    como o outro surge para mim, foco de ateno do filsofo francs Merle-

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    196

    au-Ponty desde o incio de sua obra. Pode-se dizer, a partir de um olhar da

    histria da filosofia contempornea, que Merleau-Ponty situa-se como o

    grande autor da transio entre o questionamento epistemolgico sobre o

    conhecimento do outro (resultado de uma longa tradio da filosofia moder-

    na, a partir de Descartes) e a busca por uma tica da alteridade (aspecto cen-

    tral nas assim denominadas filosofias ps-modernas- conceito problemti-

    co e possivelmente insuficiente para agrupar diferentes autores como

    Levinas e Derrida). De fato, na obra de Merleau-Ponty podemos acompa-

    nhar o progressivo deslocamento do outro reduzido, do outro apenas como

    uma questo epistemolgica, para o outro concreto, o outro pensado e apre-

    endido em seu lugar de radical alteridade, tema central das discusses e for-

    mulaes ticas contemporneas (Johnson & Smith, 1990, p. 19). Mas vamos

    comear, acompanhando os principais passos da trajetria de Merleau-Ponty,

    no longo percurso que o leva da intersubjetividade intercorporiedade.

    1. Concepes Iniciais

    Leitor apaixonado das obras de Husserl, Merleau-Ponty dedica seus

    anos iniciais de pesquisa (1933-1945) a temas centrais da psicologia (com-

    portamento e percepo), procurando desenvolver uma rigorosa reflexo

    filosfica que pudesse situar as investigaes psicolgicas diante de seus

    prprios limites. Por exemplo, no livro A Estrutura do Comportamento

    (1942), considerando os limites do realismo (behaviorista e psicanaltico) na

    explicao dos comportamentos humanos, Merleau-Ponty (1942) afirma:

    Assim no se sai do debate clssico entre mentalistas e materialistas. A nega-o do realismo materialista no parece possvel seno em proveito do realismo

    mentalista e inversamente. No se v que a partir do momento em que o compor-

    tamento tomado em sua unidade e em seu sentido humano, no se trata mais de uma realidade material nem tampouco de uma realidade psquica, mas de um con-

    junto significativo ou de uma estrutura que no pertence propriamente nem ao

    mundo exterior, nem vida interior. o realismo em geral que seria necessrio por

    em questo. (p. 197)

    Mas nem por isso, como veremos, ele buscar refgio nas concepes

    idealistas.

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    197

    Em Fenomenologia da Percepo (1945), suas formulaes sobre o

    tema da intersubjetividade comeam a ganhar corpo. Nesse livro, dedica um

    captulo ao tema Outrem e o mundo humano, em parte fundamentado nos

    estudos de Scheler sobre a recusa de um raciocnio de analogia para funda-

    mentar a existncia de um outro para mim. Apoiado em sua original teoria

    da percepo, Merleau-Ponty (1945) procura desvelar a presena e a exis-

    tncia do outro no mais a partir do cogito, mas ainda assim preso a uma

    certa noo de conscincia, que mais para frente em sua obra ele abandonar

    definitivamente :

    Quando me volto para minha percepo e passo da percepo direta ao pensamento

    dessa percepo, eu a re-efetuo, reencontro um pensamento mais velho do que eu

    trabalhando em meus rgos de percepo e do qual eles so o rastro. da mesma

    maneira que compreendo outrem. Aqui, novamente, s tenho o rastro de uma

    conscincia que me escapa em sua atualidade e, quando meu olhar cruza com um

    outro olhar, eu re-efetuo a existncia alheia em uma espcie de reflexo. (p. 404)

    Ou ainda mais, em uma passagem que me parece de grande relevncia

    para nossas discusses aqui e que, por isso, transcreverei integralmente. Tra-

    ta-se de um trecho de uma conferncia realizada por Merleau-Ponty (1996)

    (O Primado da Percepo e suas conseqncias filosficas), proferida

    perante a Sociedade Francesa de Filosofia, na sesso de 23 de novembro de

    1946:

    No saberei nunca como vocs vem o vermelho, e vocs nunca sabero como eu

    o vejo, mas essa separao das conscincias s reconhecida depois do fracasso da

    comunicao, e nosso primeiro movimento de acreditar num ser indiviso entre

    ns. No o caso de tratar essa comunicao primordial como uma iluso - o que

    o sensualismo faz - posto que mesmo ela se tornaria inexplicvel. No o caso de

    fund-la em nossa participao comum mesma conscincia intelectual, posto que

    seria suprimir a irrecusvel pluralidade das conscincias. preciso, portanto, que

    pela percepo do outro eu me ache colocado em relao com um outro eu que es-

    teja em princpio aberto s mesmas verdades que eu, em relao com o mesmo ser

    que eu. E essa percepo se realiza, e do fundo de minha subjetividade vejo apare-

    cer uma outra subjetividade investida de direitos iguais, porque no meu campo

    perceptivo se esboa a conduta do outro, um comportamento que eu compreendo, a

    palavra do outro, um pensamento que eu abrao e de que aquele outro, nascido no

    meio de meus fenmenos, se apropria, tratando-o segundo as condutas tpicas de

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    198

    que eu prprio tenho a experincia. Do mesmo modo que meu corpo, como siste-

    ma de minhas abordagens sobre o mundo, funda a unidade dos objetos que eu per-

    cebo, do mesmo modo o corpo do outro, como portador das condutas simblicas e

    da conduta do verdadeiro, afasta-se da condio de um dos meus fenmenos, pro-

    pe-me a tarefa de uma verdadeira comunicao e confere a meus objetos a dimen-

    so nova do ser intersubjetivo ou da objetividade. Tais so, rapidamente resumi-

    dos, os elementos de uma descrio do mundo percebido. (pp. 52-53)

    Acho que bom precisar que os sentidos dados, aqui, aos conceitos

    intersubjetivo e objetivo em muito se afastam da tradio filosfica que

    precede a fenomenologia da existncia de Merleau-Ponty. O mundo perce-

    bido o mundo das imbricaes inevitveis e originais entre corpos e coisas,

    corpos e outros corpos. Desse prisma, no concebvel uma assim chamada

    realidade objetiva que pudesse emergir como independente do sujeito, do

    mesmo modo que o sujeito (se ainda possvel pensar nestes termos) no

    tem como ser pensado como independente de outros (Barral, 1983, p. 158).

    E, assim, aparece tambm uma das concepes que Merleau-Ponty formula-

    r de intersubjetividade, ou seja, uma experincia perceptiva comum, uma

    co-percepo.

    Ao lado dessas posies com relao ao surgimento de um outro e da

    intersubjetividade, Merleau-Ponty (1945) explicita uma peculiar relao

    entre o mundo natural e o mundo humano:

    Estou lanado em uma natureza, e a natureza no aparece somente fora de mim,

    nos objetos sem histria, ela visvel no centro da subjetividade. (...) Assim como

    a natureza penetra at no centro de minha vida pessoal e entrelaa-se a ela, os

    comportamentos tambm alojam-se na natureza e depositam-se nela sob a forma

    de um mundo cultural. (...) Portanto, precisamos redescobrir, depois do mundo na-

    tural o mundo social, no como objeto ou soma de objetos, mas como campo per-

    manente ou dimenso de existncia: posso desviar-me dele, mas no deixar de es-

    tar situado em relao a ele. Nossa relao com o social , assim como nossa

    relao com o mundo, mais profunda que qualquer percepo explcita ou qualquer

    julgamento. (pp. 398-399; 415)

    No d para deixar de apontar o quanto, em passagens como essa,

    Merleau-Ponty faz-se tributrio no apenas do ltimo Husserl, o do Le-

    benswelt, mas tambm de Heidegger.

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    199

    E, na concluso do captulo, ainda reencontramos Merleau-Ponty

    (1945) s voltas com as questes que tambm alimentaram a reflexo heide-

    ggeriana:

    fenomenologia entendida como descrio direta, deve acrescentar-se uma feno-

    menologia da fenomenologia. Devemos voltar ao cogito para procurar ali um Lo-

    gos mais fundamental do que o do pensamento objetivo, que lhe d seu direito rela-

    tivo e, ao mesmo tempo, o coloque em seu lugar. No plano do ser, nunca se

    compreender que o sujeito seja ao mesmo tempo naturante e naturado, infinito e

    finito. Mas sob o sujeito ns reencontramos o tempo, e se ao paradoxo do tempo

    correlacionamos os do corpo, do mundo, da coisa e de outrem, compreenderemos

    que para alm nada h a compreender. (p. 419)

    2. Os Cursos na Sorbonne

    No curso A Conscincia e a aquisio da Linguagem (Merleau-

    Ponty, 1988), dado em 1949, na Sorbonne, um dos itens iniciais dedicado

    ao problema do outro como formulado por Husserl e os itens seguintes pro-

    curam apresentar e discutir as posies de Scheler sobre o tema da existn-

    cia do outro. Herdeiro da tradio fenomenolgica estabelecida por Husserl,

    mas atento aos impasses de uma filosofia ainda presa s necessidades funda-

    cionistas de uma filosofia da conscincia, Merleau-Ponty dedica ao mesmo

    tema outros dois cursos, entre 1950 e 1952, na cadeira de Psicologia da cri-

    ana e pedagogia, na Sorbonne. O primeiro, As relaes com o Outro na

    criana, com um longo estudo das contribuies psicanalticas e o segundo,

    A experincia do outro, mais voltado para um percurso do tema na hist-

    ria da filosofia e na Psicologia da Gestalt.

    No curso As relaes com o Outro na Criana, Merleau-Ponty

    (1988) questiona: Em que condies a criana entra em relao com o ou-

    tro? Qual a natureza dessa relao? Como ela se estabelece? (p. 309) E

    responde: A psicologia clssica s abordou esse problema com muitas difi-

    culdades e confessou que lhe era impossvel resolv-lo (p. 309). Diante

    desse estado das coisas, Merleau-Ponty (1988) prope-se a restabelecer a

    descrio e formulao terica das diferentes fases por que passam as rela-

    es da criana com o outro, recorrendo a Wallon, Freud, A. Freud, M. Kle-

    in, Khler, Lagache, Lacan, Glover, Spitz, entre outros. Acaba por restrin-

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    200

    gir-se a um minucioso levantamento do estado da arte, na psicologia, na

    antropologia e na sociologia, sem propor formulaes prprias de maior

    alcance. Conclui o curso, afirmando:

    Portanto, ao insistir nas relaes da criana com seus pais, ns no quisemos expli-

    car atravs delas as outras relaes com os outros e no reduzimos (rtrci -

    estreitamos) nosso assunto. As dificuldades das relaes familiares correspondem

    imediatamente s dificuldades da criana com o meio no qual ela vive. (p. 396)

    bastante curioso acompanhar o olhar do filsofo dirigir-se, como ele

    faz nesse curso, para temas muito concretos, em nada especulativos, das

    dificuldades presentes nas relaes entre a criana e um outro. Esto aqui

    apresentadas as origens de laos sociais, da agressividade, das patologias

    emocionais precoces, entre outros temas.

    J no curso dado no ltimo ano de seu trabalho de docncia na cadeira

    de Psicologia da criana e Pedagogia na Sorbonne, no ano letivo de 1951-

    52, A Experincia de Outros, encontramos Merleau-Ponty (1988) s vol-

    tas com o questionamento mais propriamente filosfico. As duas primeiras

    frases da transcrio do curso: Nosso problema j existe de forma manifes-

    ta h cem anos. Por qu? No h problemas do outro para certas filosofias.

    (p. 539). A seguir, analisa como, logicamente, o problema do outro descar-

    tado no empirismo absoluto e em concepes puramente reflexivas. Para

    logo depois afirmar que nosso problema poderia ser considerado um espe-

    lho do problema do eu. (p. 540). E pouco mais frente: Trata-se, para ns,

    no de supor certas concepes do eu e do mundo e ver o que resulta a pro-

    psito do outro, mas de examinar como preciso conceber o mundo para

    que o outro seja pensvel. (p. 540). Psicologia da Gestalt que ele ir

    recorrer para investigar o tema de como percebemos uma outra pessoa. Mer-

    leau-Ponty aponta que a percepo de outra pessoa no e no se faz da

    mesma maneira que a de objetos fsicos e nem mesmo de uma pintura (que

    envolveria, de uma forma especfica, a percepo e a ao humana, de um

    outro humano). Como demonstra a Psicologia da Gestalt, a percepo no

    pura recepo de um contedo particular. Envolve a co-existncia e apreen-

    so de uma certa inteno de uma outra pessoa. A percepo de outras pes-

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    201

    soas no seria, assim, uma construo intelectual, mas uma co-operao de

    fato, como contato direto com o outro (p. 547). Merleau-Ponty procura

    pensar, nesse curso, uma nova teoria da expressividade, a partir dos gestal-

    tistas.

    Em um certo momento critica, de forma provocativa, a psicologia e

    seus mtodos para conhecer e revelar o outro:

    ...a leitura de uma expresso s possvel em referncia situao completa; o que

    bem diferente de um poder mstico qualquer (na moda atual da psicologia h algo

    desse gnero: um certo ocultismo. Supe-se que, para conhecer o outro, basta fazer

    testes, ler um pequeno livro de grafologia e, para terminar, mergulhar na psicanli-

    se, chave dos sonhos!). No, a verdadeira psicanlise implica uma teoria bastante

    sbia a respeito do outro: perceber o outro decifrar uma linguagem. (p. 553)

    E, por fim, acaba defendendo uma certa noo de estrutura, como

    soluo para vrios impasses colocados pela problemtica da expressivida-

    de, da linguagem e da percepo do outro. Mas essa no ser em sua obra

    uma soluo muito duradoura.

    3. Os cursos no Collge de France e o perodo final de sua obra

    O panorama de seu interesse comea a mudar a partir de sua eleio pa-

    ra a cadeira de filosofia no Collge de France, em 1952. Mas ser s em seu

    ensaio de 1959, O Filsofo e sua Sombra, que a transformao ficar evi-

    dente.

    Um das marcas dessa mudana ser a introduo do conceito de inter-

    coporeidade.

    No texto O Filsofo e sua Sombra, publicado em Signes (1960) e

    considerado fundamental para se compreender a passagem entre as concep-

    es desenvolvidas em a Fenomenologia da Percepo (1945) e em O Vis-

    vel e o Invisvel (publicado postumamente em 1964), Merleau-Ponty (1960)

    trata da percepo no contexto da intersubjetividade, da relao com o outro:

    Se o outro deve existir para mim, preciso que seja primeiro abaixo da ordem do

    pensamento. Nessa regio o outro possvel porque a abertura perceptiva no pre-

    tende o monoplio do Ser e no institui a luta mortal das conscincias. Meu mundo

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    202

    percebido, as coisas entreabertas diante de mim, em sua espessura, com que prover

    mais de um sujeito sensvel com estados de conscincia, tm direito a mais tes-temunhas alm de mim. (...) O homem pode fazer o alter- ego, cuja feitura im-

    possvel para o pensamento, porque est fora-de-si no mundo e porque um ek-

    stase co-possvel com os outros. E esta possibilidade se cumpre na percepo

    como vinculum do ser bruto e de um corpo. Todo enigma da Einfhlung est em

    sua fase inicial estesiolgica, e se resolve a mesmo porque uma percepo. Aquele que pe o outro homem sujeito percepiente, o corpo do outro coisa percebida, o prprio outro posto como percepiente. Trata-se sempre de co- percepo. Vejo que aquele homem v, como toco minha mo esquerda que est

    tocando minha mo direita. (pp. 214-215)

    Ainda no texto O Filsofo e sua Sombra, Merleau-Ponty (1960)

    formular uma possibilidade radical de compreenso da relao entre eu e o

    outro, no mais atravs das tramas perceptivas de uma intersubjetividade,

    mas atravs da intercorporeidade:

    Minha mo direita assistia ao surgimento do tato ativo em minha mo esquerda.

    No de maneira diversa que o corpo do outro se anima diante de mim quando a-

    perto a mo de outro homem, ou quando o olho somente. Aprendendo que meu

    corpo coisa sentiente, que excitvel- ele e no somente minha conscincia- preparei-me para compreender que h outros animalia e, possivelmente, outros

    homens. preciso notar bem que nisto no h comparao, nem analogia, nem

    projeo ou introjeo. Se, apertando a mo de um outro homem, tenho a evidncia

    de seu ser-a, porque ela se coloca no lugar de minha mo esquerda. No aperto de

    mos, meu corpo anexa o corpo de outro numa espcie de reflexo cuja sede, pa-radoxalmente, ele prprio. Minhas duas mos so co- presentes ou co- exis-tem porque so as mos de um s corpo; o outro aparece por extenso desta co- presena. Ele e eu somos os rgos de uma s intercorporeidade. (...) Percebo pri-

    meiro uma outra sensibilidade e somente a partir da, um outro homem e um ou-tro pensamento. (pp. 212-213)

    J em seu livro inacabado, O Visvel e o Invisvel (1964), as preocupa-

    es de Merleau-Ponty com uma radical transformao, ficam ainda mais

    evidentes. Nesse livro, define-se uma interrogao mais radical da origem

    das relaes intersubjetivas, do contato do corpo com o mundo, e com o

    corpo de outros, na direo de experincias intercorpreas. Afirmam-se as

    bases de sua ontologia do ser bruto, que toma a porosidade corprea e a

    esfera da reversibilidade sensvel como um solo primeiro. Um pouco antes,

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    203

    em um dos seus cursos no Collge de France, Merleau-Ponty (1968) insistia

    na necessidade de se abandonar o plano das exigncias de uma filosofia da

    conscincia, ...j que o sentir no a possesso intelectual daquilo que

    sentido, mas sim despossesso de ns mesmos em seu proveito, abertura

    quilo que em ns no temos necessidade de pensar para compreender (p.

    179).

    Nesse momento de sua obra, Merleau-Ponty (1964) procura apresen-

    tar o corpo vivido, em sua dimenso porosa, como uma experincia revers-

    vel, de quase simultaneidade de ser sujeito e objeto de um ato sensvel. Qua-

    se simultaneidade, porque

    tempo de sublinhar que se trata de uma reversibilidade sempre iminente e nunca

    realizada de fato. Minha mo esquerda est sempre em vias de tocar a direita no

    ato de tocar as coisas, mas nunca chego coincidncia; ... nada disso fracasso,

    pois se tais experincias nunca se recobrem exatamente, se escapam no momento

    em que se encontram, se h entre elas algo que se mexeu, uma distncia, precisamente porque minhas duas mos fazem parte do mesmo corpo, porque este

    se move no mundo ... Sinto quantas vezes quiser, a transio e metamorfose de

    uma das experincias na outra, tudo se passa como se a dobradia entre elas, slida

    e inabalvel permanecesse irremediavelmente oculta para mim. (pp. 194-195)

    Merleau-Ponty procura descrever um plano de experincias que o da

    quase indiferenciao, como se no plano do sensvel, da mais radical relao

    intercorprea, as particularidades que geram as diferenas quase fossem

    abolidas e ns tivssemos, ento, que reconhecer que no princpio s h a

    unidade. Mas, como ele lembra, se no h coincidncia absoluta, se no h

    simultaneidade total ou reversibilidade instantnea, isso no deve ser en-

    tendido como um fracasso. A distncia e, portanto, o nvel das singularida-

    des prprio do corpo vivido em sua relao com o mundo e com outros

    corpos. Deve- se, no entanto, reconhecer as dobradias que compem esse

    plano de base, que no mais, definitivamente, a situao dividida, separa-

    da, das dicotomias eu- outro, sujeito- objeto.

    A noo de carne [chair], uma das noes privilegiadas por Merleau-

    Ponty (1964) em seu ltimo livro, de fundamental importncia para que

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    204

    seja possvel apreender a real dimenso de sua concepo de intercorporei-

    dade:

    ... de sorte que o que v e o que visto se permutam reciprocamente (se recipro-

    quent), e no mais se saiba quem v e quem visto. a essa Visibilidade, a essa

    generalidade do Sensvel em si, a esse anonimato inato do Eu - mesmo que h pou-

    co chamvamos carne, e sabemos no h nome na filosofia tradicional para de-sign-lo. (...) A carne no matria, no espirito, no substncia. Seria preci-so, para design-la, o velho termo elemento, no sentido em que era empregado para falar-se da gua, do ar, da terra e do fogo, isto , no sentido de uma coisa ge-

    ral, a meio caminho entre o indivduo espcio- temporal e a idia, espcie de prin-

    cpio encarnado que importa um estilo de ser em todos os lugares onde se encontra

    uma parcela sua. (pp. 183-l84)

    Parece-me que essa noo de carne fornece a Merleau-Ponty o esto-

    fo comum para que seja possvel falar em intercorporeidade. A noo de

    carne, melhor do que qualquer outra por sua radicalidade, traz em si a mtua

    constituio das polaridades em um campo existencial, que aquele da per-

    manente reversibilidade possvel entre um corpo que toca outro corpo e

    por ele tocado.

    Merleau-Ponty no supe um mundo onde distncias no existem.

    No h a defesa de uma pura indiferenciao que nos remeteria concepo

    da grande unidade originria, na forma do uno primordial, de onde tudo nas-

    ce e para onde tudo volta. Se ver tocar distncia, se busco com meu cor-

    po tocar e ser tocado porque a distncia existe, a diferena um fato. No

    entanto, o que pode tornar o ver e o tocar significativos e carregados de sen-

    tidos a simultaneidade de diferenciao e indiferenciao, esta como pre-

    sena do mesmo elemento (carne) no corpo e no mundo (Coelho Jr.,

    1997/1998). Merleau-Ponty (1964) sugere que em vez de rivalizar com a

    espessura do mundo, a de meu corpo , ao contrrio, o nico meio que pos-

    suo para chegar ao mago das coisas, fazendo-me mundo e fazendo-as car-

    ne (p. 178).

    Noes como a de carne e de intercorporeidade exigem que Merleau-

    Ponty recuse, de forma mais decisiva, uma filosofia que privilegie as repre-

    sentaes, na linha da tradio das filosofias da conscincia, e busque, no

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    205

    campo das intensidades e das experincias expressivas, plano inaugural de

    nossas relaes com o mundo e com os outros, os fundamentos para uma

    radical filosofia da alteridade.

    Concluso

    Poderamos concluir, relembrando que, de incio, colocou-se para a fi-

    losofia moderna (assim como para a nascente psicologia) uma distncia irre-

    concilivel entre eu- outro, ou conscincia - mundo (a partir da principal

    tradio da filosofia moderna, base para a cincia moderna, ao menos desde

    Descartes). Com isso, instalou-se a necessidade da postulao do problema

    da intersubjetividade, ou seja, como estabelecer pontes entre os plos,

    como estabelecer comunicao entre os plos eu-outro, conscincia-

    mundo. Desse contexto, emerge um problema epistemolgico: como pos-

    svel conhecer o outro, uma outra conscincia?

    Como vimos, h uma primeira tentativa de superao da dualidade eu-

    outro, e tambm sujeito-objeto, por meio da concepo husserliana de uma

    conscincia intencional. Parte-se do reconhecimento do abismo entre eu e

    outro, e busca-se a superao do solipsismo, mas, preciso admitir, man-

    tm-se a afirmativa (ao menos no primeiro Husserl) de que s posso conhe-

    cer o outro de forma mediada, ou seja, atravs de minha conscincia, que j

    no mais uma conscincia em si, fechada em si mesmo, mas sim, uma

    conscincia que sempre conscincia de algo, conscincia aberta ao mundo,

    aos outros, conscincia intencional. O Eu, e tambm a conscincia, tm pre-

    valncia na tarefa de conhecimento, sobre o mundo, sobre outros eus.

    Mas, ainda com Husserl e, principalmente, com Merleau-Ponty,

    emerge uma segunda possibilidade de soluo para o problema epistemol-

    gico: conceber a intersubjetividade como sendo constituda a partir de expe-

    rincias de compartilhamento da realidade, de buscas de unio, onde antes

    se reconhecia a separao. Aqui ganham relevo as noes de corpo vivido,

    percepo e co-construo da realidade, com um claro afastamento da tradi-

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    206

    o estabelecida pelas filosofias representacionais, ou filosofias da conscin-

    cia.

    preciso destacar, por fim, os caminhos filosficos que valorizam as

    modalidades pr-subjetivas de existncia, a esfera inaugural, o plano da indi-

    ferenciao original. Aqui, j no se coloca o problema epistemolgico de se

    ou no possvel conhecer um outro. A intersubjetividade um falso pro-

    blema. Situam-se, nesse nvel, a concepo de um campo primordial da

    experincia de Scheler, a proposio da intercorporeidade apoiada na noo

    de carne em Merleau-Ponty, como tambm, o Dasein heideggeriano, o qual

    no tivemos ocasio de apresentar, mas que preciso mencionar nesse con-

    texto. Nesse plano de investigao da experincia primordial, de modalida-

    des pr-subjetivas de existncia, no parece caber a noo de intersubjetivi-

    dade, claramente tributria de uma tradio filosfica que parte da primazia

    do sujeito, do sujeito soberano da razo, marca central das filosofias moder-

    nas. Talvez nem mesmo a noo merleau-pontiana de intercorporeidade

    expresse, em toda sua radicalidade, as experincias vividas como pr-

    subjetivas, ou transubjetivas. De qualquer forma, gostaria de insistir que

    venho defendendo a noo de intercorporeidade (Figueiredo & Coelho Jr.,

    2000), justamente por entender que ela nos remete valorizao de um pla-

    no existencial que no pode ser tematizado a partir da primazia das filosofias

    do sujeito e das representaes e exige um inevitvel encontro com a radical

    alteridade do outro.

    Para finalizar, gostaria de acrescentar que entendo que as posies de

    Husserl, Scheler e Merleau-Ponty sobre o problema da intersubjetividade

    no do conta, evidentemente, da ampla gama de questes que suas prprias

    obras suscitam. Mas, no resta dvida, que seus pensamentos sobre o tema

    tm o mrito de demarcar um territrio a ser pensado e que, at ento, no

    havia sido formulado com tanta clareza. Foi esse territrio que busquei ex-

    plicitar, esperando que, com isso, possa vir a contribuir para o aprofunda-

    mento dos estudos psicolgicos da alteridade.

  • Da Intersubjetividade Intercorporeidade: Contribuies da Filosofia...

    207

    Coelho Jr., N. E. (2003). From Intersubjectivity to Intercorporeality:

    Contributions of a Phenomenological Philosophy to the Psychological

    Study of Alterity. Psicologia USP, 14(1), 185-209.

    Abstract: This paper presents the philosophical questioning of

    intersubjectivity in the phenomenological theories of Husserl, Scheler and

    Merleau-Ponty, considering their contribution to the constitution of

    psychological studies of alterity. It presents forms in which the other

    appears before me, its possible presence as a constitutive element of the

    world in which I take part, and above all, as a constitutive element of

    myself. In order to recognize the other in its radical alterity I cannot

    institute it by comparison with myself, by analogy or introjection and not

    even by processes of affective fusion. These forms exclude the possibility

    of recognizing the other in its difference. It is suggested that we have to

    start with a sensible/perceptive experience in the proper sphere of a lived

    body, so as to make it possible to recognize the other as difference in its

    expressive forms. As a conclusion, a favorable substitution of the notion of

    intersubjectivity by the one of intercorporeality is proposed.

    Index Terms: Phenomenology. Alterity. Intersubjectivity.

    Intercorporeality .

    Coelho Jr., N. E. (2003). De L'intersubjectivit L'intercorporalit :

    Contributions de la Philosophie Phnomnologique L'tude

    Psychologique de L'altrit. Psicologia USP, 14(1), 185-209.

    Rsum: Ce texte prsente une rflexion philosophique sur

    l'intersubjectivit dans les thories phnomnologiques de Husserl, Scheler,

    et Merleau-Ponty, considrant leur contribution l'tude psychologique de

    l'altrit. Des formes de surgissement de l'autre moi se prsentent et de sa

    prsence possible comme lment constitutif du monde auquel j'appartiens

    et, au-dessus de tout, comme lment dont je suis constitu. Pour que l'autre

    puisse tre reconnu dans son altrit radicale je ne peux ni l'instituer par

    comparaison avec moi-mme, par analogie, ni par projection ou

    introjection, ni par des procds de fusion affective. Ce sont des formes qui

    excluent la possibilit de reconnatre l'autre en sa diffrence. On suggre

    qu' partir de l'exprience sensible/perceptive, dans la sphre propre d'un

    corps vivant, la reconnaissance de l'autre comme diffrence au moyen de

    ses formes expressives soit possible. On conclut ainsi que la notion

  • Nelson Ernesto Coelho Junior

    208

    d'intersubjectivit pourrait tre avantageusement substitue par celle

    d'intercorporalit.

    Mots-cls: Phnomnologie. Altrit. Intersubjectivit. Intercorporalit.

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    Recebido em 20.05.2002

    Aceito em 01.02.2003