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MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS CURSO DE INTEGRAÇÃO PESSOAL (contém apenas uma parte do livro original)

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Mário Ferreira dos Santos

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Page 1: Curso de Integracao Pessoal - Mario Ferreira Dos Santos

MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS

CURSO DE

INTEGRAÇÃO PESSOAL

(contém apenas uma parte do livro original)

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O PORQUÊ DESTE LIVRO

Durante os meus anos de magistério, como professor particular, fui muitas vezes procurado por

pessoas aflitas, angustiadas, que buscavam um lenitivo para as suas almas magoadas, doridas de tantas

preocupações, desencantos e amarguras.

E como também os meus dias estiveram cheios de decepções, de angústias sem fim, compreendi a

todos, e a cada um, e em meu coração ressoavam aquelas queixas e apelos.

Também minha vida foi procelosa; também passei por lanços dolorosos no caminho, pontilhados de

ingratidões, de amarguras demoradas, de incompreensões inexplicáveis, de inimigos gratuitos que

atuavam nas sombras, e de raros adversários que me enfrentaram de fronte erguida. E não poucos foram

os momentos em que, debruçando-me sobre as minhas experiências, abismei-me em desânimos e até

desesperos.

E por todos os meios, ante o espetáculo do mundo, sem deixar-me arrastar pelo pessimismo fácil,

procurei aquela fonte, a única que nos pode dar a linfa que minora a nossa sede e refrigera as nossas

mágoas: um otimismo concreto e bem fundado.

É comum, entre literatos da nossa época, tripudiar sobre as dores humanas, remexer feridas em vez

de cauterizá-las. Há quem busque angústias quando não as têm, numa morbidez afanosa de sofrimentos,

mais falsos que verdadeiros, para depois criar, com gritos de dor, obras nem sempre autênticas.

Há quem diga até que o otimismo é uma atitude de filosofia barata. Mas há algo mais barato que o

pessimismo? Olhem para o mundo. Quantos os que se queixam, quantos os que se angustiam, açulados

pela imaginação doentia; quantos proclamam angústias (as famosas angústias físicas e metafísicas de

tantos intelectuais!). Quantos procuram mágoas para explorá-las? Há coisa mais barata por este

mundo?

O otimismo é mais difícil das atitudes, e a filosofia, que nele se funda, não é mais fácil. É mais

simples lembrar os momentos de sofrimento que os de alegria.

E deixando de lado os envenenadores da vida, os caluniadores de que falava Nietzsche, os eternos

amarguradores de todos os instantes, deficiente daquele “granus salis”, chorões de todos os modos e

matizes, falsificadores de máscaras mentirosas, abismados em sombras porque temem a luz como

pássaros noturnos e duvidosos, sempre julguei que um sorriso valia mais que um esgar de amargura e

que um raio de sol é mais belo que a sombra que obscurece.

E foi procurando viver em mim a água lustral da alegria, que pude suportar o espetáculo das velhas

carpideiras milenárias.

E buscando essa água lustral, não a quis só para mim. E abençoei aqueles escritores otimistas,

ridicularizados pelos caluniadores da vida, aqueles que sempre oferecem esperança num gesto de

genuíno apoio aos transviados, que procuram caminhos luminosos dentro e fora de si.

E quando de mim se acercavam os que pediam um pouco de tranquilidade de espírito, não neguei. E

o gesto, que de mim esperavam, procurei realizar.

E nessas tentativas humanas, ao procurar minorar mágoas mais profundas, ao procurar suavizar

doridos, ao procurar reintegrar outros que se frangiam em dúvidas e desesperos, nasceu este curso, que

só bem espargiu, que só humanidade disseminou, que só esperanças construiu.

Não poderia citar aqui tantos homens e mulheres, de todas as classes e profissões, para os quais tive

palavras de ânimo, e com eles sofri a mágoa que era deles, e minha também, porque sou humano.

Um dia, um daqueles a quem dera muito de minha boa vontade e de minha melhor atenção, para

ajudá-lo a reintegrar-se em si mesmo, pediu-me, num gesto tão belo que me comoveu, numa voz tão

humana que me tocou a alma, que reduzisse a páginas de um livro aquelas nossas longas e demoradas

conversações, para que pudessem elas levar a tantos que sofrem um novo caminho, que na verdade é um

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velho caminho apenas esquecido, a fim de pô-los outra vez na estrada real, em que há tanto daquela

alegria que decorou com beatitude nossos dias de infância.

A tarefa não era fácil. Havia eu criado métodos de reintegração para casos pessoais. Como o que

fora conveniente para indivíduos, poderia tornar-se útil aos muitos que pedem um pouco de luz e de

alegria?

Era preciso meditar, procurar por entre as lições aquelas ministráveis a qualquer um, e que lhes

desse um amparo geral benéfico.

Teria de fugir ao tecnicismo da psicologia, e falar uma linguagem muito simples e verdadeira.

Ademais, precisaria passar por todas as unilateralidades de escolas e de posições, de que a psicologia

está cheia, para oferecer um método que não implicasse senão benefícios.

E buscando e estudando, através de meditações e ensaios, saíram estas páginas que hoje dou à

publicidade.

Anima-as apenas um desejo e uma convicção. Desejo de não aumentar a tristeza do mundo,

rebuscando sombras para cobrir as poucas luzes que brilham nos corações, como é tão do sabor dos que

desejam tornar de outros as angústias duvidosas que são suas. Convicção de que elas auxiliem os que

sofrem a encontrar uma solução aos males psíquicos, que se reencontrem, afinal, com um sorriso

autêntico nos lábios e muito amor nos corações.

Mário Ferreira dos Santos

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PARTE ESPECIAL

NÓS E OS NOSSOS PENSAMENTOS

Tu, quem quer que sejas, não podes negar que buscas o bem.

Tens uma obra a realizar, uma missão a fazer. Tua atenção está voltada para o que te cabe realizar.

Poderias conseguir o que desejas ou que te cabe construir, se desviasses as tuas forças para o que não

interessa à realização da meta planejada? Não julgarias desde logo que toda atividade desviada do fim é

uma atividade inútil e perdida?

Mas, para onde se dirige o teu apetite? Para o bem, sem dúvida.

Se o bem é a tua meta, toda atividade que não levar até ele é uma atividade inútil.

Portanto, se queres alcançar o teu bem, deves naturalmente planejar a tua ação para que não haja

atividades inúteis.

Mas, quem deseja realizar alguma coisa, precisa saber onde e quando vai realizá-la.

Um arquiteto que deseja construir um prédio precisa conhecer o terreno onde vai elevá-lo. Tu

precisas, para alcançar teu bem, saber onde ele está, pois do contrário serias como aquele viandante que

procura uma cidade sem saber onde ela está.

E assim como o viandante necessita que outros lhe indiquem onde está a cidade que busca, talvez

precises, também, saber onde está o teu bem.

Raciocinemos juntos: é o teu bem algo a ser criado, ou já existe?

Como já vimos até aqui, o teu bem já existe, pois todas as coisas buscam realizar o seu bem. Mas se

ele já existe, então para que procurá-lo?

Sim, ele já existe, mas é preciso saber onde ele está, da mesma forma que o viandante sabia da

existência da cidade procurada, não, porém, onde ela se achava.

Então surge outra pergunta: está em mim mesmo ou fora de mim mesmo o bem que me é próprio?

Eu te respondo que não haverá nenhum bem fora de ti, se antes não encontrares o bem em ti. E vou

mostrar-te:

O teu bem está em ti, esta é a afirmativa. Mas é preciso desvelá-lo, descobri-lo dos véus que o

ocultam. E o que o oculta são todas as solicitações que te afastem do teu próprio bem.

Digamos que procuras, levado pelo teu apetite, pondo em ação a tua vontade, o bem nas coisas que

te cercam. Por acaso, não são elas um bem para ti? Não dão elas inúmeros prazeres, bem-estar,

satisfações? Então, o teu bem está nas coisas. Mas duas são as situações de um homem ante as coisas:

a) Ser senhor das coisas;

b) Serem as coisas senhoras do homem.

Qual situação que preferirás? Ser escravo das coisas, ou utilizá-las para o teu bem? Certamente,

responderás que queres dominar as coisas. Elas devem servir-te e não servires tu a elas.

Mas como poderias tornar as coisas tuas servas, se elas te dominassem?

Nesse caso, escravo das coisas, elas não seriam o teu bem, e quanto mais as perseguisses, mais

dominado estarias por elas. Portanto, o bem que elas te dariam seria sempre menor que o bem que delas

tereis, se te tornasses senhor.

Desta forma, o teu bem, fora de ti, não poderia ser alcançado sem que fosses um senhor e não um

escravo.

Mas pode ser senhor, quem não é senhor de si mesmo?

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Ser senhor de si mesmo é realizar o que de melhor há para nós. E a ideia de melhor implica a de um

bem superior a outros bens. Portanto, o teu maior bem é seres senhor de ti, pois, desde que o sejas, te

tornarás senhor das coisas.

Pois não é verdade que as coisas provocam em ti paixões, emoções, sentimentos, preocupações que

não são o teu bem, mas reduções, ataques ao teu bem?

Desta forma, vês claramente que o teu bem está primeiramente em ti e secundariamente nas coisas.

Tens, portanto, que libertar o teu bem dos véus que o cobrem, para que possas dominar as coisas e

fazer com que elas te sirvam.

Já sabes que a confiança em ti mesmo é o ponto de partida. Poderias dizer: “não posso fazer isto

agora, mas podê-lo-ei amanhã.” Assim como um estudioso sobe degraus até alcançar o pleno

conhecimento, também conhecemos degraus para alcançar o nosso bem.

- Que devo fazer? – perguntas-me.

- Confia em tua vitória, em primeiro lugar. Já sabes que tens o teu bem em ti. Falta-te apenas libertá-

lo dos véus que o encobrem.

Realiza o exercício diário de meditação, nas formas a serem indicadas e o de respiração rítmica.

Com esses exercícios abrirás as portas que conduzirão à tua vitória.

Agora medita sobre estas minhas palavras:

Há coisas que dependem de mim e há coisas que não dependem.

Os meus pensamentos, a minha vontade e as minhas paixões dependem de mim. O que se refere aos

outros e ao mundo não depende de mim.

Se me aflijo com o que não depende de mim, só posso enfraquecer-me. Tudo quanto possa fazer para

o bem dos outros não deixo de fazer.

Contudo, sou o meu amigo que precisa lutar por mim. Se me aflijo com o que é meu, a culpa é

apenas minha, pois posso vencer o que depende de mim.

Todas as vozes que venham de mim, contra mim, não são minhas. Porque o que é meu, trabalha por

mim. Ouvirei as minhas vozes que falam a linguagem do meu bem, e repudiarei, com o meu desprezo, as

vozes que não falam a sua linguagem.

Sou eu que faço a minha força ou a minha fraqueza. Lutarei por mim e pelo meu bem.

Quando me surge uma ideia dolorosa, preocupadora, minha inimiga, dir-lhe-ei:

“Tu és apenas uma ideia e nada és do que pretendes representar.”

Analisa-a então: é uma ideia que se refere às coisas que dependem de ti ou às que não dependem de

ti?

E se se refere a coisas que não dependem de ti, despreza-a, e dize-lhe: Isto não se refere a mim.

- Mas, e as minhas preocupações sobre assuntos que dependem de mim? – podes perguntar.

Pois bem, analisa-as: são sobre fatos fundados ou infundados? São dúvidas que te assaltam? São

temores vãos? Fundam-se em fatos sucedidos?

Sejam o que forem. Sejam reais, até, tenham fundamento até. Lembra-te, porém e pronuncia dentro

de ti: “as preocupações crescem quando eu as alimento com o meu temor, quando eu lhes dou conteúdo

com a minha vontade. Sei que só poderei vencer o que é contra mim, quando estou do meu lado, quando

estou unido a mim mesmo. E quem poderia fazer essa desunião, se o interior de cada ser humano é um

reino onde podemos dominar soberanamente? Eu não me enfraquecerei em favor dos meus inimigos”.

Meu caminho já está traçado: lutar por mim. Ninguém me afastará de mim mesmo e do meu bem.

Se nós somos que são os nossos pensamentos, podemos ser o que pensamos. E acaso não temos

liberdade de pensar no bem, como podemos pensar no mal?

E se desejamos o nosso bem, pois esta é a lei de todo o existente, porque não pensamos em nosso

bem?

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EXERCÍCIOS

QUEM ÉS TU?

Se ainda não leste nem realizaste plenamente um retrato caracterológico de ti mesmo, o que te será

fácil depois de estudares a Parte Geral deste livro, não te devo preocupar esta falha, pois ela não impedirá

que possas agora na Parte Especial, iniciar os exercícios, depois das providências que passarei a

descrever, no intuito de realizar a tua integração.

Talvez sejas um retraído introvertido ou extrovertido, nervoso ou bilioso, e estarás sujeito às

contingências do teu temperamento e do caráter que adquiriste. Mas tu podes realizar a ti mesmo, e a tua

personalidade poderá por ti mesma ser construída.

Mas, antes, ponderemos sobre alguns pontos que são de grande importância para alcançarmos a meta

desejada. Vamos dispensar certos aspectos técnicos e de certas discussões filosóficas de psicologia. Não

iremos penetrar no tema da tensão psíquica, que em nós forma uma unidade de multiplicidade, e que é

mais ou menos coerente, segundo o nosso grau de integração.

Em palavras simples: há personalidades amorfas, frágeis, facilmente desviáveis, impressionáveis,

móveis, e outras que são o inverso. E entre os extremos, há uma gradatividade imensa. Não há dois tipos

humanos iguais, senão dentro das formalidades estatuídas pela tipologia. Se há em comum um número

imenso de notas, de aspectos, de qualidades, etc., há, ao mesmo tempo, outros que são diferentes,

totalmente diferentes. Portanto, o ser humano é formal e tipologicamente homogêneo, mas é

individualmente heterogêneo, diferente, diverso.

Podemos, no entanto, estabelecer algumas regras que todos os psicólogos aceitam. Por exemplo: o

grau de coerência da tensão psíquica (chamam-na alma, psiquismo, espírito, mental, o que quiserem, não

importa aqui) é uma garantia de firmeza do ser humano. Uma personalidade é mais forte quanto mais

coesa e mais coerente for a sua tensão psíquica. Em suma, a sua unidade psíquica quanto mais forte, mais

forte a sua personalidade. As agressões, que os estímulos exteriores possam realizar ou os pensamentos

negativos terão sua força na proporção da fraqueza da tensão psíquica. Se essa for forte, malograrão todas

as ideias errantes, negativas, como também as preocupações, as angústias; e os desajustamentos que daí

decorrem se tornarão consequentemente menos comuns e mais difíceis de ser adquiridos.

Todos nós conhecemos momentos de fluxo e de refluxo.

Os fluxos psíquicos caracterizam-se pelo entusiasmo, pelo “sentir-se bem” inteiramente, pela paz

conosco mesmo, pelo otimismo, pela vontade de atuar, de realizar, de empreender. Os refluxos levam-nos

ao pessimismo, à descrença em nós e nos outros, ao abatimento moral, e nos tornamos presas fáceis das

preocupações, das angústias, da tristeza, da inapetência, da falta de entusiasmo, da apatia, da desilusão, do

desespero até.

Consideremos de início, o que somos. Todos nós conhecemos momentos de fluxo e refluxo, que se

alternam constantemente, perdurando uns mais que outros.

Procedamos, no entanto, a algumas análises:

1) Quando sobrevêm os momentos de refluxo? Que nos parece tê-lo motivado? Foi uma palavra

que alguém pronunciou, um gesto, um fato, uma atitude? Foi porque pensamos nisto ou naquilo?

Anote-se aqui o fato que nos parece ser a chave que abriu a porta ao estado de refluxo.

2) Quando surgem os sintomas, analisemos as circunstâncias e anotemos os acontecimentos que os

cercaram, e os que os precederam. Vejamos se há repetições.

Por exemplo, quem sofreu, em sua família, um desastre de automóvel, no qual alguém que muito

estimava perdeu a vida, não tolera que lhe falem em desastres. Imediatamente se acabrunha, entristece-se,

entra em refluxo, mesmo que tome uma atitude irada, nervosa, agitada.

Examine-se, portanto, e verifique que fatos provocam os estados de refluxo.

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3) Às vezes, não somos capazes de examinar o que nos parece ter feito eclodir o estado de refluxo.

Ele surge como se nada o motivasse. Sobrevêm sem um porquê, e não nos aparece com

qualquer conteúdo. Estamos angustiados por nada. Não conhecemos nenhum conteúdo de nossa

preocupação ou de nossa angústia. Tudo nos corre bem e, no entanto, sentimo-nos inquietos,

como se algo nos ameaçasse. Por mais que procuremos saber de onde vem, ou a possível causa,

não a achamos. Desse estado decorrem inúmeras atitudes antissociais, irritações bruscas, e

fazemos o que normalmente (dizemos a nós mesmos) não seríamos capazes de fazer.

Nesses casos, a análise se torna mais difícil.

Mas meditemos sobre alguns exemplos que nos são bem úteis.

Dizemos: “gato escaldado até de água fria tem medo”. É que a água lhe associa a desagradabilidade

da queimadura. E basta vê-la para que o esquema água-desagradabilidade lhe surja, e consequentemente o

gato fuja. Um cão, que levou uma paulada de algum homem vestido de zuarte, foge, ou toma uma atitude

agressiva, ante qualquer outro homem vestido de zuarte, que dele se aproxime.

A tais atos reflexos chamam os psicólogos reflexos condicionados.

Tanto a criança como nós revelamos muitos desses reflexos, e outros. São verdadeiros esquemas que

construímos pela experiência. O ser humano é um grande estoque desses esquemas, e nossa vida está

marcada e orientada por eles. Repelimos tudo quanto nos é desagradável, aceitamos tudo quanto nos é

agradável.

Além desses esquemas fáticos, que são formados pela associação de imagens de fatos, já por nós

experimentados, o ser humano tem a capacidade de organizar esquemas eidéticos; isto é, esquemas

construídos apenas das ideias que captamos nesses fatos.

Vamos a exemplos esclarecedores. Quem sofreu injustiças em sua vida e revoltou-se muitas vezes

pelos castigos ou penas recebidas, sem uma justificação, forma um esquema eidético: injustiça-revolta.

E toda vez que vê alguém injustiçado, revolta-se. Aqueles que em suas vidas lutam contra a injustiça,

tomam atitudes enérgicas contra todos os atos que provoquem males aos outros que não os merecem, e

revoltam-se. Não basta que sejam contra si mesmos apenas. Em face de qualquer injustiça, o sangue sobe-

lhes à cabeça e irritam-se, rebelam-se, esbravejam, e tornam-se até campeões da justiça, lutando para que

ela se instaure soberana, na sociedade.

Analisemos alguns dos nossos esquemas. Porque nos irrita isto e nos alegra aquilo. Procuremos

descobrir os primeiros exemplos, os primeiros fatos, e verifiquemos, finalmente, o esquema eidético que

formamos.

Esses esquemas, depois que se coordenam com outros, estruturando-se dentro de nós, são

dificilmente desintegráveis. Tomam uma coerência tão grande que marcam o nosso caráter. (Caráter, em

grego significa marca). O nosso caráter é formado de inúmeros esquemas que se gravaram em nós. E

quanto mais fortemente gravados, mais nítido o nosso caráter.

Mas, assim como há esquemas benéficos, há esquemas maléficos.

Os hábitos, que são adquiridos, são verdadeiros esquemas. E do mesmo modo que obtemos bons

hábitos, também obtemos maus.

Que fazer para fortalecer os bons esquemas e desintegrar os maus, a fim de nos libertarmos da sua

tirania?

Os esquemas consistem em verdadeiras normas dentro de nossa alma. São o que os escolásticos

chamam de habitus. Esse termo vem do verbo habere, haver, ter. Habitus é tudo quanto não faz parte da

essência, mas que é adquirido.

E podemos, psicologicamente, adquirir bons hábitos ou maus, como também podemos libertar-nos

dos maus. Ora, se são eles aquisições, e não formam a nossa essência, poderemos dispensá-los, embora

isso nos custe, às vezes, muito trabalho e boa vontade.

Mas, quem vai dispensá-los? É a nossa alma, em sua pureza. É a nossa tensão psíquica forte, que é a

nossa arma de desintegração dos maus esquemas. Portanto, para que ela seja capaz de uma tarefa tão

importante, é preciso, em primeiro lugar, que ela seja muito forte, poderosa, coesa.

O caminho está em fortalecê-la. É o primeiro lanço da jornada. Podemos, depois, alcançar outros

estágios importantes.

Vamos, portanto, seguir os primeiros passos, que nos levam ao fortalecimento de nosso espírito.

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O POUCO QUE PEÇO DE TI

Vamos juntos percorrer esse lanço, e depois examinaremos outros.

Quem vai fazer uma viagem, toma diversas providências, e uma das mais importantes é preparar

tudo quanto precisa para ela. E, assim como arrumamos em nossas malas os apetrechos, objetos de que

iremos necessitar, precisamos, também, arrumar tudo quanto vamos precisar para essa viagem.

E como todo viajor deseja que a viagem seja a mais agradável possível, que menos dissabores

apresente, não julgues que eu vá exigir de ti, de início, muitas coisas. Vou pedir, ao contrário, bem pouco;

tão pouco que não me negará, pois só exigirei de ti à proporção que sejas capaz de me dar o que te peça.

Muitos se queixam de que não têm confiança em si mesmos. Seria tudo muito fácil se disséssemos

apenas: tem confiança em ti, e a confiança surgisse subitamente.

A confiança em si é a maior virtude que se pode desejar para um homem.

Quem tem confiança em si realiza o que pareceria impossível. Mas, muitos se queixam que não a

têm, e não sabem como adquiri-la.

A confiança em si não se adquire diretamente, mas direta e também indiretamente.

Não basta dizer que se tem confiança em si, pois ela não nasce apenas pela palavra. Nem adianta

desesperar-se.

Na verdade, tu tens confiança em ti. Não acreditas no que digo? Mas, pensa um pouco. Quando te

levantas pela manhã, duvidas acaso que sejas capas de vestir-te? Não és capaz de ir até à mesa e tomar a

tua primeira refeição? Não és capaz de fazer tantas pequeninas coisas?

Se és capaz de fazer tantas coisas, és capaz, pelo menos.

Rememora, por favor, tantas coisas que fazes, tens feito e que és capaz de fazer.

Mas, logo poderias me retrucar, que há muitas coisas que não podes fazer, pois não és capaz de fazê-

las.

Não há dúvida. Mas, pensa mais um pouco; quando criança, quantas coisas não podias fazer, e que

hoje fazes.

O atleta que vê um haltere tão pesado, julga que não poderá erguê-lo. E nas primeiras aulas de

halterofilismo, não pode fazer o que outros fazem. Não pode, porém, deixar de reconhecer que o que

outros fazem não o faziam antes.

Portanto, tu és capaz de muitas coisas. Assim como hoje és capaz de fazer o que anteriormente não o

podias, serás capaz de fazer amanhã o que hoje parece difícil.

Se és capaz até de viver, és sempre capaz. Portanto, reconhece uma verdade: és capaz.

Assim, já alcançamos alguma coisa ao chegarmos aqui. Tu me acompanhaste até aqui. Já temos um

importante ponto de partida, pois já temos alguma confiança em nós. Pois não fazemos já o que não

fazíamos? Não fomos capazes de um progresso? Se fomos, por que não o seríamos de mais?

Vamos fazer uma experiência. Deixa teus braços pousados sobre esta mesa, junto a este livro. Não o

movas. Conta até vinte, sem os moveres.

Conta: um, dois, três, quatro. . . . . . . . . . . . vinte.

Não conseguiste? Vamos, outra vez, contemos até cinquenta. Não te movas totalmente:

Um, dois, três, quatro, cinco . . . . . . . . . . . . cinquenta!

Viste como podes ficar quieto?

Experimentemos um pouco mais: olha aquele objeto ali. Fixa o olhar sobre ele. Não te movas, não

olhas para outra coisa, só para ele. E conta até vinte.

Um, dois, três, quatro . . . . . . . . . . . . vinte.

E que tal? Vamos contar até cinquenta.

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Um, dois, três, quatro, cinco . . . . . . . . . . . . cinquenta.

Magnífico!

Coloca-te agora na cadeira em que estás. Afasta tuas costas do encosto. Vira para cima a palma da

mão direita. Coloca sobre ela a mão esquerda. Deixa-as pousadas agora sobre as pernas. Toma uma

posição firme. Não te movas. Olha para um objeto à tua frente. E conta até vinte. Repete até cinquenta.

Toma a mesma posição. Fecha os olhos. Respira lentamente, ritmadamente pelo tempo que puderes.

Não te preocupas com os pensamentos que surjam. O que nos interessa agora é que realizes esse exercício

de respiração.

Respira profundamente. Enche mais que puderes os pulmões. Olhos fechados, mas procura “olhar”

bem no centro da raiz do nariz.

Inspira profundamente. Guarda bem o ar nos pulmões até contares dez. Deixa-o sair lentamente,

enquanto contas até cinco.

Suspende um pouco a respiração. Os pulmões esvaziados. Enche-os de novo, lentamente; guarda o

ar, esvazia, descansa, prossegue.

Esplêndido! Tudo já está correndo muito bem.

Vamos repetir.

Agora procura respirar deste modo: enche os pulmões bem de vagar. Guarda o ar. Expira

vagarosamente. Tão vagarosamente que nem sequer ouças o ruído da respiração. Torna-a bem fluídica.

Pouco a pouco, continuando nesse exercício, conseguirás alcançar um ritmo bem teu, natural.

E faze esse exercício diariamente, tantas vezes quantas puderes. Podes abusar dele, pois quanto mais

fizeres, melhor para ti. Pelo menos, deves fazê-lo uma vez pela manhã e outra à noite.

E vais fazê-lo sempre, daqui por diante, durante toda a vida.

Seria muito complexo tentar explicar quanto vale este exercício. Mas basta dizer algumas palavras:

ele vai regularizar, aos poucos, a tua respiração, a alimentação do oxigênio de que precisa o teu sangue;

vai regularizar todo o teu corpo e também ajudar a fortalecer o teu espírito. Pois a atenção que puseres,

olhando para a raiz do teu nariz, vai ajudar a concentrar a tua tensão psíquica.

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EXERCÍCIOS RESPIRATÓRIOS

O mesmo exercício que se realiza sentado, também se pode realizar quando deitado. Deita-se de

costas, estiram-se as pernas. Colocam-se duas mãos bem juntas ao corpo, de cada lado. E respira-se da

mesma forma, olhos fechados, o olhar convergente.

Se acaso surgir algum mal-estar, por estar o olhar convergido para a raiz do nariz, deve-se convergi-

lo, como se se dirigisse para um objeto distante.

E respira-se da maneira indicada.

Esse exercício acalma. Se se adormecer ao fazê-lo melhor ainda.

Mas se acaso houver estremecimento e câimbras não há motivo para preocupações. Nosso corpo não

é muito acessível à disciplina, e se rebela um pouco. São pequenas reações que não fazem mal.

Continuem-se os exercícios que afinal esses estremecimentos desaparecerão, e sentir-se-á o praticante

cada vez mais calmo.

Daremos agora uma série de regras para exercícios respiratórios.

Respiração rítmica – o ritmo é individual. No entanto, antes de alcançá-lo, o praticante pode seguir

esta norma:

3 segundos para a inspiração;

2 de retenção de ar nos pulmões;

5 para a expiração;

2 de descanso, em, seguida retorno à inspiração.

Observações:

No início, é quase impossível conseguir a regularidade.

Contudo, não há motivo para preocupação. Prossegue-se no exercício pelo prazo de uns 5 minutos.

Obtida certa regularidade, nos dias sucessivos, aumenta-se para 10, até 15 minutos.

A pouco e pouco alcança o praticante o seu ritmo individual, mas sempre conservando as quatro

fases inspiração-retenção-expiração-descanso, até alcançar a fluidez da respiração, que se fará quase em

silêncio.

Modalidades:

Este exercício pode e deve ser realizado:

A) estaticamente; B) dinamicamente;

No caso A, deve o praticante permanecer sentado na postura já indicada.

No caso B, deve colocar-se em pé, pernas abertas. Cruzar as mãos na nuca. Inspirar profundamente,

conservar o ar nos pulmões, expirá-lo com a flexão do busto sobre os joelhos até esvaziar totalmente os

pulmões. Permanecer os 2 segundos neste estado e inspirar levantando o busto até a posição normal.

Tempo:

Adquirido o ritmo individual, na postura estática, esse exercício deve ser seguido cotidianamente.

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O exercício dinâmico pode variar, e deve ser feito da seguinte maneira:

Inspiração – 3 segundos;

Retenção – 10 segundos;

Expiração – 5 a 6 segundos;

Descanso – 2 segundos no mínimo.

Alcançar esse tempo já é extraordinário, e abre campo para profundas modificações interiores.

Duração dos exercícios:

Um dos nossos graves defeitos consiste na pressa. Não gostamos de empregar dias, meses e até anos

na realização de uma tarefa que não nos ofereça imediatos resultados.

Por isso, tais exercícios, como outros, sempre úteis e benéficos para o bom funcionamento, não só

físico como químico, são abandonados em meio do caminho, por aqueles que não percebem, desde logo,

imediatos benefícios.

Mas, num setor como esse, o do nosso pleno domínio, todo esforço, toda confiança, toda decisão,

toda calma, toda a perfeição que se alcancem, embora que parcialmente, servem para nosso bem.

Podemos não perceber os benefícios maiores, porém eles se processam lenta e silenciosamente, e terão,

afinal, que dar os seus frutos, que bem valem o esforço despendido.

EXERCÍCIOS MENTAIS

Pode-se ficar na mesma posição do exercício respiratório, ou em outra que for mais cômoda.

Escolhe-se um assunto qualquer; por exemplo, esta frase de Virgílio: “Podemos, porque pensamos

poder”.

Pensar que podemos é ter confiança em nosso próprio poder, e ter confiança nele, é fortalecer o

poder que há em nós... e assim sucessivamente.

Medita-se sobre tudo isso, sem se mover. Apenas o pensamento atua e o corpo deve permanecer

imóvel. É possível que sejamos interrompidos por pensamentos diferentes, e também levados para muito

longe do que estávamos meditando. É natural que pensamentos errantes invadam o nosso cérebro e nos

desviem do ponto onde estávamos.

O que se deve fazer é voltar novamente ao assunto e meditar sobre ele, sempre com alegria, sem se

preocupar com o que aconteceu. E tantas vezes, quantas puder. Esse exercício pode durar uns 5 minutos,

o que já é um progresso extraordinário.

Não se deve forçar o pensamento, a fixar-se só sobre o tema. Não se deve lutar nunca contra as

ideias intrusas. Quanto mais se lutar contra elas, mais fortes elas serão. Deve-se deixá-las de lado, e

prosseguir no exercício, que deve ser realizado diariamente. À proporção que as ideias intrusas ameaçam

perturbar a meditação, recomeça-se outra vez, sem se preocupar com a interrupção.

Regra importante: escolher sempre, como tema de meditação, assuntos positivos. Não pensar em

coisas ruins, males, infâmias, doenças, fraquezas. Os pensamentos devem exercitar-se sobre aspectos

positivos e benéficos.

Aproveitar como tema grandes pensamentos positivos de grandes autores.

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REGRAS IMPORTANTES SOBRE A MEDITAÇÃO

Depois dos conselhos que demos sobre a meditação, desejamos, agora, chamar a atenção do leitor

para os pontos seguintes, de grande importância para o bom êxito das mesmas:

a) Na meditação, nenhuma tensão é necessária. Ao contrário, é até prejudicial.

Iniciada com tranquilidade, não exige nenhum excesso de esforço.

A meditação deve orientar-se com a maior naturalidade.

b) A duração deve ser aumentada à proporção que o bom êxito for sendo conquistado.

Para iniciar, basta meio caminho até à base ótima de meia-hora.

c) A direção do olhar deve ser para frente.

d) Se, no início, houver estremecimentos, lembrar-se que eles são naturais. Podem dar-se em todo

o corpo, ou apenas nas pernas, braços, etc.

Tais procedimentos, comuns a princípio, terminarão por desaparecer totalmente.

e) Ao iniciar a meditação, que deve ser feita em lugar reservado e ausente de estranhos, pensar

primeiramente que se está só, entregue ao seu próprio bem, que, por sua vez, está imerso no

Bem Supremo. Esse o cerca, esse o sustenta, e esse o amparará.

f) Se a meditação for sobre uma única ideia, por sobre ela a máxima tensão psíquica. Se for através

de idealizações (por encadeamento de ideias), não se preocupar se pensamentos errantes e

estranhos a perturbarem.

Quando sentimos que nos perdemos em pensamentos estranhos, não nos perturbemos por isso,

pois é natural. Voltemos ao pensamento fundamental da meditação, prosseguindo com

confiança.

g) Se se manifestarem dificuldades muito grandes para nos fixarmos sobre vários pensamentos, a

solução é pensar em poucos, e sobre esses fazer a meditação.

h) Procurar estar sempre alegre; um leve sorriso deve pairar no rosto. Não abrigar qualquer

sentimento de hostilidade. Viver um momento de pleno amor.

i) Permanecer em silêncio, e se discorremos, os pensamentos devem ser pronunciados apenas

intimamente.

j) Os pensamentos errantes ou perturbadores devem ser recebidos com tranquilidade e calma, e

sobretudo com paciência. Eles acabarão por não mais surgir, e obter-se-ão a paz interior e a

força mental desejada.

Os pensamentos estranhos, se merecerem a nossa atenção, criarão raízes e força. Deve-se

recebê-los com indiferença, e prosseguir na meditação. Eles acabarão por não mais nos procurar.

k) Esse exercícios devem ser prosseguidos de 3 a 6 meses e só devem ser substituídos por outros

mais complexos, sobre temas mais amplos, depois de obtida a sua plena realização.

l) Não se deve lutar contra o mental. Conservar-se sempre calmo.

m) Se a concentração dos olhos causar qualquer mal-estar, pode-se abandoná-la e dirigi-la para o

exterior ou olhar normalmente com os olhos fechados.

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n) Nunca abandonar a prática da meditação, embora pareça difícil a princípio. Deve-se sempre

fazê-la, porque só ela nos dará a solidez da tensão psíquica e sua força interior e mental. Ela

contribui para a formação, não só de um espírito forte, mas também de um corpo são.

A alegria, que se obterá, depois de uma longa prática, e a satisfação que se conhecerá, serão tão

grandes, que compensarão todos os esforços despendidos.

o) Lembremo-nos que a dor aumenta segundo a atenção que a ela lhe dermos. Também os

pensamentos errantes ou contrários aumentarão de força, quanto mais atenção lhes dermos.

p) Lembremo-nos que o subconsciente trabalha enquanto dormimos, e também quando estamos

despertos, em vigília, e entregues ao consciente. Para problemas, cuja solução não

encontrávamos, vemo-la surgir quando menos esperávamos. É que o subconsciente trabalhou

para solucioná-los. Lembremo-nos que o subconsciente pode atuar quase sempre a nosso favor.

Muitos sábios, filósofos, cientistas, estudiosos de toda a espécie, confiam ao seu subconsciente a

solução de grandes problemas. E conseguem obtê-la, graças à confiança que nele depositam.

q) Lembremo-nos que o mental é a maior força que existe. Confiemos no seu poder, e trabalhemos

para desenvolvê-lo, sempre com confiança nas meditações que fizermos.

r) Lembremo-nos que um mental é tanto mais forte quanto maiores forem a alegria e a serenidade.

Cultivemos a alegria com pensamentos alegres, e a serenidade pelo amor ao bem.

A SERENIDADE

Para que a mente conheça a serenidade, é preciso que o corpo a pratique constantemente.

Um bom exercício é a respiração rítmica. Mas, para conseguir melhor efeito, convém praticar

pequenos exercícios de serenidade durante o dia.

Vamos a exemplos:

Deve-se permanecer em silêncio, pelo menos um certo tempo.

Os exercícios de análise de um grande pensamento, feitos com calma, sem precipitações, separando

as ideias que estão entrosadas, para examiná-las, cada uma de per si, para depois concrecioná-las num

conjunto de pensamentos, são de grande utilidade.

Se alguém, ao ter que resolver um assunto, examiná-lo ponto por ponto, com calma e ponderação,

sem deixar arrastar-se por impulsos afetivos, fará outro exercício fácil, que ajuda a dar ao mental a

serenidade de que necessita.

Um mental agitado não permite progressos, e é presa fácil de preocupações fantasistas.

Quem domina o mental é um verdadeiro homem. Há um grande fundamento no famoso ditado:

“Aquele que é senhor do seu mental é senhor do universo.”

A vitória sobre o mental é a realização plena da liberdade.

Que cuidados devemos tomar?

Um sintoma do mental agitado está na busca desenfreada da novidade, da diversidade. Tudo

desagrada. Daí o temor à monotonia, que leva tantos ao exagero de considerar monótono tudo quanto se

repete.

Para evitar esse defeito, temos o exercício da meditação, que levando o mental a fixar-se sobre

ideias, fá-lo ir e vir de uma ideia para outra, repetindo pensamentos, permitindo vitórias, e facilitando um

prazer na repetição.

Não devemos desanimar, se há certa monotonia na vida.

Somos hoje tão solicitados para a diversidade, que toda repetição nos parece roubar uma

possibilidade de novidade. No entanto, a própria novidade acaba por nos cansar, porque temos uma

capacidade limitada para o sempre-novo.

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Precisamos, por isso, saber alternar a diversidade com a repetição, e saber ver, naquela, a primeira, o

que se repete, e na segunda, o que oferece de novo.

Por acaso podemos ver uma coisa sob todos os aspectos? Pode alguém dizer que conhece tudo de

qualquer coisa?

Todas as coisas oferecem novidades, embora sejam repetidas.

Saber perdurar entre ambas é a melhor lição que nos oferece a vida, pois os excessos, neste como em

muitos casos, só nos podem levar a aborrecimentos.

Quem teima em ver (atualizar) apenas os aspectos repetíveis, acaba por aborrecer-se. Mas, é preciso

ver que a vida é sempre nova, e nós, de certo modo, outros, cada dia que passa. Não prestemos tanta

atenção ao que se repete. Procuremos o novo no que se repete, e o encontraremos. Mas só seremos

capazes de conquistar este estado ideal se soubermos dominar o nosso mental, depois de havermos

conquistado a serenidade.

Que precisamos, então, fazer?

Ser sempre pontuais em nossos exercícios e, se possível, fazê-los sempre às mesmas horas.

Nunca esquecer a ordem do exercício de meditação:

1) Um sorriso nos lábios, erguendo os músculos zigomáticos;

2) Exercício de respiração rítmica;

3) Exercício de meditação sobre temas positivos.

E, sobretudo: alimentar os sentimentos positivos!

Quando sentirmos simpatia por alguém, um sentimento de bondade, procuremos alimentá-lo. Não

busquemos razões para justificar o nosso abandono, tais como: “ninguém merece nossa estima”, “os seres

humanos são todos maus”, ou afirmações semelhantes. Todas essas expressões só servem para

enfraquecer nossa potência positiva. Nesses instantes, deixemos que nossa ternura se desborde.

Como querem sentir-se bem aqueles que tudo fazem para aumentar a sua tristeza e, o pior, a sua

miséria?

Para se ser feliz, é preciso exercitar-se na felicidade. A felicidade exige um treino, um longo treino.

Todos os que falam contra a felicidade, já mediram bem, já procuraram em si mesmos delinear o que

fizeram para exercitar-se na felicidade?

O mundo tem muita luz. Por que, então, pensar só nas sombras?

É uma sabedoria, e a mais feliz das sabedorias, aquela que nos ensina a pôr óculos de otimismo.

Quem procura o mal, e só vê o mal, como pode alcançar o bem?

Embora pensamentos bons estejam em nossa mente, muitas vezes, ao termos que resolver alguma

coisa, fazemos tudo ao contrário do que seria razoável fazer. E por quê? Porque, dizemos, nossos

sentimentos nos levaram ao erro.

Por isso se vê que não basta apenas o pensamento para nos levar à ação. O sentimento atua com tal

força que somos desviados sem considerar o que é melhor.

Não basta a educação do mental, quando não há educação dos sentimentos. Se deixamos que os

sentimentos negativos nos dominem, seremos sempre fracos. Alimentar sentimentos positivos, eis,

portanto, a grande regra que se impõe para o nosso bem.

“Mas, é difícil, às vezes alimentá-los”! Há quem faça essa afirmativa.

Certa vez, um famoso sábio, teve estas palavras para um discípulo:

“Se colocas uma tábua estreita no chão e caminhas ao longo da mesma, se imaginas que vais cair

nela, dela cairás. Se, ao contrário, tens fé em ti mesmo, atravessá-la-ás com perfeito equilíbrio. E por que,

se ela estivesse no alto, cairias, quando, com ela no chão, não caíste? Porque tua imaginação te leva a

pensar que cais, e cairás.”

Cuida, pois, da imaginação. A imaginação é nossa amiga ou nossa inimiga. Se ela trabalha com

imagens negativas, eis que trabalha contra nós. Se trabalha com imagens positivas, ei-la a nosso favor.

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A imaginação depende muito de nós. Quando imaginamos positividades, no sentido puro do termo,

alimentamo-las. Quando imaginamos negatividades, procuremos desviar-nos delas.

FORTALECE-TE

O fortalecimento do nosso espírito exige, portanto, uma tríplice atividade, pois deve dar-se

combinada e contemporaneamente com o fortalecimento das nossas três funções psíquicas.

Para o fortalecimento do sensório-motriz (sensibilidade), temos os exercícios respiratórios, a

ginástica, etc.

Para o fortalecimento da intelectualidade, temos a prática da meditação e as práticas afins.

Para o fortalecimento da afetividade, temos os sentimentos positivos.

Caracteriza-se o nosso método pela prática da positividade, em qualquer setor.

Já que abordamos, em suas linhas gerais, os diversos aspectos e as práticas correspondentes, cabe-

nos agora acrescentar, para cada setor, novas observações e práticas que nos oferecerão meios mais

seguros e mais eficazes de alcançar o que desejamos.

A PRÁTICA DO JÚBILO

Chamavam os antigos de jubileu a indulgência plenária, solene e geral, concedida pelos papas aos

católicos, para remissão de todas as dívidas e pecados. Havia, assim, júbilo geral, alegria geral, porque os

homens tiravam de suas costas o peso do temor do pecado, que acarretava, consequentemente, os castigos

prometidos. É verdade que o termo tomou depois outros sentidos; mas mantém e conserva o conteúdo

conceitual de satisfação plena, o que nos indica uma grande e profunda alegria.

Praticar o júbilo é praticar a alegria. Em todo momento de alegria, sentimo-nos mais fortes. A alegria

é sempre excitante e criadora de forças. Com alegria, sentimo-nos mais capazes de fazer qualquer coisa,

enquanto todos sabem que, sob o peso de uma tristeza, as nossas forças se amesquinham, e a capacidade

de ação se torna menor ou desordenada e frágil.

Não há, portanto, quem não reconheça o poder da alegria. Mas, se todos a desejam, nem todos a

vivem em sua alma, e muitas fisionomias são de uma triste eloquência, pois nos revelam evidente

abatimento moral.

Sabem muitos que é difícil a alegria quando o espetáculo do mundo nos oferece tanta mágoa.

Não basta dizer-se que à parte de tanta tristeza, há muita luz e muita alegria no mundo, pois que está

imerso nas trevas não pode contemplar a beleza das coisas, que só a luz da alegria pode iluminar.

No entanto, a prática da alegria não é fácil.

Pode ter alegria quem alimenta sentimentos negativos?

Pode ter alegria quem não domina seu mental?

Pode ter alegria quem não alimenta a sensibilidade com bons exercícios?

Não se trata de uma alegria qualquer, como certas alegrias passageiras, que deixam atrás de si uma

marca sombria e, às vezes, até um rasto de tristeza. Trata-se agora do júbilo.

E o júbilo é predominantemente da intelectualidade e da afetividade.

O júbilo, em sua maior profundidade, implica um gozo mais profundo de todas as coisas.

Cada instante da vida nos oferece muitos motivos para cultivar o nosso júbilo. Cada uma das nossas

pequenas vitórias, e somos vitoriosos quando superamos qualquer dificuldade, nos oferece um motivo de

júbilo, se soubermos captá-lo.

Vejamos: cada vez que fazemos um exercício, porque não procuramos o júbilo que ele nos oferece?

Não é mais um degrau para a nossa libertação? Não basta, portanto, convencermo-nos apenas de que

cumprimos uma obrigação, é preciso gozar o júbilo que ele oferece. Pois, não vencemos? Não marchamos

no caminho das nossas vitórias? Não nos aproximamos cada vez mais do fim desejado? Rejubilemo-nos.

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Ergamos nossos olhos, inflemos nosso peito, um sorriso nos lábios, deixemos que nossos olhos brilhem

mais, e gozaremos o instante de júbilo.

Se dissermos: felizmente já fiz o meu exercício hoje. Não há nessa frase a expressão de quem se

libertou de uma obrigação penosa? Não estamos tomando uma atitude negativa?

E, no entanto, se dissermos: “muito bem, fiz o meu exercício. Mas, felizmente, em outras ocasiões,

farei outros, e assim sem fim, até o fim da minha vida.” Não estamos, então criando um júbilo?

E olhemos agora para os fatos cotidianos.

Procuremos, em cada uma das nossas atividades, o júbilo que elas nos oferecem. Ele é a luz que

ilumina cada um dos nossos instantes. Ele dissipa as trevas que obscurecem a beleza do mundo. Só com o

júbilo daremos maior positividade a cada um dos nossos instantes. E a nossa vida não é feita de muitos

instantes? Pois lutemos para dar-lhes luz, dissipando as trevas que os obscurecem, e a nossa vida será

luminosa, pela clareza da grande e potente alegria, que é o júbilo.

E quando compreendermos bem isso, rejubilemo-nos. Conheçamos o júbilo do nosso júbilo, e assim

marcharemos para a posse da alegria, que é sempre positiva.

Pois não é verdade que sempre desejamos que a tristeza passe, que ela se desvaneça?

Pois, então, guardemos esta verdade: a positividade de nossa alma está na proporção das nossas

alegrias. O júbilo é alimento da alma.

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NOVOS EXERCÍCIOS MENTAIS

É imprescindível, para nosso bem, este ponto de partida: o homem é um composto de corpo e alma.

E essa alma é o que liga mais profundamente ao que se escapa ao conhecimento dos nossos sentidos, que

é apenas do corpóreo. Não vemos e não sentimos o que não tem corporeidade para nós, mas sabemos

hoje, graças aos conhecimentos científicos, que existem poderes para os quais os nossos sentidos são

surdos e cegos.

Vemos nossos pensamentos sem os vermos. Podem nossos olhos estar pousados sobre os fatos do

mundo exterior, e, no entanto, por nossa mente estão passando pensamentos, que vemos sem vê-los,

intenções que surgem sem que as representemos, ideias que não têm dimensões nem formas espaciais,

mas que compreendemos, aceitamos ou repelimos. E, no entanto, vemo-las sem as ver. Portanto, somos

capazes de ver muito mais do que vemos, porque, com os olhos do espírito podemos ver o que os olhos

do corpo não veem.

Essas visões não são corpo, pois não se dão no espaço, porque não estão localizadas, nem têm

tamanho, formas quantitativas do espaço, e, como ideias, não têm idade, nem, portanto, tempo, embora as

captemos dentro do nosso tempo. Essas visões não são as mesmas que temos deste livro, desta mesa,

daquele quadro. Pois estes seres, nós os vemos ali, aqui, acolá, num lugar, com um tamanho. Mas essas

visões, de que falamos, não as vemos materialmente!

Quando meditamos sobre nós mesmos, quando nos examinamos, ou interrogamos conscientemente a

nossa consciência, contemplamos nossas ideias, ou oramos a uma divindade, quer com palavras

pronunciadas ou não, nós realizamos exercícios que tomam o nome genérico de exercícios espirituais.

Passear, caminhar, correr são exercícios corporais.

E assim como podemos realizar uma ginástica para o corpo, a fim de corrigir certas deficiências

nossas, podemos realizar uma ginástica para o espírito, que nos auxilie a resolver nossos problemas e nos

permita alcançar a pontos mais elevados, que nos darão uma fruição maior dos bens que a vida oferece.

Quem deseja realizar tais exercícios espirituais, deve dispor-se para eles de um modo todo especial,

e realizar, previamente, as seguintes providencias, sem as quais é preferível nada fazer:

1.ª providência:

Afirmar para si mesmo a maior verdade cósmica: o ser é o Bem, e eu, enquanto ser, sou o Bem, e

estou no Bem.

E com convicção, com fé, com dignidade e respeito, dizer para si mesmo:

“O bem me cerca, estou imerso no Bem e confio-me a ele.”

2.ª providência:

Com a maior reverência ao Bem Supremo, fonte, origem e fim de todas as coisas, realizar o

exercício respiratório, rítmico, por alguns minutos, procurando pensar apenas no Bem, no próprio bem e

no Bem Universal.

3.ª providência:

Após o exercício respiratório, realizar o exercício espiritual, segundo as normas que indicaremos.

CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

Nunca esqueçamos que todos os nossos esforços em nosso bem encontram uma resistência, oposta

pelo nosso “adversário”, o nosso obstáculo, o “demônio”, de que falam as religiões.

Não faltam vozes que tentam desmoralizar-nos. Não faltam sugestões de pessoas conhecidas, e até

dentro de nós mesmos, que constantemente afirmem a inutilidade de nossos esforços.

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Toda voz de desânimo, todo impulso de fraqueza, de covardia ante os exercícios, são de origem do

que é contrário a nós em nós. E devemos, desde logo, denunciar aos nossos próprios olhos tais fraquezas.

E desprezando-as, cumprir o nosso dever com júbilo.

Repelir a desmoralização do maligno. Opor-lhe a nossa resolução, e com dignidade e confiança em

nós mesmos, prosseguirmos.

OS EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS

Sem necessidade de examinar aqui um tema de Noologia (ciência que estuda o funcionamento do

nosso espírito), o que nos levaria a longínquas análises, desejamos apenas lembrar uma velha experiência,

que, através de milênios, sempre trouxe grandes benefícios para o homem, e é o fundamento de muitas

das orações que aconselham as religiões.

À noite, antes de dormir, naquele instante de modorra, que precede ao sono, o nosso subconsciente

está em pleno contanto com o consciente e de tal modo que tudo que, com confiança, a ele solicitarmos,

será obtido.

Nesse instante, dirigindo-nos como amigos ao subconsciente, como já vimos, devemos pedir tudo

quanto é possível obter de nós mesmos, e certamente o conseguiremos. Se pedirmos para sermos calmos,

confiantes, tranquilos, ter bastante capacidade de ação, boa lógica, raciocínio rápido e bem concatenado,

coragem, força interior, etc., muito conseguiremos. Podemos pedir tudo quanto dependa de nós, tudo

quanto desejávamos constituísse patrimônio do nosso ser.

Esse exercício deve ser repetido diariamente ao deitar e ao acordar.

Acompanhando os outros exercícios, que indicaremos a seguir, este deve processar-se da forma que

exporemos.

Ao acordar, nosso primeiro empenho deve ser o de afirmar para nós mesmos a posse do que

desejamos ter. Assim, pode afirmar-se:

“sou forte, domino minhas fraquezas” (precisar quais fraquezas);

“sou senhor dos meus desejos e venço-os (precisar quais);

“cada dia (e precisar o setor), sou mais senhor, ou cada dia sou mais senhor disto ou daquilo.”

Esse instante, importantíssimo, deve ser aproveitado para afirmarmos a nós mesmos, o que mais

desejamos de imediato de nós. Obtido o valor desejado, prossegue-se, pedindo o seu progresso e

conservação, ou para afirmar outros, e assim sucessivamente.

Este exercício corresponde ao que se faz ao dormir, ao subconsciente, que já estudamos.

QUE FAZER QUANDO ERRAMOS?

Quando fizermos alguma coisa errada, quando um mau pensamento nos assaltar, quando um desejo

indevido nos impulsionar, quando praticarmos um ato que foi injusto ou mal feito, não nos enchamos de

aborrecimento.

Levemos a mão ao peito, sintamos sinceramente o erro, e digamos a nós mesmo:

“Evitarei que se repita. Não faz mal. Evitarei que se repita.”

EXERCÍCIO ELEMENTAR COTIDIANO

Agradecer ao Bem todo benefício alcançado. E nunca esquecer que são muitos.

Quanto aos males sucedidos, nunca os atribuir ao Bem, mas apenas às relações do que acontece.

Quanto às nossas faltas, realizadas durante o dia, firmarmo-nos no propósito de não repeti-las.

Confiar que o Bem nos há de ajudar para o nosso bem.

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Esta rápida meditação deve ser feita diariamente, antes de deitar.

Segue-se, depois o pedido ao subconsciente. Esse pedido deve ser sempre positivo.

COLÓQUIOS INTERIORES

Precisamos desdobrar-nos como um amigo com quem conversamos. E no mesmo tom amigo,

confidencial e bondoso, devemos examinar nossos erros, nossos desejos, nossos sonhos, esperanças, etc.

E quando tomamos um tema para meditação, podemos interrogar-nos, para saber que pensamos sobre isto

ou aquilo. Discordar, desafiar para análises, fazer perguntas, se não esquecemos alguma coisa, se não

estamos examinando o assunto superficialmente, etc. Todas essas providências, num amplo diálogo

interior, têm um efeito extraordinário.

CONTEMPLAÇÃO ESPIRITUAL

Tomando um tema espiritual, a visão do Bem, podemos fazer um grande exercício, de efeitos

incalculáveis.

O bem desta coisa pode ser este ou aquele. Tal ser deseja alcançar tal fim, que será o seu bem. Desta

forma, o bem de cada coisa está aqui e ali, mas o Bem, o sentido do Bem, está em todas e em todas é

igual. Pensemos no Bem enquanto tal, não no disto ou daquilo, nem nisto ou naquilo, mas no Bem em si

mesmo.

Contemplemo-lo. Sentir-nos-emos logo avassalados pelo bem que nos cerca, à medida que nele

penetrarmos. Nossos sentidos devem perespiritualizar-se no exercício, à proporção que o formos fazendo

diariamente:

1) Tentemos ver o Bem com os olhos do espírito, espiritualmente, em si, em toda a sua beleza;

2) Tentemos ouvir a melodia harmoniosa que ele é;

3) O perfume que dele se evola, o sabor que sentimos do Bem, e, finalmente,

4) Tacteemo-lo com os nossos sentidos.

Devemos colocar-nos nesta disposição.

“O Bem é a minha felicidade.” Rejubilemo-nos; sintamos a alegria, um sorriso nos lábios, um sorriso

suave e meigo, uma respiração fluídica, e entreguemo-nos, depois, a essa contemplação espiritual do

Bem, que terminaremos por alcançar, sem o menor vestígio material, sem qualquer representação

material, até conquistar um estado de beatitude interior de grande satisfação interna.

Não se atinge logo nos primeiros dias a esse estado superior, mas esse exercício dispõe nossas forças

de modo a se tornarem cada vez mais poderosas.

Esse exercício implica, antes de tudo, a máxima confiança em si mesmo, através da qual se há de

alcançar o estado de plenitude do bem.

POSITIVIDADE SEMPRE!

Todos os temas de meditação, que variarão segundo as posições dos praticantes, conforme suas

crenças e ideias, devem ser positivos e nunca negativos. Desejar, tratar. Meditar sobre o que se pode dizer

sim e nunca sobre o que se quer dizer não. Meditar sempre sobre o que nos é benéfico e bom, e nunca

sobre o que nos é maléfico e prejudicial.

As ideias devem ser claras e nunca confusas. Para evitar a confusão, faça-se a análise lógica,

dialética das ideias. Examine-se e medite-se sobre a própria meditação, na análise das ideias que se

associam, verificando se o são por contiguidade, semelhança ou contradição. Ver se as ideias em

contradição não têm uma origem no “obstaculizador”.

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SILÊNCIO!

Busca-o sempre que o possas. E ante ele, pensa em teu bem. Crê firmemente em teu progresso e

afirma sempre para ti mesmo que, cada instante que passa, conheces um estado melhor.

DISCUSSÕES

Evita as longas discussões, sobretudo com pessoas dispersas, que juntam argumentos sobre

argumentos, sem ordem e sem disciplina, misturando juízos apenas de gosto com algumas pseudo-ideias

malformadas e mal assimiladas.

Evita essas discussões, que não são em nada benéficas. Se não for possível conduzir o colóquio com

alguém em boa ordem, segundo boa lógica, cuidadosa e bem organizada, é preferível que te cales. Sempre

sê disciplinado no trabalho mental. Essa é a regra importante, e nunca ceder às fogosidades do

pensamento em conversas diluídas, dispersas, em que se fala de tudo e não se fala de nada.

Para ajudar a disciplina mental, faze a disciplina física em tudo quanto empregares a tua atividade.

Lembra-te de que não serás capaz de segurar uma bola se tua atenção não estiver voltada para ela. Se

teus olhos estiverem dispersos, perdidos, não segurarás a bola que te atirarem.

Igualmente com a meditação. O bem que desejas deve sempre ser o principal tema de tua atenção, e

os teus olhos espirituais devem estar voltados para ele.

Lembra-te que confiar em ti mesmo é confiar em teu bem. E confiar em teu bem é confiar no Bem.

Ter confiança nele é adquirir sempre e sempre maior força. Nenhum mal pode ser absoluto. Se o mal

fosse absoluto, o universo já teria desaparecido, porque ele é destrutivo, e se tivesse um poder absoluto

tudo já teria sido destruído.

O Bem, portanto, é absoluto, porque não pode ser destruído. Confia nele, e a ele entrega-te com

confiança e serás invencível. Quem poderia amanhã te derrotar, quando tens em ti, certamente, o Supremo

Poder do Universo?

Medita sobre a relatividade do mal e a realidade concreta do Bem. Pensa sempre no poder absoluto

do Bem.

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OBSERVAÇÕES SOBRE REGRAS DA MEDITAÇÃO

Os exercícios respiratórios e a meditação são as práticas mais importantes que se podem oferecer.

Não são novidades, sem dúvida, são velhos e esquecidos caminhos que levaram muitos a alcançar os

pontos mais elevados que o homem jamais atingiu.

De todos os exercícios e métodos conhecidos até hoje, são aqueles dois os que maiores e mais

seguros benefícios ofereceram, pois nunca falharam em suas finalidades. Podem os psicólogos inventar

muitos métodos, mas nenhum terá o poder daquele que alimenta o corpo, fonte de nossa vida, que é uma

respiração regular e bem ordenada, e aquele que fortalece o nosso espírito, que é a meditação, e que nos

dá a maior inteireza ao espírito, a maior força para resistir à dispersão e nos afastar de tudo quanto pode

atuar para nosso mal.

Por isso, a recomendação desses velhos caminhos deve sempre ser lembrada, e muitos aspectos

importantes nunca devem ser esquecidos.

Um homem sem vida interior não é capaz de conhecer-se. A meditação facilita a interiorização, a

concentração das forças psíquicas, e por seu aspecto dinâmico, racional e dialético, evita a fixação em

ideias contempladas, que são um campo aberto às manias, tão perigosas.

Para conhecermos os nossos erros, defeitos, e as nossas possibilidades, nada melhor que a

meditação. Todo homem, capaz de manter uma vida interiorizada muito forte, é muito mais poderoso e

enfrenta melhor as situações difíceis do que qualquer outro.

Quando maus pensamentos penetrarem em tuas meditações, não te preocupes. Deixa que

sobrevenham, realizem a sua atividade, não lhes resistas, nem faças nenhum esforço de vontade para

afastá-los; pois, do contrário, além de te fatigares, dar-lhes-ás mais forças por oposição. Coloca-te apenas

como espectador um tanto indiferente, e toma uma atitude de desprezo. Se tomares outra atividade,

deverá consistir em pensar positivamente em temas opostos aos dos maus pensamentos, sem te

preocupares se aqueles retornaram. À proporção que fixares o pensamento nos bons, e desprezares os

maus, sem a eles resistir, tirar-lhes-ás toda a força, e eles acabarão por não mais surgir. Permanece sempre

calmo, e compreende que é natural que tais pensamentos sobrevenham.

Não deixes passar um dia sem fazer exercícios de meditação. Nunca é demais recordar este ponto.

Começa sempre pelas meditações mais fáceis. Não te preocupes, no princípio, em alcançar os pontos

mais elevados. O importante é começar.

Se és um extrovertido, um dilatado, terás, no início, certa dificuldade, menor que as que terá um

retraído, um introvertido. Não te preocupes, porque alcançarás, com o tempo, o pleno domínio. Por pouco

que seja o tempo de tua meditação, cada minuto ganho é uma positividade a mais. Conseguirás, com o

tempo, manter uma meditação, sem perturbações, por horas a fio.

Se ao iniciares a meditação, o teu espírito estiver muito dispersivo, não te irrites, nem fiques

nervoso. Deixa-o errar à vontade. Ele acabará por cansar-se. Quando sentires que podes fixar a atenção

sobre uma imagem que memorizas ou sobre uma ideia (reflexão), inicia o exercício, sem te aborreceres

pelo tempo perdido. Nunca perderás tempo se não te deixares preocupar.

Não esperes resultados imediatos da meditação. Eles, às vezes custam a se manifestar. São um

desafio à tua diligência. Aceita o desafio, e prossegue com alegria e com confiança no progresso, que

acabarás por conseguir. Ele virá fatalmente. Tem fé em ti mesmo.

Se meditares sobre um tema, sentirás súbito desejo de meditar em outro, não te preocupes. Medita

sobre o novo tema. Depois, noutra ocasião, retorna ao tema primitivo. Lembra-te que vencerás por

persistência e não por oposição ao mental. Faze o que tens de fazer, e não te preocupes com o que suceda

em contrário. Lembra-te que o que vale são as positividades ganhas e não as negatividades vencidas.

Sempre sê pontual em tuas meditações. Não as abandones nunca. Cada dia que deixas de fazer uma

meditação, perdes dois. Aproveita todos os instantes para pôr o máximo de atenção no que fazes.

Ajudarás, assim, a atenção às ideias.

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Para ajudar a tua meditação noturna, evita os alimentos fortes ao jantar.

Faze uma refeição frugal, se possível, ou pelo menos a mais leve que puderes.

Não percas tempo em discussões inúteis, sobretudo com fanáticos. O esforço, que mal gastas nessas

discussões, aproveita-o para estudar, para meditar, para analisar bons temas.

Se fizeres tua meditação na presença de outros, convém que sejam pessoas que não perturbam a tua

atividade interior. É preferível, porém, que as faças sempre sozinho.

Procura sempre julgar os outros com justiça. Não exijas de ninguém o que está além de suas

possibilidades. E ao examinar os erros que outros pratiquem, procura colocar-te na situação em que eles

se encontravam. Não te esqueças nunca que, quando pensas nessas situações, tu não estás nelas.

Portanto, dá mais força às circunstâncias, e procura compreender os outros para ajudá-los.

Todo o bem que faças, virá para teu bem. Podes duvidar desta milenar verdade, contudo é mais

verdadeira que todas as falsas filosofias que homens desesperados quiseram construir, para estender a

todos o mal que eles contém dentro de si mesmos.

Reconhece que cometes erros, e medita sobre eles. Aprenderás a compreender os erros dos outros e a

não exigir dos outros o impossível. Se podes fazer uma coisa que outros não podem, não sejas

demasiadamente exigente para com eles. Medita sobre isto, muitas vezes.

A IMAGINAÇÃO

Concentra o mental, sempre que possas, ao ler um livro, ao ler um jornal, ao assistir um filme, ao

escrever uma carta.

Imobiliza-te, e concentra toda a mente sobre o que fazes.

Lembra-te que o mental nunca descansa, nem mesmo quando dormes. Quando o sono se apossa de

teu corpo, em que a tua consciência também adormece, ele continua trabalhando, ativo sempre.

Os exercícios diários de meditação dão ao mental uma força e uma direção exclusiva em teu favor.

Devemos meditar sobre uma ideia sem importância, ou apenas sobre grandes ideias?

A resposta a esta pergunta é muito simples: é preferível, sempre que façamos nossos exercícios

mentais, sejam eles dirigidos para grandes pensamentos positivos. No entanto, tal não impede que, em

certas ocasiões, quando nos encontramos em face de pensamentos pouco agradáveis, não possamos

meditar sobre eles.

No início, quando o que segue nosso curso, ainda se encontra dominado por preocupações contrárias,

aconselhamos a fazer os exercícios como até agora expusemos. Tal não impedirá que, num futuro

próximo, quando tenha fortalecido devidamente o mental, o corpo e o espírito, não analise tais

pensamentos que outrora o preocupavam. Verá, então, quão fracos eram eles, e que a sua força estava

apenas na nossa fraqueza.

Ao chegarmos a esse ponto, nossa força já terá atingido a um grau bem alto. Por isso, no início,

nosso conselho é: meditação sobre temas elevados e positivos. Só posteriormente sobre quaisquer outros

temas.

O que se pode fazer aqui é o seguinte: quando tenhamos que fazer algum trabalho desagradável por

natureza, não devemos recuar. Não esqueçamos a força do júbilo, essa grandeza alimentadora de nossa

alma e de nossa imaginação.

Por que é desagradável o serviço que temos que fazer? Porque a nossa imaginação lhe empresta as

mais sombrias cores. Lembremo-nos dos estudantes de medicina, que nos primeiros anos, quando se

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veem obrigados a trabalhar no necrotério com cadáveres, sentem, de início, uma repugnância que parece

invencível. Há muitos que abandonam a carreira. No entanto, os que a seguem, realizam, depois, uma

obra de grande valor. E aquela repugnância desaparece e cuidam eles de nossas chagas e de nossas

misérias, totalmente libertados das cores sombrias e desagradáveis que lhes emprestava a imaginação.

Cuidemos, pois, quando empreendemos algo que nos parece desagradável, em ver genuinamente a

nossa tarefa. Ora, todas as coisas têm valores e desvalores. Não estaremos apenas vendo os maus e

escondendo aos nossos olhos os bons? E além disso, não estaremos aumentando o aspecto desagradável,

por valorizarmos os maus valores, provocando com a nossa imaginação aspectos desagradáveis não tão

evidentes?

Lembro-me de uma pessoa a quem um dia lhe ofereceram uma cenoura crua para que comesse. Ao

levá-la à boca, achou a coisa mais horrível e desagradável do mundo. Um caldo de cenoura seria um

verdadeiro veneno. Tinha a impressão que morreria se tomasse tal coisa!

Mas, um dia, sentiu que os olhos já não viam tão bem. Para ler um jornal, precisa óculos.

Consultando um médico, este aconselhou-o que comesse cenouras cruas.

- Cenouras cruas, doutor?! Mas isso é horrível!

- Coma cenouras cruas...

- Mas, eu não sou lebre, doutor...

- Pois seja lebre, e coma cenouras cruas como lebre. Pois lerá jornais.

- Mas é tão desagradável.

- Procure o agradável e acabará encontrando-o. Lembra que a cenoura tem tais vitaminas, etc.

O nosso amigo começou a comer cenouras cruas. Já estava convencido que eram úteis. O gosto

esquisito acabou por tornar-se agradável. Hoje, na sua casa, pode até faltar manteiga, mas cenouras

raladas não faltam. E o melhor é que lê jornais sem óculos.

Muitas das coisas desagradáveis são como as cenouras cruas. Depois de comidas, acompanhadas da

convicção de que são úteis e necessárias, nossa imaginação começa a cobrir nela os bons valores.

Pode-se ainda duvidar do valor da imaginação?

Mas se nos perguntassem: podemos dirigir a nossa imaginação?

Só uma resposta cabe aqui: podemos. E como é este um tema de tal importância para a integração de

uma personalidade e para o domínio do mental, merece eles estudos especiais.

Podemos fazer exercícios para dominar a nossa imaginação?

Sim, podemos. E são eles de uma importância tal que sem o bom domínio deles, não seremos

senhores do nosso mental.

Comecemos, portanto, por parte, degrau a degrau.

Se um trabalho desagradável ou uma ideia sem interesse recebe de nós a atenção do nosso mental,

aos poucos verificaremos que a força do mesmo tende a aumentar, e diminuem as nossas fraquezas

mentais,

Sabemos que a força de um estímulo exterior está na proporção da atenção que lhe prestamos. Se

atendemos para algo, captamos melhor e mais nitidamente o que nos era confuso.

Uma imaginação quimérica, fantasista, desorientada, só pode dar-se num mental fraco, nunca num

mental forte.

Portanto, o caminho do domínio da imaginação só pode ser aquele que começa pelo domínio do

mental.

Vamos oferecer um pequeno exercício de grande valor.

Quando sentirmos uma pequena dor numa parte do corpo ou mesmo um prurido qualquer, não os

atendamos. Procuremos desviar nossa atenção para outras coisas. Perceberemos que a dor ou o prurido

diminuirão. Mas, ao mesmo instante, porque estamos pensando sobre eles, tendem a aumentar.

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Façamos outra vez a mesma experiência, dirigindo a atenção para outra coisa, e observemos se

diminuem. Certamente diminuirão.

Chegados a este ponto, procuremos não senti-los mais, pela desatenção que lhes daremos.

É a imaginação um dos temas mais importantes da Psicologia, e os estudos que tem provocado são

dos mais numerosos.

A palavra imagem vem de imago, em latim, que indica o que é interior.

Ao intuirmos um fato do mundo exterior, dele formamos uma imagem. Assim, temos imagens que

são representadas (apresentadas de novo) pela memorização. Mas eis que o poder criador do espírito

humano revela-se aqui.

Nós não reproduzimos apenas as imagens que obtivermos dos fatos do mundo exterior. Nós também

as combinamos. Assim a imagem do ouro, que guardamos em nossa memória, e a imagem de monte,

podem levar-nos a construir a representação de um monte-de-ouro, sem que desse monte tivéssemos tido

uma experiência.

Fácil é compreender agora o papel criador da nossa imaginação.

Contudo, é preciso considerar um ponto importante. Todas as imagens, que podemos representar, são

fundadas na nossa experiência. Não é possível construir uma unidade composta de imagens diversas, que

não as tenhamos experimentado isoladamente.

Assim, se imaginarmos o Centauro, parte homem, parte cavalo, uma cabeça humana num corpo de

cavalo, temos as imagens já experimentadas por nós, pois, separadamente, já as conhecemos. O que não

intuímos do mundo exterior foi a combinação dessas duas partes, formando um novo ser, o Centauro.

Este é, portanto, o produto da imaginação, que é a atividade do nosso espírito em construir novas

unidades com partes que são imagens já por nós experimentadas.

Desta forma, o artista pode, com pincéis e tintas, construir, imaginativamente, e reproduzindo a

imaginação na tela, novas unidades, compostas de imagens diversas.

A imaginação tem um poder criador: o de criar novas imagens pela combinação delas.

Contudo, a imaginação não pode dar vida a essas novas imagens compostas. Pode um arquiteto

imaginar uma construção, e depois juntar os materiais necessários e dar-lhe a realidade.

Estamos aqui em face de uma realização material do que fora anteriormente pura imaginação. O que

o construtor faz é reunir, obedecendo às leis da mecânica, materiais sob uma forma para a qual eles estão

naturalmente formados.

Uma pedra pode ser assentada sobre outra pedra. Uma parede pode ser erguida, desde que se

obedeçam as leis da estabilidade mecânica.

Podemos, também, ao imaginar um monte-de-ouro, saber que ele pode ser realizado, mas já uma

montanha de ouro se torna praticamente impossível, e muito menos uma cadeia de montanhas de ouro.

Um centauro, que pode ser imaginado, já não pode realizar-se em vida, porque contraria as leis da

ciência.

Que vemos, então?

Que há combinações que podem encontrar uma resposta na realidade, resposta de reprodução fiel, e

outras que não o podem.

Um centauro pode ser reproduzido com tintas numa tela; não o pode na natureza.

Há pessoas que são muito imaginativas, como os poetas, artistas, sonhadores que, despertos, vivem

um mundo de imagens maravilhosas.

Outros o são menos. Há acaso alguém desprovido totalmente de imaginação? A resposta que se

impõe é que não há. Se encontrarmos graus diversos na capacidade de imaginação, há em todos sempre

imaginação.

A imaginação pode ser regrada ou desregrada. Chamam de imaginação regrada aquela em que

alguém que a vive, não a vive como realidade, mas como ficção.

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A imaginação começa a desregrar-se, quando as imagens combinadas passam da categoria de pura

ficção para a de realidade, isto é, quando, quem as crias, juntando imagens, fundadas na experiência, julga

que a nova unidade forma, também, uma realidade. Assim procederia um desregrado na imaginação que,

fundando-se na realidade do busto humano e na realidade do corpo de cavalo, acreditasse na realidade da

combinação Centauro.

Agora surge, nitidamente, a grande significação que tem a educação da imaginação.

Educar a imaginação não é secá-la, não é destruí-la. Que seria a Humanidade se o ser humano, sem

imaginação, fosse a norma? Onde estariam os grandes inventos, as grandes melhorias humanas? Onde,

enfim, o progresso, se dominasse no homem uma falta de imaginação?

Todos os grandes inventores, todos os grandes criadores, foram pessoas imaginativas.

Educá-la é conduzi-la para fins benéficos.

Há muitas providências a serem tomadas neste setor, sobretudo porque já sabemos muito bem quanto

ela influi sobre nós.

E influi, porque, se considerarmos a imaginação como realidade, poderemos errar.

No caso do arquiteto, como vimos há pouco, pode ela tornar-se realidade. Mas poderia o arquiteto

imaginar, também, uma construção tão desmedida que não tivesse nenhuma correspondência com a

realidade. Bastaria que ele desprezasse as leis da estabilidade ou as condições da técnica.

Um ser-vivo imaginário não pode tornar-se vivo na realidade, como o exemplo do Centauro.

Portanto, vemos que a imaginação pode ser medida, regrada, ou desmedida, desregrada.

Saber separar o que é mera ficção do que é realidade é importantíssimo, e implica exercícios que

começam onde começa o domínio do mental.

A imaginação criadora tem ainda outro papel importante: o de criar realidades dentro de nós. Note-se

bem:

Se não podemos criar realidades fora de nós, podemos, no entanto, criá-las dentro de nós.

E eis onde a imaginação pode atuar positiva ou opositivamente.

Vamos a exemplos esclarecedores: certo escritor criou uma personagem, numa de suas novelas, que

era um louco moral. O escritor, em toda a sua vida, havia sido um homem plenamente normal. Mas viveu

com tal intensidade o tipo que criara, que tempos depois de haver escrito o livro, começou a sentir os

sintomas da loucura da personagem, em si mesmo.

Terrível foi o seu espanto. Perplexo ante os acontecimentos, viu que, dia após dia, aumentavam os

sintomas, e já não sentia forças suficientes para dominar-se. Apavorado com a situação, e sentindo-se

fraco para dominar-se, preferiu o suicídio a realizar, em vida, a triste figura do ser que havia criado em

sua novela.

Duas perguntas podem colocar-se aqui:

1) Ou o autor criou pela imaginação um ser tão vivo em si mesmo que passou a vivê-lo com tal

intensidade, que ele dominou plenamente a personalidade do autor, substituindo-a aos poucos

pela da personagem; ou

2) O autor já tinha em si, em estado de latência, a personagem, que já formava uma personalidade

potencial, que, aproveitando-se da porta escancarada da imaginação artística, surgiu à tona para

vencer as resistências do autor.

No primeiro caso, a personagem é uma mera criação do autor;

No segundo caso, a personagem tinha uma autonomia, que permitiu vencer as resistências.

Este fato, pela sua importância, merece que sobre ele meditemos e procuremos, em face dos

conhecimentos de que atualmente dispomos, resolver entre tais possibilidades.

O homem é um feixe de possibilidades. Em nós, temos, em estado de potência, tido quanto o ser

humano pode ser e criar, tanto para o bem como para o mal. Nossa atividade psíquica tem o papel de

atualizar (tornar eficiente, realizar) ou de virtualizar (colocar no estado de latência) tudo quanto podemos

ser. É fácil agora compreender o que é sugestão, esse gerar sub, esse ordenar de modo a tornar em ato o

que contemos em potência. Por isso, se a atividade do nosso espírito tomar um sentido positivo e benéfico

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para nós, pode atualizar o que nos é positivo e benéfico, como, se tomar um sentido negativo, atualizará o

que temos de negativo, de destrutivo, em nós. Podemos despertar as forças do bem como as forças do

mal, de que tanto falavam as religiões e que a psicologia moderna nos auxilia a compreender em termos

científicos.

Os estudos, que fizemos até aqui, sobre a educação da imaginação, levam-nos a compreender quão

necessário é cuidar do domínio do mental.

Ora, a imaginação é mental, dá-se no nosso psiquismo, e dele depende.

Dominar, dirigir, educar a imaginação implica necessariamente o domínio, a direção, a educação do

mental.

Portanto, além dos exercícios que já tivemos ocasião de estudar e descrever, impõe-se agora

obedecer a um conjunto de regras que são de magna importância.

O dirigir a nossa atenção para fatos do mundo exterior é um exercício importantíssimo.

Ao vermos um fato, digamos, um inseto que se move por entre vários objetos, que devemos fazer?

Deixar que passe sem nos interessar? Não; aproveitemos o instante para um exercício de atenção externa.

Olhemos, observemos, acompanhemos os movimentos do inseto, como podemos acompanhar, observar o

movimento de um avião em pleno ar, ou de um pássaro nas alturas.

Eis uma máquina que funciona com toda a sua complexidade. Devemos aproveitar o instante para

apreciar o seu movimento, dando-lhe toda a atenção.

Concentrar nossa atenção sobre os fatos do mundo exterior, eis uma grande regra para o domínio das

forças psíquicas.

Aqueles que ante os fatos são dispersos, olham ora para cá, ora para lá, interessam-se por isto, ora

por aquilo, enfraquecem cada vez mais o seu mental.

Deve-se exercitar a atenção pela concentração em tudo quanto se faz. É uma carta que se lê: máxima

atenção! É uma carta que se bate à máquina: máxima atenção! É alguém que nos fala: máxima atenção!

Transformemos cada um dos nossos momentos da vida exterior num exercício atencional, e

estaremos construindo o poder extraordinário da mente.

Mas, nesses momentos em que observamos as coisas, surgem imagens, devaneios, ideias errantes

que procuram afastar-nos do trabalho que empreendemos.

Como proceder, então? Lembremo-nos dos conselhos já dados quanto à meditação e às ideias

errantes. Não lutemos contra o mental!

Retornemos à observação.

A princípio, essas ideias e devaneios procurarão impedir o exercício atencional. Mas, finalmente,

elas se cansarão, e nós as venceremos.

Então, podemos sintetizar agora:

A atenção exterior é a observação; a atenção interior é a meditação.

Completemos uma com a outra, e uma fortalecerá a outra.

E não nos esqueçamos nunca destas regras:

Não lutar contra o mental!

Não repelir violentamente as ideias intrusas!

Aproveitar cada instante para realizar um exercício atencional exterior!

Aproveitar cada instante para os exercícios atencionais interiores (meditação).

O trabalho feito com concentração nos dará ganho de tempo. Se hoje levarmos tal tempo para fazer

um serviço, acostumando-nos a realizá-lo sempre com concentração, acabaremos espantosamente

diminuindo o tempo gasto.

Os grandes homens da indústria não poderiam dirigir seus inúmeros negócios se não fossem capazes

de uma grande concentração. Nem o poderiam os sábios, os cientistas, os grandes inventores, os generais,

etc.

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Vê-se, assim, claramente que o domínio da imaginação começa no preciso ponto onde se inicia o

domínio do mental.

Os exercícios mentais são exercícios prévios de domínio da imaginação.

Examinemos agora estes problemas:

De onde vêm as nossas preocupações? Do mundo exterior, ou de nós?

Se vêm de nós, quando nelas atua a imaginação? Pois, ou se fundam em imagens combinadas com

um sentido e um significado próprio, que nos oferecem perigos, suspeitas, dúvidas, ou se fundam em

fatos sucedidos, cujas possibilidades procuramos descobrir, e construímos imagens sobre imagens dos

acontecimentos futuros possíveis, que possam ainda pôr em risco algum bem que prezamos.

Conclusão: nossa vida interior, por mais seca que seja, está sempre povoada, cercada, acompanhada,

estimulada ou reduzida pela imaginação.

O seu modo de proceder consiste em marcar a direção das nossas atitudes ou influir em nossas

valorizações.

Aquela montanha, que vejo daqui da janela do meu quarto, é uma massa cinzenta homogênea. Sei

que ali há árvores, arbustos, veios d’água, pássaros das mais variadas formas e cores. Mas daqui, de onde

estou, ela é apenas uma massa cinzenta. Quem estiver mais próximo dela, verá muito mais que uma

simples massa cinzenta, e quem a percorrer encontrará uma variedade tão grande de fatos e aspectos, que

não teria fim se desejasse descrevê-los.

Vê-se, assim, que os fatos são sempre o que são. Aquela montanha é o que ela é. É a sua própria

verdade. Mas, a montanha para mim é diferente do que ela é na verdade. Assim, os fatos variam para nós,

embora não sejam em si senão o que eles são. E por que variam para nós? Assim, a montanha é diversa

para os olhos dos seus espectadores, mas apenas nesses olhos, e não em si mesma; e assim os fatos são

diferentes aos nossos olhos, sem que em si mesmo sejam eles outra coisa do que eles mesmos.

Vejamos mais: estou aqui. Nunca vi aquela montanha senão à distância. Não sei como ela é em si

mesma. Sei que tem árvores, vegetação, animais diversos, caminhos para percorrê-la, algumas cabanas de

camponeses. Posso construir com a imaginação até paisagens, manchas de um trecho ou de outro, posso

imaginar até a visão que, olhando dali, teremos desta cidade. Muitas coisas posso imaginar. Mas todas as

que acaso imagine serão, naturalmente, muito distintas do que é a montanha na sua realidade.

A imaginação tende a completar o que os olhos não veem!

E eis o seu importante papel que pode ser benéfico ou maléfico.

Se conheço a montanha como ela é, não poderei tão facilmente criar tantas imagens. Já saberei como

ela é.

Ora, a nossa imaginação não pede licença para trabalhar. Ela está sempre atuando. Mesmo quando

dormimos, ela atua e, muitas vezes, vislumbramos a sua atividade nos sonhos povoados de tantos

ilogismos e de tanta criação exótica.

Cercados por ela, como sempre estamos, podemos dizer que vivemos num mundo de realidade

povoado pela imaginação.

Onde termina a realidade e onde começa a ficção? Se o soubermos, poderemos ser senhores da

realidade e da imaginação!

Que maravilhoso é possuir um critério seguro, como um guia fiel e competente que nos leve através

de caminhos desconhecidos ao ponto almejado!

Que podemos fazer para alcançar este ponto?

Duas propostas costumam ser feitas:

1) Destruir a imaginação, secá-la;

2) Dirigi-la, analisá-la, dominá-la.

A primeira está prejudicada pelas razões que tivemos ocasião de acima descrever. Resta a segunda,

portanto.

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Vamos empreender juntos este longo caminho. Serei o teu guia e tu o confiante viajor. À tua fé e à

tua confiança, corresponderão a minha confiança e a minha fé. Conheço o caminho, e tu confias no meu

conhecimento.

Pois bem, entre olhares amigos e confiantes, prossigamos a nossa jornada.

Quem segue uma viagem, a primeira coisa que faz, é munir-se de tudo quanto é necessário para ela.

E essa viagem, que nos levará a achar as fronteiras entre a imaginação e a realidade, que nos dará meios

de impedir que aquela nos prejudique em vez de nos auxiliar, exige uma preparação prévia.

Então devemos:

1) Continuar firme e confiantemente os exercícios aconselhados;

2) Desenvolver a força de concentração. Exercícios atencionais exteriores e interiores.

E agora, o 3º ponto importante:

És um homem extrovertido, como poderias ser um introvertido. Onde estás, tu te extrovertes. Se tens

ao teu lado uma só pessoa, com quem conversas, procederás de um modo. Se tens duas ou mais,

procederás diferentemente. Se és extrovertido, ante uma pessoa, és mais comedido; ante mais de duas, já

te excitas, falarás com mais ênfase, manifestarás um entusiasmo tão excessivo que podes perder até o

controle.

Se és um introvertido, ante uma única pessoa, conservas a tua naturalidade. Mas, eis que sobrevêm

duas, três, outras, e começas cada vez a fechar-te mais, a calar-te, a sobrares, como diz o povo. Não é

assim?

Por que mudaste de atitude? É que nós, em geral, nunca somos os mesmos ante fatos diferentes. E

por qu? Porque os fatos nos provocam imagens novas, nos estimulam nos movimentos de extroversão ou

de introversão.

Cuidemos, agora, de um estudo importante: as nossas atitudes ante os outros, e procuremos analisar

nelas a influência que exerce a nossa imaginação. Depois, então, nos exercitaremos para evitar os

defeitos. Aqui começa o novo caminho, aqui já palmilhamos a trilha da vitória!

Seguindo as pegadas do que dissemos, devemos, agora, salientar o importante papel das atitudes.

Nossas preocupações surgem:

1) De nós mesmo;

2) Do mundo exterior.

Têm elas suas origens em nós mesmos, em nosso psiquismo, ou provêm de quando nos encontramos,

no mundo exterior, em face dos outros.

Essa distinção apenas salienta a fonte. Se podemos distinguir quanto à origem da precipitação, da

preocupação, não podemos deixar de reconhecer que ela sempre depende de nós.

Reconhecer este ponto é de capital importância. Pois, na verdade se os outros nos provocam

preocupações, segundo as suas atitudes, devemos reconhecer que precisamos estar predispostos a nos

preocupar para que tal aconteça.

Se ante outros nos surgem preocupações, deveremos sempre considerar:

Quanto nos cabe na estrutura da preocupação. Que fixemos para criar um ambiente favorável para

que ela surgisse em nós?

Se observarmos bem, verificaremos que nossas atitudes provocam certas reações dos outros que nem

sempre percebemos nitidamente, mas que influem terrivelmente sobre nós.

Se somos introvertidos, num ambiente de extrovertidos, estamos sujeitos a criar situações

desagradáveis, tanto para nós como para os outros. Ante a expansão geral, nós nos retraímos. E quanto

mais os outros se expandem, mais nos retraímos. Provocamos nos outros o aspecto de quem é “do

contra”. Parecemos, desde logo, egoístas, antipáticos. Não rimos nem conversamos com a mesma

exuberância que eles.

Se somos extrovertidos, numa roda de introvertidos, logo nos sentimos como se estivéssemos num

velório. A tristeza parece dominar o ambiente. Sentimo-nos mal, e a nossa expansão e alegria causam, por

sua vez, mal-estar na roda.

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Quer dizer que devemos procurar apenas os nossos pares? Poder-se-ia proceder assim, mas a vida

não nos permite, e nós nos vemos obrigados a “dançar segundo a música que tocam”. Portanto, paciência.

Temos que nos adaptar ao ambiente em que estamos. E como fazer?

Ora, o conhecimento é um meio de libertação. Se sabemos que somos introvertidos ou extrovertidos,

já sabemos que, nas rodas, que nos são antagônicas, devemos conter nossos impulsos naturais e procurar

compreender com simpatia os outros. Dessa forma, evitamos aborrecimentos aos outros e a nós mesmos.

Digamos agora, que, sendo nós extrovertidos, estamos numa roda de extrovertidos, na qual se dá a

presença de um introvertido. Este exercerá sobre nós uma verdadeira provocação, que nem sempre

suspeitamos.

Temos vontade de falar mais alto, de ser mais exuberantes, de extroverter-nos mais, porque outros

(os introvertidos) parecem reagir contra nós. Queremos, então, impor-nos. E perdemos a noção dos

limites. Resultado: dizemos mais do que devíamos dizer. E depois ficamos preocupados que as nossas

palavras tenham sido compreendidas assim ou de outro modo, a serem impressões que não desejaríamos

provocar nos outros.

Sentimo-nos, então, supinamente aborrecidos. “Para que disse isso? Sei que pensam que eu...” E

uma dúvida nos espicaça a consciência. E nesse dia, por mais que façamos, e à proporção que mais

lutamos contra o mental, as preocupações crescem, e o nosso “inimigo”, sempre a postos para nos

exprobrar os erros, ri-se à nossa custa e aumenta ainda as preocupações, memorizando até fatos passados,

já esquecidos, mas que voltam à memória para aumentar ainda mais o nosso mal-estar psíquico.

Portanto, há uma regra útil: conter-se. E conter-se até quando tendemos a introvertermo-nos.

Procurar sempre a posição equilibrada entre introversão e extroversão, é o melhor meio. No início, como

em tudo, há dificuldades, mas é possível obter-se esse domínio. O pondo de partida é começar a dominar-

se e, a pouco e pouco, a vitória se aproxima, de tal forma, que a conquistaremos, afinal.

Mas todas as preocupações, que surgem das nossas atitudes para com os outros ou dos outros para

conosco, dependem do nosso estado psíquico.

Toda a vez que tais preocupações surgem, podemos estar certos que algo de defeituoso temos em

nós. Salvo, naturalmente, naqueles exemplos de desajustamento, de falta de delicadeza, de erros graves

em nosso modo de proceder, que provocam nos outros uma reação, ou que os ferimos, sem que o

desejássemos, mas apenas por falta de cuidado.

Estes casos são facilmente resolúveis, pois basta que cuidemos em não repeti-los, e a preocupação se

desvanece.

Devotam-se os psicólogos ao estudo das relações íntimas entre a realidade e a imaginação. E não é

um tema apenas de psicologia, mas de filosofia também. Onde termina a realidade e começa a

imaginação? Traçar nítidas fronteiras é difícil. Além disso, o homem é um ser supinamente imaginativo, e

poderíamos dizer, sem exagero, que nunca o ser humano pode viver a realidade pura e simples, sem a

presença da imaginação.

Portanto, o problema só se pode resolver pelo controle desta.

Aconselham os psicólogos, como melhor método para distinguir a realidade da imaginação, observar

quanto há de correspondência sobre o que pensamos com a sucessão dos fatos. Muitos imaginam isto ou

aquilo pode ser ou dar-se, mas os fatos o desmentem. Portanto, os fatos do acontecer universal podem

servir-nos de guia para que analisemos os nossos pensamentos e as nossas opiniões.

Se procedermos assim, já teremos um bom meio de ver até onde vamos no terreno do imaginativo,

bastando que recordemos o que pensamos sobre os fatos futuros, que nos confirmaram ou nos negaram o

que a imaginação havia construído.

Tem ela, assim, um grande papel, além do de conseguir novas estruturas com velhas imagens; é o de

valorizar os valores. O que valoramos pode receber de nós uma nova carga valorativa, e darmos mais

valor ao que tem menos, e menos ao que tem mais.

A medida dos valores é realmente difícil. A própria Economia não resolve facilmente este problema,

e a Filosofia também não.

Portanto, precisamos estudar os valores para que saibamos guiar-nos ante as circunstâncias e

sabermos quando nos excedemos em nossas valorações e valorizações.

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Valoração é a ação de captar um valor; valorização, a atividade que consiste em dar um suprimento

de valor a um valor, já valorado.

Assim, há objetos que podem ser valorados como valendo tal. Mas nós, por diversos fatores,

podemos dar-lhes mais valor.

Esta caneta vale tanto, por exemplo. Mas, como ela foi de meu pai, vale muito mais. Tem para mim,

um valor a mais que lhe dou. Eu valorizo-a muito mais que outros a avaliaram.

Um fato que sucede pode provocar reações diversas em diferentes pessoas. Num, pode passar

indiferentemente, mas noutros provocará uma gama de preocupações, que vão desde o desgosto mais leve

até o mais profundo pesar.

Ora, o fato é o mesmo. Em si mesmo, tem o seu valor. Mas, para os outros, apresenta valores

diversos.

Só nos preocupa aquilo a que damos um valor além da medida.

Analisemos as nossas valorizações e vejamos o papel que nossa imaginação exerce nessa atividade, e

estaremos em condições de trabalhar a nosso favor e evitar muitos dos motivos que nos têm servido para

transformar nossa vida numa existência intercalada de preocupações totalmente inúteis. São essas

preocupações totalmente inúteis que devemos afastar de nós, para que nos libertemos. E o empenho para

consegui-lo não é difícil.

Para obter o desejado, comecemos pelo princípio. Examinemos primeiramente os valores, que

emprestamos às coisas e aos fatos, e depois a sua inter-relação com a imaginação e, finalmente, nosso

papel para libertarmo-nos.

Temos, aqui, um novo veio, cuja exploração nos oferecerá novas possibilidades de vitória, e

facilitará a nossa plena integração pessoal.

Antes de estudarmos os métodos de domínio da imaginação, cujo controle é fundamental para uma

completa integração pessoal, convém previamente estudá-la sob vários aspectos:

Criadora

Positiva Inovadora

Imaginação

Negativa Desregrada

Patológica

Com este esquema, temos os diversos aspectos que são importantes para nós.

Uma imaginação positiva criadora, e uma inovadora, são úteis, benéficas e devem ser alimentadas. É

criadora a imaginação quando ela trabalha na estruturação de velhas imagens para construir uma nova

imagem sintética, como a realiza o artista. É inovadora, quando, ao perceber as possibilidades que

permitia inovar algo totalmente não conhecido, como procede, por exemplo, um industrial talentoso, que

pode, com velhos materiais, com velhas técnicas, criar uma nova modalidade de produção.

Estas duas imaginações devem ser estimuladas. Mas, como há sempre o perigo de desdobramento,

uma imaginação positiva, quando se desmesura, pode tornar-se desregrada.

Como se podem dar tais desmesuramentos?

A imaginação distingue-se da realidade. Enquanto esta se dá em ato, existe em si,

independentemente de nós, o imaginativo, enquanto tal, existe apenas em nós. Portanto fundamental. Mas

onde termina o primeiro e começa o segundo? Difícil estabelecer uma fronteira, porque, em cada caso

particular, a imaginação e a realidade se combinam, de modos diversos.

O único critério que temos é o de considerar como realidade o que de fato, fora da nossa mente, já se

dá. E como imaginação, as possibilidades maiores ou menores, ou a consideração de fatos que julgamos

terem-se dado ou em ação de dar-se, mas dos quais não temos a evidência segura de seu acontecer real.

Como já vimos, a imaginação não se afasta do homem, que com ela vive. Por isso, vivemos

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32

constantemente num mundo imaginativo e num mundo real. Mas, o critério que temos para captá-lo em

muito nos auxilia.

Convém, no entanto, ainda distinguir: Numa imaginação desregrada, o sujeito, que a experimenta,

pode saber que a vive, e é o caso normal de imaginação descontrolada, ou não pode saber que ela é

imaginação e a toma como realidade, que já é um caso patológico.

Assim temos:

a) Imaginamos, mas sabemos que imaginamos;

b) Imaginamos e pensamos que é realidade.

Quando alguém toma a imaginação por realidade é já a evidenciação de um caso patológico? Na

verdade, convém ainda distinguir. Se for esporadicamente, não o é. Mas, aqueles que tomam como

realidade, constantemente, o que imaginam, revelam que o seu desregramento já atingiu a um ponto tão

agudo, que acusa o doentio, o mórbido, o patológico.

Vamos a exemplos esclarecedores:

Estamos em face de um fato real. Começamos a considerar as suas possibilidades. Quais

possibilidades estamos considerando: as benéficas ou as maléficas?

Alguém nos olha de soslaio. Ficamos desconfiados. Nossa imaginação põe-se a trabalhar. “Esse

indivíduo não gosta de mim, tem alguma má vontade que não revela. Certamente suas intenções não são

boas. (A imaginação está trabalhando com negatividade, portanto, para nós, maléfica. Ela se agita e

prossegue). Já observei vários gestos inamistosos. Ah, não há dúvida, esse indivíduo planeja alguma coisa

contra mim!”

E nesse diapasão trabalha a imaginação. Tudo se torna para nós evidente.

Tínhamos um fato real: um olhar de soslaio. O reto pertence às nossas ficções. Temos aqui um

exemplo das fronteiras entre a realidade e a imaginação. O primeiro, o olhar, pertence à realidade; o

restante, à imaginação.

Que devemos fazer em tais casos? Examinar com cuidado o que a imaginação amontoa de provas

contra o indivíduo? Examinemos o que há de real contra nós? Nada, ou algum fato já praticado?

Examinemos o fato e o despojemos do que é imaginativo. Tiremos dele todos os valores positivos e

opositivos, e consideremos o que há de existencial no fato.

Se procedermos assim, muitas das nossas considerações imaginativas perderão sua força e a

realidade acabará por esplender com toda clareza. Lembremo-nos do seguinte: o cientista, quando estuda

um fato do mundo, como procede o botânico ao analisar uma planta, não se guia nem se deve guiar por

valores, mas descrever a planta existencialmente como a planta acontece. O cientista não pode fazer

julgamentos de valor, sob pena de afastar-se da Ciência e fazer Filosofia, o que cabe a outro setor do

conhecimento.

Enquanto a Ciência trabalha com julgamentos (juízos) de existência, a Filosofia trabalha também

com juízos de valor. A Filosofia pode julgar o homem como o ser mais valioso da terra. Mas, o cientista o

estuda, nas ciências correspondentes, com a mesma naturalidade e realidade que estuda os seres mais

ínfimos.

Todas as vezes que julgamos alguém ou um fato, façamos este exercício: quais são os meus juízos de

valor e quais os juízos de existência? Coloquemos de um lado os de existência, e, de outro, os de valor.

Cuidemos de considerar que, nos primeiros, haja realmente apenas existência, e nenhum juízo de valor,

mesmo oculto.

Feito isto, analisemos nossos juízos de valor. Todo juízo dessa ordem vale realmente quando está

fundado em uma existência; do contrário, é apenas imaginação. Se tal for feito, não nos escapará nada, e

evitaremos cometer injustiça ou tomar atitudes contra outros.

Este trabalho de análise pode ser empregado para qualquer fato, e pode ser aplicado quanto aos

julgamentos dos outros. Estamos, por exemplo, em face de um livro. O autor defende esta ou aquela

posição. Examinemos seus juízos de existência e seus juízos de valor. Façamos a análise destes últimos,

procurando os fundamentos existenciais.

Veremos, desde logo, quanto trabalha a imaginação nos outros. Revertamos para nós a mesma

prática, e compreenderemos quanto em nós ela atua.

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OS VALORES

A análise dos juízos de valor é o ponto de partida mais importante para uma verdadeira análise da

imaginação e de pleno domínio de nós mesmos.

Toda a vez que há uma ruptura da indiferença, há a presença de um valor para nós. E também o há,

quando pomos, embora considerando iguais, um objeto superior ou antecedente a outro. Sempre que

damos uma preferência a isto ou àquilo, e preferimos aquele a este, estamos revelando que há valores.

Propriamente, toda a vida é um ato de valoração. Teríamos que penetrar aqui no terreno da Filosofia

se desejássemos explicar tais aspectos; mas, basta-nos ficar no âmbito da Psicologia.

Um homem e uma mulher seguem por uma rua movimentada, cheia de lojas. Certamente, ante as

vitrinas, que exibem vestidos femininos, a mulher será mais facilmente atraída que o homem, enquanto

este se dirigirá mais para a que mostre objetos de uso masculino.

Uma criança verá melhor os brinquedos que um adulto. Um fumante de cachimbo prestará atenção

aos cachimbos expostos, e assim sucessivamente.

Nós somos atraídos por tudo quanto representa um maior valor para nós, ou põe em risco um valor

que estimamos.

Há um velho ditado de muita sabedoria: “quem vai aos porcos, tudo lhe ronca”. Conhecemos todas

as alucinações do caçador, bem como as alucinações do sedento no deserto, que vê sempre regiões de

exuberante vegetação e água cristalina e certamente fresca.

Conta um filósofo hindu que, viajando certa vez por um deserto na Índia, num dia de intenso calor,

admirava-se que, por toda parte, visse tão belas vegetações à distância e lagos tão claros, de água

cristalina e agradável. E punha-se a dizer a si mesmo: “Não compreendo por que dizem que esta região é

desértica. Como há belas manchas de terra, com lindas árvores e belos lagos!”

Como sentisse sede, resolveu dirigir-se para um desses oásis. E qual não foi o seu espanto quando

viu que tudo não passava de miragem.

Pôs-se, então, filósofo como era, a meditar. Nós vemos muito do que desejamos. Na verdade, a sede

já se fazia sentir nele há muito, embora não fosse tão exigente, porque “sabia” que poderia satisfazê-la

facilmente num daqueles lagos. Mas, ao ter a evidência de que tudo não passava de miragem, a sede

aumentou, cresceu a olhos vistos, e o temor não se apossou dele totalmente porque tinha meios de afastar-

se do deserto e obter água em pouco tempo. Tudo isso lhe serviu de grande lição.

Nossa imaginação nos dá o que desejamos... mas nos dá como imaginação. Quando estamos

dormindo e sentimos fome, no sonho, em imagens, recebemos lautos jantares, pratos maravilhosos, doces

em profusão, que comemos de tal modo, sem nos satisfazer, o que nos provoca enjoo e mal-estar quando

acordamos.

Ora, a nossa imaginação trabalha quando estamos vigilantes e ela atua valorizando os fatos.

Sabemos que valorar um fato é captar o valor que ele tem. Valorizar é dar um valor ao valor, como

desvalorizar é tirar valor de um valor, diminuir o valor de um valor.

Valorar é apreciar com justeza o valor. Valorizar é dar mais ou dar menos. Portanto, no valorizar, já

atuamos diferentemente de quando valoramos.

Na verdade, dificilmente valoramos sem valorizar ou desvalorizar.

Valorar com justeza seria captar um valor através da elaboração de um juízo de existência do valor.

Assim, quando digo: “Esta mesa é um móvel que guarnece a casa”, eu expresso um juízo de

existência. Mas quando digo: “Esta mesa é muito confortável ou agradável”, formulo um juízo de valor.

Mas esse juízo de valor pode ser existencial, isto é, o valor “está” na mesa, pois realmente ela apresenta a

qualquer pessoa uma agradabilidade ou uma confortabilidade. Neste caso, o juízo de valor está justificado

por um fato ou por uma qualidade inerente ao fato.

Ora, se nos pusermos a examinar os nossos atos e a procurar neles os juízos de valor que incluem,

veremos que muitos deles se fundam no que há na coisa valorada, mas muitas vezes, o valor não está na

coisa. Nós é que nela o pomos.

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E esses valores, que são fictícios, criação nossa, representam mais o que desejamos ou o que não

desejamos. Portanto, nossa atividade valorativa tem uma importância muito grande.

Ora, nossa imaginação, que tem um poder criador, pode emprestar a uma coisa um valor que a coisa

não tem.

Assim como a imaginação pode tomar duas realidades, como o corpo de um cavalo e o busto de um

homem, e juntá-los, para formar o centauro, que é uma ficção, também pode juntar um valor, que já

captamos e conhecemos aqui, ou ali, e pô-lo como se estivesse no objeto que apreciamos. Eis como

trabalha a nossa capacidade criadora.

Aí está um grande bem e um grande mal nosso, porque a imaginação enriquece a vida de belas

imagens ficcionais, mas também nos leva a erros clamorosos, e a consequentes injustiças.

A imaginação tem sua origem, psicologicamente falando, na nossa sensibilidade e na nossa

afetividade. Ela surge espontânea, do fundo do nosso ser. Mas, nossa razão pode efetuar um grande

trabalho para controlá-la, porque a razão, sendo fria, analista e sintetizadora, como é, pode nos ajudar na

análise de nossas ficções, facilitando-nos o meio de encontrar um controle para as nossas criações.

Analisar todos os nossos juízos de valor e ver quanto há neles de valoração e de valorização é o

primeiro passo para o domínio da imaginação. Pois, à proporção que descobrimos nossos interesses; isto

é, nossa disposição a preferir isto àquilo, aprendemos a julgar melhor. Com o decorrer do tempo, a

imaginação, que não precisa ser estancada, e que pode continuar em sua maravilhosa produção de

imagens, passa pelo cadinho da análise da razão. E esta, fria e objetivamente, verificará o que é ouro de

lei e o que não é. A pouco e pouco nos assenhoreamos desse método de análise, e em breve a nossa

imaginação, quando entra em sua atividade, não impedirá que saibamos, simultaneamente, o que é real e

o que não é.

Quando atingimos este ponto, teremos dado um grande passo. E depois dele, tudo será fácil

conquistar, porque já somos invencíveis, pois vencemos a nós mesmos, sem nos derrotarmos.

Já que entramos na tarefa mais difícil, como, também, uma das que melhores frutos nos pode

oferecer, que é o domínio da imaginação, impõe-se uma preparação prévia.

E o primeiro cuidado é ter um espírito repousado, descansado, sem mais as agitações que tantos

males nos causam.

No decorrer de um dia, passamos por muitas experiências. Nossos sentidos estão cansados de tantas

horas de vigília e de atividade sem fim.

Nossos olhos, despertos durante tantas horas, pedem repouso. E repouso pedem os nossos ouvidos, e

nosso tato e o nosso sabor.

Todo o nosso organismo precisa repousar e mesmo o nosso velho coração, infatigável trabalhador,

que cuida com tanto carinho da distribuição do sangue que vai alimentar nossos músculos, também quer

que não o perturbemos, mas o deixemos trabalhar descansadamente, isto é, com o ritmo que lhe é próprio.

E durante o decorrer desse dia, ficaram gravadas em nós inúmeras imagens do espetáculo do mundo,

palavras que ouvimos pronunciar, e que geram agora, dentro de nós, tantas réplicas ou nos provocam a

explosão de nossos sentimentos ou nos precipitam em novas atitudes. E se rememoramos o decorrer deste

dia, se durante alguns minutos dizermos como que um balanço de tudo quanto ocorreu, poderemos

aproveitar muito das lições que a nossa experiência cotidiana nos oferece.

Quantas vezes, no decorrer deste dia, prejulgamos os acontecimentos; quantas vezes esperamos que

algo sucedesse e não sucedeu ou, quantas outras, o inesperado surgiu sem que tivéssemos sequer

imaginado que tal pudesse suceder.

E quantas vezes procedemos com a lógica e em quantas outras fomos verdadeiramente irracionais,

deixando-nos arrastar pelas primeiras impressões, sem prestar a devida atenção aos acontecimentos?

Façamos um balanço do que nos aconteceu. Examinemos aquela ocasião em que fomos ríspidos

demais, e aquela outra em que, sem o querer, magoamos alguém que, na verdade, não merecia ter sofrido

tal vexame. Examinemos como se deram tais fatos, ponderemos sobre as circunstâncias, e logo veremos,

sem grande dificuldade, que poderíamos ter evitado aquele erro que nos magoa e aborrece agora.

E aprenderemos logo como evitar tais fatos.

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Passemos então os olhos sobre os diversos julgamentos. Como fomos injustos ali, e como fomos

ingênuos naquele outro caso. Como é possível que não tivéssemos visto que erramos naquele momento?

Ora, tais perguntas surgirão e muitas vezes acompanhadas de uma mágoa bem dolorosa.

E por que, durante o dia, que é tão curto no tempo, erramos tantas vezes?

Por que em tantas ocasiões trabalhou a nossa imaginação com tal ímpeto que desvalorizou

demasiadamente certos aspectos e de tal modo, que não nos foi possível aquilatar com equilíbrio o que se

passava?

Por não termos descansado bem o nosso mental.

Então, está no descanso do mental o caminho que nos levará a achar o equilíbrio desejado?

Responderemos que, em grande parte, sim. E essa parte é tão importante que não nos basta apenas

saber manejar bem a lógica, se estamos cansados e somos capazes de nos deixar arrastar pela imaginação,

cuja raiz está sempre na nossa afetividade; isto é, deixamo-nos arrastar pelas nossas paixões, que nos

levam às desvalorizações ou às valorizações extremadas.

Não dizem os psicólogos que o nosso mental nunca descansa? Não é verdade que ele sempre

trabalha?

Sim, é verdade. Mas é preciso ponderar o seguinte: quando o nosso corpo está cansado, procuramos

as posições que nos colocam à vontade para que descansemos os nossos músculos. No entanto, os nossos

pulmões e o nosso coração continuam na sua faina. Pois, também o nosso espírito continua o seu trabalho

sem descanso. Mas o que se dá durante as nossas horas de vigília? Dá-se que não deixamos nosso coração

trabalhar calmamente. Nós o excitamos, nós o apressamos, nós realizamos muitas coisas que o fazem, ora

andar mais depressa, ora mais devagar. Por isso, nas nossas horas de vigília, cansamos demais o coração,

como cansaria um chefe de oficina que obrigasse o operário, a toda hora, a mudar de ritmo de trabalho. O

coração não para, e quando para, deixamos de viver. Se nós o forçamos, ele cansa além do normal.

Assim como os exercícios que fazemos fortalecem o coração, também nossos exercícios mentais

fortalecem a nossa mente. É preciso dar descanso à nossa mente de vez em quando, para que se

recomponha. Por acaso, quem passa as noites mal dormidas pode pensar bem? Será capaz de ter o senso,

o equilíbrio para poder pensar?

Muitos podem passar bem as noites e ter a mente cansada. E por quê?

É muito simples a explicação: imaginemos que alguém tem de correr um quilômetro. Se for uma

atleta, já treinado, correrá normalmente, e mal se notará que está cansado. Se nunca fez atletismo, logo

sentirá cansaço, e finalmente estará completamente abatido.

Pois devemos ser atletas mentais. Um cérebro forte, treinado, é capaz de enfrentar melhor que

qualquer outro as solicitações da imaginação. Não que a queiramos aniquilar, mas desejamos, e apenas,

controlá-la a nosso favor. E quem irá controlar a imaginação, que é espontânea, que surge com todo o

irracionalismo natural de uma criança, com ímpetos e desejos infantis, se não o nosso mental? Uma

imaginação desbordada é uma imaginação que não foi bem conduzida para um recipiente, como os rios,

quando os leitos não são suficientes, transbordam as margens e inundam os campos.

Então, que fazer para dominar a nossa imaginação que consista, na verdade, em pô-la em serviço

útil, a nosso favor e para o nosso bem?

Em primeiro lugar, ter confiança em que é possível alcançar esse domínio.

Um desanimado nunca o alcançará, e terminará por tornar-se joguete da imaginação.

Em segundo lugar, é preciso fortalecer o mental, o que se obtém pelos exercícios que oferecemos

até aqui, e outros que iremos, a seguir, oferecer.

Em terceiro lugar, meditar logicamente. Ler trechos e verificar como os pensamentos estão

implícitos, contidos em outros; se há relação ou não entre um e outro. Ao lermos um trecho, vejamos se

há bom sentido, se há nexo entre as palavras do autor, ou se tudo está desalinhavado no que diz.

Em quarto lugar, não esquecer que há sempre uma luta entre a nossa vontade, orientada pelo nosso

eu consciente e os impulsos que vêm do inconsciente. No próprio mental, há forças que lutam pela

desordem e se rebelam. Esses choques podem dar-lhes algumas vitórias, estas, porém, serão passageiras, e

cada vez mais espaçadas.

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É preciso ter a maior atenção nos exercícios para permanecer sempre numa posição estável, evitando

qualquer movimento do corpo, pois há uma grande relação entre o corpo e o mental.

Quem domina o seu mental, domina-o até nas ruas mais movimentadas de uma cidade

metropolitana; quem não o domina, nem no silêncio de uma gruta é capaz de fazê-lo.

Segui os vossos pensamentos durante a meditação, sempre sobre temas positivos. Procurai retirar de

cada ideia tudo quanto esta ideia pode conter, e tudo quanto dela pode relacionar com outras. Meditai

sobre as novas ideias associadas. Fazei as comparações entre elas, procurai os aspectos contraditórios, o

que deixastes de considerar, e depois medi, calculai tudo, em suma, meditai e, finalmente, terminareis por

uma síntese do pensamento, completando-a com outra síntese das ideias provocadas por aquela.

Façamos exercícios práticos. Analisemos bem o que é a associação. Prestemos a atenção aos nexos

que ligam as ideias, e veremos que todas elas têm um nexo muito semelhante ao dos fatos que se dão na

natureza, ao qual chamamos de realidade. Ao nexo, que liga as ideias, chamamos idealidade. Pois

saibamos dominá-lo.

E com esses exercícios fortalecemos o mental, e de tal modo, que ele não se cansará facilmente. E

descansá-lo-emos através da respiração rítmica e do sono, sempre com o auxílio do nosso subconsciente,

que por ser o nosso melhor amigo, há de velar, toda vez que lhe apelamos, peno nosso, e sempre, pelo

nosso bem.

As associações se processam:

a) Por contiguidade;

b) Por semelhança;

c) Por contraste;

Um exemplo de associação por contiguidade: vemos uma pessoa sempre com um charuto aos lábios;

ao ver um charuto, recordamo-nos dessa pessoa.

Um exemplo de assimilação por semelhança: uma bebida verde, que bebemos, e da qual gostamos, e

toda vez que vemos um líquido verde, lembramo-nos da bebida.

Por contraste, temos os exemplos do branco que nos associa o negro, do bom que nos associa o mau,

etc.

Mas vimos também, que essas associações têm um nexo, pois não associamos tudo o que era

contíguo, semelhante, ou contrastante. Associamos alguns fatos e não outros. Há influência da nossa

afetividade, pois preferimos, inconscientemente até, associar isto e não aquilo. E nessas associações,

revelamos muito das nossas preferências, muito das nossas preocupações.

Tomando-se um conjunto de ideias chaves, podemos acrescentar-lhes as palavras que se nos

associam. Partamos de um exemplo: amor. Que se associa logo a esta palavra? Uma jovem bela, uma

praia coberta de sol, umas palmeiras decorando as margens, as ondas verdes quebrando-se nas rochas, etc.

As associações variarão segundo as pessoas.

Ao analisarmos, depois, as nossas associações, podemos fazer uma espécie de autoanálise, e penetrar

um pouco mais profundamente dentro de nós mesmos, e conhecermo-nos melhor.

Por meio dessas análises, poderemos saber muita coisa que estava oculta à nossa consciência sobre o

nosso próprio íntimo.

Ora, a nossa imaginação trabalha também por associações. Dá-se um fato, assistimo-lo; logo a nossa

imaginação associa uma sequência de imagens que o completam. Mas essas imagens não surgem sem

uma razão. Elas não vêm ao acaso como muitos julgam. Há um nexo entre elas, um nexo que é preciso

examinar.

Temos um momento de preocupação. Procuramos, primeiramente, o fato chave, isto é, o fato que

abriu a porta à imaginação.

Qual foi o acontecimento? Nem sempre é difícil perceber. Basta que examinemos da seguinte

maneira:

a) Vejamos qual foi o momento em que nos preocupamos. Um momento antes e tudo corria à mil

maravilhas. Mas sucedeu “aquilo”. Qual foi esse aquilo?

b) Examine-se o fato sucedido e coordene-se a sequência das ideias que surgiram e criaram o

estado afetivo de preocupação. Faça-se uma espécie de síntese de todas as ideias e imagens que

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surgiram. Se possível, tome-se uma folha de papel e escrevam-se imediatamente todas as ideias

sobrevindas, como também as imagens na ordem de sua sequência.

c) Temos agora às mãos as ideias e as imagens. Procuremos ver o nexo que há entre elas. Veremos

logo que todas se entrosam ou por contiguidade, ou por semelhança ou por contraste.

d) Procuremos, ao examinar a distancia entre duas ideias ou imagens, o interesse afetivo que

poderia ter surgido. É fácil fazer-se o exame.

Digamos que alguém falou em guerra, e subitamente uma sequência de ideias ou imagens se

associaram. Canhões, metralhadoras, bombardeios, aviões rasgando velozes o espaço, bombas destruindo

cidades indefesas, mortos, crianças chorando, feridos, mães desesperadas. Subitamente, a imagem do

bombardeio da cidade em que vivemos. Estamos na guerra, somos feridos; não, mortos, esmagados sob

escombros, etc.

A preocupação nos assaltou, estamos angustiados, em mal-estar, já não atendemos nada, a tristeza

cobre o nosso rosto, o coração empequenece, estamos acabrunhados.

Mas, ao examinar cada uma das imagens que se associaram, podemos ver entre elas um nexo que as

liga. Qual a razão por que, ao ouvirmos a palavra guerra, a ela se associaram canhões, metralhadoras, e

não bombardeios, que vieram em terceiro lugar? Foi tudo obra do acaso?

Por que não nos vieram logo à visão as cidades bombardeadas, as crianças feridas, etc.?

Digamos que o analista de si mesmo, o auto analista, seja um industrial. Está aí o nexo da primeira

associação. Primeiramente, viu, industrialmente, a guerra, porque vive com mais intensidade a realização

industrial. Só posteriormente sentiu o que seria associável comumente a um homem qualquer: as

destruições.

Assim como se pode fazer esta análise, podem-se fazer muitas outras, e tão ricas, que só a constante

experiência, o constante exercício desses exames podem nos mostrar.

Com o decorrer do tempo, acostuma-se a uma análise tão completa, que ela poderá invadir terrenos

novos.

O interessante de tudo isso é que, no mesmo instante, substitui-se uma preocupação de ordem afetiva

por uma preocupação de ordem intelectual.

Em vez de prosseguir angustiando-se na vivência de uma preocupação, passa-se a viver outro modo

de preocupar-se, que oferece um prazer, o prazer da análise, o prazer da pesquisa. E, em pouco tempo, o

estado de desagradabilidade que conhecera a princípio, é substituído por outro, cheio de agradabilidade, o

que oferece a análise intelectual, racional dos nexos e das razões.

Ora, para que nos momentos de máxima preocupação sejamos capazes de fazer tais análises e vencer

o estado afetivo, é necessário procedermos constantemente com exercícios, nos momentos em que

estamos perfeitamente calmos, para que o nosso espírito se habilite, quando nos estados de preocupação,

poder levar avante, sem dificuldade, a autoanálise tão necessária.

E esses exercícios, no princípio, são fáceis. E quando se complicarem, também serão fáceis, pois,

nessa ocasião, já estaremos bastante fortes para levá-los adiante.

O exercício, no início, consiste em se tomarem algumas palavras chaves e escrever imediatamente

todas as palavras que se associam. Depois desse trabalho, procura se descobrir o nexo que se encontra

entre elas. Não só as palavras devem ser anotadas como as imagens representadas, as visões intelectuais e

imaginativas que se formam. Escrever tudo com simplicidade e rapidamente.

Só depois se deve procurar o nexo. Na hora de escrever, devemos ter o máximo cuidado em deixar

as ideias e as imagens fluírem com a máxima naturalidade, sem influir, tanto quanto seja possível, com o

consciente para escolher estas ou aquelas.

A análise torna-se completa com o tempo, e permitirá o melhor domínio da imaginação, ou, pelo

menos, evitar que ela influa, de tal forma, na nossa vontade, que nos desvie dos caminhos que nos são

mais úteis e convenientes, levando-nos a falsas apreciações, valorizações desmedidas e erros, que são

sempre de funestas consequências.

Aqui, como em todas as coisas superiores, a pressa deve-se evitar, porque é a mãe da imperfeição. E

só se consegue um perfeito domínio do mental, quando não nos apressamos, quando não lutamos contra

ele, quando sabemos, com habilidade e doçura, conduzi-lo a nosso favor.

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RECOMENDAÇÕES IMPORTANTES

As páginas, que vamos apresentar a seguir, merecem de tua parte a maior atenção. Por outro lado,

não deverão ser lidas uma única vez. Relidas e meditadas, transformando-as em temas para as tuas

meditações, deves demorar-te na análise de todos os pensamentos possíveis que elas te permitam captar.

Ler, reler, e meditar!

Há muitos métodos oferecidos nas obras dos psicólogos em favor dos aflitos, dos angustiados, dos

frustrados, dos ressentidos, dos sofredores, dos inquietos, dos insatisfeitos, dos desatentos, dos inibidos,

dos fracos, dos desajustados, dos refratários, dos calados, dos solitários, dos penumbrosos, e até dos

abissais e dos terríveis. Um método favorece a uns, não favorece a outros. Outras vezes, o método,

benéfico hoje, é ineficiente amanhã.

Quem os usa, nos casos de refluxo, conclui pela total ineficiência do método, sem prestar a devida

atenção às circunstâncias, que o tornam ineficiente apenas naquele momento, pois, em outras ocasiões,

ele volta a ser benéfico.

§ 1 – Uma regra importante para todos os que desejam reintegrar-se, ou integrar-se plenamente, é a

de que devem considerar apenas as positividades, e delas rejubilar-se, e não as negatividades, que são

comuns.

Um exemplo nos auxilia a compreender bem o que pretendemos dizer.

Um agricultor, que semeou seus campos, vê nele, por entres os arbustos que surgem, vingam, os que

perecem ou pereceram. Acaso a tua colheita futura será constituída dos que não vingaram? Certamente,

não. A colheita será feita dos que vingaram e deram frutos ou sementes.

Pois o mesmo é conosco. Toda vez que adquirimos uma positividade (e sempre é uma pequena

vitória), ela constitui um efetivo. Podemos, amanhã, conhecer um refluxo e cair novamente no mal que

nos afeta, mas aquela positividade não está perdida, mas em estado de latência, guardada, esperando a

oportunidade para atualizar-se, efetiva-se outra vez.

No decorrer do tempo, as positividades em latência encontrarão, um dia, um número que as reunirá

numa nova estrutura forte, e subitamente se dá a integração dela num todo positivo, que é um conjunto

estruturado de positividades diversas.

As pequenas vitórias, que conquistamos cada dia, no nosso subconsciente, permanecem em latência,

as quais podem passar do estado de virtualidade para o de atualidade; isto é, se efetivarem num todo

poderoso, integrando a nossa tensão psíquica na sua mais alta coerência.

O importante é obter vitórias. É preciso crer nelas e confiar que elas fortalecerão outras.

Toda a vez, portanto, que aplicares qualquer método e obtiveres uma vitória, podes estar certo de que

adquiriste uma positividade que te ajudará a conquista da vitória final. Rejubila-te, portanto.

E toda a vez que te sentires em estado de refluxo, lembra-te das vitórias obtidas, e dize para ti

mesmo, que esse malogro provisório não poderá destruir o que já há de positivo em ti.

Todas as positividades ganhas são esquemas-sementes para a colheita futura.

Um exemplo ilustrará melhor as nossas palavras. Alguém que tenha estudado piano, tendo

abandonado, depois os estudos por muitos anos, se torna a estudar, encontrará muito maior facilidade do

que quando o fizera pela primeira vez. É que os esquemas adquiridos, durante os primeiros anos, eram

positividades em latência.

Quem, quando jovem, estudou, embora por alto, uma língua, e depois, quando adulto, resolve

estudá-la definitivamente, encontra uma facilidade muito maior do que quem nunca a estudara. Os

esquemas-sementes permanecem no subconsciente e facilitam, depois, as novas vitórias.

Pois cada vitória que obtenhas é um esquema-semente que, com positividade, estará no fundo de ti,

para assegurar novas positividades futuras.

E assim como um conjunto de pedaços de ferro, armados sob certa forma, constituem o arcabouço de

um prédio, de uma máquina, assim essas positividades, que permanecem no teu subconsciente, alcançam,

afinal, um número, uma forma, que dá nascimento a um todo, uma imagem integral, que formará a base

positiva de tua futura libertação.

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Confia, portanto, nas tuas vitórias, e prossegue em teus exercícios, sem desfalecimentos, com

bastante fé e confiança em ti.

§ 2 – Analisa quais os esquemas que se mostram em teus refluxos, se o de aflição, esquema da

injustiça, da traição, da perseguição, do abandono, da doença, da dificuldade financeira, da preocupação

do amanhã, do medo, da solidão, da angústia sem motivo aparente, da ingratidão, do perigo, da

incompreensão, da dúvida, etc.

Ao tomares conhecimento de quais esquemas se manifestam em teus momentos de refluxo, de

abatimento ou de ira, estás apto a analisá-los, segundo as normas que tivemos ocasião de oferecer nas

páginas deste livro.

§ 3 – Só gozarás o prazer de um copo d’água se não o beberes logo que se manifeste em ti a sede. O

teu prazer será maior se esperares um pouco. Não ter pressa na satisfação é antegozá-la, e aumentar a sua

intensidade.

Desta forma, evitarás que o tédio se aposse de ti. É uma forma de lutar contra o tédio: a de não dar

satisfação imediata aos desejos.

Mas daí não deves ir aos extremos, pois do contrário, a satisfação obtida acaba por magoar, pois

parece injusta a sua demora. Há um ponto de ouro que deves procurar em ti.

§ 4 – Quando te assalta um momento de refluxo, procura desdobrar-te e observar a ti próprio, e

deixa-o fluir. Deixa que ele venha, que ele aconteça plenamente. Não resistas, despeja-te completamente,

mas observa-te. Conseguirá essa duplicação de ti mesmo como espectador e ator de teu refluxo, a pouco e

pouco. Esse desdobramento te facilitará a purificação, a catharsis dos gregos, e te sentirás aliviado. Mas

te sentirás sobretudo forte, porque terás a consciência de que assistes a ti mesmo, e o teu eu espectador

passará cada vez a ser mais forte, mais coerente, e cada vez mais integral.

§ 5 – Toda a vez que a consciência plena do teu estado de refluxo se processar, sentirás um alívio.

Quando possas dizer a ti mesmo: “bem, o que sinto agora é um refluxo, que demora um pouco, depois

passa. Voltarei ao meu estado normal. Não tem importância, cada vez será mais fraco.” Deixa-o fluir. Se

imediatamente não te sentires aliviado, não importa. O alívio será finalmente alcançado, quando já tenhas

realizado, através dos exercícios aconselhados, a plena integração. Lembra-te sempre que uma cura

psíquica é demorada e apresente curvas ascensionais e descensionais. Há momentos de fluxos, por entre

os de refluxos. No início, estes podem ser até mais fortes e numerosos. O mal, em ti, luta pela sua

conservação, positividade que se opõe à tua positividade do bem; é ele, pois, uma opositividade. Ele

também luta por conservar-se. Mas o mal, por destrutivo, não é tão forte como o bem. Afinal, a vitória

deste é inevitável.

§ 6 – Toma de um papel e deixa fluir todas as palavras que te venham à mente. Escreve sem prestar-

lhes muita atenção. Depois de haveres escrito muitas linhas, analisa-as. Dessa tua análise sairão coisas

surpreendentes. Irás ver associações que jamais julgar-te-ias capaz de fazer. Nessa análise, já te estás

desdobrando num espectador analista e num objeto analisado. Esse exercício não só te dará alívio, como

te facilitará a integrar a tua capacidade analista e um melhor conhecimento de ti mesmo. Penetrarás,

assim, com a consciência e a calma necessárias, no âmago de ti mesmo. Se encontrares alguma coisa de

repugnante, não te aborreças. Lembra-te que somos também o animal ao lado do anjo. Há em nós

sordidezes que não nos devem espantar, pois somos seres humanos (síntese de animalidade e espírito).

Não precisarás sacrificar a segunda pela primeira. Hás de alcançar a harmonia entre ambas, necessária

para o equilíbrio de ti mesmo.

§ 7 – Se puseres tua atenção sobre a dor, ela aumentará de intensidade. Põe tua máxima atenção

sobre um instante de satisfação, e aumentarás a intensidade de tua alegria. Todo instante de alegria deves

vivê-lo como se fosse eterno, e nunca o consideres um momento que passa. Luta por ti, não contra ti.

§ 8 – Quando alguém, à tua volta, só fala no mal, nas sombras da vida, no “vale de lágrimas” da

existência, podes estar certo que ele precisa de amparo. O pessimismo é a atitude mais fácil que existe. Os

que julgam que precisam de sombras e sofrimentos para criar, só criarão sombras e sofrimentos. Eles

precisam de luz, e ajuda-os. A alegria, já o mostrava Nietzsche, é muito mais profunda que a tristeza. O

prazer é mais profundo que a dor. As eternas carpideiras na literatura costumam chamar a atenção dos

grandes que sofreram e criaram. Mas esquecemos grandes que criaram, vencendo e superando o

sofrimento. Todo artista que julga que precisa sofrer para ser grande, e busca o sofrimento, engana-se,

pois seria maior na alegria. A obra destrutiva de tantos autores não vale pelo destrutivo que tem, mas pelo

construtivo que perdura apesar dos sofrimentos.

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Se a vida é sofrimento, como dizem, por que aumentá-lo? Não é. Portanto, uma tarefa importante

torná-la mais bela e superior? Ademais, se prestares bem atenção, verás que os momentos de alegria e de

indiferença são mais numerosos que os de sofrimento. Analisa quanto o sofrimento é exagerado pelas

nossas atitudes.

§ 9 – Toda vez que aprecies alguma coisa, faze uma análise da tua apreciação. Observa se apenas

evidenciaste os aspectos positivos ou os opositivos, se atuaste como um otimista ou como um pessimista.

Observa se o estudado por ti, e por ti considerado como ruim, não faria alegria dos outros. Não te

esqueças que as coisas, em si mesmas, são o que elas são. Lembra-te que aquela montanha, uma mancha

cinzenta para ti, que estás neste lugar, é uma massa verde e bela para quem está mais próximo. Mas a

montanha é a mesma. Toma esta posição ante os fatos da vida e compreenderás, então, que as coisas são

muito do que lhe emprestamos, o que depende dos nossos julgamentos, porque as coisas, em si mesmas,

são o que elas são. Se te desdobrares nessa análise, estarás auxiliando a fortalecer a coesão do eu, que

passará a analisar a ti mesmo, e a tornar-se o teu melhor juiz, e amigo, e conselheiro.

§ 10 – Tudo o que faças, procura fazer do modo mais perfeito que possas. Principia a pôr em ordem

em tuas coisas; mas devagar, não te apresses. Cada dia põe ordem em alguma coisa. Não queira

transformar-te subitamente. Procura ser perito em algum mister, por mais simples que seja. Alcança uma

perfeição, por pequena que seja. Depois, conquistarás outras. Não tenhas pressa, se queres andar mais

rapidamente.

§ 11 – Busca o máximo de delicadeza. Não queiras impor aos outros as tuas ideias e evita aborrecê-

los. Trata os outros com deferência e respeito, e logo sentirás satisfação dentro de ti. Se alguém for

ríspido para contigo, compreende a grosseria. Que poderias esperar de um homem grosseiro? Vais imitá-

lo? Só poderás, com isso, tornar-se igual a quem consideras inferior.

Medita sobre este ponto. E quando em tua vida perderes a calma, não te preocupes. Continua

meditando, e sempre com firme propósito de não imitar o pior. Acabarás conquistando um certo domínio

de ti mesmo, imensamente útil para outras vitórias.

§ 12 – Procura desembaraçar-te. Se és tímido, fala com delicadeza e calma, com bastante

naturalidade quando estiveres ante outros. Sê apenas natural e simples. Não tentes impor-te. Apenas

expõe o que pensas, sem rebuscar argumentos complicados. Todos te ouvirão, se tiveres o bom-senso

comum. A pouco e pouco irás obtendo o desembaraço, e finalmente te imporás com argumentos mais

sólidos.

§ 13 – Ouve os outros. Todos gostam de ser ouvidos, e tu também. Ouve com atenção e respeito, e

nunca desanimes a ninguém. Obterás uma força que crescerá dentro de ti, todos os seres humanos

precisam de confidente. Sê um confidente fiel e amigo, e sobretudo compreensivo. Todos acabarão por

estimar-te, e te sentirás cada vez mais tranquilo.

§ 14 – Teus maus pensamentos e tuas meditações devem sempre dirigir-se a temas positivos. Pensa

sempre no teu bem e confia que o melhor te há de suceder. Se alguma coisa te acontece de mal, procura o

lado benéfico. O velho ditado popular de “que há males que vêm para o bem” é verdadeiro, e muito mais

do que se julga. Se confiares no bem, ele se aproximará de ti. Lembra-te que o abismo atrai o abismo; o

mal atrai o mal. Se tiveres em ti o bem, o bem será atraído. Confia no bem, que ele não te desamparará.

§ 15 – Tudo o que fizeres, faze-o com entusiasmo. O entusiasmo é uma virtude divina. Nas pequenas

coisas que tiveres de fazer, e que te parecem desagradáveis, dá-lhes a agradabilidade. Tu podes decorar a

tua vida de alegrias se o quiseres. Põe amor no que faças, e logo a agradabilidade surgirá, e tudo irá

rápido e fácil. Faze pequenas experiências, e logo verás que o conselho que te dou é verdadeiro.

§ 16 – Que a tua oração diária seja esta: “Hoje farei um bem a um ser humano”, faze-o. À noite,

rememora o que de bem fizeste e alegra-te, para aumentar a tua e a alegria do mundo.

§ 17 – A maior luta que o homem terá de empreender é a luta contra o medo. Nunca cresceu ele

tanto, avassalou tanto os seres humanos. Temer o mal é preparar-se para ele. Não tenhas medo do

amanhã; confia em ti.

Examina cada um dos teus medos e procura os seus fundamentos. Verás que são quase sempre

inexistentes, ou melhor, sem nenhum conteúdo real, mas apenas imaginários. Não temas adoecer, nem

temas malograr. Faze o que deves fazer, com confiança.

§ 18 – Cristo dizia que as nossas doenças não entram pela boca. Elas vêm do que sai pela boca.

Queria ele referir-se às nossas ideias. Se não temos fé em nosso poder, não temos poder. Se não temos fé

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em nossa força, somos fracos. Nossas ideias germinam nossas doenças e também a nossa saúde. Somos

muito do que pensamos que somos. Este é um grande tema para meditações.

§ 19 – Medita sobre a dignidade humana. Olha o espetáculo do mundo, e vê como o homem perde

em valor onde há ditaduras, onde há opressão, onde há a brutalidade travestida de lei e de ideias

progressistas. Vê quanto o homem vale pouco e os grandes muito crescem de valor. E verás que os que se

intitulam os mais realistas são os que glorificam e adoram as maiores abstrações. Medita sobre a

dignidade do homem. Observa-o como ele se transforma em utensílio, em coisa, em número. Medita

longamente sobre este tema, e afirma dentro de ti o desejo e o querer construir a tua personalidade.

§ 20 – Toda meditação bem ordenada, todo raciocínio bem concatenado, é um grande exercício para

a vontade e para a maior coerência do eu. Nunca deixes de fazer diariamente as tuas meditações, e dá-lhes

melhor ordem lógica e dialética.

§ 21- Se o teu dia foi agitado e tiveste de andar muito apressadamente, aproveita a oportunidade para

dar uns passos bem lentos, numa lenta e tranquila caminhada. Depois, descansa, entrega-te à leitura de um

livro sereno, e cheio de luz. Evita a leitura de obras mórbidas, pessimistas, porque elas apenas veem um

lado da existência e desvalorizam tudo quanto é grande.

§ 22 – Se sofres, não esqueças que todos sofrem. Mas, há também alegrias na vida. E não há dor que

a não possamos vencer. Se ela é moral, e magoa-nos tanto quanto lembrada, examina-a bem. Vê as causas

que a geraram, as circunstâncias que a acompanharam, e procura como vencê-la por ti.

Se te cabe a culpa, procura compensá-la por atos bons correspondentes.

§ 23 – Sê orgulhoso da tua dignidade. Ter maus pensamentos, pensamentos destrutivos, é muito

fácil. Constrói grandes e nobres pensamentos. Aumentarás a tua dignidade, o teu valor.

§ 24 – A alegria dos outros não é um furto à nossa alegria. A alegria é como o fogo que pode

propagar-se desde uma pequenina chama. Compreenderás, assim, que quando os outros são felizes, não o

são à custa da tua felicidade. Ri com eles, e agradece o bem que permite a alegria daquele par de

namorados, daquela criança que brinca.

§ 25 – Todos nós somos insatisfeitos, uns mais, outros menos. É uma condição de todo ser limitado.

Sempre algo nos falta. Mas, quando tens, porque vais pensar na falta? Se estás aqui e sente a falta de não

estar ali, não consegues a alegria que te dá o momento que passa.

§ 26 – A construção do esquema fundamental do eu, solidamente estruturado, só pode ser constituído

de positividades e não de negatividades. O negativo não compõe a essência de qualquer coisa, como se vê

na filosofia. Um copo, não é um copo qualquer por que não tem isto ou aquilo, mas por que é isto e

aquilo.

O nosso eu só pode constituir-se num esquema coerente, numa estrutura sólida, se atualizar em si

positividades, para com elas, embora no início dispersas, realizar a reunião que formará a nova estrutura

poderosa do nosso eu.

Assim, pensar negativamente é preparar-se contra si mesmo. Se alguma coisa é pensada

negativamente, é necessário, de imediato, com lógica e precisão, compensá-la com pensamentos

positivos, logicamente dispostos.

Digamos que ouvimos falar de tal ou qual doença, e encontramos ou julgamos encontrar em nós

algum sintoma. Se abrigarmos a ideia negativa, estaremos predispondo-nos à doença. Mas,

imediatamente, com lógica, com domínio, analisa-se a ideia que surgiu. Um sintoma qualquer não é

fundamento bastante. Ademais, é preciso que um especialista verifique. É preciso não temer. Aceitar a

possibilidade de uma doença é já preparar-se para ela. Convém resistir com segurança e positividade.

Ademais, o médico é competente para resolver o caso. Por que vou abrigar em mim a ideia, que é

negativa, pois a doença é sempre negativa, quando sei que tais ideias cooperam para destruir e não

construir, pois nada se faz com negatividade?

Assim como esse exemplo, poderíamos dar muitos outros, pois a vida de cada um está cheia de

exemplos. Não aceitar a ideia negativa não é pôr-se em discussão com ela. Não se deve aceitar

simplesmente por estas razões:

1) Porque é sem fundamento real;

2) Porque é desprezível;

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3) Porque é apenas produto das forças adversas e não vem do nosso próprio bem, que não pode

querer negatividades;

4) É proveniente do nosso componente masoquista, essa tendência que temos, negativa sem

dúvida, de sofrer e de até sentir prazer no sofrimento. Essa tendência não tem sua origem no

nosso bem, mas no que nos é adverso, portanto é desprezível.

A análise da ideia negativa e seu consequente repúdio não deve provocar uma espécie de discussão

entre o que luta pela nossa positividade e o que luta, em nós, contra nós, pela nossa negatividade.

O adversário torna-se forte à proporção que lhe damos atenção e valor. Aqui, lutar contra o que surge

de negativo em nossa mente, através de razões colocadas de parte a parte, é fortalecer o adversário. O que

é negativo, e sem fundamento, é simplesmente repudiado, por uma argumentação simples, positiva. Não

se deve proceder como os mórbidos, que se entregam ao seu sistema, à sua negatividade, para explorá-la

com furor, em plena exibição e excitação de seu componente masoquista, no intuito de provocar nos

outros repetições do seu estado doentio. Se outros mórbidos, posteriormente, vão dar valor a essa obra,

como superior, é porque ela corresponde à morbidez que os anima. Grande é o sofrimento de um Mozart

que o guarda com dignidade e, em sua música, salvo em raríssimos instantes, não expressa a sua dor. E

não deixou de ser Mozart, construtivo, fecundo e criador.

Todos os autores destrutivos são infecundos. Em poucos livros estão esgotados. Assim há pintores

que, com meia dúzia de obras, não têm mais nada a dizer, e músicos que além de uma dezena de

composições, na maioria medíocres, não têm mais nada que expressar.

Não se pense que o valor que muitos expressam está em suas negatividades, pois o negativo é

destrutivo. Eles são grandes pelas positividades, apesar das negatividades que expressam. É um erro

pensar que os grandes valores na arte se impuseram pelo negativo. O negativo neles é um ponto de

refluxo e não de fluxo.

Ninguém realiza nada com negatividade. Quem quer realizar-se, integrar-se, precisa reunir

positividades.

Vejamos como se deve proceder para alcançar essa grande meta.

A colheita do agricultor, já vimos, não será feita com as plantas que pereceram, que secaram, que se

estiolaram. A colheita será feita com as plantas que positivamente vingaram.

Pois a tua colheita só poderá ser feita de positividades.

Tua atitude mental, portanto, só pode ser favorável às positividades.

Queres ter coragem? Procede como se tivesses coragem. Dá positividades aos teus gestos, às tuas

atitudes.

Queres ser forte? Procede como se fosses forte. Dá positividade à tua força.

Infla teu peito, ergue o teu busto, retesa teus músculos. Realiza o positivo da força, e confiança em ti.

Queres ser ponderado? Toma a posição como se fosses ponderado, lógico. Realiza a positividade do

ponderado.

Queres ter atenção? Coloca-te na posição como se tivesses plena atenção.

Mas tudo isso é ficcional, exclamarão alguns. É ficcional, não há dúvida, mas em termos. Há, na

atitude, uma realidade enquanto tal, não há no conteúdo. A atitude do que tem plena atenção é

imobilidade, toda voltada para o objeto, olhos fixos, nem um músculo se move. Mas falta o conteúdo

anímico da atenção. É só corpo. Enquanto o corpo é real, é a real posição da atenção. Já temos uma

positividade. Falta a outra, que completa o esquema concreto da atenção: a interior. Mas já andamos meio

caminho. E é fácil compreender a razão. Se a interior se concreciona com a atitude para realizar o

esquema práxico, isto é, o esquema concreto da atenção, há uma grande afinidade entre o conteúdo, o

interno, com o externo. A positivação do externo, por afinidade, provoca uma atualização, uma

eficientização do interno. A repetição é importante.

O que queres ser, procede como se o fosses. Esse como se (o als ob dos ficcionalistas alemães) se

torna para nós positivo a pouco e pouco, porque já traz alguma positividade. Por isso Nietzsche, quando

dizia que quem pratica atos de bondade, acaba pelo menos benevolente, compreendia, como grande

psicólogo que era, a verdade que hoje pode servir a nós todos para amplos benefícios.

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A constante realização dessas positividades termina por constituir um lastro dentro de nós, lastro

positivo. São como inúmeras peças de uma máquina, que são dispostas umas aqui, outras ali. Mas a

máquina, funcionalmente, ainda não está estruturada; é preciso que o mecânico as coloque umas juntas às

outras, nos respectivos lugares técnicos, para que ela surja em sua integridade.

Assim somos nós. Se conquistamos positividades, não nos preocupemos, de início, se elas não se

estruturam funcionalmente. O que importa é conseguir positividades e estabelecer um programa:

nem um dia sem positividades.

Amontoemo-las, todas, aqui ou ali, em nós. Mais realizemo-las.

E assim, como um conjunto de elementos químicos, subitamente, por um simples balanço, precipita-

se numa combinação sólida, um dia subitamente, essas positividades se coordenam, estruturam-se na

formação de um sólido e coerente esquema, o nosso novo eu.

Lembra-te do exemplo da gota d’água que derrama o copo cheio.

E quando surge essa gota d’água? Mas que vale essa gota sem que o copo esteja cheio? Para que

aquela gota realize a sua função de extravazar é preciso que o que enche o copo já tenha atingido os

limites deste.

Pois tu precisas atingir os limites do número das positividades, para que uma simples positividade

qualquer realize a transmutação, a transfiguração de ti mesmo, e construa, num instante, a nova tensão de

teu eu, que será a tua plena integração.

Quando muitos psicólogos nos contam a história de pessoas angustiadas, aflitas, preocupadas, cheias

de problemas e inquietações, que subitamente ao ouvir uma frase ou ao ler um simples anúncio, ou ao

tomar uma atitude, sentem que tudo se renova dentro delas, são pessoas que procuravam positividades e

as realizavam. Quando atingiram o número repentinamente, uma simples positividade realiza a

estruturação da tensão, e ei-las novas, outras, libertas de tudo quanto as preocupava.

Aquele que ao ouvir alguém dizer para outra pessoa: “só quem tem confiança em si é capaz de

vitórias”, de súbito se sentiu capaz de vencer tudo quanto o oprimia; aquele que, ao entrar num templo, e

ao ouvir, num sermão, estas palavras: “quem domina seus pensamentos é mais poderoso que quem toma

de assalto uma fortaleza”. E sentiu-se renovar, ser outro; aquele que ao ver o sinal vermelho, que indicava

parar, e o amarelo, que lhe indicava atenção, e o verde, que lhe indicava trânsito livre, e pensou no

maquinista que atravessa milhares de quilômetros, confiante apenas nos sinais, sem maiores

preocupações. E sentiu-se senhor de si, novo, integrado – todos esses homens já haviam realizado

positividades e, subitamente, uma, uma simples, completou-lhes o número do esquema tensional,

estruturo-lhes a nova tensão do eu.

Portanto, o caminho é conquistar positividades.

E como fazer?

Cada dia, cada momento teu, procura realizar uma positividade, tomar uma atitude positiva. Não te

deixas impressionar pelas carpideiras milenárias, nem pelos propagandistas da miséria e do sofrimento

humano. Afasta-te dos que propagam o mal.

O verdadeiro gênio não é sombra. O verdadeiro gênio é luz; é luz meridiana, é sol, é alegria.

Portanto, mãos à obra; realiza positividades, e cada uma realizada, rejubila-te com ela. Fizeste hoje

uma pequenina coisa bem feita, rejubila-te. Conseguiste fazer o que não contavas rejubila-te. Ao tomares

um copo d’água, que te mata a sede e te dá prazer, rejubila-te. Rejubila-te e agradece. E vê no mundo o

que há de bem e de bom. Procura-o em cada momento de tua vida, em cada um dos teus atos.

Conquista positividades. Lembra-te do agricultor que só poderá colher os frutos maduros e positivos.

Tua colheita só poderá ser feita de maduras positividades.

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A LIBERDADE

A INTEGRAÇÃO DO EU

Seguimos juntos até aqui. Longa foi a viagem, e o caminho entrecortado de esperanças e algumas

dificuldades e estas não se abateram.

Estás convencido de que podes, por ti mesmo, alcançar dias melhores. E se cada dia disseres ao teu

subconsciente: “Eu sou o meu melhor amigo, e confio em mim mesmo”, podes estar certo de que

prepararás o verdadeiro caminho que nos leva à plena integração.

E esse velho caminho, tão esquecido dos homens de hoje, foi o que preconizaram as antigas religiões

a todos os que buscavam forças para enfrentar as grandes dificuldades, os problemas, os obstáculos de

que está cheia a vida humana.

Mas como poderás tu, agora, penetrar por uma senda se não alcançaste ainda as positividades que

predicamos em todo este curso?

Que pedimos de ti, senão positividade? Não foi outro o nosso intuito, senão o de que a tua colheita

fosse a mais feliz, e grandes os resultados.

Não podíamos, de forma alguma, tratar do que vamos fazer agora, nos capítulos anteriores. Era

necessário primeiramente que tu tivesses realizado com bastante segurança, com bastante assiduidade, e

fé, os exercícios aconselhados.

Se tudo isto fizeste, se não recuaste um só momento, se foste fiel e amigo de ti mesmo, procurando

com afinco e boa vontade, com confiança e fé, a realização de tudo quanto dissemos, podes agora

penetrar neste último caminho que te levará à plenitude de ti mesmo.

Tratá-lo-emos por partes, cuidadosamente, pois é preciso que te convenças do que iremos expor, e

possas, então, sentir a grande experiência da liberdade, que é a tua completa plenitude, a vitória que tanto

desejaste, e que mereces alcançar.

Relê as recomendações que no último capítulo te oferecemos. Medita sobre as positividades que são

ali expostas e oferecidas; mas faze-o constantemente, com júbilo e confiança.

O MEDO

Quantas vezes ele te assaltou, e te enleiou em tuas redes. Sentiste um estremecimento, um minguar

do teu coração, um frio que te percorria o corpo. Mas também sentiste medos que surgiam quando te

preocupavas com a possibilidade de acontecimentos futuros que temias.

Mas se te lembrares bem, se rememorares esses momentos tão desagradáveis, deves ter notado que

eles se processaram de duas maneiras extremas, incluindo, no entanto, diversos graus intermediários:

a) Eras totalmente dominado pelo medo que crescia até tornar-se num verdadeiro pavor;

b) Ou então, quando subitamente te punhas a observar a ti mesmo, sentias que ele se desvanecia

aos poucos.

Como toda a tua atenção estava voltada para o medo, desejavas apenas que ele desaparecesse, e não

percebeste bem o processo do seu desaparecimento. E nem podias fazê-lo. Ele te assaltava totalmente.

Mas se rememorares bem, e se agora te puseres como espectador desses momentos (e não são

poucos, bem o sabes), logo verás que à proporção que for maior a tua capacidade de examiná-los como

um espectador, o medo diminui de intensidade e desaparece.

Ora, o teu medo se apresenta de maneiras variadas, mascara-se de muitas formas e alguma até se

apresentam sem que sintas estremecer ou minguar o coração, nem um frio percorrer-te o corpo. É uma

antecedência que se processa.

Pretendes fazer algo, mas o teu medo se mascara de racionalidade, e oferece argumentos

aparentemente sólidos para que não faças isto ou aquilo. Na verdade, o teu medo procura enganar-te,

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mostrando-te apenas uma precaução, uma prudência, ou aconselhando-te uma atitude que te ponha a

coberto do que temes.

Não há dúvida que o medo é também positivo e constrói obras grandiosas. Mas é preciso evitá-lo,

quando se torna negativo e, portanto, destrutivo.

Bem sabes que ele levou os homens a realizarem grandes obras, proverem-se de bens para o futuro,

construírem ciências, defenderem-se de perigos possíveis, acautelarem-se do imprevisto desagradável no

amanhã. Tudo isso é positivo.

Mas o medo, quando predispõe situações contra o teu bem, é destrutivo e não deves aceitá-lo. É

fácil saber quando o é.

Examina cada um dos teus atos, verifica cada uma de tuas atitudes, e examina, nelas, quanto há de

medo, quanto influi ele, positiva ou negativamente.

Se tal fizeres, logo ressaltarão, aos teus olhos, inúmeras possibilidades novas, perspectivas

incalculáveis e acharás, por ti mesmo, novos caminhos interiores para o teu bem.

O CAMINHO DA LIBERDADE

Todo o homem é um infinito ainda irrealizado. Que somos nós senão um ser finito, limitado? Onde

está, então, a nossa infinitude?

Observa as coisas: uma pedra é uma pedra, e nada mais. Mas o homem pode modelá-la, e eis um

marco num caminho, uma estátua que simboliza a beleza.

Uma planta é uma planta, mas eis que o homem a torna um ornamento. Utiliza-a, e faz dela um

alimento para o seu corpo.

As coisas são apenas o que são. Elas realizam apenas as suas perfeições e nada mais. Um cão é

apenas um cão, e não conhece progressos, porque não conhece os caminhos que levam à realização das

perfeições. Mas o homem avança no seu caminho, ascende a novas situações, cria perfeições, reunindo as

coisas.

Uma pedra que está na montanha é algo do mundo da natureza. Mas essa pedra, tornada em

paralelepípedo, pela ação do homem, é transformada num ser do mundo da cultura.

Há dois mundos, portanto:

a) Mundo na natureza;

b) Mundo da cultura.

Neste último, é onde o homem cria, onde o homem modela as coisas com a marca do seu espírito; é

o mundo da criação.

O homem é um ser da natureza, mas que constrói uma cultura. E por que pode o homem construir

uma cultura, o que não a fazem os animais?

Ora, quem faz alguma coisa é porque podia fazê-lo. E a prova de que podia é que o fez. E se fez,

tinha, portanto, um poder para fazê-lo; tinha em si algo efetivo, que lhe permitia realizar o que outros

seres não o podem.

O homem, portanto, é diferente dos outros seres, pois tem um poder que os outros seres não têm.

E de onde vem esse poder? Vem dos seres que existem no mundo da natura? Mas eles não o

revelam? Nenhuma pedra construiu uma cultura, nem um animal, nem uma planta.

Mas o homem não é uma planta, nem uma pedra, nem um animal. Há no homem animalidade, como

há o vegetativo e o mineral. Mas o homem tem algo mais que os outros seres não têm.

E esse “algo mais” os outros seres não o têm enquanto são o que são. Portanto, o homem é deles

diferentes, e profundamente diferente.

Mas seu corpo é carne, sua carne é matéria orgânica, e nessa matéria estão os minerais. Não há

dúvida. É tudo isso; mas há nele o que não há nos outros seres: espírito criador.

E que é esse espírito criador?

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Naturalmente, não nos caberia num curso como este, em que apenas temos a intenção de cooperar

com o bem dos outros, que nos detivéssemos a examinar um tema de Filosofia que muito bem cabe nos

livros que se dedicam a esta tão importante disciplina. Nem, tampouco, tema de tal importância poderia

ser examinado, sem que o pensamento esteja perfeitamente disciplinado nos caminhos belos, mas árduos,

da Filosofia, e por isso não cabe examiná-lo apressadamente.

Mas, do que não há dúvida, é que, na essência do homem, há o que não há nos outros seres. E

chamavam os antigos filósofos a essa essência de rationalitas, que deve ter um sentido bem claro: é o

espírito humano em toda a sua atividade.

O ser humano, portanto, atualiza esse poder na sua capacidade ilimitada de realizar perfeições. Se

não as realiza todas de uma vez, tem, porém, a possibilidade de realizá-las umas após outras, e a história

humana nos mostra que o homem é o grande realizador de perfeições.

Que se entende por perfeição. Por perfeição se entende a realização de uma possibilidade. Essa

realização pode ser ainda melhor, e atualizando esse melhor, é mais uma perfeição que se atualiza, que se

realiza.

O homem é, portanto, um realizador de perfeições.

E há um limite para ele? Há, e não há.

Exemplifiquemos: se distinguimos bem, poderemos dizer que o homem não é capaz de realizar a

máxima e absoluta perfeição, aquela atualização de todas as possibilidades, porque, imerso no tempo, e

dele dependendo, tem de realizar, uma após a outra, as possibilidades. E também não alcança a totalidade

da perfeição; não se pode negar, porém, que ele pode avançar cada vez mais, realizando perfeições sobre

perfeições.

Essa marcha ilimitada cabe ao homem. E criador, como é, alcança a pontos cada vez mais elevados,

e que lhe podem assegurar uma marcha progressiva que todos devem compreender e desejar seguir.

Portanto, o verdadeiro e grande ideal humano só pode ser o da sua perfeição constante, o de sua

marcha ascensional para superar-se.

Consequentemente: o ideal humano verdadeiro só pode ser o da superação do homem por si mesmo.

O homem deve superar-se constantemente para alcançar, cada vez mais, uma super-humanidade, que será,

por sua vez, superada.

Eis um ideal para os que não têm um ideal, propunha Nietzsche. E o verdadeiro sentido do super-

homem, é este, e não o daquelas, em que se desenham o super-homem como apenas um monstro de

brutalidade ou de força, como o fizeram alguns dos maus discípulos e todos os adversários.

Mas, há no homem o mesmo ser que está nas coisas, dizem. E há, não resta dúvida, mas é mister não

confundir. O homem, enquanto homem, não é o que as coisas são enquanto tais.

Na forma de uma pedra, há a pedra; na forma do homem, há algo mais: o espírito.

Portanto, o espírito, que é ser também, realiza-se no homem, e não nas coisas. E aqui está a

dignidade, o valor do homem: ele tem e realiza o que não têm e não realizam as coisas do mundo físico.

O homem diferencia-se das coisas por ser criador; as coisas do mundo físico apenas são seres da

natureza.

O homem é natureza e é espírito.

O bem nem todos sabem colher. Uns porque ignoram como encontrá-lo; outros, porque o temem.

Esse fruto é a liberdade.

E embora pareça incrível, há muitos que temem a liberdade. E pode-se dizer até que o mais doloroso

espetáculo que se assiste hoje no mundo é o medo que provoca, medo que gera temor das

responsabilidades.

Leiamos essas páginas.

“Deus quando nos deu a vida, deu-nos a liberdade ao mesmo tempo”, dizia Jefferson.

Que é a liberdade?

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Grande e profundo problema de Filosofia, tema principal e capital de muitas das maiores

controvérsias da humanidade, as mais belas páginas para louvá-las já foram escritas pelos filósofos, pelos

poetas, pelos escritores de todos os tempos. Mas, muitas das páginas mais duras e mais terrivelmente

destrutivas foram escritas para negá-la.

Há livre-arbítrio ou determinismo? Praticamos nossos atos por uma escolha, ou não? Somos apenas

dirigidos pelos nossos impulsos interiores aos quais não podemos dirigir nem orientar?

Não vamos aqui relatar, nem de leve, essa imensa polêmica que levou séculos, e ainda hoje empolga

o espírito de muitos.

O homem é um animal racional: verdade que todos aceitam.

E ser racional é ser capaz de escolher, capaz de preferir, de pesar, de comparar esta ou aquela

solução, de captar as possibilidades das possibilidades.

O homem pode prever as consequências de seus atos. Pode imaginar que se proceder assim, poderá

suceder isto ou aquilo.

Tal ato poderá levar a tais ou quais consequências. E porque pode julgar, pode comparar, pode

medir, pode escolher. Se o homem fosse apenas uma máquina, apenas um autômato, que realiza os atos

pela determinação de uma força, não teria noção do futuro.

O ter noção do futuro demonstra independência, capacidade de escolher no suceder que sobrevém.

É por isso que o homem é um ser autônomo e conhece a liberdade.

Não podemos negá-lo, porque ela se verifica em cada um de nós.

Temos um impulso para a prática de um ato determinado.

Queremos refletir sobre as consequências, e a nossa imaginação põe-se a trabalhar, revelando-nos

uma série de acontecimentos possíveis, que vamos analisando racionalmente. Afinal, contrariando nosso

impulso, vencendo nosso desejo, resolvemos não fazer o que desejávamos.

Negar esse fato prático que verificamos em nossa vida, seria negar praticamente também todo o

poder da educação. E ninguém pode negar a ação desta no proceder do homem. Até os animais, que

julgamos autômatos, podemos domesticá-los, modificar seus hábitos, transformar seus gostos, dar-lhes o

poder de dominar impulsos e de não realizar o que desejam.

Estamos numa das épocas mais terríveis da história do homem. Apesar de toda a nossa grandeza, de

todo o progresso material que conquistamos, apesar de todo o desenvolvimento de nossa ciência, de nossa

técnica, estamos, no entanto, num desses momentos cruciantes da vida humana, em que muitos homens

estão dispostos a perder a sua liberdade.

Não são poucos, mas milhões e milhões de seres humanos que estão dispostos a vender a sua

liberdade por um prato de lentilhas.

Os problemas de ordem puramente material, a exigência de satisfazer as necessidades imediatas,

levam milhões de homens a se disporem a sacrificar a sua liberdade, para encher seus estômagos e vestir a

sua nudez, como se o caminho dela fosse compatível ao da solução dos problemas materiais.

Não são poucos os que acreditam que só podemos solucionar nossos magnos problemas econômicos

à custa da nossa liberdade ou, então, nos contam a impiedosa mentira de que ela consiste apenas em ter o

estômago cheio e o corpo coberto.

Não; liberdade é muito mais. E é através da conquista da própria liberdade que podemos garantir

melhor tudo isso. O caminho da liberdade é o da prática da própria liberdade. É com a prática da

liberdade que formamos homens livres.

Como poderás vencer se estás já disposto a ceder a tua liberdade por um prato de lentilhas? Os que

não amam a liberdade nunca podem ser vitoriosos. E lembra-te: o caminho da vitória é o caminho da

liberdade, e o seu caminho é o da prática da própria liberdade.

Pratica a liberdade, e respeita a dos outros, que respeitarão a tua. Onde houver escravos, liberta-os.

Onde houver opressão, rebela-te.

Luta pela liberdade de todos, e lutarás pela tua própria. Não podes ser livre onde há homens

escravos.

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“Dai-me a liberdade ou dai-me a morte!”

Que estas palavras de Patrick Henry sejam o teu lema na vida.

A DIGNIDADE

Podes perder até a tua última esperança, mas nunca deves perder a tua dignidade.

Assistimos, no mundo de hoje, a um dos mais dramáticos instantes da vida humana. Apesar de todo

o nosso progresso material, apesar de toda a nossa civilização, do grande desenvolvimento de nosso

saber, de nossa indústria, da técnica, o homem, esse ser para quem tudo isso é feito, e que tudo isso faz,

vale tanto ou menos do que valia um cafre na época da escravatura, do que valia um escravo na época

romana.

O homem aumentou o seu poder de dominar o mundo, mas diminui em seu valor, em sua dignidade.

O homem não vale nada para o homem; a vida humana é de pouca valia. Põe-se em jogo a vida de

milhões, como sempre se fez. Há falsificadores hoje mais do que nunca; há exploradores da miséria

humana mais do que nunca; e a vida de um ser humano vale menos em média que a de um animal, um

boi, um cavalo e até de um cão.

Apesar das grandes obras realizadas, do desenvolvimento da higiene, da construção de grandes

hospitais, apesar, em suma, de todo o esforço da ciência, o homem continua não valendo nada.

Leem-se as notícias de dezenas de pessoas que morreram num desastre com uma insensibilidade que

espanta. Muitos passam os olhos pelas páginas de jornais que descrevem os grandes acidentes em que se

perdem vidas humanas, com enfado até. Não é isso sintomático? Será que tudo isso deve suceder só

porque sucede. Será que deve ser assim porque sucede assim?

Medita sobre essa máquina imensa que consome vidas, que é a civilização. Observa essa pavorosa

desvalorização do homem, a que hoje assistimos. Ninguém irá dizer que devamos chorar todas as

lágrimas.

A compaixão está desterrada de entre os homens. Mas, se a compaixão está desterrada é porque algo

possui ela que não se coaduna mais com a nossa vida.

Se a compaixão não pode mais resolver esse gravíssimo problema, que é a desvalorização do

homem, muito menos o resolverá a nossa indiferença.

E além disso, precisamos dizer de uma vez: não serás um vitorioso no sentido pleno da palavra, se

não compreenderes que vales alguma coisa, que és uma vida que tem valor.

O homem tem uma dignidade que deve ser apreciada, que é o seu bem maior, o verdadeiro bem.

Repetimos: é a dignidade o maior bem que o homem possui. A dignidade é o valor, e esse valor deve

ser alimentado por ti, continuamente.

Deves valorar-te e valorizar-te, não artificialmente, mas real e humanamente, seguindo as normas

mais justas. Se a intensidade da vida de hoje faz passar despercebido esse valor, todos devemos lutar por

revigorá-lo, por torná-lo maior.

Respeita a dignidade de teu semelhante para que também sejas respeitado. Não julgues que o homem

mais forte em personalidade é o que se afasta dos outros, o que despreza os outros.

À humanidade de hoje falta a realização de uma grande obra. Assim como ela alcançou um grau tão

elevado na ciência, na técnica, ela deve elevar o homem em dignidade.

Quando sentires isso em ti, te elevarás a ti mesmo em dignidade.

A tua dignidade consiste também na dignidade de teu semelhante. Respeita-a, valoriza-a, e te

sentirás, desde esse instante, mais poderoso e mais forte.

Um homem de dignidade conhece vitórias, e para ele uma derrota é mais facilmente superável do

que a daquele que não sente nem em si mesmo, nem nos outros, o verdadeiro valor que têm.

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A LIBERDADE EM TI

Pratica a liberdade e alcançarás a tua liberdade.

E se em cada momento te puseres como um espectador de ti mesmo, um juiz austero de teus atos, se

te colocares, em suma, ao te observares, ao examinar-te, com absoluta separação de tuas paixões,

conquistarás subitamente um estado tão elevado, que te dará um prazer que é superior a todos os prazeres

que conheceste.

Estás preocupado? Separa-te. Examina a ti mesmo em face de tua preocupação.

Desdobra-te num Eu superior, que examina friamente o teu próprio eu, e serás o observador do que

fazes.

Verás que ao mesmo tempo desaparecerá totalmente a tua preocupação.

Verás que ao atingires este ponto, conquistarás a liberdade.

Estás com medo?

Examina-te: “eu estou com medo. Tremo interiormente. Deixa-me observar como se processa o

medo em mim”. E eis que ele subitamente desaparece.

“Estou angustiado. Não sei por quê. Vou examinar a minha angústia. Quero ver como ela se

processa”.

E subitamente verás que a angústia e a amargura te abandonam.

E por quê?

Porque não lutas contra elas. Não precisas. A luta ainda seria servidão. E tu, nesses instantes

supremos, és liberdade.

O homem pode ser espectador de si mesmo, espectador de sua limitação, espectador de suas

fraquezas.

E quando atinge esse estado supremo, sente-se livre.

Vejo meu corpo sofrer, observo-o, e o meu sofrimento subitamente diminui.

Vejo minha alma abismar-se em tristeza, examino-a, e subitamente menores são as trevas e um

pouco de luz cresce dentro de mim até avassalar-me totalmente.

Faze essas experiências e terás o caminho da tua liberdade.

Não as poderás fazer sem antes percorreres os caminhos que indicamos neste livro.

Mas se fores fiel aos teus exercícios, se te encheres de fé e confiança em ti mesmo, quem te impedirá

de seres livre?

Construíste a tua liberdade.

Criaste-a do nada? Não, absolutamente não. Ela já estava em ti, latente, esperando apenas que desses

o teu grande passo.

E esse passo era encontrá-la dentro de ti, luminosa e fiel, grande e amiga, para te servir de guia a

novos caminhos superiores.

E chegado aqui, já não precisas mais de mim. Já tens em ti mesmo a tua companhia. É amável e bela,

sublime, de radiante beleza: a tua liberdade.

Ela é Deus que fala em ti. Segue-a.