conto de escola

17
A escola era na rua do Costa. Uma segunda feira estava em dúvida de onde eu iria, percebi que era melhor ir à escola.

Upload: projeto-vida

Post on 05-Apr-2016

216 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

 

TRANSCRIPT

Page 1: Conto de escola

A escola era na rua do Costa. Uma segunda feira estava em dúvida de onde eu iria, percebi que era melhor ir à escola.

Page 2: Conto de escola

Semana passada já tinha matado duas aulas, quando meus pais descobriram....

Que

Menino vadio! Você tem que ter uma grande posição comercial, me dá ânsia ver você com elementos mercantis!

Falava isso em quanto me dava uma sova, por isso hoje me levou à escola.

Page 3: Conto de escola

Cheguei na sala antes do mestre, chamava-se Policarpo e tinha uns 50 anos. Tudo estava em ordem, começaram os trabalhos. Policarpo era muito rígido com seu filho, Raimundo, que tinha inteligência tarda, muito mole e com medo do pai.

Pilar, preciso falar com você.

O que você quer?

Logo te falo!

Page 4: Conto de escola

Começou a lição de escrita, como eu era um dos mais adiantados da escola, acabava sempre antes de todos, naquele dia não foi diferente, esperei os outros para entregar.

Page 5: Conto de escola

Raimundo estava pálido Estava muito curioso. Curvelo estava atento, esse Curvelo era um pouco levado ao diabo, era mais velho. Continuei inquieto. Ele olhou para o pai, e depois aos meninos, um desses, Curvelo, olhava para ele, desconfiado. O mestre fitava-nos, como era mais severo com o filho, buscava-o muitas vezes com os olhos, para trazê-lo mais aperreado. Fui um bobo em vir.

Não diga isso! Preciso de um favor!

O que foi?

É uma coisa em particular... Espere!

Me fala agora!

Papai está olhando!

Page 6: Conto de escola

Depois de algum tempo, Raimundo meteu a mão no bolso e olhou pra mim. Tirou uma moeda do tempo do rei, cuido que doze vinténs ou dois tostões. Raimundo revolveu em mim o olhar pálido;

Sabe o que eu tenho aqui?

O quê?

Uma pratinha que a mamãe me deu. Quer ela para você?

Mas então você fica sem ela?

Depois mamâe me arranja outra, mas você quer esta?

Page 7: Conto de escola

Vou lhe propor um negócio, uma troca de serviços, eu te dou a moeda e você me explica a lição de sintaxe, eu não consegui reter nada do livro, e estou com medo do meu pai.

Não que não fosse fácil empregar uma ou outra mentira de criança. A novidade estava nos termos da proposta, na troca de lição e dinheiro

Page 8: Conto de escola

Não queria recebê-la, e custava-me recusá-la. Curvelo nos observava, olhei para ele novamente e não vi mais nada. Então cobrei ânimo

Dê cá....

Page 9: Conto de escola

Ele me deu a pratinha, sorrateiramente, eu meti-a na algibeira das calças com um alvoroço que não posso definir.

Page 10: Conto de escola

Olhei para o Curvelo e estremeci, tinha os olhos em nós, com um riso que me pareceu mau. me pareceu inquieto.A aula não acabava nunca... Imaginei-me com a pratinha no bolso, que guardá-la-ia quando chegasse em casa, dizendo à mamãe que tinha achado na rua.

Page 11: Conto de escola

O mestre nos chamou para a mesa dele... Depois o mestre pegou a palmatória. Estendi-lhe as mãos e recebi 12 bolos. O mesmo com Raimundo. Na sala arquejava o terror, até o Curvelo se curvava, cá dentro de mim jurava quebrar-lhe a cara, na rua, logo que saíssemos, tão certo como três e dois serem cinco.

Então o senhor recebe dinheiro dos outros para ensinar as lições dos outros? Me dê a moeda que Raimundo te deu! Saibam que estão castigados!

Perdão, mestre.

Sem-vergonhas! Desaforados! Se repetirem este negócio irão apanhar de tal castigo que irão lembrar pra todo sempre! Porcalhões! Tratantes! Faltos de brio!

Page 12: Conto de escola

Trocava olhares com Curvelo, e penso que empalideceu. Compôs-se e entrou a ler em voz alta; estava com medo. Começou a variar de atitude, agitando-se à toa, coçando os joelhos, o nariz.

Tu me pagas! Tão duro como osso!

Page 13: Conto de escola

O que houve com as suas mãos?

Eu errei a lição.

Page 14: Conto de escola

Dormi essa noite, mandando ao diabo os dois meninos, tanto Raimundo como Curvelo, e sonhei com a moeda, sonhei que no dia seguinte eu dera com ela na rua, e apanhara, sem medo nem escrúpulos...

Page 15: Conto de escola

De manhã, acordei cedo com a ideia de ir procurar a moeda e me vesti depressa. Saí de casa, como se fosse trepar ao trono de Jerusalém, apressei o passo para ser o primeiro a chegar.

Page 16: Conto de escola

Na rua encontrei uma tropa de fuzileiros. Então decidi acompanha-los e não ir à escola.

Page 17: Conto de escola

Depois acabei a manhã no Parque, voltei para casa sem a pratinha no bolso e sem ressentimento na alma. E, contudo, a pratinha era bonita e foram eles, Raimundo e Curvelo, que me deram o primeiro conhecimento, um da corrupção, outro da delação;