curso técnico de formação para os funcionários da educação

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pro uncionário Curso Técnico de Formação para os Funcionários da Educação

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  • pro uncionrioCurso Tcnico de Formao para

    os Funcionrios da Educao

  • Presidncia da Repblica

    Ministrio da Educao

    Secretaria Executiva

    Secretaria de Educao Bsica

  • Brasil. Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Bsica.

    B823 Gesto da educao escolar / Luiz Fernandes Dourado. Braslia : Universidade de Braslia, Centro de Educao a Distncia, 2006.

    88 p. (Curso tcnico de formao para os funcionrios da educao. Profuncionrio ; 6)

    ISBN 85-86290-57-2

    1. Gesto da educao. 2. Escola pblica. I. Dourado, Luiz Fernandes. II. Ttulo. III. Srie.

    CDU 37.014.2

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Departamento de Articulao e Desenvolvimentodos Sistemas de Ensino

    Coordenao Geral do Programa Nacional de Valorizaodos Trabalhadores em Educao

    Coordenao Tcnica do ProfuncionrioEva Socorro da Silva

    Apoio TcnicoAdriana Cardozo Lopes

    Coordenao PedaggicaBernardo Kipnis - CEAD/FE/UnBDante Diniz Bessa - CEAD/UnBFrancisco das Chagas Firmino do Nascimento - FE/UnBJoo Antnio Cabral de Monlevade - FE/UnBMaria Abdia da Silva - FE/UnBTnia Mara Piccinini Soares - MEC

    Equipe de Produo - CEAD/UnBCoordenao Pedaggica - Maria de Fatima Guerra de SouzaGesto Pedaggica - Maria Clia Cardoso LimaCoordenao de Produo - Bruno Silveira DuarteDesigner Educacional Luciana Kury FreitasReviso Daniele SantosCapa e Editorao - Evaldo Gomes e Tlyo NunesIlustrao - Paulo Alexandre Rodrigues da Silva

  • ApresentaoO mdulo 6, Gesto da Educao Escolar, composto de

    cinco unidades e busca contribuir com a formao continu-ada dos funcionrios da educao cujo processo de trabalho,

    desenvolvido em diferentes espaos como os da alimentao, da secretaria, dos multi-meios, do meio-ambiente e da infra-estrutura,

    contribui para que a escola pblica cumpra com o seu papel social na formao dos estudantes.

    No presente mdulo, vamos abordar as diferentes concepes da adminis-trao capitalista, destacando a especificidade da gesto educacional, seus

    desdobramentos, limites e possibilidades, no que concerne aos atuais proces-sos de organizao e gesto. Alm disso, vamos analisar tambm os limites e as

    possibilidades de construo de processos de participao que contribuam para o repensar da gesto da educao e da escola pblica no pas, envolvendo os diferentes sujeitos da comunidade local e escolar: estudantes, professores, funcio-nrios, pais, equipe gestora e comunidade, dando nfase ao papel dos funcionrios da educao.

    A Unidade I busca refletir sobre a administrao ou gesto da escola: as principais concepes e abordagens, tomando-a como um campo de disputa de projetos, cujos desdobramentos implicam formas de organizao e gesto das escolas e a efetivao da educao como um direito social. Essa unidade aborda, ainda, a re-forma de Estado brasileiro e as perspectivas para a gesto escolar, buscando situar a relao entre educao, escola e Estado no Brasil e as polticas educacionais em curso no pas. Ao mesmo tempo, procura contextualizar as polticas educacionais com a gesto democrtica, para o avano das lutas em prol da educao pblica como direito social.

    A Unidade II busca analisar a gesto da educao e da escola por meio da compre-enso da estrutura escolar no Brasil e dos contornos legais de seu funcionamento, que revelam conceitos, concepes e significados. Nessa busca, perceberemos a discusso da gesto democrtica como princpio e motor nas lutas dos trabalha-dores em educao, na conquista do direito educao para todos como dever do Estado, expresso na atuao dos diversos entes federativos: Unio, Estados, Distrito Federal e os municpios.

    Dessa forma, a Unidade III analisa a gesto democrtica da escola pblica e aponta concepes, implicaes legais e operacionais, com nfase no projeto poltico-pe-daggico e no trabalho coletivo na escola. Essa unidade ressaltar os processos de trabalho na escola, vinculando-os construo da gesto democrtica.

  • Por sua vez, a Unidade IV analisa e discute os mecanismos de participao da uni-dade escolar e a construo de graus progressivos de sua autonomia. Ao enfatizar os processos e os mecanismos de participao, essa unidade destaca, entre outros, a escolha de diretores, os conselhos escolares e os grmios estudantis, como espa-os de vivncia e aprendizado do jogo democrtico.

    Por fim, a Unidade V retoma a discusso sobre a gesto democrtica e os trabalha-dores da educao, evidenciando conceitos e concepes trabalhadas ao longo do mdulo. Ela visa, fundamentalmente, destacar a ao pedaggica que se realiza na escola por meio do trabalho docente e no-docente e pretende ressaltar a necessi-dade da efetiva participao dos trabalhadores da educao na construo da ges-to democrtica na escola e na garantia da educao como um direito social.

    Objetivo

    Espera-se que o funcionrio de escola possa compreender as diferentes concep-es e abordagens da administrao capitalista e a especificidade da gesto educa-cional, bem como aprenda a identificar as relaes entre a reforma do Estado brasi-lieiro e a gesto escolar. Deseja-se, ainda, que o cursista, no exerccio de seu fazer profissional e nos espaos de formao educativa na escola, possa compreender os princpios da gesto democrtica e, principalmente, constru-la em seu cotidiano.

    Ementa

    Administrao e gesto da educao: concepes, escolas e abordagens. A ges-to da educao: fundamentos e legislao. Reforma do Estado brasileiro e gesto escolar. Gesto, descentralizao e autonomia. Gesto democrtica: fundamentos, processos e mecanismos de participao e de deciso coletivos.

  • Mensagem do Autor

    Prezado(a) funcionrio(a) de escola

    H muitos anos, trabalho na educao pblica no Estado de Gois. Nessa caminhada, fui professor da educao bsica e diretor de uma escola municipal de ensino fundamental na cidade de Goinia.

    Atualmente, sou Coordenador do Ncleo de Estudos e Docu-mentao Educao, Sociedade e Cultura (Nedesc) e profes-sor Titular na Faculdade de Educao da Universidade Federal de Gois, onde atuo como professor nos cursos de gradua-o e ps-graduao, vinculados Linha de Pesquisa Estado e Polticas Educacionais.

    Desde a dcada de 1980, desenvolvo pesquisas nas reas de polticas e gesto da educao. Atualmente, coordeno, orien-to pesquisas e participo de programas de formao inicial e continuada nessa rea.

    Neste mdulo, a proposta de trabalho envolver voc, traba-lhador no-docente da escola pblica e que se encontra em processo de formao, com a compreenso crtica acerca das polticas de gesto para a educao bsica. Vamos lidar com o aprendizado e a avaliao dos processos de participao nas escolas e no sistema de ensino, refletindo sobre a cons-truo da gesto democrtica da educao.

    Este material uma proposta de construo participativa. As concepes e discusses apresentadas, em sua maioria, en-contram-se em textos publicados por mim em diferentes mo-mentos e que foram reorganizados para possibilitar a discus-so e anlise das polticas e da gesto da educao bsica. Meu maior desafio contar com seu olhar criterioso e com sua avaliao, para que os textos sejam aprimorados. Assim, esperamos tornar este material acessvel e apropriado ao pro-jeto de formao em andamento, do qual voc parte.

    Luz Fernandes Dourado

  • Sumrio

  • UNIDADE I A administrao ou gesto da escola: concepes, escolas tericas 13

    UNIDADE II A reforma de Estado brasileiro: a gesto da educao e da escola 29

    UNIDADE III Gesto democrtica da escola pblica: concepes e implicaes legais e operacionais 49

    UNIDADE IV Democratizao da gesto escolar: mecanismos de participao e autonomia da unidade escolar 55

    UNIDADE V Gesto democrtica e os trabalhadores em educao 75

  • IntroduoNeste incio do sculo XXI, a acelerao dos avanos tecnol-gicos, a globalizao do capital e as transformaes nas rela-es de trabalho, como a perda de direitos sociais, trouxeram mudanas para as polticas de gesto e de regulao da edu-cao no Brasil. Tais mudanas interferem na organizao da escola e nos papis dos diversos atores sociais que constroem seu cotidiano.

    Compreender esse processo e a legislao dele decorrente, bem como fortalecer a discusso e as deliberaes coletivas na escola, um desafio que se coloca para toda a comunidade escolar, para todos os trabalhadores que atuam na escola p-blica.

    Nesse cenrio adverso, foroso agir em outra direo. Democratizao da escola implica repensar em sua organiza-o e gesto, por meio do redimensionamento das formas de escolha do diretor e da articulao e consolidao de outros mecanismos de participao. Nesse sentido, fundamental ga-rantir, no processo de democratizao, a construo coletiva do projeto pedaggico, a consolidao dos conselhos escola-res e dos grmios estudantis, entre outros mecanismos. Isso quer dizer que a cultura e a lgica organizacional da escola s se democratizaro se todos que vivenciam seu cotidiano con-triburem para esse processo de mudana.

    Ao longo do mdulo, vamos refletir sobre a importncia da par-ticipao de todos para a efetivao de uma gesto democrti-ca e participativa, que busque cotidianamente a construo da autonomia da unidade escolar.

    Nessa direo, fundamental a compreenso de que a cons-truo da gesto escolar democrtica sempre processual. Sendo, ento, uma luta poltica e pedaggica, para se impor, necessrio envolver a todos: pais, funcionrios, estudantes, professores, equipe gestora e comunidade local.

    Tal processo resulta em, pelo menos, duas outras frentes arti-culadas: a primeira, de conhecer e intervir, propositivamente, na legislao educacional. Ou seja, preciso conhecer a Lei de Diretrizes e Bases da Educao, as leis que regulamentam os sistemas estaduais e municipais de ensino. Buscar a compre-enso desses aparatos jurdicos como instrumentos vivos das

  • polticas educacionais, tornando-os aliados na luta pela de-mocratizao da escola. A segunda frente implica articular professores, funcionrios, pais, estudantes, coordenado-res, supervisores, orientadores educacionais e a comuni-dade local na construo de mecanismos de participao, visando consolidar um novo processo de gesto, onde o exerccio democrtico seja o motor de um novo poder e de uma nova cultura escolar.

    Este o desafio para todos. Contribuir com a construo e efetivao da gesto democrtica e participativa!

    Essa a luta de todos ns!

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    Voc, funcionrio de escola pbli-ca, vivencia todos os dias prticas educativas significativas na vida de nossas crianas, adolescentes e adultos. a sirena que toca, a fila de entrada, a merenda gratuita, a sala arrumada desta ou de outra forma, o incio ou fim do bimestre, a reprovao... O que talvez voc no saiba que tudo que acontece na escola est ligado, tem origem em diferentes concepes tericas e metodolgicas que permeiam a

    administrao ou gesto educacional. Nesta unidade, vamos estud-las, assim como as teorias e tendncias que explicam as formas de organizao e funcionamento de outras institui-es sociais.

    Discutir a administrao ou gesto escolar nos leva discus-so acerca do conceito de administrao em geral e, tambm, a compreender a histria da gesto, pois as transformaes eco-nmicas e tecnolgicas, bem como os princpios, funes e ma-neira de gerir interferem nas prticas sociais e educacionais.

    Vamos comear por algumas concepes sobre a adminis-trao.

    O que administrao?

    Para iniciar nossa reflexo, vamos ao dicionrio Aurlio: administrao um conjunto de princpios,

    normas e funes que tem por fim ordenar os fatores de produo e controlar a sua produtividade e eficincia, para se obter determinado resultado. Observe, ainda, a definio de outro autor1: a administrao como processo de planejar para organizar, dirigir e controlar recursos humanos, materiais, financeiros e

    informacionais visando realizao de objetivos.

    1 Martins, Jos do Prado. Administrao escolar: uma abordagem crtica do processo administrativo em educao, So Paulo, Atlas, 1991.

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    Voc pode observar que os conceitos acima esto carregados de termos como controle, produtividade e eficincia, caracte-rsticos do modo de produo capitalista. No entanto, a admi-nistrao enquanto atividade essencialmente humana nasceu antes de a sociedade se organizar a partir do ideal capitalista.

    Nesse sentido, outro autor, Vitor Paro, em seu livro Administrao Escolar: introduo crtica, ao discutir o concei-to de administrao como fenmeno universal, define o termo como a uti-lizao racional de recursos para a re-alizao de fins determinados. Assim, tanto os princpios, quanto as funes da administrao esto diretamente re-lacionados aos fins e natureza da or-ganizao social em qualquer realidade e, ao mesmo tempo, determinados por uma dada sociedade.

    Por exemplo, na empresa capitalista, que tem como objetivo a acumulao do capital, a funo da administrao organizar os trabalhadores no processo de produo, com a finalidade de ter o controle das foras produtivas, do planejamento execuo das operaes, visando maximizao da produo e dos lu-cros. J numa sociedade indgena, a comunidade organiza seus recursos de caa no para obter lucro, mas com o objetivo de garantir sua sobrevivncia com a abundncia de carnes.

    Ento, vamos refletir sobre as maneiras de organizao cons-trudas pelos homens ao longo de sua histria mais recente. Para desenvolvermos esse exerccio, apresentamos as esco-las de administrao que traduzem concepes, polticas e formas de organizao e gesto.

    Quais so as escolas de administrao?

    Os estudiosos apontam vrias abordagens para o entendi-mento do termo administrao. Para auxiliar a compreenso, usamos a seguinte classificao:

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    Capitalismo um regime econmico e social, caracterizado pela propriedade privada dos meios de produo e de distribuio, pela liberdade dos capitalistas para gerir os seus bens no sentido da obteno de lucro e pela influncia dos detentores do capital sobre o poder poltico.

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    a) escola clssica ou de administrao cientfica;

    b) escola de relaes humanas;

    c) escola behaviorista;

    d) escola estruturalista.

    Discutiremos, tambm, o enfoque cultural como uma alterna-tiva mais abrangente para a anlise da administrao.

    Escola clssica ou de administrao cientfica

    A Escola de administrao cientfica tem como principais representantes Henry Fayol e Frederick W. Taylor. Este ltimo seu principal protago-nista, pois foi quem desenvolveu novos mtodos de organizao ra-cional do trabalho. Taylor criou as linhas de montagem, adaptadas produo em massa, para o apro-veitamento mximo do tempo, dos recursos humanos e materiais. Com isso, minimizou gastos e aumentou os lucros.

    O princpio que norteia o pensamento dessa escola pode-se resumir, segundo o professor Fernando Prestes Mota2, na afir-mao de que:

    algum ser um bom administrador medida que pla-nejar cuidadosamente seus passos, que organizar e co-ordenar racionalmente as atividades de seus subordina-dos e que souber comandar e controlar tais atividades.

    Desse modo, descreveremos a seguir as idias centrais dessa abordagem.

    Sendo o homem um ser racional, ao tomar uma deciso, bus-ca conhecer todos os cursos de ao disponveis e as con-seqncias da sua opo. Pode, assim, escolher sempre a melhor alternativa e, com ela, melhorar os resultados de sua deciso. Segundo essa escola, os valores do homem so ti-dos, a princpio, como econmicos.

    Frederick W. Taylor

    2 Mota, Fernando C. Prestes. Teoria Geral da Administrao: uma introduo, 7 edio, So Paulo, Edi-tora Pioneira, 1973.

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    Para essa escola de administrao, a perspectiva dos resultados determi-nante da maneira correta e eficiente de execuo do trabalho, o que implica anlise e estudos detalhados de todo o processo produtivo, para adequ-lo ao mximo de produo. Para tanto, a gesto deve intervir desde a seleo e treinamento do pessoal at a fixao de um sistema de incentivos econmicos, passando por controles da superviso.

    A organizao uma forma de se es-truturar a empresa, visando ao mxi-mo de produtividade e de lucros, no sendo considerada nos seus aspectos sociais. Assim, a funo do administrador , fundamentalmente, determinar a maneira certa de executar o trabalho.

    No que se refere organizao propriamente dita, esta escola fundamenta-se nas seguintes idias:

    a) Quanto mais dividido for o trabalho em uma organizao, mais eficiente ser

    a empresa;

    b) Quanto mais o agrupamento de tarefas em departamentos obedecer ao critrio da

    semelhana de objetivos, mais eficiente ser a empresa;

    c) Um pequeno nmero de subordinados para cada chefe e um alto grau de centralizao das

    decises, de forma que o controle possa ser cerrado e completo, tender a tornar as orga-

    nizaes mais eficientes;

    d) O objetivo da organizao centrar-se mais nas tarefas do que nos homens. Dessa

    forma, ao organizar, o administrador no de-ver levar em considerao problemas de

    ordem pessoal daqueles que vo ocupar a funo.

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    Escola de relaes humanas

    As relaes sociais no modo de produo capitalista so, so-bremaneira, relaes antagnicas. De um lado, esto os pro-prietrios dos meios de produo e de outro, a classe traba-lhadora, detentora da fora de trabalho.

    Essas relaes apresentam-se conflitantes e algumas vezes irreconciliveis. A Escola de relaes humanas, que tem Ge-orge Elton Mayo como seu representante maior, desloca o foco de interesse da administrao, da organizao formal, para os grupos informais. Assim, os problemas sociais, polti-cos e econmicos, passam para a esfera dos problemas psi-colgicos, ocasionados pelo relacionamento no grupo, pela necessidade de participao e auto-realizao3. Nessa tica, os princpios norteadores dessa escola esto centrados em outras idias.

    O homem, alm de racional, essencialmente social. Seu comportamento dificilmente reduzvel a esquemas, sofren-do, portando, influncia de condicionamentos sociais e dife-renas individuais. A constatao do grupo informal dentro da organizao, como uma realidade prpria, diferente da organi-zao formal, exige conhecimentos e tratamentos especiais.

    Alm do incentivo monetrio, para que o homem se integre de forma eficiente aos objetivos da organizao formal, fazem-se necessrias outras motivaes, como por exemplo, a partici-pao nas tomadas de deciso.

    Escola behaviorista

    Essa escola no v a organizao em sua estrutura formal, mas foca toda sua ateno para a organizao informal, ou seja, para as relaes sociais no previstas em regulamentos ou organogramas.

    Segundo a Escola behaviorista, os princpios administrativos adotados nas empresas podem ser empregados em qualquer tipo de organizao e os problemas administrativos devem ser tratados com objetividade.

    Entre 1927 e 1932, o psiclogo industrial australiano George Elton Mayo prestou sua contribuio Escola das Relaes Humanas atravs de uma pesquisa na Western Eletric Co., na cidade de Hawtorne, onde as mulheres que l trabalhavam, executando tarefas rotineiras, eram submetidas a diferentes condies de trabalho. Ele concluiu que o fato delas se sentirem observadas fazia com que aumentasse sua motivao para o trabalho.

    3 Flix, Maria de Ftima Costa. Administrao escolar: um problema educativo ou empresarial? So Paulo, Cortez: Autores Associados, 1989.

    O Behaviorismo, teoria comportamental ou comportamentalismo, um ramo da psicologia que estuda o comportamento

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    Os principais representantes desta escola so Herbert Simon, Chester Bernard, Elliot Jacques e Chris Argyris, que se pautam nas idias mostradas a seguir.

    O comportamento do homem racional apenas em relao a um conjunto de dados caractersticos de determinada situ-ao; esses dados, variveis e resultantes do subjetivismo e do relativismo da prpria racionalidade, devem ser no s explicados, mas determinados e previstos pela teoria.

    O processo de tomada de deciso, para essa abordagem, exi-ge um tratamento metodolgico especial, tendo em vista a sua importncia no processo administrativo. Os problemas relacionados autoridade exigem estudos especiais, pois necessrio um tratamento que leve aceitao das normas e ordens. Assim, a autoridade, deve ser encarada como fen-meno psicolgico e no apenas legal.

    A organizao deve ser percebida como um instrumento co-operativo racional. A realizao e satisfao dos objetivos pessoais se obtm pela vivncia da cooperao nas organiza-es informais.

    Escola estruturalista

    A Escola estruturalista tem entre seus representantes Max Weber, Robert K. Merton, Alvin Gouldner e Amitai Etzioni. Segundo o ponto de vista dessa escola, a organizao do mundo moderno exige do homem uma personalidade flexvel, resis-tente a frustraes, com capacida-de de adiar a recompensa e com desejo de realizao pessoal.

    Diferente das escolas clssica e de relaes humanas, que defendiam a harmonia natural de interesses, e da escola behavorista, que admitia

    Relativismo a teoria filosfica que se baseia na relatividade do conhecimento e repudia qualquer verdade ou valor absoluto. Ela parte do pressuposto de que todo ponto de vista vlido.

    SubjetivismoSegundo a filosofia o sistema que no admite outra realidade seno a do sujeito pensante ou que acentua o carter subjetivo do conhecimento.

    Max Weber, foi um intelectual alemo e um dos fundadores da Sociologia.

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    a existncia do conflito, mas acreditava na sua superao por meio da integrao das necessidades individuais s organi-zacionais, os estruturalistas apontam que o conflito, alm de necessrio, inerente a determinados aspectos da vida so-cial, tendo em vista as tenses e os dilemas presentes nas organizaes. Os incentivos para o bom desenvolvimento do trabalho no podem ser apenas de natureza econmica ou de natureza psicossocial, mas de ambas, pois elas se influenciam mutuamente.

    O enfoque cultural: uma tentativa de contextualiza-o da administrao

    A anlise dessas escolas, que retra-tam a histria das diferentes concep-es de administrao, revela o nor-te poltico que as caracteriza. Como o eixo de nossa anlise a adminis-trao escolar, falta uma concepo que considere as particularidades da escola. Assim, Benno Sander4, ao situar a trajetria da administrao escolar, destaca o carter assumido por esta desde o enfoque essencial-mente normativo (que prioriza as normas e a orientao jurdica), pas-sando pelas abordagens tecnocrti-

    cas e comportamentalistas, at as abordagens contemporneas que possibilitam, em alguns casos, a centralidade da dimenso humana, favorecendo os processos de participao dos dife-rentes atores no cotidiano escolar. Nesse sentido, destaca a im-portncia do enfoque cultural, centrado na dimenso humana, como concepo que contribui para repensar a cultura escolar e, desse modo, para a construo da gesto democrtica das escolas. A seguir, vamos discutir um pouco mais essa questo, resgatando a especificidade da escola.

    4 SANDER, Benno. Gesto da Educao na Amrica Latina. Construo e Reconstruo do conhecimento. Campinas, SP : Autores Associados,1995.

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    A gesto da escola, entendida como instituio educativa, diferente da administrao de empresas?

    Discutimos, anteriormente, vrias concepes sobre a teoria da administrao. O nosso objetivo foi possibilitar ao cursista a compreenso de que existem vrias formas

    e maneiras de se ver e de se organizar a administrao de uma instituio social. Ao mesmo tempo, enfatizamos

    o enfoque cultural como aquele que possibilita uma ao contextualizada dos processos de gesto. Vamos

    discutir, em seguida, a administrao ou gesto de uma instituio social especfica: a escola.

    Os termos gesto da educao e administrao da educa-o so utilizados na literatura educacional ora como sin-nimos, ora como termos distintos. Algumas vezes, gesto apresentada como um processo dentro da ao administra-tiva, outras vezes apresenta-se como sinnimo de gerncia numa conotao neotecnicista dessa prtica e, em muitos ou-tros momentos, gesto aparece como uma nova alternativa para o processo poltico-administrativo da educao. Enten-de-se por gesto da educao o processo poltico-adminis-trativo contextualizado, por meio do qual a prtica social da educao organizada, orientada e viabilizada. (BORDIGNON; GRACINDO, 2001, p. 147). Tendo em vista a anlise feita pe-los professores Genuno Bordignon e Regina Gracindo, vamos optar pelo uso do termo gesto como substitutivo para o de administrao, quando descrevemos os conceitos de gesto de sistemas e de gesto escolar.

    Voc sabia que as escolas vinculam-se a um sistema de ensino? Para compreendermos melhor esse processo

    vamos apresentar alguns conceitos fundamentais.

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    Nas escolas e nos cursos de formao, abordam-se conceitos como: gesto da educao, gesto da escola, gesto educa-cional, gesto de sistemas e administrao escolar. Convm entender esses conceitos para, depois, utiliz-los nas escolas.

    Gesto de Sistema Educacional

    A gesto de sistema implica ordenamento normativo e jurdico e a vinculao de instituies sociais por meio

    de diretrizes comuns. A democratizao dos sistemas de ensino e da escola implica aprendizado e vivncia do exerccio de participao e de tomadas de deciso. Trata-se de um processo a ser construdo coletivamente, que considera a especificidade e a possibilidade histrica e cultural de cada sistema de ensino: municipal, distrital, estadual ou federal de cada escola.

    Programa Nacional de Fortalecimento dos conselhos escolares. vol.5. p. 23.2004

    Gesto da Escola Pblica

    Trata-se de uma maneira de organizar o funcionamento da escola pblica quanto aos

    aspectos polticos, administrativos, financeiros, tecnolgicos, culturais, artsticos e pedaggicos, com a finalidade de dar transparncia s suas aes e atos e possibilitar comunidade escolar e local a aquisio de conhecimentos, saberes, idias e sonhos num processo de aprender, inventar, criar, dialogar, construir, transformar e ensinar.

    (Abdia, autora do mdulo 2 - Educadores e Educandos: tempos histricos)

    A partir desses conceitos, vamos compreender melhor a es-cola e sua funo social, destacar as suas especificidades ao diferenciar a gesto escolar da administrao empresarial.

    A escola, como instituio social, deve ser administrada a partir de suas especificidades, ou seja, a escola uma orga-nizao social dotada de responsabilidades e particularidades

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    que dizem respeito formao humana por meio de prticas polticas, sociais e pedaggicas. Assim, sua gesto deve ser diferenciada da administrao em geral, e, particularmente, da administrao empresarial.

    A instituio escola pblica, criada para ser espao de formao dos dirigentes da sociedade, tornou-se hoje o local universal de formao de homens e de mulheres, abrigando no mesmo espa-o seres humanos em processo de vir a ser. Lembremo-nos do dever humano, aprofundado na primeira unidade do Mdulo 3. L, aprendemos que a transformao faz parte de ns e da nossa cultura. Estamos no mundo e por isso nossas aes o atinge e, a partir disso, construmos nossa educao.

    A educao aqui entendida como processo de criao, inovao e apropriao da cultura, historica-mente produzida pelo homem. Des-sa forma, a escola torna-se espao privilegiado de produo e de trans-formao do saber sistematizado. As prticas e aes que a organizam devem ser eminentemente educati-vas, de forma a atingir os objetivos da instituio: formar sujeitos parti-cipativos, crticos e criativos.

    Pensar a democratizao da escola pblica implica definir com clareza a funo social dessa instituio.

    Para que serve a escola? Quais so suas funes bsicas? Como se posicionar diante de outras funes a ela

    atribudas?

    Assim, vamos fazer uma reflexo sobre as concepes que permeiam as discusses acerca da administrao educacional e, assim, identificar e discutir os argumentos utilizados pelas escolas tericas que defendem a especificidade da gesto es-colar e questionam o emprego linear na educao dos princ-pios utilizados na administrao em geral.

    Como estarmos preparados para contribuir na educao de nossas crianas e adolescentes? O que podemos fazer duran-te nossas atividades na escola para contribuir na formao dos

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    estudantes? Como os funcionrios podem contribuir? Como podemos ser educadores e gestores na escola?

    Porque temos no pas tantos analfabetos, gente sem terra para morar, gente sem assistncia mdica e odontolgica e gente na pobreza e na misria?

    Fonte: perguntas retiradas do mdulo 2 - Educadores e Edu-candos: tempos histricos

    Qual a funo social da educao e da escola?

    O homem, no processo de transformao da natureza, instau-ra leis que regem a sua convivncia no grupo, cria estruturas sociais bsicas que se estabelecem e se solidificam conforme vo se constituindo em espao de formao do prprio ho-mem. As relaes que os homens estabelecem entre si e a natureza nas diferentes esferas da vida social, mediadas por instituies por eles criadas, tais como instituies religiosas, trabalhistas, educacionais, sindicatos, partidos polticos e as-sociaes constituem-se em espaos de construo/recons-truo de saberes sociais e da Histria humana.

    A satisfao das mltiplas e histricas necessidades humanas s possvel na medida em que os homens se relacionam en-tre si. Assim, o processo de relao entre os homens e a natu-reza aponta para a necessidade de criar meios que entrelacem as suas relaes. Segundo a autora Lcia Bruno, o processo de entrar em relaes uns com os outros nos imperativo, pois a satisfao das necessidades humanas implica agir, que impe inelutavelmente a presena do outro. (BRUNO, 2004, p. 288).

    ao relacionar-se entre si e com a natureza que os homens se constituem e, nessa relao,

    constroem saberes, objetos, conhecimentos e cultura. Os conhecimentos e os saberes construdos

    historicamente pelos homens, nas relaes que estabelecem entre si, nas diferentes esferas da vida social, constituem o que se chama de educao, que, compreendida na perspectiva ampliada, define-se como prtica social que se d nas relaes sociais que os homens estabelecem, nas diversas instituies e

    movimentos sociais, por eles criados e modificados ao longo de sua histria.

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    Mas, por ser produto das relaes estabelecidas entre os ho-mens, a educao tambm pode ser crivada por concepes mais restritas ou mais complexas, dependendo de como se do as relaes na produo/reproduo da vida material, es-piritual e na organizao da vida em sociedade.

    Assim, em uma sociedade em que o homem tido como su-jeito histrico e sua formao tem como objetivo o desenvol-vimento fsico, poltico, social, cultural, filosfico, profissional e afetivo, a concepo de educao se d na perspectiva que concebe o homem na sua totalidade. Em contrapartida, em uma sociedade em que o homem reduzido a indivduo que vende a sua fora de trabalho, a educao passa a ter como finalidade habilitar tcnica, disciplinar e ideologicamente os diversos grupos de trabalhadores para servir ao mundo do trabalho. Nessa concepo, a educao limita-se prepara-o de mo-de-obra, qualificando o homem para a submisso individual e competitiva esfera econmica e ao mercado de poucos empregos.

    A concepo de educao que orienta este mdulo fundamenta-se numa perspectiva

    crtica que concebe o homem em sua totalidade, enquanto ser constitudo pelo biolgico, material,

    afetivo, esttico e ldico. Nesse sentido, faz-se necessrio que os homens, no desenvolvimento das

    prticas educacionais, em suas mltiplas e histricas necessidades, sejam considerados como sujeitos dos

    processos educativos. Isso significa que a educao est sendo compreendida em um sentido mais amplo,

    ou seja, enquanto prtica social que se d nas relaes que os homens estabelecem entre si, nas diferentes instituies e movimentos sociais, sendo, portanto,

    constituinte e constitutiva dessas relaes. E a escola, como instituio social, criada pelos homens na busca

    da construo/reconstruo de um saber histrico e da sua prpria humanizao por meio das relaes

    estabelecidas, s se justifica quando cumpre a funo social para a qual foi criada.

    O projeto de educao a ser desenvolvido nas escolas tem de considerar, portanto, os diferentes segmentos sociais que a compem, bem como buscar a explicitao de sua identida-

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    de social, articulando-se com a realidade. Precisa prever aes com vistas melhoria dos pro-cessos educativos, propiciando condies polticas e culturais para sistematizar e socializar os saberes produzidos pelos ho-mens. Isso quer dizer que o pro-jeto de uma unidade escolar, na perspectiva da transformao, tem como atitude e compromis-so envolver os diferentes sujei-

    tos que constroem o cotidiano da escola: funcionrios, estudan-tes, professores, pais, equipe de direo e comunidade.

    Assim, a escola, no desempenho de sua funo social de for-madora de sujeitos histricos, constitui-se em um espao de sociabilidade, possibilitando a construo e a socializao do conhecimento vivo, que se caracteriza enquanto processo em construo permanente e espao de insero dos indivduos nas relaes sociais.

    Logo, funo da escola criar projetos educativos numa perspectiva transformadora e inovadora,

    onde os fazeres e prticas no estejam centrados nas questes individuais, mas sim nas questes

    coletivas. Isso quer dizer que, para a escola avanar, fundamental considerar os espaos de formao de todos que trabalham, criam, brincam, sonham e estudam, enfim, de todos aqueles que dela fazem parte. Tambm fundamental no perdermos de vista que a escola parte das relaes sociais mais amplas e que as possibilidades histricas de sua organizao passam pela sociedade poltica e civil e, nesse cenrio, os processos de mudana vivenciados pelo Estado so

    um dos indicadores dos limites e das possibilidades da gesto escolar.

    Gesto da educao: tendncias atuais

    Vimos como a concepo de administrao empresarial tem sido apresentada como parmetro para a gesto educacional e que a sua difuso se deu por meio da corrente de estudio-

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    sos que entendem os problemas da escola como meramente administrativos. Sua soluo, portanto, estaria no uso de m-todos e tcnicas oriundos das teorias das escolas de admi-nistrao.

    Segundo os defensores dessa concepo, a gesto enten-dida como direo, ou seja, como a utilizao racional de re-cursos na busca da realizao de determinados objetivos. Isso requer uma adequao dos meios aos fins a serem alcana-dos. Logo, se os objetivos so ganhos imediatos de novos mercados e consumidores, as aes da direo da empresa se pautaro por eles.

    No entanto, vimos tambm que h outra concepo de gesto educacional, derivada no dos objetivos do mundo comercial e competitivo, mas da natureza, das funes, dos objetivos e dos valores das escolas, alicerados no campo da formao humana e sociocultural. A maneira de conduzir uma escola re-flete, portanto, os valores, concepes, especificidades e sin-gularidades que a diferenciam da administrao capitalista.

    Assim, os objetivos da organizao escolar e da organizao empresarial no so apenas diferentes, mas an-tagnicos. A escola objetiva o cum-primento de sua funo de socializa-o do conhecimento historicamente produzido e acumulado pela humani-dade, ao passo que a empresa visa expropriao desse saber na produ-o de mais valia para a reproduo do capital, para manter a hegemonia do modo de produo capitalista.

    A escola, enquanto organizao so-cial, parte constituinte e constitutiva da sociedade na qual est inserida. Assim, estando a sociedade organizada sob o modo de produo capitalista, a escola enquanto instn-cia dessa sociedade, contribui tanto para manuteno desse modo de produo, como tambm para sua superao, tendo em vista que constituda por relaes contraditrias e confli-tuosas estabelecidas entre grupos antagnicos.

    A possibilidade da construo de prticas de gesto na esco-la, voltadas para a transformao social com a participao cidad, reside nessa contradio em seu interior. Desse modo, a gesto escolar vista por alguns estudiosos como a media-

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    o entre os recursos humanos, materiais, financeiros e peda-ggicos, existentes na instituio escolar, e a busca dos seus objetivos, no mais o simples ensino, mas a formao para a cidadania.

    A gesto, numa concepo democrtica, efetiva-se por meio da participao dos sujeitos sociais envolvidos com a comu-nidade escolar, na elaborao e construo de seus projetos, como tambm nos processos de deciso, de escolhas coleti-vas e nas vivncias e aprendizagens de cidadania.

    novamente do professor Paro a afirmao de que o carter mediador da administrao manifesta-se de forma peculiar na gesto educacional, porque a os fins a serem realizados rela-cionam-se emancipao cultural de sujeitos histricos, para os quais a apreenso do saber se apresenta como elemento decisivo na construo de sua cidadania. (1999, mimeo).

    Assim, a gesto escolar voltada para a transformao social contrape-se centralizao do poder na instituio escolar e nas demais organizaes, primando pela participao dos es-tudantes, funcionrios, professores, pais e comunidade local na gesto da escola e na luta pela superao da forma como a sociedade est organizada.

    Isso implica repensar a concepo de trabalho, as relaes sociais estabelecidas no interior da escola, a forma como ela est organizada, a natureza e especificidade da instituio es-colar e as condies reais de trabalho pedaggico, discusso que faremos no prximo tpico.

    Escolha de cinco a sete pessoas entre pais, mes, professores, colegas funcionrios e estudantes,

    e faa as seguintes perguntas: quais so as funes da escola hoje em dia? O que a escola representa para a cidade, para o bairro? A conversa deve ser registrada

    em seu Memorial.

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    Na unidade anterior, situamos as concepes sobre administrao em geral e destacamos o papel, a importncia e a especificidade da gesto da escola. Discutimos, ain-da, que no existe uma nica lgica de administrao ou gesto, o que coloca como desafio a reflexo so-bre o tipo de escola que queremos e sob que concepo de gesto buscamos construi-la. Visando pro-piciar mais elementos para a nossa anlise, vamos discutir a seguir a relao entre a reforma do Estado e a gesto da educao e da escola no Brasil.

    A reforma do Estado e a edu-cao no Brasil

    Nas ltimas dcadas, no Brasil, vivenciamos um processo de mudanas, causadas pelo incremento das relaes sociais ca-pitalistas, pelo expressivo avano tecnolgico e pela globa-lizao do capital e do trabalho. Essas alteraes societrias redimensionaram o papel da educao e da escola, e encon-traram terreno frtil no campo das polticas educacionais, im-plementadas no pas. Os processos de regulao da educao e de gesto da escola por meio de aes gerenciais pragma-tistas interferiram, sobremaneira, na lgica organizativa da es-cola e nos papis dos trabalhadores em educao.

    A partir dos anos 90, ocorre a consolidao de um processo de reforma do Estado, centrado na minimizao de seu papel, no tocante s polticas pblicas. Na rea educacional, viven-ciam-se, em toda a Amrica Latina, mudanas no papel social da educao e da escola, por meio de um conjunto de medi-das que alteram o panorama da educao bsica e superior. No Brasil, intensificam-se as aes polticas e reformas edu-cacionais em sintonia com a orientao de organismos inter-nacionais, expressas por vrios dispositivos da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (Lei n. 9394/1996).

    A nova LDB se enquadra numa sucesso de polticas esta-duais e municipais, de inspirao neoliberal, que enfatizam o trinmio: produtividade, eficincia e qualidade total.

    Leia mais sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educao no site http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/l9394.htm

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    TEEssas orientaes, ao redirecionarem as formas de gesto, os

    padres de financiamento, a estrutura curricular, o esquema de profissionalizao, a composio dos nveis de ensino na educao bsica e na educao superior, possibilitaram, ao mesmo tempo, mecanismos de descentralizao (municipali-zao, escolarizao) e novas formas de centralizao e con-trole por parte do poder central, como os instrumentos nacio-nais de avaliao.

    Paradoxalmente, a lei destaca o princpio da gesto democr-tica, j presente na Constituio de 1988 e cuja implantao s se concretiza se a gesto dos processos primar pela participa-o ativa de todos os atores e instituies intervenientes no processo educacional. nesse espao ambguo que devemos pensar os limites e as possibilidades da democratizao da escola, ou seja, entender a educao enquanto prtica social constitutiva e constituinte das relaes sociais mais amplas. Assim, compreender a importncia de outros espaos de for-mao no interior da escola e neles buscar a construo de novos horizontes para a gesto da educao e da escola, en-volvendo a comunidade local e escolar. Isso se tornou tare-fa mpar. Um dos primeiros elementos para essa construo implica identificar na legislao Constituio Federal, LDB, Constituies Estaduais e Leis Orgnicas Municipais os prin-cpios que norteiam a gesto escolar.

    A Gesto escolar no contexto da reforma de Esta-do: concepes em disputa

    Na dcada de 1990, predominou a retomada conservadora dos governos empenhados com o crescimento do capital financei-ro internacional. Ocorreram, ento, importantes alteraes no mundo do trabalho e da produo, resultantes do expressivo avano tecnolgico, da flexibilizao das leis trabalhistas e da globalizao do capital financeiro, sobretudo, especulativo.

    Em escala mundial, essas transformaes societrias redimen-sionaram o papel das polticas pblicas, particularmente, da edu-cao e da escola. No campo educacional, intensifica-se uma tendncia de retomada da teoria do capital humano e de propo-sies gerenciais como norte para as questes escolares, sobre-tudo, dos processos de regulao, financiamento e gesto.

    Nesse cenrio de mudanas, a reduo da educao escola, em muitos casos, um indicador da viso pragmatista e re-

    A teoria do capital humano, desenvolvida pelo grupo de estudos coordenado por Theodoro Schultz, nos Estados Unidos, na dcada de 70, compreende, segundo Gaudncio Frigotto (1999, p. 41) a idia-chave de que a um acrscimo marginal de instruo, treinamento e educao, corresponde um acrscimo marginal de capacidade de produo. Ou seja, a idia de capital humano uma quantidade ou um grau de educao e de qualificao, tomando como indicativo de um determinado volume de conhecimentos, habilidades e atitudes adquiridas que funcionam como potencializadoras da capacidade de trabalho e de produo. Dessa suposio deriva que o investimento em capital humano um dos mais rentveis, tanto no plano geral do desenvolvimento das naes, quanto no plano da mobilidade individual.

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    dentorista que passa a orientar as polticas na rea, por meio de forte interlocuo e induo dos organismos multilaterais. A interveno desses organismos, por meio de financiamento de projetos e assistncia tcnica, na definio de polticas para a educao pblica expressa a maneira sutil dos governos fe-deral, estaduais e municipais reconfigurarem a educao lgica dos negcios comerciais.

    Assim, em 1995, criou-se o Ministrio da Administrao Federal e Reforma do Estado (MARE), com o objetivo de re-definir as funes tpicas do Estado, como regulao, fiscali-zao e gerncia. Tal perspectiva implicava transferir para o setor privado as atividades ligadas sade, educao e cul-tura ou, pelo menos, torn-las aes concorrentes com a iniciativa estatal.

    Nesse perodo, foram propostas reformas na educao bsi-ca, profissional, tecnolgica e superior, numa forma de apro-ximao de interesses, em que a educao pblica passa a ser compreendida na esfera dos negcios comercializveis, com rotinas de cunho gerencial estritamente privado.

    Ento, a partir do que foi exposto podemos perceber que as polticas do Estado para a educao so resultantes das aes e dos compromissos assumidos entre as instituies financei-ras internacionais e as foras econmicas nacionais; da capa-cidade das entidades, associaes, organizaes e sindicatos de fazer avanar seus projetos e propostas na direo alme-jada; das prticas sociais e pedaggicas criadas e inventadas no interior da escola, em que se conjugam histrias, valores, culturas, identidades e saberes. Portanto, no meio das con-tradies que somos educadores e fazemos a POLTICA.

    Assim, as polticas educacionais, enquanto polticas pblicas, cumprem o papel de integrao e qualificao para o proces-so produtivo, criando estruturas norteadas por interesses e prioridades nem sempre circunscritos esfera educacional, mas voltadas para o campo dos negcios comerciais e empre-sariais. Ao mesmo tempo, as polticas educacionais se situam e so compreendidas no mbito das demais polticas sociais, portanto, como um direito social. a partir desse carter con-traditrio das polticas que devemos ocupar espaos em defe-sa do direito educao e participao cidad.

    Nesse cenrio, a educao entendida como prtica social, cuja especificidade (a ao educativa) no lhe confere autono-mia. A educao no se confunde com a escolarizao, que

    Leia sobre o Plano diretor da reforma do estado no link http://www.planejamento.gov.br/GESTAO/conteudo/publicacoes/plano_diretor/portugues.htm

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    TEconsiste em uma das modalidades da

    ao educativa, mas tem na escola o seu lugar privilegiado espao de ins-titucionalizao processual do pensar e do fazer.

    A educao escolar configura-se, portanto, em ato poltico e pedaggi-co na medida em que requer sempre uma tomada de posio. A ao edu-cativa e, conseqentemente, a polti-ca educacional em qualquer das suas feies no possuem apenas uma di-menso poltica, mas so sempre po-lticas, j que no h conhecimento, tcnica ou tecnologias neutras, pois todas so expresses e formas conscientes, ou no, de engajamento das pessoas na sociedade.

    A seguir vamos aprofundar a discusso sobre a gesto demo-crtica na Constituio Federal e na LDB.

    A construo da gesto democrtica na Constitui-o Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educa-o Nacional

    Na Constituio Federal, pro-mulgada em 5 de outubro de 1988, alguns avanos sociais fo-ram sinalizados, como a garantia do acesso ao ensino gratuito e obrigatrio, consubstanciado no direito pblico subjetivo; a ges-to democrtica do ensino p-blico; a vinculao de impostos

    educao, pela qual cabe Unio aplicar 18% e aos Estados, municpios e Distrito Federal, 25%.

    A criao e as aes do Frum Nacional em Defesa da Esco-la Pblica, enquanto espao de articulao e de luta poltica em defesa de uma educao cidad e, portanto, gratuita, de qualidade social e democrtica, foram fundamentais para a formulao de um projeto para a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional. Por meio dele, o ento Deputado Octvio Elysio apresentou Cmara dos Deputados o projeto de lei

    A Constituio brasileira de 1988, sob a presidncia de Jos Sarney, a stima a reger o Brasil desde a sua Independncia. Surge como reao ao perodo do Regime Militar e devido s preocupaes de garantia dos direitos humanos e direitos sociais. Foi batizada pelo Constituinte Ulysses Guimares como Constituio cidad.

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    de diretrizes e bases da educao nacional antecipando-se ao poder Executivo.

    A tramitao do referido projeto se deu lentamente, em meio a difceis e complexas negociaes. Isso retratou a composio heterognea do Congresso Nacional e os diversos interesses em jogo, principalmente o histrico embate entre os defenso-res do ensino pblico e os defensores do setor privado.

    Nessa caminhada, aps vrios re-trocessos, foi aprovado o substitu-tivo redigido pelo senador Darcy Ribeiro, com vrias emendas que restauraram dispositivos da Cmara e at introduziram novos avanos. Apesar das mudanas no texto por fora dos acordos do grupo gover-namental, algumas reivindicaes de setores organizados da socieda-de civil, particularmente, algumas bandeiras do Frum Nacional em Defesa da Escola Pblica foram efe-tivadas na redao final da Lei n, 9.394, de 20 de dezembro de 1996, como por exemplo:

    concepo de educao: concepo ampla, entendendo a educao para alm da educao escolar, para alm da escolarizao;

    fins da educao: educao como instrumento para o exerccio da cidadania;

    educao como direito de todos e dever do Estado: ga-rantia da universalizao da educao bsica (educao infantil, fundamental e mdia);

    gratuidade do ensino pblico em todos os nveis, assegu-rada pela destinao de impostos vinculados da Unio, dos Estados, do Distrito federal e dos municpios, repas-sados de dez em dez dias ao rgo da educao;

    articulao entre os sistemas de ensino da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos municpios;

    instituio do Conselho Nacional de Educao (CNE), garantindo a representao de setores organizados da sociedade civil;

    gesto democrtica nas instituies pblicas.

    Darcy Ribeiro

    O Conselho Nacional de Educao um rgo colegiado integrante da estrutura de administrao direta do MEC e foi criado nos termos da Lei 9.131, de 24 de novembro de 1995.

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    TEConsiderando esse processo e, ainda, entendendo que a ges-

    to democrtica no se decreta, mas se constri coletiva e permanentemente, alguns desafios se colocam para sua efe-tivao nos sistemas de ensino. Nessa direo, os processos formativos escolares que acontecem em todos os espaos da escola revelam a construo de uma nova gesto pautada pela efetivao de canais de participao, de descentralizao do poder e, portanto, de exerccio de cidadania.

    Desse modo, a construo da gesto democrtica passa pela garantia de alguns princpios fundamentais, quais sejam: a participao poltica; a gratuidade do ensino; a universaliza-o da educao bsica; a coordenao, planejamento e a descentralizao dos processos de deciso e de execuo e o fortalecimento das unidades escolares; a operao dos con-selhos municipais de educao, enquanto instncia de con-sulta, articulao com a sociedade e deliberao em matrias educacionais; o financiamento da educao; a elaborao co-letiva de diretrizes gerais, definindo uma base comum para a ao e a formao dos trabalhadores em educao e a exign-cia de planos de carreira que propiciem condies dignas de trabalho.

    Vamos, agora, discutir mais amplamente quais so os princ-pios da gesto democrtica a serem efetivados com base na LDB.

    Os princpios da gesto democrtica

    Na Lei n. 9394/1996, a gesto democrtica, enquanto princpio, aparece no artigo 3o, inciso VIII: Gesto democrtica do ensino pblico, na forma desta lei e da legislao dos sistemas de en-sino. Sobre os princpios norteadores da gesto democrtica nas escolas pblicas de educao bsica, a LDB dispe:

    Art. 14 Os sistemas de ensino definiro as normas de gesto democrtica do ensino pblico na educao bsica, de acordo com as suas peculiaridades e con-forme os seguintes princpios:

    I participao dos profissionais da educao na elabora-o do projeto poltico-pedaggico da escola;

    II participao das comunidades escolar e local em conse-lhos escolares ou equivalentes.

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    De acordo com a legislao vigente, cabe aos sistemas de en-sino regulamentar a gesto democrtica por meio de dois ins-trumentos fundamentais ao incremento da participao:

    a) projeto poltico-pedaggico da escola, elaborado por seus profissionais da educao;

    b) conselhos escolares que incluam membros da comuni-dade escolar e local.

    Portanto, nem o projeto poltico-pedaggico da escola pode ser desenvolvido sem o envolvimento dos profissionais da educao, nem o conselho escolar pode prescindir dos pro-fessores e dos funcionrios.

    Pensar esses princpios implica alterarmos a escola que temos e buscarmos a construo de uma nova escola que seja pblica e popular, com processos de participao e de gesto envolvendo a comunidade. Professores, coordenadores, supervisores, orien-tadores educacionais, funcionrios, pais e alunos tomam as deci-ses, construindo coletivamente a autonomia da escola.

    Nesse sentido, fundamental superar a lgica de gesto adotada por algumas administraes

    pblicas, caracterizada por um modelo gerencial em que autonomia se reduz administrao dos recursos

    financeiros com eficincia e produtividade. Autonomia significa gesto democrtica construda por meio do conselho escolar, do projeto poltico-pedaggico como expresso da cultura e da comunidade escolar. Tal mudana s ser possvel se todos os segmentos da escola buscarem a efetiva participao. Uma das primeiras lutas, nesse processo, refere-se garantia

    do direito educao. Vamos lutar pelo direito educao para todos?

    Polticas educacionais: a relao entre os entes federados e a garantia do direito educao

    Do ponto de vista da organizao e gesto, o atual sistema brasileiro de ensino resultado de mudanas importantes no processo de reforma do Estado e fruto de alteraes introdu-zidas em 1988 pela Constituio da Repblica Federativa do Brasil, em 1996 pela Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional e em 2001 pelo Plano Nacional de Educao (PNE).

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    TEO PNE, fixado pela Lei n. 10.172/2001, estabelece diretrizes,

    objetivos e metas a serem implementadas nas diversas eta-pas e modalidades da educao bsica e superior, de modo a garantir o acesso, a permanncia e a gesto democrtica e a qualidade do ensino. Essas aes esto vinculadas busca do cumprimento dos compromissos coletivos assumidos pelo Brasil no Frum Mundial sobre Educao de Dakar, em abril de 2000, que diz respeito garantia de educao para todos. No Brasil, a coordenao dessas aes e polticas, que visa garantir a educao como um direito social do cidado, pa-pel da Unio, por meio do Ministrio da Educao5 (MEC), em articulao com os poderes pblicos estaduais e municipais.

    A Constituio Federal do Brasil de 1988 declara a educao como um direito social, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualifi-cao para o trabalho. Estabelece, portanto, a base da organiza-o educacional do pas ao firmar direitos e deveres, delimitar competncias e atribuies, regular o financiamento e definir princpios como: pluralismo, liberdade e gesto democrtica.

    Exige-se, assim, dos governos como prioridade polticas e ges-to que garantam o envolvimento e a participao da sociedade civil na formulao e implantao de aes e programas volta-dos para a universalizao da educao bsica e para a me-lhoria da educao nos diferentes nveis e modalidades. Nessa direo, vrios encontros, seminrios, audincias e outros es-paos de participao e democratizao tm sido estabelecidos como canais de discusses coletivas no encaminhamento de proposies, projetos e estratgias e solues para a garantia da educao para todos, em sintonia com os dispositivos legais e com as metas do Plano Nacional de Educao.

    As aes dos poderes pblicos, especialmente das esferas estaduais e municipais, associadas a movimentos estruturais como a urbanizao e circulao de riqueza pelos cofres do Estado, tiveram como conseqncia uma conquista histrica na rea da educao no Brasil, a democratizao do acesso ao ensino fundamental. Atualmente, 97,2% das crianas com idade entre 7 e 14 anos esto na escola. No entanto, h muito que fazer. necessrio garantir a melhoria dos processos de ensino e aprendizagem e, desse modo, otimizar a permann-

    Leia na integra a Lei n. 10.172/2001 no link http://pedagogiaemfoco.pro.br/l10172_01.htm

    5 O Ministrio da Educao, em sua estrutura regimental, conta com as seguintes secretarias: Secretaria de Educao Bsica (SEB), Secretaria de Educao Profissional e Tecnolgica (Setec), Secretaria da Educa-o Superior (Sesu), Secretaria de Educao a Distncia (Seed), Secretaria de Educao Especial (Seesp), Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade (Secad) e, ainda, com a Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (Capes), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educa-cionais Ansio Teixeira (Inep) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao (FNDE).

    Pluralismo um pensamento, doutrina ou conjunto de idias segundo as quais os sistemas polticos, sociais e culturais podem ser interpretados como o resultado de uma multiplicidade de fatores ou concebidos como integrados por uma pluralidade de grupos autnomos, porm interdependentes.

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    cia desses estudantes no sistema escolar, rompendo com a cultura do fracasso escolar. Noutras frentes, o pas vem ado-tando aes no combate s altas taxas de analfabetismo e de ampliao do acesso educao infantil, educao de jo-vens e adultos e ao ensino mdio.

    Mas os avanos se fazem necessrios no s no acesso, mas tambm na permanncia com qualidade social e na superao do fracasso escolar. Para tanto, urgente a melhoria da quali-dade na educao em todos os nveis.

    Educao e condies sociais desiguais no Brasil

    Voc sabia que o desempenho dos estudantes brasileiros, aferido por meio dos exames de avaliao do Ministrio da Educao, demonstra que a aprendizagem dos alunos ainda est abaixo de padres adequados? Esse baixo desempenho possui vrias causas, internas e externas escola.

    Alm das questes sociais e econmicas, estruturais em um pas continental como o Brasil, necessrio perceber como os processos de organizao e de gesto pedaggicas inter-ferem na produo do fracasso escolar: deficincias no pro-cesso de ensino-aprendizagem, estruturas inadequadas das redes de ensino para dar conta dos aumentos de demanda, carncia de profissionais qualificados, recursos pedaggicos e bibliotecas.

    Todas essas questes se articulam com as condies objetivas da maioria da populao, em um pas historicamente marcado por perversas desigualdades sociais. So necessrias polticas

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    TEpblicas mais amplas que incluam a garantia de melhoria dos

    indicadores de acesso, permanncia e gesto com qualidade

    social na educao bsica.

    Recriar e democratizar a escola so processos fundamentais na lutas pela qualidade do ensino e pela melhoria das condi-es de vida da populao brasileira. Nesse sentido, vamos apresentar a seguir a organizao do sistema educacional bra-sileiro, as competncias dos entes federados e a discusso de alguns indicadores educacionais. Vamos l?

    Sistema educacional brasileiro: estrutura, compe-tncias e responsabilidades

    O sistema educacional brasileiro est legalmente regulamen-tado pela Constituio Federal de 1988, incluindo a Emenda Constitucional n. 14, de 1996, e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, entre outras.

    A LDB, de 1996, define os nveis e modalidades que compem a educao nacional, alm da sua forma de organizao. O artigo 21 define que a educao escolar composta pela edu-cao bsica (que abrange educao infantil, ensino funda-mental e ensino mdio) e pela educao superior.

    Quadro 1: Estrutura do sistema educacional brasileiro Lei n. 9.394/1996

    Nveis e Subdivises Durao Faixa Etria

    Educao Bsica

    Educao infantilCreche 4 anos De 0 a 3 anos

    Pr-escola 2 anos De 4 a 5 anos

    Ensino fundamental (obrigatrio) 9 anos De 6 a 14 anos

    Ensino mdio3 anos ou

    maisDe 15 a 17 anos

    ou maisEducao Superior

    Cursos e programas (graduao, ps-graduao) por rea.

    Varivel Acima de 17 anos

    Fonte: Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996.

    A Lei define, ainda, as competncias e responsabilidades de cada ente federado Unio, Estados, Distrito Federal e muni-cpios com relao oferta da educao, em seus diferentes nveis, etapas e modalidades, destacando o que devero or-ganizar, em regime de colaborao, em seus respectivos sis-temas de ensino.

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    De acordo com a legislao vigente, competncia dos mu-nicpios atuar prioritariamente na educao infantil e ensino fundamental; dos Estados assegurar o ensino fundamental e oferecer, prioritariamente, o ensino mdio. No caso do Distrito Federal, oferecer toda a educao bsica. A Unio se incumbe de manter sua rede de educao superior e profissional e de dar apoio tcnico e financeiro aos demais entes federados

    Analise a seguir o quadro com o nmero de matrculas da educao bsica no Brasil no ano de 2005.

    Matrculas

    Educao Bsica

    1.1 Nmero de matrculas de educao bsica, por etapas e modalidade, segundo a regio geogrfica e a unidade da federao, em 30/3/2005

    U nidade da

    FederaoTotal

    Matrculas de Educao Bsica

    Ed. Infantil

    Ensino Fundamental

    Ensino Mdio

    Ed. Especial

    Ed. de Jovens e Adultos

    Ed. Profissional

    Brasil 56.471.622 7.205.013 33.534.561 9.031.302 378.074 5.615.409 707.263

    Fonte: INEP, 2005.

    As matrculas no ano de 2005, se comparadas populao que demanda educao nas diferentes idades, revelam que o Sistema Educacional Brasileiro avanou no processo de uni-versalizao do ensino fundamental e mdio. Mas, mostram o enorme desafio nas demais etapas e modalidades da educa-o bsica. Em relao a 30 milhes de crianas e adolescen-tes de 6 a 14 anos, existiam 33.534.562 estudantes no ensino fundamental em 2005. Por que ser? No ensino mdio eram 9.031.302 matrculas, enquanto a populao entre 15 e 17 anos somava 10 milhes. Isso significa que menos de 1 milho no est atendido pelo ensino mdio?

    J a educao infantil, compreendia por 7.205.013 de matrculas, de um total de 21 milhes de crianas

    at 5 anos. Elas no teriam tambm direito a creches e pr-escolas? Leia o artigo 7o e 208 da Constituio de 1998. Imagine agora os milhes de jovens e adultos analfabetos ou que no concluram o ensino

    fundamental. Eles no tm direito a estudar?

    Esses dados revelam o grande esforo a ser feito pela Unio, Estados, Distrito Federal e municpios para universalizar toda

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    TEa educao bsica.

    Vamos agora visualizar a ao das diversas esferas adminis-trativas:

    Matrculas

    Educao Bsica

    1.2 Nmero de matrculas de educao bsica, por dependncia administrativa, segundo a regio geogrfica e a unidade da federao, em 30/3/2005

    Unidade da Federao

    Total

    Matrculas de Educao Bsica

    Dependncia Administrativa

    Federal Estadual Municipal Privada

    Brasil 56.471.622 182.499 23.571.777 25.286.243 7.431.103

    Fonte: INEP, 2005.

    Os dados do Censo Escolar de 2005 demonstram que as ma-trculas na educao bsica esto concentradas nas redes p-blicas municipais, que respondem por 25.286.243 alunos, e nas estaduais, responsveis por 23.571.777. A rede privada possui 7.431.103 matrculas e a rede federal tem atuao pre-dominante na educao superior.

    Os indicadores de matrculas para esse nvel de ensino mos-tram que as polticas pblicas se pautam pelo regime de cola-borao entre os sistemas e, no caso da Unio, limita-se as-sistncia tcnica e financeira aos sistemas de ensino estadual, distrital e municipal.

    No que se refere ao quantitativo de estabelecimentos de ensino, os dados do Censo

    Escolar de 2004 apontam que h, no Brasil, 211.933 escolas de educao bsica, sendo 176.880 pblicas e 35.053 privadas. Entre as pblicas, 206 da rede federal

    de ensino; 35.778 das redes estaduais e 140.896 das municipais. Esses dados mostram que 83.46% das

    escolas de educao bsica do pas so pblicas e 16.46% privadas. Por que a grande maioria das

    escolas pblicas municipal? Reflita sobre sua realidade.

    No que tange aos processos avaliativos, o Brasil desenvolve desde a dcada de 1990 diversos mecanismos de avaliao em todos os nveis educacionais. No caso especfico da educao bsica, esto em vigor dois instrumentos: o Exame Nacional de Ensino Mdio (ENEM), que avalia os alunos concluintes do

    O Censo Escolar coleta anualmente informaes sobre a educao bsica, abrangendo todas as suas etapas/nveis (educao infantil, ensino fundamental e mdio) e modalidades (ensino regular, educao especial, educao de jovens e adultos e educao profissional de nvel tcnico). uma pesquisa declaratria respondida pelo (a) diretor(a) ou responsvel de cada estabelecimento escolar.

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    ensino mdio, e o Sistema de Avaliao da Educao Bsica (SAEB), cujo objetivo levantar indicadores para o monito-ramento do processo ensino-aprendizagem e, nesse sentido, contribuir para a formulao de polticas, por parte dos en-tes federados, visando melhoria da qualidade do ensino. Os participantes do SAEB so alunos da 4a e 8a sries do ensino fundamental e da 3a srie do ensino mdio, que fazem provas de lngua portuguesa e de matemtica.

    Segundo dados do INEP, participaram do SAEB, em 2003, cer-ca de 300 mil alunos, 17 mil professores e 6 mil diretores de 6.270 escolas das 27 unidades da federao. As informaes coletadas nesse processo de avaliao, feito por amostragem, permitem montar um diagnstico sobre o sistema educacional no pas, possibilitando assim aos governos e gestores identi-ficar potencialidades e fragilidades das polticas educacionais delineadas local e nacionalmente e seus desdobramentos nas instituies educacionais.

    Considerando as dimenses, particularidades e a diversida-de dos sistemas educativos, os resultados dessas avaliaes tornam-se fundamentais para que os governos e comunidade discutam, no mbito de suas secretarias, as medidas relativas aos problemas locais.

    Todavia, tais informaes tm sido apenas parcialmente utili-zadas na proposio e na avaliao de polticas que objetivem a melhoria da qualidade, eficincia e igualdade da educao brasileira. Incrementar esse cenrio avaliativo, buscando re-tratar, mais pormenorizadamente, as especificidades de muni-cpios e escolas e, desse modo, contribuir para a melhor com-preenso dos fatores condicionantes do processo de ensino e aprendizagem, um dos desafios com os quais se deparam o Ministrio da Educao, as secretarias estaduais e municipais e as escolas pblicas.

    Nos estudos desenvolvidos, tem assumido grande centralida-de a criao de uma rede nacional de avaliao da educao bsica, envolvendo os esforos da Unio, dos Estados, dos municpios e do Distrito Federal. Essa rede propiciaria uma maior articulao entre as diretrizes gerais da educao na-cional, as especificidades e o acompanhamento do processo ensino-aprendizagem dos entes federativos.

    Leia mais sobre atividades que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira realiza no stio www.inep.gov.br

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    TEA construo da democratizao da escola pblica:

    os paradoxos da gesto escolar

    As polticas de gesto para a educao no Brasil, na ltima dcada, efetivaram-se a partir de aes de cunho gerencial, para garantir otimizao dos recursos e racionalizao das aes administrativas. Segundo o diagnstico do governo, os problemas educacionais no resultavam da escassez e sim da m administrao dos recursos financeiros, cujas causas, en-tre outras, eram o corporativismo dos professores, sua baixa qualificao e a ineficincia do aparelho administrativo e bu-rocrtico das escolas.

    Frente a essa radiografia, a sada apontada pelos governos nacionais, em consonncia com os interesses dos diretores e tcnicos executivos de organismos internacionais, foi rede-senhar a escola pblica e, particularmente, os processos de gesto implementados no seu cotidiano. Questes como des-centralizao, autonomia e participao foram ressignificadas por meio de uma viso restrita e funcional de cidadania. Ocor-reram processos de transferncia de aes sem a partilha efe-tiva das decises e dos recursos.

    A partir dos anos de 1990 ocorreu, como j analisamos, a con-solidao de um processo de reforma do Estado e da gesto, centrado na minimizao do papel do Estado no tocante s pol-ticas pblicas. Na rea educacional, alm de vrios dispositivos legais na esfera federal, nos Estados e municpios se multipli-caram decretos e portarias inspiradas em conceitos e prticas importadas da gerncia empresarial. Entre elas, o processo de terceirizao de servios julgados atividades-meio ou ativi-dades de apoio, no componentes do processo educativo da escola pblica. Milhares de trabalhadores foram contratados em regime de trabalho precrio, inclusive por meio de firmas de servios de alimentao escolar e de limpeza. Nesse processo, at as associaes de pais e mestres foram envolvidas como parceiras da terceirizao. As conseqncias para a categoria dos educadores foram muito srias, mas motivaram uma sadia reao dos sindicatos e das foras polticas que lutam pela qua-lidade dos servios pblicos, na tica dos direitos.

    Ao mesmo tempo, com o discurso de descentralizao admi-nistrativa e pedaggica, efetivava-se um processo de descon-centrao administrativa que, em muitos casos, resultou em desobrigao executiva do poder pblico, paradoxalmente ar-

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    ticulada a novas formas de centralizao e controle por parte do poder central.

    Estamos, a nosso ver, no limiar de mais um processo de priva-tizao do ensino, que exige uma reflexo sobre novas formas de transferncia de verbas pblicas para instituies privadas, que complementariam a ao do Estado.

    Esse contexto torna-se ainda mais complexo quando, fora-das pela LDB que preconiza a gesto democrtica, vrias se-cretarias a assumem no discurso, mas criam mecanismos de participao para no funcionarem.

    Essa questo nos faz compreender que os processos de ges-to escolar no se desvinculam dos processos de gesto das instituies sociais. Esse movimento de gesto democrti-ca deve ultrapassar os muros da escola. preciso, tambm, democratizar as instituies sociais, pois a escola pblica faz parte dessa categoria. As escolas pblicas experimentam pa-radoxos porque se dizem democrticas, mas tm dificulda-des para vivenciar a gesto democrtica e decidir seus proje-tos. Em alguns casos, permanecem as bases centralizadas do exerccio e personalizao do poder, em que a chamada par-ticipao converte-se em mais uma estratgia de controle.

    Ainda que esse cenrio continue existindo, possvel encon-trar algumas escolas que fazem alteraes pontuais no seu cotidiano, sem contudo alterar a lgica cultural vigente; outras que permanecem na concepo tradicional e autoritria; ou-tras ainda que buscam ser inovadoras e inclusivas, relacionan-do-se com a comunidade, fazendo suas escolhas e definindo coletivamente os seus projetos. Como dizia Rubem Alves, h escolas que so asas feitas para estimular o vo e h escolas que so gaiolas que aprisionam a criatividade, os inventos, as inovaes e os sonhos daqueles que nela convivem.

    Compreender a lgica dos processos de gesto em curso implica, portanto, redesenhar o horizonte poltico da gesto democrtica como princpio de luta em prol da efetiva auto-nomia, compreendida como capacidade de cada povo de au-togovernar-se. A efetivao desse processo de democratiza-o da gesto da escola pblica implica, portanto, a partilha do poder, a sensibilidade para conduzir a escola, a partir das demandas da comunidade escolar, e a tomada de decises e escolhas responsveis e coletivas.

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    TETal perspectiva supe um processo de luta poltica no sentido

    de alterar as relaes sociais mais amplas e, no caso das po-lticas educacionais, romper com a cultura autoritria vigente, por meio da criao de canais de efetiva participao e apren-dizado democrtico.

    Outro dado importante frente a esse processo de constru-o de um outro projeto de gesto refere-se necessidade de rediscusso dos marcos de formao e profissionalizao dos profissionais da educao docentes e no docentes, for-talecendo-os para atuarem como profissionais e educadores sociais, em todos os espaos no interior da escola e na co-munidade local. Vamos discutir o papel dos profissionais da educao na construo da gesto escolar democrtica?

    O papel dos profissionais da educao frente ges-to escolar

    Os profissionais da educao tm sido apontados como os responsveis pela ineficincia escolar. Por outro lado, a situ-ao objetiva de trabalho desses profissionais, professores e funcionrios tem sido de precarizao das suas condies de trabalho e fragmentao das suas atividades. Contraditoria-mente, cada vez mais requerida desses profissionais uma ao multifuncional frente ao cenrio mais complexo das rela-es sociais, trabalhistas e culturais.

    Historicamente, no Brasil, os processos formativos diante da necessidade de melhoria da ao profissional de docentes e de servidores no docentes tm sido insuficientes. Na maioria dos casos, a formao inicial deficiente, os salrios so bai-xos e precrias condies de trabalho. Reverter essa situao demanda vontade e luta poltica.

    Alm disso, a funo de trabalhador da educao conside-rada de baixo prestgio social e passa por mudanas signifi-cativas, englobando questes como formao, prtica, iden-tidade e carreira profissional, entre outras. Essas questes nos remetem necessidade de articulao dos processos de gesto com as condies objetivas em que se realiza a ao pedaggica, bem como com as condies de formao e pro-fissionalizao dos professores e dos funcionrios.

    Em que pese esse cenrio, os trabalhadores em educao vm lutando pela criao de mecanismos de participao e demo-cratizao da gesto escolar. Nesse contexto, fundamental

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    registrar as formas de organizao desses trabalhadores por meio de sindicatos e associaes e por meio da reivindicao por processos de formao continuada.

    Para melhorar esse cenrio, o governo brasileiro vem adotan-do a partir de 2003 polticas dirigidas aos trabalhadores da educao e melhoria dos processos de gesto, por meio de programas de formao continuada, entre os quais o Profun-cionrio um exemplo. No que tange ao estmulo participa-o na gesto e nos processos pedaggicos no municpio e na escola, o Pr-conselho e o Programa Nacional de Conse-lhos Escolares so iniciativas inovadoras.

    Essas questes revelam a relao direta entre a situao ob-jetiva dos trabalhadores em educao e a gesto escolar. Ou seja, pensar a democratizao da gesto implica considerar em que condies se realizam os processos de trabalho e as aes pedaggicas. Assim, preciso entender a gesto como um espao de construo poltica para alm das questes me-ramente administrativas e, portanto, englobar as condies objetivas dos profissionais que atuam no dia-a-dia dos pro-cessos de ensino-aprendizagem, de democratizao da ges-to, de escolha dos dirigentes escolares.

    A defesa da gesto democrtica como princpio faz parte da histria de luta dos trabalhadores em educao. Em diferentes momentos, tais lutas se travaram para garantir maior participa-o dos trabalhadores em educao nos destinos da escola, no fortalecimento dos conselhos escolares, na definio do pro-jeto poltico-pedaggico, na defesa da eleio de diretores, da autonomia escolar e de um crescente financiamento pblico.

    Como vimos, vivenciamos na educao pblica embates em torno da concepo de gesto. A gesto da educao tem

    O Programa Nacional de Capacitao de Conselheiros Municipais de Educao Pr-Conselho tem o objetivo de ampliar a capacidade de entendimento e de atuao dos conselheiros municipais de educao. O programa incentiva e qualifica a participao da sociedade na tarefa de avaliar, definir e fiscalizar as polticas educacionais e assim garantir a universalizao dos direitos bsicos que promovam o exerccio da cidadania.

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    TEsido objeto de importantes estudos que a situam como cam-

    po demarcado por acepes distintas no que concerne sua organizao, orientao e s suas prioridades.

    Nesse sentido, imperativo que se estabeleam alguns hori-zontes para sua prtica. Inicialmente, faz-se necessrio conce-b-la como uma prtica social em disputa, que no se limita apenas dimenso administrativa. Ela se configura como pro-cesso abrangente que se consubstancia como ato poltico.

    Uma coisa considerar a gesto como postura de participa-o restrita e funcional, atrelada s novas formas de controle social caso do paradigma da qualidade total. Outra coisa buscar mecanismos de participao efetiva no processo de construo de uma nova cultura do cotidiano escolar, como expresso de um projeto coletivo envolvendo a comunidade local e escolar. Nessa perspectiva, fundamental fortalecer o processo de participao dos diferentes segmentos na esco-la, destacando a atuao dos trabalhadores em educao por meio da compreenso e discusso do seu papel social e dos processos de trabalho que ocorrem em seus espaos.

    Assim, as prticas de interveno popular nas polticas edu-cacionais, entendidas como aes de cidadania, tm resulta-do na participao de parte da sociedade civil organizada em entidades, associaes, sindicatos e movimentos sociais na luta pela gesto democrtica na educao. A ao de estu-dantes, funcionrios, professores, pais e mes fundamental na definio do caminho a ser construdo pela comunidade escolar.

    A busca pela melhoria da educao escolar contribui para que possamos caminhar na direo das conquistas sociais e do direito a termos direitos. Vamos participar!

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    1. Promova em sua escola uma reunio com os colegas funcionrios, a coordenadora e o

    diretor, depois de ter feito um levantamento sobre os funcionrios da escola desde a sua criao. Informe aos presentes sobre o curso Profuncionrio e solicite a cada um que descreva sua experincia de trabalho nessa escola. Discutam os progressos da participao dos funcionrios na vida da escola. Depois, solicite a cada um que redija a sua experincia profissional enquanto funcionrio de escola. Recolha o material e com sua tutora, faa uma discusso sobre o que foi escrito. Caso a atividade tenha sido includa nas horas de Prtica de Trabalho Supervisionada, transporte os registros para o seu Relatrio Final.

    2. Descubra o dia e horrio da reunio do Conselho Escolar. Caso sua escola no tenha, procure o Conselho Escolar em uma outra instituio. V reunio, solicite a pauta, acompanhe as discusses e registre no seu memorial e, se for o caso, no Relatrio Final, os assuntos debatidos e os encaminhamentos propostos. Discuta com sua tutora o significado

    e a importncia do conselho na escola.

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    Como vimos, ao longo das unidades anteriores, a educao compreende todas as manifestaes humanas que buscam a apropriao da cultura produzida pelo homem. A escola, nes-se cenrio, o espao privilegiado de produo e socializao do saber e deve se organizar por meio de aes educativas que visem formao de sujeitos concretos, ticos, participa-tivos, crticos e criativos.

    Agora, vamos refletir sobre a trajetria do termo gesto nas instituies escolares. Gesto democrtica, gesto comparti-lhada e gesto participativa so termos que, embora no se res-trinjam ao campo educacional, fazem parte da luta de educado-res e movimentos sociais organizados em defesa de um projeto de educao pblica de qualidade, social e democrtica.

    Apesar das lutas em prol da democratizao da educao p-blica e de qualidade fazerem parte das reivindicaes de di-versos segmentos da sociedade h algumas dcadas, elas se intensificaram nos anos de 1980, resultando na aprovao do princpio de gesto democrtica do ensino pblico, consigna-do no artigo 206 da Constituio Federal de 1988.

    A LDB estabelece e regulamenta as diretrizes gerais para a educao nos sistemas de ensino. Em cumprimento ao artigo 214 da Constituio Federal, a LDB dispe, em seu artigo 9o, sobre a elaborao do Plano Nacional de Educao, resguar-dando os princpios constitucionais, bem como incluindo o de gesto democrtica. O PNE aborda questes, concepes e metas direcionadas melhoria da qualidade do ensino e gesto democrtica.

    Ao construir a democratizao da gesto escolar, fundamen-tal recuperarmos nos textos legais Constituio Federal, LDB e PNE o respaldo para implant-la nos sistemas de ensino e, particularmente, nas escolas.

    Mas, a efetivao da gesto democrtica fruto da mobiliza-o dos trabalhadores em educao, das comunidades esco-lar e local. Isso implica luta pela garantia da autonomia da uni-dade escolar, pela implantao de processos colegiados nas escolas, pela garantia de financiamento pelo poder pblico.

    Nesse momento, faz-se necessrio destacar os seguintes con-ceitos:

    Para ler os artigos mencionados no texto acesse o stio www.planalto.gov.br. L voc vai clicar em legislao, constituio.

    E para saber o que diz o art. 9 da LDB acesse o endereowww.rebidia.org.br/direduc.html

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    Gesto:

    Forma de planejar, organizar, dirigir, controlar e avaliar um determinado projeto;

    Sinnimo de administrao, visa racionalizao de recursos materiais, recursos humanos e tem por meta o alcance de uma determinada finalidade;

    Gesto Escolar:

    Forma de organizar o trabalho pedaggico, que impli-ca visibilid