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gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 Curso de Gestão Pública Inovadora Prof. Jackson De Toni Sobre o autor: Jackson De Toni é Economista e tem mestrado em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1994) com ênfase em Planejamento de Transportes. É professor adjunto do curso de Economia da Universidade Luterana do Brasil e do curso de Ciência Política da UniDF em Brasília. Atualmente cursa o Doutorado em Ciência Política na Universidade de Brasília, UnB. Foi Técnico em Planejamento da Secretaria de Coordenação e Planejamento do Rio Grande do Sul, onde foi Diretor-Geral e Secretário Adjunto entre 1999 e 2002. Foi professor da UFRGS (Economia) e da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Planejamento Estratégico). Tem ampla experiência em gestão de políticas públicas na área de desenvolvimento, monitoramento e avaliação de projetos. Publicou artigos sobre planejamento estratégico e governança no setor público, no Brasil e exterior. Foi assessor especial da Presidência da República (2004/06), responsável pelo monitoramento & avaliação de projetos estratégicos de Política Industrial e Tecnológica. É professor de Planejamento Estratégico da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). Foi Gerente de Projetos da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, ABDI (www.abdi.com.br ) e da Agência de Promoção de Exportações e Investimentos - APEX-Brasil (www.apexbrasil.com.br ) vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Atualmente é Especialista em Gerenciamento de Projetos do quadro efetivo da ABDI. Contato: [email protected]

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gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010

Curso de Gestão Pública Inovadora

Prof. Jackson De Toni

Sobre o autor: Jackson De Toni é Economista e tem mestrado em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1994) com ênfase em Planejamento de Transportes. É professor adjunto do curso de Economia da Universidade Luterana do Brasil e do curso de Ciência Política da UniDF em Brasília. Atualmente cursa o Doutorado em Ciência Política na Universidade de Brasília, UnB. Foi Técnico em Planejamento da Secretaria de Coordenação e Planejamento do Rio Grande do Sul, onde foi Diretor-Geral e Secretário Adjunto entre 1999 e 2002. Foi professor da UFRGS (Economia) e da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Planejamento Estratégico). Tem ampla experiência em gestão de políticas públicas na área de desenvolvimento, monitoramento e avaliação de projetos. Publicou artigos sobre planejamento estratégico e governança no setor público, no Brasil e exterior. Foi assessor especial da Presidência da República (2004/06), responsável pelo monitoramento & avaliação de projetos estratégicos de Política Industrial e Tecnológica. É professor de Planejamento Estratégico da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). Foi Gerente de Projetos da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, ABDI (www.abdi.com.br) e da Agência de Promoção de Exportações e Investimentos - APEX-Brasil (www.apexbrasil.com.br) vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Atualmente é Especialista em Gerenciamento de Projetos do quadro efetivo da ABDI. Contato: [email protected]

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Aula 1

O surgimento do Estado e a Administração Pública

A origem do Estado

A gestão pública é o modo como administramos as coisas públicas, particularmente como

são gerenciadas as organizações públicas, sejam elas municipais, estaduais ou federais. Por

isso, antes de entrar no assunto propriamente dito temos que compreender onde se realiza

a gestão publica, em que contexto institucional, que regras e estruturas a condicionam. Ou

seja, temos que compreender inicialmente o que é o Estado, como ele surgiu e como ele

funciona, qual é seu papel na sociedade democrática contemporânea. Vamos trilhar este

caminho logo a seguir.

Para estudar e entender o que é a gestão pública inovadora vamos ver nesta primeira aula

como tudo começou, isto é, o que é o Estado, qual sua origem, função e papel numa

sociedade complexa e heterogênea como a nossa. A palavra Estado vem do latim “status” e

significa “estado” ou “situação”.

O seu conceito está associado ao de ordem política e social que mantém uma determinada

sociedade estável. Desde a antiguidade o conceito de Estado também está associado ao de

dominação, isto é, de um grupo de indivíduos ou grupos organizados que, através do Estado,

domina os demais grupos e indivíduos. Esta dominação não é necessariamente ruim porque

ela pode ser, por exemplo, numa democracia, uma dominação legítima, isto é, desejável,

porque foi votada em um processo eleitoral livre democrático. Os gregos antigos, por

exemplo, se organizavam através da “Pólis”, a cidade-estado, os romanos tinha o conceito

de “civitas” e outros povos tinham organizações semelhantes que se encarregavam de

manter as funções essenciais de governo e administração da justiça, da segurança e defesa e

de outras funções básicas para manter a integridade de um povo, num dado território.

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Diversos autores atribuem a Maquiavel, que viveu entre 1469 e 1527, o uso pioneiro do

termo “Estado”. Ele teria usado com o sentido próximo ao uso mais moderno, Estado como

sociedade política permanente. Em seu livro “O Príncipe”, há a famosa frase “ Todos os

Estados, todos os domínios que tem tido ou tem império sobre os homens são Estados, e são

repúblicas ou principados”. Maquiavel transformou o fazer política, isto é, as ações e

eventos que o homem cria para que os governos funcionem, num problema essencialmente

humano, desprovido dos julgamentos morais ou de influencia religiosa que predominavam

na idade média. A reflexão de Maquiavel surge exatamente num contexto de transformação

da sociedade medieval italiana. Ele faz uma análise da situação italiana, marcada pela

instabilidade, fragilidade e violência das instituições políticas para elaborar uma espécie de

“manual de conduta” para o príncipe, isto é para a elite dominante da época.

Maquiavel propõe três conceitos básico para entender como funciona o governo:

• O primeiro seria a Virtu, ou seja, as qualidades pessoais do príncipe.

• O segundo seria a Fortuna, que seria o contexto no qual o príncipe governa, sem

controlar todas as variáveis.

• O terceiro seriam as Razoes de Estado, que seriam as premissas, as suposições, as

condições para que o governante violasse as normas jurídicas, econômicas e morais

por ele mesmo estabelecidas. Estas condições aconteceriam numa situação de perigo

eminente, guerra ou anormalidade extrema.

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Quando abordamos o problema do Estado podemos identificar dois tipos de origem ou

formação, uma chamada de Originária e outra chamada de Derivada. A formação originária é

aquela relacionada ao caminho clássico de organização dos grupos primitivos em clãs ou

tribos e a partir daí em organizações mais complexas, com uma especialização de funções

maior e de maior interdependência entre pessoas e grupos. O fundamental é que estes

indivíduos não perteçam a outro Estado. Se a formação for do tipo “natural” então não

houve uma intervenção mais dirigida de indivíduos ou grupos, se a formação for

“contratual” então a organização estatal foi deliberadamente conduzida por alguns

indivíduos ou grupos. Ainda pode haver uma formação chamada de “derivada”, quando o

Estado se forma a partir de outra organização ou instituição pré-existente.

Autores como Dallari sintetizam os aspectos relacionados à formação do Estado em três

grande posições básicas.

(a) A primeira delas é de que o Estado sempre existiu na história humana, pois o homem

sempre existiu integrado a uma organização social dotada de poder e alguma

autoridade capaz de influenciar o comportamento do grupo, mesmo nas sociedades

mais primitivas.

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(b) Uma segunda posição é a de que o Estado foi constituído ao longo de dezenas de

anos e mesmo séculos para atender às necessidades e conveniências dos diversos

grupos sociais, numa relação de dominação e poder. Mas houve época que a

organização humana dispensava a presença de uma ente acima dos grupos e

indivíduos.

(c) Uma terceira posição é aquela que considera o Estado como um sociedade política

com soberania, cujo poder estaria acima de qualquer outro, num dado território e

nação. Nesta concepção o Estado se distingue das demais formas de organização

social porque seu poder independe do poder dos seus ocupantes ou membros. O

poder do Estado está sujeitado ao direito, às leis, que independem dos governantes.

Há ainda muitas outras teorias que tentam explicar porque ou como o homem organizou e

construiu o Estado. Alguns teóricos dizem que o Estado não passa de um prolongamento em

escala das relações já estabelecidas pela estrutura familiar. A sociedade civil seria apenas um

desdobramento normal e previsível da sociedade natural, o Estado apenas refletiria a

ampliação dos laços de dependência familiares. Além da família, podem ser considerados

neste enfoque a própria comuna, ou comunidade, corporações baseadas nas relações

famliares e outros grupos como possíveis fontes para o poder do Estado. Na base deste

poder estaria o poder fundante e orginal de um “Pai” ou de um “Rei”. A legitimidade deste

poder é de origem divina: “é Deus que quis assim” ou na ordem natural das coisas: “sempre

foi assim e sempre será”.

A crítica que a ciência política mais moderna fará a esta abordagem é a de que a sociedade

humana não é igual ou sinônimo de sociedade política. Aliás, somente quando o homem se

emancipa das organizações básicas, como a família, ele passa a intervir e atuar de uma

forma não tutelada nos assuntos da “civitas”, da coletividade, da comunidade em que está

inserido, ou seja, passa a ser um ser político, a fazer política com consciência. Além disso a

fonte e a legitimidade do poder de Estado não está na idéia da paternidade, mas de uma

opção não-natural feita por homens e mulheres, muito menos na inspiração divina. Cabe

lembrar que uma das grandes conquistas das chamadas “revoluções burguesas” do século

XVIII, em especial da Revolução Francesa, foi a separação entre o poder religioso, do poder

político, criando a idéia do Estado laico e da liberdade de culto religioso.

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Uma outra vertente na teoria sobre o Estado nos diz que o Estado surge como que um

“contrato” entre os indivíduos. Este contrato teria sido inspirado na necessidade que os

homens tem em preservar e tutelas seus direitos uns dos outros, em troca da proteção de

um soberano. Um dos autores mais famosos, chamados de “contratualistas” foi Rousseau,

que viveu entre 1712 e 1778. Ele foi autor de uma obra chamada “O Contrato Social” onde

defende que o contrato entre os homens e o soberano deveria ser geral e unânime, baseado

na igualdade entre os homens, que abririam mão de suas vontades individuais para ceder a

uma “vontade geral” acima de todos. Esta nova condição poria um fim ao chamado “estado

natural”, pré-Estado, onde todos estavam a mercê da própria sorte. Outro pensador

importante desta escola foi Hobbes, que viveu entre 1588 e 1679. Hobbes dizia que o

“homem é o lobo do próprio homem”, isto é, o homem deixado a sua própria sorte estaria

condenado a uma vida torpe, violenta e breve. Outro autor, Locke, que viveu entre 1632 e

1704, era menos pessimista, dizia que o homem era pacífico, mas vivia em guerra potencial

se permanecesse no estado de natureza. Todos defendiam a idéia de que um contrato

deveria ser feito transferindo parte dos direitos e das liberdades individuais para o Estado.

Devemos lembrar aqui que a idéia de um “contrato” é uma metáfora, isto é, uma figura de

linguagem para ilustrar o processo de formação do Estado.

Hobbes, Locke e Rousseau, partilhavam do mesmo diagnóstico, mas tinham idéias diferentes

sobre qual seria a solução ideal para o problema. Hobbes, por exemplo, acreditava que a

titularidade e o exercício dos direitos naturais deveriam ser transferidos ao soberano com

uma única exceção, a segurança da sua própria vida. O soberano, para Hobbes, não seria

obrigado a respeitar as leis civis por ele constituídas, sua limitação seria apenas o direito

natural. O poder do Estado seria absoluto. Por isso se diz que Hobbes defendia o modelo

absolutista, baseado no poder de um rei.

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Locke, por sua vez, entendia que os indivíduos conservariam todos seus direitos naturais

exceto um, o de fazer justiças por suas próprias mãos, isto caberia ao Estado. Para este

pensador o principal direito a ser garantido pelo Estado seria o direito à propriedade e a

liberdade individual. Para ele o poder poderia ser revogado se o governante não cumprisse

as leis, Locke defendia o direito à rebelião contra o mau governo.

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Por fim Rousseau, que era o mais radicalmente democrático dos três, os indivíduos deveriam

transferir todos seus direitos ao Estado em troca da liberdade individual. Os conflitos

existentes no estado de natureza resultavam da existência da propriedade privada. A lei que

derivava da “vontade geral” estaria acima de tudo e de todos, menos do Soberano.

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Podemos ter ainda uma visão darwinista da formação do Estado, ou seja, o Estado surge da

imposição dos mais fortes e adaptados sobre os mais fracos. O Estado surgiria de um

processo essencialmente violento numa espécie de “darwinismo político”, os mais fortes

sobrevivem.

Ainda há um importante conjunto de pensadores que atribuem causas essencialmente

econômicas para a origem e formação do Estado. De todas as teorias talvez a que mereça

registro e consideração seja aquela formulada por Karl Marx, que viveu entre 1818 e 1883.

Marx dizia que o Estado é um instrumento de dominação de uma classe – os burgueses e

proprietários das terras e fábricas em geral – sobre as outras classes sociais, sobretudo

trabalhadores urbanos e camponeses. O Estado nasce quando a comunidade primitiva

consegue produzir mais do que suas próprias necessidades de sobrevivência imediata. Isto

começou a acontecer com a primeira revolução agrícola, na pré-história. Este excedente

produtivo liberou alguns indivíduos, geralmente aqueles com alguma função religiosa ou

militar, das tarefas cotidianas da produção. Estes formariam o núcleo de uma elite que vai

dominar os demais e dar origem ao Estado como uma organização que perpetua e reproduz

a dominação, não só econômica, mas social e política também.

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A parte as explicações sociológicas para a origem do Estado, a forma mais comum de criação

dos Estados na modernidade é por fracionamento de Estados maiores. Este foi o caso, por

exemplo, de um dezena de repúblicas formadas pelo fim da antiga União Soviética no final

dos anos oitenta. Entre outros Estados surgiram os Estados da Ucrânia, Letônia e Estônia,

por exemplo. Cada novo Estado tem um território próprio, um ordenamento jurídico próprio

e personalidade institucional independente na diplomacia internacional. Em outros casos,

como foi a unificação da Alemanha Oriental com a Ocidental em 1989, o novo Estado surge

da unificação de entidades pré-existentes.

Independente da teoria que adotarmos o Estado em conceito amplo é um ordenamento,

uma estrutura, um conjunto de organizações e instituições, eventos, processos e indivíduos

que atuam em determinado território, com soberania jurídica, para garantir a estabilidade e

a reprodução da sociedade, nas suas dimensões econômicas, políticas e sociais. O Estado

ainda, segundo o sociólogo Max Weber, tem o monopólio legítimo da violência, isto é, o

Estado seria a única organização capaz de usar e aplicar a violência física para atingir seus

objetivos. O Estado é uma forma específica, que varia ao longo do tempo e dependendo do

lugar, para organizar o poder político e administrar princípios de sua própria manutenção.

O Estado é portanto: poder organizado e soberano, povo, território e, nação.

Devemos cuidar para não confundir Estado com nação ou país. Por exemplo, existe um país

basco, mas não um Estado basco, existe uma nação palestina, mas não um Estado palestino.

A idéia de nação exprime o conceito de uma comunidade política marcada pela tradição,

cultura e história comum, mesma língua, religião ou costumes, mas a noção de Estado

implica imediatamente em soberania ou seja, um poder que não é tutelado por nenhum

outro poder a não ser ele mesmo. Da mesma forma o conceito de “povo” difere de

“população”, o primeiro se refere à uma comunidade política com característica

semelhantes, inclusive étnicas, o segundo ao conjunto de residentes num país, incluindo

imigrantes e turistas de outras nacionalidades.

A trajetória do Estado moderno

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Normalmente adotamos uma visão cronológica para apresentar as diferentes formas como

evoluiu o Estado da antiguidade até os nossos dias. Vamos começar vendo rapidamente

como se formaram os principais Estados na antiguidade.

O primeiro tipo de Estado a se consolidar é o chamado “Estado antigo”, onde as

organizações familiares, religiosas e econômicas se combinavam de forma confusa e

indistinta. A política se misturava com a moral, esta com a religião e a filosofia. Estes estados

eram de natureza unitária, não havendo divisões no seu interior, nem territoriais, nem

funcionais. Outro elemento importante era a união entre Estado e religião, eram verdadeiros

Estados Teocráticos, isto é, organizados e conduzidos sob inspiração divina. O Estado Grego,

baseado na figura da Polis, ou da cidade estado, é uma expressão deste tipo de estado. Um

detalhe importante é que a democracia grega funcionava somente para os cidadãos, sendo

que os escravos não eram considerados cidadãos. Outro tipo clássico de estado antigo foi o

Estado romano. Na origem o Estado romano foi formado pela união de famílias ou tribos,

chamados de “gens”, depois evolui para a forma de cidades-estados e finalmente para o

formato de uma república unitária no seu auge. A decadência do mundo romano cedeu

lugar a diversas formas de organização estatal fragmentária, todas elas baseadas em um

cem número de feudos auto suficientes e famílias nobres muito influenciados pela Igreja

romana e regidas por relações de suserania e vassalagem. O suserano está acima na

hierarquia, garante a proteção e doa terras ao vassalo, que paga impostos e fornece homens

para as guerras, foi a relação, por exemplo, entre os duques, marqueses, condes e barões,

nesta ordem. O Estado medieval foi praticamente mantido e sustentado pelo poder da Igreja

católica, o Papa Leão III, por exemplo, no ano de 800, chegou a coroar Carlos Magno como

Imperador da Cristandade, demonstrando a convergência entre poder civil e poder

eclesiástico durante este período.

Com a evolução econômica e social da sociedade medieval uma ruptura progressiva entre o

poder religoso e civil começa a se estabelecer. O surgimento do Estado Absolutista será

então caracterizado pela concentração de instrumentos de controle, administração e gestão

nas mãos de um único soberano, geralmente um Rei. Antes estes poderes estavam dispersos

no território das cidades-estados pelos vários nobres em cada lugar. Ocorre também uma

centralização do poder, eliminando-se as esferas intermediárias de estamentos, colegiados

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ou corporações. Por fim, começa a sedimentar a idéia da despersonalização do Estado. Ou

seja da passagem das relações de comando e obediência entre indivíduos para relações de

obediência e hierarquia entre instituições, o Estado passa cada vez mais a não se confundir

com a personalidade dos governantes, sejam Reis, Rainhas ou Príncipes. Foi nesta

conjuntura histórica que ocorreu a unificação política de países importantes como a

Alemanha e a Itália em Estados nacionais e unitários.

O Estado como o conhecemos hoje, ou o Estado Moderno, surgiu da evolução do estado

absolutista e de seus corpos intermediários, seja na idéia de um exército profissional e

permanente, na política, na burocracia administrativa em especial a fiscal, no clero e na

magistratura. Ainda no período absolutista por conta da íntima relação entre o Estado e a

economia mercantilista, o Estado tornou-se o ator de maior importância naquele

ordenamento social. O Estado moderno surge sobretudo quando se afirma a idéia de

soberania estatal e diferenciação do Estado e da Sociedade.

Neste marco do Estado moderno vamos encontrar uma variedade muito grande de

manifestações históricas distintas. Temos o Estado liberal, o estado interventor, o estado do

bem estar social, o Estado democrático, etc. Estas categorizações não são mutuamente

excludentes e geralmente são utilizadas para enfatizar uma característica mais marcante ou

dominante de uma época ou conjuntura histórica determinada.

Por exemplo, o chamado Estado Liberal é produto das grandes revoluções burguesas, que

significaram a consolidação das elites comerciais no poder de Estado, derrubando os velhos

estamentos da nobreza absolutista. Entre as mais significativas temos a chamada Revolução

Gloriosa na Inglaterra, em 1688, a Revolução de Independência dos Estados Unidos em 1786

e a Revolução Francesa em 1789. O principal atributo deste momento de transição histórica

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entre dois regimes foi o pacto entre o poder do soberano, que poderia ser um Imperador ou

um Rei, e o colegiado de representantes eleitos ou indicados. Neste período foram

conquistados os primeiros direitos civis como o direito à vida, à propriedade, à

manifestação, de ir e vir, etc., só mais tarde nos séculos XIX e XX que os direitos políticos e

sociais, como o sufrágio universal, o direito a educação, etc., foram conquistados.

As reivindicações da burguesia comercial, como as eleições livres, a separação de poderes ou

a não intervenção do Estado nos negócios eram totalmente coerentes com as necessidades

de expansão do capitalismo comercial no início do século XIX. A cena política refletia mais

uma vez os movimentos estruturantes e poderosos da base econômica da sociedade. O

Estado deveria garantir a liberdade para os cidadãos, liberdade esta de comprar e vender,

inclusive a força de trabalho, as terras e as propriedades em geral. As tarefas do Estado

seriam somente a defesa publica, a diplomacia, a defesa externa, a cobrança de tributos, a

cunhagem da moeda e a administração da justiça. O Estado Liberal clássico não durou muito

tempo, pois gerou imensas massas de excluídos dos benefícios do sistema. A progressiva

organização e pressão destes setores foi alterando durante todo o século XIX e XX a natureza

e a função do Estado.

No início dos anos oitenta vários Estados capitalistas ocidentais começaram a enfrentar

dificuldades econômicas, orçamentárias e fiscais entre eles os Estados Unidos e a Inglaterra.

Como reação a esta situação surgiram governos que mais tarde foram chamados de “neo

liberais” porque retomavam princípios do antigo Estado Liberal. Tais governos, como o de

Ronald Reagan nos Estados Unidos e Margaret Tatcher na Inglaterra implementaram um

programa de redução dos impostos, privatizações de empresas estatais, cortes no

funcionalismo público e redução de investimentos em programas sociais. Estas ações foram

altamente polêmicas e geraram inúmeras tensões sociais, ainda que tivessem contribuído

para superar a crise naquele momento. Este modelo foi recomendado pelos organismos

multilaterais como o FMI e o Banco Mundial para todos os países sub desenvolvidos como o

Brasil, naquilo que ficou mais tarde conhecido como o “Consenso de Washington”, reunião

de economistas em 1989.No Brasil este ideário de governo influenciou a gestão do então

presidente Fernando Henrique Cardoso, quando boa parte do setor produtivo estatal foi

vendido para empresas nacionais e multinacionais. Estas políticas fizeram surgir um novo

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termo, o “Estado Mínimo”, para nomear um tipo de política econômica onde as funções do

estado seriam reduzidas ao mínimo admissível, tal e qual a proposta liberal clássica. No final

dos anos noventa estas práticas de governo são abandonadas em quase todos os lugares e

reiniciou-se um novo ciclo de aumento da presença do Estado.

O estado liberal também é conhecido como Estado Representativo, já que o regime político

da democracia liberal é baseado nas eleições de representantes. Independentemente de

todos os problemas do regime representativo atualmente, nas origens do Estado liberal as

eleições foram um poderoso meio de transformação do Estado estamental do antigo regime.

O chamado “Estado do Bem Estar”, ou em inglês, o “Welfare State”, por exemplo, retrata um

tipo de organização estatal surgido sobretudo após a segunda grande guerra. Sua

característica fundamental é a maior distribuição dos benefícios do crescimento econômico

entre os segmentos antes excluídos, sobretudo as camadas médias e os trabalhadores.

Todos os cidadãos, independente de sua contribuição, teriam direito à proteção contra o

desemprego, ao abandono, a pobreza, a fome a doença. Os governos deste período não

raro se caracterizavam por grande pactos e acordos sociais que incorporavam organizações

dos trabalhadores nos governos. Este tipo de estado só foi possível graças a um período de

grande produtividade industrial e pesados investimentos estatais em infra-estrutura

econômica e social, as custas de um grande endividamento. Este tipo de estado também foi

chamado de “Estado Keynesiano”, em alusão às idéias do economista inglês Keynes, que

defendia fortes despesas públicas para superar os momentos de crise econômica como foi a

Grande Depressão de 1929.

Uma outra denominação importante, sobretudo para nós latino americanos, é o chamado

“Estado Desenvolvimentista”. Este nome decorre do papel que o Estado sobretudo na

América Latina no pós guerra teve para assumir um papel protagonista na liderança do

processo de desenvolvimento econômico e social. Como nestes países as elites econômicas

eram fracas, desorganizadas e com recursos insuficientes, o Estado assumiu a intervenção

direta em muitos setores de base, por exemplo, aço, química, energia, telecomunicações,

transportes e outros setores. O Estado desenvolvimentista atuava, na verdade como um

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grande empresário, criando as condições gerais de produção para que o setor privado, mais

tarde, assumisse os investimentos necessários ao desenvolvimento do país. O padrão

político deste período oscilou entre governos democráticos e ditaduras, com grandes

tensões sociais, várias delas decorrentes do próprio processo de rápida transformação

produtiva, como por exemplo, o rápido crescimento da urbanização e de grandes

metrópoles. No Brasil o auge deste período vai dos anos cinqüenta ao início dos anos

setenta quando fatores como o grande endividamento do Estado, a inflação e as tensões

políticas e sociais acabam enfraquecendo o modelo.

Além deste modelos, tipos ou manifestações do Estado capitalista contemporâneo temos

historicamente a ocorrência de Estados socialistas. Estes Estados surgiram geralmente de

processos revolucionários como foi a Revolução Russa em 1917 ou chinesa em 1949, da

expansão soviética no pós-guerra, como a Polonia ou Alemanha Oriental ou de guerras de

independência de ex-colônias como ocorreu na África nos anos sessenta ou na Coreia do

Norte e Vietnã respectivamente nos anos cinqüenta e setenta. Há muita diversidade de

modelos e regimes, de economias totalmente planificadas como era a soviética até os anos

oitenta até sistemas mistos como é atualmente o chinês. Após o fim da antiga União

Soviética restaram poucos países com Estados socialistas, como Cuba, por exemplo. Nestes

países predomina a centralização dos investimentos no Estado, a existência de um único

partido oficial, restrições à liberdade de organização, expressão e voto.

Atualmente o processo de globalização econômica vem criando novos desafios e limites para

a atuação do Estado. Ocorre uma desnacionalização crescente da produção econômica. Os

ciclos produtivos envolvem as vezes dezenas de países que assim ficam interligados e

dependentes dos mercados, em especial dos mercados financeiros mundiais. Os governos

perderam a influência relativa sobre grandes corporações transnacionais, há mais

dificuldade de barrar a formação de trustes e cartéis e sua influência danosa sobre o

mecanismo de livre concorrência. A interdependência entre Estados aumentou muito e

ressurgiram as tendência para formação de autênticos Estados supra-nacionais com o

alargamento do conceito de soberania, como demonstra a experiência da União Europeia.

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O Estado moderno é dividido em poderes distintos: o Executivo, o Judiciário e o Legislativo.

Foi Montesquieu, na sua obra “O Espírito das Leis”, que definiu pela primeira vez uma

justificativa para a separação de poderes porque este formato traria um maior equilíbrio

entre os diversos poderes. O poder do Estado é um só e do ponto de vista institucional e

abstrato é indivisível e indelegável, porém é como se ele se desdobrasse em poderes

diversos divididos funcionalmente. Cabe ao Executivo o domínio da função administrativa,

cabe ao Legislativo a norma fiscalizadora e cabe ao Judiciário a função jurisdicional, ou seja,

administrar a aplicação da justiça. Em alguns casos estas funções não são exclusivas. Pode o

Executivo, por exemplo, elaborar normas através das medidas provisórias, mas isto deveria

ser uma exceção.

O funcionamento do Estado de Direito

Para conhecer o funcionamento do Estado é necessário conhecer também elementos do

direito público e do direito administrativo. Porque o direito ? Por um motivo bastante

simples, o Estado é no fundo um grande ordenamento social, político e econômico validado

e formalizado por um conjunto de leis e normas de conduta, de procedimentos e de direitos

e deveres. A ciência jurídica nos ajuda a entender qual é a dinâmica de funcionamento desta

grande estrutura.

O direito público, segundo os juristas, tem por objetivo principal a regulação dos interesses

estatais e sociais, só atingindo as condutas individuais de forma indireta. As relações

jurídicas no direito público são sempre caracterizadas pela desigualdade jurídica entre dois

pólos, o privado-individual e o público-coletivo. Isto acontece porque os interesses do

Estado são na verdade os interesses da coletividade que precisam ser tutelados, protegidos

pela estrutura estatal. Quando houver um conflito entre estes dois pólos, acaba

prevalecendo os interesses do Estado, respeitando evidentemente as garantias individuais.

Um exemplo muito comum deste conflito acontece quando um governo precisa construir

uma estrada e para isso tem que utilizar uma propriedade privada. Neste caso o direito

público e coletivo de assegurar o funcionamento do sistema de transporte ou a mobilidade

dos cidadãos fica acima do próprio direito de propriedade. Neste caso pode ocorrer uma

desapropriação, que acontece sempre com a devida e justa indenização ao proprietário.

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No direito privado esta desigualdade entre pólos não existe. Num contrato entre

particulares, por exemplo, os dois pólos são iguais, tem igualdade jurídica. Um contrato

comercial qualquer, a abertura de uma conta bancária, etc., pressupõe que os dois lados

tem as mesmas prerrogativas, isto é, os mesmos direitos e deveres.

Há um conjunto de princípios que estruturam o direito público e que são interessantes e

necessários para o entendimento da própria gestão da coisa pública. Vamos analisar

rapidamente cada um deles.

(a) O primeiro é o princípio da “autoridade pública”. É aquela condição dada por uma

Constituição, por exemplo, que define o Estado como superior ao particular, como

mais relevante na relação com o particular.

(b) Um segundo princípio é o da “submissão do Estado à ordem jurídica”. Isto significa

que todo ato ou comportamento que venha do poder público, para cumprir os

quesitos de validade universal e obrigar os indivíduos, deve ter fundamento e

validade numa norma jurídica superior. O Estado, pois, está obrigado a agir sob o

abrigo de leis, de normas universalmente válidas e aceitas. O Estado que age fora

deste contexto, através de atos abusivos e ilegais de um governo, por exemplo, se

torna o que chamamos de um “Estado de exceção”, como acontece nas ditaduras e

governos autoritários, em geral.

(c) Um terceiro princípio é a “igualdade dos particulares perante o Estado”. Este

princípio é fundamental para uma sociedade democrática. Significa que todos os

indivíduos devem ser tratados de forma isonômica, ou igual, perante o Estado.

Devem ser tratados igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de

sua desigualdade. Isto quer dizer, por exemplo, que quando o Estado obriga através

de uma lei aprovada no Congresso Nacional que parte das frotas de ônibus urbanas

tenham equipamentos especiais para pessoas portadoras de necessidades especiais,

que o Estado está garantindo o princípio da igualdade entre desiguais.

(d) Um quarto princípio nos diz que sempre haverá o “devido processo legal”. O termo

“processo” na linguagem do Estado tem um significado especial. É o modo como o

estado formaliza seus atos, documenta e registra seus procedimentos. É uma

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 18

garantia para todos aqueles que sofrem uma ação do Estado (benéfica ou não para o

particular) e para todos aqueles que acionam a máquina estatal demandando um

serviço ou uma ação de fiscalização, por exemplo.

(e) Um quinto princípio nos fala da “responsabilidade objetiva”. Isto quer dizer que o

Estado deve arcar, deve assumir, a responsabilidade última e obrigatória pelos

prejuízos que sua ação ou omissão possam gerar e provocar. Por exemplo, quando

um funcionário publico dirigindo um automóvel a serviço de um Ministério colidir

com um particular, quem assume a culpa objetiva é o Estado, eventualmente caberá

um procedimento administrativo de responsabilização contra o funcionário. No

direito privado a responsabilidade direta são dos sujeitos envolvidos, por isso se diz

que esta responsabilidade é do tipo “subjetiva”. Em relação ao Estado se diz que a

responsabilidade é objetiva, independe de uma culpa, o Estado responde sempre,

qualquer que seja o dano causado a um particular. Basta que fique claro e provado

um nexo de causalidade entre o dano sofrido e uma ação (ou omissão) do Estado.

Por exemplo, quando uma Prefeitura realiza uma obra de drenagem urbana e para

isso interrompe o comércio de um supermercado, o comerciante teria direito a uma

reparação.

(f) Por fim, um sexto e último princípio declara que há uma “igualdade de pessoas

políticas”. Como o Brasil é um país federativo, isto é, composto por vários entes

políticos, Estados e Municípios com atribuições e competências diferenciadas, há um

estatuto de igualdade entre eles. Não há uma hierarquia, o Governo Federal não é

mais importante que um Município, por exemplo, todos são juridicamente iguais.

Os princípios da administração publica

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 19

Para conduzir a administração pública, para fazer a gestão publica, os agentes políticos,

servidores ocupantes de cargos efetivos ou comissionados, os particulares que prestam

serviços públicos através de permissões ou delegações e toda a sociedade, enfim, são

guiados por princípios. Os princípios não são leis propriamente ditas, mas são diretrizes de

conduta, são orientadores dos atos, eventos e processos no âmbito do Estado. Eles portanto

servem como bússola, como norte a ser seguido.

A maioria deles está na Constituição Federal de 1988, mas há outros que podem ser

inferidos de leis importantes como o Decreto lei 200 de 1967 que cumpriu um papel

importante na modernização do Estado brasileiro.

O primeiro e talvez o mais importante princípio seja o do “Planejamento”. O Estado deve

executar ações planejadas, estudadas previamente, compatibilizadas com os recursos

orçamentários e humanos disponíveis. Este princípio orienta por exemplo, a elaboração dos

Planos Plurianuais a cada quatro anos em todos os níveis administrativos.

Um princípio associado intimamente ao primeiro é o da “Coordenação”. Esta orientação nos

diz que as várias organizações do governo e os milhares de funcionários públicos federais,

estaduais e municipais devem agir coordenadamente, com harmonia, com sincronicidade.

Esta orientação implica que os processos de hierarquia, comunicação, monitoramento e

avaliação das ações deva ser uma constante na gestão pública.

O terceiro princípio nos fala da “Descentralização”. Num país como o Brasil, com mais de

oito milhões de quilômetros quadrados, com quase duzentos milhões de habitantes, perto

de seis mil municípios e vinte e três estados é impossível não pensar que as funções públicas

devam ser descentralizadas. Ela é entendida em vários planos. Há a descentralização da

administração federal para as administrações estaduais e destas para as municipais. Mas

também há descentralização de funções dentro de cada nível administrativo e do setor

público para o setor privado. Por exemplo, quando um município faz uma licitação para um

particular operar uma linha de ônibus ele está descentralizando, ou quando o Governo

Federal faz um convênio com o Estado para repassar recursos para combater a fome, há

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 20

também um processo de descentralização. Este princípio está associado a um outro muito

próximo, é o chamado princípio da “delegação de competência”. Ele segue a máxima de que

as decisões devem se situar o mais próximo possível do contexto em que elas vão ser

executadas. Isto objetiva assegurar mais agilidade, eficiência e eficácia na prestação de

serviços. É por este motivo que a educação superior fica na esfera federal e a educação

básica e fundamental é encargo dos municípios.

É importante não confundir a descentralização com a desconcentração. Esta última significa

apenas uma técnica (não um princípio), pela qual a administração, tanto a direta composta

pelos Ministérios ou Secretarias, como a indireta, composta por empresas, autarquias e

fundações, utiliza para distribuir competências. Mas esta distribuição, ao contrário da

descentralização, fica dentro de sua própria estrutura ou organização. Por exemplo, quando

o Ministério da Agricultura cria representações nos Estados ele está desconcentrando

tarefas, competências e atribuições.

O princípio do “controle”, nosso quinto princípio, orienta para que todas as ações e atos do

poder público sejam devidamente fiscalizados e controlados em todas as suas instâncias. O

controle começa no âmbito da própria organização, em cada departamento, pela chefia

imediata. Cada órgãos público tem um setor especializado em fiscalizar as suas próprias

ações. Por exemplo, em âmbito federal o controle interno é feito pela Controladoria Geral

da União, a CGU, ligada diretamente à Presidência da República. Além do controle externo

há o controle externo exercido pelos Tribunais de Contas dos Estados e da União, que são

ligados aos poderes legislativos respectivos. A existência de controle independente, ágil e

proativo é uma das condições básicas para a transparência do governo, para o combate à

corrupção e portanto para a existência do próprio Estado democrático.

A “legalidade” e a “impessoalidade”, o sexto e o sétimo princípios, são igualmente

importantes. A legalidade nos diz basicamente o seguinte, a administração só poderá agir

conforme o estabelecido em lei. Não basta que a lei não vete ou proíba determinada

conduta, na área pública a lei deve orientar expressamente o que pode ser feito, executado

e realizado. Tudo que a administração publica fizer em desconformidade com a lei pode ser,

por princípio, anulado, revogado e invalidado, pela via administrativa ou pela via judicial. Já

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 21

o princípio da “impessoalidade” nos assegura que o gestor público e a própria

administração pública pratiquem atos de forma imparcial, não promovendo seus gestores e

administradores. Não é lícito, por exemplo, que um administrador use as oportunidades ou

os recursos à sua disposição para sua própria auto-promoção. Também veda qualquer

forma de discriminação na prestação dos serviços. O princípio da “moralidade” anda junto

com a impessoalidade. Sua mensagem é muito simples: os agentes do Estado não podem

agir em desconformidade com padrões éticos, não basta apenas cumprir a lei, é preciso ter o

bom senso para diferenciar sempre o que é honesto daquilo que não é, analisando a

aplicação da lei dentro de cada contexto. O nono princípio, o da “publicidade” está na

mesma linha, ou seja, todo ato administrativo, porque é feito em nome da coletividade deve

ser necessariamente publicado, tornado de conhecimento coletivo. Uma decisão

administrativa, em qualquer nível ou sobre qualquer assunto, que não é devidamente

publicizada pode ser anulada e sem efeitos. Além disso a publicidade dos atos públicos é

condição básica para o controle e a participação popular. Estas três princípios, a legalidade, a

impessoalidade e a publicidade representam o pilar do Estado democrático de direito.

Em seguida um princípio mais moderno, a “eficiência”. Ele orienta para que o agente público

e a administração em geral atuem gastando os recursos públicos da melhor forma possível.

As estruturas administrativas devem ser racionais, uma adequação entre fins e meios é

absolutamente necessárias. Deve-se evitar o desperdício e o gasto sem resultados concretos

e objetivos. A eficiência está relacionada ao modo como os processos de trabalho são

realizados. Um departamento público cheio de funcionários ociosos, sem liderança que

promova o controle e a gestão por resultados é um exemplo notório de falta de

descumprimento do princípio da eficiência.

Estes são os princípios básicos que podem ser lidos na nossa Constituição, mas há outros

que alguns autores acabam incluindo como importantes neste debates. O princípio da

“razoabilidade”, por exemplo, está associado ao princípio do devido processo legal, ele

sempre alerta para que o ato administrativo seja sempre necessário, adequado e

proporcional. Por exemplo um Governador que usasse a tropa de choque da política militar

para reprimir uma festa de carnaval de rua não autorizada estaria em flagrante desrespeito

ao princípio da razoabilidade, da proporcionalidade.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 22

A “supremacia do interesse público” é outro princípio que reafirma a superioridade do

interesse publico acima dos interesses particulares. A “auto-tutela” é uma outra diretriz que

permite à Administração controlar seus próprios atos, analisando-os quanto ao mérito e

quanto à legalidade. Somente a própria administração pode revogar ou anular

administrativamente (chama-se também “de ofício), um ato que ela mesma produziu.

Associado a este princípio há a idéia da “indisponibilidade do interesse e dos bens públicos”.

Isto significa que os bens da administração não são da administração, muito menos dos

gestores. Eles pertencem à própria coletividade, portanto são indisponíveis, não podem ser

onerados, dados em garantia ou alienados sem o devido procedimento legal. Por fim a um

último princípio mencionado na literatura que é o da “continuidade do serviço público”.

Como os serviços públicos são essenciais ao bem estar coletivo e muitas vezes à própria

manutenção da vida eles não podem sofrer interrupção. Imaginem, por exemplo, se numa

grande cidade o sistema de semáforos parasse de funcionar ou se os médicos de um hospital

publico se recusassem a atender os doentes. É por este motivo que o direito de greve, que é

previsto em lei, sofre uma limitação drástica no setor público, obrigando os sindicatos a

manterem um força de trabalho mínima para evitar o colapso total dos serviços.

Como vimos há muitos princípios, diretrizes e orientações sobre o serviço publico. Todos

eles funcionam para preservar os interesses coletivos, de todo o povo, que é em última

instância a razão de ser do Estado. Os governantes, os gestores públicos, devem fazer o

melhor possível para cumprir esta missão institucional e seguir estes princípios. Isto não

significa, entretanto que o gestor publico seja apenas uma cumpridor de leis, um autômato,

pelo contrário ele deve ter uma atitude inovadora, um comportamento criativo e uma

postura aberta a novos desafios. Só assim ele conseguira interpretar todos estes princípios

de acordo com cada contexto ou situação.

Estado, Governo e aparelho de Estado

Para terminar esta primeira aula devemos ainda fazer uma distinção entre estes conceitos

básicos. Nós vimos que o conceito de Estado se refere em primeiro plano a um ente

abstrato, gigantesco, ramificado por todas as dimensões da vida social, política e econômica.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 23

Hoje em dia é praticamente impossível viver sem o Estado. Por exemplo, as regras que

disciplinam a existência deste curso e a possibilidade que temos de organizá-lo, são regras

que emanam deste poder, quando você atravessa a rua numa faixa de segurança, você está

sendo beneficiado pelo poder de Estado que lhe assegura, em tese, segurança e proteção

naquele momento. O Estado é uma sociedade política, diferente da sociedade civil que é

privada. Nós dizemos que o Estado tem um “poder extroverso”, o que significa que pode

executar ações e gerar efeitos para além de suas próprias fronteiras, criando obrigações para

todos os cidadãos, extravasando seus limites.

Já o conceito de “Governo” é diferente. Governo é o conjunto de funções, papéis,

atribuições e ações que concretizam, tornam real, este poder político do Estado. Ele se

materializa pela rede de cargos, funções e órgãos públicos federais, estaduais e municipais,

distribuídos nos três poderes. O Governo é submetido periodicamente à vontade dos

cidadãos, se o modelo adotado é uma república democrática representativa, baseada em

eleições gerais. Ou o Governo pode ser uma república religiosa onde os dirigentes são

indicados pela cúpula da igreja. Governos mudam de acordo com o tempo, o contexto, os

valores políticos dominantes e o momento histórico. Podem ser autoritários, participativos,

transparentes, fechados, eleitos ou indicados, eficazes ou ineficazes, enfim, estão sujeitos ao

jogo de pressões e tensões normais das sociedades modernas, complexas e heterogêneas,

com múltiplos interesses convivendo simultaneamente.

Uma outra definição muito comum é a de “aparelho de Estado”. Normalmente seu sentido

traduz uma noção de recursos existentes para fazer o Estado funcionar. Estes recursos não

são financeiros propriamente ditos, mas sobretudo a capacidade de governo instalada,

representada pelas suas instituições, processos de trabalho e burocracia. Todos eles

orientados e regidos pelo direito administrativo e pelo direitos constitucional.

Assim, Estado, Governo e Aparelho de Estado são conceitos semelhantes, entrelaçados, mas

diferentes. Saber fazer a distinção ajuda a compreender melhor como funciona a gestão

pública.

Perguntas:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 24

1. Tente fazer um definição sua do que é o Estado e qual sua importância para a

sociedade atual. Justifique.

2. Qual a relação entre Estado e Administração ?

3. Na sua opinião há diferença entre a esfera publica e Estado ? Porque ?

Bibliografia comentada:

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. Saraiva: São Paulo,1981.

Este livro traz um novo enfoque sobre os problemas do Estado, vai muito além da mera

exposição de conceitos teóricos para apresentá-lo como realidade viva, concreta e dinâmica.

Examina, em detalhes, a sociedade, a origem e a formação do Estado, sua personalidade

jurídica, o Estado Moderno e a Democracia, a separação de Poderes, as funções do Estado e

os problemas do Estado Contemporâneo. Bem como as relações internacionais, a

intervenção estatal, o socialismo, o capitalismo e o Estado Democrático.

CHIAVENATO, Idalberto. Administração Geral e Pública. Elsevier: Rio de Janeiro,

2006.

Este livro foi elaborado originalmente para auxiliar os estudantes de nível superior nos

concursos públicos relacionados às carreiras federais que são muito exigentes na área da

gestão pública. Na verdade o livro adquiriu uma densidade e abrangência impar na literatura

disponível. Inicia comentando as escolas clássicas da administração para em seguida entrar

nos assuntos típicos da gestão publica: processo administrativo, gestão de pessoas,

comportamento organizacional até as novas abordagens da recente reforma gerencial. É

indispensável para quem quiser se aprofundar no assunto.

BOBBIO, Norberto, Teoria Geral da Política: a Filosofia Política e as Lições Clássicos,

Campus, Rio de Janeiro, 2000

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Esta obra já clássica, reúne 40 ensaios sobre política e Estado. O grande pensador italiano

Norberto Bobbio (Turim, 1909) ensinou Filosofia do Direito nas universidades italianas por

mais de trinta anos. Com 720 páginas ela versa sobre todos os assuntos importantes para

entendimento do Estado e da administração pública, entre os quais a política, a moral o

direito, o problema dos valores e da ideologia entre outros. Todos temas que repercutem

diretamente na gestão publica e proporcionam uma sólida base teórica.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 26

Aula 2

O surgimento e crise do Modelo Burocrático

Nesta aula vamos estudar e compreender como se formou e se transformou a atual

administração publica conhecida como “administração burocrática” ou “modelo burocrático

de administração”. Este modelo é atualmente muito questionado, particularmente com os

movimentos que aconteceram no mundo todo nos anos oitenta e noventa. Uma das

principais razões é a de que o estilo de administrar da burocracia não tem a flexibilidade e a

versatilidade para se adaptar às inovações do mundo moderno. Por outro lado o modelo

burocrático, também conhecido como “modelo weberiano” de administração representou

no passado um salto enorme de qualidade para a gestão pública na medida em que

profissionalizou seus funcionários e garantiu um padrão de impessoalidade e universalidade

no funcionamento do aparelho de Estado. Vamos analisar este processo a seguir.

Entendendo o aparelho de Estado

A organização estatal funcional de diversas maneiras, normalmente hierárquica e

verticalizada, ainda que haja uma tendência para alguns serviços se organizarem na forma

de redes incluindo o setor privado, como por exemplo, a área de proteção social e

assistência.

Normalmente as várias funções do aparelho de estado são agrupadas em quatro grandes

áreas: o setor do núcleo estratégico, as atividades exclusivas, os serviços não exclusivos e o

setor público não estatal. Vamos ver com um pouco mais de detalhe cada um deles.

O primeiro setor, chamado de “Núcleo Estratégico” representa ao governo em sentido lato,

são os setores centrais no funcionamento do Estado. Eles definem as leis e as políticas

públicas, executam os projetos e garantem os resultados esperados pelos serviços públicos.

No núcleo estratégico as decisões mais importantes são tomadas. Ele corresponde ao

Presidente da Republica, suas organizações de apoio, aos Ministérios, ao Legislativo, ao

poder Judiciário e suas organizações e ao Ministério Público. O padrão de propriedade que

estrutura e embase este setor é o da propriedade do tipo estatal.

Este setor é responsável pelo planejamento do governo e pelo desenho das políticas

públicas. O que pesa aqui são os critérios de eficiência e eficácia na gestão pública. É o lugar

por excelência onde métodos, instrumentos, habilidades e conhecimentos de modernização

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 27

das práticas gerenciais serão aplicados e utilizados. A importância da efetividade dos

projetos impacta diretamente nesta área do aparelho de Estado.

Um segundo setor seria aquele de “atividades exclusivas” do Estado, onde os serviços

públicos são prestados, mas somente os serviços que o Estado pode prestar, que são

exclusivos de suas competências e atribuições. Nesta área o Estado exerce o “poder

extroverso” porque ele fixa, define, fomenta, executa, controla e fiscaliza a execução do

serviço. Por exemplo, a previdência social, a polícia, a defesa nacional, as políticas de

combate ao desemprego, os serviços judiciários, a vigilância sanitária, o controle do tráfego

aéreo, etc., são todos serviços exclusivos do Estado, não podem ser delegados. A forma de

propriedade deste setor também é estatal já que os bens e serviços relacionados á atividade

estatal exclusiva.

Os “serviços não exclusivos”, como o nome já indica, pertencem a um conjunto de bens

públicos que podem ser prestados por organizações públicas porém não estatais ou

privadas. Apesar destas organizações não possuírem o poder de Estado ele se faz presente.

Estes serviços atendem direitos sociais básicos (como a educação ou a saúde) ou produzem

efeitos benéficos para o conjunto da economia (com o fornecimento de iluminação pública

numa cidade ou as estradas). A rigor muitos destes serviços não podem ser produzidos

senão em condição de monopólio, daí a importância das Agências Reguladoras e dos

mecanismos de controle. Os serviços de telecomunicações e de abastecimento de energia,

as universidades federais, etc., são alguns dos melhores exemplos. A propriedade neste

setor também é publica não estatal. As instituições neste setor tem mais autonomia

gerencial e trabalham mais com a lógica de resultados. A eficiência é um critério

fundamental para o processo decisório.

Finalmente temos a “produção de bens e serviços para o mercado”, que é o setor onde

atuam as empresas estatais controladas total ou parcialmente pelo Estado. É onde o Estado

investe diretamente ou porque o setor privado não tem forças para arcar com os custos dos

investimentos ou porque são monopólios naturais. O caso da Petrobrás é um bom exemplo,

além da importância vital do fornecimento de petróleo e da nossa dependência energética

desta fonte fóssil, altíssimos recursos são necessários para a pesquisa, prospecção e

extração de petróleo em águas profundas. O tipo de administração neste caso é puramente

gerencial e o tipo predominante de propriedade é a privada.

O quadro a seguir sintetiza estas relações e funções do aparelho de Estado.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 28

A administração pública como organização

A administração pública é uma organização como qualquer outra, embora tenha

características especiais que só ela possui, como por exemplo, o dever da publicidade e

impessoalidade dos seus atos. Como organização ela possui “recursos” definidos. Os

recursos são valores reais ou virtuais, intangíveis, que são empregados para realizar tarefas

concretas. Os recursos mais utilizados por uma organização são os bens, equipamentos e

edificações, as instalações em geral, os funcionários, os conhecimentos existentes, etc. Eles

são utilizados para atingir determinados “objetivos” organizacionais, que são os resultados

esperados. No caso das organizações publicas estes objetivos estão definidos em

dispositivos normativos, que são as leis, decretos, portarias, instruções, etc.

Assim uma organização é um sistema estruturado de recursos que tem como finalidade

atingir determinados objetivos. Na vida contemporânea praticamente todas as dimensões

do cotidiano estão afetadas por diversas formas de organização, até a família, a escola, o

clube, podem ser vistos como organizações. As organizações são como que as “regras do

jogo” que definem espaços de poder, autoridade e hierarquia entre os vários agentes e

atores públicos e privados.

A administração pública seria assim uma organização especial, pois sua função é manter o

Estado funcionando da melhor forma possível, atendendo as demandas da sociedade. A

administração em si mesma não é uma ciência tão moderna, se entendermos ela como uma

forma de manter e expandir as organizações podemos considerar que desde a antiguidade

ela existia. Imaginem, por exemplo, o grau de organização e portanto, de administração,

necessário para construir as pirâmides do Egito ou um aqueduto romano.

Entretanto foi com a sociedade industrial a partir do século XIX e com todas as novas

demandas de organização do setor produtivo que começaram a surgir os primeiros

conceitos e técnicas administrativas. Este processo acabou consolidando a administração

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 29

como uma disciplina independente da economia e de outras áreas do saber. A primeira

escola administrativa, por exemplo, surgiu nos Estados Unidos, em 1881. A partir daí

assistimos a uma dezena de escolas administrativas, como a científica, a das relações

humanas, a estruturalista, a comportamental, etc., cada uma delas enfatizando um aspecto

peculiar da vida organizacional.

As organizações podem ter desempenhos diferenciados. Normalmente o desempenho

organizacional é avaliado de acordo com três princípios: a eficácia, a eficiência e a

efetividade. Vamos ver cada um deles com um pouco mais de detalhe.

A Eficácia consiste no grau de atingimento ou alcance das metas que são programadas em

um determinado período de tempo, não se considerando por enquanto, os custos

implicados nesta ação. Quanto maior o grau de realização de uma meta ou objetivo, maior

será a eficácia da organização. Aqui talvez tenhamos que explicar melhor o uso de alguns

conceitos típicos da área de projetos que serão vistos com mais profundidade adiante.

Quando falamos em “diretrizes da administração” estamos falando em princípios, valores e

orientações gerais que valem para toda a organização. Por exemplo, um determinado

governo pode ter a seguinte diretriz: “nosso governo atua de forma democrática e

participativa, envolvendo os cidadãos e os servidores públicos no processo decisório”. Esta

diretriz não é um objetivo concreto, não é uma meta, é uma orientação que deveria inspirar

todas as ações do governo. Porém, a partir desta diretriz o governo pode estabelecer o

seguinte objetivo: “Revisar o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental através

de um processo de consulta permanente com as comunidades da periferia”. Este objetivo

aplica concretamente aquela diretriz inicial, a torna mais concreta e palpável. Agora

poderemos ter uma “meta” relacionada a este objetivo. Por exemplo: “o índice de sub-

habitação será reduzido em 20% a cada ano durante 4 anos”. Agora temos um objetivo que

foi quantificado, há um indicador de resultado e um prazo associado. Então, no dia a dia

confundimos tudo, mas neste debate sobre o desempenho da administração pública

devemos sempre distinguir os conceitos: Diretrizes, Objetivos e Metas.

A eficiência é sempre a relação entre os recursos necessários para executar uma ação e seu

produto imediato. Uma organização é eficiente se utiliza os recursos de uma forma mais

produtiva e econômica possível. A eficiência significa sempre uma forma mais racional de

uso dos recursos, uma relação mais adequada entre meios disponíveis e fins desejáveis. A

eficiência se distingue da eficácia, mas lhe completa o sentido. Imaginemos por exemplo que

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 30

o governo tenha como objetivo a promoção do desenvolvimento econômico de uma região

pouco dinâmica do país, através da construção de um grande sistema intermodal de

transporte de cargas, interligando sistemas rodoviários, aeroportuários, hidroviários e

marítimos, num grande porto. Para isso o governo projeta gastar R$ 500 milhões em 3 anos.

A pergunta sobre a eficácia seria: “o porto foi construído ? a integração com as rodovias e

hidrovias foi concluída ? o aeroporto foi duplicado ?”, etc. Já a pergunta sobre a eficácia

seria: “ o recurso orçamentário gasto foi bem gasto ? Houve um gasto proporcional, razoável

e adequado em relação aos equipamentos modernizados ou implantados?”. Fica evidente

que um projeto ideal é aquele que tem alta eficácia e alta eficiência, o que nem sempre

encontramos nas obras da administração pública.

O conceito de eficiência é muito próximo à idéia de economicidade. A economicidade

implica na minimização dos custos dos recursos utilizados para executar uma atividade sem

que os padrões de controle estejam ou fiquem comprometidos. Não é simplesmente pagar

ou comprar mais barato. É fazer mais barato e manter a qualidade demandada pela

sociedade. Este princípio vem sendo cobrado muito pelas auditorias dos órgãos de controle

externo.

Principais diferenças entre eficiência e eficácia, algumas metáforas.

Mas está faltando um conceito fundamental para avaliar o desempenho da administração. O

conceito de efetividade. Este conceito está focado nos efeitos, nos impactos esperados e

observados na população-alvo do programa, projeto ou planejamento. A efetividade pode

ser entendida também como a união entre a eficácia e a eficiência. No exemplo anterior

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 31

qual seria a efetividade desejada ? Seria o gasto do recurso orçamentário ? Uma terceira

pista para o aeroporto ? Será ? De modo algum. A efetividade seria medida pelo efetivo

desenvolvimento da região estagnada economicamente. Teríamos, então, que ter

instrumentos e técnicas de monitoramento, avaliação e controle para aferirmos de fato se o

gasto público que gerou um produto específico, produziu o resultado esperado, que seria o

maior dinamismo da região. Mas estes indicadores são sempre difíceis de mensurar, porque

a realidade dos projetos públicos é de uma tal complexidade que sempre uma dezena de

outras variáveis estará sempre interferindo nos resultados esperados ou desejados.

Junto com estes princípios de avaliação do desempenho costumamos agregar um quarto

elemento, a equidade. A equidade nos orienta a considerarmos sempre qual foi o balanço

final gerado de justiça social, de compensação entre setores da população de maior e

menor renda, objetivando um maior equilíbrio econômico e social. Por exemplo, um projeto

de uma grande usina hidroelétrica que tenha alta eficiência, alta eficácia, alta efetividade,

pois garantiu o desenvolvimento de uma região carente de energia. Mas o projeto não

previu medida alguma de mitigação, compensação ou neutralização do impacto sócio-

ambiental, que obrigou o deslocamento de centenas de famílias, não é um projeto de

equidade aceitável e deverá ser refeito.

Os diversos modelos de administração pública

Na história da administração publica o primeiro modelo conhecido é chamado de

patrimonialista. Neste modelo o aparelho do Estado funciona como uma extensão do

soberano. É o modelo típico dos antigos Estados estamentais e oligárquicos, dos governos

absolutistas e centralizadores. A elite dirigente utiliza os bens públicos para proveito próprio.

Surgem e se consolidam relações de clientelismo, o poder de estado é utilizado de forma

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 32

discricionária, distribuindo favores em troca de apoio político e lealdade. Os servidores deste

tipo de governo possuem status de nobreza e estão submetidos a uma relação de

vassalagem com o soberano.

No estado patrimonialista os espaços públicos e privados se confundem, não há noção clara

de direitos e deveres, os governantes estão acima da lei e do próprio Estado. Os cargos

públicos são considerados prebendas ou presentes dados em troca de apoio. A “res pública”

ou a coisa pública é confundida com a “res principis” ou o patrimônio do príncipe. Numa

situação como esta o nepotismo, a corrupção e o tráfico de influências são comuns e até

aceitos como processos naturais. No patrimonialismo os patrimônios se confundem, são

interdependentes. Este estado era típico no período pré-capitalista, em especial no estado

medieval e no estado absolutista clássico. O comércio enfrentava grandes dificuldades de

desenvolvimento dada a proliferação de regras e normas diferentes em cada cidade ou

mercado, sem contar os entraves legais, das corporações, a carga de impostos e pedágios. O

capitalismo comercial só começou a florecer quando as Revoluções Burguesas, também

conhecidas como Revoluções liberais, derrubaram a velha ordem e implantaram uma

sociedade de homens livres, ou seja, livres para comprar e vender, baseada na propriedade

privada.

O fato interessante sobre o modelo patrimonialista de Estado é que ele não é só um modelo

histórico, localizado num tempo muito distante. Os países como o Brasil, por exemplo,

viveram práticas muito fortes de um Estado patrimonialista até a chamada Revolução de

Trinta que iniciou um forte processo de modernização do estado brasileiro. Ainda assim,

quando assistimos práticas de nepotismo no Congresso Nacional, por exemplo, estamos

presenciando resquícios do patrimonialismo que ainda persistem na nossa cultura política

moderna.

A superação do modelo patrimonialista ocorre quando o modelo burocrático se torna

dominante. Os princípios que organizam este modelo de administração são muito parecidos

com os princípios da racionalidade produtiva que eram praticados nas grandes plantas

industriais no final do século XIX e início do século XX. Ele representou também uma reação

ao modelo patrimonial que era marcado pela injustiça e pela discriminação.

A melhor definição teórica do modelo burocrático foi deduzida a partir das contribuições do

sociólogo alemão Max Weber, que viveu entre 1864 e 1920, tanto que este modelo também

é conhecido como “modelo weberiano” de administração. Weber estudou muito as

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 33

organizações que se consolidaram numa fase de rápida prosperidade do capitalismo

industrial nascente. Estas organizações, segundo Weber, se baseavam em leis escritas, em

normas documentadas e formais. A autoridade nestas organizações não derivava de um

título de nobreza, do sangue ou da vontade divina, mas do cargo que a pessoa ocupava na

organização. A obediência devida é para leis e normas, regulamentos que são impessoais,

valem para todos, inclusive para os governantes.

Para Weber toda organização que se baseia em leis, normas e códigos formalizados é uma

burocracia. Esta burocracia representava para Weber um “tipo ideal”, ou seja, um conceito

abstrato que serviria como uma ferramenta analítica para compreender a realidade

existente. As características deste “tipo ideal” seriam bem marcadas. Vamos ver com mais

detalhe a seguir.

O primeiro traço de personalidade é a “formalidade”. As organizações são baseadas em

estatutos, normas e regulamentos explícitos, que estipulam direitos e deveres aos ocupantes

em cada cargo e que orientam a conduta e as atividades de todos. Estas normas devem ser

executadas de acordo com as rotinas e procedimentos fixados por regras e normas técnicas.

O problema das comunicações é resolvido através da mensagem escrita, passível de

comprovação adequada. A formalidade iguala todos perante a lei, é a igualdade formal,

típica dos regimes de democracia liberal.

Os governos são impessoais, a impessoalidade orienta as relações hierárquicas. O

relacionamento entre funcionários não é subjetivo, não depende dos caprichos ou do bom

humor entre eles, nem do carisma. A autoridade é baseada na racionalidade. Isto ocorre

porque o relacionamento existe entre cargos e funções, antes que pessoas. As normas se

aplicam universalmente, a todos. A impessoalidade garante que a conduta do funcionário

público será isenta de ódios e paixões.

A seleção de funcionários é feita pelo mérito, não pela troca de favores ou pelo clientelismo.

O treinamento constante assegura que o mérito seja mantido como atributo necessário para

o exercício de uma função e ocupação de um cargo público. Por isso este modelo também é

conhecido como “modelo meritocrático”, a organização do trabalho é baseada nas

qualidades intrínsecas da pessoa, não na sua lealdade política ou ideológica. Este modelo

separa a técnica da política. Os funcionários são profissionalizados e seguem uma carreira

publicamente definida, tem acesso aos cargos públicos não por indicações políticas, mas por

processos seletivos impessoais e igualitários.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 34

Outra característica forte do modelo weberiano é sua ênfase clara na disciplina e na

hierarquia. Weber teria adaptado estes elementos a partir de sua observação de como se

organizava o exército prussiano e as razões de seu sucesso militar. As relações de trabalho

são piramidais, verticalizadas. A cada funcionário corresponde um chefe imediato que se

reporta a um nível hierárquico superior e assim por diante até o topo da pirâmide. Este

sistema só funciona com uma alta divisão do trabalho, isto é, cada um cumpre uma tarefa

especializada que é perfeitamente harmonizada com as demais, o organismo só funciona em

conjunto, como um todo articulado. As competências e responsabilidades estão claramente

definidas, como num formigueiro, cada funcionário sabe quem é e o que faz.

No modelo meritocrático há uma separação total entre propriedade pública e propriedade

privada ou particular. O estado não tem donos, os cargos não tem donos, pelo contrário,

estão acima de todos seus ocupantes. Este tipo de estrutura supõe que tudo seja planejado

nos mínimos detalhes, e que tudo seja previsível, antecipadamente conhecido. Como

podemos deduzir, o mundo weberiano da administração pública é um mundo muito árido de

relações humanas, é quase uma condenação à perfeição.

Resumindo, o conceito ideal de burocracia, para Weber, apresentaria os seguintes

elementos fundamentais:

FORMALIDADE: as organizações são formadas baseadas em estatutos, normas e

regulamentos explícitos, que estipulam direitos e deveres dos ocupantes de cada cargo e

regulam sua conduta e atividades, que devem ser executadas de acordo com as rotinas e

procedimentos fixados pelas regras. As comunicações são sempre feitas por escrito, a fim de

proporcionar comprovação e documentação adequadas. Na burocracia, todos são iguais

perante a lei.

IMPESSOALIDADE: a obediência dos subordinados ao chefe é devida pelo cargo que este

ocupa, não pela tradição ou pelo carisma deste. As normas instituídas racionalmente são

aplicadas a todos. As relações profissionais são isentas de ódios ou paixões, possuindo

caráter impessoal.

PROFISSIONALISMO: as burocracias são formadas por funcionários especializados

remunerados, ocupantes de cargos, e oferecem a estes uma carreira profissional.

MÉRITO: os funcionários são selecionados por suas qualificações, às quais são aperfeiçoadas

por treinamento especializado. A atribuição de responsabilidades e a evolução na carreira

são realizadas por critérios de mérito.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 35

HIERARQUIA e DISCIPLINA: a burocracia é uma organização que tem seus cargos

previamente estabelecidos segundo os princípios da hierarquia. Cada cargo inferior deve

estar sob controle e supervisão de um superior, ou seja, as relações de trabalho possuem

caráter hierárquico.

DIVISÃO DO TRABALHO: a fim de se atingir a eficiência da organização, há uma sistemática

divisão do trabalho, que estabelece as atribuições de cada participante, suas funções

específicas e sua esfera de competência e responsabilidade.

SEPARAÇÃO DA PROPRIEDADE: os administradores da burocracia não necessariamente seus

donos ou proprietários, surgindo a figura do profissional que se especializa em gerenciar a

organização. Os meios de produção não são propriedade dos burocratas, mas estão acima

destes.

Para Weber um dos elementos fundamentais da burocracia é o detalhamento prévio das

atividades. A conseqüência desejada é a previsibilidade do comportamento dos seus

membros, ou seja, os regulamentos garantem que o comportamento futuro dos servidores

será este ou aquele. Este desejo de previsibilidade weberiano e sua conseqüente

padronização do comportamento humano foi .

O modelo burocrático de administração garantiu a estabilidade e a previsibilidade tão

importantes para a expansão do comércio e da indústria. Um Estado eficiente e funcionando

como uma máquina poderia ser muito útil para o liberalismo econômico. Devemos ressaltar,

como já foi assinalado antes, que o modelo burocrático não eliminou o modelo

patrimonialista. Há casos inclusive, como é o do próprio Brasil, onde elementos dos dois

modelos convivem numa contradição aparente, mas reveladora da forma imperfeita como

evolui nossa gestão pública. Um exemplo é a própria gestão de pessoas na administração

pública federal. Ao mesmo tempo que a estruturação de carreiras burocráticas típicas no

núcleo estratégico avançou, há ainda milhares de cargos ocupados por indicações políticas

com pouca preocupação sobre o mérito ou a conveniência destas indicações para a

qualidade do serviço publico.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 36

A crise do modelo burocrático tradicional

Antes de mais nada é preciso reforçar algo que nem sempre é enfatizado na literatura mais

recente sobre a gestão publica: o modelo weberiano representou um tremendo avanço em

relação aos modelos anteriores. Apesar dos vários limites e fragilidades que vamos examinar

com mais detalhe a seguir, o modelo burocrático superou as mazelas do patrimonialismo e

tem méritos próprios inquestionáveis.

Weber, entretanto desenhou um modelo ideal de organização para um contexto histórico

onde a rotina e as mudanças eram pouco significativas. O mundo real é muito mais dinâmico

e as mudanças são muito mais freqüentes e inesperadas que as suposições do modelo

burocrático. A visão weberiana é muito simplificadora ao isolar elementos da política dos

elementos da técnica, é muito mecanicista ao supor que as rotinas possam ser previsíveis.

Normalmente as pessoas levam para dentro das organizações em que estudam, trabalham,

vivem, enfim, os interesses individuais ou dos grupos a que pertecem. A este processo

chamamos de “particularismo”. Além disso o excesso de regras e normas supõe que o

comportamento social e humano, que é imprevisível por natureza, possa ser enquadrado em

todos os seus detalhes através de um “manual de procedimentos”.

A hierarquia excessiva acabaria por gerar uma perda de autonomia e iniciativa dos escalões

subordinados. Isto conduziria a uma perda de eficiência e eficácia da maquia pública. Em

todo os casos, parece que o modelo esquece o peso do fator humano, do comportamento

humano. A valorização exagerada de normas e manuais poderá gerar uma conformidade

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 37

muito grande, uma passividade muito grande. O burocrata weberiano trabalha em função

do regulamento e não dos resultados. Ligado à conformidade está a grande resistência às

mudanças que pode se criar na cultura política interna. Esta resistência cria uma espécie de

blindagem contra a exploração de novas oportunidades, de melhoria de processos e

qualidade.

A rigor a hierarquia não é um problema ou uma disfunção, o problema acontece quando ela

é exagerada e gera distorções. Uma delas é inibir a iniciativa e proatividade dos

subordinados. Uma decorrência quase patológica do excesso de hierarquia e impessoalidade

são os sinais visíveis que demonstram a posição das pessoas na organização. Por exemplo, o

uso de broches, crachás diferenciados, o tamanho das mesas ou outros privilégios podem

gerar um clima organizacional desmotivador para os demais funcionários.

Os relacionamentos despersonalizados acabam desumanizando as relações de trabalho e a

própria relação com os cidadãos. Esta postura acaba criado uma série de patologias de grupo

e sofrimento mental variado que no limite diminui a qualidade do serviço público e debilita

sua própria força de trabalho. O processo decisório no modelo burocrático é baseado na

categorização prévia da realidade e na adoção de soluções prontas, do tipo “recomendadas

pelo manual”. Este aspecto reforça a idéia que temos dos equívocos das soluções

burocráticas e administrativas que não resolvem os problemas reais, e até os agravam. Um

exemplo sarcástico que ilustra este aspecto é a cultura burocrática e cartorial brasileira das

certidões, autenticações e comprovantes. Para tudo ou quase tudo, os cidadãos precisam

comprovar a todo momento quem são, onde moram e o que fazem.

O modelo burocrático começa a entrar em crise com a crise do chamado “Estado do Bem

Estar social” e na nossa realizada quando entra em crise o modelo de “substituições de

exportações”. Vamos ver rapidamente estes dois conceitos. O “Estado do Bem Estar Social”

foi assim denominado por se referir a um sistema onde os governos garantiam políticas

públicas sociais como a educação, a saúde, a previdência social, a habitação para toda a

população ou quase toda. Um traço fundamental deste tipo de sociedade foi a garantia do

pleno emprego com políticas ditas keynesianas e a intervenção do Estado em setores

estratégicos da economia. Este estado foi característico nos Estados Unidos e nos países

europeus e o Japão no pós guerra. Já o modelo de “substituições de importações” foi um

modelo econômico e político adotado por diversos países da América Latina, entre eles o

Brasil para acelerar o processo de industrialização nos anos cinqüenta e sessenta. Nestes

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 38

países a industrialização foi tardia, isto é, enquanto os países mais centrais já estavam com

suas indústrias montadas, aqui a dinâmica econômica girava em torno da exportação de

matérias primas. Os defensores deste modelo propunham que as tarifas alfandegárias para

importar produtos industrializados fossem relativamente altas, estimulando num primeiro

momento e protegendo logo a seguir, o surgimento de indústrias nacionais que

substituíssem as importações dos países mais desenvolvidos. Outro elemento importante

era o investimento publico pesado em infra-estrutura para garantir a economia. Junto com a

industrialização acelerada, este modelo produziu grande nível de endividamento dos

governos e começou a fazer água quando estouraram as crises do petróleo nos anos setenta,

uma das principais matérias-primas. Foi o fim da chamada “era dourada” de crescimento

rápido do capitalismo mundial.

Mas o que isto tudo tem a ver com gestão pública ? Tem muito a ver. Esta falência de um

modelo de Estado nos países ricos e do outro modelo nos países mais pobres atingiu em

cheio o modelo burocrático de administração. Tanto que nos anos oitenta surgiu uma vasta

literatura sobre a “crise do Estado” e todo o debate sobre qual o tamanho do Estado, que

tipo de governo seria melhor para enfrentar estes problemas e outros temas relacionados.

Um primeiro impacto da crise foi a crise fiscal. O grande endividamento do Estado abalou

sua forma de financiamento, seu crédito. As políticas públicas se deterioraram, as carreiras

públicas foram sendo desmanteladas. Pesados cortes de gastos atingiram em cheio o custeio

da máquina pública e seu funcionamento normal. Muitos países neste período – anos

oitenta – tiveram crises de pagamento da dívida externa e foram obrigados a pedir

empréstimos no FMI, pagando altas taxas de juro e comprometendo seu futuro.

O Estado do Bem Estar não pode ser mais sustentado, havia uma rejeição crescente à alta

carga de impostos nos países centrais. Fator que contribui para que no início dos anos

oitenta ressurgisse com força as velhas teorias liberais do Estado “mínimo”. Nos países

periféricos a dívida publica gigantesca, o retorno de surtos inflacionários e a frágil

democracia puseram um fim ao modelo antigo de crescimento. Houve nesta época sérias

crises de governabilidade: os governos eram incapazes de agir e resolver os grandes

problemas de seus países. Além disso, as transformações atingiram o antigo sistema

soviético de economias planificadas.

O cenário estava quase completo: um mundo com rápidas transformações, crise do Estado,

demandas sociais crescentes, redemocratização em muitos países e necessidade de inovar

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 39

na administração pública. O modo formalista e ineficiente do modelo weberiano foi cada vez

mais questionado. Aqui e ali surgiram experiências e idéias sobre como reformar o Estado,

para garantir mais agilidade e flexibilidade, que novo tipo se servidor público seria

necessário formar para esta época conturbada e imprevisível. Um conjunto de propostas foi

progressivamente construídas, mais tarde este movimento ficou conhecido como

“administração pública gerencial”, tema do nosso próximo debate.

Um resumo da crise do modelo burocrático de administração:

• Disseminação das Tecnologias da Informação

• Demandas crescentes por melhores serviços públicos.

• Maior democratização do Estado e da Sociedade.

• Atacado pela “onda” ultra-liberal: Estado Mínimo.

• Pouco eficaz para universalizar serviços públicos com qualidade: enfraquecido

pelo processo privatizante.

• Em crise fiscal profunda, reduzida capacidade de investimentos e manutenção.

• Crise de legitimidade e representatividade.

• Ineficiências gerenciais generalizadas.

• Culturas organizacionais excludentes e não-democráticas.

• Embrutecimento e degeneração dos servidores públicos.

O modelo gerencial na administração pública

Na medida em que o estilo anterior de administração se esgotava, novas experiências foram

surgindo no campo administrativo. Em países como os Estados Unidos, a Inglaterra, a

Austrália e na Nova Zelândia e logo após na Europa e Canadá, surgiram experiências

inovadoras. Todas elas tinham algo em comum e ficaram conhecidas na literatura como

“gerencialismo”, ou em inglês, “managerialism”. O estilo gerencialista foi ganhando

variedades e ramificações dependendo do contexto em que era aplicado mas podemos

identificar com segurança elementos essenciais que estavam na sua base.

Ele foi associado, pelo menos no seu início, a um forte corte de pessoal, de gastos com

recursos humanos. Havia a idéia de que aparelhos do Estado estavam “inchados” de pessoal

com muita ociosidade. Foi retomada uma idéia muito persistente em torno da melhoria da

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 40

eficiência do gasto publico. O debate sobre a produtividade do setor público ganhou

primeiro plano.

Os processos de trabalho foram revistos, o que importava agora não eram os meios, mas os

resultados. A estrutura do governo, em alguns países, foi reorganizada no formato de

“agências”, ao invés de ministérios, com mais autonomia operacional e maior cobrança de

metas e resultados. Uma série de técnicas e ferramentas conceituais foram criadas e

difundidas para melhorar o controle sobre procedimentos e funcionários, monitorar

projetos, avaliar políticas e medir os resultados obtidos. Neste período foram adaptados

programas de “qualidade total” que já eram usados no setor privado, para dentro da esfera

pública, da administração pública. Outras variações do gerencialismo enfatizaram aspectos

singulares. O chamado “consumismo” ou “consumerism” em inglês, por exemplo, focalizava

a satisfação dos cidadãos renomeados de “clientes” na perspectiva do consumo maior e

melhor de bens e serviços. Outra perspectiva gerencial, a “orientação ao serviço público” ou

“Public Service Orientation”, em inglês, já enquadrava o cidadão não mais como simples

consumidor de produtos e serviços, mas como sujeito de direitos, a equidade passou a

importar.

O modelo de Orientação ao Serviço Público (o “Public Service Orientation”), não propõe a

volta ao estado pré-gerencial, ao modelo weberiano. Ele surgiu na Inglaterra como um

debate sobre os impactos da descentralização no setor público. Alguns teóricos ingleses na

época diziam, por exemplo, que os governos locais não são bons para os serviços públicos

porque são pequenos, mas porque estão mais próximos dos cidadão. Isto deveria permitir

maior participação e a decisão próxima da comunidade.

Nesta escola o conceito de cidadão é radicalmente diferente das concepções anteriores,

porque há o conceito de cidadão, que é sempre um conceito coletivo. O termo “cliente” ou

“consumidor” tem uma conotação individualizada, vinculado à tradição liberal. Isto permite

pensar os valores de equidade, justiça e accontabilty, que não são exatamente iguais aos

valores do mercado, do mundo empresarial. O planejamento estratégico, por exemplo, não

pode estar confinado à burocracia, o debate público é valorizado. Outro conceito estratégico

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 41

para esta corrente é a cooperação entre agências publica, tanto quanto o valor da

“competição” como é colocado pelo modo gerencial puro.

Segundo a escola orientada para o serviço público as diferenças fundamentais entre a gestão

pública e privada são muitas e diversificadas

As principais diferenças entre o público e o privado na gestão.

Fonte: Abrúcio, 1997

O modelo gerencial representou um rompimento com a administração burocrática anterior.

Seria um erro, entretanto que todos os princípios do estilo weberiano foram negados. A

idéia mais adequada seria a de que eles foram absorvidos e reorganizados na sua maior

parte. Por exemplo, manteve-se e valorizou-se a idéia de que os processos de seleção e

recrutamento no setor públicos estejam baseados estritamente no mérito das pessoas, a

existência de um sistema racional de remuneração, baseado na avaliação sistemática do

desempenho e assim por diante.

A administração pública gerencial valoriza uma estratégia que define claramente os

objetivos, que confere mais autonomia na gestão de recursos, mas também cobra metas

pactuadas previamente. A organização deve ser mais “enxuta”, com menos níveis

hierárquicos e menos chefes. Mais voltada para os fins, do que para os meios. No novo

estilo o interesse publico não é necessariamente o “interesse do Estado” e de seus

burocratas. Rompe-se com uma tendência dos burocratas públicos se identificarem a tal

ponto com o Estado confundindo interesses. O interesse público é o da coletividade, que

deve ter meios e condições de livre manifestação e controle sobre os aparelhos do Estado.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 42

O novo paradigma descentraliza as funções, estimula processos mais colegiados e

horizontais dentro da gestão pública. O cidadão também é visto como cliente dos serviços.

Perguntas

1. O chamado modelo de gestão racional-legal ou burocrática não atende as demandas

da sociedade moderna, mas cumpriu um papel na história da administração

importante. Você sabe porque ?

2. No modelo gerencialista o cidadão é tratado tambem como cliente. Explique.

3. Quais são as tendência de evolução da escola chamada “nova gestão pública” ?

Bibliografia

ABRUCIO, F. L. (1997). O impacto do modelo gerencial na Administração pública: um breve

estudo sobre a experiência internacional recente. Caderno ENAP, n. 10, Brasília.

Nesta publicação o Professor Abrucio da FGV faz um rápido apanhado das experiências

internacionais tendo como referência a expansão do modelo gerencial puro. Ele destaca a

flexibilidade de gestão, a qualidade dos serviços e as prioridades ao consumidor como

aspectos centrais na tendência dominante nos anos oitenta. Em seguida analisa a

abordagem do “public service oriented” e as transformações da administração norte-

americana. É uma excelente leitura para quem quiser se situar no debate sobre a gestão

pública inovadora.

CÂMARA DA REFORMA DO ESTADO – PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Plano Diretor da

Reforma do Aparelho do Estado. Brasília, 1995.

O Plano Diretor da Reforma do Estado foi elaborado pelo Ministério da Administração

Federal e da Reforma do Estado e, depois de ampla discussão, aprovado pela Câmara da

Reforma do Estado em sua reunião de 21 de setembro de 1995. Em seguida, foi submetido

ao Presidente da República, que o aprovou. O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do

Estado definiu objetivos e estabeleceu diretrizes para a reforma da administração pública

brasileira, instrumento indispensável para consolidar a estabilização e assegurar o

crescimento sustentado da economia. A leitura deste trabalho é fundamental para entender

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 43

a guinada na gestão pública brasileira pós Bresser Pereira e as reformas postas em prática a

partir do primeiro governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.

CHIAVENATO, Idalberto. Administração Geral e Pública. Elsevier: Rio de Janeiro, 2006.

Este livro foi elaborado originalmente para auxiliar os estudantes de nível superior nos

concursos públicos relacionados às carreiras federais que são muito exigentes na área da

gestão pública. Na verdade o livro adquiriu uma densidade e abrangência impar na literatura

disponível. Inicia comentando as escolas clássicas da administração para em seguida entrar

nos assuntos típicos da gestão publica: processo administrativo, gestão de pessoas,

comportamento organizacional até as novas abordagens da recente reforma gerencial. É

indispensável para quem quiser se aprofundar no assunto.

Aula 3

A Gestão Pública no Brasil

O modelo patrimonialista de gestão publica vigorou com domínio quase absoluto no Brasil

até a chamada “revolução de trinta”. O Estado era administrado de forma autoritária,

clientelista e verticalizada pelas elites agrário-exportadoras. O aparelho do Estado era objeto

das disputas políticas entre as oligarquias regionais. A Republica Velha foi palco constante de

escândalos e corrupção, as eleições inclusive não eram legitimadas por todas as elites. A

administração pública refletia este contexto, não era profissionalizada, nem havia

mecanismos de seleção pública, impessoal e transparente.

Na Revolução de Trinta novas elites assumem o país. Mais ligadas aos setores médios

urbanos e industriais estas elites estabelecem, através do Governo Vargas, um programa de

reformas e modernização do Estado brasileiro. O modelo patrimonialista vigente não se

ajustava mais aos interesses econômicos que demandavam investimentos públicos em infra-

estrutura, uma burocracia ágil para apoiar o setor privado, um ordenamento legal mais

racionalizado e funcional. Nesta época foram criados os ministérios da Educação, Saúde

Pública, Trabalho e Indústria e Comércio. A Constituição de 1934 foi a primeira a trazer um

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 44

título específico sobre os funcionários públicos. O primeiro governo Vargas é considerado

pioneiro na modernização da gestão pública brasileira.

Este primeiro movimento modernizante foi inspirado nas idéias de dois fundadores da

administração moderna como disciplina: Taylor e Fayol. Ambos desenvolveram esforços para

racionalizar os processos de trabalho. Eles concebiam a organização como um sistema

fechado, sem considerar o ambiente institucional que o cerca. Já em 1936 o governo Vargas

introduziu no país o sistema de mérito, delegando ao diplomata Mauricio Nabuco, no ano de

1936, o texto da proposta ao Congresso Nacional de uma lei que regulamentasse a gestão do

Estado. Esta lei ficou conhecida como a “Lei de Reajustamento”. Foi inspirada no modelo

meritocrático das carreiras do “Civil Service” da Inglaterra, do serviço público Francês e da

“Civil Service Commission” dos Estados Unidos.

A primeira lei a organizar o serviço publico brasileiro, a lei 284, data desta época. Ela criou

um colegiado para coordenar o esforço de modernização pública. Ele se chamava “Conselho

Federal do Serviço Público Civil”, criado em 1936. Entretanto, como fruto da negociação no

Congresso com as bancadas ligadas aos setores mais conservadores manteve-se uma série

de resquícios do estado patrimonialista. Um deles foi a adoção de quadros de cargos

comissionados, de livre nomeação e demissão pelos governantes. Neste momento inciou o

processo de organização e separação de cargos comissionados dos efetivos e a elaboração

da grade de remuneração dos servidores públicos.

Em 1937 o Conselho Federal do Serviço Publico é extinto e no seu lugar surge o DASP,

Departamento Administrativo do Serviço Público. O DASP implementou um conjunto de

reformas muito importantes. É desta época que surgem os primeiros concursos públicos e o

combate ao nepotismo, que era uma prática corriqueira até então. A promoção por mérito e

tempo de serviço, o incentivo à profissionalização dos funcionários e normas mais rigorosos

de organização dos serviços, forma algumas características notáveis deste inicio do DASP.

Neste período passamos a ter no Brasil um conjunto de critérios mais próximos ao modelo

racional-legal para funcionamento da máquina pública. Os princípios da chamada

“organização científica do trabalho” de inspiração tayloristas foram levados ao extremo.

Um resumo destes primeiros trinta anos da gestão pública brasileira.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 45

O processo de redemocratização, após a queda do “Estado Novo”, em 1945, resultou num

debilitamento do ímpeto original do DASP. Por pressões do funcionalismo, a Constituição de

1946 efetivou funcionários interinos e que não haviam sido admitidos por concurso público.

Foi o início dos tristemente conhecidos “trens da alegria” do serviço público. Acordos sem

ética para manutenção de privilégios e mordomias à segmentos da burocracia e

governantes, que são pagos no final por toda a sociedade. Na verdade era o velho estilo

patrimonialista ainda sobrevivendo nas entranhas da cultura política. A gestão pública ainda

era usada como moeda política no jogo nem sempre lícito da jovem democracia brasileira.

Em 1952 houve uma retomada dos princípios originais com promulgação por lei do Estatuto

dos Funcionários Públicos Civis da União. Esta normativa reforçava mais uma vez a exigência

de concurso público como regra geral para admissão. No segundo governo Vargas outras

medidas afetam a gestão pública brasileira. Houve uma maior descentralização, incentivo ao

planejamento administrativo, coordenação das ações e criação de assessorias mais

qualificadas para a Presidência da República e os ministérios.

Na sequência temos as importantes transformações provocadas pelo Governo Juscelino

Kubitschek que ao assumir o poder identificou a incapacidade da máquina pública brasileira

em atender seu ambicioso programa de governo. O “Plano de Metas” exigia muita eficiência

e eficácia da administração pública. Naquela época o funcionalismo público era muito

influenciado pelo jogo dos partidos, isto se refletia na dificuldade de negociação dos projetos

do governo no Congresso. Foi por isso que JK criou uma estrutura executiva quase que

paralela ao Governo, os chamados “Grupos Executivo”. Estes grupos executam os principais

projetos do Plano de Metas, inclusive a criação de Brasília. Mas em relação à reforma

administrativa houve poucos avanços, o DASP estava fragilizado desde 1945 e o governo

limitou-se a produzir estudos e criar comissões. Em 1962 uma lei federal dá estabilidade a

todos os servidores com no mínimo cinco anos de serviço, independente da forma de

contratação. Com isso alguns milhares de servidores sem concurso entraram na

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 46

administração publica. Como podemos ver, de tempos em tempos há uma sobrevida das

práticas da Republica Velha, demonstrando uma espécie de ciclo político onde se revezam

com diferentes ritmos o modelo racional-legal em luta contra o estilo patrimonialista.

A gestão pública nos governos militares

Os governos militares foram caracterizados pelo autoritarismo no plano político, mas pela

modernização gerencial em diversas áreas, inclusive na administração publica. A reforma

administrativa de 1967 foi precursora de várias iniciativas que foram tomadas só vinte anos

depois no movimento gerencialista que culminou na proposta da Reforma de 1995.

Tudo teve início com os estudos e propostas da chamada “Comissão Amaral Peixoto” que

continha um detalhado diagnóstico da administração pública brasileira, porém avançava

pouco em termos de propostas concretas. Entre os principais problemas apontados pela

Comissão estavam a falta de coordenação das ações governamentais, a excessiva

centralização da administração na Presidência da República, o excesso de burocracia e o

engessamento das carreiras públicas provocado pelo antigo estatuto do servidor público que

vinha de 1952.

O próprio presidente Castelo Branco já havia participado na coordenação da comissão pelas

Forças Armadas. Apesar da importância na agenda política do governo militar a proposta em

debate no Congresso era muito tímida. O Governo retirou a proposta e criou mais uma

comissão: a Comissão de Estudos Técnicos para a Reforma Administrativa, a COMESTRA. Um

ilustre ministro do governo militar, Roberto Campos, foi designado para coordenar a

comissão que foi presidida por Hélio Beltrão e contaria com eruditos da área: Simões Lopes,

Carlos Veloso e Jorge Flores. Hélio Beltrão defendia os princípios da descentralização, da

delegação e da desburocratização. Quinze anos depois ele assumiria o Ministério da

Desburocratização no Governo Figueiredo. Um outro expoente da comissão, Teixeira Dias,

vinculado a Roberto Campos, era um quadro experiente com passagem pela Light e

conhecedor de técnicas modernas de orçamento.

No final de 1965 a Comissão começou a trabalhar no que seria mais tarde conhecido como o

“Decreto-Lei 200/67” da Administração Pública federal. Neste ordenamento legal muitas

idéias avançadas para a época já estavam formalizadas. A articulação entre planejamento,

orçamento e execução financeira, a criação de mecanismos de controle interno e

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 47

transformação do controle externo em ex-post ao invés de ex ante, estavam entre elas. Uma

das principais definições era a profissionalização do serviço público, com a definição do

sistema de carreiras e a criação de um órgão central para administrar a reforma

administrativa.

As fundações foram definidas como entidades de direito privado e portanto, não sujeitas ao

controle burocrático da administração direta e autárquica. Elas foram muito utilizadas por JK

no Plano de Metas. No período militar houve também uma grande expansão do Estado

brasileiro. Dezenas de fundações, autarquias, empresas e sociedades de economia mista

foram criadas. A administração federal já podia contratar servidores utilizando a

Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT. Porém, mantendo a tradição nefasta da gestão

pública brasileira, a Constituição de 1967 apesar de valorizar o concurso público, também

deu estabilidade para todos aqueles que tivessem pelo menos cinco anos de serviço publico

em todos os níveis da federação. Ao longo dos anos setenta houve pequenos avanços na

estruturação da administração federal, especialmente. De fato a qualidade e a eficiência da

gestão pública deixaram muito a desejar. Apenas em alguns setores ou instituições se

conformaram verdadeiras “ilhas de excelência” com processos organizados e pessoal mais

qualificado. Geralmente estas “ilhas” se construíram em volta de burocracias que eram

autênticas tecnocracias dentro do governo. As áreas mais sólidas eram a fazendária, a

jurídica, a legislativa, a diplomática e a militar. Em 1970 foi criada a Secretaria de

Modernização – SEMOR, funcionando em paralelo ao DASP, ela tinha a função de avançar

nas propostas do Decreto Lei 200, mas não surtiu resultado.

No início dos anos oitenta surge uma nova tentativa de modernizar o setor público. Foi

criado o “Ministério da Desburocratização” e o “Programa Nacional de desburocratização”.

Helio Beltrão comandava. Houve nesta época centenas de pequenas medidas reduzindo o

peso da burocracia no serviço publico, por exemplo, o estatuto da microempresa e o juizado

de pequenas causas foram criações deste programa. Nos anos em que o ministério

funcionou até o inicio dos anos noventa, mais de cem mil decretos federais superados e

inúteis, foram revogados.

A gestão pública após os governos militares

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 48

O país passa pelo regime militar com altos e baixos na reforma do Estado, mas de um modo

geral a administração pública brasileira se encontrava bastante enfraquecida quando os civis

retornam ao poder. Em 1986 o DASP foi extinto e substituído pela Secretaria de

Administração Pública da Presidência da República, a SEDAP. São criadas novas carreiras

unificando antigas carreiras, na área de controle e orçamento em 1987 e de especialista em

políticas públicas e gestão governamental em 1989.

A Constituição de 1988 aprovou a unificação dos regimes jurídicos dos servidores públicos, o

fortalecimento dos controles e o concurso público como única forma de acesso ao cargo e

emprego público. O Supremo Tribunal Federal baniu a possibilidade de ascensão funcional

interna, até então possível. A Constituição de 1988 apresentou um grande viés

democratizante na vida publica nacional. Criou-se a possibilidade de participação popular,

dos conselhos populares, aumentou-se a descentralização e a municipalização de serviços

públicos, etc. Os direitos e garantias sociais foram ampliados. Tratava-se de reorganizar o

ordenamento jurídico democrático após vinte anos de governos autoritários.

Entretanto alguns problemas relacionados à última e atual constituição merecem ser

analisados para podermos entender melhor os limites e desafios para uma gestão pública

inovadora. A Constituição engessou o aparelho estatal, ao estender para os serviços do

Estado e para as próprias empresas estatais praticamente as mesmas regras burocráticas

adotadas no núcleo estratégico do Estado. Além disso, ela induziu a perda da autonomia do

poder executivo para tratar da estruturação dos órgãos públicos. O regime jurídico único se

tornou obrigatório para todo o serviço público federal, limitando a inovação e a flexibilidade

nas formas de contratação. A administração indireta que se notabilizara pela grande

flexibilidade teve reduzida sua autonomia ao adotar normas de funcionamento idênticas à

administração direta. Por fim, esta Constituição seguindo a tradição patrimonialista das

anteriores, também deu estabilidade funcional para contratos sem concurso e regimes de

aposentadoria desvinculados de tempo de serviço. Isto gerou grandes desequilíbrios nos

regimes de previdência para o futuro.

Em diversos aspectos a Constituição representou um retrocesso burocrático. Alguns autores

entendem que foi uma forma de reação da burocracia pública diante do clientelismo que

dominou o país naqueles anos. De fato a transição para a democracia no Brasil ocorreu

simultaneamente à crise do Estado e do modelo econômico desenvolvimentista. As forças

democráticas identificaram na excessiva descentralização e crescimento da administração

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 49

indireta uma das causas do descontrole administrativo que a Constituição deveria anular e

corrigir.

O saldo final da Constituição foi o reforço da visão burocrática clássica, mas permitindo

ainda uma certa ingerência patrimonialista ao estabelecer privilégios para diversas carreiras.

Entre os quais talvez o mais ilustrativo tenha sido a concessão de aposentadorias

desvinculadas do tempo de contribuição e a incorporação de funções gratificadas sem

relação com avaliação de mérito. Em 1989, no final do governo Sarney, a SEDAP foi extinta e

suas atribuições passaram para a Secretaria de Planejamento e Coordenação da Presidência

da República, a SEPLAN.

No governo Collor a modernização administrativa foi traduzida pela ausência de

planejamento e pelo conjunto de medidas irracionais visando desmantelar sem critérios

órgãos públicos que eram considerados ineficientes. A SEPLAN foi substituída pela Secretaria

de Administração Federal – SAF. A grande maioria dos funcionários públicos demitidos no

governo Collor foi readmitida judicialmente nos anos posteriores, com grande prejuízo à

capacidade gerencial do governo.

Em 1994, no final do Governo Itamar Franco, a campanha presidencial recoloca o tema da

gestão pública na agenda política nacional. Diversas propostas foram apresentadas, entre as

quais a do candidato Fernando Henrique Cardoso que mais tarde ficou conhecida como a

“Reforma Bresser”, em alusão ao Ministro da Administração e Reforma do Estado, o

economista Bresser Pereira.

Vamos a seguir entrar neste contexto que influencia a gestão pública brasileira até nossos

dias.

A reforma gerencial de Bresser Pereira

Originalmente o presidente Cardoso não propunha uma reforma abrangente do setor

publico, apenas intervenções mais cirúrgicas e localizadas. O objetivo seria recuperar a

eficiência do setor público e apoiar o desenvolvimento do setor privado. Foi neste sentido,

por exemplo, que um amplo programa de privatizações foi implementado na época.

Com a entrada de Bresser Pereira, homem de confiança do presidente Fernando Henrique

Cardoso, a antiga SAF criada no Governo Collor, ganha status de Ministério. O MARE, como

ficou conhecido, o Ministério da Administração e Reforma do Estado, deveria liderar uma

estratégia que culminasse com a aprovação de uma emenda constitucional. Estas estratégia

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 50

ao constitucionalizar o tema, colocou o problema não só como mais uma nova reforma

administrativa, mas como a reforma do próprio Estado brasileiro.

Foi criada um colegiado chamado “Câmara da Reforma do Estado” para coordenar o debate

interno no governo. As propostas da Reforma tiravam da zona de conforto muitos dogmas

da cultura política vigente. Bresser encontrou oposição dentro do Palácio do Planalto, tanto

Eduardo Jorge, o Secretário Geral da Presidência, quanto Clovis Carvalho, chefe da Casa Civil,

por motivos diferentes, apostaram contra a proposta.

Mas havia um terceiro foco de resistência, muito mais importante e difícil de transpor: a

área econômica do governo. Bresser era um crítico ferrenho da política macroeconômica,

além disso, muitas medidas da reforma tinham impacto direto sobre as finanças públicas.

Para se contrapor a este bloqueio a estratégia de Bresser foi buscar apoio nos governadores

que viram na proposta uma forma de flexibilizar a gestão publica e superar a paralisia fiscal

em que se encontravam.

A idéia-força da reforma bresseriana era a flexibilização do setor público. Se rejeitava uma

estratégia seqüencial, retomando propostas inacabadas da tradição brasileira. A

flexibilização deveria atingir os regimes de contratação de pessoal, as estruturas, os

processos de trabalho e os processos decisórios. Tudo ou quase tudo dependeria da maior

flexibilidade: a busca da eficiência, a maior autonomia dos gerentes, a delegação e

descentralização, a contratualização de resultados, a valorização de mecanismos de mérito e

avaliação de desempenho, etc.

Do ponto de vista teórico havia uma clara disputa entre duas abordagens da escola

gerencialista. De um lado a visão clássica defendida pelo Ministro, valorizando o

empreendedorismo dos gerentes e sua autonomia decisória. Do outro a abordagem

conhecida como a “escola da escolha pública”, que olhava com desconfiança para o

corporativismo da burocracia e propunha o aumento de controles, defendida por setores do

próprio ministério.

O Congresso Nacional votou a emenda constitucional quase três anos após seu envio pelo

poder Executivo. Algumas decisões de grande impacto, como o fim do regime jurídico único

para os servidores federais foram aprovadas. Neste período também foram criadas novas

formas de organização institucional que inovaram bastante a administração publica. Entre

elas podemos citar as Organizações Sociais, as OS, e as Agências Executivas. A Escola

Nacional de Administração Pública, a ENAP, se tornou o principal pólo irradiador das idéias

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 51

da Nova Gestão Pública, particularmente na formação das carreiras do Ministério do

Planejamento.

Entretanto as propostas não tiveram o apoio esperado dentro do governo Cardoso. Alguns

ministérios importantes como a Casa Civil, a Fazenda, o Planejamento, a Educação e a

Saúde, por motivos diversos, apresentavam sérias restrições ao projeto. No final do primeiro

mandato do presidente Cardoso o então Ministério da Administração e Reforma do Estado,

o MARE, foi unificado com o Ministério do Planejamento, que passou a se denominar

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, MPOG. As primeiras Agências

Reguladoras também foram formadas neste período.

Uma outra inovação deste período foi a experiência do projeto “Avança Brasil”. Este foi o

nome dado para um conjunto de projetos estratégico presentes no Plano Plurianual daquele

período. A importância está na hierarquização de prioridades e no “enforcement”, quer

dizer, no empoderamento que foi dado para os gerentes destes projetos. A sua quase

totalidade era orientada para superar gargalos de infraestrutura e redução do chamado

“custo Brasil”. As técnicas mais modernas de elaboração e execução de projetos foram

adotadas, os gerentes tiveram grande autonomia de execução e eram cobrados por

resultados e metas.

Estas mudanças no PPA 2000-2003 geraram uma grande transformação metodológica no

processo de planejamento federal. Adotou-se a categoria “programa” como unificadora do

planejamento físico com o orçamento previsto e a executar. Antes disto o orçamento era

elaborado e monitorado de forma quase independente do planejamento. Fazendo com que

este último se tornasse uma peça de ficção ou de erudição burocrática. Este PPA em especial

foi beneficiado com um estudo profundo chamado “Eixos de Desenvolvimento” feito por um

pool de consultorias privadas para o Ministério do Planejamento. O estudo estabelecia um

portofólio com centenas de obras necessárias ao desenvolvimento do país. Ele deveria tanto

inspirar o planejamento federal, como atrair investidores externos. Esta última pretensão,

entretanto, ficou eclipsada com a crise cambial internacional no final dos anos noventa. O

fato mais simbólico desta época foi a flexibilização das categorias estáticas de classificação

orçamentária fixadas há mais de trinta anos pela Lei Federal 4.320 de 1964. A partir daí os

organismos de planejamento tiveram mais liberdade e flexibilidade de estruturar a prática

de planejamento integrada ao orçamento.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 52

Apesar da crise internacional, as mudanças nas metodologias de planejamento e orçamento

produziram uma valorização das carreiras de planejamento e gestão do Ministério do

Planejamento em especial os Analistas de Planejamento e Orçamento e os Especialistas em

Políticas Publicas e Gestão Governamental, mais conhecidos como “gestores”. Outro avanço

importante foi a criação de Secretarias de Planejamento, Orçamento e Administração, as

SPOAs, em todos os ministérios finalísticos com a finalidade de modernizar a gestão dos

ministérios e com apoio de quadros concursados qualificados, vindos do planejamento. Para

monitorar o planejamento federal foram criados novos sistemas de informação, como o

SIGPLAN, Sistema de Informações Gerenciais e de Planejamento e sistemas locais em cada

Ministério.

Cabe lembrar que muitos dos avanços do final dos anos noventa tinham inspiração bem

anterior. Já nos anos sessenta havia a prática do chamado “orçamento programa”, também

conhecido pela sigla em inglês, o PPBS. Em alguns estados como o Rio Grande do Sul, desde

aquela época já havia iniciativas pioneiras nesta área. O movimento da nova gestão pública

apenas recuperou o modelo e lhe deu nova embalagem.

Mas a experiência de gestão inovadora no governo Cardoso apresentou também, muitos

problemas. Em relação às práticas de planejamento federal elas não conseguiram se traduzir

por uma efetiva mudança nas práticas de gestão. Por exemplo, os gerentes dos projetos

estratégicos, apesar de formalmente autorizados, não tinham ascendência sobre equipes de

outros ministérios, enfraquecendo sua capacidade executiva. A cultura decisória apesar de

qualificada continuou a ser impregnada pelo pragmatismo e pelo imediatismo do jogo

político. Fator que seria acentuado mais tarde nos governos do Presidente Lula.

Para resumir, podemos dizer que os principais avanços na gestão inovadora durante o

Governo Cardoso foram: a criação de novas estruturas organizacionais, como as OS, as OSCIP

(Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) e a s Agências Reguladoras; a

revitalização do processo de Planejamento Federal, a configuração de um núcleo estratégico

do Estado com algumas carreiras centrais, o reforço do controle interno com a criação da

Corregedoria Geral da União, a CGU, mais tarde transformada em Ministério no Governo

Lula e a introdução do “pregão eletrônico” que agilizou e baixou o custo das compras

governamentais.

A gestão no Governo Lula

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 53

O governo Lula foi eleito pela primeira vez para o mandato 2003-2006, com expectativas de

mudanças profundas na gestão publica federal, dado seu programa e origem de centro-

esquerda, diferente do governo Cardoso. Entretanto, o Governo Lula rapidamente

incorporou características centrais do governo anterior, como a manutenção e até

aprofundamento da política econômica e de vários programas sociais que foram unificados e

redesenhados.

Não houve no governo Lula, ao contrário do governo anterior, um núcleo articulador e

protagonista de mudanças e modernização da gestão pública. Aliás este tema nunca tinha

recebido muita atenção no programa eleitoral, nem na história dos partidos que lhe davam

suporte. A única exceção importante e digna de nota foi a experiência de participação

popular no orçamento, que diversas prefeituras dirigidas pelo Partido dos Trabalhadores

implementaram nos anos noventa. Contudo, durante o primeiro mandato e até quase o final

do segundo, não observamos iniciativas importantes em relação à democratização da peça

orçamentária.

Os temas de gestão ou modernização administrativa no governo Lula foram iniciativas

isoladas e tomadas diretamente do núcleo de poder do Palácio do Planalto, a margem de

qualquer estratégia mais articulada da Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento.

Entre as iniciativas mais importantes e inovadoras na gestão pública podemos registrar:

• A criação de uma mesa de negociações para lidar com as questões trabalhistas do

setor público;

• A realização de conferências setoriais de caráter consultivo sobre políticas públicas;

• O incremento dos mecanismos de controle interno através das auditorias da CGU,

inclusive sobre repasses de verbas federais aos estados e municípios;

• A criação do instrumento regulador para implantar consórcios de entidades públicas,

por exemplo, o manejo conjunto de um aterro sanitário comum à vários municípios;

O fato notável no Governo Lula foi a qualificação e centralização de funções de

planejamento, coordenação e monitoramento próximas ao núcleo presidencial. Foi criada,

inclusive, em 2004 uma Sub-chefia na Casa Civil chamada de “Articulação e Monitoramento”

com funções exclusivas de monitoramento de projetos estratégicos da presidência da

republica. Este movimento gerou algumas distorções. Por um lado a Casa Civil não estava

capacitada para o exercício destas funções, faltavam quadros qualificados e experientes e os

sistemas de informação eram precários. Ao mesmo tempo o Ministério do Planejamento,

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 54

que possuía carreiras qualificadas e ferramentas de coordenação, foi progressivamente

esvaziado. No Governo Lula o Ministério do Planejamento voltou a ter uma função

ritualística e burocrática, sobretudo com o advento do “Programa de Aceleração do

Crescimento”, uma espécie de “Avança Brasil” tardio. Atualmente o MP tem peso decisório

praticamente nas questões de orçamento, e ainda assim subordinado na prática às diretrizes

da Secretaria do Tesouro Nacional, no âmbito do Ministério da Fazenda.

Em relação à política de Recursos Humanos do governo Lula há claros avanços. Por exemplo,

a recomposição da força de trabalho em várias áreas do governo federal como as

Universidades federais e a substituição progressiva de funcionários terceirizados por

quadros efetivos. Entretanto há problemas também. Houve uma expansão muito grande de

cargos de confiança em funções que poderiam ser exercidas por quadros efetivos, as

políticas de capacitação foram muito fracas ou isoladas em “ilhas de excelência” e em

muitos lugares os interesses corporativos de segmentos ou carreiras pautou a política de RH

em benefício próprio.

Perguntas:

1. Os valores predominantes na administração pública, até a Revolução de Trinta, eram

totalmente compatíveis com uma visão patrimonialista do Estado. Justifique.

2. Durante os governos militares houve um impulso modernizador na gestão pública

federal. Quais foram os principais avanços do período.

3. A história da gestão pública brasileira foi marcada por avanços e retrocessos nas

últimas sete décadas. Explique.

Bibliografia:

NUNES, Edson. A gramática política do Brasil, Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 1997.

Este livro, originado de uma tese de doutorado do autor na Universidade de Berkeley, na

Califorina, aborda os modelos básicos que explicam as relações entre Estado e Sociedade no

Brasil. Seriam quatro as “gramáticas”: o clientelismo, o corporativismo, o insulamento

burocrático e o universalismo de procedimentos. A partir delas o autor analisa a trajetória

do Estado Brasileiro, de Vargas até a o final da ditadura militar. Leitura indispensável para

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 55

entender a influência que os padrões políticos e estilos de governo tem na gestão publica

brasileira.

NOGUEIRA, Marco Aurélio. Um Estado para a Sociedade Civil, Cortez Editora, São Paulo,

2004.

O centro desta obra do professor Marco Aurélio Nogueira são temas relacionados à gestão

do Estado, particularmente aos dilemas e desafios da democracia na sociedade brasileira

contemporânea. Ele combina conceitos da administração, da ciência política e da filosofia

para propor uma nova forma de governança. A coletânea de textos ajuda o leitor a

compreender a realidade brasileira atual. É obra importante para entender a relação entre

governo e gestão no Brasil moderno.

CHIAVENATO, Idalberto. Administração Geral e Pública. Elsevier: Rio de Janeiro,

2006.

Este livro foi elaborado originalmente para auxiliar os estudantes de nível superior nos

concursos públicos relacionados às carreiras federais que são muito exigentes na área da

gestão pública. Na verdade o livro adquiriu uma densidade e abrangência impar na literatura

disponível. Inicia comentando as escolas clássicas da administração para em seguida entrar

nos assuntos típicos da gestão publica: processo administrativo, gestão de pessoas,

comportamento organizacional até as novas abordagens da recente reforma gerencial. É

indispensável para quem quiser se aprofundar no assunto.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 56

Aula 4

Governabilidade e Accountability na Gestão Pública

Governabilidade e Governança

A gestão pública é influenciada diretamente por duas variáveis fundamentais da política e da

institucionalidade: a governabilidade e a governança. Vamos analisar mais um pouco o

significado delas.

A “governança” está relacionada aos supostos institucionais para que ocorra a otimização do

desempenho administrativo. Ela seria o conjunto de instrumentos e ferramentas técnicas de

gestão que assegurariam a eficiência e a democratização das políticas publicas. Alguns

autores encaram a “governança” como a capacidade de ação estatal na implementação de

políticas e projetos, na execução de metas coletivas.

Governança

• Governança: Capacidade do Estado de transformar em realidade, de forma eficiente e efetiva, as decisões tomadas.

• Uma governança forte é resultado de um Estado sadio no plano fiscal e financeiro e competente no plano administrativo.

Há também uma dimensão participativa na governança. Ela pode significar os

procedimentos para lidar com a pluralidade da sociedade, com os múltiplos interesses

sociais. O fator determinante para avaliar a governança de um determinado Estado ou

governo é a competência dos gerentes e administradores públicos no cumprimento das

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 57

metas. E esta avaliação deverá sempre ser feita considerando a complexidade do mundo

atual e a grande heterogeneidade de interesses e posicionamentos da sociedade.

A “governabilidade” por sua vez se refere às condições e ao contexto do ambiente político

em que se efetivam as ações administrativas. Ela se relaciona diretamente à legitimidade e à

credibilidade dos governos. A governabilidade depende muito das condições materiais de

exercício do poder, da sustentação política dos governos para executar seu próprio

programa eleitoral. Uma boa governabilidade implica numa boa capacidade de articulação

política, de formação de coalizões. No fundo ela traduz uma relação entre as variáveis que o

governo controla e as variáveis não controladas.

A reforma do Estado, na medida em que afeta os mecanismos de legitimação e credibilidade

da “coisa pública” implica diretamente em alterar as condições de governabilidade. Já a

reforma do aparelho do Estado, como se relaciona ao modelo organizacional e ao sistema de

planejamento e decisão, se relaciona diretamente com a governança do Estado.

Pode-se ver que os dois conceitos estão intimamente relacionados. Uma boa governança,

uma boa capacidade de governo, ajuda muito na obtenção e manutenção da

governabilidade. Da mesma forma uma boa governabilidade pode ajudar na melhoria da

governança já que teoricamente haveria mais suporte político, por exemplo, para dotar as

ações de modernização administrativa com mais orçamento.

A crise do Estado no Brasil se manifestou como uma crise de governança e como uma crise

de governabilidade. Houve de fato, uma combinção de uma crise fiscal muito grande que

afetou a governança do Estado. A crise da burocracia e da forma burocrática de

administração também contribui para a fragilidade da governança. Esta crise foi associada ao

modo de intervenção do Estado na economia que também afetou os padrões de

governabilidade.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 58

Podemos falar também que a construção de uma governabilidade democrática, pós-

governos militares, também foi uma das bases de mudança do modelo de administração

pública. Esta nova governabilidade, baseada nos regimes eleitorais, na liberdade de

organização e expressão e na ampliação dos processos participativos, exige um novo

processo de governo. O próprio sistema de intermediação de interesses, mais corporativista

ou mais pluralista, vai mudar numa governabilidade mais democrática. A administração

publica será mais demandada e tensionada para atender grupos sociais mais conscientes,

exigentes e diversos.

Um bom padrão de governança estaria associado à objetivos tais como a prevenção das

práticas clientelistas (também chamada, em inglês, de “rent seeking”). Outros objetivos

seriam a redução dos custos de informação, o aumento da produtividade, da flexibilidade e a

maior descentralização. Outro elemento essencial da boa governança, para finalizar, é a

responsabilização dos administradores pelos seus atos e resultados. Na literatura este

processo é chamado pelo seu termo em inglês, “accoutability”, significando mais ou menos

em português: responsabilização e responsividade.

Diferentes autores com diferentes conceitos de governabilidade e governança.

Fonte: Araújo, 2002

Fica evidente para nós que os padrões da boa governança dependem muito do contexto em

que o Estado está inserido e qual as relações que estabelece. Neste sentido, é impossível

dissociar a governança da governabilidade. Não existem técnica ou modelos administrativos

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 59

universais, como receitas genéricas, válidos para todos contextos. O contexto implica em

saber qual é a cultura política, qual o padrão de articulação do Estado com a sociedade,

como os três poderes interagem, qual a capacidade do Estado em resolver os problemas

reais e assim por diante.

Corporativismo, clientelismo e intermediação de interesses

Uma função importante do Estado e da própria administração pública é a intermediação de

interesses. Na gestão pública há vários tipos de intermediação, a clientelista, o

corporativismo, o insulamento burocrático e o universalismo de procedimentos. Cada uma

delas produz um tipo de relacionamento, de postura, conduta e atitude dentro dos

aparelhos do Estado.

O clientelismo é parte da nossa herança patrimonialista que dominava na República Velha,

mas que se perpetua na nossa tradição político-institucional até nossos dias. Se analisarmos

mais a fundo, vamos perceber que estas práticas, esta grande confusão entre o que é

público e de todos e o que é privado e individual, vem lá da tradição absolutista das cortes

portuguesas. Portugal, como sabemos, não passou integralmente pelas transformações por

que passaram os outros países europeus. A revolução industrial e os princípios da razão

iluminista não se completaram na corte portuguesa. Práticas medievais, nobiliárquicas,

ainda persistiram e se transmitiram para a tradição republicana posterior.

Um dos sintomas visíveis do clientelismo é o sistema cartorial. A idéia de que o Estado deve

validar, chancelar ou aprovar previamente todas ou quase todas as relações sociais, sejam

elas públicas ou privadas. Este aspecto sempre representou um grande entrave para a

mobilidade de capitais e a liberdade de comércio. Por conta disto, deste monopólio estatal

das relações privadas, surge uma outra prática perversa: a distribuição de favores ou como

alguns chamam, das prebendas. Ela teve origem nas relações de suserania e vassalagem

medievais, quando o Rei mantinha lealdades dos estamentos da nobreza com base na troca

de favores, presentes e rendas que derivavam deste monopólio. Os cargos públicos e sua

negociação se tornam fonte de renda, rendas perversas é claro, mas que mantinham coeso

os grupos dominantes.

Se olharmos para a própria história do Brasil, vamos identificar desde a época colonial claras

demonstrações de clientelismo. Na época colonial não havia extritamente o conceito de

“serviços público”. Os proprietários de terras administravam a justiça, a defesa e a garantia

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 60

de sobrevivência de seus empregados e agregados. Acontecia uma troca, os proprietários

garantiam os serviços coletivos e em troca as populações locais atribuíam uma “autoridade

política” aos latifundiários. Ainda hoje, em lugares muito afastados dos centros urbanos

estas relações de patronagem e trabalho escravo ainda persistem, infelizmente. A literatura

chamou este fenômeno no Brasil de “coronelismo”. O coronelismo foi – e é ainda em

muitos lugares – um verdadeiro sistema de concentração e distribuição de poder de tipo

piramidal. O “coronel”, geralmente um senhor de terras se liga a uma rede de influências,

devendo obediência a um núcleo de poder central. Ele é ao mesmo tempo uma autoridade

publica e privada, controla os fluxos econômicos e políticos locais, baseado apenas da

autoridade pessoal, sem nenhum respaldo jurídico ou legal.

Podemos dizer que o sistema partidário brasileiro foi muito influenciado pelas práticas

clientelistas. E qual o impacto disto na administração pública? Há muitos efeitos. O mais

drástico deles é a utilização do aparelho do Estado para fins particulares, de grupos restritos,

sejam eles oligarquias econômicas ou partidos políticos.

Uma outra “patologia” política que convive lado a lado com o clintelismo é o corporativismo.

Ele tem origem histórica desde que as primeiras carreiras técnicas começaram a se formar

na década de trinta como já foi debatido. Uma burocracia meritocrática, com especialização

técnica e em maior número se refletiu em maiores demandas de participação e poder. Além

disso, a própria sociedade mais urbana e industrial produziu grupos e segmentos que se

organizaram para demandar seus interesses ao Estado. O modelo totalmente baseado no

clientelismo que atomiza as relações e individualiza os fluxos de poder era totalmente

incapaz de atender estas demandas.

O governo Vargas vai tentar absorver estes novos segmentos, especialmente os

trabalhadores urbano industriais, num novo sistema de organização sindical e ordenamento

jurídico das relações de trabalho. A estrutura sindical, por exemplo, foi concebida como um

sistema verticalizado, altamente hierárquico, dependente e tutelado pelo Estado. O objetivo

final era evitar situações de conflito com o Estado e integrar estes segmentos ao esquema de

dominação. Este sistema passou a ser conhecido na literatura de gestão pública como

“corporativismo”. Na ciência política foi Schmitter quem trabalhou com este tema. Ele

definia o corporativismo como um sistema de representação de interesses em que as

uniddes constitutivas estão organizadas em categorias únicas, obrigatórias e não-

competitivas. Um elemento central é o reconhecimento de sua existência pelo Estado, que

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 61

concedia um monopólio de representação, em troca da seleção e controle da escolha de

seus dirigentes.

Podemos ver que a prática corporativa, assim como a clientelista, o Estado, e portanto a

administração e gestão publica desempenham um papel fundamental. Tudo surge e volta

para o Estado no corporativismo, ele é o início e o final dos fluxos de produção do poder.

Será o Estado quem escolhe seus interlocutores e não o contrário. O corporativismo é uma

forma de relação entre Estado e sociedade tão ou mais autoritária e excludente que o

clientelismo.

Por outro lado o elemento central do corporativismo é uma relação de troca, de negociação

e de conivência mútua. As organizações que representam grupos, dentro e fora do Estado,

podem recusar a participação no esquema de dominação. Assim, deve operar uma troca

política, uma barganha entre interesses organizados e interesses oficiais. A participação no

esquema também cria deveres e obrigações para os dois lados. Assim a cultura

corporativista funciona como um poderosos mecanismo de intermediação de interesses e de

formulação de políticas publicas.

Uma evolução da análise do corporativismo aponta para uma derivação conhecida como

“neocorporativismo”. Esta concepção avança no conceito de que as organizações com

monopólio de representação de um segmento celebrariam um tipo de “compromisso ético”

com as agências estatais. Este compromisso ocorreria sobretudo no âmbito da produção de

políticas públicas setoriais.

No Brasil, por exemplo, as “Camaras Setoriais” foram um exemplo de neocorporativismo,

onde os sindicatos industriais recebiam garantia de emprego em troca, por exemplo, de não

fazer greves e o Estado concedia redução de impostos ao setor automobilístico. Havia

portanto um pacto tripartite, entre Governo, empresários e trabalhadores. Há dezenas de

outros exemplos de práticas neocorporativas como os Conselhos, os colegiados, a atuação

de entidades de classe em políticas específicas como a educação e a saúde.

Diametralmente diferente do corporativismo surge uma outra visão, a pluralista, que atribui

a defesa de interesses não à organizações representativas, mas à existência de “grupos de

interesse”.

Um outro modelo teórico interessante para entender a administração pública é a

abordagem pluralista. Esta escola de pensamento nos diz que a sociedade democrática se

organiza e funciona através de um grande número de grupos de pressão competitivos. Estes

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 62

grupos de pressão, a rigor não participam do processo eleitoral, mas influenciam a gestão do

Estado, a produção de políticas públicas e as decisões administrativas de um modo geral. A

teoria pluralista diz que os grupos de pressão tem igualdade de condições de acesso aos

recursos de poder, fazendo “lobby” de seus interesses. Esta suposta “igualdade” de acesso

tem sido criticada por outros teóricos da gestão publica como um característica ingênua e

não realista.

Quanto maior o número de grupos organizados fazendo pressão pelos interesses, maior

equilíbrio e balanço nas relações de poder, e portanto maior democracia. Esta modelo foi

construído tendo em vista principalmente a sociedade norte-americana. Mas, em sociedades

com grandes desigualdades como a nossa o modelo tem fraca capacidade de análise.

Há momentos em que a intermediação de interesses funciona com menor impacto. Nestes

casos pode ocorrer o que a ciência política que estuda a gestão publica chama de

“insulamento burocrático”. O insulamento, como o nome já diz, é uma política deliberada

para “blindar” e proteger setores administrativos das pressões do mundo político.

Historicamente o governo JK aplicou este princípio em muitas organizações para execução

do seu plano de governo, tentando driblar as ineficiências gerais do governo, na época.

Se o insulamento burocrático representa um contexto em que organizações se protegem de

influências perversas da política poderíamos até achar que isto seria uma solução e não um

problema. O que acontece, entretanto, é algo bem diverso. A prática e a experiência

histórica demonstraram que o isolamento de setores da burocracia do mundo da política

real foi muito negativo. Setores protegidos tendem a fugir de mecanismos de controle e

transparência. Isto favorece o surgimento de comportamentos clientelistas e de corrupção.

A superação das práticas clientelistas, corporativas e do insulamento burocrático devem ser

superadas pelas práticas de universalização de procedimentos. A universalização de

procedimentos está associada à cidadania e ao estatuto da igualdade dos atores sociais. O

grande problemas que esta igualdade é na tradição política liberal uma igualdade somente

política, descolada das profundas desigualdades materiais.

O universalismo de procedimentos está relacionado à administração weberiana ou racional-

legal, com impessoalidade e previsibilidade nas relações. Este tipo de conduta é básico para

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 63

o funcionamento das democracias representativas baseadas no sufrágio universal e nos

ordenamentos jurídicos universalmente aceitos.

Controle e accountability na gestão inovadora

O termo inglês “accountability” é de difícil tradução para o português. Mas seu conceito vem

adquirindo importância cada vez maior na gestão publica desde a redemocratização do país

nos anos oitenta. Ele pode significar desde a simples prestação de contas até a sensibilidade

dos dirigentes para as demandas dos cidadãos. Podem ser um conjunto de instrumentos,

mecanismos e processos institucionais que permitem a responsabilização dos servidores

públicos quando não cumprirem suas responsabilidades e resultados esperados.

O conceito surgiu no final dos anos sessenta nos Estados Unidos. Como uma

responsabilidade objetiva ou obrigação de responder algo, implicando na responsabilização

pessoal ou da organização perante um terceiro. O erro, por ação ou omissão, na falha de um

resultado pactuado implicaria numa irresponsabilidade e seria passível de punição. Podemos

notar que o conceito tem um sentido de obrigatoriedade, um significado de imposição

direta. No caso haveria punição pelo não cumprimento e premiação pelo cumprimento além

das expectativas.

Uma das primeiras questões que surgem quando debatemos este tema é sobre quem seria

responsável por cobrar a responsabilidade na gestão pública. Seriam os chefes superiores, os

eleitores, os clientes do serviço ou mesmo os legisladores e juízes num tribunal ?

Na história da administração pública, a responsabilização dos gestores sempre se situou

dentro do Estado, na prestação de contas que uma administração faz regularmente. Esta

prestação de contas deveria contemplar as necessidades, padrões e exigências dos governos

de plantão e de todos os órgãos de controle, internos e externos. A sociedade, que é em

última instância, o cliente final dos bens e serviços públicos nunca foi consultada. A

burocracia do estado funcionava como se estivesse trabalhando para seus chefes, no fundo

para si mesma, e não para um cliente-cidadão, sujeito de direitos.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 64

O problema da cobrança e da prestação de contas no setor público não diz respeito somente

à Administração mas também à cultura política da sociedade. Anos de apatia política e

autoritarismo deixaram a sociedade inerte e passiva em relação à administração pública. Os

níveis de educação e consciência política são baixíssimos e muito desiguais de região para

região do país. Muitas vezes os representantes da sociedade civil organizada não sabem ou

não desejam ter uma postura mais ativa e rigorosa. As vezes o problema é de comunicação

também.

O próprio comportamento dos servidores públicos contribui para baixos níveis de

“accountability”. Ora desprezados pela sociedade, considerados parasitas e ociosos, ora

temidos como tecnocratas, os servidores públicos quase nunca tiveram uma imagem

positiva. Normalmente associamos a carreira pública a uma espécie de “sorte grande”, como

se fosse uma premiação ou recompensa que garantisse um futuro tranqüilo sem muito

trabalho e responsabilidade. Neste clima a cultura da prestação de contas, da

responsabilidade pessoal, nunca pode prosperar.

Hoje em dia a presença do Estado é sentida e percebida em todas as dimensões da vida

humana, independente da origem, cor, gênero, raça ou posição social. Viver sem o Estado ou

contra o Estado é virtualmente impossível. Neste ambiente a “accountability” torna-se um

valor ainda mais precioso. É preciso criar instrumentos e mecanismos que possam

salvaguardar o cidadão dos eventuais abusos do Estado. Há um risco de concentração do

poder muito grande na mão dos servidores públicos. Imaginemos, por exemplo, as

informações que o Estado possui de cada um de nós, nossas movimentações bancárias,

rendimentos, ocorrências judiciais, etc. E nem cogitamos ainda das informações que o

Estado pode obter através dos organismos de inteligência e segurança nacional.

A gestão pública inovadora deve incorporar a “accountability” como elemento fundante de

seu aperfeiçoamento. O próprio valor da democracia diminui e se enfraquece sem uma

cultura de responsabilidade. A burocracia pública atua verdadeiramente como se fosse um

ator político, influenciando os rumos dos governos legitimamente eleitos pelo povo. A

cidadania precisa ter garantias contra o uso arbitrário do poder e as condutas anti-éticas.

Como o poder no nosso sistema político está muito concentrado no topo da pirâmide,

muitos pensam que a “accountability” só pode ocorrer de baixo para cima. Isto é, os

burocratas só prestam contas para seus superiores imediatos, e estes para os seguintes e

assim por diante. Este mecanismo de fato não pode assegurar que as reivindicações do povo

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 65

sejam atendidas. O poder público, por mais ético que seja, tem evidentes dificuldades de

avaliar-se a si mesmo. O risco de uma avaliação tendenciosa ou não isenta seriam muito

grandes. Não é por outra razão que a “accountability” tem que ocorrer voltada para o

cidadão, é ele que deve tomar contas das ações dos seus governantes.

A única forma de “accountability” é praticamente o processo eleitoral. Na eleição o eleitor

faz implicitamente um juízo de valor sobre o governo. Ele poderá premiar o governante

mantendo-o ou puni-lo não o elegendo. Contudo as eleições são formas altamente

imperfeitas de avaliação dos governos. Nem sempre os cidadãos-eleitores estão bem

informados sobre os resultados do governo, há processos claros de manipulação da opinião

pública com técnicas de marketing e publicidade. Por outro lado o controle é feito sempre

“ex post”, isto é, o cidadão-eleitor só saberá se suas preferências e interesses foram

respeitados depois que os erros ou omissões dos governos aconteceram, nunca antes, nem

durante. Os partidos políticos, por exemplo, deveriam ser verdadeiras escolas de governo,

mas não são. Eles contribuem para o monopólio do poder político, são dominados por

grupos e oligarquias e não tem uma cultura de prestação de contas à sociedade.

Não é por outro motivo que as formas participativas não-eleitorais tem ganhado importância

em todo o mundo democrático. Tenta-se superar a apatia das pessoas que paradoxalmente,

valorizam a democracia, mas não se envolvem muito pouco em processos participativos. As

novas tecnologias de informação e comunicação, como a internet, tem ajudado na

“accountabiliy”, democratizando o acesso à informação sobre o Estado. O crescente

associativismo e formação de comitês de bairros, de bacias hidrográficas, as ONGs que

fiscalizam e o grande número de conselhos existentes ligados às prefeituras tem contribuído

bastante.

Ou seja, entre as condições para o crescimento da “accountability” está a própria

maturidade da democracia. O que implica em consciência política da população, dos direitos

e deveres de cada cidadão. É uma tarefa bastante difícil num país que conta ainda com

desigualdades econômicas e sociais abismais. A consciência gera organização, a organização

gera ainda mais consciência. Se todos os cidadãos fossem de alguma forma organizados em

comitês, grupos de moradores, partidos, sindicatos ou entidades representativas,

poderíamos ter uma verdadeira “rede articulada de interesses” da população, independente

de governos e do próprio Estado. Este “sentimento de comunidade” é outro pré-requisito

para a “accountability”. Não se trata de ir contra o Estado e os Governos, mas de fazer com

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 66

que o controle social impeça os desvios freqüentes na gestão pública: a corrupção, a

ineficiência e a ausência de resultados concretos.

Nas sociedades mais maduras a participação e o controle sobre a gestão pública são valores

consolidados. Na democracia norte americana, por exemplo, desde a tradição dos

federalistas, políticos e pensadores influenciados pelo iluminismo europeu, há uma distinção

clara entre o que é estatal e o que é público. Apesar dos problemas conhecidos de baixa

participação eleitoral e apatia política, o modelo dos Estados Unidos estimula a participação

do cidadão a nível local, sobretudo em torno das comunidades escolares e de vizinhança.

Estas organizações (por bairros, igrejas ou profissionais) acabam servindo de fórum para o

debate de questões públicas. Elas consolidam posições mais coletivas que depois são

direcionadas para os representantes governamentais e legislativos.

Perspectivas da “accountability” na gestão pública brasileira

Já vimos que os regimes políticos influenciam tremendamente o tipo de gestão pública. Será

muito difícil implementar inovações e padrões mais criativos de administração em regimes

autoritários e totalitários. Por outro lado, se a democracia é o regime que mais estimula a

inovação na gestão pública, sua consolidação e amadurecimento depende de fatores muito

complexos e até certo ponto desconhecidos. Sabe-se, por exemplo, que quanto mais

consolidadas as redes de associativismo dos cidadãos, maior será a consciência de direitos e

deveres e o envolvimento participativo.

No Brasil, infelizmente, nossa tradição nunca foi das mais democráticas. Na história da

República e mesmo no período colonial, a democracia foi exceção e não a regra.

Aprendemos a considerar a desigualdade como natural e inevitável e a sermos submissos

diante do Estado. Transferimos sempre a responsabilidade pelas coisas públicas, pelo que

acontece na nossa rua, nas cidades e no país para alguma autoridade política, para um

governo. É verdade que na conjuntura brasileira a presença do Estado é muito desigual. Não

podemos comparar os grandes centros urbanos onde o Estado é visível, presente e atuante

com as imensas regiões no interior do pais onde o Estado é muitas vezes uma tênue

lembrança. A questão relevante para a gestão democrática e inovadora, portanto, não é se o

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 67

Estado deva ser “mínimo” ou “máximo”, mas qual o tamanho do Estado ideal para a

cidadania.

Se um super-Estado implica numa sub-cidadania, um Estado fraco e incapaz de resolver os

problemas coletivos conduz a uma negação da cidadania, pela negação dos direitos do

cidadão. Seria como uma sociedade onde só houvesse deveres, inclusive o de pagar os

impostos, mas muito poucos direitos.

Nossa tradição, além de não-democratica é paternalista. O Estado é visto como um “grande

pai” que deve ajudar o povo, ao contrário de estimular a auto-confiança. O paternalismo é

uma forma disfarçada de autoritarismo e conduz rapidamente ao populismo na política.

Vivemos muitos períodos de populismo no Brasil. Um governo populista é aquele que

estabelece concessões e benefícios para segmentos da população de maneira fácil e

irresponsável, transferindo os custos para outros setores ou para o futuro. Nos governos

populistas até há um desejo de participação da comunidade. Mas é uma participação

controlada, tutelada e dirigida instrumentalmente para apoiar ações do governo. É uma

participação domesticada. Todas estas formas e estilos de governo e política – o

autoritarismo, o paternalismo, o populismo – enfraquecem a sociedade civil, diminuem as

chances da “accountability”.

Para o cidadão a face mais visível disto é o desrespeito. Sobretudo naquilo que a literatura

chama de “burocracia ao nível da rua”, isto é, na prestação de serviços diretos aos cidadãos.

As violações da ética e da moralidade pública acontecem a todo instante. Basta tentar obter

algum serviço de saúde, educação ou informação em uma repartição pública. Certamente

em raras oportunidades você escapará de longas filas, grosserias de todo tipo e informações

incompletas. O desrespeito acontece em todos os níveis, como eleitores, como

contribuintes, como cidadãos. Os políticos eleitos não cumprem o que prometem, os

eleitores tampouco cobram o que foi prometido. É como se o Estado não existisse ao abrigo

da lei e do direito, como se o Estado não tivesse, também ele, obrigações com a cidadania.

Nossa cultura política influenciou um padrão de gestão pública acomodado com a idéia de

sub-cidadania ou de cidadania regulada. Este tipo de conduta enraizado durante mais de

cem anos de República permeia todos os níveis do Estado, do mau atendimento em um

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 68

posto de saúde numa cidadezinha do interior até o clientelismo e nepotismo no Senado

Federal.

Parece que estamos condenados a um tipo de fatalismo político, é mais fácil lutar para estar

entre os incluídos e beneficiados pelo sistema do que transformá-lo por inteiro. Neste

cenário onde há muita fragmentação cívica e interesses difusos o cidadão não pode esperar

muito pelo Estado. Sua burocracia está sujeita aos controles que ela mesma coordena e

implementa. Porém, as perspectivas tem melhorado desde a redemocratização dos anos

oitenta. O Estado brasileiro tem sido cada vez mais alvo de reivindicações organizadas e da

vigilância social ativa. A sociedade vem aprendendo, embora lentamente e com retrocessos,

a se organizar, superando os horizontes meramente corporativos. O cenário atual é muito

mais promissor que há dez ou vinte anos atrás. A liberdade de imprensa, as novas

tecnologias de comunicação, o reforço dos órgãos de controle externo e interno e a

modernização do judiciário tem exposto com maior intensidade os temas da conduta ética e

dos abusos de poder. O próprio aparelho administrativo tem se modernizado introduzindo

novas técnicas gerenciais e as carreiras estratégicas tem se consolidado pela via do concurso

público.

Resumindo, então, a “accountability” é uma variável-chave para modernizar a gestão

pública, sua intensidade depende de vários fatores:

• A intensidade e textura das redes e instituições que se formam na sociedade civil;

• A consolidação de valores (na escola, na família, na comunidade, etc.) democráticos e

de valorização das ações coletivas;

• A história do país, da região ou do município, sua tradição cultural, origem dos

costumes e dos hábitos sociais;

• A consolidação formal dos processos, instrumentos e organizações de controle

interno e externo;

Perguntas:

1. A governabilidade é muito importante nos regimes democráticos. Porque ?

2. Quando os governos tem problema de governança a capacidade de execução das

políticas é reduzida. Você concorda com esta afirmação ? Justifique sua resposta.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 69

3. A “accountability” é um conceito relativamente novo na gestão pública brasileira.

Este conceito tem relação com a eficiência e a eficácia na gestão inovadora ? Porque

?

Bibliografia

A conceituação de governabilidade e governança, da sua relação entre si e com o conjunto

da reforma do Estado e do seu aparelho, de Vinícius de Carvalho Araújo — Brasília: ENAP,

2002.

O objetivo deste curto, mas significativo trabalho foi introduzir o leitor às principais

abordagens feitas sobre os conceitos de governabilidade e governança. Para isso o autor

tomou como referência a elaboração de importantes autores no campo da gestão publica no

Brasil: Bresser Pereira, Eli Diniz e Caio Marini. O objetivo foi gerar um quadro comparativo

que ilustra bem a interelação entre estes conceitos.

BOBBIO, Norberto, Teoria Geral da Política: a Filosofia Política e as Lições dos Clássicos,

Campus, Rio de Janeiro, 2000

Esta obra já clássica, reúne 40 ensaios sobre política e Estado. O grande pensador italiano

Norberto Bobbio (Turim, 1909) ensinou Filosofia do Direito nas universidades italianas por

mais de trinta anos. Com 720 páginas ela versa sobre todos os assuntos importantes para

entendimento do Estado e da administração pública, entre os quais a política, a moral o

direito, o problema dos valores e da ideologia entre outros. Todos temas que repercutem

diretamente na gestão publica e proporcionam uma sólida base teórica.

NUNES, Edson. A gramática política do Brasil, Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 1997.

Este livro, originado de uma tese de doutorado do autor na Universidade de Berkeley, na

Califorina, aborda os modelos básicos que explicam as relações entre Estado e Sociedade no

Brasil. Seriam quatro as “gramáticas”: o clientelismo, o corporativismo, o insulamento

burocrático e o universalismo de procedimentos. A partir delas o autor analisa a trajetória

do Estado Brasileiro, de Vargas até a o final da ditadura militar. Leitura indispensável para

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 70

entender a influência que os padrões políticos e estilos de governo tem na gestão publica

brasileira.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 71

AULA 5

A excelência dos serviços públicos

A excelência nos serviços públicos é mais que uma demanda da sociedade moderna, é um

pré-requesito básico para modernização da gestão pública. Não podemos falar em gestão

inovadora se não há padrão de qualidade no serviço publico. A excelência no atendimento e

nas rotinas internas não é contudo uma tarefa fácil de ser conquistada, e mais difícil ainda,

de ser mantida ao longo do tempo. Em primeiro lugar existe a necessidade de uma avaliação

permanente do impacto das ações. Sem esta avaliação constante não como obter

qualidade. Além disso será preciso ter sempre clareza e lucidez sobre qual é o foco de

atenção da administração, qual é a hierarquia de prioridades, quais são os objetivos.

Muitos estudiosos que pesquisam a administração pública vem chamando esta nova

exigência de “administração de resultados”, outros chama de “administração

empreendedora”. O nome importa menos. O que realmente importa é uma organização que

não seja burocrática, que responda as demandas e resolva problemas concretos e que custe

menos para a sociedade. Para alcançar este novo patamar de eficácia, eficiência e

efetividade das ações muitas organizações estão modernizando suas ferramentas de gestão,

o modo como capacitam seus dirigentes, seus sistemas de informação gerencial e assim por

diante.

Entre as várias questões relacionadas a este tema, talvez a primeira seja, que grau de

autonomia tem as organizações públicas para levar adiante um programa de excelência e

qualidade na gestão. Outra pergunta e sobre qual o perfil de gestor publico que se demanda

para liderar este processo. Questões que vamos debater em seguida.

A formação dos gestores é um aspecto vital para a excelência. Possuimos uma tradição não

muito boa nesta área. Como o serviço público padeceu muitos anos pela falta de

profissionalização das carreiras públicas, a capacitação sempre foi negligenciada. Na maioria

das vezes faltam competências e habilidades necessárias em ambientes de alta

complexidade como é a administração pública.

As escolas de governo tem um papel importante na superação destes gaps de formação. Elas

deverão se constituir em verdadeiros centros de excelência para formação de gestores. No

Brasil temos poucas Escolas deste nível, geralmente associadas às carreiras mais prestigiadas

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 72

da área fazendária ou diplomática. As escolas de governo devem ser grandes laboratórios

para novas práticas, centros de reflexão crítica sobre o estado de coisas na gestão pública e

espaço de inovação permanente. Em uma palavra, elas devem ser mais efetivas na sua

missão. Ultrapassar o simples fornecimento de catálogos de formação no varejo, para se

preocuparem com os resultados deste esforço, ou seja, com os impacto concretos da

formação no dia-a-dia da administração.

Algumas tarefas que estariam colocadas para as Escolas de Governo nesta conjuntura

poderiam ser resumidas nos seguintes aspectos:

• Ênfase nos resultados e não nos meios ou produtos, focar na gestão de resultados e

em modelos mais proativos de administração;

• Trabalhar a formação de servidores e gestores públicos com foco no aspecto

gerencial e no manejo de novas ferramentas gerenciais e de planejamento

estratégico no setor público;

• Estarem vinculadas às agendas de governo em cada nível federativo, procurando

formar carreiras adequadas às exigências de qualidade e excelência nos serviços

prestados à população.

Por sua vez a questão da autonomia gerencial está ligada à responsabilização e uso dos

recursos. A Reforma do Estado dos anos noventa criou novas formas de contratualização de

serviços públicos e novas formas de organização. No fundo o que está orientando este

debate é a forma com que os gestores utilizam os recursos disponíveis para executarem sua

missão institucional. Temos consciência de que há muito desperdício de recursos na

administração pública, mas não sabemos muitas vezes como aproveitar os recursos, como

otimizá-los. A tendência da gestão pública moderna é trabalhar cada vez mais em redes e

parcerias público-privadas. Neste contexto a boa gestão de recursos ganha ainda mais

relevância para a excelência no atendimento.

O Programa brasileiro de qualidade e produtividade

O chamado Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade, o PBQP vem se consolidando

como uma importante fonte irradiadora de novos paradigmas na gestão pública inovadora.

Desde 1991 o Programa criado originalmente no governo federal tem inspirado Estados e

Municípios a melhorarem suas práticas e resultados.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 73

O símbolo do programa:

O foco do PBQP é tornar o cidadão o centro da gestão pública. Isto significa que mecanismos

de qualidade devem garantir a satisfação do cidadão como um cliente de serviços. A própria

avaliação institucional passa a incorporar esta visão como parte dos quesitos e requesitos

necessários ao processo de modernização. O programa foi um dos principais instrumentos

de aplicação das reformas gerenciais nos anos noventa, introduzindo progressivamente,

soluções de gestão do campo privado para a esfera publica.

Aqui devemos fazer um parênteses no nosso debate sobre padrões de excelência e tocar

num assunto simples, mas que muitas vezes gera muita polêmica: quais são as diferenças

entre a gestão pública e a gestão privada. Vamos pontuar o debate em alguns aspectos mais

importantes.

• No setor privado a orientação da atividade é o lucro e a

sobrevivência das empresas num ambiente de alta competitividade, no setor público

o objetivo é satisfazer o bem comum, o interesse coletiva da sociedade,

independente da condição financeira ou social das pessoas;

• A motivação essencial do setor privado é satisfazer o cliente, em troca de um

pagamento monetário, já no setor público o objetivo é satisfazer o cidadão -

inclusive como cliente – mas a motivação é o dever, é um ordenamento legal;

• No setor privado há uma simetria entre serviço ou produto recebido e pagamento

efetuado, no setor público esta simetria em quantidade e qualidade, não existe;

• A qualidade no setor privado é pautada pela maior competitividade, expansão dos

mercados, maior lucratividade, menor custos, maior faturamento, etc. Na gestão

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 74

pública a qualidade é pautada pela excelência de atendimento a todos cidadãos ao

menor custo possível, dentro das normas jurídicas e sociais aceitas.

• Por fim há uma série de diferenças contingenciais entre os dois campos. Na

administração pública, por exemplo, há um conjunto de ordenamento legais que

tornam sua atividade mais complexa que o setor privado. Por exemplo, a aquisição

de bens e serviços na área pública deve obedecer às normas de licitações, com regras

bem definidas. Os funcionários na administração publica, se efetivos, adquirem mais

estabilidade que no setor privado e assim por diante.

Entretanto, estas enormes diferenças não impedem que a gestão pública adote cada vez

mais instrumentos e ferramentas de gestão já testadas e aplicadas há anos pelo setor

privado. Boa parte delas é aplicável em qualquer tipo de organização que tenha uma

burocracia, recursos disponíveis e finalidades claras para executar. Neste sentido grandes

corporações privadas tem muita semelhança no plano organizacional, com grandes

organizações públicas. Por exemplo, ferramentas de avaliação de recursos humanos,

técnicas de elaboração de projetos, conceitos de organização de organogramas ou sistemas

de informações gerenciais são muito parecidos nas duas esferas.

O movimento pela qualidade que contagiou o ambiente empresarial nos anos oitenta é

exatamente um destes exemplos. A administração publica lentamente foi adotando suas

ferramentas e conceitos. Seu objetivo é elevar o padrão de serviços prestados ao cidadão e

ao mesmo tempo contribuir para que o cidadão se torne mais exigente em relação aos

serviços a que tem direito. Este é o grande desafio do PBQP.

O espaço privilegiado do programa é aquele em que a organização se relaciona diretamente

com o cidadão, ou seja, nos espaços onde acontecem os serviços. É aqui que percebemos a

qualidade de toda a máquina administrativa que está por trás do balcão, da fila, do guichê.

Um bom serviço, ágil, eficiente e barato, na ponta do processo, diretamente ao cidadão-

cliente, revela todo um processo e uma organização ágil e eficiente que dá sustentação ao

resultado final. É como se a maquina administrativa fosse um “iceberg”, a parte submersa

que não é visível, é a base de tudo.

O programa é articulado sempre em parceria, formando redes entre organizações publicas.

A partir de 1999 ele mudou de nome no governo federal para “Programa de Qualidade no

Serviço Público” e está orientado para a distribuição de uma premiação nacional, à

semelhança das organizações privadas. No início o programa teve uma função mais de

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 75

sensibilização e capacitação com foco em técnicas e ferramentas. Depois evoluiu para o foco

na gestão de resultados e finalmente hoje o programa se estrutura com foco na satisfação

do cidadão, que é um conceito abrangente e estratégico.

Os objetivos do programa são abrangentes e diversificados, vamos apenas comentar alguns

deles:

• O programa visa instrumentalizar, acompanhar e avaliar as ações que visam o

aprimoramento e a melhoria da qualidade na prestação dos serviços públicos. Ele

mesmo deve ser reproduzido em outras unidades administrativas e níveis da

federação;

• Um objetivo central é incorporar o cidadão no processo de definição, implementação

e avaliação da ação publica. Por isso que o programa valoriza a “accountability”, a

transparência e o envolvimento dos cidadãos na gestão;

• O programa promove a gestão de processos na administração publica;

• Um ponto forte é a importância dada à capacitação e formação de servidores voltada

para a inovação e a criatividade, disseminando valores de cooperação e participação;

• O programa iniciou no poder executivo, mas hoje já tem ampla aderência dos demais

poderes, especialmente o poder judiciário.

Os princípios do Programa de qualidade e participação na administração pública foram

estabelecidos para garantir a abrangência necessária ao padrão de excelência buscado.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 76

Vamos comentá-los a seguir porque eles são a base dos modernos programas de gestão

inovadora.

Satisfação do cliente: os cidadãos são os legítimos destinatários da ação publica, as

organizações devem estabelecer mecanismos que viabilizem a parceria com eles e a

superação de suas expectativas;

Envolvimento de todos os servidores: a alta administração, o corpo gerencial e a base

operacional devem envolver-se com a qualidade, assumindo o compromisso com a melhoria

contínua da administração púbica;

Gestão participativa: a gestão da qualidade deve ser participativa. Pressupõe a convocação

dos servidores para participar na melhoria de seus processos de trabalho, na cooperação

entre gerentes e gerenciados, na disseminação de informações gerenciais e organizacionais,

no compartilhamento de desafios e na união entre o processo decisório e sua execução;

A gerência de processos: o processo é centro prático da gestão da qualidade. Isto significa

que temos que identificar e analisar os processos da organização, estabelecer metas de

melhoria e aperfeiçoamento, avaliar os processos pelos resultados que produzem e frente à

satisfação dos clientes;

Valorização do servidor público: o servidor público é o cliente interno dos processos. É a

garantia de cumprimento da missão da Administração Pública, do atendimento dos quesitos

de qualidade dos clientes externos, os cidadãos. A valorização gera conscientização,

responsabilização e profissionalização;

Constância de propósitos: coerência e efetividade nos projetos e ações. Esta objetivo deriva

da própria condição da administração do seu “poder-dever”. Se relaciona à perenidade na

prestação dos serviços, ao necessário planejamento estratégico de médio e longo prazo;

Melhoria contínua: criatividade e inovação permanente. Se relaciona e complementa o

objetivo anterior. Para manter coerência nos padrões de excelência a administração pública

deve estar em permanente renovação e inovação.

Em 2001 o Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade foi extinto e no seu lugar

diversas entidades empresariais e públicas criaram o Movimento Brasil Competitivo, o MBC.

Nesta época o Programa da Qualidade no Serviço Público passou a integrar o Conselho do

MBC, sendo responsável pela medidas aplicadas à área pública. O programa estava situado

na Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 77

Em 2005, já no Governo Lula, o programa se moderniza e muda de nome. Passa a se chamar

agora de “Programa nacional de Gestão Pública e Desburocratização”, conhecido com

“GESPÚBLICA”. Ele amplia o escopo de atuação, agregando à qualidade, outros temas como

a abordagem gerencial, a desburocratização, a profissionalização dos gestores e assim por

diante.

Na prática o GESPUBLICA representou a fusão entre o Programa de Qualidade no Serviço

Público e o Programa Nacional de Desburocratização. Uma das razões que motivaram a

fusão foi o entendimento de que a desburocratização é uma das dimensões essenciais da

qualidade. O programa foi baseado em três princípios fundamentais.

Na essencialidade de uma política pública, formulada com o claro propósito de assumir o

desafio da excelência dos serviços. Isto implica, por exemplo, que a administração pública

brasileira passou a ser comparada com padrões internacionais de benchmarking e

performance.

No foco em resultados, nas “entregas” das ações públicas. Entendido por resultado o

atendimento total ou parcial das demandas sociais. Aqui entram, por exemplo, todo o

debate sobre eficiência e eficácia e a diferenciação entre produtos e resultados. Por

exemplo, um programa educacional não deve ser só avaliado pelo número de vagas que

foram criadas na rede de ensino básico, mas sobretudo, pelos impactos e transformações

sociais e econômicas geradas pelo aumento da escolarização básicas.

No princípio de que a política de gestão deva ter uma natureza federativa. A base conceitual

do GesPública implica que o tema da gestão é universal e ultrapassa as fronteiras

federativas. Ele exige íntima cooperação e solidariedade entre os três níveis federativos.

Portanto não se pode falar em “boas práticas de gestão” no Brasil, até que todos os Estados,

de São Paulo à Roraima, tenham boas práticas de gestão.

A mobilização pela qualidade e desburocratização:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 78

O modelo de excelência

O modelo de excelência do GesPública foi construído ao longo dos anos noventa e partiu

inicialmente de uma adaptação do modelo de Qualidade Total adotado no setor privado.

Entretanto, o modelo sofreu fortes transformações para dar conta da diversidade

administrativa e sobretudo pelas lógicas diferentes entre o setor público e o privado, ainda

mais na administração direta.

A estratégia foi a adaptação e o ajuste na linguagem e na terminologia utilizada, de forma a

respeitar a natureza distinta das organizações públicas. Este aspecto foi essencial para

diminuir as resistências e dar viabilidade institucional ao modelo.

A adaptação realizada trabalhou com dois aspectos distintos. Em primeiro lugar houve uma

interpretação para o setor público dos conceitos de gestão contidos nos modelos originais.

Em segundo lugar se preservou a natureza pública das organizações que integravam o

aparelho do Estado. Após este movimento inicial todos os anos praticamente o programa

sofre adaptações e prioridades diferentes, mas mantém sua base conceitual constante.

O modelo é representado por um sistema de gerenciamento onde interagem sete partes

integradas, que orientam a adoção de práticas de excelência em gestão com a finalidade de

levar às organizações públicas brasileiras a padrões elevados de desempenho.

Os subsistemas são:

1. Liderança

2. Estratégias e Planos

3. Cidadãos e Sociedade

4. Informação e conhecimento

5. Pessoas

6. Processos e

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 79

7. Resultados

O primeiro bloco, que trata de lideranças, estratégias, planos, cidadãos e sociedade é o

chamado “bloco do Planejamento”. Por meio da liderança da alta administração que focaliza

as necessidades dos cidadãos destinatários da ação da organização, os serviços e produtos e

os processos planejados, conforme os recursos disponíveis.

O segundo bloco, das Pessoas e processos representa a “execução do planejamento”. Nesta

fase concretiza-se a ação planejada, que transforma metas em resultados. As pessoas

motivadas e capacitadas, devem operar processos e garantir as “entregas” projetadas.

O terceiro bloco, o bloco dos resultados representa o controle, pois serve para acompanhar

o atendimento à satisfação dos destinatários finais da ação pública. Aqui entra a adequação

do orçamento, das finanças, da gestão de pessoas, da gestão de suprimentos, das parcerias

institucionais, bem como o desempenho dos serviços e produtos e os processos

organizacionais.

No quarto bloco, da informação e conhecimento, temos o que podemos chamar de “a

inteligência da organização”. Nesta fase são processados e monitorados os dados e os fatos

da organização, tanto no seu ambiente interno, quanto externo. Estes dados geralmente não

estão sob seu controle direto, mas podem certamente condicionar seu desempenho. Neste

quesito o modelo trabalha com a capacidade que a organização tem (ou não) em corrigir e

melhorar suas próprias práticas de gestão e seu desempenho.

O modelo esquematizado:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 80

Muitos autores organizacionais chamam esta capacidade de “capacidade de resiliência”. A

resiliência é um conceito que vem da física, significa a capacidade de alguns materiais

acumularem energia quando submetidos a algum stress, sofrerem uma deformação

temporária e voltarem ao formato inicial. Nas organizações seria a capacidade de tomar

decisões e vencer dificuldades, sem processos de ruptura organizacional ou institucional.

Estes sete quesitos ou momentos servem como base para estruturar uma avaliação

organizacional, a partir dos quais a organização púbica pode implementar ciclos contínuos

de avaliação e melhoria da sua gestão. Mais adiante vamos apresentar com mais detalhes

cada um deles.

Os fundamentos da excelência

Os fundamentos deste processos são os valores essenciais que distinguem a natureza de

uma boa prática na administração pública. Eles não são normas escritas muitas vezes, ou leis

e decretos para serem cumpridos, nem técnicas, mas antes de tudo valores culturais. Como

valores eles devem ser encarados como orientações do comportamento, como hábitos

mentais e como balizas para a conduta das pessoas, sejam elas dirigentes ou simples

funcionários. Por exemplo, a competição é um valor comum no mundo empresarial. Todos

querem ser competitivos, não só como outros concorrentes, mas no ambiente de trabalho,

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 81

as vezes exagerando e transformando a competição num problema organizacional. Na

gestão pública a competição interna é prejudicial, porque quebra a complementariedade

entre órgãos que precisam estar coordenados num mesmo objetivo e meta.

A primeira observação que cabe fazer neste debate é o registro pela Constituição Federal, no

seu artigo 37, dos valores básicos da administração: a legalidade, a impessoalidade, a

moralidade e a eficiência, por exemplo. Já comentamos estes valores antes. Agora é

importante acrescentar outros valores, fundamentais para a compreensão da boa gestão.

Excelência dirigida ao cidadão. O cidadão é o centro sob o qual gravita o sistema de gestão.

Ele deve ser visto como cidadão, isto é, portador de direitos e deveres e também como

cliente. Por isso as organizações devem ser avaliadas pelos cidadãos-clientes. Mesmo

quando os serviços são executados com exclusividade, o cidadão deve avaliar os serviços

ofertados. O monopólio do Estado não elimina o direito ao bom serviço.

Gestão participativa. A participação é antes de mais nada uma atitude, uma abertura ao

convívio e ao diálogo com cidadãos, clientes e servidores. Na gestão participativa há um

compartilhamento de informações e capacidade de delegação real dos serviços. Ela permite

maior compromisso e responsabilidade de todos os envolvidos, mais autonomia na execução

das tarefas.

Gestão baseada em processos e informações. O centro prático de ação da gestão pública de

excelência é o processo, entendido com num conjunto de atividades relacionadas e

interativas que transforma os insumos em produtos e serviços com alto valor agregado. A

informação permite combater as escleroses das hierarquias burocráticas. Ela torna os

processos mais horizontais e envolventes, é fundamental para o estilo de trabalho em redes

com muitas parcerias.

Valorização das pessoas. As pessoas fazem a diferença na área de serviços, inclusive na

administração pública. Aqui a preocupação central é sobretudo com os funcionários, com os

servidores públicos. Para que se sintam parte do processo, para que seu trabalho faça

sentido num processo mais amplo de cidadania e maturidade institucional.

Visão de futuro. A busca da excelência é diretamente relacionada à capacidade de

estabelecer um cenário-meta, um futuro desejável. Um processo que permita à organização

antecipar-se às novas necessidades e expectativas dos cidadãos e da sociedade. A visão de

futuro impõe a ação persistente, contínua e sistemática, para que todas as tarefas do dia-a-

dia contribuam com a construção do futuro almejado. Este princípio indica que a

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 82

organização tem que ter uma imagem de futuro, um norte a ser perseguido, que sirva de

motivação para o corpo funcional, mensagem para clientes e fornecedores e embase uma

estratégia de ação.

Aprendizado organizacional. Hoje as organizações sobrevivem na medida em que

conseguem gerar e agregar conhecimento ao que fazem. O aprendizado deve ser

internalizado na cultura organizacional, tornando-se parte do trabalho diário em qualquer

atividade. Seja na busca pela causa dos problemas, na busca por soluções e inovações ou na

motivação das pessoas. Este fundamento é transversal na organização. Isto é, ele perpassa

horizontalmente toda a administração. Independente da pratica ou padrão de trabalho o

aprendizado deve ser contínuo. Será preciso transformar os dados e fatos em informações.

Transformar as informações em conhecimento e este em matéria prima para a decisão, para

as escolhas da organização. Este processo além de contínuo é muitas vezes incremental,

misturando inovação e ruptura.

Agilidade. A organização pública precisa antecipar-se às rápidas mudanças no ambiente

tecnológico, político e econômico. A rapidez de resposta no atendimento ao cidadão ou na

execução de um processo se traduz em redução de custos, em agregação de valor.

Foco em resultados. Resultado é o impacto sobre um público alvo, num contexto

determinado. Não se confundo com produtos ou meios. É medido por indicadores, é

mensurável e monitorado constantemente. Pelos resultados podemos medir se a gestão

púbica é vitoriosa ou não.

Inovação. Inovação pode ocorrer em qualquer lugar e em qualquer fase do processo. Pode

ser uma inovação no produto ou serviço final, pode ser uma inovação no modo como as

coisas são feitas. O importante é não ter medo de errar, é usar a criatividade. Inovar muitas

vezes é combinar coisas velhas e conhecidas de um jeito novo, que atende a uma demanda,

que resolve um problema. A inovação não acontece somente na elaboração das grandes

estratégias, dos “Insights” dos gênios, mas no cotidiano, no dia-a-dia. Muitas vezes

processos simples que são inovados, tem grande repercussão.

Controle social. A gestão das organizações publicas deve estimular o cidadão e a própria

sociedade a exercer ativamente seu papel de guardiãs de seus direitos e de seus bens

comuns. A boa gestão supõe a criação de canais efetivos de participação da cidadania no

processo decisório, na avaliação da qualidade do serviço, em sentido amplo.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 83

O programa GesPública, além de adotar estes princípios norteadores, ou melhor, de agregá-

los aos princípios fundamentais da administração pública foi mais além. Na relação de

critérios para avaliar as organizações públicas o GesPública define com precisão cada

critério.

O Critério Liderança aborda como está estruturado o sistema de liderança da organização,

ou seja, sua composição e funcionamento. Discorre sobre o modo como a Alta

Administração, a partir das macroorientações de Governo, atua pessoalmente para definir e

disseminar entre os colaboradores os valores, as políticas e orientações estratégicas,

considerando as necessidades de todas as partes interessadas, orientando-as na busca do

desenvolvimento institucional, do seu desenvolvimento individual, estimulando a iniciativa e

a criatividade e estabelecendo uma cultura da excelência que permeie toda a organização. O

Critério Liderança também aborda como a alta administração analisa criticamente o

desempenho global da organização e como as práticas relativas ao sistema de liderança são

avaliadas e aperfeiçoadas.

O Critério Estratégias e Planos aborda como a organização, a partir de sua visão de futuro,

formula suas estratégias e as desdobra em planos de ação de curto e longo prazos. Versa,

particularmente, sobre o modo como a organização utiliza as informações sobre os usuários

e sobre o seu próprio desempenho para estabelecer as estratégias, de forma a assegurar o

alinhamento e a implementação delas com vistas ao atendimento de sua missão e à

satisfação das partes interessadas. O Critério também aborda como é definido e

implementado o sistema de medição do desempenho global da organização. Aborda, ainda,

como as práticas relativas à formulação, desdobramento/operacionalização das estratégias e

ao planejamento da medição do desempenho são avaliadas e aperfeiçoadas.

O Critério Cidadãos e Sociedade examina como a organização, no cumprimento das suas

competências institucionais, identifica os usuários dos seus serviços/produtos e conhece

suas necessidades, antecipandose a elas, no cumprimento das suas competências

institucionais. Examina, também, como divulga seus serviços/ produtos e ações para reforçar

a sua imagem institucional e como a organização estreita o relacionamento com os seus

usuários, mede e intensifica a satisfação deles. Esse Critério examina, ainda, como a

organização aborda suas responsabilidades perante a sociedade e as comunidades

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 84

diretamente afetadas pelas suas atividades e serviços/produtos e como estimula a

cidadania. Examina, também, como as práticas relativas ao conhecimento mútuo, ao

relacionamento com os usuários e à interação com a sociedade são avaliadas e

aperfeiçoadas.

O Critério Informação e Conhecimento aborda como a organização gerencia as informações

e os indicadores de desempenho mais importantes da organização e dos seus referenciais

comparativos e como é feita a gestão do conhecimento na organização. Aborda, também,

como as práticas relativas à gestão das informações da organização, a gestão das

informações comparativas e a gestão do conhecimento são avaliadas e aperfeiçoadas.

O Critério Pessoas aborda como a organização prepara e estimula as pessoas para

desenvolverem e utilizarem seu pleno potencial em alinhamento com as estratégias da

organização. Também aborda os esforços para criar e manter um ambiente que conduza à

excelência no desempenho, à plena participação e ao crescimento individual e institucional.

Discorre, ainda, sobre a forma como as práticas relativas ao sistema de trabalho, à

capacitação e desenvolvimento e à qualidade de vida são avaliadas e aperfeiçoadas.

O Critério Processos aborda os principais aspectos do funcionamento interno da

organização, entre os quais se inclui a estruturação de seus processos com base em suas

competências legais, a definição dos seus serviços com foco nas necessidades dos cidadãos,

a implementação e a operacionalização de seus processos finalísticos, de apoio,

orçamentários e financeiros e os relativos aos seus fornecedores. Versa, portanto, sobre a

forma como os principais processos da organização são definidos, estruturados,

implementados, gerenciados e aperfeiçoados, para obter melhor desempenho e para

melhor atender às necessidades dos cidadãos. Aborda, ainda, como as práticas relativas à

gestão de processos finalísticos, de apoio, orçamentários e financeiros e relativos aos

fornecedores são avaliadas e aperfeiçoadas.

O Critério Resultados aborda a evolução do desempenho da organização relativamente: à

satisfação de seus cidadãos, considerando o atendimento ao universo potencial de cidadãos;

à melhoria dos seus serviços/produtos e dos processos organizacionais; à satisfação,

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 85

avaliação, bem-estar, educação e capacitação das pessoas; à gestão dos fornecedores; ao

cumprimento das metas e aplicação dos recursos orçamentários e financeiros. Trata,

também, dos níveis de desempenho em relação aos referenciais comparativos pertinentes.

O prêmio Nacional de Gestão Pública

A premiação foi instituída em 1998 como uma das principais estratégias para estimular e

disseminar os padrões de excelência e gestão inovadora na administração pública brasileira.

As organizações que comprovassem um alto desempenho institucional, com qualidade em

gestão poderiam receber o prêmio. Portanto há mais de dez anos o programa vem

contribuindo para mudar a realidade de gestão no Brasil. Progressivamente a premiação foi

se ampliando do poder executivo para todo tipo de organização pública. O prêmio tem dois

grandes degraus, um primeiro que reconhece que a organização está a caminho da

excelência e um segundo degrau que reconhece a adoção de práticas de classe mundial.

Premiações como estas já são utilizadas em mais de 60 países, sobretudo os mais

desenvolvidos.

Os objetivos da premiação são reconhecer formalmente os resultados alcançados pelas

organizações com a implementação de uma gestão pública de qualidade. Se pretende

também estimular os órgãos e entidades da administração pública brasileira a priorizarem

ações voltadas para a melhoria da gestão e do desempenho institucional e disponibilizar

para as organizações informações sobre práticas bem sucedidas de gestão.

As organizações participantes tem diversos benefícios. O primeiro deles e não menos

importante é a oportunidade de avaliar o sistema de gestão. Identificar problemas, avanços

e sobretudo oportunidades de melhoria. O segundo deles é de natureza motivacional. A

participação desperta a organização para o que ela tem de melhor e para seu potencial de

crescimento. Estimula os servidores a repensarem suas práticas e anima o clima

organizacional. Um outro benefício é a própria melhoria da imagem externa junto aos

clientes-usuários do serviço e aos cidadãos em geral. As empresas participantes e as

premiadas tornam-se “vitrines” para as outras organizações.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 86

A evolução da pontuação no prêmio:

A gestão por resultados

A internalização, através do planejamento de princípios organizacionais mais modernos de

gestão, que passam a reestruturar o serviço público, acabam levando a uma nova forma de

pensar a administração dos recursos financeiros e os resultados para a sociedade.

A idéia de que o planejamento deva ser intensivo em gestão e orientado para resultados

concretos foi quase que uma decorrência natural deste processo de reforma. Incorporou-se

experiências de outros países no setor público. A idéia de combinar um planejamento

abrangente que envolvesse o conjunto de bens e serviços do Estado com uma estratégia de

priorização de programas foi implementada. A definição de metas plurianuais de

desempenho teve o propósito de elevar a capacidade do Estado para produzir resultados

crescentes. A seletividade e a focalização foram outras duas iniciativas para reforçar este

propósito.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 87

A introdução da gestão por programas no ambiente atual da administração pública produziu

uma tensão entre as práticas existentes e os novos valores e atitudes empreendedoras. O

governo federal tem lidado com essa tensão de modo que sua intensidade não seja um

obstáculo à modernização, mas tenha um efeito indutor no processo de mudança.

Fundamental para a gestão por resultados foi a adoção do conceito de “programa” como elo

de ligação entre o Plano Plurianual e o Orçamento. Isto aumentou a transparência na

alocação dos recursos e no compromisso com resultados. Entretanto outros passos ainda

devem ser percorridos para isso.

Estas mudanças dependem ainda de aspectos interligados. O primeiro deles é a adoção

efetiva da orgnaização a uma gestão mais matricial e intersetorial. Em resumo, a

administração por resultados implica num modelo de gestão por projetos, ou no caso, por

programas. Como veremos a seguir.

O peso de cada ponto nos diversos critérios:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 88

A gestão por programas

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 89

Um programa na administração pública tem quase o mesmo sentido que na administração

privada, onde ele é mais conhecido como projeto. Um programa é um conjunto ordenado de

informações que objetiva organizar recursos (humanos, financeiros, organizacionais, etc.),

para produzir um resultado desejado. Assim os programas devem ser inspirados por

diretrizes claras, ter metas objetivas, mensuráveis, ações concretas, estratégias de realização

factíveis, orçamentos definidos e sistemas de informação, por exemplo.

O modelo de gestão por programas, que é necessário para a gestão por resultados, introduz

um conflito entre a estrutura departamental e a performance por objetivos. Vamos explicar

melhor, O que acontece é uma ênfase mais acentuada na contradição entre as visões

setoriais e o objetivo do programa. Isto ocorre porque o objetivo do programa é por

definição composto por uma demanda externa da sociedade.

Por exemplo, imaginem um Programa de Geração de Emprego no Município de São Paulo. O

programa certamente terá um objetivo, várias metas e ações. As ações terão orçamento,

recursos humanos, prazos para serem executadas e responsáveis. Um dos objetivo poderá

ser “atrair investimentos produtivos para a cidade”. Para executar este objetivo, por

exemplo, será necessário alterar a legislação municipal que regula a abertura e

licenciamento de empresas. Entretanto, os interesses setorias da área que cuida deste setor

na Secretaria da Fazenda, podem não contemplar esta ação ou isto não ser importante no

momento para aquele setor. Outra ação poderia ser “implantar infraestrutura de transporte

no distrito industrial da zona leste”. Ora, o departamento municipal que cuida das ruas e do

transporte pode não ter na sua agenda este objetivo. E assim por diante.

É por isso que dissemos que uma gestão voltada para programas deve ser necessariamente

intersetorial, articulada de forma matricial e isto pode gerar tensões internas na

administração pública. Neste caso a habilidade gerencial do gerente inovador será saber

transforma a tensão em ponto de apoio para fazer uma verdadeira gestão da mudança.

Mudando estratégias, valores, estruturas, liderança, sistemas de controle, etc.

Os objetivos do programa devem estar claros e precisos. A tarefa que cabe a cada

Ministério, Secretaria ou Departamento deve estar clara para todas as partes,

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 90

compromissada e pactuada. Isto é condição necessária para mobilização das organizações e

harmonização da direção administrativa.

Um outro passo importante é o fortalecimento e a integração das funções de planejamento,

orçamento e gestão. Em uma perspectiva orientada para resultados é recomendável que se

dê ênfase ao planejamento e à gestão estratégica, à elaboração e execução orçamentária e

financeira orientada pelos resultados dos programas, a um processo contínuo de evolução

organizacional, que tenha o objetivo de agregar à gestão por programas todas as estruturas

formais e os processos decisórios da organização.

O ciclo de gestão do gasto do governo e suas diferentes etapas também deve ter como

referência os programas e seus resultados. Aqui o objetivo é garantir que o programa atua

como elemento integrador do processo. Ele estabelece uma linguagem comum para as

atividades de elaboração, revisão e avaliação do Plano Plurianual, a definição de prioridades

e metas na Lei de Diretrizes Orçamentárias, na elaboração de orçamentos, na programação

financeira e finalmente na auditoria interna e externa.

A gestão por programas também é valida para a melhoria da transparência e fortalecimento

do controle social. Ninguem pode ter opinião sobre aquilo que não conhece, que não

acompanha. Para monitorar as ações do governo a organização de programas claros e

coerentes é fundamental. O programa pode se transformar em referencial para o debate

político e na mídia, tornando-se um instrumento de diálogo e conversação entre o Estado e

a sociedade.

Na gestão por programas o papel do gerente ganha relevância e importância. É ele quem

garante a articulação e tem a liderança para viabilizar a transversalidade entre órgãos e

departamentos diferenciados. O gerente deve ter a um só tempo perfil técnico e político, um

perfil tecno-político. Técnico porque deve entender com profundidade do assunto que vai

gerenciar, suas variáveis, dinâmica e fatores críticos de sucesso. E político porque deve saber

transitar entre as várias esferas de governo e ter legitimidade perante os gestores públicos.

As funções do gerente do programa deve ser múltipla, ele deve ser capaz de:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 91

• Planejar a execução do programa

• Formar e motivar a equipe

• Negociar os compromissos com as parcerias externas e internas

• Manter um sistema de informações gerenciais para o controle do desempenho e da

gestão de restrições

• Promover a execução das ações para obter os resultados desejados

• Participar da administração orçamentária e financeira

• Comunicar-se com o público-alvo do programa e

• Avaliar e aperfeiçoar continuamente o programa

O gerente é o responsável pela documentação do programa, pelo registro dos avanços e das

lições apreendidas. Ele é também um “gestor do conhecimento” na organização. Os

sistemas de informações gerencias são as ferramentas e instrumentos que ele deve manejar

e administrar. Nunca devemos nos esquecer que o que não é medido e não tem informação

registrada, não pode ser monitorado e controlado. E tomar decisões sem acompanhar as

ações é como navegar no escuro, sem bússola, nem direção.

A importância estratégica da avaliação

Outro elemento importante no modelo de gestão por programas é a avaliação. Ela implica

em controlar os custos, assegurar a conformidade legal de procedimento ou medir a

capacidade de implementação do governo. Mas sobretudo avaliar significa identificar o

quanto houve de adequação entre o esforço realizado e as demandas da sociedade, os

problemas reais da população. Se o processo de avaliação for realizado de forma

participativa e transparente, de forma honesta e responsável, todos tem a ganhar. Os

gestores públicos aumentam seu conhecimento, a sociedade tem mais condições de

controlar os governos e os fornecedores do Estado são regulados de forma mais eficaz.

A avaliação mantém o ciclo de melhorias:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 92

Normalmente a avaliação é feita com indicadores, o que vamos debater com mais

profundidade adiante. O primeiro bloco de avaliação considera a concepção do programa,

avalia seu desenho: objetivo, indicadores, ações, metas, produtos e serviços. O objetivo aqui

é checar e verificar se estão consistentes entre si e adequados para atender à demanda ou

resolver o problema que deu origem ao programa. Num outro bloco de avaliação o debate

ocorre sobre a dimensão da execução e seu contexto. Verifica-se a suficiência de recursos

alocados, a pertinência da estratégia de implementação, assim como os reflexos do modelo

gerencial e da estrutura organizacional sobre o desempenho do programa.

Resumindo os objetivos da gestão por programas e resultados poderíamos afirmar que este

modelo gerencial deve:

• Prover informações gerenciais: disponibilizar para a alta direção do governo as

informações para o desempenho físico e financeiro das ações de cada programa,

seus resultados e as restrições que enfrentam durante a execução.

• Generalizar a cultura de avaliação e dsempenho: só a avaliação sistemática permite e

garante um aperfeiçoamento contínuo do sistema de gestão. Organizações que não

pedem e não prestam contas, não demandam planejamento estratégico, nem

modernização na gestão. Elas permanecem numa situação de equilíbrio medíocre e

estacionário.

• Maior flexibilidade para procedimentos administrativos e de execução orçamentária:

normalmente os gastos não são executados porque há muita rigidez nas regras e

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 93

procedimentos internos, administrativos. É um erro pensar que a baixa execução dos

orçamentos é causada somente pelas restrições fiscais.

• Estabelecer a comunicação com a sociedade: a interação com o público atingido

pelos programas é normalmente o maior fator de motivação das equipes públicas e

dos gestores. É no contato direto com a população que a energia e a disposição

pessoal do servidor público se renova. A comunicação também é direcionada para o

legislativo, pois o parlamento é parte integrante do sistema democrático para

fiscalizar a ação do executivo e exercer a representação da sociedade.

• Viabilizar parcerias: um programa ajuda a definir responsabilidades e compartilhar

parcerias.

Segundo o GesPública, o Sistema de Avaliação Continuada é um conjunto integrado de

ações, realizadas de modo contínuo, que começa com a decisão da organização de avaliar

continuamente as práticas e os resultados da sua gestão e se mantém ao longo do tempo

mediante repetição cíclica do processo. A avaliação continuada da gestão, em cada ciclo,

compreende as ações identificadas no quadro a seguir.

Na auto-avaliação os servidores da própria organização, liderados pela alta-administração,

realizam a avaliação da gestão da sua organização, tendo por referência os requisitos do

modelo já apresentados. Um momento importante da auto-avaliação é a validação externa

da avaliação realizada pela própria organização. Essa validação é uma ação conjunta do

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 94

Programa com a organização com a finalidade de garantir a qualidade técnica da auto-

avaliação e propiciar o reconhecimento público do nível de gestão atingido naquele

momento pela organização.

Após a auto avaliação deve ser elaborado um Plano de Melhoria da Gestão é elaborado a

partir da priorização das oportunidades de melhoria identificadas na auto-avaliação. Nesse

Plano devem estar as metas de melhoria da gestão que a organização decidiu implementar.

Ação de transformar metas em resultados e resultados em benefícios para a organização e

para os seus usuários. É por meio desta fase que cada organização, efetivamente pode

contribuir para a melhoria da satisfação de seus usuários, para melhorar a imagem do

serviço público junto à sociedade e, principalmente, para promover a cidadania e a

qualidade de vida.

Tão importante quanto fazer é monitorar o que é feito no momento em que está sendo

feito, analisar o andamento da execução do plano, medir a distância entre meta e resultado

e aprender com esse exercício. Todas as diferenças, para mais ou para menos, todos os

cálculos que apontam para o atingimento ou não das metas do plano são objeto, nessa ação,

de intervenção para correção de rumos, seja no planejamento, seja na execução, ou até

mesmo no próprio sistema de acompanhamento. Ao término de cada ciclo uma nova

avaliação e um novo plano são necessários para que a melhoria contínua continue seu

curso, seja internalizada como uma prática de gestão e permita à organização atingir

paulatinamente patamares mais elevados de desempenho.

Concluindo, a auto-avaliação é um diagnóstico interno, feito pela própria organização, tendo

por objetivo quantificar e qualificar os principais fatores relacionados à organização, com

ênfase em suas práticas de gestão e resultados institucionais.

Como funciona a auto-avaliação:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 95

Essa assistência será feita à distância ou de forma presencial e tem o propósito de transferir

o conhecimento em avaliação da gestão para as organizações participantes; criar um

verdadeiro ambiente de auto-avaliação, sem a presença de pessoas que não pertencem aos

quadros da organização e, por último, otimizar o tempo dos consultores, cujo serviço é

voluntário, solicitando sua atuação apenas nos momentos em que a organização julgar

importante. Para facilitar a realização da auto-avaliação, as organizações têm acesso ao

aplicativo desenvolvido para apoiar a execução dos ciclos de melhoria da gestão.

Uma síntese de todo o programa no seu formato recente:

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Perguntas:

1. Para você o que significa ter excelência na gestão pública ?

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2. Se você é um servidor publico, sua organização poderia participar do GesPública ?

Justifique a resposta.

3. Na sua opinião que adaptações devem ser feitas nos modelos gerenciais empresariais

para que possam ser utilizados na esfera pública ?

Bibliografia:

Excelência em Gestão Pública – A Trajetória e a Estratégia do Gespública de Paulo Daniel

Barreto Lima

O livro é um verdadeiro manual de avaliação do sistema de gestão. Paulo Daniel destaca

alguns aspectos essenciais da proposta do GESPÚBLICA, referentes ao entendimento do

Modelo de Excelência em gestão pública proposto pelo Programa e dos critérios de

avaliação dele desdobrados. Segundo o autor a obra é o primeiro registro do

desenvolvimento de um programa, que tem a intenção de transformar a prática de gestão

do setor público brasileiro. O livro está dividido em 10 capítulos, que explicam desde o qual

é o conceito de GESPÚBLICA, culminando com o desafio da

Gestão Pública por resultados; quando o Estado se Compromete, de Sylvie Trosa

O Estado precisa crescer, oferecer ele próprio mais e melhores serviços à população, ou ao

contrário, está grande demais, gasta demais, tem de definhar? Ele deve atuar diretamente,

com seus ministérios e equipamentos (hospitais, escolas etc.), ou faze-lo através de

empresas privadas contratadas ou subvencionadas, ou seja, terceirizar? Gestão pública por

resultados se insere entre as obras mais inteligentes e úteis para a focalização desse tema. A

autora, Sylvie Trosa, tem larga experiência internacional no assunto: começando na

universidade e no governo da França, seu país natal, ela trabalhou em diversos governos na

Europa e além-mar como assessora em reformas do sistema de administração pública. È um

livro de leitura indispensável para os dirigentes e gerentes do serviço público e para todos os

executivos de empresas privadas que lidam ou planejam lidar com o setor público.

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CÂMARA DA REFORMA DO ESTADO – PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Plano Diretor da

Reforma do Aparelho do Estado. Brasília, 1995.

O Plano Diretor da Reforma do Estado foi elaborado pelo Ministério da Administração

Federal e da Reforma do Estado e, depois de ampla discussão, aprovado pela Câmara da

Reforma do Estado em sua reunião de 21 de setembro de 1995. Em seguida, foi submetido

ao Presidente da República, que o aprovou. O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do

Estado definiu objetivos e estabeleceu diretrizes para a reforma da administração pública

brasileira, instrumento indispensável para consolidar a estabilização e assegurar o

crescimento sustentado da economia. A leitura deste trabalho é fundamental para entender

a guinada na gestão pública brasileira pós Bresser Pereira e as reformas postas em prática a

partir do primeiro governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 99

AULA 6

Gestão de Pessoas e a dinâmica das organizações

A administração pública não ficou indiferente às grandes transformações tecnológicas e

institucionais dos últimos dez a quinze anos. A tecnologia da informação mudou

radicalmente o cenário organizacional. Hoje se produz, consome e distribui milhares vezes

mais informações que nossos antecessores sonhavam imaginar. Os processos ganharam

velocidade. O ambiente democrático tornou o cidadão mais exigente em qualidade e

atendimento.

Mudaram as carreiras e o processo de seleção de funcionários. Novas habilidades, novas

competências são necessárias para enfrentar a complexidade do mundo moderno. A gestão

pública não está preparada para enfrentar estes desafios. Aos poucos, lentamente vamos

construindo o que será um nova política de pessoas, uma nova política que dê conta da

qualificação e da competência do servidor publico.

A seguir vamos ver estes temas com maior detalhe. Por exemplo, as questões da liderança,

da gestão de pessoas, da avaliação de competências, da capacitação e desenvolvimento,

enfim da dimensão humana da gestão pública inovadora.

As origens e evolução do “management”

A função de direção na gestão pública tem sido pouco influencia pelas modificações

ocorridas nos estilos de gerenciamento no mundo corporativo. O século XX foi o século do

gerenciamento, do “management”. Nos primeiros anos do século passado a orientação

dominante foi o controle de tempo. Em 1899 o Presidente dos Estados Unidos, McKinley,

nomeou Elihu Root para organizar o caos no exército americano. Root identificou que o

principal problema era a coordenação dos efetivos e o afastamento da hierarquia do que

acontecia em campo. Como resultado de seu estudo foi criada a Academia Militar e o Estado

Maior. Talvez este episódio tenha sido o pioneiro na revolução da gestão no século XX.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 100

Um outro ícone na sequência da história foi Henry Fayol, um engenheiro de minas francês.

Ele disse que o gerenciamento teria um caráter universal podendo ser aplicado em qualquer

organização, que era uma disciplina independente das demais e definiu 14 princípios para a

boa gestão. Entres os quais, só para ilustrar, podem ser citados na ordem que Fayol propôs:

a divisão do trabalho, a autoridade e responsabilidade, a disciplina, a unidade de comando e

direção, etc.

Para ele as cinco funções de um dirigente são o planejamento, a organização, a autoridades,

a coordenação e o controle. Taylor, outro engenheiro, ficou conhecido pelos princípios do

que se chamou mais tarde de “administração científica”. Ele dizia que a gestão era 75% de

ciência e 25% de senso comum. Sua preocupação era com a cadência e o ritmo de trabalho

dos funcionários. A produtividade era um valor acima de qualquer outro.

Talvez um dos pioneiros mais importantes na gestão de pessoas tenha sido Henry Ford. Ele

viveu entre 1863 e 1947 e ficou na historia por ter sido um dos criadores do conceito

industrial de “linha de montagem”. Sua política de recursos humanos era baseada no medo

e na desconfiança dos empregados. Até 1941 demitia todos que se filiassem a um sindicato.

No Japão, Matsushita copiou o modelo, embora com conceitos morais diferenciados,

relativizando o valor da produtividade e do faturamento.

Outro pensador da área que merece ser citado é Elton Mayo, que viveu entre 1880 e 1949.

Ele era um biólogo australiano que foi em 1926 para a Universidade de Harvard para estudar

a realidade do mundo do trabalho. Neste estudo ele entrevistou vinte mil pessoas, numa

fábrica da Western Eletric, conhecida com Hawthorne, entre os anos de 1927 e 1932.

A pergunta central era sobre quais os fatores que poderiam influenciar a produtividade

conforme diferentes graus de iluminação do ambiente. Mas o grande resultado indireto da

pesquisa foi a descoberta de que os trabalhadores se motivaram simplesmente sabendo que

a direção da empresa de alguma forma se preocupava com seu bem estar. Pela primeira vez

havia a idéia de que os fatores humanos eram importantes para debater os temas de gestão.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 101

No pós guerra o debate sobre gestão foi muito influenciado por Edward Deming. Junto como

outro professor, Joseph Juran, criaram as bases do que foi conhecido mais tarde como

movimento da qualidade total. Eles foram enviados ao Japão como consultores econômicos

para contribuir com a recuperação no pós-guerra. Os princípios e ferramentas da qualidade

mais tarde, já nos anos oitenta foram incorporados pelo movimento de renovação da

administração pública em todo o mundo.

Peter Drucker, um dos maiores gurus da administração corporativa mostrou a importância

da gestão como uma prática sistematizada e passível de um aprendizado. Ele defendia que

os gerentes devem se converter em um grupo estratégico da sociedade industrial, um grupo

privilegiado pelos conhecimentos que detém.

A ênfase dada na necessidade de capacitação e formação para a produtividade foi uma de

suas marcas. Drucker argumentava que as funções básicas do líder seriam a fixação de

objetivos, a organização, a motivação e a comunicação, o controle e o desenvolvimento de

recursos humanos. Caberia ao dirigente assumir os riscos, tomar decisões estratégicas, criar

equipes integradas, comunicar com rapidez e claridade e ter uma visão ampla dos negócios,

entre outras atribuições.

Entre as abordagens mais modernas de gestão estão as de Champy e Hammer com sua

proposta de reengenharia das organizações. Em todas organizações há processos básicos

que devem ser identificados, em detrimento de processos periféricos, que devem ser

descartados. Assim as organizações deveriam passar por uma verdadeira “reengenharia de

processos” e um “downsizing”.

Outro teórico, Tom Peters, propôs o “gerenciamento libertador”, uma organização baseada

em redes, que cultivasse valores como a curiosidade e a iniciativa. Peters faz algumas

recomendações para atingir a excelência na política de recursos humanos, tais como a

proximidade ao cliente, a autonomia, a especialização, a simplicidade das estruturas e o

equilíbrio entre flexibilidade e rigor.

A evolução da administração pública em relação ao tema da liderança e do papel dos

dirigentes pode ser dividida em três etapas distintas. Temos uma primeira etapa até meados

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 102

dos anos setenta que pode ser denominada de “fase administrativa e burocrática”. Uma

segunda fase de meados dos anos setenta até meados dos anos noventa que pode ser

chamada de “fase do gerenciamento ou management”. Finalmente uma terceira fase, que

vivemos atualmente, onde predominam os debates sobre a “boa governança”.

Em outras oportunidades já debatemos o papel e a crise da administração de estilo

burocrático. Vamos agora retomar alguns princípios do estilo mais contemporâneo e atual

porque ele tem muita repercussão sobre as estratégias de gestão de pessoas na perspectiva

inovadora.

A administração publica dita “gerencial”, que coloca o debate da boa governança, pode ser

sintetizada em alguns pontos, a saber:

• A relevância da perspectiva do “cidadão-cliente” ou do “cidadão-usuário de

serviços”.

• Ênfase no controle de resultados, na avaliação de resultados e não de meios.

• Se enfatiza a discricionariedade, ou seja, a capacidade de decisão e autonomia dos

dirigentes e gestores.

• Descentralização na execução das políticas públicas.

• Transferências ao setor privado e terceiro setor, as ONGs, de alguns serviços

públicos.

• Maior terceirização de atividades auxiliares.

No plano gerencial este movimento significou a recolocação da importância da gestão de

pessoas. Porque um dos eixos deste debate é saber exatamente o que se quer gerenciar ?

Como se tomam as decisões na administração pública ? Temas que vamos debater com mais

profundidade adiante.

A gestão de pessoas nas organizações

Os modelos tradicionais de gestão de pessoas são cada vez mais inadequados para enfrentar

as novas necessidades e expectativas das organizações públicas modernas. Aqueles velhos

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 103

princípios da administração científica, baseados no controle e na unidimensionalidade da

pessoa não são mais adequados. A globalização, a complexidade, a imprevisibilidade

levaram à maior flexibilidade e mudança rápida de sistemas e referências.

O perfil das pessoas está mudando rapidamente. As organizações modernas não demandam

mais pessoas que se limitem a repetir tarefas mecânicas. Elas demandas um perfil autônomo

e empreendedor. Mesmo nos setor público onde os processos de recrutamento e seleção

ainda são muito convencionais, há uma lenta mas definitiva mudança nos processos

seletivos. Eles estão mais sofisticados, os processos seletivos incorporam instrumentos de

aferição de atitudes e aspectos comportamentais.

Segundo estudos da União Européia, a moderna Gestão de Recursos Humanos (GRH)

relaciona-se fortemente com a visão, a missão e os objetivos operacionais da organização.

Os seguintes elementos da política e estratégia de GRH são características importantes e a

diferenciam da administração de pessoal tradicional:

1. Os empregados são considerados os recursos mais valiosos da organização.

2. A GRH é uma responsabilidade direta dos gestores de linha e está intimamente

ligada à gestão de desempenho.

3. A GRH baseia-se em valores, fortalecendo o compromisso com a missão e os

valores da organização.

4. A GRH pauta-se por políticas expressas e documentadas.

5. A GRH acredita que os empregados compartilham os mesmos interesses que os

empregadores.

6. A GRH é estratégica, na medida em que busca identificar as áreas críticas para o

desenvolvimento e o sucesso da organização.

7. A GRH é guiada pelos objetivos e seu acompanhamento.

8. A GRH é orientada processualmente.

9. A avaliação do desempenho gera a melhoria contínua.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 104

O foco da gestão de pessoal não é mais só o controle. Agora é mais importante o

desenvolvimento de posturas ativas e empreendedoras. Além disto, as pessoas ganharam

mais importância na estratégia de negócios. Surgiu inclusive na literatura a expressão

“capital humano”, tão importante quanto as outras formas de capital.

A gestão de pessoas também teve que mudar para acompanhar este esforço. Ela ficou mais

integrada com a estratégia organizacional como um todo. O alinhamento com as diretrizes

da alta direção ficou mais evidente. Os antigos “departamentos de pessoal” estão

começando a dar lugar para centros integrados de gestão, que são ao mesmo tempo suporte

administrativo, órgãos de controle e normatização e centros de desenvolvimento de

pessoas. A gestão integral de pessoal é sempre uma combinação de efetividade

organizacional e qualidade de vida no trabalho.

Atualmente a gestão de pessoas está centrada nas competências essenciais entendidas

como capacidades para realizar e desempenhar as tarefas com eficiência e eficácia. No

início as competências se limitavam a um “estoque de qualidades”. Com a evolução do

conceito a competência é entendida dentro de certo contexto. Conforme mudam os

ambientes, também mudam as competências essenciais.

Assim as competências são a combinação sinérgica de conhecimentos, habilidades e

atitudes, que se desenvolvem no ambiente e contexto organizacional e que agregam valor às

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 105

pessoas e às organizações. Os indivíduos mobilizam recursos e insumos para desenvolver

competências. Ela apresenta três dimensões, vamos analisá-las com mais detalhe a seguir:

• O conhecimento corresponde a informações que, ao serem reconhecidas e

integradas pelo indivíduo em sua memória, causam impacto sobre seu julgamento ou

comportamento. Refere-se ao saber que a pessoa acumulou ao longo de sua vida,

algo relacionado a lembrança de conceitos, idéias ou fenômenos.

• A habilidade está relacionada com a aplicação produtiva do conhecimento, ou seja, a

capacidade da pessoa de instaurar conhecimentos armazenados em sua memória e

utilizá-los em uma ação. Podem ser classificadas como intelectuais - quando

abrangerem essencialmente processos mentais de organização e reorganização de

informações - e como motoras ou manipulativas – quando exigirem principalmente

coordenação neuromuscular.

• Já a atitude refere-se a aspectos sociais e afetivos relacionados ao trabalho, dizendo

respeito a um sentimento ou a predisposição da pessoa, que determina a sua

conduta em relação aos outros, ao trabalho ou a situações. O próprio desempenho

profissional é expresso pelos comportamentos que a pessoa manifesta no trabalho e

pelas suas conseqüências, em termos de realizações e resultados.

As competências podem ser identificadas nos times e nas organizações. As grandes

empresas possuem competências distintas que as caracterizam no mercado. Por exemplo, a

capacidade de miniaturização de componentes dos fabricantes japoneses de eletrônicos ou

o design da indústria do vestuário italiana. Estas competências organizacionais não são o

mero somatório de qualidades individuais.

O ambiente institucional é capaz de produzir e manter novas competências. No setor publico

também temos competências organizacionais ? É claro que sim. É comum reconhecermos

diferentes distinções de desempenho entre órgãos públicos pela demonstração repetida de

sinais positivos.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 106

A competência profissional será sempre uma combinação virtuosa de conhecimentos,

atitudes e habilidades.

A gestão de competências começa alinhando as competências existentes com aqueles

demandadas pela missão e visão de futuro da organização. O “gap” identificado entre um

nível e outro é a base para construção e execução do programa de desenvolvimento de

pessoas. Com o passar do tempo surgem novas competências, porque a missão da

organização muda. Outras se tornam obsoletas.

O desenvolvimento de novas competências precisa ser monitorado constantemente através

de indicadores. É comum a implantação de sistemas de avaliação de desempenho e

remuneração variável acoplados aos sistemas de desenvolvimento de competências.

A avaliação de desempenho moderna é uma avaliação baseada em competências.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 107

A gestão de pessoas por competência influencia outros sistemas da organização. Por

exemplo, uma política de retenção de talentos deve ser elaborada tendo em vista a

preservação dos quadros mais estratégicos para a organização, normalmente aqueles que

reúnem um maior número de competências essenciais.

Os sistemas de educação corporativa devem ser desenhados para corrigir a discrepância

entre competências necessárias e instaladas.

A seguir um quadro-resumo das principais dimensões da gestão de pessoal, todos eles são

de uma forma ou outra influenciados pela gestão de competências.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 108

As várias dimensões da liderança e do papel do dirigente público

Há várias compreensões do que é o fenômeno da liderança na organização moderna. É a

capacidade de conduzir, de influenciar pessoas, exercida através da comunicação humana.

Pode ser uma liderança autocrática, liberal ou democrática. O fato é que hoje em dia não há

mais espaço para o dirigente público ou o executivo que se limita a dar ordens. O novo líder

que o mundo contemporâneo, complexo e heterogêneo, está a exigir é o líder como

facilitador, como mentor, como desenvolvedor de pessoas.

Ele deve ser capaz de estimular o auto-desenvolvimento dos funcionários e das equipes. Ele

conduz a organização pelo exemplo de conduta e atitudes e não só pelo que fala o diz.

Algumas abordagens atribuem a liderança à fatores natos. Como se alguns tivessem nascido

para serem “grandes homens” ou “grandes mulheres” com dotes e atributos de genialidade.

Estes autores dizem que traços do caráter ou da personalidade poderiam explicar porque

alguns se tornam líderes e outros não. É fato que a personalidade dos indivíduos depende

das normas e regras formais e informais da organização. Um traço de personalidade, por

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 109

exemplo, a capacidade de inovação, pode não ser valorizado numa organização cuja cultura

é aversa a assumir riscos e vice-versa.

De fato não há um estilo único ou melhor de liderança. A abordagem conhecida como

“liderança situacional” nos diz isso. A liderança não nasce com as pessoas, mas se forma na

interação entre o comportamento da pessoa e o relacionamento que tem com os demais e o

nível de maturidade dos subordinados.

E esta interação acontece e muda em cada ambiente específico. Conforme o ambiente o

estilo pode ser do tipo mais determinativo, ou persuasivo, ou de compartilhamento e

delegação. Nesta ótica os fatores importantes para conduzir à uma situação de liderança

seriam:

• características do líder e dos empregados;

• clima organizacional;

• natureza da tarefa a ser executada e

• pressões sobre o grupo de trabalho.

Ou seja, a liderança é uma condição que depende muito mais da interação entre pessoas do

que de habilidades do líder. A disposição dos subordinados para serem liderados é uma das

condições-chave. A situação faz o líder. Ou seja, o principal traço do líder deveria ser a sua

capacidade de adaptação, seja ele orientado para a tarefa ou orientado para o

relacionamento, para as pessoas.

A capacidade de adequação depende do quanto os contextos favorecem a ação de liderança.

Obviamente que fatores como a reação dos funcionários, o grau de estruturação das tarefas

e quanto poder tem o líder – sobretudo o formal – influenciam muito a situação.

A reação dos subordinados, por exemplo, é uma variável complexa. Uma primeira questão é

saber se os subordinados compreendem como atingir os objetivos propostos pelo líder.

Outro problema é a expectativa do líder sobre o desempenho dos liderados. A virtude do

líder seria neste contexto fazer com que sua equipe acredite que os objetivos são viáveis,

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 110

que o esforço não será em vão. Esta abordagem, também conhecida como “caminho-meta”

nos diz que o líder tem que ter quatro tipos de comportamentos, com mais ou menos

ênfase, dependendo da situação.

• Diretivo – O líder fornece diretrizes específicas aos subordinados sobre como eles

realizam suas tarefas. O líder deve fixar padrões de desempenho e dar expectativas

explícitas de desempenho.

• Prestativo – O líder deve demonstrar interesse pelo bem-estar dos subordinados e se

mostrar acessível a eles como indivíduos.

• Participativo – O líder deve solicitar idéias e sugestões dos subordinados e incentivar

sua participação em decisões que os afetam diretamente.

• Orientado para realização – O líder deve fixar objetivos desafiadores, enfatizar

melhoras no desempenho do trabalho e encorajar altos níveis de realização de

objetivos.

As competências da nova liderança

A função de direção exige atualmente muito mais qualificação dos gestores públicos. O

dirigente público é a peça chave do processo de gestão da mudança e modernização da

administração pública.

Podemos resumir as novas competências nos seguintes tópicos:

Instrumentos de direção:

• Planificação estratégica;

• Direção por objetivos.

• Gestão da mudança organizacional;

• Programação e técnica de projetos.

Instrumentos de apoio:

• Gestão de recursos humanos

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 111

• Gestão econômica e financeira

• Gestão de serviços;

• Marketing Público;

• Gestão da informação;

• Gestão da Informação;

• Desenho organizativo;

Habilidades de direção:

• Tomada de decisões;

• Liderança;

• Comunicação;

• Equipes de trabalho;

• Criatividade e inovação;

• Gestão de conflitos;

• Negociação;

• Gestão do tempo;

• Direção de reuniões;

• Técnicas de motivação.

A liderança é a base da função dirigente numa gestão pública inovadora. A liderança define-

se por uma capacidade que gera confiança e persuasão necessárias para o alcance dos

objetivos definidos. Alguns autores sinalizam que a liderança seria relacionada à faculdade

de alguns indivíduos em ter carisma.

Entretanto sabemos que além do carisma há características adquiridas, que podem ser

obtidas por capacitação. Além disso há um componente social importante relacionada ao

prestígio social dos indivíduos, ao reconhecimento que possuem no grupo em que

participam e atuam.

Segundo Marimón, por exemplo, a liderança pode ser definida pelo que efetivamente ela

NÃO representa. Assim a liderança não é:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 112

• Insensibilidade e atitude intimidatória;

• Distanciamento e arrogância;

• Ambição excessiva;

• Supervisão excessiva, resistência a delegar;

• Incapacidade de formar e unir equipes;

• Selecionar subordinados incompetentes;

• Dificuldade de pensar estratégicamente;

• Carência de flexibilidade para adaptação à mudança;

Há elementos não totalmente racionais que influenciam a liderança como uma competência

essencial. Daniel Goleman, por exemplo, teorizou sobre a importância dos lideres terem

inteligência emocional. Para ele os líderes devem ter uma alta inteligência emocional para

um efetivo exercício da liderança. Este autor analisou 188 grandes empresas e organizações

e agrupou as capacidades em três grandes modelos diferentes:

(a) Habilidades predominantemente técnicas, como a capacidade de planejamento

estratégico e a gestão financeira;

(b) Habilidades cognitivas, como a capacidade de raciocínio analítico;

(c) Habilidades complementadas pela inteligência emocional, entendida como

capacidade de empatia, capacidade de trabalho em grupo, ser eficaz na gestão da

mudança e outras.

Goleman comprovou que 90% das diferenças de desempenho entre os indivíduos se devia a

dotações diferenciadas de inteligência emocional. Ele compactou os traços deste tipo de

inteligência em cinco grandes componentes:

1. Auto-consciência e auto-controle

2. Auto-avaliação

3. Motivação

4. Empatia

5. Atitudes sociais

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 113

A primeira característica diz respeito à capacidade que os líderes tem de auto-aprendizagem,

de conhecimento de seus próprios limites e fraquezas. E limites não só técnicos ou racionais,

mas emocionais e afetivos. O líder que conhece seus limites tem mais honestidade consigo

mesmo, não comete erros por excesso de auto-confiança. É mais tolerante e aberto à críticas

e ao dialogo com subordinados e superiores. O auto-controle é produto do auto-

conhecimento.

Ele representa o componente da liderança que nos ajuda a manejar nossos próprios

sentimentos, sem desconhecê-los ou rejeitá-los. Esta capacidade é especialmente necessária

em momentos de crise, de ambientes com informação incompleta para a tomada de

decisão. O auto-controle ajuda a discernir e dosar a proporção certa entre emoção e razão

nos processo decisórios.

A motivação é um componente relacionado à eficácia do gestor, um líder capaz de se

motivar acaba contagiando a sua equipe como um todo. A motivação faz com que as

próprias expectativas sejam superadas. Ela está associada também ao otimismo, à

capacidade de aprendizagem, à criatividade e à lealdade e compromisso com a organização.

A empatia, por sua vez é atributo de um líder negociador e perspicaz. A empatia permite

reconhecer rapidamente sentimentos e emoções dos demais, o que ajuda a controlar

situações imprevistas. A empatia é condição necessária para dirigir e gerenciar grupos. Ela é

ainda mais importante num mundo globalizado onde se cruzam diferentes culturas,

personalidades e estilos de trabalho. Na administração pública onde o líder é um treinador

permanente, fazendo o que chamamos de “coaching”, a empatia é imprescindível para

estimular e coordenar o processo de aprendizagem.

As atitudes sociais significam um tipo de postura atenta para o que acontece com os

cidadãos e com a sociedade. Também significa uma aptidão para a sociabilidade, para os

relacionamentos mais amplos com grupos, seja de subordinados, colegas ou da sociedade.

Pode ser vista como a habilidade do líder em criar redes de relacionamento.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 114

Um líder efetivo começa por ter idéias. Para isso deve estar atento o tempo inteiro a novas

oportunidades, novas formas de agregar valor ao serviço público, com mais qualidade e

menor custo para a sociedade. Idéia sobre como tornar mais acessível os bens públicos, mais

universal e com mais equidade. As idéias novas podem impactar de forma profunda e

estrutural, quando mudam a forma de pensar sobre um tema. Ou podem ser idéias

incrementais quando melhoram a produção de um serviço ou um processo administrativo.

Os valores que o líder tem devem ser vividos. Valores que devem espelhar a ética e a moral

da organização. Se não vivemos estes valores no cotidiano é porque, na prática, não

acreditamos neles. Energia positiva é outra característica da liderança inovadora. Ela não é

só uma energia emocional, mas também uma energia física. A liderança deve ser capaz de

difundir entusiasmo na equipe com sua energia.

Uma das habilidades mais requeridas para a gestão inovadora é a capacidade de lidar com o

stress. Uma organização pública é uma fonte inesgotável de problemas e temas complexos.

Muitas vezes a falta de um sistema de planejamento e gestão que funcione a contento, pode

sobrecarregar a agenda do dirigente. A situação começa a se tornar grave quando a agenda

fica sobrecarregada de problemas de rotina, impedindo que o dirigente se dedique aos

trabalhos criativos de sua responsabilidade.

A gestão do tempo é um problema crítico de stress na organização. Saber inovar na gestão

implica em tratar o tempo com o máximo de cuidado. O tempo é inelástico, um recurso que

não pode ser substituído por outro. E normalmente quando percebemos que ele está

faltando é porque algo já deu errado antes, ou no planejamento das atividades ou na sua

execução. Quase nunca se trata de aumentar a carga de trabalho, mas de conseguir os

resultados desejados.

Nos anos noventa o governo norte-americano definiu as diretrizes do que foi chamado de

“Competências Executivas Essenciais” (Executive Core Qualifications, ECQ), há muita

semelhança com os atributos debatidos até agora, veja a tabela a seguir.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 115

A primeira coisa a fazer é distinguir o urgente do importante, para se dedicar ao que

realmente faz diferença para obtenção dos resultados e cumprimento das metas acordadas.

Por exemplo, se aplicarmos o princípio de Pareto, que identifica a maioria dos problemas

num conjunto pequeno de causas, veremos que a grosso modo, em 20% do gasto de tempo,

acabamos produzindo 80% dos resultados.

A gestão do tempo numa organização pública deve ser aplicada permanentemente, mas em

algumas situações o gestor deve prestar muita atenção:

1. A realização de reuniões: reuniões que não são preparadas e cujos objetivos são

vagos são verdadeiras “devoradoras de tempo”.

2. Receber visitas também é outro problema, se não adotamos um tom formal e se não

planejadas podem gerar problemas na agenda.

3. Processos internos de comunicação: se somarmos o tempo gasto na comunicação

interna por email, telefone ou pessoalmente veremos que muito tempo é perdido

pela comunicação ineficaz, por ruídos ou mau entendidos desnecessários.

Assim, vemos que as habilidades humanas para os dirigentes e líderes nas organizações

públicas mudaram radicalmente nos últimos dez a quinze anos. A mudança de paradigma

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 116

para um estilo mais gerencial, voltado a resultados e uma maior transparência e cobrança da

sociedade organizada impuseram novas competências, atitudes e conhecimentos.

O redesenho da administração pública criou novas formas organizativas. Estas formas são

marcadas pela descentralização, pelo princípio da complementariedade, da responsabilidade

e pelo controle de processos.

Uma nova governança começa lentamente a ser construída. A maior flexibilidade e

descentralização dos séricos públicos gera novas demandas por universalização do Estado. O

governo criou novas formas de administração em redes e gestões coordenadas por vários

atores simultaneamente. As formas burocráticas do paradigma industrial se combinam com

formas gerenciais de uma fase intensiva em conhecimento e aprendizagem, da era pós-

industrial.

Nesta nova administração e nova fase a gestão de pessoas, e não mais de “recursos

humanos” ganhou nova dimensão. Novas carreiras se estruturaram e se desenvolveram,

processos de recrutamento e seleção no serviço público se tornaram mais complexos e

exigentes. A capacitação superou o mero treinamento, as escolas de governo tendem a se

tornar centros de formação integral, e não só a repetição mecânica das velhas fórmulas

pedagógicas. A educação a distância e os impactos da novas tecnologias de comunicação e

informação mudaram radicalmente esta realidade.

É fundamental fazermos a distinção das pessoas “como recursos” – visão antiga, e das

pessoas como “parceiras” – visão contemporânea:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 117

Por fim a nova organização pública é mais transparente, exige mais ética pública, há muito

mais participação nos negócios do estado. A democracia consolida-se como o regime mais

adequado ao desenvolvimento da sociedade e do Estado. Longe de ser perfeita, mas

permitindo reinventar-se a cada crise, a cada impasse. E não são poucos os impasses da vida

democrática. Novas disciplinas estão surgindo, como o marketing público, a agregação de

valor público e outras terminologias que tentam capturar as novas mudanças.

No mundo corporativo a velocidade das mudanças é espantosa. A cada 18 meses duplicam-

se a capacidade de processamento dos computadores. Em 2006, por exemplo, havia

informação digital três milhões de vezes superiores a todos os livros escritos até aquele ano.

Equipes virtuais e governo eletrônico são palavras já comuns no nosso vocabulário. Para

enfrentar esta realidade, ainda em grande parte desconhecida, o gestor publico precisa

mudar radicalmente, mais ainda, ele precisa fazer da mudança um hábito permanente e

auto motivado.

A gestão inovadora exige mais do que administradores eficazes, exige líderes com visão.

Visão de futuro é uma imagem desejável e possível para a organização. Uma imagem que

tenha capacidade de mobilização coletiva, de deslocamento da zona de conforto onde as

pessoas normalmente estão. Podemos ter uma visão da organização como um todo ou de

um projeto isolado ou departamento. O que importa é esforçar-se mentalmente e imaginar

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 118

com criatividade como os processos poderiam funcionar melhor, como poderíamos atender

melhor nosso cidadão-usuário de serviços públicos com mais qualidade e menor custo.

Na literatura existem várias abordagens sobre como a liderança se forma e se consolida nas

organizações.

A teoria da atribuição da liderança nos diz, por exemplo, que a liderança é apenas uma

atribuição que as pessoas fazem a respeito de outros indivíduos. As pessoas tendem a

considerar líderes aqueles que possuem certos traços como inteligência, personalidade

forte, habilidades verbais, agressividade, conhecimento e disposição, etc. Já a teoria da

liderança carismática vai nos dizer que os líderes possuem habilidades extraordinárias ou

heróicas. São aquelas pessoas de absoluta autoconfiança , fortes convicções e crenças,

capacidade de comunicação de uma visão clara de futuro. Um líder carismático não forma

equipes, ele tem seguidores.

Uma terceira abordagem diz que há dois tipos de líderes, os transacionais e o

transformacionais. Os primeiros motivam e guiam suas equipes rumo a objetivos

estabelecidos e acordados, com claros papéis e funções, definições objetivas de tarefas. Já

os lideres transformacionais estabelecem um ritmo de trabalho e uma meta que transcende

a definição habitual de papéis e tarefas. Este tipo de líder é do tipo desbravador, ele

conquista novos espaços e poder, mas os riscos de insucesso são bem maiores.

Mais uma vez a questão do poder na organização é parte do processo de liderança. O poder

pode ter várias fontes. Pode ser um poder legítimo, derivado do direito ou da autoridade

estabelecida. Pode ser um poder sobre recompensas que valorizam ou não o trabalho e as

pessoas. Pode ser um poder de coerção que controla e pune os desvios. Pode ser um poder

que vem da admiração, da referência ou estima pessoal que os outros tem pelo líder. Pode

ser um poder que vem da competência técnica e profissional. Enfim o poder pode ter várias

fontes e na prática é uma combinação variável de cada uma delas. O fato é que uma atitude

de liderança implica em acumular recursos de poder sobre as equipes e as organizações.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 119

É por isso que a figura do chefe, nem sempre é a mesma do líder. Infelizmente na gestão

pública as posições de chefia hierárquica nem sempre são ocupadas por líderes. Os chefes

administram recursos humanos, enquanto os líderes conduzem pessoas. Os chefes baseiam

seu poder na autoridade, os líderes na competência e adesão. Os chefes fazem das crises um

risco crescente, os lideres fazem das crises uma oportunidade de mudança e melhoria. Um

chefe tem subordinados, um líder tem parceiros e equipes. A liderança é um tipo especial de

chefia. É o perfil necessário para uma gestão inovadora.

Um estudo da OCDE, Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico que

reúne países desenvolvidos, elencou após exaustiva pesquisa o que seriam as competências

executivas essenciais da lideranças. Elas podem sugerir a base dos programas de formação e

capacitação no setor público. Estão listadas a seuir.

Conduzir a mudança

Aprendizagem contínua - Compreende a essência das novas informações; domina os novos

conhecimentos técnicos e de negócios; reconhece os próprios pontos fortes e fracos; busca

o auto-desenvolvimento; procura obter feedback das pessoas e aproveita as oportunidades

para adquirir novos conhecimentos.

Criatividade e inovação - Considera as situações sob um novo ângulo e aplica soluções

inovadoras para aperfeiçoar a organização; cria um ambiente de trabalho que estimula a

reflexão criativa e a inovação; concebe e implementa novos programas/processos de ponta.

Consciência do mundo exterior - Identifica e mantém-se atualizado acerca das principais

políticas e tendências econômicas, políticas e sociais, nacionais e internacionais, que afetem

as organizações. Compreende planos de curto e longo prazo e determina como estar melhor

posicionado para adquirir uma vantagem competitiva na economia mundial.

Flexibilidade - Sempre aberto a mudanças e a novas informações: adapta seu

comportamento e seus métodos de trabalho em função das informações ou situações novas,

ou de obstáculos imprevistos. Ajusta-se rapidamente a novas situações que demandem

atenção e resolução.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 120

Capacidade de adaptação - Suporta efetivamente a pressão; não se deixa abater e mantém-

se otimista e persistente, mesmo em situações adversas. Recupera-se rapidamente dos

reveses. Equilibra efetivamente a vida privada e profissional.

Motivação para o trabalho - Cria e sustenta uma cultura organizacional que encoraja os

outros a proverem a qualidade de serviço essencial para um alto desempenho. Permite aos

outros adquirirem as ferramentas e o suporte de que necessitam para trabalharem bem.

Demonstra comprometimento com o serviço público. Influencia os outros para que

demonstrem senso de serviço e o desejo de contribuir eficazmente para o cumprimento das

missões.

Reflexão estratégica - Formula estratégias eficazes e consistentes com os negócios e a

estratégia competitiva da organização em uma economia global. Examina questões afetas a

políticas e ao planejamento estratégico, com uma perspectiva de longo prazo. Determina os

objetivos e estabelece prioridades; prevê ameaças potenciais ou oportunidades.

Visão - Demonstra uma visão de longo prazo e age como elemento catalisador para a

mudança organizacional; faz surgir uma visão compartilhada entre sua equipe. Persuade os

outros a traduzirem sua visão em ação.

Conduzir as pessoas

Gestão de conflitos - Identifica e adota as medidas necessárias para evitar confrontos

indesejáveis. Gerencia e soluciona conflitos e desacordos de modo positivo e construtivo, a

fim de reduzir ao mínimo seu impacto negativo.

Consciência cultural - Inicia e gerencia intercâmbios culturais em benefício da organização.

Valoriza a diversidade cultural e outras diferenças individuais na força de trabalho. Assegura

que a organização se beneficie com essas diferenças e que os funcionários sejam tratados de

modo justo e eqüitativo.

Integridade/Honestidade - Instaura a confiança mútua; fomenta uma cultura que estimule

os altos padrões éticos; comporta-se de modo justo e ético com os outros, e demonstra um

senso de responsabilidade corporativa e de comprometimento com o serviço público.

Capacidade de constituir equipes - Inspira, motiva e orienta os outros para o cumprimento

dos objetivos. Desenvolve e mantém de modo consistente relações de trabalho

cooperativas. Encoraja e facilita a cooperação no âmbito da organização e com grupos de

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 121

clientes; fomenta o engajamento, o espírito de equipe, o orgulho, a confiança. Desenvolve a

capacidade de liderança de outras pessoas por meio do aconselhamento,

da tutoria, de recompensas e da orientação de seus funcionários.

Buscar os relutados

Prestação de contas - garante que controles efetivos sejam desenvolvidos e mantidos, de

modo a assegurar a integridade da organização. Assegura sua própria responsabilização e a

dos outros membros da equipe pelas regras e atribuições. Assegura que os projetos em

áreas de responsabilidade específicas sejam concluídos na data esperada e dentro dos

limites orçamentários. Monitora e avalia planos; privilegia os resultados e a mensuração de

sua consecução.

Foco no cliente - Equilibra os interesses de uma variedade de clientes; reajusta prontamente

as prioridades para responder a demandas prementes e mutáveis de seus clientes. Prevê e

satisfaz as necessidades de seus clientes; oferece produtos finais de qualidade; mostra-se

comprometido com o aperfeiçoamento contínuo dos serviços.

Capacidade de tomada de decisão - Exercita uma boa capacidade de julgamento, ao tomar

decisões judiciosas e bem informadas, percebe o impacto e as implicações das decisões;

toma decisões efetivas e convenientes, mesmo quando os dados disponíveis são limitados

ou as soluções produzem conseqüências indesejáveis; demonstra ser pró-ativo e orientado

para realizações.

Espírito empreendedor - Identifica oportunidades a serem desenvolvidas e novos produtos e

serviços no âmbito ou fora da organização. Mostra-se pronto a assumir riscos; empreende

ações que envolvam um risco calculado a fim de alcançar uma vantagem ou benefício

reconhecido.

Capacidade de solucionar problemas - Identifica e analisa os problemas; distingue entre

informações relevantes e irrelevantes para tomar decisões lógicas; fornece soluções para

problemas individuais e organizacionais.

Credibilidade técnica - Compreende e aplica apropriadamente os procedimentos,

exigências, regulamentos e políticas relacionadas com conhecimentos especializados. É

capaz de tomar decisões judiciosas em matéria de recrutamento e de recursos materiais

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 122

para responder às necessidades de formação e desenvolvimento. Compreende as relações

entre competências administrativas e necessidades das missões.

Perspicácia

Gestão financeira - Demonstra uma compreensão ampla acerca dos princípios de gestão

financeira, além do conhecimento de técnicas comerciais necessário para assegurar níveis de

financiamento apropriados. Prepara, justifica e/ou administra o orçamento em seu domínio

programático; estabelece suas prioridades mediante considerações de custo/benefício;

monitora as despesas relacionadas à execução dos programas e políticas. Identifica

abordagens que permitam uma relação custo/ benefício adequada. Gerencia as compras e

os contratos.

Gestão de recursos humanos - Avalia as necessidades correntes e futuras de recursos

humanos com base nos objetivos organizacionais e na realidade orçamentária. Lançando

mão dos princípios de mérito, assegura que os membros da equipe sejam adequadamente

selecionados, formados, utilizados, avaliados e recompensados; adota as medidas corretivas

necessárias.

Gestão de tecnologia - Lança mão de soluções eficientes e dotadas da adequada relação

custo/benefício, a fim de integrar a tecnologia ao ambiente de trabalho, e aperfeiçoa a

eficácia dos programas. Desenvolve estratégias fazendo uso de novas tecnologias que

propiciem a tomada de decisões. Compreende o impacto exercido por mudanças

tecnológicas na organização.

Fomentar coalizões e comunicação

Capacidade de influenciar/negociar - É capaz de persuadir as outras pessoas; estabelece o

consenso por meio de concessões mútuas; conquista a cooperação de outras pessoas para

obter informações e cumprir seus objetivos; facilita situações em que todos ganham.

Habilidades inter-pessoais - Considera e responde apropriadamente às necessidades,

sentimentos e capacidades de diferentes pessoas, em diferentes situações; é dotado de tato,

compreensão e sensibilidade, e trata os outros com respeito.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 123

Comunicação oral - Profere apresentações orais claras e convincentes para indivíduos ou

grupos; escuta efetivamente e esclarece informações sempre que necessário; facilita um

intercâmbio produtivo de idéias e fomenta uma atmosfera aberta de comunicação.

Parcerias - Desenvolve redes de comunicação e constitui alianças, participa de atividades

trans-funcionais; colabora com agentes externos, e encontra pontos em comum com uma

gama crescente de interlocutores. Utiliza os contatos para edificar e fortalecer bases de

apoio internas.

Refinamento político - Identifica as políticas internas e externas que podem exercer impacto

sobre o trabalho da organização. Aborda cada situação problemática com uma percepção

precisa da realidade organizacional e política; mostra-se consciente do impacto de

diferentes modos de ação possíveis.

Comunicação escrita - Expressa fatos e idéias por escrito de forma clara, convincente e

organizada.

O comportamento na organização

Entender o comportamento da organização é hoje um grande desafio e um grande

problemas na vida das empresas, sejam elas públicas ou privadas. Simplesmente porque a

quantidade de fatores que influenciam as atitudes das pessoas é tão grande, variada e

imprevisível que o trabalho de gestão motivacional se tornou, em parte, um exercício de

tentativa e erro.

A palavra motivação vem do latim “motivus” e “movere”, que significa um deslocamento,

uma movimentação. Daí que a motivação pode ser entendida com a força e o impulso, o

empurrão, que nos faz movimentar, que nos desloca de uma posição para outra.

Há várias teorias e modelos que tentam explicar porque as pessoas se motivam ou perdem

motivação numa organização. Uma abordagem já bem conhecida é aquela do psicólogo

Abraham Maslow. Ele criou a conhecida “hierarquia de necessidades” também chamada de

“pirâmide de Maslow”. Ela tem uma lógica biológica ou natural. A motivação segue uma

linha crescente de realização ou plenitude. Tudo começa com a satisfação das necessidades

fisiológicas, como a alimentação e o abrigo. O segundo passo é a segurança e a busca de

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 124

proteção. O terceiro são necessidades sociais como a participação e a aceitação dentro do

grupo. O quarto degrau são as necessidades de estima, de reconhecimento, aprovação,

status e prestigio.

Por fim o quinto e último grau de motivação é dado pela necessidade de satisfação da auto-

realização. Maslow não explica bem o que vem a ser isso, mas podemos entender como a

realização do potencial de auto-desenvolvimento continuo do ser humano. Diferentes

pessoas podem se sentir motivadas em diferentes degraus da pirâmide, não é

necessariamente um caminho de passagem obrigatória para todos.

Outras abordagens diferentes do enfoque estático de Maslow, identificam a motivação

como resultado de um ciclo de equilíbrio dinâmico. Em momentos alternados e repetitivos o

ser humano apresenta novas necessidades que podem ser individuais ou sociais, estas novas

demandas rompem uma situação de equilíbrio, surge uma fase de conflito e tensão. Quando

a tensão é superada surge uma nova fase de satisfação e equilíbrio e assim por diante. Não

haveria assim, uma pessoa que estivesse permanentemente motivada ou desmotivada.

O conjunto de motivações na organização influencia e determina o clima organizacional, um

dos temas mais controvertidos para uma gestão inovadora. O clima emocional, afetivo ou

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 125

comportamental numa organização reflete a tendência que nós seres humanos temos de

permanente ajustamento às circunstâncias, aos ambientes e aos outros. Este movimento de

ajuste contínuo em um propósito claro: precisamos manter sempre um equilíbrio emocional.

Isto implica num conjunto de sentimentos: sentido de pertencimento, reconhecimento

social, valorização, auto imagem e auto realização. Quando estas necessidades são

frustradas, não são superadas, nem compensadas, surge a desmotivação e a deterioração do

clima organizacional.

Contudo gerenciar uma organização, pública ou privada, de modo a fazer com que as

pessoas sempre estejam bem consigo mesmas, sintam-se bem em relação às outras pessoas

e sejam capazes de enfrentar por si mesmas os problemas da vida, não é tarefa das mais

simples e fáceis. É preciso reconhecer que todas as pessoas tem motivos ou demandas

básicas que podem ser ativados ou não de acordo com a percepção que elas tem do

ambiente em que vivem e trabalham.

Por exemplo, se tenho uma inclinação para o trabalho em grupo e formas cooperativas de

relacionamento, uma organização rigidamente hierárquica e verticalizada provavelmente

resultará numa desmotivação neste aspecto particular. Este efeito desmotivante pode ser

compensando por uma outra motivação, por exemplo, uma remuneração superior às

expectativas, ou não. É deste balanço de fatores que depende a motivação de cada um, e o

clima organizacional é o resultante do balanço de “climas” de cada funcionário. É claro que

quanto maior a posição de autoridade e poder na organização, maior será a influência no

clima como um todo.

Podemos ver que a motivação individual influencia o clima organizacional e o clima por sua

vez influencia a motivação de cada um, numa relação de dependência mútua. Um psicólogo

norte americano, chamado Frederick Herzberg classificou os princípios motivacionais em

duas partes. Primeiro há os fatores higiênicos ou extrínsecos, que são fatores do meio

ambiente, tais como os salários, o relacionamento com os funcionários, as diretrizes da

organização, as condições físicas, etc. Tradicionalmente só estas variáveis eram

consideradas, o trabalho em si era considerado uma atividade desagradável, penosa.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 126

Os funcionários só seriam motivados por prêmios e supervisão constante e a ameaça de

punição. Herzberg demonstrou que estes fatores apenas evitam a insatisfação. Eles não são

capazes de manter a motivação por muito tempo. Devemos considerá-los como fatores

“mínimos” ou “básicos” que devem ser mantidos para evitar uma deterioração do clima

organizacional.

Uma outra escola muito conhecida, chamada de “comportamentalista”, ou como diz seu

termo em inglês “behaviorista”, foi construída quase que totalmente sobre esta noção: de

que o comportamento humano pode ser modificado por técnicas de condicionamento. Eles

imaginaram um conjunto de mecanismos de estímulo e resposta das pessoas ao longo do

tempo que vão moldando (ou condicionando) seu padrão comportamental. Podemos ver

que estas práticas ainda são muito utilizadas nas empresas privadas, como exemplo, o bônus

salarial.

O comportamentalismo é importante para explicar a motivação, mas insuficiente se

quisermos entendê-la no longo prazo. Um pensador famoso neste foi Skinner. Ele criou a

idéia de que o comportamento pode ser condicionado através de ações de reforço. O

reforço positivo é todo estímulo que mantém uma conduta. Diferente do mero reflexo

condicionado o condicionamento operante seria o resultado da aprendizagem pela repetição

de reforços. O reforço negativo não seria uma punição, mas a remoção de um estimulo que

bloqueia ou impede uma conduta.

A outra parte de fatores motivacionais, Herzberg chamou-os de “fatores intrínsecos” ou

simplesmente “fatores motivacionais”. Estas variáveis estão sob controle do indivíduo pois

estão relacionadas com seu desempenho, com sua performance. Envolvem sentimentos de

crescimento individual, de reconhecimento profissional e auto-realização e dependem quase

que exclusivamente de minha própria vontade e disposição. Herzberg propôs que os

empregadores tivessem uma política de constante desafio e enriquecimento das tarefas

profissionais dos funcionários.

A criatividade e a inovação seriam os remédios para combater a apatia e a indiferença. Uma

série de mecanismos poderiam operar aqui: ampliar a delegação de responsabilidades,

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 127

aumentar a autonomia e a liberdade individuais, estimular o trabalho em equipe,

mecanismos de participação, novas metas e objetivos, etc. A satisfação com o cargo

resultaria em motivação no trabalho.

O oposto de satisfação não seria a insatisfação, mas a não-satisfação, ou seja, os fatores que

provocam a satisfação não se relacionam com os fatores que impedem que ela ocorra. Por

exemplo, tem pouco efeito aumentar a remuneração se o trabalho é rotineiro, repetitivo e

não representa desafio algum. No longo prazo ocorre a desmotivação.

Neste sentido Maslow e Herzberg são compatíveis, pois ambos argumentam que existe uma

lógica, uma maneira melhor de motivar as pessoas, seja por meio do reconhecimento da

“pirâmide” de necessidades humanas, seja através da aplicação de fatores motivacionais e

enriquecimento do cargo, das tarefas e do trabalho. Outros autores como Victor Vroom

imaginaram que a motivação das equipes está ligada a uma avaliação de custo/beneficio, ou

como ele chamou, a uma relação entre objetivos e fins. Para Vroom os indivíduos são

orientados por objetivos pessoais (dinheiro ou segurança), para uma relação percebida entre

satisfação dos objetivos e uma alta produtividade (sua produtividade ajusta-se as

expectativas do grupo em que está) e finalmente, para uma percepção de sua própria

capacidade em influenciar a produtividade (seu empenho será regulado pelo resultado

esperado).

Ele chegou até a fazer uma escala numérica para graduar esta relação entre a percepção do

indivíduo sobre o que a organização espera de seu desempenho e o resultado final do seu

trabalho.

Há ainda muitas explicações para a motivação no trabalho. Algumas teorias enfatizam a

equidade. Se os funcionários perceberem uma relação entre resultados e o que eles

contribuem para sua formação, então estarão motivados. Mas as recompensas devem ser

equânimes entre os empregados, uma disparidade pode gerar desmotivação. Outras

abordagens centram a explicação na expectativa individual. Independente dos fatores

envolvidos (se intrínsecos ou extrínsecos), se o funcionário tiver sua expectativa atendida na

relação desempenho-recompensa e recompensa-metas pessoais, então ele estará motivado.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 128

Não importando se suas expectativas são altas ou baixas em relação ao seus pares ou a

padrões socialmente aceitos. As expectativas, por sua vez dependem de uma infinidade de

questões, do ciclo de vida, da personalidade, etc.

É importante perceber que há fatores que mantém um bom clima organizacional, como as

condições de trabalho e os fatores relacionados à remuneração. Mas estes fatores não são

capazes de empurrar a motivação para cima. Aqui entram outros fatores mais sutis e

complexos, como a criativiade, a auto-realização e o sentir-se parte de um projeto e de um

ideal que transcende a simples rotina do dia-a-dia. Devemos lembrar que fatores

motivacionais mudam com o tempo, o que motiva hoje, pode não motivar amanhã. Eles

também mudam de acordo com cada personalidade, o que motiva um, pode não motivar o

outro, mesmo fazendo parte da mesma equipe. O que importa é que o trabalho faça sentido

para o trabalhador, que ele se reconheça no produto ou serviço que cria, produz e mantém

para a sociedade.

A cultura organizacional

Um fator intimamente ligado ao clima nas organizações e o tema da cultura organizacional.

Este assunto foi muito valorizado nos anos setenta e oitenta para tentar explicar porque o

Japão, um país pequeno, quase sem recursos naturais e derrotado na última grande guerra,

se tornou uma potência mundial. A cultura depende de muitas variáveis: a história da

organização, os pontos marcantes de sua trajetória, como são socializados os novos

membros, as políticas de recursos humanos, o processo de comunicação e de trabalho, etc.

A cultura, no fundo é o padrão de desenvolvimento que se reflete nos valores, na ideologia,

nos ritos e na auto-imagem da organização. Podemos inclusive adotar metáforas para

entender a cultura. Um pesquisador, chamado Morgan, por exemplo, utilizou este recurso

para entender a cultura organizacional. Haveria organizações como máquinas, como

organismos, como cérebros, como sistemas políticos, por exemplo. Cada uma com

caracterísiticas e ritmos próprios.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 129

A cultura organizacional seria um sistema simbólico, como é a arte, os mitos ou a linguagem.

É um grande e complexo instrumento de comunicação entre pessoas e grupos que permite a

elaboração de consensos, o nivelamento de expectativas e a homogeneização de valores.

Neste sentido a cultura de uma empresa, organização ou departamento é um poderoso fator

de legitimação da ordem vigente. Não é por outra razão que as mudanças culturais são as

mais prolongadas e difíceis, embora não impossíveis, como demonstram os casos de várias

organizações publicas e privadas.

A cultura organizacional manifesta-se em três níveis:

Artefatos:

• Estruturas e processos organizacionais visíveis, mais fáceis de decifrar e de mudar.

• São todas aquelas coisas que, no seu conjunto, definem uma cultura e revelam como

a cultura dá atenção a elas.

• Fazem parte do primeiro nível da cultura, o mais superficial, visível e perceptível.

• É tudo aquilo que cada pessoa vê, ouve e sente quando se depara com uma

organização.

• São compostos por produtos, serviços e padrões de comportamento dos membros de

uma organização.

Valores Compartilhados:

• São também chamados de valores casados.

• Filosofias, estratégias e objetivos (justificativas aceitas por todos os membros).

• Focaliza a maneira como as situações são tratadas e os problemas são enfrentados na

organização.

• São os valores relevantes que se tornam importantes para as pessoas e que definem

as razões pelas quais elas fazem o que fazem.

• Funcionam como justificativas aceitas por todos os membros.

Pressuposições Básicas:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 130

• São também chamadas de certezas tácitas compartilhadas.

• Crenças inconscientes, percepções, pensamentos e sentimentos.

• Constituem o terceiro nível, o mais íntimo, profundo e oculto.

• A cultura prescreve a maneira certa de fazer as coisas na organização, muitas vezes,

por meio de pressuposições não-escritas e nem sequer faladas.

A cultura na organização não deve, entretanto, ser concebida com um molde que produz

condutas e comportamento sempre idênticos e uniformes. Devemos entender os processos

culturais como um conjunto de regras do jogo. Estas regras permite que as pessoas atribuam

significados às ações e eventos, em função dos quais infinitas partidas são jogadas.

A cultura é então um sistema de conhecimentos e crenças compartilhadas. Mas também é o

conjunto de signos, de símbolos. Neste sentido os fundadores da organização, aqueles que a

conceberam e a desenvolveram no início tem um papel-chave na explicação dos valores

culturais.

A cultura pode ser vista também como um sistema de valores compartilhados pelos

membros, que diferencia a organização. Ele seria formado por um conjunto de

características-chave que a organização valoriza, que capturam sua essência e natureza mais

profunda. Para Robbins estes fatores seriam:

• Inovação e assunção de riscos: o grau em que os funcionários são estimulados a

inovar e a assumir riscos.

• Atenção aos detalhes: o grau em que se espera que os funcionários demonstrem

precisão, análise e atenção aos detalhes.

• Orientação para os resultados: o grau em que os dirigentes focam mais nos

resultados do que as técnicas e os processos empregados para o seu alcance.

• Orientação para as pessoas: o grau em que as decisões dos dirigentes levam em

consideração o efeito dos resultados sobre as pessoas dentro da organização.

• Orientação para a equipe: o grau em que as atividades de trabalho são mais

organizadas em termos de equipes do que de indivíduos.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 131

• Agressividade: o grau em que as pessoas são competitivas e agressivas, em vez de

dóceis e acomodadas.

• Estabilidade: o grau em que as atividades organizacionais enfatizam a manutenção

do status quo em contraste com o crescimento.

Outra forma de entender a cultura organizacional é uma classificação pela natureza dos

fatores que a determinam. Os componentes da cultura organizacional distribuem-se em

níveis conforme sua visibilidade. São eles:

• Nível Externo: Artefatos, Linguagem, Hábitos. Os artefatos constituem os

componentes mais visíveis de uma cultura organizacional. Compreendem a

arquitetura, os veículos, as roupas, os produtos que as pessoas usam. São as

estruturas e processos organizacionais visíveis, mais fáceis de decifrar e de mudar

(arquitetura da organização). São todas aquelas coisas que, no seu conjunto, definem

uma cultura e revelam como a cultura dá atenção a elas. Fazem parte do primeiro

nível da cultura, o mais externo, visível e perceptível. É tudo aquilo que cada pessoa

vê, ouve e sente quando se depara com uma organização. São compostos por

produtos, serviços e padrões de comportamento dos membros de uma organização.

• Nível Intermediário: Histórias, Mitos, Heróis. São também chamados de valores

casados ou compartilhados, abrangendo filosofias, estratégias e objetivos

(justificativas aceitas por todos os membros). Focaliza a maneira como as situações

são tratadas e os problemas são enfrentados na organização. São os valores

relevantes que se tornam importantes para as pessoas e que definem as razões pelas

quais elas fazem o que fazem. Funcionam como justificativas aceitas por todos os

membros.

• Nível Interno: Valores, Crenças e Premissas. São também chamadas de certezas

tácitas compartilhadas ou pressuposições básicas. Exemplos: crenças inconscientes,

percepções, pensamentos e sentimentos. Constituem o terceiro nível, o mais íntimo,

profundo e oculto. A cultura prescreve a maneira certa de fazer as coisas na

organização, muitas vezes, por meio de pressuposições não-escritas e nem sequer

faladas.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 132

Uma cultura forte e bem estruturada é um desafio para a gestão inovadora. Mas em alguns

casos ela pode tornar-se fonte de problemas. Uma cultura que não é permeável ao contato

com outras organizações pode criar dificuldades para a tolerância e aceitação de valores

diferentes. Se ela não for flexível, haverá sempre muita dificuldade e stress para a mudança

que é sempre necessária. Muitas vezes as culturas se fecham sobre si mesmas, não é

incomum no nosso dia a dia entrarmos em contato com pessoas que usam jargões técnicos e

palavras cifradas, os códigos de linguagem são elementos essenciais das culturas. Porém,

seu uso pode denotar arrogância, sentimento de superioridade e prejudicar a interação com

outras organizações.

A cultura no setor publico varia de órgão para órgão, mas em geral é marcada pela

burocracia, pelo autoritarismo centralizador, pelo clientelismo e paternalismo e pela

descontinuidade administrativa e pela baixa legitimidade da ingerência política. Estas

características influenciam o modo como o setor público produz – ou não – os resultados.

Neste ambiente os funcionários são vistos como aéticos e apáticos, precisando de controle a

priori, de forma permanente.

Na cultura gerencial os funcionários ganham mais autonomia e a liberdade de ação. Os

controles focam os processos a partir dos resultados produzidos. Entretanto a gestão da

mudança organizacional não é simples. Nas primeiras escolas de administração a gestão da

mudança da cultura organizacional era mecânica, voltada para a eficiência dos projetos. A

mudança organizacional é tão complexa que há vários modelos explicativos para sua análise

e compreensão.

O primeiro modelo é o de Lewin, conhecido como “modelo das três etapas”. A primeira

etapa é chamada de “descongelamento” do status quo. Neste estado há um equilíbrio que

só é afetado quando surgem pressões dos indivíduos que geram uma desconformidade com

os processos culturais e organizacionais. O segundo passo ou momento é o movimento de

estabilização numa nova condição e o terceiro o recongelamento da mudança e a retomada

de sua posição estável. A mudança é vista como um ciclo, onde combinam-se forças

restritivas e impulsoras num jogo sem fim.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 133

Um outro autor, Kotter, desdobrou estes três passos em oito etapas para a mudança

organizacional. Seriam eles:

1) Estabelecer um senso de urgência para gerar uma razão motivadora pela qual a

mudança seria necessária.

2) Formar uma coalizão com força suficiente para liderar a mudança.

3) Criar uma nova visão para direcionar a mudança e de estratégias para que ela seja

conquistada.

4) Comunicar a visão em toda a organização.

5) Dar autonomia aos outros para a busca da visão, removendo barreiras e encorajando

as pessoas a assumir riscos e soluções criativas para os problemas.

6) Criar, planejar e recompensar metas de curto prazo que encaminhem a organização

para a nova visão.

7) Consolidar as melhorias, reavaliar as mudanças e fazer os ajustes necessários nos

novos programas.

8) Reforçar as mudanças por meio da demonstração do relacionamento entre os novos

comportamentos e o sucesso da organização.

O planejamento da mudança implicaria em um roteiro que inicia com o diagnóstico da

organização onde são levantadas informações sobre os problemas, preocupações e

necessidades. Em seguida uma análise das informações identifica as ações possíveis. Depois

um processo de feedback com os funcionários compartilha as informações e possíveis cursos

de ação. Há finalmente o momento da ação que se traduz em planos específicos para a

mudança e por fim uma avaliação da eficácia encerra o roteiro.

Trabalhando em Equipes

Um dos aspectos mais distintivos da gestão inovadora de pessoas é o trabalho em equipe.

Com diferentes nomes... times, equipes, comitês ou comissões, não há mais espaço para o

trabalho solitário e individualista. A própria natureza coletiva das equipes parece ser uma

condição necessária para que as qualidades individuais possam se desenvolver na sua

plenitude.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 134

Os grupos de trabalho se constituem de padrões complexos de relações que são dinâmicas,

entre os seus membros e que tem sempre um propósito em comum. Os grupos criam

identidades, uma auto-imagem que lhes dá coerência interna e consistência, diante de si

mesmos e de outros grupos, dentro e fora da organização. A estabilidade do grupo depende

de quanto suas regras de funcionamento e sua cultura interna conseguem garantir o

equilíbrio frente as mudanças, internas e externas.

Muitos autores diferenciam grupos de equipes. Grupos são pessoas que por algum motivo

externo estão temporariamente juntas. Pode ser um departamento dentro da organização.

Nos grupos o esforço individual é determinante. Já nos grupos o esforço individual só tem

sentido no contexto do esforço coletivo. O Grupo tem objetivos comuns e dura enquanto

estes objetivos durarem.

A responsabilidade é outra diferença entre grupos e equipes. Nos grupos ao contrário das

equipes, a responsabilidade individual só tem sentido e se completa na responsabilidade do

grupo, se o grupo vence, todos vencem. Assim, o esforço do gestor inovador é o de

transformar os grupos em verdadeiras equipes ou times orientados para os resultados

desejados.

Os grupos podem ter natureza diversa, conforme sua missão, seus objetivos, tempo de

duração e lugar na organização. Podem assumir desde a configuração de uma força-tarefa

para enfrentar e resolver um problema temporário. Até o aspecto de um grupo

interdepartamental para gerenciar uma rotina ou um conjunto de tarefas de maior

amplitude e escala.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 135

Os grupos passam por fases ou ciclos de início, consolidação, desenvolvimento, maturidade,

declínio e encerramento. Há várias abordagens sobre o ciclo de vida dos grupos, mas em

quase todas elas vemos as seguintes fases:

• Formação: é o encontro inicial de individualidades e a negociação para formação de

uma identidade grupal, é o reconhecimento mútuo e implica sempre em muita

incerteza e identificação de divergências e convergências;

• Conflito: é a fase dos ajustes individuais ao perfil do grupo e da consolidação de uma

identidade coletiva. Surgem as lideranças e as negociações podem ser cooperativas

ou conflitivas dentro do grupo e com outros grupos;

• Normatização: negociados os conflitos, são criadas regras de funcionamento e

solução de controvérsias, as informações circulam melhor, o conflito diminui;

• Maturidade: é o auge da produtividade e do desempenho, é o pico de entrosamento

interno e obtenção de satisfação e auto-realização;

• Encerramento: os objetivos são atingidos ou algum fator interno ou externo bloqueia

de forma permanente seu alcance. O grupo perde sentido e a identidade se

fragmenta, os conflitos reaparecem. O grupo só sobrevive se tiver capacidade de

recriar sua identidade e se relocalizar no mapa de poder da organização.

É evidente que estes passos não são lineares, os grupos reais vão e voltam nestes passos,

tomam atalhos e muitos mesmos podem desaparecer antes de atingir sua plenitude. As

competências gerenciais mais valorizadas para o trabalho em equipes são a capacidade de

negociação, construção de consensos e liderança coletiva. Um dos elementos essenciais à

vida dos grupos é a comunicação. É por isso que as habilidades de comunicar, de se fazer

entender e de escutar são tão importantes. A capacidade de escuta é sobretudo um traço do

líder. Liderar é saber escutar a equipe.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 136

As estruturas organizacionais

Uma organização sempre tem estruturas formais e estruturas informais. A estrutura

informal é composta pela rede de relações sociais e pessoais derivadas da estrutura formal.

Ela surge da interação normal das pessoas que surge no dia a dia da organização, com o

contato entre as pessoas. A estrutura formal, por sua vez é aquela que é intencionalmente

planejada e concebida, ela é materializada no organograma.

Na estrutura informal é o ambiente onde surgem e desaparecem líderes e equipes de

trabalho.

Muitas vezes estas relações são mais importantes do que o próprio organograma,

especialmente quando os projetos ou ações continuadas das organizações tiverem um

caráter transversal ou interdepartamental. O grande desafio é a integração das duas

estruturas e harmonização de seu funcionamento.

Uma estrutura organizacional é o conjunto ordenado de responsabilidades, autoridades,

comunicações e decisões das unidades organizacionais. Esta definição vale tanto para uma

empresa quanto para uma organização pública. Nas estruturas os organogramas devem

representar sempre os órgãos componentes, as funções desenvolvidas pelos órgãos, as

vinculações e interdependências entres eles e os vários níveis administrativos e hierárquicos

existentes.

Toda estrutura tem um sistema de responsabilidade definido. Este sistema é o resultado da

alocação de atividades e é constituído pelos diversos departamentos, pelas ações de linha,

isto é, da atividade fim e por funções especializadas. O sistema de autoridade,por sua vez é o

resultado direto da distribuição formal e informal do poder interno na organização.

É determinado por vários fatores, entre os quais a amplitude administrativa, os níveis

hierárquicos e o sistema interno de delegação e descentralização de funções e tarefas. Por

fim um terceiro componente básico da organização seria seu sistema de comunicações, que

resulta da interação entre as diversas unidades organizacionais.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 137

O sistema de responsabilidade, de autoridade e de comunicações devem funcionar de forma

balanceada e harmônica. Qualquer disfunção entre eles provoca certas patologias

organizacionais. Por exemplo, uma organização cujo sistema de responsabilidade não defina

claramente as funções de cada departamento e a relação entre eles certamente terá

problemas de gestão, ainda que a amplitude administrativa e as comunicações estejam

funcionando conforme as expectativas.

Responsabilidade

• Obrigação de uma pessoa fazer algo para alguém;

• Necessidade de prestação de contas pelo trabalho realizado;

• Quanto maior a demanda de prestação de contas, maior será a quantidade de

autoridade delegada.

Autoridade

• O direito de fazer alguma coisa;

• Uma ordem, uma referência, um direito, pode ser qualquer coisa que exerce

influência;

• Varia conforme o nível hierárquico.

Comunicação

• Rede por onde fluem as informações e o conhecimento;

• Pode ser formal se planejada, ou informal se expontânea;

• O fluxo informal pode ser negativo ou positivo para a organização.

Há vários fatores que condicionam o funcionamento da estrutura organizacional. O primeiro

e talvez o mais importante deles seja o fator humano, as pessoas. As organizações devem se

moldar ao tipo de pessoas necessárias para produzir os resultados desejados. Por exemplo,

os sentidos de hierarquia e comando são necessariamente diferentes numa organização

policial se comparada a uma organização de ensino e pesquisa. Nesta última a forte

hierarquia pode estimular um ambiente de baixa inovação e criatividade, necessário ao

ambiente de pesquisa.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 138

O ambiente externo certamente é outro fator importante. Nenhuma organização vive

isolada, sobretudo uma organização pública cuja essência é servir ao público, aos cidadãos.

O próprio sistema de objetivos e estratégias influencia a organização. Metas ambiciosas

exigem organizações eficazes, objetivos complexos exigem organizações complexas. A

organização tem que estar a serviço dos objetivos, e não o contrário. No setor público a

inércia e a resistência para mudar as organizações é muito maior que no setor privado.

Uma série de amarras legais e institucionais, por exemplo, que servem como proteção do

cidadão contra eventuais usos clientelistas do governo, também criam um efeito colateral de

maior rigidez administrativa.

Há vários tipos de estruturas organizacionais. A estrutura linear ou militar do tipo “linha” é

conhecida desde os tempos antigos. Graficamente podemos dizer que é uma estrutura do

tipo “pirâmide”. Há um comando único e centralizado no topo e escalões hierárquicos de

controle até a base. É um tipo de organização que funciona bem para objetivos simples e

pouco complexos. A tendência à burocracia é grande porque não há comunicação

horizontal, todos se comunicam somente através de uma chefia superior do mesmo nível.

A seguir um exemplo de estrutura linear, onde o eixo organizador é o foco em produtos.

Cada funcionário recebe ordens de um só chefe e se reporta somente a ele. Pela facilidade

de transmissão de ordens e comandos é o tipo de organização comum nas forças militares e

policiais, a disciplina é fácil de manter. O problema destas organizações é sua dependência

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 139

de um chefe que deve ser excepcional e saber de tudo. Se ele falha, a organização inteira

falha.

Além disso, é uma organização que não estimula a especialização de seus membros, muito

menos a cooperação entre eles. Apesar de pouco utilizada hoje em dia, ainda vemos nesta

ou naquela organização publica, estruturas como estas, ilustradas no diagrama seguinte.

Uma organização de linha é baseada em departamentos. Os departamentos nada mais são

que formas de aglutinar, de homogeneizar as atividades, agrupando seus componentes em

unidades que podem ser chamadas de departamento de uma forma genérica, mas os

princípios também valem para supervisões, divisões, setores ou outros nomes que possam

surgir. Normalmente os departamentos são organizados por função, por produtos ou

serviços, por localização geográfica ou por processos, situação mais difícil de encontrar.

A organização linear é a forma por excelência da organização do tipo pirâmide, que

concentra responsabilidades e decisões no topo.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 140

Quando a organização aumenta suas competências ou amplia sua missão institucional pode

ocorrer o chamado “processo funcional”. Ou seja, uma expansão horizontal de

departamentos, cada um com funções e tarefas diferenciadas e com o mesmo nível

hierárquico. Quando há um desdobramento de graus de autoridade e responsabilidade

ocorre uma especialização vertical, o organograma cresce para cima, ou para baixo.

Normalmente a especialização vertical e horizontal andam juntas. O tamanho do

organograma de uma organização depende do tamanho da própria organização e da

complexidade dos resultados que ela deve produzir. A departamentalização funcional, a que

predomina, é mais indicada quando as funções da organização mudam muito pouco e suas

tarefas são continuadas e repetitivas. É a mais utilizada no setor público. Quando os

departamentos são organizados por produto ou serviço, há uma facilitação da coordenação

interna e do processo de cooperação entre especialistas.

Conforme a figura seguinte ilustra, na base da organização há um intenso fluxo de

informação e compartilhamento de responsabilidades.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 141

Um outro tipo de organização é aquela que se forma através de uma combinação da

organização de linha com um staff. Mantem-se a linha de comando e controle, mas cada

órgão em seu nível recebe a assessoria horizontal de um grupo, chamado de staff.

Geralmente estes órgãos de assessoria prestam informação especializada, ajudam no

processo decisório e fazem o planejamento e gestão das determinações superiores.

É um tipo de organização que separa os órgãos operacionais dos órgãos executivos. É um

desenho muito mais flexível que o anterior, permitindo a especialização de funções e a

colaboração entre equipes de assessoria. É mais eficaz porque dilui mais a responsabilidade

do chefe e qualifica o processo de decisão. A seguir um exemplo de estrutura com seus

diversos staffs ou assessorias.

Entretanto ela proporciona uma certa tensão entre o staff e os chefes de linha porque há

uma ampla zona cinzenta entre eles, onde os papéis acabam se misturando no dia a dia. Em

muitos contextos o staff tende a substituir a autoridade do chefe, por isso este tipo de

organização demanda uma constante coordenação e comunicação interna. Este tipo de

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 142

organização é amplamente aplicada tanto no mundo corporativo, quando no setor público.

Talvez seja o modelo dominante.

O quadro a seguir ilustra algumas das principais diferenças entre “staff” e linha.

Uma variação da organização do tipo staff-linha é aquela cuja estrutura de direção é baseada

em um colegiado dirigente. Geralmente é a estrutura de empresas de grande porte, pouco

comum na área pública, exceto nas grandes empresas públicas que tem conselhos

deliberativos.

Neste modelo a decisão é colegiada, isto é, compartilhada por um conjunto de pessoas

hierarquicamente iguais, com mais impessoalidade. Há um estímulo claro para a formação

de um espírito de equipe, ainda que ocorra um fracionamento da responsabilidade e muitas

vezes um processo decisório mais lento e demorado.

Por fim há uma estrutura pouco usual, mas em ampla expansão tanto no setor público

quanto no setor privado. É a estrutura matricial. Este modelo pode ter várias configurações,

mas uma característica básica é a combinação entre a estrutura de linha com seus chefes e

departamentos verticais com processos horizontais. Estes processos podem assumir a forma

de funções, a forma de produtos específicos ou a forma de projetos.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 143

Daí a formação de uma matriz com o eixo vertical – a linha – e o eixo horizontal – os

produtos ou projetos. Os funcionários se reportam aos gerentes da linha e simultaneamente

aos gerentes do projeto ou do produto. Pode-se ver que a equipe ou o time é a principal

unidade neste modelo. O controle vertical é mínimo, o controle horizontal é máximo. É o

modelo mais flexível e adaptado para contextos de alta imprevisibilidade e competição,

onde a organização tem que adaptar rapidamente seu mix de produtos e serviços.

Uma estrutura matricial cria nós onde se encontram uma linha de comando vertical e uma

linha horizontal de projeto ou produto.

A estrutura matricial tem grandes vantagens e grandes desvantagens. Talvez o maior ganho

seja a flexibilidade, gerada pela comunicação informal constante dentro e entre as equipes.

O ambiente de sinergia e aprendizagem é alto, as competências profissionais geralmente são

maximizadas. A grande desvantagem é exatamente sua característica matricial, ou seja, a

tensão constante entre os chefes de linha, por exemplo, o setor de gestão de pessoas,

logística ou financeiro e os gerentes dos projetos. A diluição da hierarquia pode gerar

ambigüidades se não for bem coordenada.

A seguir um quadro-resumo com três tipos de estrutura, a matricial e suas variações, a

funcional e a estrutura por projetos. O quadro compara diferentes características do

gerenciamento de projetos em cada uma delas.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 144

Recentemente tem surgido um novo modelo baseado no conceito de redes. Nos serviços

públicos que são altamente descentralizados e o nível de delegação também é grande há um

conjunto de organizações trabalhando coordenadamente. Se os problemas de coordenação

e transação forem resolvidos a um baixo custo e houver claros incentivos para a cooperação

entre as partes, estas estruturas apresentam muitas vantagens. A principal delas são os

ganhos de flexibilidade e adaptabilidade.

Um debate muito comum na área de gestão é sobre qual orientação deve predominar na

arquitetura organizacional: uma estrutura orientada aos processos ou uma estrutura

orientada à funções ? O que você acha ?

A orientação para processos é uma lógica mais voltada para resultados e projetos, e menos

voltada para hierarquias e departamentos com fronteiras limitadas e funcionários

especializados. Um processo é todo conjunto de eventos que mobilizam recursos e geram

resultados. Assim teríamos o processo de gestão de pessoas, o processo de administração

financeira, o processo de compras e aquisições, etc. Mas os projetos também podem ser

considerados um conjunto harmônico e coerente de processos com início, meio e fim. Assim

tudo o que acontece na organização pode ser visto como um ou mais processos

interdependentes.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 145

É um enfoque mais orgânico, que facilita o engajamento dos funcionários nos resultados,

pois tem a visão dos processos inteiros e não mais das funções que fragmentam. Por

exemplo, ao analisar o processo de aquisições numa organização, temos várias funções no

modelo original. A função vinculada à demanda de um bem ou serviço, geralmente ligada à

área fim da organização, digamos, a compra de material cirúrgico para um hospital. Ainda

temos a função de compras ou licitações que organiza o processo de compra, a função

financeira que libera os recursos, a função de controle patrimonial e assim por diante. Numa

visão de processos teríamos somente o processo de compras e aquisições com seus vários

momentos ou fases interdependentes.

Quando debatemos estes vários modelos é importante perceber que na realidade prática

nenhum modelo acontece de forma pura, o que há são diferentes combinações. E embora

não seja fácil perceber, as organizações mudam ao longo do tempo, com ritmos diferentes,

mas nem sempre com a adequação e senso de oportunidade necessário. O mais comum é o

surgimento de novas demandas e exigências dos cidadãos, de melhoria dos serviços e

produtos prestados pelos governos, aparecerem muito antes que a estrutura organizacional

possa se adaptar para responder melhor e com menos custo.

Esta defasagem, este “gap”, entre o modelo de organização e as demandas da sociedade é

um dos maiores desafios para a gestão inovadora. Quando ele não é resolvido no setor

privado, a empresa geralmente fecha, vai à falência. É claro que os governos não “fecham”

como as empresas, mas o que acontece então ? Uma baixa de qualidade nos serviços, filas

de atendimento, produtos ruins, impostos mais altos, baixa legitimidade dos políticos e

assim por diante.

Criando organizações eficazes

Qual o modelo ideal de organização ? Que diretrizes ou princípios devem nos orientar para

desenhar a melhor organização possível ? Um professor canadense tem dado respostas

interessantes para este dilema, ele se chama Henry Mintzberg. Vamos acompanhar sua

reflexão.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 146

Primeiramente Mintzberg classifica as organizações em vários modelos diferenciados:

estrutura simples, burocracia mecanizada, burocracia profissional, forma divisionada e

adhocracia. Toda a ação humana demanda duas atividades que são complementares mas ao

mesmo tempo contraditórias: a divisão do trabalho e a necessidade de coordenação destas

atividades. As estruturas das organizações são definidas como a soma total destas formas

diversas.

Ele propõe cinco configurações organizacionais básicas que explicam porque as organizações

se estruturam desta ou daquela forma. Além disto, há cinco partes básicas em qualquer

organização:

• O núcleo operacional: é o lugar onde se fabricam produtos e serviços. Aqui estão as

entradas para a produção, os processos de transformação, de suporte e as saídas. É o

centro, o coração da organização. Nas organizações simples a coordenação é

basicamente auto-ajustada pelos seus membros.

• Cúpula estratégica: é a alta direção e suas assessorias diretas. É responsável pela

missão e visão de futuro da organização. Faz as principais interfaces externas da

organização com o meio externo. É a principal responsável pelo planejamento

estratégico.

• Linha intermediária: faz a ligação entre a cúpula e o núcleo operacional. Coordena

através da supervisão direta. São os gerentes de nível médio, faz o planejamento

tático. É o elo mais importante na cadeia de comando.

• Tecnoestrutura: são os analistas, assessores e consultores que exercem as ações de

controle e padronização em todos os níveis da hierarquia organizacional. A função da

tecnoestrutura é tornar o trabalho das outras pessoas mais eficaz com seus planos,

mudanças, treinamentos e projetos. Quanto mais padronizada for uma organização,

maior a confiança na sua tecnoestrutura. Os analistas atuam sobre três formas de

controle: os sistemas e métodos, o planejamento e controle e a gestão de pessoas

(padronização das habilidades).

• Assessoria de apoio: são os prestadores de serviços diversos. Muitos são organizados

em unidades autônomas (terceirizados), sua forma de coordenação depende das

funções que exercem em cada unidade.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 147

O diagrama abaixo, feito a partir da sugestão de Mintzberg, ilustra estas cinco partes.

Os cinco mecanismos de coordenação das tarefas correspondente seriam:

• Ajustamento mútuo: garantido pelo simples processo de comunicação informal;

• Supervisão direta: coordenado por intermédio de uma pessoa tendo a

responsabilidade pelo trabalho dos outros, monitorando suas ações;

• Padronização dos processos de trabalho: especificação e programação das execuções

de trabalho. A padronização é feita antes do trabalho ser realizado. Os operários

sabem o que esperar do trabalho uns dos outros em contextos de normalidade;

• Padronização dos resultados: especificações das saídas, dos resultados, como por

exemplo, as dimensões do produto ou do desempenho e

• Padronização das habilidades dos trabalhadores: especificação do tipo de

treinamento necessário para a execução do trabalho.

Na prática a organização adota uma combinação variada das cinco formas de coordenação.

Conforme aumenta a complexidade do processo de trabalho, ocorre um ajustamento nos

meios de coordenação iniciando com o ajuste mútuo, passando para a supervisão direta e

depois para a padronização. O movimento de padronização, por sua vez, cria elementos para

retomada do ajuste mútuo – agora em outros patamares – em toda a organização.

As cinco formas de configuração possíveis são as seguintes:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 148

Estruturas simples: possui reduzida divisão de trabalho, diferenciação mínima entre suas

unidades e pequena hierarquia. As relações informais são dominantes, o planejamento é

mínimo e o treinamento é escasso. É considerada uma estrutura orgânica. Seu processo de

coordenção é centralizado nas mãos do principal executivo. O processo decisório é rápido.

Burocracia mecanizada: é próxima do tipo weberiano, padronização de responsabilidades,

qualificações uniformes e canais formais de comunicação. Hierarquia clara e autoridade

definida. Principais parâmetros: especialização vertical e horizontal do trabalho, tarefas

operacionais rotinizadas, proliferação de normas e regulamentos. O trabalho é agrupado por

função em unidades diferenciadas. O poder é hierárquico, centralizado e com clara distinção

entre linha e assessoria. O núcleo operacional executa tarefas simples e com pouco

treinamento. A padronização dominante reduz a autonomia e o poder dos gerentes. A

coordenação é exercida pela supervisão direta. A linha intermediária é altamente

desenvolvida.A tecnoestrutura tende a crescer e assumir um papel dominante em toda a

organização.

Burocracia profissional: é semelhante a anterior, contudo seus padrões profissionais são

determinados externamente por associações profissionais. A autoridade não emana da

hierarquia ou posição no organograma, mas do domínio da perícia técnica. O núcleo

operacional tem grande autonomia porque o trabalho é altamente especializado na

dimensão horizontal. O trabalhador é mais independente e atua próximo aos clientes. O

núcleo operacional é a parte-chave desta organização. Como há baixa necessidade de

planejamento e formalização a tecnoestrutura é pouco desenvolvida.

A forma divisionada: este tipo de organização na verdade é a configuração de um conjunto

de entidades autônomas que estão acopladas a um eixo central. Estas entidades ficam na

linha intermediária, como divisões, que se reportam a um escritório central. As relações são

hierárquicas e verticalizadas. A natureza do mercado determina o tipo e número de

divisões. As divisões atuam com estruturas completas independentes e com autonomia

entre si. O mecanismo de coordenação predominante é a padronização de resultados e o

sistema principal é o controle do desempenho.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 149

Adhocracia: esta organização é de estrutura basicamente orgânica, agrega especialistas para

projetos ad-hoc, com fim específico. Tem baixa formalização, grande especialização

horizontal e tendência para pequenas unidades de peritos com habilidades semelhantes. É

uma configuração fluida, dinâmica, flexível e ágil, adaptada para buscar inovações e fugir dos

padrões de uma estrutura burocrática. Há muita ênfase nos sistemas de planejamento e

controle. Trabalha com estruturas matriciais e de projeto.

Configuração missionária: seu parâmetro de design é a doutrinação, sua padronização são os

princípios de socialização de seus membros, a ideologia é uma parte-chave da organização.

O sistema de crenças é a força dominante, na missão e visão da empresa. Não é estruturada,

seus membros tem total autonomia, baseada em lealdade irrestrita à organização. Há

rotação de tarefas e quase nenhuma especialização. É o modelo das organizações de

voluntariado, de algumas empresas familiares.

É evidente que estes formatos são apenas modelos teóricos para nos ajudar a compreender

a realidade como de fato ela é. E a realidade geralmente não segue nossos modelos e

teorias. Por isso a intenção de Mintzberg foi fornecer parâmetros para que construíssemos

nossos próprios modelos, baseados na experiência e intuição também.

As configurações surgem como um conjunto de impulsos básicos da organização, em cada

uma delas haveria uma força dominante: da cúpula estratégica, da tecnoestrutura, dos

operadores, da profissionalização, pelos gerentes intermediários e pelas assessorias de

apoio. A organização eficaz pode ser qualquer uma das configurações ou uma combinação

delas. As organizações selecionam os parâmetros de design que as ajustam em cada

situação. Neste ajuste elas podem atingir uma consistência interna entre estes parâmetros.

Perguntas:

1. Porque a chamada “gestão de competências” é mais adequada ao estilo gerencial de

administração ? Justifique sua resposta.

2. Como deve ser a estrutura organizacional nas organizações públicas inovadoras?

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 150

3. Na sua visão a liderança é importante para a gestão inovadora ? Justifique.

Bibliografia:

Marimón, Francisco Borrás (2008). La función directiva pública. Habilidades directivas, 4ª

edición. Fundación Centro de Educación a Distancia para el Desarrollo Económico y

Tecnológico, INAP, Madrid.

Este trabalho é base para os cursos de formação do importante centro de capacitação do

governo Espanhol, o Instituto Nacional de Administração Pública, o INAP. O trabalho nos

conduz por um revisão geral das principais escolas administrativas com ênfase para as

habilidades e competências dos diretivos públicos, dos dirigentes de organizações públicas.

CHIAVENATO, Idalberto. Administração Geral e Pública. Elsevier: Rio de Janeiro,

2006.

Este livro foi elaborado originalmente para auxiliar os estudantes de nível superior nos

concursos públicos relacionados às carreiras federais que são muito exigentes na área da

gestão pública. Na verdade o livro adquiriu uma densidade e abrangência impar na literatura

disponível. Inicia comentando as escolas clássicas da administração para em seguida entrar

nos assuntos típicos da gestão publica: processo administrativo, gestão de pessoas,

comportamento organizacional até as novas abordagens da recente reforma gerencial. É

indispensável para quem quiser se aprofundar no assunto.

CHIAVENATO, Idalberto. Recursos Humanos: o capital humano das organizações. São

Paulo: Atlas, 2006.

Obra moderna e atualizada obra sobre a administração das pessoas nas organizações:

Recursos Humanos, Gestão de Talentos, Capital Humano, Capital Intelectual ou qualquer

outra denominação que receba. Trata-se de um livro inovador que mostra os novos

horizontes e as desafiadoras tendências que se abrem para o novo milênio. Escrito por uma

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 151

das maiores autoridades no assunto, apresenta mais de 500 citações de empresas de

primeira linha para oferecer exemplos de casos bem-sucedidos e aplicações práticas dos

conceitos apresentados.

Organização Para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. Liderança e Setor

Público no Século 21 : Governança / Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento

Econômico. - Brasília : MP, SEGES, 2002.

A liderança tem sido crescentemente considerada como um dos elementos essenciais da

boa governança pública. Líderes no setor público precisam saber mobilizar as pessoas por

meio de valores e visões; persuadi-las e fazer convergir seus esforços para uma causa

comum. Disso depende o desenvolvimento de uma administração pública eficiente, com

foco em resultados, orientada para a prestação de serviços de qualidade para o usuário e

bem organizada. Esta publicação tem por objeto explorar as tendências gerais de formação

de líderes que podem ser inferidas a partir das experiências de países membros da OCDE.

Além disso, contém estudos de casos específicos: Reino Unido, Estados Unidos, Alemanha,

Suécia, Noruega e México, nos quais são apresentados o arcabouço conceitual dos

programas de formação de lideranças em desenvolvimento, bem como informações sobre a

organização do quadro de pessoal desses países.

Introdução à Gestão de Recursos Humanos: texto de referência para a área temática de

gestão de pessoas / Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

Secretaria de Recursos Humanos; Björn Bengtson e Göran Järvstrand, Brasília: MP, 2006.

Este texto faz parte de um projeto do Ministério do Planejamento chamado “EU-Brasil” de

intercâmbio com a Comunidade Europeia sobre temas de planejamento e administração

públca. No âmbito da componente “Fortalecimento da Administração Pública” e da área

temática “Gestão de Pessoas” do Projeto, em parceria com a Secretaria de Recursos

Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (SRH/MP), o texto subsidiou

a oficina “Tendências Internacionais no Campo da Gestão de Pessoas no Setor Público”. Esta

publicação foi baseada no texto “Introdução à Gestão de Recursos Humanos”, de autoria de

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 152

Björn Bengtson e Göran Järvstrand, precedido de um texto introdutório ao contexto federal

brasileiro de administração de recursos humanos, elaborado pelo corpo técnico da SRH/MP.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 153

Aula 7

Metodologias de Gestão Inovadora

Esta aula se diferencia das demais pela sua natureza eminentemente prática e aplicada. A

gestão inovadora não acontece sem o uso adequado e pertinente de metodologias,

ferramentas e técnicas de gestão. Das mais simples as mais complexas as técnicas aqui

apresentadas possibilitam a visão de um panorama geral da área. Não há a pretensão de

você se torne um expert em poucas horas, mas é importante que o gestor público, o aluno e

até mesmo o estudioso do assunto tenha clareza de que existem múltiplos instrumentos,

para múltiplos contextos.

Aqui apresentamos técnicas mais amplas de orgnização da gestão como um todo, passando

por métodos de planejamento simples e mais complexos até técnicas mais singelas de

organização de reuniões, por exemplo. Todos os métodos são tijolos ou peças de um

quebra-cabeças que você deve manejar com cuidado, em cada situação, fazendo as

adaptações necessárias.

Nesta aula vamos abordar diversos tópicos e ver as seguintes metodologias ou técnicas de

gestão.

• Plano de Melhoria de Gestão do Ministério do Planejamento;

• A metodologia de planejamento “Método do Quadro Lógico” (MQL);

• A metodologia do Planejamento de Projeto Orientado pelos Objetivos (ZOPP);

• O Método de Análise e Solução de Problemas – MASP e o PDCA;

• A metodologia do “5W2H” e a metodologia “SWOT”;

• Monitoramento e da avaliação das ações de gestão;

• Reengenharia e a análise de processos;

• Facilitação de grupos e técnicas de moderação e

• Organizando reuniões.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 154

Organizando o Planejamento Gerencial

Apresentamos aqui um conjunto de recomendações ou um repertório para a melhoria da

gestão organizacional. Ele é baseado na valiosa contribuição do Ministério do Planejamento,

elaborada em 2004, no âmbito da melhoria da qualidade da gestão das organizações

federais. Como técnica e ferramentas elas tem validade universal, desde que adaptadas em

cada contexto concreto de aplicação. A seguir vamos apresentar a metodolgia como ela foi

originalmente elaborada.

Segundo o Ministério do Planejamento, o Plano de Melhoria da Gestão – PMG é o

instrumento de gestão, constituído de um conjunto de metas e ações estabelecidas a partir

do processo de autoavaliação da gestão da organização, com vistas a transformar a sua ação

gerencial e melhorar o seu desempenho institucional. A avaliação da gestão pode ser

considerada uma visão panorâmica da organização sobre o seu sistema de gestão. Pode ser

comparado a um exame de rotina que permite aos gestores perceberem onde há

problemas, onde há boas práticas e qual o impacto desse conjunto de práticas sobre o

desempenho da organização.

Assim, ao determinar que aspectos da avaliação serão objeto de ação do Plano de Melhoria

da Gestão, possivelmente, as áreas ou funções da organização que serão atingidas pelo

Plano deverão passar por estudos mais aprofundados para que a solução proposta seja ao

mesmo tempo consistente e adequada à organização.

Por ser um instrumento de gestão, o Plano de Melhoria de Gestão, não depende do

planejamento estratégico nem dos planos dele decorrentes, nem os substitui. Por ser um

plano de gestão, pode conter metas de implementação ou de melhoria do próprio sistema

de planejamento estratégico da organização avaliada. Não se deve esquecer que o

planejamento é uma das funções gerenciais, junto com a organização, a direção, a

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 155

coordenação e o controle. Portanto, avaliar e melhorar a gestão são, sob esse enfoque,

muito mais que planejar.

O processo de planejamento da melhoria da gestão pode ser realizado seguindo os

momentos descritos a seguir.

A Priorização das Oportunidades de Melhoria

O objetivo desta etapa é selecionar um conjunto de oportunidades de melhoria, dentre as

identificadas na auto-avaliação, que serão foco das ações do Plano de Melhoria da Gestão,

evitando - se assim a dispersão de recursos. O principal critério de priorização não necessita

de qualquer técnica ou ferramenta, basta responder à pergunta: “há alguma oportunidade

de melhoria identificada que diga respeito a um problema, melhoria, ou inovação que a alta-

administração tem manifestado interesse em resolver ou implementar?”. Se positivo, essa

ou essas oportunidades de melhoria são necessariamente prioritárias.

Outro critério importante de priorização é incluir entre as ações do Plano de Melhoria de

Gestão os projetos já em desenvolvimento que têm relação direta com pelo menos uma das

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 156

oportunidades de melhoria identificadas. Essa ou essas oportunidades de melhoria são

igualmente prioritárias.

É importante que a realização da auto-avaliação e o planejamento para a melhoria não

interrompam as ações e os projetos em desenvolvimento na organização. O Plano de

Melhoria da Gestão deve ser, nesses casos, um instrumento de organização das ações e, de

preferência, que dê velocidade na execução e visibilidade aos resultados.

Identificadas as oportunidades de melhoria que respondam a esses dois critérios, e caso os

planejadores decidam incluir outras oportunidades de melhoria, podese utilizar alguma

ferramenta de priorização que poderá ajudar a dar consistência técnica à escolha, mas, de

forma alguma, substituirá a percepção do que é e não é considerado importante pela

organização naquele momento. Entre uma e outra, deve-se ficar com aquelas oportunidades

de melhoria que representem a preocupação da organização, principalmente da alta

administração.

Dentre essas ferramentas, destacamos a matriz GUT (Gravidade, Urgência e Tendência). O

quadro a seguir apresenta a matriz e seus componentes: a lista de oportunidade de melhoria

a serem priorizadas, os três critérios de análise: gravidade, urgência e tendência; e a

pontuação geral obtida em cada oportunidade de melhoria analisada.

A pontuação de cada oportunidade de melhoria é obtida pela multiplicação dos pontos (1, 3

ou 5) atribuídos à gravidade à urgência e à tendência. A coluna ‘PONTOS’ indicará a

priorização estabelecida, sendo que a oportunidade de melhoria com maior prioridade será

aquela que na opinião dos planejadores atingir a maior pontuação.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 157

A ordem de priorização não determina necessariamente quais oportunidades de melhoria

serão transformadas em metas no Plano. Os planejadores deverão estabelecer um ponto de

corte, cuidando para não definirem um Plano de Melhoria com muitas metas. É bom

lembrar que a organização tem suas metas finalísticas e precisa compartilhar a melhoria da

gestão com vistas ao aumento da capacidade de desempenho.

Vale ressaltar algumas recomendações no momento da priorização das oportunidades de

melhoria:

• Resistir à vontade de considerar todas as oportunidades de melhoria como

prioritárias;

• Priorizar, pelo menos, uma importância, não se deixar seduzir pelas urgências;

• Identificar objetivamente o principal critério de priorização a ser utilizado;

• A melhoria da qualidade dos serviços disponibilizados aos cidadãos deve levar em

consideração a eficiência da ação pública com ênfase na capacidade de fazer o

máximo com os recursos disponíveis;

• As atividades finalísticas da organização são preferenciais como estratégia de atingir

mais rapidamente o cidadão-usuário;

• As ferramentas auxiliam, mas não substituem a percepção da organização sobre si

mesma.

• Considerar os fatores críticos de sucesso na busca da excelência em gestão.

• Fatores críticos para o sucesso são condições fundamentais que precisam

necessariamente ser satisfeitas para que a instituição ou a estratégia tenha sucesso,

tais como: credibilidade; compromisso e aceitação.

Dois pontos importantes devem ser considerados na identificação dos fatores críticos de

sucesso:

i) ser um fator crítico de sucesso não significa ser um problema, pode ser um ponto forte da

organização;

ii) o que é próprio para que uma tarefa seja realizada, dinheiro, pessoas, instalações, por

exemplo, não devem ser consideradas como fator crítico para o sucesso.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 158

Definição das Metas de Melhoria

Selecionadas as oportunidades de melhoria, o passo seguinte é transformá-las em metas. As

metas são objetivos quantificados que estabelecem onde se deseja chegar, o que se quer

implementar ou produzir, em quanto tempo. Nesse contexto, as metas devem se constituir

em verdadeiros desafios para a organização. Não devem ser desafios ‘alucinados’ que a

priori já se sabe que não serão atingidos. Não devem, por outro lado, ser resultados que sem

qualquer esforço, a organização os atingirá. Uma boa meta deve representar um tipo de

esforço adicional, uma ruptura, uma visão ousada, porém atingível, dentro de um tempo

previamente estabelecido.

As metas devem indicar que práticas da sua gestão, avaliadas como oportunidades de

melhoria, a organização deseja transformar em pontos fortes. As metas de um plano de

melhoria de gestão devem ser:

• Formuladas a partir das oportunidades de melhoria (OM);

• Quantificadas, portanto, mensuráveis;

• Desafiadoras, mas exeqüíveis.

Essenciais na definição de uma meta são os indicadores que o gestor da meta vai utilizar

para monitorar a sua execução e, principalmente, os seus resultados. Os indicadores são

dados ou informações, preferencialmente numéricos, que representam um determinado

fenômeno e que são utilizados para medir um processo, nesse caso, uma meta.

As principais características dos indicadores são:

• Seletividade - captação dos aspectos, etapas e resultados essenciais ou

críticos da meta;

• Simplicidade - coleta e a análise de dados simples e direta. Indicadores

expressos através de relações percentuais simples, média aritmética ou

números absolutos.

• Disponibilidade - facilidade de se conseguir dados em tempo hábil.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 159

• Estabilidade - permanência ao longo do tempo e geração com base em

procedimentos rotinizados e incorporados às atividades do órgão. Permite

série histórica.

• Rastreabilidade - passíveis de levantamento regular. Os indicadores

devem ser medidos sistemática e periodicamente e transformados em

gráficos para melhor visualização.

• Confiabilidade - consistência (conceitual e metodológica) com indicadores

da mesma natureza.

• Comparabilidade - permitem comparações com referenciais.

O quadro a seguir apresenta uma tipologia de indicadores, a mais simples possível, cujo

objetivo é garantir aos formuladores a abrangência necessária à medição e

acompanhamento de suas metas.

Elaboração do Plano de Melhoria da Gestão – PMG

O conjunto de metas, formuladas a partir das oportunidades de melhoria (OM) selecionadas,

constitui a base do Plano de Melhoria de Gestão - PMG. O Plano de Melhoria da Gestão é,

portanto, a programação – meta a meta – das ações de melhoria gerencial a serem

implementadas.

Um Plano de Melhoria da Gestão deve abordar, no mínimo, os seguintes itens:

Meta - Resultado que se deseja alcançar, em que prazo.

Indicadores – Informações que permitirão medir e eficiência e eficácia das ações para o

atingimento da meta.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 160

Líder – Cada meta deve ter um líder, alguém que irá gerenciar o conjunto de ação da sua

meta, mobilizar e inspirar as pessoas na direção do sucesso da implementação e dos

resultados da meta.

Para cada meta deve ser identificado:

• As ações que serão executadas para alcançar a meta;

• O nome dos responsáveis pelas ações da meta;

• Onde as ações serão executas;

• Quando as ações serão executadas;

• Como cada uma das ações serão realizadas (estratégia, técnica etc);

• Por que essas ações serão desenvolvidas; (destacando, quando for

necessária, a principal contribuição da ação para a consecução da meta);

• Os recursos necessários para a execução de cada ação (aqui incluído

pessoas, conhecimento, dinheiro, tempo, instalações e, equipamentos).

Para facilitar a elaboração da programação de cada meta o Manual sugere a ferramenta

5W2H, apresentada a seguir, pode ser utilizada nesse momento do planejamento.

Definição do Sistema de Acompanhamento do Plano

Esta é a fase do planejamento do controle. A organização deve estabelecer, em conjunto

com os líderes das metas, um mecanismo de acompanhamento das ações/projetos e de

monitoramento do cumprimento parcial das metas, de maneira a possibilitar eventuais

realinhamentos, em tempo hábil e, portanto, em tempo de execução do plano. Devem ser

estabelecidos canais ágeis e eficientes de comunicação entre os diversos níveis de

desdobramento das metas. Importante lembrar a diferença entre “delegar” e “entregar”. A

organização deve delegar às equipes de melhoria a autoridade pela condução das atividades

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 161

e resolução dos eventuais problemas ou dificuldades que possam ocorrer. Mas é vital, para o

sucesso do plano de melhoria, que a alta administração esteja permanentemente informada

do andamento das atividades, podendo interferir para auxiliar ou corrigir o trabalho das

equipes, além de prover assessoria técnica e apoio político, sempre que necessário.

Como sugestão o Ministério do Planejamento apresenta uma forma de painel de controle

do Plano de melhoria.

O significado de cada quesito está na tabela a seguir:

Elaboração do Plano de Comunicação

Um plano de comunicação deve ser elaborado para compartilhar os resultados da avaliação,

o Plano de Melhoria da Gestão e os resultados que advirão da sua execução. Não se pode

falar de gestão participativa e transparente se a prática de planejar a melhoria da gestão não

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 162

começar pelo hábito de envolver, comunicar, de dar a conhecer, de induzir o controle por

parte de todos os servidores. O plano de comunicação é o primeiro passo na implantação de

uma ‘gestão à vista’ que possa ser mais do que mostrada, entendida por todos, ou pelo

menos, pela maioria das partes interessadas.

Como sugestão, é apresentado um roteiro para o plano de comunicação do PMG.

Elaboração do Plano de Capacitação

Diferentemente de uma gestão normativa e burocrática, a gestão orientada para resultados

prepara e capacita as pessoas nas estratégias, métodos e técnicas a serem utilizadas na

execução das ações do plano. Embora as ações de capacitação continuem ao longo do plano

e durante a implementação das novas práticas, é essencial que haja uma capacitação que

preceda o plano que tenha por objeto o próprio plano. Daí a necessidade de definir, em

tempo de planejamento, uma programação consistente para capacitação das pessoas

envolvidas diretamente na execução do Plano, seja no gerenciamento das metas e das

ações, seja nos métodos, ferramentas e técnicas que pretende utilizar para a transformação

gerencial estabelecida pelo conjunto de metas do Plano.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 163

A metodolgia lembra que é importante observar que esse não é o plano de capacitação da

organização: é apenas o plano de capacitação das pessoas para bem executar o Plano de

Melhoria da Gestão – PMG.

A metodologia de planejamento “Método do Quadro Lógico” (MQL)

O Quadro Lógico ou Método do Quadro Lógico (MQL) foi desenvolvido a partir da

experiência de cooperação internacional para o desenvolvimento estabelecida nos anos

sessenta entre as nações desenvolvidas e o terceiro mundo. Sua origem é a United States

Agency for Internationl Development (USAID), uma agência de cooperação norte-americana.

Ela identificou dificuldades no planejamento dos projetos, falta de clareza para a

responsabilização no gerenciamento e ausência de mecanismos para monitorar a

efetividades dos projetos contratados. A USAID então produziu uma metodologia chamada

Logical Framework Approach que foi aprimorada ao longo dos anos de utilização.

Com o tempo uma série de organizações internacionais ligadas às estruturas de cooperação

para o desenvolvimento, fossem elas governamentais ou não-governamentais, foram

adotando o método. Atualmente os bancos internacionais como como o Banco

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 164

Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial (BIRD) adotam esta

metodologia. O ciclo do MQL será detalhado adiante, mas o essencial é um conceito que

ordena meios e fins de maneira lógica através da elaboração de uma matriz onde se

relacionam objetivos do projeto, resultado e atividades planejadas de um lado e do outro

indicadores, fontes de comprovação e suposições importantes. O MQL estabelece, em

essência, um discurso estruturado e plausível entre relações de causa e efeito. Por exemplo,

os resultados previstos pelo Projeto devem contribuir decisivamente para alcançar os

objetivos do projeto e este processo deve ser monitorado por indicadores com suas fontes

de comprovação dentro de determinadas suposições.

Assim a matriz do MQL apresenta uma lógica vertical (a leitura das colunas) baseada na

suposição de que determinados recursos aplicados produzirão resultados que por sua vez

constituirão o objetivo do projeto que contribuirá para o objetivo superior ou último da

organização o do enfrentamento do problema do plano, é uma leitura de baixo para cima.

Há também uma lógica horizontal identificada a partir da relação entre Objetivos (superior

ou do projeto), indicadores, fontes de comprovação e suposições importantes.

Uma versão simplificada da matriz do MQL

Indicadores

objetivos

Indicators

Fontes de

comprovação

Means of verification

Suposições

importantes

assumptions

Objetivo Superior

Goal

Objetivo do

Projeto

purpose

Resultados

products

Atividades Recursos/Insumos necessários

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 165

Abaixo um quadro montado a partir do guia do Banco Interamericano Note-se que a

terminologia muda, por exemplo, “componentes” é um desdobramento das “atividades” no

quadro anterior, os “impactos” são os “objetivos”.

Matriz do Marco Lógico

Descrição Indicadores Meios de verificação Pressupostos

Impactos (objetivos) Os impactos/finalidade do projeto mostram como o projeto contribuirá para a solução de um problema social definido.

Medem o impacto final do projeto. Devem especificar quantidade, qualidade e prazos.

São as fontes de informação que podem ser utilizadas para verificar se os objetivos foram alcançados. Podem incluir publicações, pesquisas, levantamentos etc.

Indicam acontecimentos, condições e decisões importantes necessárias para a sustentabilidade dos benefícios gerados pelo projeto.

Resultados Resultados diretos a serem alcançados com a aplicação dos componentes produzidos durante o projeto. São hipóteses sobre os benefícios que se espera obter a partir dos componentes.

Descrevem os resultados alcançados ao final do projeto. Devem incluir metas que reflitam a situação ao final do projeto.

São as fontes de informação que podem ser utilizadas para verificar se os objetivos estão sendo alcançados. Pode indicar a existência de problemas e/ou a necessidade de ajustes ou mudanças nos componentes do projeto.

Indicam acontecimentos, condições ou decisões que devem ocorrer para que o projeto contribua significativamente para os impactos desejados.

Componentes (atividades) São os serviços e/ou produtos desenvolvidos no âmbito do projeto. Ex.: curso de capacitação, produção de apostila, campanha de vacinação.

São descrições breves e claras sobre quantidade, qualidade dos componentes do projeto e seus prazos de execução.

Onde encontrar informações sobre os componentes produzidos.

Suposições, acontecimentos ou condições que devem ocorrer para que os componentes do projeto levem aos resultados desejados.

Atividades São as tarefas que devem ser executadas para completar cada um dos componentes do projeto. Elas implicam em custos e devem ser organizadas cronologicamente para cada componente.

O orçamento de cada componente do projeto e de suas atividades.

Indica as fontes de informação para acompanhar a execução das atividades (cronograma) e orçamento do projeto.

São acontecimentos, condições ou decisões fora do controle do gerente do projeto que precisam ocorrer para que os componentes sejam completados adequadamente.

O ciclo do projeto no marco lógico

O ciclo do projeto é dividido em (1) identificação , (2) elaboração e (3) execução e

gerenciamento. O ciclo de um projeto representa uma seqüência lógica e progressiva de

construção do projeto, cada etapa deve necessariamente se apoiar nas conclusões e sínteses

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 166

das etapas anteriores. Dentro do contexto do planejamento estratégico a elaboração e

execução do projeto representa um movimento circular, sem fim, porque a reflexão

necessária para desenhar o projeto deve ser confrontada dialeticamente com a ação

resultante da execução do projeto.

Assim, por exemplo, o movimento de monitoramento e avaliação de desempenho do

projeto alimenta criticamente o diagnóstico de problemas ou a análise de recursos

disponíveis porque a execução do projeto sempre acontece em cenários imprevisíveis, em

condições de incerteza incapazes de serem apreendidas pelo planejador no momento de

reflexão inicial na elaboração das ações e atividades do projeto.

É por este motivo que uma organização que estrutura seu modelo de gestão com base na

elaboração e execução de projetos deve estimular permanentemente a flexibilidade crítica

de seus gestores, a criatividade diante da incerteza e a capacidade de reação nos cenários

monitorados. Estas habilidades gerenciais compõe uma nova cultura gerencial que no caso

do setor público, deve ser construída contrapondo-se ao clientelismo e autoritarismo

comuns na tradição governamental.

Os passos lógicos a seguir são baseados na metodologia do Quadro Lógico com algumas

adaptações.

(1) Identificação

Esta é a fase para preparação do projeto quando são checadas as condições de possibilidade

para sua elaboração e execução. O planejador deve fazer uma primeira abordagem da

situação problemática, investigar os limites institucionais de atuação, saber se o âmbito de

solução do problema está dentro ou fora da governabilidade imediata do ator que planeja.

O resultado imediato da fase de identificação do projeto é saber se há viabilidade para o

projeto diante da problemática trabalhada no início do planejamento. O processo de

planejamento – no qual o projeto se insere como peça fundamental – já indicou a

identificação de uma situação problemática, descortinando um fluxograma explicativo para

cada problema analisado. A identificação do projeto é o primeiro “descobrimento” das

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 167

grandes linhas de ação para enfrentar o problema, cabe perguntar portanto, até que ponto o

projeto tem sustentabilidade política, institucional, financeira, etc... Trata-se, pois, de uma

“identificação inicial” de grandes linhas e oportunidades de ação.

Uma última tarefa relevante na fase de identificação é a reflexão do planejador sobre as

condições de elaboração e execução do projeto, condições estas referentes à capacidade de

gestão ou à capacidade de governo da organização que planeja: há condições de

enfrentamento da situação problemática ? A vontade política da direção é suficiente para o

compromisso necessário com o projeto ? As condições técnicas de elaboração do projeto

estão viabilizadas, isto é, o conhecimento técnico necessário está sistematizado, disponível e

assimilado pelos planejadores ?

A identificação inicial do projeto é na verdade um primeiro exame de consistência sobre a

viabilidade das idéias e insights que o grupo de planejamento tem para resolver os

problemas da organização. Funciona como um primeiro filtro para peneirar e separar idéias

com e sem viabilidade.

(2) Elaboração

1º Passo: Identificar os objetivos do projeto

Uma das maiores fontes de fracassos dos projetos está a possibilidade de leituras

contraditórias sobre os objetivos que o projeto quer alcançar, feitas as vezes por setores

diferentes da mesma organização ou empresa. A precisão e exatidão das formulações,

portando deve ser a mais rigorosa possível. Um projeto sem objetivos fica sem foco de

atuação, dificulta qualquer processo de monitoramento ou avaliação de desempenho, não

há como medir o grau de sucesso ou fracasso, nem responsabilizar os responsáveis pela sua

execução. Recomenda-se por isso definir os objetivos descrevendo-os como se já estivessem

materializados, por exemplo, “trinta casas construídas” ou “cem famílias beneficiadas com

renda mínima”.

O objetivo superior (a primeira célula da primeira coluna) tem a função de orientação mais

estratégica ou geral ao projeto e à equipe de elaboração/execução. Normalmente está

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 168

relacionado à missão da organização ou a sua visão de futuro, ou seja, o objetivo superior

sempre será uma derivação ou um sumário das Declarações Estratégicas da organização que

planeja.

O objetivo do projeto deve ser visto como o resultado esperado da atuação das pessoas e

organizações para mudança de uma situação problemática e indesejável previamente

explicada e analisada na atividade de planejamento estratégico. Só há sentido na definição

de objetivos do projeto se sabemos quais os problemas ou aspectos críticos dos problemas,

os nós críticos, a serem enfrentados. Os cuidados metodológicos mais importantes na

definição dos objetivos são:

(a) Desenhar os objetivos do projeto pensando sempre na mudança da natureza

negativa de um problema ou de suas causas, no planejamento estratégico

geralmente cada causa identificada do problema (na árvore explicativa ou

fluxograma explicativo) é suficientemente complexa para demandar um projeto de

ação com várias atividades e ações previstas. O objetivo sempre será o efeito

esperado de nossa intervenção.

(b) Desenhar os objetivos do projeto sempre mantendo coerência e acumulando poder

para realização do Objetivo Superior do Projeto, ou dito de outra forma, o resultado

do projeto deve nos aproximar sempre das declarações estratégicas. Se isto não ficar

claro entre os participantes provavelmente os problemas identificados não ajudam a

entender a situação inicial da organização (má escolha ou explicação de problemas)

ou as declarações estratégicas (Missão, visão de futuro e diretrizes) estão

desproporcionais em relação à governabilidade do ator (abstratas e utópicas em

demasia ou pouco ambiciosas).

(c) Desenhar os objetivos do projeto como resultado do mais amplo acordo político-

administrativo interno na organização, capaz de superar eventuais divergências

individuais sobre o rumo ou procedimentos da instituição. Não se quer eliminar

divergências ou olhares individuais o que é impossível, mas elaborar uma síntese

coletiva e acordar um modo sistemático de solução das divergências. Nas

organizações públicas cuja direção espelha a diversidade política da própria

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 169

sociedade, saber construir consensos é uma tarefa relacionada à própria

governabilidade institucional.

(d) Desenhar os objetivos do projeto sempre que possível envolvendo os beneficiários

das ações. Isto é possível quando os projetos de ação visam resolver nós críticos ou

causas dos problemas relacionadas à dinâmica interna da organização (por exemplo

“implantar novo sistema de controle das licitações” ou “modernizar o setor de

concursos e RH”). Em projetos de desenvolvimento local ou setorial, financiados ou

não por bancos de desenvolvimento, também é possível envolver beneficiários de

forma participativa. Outros projetos cuja natureza ou escala inviabiliza a participação

direta dos beneficiários (por exemplo, “Execução de novo sistema de fiscalização

tributária” ou “Implantação de posto de saúde”) pode-se criativamente utilizar

outros meios como pesquisas de opinião, entrevistas, etc...

2º Passo: definir os resultados do projeto

Enquanto o objetivo do projeto é um efeito desejado pelo grupo, mas implica em variáveis

fora da governabilidade imediata do grupo que planeja, os resultados são obras, serviços,

enfim, situações produzidas diretamente pelo esforço e mobilização de recursos da

organização. Os resultados devem contribuir com coerência e consistência lógica para o

alcance dos resultados. Assim após o debate e a redação final dos resultados esperados o

grupo de planejamento deve ser perguntar se estes resultados são suficiente e necessários

para atingir os objetivos, deve se perguntar se a ocorrência das suposições importantes, os

pressupostos são de fato realizáveis. Da mesma forma a relação para baixo, isto é, das

atividades a serem desenvolvidas deve-se inquirir sobre a relação lógica para alcance dos

resultados formando uma cadeia coerente de ações.

3º Passo: definir as atividades e ações necessárias

Assim como os resultados são situações factíveis de monitoramento e controle por parte da

organização, as atividades representam um conjunto de ações, que podem implicar em

custos financeiros ou não, diretamente relacionadas à produção dos resultados. Um dos

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 170

objetivos do trabalho com matrizes, como a matriz de planejamento do projeto, inspirada no

MQL, é viabilizar a participação dos envolvidos, para que isso aconteça realmente o

processo de comunicação é variável estratégica. Por isso as atividades não devem ser

detalhadas em seus aspectos mais operacionais, isto sobrecarregaria de informações a

matriz inviabilizando sua leitura e apropriação coletiva. O detalhamento operacional de cada

atividade (quem ? quando ? onde ? quanto custa ? etc...) deverá ser feito numa etapa

posterior e possivelmente descentralizada de planejamento tático ou operacional.

4º Passo: identificar os insumos e recursos necessários

A identificação inicial de recursos e insumos necessários à execução das atividades

programadas deve ser desdobrada no detalhamento operacional. Ela está presente nesta

etapa porque talvez, entre todos os quesitos mais operacionais, esta pergunta, “que

recursos ou insumos são necessários para executar a atividade ?” , seja aquela que mais

possibilita um exame realista e auto-crítico sobre os níveis de capacidade de governo e

governabilidade da organização que planeja.

5º Passo: definir os indicadores e as fontes de comprovação

Na Segunda coluna da matriz de planejamento os indicadores tem uma única função:

permitir o monitoramento do planejamento, da forma mais eficiente e eficaz possível. Isto

significa que dificilmente pode-se controlar o desenrolar do planejamento e eventualmente

efetuar correções de percurso se não houver – previamente – identificação das

desconformidades, da efetividade de atividades, resultados ou objetivos previstos. É por isso

que os indicadores (relações entre variáveis, quantidades ou outra informação) devem ser

objetivamente verificáveis, independentes, o que não é medido não pode ser controlado. Os

resultados devem ter indicadores de acompanhamento ou desempenho, relacionando o

quanto se está progredindo na execução do planejamento em relação aos recursos e

atividades executadas.

Já os objetivos do projeto e objetivo superior exigem indicadores de efeito e de impacto no

caso do objetivo geral, devendo mensurar aquelas mudanças desejadas pelo projeto. As

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 171

atividades planejadas no projeto são acompanhadas por indicadores operacionais. Os

indicadores devem demonstrar claramente o que se pretende com os objetivos, resultados e

atividades, induzem o grupo a precisar e focalizar melhor a descrição do planejamento.

Por isso devem ser plausíveis (coerência com o alcance das medidas), independentes e

substanciais. Normalmente o acompanhamento e os efeitos de um projeto são avaliados

pela análise combinada de vários indicadores simultaneamente. O julgamento sobre o grau

de relevância ou sucesso do projeto é mais ou menos possível conforme a qualidade dos

indicadores selecionados.

Cada indicador deve possuir sua “fonte de comprovação” (terceira coluna), para indicar

onde se encontram as informações que sustentam os indicadores, suas fontes ou meios,

indicam o custo de obtenção e manutenção das informações e o grau de realismo dos

indicadores. Custo e confiabilidade das fontes são importantes para a montagem de um

sistema de informações gerenciais sobre o projeto, bem como a documentação do mesmo.

Indicadores operacionais

São usados para monitoramento dos recursos necessários para executar as atividades e das próprias atividades(1ª linha). Medem a quantidade, disponibilidade, tempo, custo, produto de cada atividade, etc...

Indicadores de desempenho e acompanhamento

Monitoram o desempenho dos resultados da matriz operacional (2ª linha). Contribuem para diferenciar o conceito de produto (ligado à atividade) de resultado.

Indicadores de efetividade

Monitoram o grau de sucesso, a performance dos objetivos do projeto. Indicam mudanças mais abrangentes e complexas na situação da organização, ou do público-alvo do projeto.

Indicadores de Impacto

Monitoram o impacto de mais longo prazo e abrangência, tentando acompanhar o grau de contribuição do projeto ao objetivo geral da organização o do planejamento estratégico. Muitas vezes são indiretos evidenciando resultados conjuntos de outros projetos na mesma área ou setor.

6º Passo: Identificar os pressupostos importantes do projeto

Finalmente o último passo na elaboração do MQL é a identificação dos fatores importantes

para o planejamento, considerados fatores verdadeiros e reais. Esta etapa, portanto, deve

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 172

considerar todos os riscos fora da governabilidade do grupo capazes de atingir os objetivos e

resultados esperados. A idéia é que determinadas suposições devem ocorrer para que cada

etapa do projeto seja bem sucedida.

Portanto, somente as suposições realmente importantes e necessárias são consideradas e

somente se houver algum risco de que elas não ocorram ou se concretizem. Se uma

suposição externa é importante para alcançar os resultados ou os objetivos do projeto, mas

ao mesmo tempo é improvável que ocorra, então há uma quebra da lógica do projeto (o

planejamento foi mal feito) ou de fato há um risco externo não perceptível inicialmente que

inviabiliza a execução do projeto.

O objetivo primordial da análise de pressupostos é diminuir a vulnerabilidade do projeto

diante de eventuais erros de avaliação ou inconsistência, relacionada por exemplo, à

percepção das forças sociais, à conjuntura na qual o projeto será desenvolvido ou às

próprias forças e fraquezas da organização que planeja. Na lógica horizontal do MQL as

atividades e as respectivas suposições devem conduzir aos resultados esperados, assim

como, os resultados e suas suposições (ou pressupostos) devem conduzir aos objetivos

desejados.

Execução e Gerenciamento do Projeto

A matriz de planejamento no ciclo do projeto a partir do enfoque do MQL não é uma

construção estática, acabada ou preenchida mecanicamente, ela evolui na medida em que o

próprio projeto é executado e replanejado. Neste sentido a execução e o gerenciamento do

projeto se confundem com o momento da gestão do plano, pois vários projetos são

executados simultaneamente gerando sinergias positivas (ou pontualmente negativas),

situações novas e imprevistas para o gesto público.

É no momento da ação onde tudo se decide e para isso o método do quadro lógico é uma

ferramenta potente de trabalho para monitorar e gerenciar o projeto, mas é insuficiente

para responder a todos desafios da gestão pública ou de projetos sociais. O primeiro passo

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 173

após a elaboração da matriz geral do projeto é a decomposição das atividades no seu

desdobramento natural em sub-atividades, sub-ações, etc...

As considerações sobre a gestão do plano e das ações comentadas no Capítulo 03 são válidas

para a reflexão sobre o gerenciamento dos projetos, particularmente nos temas que

abordam as mudanças organizacionais e administrativas necessárias para assumir o modelo

de gerenciamento por projetos.

Um projeto de desenvolvimento, uma política de assistência social ou algum projeto de

modernização administrativa (da área de Recursos Humanos, por exemplo) podem ser

organizados a partir da aplicação do Método do Quadro Lógico, a mudança de escala não

altera o conceito básico do processo. Entretanto a simplicidade operacional do método não

deve gerar ilusões sobre o grau de precisão e rigor conceitual necessário para preencher

cada campo da matriz.

Sempre que possível deve-se contar com ajuda especializada na metodologia e

particularmente com profissionais habilitados em moderação de grupos pois o processo

participativo exige constante síntese e mediação das várias posições em debate.

A seguir um exemplo de quadro resumo no formato mais convencional e tradicional do

marco lógico com os principais conceitos utilizados para construir a matriz de planejamento.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 174

Quadro-resumo conceitual do Método do Quadro Lógico

Descrição

Indicadores objetivamente comprováveis

Fontes de comprovação (verificação)

Pressupostos

Objetivo Superior (OS) Para o qual o projeto deverá contribuir

Como vamos medir o conteúdo do Objetivo Superior? Qualidade, quantidade, duração, local, grupo destinatário

Que documentos, elaborados no projeto ou provenientes de outras fontes, podem ser utilizados para comprovar os indicadores a serem medidos?

Que fatores externos têm que ocorrer, para que o Objetivo do Superior seja mantido no longo prazo

Objetivo do Projeto (OP) Com que contribuímos essencialmente para alcançar o Objetivo Superior

Como vamos medir o conteúdo do Objetivo do Projeto? Idem

Idem

Que pressupostos têm que ocorrer, para que o Objetivo Superior seja alcançado

Resultados Que têm que ser obtidos (quantidade e qualidade), para alcançar o efeito esperado (OP)

Como vamos medir o conteúdo dos Resultados? Idem

Idem

Que pressupostos – em relação aos Resultados – têm que ocorrer, para que o Objetivo do Projeto seja alcançado

Atividades Pacote de medidas do projeto visando alcançar os resultados pretendidos

Quanto custa ou quais os insumos requeridos (incluindo pessoal) para executar cada uma das atividades?

Que documentos comprovam os indicadores a serem medidos?

Que pressupostos - definidos como fatores externos, em relação às Atividades – têm que ocorrer, para que os Resultados sejam alcançados

Pré-requisitos Condições prévias e requisitos para implementar as atividades

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 175

A metodologia do Planejamento de Projeto Orientado pelos Objetivos (ZOPP)

Em alemão Zielorientierte Projektplanung o ZOPP surgiu de uma adaptação feita em meados

dos anos setenta pelo Ministério Federal da Alemanha, responsável pela cooperação

internacional. A Agência Alemã de Coorperação Técnica, a GTZ, conservou o coração da

metodologia original e fez inovações importantes especialmente aquelas baseadas no maior

grau de participação e envolvimento dos beneficiários nos projetos de desenvolvimento.

O ZOPP é composto de três elementos básicos, (1) o processo de planeamento baseado no

diagnóstico de problemas, (2) a elaboração de uma matriz lógica semelhante ao MQL que o

ZOPP chama de “Marco Lógico” e (3) técnicas participativas de trabalho que possibilitam o

envolvimento dos beneficiários e participantes do projeto (em inglês, os stakeholders).

Segundo Brose (2001) o método ZOPP não é um fim em si mesmo, deve ser visto como parte

de um sistema de gestão onde o que realmente importa é a execução do projeto, ou seja, o

constante replanejamento diante dos imprevistos e incertezas da realidade.

Os gestores não devem esquecer que a simplicidade e a elegância do método não garante,

por si só, a qualidade daquilo que é feito e implementado. Talvez um dos maiores resultados

do método seja a construção de um nível de consenso e acordo entre os participantes.

A seguir um exemplo de “arvore do Problema” no caso “Mortalidade Infantil”. A árvore do

problema é uma técnica utilizada no ZOPP para identificar problemas. A maior vantagem da

técnica é identificar causas do problema, separadas dos seus efeitos. Somente identificando

as causas pode-se ter uma ação efetiva e eficaz.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 176

A seguir o mesmo problema, transformado agora na “Arvore de Objetivos”, isto é, num

conjunto coerente e racional de objetivos interdependentes que configuram o norte, os

alvos do projeto. Explicar o problema e desenhar os objetivos são passos essenciais para a

lógica do ZOPP. O desenho dos objetivos deve ser sempre uma poderação entre a vontade

política do grupo que planeja, o contexto no qual está inserido (as relações de poder com

outros atores) e os recursos de que dispõe ou pode mobilizar (financeiros, cognitivos,

materiais, etc.).

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 177

O Método de Análise e Solução de Problemas – MASP e o PDCA

A origem do MASP é um conjunto de procedimentos para resolução de problemas que foi

elaborado como parte do conjunto de técnicas de gestão empresarial baseadas no modelo

japonês conhecido como Total Quality Control, ou TQC. O procedimento metodológico é

baseado na aplicação seqüencial de sete passos: (1) identificação do problema, (2)

observação sobre as características do problema, (3) Análise das causas fundamentais do

problema,(4) elaboração de um Plano de Ação para eliminar as causas do problema, (5)

verificação da efetividade da ação executada, (6) padronização da solução e eliminação

definitiva das causas e por fim (7) a conclusão do processo com a revisão de todos os

procedimentos com planejamento das ações futuras.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 178

A seguir um diagrama ilustra os principais passos do MASP.

Em cada passo várias ferramentas quantitativas e não-qualitativas são utilizadas para

hierarquizar processos, estratificar estatisticamente ocorrência de eventos, classificar

procedimentos, etc... O roteiro metodológico também pode ser organizado a partir do

chamado “ciclo do PDCA” (em inglês, Plan, Do, Check e Action).

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 179

Estes métodos foram pensados originalmente para auxiliar a gestão de processos produtivos

industriais e não para a gestão pública, apesar disso é interessante observarmos algumas

idéias comuns como a importância atribuída à análise e explicação de problemas, ao

processo de planejamento, execução e monitoramento como momentos indissociáveis, à

circularidade do planejamento como processo permanente, etc...

O métdodo do Balanced Scorecard

Nos últimos anos tem proliferado a divulgação de novas metodologias de gestão e

planejamento com aspectos realmente inovadores. Uma delas foi criada no setor privado,

mas logo foi expandida para a gestão publica com muito sucesso, é o Balance Scorecard,

como é o termo em inglês, ou traduzindo, seria um quadro de indicadores balanceados. Ele

surgiu originalmente a partir da constatação que os métodos de avaliação do desempenho

das empresas não estavam respondendo satisfatoriamente.

Originalmente formulada por dois autores norte-americanos da área de gestão, Norton e

Kaplan, o BSC é uma ferramenta que traduz uma visão estratégica da organização num

conjunto coerente de objetivos, medidas e indicadores de desempenho. Estas dimensões

são organizadas conforme vários aspectos: financeiro, do cliente, dos processos internos e

do aprendizado. O quadro de indicadores propriamente dito (o scorecard) cria não só uma

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 180

estrutura, mas uma linguagem para comunicar a missão e a estratégia a todos os

funcionários.

Ao integrar os resultados desejados pela empresa com os indicadores, a direção tem a

expectativa de canalizar as energias, as habilidades e os conhecimentos específicos das

pessoas no conjunto da organização para alcançar as metas de longo prazo.

As quatro perspectivas do BSC devem ser equilibradas, são elas, conforme a elaboração

proposta por Marinho:

a) Perspectiva Financeira: Os objetivos financeiros representam a meta de longo prazo

da empresa : gerar retornos superiores a partir do capital investido na unidade de

negócios. O uso do Balanced Scorecard não conflita com essa meta vital. Na realidade

, o Balanced Scorecard permite tornar os objetivos financeiros, como lucratividade,

retorno dobre os ativos e aumento de receita, explícitos , e ajustá-los às unidades de

negócios nas diferentes fases de seus ciclos de vida e crescimento.

b) Perspectiva do Cliente: Identifica os seguimentos de clientes e mercados nos quais a

unidade de negócios competirá e as medidas do desempenho da unidade nesses

segmento salvo. Entre as medidas essenciais de resultado estão a satisfação do

cliente, a retenção de clientes, a aquisição de novos clientes, a lucratividade dos

clientes e a participação em contas ( clientes ) nos segmentos-alvo.

c) Perspectiva dos Processos Internos : Identifica os processos internos críticos nos

quais a empresa deve alcançar a excelência. Esses processos permitem que a unidade

de negócios ofereça as propostas de valor capazes de atrair e reter clientes em

segmentos-alvo de mercado e satisfaça às expectativas que os acionistas têm de

excelentes retornos financeiros.

d) Perspectivas de Aprendizado e Crescimento : Identifica a infra-estrutura que a

empresa deve construir para gerar crescimento e melhoria a longo prazo. As

perspectivas do cliente e dos processos internos identificam os fatores mais críticos

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 181

para o sucesso atual e futuro. É improvável que as empresas sejam capazes de atingir

sua metas de longo prazo para clientes e processos internos utilizando as tecnologias

e capacidades atuais. Além disso, a intensa competição global exige que as empresas

melhorem continuamente sua capacidade de oferecer valor a clientes e acionistas.

O BSC tem no equilíbrio das várias dimensões de resultados da empresa sua idéia-força. Ele

articula conceitualmente meios e fins, conforme a figura a seguir demonstra como exemplo

para o mundo corporativo:

Para o setor público ou qualquer outro tipo de organização poderíamos adaptar a lógica do

BSC conforme o diagrama a seguir. O importante é seguir a articulação entre os vários

componentes.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 182

A estratégia para o BSC é um conjunto de hipóteses de causa e efeito, a implementação

depende da compreensão desta relação, do alinhamento dos recursos disponíveis e do

engajamento de toda a organização. Kaplan e Norton sugerem os seguintes passos para

implantar o BSC e viabilizar o processo de implementação da estratégia:

1- Esclarecer e traduzir a visão e a estratégia;

2- Comunicar e associar objetivos e medidas estratégicas;

3- Planejar, estabelecer metas e alinhar iniciativas estratégicas;

4- Melhorar o feedback e o aprendizado estratégico.

A primeira etapa objetiva construir o consenso embasado na visão e na estratégia da

organização através de um conjunto integrado de objetivos e medidas, visando os

resultados. O segundo passo deve mobilizar os funcionários para os alvos a serem atingidos.

A compreensão da estratégia é condição-chave para o estabelecimento de metas. O terceiro

passo fixa as metas para os vários processos internos de aprendizado e crescimento, a

prioridade aqui é gerar caixa, faturamento. Numa organização pública este objetivo não é

importante, sendo substituído pela meta de redução de custos e aumento da satisfação dos

cidadãos.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 183

O quarto passo é considerado a inovação do BSC. Ele indica que a organização deve

aprender com os desvios e as falhas de percurso, corrigindo rotas e o prumo. Isto implica

que novas estratégias poderão surgir, inclusive não previstas na formulação original do

plano. Este processo de feedback de aprendizagem foi incorporado a partir de outras teorias

de gestão.

O BSC organiza estas informações no chamado “mapa estratégico”. O mapa correlaciona os

objetivos nas várias dimensões com a visão e a missão da organização. Segundo os criadores

do BSC o mapa estratégico tem várias funções, entre as quais:

1. Mostrar o destino estratégico: O mapa estratégico possibilita que uma organização

descreva

e ilustre, em linguagem clara e geral, seus objetivos, iniciativas e alvos; os indicadores

utilizados

para avaliar seu despenho e as conexões, que são o fundamento da direção estratégica.

2. Destacar o valor do capital intelectual: O mapa estratégico, ajustado à estratégia

específica da organização, descreve como os ativos intangíveis impulsionam melhorias de

desempenho dos processo internos da organização, que exercem o máximo de alavancagem

no fornecimento de valor para os clientes, os acionistas e as comunidades.

3. Representar visualmente a estratégia; O mapa estratégico é a representação visual da

estratégia, mostrando numa única página como os objetivos nas quatro perspectivas se

integram e combinam para descrever a estratégia.

4. Ligar o trabalho individual à estratégia: Com o mapa estratégico, os empregados têm

uma representação visual de como suas funções se conectam com os objetivos gerais da

empresa, ao mesmo tempo em que os gerentes compreendem com mais clareza a estratégia

e identificam os meios para detectar e corrigir os desvios de rumo.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 184

5. Demonstrar o fluxo de valor: Os objetivos nas quatro perspectivas são conectados uns

aos outros por relações de causa e efeito. A partir do topo, parte-se da hipótese de que os

resultados financeiros só serão alcançados se os clientes-alvo estiverem satisfeitos.

6. Reforçar a importância do conhecimento: O fundamento de qualquer mapa estratégico é

a perspectiva de aprendizado e crescimento, que define as competências e habilidades

essenciais, as tecnologias e a cultura organizacional necessárias para suportar a estratégia da

empresa.

A estratégia é um processo contínuo na orgnização, não deve ser algo distante reservado

somente às salas luxuosas dos altos dirigentes. Este desdobramento para toda entidade é

feito através de processos de comunicação e educação permanentes, do desenvolvimento

de competências e sistemas de avaliação. Daí porque muitas organizações fazem o Mapa

Estratégico para subsidiar os programas de capacitação e formação de pessoal. Além disto,

um sistema de incentivos e recompensas deve mostrar a conexão da performance individual

com a performance de toda a organização.

Algumas críticas tem sido feita ao BSC pela sua unidirecionalidade aos resultados

financeiros. Ele por si só não contemplaria os fatores complexos de uma organização como a

análise do ambiente externo ou restrições mais estruturais. Ele seria pouco dinâmico e suas

relações de causa e efeito muito simplificadoras. A relação entre planejamento e execução

permanece fragmentada no esquema do mapa estratégico. Apesar disto, ele tem se tornado

muito usual em organizações publicas e privadas.

No setor público a dimensão financeira não tem o mesmo enfoque que no setor privado. Os

órgãos fazendários por exemplo, adotam a perspectiva fiduciária, outros adotam a

perspectiva da execução orçamentária. A perspectiva dos cliente pode ser substituída pela

perspectiva dos cidadãos e/ou contribuintes. A perspectiva do aprendizado no setor público

é ainda mais importante que no setor privado. Como a estabilidade de emprego, sem um

potente sistema de motivação funcional e avaliação de desempenho, funciona como fator

de acomodação e queda de produtividade.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 185

A metodologia do “5W2H”

Esta metodologia, na verdade é uma técnica muito simples e efetiva de organizar reuniões,

assuntos, preparar processos de planejamento de forma rápida e direta. Ela surgiu na área

de comunicação social como uma orientação aos jornalistas para elaboração das matérias,

procurando identificar rapidamente todos os pontos que seriam importantes para relatar

um evento ou caso.

O método é um check-list de várias perguntas formuladas originalmente em ingles como

segue:

• What? O quê? Qual?

• Who? Quem?

• Where? Onde?

• When? Quando?

• Why? Por quê?

• How? Como?

• How much? Quanto custa? Qual será o investimento necessário?

Ele pode ser utilizado também para mapear e identificar processos. Como não requer maior

fundamentação teórica ou assessoria externa é de emprego universal. A idéia é que sua

aplicação de origem a um “plano de ação” para enfrentar uma situação problemática ou

aproveitar uma oportunidade. Como segue;

PLANO DE AÇÃO

1. O que fazer?

2. Por que faze-lo?

3. Quem o fará?

4. Quando será feito?

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 186

5. Onde será feito?

6. Como será feito (método)?

7. Quanto custará a ação?

Na figura a seguir ssão resumdas as principais perguntas do “5W2H”:

A Análise de SWOT

Esta é outra metodologia ou mais corretamente falando, outra técnica de pronto emprego

para uso em reuniões, processos de planejamento rápido ou mapeamento de processos. A

implementação do SOWT, que quer dizer forças, fraquezas, oportunidades e ameaças

depende do detalhamento destes quatro pontos, como segue:

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 187

a) Forças : Determine os pontos fortes de sua organização. Isto deveria ser de ambos seus

clientes internos e externos. Não seja humilde; seja tão pragmático quanto possível.

Questões básicas :

• Há qualquer vantagem sem igual ou distinta que faz sua organização se destacar?

• O que faz com que os clientes escolham sua organização ao invés da concorrente?

• Há qualquer produto ou serviços que o concorrente não pode imitar (agora e no futuro)?

b) Fraquezas : Determine as fraquezas de sua organização, não somente de seu ponto de

vista, mas também, o mais importante, de seus clientes. Embora possa ser difícil para a

organização reconhecer suas fraquezas, é melhor encarar a realidade , sem procrastinar.

Questões básicas :

• Existem operações ou procedimentos que podem ser melhorados?

• No que ou por que seus concorrentes operam melhor que a sua organização?

• Existe algo inoperante da qual sua empresa deveria estar ciente?

• Seus concorrentes tem um certo segmento de mercado conquistado?

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 188

c) Oportunidades : Outro fator importante é determinar como sua organização pode

continuar a crescer dentro de seu mercado. Afinal, oportunidades estão em todo lugar, tais

como mudanças na tecnologia, política governamental, padrões sociais.

Questões básicas :

• Onde e quais são as oportunidades atrativas dentro do seu mercado?

• Existe alguma nova tendência surgindo dentro do mercado?

• Quais as perspectivas futuras da sua empresa que possam vir a descrever novas

oportunidades?

d) Ameaças : Ninguém gosta de pensar em ameaças, mas nós ainda temos de enfrentá-las,

apesar do fato que elas são fatores externos que estão fora de nosso controle. É vital estar

preparado e enfrentar as ameaças durante situações de turbulência.

Questões básicas :

• O que seu concorrente está fazendo que está suprimindo seu desenvolvimento

organizacional?

• Existe alguma mudança na demanda do consumidor, que pede por novas exigências de

seus produtos e serviços?

• As mudanças tecnológicas estão afetando sua posição dentro do mercado?

A análise SOWT acontece quando os quatro quadrantes estão preenchidos, veja a figura a

seguir. Em cada quadrante há uma configuração específica e uma indicação que ajuda o

planejador a determinar o que fazer. Por exemplo, no quadrante onde estão combinadas as

forças (internas) com as oportunidades (externas) há claramente uma indicação das

prioridades da organização, do seu foco de ação, daquilo que a distingue das demais e que é

sua força. Já o oposto, no quadrante de confluência das ameaças (externas) com as

fraquezas (internas) há um sinal de alerta, uma indicação de estratégia defensiva ou de

sobrevivência num cenário hostil.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 189

A análise SWOT pode ser muito útil como ferramenta auxiliar para fomentar um

brainstorming no início de um debate sobre cenários futuros para a organização ou

seminários de planejamento estratégico. O SWOT é especialmente útil para a gestão de

riscos porque permite visualizar num mesmo quadro fontes internas e externas de riscos

para os projetos e ações.

Deve-se ter o cuidado para não congelar a análise, a realidade é dinâmica e os pontos mais

importantes devem ser monitorados o tempo todo. Ainda mais porque boa parte das

informações dependem de eventos externos, muitos fora da governabilidade da

organização.

Debatendo o tema do monitoramento e da avaliação das ações de gestão

Uma das características da gestão inovadora é a crescente difusão de técnicas de avaliação.

Sabemos que o que não pode ser medido, não pode ser avaliado nem melhorado de forma

eficaz. A primeira dificuldade na avaliação de um projeto (ou uma política pública) é

encontrar arquiteturas metodológicas ou desenhos de projetos que não foram feitos para

serem avaliados. Se o projeto não resulta de uma metodologia consistente de planejamento

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 190

estratégico, ou seja, não avalia a situação inicial com a devida profundidade é impossível

avaliar impactos ou resultados de forma conclusiva.

Pode-se também fazer uma avaliação geral do desempenho institucional, como suger o

quadro a seguir. Neste caso os principais indicadores seriam:

• Indicadores de resultados: apresentam os resultados da ação, tais como Taxa de

mortalidade infantil, número de idosos vacinados, etc;

• Indicadores de eficácia: descrevem a eficácia da administração, ou o alcance das

ações e dos objetivos propostos, tais como: Redução da taxa de mortalidade infantil,

redução da criminalidade, etc;

• Indicadores de funcionamento: descrevem a eficiência dos processos de trabalho,

tais como: tempo de atendimento no posto de saúde, custo da vacinação por criança

vacinada, etc; Indicadores de recursos: estão relacionados à alocação e à gestão dos

recursos orçamentários-finaceiros destinados à organização;

• Indicadores sócio-econômicos: descrevem o ambiente econômico em que a

organização atua: Renda per capita, taxa de crescimento do produto interno bruto;

• Descritores: mostram a administração do ponto de vista da sua organização interna.

Número de servidores, servidores por escolaridade, nível de informatização, etc.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 191

Entretanto, vamos focar nossa atenção no nível dos projetos e ações. Compreender um

projeto é antes de tudo apreender a complexidade do problema que o determinou,

complexidade entendida como uma situação onde não é possível separar saberes de forma

independente (o econômico, o político, o psicológico, por exemplo), o recorte acadêmico

das disciplinas especializadas torna a complexidade dos problemas um ente abstrato,

desprovido de concretude e conexão com outros elementos. Assim a avaliação deve

enfrentar este primeiro desafio, apreender a multidimensionalidade dos fenômenos, recusar

a formalização arbitrária que separa saberes.

Os processos de avaliação podem apresentar sintomas de fracasso antecipado como: muitas

vezes a avaliação é dispensada quando é possível, gera ansiedade e reações defensivas ao

invés de receptividade, dificuldade de definir critérios justos para realizar avaliações, o

processo avaliativo não gera informações úteis para a decisão dos gestores, não há definição

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 192

compartilhada entre avaliados e avaliadores sobre os objetivos da avaliação, muitos

processos reais de decisão são ocultos e não-transparentes, objetos avaliados com mesmos

procedimentos apesar de níveis de complexidades diferenciados, falta de pessoal treinado,

etc.

A avaliação é base do aprendizado, suporta a tomada de decisão e viabiliza o controle social.

O maior problema apontado é a desconexão existente entre o processo de monitoramento

(que é pré-condição para a avaliação) e o processo propriamente dito de avaliação com os

procedimentos decisórios reais da organização. Uma das causas desta ritualização e

burocratização dos processos avaliativos é a pretensão ilusória de produzir informação

completa, aparentemente neutra e objetiva, sobre problemas do tipo quase-estruturados,

cuja natureza é difusa e leitura dependente do universo ideológico-cognitivo do observador.

Segundo os princípios metodológicos de planejamento aqui apresentados a avaliação de

projetos ou de políticas só adquire capacidade de impulsionar a cultura de planejamento,

isto é, funciona como um “motor” para ampliar os níveis de planejamento sistêmico se, e

somente se, for conectada aos processos de tomada de decisão, ao modo como o “governo

se governa”.

A atividade mesma de avaliar é compreendida de diferentes maneiras. Não é raro que

pessoas ligadas a instituições, programas e projetos, na posição de objeto da avaliação,

considerem-se a caminho do cadafalso. Muitos avaliadores, por outro lado, sentem-se mais

realistas do que os reis, mais poderosos e oniscientes que os deuses do Olimpo. Entre os que

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 193

se dedicam ao tema, há razoável consenso de que o processo avaliativo exitoso possui

quatro características fundamentais: (i) deve ser útil para as partes envolvidas no processo;

(ii) tem que ser oportuno, ou seja, realizado em tempo hábil para auxiliar a tomada de

decisão, que é um processo incessante; (iii) tem que ser ético, isto é, conduzido de maneira a

respeitar os valores das pessoas e instituições envolvidas, em um processo de negociação e

de entendimento sobre os critérios e medidas mais justas e apropriadas; (iv) tem que ser

preciso, bem feito, adotando-se os cuidados necessários e os procedimentos adequados

para se ganhar legitimidade.

Será tentando sempre fazer esta conexão – que confere legitimidade e por isso, aceitação e

compartilhamento da avaliação – que esta metodologia foi desenvolvida. A qualidade de

avaliação e monitoramento de um projeto depende diretamente da qualidade do desenho

global do projeto. Por exemplo, se a identificação do problema, suas causas, sintomas e

efeitos na fase inicial do planejamento estratégico foi incompleta, parcial ou insatisfatória,

provavelmente será muito difícil obter eficácia no monitoramento do projeto simplesmente

porque não se sabe o que está sendo resolvido, não há como saber se o problema está

diminuindo ou aumentando no decorrer da gestão. Outra condição necessária para a

avaliação é a elaboração de um bom projeto no seu aspecto operacional.

A Matriz do Quadro Lógico fornece, se bem elaborada, um pré-desenho estrutural do

projeto, mas há informações adicionais que devem ser detalhadas. Na literatura sobre

projetos há vários nomes para esta etapa: “projeto operacional” ou “projeto executivo”, o

que merece toda atenção agora é o detalhamento operacional da MQL. Além dos

indicadores para os vários níveis que já devem estar prontos (assim como suas fontes de

verificação) serão necessários para cada atividade estabelecer - no mínimo - as seguintes

informações: (a) quais recursos serão necessários (já previamente debatidos na etapa da

MQL), (b) quais produtos serão gerados pela execução destas atividades, (c) precisar os

resultados previstos em cada uma delas (já previamente debatidos na MQL) e (d) quais os

participantes do grupo de planejamento serão responsabilizados pela coordenação de sua

execução.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 194

Outras informações adicionais são necessárias como o cronograma previsto de execução, as

interfaces internas e externas necessárias para obtenção dos produtos e resultados

previstos. O detalhamento de um projeto pode (e deve) ser feito detalhadamente

respeitando sempre o princípio de envolver diretamente no planejamento das atividades os

grupos ou pessoas envolvidas na sua execução. O grau de agregação de atividades em um

projeto, ou de combinação de vários projetos para formar um programa depende de vários

fatores, complexidade do problema que se quer resolver e correspondente complexidade do

quadro-lógico elaborado, tamanho e abrangência da organização, grau de conflito ou

interesses divergentes no público alvo do projeto, etc...

A avaliação do projeto será sempre uma avaliação situacional, isto é, será sempre um juízo

técnico e político na conjuntura de execução do projeto, que permite captar e avaliar a

realidade, analisar o desenvolvimento inicial de novos problemas e avaliar a direcionalidade

geral do planejamento estratégico. Só faz sentido avaliar a eficácia, eficiência e efetividade

de um projeto dentro do contexto mais complexo de avaliação do planejamento estratégico,

da conjuntura presente e futura (cenários) e da própria evolução da organização que

planeja.

Portanto deve-se recusar totalmente padrões de conduta e procedimentos burocráticos e

formalistas, comuns em algumas áreas do setor público, que costumam avaliar projetos

ignorando a complexidade do sistema social e a cultura organizacional. A avaliação

situacional é aquela que, a partir do ponto de referência teórico e ético-moral daquele que

faz a avaliação, é capaz de apreender esta realidade complexa e contraditória. Neste sentido

a avaliação de um projeto é feita previamente quando é analisada a viabilidade do projeto,

se as suposições são verdadeiras, o projeto é localizado dentro dos vários cenários do

planejamento estratégico, as opções estratégicas em relação aos demais atores são

revisadas, etc..., e a avaliação a posteriori quando o projeto está em execução ou já produziu

os resultados esperados.

É esta segunda avaliação que demanda um bom desenho operacional e um conjunto de

indicadores, inclusive indicadores associado à evolução do problema inicial que estimulou a

criação do projeto. Normalmente indicadores que monitoram a situação problemática inicial

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 195

estão associados ao objetivo do projeto ou ao objetivo superior da organização porque há

sempre uma relação lógica entre objetivo da organização e a seleção do problema. Por

exemplo, um problema declarado da seguinte forma “o sistema de transporte urbano é

ineficiente” está obviamente associado ao objetivo do órgão público, gestor do sistema, em

garantir eficiência, eficácia, qualidade,..., ao sistema de transporte urbano.

As características básicas do sistema de avaliação devem ser:

• Objetividade: entendida como capacidade de apreender a realidade a partir de

determinada referência situacional, explicitada por quem observa e faz a análise. Ser

objetivo não é “ser neutro” ou “imparcial”, mas analisar a realidade com a máxima

consciência possível dos próprios viéses e distorções de foco (admitir uma certa

“cegueira situacional”).

• Completa: significa uma negociação permanente entre o que é viável e factível e o que é

ideal e perfeito, dados coletados à exaustão geralmente tornam o processo avaliativo

nebuloso e difuso, há necessidade de focalização é permanente.

• Validade e confiabilidade: exige coerência entre os instrumentos e conceitos usados pela

medição e o que se pretende medir. Depende da estabilidade e qualidade dos dados

coletados.

• Qualidade: é a adequação entre a informação obtida e o uso que se quer, é uma

condição necessária para a boa avaliação.

• Estabilidade: desde que sejam adotados os mesmo métodos e conceitos, os resultados

da avaliação não devem variar com o avaliador.

As avaliação podem ser classificadas de acordo com o momento em que se realizam, em

função de quem realiza a avaliação, em função da escala do projeto e ainda em função dos

destinatários da avaliação.

A primeira tipologia diz respeito à avaliação (a) ex-ante e (b) avaliação ex-post. Como o nome

sinaliza na avaliação anterior à realização do projeto o objetivo fundamental é definir se o

projeto deve ou não ser implementado. Em alguns casos é possível aplicar o método da

Análise Custo-Benefício (ACB) e a Análise Custo-Efetividade (ACE) para hierarquização entre

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 196

vários projetos alternativos. O primeiro método para avaliação de projetos econômicos e o

segundo para projetos sociais. Na avaliação posterior (b) a dimensão temporal permite dois

níveis de análise:

(a) Avaliação de processos: realizada durante a execução do projeto para determinar o grau

de compatibilização entre os objetivos do projeto e os componentes do projeto, de

forma periódica, com foco na eficiência da operação do projeto.

(b) Avaliação de impacto: procura determinar se o projeto está alcançando seus objetivos e

quais os efeitos secundários.

A avaliação de processo “olha para frente” , enquanto a avaliação de impacto “olha para

trás”, verificando se o projeto funcionou ou não. No primeiro caso os “clientes” da avaliação

são os responsáveis diretos pelo projeto, no segundo caso são os gestores públicos ou a

agências financiadoras.

Em função de quem realiza a avaliação pode-se desenvolver a (a) avaliação externa, com

mais ênfase na metodologia, (b) avaliação interna, com provável ênfase no conteúdo do

projeto (c) avaliação mista, combinando os dois processos e (d) avaliação participativa. Esta

última adquire especial importância nos processos avaliativos porque introduz na cena

institucional um elemento estratégico para a natureza participativa do planejamento

público: a oportunidade de participação e protagonismo do público-alvo, dos beneficiários

das políticas e projetos públicos.

A criação de mecanismos e instrumentos de uma avaliação participativa (que depende

muito do tamanho e natureza do projeto) cria os elementos essenciais de adesão da

população ao processo de planejamento e com efeito de compromisso coletivo sobre o

balanço crítico, as eventuais correções de rumo e os ajustes a fazer. A estratégia da

avaliação participativa cria uma espécie de compartilhamento entre os gestores e a

finalidade do projeto.

Em relação á escala dos projetos a avaliação as estratégias são diferenciadas, projetos

grandes demandam uma avaliação mais analítica e objetiva enquanto os pequenos a ênfase

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 197

é mais qualitativa. A lógica da avaliação de grandes projetos é mais dedutiva, exigindo a

construção de variáveis, indicadores, desagregando partes e depois reconstruindo um

conceito mais geral. Nos pequenos projetos a lógica é mais indutiva, o avaliador julga o

projeto como um todo mais facilmente.

As técnicas de avaliação dos grandes projetos são mais quantitativas, já nos projetos de

menor escala pode-se aplicar mais facilmente técnicas relacionadas aos métodos

qualitativos relacionados, por exemplo, à antropologia cultural, à etnografia, pesquisa

participante, histórias de vida, etc...O próprio avaliador em projetos pequenos tem mais

interações com os gestores e o público-alvo, os resultados são quase colocados em

perspectiva pessoal, fato quase impossível em projetos de maior porte.

As avaliações podem variar também conforme for a resposta a uma pergunta simples e

direta: para quem avaliar ? Toda avaliação prepara um momento de transição para a

tomada de decisão, mesmo que a decisão seja manter o que está sendo feito ou projetado

conforme a idéia original. A complexidade da avaliação depende, assim, dos destinatários

finais do relatório, quem deverá decidir sobre o processo final, dirigentes da alta direção da

organização, quadros intermediários ou responsáveis executivos e operacionais. Neste

sentido mesmo que haja uma base comum para a produção do relatório de avaliação, o seu

uso é obviamente seletivo dentro da organização.

Uma síntese geral sobre os procedimentos gerais de avaliação pode ser a seguinte:

• a avaliação não é um elemento agregado ao design organizacional de instituições do

setor público, mas é parte integrante da função de aprendizado institucional;

• a distinção entre avaliação cumulativa e formativa é ilusória: avaliações cumulativas

visam à melhoria da administração do setor público, exatamente como a avaliação

formativa. Uma avaliação cumulativa que não seja formativa (isto é, que não contribua

para a tomada de decisão aprimorada) é irrelevante e constitui uma perda de recursos;

• a responsabilidade é uma condição que permite governar melhor e a avaliação é um dos

instrumentos mais importantes para a melhoria do setor público, pois possibilita a

tomada e a prestação de contas pela atribuição de responsabilidade;

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 198

• para ser eficiente a avaliação precisa ser sustentada por uma cultura de aprendizado:

sem esta, corre o risco de se tornar um exercício irrelevante, ou pior, uma restrição

burocrática sufocante;

• como parte integrante do aprendizado organizacional, a avaliação é um processo

contínuo e interativo – uma conversa ou um discurso crítico com as pessoas envolvidas

na execução ou atingidas pelas políticas, programas, projetos avaliados e,

principalmente, com os que podem tomar decisões pertinentes;

• no setor público, a avaliação é ao mesmo tempo um medidor de eficácia e um veículo de

responsabilidade. Nesse sentido, é um instrumento indispensável ao governo.

Abaixo visualiza-se um exemplo baseado em aplicação real de uso do Marco Lógico em

projeto de geração de renda no contexto de sustentabilidade ecológica, reserva de biosfera

de cinturão verde. Observe o encadeamento da lógica horizontal (resultados decorrentes

das atividades e pressupostos) e da lógica vertical (relação entre impacto esperado, efeitos,

resultados e atividades).

Os indicadores possuem uma natureza qualitativa distinta relacionada a cada nível do

quadro (impacto, efeito e resultado), note-se ainda que a cada resultado previsto estão

associadas atividades e que entre os pressupostos das mesmas está o acesso às fontes de

financiamento e a disposição dos participantes para interagirem proativamente no processo

de elaboração/implementação do planejamento.

gestão pública inovadora – jackson de toni – dezembro de 2010 199

IMPACTO Melhoria da qualidade de vida de famílias pobres na região X, através de novos modelos de ação pública, tanto governamental como do terceiro setor.

INDICADORES IMPACTO 1) Ao menos 30 famílias/ano dispõem de segurança alimentar e habitação adequada. 2) Ações iniciadas servem de referência para projetos similares.

PRESSUPOSTO P/ SUSTENTABILIDADE 1) Fortalecimento das organizações da sociedade civil. 2) Consolidação da subprefeitura como indutor do desenvolvimento local.

INDICADORES 1) Atuação integrada e c/ continuidade 2) Subprefeitura tem capacidade para elaborar e executar novos projetos

EFEITO Desempregados, em especial jovens e adolescentes em situação de risco, dispõem de acesso a postos de trabalho na própria região e novas fontes de renda.

INDICADORES EFEITO 1) Ao final de cada ano, 30 jovens e/ou adultos dispõe de nova fonte de renda 2) Ampliação do volume de compra no crediário nas Casas Bahia.

PRESSUPOSTO P/ IMPACTO 1) Interrupção da expansão de loteamentos clandestinos. 2) Regularização fundiária. 3) Fim das obras públicas de grande degradação ambiental. 4) Melhoria da educação pública

INDICADORES 1) Estabilização da taxa de crescimento populacional. 2) Término do mercado imobiliário clandestino. 3) Vegetação intacta cobre todas áreas de manancial.

RESULTADOS 1) Criada, através de articulação entre diferentes organizações, uma incubadora de cooperativas. 2) Empreendimentos, individuais e cooperativados, de produção e comercialização de produtos agroecológicos são assessorados. 3) Empreendimentos, individuais e cooperativados, de ecoturismo e turismo histórico/cultural são assessorados. 4) Fórum de Desenvolvimento Regional congrega os principais atores e consolida identidade regional própria. 5) Gerência regional da ...... inserida ativamente como catalisadora de processos inovadores de desenvolvimento com foco na geração de trabalho e renda.

INDICADORES RESULTADO 1) Anualmente são aprovadas ao menos duas propostas de crédito pelo PROGER. 2) Anualmente criada ao menos uma cooperativa que sobrevive aos cinco primeiros anos. 3) Região X passa a figurar em guias e revistas de ecoturismo. 4) Região X registra segurança alimentar.

PRESSUPOSTO P/ EFEITO 1) Conselhos Gestores capazes de garantir uma política continuada de proteção e uso racional dos parques 2) Parceiros locais se envolvem ativamente no projeto ao longo do tempo. 3) Programas e projetos setoriais da Prefeitura de São Paulo são estendidos até a região X 4) Famílias apoiam processo de mudança iniciados através da empregabilidade. 5) Compras públicas são redirecionadas

INDICADORES 1) Continuidade das ações, mesmo após eleições 2) Disponibilidade de crédito e assessoria pela Prefeitura

ATIVIDADES 1.1) Articular parceria local 1.2) Articular assistência técnica e assessoria 1.3) Formatar currículo de capacitação 1.4) Fazer estudos de mercado (lixo; habitação popular; serviços p/ órgãos públicos; produção alimentos) 2.1) Fazer levantamento dos potenciais 2.2) Elaborar um plano de negócio piloto 2.3) Assessorar projeto piloto

3.1) Fazer levantamento 3.2) Articular parcerias 3.3) Assessorar projeto piloto 4.1) Assessorar reuniões regulares 4.2) Montar projeto de marketing regional 4.3) Formar banco de dados e projetos

PRESSUPOSTOS P/ RESULTADOS 1) Acesso a fontes de financiamento e assessoria técnica em manejo na Mata Atlântica. 2) Atores locais dispostos ao diálogo e crítica construtiva no âmbito do Fórum

INDICADORES 1) ONGs atuantes na Mata Atlântica prestam assessoria 2) Fundação de Meio Ambiente do Estado e Governo são acessados 3) Baixa rotatividade dos membros do Fórum

200

Uma palavra sobre a reengenharia e a análise de processos

O termo surgiu a partir de um livro de Michael Hammer no início dos anos noventa. A

reengenharia, como o nome diz, implicava num corte com a organização tradicional, um

processo agressivo de ruptura em direção ao modelo gerencial de flexibilidade, orientação

para os resultados e redefinição de processos decisórios, organogramas e chefias. Um dos

meios para isso era a aplicação intensiva das novas tecnologias de informação, em especial

os recuros da informatização e comunicação digital.

Uma das características principais da reengenharia é a identificação e o redesenho de

processos. Um processo é qualquer conjunto de decisões, estratégias, escolhas que

acontecem através de um fluxo de informação e decisão e que gera um resultado. Os

processos são formas de comunicação interna, mas também são formas de conexão da

organização com o meio exterior. Todos os produtos da organização podem ser

decompostos em processos maiores ou menores que se encaixam formando um mosaico,

uma paisagem dinâmica que envolve pessoas, recursos e tempo.

O detalhamento dos processos obedece a uma lógica precisa: quais atividades devem ser

realizadas para se obter o melhor resultado, que conhecimentos são necessários, que

informações devem ser disponibilizadas, que tipos de equipes serão capazes de assumir o

processo e liderá-lo ? Tudo o mais, que for excedente, obsoleto, desenecessário e peso

morto será cortado ou reduzido. Por isso a reengenharia foi muitas vezes confundida com

um movimento indiscriminado de cortes de pessoal e processos.

O redesenho de processos é o ponto alto da reengenharia. A intenção é otimizar os

procedimentos, se concentrar naquilo que o centro do negócio, a razão de existência da

organização. Neste trabalho os processos devem passar a ter objetivos e indicadores

mensuráveis e estarem vinculados intimamente á estratégia maior. A melhoria de processos

pode ser conduzida por consultores externos, mas deve ser protagonizada pelo pessoal da

organização, pelos próprios funcionários que vivem e se responsabilizam pelos processos.

201

Outro ponto importante é a prioridade na implantação do novo processo, mais do que seu

redesenho, de fato. Um novo processo implica em novas relações de poder, novas

competências. Isto afeta as relações interpessoais e tira muitos funcionários da sua zona de

conforto. Cria tensões e divergências que precisam ser trabalhadas para não deteriorar o

clima organizacional. A gestão da mudança nos processos é seu ponto mais crítico

Assim a reengenharia constitui-se num esforço organizado, que envolve toda a empresa com

o objetivo de mapear e redesenhar todos os processos. Se for necessários reformulando-os

completamente para aumentar a produtividade, a qualidade dos serviços, reduzir custos e

satisfazer os clientes.

Facilitação de grupos e técnicas de moderação

A aplicação de metodologias de planejamento exige sempre e em todos os casos um

processo de interação entre pessoas, este processo é fundamentalmente um momento de

aprendizagem coletiva. A moderação ou facilitação deve a um só tempo promover a

organização e coordenação necessária no processo de planejamento, estimular a

participação de todos envolvidos (isto é crucial em metodologias participativas) e motivar o

grupo para construir soluções de compromisso, sínteses político-administrativas capazes de

coesionar o grupo (da direção à base) em direção aos objetivos estratégicos da organização.

Portanto, aqui tem-se um primeiro alerta: moderar grupos não é tarefa fácil, especialmente

se os grupos apresentam algum grau de conflito interno ou disputas políticas mal

processadas e resolvidas, eventos comuns no cotidiano da administração pública. A

aprendizagem é muito mais do que a mera transferência de conhecimentos, o processo de

construção congnitiva da realidade é essencialmente subjetivo, racionalidade, não-

racionalidade, conhecimento e intuição, ciência, lógica e arte se misturam inexoravelmente.

A moderação de grupos deve saber potencializar virtudes e trabalhar as debilidades do

grupo para que o produto seja resultado desta permanente interação, por isso, a

importância da metodologia capaz de garantir a expressão comunicativa do grupo entre si.

202

As técnicas e dinâmicas de grupo – muitas vezes utilizadas de forma automática e

burocrática – servem basicamente a este propósito, viabilizar formas de expressão, de

contato, de aproximação com “o outro” utilizando processos não-verbais, trabalhando a

carga afetiva, o universo de sentimentos e as competências interpessoais. Resumindo, a

moderação de grupo requer toda uma “dramaturgia” que envolve desde as adequadas

condições físicas e materiais até a perícia pessoal de quem está protagonizando este

importante papel.

Em síntese as principais variáveis que afetam este processo são: (a) a interação provocada

entre elementos cognitivos, afetivos e psicomotores (atitudinais), (b) a experiência pessoal

vivenciada por cada elemento do grupo e sua identidade coletiva prévia, (c) os diversos

estilos de aprendizagem dos participantes, (d) a capacidade do moderador em manter e

conduzir o processo de aprendizagem de forma aberta e flexível e (e) a correta combinação

de técnicas de trabalho e aprendizagem com instrumentos metodológicos adequados

(dinâmicas, jogos, simulações, etc...).

A dinâmica de evolução do grupo

Um grupo pode ser considerado como um campo de forças onde elementos bem definidos

estão presentes. Segundo Moscovici estes elementos são: (1) Objetivos: até que ponto o

objetivo do grupo é suficientemente claro e aceito por todos? Há convergência entre

objetivos individuais e do grupo ? (2) Motivação: qual o nível de envolvimento real nos

problemas do grupo ? Quanto tempo e energia é efetivamente devotada ao grupo ? (3)

Comunicação: há espontaneidade ou distorção na recepção das mensagens ? Há troca de

feedback ? (4) Processo decisório: o grupo decide por imposição de quem tem o poder, por

votação ou consenso ? (5) Relacionamento: são de competição, cooperação ou conflitivas ?

Como o grupo resolve relacionamentos conflitivos ? (6) Liderança: como é exercida e quais

seus estilos ? Como o poder se distribui no grupo ? e (7) Inovação: como o grupo recebe

idéias novas ? De que forma os procedimentos são modificados ? Estes sete elementos

definem a dinâmica do grupo, isto é, seu modo de funcionamento.

203

No processo de planejamento o grupo é desafiado a olhar criticamente para a trajetória da

organização de que faz parte, sua situação atual e conformação de uma situação objetivo no

futuro. Este momento mobiliza forças variáveis que afetam diferenciadamente estes sete

componentes, momentos de otimismo e euforia podem dar lugar à frustração e decepção na

medida em que o processo de planejamento não atingir seus objetivos.

Deve-se lembrar que a elaboração de um plano ou projeto é apenas parte do processo de

planejamento, na verdade, o processo que envolve o amadurecimento coletivo de uma

equipe dirigente ou um setor qualquer é tão ou mais importante que o resultado final

desejado por todos, de qualquer forma, o planejamento é um traço cultural e uma prática

permanente de gestão estratégica.

Se a dinâmica de um grupo não reproduz os movimentos ritmados de uma máquina que

pode ser previamente programada, também não é verdade que toda experiência grupal é o

conflito permanente. Na verdade todo grupo evolui num processo constante de adaptação,

luta por seus objetivos, integração entre as partes e manutenção de um padrão

comportamental, até que fatores internos ou externos estimulem novos processos

adaptativos, ou seja, a dinâmica de um grupo no processo de planejamento é sempre uma

oscilação entre padrões de conflito e equilíbrio precário. O moderador deve ter a

capacidade de distinguir tais movimentos, considerando os aspectos da personalidade de

cada participante, promovendo inclusive integração emocional e afetiva.

O conflito de opiniões na dinâmica do grupo é normal, desejável e inevitável. A natureza

legítima do conflito decorre de posicionamentos situacionais diferenciados entre os

membros do grupo (fontes de informação, objetivos pessoais, crenças, sentimentos, etc...) e

não deve ser bloqueada ou tratada com fugas e evasivas pelo grupo. Será preciso identificar

a natureza das diferenças, as condições subjacentes ou o contexto e o seu estágio de

evolução, dos primeiros sintomas até a radicalização e disputa aberta dentro do grupo.

Nos processos de planejamento é impossível evitar conflitos através da escolha prévia dos

participantes a partir de uma mesma posição ou referência política pois nos processos

participativos de fato há sempre uma parte do grupo de planejamento que representa

204

posições eleitas ou delegadas de setores da organização, nem sempre em estrito acordo

com os princípios da direção. De qualquer forma a pior opção no enfrentamento das

diferenças internas é deixar que a lealdade baseada unicamente na hierarquia ou o medo de

reprovação e punição do chefe reprimam a criatividade que só se desenvolve quando as

diferenças afloram livremente.

A superação das divergências passa também pela criação de uma atmosfera organizacional

(ou clima) que deixe as pessoas à vontade para se exporem sem medo ou ameaças (veladas

ou diretas). A ameaça de um chefe que levanta a voz ou assume uma postura corporal

agressiva e hostil, por exemplo, gera um reflexo defensivo por parte dos funcionários, reduz

a tolerância recíproca às diferenças e ambigüidades, à incerteza do novo e não-familiar.

Liberdade para expressar-se sem censura ou possibilidade de retaliação são fundamentais

para aprender a conviver com as diferenças. A saída mais adequada nestes casos é criar as

condições para transformar diferenças em soluções de problemas:

“esta abordagem de resolução de problemas ajuda a lidar com sentimentos que

acompanham discordâncias, tais como frustração, ressentimentos, hostilidade. Através

de aceitação e colocação aberta de sentimentos, o líder ajuda a evitar a repressão de

sentimentos que explodiriam em ocasiões inoportunas. Auxilia também a canalizar

energia gerada por sentimentos para atividades construtivas ao invés de destrutivas. O

conflito em si tende a fazer com que o indivíduo procure meios de enfraquecer e minar

os que discordam dele, ao passo que a abordagem de resolução de problemas leva o

indivíduo a aceitar as discordâncias como sendo potencialmente vantajosas e

enriquecedoras a seus próprios objetivos, idéias e procedimentos” (Moscovici, 2001, p.

151)

É óbvio que esta opção exige mais tempo, dedicação e método, sob pena de aguçar ainda

mais o conflito para posições irreconciliáveis o que comprometeria a existência do grupo

enquanto grupo, o mais cômodo seria acomodar ou conformar-se com as diferenças.

Toda diferença gera conflito, todo conflito deve ser superado positivamente, uma nova

síntese deve surgir e isto representa mudança no comportamento e na dinâmica do grupo.

205

Toda mudança implica em resistência que pode ser - caso seja uma reação normal e sadia –

um processo de adaptação transitória, de instabilidade passageira diante de um novo padrão

que ameaça costume e prática familiares. Há várias formas de reação à mudança: bloqueios,

fuga, mecanismos de defesa, seletividade perceptiva, esquecimentos seletivos,

racionalizações, etc... Cabe ao moderador ou facilitador do grupo ajudar a transformar

progressivamente a insegurança diante da necessidade de mudança em níveis maiores de

autonomia e previsibiliade.

As fases de evolução psico-social dos grupos podem assumir durações variadas, o

moderador deve estar alerta para manter os objetivo do seminário de planejamento, para

isso deve manter sempre um argumento de autoridade em relação ao grupo, evitando

reproduzir relações autoritárias presentes eventualmente na organização:

(1) Aquecimento ou

quebra-gelo

A dependência do moderador é grande, os participantes testam o

moderador e definem os espaços de poder de cada um, fase tensa e

fundamental para começar bem o trablho de moderação.

(2) Disputa interna e

definição de papéis

O moderador estabelece as regras do jogo do grupo, objetivos e

organização interna, os participantes assumem diversos papéis, a

liderança interna se consolida, há mais segurança e confiança no

trabalho do moderador, os bloqueios diminuem.

(3) Surge um padrão de

relacionamento

Os participantes estabelecem um padrão de comunicação, a

conversa flui com mais clareza e objetividade, os sentimentos são

manifestados com mais sinceridade e solidariedade interna. Os

conflitos tornam-se mais explícitos e sistematizados.

(4) Diferenciação e

criatividade

Os participantes adquirem mais autonomia e eficiência. Os conflitos

começam a ser processados positivamente, novas identidades dentro

do grupo são recriadas, a dependência do moderador diminui.

(5) Integração e

maturidade

O grupo atinge o momento de maior coesão interna sobre pontos

importantes de divergências, os conteúdos emocionais e afetivos são

manifestados naturalmente e aceitos pelo grupo.

206

(6) Autonomia

É a fase de “terminação” da experiência de grupo, de retorno às

funções rotineiras, agora iluminadas sob a inspiração pessoal e

coletiva vivida no grupo. Cada participante se sente desafiado a

reproduzir no seu cotidiano o aprendizado do grupo.

Nos grupos os pontos mais críticos são como as pessoas lidam com o conflito, uma forma

esquemática de representar a evolução do conflito no grupo está mostrada a seguir.

Técnicas e dinâmica para o trabalho com grupos

Os jogos dramáticos e as dinâmicas de grupo tem demonstrado enorme utilidade no

processo de moderação de grupos de planejamento estratégico por razões evidentes: o jogo

estabelece uma “ordem lúdica” que ao interromper temporariamente a rotina de trabalho,

possibilitando a um só tempo estimular a criatividade, a espontaneidade e o convívio

democrático (por exemplo, entre pessoas de relação hierárquica subordinada), além de

ajudar no processo de maturidade do grupo na medida em que o processo de planejamento

avança e gera tensões.

207

O simples domínio de uma ferramenta específica, por exemplo, a aplicação de um “júri

simulado” para aprofundar determinado tema, não faz do moderador um especialista em

dinâmicas de grupo, muito menos em metodologia de planejamento. O idealmente

recomendável é planejar processos de planejamento estratégico participativos com a co-

moderação de especialistas neste temas, geralmente psicólogos organizacionais e outros

profissionais.

Então estes são os principais alertas sobre o uso indiscriminado ou amador de técnicas: (a) o

domínio de algumas técnicas não faz seu aplicador um mestre em dinâmicas de grupos,

quando se trata de mobilizar sentimentos todo cuidado é pouco e só a experiência

proporciona a sensibilidade para tratar com dinâmicas de grupo de forma produtiva, (b) não

confundir jogos e simulações com pirotecnia ou representações cênicas que se esgotam em

si mesmo, tudo deve fazer algum sentido para o grupo, para cada participante, para o

moderador, (c) cada situação demanda uma adaptação específica, não há receita universal

aplicada em todos os grupos, em todos os momentos, o moderador deve estar atento os

aspectos particulares de cada grupo e sua história.

A aplicação de técnicas de grupo sempre apresenta algum grau de resistência, os motivos

são diversos e complexos: o medo de exposição pública de deficiências ou falhas, o receio de

enfrentar situações que questionam papéis, funções e o status de cada um dentro do grupo,

a acomodação e o conformismo com vivências, sentimentos e problemas da rotina, etc... O

planejamento da atividade deve analisar detidamente o perfil do público envolvido, o

contexto em que os seminários ou oficinas de planejamento (ou projeto) estão se

realizando, as expectativas dos gestores ou direção das organizações, o grau de formação

escolar dos participantes, suas funções na organização e outras informações que ajudem na

concepção de cada dinâmica ou técnica a ser empregada em cada fase do processo de

planejamento ou elaboração do projeto de forma participativa, com menor resistência.

Situações limites que podem desencadear manifestações de angústia, depressão, raiva ou

agressividade devem ser encaminhadas com ajuda psicológica especializada. A experiência

da comunicação é fundamental na dinâmica de evolução do grupo e no trabalho do

moderador. A linguagem que usamos não só descreve uma realidade pré-existente como é

208

fonte geradora de novas realidades porque realizamos verdadeiros “atos de fala”:

prometemos, pedimos, ofertamos, afirmamos ou declaramos coisas, processos, pessoas,

realidades, etc... Assim a linguagem cria e recria constantemente o mundo e as pessoas, o

modo como as coisas são depende de como elas são ditas, as interpretações sobre o

mundo, portanto são fundamentais para a convivência entre pessoas, grupos, sociedades.

No grupo a comunicação ocorre sempre referenciada em dois processos distintos: uma fala

ou origem e uma escuta ou destino. Saber escutar as diferentes mensagens é fundamental,

entender qual sua história, origem, contexto cultural, ânimo,..., escutar é recriar uma

identidade com o interlocutor reinterpretando sua fala para fazer ou criar um novo sentido.

A técnica de moderação deve sempre considerar este processo de conversação. A técnica ou

dinâmica a ser utilizada é na essência uma processo de “conversação” do grupo entre si e

com o moderador. Cada processo de conversação tem uma natureza distinta, pode servir

para definir ações, possibilidades, justificativas ou simplesmente manter o processo de

conversação em aberto.

A moderação de grupos utiliza freqüentemente uma técnica básica para conduzir, motivar e

estimular processos comunicativos (conversações) no grupo: a pergunta com um fio

condutor do processo. A técnica de perguntar ao grupo pode ser uma das mais eficazes

ferramentas de moderação, na medida em que provoca, desafia, demanda uma resposta.

Toda pergunta do moderador deve almejar um objetivo preciso: o que, quem, quando,

como. Alguns elementos para utilizar corretamente esta técnica:

(a) perguntar com simplicidade e sem rodeios: perguntas diretas e ousadas tem o mérito de

despertar o grupo para ângulos ou ênfases de abordagem da temática (seja ela a

descrição das metas de um projeto ou a identificação de uma operação estratégica) até

então ocultas pelo senso comum. Saber ousar na formulação da pergunta, desafiando o

grupo e enfrentar seus limites implica em descortinar novas possibilidades de ação e

posicionamento no processo de planejamento. Enfim, a boa técnica de moderação faz

perguntas “que ninguém quer fazer”, isto é, a natureza das perguntas deve

209

“desacomodar” o grupo e não raramente, despertá-lo para o óbvio, nem sempre tão

evidente.

(b) Cada fase de evolução do grupo exige perguntas diferentes. Por exemplo, todo encontro

ou seminário de planejamento possui uma fase inicial de aquecimento, quebra-gelo e

reconhecimento mútuo entre os participantes, nesta etapa é completamente inócuo e

pode estressar prematuramente a relação com o moderador caso o mesmo insiste em

direcionar o ritmo do trabalho através de perguntas relacionadas às fases finais do

planejamento. Fazer a mesma pergunta num dependendo do grau de consolidação de

uma identidade básica e amadurecimento tem uma efeito completamente diferente.

(c) As perguntas podem ser abertas ou fechadas. As primeiras permitem iniciar um processo

de conversação mais espontâneo e livre, são mais adequadas para despertar a

criatividade e o aprofundamento de idéias do grupo, elencar a diversidade de opiniões,

checar a variedade de opções ou possibilidades que determinado assunto provoca ou

mobiliza. Geralmente começam com pronomes interrogativos: qual, o que, quando,

quem, etc...As perguntas fechadas embutem na própria sentença as opções de resposta,

direcionando mais o campo de possibilidades que provocam. Normalmente o

moderador utiliza este tipo de pergunta para valorizar, priorizar ou estabelecer

hierarquia entre opções disponíveis para o grupo em momentos de síntese de um

debate ou decisão. Entre a natureza “aberta” e a “fechada” das perguntas há outros

formatos que implicam, por exemplo, em perguntas que demandam uma escala ou

graduação da resposta (“Entre 1 e 10 qual a nota que você daria sobre....?”).

(d) Saber perguntar só adquire sentido se as perguntas estiverem organizadas numa

seqüência lógica. Alguns passos são indispensáveis: o que se quer com a pergunta, qual

o produto final esperado com a mesma e como a pergunta se relaciona com as demais,

tanto as precedentes como as seguintes. O seminário de planejamento pode assim ser

estruturado pelo moderador através de um verdadeiro “fio condutor” de

perguntas/conversações adequadas a cada fase de evolução do grupo e a cada

momento da metodologia de planejamento estratégico proposto.

210

Um quadro síntese deste processo das perguntas como fio-condutor:

Modalidade de

Perguntas

Modalidade de

Respostas

Procedimentos do moderador Características

Abertas

Fechadas

ou mistas (em

escala)

Em tarjetas

Lê a pergunta, define a tarjeta

para resposta, recebe e lê cada

tarjeta, provoca o debate no

grupo e monta um painel (ou

matriz)

Favorece maior

participação de todos,

exige menos tempo e

estimula capacidade de

síntese e objetividade

Verbal

Lê a pergunta, participantes

falam, moderador faz a síntese

em tarjeta ou próprio

participante, confirma o

argumento no grupo e monta o

painel negociando com todos

participantes.

Estimula maior

espontaneidade e

interação entre o grupo,

exige mais tempo, valoriza

o protagonista, quem está

falando.

Não-verbal

Lê a pergunta e define as

regras, participantes fazem

colagens ou desenhos ,são

apresentados e interpretados

pelo grupo. Moderador

sistematiza painel final.

Trabalha mais estados de

ânimo e o discurso não-

racional, ajuda a resolver

impasses prolongados,

estimula criatividade.

Outros aspectos relevantes para o uso e aplicação de dinâmicas de grupo:

(a) a formação de subgrupos: é um recurso muito utilizado para aprofundar temas

específicos simultaneamente e portanto, produzem economia de tempo, no máximo

oito participantes, criam um ambiente “menos hostil” para participação daqueles com

maior dificuldade de expressão ou timidez. Os subgrupos não devem diminuir ou

subtrair o poder deliberativo conclusivo da plenária, ao contrário, sua função é qualificar

o processo decisório. Podem ser agrupados por afinidade (tendência a reproduzir grupos

211

de interesses prévios ao seminário), de forma aleatória (facilita o entrosamento entre

cargos e funções hierárquicas distintas), para trabalhar temas particulares, etc...

(b) o momento inicial da apresentação: a fase mais tensa e importante da dinâmica do

grupo, é o momento de conter a ansiedade, demonstrar segurança e confiança no

trabalho que vai ser realizado. O processo deve começar pela apresentação dos

objetivos do evento e em seguida pela apresentação do próprio moderador, todos os

sinais (verbais ou não) são captados (escutados) pelos participantes. Em seguida a

apresentação dos próprios participantes deve ser desenhada de tal modo (uso de

técnicas e ferramentas) para que todos sintam-se à vontade para exporem suas

expectativas, medos e desejos em relação ao evento de planejamento. Os demais

elementos deste momento inicial são a apresentação sucinta da metodologia, das regras

de funcionamento do seminário e por fim o “contrato” que simboliza o compromisso

coletivo com o ambiente de debates e o sucesso do evento.

(c) Aspectos organizativos e ambientais: a moderação de grupos num seminário típico de

planejamento estratégico exige previamente a constituição de uma equipe de apoio

capaz de viabilizar e garantir durante o seminário a infra-estrutura de apoio (intervalos,

materiais gráficos, equipamentos didáticos e pedagógicos, salas de trabalho, etc...). Para

elaboração de planos estratégicos cujo horizonte é no mínimo um ou dois anos

recomenda-se no mínimo dois a três dias de seminário (para problemas ou organizações

mais complexas o seminário principal tem em média 40 horas), isto exige preocupações

adicionais com hospedagem, transporte, alimentação e lazer que o moderador não pode

e não deve assumir. Todos estes aspectos devem ser definidos previamente nas reuniões

de sensibilização e contrato com a organização. Não é recomendável tentar realizar os

encontros de planejamento estratégico mais críticos e importantes – nos moldes em que

esta metodologia se propõe – tentando combinar o ambiente das rotinas do dia-a-dia

dos participantes com reuniões tipo “meio turno” no próprio ambiente de trabalho.

A importância da visualização dos processos

212

A variável-chave para o processo de construção coletiva no grupo de planejamento chama-

se comunicação, é a interação verbal e não-verbal entre os vários membros do grupo que se

estende – antes e depois dos seminários de planejamento – entre a direção da organização e

o conjunto dos funcionários, colaboradores, clientes e fornecedores.

A concentração e a atenção dos participantes aumentam significativamente através da

comunicação visual, a associação entre a comunicação verbal e a visualização se

complementam. O uso de cartelas (tarjetas) ou papel são exemplos típicos de instrumentos

de baixo custo e bons resultados, principalmente porque viabilizam a participação individual

de cada membro do grupo.

O uso de pequenos retângulos de papel-cartolina (cartões) onde se pode escrever uma frase

ou algumas palavras (com pincel atômico) para facilitar a visualização é o recomendado. As

tarjetas de cartolina (papel gramatura 120g. e 22x12 cm.) podem ter formatos (retângulo,

oval, redondo) e cores diferentes (no máximo três de tons claros) para expressar diferentes

assuntos, estimular estados de ânimo e gerar emoções diferenciadas, criar associações,

etc...É importante lembrar que as frases escritas devem ser auto-explicativas, argumentos

completos”, deve-se tratar a tarjeta com o mesmo cuidado e respeito que a opinião de um

participante. As cartelas podem ser afixadas em painéis móveis, papel “kraft” ou pardo, com

alfinetes ou fita adesiva apropriada.

As vantagens da visualização como técnica de moderação de grupos:

(1) concentra a atenção do grupo e ajuda fixar conceitos importantes do planejamento. Facilita

o proceso de comunicação na medida em que cria uma “versão” comum e aceita por todos

sobre processos, argumentos ou conceitos.

(2) registra e permite a sistematização de contribuições individuais contribuindo para criar

“visualmente” um resultado coletivo que ajuda na formação da identidade. Ajuda o grupo a se

auto-reconhecer e amadurecer.

(3) facilita a retomada ou reconstrução de processos anteriores da metodologia, a hierarquia

entre conceitos e a construção de cadeias causais. Ajuda a aprofundar a discussão na medida

em que conceitos e argumentos são facilmente comparados e modificados pelo debate.

(4) é fundamental para assegurar processos participativos e democráticos, na medida em que o

moderador assegura a transparência dos argumentos em debate. Permite e respeita a igualdade

213

de opinião: “todas as cartelas escritas tem a mesma importância”.

(5) pode garantir mais objetividade ao processo de debates e discussões na medida em que a

linguagem escrita exige mais rigor e formalismo.

(6) os instrumentos de comunicação são de baixo custo e acesso universal (exigindo no mínimo,

domínio da escrita pelos participantes).

(7) facilita processos de avaliação do projeto ou planejamento, elaboração e difusão de

relatórios. Facilita o processo de síntese e objetividade dos debates e reuniões. Permite a

reconstituição rápida da trajetória do seminário até o momento atual.

Na medida em que o seminário de planejamento progride vários painéis ou mosaicos com

tarjetas vão sendo formados, as declarações estratégicas, a explicação do problema, o

desenho dos projetos, e assim por diante. A estética da visualização não é menos

importante, painéis confusos, mal escritos ou desorganizados acabam prejudicando o

diálogo e a comunicação entre o grupo e o próprio moderador, além de refletirem

esteticamente o estado de ânimo do debate.

O uso de outros instrumentos de apoio para exposições orais com o flipchart, papelógrafo

ou transparências requer cuidadoso planejamento em relação ao tipo de público que vai

participar, à clareza e não saturação de informações, ao ritmo da exposição e dinâmica.

O papel do moderador

O trabalho em grupos na atividade de planejamento estratégico com enfoque participativo

requer procedimentos especiais. Do ponto-de-vista técnico o moderador deve ter e saber

utilizar técnicas para despertar o interesse e a curiosidade dos participantes, manejar

técnicas de visualização, conhecer princípios e dinâmicas de grupos (jogos dramáticos),

saber aplicar em cada caso procedimentos para superar e resolver os conflitos.

Deve entretanto, saber usar sua sensibilidade e intuição, sua própria carga afetiva e

emocional para gerar e sustentar processos de aprendizagem. A combinação adequada

214

destes dois elementos distingue a boa da má moderação. Saber moderar é muito mais do

que memorizar um conjunto de técnicas de grupo ou um repertório de perguntas.

O papel do moderador é o de proporcionar um processo de autêntica “catálise” de idéias

entre os participantes, seu dever é viabilizar o processo comunicativo, nunca deve manipular

ou conduzir o grupo para determinada conclusão, deve fazer com que o grupo tenha níveis

crescentes de auto-consciência sobre suas virtudes e fraquezas para construir objetivos

coletivamente. A atividade de moderação não pode ser feita seguindo rigorosamente um

“manual de conduta” ou com regras fixas, saber moderar exige maleabilidade

comportamental, flexibilidade metodológica, adaptação sistemática ao padrão do próprio

grupo.

Sua imparcialidade diante dos temas em debate é fundamental para assumir o papel de

facilitador e portanto de mediador confiável dos processos comunicativos, sua credibilidade

reside nesta capacidade, seu profissionalismo também.

Resumindo as funções do moderador:

(1) Estimula o trabalho do grupo: promove o início e a continuidade do trabalho em grupo,

distribui tarefas, coordena atividades, atribui papéis, estrutura o conteúdo de trabalho,

motiva e conduz a atenção para temas relevantes, é o “guardião” do método, o método

é um “roteiro de viagem”, não o manual, propõe objetivos conquistáveis no andamento

do trabalho, assegura o registro e a documentação da trajetória do grupo;

(2) Observa e intervém nos processos grupais: assegura o prosseguimento e a acumulação

positiva no trabalho do grupo evitando, para isso, toda forma de interrupção, quebra de

ritmo ou desvio que implique formas abertas ou veladas de resistência, bloqueio, dúvida

ou divergências, fazendo com que estes processos sejam evidenciados coletivamente; o

conflito é a oportunidade para avançar na unidade e coesão do grupo;

(3) Adota postura que desafie o grupo a tomar decisões participativas: sugere e propõe

regras para os procedimentos de trabalho em grupo, estimular a participação de todos

independente de sua função ou cargo, esclarece as tarefas e papéis, promove a

215

socialização de conhecimentos, experiências e sentimentos dentro do grupo, mobiliza os

pontos positivos e viabiliza maior integração entre seus membros.

Para o processo de facilitação o moderador deve:

(1) Trabalhar para que haja condições no processo grupal de tranqüilidade, prazer e eficiência

dos participantes.

(2) Facilitar o processo de decisão do grupo na solução positiva dos conflitos e diferenças e nos

processos adaptativos de mudanças.

(3) Estimular o convívio democrático, a tolerância recíproca e o diálogo permanente

privilegiando sempre a pluralidade de opiniões e pontos-de-vista como método para

enriquecimento do conhecimento coletivo.

(4) Fomentar processos comunicativos a partir das trajetórias e experiências singulares de cada

participante através do uso consciente da linguagem verbal e não-verbal.

(5) Aplicar com conhecimento e sensibilidade um conjunto de ferramentas para fomentar a

participação e a criatividade (as dinâmicas de grupo).

(6) Ajuda o grupo a compreender de forma comum um conceito, processo ou situação,

independente da concordância ou não que deve ser trabalhada. Estimulando a capacidade de

síntese, a fundamentação dos argumentos e a clareza e consciência da comunicação

(conversações) interna.

Assim o processo de moderação não é totalmente isento ou inocente, só a prática contínua

cria no moderador a sensibilidade para saber até onde vão os limites da participação

individual, até onde os participantes estão dispostos a expor publicamente seus sentimentos

e estados de ânimo.

Só a experiência acumulada permite ao moderador saber separar sempre suas convicções

pessoais e a necessária isenção na facilitação do trabalho de grupo, tarefa sempre muito

difícil se a origem ou relação do moderador é muito próxima do grupo envolvido. É

fundamental sempre o respeito às pessoas, a transparência do processo (objetivos,

métodos, regras do jogo no grupo acertados e definidos previamente) e a garantia de

igualdade no processo de participação.

216

Um outro ponto importante é a autenticidade como uma característica natural e necessária

da moderação. Em processos de convívio intenso onde a autoridade combina-se com

crescente intimidade entre os participantes, qualquer sinal de não-sinceridade do

moderador abala a confiança e a credibilidade. Sem estas duas coisas não há identidade

necessária entre grupo e moderador, entretanto deve-se lembrar que o moderador tem

limites (que deve conhecer), também erra como qualquer outra pessoa e também está

sujeito à variações comportamentais e de humor que influenciam seu trabalho.

A identificação do moderador com o grupo não depende de uma eventual concordância com

as diretrizes estratégicas da organização que planeja ou uma identidade cultural ou política

prévia, depende mais da sua postura pessoal no relacionamento com o grupo. Neste sentido

alguns atributos são importantes para garantir uma boa moderação: olhar diretamente para

as pessoas, falar com convicção e firmeza, estar atento para a postura corporal, utilizar o

corpo e o espaço adequadamente no processo, observar os códigos de convivência do grupo

(modo de falar, vestir, p. ex.).

A moderação, enfim, é uma arte que cria suas próprias regras, o bom moderador não segue

manuais, a cada experiência inventa um novo script, em cada estréia escreve um novo

roteiro.

Atitudes que facilitam a Comunicação em Grupo

(1) Faça a reunião em forma de círculo de modo que todos se vejam face a face. Círculo é o

símbolo da “equilibração”. No círculo são todos iguais.

(2) Diga “Nós”. Evite o Eles, o Vocês. Envolva-se profundamente no grupo. Dirija-se a todos

mesmo referindo apenas a um. Não se exclua ao falar.

(3) Não faça “panelinhas”. Jogue com todos. Procure sentar-se junto a quem você conhece

menos. Dê chance aos demais de conhece-lo(a).

(4) Mantenha-se atento (a). Olhe para quem fala. Não se alheie do grupo pensando no que

você vai dizer. Espere sua vez de falar. Quando a bola vier, chute. Ouça! Olhe para quem

fala!

217

(5) Não fale baixinho com o(a) companheiro(a) ao lado. Podem pensar que critica algum

membro do grupo. Fale alto dirigindo-se a todos. O grupo é seu feedback.

(6) Faça como um jogador que recebe o passe. Sua contribuição deve encadear-se com a

anterior. Opere em conjunto! Seja como um elo de uma corrente! Coopere!

(7) Explique o “Porque” das suas afirmações. Se você não souber explicar os “porquês” (o

significado) está chutando fora do campo....

(8) No seu grupo podem existir pessoas tímidas, sem muita experiência. Valorize suas

contribuições. Jogue o jogo delas!

(9) Manifeste sua discordância com argumentos ou fatos e não simplesmente dizendo “Não

concordo”. Assim, as invés de criar barreiras, será percebida sua discordância tranqüila e

todos terão condições de prosseguir na “operação mental em conjunto” (Cooperação).

(10) Quando você estiver de acordo, procure expressar sua concordância, ainda que por um

pequeno gesto. Isto cria coesão e faz o grupo.

Organizando reuniões

As reuniões tomam muito tempo em qualquer sistema de gestão, seja público ou privado.

São centenas ou milhares todos os anos. Você já parou para contar quantas horas você passa

participando em reuniões durante uma semana, um mês, um ano ? O problema não são as

reuniões, pelo contrário, elas são os meios mais eficazes de comunicação direta, pessoal e

são necessárias para o desenvovlimento do nosso coeficiente emocional. O problema são as

reuniões que resultam em pouca produtividade, são desnecessárias e fazem-nos perder um

tempo que nunca mais poderá ser recuperado.

O fundamental antes de uma reunião é saber planejá-la, para isso três perguntas devem ser

respondidas sempre: (1) Para que devemos fazer a reunião ? Qual seu objetivo ?, (2) Em

função disto, que assuntos ela deverá tratar ? e finalmente (3) Como deverá ser realizada ?

Quais as questões logísticas envolvidas ?

Nestas perguntas estão contidos uma série de tópicos importantes, na primeira:

218

• Objetivos da reunião;

• Saber se a reunião é o melhor meio de alcançar os objetivos;

• Quem deverá participar da reunião;

• Qual a agenda;

• Quais informações os participantes devem ter ANTES da reunião;

• Quem deve ser responsável para sistematizar e distribuir estas informações;

• Qual a melhor data, horário e local para realizar a reunião.

Na segunda pergunta:

• Qual é o objetivo específico de cada item da agenda;

• Como ele deverá ser desenvolvido durante a reunião;

• Quais são as técnicas mais adequacadas para desenvolver cada ponto;

• Quanto tempo se demanda para cada tema;

• Que materiais didáticos devem subsidiar os participantes na reunião;

• Quem deve apresentar cada tema, como deve ser apresentado e que

encaminhamentos serão necessários em cada um.

Na parte logística todos os detalhes devem ser pensados, inclusive aqueles que

normalmente passam desapercebidos como o conforto ambiental e a qualidade dos

materiais utilizados, os problemas de transporte e deslocamento para chegar e retornar da

reunião, a importância de feedback aos participantes, etc.

As qualidades para conduzir uma reunião dependem do tipo e circunstâncias em que ela

ocorre, mas é sempre interessante que haja bom umor, segurança de si mesmo, intuição,

criatividade e flexibilidade. Sobretudo deve-se ter capacidade para improvisar, em se desviar

dos resultados planejados.

Outra habilidade é muito importante, saber animar e estimular a reflexão coletiva. Para isso

deve-se ter capacidade de moderação e facilitação de grupos, coordenar a superação de

divergências e ajudar o grupo a pensar como equipe. Para exercer estas competências deve-

219

se ter um outro conjunto de habiilidades: confiança e entusiasmo, tolerância, auto-estima,

capacidade de aprendizagem e auto-controle.

A literatura e a pesquisa mostra que o passo fundamental é motivar os participantes fazendo

com que sua percepção sobre a ocorrência da reunião seja proativa. Isto é, eles devem

perceber e acreditar que a reunião é importante e faz sentido para sua rotina profissional e

o cumprimento de suas tarefas, que sua presença faz diferença.

Infelizmente a maioria das reuniões são um fracasso. Não são preparadas, não há processo

de comunicação produtivo e seus encaminhamentos são inúteis ou inexistentes. A

participação das pessoas só ocorre por conta de uma ordem burocrática, ela acontece

envolta em apatia. Um chefe fala, os demais escutam. No final todos vão embora sem saber

porque vieram.

As pesquisas internacionais tem apontado causas variadas para o fracasso das reuniões.

Algumas são de fácil identificação: dispersão da atenção e do foco, falta de objetivos na

agenda, duração excessiva, preparação insuficiente, indecisão sobre os temas,

desorganização, falta de eficácia ou controle da liderança, temas irrelevantes, sensação de

perda de tempo, atrasos, interrupções externas freqüentes, falta de continuidade,

informação incompleta, assuntos repetidos e já decididos, etc.

Parece-nos que o papel fundamental para garantir uma boa reunião é o desempenho do

líder, do responsável pela reunião. Neste sentido ele deve cumprir algumas funções

indelegáveis:

1. criar um clima de confiança, para que os participantes se sintam importantes e

valorizados;

2. adotar e seguir um plano de trabalho (objetivos, metas, técnicas de apresentação,

documentação, etc.);

3. fazer as sínteses necessárias em cada ponto, na medida em que o debate avança,

para que se consolidem progressivamente conclusões coletivas;

220

4. atuar para elucidar dúvidas, superar ambigüidades e identificar eventuais

divergências, evitando trabalhar com generalizações;

5. zelar e proteger as opiniões minoritárias;

6. atuar para produzir um conclusão, ainda que provisória, que conduza o grupo a um

estágio superior de decisão e deliberação.

Uma reunião breve e de alta produtividade depende muitas vezes de coisas singelas e

simples. Por exemplo, o envio de um brainstorming breve, com posições diferenciadas sobre

o tema, para os participantes antes da reunião, pode abreviar longas horas de debate. A

experiência mostra que na ampla maioria das diverêngias o que ocorre são problemas de

comunicação, ruídos que impedem o entendimento. Saber escutar é tão importante quanto

saber se expressar.

Algumas regras práticas:

1. prepara sempre a reunião ANTES que ela aconteça;

2. na preparação municie os participantes com informação breve, focada e relevante;

3. se for dirigir a reunião, evite que sua opinião paute o resultado dos debates, se for

necessário, convide um moderador externo;

4. comece e termine a reunião no horário marcado, não faça reuniões freqüentes sem

que haja tempo para que as decisões tomadas amadureçam e se desenvolvam,

produzindo novos elementos e fatos a ponderar;

5. limite o tempo de cada intervenção individual, sem limitar o direito de expressão;

6. documente todo o processo;

7. nunca deixe de enviar aos participantes um registro dos principais temas debatidos e

sobretudo das decisões, prazos e responsáveis.

Uma palavra final sobre métodos, técnicas e ferramentas de gestão

Após analisarmos este conjunto de técnicas e ferramentas de gestão cabe uma reflexão final

sobre o tema. A gestão pública como vimos não é mais a mesma. Um sociedade que

221

caminha para uma fase de maturidade democrática é uma sociedade que exige muito mais

dos seus governos. Mais qualidade, mais atenção, serviços mais universais, menos impostos

e menos custos. Para isso não há mágica a não ser um longo e as vezes penoso processo de

mudança comportamental, cultural e política.

Os métodos são meios para isso, mas não são o objetivo final. Ele apenas servem para

caminharmos nesta estratada. É importante perceber esta diferença para não cairmos nas

armadilhas dos “metodologismos” e dos modismos passageiros que o mercado de

managment cria a cada ano com seus novos gurus e teorias mirabolantes. Muitas vezes o

método mais eficaz é aquele baseado no bom senso, para isso a mente deve estar aberta à

recombinações, fórmulas novas e processos de invovação, de tentativa e erro. Vale a pena

correr o risco ? Acreditamos que sim, a ferramenta que conseguimos criar certamente será

sempre a mais adequada para resolvermos nossos próprios problemas.

Perguntas

1. Porque utilizar uma metodologia na gestão inovadora é importante ? Justifique.

2. Na sua opinião existe um método ideal para resolver problemas da organizão ?

Justifique.

3. Num plano de melhoria gerencial qual seria a importância do plano de capacitação.

Bibliografia utilizada

Marinho, Sidnei. Uma Proposta de sistemática para operacionaliação da estratégia

utilizando o Balance Scorecard. Tese de Doutorado no Programa de Pos Graduação em

Engenharia da Produção da UFSC, 2006.

O objetivo deste excelente trabalho de pesquisa (disponível na web) foi o de de aprofundar

os princípios e práticas da utilização da medição de desempenho, o trabalho busca

222

consolidar uma sistemática para operacionalização da estratégia utilizando o Balanced

Scorecard por meio de análise crítica da pesquisa bibliográfica e da utilização do Método

Delphi para consultar especialistas da área. O autor utiliza técnicas como o SWOT, o Método

da Global Business Network para enriquecer a aplicação prática do BSC.

CHIAVENATO, Idalberto. Administração Geral e Pública. Elsevier: Rio de Janeiro,

2006.

Este livro foi elaborado originalmente para auxiliar os estudantes de nível superior nos

concursos públicos relacionados às carreiras federais que são muito exigentes na área da

gestão pública. Na verdade o livro adquiriu uma densidade e abrangência impar na literatura

disponível. Inicia comentando as escolas clássicas da administração para em seguida entrar

nos assuntos típicos da gestão publica: processo administrativo, gestão de pessoas,

comportamento organizacional até as novas abordagens da recente reforma gerencial. É

indispensável para quem quiser se aprofundar no assunto.

BROSE, M. Metodologia Participativa. Tomo Editorial, Porto Alegre, 2001.

Esta publicação é essencial para quem quiser conhecer métodos de planejamento e desenho

de projetos que podem ser aplicados no setor publico de forma participativa. São 29

metodologias mapeadas e identificadas. As metodologias estão divididas em grandes

agrupamentos segundo sua natureza: para trabalhos em grupo, para capacitação, para

diagnóstico participativo, para planejamento, etc. É uma obra importante na perspectiva de

maior democratização da gestão pública e envolvimento dos cidadãos nas questões

coletivas.

CLEMENTE, Ademir (organizador). Projetos Empresariais e Públicos, Atlas, São Paulo, 2002.

223

Esta obra se insere no contexto da retomada da importância do planejamento publico. O

autor organiza um conjunto de métodos e temas relacionados à elaboração de projetos, de

uso comum no setor público e privado. Entre os quais há técnicas de análise e previsão,

localização de investimentos, análise econômica e financeira, o problema da escala,

financiamento de proejtos, etc. A obra é um manual de referência indispensável para

entender metodologias inovadoras na gestão publica.

ALECIAN, S. e FOUCHER, D. Guia de Gerenciamento no Setor Publico. Editora RENAVAN e

ENAP, 2001.

Como o nome já diz esta obra é um guia, uma referência, não se trata de obra acadêmica ou

meramente teórica. Os autores são consultores franceses renomados na área e tem visitado

frequentemente o Brasil. O livro resultou de um programa de desenvolvimento gerencial

para a burocracia francesa e parte da tese de que o bom gerenciamento é antes de tudo

uma questão de boas práticas. É essencial pra entender o que é inovar em gestão pública.

VALERIANO, Dalton. Gerenciamento Estratégico e administração por projetos, Makron

Books, São Paulo, 2001

Este livro debate o tema da estratégia vinculado à formulação de projetos. O autor utiliza a

metodologia do PMI, Project Management Institute, que é mundialmente reconhecida para

elaboração de projetos. Apesar de não ser focado na esfera pública, os ensinamentos do

livro são essenciais para entender o processo de elaboração de projetos. Fundamental para

uma perspectiva gerencial da administração pública.

Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Gestão. Avaliação

Continuada da Gestão Pública: Repertório / Secretaria de Gestão. – Brasília: MP, SEGES,

2004.

Esta obra coletiva do Ministério do Planejamento constitue-se num repertório que reúne

informações, conceitos, fundamentos, métodos e técnicas para orientar as organizações

224

públicas brasileiras nos processos de avaliação e melhoria da gestão e de elaboração e

implementação de planos de melhoria da gestão. O trabalho pode servir a organizações com

vários ciclos de gestão realizados, que utilizam diretamente o Instrumento para Avaliação da

Gestão Pública, mas atende, principalmente, àquelas organizações públicas que estão

iniciando seu primeiro ciclo de avaliação e melhoria, utilizando o Manual para Avaliação da

Gestão Pública. A obra representa o “estado da arte” de metodologias de gestão inovadora,

de consulta e referência indispensável a todos os estudiosos, dirigentes públicos e

pesquisadores da área.

Mosocvici, Fela. Desenvolvimento Interpessoal: treianamento em grupo. José Olympio,

2001

Esta obra é um guia para treinamento em grupo – um verdadeiro clássico do gênero.

Destina-se a educadores e profissionais de organizações públicas ou privadas, como

dirigentes, executivos, gerentes ou assessores. É uma coletânea de textos de

fundamentação conceitual e de sugestões de atividades de aplicação para treinamento e

desenvolvimento em grupo. É uma obra ‘multiuso’, sem rigidez de seqüência obrigatória

tanto para os textos quanto para os exercícios. Server de referência básica para entender o

processo grupal, a evolução e as principais técnicas para coordenação dos grupos.

225

Aula 08

Planejamento e Gestão Inovadora

“(...) a capacidade de governo somente se

desenvolve quando é exigida pelas regras do jogo

político mediante práticas sistemáticas que exijam

cobrança e prestação de contas por desempenho.

Por trás da baixa capacidade de governo encontra-se

a fragilidade da crítica social profunda e a crise do

estilo de fazer política, que confere ao cidadão a

capacidade de eleger seus governantes mas lhe nega

a capacidade para avaliá-los periodicamente e

participar da gestão do governo”. C. Matus, “O Líder

sem Estado-Maior”.

As ferramentas de planejamento estratégico talvez sejam aquelas que mais representem as

habilidades e ferramentas de uma gestão verdadeiramente inovadora. Os desafios de

modernização da gestão pública, o padrão crescente de qualidade exigida pelos cidadãos-

usuários dos serviços e a imprevisibilidade das sociedades complexas exigem uma

verdadeira revolução nas metodologias e técnicas de planejamento estratégico.

Nesta aula vamos apresentar não só uma concepção nova de planejamento, profundamente

adequada ao enfoque da gestão publica inovadora, mas também um roteiro prático de

apresentação. Este roteiro envolve tanto o “como fazer” com templates e dicas de

moderação de grupos, como o sentido de cada momento da metodologia.

Um dos maiores desafios de qualquer governo é enfrentar sua baixa capacidade de gestão

para mudar a realidade, aplicar seu programa e resolver problemas estruturais que estão

fazendo parte da “paisagem”. Quando o projeto político é transformador e ambicioso este

226

problema ganha maior importância ainda, pois é preciso lutar contra a baixa governabilidade

e o isolamento imposto pelos adversários. A valorização das técnicas e ferramentas de

gestão e de planejamento estratégico fazem parte assim de um amplo e longo esforço para

retomar o sentido mais profundo do termo política: a arte de governar.

A transparência da gestão pública, a participação democrática dos servidores na condução

dos seus organismos, a reconstrução do setor público passam necessariamente pela ação

intensiva na formação de recursos humanos. Tenta-se aqui propor uma técnica de

Planejamento Estratégico fundamentada em três fontes: a primeira está baseada no

enfoque metodológico proposto pelo Planejamento Estratégico situacional de Carlos Matus,

economista chileno, para o setor público. A segunda é a experiência teórico-prática em

diversos níveis da administração pública. A terceira é a argumentação em favor da

centralidade da participação e da democracia deliberativa como método de governar e

construir um paradigma mais democrático na gestão pública.

A efetiva participação dos envolvidos no processo de planejamento além de ser um

preceito metodológico - planeja quem executa - e uma técnica para aumento da eficácia

e controle sobre a aplicação de verbas, é uma síntese político-ideológica que fundamenta

o compromisso democrático com uma visão de futuro concretamente vinculada à

cidadania e a sua identidade social e individual.

Em que consiste a efetiva participação? Não pode ser considerada como ‘método’ da

transmissão de informações das direções e não deve se constituir como subproduto, quer

como ‘benesse’ política, quer ‘simples conquista de espaço político’. Na verdade como

dizia o francês Michel Crozier nos anos setenta a participação é o princípio fundamental de

toda a participação não é a comunicação ou simples informação, nem somente o diálogo

sobre os grandes objetivos e os pequenos meios, mas a negociação, portanto o confronto

gerador de acordo sobre os elementos mais práticos da vida de todos os dias.

Deste modo, pode-se dizer que o segredo da natureza desta participação nos processos

decisórios, está no conteúdo de exposição consciente que as altas direções farão em relação

227

aos servidores. Desta maneira, abrindo e discutindo, concreta e democraticamente, suas

visões e noções sobre o curso das ações e a direcionalidade estratégica de suas instituições.

Antes, porém, de efetivamente discutir-se o Planejamento Estratégico com enfoque

participativo deve-se esclarecer o papel dos participantes deste processo. Considera-se que,

para efeitos desta metodologia, as organizações públicas necessitem de profissionais

qualificados com características de facilitadores internos.

Entende-se, aqui, portanto facilitador como a pessoa que, tendo sido capacitada através de

atividades formativas específicas, poderá desenvolver junto à sua organização, o processo

de Assessorar, Moderar e Facilitar a implantação do modelo, seguindo a dinâmica e os

pressupostos indicados. A característica desejável mais marcante deste consultor é o perfil

de “facilitador de processos”, porque é aquela pessoa que irá desenvolver um conhecimento

multi-disciplinar da organização, conhecendo de forma ampla as atividades, seus principais

fatores de êxito e limitação.

Tais características serão necessárias para que consiga ‘processar’ suas tarefas de facilitação,

auxiliando a sua organização na elaboração de suas perspectivas técnico-políticas. O

Planejamento Estratégico com enfoque participativo, objetiva consolidar-se como um

instrumento gerencial, uma ferramenta de construção coletiva de identidades democráticas

no setor público. Significa uma aposta, fundamentada e legitimada no projeto de governo e

talvez o embrião de uma cultura fundante de uma nova escola de gestão pública que mude

radicalmente a visão do gestor sobre seu papel e seu compromisso social.

Possibilita capacitar quadros técnico-políticos das organizações públicas e do terceiro setor

para desempenhar as atividades de elaboração, gestão e monitoramento de programas de

complexa governabilidade, sempre numa perspectiva inovadora. Através do domínio de

ferramentas e instrumentos participativos pretende-se incidir na melhoria da capacidade de

governo e, por efeito, na melhoria geral das técnicas de governo.

228

O que é o Planejamento Estratégico com enfoque participativo ?

� É uma construção metodológica derivada da proposta de Carlos Matus, da centralidade

da participação e a da experiência concreta de planejamentos estratégicos concretos em

gestões públicas em diversos níveis, de movimentos sociais e entidades de classe.

� É a defesa de uma concepção democrática e participativa de Estado e gestão pública,

que associa a eficiência e eficácia das políticas públicas com a inclusão social e política

dos trabalhadores públicos e das populações beneficiadas.

� É uma construção metodológica para moderação de grupos e solução de problemas

relacionados aos atos de governar, à direção de organizações, problemas de alta

complexidade e baixa governabilidade.

� É um movimento teórico-prático para reconstrução da capacidade de planejamento

governamental como capacidade de governo, não restrita à formulação de políticas

macro-econômicas ou de desenvolvimento regional.

� É tributário de uma concepção de planejamento geradora de conteúdos para formação

gerencial dos gestores públicos, ou seja, para o acúmulo de capital humano, articuladora

básica de curriculos e conteúdos para Escolas de Governo que formem quadros gestores

para administração pública brasileira.

Nas próximas seções será abordada uma proposta metodológica na forma de um “roteiro de

aplicação” do planejamento em organizações, particularmente aquelas em que as relações

de poder entre gestores/ofertantes e cidadãos/demandantes, ou seja, a variável política não

é desprezível.

Isto não significa que relações de poder não existam em organizações privadas de mera

natureza mercantil, nestas a incerteza futura de mercados globalizados, a disputa

permanente com concorrentes em estruturas de monopólio e oligopólio ou as relações

sempre tensas entre políticas públicas regulatórias e clientes cada vez mais organizados e

conscientes já justificaria o emprego e uso de planejamento estratégico.

229

1. O marco referencial

O Planejamento Estratégico diz respeito à gestão de governo, à arte de governar. Quando

perguntamos se o governo está caminhando para onde se quer ir, se está fazendo o

necessário para atingir seus objetivos, se está começando a debater o problema do

planejamento. A grande questão consiste em saber se a organização é arrastada pelo ritmo

dos acontecimentos do dia-a-dia, como a força da correnteza de um rio, ou se ela sabe onde

chegar e concentra suas forças em uma direção definida.

O planejamento, visto estrategicamente, não é outra coisa senão a ciência e a arte de

acrescentar maior governabilidade aos nossos destinos, enquanto pessoas, organizações ou

países. O processo de planejamento, portanto, diz respeito a um conjunto de princípios

teóricos, procedimentos metodológicos e técnicas de grupo que podem ser aplicados a

qualquer tipo de organização social que demanda um objetivo, que persegue uma mudança

situacional futura. O planejamento não trata apenas das decisões sobre o futuro, mas

questiona principalmente qual é o futuro de nossas decisões. O Planejamento ao “ver” (e

simular) o futuro amplia o exame do presente, alterando-lhe as condições, o que promove o

futuro desejável e possível.

Se tentamos submeter o ritmo do desenvolvimento dos acontecimentos à vontade humana

devemos imediatamente pensar que governar em situações complexas exige exercer a

prática do planejamento estratégico até seu último grau. Para atingir este objetivo será

necessário entender e ultrapassar muitos pré-conceitos em relação à atividade de

planejamento no setor público.

A incorporação do paradigma da participação ao processo do planejamento é pré-condição

para integração metodológica e articulação de conceitos com os processos de participação

preexistentes (por exemplo: orçamento participativo, consultas populares, conselhos

representativos, etc...). Enquanto este último radicaliza e amplifica a decisão sobre a

destinação dos recursos públicos, o planejamento estratégico, pode organizar a intervenção

governamental a nível local, regional ou nacional e o processo de definição das diretrizes no

230

processo participativo. Ou seja, a participação é um processo que exige planejamento prévio

e o planejamento de governo pode ser feito de forma participativa.

Revisando o enfoque normativo e tradicional

Os métodos mais tradicionais de planejamento são extremamente normativos, impessoais e

se dizem neutros, pois se pretendem amparados na “boa técnica de planejamento”. Este é o

caso, por exemplo, de toda a tradição do planejamento macroeconômico que se organizou

em torno do uso de modelos econométricos para projeção de taxas de crescimento e outras

variáveis.

Retomamos sinteticamente como se estruturam teoricamente tais visões:

• Há sempre um ator que planeja e os demais são considerados simples agentes

econômicos com reações completamente previsíveis. O planejamento pressupõe um

“sujeito” que planeja, o Estado, e um “objeto” que é a realidade econômica e social. O

primeiro pode controlar o segundo.

• As reações dos demais agentes ou atores são previsíveis porque seguem leis e obedecem

a prognósticos de teorias sociais bem conhecidas. O Diagnóstico é pré-condição para o

planejamento, ele é verdadeiro e objetivo (segue do comportamento social) , portanto,

único possível, não há explicações alternativas dos demais atores.

• O sistema gera incertezas, porém são numeráveis, previsíveis enquanto tais, não há

possibilidade de surpresas não-imagináveis.

• O ator social que planeja não controla todas variáveis. Estas são consideradas não

importantes ou determinantes; têm um comportamento previsível ou não são

controladas por outros atores.

• Há nesta visão, uma aparente governabilidade, gerada pela ilusão de que as variáveis

não controladas simplesmente não são importantes. A governabilidade e a capacidade

de governar são reduzidas e absorvidas, em última instância, pela aparente pujança do

projeto político (que é “verdadeiro” per si e portanto, auto-legitimado). Neste cenário,

só há uma teoria e técnica de planejamento. Além do mais, suas deficiências não

aparecem como problema a ser resolvido, os dirigentes se concentram mais nas relações

231

de mando e hierarquia e no tempo gasto na tentativa de corrigir a ineficácia dos projetos

(gestados convencionalmente).

Uma síntese do modelo tradicional de planejamento na esfera pública

• Há um sujeito que planeja um objeto: materialismo vulgar.

• Há uma explicação verdadeira, se verdadeira é objetiva: recusa a “visão situacional”

(ontologia dialética).

• Explicar é descobrir as leis que regem o sistema: ação se confunde com

comportamento (economicismo).

• O Poder não é um recurso escasso (não há resistência criativa dos “outros”): o poder

não é relacional.

• É possível predizer o futuro e calcular as probabilidades de êxito e risco: ignora a

natureza do sistema social.

• É discursivo, oficialista e sempre “de médio prazo”.

• Planejar é uma coisa, fazer é outra: plano e gestão se compensam negativamente.

• Os núcleos dirigentes improvisam no dia-a-dia, sem estratégia, sistemas de

informações vulneráveis e ferramentas de gestão ineficazes, são governados pelas

circunstâncias.

Uma concepção mais estratégica de planejamento

Uma concepção estratégica de planejamento parte de outros postulados. A eficácia do

plano depende da eficácia das estratégias dos oponentes e dos aliados. Não há uma única

explicação para os problemas, tampouco uma única técnica de planejamento e monopólio

do Estado. Neste modelo de poder compartilhado a teoria normativa e tradicional do

planejamento perde quase toda sua validade.

Normalmente pensamos que se nada deve mudar é porque o planejamento é muito eficaz,

embora desnecessário. Por outro lado, se tudo está rapidamente mudando o planejamento

é pouco eficaz, embora muito necessário. Este paradoxo aparente se dissolve quando

232

abandonamos a idéia equivocada que associa o planejamento ao exercício inconseqüente da

pura futurologia. Pensar estrategicamente neste novo enfoque pressupõe colocar as

relações iniciativa-resposta de agentes criativos no lugar das relações causa-efeito, típica dos

sistemas naturais.

O cálculo de planejamento é sempre interativo porque, sendo a eficácia do nosso plano

dependente da eficácia do plano dos outros atores, há um componente de incerteza

primordial, que é diferente de processos sociais repetitivos ou das relações das ciências

naturais. Há, portanto, uma carga intensiva em formulação de estratégias e recursos de

gestão, o oposto ao “plano-livro” estático e tradicional.

O ator que planeja está inserido num jogo de final aberto, onde o próprio tempo já tem

conceitos diferenciados conforme a percepção de múltiplos agentes em situação de poder

compartilhado. Isto não quer dizer, entretanto que se rejeitem instrumentos e ferramentas

metodológicas comumente utilizadas no planejamento normativo, ao contrário, tais

ferramentas adquirem uma utilização ainda mais pragmática e eficaz.

Pode-se resumir os postulados teóricos deste enfoque metodológico nos seguintes

argumentos:

• O sujeito que planeja está incluído no objeto planejado. Este por sua vez é constituído

por outros sujeitos/atores que também fazem planos e desenvolvem estratégias. Deste

contexto surge o componente de incerteza permanente e o cálculo interativo que exige

intensa elaboração estratégica e um rigoroso sistema de gestão. O caráter modular do

enfoque estratégico deriva desta necessidade de redimensionar, agregar, combinar

diferentes operações em diferentes estratégias.

• O “diagnóstico” tradicional, único e objetivo, já não existe mais, no lugar surgem várias

explicações situacionais. Como os demais atores possuem capacidades diferenciadas de

planejamento, a explicação da realidade implica em diferentes graus de governabilidade

sobre o sistema social.

• Não há mais comportamentos sociais previsíveis e relações de causa-efeito

estabelecidas. O “juízo estratégico” de cada ator determina a complexidade do jogo

233

aberto e sem fim. A realidade social não pode mais ser explicada por modelos

totalmente analíticos, a simulação estratégica assume nesse contexto uma relevância

destacada.

• O planejamento deve centrar sua atenção na conjuntura, no jogo imediato dos atores

sociais, o contexto conjuntural do plano representa uma permanente passagem entre o

conflito, a negociação e o consenso, é onde tudo se decide. Na conjuntura concreta

acumula-se ou não recursos de poder relacionados ao balanço político global das ações

de governo. É por isso que “planeja quem governa”. Quem tem capacidade de decisão e

responsabilidade de conduzir as políticas públicas deve obrigatoriamente envolver-se no

planejamento. A atividade de coordenação, assim, é indissociável do planejamento, que

é também, uma opção por um tipo de organização para a ação, que se refere a

oportunidades e problemas reais.

• Os problemas sociais são mal-estruturados, no sentido de que, não dominamos,

controlamos e sequer conhecemos um conjunto de variáveis que influenciam os juízos

estratégicos dos demais agentes sociais envolvidos. Não há portanto como determinar

com exatidão as possibilidades de eficácia do plano ou os resultados esperados em cada

ação. Governar com plano estratégico mais do que resolver problemas significa

promover um intercâmbio de problemas quando nosso objetivo é que problemas mais

complexos e de menor governabilidade cedam lugar a outros menos complexos e de

maior governabilidade.

• O planejamento não é monopólio do Estado, nem de uma força social situacionalmente

dominante. O planejamento sempre é possível e seu cumprimento não depende de

variáveis exclusivamente econômicas, qualquer ator, agente ou força social tem maior

ou menor capacidade de planejamento e habilidades institucionais.

A visão normativa e a visão estratégica não existem em “estado puro” na prática do

planejamento e nas técnicas de governo, embora a maioria dos órgãos públicos trabalhe

sobre influência predominante da primeira.

Esta concepção, portanto, recoloca o planejamento como um amplo processo de

reorganização administrativa, intensivo em gestão, capaz de apoiar o redesenho

organizativo e otimizar a produção dos serviços públicos.

234

O Planejamento Estratégico na perspectiva participativa

O Planejamento Estratégico e Participativo assume as suposições do planejamento

situacional baseando-se nos seguintes fundamentos:

• É uma Mediação entre o Presente e o Futuro. Todas as decisões que tomamos hoje tem

múltiplos efeitos sobre o futuro porque dependem não só da minha avaliação sobre

fatos presentes, mas da evolução futura de processos que não controlamos, fatos que

ainda não conhecemos. Portanto, os critérios que utilizamos para decidir as ações na

atualidade serão mais ou menos eficazes se antecipadamente pudermos analisar sua

eficácia futura, para nós mesmos e para os outros. Qual o custo da postergação de

problemas complexos? Que tipo de efeitos futuros determinada política pública

resultará? Estes impactos futuros aumentarão ou diminuirão a eficácia do nosso projeto

de governo? Tais perguntas dizem respeito ao necessário exercício de simulação e

previsão sobre o futuro, quando devemos adotar múltiplos critérios de avaliação e

decisão.

• É necessário prever possibilidades quando a predição é impossível: na produção de

fatos sociais, que envolvem múltiplos atores criativos que também planejam, a

capacidade de previsão situacional e suas técnicas devem substituir a previsão

determinística, normativa e tradicional que observa o futuro como mera conseqüência

do passado. Decorre desta percepção a necessidade de elaborar estratégias e desenhar

operações para cenários alternativos e para surpresas, muitas vezes, não imagináveis.

• Capacidade para lidar com surpresas: o futuro sempre será incerto e nebuloso, não

existe a hipótese de governabilidade absoluta sobre sistemas sociais, mesmo próximo

desta condição há sempre um componente imponderável no planejamento. Devemos

então, através de técnicas de governo apropriadas, preparar-nos para enfrentar

surpresas com planos de contingência, com rapidez e eficácia, desenvolvendo

habilidades institucionais capazes de diminuir a vulnerabilidade do plano.

• Mediação entre o Passado e o Futuro: o processo de planejamento estratégico se

alimenta da experiência prática e do aprendizado institucional relacionados aos erros

235

cometidos. Portanto será preciso desenvolver meios de gestão capazes de aprender com

os erros do passado e colocar este conhecimento a serviço do planejamento.

• Mediação entre o Conhecimento e a Ação: o processo de planejamento pode ser

comparado a um grande cálculo que não só deve preceder a ação, mas presidi-la. Este

cálculo não é óbvio ou simples, é influenciado e dependente das múltiplas explicações e

perspectivas sobre a realidade, só acontece, em última instância, quando surge a síntese

entre a apropriação do saber técnico acumulado e da expertise política. É um cálculo

técnico-político, pois nem sempre a decisão puramente técnica é mais racional que a

política, e vice-versa. O cálculo estratégico dissociado da ação, será completamente

supérfluo e formal. Por sua vez, se a ação não for precedida e presidida pelo cálculo

estratégico, a organização permanecerá submetida à improvisação e ao ritmo da

conjuntura.

• É qualificador da participação: Como a ninguém é dado o monopólio do cálculo

estratégico, a participação passa a ser um condicionante do método. Ver a organização e

suas interações políticas e institucionais não é exclusivo das direções e é até mesmo

necessário que as partes tenham sua visão particular do todo, organizada e

sistematizada pelas mediações necessárias e próprias das suas atividades. Assim, a

capacidade de realização da organização decorre da capacidade também de suas áreas

internas compreenderem o papel que desempenham como parte indissociada do

conjunto, bem como, de suas capacidades executivas. Assim, as áreas da organização e

suas respectivas equipes, através da sua visão singular, são indispensáveis para

conformar o todo, disso resultando que o imperativo da participação não é apenas um

momento político de diálogo simultâneo das partes entre si com a direção, mas

momento instituinte da capacidade mais universal da organização. Desta maneira, a

participação não é apenas bem vinda por promover a integração e harmonia na

organização, mas porque permite apreender a realidade situacional com muito maior

capacidade e bom senso, garantindo a execução desejável aos projetos planejados.

Participar, neste sentido, é instituir uma prática social na qual os interlocutores possuem

conhecimentos sob pontos referenciais diferentes, mas podem ser integrados

produzindo novas sínteses mais consensuais. Participar é repensar o saber em confronto

com outros saberes, é fazer “com” e não “para”.

236

O enfoque proposto de planejamento, portanto, não é um rito burocrático ou um

conhecimento que possa ser revelado a alguns e não a outros, mas uma capacidade pessoal

e institucional de governar, de fazer política no sentido mais original deste termo. O

processo de planejamento não substitui a perícia dos dirigentes, nem o carisma da liderança,

ao contrário, aumenta sua eficácia porque coloca estes aspectos a serviço de um projeto

político coletivo.

Neste modo de ver a política, o governo e o planejamento ninguém detém o monopólio

sobre o cálculo estratégico e sistemático sobre o futuro, há uma profunda diferença em

relação ao antigo “planejamento do desenvolvimento econômico e social” tão comuns nos

órgãos de planejamento de toda América Latina e particularmente na tradição brasileira.

2. A metodologia proposta

A Metodologia do Planejamento Estratégico com enfoque Participativo – tem sua principal

inspiração no Planejamento Estratégico Situacional - PES, originalmente elaborado por

Carlos Matus e com as adaptações produzidas pela trajetória de aplicação deste e outros

métodos em inúmeros governos, organizações públicas e do terceiro setor (ONGs,

associações de classe, cooperativas, etc...).

Duas adaptações, entretanto, foram introduzidas no método original a fim de harmonizar o

método às finalidades do planejamento de estruturas administrativas governamentais,

distintas do conceito original e amplo de Governo, concebida pelo modelo inspirador de

Matus.

A fim de adaptar metodologicamente o propósito original do PES às condições de

planejamento de um Governo que, por conseguinte, possui já suas Diretrizes Políticas Gerais

(derivadas de um programa debatido eleitoralmente) – o que inclui a diretividade dos seus

órgãos e instituições subordinadas – tornou-se necessário redefinir o desenho da

‘identificação de problema’, introduzindo tais diretividades no método como passo inicial.

Essa operação de alteração e adaptação, resultou em admitir-se que a contextualização

237

somente pode ter sentido político estratégico, se condicionada à diretividade do Programa

de Governo equivalente nos seus órgãos e instituições.

Isto significa que enfrentar os problemas implica em identificá-los respondendo

propositivamente, em função da direcionalidade imposta pela Programa de Governo. Vale

dizer de modo reduzido que, identificar e enfrentar os problemas, no planejamento

estratégico, consiste em responder a pergunta: “quais os problemas reais que impedem ou

dificultam a realização das metas inscritas no Programa Político do Governo do órgão,

instituição, programa, agente, etc..., a ele relacionado e subordinado politicamente?”

Adota-se, portanto, a suposição de que um “programa de governo,” constituído como tal, já

é por si só uma primeira síntese direcional face aos macro problemas de conjuntura, prévia a

declaração de problemas original. Aqui o conceito de “programa” deve ser tomado em

sentido amplo, ou seja, vale para explicar, por exemplo, as diretrizes gerais dos programas

eleitorais debatidos em processos eletivos, como também se aplica para toda e qualquer

direcionalidade (diretriz, objetivos, metas estratégicas) que orientam uma gestão

determinada qualquer, numa empresa pública, numa organização prestadora de serviços,

numa entidade da administração direta ou grupos executivos formados para cumprir tarefas

específicas.

As noções intrínsecas de ‘problema’, desenvolvidas no método original, permanecem

intactas, pois pressupõe-se no planejamento estratégico que a colocação e identificação dos

problemas implica numa estrutura lógica, numa estruturação sistêmica entre aparência e

essência de eventos, estruturando causa e resultado, identificando causa e efeito, tendo

como eixos avaliativos da situação problematizada: quem está envolvido, onde, quando e

como...

Assim, para o planejamento estratégico, o ‘problema’ assume a mesma dimensão que no

PES, pois tanto neste como naquele, ‘problema’ será sempre a causa de uma

impossibilidade, de uma fragilidade ou de uma inexistência. Portanto, a caracterização dos

‘problemas’ centrais, também chamados nós-críticos que devemos atacar com o

planejamento ou ação estratégica, em nada se afeta partindo-se do modelo adotado pelo

planejamento estratégico, com enfoque participativo. Dir-se-ia que ao contrário, aguça-se a

238

noção descritiva da realidade a ser enfrentada e planejada, pois fundamentalmente

desejamos que o Programa de Governo - democraticamente eleito - seja realizado com a

máxima eficiência e eficácia possíveis.

A segunda alteração/adaptação metodológica de fundo, a partir do original PES, consiste na

introdução da categoria ‘participação’ como ontológica do método de planejamento. O

pressuposto da participação decorre da raiz do método de governar democrático, que

assume no plano social macro essa identidade intrínseca. Um Governo “democrático”

governa através da participação democrática da cidadania.

A materialização da teoria se dá quando ela é produto da práxis. Como se tem por certo que

a teoria somente se torna realidade material, se for assumida na prática por quem a

implementa, a força das idéias do planejamento desejado serão as idéias das forças políticas

que as materializam. Disso resulta que, aquele que executa deve planejar, mas também que

é absolutamente pertinente que a atividade prática seja uma atividade prático-crítica.

Para atender o pressuposto necessário e orgânico da função governar – a necessidade

executiva – o planejamento estratégico com enfoque participativo estabelece a participação

democrática numa forma de regime de ‘escala’, ou por momentos de representatividade.

Permite-se assim, a ação executiva sobre as deliberações do plano, sem comprometer a

sondagem constante e o monitoramento contínuo da própria execução dos planos,

possibilitando incorporar as movimentações situacionais dos atores e processos. Tal

característica não somente confere versatilidade ao estilo democrático, como potencializa os

escassos recursos de tempo, em especial dos gestores que, como condição do planejamento,

precisam participar de todas suas etapas - condição promotora da efetiva governabilidade

interna do planejamento.

A qualidade desta metodologia é a de amplificar o potencial resolutivo do Programa de

Governo e ao mesmo tempo incluir a participação como categoria central. A idéia geral de

participação no planejamento estratégico associa o envolvimento consciente dos servidores

públicos com os compromissos de gestão resultantes do próprio processo que os coloca

como protagonistas centrais.

239

Sua realização impõe um corpus pedagógico que lhe corresponda em forma e conteúdo.

Exige uma dinâmica que empregue, na transmissão e capacitação das habilidades aplicativas

do método, as mesmas categorias sob as quais se estrutura. Disso deriva seu poder

pedagógico intrínseco, pois o próprio domínio da metodologia implica na realização crítica

da prática que inspira. Considera-se que não é possível apreender o método, sem fazê-lo de

modo prático, aplicando sua técnica sobre um modelo real capaz de permear concreticidade

e crítica ao amadurecimento do próprio aprendizado.

Aspectos e procedimentos Planejamento tradicional Planejamento Estratégico

Participativo

(1) Objeto do

Planejamento

Situação passiva Situação ativa e complexa

(2) Explicação da realidade Baseada em diagnósticos e leis Apreciação situacional

(3) Concepção de Plano Normativo e prescritivo Jogadas sucessivas e apostas

(4) Análise estratégica Consulta de especialistas Análise de viabilidade técno-

política

(5) Atores Sociais Genéricos Específicos e com trajetórias

definidas

(6) Conceito de Operação Ação isolada do plano Medição entre plano e ação

(7) Papel da Gestão Não é um problema do plano É onde tudo se decide,

momento central do plano.

(8) Agenda da direção Domínio das urgências e

improvisação

Domínio das importâncias e do

planejamento estratégico

(9) Prestação de Contas Não há ou tem função ritual. É sistemática e orienta a

qualificação da gestão.

(10) Gerenciamento do

Plano

Gerência por setores ou

departamentos, domínio da

rotina

Gerência por Operações,

domínio da criatividade,

intensivo em gestão.

Momentos e método

240

Algumas advertências metodológicas prévias e cautelares são necessários para o

encadeamento do roteiro proposto:

• Mais do que um conjunto de técnicas, o que pretende-se é construir e disponibilizar

coletivamente um enfoque metodológico baseado na visão estratégica e situacional que

incorpore radicalmente elementos de emancipação, liberdade e participação das

pessoas. Neste sentido cada processo de planejamento, seja institucional (numa

secretaria, empresa pública, autarquia ou fundação, por exemplo) ou por Projeto/Tema

específico, deve ser pensado particularmente com as devidas adaptações metodológicas.

Os princípios teóricos e postulados metodológicos necessariamente devem sofrer

mediações a partir da trajetória e clima interno da organização, da conjuntura do

planejamento, do momento em que ele se realiza e do projeto político-institucional da

direção.

• Nada adianta adotar a linguagem e as palavras do planejamento estratégico e

participativo se não houver vontade política para disponibilizar os meios necessários na

organização para garantir que haverá acompanhamento permanente dos fatos da

conjuntura, cotejamento com o plano elaborado, redesenho das ações e busca dos

objetivos planejados. É no cotidiano, no dia-a-dia, que o plano prova ou não sua eficácia,

para isso, as práticas de trabalho e as culturas organizacionais departamentalizadas e

verticalizadas tem que ser duramente combatidas. Afinal, a participação, como categoria

organizadora do Estado, não é só uma questão ideológica, mas também gerencial e

administrativa.

• As ferramentas e técnicas metodológicas propostas (matrizes, diagramas, técnicas de

priorização de idéias) são apenas instrumentos a serviço de uma concepção

metodológica determinada. Este método, por seu turno, está impregnado de concepções

teóricas sobre a sociedade, o Estado, a ação humana e a produção de fatos sociais. Um

erro comum acontece quando inadvertidamente tomamos as técnicas pelos métodos ou

os métodos pelas sínteses teórico-ideológicas que os informam. O fundamental para a

eficácia do processo de planejamento é a plena consciência do grupo de planejamento

sobre quais são os marcos teóricos e os princípios que estão orientando o uso dos

241

métodos e a aplicação desta ou daquelas técnicas que, de resto, são adaptadas de

acordo com as circunstâncias concretas.

• A “tecnologia” de aplicação do método implica em visualização permanente de todos os

passos constituídos pelo grupo. Para cumprir este objetivo são sugeridas várias matrizes

(em anexo) que sistematizam os passos e guardam coerência com o roteiro proposto.

A seguir um quadro-resumo entre o planejamento convencional e o planejamento

situacional:

A coerência interna do enfoque participativo e estratégico do planejamento, no plano geral,

decorre de quatro grandes momentos, que podem ser recursivos e não-lineares, mas que

representam um sequenciamento lógico da elaboração teórica do planejamento. A seguir as

características básicas dos quatro grandes momentos.

Momento Explicativo (explicar posicionanando-se)

O momento explicativo tem como categoria central a noção de problema. No planejamento

tradicional a realidade é dividida em setores e o método dos planejadores é tão

242

fragmentado quanto são os departamentos dos órgãos de planejamento. O conceito de

setor, além de muito genérico e pouco prático, é uma imposição analítica. O planejamento

estratégico situacional propõe trabalhar com o conceito de problemas. A realidade é

composto de problemas, oportunidades e ameaças. Esta categoria permite sintetizar a

noção de explicação da realidade em suas múltiplas dimensões (inter-disciplinar) com a

noção de direcionalidade do ator: saber selecionar e identificar problemas reais (atuais ou

potenciais) e distinguir causas de sintomas e conseqüências já é mudar radicalmente a

prática tradicional dos “diagnósticos” convencionais. Explicar a realidade por problemas

também permite o diálogo e a participação com setores populares que afinal sofrem

problemas concretos e não “setores” de planejamento, além de facilitar a aproximação

entre “técnicos” e “políticos”. Na explicação da realidade temos que admitir e processar a

informação relativa a outras explicações de outros atores sobre os mesmos problemas, isto

é, a abordagem deve ser sempre situacional, posicionada no contexto. Em resumo,

“explicar” é dialogar com a situação.

Momento Normativo (definir o que se quer fazer)

É a instância onde se desenha o plano. Após a identificação, seleção e priorização de

problemas, bem como o debate sobre as causas, sintomas e efeitos estamos prontos para

desenhar o conjunto de ações ou operação necessárias e suficientes para atacar as causas

fundamentais dos problemas (também chamadas de Nós Críticos). Esta é a hora de definir o

conteúdo propositivo do plano. O central neste processo de planejamento é discutir a

eficácia de cada ação e qual a “situação - objetivo” esperada. Isso só pode ser feito

relacionando-se os resultados desejados com os recursos necessários e os produtos de cada

ação. Os planos normativos normalmente terminam aqui, onde o planejamento situacional

apenas começa, para que ações tenham impacto efetivo e real na causa dos problemas há

ainda dois passos ou momentos fundamentais, o estratégico e o tático-operacional.

Momento Estratégico (construir viabilidade política)

É a criação de possibilidades, a construção da viabilidade do plano. Se a realidade social não

pode ser fragmentada em diferentes “setores”, se outros “jogadores” existem e tem seus

243

próprios planos, se o indeterminismo e as surpresas fazem parte do cotidiano, então o

debate sobre a viabilidade estratégia das ações planejadas não é só necessário como

indispensável. Toda estratégia é uma exploração consciente do futuro, ela resulta da

situação diferenciada dos vários atores em relação à problemas, oportunidades e ameaças. A

parte a grande quantidade de conceitos envolvendo o termo “estratégia” aqui vamos adotá-

la com um conjunto de procedimentos práticos e teóricos para construir viabilidade para o

plano, para garantir sua realização com máxima eficácia. Dois instrumentos-processos

cabem aqui: a análise de cenários e a análise criteriosa dos demais atores sociais ou agentes.

Os cenários representam distintas reflexões, limitadas pela qualidade da informação

disponível, sobre possíveis “arranjos” econômicos, institucionais, políticos, sociais, etc.,

capazes de influenciar positiva ou negativamente a execução das ações planejadas no

futuro. Ao permitir a simulação sobre as condições futuras os cenários permitem a

antecipação das possíveis vulnerabilidades do plano e a elaboração de planos de

contingência necessários para minimizar os impactos negativos. Já a análise dos demais

agentes envolvidos no espaço do problema-alvo do plano é imprescindível para identificar o

possível interesse e motivação de cada um e o tipo de pressão que é (ou será) exercida em

relação às ações planejadas. É obvio dizer que a elaboração de cenários e o “estudo do

outro” só tem um grande objetivo: desenhar as melhores estratégias para viabilizar a

máxima eficácia ao plano.

Momento Tático – Operacional (atuar na conjuntura)

É o momento de fazer, de decidir as coisas, de finalmente agir sobre a realidade concreta. É

quando tudo se decide e por isso do ponto-de-vista do impacto do plano é o momento mais

importante. Neste momento é importante debater o sistema de gestão da organização e até

que ponto ele está pronto para sustentar o plano e executar as estratégias propostas. Para

garantir uma resposta positiva será preciso acompanhar a conjuntura detalhadamente e

monitorar não só o andamento das ações propostas, mas também a situação dos problemas

originais. Deve-se reavaliar criticamente todo o processo interno de tomada de decisões, o

sistema de suporte à direção, como os sistemas de informações, devem ser revistos e

reformulados. Outros temas vitais neste momento são a estrutura organizacional, o fluxo

interno de informações, a coordenação e avaliação do plano, o sistema de prestação de

244

contas, as ferramentas gerenciais existentes e necessárias e finalmente a forma, dinâmica e

conteúdo da participação democrática na condução do plano. Não podemos esquecer que o

planejamento estratégico só termina quando é executado, é o oposto à visão tradicional do

“plano-livro” que, separando planejadores dos executores, estabelecia uma dicotomia

insuperável entre o conhecer e o agir.

Um resumo dos quatro momentos do PES:

3. A construção do método: um roteiro de aplicação

As Declarações Estratégicas – o início

Este momento é o equivalente a um Planejamento Institucional, realizado pela direção da

organização, que estabelece o norte estratégico, os grandes macro-objetivos institucionais

propostos pelo jogo social. A teoria matusiana de planejamento usa com frequência a

metáfora do “jogo” para explicar o posicionamento histórico dos atores sociais, o jogo é

245

composto de “situações” no sentido hermenêutico, isto é, é impossível saber-se plenamente

onde se está e como vão agir os demais. Estes conceitos são muito próximos aos conceitos

do sociólogo francês Pierre Bourdieu de habitus – estruturas mentais e sociais que

condicionam a ação e o espaço de sociabilidade e campo – espaços sociais onde os atores

medem relações de força e cujas regras de funcionamento derivam desta própria disputa.

Ele será o ponto de partida do seminário de Planejamento Estratégico mais amplo. Neste

passo será definida a missão, uma imagem de futuro, os valores e as diretrizes estratégicas

da organização.

A missão: o que é ?

É a atividade essencial da finalidade e razão da existência de uma organização. Esta

definição serve para qualquer instituição pública, seja da Administração Direta ou da

Indireta ou organizações sociais e sem fins lucrativos.

Contudo há uma distinção que se deve adotar na caracterização deste conceito,em relação a

como é entendido pelo setor privado ou mercantil. Esta caracterização é importante em

razão da reduzida produção teórica desse conceito, vinculando-o à atividade pública.

No setor privado, pode-se escolher livremente a missão que se desejar, desde que atenda

ao reclame de seu público alvo, a um determinado foco, uma certa qualificação ou

excelência e se incorpore á imagem via missão de valores dignificantes apontando em

direção a aceitação social – e sobretudo mercadológica - da empresa pela relevância da

atividade. Em última instância, no setor privado a “razão de existência” da empresa é

sancionada ou não pelo mercado, é a perspectiva de demanda presente ou expectativa

futura de realização que justifica a existência da entidade.

Planejamento Institucional

Planejamento Estratégico

Planejamento Operacional

246

No setor público, a missão de qualquer de suas instituições deriva de um permissivo

legislativo. Ela está condicionada às regras de responsabilidade do jogo macroinstitucional,

não há liberdade imediata de arbítrio por parte do gestor na definição da “razão de

existência” de uma organização pública. Uma disfunção de tal natureza geraria tensões

entre a conduta do governo e a legalidade pré-constituída, o que pode inclusive, ser uma

opção consciente que forma parte da direcionalidade do governo.

Note-se que o empreendimento privado necessita de aprovação social, de uma imagem que

o público em geral e o alvo mercantil, em particular, perceba no empreendimento, como

inserida nos valores sociais amplamente aceitos e os dignifique.

Em outra posição estão as organizações de natureza estatal, criadas pelo poder público

através de processos legislativos genuínos e pelo poder constituinte de Governo. Nestas, o

caráter e essência de sua missão são previamente definidos pelo poder que as criou. Neste

caso, a definição da missão da organização deve coincidir com suas finalidades expressas no

ato constituinte.

Qualquer alteração nesse princípio supõe uma alteração da sua criação. Isto não significa

que sua ‘missão’ não possa ser alterada. Todavia, a complexidade social que impõe tal

escolha - modificar a missão de uma instituição pública, implica numa estratégia de

caráter e essência derivadas da construção da hegemonia política e social.

É nesta perspectiva política que um órgão de Estado é sistematicamente tensionado pelo

projeto de governo. Este tensionamento é que constitui a matéria prima da

governabilidade, isto é, pergunta-se sempre até que ponto (e qual o limite?) em que os

formatos e desenhos institucionais prévios devam se adaptar (ou não) aos programas

eleitos ? Sob esta perspectiva faz sentido diferenciar o que seria uma “missão

institucional”, que “independe” da vontade política do gestor, do seu próprio programa

de governo legitimamente constituído.

A missão de uma organização possui uma certa estabilidade, assim como a visão de

futuro de sua direção, alguns fatores devem estar presentes na sua constituição: (a) as

necessidades que a instituição procurará satisfazer em relação às expectativas da

247

sociedade, (b) os serviços que irá oferecer, (c) os públicos ou grupos sociais beneficiários

e por fim (d) a maneira como atenderá seu público-alvo, o que está relacionado aos

valores que adotará no seu dia-a-dia. É por isso que a missão deve sempre que possível

responder as perguntas: O que a organização faz ? Para quem ela faz o que faz ? Como

ela faz o que faz ?

A visão de futuro: o que é?

É o sentido da direcionalidade da instituição. É aquele estágio que desejamos alcançar,

dentro de um parâmetro de realidade, em um determinado espaço temporal. Corresponde a

um futuro desejado e possível de ser alcançado, para o qual serão fixados objetivos

estratégicos. Cuida a visão de dotar a organização de um ‘sonho possível’ e tangível, para o

qual as energias devem ser dedicadas.

O debate em torno da “visão de futuro” deve habilitar a construção de uma imagem capaz

de polarizar atenções e mobilizar “corações e mentes” da organização. Tal imagem não se

confunde com a “Missão”, mas a completa e atualiza em um plano superior.

A visão deve materializar uma “ambição coletiva”, capaz de criar um clima de envolvimento

e comprometimento compartilhado, seu enunciado deve ser claro e objetivo, desafiador,

irradiador de otimismo e positividade.

Os valores da organização: o que são?

São os princípios que orientam a prática organizacional. Mediatizados pela definição que

melhor caracteriza o sentido de sua realização. Toda organização, pública ou privada, possui

valores que busca realizar. Tais valores exigem evidenciação para que todos os envolvidos

possam analisar sua efetivação prática. O debate coletivo sobre os valores prezados e

cultivados pela organização permite elucidar e declarar – muitas vezes com tensionamentos

necessários – as condições efetivas de clima organizacional, das relações interpessoais, do

processo decisório interno e das práticas organizativas mais dominantes.

248

Assim os valores de uma organização representam sempre as idéias fundamentais em torno

das quais se organiza a instituição, são as convicções dominantes, as crenças básicas. Devem

servir sempre como fonte de orientação e inspiração no local de trabalho, são

fundamentalmente idéias e simbologias motivadoras que dão coerência e unidade de

trabalho.

Os valores de uma organização pública, por exemplo, podem se referir à qualidade dos seus

serviços, a democratização e transparência, à eqüidade, à ética na função pública e

responsabilização social, etc...

As diretrizes estratégicas : o que são?

São os rumos-direções-sentidos que devem ser perseguidos para a escolha de objetivos,

projetos e metas, conformados por políticas, deduzidos da Missão e Visão da Instituição,

mas sobretudo, do programa de governo. É uma linha-guia, norteada pelos próprios

objetivos, ou pela interpretação das políticas.

As Diretrizes Estratégicas definidas pela Direção política do órgão constituem-se em

“input” para a fase seguinte, devendo, portanto, serem apresentadas para todos os

servidores e em especial aos participantes dos diferentes fases do Planejamento

Estratégico com enfoque participativo.

Ao estabelecerem uma direcionalidade para o órgão, as Diretrizes Estratégicas devem ser

intensivas e focalizadas, ou seja “poucas e boas”, pois elas irão condicionar todas as etapas

seguintes.

As diretrizes devem constituir materialidade e significância para a missão, assegurar

coerência com a “visão de futuro” e compatibilidade plena com os valores institucionais.

Quem participa?

249

É o momento instituinte da Direção do Órgão, indelegável e indispensável para desencadear

todo o processo de planejamento e gestão estratégica. Não se pode delegar a outras

instâncias da organização uma possível “interpretação” das diretrizes da direção, ela mesma

deve traduzir sua leitura do programa de governo para o processo de planejamento.

Como fazer?

Deve decorrer da adaptação reflexiva, sobre a instituição a ser planejada, deduzindo das

diretivas fundantes, a Missão, uma Visão de Futuro, as Diretrizes Políticas do Programa de

Governo. Tais diretivas, para se constituírem num corpus político que agregue e potencialize

a organização devem ser compartilhadas de forma clara e consolidada pela alta direção do

Órgão.

Quadro 1: Matriz das Declarações Estratégicas

Missão Porque a organização existe ?

Visão de Futuro Onde queremos chegar no futuro ?

Valores institucionais O que valorizamos no nosso convívio ?

Diretrizes estratégicas Quais os caminhos a percorrer para chegar ?

250

Quadro 1: Matriz das Declarações Estratégicas

MISSÃO

AMEAÇAS

(Limites)

OPORTUNIDADES

(Potencialidades)

VISÃO de futuro

VALORES

INSTITUCIONAIS

DIRETRIZES ESTRATÉGICAS

Nota Explicativa:

A informação mais importante registrada neste quadro é uma avaliação preliminar do grupo

sobre o grau de vulnerabilidade e potencialidade que representa na conjuntura presente o

desafio proposto pela Missão, Visão , Valores e Diretrizes Estratégicas da organização,

especialmente este último elemento. As afirmações devem ser claras e objetivas para

auxiliar depois no desenho de operações e na análise de cenários. A análise de “ameaças &

oportunidades” – relativas à missão e visão de futuro – pode ser feita pelo grupo dirigente

ou no início do seminário de planejamento estratégico como tática para envolvimento dos

participantes e nivelamento teórico.

Decidindo coletivamente o plano estratégico – o passo seguinte

A constituição de um Comitê de Planejamento ou Grupo de Planejamento dentro da

organização é o primeiro passo para desencadear o planejamento estratégico no âmbito do

conjunto da organização. Sua tarefa será organizar e sistematizar as Declarações

Estratégicas da alta Direção, de modo a torná-las acessíveis à toda organização e preparar a

ampliação participativa do processo.

251

A constituição desse Comitê é de exclusiva responsabilidade da Direção do órgão que

indicará sua composição e coordenação. Sua existência culmina com a definição, já no

âmbito do Seminário Geral, de novos componentes que irão, então, constituir, o Comitê de

Gestão, junto aos originários do Comitê de Planejamento, com a coordenação indicada pela

Direção do órgão. Resumindo, sugere-se que após tomada a decisão política-institucional de

fazer o planejamento, a direção delegue a uma força-tarefa (um grupo de trabalho ou

comissão) a incumbência pela organização e preparação do processo amplo, ou seja, dos

seminários de planejamento até a elaboração do documento final.

Durante o seminário este grupo deve transformar-se num coletivo de gestão do plano

elaborado incorporando a representação do próprio grupo de planejamento que desenhou

o plano durante os seminários.

Há três boas razões para este formato:

(a) o planejamento é sempre um processo constituinte da organização em que a própria

direção deve submeter-se aos seus resultados, daí a importância política e operacional em

delegar a um grupo externo a preparação do processo com maior isenção,

(b) o GT de planejamento além de assumir todas as tarefas materiais de organização do

processo (preparação do evento, logística, agendas, etc...), organiza e garante a eleição dos

representantes dos funcionários para os seminários de planejamento, isto é essencial para

garantir a natureza participativa do método e não pode ser resumido ao cumprimento de

uma tarefa meramente técnica, por fim

(c) o GT é o embrião de uma comissão que vai acompanhar a execução do plano

funcionando como subsídio permanente à direção da organização. Em algumas experiências

de maior radicalidade democrática o “comitê de gestão do plano” praticamente absorveu a

direção da organização, porque “executar o plano” implica, de fato, em dirigir e governar.

A análise situacional da organização – iniciando o seminário de planejamento

252

O que é ?

É a análise coletiva da situação em que se encontra a organização que planeja, no contexto

da conjuntura, consideradas as declarações estratégicas propostas pela direção política do

órgão. É o momento de introdução do seminário geral.

Qual objetivo ?

O objetivo deste passo é crucial para viabilizar o processo do planejamento estratégico, com

enfoque participativo. Em primeiro lugar é preciso reconhecer que a proposição de diretrizes

estratégicas para o órgão é específica da função de governo exercida pela direção.

Este atributo está legitimado pelo processo de escolha eleitoral democrática e fundante do

início do processo de planejamento. Nesta fase a direção “submete” à reflexão conjunta do

grupo de planejamento a Missão, os Valores norteadores, a Visão de futuro, e as Diretrizes

Estratégicas. Os objetivos são:

(1) Tornar clara e transparente para todo o grupo “onde a direção quer

chegar”, quais as grandes estratégias da organização e quais as ameaças

e oportunidades que ela visualiza para o condicionamento destas

diretrizes.

(2) Garantir ao conjunto dos participantes (staff, gerentes e representantes

dos funcionários) a crítica às orientações gerais da direção.

(3) Criar situação de assimilação/reflexão por parte dos funcionários, em

relação às diretrizes. Mesmo que haja discordância ou antagonismos

aparentemente irreconciliáveis entre os participantes do seminário (os

funcionários eleitos, por exemplo) é vital que todos tenham a mesma

compreensão das diretrizes, ou seja, “falem a mesma língua”.

(4) Construir uma solução de compromisso com o grupo de participantes

(especialmente aqueles não vinculados à direção) em relação às diretrizes

253

propostas. Ou seja, exercitar a prática do convencimento pela

racionalidade argumentativa, pelo livre debate de idéias.

Como fazer ?

O facilitador - consultor externo, moderador ou coordendor - (não é aconselhável a

apresentação por membro da direção) deve apresentar o Planejamento Institucional que

contém as principais informações sobre a avaliação situacional do órgão. A seguir deve-se

debater a partir da missão, visão de futuro, valores, análise de oportunidades e ameaças até

chegar nas diretrizes estratégicas.

É importante deixar claro que as Diretrizes são prerrogativas da direção, porém elas não

estão acima, nem abaixo, da crítica do coletivo presente ao seminário. Este deve, se for o

caso, propor formulações alternativas com leituras diversas para convergência de

expectativas e acordos internos.

O debate técno-político direto, sincero e aberto define até onde as mediações serão

necessárias. O importante é assegurar o maior grau de realidade para o debate.

Normalmente avaliações situacionais auto-complacentes ou triunfalistas provocam uma

“falsa auto-imagem” que resultará em planos ineficazes ou estratégias equivocadas.

As oportunidades representam as forças impulsoras ou os “fatores críticos de sucesso” e

podem estar relacionados a aspectos econômicos ou financeiros, oportunidades da

conjuntura, características organizacionais ou de recursos humanos, potencialidades futuras

do ambiente interno e externo da organização, clima organizacional, imagem externa,

cultura de planejamento, liderança, qualidade dos serviços prestados, experiência, etc.

A chamada “análise SWOT” (já debatida no curso) serve como um “aquecimento” do grupo

para identificar a situação atual da organização, particularmente os grandes gargalos e

problemas relacionados aos seus objetivos estratégicos.

As ameaças ou pontos fracos, também chamadas de debilidades, constituem tudo que a

organização faz ou deixa de fazer tornando-se distante da missão, valores e imagem de

254

futuro. Neste momento podem constar os mesmos processos e análises da etapa anterior,

porém agora com conteúdo negativo.

A análise de ameaças/pontos fracos e oportunidades/pontos fortes deve ser feita

relativamente ao desejo de cumprir a Missão, construir os valores e uma visão de futuro.

Análise do ambiente interno:

(a) forças ou pontos fortes: aquilo que a organização deveria estar fazendo e já está fazendo

bem. São variáveis que a organização controla e executa bem. Exemplos: boa imagem

junto aos clientes; existência de bom sistema de informações gerenciais, colaboradores

comprometidos, liderança forte e atuante, cultura de planejamento, qualidade dos

serviços prestados, experiência acumulada, etc...

(b) fraquezas ou pontos fracos: aquilo que a organização deveria estar fazendo e não está

fazendo, ou está fazendo mal. São variáveis que a organização controla, mas executa

mal. Exemplos: ausência de objetivos e metas claras, desmotivação dos colaboradores,

clima de desconfiança, liderança fraca, serviços de má qualidade, etc...

Análise do ambiente externo:

(a) oportunidades: forças externas à organização (políticas, econômicas, sociais,

tecnológicas, legais) que, se conhecidas a tempo podem ser melhor aproveitadas

enquanto perduram, dependendo das condições internas da organização. Exemplos:

facilidade de acesso a novas tecnologias, disponibilidade de maior volume de recursos

por conta de linhas de crédito especiais, incentivos governamentais à cultura do

planejamento e avaliação de resultados, etc...

(b) Ameaças ou riscos: forças externas à organização, que se conhecidas a tempo podem

Ter o seu impacto minimizado. As ameaças podem concretizar-se ou não e seus

impactos podem afetar ou não a organização, dependendo de suas condições internas

de neutralização. Exemplos: instabilidade política dos dirigentes, falta de autonomia

gerencial, greves, etc...

255

As diretrizes serão revisitadas após esta análise, no sentido de fixar as grandes marcas

estratégicas que, superando as ameaças e aproveitando as oportunidades, nos aproximam

da missão e da imagem da organização.

Ou seja, pressupõe-se que após um exaustivo diagnóstico global da situação da organização

feito pelos participantes do seminário as condições para hierarquização e priorização das

diretrizes estarão postas. Algumas experiências realizadas concluem esta parte inicial do

evento com a definição das grandes “marcas” e símbolos que deverão marcar a gestão.

Quem faz ?

O Grupo de Planejamento em plenária, a princípio. Pode-se conforme as circunstâncias (para

ganhar tempo, por exemplo) dividir o grande grupo em grupos menores para análise de

oportunidades e ameaças. É vital para o planejamento que a direção política do organismo

esteja totalmente envolvida desde este primeiro debate.

Identificando, selecionando e explicando problemas – o momento explicativo

O que é ?

É a identificação, seleção e priorização de problemas que se constituem nos principais

obstáculos para o cumprimento das diretrizes estratégicas da organização, considerada a

análise de ameaças e oportunidades.

Qual objetivo ?

IDENTIFICAÇÃO Tema de Insatisfação

(sintomas)

ANÁLISE E DESCRIÇÃO (descrição e formulação de problemas), limpeza e

descarte

SELEÇÃO DE PROBLEMAS

(compromisso de execução)

256

O problema é fundamentalmente uma situação desconfortável para o ator que pode ser

evitada. Isto é, o problema deve tornar-se um centro prático de ação, mesmo que existam

variáveis ligadas à explicação do mesmo, sobre as quais possuímos baixa governabilidade. A

identificação, seleção e explicação do problema (através do fluxograma explicativo ou

“árvore do problema”) é passo fundamental porque dele deriva toda a construção posterior

da metodologia.

Na percepção de Matus:

“Existe uma tendência a crer que as soluções são previamente conhecidas e que a

explicação do problema deve acomodar-se às soluções pré-concebidas. Existe também

uma tendência, em cada ator, a crer que sua solução e sua explicação são as corretas.

Esses vícios de irreflexão opõem-se ao planejamento como processo criativo e

penetrante. “

Resumo das principais vantagens metodológicas na “análise do problema”:

(1) demonstra claramente que os problemas têm causas relacionadas umas às outras.

(2) permite construir uma visão mais sistêmica e holística sobre possíveis estratégias.

(3) contribui para hierarquizar recursos escassos e focalizar as energias de gestão.

(4) ajuda pedagogicamente nos processos de aprendizagem e participação internos.

Os problemas que predominam no universos social, na gestão pública em especial, são

aqueles ditos “quase-estruturados” que exigem metodologias de planejamento de

qualidade diferenciada.

Identificar problemas não é tarefa simples. Vemos o mundo de acordo com os óculos que

estamos usando. Cada pessoa tem sua cultura, suas referências e valores. O que é problema

para uns pode ser a solução para outros. Nossa percepção e intuição são importantes, mas

podem enganar.

257

Uma quadro-resumo que mostra a diferenças entre problemas bem estruturados (fáceis de

resolver) e problemas quase-estruturados (difíceis de resolver).

Problema Estruturado Problema Quase-Estruturado

1. As regras do sistema que o produz são precisas, claras,

invariáveis e predeterminadas. Elas existem antes da

solução do problema e permanecem iguais após a

solução.

1. O problema está determinado por regras, mas estas não

são precisas, nem invariáveis e nem iguais para todos. Os

atores sociais criam as regras, e às vezes as mudam para

poder solucionar os problemas.

2. O homem está fora do problema e se relaciona com

ele somente para tentar resolvê-lo conforme regras

predeterminadas; e, se o problema é solucionado,

ninguém terá dúvidas quanto à eficácia da solução.

2. O homem (ou ator social) está dentro do problema e é

aí que o conhece e o explica, mesmo que não tente

solucioná-lo. A eficácia de uma solução é discutível e

relativa aos problemas que seguem.

Veja, por exemplo, o que você vê na figura a seguir, uma jovem senhora olhando para o lado ou o rosto de uma velha ?

Tente explicar a “lógica” deste cubo !

258

3. As fronteiras do problema e do sistema que o gera

estão perfeitamente definidas. Não há dúvidas sobre

onde começa e onde acaba cada coisa.

3. As fronteiras do problema e do sistema que o

gera são difusas.

4. As regras do sistema tornam explícitos ou contêm

implicitamente os conceitos (possibilidades e restrições)

pertinentes à resolução do problema.

4. Os atores sociais (ou os homens) criam possibilidades de

solução, que não existem previamente. Os conceitos para

compreender as possibilidades de solução e suas

restrições não são dados necessariamente previamente.

5. O problema está isolado de outros problemas e,

havendo uma seqüência com outros, a solução de cada

um não afeta a solução dos seguintes.

5. O problema está sincrônica e diacronicamente

entrelaçado a outros; a solução de um problema facilita ou

dificulta a solução de outros.

6. O espaço e o tempo pertinentes ao problema são

definidos nas regras como fixos, ou tornam-se fixos para

quem se relaciona com ele.

6. O espaço e o tempo são relativos a quem se relaciona

com o problema a partir de diferentes posições.

7. As variáveis que constituem o problema são dadas,

enumeráveis, conhecidas e finitas.

7. O sistema é criativo e suas variáveis não são dadas, não

são todas enumeráveis, nem conhecidas e nem finitas.

8. Qualidade e quantidade não se combinam, o problema

se move em um ou outro âmbito.

8. Qualidade e quantidade combinam-se

inseparavelmente.

9. As possibilidades de solução do problema estão

contidas nas suas premissas e são finitas em número. As

soluções são conhecidas ou conhecíveis mesmo não

sendo evidentes.

9. As possibilidades de solução do problema são criadas

pelo homem e são potencialmente infinitas em número.

10. O problema coloca um desafio científico ou técnico,

podendo supostamente ser tratado com objetividade.

10. O problema coloca um desafio múltiplo que abrange

sempre o âmbito sociopolítico, mesmo tendo uma

dimensão técnica. A objetividade não é possível, mas

deve-se procurar o rigor.

Como fazer ?

A identificação do problema segue, normalmente, uma seqüência onde:

• O grupo define uma listagem de problemas com liberdade total de critérios. Pode-se

estimular o debate a partir da análise do “triângulo de governo” que relaciona nos

vértices as categorias “Projeto de Governo”, “Governabilidade” e “Capacidade para

Governar”. Normalmente o debate sobre estes três pontos enseja um “chuva de idéias”

sobre os problemas da organização. Abaixo um diagrama que ilustra esta relação:

259

• O facilitador ou monitor promove a “limpeza” de problemas mal-formulados ou

confusos, inquirindo o grupo e provocando a reflexão sistemática sobre os resultados da

produção coletiva.

• O uso de tarjetas (pedaços retangulares de cartolina colorida onde os participantes

escrevem seus argumentos) ou outro método de visualização é fundamental pois

garante a participação de todos. Aqui cada palavra ou frase pode ter múltiplos

significados.

• A descrição ou redação de um problema deve ser feita de forma negativa, isto é,

expressando um sentido de negatividade de não-conformidade, etc.

• Tradicionalmente iniciamos por definir soluções mesmo sem saber qual problemas elas

supostamente estão tentando resolver. No planejamento estratégico, com enfoque

participativo ocorre o contrário da reflexão convencional.

• É fundamental colocar um só problema por tarjeta, facilitando a recomposição visual das

idéias durante o processo de seleção. Na medida em que os problemas de redação são

filtrados e corrigidos, o entendimento e validação das declarações e o processo de

seleção ou priorização pode iniciar.

260

• Devemos passar, em todas as fases ou passos, de uma situação de reflexão extensiva

para outra de priorização e seleção intensiva, ou seja, de focalização permanente naquilo

que é sempre prioritário, que é anterior.

• O grupo deve separar três categorias analíticas que envolvem a identificação de

problemas: as causas, os efeitos e os sintomas do problema. Deve-se começar pela

descrição do problema, como ele aparece, como se torna visível e só depois explicar

causas e efeitos. A descrição de um problema pode ser a base para formular indicadores

que permitirão, mais adiante, montar um sistema de monitoramento.

• O grupo seleciona vinte, trinta ou quarenta problemas que estão “no caminho” das

diretrizes estratégicas. Quanto maior o número de problemas, mais tempo será

necessário para processar o debate seguinte (seleção e explicação).

• O grupo deve selecionar no máximo dois ou três grandes problemas em cada estratégia

(ou no máximo cinco problemas, para o conjunto das estratégias). Lembramos que para

cada problema selecionado todo um “plano de ataque” deverá ser elaborado, suas

estratégias, instrumentos de gestão, etc.

• O consultor deve agrega-las por âmbito temático (administração, finanças, atividades

finalísticas, etc.) pois isto facilita a leitura e interpretação do conjunto de problemas do

grupo. Sugerimos a seguir algumas perguntas-orientadoras como fio condutor dos

debates, por exemplo: Quais problemas são centrais para atingir as diretrizes?

Considerando a análise situacional - quem nós somos e para onde queremos ir, onde

devemos concentrar nossos recursos estratégicos? Quais problemas estão totalmente

fora da nossa governabilidade e portanto, exigem que se adote estratégias

diferenciadas?

CR

ITÈR

IOS

P

AR

A

SELE

CIO

NA

R

PR

OB

LEM

AS

(1) Qual a natureza e a intensidade do impacto do problema nas Declarações Estratégicas

definidas no Planejamento Institucional (diretrizes).

(2) Qual o valor Político atribuído ao problema.

(3) Período de maturação dos sintomas e efeitos do problema (mandato).

(4) Recursos dominantes necessários para seu enfrentamento e solução.

(5) Grau de governabilidade e eficácia exigida do governo ou organização.

(6) Qual a reação dos outros atores diante dos problemas selecionados.

(7) Quais os custos (financeiros ou não) do adiamento de seu enfrentamento.

261

(8) O ataque aos problemas exige padrões de inovação ou continuidade.

(9) Quais os impactos (ou abrangência) do problema a nível regional.

Explicar bem o problema é fundamental para desenhar operações e ações no momento

seguinte. Muitos problemas iniciais, que foram descartados pelo grupo, surgem novamente

como causas ou conseqüências dos problemas escolhidos, este “entrelaçamento” de

problemas é um indicador importante da pertinência situacional do método.

Outra finalidade deste “debulhamento” do problema é concentrar as atenções nas causas e

não nos efeitos ou sintomas do problema. A identificação das causas dos problemas é

fundamental e ainda podemos descrevê-las segundo os diferentes graus de governabilidade

que temos sobre elas. Por exemplo, existem regras jurídicas ou condicionamentos

estruturais (ou históricos) que ajudam a conformar determinados problemas, porém não são

centros práticos de ação, pelo menos da ação direta do ator social que está planejando.

Para Matus o ator social é definido a partir das seguintes caracterísiticas:

a) sua ação é criativa, não segue leis, é singular e único como ente com sentidos, cognição,

memória, motivações e força, é produtor e produto do sistema social;

b) tem um projeto que orienta sua ação, mesmo que seja inconsciente, errático ou parcial;

c) controla uma parte relevante do vetor de recursos críticos do jogo, tem força e

capacidade para acumular ou desacumular forças e, portanto, tem capacidade para produzir

fatos no jogo social; d) participa de um jogo parcial ou do grande jogo social, não é um

analista ou simples observador;

e) tem organização estável, que lhe permite atuar como peso de um coletivo razoavelmente

coerente; ou, tratando-se da exceção aplicável a uma personalidade, tem presença forte e

estável, o que lhe permite atrair, com suas idéias, uma coletividade social,

f) poder ser uma ator-pessoa ou um ator-grupo, no caso de que se trate de um líder ou de

uma direção de uma organização; é um jogador real que acumula perícia e emite

julgamentos, não uma ficção analítica; é um produtor de atos de fala e de jogadas.

262

No PES original o ator que planeja escolhe um ou dois problemas centrais e monta uma

árvore explicativa (em sentido horizontal, com as relações causais da esquerda para a

direita), no método ZOPP – já debatido no curso - a árvore explicativa é montada com as

causas na base, como as “raízes do problema”. Como normalmente possuímos várias

diretrizes estratégicas na organização e a identificação de problemas (no âmbito de cada

diretriz) é fundamental para o sentido do método, optamos aqui por selecionar vários

problemas com causas agregadas do que construir exaustivamente as árvores explicativas de

apenas um ou dois problemas centrais.

Caso haja disponibilidade de tempo no seminário, a montagem das árvores explicativas e o

fluxograma situacional (árvore só com causas fundamentais) para cada um dos problemas

selecionados, é sempre a melhor opção. Um olhar atento para uma árvore de um problema

qualquer rapidamente identificará os nós críticos como verdadeiros “nós” de uma rede

explicativa mais ampla. Nosso universo cognitivo deve ser sempre tensionado para

apreender as “redes explicativas” mais amplas que compõe o cenário e pano de fundo de

explicações parciais e incompletas.

O central na explicação de um problema é concentrar as atenções nas suas causas – por isso

devem ser sempre separadas de sintomas e efeitos. Quanto mais clareza e evidência coletiva

das causas de um problema, maiores as chances de desenhar a operação certa para

enfrentá-lo e buscar a diretriz estratégica pré-definida. As causas mais fundamentais são

verdadeiros nós críticos que precisam ser “desatados”. O método propõe neste sentido o

desdobramento das causas em três tipos ou níveis classificatórios:

Regras

• São determinadas por jogos anteriores, é a história passada do jogo.

• São leis, normas, condicionantes que definem o jogo.

• Os atores sociais que as defendem são os dominantes e tem hegemonia.

• São normas estruturais, exigem muito poder sua modificação.

Acumulações

• São as potencialidades, as capacidades acumuladas dos jogadores.

• São estoques de poder que sedimentam as jogadas, causas influentes na

conjuntura

• São as causas mais imediatas do problema, mais próximas da conjuntura.

263

Fluxos • Tem influência sobre as acumulações e regras, mas podem ser resultado

imediato das mesmas.

Algumas analogias ilustram as diferenças entre estes três tipos de causas dos problemas

ditos “quase-estruturados”. Na hidráulica as regras seriam o regime de chuvas, as

acumulações a água dos rios e os fluxos a correnteza; nas finanças as regras seriam os

regulamentos do mercado de capitais, a acumulação o capital financeiro e o fluxo a

aplicação do capital, que pode gerar novas acumulações ou não.

Exemplos de problemas quase-estruturados na administração pública: “Ineficiência dos

Serviços de Transporte Coletivo”, “Excessiva concentração da renda”, “Baixa produtividade

do funcionário público”, “Inviabilidade do modelo previdenciário atual”, “Inexistência de

mecanismos participativos na gestão”, “Baixo desenvolvimento econômico regional”,

“Poucos recursos tributários próprios do Município”, “Baixa consciência política da

população”, “Sistema de Monitoramento do Governo é precário”, “Relação desqualificada

entre Administração e Sindicatos”, “Planejamento burocrático e normativo é dominante”.

A explicação situacional de um problema gera um conjunto de causas interligadas

(fluxograma situacional), se selecionarmos, por exemplo, dois problemas centrais para cada

diretriz estratégica, dependendo do número de diretrizes haverá dezenas de causas a serem

resolvidas. É aqui que operamos mais uma vez com o conceito de seletividade e hierarquia

do método, devemos escolher as causas mais fundamentais – chamadas de nós críticos –

que sejam centros práticos de ação e estruturem as cadeias causais.

Um recurso de visualização gráfica que pode ser utilizado é a elaboração da Matriz de

relacionamento Diretrizes Estratégicas X Problemas. Ela ajuda a perceber os níveis de

sensibilidade cruzada entre o conjunto das diretrizes e o conjunto de problemas.

O facilitador deve estimular o grupo a responder qual é o grau de impacto do problema na

Diretriz - alto, médio ou baixo.

264

Na análise horizontal – Diretriz, pode-se verificar o balanço do conjunto de impactos dos

problemas e o nível relativo de exigência de recursos para sua conquista.

Na análise vertical – Problema, pode-se identificar o balanço de impactos de um único

problema no conjunto de diretrizes e assim, a noção relativa da importância de cada

problema em relação aos demais.

Quadro 2: Descrição de problemas – analítico

DIRETRIZ ESTRATÉGICA

PROBLEMA(s) SELECIONADO (s)

(CAUSAS DO PROBLEMA)

regras – acumulações - fluxos

(DESCRITORES DO

PROBLEMA)

(EFEITOS DO

PROBLEMA)

Quadro 3: Descrição de problemas - sintético

DIRETRIZES

PROBLEMAS

DESCRITORES

Nota Explicativa:

Este quadro (em ambas formas) deve registrar com precisão quais são os problemas

escolhidos para enfrentamento. A sinalização dos descritores ajuda no momento de

debater indicadores e monitoramento enquanto que a precisão das causas é fundamental

para o desenho normativo do plano. Um problema central para cada diretriz ou dois a três

265

problemas para o conjunto de diretrizes. O quadro 2 apresenta um desenho da “arvore do

problema” na horizontal, as causas na esquerda, no centro a descrição do problema e na

extrema direita os efeitos do problema. Pode-se entretanto adotar uma representação

usando a metáfora da “arvore”, de baixo para cima.

Agora temos vários problemas, todos verdadeiros, bem redigidos, compreensivos e de

enfrentamento necessário para atingir ou aproximar-nos das diretrizes. Apesar do

pressuposto metodológico de que os debates e construção de consenso de grupo são

objetivos permanentes, estes dependem do tempo disponível e do grau de divergência que

se apresente no momento e de qual é a maturidade do grupo para processá-la. O consultor

deve priorizar os problemas, o ideal é um ou dois problemas em cada diretriz. Para isto

utiliza-se técnicas de priorização, por exemplo como aquelas baseadas em pontuação livre

dos participantes, em um sistema de apostas, com valor máximo e mínimo.

A “árvore do problema” pode ser desenhada conforme o formato abaixo, isto é, o problema

central constitui o “tronco” da árvore com as cadeias causais como “raízes” e os efeitos

como os “galhos”.

266

A seguir uma outra forma de descrever o problema, horizontalmente:

Quadro 4: Matriz de relacionamento Diretrizes Estratégicas x Problemas

PROBLEMAS

P1

P2

P3

P4

DIRETRIZ

D1

267

D2

D3

Nota Explicativa:

Este quadro é útil quando houver um grande número de diretrizes estratégicas a serem

atingidas e/ou um grande número de problemas a serem enfrentados. Deve registrar a

análise das relações de mútua influência entre a solução dos vários problemas selecionados

e as diretrizes estratégicas da organização. Sua utilidade fica evidente no auxílio à decisão

sobre quais problemas tem maior impacto negativo nas diretrizes. As noções de

governabilidade, capacidade de governo e projeto político surgem com intensidade neste

tipo de debate, pois a valorização dos problemas é sempre situacional e distinta entre os

membros da organização. A natureza do problema selecionado determina em grande

medida a qualidade do processo de planejamento e do modelo de gestão.

Quem faz a análise de problema?

O Grupo de Planejamento, conforme o tempo disponível e o tamanho do grupo pode ter

uma divisão em grupos menores por diretriz. O fundamental é que todos se envolvam na

seleção e explicação dos problemas.

Definindo as operações do plano - o momento normativo

O que é ?

É o momento onde definimos o desenho das operações para incidir na realidade concreta. É

o momento mais normativo do método. O que fazer para resolver as causas essenciais dos

nossos problemas? Qual deve ser o rumo a tomar para atingir as diretrizes estratégicas?

268

Quais as grandes ações ou operações necessárias? Estas questões dizem respeito à aplicação

de variados recursos para produzir resultados determinados. Tudo que demandar recursos,

gerar um produto específico e produzir resultados pode ser chamado de ação.

Usamos neste texto as palavras “projeto” e “operação” e “ação” como equivalentes. Uma

taxionomia mais rigorosa definiria “projeto” como um conjunto lógico de operações e

“ações” (e sub-ações) como desmembramentos lógicos das operações, os projetos podem

ainda ser agrupados em programas conforme identidades temáticas: administração, infra-

estrutura, econômico, etc. As operações do plano na verdade é a denominação genérica de

uma categoria de planejamento que traduz fundamentalmente a iniciativa, a vontade de

fazer de um ator social, sua direcionalidade, ela assume formas diferenciadas de acordo com

a escala e o escopo do projeto, pode significar as atividades, as ações, os projetos ou os

programas. Na definição precisa de Matus:

“(...) o programa direcional de um ator social [o conjunto coerente de operações e

ações] é o conjunto de meios ou atos de intervenção social capazes de gestar uma

dinâmica causal de mudança situacional na direção e velocidade necessárias e

suficientes para alcançar, com boa aproximação qualitativa e quantitativa, a situação-

objetivo assumida como compromisso. Em outras palavras, o programa direcional é

um compromisso de ação e resultados; é uma proposta normativa. Através dele o

dirigente procura estabelecer um novo eixo direcional que aponte para a situação-

objetivo e permita alcançá-la num determinado tempo. Chamamos projeto de ação ao

conjunto de operações que enfrentam a situação de uma área problemática. O

programa direcional não é uma estratégia e tampouco é uma política. Não é uma

estratégia porque não indica a forma de construir a viabilidade do plano. Não é uma

política porque, em nossa concepção, uma política é o modo de fazer ou desenvolver

uma estratégia na prática. Nesta divisão de tarefas, a estratégia é um modo de pensar

a política, e a política um modo de fazer uma estratégia...”

Recomendamos utilizar como base metodológica para o desenho e gestão de projetos e/ou

operações, aquela proposta pela metodologia do PMI (“Project Managment Institute”),

sistematizada pelo livro “Guia de Conhecimentos em Gerenciamento de Projetos PMBOK”.

269

Esta metodologia oferece uma técnica efetiva de projetos distribuída por áreas de

conhecimentos, cada uma com seus processos, distribuídas por cinco fases: iniciação,

planejamento, execução, monitoramento e controle e encerramento. Há vários softwares no

mercado que auxiliam a elaboração de projetos, entre os quais podemos citar o MS Project,

o WBS Chart Pro, o PERT Chart Expert, o Mind Manager, etc.

No diagrama a seguir apresentamos uma síntese da metodologia PMI, com as áreas de

conhecimento, os processos e as fases do projeto:

Qual objetivo do desenho das operações?

Aqui devemos construir coletivamente, direção e funcionários do órgão, uma solução

democrática e de compromisso sobre os rumos da organização, os principais projetos,

programas , ações, etc., rumo ao cumprimento das diretrizes, à construção da imagem de

futuro dentro do horizonte de planejamento determinado.

270

Como fazer operações?

O facilitador ou consultor deve promover o grupo de modo a estimular a participação de

todos, facilitar o processo de exposição de idéias, independente do cargo, função ou salário

de cada participante. Algumas dinâmicas e técnicas de grupo podem ser utilizadas para

facilitar a criatividade do grupo.

Uma ação ou operação, projeto, atividade, etc. representa, fundamentalmente, uma

intenção materializada num compromisso de mudança da realidade que é declarado pelo

ator ou agente que está planejando.

Desenhar uma ação implica em determinar uma relação entre recursos, produto e geração

de um resultado e não pode ser confundida como uma recomendação, simples intenção

genérica ou enunciado de um desejo vago e nebuloso.

A elaboração de um programa de ação deve sempre levar em conta os critérios de coerência

com a imagem de futuro declarada, consistência com a análise situacional - grau de realismo

na relação entre meios e fins, e viabilidade técnica e política.

O repertório de ações para conquistar as diretrizes propostas é sempre uma convocação

para a ação, para a qual se deseja adesão da base social ou dos atores parceiros, um

compromisso público e um guia para ação prática.

Alguns cuidados devem ser observados quando desenhamos operações no planejamento

estratégico:

• Evitar a “síndrome da auto-suficiência”, cegar-se pelo voluntarismo ou falsa percepção

dos limites, propor-se a fazer “mais do que os recursos disponíveis permitem”.

• evitar deixar fora do foco de atenção variáveis importantes ou avaliações necessárias.

• evitar a má apreciação das oportunidades da conjuntura.

• superestimar a própria força ou subestimar as forças adversárias ou concorrentes.

271

• perder eficácia por insuficiência de conhecimento técnico, científico ou cultural para

elaborar os projetos (operações) necessários ou

• perder eficiência por incapacidade ou debilidade de gestão e organização.

Quem faz as operações e ações?

Normalmente o desenho de operações exige reflexão e debate multi-disciplinar e inter-

setorial, o que rompe com a segmentação convencional das organizações públicas. Pode-se

reorganizar o grupo todo por diretrizes ou problemas com similaridade temática, formar

grupos parciais para elaborar a Matriz Operacional e realizar a análise de eficiência, eficácia

e impactos nas diretrizes.

É fundamental o conjunto do coletivo de planejamento aprovar o resultado final desta

etapa. A parte normativa importante é o detalhamento operacional (analisada adiante)

destas ações na fase do Planejamento com ênfase mais Operacional. Em muitos casos o

desenho de operações exige domínio de competências técnicas específicas. Por exemplo, no

planejamento de um serviço de “pregão eletrônico” para compras públicas haverá

necessidade de apoio especializado em informática ou no planejamento de um sistema de

indicadores sociais certamente haverá que se contar com o apoio de especialistas setoriais

em educação, saúde pública, saneamento básico e assim por diante.

A Matriz Operacional ou Desenho das Operações

A idéia de uma Matriz Operacional consiste em elaborar um instrumento de visualização

gráfica, que contenha o conjunto das informações mais importantes do desenho normativo

do plano. A matriz consiste na disposição do conjunto de operações definidas na primeira

coluna e deve levar em consideração os seguintes itens:

• Detalhamento: conforme a complexidade das causas do problema ou da diretriz

estratégica será necessário detalhar a Operação em ações ou os Programas em Projetos

ou ações e assim por diante, o grau de detalhamento deve obedecer critérios de

praticidade e operacionalidade do plano.

272

• Recursos necessários: deve-se estimular uma reflexão sobre o grau de

comprometimento de recursos necessários para executar a operação. Os recursos

sempre são multifuncionais, podendo ser classificados em econômicos ou financeiros,

tempo, humanos e políticos. Pode-se atribuir uma graduação -alto, médio, baixo - em

operações mais complexas. A análise de recursos necessários é fundamental para avaliar

a eficiência da ação proposta a partir do balanço geral de recursos. A análise dos

recursos financeiros é a base para construção da proposta orçamentária nas fases

posteriores.

• Produto gerado: é o efeito imediato e direto da execução da ação ou operação. Por

exemplo, se a ação proposta for: “Elaborar projeto de implantação de controladoria

interna,” o produto gerado será provavelmente um “Projeto de Implantação da

Controladoria” e os resultados “melhoria da qualidade do gasto público”.

• Resultado esperado: é crucial distinguir resultado de produto, para que se analise a

eficácia da ação, isto equivale a responder a seguinte pergunta: o produto esperado

desta operação realmente garante o resultado desejado? No exemplo anterior um dos

resultados mais prováveis seria a redução do desperdício ou melhoria da gestão. Há

sempre uma pré-intencionalidade ao definir resultados, já que uma operação pode

produzir muitos resultados. Resultados imprevistos ou negativos, dependendo das

estratégias de viabilidade e dos cenários futuros. Pode-se debater aqui indicadores

quantitativos e qualitativos de resultado que, junto com os indicadores do problema,

podem ajudar para montar o sistema de monitoramento.

• Responsável: recomenda-se definir junto ao grupo de planejamento a pessoa

responsável pela execução da operação e que vai se responsabilizar perante o grupo por

esta tarefa ou pelo seu detalhamento técnico. Esta definição pode ficar “em aberto” e

ser retomada no final do processo de planejamento quando debate–se o problema da

gestão do plano e o conjunto de responsabilizações institucionais que ele demanda.

RECURSOS PRODUTOS

RESULTADOS eficiência

eficácia

273

Estes elementos conformam o padrão mínimo da Matriz Operacional. Algumas metodologias

utilizam outras ferramentas como o “5W2H” (Quem ? Onde ? Como ? Porque? Quando ?

Quanto ? ver glossário), metodologias de controle de qualidade no ciclo PDCA (planejar,

fazer, corrigir e atuar corretivamente) ou o Método do Quadro Lógico, por exemplo. Todas

formas e arranjos descritivos possíveis são válidos desde que haja sempre coerência

metodológica entre os princípios teóricos do método, a metodologia utilizadas, as

ferramentas empregadas e os valores da organização que protagoniza o processo de

planejamento.

Quadro 5: Matriz Operacional

PROGRAMA

PROJETO:

Operações

Ações

RECURSOS

PRODUTO

RESULTADO

RESPON-

SÁVEL

PRAZOS

APOIO

P1

P2

P3

Nota Explicativa:

Esta matriz ou quadro procura resumira etapa ou fase normativa do planejamento quando

desenhamos o “dever ser” do plano. Evidentemente que o quadro representa mais uma

274

ilustração do que um dispositivo operacional para trabalho a nível tático ou operacional. Os

elementos constantes da matriz são mínimos para o desenho normativo de um projeto que

podem ser agrupados e articulados em programas específicos. Posteriormente, nos

seminários operacionais os projetos e operações serão formatados em detalhe para

execução.

Pode-se acrescentar outras tarefas ao Seminário de Planejamento Estratégico –

dependendo do tempo disponível ou da necessidade da direção da organização - outros

elementos tais como: cronograma de execução, metas quantitativas, pessoal de apoio,

departamentos responsáveis pela execução, indicadores de resultado, etc.

O método ZOPP, por exemplo, contempla a montagem de uma “matriz de planejamento

do projeto”, derivada da metodologia do quadro lógico, com vários outros aspectos

interessantes como por exemplo a “análise dos pressupostos” ou “fontes de verificação”

dos indicares que aumentam a confiabilidade do desenho normativo como se verá mais

adiante.

Um bom teste de vulnerabilidade das ações previstas e do caráter sistêmico e situacional do

planejamento é a elaboração de uma matriz “Diretrizes Estratégicas/Problemas X

Projetos/Ações”. Na análise horizontal pode-se refletir sobre o grau de impacto combinado

de todo o desenho normativo, sobre uma única diretriz. Cada diretriz deve ter no mínimo

um impacto alto, de no mínimo uma ou mais ações, caso contrário deve-se redesenhar o

plano e rever a eficácia das ações propostas. Na análise vertical verifica-se o conjunto de

impactos cruzados das ações sobre as diretrizes. Isto nos permite visualizar que algumas

operações/ações distribuem altos impactos sobre um número maior de

diretrizes/problemas, outras produzem baixos impactos.

Não deve-se esquecer que desenhamos ações para resolver problemas que, se resolvidos,

nos aproximam mais das diretrizes estratégicas. A conquista destas diretrizes, considerando

uma analise situacional dada, nos aproximará da nossa missão e imagem de futuro proposta.

Podemos ver que há um encadeamento lógico não-linear entre os momentos. Uma seleção

275

equivocada de problemas, por outro lado, certamente induzirá o desenho de ações com

baixa eficiência ou baixa eficácia.

O desenho das operações pode ser aproveitado como um momento para aprofundar o

caráter participativo do planejamento combinando a autoridade tecno-política dos

dirigentes e da equipe técnica do projeto ou da instituição com a manifestação expontânea e

autêntica da base da organização – funcionários em geral.

Por fim cabe lembrar que o momento normativo (o desenho das operações do plano) não

pode – durante o seminário de planejamento – detalhar e aprofundar cada elemento da

operação prevista. Imagine-se por exemplo que num seminário da área de segurança pública

surja a operação “Implantar sistema de vigilância eletrônica nas áreas de maior

periculosidade”. Evidentemente o detalhamento de tal operação demandaria muitas

informações adicionais, entre as quais a definição precisa do conceito de periculosidade, a

viabilidade jurídica de tal sistema, custos e tecnologia disponível, manutenção após

implantação, etc...este detalhamento deve ser feito no planejamento operacional após o

seminário geral de planejamento e sob coordenação da “comissão de gestão do plano”.

Quadro 6: Matriz Diretrizes Estratégicas/Problemas x Ações Propostas

AÇÕES OU

PROJETOS

Projeto 1

Ação...

Projeto 2

Ação...

Projeto 3

Ação...

DIRETRIZES PROBLEMAS

DIRETRIZ 1

PROBLEMAS

DIRETRIZ 2

PROBLEMAS

276

Nota Explicativa:

Este quadro retrata uma relação muitas vezes difícil de perceber ou esclarecer: a relação

entre as ações adotadas pelo grupo e sua relação de impacto sobre os problemas que

objetivam resolver, organizados por diretrizes estratégicas. Cabe lembrar que a cada diretriz

estratégica proposta pela equipe dirigente um conjunto de problemas foram identificados,

selecionados e explicados. Se o grupo ou a organização adotou um único macro-problema

para resolver então na primeira coluna poderão ser listadas as principais causas do problema

(os nós-críticos).

A elaboração de cenários – o momento estratégico

Desenhar projetos, ações, operações, pressupõe algum juízo sobre o resultado futuro do

nosso esforço, da mobilização de recursos. Esta direcionalidade do programa depende,

contudo, de muitas outras variáveis que são controladas por diversos atores em contextos

específicos, que sempre são nebulosos e impossíveis de predizer. Por isso, é preciso

aprender com o passado, simular o futuro e diminuir as chances da improvisação.

A elaboração de cenários é relativamente complexa, depende do grau de informação

disponível pelo grupo e da complexidade do problema a ser enfrentado. Quanto maior o

âmbito temático do problema e menor, por efeito, a governabilidade do ator que planeja,

mais difícil fazer o cenário sem cair na armadilha da “futurologia especulativa”. Imaginar

cenários é como fazer análise de conjuntura, só que para situações prováveis no futuro,

tentando criativamente projetar prováveis comportamentos.

Como fazer cenários?

Elenca-se descritivamente todas variáveis importantes para o cenário, de acordo com o

âmbito do problema, a abrangência das operações e as diretrizes da organização.

277

Lembramos que as variáveis podem ser subdivididas de acordo com o grau de

governabilidade que temos sobre elas para facilitar a análise posterior.

Construímos três hipóteses básicas sobre o cenário:

♦ um cenário provável,

♦ uma variação otimista do cenário provável

♦ uma variação pessimista do cenário provável.

É evidente que o conceito de “provável” depende de uma série de fatores entre os quais a

quantidade de informação disponível sobre o comportamento passado de determinados

agentes sociais e processos, os juízos de valor de cada um sobre o que pode acontecer, uma

boa dose de “intuição cognitiva”, de sensibilidade e aprendizado, etc...

Mesmo com todas dificuldades porque é importante tentar elaborar cenários futuros? Por

que saber identificar prováveis ameaças e oportunidades com antecipação permite-nos

adquirir uma vantagem estratégica, além de melhorar a eficácia das operações pensadas na

atualidade. Desenhar cenários permite simular a viabilidade futura das ações do plano.

Em cada cenário revisamos os resultados esperados de cada ação/operação e identificamos

as vulnerabilidades existentes. Estas fragilidades serão fonte inspiradora para redesenhar as

ações ou elaborar outros projetos capazes de manter o resultado original.

Os cenários servem, afinal, para testar a consistência da Matriz Operacional num quadro de

incerteza sobre o futuro. Permitindo simular e antecipar as oportunidades e ameaças

conjunturais e aumentar a viabilidade do plano, pois melhoram o desenho normativo, o

“deve ser” do planejamento.

Recomendações no desenho de cenários:

• Ter uma visão situacional da realidade como construção social.

• O futuro não é só a extrapolação de padrões comportamentais do passado.

• Distinguir tendências conjunturais daquelas estruturais: estabilidade X ruptura de padrão de

278

conduta ou comportamento.

• Construir hipóteses alternativas com plausibilidade e factibilidade: possuir a noção de

restrição.

• Imaginar as surpresas como rupturas dos padrões observados: atenção para focalizar

detalhes aparentemente “não-importantes”.

• Nunca “congelar” os cenários, nem indicadores quantitativos

É evidente que cabe ao grupo de planejamento monitorar a evolução dos cenários e suas

principais variáveis para fornecer informações de gestão e execução do plano. Se não

houver viabilidade para acompanhar e monitorar cenários ao longo da execução do

plano, não vale a pena gastar energias na sua elaboração durante o seminário geral. Esta

tarefa poderá ser atribuída ao Comitê de Gestão (ver anexo).

Quadro 7: Desenho de cenários

OTIMISTA (B)

PROVÁVEL (A)

PESSIMISTA (C)

VARIÁVEIS

SELECIONADAS

1....................

2....................

3....................

VARIÁVEIS FORA

GOVERNABILIDADE

VARIÁVEIS FORA

GOVERNABILIDADE

VARIÁVEIS FORA

GOVERNABILIDADE

Nota Explicativa:

279

Um dos protocolos mais importantes para processar o quadro de incerteza futura do plano

é fixar sempre a idéia de que – ao desenhar criativamente operações, projetos e

programas – não o fazemos em condições abstratas e ideais, nem sozinhos. Esta matriz

procura sistematizar o debate sobre este contextos e estas condições políticas onde a

governabilidade é sempre uma variável limitada e dinâmica. É importante que o cenário

provável seja o mais realista possível, quanto maior for o conhecimento acumulado pelo

grupo e seu domínio sobre o jogo, mais confiáveis tenderão ser os cenários. O

gerenciamento do plano exigirá um acompanhamento preciso da evolução de cada

variável do cenário e seu monitoramento para redesenho das operações em cada caso ou

situação.

Como tratar com as incertezas? O planejamento situacional concebe as consciência sobre a

inevitabilidade de incertezas como uma noção determinante para a elaboração do plano.

Não há como ignorar ou esconder as incertezas de modo permanente, a menos que

estejamos trabalhando de forma convencional e determinística.

O cálculo estratégico nunca pode ser congelado, é um processo cujo formato deve mudar

continuamente, na medida em que as condições do jogo social são elas mesmas modificadas

e produzidas. A organização social que planeja, por sua vez, deve estar sempre preparada

para reagir rapidamente, aprendendo com o passado recente, acompanhando cenários,

aguçando a imaginação e a intuição criativa.

Ou seja, o planejamento deve de alguma forma preparar a organização para estar em

prontidão permanente, pronta para rápida reação diante de imprevistos. Quando

aparentemente não houver alternativas políticas, cabe ao ator criar as próprias opções das

trajetórias futuras. Sugere-se trabalhar com planos de contingência para as surpresas de alta

probabilidade de ocorrência, com significativo impacto sobre as diretrizes ou problemas do

plano e cujo custo seja adequado às condições da organização.

O preparo de planos de contingência e sua condição stand by não podem, em absoluto,

diminuir a prontidão diante das surpresas inevitáveis dos cenários futuros.

280

Quadro 8: Impacto dos cenários nas ações

CENÁRIOS

Projetos Operações

MANTIDAS

Projetos Operações

REJEITADAS

Projetos Operações

REDESENHADAS

CENÁRIO

otimista

CENÁRIO

provável

CENÁRIO

pessimista

Nota Explicativa:

Esta matriz está vinculada à anterior na medida em que após análise de cada cenário muitas

operações que anteriormente foram pensadas e desenhadas sem esta reflexão, agora serão

modificadas com mais ciência e precisão a partir dos cenários colocados. Conforme o

balanço entre os três cenários e principalmente o cenário provável, o grupo de

planejamento terá teoricamente uma noção maior da vulnerabilidade do plano diante da

provável conjuntura futura do jogo. Por exemplo, ações de alto impacto no problema que

são rejeitas no cenário provável estão demandando nova reflexão sobre produtos, recursos

ou resultados esperados.

Construção das estratégias de viabilidade do plano

281

O que é o momento estratégico ?

É o momento ou etapa que devemos refletir e formular o que deveremos fazer para criar as

condições nas quais as ações ou operação ganharão viabilidade. A questão estratégica

portanto pode ser sintetizada no gasto de recursos para gerar um único resultado:

conquistar viabilidade política (poder) para execução do plano. A estratégia faz parte do

planejamento e é um dos elementos que diferenciam radicalmente este enfoque das

concepções normativas e tradicionais.

A formulação estratégica é necessária porque a visão situacional do “jogo social” implica na

aceitação de outros jogadores e do futuro como resultado nebuloso, aberto e permanente.

O centro do memento estratégico é a análise de viabilidade política do plano. Conforme

Matus é um cálculo necessário ao processo de governo, sujeito a fortes elementos de

incerteza. A análise não é um mero exercício de predição, mas um a incursão simulada no

futuro, expressa também nossa vontade de fazer, tentando criar situações favoráveis e

antecipando o pré-desenho do projetos viáveis, com potencial para aproveitar as

oportunidades abertas e alterar o curso da mudança situacional, num movimento de

aproximação da situação-objetivo.

Qual objetivo do cálculo estratégico?

Os resultados previstos em cada operação do momento anterior só ganham materialidade a

partir do cálculo estratégico. Quanto maior for a mobilização de recursos ou a ambição do

projeto político do gestor público, maior a necessidade do cálculo estratégico, que depende

muito das habilidades e perícias organizacionais e institucionais, da capacidade de governar.

Embora possam existir alguns protocolos metodológicos para elaborar estratégias, grande

parte do sucesso depende da perícia individual e institucional, do “pensar” estrategicamente

que é construído também pela experiência que ensina. A categoria central que organiza este

momento do método é o “poder”, que é o resultado das pressões que a força aplicada de

cada “jogador” (ator ou agente social) produz. Aumenta-se a viabilidade do plano quando se

acumula mais poder, perde-se poder quando projetos e ações tornam-se inviáveis.

282

Mas o que é o poder ? O conceito de “poder” talvez seja um dos mais complexos na ciência

política, Matus responde com uma série de perguntas...

“O que é poder? É um complexo de recursos de aplicação potencial? É uma

acumulação que sintetiza todas as acumulações sociais possíveis para uma força

social? É ao mesmo tempo uma relação social e uma acumulação? De onde emana o

poder? Como se cria e se perde poder? Quais são os insumos sociais da produção de

poder? As forças sociais apropriam-se de um poder pré-existente ou o poder só existe

como atributo das forças sociais? Como o poder relaciona-se com outros conceitos

como dominação, autoridade, habilidade para conduzir, etc.? Como se relaciona o

poder de uma força social com o uso do poder que ela faz numa situação? Liberdade

de ação é poder? A variedade do possível para um ator expressa seu poder na

situação? Quanto vale o poder? Seu valor é absoluto ou é relativo ao âmbito de seu

uso? O poder é sempre relativo a outros? Qualquer acumulação social é redutível a

poder? Então, o que não é poder? A informação, o domínio das ciências, o carisma, a

simpatia, a organização,os recursos econômicos, a ideologia assimilável, os meios de

comunicação, os meios de repressão, a adesão popular, os deputados e senadores no

Congresso Nacional e o controle do aparelho de Estado são poder? Tudo isto, tão vago

e tão complexo, pode ser expresso em categorias operacionais que sejam úteis para

uma análise de viabilidade política?”

Respondendo parcialmente suas próprias perguntas o autor propõe um conceito

multidimensional de poder (tudo é poder), entretanto o poder só existe como capacidade de

fazer ou influir sobre o que os outros fazem, ou seja, está relacionado ao agir e à ação social

ou à expectativa de ação (a mera demonstração de poder). Portanto o poder é uma relação

social que sempre se refere ao nosso projeto vis a vis o projeto dos demais agentes, é

passível de acumulação (estoque de poder) ou perda na arena social quando “compra-se”

poder (no conflito) de outros atores.

Como fazer o desenho das estratégias?

283

No momento normativo, quando desenhamos um conjunto de ações estamos debatendo e

construindo uma análise de direcionalidade para o Plano, agora devemos nos propor o

desafio de construir a análise de viabilidade que tem outros pressupostos e

condicionamentos.

Normalmente a viabilidade de um plano está condicionada à viabilidade política, econômica,

técnica e institucional. Destas a viabilidade política é a mais complexa porque diz respeito

imediato às relações que estabeleço com outros atores, aos recursos que domino e às

motivações e interesses pelos problemas concretos. Em resumo, a viabilidade política

implica em acumular poder “no jogo” e através deste processo ser capaz de materializar os

resultados do plano e atingir as diretrizes.

Só há debate estratégico se reconhecemos nossas limitações, nossas restrições de qualquer

ordem. Embora a passividade e conformidade diante das restrições possam configurar uma

estratégia deliberada (não há como neutralizar o adversário), a limitação ao que é viável

hoje não constitui uma opção estratégica, antes disso traduz a renúncia ao um projeto

próprio ou completa adesão ao projeto de outro ator (perda de autonomia).

Comumente se colocam três grandes opções estratégicas:

• de cooperação, que supõe negociação e acordo onde cada parte cede em troca de

benefícios mútuos (jogo com resultado diferente de zero);

• de cooptação, implicando que uma parte ganhe a adesão da vontade de outros

atores seja pelo peso, domínio de recursos ou força do projeto ideológico, ou

• de conflito com outros atores sociais.

A escolha da melhor estratégia em cada caso concreto varia de acordo com a direcionalidade

de cada projeto, fatores ideológicos, culturais, emocionais e não raras vezes absolutamente

circunstanciais e imprevisíveis. A definição depende basicamente da intensidade da vontade

política em cumprir determinado plano, apesar dos conflitos prováveis que isto pode

implicar.

284

Numa situação de definição estratégica concreta (cooperação, convencimento ou conflito)

haverá sempre uma concorrência entre processos alternativos e mutuamente excludentes:

eficácia relativa à probabilidade de êxito, economia de tempo como velocidade para obter

resultados, eficiência do custo político e econômico em relação aos resultados esperados,

segurança para evitar os riscos desnecessários e a redução de alternativas futuras, etc..

A formulação estratégica, como já estamos percebendo, não é tarefa de simples solução e

requer muita reflexão e tempo do grupo de planejamento. Muitas vezes as circunstâncias

exigem ceder diante das restrições, buscar aliados, fazer rodeios táticos, atacar pelo ponto

de menor resistência, dissimular o objetivo de maior valor, esperar uma conjuntura mais

favorável, etc.

O importante é nunca perder o sentido da direcionalidade do projeto político (o repertório

de operações e as diretrizes). O êxito não deve ser alcançado pela simples adaptação dos

objetivos, mas pela criação de condições de possibilidade para viabilidade do plano.

Se a imagem de futuro ou as diretrizes estratégicas indicam uma situação-objetivo no futuro,

que atualmente não se mostra viável então será preciso planejar estrategicamente,

aproveitando oportunidades e agindo planejadamente.

Para ilustrar a complexidade deste debate imaginemos por um instante como seria a análise

estratégica, no Brasil contemporâneo, do “jogo da Reforma Agrária” com atores sociais

como o INCRA, o MST, entidades de grandes proprietários,etc..., o “jogo da política

econômica” com os “jogadores” Banco Central, CUT, Federação dos bancos, Congresso

Nacional, FMI, etc... ou “jogo da municipalização da saúde” com o Ministério da Saúde, os

Planos privados, as Prefeituras, as entidades de usuários, etc...

Diferentes domínios da viabilidade estratégica

• Viabilidade Política: refere-se à administração de recursos de poder para aplicação na

consecução dos objetivos possíveis. Trata-se de produzir ações que acrescentem

recursos de poder no relacionamento com os demais atores.

285

• Viabilidade Econômica: refere-se à disponibilidade de recursos econômicos e financeiros

necessários para desenhar as operações. Trata-se de produzir ações que ajustem os

resultados aos recursos disponíveis ou elevar os recursos às necessidades das operações.

Aqui entra o tema da eficácia e eficiência meramente econômica, os critérios de

produtividade, rentabilidade, as metas das taxas de crescimento, viabilidade micro ou

macroeconômica, etc.

• Viabilidade Técnica: consiste em disponibilizar a capacidade técnica existente na forma

de tecnologia que viabilize as operações, sejam elas mobilizadoras de recursos na área

das ciências naturais (projetos de engenharia, p. ex.), ou na tecnologia organizacional e

administrativa.

• Viabilidade Organizacional: refere-se às capacidades institucionais do sistema como um

todo e às capacidade pessoais e de liderança dos gestores envolvidos no processo de

planejamento. Ao nos perguntarmos se nosso plano é viável organizacionalmente, qual

é nossa real capacidade operativa e se a rigidez burocrática é uma ameaça ao êxito do

plano, avaliamos este tipo de viabilidade. Isto implica na imensa maioria dos casos, em

colocar em cheque o modo como dirigimos, organizamos nossos departamentos e

tomamos nossas decisões.

A viabilidade organizacional do plano depende da capacidade da liderança política dos

gestores em conduzir as estratégias de transformação dos organismos. Capacidade de

planejamento estratégico, flexibilidade e descentralização gerencial, responsabilização

coletiva, alto desenvolvimento de recursos humanos, avaliação permanente de resultados,

sistemas democráticos de direção, processo decisório participativo, alto capital intelectual e

capacidade de aprendizagem são características necessárias para o aumento da viabilidade

organizacional do plano.

Estas “viabilidades situacionais” conformam um conjunto de “testes” independentes pelos

quais deve passar o plano elaborado. Cada uma delas tem implicações sobre as demais,

entretanto a existência isolada de uma delas não compensa a ausência de outras.

Para a análise estratégica o que se requer é uma análise de síntese e balanço entre todos os

tipos de viabilidade simultaneamente. É a capacidade de antecipação da provável reação dos

286

demais atores sociais (aliados e adversários) aos resultados desejados dos nossos Projetos e

Operações.

A análise de viabilidade política, por exemplo, é o cálculo sobre os processos de governo,

sujeito à fortes elementos de incerteza. Este cálculo deve expressar também nossa vontade

de fazer, criando situações favoráveis para alterar o curso dos acontecimentos, nos cenários

de nossas simulações.

A Análise dos Atores Sociais

O comportamento dos demais atores ou entidades que estão no espaço dos nossos

problemas é determinante para a eficácia dos nossos planos, em todos os domínios da

viabilidade estratégica.

Conhecer profundamente os adversários ou concorrentes, como também os aliados, é

condição para formulação da estratégica mais adequada. Identificar suas posições, seus

interesses diante dos problemas e projetos, simular sua provável reação no tempo,

identificar sua capacidade de resposta, conhecer os recursos críticos que controla, enfim, a

viabilidade política de uma estratégia é proporcional ao grau de conhecimento que

possuímos sobre o outro, embora não devamos esquecer que este conhecimento não é

definitivo e que os comportamentos são sempre criativos e imprevisíveis. A viabilidade

política é assim, referente sempre às relações de poder e só no momento da interação

criativa com os demais é que podemos acumular ou não poder.

Uma técnica gráfica recomendável para análise dos demais atores pode ser seguida através

dos seguintes passos:

• Define-se ator como uma organização social que mobiliza recursos, sustenta com certa

estabilidade um projeto político, enfim, “joga” na conjuntura. A partir daí deve-se listar

todos atores sociais relevantes para a solução do problema já analisado.

• Devemos produzir uma matriz chamada “Matriz de Interesse dos Atores Sociais” que

consiste em relacionar o conjunto dos atores selecionados com o conjunto das

287

operações ou ações projetadas no momento normativo. O valor que um ator atribui para

uma ação pode ser alto, médio ou baixo e o interesse pode ser positivo, caso ele apoie

ou negativo, caso ele rejeite a operação. Assim os atores sociais com alto valor e

interesse negativo constituem a base dos prováveis oponentes ou adversários enquanto

os de alto valor e interesse positivo os aliados e apoiadores. O valor e o interesse juntos

sinalizam a motivação ou a intenção dos atores, porém esta identificação isolada da

capacidade real não nos diz muita coisa.

O que é a “força de um Ator social” enquanto poder?

• É multidimensional, não é sua natureza que define mas a circunstância do uso.

• Só tem valor relativo ao propósito do Ator, é situacional.

• É produto da acumulação social, é capacidade ganha ou perdida no jogo.

• É um conceito que permite comparação, é mensurável, existe quando está em movimento.

É poder aplicado.

• Pode produzir resultados sem ser usada, poder de dissuasão.

• Na política se expressa pelo controle de “centros de poder”.

• É um recurso permutável, pode ser intercambiado no jogo social.

• A acumulação é condicionada pelas regras de poder, a institucionalidade fixa as

possibilidades-limite.

Será necessário analisar a capacidade real “de jogo” dos atores, pois ela confere poder real

(ou não) às suas motivações e intenções. A motivação e a capacidade de um ator conformam

sua capacidade de pressão no jogo social, isto é, um ponto de aplicação da força do ator.

• Deve-se proceder uma análise dos recursos controlados por cada ator já analisado. Os

recursos no campo do debate estratégico podem ser de múltipla natureza, por exemplo,

recursos econômicos, adesão popular, controle dos meios de comunicação, controle de

bancadas parlamentares, etc. Uma técnica de visualização gráfica simples consiste em

montar uma matriz de dupla entrada com os recursos relevantes na primeira coluna e os

atores na primeira linha, as casas são preenchidas com alguma graduação que pode ser

quantitativa (percentual, p.ex.) ou qualitativa (alto, médio e baixo). Os atores mais

288

críticos para o problema estratégico são os que representam a um só tempo os maiores

graus de motivação, contra e a favor, com as maiores capacidades expressas como

controle de recursos críticos.

Quadro 9: Matriz de Controle de Recursos

AÇÕES

A1

A2

A3

A4

A5 RECURSOS

FINANCEIROS

COGNITIVOS

POLÍTICOS

Outros...

Nota Explicativa:

Esta matriz identifica quais são os principais tipos de recursos importantes para o

planejamento em curso e qual o grau de controle de cada ator sobre o mesmo, ela é uma

Motivação

Força

Pressão

Controle de recursos – qual o peso ?

Valor (+,-) Interesse (A,M,B)

Ação

289

matriz de informações básicas para ser utilizada mais adiante no aprofundamento da análise

estratégica e na interação entre atores sociais que estão ora em conflito, ora em

cooperação.

290

Quadro 10: Matriz de Interesse dos Atores

ATORES

SELECIONADOS

ATOR

1

ATOR

2

ATOR

3

ATOR

4

ATOR

5

ATOR

6 Projetos e

Operações

AÇÃO 1

AÇÃO 2

AÇÃO 3

Analisar em cada

cenário ou no cenário

mais provável

VALOR INTERESSE Máxima adesão

ALTO APOIA (+) A+

MEDIO REJEITA (-) Máxima rejeição

BAIXO Indiferente A-

Nota Explicativa:

Este quadro expressa teoricamente as motivações dos atores sociais. Um quadro básico

para análise estratégica, que é sempre uma questão de força e poder, relação entre forças e

pressões. O valor agregado ao interesse produz uma motivação concreta de cada ator sobre

cada ação, projeto ou operação do jogo. A força de cada ator (elemento crítico para

estabelecer a estratégia) depende de vários fatores além da motivação, como a perícia, a

personalidade, o suporte cognitivo e o controle de recursos de cada jogador.

291

Mapeada a correlação de forças relativas ao espaço do problema já há condições mínimas

de avançar na análise estratégica. Sabemos que os comportamentos institucionais não

dependem só das motivações ou do poder acumulado por cada agente social, o jogo de

pressões se realiza em conjunturas concretas, em determinadas cenas ou cenários, portanto,

devemos retomar os cenários elaborados no momento anterior e construir nosso plano

estratégico que consiste na elaboração de ações de viabilidade para o plano.

Em algumas experiências o grupo de planejamento define as linhas gerais das estratégias ou

as marcas centrais da mesma e delega para um grupo menor, que pode ser a direção da

organização ou parte do Comitê de Gestão para detalhar as operações de estratégia. Em

problemas complexos e de alto potencial conflitivo, o planejamento de uma nova matriz

tributária, ou operações financeiras de alto risco, p. ex. - o caráter reservado ou mesmo

sigiloso da estratégia pode ser necessário para preservar sua eficácia, pois o conhecimento

prévio anteciparia eventuais comportamentos hostis dos atores adversários.

Princípios para formulação de estratégias.

1º Aprecie eficazmente a situação: dissolva o problema em espaços maiores.

2º Compatibilize a relação recursos-objetivos: proponha-se objetivos ao alcance da sua

capacidade de criar recursos.

3º Mantenha a concentração: evitar a “distração tática” imposta pela agenda do dia-a-

dia ou pelo ritualismo da burocracia (paisagem das urgências).

4º Use o rodeio tático: evitar a “síndrome do touro”, não confundir o tático com a

negociação do doutrinário.

5º Economia de recursos: não abusar do poder, não “ganhar” oponentes sem

necessidade.

6º Valorize os demais Atores: conheça os recursos que controlam e suas motivações,

seu código operacional, o padrão de comportamento institucional.

7º Encadeamento estratégico: não há vácuo em política, simule os efeitos dos

movimentos táticos, projetando a seqüência de estratégias.

8º Evitar o pior é sempre prioridade: impedir o retrocesso ou desacumulo de poder é

sempre prioridade.

292

9º Evite trabalhar com certezas: não faça predições, prepare-se para surpresas através

da análise de cenários.

A melhor estratégia será sempre aquela que aumenta o campo de possibilidades futuras

para atingir as diretrizes estratégicas da organização. É por isso que o centro estratégico

concreto é a ampliação da governabilidade do ator social que planeja. No setor público o

debate estratégico é crucial para enfrentar a crise do Estado e a fragilização das funções

governamentais, a própria despolitização da gestão pública.

Novamente é crucial ter uma atitude mental aberta a compreender o mundo e os agentes

de uma forma situacional, isto é relativa ao posicionamento de cada um no tabuleiro do

jogo. Gadamer, o filósofo alemão da hermeneutica, coloca assim a imposssibilidade de

clarividência absoluta sobre a circunstâncias do jogo social ou a necessária consciência sobre

os limites e os horizontes, pois estamos “imersos” na própria história que descrevemos:

"(...) tornar-se consciente de uma situação é uma tarefa que em cada caso reveste uma

dificuldade própria. O conceito de situação se caracteriza pelo fato de não nos

encontrarmos diante dela e, portanto, não podemos ter um saber objetivo dela. Nós

estamos nela, já que nos encontramos sempre numa situação, cuja iluminação é a

nossa tarefa, e esta nunca pode se cumprir por completo. E isso vale também para a

situação hermenêutica, isto é, para a situação em que nos encontramos face à tradição

que queremos compreender. Também a iluminação dessa situação, isto é, a reflexão

da história efeitual, não pode ser plenamente realizada, esta impossibilidade não é

defeito da reflexão, mas encontra-se na essência mesma do ser histórico que somos.

Ser histórico quer dizer não se esgotar nunca no saber-se."

Neste cenário ampliar a governabilidade no setor público sinaliza uma efetiva recuperação

da capacidade de governo, pressuposto imprescindível para realização de projetos

transformadores e contra-hegemônicos. Um recurso intelectual bastante útil, embora pouco

utilizado, é a análise e o estudo de casos e as experiências históricas ou mais recentes do

ponto-de-vista do embate e de conflitos estratégicos. Tente, para ilustrar e exercitar

mentalmente, lembrar de um caso público e concreto e responder metodicamente a estas

293

perguntas: Quem acumulou poder? Porque? Quais as estratégias adotadas? O que estava

realmente em jogo?

A seguir algumas perguntas-orientadoras que o facilitador ou consultor pode desenvolver

junto ao grupo para estimular a reflexão sobre o debate de estratégias:

1. Quais as motivações dos nossos oponentes ou concorrentes ?

2. Qual os motivos dos nossos aliados ou parceiros ?

3. Quais Projetos ou ações nossas tem maior oposição ou concorrência? Porque?

4. Quais estratégias possíveis viabilizarão as operações mais críticas (que mobilizam mais

oposição e recursos) ?

5. Quais recursos os demais atores controlam e que são importantes para o êxito do nosso

plano?

6. Como podemos usar/neutralizar suas capacidades ?

7. Devemos redesenhar as Operações e Projetos? Repensar os cenários ? Como se

comportam nos cenários?

8. Estamos preparados para adotar a melhor estratégia?

Quem faz a análise estratégica?

O debate sobre estratégia exige intensa reflexão política e dependendo do grau de coesão

do grupo pode mobilizar grande debate. O facilitador (moderador) deve ter a sensibilidade

apropriada para identificar se o grau de stress mental do grupo não compromete a qualidade

do debate. A matriz de interesse dos atores pode ser debatida no grande grupo, mas o

detalhamento mais sofisticado das operações tipicamente estratégicas (aumento da

viabilidade) devem ser delegadas para grupos menores.

Definição do sistema de gestão – o momento tático e operacional

O que é ?

294

No seminário de planejamento, o momento final focaliza o sistema de gestão do plano, onde

serão desenvolvidos os seguintes debates a partir do fio condutor posto pelos seguintes

questionamentos:

• como este será coordenado ?

• quais procedimentos serão implementados para redesenhar a organização ?

• como será montado o sistema de informações ?

• quais estruturas serão responsáveis pela avaliação permanente de resultados e as

correções necessárias ?

Estes processos não poderão ser vivenciados totalmente no seminário de planejamento,

apenas simulados. Um sistema de planejamento só é valorizado e demandado pelo gestor

público, na medida em que se constitui como um suporte para a decisão cotidiana. A

improvisação complementa criativamente o plano, se a cultura de planejamento

predomina.

Qual objetivo deste momento?

Sumariamente, os passos percorridos até agora foram os seguintes: elaborou-se as

Declarações Estratégicas e a avaliação situacional da organização, identificou-se, selecionou-

se e explicou-se os problemas centrais para cumprir as diretrizes estratégicas, desenhou-se

um plano de “apostas bem fundamentadas” - as ações planejadas, fez-se a matriz

operacional, elaborou-se cenários e revisou-se a consistência dos projetos planejados.

Identificou-se a motivação e a capacidade dos demais atores, refletiu-se sobre as principais

estratégias em cada caso e cenário.

Nada disso terá sentido, porém, sem o momento operacional, quando coloca-se em prática

o planejamento, é onde tudo se decide. O objetivo deste momento é pensar como

funcionará o sistema de gestão do plano, quais habilidades organizacionais deverão ser

desenvolvidas para executar o plano, obter resultados e mantê-los ao longo do tempo.

A execução no dia a dia do planejamento é o momento mais crucial de todo processo, é

onde tudo se decide.

295

Os princípios organizadores deste momento resultam na convergência de dois critérios:

(a) a concentração estratégica, que é dominante, significa evitar a dispersão de recursos

em elementos “da paisagem”, fatores sociais, econômicos ou políticos não essenciais

ao sucesso do plano e

(b) a flexibilidade tática, subordinada ao primeiro princípio, ela significa a capacidade de

improvisar criativamente, no espaço de liberdade permitido pela estratégia, até que

a própria estratégia seja alterada diante das impossibilidades táticas.

Segundo Matus:

“O segundo critério é a flexibilidade tática, mas sem esquecer que a tática não é eficaz

por si própria, mas em relação à estratégia perseguida. O planejamento no presente é

planejamento tático; exige uma avaliação permanente da evolução da mudança

situacional e dos resultados reais alcançados após cada ato de intervenção social, ou

depois que algum evento não planejado ou exógeno ao sistema considerado altere as

características da situação ou de seu movimento. Esse acompanhamento visa, por um

lado, aprender com a praxis , comparando simulação e realidade a fim de melhorar a

qualidade dos cálculos seguintes; por outro revisar constantemente o plano, a fim de

adaptá-lo com flexibilidade sempre que a situação se altere. Neste processo de

avaliação permanente é preciso comparar o planejado e o alcançável com o obtido em

cada situação, e examinar se o curso seguinte do movimento planejado segue na

direção correta. Este último aspecto da avaliação supõe uma comparação permanente

entre o arco conjuntural do plano, o arco direcional e o arco da utopia perseguida.”

A execução do plano então é o exato momento em que as fases do planejamento são

articuladas numa síntese dialética: a explicação da realidade é atualizada pela análise

situacional sistemática (momento explicativo), a direcionalidade do plano é materializada

em ações que modificam a realidade (momento normativo) e a viabilidade do planejado, do

desejado, sofre seu teste definitivo pelo exame da praxis (momento estratégico).

296

Como fazer o debate operacional?

Nesta parte do seminário o processo caminha para sua conclusão e por isso é importante a

sensibilidade do facilitador ou consultor em “amarrar” as decisões e encaminhar os temas

pendentes.

O debate de gestão pode ser dividido ou encaminhado por partes, tendo clareza que as

formas organizativas ou os processos internos de tomada de decisão devem viabilizar o

plano e suas estratégias.

A gestão do planejamento, neste enfoque, é parte inseparável do próprio plano, aliás ela é o

próprio planejamento em processo permanente de elabor(ação). A natureza metodológica e

os pressupostos teóricos que adotamos, entretanto, exigem um outro tipo de gestão, muito

diferente do desenho organizacional tradicional do setor público. O acompanhamento dos

resultados a partir do monitoramento do problema exige uma gestão mais sistêmica e

descentralizada, menos departamentalizada e fragmentada.

Gerenciar problemas não é o mesmo que gerenciar setores ou projetos isolados. As ações e

operações constituídas no enfoque situacional e participativo têm, por exemplo, sempre um

caráter multifuncional e inter-disciplinar. Os gerentes e a gestão destes tipos de projetos

necessariamente ultrapassarão as fronteiras departamentais ou setoriais.

Para o cálculo estratégico ser efetivo há uma necessidade permanente de mediação entre o

conhecimento e a ação, que se trava na prática da conjuntura presente, por isso, o plano

deve preceder e conduzir a ação concreta.

Finalmente, é importante lembrar que cabe ao grupo definir coletivamente um cronograma

mínimo e procedimentos gerais necessários ao replanejamento, isto é, a revisão global do

plano como um todo, no mesmo nível de sua elaboração original. Geralmente este período

tem sido de seis meses ou um ano, a depender do ritmo e da evolução das ações e da

situação do problema.

297

A trajetória das ações ou projetos

O tempo e o modo como se encaixam as ações ou projetos do planejamento é uma das

principais questões estratégicas por dois motivos, a saber. A execução das ações ou projetos

criam resultados que alteram a situação do problema, provocando reação nos demais

atores e a expectativa do tempo assume distintas percepções durante a gestão - a noção do

“tempo político” se relaciona à maturação dos resultados do plano mais do que ao tempo

físico.

É evidente que este aspecto não é indiferente ao gerenciamento do plano. Saber o que deve

ser feito e o que deve ser feito depois é tarefa complexa, depende não só da importância

que atribuímos a determinado problema, mas também ao comportamento de eventuais

adversários e aliados.

Uma das técnicas de visualização gráfica que ajudam a definir a trajetória mais adequada é

aquela que analisa este problema do ponto de vista específico da relação entre os resultados

do plano sobre ele mesmo, isto é, qual é o possível impacto multi-setorial entre todos os

projetos entre si?

A matriz que sugerimos denomina-se “Matriz de Apoios” das operações. Esta é uma matriz

quadrada, de dupla entrada, com a relação de operações ou projetos na primeira coluna e

na primeira linha, simetricamente.

O facilitador deve estimular a reflexão do grupo para simular o impacto que o resultado do

“Projeto 1”, p. ex., teria sobre cada um dos demais projetos. A gradação poderia ser dada

por alto (A), médio (M) e baixo (B) impacto e positivo (+), se o resultado contribui para a

obtenção do resultado do projeto e negativo (-) se representa uma dificuldade ou obstáculo

para este alcance.

Algumas vezes as operações criam dificuldades para execução de outras, como é comum

quando há concorrência pelos mesmos recursos. A análise horizontal desta matriz poderia

298

nos apontar quais são as ações ou projetos mais importantes sob o enfoque da viabilidade

do conjunto do plano, a conclusão parece óbvia, existem ações e projetos que tem pela sua

natureza mais variabilidade de impactos positivos que outros, estes devem vir antes, devem

ser prioritários. A leitura vertical desta matriz sugere uma visão do conjunto de

dependências de cada projeto em relação aos demais (teste de coerência interna).

O problema fundamental do gestor na estratégia situacional é desenvolver a perícia técno-

política necessária para conduzir e calcular a conjuntura, tendo em vista, o conjunto de

análises elaboradas sobre o impacto das Ações ou Projetos.

Como nos diz mais uma vez Matus:

“ ...deve-se evitar que a prática da ação dissocie-se da estratégia e que a estratégia

limite-se a elocubrações, sem contacto contato com a ação tática. No plano da gestão

institucional isso significa evitar que o sistema informal de planejamento afaste o

sistema formal, e que o pragmatismo imediatista e simplista choque-se com o cálculo

sistemático sobre as decisões. Num sistema de planejamento maduro a experiência, o

pragmatismo e a criatividade imediatista combinam-se com o domínio teórico, o

cálculo formal e a persistência no cumprimento do plano. Estas práticas devem

enriquecer-se mutuamente, em vez de se oporem como extremos. Do contrário o

planejamento formal não passaria de um discurso normativo sem repercussão

prática...o que conta afinal é o que se faz na conjuntura; daí o centro do planejamento

não ser o futuro, mas o presente”

Sugere-se observar conjuntamente as matrizes que envolvem os Projetos ou Ações,

relacionadas ao impacto de cada cenário, impacto nos problemas e Diretrizes, interesses dos

demais Atores Sociais, análise de eficiência e eficácia (Matriz Operacional) e finalmente

impactos cruzados entre si. Nem sempre os projetos ou operações com maior capacidade de

resolver problemas ou impactos positivos sobre as diretrizes estratégicas são executados

primeiro ou antes das demais.

Quadro 11: Matriz de apoio das operações ou ações

299

Operações Op. 1 Op. 2 Op. 3

Op. 1

Op. 2

Op. 3

Nota Explicativa:

Este quadro é útil para ajudar a estabelecer um conceito de hierarquia entre as várias ações

previstas no plano a partir das relações de precedência entre as mesmas. A idéia aqui é

considerar os resultados previstos de cada ação e questionar se os mesmos não ajudam,

apoiam ou constróem viabilidade para executar outras ações. Teoricamente as ações com

maiores apoios guardam uma relação de maior importância no conjunto das operações.

300

Monitoramento do plano e das estratégias

A função de um sistema de pedido e prestação de contas é tornar efetiva a responsabilidade

do governante perante sua base social. Este aspecto se expressa no fato de que nenhum

gestor, em qualquer nível, está desresponsabilizado de prestar ou demandar resultados de

outros níveis. Para que o sistema funcione com eficácia são necessários alguns requisitos:

• o processo tem que ser público e transparente, interna e externamente, para que os

resultados do planejamento sejam plenamente conhecidos,

• tem que ser sistemático e os critérios de avaliação devem ser conhecidos antes do

processo,

• os métodos de avaliação institucional e individual devem ser baseados no

monitoramento dos resultados e

• não deve estar limitado apenas à avaliação de recursos orçamentários.

O sistema de monitoramento do plano deve viabilizar um alto nível de responsabilidade e

compromisso interno na organização. Ele se fundamenta, em última instância, no programa

eleitoral das forças políticas vencedoras e nos compromissos de campanha.

As seguintes perguntas são típicas do monitoramento do plano:

O monitoramento do plano é feito através do uso de indicadores que são informações

objetivas, qualitativas ou quantitativas, dadas a partir da evolução do problema, isto é,

sinalizam a situação do problema ou a partir dos resultados das ações e projetos previstos.

Em que medida estamos resolvendo os problemas identificados e atingindo as diretrizes estratégicas? Novos problemas estão surgindo? Como submetê-los ao cálculo estratégico? Que correções sobre a matriz operacional devem ser processadas? Quais são as vulnerabilidades da organização diante dos

acontecimentos não previstos?

301

Conforme o tipo de problema proposto pelo planejamento estratégico e seu grau de

complexidade e mobilização de recursos, os indicadores podem variar em natureza, grau e

profundidade. Podemos construir indicadores econômicos, políticos, sociais, etc.

Em cada situação concreta, o importante é compatibilizar o sistema de acompanhamento

com a agenda da direção. Existe atualmente abundante literatura sobre a construção, uso e

manutenção de indicadores de desempenho e avaliação de projetos, tanto para projetos

sociais como econômicos. Há inúmeras estratégias informacionais que contemplam as novas

tecnologias de informação e comunicação, sistemas de monitoramento, ouvidorias, pontos

de acesso às redes, etc.

Quem faz o debate sobre a gestão?

A gestão do plano pode ser feita coletivamente com todo o grupo. Em cada caso poderão

surgir necessidades concretas e diferenciadas. Uma organização, por exemplo, resolve que

para executar o plano será necessário um redesenho de sua estrutura organizativa ou uma

mudança do fluxo interno de processos e informações. Neste caso um grupo de trabalho a

parte pode formular as linhas gerais deste redesenho (identificando problemas e operações,

p.ex.) para ganhar tempo.

É importante que a direção assuma com os demais participantes os encargos de gestão do

plano. Sugere-se que o gerenciamento do plano seja feito pelo Comitê de Gestão eleito no

Seminário, do qual a direção participa.

Outros temas, como por exemplo, compatibilização do plano com o orçamento anual, a

criação de instrumentos e ferramentas informacionais necessárias para a gestão e

monitoramento, etc. podem ser trabalhados em grupo, simultaneamente, delegados para a

direção ou grupos específicos .

O jogo macroorganizacional e a mudança organizacional

302

A estrutura organizacional de um governo pode ser comparada a um jogo, o jogo

macroorganizacional. Nele os jogadores são representados pelas organizações que se

relacionam com base na autonomia de cada uma, fundamentada na construção jurídico-

administrativa do sistema político e na capacidade de governo específica a cada órgão.

Assim temos os vários poderes e níveis de governo compondo um “aparelho” administrativo

amplo e complexo, sujeito a regras de funcionamento. Esta “convivência de atores

desiguais” configura o grande jogo da institucionalidade de um país, entre seus vários níveis,

poderes e competências.

As regras deste jogo determinam o espaço de possibilidades em cada organização. A

necessidade de planejamento, por exemplo, só se converte em demanda concreta se as

“regras de responsabilidade” assim determinam – existência de sistema de pedido e

prestação de contas, gerência por operações, etc. Se as “regras do jogo” institucional não

exigem avaliação por desempenho e existe como função ritual a alternativa ao planejamento

surge na improvisação, dominada pelo pragmatismo, pela centralização e pela baixa

responsabilidade.

A improvisação – neste contexto institucional – neutraliza a demanda por planejamento

estratégico porque é sempre prática, acontece no tempo certo, é situacional e neste sentido,

muito mais eficaz que o planejamento tradicional, lento, burocratizado e ineficaz. Romper

com este círculo vicioso onde o domínio da improvisação subordina a qualidade da gestão

pública a um menu de decisões diárias sem propósito definido, sob pressão das

circunstâncias e das urgências é maior desfio colocado.

A capacidade de um sistema organizativo para evoluir está condicionada pela dinâmica do

capital social da organização. Matus define este capital como síntese do capital humano –

formado pelos valores, conhecimentos, ciência, tecnologia, arte e cultura, pelo capital

material – os meios materiais e o capital organizativo - a tradição e valores das práticas de

trabalho, as ciências organizativas, as regras do jogo institucional.

O mais estratégico e importante é o investimento em capital humano (ou capital cognitivo),

pois é ele que pode aumentar o capital organizativo, incidir na mudança da cultura da

303

organização e de suas práticas de trabalho. Estas mudanças são pré-condição para

modernização dos sistemas de gestão. Há sempre uma correlação estrita entre formas

organizativas, práticas de trabalho e estruturas mentais, estas últimas indicam o quanto de

capital humano a organização tem acumulado e qual o alcance possível do processo de

mudança cultural.

As regras fundamentais que determinam o espaço de variedade dos graus de liberdade

permitidos ao re-desenho organizativo são as seguintes:

(1) Direcionalidade

distribuem e selecionam as funções e missões das várias

organizações. Estas regras respondem pelo padrão

político-ideológico vigente.

(2) Macroinstitucionhalização

Definem e precisam os modelos-tipo de administração e

organização pública, por exemplo, administração direta,

fundacional, empresas públicas, organizações semi-

públicas, etc...

(3) Departamentalização

São as regras que determinam as estruturas

administrativas concretas e reais dentro de cada modelo-

tipo. Um extremo de redundância é a existência de vários

órgãos para cumprir uma única missão, no outro um órgão

centraliza várias missões diferenciadas. São específicas e

peculiares a cada órgão, fixam a divisão de trabalho entre

vários órgãos com função intermediária e finalística.

(4) Governabilidade

Determinam o nível de controle sobre as variáveis de

gestão governamental. Estabelecem a proporção entre a

missão assumida e a competência para cumpri-la. Definem

o grau de centralização e descentralização no

processamento de problemas.

(5) Responsabilidade

Estas regras se expressam na intensidade de três processos

interligados: a gerência por operações, o funcionamento da

agenda da liderança e o sistema de petição e prestação de

304

contas. Há dois extremos, os sistemas de baixa

responsabilidade, dominados pelo improviso que não

demandam planejamento e os sistemas de alta

responsabilidade que demandam planejamento e capital

social.

Uma organização não pode ser melhor que a cultura institucional que possui, esta cultura é

formada pela combinação específica de estruturas mentais dominantes no interior da

organização, reforçadas por culturas institucionais, práticas de trabalho e formas

organizativas – organogramas, regulamentos administrativos, fluxos de informação e

manuais de procedimento.

Uma organização muda verdadeiramente somente quando mudam suas práticas de

trabalho, estas só mudam quando as estruturas mentais – condicionadas pela cultura

institucional – também se modificam. Portanto, o centro da intervenção deve ser sempre a

mudança da cultura institucional. Colocada desta forma o problema assume uma

complexidade maior e exige uma estratégia mais abrangente de enfrentamento.

As regras básicas do espaço de possibilidades institucionais funcionam, segundo Matus, sob

um “triângulo de ferro”. Este triângulo tem em seus vértices os seguintes sistemas:

(a) formação da agenda do dirigente: distribui o tempo, fixa o foco de atenção,

seleciona entre as emergências e as importâncias. A disputa entre direção

planificada e domínio da improvisação se reflete no menu diário de decisões do

dirigente, no uso dos recursos mais escassos: o tempo e o foco de atenção.

(b) Petição e prestação de contas por desempenho: avalia, valora, estimula e corrige os

resultados da gestão e o esforço para obtê-los. Induz à prática da inovação, da

criatividade e do planejamento estratégico, divide as organizações entre as de alta

e baixa responsabilidade.

(c) Gerência por operações (ou projetos): determina se o estilo será criativo ou

rotineiro de gestão entre os extremos da inovação e da decadência organizacional.

305

É o sistema de prestação de contas, de monitoramento e avaliação que domina o triângulo

de ferro. A qualidade da avaliação determina as demandas por práticas de trabalho

inovadoras e mudança da cultura institucional.

A partir destas reflexões o método sugere um conjunto de princípios (e encaminhamentos)

para conceber um sistema de direção estratégica e elevar o desempenho institucional das

organizações.

(1) atuar na cabeça da organização: toda reforma deve começar como iniciativa

política e protagonismo da alta direção. A implantação de sistemas de

planejamento, prestação de contas, monitoramento de desempenho e

democratização da gestão só se efetivam com o envolvimento da alta direção.

(2) Mudar as regras de responsabilidade: quando todos estão envolvidos no

sistema de prestação de contas sistemáticas, avaliação do desempenho real com

as missões assumidas, sistema de monitoramento, mecanismos de participação

consolidados a organização passa a ter alta responsabilidade e demanda

planejamento sistemático.

(3) Concentração em problemas relevantes: nenhum problema é óbvio para ser

processado técno-políticamente, deve-se operar uma seleção sistemática de

problemas e ele deve ser processado em níveis diferenciados onde assumir

maior valor e importância.

(4) Reformular primeiro o conteúdo, depois a forma: As estruturas formais da

organização (organogramas e carreiras funcionais, p. exemplo), só tem sentido

na sua mudança se decorrem de efetivas transformações nas práticas de

trabalho e estas nas estruturas mentais e na cultura institucional que lhe

sustenta e legitima. É por isso que o investimento em capital humano, em

Regras de responsabilidade

Prestação de contas

Qualidade da Gestão

306

treinamento e capacitação é absolutamente estratégico para reformar as

organizações públicas.

(5) Promover estratégias descentralizadas: todo problemas deve ser processado no

nível hierárquico onde possuir maior valor. Fora do seu espaço institucional de

governabilidade o problema tende a ser tratado de forma rotineira, superficial e

burocrática.

(6) Centralização: problemas complexos, cuja solução exige um espaço maior de

governabilidade não devem ser processados nos espaços originais onde

surgiram, sob pena de um déficit de responsabilidade, visão estratégica ou

domínio de variáveis mais amplas. Este princípio deve ser combinado com o

anterior.

Cultura Institucional

Estruturas Mentais

Práticas de trabalho

Estruturas Formais

307

(7) Normatizar problemas bem-estruturados: problemas complexos, mas bem-

estruturados, isto é, com certa previsibilidade e conhecimento de lógica interna

devem ser processados e monitorados por níveis inferiores, liberando a alta

direção para problemas complexos de gestão.

(8) Modular problemas repetitivos: há um conjunto de problemas rotineiros cuja

solução é pré-processada modularmente, através de modelos, manuais de

procedimentos e outras formas mais simples e menos custosas.

(9) Reformar órgãos é mais efetivo que reformar sistemas: há muitas reformas no

setor público que são focadas em sistemas específicos (compras, orçamento,

pessoal, etc.), passando por vários órgãos simultaneamente. Uma desvantagem

básica disto é a coexistência dentro da mesma organização de sistemas com

lógicas diferentes e às vezes opostas. A falta de continuidade administrativa e as

resistências dos sistemas não-reformados acaba inviabilizando esta estratégia

“horizontal” de reforma. Este princípio sugere a prioridade por reformar um

órgão verticalmente, atacando todos seus sistemas simultaneamente,

envolvendo todo o “triângulo de ferro”.

4. Como organizar o planejamento – síntese dos procedimentos

Passo 1 (planejamento institucional)

A direção da organização – já convencida sobre a necessidade do planejamento estratégico

participativo – organiza e executa o Planejamento Institucional para definir as Declarações

Estratégicas (Diretrizes, Missão, Visão de Futuro e Valores) e indica o Comitê de

Planejamento encarregado de preparar o processo até o Seminário Geral.

Lembrando mais uma vez: se a direção não estiver definitivamente sensibilizada técnica e

politicamente sobre a necessidade de planejamento participativo e democrático, com a

decisão de envolvimento pessoal de seus componentes, o processo está totalmente

comprometido. Isto significa que as condições materiais e objetivas para executar as

atividades necessárias devem estar asseguradas.

308

Composição e funcionamento do Comitê de Planejamento

Como vimos é condição para o desenvolvimento do processo a Constituição prévia do

Comitê de Planejamento no órgão, sua composição deve incluir sempre funcionários do

quadro permanente da instituição. Ele é responsável pela elaboração das regras

metodológicas de cada órgão, setor ou área no processo de preparação do Seminário Geral

(debate das declarações estratégicas e escolha dos participantes/delegados); pelo

acompanhamento e sistematização dos seminários de planejamento das áreas; pela

coordenação do processo de planejamento até a realização do Seminário; pelo

desenvolvimento de um Seminário de Planejamento Institucional, com a alta direção do

órgão para formulação das Declarações Estratégicas (Missão, Visão, Valores e Diretrizes

Estratégicas); divulgação das Declarações Estratégicas para o conjunto do Órgão, em evento

que constituirá o início do processo de planejamento; realização de seminários por área

(deptºs/divisões), orientados pelas Declarações Estratégicas que devem: (a) eleger

representantes para participação no Seminário Geral de Planejamento Estratégico

Participativo, (b) selecionar e identificar problemas, cuja superação seja considerada

indispensável à consecução das Declarações Estratégicas. Este material, sistematizado pelo

Comitê de Planejamento, servirá de insumo à parte inicial do Seminário Geral de

Planejamento, realização de Seminário Geral de Planejamento Estratégico com participação

dos: (a) dirigentes da instituição, são os representantes naturais, (b) representantes

proporcionais dos quadros de chefias, (c) representantes eleitos dos servidores, por área, e

participação proporcional de estagiários, com direito apenas à voz.

Passo 2 (eventos preparatórios)

Os seminários preparativos: desenvolvimento da metodologia nas áreas ou setores

operacionais

Pressupostos:

309

• As áreas devem realizar seminários preparatórios, acompanhadas por monitoria e

moderação designada pelo Comitê de Planejamento e seguindo as regras gerais por ele

fixadas, a fim de guardar direta relação com a metodologia que será aplicada nas demais

áreas e para garantir o sentido democrático e um padrão de procedimentos comuns a

toda organização.

• A discussão nas áreas deve ser balizada pela escolha do(s) representante(s) que irá

participar, em regime de delegação universal, do Seminário Geral do planejamento

estratégico, com enfoque participativo. O nº de representantes por área será

estabelecido em cada organização pelo Comitê de Planejamento, resguardados os

princípios de proporcionalidade.

• O Comitê de Planejamento distribuirá para as reuniões preparatórias do planejamento

(os seminários setoriais), o material bibliográfico (relatórios) resultante do Seminário

Institucional, servindo de orientação aos temas a serem debatidos por todos. Todos os

funcionários devem ter assegurado o direito de conhecer, refletir e se posicionar diante

das declarações estratégicas construídas pela direção da organização, sobretudo

manifestando sua divergência, se assim desejar.

• Todos os servidores e estagiários devem participar nas reuniões preparatórias do

planejamento nas áreas. Os estagiários, dado a natureza de seu vínculo institucional,

somente terão direito à voz.

A dinâmica dos seminários setoriais preparatórios

Partindo do resultado da fase Planejamento Institucional, sob a forma de seminários, as

áreas devem debater e propor os problemas segundo método previamente definido. Este

processo servirá, também, de balizamento para a escolha dos representantes para o

Seminário Geral (Planejamento Estratégico).

A eleição de representantes para as etapas seguintes de planejamento é um momento-chave

no conceito de planejamento participativo. A qualidade da delegação nas áreas e setores de

uma organização pública depende de muitos fatores entre os quais a cultura institucional

pré-existente, a complexidade e natureza da organização ou o grau de qualificação da força

de trabalho. É certo que quanto maior ou mais complexa for a organização mais criativo,

310

cuidadoso e monitorado deverá ser o processo de delegação e eleição de representantes.

Um dos riscos envolvidos nestas situações é a eleição “automática e natural” de

representantes sindicais – sinalizando uma provável confusão entre o momento de

planejamento e o espaço de negociação reivindicativa – ou o oposto, através da eleição de

representantes “alinhados” com a direção do órgão (como os cargos comissionados). É por

isso que o elemento qualificador fundamental do processo deva ser o debate sobre as

diretrizes estratégicas e o posicionamento – reflexivo e crítico - individual e as sínteses

coletivas em cada setor.

A arquitetura de evolução do planejamento baseada num sistema de delegações sucessivas

e articuladas, especialmente em órgãos públicos muito grandes ou territorialmente

dispersos, não invalida o uso de instrumentos pontuais de diálogo direto da direção do

órgão com o conjunto dos funcionários como as Assembléias Gerais, plebiscitos internos,

audiências públicas, agendas sistemáticas com as entidades sindicais representativas,

consultas, ou outros mecanismos de consulta/deliberação auto-regulamentados.

O problema da escala: metodologias participativas são inviáveis em organizações públicas

com centenas ou milhares de servidores? A democracia direta se inviabiliza com a escala da

participação? Acreditamos que não. Pode-se dizer que de um modo geral quanto maior é a

organização pública mais evidente é a necessidade de mecanismos não convencionais de

gestão e planejamento estratégico (usando modernos recursos de telecomunicações, por

exemplo). Imagine-se, por exemplo, as organizações na área da educação, saúde ou

segurança pública que possuem milhares de servidores, territorialmente dispersos e

envolvidos em vários níveis de administração. Nestes casos a maior diferença é a elevação

dos recursos necessários para a preparação, execução e manutenção de um sistema de

planejamento e gestão.

Alguns pontos críticos devem ser observados com especial atenção:

(a) A importância de um sistema de delegações e representações, da base até a

direção, deve ser meticulosamente pensada, para evitar a reprodução dos vícios da

311

representação formal e burocrática e da perda de legitimidade entre representantes

e representados.

(b) Os instrumentos, meios e processos comunicativos adquirem papel estratégico já

que o acesso e o processamento de informações é um dos melhores anticorpos para

o gerenciamento autoritário.

(c) O processo de capacitação preparatória é crucial na medida em que a padronização

metodológica depende de uma extensa rede de multiplicadores ou de “formadores

de formadores” capazes de replicar o método simultaneamente em toda a

organização. Decisão qualificada é decisão informada.

Passo 3: (organizar o seminário de planejamento estratégico)

O seminário de planejamento pode ser organizado em etapas, recomenda-se fazer todo o

processo sem dispersão em ambiente adequado com ajuda profissional para organização do

evento, evitando qualquer possibilidade de ruído externo e interferência perturbadora.

Um dos resultados do seminário para montagem participativa da gestão do plano é a eleição

de um Comitê de Gestão, responsável pelo monitoramento dos cenários, organização da

prestação de contas, acompanhamento de indicadores, elaboração e processamento das

informações necessárias para o processo decisório, entre outras possíveis competências. Os

eventuais seminários de replanejamento – as atualizações gerais do plano quando muda a

direção de um setor ou surge fato novo na conjuntura, por exemplo, também podem ser

organizados pelo Comitê.

Parte do comitê de gestão do plano é indicada e confirmada pela direção e parte é eleita

pelos funcionários, a proporção entre as partes depende do grau de qualidade do processo

de planejamento e da maturidade política-institucional existente. A experiência tem

recomendado que a direção da organização estabeleça claramente a natureza e o caráter

deste grupo de trabalho – normalmente consultivo – em relação às demais instâncias

hierárquicas para evitar futuros conflitos funcionais.

312

Alerta-se para que a conduta da direção em seus diversos níveis assegure sempre

respeitabilidade pela comissão e pelo processo eletivo de seus membros que evidentemente

podem ter seus mandatos revogados, devem prestar contas à sua base e todos os demais

regulamentos democráticos.

Composição e funcionamento do Comitê de Gestão:

No seminário geral o comitê de Planejamento transforma-se em Comitê de Gestão, a partir

da incorporação de tarefas relacionadas à execução e detalhamento do planejamento. O

próprio seminário deve indicar e definir a forma de incorporação dos funcionários

(representantes) no comitê. A participação dos servidores e a natureza gerencial desta

instância são vitais para a manutenção do caráter participativo do planejamento. Não se

trata apenas de mudar o nome e incorporar funcionários do quadro permanente num

comitê que vai detalhar o plano geral nas áreas e fazer relatórios para a direção. A inflexão

para a gestão sinaliza e inaugura uma fase do planejamento que é intensiva em gestão e

onde realmente a capacidade de governo é testada decisivamente. Note-se bem que o

Comitê Gestão não substitui, nem se contrapõe, ou mesmo diminui o papel da Direção do

órgão, mas a complementa como instância estratégica de encaminhamento e deliberação

no nível planejado. Muitas experiências indicam que os comitês de gestão do Plano

313

Estratégico acabam assumindo várias outras funções de suporte e apoio à alta direção da

organização tais como processos formativos a nível gerencial, elaboração de projetos

especiais ou coordenação de atividades inter-disciplinares com um ou mais órgãos

públicos. Síntese das atribuições do Comitê de Gestão: (a) coordenação futura de todo o

trabalho de planejamento e seu monitoramento, (b) permanecer até o advento do próximo

momento de planejamento que coincidirá com o final de cada ano ou outro período

definido pelo Seminário Geral, (c) ser instância de recurso e harmonização dos processos

de interseção e interação entre as áreas, (d) auxiliar na elaboração de indicadores de

resultados e homologá-los, (e) elaborar e executar o plano de monitoramento, (f) resolver

divergências na execução de planos, sejam setoriais ou excepcionais, (g)

divulgação/devolução do resultado do planejamento do Seminário Geral às áreas e, para o

conjunto do órgão, através dos meios de comunicação disponíveis - por exemplo, Intranet,

distribuição de documentos aos setores, e assim por diante e (h) sistematiza o documento

final do planejamento e apresenta ao conjunto do órgão para início de sua execução. Sua

função não é suprimir ou resolver os conflitos sindicais, funcionais ou inter-departamentais,

mas criar condições institucionais para processar os conflitos de forma propositiva,

encaminhando sínteses, acordos e pactos de governabilidade interna do órgão. Ou seja,

sua função-síntese é manter e aprofundar a responsabilização geral da organização,

produzindo insumos sistemáticos e permanentes para qualificar o processo decisório da

interno.

Passo 4: (o planejamento operacional)

Elaboração do planejamento operacional.

É o detalhamento das operações, projetos e ações, de atividades, do orçamento detalhado,

da definição dos responsáveis e equipes de apoio, dos indicadores de resultado, enfim, de

todos detalhes necessários a partir das operações do seminário para completar a matriz de

planejamento e permitir o monitoramento e avaliação do planejamento na medida em que

for implementado. Este detalhamento é necessário pois no seminário geral de Planejamento

os projetos são desenhados genericamente, proporcionando às áreas e departamentos, a

posteriori o seu desenvolvimento integral.

314

A determinação detalhada das metas a serem atingidas no período, para os indicadores de

desempenho da instituição, só pode ser feita a nível operacional. As metas devem ser

factíveis devendo considerar o histórico do indicador. Também devem ser contempladas

metas que envolvam um processo de avaliação dos serviços prestados pela organização,

com participação direta dos usuários, por exemplo, as pesquisas de satisfação, mecanismos

de ouvidoria, cadastro de usuários, técnicas de entrevistas, etc.

5. A dimensão pedagógica do processo de planejamento à guisa de conclusão

O planejamento estratégico, com enfoque participativo se fundamenta na Participação

democrática, na autonomia do indivíduo, na democratização do conhecimento e na práxis

técno-política. Com tais pressupostos, o planejamento inicia um processo de Inversão do

padrão histórico da capacitação dos servidores e agentes políticos, tornando-os

solidariamente partícipes da discussão dos temas da gestão pública, num quadro de

democratização das relações sociais e de poder.

Destacam-se neste processo de capacitação:

• a integração e articulação entre as habilidades básicas, específicas e de gestão;

• conteúdos extraídos da realidade contextualizada;

• temáticas abrangendo as dimensões técnico-profissional, política e comportamental;

• conteúdos atualizados e abrangentes, abordados de modo diverso do tradicional;

• integração entre as atividades teóricas e práticas.

As formas de capacitação que utilizam metodologias participativas permitem:

• a dinamização e interação institucional dos conteúdos temáticos da organização;

• a troca de informações e experiência entre os participantes, juntamente à possibilidade

individual de incidir no rumo da organização, rompendo com a estrutura taylorista da

atividade burocrática;

• a valorização da experiência individual e a integração horizontal entre as dimensões,

política, técnica e administrativa;

315

• a construção coletiva de conhecimento com base na crítica, racionalidade e

interatividade.

A capacitação provocada, pelo planejamento estratégico, com enfoque participativo, desta

forma opõe-se ao continuísmo, ao instituído, por ser um processo permanente, instituinte

que valoriza o compromisso com padrões éticos, de respeito aos direitos humanos e aos

direitos do cidadão e porque estabelece uma ruptura com os processos de ação

fragmentada, típicas do serviço público.

Sob o ângulo democrático do conhecimento, a capacitação desejada é aquela que, além de

incorporar saber, incorpora também poder e realiza a integração e articulação de saberes. O

planejamento não trabalha estes princípios e valores de modo genérico. Antes, equaciona-os

na realidade concreta da cultura e das relações organizacionais. A democracia se associa

assim, à eficiência, e a racionalização do serviços, fundados em padrões crescentes de

melhoria nas condições civilizatórias.

A assimilação deste novo procedimento de planejamento, inaugura uma forma nova de

expressar e arranjar o poder da base (dos servidores administrativos e técnicos, servidores e

agentes), porque articula (sob um sistema de triângulo de relações) o enfrentamento de

situações problemáticas, a cultura da organização, seu processo instituinte e seus códigos

instituídos. Não se percebe mais a organização apenas como código, como norma, mas

como força, como projeto (imaginário até, na Visão de futuro que expressa), como valor e

como cultura. Não se vê ao funcionário/servidor apenas como um executor de ordens, mas

como um sujeito que tem auto-realização, que tem direitos, que tem um coletivo ao qual

pertence e se inscreve numa relação a serviço da cidadania, da democracia e da ética.

O processo de enfrentamento conjunto - do poder político, poder técnico e poder

administrativo - de problemáticas compartilhadas e contextualizadas de forma histórica,

econômica e política, multidimensional portanto, potencializando uma abordagem crítica da

realidade, implica numa desmistificação (e desmitificação) das próprias situações

problematizadas, também porque estabelece processos de mudança centrados em uma

316

metodologia que visa a mudança real das situações, através da compreensão e construção

coletivas dos objetivos da organização.

Portanto, mesmo correndo o risco de algum exagero, o planejamento estratégico, com

enfoque participativo é instrumento que planeja a organização, ao mesmo tempo que

desenvolve seus participantes numa pedagogia que institui uma nova forma de compartilhar

a direção e sentido das organizações pública

317

FLUXO-RESUMO do processo de planejamento

Sensibilização da alta direção

Formação do Comitê de

Planejamento

Planejamento Institucional

Seminários Operacionais

Comitê de Gestão

Capacitação de Multiplicadores

Seminários preparatórios

Redesenho dos Projetos Seminário Geral

de Planejamento

Avalia desempenho

Monitora Cenários internos e externos

Alta direção política-

institucional

Assessora a direção no dia-a-

dia

318

Perguntas:

1. O planejamento estratégico é uma das funções mais complexas e importantes na

gestão inovadora. Você concorda ? Justifique sua resposta.

2. A identificação de uma situação problemática ou uma oportunidade nunca é um

processo neutro ou apático, no PES a “análise situacional” procura mudar esta

perspectiva. Você sabe porque ?

3. O momento da execução do planejado é onde tudo se decide, por isso ele implica em

refletir sobre os sistemas de gestão e sobre o desenho organizacional. Quais

ferramentas ou técnicas poderiam ser utilizadas nesta fase pelo gestor ?

Bibliografia:

Obras de Carlos Matus:

Política, Planejamento e Governo, Tomo I e II, IPEA, Brasília, 1993.

Esta é a obra fundamental de Carlos Matus, traduzida e publicada pelo Instituto de Pesquisa

Econômica Aplicada do Ministério do Planejamento em 1993. Matus expõe

sistematicamente o que ficou conhecido como Planejamento Estratégico e Situacional. Mais

do que um método o PES é uma metalinguagem sobre planejamento, é filosofia de

planejamento. O Autor se propõe a uma critica demolidora do estilo de planejamento

governamental dos governos da América Latina e propõe uma visão mais contingencial ou

situacional, baseada na complexidade da administração publica e na imprevisibilidade dos

cenários sociais, políticos e econômicos.

Chipanzé, Maquiavel e Ghandi, Estratégias Políticas, Ed. FUNDAP, São Paulo, 1996.

319

Nesta obra o pensador chileno Carlos Matus discute o tema das estratégias. Uma das

inovações da metodología de planejamento estratégico proposta é exatamente a

compreensão de que qualquer planejamento implica em lidar com relações de poder. Estas

relações existem dentro da empresa privada ou do setor público. As pessoas estabelecem

processos de autoridade, obediencia, resistência ou passividade, aceitação e conformidade

conforme cada contexto. Matus adota as metáforas de Maquiavel, do chipanzé e de Ghandi

para sistematizar diferentes estilos estratégicos. Livro fundamental para entender o proceso

estratégico no planejamento.

O Líder Sem Estado Maior, FUNDAP, São Paulo, 2000.

Neste livro o já falecido economista chileno Carlos Matus elabora com maestria e

brilhantismo uma profunda crítica ao funcionamento dos governos na América Latina. Ele

desenvolve a tese de que a democracia se enfraquece quando os governos são incapazes de

resolver os problemas concretos dos cidadãos. Para isso três variáveis são fundamentais: a

governabilidade, a capacidade de governo e o projeto de governo. Matus analisa também o

funconamento do Gabinete Presidencial, mas sua reflexão vale para todas estruturas de

direção pública. É de leitura obrigatória para quem trabalha ou quer conhecer a função

publica, especialmente se desempenhar funções de liderança e direção.

Chiavenato, I. e Sapiro, A. (2003) Planejamento Estratégico, Elsevier, Rio De Janeiro

Nesta obra Chiavenato e Sapiro realiza um trabalho de pesquisa importante reunindo

diversas técnicas e ferramentas de planejamento voltadas especificamente para o setor

privado, mas que podem ser utilizadas com alguma adaptação ao setor público. Além da

revisão conceitual a obra tem um sentido de aplicação prática. Cabe especial menção a

parte III com importante contribuição para a formulação da estratégia como política de

negócios, modelos de cooperação e concorrência e desempenho organizacional. É uma

leitura complementar indispensável para manejar os instrumentos do planejamento

estratégico público.

320

Aula 09

Temas emergentes na gestão pública inovadora

O período que estamos vivendo no Brasil desde os anos noventa é uma período de reformas

e de ajuste do Estado. Muitos temas emergem neste debate, as idéias ainda não estão

consolidadas e as conclusões ainda padecem de um saber provisório.

Entre estes temas selecionamos alguns de especial relevância, para ajudar a compor este

mosaico de novos insights e potencialidades para a gestão pública inovadora.

Nesta aula vamos abordar os seguintes temas:

• O impacto das novas tecnologias, em especial os temas do governo eletrônico;

• A gestão do conhecimento no setor público ;

• Os processos de participação social e parceria e

• Os novos formatos organizacionais criados pelo movimento de reforma do Estado

nos anos noventa.

Novas tecnologias e o governo eletrônico

A revolução causada nos sistemas produtivos pelo emprego maciço de novas tecnologias de

comunicação e informação foi gigantesca. Ao ponto de muitos autores chamarem este

período do capitalismo em que estamos vivendo de “era do conhecimento”, “capitalismo

pós-industrial” ou simplesmente “sociedade da informação”.

Na administração pública as coisas não foram diferentes. Surgiu uma organização pública

eletrônica ou governo eletrônico melhorando a informação e a prestação de serviços aos

cidadãos, aumentando em eficiência (os custos foram reduzidos) e a eficácia aumentada.

Além disso, a transparência foi aumentada radicalmente. A base do processo foi a

universalização das redes, criando condições para conexão de todos com tudo, a qualquer

hora.

• A administração eletrônica ou o governo eletrônico é caracterizado por:

• Ênfase no fluxo de informações e prestação de serviços;

• Transformações na organização e funcionamento da administração pública;

321

• Uso intensivo das TICs e processos de convergência, integração e sofisticação dos

serviços públicos;

A administração eletrônica é um estágio superior ao governo eletrônico, pois a

administração pública é composta por sistemas perenes de gestão que ultrapassam o

horizonte contingente dos governos. Ela pode se desdobrar em várias dimensões: o e-

Serviços, a e-Democracia, a e-Gestão ou o e-Comércio, ou qualquer outra forma de

configuração.

No futuro os funcionários públicos deixarão de usar canetas pois passarão a autenticar seus

documentos e notas técnicas através de assinaturas eletrônicas. O fluxo de informações

ligara o serviço visível na linha da rua (o front Office) com a retaguarda da administração (o

back office). Serão verdadeiros “despachantes eletrônicos”. O ambiente de trabalho será o

Portal, através dele o funcionário fará gestão do seu tempo produtivo, das suas tarefas e

metas de desempenho.

As ações de coordenação são impactadas pelas novas tecnologias. Elas permitem a

desterritorialização de muitos serviços, que podem ser conectados a lugares muito distantes,

sem prejuízo da sua qualidade. Imagine por exemplo, no benefício da educação e da

disseminação de conhecimentos através do ensino à distancia. Ainda mais num país com

milhões de habitantes e dimensões continentais como é o Brasil.

Devemos centralizar os serviços em portais, por exemplo, mas descentralizar o poder por

meio da difusão de informações. Há perdas ao não descentralizar que devem ser

contrabalançadas.

A governança no ambiente informacional passa por sete dimensões diferentes:

conhecimento, autoridade, partilha, controle interno e externo, capacidade de

implementação e indução legislativa e regulatória.

Um grupo de consultoria, o Gartner Group, criou as quatro fases mais divulgadas de

maturidade da administração pública eletrônica. Segundo Vidigal as fases são:

322

• Fase 1 – Presença: Esta fase de desenvolvimento da Administração Pública Eletrônica

é caracterizada pela pressa que todos os órgãos da administração pública têm para

ter uma página na Internet. A meta primária é publicar informação, tal como a

missão do organismo, endereços, horários e, possivelmente, alguns documentos

oficiais de relevância para o público;

• Fase 2 – Interação: Esta fase é caracterizada por sítios da Web que disponibilizam

capacidades de procura básica, formulários para download e ligações a outros sítios

pertinentes, assim como e-mail dos organismos e, em alguns casos, dos funcionários

públicos. Nesta fase é fornecida informação crítica para o cidadão, bem como

formulários que, de outro, modo exigiam a deslocação ao serviço;

• Fase 3 – Transação: Esta fase é caracterizada por permitir algumas componentes

para administrar e resolver tarefas completas on-line. O foco desta fase é construir

aplicações de auto-serviço para o público acessar on-line, mas também usar a Web

como um complemento para outros canais de entrega. Os serviços típicos que são

migrados para esta fase de desenvolvimento incluem recolha de declarações e

pagamento de impostos, renovação da carta de condução e pagamento de multas e

licenças. Adicionalmente, muitos governos colocaram anúncios e regulamentos on-

line para concursos, como uma forma precursora de e-Procurement. Esta é a fase

atual em que se encontram alguns dos países mais evoluídos na Administração

Pública Eletrônica e é o objetivo mais imediato para a maioria dos países. Não só

realça os benefícios a disponibilidade de serviços “24x7”, mas também cria

oportunidades para desenvolver serviços compartilhados de forma

interdepartamental;

• Fase 4 – Transformação: Esta fase é a meta em longo prazo de quase todas as

iniciativas de Administração Pública Eletrônica ao nível nacional e local. É

caracterizada por meio da redefinição dos processos de fornecimento de serviços

públicos, provendo um único ponto de contato, tornando a organização da

administração pública muito mais transparente para os cidadãos. Esta fase baseia-se

em ferramentas robustas de relacionamento com o cidadão (CRM) e novos métodos

de fornecimento dos serviços, que melhoram significativamente as relações dos

cidadãos e das empresas com a administração pública. Também aumentam as

facilidades para os cidadãos participarem mais diretamente nas atividades do

323

governo (por exemplo, referendos e votações eletrônicas). Exemplos de

transformação incluem sítios na Web muito sofisticados ou “serviços virtuais” onde a

administração pública fornece informação e serviços de forma proativa e onde se

podem obter diversos serviços em um só lugar, com interfaces automáticas e

integradas com os diversos departamentos envolvidos nas transações. Esta fase

também incluirá o desenvolvimento de intranets e extranets, ligando os funcionários

públicos de departamentos diferentes de forma a participarem nos processos

decisórios e no respectivo fluxo de informações e serviços.

Os valores atuais que orientam as experiências de administração eletrônica são a

maturidade dos serviços, dada pela desmaterialização progressiva dos mesmos. Pela

democratização das informações com os cidadãos influenciando o governo através das

ferramentas em rede. E da integração e interoperabilidade, enquanto requisito para os

valores anteriores.

Para o Gartner Group, as prioridades de serviços eletrônicos para os cidadãos seriam:

1. Mudança de endereço

2. Marcação de consultas médicas

3. Documentos sobre automóveis

4. Votação eletrônica

5. Acesso aos políticos eleitos

6. Pagamento de multas

7. Licenças e autorizações

8. Declarações de Impostos

9. Acesso aos registros de saúde

Os cidadãos teriam as seguintes expectativas:

• Ter o direito de escolher qual o canal de atendimento que preferem na sua

relação com o Estado (Intermediação presencial, Contact center, Quiosques,

Internet, etc.);

• Evitar ter de dialogar com várias entidades para completar uma simples tarefa;

324

• Ver os vários órgãos da administração pública dialogando entre si, para cumprir

processos básicos que digam respeito aos cidadãos e às empresas;

• Evitar custos sociais incomportáveis relacionados com tarefas de certificação,

licenciamento e transporte de dados e informações, que competiriam ao Estado

garantir no seu interior (em back office);

• Fornecer apenas uma só vez dados à Administração Pública, dando cumprimento

a um dos princípios atualmente mais relevantes nas estratégias de modernização

administrativa – “Pedir uma vez e usar muitas vezes” (Ask once, use many).

Esta é exatamente a lógica dos portais onde o cidadão, em tese, tem uma oferta integrada

de serviços de acordo com suas demandas e não de acordo com as divisões administrativas e

departamentais. Atualmente as tecnologias ainda são usadas de forma verticalizada, cada

organização pública tem seu site, seus serviços, seus contact centers. O problema não é

somente colocar todos os serviços juntos virtualmente, é fazer com que troquem

informações.

Quase não há compartilhamento de cadastros ou informações complementares, serviços

prestados com base na residência por exemplo, o que obriga o cidadão a percorrer labirintos

virtuais e uma verdadeira burocracia eletrônica. É como se cada órgão tivesse um silo de

informações do cidadão, independente dos demais órgãos. Será de muito pouca eficácia

substituir certidões e atestados em papel pelos seus equivalentes eletrônicos, estes

documentos não deveria passar de simples pontos automatizados em um workflow

interdepartamental.

Neste contexto surge um novo conceito, o de “governança informacional”. Ela compreende

a capacidade do Estado em estabelecer uma política de gestão da informação voltada pra a

accountability e para a transparência. A governança informacional refere-se à

implementação de estruturas e fluxos de informação, mediante processos decisórios

horizontais e descentralizados.

O maior desafio da governança informacional é a articulação política e a coordenação

administrativa das ações do governo. Estes dois movimentos são pré condição para a

comutabilidade digital dos meios e mensagens, ou seja, para a interoperabilidade entre os

diferentes recursos e serviços públicos.

325

Uma política pública de informação pode se manifestar através do governo eletrônico, da

gestão integrada das unidades de informação (os próprios órgãos públicos) e da ouvidoria

pública. A tecnologia em si mesma não é a política pública, nem a governança informacional,

a tecnologia é apenas um meio, um instrumento. Este alerta é importante para evitarmos o

surgimento de uma nova “tecnocracia informacional” que pretenda substituir o processo

político de governo na definição destas políticas.

O governo eletrônico não se resume a um site publico para pagar impostos ou emitir

certidões. A “lógica do guichê” não deveria ser reproduzida por meio eletrônico, a tecnologia

disponível permite criar uma nova relação com os cidadãos, mais dialógica, de mão dupla,

com interatividade. Estas facilidades viabilizam algumas diretrizes da administração

gerencial, inclusive a maior participação dos cidadãos.

Segundo a CEPAL ainda é baixo o investimento em governos eletrônicos, conforme o gráfico

a seguir.

Em qualquer cenário futuro a presença da administração eletrônica será uma constante. A

virtualidade, a portabilidade, a miniaturização, os processos em tempo real e os serviços

públicos on-line serão expressões cada vez mais naturalizadas e incorporadas no dia a dia. A

conectividade ajudará a romper as fronteiras do organograma, tornando as organizações

mais flexíveis e permeáveis hierarquicamente. Grupos e redes se formarão com maior

fluidez, teremos tele-trabalho e tele-reuniões com maior freqüência.

326

Para resumir o impacto das novas tecnologias nas organizações, inclusive no setor público

vamos apresentar os pontos colocados por Chiavenato:

• Cadeias de comando mais curtas: a antiga cadeia escalar e linear de comando está

terminando. Os níveis hierárquicos mais enxutos e flexíveis serão dominantes. As

estruturas serão mais achatadas, flexíveis e fluidas, proporcionando maior

capacidade de adaptação das organizações à conjuntura;

• Menos unidades de comando: a autonomia das equipes nas relações horizontais ou

diretamente com os clientes está reduzindo a quantidade de chefes e as unidades no

topo da pirâmide;

• Amplitude de controle mais ampla;

• Mais empowerment e participação: com a transferência de responsabilidades e

maior delegação viabilizada pelos fluxos instantâneos de informação (que ajudam no

controle, supervisão a distância e prestação de contas), haverá maior

responsabilização na base das organizações;

• Ênfase nas equipes de trabalho: estruturas matriciais e por projetos ficam mais

viáveis nas novas tecnologias;

• Os antigos departamentos se tornam unidades independentes de ação ou execução

de serviços e produtos. As funções de coordenação estão facilitadas pelo apoio dos

sistemas gerenciais, como os de Business Inteligence (BI) e outros;

• Menos rigor no controle externo sobre as pessoas: transferência do controle sobre os

meios (horário de trabalho, por exemplo) para o controle sobre os fins (contratos

flexíveis, salários variáveis, avaliação de desempenho, etc.).

Gestão do Conhecimento no setor público

É absolutamente normal e esperado que a capacidade de aprendizagem e o conhecimento

sejam valorizados na época atual. Sempre que o mundo passou por grandes e aceleradas

transformações, especialmente durante as crises ou logo após eventos traumáticos como

guerras e conflitos a sociedade e o Estado tiveram que se reinventar para uma nova fase de

estabilidade e crescimento. Não é por acaso que a gestão do conhecimento passou a ser tão

valorizada no setor público e privado nos últimos anos.

Segundo Batista o papel da gestão do conhecimento na área pública é:

327

i) tratar de maneira adequada e com rapidez desafios inesperados e desastres;

ii) preparar cidadãos, organizações não-governamentais e outros atores sociais para

atuar como parceiros do Estado na elaboração e na implementação de políticas

públicas;

iii) promover a inserção social, a redução das desigualdades sociais e um nível aceitável

de qualidade de vida para a população por meio de construção, manutenção e

ampliação do capital social e do capital intelectual das empresas;

iv) criar uma sociedade competitiva na economia regional e global por meio da

educação dos cidadãos para que eles se tornem trabalhadores competentes do

conhecimento, e mediante o desenvolvimento das organizações para que estas

se tornem competitivas em todas as áreas do conhecimento.

Novas tecnologias, novos processos de trabalho, novos perfis de cidadãos-consumidores,

novas variáveis da “era da informação” estão provocando mudanças cada vez mais

profundas e rápidas. No sistema produtivo um dos eixos centrais passa a ser a agregação de

valor aos produtos e serviços pela agregação de conhecimento, seja ele incorporado como

novas tecnologias de produto ou processo ou novos arranjos produtivos.

No setor público a gestão do conhecimento passou a ser uma das variáveis explicativas

centrais do desempenho organizacional, da avaliação institucional e do aumento da

produtividade dos funcionários.

O ciclo da gestão do conhecimento:

328

Um dos primeiros autores nesta área, Peter Senge, afirmava que as organizações tem

capacidade de aprender, dese que dominem cinco disciplinas distintas. Cada uma destas

disciplinas implica uma estrutura de desenvolvimento com capacidade para realizar

resultados específicos.

Todo aprendizado organizacional começa no plano individual. As pessoas armazenam

experiências e informação, reelaboram novos conteúdos em confronto com os já

consolidados e produzem novos mapas mentais. Estes mapas são roteiros para a ação, para

a produção de novas informações e experiências no mundo real. Este ciclo é alimentado

continuamente se o ambiente institucional favorece a aprendizagem, mas é empobrecido e

diminuído se o ambiente não estimula a inovação, a criação e a aprendizagem.

As disciplinas propostas por Senge são as seguintes:

Domínio Pessoal: é uma disciplina que depende da aspiração pessoal, ela implica em

questionamento criativo da visão pessoal das pessoas e sua realidade fática, empírica e

existencial. Os resultados desta tensão, se bem elaborados, podem viabilizar melhores

escolhas e o alcance dos resultados almejados;

Modelos Mentais: é a disciplina da reflexão e do questionamento. As pessoas precisam

ajustar suas imagens internas do mundo (que são base de suas percepções) para melhorar

seu processo decisório;

Visão compartilhada: é a disciplina coletiva que visa estabelecer objetivos comuns, o senso

de compromisso possibilita a criação de imagens de futuro com capacidade de mobilização;

Aprendizado em equipe: é a disciplina de interação do grupo, o aprendizado é

essencialmente complementado pela ação coletiva, pela discussão e debate. O objetivo é

desenvolver um tipo de inteligência capaz de ser maior que simples soma dos talentos

individuais;

Raciocínio Sistêmico: é a disciplina da aprendizagem e busca de uma visão com globalidade.

As pessoas precisam ter uma visão holística, global do sistema e suas partes e componentes

para terem a possibilidade de mudar sistemas com coerência e sinergia.

O ciclo de aprendizagem individual se completa no ciclo de aprendizagem coletiva e um

alimenta o outro. A aprendizagem que falamos aqui está longe daquela visão convencional

de “armazenagem de conteúdos prontos”, da escola tradicional. Aprender significa mais do

que identificar, coletar e sistematizar informações, significa criar novos conhecimentos com

base na práxis diária e fazer isto coletivamente.

329

O aprofundamento do conhecimento depende de alguns fatores:

Arquitetura organizacional: a organização precisa de empowerment, isto é, precisa ser

gerenciada com flexibilidade, participação, autonomia dos escalões intermediários,

comunicação horizontal e estruturas mais matriciais.

Cultura organizacional: já debatemos o tema da cultura nas organizações, vimos o quanto é

difícil sua mudança e quanto são complexos os fatores que a formam e a dinamizam. O

fundamental é estimular uma cultura participativa, democrática e envolvente, baseada em

relacionamento humanos e não em cargos e hierárquicas verticalizadas. O fundamental é

criar um senso de comunidade, de comunhão de interesses. Isto não significa abolir a

autoridade, o comando e o controle, mas organizá-los de uma forma legítima, natural e

transparente.

Compartilhamento da informação: a informação deve ser cuidadosamente gerenciada de

modo a ser pertinente, eficaz e acessível a todos os funcionários e escalões de autoridade.

Não basta o funcionamento de sistemas sofisticados de inteligência artificial e bancos de

dados super potentes, se não há, previamente, uma disposição da alta direção em socializar

informações críticas, em confiar nos seus funcionários.

Liderança Estratégica: a visão compartilhada do futuro surge na alta direção e se enriquece e

ganha vida em todas as áreas da empresa. O envolvimento dos dirigentes não se limita ao

compromisso verbal, deve ocorrer o testemunho vivencial, o compromisso emocional

através de atitudes e comportamentos autênticos e não-manipulatórios.

As características do conhecimento

O conhecimento é tácito. Na maioria das vezes o conhecimento não está sistematizado,

estruturado e documentado em textos ou formatos digitais. Ele está nas experiências

pessoais, na cabeça das pessoas. Se relaciona intimamente com o meio no qual nos

construímos com pessoas, com identidades próprias. Por isso, é de difícil transmissão,

precisa de ambientes informais que viabilizem o contato face a face, só a intimidade da

comunicação direta pode compartilhar este tipo de conhecimento. O conhecimento tácito é

a expertise do funcionário sobre uma tarefa específica ou sobre o modo de vida na

organização.

330

O conhecimento tácito se converte em parte em conhecimento explícito através de

iniciativas como a socialização, a externalização, a internalização e a combinação entre os

dois tipos de conhecimento, conforme a figura a seguir está ilustrando.

O conhecimento é orientado para a ação. Polanyi, que pesquisou o conhecimento, dizia que

o processo de saber é a tentativa de juntar pistas fragmentadas a partir das lembranças que

são agrupadas em categorias que criamos de acordo com nossa percepção da realidade. Isto

quer dizer que o contato com o mundo real testa nosso saber de forma automática e

instantânea, quando refletimos, questionamos esta automaticidade, problematizamos o

saber, criamos novos saberes. A linguagem expressa este saber através dos verbos:

aprender, fazer, esquecer, lembrar, compreender.

O conhecimento é sustentado por regras. O processo de sobrevivência cria rotinas e atalhos

mentais como esquemas simplificados de compreensão que interpretam eventos, símbolos

e informações que se repetem. Estas “regras” poupam esforço e nos permitem agir com

eficácia, imagine se tivéssemos que refletir sobre o sentido da vida cada vez que ouvíssemos

a palavra “respirar”. Todos sabemos de uma forma ou outra, o que significa e quais

implicações tem este verbo. Todo evento em que participamos testamos esta regra, que fica

armazenada em nosso esquema mental. Sabemos por exemplo, que respirar não é possível

sob a água e não precisamos testar esta informação para saber que ela é válida, é útil para

nossa sobrevivência. Estas regras embasam o conhecimento tácito também, uma regra serve

como padrão para correção, como filtro para novas experiências. Nossos pré-conceitos

funcionam como regras, só enxergamos o que queremos ver. Estas regras moldam nossa

331

identidade, por isso são de difícil mudança. O conhecimento novo só pode surgir num

ambiente sem pré-conceitos, onde as “regras mentais” podem ser testadas sem medo.

O conhecimento muda constantemente. Exatamente porque o conhecimento resulta do

eterno confronto entre nossos mapas mentais e a realidade viva, ele está sempre em

mutação. Se vivêssemos num mundo que por hipótese sempre fosse igual a ele mesmo, isto

é, nunca mudasse, então o conhecimento seria impossível.

Uma organização com capacidade de aprendizagem deve sempre combinar o conhecimento

tácito e o conhecimento explícito que já foi codificado e internalizado. Ela deve criar

instrumentos de compartilhamento, de socialização entre as pessoas para possibilitar a

aprendizagem. A internalização só acontesse quando o conhecimento tácito se formaliza em

novos procedimentos e regras de conduta.

A gestão do conhecimento é a função responsável pelo processamento destas questões na

organização. Ela demanda um planejamento estratégico para definir como agregar valor á

organização, que informações devem ser identificadas, coletadas, armazenadas,

estruturadas e divulgadas para que se transformem em conhecimento para a ação. O

primeiro passo é identificar:

• Quais categorias de conhecimento são necessárias para subsidiar o planejamento

estratégico da organização;

• Qual é a situação atual do conhecimento na organização, quais são suas fontes, onde

ele está e como se manifesta;

• Quais as atividades necessárias para criar uma base de conhecimentos;

• Quais os benefícios que o uso deste conhecimento trará para a organização;

• Como criar condições para que o conhecimento tácito seja compartilhado e se torne

conhecimento explícito;

• Como monitorar informações ambientais, de organizações parceiras e/ou

competidoras, dos cenários estratégicos e de variáveis-chave para o planejamento;

• Quais e como implantar os instrumentos, técnicas e competências necessárias para

operar os sistemas de informação necessários à gestão do conhecimento (sitemas de

BI – business inteligence, SIGs, sistemas de informação gerenciais, etc.).

Não devemos esquecer que informação não significa conhecimento. Saber, por exemplo,

qual é o déficit habitacional de um município não significa conhecer por exemplo quais as

relações entre o número de sub-habitações e os padrões de renda familiar. Da mesma forma

332

o conhecimento não é ainda inteligência. Ele precisa ser reelaborado, reestruturado,

combinado com outros conhecimentos e submetido a um propósito, um objetivo. Assim se

sabemos o que é o déficit habitacional, quais são suas causas e conseqüências, e se temos o

propósito de diminuí-lo 20% a cada ano podemos elaborar um plano estratégico para isso. A

elaboração deste plano requer então “inteligência”, que é o conhecimento aplicado.

Os sistemas de informação são a base da gestão do conhecimento. Eles devem representar

sempre a combinação entre aquilo que os dirigentes e gerentes da organização pensam que

precisam saber e conhecer com aquilo que eles realmente precisam saber para tomar

decisões. Um sistema deve prover informações no tempo certo, com simplicidade e

confiabilidade necessárias. As perguntas universais que devem ser respondidas são quase

sempre as seguintes:

• Quais decisões os dirigentes tomam regularmente ?

• Que informações são necessárias para tomar estas decisões ?

• Que estudos especiais e não-rotineiros são solicitados com alguma regularidade?

• Quais informações dispomos hoje e quais ainda não temos ?

• Como vamos obter, armazenar, processar e compreender as novas informações e

combiná-las com as já disponíveis ?

• Quais atributos as novas informações devem ter: formato, profundidade, tipo de

relatório, periodicidade, design, etc.

Muitos se esquecem que a própria organização é uma fonte riquíssima e inesgotável de

informações. Imaginem, por exemplo, se todos os contatos importantes dos funcionários

com clientes e fornecedores fossem cuidadosamente identificados, estruturados e

sistematizados para consulta, quanta informação poderia se transformar em conhecimento

estratégico. Hoje existem no mercado inúmeros sistemas de CRM – “Customer Relationship

Management” e de ERP – “Enterprise Resource Planning”, disponíveis, o problema;

entretanto, não é de ordem tecnológica, mas de natureza política e institucional.

A seguir o esquema ideal da cadeia de valor no setor público. A gestão do conhecimento

deverá garantir o funcionamento dos processos de trabalho, dos produtos e dos impacto, ou

seja, da eficiência, eficácia e efetividade organizacional.

333

Um sistema de suporte à decisão na maioria das nossas organizações públicas não passa de

uma montanha de estatísticas impressas que são colocadas na mesa do chefe regularmente.

Na maioria dos órgãos nem isso existe. Estamos muito longe do estado ideal nesta área.

Infelizmente pouquíssimas organizações públicas possuem áreas ou funções de inteligência.

Muitas vezes o trabalho de inteligência é confundido com espionagem ou qualquer coisa à

beira da legalidade. Não se trata disso evidentemente. A gestão do conhecimento é digamos

uma forma profissional e mais sofisticada de gerenciar o conhecimento institucional, é disto

que se trata.

Exemplos de projetos de Gestão do Conhecimento em âmbito federal, em 2004.

Processos participativos e parcerias na gestão inovadora

A Constituição Federal de 1988 estimulou a existência de mecanismos participativos. A Lei

de Responsabilidade Fiscal, do início desta década, em seu artigo 67, por exemplo, prevê a

criação de conselhos de gestão fiscal. Estes conselhos segundo a própria definição, deverão

buscar cumprir as metas através da disseminação de técnicas eficientes de gestão da receita

e da despesa pública, padronizando procedimentos, relatórios e prestações de contas.

A lei prevê que este conselho tenha uma natureza de deliberação coletiva. A nível federal o

conselho deveria ter a seguinte composição:

• seis representantes da União, sendo três do Poder Executivo, um do Poder

Legislativo, um do Poder Judiciário e um do Ministério Público da União;

334

• quatro representantes dos Estados, sendo um do Poder Executivo, um do

Poder Legislativo, um do Poder Judiciário e um do Ministério Público;

• dois representantes dos Municípios, sendo um do Poder Executivo e um do

Poder Legislativo; e

• um representante de cada uma das seguintes entidades:

− Conselho Federal de Contabilidade;

− Conselho Federal de Economia; e

− Conselho Federal de Administração.

Este dispositivo não foi regulamentado, quando o for representará um enorme avanço na

participação da sociedade civil numa das áreas mais restritas e fechadas do governo que é

justamente a área fazendária.

A CF de 1988 criou vários conselhos de representação descentralizada, alguns de

composição paritária entre membros do governo e não. Estes conselhos acabaram por se

reproduzir na esfera municipal e na esfera estadual.

No Brasil o processo de participação política vem crescendo na medida em que se consolida

a democracia no país. Apesar dos grandes níveis de desigualdade social e econômica e dos

períodos autoritários (1937-45, a ditadura civil de Vargas e 1964-85, a ditadura militar) a

democracia tem avançado no país.

A evolução do sistema eleitoral, por exemplo, do voto ao analfabeto em 1985 à

universalização da urna eletrônica em 2002, colocou o país entre as maiores taxas de

comparecimento eleitoral entre os regimes de voto obrigatório.

Nogueira classifica a participação em quatro grandes modalidades de acordo com os

diferentes graus de consciência política coletiva, relacionada à maior ou menor maturidade,

homogeneidade e organicidade dos grupos sociais. A participação assistencialista (1),

filantrópica ou solidária se revela com freqüência entre os grupos mais pobres e

marginalizados como estratégia de sobrevivência, especialmente nos momentos de maior

crise social.

É a forma mais comum e primitiva de participação, é a de menor grau de consciência política

coletiva, visa atender requerimentos imediatos de manutenção da vida ou do bem estar de

grupos ou segmentos sociais, freqüentemente relacionada a atividades religiosas,

comunitárias e políticas de assistência social estatais.

335

Um outro grau pode ser chamado de participação corporativa (2) quando o objetivo do

movimento está conscrito aos interesses de um segmento ou categoria social específica.

Esta forma de associativismo está na base do sindicalismo moderno e se relaciona

diretamente com a forma assistencial de participação motivada por lutas econômicas

geralmente.

Em casos excepcionais pela natureza das reivindicações a participação corporativa pode

ampliar sua esfera de representação ganhando terreno mais amplo que categorias

específicas. Assim como a primeira forma esta também pode ser considerada pré-política.

A participação eleitoral (3) se situa no plano direto da ação política do cidadão na sua

relação com o Estado, além dos direitos civis aqui ganha relevo os direitos políticos e o

problema da governabilidade. Esta modalidade de participação deriva historicamente do

contratualismo liberal e portanto da liberdade individual e da livre iniciativa.

Esta forma de participação sofre, entretanto, um conjunto de limitações típicas daquelas

existentes em regimes democráticos representativos: distorções das preferências pessoais,

igualdade formal anulada pela desigualdade real, falhas do processo eleitoral, mecanismos

frágeis de controle dos eleitos, etc.

Por fim a modalidade de participação com maior grau de consciência política seria, segundo

o autor, a participação política (4). Ela se relaciona diretamente com o Estado e dialoga com

as formas de organização da vida em sociedade e sua reprodução. Alimenta-se da

participação corporativa e eleitoral, mas vai além delas porque questiona e formula novos

consensos sociais, formaliza conquistas de direitos universais que afetam o conjunto de uma

população, sociedade, nação.

O que distingue os cidadãos nesta modalidade participativa não é seu lugar na estrutura

social, sua origem de classe ou estoque de riqueza mas as diferentes visões globalizantes dos

problemas comuns a todos e das soluções e estratégias propostas, portanto, da essência do

próprio debate político democrático ou da gestão coletiva dos conflitos.

O campo da participação política é portanto a arena da declaração e competição de projetos

de sociedade ou nação. A modalidade “política” da participação é aquela claramente

identificada como manifestação de poder político, não como simples expressão de direito

público subjetivo.

A dimensão política da participação cidadã nos remete ao tema do controle social sobre o

Estado, realizado de modo absolutamente imperfeito e insuficiente pelas eleições

336

periódicas. Mesmo quando são eleições limpas, competitivas, livres, igualitárias, decisivas e

inclusivas, o controle social pode ser meramente formal ou burocrático. Com a onda de

reformas do Estado no mundo e na América Latina durante os anos oitenta e noventa o

controle social foi associado ao termo accountability, que a abordagem da New Public

Management presumia ser melhor realizada pelos mecanismos de mercado (oferta e

procura), melhor que os mecanismos políticos, permitindo assim o verdadeiro controle e

identificação das preferências dos cidadãos.

Neste paradigma a participação é qualidade do indivíduo isolado, relegada a micro-espaços

(escola, igreja, etc...), recaindo quase totalmente sobre a dimensão técnica dos projetos,

despolitizando os cidadãos que serão vistos agora como clientes e consumidores. A onda de

reformas não só deixou de enfrentar uma atuação auto-referenciada da administração

pública burocrática, como aumentou o déficit de participação e controle social ao substituir

o condenável clientelismo da política tradicional pelo controle das leis do mercado.

Além de modalidades distintas o processo participativo pode ser considerado conforme os

vários estágios de implantação. Ricci sugere uma tipologia de três fases, no contexto da

participação local:

• fase de legitimação: fase inicial que supõe a legitimação do processo da participação

como um processo decisório de governo e como lócus de apresentação de demandas

sociais e deliberação participativa de ações públicas. Conquista-se a legitimidade no

interior dos governos, o reconhecimento e a incorporação dos ritos participativos na

dinâmica gerencial das organizações públicas assim como o reconhecimento externo

que se revela na capacidade mobilizatória e na representatividade de conselheiros e

delegados;

• fase de efetividade: consolidada a legitimação junto ao governo e á sociedade as

pautas se unificam e se ampliam, além das demandas imediatas inicia-se o debate

sobre modelos de desenvolvimento e políticas mais universais. Nesta fase começam

a surgir programas e agendas intersetoriais que abrangem a totalidade do território e

ultrapassam os limites dos organogramas governamentais, o debate do

planejamento se faz presente e inicia-se processo de maior empoderamento das

organizações sociais em redes e na descentralização de políticas e serviços;

337

• fase de institucionalização: criam-se novas estruturas de gestão, monitoramento e

avaliação das ações de governo, internalizando formas, instrumentos e processos

participativos (consultas, conselhos, comunicação,...).

O conceito de “participação política” resulta, ele mesmo, de um processo de evolução da

compreensão da teoria política sobre a América Latina. O paradigma clássico da análise da

ação coletiva na América Latina consistiu no predomínio de uma concepção que concebia a

sociedade como articulação de diversas estruturas interelacionadas (econômica, social,

política, etc...), seguindo leis que determinavam o comportamento dos atores sociais.

As sociedades podiam ser classificadas de acordo com “fatores estruturais” determinantes

em desenvolvidas ou subdesenvolvidas, democráticas ou autoritárias, modernas ou

tradicionais e assim por diante. A mudança de padrões sociais ao longo da história ocorreria

através de etapas sucessivas de modernização. Nesta concepção os atores sociais são

definidos a partir de parâmetros externos a si próprios ou às suas circunstâncias, são

portadores a priori de algum papel ou missão histórica.

Nos anos oitenta este paradigma cedeu cada vez mais terreno para um outro tipo de análise

que abandonava a visão monolítica e determinística da sociedade, o que implicou na adoção

de várias hipóteses explicativas.

Em comum a todas elas a noção de que as relações entre economia, política, cultura e

sociedade são definidas por esquemas flexíveis, sem uma determinação universal, mas

sujeitas aos momentos históricos e contextos específicos de cada região ou país.

Os processos sociais por sua vez começam a ser vistos com mais autonomia em relação à sua

“base estrutural”. Assim determinada sociedade possui uma “matriz sócio-política” única e

definida, sintetizando um modo específico de configuração entre Estado, sociedade, partidos

políticos, sociedade civil e base social.

Nesta concepção analítica o papel do ator social que atua politicamente assume importância

chave porque ele não é mais tributário de um estrutura fixa, ao contrário, cria suas próprias

circunstâncias históricas, possui densidade, identidade e alteridade. Não há mais um único

sujeito da ação histórica, predestinado a cumprir um papel modernizador, seja ele um

partido político ou movimento social. Há vários sujeitos, assim como há vários sistemas de

dominação produzidos pela crescente autonomização da esfera política, social e econômica.

Neste embate teórico e prático surgiram novos eixos para a ação coletiva na América Latina.

O primeiro e mais importante foi à democratização política implicando no retorno da

338

dinâmica conflitiva de sujeitos sociais novos como movimentos sociais, populares, étnicos,

etc, junto com partidos políticos – que ganham maior protagonismo - e a reconstrução de

organizações estatais. Implica em reconhecer que a sociedade moderna é plural,

heterogênea e composta por um conjunto de identidades diferenciadas. Nem sempre a

lógica da democracia representativa consegue fazer com que todos sejam representados.

Entretanto, nossa democracia é débil e os sistemas de representação são frágeis, há uma

infinidade de pontos na agenda de transição que não foram completados. Há um

desencanto crescente de parcela significativa da população com as a ineficácia dos

mecanismos clássicos de representação para mudar o modo de vida.

Duas décadas de democracia em muitos países não mudaram substancialmente o quadro de

injustiça social, concentração de renda e atraso econômico. Um segundo eixo são as lutas

pela democratização social e pelos direitos da cidadania, assumindo a forma dos direitos

políticos, econômicos ou sociais.

A incorporação de minorias, as lutas étnicas ou de gênero, o direito à informação, ao

ambiente, etc. Movimentos da juventude, periferias urbanas e uma gama enorme de lutas

específicas e pontuais entram nesta agenda. Um terceiro eixo mobilizador poderia ser

chamado de “a disputa pelo modelo de desenvolvimento”, no contexto da globalização.

Neste último caso a ação coletiva é pautada ou pela defesa de condições ameaçadas, por

exemplo, na privatização de serviços públicos gratuitos ou pela proposição de novas agendas

capazes de recompor a intervenção estatal em setores estratégicos.

Na esfera não estatal ou associativa o Brasil transformou-se radicalmente nos últimos quinze

anos. Entre 2002 e 1996 o número de fundações privadas e associações sem fins lucrativos

cresceu 157%. Mais de 70% das ONGs atuais foram criadas na década de noventa. As

organizações ligadas às lutas ambientais e à defesa de direitos foram multiplicadas por

quatro no mesmo período. Este tipo de organização representava 17% do universo

associativo não-estatal brasileiro em 2002, num universo de 276 mil organizações.

O fenômeno ainda é mais presente nas regiões mais ricas e urbanizadas do país, o sudoeste

concentrava 44% e a região Sul 23% das associações sem fins lucrativos, mostrando forte

correlação entre nível de desenvolvimento e grau de associativismo. Outro sintoma claro de

expansão do processo participativo no Brasil foi o rápido crescimento dos conselhos de

políticas públicas pós-Constituição de 1988.

339

Na maioria dos casos os conselhos têm composição bipartite, metade governo e metade

sociedade civil como são os Conselhos de Assistência Social ou Desenvolvimento Rural

Sustentável. No caso da saúde metade são organizações de usuários, 25% de instituições

prestadoras de serviços e o governo tem somente os 25% restantes. Segundo o Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada, o IPEA, vinculado ao Ministério do Planejamento, o Brasil

tinha em 2005 aproximadamente 6.000 conselhos na área da saúde, 3.000 na área da

criança e adolescente e 4.671 conselhos no setor de assistência social.

Para estes autores o Brasil possui hoje todas as características de uma sociedade com

estatuto democrático: liberdade de opinião, de ir e vir, de crença, iniciativa econômica, etc.

O problema central está na incapacidade do Estado em garantir a efetividade deste

estatuto, atribuindo-lhe a necessária universalidade e concretude para crescentes parcelas

da população.

Outra experiência notável de inovação no aspecto participativo foi a elaboração do

orçamento feita por diversos municípios ao longo das últimas duas décadas. Os casos mais

conhecidos foram os de Lajes (SC) e Boa Esperança (ES) – adotadas entre 1978 e 1982 – e,

posteriormente, Diadema (SP), iniciada em 1983 e Vila Velha (ES), ocorrida entre 1986 e

1989. Mas foi a experiência de Porto Alegre, dada sua longevidade e repercussão

internacional, a mais conhecida. Até 2004 havia 195 municípios brasileiros onde o

orçamento participativo estava em funcionando, incluindo algumas capitais importantes

como Porto Alegre, São Paulo, Recife e Belo Horizonte, reunindo anualmente só nestas

cidades em torno de 200 mil participantes.

O processo do orçamento participativo é basicamente um sistema de consultas organizadas

por temas, regiões geográfica ou rubricas orçamentárias abertas à participação individual

dos eleitores e organizados por órgãos estatais, normalmente as Prefeituras. Em algumas

experiências mais consistentes a população elege delegados que compõe comissões de

controle e monitoramento ad hoc de obras e serviços públicos.

Durante o governo do Presidente Lula (2003/2006 e 2007/10) houve muita ênfase na

realização de conferências temáticas nacionais. Até 2008 haviam sido realizadas 51

conferências nacionais abrangendo 32 temas diferentes, dos quais 20 temas pela primeira

vez. Segundo o governo federal estas conferências mobilizaram diretamente 3,4 milhões de

pessoas nas três esferas administrativas. Além disto, foram reforçados os conselhos de

340

políticas públicas. A Secretaria Geral da Presidência da República identificou 130 Conselhos

existentes, 19 dos quais criados no atual governo.

O processo de participação apesar de desejável e necessário para uma gestão inovadora não

acontece gratuitamente. Uma abordagem já tradicional da ciência política, nas reflexões de

Mancur Olson, já apontou os chamados “limites da ação coletiva”. Pode-se listar as

principais:

(a) não-percepção: há inúmeras situações na vida cotidiana de não convergência entre a

ação imediata do indivíduo e seu interesse próprio ou legítimo. Por ignorância das

alternativas possíveis ou conseqüências futuras de determinadas escolhas os indivíduos

podem inclusive agir contra seus interesses, dificultando ações coletivas onde esta não-

percepção tem mais chance de acontecer. Além disso, há sempre o problema da informação

assimétrica entre os vários atores sociais, o foco muda conforme o posicionamento no

tabuleiro do “jogo social”.

(b) defecção: ocorre quando o cidadão abandona a ação coletiva em função de uma

avaliação custo/benefício mais favorável à ação individual. Por apatia, descrença,

acomodação ou inércia os benefícios da ação coletiva são diminuídos ou seus custos

aumentados. A opção da classe média brasileira pela escola privada e o abandono das

mobilizações pela escola pública gratuita e de qualidade é usado como exemplo desta

limitação.

(c) tamanho do grupo latente: quanto maior é o grupo e mais complexo o mosaico e a

composição de interesses de sub-grupos, mais marginal será a contribuição individual. Se um

grupo é muito pequeno, por outro lado, os custos individuais de participação aumentam e os

resultados do processo tendem a diminuir. Exemplos desta restrição: o grande número de

abstenções eleitorais nos países onde o voto é facultativo, a não participação em

movimentos de massa, etc... A figura do free rider ou “carona” surge pois há um desestimulo

a participação individual se os benefícios da ação coletiva atingirão todos igualmente,

participantes e não-participantes, eles não podem ser individualizados. Custos individuais,

benefícios coletivos.

(d) custos altos: o primeiro deles é a busca e manutenção de informação, indispensável para

qualificar a participação, sacrifícios pessoais, alto grau de exposição individual,

disponibilidade para travar conflitos e conviver em ambientes hostis são alguns exemplos

básicos.

341

(e) lógica temporal: nos processos de participação política geralmente os custos são

imediatos e os benefícios de longo prazo, às vezes inter geracionais, o exemplo da luta pela

escola pública de qualidade vale também neste caso: não seria razoável participar de fóruns,

reuniões, grupos de trabalho pensando somente na educação dos próprios filhos.

Os processos participativos são extremamente complexos. Eles se prestam muitas vezes à

ação demagógica e à manipulação dos governos. Nestes casos o que acontece é um

simulacro de participação, algo que vale mais como publicidade oficial e marketing dos

governantes do que um processo efetivo de cidadania e aprendizagem. É importante

envolver as pessoas desde o início dos processos e não apenas no final onde as soluções já

estão prontas e encerradas. Por isso o processo de participação deve começar no próprio

planejamento das políticas públicas.

Não há fórmulas nem receitas de bolo, o fundamental é manter algumas diretrizes, três

delas são comentadas a seguir:

• Empoderamento dos participantes e das arenas de disputa e pactuação: a

“participação” aparece na agenda do debate sobre governo e Estado “só” porque há

uma distribuição não equitativa do poder. Não precisamos fazer um debate sobre a

origem e reprodução do sistema capitalista para saber que os processos de produção

de políticas públicas e de governo em geral são profundamente concentradores do

poder político, desiguais e não equitativos. Assim, processos de planejamento que

não resultem de situações prévias de empoderamento de seus participantes, não

são, de fato, participativos. Ou melhor, serão participativos tanto quanto maior for o

grau de empoderamento, de autonomia, de capacidade de valer suas decisões e

quiça de institucionalização da vontade dos participantes. Neste sentido, o tema da

“participação” é um problema que a rigor, se resolve antes da aplicação de técnicas,

ferramentas ou instrumentos de planejamento, não durante, muito menos depois.

Planejar sem poder é deixar-se manipular, participar de um simulacro democrático.

Se não é “para valer”, então não é participativo.

• Comunicação e transparência de procedimentos: todo processo participativo é um

processo comunicativo. Sem livre fluxo das informações e a possibilidade do

encontro entre as diferenças de visões de mundo, posicionamento, atitudes e

posturas, que a socialização da informação proporciona, não há participação. Esta é

342

uma condição necessária para equalizar o saber e o conhecimento, anular a diferença

de poder representada pela posse do saber acadêmico ou intelectual. Todo processo

participativo pressupõe ambientes, regras e instituições que favoreçam a negociação,

a formação de pactos e consensos – o que obriga a exposição pública e

processamento público de conflitos e divergências. Para que a negociação aconteça a

comunicação qualificada é imperativo básico, a capacidade de expressão, a

capacidade de escuta, a retórica acessível ao homem comum.

• Mecanismos de monitoramento e avaliação de resultados auto constituídos e

regulados: Se os participantes não tiverem mecanismos de responsabilização pelos

resultados esperados do planejamento, não há participação, no máximo o que ocorre

é uma “encenação participativa”, um engodo. Se não como cobrar e prestar contas, a

própria necessidade do planejamento – como método de governo – se desvanece e

torna-se desnecessária. Seria melhor administrar conforme as circunstâncias, um dia

depois do outro. O processo participativo não garante, per si, eficácia da ação

coletiva (pública ou não). Seria uma ilusão substituir o “planejamento sem

participação” pela “participação sem planejamento”, isto é, sem domínio da “boa

técnica” que se requer para avaliar os outcomes e os outputs planejados, decidir o

que fazer para corrigir desvios, mudanças de cenários e estratégia de stakeholders,

por exemplo.

As parcerias entre Estado e Sociedade

Outro movimento importante de ampliação da participação na gestão pública é a ocorrência

cada vez maior de parcerias entre o estado e a sociedade. Com a crise do estado e a

insuficiência de recursos para atender as demandas crescentes, começaram a surgir

alternativas de compartilhamento destas responsabilidades com entidades da sociedade

civil. Com o tempo as parcerias ganharam uma natureza política e institucional, conferindo

mais eficiência e eficácia, sobretudo aquelas ações descentralizadas na área da assistência e

proteção social.

Na administração pública alguns movimentos começaram a se consolidar em torno da idéia

de parceria:

343

• transparência, para designar o velho princípio da publicidade e afastar a atuação

sigilosa;

• privatização, para designar a transferência de ações das empresas estatais para o

setor privado;

• parceria entre o poder público e o privado, para designar fórmulas antigas, como a

concessão e a permissão de serviços públicos e, mais recentemente, as Parcerias

Público-Privadas (PPP);

• flexibilização, quando se quer descentralizar mais, diversificar o Regime Jurídico dos

servidores, simplificar os procedimentos licitatórios e os procedimentos de controle.

As parcerias adquirem vários sentidos. Podem significar um diálogo permanente entre o

Estado que contrata serviços e um fornecedor privado. Pode significar um nova

personalidade jurídica que compartilhe a gestão de determinado serviço público,

compartilhando riscos, lucros e perdas.

A forma mais comum de parceria é a delegação para execução de serviços através dos

instrumentos de concessão e permissão, ambos previstos e regulados pelo direito

administrativo. Entretanto, esta forma de parceria não pode ser aplicada para aquelas

atividades que são exclusivas do Estado e indelegáveis pela sua natureza (a segurança

pública, por exemplo). Através de convênios e contratos de gestão o Estado pode

estabelecer parcerias para prestação de serviços não exclusivos, como por exemplo a ação

de promoção das exportações brasileiras que é executada por uma Agência de natureza

privada vinculada o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, através

de contrato de gestão.

Uma foram recente de parceria que inovou as relações entre o Estado e os agentes privado

foi a chamada “parceria público-privada” ou PPPs. Elas foram criadas por lei federal em

2004. O objetivo é atrair o setor privado, nacional ou estrangeiro para investimentos em

projetos de infra-estrutura de grande vulto, ou em caráter de urgência para o

desenvolvimento do país.

O Estado garante ao agente e investidor privado um retorno mínimo sobre o capital

investido, por exemplo, uma tarifa de pedágio que cubra os custos de implantação e

remunere o capital do investidor.

Novas organizações na administração publica

344

No movimento de reforma gerencial do Estado brasileiro dos anos noventa foram criados

novos formatos e arranjos administrativos, entre os quais as organizações sociais, as

agências executivas e as agências reguladoras. A intenção foi adaptar o aparelho do Estado

às diferentes formas de organização e prestação dos serviços não exclusivos. Vamos analisar

as configurações básicas.

As organizações sociais

As Organizações Sociais, ou simplesmente OS, como ficaram conhecidas são um dos modelos

de organização pública não-estatal destinada a absorver as atividades passíveis de

publicização, ou seja, de se converteram em atividades públicas, embora não estatais. Trata-

se de uma propriedade pública não-estatal, constituída por associações civis sem fins

lucrativos, que não são propriedade de um indivíduo ou grupo e estão orientadas

prioritariamente para o atendimento de um interesse público.

No fundo as OS são um modelo de parceria entre o Estado e segmentos da sociedade. O

Estado emite as diretrizes e faz o controle, repassa recursos públicos e em troca tem

demandas sociais atendidas com menores custos coletivos e maior qualidade dos serviços.

As OS tem autonomia administrativa bem maior que os órgãos da admininstração direta ou

indireta como as empresas, fundações ou autarquias públicas. Em compensação elas

contratualizam metas e resultados com o poder publico, através de um Contrato de Gestão

que estabelece objetivos, formas de incentivo ou penalidades aos seus dirigentes.

Juridicamente elas são associações sem fins lucrativos, com pessoa jurídica de direito

privado. Normalmente sua qualificação como OS acontece mediante decreto do poder

executivo, após o atendimento de uma série de quesitos.

O modelo das OS não é um simples convênio de transferência de recursos públicos para o

setor privado não-lucrativo. Os conselhos administrativos devem ter representantes do

Estado e da sociedade e a gestão, ainda que privada, deve atender os princípios da

administração pública, além da orientação para os resultados contratados.

A princípio o modelo das OS tem a agilidade de uma empresa privada, na gestão dos

recursos, aquisições e política de pessoal, por exemplo, sem perder a natureza de uma

função pública.

345

Os passos previstos para implantação e gestão de uma OS são os seguintes:

• Divulgação da proposta de criação pelo Governo ou por entidade da sociedade:

divulgação institucional, reuniões técnicas e articulação institucional;

• Protocolo de intenções: plano de trabalho e comissão coordenadora;

• Preparação organizacional das atividades a serem publicizadas: capacitação para a

mudança, planejamento estratégico e operacional;

• Criação e composição da entidade não-estatal: estatuto registrado, Conselho e

regulamentos aprovados, composição organizacional;

• Preparação e negociação do contrato de gestão: objetivos, sistema de avaliação e

acompanhamento, metas, indicadores e recursos;

• Atos legais (extinção e qualificação): lei, decreto e abertura de crédito especial,

inventário;

• Gestão da OS: foco no cidadão, ênfase nos resultados, controle social e flexibilidade,

relatório de avaliação, acompanhamento e ações corretivas.

As Organizações Sociais ainda são em número reduzido, no governo federal elas

predominam na área de ciência e tecnologia: o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos

(CGEE); o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA); o Instituto de Desenvolvimento

Sustentável Mamirauá (IDSM); a Associação Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) e a

Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron, que gere o Laboratório Nacional de

Luz Síncrotron (LNLS).

Em 2005 um decreto federal obrigou as Organizações Sociais a seguirem as normas de

licitações públicas para aquisições de bens e serviços.

Além das OS foram criadas as Organizações da Sociedade civil de Interesse Público, as OSCIP.

Através de um Termo de Parceria a organização não governamental estabelece um processo

de cooperação com o governo para realização de projetos específicos. Ao contrário das OS,

onde é reservado ao Estado a concessão da qualificação, a lei das OSCIP tornou sua

qualificação automática, já que é um ato vinculado ao cumprimento de exigências

específicas. Este dispositivo visava impedir o clientelismo e diminuir os custos

procedimentais.

346

Para obter a qualificação de OSCIP, a associação deve apresentar diversos documentos ao

Ministério da justiça que deferirá ou não o processo em trinta dias de acordo com o

interesse público.

Para ser uma OSCIP a organização não deve ter fins lucrativos e deve desenvolver atividades

de interesse social como a assistência social, a promoção da cultura, a defesa do patrimônio

histórico e artístico, a promoção gratuita da educação, a promoção da segurança alimentar,

o voluntariado, o combate à pobreza, à experimentação de modelos socioprodutivos e de

sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito, etc. Além disso o regime

de funcionamento deve incluir nos seus estatutos os preceitos da esfera pública que a torne

viável e transpartente com a devida responsabilização pelos atos praticados.

Assim como as OS as OSCIP podem receber verbas da União, através de destinações

específicas no orçamento geral da União. Diferente das OS, as OSCIP não exigem a

participação do poder público no conselho de administração. Além disso não existe a

possibilidade, ao contrário das OS, de cessão de servidores públicos para as OSCIP.

Atualmente há centenas de OSCIPs já qualificadas atuando em inúmeras áreas.

O contrato de gestão

O contrato de gestão é um instrumento utilizado pelo poder público e pelas entidades não

estatais, mas com funções públicas para prestação de serviços, como as OS e as Agências

Executivas. O contrato deve ser assinado entre a organização e um Ministério da

administração direta que funciona como órgão supervisor das metas, resultados e

desempenho previstos.

No contrato de gestão deve constar:

• Obrigação da organização especificada através de um programa de trabalho

contendo as metas a serem atingidas e os prazos de execução;

• Previsão expressa de critérios, objetivos de avaliação de desempenho a serem

utilizados, mediante indicadores de qualidade e produtividade;

• Limites e critérios para as despesas com remuneração e vantagens de qualquer

natureza a serem percebidas pelos dirigentes e empregados das OS, no exercício das

suas funções;

347

Os resultados do contrato são aferidos periodicamente através de relatórios e comissões

conjuntas que publicam os resultados. Os órgãos de controle interno e externo também

auditam os resultados do Contrato.

As agências

Este formato institucional também precisa de uma qualificação por decreto do executivo,

criando uma autarquia especial para prestação de serviços exclusivos do Estado. Elas foram

uma das maiores inovações do plano de reforma do estado, foram inspiradas no modelo

britânico conhecido como “Next Steps”. Elas seriam autônomas, flexíveis e teriam as

condições institucionais para viabilizar a nova cultura gerencial proposta pelo Plano Diretor

da reforma do Estado. Deveriam ter contratos de gestão e um tipo de administração voltado

para obtenção de resultados.

Na gestão do Presidente Fernando Henrique, quando foram criadas, apenas o INMETRO foi

qualificado como agência executiva. No modelo original concebido pelo Plano Diretor as

agências executivas tem:

• Flexibilidade de gestão dos seus recursos humanos;

• Reordenamento de sua estrutura organizacional, respeitando os limites quantitativso

autorizados para cargos comissionados;

• Gestão orçamentária e financeira agregando os recursos em apenas um projetos

e/ou atividade, observando os demais grupos de despesa de pessoal e outros

custeios e capital.

Sua institucionalização legal ocorreu em 1997. Houve muita resistência da administração

direta em transformar parte de suas funções no novo modelo pelo temor da perda de

atribuições, cargos e poder.

Além destas agências outro modelo previsto no Plano Diretor foi as agências de fomento

como a ADENE, Agência de Desenvolvimento do Nordeste e a ADA, Agência de

Desenvolvimento da Amazônia, ambas só regulamentadas recentemente. Além disso há

outro tipo de agências, com a ABIN, agência de inteligência e a AEB, agência espacial que

imitam o modelo norte-americano.

348

Já as agências reguladoras tem outro papel. Cabe a elas regular os serviços públicos

concedidos ou permitidos. As primeiras a serem criadas a nível nacional foram a ANEEL, para

regular o sistema de energia elétrica, a ANATEL, para os serviços de comunicação e a ANP,

para o mercado do petróleo. Ao contrário as demais agências que sofrem com a não

regularidade de transferências financeiras, as agências reguladoras tem base independente

de arrecadação baseada em taxas pagas pelos serviços regulados.

Originalmente as características que nortearam a criação as agências se pautaram pela:

• Total autonomia e independência decisória do ente regulador, com o

estabelecimento de mandatos para seus dirigentes, nomeados pelo Presidente da

República, após aprovação do Senado federal;

• Autonomia administrativa para regular mediante a adoção de novos critérios e

formatos mais democráticos e menos intervencionistas e burocráticos. Imprimindo

agilidade processual e simplificação das relações mantidas pelos atores envolvidos,

agência, usuários e investidores;

• Participação dos usuários e investidores no processo de elaboração das regulações,

com a realização de audiências públicas;

• Imitação da intervenção do Estado ao limite indispensável à prestação de serviços.

O marco legal da função regulatória foi regulamentado recentemente pelo Congresso

Nacional está sendo debatido pelo Congresso desde 2004. Os grandes pontos polêmicos são

o tema da independência das agências, da fragilidade dos controles democráticos e das

dificuldades em sua gestão.

O modelo das agências foi criado para revitalizar a administração direta, modernizar a

prestação de serviços e evitar a monopolização de empresas concessionárias. Entretanto,

ainda persistem muitos pontos de conflito. A heterogeneidade e fragmentação do setor

público, com milhares de organizações, ainda impõe um pesado custo e ônus de

coordenação. O tema da autonomia e da independência das agências também não está

pacificado. Há um conflito latente entre o poder executivo e as agências reguladoras em

relação a uma série de funções de regulação, por exemplo, a política de tarifas e a política de

concessões.

Uma sínteses dos principais arranjos organizacionais recentes na administração pública

brasileira:

Agências Executivas

349

• Natureza jurídica de direito público

• Personalidade jurídica própria

• Sujeição aos princípios e regras da administração pública: licitação, concurso,

orçamento, controle interno e externo

• Qualificação: processo e requisitos

• Contrato de gestão - relação hierárquica x relação contratual

• Flexibilidades: Autonomia financeira, limites de licitação, contratação de

servidores, controles de resultado

• Receitas próprias e flexibilidade salarial

Organizações Sociais

• Entidades criadas por “indução” e sob controle do Estado

• Natureza jurídica de direito privado

• Personalidade jurídica própria, não integra a administração

• Sujeição parcial aos princípios da administração pública

• Administração privada do patrimônio público

• Redução do aparelho estatal: substituição de entes estatais

• Qualificação: processo e requisitos

• Contrato de gestão

• Flexibilidades: dotação global, licitações, contratação de pessoal (CLT), controles

“ex post” (de resultados)

• Desqualificação e sucessão, em caso de descumprimento do contrato ou gestão

irregular

Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público

• Orientação estratégica do PPA 2000/2003 : “o novo padrão de relacionamento

entre Estado e sociedade impõe a participação, a formação de parcerias e o senso

de responsabilidade social”

• Lei do 3º Setor: Lei Federal 9.790, de 23 de março de 1999

• Natureza jurídica de direito privado, reconhecida como de utilidade pública, não

integra a administração

• Atuação substitutiva ou complementar à Estatal

• Sustentadas por recursos públicos e receitas próprias

• Sujeição estatutária e parcial aos princípios da administração pública

350

• Prestação de Contas ao TCU

• Termo de Parceria, firmado entre a OSCIP e o Poder Público, precedido de

consulta aos conselhos de políticas públicas setoriais;

• Fiscalização e acompanhamento pelo Poder Público e Conselhos

• Flexibilidades: não sujeição ao regime jurídico administrativo

• Premissa: maior eficiência e agilidade na prestação de serviços.

OSCIPs – áreas de atuação

• promoção da assistência social;

• promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;

• promoção gratuita da educação;

• promoção gratuita da saúde, de forma complementar;

• promoção da segurança alimentar e nutricional;

• defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do

desenvolvimento sustentável;

• promoção do voluntariado;

• promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza;

• experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas

alternativos de produção, comércio, emprego e crédito;

• promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria

jurídica gratuita de interesse suplementar;

• promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e

de outros valores universais;

• promoção de estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas,

produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos nas

áreas de atuação.

Fundação Pública de Direito Privado

• Este é um novo formato proposto em 2007 pelo Executivo federal sobretudo

para o setor de saúde ainda tem muitos oponentes, especialmente das entidades

de trabalhadores que temem a precarização das relações de trabalho no regime

celetista.

351

• Requisito: Lei Complementar definido áreas de atuação das fundações,

permitindo a instituição de dois tipos de fundação: Fundação Pública de Direito

Público e Fundação Pública de Direito Privado

• Objetivo: permitir a utilização criteriosa de modelo jurídico-institucional

adequado para as entidades públicas responsáveis pela execução de atividades

em que o Estado não detém a exclusividade (áreas de saúde, educação, cultura,

proteção ao meio ambiente, assistência social, tecnologia etc.)

• Forma de propriedade pública – integra a Administração Pública Federal

• Regida pelo Direito Civil

• Sem fins lucrativos - Patrimônio próprio

• Autonomia administrativa, orçamentária e financeira

• Estrutura de governança participativa – Governo + Sociedade

• Regime de emprego celetista

• Sujeita ao controle do TCU e tutela do Ministério Público

• Firma Contrato de Gestão

Perguntas:

1. O processo de inovação na gestão publico passa pelo uso das novas tecnologias de

informação na área de gestão. Você poderia citar e comentar alguns exemplos desta

utilização que você conhece ?

2. No processo de modernização do Estado surge com muita força a importância da

gestão do conhecimento. Um dos pilares desta gestão é a transformação de

conhecimento tácito em conhecimento explícito. Que estratégias podem viabilizar

este processo ?

3. A participação dos cidadãos deixou de ser uma bandeira ideológica ou política para

tornar-se um dispositivo desejável e normal de gestão eficiente e eficaz. Você

concorda com esta afirmação ? Justifique a resposta.

Bibliografia:

352

Nogueira, M. A. (2004) Um Estado para a Sociedade Civil: temas éticos e políticos da

gestão democrática, Cortez, São Paulo.

O estado, atualmente, está em crise: tem desafetos à direita e à esquerda. marco aurélio,

porém, adverte contra os riscos de um "estado sem sociedade civil" e também contra os

riscos de uma "sociedade civil sem estado". nas condições em que nos encontramos,

arrastados num processo de mundialização que não corresponde às nossas aspirações,

temos, entretanto, a chance de aproveitar importantíssimos avanços técnico-científicos, de

promover uma desprovincianização.

Por tudo isso, mesmo em plena globalização neoliberal, Marco Aurélio Nogueira recusa a

sedução de uma perspectiva catastrofista ou apocalíptica e busca delinear um reformismo

democrático radical, para que possamos vir a ter acesso a formas de vida mais justas e mais

inteligentes.

Ricci, R. (2004) Contradições na Implementação das Ações de Participação, Revista Espaço

Acadêmico, n. 36

Neste artigo o sociólogo Rudá Ricci faz uma abordagem sobre a fragilidade dos processos de

participação no Brasil, com especial menção à nossa ambivalência em relação à cultura

democrática. O artigo sugere uma institucionalização maior dos valores participativos

através de uma rede de “escolas da cidadania” que pudessem funcionar como centros

irradiadores desta nova cultura.

Chiavenato, I. e Sapiro, A. (2003) Planejamento Estratégico, Elsevier, Rio De Janeiro

Nesta obra Chiavenato e Sapiro realiza um trabalho de pesquisa importante reunindo

diversas técnicas e ferramentas de planejamento voltadas especificamente para o setor

privado, mas que podem ser utilizadas com alguma adaptação ao setor público. Além da

revisão conceitual a obra tem um sentido de aplicação prática. Cabe especial menção a parte

III com importante contribuição para a formulação da estratégia como política de negócios,

modelos de cooperação e concorrência e desempenho organizacional. É uma leitura

353

complementar indispensável para manejar os instrumentos do planejamento estratégico

público.

CHIAVENATO, Idalberto. Administração Geral e Pública. Elsevier: Rio de Janeiro, 2006.

Este livro foi elaborado originalmente para auxiliar os estudantes de nível superior nos

concursos públicos relacionados às carreiras federais que são muito exigentes na área da

gestão pública. Na verdade o livro adquiriu uma densidade e abrangência impar na literatura

disponível. Inicia comentando as escolas clássicas da administração para em seguida entrar

nos assuntos típicos da gestão publica: processo administrativo, gestão de pessoas,

comportamento organizacional até as novas abordagens da recente reforma gerencial. É

indispensável para quem quiser se aprofundar no assunto.

Batista, Fábio. Governo que aprende: gestão do conhecimento em organizações do

executivo federal, Texto para discussão 1022, IPEA, Brasília, 2004

Neste trabalho o autor discute o conceito da Gestão do Conhecimento (GCO) e a sua

importância para a Administração Pública, além de identificar o estágio de implementação

da GCO em que se encontram seis organizações do executivo federal – Banco do Brasil,

Banco Central do Brasil, Caixa Econômica Federal, Empresa Brasileira de Pesquisa

Agropecuária (Embrapa), Serviço de Processamento de Dados (Serpro), e Petróleo Brasileiro

(Petrobras) –, com base no método da American Productivity and Quality Center (APQC):

“Road Map to Knowledge Management Results”. O estudo destaca algumas práticas de

sucesso, situa o tema GCO nas organizações públicas no campo de estudo da Gestão Pública

e defende a tese de que a finalidade da GCO em tais organizações deve ser vista de forma

mais ampla que em empresas do setor produtivo.

354

Aula 10

Experiências na gestão inovadora

1º CASO:

Sistema inovador de Gestão e Planejamento na esfera nacional

Vamos relatar o caso da criação e implantação do SIMEC, o Sistema de Planejamento,

Orçamento e Finanças do Ministério da Educação do Governo Federal. Esta experiência

conquistou o 1º lugar no Concurso de Inovação na Gestão Pública Federal, na sua 13ª

edição, realizada em 2008.

O SIMEC é um sistema baseado em software livre que integra os processos de planejamento,

gestão e orçamento do MEC e que está rapidamente se disseminando através da cessão do

sistema a outros órgãos federais e estaduais. Entre 2003 e 2007 o orçamento do MEC passou

de R$ 18,1 bilhões para R$ 28,7 bilhões, um aumento de 58,5%. Tal volume de recursos

impunha um sistema mais sofisticado de controle que nasceu como um sistema para

monitorar as ações do MEC no PPA federal, o que antes era feito através do SIGPLAN (ver

glossário). Em 2003 o Ministério iniciou a elaboração do sistema utilizando um sistema de

sinalização cromática para o status das ações e projetos e a construção dos planos de

trabalho como instrumentos de programação das atividades. Uma parceria como programa

PNUD da ONU e a agência ABC do Ministério de Realções Exteriores permitiu a primeira

plataforma do sistema em 2005.

Atualmente o sistema possui dez módulos que se integram com outros sistemas do governo

federal como o SIGPLAN, o SIDOR e o SIAFI. Entre os módulos encontram-se, como exemplo:

monitoramento e avaliação do PPA, programação orçamentária, elaboração e revisão do

PPA, orçamentário e financeiro, etc.

355

Em 2007 o MEC elaborou o PDE, Plano de Desenvolvimento da Educação, o que ensejou a

elaboração de uma 4ª versão do sistema. Foram criados o módulo de monitoramento do

PDE, o módulo de reestruturação e expansão das universidades federais e o Plano de Metas,

o módulo “Brasil Profissionalizado” e o módulo “Plano de Ações Articuladas” (PAR). Este

último módulo permite a captação do diagnóstico da situação educacional e a definição de

um Plano de Ações Articuladas de estados e municípios. O módulo permite subsidiar as

metas para o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) das escolas e das redes

municipais e estaduais e tornou mais transparente a política de assistência técnica e apoio às

demais unidades da federação.

No atual estágio de implantação o sistema possui 20 mil usuários cadastrados, incluindo

governos de estados e municípios, as 175 unidades orçamentárias do MEC, a Presidência da

República e o Ministério do Planejamento. O sistema demandou o investimento de R$ 2,2

milhões considerando inclusive os recursos humanos envolvidos. A equipe responsável é

composta por 9 consultores de organismos multilaterais e 9 programadores terceirizados.

Os benefícios mais diretos do sistema são os ganhos de processamento interno de

informações e a melhor qualificação do processo de gestão estratégica do ministério.

Indiretamente o sistema qualifica o processo decisório na medida em que viabiliza acesso à

informações estruturadas, integrando ferramentas de planejamento, gestão e orçamento e

redefinindo o padrão de relacionamento entre as esferas de governo.

Tela inicial do SIMEC na web.

356

2º CASO:

Modernização da função de Planejamento na esfera sub-nacional

Vamos descrever o processo de modernização administrativa nas funções de gestão e

planejamento. O caso que será descrito é o processo acontecido nos últimos anos no Estado

de Minas Gerais. O Estado tem 583 mil Km2, 853 municípios e uma população de 18,6

milhões de pessoas, com um PIB de R$ 166 bilhões. É um dos três maiores estados

brasileiros.

O processo iniciou com medidas de reestruturação das funções e do organograma do

governo:

• O colegiado de gestão governamental foi criado;

• Criação das câmaras temáticas;

• As áreas de planejamento, gestão e finanças de cada órgão e entidade foram

integradas;

• A função de gerente executivo de projetos foi criada;

• Foi criado o comitê de governança eletrônica;

357

• Foi adotado o modelo das OSCIP como estratégia de parceria para promoção dos

serviços não exclusivos do Estado.

A iniciativa marcante e inovadora foi a integração entre o processo de orçamento e o

processo de planejamento. Medida que já havia sido tomada no governo federal com a

flexibilização das categorias orçamentárias da Lei 4.320/64 e com a definição metodológica

da categoria “Programa” como elo de ligação entre a peça orçamentária e o planejamento.

O Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (o PMDI), como é denominado o plano

plurianual naquele Estado foi elaborado com base numa matriz SWOT divulgada e debatida

em todo o Estado. Com base no plano foram definidos um conjunto de 30 projetos

estruturante que compuseram a “gestão estratégica dos recursos e ações do Estado”, a

GERAES.

No debate popular do plano foi acrescentado um 31º projeto estruturador denominado

“inclusão social das famílias vulnerabilizadas”. Fator importante também foi a negociação de

quotas orçamentárias para incidência das emendas dos deputados estaduais. Foi implantada

também a gestão publica voltada a resultados com a contratualização de metas de

desempenho pelos diversos órgãos com a Secretaria de Planejamento e Gestão. O acordo de

resultados previu maior autonomia das entidades pactuadas na definição do seu modelo de

gestão (processos, estruturas, pessoas e informação).

A experiência recente do governo de Minas Gerais aliou duas dimensões: o ajuste a

realidade e a inovação. As principais medidas de saneamento financeiro e organização da

máquina administrativa foram:

• regulamentação de registro de preços para ganhos em escala com compras comuns

aos diversos órgãos e entidades;

• obrigatoriedade do pregão para compras e contratações de bens e serviços comuns;

• instituição de cotação eletrônica de preços (para compras por dispensa – baixo

valor); o Integração com o Sistema Integrado de Administração Financeira - SIAFI –

com a adoção do empenho prévio automático;

• vedação de reconhecimento de dívida por via administrativa;

• Melhoria do Portal de Compras e diversas outras Leis, Decretos e Resoluções.

358

A inovação foi representada pelo novo Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado e pelo

Plano Plurianual de Ação Governamental – PPAG, ilustrados abaixo.

Síntese dos aspectos mais importantes da reforma gerencial:

• Reorganização da estrutura do governo: redução de 59 para 6 Secretarias de Estado,

extinção de três mil cargos e funções comissionadas. 15 secretarias, 2 Secretarias

Extraordinárias, 6 órgãos autônomos com status de Secretaria de Estado e

subordinação ao Governador, 18 Autarquias, 15 Fundações, 17 empresas públicas, 6

órgãos autônomos e 51 conselhos de políticas públicas. Foram criadas a Ouvidoria

Geral do Estado, a Advocacia Geral e a Auditoria Geral, reforçando os instrumentos de

controle e transparência; criação da Secretaria de Planejamento e Gestão, unificando a

função orçamentária com a de planejamento.

• Metodologias inovadoras no planejamento: baseado em câmaras temáticas e

colegiados que viabilizam a transversalidade necessária das políticas públicas foram

elaborados os planos (PMDI e PPAG) utilizando a técnica de cenários exploratórios e

prospectiva.

• Modernização da gestão de pessoas: avaliação de Desempenho Institucional (Acordo

de Resultados); adoção de novo modelo de parceria para a implementação de políticas

359

públicas (OSCIP); avaliação de Desempenho Individual; desenvolvimento e

Implementação de Políticas de Recursos Humanos, e formação, qualificação e

capacitação de Recursos humanos pela Escola de Governo (da Fundação João

Pinheiro); Redução do número de carreiras, implanação de remuneração variável e

intensificação da capacitação (curso de graduação permanente na Escola de Governo);

• Sistemas de avaliação de desempenho e acordos de resultado, conforme ilustrado a

seguir. As setas azuis representam os ganhos se os resultados são alcançados e as

vermelhas as perdas se as metas não forem atingidas. Foi implantado um sistema de

autonomias nas instituições conforme o desempenho, inclusive com censura pública

para reincidência de resultados insatisfatórios (3 em 5 avaliações).

360

• Foi criado uma premiação chamada “adicional de desempenho” distribuído em 40%

vinculado ao desempenho institucional, 50% ao desempenho individual e 10%

vinculado à formação acadêmica; O montante do prêmio era definido conforme a

economia de despesas correntes, posteriormente ampliado para o limite de 10%

das receitas diretas, vedadas as receitas decorrentes do poder fiscalizatório;

• Modelo matricial de gestão: cada linha horizontal corresponde a um programa ou

projeto com resultados contratualizados com os gerentes responsáveis e o

Governador do Estado. Acordos verticais com os órgãos também foram feitos com

a mediação e coordenação da área de planejamento (SEPLAG), conforme

demonstrado a seguir;

Relação das autonomias negociadas e vinculadas ao desempenho institucional:

Abertura de créditos suplementares em custeio e capital, mediante cancelamentos até o

limite de 10% (o previsto na LDO-LOA é 7% para o geral);

• Alteração do quantitativo e da distribuição de cargos comissionados e de funções

gratificadas, sem aumento de despesa;

• Aprovação ou readequação de estruturas ou estatuto do acordado;

361

• Reversão de no mínimo 50% da receita diretamente arrecadada que superar o

efetivamente realizado no exercício de 2003;

• Limites de dispensa de licitação em dobro;

• Modalida de licitação de consulta;

• Além de diversas outras flexibilidades em relação à gestão de recursos logísticos,

benefícios indiretos, estagiários, ...

Uma dos efeitos de médio prazo foi a redução da dependência de transferências da União e

o aumento da arrecadação própria do Estado, como demonstram os gráficos a seguir.

Uma síntese da experiência mineira pode ser visualizada a seguir, com os principais

componentes da estratégia adotada para o período 2003 / 2007:

362

3º CASO:

Aplicação do Balance Score Card na gestão municipal.

Aqui vamos descrever o caso da Prefeitura de Porto Alegre que vem aplicando nos últimos

anos um modelo de gestão inovador, baseado na preservação dos mecanismos de

participação popular do Orçamento Participativo implantado nos anos noventa com

ferramentas modernas de gestão como é caso do Balance Score Card.

Porto Alegre é capital mais meridional do Brasil, no Estado do Rio Grande do Sul, possui 1,4

milhão de habitantes, um IDH de 0,865, alto para os padrões brasileiros. O produto interno

bruto da cidade é de R$ 30,1 bilhões, com uma renda per capita de R$ 20 mil. A cidade é

predominantemente um centro de serviços com 37% dos estabelecimentos vinculados ao

comércio e 51 % a serviços diversos que detém 66% dos postos de trabalho.

Segundo a empresa de consultoria Symetics que apoiou a execução do projeto a Prefeitura

de Porto Alegre elaborou, com o apoio do Programa Gaúcho da Qualidade e Produtividade

(PGQP), um novo modelo de gestão, o que tornou Porto Alegre a primeira capital brasileira a

363

utilizar ferramentas como o Balanced Scorecard (BSC), que permite o acompanhamento

através de programas, utilizando indicadores e metas de desempenho a médio e longo

prazo.

A adoção da ferramenta BSC permitiu ainda a comunicação e a visualização da estratégia em

todos os níveis da organização. A gestão por programas estratégicos gera a integração entre

diferentes órgãos, a otimização de recursos e o trabalho conjunto para vencer desafios. A

direção do trabalho foi dada por objetivos estratégicos, indicadores e pela constante

perseguição de metas através dos 21 programas que integraram o Plano Plurianual 2006-

2009 e visavam a garantia de uma cidade ambientalmente responsável, empreendedora,

capaz de atender à população, sem deixar de lado a responsabilidade financeira e fiscal. A

governança propõe-se a estimular o capital social, envolvendo a comunidade em favor de

um projeto comum. Cabe ao governo identificar e respeitar as diferenças de cada território

que compõe a Capital.

Os programas de governo:

Os programas foram gerenciados por servidores, que são funcionários de carreira,

escolhidos por sua experiência e dedicação à administração do município. Dessa forma, as

ações e os programas não sofreram descontinuidade e as informações foram mantidas ao

364

longo do tempo. Com esse trabalho, a administração municipal buscou desenvolver ações

que aumentaram a qualidade de vida dos cidadãos, atendendo às demandas e prestando

serviços com qualidade. De forma geral, o modelo de gestão envolveu duas frentes de

trabalho, sendo uma estrutural e outra emergencial. A primeira inclui explicitar a alinhar a

visão de futuro, desenhar e implementar o modelo de gestão, desenvolver ferramentas de

acompanhamento e gestão (através do BSC e de um Portal na Internet), definir os principais

programas e implementar a gestão de programas. A segunda frente de trabalho implica em

aumentar a receita, reduzir despesas e aprimorar processos na saúde.

O modelo concebia uma visão sistêmica de governo, conforme diagrama a seguir.

As informações obtidas a partir do sitio da prefeitura (www.portoalegre.rs.gov.br), indicam

que o modelo de gestão combina, de forma integrada, a gestão da estratégia, a gestão de

processos e a gestão de conhecimento, o que permite o alinhamento de esforços para

alcance da visão de futuro, compartilhando a estratégia para todos os níveis da organização.

O Modelo adota como premissas o conceito de participação cidadã (Governança Solidária

365

Local), a estruturação da organização por eixos de atuação (Visão sistêmica), e a contínua

avaliação de resultados.

O modelo é gerenciado pelo Portal de Gestão e sustentado por diferentes ferramentas como

Mapa Estratégico (gestão da estratégia), Programas de Governo - PPA (execução da

estratégia) e Gestão de Processos. Os aspectos contemplados pelo Modelo de Gestão estão

colocados a seguir:

• Criação de Valor na relação Governo e Sociedade: O conceito de criação de valor

baseia-se na percepção dos benefícios gerados pela prefeitura frente ao principal

público-alvo: a Sociedade. A proposta é trabalhar para que os esforços maximizem a

satisfação dos usuários de serviços prestados pela Prefeitura. O papel da Prefeitura é

o de maximizar o potencial do capital social existente na sociedade, promovendo

condições para que seus ativos possam construir, de forma conjunta, o

desenvolvimento dos cidadãos. O principal conceito que sustenta este esforço é a

Governança Solidária Local.

• Governança Solidária Local: É uma rede intersetorial e multidisciplinar que se

organiza territorialmente para promover espaços de convivência capazes de

potencializar a cultura da solidariedade e cooperação entre governo e sociedade

local.

• Gestão da Estratégia: Para atender aos desafios colocados, a prefeitura se organiza a

partir da Visão Sistêmica, que divide a atuação das secretarias e órgãos em eixos de

atuação e propõe a criação de estruturas coletivas para discussão das estratégias nos

respectivos eixos. Para explicitar a estratégia, avaliar o desempenho da organização

em relação aos respectivos eixos e estabelecer os níveis desejados de desempenho a

Prefeitura utiliza o Mapa Estratégico.

A Prefeitura assumiu o objetivo de implantar um Modelo de Gestão que garantisse a

integração e unidade do governo, na busca da qualidade na execução e monitoramento dos

programas, no alcance das diretrizes estratégicas definidas e nos compromissos de

366

campanha assumidos. Para tanto, foi desenvolvida uma estrutura organizacional que

sustentasse a gestão da estratégia visando o estabelecimento de um padrão gerencial que

organiza e racionaliza o funcionamento da instituição.

Um dos alicerces desta estrutura para a gestão da estratégia esteve na organização coletiva

e descentralizada do trabalho. Daí a importância da implantação de estruturas coletivas de

gestão permitindo que as áreas atuem de forma integrada, racionalizando o orçamento

público, evitando retrabalho e duplicidade de atividades e potencializando o resultado das

políticas públicas.

A estratégia pode ser entendida como a descrição daquilo que a organização pretende

atingir no longo prazo e pode ser expressa na forma de objetivos estratégicos integrados. A

estratégia da Prefeitura partiu de uma visão de futuro definida - onde queremos chegar - e

das diretrizes estratégicas - como a prefeitura quer chegar - e "traduziu" essas diretrizes e

visão em objetivos estratégicos. Esses objetivos foram comunicados a todos para que

possam direcionar seus esforços para o mesmo foco.

A seguir o Mapa Estratégico que traduz a aplicação da metodolgia BSC:

367

• Gestão de Processos: Alguns Programas de Governo utilizam a gestão de processos

como ferramenta de melhoria contínua. A implementação desta ferramenta

compreende o Gerenciamento Matricial de Despesas e de Receita, utilizado para o

planejamento e acompanhamento do orçamento anual, e na área da Saúde visa a

melhoria dos processos a fim de qualificar o atendimento à população.

• Gestão de Conhecimento: O modelo de gestão está baseado na gestão do

conhecimento com ênfase na gestão da mudança, focada na capacitação e na

comunicação. Este processo é fundamental, pois dissemina o conhecimento para

todos os níveis da organização, estimula a participação no planejamento e execução

de ações governamentais, promovendo a efetividade e a continuidade das políticas

públicas.

368

O diagrama a seguir ilustra as relações entre a governança, os objetivos e os processos

estabelecidos.

A ferramenta de um portal na web foi fundamental para coordenar, comunicar e dar

transparência aos procedimentos de monitoramento e controle dos programas:

A experiência de Porto Alegre com o BSC além de inédita trouxe lições importantes para a

gestão inovadora. Podemos por exemplo considerar as dimensões que o próprio BSC sugere

para uma organização orientada para a estratégia: (1) traduzir a estratégia em termos

369

operacionais, (2) alinhar a organização para criar sinergia, (3) transformar a estratégia em

tarefa de todos, (3) transformar a estratégia em processo contínuo e (4) mobilizar a

mudança por meio da liderança executiva. O primeiro aspecto foi confirmado pela

experiência, o programa de governo foi base para a montagem do Mapa Estratégico, ainda

que os indicadores estratégicos não tenham sido formulados, o que é foi uma lacuna

importante. O alinhamento da organização apresentou problemas decorrentes das tensões

entre a estrutura verticalizada da burocracia tradicional e a lógica transversal do modelo.

O modelo enfrentou problemas de disseminação dado o linguajar técnico e as dificuldades

de capacitação para os 17 mil servidores. Um ponto positivo foi o reconhecimento de

desempenho dos gerentes, a remuneração variável não foi implantada, mas houve

premiação na forma de cursos no exterior. Outros pontos vulneráveis da experiência foram a

pouca integração entre estratégia e orçamento, a complexidade do processo decisório

interno e a não contratualização de resultados.

Bibliografia

Planejamento estratégico e gestão pública por resultados no processo de reforma

administrativa do estado de Minas Gerais Izabela Moreira Corrêa RAP Rio de Janeiro

41(3):487-504, Maio/Jun. 2007

Reformar uma organização já é, administrativamente, uma tarefa árdua. Reformar uma

organização como o Estado pode ser ainda mais complicado. Essa tarefa pode tornar-se

menos complexa quando o governo é capaz de estabelecer estratégias claras de intervenção

no modelo de administração pública e negociação com o Legislativo. Neste artigo o autor

desenvolve o argumento de que o processo de reforma do Estado em Minas Gerais foi

viabilizado pelo desenvolvimento do planejamento estratégico e facilitado pela política de

gestão pública por resultados — acordo de resultados — que garantiu o alinhamento

estratégico dos órgãos, entidades e servidores às metas do governo.

370

O governo matricial em Minas Gerais: implantando o choque de gestão. Luiz Arnaldo

Pereira da Cunha Junior, IX Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y

de la Administración Pública, Madrid, Espanha, 2 - 5 Nov. 2004 .

Neste artigo o autor analise as mudanças de gestão ocorridas no Governo de Minas Gerais

no último período, conhecidas como “choque de gestão” e aponta perspectivas de

continuidade futura das melhorias e avanços alcançados.

Limites e desafios do uso do BSC em organizações públicas: o caso da Prefeitura de Porto

Alegre, Priscilla Perdicaris, Aurelio Formoso Junior e José Marcelo Maia Nogueira II

Congresso Consad de Gestão Pública – Painel 13, Brasilia, 2009.