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O Pibinho se repete ano após ano André F. Z. de Azevedo Pelo terceiro ano consecutivo, a economia brasileira apresentou um desempenho decepcionante. Embora melhor do que o observado em 2012, quando se expandiu apenas 1%, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), de apenas 2,3% em 2013, confirmou aquilo que já era esperado, mais um ano de fraca expansão econômica. Nosso desempenho no ano passado, quando comparado ao dos principais países emergentes, só foi melhor do que o da Rússia e o da África do Sul, que cresceram menos de 2% (ver tabela 1). O crescimento brasileiro ficou aquém da média mundial mais uma vez, algo que vem ocorrendo sistematicamente desde 2011. Ao longo desse período, o mundo cresceu quase o dobro de nossa economia, reduzindo a nossa importância cada vez mais. Vale lembrar que, entre 2007 e 2010, o dinamismo da economia brasileira foi superior à média mundial, gerando a época uma onda de otimismo em relação ao futuro de nossa economia, que vem perdendo força desde então. Nos últimos três anos, todos os países emergentes relevantes apresentaram um crescimento mais vigoroso do que o nosso. Cada vez mais nos distanciamos do grupo dos BRICS e, junto com Índia e África do Sul, nos aproximamos dos BIITS – Brasil, Índia, Indonésia, Turquia e África do Sul, que é um

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Page 1: Cp 64o artigo pib 2013

O Pibinho se repete ano após ano

André F. Z. de Azevedo

Pelo terceiro ano consecutivo, a economia brasileira apresentou um desempenho

decepcionante. Embora melhor do que o observado em 2012, quando se expandiu apenas

1%, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), de apenas 2,3% em 2013, confirmou

aquilo que já era esperado, mais um ano de fraca expansão econômica. Nosso desempenho

no ano passado, quando comparado ao dos principais países emergentes, só foi melhor do

que o da Rússia e o da África do Sul, que cresceram menos de 2% (ver tabela 1).

O crescimento brasileiro ficou aquém da média mundial mais uma vez, algo que

vem ocorrendo sistematicamente desde 2011. Ao longo desse período, o mundo cresceu

quase o dobro de nossa economia, reduzindo a nossa importância cada vez mais. Vale

lembrar que, entre 2007 e 2010, o dinamismo da economia brasileira foi superior à média

mundial, gerando a época uma onda de otimismo em relação ao futuro de nossa economia,

que vem perdendo força desde então.

Nos últimos três anos, todos os países emergentes relevantes apresentaram um

crescimento mais vigoroso do que o nosso. Cada vez mais nos distanciamos do grupo dos

BRICS e, junto com Índia e África do Sul, nos aproximamos dos BIITS – Brasil, Índia,

Indonésia, Turquia e África do Sul, que é um acrônimo para identificar países que inspiram

temores nos investidores internacionais por apresentarem uma forte desaceleração de suas

economias. O exame do crescimento econômico desses dois grupos de países, entre 2011 e

2013, mostra o nosso país na lanterna, com uma expansão média de apenas 2% ao ano. Até

mesmo os Estados Unidos, ainda se recuperando dos efeitos da crise financeira de 2008,

cresceram mais do que o Brasil nesse período.

Embora o governo mantenha o discurso otimista em relação ao crescimento do PIB

para esse ano, novamente as chances de frustração são grandes. As previsões do mercado

apontam para uma expansão da economia inclusive inferior àquela observada no ano

passado, não devendo chegar sequer a 2%. Se o cenário externo mais inóspito do que

aquele de alguns anos atrás contribuiu para a desaceleração de nosso crescimento, a

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comparação com o desempenho de outros países mostra que as causas principais estão aqui

dentro.

Tabela 1: Brasil na lanterna dos BRICS e dos BIITS

(Crescimento do PIB, em %)

Países 2011 2012 2013Crescimento médio anual

China 9,3 7,7 7,7 8,2

Indonésia * 6,5 6,2 5,3 6,0

Turquia * 8,8 2,2 3,8 4,9

Índia * 6,3 3,2 3,8 4,4

Rússia * 4,3 3,4 1,5 3,1

África do Sul 3,5 2,5 1,9 2,6

Estados Unidos * 1,8 2,8 1,6 2,1

Brasil 2,7 1,0 2,3 2,0

Mundo 4,6 3,1 3,0 3,6Fonte: Fundo Monetário Internacional (FMI)*: Estimativas para 2013.

Está cada vez mais claro que a aposta do governo na elevação do consumo interno

chegou ao seu limite. Como se sabe, na última década, o crescimento do Brasil ocorreu a

partir da expansão da demanda e da incorporação de trabalhadores pouco qualificados ao

mercado de trabalho. Isso proporcionou uma acentuada melhoria na distribuição de renda,

mas não contribuiu para o aumento da produtividade. Desde o ano 2000, a produtividade

do trabalhador brasileiro tem crescido apenas 1% ao ano, muito abaixo do nível de outros

países emergentes. A economia conseguiu crescer mais rapidamente, mesmo com uma

baixa produtividade, porque o desemprego era elevado. Mas devido a queda contínua do

número de desempregados ao longo dos últimos anos, refletida na escassez de mão de obra

em diversos setores da economia, a estratégia de crescer adicionando mais trabalhadores

fica comprometida.

Investimentos crescem, mas ainda são muito baixos

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Se na comparação com os demais países emergentes, o Brasil não vai muito bem,

ao menos, melhoramos um pouco em relação a nós mesmos, com todos os setores da

economia apresentando em 2013 um desempenho melhor do que o do ano anterior. A

agricultura e a indústria mostraram uma recuperação no nível de atividade, com

crescimento de 7% e 1,3%, respectivamente, revertendo a queda observada em 2012 (ver

tabela 2). No setor primário, o maior destaque foi a soja, cuja produção aumentou 24,3%.

Embora a indústria tenha voltado a crescer no ano passado, é o setor que mais preocupa,

pois a sua expansão ficou mais uma vez abaixo dos demais setores. Assim, a sua

participação no PIB continua caindo, passando de 29%, em 2005, para 26,1%, em 2013,

reforçando a ideia de que o país está sofrendo um processo de desindustrialização. Já o

setor de serviços mostrou uma tênue elevação em relação ao ano anterior, com uma

expansão de 2%.

Tabela 2: Consumo cai enquanto investimentos se recuperam

(Variação % do PIB, por setor da economia)

Setores 2011 2012 2013

Agropecuária 3,9 -2,1 7,0

Indústria 1,6 -0,8 1,3

Serviços 2,7 1,9 2,0

PIB 2,7 1,0 2,3

Consumo 4,1 3,2 2,3

Gastos do Governo 1,9 3,3 1,9

Investimento 4,7 -4,0 6,3

Exportações 4,6 0,5 2,5

Importações 9,7 0,2 8,4

Ótica da Demanda

Ótica da Produção

Fonte: IBGE

A análise da evolução do PIB, através da ótica da demanda, mostra uma trajetória

de redução do ritmo de expansão do consumo, ao longo dos últimos anos, caindo para

apenas 2,3% no ano passado. Como ele é o principal componente do PIB, com uma

participação superior a 60%, esse desempenho influiu decisivamente para o

desaquecimento da economia. Os principais vilões são o maior endividamento das

famílias, que tem boa parte da renda comprometida com o consumo passado, e o impacto

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negativo da aceleração da inflação sobre a renda real dos brasileiros. Isso mostra que

mesmo com um mercado de trabalho ainda bastante aquecido, a renda disponível para

consumir não tem tido o mesmo dinamismo de alguns anos atrás.

Já o setor externo, mais uma vez, teve uma contribuição negativa para o

crescimento. Assim como tem ocorrido, na maioria dos últimos anos, as importações

(8,4%) cresceram mais do que as exportações (2,5%). As importações são fundamentais

para permitir a incorporação de novas tecnologias, aumentando a eficiência das empresas

que atuam no país, promovendo o crescimento no longo prazo. No entanto, no curto prazo,

elas substituem a produção doméstica, reduzindo o crescimento da economia.

A boa notícia foi a recuperação dos investimentos, que cresceram 6,3%, em 2013,

após o tombo observado em 2012, quando declinaram 4%. Apesar desse resultado, a sua

participação no PIB ainda é muito baixa para padrões internacionais, chegando a apenas

18,4%. Nos países emergentes, de acordo com o FMI, os investimentos alcançam 32% do

PIB, enquanto na América Latina chegam a 22% do PIB. É preciso que a taxa de

crescimento dos investimentos no Brasil continue sendo superior a do consumo para

atingirmos os patamares de nossos vizinhos latino-americanos, permitindo que a economia

volte a aumentar o seu crescimento sem pressionar a inflação.

Com mais investimentos teremos um aumento da produtividade, permitindo que o

país eleve a sua produção, sem depender tanto da incorporação de mais trabalhadores ao

processo produtivo, cada vez mais escassos. O próprio presidente do Banco Central,

Alexandre Tombini, reconheceu recentemente a importância dos investimentos produtivos

para a expansão do PIB. De acordo com ele, o consumo das famílias funcionaria como um

suporte, mas o que daria dinâmica ao crescimento seriam os investimentos. Tomara que ele

seja mais ouvido dentro do governo, tirando de cena os defensores do aumento ilimitado

do consumo.