contexto histórico filosófico da educação

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2017 Prof. Graciela Márcia Fochi Prof. Thiago Rodrigo da Silva CONTEXTO HISTÓRICO- FILOSÓFICO DA EDUCAÇÃO

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Page 1: Contexto HistóriCo FilosóFiCo da eduCação

2017

Prof. Graciela Márcia FochiProf. Thiago Rodrigo da Silva

Contexto HistóriCo-FilosóFiCo da eduCação

Page 2: Contexto HistóriCo FilosóFiCo da eduCação

Copyright © UNIASSELVI 2017

Elaboração:

Prof. Graciela Márcia Fochi

Prof. Thiago Rodrigo da Silva

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

370.1F652c Fochi; Graciela Márcia Contexto histórico-filosófico da educação / Graciela Márcia

Fochi; Thiago Rodrigo da Silva: UNIASSELVI, 2017.

225 p. : il. ISBN 978-85-515-0056-9

1.Educação - Filosofia. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

Impresso por:

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III

Apresentação

Prezado acadêmico!

Com grande satisfação apresentamos mais um caderno, que com zelo preparamos para que ele possa lhe ser referência e fonte de consulta na jornada de estudos que aqui se inicia. Trata-se do Caderno de Estudos da disciplina de Contexto Histórico-filosófico da Educação. Com isto, compreendemos que o papel social de educar e aprender apresenta diferentes características e que sofre alterações conforme o contexto histórico, filosófico, político e social de cada sociedade com que se está lidando.

Na primeira unidade de estudos, leremos sobre o desenvolvimento das práticas educativas em contextos sociais distintas das nossas, mas que ao mesmo tempo, possuem uma relação primordial com o ensino ministrado e aprendido no presente, pois estudaremos a educação da invenção da escrita até o surgimento das universidades. A importância da temática é quase “autoexplicativa”, pois, estamos num contexto de ensino superior e temos consciência da importância da escrita para o desenvolvimento do intelecto humano, do registro escrito à transmissão dos conhecimentos.

Porém, como parte intrínseca das organizações sociais, mesmo em culturas humanas sem escrita (as sociedades ágrafas), existem práticas educativas que foram e são fundamentais para a manutenção, unidade e renovação de inúmeros grupos tribais. Enfatizaremos também como a filosofia grega e o pensamento cristão medieval motivaram o desenvolvimento de pedagogias inovadoras.

Na Unidade 2 do Caderno de Estudos, contemplaremos um segundo

momento da história da educação no ocidente, no qual tivemos um aumento da preocupação das sociedades com o ato de ler, escrever e realizar as quatro operações matemáticas básicas (somar, subtrair, dividir e multiplicar). Tal preocupação das sociedades possui motivações religiosas, como a leitura da bíblia para os protestantes, assim como motivações econômicas, nas quais podemos pensar nos exemplos dos contratos comerciais e políticos realizados na época das grandes navegações ibéricas e as aferições dos lucros durante a época da Revolução Industrial.

Neste mundo que se transformou de majoritariamente agrário para amplamente urbanizado, artesanal para industrial, sagrado a laico, de religioso a científico, tivemos uma grande quantidade de pensadores que buscaram formas criativas e humanistas de educar a juventude, começando por Comênio, passando por Froebel, Jean Piaget e outros pedagogos.

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IV

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

Por fim, na terceira unidade de estudos, abordaremos questões relativas à educação no Brasil. Faremos uma digressão histórica, que se inicia ainda nos tempos do Brasil Colonial e a educação dos padres jesuítas, passando pela formação de instituições educacionais ao longo do Brasil Imperial (Colégio D. Pedro II, Faculdades de Medicina, Engenharia e Direito), chegando até a República, que teve como um dos seus principais marcos a criação de universidades e o Manifesto dos Pioneiros da Nova Educação de 1932.

Em relação aos pensadores que refletiram e buscaram abrir novos caminhos para aumentar a qualidade da educação nacional, conheceremos um pouco da vida e do pensamento de homens como Anísio Teixeira, Paulo Freire e Rubem Alves.

No desejo de uma ótima jornada de estudos, um abraço afetuoso dos conteudistas.

Graciela Márcia Fochi Thiago Rodrigo da Silva

UNI

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V

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

UNI

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VII

Sumário

UNIDADE 1 – DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES .... 1

TÓPICO 1 – A EDUCAÇÃO NAS SOCIEDADES ÁGRAFAS E O SURGIMENTO DA ESCRITA NA ANTIGUIDADE ............................................................................................................ 31 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 32 AS SOCIEDADES ÁGRAFAS ........................................................................................................... 33 A EDUCAÇÃO NAS SOCIEDADES ÁGRAFAS .......................................................................... 9 3.1 O PAPEL EDUCACIONAL DO CHEFE TRIBAL ...................................................................... 11 3.2 O PAPEL EDUCACIONAL DAS MÃES E DOS PAIS ............................................................... 12 3.3 O PAPEL EDUCACIONAL DO XAMÃ ...................................................................................... 12 3.4 O PAPEL EDUCACIONAL DOS HOMENS MAIS VELHOS .................................................. 12 3.5 AS VISÕES SOBRE A INFÂNCIA NAS SOCIEDADES TRIBAIS ........................................... 124 AS SOCIEDADES DO ANTIGO ORIENTE .................................................................................. 135 AS SOCIEDADES DO ANTIGO ORIENTE PRÓXIMO, AS INSTITUIÇÕES E O PENSAMENTO EDUCACIONAL ....................................................................................................... 18RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 21AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 22

TÓPICO 2 – O MUNDO GRECO-ROMANO: UMA DAS BASES EDUCACIONAIS DA SOCIEDADE OCIDENTAL .................................................................................................................. 231 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 232 O PROCESSO DE FORMAÇÃO HISTÓRICA DA SOCIEDADE GRECO-ROMANA ........ 233 A FILOSOFIA GREGA E O PENSAMENTO ROMANO ............................................................ 304 A EDUCAÇÃO NA ANTIGUIDADE CLÁSSICA: A CRIAÇÃO DE INSTITUIÇÕES ......... 34RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 37AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 38

TÓPICO 3 – IDADE MÉDIA: A PATRÍSTICA, A ESCOLÁSTICA E O NOMINALISMO ..... 391 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 392 O MUNDO BIZANTINO ................................................................................................................... 403 O MUNDO ÁRABE MUÇULMANO ............................................................................................... 434 A EDUCAÇÃO NA IDADE MÉDIA OCIDENTAL ...................................................................... 45 4.1 A CAVALARIA ................................................................................................................................ 47 4.2 PRECEPTORIA: A EDUCAÇÃO DA NOBREZA NA IDADE MÉDIA E NA IDADE MODERNA ...................................................................................................................................... 47 4.3 A PATRÍSTICA ................................................................................................................................ 48 4.4 A REFORMA EDUCACIONAL CAROLÍNGIA ........................................................................ 50 4.5 OS MOSTEIROS E A EDUCAÇÃO MEDIEVAL: O MOVIMENTO CENOBITA E AS ORDENS MENDICANTES ............................................................................................................ 51 4.6 OS MONGES COPISTAS ............................................................................................................... 52 4.7 A ESCOLÁSTICA ............................................................................................................................ 53 4.8 O NOMINALISMO ......................................................................................................................... 54 4.9 A FORMAÇÃO DAS CIDADES E AS CORPORAÇÕES DE OFÍCIO ..................................... 54 4.10 AS UNIVERSIDADES .................................................................................................................. 55

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LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 57RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 63AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 64

UNIDADE 2 – ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO .................................................................................................. 65

TÓPICO 1 – O DECLÍNIO DO PENSAMENTO CRISTÃO E O FORTALECIMENTO DO HUMANISMO MODERNO ................................................................................................................. 671 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 672 O IMPACTO DAS GRANDES NAVEGAÇÕES E DA PRENSA DE GUTTEMBERG NO CENÁRIO EDUCACIONAL, POLÍTICO E SOCIAL ...................................................................... 693 ELEMENTOS DO CONTEXTO FILOSÓFICO E CIENTÍFICO DA RENASCENÇA ............ 72 3.1 AS UNIVERSIDADES, AS CORPORAÇÕES DE OFÍCIO, AS GRAMÁTICAS E O DECLÍNIO DO LATIM ....................................................................................................................................... 74 3.2 IMPLICAÇÕES DA REFORMA PROTESTANTE E DA CONTRARREFORMA NO CAMPO RELIGIOSO E EDUCACIONAL .................................................................................. 764 PRINCÍPIOS CIENTÍFICOS E FILOSÓFICOS DA ÉPOCA MODERNA ............................... 82 4.1 ELEMENTOS DO CONTEXTO EDUCACIONAL MODERNO: A EDUCAÇÃO REALISTA DO SÉCULO XVII ....................................................................................................... 88 4.2 OS MANUAIS DE ETIQUETA E DE BONS COSTUMES ......................................................... 92LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 93RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 99AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 100

TÓPICO 2 – A FORMAÇÃO DO SISTEMA LAICO DE ENSINO NO OCIDENTE CONTEMPORÂNEO ............................................................................................................................. 1011 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 1012 A SUPERAÇÃO DO ANTIGO REGIME E DO SISTEMA COLONIAL E AS IMPLICAÇÕES NA EDUCAÇÃO ....................................................................................................... 1013 OS PRINCIPAIS INTELECTUAIS E O PENSAMENTO DOS EDUCADORES LEIGOS .... 1034 O EXEMPLO DE HEGEL .................................................................................................................... 1065 O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO DE DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS E DISCIPLINAS AUXILIARES ............................................................................................................... 107 5.1 SOCIOLOGIA: A CIÊNCIA DA SOCIEDADE ........................................................................... 108 5.2 A PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO ............................................................................................... 115 5.3 O IMPASSES DO PROCESSO DE LAICIZAÇÃO E DA RACIONALIZAÇÃO .................... 116 5.3.1. O MOVIMENTO DO ROMANTISMO .............................................................................. 116 5.3.2 O exemplo de Friedrich Nietzsche ....................................................................................... 117 5.4 TRANSFORMAÇÕES DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL NO CONTEXTO EDUCACIONAL ............................................................................................................................. 118 5.5 OS IMPACTOS DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL NO ENSINO SUPERIOR ....................... 121 5.6 A EDUCAÇÃO NOS PAÍSES AUTORITÁRIOS: O COMUNISMO E O NAZI- FASCISMO ....................................................................................................................................... 121 5.7 O EXEMPLO DA ESCOLA DE FRANKFURT ............................................................................ 123 5.8 O EXEMPLO DA TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO ..................................................................... 123LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 124RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 127AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 128

TÓPICO 3 – CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL CONTEMPORÂNEO ............................................................................................................................. 1291 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 129

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IX

2 A FILOSOFIA NO CONTEXTO EDUCACIONAL CONTEMPORÂNEO .............................. 1303 O CONTEXTO EDUCIONAL EM TEMPOS DE GLOBALIZAÇÃO: DO CÓDEX À TELA ...... 1314 IMPLICAÇÕES DA PÓS-MODERNIDADE NO CONTEXTO EDUCACIONAL ................. 133LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 138RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 141AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 142

UNIDADE 3 – O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA ............................................................................................................................................ 143

TÓPICO 1 – CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO DA EDUCAÇÃO NO PERÍODO COLONIAL E IMPERIAL ..................................................................................................................... 1451 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 1452 O EXEMPLO DE PORTUGAL .......................................................................................................... 1463 FUNDAMENTOS DO MODELO E MÉTODO JESUÍTICO DE ENSINO ............................... 1504 FUNDAMENTOS HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO NA ÉPOCA IMPERIAL ................................................................................................................................................ 153RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 160AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 161

TÓPICO 2 – CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL NOS PRIMEIROS ANOS DA REPÚBLICA ........................................................................................................................ 1631 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 1632 ELEMENTOS EDUCACIONAIS DO BRASIL IMPÉRIO ........................................................... 164 2.1 DIRETRIZES DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA APÓS OS ANOS DE 1930 .............................. 169 2.2 O LEGADO DE ANÍSIO TEIXEIRA: O DEFENSOR DA ESCOLA NOVA NO BRASIL ..... 175RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 178AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 179

TÓPICO 3 – CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX ................................................................................................................... 1811 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 1812 A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL – LDB ................................ 1813 ORGÃOS E INSTITUIÇÕES DE ENSINO NO BRASIL: O ENSINO MILITAR ................... 1844 EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA ......................................................................................... 186 4.1 MARGINALIZADOS E DESVALIDOS TUTELADOS PELO ESTADO .................................. 188 4.2 O ENSINO TÉCNICO NO BRASIL .............................................................................................. 1885 FUNDAMENTOS DIDÁTICO-PEDAGÓGICOS E FILOSÓFICOS PRESENTES NOS PCN ............................................................................................................................................................ 191 5.1 HISTÓRIA DA ÁFRICA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA: A LEI Nº 10.639, DE 2003 ..... 194 5.2 AS POSSIBILIDADES DOS ESPAÇOS NÃO ESCOLARES ...................................................... 1956 PRINCIPAIS PENSADORES DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA DO SÉCULO XX .................. 196 6.1 PAULO FREIRE (1921- 1997) ......................................................................................................... 196 6.2 RUBEM ALVES (1933-2014) ........................................................................................................... 200 6.3 DERMEVAL SAVIANI (1943) ........................................................................................................ 201 6.4 JOSÉ CARLOS LIBÂNEO (1945) .................................................................................................. 2027 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................. 203LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 205RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 210AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 211REFERÊNCIAS ........................................................................................................................................ 213ANOTAÇÕES .......................................................................................................................................... 232

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UNIDADE 1

DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir desta unidade, você será capaz de:

• ter elementos para a compreensão do processo de formação da educação nas sociedades sem escrita.

• relacionar a tradição greco-romana como uma das raízes da educação oci-dental.

• compreender o processo de formação do sistema ocidental cristão de edu-cação.

• avaliar diferentes formas de educação antes da invenção da imprensa.

Esta unidade está dividida em três tópicos, para facilitar a compreensão das temáticas abordadas. Ao final de cada tópico existem atividades que facilitarão a compreensão dos temas históricos abordados.

TÓPICO 1 - A EDUCAÇÃO NAS SOCIEDADES ÁGRAFAS E O SURGIMENTO DA ESCRITA NA ANTIGUIDADE

TÓPICO 2 - O MUNDO GRECO-ROMANO: UMA DAS BASES EDUCACIONAIS DA SOCIEDADE OCIDENTAL

TÓPICO 3 - IDADE MÉDIA: PATRÍSTICA, ESCOLÁSTICA E NOMINALISMO

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TÓPICO 1UNIDADE 1

A EDUCAÇÃO NAS SOCIEDADES ÁGRAFAS

E O SURGIMENTO DA ESCRITA NA

ANTIGUIDADE

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico entraremos em contato com a formação dos primeiros tipos de modelos educacionais surgidos na humanidade. A educação tribal pode ser denominada também como educação difusa, pois nela não está presente a figura da instituição escolar. Também analisaremos a presença da educação e o seu desenvolvimento nas primeiras sociedades letradas da história humana, como os mesopotâmicos, egípcios, hebreus, fenícios e persas. Seguindo a cronologia, iniciaremos nossa narrativa contemplando a presença da educação nas sociedades ágrafas.

2 AS SOCIEDADES ÁGRAFAS

Podemos compreender por sociedades ágrafas as comunidades humanas que não possuem formas de escrita. Em geral, uma visão linear da história classifica que o homem “entra na história” deixando a pré-história após o desenvolvimento da capacidade de escrita. Porém, não temos como, em pleno século XXI, continuar a reproduzir uma visão tão estreita das sociedades humanas, pois até na atualidade existem grupos humanos, com formas de organização social complexas, que não possuem a escrita como forma de mediação de conhecimento e memória.

Assim, neste primeiro tópico vamos contemplar um pouco das sociedades ágrafas. Não é pela ausência da escrita que as sociedades teriam uma ausência de funções sociais, além de uma preocupação educacional constante por parte das lideranças grupais. Em geral, as sociedades ágrafas são estudadas por diferentes profissionais das ciências humanas e naturais. Quando se trata do estudo das sociedades sem escrita que já desapareceram há milhares de anos, seu estudo fica a cargo de arqueólogos. Quando se trata do estudo de sociedades contemporâneas, seu estudo fica a cargo dos antropólogos e, por vezes, sociólogos e historiadores.

Os arqueólogos são profissionais que estudam os vestígios fósseis de civilizações pré-históricas, ou de civilizações perdidas há milhares de anos. Portanto, seu trabalho se realiza nos denominados sítios arqueológicos, nos quais

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

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são encontrados os restos de cultura material de alguma civilização pretérita (BRAIDWOOD, 1988). Os paleontólogos estudam os fósseis da vida na Terra, não obrigatoriamente vinculados aos seres humanos. O seu método analítico é plural, devido aos diferentes tipos de fósseis que o paleontólogo analisa: de animais invertebrados, de vertebrados, de plantas, entre outras possibilidades de vida humana fossilizada.

Os antropólogos, por sua vez, utilizam uma metodologia de trabalho completamente diferente dos arqueólogos e paleontólogos. Os antropólogos em geral realizam o denominado trabalho de campo. Isto é, passam meses em uma tribo, buscando compreender sua língua e seu modo de funcionamento, anotando suas observações em um diário de campo. Posteriormente, realizam o relato etnográfico, no qual apontam as características da população por eles analisada.

Em grande parte, é com base nos diferentes dados disponibilizados pelos antropólogos, arqueólogos, paleontólogos e demais profissionais das ciências humanas, que iremos realizar a caracterização das sociedades ágrafas na presente unidade deste caderno de estudos. Um primeiro e importante dado a pensar é que, mesmo estando vivendo em um período da história do mundo no qual temos acesso a diversos mecanismos tecnológicos para a comunicação entre as pessoas, passando pela televisão e o rádio, chegando aos computadores e telefones celulares, hoje, no momento em que estamos lendo este texto, existem milhares de pessoas vivendo em formas de organização social na qual não existem estas mediações tecnológicas, e a vida segue em um contato direto com a natureza. Estas populações, em geral, não possuem escrita formal. Assim, contemplaremos algumas destas sociedades.

As sociedades ágrafas mais próximas aos brasileiros são as comunidades indígenas. O termo índio provém do eurocentrismo dos primeiros navegadores europeus que atingiram as costas litorâneas do continente americano e denominaram os nativos índios por acreditarem estar pisando nas Índias, isto é, na Ásia. As sociedades indígenas têm uma tradição secular na América. Em geral, se acredita terem os nativos americanos migrado da Ásia, atravessando o Estreito de Bering, no extremo norte do continente. Assim como entre os europeus ocidentais, que têm sua divisão cultural marcada pela origem dos idiomas (latino, eslavo, saxão, escandinavos), os indígenas da América também são classificados conforme a sua diferente forma de fala. Quatro são os principais troncos linguísticos dos indígenas americanos: Tupi-guarani, Arauaque, Jê e Caribe. Isto é, estes quatro troncos linguísticos apontam que vários grupos têm uma matriz cultural comum, que ganhou maior variedade devido ao processo de migração pelo continente (OLIVEIRA; FREIRE, 2006).

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TÓPICO 1 | A EDUCAÇÃO NAS SOCIEDADES ÁGRAFAS E O SURGIMENTO DA ESCRITA NA ANTIGUIDADE

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FIGURA 1- MENINA INDÍGENA

Uma visão estereotipada dos indígenas aponta como menos desenvolvidos, andando nus pelas matas, realizando o canibalismo e vivendo em poligamia, isto é, um homem tendo várias esposas. Tal visão estereotipada é reforçada pelos manuais didáticos de história, pois estes apresentam apenas os indígenas de 500 anos passados, quando da vinda dos europeus para a América. Todavia, deveríamos ter uma relação e visão completamente diferentes das tribos existentes na atualidade. Se nos últimos 500 anos o homem branco mudou de forma radical, os indígenas também mudaram.

Até mesmo considerar as tribos indígenas como pertencentes a sociedades sem escrita pode ser considerado uma visão estereotipada. Desde o século XVI, parte das línguas nativas passou a ter alguma forma de escrita. No atual momento da história brasileira, temos alguns indígenas alcançando os graus universitários, sendo também comum a presença de alfabetizadores dentre as principais tribos brasileiras. Todavia, apenas por força da tradição, mantivemos os indígenas brasileiros como exemplos de sociedades ágrafas.

Um dos principais estudiosos da presença indígena na sociedade brasileira foi o antropólogo Darcy Ribeiro. Em relação às suas obras, é interessante ler alguns de seus livros, como Os Índios e a Civilização, assim como O Povo Brasileiro e O Processo Civilizatório.

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FONTE: Disponível em: <www.amazonia.org.br>. Acesso em: 15 ago. 2016.

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

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Não apenas as tribos indígenas presentes no Brasil e nos demais países americanos são exemplos de sociedades sem escrita (com as ressalvas realizadas no parágrafo anterior). Na África e na Ásia ainda encontramos algumas formações culturais que não precisaram do desenvolvimento da escrita. Podemos citar os aborígines australianos, as populações isoladas das ilhas do Oceano Pacífico, assim como algumas tribos africanas, com destaque para os povos pigmeus.

Em geral, denominam-se aborígines os nativos da Austrália, local em que grande parte das tribos sofreu com o processo de colonização empreendido pelos ingleses, assim como o preconceito racial marcou a vida de muitos destes nativos da Oceania durante grande parte da presença europeia na Austrália. Na atualidade, o governo australiano buscou formas de integrar os aborígines, sem utilizar da violência como a principal forma de linguagem. Também em pequenas ilhas do Oceano Pacífico, outras comunidades existem e são formadas por sociedades sem escrita. Como já afirmado, na África, dentre as populações sem escrita, uma das mais tradicionais são os pigmeus. Caracterizados pela baixa estatura, possuem uma forma peculiar de vida.

As sociedades sem escrita possuem algumas características comuns. Em geral, as trocas econômicas são naturais, isto é, não possuem as moedas como símbolo econômico. Outra importante característica das sociedades ágrafas é a ausência de uma divisão de classes. Grande parte da divisão do trabalho é sexual. Determinadas tarefas cotidianas são destinadas aos homens, e outras destinadas

FIGURA 2 - INDÍGENA UNIVERSITÁRIO

FONTE: Disponível em: <www.portalmec.gov.br>. Acesso em: 15 ago. 2016.

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TÓPICO 1 | A EDUCAÇÃO NAS SOCIEDADES ÁGRAFAS E O SURGIMENTO DA ESCRITA NA ANTIGUIDADE

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às mulheres. Questões ligadas à caça e pesca de animais para a alimentação, assim como a guerra, em geral, são atividades masculinas. Por sua vez, o preparo do alimento, assim como a coleta de frutos e grãos, são atividades majoritariamente femininas.

Uma das classificações gerais das sociedades ágrafas é a divisão entre nômades e sedentários. Não é ausência de casa, mas sim de agricultura, a principal característica a diferenciar os dois grupos humanos. As sociedades nômades se caracterizam pala ausência de agricultura, sobrevivendo da coleta de frutos e raízes. Por sua vez, as comunidades sedentárias são aquelas que possuem grande produção agrícola e a existência de excedente, o que permite, como consequência, a fixação de residência em um local determinado, por não existir a necessidade de se migrar para a busca de alimentação (BRAIDWOOD, 1988).

Podemos compreender, a partir desta explicação, que os indígenas

brasileiros têm como principal característica o seminomadismo. Isto porque as comunidades possuem agricultura, porém, não possuem a figura do excedente. Com isto, essas comunidades possuem processos migratórios. Devido a isto, podemos compreender como é complexa a solução encontrada pelo Estado brasileiro ao longo do século XX, que é a da criação de reservas indígenas.

A grande pergunta a se responder com relação às sociedades tribais é a seguinte: por que, mesmo com o grande desenvolvimento tecnológico da sociedade ocidental, as sociedades tribais continuam a existir em pleno século XXI?

A principal resposta é a eficiência econômica. Para compreendermos esta eficiência, devemos analisar a formação das sociedades ágrafas desde o período pré-histórico. Pois, partindo do pressuposto de que a necessidade básica da manutenção da vida humana é a alimentação, nós podemos compreender que a denominada Revolução Agrícola, ocorrida há mais ou menos 10 mil anos, teve como legado uma eficiência na produção de alimentos que se manteve até o presente.

Um dos mais destacados pesquisadores da Pré-história foi o australiano Gordon Childe. Suas pesquisas relativas ao período neolítico foram revolucionárias para a compreensão que temos sobre a vida humana, em especial pelos termos criados por ele, como Revolução Neolítica e Revolução Urbana.

Por pré-história se compreende o estudo do passado da humanidade, do surgimento dos homens na Terra até a invenção da escrita. Portanto, podemos compreender a pré-história como um dos principais períodos da história humana,

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

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porque ele é o mais longo. Todavia, não devemos afirmar, por exemplo, que os indígenas brasileiros vivem na pré-história, mas sim que possuem um modo tribal de organização econômica que surgiu na pré-história.

Uma das principais classificações sobre a pré-história é a divisão tripartite do período em paleolítico, mesolítico e neolítico. O paleolítico, período mais antigo, se caracteriza pelo período no qual os homens eram nômades. Por sua vez, o mesolítico é um período intermediário, que desemboca no neolítico, que tem como principal característica o processo de sedentarização. De modo esquemático, podemos compreender estes três períodos como:

Paleolítico: Período anterior ao domínio do fogo.

Mesolítico: Período no qual o homem conseguiu dominar o fogo.

Neolítico: Período da Revolução Agrícola. A principal revolução tecnológica vivida durante o período da pré-história

foi o desenvolvimento da agricultura, há aproximadamente 10 mil anos. Pois, tivemos um início da possibilidade de se utilizar o reino vegetal a favor dos seres humanos. Por isso, este processo, um dos mais importantes para a história humana, é denominado de Revolução Agrícola. Esta possibilitou aos seres humanos uma melhor utilização do meio ambiente. Pois, além de se utilizar a força dos animais para o desenvolvimento humano, também se passou a utilizar das sementes, plantas, flores e frutos, para a alimentação, cura de doenças, além de perfume e embelezamento estético nas diferentes sociedades humanas.

Com relação à importância da pré-história e das sociedades ágrafas, alguns filmes foram criados. Dentre eles, podemos citar alguns que se tornaram clássicos. Com relação à pré-história, o filme A Guerra do Fogo, dirigido pelo cineasta francês Jean-Jacques Annaud, é destaque. Outro filme interessante é Rappa-Nui, produção norte-americana que retrata a vida na Ilha de Páscoa, antes da chegada dos colonizadores europeus.

Uma das principais transformações sociais que a sedentarização (possibilitada pela revolução agrícola) vivenciou foi o surgimento do excedente. Isto é, o surgimento de uma produção de alimentos maior que a necessidade de consumo do grupo. Assim, surge uma das primeiras preocupações sociais, a de se ter a capacidade de guardar o excedente de modo a possibilitar a alimentação da tribo em momentos de intempéries climáticas, como secas. Em função da agricultura, sistemas irrigados tiveram de ser criados, visando à utilização de vastas áreas para a produção de alimentos.

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Também o excedente gerado pela agricultura teve como um dos efeitos o aumento da rivalidade entre as tribos, pois uma disputa pelas terras que apresentavam melhores condições de plantio se tornou uma das principais ambições dos grupos humanos. O excedente estimulou, nas diferentes sociedades, uma incipiente divisão do trabalho. Todavia, a divisão era regida pela forma de organização social, em que se pesava a faixa etária, a hereditariedade e o gênero. Como já afirmamos, em geral, o papel de caça e pesca era masculino, assim como a ação de guerreiros nas violentas disputas tribais. Para as mulheres eram reservadas as funções ligadas à agricultura. As crianças, por sua vez, eram estimuladas a auxiliar os adultos nas tarefas da tribo que eram, em geral, divididas conforme o sexo. No entanto, é importante salientar que existiam funções especiais, como a do líder político (entre os indígenas comumente denominamos cacique) e os xamãs, os chefes espirituais das tribos (entre os indígenas, denominados pajés).

Este sistema socioeconômico demonstrou grande eficiência, ao possibilitar a manutenção da vida nos mais diferentes locais do mundo. Dois pontos são importantes para a compreensão da educação nas sociedades ágrafas. Um primeiro é o da ausência de instituições. Uma segunda questão é a compreensão mítica do universo. Estes dois elementos explicam o modo difuso de educação praticado nestas sociedades.

3 A EDUCAÇÃO NAS SOCIEDADES ÁGRAFAS

Uma das principais características das sociedades ágrafas é a ausência de instituições formais. Esta ausência de instituições pode ser compreendida segundo a teoria de um importante antropólogo francês da segunda metade do século XX, Pierre Clastres, autor da relevante tese A Sociedade Contra o Estado (CLASTRES, 2003).

Segundo a observação deste antropólogo, a figura do chefe político das tribos indígenas da América do Sul não é tão relevante quanto a dos chefes de Estado da atualidade. O chefe possuía algumas regalias, como a possibilidade da poligamia, porém, as obrigações do chefe guerreiro são maiores que seus privilégios. Assim, deve o chefe ter grande capacidade oratória, ao mesmo tempo em que deve demonstrar generosidade com relação aos demais membros da tribo. O poder é mais aparente do que eficaz, pois não consegue o chefe impor aos demais membros da tribo obrigações, como impostos, privação de liberdade ou recrutamento militar compulsório. Este fato demonstra um maior controle da sociedade sobre os seus chefes. No Ocidente, por conseguinte, ocorre o contrário, sendo a principal característica o controle do Estado sobre a sociedade, tendo os chefes políticos um efetivo controle e poder sobre a população por eles dominada.

Clastres aponta que o Estado existe nas sociedades ágrafas em sua forma latente, porém, as formas de controle da sociedade contra o poder instituído são melhores que as apresentadas pelo Ocidente, no qual o Estado possuiu um poder maior sobre os indivíduos que nas sociedades tribais.

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FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 12 ago. 2016.

Deste modo, o poder nas sociedades ágrafas é difuso. Isto é, ele não se apresenta da forma racional e hierarquizada como na sociedade ocidental. Por isso, o poder permanece difuso. Neste caso, podemos compreender que em uma sociedade na qual o poder permanece difuso, a educação é igualmente difusa. Um dos dados importantes para a compreensão das sociedades ágrafas é a ausência de instituições. Isto é, não existe nela marinha, exército, igreja, congresso nacional ou poder judiciário. No que tange às instituições educacionais, estão ausentes creches, escolas, colégios, universidades e faculdades, porém, podemos compreender a ausência destas instituições educacionais pela ausência das primeiras instituições citadas, pois, em grande parte, a educação tem como principal meta adequar os indivíduos ao meio social. Em um meio social no qual o poder é difuso, os processos educativos por eles realizados também são difusos. Em locais nos quais a relação de poder não é institucionalizada, não existe a necessidade de se institucionalizar o processo educativo.

Mesmo com o pouco grau de institucionalização do processo educacional nas sociedades analisadas, podemos compreender que não eram grandes as liberdades dos indivíduos nas sociedades tribais. Isto porque, em grande parte, podemos observar que as funções sociais são muito rígidas, marcadas pela idade e sexo do indivíduo. No entanto, a ausência de liberdade, em geral, se relaciona também à compreensão do universo, que é de base mítica. Assim, a relação do indivíduo com o seu meio se caracteriza por uma mentalidade marcadamente vinculada aos mitos fundadores das tribos.

Os mitos possuem uma função pedagógica fundamental para a compreensão das sociedades tribais. Eles são uma forma de se passar o conhecimento dos antepassados, dos ancestrais, para as populações contemporâneas. Assim, a mitologia tinha uma relação clara com o processo educacional. Contudo, como podemos relacionar os mitos e suas implicações educacionais?

Primeiramente, temos que compreender os mitos, e suas diversas funções: a de estabelecer uma explicação sobre o surgimento dos seres humanos, sobre a natureza, a contagem do tempo e as condutas individuais.

FIGURA 3 - INSCRIÇÕES RUPESTRES

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Com relação ao surgimento do universo, a função dos mitos possuiu uma clara e fundamental função explicativa. Muitos mitos existem ao redor do mundo, relacionando o surgimento do planeta a elementos da natureza, como a água, a terra, ou então, com fábulas relacionadas a demiurgos, isto é, a deuses criadores.

Assim como para explicar o mundo, os mitos também são importantes para a compreensão do surgimento dos seres humanos sobre a Terra. Temos, assim, uma grande quantidade de mitos que apontam a presença dos seres humanos vinculados à natureza, ou como descendentes de antigos deuses.

Como principal efeito dos mitos, temos uma visão sacralizada da natureza. Deste modo, os seres humanos têm uma visão de que a natureza deve ser preservada em seus principais aspectos, para que se possa ter um melhor aproveitamento do que ela oferta para o homem. Isto é, a visão principal das comunidades tribais é a da natureza como uma mãe, que com o seu seio possibilita a saciedade da fome de seus filhos.

Assim, podemos compreender que a mitologia tem um papel fundamental no estabelecimento das condutas individuais das pessoas que vivem nas sociedades tribais, pois o mito, além de impulsionar algumas ações, também tem a capacidade de limitar as ações individuais e coletivas que causariam a ruína da coletividade.

O papel de educador cabe a qual indivíduo nas sociedades ágrafas? O papel

de professor é difuso, diluído entre os diversos personagens sociais que compõem a tribo. Deste modo, podemos pensar no papel educacional exercido pelos vários membros das comunidades tribais (ARANHA, 1996).

3.1 O PAPEL EDUCACIONAL DO CHEFE TRIBAL

Podemos compreender que o chefe tribal possui alguma função educacional com os mais jovens. Sendo o líder, deveria ser ele um exemplo de coragem, carisma e astúcia com relação à superação das dificuldades cotidianas, que poderiam ser causadas tanto pela ação da natureza, como secas e estiagens, assim como cheias dos rios ou excesso de chuva, ao mesmo tempo que poderiam ser ocasionadas pelas ações belicosas de tribos rivais. Assim, ao observar a postura do chefe tribal, que liderava as ações de caça e guerra, os meninos iam aprendendo sobre a importância das habilidades com arco, flechas e pedras para a manutenção da tribo enquanto organização social.

3.2 O PAPEL EDUCACIONAL DAS MÃES E DOS PAIS

Uma figura que possuiu uma posição social diferente com relação à sociedade judaico-cristã ocidental no tocante ao papel de educar está na figura dos pais e das mães. Em nossa sociedade, cabe a estas figuras o papel de primeiro

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educador, porém, nas sociedades tribais, o principal papel da mãe, o de amamentar, poderia ser compartilhado com outras mulheres em processo de lactação.

Por vezes, o papel que caberia ao pai, de ser um exemplo de masculinidade para a prole, era desempenhado pelo líder tribal, que possui, neste tipo de organização social, em geral, um papel de maior prestígio que o do progenitor.

3.3 O PAPEL EDUCACIONAL DO XAMÃ

Uma das principais figuras educacionais era desempenhada pelo líder religioso. Isto porque os líderes religiosos tinham função de grande destaque nas tribos. Em especial, por serem os principais guardiões do conhecimento tribal com relação ao universo mítico, como também com relação à utilização medicinal dos elementos da natureza. Os xamãs, por sua vez, educavam seu sucessor, escolhido em geral dentre os meninos mais habilidosos da tribo.

3.4 O PAPEL EDUCACIONAL DOS HOMENS MAIS VELHOS

No lugar do pai, um dos principais vetores de educação entre as sociedades ágrafas eram os anciãos e as anciãs. As mulheres e os homens mais velhos possuem uma grande importância para a tribo, pois a experiência no contato com a natureza permitia a eles uma grande vantagem na luta cotidiana pela sobrevivência.

3.5 AS VISÕES SOBRE A INFÂNCIA NAS SOCIEDADES TRIBAIS

Nas sociedades tribais, as crianças tinham uma posição diferente em comparação com nossa sociedade. Sobre isto, podemos pensar em duas possibilidades de compreensão. A compreensão utópica e a compreensão funcionalista. A compreensão utópica aponta que as crianças gozavam de grande liberdade em sociedades como as tribais ou ágrafas. Isto porque a ausência de uma instituição disciplinadora, como a escola, garantiria às crianças um espaço de liberdade que elas não teriam em uma sociedade como a ocidental, na qual grande parte da vida infantil é regrada e disciplinada pela uniformização de condutas e castração de impulsos com os quais as sociedades ocidentalizadas tratam a infância.

Tal visão é, em grande parte, uma utopia, uma visão sonhadora da vida

nas comunidades tribais. Os funcionalistas nos lembram que em grande parte, assim como no Ocidente, as crianças observam uma rígida disciplina, porém, vinculadas não a trabalhar em indústrias ou repartições governamentais, mas, sim, em atividades ao ar livre. Muitos rituais que envolvem violência, como torturas físicas, fazem parte do universo indígena, em especial nos rituais de passagem que simbolizam o fim da vida infantil e o início da idade adulta. Com isto, podemos considerar que mais importante que julgar ser boa ou má a forma como

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as sociedades ágrafas educam suas crianças, é buscar compreender como estas sociedades lidam com a infância.

4 AS SOCIEDADES DO ANTIGO ORIENTE

Por sociedades do antigo Oriente Próximo são denominadas algumas das civilizações que existiram no denominado Crescente Fértil, terras que hoje são nomeadas como Oriente Médio e parte do norte da África. Dentre elas, podemos elencar algumas civilizações, como o antigo Egito, a Mesopotâmia, os hebreus, os fenícios, além dos persas, que formaram posteriormente aos babilônicos um dos primeiros impérios da história do mundo. O sistema produtivo destas sociedades era baseado em uma servidão coletiva, na qual o Estado era o principal gestor e proprietário das terras. Vamos conhecer um pouco sobre estas civilizações?

Sociedade egípcia: a sociedade egípcia é comumente lembrada como a terra

das pirâmides, construídas ao longo dos séculos. Também fazem parte da memória social do antigo Egito as múmias. Em geral, se tratavam dos corpos dos antigos membros da nobreza, que passavam por este tipo de processo de manutenção física. Este se relacionava à religião, que tinha como uma das principais características a ideia de reencarnação. Assim, os corpos eram mumificados para novamente retornar à vida. Como se tratava de uma sociedade politeísta, tinham os egípcios uma organização teocrática, na qual o faraó, líder político daquela civilização, tinha também responsabilidades religiosas, sendo adorado como um deus (CARDOSO, 1990).

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.br>. Acesso em: 17 ago. 2016.

FIGURA 4 - PIRÂMIDE EGÍPCIA

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A base da pirâmide social era composta pelos servos, que trabalhavam na produção agrícola, bem como nas grandes obras de irrigação, fundamentais para a manutenção da vida, pois eram as cheias e os vazantes do rio Nilo que garantiam a fertilidade do solo, fundamental para a produção de alimentos. Também existia uma camada de burocratas (funcionários públicos), bem como de militares, escribas e sacerdotes; no topo da pirâmide, a nobreza, composta pelo faraó e suas famílias.

Dentre o principal mito egípcio temos a contenda entre Set e Horos, bem

como a presença de Ísis e Osíris. Os deuses do panteão egípcio tinham características antropomórficas (humanas), zoomórficas (culto aos animais), antropozoomórficas (deuses metade humanos e metade animais).

Sociedade mesopotâmica: o termo Mesopotâmia quer dizer “Terra entre

Rios”. Tal nome se deve à importante presença dos rios Tigre e Eufrates na constituição desta sociedade, marcada pela presença de alguns povos, como os sumérios, os babilônicos e os caldeus. Os povos que habitavam a Mesopotâmia possuíam uma religião politeísta, marcada também pela compreensão mítica das cheias dos rios e do poder civil. A sociedade, assim como a egípcia, era marcada pela desigualdade social, sendo as relações de trabalho vinculadas pela servidão (REDE, 2007).

Apesar de menos famosa que o Egito, no tocante à religião, alguns dos

mitos e práticas surgidas na Mesopotâmia deixaram um legado na sociedade ocidental. O horóscopo, prática até hoje presente, surgiu entre os mesopotâmicos. Tinham como uma de suas principais características a ideia de poder adivinhar o futuro dos indivíduos com a observação das estrelas. Visando à observação astronômica, os povos mesopotâmicos criaram enormes torres, que se chamavam zigurates. Ainda com relação à religião mesopotâmica, podemos nos lembrar de alguns mitos e deuses. Um dos principais era o deus Marduk. Entre os mitos, o principal era o mito do dilúvio, uma grande inundação de água, capaz de destruir a maior parte dos seres humanos.

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FIGURA 5 - MAPA DA MESOPOTÂMIA

Sociedade israelita: outra importante sociedade existente no antigo Oriente Próximo eram os israelitas. Grupo fundado pelo patriarca Abraão, que fora chamada por Deus, na cidade mesopotâmica de Ur, habitada pelo povo caldeu, para formar um povo escolhido. Os israelitas tinham como principal diferença com relação às demais sociedades do antigo Oriente o monoteísmo, isto é, a crença em um único Deus.

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 11 ago. 2016.

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FIGURA 6 - MAPA DO ANTIGO ISRAEL

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 30 ago. 2016.

A história política do povo israelita possuiu várias fases. Uma primeira, na qual o povo era organizado em tribos. Posteriormente, com Saul, formou-se uma monarquia, que contou com os famosos reis Davi e Salomão, responsável pela criação do templo de Deus, denominado pelos israelitas como Jeová (YAWEH). Uma divisão política fez com que o povo fosse dividido em dois reinos, Israel, ao norte, que teve como capital Samaria, e Judá, ao sul, que tinha como capital Jerusalém. Um dado marcante da história do povo de Israel foi o momento em que foram escravizados pelos egípcios, dos quais foram libertos com a liderança de Moisés, que guiou o povo pelo deserto até Canaã, a terra prometida. Posteriormente, um segundo período foi caracterizado pelo denominado Cativeiro Babilônico, no qual Israel foi dizimado, sendo Judá, ao sul, preservada, mas teve parte de sua população cativa na Babilônia (CARDOSO, 1990). Posteriormente, também dominados pelo Império Romano, os judeus foram dispersos pelo mundo em 70 D.C., com a denominada Diáspora, na qual a região de Jerusalém deixou de ser

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uma área de posse exclusiva dos judeus, tendo retornado a Jerusalém apenas no século XX, após a Segunda Guerra Mundial.

Sociedade fenícia: dentre os grupos humanos importantes para a

compreensão da dinâmica socioeconômica do mundo da antiguidade, um destaque foram os fenícios. Grupo humano que se caracterizou pelo comércio marítimo, tanto ao longo do Mediterrâneo, quanto ao longo do Mar Vermelho. Os fenícios possuíam uma forma de organização política na qual a presença forte das cidades, com autonomia, era a principal característica. Assim, algumas das cidades-estado fenícias tiveram grande destaque, como Sídon, Tiro, Biblos e Cartago, no norte da África.

Com relação à religião, os fenícios possuíam uma religião politeísta,

na qual alguns deuses possuíam grande destaque no panteão, como Baal, além de Yam, o deus do mar, de grande destaque em uma sociedade marcada pela grande presença de marinheiros. A estrutura social era semelhante às das demais sociedades asiáticas. Todavia, possuía uma diferença fundamental: a presença do comércio de longa cabotagem, isto é, de longas distâncias através da costa, o que permitiu o enriquecimento das principais cidades-estado vinculadas ao povo fenício. Uma das cidades fenícias, Cartago, chegou a rivalizar com Roma o domínio do Mediterrâneo. No entanto, com a derrota do general Aníbal, Cartago acabou sendo dominada pelo Império Romano.

Império Persa: um dos primeiros impérios surgidos no mundo foi o Império Persa. Teve como seus mais célebres líderes Sargão e Ciro, o Grande, conquistador de grande faixa de terra ao longo do Mar Mediterrâneo. Uma das principais conquistas do Império Persa foi o domínio sobre o antigo Império Babilônico. A sociedade persa viveu grande apogeu cultural, sendo desenvolvida pelo povo persa uma das primeiras religiões monoteístas do mundo, o zoroastrismo. O modelo de sociedade persa entrou em rivalidade com o mundo grego, sendo um dos mais importantes eventos da história grega as denominadas Guerras Médicas, nas quais os gregos venceram os persas na Batalha de Salamina, garantindo o domínio dos gregos no Mar Mediterrâneo (CARDOSO, 1990).

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FIGURA 7 - ARTE PERSA

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 1 ago. 2016.

As sociedades do antigo Oriente Próximo deixaram um grande legado cultural a todo o mundo. Grande parte das populações, atualmente, segue religiões como a cristã ou muçulmana, que tiveram como uma das suas principais bases o judaísmo, uma das religiões criadas por um dos povos do antigo Oriente Próximo, porém, como podemos observar no texto já descrito, ocorreu um domínio da sociedade greco-romana sobre as civilizações do antigo Oriente Próximo.

5 AS SOCIEDADES DO ANTIGO ORIENTE PRÓXIMO, AS INSTITUIÇÕES E O PENSAMENTO EDUCACIONAL

As diferentes sociedades do antigo Oriente Próximo, brevemente descritas nos parágrafos acima, têm grande importância na análise do desenvolvimento da educação. Por vezes, alguns dos inventos produzidos pelas antigas sociedades do Oriente são rememorados pelos professores de História, como as obras hidráulicas, responsáveis pela irrigação nas margens dos rios Nilo, Tigre e Eufrates, assim como os zigurates e as pirâmides.

Podemos considerar que uma das mais importantes invenções destes povos está relacionada à questão educacional. Os mesopotâmicos inventaram o primeiro sistema de escrita da história, a denominada escrita cuneiforme. Em uma visão linear, progressista da história, se diria que com este invento a humanidade deixou de estar na pré-história e adentrou para a história. A denominada escrita cuneiforme era realizada em cunhas, por isso o nome que possui. A invenção da escrita possibilitou um grande desenvolvimento social, econômico, político, como também nas questões de inteligência e sentimentos portados pelos homens, pois o registro de ideias, sentimentos, pensamentos, além de propriedades, heranças, dívidas e dividendos, é parte fundamental nas sociedades humanas (ARANHA, 1996).

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FIGURA 8 - TÁBUA DE ESCRITA CUNEIFORME

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gv.br>. Acesso em: 17 set. 2016.

O desenvolvimento da escrita possibilitou aos homens o desenvolvimento de normas escritas de conduta, como o Código de Hamurábi, na Mesopotâmia, assim como os Dez Mandamentos, as tábuas da lei de Moisés, presente entre os hebreus. Tais leis alteraram a forma de organização das sociedades. Se antes o mais forte possuía legitimidade social para impor sua vontade através da violência, com o desenvolvimento da escrita tivemos a possibilidade do desenvolvimento da lei como forma de se resolver os conflitos entre os indivíduos pertencentes a um mesmo grupo humano.

Outro povo que deixou um importante legado no que se refere às questões educacionais foram os fenícios, pois foram os inventores do alfabeto, que influenciou as civilizações posteriores de Grécia e Roma, e, por consequência, a sociedade ocidental. Antes, as palavras eram formadas de modo inteiro, os ideogramas. No entanto, com a formação do alfabeto, temos a possibilidade da ampliação da expressão escrita pelos seres humanos.

Também entre os fenícios, tivemos uma ampliação da possibilidade da

realização de cálculos numéricos, pois, como grandes comerciantes, eles tiveram a necessidade de ampliar a eficiência da matemática (todavia, ainda não realizada com os números hindu-arábicos). Os fenícios também foram os responsáveis pela criação do termo biblioteca. Foi na cidade de Biblos, na antiga Fenícia, o local onde

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se produziam os papiros, utilizados para o registro da palavra escrita em toda a sociedade do mundo mediterrânico e do antigo Oriente Próximo (ARANHA, 1996).

Podemos compreender que uma das principais funções da educação é

adequar os indivíduos ao meio social. Assim, a educação está sempre, de forma indelével, relacionada à estrutura da sociedade na qual pertencem. Assim, podemos compreender que, mesmo com o processo de desenvolvimento da escrita, a educação escolar institucionalizada era destinada a poucas pessoas dentre os indivíduos que compunham as sociedades que até aqui estudamos. A grande massa permaneceu analfabeta, porém, ela era educada por algumas instituições sociais, como a família, em especial a figura dos pais, como também tinham papel de educadores os sacerdotes destas sociedades.

Em algumas delas existia uma classe profissional específica na qual o sustento dependia da alfabetização: os escribas. Esta categoria ocupacional era presente entre os egípcios, e tinha alguns privilégios sociais. Com isto, podemos medir o quanto ser alfabetizado é uma das principais formas de se ter poder em uma sociedade. E que a ampliação da alfabetização representa um aumento de práticas democráticas no corpo social. Todavia, como na antiguidade, as principais formas de trabalho não envolviam tecnologia, mas sim a força física, as sociedades eram compostas por massas analfabetas e pequenas parcelas letradas, que compunham a classe de privilegiados desta mesma sociedade.

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Neste tópico você viu que:

• A educação nas sociedades ágrafas é difusa. Isto é, não existe uma instituição formal que se responsabiliza pela educação, sendo ela responsabilidade de toda a tribo.

• Não podemos ter uma visão evolucionista, desconsiderando a presença de

comunidades culturalmente ágrafas ainda no presente, em várias partes do mundo.

• A primeira possibilidade de expressão escrita da humanidade foi inventada na Mesopotâmia, e tem o nome de escrita cuneiforme.

• As principais sociedades da antiguidade oriental, que já possuíam uma cultura letrada, foram os egípcios, mesopotâmicos, hebreus, fenícios e persas.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 Por que podemos dizer que a invenção da escrita foi uma grande conquista da humanidade?

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 2

O MUNDO GRECO-ROMANO: UMA DAS

BASES EDUCACIONAIS DA SOCIEDADE

OCIDENTAL

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, contemplaremos algumas das principais questões sobre a formação da sociedade grega e romana. Vamos compreender a influência cultural que a antiga Grécia exerceu sobre o Império Romano, assim como as especificidades culturais destas duas distintas civilizações.

Estas questões são importantes para a compreensão da educação na sociedade ocidental. O importante historiador francês Fernand Braudel afirmava que o Ocidente possui uma dupla raiz cultural: judaico-cristã e greco-romana.

Deste modo, entendendo a importância do tema, abordaremos um breve resumo histórico do mundo greco-romano, as questões da filosofia grega e as instituições sociais responsáveis pela educação no universo cultural greco-romano.

2 O PROCESSO DE FORMAÇÃO HISTÓRICA DA SOCIEDADE GRECO-ROMANA

A Grécia antiga foi uma civilização surgida na denominada Península do Peloponeso, que possui o istmo de Corinto, banhada pelo Mar Egeu, que compõe o Mar Mediterrâneo. Sua história é didaticamente dividida em cinco grandes períodos: Pré-Homérico, Homérico, Arcaico, Clássico e Helenístico. Os períodos têm grande relação com os escritos de Homero, autor de obras clássicas da antiguidade, como a Ilíada e a Odisseia, em que são relatadas histórias fabulosas, como a do cavalo de Troia.

A Península no Peloponeso foi habitada por populações denominadas aqueus, jônios, dórios e eólios. Populações estas que estão na origem do povo grego, que na antiguidade se organizava em cidades-estado, isto é, cidades que possuíam autonomia administrativa. Dentre estas unidades político-administrativas, duas se destacaram e organizaram dois tipos antagônicos de sociedade: Atenas e Esparta.

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FIGURA 9 - MAPA DA GRÉCIA ANTIGA

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 18 set. 2016.

A sociedade ateniense tinha como principal característica o desenvolvimento cultural. Era formada por três classes sociais. Os escravos, os cidadãos atenienses, além de um grupo de homens livres, mas sem direito à cidadania, os metecos. Uma das principais questões que envolvem a sociedade ateniense foi o desenvolvimento da democracia. Isto é, de uma forma de organização política na qual os cidadãos possuem direitos iguais, a denominada isonomia legal. O local no qual ocorriam os debates políticos em Atenas era denominado Ágora. Nela, os denominados demagogos, isto é, os políticos daquele período, utilizavam-se do talento retórico para poder defender suas ideias e interesses. A palavra democracia é uma justaposição de duas palavras gregas: demos, que quer dizer povo, e cracia, que significa governo (FUNARI, 2000).

Uma das principais formas de conseguir ter direitos políticos na sociedade

ateniense era a participação no exército. Este era organizado em unidades militares que eram denominadas de falanges. Os guerreiros gregos utilizavam um tipo de escudo chamado hoplom. Aqueles que detinham condições financeiras para comprar este escudo poderiam ingressar nas fileiras militares. Este ingresso possibilitava participar ativamente dos debates da Ágora, ingressando assim no mundo da política ateniense. Todavia, a democracia na Grécia possuía uma grande limitação, pois as mulheres eram excluídas do debate político. O machismo era legitimado pelo fato de as mulheres não ingressarem nas fileiras militares.

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FIGURA 10 - DISCURSO POLÍTICO EM ATENAS

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gv.br>. Acesso em: 17 set. 2016.

Enquanto Atenas seguia o modelo democrático de gestão do poder político,

sua vizinha Esparta seguia um modelo autocrático de relações sociais, pois em Esparta tínhamos um exemplo de sociedade militarizada e profundamente hierarquizada. Ela era formada por três categorias sociais: os espartanos, que compunham o topo da pirâmide social, os periecos e hilotas, duas outras classes sociais que compunham Esparta. A principal lei a reger a vida em Esparta foi a constituição de Licurgo, que segundo alguns estudiosos, teria durado seis séculos (FUNARI, 2000).

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FIGURA 11 - SOLDADOS ESPARTANOS

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 19 set. 2016.

Duas guerras marcaram a história grega. As Guerras Médicas e a Guerra do Peloponeso. Por Guerras Médicas ficaram conhecidas as disputas entre os gregos e os persas pelo domínio da navegação em partes do Mar Mediterrâneo. Ela terminou com uma vitória grega, na Batalha Naval de Salamina, que decretou uma hegemonia ateniense, o que possibilitou um imperialismo grego em algumas regiões mediterrânicas. Por sua vez, a Guerra do Peloponeso foi travada entre Esparta e Atenas. A guerra acabou por enfraquecer os dois principais modelos de cidade-estado da antiguidade. Com um enfraquecimento militar causado pela guerra interna, Felipe II, rei da Macedônia, conquistou a península grega. Seu filho, Alexandre “O Grande”, que fora aluno do filósofo Aristóteles, foi um dos principais líderes a expandir a cultura grega por diversos locais em que Alexandre liderou a conquista militar. Assim, tivemos, com o império de Alexandre, o denominado Período Helenístico.

A mitologia é um dos importantes elementos culturais para a compreensão

da mentalidade dos antigos habitantes da Grécia. Os gregos eram politeístas, isto é, acreditavam em vários deuses. Estes, em geral, tinham características antropomórficas, isto é, tinham os antigos deuses formas humanas. Também eram os mesmos dotados dos mesmos sentimentos que os homens possuem, como amor, ciúmes, inveja, raiva. Todavia, a grande diferença é que os deuses gregos eram imortais. O local de morada era o Monte Olimpo, no qual esses deuses eram cultuados. As cidades possuíam seus deuses fundadores, como é o caso de Palas Atena, a fundadora de Atenas.

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Os gregos se diziam descendentes do deus Heleno. Com relação à vida após a morte, os gregos acreditavam que deveriam ter uma moeda após morto para pagar o barqueiro Caronte, responsável pelo trajeto da alma morta até o paraíso. Deste modo, colocavam nos olhos dos cadáveres duas moedas. Assim, tinham os gregos uma relação diferente com a morte dos demais povos que até aqui estudamos. Em especial, por separarem o corpo do espírito, separação não presente entre os povos da antiguidade oriental (FUNARI, 2000).

Os principais deuses do panteão grego tinham características específicas.

Zeus era o deus dos deuses e Hera, a sua esposa, juntos moravam no Olimpo com as demais divindades. Ares era o deus da guerra, que protegia nas batalhas; Poseidon, o deus do mar; Hades, deus dos mortos e cemitérios; Afrodite, a deusa da Beleza, entre outros exemplos de deuses que poderiam ser citados.

Além dos deuses, o imaginário da Grécia antiga era povoado pelas musas: Calíope, da poesia; Clio, da História; Érato, do casamento; Euterpe, das festividades; Melpômene, do canto e teatro; Polímnia, da retórica; Talia, da comédia; Terpsícore, da dança; Urânia, da astronomia. Estas musas se relacionavam a diferentes atividades, consideradas artes pelos antigos gregos.

FIGURA 12 - ESTÁTUA DE POSEIDON

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.br>. Acesso em: 20 set. 2016.

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Um dos principais festivais realizados pelos gregos eram as Olimpíadas, quando eram cultuados os deuses em competições esportivas. Também faziam parte do universo cultural grego algumas belas artes, com destaque para o teatro e as esculturas. O Teatro de Dionísio (cultuado como o deus do vinho) foi uma das principais casas de espetáculo, na qual se destacavam as tragédias e comédias. Por sua vez, as esculturas gregas possuíam características de grande beleza, ao buscar retratar o corpo humano em toda a sua potencialidade estética. Como se poderá observar, a cultura grega influenciou sobremaneira a sociedade romana.

Roma foi fundada por algumas tribos latinas e sabinas, que foram

dominadas pelos invasores etruscos. Roma, em sua história, teve três grandes períodos marcados por diferentes formas de legitimação das relações de poder. A Monarquia, a República e o Império. A monarquia foi substituída por uma forma menos autoritária de poder, a Rex Publica (isto é, a “coisa pública”). No entanto, o expansionismo militar gerou dificuldades administrativas, e uma das soluções foi a instituição do Império.

Uma das principais características da vida romana foi o expansionismo

militar. Este se iniciou como uma forma de aumentar a produção agrícola, graças à ampliação das terras destinadas ao cultivo do trigo, das oliveiras e das parreiras de uva, bases da produção de três dos principais produtos da dieta romana: pão, azeite e vinho. Para tanto, se escravizavam as populações dominadas pelos romanos através da guerra. O exército romano, um implacável empreendimento militar, tinha como uma de suas principais características a rígida disciplina. Ao contrário de Atenas, não necessariamente a presença no exército garantiria direitos políticos, pois em 111 A.C., Mário institui o soldo, isto é, o pagamento de salário aos militares.

Assim, o exército romano era organizado em legiões, que eram organizadas em centúrias e decúrias, contando com um inovador sistema de estradas que ligava a capital ao interior das possessões coloniais, proporcionando uma contínua expansão de seus domínios, pela rápida mobilidade de soldados que o sistema de estradas possibilitava. Uma máxima afirmava que “todos os caminhos levam para Roma”.

As legiões romanas possibilitavam um aumento produtivo, ao ampliar

o número de escravos em Roma, que eram capturados dentre os prisioneiros de guerra. Com uma grande quantidade de escravos, Roma chegou a ter centenas de milhares de pessoas desocupadas, que eram entretidas com a denominada Política do Pão e Circo, em que a maior parte da população ociosa se dirigia ao Coliseu, um grande estádio romano, no qual lutavam os gladiadores.

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TÓPICO 2 | O MUNDO GRECO-ROMANO: UMA DAS BASES EDUCACIONAIS DA SOCIEDADE OCIDENTAL

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FIGURA 13 - COLISEU ROMANO

FONTE: Disponível em: <http://www.rome-chauffeur.com/wordpress/wp-content/uploads/2015/03/Colosseum-Rome-Chauffeur.jpg>. Acesso em: 20 set. 2016.

Um dos principais clássicos da história do cinema de Hollywood foi o filme Spartacus. Dirigido por Stanley Kubrick, retrata a vida de um escravo romano, que se revolta em relação à sua condição social, buscando a liberdade.

Aos poucos, os bárbaros foram invadindo as fronteiras do Império Romano. Os principais grupos bárbaros, como os ostrogodos, visigodos e vândalos, foram conquistando antigas possessões coloniais romanas. No século IV, Roma foi conquistada completamente pelos bárbaros, sendo este um dos fatos que marcaram o fim da Idade Antiga e o início da Idade Média.

Assim como os gregos, os romanos também possuíam sua mitologia, sendo

ela muito próxima da mitologia dos gregos. O principal mito romano é o da fundação da cidade imperial. Segundo uma antiga lenda, dois irmãos, Rômulo e Remo, eram ainda bebês e foram criados por uma loba, que os amamentou. Posteriormente, os dois foram os fundadores da principal cidade do mundo. Com relação à proximidade com os gregos, a mitologia romana também possuía seus deuses específicos para as distintas atividades humanas, em grande parte, versão latinizada dos antigos deuses gregos. Vejamos alguns exemplos: Baco (versão latina de Dionísio) era o deus do vinho; Marte (versão latina de Ares), era o deus da guerra.

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Uma importante inspiração que a mitologia grega possibilitou para o desenvolvimento das ciências no século XX se relaciona à psicanálise. O seu principal formulador, Freud, criou seus conceitos científicos, como o Complexo de Édipo, com forte inspiração na mitologia grega.

Apesar da presença destes deuses da mitologia, popularizados pelos romances, pelo cinema e pela psicanálise, o principal culto cotidiano dos gregos e romanos não era sobre estes “afamados” deuses da mitologia. A principal forma de culto entre os gregos e romanos era o culto aos fogos nos lares. Para ser considerada uma família e ter o status e prestígio social, advindo de ser membro de um clã, deveria a casa ter um fogo que sempre era mantido aceso e nunca deveria se apagar. Era o fogo que tinha como nome lar, responsável pelo aquecimento da casa, como também estava presente nos rituais de casamento, que simbolizava a continuidade do mesmo fogo em outro domicílio.

A sociedade greco-romana também teve em comum um mesmo sistema produtivo, marcado pelo expansionismo militar e pela escravidão. Um dado interessante é que em determinadas regiões do Império Romano não se falava o latim, mas sim o grego, em especial na Ásia Menor. Isto explica por que grande parte da Bíblia, em especial o Novo Testamento, foi escrito em grego, mesmo fazendo parte do Império Romano. Com a cristianização do Império, em 395, quando o cristianismo deixou de ser perseguido, grandes alterações na mentalidade ocidental ocorreram. Posteriormente, o Império Romano se dividiu em duas partes. A região que falava latim viveu um processo de ruralização, e Roma acabou se tornando a sede da Igreja Católica Apostólica Romana. Por sua vez, Constantinopla se tornou a sede do Império Bizantino, sendo sede da Igreja Católica Cristã Ortodoxa.

3 A FILOSOFIA GREGA E O PENSAMENTO ROMANO

Apesar da grande popularidade e da presença da mitologia, a Grécia foi um dos primeiros locais do mundo no qual se desenvolveu um modo não mitológico de estruturar o pensamento sobre a natureza e a sociedade. Por isso, o destaque que devemos dar à presença da filosofia grega. A palavra filosofia tem sua raiz etimológica (isto é, sua origem) em duas palavras gregas, Filos e Sofia, que juntas podem ser traduzidas como “amante da sabedoria”. A ideia de se cultuar o pensamento humano na busca de se tentar compreender a natureza e a sociedade não apenas através dos mitos, como também através da especulação, foi uma verdadeira revolução na forma de o ser humano conceber a vida na Terra (JAEGER, 1995).

Podemos citar vários nomes do pensamento grego. Em geral, a filosofia grega antiga é dividida em dois períodos: socrático e pré-socrático. Isto devido à importância da figura de Sócrates para o desenvolvimento do pensamento grego.

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TÓPICO 2 | O MUNDO GRECO-ROMANO: UMA DAS BASES EDUCACIONAIS DA SOCIEDADE OCIDENTAL

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Sócrates foi um cidadão ateniense amante do saber, e dono de uma profunda capacidade de compreender a natureza humana e suas contradições. Filho de uma parteira, desenvolveu um método denominado maiêutica, cujo principal intento é possibilitar aos seres humanos “dar luz a novas ideias!”.

Um interessante livro que trata da história e do desenvolvimento da filosofia foi escrito pelo norueguês Jostein Gaarder, de título O Mundo de Sofia. Obra que vale a pena ser lida pelos estudantes que sonham em atuar como professores.

Sócrates foi o principal nome (símbolo) da vida intelectual da Grécia antiga. As suas formulações intelectuais têm grande importância para o desenvolvimento intelectual do Ocidente. Vivia perambulando pela cidade, refletindo sobre a existência humana, tendo muitos ouvintes. Sócrates apontava que era papel do filósofo ser uma espécie de mosca a avivar as consciências individuais. Teve como seu principal discípulo Platão. O seu pensamento foi considerado subversivo pelas autoridades, o que lhe acarretou sérios problemas. Sendo julgado, se negou a abjurar (desdizer) o que havia afirmado. Ao invés de ser punido, propôs para a corte que o julgava que deveria ser tratado como um deus no Monte Olimpo. Assim, ao “debochar” dos que o julgavam, acabou sendo punido, sendo obrigado a se envenenar. Assim, morto de maneira trágica, se tornou um marco histórico de pensador libertário morto pelo poder instituído.

Mesmo antes de Sócrates, podemos observar o início do desenvolvimento de um pensamento original, e de alguns pensadores que possibilitaram o alargamento da compreensão que o ser humano possui sobre a natureza e sobre si mesmo. Alguns nomes podem ser lembrados, como Tales de Mileto, Arquimedes, entre outros.

Um dos primeiros nomes ligados à cultura grega foi Homero. Não sendo considerado um filósofo, seu nome deve ser lembrado como personagem importante ao escrever as obras fundantes da cultura grega, que foram Ilíada e Odisseia. No entanto, outros nomes são em geral lembrados pelos historiadores da filosofia. Um dos sempre lembrados é o de Tales. Oriundo da cidade de Mileto, foi um importante nome no desenvolvimento dos cálculos matemáticos. Buscando saber a distância das embarcações em relação à terra, foi o criador do denominado Teorema de Tales, até hoje ensinado nas escolas para os estudantes do ensino básico. Outro nome importante para o desenvolvimento da filosofia foi Arquimedes, o descobridor da máxima: “Dois corpos, que possuem massa, não podem ocupar o mesmo lugar no espaço, ao mesmo tempo”. O desenvolvimento da hidráulica teve em Arquimedes um dos seus pioneiros. Uma história que se conta afirma estar Arquimedes em uma banheira, e ter feito uma descoberta, tendo saído nas ruas nu e gritando “Eureka!”, isto é, descobri (na língua grega).

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Todavia, mesmo com a presença de vários personagens intelectuais, os principais nomes da filosofia grega clássica são os de Sócrates (já citado), Platão e Aristóteles. Platão foi discípulo de Sócrates, tendo sido o principal divulgador das ideias de seu mestre. Suas ideias são consideradas relevantes para o desenvolvimento da filosofia até o tempo presente. Seus principais livros são A República e O Banquete. O livro A República é uma crítica à ação dos demagogos, na Ágora. Por demagogos podem ser considerados os políticos que possuem bela retórica, porém, são construtores de um discurso vazio, sem ação prática nas palavras que dizem. Por isso, Platão defendia a ideia de que apenas os sábios deveriam ter cargos políticos. Uma de suas principais formulações é o denominado mito da caverna (CHAUÍ, 1993).

FIGURA 14 - SÓCRATES

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 15 set. 2016.

O mito afirma que existia uma comunidade formada por pessoas que viviam acorrentadas no interior de uma caverna e que enxergavam a realidade através das sombras que uma parca iluminação projetava sobre uma parede da caverna. Próximo à caverna existiam algumas estátuas, que formavam as principais sombras. Assim, as pessoas acorrentadas foram nomeando as sombras observadas. Todavia, caso alguém conseguisse se desamarrar e sair do interior da caverna, veria que a realidade não era aquela que havia sido ensinada. No entanto, ao voltar para a caverna, a probabilidade de as pessoas acreditarem no que foi dito pelo homem que saiu da caverna era muito pequena, sendo mais provável que os colegas ridicularizassem as afirmações do primeiro homem a sair da caverna. Neste sentido, podemos pensar que estamos por vezes acorrentados em uma caverna

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TÓPICO 2 | O MUNDO GRECO-ROMANO: UMA DAS BASES EDUCACIONAIS DA SOCIEDADE OCIDENTAL

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marcada pelas convenções que aprendemos. Uma tarefa importante é tentarmos sair da caverna e nos libertar das amarras que prendem nosso intelecto.

Além de Platão, Aristóteles também é rememorado como importante filósofo. Ele foi o mestre de um dos principais líderes da história da antiguidade, Alexandre “O Grande”. Suas capacidades intelectuais elevadas o fizeram ser pioneiro em várias áreas do conhecimento humano. Uma delas foi a taxonomia, isto é, a classificação dos diferentes seres vivos. Uma de suas principais obras foi A Política, na qual apontou uma polêmica ideia na qual existiam almas que nasceram para serem livres, e outras que nasceram para a escravidão. Outros livros nos quais apontou questões importantes foi em um conjunto de obras denominado Metafísica, em que aponta questões sobre o estudo do ser.

Dentre as escolas filosóficas desenvolvidas na Grécia antiga, se destacaram o estoicismo e o epicurismo. Por estoicismo se considera uma escola filosófica fundada por Zenão de Cítio, e que teve em Sêneca um de seus principais elaboradores. Em geral, afirmava que a resignação era uma das principais características do sábio. Os estoicos pregavam um controle das emoções. Por sua vez, o epicurismo foi uma doutrina filosófica desenvolvida pelo filósofo Epicuro. Em geral, apontava a busca moderada pelos prazeres como um caminho para a paz (CHAUÍ, 1993).

Um dos nomes lembrados por ser um personagem especial no interior da vida grega antiga é o de Diógenes. Teve como principal propósito viver da forma mais simples possível. Morava nas ruas, tendo como único objeto uma caneca. No entanto, ao ver uma criança bebendo água com auxílio direto das mãos, resolveu jogar fora sua caneca. Outra feita ele foi observado pelas pessoas andando à noite, com uma lanterna acesa na mão. Perguntado sobre o que fazia, respondeu que estava à procura de um justo. Quando Alexandre “O Grande” foi falar com Diógenes, lhe perguntou o que poderia fazer por ele. A resposta de Diógenes foi simples e sincera, pedindo que ele saísse da frente de seu banho de sol. A escola filosófica que Diógenes fundou ganhou o nome de Escola Cínica.

Houve uma grande influência do pensamento grego na cultura romana. Alguns dos professores gregos foram trazidos para Roma, com o intuito de educar os filhos das famílias abastadas. Alguns destes mestres tiveram a condição de escravos, porém, eram reconhecidos como importantes para as famílias em que trabalhavam.

Dentre os educadores romanos, um teve grande destaque na história da pedagogia; Quintiliano. Ele foi professor durante mais de 20 anos na escola de retórica em Roma, como também defendeu princípios importantes para o desenvolvimento dos seus educandos. Em especial, por defender que leitura e escrita deveriam ser aprendidas de maneira conjunta, além de defender a presença de exercícios físicos para os educandos.

Com relação à vida intelectual romana, uma das funções mais valorizadas era a capacidade de oratória. Isto porque a maior parcela dos patrícios e demais homens de poder eram membros do Senado, importante instituição que tinha

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poder de comando nas questões políticas. Dentre os oradores romanos, um dos mais destacados foi Cícero, um nome constantemente lembrado no que tange à capacidade oratória. Outros intelectuais romanos importantes foram Ovídio e Plotino. Ovídio foi autor de um livro sobre o amor romântico entre homens e mulheres, denominado A Arte de Amar. Outro intelectual importante para o desenvolvimento da filosofia ocidental foi Plotino, ao recuperar as ideias de Platão.

Tanto na Grécia quanto em Roma, se desenvolveu a História enquanto disciplina do conhecimento humano. Heródoto de Halicarnasso foi o primeiro a utilizar o conceito, em um livro de título História. Plutarco, por sua vez, foi autor de um dos mais importantes textos históricos da Antiguidade, o livro História da Guerra do Peloponeso. Em Roma, foi destaque Caio Suetônio, autor do livro A Vida dos Doze Césares.

4 A EDUCAÇÃO NA ANTIGUIDADE CLÁSSICA: A CRIAÇÃO DE INSTITUIÇÕES

A educação na antiguidade clássica greco-romana possuiu modelos diferentes, e até contraditórios no tocante aos modelos educacionais elaborados pelos membros deste mundo cultural greco-romano que estamos contemplando nesta unidade. Assim, uma das principais diferenciações possíveis são os modelos educacionais formulados em Atenas, em Esparta e em Roma.

O modelo de educação espartana está em grande parte vinculado à

possibilidade do Estado em reger a vida dos indivíduos. Assim, uma inculcação ideológica de grande monta era necessária para convencer os indivíduos de que era a função de sua vida matar e morrer por Esparta. Tal possibilidade de forma de organização da educação só é possível de ser compreendida se tivermos em mente rígida e hierárquica a estrutura social que os espartanos vivenciaram (JAEGER, 1995).

Por volta dos seis anos de idade, o menino espartano era retirado de

sua família, para que pudesse se transformar, na vida adulta, em um soldado que servisse aos interesses do Estado espartano. Portanto, uma das primeiras características que a educação forjava na mentalidade do futuro homem espartano era a que o Estado como entidade é mais importante que a família, pois não tinham os meninos espartanos um contato prolongado com os seus pais, mas, sim, com os instrutores militares, que buscavam transformar os meninos em guerreiros.

A função de soldado era uma das principais a ser desenvolvida. Assim,

desde a infância, os meninos eram designados a atividades como longas marchas, acampamentos, além de obviamente serem incentivados a atitudes violentas, com as quais eram testados em suas capacidades belicosas. Um dos principais ritos de passagem de um menino espartano, quando então ele passava a ser considerado um homem, e não mais um menino, era assassinar um hilota, que era um habitante de Esparta, mas considerado de uma classe social inferior.

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TÓPICO 2 | O MUNDO GRECO-ROMANO: UMA DAS BASES EDUCACIONAIS DA SOCIEDADE OCIDENTAL

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As mulheres também recebiam uma educação em Esparta. No entanto, o poder político e o maior investimento eram realizados em função dos rapazes, pois os futuros homens teriam destaque social, ao liderar a polis espartana. Todavia, no caso espartano, havia uma certa valorização da figura feminina, pois como poderiam dar à luz a novos guerreiros, as mulheres eram valorizadas pelo corpo social. Todavia, na vizinha Atenas, a mulher não recebia nenhum tipo de valorização no corpo social.

A educação ateniense possuía como principal objetivo algo muito distinto da educação espartana. Ela tinha a principal função de educar o membro da polis, que vivia em um regime democrático. Assim, se pode compreender que a educação entre os atenienses tinha a função de capacitar os indivíduos a assumir funções públicas, desenvolvidas na praça pública, na Ágora, o local das principais disputas políticas.

Dois filósofos gregos fundaram duas das instituições que nomeiam, até o

presente, instituições de ensino: O Liceu e a Academia. Platão está relacionado à fundação da academia. Seu aluno e discípulo, Aristóteles, foi o criador do Liceu. Mais que isto, Aristóteles fundou uma metodologia de ensino denominada Peripatética. O termo provém da palavra peripatus, que em grego quer dizer passeio. Deste modo, ao invés de manter os alunos trancados em uma sala fechada, Aristóteles ensinava aos seus discípulos passeando pela cidade, observando as diferenças e semelhanças entre os homens, como também contemplando a natureza e observando a multiplicidade da vida animal e vegetal.

O ideal da educação na Grécia pode ser resumido em uma máxima denominada Mens sana in corpore sano, no qual se pode concluir que o cuidado com a saúde e o bem-estar físico são tão importantes quanto o desenvolvimento intelectual dos seres humanos. Tal perspectiva foi também importante para a educação romana.

A educação em Roma é didaticamente definida em três grandes períodos. A educação latina, termo pelo qual se designa a educação em um período anterior à influência grega. Um segundo momento, no qual tivemos a influência dos educadores trazidos da Grécia. E, por fim, o terceiro período, no qual se denomina educação greco-romana, pois ocorreu uma síntese entre a educação latina, já realizada, e a educação grega. Ao pensarmos a formação de instituições na Roma antiga, podemos lembrar que existiram Escolas de Retórica. Isto porque a formação de um tribuno, de um homem capaz de bem falar no Senado, era uma das principais funções educacionais.

À guisa de conclusão, podemos pensar que a educação greco-romana teve

aspectos distintos, extremamente evoluídos, ao possibilitar o desenvolvimento intelectual da humanidade, e ao mesmo tempo restritos, ao excluir a maior parte da população, que era composta por escravos, assim como as mulheres que também não eram educadas em sua maioria.

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

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A educação do mundo greco-romano sofreu profundas alterações quando a sociedade ocidental foi influenciada pela cultura judaico-cristã, com o período denominado Idade Média.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico você viu que:

• A sociedade grega era dividida em cidades-estado, sendo as duas mais importantes Atenas e Esparta.

• Atenas possuiu uma vida cultural intensa, enquanto Esparta era vinculada ao militarismo.

• Roma formou um dos principais impérios da antiguidade.

• A educação ateniense tinha como função formar um cidadão.

• A educação espartana tinha como função formar um soldado.

• A educação em Roma tinha como uma das principais funções formar um bom orador.

• A filosofia se desenvolveu na Grécia antiga, cujos principais destaques foram Sócrates, Platão e Aristóteles.

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1 Como podemos compreender as diferenças existentes entre os modelos educacionais espartano, ateniense e romano?

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 3

IDADE MÉDIA: A PATRÍSTICA, A ESCOLÁSTICA E

O NOMINALISMO

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico vamos contemplar o processo de formação da educação na sociedade judaico-cristã ocidental. O cristianismo revolucionou as estruturas sociais do Império Romano. Os valores do cristianismo, entre os quais a solidariedade social é o ponto alto, se opuseram aos valores greco-romanos, antropocêntricos e belicosos.

Neste sentido, a educação na Idade Média se relaciona em grande parte às questões da teologia cristã. Por Idade Média compreendemos um período da História do Ocidente, que se iniciou com o fim do Império Romano e terminou com o fim do Império Bizantino.

Muitos historiadores consideram o dia de hoje como o marco da queda do Império Romano do Ocidente, no ano de 476. Nesta data, foi deposto o usurpador Rômulo Augusto, forçado a abdicar do poder pelo chefe germânico Odoacro. Não se deve esquecer, contudo, que o Império Romano do Ocidente ainda sobreviveria por mais um milênio - a divisão em duas partes do império foi feita por Diocleciano em 286 d.C.. O depois chamado Império Bizantino seguiu até 1453, quando ocorreu a Queda de Constantinopla. Com o fim do Império Romano do Ocidente, muitos historiadores aproveitaram o fato para demarcar o fim da Antiguidade e o começo da Idade Média.

Podemos afirmar que a Idade Média também é subdividida em algumas periodizações, segundo uma tradição dos historiadores medievalistas franceses.

Alta Idade Média (Séculos V-X): período também denominado Antiguidade Tardia, no qual o processo de formação da sociedade medieval ainda se fazia em contato com a desagregação das instituições romanas.

Idade Média Central (Séculos XI-XIII): período de auge de um sistema social denominado feudalismo.

Baixa Idade Média (Séculos XIV-XV) desagregação do mundo feudal com o surgimento de novas instituições, como os Estados Nacionais. Período de expansão territorial da cristandade latina, que irá culminar com a descoberta da América, em 1492. Período em que temos o fim do Império Bizantino, com a conquista de Constantinopla pelos turcos otomanos, em 1453.

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

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Em geral, os cursos de Idade Média abordam três sociedades principais. A sociedade ocidental, denominada como Cristandade Latina, a sociedade cristã ortodoxa do Oriente, denominada Império Bizantino, e, por fim, as sociedades muçulmanas, no chamado Império Árabe. Estas três civilizações surgiram às margens do Mar Mediterrâneo. Outras formações culturais existiram no período, como o Império Mongol, na Ásia, comandado por Gengis Khan, ou mesmo os Vikings, do norte europeu. No entanto, foi a cristandade latina que gerou as instituições escolares que temos no presente. Por isso, daremos destaque às instituições latinas, e também discorreremos sobre Bizâncio e sobre o mundo muçulmano, sociedades nas quais os ocidentais estavam em permanente diálogo, seja através do comércio, das guerras ou das disputas teológicas.

Podemos afirmar que a Idade Média é, acima de tudo, um conceito

historiográfico surgido por volta do século XVII. O pensador alemão Cellarus criou o termo Medieval (JÚNIOR, 2001). Este conceito é deveras preconceituoso, pois os idealizadores da Renascença consideravam a Idade Média uma noite de mil anos, na qual os ideais gregos e romanos seriam retomados. Alguns consideram a Idade Média como a Idade das Trevas, ou Noite de Mil Anos, na qual os ideais científicos e o conhecimento dos seres humanos sobre o seu próprio corpo e sobre a natureza como um todo eram obscurecidos pela fé católico-romana. Um período no qual o cristianismo seria o único conhecimento válido. Concomitantemente, um período no qual o conhecimento sobre a Bíblia era negado aos fiéis, e em que o analfabetismo era uma constante.

Nos últimos 40 anos, as visões sobre o período medieval se renovaram.

Muitos pesquisadores de diversos aspectos da cultura medieval, como os filósofos, os historiadores e os teólogos contemporâneos, buscaram expandir o conhecimento sobre o período medieval sem o olhar preconceituoso da Idade das Trevas. A historiadora francesa Regine Pernot, no livro O Mito da Idade Média, provocou a intelectualidade a repensar o período. Muitas das transformações nas técnicas de pesquisa que a história enquanto disciplina passou foi uma das principais contribuições dos medievalistas, como o holandês Joahn Huizinga, ou os franceses Henri Pirrene e Marc Bloch.

Neste tópico, o enfoque será o Ocidente latino. No entanto, veremos sobre

as sociedades bizantinas e muçulmanas, com as quais a intelectualidade ocidental, formuladora da educação cristã latina, estava em perene diálogo. Como vivemos em um país ocidental de maioria cristã católica, estudaremos com maior profundidade o cristianismo no Ocidente. Para um alargar de consciência sobre diferentes culturas, analisaremos, com respeito e interesse científico, alguns dos principais aspectos da sociedade, cultura religiosa e educação entre ortodoxos e maometanos.

2 O MUNDO BIZANTINO

O denominado Império Bizantino pode ser encarado como uma típica teocracia. Isto é, um governo no qual o chefe político é considerado o representante de Deus na face da Terra. (RUNCIMAN, 1978, p. 13). A Teocracia Bizantina durou

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TÓPICO 3 | IDADE MÉDIA: A PATRÍSTICA, A ESCOLÁSTICA E O NOMINALISMO

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perto de mil anos, sendo o seu início a mudança da capital do Império Romano para a antiga cidade de Bizâncio, remodelada pelo imperador Constantino e renomeada Constantinopla. O fim do Império Bizantino ocorreu em 1453, quando turcos otomanos tomam militarmente Constantinopla, rebatizando a cidade como Istambul.

Para a compreensão da formação de Constantinopla, antes devemos

compreender o processo de declínio do Império Romano, pois Roma foi um império no qual a cultura grega permaneceu, vindo ainda como resquícios do império de Alexandre, “O Grande”. Assim, muitas regiões do Império Romano tinham o grego como principal idioma (LE GOFF, 2007, p. 51). Esta região foi o palco de um processo de cristianização, iniciado ainda no período dos apóstolos, relatado nos livros do Novo Testamento bíblico, alguns deles escritos em grego, como as cartas do apóstolo Paulo. Nos séculos posteriores, o cristianismo se arraigou na cultura popular, sendo ele um vetor de disputas políticas e teológicas em uma organização social romana que apresentava acentuada decadência.

Em 395 D.C., Constantino, imperador romano, além de alterar a capital do

Império para Bizâncio, ofertou liberdade de culto aos cristãos. No entanto, mais do que dar a liberdade de culto, convocou um Concílio Ecumênico, que tinha como principal pressuposto evitar disputas doutrinárias entre os cristãos que pudessem motivar motins ou rebeliões contra o governo imperial.

A economia em Bizâncio girava em torno do comércio marítimo. As costas

do Mar Egeu foram importantes pontos de trânsito de mercadorias, pois este era um entreposto entre os produtos orientais e Roma. Com a queda do Império Romano do Ocidente, em 476, quando Odoacro tomou Roma definitivamente, destronando o último imperador romano, Rômulo Augusto, Constantinopla se tornou a mais importante cidade do mundo de então.

A vida em Bizâncio em grande parte girava em torno do cristianismo. A Catedral de Hagia Sofia, que em português significa “Santa Sabedoria”, é um símbolo do poder eclesiástico e temporal. Tratava-se do local no qual o patriarca de Constantinopla celebrava as missas e, também, o local no qual o imperador bizantino era coroado (RUNCIMAN, 1978, p. 75).

Até 1054, existiam concomitantemente o papa em Roma e o patriarca em Constantinopla, em uma unidade de fé. No entanto, a partir do século XI ocorreu o chamado cisma greco-oriental. Devido a este cisma, isto é, a esta divisão teológica e político-eclesiástica entre o Catolicismo Romano e a Igreja Ortodoxa, o cristianismo passou por sua primeira divisão em sua unidade (OLSON, 2001). Tanto a Igreja Romana quanto a Ortodoxa consideram-se católicas, isto é, universais. Outra questão que ambas consideram ter é a descendência direta dos apóstolos. No entanto, podemos observar que as culturas grega e latina eram muito distantes em diversos aspectos da fé, o que somado a intenções políticas e econômicas, explica a divisão entre o cristianismo do Oriente e do Ocidente.

Bizâncio foi uma civilização que era organizada em uma teocracia. Assim,

muitos dos preceitos educacionais da sociedade bizantina seguiam os ditames da

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

fé. O mundo helenístico da denominada Ásia Menor foi fecundo em produções intelectuais nos campos da filosofia, da teologia e da náutica.

Com relação à náutica, os bizantinos desenvolveram o famoso fogo grego, uma arma de guerra naval capaz de propelir incêndios sobre as águas do Mar Egeu. As preocupações navais do Império Bizantino eram justificáveis devido ao fato de ser uma nação formada por diversas e pequenas ilhas e pontos litorâneos cobiçados pelos europeus latinos e pelos árabes muçulmanos. Nesta sociedade as funções marítimas eram desempenhadas por homens que aprendiam no cotidiano da faina naval a arte de navegar. No entanto, no que tange à História da Educação, o ensino em Bizâncio seguia os ditames da fé.

A região que compreendia o Império Bizantino em seu início era formada

por diversas escolas teológicas de renome na história da Igreja Cristã. As cidades de Antioquia, Alexandria e Constantinopla possuíam uma rivalidade em disputas teológicas na época da Teologia Cristã denominada patrística, que compreende o início das discussões teológicas nas quais os princípios da fé cristã estavam sendo elaborados.

A teologia da trindade teve nos chamados Pais Capadócios seus principais

formuladores. Por esta alcunha eram conhecidos os teólogos Gregório de Nissa, Gregório de Nazianzo e Basílio de Cesareia. Foram estes os formuladores da tese segundo a qual Deus é compreendido como Pai, Filho e Espírito Santo, como três pessoas distintas. Comum a muitas denominações cristãs no Ocidente e no Oriente.

No Egito surgiu um grupo de cristãos denominados coptas. Até o presente,

os coptas formam uma minoria religiosa respeitada. Os cristãos coptas não aceitavam a autoridade do patriarca de Constantinopla, aceitando por sua vez as ideias do patriarca de Alexandria. No entanto, para alguns, os coptas eram grupos de hereges. Algumas heresias foram consideradas importantes para a compreensão das disputas entre os cristãos no interior do Império Bizantino. Uma das mais importantes foi a de Ário, um pensador e líder cristão que questionou a divindade do Cristo, se opondo às ideias trinitarianas (OLSON, 2001).

A principal discussão teológica e social foi a chamada questão iconoclasta do século VIII, no qual se punham os cristãos favoráveis e os contrários à veneração de imagens. As disputas entre os favoráveis e aqueles que se mostravam contrários se acirraram a ponto de se conclamar o Segundo Concílio de Nicéia, no qual as ideias favoráveis ao culto às imagens de Maria Santíssima se tornaram vencedoras, em grande parte devido às ideias do sacerdote João Damasceno (OLSON, 2001, p. 306-309).

Alguns nomes da teologia bizantina são importantes de serem mencionados. São João Crisóstomo, conhecido pela alcunha Boca de Ouro. Sua eloquência era um dos fatores de liderança de revoltas e contestações contra o luxo em que viviam os patriarcas e imperadores. Orígenes foi um grande e importante místico, capaz de reflexões profundas sobre a natureza da alma humana.

A formação dos letrados era em grande parte vinculada à Igreja, por isso, a principal fonte de conhecimento dos bizantinos sobre os diversos assuntos que pautam

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a realidade humana eram vinculadas à teologia. O sacerdócio na religião ortodoxa segue a princípios distintos daqueles que segue a Igreja Romana. Uma das principais diferenças é com relação ao celibato. No Ocidente latino era (pelo menos do ponto de vista formal durante a Idade Média) obrigatório. No entanto, para a Igreja do Oriente grego, o celibato é opcional. Os sacerdotes podem escolher em constituir uma família ou apenas se dedicar à Igreja. Todavia, os cargos eclesiásticos de mais alta hierarquia são comumente designados apenas para os celibatários.

A formação como teólogo para a Igreja bizantina também não segue diretamente a tradição latina, pois para os bizantinos a função principal do sacerdote é estar em serviço do povo, não tendo uma distinção entre os mais capacitados intelectualmente (teólogos) e os demais sacerdotes (padres ou pastores). Assim, podemos concluir que a vida bizantina teve na religião cristã ortodoxa o centro ideológico principal do seu sistema educacional e de organização política.

No presente, existem alguns preconceitos contra a civilização e cultura

bizantina. Existe inclusive a pecha “discussão bizantina” para debates de temas pouco relevantes. Uma das críticas aos teólogos e educadores bizantinos era em relação a alguns debates de pouca importância instrumental, como quantos anjos cabiam na “ponta de uma agulha” ou “qual a cor dos olhos de Santa Maria”. Apesar deste preconceito, podemos afirmar a importância dos pensadores bizantinos. A Igreja Ortodoxa possui maioria entre as populações eslavas, sendo a religião mais tradicional e importante da Rússia. Os pensadores bizantinos influenciaram sobremodo a civilização ocidental, porém, não foram os únicos que estavam em contato com os europeus ocidentais. Os muçulmanos também estavam em um misto de diálogo e confronto com a “cristandade latina”.

3 O MUNDO ÁRABE MUÇULMANO

A sociedade muçulmana foi formada no século VII após o nascimento de Cristo. Maomé foi o fundador da religião muçulmana. Segundo a crença islâmica, ele teve um profundo contato com Deus, denominado pelos maometanos como Alá. Após este contato pessoal, sua vida se transformou de maneira radical. Homem que era casado com uma viúva de um rico comerciante, sua vida se transformou após esta experiência mística, com a qual se tornou um dos principais líderes carismáticos da história das religiões proféticas mundiais.

A Arábia no tempo de Maomé era um local de grande miscigenação cultural, em que conviviam homens e mulheres com convicções religiosas cristãs, judaicas e de antigos ritos politeístas. Este sincretismo social entre pessoas de diferentes convicções de fé demonstra algumas características básicas que a religião muçulmana possui. Em uma comparação com o cristianismo ocidental católico ou oriental ortodoxo, pode-se afirmar que a religião muçulmana é radicalmente monoteísta, pois não acreditam na trindade ou na veneração a imagens de santos.

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Maomé foi o homem que formulou as suras, textos que eram ditados aos seus seguidores, que os compilaram no livro sagrado denominado Alcorão. O Alcorão possui narrativas sobre a vida humana. Muitas das crenças judaicas e cristãs permaneceram entre os maometanos. O nascimento de Cristo, anunciado pelo Arcanjo Gabriel para Maria, que seria a mãe de Jesus. Noé é outro personagem presente no Alcorão, como também na Bíblia cristã e na Torah Judaica. Os maometanos acreditam em Jesus como um profeta e não como Deus encarnado entre os homens. Noé também é um personagem bíblico que está constantemente presente no Alcorão.

A formação de religião tem como marco a Hégira, período no qual Maomé

se desloca de Meca para Medina. Entre as características básicas dos muçulmanos está a de cumprir cinco obrigações ao longo de sua existência enquanto ser. Entre elas, está uma vez na vida se deslocar até Meca. Nesta cidade se encontra a Caaba, um meteorito, o qual os seguidores da religião acreditam ter algum poder especial. Outra característica da religião muçulmana é o jejum no mês do Ramadã, no qual os adeptos da religião não consomem alimentos no nascer até o pôr-do-sol.

Existem três vertentes majoritárias na interpretação da fé islâmica. Os

xiitas, os sunitas e os sufis. Os xiitas recebem esta denominação, pois formam um grupo ligado à tradição aos escritos do Alcorão. Os sunitas, por sua vez, possuem um maior apreço pelas palavras escritas no Alcorão, as sunas - a forma encontrada por Maomé para disseminar, ensinar e aplicar o Islã. Os sunitas são os adeptos majoritários entre os islamitas. O grupo minoritário é composto pelos sufis. Os sufis possuem uma maior liberalidade nos costumes em comparação com os demais grupos citados. Um exemplo é a permissão do consumo de bebidas alcoólicas entre os sufis, algo terminantemente proibido pelos muçulmanos xiitas e sunitas.

A religião muçulmana esteve em diálogo constante com a formação do

pensamento ocidental. Como nós veremos, os comentaristas árabes da obra de Aristóteles, Averróis e Avicena, influenciaram o Ocidente medieval a partir do século XII (LIBERA, 1999). A Península Ibérica, território no qual se encontram Portugal e Espanha, durante a Idade Média era um território árabe, que compunha o afamado Califado de Córdoba. Naquela época, os intelectuais árabes compuseram importantes técnicas e formas do comércio, da cultura e das artes. Os números que utilizamos são influência dos árabes, assim como técnicas de navegação e comércio.

Por vezes, os muçulmanos são questionados como cultores das ciências, das artes e das letras. Em especial, por terem destruído o farol de Alexandria, uma das sete maravilhas do mundo antigo. A torre do farol era composta por uma biblioteca com milhares de pergaminhos, depósito de toda a cultura helenística, isto é, dos povos de fala grega que habitavam a Ásia Menor. No entanto, os maometanos são acusados de terem queimado todos os pergaminhos, para esquentar as caldeiras dos chamados banhos turcos. Este fato pode ser apenas uma lenda, mas é um retrato da visão do Ocidente sobre a relação dos árabes com o conhecimento.

O sistema educacional árabe era muito semelhante ao do Ocidente, no sentido de que a pedagogia seguia os ditames da fé. No entanto, enquanto o Ocidente medieval apresentou uma decadência nos aspectos intelectuais, os muçulmanos apresentaram

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centros educacionais e universitários de grande renome. Um dos destaques das sociedades árabes durante a Idade Média foi o centro universitário de Bagdá. Um local no qual grande parte de textos da antiguidade clássica greco-latina era traduzida para o idioma local, facilitando o estudo e se transformando em uma das principais regiões do mundo no que tange à produção de conhecimento acadêmico (LIBERA, 1999).

Uma das principais razões para se estudar a História da Educação é a de desmistificar preconceitos. Em especial a mídia ocidental, nos últimos 30 anos, apresenta a religião islâmica e o mundo árabe de uma forma deturpada. Fundamentalismo, totalitarismo e ignorância são apresentados como sinônimos dos árabes muçulmanos. Todavia, como podemos observar nesta breve visão panorâmica sobre o mundo medieval islâmico, a presença de grandes centros de pensamento, além da inconteste influência intelectual dos árabes na formação da escolástica, a principal corrente da teologia Católica Apostólica Romana, nos permite afirmar que a vida ocidental é influenciada pelos árabes muçulmanos.

A religião islâmica é uma das principais formas religiosas do mundo. Após os atentados terroristas aos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001, as informações sobre a religião e cultura árabe e maometana são tendenciosas e negativas. Vale a pena pesquisar em sites da internet sobre a religião islâmica em seus múltiplos aspectos, assim como diferentes questões culturais árabes.

4 A EDUCAÇÃO NA IDADE MÉDIA OCIDENTAL

O processo de desenvolvimento da educação na Alta Idade Média sofria uma radical transformação com relação ao processo educativo nos tempos do Império Romano, pois se em Roma o valor da valentia e da competitividade era considerado grande virtude, após a instituição do cristianismo, em 395, como uma religião permitida, e após o Édito de Teodósio, considerando a religião oficial do Império Romano, as ideias da compaixão e da piedade, contrárias à antiga ordenação social, acabaram por se transformar em virtudes sociais (LIERRARD, 1982). Com a alteração dos valores sociais, a sociedade na qual os mestres ensinavam a seus discípulos também foi alterada.

Acima de tudo, o cristianismo prega uma ideia de igualdade social, sem distinções entre bárbaros e romanos, judeus, latinos ou gregos, como afirmam as cartas paulinas do Novo Testamento (Gálatas: 3: 28). Todavia, com a rotinização do carisma cristão, a ideia de um mundo onde todos são iguais perante Cristo se transformou para uma sociedade profundamente desigual (GOMES, 1997). É comum designar a sociedade medieval como sociedade estamental. Isto é, uma

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sociedade na qual a posição social do indivíduo não é marcada pelo dinheiro que possui, mas, sim, pelo seu status, em geral vinculado à posse de terras. O estamento pode ser definido como um grupo social garantido por convenções e leis, mantido através da honra social e de um estilo de vida diferenciado (WEBER, 1982.).

Na Idade Média existiam três grandes grupos sociais: os servos, os sacerdotes e a nobreza guerreira. De modo esquemático e reducionista, apresentamos os seguintes tópicos explicativos:

• Servos: trabalhavam nas terras de um senhor. Para este estamento, a educação ocorria no interior das famílias, com as quais as crianças aprendiam o trabalho com a terra.

• Nobreza: eram proprietários rurais. Os jovens ingressavam na cavalaria e possuíam uma educação para a guerra. Outros filhos da nobreza possuíam um “professor particular”, o preceptor. No fim do período medieval surgiram as universidades.

• Sacerdotes: a Igreja foi a principal instituição educacional da Idade Média. Para os membros das ordens religiosas, a educação servia para a elevação do espírito.

A educação dos servos era realizada no interior das famílias, onde aprendiam a duras lidas lavrar a terra, realizar as orações e acompanhar as missas. Tratava-se de uma camada que não possuía acesso à educação institucionalizada. Em geral eram analfabetos, tendo um duro cotidiano de trabalho rural. Uma vida em contato direto com a natureza hostil de um ambiente rude e de cotidiana exploração. Os servos possuíam uma série de obrigações para com os senhores, devendo trabalhar nas terras senhoriais, pagando com uma porcentagem das colheitas (SILVA, 1982).

As duas camadas sociais que possuíam uma melhor formação escolar eram os membros da nobreza e os clérigos. A nobreza possuía como instituição social e educacional a cavalaria. Eram os membros da nobreza formados por suseranos e vassalos. Os suseranos eram os donos das terras. Por vezes, os suseranos concediam glebas de terras para vassalos, que, devendo proteção militar aos seus senhores, deviam estrita obediência a eles (JÚNIOR, 2001). Os sacerdotes formavam um dos estamentos mais privilegiados e a Igreja possuía um poder temporal (econômico) muito vasto, além do poder espiritual de influenciar a mentalidade dos fiéis (SILVA, 1982.). A elite intelectual medieval era composta por membros do clero, que aprendiam latim, grego e conhecimentos teológicos nas ordens religiosas às quais pertenciam.

Vejamos algumas características e instituições educacionais e sociais da

Idade Média no Ocidente latino.

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4.1 A CAVALARIA

A cavalaria foi uma instituição permanente e marcante no mundo medieval. Naquela sociedade existiam as Ordens Militares Cristãs, surgidas em geral durante as Cruzadas, como a Ordem de Santiago (espanhola), a Ordem dos Cavaleiros Teutônicos (alemã) e a Ordem dos Templários (francesa). As Cruzadas foram o esforço da cristandade latina em expulsar de Jerusalém os muçulmanos. Apesar de militarmente derrotadas, as Cruzadas possibilitaram um forte intercâmbio comercial e cultural do Oriente Médio com o Ocidente romano-germânico (JÚNIOR, 1987).

A guerra era uma ocupação cotidiana para a nobreza, que treinava com afinco para os combates. Todavia, as batalhas na Idade Média seguiam uma ética (ethos) própria. A principal diferença com os conflitos militares da atualidade é que a maior parte da população não participava. Apenas os que possuíam armadura e cavalo poderiam ser guerreiros. O que ocorria eram as batalhas denominadas justas, nas quais dois cavalarianos lutavam, buscavam derrubar ao chão ou matar seu oponente. Em geral, o prêmio pela vitória militar era o recebimento de um feudo, gleba de terras que também poderia ser conquistada através de casamentos arranjados (JÚNIOR, 1986).

Para iniciar como um membro da Cavalaria, o jovem deveria iniciar seu trajeto como escudeiro de um cavaleiro mais antigo. Com ele aprendia as técnicas do trato com as armas e os cavalos. A cavalaria foi uma escola para a nobreza guerreira, na qual os jovens aprendiam regras hierárquicas, equitação e as leis dos combates medievais (MONROE, 1979). Por vezes, estas são denominadas guerras intestinas, que recebiam este nome por se realizar disputas no interior de territórios que obedeciam ao papa. Os confrontos entre a nobreza armada motivaram aos papas decretarem leis que as limitavam, como a Paz de Deus, que proibia batalha nos domingos, e a Trégua de Deus, que proibia combates em dias santos.

4.2 PRECEPTORIA: A EDUCAÇÃO DA NOBREZA NA IDADE MÉDIA E NA IDADE MODERNA

Enquanto os servos possuíam sua educação com a família, aprendendo as lidas da terra, e parte da nobreza se dedicava à cavalaria, existiu um tipo específico de educação, a preceptoria. Esta era uma espécie de ensino particular, em que um professor se dedicava a ensinar os filhos de uma família rica. O preceptor era um tipo específico de professor particular, pois morava na mesma casa que o seu educando. Em geral, não era apenas um professor que deveria ter predisposição para ensinar os rudimentos das chamadas sete artes liberais, como também ser uma espécie de exemplo, na vida cotidiana, para seus pupilos.

As sete artes liberais eram conhecidas como Trivium e o Quadrivium.

Nestas, os alunos tinham contato com as disciplinas de gramática, retórica e dialética, no Trivium. O Quadrivium era composto pelas disciplinas de geometria,

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aritmética, astronomia e música (ARANHA, 1996). Em geral, o ensino das sete artes liberais ocorria nas escolas catedrais. A função do preceptor era a de preparar os filhos da nobreza para o ensino médio (trivium) e superior (quadrivium).

A principal característica da educação com base na preceptoria é a ausência de uma institucionalização da educação primária. Ao invés de as crianças passarem a frequentar um ambiente distinto do seu cotidiano e extrafamiliar para aprender a ler e escrever, o sistema de preceptoria possibilitava que a educação ocorresse sem a necessidade de ser mediado por outra organização que não a família.

Os preceptores eram, em geral, homens que tiveram uma formação

sacerdotal. Esta formação enquanto padres, monges ou freis se explica por ser a Igreja a principal instituição a zelar pelo conhecimento, ao serem os mosteiros os depositários das mais distintas obras da antiguidade clássica (NUNES, 1979). A educação realizada pelos preceptores extrapolou os limites cronológicos da Idade Média, em especial nos países católicos, nos quais a formação de um sistema público de ensino foi posterior aos países de idioma protestante.

4.3 A PATRÍSTICA

Por Patrística é compreendida a teologia cristã surgida após a morte dos apóstolos e findada com o desenvolvimento da Escolástica, no Ocidente, por volta do século XI. Os teólogos e demais líderes cristãos na época da perseguição do Império Romano foram chamados Pais da Igreja ou Pais da Fé, por isso a denominação Patrística.

Com o fim da perseguição romana aos cristãos com o imperador Constantino em 395 D.C., e com o Concílio de Niceia, no qual se teve o credo dos apóstolos, o cristianismo se torna doutrina oficial do Império. Certas questões teológicas, como a definição das doutrinas cristãs, em especial a trindade, no qual se estabeleceu a figura do Deus que é pai, filho e espírito santo, ganham não somente um cunho religioso, como uma aplicação social e política. A institucionalização da fé pode ser medida na delicada e profunda diferença em considerar que Jesus é o caminho, a verdade e a vida, para compreender que fora da Igreja não existe salvação (GOMES, 1997). Esta alteração pode ser encarada como uma forte relação da Igreja com o Estado, sendo o ideal cristão profundamente modificado dos tempos da igreja primitiva dos apóstolos Pedro, Tiago e Paulo, expresso nas epístolas neotestamentárias.

A Patrística, enquanto movimento intelectual, foi fecunda em diversos

sábios que buscaram aliar o conhecimento advindo com a filosofia grega de Platão aos ditames da fé. Muitos dos intelectuais patrísticos eram antigos professores de filosofia grega, convertidos ao cristianismo por considerar a mensagem de Jesus o ponto culminante da história humana, ou simplesmente porque encontraram descanso para as suas almas (LUCA, 1988). Alguns nomes, tanto os da Igreja grega quanto da latina, são importantes para a compreensão deste período da história cristã. Santo Ambrósio, bispo de Milão, foi um importante doutrinador da Igreja

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Romana, por justamente ser colocado no hall de grandes nomes da intelectualidade cristã. Orígenes, grande místico da Europa Bizantina, também teve destaque em suas reflexões espirituais. Todavia, o principal nome da Patrística no Ocidente foi um discípulo de Santo Ambrósio: Agostinho de Hipona ou Santo Agostinho.

Aurélio Agostinho nasceu em Tagaste, na província romana da Numídia

(atual Souk Aras –Marrocos). Seu pai era um pagão que se deixou batizar cristão perto da morte, como era usual no cristianismo romano do século IV. Sua mãe, Santa Mônica, era uma cristã que buscava a conversão da família para a fé nos ensinamentos de Jesus. No início da sua vida, Agostinho não compreendia o cristianismo como uma doutrina racional, se dedicando a práticas pagãs e intelectualmente sendo influenciado pelo maniqueísmo, uma doutrina igualmente pagã. Possuiu em sua vida um certo destaque como professor de retórica para membros da juventude romana. Com 32 anos de idade, após uma grave crise existencial, se converte. Esta conversão, após muita reflexão, foi um dos principais lumes do cristianismo. Sua principal contribuição intelectual foram os livros As Confissões, no qual, de forma autobiográfica, narra detalhes de sua conversão, e A Cidade de Deus, no qual defende o cristianismo contra as acusações pagãs que culpavam a queda de Roma à pouca combatividade de uma religião que pregava a paz universal. Ao refletir sobre a tomada de Roma pelos soldados do bárbaro Alarico, Agostinho ponderava que uma das poucas construções que foram respeitadas pelos bárbaros foram as igrejas cristãs. Em parte, Agostinho apontava que as virtudes cristãs eram os valores romanos (OLIVEIRA, 1987).

A principal obra de Agostinho de Hipona sobre a Educação foi o De

Magistrum, em uma tradução literal, O mestre. Trata-se de um diálogo de Agostinho com um discípulo, no qual o autor aponta sua visão de educação, onde havia a necessidade de uma iluminação divina para que o processo educativo pudesse ser desencadeado. A ideia de um mestre ensinando discípulos, e em especial a obra De Magistrum, revelam o quanto o cristianismo foi a base da educação no Ocidente durante vários séculos.

Agostinho de Hipona é um dos principais intelectuais da história do cristianismo. O seu retrato autobiográfico “As Confissões” é uma das obras clássicas da literatura universal. Como se trata de um retrato biográfico, é uma agradável leitura que vale a pena ser feita.

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FIGURA 15 - SANTO AGOSTINHO

FONTE: Disponível em: <http://www.diocesepetropolis.org.br/paroquiadenogueira/?p=578>. Acesso em: 10 out. 2016.

4.4 A REFORMA EDUCACIONAL CAROLÍNGIA

A expansão dos muçulmanos pelo Ocidente foi avassaladora. Conquistaram a Península Ibérica e não conseguiram conquistar a Europa devido à vitória dos soldados comandados por Carlos Martel da Batalha de Poitiers. Seu filho Pepino “O Breve” foi um importante líder. Carlos Magno, filho de Pepino, foi o líder maior de um império que surgiu no norte europeu no século VII e que foi uma das últimas tentativas de manutenção de um governo politicamente unificado. Com o fim do Império Carolíngio, temos a ampliação do feudalismo na Europa. No campo político e militar, o Império Carolíngio obteve uma unidade política na região da Europa central. A imponência imperial atingiu tanto os aspectos políticos, quanto os militares, econômicos e culturais (NUNES, 1979).

Do ponto de vista político, houve uma união territorial que possibilitou

uma maior estabilidade social, e fez com que o Rei Carolíngio pudesse estender sua liderança não apenas no campo militar, mas também nas questões culturais. Por isso, é comum a utilização do termo Renascimento Carolíngio, para expressar este novo momento de incentivo às artes e à cultura. Mesmo sendo analfabeto, Carlos Magno contratou professores e realizou diversos investimentos em questões culturais e educacionais. O grande nome de destaque do Renascimento Carolíngio, no que tange às questões educacionais, foi o britânico Alcuino de York, líder educacional a quem Carlos Magno doou a Abadia de Tours, local que foi transformado em um centro de saber e erudição.

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O Império Carolíngio foi dividido entre os filhos de Carlos Magno, que fragmentaram ainda mais as posses territoriais. Após o fim do Império Carolíngio, a Europa passou por um processo de fragmentação de poder. No entanto, não apenas com consequências no tocante à política e à economia, que se tornou menos monetária, como também com relação à educação, que ficou ainda mais dependente dos ensinamentos da Igreja, não apenas nos ditames teológicos ou devocionais, como, acima de tudo, do ponto de vista político.

4.5 OS MOSTEIROS E A EDUCAÇÃO MEDIEVAL: O MOVIMENTO CENOBITA E AS ORDENS MENDICANTES

As ordens religiosas compreendem o chamado clero regular, no qual os

sacerdotes católicos passam as suas vidas em contemplação e dedicação exclusiva à instituição religiosa à qual pertencem. O clero secular é aquele formado por padres diocesanos, isto é, sacerdotes que vivem em contato direto com o povo cristão, nas paróquias que estão sob a jurisdição de um bispo de uma região determinada.

As ordens religiosas foram fundadas em um período histórico de êxodo

urbano no Império Romano do Ocidente. Muitos dos moradores das cidades romanas abandonavam a cidade buscando uma vida mais tranquila em pequenas cidades rurais. Assim, cristãos também faziam parte desta tendência migratória interna ao Império. Todavia, no caso cristão, ao invés de serem movidos apenas por uma busca de vida melhor longe dos conglomerados urbanos, os mesmos possuíam um ideal místico de salvação das almas. Este movimento cristão de formação de comunidades de fé foi denominado movimento cenobita (PIERRARD, 1982).

Santo Antão e outros precursores buscavam a vida no deserto do norte africano como um modo de atingir um ideal de pureza espiritual, fugindo das tentações. No entanto, o marco inicial da vida monástica no Ocidente foi a ordem religiosa formada na Europa por Bento de Núrcia. A Ordem de São Bento, como até hoje existente e conhecida, apresentou para o mundo cristão instituído a novidade de uma Regra de Vida Comum. A regra de São Bento, primeira a existir no cristianismo, foi uma das propulsoras da multiplicação de mosteiros de irmãos de vida comum. Assim como São Bento, Santo Agostinho também formulou uma regra de vida no cenóbio, a conhecida Regra de Santo Agostinho (BOFF, 2009).

Um outro momento, além do século IV, na formação de ordens religiosas,

foram os séculos XII e XIII. Naquele período, a sociedade europeia passou por profundas transformações sociais, como as Cruzadas e as formações de cidades. Estas transformações se refletiram nas sensibilidades religiosas. Naquele século surgiram as chamadas ordens mendicantes: franciscanos e dominicanos (COMBY, 1993).

As ordens mendicantes recebem este nome pela forma como os irmãos de fé se comprometem antes de entrar nelas. Ter uma vida de pobreza, obediência e castidade. Este triplo compromisso é simbolizado na Ordem Franciscana com o TAU, símbolo que o franciscano carrega em seu peito, assim como três nós em uma

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corda pendurada ao lado direito do corpo do irmão de fé. Os franciscanos seguem o carisma do fundador São Francisco.

Este foi um nativo da cidade italiana de Assis. Filho de um comerciante que enriqueceu com as transações financeiras de um sistema de trocas de produtos que crescia na Europa do século XII e que resolveu abandonar a riqueza da família e um possível casamento com a jovem Clara, para seguir um ideal religioso de pobreza. O ideal de vida proposto por Francisco de Assis perpassa não somente por um elogio à pobreza como uma forma de vida, mas também uma possibilidade de vida em maior contato com a natureza.

São Francisco afirmava que a vida dos homens e dos animais possuía a comum origem divina, pois no Gênesis bíblico a criação é apresentada tanto dos animais quanto do ser humano, por isso, uma das histórias que perpassam o fundador da ordem é a da pregação que São Francisco realizava para os seres da natureza, como as plantas e os animais selvagens.

Os dominicanos foram outra importante ordem surgida no Ocidente latino. Eles têm este nome em homenagem ao seu fundador, Domingos de Gusmão. Nascido no País Basco, São Domingos foi um dos principais defensores da fé católica contra um grupo de hereges denominados Cátaros. Com o ideal de pregar a verdadeira fé proposta nos evangelhos, Domingos funda uma ordem religiosa. Todavia, os dominicanos não possuem uma regra de vida comum original. Utilizam da Regra de Santo Agostinho, com comentários adicionais realizados pelo fundador da ordem. Principal carisma da Ordem Dominicana é pregar o evangelho. Também são conhecidos como Ordem dos Pregadores, e têm como distintivo a abreviatura O.P. (Ordem dos Pregadores). Os dominicanos surgiram em um ambiente de defesa da fé cristã católica contra uma heresia. Também são conhecidos pela alcunha de cães do senhor, ou em latim, domini cani. Os papas os encarregavam do tribunal da Santa Inquisição, uma instituição punitiva da Igreja Católica e que teve como intenção enquadrar pessoas que não andassem de acordo com os mandamentos da Igreja, como os judeus ou os acusados de bruxarias ou feitiçarias. Os dominicanos não foram apenas inquisidores, mas também muitos deles se transformaram nos principais professores das universidades europeias, a partir do século XIII (BEDOUELLE, 1997).

4.6 OS MONGES COPISTAS

Os monastérios foram os principais repositórios da cultura antiga grega e romana durante todo o período medieval. Isto porque as bibliotecas eram presentes nas instituições religiosas, sendo, por isso, verdadeiros locais de formação do conhecimento. Entre as diversas ocupações com as quais os monges passavam seu dia a dia, como cuidar da horta ou das orações, existiram monges que tinham uma função específica: realizar cópias dos antigos livros nos quais se encontravam explicações sobre as ciências, sobre a teologia e sobre as normas sociais da antiguidade grega, romana e patrística. Também bíblias, em especial da vulgata de São Jerônimo, eram copiadas em sua versão em latim.

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Um dos principais filmes que retratam a vida intelectual na Idade Média é “Em Nome da Rosa”. Baseado no livro homônimo do intelectual italiano Umberto Eco, é uma obra que vale a pena ser lida e vista em filme.

4.7 A ESCOLÁSTICA

O termo Escolástica se refere à teologia cristã formulada a partir do século XI no Ocidente (cristandade latina). A origem etimológica latina é scolarum (escola). Isto porque os principais intelectuais escolásticos trabalhavam em instituições de ensino. Podemos afirmar que a principal influência da Escolástica foi o pensamento aristotélico, e a principal rivalidade intelectual com os intelectuais árabes Averróis e Avicena (LIBERA, 1999).

Um dos primeiros autores escolásticos foi Santo Abelardo. Monge da Ordem de São Bento, autor de importantes escritos que visavam casar a fé cristã com a razão filosófica. No entanto, São Tomás de Aquino foi o principal formulador das teses escolásticas. Monge da Ordem Dominicana, seu primeiro livro foi a Suma Contra os Gentios, no qual combatia argumentativamente contra os intelectuais árabes maometanos da Península Ibérica (Averróis, Avicena). Contudo, seu principal livro foi a Suma Teológica, um tratado no qual o autor reflete sobre múltiplas questões da vida nas esferas cultural, econômica e social, como a guerra, a paz, os lucros nas transações financeiras, a sexualidade, entre tantos outros, sempre com uma dupla lente, formada pelo cristianismo e o aristotelismo. Sua base racionalista o fez formular cinco vias que levam até Deus.

FIGURA 16 - DOUTOR ANGÉLICO - SÃO TOMÁS DE AQUINO

FONTE: Disponível em: <http://academico.arautos.org/2012/09/o-conhecimento-de- deus-segundo-suma-contra-os-gentios-de-sao-tomas-de-aquino/>. Acesso em: 10 out. 2016.

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

4.8 O NOMINALISMO

Não existiram apenas a Patrística e a Escolástica como modos de pensamento durante a Idade Média. No norte da Europa, a Escolástica não teve grande relevância. O Nominalismo, corrente de pensamento que teve em John Duns Scot e Guilherme de Ockham seus principais formuladores, foi uma das principais fontes de reflexão nas universidades do norte europeu, chegando inclusive a influenciar o reformador da Igreja, Martinho Lutero, leitor de um pensador nominalista, Gabriel Biel (FEBVRE, 2012, 25-49).

O Nominalismo baseava-se na ideia dos universais. Os universais podem ser considerados como os conceitos que os homens utilizam para pensar. Os universais passavam a ser o ponto principal das reflexões filosóficas e teológicas, não mais sendo a tentativa de junção entre a fé e a razão, como na Escolástica.

Tanto John Duns Scott quanto Guilherme de Ockham eram oriundos

da Universidade de Oxford e tiveram anos de vivência como irmãos da Ordem Franciscana. O Nominalismo baseava-se na chamada Navalha de Ockham. Isto seria uma das formas de pensar em que a pluralidade e as diferenças deveriam ser crivadas através de alguns critérios. Para o nominalista, “Não se deve anunciar uma pluralidade sem a isso ser obrigado por uma necessidade: razão, experiência, autoridade da Escritura ou da Igreja” (LUCA, 1988, p. 85). Esta afirmação é de profunda dialética, isto é, revela um pensamento original baseado em ideias contrárias, pois visava excluir todas as ideias supérfluas de uma argumentação.

Com relação às ideias políticas, na disputa entre o papado e o império,

Ockham tomou posição intelectual para o segundo. Sua teologia discordava de uma submissão do imperador para o papado. Talvez por sua rebeldia ou pela sua originalidade intelectual e teológica, Ockham foi excomungado em 1328. Todavia, suas reflexões ficaram como uma das bases do pensamento do homem ocidental.

DIALÉTICA: Por dialética é compreendida uma forma de alcançar conhecimento baseado em pensamentos contraditórios. Uma tese é contestada por uma síntese, que por sua vez, com a junção de tese mais antítese, se formaria uma síntese. Em suma, podemos definir dialética como um modo de pensar que valoriza a polêmica, o debate entre ideias contrárias.

4.9 A FORMAÇÃO DAS CIDADES E ASCORPORAÇÕES DE OFÍCIO

Durante a Idade Média Central desenvolveram-se trocas comerciais, nas feiras, essas tratavam-se de locais nos quais o excedente da produção dos

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feudos era comercializado. Os produtos orientais trazidos pelas Cruzadas eram comercializados nos chamados burgos fortificados, locais em que havia a presença de uma ordem monástica-militar, como a dos Cavaleiros Teutônicos ou dos Cavaleiros Templários.

Estas feiras periódicas se transformaram em constantes, sendo deste período a formação de uma classe social responsável por este comércio, os burgueses (habitantes do burgo). O surgimento da vida urbana prescindiu a formação de uma gama de profissionais que pudessem adequar as cidades a uma qualidade mínima de vida. Profissões antes não existentes nos feudos começaram a surgir no chamado Outono Medieval.

São alguns exemplos os padeiros, os alfaiates, os sapateiros e os pedreiros, que eram artífices importantes para a manutenção de uma vida digna em um ambiente urbano. Com o aumento da monetarização, outras profissões se tornaram importantes, dentre elas a de advogado, que buscava estabelecer justiça entre os antagônicos interesses presentes, e a de médico, que buscava a cura para as mais diferentes doenças sem apelar para os rituais tradicionais, que poderiam ser considerados demoníacos pela Santa Inquisição (NOVINSKI, 1988).

A monetarização foi uma das principais características das cidades

medievais, pois as moedas de ouro e prata passaram a ter cada vez maior espaço, declinando, de forma lenta, as trocas naturais de produtos por outros produtos. Entre os produtos vendidos nas cidades estavam aqueles fabricados nas denominadas corporações de ofício (PIRRENE, 1968).

As corporações de ofício eram instituições de artesãos que fabricavam produtos manufaturados, como tecidos ou sapatos. As corporações formavam uma espécie de sistema de aprendizagem entre os artesãos. Iniciavam ainda crianças como aprendizes, galgavam posto como oficial e poderiam chegar a mestre, posição que os possibilitaria abrir uma corporação própria (JÚNIOR, 2001).

As corporações possuíam um rígido sistema hierárquico, no qual os candidatos a mestre deveriam ter a capacidade de realizar uma obra-prima. Este sistema se manteve durante séculos em muitos países europeus, até ser transformado pela Revolução Industrial.

4.10 AS UNIVERSIDADES

As corporações de ofício foram uma inovação social, surgida pouco antes das universidades, e em grande parte as inspiraram. Todavia, eram corporações muito distintas das usuais. A Igreja teve uma importante participação no fomento das universidades. Em grande parte, por questões de honra estamental, isto é, pelo prestígio que concedia a uma ordem ter um de seus membros participando como catedrático de uma universidade. Um prestígio tanto no interior do clero, quanto na representação dos religiosos com relação à comunidade na qual estavam inseridas (CARDINI, 1997).

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A Igreja foi uma fomentadora, porém, diversas outras instituições sociais e estratos da população apoiavam a criação destas instituições de ensino. Entre os diversos fatores, podemos citar o fomento à economia das cidades nas quais elas se encontravam, pois uma grande gama de pessoas migrou para algumas cidades, como Coimbra, Salamanca ou Paris, tornando-se um mercado consumidor para os produtos produzidos pelas corporações de ofício e revendidos pelos comerciantes locais.

Outra camada social que estimulou a criação de universidades foi o Estado

Nacional em processo de criação na Europa da Baixa Idade Média. Das universidades saíram os principais administradores da burocracia dos governos dos distintos países. A vinculação do Estado com as universidades pôde ser relacionada ao verdadeiro símbolo nacional de alguns países em algumas instituições, como é o caso de Salamanca na Espanha, Oxford na Inglaterra, Sorbonne na França e Coimbra em Portugal. A grande autonomia que as universidades possuíam no fim da Idade Média revela a importância que estas instituições ganharam na sociedade europeia de então.

Por vezes, o título de bacharel ou “letrado” era assemelhado (se não equivalente) a um título nobiliárquico. Esta equiparação de status servia como um incentivo para jovens que buscavam ascensão social. As universidades foram instituições surgidas com o apoio do clero e que visavam o ensino de jovens para profissões liberais, como o direito e a medicina. Estas profissões passaram a ter um forte status social, sendo também buscadas por filhos da nobreza.

Durante a Idade Média, o curso superior de maior prestígio era o de Teologia. Ele formava o quadro dirigente da Igreja, principal instituição medieval. A Teologia era reconhecida como a Rainha das Ciências. Em especial devido ao trabalho intelectual de Pedro Abelardo, intelectual responsável por divulgar o termo “Teologia” (JÚNIOR, 1997).

No decorrer dos séculos, as universidades conseguiram se afirmar como a principal instituição do sistema de ensino, ao serem as formuladoras das reformas educacionais e propositoras de novas ideias científicas. As proposições dos intelectuais universitários se fazem com uma nova possibilidade de compreensão dos homens no Ocidente com relação à importância do conhecimento para o desenvolvimento político, social e econômico das sociedades.

Pedro Abelardo foi um interessante personagem medieval. Sua vida foi retratada no filme Em Nome de Deus, no qual foi contada sua romântica história com a jovem Heloísa. Um romance que deveria ser mantido em segredo devido ao compromisso do celibato do teólogo Abelardo.

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TÓPICO 3 | IDADE MÉDIA: A PATRÍSTICA, A ESCOLÁSTICA E O NOMINALISMO

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LEITURA COMPLEMENTAR

Os primórdios da arqueologia históricaO arqueólogo brasileiro e professor da Unicamp conversou com Leituras da História

sobre esta modalidade eurocêntrica e fala sobre as origens e o campo de atuação no Brasil.

Por definição, a chamada arqueologia histórica é uma modalidade que estuda sociedades por meio de registros escritos. É, assim, disciplina bastante abrangente e considerada uma das mais eurocêntricas, ou seja, que coloca a Europa como centro da constituição da sociedade moderna. O objetivo de seus estudos é justapô-los com os outros que investigam e grupos mais antigos e até mesmo pré-históricos. Por vezes se concentra nas atividades de classes operárias, mulheres e até mesmo de crianças.

Como uma modalidade tão específica pode encontrar um campo de trabalho em nosso país? Para tanto, fomos em busca de um nome nacional que discute as aplicações da arqueologia histórica há algum tempo. Pedro Paulo Funari é, além de professor, pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam/Unicamp). Participa do conselho editorial de pelo menos 30 revistas científicas nacionais e 14 estrangeiras. Dentre estas últimas, destacam-se publicações como o “Public Archaeology”, o “Journal of Social Archaeology” e o “International Journal of Historical Archaeology”. É autor de mais de 330 artigos publicados em revistas de todo o mundo e escreveu ou coescreveu mais de 80 livros na área de História e Arqueologia.

O professor, que hoje é também assessor do reitor da Unicamp, apresentou alguns resultados obtidos com o Grupo de Pesquisas que coordena junto com o professor André Chevitarese. Dentre os artigos científicos já publicados, estão aqueles que saíram em revistas de renome, como “World Archaeology”, “Journal of Roman Archaeology”, “Journal of Social Archaeology” e “Current Anthropology”. Vários dos estudantes que já passaram pelo crivo de Funari tornaram-se professores de universidades como a UFMG, UFPR, Unifesp e UFRJ, entre outras.

Na entrevista a seguir, Funari fala sobre as definições de arqueologia histórica e suas aplicações práticas.

Arqueólogos participam de escavações no Fórum Romano

LEITURAS DA HISTÓRIA – O que vem a ser arqueologia histórica e qual a diferença desta modalidade para a arqueologia convencional?

PEDRO PAULO FUNARI – A arqueologia histórica pode ser definida de duas maneiras. Para alguns especialistas, ela estuda a cultura material das sociedades modernas, resultantes da expansão do capitalismo, a partir do século XV. Desta perspectiva, a arqueologia histórica

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

estaria centrada na globalização e na modernidade. Para outros, dentre os quais me incluo, a disciplina está centrada no estudo da cultura material das sociedades que utilizam a escrita, desde o Egito antigo, até os dias atuais. Portanto, esta definição não é cronológica, mas epistemológica, ao enfatizar a convivência de discursos escritos sobre a sociedade e a cultura material dessas sociedades. Em ambas definições, contudo, a arqueologia histórica é uma disciplina especializada da Arqueologia que se diferencia, em primeiro lugar, da arqueologia pré-histórica, que estuda a cultura material de sociedades que não se utilizaram da escrita.

LDH – Como e quando surgiu cronologicamente a arqueologia histórica?

PPF – A arqueologia histórica, com esse nome, surgiu nos Estados Unidos, na década de 1960, voltada para o estudo da cultura material associada aos fundadores da nação, os protestantes anglo-saxões brancos, cujo acrônimo é WASP (White Anglo-Saxon Protestant). Nas duas décadas seguintes, com o crescimento dos movimentos sociais, a disciplina passou a incluir outros grupos constitutivos americanos, como os católicos, os afroamericanos, os irlandeses e as mulheres. De toda forma, a disciplina surgiu voltada para a modernidade. O livro clássico que apresenta esta abordagem foi escrito por Charles E. Orser, “A Historical Archaeology of the Modern World” (1996). A partir da década de 1990, estudiosos de outras partes do mundo, em particular da América Latina, África, Europa e Ásia, propuseram uma definição mais ampla da disciplina, voltada para o estudo da cultura material de todas as sociedades, no passado e no presente, que conhecem a escrita, tal como apresentado no volume “Historical Archaeology, Back From the Edge”, organizado por mim, Martin Hall e Sian Jones em 1999.

LDH – Qual é a contribuição de um arqueólogo histórico para a melhor compreensão das civilizações do passado?

PPF – As sociedades com escrita produziram informações de diferentes tipos: documentos escritos transmitidos pela tradição literária e uma imensa e crescente quantidade de objetos, alguns com escrita e imagens, provenientes da pesquisa arqueológica. Graças à Arqueologia, conhecemos uma grande quantidade de textos do Egito antigo, assim como temos imagens, estátuas e edifícios inteiros escavados. Tudo isso nos fornece informações únicas sobre a vida dos faraós, mas também das pessoas comuns. Sabemos mais sobre as sociedades da antiga Mesopotâmia por vestígios arqueológicos, do que sobre períodos recentes, mas menos estudados, o que pode parecer um paradoxo, mas demonstra a importância de estudarmos a materialidade. “Tradicionalmente, a formação dá-se numa graduação de História ou outra ciência (Ciências Sociais, Geografia, Biologia), seguida de mestrado e doutoramento focado no tema arqueológico”.

LDH – Há algum exemplo da atuação da arqueologia histórica para uma melhor compreensão das eras mais modernas?

PPF – Dentre os exemplos mais recentes e relevantes está o estudo arqueológico dos períodos ditatoriais. Por meio da arqueologia histórica, tem sido possível identificar pessoas que foram assassinadas e enterradas sem identificação.

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Na Europa, hoje, há escavações em curso na Espanha, referentes ao período da Guerra Civil (1936-1939). Na América Latina, em particular, essa recuperação da memória tem sido muito importante em diversos países, inclusive no Brasil. Não se trata, apenas, da possibilidade de identificação de corpos de desaparecidos, mas também do estudo das prisões clandestinas e de outros temas, como atesta o livro recém-lançado “Memories from Darkness, Archaeology of Repression and Resistance in Latin America” (Nova Iorque, Springer, 2009), organizado por mim, Andrés Zarankin e Melisa Salerno e que havia sido publicado, em versão anterior, no Brasil (“A Arqueologia da Repressão e da Resistência na América Latina”, São Paulo, Annablume, 2008).

LDH – Como é a formação do arqueólogo histórico? Quais os cursos para se obter esta especialização?

PPF – Há diversas possibilidades. Tradicionalmente, a formação dá-se numa graduação de História ou outra ciência (Ciências Sociais, Geografia, Biologia), seguida de mestrado e doutoramento focado no tema arqueológico. Nos últimos anos, surgiram cursos de graduação em Arqueologia e isso abre novas oportunidades na formação acadêmica de alto nível. O estudo da arqueologia histórica, em particular, tem crescido muito nos últimos anos no Brasil, pois cada vez mais se valoriza o patrimônio histórico.

LDH – Qual o campo de atuação no Brasil de um arqueólogo histórico?

PPF – Há dois grandes campos de atuação: acadêmico e de mercado. No primeiro caso, existem cursos que congregam arqueólogos históricos no corpo docente e, neste caso, o arqueólogo histórico pode atuar e ser remunerado pela pesquisa. Este é o caso de arqueólogos históricos renomados, professores de instituições de prestígio, como Andrés Zarankin (UFMG), Gilson Rambelli (UFS) ou Fábio Vergara Cerqueira (UFPel). Também museus e outras instituições patrimoniais podem abrigar arqueólogos históricos. Em seguida, existe o crescente mercado de trabalho em empresas privadas. Devido à legislação de proteção ambiental e patrimonial, multiplicaram-se as firmas voltadas para o segmento e há, portanto, empregos para arqueólogos em diversas funções.

LDH – Fala-se muito sobre arqueologia de cunho filológico. Pode explicar melhor este termo?

PPF – A arqueologia histórica, entendida como aquela que estuda os egípcios, mesopotâmicos, gregos, romanos, medievais e modernos, surgiu a partir do estudo das línguas e da escrita. Para estudar a cultura material desses povos, é necessário conhecer também as línguas e as escritas usadas por aqueles que construíram as pirâmides, os zigurates ou o Parthenon. Já por este aspecto, a arqueologia histórica liga-se ao estudo das línguas. Mais do que isso, o próprio sistema de classificação dos objetos, por meio de tipologias, inspirou-se na Filologia. Assim como se classificam as línguas, as palavras e os modos de falar, também se pode classificar os artefatos.

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

LDH – Nesse meio fala-se muito sobre o Congresso Mundial de Arqueologia. Pode explicar melhor o que vem a ser?

PPF – Esse órgão congrega arqueólogos do mundo todo. Ele foi fundado em 1986, com o objetivo de permitir que estivessem representados todos os continentes e mesmo os grupos estudados pelos arqueólogos, como os indígenas. Foi uma iniciativa muito importante para mudar os rumos da disciplina. A Arqueologia surgiu como uma atividade militar ligada ao imperialismo das grandes potências ocidentais. A

Antropólogo forense ajuda arque-ólogos em escavações na Ilha Wake, no norte do Oceano Pacífico.

introdução de arqueólogos da América Latina, África e Ásia no Congresso Mundial de Arqueologia permitiu, pela primeira vez, que todos tivessem voz. O mesmo vale para a inclusão dos representantes indígenas, pois os arqueólogos ligados ao imperialismo contribuíram para a exploração dos povos colonizados, do Egito ao continente americano. Não se pode, portanto, subestimar a relevância política e epistemológica do Congresso Mundial de Arqueologia, para democratizar a disciplina.

LDH – Qual período histórico possui mais arqueólogos históricos em atividade?

PPF – Nos Estados Unidos, predominam os arqueólogos históricos voltados para o estudo do mundo moderno, a partir do século XV. Na Europa, são mais numerosos os estudiosos do mundo greco-romano. No Brasil, o período histórico mais estudado refere-se à época colonial, em parte pela valorização, por parte dos órgãos patrimoniais, dessa época, mas cresce muito o interesse por períodos mais recentes e pelas civilizações como a romana, a grega e a egípcia, também com pesquisas arqueológicas originais de brasileiros.

LDH – Qual a diferença entre um arqueólogo histórico e um historiador?

PPF – O historiador, em geral, estuda documentos escritos, enquanto o arqueólogo volta-se para o estudo de artefatos, edifícios, estátuas, inscrições, ossos, tudo o que é material e foi usado pelo ser humano. Essa diferença de objeto de pesquisa, contudo, não impede o diálogo, ao contrário. Todo arqueólogo histórico deve conhecer a documentação escrita e a historiografia sobre determinado tema, e isto facilita bastante o diálogo e a cooperação. Os historiadores interessam-se, cada vez mais, por aspectos da cultural material, mas falta uma maior ênfase na formação do historiador, no conhecimento de aspectos materiais da cultura. Contudo, nos últimos anos muitos departamentos de História passaram a incluir disciplinas de Arqueologia em seu currículo, com a respectiva contratação docente. O mesmo deverá ocorrer com os cursos de Arqueologia implantados no momento, o que facilitará a cooperação. “Nos últimos anos muitos departamentos de História passaram a incluir disciplinas de Arqueologia em seu currículo, com a respectiva contratação docente”.

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TÓPICO 3 | IDADE MÉDIA: A PATRÍSTICA, A ESCOLÁSTICA E O NOMINALISMO

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LDH – O que é o Grupo de Pesquisa Arqueologia Histórica?

PPF – O Grupo de Pesquisa Arqueologia Histórica, sediado na Unicamp e liderado por mim e pelo professor André Leonardo Chevitarese (UFRJ e Unicamp), procura coordenar as atividades de pesquisa de diversos doutores, espalhados pelo Brasil, estudiosos da cultura material em sociedades com escrita. Destacam-se os estudos sobre o mundo romano, mas também sobre a modernidade e os usos do passado.

LDH – Quais as universidades nacionais que mais ajudam na formação e pesquisa das atividades ligadas à arqueologia histórica?

PPF – Há pesquisas de arqueologia histórica e formação de quadros em diversas instituições, com destaque para a USP, UNICAMP, UFMG, PUCRS, UFPel, UFS, UFRJ, sendo as duas primeiras aquelas que mais formaram estudiosos da cultura material das sociedades com escrita. Nos últimos anos houve uma diversificação e interiorização dessa formação e, hoje, há oportunidades em muitas universidades, como UFMA, UFPR, entre outras.

LDH – No que a arqueologia pré-histórica difere, em termos de metodologia, da arqueologia histórica?

PPF – A arqueologia pré-histórica estuda sociedades sem escrita e, por isso mesmo, está muito atenta às discussões da Antropologia, da Etnologia e dos modelos antropológicos. Para estudar objetos sem ter informações escritas, o pré-historiador recorre aos modelos interpretativos e à analogia com povos contemporâneos, como os indígenas brasileiros. Já a arqueologia histórica não pode prescindir do conhecimento da informação das fontes escritas e da historiografia. Mas ambas têm em comum o estudo detalhado e atento da cultura material, dos objetos em sua concretude.

LDH – Qual a diferença entre a arqueologia histórica e a de conservação?

PPF – A conservação é uma atividade específica, ligada ao estudo da cultura material histórica, mas específica. A conservação e a restauração de edifícios são ações para as quais o arqueólogo histórico contribui, ao colaborar com os especialistas conservadores e restauradores. De todo modo, a experiência internacional e brasileira mostra que essa cooperação é importante, para que não se percam informações relevantes ao restaurar um edifício sem um estudo arqueológico prévio.

LDH – Qual é o futuro da arqueologia histórica no Brasil?

PPF – As perspectivas para a arqueologia histórica no Brasil são muito promissoras. Em poucos anos, a disciplina floresceu, formou quadros qualificados, publicou livros e artigos no Brasil e no estrangeiro. A inserção internacional dessas pesquisas também já ocorre. Tudo isso indica a vitalidade atual da disciplina e as

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UNIDADE 1 | DAS SOCIEDADES ÁGRAFAS À FUNDAÇÃO DAS UNIVERSIDADES

possibilidades adiante. O mercado de trabalho tende a crescer, tanto na iniciativa privada como na área acadêmica. As oportunidades de pesquisa conjunta com instituições e pesquisadores estrangeiros, já existentes, tendem a aumentar e se diversificar.

Literatura ArqueológicaO professor Funari é autor e coautor de mais de 80 livros nas áreas de

História e Arqueologia. Muitos deles tratam de várias facetas do setor, como patrimônio histórico e o turismo.

FONTE: Disponível em: <http://www.academia.edu/11320545/Os_prim%C3%B3rdios_da_Arqueologia_Hist%C3%B3rica_-_Leituras_da_Hist%C3%B3ria>. Acesso em: 5 out. 2016.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico vimos que:

• Bizâncio foi uma importante civilização medieval.

• Maomé foi o fundador da religião muçulmana, importante no contexto cultural da Idade Média.

• O movimento cenobita e as ordens mendicantes estruturaram os mosteiros e o modo de ensino medieval.

• As universidades surgiram por volta do século XII, sob o patrocínio da burguesia e da Igreja.

• A Patrística foi uma corrente teológica predominante na primeira metade da Idade Média e teve como principal expoente intelectual Santo Agostinho.

• A Escolástica foi uma corrente teológica surgida entre a Idade Média Central e a Baixa Idade Média, buscava conciliar a fé e a razão, tendo como principal teólogo São Tomás de Aquino.

• O Nominalismo foi uma corrente teológica do final da Idade Média e teve como principais nomes os teólogos Guilherme de Okham e Duns Scotto.

• O denominado Renascimento Carolíngio foi um dos importantes momentos de fomento educacional na Idade Média.

• A Cavalaria era uma destinação de alguns dos filhos das famílias nobres.

• A Idade Média não merece a pecha de Idade das Trevas, pois foi um período rico em diversos campos das artes, letras e ciências.

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1 Por que não devemos considerar a Idade Média como a Idade das Trevas?

AUTOATIVIDADE

2 Por que podemos considerar a Idade Média como o período de formação do modelo ocidental cristão de educação?

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UNIDADE 2

ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO

EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir desta unidade você será capaz de:

• reconhecer o contexto histórico e filosófico no qual os principais pensa-dores da época renascentista e do Iluminismo formularam e defenderam suas ideias e teorias;

• identificar o impacto de instituições como as corporações de ofício, univer-sidades, o movimento da reforma religiosa, a formação do Estado laico e a Revolução Industrial ao contexto educacional;

• relacionar as principais concepções teórico-filosóficas e metodológicas que passaram a ser defendidas e legitimadas em meio à comunidade científica, nas instituições políticas e educacionais da época moderna;

• abordar as principais escolas e pensadores da educação do século XX, bem como o contexto político, econômico e sociocultural que propiciaram as condições para que as mesmas se desenvolvem.

Esta unidade está dividida em três tópicos. Em cada um deles são feitas su-gestões de filmes, sites, leituras para que você enriqueça seus conhecimentos, aprofunde e contextualize de forma mais completa e ampla seus estudos.

TÓPICO 1 – DECLÍNIO DO PENSAMENTO CRISTÃO E O FORTALECI-MENTO DO HUMANISMO MODERNO

TÓPICO 2 – A FORMAÇÃO DO SISTEMA LAICO DE ENSINO NO OCI-DENTE CONTEMPORÂNEO

TÓPICO 3 – OS DESAFIOS EDUCACIONAIS NO CONTEXTO DA PÓS-MODERNIDADE

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TÓPICO 1

O DECLÍNIO DO PENSAMENTO CRISTÃO

E O FORTALECIMENTO DO HUMANISMO

MODERNO

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico! Os fundamentos do processo educativo no contexto histórico e filosófico que transcorreram entre o Renascimento e o Iluminismo podem ser compreendidos cronologicamente como baixa Idade Média, que transcorreu entre os anos finais do século XV e que se estendeu até os últimos anos do século XVIII.

Algumas alterações e invenções ocorridas nos últimos 400 anos foram responsáveis por uma nova forma dos seres humanos viverem. Antes do século XV, vivíamos num mundo encravado, isto é, não havia trocas humanas e comerciais perenes entre os diversos continentes. Porém, no século XV, as viagens de Cristóvão Colombo, encontrando em sua rota o continente americano, e Vasco da Gama, achando um novo caminho marítimo para alcançar as Índias, são os reflexos de um mundo que se transformou, iniciando um processo de ocidentalização do mundo (CHAUNU, 1978).

Em outras palavras, a partir do século XVI, os países da Europa Ocidental começaram a impor as suas formas de organização social para os demais povos da Terra, em um sistema de exploração colonial. Porém, outras transformações ocorreram também nos campos político, religioso, artístico e cultural. No campo político, tivemos o fim do Império Bizantino com a queda de Constantinopla em 1453, tomada pelos turcos otomanos, o que significou um avanço da religião islâmica nas fronteiras da Europa Ocidental.

No campo religioso, a Reforma Protestante, simbolizada pelos líderes

Martinho Lutero e João Calvino, rompeu com a autoridade do papa em todos os países europeus, autoridade mantida apenas nos países da Europa no qual a Reforma não prosperou, como nas penínsulas ibérica e itálica. No tocante aos aspectos artísticos e culturais, o maior símbolo destes novos tempos no mundo ocidental foi o Renascimento artístico e cultural, que teve como principal local a Itália dos Bórgia e dos Médici, as principais famílias que patrocinavam as artes, o denominado mecenato artístico.

A partir do movimento do Iluminismo, somado às transformações que ocorreram a partir do século XVIII, ou da chamada Idade Moderna, caracterizada

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

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especialmente pelos eventos da Revolução Francesa e a Independência dos Estados Unidos da América e a Revolução Industrial, eis que se instaura uma nova forma de pensar a vida em comunidade e de produzir o saber. Agora a composição do Estado é laica, ou seja, ausente de integrantes do clero. A produção do conhecimento deixou de ser tutelada e financiada pela Igreja, posição que vai ser ocupada pelos grupos econômicos da burguesia, que vai favorecer que os estudos de cunho científico e não mais sobre os dogmas religiosos e as questões teológicas.

Segundo Ghiraldelli Jr. (1999), a filosofia da educação moderna consistiu em uma aliança entre a filosofia do sujeito e a educação humanista, cuja preocupação residiu em que o processo educativo garantisse a formação do sujeito racional, autônomo e consciente, o que, por sua vez, foi forjado por meio de uma educação monológica, verticalizada e autoritária, que valorizava métodos e concepções teóricas frente à experiência e prática cotidiana.

Ao longo de mais de quase três séculos ocorreram muitas transformações do ponto de vista político, econômico, social e cultural, assim como no que diz respeito à mentalidade e ao imaginário, dos modos de viver, de morrer, de transformar e elaborar as matérias-primas, o transportar, negociar e consumir os produtos, de explicar os fenômenos da natureza e as questões da origem, sentido e da finitude humana.

No campo das ideias pode-se relacionar a invenção da imprensa e as práticas de leitura: Trovadorismo, Renascença, Reforma, Contrarreforma, a superação dos regimes de monarquia (antigo regime) pelos de repúblicas democráticas, os primeiros processos de independência de colônias de metrópoles (E.U.A), a Revolução Francesa, a Declaração dos Direitos Humanos, a laicização do Estado, a secularização da sociedade (enfraquecimento das explicações sagradas/religiosas), fortalecimento das ideias racionais, o princípio da dúvida, as investigações, os métodos científicos, a abordagem dialética, as concepções de tese, antítese e síntese.

No contexto filosófico registrou-se o recuo do pensamento escolástico e o avanço de um pensamento menos especulativo e contemplativo. A partir da época moderna, o campo filosófico dedicou-se às questões práticas e almejava aplicação em meio à sociedade daquele tempo, o que fez com que a teologia e a filosofia tradicional passassem a considerar outras áreas do conhecimento, tais como as ciências exatas e naturais. A partir da época moderna, os experimentos científicos, o uso de métodos, os processos de observação, a formulação de hipóteses e registros de deduções se fizeram cada vez mais presentes na produção do conhecimento, ou seja, prevaleceu a visão científica e mecanicista do mundo.

Caro acadêmico! Ao longo desta unidade de estudos ilustraremos e teceremos maiores definições e exemplificações sobre este quadro que foi brevemente apresentado. Prossiga na leitura com atenção e concentração.

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TÓPICO 1 | O DECLÍNIO DO PENSAMENTO CRISTÃO E O FORTALECIMENTO DO HUMANISMO MODERNO

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2 O IMPACTO DAS GRANDES NAVEGAÇÕES E DA PRENSA DE GUTTENBERG NO CENÁRIO EDUCACIONAL, POLÍTICO E SOCIAL

Nas áreas técnicas e científicas ocorreram mudanças significativas, como no campo da navegação, o processo de manufatura e industrialização da produção, a substituição do trabalho servil pelo trabalho assalariado, a troca natural e escambo pelo comércio financeiro, a gradual migração para as cidades da população que residia no campo.

Por outro lado, pertencem ao mesmo período as práticas de colonização por parte das nações europeias em regiões como a América, regiões ainda mais no interior da África e Ásia, que, por sua vez, forneceriam matérias-primas e artigos de luxo. Um dos processos de transformação do mundo ocidental durante a ruptura da Idade Média para a Idade Moderna foi o perene desenvolvimento de contatos entre os europeus e os povos americanos, africanos e asiáticos. Uma das razões apontadas seria a existência, no sul de Portugal, de uma escola de navegadores, a afamada “Escola de Sagres”.

É atribuída ao infante português D. Henrique (1394-1460) a idealização da escola. Não se tratava de uma escola formal, foi uma escola que levava o lema de “O talento de bem-fazer”. No estaleiro de Lagos, região de Algarve, se dava a construção de embarcações. Toda vez que uma expedição era feita, relatórios e registros deveriam ser redigidos a fim de servir de referência a melhorias e ampliações ao que já existia em Sagres.

Chaunu (1978) apresenta que ocorreu forte especulação sobre a existência da Escola propriamente dita e cogitava-se que tal escola não tenha existido, pois acredita-se que as navegações foram possíveis pelo desenvolvimento empírico (experimental) dos navegadores. A ideia de escola, porém, pode ser compreendida de um modo amplo, isto é, um modo próprio dos portugueses em navegar pelos oceanos.

As navegações ibéricas constituíram uma ação social que envolvia aprendizado constante entre aprendizes-marinheiros e mestres de navegação. Em geral, este aprendizado, na época, não era feito em uma escola de aprendizes-marinheiros, mas sim no cotidiano de bordo em alto-mar. Além destes personagens, podemos destacar os cosmógrafos, autores dos mapas que representavam as descobertas marítimas.

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1492 - A Conquista do Paraíso. Ridley Scott, França/Espanha,1992.Filme que retrata a era das grandes navegações, a corrida marítima entre Portugal e Espanha, os investimentos das cortes daqueles países na descoberta, conquista e exploração de novas terras. A produção ilustra, em especial, a trajetória de Cristóvão Colombo, o contato com as populações no novo mundo e os choques e encontros culturais.

Johannes Guttenberg, por volta dos anos de 1450, foi responsável pela invenção da imprensa, que superou os problemas que haviam até então para com as atividades de registro e comunicação de informações, documentos e demais conhecimentos. Gumbrecht (1998) explica que a invenção da prensa possibilitou a produção e a reprodução de livros em maior quantidade, em menor tempo, além de descentralizar esta tarefa que antes somente era feita por copistas, domínios que se resignavam no interior de mosteiros e igrejas.

Outras consequências podem ser deduzidas ainda, como a confecção das

bíblias que foram utilizadas na difusão da Reforma Protestante, agora traduzidas e impressas fora dos domínios católicos. Por outro lado, logo a prensa foi utilizada na emissão de notas bancárias, cédulas, cartas de crédito, normas, leis, salvo-condutos, entre outros.

A prensa de Guttenberg a que a história atribui o mérito principal, não só pela ideia dos tipos móveis, “a tipografia”, mas também pelo seu aperfeiçoamento, já era conhecida e utilizada para cunhar moedas, espremer uvas, fazer impressões em tecido e acetinar o papel. Pode ter sido na Casa da Moeda do arcebispo de Mogúncia, onde tanto o pai como o tio eram funcionários, que Gutenberg aprendeu a arte da precisão em trabalhos de metal.

Nos primeiros documentos impressos e produzidos contam-se várias edições do “Donato” e bulas de indulgências concedidas pelo Papa Nicolau V. No início da década de 1450, Guttenberg iniciou a impressão da célebre Bíblia de 42 linhas (em duas colunas), publicada cinco anos mais tarde. Das cerca de 300 cópias da Bíblia então produzidas, ainda existem cerca de 40.

Com a ocorrência de guerras, a imprensa se difundiu amplamente. O primeiro livro impresso por Guttenberg foi uma Bíblia em latim, em uma versão impressa da Vulgata de São Jerônimo, tradutor da Bíblia Católica ainda no século IV. Porém, não foram apenas livros religiosos que passaram a ser publicados. As possibilidades de se reproduzir diversos compêndios sobre as mais variadas questões, nos campos do Direito, da Teologia e da Medicina, eram incalculáveis. Outra questão importante que significou uma profunda alteração no modo do homem ocidental lidar com o conhecimento era relacionada à forma de se instruir.

DICAS

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A forma de as autoridades civis e eclesiásticas lidarem com os livros também foi sendo alterada. Isto porque a difusão de conhecimento proporcionada através dos livros poderia abalar os pilares ideológicos da sociedade ocidental. Instrumentos organizacionais de censura foram desenvolvidos nas diversas monarquias. Este órgão em Portugal tivera o nome de Mesa de Consciência e Ordens, e visava impedir a publicação ou circulação de livros subversivos à ordem pública tanto no reino quanto nas colônias. O Vaticano criou uma relação de livros que os fiéis não deveriam ler. O Índex papal era um dos símbolos máximos de intolerância do catolicismo em relação à liberdade de pensamento e fé. Liberdade esta que também não era presente nos países protestantes.

A resposta da Igreja Católica diante do movimento de impressão de livros e compêndios fora de seu controle foi lançar mão de algumas estratégias de censura que visavam impedir a publicação e a circulação de livros considerados subversivos aos dogmas religiosos e à ordem pública. Uma das formas de controle foi a publicação do Index Librorum Prohibitorum (Índice de Livros Proibidos), mais conhecido como Index, lista expedida pelo Vaticano, pelo papa Paulo IV, no ano de 1559, em que constavam os livros considerados proibidos.

A lista foi modificada ao longo do tempo, mas já estiveram inscritas nela obras de pensadores e cientistas como Galileu Galilei, Nicolau Copérnico, Giordano Bruno, Nicolau Maquiavel, Erasmo de Roterdã, Baruch de Espinosa, John Locke, Denis Diderot, Blaise Pascal, Thomas Hobbes, René Descartes, Rousseau, Montesquieu, entre outros escritores e romancistas.

CURIOSIDADE: INDEXO Index deixou de existir no ano de 1966, com o Papa João Paulo VI, mas até hoje é prática do Vaticano publicar uma notificação quando determinado livro fere os principais dogmas da instituição. Dentre as obras que recentemente foram notificadas pelo Vaticano tem-se os livros dos escritores Dan Brown e J. K. Rowling.

A título de síntese, cabe ressaltar que um dos principais benefícios que a imprensa trouxe foi a maior circulação de conhecimento através dos livros. Com isto, se processou, no Ocidente, uma alteração nas práticas de leitura. Pois, com os antigos pergaminhos, as leituras em geral eram feitas em voz alta, sendo o ato de ler uma ação comunitária. Com a imprensa, a ideia de uma leitura individualista ganhou corpo. Pois, em grande parte, o livro passou a ser lido de forma silenciosa.

UNI

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3 ELEMENTOS DO CONTEXTO FILOSÓFICO E CIENTÍFICO DA RENASCENÇA

A Renascença corresponde ao momento histórico, intelectual e artístico que se desenrolou entre as épocas medieval e moderna. Alguns estudiosos estabelecem em termos cronológicos o período transcorrido entre os anos de 1300 e 1650. Como o nome já sugere, tratou-se do renascimento dos antigos valores e modelos de civilização que foram hegemônicos no passado, no passado da Grécia e Roma clássica. O retorno aos padrões da antiguidade clássica significa a invocação e valorização dos ideais do humanismo (Homem) e da natureza, em detrimento das concepções dogmáticas do teocentrismo, do divino e sobrenatural.

Corvisier (1976) explica que o teocentrismo almejava justificar pela vertente religiosa e divina as atividades e pesquisas científicas e eruditas ao longo da Idade Média. A nomenclatura de teocentrismo comporta a nominação de Theo, que significa Deus (Theo – em latim) era o centro de todas as preocupações intelectuais. A partir do renascimento, entre os séculos XIV-XVII, os intelectuais passaram a se preocupar com o entendimento cada vez mais natural do homem, como um ser, uma espécie da natureza.

Foi neste período que as escolas filosóficas cada vez mais estabelecem suas teses e demarcam suas fronteiras, passando a exercer hegemonia em relação às demais vertentes do pensamento; em especial, o tomismo e a escolástica passam a ser criticados. No interior do pensamento religioso católico ocorria o enfraquecimento do domínio papal, e, se não bastasse, no seio da própria Igreja ocorriam divergências, como foi o caso dos impasses entre franciscanos e dominicanos.

Aquino (2013) aponta que na baixa Idade Média a filosofa aristotélica já se difundia em meio à Inglaterra, sendo que Roger Bacon (1214-1294) foi um dos primeiros a manifestar simpatia. Bacon defendia que teologia e conhecimento científico deveriam ser vistos como indissociáveis, e que, por sua vez, se fazia necessário demonstrar interesse sistemático, total e absoluto, observação direta da realidade, acompanhada de raciocínios, o que posteriormente possibilitou a formulação de métodos experimentais.

Fatores históricos podem ser elencados como favorecedores deste cenário de mudanças no campo filosófico, tais como os impasses entre França e Inglaterra que foram levados a cabo por meio da Guerra dos Cem Anos, epidemias como a da peste bubônica e uma série de transformações políticas e econômicas, entre elas o renascimento comercial.

Os “homens do Renascimento” reuniam interesses e preocupações para com muitas áreas do conhecimento, tais como engenharias, astronomia, física, anatomia, artes, filosofia e política, ou seja, um indivíduo que percebia a natureza e a realidade e a procurava compreender e explicar pelo viés da interdisciplinaridade, por meio da associação de conhecimentos das mais diferentes áreas, a título de

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exemplo é possível citar o italiano Leonardo da Vinci, que atuou e deixou projetos na pintura, escultura, arquitetura, na engenharia, recursos de guerra, entre outros.

Uma das condições para que o Renascimento ocorresse foi o fato da prática do mecenato. No caso italiano, o mecenato foi empreendido especialmente pela Igreja católica. A Igreja Católica Apostólica Romana foi responsável por patrocinar os artistas tais como Rafael, Leonardo da Vinci, Michelangelo, que produziram obras para a decoração e preenchimento dos espaços no interior das Igrejas, capelas, mosteiros e conventos em diversas cidades da Itália. Quando a hegemonia dos dogmas católicos foi contestada, os patrocinadores das artes foram a nobreza e a burguesia.

Burg, Fronza e Silva (2013) explicam que entre os séculos XV e XVI surgiu

uma nova espiritualidade e relação para com as coisas visíveis e não visíveis, os fenômenos da natureza e do espírito. Um dos estudiosos que se destacou nesta perspectiva do conhecimento e da ciência foi Giordano Bruno, que por meio do uso de um microscópio, conseguiu propor que o planeta terra possuía forma redonda. Porém, foi vítima da perseguição dos sensores da Igreja Católica, pois as teorias de Giordano Bruno, contestavam os dogmas católicos, e estes o julgaram no tribunal da Santa Inquisição e condenaram à morte na fogueira.

Nicolau Maquiavel foi outro grande nome do Renascimento italiano, foi responsável por escrever a obra O príncipe, que discorre sobre as maneiras mais adequadas pela qual um príncipe deve conduzir, administrar e manter o poder. Trata-se de uma obra que ultrapassou a época renascentista e seguiu ao longo da época moderna e contemporânea como um dos principais documentos acerta da política e governabilidade de estados laicos.

Entre as principais teses contidas na obra de Maquiavel encontra-se a de que um príncipe e/ou um governante devem estar atentos aos adversários, aos companheiros e aliados, pois estes sem distinção, possuem ambições pelo poder e facilmente podem conspirar contra o príncipe; uma guerra jamais deve ser adiada e que em nome dos fins, dos benefícios que são oferecidos, os meios não serão questionados, pois todos compreendem e perdoam os custos que possam ter exigido.

Aranha (1996) destaca também o francês Michel de Montaigne, que viveu ao longo do século XVI. Também é reconhecido como um dos grandes nomes do Renascimento. Em suas obras foi responsável por refletir sobre a natureza humana e deixou três escritos sobre os temas educacionais que são: da afeição dos pais pelos filhos, da pedantia e da educação das crianças. A autora relaciona também os escritos de Erasmo de Roterdã, que foi responsável por escrever Elogio da loucura e Manual do soldado cristão, obras em que exercitava seu pensamento crítico com relação à sociedade feudal. Fez críticas ferrenhas ao clero e às hierarquias no interior da Igreja, e advogava a favor dos valores humanistas, e na compreensão do homem não meramente como um pecador, mas como um ser em processo de conscientização e capaz de melhoramentos.

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Curto (1993) explica que os estudos e escritos de Erasmo ganharam amplos alcances e adeptos. Martinho Lutero foi um dos leitores de Erasmo de Roterdã, mesmo tendo rompido com seu pensamento anos depois. Em Portugal, o pensamento de Roterdã se fez presente por meio de alguns intelectuais no Colégio das Artes em Coimbra, que sem demora foram descobertos e rapidamente foram censurados e expulsos do local. A substituição dos sacerdotes erasmistas foi procedida com sacerdotes oriundos da ordem jesuítica recém-criadas a fim de difundir os ideais religiosos católicos.

Outro estudioso renascentista, amigo de Erasmo de Roterdã, foi Thomas Morus, intelectual inglês responsável por redigir a obra A utopia, na qual descrevia uma sociedade imaginária desprovida de desigualdades sociais. A partir de a A utopia foi possível designar como ‘utópicas’ ideologias, crenças, sociedades, correntes de pensamento que almejavam alcançar estágios de sociedade e posturas do ser humano diferentes dos registros históricos de guerra e das experiências de injustiça, ignorância, opressão e dominação. No caso específico da educação é possível reconhecer como utópicas as propostas educacionais que foram feitas pelos pensadores do século XVI, em que estava presente as concepções de virtude, bondade, justiça, equidade, liberdade, tolerância, amor e ética.

3.1 AS UNIVERSIDADES, AS CORPORAÇÕES DE OFÍCIO, AS GRAMÁTICAS E O DECLÍNIO DO LATIM

As universidades e as corporações de ofício revelam quanto o processo educativo medieval era estanque. Existia uma forte divisão entre o trabalho braçal e o trabalho mental, assim como uma forte divisão entre as classes sociais. Com as preceptorias ou nas antigas corporações de ofício, a relação de ensino-aprendizagem era autoritária, pois de um lado tínhamos um personagem detentor do saber – o mestre – e de outro lado um receptor de instruções – o aprendiz. O exemplo cotidiano do mestre era a principal forma de o aprendiz poder aprender o seu ofício. Porém, com a imprensa, a relação de saber começou a ser alterada, pois os livros poderiam auxiliar os professores na tarefa educacional.

Teixeira (1977) explica que as corporações eram destinadas ao trabalho

manual. As universidades, ao trabalho intelectual. Porém, estas duas instituições, separadas, se uniram em uma nova forma de pensar a universidade e a produção de conhecimento. Este processo de união entre o saber mecânico e o conhecimento acadêmico ocorreu no movimento intelectual conhecido como Renascimento.

Na Renascença ocorreu o declínio do latim e o fortalecimento das línguas nacionais nas universidades e instituições governamentais dos países nascentes. Em grande parte, os países surgem do declínio da frágil unidade representada pelo Sacro Império Romano Germânico. Porém, as diversas regiões dos distintos países falavam diferentes dialetos. Por isso, o fato de se ter um único idioma nacional foi também uma disputa política entre as províncias.

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Burg, Fronza e Silva (2013) explicam que no final do século XV e meados do século XVI foram redigidas gramáticas significativas na Península Ibérica, como por exemplo a Gramática da Língua Castelhana, escrita por espanhol Antônio Nebrija, em 1492, e a Gramática da Língua Portuguesa escrita por Fernando Oliveira em 1536. A publicação e a difusão das gramáticas nacionais foram responsáveis pela retomada do ensino nas línguas nacionais, e por outro lado pelo desprestígio e detrimento do latim. Nos países protestantes, o declínio do latim foi também agravado pelas questões teológicas e dogmáticas. Como já explicamos, as alterações e influências religiosas no ensino ocorridas nos séculos XVI e XVII ocorreram devido às transformações nas diretrizes religiosas oriundas da Reforma Protestante.

O latim foi a língua oficial do papado e de toda a ritualística católica enquanto a Igreja católica era hegemônica no campo das ideologias religiosas. O latim foi utilizado em cerimônias religiosas até o século XX, especialmente nos países católicos. No chamado Antigo Regime, era comum o chamado direito divino dos reis. Portanto, nos campos do direito e da administração, o latim se tornara um idioma ainda muito solicitado, especialmente com uso de conceitos e termos jurídicos e administrativos.

TERMOS LATINOS Modus operandi: modo de operar, modo de procederSine qua non: condição sem a qual, indispensável, essencialCurriculum vitae: carreira de vidaIn loco: no próprio local In natura: de acordo com a naturezaStatus quo: situação das coisas, estado atualTabula rasa: falta de experiência.

Como pudemos estudar, o conceito de Renascimento remete à ideia de retomada dos valores greco-romanos da época clássica, porém agora, no que diz respeito às línguas em que os conhecimentos eram ministrados, ocorreu a substituição do latim e do grego, tidas como línguas universais até então, pelas línguas dos países europeus emergentes da Idade Média, como o francês, o alemão, o inglês, entre outras. Assim, pode-se interpretar que ocorria todo um movimento político de valorização das línguas nacionais e que desabilitava a ideia de uma única língua que tendia ao internacionalismo como idioma e língua oficial.

DICAS

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PARA REFLETIR:Caro acadêmico! Nos tempos atuais, em meio à sociedade globalizada,

observa-se o enfraquecimento das línguas nacionais e/ou regionais e, em contrapartida, o fortalecimento do idioma inglês como ferramenta de inclusão e acesso dos indivíduos à internacionalização; porém, em outras sociedades e épocas históricas o panorama se apresentava de forma diferente, outras línguas foram hegemônicas. No caso do latim, pode-se dizer que ele permanece presente no campo da teologia católica e do direito, que muito se utilizam ainda de expressões deste idioma.

3.2 IMPLICAÇÕES DA REFORMA PROTESTANTE E DA CONTRARREFORMA NO CAMPO RELIGIOSO E EDUCACIONAL

A Reforma Protestante foi um movimento religioso que ocorreu na Europa do século XVI. Para melhor compreendermos este evento ligado às questões da fé, devemos compreender o contexto social que possibilitou a alteração das ideias dos indivíduos em relação às suas crenças. As principais questões conjunturais ocorreram décadas anteriores. Trata-se da invenção da imprensa por Johannes Gutemberg, que permitiu uma maior circulação de livros, da queda do denominado Império Bizantino, conquistados pelos turcos otomanos, a conquista de Granada pela Espanha e a Descoberta da América, o que possibilitou aos europeus uma nova consciência em relação a sua presença no mundo.

Como já apresentamos anteriormente, a imprensa foi inventada por Johannes Guttenberg, que desenvolveu uma máquina tipográfica que republicava diversas folhas impressas, não sendo assim mais necessárias as ações dos copistas medievais, que reproduziam os escritos com a sua caligrafia pessoal. Em um universo de mentalidade fortemente cristã é simbólico que o primeiro livro publicado por Guttenberg tenha sido justamente a bíblia. A impressão possibilitou uma maior e mais ágil circulação de informações na Europa da segunda metade do século XV.

Assim, as formas pelas quais os europeus passaram a compreender o mundo estavam se alterando de forma rápida. Esta alteração das sensibilidades, porém, não foi acompanhada por uma profunda alteração na teologia da cristandade latina. No ocidente, grande parte do ensino ministrado pela Igreja continuava o mesmo que em séculos anteriores. Com isto, novas formas de teologia e filosofia, para além da escolástica e do nominalismo foram criadas ao longo dos séculos XVI e XVII.

O evento principal a desencadear a Reforma foi a publicação, pelo monge agostiniano Martinho Lutero, de 95 teses, na qual ele criticou alguns postulados católicos romanos, em especial a venda de indulgências. O contexto para tal crítica

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se relaciona à visita de um representante papal aos territórios de língua alemã, Tetzel, que vendia o perdão dos pecados, a indulgência. Neste debate sobre a salvação das almas, se desencadeou um processo de profunda alteração da vida social, política e econômica de todo o mundo.

Em relação à Reforma Protestante, temos alguns vetores explicativos. O mais popular, do lado católico, afirma ter sido a Reforma uma revolta cometida por um padre que desejava fugir do voto de celibato, causando grande desonra ao ocidente cristão. Por sua vez, explicações de senso comum, do lado protestante, afirma ter sido a Reforma uma ação comandada por um servo de Deus, Martinho Lutero, contra a corrupção e luxúria da igreja católica, cujo principal símbolo de degradação seria o Vaticano e sua vida suntuosa. Tais explicações de senso comum nos impedem de compreender as motivações da Reforma Protestante assim como da Reforma Católica ou Contrarreforma.

Um segundo vetor explicativo indica a Reforma como um processo que é

explicado apenas pelo viés econômico e político da formação e fortalecimento de Estados Nacionais ao longo do século XVI. Tal vetor explicativo é frágil, pois os principais países envolvidos na Reforma e Contrarreforma, a Itália e a Alemanha, tiveram sua unidade política apenas quatro séculos após o movimento reformador. Portanto, a melhor compreensão da Reforma, segundo alguns especialistas católicos, como Jean Delumeau (DELUMEAU; 1989), ou protestantes, como Timothy George (GEORGE 1993), é compreendermos a teologia proposta pelos reformadores e suas consequências políticas, sociais e econômicas.

Quatro foram os principais reformadores. Martinho Lutero, João Calvino,

Ulrico Zwinglio e Meno Simons. Duas foram as principais formas de relação com o Estado: a reforma Radical e a Reforma Magisterial. E quatro as famílias de igrejas que surgiram do movimento reformador: luteranos, anglicanos, calvinistas e batistas.

FIGURA 17 - MARTINHO LUTERO FIGURA 18 - JOÃO CALVINO

FONTE: Disponível em: <www.brasilescola.com.br>. Acesso em: 13 fev. 2017.

FONTE: Disponível em: <www.luteranos.com.br>. Acesso em: 13 fev. 2017.

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FIGURA 19 - ÚLRICO ZWINGLIO FIGURA 20 - MENO SIMONS

FONTE: Disponível em: <www.wikipedia.com.br>.

FONTE: Disponível em: <http://quotesgram.com/menno-simons>. Acesso em: 13 fev. 2017.

Começando nossa narrativa pelos reformadores, Martinho Lutero foi o principal líder a iniciar o movimento. Sua principal proposição teológica está exposta no pequeno livro Da Liberdade Cristã (LUTERO, 2001). Nele, apontou as principais proposições teológicas seguidas pelas principais correntes do protestantismo. Infalibilidade da bíblia, sacerdócio de todos os crentes, justificação pela fé e salvação pela graça. Isto é, a bíblia, e não a tradição da igreja, deve ser o guia de fé dos fiéis, deste modo, todo o cristão é capaz de compreender a bíblia, e não somente os sacerdotes.

A salvação é uma graça imerecida concedida por Deus, sendo impossível o homem chegar próximo a Deus se não tiver fé. Estes postulados teológicos são, até o presente, as principais características das doutrinas das igrejas protestantes ao redor do globo. Também todo o aspecto exterior da fé foi abolido, como as rezas decoradas, a intercessão pelos santos, a realização de jejuns periódicos e peregrinações a lugares santos, que não são presentes no protestantismo.

João Calvino foi um reformador que atuou na França e na Suíça, mais especificamente na cidade de Genebra, da qual foi um dos principais líderes ao longo de sua vida. Calvino escreveu uma das principais obras da teologia protestante do século XVI, As Institutas da Religião Cristã.

Sua principal formulação foi a denominada teologia da predestinação. Por ela Calvino afirmou que alguns cristãos foram escolhidos por Deus para a salvação, devido a Deus tudo conhecer. Deste modo, a graça irresistível de Deus seria a principal diferença entre os escolhidos e os rejeitados pela cólera divina. Em oposição à teologia de Calvino, no século XVII, surgiu o teólogo Jacob Armínio, para quem a predestinação não ocorreria do modo explicado por Calvino, pois

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Deus dotou o homem de livre-arbítrio. O debate entre calvinistas e arminianos se estende através dos séculos.

Ulrico Zwinglio e Meno Simons são dois grandes nomes na formulação da teologia protestante, porém, não tiveram o mesmo destaque que Lutero e Calvino. Zwinglio era suíço e foi contemporâneo de Lutero. Suas teologias eram próximas, porém discordaram no que tange à Ceia do Senhor, sendo a presença real de Cristo no pão e vinho da celebração litúrgica o ponto crucial do debate.

Meno Simons era holandês e esteve vinculado ao movimento anabatista. Para os anabatistas, a principal discordância com Lutero e Calvino era em relação ao batismo de crianças, fato pelo qual os menonitas e demais grupos anabatistas discordavam, afirmando que apenas adultos poderiam ser batizados. Porém, a principal diferença entre os anabatistas e os demais reformadores estava vinculado à relação com o Estado.

A relação igreja Estado é fundamental para uma aprofundada compreensão da Reforma, pois o termo protestante foi cunhado na Dieta de Espira, em 1529, na qual os príncipes alemães protestaram à perseguição de Lutero. Assim, a relação igreja e Estado é importante para a compreensão da Reforma, que foi dividida em dois grandes grupos pelo erudito George Willians: reforma magisterial e reforma radical. Pela reforma magisterial se compreendem os reformadores que tinham apoio dos magistrados. Isto é, dos juízes e em grande parte dos príncipes. Neste grupo estão Lutero e Calvino.

Para a reforma radical, cujo grupo mais simbólico foram os dos anabatistas, tivemos uma oposição radical ao Estado, sendo o grupo de reformadores radicais, liderados por Tomaz Munzer, responsável por ações violentas nos principados alemães, buscando efetivar o fim dos privilégios feudais. O movimento anabatista teve dura perseguição dos príncipes, que apoiados por Lutero, dizimaram a espada os radicais anabatistas. Mesmo Meno Simons, que vivia nos Países Baixos e era pacifista, sofreu forte perseguição.

Além destes grupos, outro importante polo da Reforma Protestante foi a Grã-Bretanha. Nela tivemos o anglicanismo, o presbiterianismo, o metodismo e o denominado puritanismo. A fundação da Igreja Anglicana está ligada ao fato do rei inglês Henrique VIII desejar o divórcio de Catarina de Aragão, não autorizado pelo papado. Em grande parte, a Igreja Anglicana manteve os rituais próximos da igreja católica, com o diferencial dos padres contraírem matrimônio.

Na Escócia, um líder religioso, John Nnox, coordenou a fundação da Igreja Presbiteriana, profundamente inspirada nos escritos de João Calvino. Entre os povos de língua inglesa se destacou um grupo especial, os puritanos, que devido à perseguição religiosa imigraram para os Estados Unidos da América. No século XVIII, no interior do anglicanismo, surgiu um grupo reformador liderado pelos irmãos John e Charles Wesley, que foram os inspiradores da igreja Metodista. Também da Inglaterra, um grupo de refugiados ingleses partiu para a Holanda em 1608, fundando a Igreja Batista.

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O movimento de reforma cristã teve um profundo impacto na história e na filosofia da educação. Isto porque a teologia da infalibilidade bíblica e do sacerdócio universal, além da ampla divulgação das sagradas escrituras gerou um impulso por alfabetização nos países europeus que aderiram à Reforma. Deste modo, Lutero afirmou ser dever do príncipe garantir a educação de todos os cidadãos. Com isto, a alfabetização das massas ganhou um grande impulso. Outro impulso ocorreu em relação ao ensino universitário, em especial nos países de língua inglesa. Pois, parte das principais universidades dos Estados Unidos da América, como o caso da prestigiada Universidade Harvard, surgiu como centro de estudos na área de teologia. Deste modo, os países de maioria protestante tiveram um maior capital cultural na disputa com os países que não passaram pelo movimento reformador.

Contudo, a afirmação acima não implica afirmar que os povos de maioria católica não se preocuparam com as questões educacionais. Todavia, as preocupações eram teologicamente motivadas em um sentido oposto. Para melhor compreender a relação dos católicos com a educação, se faz necessário compreender o catolicismo que foi formulado no Concílio de Trento.

A Igreja Católica Romana respondeu teologicamente às proposições dos reformadores. Em relação à proposição da infalibilidade da bíblia, os teólogos católicos apontaram que as escrituras deveriam ser interpretadas pelo magistério da igreja. Assim, não havia sentido em se traduzir a Vulgata de São Jerônimo (versão da bíblia católica) do latim para os idiomas nacionais. Em relação à salvação como fruto da graça mediante a fé, a igreja compreendeu que graça e fé deveriam ser acompanhadas de obras. Tal compreensão de vida de fé fora seguida de algumas reformas, como a instituição de seminários para a formação do clero, além do estabelecimento da primeira comunhão enquanto rito de iniciação da criança nas lides da fé.

As principais articulações da relação entre fé e educação estavam ligadas às

ordens religiosas, pois foram as ordens dos agostinianos, beneditinos, franciscanos, dominicanos e jesuítas as principais divulgadoras dos ideais religiosos católicos ao redor do mundo nos séculos subsequentes ao Concílio Tridentino, os jesuítas, ordem fundada por Santo Inácio de Loyola, com grande destaque na América Portuguesa, em especial na catequização dos Indígenas.

A principal cidade brasileira, São Paulo, surgiu como um colégio jesuítico fundado para catequizar os indígenas. Não apenas na América Portuguesa os Jesuítas tiveram grande destaque na educação. Também grande parte da elite dos países europeus tivera educação jesuítica. Dentre estes, podemos nos lembrar que René Descartes foi aluno de escola jesuíta na França do século XVII (SEBE, 1982).

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FIGURA 21 - SANTO INÁCIO DE LOYOLA

FONTE: Disponível em: <http://arquidiocesedenatal.org.br>. Acesso em: 13 fev. 2017.

Ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII surgiram novas ordens religiosas na Europa. Algumas, como reformulação de antigas ordens, como os capuchinhos, reformadores da ordem franciscana, e os agostinianos recoletos, reformadoras da Ordem de Santo Agostinho. Também é deste período a Ordem do Oratório.

Entre os principais educadores católicos ligados à educação temos o nome

de João Batista de Lassale. Sacerdote francês, que fundou escolas para alfabetizar crianças pobres, sendo considerado o padroeiro dos professores primários.

Em análise comparativa, tanto os países católicos quanto os países

protestantes investiram em educação. A principal diferença está na ênfase. Enquanto países católicos investiram apenas na educação das elites, os países protestantes investiram em educação para todos os indivíduos. Com isto, o número de analfabetos entre os protestantes tendia a ser menor que dentre os católicos, com repercussões grandes no desenvolvimento social e político dos países.

As disputas entre católicos e protestantes na Europa fora intensa ao longo dos séculos XVI e XVII. Estas disputas, porém, se tornaram menores com a denominada Pax de Wetsphalia, na qual encerraram as Guerras de Religião na Europa. Também as disputas entre católicos e protestantes foram questionadas pelo pensamento iluminista.

Caro acadêmico! No sentido de aprofundar os conteúdos e contextualizar a trajetória de Lutero enquanto reformador religioso, procure assistir ao filme que sugerimos a seguir:

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SUGESTÃO DE FILME:LUTERO. Eric Til. Estados Unidos: 2004. 124 minDisponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=PlP-Xt4LLNg>. Acesso em: 2 out. 2016.

4 PRINCÍPIOS CIENTÍFICOS E FILOSÓFICOS DA ÉPOCA MODERNA

Burg, Fronza e Silva (2013) explicam que mesmo diante de um quadro desanimador com relação ao acesso e a real democratização do ensino que perdurou até o século XIX, as transformações sociopolíticas ocorridas a partir do século XVI, forneceram as condições necessárias para que a escolaridade média da população fosse ampliada, uma vez que boa parte da população analfabeta, agora pode ter acesso à alfabetização.

Durante os séculos XV a XVIII, a humanidade passou por uma verdadeira revolução do conhecimento, pois, em grande parte, os principais paradigmas que o homem do Ocidente medieval se utilizava como verdades absolutas foram desmentidos. Uma visão mítica do mundo se transformou de uma visão teocêntrica em uma visão antropocêntrica. Isto é, ao invés de enxergar a presença divina em todos os campos de atuação humana, os pensadores passaram a considerar apenas a razão como forma máxima de se alcançar a verdade dos fatos.

Podemos afirmar que houve um primeiro momento pelo qual o homem ocidental passou a questionar as verdades estabelecidas pelos eruditos medievais. Durante os séculos XV e XVI, alguns eruditos questionaram algumas verdades cristalizadas. Podemos citar alguns homens que realizaram algumas façanhas. Harwey e Miguel Servetto foram estudiosos pioneiros da anatomia humana, ao dissecarem alguns cadáveres e descobrirem o processo de funcionamento da corrente sanguínea humana. Servetto foi perseguido na Espanha por suas crenças religiosas. Fugiu para Genebra, na Suíça, onde foi condenado à pena de morte por João Calvino, devido à sua crença antitrinitariana. Isto é, Servetto não acreditava na ideia de trindade.

Nicolau Copérnico e Galileu Galilei afirmaram que a Terra era redonda. O que estes cientistas revelaram eram afirmações científicas contrárias às ideias de Lactâncio, erudito do século IV, para quem a Terra era plana. Com a Viagem de Circunavegação de Fernão de Magalhães, se teve uma comprovação empírica de que a Terra era uma esfera.

Em relação à astronomia, um dos principais cientistas foi Kepler, autor da lei de gravitação dos planetas. Isto é, este astrônomo compreendeu que alguns planetas giram em torno de outros, formando elipses, e muitos dos diversos

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planetas das distintas galáxias giram em torno de diversas estrelas. Um exemplo é a Lua, que gira ao redor do planeta Terra, que por sua vez, assim como outros planetas, gravita ao redor do Sol, que por sua vez é uma estrela que irradia a luz que mantém a vida em nosso planeta.

A ciência moderna se desenvolveu e consolidou ao longo dos séculos XVII, XVIII e XIX, tratou-se de um conhecimento obtido de forma natural, independente e desarticulado das dimensões sobrenaturais, mitológicas, mágicas e fantásticas da realidade. É quando se acentua o distanciamento entre o campo da fé, do espiritual, do religioso, do sagrado e do eterno (poder invisível) e o campo do temporal, do método, do racional, do profano e do leigo (poder visível).

A ciência acabou por se tornar uma ideologia dominante – o cientificismo, uma forma de saber superior, criada pelo positivismo no século XIX. A ciência resumia-se na busca pela verdade a qualquer custo, almejava extrair todos os segredos que houvesse na natureza, e para tanto deveria proceder a uma rigorosa observação empírica, lançando mão da imaginação, dos sentimentos e das emoções quando investigava tanto os seres da natureza como os fatos e acontecimentos humanos.

A obra que ocupa o posto de marco-fundante da ciência ocidental sem sombra de dúvidas foi o Discurso do método, redigida por René Descartes, que foi educado em um colégio jesuíta e foi membro oficial do exército francês. Nesta obra, o autor trata da forma como se deve proceder quando que se quer alcançar a verdade através dos recursos da razão. A obra de Descartes trata em especial de como o homem pode ser sujeito responsável pela resolução dos próprios problemas, agora sem precisar recorrer as explicações divinas e bíblicas. Discurso do método foi publicado no século XVII e até os dias atuais permanece como sendo a célebre obra do pensamento racional e científico ocidental.

Caro acadêmico! No sentido de identificar de forma sistematizada o pensamento de René Descartes, observe com atenção o quadro a seguir:

QUADRO 1 - SÍNTESE DO PENSAMENTO DE RENÉ DESCARTES

OBRA PRINCÍPIOSRENÉ DESCARTES (1596-1650)

DISCURSO SOBRE O MÉTODOF R A G M E N TA R , F R A C I O N A R , PARTES, REDUZIR, DIVIDIR.

O MÉTODO

VERIFICAR: se existem evidências reais e indubitáveis acerca do fenômeno ou coisa estudada.ANALISAR: dividir ao máximo as coisas, em suas unidades mais simples e estudar essas coisas mais simples.SINTETIZAR: agrupar novamente as unidades estudadas em um todo verdadeiro.ENUMERAR: as conclusões e princípios utilizados, a fim de manter a ordem do pensamento.

Fonte: Os autores

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Talvez o principal personagem da Revolução Científica que a Idade Moderna vivenciou foi Isaac Newton. Assim como Miguel Servetto, Newton possuía profunda fé religiosa e era antitrinitariano. Seu principal livro sobre questões religiosas trata sobre as profecias de Daniel e do Apocalipse sobre o final dos tempos. Porém, não foram as suas reflexões teológicas as principais contribuições ao pensamento no Ocidente, mas sim suas reflexões sobre a natureza (CORVISIER, 1976).

Uma das lendas sobre a descoberta da lei da gravidade indica que Newton estava debaixo de uma macieira e uma fruta madura havia caído sobre a sua cabeça. Este fato havia funcionado como um despertar para a elaboração de suas descobertas científicas: as leis da física. A palavra física significa em grego “natureza”. O que Newton observou foi que a natureza possui mecanismos que se repetem. A estes eventos repetitivos denominou lei. A lei da gravitação é uma das mais conhecidas, assim como a lei de ação e reação.

Alguns movimentos sociais, políticos e religiosos foram responsáveis pela valorização da educação no mundo ocidental. Entre estes, já abordamos a Reforma Protestante. Outro movimento que motivou alterações sociais e educacionais foi o Iluminismo. De maneira geral, o Iluminismo, ou século das luzes ou da ilustração, foi um movimento intelectual e cultural do século XVIII, que almejava libertar o homem das crenças mitológicas e de toda herança dogmática da época medieval. Defendia os princípios da razão crítica, do progresso, da autonomia dos indivíduos e da liberdade de pensamento.

O Iluminismo não foi uma invenção da sociedade de sua época propriamente dita, sustentava-se em bases teóricas que já haviam sido defendidas ainda na Antiguidade e também na época da Renascença, porém encontrou no século XVIII o melhor momento de alcance e amplitude. Dentre os principais intelectuais iluministas, podemos nos lembrar de alguns nomes, como Voltaire, Rousseau, Diderot, entre tantos outros pensadores.

Abbagnano (2007) descreve que é possível entender o Iluminismo como uma linha filosófica que defende a razão como crítica e guia a todos os campos da experiência humana. Kant (1724-1804) defende que o Iluminismo contou com o empirismo como um grande aliado, ambos garantiram a abertura do domínio da ciência e, em geral, do conhecimento, que por sua vez favoreceu à crítica da razão, no sentido de que toda verdade poderia e deveria ser colocada à prova, e eventualmente modificada, corrigida ou abandonada.

Os fundamentos teóricos que favorecem a ancoragem do movimento do Iluminismo podem ser encontrados na física e sistematizados na obra de I. Newton (1643-1727), ‘Princípios matemáticos de filosofia natural, publicada em 1687; nas pesquisas de Boyle (1627-1691), que encaminham a química como ciência positiva; na obra de Buffon (1707-1788) e de outros naturalistas, que assinalam as ciências biológicas como responsáveis por explicar as etapas fundamentais de desenvolvimento.

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O empirismo foi o ponto de partida e o pressuposto da filosofia defendida, por exemplo, por Voltaire (1694-1778), Diderot (1713-1784) e D'Alembert (1717-1783). A Enciclopédia continha o pensamento contrário aos privilégios que foram reclamados posteriormente na Revolução Francesa, defendia a felicidade ou o bem-estar do gênero humano, alcançados e desfrutados através de práticas tolerantes e com fé no progresso. Estas noções enfraqueceram a ideia de fatalidade histórica que impedia qualquer iniciativa de transformação da realidade.

Em relação às questões ligadas à educação, podemos compreender que o autor que possuiu maior destaque dentre os filósofos iluministas foi Rousseau. Este destaque se deve ao seu principal livro relacionado à temática educacional, Emílio (GADOTTI, s.d., p. 87-89). Uma das principais teses defendida por Rousseau é a de que o homem nasce bom, porém o meio o corrompe. Esta ideia, a de que o homem nasce bom e é corrompido pelo meio foi uma das maiores influências do iluminismo para as ideias pedagógicas nos séculos posteriores.

Isaac Newton, físico, matemático, filósofo e teólogo inglês, ficou amplamente conhecido com os três volumes de ‘Princípios matemáticos da filosofia natural’, nos quais constam as famosas Leis de Newton, que compõem os princípios da mecânica e de todo o pensamento moderno. As Leis de Newton contêm o princípio de ‘inércia’, em que todo corpo continua em seu estado (repouso ou movimento) a menos que seja forçado a mudar; o princípio de ‘dinâmica’, em que a mudança é proporcional à força atribuída; e o princípio de ‘ação e reação’, em que para toda ação há sempre uma reação oposta e em igual proporção.

Immanuel Kant (1724-1804) tem sua produção intelectual e filosófica denominada de filosofia crítica, idealismo transcendental, que tinha como finalidade estabelecer um método cognitivo e uma doutrina da experiência pelo uso da razão que suplantasse a metafísica racionalista dos séculos XVII e XVIII, que ele chamava de sono dogmático. Kant foi leitor de Isaac Newton (1643-1727), John Locke (1632-1704), Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716) e David Hume (1711-1776).

Nos estudos de Kant percebe-se o forte afastamento da noção de que a

Providência divina representava um fator determinante da História, a ampla defesa da ideia de racionalidade e de télos (fim/alvo) e de progresso, de que, se há passos contínuos, conduziriam a humanidade à emancipação plena. A história, guiada pela razão, seria a fonte maior a partir da qual se alcançaria a liberdade e a perfeição humana. Estas intenções contagiariam a humanidade e se realizariam em escala universal. A ideia de uma história universal se realizaria na conjugação das forças do homem de posse e uso da razão apoiado nas disposições da natureza.

Martinazzo (2010) explica que para Kant o sujeito, por meio da educação, pode sair da menoridade na qual se encontra, e a educação seria a arte de transformar homens em homens. Pelo processo educativo o “homem torna-se homem” com capacidade reflexiva e autônoma para decidir com liberdade e sem depender de condições exteriores para tal. Segundo Kant, a educação deveria durar “até o momento em que a natureza determinou que o homem se governe a si mesmo” (KANT, 1999, p. 32).

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A finalidade da educação moderna esteve centrada na construção de sujeitos livres, autônomos e responsáveis, com plena capacidade de poder escolher racionalmente os fins adequados e, de forma livre e consciente, submeter-se aos mesmos. Nas concepções modernas de educação, a busca da autonomia seria o objetivo máximo da educação, e esta deveria ser fundamentada na razão.

Um dos mitos criados ao redor dos cientistas dos séculos XVI, XVII e XVIII é

que eles fossem ateístas. O que podemos observar nos seus escritos e nas suas ações sociais é que possuíam profunda fé em Deus e em geral eram cristãos convictos. A que por vezes se opuseram foi contra o obscurantismo das elites eclesiásticas, universitárias e políticas, que enxergavam nas descobertas do processo de funcionamento do corpo humano ou da natureza que os circundava uma oposição ou mesmo um risco ao poder que possuíam.

Estas mesmas elites eclesiásticas eram capazes de condenar diversas pessoas à pena de morte por motivos fúteis, como se apresentou em muitos autos de fé da Santa Inquisição. Muitos outros homens e mulheres foram acusados de bruxarias ou de práticas diabólicas, mas se tratavam apenas de pessoas com pensamento distinto do que os dispositivos de poder ensinavam como correto.

O contexto filosófico que diz respeito à época moderna compreende pouco mais de 200 anos, pode-se dizer que está circunscrito ao intervalo de tempo entre os séculos XVI e XVIII. Franciotti (2009) argumenta que as formulações filosóficas que foram propostas neste período acabaram de ultrapassar a cronologia e o próprio campo da filosofia, tais como ‘penso, logo existo’, de Descartes; ‘o homem é naturalmente bom, é a sociedade que o perverte’, proposta por Rousseau; e ‘o coração tem razões que a própria razão desconhece’, formulada por Pascal.

No campo da compreensão e da postura do ser humano forja-se o conceito de subjetividade como dimensão epistêmica do sujeito, como uma forma de consciência, capaz de constituir as certezas, as verdades em todas as instâncias:

A subjetividade pode ser descrita por meio de “formas de consciência”: o eu, a pessoa, o cidadão e o sujeito epistemológico. O eu é a identidade, formada das vivências psíquicas; é a forma de consciência mais singular, pois as vivências psíquicas são o que se tem de menos compartilhável. A pessoa é a consciência moral; é o sujeito como juiz do certo e do errado, do bem e do mal. O cidadão é a consciência política; o sujeito como o juiz dos direitos e deveres da vida na cidade. O sujeito epistemológico é a consciência intelectual. O sujeito como juiz do verdadeiro e do falso; o detentor da linguagem e do pensamento conceitual; trata-se da forma de consciência mais universal (GHIRALDELLI JR., 1999, p. 23).

Entre os principais conceitos defendidos pelos pensadores modernos pode-se relacionar a razão matemática, na condição de proporção e da relação das grandezas entre si; a visão científica e mecanicista do mundo. Entre as preocupações dos pensadores da época moderna estava a ideia de como conhecemos as coisas, a realidade e o mundo; e, por sua vez, o limite das faculdades e sentidos humanos, que poderia ser sanado com o uso de métodos rigorosos e a razão no campo do

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raciocínio explicativo, que foram consolidados por meio das escolas filosóficas do empirismo e do racionalismo.

Observe no quadro a seguir como as duas escolas filosóficas que perpassaram o contexto educacional da época moderna podem ser sistematizadas:

QUADRO 2 - SÍNTESE DAS PRINCIPAIS CORRENTES FILOSÓFICAS MODERNAS

PRINCÍPIOS PRINCIPAIS REPRESENTANTES

EMPIRISMO(Sec. XVII e XVIII)

O conhecimento advém das experiências.São consideradas as evidências, descobertas por meio de experiências.Almejava resultados práticos, úteis e que pudessem ser aplicados no domínio da natureza.

John LockeGeorge BerkeleyDavid Hume Immanuel Kant

RACIONALISMO(Sec. XVII e XVIII)

O raciocínio é a principal operação mental e o principal caminho à verdade.Tudo que existe possui uma causa inteligível.Privilegia a razão diante da experiência, e a dedução como o principal caminho das investigações filosóficas.

René DescartesBaruch SpinozaGottfried Wilhelm Leibniz

Fonte: Os autores

Outra vertente dos pensadores foi a dos contratualistas, porém agora com preocupações mais específicas do campo jurídico, político e da organização da sociedade propriamente dita, no sentido de que a sociedade moderna, o Estado civil, as constituições, as leis, os contratos forneciam as condições necessárias que garantiriam a vida pacífica, sem discórdia, em justiça e liberdade entre os indivíduos e as sociedades. Observe que a seguir procuramos relacionar de maneira esquemática o pensamento contratualista e quais foram os principais simpatizantes:

QUADRO 3 - SÍNTESE DO PENSAMENTO CONTRATUALISTA

PRINCÍPIOS PRINCIPAIS REPRESENTANTES

CONTRATUALISMO(Séc. XVII e XVIII)

NATUREZA: guerra, violência, vitória do mais forte, incertezas e insegurança.CONTRATO: fundamento do poder político e dos governos;LEIS: capazes de garantir a liberdade e a justiça.PACTO SOCIAL: reconhecimento dos governos, do conjunto das leis, e dos regimes políticos como fundamentais à vida em sociedade.ESTADO CIVIL: reconhecimento de uma autoridade absoluta.

T. Hobbes

John Locke

Jean-J. Rousseau

Fonte: Os autores

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Thomas Hobbes (1588-1679) parte do conceito do Direito natural (Jus naturalismo), cujo preceito ensina que todo homem tem direito à vida e ao que é necessário para mantê-la, também (principalmente) à liberdade. Para ele, todos são livres, ainda que uns sejam fracos e outros fortes. Um contrato social, conforme o Direito Romano, só tem validade se ambas as partes forem livres e iguais e, por vontade própria, consentem ao que está contratado, pactuado.

Para Hobbes, há três motivações intrínsecas no ser humano: a competição, a desconfiança e a glória (a vaidade). O estado natural de guerra é porque todos se imaginam poderosos, perseguidos e traídos, para tanto o Estado Civil moderno regulamentaria a vida, as regras do jogo/guerra e da liberdade, permitindo a todos condições iguais na competição.

Caro acadêmico! Os autores das duas correntes filosóficas modernas ainda serão analisados com maior profundidade ao longo desta unidade. Para potencializar seu conhecimento, esteja atento e reúna o maior número de elementos e argumentos possíveis sobre cada um deles.

4.1 ELEMENTOS DO CONTEXTO EDUCACIONAL MODERNO: A EDUCAÇÃO REALISTA DO SÉCULO XVII

Brug, Fronza e Silva (2013) explicam que a partir do século XVI, teólogos católicos e os protestantes, teceram profundos debates, todavia foi o momento em que os intelectuais idealistas entram no debate e passam a fundar escolas sob sua orientação educacional. O italiano Vitorino Feltre, em 1428, foi convidado a ministrar aulas junto à universidade de Veneza e Pádua, pelo príncipe de Mântua, na qual pode fundar uma escola e permanecer nela até o seu falecimento.

Monroe (1979) descreve que Vitorino Feltre não chegou a deixar seus ideais educacionais e pedagógicos registrados, porém é reconhecido como um dos educadores renascentista pioneiros. Algumas das escolas que foram fundadas na época da renascença destinavam-se especialmente à nobreza e podiam ser encontradas nas cidades de Pádua, Veneza e Florença. Em outras regiões da Europa como a Alemanha, passaram a existir escolas infantis que eram tuteladas diretamente pelas cortes, leia-se: escola às elites; por outro lado ocorriam também os ginásios, cujo fundador foi João Sturn.

A Idade Moderna foi o momento histórico de muitas transformações no que diz

respeito ao cenário político, econômico, científico, intelectual e educacional. Em meio a este contexto as primeiras escolas de alfabetização e educação primária, que eram novidade no cenário educacional europeu, não passaram ilesas. As primeiras escolas, nas quais a maior parte da elite europeia se alfabetizou, contavam com preceptores, que supervisionavam, orientavam e acompanhavam as atividades escolares.

O século XVI no campo intelectual é conhecido como humanista-

renascentista, já no campo artístico é reconhecido como o período barroco, já no campo educacional se desenvolveu a tendência do realismo pedagógico.

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Caro acadêmico! Não se esqueça de que os pensadores do Renascimento foram chamados de ‘utópicos’, ou seja, que lançavam e almejavam teorias idealizadas e de difícil realização. Logo o século seguinte, o século XVII, foi de compensação pelo aspecto racional, metódico e realista, embasado pelo pensamento dos pesadores como John Locke, João Amós Comenius e Francis Fenelon.

John Locke (1632-1704), filósofo e pensador britânico, preceptor dos filhos do conde de Shaftesburg, foi um estudioso que contribuiu na produção do conhecimento que pretendia superar a tradição medieval. Se destacou nas áreas da filosofia, da economia, política, religião e educação. Seus estudos se inserem no contexto histórico e filosófico do pensamento pedagógico moderno e seus pensamentos ganharam importância, pois foi o estudioso que defendeu o empirismo, ou seja, que acredita que o conhecimento seja consequência da experiência, que não existem ideias inatas, ou seja, ideias com as quais nós já nascemos; ao invés disso, propôs que o que sabemos aprende-se tudo pelo caminho da experiência. Criticou enfaticamente as ideias medievais, o descaso atribuído às línguas vernaculares e aos cálculos, e ênfase atribuída ao latim.

Na obra de quatro volumes ‘Ensaio sobre o entendimento humano’, pensamentos sobre a educação, apresentou a expressão latina pela qual ficou muito conhecido, que é a de tábula rasa, que procurava explicar que o ser humano nasce como um papel em branco e que vai sendo preenchido ao longo de sua vida. Foi defensor da separação de poderes entre Igreja e Estado, ou seja, defendeu o Estado laico.

CONCEITO: ESTADO LAICO:Casanova (1994) refere-se, histórica e normativamente, à emancipação do Estado e do ensino público dos poderes eclesiásticos e de toda referência e legitimação religiosa, à neutralidade confessional das instituições políticas e estatais, à autonomia dos poderes político e religioso, à neutralidade do Estado em matéria religiosa (ou a concessão de tratamento estatal isonômico às diferentes agremiações religiosas), à tolerância religiosa e às liberdades de consciência, de religião (incluindo a de escolher não ter religião) e de culto.

Cambi (1999) explica que Locke teoriza sobre uma educação que se destinava tanto a homens como a mulheres e que tinha por objetivo endurecer, regular e moldar a delicadeza e os demasiados cuidados, que seria obtida por meio de uma espécie de “educação do corpo”, este entendido como um vaso de argila (como se exprime Locke), que impunha ajustes desde os modos de vestir, que deveriam parecer nem leves nem pesados, ao mesmo tempo a robustez e a possibilidade da vida "ao ar livre", válida tanto para os rapazes como para as moças” (CAMBI, 1999).

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Para Locke, as capacidades e as competências do ser humano são inatas, mas o conhecimento e as habilidades são construídos. Defendendo estas ideias, colocava-se contrário às noções de dom artístico.

Para Locke, o pensamento e a memória humana consistem em uma espécie

de tábula rasa a ser preenchida e o corpo como um vaso de argila, passível de moldagem. Os estudiosos apontam que seus estudos e teorizações no campo da educação destinam-se à Educação Física e recebe diversas críticas, pois seu pensamento sugeria uma espécie de controle e atos de mutilação com relação ao corpo com justificativa educativa.

QUADRO 4 - SÍNTESE DO PENSAMENTO DE JOHN LOCKE

OBRA PRINCÍPIOS

JOHN LOCKE(1632-1704)

Ensaio sobre o entendimento humano (1690).Alguns pensamentos sobre a educação (1693).A conduta do entendimento (1706).

Homem: sujeito.Natureza: fonte de conhecimento.Conhecimento: por empirismo e experiência.Verdade: processo histórico.

Fonte: Os autores

Francis Fenelon (1567-1622) foi um bispo católico francês. E, assim como Locke, trabalhou como preceptor de uma família nobre. No caso, Fenelon foi o responsável pela instrução de um dos netos de Luiz XIV, o “Rei Sol”. Seu destaque foi propor uma pedagogia para as mulheres. Como retrato da mentalidade da época, acreditava que as moças deveriam se dedicar a conhecimentos religiosos e morais, que as capacitassem para bem desenvolver suas funções sociais como esposas e mães de famílias. As escolas para mulheres foram desenvolvidas na França, sendo a de Saint-Cry um símbolo da educação feminina da monarquia francesa antes da Revolução Francesa (ARANHA, 2006).

Outro importante pensador presente na história da educação ocidental é o

tcheco João Amós Comenius (1562-1670). Formado em Teologia, não conseguiu ser ordenado sacerdote devido aos problemas políticos oriundos na Europa durante a Guerra dos Trinta Anos, um dos conflitos militares oriundos das disputas territoriais entre príncipes católicos e protestantes.

As suas reflexões sobre educação são marcadas por sua perspicácia em

relação ao amadurecimento dos seres humanos. Seus principais livros foram Pródomus da Pansofia, no qual propunha a organização e ampliação do acesso ao ensino como um modo de pôr fim às guerras. Em Porta aberta às línguas, propôs uma inovadora metodologia para o ensino do latim. Porém, sua principal contribuição para a tarefa educacional foi a Didática magna (1657) ou Grande didática. Comenius compreendia o homem e suas fases de desenvolvimento da seguinte forma:

Portanto, o que é inicialmente o homem? Uma massa informe e bruta. Depois, assume o contorno de um pequeno corpo, mas sem sentidos e movimento. A seguir, começa a movimentar-se e por força da natureza vem à luz; pouco a pouco manifestam-se os olhos, os ouvidos e os

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outros sentidos. Após um certo tempo manifesta-se o sentido interno, quando ele percebe que vê, ouve e sente. A seguir será manifestado o intelecto, apreendendo as diferenças entre as coisas; finalmente, a vontade, dirigindo-se a alguns objetos e fugindo de outros, assume papel de governante (COMENIUS, 1997, p. 44).

Para Comenius (1997, p. 58), “nossa mente não apreende só as coisas próximas, mas também aproxima de si as distantes (em lugar e tempo), alça-se às mais difíceis, indaga as ocultas, descobre as veladas, esforça-se por investigar também as imperscrutáveis: é algo infinito e sem limite”. Portanto, dedicou-se em formular um método universal que facilitaria o ensino do maior número de conteúdos e conhecimentos, ensinar tudo e a todos (Omnes Omnia Omnimo), em que os objetivos e os resultados seriam alcançados rápida e solidamente e de modo satisfatório, e que se destinaria a um amplo público de interessados.

Criticava as formas enfadonhas e tortuosas de ensino e aprendizagem, bem como a especialidade e restrição a determinados saberes e ofícios, assim como as restrições de sexo (homens e mulheres), de classes sociais (agricultores, comerciantes, operários, administradores) e aos que apresentavam sinais de deficiências (mental e outras debilidades), que acompanhavam as instituições escolares da época. Enfatizava a necessidade de se subdividir o processo de ensino em níveis e graus mediante a faixa etária dos estudantes, bem como abordava questões de falta de interesse e motivação por parte dos estudantes.

Para Comenius (1997), a educação deveria observar os seguintes preceitos: I. Começar cedo, antes da corrupção das inteligências. II. Fazer a devida preparação dos espíritos. III. Proceder às coisas gerais para as coisas particulares. IV. Proceder às coisas mais fáceis para as mais difíceis. V. Não sobrecarregar ninguém com demasiados trabalhos escolares.VI. Proceder de forma lenta. VII. Não constranger os espíritos a fazer aquilo que não desejam, permitir que seja

de forma espontânea, tendo em vista método e a idade ideal. VIII. Ensinar todas as coisas, colocando-as imediatamente sob os sentidos. IX. Dar ênfase à utilidade imediata dos conhecimentos.X. Utilizar sempre com um só e o mesmo método.XI. Prezar por um andamento suave e agradável das atividades.

Comenius defendia que se devia saber tudo, mas não nos aspectos superficiais e vulgares dos saberes, antes os fundamentos, os princípios, as razões e os objetivos dos principais conhecimentos da natureza e daqueles que o homem foi responsável. Para tanto, classificou as coisas em três naturezas: objetos de observação: o céu, Sol, Lua, as rochas, as estrelas, os fenômenos naturais, entre outros; objetos de imitação: a ordem que rege o mundo, a natureza e o homem; objetos de fruição: o não palpável, o metafísico, o imaterial, o divino, de natureza simbólica e espiritual.

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O que podemos compreender nestes pensadores realistas é a ideia da importância da educação para o desenvolvimento humano. Porém, não apenas do ponto de vista da utopia, do sonho de se viver em uma sociedade marcada pela perfeição. A ideia educacional principal era um pouco mais prática, uma noção da necessidade da educação na alteração de comportamentos e pensamentos no cotidiano dos discentes. Muito mais que um sonho de sociedade, os autores em análise tiveram em suas experiências pessoais a principal motivação para escrever seus livros.

As experiências pessoais de Fenelon e Locke como preceptores os motivaram a pensar uma educação para as moças e de melhor qualidade. As dificuldades de vivenciar uma guerra motivaram Comenius a escrever sobre a paz universal. Estas são as razões principais de as reflexões destes intelectuais não serem teóricas, mas, sim, metodológicas. Isto é, o método de ensino, as faixas etárias apropriadas para o ensino de determinados conteúdos e quais os conteúdos a se ensinar foram os pontos principais das reflexões dos pedagogos seiscentistas.

4.2 OS MANUAIS DE ETIQUETA E DE BONS COSTUMES

Burg, Fronza e Silva (2013) explicam que os manuais de etiqueta, as dietas e cardápios variados e refinados representam uma novidade aos homens do Renascimento, mas a partir de então fazem parte das preocupações da vida pública e privada da sociedade ocidental até os dias atuais. Por meio das expressões, comportamentos e posturas nos momentos festivos, em meios aos baquetes e no cotidiano no interior dos palácios, as elites econômicas e políticas afirmavam-se por meio da demonstração de modos refinados, sofisticados e elegantes.

Elias (1993) explica que os autores renascentistas que já mencionamos antes

nesta unidade, Leonardo da Vinci e Erasmo de Roterdã foram, além de outras coisas, já mencionadas anteriormente, autores de manuais de etiqueta e cardápios gastronômicos. Nos manuais constavam desde noções de como os nobres deveriam se portar e apresentar à mesa assim como cuidados higiênicos que deveriam ser observados no cotidiano. A título de exemplo tem-se que não era de bom tom escarar na mão direita e usar a mesma mão para pegar algum pedaço de carne. Neste contexto não se pode negligenciar a informação de que os artefatos de garfo e faca representavam utensílios raros, que muitas vezes eram objetos de disputas em heranças de pai para filho.

Ribeiro (1990) explica que além das questões de etiqueta e bons costumes, havia também segregações e distinções sociais que eram obtidas pelas questões de honra, ou melhor pelas noções de status quo, ou seja, que se baseava na importância e no reconhecimento que a família obtinha em meio à sociedade. O status era obtido pela demonstração de boa apresentação nos bailes, cafés, museus e galerias, por meio do uso de trajes elegantes, perucas, vestidos e demais acessórios enobrecedores.

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Burg, Fronza e Silva (2013) explicam que foi nas confrarias duelistas, que funcionavam nos castelos e palácios da nobreza, que as regras de etiqueta e bons costumes eram aprendidas; destinavam-se especialmente aos integrantes da elites e nobres praticantes de esgrima. Além das atividades de esgrima, a montaria representava outra atividade, quem quisesse se distinguir deveria apresentar conhecimentos e demostrar habilidade.

Caro acadêmico! Observe com atenção o texto "Escolas Filosóficas: um panorama", escrito pelo professor Kevin Daniel dos Santos Leyser, pois contempla explicações sobre as correntes filosóficas que compõem a matriz do pensamento ocidental e o pano de fundo filosófico em que se desenvolveram os autores que já foram mencionados até aqui e que ainda serão mencionados ao longo das próximas unidades. Mas, para saber mais, prossiga na leitura.

LEITURA COMPLEMENTAR

ESCOLAS FILOSÓFICAS: UM PANORAMA

Kevin Daniel dos Santos Leyser

As escolas filosóficas podem ser sistematizadas em quatro correntes de pensamento, que são o idealismo, o realismo, o pragmatismo e o existencialismo. O idealismo e o realismo derivam dos pensamentos e escritos dos antigos filósofos gregos, Platão e Aristóteles, que por sua vez já foram discutidas na Unidade 1. As outras duas são mais contemporâneas, o pragmatismo e o existencialismo. No entanto, os educadores que compartilham um desses conjuntos distintos de crenças sobre a natureza da realidade atualmente aplicam cada uma dessas filosofias gerais em salas de aula. Vamos explorar cada uma dessas escolas metafísicas de pensamento:

1- Idealismo: é uma abordagem filosófica que tem como princípio central que as ideias são a única realidade verdadeira, a única coisa que vale a pena conhecer. Em busca da verdade, beleza e justiça que é duradoura e eterna, o foco está no raciocínio consciente na mente. Platão, pai do idealismo, abraçou esta visão cerca de 400 anos A.E.C., em seu famoso livro A República. Platão acreditava que havia dois mundos. O primeiro é o mundo espiritual ou mental, que é eterno, permanente, ordenado, regular e universal. Há também o mundo da aparência, o mundo experimentado através da visão, do toque, do cheiro, do gosto e do som, que está mudando, imperfeito e desordenado. Esta divisão é muitas vezes referida como a dualidade da mente e do corpo. Reagindo contra o que ele percebia como um foco excessivo na imediação do mundo físico e sensorial, Platão descreveu uma sociedade utópica na qual a educação para o corpo e a alma seria toda a beleza e perfeição da qual são capazes como um ideal. Em sua alegoria da caverna, as sombras do mundo sensorial devem ser superadas com a luz da razão ou da verdade universal. Para compreender a verdade, é preciso buscar o conhecimento e identificar-se com a Mente Absoluta. Platão também

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acreditava que a alma está totalmente formada antes do nascimento e é perfeita e em harmonia com o Ser Universal. O processo de nascimento verifica essa perfeição, de modo que a educação exige que à consciência sejam trazidas ideias latentes (conceitos totalmente formados).

No idealismo, o objetivo da educação é descobrir e desenvolver as habilidades e a excelência moral de cada indivíduo para melhor servir à sociedade. A ênfase curricular é assunto da mente: literatura, história, filosofia e religião. Os métodos de ensino centram-se no tratamento de ideias através de palestra, discussão e diálogo socrático (um método de ensino que utiliza o questionamento para ajudar os alunos a descobrir e clarificar o conhecimento). Introspecção, intuição, insight e lógica são usados para levar à consciência as formas ou conceitos que estão latentes na mente. O caráter é desenvolvido através da imitação de exemplos e heróis.

2- Realismo: Os realistas acreditam que a realidade existe independentemente da mente humana. A realidade última é o mundo dos objetos físicos. O foco desta perspectiva está no corpo/objetos. A verdade, portanto, é objetiva – aquilo que pode ser observado. Aristóteles, um estudante de Platão que rompeu com a filosofia idealista de seu mentor, é chamado o pai do realismo e do método científico. Nesta visão metafísica, o objetivo é compreender a realidade objetiva através do escrutínio diligente e imparcial de todos os dados observáveis. Aristóteles acreditava que, para compreender um objeto, sua forma última deveria ser entendida, aquilo que não mudava. Por exemplo, uma rosa existe se uma pessoa está ou não consciente dela. Uma rosa pode existir na mente sem estar fisicamente presente, mas em última análise, a rosa compartilha propriedades com todas as outras rosas e flores (sua forma), embora uma rosa pode ser vermelha e outra amarela. Aristóteles também foi o primeiro a ensinar a lógica como uma disciplina formal, a fim de ser capaz de raciocinar sobre eventos e aspectos físicos. O exercício do pensamento racional é visto como o fim último da humanidade. O currículo realista enfatiza o assunto do mundo físico, particularmente a ciência e a matemática. O professor organiza e apresenta o conteúdo sistematicamente dentro de uma disciplina, demonstrando o uso de critérios na tomada de decisões. Os métodos de ensino centram-se no domínio dos fatos e das competências básicas através da demonstração e da recitação. Os alunos também devem demonstrar a capacidade de pensar criticamente e cientificamente, usando observação e experimentação. O currículo deve ser abordado cientificamente, padronizado e baseado em disciplina distinta. O caráter é desenvolvido através da formação nas regras de conduta.

3- Pragmatismo (Experiencialismo): Para os pragmáticos, apenas as coisas que são experimentadas ou observadas são reais. Nesta filosofia americana do final do século XIX, o foco está na realidade da experiência. Ao contrário dos realistas e racionalistas, os pragmatistas acreditam que a realidade está em constante mudança e que aprendemos melhor através da aplicação de nossas experiências e pensamentos aos problemas, à medida que surgem. O universo é dinâmico e evolutivo, uma visão do mundo "tornando-se". Não há uma verdade absoluta

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TÓPICO 1 | O DECLÍNIO DO PENSAMENTO CRISTÃO E O FORTALECIMENTO DO HUMANISMO MODERNO

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e imutável, mas sim, a verdade é o que funciona. O pragmatismo deriva do ensinamento de Charles Sanders Peirce (1839-1914), que acreditava que o pensamento deve produzir ação, em vez de ficar na mente e levar à indecisão. John Dewey (1859-1952) aplicou a filosofia pragmatista em suas abordagens progressivas. Ele acreditava que os aprendizes deviam adaptar-se uns aos outros e ao seu ambiente. As escolas devem enfatizar o assunto da experiência social. Toda aprendizagem depende do contexto de lugar, tempo e circunstância. Diferentes grupos culturais e étnicos aprendem a trabalhar em cooperação e a contribuir para uma sociedade democrática. O objetivo final é a criação de uma nova ordem social. O desenvolvimento do caráter baseia-se na tomada de decisões de grupo à luz das consequências.

Para os pragmatistas, os métodos de ensino se concentram na resolução de problemas práticos, experimentação e projetos, muitas vezes fazendo com que os alunos trabalhem em grupos. O currículo deve reunir as disciplinas para se concentrar na resolução de problemas de forma interdisciplinar. Ao invés de passar corpos de conhecimento organizados para novos alunos, os pragmatistas acreditam que os alunos devem aplicar seus conhecimentos a situações reais por meio de pesquisas experimentais. Isso prepara os alunos para a cidadania, vida diária e carreiras futuras.

4- Existencialismo: A natureza da realidade para os existencialistas é subjetiva e está dentro do indivíduo. O mundo físico não tem nenhum significado inerente fora da existência humana. A escolha individual e os padrões individuais em vez de padrões externos são centrais. A existência vem antes de qualquer definição do que somos. Nós nos definimos em relação a essa existência pelas escolhas que fazemos. Não devemos aceitar o sistema filosófico predeterminado de outra pessoa. Em vez disso, devemos assumir a responsabilidade de decidir quem somos. O foco é sobre a liberdade, o desenvolvimento de indivíduos autênticos, tal como fazemos o significado de nossas próprias vidas.

Existem várias orientações diferentes dentro da filosofia existencialista. Sören Kierkegaard (1813-1855), ministro e filósofo dinamarquês, é considerado o fundador do existencialismo. Sua orientação era cristã. Outro grupo de existencialistas, em grande parte europeu, acredita que devemos reconhecer a finitude de nossas vidas neste pequeno e frágil planeta, em vez de crer na salvação por meio de Deus. Nossa existência não é garantida em uma vida após a vida, então há tensão sobre a vida e a certeza da morte, da esperança ou do desespero. Ao contrário das abordagens europeias mais austeras onde o universo é visto como sem sentido quando confrontado com a certeza do fim da existência, os existencialistas americanos têm se concentrado mais no potencial humano e na busca de significado pessoal. O esclarecimento de valores é uma consequência desse movimento. Após o período sombrio da Segunda Guerra Mundial, o filósofo francês Jean-Paul Sartre sugeriu que, para a juventude, o momento existencial surge quando os jovens percebem pela primeira vez que a escolha é deles, que eles são responsáveis por si mesmos. Sua pergunta se transforma em "Quem sou eu e o que devo fazer?”

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

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Em relação à educação, o tema das aulas existencialistas deve ser uma questão de escolha pessoal. Os professores veem o indivíduo como uma entidade dentro de um contexto social em que o aluno deve confrontar os pontos de vista dos outros para esclarecer o seu próprio. O desenvolvimento do caráter enfatiza a responsabilidade individual pelas decisões. Respostas reais vêm de dentro do indivíduo, não de autoridade externa. Examinar a vida através do pensamento autêntico envolve os alunos em experiências de aprendizagem genuínas. Os existencialistas se opõem a pensar nos alunos como objetos a serem medidos, rastreados ou padronizados. Esses educadores querem que a experiência educacional se concentre na criação de oportunidades para autodireção e autorrealização. Eles começam com o aluno, e não com o conteúdo do currículo.

Observe no quadro abaixo como estas escolas podem ser sistematizadas e quais foram os principais estudiosos que as seguiram:

ESCOLA FILOSÓFICA

IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS

O QUE DEVEMOS ENSINAR?

COMO DEVEMOS ENSINAR?

EXEMPLOS HISTÓRICOS

IDEALISMO(Séc. V a.C; XVIII, XX)

Considera ideias ou conceitos como a essência de tudo o que vale a pena conhecer. O mundo espiritual é eterno e não está sujeito a mudanças porque é perfeito (metafísica). Ênfase no raciocínio, mas não na investigação científica.

O idealismo é centrado na ideia ao invés de no sujeito ou na criança porque o ideal, ou a ideia, é o fundamento de todas as coisas. O idealista acredita que a aprendizagem vem do interior do indivíduo, e não do exterior. Portanto, o verdadeiro crescimento mental e espiritual ocorre quando é autoiniciado.

As crenças educacionais dos idealistas incluem uma ênfase no estudo de ideias ou grandes obras que persistem ao longo do tempo. Eles também enfatizam a importância de grandes líderes para nós imitarmos. Para os idealistas, o professor é um modelo para o aluno.

Os idealistas enfatizam os métodos de leitura, discussão e imitação. Eles acreditam que pensar com clareza e precisão é fundamental para descobrir as grandes ideias que explicam o universo. Há uma ênfase em questões que despertam o pensamento.

· Platão· Sócrates· Immanuel Kant· Jane Roland Martin

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REALISMO(Séc. IV a.C. XVII e XIX)Sustenta que a realidade, o conhecimento e o valor existem independentemente da mente humana. O realismo contrasta com o idealismo. Realistas endossam o uso dos sentidos e a investigação científica (razão) para encontrar a verdade no mundo físico.

Realistas reconhecem leis universais. Enfatizam a investigação e o desenvolvimento científico. O currículo realista irá utilizar testes padronizados, livros-textos e currículo em que as disciplinas são áreas separadas de investigação.

Os realistas acreditam que o objetivo final da educação é o avanço do raciocínio humano. O currículo seria centrado no sujeito e encorajaria o aprendizado através da observação e experimentação. Os professores teriam conhecimento extenso sobre um assunto.

Importância é colocada sobre o papel do professor. O professor apresenta conteúdo de forma sistemática e organizada. Os professores realistas enfatizam a importância das técnicas experimentais e observacionais. Os realistas sustentam testes cuidadosos do conhecimento dos alunos.

· Aristóteles· John Locke· Alfred North Whitehead

PRAGMATISMO(Séc. XIX, XX, XXI)

Desenvolvido nos Estados Unidos no final de 1900. O pragmatismo enfatiza a evolução e a mudança ao invés do ser, a crença em um universo aberto que é dinâmico, em evolução e em estado de tornar-se.

Os pragmatistas acreditam que aprendemos melhor através da experiência, mas que a experiência muda tanto o aluno como o mundo. O professor ajuda os alunos a aprender a questionar o que é e a resolver problemas como ocorrem naturalmente. A abordagem é interdisciplinar e reúne disciplinas curriculares para resolver problemas.

Os pragmatistas favorecem a resolução de problemas através da interação com o ambiente de forma inteligente e reflexiva. Ensinar os alunos a usar métodos de investigação científica é uma alta prioridade.

Os pragmatistas enfatizam a aplicação de ideias de uso do conhecimento como instrumentos para a resolução de problemas (epistemologia). Os pragmatistas veem a escola como uma comunidade de aprendizes. Como o processo de resolução de problemas é mais importante do que ensinar assuntos específicos, o uso de problemas centrados no aluno como um foco de ensino é preferido.

· Charles Sanders Peirce· William James· John Dewey· Richard Rorty

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EXISTENCIALISMO(Séc. XIX, XX e XXI)

Centra-se na importância do indivíduo em vez de nos padrões externos. A realidade nada mais é do que a existência vivida. Não há nada absoluto, nem mesmo a mudança. Não há princípio ou significado último.

A filosofia existencialista sustenta a importância de os seres humanos desenvolverem suas identidades pessoais e determinarem o que é e não é significativo e digno. Os existencialistas acreditam que a maioria das escolas são como símbolos corporativos que transformam os indivíduos em objetos a serem medidos, quantificados e processados.

Os existencialistas acreditam que a educação deve ser um processo centrado nos estudantes se tornarem autoatualizados. A discussão é encorajada, uma vez que todos estamos na mesma situação sem sentido, para que possamos aprender com as preocupações, perguntas e escolhas dos outros.

O estudante existencialista teria uma atitude questionadora e estaria envolvido em uma busca contínua pelo eu e pelas razões da existência. O professor existencialista iria oferecer projetos que incentivam os alunos a se tornarem o que eles próprios querem se tornar. O valor chave é que os seres humanos são livres para fazer escolhas (Axiologia).

· Jean-Paul Sartre· Friedrich Nietzsche· Maxine Greene

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RESUMO DO TÓPICO 1

Ao longo do Tópico 1, você estudou que:

• O renascimento consistiu na retomada dos valores e padrões estéticos, filosóficos e culturais da antiguidade clássica greco-romana, que por sua vez colocavam o homem no centro das preocupações.

• Entre os antecedentes que propiciaram as mudanças nos fundamentos do pensamento pedagógico ocorridas na época renascentista e moderna estão as invenções técnicas da prensa e da era das grandes navegações.

• A invenção da imprensa por Guttenberg impactou a cultura letrada, facilitando o acesso a livros e proporcionando melhorias nos campos educacionais, assim como a leitura individualizada e não mais intermediada e guiada por uma terceira pessoa.

• As grandes navegações possibilitaram o contato com regiões, matérias-primas e culturas que até então não haviam sido exploradas e colonizadas.

• A Reforma Protestante estimulou a alfabetização da população europeia, bem como a tradução de documentos nas línguas regionais e que até então somente eram conhecidos nas línguas latinas e gregas.

• Os principais nomes da Reforma Protestante foram Martinho Lutero e João Calvino.

• A Contrarreforma, que foi empreendida pela Igreja Católica, prestigiou novas ordens religiosas ligadas à educação, como a Companhia de Jesus, a Ordem do Oratório e as iniciativas educacionais de Jean Batista de La Salle.

• Os intelectuais do século XVI pensavam a educação de um modo utópico, idealista; já os intelectuais do século XVII pensavam a educação de modo realista, demonstrando uma profunda preocupação metodológica.

• Entre os teóricos do realismo pedagógico estava Comenius, que com seus estudos e teorias almejava fornecer um método universal que facilitaria o ensino do maior número de conteúdos e conhecimentos, transmitidos de forma sólida e que alcançaria o maior número de pessoas possível.

• John Locke defendeu em seus estudos que o homem constitui um sujeito, que a natureza é fonte de conhecimento e que este deve ser adquirido por meio do empirismo e da experiência.

• René Descartes, enquanto cientista e estudioso, propunha que um método deveria ser seguido para obter a verdade na ciência, que, por sua vez, compreendia os passos de ‘verificar’, ‘analisar’, ‘sintetizar’ e ‘enumerar’.

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AUTOATIVIDADE

1- De que maneira é possível associar a Reforma Protestante e o processo de alfabetização em massa de setores da população europeia?

2- É correto afirmar que no contexto de transformações de mudança da sociedade feudal em sociedade moderna se deu a substituição dos discursos religiosos pelos científicos e racionais em meio às concepções e mentalidades e no imaginário da época; ao mesmo tempo, ocorreu o fenômeno de laicização do Estado. Quais foram as implicações da composição de Estado laico na formação dos governos? Analise as sentenças atribuindo V para as verdadeiras e F para as falsas:

( ) A laicização consistiu na separação, emancipação política, institucional e jurídica entre religião (Igreja) e política (Estado).

( ) O Estado passou a atuar de forma neutra, como um juiz de fora, o que por sua vez não governa nem de forma favorável nem em prejuízo a qualquer tradição religiosa.

( ) A laicização possibilitou a livre prática religiosa e de culto, e assim a prática da religião católica deixava de ser obrigatória nos espaços escolares.

( ) O processo de laicização do Estado consistiu na criação de feriados, festas e comemorações a partir da organização religiosa cristã.

Agora assinale a alternativa que apresenta a sequência correta:a) V – V – V – V.b) V – F– V – V.c) V – V – F – V.d) V – V – V – F.e) F – V – V – V.

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TÓPICO 2

A FORMAÇÃO DO SISTEMA LAICO DE ENSINO

NO OCIDENTE CONTEMPORÂNEO

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

A ideia de Estado sem religião oficial se estruturou e legitimou a partir as revoluções liberais ocorridas ao longo do século XVIII. Burg, Fronza e Silva (2013) explicam que quando o fato de o Estado ser laico significa que Igreja não compõe mais o governo, outras esferas e instâncias da sociedade como a educação, permaneceram sob o controle e tutela da Igreja, o que mudou a partir da época moderna é que a Igreja não possuía mais o monopólio hegemônico sobre a educação. O que passa acontecer também é que as instituições religiosas precisavam se adaptar às exigências e normas do governo, que prescreviam os conteúdos mínimos que deveriam ser ministrados. Isso implicava que as escolas mesmo sendo confessionais deveriam ministrar os conteúdos de caráter científico, ou seja, escolas religiosas ensinar sobre a Teoria da Evolução das Espécies proposta por Charles Darwin.

O século XVIII foi um dos principais períodos em que a sociedade humana viveu transformações profundas, verdadeiramente revolucionárias: o Iluminismo, uma revolução no campo das ideias; a Revolução Industrial, uma verdadeira transformação no campo da economia; a Revolução Francesa, uma transformação no campo da política; e a Revolução Americana, que simbolizou uma alteração na relação entre os países do mundo.

A sociedade estamental e o antigo sistema colonial eram os dois principais pilares da dominação econômica e social. Por sua vez, a ideia de um direito divino dos reis em comandar a plebe, e os resquícios de dominação feudal, com a maioria da população vivendo nos campos, explicam quão revolucionários foram os eventos que estudaremos. Pois teremos, com a Revolução Francesa, o fim da Sociedade Estamental, com a Revolução Americana o fim do Antigo Sistema Colonial e, com o Iluminismo, o fim da legitimação divina do poder real.

2 A SUPERAÇÃO DO ANTIGO REGIME E DO SISTEMA COLONIAL E AS IMPLICAÇÕES NA EDUCAÇÃO

Uma primeira importante revolução existiu no campo das ideias e a conhecemos por Iluminismo. Este influenciou a Revolução Francesa e a Independência dos Estados Unidos da América.

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

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Uma das principais revoluções sociais ocorreu quando os Estados Unidos da América se tornaram uma nação independente da Inglaterra. Tal revolução é explicada pelo fim do Antigo Sistema Colonial. Isto é, as colônias americanas deveriam ser submissas às metrópoles, sendo elas fornecedoras de lucros aos europeus. Com o exemplo norte-americano, as antigas colônias espanholas e portuguesas também se tornaram independentes das suas metrópoles, o que ocasionou uma grande consequência para a história da educação. Pois, estes Estados Nacionais que surgiram na América Latina tiveram de implantar um sistema nacional de educação. Pela primeira vez, as elites políticas ibero-americanas tiveram de se responsabilizar pela instrução de sua população.

A Revolução Francesa teve incomensurável importância para compreendermos as transformações educacionais. A mesma se iniciou em 1789, quando da Queda da Bastilha, um símbolo do Antigo Regime Monárquico e termina quando Napoleão Bonaparte assume o poder francês e expande algumas das ideias revolucionárias para os demais países europeus.

FILMEUm filme interessante sobre a Revolução Francesa é Darton – o processor da revolução. Estrelado pelo principal ator francês de sua geração, Gerard Depardieu, trata-se de uma visão sobre a revolução tendo como protagonistas seus principais e opostos líderes: Darton e Robespierre.

Uma das principais questões da Revolução Francesa que alterou a forma de organização social foi o fim do sistema estamental do Antigo Regime, no qual a sociedade era dividida em três estados. O primeiro, composto pelo clero, o segundo, pela nobreza e o terceiro, pelos demais membros da sociedade, independente da renda que possuíam. Mesmo que alguém fosse rico, teria menos direitos políticos e sociais que os membros dos estamentos superiores. A Revolução Francesa aboliu com este sistema de organização social, estabelecendo um processo de igualdade de todos os indivíduos perante a lei, o que ficou explicitado no Código Civil Napoleônico.

O fato de todos os seres humanos serem considerados iguais foi uma revolução político-social de grande tamanho, com óbvios reflexos no campo educacional, pois todos teriam direito de ter acesso à educação formal, não apenas os que possuíssem dinheiro ou fossem membros da nobreza e clero. Deste modo, após a Revolução Francesa se observa a construção de uma sociedade na qual o acesso às carreiras de Estado, como o magistério, a justiça, as forças armadas e a diplomacia, é tido através de méritos educacionais, simbolizados nos concursos públicos. A Revolução observou grande importância à educação. Liderados por

DICAS

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TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DO SISTEMA LAICO DE ENSINO NO OCIDENTE CONTEMPORÂNEO

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Condorcet, os revolucionários estabeleceram comitês de educação pública. Após a Revolução, se observou o aumento da oferta de educação para todos os cidadãos, tanto na França quanto nos demais países do mundo.

Uma das revoluções já citadas foi a Revolução Industrial. Iniciada na Inglaterra do século XVIII e originalmente ligada à indústria têxtil, a mesma se expandiu ao longo dos séculos XIX e XX aos demais países do mundo, açambarcando outras áreas da produção de objetos e máquinas, como a indústria metalúrgica, avançando no presente momento a áreas tecnológicas de extrema complexidade, como a informática e a nanotecnologia. A Revolução Industrial também possuiu fortes implicações educacionais. Isto porque ela acabou por alterar a vida cotidiana da maior parcela da população ocidental, pois, anteriormente, a mesma vivia majoritariamente no campo, tendo um contato direto com a natureza. Nestes tipos de comunidades rurais, a aprendizagem para o trabalho era mimética, ocorrendo em contato com os pais e demais parentes que ensinavam às crianças as lides rurais. As escolas, em geral ligadas às paróquias das igrejas, tinham como principal função ensinar a ler e escrever, além de instruir as quatro operações matemáticas básicas.

A Revolução Industrial modificou a estrutura educacional do ocidente,

desde a pré-escola até o ensino de pós-graduação. Isto porque, antes da Revolução Industrial, a educação da elite era realizada por preceptores (professores particulares) em seu nível elementar, e nas universidades, ao longo do ensino superior. Porém, a educação das elites foi profundamente alterada, com a popularização de escolas elementares e colégios secundaristas. Ao mesmo tempo, a educação das massas também foi alterada, com a criação de institutos de ensino técnico, que visava à formação de mão de obra para as indústrias. A Revolução Industrial também criou empregos de classes médias ligados diretamente às fábricas, como técnicos industriais e engenheiros mecânicos.

Como podemos observar, as denominadas revoluções atlânticas foram as principais propulsoras da alteração da relação do Estado Nacional com a educação, pois, tiveram o impacto de forçar aos países ofertar educação para todos os cidadãos, independente do credo religioso, posição social ou situação econômica.

3 OS PRINCIPAIS INTELECTUAIS E O PENSAMENTO DOS EDUCADORES LEIGOS

Com a implantação do Estado moderno se instaurou todo um contexto de políticas de fomento à popularização da arte e da cultura, que estas fossem de fácil assimilação, circulação e consumo, bem como democratizar os espaços de arte e cultura, museus, galerias, exposições, no sentido de aproximar o público dos artistas, os produtores dos consumidores, ou oportunizar que a arte e a cultura fossem de acesso ao maior número possível de indivíduos. Durante o século XVII, coleções de curiosidade, difundidas por toda a Europa, receberam espaços em museus, gabinetes ou câmaras de curiosidades. Nesses locais, que não pertenciam

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

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mais somente à nobreza, encontravam-se quadros, esculturas, livros, instrumentos científicos, objetos vindos de terras que estavam sendo exploradas, peças do mundo natural, curiosidades em geral.

Um dos principais sinais do processo de laicidade da formação dos sistemas educacionais das diferentes nacionalidades foi a exclusão de intelectuais ligados diretamente a igrejas cristãs. Como afirmamos, temos a presença de intelectuais leigos, isto é, não sacerdotes, porém, muitos dos pensadores da educação nos séculos XIX e XX eram pessoas que tinham fé cristã. O fato de não serem sacerdotes possibilitou a eles uma maior liberdade, por poderem inovar em matéria educacional sem o perigo de sofrerem punições pelas hierarquias eclesiásticas das igrejas que professavam suas crenças.

O princípio de uma divisão entre a Igreja e o Estado foi uma ampla tendência no século XIX, pois a religião, que no Antigo Regime deveria ser expressa publicamente pelos indivíduos, em rituais nos quais o poder político era legitimado pelos clérigos, deixou de ser uma obrigação social. Por sua vez, a educação, que era algo reservado à esfera privada e que não era considerada uma obrigação, passou a ser uma das preocupações dos dirigentes sociais.

O amplo desenvolvimento das distintas ciências durante os novecentos possibilitou uma nova forma de pensar o ser humano e suas relações sociais. O evolucionismo, o socialismo, além do desenvolvimento da sociologia e da psicologia enquanto ciências, possibilitaram aos homens uma nova forma de pensar a realidade, uma nova sensibilidade em relação à infância e a possibilidade do desenvolvimento de uma ciência voltada ao progresso educacional dos indivíduos, materializada em escolas que seguiam novos conceitos educacionais.

Podemos compreender o surgimento de intelectuais que trabalharam com

temas educacionais como um indício da emergência histórica do laicismo, de uma separação radical entre as questões da fé e as questões da política. Os intelectuais a seguir citados não são gênios isolados, mas professores que souberam adequar a tarefa educacional aos desafios de suas épocas.

Ao longo dos séculos XIX e XX, muitos intelectuais refletiram sobre as transformações que a sociedade estava passando. Alguns destes pensadores refletiram, sobre a importância da educação se adequar à nova sociedade que estava sendo formada após as grandes transformações simbolizadas pela Revolução Industrial e Francesa. Dentre os vários pensadores, neste momento, iremos destacar três que tiveram maior relevância nos últimos duzentos anos: Froebel, Pestalozzi e John Dewey (GADOTTI, s.d.).

Froebel foi um dos importantes teóricos da educação moderna. As suas ideias tiveram reflexos até o presente no que se concebe sobre as políticas educacionais do ocidente. Froebel partiu do princípio que todo o ser humano nos primeiros anos de vida é uma semente, que deve ser regada e fortificada para poder crescer e ser um bom indivíduo. Por isso, ele foi o criador dos jardins de infância, as unidades de educação infantil no qual as crianças têm a possibilidade

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TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DO SISTEMA LAICO DE ENSINO NO OCIDENTE CONTEMPORÂNEO

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de serem socializadas protegidas pelos adultos, sem interferências do mundo externo, que poderiam ser a elas uma má influência. Assim, o jardim de infância é uma das principais ferramentas para a construção de um futuro melhor para toda a sociedade, ao proteger as crianças das influências maléficas e possibilitar a formação de pessoas com melhor saúde, caráter e inteligência.

Outro importante intelectual da educação do século XIX foi Pestalozzi, educador suíço de grande destaque entre os intelectuais da educação. Uma importância da revolução que Pestalozzi produziu na história da pedagogia foi sua insistência em afirmar que mais importante que a acumulação de conhecimentos, a educação deve ser capaz de formar indivíduos de forte caráter. (ARANHA; 1996) O que hoje é um dado comum, porém, isto significou uma verdadeira revolução em sua época.

FIGURA 22 - FROEBEL PESTALOZZI

JOHN DEWEY

FONTE: Disponível em: <http://c250.columbia.edu/c250_celebrates/remarkable_columbians/john_dewey.html>. Acesso em: 13 fev. 2017.

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

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No Século XX, tivemos vários intelectuais de destaque que pensaram as questões educacionais. O destaque maior cabe ao estadunidense John Dewey. Este intelectual foi o formulador do denominado escolanovismo. Este movimento educacional tinha como uma das principais bandeiras o ensino integral. Isto é, em um momento da história humana na qual os pais e as mães faziam parte do mercado de trabalho, as crianças poderiam ficar o dia inteiro em escolas nas quais, além da educação formal, receberiam atenção de educadores que forneceriam alimentação, práticas esportivas e o contato com a tecnologia desenvolvida pelos homens.

O escolanovismo teve uma preocupação justa com a qualidade da educação e sua popularização, mas também em utilizar dos inventos do século XX nas escolas, como o gramofone, o cinema e as projeções eletrônicas de imagens, como os slides. Isto é, ao invés de se ter a tecnologia como uma inimiga das tarefas pedagógicas cotidianas, os escolanovistas tiveram a percepção que estes inventos poderiam ser utilizados como aliados no ato de ensinar às novas gerações o conhecimento.

John Dewey também se destacou como importante filósofo, ao propor uma nova forma de pensar a realidade, o denominado pragmatismo. Para os filósofos que seguem tal perspectiva de análise, as ideias deveriam ter sua relevância medida por sua possível utilização prática. Na atualidade, Richard Rorty é o principal seguidor no campo da filosofia das teorias pragmáticas.

4 O EXEMPLO DE HEGEL

Georg W. Friedrich Hegel (1770-1831), filósofo alemão, foi influenciado pelas obras de Heráclito (353 a.C - 475 a.C), Espinoza (1632-1677), Kant (1724-1804) e Rousseau (1712-1778), assim como pela Revolução Francesa e Napoleão Bonaparte. Dedicou-se aos estudos do Idealismo Absoluto, procurou investigar a relação entre mente e natureza, sujeito e objeto do conhecimento. Para tanto, empreendeu estudos em história, arte, religião e filosofia.

Com a obra “Fenomenologia do espírito”, pretendeu mostrar que a ideia não é seguir o acumular do desenvolvimento histórico da humanidade na dimensão do tempo, mas de colher os momentos estratégicos, de vicissitudes e ideais que são responsáveis por conferir desenvolvimento ao espírito. Para Hegel, o desenvolvimento da realidade passa por três momentos fundamentais: o da ideia, o da natureza e o do espírito.

O espírito é o absoluto, o complemento de todas as coisas, o ponto extremo de síntese para a qual tende toda filosofia, ciência, religião e cultura. O espírito não é transcendente em relação ao mundo, mas constitui seu complemento interno e sua essência que é a liberdade. Para Hegel, o espírito subjetivo e o espírito objetivo são a via pela qual se vai elaborando o espírito absoluto, cujas formas são a arte, a religião e a filosofia.

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Hegel apresenta também a unidade dos opostos, como princípio fundador de uma nova lógica, no sentido de que esta é imanente, de modo que aquilo que é real deve ser caracterizado pela unidade dos opostos. Para Hegel, o homem se apresenta como um animal que não tem uma natureza determinada, mas que se forma incessantemente. Seguindo este raciocínio, a história do passado não é capaz de ensinar alguma coisa de útil ao momento presente, o que coloca Hegel distante da doutrina “Historia magistra vitae”, que foi proposta desde os historiadores da época antiga, como Heródoto, Tucídides e Cícero.

A história apresenta uma racionalidade própria, mas não deve apresentar uma tendência na direção de um telos (fim, alvo) específico. Para Hegel, os ‘meios’ são mais importantes que os ‘fins’; ou seja, o navio, o automóvel e o trem são mais importantes do que alcançar e chegar do outro lado do oceano, na cidade, e qualquer destino traçado. Uma vez que se conta com tais recursos, pode-se trilhar novos caminhos, percorrer outras distâncias, chegar a diferentes lugares.

A grande tese de Hegel reside na defesa de que o finalismo “ad usum hominis” (para uso humano) não existe na natureza e, que quando existe na história, não é por virtude da Divina Providência, mas unicamente pelos feitos das ações humanas. E o fato de propor a relação de prioridade dos meios diante dos fins distanciava-se do pensamento que havia sido proposto desde Maquiavel (1469-1527), Voltaire (1694-1778) até Herder (1744-1803).

Para Hegel, a racionalidade está por trás de tudo no mundo e a filosofia tem o poder de compreender a racionalidade da história. O pensamento capta a racionalidade, mas substitui a noção de progresso linear por uma filosofia da contradição, da dialética. O percurso dialético que resulta disso pressupõe uma visão unitária e uma síntese do espírito por meio de suas múltiplas concretizações.

5 O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO DE DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS E DISCIPLINAS AUXILIARES

A partir da época moderna, a ciência alcançou uma autonomia e emancipação nunca observadas em outros tempos históricos. As revelações, verdades e metáforas religiosas, ou de senso comum ou mitologias e folclores que desfrutavam de prestígio e autoridade no interior das sociedades, passam a ser abordadas a partir do princípio da dúvida, do questionamento e das hipóteses formuladas no campo da ciência e da racionalidade.

O percurso metodológico foi instaurado como o único procedimento básico para alcançar a verdade, ou seja, o caminho do laboratório, da observação, da análise, da descrição, da dedução, da comparação, da interpretação, da síntese, da antítese e da tese seria o garantidor da veracidade dos novos conhecimentos que estavam sendo produzidos.

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Os testes, os experimentos, tratamentos e medicamentos preventivos, simulações, supervisionamentos, monitoramento, o isolamento e o controle em laboratório, as cirurgias, as amputações, as incisões, as transfusões, as combinações, os enxertos, os hibridismos, a criação de ambientes artificiais, as induções, o uso de paliativos, isto tudo foi possível a partir da ciência moderna e possibilitou a verificação específica, profunda e restrita tanto de objetos, fatos e fenômenos.

Como resultado deste cenário, obtiveram-se as descobertas e as invenções

do termômetro clínico, lentes de A. Fresnel (1788-1827), a anestesia, a teoria da evolução das espécies de Charles Darwin (1808-1882), teoria microbiana de L. Pasteur (1822-1895) e P. V. Gautier (1846-1908), teoria atômica de J. Dalton (1766-1844), e a teoria psicanalítica de Sigmund Freud (1856-1939).

As interpretações estatísticas e demográficas foram responsáveis por servir de base de dados e desencadear ações e práticas aos estados em termos de saneamento básico, como oferecer água encanada, canalização de esgotos, controle de epidemias e doenças, construção de hospitais, laboratórios, escolas, orfanatos, asilos, cemitérios, entre outros.

O desenvolvimento de ciências auxiliares para a educação foi um dos sinais que ganhou importância e prestígio social, em especial no final do século XIX e na primeira metade do século XX. Duas delas são de importância incalculável para o desenvolvimento de melhores formas de educar os jovens: a sociologia e a psicologia da educação.

O termo “ciências auxiliares”, por vezes, é criticado, pois alguns autores observam que existe uma multiplicidade de temas educacionais e que somente uma abordagem interdisciplinar poderia realmente ser capaz de vencer os diferentes desafios da educação na contemporaneidade. Todavia, o que se pretende ao ainda utilizarmos o conceito “ciências auxiliares”, é observar a importância da educação como forma de estudo para diferentes áreas das ciências humanas e sociais.

5.1 SOCIOLOGIA: A CIÊNCIA DA SOCIEDADE

O surgimento da sociologia enquanto ciência ocorreu no século XIX. Augusto Comte, formulador da filosofia positivista, foi o autor da ideia de uma nova ciência de estudar a sociedade, o “sócio-logos”, que em sua origem etimológica define sua função, pois logos, no grego, quer dizer justamente conhecimento, estudo ou ciência sobre algum tema. Todavia, os estudiosos reconhecem três grandes fundadores da sua especialidade: Karl Marx, Max Weber e Émile Durkheim.

Augusto Comte (1798-1857) foi politécnico organizador, bem como hostil ao

pensamento socialista/marxista e de quem fosse inimigo da propriedade privada. Possuía como objetivo fundar uma ciência social, que deveria ser chamada de física social ou sociologia. No pensamento de Comte, somente com a síntese das ciências e com a criação de uma política positiva se daria conta de analisar conflitos e as contradições sociais e propor reformas e soluções.

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O principal ponto de partida residia no próprio século XIX, que almejava superar a tradição teológica e favorecer a transição a uma sociedade científica e industrial. Os principais temas que interessaram a Comte foram a filosofia da História, a classificação das ciências e física social ou sociológica. Para tanto, escreveu as obras Curso de filosofia positiva – seis volumes (1830-1842), Discurso preliminar sobre o espírito positivo (1844) e Sistema de política positiva – quatro volumes (1851-1854).

Comte defendeu a lei dos três estados os quais o espírito humano percorre em seus estágios de desenvolvimento: estado teológico ou fictício (fenômenos sobrenaturais); estado metafísico ou abstrato (fenômenos da natureza); e o estado científico ou positivo (fatos e leis que determinavam a realidade): maneira de pensar positiva. Vamos analisar com mais detalhes como funcionava a filosofia histórica das ‘leis dos três estados’ que Comte formulou e procurou explicar.

O conhecimento positivo se caracterizou pela previsibilidade; o “ver para prever” que funcionou como lema da ciência positiva. A previsibilidade científica permitiria o desenvolvimento da técnica e, assim, o Estado corresponderia ao pleno desenvolvimento industrial, no sentido de exploração da matéria-prima (recursos naturais) e do trabalho do homem. Neste estado, Comte determinou que o poder do conhecimento passaria para os sábios e cientistas e o poder material para as indústrias e os industriais, configurando assim o desenvolvimento científico e tecnológico.

No pensamento positivista de Comte, a civilização material só poderia se desenvolver se cada geração produzisse mais do que o necessário para sua sobrevivência, transmitindo assim à geração seguinte um estoque de riqueza maior do que o recebido da geração anterior.

Comte foi um organizador que desejava manter a propriedade privada e transformar seu sentido, para que, embora exercida por alguns indivíduos, tivesse também uma função social (catolicismo social).

Para Comte, as ciências libertavam o espírito humano da tutela exercida sobre ele pela teologia e pela metafísica, e que a partir de então tendia a se prolongar indefinidamente. Consideradas no presente, elas deveriam servir, seja pelos seus métodos, seja por seus resultados gerais, para determinar a reorganização das teorias sociais. Consideradas no futuro, constituiriam a base espiritual permanente da ordem social, enquanto durar a atividade da nossa espécie no planeta.

Karl Marx (1818-1883) foi um dos mais influentes pensadores surgidos no século XIX, a ponto de surgir um Estado nacional, a União Soviética, que foi desenvolvida em torno de suas ideias. A principal obra de Marx foi o livro "O capital", no qual demonstrou o desenvolvimento da economia capitalista. Outro livro importante foi o "Manifesto do Partido Comunista", no qual revelou seu ideal de sociedade, no qual as diferenças entre as classes sociais não mais iriam existir.

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O marxismo inspirou grandes pedagogos em diversos lugares no mundo. No caso específico do Brasil, podemos citar os nomes de Paulo Freire e Darcy Ribeiro, como profissionais da educação influenciados pelo ideal do denominado materialismo dialético. A principal ideia de Marx é que a história humana se transforma através da luta de classes. No tocante à educação, a ideia de que a educação escolar nos países capitalistas está a serviço do poder político-econômico foi a grande denúncia marxista em relação à área educacional (GADOTTI, s.d).

O centro do pensamento de Karl Marx reside em compreender e denunciar as contradições do regime capitalista. As principais influências teóricas de Marx são as do idealismo alemão de Hegel e seus seguidores, os estudos de economia política inglesa feitos por Adam Smith (1723-1790), Jean-Baptiste Say (1767-1832) e David Ricardo (1772-1823), o socialismo utópico francês representado por Saint Simon (1760-1825), Jean-Baptiste Fourier (1768-1823) e Robert Owen (1771-1858).

Quando Marx entra na universidade, o universo acadêmico e científico da época era dominando pelas ideias de Hegel. Foi da tese de Hegel de que “a consciência é que determina a existência”, que Marx retirou a sua principal chave de entendimento e explicação do seu momento histórico, mas agora, com Marx, na perspectiva inversa, a de que é “a existência que determina a consciência”.

Para Hegel, a racionalidade está por trás de tudo no mundo e a filosofia tem o poder de compreender a racionalidade da história, ou seja, o pensamento capta a racionalidade da história. Para Marx, Hegel e todos os filósofos estavam alienados e poderiam ser chamados de a-históricos, e, segundo suas teses, as características da história seriam sempre as mesmas em todas as épocas, a natureza humana era somente crítica; procuravam mudar, transformar o mundo com filosofias e teorias. Marx, em contrapartida, defendia que o mundo não se transforma com o pensamento, com críticas, o mundo se transforma pela ação politicamente orientada, que ele preferiu chamar de práxis, e que se faziam necessárias tanto a explosão como a revolução das antigas estruturas.

Marx, ao longo da vida intelectual e financeira, contou com a ajuda de Friedrich Engels (1820-1895). No livro "A ideologia alemã", de 1846, ambos abordam as bases do materialismo histórico e procuram, ao longo da obra, defender que o homem é fruto do seu trabalho e das relações de produção, e não da vida espiritual e intelectual que leva. Para Marx, o trabalho é o que diferencia e distingue os seres humanos de outras espécies.

A concepção de História defendida por Marx e Engels residia no fato de que estão na vida material, no modo de produção e na estruturação da sociedade civil as chaves de entendimento de todo o processo histórico, e que ao invés de resultar em ‘emancipação e autonomia’ do homem, como foi defendido pelos iluministas e idealistas, o que ocorre é a exploração e a ‘alienação’ dos indivíduos. Com a defesa destes termos, Marx e Engels foram responsáveis por tecer as críticas mais expressivas às teorizações defendidas anteriormente tanto por Kant como por Hegel.

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SÍNTESEDe forma resumida, o paradigma marxista apresenta a seguinte perspectiva de história:

• a realidade social é mutável;

• a mudança está submetida a leis que se encaixam em outras leis históricas;

• as mudanças tendem a momentos de equilíbrio relativo.

Platão (428-347 a.C) e Aristóteles (384-322 a.C) já discutiam a noção de dialética, sob a nomenclatura de a ‘arte da conversação’, mas restringiam-se ao universo especulativo e idealista que trata do movimento universal e de transformação constante das coisas, que já havia sido contemplado nos estudos de Hegel.

A concepção de ‘materialismo dialético’ que Marx e Engels desenvolveram é oriunda dos estudos de Ludwig Feuerbach (1804-1872) presentes nas obras “Essência do cristianismo” e “Pensamentos sobre a filosofia do futuro”, escritos entre 1841-1843; que, somada à tradição de antagonismo social latente desde a Revolução Francesa, ao contexto de industrialização, da formação dos movimentos operários (cartismo e ludismo), forneceu a base de referências para que Marx e Engels desenvolvessem a questão com propriedade.

Marx e Engels aproveitam os elementos racionais da dialética de Hegel, negam a dimensão idealista e a adaptam à práxis social, reconhecem a vida cotidiana e o modo de produção como responsáveis pela transformação da consciência e da subjetividade dos indivíduos. Os fenômenos materiais e mecanicistas passam a ser entendidos como os verdadeiros responsáveis pelo desenvolvimento das atividades humanas; tendo em conta estes pressupostos, acabavam por refutar tanto a tradição idealista como a tradição moral religiosa, que visavam meramente observar e constatar os fenômenos sociais.

A pauta da discussão do materialismo dialético residiu na proposta de que o método utilizado para compreender os fenômenos da natureza e gerar conhecimento deveria ser o dialético, e a interpretação, a base conceitual de verificação deste conhecimento, de natureza materialista. A noção central residia no fato de que o desenvolvimento de qualquer atividade humana se dava a partir de contradições. No caso dos estudos do marxismo, os elementos que protagonizavam esta contradição foram o proletariado e o capitalista/burguês.

Para ilustrar esta abordagem da realidade, Marx e Engels partiam do raciocínio de que o homem tem necessidade de comer e beber, ou seja, de sobreviver antes de filosofar ou expressar-se artisticamente; o restante (Estado, instituições civis, religiões, cultura...), se desenvolveria no prolongamento. Primeiro os homens almejavam satisfazer suas necessidades básicas: a vida material determina a vida intelectual; o ser social determina a consciência social; o material determina o espiritual e os assuntos sociais.

UNI

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A sociedade, os fatos e os acontecimentos sociais deveriam ser tomados na sua totalidade; a economia entendida como a responsável por organizar as estruturas básicas da sociedade; a política e a cultura estabeleciam as formas históricas de gestão econômica. Em meio a este contexto de determinações, o materialismo dialético serviria como referência tanto como categoria de análise, como de orientação teórica à ação prática da política revolucionária.

Outro intelectual alemão a ser considerado cofundador da sociologia foi Max Weber, autor de dois livros basilares no tocante à sociedade contemporânea. Segundo Weber (1982), cada indivíduo age levado por um motivo e se orienta pela tradição (conduta social orientada pelas tradições), o que quer dizer que cada indivíduo mobiliza suas ações e interesses racionais e se realiza pelo campo da emotividade e da subjetividade. Logo, um pesquisador deveria lançar mão do que é de natureza particular, daquilo que permite identificar na sua peculiaridade na configuração panorâmica da cultura, e para tanto deveria lançar mão do método compreensivo, isto é, um esforço interpretativo que percebe as tradições e sua repercussão nas sociedades contemporâneas.

Em A ética protestante e o espírito do capitalismo, relaciona o ideal de salvação das igrejas protestantes, vinculadas à vida sóbria, ligadas a ideias como moral elevada e trabalho, que estão em afinidade com os valores do capitalismo, dependente de funcionários competentes, pontuais e ordeiros. Este aspecto foi denominado por Weber como ascese laica ou ascetismo intramundano, pois, se o catolicismo pregava que para ter uma vida santa, longe dos prazeres pecaminosos, o cristão deveria se isolar do mundo, vivendo em um convento, o protestantismo afirmava que o ideal de santidade deveria ser perseguido no confronto cotidiano com o mundo.

Outras duas questões apontam afinidades do cristianismo protestante com o capitalismo. O primeiro é: para o catolicismo, o lucro é um pecado denominado usura. Para o protestantismo, este pecado não existe, pois, como afirmava Calvino, as relações comerciais que envolvem lucro não são conquistadas através de coação, mas sim através da troca. Também, para o protestantismo, a prosperidade econômica não era um sinal de contradição com a fé, mas sim o sinal de uma bênção divina.

Em relação à educação, a principal contribuição weberiana foi o estudo

sobre a burocracia. Pois, para Weber, é a burocracia um dos sinais da sociedade da modernidade, pois o racionalismo que a burocracia emprega depende em muito da formação escolar de uma classe de técnicos capacitados para gerir os bens públicos ou privados. Uma classe gerencial, que Weber definiu como Estamento Burocrático, é a principal camada dirigente das instituições privadas ou estatais contemporâneas. Isto em parte explica a importância que as classes dirigentes ofertam para a educação, pois será entre os que receberam maior instrução, os melhores cargos. Esta perspectiva formou um verdadeiro ethos educacional nas sociedades do Ocidente.

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O último dos sociólogos que iremos citar, neste tópico, foi um dos mais importantes para o estabelecimento da sociologia da educação como disciplina do conhecimento humano. Émile Durkheim foi o principal formulador da sociologia como ciência, ao possuir uma cátedra desta ciência na Universidade de Paris-Sorbonne e ser o escritor do livro As regras do método sociológico. Sua importância para a história da educação se mede ao ser Durkheim o principal formulador da sociologia da educação enquanto ciência humana. Hoje, jamais se pensaria a educação apartada das realidades nas quais as famílias e as escolas estão presentes. Porém, a influência iluminista e cristã de alguns teóricos do século IX não compreendia que as diferenças sociais são parte importante ao se pensar a educação na contemporaneidade (GADOTTI, s.d. 113-115).

Para o autor, o indivíduo na fase da infância nada mais é do que uma tábula rasa e diante disto a escola, as instituições de ensino e o sistema educacional devem atuar no sentido de preencher aquela criança de forma adequada ao convívio em sociedade de forma mais integrada e adequada possível. Estudiosos analisam estas ideias de Durkheim e o nominam de conservador, no ponto em que compreendia a escola como simplesmente uma instituição de ajuste e não de transformação da sociedade.

A disciplina de sociologia da educação tem contribuído de forma significativa no sentido do reconhecimento e da importância do fazer educacional. Os estudiosos da sociologia se esforçam em fazer análises e trabalhos críticos que indicam os limites e impasses no campo educacional. Na atualidade têm-se os trabalhos do estudioso argelino Pierre Bourdieu, que se dedica a denunciar os mecanismos e modelos de ensino que tendem a tornar a escola um mero local reprodução dos conteúdos

Como os estudiosos da filosofia foram responsáveis por formular escolas

filosóficas que ultrapassam os tempos históricos, os estudiosos da sociologia também contribuíram com a formação de correntes sociológicas que perpassam o pensamento filosófico, social, histórico e educacional. Para facilitar o entendimento das principais correntes sociológicas e a relação que possuem com as demais áreas do conhecimento, atente para o quadro a seguir:

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CORRENTES SOCIOLÓGICAS PRESSUPOSTOS PRINCIPAIS

REPRESENTANTES

POSITIVISMO/FUNCIONALISMO(Séc. XIX)

* Toda sociedade é um sistema constante e estável de elementos (hipótese de estabilidade).* Toda sociedade é um sistema de equilíbrio de elementos (hipótese de equilíbrio).* Cada elemento dentro da sociedade contribui ao funcionamento dela (hipótese do funcionalismo);* Cada sociedade se mantém graças ao consenso de todos os seus membros acerca de determinados valores comuns (hipótese do consenso).* Valoriza as instituições, as funções, a estrutura, a ordem social.

Augusto ComteÉmile DurkheimTalcott ParsonsNiklas LuhmannLouis Althusser

MARXISMO-SOCIOCRÍTICA(Séc. XIX e XX)

* Visão dialética que privilegia o aspecto da mudança histórica, dos processos sociais.* Toda sociedade e cada um de seus elementos serão submetidos em todo o tempo à mudança (hipótese da historicidade).* Toda sociedade é um sistema de elementos contraditórios em si e explosivos (hipótese da explosividade e revoluções).* Cada elemento dentro da sociedade contribui para sua mudança (hipótese da disfuncionalidade).* Toda sociedade se mantém graças à coação que alguns de seus membros exercem sobre os outros (hipótese da dominação).

Karl MarxFriedrich EngelsAntonio GramsciKarel KosikGeorges Snyders

COMPLEXIDADE(Séc. XX e XXI)

* A realidade consiste em uma totalidade inter-relacionada, interdependente, multidimensional, que propõe a conquista de uma nova percepção sistêmica, pós- cartesiana, ainda em gestação.* O universo é uma totalidade integrada na qual tudo está conectado, e onde o todo é mais que o conjunto das partes que o compõem.* Superação da dicotomia entre as ciências naturais/sociais; observador e objeto observado.* O homem como ser indiviso, multidimensional cérebro/espírito/mente e corpo.* Todo conhecimento visa constituir-se em senso comum, principalmente com aquele construído no cotidiano, que busca orientar e dar sentido à vida.* O senso comum integra ação e intencionalidade; é prático, transparente, interdisciplinar.* O senso comum reinterpretado pelo conhecimento científico pode ser a porta para a nova racionalidade.

Anthony WildenEdgar Morin Isabelle StengersFritjof CapraHumberto Maturana

FONTE: Os autores

QUADRO 5 - PRINCIPAIS CORRENTES SOCIOLÓGICAS

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5.2 A PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

De acordo com Fernanda G. de Oliveira (2014), há muitos anos, psicólogos e educadores procuram descobrir como se aprende. Várias observações foram feitas e surgiram diversas teorias, na tentativa de explicar o processo de aprender. O ideal seria se as teorias repercutissem na educação, tornando mais eficiente o trabalho dos educadores e influindo na prática escolar. Felizmente, alguns pesquisadores da aprendizagem têm apresentado conclusões que falam diretamente aos educadores.

Podemos descrever que a psicologia contribui na educação, no estudo das diversas fases de desenvolvimento dos seres humanos, no estudo da aprendizagem e das condições que a tornam mais eficiente e mais fácil. Em nossos dias, tal é a importância da Psicologia da Educação e da Aprendizagem que todos na área da educação precisam refletir sobre o seu significado. No entanto, a indagação que você mesmo deve estar se fazendo é a seguinte: afinal, o que é Psicologia da Educação e da Aprendizagem? Antes de explorarmos este conceito, vamos compreender o que é aprendizagem.

Atualmente existem diversas teorias sobre a aprendizagem, sendo estudadas pela psicologia da educação. A aprendizagem integra os elementos cognitivo, biológico, social, psíquico e cerebral, sendo, portanto, um fenômeno, um processo bem complexo que ocorre num determinado momento histórico e dentro de uma cultura particular. Aprender é bem mais do que absorver uma informação, pois se pode saber tudo, por exemplo, a respeito de dentes: a sua estrutura, a causa de suas cáries e de suas moléstias e, ainda assim, nada disso alterar a conduta prática.

A aprendizagem é considerada como um processo contínuo, no qual o ser humano desde a vida uterina começa a aprender e permanece durante toda a vida, pois o caminho para atingir o crescimento, a maturidade e o desenvolvimento como pessoas, num mundo organizado, cujas interações com o meio nos permitem a organização do conhecimento, é a aprendizagem. E a psicologia da educação busca empregar os princípios e as informações que as pesquisas psicológicas oferecem acerca do comportamento humano, para tornar mais eficiente o processo ensino-aprendizagem.

A contribuição da Psicologia da Educação abrange dois aspectos fundamentais, conforme descreve Piletti (1994):

• Compreensão do aluno: compreensão de suas necessidades, suas características individuais e seu desenvolvimento, nos aspectos: físico, emocional, intelectual e social. O aluno não é um ser ideal, abstrato. É uma pessoa concreta, com qualidades e preocupações.

• Compreensão do processo ensino-aprendizagem: para o professor, não é suficiente conhecer o aluno. É necessário que ele saiba como funciona o processo de aprendizagem, quais os fatores que facilitam ou prejudicam a aprendizagem, como o aluno pode aprender de maneira mais eficiente, além de outros aspectos ligados à situação de aprendizagem, envolvendo o aluno, o professor e a sala de aula.

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Assim a psicologia da educação estabelece um conjunto de relações estáveis entre sujeito e objeto. A ação do sujeito, estruturada por dados internos e externos, constitui e determina o motivo da observação, isso significa que o estudo do homem se viabiliza quando consideramos a mediação recíproca entre sujeito e objeto, isto é, quando consideramos estes aspectos em interação constante. É útil aos professores conhecer as teorias predominantes desenvolvidas pelos psicólogos da aprendizagem, para que entendam a orientação do ensino nas escolas atuais e optem pela prática escolar que desejarem.

5.3 O IMPASSES DO PROCESSO DE LAICIZAÇÃO E DA RACIONALIZAÇÃO

O processo de implantação das ideias iluministas, modernas, laicas e racionais não se deu de forma pacífica e de aceitação unânime, e formas de resistência podem ser registradas tanto em países católicos como em países protestantes. O século XIX foi um momento histórico em que diversas formas de resistência à modernização e racionalização foram registradas, um exemplo pode ser o do sacerdote católico Dom Bosco (1815-1888), que contribuiu na formulação da rede salesiana de ensino, que visava atender crianças e jovens que origem humilde e que se encontravam em condições de abandono e violência na Itália.

Nas regiões de maior presença das tradições protestantes, ocorreram conflitos no campo escolar onde se dava o ensino da origem do homem, sendo que as unidades escolares ministravam as teorias evolucionistas de Charles Darwin. Nos Estados Unidos da América, cuja articulação religiosa era forte e politicamente legitimada, ocorreu um caso peculiar, o professor de ciências John Scopes sofreu processo por ensinar as teorias onde atuava. Neste caso, o professor obteve a vitória e seu exemplo foi utilizado como inspiração em outras nações (OLSON, 2001).

O processo de laicização do Estado e da sociedade foram responsáveis para contribuir no sentido de ampliar o alcance da educação e da alfabetização. Na atualidade, este modelo apresenta limites, e as questões religiosas não são o centro dos debates e sim como melhor ensinar, as melhores formas de promover aprendizagem, pois os desafios são muitos, em especial os que são oriundos do mundo do trabalho, que se encontra em constante transformação, as novas realidades sociais, as diferentes configurações de família entre outras questões.

5.3.1 O Movimento do romantismo

O Romantismo, ao se expressar, utilizou-se de metáforas que eram oriundas do campo da natureza, da poesia, do fantástico e do encantado, do folclore e do místico. Com estes recursos procurava denunciar o rigor da razão, do academicismo, do classicismo, dos regulamentos, normas, condutas, das demais regras e imposições que vinham ganhando espaço desde o Iluminismo e a Revolução Industrial.

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Conforme Abbagnano (2007), o significado comum do termo "romântico", que significa "sentimental", valorizou o sentimento, que fora ignorado na Antiguidade Clássica e que foi reabilitado pelo Iluminismo do século XVIII, no sentido de que se fazia necessário conciliar razão e fé, conteúdo e forma, matéria e espírito, experiência e sentido. O movimento do Romantismo estava relacionado ao sentido de valorizar os aspectos do inconsciente, os instintos, o lirismo, o melódico, o dramático, a liberdade criativa, a paixão, o desejo por ideais e pelo inatingível, do misticismo, indianismo, da boemia, vida noturna, entre outros hábitos.

Esta corrente artística foi inserida em um momento em que ocorreram outras mudanças no contexto da sociedade dos séculos XVIII e XIX, entre elas, o processo de massificação da leitura e da palavra escrita. As produções de intelectuais – como Karl Marx – apresentavam novas formas de compreender e denunciar a realidade social, numa perspectiva de preencher o ambiente crítico e que tendeu proceder a uma leitura crítica e dialética da sociedade, e esta foi feita contra a promessa de progresso e felicidade pura e simples contida na modernidade. O Romantismo reuniu adeptos das mais diversas áreas do conhecimento, da literatura, da música, das artes plásticas. Enquanto Marx descobria o socialismo, na Paris de 1840, T. Gautier (1811-1872) e Flaubert desenvolviam sua mística da “arte pela arte”.

5.3.2 O exemplo de Friedrich Nietzsche

A laicização no campo político e público afetou as relações humanas, com a natureza e as dimensões espirituais, que por sua vez favoreceu o processo de secularização da sociedade, que consistiu no movimento da distinção, separação, distanciamento entre o campo da fé, do espiritual, do religioso, do sagrado e do eterno (poder invisível) em relação ao campo do temporal, do método, do racional, do profano e do leigo (poder visível e palpável). O pensador Friedrich Nietzsche (1844-1900) procurou definir como “a morte de Deus” e “o advento do niilismo”. Nietzsche (2012, p. 125) afirma que:

Deus está morto! Deus permanece morto! E quem o matou fomos nós! Como haveremos de nos consolar, nós, os algozes dos algozes? O que o mundo possuiu, até agora, de mais sagrado e mais poderoso sucumbiu exangue aos golpes das nossas lâminas. Quem nos limpará desse sangue? Qual a água que nos lavará? Que solenidades de desagravo, que jogos sagrados haveremos de inventar? A grandiosidade deste ato não será demasiada para nós? Não teremos de nos tornar nós próprios deuses, para parecermos apenas dignos dele? Nunca existiu ato mais grandioso, e, quem quer que nasça depois de nós, passará a fazer parte, mercê deste ato, de uma história superior a toda a história até hoje!

Nietzsche (2012) discutiu que sentimento de niilismo deve ser entendido juntamente com as noções de “desvalorização dos valores” e “a morte de Deus”, que foi ocasionada pelo afastamento dos valores sagrados e espirituais das explicações e formulações humanas, e em especial a dissociação entre o mundo visível e sensível, com a supervalorização do primeiro diante do segundo, produzindo assim uma espécie de vazio existencial.

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CONCEITOO Niilismo está relacionado aos sentimentos de descrença e desengajamento diante da promessa de progresso e realização/felicidade humana, contidos no interior dos projetos modernos globalizantes/totalizantes ou grandes narrativas que se pretendiam e apresentavam como atemporais e universais, nos esquemas de verdade, liberdade e igualdade, história, progresso e felicidade, razão, revolução e redenção, ciência, industrialismo e bem viver. Que por sua vez desabilitavam as experiências históricas contidas no passado e reconheciam somente como campo e horizonte do presente e do futuro como o terreno de realização humana primordial.Nietzsche empregou o conceito também para qualificar sua oposição radical aos valores morais tradicionais e às tradicionais crenças metafísicas, na qual o niilismo não é somente um conjunto de considerações sobre o tema “tudo é vão”, não é somente a crença de que tudo merece morrer, mas consiste em colocar a mão na massa, em destruir. E o filósofo aponta que as gerações que sucederam a geração da modernidade nasceram em meio a esta noção de sociedade. A noção de niilismo causava certo deslocamento nas formulações mentais de sentido do ser humano, causando certa secura espiritual e existencial.

5.4 TRANSFORMAÇÕES DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL NO CONTEXTO EDUCACIONAL

Com relação ao contexto histórico desta época, pode-se afirmar que a Revolução Industrial foi marcada pela produção capitalista, que introduziu a máquina a vapor, a modernização dos métodos de produção, desintegrou costumes e introduziu novas formas de organização da vida social. Por outro lado, ocorreu a transição da produção artesanal para a manufatureira e desta para a produção fabril, a migração do campo para a cidade; o fim da servidão; o desmantelamento da família patriarcal; a introdução do trabalho feminino e infantil. O crescimento demográfico das cidades sem a devida infraestrutura básica favoreceu a formação de cortiços e favelas, o aumento das condições degradantes de vida, da prostituição, suicídio, alcoolismo, violência, epidemias. O aparecimento do empresário capitalista, que concentrou as máquinas, as terras e as ferramentas de trabalho; e do proletariado, que foi submetido a severa disciplina, como novas classes sociais.

Observe no quadro abaixo, outras invenções que acompanharam o processo de revolução industrial:

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QUADRO 6 - INVENÇÕES E INVENTORES DE TECNOLOGIA

ANO APROX. INVENTOR INVENÇÃO1855 Isaac Merritt Singer Patenteia a máquina de costura1855 Georges Audemars Inventa o Rayon1866 Alfred Nobel Inventa a dinamite1868 Christopher Latham Sholes Inventa a máquina de escrever1868 George Westinghouse Inventa o freio a ar1868 Robert Mushet Inventa o aço1873 Levi Strauss Inventa a calça jeans1869 Dmitri Mendeleyev Monta a Tabela Periódica1876 Alexander Graham Bell Telefone1877 Eadweard Muybridge Inventa a câmera de filmagem

1879 Thomas Alva Edison Lâmpada Elétrica – inventa a lâmpada com filamento de carbono incandescente

1881 Louis Pasteur Vacinas – produz vacina contra o antraz e a raiva

1888 Heinrich Hertz Produz as primeiras ondas de rádio1900 Ferdinand von Zeppelin Primeiro dirigível de estrutura metálica

FONTE: Os autores

CURIOSIDADE: MUSEUSO primeiro museu público, o Asmoleum Museum, foi aberto em 1683, na Inglaterra e encontrava-se vinculado à Universidade de Oxford, mas possibilitava visitação somente a artistas e estudiosos. Foi a partir da Revolução Francesa, no século XVIII, que os museus ganharam caráter popular propriamente dito, em especial surgem os grandes museus nacionais, voltados à educação e esclarecimento do povo. O Museu do Louvre foi aberto na França em 1793. Em 1810, surge o Altes Museum, de Berlim, na Alemanha, o Museu do Prado, na Espanha, em 1819, e o Museu Hermitage de Leningrado, na Rússia, em 1852.

As manifestações de revolta dos trabalhadores foram da destruição das máquinas, sabotagem, explosão de algumas oficinas, roubos e crimes, formação de sindicatos. Nesta trajetória, produziram jornais e literatura, exercendo a crítica à sociedade capitalista e inclinando-se para o socialismo como alternativa de mudança. A tarefa dos pensadores deste período foi a de racionalizar a nova ordem, encontrando soluções para o estado de ‘desorganização’ existente, conhecendo as leis que regem os fatos sociais.

Determinados pensadores da época estavam imbuídos da crença de que era necessário introduzir uma certa ‘higiene’ na sociedade e fundar uma nova ciência. A sociologia assumia como tarefa intelectual repensar o problema da ordem social,

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enfatizando a importância de instituições como a autoridade, a família, a hierarquia social, destacando a sua importância teórica para o estudo da sociedade.

Sabe-se que a capacitação intelectual não cessou de avançar ao longo dos últimos 200 anos, quando carrega um processo de declínio das ocupações única e exclusivamente braçais e, em contrapartida, a legitimação do processo produtivo mecanizado, automatizado e robotizado (ARANHA, 1996). Foi no contexto da Revolução Industrial que cada vez mais foi dada ênfase à educação técnica. Durante o denominado Antigo Regime Europeu, período que inicia na baixa Idade Média e finda com a Revolução Francesa, os objetos eram produzidos através das corporações de ofício.

Portanto, algumas profissões tradicionais existiam, como as de sapateiros, relojoeiros, carpinteiros etc. Com o incremento da produção industrial destes objetos fabricados por estes artífices citados, como sapatos, relógios e móveis para o lar, o aprendizado para o ingresso em uma indústria passa a ser realizado não em corporações, nas quais aprendizes aprendiam com mestres mais antigos no ofício, até que se especializavam e, deixando de ser aprendizes, se tornavam oficiais e posteriormente mestres.

A formação necessária à preparação do trabalhador da indústria solicitava a realização em escola técnica, na qual o aluno aprende as rotinas industriais, até ser capaz de atuar como técnico qualificado para determinada função, pois a mecanização da produção é uma tendência constante no capitalismo, sendo assim presente a necessidade de técnicos que cuidem das máquinas, que substituíram a tração animal ou o braço humano na confecção dos mais distintos produtos. Em geral, o ensino técnico é voltado para as camadas mais baixas da população dos diferentes países industrializados, pois muitos observam no trabalho industrial especializado uma chance de ascensão para a classe média.

LITERATURAPara melhor compreender o contexto histórico das mudanças na sociedade, nas áreas política e cultural, iniciadas na época moderna, observe as sugestões de livros e filmes que fazemos abaixo:Os miseráveis, escrito por Victor Hugo (existe em filme também)Germinal, de Emile Zola (existe em filme também)Madame Bovary, de Gustave Flaubert (existe em filme também)Senhores e camponeses, de Leon Tolstoi (existe em filme também).

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5.5 OS IMPACTOS DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL NO ENSINO SUPERIOR

O ensino superior sempre representou um ponto de grande disputa entre os mais diferentes indivíduos da sociedade, por ser uma das condições pelas quais o indivíduo consegue galgar outras posições sociais. Em especial, quando os índices de abandono escolar são registrados no ensino médio, e quando o ensino médio é concluído de forma satisfatória mediante de custeio familiar. Outro fator agravante reside no fato de que os estudos universitários são oferecidos em horários como o matutino e vespertino o que inviabiliza que trabalhadores os frequentem. Diante disto, eis que o ensino superior acaba sendo uma condição acessada somente por pessoas oriundas de grupos sociais abastados. Diante da necessidade de especialização da mão de obra no interior das fábricas e indústrias, em especial nas áreas da engenharia, surgem núcleos de inovação e desenvolvimento tecnológico.

INSTITUIÇÕESNo Brasil, a educação técnica é presente em diversos Estados, tanto com Institutos Federais e estaduais, que formam técnicos nos mais diversos ramos da indústria e dos serviços, como o sistema “S” (SESI, SENAI, SENAC etc.), que primam pela qualificação da mão de obra. Inclusive, um ex-presidente da República, Lula, frequentou uma destas escolas de formação profissional.

5.6 A EDUCAÇÃO NOS PAÍSES AUTORITÁRIOS: O COMUNISMO E O NAZI-FASCISMO

O século XX foi marcado por inúmeras situações que colocaram em xeque o processo de desenvolvimento que se havia alcançado, entre elas encontram-se as guerras mundiais e as péssimas condições de vida das populações em determinadas regiões do mundo. As dificuldades também alcançaram as instâncias políticas e econômicas, em que diversas crises abalaram governos e sociedades inteiras.

Os modelos de política e sociedade autoritários acabaram se aproveitando do contexto de crise de determinados países de se instalar e para se manter no poder se utilizaram de estratégias que restringiam o acesso às informações, em especial alterando as formas de ensinar e censurando conteúdos de disciplinas que possuíam potencial crítico-reflexivo diante da realidade.

A título de exemplo, o modelo comunista de educação é pouco conhecido, porém bastante mencionado, tanto em situações positivas como negativas, mas o que se pode reconhecer como prioridade é a ampliação de vagas no ensino básico, o que conseguiu melhorar os números de analfabetismo que eram registrados

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naqueles países. No que diz respeito ao ensino superior, em algumas universidades dos países, como Cuba e Rússia, os estudos e pesquisas nas áreas médicas e da saúde foram responsáveis por encontrar inúmeros tratamentos e curas a doenças que até então pareciam invencíveis. A crítica a estes países ainda recai sobre os aspectos da liberdade de expressão dos cidadãos, em especial, quem se manifestava contrário à adoção do regime.

Mas não foram os únicos países e nações que impuseram a restrição à liberdade de pensamento e expressão a seus cidadãos, o fascismo de Mussolini na Itália, de Franco na Espanha, de Salazar em Portugal, o nazismo de Hitler na Alemanha, não foram diferentes. Ao ponto que professores universitários fugiam de seus países de origem ou cometiam suicídio a fim de não colaborar com o governo imoral que havia se instalado. A título de exemplo podemos citar Albert Einstein (1879-1955), notório pelos seus estudos e pesquisas no campo da física, que em fuga das perseguições religiosas que o governo nazista empreendia, refugiou-se nos Estados Unidos (ARANHA, 1996).

PARA REFLETIR:Einstein (1981), em seus escritos e reflexões sobre ciência e conhecimento, tecia as seguintes orientações: Não basta ensinar ao homem uma especialidade. Por que se tornará assim uma máquina utilizável, mas não uma personalidade. É necessário que adquira um sentimento, um senso prático daquilo que vale a pena ser aprendido, daquilo que é belo, do que é moralmente correto. A não ser assim, ele se assemelhará, com seus conhecimentos profissionais, mais a um cão ensinado do que a uma criatura harmoniosamente desenvolvida.Deve aprender a compreender as motivações dos homens, suas quimeras e suas angústias para determinar com exatidão seu lugar em relação a seus próximos e à comunidade.Estas reflexões essenciais, comunicadas à jovem geração graças aos contatos vivos com os professores, de forma alguma se encontram escritas nos manuais. É assim que se expressa e se forma de início toda a cultura. Quando aconselho com ardor “as humanidades”, quero recomendar a cultura viva e não um saber fossilizado, sobretudo em história e filosofia. Os excessos do sistema de competição e de especialização prematura, sob o falacioso pretexto da eficácia, assassinam o espírito, impossibilitam qualquer vida cultural e chegam a suprimir os progressos nas ciências do futuro. É preciso, enfim, tendo em vista a realização de uma educação, desenvolver o espírito crítico na inteligência do jovem. Ora, a sobrecarga do espírito pelo sistema de notas entrava e necessariamente transforma a pesquisa em superficialidade e falta de cultura. O ensino deveria ser assim: quem o receba o recolha como um dom inestimável, mas nunca como uma obrigação penosa.Adaptado de: Einstein, Albert. Como vejo o mundo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.

As ideologias nazistas e fascistas transformaram o sistema escolar em mecanismos cujos valores e preceitos eram deturpados, que condenavam indiscriminadamente o povo judeu, homossexuais, ciganos e outras minorias. Nos países latino-americanos ocorreu algo semelhante nos anos de 1970, quando se instauraram as ditaduras militares que passaram a perseguir estudantes e

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professores que manifestavam pensamento crítico diante a realidade política do país. Foi o momento também em que pesquisadores e professores das áreas da física, química, sociologia e antropologia foram fazer estudos, ministrar aulas e participar de projetos científicos em instituições e universidade de países de primeiro mundo.

Os países que passaram por períodos em que formas autoritárias de poder foram implantadas também foram países nos quais a educação sofreu fortes projetos de sucateamento e desvalorização em termos estruturais e no reconhecimento social e profissional dos professores.

5.7 O EXEMPLO DA ESCOLA DE FRANKFURT

Foi um grupo de estudiosos que na primeira metade do século XX encontrava-se congregado ao Instituto de Pesquisa Social da Universidade de Frankfurt, na Alemanha. Possuem forte influência marxista, mas não se resumiam aos dogmatismos e ao marxismo tradicional do século XIX, atuaram como críticos tanto das ideologias do capitalismo e liberalismo internacional como do socialismo soviético. E o que os identificava com mais coerência era lançar mão de alternativas que promovessem o desenvolvimento e o bem-estar social, para tanto dedicaram-se em proferir análises e críticas às mais diversas áreas, como a educação, a ciência, o Estado, o cinema, a música, o sistema de produção e consumo.

Na primeira leva de integrantes da Escola estavam Max Horkheimer, Theodor Adorno, Herbert Marcuse, Friedrich Pollock e Erich Fromm. Na segunda geração participaram Jürgen Habermas, Franz Neumann, Albrecht Wellmer. Outros estudiosos, como Walter Benjamin, Siegfried Kracauer, Karl A. Wittfogel, participaram associando-se temporariamente ao Instituto. Os estudiosos da Escola de Frankfurt inspiravam-se nas concepções teórico-filosóficas e metodológicas legadas nos escritos de Immanuel Kant, Hegel, Karl Marx, Sigmund Freud, Max Weber e George Lukács.

5.8 O EXEMPLO DA TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO

Tratou-se de um movimento religioso cristão originado do Concílio Vaticano II, realizado na cidade de Medellín, na Colômbia, no ano de 1968, mas é atribuído ao padre peruano Gustavo Gutiérrez o pioneirismo do movimento. A Teologia da Libertação priorizava o trabalho aos pobres e desvalidos e defendia toda uma reinterpretação analítica e antropológica da fé cristã, ou seja, a viabilidade prática dos princípios e valores cristãos. Tal orientação ideológica da Teologia da Libertação foi responsável por provocar críticas de caráter político, que por sua vez interpretavam o movimento como uma vertente marxista de organização político-social.

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

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O movimento foi reprovado nos pontificados de João Paulo II e Bento XVI, porém recentemente recebeu reconhecimento favorável do Papa Francisco. Entre os integrantes da Teologia da Libertação pode-se relacionar os brasileiros Leonardo Boff e Rubem Alves, Jon Sobrino de El Salvador, o equatoriano Leônidas Proaño e o uruguaio Juan Luis Segundo.

O movimento seguiu aos anos de 1970 e 1980 com grandes ações e

movimentos em meio à sociedade, porém, a partir dos anos de 1990 passou a declinar, em especial pela falta de renovação das lideranças, tanto em meio às ações de base no interior das comunidades como na esfera de orientação intelectual.

No filme A VIDA É BELA, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro, existe uma bela sátira das intervenções dos funcionários fascistas no sistema escolar, feita por um observador da vida social e personagem principal do filme, que por fim acaba sofrendo as agruras de um campo de concentração ao lado da esposa e do seu filho.A VIDA É BELA. Roberto Benigni. Itália/EUA. 1997. 116min. Cor

LEITURA COMPLEMENTAR

A FRAGILIDADE DOS LAÇOS HUMANOS: AMOR LÍQUIDO

Os tempos modernos e, agora, os tempos contemporâneos são marcados por um estado de fusão líquida da sociedade humana, e a transformação se deu do estado sólido para o líquido. A metáfora “líquido mundo moderno” evidencia um dos principais conceitos propostos pelo pensador e pode ser entendida como sendo oriunda de um contexto semelhante ao da frase que foi proposta por Marx: “tudo o que é sólido desmancha no ar”, proposta ainda no século XIX, quando a modernidade estava em pleno curso. Esta mesma serviu de base interpretativa a Bauman (1925-2017), que foi utilizada ao longo desta obra.

O livro Amor Líquido reúne uma reflexão crítica do cotidiano do homem moderno, e preocupa-se em analisar a sociedade contemporânea e ressaltar “a fragilidade dos laços humanos”. Encontra-se dividido em quatro capítulos: Apaixonar-se e desapaixonar-se; Dentro e fora da caixa de ferramentas da sociedade; Sobre a dificuldade de amar o próximo; convívio destruído. Ao final das análises e reflexões, o autor pontua que o “cidadão da líquida sociedade moderna” constitui um homem sem vínculos e inserido em um quadro e esboço imperfeito e fragmentado.

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Nos dois primeiros capítulos, Bauman (2004) analisa a fragilidade que o “líquido mundo moderno”, de certa forma, impôs ao relacionamento humano. Em “Apaixonar-se e desapaixonar-se”, o autor atrela amor à cultura consumista e de mercado. O sentido de que amar tornou-se como um passeio no shopping center, visto “tal como outros bens de consumo”; neste contexto a vida deve ser consumida instantaneamente, despreocupadamente (não requer maiores treinamentos nem uma preparação prolongada); é usada uma só vez, sem preconceitos, receios e critérios, a experiência da vida deve ser fluida e deliberadamente flexível.

A cultura consumista do amor, então, serve de cenário para o segundo capítulo, “Dentro e fora da caixa de ferramentas da sociedade”. Neste momento, o autor discute que o sentimento do imediatismo e rapidez oferece consequências e custos à “líquida, consumista e individualizada sociedade moderna”, e o resultado de intensificação da velocidade globalizante é o de que a dimensão da solidariedade da vida e das relações humanas perde valor, e sobre estas passa a ocupar espaço e a triunfar o mercado consumidor’.

Quem seria, portanto, o responsável por este contexto de mudanças? De acordo com Bauman (2004), é o próprio homem, mediante a (des)configuração que este sofreu diante das exigências competitivas do mundo moderno. Hoje, mais do que nunca, o homem necessita de produtos pré e/ou fabricados, e em função destes são programadas as demais necessidades do homem, como o tempo livre, os horários de intervalo, as refeições, as férias, entre outras.

Em “Sobre a dificuldade de amar o próximo”, o autor remonta a atmosfera que ronda os relacionamentos humanos e a interpreta à luz do conceito bíblico de amar ao próximo como a si mesmo. Segundo Bauman (2004), o amor próprio é construído a partir do amor que é oferecido e atribuído por outros. Ou seja, a construção de amar a si mesmo somente é possível quando o mesmo sentimento é manifestado pelos outros, que “devem nos amar primeiro para que comecemos a amar a nós mesmos”. Assim, o amor e o cuidado de si e autovalorização e autoestima, bem como o amor gratuito e incondicional que poderia ser oferecido aos outros, não fazem mais sentido neste contexto.

No quarto e último capítulo de “Amor líquido”, o autor reflete sobre a vertiginosa indústria do medo que criou um novo espectro: o da xenofobia, ou seja, a aversão ao estrangeiro. Os imigrantes passam a ser acusados como sendo os principais causadores da epidemia financeira do líquido mundo moderno, que estas ainda fornecem à sociedade atual as ameaças reais aos Estados-nação. Assim instaura-se uma indústria do medo com relação aos imigrantes, entendidos como criminosos, configurando um cenário favorável ao sensacionalismo e à especulação aos meios de comunicação. A pauta, dentro dessas redações, é e continuará sendo a mesma. Roubos, assassinatos, e principalmente, atentados terroristas são reflexos da invasão imigratória de indivíduos oriundos de países periféricos e/ou miseráveis.

Atualmente e cada vez mais os seres humanos buscam contatos com seus pares numa espécie de irmandade, construída a partir do mundo virtual, e

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procuram substituir e compartilhar fracassos, frustrações, desequilíbrios e solidões com a agilidade, praticidade e velocidade da internet.

Bauman (2004) utiliza como reflexo da metamorfose da relação humana o testemunho de um universitário polonês que afirma categoricamente que dentro do líquido mundo moderno tudo se resolve na base do delete, do bloqueio – um simples toque no mouse é tal como um passe de mágica, os problemas desaparecem. Basta limpar a lixeira, ocultar as ações e alterar as configurações de privacidade e tudo estará resolvido. É nítido e avassalador o contato físico e em especial o recuo dos momentos e espaços de real sociabilidade. O resultado não poderia ser outro e está anunciado no subtítulo do livro de Bauman (2004): “a fragilidade dos laços humanos”.

A partir do momento em que os verdadeiros cidadãos perceberem o tamanho do labirinto onde se encontram, e moverem-se no sentido de buscarem saídas, alternativas e soluções ao problema real e complexo que os envolve, é que se poderá avançar rumo à retomada da vida humana na sua dimensão individual, social, integral ao universo. Caso contrário, permanecerá aprofundando o isolamento, confundindo coisas/produtos/mercadorias com seres/existências/ experiências/histórias e multiplicando os ambientes virtuais.

FONTE: Adaptado de: FERNANDES, Jorge Marcos Henriques. A fragilidade dos laços humanos. Revista Ciências Humanas, Taubaté, v. 11, n. 2, p. 173-174, jul./dez. 2005. Disponível em: <http://www.fesppr.br/~daiane/Sociologia%20Jur%EDdica/bauman.pdf>. Acesso em: 29 set. 2016.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Ao longo desta unidade de conteúdos você pôde estudar que:

• A época moderna foi forjada em meio à desagregação da sociedade feudal, à consolidação da civilização capitalista, política imperialista das nações europeias sobre as demais nações e povos do mundo.

• A cidade passou a ocupar o status de excelência em termos de espaço e da sociabilidade e realização de modernidade, e diante disto, ocorreu o gradual abandono das regiões agrícolas e a subsequente concentração da população nas imediações das cidades e centros industriais.

• Os movimentos de independência dos Estados Unidos da América, a Revolução Francesa, a Revolução Industrial, a revolução da técnica e tecnologia, a urbanização da população, os estudos da sociologia e da psicanálise, os regimes autoritários, as guerras mundiais compõem o contexto no qual se desenvolveram o pensamento, a ciência e a educação da época contemporânea.

• A educação técnica, científica e laica passa a ser favorecida por políticas de governo, e estas almejavam formar mão de obra às indústrias e aos setores do governo, agora denominado de Estado Laico.

• Pestalozzi foi um pedagogo iluminista, influenciado pelo pensamento de Rousseau, em especial no que diz respeito à influência do meio e da sociedade sobre a formação do homem.

• Froebel foi um pedagogo que se inspirava na natureza e no desenvolvimento natural para compreender e explicar o cuidado e a forma como se deveria conduzir a educação das crianças, que, conforme compreendia, necessitavam de cuidados e proteção especial.

• Dewey foi um pensador norte-americano que propôs a chamada ‘Escola Nova’, que defendia a importância da escola integral, cuja organização de currículo e conteúdos deveria contemplar os conhecimentos específicos e experiências de sociabilidade.

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AUTOATIVIDADE

1. Construa um texto explicando como é possível afirmar que a educação no Ocidente é predominantemente laica e qual foi o principal ponto de divergência que ocorria em relação aos conteúdos ministrados pelas instituições religiosas.

2. Construa um texto apresentando o que caracteriza o pensamento de cada um dos pensadores da educação moderna: Pestalozzi e Froebel:

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TÓPICO 3

CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO

EDUCACIONAL CONTEMPORÂNEO

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

No decorrer da época Moderna e Contemporânea, dentre as ações de governos foram elencados como prioridade os problemas e fatos sociais modernos, como erradicação do analfabetismo, doenças, epidemias, que representavam pontos nevrálgicos ao desenvolvimento. O fortalecimento e a realização destes projetos foram alcançados com a colaboração de entidades, instituições, centros educacionais e profissionais, universidades, laboratórios de pesquisas.

Em 1789 ocorreu a publicação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que foi resultante do processo da Revolução Francesa. Trazia em seu conteúdo os ideais de liberdade e igualdade; delegava ao homem moderno uma relação de deveres e de direitos, que seriam responsáveis por conduzi-lo à categoria de cidadão e indivíduo emancipado. Implanta-se a democracia, na qual homens e mulheres, independentemente de cor, raça, classe social, venham a requerer condições de concorrer, apoiar, eleger e ser eleito no campo político, econômico e social.

Martinazzo (2010) explica que o paradigma moderno concebeu a estrutura do universo como algo estável, linear, simétrico e previsível e que, pela via dos métodos hipotético-dedutivo e indutivo-experimentalista, o homem pode acessar à realidade e representar mentalmente suas leis e funções. Conhecer é representar o real, onde a consciência de si, como sujeito epistêmico, é condição sine qua non para a apreensão e consciência do objeto.

Desde a época moderna instauraram-se as ideias de progresso, de democracia, de inclusão, de liberdade, na capacidade do homem em intervir em seu meio e destino. Para alcançar estas pretensões, empreendeu suas ações obtendo o suporte do industrialismo, com emprego de novas técnicas e tecnologias; de teorias, métodos, invenções, máquinas, ferramentas, utensílios, entre outros. Os campos teórico e material combinaram-se para que a modernidade se cumprisse. (DIEHL; TEDESCO, 2001).

Os meios de comunicações foram responsáveis por anunciar os novos inventos e descobertas e comunicar às demais regiões que se encontravam distantes das metrópoles modernas. E nesse sentido, o rádio conseguiu superar, não tornar obsoleto ou deslegitimar o alcance da imprensa tradicional, que era representada pelos jornais e folhetins, muito em voga nos séculos XVIII e XIX.

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

Agora acabamos de nos despedir do século XX e assistimos ao descortinar do século XXI e nos encontramos, no exercício de qualidade de humanidade, diante de um acúmulo de problemas sociais, políticos, econômicos e ambientais, que nos deixam um tanto perplexos, desorientados e, em especial, desconfiados com o que nos aguarda caso não repensarmos e mudarmos nossos valores, hábitos e costumes enquanto indivíduos e sociedade.

2 A FILOSOFIA NO CONTEXTO EDUCACIONAL CONTEMPORÂNEO

Severino (1990) descreve que o campo da filosofia, ainda na Grécia clássica, apresentava forte preocupação e intenção pedagógica e com a formação do ser humano. Observe a citação que apresentamos:

Ela já nasceu Paideia! Para não citar senão o exemplo de Platão, em momento algum o esforço dialético de esclarecimento que propõe ao candidato a filósofo deixa de ser simultaneamente um esforço pedagógico de aprendizagem. Praticamente todos os textos fundamentais da filosofia clássica implicam, na explicitação de seus conteúdos, uma preocupação com a educação (SEVERINO, 1990, p. 19).

Porém, chegamos aos dias atuais e nos deparamos com o fato de que as áreas da educação, da filosofia, da história, da sociologia e das demais disciplinas reflexivas encontram-se desprestigiadas, são anunciadas como campos menores do saber. Para Severino (1990), os caminhos da filosofia da educação na nossa época são preocupantes, pois:

Parece ser a primeira vez que uma forte tendência da filosofia se considera desvinculada de qualquer preocupação de natureza pedagógica, vendo-se tão somente como um exercício puramente lógico. Essa tendência desprendeu-se de suas próprias raízes, que se encontravam no positivismo, transformando-se numa concepção abrangente. Denominada neopositivismo, que passa a considerar a filosofia como tarefa subsidiária da ciência, só podendo legitimar-se em situação de dependência frente ao conhecimento científico, o único conhecimento capaz de verdade e o único plausível fundamento da ação. Desde então, o qualquer critério do agir humano só pode ser técnico, nunca mais ético ou político. Fica assim rompida a unidade do saber (SEVERINO, 1990, p. 19).

No campo social supervalorizam-se as sociedades que apresentam alta urbanização, arsenal metalúrgico, industrial, científico, bélico, os regimes políticos com maior tempo de experiência política de república e democracia, ou seja, as sociedades/nações que circundam o Mar Mediterrâneo e a costa norte do Oceano Atlântico, que recebem o status de “nações civilizadas”.

Por outro lado, desvalorizam-se os indivíduos e as sociedades/comunidades tradicionais, as quais se encontram regidas por princípios milenares, que estão

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TÓPICO 3 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL CONTEMPORÂNEO

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fixadas em regiões rurais, sustentadas em atividades agrícolas, artesanais e manufatureiras; que apresentam coesos sistemas morais e religiosos, que se localizam no Oriente Médio ou no interior dos continentes da Ásia e África e América, que acabam por ser interpretadas e traduzidas como ‘bárbaras e/ou incivilizadas’, retrógradas.

Em meados dos séculos XXI, a crise econômica nos Estados Unidos e na União Europeia, os regimes totalitários na Coreia do Norte e na China, a perpetuação das situações de fome, miséria, a exploração humana pelo sistema econômico, entre outros, atestam que os descaminhos do progresso da humanidade do século passado ainda não foram superados, fazendo com que uma sensação e sentimento de mal-estar, desconforto e até mesmo de desencanto se instaure no imaginário e nas expectativas dos indivíduos do tempo presente.

Eis que o campo da filosofia da educação pode contribuir na identificação e solução profunda de tais contextos e realidades, em especial, no ponto em que Severino (1990) afirma que a educação precisa estar comprometida com a finalidade de atribuir sentido à existência cultural da sociedade histórica.

3 O CONTEXTO EDUCACIONAL EM TEMPOS DE GLOBALIZAÇÃO: DO CÓDEX À TELA

O códex consistiu nos manuscritos gravados em madeira no formato de livro, que foram muito utilizados no final da Idade Média, a partir do século XV. Significou a superação dos antigos pergaminhos, e em contrapartida o códex foi substituído pelos livros em papel, e agora, mais recentemente, os livros impressos em papel passaram a ser substituídos pelos e-books e demais versões de livros digitais.

Uma das principais alterações que a humanidade vivenciou no fim do século XX e início do século XXI foi a ampliação do acesso à informação proporcionado pelos computadores, em especial, pela internet, que possibilitou uma melhoria em vários aspectos do desenvolvimento intelectual humano, pois as informações científicas e o acesso a bibliotecas e museus pode ser viabilizados de forma virtual. Um estudante no Brasil, por exemplo, pode acessar a seção de obras raras da Biblioteca de Lisboa. Todavia, esta alteração na relação do conhecimento que foi provocada pela internet nos posiciona a outra questão: a autoridade do professor.

Durante os últimos séculos, o professor era considerado o dono do

conhecimento. Hoje, os educadores não mais possuem este papel, pois as alterações e descobertas científicas provocam questões nas quais as verdades científicas são questionadas diariamente nos periódicos, das mais distintas disciplinas do conhecimento humano. Neste sentido, os professores são muito mais os mediadores das relações educacionais, despertando curiosidades e desenvolvendo determinadas sensibilidades dos educandos em relação ao mundo que os rodeia.

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Com relação aos acúmulos alcançados pela ciência, bem como os alcances e formas de acesso ao conhecimento, leia com atenção as reflexões que Durant (2000, p. 9) tece:

O conhecimento humano tornou-se incontrolavelmente vasto; cada ciência gerou uma dúzia de outras, cada qual mais sutil que as demais; o telescópio revelou estrelas e sistemas em número tal, que a mente do homem não consegue contá-los ou dar-lhes nomes; a geologia falou em termos de milhões de anos, quando os homens, antes dela, haviam pensado em termos de milhares; a física descobriu um universo no átomo, e a biologia encontrou um microcosmo na célula; a fisiologia descobriu um mistério inesgotável em cada órgão, e a psicologia, em cada sonho; a antropologia reconstruiu a insuspeitada antiguidade do homem, a arqueologia desenterrou cidades e estados esquecidos, a história provou que toda história é falsa e pintou uma tela que só um Spengler ou um Eduard Meyer podia ver como um todo; a teologia desmoronou, e a teoria política rachou; a invenção complicou a vida e a guerra, e as doutrinas econômicas derrubaram governos e inflamaram o mundo; a própria filosofia, que antes havia convocado todas as ciências para ajudá-la a formar uma imagem coerente do mundo e fazer um retrato atraente do bem, achou que sua tarefa de coordenação era prodigiosa demais para a sua coragem, fugiu de todas essas frentes de batalha da verdade e escondeu-se em vielas obscuras e estreitas, timidamente a salvo dos problemas e das responsabilidades da vida. O conhecimento humano tornara-se demasiado para a mente humana.

O ensino a distância também passou por profundas transformações nos

últimos anos, graças às inovações da informática, pois uma primeira geração de ensino a distância acontecia com os cursos por correspondência. Uma segunda geração, pelos cursos que utilizavam o rádio e a televisão como mediadores do ensino. Hoje, com os computadores, a facilidade do acesso à informação possibilitou uma nova forma de ensino, com cursos a distância de graduação em diversas áreas do conhecimento humano.

No que tange à educação em todos os níveis, o que os computadores estão proporcionando são alterações nos hábitos de leitura (CHARTIER, s.d). Pois, temos uma geração que está se formando que não são migrantes digitais, mas nativos digitais. Isto é, ao invés de leitores de livros que passam a se habituar à internet, existem jovens que já possuem na internet seu principal hábito de leitura. Um aspecto interessante e revolucionário foi a do fim da leitura de jornais impressos, que passam por dificuldades para se manter. Alguns jornais importantes não mais circulam em meios impressos, como o Jornal do Brasil.

Outra prática de leitura que se transformou foi a utilização de enciclopédias, hoje substituídas pelos sites de busca. O declínio de livros impressos não é necessariamente um problema educacional, porém, as atuais gerações não possuem uma carga de leitura considerável comparada a gerações anteriores.

A internet e os computadores ainda são, muitas vezes, concorrentes dos professores em seu cotidiano escolar. Cabe às atuais gerações de educadores, que se formam nas universidades, vencer o desafio de transformar a tecnologia em uma poderosa aliada da educação no Brasil.

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As universidades, em sua origem etimológica, significam justamente pensamento universalizado. Como podemos observar, as universidades, desde o seu surgimento na Idade Média, estão relacionadas às relações de poder no interior das fronteiras dos Estados Nacionais. Isto porque o conhecimento sempre foi uma arma poderosa nas relações de poder.

As diversas ciências que surgem com o desenvolvimento secular das universidades nos apresentaram para a humanidade melhorias incalculáveis na qualidade de vida cotidiana, no desenvolvimento das condições de saúde das pessoas. Também são frutos do desenvolvimento técnico-científico em geral, relacionados às universidades, os terríveis armamentos que podem dizimar a vida humana por diversas vezes.

4 IMPLICAÇÕES DA PÓS-MODERNIDADE NO CONTEXTO EDUCACIONAL

As reflexões de Fromm (1987) se fazem pertinentes no ponto em que ele discute que a técnica nos tornou onipotentes (pode-se tudo); a ciência nos fez oniscientes (sabe-se tudo). O homem moderno e contemporâneo encontra-se ávido e sedento por mais, e alcançar cada vez níveis mais específicos, profundos e complexos; a partir de então, a natureza, os corpos e os materiais tinham de ser ‘acossados em seus descaminhos’, ‘obrigados a servir’ e ‘escravizados’. O comando foi o de ‘reduzir à obediência’, e o objetivo do cientista foi de ‘extrair da natureza, sob tortura, todos os seus segredos’ (CAPRA, 1982).

A visão do mundo e da vida moderna e que ainda prevalece nos tempos contemporâneos foi conduzida a partir de duas distinções fundamentais, entre o conhecimento científico e o conhecimento do senso comum, por um lado, e entre a natureza e a pessoa humana, por outro, ambos completamente dissociados (SANTOS, 1995).

No campo metodológico da construção do conhecimento foi observada uma espécie de aversão à dúvida, a precipitação nas respostas, o pedantismo cultural, o receio de contradizer, a parcialidade, a negligência na pesquisa social, o fetichismo verbal, a tendência a dar-se por satisfeito com conhecimentos parciais, o que impediu o entendimento humano de estabelecer uma relação profunda e conciliadora com a natureza das coisas, e foram, em vez disso, responsáveis por constituir uma ligação com conceitos fúteis, amorais e experimentos não planejados (ADORNO; HORKHEIMER, 2000).

Na modernidade, o objetivo da ciência era o domínio e o controle da natureza, afirmando que o conhecimento científico podia ser usado para tornar o homem o senhor e dominador da natureza. O rigor científico encontrava-se fundado no rigor matemático, um rigor que quantifica e que, ao quantificar, desqualifica, um rigor que, ao objetivar os fenômenos, os objetualiza e os degrada, que, ao caracterizar os fenômenos, os caricaturiza (SANTOS, 1999).

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

Nestes termos, o conhecimento ganhou em rigor, mas perdeu em riqueza, relevância e justificativa social; por outro lado, a retumbância dos êxitos da intervenção tecnológica escondeu os limites da nossa compreensão do mundo, e reprimiu a pergunta pelo valor e sentido humano e científico.

A pós-modernidade é um conceito em debate nas ciências humanas e pretende classificar o mundo da atualidade, no qual as antigas estruturas sociais, com o Estado, as indústrias, as famílias, que eram instituições sólidas, verdadeiros pilares na sociedade ocidental, vêm sendo profundamente questionadas. Alguns teóricos apresentam o mundo atual como um processo de transformação rápida e veloz das estruturas sociais, no qual a pluralidade de ideias, ações e práticas se revela uma realidade presente.

É difícil estabelecer uma data de início da pós-modernidade. Mas, de toda forma, o pós-guerra e as transformações nos costumes vivenciadas nos anos 1960 nos demonstram um mundo que não mais crê nos valores iluministas, pois uma ideia universalizante, na qual o Estado é tripartite como no modelo de Montesquieu, mostra limites devido à descrença nos políticos, devido aos constantes escândalos de corrupção.

As tendências pós-modernas trouxeram em sua essência aspectos que

tratam da heterogeneidade, fragmentação, subjetividade e relatividade, que podem ser entendidos como o estágio e a metamorfose mais sublime da época moderna (DIEHL; TEDESCO, 2001).

No campo cultural, a pós-modernidade se caracterizou por projetos que revisitaram outras épocas e períodos históricos; de onde trouxeram para o momento presente e de forma atualizada estilos, conceitos; outro projeto também foi o de repaginar um determinado cenário e contexto, muito distante e diferente do que foi e como existia no original. Muitas vezes, neste processo, o que ocorre é a perda da essência, a coerência e a capacidade de originalidade das manifestações artísticas atuais.

No campo dos movimentos sociais é possível relacionar, dos anos de 1960, o feminismo, os panteras negras e movimentos ecológicos, os chamados “novos movimentos sociais”, juntamente com as revoltas estudantis, de contracultura e antibelicistas, que reclamavam pelo retorno às lutas pelos direitos civis, os movimentos revolucionários do terceiro mundo, as questões pela paz, entre outros.

Nestes movimentos pode-se indicar que o feminismo contribuiu para o reconhecimento de outros grupos no interior da sociedade e da política, mas também favoreceu diretamente a fragmentação conceitual do sujeito, nas relações que se estabeleciam do campo público ao privado, do trabalho ao lar, da vida profissional à vida pessoal, divisão doméstica do trabalho; no campo de atuação política, da família, da sexualidade, ao cuidado das crianças, entre outros aspectos, no ponto em que tomou para si a luta específica das mulheres, desarticulado de uma luta maior de melhoria das condições e dignidade humana; bem como o movimento ambientalista, que tem suas ações pautadas somente nas questões que

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TÓPICO 3 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL CONTEMPORÂNEO

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dizem respeito à natureza, desarticuladas de uma preocupação maior para o ser humano que também compõe o mesmo meio.

O desenvolvimento das máquinas artificiais rumo à autonomia crescente

e à auto-organização e o desenvolvimento futuro das inteligências artificiais fazem-nos imaginar a era das metamáquinas que, associadas às micromáquinas nas nanotecnologias, liberariam os seres humanos de todas as obrigações secundárias e tarefas subalternas, permitindo-lhes viver poeticamente, dedicar-se ao desenvolvimento moral e espiritual. Mas percebe-se a permanência de sistemas totalitários, a concentração de renda e riqueza, a exploração do trabalho, a violação dos direitos humanos, intolerâncias religiosas, questões raciais e de gênero cada vez mais acirradas (MORIN, 2007).

Ideias e valores absolutos são relativizados. O relativismo é uma das principais marcas do nosso tempo, no qual os valores sociais, como o trabalho e a família, já não são considerados absolutos, mas, por vezes, preteridos por valores como o lucro fácil e a fama, a popularidade. Estes valores relativistas a que muitos estudantes foram formados revelam um choque com os antigos conceitos educacionais.

O modelo de educação escolar tradicional vem sendo criticado nos últimos 30 anos por diversos intelectuais, das mais distintas correntes teóricas. Uma espécie de mal-estar docente invade as salas de aula pelo país. Em grande parte, devido às distintas formas de ensinar em um mundo em que a velocidade de informação é maior que as atualizações curriculares.

Um dos primeiros intelectuais a diagnosticar este problema foi o sociólogo marxista francês Louis Althusser. No livro "A ideologia e os aparelhos ideológicos de estado", afirmava a escola como um local no qual os professores eram os propagadores das ideias que mantinham o Estado como um agente da classe burguesa, ao inculcar ideias de submissão dos seres humanos. Uma submissão ao patrão, ao padre da paróquia, ao oficial do serviço militar, que nasceu de uma submissão incontida aos professores nas escolas.

Um sociólogo argelino, Pierre Bourdieu, com base na tese de Althusser, buscou ampliar sua percepção. No livro A reprodução, afirmava não ser a escola um lugar pensante, mas um mero centro reprodutor de informações aos quais os alunos deveriam apenas memorizar, sem a ela apresentar reflexão. Esta excessiva memorização não levaria à construção de cidadãos conscientes, mas de homens e mulheres obedientes aos ditames do Estado.

As temáticas abordadas por Foucault favoreceram contemplar a subjetividade, os modos de viver e fazer, os hábitos, os costumes, os valores e as tradições; deixando de lado a partir de então os grandes temas/pesquisas da História política, econômica e/ou as grandes sínteses da História Social (DIEHL, 1993).

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Na obra de Foucault encontra-se uma forte crítica aos processos de modernização da sociedade, bem como as estruturas dos governos que procuravam racionalizar de forma esmagadora os indivíduos. Diante disto, pesquisou a história do ensino, do saber, a epistemologia das palavras, a hermenêutica; a história da loucura, as teorias psiquiátricas, os espaços de manicômios, asilos, hospitais; as teorias penais e a arquitetura de prisões, o nascimento da biopolítica, o Estado regulador, o controle sobre o território e a população, do final do século XVIII e início do XIX, e as apresenta como instituições disciplinares das condutas e dos comportamentos sociais.

Para o filósofo Michael Foucault, a escola era um local, assim como os quartéis, que visavam à construção de corpos dóceis. Por corpos dóceis busca-se compreender a relação de submissão que os homens possuem perante as instituições do Estado, um dos fatores a explicar a convocação para os exércitos, ou mesmo, a relação de entrega de um paciente perante um médico. A função da escola enquanto instituição, de formar corpos dóceis, seria a de internalizar a disciplina, não apenas como valor abstrato, mas como uma expressão cotidiana dos homens e das mulheres quando adultos.

Entre os pensadores da escola podemos destacar Perrenoud, que escreveu

o livro "As 10 novas competências para ensinar". Buscou este educador suíço lembrar a importância do professor como um agente que lidera o desencadeamento do processo educativo.

Em Portugal, por meio da Escola da Ponte, na Vila das Aves, surgiu uma proposta educacional diferenciada, tendo como formulador o professor José Pacheco, que buscou criar, na Escola da Ponte, uma nova fórmula de ensino, na qual os estudantes possuem maior liberdade na escolha dos conteúdos e temáticas a serem desenvolvidos, ou seja, em que a autonomia dos estudantes foi levada a cabo.

O fato de vivermos uma verdadeira revolução em matéria de informações,

mais um problema, se torna um salutar desafio aos docentes das mais distintas disciplinas, pois, ao invés de se trabalhar com a excessiva memorização, o acesso a informações permite ao professor construir e incentivar atitudes reflexivas nos educandos. Como veremos, estas transformações atingem diversos níveis de ensino.

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EDUCAÇÃO INTEGRALPara maiores informações sobre o projeto de José Pacheco, acesse o site que indicamos a seguir:Centro de referência em Educação Integral: Disponível em: <http://educacaointegral.org.br/experiencias/escola-da-ponte-radicaliza-ideia-de-autonomia-dos-estudantes/>.

FILME AO MESTRE COM CARINHO é um clássico do cinema de Hollywood e retrata o cotidiano de um professor comprometido com os seus alunos. Obras cinematográficas como esta nos revelam a noção de quanto o engajamento de um educador pode mudar a realidade de muitos estudantes.

LIVROCAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. 22. ed. São Paulo: Cultrix, 1992. 447 p.Capra é um estudioso da física, ciência e das questões ambientais contemporâneas. Nesta obra, o autor discute a crise dos paradigmas modernos, os modelos de Newton e Descartes, as concepções mecanicistas da sociedade, os problemas econômicos mundiais, o lado sombrio do crescimento, as concepções alternativas de vida e sociedade.O livro encontra-se na íntegra e em pdf disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/5014979/O-ponto-de-mutacao>.

FILMEO ponto de mutação/Mindwalk. Bernt A. Capra, Estados Unidos, 1990. CorO longa-metragem é dirigido por Bernt A. Capra, irmão de Fritjof Capra, autor do livro de mesmo nome, que foi publicado em 1982. Através dos personagens de um poeta (angustiado com o sentido e a falta de sentido da vida humana), um político liberal (que experimenta uma crise por não ter vencido as eleições) e uma física (que se encontra frustrada por ver suas experiências e conhecimentos sendo pervertidos e utilizados para fins militares e de destruição), o filme aborda a trajetória e as implicações do conhecimento humano a partir das teorias científicas do século XV no âmbito da física, economia, política, psicologia, ecologia etc., que serão implementadas na modernidade e que se encontram ainda em voga na atualidade.O filme encontra-se disponível com legenda em português em: <http://www.youtube.com/watch?v=7tVsIZSpOdI>.

DICAS

DICAS

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

Caro acadêmico! Atente para a leitura complementar. Trata-se de um texto que contempla as principais abordagens que se encontram no pano de fundo do fazer educacional. As abordagens filosóficas educacionais encontram-se relacionadas com as filosofias gerais, que foram apresentadas na leitura complementar do Tópico 1 desta unidade. As abordagens filosóficas educacionais são colocadas em prática no momento de transpor o conhecimento científico para a realidade das salas de aula. Para tanto, vamos conhecer melhor cada uma delas, reforce a atenção e prossiga na leitura:

LEITURA COMPLEMENTAR

ABORDAGENS FILOSÓFICAS EDUCACIONAIS

Kevin Daniel dos Santos Leyser

Dentre as abordagens filosóficas educacionais prevalecem o Perenialismo, o Essencialismo, o Progressismo e o Reconstrucionismo. Essas filosofias educacionais fornecem elementos essenciais do que se deve ensinar e são fundamentais no que diz respeito aos componentes curriculares escolares. Vamos estudar e aprofundar cada uma delas:

1- Perenialismo

Para os perenialistas, o objetivo da educação é garantir que os alunos adquiram compreensão sobre as grandes ideias da civilização ocidental. Essas ideias têm o potencial para resolver problemas em qualquer época. O foco é ensinar ideias que são eternas, para buscar verdades duradouras que são constantes e não mudam, como os mundos naturais e humanos em seu nível mais essencial não mudam. Ensinar esses princípios imutáveis é crítico. Os seres humanos são seres racionais, e suas mentes precisam ser desenvolvidas. Assim, o cultivo do intelecto é a mais alta prioridade de uma educação que vale a pena. O currículo exigente centra-se na obtenção de alfabetização cultural, enfatizando o crescimento dos alunos em disciplinas duradouras. As realizações mais sublimes da humanidade são enfatizadas – as grandes obras da literatura e da arte, as leis ou os princípios da ciência. Advogados dessa filosofia educacional são Robert Maynard Hutchins, que desenvolveu o programa Grandes Obras em 1963, e Mortimer Adler, que avançou ainda mais este currículo baseado em 100 grandes obras da civilização ocidental.

2- Essencialismo

Os essencialistas acreditam que há um núcleo comum de conhecimento que precisa ser transmitido aos alunos de forma sistemática e disciplinada. A ênfase nesta perspectiva conservadora é sobre padrões intelectuais e morais que as escolas devem ensinar. O núcleo do currículo é conhecimento e habilidades essenciais e rigor acadêmico. Embora essa filosofia educacional seja semelhante,

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TÓPICO 3 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL CONTEMPORÂNEO

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de certa forma, ao perenialismo, os essencialistas aceitam a ideia de que esse currículo pode mudar. A escolaridade deve ser prática, preparando os alunos para se tornarem membros valiosos da sociedade. Ela deve se concentrar em fatos – a realidade objetiva lá fora – e "o básico", a formação dos alunos para ler, escrever, falar e calcular clara e logicamente. As escolas não devem tentar definir ou influenciar as políticas. Aos alunos devem ser ensinados o trabalho, o respeito pela autoridade e a disciplina. Os professores devem ajudar os alunos a manter seus instintos não produtivos sob controle, como a agressividade ou a insensatez. Esta abordagem desenvolveu-se em reação às abordagens progressistas prevalentes nas décadas de 1920 e 1930. William Bagley desafiou as abordagens progressistas no periódico que ele inaugurou em 1934. Outros proponentes do essencialismo são: James D. Koerner, H. G. Rickover, Paul Copperman e Theodore Sizer.

3- Progressismo

Os progressistas acreditam que a educação deve se concentrar em toda a criança, e não no conteúdo ou no professor. Esta filosofia educacional enfatiza que os alunos devem testar ideias através da experimentação ativa. A aprendizagem está enraizada nas questões dos alunos que surgem ao experimentar o mundo. É ativa, não passiva. O aluno é um solucionador de problemas e pensador que faz sentido através de sua experiência individual no contexto físico e cultural. Professores eficazes fornecem experiências para que os alunos possam aprender fazendo. O conteúdo do currículo é derivado dos interesses e perguntas dos alunos. O método científico é usado por educadores progressistas para que os alunos possam estudar a matéria e os eventos sistematicamente e em primeira mão. A ênfase está no processo – como se conhece. A filosofia da educação progressiva foi estabelecida na América desde meados da década de 1920 até meados dos anos 1950. John Dewey foi seu principal proponente. Um de seus princípios era que a escola deveria melhorar o modo de vida dos nossos cidadãos através da experiência da liberdade e da democracia nas escolas. A tomada de decisão compartilhada, o planejamento de professores com alunos, os tópicos selecionados pelos alunos são todos aspectos desta abordagem. Os livros são ferramentas, e não autoridade.

4- Reconstrucionismo/Teoria Crítica

O reconstrucionismo social é uma filosofia que enfatiza o tratamento de questões sociais e uma busca para criar uma sociedade melhor e uma democracia mundial. Educadores reconstrucionistas se concentram em um currículo que destaca a reforma social como o objetivo da educação. Theodore Brameld (1904-1987) foi o fundador do reconstrucionismo social, em reação às realidades da Segunda Guerra Mundial. Ele reconheceu o potencial para a aniquilação humana através da tecnologia e crueldade humana ou a capacidade de criar uma sociedade beneficente usando a tecnologia e a compaixão humana. George Counts (1889-1974) reconheceu que a educação era o meio de preparar as pessoas para criar essa nova ordem social.

Os teóricos críticos, como os reconstrucionistas sociais, acreditam que os

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UNIDADE 2 | ELEMENTOS DO CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL MODERNO E CONTEMPORÂNEO

sistemas devem ser mudados para superar a opressão e melhorar as condições humanas. Paulo Freire (1921-1997) foi um brasileiro cujas experiências vivendo na pobreza o levaram a defender a educação e a alfabetização como veículo de mudança social. Em sua opinião, os seres humanos devem aprender a resistir à opressão e não se tornar suas vítimas, nem oprimir os outros. Para isso são necessários o diálogo e a consciência crítica, o desenvolvimento da consciência para superar a dominação e a opressão. Ao invés de "ensino bancário", no qual o educador deposita informações nas cabeças dos alunos, Freire viu o ensino e a aprendizagem como um processo de investigação em que a criança deve inventar e reinventar o mundo.

Para os reconstrucionistas sociais e teóricos críticos, o currículo concentra-se na experiência dos alunos e na ação social em problemas reais, como a violência, a fome, o terrorismo internacional, a inflação e a desigualdade. As estratégias para lidar com questões controversas (particularmente em estudos sociais e literatura), inquérito, diálogo e múltiplas perspectivas são o foco. A aprendizagem baseada na comunidade e a inserção do mundo na sala de aula são também estratégias.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Ao longo do tópico, você pôde compreender que:

• Entre os principais desafios educacionais da época contemporânea estão os de erradicar o analfabetismo, doenças e epidemias, atuar na garantia dos direitos humanos, na emancipação e realização humana.

• Os espaços considerados formadores e de referência em educação são governos, autoridades, unidades escolares, instituições de ensino nos mais diferentes níveis, instituições não escolares, organizações não governamentais, entidades e a sociedade civil.

• Os ideais de progresso, democracia, inclusão, liberdade são traduzidos como resultantes do trabalho, consumo e do domínio de tecnologias.

• A realidade dos primeiros anos do século XXI é de concentração de renda, desigualdades sociais, exploração humana, destruição da natureza, crises econômicas e problemas políticos.

• Ocorre ampla valorização dos modelos científicos. A matéria e a tecnologia são valorizadas como saberes populares, dissociação com a natureza e o homem, em que o homem é responsável por predar, dominar e extrair da natureza tudo o que é necessário.

• Os governos, as indústrias, as famílias e a Igreja deixaram de ser referências sólidas e, em contrapartida, novas estruturas e movimentos sociais têm emergido, tais como movimentos étnicos, feminista e ambientalista.

• O relativismo de valores culturais e sociais, e a legitimação dos princípios de lucro fácil, sucesso financeiro e material, prestígio midiático e fama.

• Para Michael Foucault, a escola contribuiu para a formação de corpos dóceis, semelhante à disciplina no interior de quartéis e da relação entre pacientes e médicos.

• Os computadores, a internet e os aparelhos telefônicos móveis estão muito presentes no cotidiano escolar, porém ainda não foram implementadas soluções eficientes de ensino e aprendizagem com eles.

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1- Na época contemporânea, vários fatos marcam a luta de sujeitos, grupos e categorias que até então não haviam tido vez e voz no interior da sociedade e das instituições políticas. Os novos grupos que agora alcançaram representatividade são indicados como responsáveis por promover uma espécie de ‘política das identidades’ e acabaram por formar guetos, redutos, separatismos e unidades específicas e circunscritos a uma causa somente. Que grupos/movimentos são estes?

a) ( ) Movimentos pacifistas, ambientalistas, antirracistas e feministas.b) ( ) Grupos de peregrinos e romeiros que almejam difundir os dogmas

religiosos.c) ( ) Movimentos que se expressam por meio das mídias eletrônicas e

aplicativos em celulares.d) ( ) Grupos de guerrilheiros e comandos armados que detém o controle de

determinada região e população.

AUTOATIVIDADE

2 A pós-modernidade foi responsável por atribuir inúmeras transformações ao contexto da educação e do ensino da nossa época. A pós-modernidade é interpretada como um período que ganhou expressão a partir dos anos de 1960, ficou marcada por promover mudanças e fazer problematizações às explicações e instituições da época moderna, que ainda se perpetuam em meio à sociedade atual. Diante disso, disserte sobre as repercussões e os impactos das concepções pós-modernas no campo educacional contemporâneo.

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UNIDADE 3

O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO DA EDUCAÇÃO

BRASILEIRA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir desta unidade você será capaz de:

• analisar o espaço da educação brasileira como local de continuidade e des-continuidade, ou rupturas e permanências em termos de teorias, modelos, explicações, métodos, normas e leis educacionais;

• estudar o contexto histórico e as estruturas educacionais do período colo-nial brasileiro, em especial o sistema de ensino da Companhia de Jesus;

• conhecer as condições históricas e sociais do período político denominado de Brasil Império, no que diz respeito a instituições políticas e políticas públicas em educação para a época;

• analisar as principais diretrizes educacionais que se instalaram no Brasil a partir da Proclamação da República e nos primeiros anos do século XX;

• identificar e compreender os novos rumos e tendências que se configura-ram na educação brasileira a partir da Constituição de 1988.

A Unidade 3 deste caderno está dividida em três tópicos de conteúdos. Ao longo de cada um você encontrará sugestões de filmes, de leitura, resumos e atividades de fixação dos conteúdos estudados.

TÓPICO 1 – CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL NO PERÍODO COLONIAL E IMPERIAL

TÓPICO 2 – CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL A PARTIR DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA E NOS PRI-MEIROS ANOS DO SÉCULO XX

TÓPICO 3 – CONTEXTO HISTÓRICO E INTELECTUAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX

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TÓPICO 1

CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO DA

EDUCAÇÃO NO PERÍODO COLONIAL E

IMPERIAL

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico! Agora chegou o momento de analisarmos em linhas gerais como se deu a estruturação do ensino e das instituições educacionais no Brasil. Isso significa reconhecer o que adaptamos de outras regiões e países, como a Europa e os Estados Unidos, e o que desenvolvemos de forma genuína, ou seja, o que a intelectualidade brasileira foi capaz de pensar e realizar a partir do contexto de desafios da realidade que se apresentava.

Antecipamos que o Brasil, em termos de políticas de governo em educação, por muito tempo não se preocupou em pensar uma estrutura educacional coesa e sólida que envolvesse ensino, pesquisa e extensão. Isto passou a ser uma realidade somente a partir do século XX e, hoje, no descortinar das primeiras décadas do século XXI, ainda não representa uma prática sólida e autônoma, ainda nos encontramos numa posição de dependência no que diz respeito a matrizes teóricas e metodológicas do que é produzido no exterior.

Gostaríamos que estas reflexões não sejam responsáveis por desmerecer toda a jornada e luta que foi travada pelas gerações anteriores, pois sem o trabalho deles não estaríamos hoje aqui, revisitando e refletindo o seu legado, e muito menos teríamos o ponto de partida no qual nos situamos; assim como não desestimulem ou desmotivem as superações que você, sua turma e sua geração podem fazer pelo contexto educacional atual, seja em meio à sua comunidade, região, país e/ou mundo.

Neste momento, nos dedicaremos mais a descrever e explicar as estruturas políticas, as instituições e os movimentos educacionais, os métodos e os principais idealizadores de teorias pedagógicas brasileiras. Fique atento aos tópicos que compõem esta unidade, procure identificar as continuidades e semelhanças que perpassaram cada época e, em especial, as mudanças e rupturas que possibilitaram a renovação do pensamento pedagógico no Brasil.

O que compreendemos por período colonial brasileiro se refere a uma temporalidade iniciada em 1500, quando da viagem de Pedro Álvares Cabral, até a Independência do Brasil, em 1822. Todavia, estes marcos cronológicos da história brasileira não correspondem, necessariamente, aos períodos de maior

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intensidade nas transformações sociais que permitiram ao Brasil sua composição socioeconômica presente; de modo sistemático e cronológico, a história política brasileira se divide em três períodos: período colonial, período imperial e período republicano (FAUSTO, 2000).

Votos de uma boa leitura e apropriação de conhecimentos pela frente!

2 O EXEMPLO DE PORTUGAL A educação brasileira, no período colonial, se relaciona às dinâmicas

educacionais da metrópole; na colônia obrigatoriamente vigoraria a confissão religiosa da metrópole, portanto, muitas das decisões relativas às questões educacionais durante o período colonial brasileiro se relacionam às políticas portuguesas em relação às suas colônias. Por isso, devemos, antes de compreender o Brasil, analisar os antecedentes portugueses na educação.

Portugal surge como nação por volta do século XIII, quando se tem no poder os reis da dinastia afonsina. Durante a chamada Revolução de Avis, de 1385, surge uma nova dinastia homônima ao movimento revolucionário. Com os reis da Dinastia Avis temos o auge das grandes navegações portuguesas. Expansão ultramarina iniciada em 1415, quando os lusitanos, liderados pelo infante D. Henrique, conquistaram a cidade de Ceuta, no norte da África. Depois tivemos as chamadas grandes viagens de Gil Eanes, que ultrapassou o Cabo Bojador; de Bartolomeu Dias, que descobriu o Cabo da Boa Esperança, e Vasco da Gama, que descobriu o caminho marítimo para as Índias. Dois anos após, as embarcações comandadas por Pedro Álvares Cabral alcançaram as praias de Porto Seguro, sendo a data “oficial” da primeira chegada dos portugueses ao Brasil (MATOSO, 2001).

Portugal confessava-se cristã católica, sendo assim o modelo antropológico e cosmovisão tomista, cuja matriz encontra-se nas obras de São Tomás de Aquino. Segundo Lauand e Sproviero (1999), a doutrina de São Tomás centra-se na noção de participação, no sentido de que os indivíduos comungam dos ideais, congregam, fazem parte do grupo ou do movimento. O que nos leva a interpretar que os novos adeptos e convertidos da fé católica deveriam ser catequizados e posteriormente demonstrá-la e professá-la de forma íntegra e convincente.

Lauand e Sproviero (1999) acrescentam que o pensamento de São Tomás de Aquino foi responsável por sustentar filosoficamente as alianças que a Igreja Católica realizou com as instituições políticas e econômicas ao longo da era das grandes navegações, descobertas, colonização e catequização do Novo Mundo.

A relação das grandes navegações portuguesas com a educação é um ponto de discórdia entre diversos historiadores, pois, para alguns, existiu uma instituição formada com o objetivo de educar jovens marinheiros para a

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“faina marítima”, isto é, para as lidas cotidianas navais. A escola teria como local de sede o promontório de Sagres, no sul da Península Ibérica. Teria como principal diretor o infante D. Henrique, que seria o principal responsável pela fundação e manutenção de uma instituição de ensino para a Marinha.

Todavia, existem outros historiadores, que não concordam com a existência de tal “escola de aprendizes-marinheiros”. Isto porque as navegações, em seus aspectos de maior materialidade, como a construção naval, ou teóricos, como a navegação astronômica, tiveram seu desenvolvimento ligados a uma empiria no trato com o mar, e da tradição de povos que habitam a Península Ibérica e que possuíam o hábito tradicional de contemplar as estrelas, como os judeus e árabes.

Uma instituição de ensino que pode ser considerada um ponto de concórdia entre os historiadores da educação em língua portuguesa foi a Universidade de Coimbra. Fundada ainda no período medieval, a universidade foi formada para ser um centro intelectual do reino português.

Enquanto Guimarães e posteriormente Lisboa foram as capitais políticas de Portugal, Coimbra foi a sua capital cultural, pois está nesta cidade a mais antiga universidade. Não apenas por sua tradição, mas também por sua condição enquanto universidade, Coimbra se destacou. Em geral, a principal carreira a ser seguida era a de Direito. Os letrados de Coimbra eram as principais figuras da burocracia do Império Marítimo Português. Com isso, podemos compreender algumas questões ligadas às instituições educacionais do Brasil Colonial.

No Brasil, ao contrário da América Espanhola, não havia universidades (HOLANDA, 1995). Isto é, ao invés de investir em universidades no ultramar, o governo português centralizava a educação superior em uma única instituição. O Império Espanhol, ao contrário, instituiu universidades em diversos pontos de sua colônia americana, sendo a mais antiga a Universidade de São Marcos, no Peru.

Tal política de educação superior da realeza lusitana possuiu pontos positivos e negativos. Os pontos negativos podem ser enumerados na dificuldade de acesso ao Ensino Superior aos súditos lusitanos na América Portuguesa, além da pouca produção intelectual, algo que a presença de uma universidade pode fomentar, porém, entre os pontos positivos, está a de uma mentalidade uniforme entre os burocratas do reino português, pois alguns homens teriam de exercer, em uma mesma existência, cargos de poder em pontos distintos do globo, como na Ásia, na África e no Brasil.

A educação desde os tempos mais longínquos consiste em um dos principais vetores na divulgação de novas ideias políticas, filosóficas e científicas. Por isso, os Estados nacionais, durante o Antigo Regime, possuíam um profundo controle não apenas nas instituições universitárias, como também sobre todas as produções intelectuais. Em Portugal existiu a denominada Mesa de Consciência e Ordem, órgão responsável pela censura de livros, peças teatrais e demais obras a serem publicadas no reino e nos domínios de ultramar. Todavia, para se estabelecer

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o “certo” e o “errado” do ponto de vista intelectual, temos de compreender as disputas intelectuais no interior do reino português quinhentista.

No Portugal dos Quinhentos, dois grupos sociais lutavam pela hegemonia das ideias: os erasmianos e os neoescolásticos. Os erasmianos eram os intelectuais ligados às ideias de Erasmo de Roterdã. Tal postura intelectual era ligada a influências agostinianas e humanísticas, típicas do Renascimento europeu: o pensamento neotomista.

A concepção erasmiana era influenciada pelo platonismo agostiniano,

enquanto os neoescolásticos eram ligados ao pensamento de São Tomás de Aquino. O pensamento erasmiano foi fecundo em Portugal na primeira metade do século XVI. Damião de Góis foi um dos principais intelectuais erasmianos portugueses. O termo erasmiano é oriundo de Erasmo de Roterdã, intelectual importante no século XVI, autor de um clássico do pensamento ocidental chamado Elogio da Loucura.

Os erasmianos realizaram uma obra educacional interessante no afamado Colégio das Artes de Coimbra. Todavia, são expulsos e colocados sob suspeita. Em Portugal, assim como na Espanha, se debateu qual é o melhor método filosófico, e os neoescolásticos ganharam a disputa. Os jesuítas eram os principais neoescolásticos e foram os religiosos que substituíram os erasmianos no colégio coimbrão. Esta substituição é um marco na mudança de rumos da educação durante a Idade Moderna portuguesa.

Um dos marcos da colonização portuguesa nos trópicos da América foi a instalação do Governo Geral em 1550. Este foi acompanhado por religiosos jesuítas, que se instalaram no Brasil e marcaram profundamente a história brasileira nos séculos XVI e XVII, a ponto de se atribuir uma máxima ao historiador Capistrano de Abreu, cuja História do Brasil dos dois primeiros séculos é a história da Companhia de Jesus.

Na tentativa de explicar a instauração dos modelos de civilização, educação e aculturação da metrópole na colônia, Saviani (2004, p. 123) colabora descrevendo que “[...] no caso da educação instaurada no âmbito do processo de colonização tratava-se, evidentemente, de aculturação, já que as tradições e costumes que se busca inculcar decorrem de um dinamismo externo, isto é, que vai do meio cultural do colonizador para a situação objeto de colonização”.

Segundo Paiva (1978), havia o projeto de transformação de costumes, que deveria alcançar e sensibilizar desde as organizações familiares, a estrutura de governo, a geografia das aldeias e as relações no interior das mesas, entre outros aspectos, almejando a superação dos costumes autóctones sob o pretexto de obter a salvação das almas. Em outras palavras, os hábitos selvagens dos povos nativos deveriam ser suprimidos e em seu lugar cultivados os valores da civilização, aqueles ainda da antiguidade clássica de Aristóteles e Platão, de superar os vícios por meio do hábito constante das virtudes.

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BEDEL: ou disciplinador; nome dado ao responsável por aplicar a disciplina no interior dos espaços escolares, é comum também o nome ser utilizador para referir e denominar os profissionais que são responsáveis pelas atividades burocráticas.

Tobias (1987) explica que, além da finalidade de aculturar e converter os nativos brasileiros, a educação desenvolvida no Brasil almejava formar padres, e que a estrutura familiar do Brasil, que se caracterizava por ser numerosa, fornecia condições favoráveis para tal, sendo que: “o primeiro filho tinha que ser o herdeiro da herança material do pai; o segundo, o intelectual da família; o ‘terceiro filho’ ‘entrava para a Igreja” (TOBIAS, 1987, p. 80).

DICAS

Segundo Saviani (2007, p. 41), diversas ordens religiosas, tais como franciscanos, beneditinos, carmelitas, mercedários, oratorianos e capuchinhos desenvolveram ações educativas e religiosas em terras brasileiras, mas foram os jesuítas que as consolidaram ao longo da maior parte do período colonial. Logo, se faz necessário aprofundar os conhecimentos sobre elas.

A Companhia de Jesus foi fundada por volta de 1530, por Inácio de Loyola, um basco que, desejando se tornar cavaleiro, ficou ferido e, se tratando em um mosteiro, solicitou ler sobre aventuras da cavalaria, mas acabou lendo a única literatura disponível no mosteiro, as hagiografias, isto é, a escrita sobre a vida de santos. Inspirado por esta literatura religiosa, acabou por fundar uma Companhia de Soldados de Cristo. Possuem os mesmos o lema Ad Majorem Gloriam Dei (Para a Maior Glória de Deus), como sigla as letras SJ, além de uma regra de vida comum própria. Dois livros são marcas do pensamento inaciano: Os exercícios espirituais e a Ratium Studiorum (SEBE, 1981).

A Companhia de Jesus tinha como finalidade traduzir em ações a fé que

professava; não lhe bastando meditar e orar, daí o fervor missionário, de caráter militante e combatente, que moveu os seguidores a considerar a cruz e a espada como faces de uma mesma moeda.

A Ratio atque Institutio Studiorum Societatis Iesu (Plano e Organização de Estudos da Companhia de Jesus) foi publicada no ano de 1599, continha as regras que orientavam todas as atividades dos agentes diretamente ligados ao ensino. Abrangia desde as regras do Provincial, passando pelas do Reitor, do Prefeito de Estudos, dos professores de modo geral e de cada matéria de ensino, abrangendo as regras da prova escrita, da distribuição de prêmios, do bedel, chegando às regras dos alunos e concluindo com as regras das diversas academias.

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3 FUNDAMENTOS DO MODELO E MÉTODO JESUÍTICO DE ENSINO

Os portugueses que gradualmente chegaram ao Brasil traziam os modelos e concepções que estavam em voga em Portugal e na Europa medieval. Os jesuítas se instalaram em diversos pontos do país. Dois dos mais afamados jesuítas que atuaram no Brasil colonial foram os padres José de Anchieta e Antônio Vieira.

A importância da educação jesuítica para a história brasileira é incontável, pois foram eles os fundadores do Colégio de São Paulo de Piratininga, que deu origem à atual cidade de São Paulo, a maior metrópole brasileira.

Os jesuítas possuíam como método de estudo o Ratium Studiorum, pelo qual os estudantes eram disciplinados, ligando as ideias de Inácio de Loyola com o cotidiano dos alunos. Na colônia, as principais instituições eram as vinculadas ao ideal jesuítico. O Colégio de Salvador possuiu grande qualidade acadêmica, a ponto de as autoridades coloniais solicitarem uma equiparação do Colégio Jesuíta de Salvador com a Universidade de Coimbra. Equiparação esta que não ocorreu por questões políticas.

Quanto aos indígenas, a ação jesuítica foi muito intensa. Eles organizaram sua ação com relação às maneiras de catequizar através das reduções, formas de atrair os indígenas e nelas também explorar sua mão de obra, em especial nas denominadas “drogas do sertão”, isto é, as especiarias brasileiras, como castanhas. No interior da América do Sul, entre os territórios do Paraguai, Paraná e Rio Grande do Sul, a ação dos jesuítas com os indígenas foi grande, nas chamadas missões, nas quais os jesuítas influenciaram a cultura. Os padres traduziram as histórias bíblicas para o idioma guarani, até hoje a língua oficial dos paraguaios, ao lado do espanhol. Em relação ao idioma, em muitas localidades do Brasil Colonial, a chamada língua geral, uma forma de tupi-guarani padronizado pelos jesuítas, era língua corrente.

As reduções que foram edificadas no interior do Rio Grande do Sul, quando da expulsão dos jesuítas do Brasil, passaram por um longo período de declínio e decadência e hoje restam apenas ruínas das estruturas edificadas, que abrigavam as unidades de educação, trabalho e moradias. As edificações mais expressivas encontram-se na cidade de São Miguel das Missões, que foi reconhecida como sítio arqueológico de São Miguel Arcanjo e, em 1983, declarado patrimônio mundial pela Unesco. Observe a imagem a seguir da estrutura que a redução possuía, bem como uma imagem do local na atualidade:

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FIGURA 23 - ESTRUTURA DA REDUÇÃO DE SÃO MIGUEL ARCANJO, SIMULAÇÃO DA ESTRUTURA ORIGINAL

FONTE: Disponível em: <http://compartilhandoescritas.blogspot.com.br/2012/06/missoes-jesuiticas-os-sete-povos-das.html>. Acesso em: 30 out 2016.

FONTE: Disponível em: <http://portaldasmissoes.com.br/site/view/id/406/ruinas-de-sao-miguel-arcanjo-sitio-arqueologico.html>. Acesso em: 29 out. 2016.

FIGURA 24 - REDUÇÃO DE SÃO MIGUEL DAS MISSÕES-RS, IMAGEM ATUAL

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Silva (2012) procura explicar que:

A didática dos jesuítas era fiel aos fundamentos de sua pedagogia, reproduzindo, quase que completamente, o modelo medieval escolástico. Conteúdos e formas de ensino, assim, manteriam os professores e os estudantes sob a tutela magisterial da igreja, principalmente porque a livre interpretação das escrituras e a salvação pela fé eram bandeiras protestantes que atribuíam liberdades exageradas aos fiéis, do ponto de vista católico.

Se nos séculos XVI e XVII os jesuítas se destacaram nos aspectos educacionais da colônia, tal assertiva não corresponde ao século XVIII, no qual a ordem inaciana perdeu grande parte de seu prestígio, e em 1759 os jesuítas foram expulsos do Brasil.

Por reformas pombalinas ou reformas ilustradas são denominadas as transformações político-sociais empregadas por um conselheiro do rei D. José I, José Sebastião de Carvalho Mello, que tinha o título de nobreza Marquês de Pombal. De maneira geral, possuíam caráter iluminista, racionalista e defendiam o estado laico, ou seja, o governo político sem a influência da Igreja. A partir daquele momento foram organizadas as aulas régias, avulsas e que seriam ministradas por um professor pago pela Coroa portuguesa.

Ao tentar modernizar o Estado português, Pombal influiu em diferentes campos da sociedade, com reflexos na educação, pois uma de suas medidas em relação ao contato do Estado português com os indígenas brasileiros foi instituída em um dispositivo legal, o Diretório dos Índios do Grão-Pará e Maranhão. Nesta lei, Pombal instituiu que as reduções deveriam ser comandadas não mais por religiosos, mas por funcionários do Estado. Com isto, o poder dos jesuítas diminuiu. Este poder jesuítico acabou com a expulsão desta ordem religiosa dos territórios portugueses (FAUSTO, 2000).

Para substituir os Soldados de Cristo foram denominados irmãos da Ordem

do Oratório, como substitutos dos inacianos nas instituições religiosas. Em grande parte, pela similaridade do carisma das duas ordens em pregar o evangelho, além dos interesses econômicos por parte da monarquia portuguesa, que via na Companhia de Jesus uma concorrente comercial. A expulsão dos jesuítas significou uma profunda alteração, pois eles eram os principais promotores da educação brasileira.

PARA REFLETIR:Caro acadêmico, ao longo de todo o período do Brasil Colonial não

existiram universidades em nosso país. Até que ponto esta característica de nossa colonização nos prejudicou no que diz respeito ao desenvolvimento educacional?

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O período colonial foi um tempo de forte controle sobre a estruturação e o desenvolvimento do Brasil; o país não era impedido somente de criar universidades, como também de estruturar atividades industriais.

Para compreender o grau de controle que Portugal exercia sobre o Brasil e os alcances do domínio que exercia, observe a passagem a seguir, que ilustra uma das determinações da rainha Maria I, que governou o Brasil e Portugal entre os anos de 1777 e 1815:

O Brasil é o país mais fértil do mundo em frutos e produção da terra. Os seus habitantes têm, por meio da cultura, não só tudo quanto lhes é necessário para o sustento da vida, mais ainda artigos importantíssimos, para fazerem, como fazem, um extenso comércio e navegação. Ora, se a estas incontáveis vantagens reunirem as das indústrias e das artes para o vestuário, luxo e outras comodidades, ficarão os mesmos totalmente independentes da metrópole. É, por conseguinte, de absoluta necessidade acabar com todas as fábricas e manufaturas no Brasil (Alvará de 05.01.1785 in Fonseca, 1961- D. Maria I- A louca).

Tendo em vista as implicações destas determinações ao processo histórico de desenvolvimento do Brasil, passam a fazer sentido muitos dos problemas em termos de desenvolvimento e justiça social que ainda se apresentam em nossa época.

Caro acadêmico! Vamos adiante nos estudos. O cenário histórico, social, político e filosófico passa por significativas alterações a partir da mudança do sistema colonial ao sistema monárquico. Prossiga na leitura.

4 FUNDAMENTOS HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO NA ÉPOCA IMPERIAL

Nos mais de 80 anos em que o Brasil foi governado pelo regime de monarquia

(1808-1889), o sistema educacional atuava em três níveis: o ensino elementar (ou primário), o ensino secundário e o ensino superior. Piletti (2006) destaca que o ensino no Brasil Império era fragmentado em aulas avulsas (e dispersas), caracterizando conteúdos totalmente desconexos para o ensino elementar e o ensino secundário. Deve-se considerar ainda que não havia exigência de conclusão de uma forma de ensino para alcançar a outra fase, ou seja, mesmo sem concluir o ensino elementar, o ensino secundário poderia ser acessado.

A configuração social do Brasil no século XIX não favorecia investimentos

à educação primária. A Constituição, outorgada em 1824, destacava que “A instrução primária é gratuita para todos os cidadãos [...]”, mas o número de escolas era reduzido. Foi somente em 15 de outubro de 1827 que a Assembleia Legislativa aprovou a primeira lei sobre a instrução pública nacional do Império Brasileiro.

Esta lei estabelecia que “em todas as cidades, vilas e lugares populosos haverá escolas de primeiras letras [ler, escrever, contar] que forem necessárias”

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(WEREBE, 1994, p. 63). A Constituição do Brasil também determinava os conteúdos das disciplinas a serem ministradas nas escolas primárias e secundárias. Destacavam-se os princípios da moral cristã e de doutrina da religião católica e apostólica romana. A preferência acerca dos temas, para o ensino de leitura, era para a Constituição do Império e História do Brasil (AZEVEDO, 1971).

O Ato Adicional, de 6 de agosto de 1834, instituiu as Assembleias Legislativas Provinciais, com o poder de elaborar o seu próprio regimento, desde que não ferissem as imposições gerais do Estado. Cada província passava a responder pelas diretrizes e pelo funcionamento das suas escolas de ensino elementar e secundário. Dificuldades surgiram quanto aos moradores dos lugares distantes, devido à falta de escolas e de professores. Outro Ato Adicional, em 1835, instituiu as Escolas Normais, que objetivavam formar docentes. Embora houvesse muitas leis, na prática os investimentos na área educacional por parte do governo eram mínimos e atendiam somente a população elitizada (NASCIMENTO, 2004).

O surgimento das Escolas Normais (em Niterói, Bahia, Ceará e São Paulo) ampliou um pouco a formação docente. No entanto, o título de bacharel, necessário para acessar o Ensino Superior, só era frequentado pela sociedade abastada, que se formava para manter a elite como dirigente social.

Em 1840 existiam 441 escolas primárias, sendo o Colégio Pedro II considerado escola modelo no país (AZEVEDO, 1971). O governo imperial estabeleceu, em 1854, algumas normas para o exercício da liberdade de ensino e de um sistema de preparação do professor primário, bem como a criação do ensino para cegos e surdos-mudos. A iniciativa privada foi responsável pela criação do Liceu de Artes e Ofícios, em 1856. Embora essas normas tivessem sido ideias produtivas e que geraram avanços na área educacional, não produziram resultados satisfatórios (NASCIMENTO, 2004).

A partir de 1843, mesmo sem permissão oficial, a Companhia de Jesus retoma a missão no Brasil e funda o Colégio Catarinense, em Florianópolis, e a Escola de Latim, em Porto Alegre. No Recife, em 1873, um colégio jesuíta é fechado pela hostilidade da maçonaria e do imperador D. Pedro II. Com o passar do tempo, a Companhia de Jesus fundou novos colégios e faculdades em todo o país (WEREBE, 1994).

Em 1879, a reforma de Leôncio de Carvalho instituiu a liberdade de ensino, possibilitando o surgimento de colégios protestantes e positivistas, além de colégios privados. Ainda assim, o período do governo imperial brasileiro terminou deixando muitas lacunas quanto à acessibilidade, qualidade e interesse no sistema educacional, pois a população analfabeta ultrapassava 67% dos brasileiros (NASCIMENTO, 2004).

Embora a educação sempre tenha sido pensada no Brasil como instrumento de domínio, desde que os jesuítas foram expulsos pelo Marquês de Pombal, a educação teve como característica a simplificação e abreviação dos estudos. O ensino secundário deixou de ser organizado em cursos e passou a ser aplicado em

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FONTE: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Joseph_Lancaster#/media/File:Joseph_Lancaster_by_John_Hazlitt.jpg>. Acesso em: 30 out. 2016.

Tais diretrizes foram adaptadas ao Brasil, por meio de aulas régias, nas quais usava-se o Método Lancaster (1789), em que as crianças tinham noção de leitura, cálculo, escrita e catecismo. Devido à falta de professores, um professor atendia cerca de 100 alunos e escolhia seus melhores discípulos para auxiliar outros dez alunos (chamado de método decúria, em que o ajudante era um decurião). Apesar das evidentes dificuldades e falhas, considerando-se que a aprendizagem girava em torno do conhecimento de colegas da própria classe, esse método prevaleceu por 15 anos no país (FÁVERO, 2002).

Com professores mal preparados e mal remunerados, com a dificuldade de locomoção dos alunos e com o total desinteresse do governo, a educação permaneceu estagnada. As aulas régias foram extintas em 1857 por não abrangerem as disciplinas necessárias para acessar o Ensino Superior (latim, comércio, geometria, francês, retórica e filosofia) (AZEVEDO, 1984). Como alternativa a este cenário existiam, desde 1835, os liceus provincianos, que funcionavam nas capitais brasileiras e que tinham como objetivo reunir todas as aulas avulsas em um mesmo lugar, construindo assim os primeiros currículos seriados.

aulas avulsas, ou seja, um processo rápido e básico de ensino, em que o aluno ia até o professor para obter conteúdos para sua formação (HAIDAR, 1972).

Em nível mundial, em 1827 ocorreu a criação da escola das primeiras letras, idealizada por Andrew Bell, pastor anglicano, e Joseph Lancaster, pastor Quacker. De maneira geral, ambos propunham uma metodologia em que prevalecia a disciplina e hierarquização do espaço, no qual o professor supervisionava a classe e indicava o estudante mais avançado para auxiliá-lo; além disso, as preocupações e os objetivos das atividades restringiam-se em silabar e soletrar, e o método avaliativo centrava-se no aproveitamento e no comportamento do estudante.

FIGURA 25 - JOSEPH LANCASTER

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Os liceus atendiam aos alunos de 10 a 18 anos, pertencentes ao ensino secundário, que hoje corresponde à faixa etária que vai do sexto ano ao Ensino Médio. Receberam este nome para diferenciar-se dos colégios que ofereciam o ensino primário. Nos liceus, o aluno poderia escolher a ordem e a quantidade de disciplinas que quisesse cursar ao mesmo tempo, formando uma reunião de aulas avulsas, mas que atendiam às disciplinas exigidas nos exames preparatórios para o Ensino Superior (HAIDAR, 1972).

Muitos liceus surgiram e se tornaram importantes, mas no Rio de Janeiro foi criado, em 1837, o Colégio Pedro II (também chamado de Colégio Imperial Pedro II e de Ginásio Nacional), considerado o liceu modelo em todo o país.

FIGURA 26 - COLÉGIO D. PEDRO II, DESENHO DE 1856

Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_da_educa%C3%A 7%C3%A3o_no_Brasil#/media/File:Colegio_Pedro_II_(1856).jpg>. Acesso em: 5 nov. 2016.

De 1835 até 1959 foram criadas 21 instituições de ensino secundário, e destas, 17 foram chamadas de liceu (FÁVERO, 2002). Nos liceus, sobretudo no Colégio Pedro II, após estudar por sete anos conteúdos variados, embora fragmentados, o estudante (masculino, pois as mulheres não podiam cursar o ensino secundário, a profissão de professor era exclusivamente masculina) recebia a carta de bacharel em Letras.

Depois de prestar juramento perante ao Ministro do Império, o estudante tinha o direito de lecionar para o primário. Estas escolas tinham a intenção de disponibilizar mão de obra que aceitasse os salários pagos pelo Estado. No entanto,

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embora sanasse a carência de professores, começaram a faltar alunos devido ao alto preço dos materiais didáticos, que não eram gratuitos (AZEVEDO, 1984).

Proibidas de criarem cursos de nível superior, prerrogativa exclusiva do governo nacional, as províncias passaram a tentar estabelecer liceus técnicos, dando ênfase a disciplinas como Química, Física, Botânica e Agricultura. Assim, efetivaram-se as escolas técnicas voltadas a mercados como enfermagem, contabilidade, agricultura, pedagogia, desenho, artífices, costura, prática manual, música, artes plásticas etc. (HAIDAR, 1972).

O retorno dos jesuítas ao Brasil em 1842, ainda que sem autorização do governo, proporcionou a fundação de vários colégios particulares de ensino secundário (para meninos, e mais tarde para meninas). Diante disso, criou-se rapidamente uma rede amplamente disputada pela elite brasileira e seguida por outras instituições que também investiram na formação particular. Assim, essas instituições supriram parte da necessidade de formação educacional que deveria ser atribuição do Estado (HAIDAR, 1972).

Data deste contexto a criação de instituições como o Colégio Caraça de 1820, em Minas Gerais; o Colégio Mackenzie, de 1870, na cidade de São Paulo; o Colégio São Luís, que iniciou as atividades em Itu, em 1867, e que em 1919 foi transferido para São Paulo; o Colégio Internacional, de 1873, em Campinas; o Colégio Americano, de 1885, em Porto Alegre, entre outros.

O desprezo que a elite nutria pelo trabalho, sobretudo pelo trabalho manual que estava bem de acordo com a estrutura social e econômica vigente, explica em parte o abandono do ensino no primário e o total desinteresse pelo ensino profissional. A repulsa pelas atividades manuais levava essa elite a considerar vis as profissões ligadas às artes e aos ofícios. Só mesmo o descaso com que o ensino primário era tratado e a falta de visão na busca de soluções para os problemas educacionais permitem entender a adoção por tanto tempo do método lancasteriano nas escolas brasileiras. (WEREBE, 1974, p. 369).

A fundação de escolas particulares não garantiu um ensino de qualidade ao Brasil Imperial, pois o objetivo da iniciativa privada era o êxito financeiro. Sem, no entanto, se preocupar em discutir ou tentar melhorar as condições econômicas e sociais do país ou ajudar no desenvolvimento nacional (FÁVERO, 2002). O Ensino Médio gratuito para as mulheres só foi conquistado no fim do Império, antes, somente as escolas particulares ofereciam a modalidade. Ainda assim, no setor privado, as mulheres eram mantidas em escolas ou salas separadas, com ensinamentos diferenciados, voltados à vida doméstica, à maternidade e à religião. O conteúdo intelectual e científico ainda era exclusivamente masculino (NASCIMENTO, 2004).

Vale destacar ainda que a chegada de imigrantes ao país também fez surgir escolas voltadas aos imigrantes. Algumas eram comunitárias, outras eram particulares, geralmente mantidas por entidades religiosas do país de origem ou laicas. No entanto, essa iniciativa não ocorreu com todos os imigrantes. Destacaram-se, nesse sentido, alemães, italianos, poloneses e japoneses (TRAVERSINI, 1998).

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ENSINO SUPERIOR: No período colonial, existiam no Brasil apenas cursos superiores de Filosofia e Teologia, oferecidos pelos jesuítas, pois Portugal impedia o desenvolvimento do Ensino Superior nas suas colônias, temendo contribuir com os movimentos de independência.

Com a vinda da Família Real Portuguesa para o Brasil, a partir de 1808, o Ensino Superior passou a existir em instituições formais. Foram criadas as escolas de Cirurgia e Anatomia em Salvador (hoje Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia), a de Anatomia e Cirurgia, no Rio de Janeiro (atual Faculdade de Medicina da UFRJ) e a Academia da Guarda Marinha, também no Rio de Janeiro. Dois anos depois foi fundada a Academia Real Militar (atual Escola Nacional de Engenharia da UFRJ). Seguiram-se o curso de Agricultura em 1814 e a Real Academia de Pintura e Escultura.

Foram propostos 24 projetos para criação de faculdades [e não

universidades] no período 1808-1882, mas nenhum deles foi aprovado. Ao Brasil não interessava formação superior, que não trazia mais que formação a poucos profissionais liberais e prestígio social. Depois de 1850 observou-se uma discreta expansão do número de instituições de Ensino Superior, mas a capacidade de investimentos dependia do governo central e de sua vontade política (inexistente). Até o fim do século XIX existiam somente 24 estabelecimentos de Ensino Superior no Brasil, com cerca de 10 mil estudantes, em que se destacava a Faculdade de Medicina (CUNHA, 2007).

Em 19 de abril de 1879, o ministro do Império, Leôncio de Carvalho, propôs a reforma do ensino primário e secundário no município da Corte, e do Ensino Superior em todo o Império, publicando o Decreto de nº 7.247/1879. Todavia, o decreto somente reafirmou a liberdade de criação de escolas particulares quanto à oferta de Ensino Superior no país. Cabia ao Império a fiscalização para a garantia de moralidade e de condições de higiene nesses cursos (MOROSINI, 2005).

As faculdades privadas que funcionassem regularmente pelo período consecutivo de sete anos, com outorga de grau acadêmico para 40 alunos no mínimo, receberiam do governo o título de “faculdade livre”, com todos os privilégios e vantagens outorgadas às escolas oficiais (BRASIL, 1879), § 1º, art. 21 do Decreto 7.247). Conforme Morosini (2005), a criação de cursos superiores no Brasil Império foi marcada por cursos isolados e profissionalizantes, desvinculando teoria e prática. Os principais cursos eram voltados ao ensino médico, engenharia, direito,

ATENCAO

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TÓPICO 1 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO DA EDUCAÇÃO NO PERÍODO COLONIAL E IMPERIAL

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agricultura e artes. A revisão e valorização do Ensino Superior só teve amplitude no país após a Proclamação da República. Ressalta-se ainda que essas instituições não eram universidades, estas só foram criadas a partir do século XX (CUNHA, 2007).

Caro acadêmico! Apresentamos acima como se deu a formação das primeiras faculdades e universidades do Brasil; estas nomenclaturas são muito ouvidas em nossa época e, muitas vezes, não se sabe ao certo o que cada uma significa; agora, neste momento, aproveitamos para diferenciar no que consiste uma instituição de Ensino Superior que é denominada de ‘Universidade’, a que é chamada de ‘Faculdade’ e o que leva o nome de ‘Centro Universitário’.UNIVERSIDADE: oferece atividade de ensino, pesquisa e extensão à comunidade; não precisam de autorização do MEC (Ministério da Educação) para abrir cursos; precisam ter 1/3 do corpo docente de mestres e doutores, 1/3 dos docentes com carga horária integral e pelo menos quatro cursos de pós-graduação stricto sensu.CENTRO UNIVERSITÁRIO: possui curso de graduação em várias áreas do conhecimento e autonomia para criar cursos no Ensino Superior, 1/3 do corpo docente de mestres e doutores e 1/5 dos docentes com carga horária integral.FACULDADE: instituições que oferecem um número mais reduzido de cursos e em uma determinada área do saber, não possuem autonomia para criar cursos sem a autorização do MEC e o corpo docente precisa ter pelo menos pós-graduação lato sensu.Agora lançamos o desafio para que você pesquise as diferenças que existem no que diz respeito às modalidades de pós-graduação, que são lato sensu e stricto sensu. Para tanto, acesse o site do Ministério da Educação, disponível em: <http://www.mec.gov.br/>.

DICAS

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Neste tópico você viu que:

• A educação que prevaleceu na época colonial era oriunda do modelo institucional da Companhia de Jesus, idealizado por Santo Inácio de Loyola, por volta de 1534, a fim de expandir os dogmas e converter fiéis à Igreja Católica.

• Os integrantes da Companhia de Jesus eram chamados de jesuítas e o método que utilizavam foi o da catequese, no qual a função social da educação era de caráter religioso, sendo os clérigos os principais educadores.

• Com a expulsão dos jesuítas e o cumprimento das reformas pombalinas foram implantados, no Brasil, os modelos de educação que se encontravam em voga na época na Europa, que eram os dos pastores Andrew Bell e Joseph Lancaster, que haviam formulado uma modalidade de ensino que previa a indicação e a participação de estudantes mais avançados para atuar como tutores em meio às atividades pedagógicas realizadas pelos professores.

• As reformas pombalinas estavam alinhadas aos valores iluministas, racionalistas e advogavam em defesa do Estado laico.

• A estrutura educacional da época imperial pode ser sintetizada no modelo de aulas régias e liceus; as aulas régias correspondiam ao ensino primário, e os liceus ao ensino secundário; havia pouco interesse e investimento por parte do governo, pois as elites enviavam seus filhos para estudar na Europa.

• Na época imperial formaram-se diversas instituições de ensino, porém extremamente elitistas, que desvalorizavam os trabalhos manuais e as artes, apresentavam restrições às mulheres, que eram mantidas em salas separadas e com conteúdos que tratavam da vida doméstica, maternidade e ensinamentos religiosos.

• Tanto no período colonial como no imperial, o Brasil possuía um Ensino Superior insuficiente, isso se deve ao fato de que no período colonial foi impedida a criação de universidades. Somente no período imperial, a partir da existência de escolas normais, foram emitidos os primeiros títulos em Ensino Superior.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 As ordens religiosas mantidas pela Igreja Católica possuem uma incomensurável importância para o desenvolvimento educacional do Ocidente. Assim compreendendo, pergunta-se: qual é a importância dos jesuítas para a educação brasileira colonial? Assinale a alternativa correta:

a) ( ) Os jesuítas foram apenas mais uma das ordens católicas a pisar o solo brasileiro, sem maior importância que as demais ordens religiosas que aqui trabalharam. b) ( ) Os jesuítas foram os principais religiosos a pregar o evangelho no Brasil colonial, respeitando a diversidade cultural e desejando catequizar os indígenas. c) ( ) Os jesuítas foram os principais religiosos a catequizar os indígenas. Sua ação os fez aprender o idioma tupi-guarani. A sua eficácia nas ações na América Portuguesa chegou a rivalizar com a Coroa, o que explica sua expulsão dos territórios ultramarinos portugueses no século XVIII. d) ( ) Os jesuítas não obtiveram êxito na sua pregação evangélica, em grande parte por se negarem a aprender o idioma indígena. Sua pouca produtividade no processo colonizador foi patente. Por isso, foram expulsos dos territórios ultramarinos portugueses pelo Marquês de Pombal, no século XX.

AUTOATIVIDADE

2 As instituições de Ensino Superior foram criadas no Brasil apenas após a vinda da família real portuguesa, em 1808. Assim compreendendo, pergunta-se: qual é a importância da criação dos cursos superiores no Brasil, a partir da vinda da família real portuguesa para o Rio de Janeiro? Assinale a alternativa correta:

a) ( ) A criação de cursos superiores possibilitou a construção de um pensamento brasileiro autônomo, não mais ligado à antiga metrópole, a Inglaterra. b) ( ) A criação de cursos superiores no Brasil Império não alterou o panorama da educação brasileira.c) ( ) A criação de cursos superiores no Brasil, durante o século XIX, possibilitou uma ampliação do acesso dos brasileiros às faculdades. d) ( ) A criação de cursos superiores no Brasil só aconteceu com a fundação da Universidade de São Paulo, nos anos 1930.

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TÓPICO 2

CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO

EDUCACIONAL NOS PRIMEIROS ANOS DA

REPÚBLICA

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Segundo os estudiosos, foi somente a partir da época imperial e republicana que o Estado/governo passou a assumir a responsabilidade em prover formação escolar à população brasileira. Até então, quem coordenava e monitorava as atividades educacionais desenvolvidas no Brasil era a Igreja Católica, como foi estudado no Tópico 1 desta unidade.

A educação no denominado período da República Velha passou por poucas transformações, se compararmos ao sistema educacional “herdado” do império. Grande parte das instituições de ensino ainda era oriunda do segundo reinado. A principal alteração é a que vincula a educação com as elites políticas.

As elites políticas utilizavam-se da educação como uma ferramenta que alavanca as condições econômica e social na qual se encontravam e galgavam prestígio e integração em espaços e postos superiores. Porém, as novas acomodações do cenário político (monarquia para república) e da nova base econômica (elites das oligarquias agrícolas a elites urbano-industriais) promoveram abalos nas antigas estruturas sociais do país e a demanda por instituições que coordenassem a implantação de um sistema de ensino propriamente dito.

O cenário político que se configurou entre os anos de 1930 e 1964 foi o de concorrência entre o modelo que havia sido hegemônico até os anos de 1930, ou seja, de base agrícola, rural, pecuarista, voltado à exportação e abastecimento do mercado internacional, e outro que almejava promover a industrialização da produção, a urbanização da população e a produção para abastecimento do mercado consumidor interno.

Caro acadêmico! Prossiga na leitura, nas próximas páginas estaremos apresentando conteúdos que ilustram como se deu a ampliação e consolidação da educação pública e o processo de democratização da sociedade brasileira, e como este processo se inseria no contexto histórico e educacional mundial.

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

2 ELEMENTOS EDUCACIONAIS DO BRASIL IMPÉRIO

Por volta de 1870 ocorreram embates entre quem defendia as concepções cientificistas e os setores conservadores ligados ao ensino moralizante dominado pela Igreja Católica, o que gradualmente resultou na ampliação dos conteúdos e na incorporação de disciplinas como Ciências Físicas, História Natural, com a adoção dos preceitos metodológicos das chamadas “lições de coisas” e a inclusão de tópicos sobre História e Geografia Universal, História do Brasil e História Regional (BRASILO, 1997).

Estas mudanças incluíram nas discussões temas sobre o fim da escravidão, a transformação do regime político do Império para a República e a retomada dos debates sobre o ensino laico, visando, cada vez mais, à separação entre o Estado e a Igreja Católica e sua ampliação para outros segmentos sociais.

A precariedade das escolas elementares indicava que entre as propostas de ensino e sua efetivação na sala de aula existiu sempre um hiato. Em geral, as salas de aula eram palco de uma prática bastante simplificada. Por isso, as autoridades escolares exigiam dos professores o cumprimento mínimo da parte obrigatória composta de leitura e escrita, noções de Gramática, princípios de Aritmética e o ensino da doutrina religiosa.

A Constituição Republicana, promulgada em 1891, indicava que o voto era universal, e não mais definido pela renda do cidadão. As condições para ser eleitor eram ter mais de 21 anos, do sexo masculino e ser alfabetizado. Porém, grande parte da população continuou analfabeta, mesmo a alfabetização significando um status social distinto, o de eleitor. Do ponto de vista das instituições de ensino, a Igreja Católica ainda possuía grande importância, sendo mantenedora de grande parte das instituições educacionais, porém, com a laicidade dos Estados Unidos do Brasil, algumas instituições educacionais protestantes e judaicas começaram a ser formadas, algumas delas até hoje presentes no campo educacional brasileiro.

Os materiais didáticos eram escassos, restringindo-se à fala do professor e aos poucos livros didáticos que seguiam o modelo dos catecismos. No final do século XIX, com a abolição da escravatura, a implantação da República, o civismo, o patriotismo, a higiene, a preocupação pela racionalização das relações de trabalho e o processo migratório, atribuiu-se à educação o duplo papel de dar conta de uma formação ao mesmo tempo civilizatória e patriótica.

O ensino era dividido em primário, até a 4ª série. Posteriormente, viria o Curso Ginasial, de também quatro anos de duração. Havia a chamada Prova de Admissão ao Ginasial, um exame que selecionava os alunos mais capazes. E, por fim, o Clássico e o Científico, que corresponderiam ao atual Ensino Médio. O Clássico mais ligado a áreas humanas, e o Científico mais ligado às ciências exatas. Todavia, o único colégio responsável por ministrar o segundo grau em todo o território nacional era o Colégio D. Pedro II, da capital da República.

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TÓPICO 2 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL NOS PRIMEIROS ANOS DA REPÚBLICA

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Porém, alguns estabelecimentos de ensino das capitais dos principais estados, além de ter vários ginásios, pediam a equiparação ao Colégio Pedro II, possibilitando, assim, um aumento no número de matrículas. Contudo, o processo de equiparação se tratava de um procedimento difícil. Com isso era comum muitos dos filhos das elites estaduais estudarem como internos no Colégio Pedro II.

O Colégio D. Pedro II representava uma instituição moderna, dividida em salas, pátios e jardins, que deveriam conter ambientes limpos e higiênicos, favoráveis às atividades físicas. Júnior (2012, p. 64) explica que:

Essa organização do espaço físico possibilitou uma nova estrutura escolar, com a reunião de vários professores e de um corpo técnico-administrativo, formado por diretores e funcionários, exigindo, assim, a elaboração de regimes e cumprimentos de rotinas burocráticas. Ou seja, foram instituídos horários para início e fim das aulas, normas de conduta a serem seguidas por todos os alunos e professores, o surgimento da figura do diretor, como o principal cargo dentro desse universo.

Júnior (2012) explica que foram incluídas novas disciplinas no currículo escolar, tais como ciências físicas e naturais, história, geografia, música, geometria, instrução moral, educação física, desenho, instrução cívica e trabalhos manuais, o que por sua vez ia ao encontro da proposta republicana de formar um cidadão apto a desempenhar diversas funções na sociedade, por isso a preocupação de aumentar as disciplinas obrigatórias.

Tratou-se de uma união de disciplinas que envolviam tanto o trabalho

mental (história, geografia, instrução moral e cívica etc.) como disciplinas voltadas para trabalhos manuais (música, desenho, etc.), o que culminaria nos preceitos de educação integral que almejava a educação física, intelectual e moral, defendida pelo teórico inglês Herbert Spencer, na obra intitulada "Educação intelectual, moral e física", publicada na segunda metade do século XIX. Rui Barbosa foi um dos intelectuais a recomendar a obra de Spencer à realidade brasileira.

A herança do Império brasileiro em que a educação era direcionada para a elite (em 1900, 75% da população era analfabeta), valorizando o ensino secundário e superior em detrimento da formação primária e profissional, que atingia as camadas mais pobres, continuou no início dos primeiros governos presidenciais. O Código Epitácio Pessoa, criado em 1901, incluía a Lógica entre as matérias ministradas nas escolas imperiais e retirava a Biologia, a Sociologia e a Moral, acentuando a literatura e não a ciência.

O cenário social dos primeiros anos da República brasileira foi o da entrada de fortes levas de imigrantes europeus (italianos, alemães, poloneses, japoneses, judeus alemães), que por sua vez atuariam tanto nas lavouras de café e regiões agrícolas do Brasil e nas vagas que as indústrias pudessem necessitar.

A pintura de Tarsila do Amaral que apresentamos a seguir ilustra a diversidade social que passava a compor as cidades do Brasil da época. A

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

concentração da população se deu nas principais capitais do Brasil, pois lá estavam as oportunidades de trabalho no campo da indústria, no comércio e nos espaços públicos das unidades do governo.

FIGURA 27 - OPERÁRIOS. TARSILA DO AMARAL, 1933, ÓLEO SOBRE TELA

FONTE: Disponível em: <http://acervo.novaescola.org.br/arte/pratica-pedagogica/tem-muitas-historias-brasil-telas-tarsila-424884.shtml>. Acesso em: 31 out. 2016.

As primeiras décadas do século XX foram de forte diversidade populacional. Nos espaços urbanos cresceu a organização de trabalhadores em sindicatos que militavam por melhores condições de trabalho, salário, direitos e moradia. A organização dos movimentos foi favorecida pela presença dos imigrantes europeus que já conheciam as lutas operárias e a organização sindical na Europa. Destaque do jornal Correio Paulistano abordando a grande confusão reinante no ano de 1917, em São Paulo, por conta da grande greve dos operários, que lutavam por melhores salários e condições mais dignas de trabalho, observe a manchete a seguir:

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TÓPICO 2 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL NOS PRIMEIROS ANOS DA REPÚBLICA

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FIGURA 28 - AGITAÇÃO SOCIAL NO COMEÇO DO SÉCULO XX

FONTE: Jornal Correio Paulista de 14/07/1917

APROPRIAÇÃO SIGNIFICATIVACaro acadêmico! Aproveite este anúncio de jornal, que significa uma fonte primária, para se apropriar de outros elementos além da notícia sobre o movimento operário de São Paulo nos anos de 1917. Procure compreender também como ocorria a mobilização dos movimentos sociais, como se dava a reação das forças do governo diante das agitações sociais, assim como o jornal retratou o ocorrido, e, por fim os elementos ortográficos que faziam parte da língua portuguesa na época.

O cenário político foi o de diversas correntes que chegavam da Europa ao Brasil, porém marcadas por confusões no que diz respeito às ideologias que cada uma pregava. Atente aos estudos e explicações de Carvalho (1987, p. 42): “Liberalismo, positivismo, socialismo, anarquismo misturavam-se e combinavam-se das maneiras mais esdrúxulas na boca e na pena das pessoas mais inesperadas”.

DICAS

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Carvalho (1990) explica que após a Proclamação da República existiam no Brasil pelo menos três correntes políticas que disputavam a hegemonia no cenário político nacional, sendo elas: o liberalismo à americana, o jacobinismo à francesa e o positivismo, que travaram disputas acirradas ao longo dos primeiros anos da República, porém o ‘liberalismo americano’ sobressaiu-se.

Os anos de 1920 foram marcados por crises generalizadas no cenário educacional. O modelo elitista entrou em crise, bem como outras áreas sociais: o controle político dos coronéis da cultura café com leite (São Paulo e Minas Gerais), as fraudes nas eleições (falsificações de documentos, mortos que votavam e o voto exclusivo para homens maiores de 21 anos), a classe média oprimida, a crise econômica do café nos mercados internacionais, tudo isso gerou uma frustração no ideal democrático.

Este contexto culminou na Semana de Arte Moderna, em 1922, com representantes das artes plásticas, música, arquitetura e literatura propondo uma cultura autenticamente brasileira. Essas crises desencadearam muitas discussões polêmicas, que resultaram na fundação da Associação Brasileira de Educação (ABE), em 1924.

Em conferências para debater a educação, sugestões de profissionais renomados foram levantadas pelo jornal “O Estado de São Paulo”, em 1926, dirigido por Fernando Azevedo, em relação a soluções para o sistema educacional, muitas das quais colocadas em prática. Nas reformas educacionais em diversos estados brasileiros, durante toda a década de 1920, melhorou-se consideravelmente o ensino primário e secundário, ainda responsabilidades dos estados (destacam-se aqui as iniciativas dos estados de São Paulo, Ceará, Bahia, Minas Gerais e, sobretudo, do Distrito Federal, de maior repercussão).

Entre os principais intelectuais que pensaram a educação brasileira no

período entre a Proclamação da República e a Revolução de 1930, está a figura de Antônio Carneiro Leão. Formado pela prestigiosa Escola de Direito do Recife, suas ações como educador podem ser apontadas tanto na produção literária quanto na ação política. Enquanto produtor de livros sobre temáticas educacionais, sua estreia foi em 1909, com o livro de título Educação.

Em 1917, Leão publicou O Brasil e a educação popular. Morto em 1966, recebeu importantes títulos honoríficos no estrangeiro, como Doutor Honoris Causa, pela Universidade de Paris (Sorbone) e pela Universidade Autônoma do México. Quando na função de gestão, foi secretário no então Distrito Federal (Rio de Janeiro) e em Pernambuco, oportunidades nas quais se caracterizou por abrir escolas.

Foi um momento de profundas mudanças em meio à sociedade brasileira,

quando ocorreu ampla modernização nas principais cidades/capitais do Brasil, arruamentos e sistemas de transporte, reformulação de prisões, hospitais e escolas, tendo como referência os modelos e métodos positivistas e científicos europeus. Toda a movimentação pela qual o Brasil passou ficou também conhecida como belle époque (bela época).

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Conforme explica Foucault (1987), a modernização poderia ser traduzida como a ideologia de controle, que se multiplicou por todo o corpo social, formando o que se pode chamar de sociedade disciplinar. A ideologia de controle abrangia hospitais, manicômios, prisões, escolas, praças, cemitérios, entre outros espaços públicos de convivência, de circulação, de comum uso da população; e seria instalado um regime que invadiria e vigiaria o comportamento e os costumes dos indivíduos nestes espaços.

As posturas da racionalidade organizacional e positivista foram e ainda são possíveis de se observar na organização interna das escolas, nos espaços das salas de aula; nos hospitais, com os leitos de internação; no exército, na apresentação dos recrutas; nos restaurantes, em torno dos buffets; nos bancos e no comércio, no momento do pagamento de produtos ou serviços; e até no interior das igrejas, na disposição dos bancos para os fiéis se acomodarem.

Assim como a sociedade, a educação brasileira passou por profundas transformações após a Revolução de 1930. A partir desta data, tivemos várias ações que viabilizaram uma melhora no nível e acesso à educação no Brasil. Uma importante medida foi a criação, em 1931, do Ministério da Educação e da Saúde. Posteriormente, em 1932, tivemos o Manifesto dos Pioneiros da Nova Educação. O Manifesto teve ampla repercussão nos meios políticos-educacionais, e foi um importante marco para a ampliação do acesso e aumento da qualidade educacional. Porém, podemos relacionar este manifesto às transformações sociais por que passou o Brasil nos anos 1920.

Júnior (2012) explica que os fundamentos da Escola Nova consistiam em ampliar a importância dos processos de aprendizagem e amenizar a ênfase que era atribuída ao grande número de conteúdos lecionados em sala de aula.

2.1 DIRETRIZES DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA APÓS OS ANOS DE 1930

As mudanças educacionais também alteraram as características políticas brasileiras. Durante a década de 1920 ocorreu o Movimento dos 18 do Forte, também chamado de Revolta do Forte de Copacabana (1922). Este movimento desejava a queda da República Velha, ou seja, o fim do poder nas mãos dos coronéis da cultura café com leite. Sob o comando do Capitão Euclides Hermes da Fonseca, esse movimento, isolado e facilmente controlado pelo governo, originou, com muitas vítimas, um sentimento patriótico que segmentou outras revoltas, como a Coluna Prestes (uma marcha de soldados pelo Brasil, que durante dois anos e meio (1924-1927) tentou a adesão da população contra a opressão do governo, o voto secreto e ensino primário público e gratuito para todos). Liderada por Luís Carlos Prestes, também chamado de Cavaleiro da Esperança, originou o ideal do Soldado Cidadão e culminou na criação dos ideais da Revolução de 1930, que eclodiu logo em seguida.

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Uma das importantes medidas das elites brasileiras foi a de buscar instituir universidades no país. Uma das motivações foi a visita, em 1922, do rei Alberto, da Bélgica, ao Brasil. Quando quis visitar a universidade brasileira, foi informado de que no Brasil não existiam universidades.

Além disso, contribuiu para a Revolução de 1930, no que se refere à educação, a realização de diversas reformas de abrangência estadual, como a de Lourenço Filho, no Ceará, em 1923; a de Anísio Teixeira, na Bahia, em 1925; a de Francisco Campos e Mario Casassanta, em Minas, em 1927; a de Fernando de Azevedo, no Distrito Federal (atual Rio de Janeiro), em 1928, e a de Carneiro Leão, em Pernambuco, em 1928.

Em 1932, um manifesto denominado Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, escrito durante o governo de Getúlio Vargas, por diferentes segmentos da elite intelectual, inclusive de posicionamentos diferentes, vislumbrava interferir na educação do país, revolucionando-a. Entre os 26 intelectuais que assinaram o Manifesto destacam-se Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira, Afrânio Peixoto, Lourenço Filho, Antônio F. Almeida Junior, Roquette Pinto, Delgado de Carvalho, Hermes Lima e Cecília Meireles. Além de criticar o ensino e sua organização, sugeria um plano educacional que se propunha público, laico, obrigatório e gratuito.

Segundo Aranha (2006, p. 263),

[...] um movimento que defendia a educação ativista, a partir da renovação da pesquisa pedagógica, na busca teórica dos fundamentos filosóficos e científicos de uma prática educativa mais eficaz. Ao lado de uma atenção especial na formação do cidadão em uma sociedade democrática e plural – que estimulava o processo de socialização da criança –, havia o empenho em desenvolver a individualidade, a autonomia, o que só seria possível em uma escola não autoritária que permitisse ao educando aprender por si mesmo, e aprender fazendo.

Embora duramente criticado pela Igreja, detentora de expressiva parcela de escolas da rede privada na sociedade, o manifesto conseguiu orientar (até os dias de hoje) algumas mudanças na concepção pedagógica e na forma de olhar para o ensino (SANDER, 2007). Observe um trecho do documento que apresentamos a seguir:

Ora, se a educação está intimamente vinculada à filosofia de cada época, que lhe define o caráter, rasgando sempre novas perspectivas ao pensamento pedagógico, a educação nova não pode deixar de ser uma reação categórica, intencional e sistemática contra a velha estrutura do serviço educacional, artificial e verbalista, montada para uma concepção vencida. Desprendendo-se dos interesses de classes, a que ela tem servido, a educação perde o "sentido aristológico", para usar a expressão de Ernesto Nelson, deixa de constituir um privilégio determinado pela condição econômica e social do indivíduo, para assumir um "caráter biológico", com que ela se organiza para a coletividade em geral, reconhecendo a todo o indivíduo o direito a ser educado até onde o permitam as suas aptidões naturais, independente de razões de ordem econômica e social. A educação nova, alargando a sua finalidade para

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TÓPICO 2 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL NOS PRIMEIROS ANOS DA REPÚBLICA

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além dos limites das classes, assume, com uma feição mais humana, a sua verdadeira função social, preparando-se para formar "a hierarquia democrática" pela "hierarquia das capacidades", recrutadas em todos os grupos sociais, a que se abrem as mesmas oportunidades de educação. Ela tem, por objeto, organizar e desenvolver os meios de ação durável com o fim de "dirigir o desenvolvimento natural e integral do ser humano em cada uma das etapas de seu crescimento", de acordo com uma certa concepção do mundo. [...] A diversidade de conceitos da vida provém, em parte, das diferenças de classes e, em parte, da variedade de conteúdo na noção de "qualidade socialmente útil", conforme o ângulo visual de cada uma das classes ou grupos sociais. A educação nova que, certamente pragmática, se propõe ao fim de servir não aos interesses de classes, mas aos interesses do indivíduo, e que se funda sobre o princípio da vinculação da escola com o meio social, tem o seu ideal condicionado pela vida social atual, mas profundamente humano, de solidariedade, de serviço social e cooperação. (MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO NOVA, Finalidades da Educação, 1932).

A crítica de que a educação brasileira servia apenas a um grupo social, às elites, marca o tom do manifesto, e em contrapartida seus autores defendem uma educação que dê conta de desenvolver competências e habilidades a todo e qualquer indivíduo, ou seja, que tenha alcance universal e que seja democrática. Os autores do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, a fim de alcançar os objetivos e abordagem que estavam reclamando à educação brasileira, estruturaram um plano educacional nos seguintes termos:

A estrutura do plano educacional corresponde, na hierarquia de suas instituições escolares (escola infantil ou pré-primária; primária; secundária e superior ou universitária) aos quatro grandes períodos que apresenta o desenvolvimento natural do ser humano. É uma reforma integral da organização e dos métodos de toda a educação nacional, dentro do mesmo espírito que substitui o conceito estático do ensino por um conceito dinâmico, fazendo um apelo, dos jardins de infância à Universidade, não à receptividade mas à atividade criadora do aluno. A partir da escola infantil (4 a 6 anos) à Universidade, com escala pela educação primária (7 a 12) e pela secundária (l2 a 18 anos), a "continuação ininterrupta de esforços criadores" deve levar à formação da personalidade integral do aluno e ao desenvolvimento de sua faculdade produtora e de seu poder criador, pela aplicação, na escola, para a aquisição ativa de conhecimentos, dos mesmos métodos (observação, pesquisa, e experiência), que segue o espírito maduro, nas investigações científicas. A escola secundária, unificada para se evitar o divórcio entre os trabalhadores manuais e intelectuais, terá uma sólida base comum de cultura geral (3 anos), para a posterior bifurcação (dos 15 aos 18), em seção de preponderância intelectual (com os 3 ciclos de humanidades modernas; ciências físicas e matemáticas; e ciências químicas e biológicas), e em seção de preferência manual, ramificada por sua vez, em ciclos, escolas ou cursos destinados à preparação às atividades profissionais, decorrentes da extração de matérias-primas (escolas agrícolas, de mineração e de pesca) da elaboração das matérias-primas (industriais e profissionais) e da distribuição dos produtos elaborados (transportes, comunicações e comércio). (MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO NOVA, Plano de reconstrução educacional, 1932).

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Os pioneiros reclamam por uma educação criativa, não estática, que esteja atenta à formação integral dos estudantes, que abranja o campo científico e prático, que associe atividades manuais e atividades intelectuais para os temas de cultura geral, humanidades e ciências cada vez mais ramificadas e aprofundadas.

Com métodos ativos, com aulas mais dinâmicas, centradas nas atividades do aluno, com a realização de trabalhos concretos como fazer maquetes, visitar museus, assistir a filmes, comparar fatos e épocas, coordenar os conhecimentos históricos aos geográficos, quando o que predominava era a memorização e as festividades cívicas, que passaram a ser parte fundamental do cotidiano escolar. Porém, a prática no interior das salas de aula continuou sendo a de recitar as “lições de cor”, com datas e nomes dos personagens considerados mais significativos da História (PCN, 1997).

FIGURA 29 - INTEGRANTES DO MANIFESTO DOS PIONEIROS DA ESCOLA NOVA, 1936

FONTE: Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/c/ce/Manuel_Bandeira%2C_Alceu_Amoroso_Lima%2C_H%C3%A9lder_C%C3%A2mara%2C_Louren%C3%A7o_Filho%2C_Roquette_Pinto_e_Gustavo_Capanema.jpg>. Acesso em: 5 nov. 2016.

Em 1930 havia sido criado o Ministério da Educação e Saúde. Da junção de diversas instituições foram fundadas algumas universidades. As primeiras a serem instituídas foram a Universidade do Distrito Federal, no Rio de Janeiro, e a Universidade de São Paulo (USP). Grande parte dos professores contratados eram estrangeiros, vieram ao Brasil para lecionar nos cursos recém-criados. A Universidade do Distrito Federal foi fechada por problemas políticos advindos do

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Estado Novo. Em seu lugar foi inaugurada a Universidade do Brasil, que após o golpe militar de 1964 foi rebatizada como Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A tradição colonial dos filhos das elites irem para a Europa estudar, que no império “diminuiu”, após os anos 1930 diminuiu ainda mais. A Constituição de 1934, promulgada por Getúlio Vargas, apontava a necessidade de se implantar um Plano Nacional de Educação, o qual estabeleceu competências no interior dos níveis administrativos, regulamentou e fixou os financiamentos de cotas específicas de verbas à federação, aos estados e aos municípios. Por conseguinte, implantou-se a gratuidade, a obrigatoriedade e o ensino religioso tornou-se optativo.

Na Constituição de 1937 avançou-se no sentido de que se incluiu o ensino profissionalizante e de que os grupos industriais e os sindicatos deveriam criar escolas de aprendizagem e aperfeiçoamento em áreas especializadas para atender aos trabalhadores sindicalizados, aos seus familiares e à comunidade. Na mesma Constituição constava que os conteúdos de educação moral e política se tornavam obrigatórios nos currículos escolares.

Com o fim do Estado Novo, tivemos uma grande disputa política, que caracterizou os debates sobre a educação entre 1945 e 1964: a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Uma das principais polêmicas era se o ensino deveria ser laico ou religioso. Polêmicas que eram refletidas nas disputas eleitorais para a Presidência da República.

Entre os presidentes que se destacaram no período em relação à educação, podemos destacar os governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubistchek. No governo Getúlio Vargas tivemos a fundação de instituições que auxiliaram sobremaneira a expansão do Ensino Superior e de pós-graduação no Brasil: a fundação da CAPES e do CNPq. O CNPq é um órgão, de título Central Nacional de Pesquisas, e foi idealizado pelo Almirante Álvaro Alberto, tendo como função fomentar a pesquisa científica no Brasil. A CAPES é a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior e tem como função desenvolver a pós-graduação no país.

Acesse os sites:CAPES: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior: <http://www.capes.gov.br/>.CNPQ: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico: <http://www.cnpq.br/>.

DICAS

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Estes órgãos foram fundamentais para o aumento das universidades nos diversos Estados brasileiros, pois foram os responsáveis por formar os professores de nível superior. A educação no governo Juscelino Kubistchek foi um dos temas dos Planos de Metas. Uma das metas era, justamente, construir uma universidade federal em cada capital de estado da federação. O que possibilitou uma melhora geral no ensino brasileiro, ao aumentar as portas de acesso ao Ensino Superior.

Caro acadêmico! Para que você possa compor uma análise mais próxima das condições educacionais do país e de sua população, observe o quadro a seguir, procurando perceber relações que existem entre as décadas, a relação que existe entre o local de residência (rural ou urbana), a localização das escolas (urbana) e o número de analfabetismo da população brasileira:

QUADRO 7: Números da população, residência e índice de analfabetismo, Brasil, 1920-1950

Indicadores 1900 1920 1940 1950

População total 17.438.434 30.635.605 41.236.315 51.944.397

% da população urbana 10 16 31 36

% de analfabetos 65,3 69,9 56,2 50,0

FONTE: Adaptado de Lourenço Filho (1970)

O quadro ilustra os desafios que existiam em termos de percentuais de analfabetismo na primeira metade do século XX. Os dados presentes nas décadas de 1900 e 1920 ilustram os resultados obtidos por meio das políticas de governo desde a implantação da República, que foi de aumento dos índices de analfabetismo, bem como as políticas de modernização das instituições e das políticas de urbanização da população; os dados precisam ser pensados num contexto social mais amplo, que foi o de aumento da população, através de nascimentos e das ondas de imigrações europeias e asiáticas, dados que foram responsáveis por originar boa parte dos objetivos dos intelectuais do Movimento dos Pioneiros da Educação Nova.

Os dados das décadas de 1940 e 1950 ilustram os resultados que foram

alcançados pelas políticas educacionais de governo a partir dos anos de 1930, ou seja, em meio ao governo de Getúlio Vargas, da criação do MEC e pelo Movimento dos Pioneiros da Escola Nova. Entre os anos de 1920 a 1950, ou seja, num intervalo de 30 anos, o alcance da redução do índice de analfabetismo foi de quase 20%.

Não se pode esquecer que as unidades escolares não conseguiam atender

aos brasileiros que residiam nas regiões mais afastadas dos centros urbanos e das capitais do país, e que os números de analfabetismo passaram a ser alterados significativamente a partir do momento em que a população passou a migrar e residir nas cidades.

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TÓPICO 2 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL NOS PRIMEIROS ANOS DA REPÚBLICA

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2.2 O LEGADO DE ANÍSIO TEIXEIRA: O DEFENSOR DA ESCOLA NOVA NO BRASIL

Anísio Teixeira (1900-1971), nascido na cidade de Caetité, no interior da Bahia, foi um jurista, intelectual e educador responsável por difundir os conceitos e valores do pedagogo norte-americano John Dewey e da Escola Nova, com quem teve contato e firmou amizade em uma viagem feita aos Estados Unidos da América. No retorno ao Brasil, se dedicou a viabilizar a adaptação à realidade brasileira e a vislumbrar a concretização prática de tais ideais, por meio da qual preconizava o ensino público, gratuito, obrigatório, integral e laico.

Contribuiu significativamente na reforma do ensino no Estado da Bahia e no Rio de Janeiro, e em 1935 foi o personagem fundamental na consolidação da Universidade do Distrito Federal-UDF, na cidade do Rio de Janeiro, capital do Brasil na época. A universidade funcionava com as escolas de Ciências, Educação, Economia e Direito, Filosofia e Instituto de Artes, e contou com a colaboração dos professores e intelectuais franceses Eugène Albertini, Henry Hauser, Jacques Perro. Porém, em 1937, em meio a agitações políticas, a universidade foi fechada, os estudantes e o quadro de professores foram transferidos para a Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, cuja orientação ideológica foi católico-cristã.

Caro acadêmico! Deixemos este dissabor de lado e nos centremos um pouco mais na produção intelectual de Anísio Teixeira. Entre os principais trabalhos publicados tem-se o “A Educação não é privilégio”, publicado em 1953, que consiste em uma reunião de vários textos; “A escola pública, universal e gratuita”, de 1956; “A educação e a formação nacional do povo brasileiro”, de 1959; “A educação é um direito”, de 1968.

Para Teixeira é fundamental o financiamento estatal do ensino, pois este deve atender à esfera pública. A escola primária é para o autor a mais importante escola do sistema de educação, ao ponto de que o Ensino Superior existe porque o homem foi capaz de inventar a arte da escrita e porque as pessoas a dominam. A capacidade de ler, escrever, somar, subtrair, dividir e multiplicar possibilitou todo o desenvolvimento do dito mundo ocidental. É realmente fundamental termos o domínio destas simples, pequenas e fundamentais operações, pois exercem papel primordial no exercício e atividade de libertação do homem (FREIRE, 1987).

Anísio Teixeira foi autor de importantes livros educacionais, como “A Educação Não é privilégio”, no qual apontou as principais deficiências e desafios da educação brasileira. Em especial, as dificuldades da formação dos professores, e a necessidade de se ter uma formação universitária para os docentes do ensino primário.

Para Teixeira, era muito grave que o ensino primário no Brasil não fosse tratado como prioridade, denunciava que o país contava com centros universitários comparados com os do ‘primeiro-mundo’, porém não conseguia oferecer a toda

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

população ensino público elementar com qualidade. O modelo ideal de escola pública ao qual se dedicou Anísio foi o de escola integral. Para dar conta de tal tese ele fundou, em Salvador, uma escola modelo chamada Carneiro Ribeiro.

O professor Anísio foi o responsável por uma das principais experiências educacionais: A Escola de Ensino Integral Carneiro Ribeiro, instalada em um dos bairros mais pobres de Salvador, a capital baiana, e seguindo a inspiração teórica do escolanovismo norte-americano de John Dewey, sua proposta era a de uma escola na qual as crianças ficavam o dia inteiro na unidade educacional, tendo, além do ensino formal, aulas com capacitação técnica ou atividades lúdicas, como carpintaria, música e teatro. Nesta escola, o horário de funcionamento foi dividido em dois períodos, um de instrução em classe, outro de trabalho, educação física, atividades propriamente sociais e atividades artísticas; funcionava como um semi-internato, recebendo os alunos às 7 horas e 30 minutos e devolvendo-os às famílias às 4 horas e 30 minutos da tarde.

O projeto de Anísio Teixeira de educação integral foi revisitado por diversos

estudiosos e lideranças políticas, porém, na época, foi taxado de marxista, comunista e subversivo. Sempre se apresentou muito consciente da dependência e influência estrangeira sobre a intelectualidade brasileira, diante da qual se posicionava no sentido de que, apesar de havermos copiado as instituições políticas do modelo da América do Norte, havíamos buscado inspiração ao campo educacional na França e demais países da Europa (TEIXEIRA, 1977).

Entre as críticas que foram feitas ao pensamento e projeto de Anísio tem-se a do governo do general Ernesto Geisel (1997, p. 322), que se manifestou nos seguintes termos:

É uma escola que se propõe substituir o lar. A família só vai tomar conhecimento da criança praticamente na hora em que ela vai dormir, e talvez aos sábados e domingos. O resto da semana as crianças estão, pelo menos teoricamente, desligadas dos pais. Pode ser que eu esteja pensando como velho, avesso ao que é considerado moderno hoje em dia, mas creio que não é bom sistema. Dizem que é uma ideia antiga do Anísio Teixeira, que foi um grande educador. Mas não se pode isolar um problema no Brasil... As coisas estão interligadas.

O modelo de ensino proposto por Teixeira nos anos de 1950 foi responsável também por denunciar a fragilidade do contexto econômico e social das famílias que precisavam trabalhar para garantir o sustento da casa, deixando assim os filhos vulneráveis e expostos a todos os tipos de infortúnios e desvios possíveis.

Como reflexo e resultado de uma boa educação primária teríamos a possibilidade de mobilidade social, pois no modelo liberal de vida a competição está presente, sendo que todos os cidadãos brasileiros teriam a mesma possibilidade inicial de desenvolvimento pessoal, onde teríamos o perfeito desenvolvimento do ideal liberal. Porém, as elites jamais irão permitir que tal fato ocorra, observe as palavras do próprio Anísio Teixeira:

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Ora, a educação não foi considerada necessidade para o funcionamento da nova sociedade. Ficara relegada também à iniciativa privada. E assim aos que tivessem recursos para consegui-la. Deste modo, a sociedade democrática pode ir aos poucos se fazendo oligárquica, e deste modo, aristocrática” (TEIXEIRA, 1977, p. 153).

A ideia de ensino integral, proposta por Anísio Teixeira, foi posta em prática no Rio de Janeiro nos anos 1980, quando Darcy Ribeiro ocupou o cargo de secretário de Educação. Foram criados os chamados CIEPs - Centros Integrados de Educação Pública, que nada mais eram que o estabelecimento de uma rede de ensino nos moldes da experiência do Colégio Carneiro Ribeiro, de Salvador. Porém, devido a problemas políticos, a iniciativa não prosperou. Anísio Teixeira morreu em um provável atentado à sua vida, sendo achado morto na cisterna de um prédio no Rio de Janeiro, em 1971, durante a vigência da ditadura militar. A proposta de Teixeira é frequentemente mencionada também em discursos políticos eleitorais, em especial no que diz respeito ao projeto de educação integral, porém em poucas cidades foi levada a cabo.

Uma indicação para saber mais sobre a vida e a importância do legado de Anísio Teixeira para a educação brasileira é o site da Biblioteca Virtual Anísio Teixeira, disponibilizado pela Universidade Federal da Bahia. Biblioteca Virtual Anísio Teixeira: <http://www.bvanisioteixeira.ufba.br/>.

DICAS

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Ao longo desta unidade você pôde estudar que:

• O contexto histórico e filosófico da educação brasileira dos primeiros anos da República consistiu na continuidade da herança do legado da época imperial, ou seja, em que as elites se apropriavam da educação como forma de manutenção do status e da condição econômica.

• O ensino dos primeiros anos da República foi dividido em ensino primário (até a 4ª série), ginásio (quatro anos após o primário) e clássico e científico (Ensino Médio, o primeiro com ênfase em ciências humanas e o segundo às ciências exatas).

• A partir dos anos de 1920 passam a ocorrer mudanças significativas nas estruturas políticas, sociais e educacionais, que abalam as estruturas nas quais o contexto histórico e filosófico brasileiro havia se sustentado até então.

• Os anos de 1920 foram marcados por forte organização de movimentos sociais, entre eles o movimento operário e rupturas no cenário político, em que a política do café com leite foi abalada pela crise interacional e pelo movimento político liderado por Getúlio Vargas.

• A Escola Nova norte-americana foi adaptada na realidade brasileira dos anos de 1920 por meio do movimento ‘pioneiros da nova escola’.

• A partir dos anos de 1930, em meio ao governo de Getúlio Vargas, foram criados o Ministério da Educação e Saúde, o Plano Nacional de Educação, a CAPES, o Cnpq e a Universidade de São Paulo.

• Nos anos de 1920, o percentual de analfabetos chegava a 69,9%, isso se deve ao fato de que o ensino priorizava a formação das elites e as unidades escolares localizavam-se nas principais cidades e capitais do Brasil.

• Anísio Teixeira, em sua obra “A educação não é privilégio”, defendia os valores da matriz de pensamento norte-americana ‘escola nova’, que eram os de ensino público, gratuito, obrigatório, integral e laico, que compreendia fortemente o compromisso do Estado/nação na oferta de ensino à população brasileira.

RESUMO DO TÓPICO 2

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AUTOATIVIDADE

1 Anísio Teixeira, que defendia a adaptação na realidade brasileira do modelo norte-americano conhecido como ‘A Escola Nova’, foi um dos principais intelectuais a reclamar por mudanças no campo da educação, sendo muitas vezes mal compreendido e vítima de perseguições. No que diz respeito às sugestões de Teixeira para a formação e qualificação dos profissionais que atuavam na educação, é correto afirmar que:

a) ( ) Os professores de educação primária deveriam possuir formação em Ensino Superior.b) ( ) Os professores de educação secundária deveriam possuir formação em ensino técnico.c) ( ) Os professores em educação primária deveriam possuir formação em Ensino Médio.d) ( ) Os professores em educação secundária deveriam possuir formação em nível de pós-graduação.

2 Adaptado de ENADE, Pedagogia, 2011.

John Dewey foi um filósofo, psicólogo e pedagogo, nascido nos Estados Unidos da América, que se posicionou a favor do conceito de Escola Ativa, na qual a educação do estudante deve ser voltada ao pensar, transformar uma capacidade natural em hábito, por meio de uma atividade, de forma cooperativa. O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que ocorreu em 1932, está relacionado com as preocupações educacionais da década de 1920 e a Escola Ativa. Considerando essas ideias, redija um texto dissertativo acerca do seguinte tema: O Movimento Escolanovista. Em seu texto, aborde os seguintes aspectos:

a) relação do escolanovismo com a democracia;b) caracterização do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova.

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TÓPICO 3

CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO

EDUCACIONAL DA SEGUNDA METADE DO

SÉCULO XX

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico! Foi possível estudar que desde o século XIX, em especial com o movimento da Escola Nova, os teóricos defendiam a necessidade de se manter um currículo humanístico que favorecia os estudos das línguas (latim, grego e língua nacional), de oratória, o que cumpria a missão de disciplinar a mente com o uso das obras literárias, e o domínio oral escrito da cultura clássica, e ainda atendia aos interesses e necessidades de formação e preparação intelectual das elites.

No que diz respeito às instituições educacionais, tem-se que em 1837 se deu a fundação da primeira escola pública brasileira, e no século XX, a partir da década de 1930, se deu a instalação dos primeiros cursos em nível superior.

E agora pergunta-se, com a preocupação de despertar o senso crítico reflexivo sobre os processos históricos a partir da dinâmica social e intelectual da segunda metade do século XX, que perfil escolar e de letramento vai se configurar no Brasil.

2 A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃONACIONAL – LDB

A luta pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação se inicia com o Manifesto dos Pioneiros da Educação em 1932, passa pela Constituinte de 1946 e só foi aprovada em 1961. Nos anos 1960 ocorreram alguns importantes avanços educacionais: a LDB de 1961, a UNB e as propostas de alfabetização de Paulo Freire.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB foi promulgada

em 1961, baseada em longos debates, nos quais se opunham os favoráveis à ação do Estado na educação, como os educadores Lourenço Filho e Anísio Teixeira, e, de outro lado o deputado Carlos Lacerda, que acusava o Estado de querer monopolizar a educação, tendo apresentado um projeto de lei buscando garantir

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

182

a existência de escolas particulares. As igrejas cristãs, tradicionais proprietárias de escolas privadas confessionais, eram as grandes interessadas em manter o ensino particular.

Caro acadêmico! Agora vamos analisar parte do conteúdo e dispositivos da Lei nº 4.024:

• Tanto o setor público como o setor privado têm o direito de ministrar o ensino em todos os níveis.

• O Estado pode subvencionar a iniciativa particular no oferecimento de serviços educacionais.

• O ensino pré-primário correspondia às escolas maternais e jardins de infância. Ensino primário de quatro anos, com possibilidade de acréscimo de mais dois anos para programa de artes aplicadas.

• Ensino Médio, subdividido em dois ciclos: o ginasial, de quatro anos, e o colegial, de três anos. Ambos compreendiam o ensino secundário e o ensino técnico (industrial, agrícola, comercial e de formação de professores).

• Ensino Superior: flexibilidade de organização curricular, o que não pressupõe um currículo fixo e único em todo o território nacional.

A lei que abordava, organizava e estabelecia as diretrizes da educação no Brasil foi forjada em meio a disputas políticas e do interesse de grupos econômicos. O cenário educacional no qual a LDB foi apresentada e votada era o de que até os anos de 1950 o país contava com 50% de sua população analfabeta. Observe a tabela a seguir:

Indicadores 1950 1960 1970

População total 51.944.397 70.119.071 94.501.554

% da população urbana 36 46 56

% de analfabetos 50,00 39,5 33,1

A partir dos anos de 1960 e 1970 os índices de analfabetismo foram reduzidos de forma significativa, mais de 15% num intervalo de 20 anos. Por outro lado, foram as décadas em que o país quase alcançou os 100.000.000 de habitantes, assim como foi o intervalo de tempo em que o número da população urbana superou a população que residia na área rural.

A Universidade de Brasília-UNB foi organizada pelos educadores Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro e tinha uma proposta inovadora para o Ensino Superior, visando ao estabelecimento da pós-graduação. Porém, o projeto original foi alterado após a ditadura militar. Em relação a métodos inovadores de ensino, podemos destacar os projetos de alfabetização iniciados por Paulo Freire em Pernambuco.

TABELA 8: NÚMEROS DA POPULAÇÃO, RESIDÊNCIA E ÍNDICE DE ANALFABETISMO, BRASIL, 1950-1970

FONTE: Adaptado de Lourenço Filho (1970)

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TÓPICO 3 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX

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Seu método de ensino possibilitava a alfabetização de jovens e adultos em três meses, algo revolucionário no campo educacional em todo o mundo, a ponto de o “Método Paulo Freire” ser utilizado em diversos países.

Com a ditadura militar tivemos profundas alterações no campo educacional e o fim de uma geração de grandes educadores, que desde 1932, com o Manifesto dos Pioneiros da Nova Educação, militaram nas lides político-educacionais. Entre estes podemos citar grande parte dos pensadores da educação brasileira do século XX, dos quais destacam-se Anísio Teixeira e o já citado Paulo Freire.

As transformações sociais do Brasil nos anos 1960, somadas às disputas geopolíticas mundiais nos tempos da Guerra Fria, explicam o fim da democracia brasileira e a instalação de um regime autoritário. Com isso, temos uma nova forma de conceber a educação. Como todo governo autoritário, a ditadura tentou, através da educação, impor seus valores sociais.

Para tanto, instituiu diversas disciplinas da grade curricular, como

Educação Moral e Cívica, Preparação para o Trabalho, Organização Social e Política do Brasil e Estudos de Problemas Brasileiros. Tais disciplinas substituíam as disciplinas de humanidades, como História, Geografia, Sociologia, Filosofia e Antropologia, porém, a atuação da ditadura na educação foi mais ampla que meramente alterações em grades curriculares.

Em 1972 se instituiu uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Sendo a maior transformação o fim do exame de admissão ao ginasial, que unido com o antigo primário, se transformou em um curso único de oito anos, com a nomenclatura ensino de primeiro grau. Também o Clássico e o Científico foram unidos, no chamado Segundo Grau, com a duração de três anos. Sobre a relação do Governo Federal com as universidades, foi tensa nos anos da ditadura. Isto porque o movimento estudantil foi amplamente perseguido.

O movimento estudantil brasileiro se organizou nos anos 1930, com a fundação da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e da União Brasileira dos Estudantes. Ambas as instituições estavam ligadas ao ideal nacionalista dos governos Getúlio Vargas e João Goulart. Sendo que a participação brasileira na Segunda Guerra Mundial foi apoiada pelos estudantes. Também as campanhas pela nacionalização da exploração de petróleo contaram com a participação estudantil. No governo João Goulart, os estudantes participaram da defesa das Reformas de Base.

A UNE foi incendiada dias após o golpe. O governo também ocupou

militarmente a Universidade de Brasília, perseguiu professores na Universidade do Brasil (no Rio de Janeiro) e aposentou compulsoriamente professores da Universidade de São Paulo. Como reação às atitudes arbitrárias e violentas, surgiram entre os estudantes os chamados movimentos de luta armada. Existiam alguns estudantes que apoiaram o regime militar, como os alunos da Universidade Presbiteriana Mackenzie, porém, a maior parte do movimento estudantil foi presa em 1968, no congresso organizado pela UNE em Ibiúna, no interior de São Paulo.

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

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Apesar das relações tensas, a ditadura impôs uma Reforma Universitária, na qual o sistema de cátedra foi extinto, sendo os professores contratados não por cadeira, mas por curso. Outra modificação importante no Ensino Superior foi a extinção do ciclo anual, sendo substituído pelo ciclo semestral.

Em relação ao ensino elementar, as ações da ditadura também foram de profundo radicalismo. O analfabetismo, um grave e secular problema brasileiro, começou a ser encarado como um problema pelos generais, que criaram o Mobral – Movimento Brasileiro de Alfabetização. Em relação às instituições educacionais secundárias, tanto as escolas particulares quanto as escolas públicas existiram, sendo no período militar o início da decadência das escolas públicas que, durante o período getulista, possuíam melhor qualidade que as privadas. O desmonte da educação pública ocorreu porque o governo ampliou as matrículas do ensino ginasial, sem adequar as escolas, o que gerou o problema da falta de vagas. Além disso, os salários dos educadores também começaram a ficar defasados. Uma triste realidade que, infelizmente, se mantém até o presente.

Com o fim da ditatura militar, a educação brasileira foi remodelada. A Constituição Federal de 1988 garante a educação como uma ação que deve ser mantida pelo governo, com o auxílio das empresas educacionais privadas e confessionais. Porém, a educação contém, além das garantias educacionais, uma legislação específica, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei que teve como principal relator o senador Darcy Ribeiro, um entusiasta da educação no Brasil.

Como novidades, nos conteúdos, além das disciplinas tradicionais, como

Matemática e Ciências, também foram incluídas questões que são consideradas os temas transversais, como o trabalho e a sexualidade. Algumas novidades no campo educacional são a ampliação do número de vagas nas escolas, além da ampliação da formação universitária dos educadores.

As unidades educacionais se ampliaram também na pré-escola, com a criação de creches, porém, apesar da ampliação, não temos ainda uma condição educacional satisfatória. Nossos indicadores são ruins, em especial no que se relaciona ao chamado analfabetismo funcional; isto é, na incapacidade dos alunos alfabetizados em compreender os textos que leem.

No processo de redemocratização dos anos de 1980 passam a ocorrer redefinições e reformas curriculares, bem como no que diz respeito à clientela escolar, agora composta de vários grupos sociais que viviam um intenso processo de migração, do campo para as cidades, e entre os Estados, com acentuado processo de diferenciação econômica e social.

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TÓPICO 3 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX

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3 ORGÃOS E INSTITUIÇÕES DE ENSINO NO BRASIL: O ENSINO MILITAR

O Brasil, assim como os demais países da América Latina, teve ao longo de

sua história diversos militares como presidentes da República. Tanto em ditaduras, como eleitos democraticamente. Portanto, conhecer um pouco sobre as instituições educacionais militares é importante para o futuro profissional da educação.

Como já afirmamos, a Escola Naval é a mais antiga instituição do Ensino Superior brasileiro. Oferta um curso de nível superior, com a função de formar os futuros oficiais da Marinha de Guerra. Para a Marinha Mercante existem duas escolas para a formação dos oficiais: O CIAGA (Centro de Instrução Almirante Graça Aranha), no Rio de Janeiro, e a CIOMM, em Belém do Pará. Praças da Marinha são formados nas escolas de Aprendizes-Marinheiros, nas cidades de Recife, Fortaleza, Vitória e Florianópolis. A Marinha também possui uma escola para a formação dos futuros almirantes, a Escola de Guerra Naval, instituição centenária sediada no Rio de Janeiro. O Colégio Naval é uma escola de segundo grau, que prepara jovens para a Escola Naval.

O Exército também possui instituições similares. A formação dos oficiais

do Exército passou por algumas escolas. No Império havia a Academia Militar da Praia Vermelha, fechada em 1904, pelos cadetes que apoiaram a Revolta da Vacina obrigatória. Após, foi transferida para Porto Alegre e novamente transferida para o Rio de Janeiro em 1910, sendo conhecida como a Academia Militar do Realengo, estabelecimento de Ensino Superior que formou os presidentes de ditadura civil-militar de 1964. Os praças do Exército são formados na Escola de Sargentos das Armas, sediada na cidade de Três Corações. Os generais são formados na Escola de Comando e Estado Maior do Exército. Em relação aos civis, o Exército possui o afamado Instituto Militar de Engenharia, uma das principais escolas de engenharia do país. A Escola Preparatória de Cadetes do Exército, sediada em Campinas, serve como porta de entrada para o oficialato.

A Aeronáutica é a mais recente das três forças armadas. Foi fundado o Ministério da Aeronáutica em 1942. A força aérea tem como principal escola de formação a Academia da Força Aérea, anteriormente sediada no Campo dos Afonsos (RJ) e atualmente sediada em Pirassununga-SP. Sua função é formar os oficiais aviadores do Brasil. Os brigadeiros são formados na Universidade da Aeronáutica, sediada no Rio de Janeiro. Os praças são formados na Escola de Especialistas da Aeronáutica, em Guaratinguetá-SP. As Escolas Preparatórias de Cadetes do Ar formam uma instituição de Ensino Médio, que visam preparar os futuros alunos da AFA. Por fim, em relação aos civis, temos o Instituto Tecnológico de Aeronáutica, que forma os engenheiros ligados às lides do ar.

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

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Para uma melhor compreensão sobre as especificidades presentes no ensino militar, indicamos a visita aos sites das diretorias de ensino do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.

FBA: Força Aérea Brasileira: <http://www.fab.mil.br/>.

EXÉRCITO BRASILEIRO: Portal de Educação do Exército Brasileiro: <http://www.ensino.eb.br>.

MARINHA DO BRASIL: Diretoria de Ensino da Marinha: <https://www.ensino.mar.mil.br>.

O ensino militar possui especificidades. Em especial, os alunos são chamados de cadetes, algumas escolas possuem até o tempo presente restrições de gênero, sendo vetadas para mulheres, e também existem restrições físicas, devido à finalidade do ensino militar, que é capacitar pessoas para desempenhar funções bélicas nas guerras nas quais o Brasil for envolvido.

Questão para reflexão: O Brasil, ao longo de sua história republicana, teve como presidentes da República vários oficiais-generais. Porém, ainda hoje existe um mútuo preconceito entre militares e civis. Neste sentido, pergunta-se: podemos dizer que a população civil conhece o ensino ministrado nas escolas militares?

4 EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA

Quando se trata de temas de educação inclusiva, fala-se da consolidação e universalização dos valores da sociedade moderna do humanismo e democráticos, que contemplam os direitos humanos, ainda apresentados no século XVIII e que no contexto atual ganham as terminologias, noções práticas e posturas que versam sobre respeito mútuo, empatia, compreensão, dignidade humana, equidade, justiça social, apoio e autorização, efetivação, legitimação e desenvolvimento.

A educação especial é uma modalidade transversal a todos os níveis e modalidades de ensino, enfatizando a atuação complementar da educação especial ao ensino regular. A Constituição Federal de 1988 traz como um dos seus objetivos fundamentais “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art.3º, inciso IV). Define, no artigo 205, a educação como um direito de todos, garantindo o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. No seu artigo 206, inciso I, estabelece a “igualdade de condições de acesso e permanência na escola” como um dos princípios para o ensino e garante

DICAS

UNI

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como dever do Estado, a oferta do atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208). O público alvo da educação, como define a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva atende as pessoas com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e com altas habilidades/superdotação.

A educação especial e a inclusiva não podem mais ser questões compreendidas, abordadas e resolvidas de forma assistencialista, como ações de caridade. Antes de mais nada, trata-se de um direito humano, uma condição de justiça e dignidade social; e no campo de políticas públicas e na esfera didático-pedagógica representam questões de grandes desafios do ponto de vista do indivíduo que é acometido por uma delas, da sociedade em que está inserido, da formação profissional pedagógica, bem como estruturas físicas que atendam às necessidades dos indivíduos que se encontram em tais circunstâncias e condições.

Em relação às demais épocas e sociedades, talvez a nossa geração, a das primeiras décadas do século XXI, tenha apresentado leis, normas, diretrizes, atitudes e níveis de conscientização mais expressivos que os que haviam sido implementados pelas gerações anteriores. Um dos aspectos que nos preocupa é que, muitas vezes, a educação especial e a educação inclusiva têm sido realizadas em espaços e locais à parte, desarticulados da sociedade e do universo escolar regular. Pensa-se que quando ela é assim conduzida não alcance o propósito de inclusão que se pretende.

Um dos aspectos que precisamos considerar quando pensamos a formação da escola no Brasil é a falta e especificidade e atenção dada às pessoas com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e com altas habilidades/superdotação. Em geral, a tradição brasileira era a de formar instituições específicas para estas pessoas, como instituições para cegos e para surdos.

No Brasil imperial, tivemos a primeira escola para as pessoas com deficiência visual ainda no reinado de D. Pedro II, o Imperial Instituto de Cegos, que durante a República foi rebatizado como Instituto Benjamin Constant. Outras escolas específicas foram criadas, como para os surdos. Com o advento republicano, as capitais dos estados e cidades mais influentes do interior foram montando seus estabelecimentos de ensino visando integrar socialmente os meninos cegos, mudos e surdos.

Um outro marco histórico no Brasil foi a formação de um sistema de ensino,

a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), que nasceu em 1954, no Rio de Janeiro. Caracteriza-se por ser uma organização social, cujo objetivo principal é promover a atenção integral à pessoa com deficiência intelectual e múltipla. A Rede APAE destaca-se por seu pioneirismo e capilaridade, estando presente em mais de 2 mil municípios em todo o território nacional. Nesse tempo a Organização acumulou resultados expressivos e que refletem o trabalho e as conquistas do Movimento Apaeano na luta pelos direitos das pessoas com deficiência. Nesse esforço destacam-se a incorporação do Teste do Pezinho na rede pública de saúde; a prática de esportes e a inserção das linguagens artísticas como instrumentos pedagógicos na formação das pessoas com deficiência, assim como a estimulação precoce como fundamental para o seu desenvolvimento. Hoje, no Brasil, essa mobilização social presta serviços de educação, saúde e assistência

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social a quem deles necessita, constituindo uma rede de promoção e defesa de direitos das pessoas com deficiência intelectual e múltipla, que hoje conta com cerca de 250 mil pessoas com estes tipos de deficiência.

4.1 MARGINALIZADOS E DESVALIDOS TUTELADOS PELO ESTADO

A educação no Brasil tem também uma legislação separada para o cuidado com os órfãos, com os menores que cometeram crimes, além além pessoas com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e com altas habilidades/superdotação. Na educação também devem ser uma preocupação de todos os envolvidos com a tarefa educativa.

Na educação lançada aos marginalizados, o Brasil possui uma tradição ampla, iniciada ainda no Império, com os reformatórios, até o presente, com sistemas estaduais que abrigam os menores em conflito com a lei. Uma das primeiras instituições a cuidar dos menores foram as Companhias de Aprendizes-Marinheiros dos tempos do Império, que eram vistos pelas populações civis como uma espécie de reformatórios. As escolas de aprendizes-marinheiros foram uma das primeiras instituições que eram encaradas como uma espécie de educandário, e úteis para a reeducação dos “meninos problemas”. Porém, após a Revolta da Chibata de 1910, elas foram alteradas e não mais se comportaram como “reformatórios”.

Posteriormente, com a República, foram criadas instituições, como os patronatos agrícolas, nos quais eram destinados muitos meninos marginalizados para o aprendizado de uma profissão. O Código de Menores republicano vinculava a ideia de uma regeneração pelo trabalho dos menores delinquentes. Importante salientar uma diferença básica: a dos menores que cometem delitos, dos menores órfãos. A partir da segunda metade do século XX, ambos passaram a ser assistidos pelas Fundações do Bem-Estar do Menor, as FEBEM, que no presente se demonstraram como obsoletas para o cuidado com os menores. No início dos anos 1990, foi criado o Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê marcos legais para os menores sob a responsabilidade do Estado, sendo hoje comum a presença de modelos alternativos, como as chamadas mães sociais.

4.2 O ENSINO TÉCNICO NO BRASIL

Um dos capítulos interessantes da influência da Revolução Industrial no processo de educação no Ocidente foi a denominada Educação Técnica, pois a capacitação intelectual avança de modo ininterrupto nos últimos 200 anos, quando

PARA REFLETIR:Alguns apontam a redução da maioridade penal como solução para a

violência provocada pelos jovens. Porém, em oposição a esta ideia, pergunta-se: qual é a importância (ou o papel) da educação para a prevenção da delinquência juvenil?

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se trata de um declínio das ocupações única e exclusivamente braçais para um processo produtivo cada vez mais automatizado (ARANHA, 1996, p. 183).

Durante o denominado Antigo Regime europeu, período que inicia na baixa Idade Média e finda com a Revolução Francesa, os objetos eram produzidos através das corporações de ofício. Portanto, algumas profissões tradicionais existiam, como as de sapateiros, relojoeiros, carpinteiros etc. Com o incremento da produção industrial destes objetos fabricados por estes artífices citados, como sapatos, relógios e móveis para o lar, o aprendizado para o ingresso em uma indústria passa a ser realizado não em corporações, em que aprendizes aprendiam com mestres mais antigos no ofício, até que se especializavam e, deixando de ser aprendizes, se tornavam oficiais e posteriormente mestres.

O aprendizado para a indústria passa por frequentar uma escola técnica, na qual o aluno aprende as rotinas industriais, até ser capaz de atuar como técnico qualificado para determinada função, pois a mecanização da produção é uma tendência constante no capitalismo, sendo assim presente a necessidade de técnicos que cuidam das máquinas, que substituíram a tração animal ou o braço humano na confecção dos mais distintos produtos. Em geral, o ensino técnico é voltado para as camadas mais baixas da população dos diferentes países industrializados, pois muitos observam no trabalho industrial especializado uma chance de ascensão para a classe média.

Durante muitos nos, no Brasil, tínhamos uma tradição, em processo de extinção, de um ensino técnico difuso, que ocorria no interior das corporações, como no caso de alfaiates e funcionários da construção civil. Tal conhecimento, passado pelos profissionais mais antigos aos mais jovens, sem passar pela escola, perde espaço em um mercado de trabalho competitivo e que exige a excelência na qualidade dos produtos.

Uma das principais funções da educação é adequar o indivíduo ao meio

social. Em uma sociedade como a capitalista, o desenvolvimento industrial depende da ação de técnicos capacitados. O ensino técnico no Brasil possui uma grande importância, mesmo por vezes não reconhecida. Ele se iniciou ainda no século XIX, com instituições em diversos pontos do país. Um dos principais era o chamado Liceu de Artes e Ofícios, da capital de São Paulo. O Governo Federal começou a fundar escolas agrícolas para formar técnicos agropecuários, como também as escolas técnicas federais, para formar técnicos industriais. As escolas técnicas foram renomeadas como CEFETs – Centro Federal de Educação Tecnológica –, que atualmente se transformaram nas Universidades Federais Tecnológicas. Na Primeira República, os governos estaduais também instituíram escolas técnicas e de artífices, para a formação profissional dos jovens.

As antigas escolas técnicas possibilitavam aos educandos o ensino técnico casado ao Ensino Médio. Em alguns casos, existiam internatos que possibilitavam aos educandos morarem nas escolas, cenário que hoje não mais se mantém.

Não apenas o governo, como também a iniciativa privada faz parte do esforço em formar a mão de obra qualificada para o parque industrial brasileiro. As associações

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empresariais dos estados, em acordo com a CNI – Central Nacional da Indústria, fundaram o sistema “S”, formado pelo SENAI – SENAC – SENAR, entre outras.

O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial tem como função formar os técnicos das empresas. O Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial fomenta a qualificação dos funcionários do comércio e, por fim, o mais novo, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural, capacita os técnicos das agroindústrias.

Uma importante fonte de informação sobre o sistema S são os sites do SENAI, do SENAC e do SENAR. Endereços eletrônicos:

SENAI: Serviço Nacional da Aprendizagem Industrial: <https://www.sc.senai.br/>.

SENAC: Serviço Nacional da Aprendizagem Comercial: <http://www.senac.br/>.

SENAR: Serviço Nacional da Aprendizagem Rural: <http://www.senar.org.br/>.

O sistema “S” também se complementa com instituições ligadas ao esporte e lazer dos funcionários das empresas privadas, como o Serviço Social da Indústria – SESI – e Serviço Social do Comércio – SENAC. Ambas instituições atuam, na maior parte dos casos, com ações nos campos recreativos, esportivos e culturais. Porém, em alguns Estados da federação, como no caso de São Paulo e Paraná, o SESI atua diretamente no ensino básico, isto é, em escolas de Ensino Fundamental e Médio. O SESI também tem forte atuação no Ensino de Jovens e Adultos – EJA.

PARA REFLETIR:O sistema “S” possui uma grande importância na história da

industrialização brasileira. Também do ponto de vista social, muitos brasileiros foram integrados ao mercado de trabalho através dos cursos ministrados pelo SENAI, SENAC e seus congêneres. Até mesmo um presidente da República foi formado por estas escolas. Neste sentido, pergunta-se: ainda existe preconceito em relação ao ensino técnico em detrimento ao ensino superior?

DICAS

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5 FUNDAMENTOS DIDÁTICO-PEDAGÓGICOS E FILOSÓFICOS PRESENTES NOS PCN

A didática e a metodologia do ensino e da aprendizagem passaram a fazer parte das preocupações na área da educação de forma mais profunda a partir dos anos de 1980 e 1990. E, muitas vezes, são temas que ainda são abordados como secundários ao ensino. As novas gerações de alunos habituavam-se à presença de novas tecnologias de comunicação, especialmente o rádio e a televisão, que se tornaram canais de informação e de formação cultural.

Os métodos tradicionais de ensino, os livros didáticos, os textos simplificados, os conteúdos carregados de ideologias, os testes ou exercícios sem exigência de nenhum raciocínio passam a ser questionados com maior ênfase. Na década de 1990 foi quando ocorreu a negação do conteúdo no campo da didática; e se passou a reclamar pela reelaboração da didática, agora contemplando, além das questões metodológicas, as ideológicas, que perpassam os conteúdos e o exercício profissional do professor.

No ano de 1990, o Brasil participou da Conferência Mundial da Educação para Todos, que foi promovida pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Banco Mundial.

A partir disto, o Brasil iniciava uma espécie de alinhamento com estes órgãos, dos quais surgiu a necessidade de elaborar, ajustar e adequar as diretrizes curriculares que norteavam a educação no país. Inicialmente, houve um estudo preliminar para com as realidades dos municípios brasileiros, o que foi levado para um debate geral em 1993, na Semana Nacional de Educação para Todos, que foi mediada por professores universitários, representantes e secretários estaduais e municipais de Educação (NETO, 2009).

No ano de 1996, o MEC publicou os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de 1ª à 4ª série; em 1997, de 5ª à 8ª série; em 1998, os de Ensino Médio; em 1999 foram feitos acréscimos aos PCN, que ficaram conhecidos como Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais.

Os PCN (1997) destacam que o professor não está sozinho no processo de ensino e aprendizagem. Existem a família, o mundo do trabalho, as instituições de ensino e pesquisa, os movimentos sociais, os meios de comunicação, as atividades culturais, entre outras com as quais ele precisa buscar apoio, colaboração e se relacionar.

Os PCN enfatizam que sejam considerados conteúdos e temas que contemplam o exercício da cidadania e o respeito à diversidade, as relações sociais, o mundo do trabalho, os temas transversais (ética, meio ambiente, pluralidade cultural) nas mais diferentes disciplinas, conteúdos, séries e faixas etárias dos estudantes.

O documento ainda aponta a necessidade de se contemplar competências e habilidades nos processos de ensino-aprendizagem. Trata-se de um quadro conceitual

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ainda muito recente na tradição da educação brasileira e, por outro lado, conta com poucas referências teóricas a que se possa recorrer. O Governo Federal passou a contemplar e verificar estas noções no interior das avaliações do Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM e no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes do Ensino Superior – ENADE.

De maneira geral, as competências e habilidades pertencem ao campo da psicologia e da psicometria cognitiva, que estruturam a inteligência humana na dimensão tanto fluida como cristalizada. Competências são as modalidades estruturais da inteligência, ou melhor, ações e operações que utilizamos para estabelecer relações com e entre objetos, situações, fenômenos e pessoas que desejamos conhecer.

As habilidades decorrem das competências adquiridas e referem-se ao plano imediato do ‘saber fazer’. Por meio das ações e operações, as habilidades aperfeiçoam-se e articulam-se, possibilitando nova reorganização das competências (INEP, 1999).

Tanto no que diz respeito às habilidades e às competências, as orientações apontam para que sejam estimulados e favorecidos a criatividade, a sensibilidade, o respeito e a diversidade, os direitos e os deveres, a responsabilidade social, as atitudes autônomas e solidárias e a preocupação com o patrimônio histórico e com o bem comum.

O Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais – INEP – elaborou uma matriz de competências e habilidades para o Ensino Fundamental e Médio. Para maiores informações, acesse o site do INEP conforme é indicado a seguir:

MATRIZ DE COMPETÊNCIAS E HABILIDADES:Disponível em: <http://encceja.inep.gov.br/matriz-de-competencias>.

Os PCN's (1997) também apresentam os objetivos gerais e objetivos específicos a cada fase de instrução. Os objetivos gerais do Ensino Fundamental residem na tentativa de que os estudantes gradativamente sejam capazes de ler e compreender sua realidade, posicionar-se e agir tendo em vista critérios e parâmetros.

Os objetivos específicos preveem que os estudantes adquiram as capacidades de:- identificar o grupo de convívio e as relações que estes estabelecem com outros

tempos e espaços;- reconhecer acontecimentos em escala temporal múltipla para questões/problemas

tanto do presente como do passado;

DICAS

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- compreender respeitosamente os mais diferentes grupos sociais nas suas manifestações culturais, econômicas e políticas;

- reconhecer permanências e mudanças em termos de experiências e vivências humanas, próximas ou distantes no tempo e no espaço;

- questionar a realidade no sentido de perceber como as instituições do governo e a sociedade civil se encontram articuladas e podem ser acionadas diante deles, no sentido de vislumbrar soluções possíveis;

- favorecer exercícios e estudos com métodos de pesquisa e produção textual, a partir da exploração de fontes e registros escritos, iconográficos, sonoros, orais, edificados, entre outros.

- reconhecer o patrimônio sociocultural e a diversidade como sendo um direito dos povos e dos indivíduos com intuito de ampliar e fortalecer a democracia e os direitos humanos.

A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) denominou o Ensino Médio como uma extensão, a etapa final da Educação Básica, o que atribuiu ao governo a responsabilidade pela oferta obrigatória e gratuita, ou seja, um direito ao cidadão. Todos que quiserem deverão ter acesso.

A LDB (Lei nº 9.394/96, art. 36) apresentou que o Ensino Médio possui o caráter de terminalidade, o que significa assegurar a todos os cidadãos a oportunidade de consolidar e aprofundar os conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental; aprimorar o educando enquanto pessoa humana; possibilitar a continuidade dos estudos; conferir uma preparação básica para o trabalho e o exercício da cidadania, tendo em vista o desenvolvimento da compreensão dos “fundamentos científicos e tecnológicos dos processos produtivos”.

Os PCN's (1997) sugerem ao professor que, quando abordar os conteúdos com seus estudantes, que valorize o que já possuem, no sentido de dialogar sobre o que se sabe e, ao mesmo tempo, lance provocações e indagações que motivem os estudantes a pesquisar, a organizar, aprofundar e compreender de maneira ampla, no sentido de enriquecer e ampliar o repertório que possuem. Por sua vez, os estudantes podem expressar, materializar, tornar tangíveis os estudos e as pesquisas através de produções textuais, teatralizações, produzir painéis, murais, maquetes, jogos, mapas, infográficos, esquemas cronológicos, entre outros.

O Ministério da Educação ajustou e reformou as propostas de ensino em nível médio, tendo como preocupação melhorar o desenvolvimento social. Os PCN (2000) apresentam que a formação dos estudantes deve ter como alvo principal a aquisição de conhecimentos básicos, a preparação científica e a capacidade de utilizar as diferentes tecnologias relativas às áreas de atuação profissional.

A reforma curricular do Ensino Médio estabeleceu a divisão do conhecimento escolar em três áreas: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias; e Ciências Humanas e suas Tecnologias. História encontra-se inserida na grande área de ‘ciências humanas e suas tecnologias’.

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Os objetivos específicos, por meio da constituição das competências e habilidades, preveem que o estudante seja apto a:

• compreender os elementos cognitivos, afetivos, sociais e culturais que constituem a identidade própria e a dos outros;

• compreender a sociedade, sua gênese e transformação, e os múltiplos fatores que nela intervêm, como produtos da ação humana; a si mesmo como agente social; e os processos sociais como orientadores da dinâmica dos diferentes grupos de indivíduos;

• compreender o desenvolvimento da sociedade como processo de ocupação de espaços físicos e as relações da vida humana com a paisagem, em seus desdobramentos político-sociais, culturais, econômicos e humanos;

• compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as às práticas dos diferentes grupos e atores sociais, aos princípios que regulam a convivência em sociedade, aos direitos e deveres da cidadania, à justiça e à distribuição dos benefícios econômicos;

• traduzir os conhecimentos sobre a pessoa, a sociedade, a economia, as práticas sociais e culturais em condutas de indagação, análise, problematização diante de situações novas, problemas ou questões da vida, tanto do ponto de vista pessoal, social, política, econômica e cultural;

• entender os princípios das tecnologias associadas ao conhecimento do indivíduo, da sociedade e da cultura, entre as quais as de planejamento, organização, gestão, trabalho de equipe, e associá-las aos problemas que se propõem resolver;

• entender o impacto das tecnologias associadas às Ciências Humanas sobre sua vida pessoal, os processos de produção, o desenvolvimento do conhecimento e a vida social;

• entender a importância das tecnologias contemporâneas de comunicação e informação para planejamento, gestão, organização, fortalecimento do trabalho de equipe;

• aplicar as tecnologias das Ciências Humanas e Sociais na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para sua vida.

Como resultado desta jornada, pode-se dizer que as diretrizes da educação contemporânea, por meio dos PCN, a LDB e o Conselho Nacional de Educação, apontam que, ao longo do processo de desenvolvimento das ciências humanas, as humanidades foram progressivamente superadas na cultura escolar, ou seja, conseguiu-se incluir conteúdos de formação geral, além da formação específica. Nesse contexto ocorreu a inclusão das disciplinas de História, Sociologia, Ensino Religioso, Artes e Geografia, que procuram dedicar-se à compreensão do homem, não somente formá-lo, ensiná-lo ao mercado de trabalho.

5.1 HISTÓRIA DA ÁFRICA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA: A LEI Nº 10.639, DE 2003

Em 2003 foi aprovada e sancionada a Lei nº 10.639, que alterou o conteúdo da Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394/1996) e tornou obrigatório o ensino da História da África e Cultura Afro-Brasileira nas modalidades de Ensino

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Fundamental e Médio. Esta lei faz parte de outras atividades afirmativas por parte do governo que fortalecem as Leis de cotas raciais, as quais se encontram em vigor desde os anos de 2000.

Trata-se de uma possibilidade de superação da opressão e invisibilidade social promover a preservação dos valores culturais, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira, empoderamento e valorização da identidade étnica, pois o racismo constitui um fator estruturante de injustiças sociais.

A partir da aprovação desta lei ganham representatividade e expressão os seguintes movimentos sociais:

• Fundação Cultural Palmares (FCP). • Movimento Negro Unificado (MNU).• Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN).• União de Negros pela Igualdade (UNEGRO).• Articulação de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB).• Fórum Nacional de Mulheres Negras (FNMN).

Procure assistir ao filme O jardineiro fiel, dirigido por Fernando Meirelles, 2005, o qual denuncia a atuação de laboratórios farmacêuticos, que se utilizam da população africana para testar, de forma indiscriminada, medicamentos.

5.2 AS POSSIBILIDADES DOS ESPAÇOS NÃO ESCOLARES

A partir dos anos de 1980, quando se deu a redemocratização da sociedade brasileira e a retomada da participação popular nos campos decisivos da política e educação, novos pactos de responsabilidade no processo de educação e formação dos indivíduos são acordados, sendo que não caberia mais somente às famílias e à escola a missão de formar os indivíduos, cabendo às instituições, organizações, espaços públicos e à sociedade civil como um todo comprometer-se com esta tarefa.

A partir destas novas diretrizes, se faz necessário que se construam parcerias e projetos com outras instâncias da sociedade, como Organizações Não Governamentais – ONGs, movimentos sociais, cooperativas, grupos de trabalho voluntário, órgãos públicos que realizam atividades e intervenções culturais e sociais, tais como centros de memória, arquivos públicos, museus, Centro de Atenção Psicossocial – CAPs, Centro de Referência de Assistência Social – CRAs, conselhos tutelares, bibliotecas, abrigos, sindicatos de profissões, associações de

DICAS

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moradores, espaços de cultura, feiras, entre outros, e dos mais diversos meios de comunicação social, tais como rádios, jornais, revistas, editoras, sites, mídias sociais, blogs de conhecimento e informação.

6 PRINCIPAIS PENSADORES DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA DO SÉCULO XX

As conquistas no campo educacional do século XX, a consolidação da estruturação de políticas públicas nacional de ensino e educação, bem como o fortalecimento do ensino e pesquisa e extensão no interior das universidades tornaram possível que se estruturassem programas de graduação e de pós-graduação, em nível de especialização, assim como de mestrado e doutorado no campo das licenciaturas. No interior destes cursos consolidaram-se práticas de estudos, debates e pesquisas sobre os mais diferentes temas e questões da educação brasileira.

Mesmo assim, somos ainda muito dependentes das referências estrangeiras

no que diz respeito a matrizes epistemológicas, categorias, conceitos e métodos pedagógicos. A seguir, procuramos relacionar três dos principais estudiosos brasileiros que alcançaram amplo reconhecimento nos espaços acadêmicos e escolares e se tornaram aportes teóricos e metodológicos de outros estudos e pesquisas.

6.1 PAULO FREIRE (1921-1997)

Educação não transforma o mundo.Educação muda as pessoas.

Pessoas mudam o mundo.PAULO FREIRE

Paulo Freire foi um dos intelectuais da educação que mais se destacou ao longo das décadas de 1960 até 1990. Seus livros foram a inspiração para muitos educadores brasileiros. Ficou muito reconhecido por ter desenvolvido, juntamente com outros profissionais, um método de alfabetização de adultos, que alcançou o resultado de alfabetizar 300 cortadores de cana em apenas 45 dias.

Freire fazia uma aliança entre os fundamentos e concepções cristãos e

marxistas, simpatizava com elementos da psicanálise, da linguística, teologia, política e filosofia. O método considerava a experiência de vida daqueles estudantes e o contexto social no qual se inseriam; centrava-se na adaptação à realidade dos conteúdos e temas que eram estudados, em especial na tarefa de identificação das relações de trabalho, das experiências de exploração e injustiça, e reconhecer as possibilidades de libertação e realização humana que se encontram latentes na realidade.

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Paulo Freire formou-se em Direito na Universidade Federal de Recife, mas pouco exerceu a profissão. Foi amplamente influenciado pelas obras de Karl Marx, Antonio Gramsci, concepções teórico-metodológicas do materialismo dialético, bem como os temas da alienação, exploração, a desumanização do homem, injustiças, a luta de classes, os privilégios de alguns, o opressor e o oprimido, e a preocupação com a dignidade humana sempre o acompanharam em sua trajetória de vida. No campo da linguística, Freire simpatizava com os fundamentos teórico-metodológicos de Ferdinand Saussure (1857-1913), que era adepto do materialismo e do marxismo.

Dermerval Saviani nos ajuda a compreender o nível que Paulo Freire reclamava como papel fundamental da educação:

Para Paulo Freire a educação surgia como um instrumento de crucial importância para promover a passagem da consciência popular do nível transitivo-ingênuo para o nível transitivo-crítico, evitando-se a sua queda na consciência fanática. É em vista desse objetivo que foi criado um método de alfabetização ativo, dialogal, crítico e criticizador. Esse método, no entanto, é apenas um aspecto de uma proposta pedagógica mais ampla enraizada na tradição mais autêntica do existencialismo cristão, em diálogo com algumas contribuições do marxismo (SAVIANI, 2007, p. 332).

No livro "A pedagogia do oprimido", denunciou o que denominou como Ensino Bancário, ou a pedagogia dos dominantes. Isto é, uma forma de considerar o aluno tábula rasa, e o conhecimento como se este fora dinheiro a ser depositado em um banco, no qual renderia com as notas das provas. Neste sentido, a memorização seria mais valorizada que a reflexão, por consequência como a formação humana do estudante. Observe nas palavras de Freire como se dá o processo de educação bancária:

Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los (FREIRE, 2002, p. 58).

Perseguido pela ditadura militar, voltou ao Brasil em 1979, com a Lei de Anistia, sendo secretário da Educação da Prefeitura de São Paulo, no governo de Luiza Erundina. Seu último livro, publicado em 1996, se chamou A Pedagogia da Autonomia, e versava sobre os saberes necessários à prática pedagógica. Paulo Freire sofre de uma espécie de esquecimento e ocultamento, por vezes banalização e vulgaridade, por parte da intelectualidade brasileira, mesmo tendo em seu currículo 29 títulos de Doutor Honoris Causa de universidades da Europa e América e diversos galardões, como o prêmio da UNESCO de Educação para a Paz em 1986. Observe, a seguir, uma escultura que homenageia diversas autoridades reconhecidas mundialmente, esta encontra-se em Estocolmo, na Suécia. Paulo Freire encontra-se na segunda posição da esquerda para a direita, ao lado de personalidades como Pablo Neruda e Mao Tsé-Tung.

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FIGURA 30 - PAULO FREIRE ENTRE OUTRAS REFERÊNCIAS MUNDIAIS, NA SUÉCIA

FONTE: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire>. Acesso em: 4 out. 2016.

As obras de Paulo Freire foram fortemente incorporadas pelas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), aos movimentos sociais rurais e também urbanos, bem como aos grupos de educação de jovens e adultos e a educação popular.

Dentre as principais obras do autor estão:Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1967.Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1970.Educação e mudança. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1979.Pedagogia da esperança. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1992.Política e educação. São Paulo: Cortez Editora, 1993.Pedagogia da autonomia. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1997.Pedagogia da indignação. São Paulo: UNESP, 2000.

Segundo o Google Scholar, o livro a ‘Pedagogia do Oprimido’ consta como a terceira referência mais citada em estudos na área da educação e ciências humanas. Sendo mais citado até que estudiosos como o filósofo francês Michel Foucault, o antropólogo norte-americano Clifford Geertz e o sociólogo francês Pierre Bourdieu. Observe o quadro a seguir:

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QUADRO 31 - LIVRO ‘PEDAGOGIA DO OPRIMIDO’ DE PAULO FREIRE EM TERCEIRO LUGAR

FONTE: Disponível em: <https://www.paulofreire.org/noticias/463-paulo-freire-%C3%A9-o-terceiro-pensador-mais-citado-em-trabalhos-pelo-mundo>. Acesso em: 12 nov. 2016.

Diante deste contexto de falta de reconhecimento, sua filha, Madalena Freire, que se dedica à educação infantil e a manter vivo o legado do pai, proferiu as seguintes palavras:

O querer bem, o amor, regia sua interação com o mundo. Muito poucos o entenderam (ou, ainda não o entendem) sobre

essa sua convicção. É preciso querer bem para educar, aprender e ensinar. Penso que era essa capacidade de amar que lhe dava

possibilidade intensa de educar sua paciência impaciente. Sempre com aqueles olhos de menino curioso, incansável diante

do novo, do conflito, do que não conhecia.

MADALENA FREIRE

Uma indicação para saber mais sobre a vida e a importância do legado de Paulo Freire para a Educação Mundial é o site do Instituto Paulo Freire, no qual podemos ter maiores informações sobre a vida e a obra deste grande intelectual da educação. Quem dirige o Instituto é Madalena Freire, filha de Paulo, e Moacir Gadotti, estudioso e defensor de seu legado. Instituto Paulo Freire. Disponível em: <http://www.paulofreire.org/>.

DICAS

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6.2 RUBEM ALVES (1933-2014)

Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros

desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram

de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o voo.Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados.

O que elas amam são pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem

fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O voo não pode ser ensinado.

Só pode ser encorajado.RUBEM ALVES

Foi escritor, educador, psicanalista, teólogo e ex-pastor presbiteriano, dedicou-se a escrever sobre a educação, em especial, a educação infantil. Foi um dos fundadores da Teologia da Libertação e foi professor da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Nos anos de 1960 foi considerado subversivo pela Igreja Presbiteriana e foi perseguido pelo regime militar, o que fez com que rompesse com a Igreja e se refugiasse nos Estados Unidos da América. Dedicava-se à música, sendo professor de piano, e à culinária. Ele possuía um restaurante.

Em seus escritos exalta o espírito das crianças em relação ao adulto, pois estas mantêm forte relação e paixão pela vida. Rubem Alves possui inúmeros livros publicados que tratam de religião, psicanálise, literatura infantil. No campo da educação é possível relacionar as seguintes obras:

Conversas com quem gosta de ensinar, 1984.Estórias de quem gosta de ensinar, 1985.A alegria de ensinar, 1991.Por uma educação romântica, 2002.A escola com que sempre sonhei, 2002.Conversas sobre educação, 2003.Fomos maus alunos, 2003.Ao professor com o meu carinho, 2004.Aprendiz de mim: um bairro que virou escola, 2004.Educação dos sentidos, 2005.Ensinar, cantar, aprender, 2008.Pedagogia dos caracóis, 2010.O aluno, o professor, a escola, 2010.Lições do velho professor, 2013.

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TÓPICO 3 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX

201

Para saber mais sobre a trajetória de vida e obra do pensador, acesse o site a seguir:Instituto Rubem Alves. Disponível em: <http://www.institutorubemalves.org.br/>.

6.3 DERMEVAL SAVIANI (1943)

O papel da escola não é o de mostrar a face visível da Lua, isto é, reiterar o cotidiano, mas mostrar a face oculta, ou

seja, revelar os aspectos essenciais das relações sociais que se ocultam sob os fenômenos que se mostram sob a nossa

percepção imediata.DERMEVAL SAVIANI

Filho de trabalhadores operários, é um filósofo, professor e pensador da educação, foi docente no Curso de Pedagogia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), ajudou a criar o Curso de Mestrado em Filosofia da Educação na mesma instituição. Atuou em instituições como a Universidade Federal de São Carlos, onde auxiliou na estruturação e consolidação dos cursos de mestrado e doutorado daquela instituição. Concluiu o curso de livre docência na área de História da Educação na Faculdade de Educação na Unicamp-SP. A ele é reconhecida a autoria de uma pedagogia dialética, mais conhecida como pedagogia histórico-crítica, na qual preza pela aprendizagem significativa, que forja a postura de indivíduos críticos, autônomos e que vislumbram a inclusão social.

Colaborou na fundação da ANDE – Associação Nacional de Educação e é sócio fundador da ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. Entre suas principais obras estão:

Educação brasileira: estrutura e sistema. São Paulo, Saraiva, 1973.

Pedagogia histórico-crítica, primeiras aproximações. Campinas: Autores Associados, 1991.

História das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas, Autores Associados, 2007.

Educação em diálogo. Campinas, Autores Associados, 2011.

Sistema Nacional de Educação e Plano Nacional de Educação: significado, controvérsias e perspectivas. Campinas, Autores Associados, 2014.

DICAS

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202

Professor Saviani participou da estruturação do Plano Nacional de Educação/PNE e acompanhou todo o trâmite no interior do Congresso Nacional, sendo aprovado pela Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, e ficará em vigor até o ano de 2024. O PNE contém as metas, bases e diretrizes, e as estratégias da política educacional nacional. Para conhecer melhor o documento, acesse o site do PNE em movimento, conforme está indicado a seguir:Plano Nacional de Educação em movimento/PNE.Disponível em: <http://pne.mec.gov.br/>.

6.4 JOSÉ CARLOS LIBÂNEO (1945)

Escola, professores, pais estão inseridos na dinâmica das relações sociais. A sociedade não é um todo homogêneo, onde

reinam a paz e a harmonia. Ao contrário, há antagonismos e interesses distintos entre grupos e classes sociais que se refletem

nas finalidades e no papel atribuído à escola, ao trabalho do professor e dos alunos.

JOSÉ CARLOS LIBÂNEO

Libâneo teve sua trajetória de formação acadêmica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-PUC-SP, escreve sobre os temas de teoria, didática e metodologia da educação. Para o autor, os principais desafios que estão postos aos profissionais da educação são os de reafirmar a educação como capacitação para a autodeterminação de forma racional pelos indivíduos, pela formação da razão crítica; repensar o conceito de qualidade democrática numa pedagogia emancipatória; que os sistemas de ensino e as escolas estejam comprometidos com a qualidade cognitiva da aprendizagem e que a vida escolar esteja articulada com o mundo social, com o mundo informacional e o mundo comunicacional, fazendo com que a escola represente um “espaço de síntese”; repensar os processos de ensino e aprendizagem na sociedade do conhecimento e da informação; reconhecer que a autonomia das escolas depende de uma reconfiguração das práticas de gestão e dos processos de tomada de decisões; recuperar a significação social da atividade do professor, ou seja, da identidade profissional do professor.

Entre suas principais obras estão:

Adeus professor, adeus professora?: novas exigências educativas e profissão docente / José Carlos Libâneo. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

Didática. São Paulo: Cortez, (Coleção Magistério Série Formação do Professor). 2008.

DICAS

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Na atualidade existem diversas sociedades, institutos, instituições, processos avaliativos, fundos, que visam desenvolver políticas públicas educacionais no Brasil. Procure acessar o site de cada uma delas e identificar suas principais ações e campo de atividade. Observe a relação a seguir:SBPC: Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.Fundada em 1948, trata-se de uma instituição sem fins lucrativos que promove ações que visam promover desenvolvimento científico, tecnológico, educacional e cultural. Disponível em: <http://www.sbpcnet.org.br/site/>. INEP: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.Criado em 1937 e encontra-se vinculado ao Ministério da Educação (MEC), responsável por promover estudos, pesquisas e avaliações sobre o Sistema Educacional Brasileiro com o objetivo de produzir informações a gestores, pesquisadores e educadores e subsidiar a formulação e implementação de políticas públicas para a área educacional.Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/conheca-o-inep>. FNDE: Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.Autarquia criada em 1968 junto ao Ministério da Educação-MEC, responsável por executar políticas públicas em educação. Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/>. PRONATEC: Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego.Criado em 2011, possui como objetivo expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica no país. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/pronatec>.PROUNI: Programa Universidade para todos. Criado em 2004 e é responsável pela concessão de bolsas de estudos integrais e parciais em cursos de graduação e formação específica em instituições de ensino privadas. Disponível em: <http://prouniportal.mec.gov.br/o-programa>. ENEM: Exame Nacional do Ensino Médio. Foi criado no ano de 1998, fornece um panorama do desempenho dos estudantes tanto de escolas públicas como particulares ao término do Ensino Médio. A partir dos dados gerados no Enem, os governos lançam políticas públicas em educação e instituições que visam à melhoria da própria modalidade, assim como favorecem o acesso a bolsas e financiamentos no Ensino Superior. Um exemplo disto é o ProUni.Para maiores informações, acesse o site do Ministério da Educação específico do Enem, disponível em: <http://portal.mec.gov.br/enem-sp-2094708791>. ENADE: Exame Nacional de Desempenho de Estudantes. Trata-se de uma avaliação que almeja avaliar o rendimento dos estudantes quando do término dos cursos de graduação. A primeira avaliação ocorreu no ano de 2004 e é aplicada a cada três anos. Para maiores informações, acesse o site do Ministério da Educação específico do Enade, disponível em: <http://portal.mec.gov.br/enade>.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegamos ao final do século XX, adentramos às primeiras décadas do século XXI e deparamo-nos com inúmeros desafios, em especial persiste forte segmentação entre o universo acadêmico e o universo escolar, em que os espaços escolares de formação básica são compreendidos como de menor importância em relação aos espaços de ensino técnico e superior. Ou seja, deparamo-nos com o desafio de transpor, romper com o isolamento e estabelecer pontes e relações cada vez mais próximas entre o conhecimento científico e o universo escolar, os saberes espontâneos do senso popular e comunitário.

DICAS

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Os tempos atuais se caracterizam como de crise, e este contexto pode ser entendido como o ponto em que nos encontramos, no contraponto do discurso da modernidade e da pós-modernidade, que é identificado como crise de civilização, crise das promessas otimistas e triunfantes de progresso, se apresentando agora com um caráter complexo, multifacetado e por apresentar uma dinâmica de extrema fluidez.

Como ponto de partida pode-se tomar como referência que as tendências pós-modernas trouxeram em sua essência aspectos que tratam da heterogeneidade, fragmentação, subjetividade, polaridades e da relatividade. Ao mesmo tempo, as consequências do pensamento pós-moderno permanecem gerando catástrofes ambientais, o aprofundamento das desigualdades sociais, de acirramento dos conflitos e atos de intolerância entre os hemisférios Norte e Sul, Ocidente e Oriente, assim como existem, por outro lado, a ampliação e o fortalecimento dos modelos democráticos de governos e sociedades.

No contexto educacional passou-se a compreender que as estratégias e os processos de aprendizagem precisam levar em consideração a aprendizagem conceitual, as interferências sociais e culturais, as mais diversas linguagens, expressões e mídias, bem como os conhecimentos prévios dos estudantes para que se teça uma aprendizagem significativa. Estes aspectos tornaram favoráveis uma relação e postura de diálogo e colaborativa nos momentos de ensino-aprendizagem no interior dos espaços escolares e entre os mais diferentes indivíduos.

Castro (2011) afirma que os estudos e pesquisas oriundos do campo das Ciências da Educação podem contribuir no sentido de se aproximar e conhecer mais intimamente o homem, ou seja, para além do homem enquanto fenômeno da natureza e da cultura, podendo alcançar a natureza mais profunda, no campo filosófico e íntimo de sua existência; seara que as demais ciências, seja as ciências da natureza ou das exatas, não conseguem tocar e sensibilizar, pois trata-se de um conhecimento e saber que se encontra além da dimensão quantitativa, descritiva, experimental e funcional do homem.

Severino (1990 ) advoga que a educação pode não fugir do compromisso de implementar um projeto humanizador, assim como as escolas teóricas, leis, diretrizes, planos, metodologias devem estar comprometidos na construção de uma sociedade mais justa e fraterna, que se orienta por valores éticos e de cuidado com o ser humano, com a natureza, com a paz entre as nações. Portanto, não perca de vista que as matrizes teórico-metodológicas, os movimentos intelectuais, as políticas educacionais e a história das instituições educacionais devem ser investigados e compreendidos numa perspectiva histórica, e o papel exercido pela escola em meio a uma sociedade deve ser contextualizado no seu devido momento histórico e social, para não promover anacronismos, equívocos e incoerências.

Mais uma vez gostaríamos de reforçar a ideia de que este material é introdutório e não conclusivo, as possibilidades que o ensino de História permite e exige são inúmeras. Não se dê por satisfeito, aprofunde os conteúdos apresentados

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e relacionados ao longo deste caderno, construa sua própria história e bagagem acadêmica.

Caro acadêmico! A seguir procuramos fazer uma sugestão de leitura extraída de uma entrevista de um dos principais estudiosos brasileiros no campo da história da educação e da pedagogia. A entrevista foi concedida em meados do ano de 2014, quando o projeto do primeiro Plano Nacional de Educação/PNE ainda não havia sido aprovado pelo Congresso Nacional.

LEITURA COMPLEMENTAR

Em entrevista especial ao Portal Anped, Dermeval Saviani, professor emérito da Unicamp, contextualiza o histórico de lutas que perpassa o Plano Nacional de Educação (PNE), fala sobre as expectativas para a sua aprovação, enfatiza a necessidade de se fortalecer o magistério e aponta uma equação que precisa ser superada: "podemos dizer que a política educacional brasileira desde o final da ditadura (1985) até os dias de hoje se apresenta com características condensadas nas seguintes palavras: filantropia, protelação, fragmentação e improvisação".

Portal Anped – Professor Saviani, o senhor participou ativamente da disputa pela construção do texto da LDB e do primeiro PNE. Como avalia a história da luta recente pela educação pública no Brasil?

Dermeval Saviani – A luta pela educação pública no Brasil continua bastante difícil. Por ocasião dos debates em torno da nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada em 20 de dezembro de 1961, o confronto era com os interesses privados que, capitaneados pela Igreja Católica, buscavam assegurar os subsídios públicos. Para tanto posavam de defensores da liberdade de ensino, alegando o direito das famílias de escolher o tipo de educação que deveria ser dado a seus filhos e combatendo o que chamavam de monopólio estatal do ensino.

Quando da elaboração da segunda LDB, que veio a ser aprovada em 20 de dezembro de 1996 e do Plano Nacional de Educação, que entrou em vigor em 10 de janeiro de 2001, o embate se deu com a própria instância governamental. Assim foi que o governo FHC, cuja política educacional seguia os ditames da orientação neoliberal, interferiu na reta final afastando o projeto aprovado na Câmara dos Deputados, assim como o Substitutivo aprovado na Comissão de Educação do Senado e impondo seu projeto de LDB articulado com Darcy Ribeiro, neutralizando, assim, os avanços que a luta pela escola pública havia conseguido incorporar ao projeto de LDB. No caso do PNE, à vista do projeto do MEC que não consultava os interesses do fortalecimento da educação pública, elaborou-se, no âmbito do I e do II Congresso Nacional de Educação, o Plano Nacional de Educação chamado de “projeto da sociedade” em contraposição ao “projeto do

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

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governo”. E, embora por ter entrado antes no Congresso Nacional o “projeto da sociedade” teria a primazia, esta foi invertida com a indicação para a relatoria de parlamentar do partido governista. O resultado foi um PNE não apenas aquém das expectativas dos defensores da educação pública, mas ainda mutilado pelos vetos apostos pelo presidente da República, neutralizando de modo especial as metas relativas ao financiamento da educação.

No contexto atual a luta se tornou mais complexa, pois o enfrentamento se dá diretamente com os grandes grupos empresariais, que além de atuar no ensino, têm ramificações nas forças dominantes da economia e também na própria esfera pública, seja junto aos governos, seja penetrando no interior das próprias redes de educação pública. Por isso, na conclusão do livro Sistema Nacional de Educação e Plano Nacional de Educação: significado, controvérsias e perspectivas, que lancei recentemente, registro que não será fácil seguir o caminho da defesa da educação pública de qualidade acessível a toda a população brasileira, pois a força do privado traduzida na ênfase nos mecanismos de mercado vem contaminando crescentemente a própria esfera pública. É assim que o movimento dos empresários vem ocupando espaços nas redes públicas via Undime e Consed, nos Conselhos de Educação e no próprio aparelho de Estado, como o ilustram as ações do Movimento “Todos pela Educação”. É assim também que grande parte das redes públicas, em especial as municipais, vem dispensando os livros didáticos distribuídos gratuitamente pelo MEC e adquirindo os ditos “sistemas de ensino”, como “Sistema COC”, “Sistema Objetivo”, “Sistema Positivo”, “Sistema Uno”, “Sistema Anglo” etc., com o argumento de que tais “sistemas” lhes permitem aumentar um pontinho nas avaliações do IDEB, o que até se entende: esses autodenominados “sistemas” têm know-how em adestrar para a realização de provas. É assim, ainda, que os recursos públicos da educação vêm sendo utilizados para convênios com entidades privadas, em especial no caso das creches.

Nesse contexto, é fundamental unir todas as forças representadas por milhões de professores e milhões de crianças e respectivos pais que dependem de uma educação de qualidade, para que possam sair da situação difícil em que se encontram. E considerando que 2014 é um ano de eleições nacionais, cabe aproveitar a oportunidade para contagiar todas as campanhas políticas com o tema da construção e implantação do Sistema Nacional de Educação no Brasil e aprovação de um novo Plano Nacional de Educação que efetivamente assegure ao sistema as condições necessárias para prover uma educação com o mesmo e elevado padrão de qualidade a toda a população brasileira.

De uma forma geral, qual a relação do Plano com a questão do magistério?

O adequado equacionamento do magistério é crucial, porque dele depende o alcance das metas voltadas para a elevação da qualidade da educação básica. Nesse âmbito é necessário considerar duas dimensões reciprocamente relacionadas entre si: a formação e o exercício docente. O entendimento de que o trabalho docente é condicionado pela formação resulta uma evidência lógica, assumindo caráter consensual o enunciado de que uma

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TÓPICO 3 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX

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boa formação se constitui em premissa necessária para o desenvolvimento de um trabalho docente qualitativamente satisfatório.

Mas é evidente também que as condições do exercício do magistério reciprocamente determinam, em vários sentidos, a qualidade da formação docente. Num primeiro sentido, porque a formação dos professores se dá, também, como um trabalho docente por parte dos formadores. Num segundo sentido, as condições de trabalho docente das escolas a que se destinam os professores em formação também influenciam a própria formação, na medida em que o processo formativo implica o aspecto prático, que tem como referência a rede escolar onde os estágios devem ser realizados.

Finalmente – e este talvez seja o aspecto mais importante –, as condições de trabalho docente têm um impacto decisivo na formação, uma vez que elas se ligam diretamente ao valor social da profissão. Assim sendo, se as condições de trabalho são precárias, isto é, se o ensino se realiza em situação difícil e com remuneração pouco compensadora, os jovens não terão estímulo para investir tempo e recursos numa formação mais exigente e de longa duração. Em consequência, os cursos de formação de professores terão de trabalhar com alunos desestimulados e pouco empenhados, o que se refletirá negativamente em seu desempenho. Considerando a situação atual da educação brasileira, há dois pontos de estrangulamento referentes às duas dimensões articuladas na questão do magistério que precisam ser sanados.

O primeiro ponto diz respeito à necessidade de se instituir a carreira dos profissionais da educação aumentando significativamente o valor do piso salarial dos professores e estabelecendo a jornada de tempo integral em uma única escola com no máximo 50% do tempo destinado a ministrar aulas. O restante do tempo será dedicado à preparação de aulas, correção dos trabalhos dos alunos, atendimento diferenciado aos alunos com mais dificuldades de aprendizagem, além da participação na gestão da escola.

O segundo ponto consiste na necessidade de se criar uma rede pública consistente de formação de professores ancorada nas universidades públicas. Isso é indispensável para corrigir uma grande distorção do processo de formação docente no Brasil, que se constitui no outro ponto de estrangulamento de todo o sistema educacional.

A referida distorção é a seguinte: a grande maioria dos docentes que atuam nas redes públicas de educação básica do país é formada em instituições particulares de Ensino Superior de duvidosa qualidade. Com isso, a educação básica pública fica refém do ensino privado mercantilizado, sem possibilidade de resolver seus problemas de qualidade. Portanto, diferentemente do que a mídia divulga incessantemente, não é verdade que a rede particular seja qualitativamente melhor que a rede pública. Ao contrário: a má qualidade das escolas superiores privadas de formação de professores é um dos fatores determinantes da baixa qualidade da rede pública de educação básica. É preciso, pois, organizar uma rede pública de formação docente em regime de colaboração entre a União e os estados

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UNIDADE 3 | O CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

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para assegurar o preparo adequado dos professores que irão atuar nas escolas públicas de educação básica.

O projeto de PNE trata da questão do magistério nas metas 15 e 16 (formação) e 17 e 18 (condições de exercício). Apesar de alguns avanços, o que se prevê é insuficiente, pois não assegura a formação centrada em instituições públicas e não garante as condições necessárias à carreira docente e ao exercício do magistério. Penso que caberia ao PNE fixar metas claras que permitissem no curto e médio prazo resolver de uma vez por todas a questão do magistério. Sem isso, todos os discursos em prol da melhoria da qualidade da educação pública não passarão de promessas vãs.

Em outras oportunidades o senhor tratou de históricas dificuldades estruturais do Estado brasileiro. Uma delas estaria relacionada com a histórica resistência que as elites dirigentes opõem à manutenção da educação pública. A outra estaria relacionada com a descontinuidade, também histórica, das medidas educacionais acionadas pelo Estado. O PNE contribui para enfrentar as dificuldades apontadas? Em que medida?

Considerando, como já assinalei, que o PNE não tem passado de carta de intenções, sendo ignorado na formulação e implementação das medidas de política educacional, forçoso é concluir que ele não tem contribuído para enfrentar as dificuldades apontadas, as quais vêm persistindo apesar de todas as proclamações em contrário por parte dos governantes, de modo especial em períodos eleitorais. Resumidamente, podemos dizer que a política educacional brasileira, desde o final da ditadura (1985) até os dias de hoje, se apresenta com características condensadas nas seguintes palavras: filantropia, protelação, fragmentação e improvisação.

A filantropia diz respeito à demissão do Estado em consonância com a ideia do Estado mínimo, o que se traduz na tendência a considerar que a educação é um problema de toda a sociedade e não propriamente do Estado, isto é, dos governos. A impressão é que, em lugar do princípio que figura nas constituições segundo o qual a educação é direito de todos e dever do Estado, adota-se a diretriz contrária: a educação passa a ser dever de todos e direito do Estado. Com efeito, o Estado se mantém como regulador, como aquele que controla, pela avaliação, a educação, mas transfere para a “sociedade” as responsabilidades pela sua manutenção e pela garantia de sua qualidade. Veja-se como exemplo, no governo FHC, o mote “Acorda Brasil. Está na hora da escola” e, no governo Lula, o “Compromisso Todos pela Educação”, ementa do decreto que instituiu o PDE.

A protelação significa o adiamento constante do enfrentamento dos problemas. Tomemos o exemplo dos dois pontos fixados pelo Art. 60 das Disposições Transitórias da Constituição: eliminação do analfabetismo e universalização do Ensino Fundamental. A Constituição fixou o prazo de 10 anos para o cumprimento dessa meta: 1998. O Plano Decenal “Educação para Todos”, de 1993, também 10 anos: 2003. O FUNDEF, de 1996, igualmente 10 anos: 2006. O FUNDEB, de 2007, 14 anos: 2021. O PDE, de 2007, 15 anos: 2022. E o PNE, 10 anos a partir de sua aprovação.

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TÓPICO 3 | CONTEXTO HISTÓRICO-FILOSÓFICO EDUCACIONAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX

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A fragmentação se constata pelas inúmeras medidas que se sucedem e se justapõem perpetuando a frase do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932: “todos os nossos esforços, sem unidade de plano e sem espírito de continuidade, não lograram ainda criar um sistema de organização escolar” à altura das necessidades do país.

A improvisação se manifesta no fato de que para cada ponto que se levanta como importante busca-se logo aprovar uma emenda constitucional, uma lei ou baixar um decreto ou portaria sem atentar para sua efetiva necessidade e sua justaposição com outras medidas correlatas ou de efeito equivalente.

O resultado observável empiricamente é a precarização geral da educação em todo o país, visível na rede física, nos equipamentos, nas condições de trabalho e salários dos profissionais da educação, nas teorias pedagógicas de ensino e aprendizagem, nos currículos e na avaliação dos resultados.

Em síntese, eis a perversa equação que expressa o significado da política educacional brasileira desde o final da ditadura (1985) até os dias de hoje:

FILANTROPIA + PROTELAÇÃO + FRAGMENTAÇÃO + IMPROVISAÇÃO = PRECARIZAÇÃO GERAL DO ENSINO NO PAÍS.

Adaptada de entrevista concedida em abril de 2014 à Anped. Disponível em: <http://www.anped.org.br/news/entrevista-com-dermeval-saviani-pne>. Acesso em: 6 nov. 2016.

No início do mês de junho de 2014, a Câmara dos Deputados havia terminado a votação e aprovação do PNE, e entre as principais diretrizes do Plano constam a erradicação do analfabetismo; o aumento de vagas ofertadas em creches, no Ensino Médio, no ensino profissionalizante e nas universidades públicas; oferta de pelo menos 25% do ensino básico na modalidade integral; a universalização do atendimento escolar para crianças de 4 a 5 anos; aumento paulatino dos investimentos do PIB ao ano à educação, o atual percentual de 5,3% alcançando 10% no ano de 2024.

Para ficar atualizado no que diz respeito a pesquisas, eventos, congressos, leis, diretrizes e demais questões sobre a educação e o cotidiano escolar, observe a dica que é feita a seguir:

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO/ANPED:Acesse o site da ANPED: trata-se de uma organização sem fins lucrativos que reúne estudos e pesquisas em nível de pós-graduação de todo o Brasil. Disponível em: <http://www.anped.org.br/>.

DICAS

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Neste tópico, o acadêmico pôde observar o processo da construção da escola no Brasil.

• Além dos sistemas regulares de educação, o Brasil possui alguns sistemas específicos de educação. Um dos mais tradicionais é o ensino militar, que tem como característica a formação de militares para as fileiras das forças armadas.

• O ensino técnico, cujo maior exemplo é o sistema “S”, que tem como função formar profissionais para os diferentes ramos industriais. Também a educação para os especiais, como os cegos, surdos e portadores de Síndrome de Down, que possuem escolas específicas.

• Contemplamos os desafios atuais da educação, no que tange às novas tecnologias educacionais. A instituição escolar está sendo modificada pela pressão social criada pelas novas tecnologias, em especial a informática.

• A partir dos anos de 1980 ocorreu a aproximação da escola com a comunidade e as pessoas propriamente ditas, assim, espaços não escolares passaram a ser compreendidos como espaços de ensino e aprendizagem, tais como CAPs, CRAs, museus, arquivos, sedes de sindicatos, ONGs, associações, locais em que ocorrem feiras, entre outros.

• Os PCN (1997) enfatizam que sejam considerados conteúdos os temas que contemplam o exercício da cidadania e o respeito à diversidade, as relações sociais, o mundo do trabalho, os temas transversais (ética, meio ambiente, pluralidade cultural) nas mais diferentes disciplinas, conteúdos, séries e faixas etárias dos estudantes.

RESUMO DO TÓPICO 3

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AUTOATIVIDADE

1 Muitos jargões são utilizados pelos profissionais de ensino, e são fundamentais para um melhor conhecimento do panorama educacional brasileiro na contemporaneidade. Neste sentido, pergunta-se: o que podemos compreender por sistema “S”? Assinale a alternativa correta:

a) ( ) Sistema social e educacional mantido pelas confederações de indústrias e do comércio dos estados da federação, que se materializam nas famosas escolas técnicas e superiores, como o SESI, SENAI, SENAC E SESC, entre outras instituições.b) ( ) Sistema social e educacional formado pelas ações comunitárias da Igreja Católica no Brasil, que se materializam nos famosos hospitais da Santa Casa de Misericórdia, importante para a formação dos médicos residentes brasileiros.c) ( ) Sistema social e educacional mantido pelas igrejas protestantes brasileiras, em especial simbolizadas pelas famosas “Sociedades de Educação”, como a Universidade Presbiteriana Mackenzie ou a Universidade Luterana Brasileira. d) ( ) Sistema social e educacional das Forças Armadas Brasileiras, que tem como símbolo a hierarquia, a disciplina e a obediência às ordens superiores.

2 Em relação à educação dos portadores de necessidades especiais, pergunta-se: qual é a importância das APAEs? Assinale a alternativa correta.

a) ( ) A Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) é uma importante instituição que se preocupa com a educação dos portadores da Síndrome de Down. b) ( ) A APAE (Associação dos Professores e Auxiliares de Educação) é uma instituição que serve para a inserção dos surdos-mudos no mercado profissional. c) ( ) A APAE (Associação dos Profissionais e Auxiliares Estaduais) é uma instituição que visa à colocação profissional de menores em conflito com a lei. d) ( ) A APAE (Associação dos Portadores dos Excepcionais da Escola) é uma associação extinta e que pouco contribuiu para a educação ao longo dos anos.

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