critica a lei de resposabilidade fiscal
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EFEITOS DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCALTRANSCRIPT
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RAFAEL TERRA DE MENEZES
EFEITOS DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL SOBRE AS CATEGORIAS E
FUNES DE DESPESAS DOS MUNICPIOS BRASILEIROS (1998 2004)
Dissertao apresentada ao Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade de Ribeiro Preto Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Mestre em Economia Aplicada.
RIBEIRO PRETO 2006
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FOLHA DE APROVAO
Rafael Terra de Menezes Efeitos da Lei de Responsabilidade Fiscal sobre as categorias e funes de despesas dos municpios brasileiros (1998 2004)
Dissertao apresentada ao Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade de Ribeiro Preto Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Mestre em Economia Aplicada rea de Concentrao: Economia do Setor Pblico
Aprovado em: __/__/____
Banca Examinadora
Prof(a). Dr(a). _______________________________________________________________
Instituio:______________________________ Assinatura:__________________________
Prof(a). Dr(a). _______________________________________________________________
Instituio:______________________________ Assinatura:__________________________
Prof(a). Dr(a). _______________________________________________________________
Instituio:______________________________ Assinatura:__________________________
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DEDICATRIA
A Marli, minha me, pelo apoio, incentivo, amor e compreenso durante o processo de
elaborao deste trabalho e ao longo de minha vida.
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AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Rudinei Toneto Junior, meu orientador, pela ateno e enorme contribuio
cientfica e intelectual nesse perodo, e por estar sempre disposto a me ajudar e a todos em sua
volta.
Universidade de So Paulo, pela oportunidade de cursar o Mestrado em Economia
Aplicada.
Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES), pela concesso
da bolsa de mestrado, a qual muito contribuiu para a realizao deste trabalho.
A meus colegas de mestrado, Carla, Eduardo, Heitor, Jlia, Matheus, Priscila, Renata,
Roberta e Thiago, pelos momentos de descontrao e esforo conjunto vividos.
A meu pai, Jos Reinaldo, e a meu irmo, Gustavo, por todo o apoio, compreenso e amor ao
longo de minha vida.
A Carol, pelo amor, companhia, dedicao, apoio, compreenso, e pacincia nesses dois
ltimos e especiais anos.
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RESUMO
Menezes, R. T. Efeitos da Lei de Responsabilidade Fiscal sobre as categorias e funes de despesas dos municpios brasileiros (1998 2004). 2006. 128 f. Dissertao (Mestrado) Faculdade de Economia Administrao e Contabilidade de Ribeiro Preto, Universidade de So Paulo, Ribeiro Preto, 2006.
Embora alguns estudos tenham encontrado evidncias acerca da eficcia da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) em reduzir as despesas estaduais e municipais, procurou-se neste trabalho, analisar os efeitos da lei sobre nveis mais desagregados de despesa. Partiu-se da hiptese de que, possivelmente, os componentes menos rgidos de despesa teriam sido mais afetados pela LRF. Dessa forma, as despesas foram classificadas em categorias e funes, abrangendo os municpios brasileiros no perodo entre 1998 e 2004. A segmentao por categorias seguiu uma estrutura contbil, enquanto a classificao por funes se referiu quatro principais reas de destinao das despesas: social, overhead, infra-estrutura e outras. Os dados obtidos foram provenientes da FINBRA, uma base de dados elaborada pela Secretaria do Tesouro Nacional. Utilizou-se tambm a base de dados do Tribunal Superior Eleitoral para a construo de algumas variveis polticas. Os resultados das anlises descritivas mostraram que os gastos mais rgidos cresceram mais do que a receita para o total de municpios, indicando um maior comprometimento do oramento. Adicionalmente, foram encontradas evidncias de que a LRF obteve sucesso em fazer os municpios cumprirem os limites relacionados a ela. Inclusive, estimou-se um modelo de varivel categrica (Logit de efeitos fixos) com o intuito de analisar o impacto da LRF sobre a probabilidade de cumprimento do limite de gasto com pessoal (60% da Receita Corrente Lquida). Os resultados indicaram que a LRF afetou positivamente a probabilidade de respeitarem o limite. No entanto, os municpios que se encontravam dentro dos limites podem no ter sido afetados pela lei, pois permitiram que a despesa com pessoal crescesse mais do que a receita. Os resultados das estimaes pelo mtodo de Anderson-Hsiao para painis dinmicos mostraram que a LRF no surtiu efeito sobre gastos com pessoal e outras despesas correntes (mais rgidos). O investimento (menos rgido) foi a categoria mais prejudicada, pois sofreu forte reduo devido lei. Assim, a LRF reduziu a despesa total, mas em virtude da forte queda do investimento. Os resultado obtidos para as funes de despesa mostraram que o gasto com social sofreu uma pequena reduo, enquanto a despesa com overhead um aumento. O gasto com infra-estrutura (menos rgido) foi o mais atingido, apresentando uma forte queda em virtude da lei, a qual acabou influenciando no resultado da despesa oramentria. Portanto, as evidncias encontradas neste trabalho confirmam a hiptese de que o ajuste promovido pela LRF se deu realmente sobre os componentes menos rgidos de despesa.
Palavras-chave: Lei de Responsabilidade Fiscal. Finanas Municipais. Regras Fiscais. Painel de Dados.
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ABSTRACT
Menezes, R. T. Effects of the Fiscal Responsibility Law on expenditure categories and functions of the Brazilian municipal districts (1998 2004). 2006. 128 f. Dissertation (Master Degree) Faculdade de Economia Administrao e Contabilidade de Ribeiro Preto, Universidade de So Paulo, Ribeiro Preto, 2006.
Although some studies have found evidences about the efficacy of the Fiscal Responsibility Law (FRL) in reducing state and municipal expenditures, it was intended to analyze the effects of the law on more disaggregated levels of expenditures in this work. The initial hypothesis was that more flexible expenditures components would have been more affected by the FRL. Thus, the expenditures were classified in categories and functions, considering the brazilian Municipal Districts in the period between 1998 and 2004. The repartition by categories followed an accounting structure, while the classification by functions referred to four main areas of expenditures destination: social, overhead, infrastructure and others. The data were obtained from FINBRA, a database elaborated by the National Treasury Office. The Electoral Supreme Court database was also utilized in the construction of political variables. The results of the descriptive analysis showed that less flexible expenditures increased more than the revenues, indicating a higher commitment of the budget. Further, it was found evidences that the FRL succeed in making the municipal districts accomplish the limits related to it. It was also estimated a model of categorical variable (Fixed effects Logit) that analyzes the impact of the FRL on the probability of accomplishing the personnel expenditure limit (60% of the Net Current Revenue). The results showed that the FRL had a positive effect on the probability of respecting the limit. Nevertheless, the municipal districts that were already respecting the limit may not have been affected by the law, since they let the personnel expenditure increase more than the revenue. The results of the estimations by Anderson-Hsiaos dynamic panel data method indicated that the FRL didnt have effect on personnel and other current expenditures (less flexible). The investment (more flexible) was the most damaged category, since it suffered a major reduction by the law. Thus, the FRL had a negative impact on total expenditure by making the investment decrease considerably. The results obtained for the expenditure functions showed that the social expenditure had a slight decrease, while the overheads had an increase. The infrastructure expenditure (more flexible) was the most affected, showing a major decrease caused by the law, which influenced the result of the total expenditure. Therefore, the evidence founded in this work confirms the hypothesis that the adjustment accomplished by the FRL indeed reached the more flexible expenditure components.
Keywords: Fiscal Responsibility Law. Local Finance. Fiscal Rules. Panel Data.
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Necessidades de Financiamento do Setor Pblico: conceito nominal 1994/2002 (em % do PIB) ..........................................................................................................................20 Tabela 2 Dvida Lquida do Setor Pblico: fim de perodoa 1994/2001 (em % do PIB) ...22 Tabela 3 Despesa oramentria segmentada por categorias..................................................50 Tabela 4 Despesa oramentria segmentada por funes .....................................................50 Tabela 5 Medidas de concentrao e disperso do logaritmo neperiano das variveis oramentrias............................................................................................................................67 Tabela 6 Evoluo das variveis oramentrias indicadoras de desempenho 1998 a 2004 (1998=100) ...............................................................................................................................68 Tabela 7 Nmero de municpios deficitrios entre 1998 e 2004..........................................69 Tabela 8 Evoluo das despesas correntes e de capital, e suas sub-categorias 1998 a 2004 (1998=100) ...............................................................................................................................72 Tabela 9 Evoluo das variveis oramentrias indicadoras de desempenho 1998 a 2004 (reais per capita) .......................................................................................................................74 Tabela 10 Evoluo das despesas correntes e de capital, e suas sub-categorias 1998 a 2004 (reais per capita) ..............................................................................................................76 Tabela 11 Evoluo das despesas segmentadas por funo 1998 a 2004 (1998=100) ....78 Tabela 12 Evoluo das despesas segmentadas por funo 1998 a 2004 (reais per capita)..................................................................................................................................................79 Tabela 13 Evoluo das despesas correntes e de capital, e suas sub-categorias 1998 a 2004 ( em % da despesa oramentria) ....................................................................................80 Tabela 14 Evoluo das despesas segmentadas por funo, segundo tamanho da populao dos municpios 1998 a 2004 (em % da despesa oramentria) ..........................................81 Tabela 15 Variveis polticas municipais entre 1998 e 2004 (nmero e percentual de municpios que apresentaram a caracterstica considerada) .....................................................83 Tabela 16 Variao temporal das variveis polticas municipais (em percentual dos municpios da amostra).............................................................................................................84
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Tabela 17 Nmero de municpios que descumpriu os limites definidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal e pelas Resolues n 40 e n 43 do Senado Federal entre 1998 e 2004 ..........................................................................................................................................86 Tabela 18 Mdia e desvio-padro do gasto com pessoal dos municpios como proporo da receita corrente lquida .............................................................................................................88 Tabela 19 Coeficientes estimados pelo mtodo Logit de efeitos fixos, tendo como varivel dependente o cumprimento do limite de despesa com pessoal de 0,6 vezes a receita corrente lquida .......................................................................................................................................89 Tabela 20 Coeficientes estimados pelo mtodo de Anderson-Hsiao para despesa oramentria, despesa corrente e sub-categorias......................................................................95 Tabela 21 Coeficientes estimados pelo mtodo de Anderson-Hsiao para dvida , despesa de capital e sub-categorias.............................................................................................................97 Tabela 22 Coeficientes estimados pelo mtodo de Anderson-Hsiao para despesas segmentadas por funo ...........................................................................................................99
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LISTA DAS TABELAS DOS APNDICES
Tabela A-1 Evoluo das variveis oramentrias indicadoras de desempenho, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (em milhes de reais)........................................................113 Tabela A-2 Evoluo das despesas correntes e de capital, e suas sub-categorias, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (em milhes de reais)........................................................114 Tabela A-3 Evoluo das despesas segmentadas por funo, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (em milhes de reais).........................................................................................115 Tabela A-4 Evoluo das variveis oramentrias indicadoras de desempenho, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (1998=100) .......................................................................116 Tabela A-5 Nmero de municpios deficitrios no Brasil e regies entre 1998 e 2004.....116 Tabela A-6 Evoluo das despesas correntes e de capital, e suas sub-categorias, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (1998=100) .......................................................................118 Tabela A-7 Evoluo das despesas segmentadas por funo, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (1998=100) ........................................................................................................119 Tabela A-8 Evoluo das variveis oramentrias indicadoras de desempenho, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (per capita) ........................................................................119 Tabela A-9 Evoluo das despesas correntes e de capital, e suas sub-categorias, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (per capita) ........................................................................120 Tabela A-10 Evoluo das despesas segmentadas por funo, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (per capita) .........................................................................................................121 Tabela A-11 Evoluo das despesas correntes e de capital, e suas sub-categorias, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (em % da despesa oramentria) ......................................122 Tabela A-12 Evoluo das despesas segmentadas por funo, segundo regies do Brasil 1998 a 2004 (em % da despesa oramentria) .......................................................................123 Tabela A-13 Evoluo da arrecadao prpria e da receita de transferncias segundo regies do Brasil 1998 a 2004 ( em % da receita oramentria)......................................124 Tabela B-1 Evoluo das variveis oramentrias indicadoras de desempenho, segundo tamanho da populao dos municpios 1998 a 2004 (variveis fiscais em milhes de reais)................................................................................................................................................125 Tabela B-2 Evoluo das despesas correntes e de capital, e suas sub-categorias, segundo tamanho da populao dos municpios 1998 a 2004 (em milhes de reais)......................126
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Tabela B-3 Evoluo das despesas segmentadas por funo, segundo tamanho da populao dos municpios 1998 a 2004 (em milhes de reais) ..........................................................127 Tabela C-1 Evoluo da arrecadao prpria e da receita de transferncias 1998 a 2004 (em % da receita oramentria) ..............................................................................................128
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SUMRIO
1 INTRODUO...............................................................................................................12 2 O CENRIO DAS FINANAS PBLICAS DO BRASIL ANTERIOR LRF..........19 3 DFICITS PERSISTENTES E MECANISMOS DE CONTROLE...............................27 3.1 Razes para o surgimento de dficits persistentes...........................................................28 3.2 Mecanismos de conteno de dficits .............................................................................33 3.3 Formas alternativas de se atingir a disciplina fiscal ........................................................38 4 REVISO DA LITERATURA EMPRICA...................................................................41 5 METODOLOGIA DO TRABALHO ..............................................................................48 5.1 Metodologia da anlise descritiva ...................................................................................50 5.2 Metodologia da anlise do cumprimento do limite de gastos com pessoal.....................54 5.3 Metodologia da anlise economtrica para painis dinmicos........................................59 6 EVOLUO DAS VARIVEIS MUNICIPAIS NO BRASIL ENTRE 1998 E 2004..63 6.1 A rigidez dos componentes oramentrios municipais ...................................................65 6.2 Comportamento das categorias de despesa no perodo ...................................................67 6.3 Comportamento das despesas segmentadas por funo no perodo ................................77 6.4 Participao das despesas por categorias e funes econmicas na despesa total ..........80 6.5 Descrio das variveis polticas.....................................................................................82 7 ANLISE DO CUMPRIMENTO DOS LIMITES DECORRENTES DA LRF ............85 7.1 Anlise do cumprimento do limite para gastos com pessoal...........................................87 8 OS EFEITOS DA LRF SOBRE AS CATEGORIAS E FUNES DE DESPESA:
RESULTADOS DO MODELO DINMICO.................................................................92 9 CONCLUSES.............................................................................................................102 REFERNCIAS .....................................................................................................................107 APNDICES ..........................................................................................................................112
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1 INTRODUO
Desde o incio da dcada de 90, muitos pases tm adotado mecanismos de restrio fiscal
para evitar a utilizao irresponsvel de recursos pblicos visando permanncia no poder.
Um exemplo importante foi o Tratado de Maastricht, assinado por alguns pases da Unio
Europia em 1992. De acordo com Kennedy e Robbins (2001, apud LIMA, 2002), o tratado
estabelecia que pases integrantes do bloco econmico deveriam atender certos limites
necessrios estabilidade macroeconmica do pas e, conseqentemente, do bloco como um
todo. A dvida, por exemplo, no deveria ultrapassar 60% do PIB, e o dficit, 3% do PIB.
Caso ultrapassasse, seria implementado um programa de ajuste de dez meses. Se a tentativa
de ajuste fracassasse, retaliaes seriam impostas. Alm disso, pases no-membros poderiam
ingressar no bloco mesmo que no atendessem os limites, desde que se observasse uma
trajetria descendente da dvida.
Outros dois exemplos de regras fiscais de oramento equilibrado foram o Budget Enforcement
Act (BEA) de 1990, adotado pelos Estados Unidos e o Fiscal Responsibility Act (FRA) de
1994, adotado pela Nova Zelndia. Enquanto o BEA se concentrava em controlar os gastos e
receitas pblicas, ao invs de estabelecer metas de dficit e dvida, o FRA estabelecia normas
de transparncia. Ambas obtiveram sucesso. A regra americana, por exemplo, previa um
prazo de doze anos para atingir o equilbrio oramentrio, mas atingiu antes, em 2000 (LIMA,
2002).
As experincias bem sucedidas dos pases desenvolvidos suscitaram interesse em mecanismos
de auto-restrio fiscal por parte de pases da Amrica Latina. Desde o fim da dcada de 90,
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para garantir a estabilidade macroeconmica, foram criadas leis em diversos pases com o
intuito de reforar as instituies oramentrias que pudessem promover a disciplina fiscal
tanto no Governo Federal quanto nos Governos Sub-Nacionais (GSNs)1. A ateno especial
dada aos entes sub-nacionais era justificada pelo intenso processo de descentralizao poltica
e fiscal ocorrida em boa parte dos pases latino-americanos.
O processo de descentralizao, ao mesmo tempo em que confere maiores poderes para
realizao de gastos e arrecadao de impostos locais, tambm surte efeito sobre a
administrao macroeconmica. De acordo com Ter-Minassian (1997), gastos excessivos por
parte dos GSNs podem provocar presses inflacionrias e um aumento da demanda quando o
Governo Central deseja restringi-la. Podem-se sentir os efeitos inclusive no Balano de
Pagamentos, tanto em razo de um possvel aumento da taxa de juros para conter a demanda,
quanto ao prprio aumento de importaes. Essa situao mais grave no contexto brasileiro,
pois mesmo que o Governo Central quisesse compensar esse aumento dos gastos dos GSNs
restringindo os prprios gastos, no seria possvel, em virtude do alto grau de rigidez das
despesas da Unio2. Assim, instituies oramentrias adequadas, que promovam o equilbrio
fiscal dos GSNs, garantem tambm a estabilidade macroeconmica.
No Brasil, a necessidade de controle das finanas pblicas dos GSNs um problema antigo,
agravado desde a descentralizao poltica ocorrida em 1984, que acirrou a disputa por
participao na receita tributria com a facilitao da criao de micro-municpios (GOMES;
MACDOWELL,2000). Em 1988, com a promulgao da nova Constituio, a qual reforava
1 Segundo Alesina e Perotti (1996, p.2), instituies oramentrias so todas as regras e regulamentaes de acordo com as quais os oramentos so traados, aprovados e implementados. 2 De acordo com Giambiagi (2001, p.170) acerca da perda de discricionariedade das despesas da Unio aps a Constituio de 1988 (...) a capacidade do governo central responder sem ajuda da inflao diante de uma situao fiscal difcil foi seriamente afetada , seja porque passou a ser responsvel por uma parte menor do gasto pblico total, ou porque no gasto do governo central, a parcela sobre a qual ele tinha controle direto ficara tambm menor.
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a idia de uma maior autonomia para os GSNs, foram estabelecidas as bases legais para a
descentralizao tanto no mbito poltico quanto fiscal. No entanto, a descentralizao fiscal
abrangeu predominantemente a arrecadao de receitas, sem fazer o mesmo com as despesas
(TER-MINASSIAN, 1997). Mesmo assim, a situao dos GSNs ao invs de melhorar,
apresentou piora gradativa3. Os governos estaduais e municipais (especialmente dos entes
sub-nacionais mais populosos) recorriam a emprstimos de bancos pblicos (principalmente
estaduais) alm de suas capacidades, provocando insolvncia dos bancos e obrigando o
Governo Central a socorrer essas instituies e os prprios GSNs, o que contribua para o
comportamento irresponsvel das autoridades polticas locais.
De acordo com Giambiagi (2002), j em 1995, aps uma reunio com os secretrios da
Fazenda dos quatro maiores estados do pas So Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio
Grande do Sul para discusso da dvida mobiliria, observou-se a necessidade de promover
uma melhora nos aspectos institucionais que regiam as finanas pblicas dos entes sub-
nacionais. Em 1996 foi criada uma secretaria adjunta Secretaria do Tesouro Nacional (STN)
responsvel pelos estados e municpios, a qual iniciou um trabalho que resultaria na Lei
9.496/97 que serviu de base para as assinaturas dos contratos de renegociao das dvidas de
estados e municpios que durariam at 2000.
Para assegurar uma mudana de postura fiscal, especialmente nos GSNs, iniciou-se uma srie
de negociaes para alterar as instituies oramentrias, culminando na aprovao da Lei de
3 Segundo Barroso e Rocha (2004), o cenrio ps-constituio negativo para os GSNs se deveu muito mais a prpria irresponsabilidade dos administradores pblicos do que a escassez de receitas. As altas taxas de inflao verificadas no Brasil at 1994 permitiam a adequao das despesas s receitas por meio do simples atraso no pagamento das despesas, o que corroia o valor real destas e permitia um equilbrio oramentrio artificial. Com a queda abrupta da inflao, a situao oramentria real veio tona, e os dficits e endividamentos dos entes sub-nacionais se revelaram um srio problema para estes.
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Responsabilidade Fiscal (LRF) em 20004. O objetivo principal da LRF consiste em promover
a disciplina fiscal do Governo Federal, Estados e Municpios. Para tanto, a LRF reforou o
processo oramentrio, atribuindo um papel mais importante ao Plano Pluri-Anual (PPA),
Lei de Diretrizes Oramentrias (LDO) e Lei Oramentria Anual (LOA). Na LDO
encontra-se o anexo de metas fiscais, no qual so estabelecidas metas de resultado primrio,
nominal, dvida pblica, receitas e despesas, para o exerccio corrente e para os dois
seguintes. Alm disso, a LDO conta tambm com um anexo de riscos fiscais e um anexo com
os objetivos macroeconmicos. Por outro lado, a LOA, que estabelece pormenorizadamente
as receitas e despesas, deve ser compatvel com as metas do PPA e com as metas fiscais da
LDO.
A LRF tambm estabelece diversos limites para municpios. Para gastos com pessoal h um
limite de 60% da Receita Corrente Lquida (RCL). Por meio da Resoluo n 40 do Senado
Federal, estabelecido um limite de endividamento de 1,2 vez a RCL. J por meio da
Resoluo n 43 do Senado Federal, so estabelecidos limites de 16% da RCL para operaes
de crdito no exerccio fiscal; limite de 11,5% da RCL para pagamento de servios da dvida;
limite de 7% da RCL referentes Antecipao de Receitas Oramentrias (AROs) e o limite
de 22% da RCL referentes a Garantias.
Alm da dvida, operaes de crdito e despesas com pessoal, a lei tambm dispe sobre a
criao de despesas permanentes, gastos em anos eleitorais, previso de receitas, renncia de
receitas, transferncias, transparncia nos procedimentos de elaborao e divulgao dos
relatrios fiscais5, e estabelece punies caso no sejam cumpridas as normas.
4 Lei Complementar n 101 de maio de 2000. Ver Nunes e Nunes (2003) e Lima (2003) para maior detalhamento da LRF. 5 A transparncia est ligada, entre outras coisas, ao envio STN de relatrios contbeis pelos prprios GSNs para consolidao e divulgao dos resultados em meio eletrnico.
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Diversos pases, no entanto, lanaram mo de outros mecanismos para promoverem a
disciplina fiscal nos GSNs em vez de leis de oramento equilibrado como a LRF. Regras de
procedimentos oramentrios, que se referem relao de poder entre Executivo e Legislativo
no processo de elaborao, alterao e aprovao do oramento, comumente constituem uma
forma de se obter mais ou menos disciplina fiscal, de acordo com a relao de poder existente.
Alm disso, mecanismos de auto-restrio fiscal podem ser implementados pelo prprio
mercado, minimizando o papel do governo como fiscalizador dos nveis inferiores de
governo. Dessa maneira, regras de oramento equilibrado, regras de procedimentos
oramentrios e mecanismos de disciplina fiscal impostos pelo mercado so de importncia
crucial para evitar o descontrole dos gastos e do endividamento dos GSNs. No h consenso
entre os pesquisadores sobre qual seria o melhor mecanismo, mas certo que, sem eles, surge
espao para comportamentos oportunistas por parte de representantes polticos. Considerando
ainda a importncia dos GSNs na proviso de bens pblicos (j que o Governo Central atua
mais por meio da transferncia direta de renda), conclui-se que um estudo mais aprofundado
sobre seus gastos e indicadores fiscais bastante relevante. Portanto, o problema central deste
trabalho se refere ao estudo de instituies oramentrias que atuem como mecanismo de
conteno da tendncia de gastos excessivos dos entes sub-nacionais.
Devido ao pouco tempo desde a aprovao da LRF, h poucos estudos no Brasil que tratam
das questes relativas a regras oramentrias e os impactos que estas causam no oramento
pblico6. Alm disso, essa literatura trata da anlise terica da lei ou da anlise emprica dos
efeitos da lei sobre os oramentos estaduais. Os efeitos da LRF sobre o oramento dos
6 Alguns que se pode destacar so, Lima (2003), Barroso e Rocha (2004), Nakaguma e Bender (2004).
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municpios, por exemplo, foram pouco explorados at agora7. Dessa forma, dada a relevncia
dos gastos municipais tanto para proviso de bens pblicos quanto para a prpria estabilidade
macroeconmica, buscou-se estudar esse nvel de governo neste trabalho, com foco sobre os
principais componentes de despesa, alm da receita, dvida e dos dficits dos municpios de
todo o pas entre 1998 e 2004.
O objetivo geral deste trabalho analisar o impacto da Lei de Responsabilidade Fiscal sobre
os principais componentes de despesa dos municpios brasileiros8, inclusive segmentados por
funo econmica. Partiu-se da hiptese inicial de que, caso a lei tenha promovido uma
reduo nas despesas municipais, esta deve ter se dado, predominantemente, sobre seus
componentes mais discricionrios (menos rgidos). Despesas com pessoal, por exemplo, so
mais rgidas devido legislao trabalhista dos servidores pblicos, que se baseia na
estabilidade de emprego do servidor e impede cortes salariais (conferindo, inclusive,
aumentos peridicos de salrio). Na segmentao por funes, partiu-se da hiptese de que as
despesas de carter social tambm no devem ter sido afetadas pela lei. Tais gastos so
bastante rgidos, pois so fortemente vinculados a recursos provenientes de fundos especiais
como o Fundo de Manuteno e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF) e do
Sistema nico de Sade (SUS). Adicionalmente, foram utilizadas variveis explicativas
polticas na estimao dos modelos para avaliar as influncias que estas exercem sobre os
componentes das despesas e para aumentar o poder de explicao.
Podem-se ressaltar, ainda, os objetivos especficos, que consistem em verificar as diferenas
de performance fiscal entre municpios de acordo com o tamanho da populao, e analisar o
7 Dois trabalhos que podem ser citados sobre os efeitos da LRF sobre os oramentos municipais so Nunes e Nunes (2003) e Giuberti (2005). 8 A anlise dos os pormenores da LRF no constitui o foco deste trabalho. Em vez disso, optou-se por concentrar esforos apenas sobre os efeitos da lei sobre as finanas municipais.
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cumprimento dos limites da LRF e legislao correlata, especialmente o limite de gastos com
pessoal. Nesse sentido, espera-se um menor nvel de gastos por pessoa nos municpios menos
populosos, em virtude do baixo poder de arrecadao prpria destes. Quanto ao cumprimento
dos limites de gastos com pessoal, tendo em vistas as punies previstas, espera-se que a LRF
tenha incentivado os municpios a se adequarem aos limites.
Este trabalho est dividido em nove captulos, com esta introduo representando o captulo 1.
O captulo 2 apresenta uma exposio do cenrio fiscal brasileiro no perodo anterior LRF.O
captulo 3 trata dos motivos para ocorrncia de dficits persistentes e dos mecanismos de
controle mais conhecidos e utilizados. O captulo 4 consiste em uma reviso da literatura
internacional sobre instituies oramentrias, e da literatura nacional que analisa a LRF. No
captulo 5, referente metodologia, so apresentadas as descries das bases de dados
utilizadas, as variveis escolhidas, as especificaes dos modelos economtricos, e uma breve
explicao sobre os mtodos Logit de efeitos fixos e Arderson-Hsiao para painis dinmicos
de dados. O captulo 6 mostra uma anlise descritiva das variveis referentes s categorias e
funes de despesas entre 1998 e 2004, de acordo com o tamanho da populao dos
municpios. Conta tambm, na ltima seo, com uma breve descrio das variveis polticas.
No captulo 7, encontra-se uma anlise do cumprimento dos limites relativos LRF, e em
especial, buscou-se verificar o efeito da LRF sobre os gastos municipais com pessoal por
meio do mtodo Logit de efeitos fixos. No captulo 8 so apresentados os resultados
economtricos das estimaes para painis dinmicos e, por fim, no captulo 9 so feitas
algumas consideraes finais.
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2 O CENRIO DAS FINANAS PBLICAS DO BRASIL ANTERIOR LRF
A aprovao da Lei de Responsabilidade Fiscal em maio de 2000 no foi um evento exgeno
e sim resultado de uma combinao de fatores internos e externos que demandaram uma
postura fiscal mais conservadora por parte do Governo Central. O conhecimento desses
fatores crucial para entender o porqu da mudana de comportamento fiscal em todos os
nveis de governo. Dessa forma, a seguir feita uma descrio do cenrio pr-LRF com
intuito de esclarecer a situao fiscal vigente no perodo e os motivos para a deteriorao das
contas pblicas que levaram a aprovao da lei.
De acordo com Giambiagi e Alm (2001)9, a estabilizao monetria ocorrida no Brasil em
1994 trouxe tona a precria situao fiscal do Governo Central e seus entes sub-nacionais.
Acostumados com um cenrio altamente inflacionrio, os administradores pblicos de todos
os nveis governo se aproveitavam disso por meio do atraso no pagamento das despesas.
Assim, quando o gasto era efetuado a inflao j tinha corrodo seu valor real e as contas
pblicas ficavam artificialmente equilibradas. Com isso, os diversos nveis de governo no
impunham restries alta demanda por bens e servios pblicos da populao, a qual, por
sua vez, tinha pouca disposio a ser taxada. Com a estabilizao da moeda, no foi mais
possvel recorrer a essa forma de equilibrar o oramento e tampouco ao financiamento
inflacionrio.
Como se pode verificar na tabela 1, essa nova situao levou a um aumento no dficit
primrio do setor pblico de 4,94% do PIB entre 1994 e 1995. Por outro lado, as 9 A breve descrio das finanas pblicas no Brasil realizada aqui se baseou nos captulos 6, 7 e 8 dessa obra. Os dados das tabelas 1 e 2, no entanto, foram retiradas de Giambiagi (2002), o qual contm basicamente as mesmas consideraes com alguns dados mais atuais.
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Necessidades de Financiamento do Setor Pblico (NFSPs) diminuram consideravelmente (de
26,97% do PIB para 7,27%) em virtude da queda brusca da inflao, que derrubou a taxa
nominal de juros, e conseqentemente, as despesas com juros (a qual era a maior componente
das NFSPs). Todavia, a situao foi agravada com o esgotamento dos meios de financiamento
j citados, pois nesse novo cenrio, o financiamento de dficits deveria se dar por meio de
aumento do endividamento.
Tabela 1 Necessidades de Financiamento do Setor Pblico: conceito nominal 1994/2002 (em % do PIB)
1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002a NFSPs 26,97 7,27 5,86 6,07 7,47 5,82 3,68 3,63 3,70
Governo Central 10,16 2,38 2,56 2,62 4,94 2,73 2,30 2,14 1,75 Estados e Municpios 12,07 3,57 2,70 3,01 2,01 3,16 2,12 2,05 2,10 Empresas Estatais 4,74 1,32 0,60 0,44 0,52 -0,07 -0,74 -0,56 -0,15
Dficit Primriob -5,21 -0,27 0,09 0,97 -0,02 -3,23 -3,50 -3,69 -3,50 Governo Centralb -3,25 -0,52 -0,37 0,32 -0,55 -2,35 -1,88 -1,86 -2,25 Estados e Municpiosb -0,77 0,18 0,54 0,72 0,18 -0,22 -0,55 -0,89 -0,70 Empresas Estataisb -1,19 0,07 -0,08 -0,07 0,35 -0,66 1,07 -0,94 -0,55
Juros Nominais 32,18 7,54 5,77 5,10 7,49 9,05 7,18 7,32 7,20 Governo Central 13,41 2,90 2,93 2,30 5,49 5,08 4,18 4,00 4,00 Estados e Municpios 12,84 3,39 2,16 2,29 1,83 3,38 2,67 2,94 2,80 Empresas Estatais 5,93 1,25 0,68 0,51 0,17 0,59 0,33 0,38 0,40
Memo: Ajuste Patrimonial Anual (Fluxo)c
n.d. n.d. 1,90 -1,80 0,60 3,20 -0,10 3,80 1,00
Privatizao n.d. n.d. -0,10 -1,90 -1,40 -0,40 -1,50 0,40 0,00 Outros n.d. n.d. 2,00 0,10 2,40 7,40 1,40 3,40 1,00
Ajustes da Dvida Interna n.d. n.d. 0,00 0,00 0,40 3,80 0,50 1,20 0,00 Demais Ajustes n.d. n.d. 2,00 0,10 2,00 3,60 0,90 2,20 1,00
Fonte: Banco Central apud Giambiagi (2002, p.9). Para 2002, previso do autor, com base em uma mdia de projees de mercado. a Previso b (-) = Supervit c Resultado Lquido (ajuste bruto privatizaes). Diferena entre a relao ajuste/PIB de anos sucessivos. n.d. = no disponvel
De fato, o Dficit Primrio cresceu de 1995 at 1997 (inclusive) devido a diversos fatores.
Primeiramente, a poltica fiscal do Governo Central foi claramente expansionista. Na disputa
de foras sobre a conduo da poltica fiscal, os polticos, mais interessados em realizar
gastos, levaram vantagem sobre a equipe econmica, favorvel a uma poltica fiscal mais
conservadora. Havia tambm uma preocupao do governo em atender s demandas sociais,
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esperando que o crescimento do PIB e das receitas compensasse o aumento das despesas. Um
dos principais causadores do aumento do Dficit Primrio foi o gasto com previdncia, o qual
acompanhou o aumento do salrio mnimo acima da inflao em 1995 (que tambm elevou a
despesa com pessoal). Alm disso, os gastos com outras despesas correntes e de capital
(OCC), que constituam a parcela menos rgida (mais discricionria) das despesas do Governo
Central, aumentaram fortemente, refletindo a inteno expansionista da poltica fiscal.
Destaca-se ainda, que parte dessa expanso dos gastos do Governo Central se deveu aos
efeitos defasados da Constituio de 1988, que diminuiu o nvel de discricionariedade de suas
despesas. Pelo lado das receitas, em 1993, quando se completou o processo de aumento das
vinculaes, o crescimento das transferncias das receitas provenientes do IR10 e do IPI11 para
Estados e Municpios foi superior a 40%. Portanto, no momento em que os aumentos do
salrio mnimo e das aposentadorias se deram, o Governo Central no teve muito espao para
cortar gastos ou aumentar impostos para ajustar o oramento12, o que contribuiu para o
aumento dos dficits.
Adicionalmente, os dados da tabela 1 mostram que grande parte do aumento do Dficit
Primrio verificado entre 1995 e 1997 se deveu aos Estados e Municpios (especialmente aos
primeiros, segundo os autores). Os Estados registraram um grande aumento nas despesas com
funcionrios em virtude de reajustes concedidos. Aumentaram tambm o gasto com
aposentados devido permisso de aposentadorias precoces. Esses fatores, aliados ao fato de
que grande parte das empresas estatais estaduais encontrava-se em situao deficitria,
contriburam para a piora fiscal verificada no setor pblico agregado.
10 Imposto de Renda. 11 Imposto sobre Produtos Industrializados. 12 Ressalta-se que a disposio da populao a ser taxada era baixa.
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Tabela 2 Dvida Lquida do Setor Pblico: fim de perodoa 1994/2001 (em % do PIB)
Composio 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 Dvida Totala 26,00 27,30 30,90 30,70 38,90 44,60 45,20 49,00 Governo Central 9,20 10,10 13,60 15,00 21,50 25,50 26,80 28,90 Governos Estaduais e Municipais 9,80 10,60 11,50 12,90 14,70 16,40 16,20 18,50
Estados n.d. n.d. n.d. 11,10 12,70 14,20 14,10 16,40 Municpios n.d. n.d. n.d. 1,80 2,00 2,20 2,10 2,10
Empresas Estatais 7,00 6,60 5,80 2,80 2,70 2,70 2,20 1,60 Federais n.d. n.d. 2,50 1,00 0,50 0,30 -0,40 -1,20 Estaduais n.d. n.d. 3,20 1,70 2,10 2,20 2,40 2,60 Municipais n.d. n.d. 0,10 0,10 0,10 0,20 0,20 0,20
Dvida Totala 26,00 27,30 30,90 30,70 38,90 44,60 45,20 49,00 Dvida Fiscalb 26,00 27,30 29,00 30,60 37,80 36,50 37,20 37,20 Ajuste Patrimonial (Estoque)c 0,00 0,00 1,90 0,10 1,10 8,10 8,00 11,80
Privatizao 0,00 0,00 -0,10 2,0 -3,40 -3,80 -5,30 -4,90 Outros 0,00 0,00 2,00 2,10 4,50 11,90 13,30 16,70
Ajustes da Dvida Interna 0,00 0,00 0,00 0,00 0,40 4,20 4,70 5,90 Demais Ajustes 0,00 0,00 2,00 2,10 4,10 7,70 8,60 10,80
Base Monetria 3,60 3,10 2,40 3,60 4,40 4,60 4,20 4,30 Dvida Total com Base Monetria 29,60 30,40 33,30 34,30 43,30 49,20 49,40 53,30
Fonte: Banco Central apud Giambiagi (2002, p.31) a Exclui base monetria. b Sem base monetria e sem descontar privatizao. c Inclui efeitos patrimoniais da desvalorizao sobre a dvida em dlares. n.d. = no-disponvel
Como se pode verificar na tabela 2, os resultados fiscais ruins dos diversos nveis de governo
levaram a um crescimento da Dvida Lquida Total igual a 3,4% do PIB entre 1995 a 1997.
Do total da dvida, uma parte significativa pertencia aos Estados13. Esse fato levou o Governo
Central a tomar uma srie de medidas no perodo para atenuar os dficits desse nvel de
governo. Entre elas: i) privatizao dos bancos e empresas estatais estaduais (importantes
fontes de financiamento dos dficits estaduais); ii) controle das Antecipaes de Receitas
Oramentrias (AROs); iii) inibio do uso de precatrios para financiamento dos dficits;
iv) renegociao das dvidas mobilirias estaduais14; e v) aprovao de reformas
administrativas. Entre 1997 e 1998, o Dficit Primrio dos Estados e Municpios diminuiu em
0,54% do PIB e comprovou a eficcia das medidas tomadas.
13 Os municpios, em geral, por terem maiores dificuldades em se endividarem, no tm tanta responsabilidade no total da dvida. 14 Segundo os autores, a Lei 9.496/97 constituiu a base do processo de federalizao da dvida. Os termos da negociao exigiam dos estados uma taxa de 6 % a.a., e 30 anos para amortizao total, seguindo o sistema Tabela Price com pagamento mensais. A penalidade para o descumprimento do acordo era a reteno de receitas por parte do Governo Central.
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No segundo semestre de 1998, aps as crises asiticas (1997) e russa (1998), aumentou a
desconfiana dos investidores estrangeiros em relao a mercados emergentes. O crdito
internacional diminuiu fortemente e os investidores buscaram mercados mais seguros. Os
resultados fiscais ruins do Brasil, o aumento do endividamento interno, o temor da moratria,
o prprio regime de cmbio fixo e os dficits em conta corrente apresentados entre 1995 e
1997 (devido taxa de cmbio fixa valorizada) suscitaram fortes temores nos investidores em
relao desvalorizao do Real.
Esse temor de desvalorizao deu incio a uma fuga de capitais, a qual provocou uma reduo
drstica no nvel de reservas15. Entre o incio de Agosto de 1998 e o final de Setembro do
mesmo ano, a sada de capitais chegava a quase 1 bilho de dlares por dia.
A situao preocupante mobilizou o governo em prol de um acordo com o FMI a fim de obter
ajuda financeira para reforar as reservas e sinalizar aos investidores estrangeiros que a
situao estava sob controle. O acordo previa a liberao de 42 bilhes de dlares e abrangia
algumas medidas importantes como micro-desvalorizaes cambiais de 0,6% ao ms, e ajuste
fiscal destinado obteno de supervits primrios de 2,6% do PIB em 1999, 2,8% em 2000 e
3% em 2001.
Entretanto, o acordo aprovado em dezembro de 1998 foi acompanhado de dois fatores de
tenso interna. O primeiro consistiu na reprovao de um conjunto de medidas fiscais
restritivas pelo Congresso Nacional, e o segundo na moratria decretada pelo Estado de
Minas Gerais16. Os investidores receberam muito mal esses fatos e acentuaram a retirada de
15 O nvel de reservas at ento era bastante alto em virtude da privatizao da Telebrs. Mesmo assim, a fuga de capitais consumiu os recursos arrecadados com a venda da estatal e diminuiu drasticamente as reservas. 16 A moratria de Minas Gerais foi na verdade simblica, pois o Governo Central pode impedir a liberao de receitas ao estado caso este no honre seus compromissos.
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capitais investidos no Brasil, pressionando o nvel de reservas para baixo. Dessa forma, o
mecanismo de micro-desvalorizaes falhou, e em 15 de janeiro de 1999, o governo deixou o
cmbio flutuar e observou-se uma maxi-desvalorizao.
O Governo Central, no entanto, prevendo danos aos bancos e s empresas nacionais
decorrentes da desvalorizao cambial, forneceu-lhes proteo (hedge) cambial, o que
aumentou fortemente a dvida atrelada ao cmbio nos primeiros meses de 1999. Essa
combinao de forte crescimento da dvida e maxi-desvalorizao levou o Brasil a um novo
acordo com o FMI para estabelecer o supervit primrio ao invs do dficit nominal como
critrio de desempenho17.
Entretanto, as metas de supervit primrio negociadas nesse novo acordo foram mais
rigorosas (3,10% do PIB em 1999, 3,25% em 2000 e 3,35% em 2001) devido ao aumento da
dvida e perda de credibilidade do Brasil no incio de 1999. Foram estabelecidas metas de
supervit primrio inclusive para estados e municpios como parte do acordo. Esse maior
rigor tinha o claro objetivo de estabilizar ou diminuir a relao Dvida/PIB.
Ao final de 1999, a Dvida Total18 como proporo do PIB j tinha diminudo
consideravelmente, mas ainda assim, representava 44,6% do PIB (tabela 2), 5,8% do PIB a
mais do que no ano anterior.
17 Os critrios de desempenho so utilizados para decidir sobre futuros desembolsos do FMI, pois indicam o cumprimento ou no do acordo. O acordo de 1998 exigia que as NFSPs nominais fossem utilizadas como critrio de desempenho e o supervit primrio como meta indicativa. O no cumprimento das metas de supervit primrio no impedia os saques previstos. Entretanto, como era necessrio elevar a taxa de juros interna para reforar as reservas e impedir uma maior desvalorizao, a utilizao das NFSPs como critrios de desempenho desfavoreceriam o Brasil. Assim, foi negociada no novo acordo a utilizao do supervit primrio como critrio de desempenho. 18 Excluindo-se a Base Monetria.
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Ainda em 1999, aps a estabilizao dos nimos dos investidores, e conseqentemente da
taxa de cmbio e da dvida, o Governo Central se empenhou fortemente em realizar o ajuste
fiscal para cumprir as metas do acordo com o FMI. Uma das principais medidas nesse sentido
foi a reviso do fator previdencirio, que coibiu as aposentadorias precoces e atenuou o
dficit. A aprovao da Lei de Responsabilidade Fiscal foi outra medida de grande
importncia, a qual comprovou a mudana de postura do Governo Central em relao
austeridade fiscal e representou uma grande evoluo em relao exigncia de disciplina nos
GSNs. At ento, a legislao no punia com rigor a indisciplina fiscal dos nveis inferiores
de governo, e permitia o surgimento de comportamentos oportunistas por parte dos polticos.
Os limites19 impostos pela LRF (e Resolues n40 e 43 do Senado Federal) restringiram a
utilizao da poltica fiscal por prefeitos e governadores, pois prevem punies
administrativas e criminais caso no sejam cumpridos. A lei estabeleceu tambm, uma srie
de normas de transparncia na gesto e divulgao dos dados referentes aos gastos pblicos,
visando ampliar o controle do eleitor sobre o comportamento dos polticos.
Os dados das tabelas 1 mostram que, a partir de 1998, tanto a Unio quanto os Estados e
Municpios, apresentaram supervits primrios importantes para o ajuste fiscal pretendido. J
Dvida Total (tabela 2) cresceu, apesar dos supervits observados. A razo reside nas NFSPs
positivas (mesmo que decrescentes) observadas nesse perodo, que refletem os altos gastos
com juros e so financiadas por meio de endividamento. Mesmo assim, o aumento da dvida
era algo esperado em vista da necessidade de se elevar a taxa de juros para controlar a
depreciao cambial.
19 Os limites de Despesas com Pessoal como percentual da RCL para Estados e Municpios so iguais a 60%. J para a Dvida Consolida Lquida tem-se limites iguais a 1,2 vez a RCL para Municpios e 2 vezes a RCL para Estados. Os demais limites citados na introduo deste trabalho so vlidos tanto para Municpios quanto para os Estados. Vale destacar tambm a imposio do limite para Gastos com Pessoal da Unio, igual a 50% da RCL.
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A adoo de mecanismos de conteno de dficits, como os observados, geralmente se d em
um contexto de crise, quando a sociedade e os representantes polticos percebem a
necessidade de impor restries poltica fiscal para equilibrar o oramento e diminuir a
divida. No Brasil, essa preocupao efetiva com a disciplina fiscal em todos os nveis de
governo s se manifestou no contexto da crise de confiana externa, dficits primrios
sucessivos, desvalorizao cambial e aumento da dvida interna no final do primeiro mandato
do governo Fernando Henrique Cardoso (FHC). Depois de tomadas as medidas de ajuste j
citadas, estas surtiram o efeito desejado, e consolidaram a mudana de postura na poltica
fiscal durante o segundo mandato do governo FHC.
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3 DFICITS PERSISTENTES E MECANISMOS DE CONTROLE
Diversos pesquisadores nas reas de finanas pblicas e economia das instituies tm se
dedicado a estudar os dficits oramentrios. Em geral, a anlise centrada no nvel federal e
estadual de governo devido a maior influncia na rea macroeconmica e maior
disponibilidade de dados. J os municpios so menos estudados, dada a dificuldade de coleta
dos dados. Entretanto, os motivos para surgimento de dficits e os mecanismos de controle
utilizados so similares para todos os nveis de governo (com exceo dos dficits como
poltica anticclica, mais utilizados pelo governo central e estados). Dessa forma, no h
problema em expor estudos com base em diferentes nveis de governo, como feito neste
captulo.
Vale destacar ainda, que a preocupao dos pesquisadores no diz respeito a dficits
ocasionais, e sim queles persistentes. Enquanto os primeiros tm uma funo de
estabilizao da economia nacional ou local, os ltimos so uma fonte de desestabilizao. No
caso da economia do pas como um todo, a desestabilizao se d especialmente em razo das
formas de financiamento, que podem ser:
a) senhoriagem, a qual acentua a presso inflacionria e impe um imposto inflacionrio
especialmente sobre a populao mais pobre;
b) operaes de crdito internas e externas, que comprometem parte do oramento
pblico com pagamento de juros e amortizaes e afetam a capacidade de promover o
crescimento econmico e arrecadar impostos;
c) emisso de ttulos da dvida, que alm de comprometerem parte do oramento com
pagamento de juros e resgate do principal, requerem um aumento na taxa de juros
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como prmio pelo risco, a qual pode determinar um efeito-deslocamento (crowding-
out) entre gastos do governo e investimentos privados.
As formas mais comuns de financiamento dos dficits persistentes dos GSNs consistem em
operaes de crdito internas e externas junto ao setor privado ou rgos multilaterais,
emisso de ttulos da dvida e endividamento junto ao Governo Central. De qualquer forma,
levam ao aumento do endividamento e do comprometimento oramentrio com pagamento de
juros e demais encargos. O resultado a incapacidade de fornecer os bens e servios pblicos
demandados pelas comunidades locais, e conseqentemente, a deteriorao das condies de
vida dos habitantes.
Assim, importante tentar entender os possveis motivos para o surgimento de dficits
persistentes, como realizado na seo 2.1, e os mecanismos de conteno desses dficits,
apresentados na seo 2.2. Por ltimo, na seo 2.3, so apresentadas algumas formas
alternativas (menos mencionadas na literatura) de conter gastos excessivos.
3.1 Razes para o surgimento de dficits persistentes
A ocorrncia de dficits fiscais por um perodo curto sempre foi algo comum de se observar
durante a histria dos pases. Todavia, desde meados da dcada de 70 a relao Dvida/PIB
apresentou uma tendncia de crescimento contnua em virtude dos dficits persistentes em
muitos pases da OCDE. Com base nas teorias que tratam do assunto, Alesina e Perotti (1995)
buscam responder a duas questes cruciais: Por que esses desequilbrios fiscais apareceram
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nos ltimos vinte anos e no anteriormente? Por que alguns pases, mas no outros, tm
experimentado grandes dficits oramentrios por muitos anos?20.
Inicialmente, os autores consideram a teoria originalmente desenvolvida por Barro (1979) e
denominada tax smoothing para tentar responder as perguntas. Tal teoria baseada na
utilizao tima de dficits e supervits oramentrios para minimizar os efeitos distorcivos
(de m alocao) da tributao, dada certa trajetria de gasto. Os agentes no so fiscalmente
iludidos e percebem que os dficits de hoje devem ser compensados por supervits no futuro,
levando o planejador central a produzir um oramento intertemporal equilibrado com uma
alquota de imposto constante. Isso tem importantes implicaes no s para a ocorrncia de
choques de gasto, mas tambm para flutuaes cclicas das receitas tributrias devido ao ciclo
de negcios. Dessa maneira, um acmulo de dvida devido a dficits persistentes no presente
deveria ser compensado por grandes supervits, tais que a relao Dvida/PIB diminusse no
futuro.
Entretanto, os autores destacam que o comportamento da relao Dvida/PIB observado nos
pases no comprova a teoria de tax smoothing. Esta, dificilmente poderia explicar o porqu
desse aumento repentino da relao Dvida/PIB nos ltimos anos, e de forma alguma
explicaria porque isso ocorreu em alguns pases e no em outros.
Outra teoria abordada pelos autores para tentar responder s perguntas refere-se a iluso
fiscal. De acordo com essa teoria, os eleitores no entendem o oramento do governo e
tendem a superestimar benefcios presentes e subestimam encargos futuros. Assim, para se
reelegerem, polticos oportunistas realizam gastos maiores que aumentos de impostos para
20 Why did these fiscal imbalances appear in the last twenty years rather than sooner? Why have certain countries, but not others, experienced large budget deficits for several years?
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satisfazer os eleitores iludidos, da a tendncia ao dficit excessivo e persistente. Os autores
ressaltam ainda as diferenas entre erro de previso do eleitor e iluso. Erros no
correlacionados se do tanto para mais quanto para menos, se do devido informao
imperfeita, e em mdia so nulos. Iluso consiste em um vis sistemtico em uma direo. Os
defensores dessa teoria, contudo, no explicam porque o vis se d sempre no sentido de
subestimar a carga tributria futura. Alm disso, no esclarecem tambm o porqu do
aumento recente da relao Dvida/PIB nem porque esse aumento se deu em alguns pases e
no em outros.
Uma terceira teoria, denominada redistribuies intergeracionais, se baseia na hiptese de
egosmo intergeracional. Cukierman e Meltzer (1989, apud ALESINA; PEROTTI, 1995)
propem um modelo poltico onde h ricos e pobres. Os ricos desejam deixar heranas
positivas, e os pobres, negativas. Como no possvel deixar uma herana negativa, os pobres
incorrem em dficits e deixam dvidas. Os ricos so indiferentes entre realizarem dficits e
aumentarem o endividamento ou no. Portanto, no geral, a escolha social tende a acumular
dvida. Entretanto, os autores no explicam porque esse aumento verificado no endividamento
dos pases se deu agora, nem porque se deu diferentemente em vrios pases.
A quarta teoria apresentada pelos autores refere-se utilizao estratgica da dvida como
comprometimento de governos futuros. Supondo um sistema poltico com dois partidos com
diferentes preferncias e incerteza em relao a ganhar as prximas eleies, o partido no
poder busca gastar o mximo possvel naquilo que lhe preferido, recorrendo inclusive ao
endividamento. Dessa forma, caso o partido rival esteja no poder no mandato seguinte, este
ser obrigado a honrar os compromissos da dvida para evitar os enormes custos de default.
Portanto, mudanas freqentes de governo esto associadas ao aumento do endividamento,
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assim como a forte polarizao poltica. Os autores alegam que modelos desse tipo explicam
as duas questes colocadas. Nos ltimos anos observou-se uma intensa troca de governos nos
diversos pases da OCDE, o que explicaria a questo por que agora. Adicionalmente, as
diferenas na evoluo das dvidas entre pases podem ser explicadas pelo grau de polarizao
poltica observada nestes. Contudo, tais modelos so considerados incipientes pelos autores.
Alesina e Drazen (1991, apud ALESINA; PEROTTI, 1995) destacam, ainda, a teoria de
conflitos distributivos e guerras de desgaste. De acordo com essa teoria, caso haja um
choque de gastos que aumente o endividamento e demande ajustes fiscais, em um governo de
coalizo21, haver uma guerra de desgaste entre membros da coalizo para ver quem ter que
arcar com o fardo desse ajuste. Nesse processo de espera, a dvida tende a aumentar e piorar
cada vez mais a situao, at que uma parte ceda. Segundo os autores, modelos desse tipo
respondem as duas perguntas. O choque original teria sido o Choque do Petrleo, e o ajuste
teria sido postergado, causando o acmulo de dvida em vrios pases. Esse acmulo teria se
dado mais fortemente em alguns pases do que em outros, devido existncia de coalizo
fraca nos pases que apresentaram maior acmulo de endividamento.
Sob outra perspectiva de anlise, os autores ressaltam a teoria de interesses geograficamente
dispersos. Weingast, Shepsle e Johnsen (1981, apud ALESINA; PEROTTI, 1995) ressaltam
que em um sistema federativo altamente fragmentado, com cada ente representando apenas
uma pequena frao do total e grande parte dos recursos provenientes de um fundo comum
administrado pelo Governo Central, o gasto tende a exceder o timo social. Esse problema se
deve ao fato de que os agentes representativos de um distrito ou GSN no internalizam os
reais custos do financiamento dos projetos para esse distrito. O benefcio Bj advindo de um
21 Destaca-se que as coalizes podem ser fortes ou fracas.
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projeto para o j-simo distrito tem um custo Cj que ser distribudo por todos os demais
distritos, o que significa que o distrito beneficiado internalizar apenas N
N j do custo total, em
que Nj o tamanho do distrito j. Portanto, o benefcio do projeto maior do que o custo
percebido, gerando um vis de gasto excessivo devido a um aumento na demanda por bens
pblicos.
Por outro lado, se as decises de gastos so tomadas localmente, h tendncia de gastos
excessivos no caso de grande parte das receitas serem provenientes de transferncias, pois os
agentes no estabelecem uma correspondncia entre o que se gasta e o que se arrecada
localmente. Assim, um aumento das transferncias gera um incentivo adverso ao sobre-gasto
e gerao de dficits22.
Essa teoria tambm explica as duas perguntas. Quanto mais descentralizadas as decises de
gastos nos pases, mais propensos estes sero a incorrer em dficits. Em relao ao motivo
para o surgimento de dficits nas ltimas dcadas, pode-se verificar uma tendncia a maior
descentralizao23 das decises de gasto desde meados da dcada de 70.
Finalmente, a teoria das instituies oramentrias trata de todas as regras e procedimentos
que regulam a elaborao do oramento. A distribuio de prerrogativas entre os ministros, a
transparncia na elaborao do oramento, o grau de dificuldade para realizao de emendas
parlamentares, a existncia do voto sobre o tamanho do oramento ao invs de votos item por
item, so todos fatores que contribuem para uma instituio mais ou menos eficaz para
promover a disciplina fiscal. Von Hagen e Harden (1995) encontram evidncias que permitem
22 Por outro lado, um aumento na receita tributria prpria de um distrito no gera esse vis de expanso do gasto, pois o custo desses bens completamente internalizado pelo distrito. 23 Hughes e Smith (1991 apud Alesina e Perotti, 1995).
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responder s duas questes colocadas com base nessa teoria. A questo relativa ao porqu do
endividamento ter aumentado desproporcionalmente em alguns pases e no em outros pode
ser explicada pelas diferenas entre as instituies oramentrias em cada pas. J em relao
ao motivo para o aumento em questo ter se dado nos ltimos anos, a explicao segue a
mesma linha do modelo de conflitos distributivos e guerras de desgaste, ou seja, o choque
do petrleo foi o fato gerador que surtiu efeitos diferentes de acordo com as instituies
vigentes em cada pas.
3.2 Mecanismos de conteno de dficits
Uma vasta literatura tem se dedicado ao estudo de mecanismos para conteno desses dficits
excessivos. De acordo com Alesina et al. (1999), a literatura terica que trata de instituies
oramentrias considera trs principais formas de se atingir a disciplina fiscal:
1) regras ou leis de oramento equilibrado que estabeleam restries ex-ante, como
restries ao endividamento e limites para gastos com pessoal que sejam consistentes
com uma meta geral para a economia do pas, e contabilizao ex-post, de modo que
seja exigido o equilbrio oramentrio ao final do exerccio;
2) regras de procedimento hierrquicas, ou seja, que atribuam maiores prerrogativas ao
governo em relao ao legislativo na fase de aprovao do oramento. No caso de
negociaes do oramento dentro do prprio governo, esto relacionadas atribuio
de maiores prerrogativas ao ministro da Fazenda. So opostas s regras colegiais, mais
democrticas, pois atribuem maiores prerrogativas aos ministros setoriais e ao
legislativo, alm de conferirem maiores direitos minorias de oposio no legislativo.
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3) transparncia nos procedimentos, como relatrios inteligveis e de fcil acesso ao
cidado comum. A no exigncia de transparncia abre espao para o surgimento de
artimanhas contbeis que produzam relatrios no condizentes com a realidade.
Vrias crticas podem ser feitas s leis de oramento equilibrado. Segundo a teoria de tax
smoothing desenvolvida por Barro (1979), tais leis impem custos distorcivos ao setor
privado em decorrncia da m alocao da receita governamental, alm dos custos do prprio
processo de arrecadao, conhecidos na literatura como peso morto. Uma lei que exija um
oramento equilibrado pode provocar, a cada ano, variaes nas alquotas de impostos para se
atingir o equilbrio entre receitas e despesas. Assim, o ideal seria que no houvesse leis de
oramento equilibrado de forma a manter constantes as alquotas. Nesse caso, os dficits e
supervits seriam utilizados para minimizar os custos distorcivos da taxao, que tendem a
aumentar quando se aumentam impostos para a realizao de maiores gastos.
Prosseguindo com as crticas, Bayomi e Eichengreen (1995), com base em sries temporais de
dados, estimam a sensibilidade entre produto e supervit fiscal para cada estado americano.
Com esses coeficientes, estimam uma regresso com dados em cross-section, sendo a varivel
dependente a sensibilidade estimada, e o ndice de severidade construdo por Anderson e
ACIR24 (1987) a varivel explicativa. Esse ndice reflete o grau de severidade das leis de
oramento equilibrado aplicadas nos estados, e varia de zero a dez. Os autores encontram
evidncias de diminuio da capacidade de utilizao de dficits como mecanismos
anticclicos quanto mais severas ou restritivas as leis. Assim, concluem que, em perodos de
crise, as leis de oramento equilibrado reduzem o poder de estabilizao da poltica fiscal e
aumentam a varincia do produto.
24 Advisory Commission on Intergovernmental Relations.
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Dur, Peletier e Swank (1997) demonstram que, no caso de dficits politicamente motivados,
uma regra que restrinja o endividamento, pode provocar uma diminuio do investimento.
Segundo os autores, no caso de no haver restries ao endividamento, o partido no poder
incorrer em dficits persistentes voltados aos gastos com os bens pblicos preferidos, o que
leva a um aumento da dvida. Na viso dos polticos, o investimento menos preferido, pois
diminui a renda disponvel do governo para consumo daqueles bens no presente e aumenta a
renda no futuro, quando no se sabe se o partido estar no poder. Assim, uma regra de
restrio ao endividamento leva o partido no governo a diminuir o investimento (menos
preferido) para atenuar a restrio, e dessa maneira, permitir maiores gastos com os bens
pblicos preferidos.
Mesmo concordando com a existncia de custos distorcivos da taxao e com a perda de
graus de liberdade decorrentes das leis de oramento equilibrado, Inman (1996) estabelece
alguns critrios que as caracterizam como fortes, mais eficazes na promoo da disciplina
fiscal, ou fracas, menos eficazes. Dentre os critrios que caracterizam as leis como fortes
pode-se destacar que:
a) a aplicao deve ser ex-post, ou seja, requer o equilbrio contbil ao final do exerccio
fiscal, de outra forma, um oramento equilibrado ex-ante permite a previso de
receitas e despesas com otimismo excessivo;
b) deve tambm contar com um rgo independente (ex: tribunal de contas) que seja
responsvel pelo enforcement da lei. As penas aplicadas por esse rgo devem ser
severas caso a lei seja descumprida, e o acesso a ele deve ser aberto, ou seja, qualquer
cidado avesso ao dficit pode cobrar o cumprimento da lei;
c) a realizao de emendas lei deve ser difcil;
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d) no deve ser permitida a anulao da lei por maioria simples no Congresso;
e) a lei deve ter carter constitucional, de modo que ela s possa ser modificada por
maioria qualificada25.
Alesina e Perotti (1996), tambm salientam os custos distorcivos e a perda de graus de
liberdade que tais leis impem ao funcionamento anticclico (sintonia fina26) da poltica fiscal.
Alternativamente, defendem a utilizao de regras de procedimentos hierrquicas e
transparentes, ressaltando que leis de oramento equilibrado no so necessrias nem
suficientes.
Ao analisarem os efeitos de regras de procedimento hierrquicas e colegiais sobre o
oramento pblico, von Hagen e Harden (1995) constroem um modelo baseado na teoria dos
jogos para analisarem diferentes equilbrios oramentrios de acordo com diferentes
processos de negociao do oramento sob a hiptese de iluso fiscal. Primeiramente os
autores calculam o oramento timo de equilbrio determinado por um planejador central e
obtm o oramento timo de equilbrio que reflete a maximizao do bem-estar da sociedade.
Em seguida consideram uma situao em que cada ministro setorial faz um lance sobre o
quanto quer gastar e feita uma votao sobre o oramento resultante. Nesse caso, o
oramento de equilbrio maior do que o oramento timo, resultando em um vis de sobre-
gasto. Consideram tambm um processo oramentrio que comece com todos os ministros
setoriais negociando entre si sujeitos a limites de gasto e encontram um equilbrio com vis de
gasto excessivo, mas menor do que no caso anterior. Por ltimo, consideram o oramento
resultante da atuao do ministro da Fazenda e encontram um oramento de equilbrio que
25 Geralmente representa dois teros ou trs quintos dos membros da Cmara Legislativa. 26 Segundo os prprios autores, fazendo referncia a crtica de Friedman acerca da longa defasagem dos efeitos das polticas monetrias sobre a economia, possvel que o mesmo ocorra no caso da poltica fiscal, desqualificando a utilizao dos dficits como mecanismo de sintonia fina.
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pode ser igual ao obtido pelo planejador central, caso o ministro tenha grande poder
estratgico; ou igual ao oramento obtido pela negociao entre os ministros setoriais, caso
seu poder estratgico seja nulo. Dessa forma, quanto maiores as prerrogativas do ministro da
Fazenda, ou seja, quanto mais hierrquico o processo oramentrio, mais prximo do nvel
timo ser o oramento.
Entretanto, Alesina e Perotti (1996) ressaltam o trade-off existente entre a adoo de regras de
procedimento hierrquicas e o respeito aos direitos das minorias. Segundo os autores, as
regras de procedimento hierrquicas so mais eficazes em impor restries oramentrias,
implementar ajustes fiscais rapidamente e evitar grandes dficits. Portanto so mais indicadas
para pases que necessitam de disciplina fiscal com urgncia. No entanto o ideal seria uma
situao intermediria que no negligencie os direitos das minorias, mas que tambm favorea
um ajuste fiscal rpido caso necessrio.
A transparncia outro ponto importante salientado pelos autores, um oramento complexo
demais permite a utilizao de artimanhas contbeis que escondam a situao real. A falta de
transparncia pode confundir os eleitores e incentivar os polticos a serem fiscalmente
irresponsveis. Quanto menos o eleitor entender o oramento mais os polticos podem agir de
maneira oportunista. Elaborao de relatrios contbeis de forma clara e inteligvel e
divulgao na internet e em outros meios de comunicao, permitem um melhor
monitoramento das aes dos representantes polticos por parte de seus eleitores.
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3.3 Formas alternativas de se atingir a disciplina fiscal
H diversas outras formas de se atingir a disciplina fiscal, alm das mencionadas
anteriormente. Em especial, podem-se destacar trs alternativas.
Ter-Minassian (1997), ressalta a disciplina de mercado como mecanismo alternativo para
promover o equilbrio oramentrio dos GSNs e preservar a poltica fiscal como ferramenta
de gesto macroeconmica. No entanto, a autora ressalta como requisitos para a
implementao desse mecanismo: i) o mercado livre e aberto; sem regulamentao em relao
a intermedirios financeiros que privilegiem os entes sub-nacionais; ii) a informao perfeita
ou pelo menos adequada em relao ao GSN; iii) a impossibilidade de socorro por parte do
Governo Central s instituies credoras lesadas pelos GSNs; e iv) estrutura institucional dos
entes sub-nacionais que garanta resposta poltica adequada antes que se atinja um ponto em
que sejam recusados novos emprstimos. A autora defende, ainda, que pases em
desenvolvimento deveriam reforar suas instituies oramentrias antes de tentar a disciplina
de mercado, mais adequada a pases com histrico de disciplina fiscal.
Perry (2003) tambm apia um meio alternativo de se lidar com a indisciplina fiscal que
preserve a capacidade de utilizao de dficits de modo anticclico. O autor aponta o fato de
que leis de oramento equilibrado tornam as polticas fiscais ferramentas pr-cclicas, que
aumentam a variabilidade do crescimento do produto interno e provocam perdas permanentes
para a populao mais pobre.
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O ideal, segundo ele, seria uma regra fiscal que promovesse a disciplina, mas que fosse
flexvel o suficiente para permitir dficits em pocas de crise e supervits em pocas de
crescimento. Contrariando a opinio de alguns analistas, descrentes na possibilidade de
aplicao de tais regras em pases subdesenvolvidos, o autor destaca a experincia chilena.
Em 2001, o Chile adotou uma regra baseada no comprometimento de apresentar um supervit
estrutural de 1% ao ano27. O clculo do equilbrio estrutural retira os efeitos da variao no
preo do cobre28 e do ciclo econmico sobre as receitas. A adoo dessa regra permitiu ao
Chile promover polticas anti-cclicas. Em pocas de forte crescimento das receitas, ou
aumento do preo do cobre em relao ao preo estimado de longo prazo, os supervits
aumentam, permitindo a realizao de maiores poupanas para que em pocas de crise se
possa incorrer em dficits e suavizar o ciclo. Entretanto, as penalidades impostas pelo
descumprimento dessa regra no so severas, o que pode afetar a eficcia da mesma. Esse fato
comprova a idia de Alesina e Perotti (1995, p.25), segundo os quais, quanto mais
complicada a regra, mais difcil de obrigar seu cumprimento29. Tal afirmao deve ser mais
verdadeira para aplicao nos municpios, que dispem de menos recursos e informaes.
27A regra, de acordo com Garca, Garca e Piedrabuena (2005), dada por:
( ) *** tREFtFOBtt
ttttt PPCSY
trendYTTBobserbedSB
+=
Em que, SBt representa o saldo estrutural; Bobservedt o saldo do Governo Central; Tt representa a receita de impostos mais contribuies previdencirias correntes; Yt trend representa a tendncia nominal do nvel do PNB, calculada por especialistas independentes; Yt o nvel do PNB nominal; representa a elasticidade da receita em relao ao produto, com um valor de 1,05; CSt mostra a venda de cobre fino em toneladas mtricas pela Codelco; PFOB o preo Free on Board do cobre exportado pela Codelco; PREF o preo do cobre de longo prazo, calculado por especialistas independentes; = 2.204,62/100.000,00, fator usado para converter preo em dlares por tonelada mtrica para cents por libra. 28 O cobre constitui um dos principais itens de exportao da economia chilena, e portanto, seu preo exerce grande influncia sobre o produto. 29 (...) the more complicated the rule, the harder it is to enforce it.
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Para se ter uma idia no nvel de complexidade de uma regra similar chilena, Perry (2003)30
destaca a necessidade de que se tenha um banco de dados bem estruturado e especialistas que
se dediquem integralmente anlise para estabelecer os limites de gasto dessa regra. Para os
nveis federal e estadual tal tipo de regra factvel e possivelmente produziria bons resultados
nos pases em desenvolvimento; principalmente por meio de ganhos de credibilidade e,
conseqentemente, maior acesso aos mercados externos de crdito. Apesar do autor no
mencionar a aplicabilidade de tal regra para governos locais, acredita-se que dificilmente
daria certo, devido dificuldade na coleta de dados para todos os municpios, e a ao prprio
fato de que no cabe aos governos locais promoverem polticas anti-cclicas.
Por fim, Shah (1996), citando a experincia sua, destaca uma outra forma de conteno de
dficits e endividamento. Segundo o autor, na Sua, a responsabilidade do endividamento
de certa forma transmitida aos eleitores. Sob a condio de que no haja socorro por parte do
Governo Central nem possibilidade de transmisso do encargo da dvida s geraes futuras,
os eleitores podem decidir se o governo deve se endividar para realizar os gastos necessrios
para projetos de capital por meio de referendum popular. Dessa forma, o comportamento
oportunista de polticos coibido e o fardo do gasto excessivo internalizado pela
populao, a qual deve se preocupar mais com a disciplina fiscal.
30 O autor, no entanto, considera a regra chilena bastante simples.
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4 REVISO DA LITERATURA EMPRICA
A literatura acerca das instituies oramentrias tem dado bastante ateno questo da
hierarquizao das regras de procedimentos, s leis de oramento equilibrado e
transparncia. Alesina et al. (1999) constroem um ndice que mede esses fatores em vinte
pases latino-americanos. Para os autores, a concepo de instituies oramentrias
hierrquicas est ligada tanto existncia de regras de procedimentos hierrquicas, quanto
existncia de leis de oramento equilibrado e maior nvel de transparncia nos procedimentos.
Assim, o ndice baseou-se em um questionrio31 respondido por diretores de oramento dos
pases32, calculado para o perodo entre 1980 e 1992 e varia de 0 a 100. Um ndice maior
reflete instituies mais hierrquicas ou transparentes ou ambas. J ndices menores refletem
instituies colegiais, ou menos transparentes ou ambas.
Os autores fazem, ento, um ranking dos pases de acordo com os ndices mdios de cada pas
no perodo e dividem em trs grupos: pases com instituies oramentrias altamente
hierrquicas, pases com hierarquizao moderada e pases com instituies colegiais. Com
base nesses grupos realizam regresses tendo como varivel dependente a razo dficit/PIB,
diversas variveis de controle e dummies para pases com alta e moderada hierarquizao33.
31 As questes se referiam a diversos aspectos das instituies oramentrias de um pas. Entre eles: i) a existncia de regras de oramento equilibrado ou financiamento apropriado; ii) a necessidade de aprovao de um programa macroeconmico antes da elaborao do oramento; iii) limites de endividamento; iv) relao de poder e prerrogativas entre executivo e legislativo, e v) entre ministro da fazenda e ministro setoriais; vi) restries a realizao de emendas ao oramento por parte do congresso nacional; vii) possibilidade de alterao do oramento aps aprovao no congresso; viii) possibilidade de socorro por parte do Governo Central. 32 Denominao utilizada pelos autores para designar os dirigentes do Tesouro Nacional de cada pas. 33 Poterba (1996) ressalta a possibilidade da endogeneidade entre dficits e instituies oramentrias, que pode comprometer a anlise economtrica da eficcia das ltimas sobre o resultado fiscal. A fonte dessa endogeneidade o gosto dos eleitores por dficits. Quanto mais preferidos, menos rgidas ou menos hierrquicas sero as instituies oramentrias, que devem ser moldadas de acordo com os gostos dos eleitores. Entretanto, o autor ressalta que, a maior parte dos estados americanos analisados, apresenta pouca variao nas instituies.
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Os resultados indicam uma influncia significativa das instituies sobre os dficits dos
pases, ou seja, o grupo de pases com instituies mais hierrquicas apresentaram melhores
resultados, comprovando a teoria de que as instituies interferem nos resultados
oramentrios.
Von Hagen e Harden (1995), alm da exposio terica da questo do dficit com hiptese de
iluso fiscal sob diferentes formas de negociao do oramento, realizam uma anlise
emprica dos efeitos das instituies oramentrias sobre o resultado fiscal de doze pases
europeus. A anlise baseou-se em um ndice que leva em considerao a estrutura de
negociaes dentro do governo, as regras do processo parlamentar, a flexibilidade de
execuo do oramento e o grau de informao do esquema do oramento. O ndice maior
para instituies mais hierrquicas ou transparentes ou ambas, e menor para as mais colegiais
ou menos transparentes ou as duas coisas. A variveis dependentes analisadas foram o gasto
total, o dficit e a dvida, todas como proporo do PIB. Os resultados indicam que quanto
maior a classificao no ranking dos ndices, menores so os gastos, as dvidas e os dficits
em relao ao PIB.
Restringindo a anlise a questo das leis ou regras de oramento equilibrado, Poterba (1994)
faz uma anlise da resposta dos estados americanos a choques de dficits no perodo de 1988
a 1993 considerando o tipo de regra de oramento equilibrado vigente no estado (forte ou
fraca). Essa resposta pode se dar tanto por meio de corte nas despesas como por elevao de
impostos. Baseado no ndice de severidade das regras da ACIR (1987) que varia de 0 a 10, o
autor realiza uma estimao com base no mtodo de mnimos quadrados ponderados.
Variaes nas despesas e receitas so as variveis dependentes e os choques de dficit e a
Fatores histricos como costume ou regras que dificultam a alterao das instituies oramentrias podem torn-las praticamente imutveis, o que contribui para a idia de exogeneidade das instituies.
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interao entre choques de dficit e o grau de severidade das regras so as variveis
independentes. Os resultados indicam que o corte de gastos em resposta a choques de dficits
maior para os estados com regras fortes. No entanto, no esclarecem se as regras afetam a
resposta aos dficits por meio de elevao de impostos.
Em relao ao caso brasileiro, Nunes e Nunes (2003) realizam uma exposio do problema do
gasto alm do timo social por meio de um modelo terico de fundo comum com as hipteses
de oramento equilibrado e de endividamento. De acordo com estimaes de utilidade
baseadas no modelo, os municpios e estados brasileiros tm utilidade negativa, ou seja,
gastam alm do timo social. Segundo os autores, a importncia da LRF a de corrigir tais
distores para permitir um crescimento auto-sustentado dos entes pblicos com gastos e
dvidas compatveis (Ibid., p.15). Em seguida, realizam uma descrio dos principais pontos
da LRF e do processo oramentrio brasileiro, alm de uma anlise descritiva dos efeitos da
lei sobre os diversos indicadores de desempenho fiscal, gastos e endividamento de estados e
municpios. As evidncias para o perodo de 1999 a 2001 obtidas por meio de uma anlise
descritiva indicam melhoras nos resultados primrio e nominal, na qualidade do gasto
pblico, nas despesas com pessoal, na dvida como proporo da receita corrente lquida, nos
restos a pagar, na contratao de operaes de crdito e nas despesas com juros e servios de
terceiros de estados e municpios.
Lima (2002) faz uma reviso da literatura sobre instituies oramentrias e analisa diversas
regras de oramento equilibrado aplicadas em vrios pases. Alm disso, com base nos
critrios de classificao de regras de Inman (1996), classifica a LRF como fraca, pois basta
uma maioria simples no congresso tanto para a alterao das metas de supervit e dos limites
de endividamento quanto para a criao de despesas permanentes. Alm disso, no caso de
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descumprimento das metas de supervit previstas na LDO, as penalidades associadas so
leves. Por outro lado, as regras de procedimento oramentrio brasileiras atribuem maiores
prerrogativas ao executivo o qual tem o poder de iniciativa, o poder de veto e o poder de no
executar integralmente(Ibid., p.28). Quanto relao entre o presidente e os ministros
setoriais, o primeiro mais suscetvel a presses por gastos dos ltimos em perodos de
normalidade; em perodos de crise, o presidente atribui maiores prerrogativas ao ministro da
Fazenda34. Por ltimo, seguindo a classificao de von Hagen e Harden (1995), o autor
considera o processo oramentrio brasileiro bastante hierrquico, inclusive dentro do
Legislativo, onde h uma concentrao de poderes na figura do Relator Geral(Ibid., p.29).
Webb (2004) realiza uma anlise das leis de responsabilidade fiscal nos pases latino-
americanos, com foco sobre os governos sub-nacionais dos pases. O autor relaciona, ainda,
dois meios de se obter disciplina fiscal nos GSNs alm das leis de responsabilidade:
incentivos polticos35 e meios de reforar o controle de dficits e endividamento externos ao
processo oramentrio. Em relao aos meios de controlar dficits e endividamento dos GSNs
externos ao processo oramentrio, o autor, salienta a imposio pelo Governo Central de
controles ex-ante36 e conseqncias ex-post37 sobre tomadores e credores. Webb ressalta que
dentre os pases que adotaram LRFs do tipo top-down38 (Brasil, Peru e Colmbia), o Brasil
34 Isso no implica que o Ministro da Fazenda brasileiro no tenha uma posio forte no controle dos gastos, e sim que em perodos de normalidade so cedidos mais recursos para os ministros setoriais. 35 So mais eficazes na promoo de disciplina fiscal pases em que: i) o partido do executivo representa a maioria no legislativo; ii) h forte identidade partidria e unidade; ii) h maior poder do Governo Central de intervir e controlar os GSNs (em oposio a grande autonomia destes) e; iii) forte autoridade do governo Central (em oposio a um papel importante do legislativo, e forte influncia dos governadores sobre os legisladores); 36 Exemplos de controles ex-ante sobre tomadores (GSNs) so tetos de endividamento, metas de dficit, restrio a emprstimos externos e controle de emprstimos baseado na capacidade fiscal dos mesmos. J os controles ex-ante sobre os possveis credores seriam a impossibilidade de financiamento do Banco Central, regulao pelo Banco Central, racionamento de crdito aos GSNs e maior necessidade de capital para emprestar a entes sub-nacionais considerados arriscados. 37 Quanto s conseqncias ex-post para tomadores so exemplos, limites de financiamento do Banco Central, impossibilidade de socorro pelo Governo Central, e deduo dos servios da dvida das transferncias. Exemplos de conseqncias ex-post sobre os credores so a forte superviso do Banco Central e subscrio de capital por perdas decorrentes da dvida dos GSNs. 38 O Governo cria uma LRF para si e a impe aos GSNs.
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apresenta a lei com enforcement mais rigoroso, e no geral, os GSNs dos pases tm
apresentado resultados positivos. J dentre os pases que adotaram regras do tipo bottom-up39
(Mxico e Argentina), a Argentina apresentou resultados insatisfatrios devido aos conflitos
entre os GSNs nos ltimos anos. J o Mxico representa um exemplo de disciplina fiscal
imposta pelo mercado aos entes sub-nacionais sem sequer cogitar a imposio de uma LRF, o
Governo apenas sinaliza a capacidade fiscal dos GSNs ao mercado. O autor conclui que a
eficcia da LRF no Brasil s ser comprovada com um governo no qual a prudncia fiscal no
seja prioridade.
Barroso e Rocha (2004) realizam uma anlise emprica dos efeitos da LRF sobre a dvida
pblica dos estados brasileiros como proporo do PIB para o perodo de 1999 a 2002. Para
tanto, estimam trs especificaes de um modelo de dados em painel, a primeira com base no
mtodo de mnimos quadrados ordinrios, sem considerar