contratos - nocoes gerais

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1 DISCIPLINA: DIREITO CIVIL III CONTRATOS PROFª.: ÚRSULA BEZERRA MÓDULO 1. CONTRATOS. NOÇÕES GERAIS. 1.1. Conceito Contrato é um negócio jurídico bilateral, um acordo de vontades, com a finalidade de produzir efeitos no âmbito do Direito. 1.2. Requisitos de validade do contrato a) comuns a todos os negócios jurídicos - agente capaz; - objeto lícito, possível e determinado, ou pelo menos determinável, como, por exemplo, a compra de uma safra futura; - forma prescrita ou não defesa em lei. b) especiais aos contratos - É o consentimento recíproco ou acordo de vontades, (consentimento recíproco) podendo ser expresso ou tácito. O consentimento tácito ocorre quando se pratica ato incompatível com o desejo de recusa. Há contratos em que a lei exige o consentimento expresso, não valendo o silêncio como aceitação. Aqui não se aplica o brocado: quem cala consente. Silêncio qualificado = exceção. Quanto a possibilidade de aceitação tácita, vejamos o disposto no Código Civil: Art. 111. “O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa”. Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa. (contrato firmado entre ausentes) Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça, dentro dele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo. (contrato de doação simples). Art. 512. Não havendo prazo estipulado para a declaração do comprador, o vendedor terá direito de intimá-lo, judicial ou extrajudicialmente, para que o faça em prazo improrrogável. (contrato de compra e venda com inclusão de cláusula a contento REQUER DECLARAÇÃO EXPRESSA) 1.3. Formação dos contratos a) Fase das Negociações preliminares ou fase da Puntuação (atos preparatórios) Os contratos começam com as negociações preliminares. Quanto maior o valor dos bens, maiores serão as negociações preliminares. Essas negociações não obrigam e não vinculam os contratantes, pois ainda não passam de especulação de valores e condições. (EM REGRA) Apresenta-se como reposta ao princípio da liberdade em celebrar-se negócios jurídicos.

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Page 1: Contratos - Nocoes Gerais

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DISCIPLINA: DIREITO CIVIL III – CONTRATOS PROFª.: ÚRSULA BEZERRA

MMÓÓDDUULLOO 11.. CCOONNTTRRAATTOOSS.. NNOOÇÇÕÕEESS GGEERRAAIISS..

1.1. Conceito

Contrato é um negócio jurídico bilateral, um acordo de vontades, com a

finalidade de produzir efeitos no âmbito do Direito.

1.2. Requisitos de validade do contrato

a) comuns a todos os negócios jurídicos

- agente capaz;

- objeto lícito, possível e determinado, ou pelo menos determinável, como,

por exemplo, a compra de uma safra futura;

- forma prescrita ou não defesa em lei.

b) especiais aos contratos

- É o consentimento recíproco ou acordo de vontades, (consentimento

recíproco) podendo ser expresso ou tácito. O consentimento tácito ocorre quando se

pratica ato incompatível com o desejo de recusa.

Há contratos em que a lei exige o consentimento expresso, não valendo o

silêncio como aceitação. Aqui não se aplica o brocado: quem cala consente. Silêncio

qualificado = exceção. Quanto a possibilidade de aceitação tácita, vejamos o disposto no Código Civil: Art. 111. “O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa”. Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa. (contrato firmado entre ausentes) Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça, dentro dele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo. (contrato de doação simples). Art. 512. Não havendo prazo estipulado para a declaração do comprador, o vendedor terá direito de intimá-lo, judicial ou extrajudicialmente, para que o faça em prazo improrrogável. (contrato de compra e venda com inclusão de cláusula a contento – REQUER DECLARAÇÃO EXPRESSA)

1.3. Formação dos contratos

a) Fase das Negociações preliminares ou fase da Puntuação (atos

preparatórios)

Os contratos começam com as negociações preliminares. Quanto maior o valor

dos bens, maiores serão as negociações preliminares. Essas negociações não obrigam

e não vinculam os contratantes, pois ainda não passam de especulação de

valores e condições. (EM REGRA)

Apresenta-se como reposta ao princípio da liberdade em celebrar-se negócios

jurídicos.

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A não contratação é um direito desde que esta recusa seja firmada dentro dos

limites da boa-fé objetiva e não viole a confiança alheia.

Tem que se observar se não foi criada uma legítima expectativa de

contratar (indícios), sob pena de responder civilmente com fulcro no disposto no

art. 186 do Código Civil c/c 927.

Assim quando as partes não passaram desta fase, eventual recusa de formação

do contrato não gera inadimplemento contratual, mas excepcionalmente poderá gerar a

responsabilidade civil por eventual dano.

b) Proposta, policitação ou oblação

b.1. Proposta séria e consistente, vinculação

É possível que, após essa fase, surja de um dos contratantes, uma proposta, a

qual vinculará o proponente, desde que séria e consistente. Essa proposta também é

chamada policitação ou oblação. Quem faz a proposta deve sustentá-la. Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, (PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO OU DA OBRIGATORIEDADE) se o contrário não resultar dos termos dela (CLÁUSULA DE DIREITO DE RETRATAÇÃO), da natureza do negócio (EX. PROPOSTA ABERTA AO PÚBLICO QUE SE CONSIDERA LIMITADE AO ESTOQUE EXISTENTE, OU PROMOÇÕES DE RADIODIFUSÃO) ou das circunstâncias do caso.(DISCRICIONARIEDADE PELO JUIZ). E existiria um caso de não obrigatoriedade que seria: O DECURSO DO LAPSO TEMPORAL PARA ACEITAÇÃO (art. 428 I CC)

b.2. O Código Civil faz distinção entre proposta feita a pessoa presente e

proposta feita a pessoa ausente.

A grande diferença é que nas hipóteses de proposta entre presentes exigi-se o

contato direito ou simultâneo, enquanto que entre ausente não.

Se a proposta é feita a uma pessoa presente e contém prazo de validade, esse

deve ser obedecido; se não contém prazo, a proposta deve ser aceita de imediato. É o

famoso “pegar ou largar”.

Se a proposta é feita à pessoa ausente, por carta ou mensagem, com prazo

para resposta, esta deverá ser expedida no prazo estipulado. Se a proposta não fixar

prazo para resposta, o Código Civil dispõe que deve ser mantida por tempo razoável

(que varia de acordo com o caso concreto). Núncio é o nome que se dá ao mensageiro.

A proposta feita por telefone é considerada "entre presentes". A proposta feita

por intermédio de salas de bate-papo é considerada pela maior parte da doutrina como

“entre presentes”, e a firmada por e-mail é considerada como "entre ausentes -

presentes".

A proposta ainda não é o contrato: este só estará aperfeiçoado quando houver a

aceitação. Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta: I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado; IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.

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Art. 429. A oferta ao público equivale a proposta quando encerra os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou dos usos. (ex. costume de anunciar na cidade produtos em alta voz como forma de atrair cliente, sendo a proposta definitiva firmada ao vivo) Parágrafo único. Pode revogar-se a oferta pela mesma via de sua divulgação, desde que ressalvada esta faculdade na oferta realizada

c) Aceitação (QUEM ACEITA = OBLATO OU ACEITANTE)

c.1. Características do aceite

A aceitação é a concordância com os termos da proposta, que deve ser pura e

simples.

c.1. Contra-proposta Art. 431. A aceitação fora do prazo, com adições, restrições, ou modificações, importará nova proposta. c.3. Princípio da eticidade. Obrigatoriedade de avisar caso não chegue a resposta quando entre ausentes. Art. 430. Se a aceitação, por circunstância imprevista, chegar tarde ao conhecimento do proponente, este comunicá-lo-á imediatamente ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos.

c.4. Momento do aceite. Nascimento do contrato. Expresso ou tácito.

Aceite tácito. Confusões quanto ao momento do nascimento do contrato.

Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação

expressa,(QNT NÃO É USUAL A ACEITAÇÃO, EX. INDUSTRIAL. CREDOR

QUE NÃO QUIZER MAIS A MERCADORIA TEM QUE AVISAR) ou o

proponente a tiver dispensado, (EXEMPLO HOTÉIS/ RESERVA) reputar-se-á

concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa. Teorias

Teoria da Expedição

A proposta "entre ausentes" pode ser feita por carta ou telegrama,

aperfeiçoando-se o contrato quando da expedição daqueles. Caput. Art. 434 CC. Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto: I - no caso do artigo antecedente; II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta; III - se ela não chegar no prazo convencionado.

Teoria da recepção – está é a teoria aceita na prática. Segundo a qual

considera-se o momento do aceite aquele em que a resposta é recebida, isto porque,

enquanto não recebida poderá haver arrependimento, conforme disposto no artigo 433. Art. 433. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante.

Teoria da declaração – qnd o proponente não requer o conhecimento.

Teoria da cognição – qnd o proponente lê a resposta.

Obs. No CDC, art. 35. Permite-se que requeira-se a execução específica.

1.3. Do lugar da Celebração

Artigo 435 do CC. Lugar da proposta. Art. 435. Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto.

Dúvida. Qnt firmada via internet. Endereço lógico. Virtual.

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1.4. Interpretação dos contratos = necessidade de estabelecer o significado e o

alcance de uma regra positivada, constatar a situação real prevista e os seus efeitos.

a) Divergências entre vontade e declaração

Regra subjetiva- art. 112 CC visa a proteção do hipossuficiente na relação

contratual. Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.

Deve-se buscar a compreensão adequada do que aparenta ser a vontade dos

sujeitos contratantes, ainda que isso não transpareça da literalidade do escrito.

b) Princípio da boa-fé e os usos do lugar da celebração

Regra objetiva – art. 113 - Regra de ouro.

Interpretar levando em consideração não apenas o escrito, mas também as

negociações que levaram à celebração do contrato, as tratativas preliminares e o

comportamento mantido pelas partes, antes, durante e depois de celebrado o negócio

jurídico. Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

Enunciados Jornada de Direito Civil STJ

26 - Art. 422: a cláusula geral contida no art. 422 do novo Código Civil impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como a exigência de comportamento leal dos contratantes. 27 - Art. 422: na interpretação da cláusula geral da boa-fé, deve-se levar em conta o sistema do Código Civil e as conexões sistemáticas com outros estatutos normativos e fatores metajurídicos. c) Interpretação dos contratos benéficos

Regra objetiva – art. 114 Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.

d) Interpretação das cláusulas ambíguas e contraditórias

Para a manutenção do equilíbrio contratual, nos contratos de adesão as

cláusulas contratuais devem ser interpretadas da forma mais favorável ao

aderente.

e) Interpretação integrativa

Feita a partir da vontade presumida ou tendencial das partes e não o critério da

vontade real. Deve limitar-se a incidir sobre pontos omissos, mas limita-se aos

requisitos acessórios que não interfiram no valor econômico do contrato.

Obs. Contratos de Adesão. Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente. Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio. (princípio da função social e da boa-fé objetiva)

Ex. se houverem clausulas impressa e outras acrescidas ao formulário deverão

prevalecer estas.

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A intervenção do juiz deverá ser moderada. Boa-fé e não deverá atuar com abuso de

direito em face da limitação da liberdade de contratar.

Obs. relações de consumo. Art. 47 CDC. Interpretação favorável não apenas nos

contratos de adesão.

Caso concreto (2)

Abelardo obrigou-se, como fiador, em contrato de locação de imóvel para fins

residenciais. Ficou estabelecido, em cláusula expressa, que responderia pelos futuros

reajustamentos. Após o termo final pactuado no contrato, locador e locatário, prorrogam-

no, fixando aumento do aluguel. Tempos depois, o valor é novamente ajustado, em ação

revisional, na qual as partes chegaram a novo acordo, também sem a participação do

fiador. Estando o locatário em mora, o locador ajuíza ação de cobrança em face do fiador.

Pergunta-se:

1) A cláusula por meio da qual o fiador se obrigou pelos futuros reajustes no valor da

locação deixa espaço para interpretação dúbia. Terá ele se obrigado pelo valor de qualquer

reajuste, seja este feito entre as partes contratantes ou tão-somente pelos reajustes

previstos em lei? Justifique qual seria a melhor interpretação e qual o fundamento legal.

2)Está o fiador obrigado a pagar pelos reajustes mencionados na questão? Justifique.

Sugestão de gabarito

1)Todo contrato, assim como todo e qualquer negócio jurídico, deve ser interpretado antes de

ser executado. De fato, a cláusula, da forma redigida, deixa espaço para conflitos futuros,

devendo ser interpretada levando-se em conta as regras de hermenêutica contratual.

Considerando a natureza jurídica do contrato de fiança, que é a de negócio jurídico gratuito,

liberal, deve ser aplicada a regra do art. 114 do C.C., pela qual os negócios jurídicos benéficos

interpretam-se estritamente, o que nos leva à conclusão de que Abelardo teria se obrigado

apenas pelos reajustes previstos em lei.

2)De acordo com o raciocínio desenvolvido na pergunta anterior, Abelardo só precisaria

responder pelos reajustes previstos em lei ou no contrato, não se obrigando aos reajustes feitos

pelas partes se não houver prova de que os conhecia e/ou com eles anuiu.

Enunciado Nº. 134 TJ/RJ - “Nos contratos de locação responde o fiador pelas obrigações

futuras após a prorrogação do contrato por prazo indeterminado se assim o anuiu

expressamente e não se exonerou na forma da lei”.