construindo a gestÃo social em conselhos...

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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local CÍNTIA ALVES ARAÚJO CONSTRUINDO A GESTÃO SOCIAL EM CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE: espaço para o exercício do saber e participação Belo Horizonte 2014

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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO

Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local

CÍNTIA ALVES ARAÚJO

CONSTRUINDO A GESTÃO SOCIAL EM

CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE:

espaço para o exercício do saber e participação

Belo Horizonte

2014

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CÍNTIA ALVES ARAÚJO

CONSTRUINDO A GESTÃO SOCIAL EM

CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE:

espaço para o exercício do saber e participação

Dissertação apresentada ao Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Inovações Sociais, Educação e Desenvolvimento Local. Linha de pesquisa: Gestão Social e Desenvolvimento Local. Orientadora: Profa. Dra. Matilde Meire Miranda Cadete.

Belo Horizonte

2014

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Ao meu filho, Thiago;

que ele cresça em uma sociedade

na qual os direitos sejam respeitados,

as vozes ouvidas

e a justiça social não seja mera utopia.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por abençoar minha caminhada todos os dias, concedendo-me a força

necessária para não desanimar diante das dificuldades.

De maneira especial, à educadora Matilde Meire Miranda Cadete, que com sua

sabedoria sublime me fez caminhar nos trilhos certos, possibilitando que eu

alcançasse esse sonho.

Aos conselheiros municipais de saúde de São Gonçalo do Rio Abaixo, que

colaboraram para a construção desse conhecimento, em especial à conselheira

Kelly Cristina Soares, que com sua dedicação muito contribuiu para o andamento

da pesquisa.

À gestora municipal de saúde do municíoio de São Gonçalo do Rio Abaixo, por

possibilitar a realização deste trabalho.

Aos mestres e amigos do curso de Gestão Social, Educação e Desenvolvimento

Local do Centro Universitário UNA, pelo ganho pessoal adquirido com tantas

experiências e compartilhamento de saberes.

Ao Rogério, pela companhia nas estradas da vida, por ter sempre uma palavra de

estímulo.

Aos meus pais, que nunca mediram esforços e que me deram a maior herança

que se pode receber: a educação. A minha irmã Renata e sobrinhos, vocês são

as alegrias da minha vida.

Ao Thiago, que chegou para fazer com que eu entendesse o sentido da vida, fez

surgir em mim forças jamais imaginadas e me transformou em um ser humano

melhor. Eu te amo, meu filho.

A todos, muito obrigada!

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“Talvez não tenhamos conseguido fazer o melhor,

mas lutamos para que o melhor fosse feito.

Não somos o que deveríamos ser,

não somos o que iremos ser...

Mas Graças a Deus, não somos o que éramos.”

Martin Luther King.

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RESUMO

Os Conselhos Municipais de Saúde representam, na atualidade, um importante instrumento de participação social na construção das políticas públicas e fiscalização das ações dos órgãos gestores do Sistema Único de Saúde. Entretanto, apesar de instituídos legalmente, os conselhos enfrentam diversas dificuldades para o seu pleno funcionamento. Nesse contexto, esta pesquisa objetivou analisar as dificuldades enfrentadas pelo Conselho Municipal de Saúde de São Gonçalo do Rio Abaixo-MG e a efetividade desse canal de participação no acompanhamento, controle e fiscalização das políticas públicas para o exercício do controle social. Trata-se de uma investigação de cunho qualitativo, realizada por meio de análise documental, entrevista semiestruturada e observação participante. O estudo proposto buscou compreender o processo que envolve esse canal de participação. Foram analisadas 31 atas de reuniões do Conselho realizadas no período de 2010 a 2012, configurando esse período dois anos de exercício do referido Conselho. Assim, foi observada a capacidade de vocalização dos conselheiros, relativas a cada segmento representativo, no qual se constatou a predominância de vocalização do segmento governamental. No que diz respeito às entrevistas, participaram do estudo 10 membros titulares, representando os segmentos dos usuários, governo e trabalhadores de saúde. Para fundamentar a análise e organizar os dados de natureza verbal, recorreu-se à técnica de categorização proposta por Bardin (2011). Os conselheiros identificam como entraves a dificuldade no acesso à informação, falta de preparo para a função, falta de tempo para se dedicar às funções do Conselho, dificuldades na infraestrutura, horário incompatível com as atribuições cotidianas dos conselheiros e acesso prévio aos documentos. O estudo indica que os representantes dos segmentos da sociedade não estão conseguindo traduzir em ações as suas reais demandas e as da base que representam. Os resultados obtidos possibilitaram a elaboração de uma proposta de intervenção que poderá contribuir para o empoderamento dos atores sociais e fortalecimento da participação cidadã. Palavras-chave: Conselhos de Saúde. Controle social. Participação cidadã. Gestão social.

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ABSTRACT

The municipal health Councils represent today an important instrument of social participation in the construction of public policies and monitoring of the actions of the managers of the unified Health System. However, although legally established, the Councils are facing several difficulties for their full operation. In this context, this study aimed to analyze the difficulties faced by the Municipal Council of health of São Gonçalo do Rio Abaixo, Minas Gerais and the effectiveness of this participation channel in monitoring, control and surveillance of public policies for the exercise of social control. This is a qualitative oriented research, performed by means of document analysis, participant observation and semi-structured interview. The proposed study sought to understand the process that involves the participation channel. Were analyzed 31 minutes of Board meetings held during the period from 2010 to 2012, setting this period, two years of exercise of that Council. Thus, it was observed the ability of vocalization of Councillors, for each representative segment, where they found the predominance of vocalization of the governmental segment. With regard to interviews, participated in this study ten full members, representing the segments of users, Government and health workers. To support and organize the data analysis of verbal nature, resorted to the categorization technique proposed by Bardin (2011). The counselors point out how difficult barriers in access to information, lack of preparation for the role, lack of time to devote to the functions of the Council, difficulties in the infrastructure, time incompatible with daily assignments of Directors and prior access to documents. The study indicates that representatives of segments of society are not able to translate into action their real demands and base charges they represent. The results obtained made it possible to draw up a proposal for intervention that could contribute to the empowerment of the social actors and strengthening of citizen participation. Key words: Health advice. Social Control. Citizen participation. Social Management.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CAPS Centro de Atenção Psicossocial

CF Constituição Federal

CMS Conselho Municipal de Saúde

CNS Conselho Nacional de Saúde

CS Conferência de Saúde

EC29 Emenda Constitucional 29

EP Educação Permanente

ES Estratégia de Saúde da Família

MS Ministério da Saúde

ONG Organização Não Governamental

PIB Produto Interno Bruto

PMS Plano Municipal de Saúde

PNI Programa Nacional de Imunização

PSF Programa Saúde da Família

RAG Relatório Anual de Gestão

SGRA São Gonçalo do Rio Abaixo

SUS Sistema Único de Saúde

TIC Tecnologias de Informação e Comunicação

VISA Vigilância Sanitária

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura

FIGURA 1 - Layout do blog do Conselho de Saúde de São Gonçalo do Rio

Abaixo......................................................................................

99

Gráfico

GRÁFICO 1 - Evolução da população, 1991, 2000 e 2010........................... 18

Quadros

QUADRO 1 - Dificuldades apresentadas pelo CMS e os autores

correlacionados........................................................................

36

QUADRO 2 - Participação nas eleições municipais....................................... 74

QUADRO 3 - Significado do Conselho de Saúde.......................................... 76

QUADRO 4 - Papel dos conselheiros de saúde............................................ 77

QUADRO 5 - Competências dos CMS.......................................................... 79

QUADRO 6 - Participação nas decisões do Conselho.................................. 81

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 - Vocalizações por segmento no CMS de SGRA, nas reuniões

de 2010 a 2012.........................................................................

58

TABELA 2 - Tipos de manifestação por segmento de representação no

CMS de SGRA..........................................................................

61

TABELA 3 - Interesse por política................................................................ 73

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SUMÁRIO1

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 13

1.1 Objeto da pesquisa ............................................................................................. 13

1.2 Contextualizando o problema .............................................................................. 17

2 REFERENCIAL TEÓRICO- CONCEITUAL............................................................ 21

2.1 Democracia, participação e representação ......................................................... 21

2.2 Participação na sua concepção conceitual ......................................................... 24

2.3 Participação social no campo da saúde .............................................................. 26

2.4 O Sistema Único de Saúde e suas perspectivas ................................................ 29

2.5 Arcabouço Legal dos Conselhos de Saúde no Brasil ........................................ 32

2.5.1 Conselhos Municipais de Saúde: a institucionalização da participação social . 32

2.5.2 Retrato dos conselhos de saúde no Brasil ...................................................... 34

2.5.3 Conselhos: entre a paridade e a representatividade ........................................ 37

2.6 A gestão social nos conselhos: possibilidade de exercício do controle social .... 39

2.7 O empoderamento social e o poder local como instrumentalizadores da gestão

social nas políticas de saúde .................................................................................... 43

2.8 Considerações .................................................................................................... 45

3 OBJETIVOS ........................................................................................................... 47

3.1 Objetivo geral ...................................................................................................... 47

3.2 Objetivos específicos .......................................................................................... 47

4 METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS DE INVESTIGAÇÃO ............................... 48

4.1 Caminho metodológico........................................................................................ 48

4.2 Caracterização do cenário da pesquisa .............................................................. 48

4.3 Os sujeitos da pesquisa ...................................................................................... 49

4.4 Procedimentos de coleta e análise de dados ...................................................... 50

4.5. Técnica e procedimentos para a coleta dos dados ............................................ 51

1 Este trabalho foi revisado de acordo com as novas regras ortográficas aprovadas pelo Acordo

Ortográfico assinado entre os países que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), em vigor no Brasil desde 2009. E foi formatado de acordo com a ABNT NBR 14724 de 17.04.2011.

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4.5.1 Pesquisa documental ....................................................................................... 51

4.5.2 Entrevistas ....................................................................................................... 51

4.5.3 Observação participante .................................................................................. 52

4. 6 Procedimentos adotados para a análise dos dados ........................................... 52

4.7 Aspectos éticos da pesquisa ............................................................................... 53

5 RESULTADOS E ANÁLISE DOS DADOS ............................................................ 54

5.1 Análise documental ............................................................................................. 54

5.2 Entrevistas com os conselheiros do CMS de São Gonçalo do Rio Abaixo ......... 66

5.2.1 Perfil dos sujeitos ............................................................................................. 68

5.2.2 Análise dos dados coletados nas entrevistas ................................................... 70

5.3 Observação participante .................................................................................... 88

6 CONTRIBUIÇÕES TÉCNICAS: PROJETO DE INTERVENÇÃO BLOG

CONSELHO DE SAÚDE DE SÃO GONÇALO DO RIO ABAIXOErro! Indicador não definido.

6.1 Introdução ........................................................................................................... 90

6.2 Resultados da pesquisa e análise ....................................................................... 92

6.3 Problema ............................................................................................................. 94

6.4 Justificativa .......................................................................................................... 94

6.5 Objetivos ............................................................................................................. 97

6.5.1 Objetivo geral ................................................................................................... 97

6.5.2 Objetivos específicos ....................................................................................... 97

6.6 Metodologia ......................................................................................................... 97

6.7 Considerações finais do projeto de intervenção .................................................. 98

Referências ............................................................................................................... 99

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 101

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 109

APÊNDICES E ANEXOS ........................................................................................ 116

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1 INTRODUÇÃO

A pesquisa realizada para o mestrado em Gestão Social, Educação e

Desenvolvimento Local abordou a participação social no âmbito dos Conselhos

Municipais de Saúde. A ideia foi possibilitar reflexão e diálogo sobre a

participação da sociedade brasileira nos espaços de negociação e deliberação

das políticas públicas no campo da saúde. Como contribuição, buscou-se a

construção de intervenções que favorecessem o desenvolvimento local dessas

instâncias deliberativas.

Seu objetivo principal foi avaliar as dificuldades enfrentadas pelo Conselho

Municipal de Saúde de São Gonçalo do Rio Abaixo e a efetividade desse canal de

participação no exercício do controle social. Para alcançar esse propósito, a

investigação foi construída em quatro momentos:

a) Conhecer os processos vivenciados para a formação do atual Conselho em

São Gonçalo do Rio Abaixo.

b) Verificar o sentido atribuído pelos conselheiros quanto à sua participação

nesses espaços e à parceria com a comunidade que representam.

c) Discutir o discursar político e a dimensão técnica vinculada à participação

nos conselhos.

d) Elaborar uma proposta de intervenção visando contribuir para a

participação social consciente desses conselheiros.

Nos dois subitens que se seguem, serão apresentados o objeto e o contexto da

pesquisa, como tentativa de legitimar a abordagem da temática escolhida para ser

desvelada.

1.1 Objeto da pesquisa

O fim do regime ditatorial e o retorno das eleições diretas na década de 80

marcaram o processo de redemocratização do Brasil. A escolha dos seus

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governantes fez revigorar o sentimento de democracia na população. Dessa

forma, ocorreu no país uma busca pela ruptura de um Estado centralizador,

autoritário e detentor exclusivo do poder. Ressaltam-se as iniciativas e esforços

associados aos movimentos populares pela democratização do país. Assim:

O povo, os excluídos dos círculos do poder dominante, eram os agentes e os atores básicos da participação popular. Foi um período de luta nacional pelo acesso e reconhecimento dos direitos sociais, econômicos e políticos dos setores populares... tratava-se de mudar as regras do controle social e de alterar a forma de fazer política no país (GOHN, 2007, p. 50).

As lutas da sociedade civil pela conquista dos direitos sociais culminaram com a

Constituição Federal (CF) de 1988. Por meio dessa Constituição, os brasileiros

obtiveram diversas conquistas, entre elas o avanço nos direitos sociais e políticos,

quando dispositivos da democracia representativa foram combinados com

dispositivos da democracia participativa, entre os quais a diretriz da participação

da comunidade na organização do Sistema Único de Saúde (SUS) (OLIVEIRA;

PINHEIRO, 2010, p. 2456).

A saúde passa a ser considerada direito de todos e dever do Estado, dever este

garantido mediante políticas sociais e econômicas, com vistas não só à redução

de agravos, mas também ao acesso universal e igualitário às ações e serviços.

O SUS é constituído pelo conjunto dessas ações e serviços prestados por órgãos

e instituições públicas federais, estaduais e municipais e, complementarmente,

pela iniciativa privada que se vincule a ele (LANDERDHAL et al., 2010, p. 2432).

Criado pela CF de 1988, foi regulamentado pelas Leis nº 8.080/90 (BRASIL,

1990a) e nº 8.142/90 (BRASIL, 1990b). Além da participação da comunidade,

outras duas diretrizes organizaram esse sistema público, sendo elas: a

descentralização, com direção única em cada esfera de governo, e o atendimento

integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços

assistenciais (BRASIL, 1988, art. 198).

A sociedade passa a ter garantido um canal de participação direto com a

formulação e execução das políticas públicas. A Lei Orgânica nº 8.142/90

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estabelece como instâncias colegiadas os Conselhos Municipais de Saúde (CMS)

e as Conferências de Saúde (CS), em cada esfera de governo (BRASIL, 1990b).

As conferências têm por finalidade avaliar a situação de saúde e propor diretrizes

para a formulação da política de saúde; já os conselhos atuam na formulação de

estratégias e no controle da execução da política de saúde, inclusive nos

aspectos econômicos e financeiros.

Tanto nas conferências como nos conselhos de saúde, foco deste estudo, a

participação do cidadão em todas as etapas do processo é requisito fundamental

para o exercício do controle social.

Os conselhos de saúde atuam, portanto, na consolidação do controle social,

entendido como a forma da sociedade participar e dialogar com o Estado, de

maneira a possibilitar ações voltadas para o interesse da comunidade. Para

Landerdhal et al. (2010, p. 2432), o controle social permite à população o direito

de fiscalizar as ações do Estado em relação à elaboração, controle e fiscalização

das políticas de saúde, dentro de cada esfera de atuação.

A participação pode provocar nos indivíduos a necessidade de busca constante

para o alcance de mais autonomia e liberdade de decisão. Apesar de vários

avanços nessas discussões, muito ainda tem que ser feito para garantir aos

cidadãos a existência de espaços efetivamente democráticos.

Retomando a discussão sobre os CMS, por meio da Lei nº 8.142/90, a

participação da comunidade ganha sentido de participação política a partir do

momento em que passa a deliberar sobre os caminhos das políticas de saúde.

No tocante à participação em saúde, ela é definida por Machado (1986 apud

BRAVO; CORREIA, 2012, p. 128) como o “conjunto de intervenções que as

diferentes forças sociais realizam para influenciar a formulação, a execução e a

avaliação das políticas públicas para o setor saúde”.

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Pela primeira vez, no campo da saúde, a população passa a ter garantido o direito

de questionar e decidir sobre os caminhos das políticas públicas na instância

local. Porém, mesmo tendo o direito garantido em lei, diversas dificuldades foram

e continuam sendo enfrentadas pelos conselhos em todo o país.

Atuando em conselhos de saúde, é instigador o fato de que a população tem nas

mãos um poderoso instrumento de gestão, que é a garantia de participação na

composição dos CMS e o caráter deliberativo desses conselhos. Porém, diversos

estudos trazem como realidade a dificuldade do efetivo exercício do controle

social e da participação popular. Grande parte das discussões é superficial, os

pontos mais críticos e relevantes não são aprofundados, existe pouca

participação da população e a maior parte das informações não chega até a

comunidade. Como consequência, inúmeras decisões, projetos e propostas são

aprovados sem o devido questionamento ou discussão por parte dos

conselheiros.

De acordo com Duarte e Machado (2012), em referência à realidade dos

conselhos de saúde no Brasil, alguns nós críticos podem ser identificados como a

dificuldade dos conselhos de saúde em deliberar conscientemente sobre os

assuntos em pauta; a baixa influência dos colegiados na condução dos sistemas

municipais de saúde; a existência de conselhos apenas cumprindo seu papel na

legislação; a pouca cultura sobre controle social nas práticas municipais; o

afastamento dos conselhos diante da comunidade que representam e o

desconhecimento por parte da população da própria existência dos conselhos.

Dessa forma, surgem os seguintes questionamentos: serão hoje os CMS efetivos

canais de participação, controle e fiscalização da população sobre as políticas

públicas? Que dificuldades seus representantes enfrentam para o exercício e

participação no processo de controle e deliberação das políticas públicas? Os

conselheiros de saúde sentem-se corresponsáveis e atuam em conjunto com as

comunidades que representam? O acesso aos CMS tem sido exercido de

maneira democrática?

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Atuando na área da saúde, especialmente na saúde, percebe-se que existe

distanciamento nos processos de decisão. Esse distanciamento se dá pelos

gestores de saúde e governantes, que acabam sendo os detentores da

informação. A principal consequência é a baixa participação e atuação tanto de

trabalhadores como de usuários nos processos de decisão.

1.2 Contextualizando o problema

O povoado de Rio Abaixo do Mato Dentro surgiu aos pés da Serra do Catungui e

às margens do Ribeirão Santa Bárbara, aproximadamente em 1720. Suas terras

pertenciam ao município de Santa Bárbara do Mato Dentro, conforme explicitado

no Plano Municipal de Saúde (PMS) (SÃO GONÇALO DO RIO ABAIXO - SGRA,

2013).

A ocupação do território deu-se, em grande parte, pela afoita procura de terras

férteis, para a prática da agricultura às margens do Rio Una e à procura de ouro

no Rio Santa Bárbara. Alguns anos depois já existia a Capela de São Gonçalo,

erguida em homenagem ao santo português. Em 1733 José de Olanda Braga

doou o terreno para a construção de uma capela maior de São Gonçalo, em Rio

Abaixo, daí o nome de São Gonçalo do Rio Abaixo (SGRA, 2013).

A pequena e tranquila São Gonçalo do Rio Abaixo guarda em suas ruas e

avenidas resquícios dos tempos áureos em que desbravadores corriam pelas

terras brasileiras em busca de riquezas há cerca de 300 anos. Hoje casarões e

igrejas centenárias dividem espaços, com construções modernas revelando o

desenvolvimento sustentável, com respeito ao patrimônio histórico e ao meio

ambiente.

Situado a 84 km da capital Belo Horizonte, São Gonçalo possui posicionamento

geográfico privilegiado. Seu território, 364 km², abriga uma das maiores e mais

produtivas minas de minério de ferro em capacidade inicial de exploração do

mundo, administrada pela VALE.

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Em seus mais de 360 km2, 52% da população residem na zona rural, totalizando

uma população de 9.777 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA

E ESTATÍSTICA – IBGE, 2010). Em toda a extensão do município existem

aproximadamente 500 propriedades. A estrutura fundiária é constituída,

basicamente, de pequenas propriedades (áreas inferiores a 100 ha), com mais de

95% nas mãos de agricultores familiares.

O GRÁF. 1 confirma as informações citadas anteriormente:

GRÁFICO 1 – Evolução da população, 1991, 2000 e 2010

Fonte: SGRA (2013).

Os crescentes investimentos, principalmente no setor de mineração, fazem do

município uma pérola no estado de Minas Gerais, cujo aumento constante do

Produto Interno Bruto (PIB) e da arrecadação municipal eleva sensivelmente a

qualidade de vida da população e atrai investidores de todas as regiões do país.

São Gonçalo do Rio Abaixo é hoje, devido à expansão do mercado minerador e

da arrecadação de tributos, um polo promissor de desenvolvimento. A cidade

passa por mudanças históricas e culturais, o que influencia diretamente no

cotidiano dos moradores.

Crescimento econômico associado ao aumento populacional tem gerado impacto

até mesmo na aceitação dos moradores mais antigos, daqueles que possuem

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raízes na cidade. A cobrança dos órgãos públicos quanto à preservação dos

valores e tradições tem sido grande.

É interessante investigar se essas cobranças têm realmente sido trazidas para um

dos espaços possíveis de discussão e negociação que são os conselhos

gestores.

A hipótese que orientou esta investigação é a ocorrência de uma baixa

participação e atuação dos trabalhadores e usuários nos processos de decisão no

Conselho devido à existência de um distanciamento entre estes e o segmento

governamental. Apesar da garantia da participação da sociedade na formulação

das políticas públicas, acredita-se na existência de mecanismos de manipulação e

de diferentes escalas de poder dentro desses espaços de deliberação,

dificultando a efetiva representação da sociedade civil.

Considerando o tempo de existência do CMS de SGRA, é instigante saber como

tem sido a atuação desse órgão, quais são os segmentos da sociedade que estão

representados no espaço desse Conselho. Existem vinculações políticas e

partidárias associadas? O processo de escolha dos participantes tem sido

democrático? As políticas de saúde estão respondendo aos anseios da

população?

O CMS é um importante instrumento de mobilização social e participação nas

políticas de saúde do país. Torna-se um grande desafio fazer com que os órgãos

de controle social, como os CMS, ampliem o debate em conjunto com a

comunidade que representam e com os gestores para que os princípios do SUS,

entre eles a participação social, sejam fortalecidos.

Nesse sentido, a questão central deste estudo é a identificação das principais

dificuldades enfrentadas para o exercício do controle social e participação na

formulação e acompanhamento das políticas públicas no âmbito do CMS de uma

cidade do interior de Minas Gerais.

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20

Acredita-se ser relevante contribuir nesse movimento para a participação cidadã,

seja por meio dos resultados da pesquisa que poderão subsidiar outras pesquisas

e trabalhos na temática ou pelo projeto de intervenção que poderá ultrapassar o

espaço do Conselho em estudo.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO-CONCEITUAL

2.1 Democracia, participação e representação

A democracia é o regime político mais adotado no mundo contemporâneo.

Defensores afirmam ser a democracia o regime em que os cidadãos participam.

Porém, é interessante observar que muitas vezes a prática democrática distancia-

se muito da sua concepção teórica. Nem sempre em um regime dito democrático

existe participação dos cidadãos nas decisões dos governantes.

O debate sobre o sistema democrático começou a ser travado por grandes

filósofos e pensadores dos séculos XVII, XVIII e XIX. De um lado estariam os

chamados “neorrepublicanos”, pensadores que de modo ou de outro defendiam

um novo sistema político que estava sendo construído e que, em linhas gerais,

caracterizava-se por seu poder representativo. Exemplos desses pensadores

seriam Montesquieu, Edmund Burke e Immanuel Kant. Do outro lado estaria Jean

Jacques Rousseau com seu discurso que ganhou grande repercussão em todo o

mundo (LATTMAN-WELTMAN, 2008).

Para Sipioni e Zorzal e Silva (2013, p. 148), “esses diversos teóricos abordaram o

tema com bastante propriedade, ao tratarem da questão de como uma ordem

política poderia ser constituída de forma a postar-se legítima aos cidadãos, os

quais, por isso mesmo, prestariam obediência à autoridade constituída”. Os

questionamentos fundavam-se na busca de um meio legítimo que conseguisse

atender aos interesses coletivos.

A partir da segunda metade do século XX, “as relações entre Estado e sociedade

mudaram profundamente e a dinâmica social impôs novos comportamentos e

posturas aos atores individuais e coletivos” (BISPO JÚNIOR; GERSCHMAN,

2013, p. 8).

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Surge, então, outro grupo de teóricos da democracia, sendo os principais Jürgen

Habermas e Joshua Cohen, que voltaram suas discussões na busca da

recuperação de tradições participativas no processo de construção de identidades

nacionais homogêneas (AVRITZER, 2002 apud SIPIONI; ZORZAL e SILVA, 2013,

p. 149).

Em suma, se o grupo de autores da primeira metade do século XX defende o abandono do papel da mobilização social e da ação coletiva na construção democrática, com a consequente supervalorização do papel dos mecanismos de representação, o grupo que emerge na segunda metade do século XX centra suas reflexões nos mecanismos restritivos à participação e à soberania ampliada, propondo como solução a combinação dos mecanismos de representação com os mecanismos societários de participação.

A década de 80 foi marcada por inúmeras lutas e protestos de diversos setores da

sociedade contra um regime autoritário. A busca pelos direitos e pelo atendimento

às demandas reprimidas da população fortalecia os movimentos sociais que se

espalhavam pelo país. Almejava-se expandir o processo democrático para além

do voto. Com a inserção de novos atores nos espaços deliberativos, surgiram

novas formas de representação ligadas à sociedade civil, diferentes da

representação parlamentar que se tornou pouco eficaz e deslegitimada. Essas

formas alternativas de participação buscam substituir a representação e a criação

de instrumentos que favoreçam a accountability ou prestação de contas (SIPIONI;

ZORZAL e SILVA, 2013).

Esses autores ainda explanam acerca do conflito que residia na aceitação e/ou

negação da democracia como forma de governo. Houve, então, intensa disputa

entre diversas concepções de democracia, condensadas em dois campos

politicamente distintos: a democracia representativa e a democracia participativa.

Para Sipioni e Zorzal e Silva (2013, p. 149), “as críticas atuais da democracia

participativa em relação è democracia representativa problematizam o fato desta

se referir a indivíduos isolados como sujeitos políticos”. Na concepção

participativa, seria impossível um indivíduo apenas produzir um debate plural,

amplo, que promova mudanças significativas políticas e institucional; defende a

participação coletiva nos processos decisórios. Já a democracia representativa

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reduz a soberania popular a um procedimento de opção por governos, ao

enfatizar a participação como o ato do voto.

Bispo Júnior e Gerschman (2013) consideram a democracia sob dois pontos de

vista. Do ponto de vista macroestrutural, tem como características as eleições

periódicas, concorrência entre partidos, direito de associação, separação dos

poderes, respeito e garantia dos direitos individuais. Já a concepção minimalista

considera a democracia “como procedimento e como forma” (BISPO JÚNIOR;

GERSCHMAN, 2013, p. 9). Nesse sentido, ela é entendida como atividade-meio

para se alcançar o processo decisório. Para os autores, o voto é de ordem

pessoal, de caráter individual e não representa as reais demandas da sociedade.

Ter como direito garantido a participação no processo eleitoral não representa por

si só a participação democrática. Tanto é verdade que, na época atual, a

população volta para as ruas como forma de protestar, por não conseguir fazer

valer os seus direitos e pelo não atendimento às demandas da sociedade como

um todo. Para que as decisões estejam de acordo com os anseios dos cidadãos,

torna-se primordial a participação ativa e consciente durante os processos

deliberativos. Oliveira e Pinheiro (2010, p. 2463) afirmam que “a democracia

pressupõe não só a liberdade, mas também a igualdade e justiça social, ainda

longe de se concretizar na nossa realidade”.

Guiados pelos ideais participacionistas, os movimentos sociais buscavam

espaços legítimos para a participação nos processos decisórios, que

representassem canais de comunicação direta com o Estado. Os conselhos

gestores de políticas públicas surgem, então, como possibilidades de atendimento

às demandas da população nas áreas de saúde, assistência social, educação,

segurança pública, entre outros. Para Avritzer (2010), os conselhos representam

uma democracia “híbrida”, na qual a democracia participativa estaria em

concomitância com democracia eleitoral, havendo uma complementaridade entre

a democracia participativa e a representativa.

Porém, para Ferraz (2009), nesse espaço existem práticas clientelistas como o

distanciamento entre os representantes e os representados, o que ocasiona uma

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tensão entre a democracia representativa e a participativa. Para a autora, a

participação nos conselhos não é direta, como o idealizado quando foram

instituídos os conselhos. A representação continua a se fazer presente, pois é

atribuída a alguém (no caso, o conselheiro) a função de representar os anseios e

necessidades dos representados.

Young (2006) enfatiza a necessidade de se entender a representação de maneira

menos utópica e perceber que existirão interesses diferentes entre representantes

e representados e a partir daí é que se poderá estabelecer um diálogo

democrático comunicativo. Dessa forma, a consolidação dos conselhos gestores

é um avanço no processo democrático, mas, como toda prática democrática, são

necessários critérios e cuidado para que não se tornem espaços burocratizados e

clientelistas, deixando de exercer o papel que lhes foi confiado pela sociedade.

2.2 Participação na sua concepção conceitual

A palavra participação está vinculada ao sentido de “ter parte”, “tomar parte” ou

“fazer parte” de algum grupo ou associação (VALDIVINO E SILVA; SILVA;

SOUZA, 2013, p. 255). Todavia, sabe-se que fazer parte de um grupo não

significa propriamente participação nas decisões desse grupo. Fundamental no

processo participativo também é a qualidade dessa participação.

Foi no final da década de 60 que o termo participação começou a ganhar força

nas arenas políticas. Segundo Paterman (1992), na Europa e nos Estados Unidos

políticos recorriam ao termo “participação” como forma de sensibilizar a

população excluída.

Segundo Gohn (2007, p. 14), participação é uma das palavras mais utilizadas no

vocabulário político, científico e popular da modernidade. Considerando o período

histórico ao qual se refere, pode estar associada a outros termos como

democracia, representação, organização, conscientização, cidadania,

solidariedade e exclusão, entre outros.

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Ainda segundo essa autora, é possível analisar a participação segundo três níveis

básicos: o conceitual, o político e o da prática social. O conceitual é ambíguo,

variando de acordo com o paradigma teórico em que se baseia. Já o nível político

está relacionado não somente aos processos de democratização, mas também

como um discurso mistificador que resulta em políticas sociais de controle social.

As práticas seriam as ações concretas engendradas nas lutas, movimentos e

organizações em busca de um objetivo, ou seja, o processo social propriamente

dito (GOHN, 2007, p. 14).

Paterman (1992) discute a participação distinguindo-a em: pseudoparticipação,

participação parcial e participação total. Quando se fala em pseudoparticipação,

percebe-se a ocorrência de apenas uma consulta ao público acerca de algum

assunto, as decisões são apenas informadas ao grupo. No concernente à

participação parcial, vários sujeitos participam do processo, mas somente uma

parte realmente decide; já na participação total ou plena, todos os grupos

participam das discussões e possuem igual poder decisório.

No Brasil, foi no final da década de 1970 que a sociedade civil começou a

experimentar as iniciativas de participação movidas pelo movimento de

redemocratização do país. Carvalho (1995 apud VALDIVINO E SILVA; SILVA;

SOUZA, 2013) define três tipos de participação: comunitária, popular e cidadã. A

participação comunitária é a atuação da sociedade complementando as políticas

propostas pelo Estado; a participação popular representa uma reação dos

movimentos sociais às políticas do Estado e traz consigo uma crítica ao sistema

dominante. Já a participação cidadã representa a luta e esforço da sociedade civil

na busca do controle social.

Demo (2009), estudioso brasileiro sobre esse tema, analisa a participação dos

cidadãos relacionada à política social sob duas perspectivas: a do Estado, que

pode ser considerada uma estratégia de redistribuição de renda e de legitimação,

e a dos sujeitos, como conquista de autopromoção.

Esse mesmo autor afirma que existe um contexto histórico de dominação e

desigualdades e a participação é resultado de uma ação coletiva que vai ao

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contrário desse histórico dominador: “Não existe participação suficiente, nem

acabada. Participação que se imagina completa, nisto mesmo começa a regredir”

(DEMO, 2009, p. 18).

Por essa vertente, a participação pode ser relacionada também ao conceito de

poder político. De acordo com Teixeira (2001, p. 27):

Participação significa “fazer parte”, “tomar parte”, “ser parte” de um ato ou processo, de uma atividade pública, de ações coletivas. Referir “à parte” implica pesar o todo, a sociedade, o Estado, a relação das partes entre si e destas com o todo, e como este não é homogêneo, diferenciam-se os interesses, aspirações, valores e recursos de poder.

Teixeira (2001) ressalta que não se deve confundir poder político com poder de

Estado. Relacionar participação com poder político é considerar que ambos

partem do princípio das relações entre os atores sociais nos espaços públicos na

construção de suas identidades.

Apesar dos esforços para a consolidação da visão de participação social, nota-se

que o quadro de reordenação social e política proposto ainda não experimentou

progresso sequencial dos direitos civis, políticos e sociais. A construção da

cidadania como um valor coletivo é um processo de construção lento, ainda em

amadurecimento (MARTINS et al., 2008 apud COTTA, 2011, p. 1122).

2.3 Participação social no campo da saúde

Historicamente, no campo da saúde pública, os movimentos sociais buscaram

conquistar espaços legítimos para a oferta de serviços públicos de qualidade.

Durante o movimento operário, na década de 60 observaram-se algumas

conquistas como programas de atenção médica e de auxílio para alguns setores

populares (CRUZ et al., 2012). Entretanto, tanto a estrutura como a oferta de

serviços ainda eram bastante limitadas.

A Medicina comunitária, com suas origens nos movimentos norte-americanos,

encontra no Brasil campo para sua experimentação, especialmente devido a dois

fatores: altos índices de exclusão social e pobreza e grandes desigualdades

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sociais em saúde. De acordo com Valdivino e Silva, Silva e Souza (2013), a

Medicina comunitária ampara-se na extensão da cobertura da assistência médica

e no estímulo à formação organizada e autônoma da população.

No período ditatorial, a repressão se fez presente e os movimentos sociais

encontraram diversos obstáculos na luta pela liberdade de expressão e pelos

direitos sociais. Nesse contexto de crises, as condições precárias e a insatisfação

popular se intensificaram e a população passou a reivindicar melhorias de

infraestrutura e de oferta de serviços públicos, especialmente no âmbito da saúde.

A participação popular ganha força aliada aos movimentos sociais urbanos,

sindicais, dos trabalhadores e de estudantes. Nesse cenário, segundo Valdivino e

Silva, Silva e Souza (2013, p. 256), “ocorre um deslocamento da dimensão

técnico-sanitária típica da Medicina Comunitária para uma dimensão política”.

O modelo médico sanitarista já não conseguia mais atender às reivindicações de

uma população que almejava por melhoria nos serviços de saúde e no acesso da

população a essa assistência. Foi então que, nas décadas de 1970 e 1980, foram

surgindo os processos que culminaram com o movimento conhecido como

Reforma Sanitária (BRASIL, 1997).

Dessa forma:

O Projeto da Reforma Sanitária Brasileira foi ancorado por um conceito ampliado de saúde que a compreende como um fenômeno também social e um exercício de cidadania e, portanto, é dever do Estado assegurar melhores condições de vida e saúde e prevenir os agravos que possam ameaçar a população (VALDIVINO e SILVA; SILVA; SOUZA, 2013, p. 257).

As propostas da reforma foram definidas na VIII Conferência Nacional de Saúde,

que contou com a participação de profissionais de saúde, usuários, técnicos,

políticos, lideranças populares e sindicais. Tais propostas subsidiaram o conteúdo

do capítulo da ordem social na Constituição de 1988 (BAHIA, 2013).

Surge, por conseguinte, um novo sistema de saúde, baseado nos princípios da

integralidade, universalidade e descentralização. Com a institucionalização do

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Sistema Único de Saúde (SUS), a participação da comunidade na gestão dos

sistemas de saúde tornou-se assegurada, por meio do art. 198 da CF de 1988

(BRASIL, 1988) e da Lei nº 8.142 (BRASIL, 1990b). Esta última define, ainda, as

conferências de saúde e conselhos como espaços democráticos de discussão,

formulação e deliberação de políticas de saúde.

Do mesmo modo, as conferências e os conselhos se afirmaram como espaços de

democratização das informações em saúde, em que a sociedade passou a

participar das decisões, contribuindo para a construção das políticas públicas de

saúde. Contudo, conforme discutido por Fleury e Lobato (2009), algumas

ponderações são necessárias quando são avaliadas as principais características

e os impasses da participação social em saúde. Um aspecto a ser considerado

são as diferenças que existem entre os próprios conselhos, por exemplo, entre

uma esfera governamental e outra e até mesmo entre conselhos da mesma

esfera governamental. Outro aspecto relevante é que foram criados mecanismos

e instâncias de participação, mas a cultura política não se transformou; ainda se

encontram traços de autoritarismo, elitismo, práticas clientelistas e os

corporativismos.

A participação política ocorre de maneira desigual. A história de vida, os valores,

o interesse de participação e os próprios conhecimentos adquiridos individual ou

coletivamente são fatores que influenciam na forma de participação dos sujeitos

nas políticas públicas. A distribuição desigual de recursos cívicos em uma

população poderia explicar o seu comportamento também desigual em relação à

participação. Em países com histórico de desigualdades como o Brasil, o

desenvolvimento da cidadania é um processo gradual que vai sendo construído

aos poucos, um caminho que o país já começou a traçar. “Implantar um método

de construção de Conselho, com negociação e ampla participação social, tem se

tornado desafiador, requerendo o permanente estímulo da atuação dos cidadãos

no processo de tomada de decisão e controle das ações” (STOTZ, 2005 apud

CRUZ et al., 2012).

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2.4 O Sistema Único de Saúde e suas perspectivas

A CF de 1988 estabeleceu a saúde como um direito de todos e dever do Estado.

Esse direito é exercido por meio de políticas públicas e pelo SUS, sistema

implantado em todo o país para assegurar esse direito. Para cumprir esse papel,

o SUS é organizado por doutrinas e diretrizes. Os princípios doutrinários são

universalidade, equidade e a integralidade. A universalidade é entendida como a

garantia de atenção a todo e qualquer cidadão, a todos os serviços públicos de

saúde e também atendimento em serviços contratados pelo poder público.

Integralidade é tratar os indivíduos de maneira integral, assitindo-os como o todo.

Já equidade compreende assegurar aos indivíduos as ações e serviços de acordo

com os níveis de complexidade de cada caso (BRASIL, 1990a).

Entre as diretrizes estão a descentralização político-administrativa, atendimento

igualitário e participação da comunidade (BRASIL, 1990 a). Amplia-se, dessa

forma, o conceito de saúde, visto anteriormente apenas como ausência de

doença. A saúde passa a considerar as dimensões psico, físico e social dos

indivíduos, prevendo também o acesso da população aos bens e serviços

voltados para a promoção da saúde, proteção e reabilitação. Essa definição

formal não garante que esses princípios sejam cumpridos, pois a realidade

vivenciada em grande parte do Brasil é a dificuldade para a efetivação de um SUS

real e alcançável.

Para Menicucci (2009), o cenário nacional e internacional era desfavorável à

implantação de um sistema tão amplo quanto o SUS. O país estava atravessando

um período de transição democrática, pela redefinição do papel do Estado, em

sintonia com o ambiente internacional. O período foi marcado também por

tentativas de ajuste e estabilização econômica e a crise fiscal impôs limites à

implantação de um sistema de saúde integral e universal. Outro ponto merecedor

de destaque é que se acirraram as disputas de interesses partidários e o

corporativismo médico distanciou-se das propostas advindas do projeto da

reforma sanitária.

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Apesar de clamar pela oferta de serviços de qualidade e acessíveis a todos, a

população ainda estava fracamente mobilizada para conseguir pressionar os

órgãos gestores e até mesmo para entender essa nova configuração do sistema

de saúde.

A falta de identificação dos segmentos organizados da população com uma assistência pública e igualitária contribuiu para o enfraquecimento da proposta de caráter publicista e universalista e para o fortalecimento da segmentação, reforçando a perspectiva de que ao SUS cabe a cobertura da população mais pobre e em condições desfavoráveis de inserção no mercado de trabalho (MENICCUCI, 2009, p. 1622).

A rede pública ainda dependia muito da rede privada, conforme o próprio texto

constitucional previa. A rede estruturada de serviços públicos era deficiente para

atender à demanda (MENICCUCI, 2009). Até hoje essa é uma realidade no país,

a dependência da rede privada conveniada aos SUS.

Contudo, mesmo com diversas dificuldades, muitos avanços já foram

conquistados (TEIXEIRA, 2011). A rede básica foi ampliada por meio da

Estratégia de Saúde da Família (ESF). O Programa Nacional de Imunização (PNI)

oferece um leque de vacinas cada dia maior à população; a assistência

farmacêutica possibilita ao usuário mais controle das doenças crônicas e

degenerativas; a rede assistencial e a cobertura da população foram ampliadas.

Diversos programas direcionam as ações dos profissionais e padronizam a

assistência em todo o país (BRASIL, 2010).

Os problemas que cercam o SUS vão além do aumento da demanda. O

subfinanciamento do sistema é um dos maiores desafios enfrentados pelos seus

gestores. A Emenda Constitucional 29 (EC29) fixa os percentuais mínimos sob

responsabilidade de cada esfera de gestão (federal, estadual e municipal). Porém,

as dificuldades na regulamentação dessa emenda fizeram com que o governo

federal investisse menos do que o necessário para a organização de um sistema

que busca a integralidade e a universalidade da atenção. Outro ponto importante

e que se encontra fora das agendas públicas de discussão é o financiamento

indireto do setor privado, por meio dos incentivos fiscais, que acaba interferindo

no financiamento do setor público (MENICUCCI, 2009).

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O maior desafio para uma construção institucional do sistema de saúde do Brasil que garanta maior efetividade e sustentabilidade parece estar relacionado à definição das formas de articulação do mix privado/público que se constituiu ao longo do tempo. Dada a institucionalização de um sistema dual, isso demanda a construção social de uma agenda radicalmente inovadora que supere a discussão focada apenas no sistema “único” e possa levar a uma reconstrução do arcabouço regulatório do sistema de saúde (MENICUCCI, 2009, p. 1624).

Paim (2012), ao avaliar o futuro do SUS, faz importantes reflexões acerca de sua

sustentabilidade econômica, política e institucional. A sustentabilidade econômica

encontra-se ameaçada, considerando-se a desaprovação do projeto que obrigava

à destinação mínima de 10% dos recursos federais para aplicação na saúde.

Hoje, o Estado brasileiro cobre 41% do gasto em saúde, enquanto em outros

países que também são regidos por sistemas universais de saúde o custeio é de

80% das despesas.

No tocante à sustentabilidade política, o que se observa é uma mobilização social

ainda insuficiente para pressionar partidos, parlamentares e governantes.

Consequentemente, o que se contata é a existência de um sistema público

subfinanciado e um setor público sub-regulado (PAIM, 2012).

Já a sustentabilidade institucional do SUS está ameaçada sempre que são

modificados os governos e os quadros técnicos e gerenciais alterados. Para o

autor, “diante do refluxo ou cooptação de movimentos sociais os canais de

participação cidadã têm sido colonizados por interesses privados, partidários e

corporativos, enquanto os milhares de cargos de confiança são utilizados nas

transações políticas” (PAIM, 2012, p. 612). Para os que vivenciam o SUS no seu

cotidiano, seja como usuário ou como trabalhador, essas mudanças influenciadas

pelas alterações de governo são reais e trazem consigo uma série de atrasos

para o sistema. Portanto, torna-se um desafio romper com as lógicas pessimistas

que acercam o SUS e acreditar em uma reestruturação do sistema condizente

com as atuais mudanças vivenciadas pelo país, corrigindo as iniquidades e

promovendo novas ações políticas que promovam uma saúde de qualidade para

toda a sociedade.

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2.5 Arcabouço legal dos conselhos de saúde no Brasil

2.5.1 Conselhos Municipais de Saúde: a institucionalização da participação

social

Decidir sobre o caminho da saúde pública do município... parece impossível

pensar nessa realidade? Mas esse é um direito adquirido por lei e já é realidade

em diversos municípios brasileiros. Cidadãos engajados politicamente são peças-

chave para se alcançar uma política pública voltada para as necessidades reais

da comunidade. A institucionalização da participação social no SUS foi feita por

meio de vários dispositivos legais, a começar pelo texto constitucional (BRASIL,

1988), que democratiza a gestão administrativa por meio da participação da

comunidade.

Por serem democráticos, tanto os gestores, prestadores de serviços,

trabalhadores e usuários devem ter assegurada a sua participação no processo

decisório. Além desse direito adquirido, é de responsabilidade de todos esses

atores o controle sobre as ações e serviços de saúde. O termo controle social,

utilizado na Sociologia, pode ser entendido como a articulação, a mobilização e a

interferência da sociedade civil sobre o planejamento, a execução, a avaliação e o

controle das ações do Estado (SANTOS et al., 2012, p. 124).

Os conselhos consolidam o controle social, uma vez que se constituem espaços

de participação social na administração do sistema público. Considerando-se a

possibilidade de um novo modelo de fazer saúde, os conselhos não podem deixar

de assumir uma postura dinâmica, ativa e renovadora para se tornar mero

cumpridor de resoluções formais. Muito se tem questionado sobre a efetividade

desses conselhos. Fatores que vão desde a capacidade de formulação até a

negociação de propostas interferem nesse âmbito. O que se apura é que foram

desconcentradas responsabilidades e não democratizado o poder (KLEBA et al.,

2010).

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O que fazer para fortalecer os conselhos e interferir no cenário em que se

desenvolvem?

[...] a operacionalização não plena dessas novas instâncias democratizantes se dá devido à falta de tradição participativa da sociedade civil em canais de gestão dos negócios públicos; a curta trajetória de vida desses conselhos e, portanto, a falta de exercício prático (ou até inexistência); e ao desconhecimento - por parte da maioria da população, de suas possibilidades (deixando-se espaço livre para que eles sejam ocupados e utilizados como mais um mecanismo da política das velhas elites, e não como um canal de expressão dos setores organizados da sociedade) (GOHN, 2007, p. 90).

Na realidade vivida como partícipe de um Conselho, são perceptíveis as

necessidades e as lacunas existentes. Dentre elas, destaca-se a capacitação dos

conselheiros, que ainda é deficitária (COTTA; CAZAL; RODRIGUES, 2009). As

capacitações existentes propagadas pelo Estado ou por iniciativas de instituições

como universidades existem (BRASIL, 2002), mas dificilmente chegam até a

ponta, principalmente nos conselhos das cidades pequenas.

Em 1999, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) instituiu um grupo de trabalho

para tratar do tema capacitação de conselheiros. Esse grupo era formado por

representantes de universidades, das Organizações Não Governamentais

(ONGs), das Secretarias de Saúde, de trabalhadores e dos Conselhos Estaduais

e Municipais de Saúde, entre outros. Com base nas propostas do grupo foi

formulado e publicado, em 2003, o documento “Diretrizes Nacionais para

Capacitação de Conselheiros de Saúde”. Em 2005 houve atualização do texto

com título “Diretrizes Nacionais para o Processo de Educação Permanente no

Controle Social no SUS” (BRASIL, 2006).

De acordo com esse documento, o processo de Educação Permanente (EP) no

controle social do SUS tem como pressupostos que a capacitação de

conselheiros de saúde integra o processo de educação permanente para o

controle social no SUS e que cada cidadão e os diversos segmentos da

sociedade e o governo têm o direito de conhecer, propor, fiscalizar e contribuir

com o fortalecimento do SUS (BRASIL, 2006).

Por meio dessas diretrizes nacionais, o CNS definiu a responsabilidade de cada

esfera governamental no processo formativo; porém, estabelece como

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responsabilidade intransferível dos próprios conselhos de saúde a EP para o

controle social no SUS de seus conselheiros. Caberia ao Ministério da Saúde

(MS), por intermédio do CNS, um papel mais consultivo e de acompanhamento.

As Secretarias Estaduais e Municipais estariam incumbidas de viabilizar recursos

financeiros, materiais e humanos para o exercício das atividades e para

participações dos conselheiros em eventos sobre o controle social. Dessa forma,

aos CMS caberia a realização propriamente dita das capacitações e

estabelecimento das parcerias necessárias (BRASIL, 2006).

Muitos conselheiros adentram nesse espaço sem saber ao certo as

responsabilidades que estão assumindo. Infelizmente, existem realidades nas

quais os participantes que compõem os conselhos são “escolhidos” e indicados

(TATAGIBA, 2002).

Os conselhos, para atuar como espaços participativos, devem garantir o exercício

do diálogo, da contestação e da negociação em busca constante pela efetivação

da democracia e da cidadania (COTTA; CAZAL; RODRIGUES, 2009).

Dessa forma, é visível a existência de conselheiros que desconhecem tanto as

atribuições inerentes aos conselhos como também o seu papel como

representante de um segmento. Consequentemente, os conselhos apresentam

baixo desempenho no sentido de articular as bases sociais, de transformar os

direitos e necessidades de seus segmentos em projetos de interesse público.

Deixam de estabelecer uma ponte com o restante da sociedade (GOHN, 2002).

2.5.2 Retrato dos conselhos de saúde no Brasil

O arcabouço jurídico para a participação da população está ancorado no texto da

CF de 1988, na Lei Orgânica da Saúde nº 8.080/90 (BRASIL, 1990a) e na Lei

8.142/90, que conferiu às conferências e aos conselhos de saúde poder

deliberativo (BRASIL 1990b).

A partir de 1991, o MS editou Normas Operacionais que potencializaram o

processo de instalação dos conselhos de saúde em todo o país, pois

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condicionavam a existência dos conselhos ao repasse de transferências

financeiras federais (CARVALHO, 1995).

Para Escorel e Moreira (2009, p. 796), os CMS criados nos 5.564 municípios

brasileiros “representam a mais ampla iniciativa de descentralização político-

administrativa implementada no país”. Os conselhos representam a conquista da

população em participar das arenas decisórias, mas representa também uma

ameaça à elite dominante do país. Dessa forma, inúmeras são as dificuldades e

empecilhos que se apresentam aos conselhos, na tentativa de enfraquecer esse

movimento. As primeiras dificuldades surgem ao compreender que, subitamente,

extraíram-se da sociedade novos atores sociais para participar dessas arenas de

decisão. Importante considerar também é que a experiência brasileira nos

espaços participativos era baixa, considerando-se o passado opressor e

dominador a que o país foi submetido.

Outra experiência inovadora foi a participação desses órgãos no cenário de

decisão política. Um espaço que era de domínio governamental passa a ser

dividido com segmentos da sociedade (GONH, 2002).

Com início em 2003, foi realizado um estudo censitário inédito no Brasil, que

possibilitou traçar características encontradas na quase totalidade dos Conselhos

Municipais de Saúde do país (98% dos CMS). Os resultados dessa pesquisa

foram apresentados no artigo “Conselhos Municipais de Saúde do Brasil: um

debate sobre a democratização da política de saúde nos 20 anos do SUS”, escrito

por pelo Dr. Marcelo Rasga Moreira e pela Dra. Sarah Escorel, que participaram

como pesquisadores da pesquisa (ESCOREL; MOREIRA, 2009). Esse artigo

tornou-se referência para os pesquisadores sobre Conselhos Municipais de

Saúde, pois traça um retrato das configurações desses conselhos no país. Alguns

dados dessa pesquisa serão apresentados a seguir.

No que diz respeito ao ano de criação dos conselhos, constatou-se que no

período de 1991-1997 é que foi instituída a maioria dos CMS. Os 5.463 CMS

contam com 72.184 conselheiros titulares, sendo que 36.638 representam o

segmento dos usuários do SUS. Sobre a representação dos trabalhadores da

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saúde, destacam-se trabalhadores de nível médio e superior e representam na

maior parte sindicatos e associações de trabalhadores. O segmento dos

prestadores de serviços está ligado, na grande maioria, a hospitais e

estabelecimentos privados contratados pelo SUS (ESCOREL; MOREIRA, 2009).

Avaliando as condições de funcionamento dos conselhos, detectaram-se grandes

limitações relacionadas aos recursos materiais e de apoio administrativo,

inexistência de sede, dotação orçamentária própria. Dos 5.463 conselhos, apenas

265 possuem orçamento próprio (apenas nos municípios com mais de 2 milhões

de habitantes), No tocante às capacitações de conselheiros, os resultados

mostraram índices baixos. Em 2004, 90% dos conselhos responderam

negativamente quando questionados se receberam algum tipo de capacitação

(ESCOREL; MOREIRA, 2009).

Ainda de acordo com Escorel e Moreira (2009), aqueles que vivenciam o cotidiano

dos conselhos sabem que é recorrente o adiamento de reuniões por falta de

quórum. Porém, nesse sentido, o estudo revela que 82% dos conselhos

afirmaram realizar suas reuniões mensalmente e em 66% dos casos não

ocorreram cancelamentos por falta de quórum.

Apesar de instituídos, os conselhos encontram diversas dificuldades para o seu

pleno funcionamento. Estudo realizado por Vieira e Calvo (2011) apresentou

algumas dessas dificuldades que, devido à sua importância, foram organizadas

no QUADRO 1:

QUADRO 1 - Dificuldades apresentadas pelo CMS e os autores correlacionados

DIFICULDADES AUTORES CORRELACIONADOS

Clientelismo Carvalho (2004)

Rompimento da autonomia Pestana, Vargas e Cunha (2007), Moreira e Escorel (2009)

Condições inadequadas de funcionamento Pestana, Vargas e Cunha (2007)

Mínima existência de comissões Moreira e Escorel (2009)

Elitização da representação Labra e Figueiredo (2002)

Legitimidade comprometida/ representatividade desarticulada da base

Wendhausen e Cardoso (2007)

Desequilíbrio entre estrutura e mobilização Coelho, Ferraz e Fanti (2010)

Pouca decisão no encaminhamento das deliberações

Grissoti e Patrício (2006)

Ingerência da gestão sobre a pauta Oliveira e Almeida (2009)

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Fonte: elaboração própria com base no estudo realizado por Vieira e Calvo (2011).

Dessa forma, conclui-se que o caminho percorrido pelos conselhos ao longo de

sua trajetória não tem sido fácil, diversos obstáculos são levantados pelos

estudos nessa área de pesquisa. Cabe aos pesquisadores, também, buscar

alternativas que busquem contribuir para o fortalecimento desses órgãos que

representam uma conquista da sociedade brasileira e que são meios legítimos

para a população tentar melhorias no acesso e na qualidade dos serviços

públicos (VIEIRA; CALVO, 2011)..

2.5.3 Conselhos: entre a paridade e a representatividade

O CMS é um órgão colegiado, de caráter permanente e deliberativo, composto de

representantes do governo, dos prestadores de serviços, de trabalhadores da

saúde e dos usuários. Os conselhos de saúde têm como característica a

paridade, ou seja, 50% dos representantes são usuários e os demais 50%

dividem-se entre os outros segmentos, sendo 25% representantes do governo e

prestadores de serviços e 25% por representantes dos trabalhadores de saúde.

Essa paridade foi sugerida pela Resolução nº 33/92 do Conselho Nacional de

Saúde (CNS) e regulamentada pela Resolução nº 333/2003 do CNS (BRASIL,

2003).

Além da paridade, a Resolução nº 33/92 estabelece ainda as competências,

ações e possíveis intervenções dos Conselhos de Saúde, sintetizados, de acordo

com Fleury e Lobato (2009, p.185-6), nos seguintes objetivos:

a) Atuar na formulação e no controle da execução da política de saúde,

incluídos seus aspectos econômicos, financeiros e de gerência técnico-

administrativa.

b) Estabelecer estratégias e mecanismos de coordenação e gestão do SUS,

articulando-se aos demais colegiados em nível nacional, estadual e

municipal.

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c) Traçar diretrizes de elaboração e aprovar os planos de saúde, adequando-

os às diversas realidades epidemiológicas e à capacidade organizacional

dos serviços.

d) Propor a adoção de critérios que definam qualidade e melhor

resolutividade, verificando-se o processo de incorporação dos avanços

científicos e tecnológicos na área.

e) Propor medidas para o aperfeiçoamento da organização e do

funcionamento do SUS.

f) Examinar propostas e denúncias, responder a consultas sobre assuntos

pertinentes a ações e serviços de saúde, bem como apreciar recursos a

respeito de deliberações do colegiado.

g) Fiscalizar e acompanhar o desenvolvimento das ações e serviços de

saúde.

h) Propor a convocação e estruturar comissão organizadora das conferências

estaduais e municipais de saúde.

i) Fiscalizar a movimentação de recursos repassados à Secretaria de Saúde

e/ou ao Fundo de Saúde.

j) Estimular a participação comunitária no controle da administração do SUS.

k) Propor critérios para a programação e para as execuções financeiras e

orçamentárias dos Fundos de Saúde, acompanhando a movimentação e

destinação dos recursos.

l) Estabelecer critérios e diretrizes quanto à localização e ao tipo de unidades

prestadoras de serviços de saúde públicos e privados, no âmbito do SUS.

m) Elaborar o regimento interno do conselho e suas normas de

funcionamento.

n) Estimular, apoiar ou prover estudos e pesquisas sobre assuntos e temas

na área da saúde de interesse para o desenvolvimento do SUS.

o) Outras atribuições estabelecidas pela Lei Orgânica da Saúde e pela 9ª

Conferência Nacional de Saúde.

Recentemente, em maio de 2012, foi homologada a Resolução CNS nº 453/2012

(BRASIL, 2012), que além de reafirmar a paridade nos conselhos, acrescenta

alguns pontos importantes, que são a exigência de um quórum mínimo dos

integrantes para deliberação nas plenárias e que as pautas das reuniões e o

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material de apoio devam ser encaminhados aos conselheiros com antecedência

mínima de 10 dias (Resoluções CNS nº 333/2003 e nº 453/2012). Tais medidas

evitam que decisões importantes sejam aprovadas sem o prévio conhecimento e

aprovação por um número mínimo de conselheiros.

Apesar das inúmeras competências, a fiscalização é considerada por muitos a

principal competência dos conselhos gestores. Observa-se que os conselhos

atuam no intuito de evitar transgressões do Estado e na maior parte das vezes

são mais reativos do que propositivos. Apesar da importância da fiscalização,

quando se pensa na democratização das políticas públicas, o caráter deliberativo

assume caráter mais radical (TATAGIBA 2002) .

Os conselhos representam uma importante conquista, pela possibilidade de

intervenção nas políticas de saúde. Podem atuar também como ponte entre o

Estado e a sociedade. O processo de democratização na saúde acompanha o

processo de democratização da própria sociedade e nesse aspecto a sociedade

brasileira ainda está bem distante. A burocracia e os governos elitistas dificultam

a participação e ainda insistem na concentração do poder nas mãos de poucos. O

exercício da participação e do controle social é dificultado por fatores como o

autoritarismo presente na sociedade e nas instituições brasileiras e pela

assimetria de saber e de poder dos conselheiros (OLIVEIRA; PINHEIRO, 2010).

Por conseguinte, apesar de garantida a paridade, a representatividade torna-se

prejudicada e, consequentemente, os espaços “vazios” de voz acabam por ser

ocupados por aqueles que detêm a informação e o poder.

2.6 A gestão social nos conselhos: possibilidade de exercício do controle

social

A gestão democrática do SUS, exercida principalmente por meio das conferências

e dos conselhos de saúde em cada esfera de governo, é um importante modelo

de exercício da cidadania, que ocorre mediante a organização da sociedade civil

e a efetivação do processo de controle social. O caráter propositivo, assim como o

poder deliberativo desses órgãos de gestão do SUS, são elementos importantes

no processo de gestão (BRAVO; CORREIA, 2012).

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Para ampliar essa discussão, torna-se imperativo refletir acerca dos conceitos de

gestão social, visando articular a atuação nos conselhos de saúde, objeto desta

pesquisa, com as possibilidades de exercício da gestão social. Adentrando nessa

temática, Schommer e França Filho (2006) consideram que a gestão social

corresponde ao modo de gestão próprio das organizações que atuam num circuito

que não é, originariamente, aquele do mercado e do Estado. Afirmam, ainda, que

a gestão social relaciona-se à gestão das demandas e necessidades do social.

Por essa vertente, o conceito de gestão social sai do foco prioritariamente

economicista das principais formas de gestão e volta-se para implicações mais

sociais e políticas. Não que a gestão social desconsidere os aspectos

econômicos, mas seu foco de atuação amplia-se, nesse sentido (SCHOMMER;

FRANÇA FILHO, 2006).

Segundo Pasche (2009), o objetivo da gestão social é a formação de

personagens sociais com mais autonomia, participantes do processo de trabalho

e se sentindo corresponsáveis com o processo de trabalho. Pensando em

autonomia, esta surge como ferramenta necessária no processo de gestão e de

desenvolvimento. Nesse sentido:

[...] a autonomia constitui a base do desenvolvimento, este encarado como o processo de autoinstituição da sociedade rumo a mais liberdade e menos desigualdade; um processo não raro doloroso, mas fértil, de discussão livre e “racional” por parte de cada um dos membros da coletividade acerca do sentido e dos fins do viver em sociedade, dos erros e acertos do passado, das metas materiais e espirituais, da verdade e da justiça (SOUZA, 2009, p. 105-106).

Assim, as pessoas, para atuarem como cidadãs ativas, é importante que tenham

informações e, para isso, a formação deve iniciar-se desde cedo, com as

crianças, e estender-se ao bairro, à comunidade, ao município, e assim por

diante. A educação não deve ser vista apenas como promoção individual; os

cidadãos devem utilizar o conhecimento para ajudar a transformar a realidade que

vivem (SOUZA, 2009).

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Para essa transformação da realidade é imperativa a inserção dos cidadãos no

processo de gestão, no conhecimento e participação sobre os caminhos traçados

para aquela localidade, pelo poder público. Participar ativamente desse processo

é um dos caminhos para o alcance da gestão social (PASCHE, 2009).

Na concepção de Oliveira (2001), embora o bem-estar e uma alta qualidade de

vida devam ser direitos dos cidadãos, não se devem colocar tais direitos como

sinônimos de cidadania, pois esse economicismo pagaria o preço de

desconsiderar como cidadãos os que não têm meios materiais de bem-estar e

qualidade de vida. A noção de cidadania que deve nortear a tentativa de

mensurar os processos e estoques de bem-estar e qualidade de vida refere-se ao

indivíduo autônomo, crítico e reflexivo, longe, portanto, do indivíduo-massa.

Os conselhos de saúde, nesse sentido, poderiam representar polos de

qualificação de cidadãos para o controle social no âmbito do SUS, considerando

que são espaços para a discussão e articulação entre diversos atores sociais,

com diferentes interesses (COTTA et al., 2010).

De acordo com Dowbor (2007), a ideia de educação para o desenvolvimento local

está diretamente vinculada à compreensão de que desenvolvimento não se

espera, mas se faz e que podemos ser donos da nossa própria transformação

econômica e social. É necessário, também, que se formem pessoas que amanhã

possam participar de forma ativa das iniciativas capazes de transformar o seu

entorno, de gerar dinâmicas construtivas.

Em Sen (2000), o desenvolvimento pode ser visto como um processo de

expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam. O enfoque nas

liberdades humanas contrasta com visões mais restritas de desenvolvimento.

Assim, as oportunidades econômicas, as liberdades políticas, os poderes sociais

e as condições habilitadoras influenciam no que as pessoas conseguem realizar.

No caso dos CMS, o desenvolvimento de todas essas condições influencia

diretamente no poder de deliberação e de gestão desses órgãos.

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Retomando o conceito de gestão social, Tenório (2002) menciona que, para

exercê-la, há a necessidade de um gerenciamento mais participativo, em que o

processo decisório é compartilhado entre os diferentes sujeitos sociais. Inclui,

também, a participação dos cidadãos em todas as fases do processo de gestão,

incluindo o planejamento, a execução e a avaliação.

Entre as diversas competências dos conselhos de saúde estão a definição das

diretrizes para a elaboração dos planos de saúde, dos programas de saúde

locais, da elaboração dos convênios, além da aprovação das propostas

orçamentárias. Cabem aos conselhos, ainda, a fiscalização e o acompanhamento

do desenvolvimento das ações e serviços de saúde (BRASIL, 2003).

Dessa forma, o espaço dos conselhos torna-se uma proposta alcançável para a

gestão social, desde que seja exercida de maneira participativa e igualitária. Para

Dowbor (1999), gestão social remete-se à transformação da sociedade, na qual

há a necessidade da construção de um novo paradigma organizacional a partir da

redefinição da relação entre o político, o econômico e o social.

Para que essa participação se concretize de maneira efetiva, torna-se

imprescindível a integração entre os diversos segmentos da sociedade, sejam

eles população, administradores, empresários, gestores e representantes do

poder público (DOWBOR, 1999).

Assim sendo, a gestão social pode ser entendida:

[...] como um conjunto de processos sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário, emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e formação da democracia e da cidadania, em vista do enfrentamento às expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como padrões de uma nova civilidade. Construção realizada em pactuação democrática, nos âmbitos local, nacional e municipal; entre os agentes das esferas da sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de distribuição das riquezas e do poder (MAIA, 2005, p. 78).

Dessa forma, de modo geral, a gestão social pode ser vista como um conjunto de

processos sociais capazes de transformar a realidade, proporcionando

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desenvolvimento local. Ao cidadão cabe instrumentalizar-se por meio do exercício

da democracia e da cidadania para que essa participação seja exercida de

maneira consciente e efetiva, atuando como sujeito no processo de gestão social

(MAIA, 2005, p. 78).

2.7 O empoderamento social e o poder local como instrumentalizadores da

gestão social nas políticas de saúde

No âmbito dos conselhos, a gestão social pode acontecer por meio de discussões

voltadas para as necessidades reais de determinado grupo ou comunidade.

Nesse sentido, os gestores sociais não podem ser considerados apenas como

meros participantes, e sim devem atuar como sujeitos ativos nos processos de

planejamento, acompanhamento, monitoramento, avaliação e fiscalização das

políticas públicas (PASCHE, 2009).

Na atualidade, os conselhos de saúde tornaram-se espaços possíveis para a

articulação e mobilização da sociedade, especialmente no tocante aos direitos

constitucionais que fundamentam o SUS (COTTA; CAZAL; RODRIGUES, 2009).

De acordo com Carvalho (1995, p. 104):

Nada há, na história do Estado brasileiro, que se assemelhe aos Conselhos de Saúde da atualidade, seja pela representatividade social que expressam, seja pela gama de atribuições e poderes legais de que são investidos, seja pela extensão em que estão implantados por todo o país, nas três esferas governamentais.

Essa participação efetiva do povo se dá pelo exercício da democracia, que pode

ser exercida de maneira direta ou indireta. Na democracia direta, o povo controla

diretamente a gestão da sociedade; o poder do povo é exercido de maneira mais

efetiva do que na democracia indireta, quando o povo governa por intermédio dos

seus representantes eleitos (CARVALHO, 1995).

Sobre esse assunto, Dallari (1990, p. 31) afirma que:

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Primeiramente a democracia surge como um processo de democratização entendido como processo de aprofundamento democrático da ordem política, econômica, social e cultural. Depois, o princípio democrático recolhe as duas dimensões historicamente consideradas antitéticas: por um lado, acolhe os mais importantes elementos da teoria democrática-representativa (órgãos representativos, eleições periódicas, pluralismo partidário, separação de poderes); por outro lado, dá guarida a algumas exigências fundamentais da teoria participativa (alargamento do princípio democrático a diferentes aspectos da vida econômica, social e cultural, incorporação de participação popular directa, reconhecimento de partidos e associações como relevantes agentes de dinamização democrática).

De acordo com Mattei (2009), a melhor participação cidadã na democracia não é

a que se manifesta sempre e em todas as partes, porém a que se mantém alerta,

aquela que está presente quando há a necessidade de impedir desvios dos

governantes e também no atendimento a demandas que não são atendidas com a

devida importância. Contudo, sabe-se que há um longo caminho a ser seguido

por aqueles que realmente desejam alcançar a participação democrática e a

gestão social.

Em primeira instância, há que se considerar a necessidade de desenvolvimento

de uma cultura política e consciência popular de participação (BISPO JÚNIOR;

GERSCHMAN, 2013). É indispensável modificar a postura de “consumidor” de

serviços públicos para agente provocador de mudanças. A sociedade precisa

instrumentalizar-se para exercer um controle efetivo sobre o Estado.

Para Campos (1990), a emergência e o desenvolvimento de instituições na

sociedade é que favorecem a recuperação da cidadania e, portanto, a verdadeira

vida democrática. Dessa forma, torna-se real a possibilidade de canalização das

demandas e identificação das necessidades reais, assim como a cobrança de

melhor desempenho dos serviços públicos. Em segunda instância, mas não

menos importante, é a necessidade de empoderamento do cidadão para uma

participação mais efetiva.

O poder é onipresente nas relações sociais. Ele corresponde à habilidade

humana de não apenas agir, mas de agir em uníssono, em comum acordo. O

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poder não é propriedade de um indivíduo; ele pertence a um grupo e coexiste

apenas enquanto esse grupo se mantiver unido. Quando se diz que alguém está

“no poder”, na realidade está se referindo ao fato dessa pessoa encontrar-se

investida de poder, que lhe foi dado por um grupo de pessoas, para representá-

los. “No momento em que o grupo, de onde se originara o poder (potestas in

populo, sem um povo ou um grupo não há poder), desaparece, ‘o seu poder’

também desaparece” (ARENDT, 1985 apud SOUZA, 2009, p. 80).

Essa conquista individual e social - o empoderamento - é a qualificação do

cidadão para uma participação efetiva nas decisões que envolvem o bem coletivo.

Envolve consciência social a partir do momento em que o cidadão sai de uma

situação particular para o envolvimento de uma questão mais abrangente, social

(BENKENSTEIN, 2010).

Apesar de todas as dificuldades, os conselhos assinalam para possibilidades

concretas de desenvolvimento de um espaço público, que não se resume e não

se confunde com o espaço governamental (GOHN, 2002).

Considerando que nos conselhos de saúde existem diferentes escalas de poder e

interesses das partes, é instigante refletir sobre como essas relações de poder

podem ser trabalhadas dentro desses conselhos e como esses canais de

participação podem ser efetivos para o controle social das políticas públicas

(COTTA; CAZAL; RODRIGUES, 2009).

2.8 Considerações

Os assuntos abordados foram didaticamente separados para facilitar a

compreensão do caminho traçado para a conquista do processo democrático no

país e as configurações estabelecidas de um dos possíveis canais de participação

conquistados pela população: os Conselhos Municipais de Saúde.

A participação cidadã foi um avanço na sociedade brasileira, mas, como todo

processo de conquista de direitos, traz consigo uma série de dificuldades, que são

colocadas por grupos que aspiram à concentração do poder.

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Assim, compreender toda essa trajetória possibilitou melhor compreensão do que

se pretendia alcançar com este estudo.

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3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo geral

Analisar as dificuldades enfrentadas pelo CMS de São Gonçalo do Rio Abaixo

(SGRA) e a efetividade desse canal de participação no acompanhamento,

controle e fiscalização das políticas públicas para o exercício do controle social no

âmbito municipal.

3.2 Objetivos específicos

a) Conhecer os processos vivenciados para a formação do atual CMS de

SGRA.

b) Verificar o sentido atribuído pelos conselheiros quanto à sua participação

nos conselhos e à parceria com a comunidade que representam.

c) Discutir o discursar político e a dimensão técnica vinculada à participação

nos conselhos.

d) Elaborar uma proposta de intervenção visando contribuir para a

participação social consciente desses conselheiros.

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4 METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS DE INVESTIGAÇÃO

4.1 Caminho metodológico

Considerando-se que o estudo irá investigar as opiniões, pensamentos e até

sentimentos das pessoas relativos à participação no conselho, a pesquisa

qualitativa se mostrou como uma abordagem adequada e em consonância com o

objetivo que se pretendeu alcançar.

De acordo com Minayo (2010, p. 57), o método qualitativo “é o que se aplica ao

estudo da história, das relações, das representações, das crenças, das

percepções e das opiniões, produtos das interpretações que os humanos fazem a

respeito de como vivem, sentem e pensam”.

Oliveira (2007) relata que a pesquisa qualitativa pode ser caracterizada como

sendo um estudo detalhado de um determinado fato, objeto, grupo de pessoas ou

ator social e fenômenos da realidade.

Essa concepção, portanto, de investigação permitiu-nos uma aproximação densa

do fenômeno pesquisado, possibilitando agregar conhecimentos e compreensão

da realidade vivida pelos conselheiros de saúde de São Gonçalo do Rio Abaixo.

Nessa realidade de conflitos, de construção e desconstrução, de legitimação de

interesses e de participação ativa e passiva, o sujeito conselheiro teve voz, opinou

e mostrou-se.

4.2 Caracterização do cenário da pesquisa

O CMS de SGRA foi instituído pela Lei Municipal nº 401 de 21 de agosto de 1992

(SGRA, 1992) (ANEXO A) e alterado pelas leis 466/1995, 543/2002 e 552/2002,

sendo que nesta última ficou assim definida a composição do CMS:

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I- Do Governo Municipal

a) Representante da Divisão de Saúde ou órgão equivalente;

b) Representante (s) da Divisão de Finanças;

c) Representante (s) da Divisão de Educação.

II- Dos Prestadores de Serviços Públicos e Privados

a) Representante (s) dos Prestadores Privados contratados pelo SUS.

III- Dos Trabalhadores do SUS

a) Representante (s) das Entidades de Trabalhadores do SUS.

IV- Dos Usuários

a) Representante (s) de Entidade ou Associação Comunitárias;

b) Representante (s) de Sindicatos e Entidades de Trabalhadores;

c) Representante (s) de Associações de Portadores de Deficiência e

Patologias;

d) Representante (s) de Instituições Culturais;

e) Representante (s) de Instituições Religiosas” (SGRA, 2002)

Cada representante possui o seu suplente, que é da mesma categoria do titular.

Atualmente, o CMS se reúne mensalmente e também em caráter extraordinário

quando solicitado pelo seu presidente. O conselho não possui sede própria, mas

se reúne em uma casa locada pela prefeitura para utilização de todos os

conselhos municipais. Apesar de já existir um calendário predefinido, os

conselheiros são comunicados das reuniões por meio de e-mails enviados pelo

presidente.

Na gestão atual, a presidente do conselho é representante do governo. A escolha

foi exercida por meio de votação em plenária.

4.3 Os sujeitos da pesquisa

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Inicialmente seriam sujeitos do estudo todos os conselheiros titulares e os

suplentes (total de 20 pessoas) do CMS do município de São Gonçalo do Rio

Abaixo que aceitassem espontaneamente, a partir do convite que lhes seria feito.

A escolha também se pautou no seguinte critério: que o conselheiro exercesse

atividade no conselho há pelo menos um ano. Dessa forma, evitar-se-ia o risco de

não se sentirem confortáveis e aptos para responder à entrevista, considerando

que durante o período de 12 meses já teriam participado de alguma reunião e,

assim, poderiam contribuir para o estudo em questão.

Porém, já na etapa inicial da pesquisa, revelou-se uma situação desconcertante.

Na lista repassada pela presidente do conselho constava o nome dos 20

conselheiros. E dos 10 conselheiros titulares, constatou-se que a categoria dos

prestadores de serviços estava sem representação (a conselheira não reside mais

no município nem a sua suplente) e a categoria dos trabalhadores estava com

dois representantes titulares. Em relação aos suplentes, apurou-se que apenas

três pessoas compareceram em mais de 20% das reuniões do conselho. Destes,

apenas o suplente do representante do segmento governo (suplente do gestor)

era presença constante nas reuniões (presença em 22 das 31 reuniões

realizadas). Todavia, ao ser convidado para a entrevista, este relatou que não

fazia mais parte do conselho e optou por não participar da pesquisa.

Por conseguinte, ao serem procurados pelo pesquisador, ocorreram relatos de

conselheiros que não se sentiam à vontade para as entrevistas e até mesmo

relato de suplente que não sabia que era integrante do conselho. Três

conselheiros também não residiam mais no município.

Dessa forma, respeitados os critérios de inclusão do estudo, foram realizadas as

entrevistas com os 10 conselheiros titulares que compõem o atual CMS do

município de SGRA.

4.4 Procedimentos de coleta e análise de dados

Considerando o interesse na busca de compreensão não somente das

dificuldades vivenciadas pelos conselheiros no conselho, mas também como se

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efetiva a participação deles nas reuniões, procurou-se investigar e analisar dados

que revelassem a realidade dessa participação.

Para tanto, foram eleitos como instrumentos de coleta de dados: a pesquisa

documental, a realização de entrevistas com os membros do conselho em estudo

e a observação participante, conforme descrito nos tópicos a seguir.

4.5 Técnica e procedimentos para a coleta dos dados

4.5.1 Pesquisa documental

A pesquisa documental foi realizada por meio da análise das atas das reuniões

dos dois primeiros anos de funcionamento do respectivo conselho. Com a leitura

das atas, almejou-se avaliar a presença dos conselheiros por categoria de

representação e também analisar e discutir sobre o grau de interferência dos

conselheiros nas decisões deliberadas por esse órgão.

Para Oliveira (2007, p. 69), semelhante à pesquisa bibliográfica, a documental

“caracteriza-se pelas informações contidas em documentos onde não ocorreu

nenhum tratamento científico, como relatórios, reportagens de jornais, cartas,

filmes, gravações, dentre outros”.

4.5.2 Entrevistas

Utilizou-se a entrevista semiestruturada (APÊNDICE B), realizada com os

membros titulares do CMS, individualmente, em ambiente reservado. Todas foram

gravadas com o consentimento prévio dos sujeitos e, posteriormente, transcritas

literalmente.

A entrevista semiestruturada possibilitou ao pesquisador avançar além do que

estava determinado no roteiro de entrevista, uma vez que permitiu flexibilidade

nos diálogos e consequente surgimento de novos temas e novas questões.

No processo das entrevistas, o pesquisador atuou como mediador com vistas a

possibilitar reflexões dos sujeitos sobre sua participação e atuação.

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52

Para Duarte (2004, p. 219), tomar depoimentos como fonte de investigação

implica extrair daquilo que é subjetivo e pessoal neles, o que permite pensar a

dimensão coletiva.

4.5.3 Observação participante

Para analisar como o CMS se articula e quais seriam as principais dificuldades

vivenciadas pelos conselheiros, tornou-se necessário ao pesquisador inserir-se e

trabalhar diretamente com os sujeitos, como um integrante do grupo. Pelo fato de

o pesquisador ser também conselheiro, tal processo foi facilitado pela

familiaridade com os membros do grupo.

A observação constitui elemento importante para a pesquisa, especialmente para

a pesquisa qualitativa. O ato de observar permite atribuir sentidos a fim de

conhecer determinadas realidades. Para Oliveira, Ianni e Dallari (2013, p. 2331), a

“técnica da observação participante traz consigo a dualidade do pesquisador

estar, ao mesmo tempo, distante e próximo do objeto de observação, facilitando o

conhecimento e a compreensão da realidade”.

A observação participante ocorreu por meio da presença do pesquisador em uma

das reuniões realizadas pelo conselho em estudo, quando o observador pôde

vivenciar o contexto da participação dos conselheiros. O conteúdo da observação

foi anotado em um diário de campo.

A observação torna-se uma científica a partir do momento em que passa por

sistematização, planejamento e controle da objetividade.

Assim, pela associação das informações das atas, pela observação da prática e

pelo relato dos próprios conselheiros, aspirou-se a elucidar os pontos

questionados na pesquisa.

4. 6 Procedimentos adotados para a análise dos dados

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As entrevistas foram transcritas literalmente, preservando-se a fala dos sujeitos,

para posterior tratamento dos dados. Estes foram decompostos, codificados e

ordenados em categorias. Esse procedimento de categorização fundamentou-se

na técnica de análise de conteúdo proposta por Bardin (2011).

A codificação é o processo pelo qual os dados brutos são transformados

sistematicamente e agregados em unidades, as quais permitem a exata descrição

exata das características pertinentes do conteúdo (BARDIN, 2011).

As categorias foram estabelecidas durante o processo de análise, não sendo

determinadas a priori.

As atas foram lidas várias vezes e passaram por decomposição e pinçamento das

frases que respondiam ao objetivo desta pesquisa e desveladoras da participação

dos conselheiros nas reuniões. Os trechos da observação enriqueceram dados

oriundos das entrevistas e, pode-se inferir, corroboram dados retirados das atas.

4.7 Aspectos éticos da pesquisa

A pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do

Centro Universitário UNA (ANEXO B), de acordo com as normas do Conselho

Nacional de Saúde – Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996 – que

regulamentam a pesquisa com seres humanos (BRASIL, 1996).

Foi solicitada mediante documento autorização do presidente do CMS de SGRA

para a realização da pesquisa. Cada participante (conselheiro), após ter sido

devidamente orientado e esclarecido, assinou o Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido (TCLE) (APÊNDICE A), autorizando a participação como sujeito da

pesquisa e posterior divulgação dos resultados.

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5 RESULTADOS E ANÁLISE DOS DADOS

A participação social materializada a partir dos espaços deliberativos

conquistados na nossa sociedade é um caminho o qual muitos conselhos

gestores têm buscado alcançar.

Muitos avanços já foram atingidos, mas também muitas dificuldades ainda são

vivenciadas no cotidiano desses órgãos. Essas dificuldades podem perpassar por

entraves institucionais e políticos para a efetivação das funções inerentes aos

conselhos até chegar ao conselheiro, que também se torna responsável pela

concretização do controle social, dependendo de sua vontade e consciência

participativa.

Nessa perspectiva, este trabalho teve a pretensão de conhecer e analisar essas

dificuldades, a partir de estudo no CMS de São Gonçalo do Rio Abaixo. Buscou

também avaliar a efetividade desse canal de participação no acompanhamento,

controle e fiscalização das políticas públicas para o exercício do controle social.

5.1 Análise documental

Compuseram o universo de análise documental todas as 31 atas das reuniões do

Conselho Municipal de São Gonçalo do Rio Abaixo realizadas no período de

agosto de 2010 a setembro de 2012. Esse período compreende o primeiro e o

segundo anos de atuação do atual CMS de SGRA.

Das 37 reuniões planejadas para ocorrer nesse período anteriormente citado, seis

não se concretizaram por falta de quórum. Por conseguinte, das 31 que

efetivamente aconteceram, 25 foram ordinárias e seis extraordinárias. Nesse

sentido, reafirma-se que 31 atas foram lidas, analisadas e discutidas neste

estudo.

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As reuniões ordinárias são aquelas reuniões que já estão programadas, definidas

em um calendário preestabelecido. No caso do referido Conselho, as reuniões

ordinárias são realizadas toda última quarta-feira do mês. Essa definição já é

repassada aos conselheiros desde a primeira reunião. As reuniões extraordinárias

são realizadas quando existe alguma pauta a ser deliberada pelo Conselho em

um prazo mais urgente.

Para que a deliberação do Conselho seja válida, é necessário um quórum mínimo

para que possa ocorrer a votação da pauta programada. Este deve ser no mínimo

de seis conselheiros com direito a voto.

A leitura minuciosa de cada ata e respectiva análise permitiram abstrair que no

primeiro ano de funcionamento do Conselho, apenas duas reuniões não se

realizaram por falta de quórum. Entretanto, já no segundo ano esse número subiu

para quatro reuniões não realizadas.

Pela participação durante as reuniões, percebe-se que ao longo de dois anos

existiram conselheiros que estiveram presentes somente na primeira reunião.

Acrescenta-se ainda o fato de que a média de participação no primeiro ano foi de

14 conselheiros por reunião (exemplo ata de reunião ocorrida na data de 25 de

agosto de 2010); já no segundo ano, a média foi de oito conselheiros por reunião

(exemplo ata de reunião ocorrida na data de 28 de novembro de 2012).

Tal fato faz insurgir o questionamento: é possível que no primeiro ano de atuação

os conselheiros se sintam mais dispostos a participar e esse “entusiasmo” vai se

alterando no decorrer do mandato como conselheiro? Suas vocalizações durante

as discussões ocorridas em plenário se fazem ouvir e têm ressonância nas

tomadas de decisão?

Santos, Vargas e Lucas (2011, p. 488) consideram que existem motivos coletivos

e individuais que incentivam a participação. Os motivos coletivos são aqueles que

“são capazes de sensibilizar o sujeito em prol de uma ação que beneficiará a

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todos”; já os motivos pessoais, ao estimular o envolvimento de determinado

sujeito, acabam beneficiando os demais.

Os conselheiros podem ter deixado de participar por verem enfraquecidos os

motivos iniciais que levaram à sua participação, sejam eles pessoais ou coletivos.

Carvalho, estudioso sobre os conselhos de saúde no Brasil, considera que:

Diante da inefetividade desses órgãos em satisfazer as demandas finalísticas a eles submetidas, os representantes de segmentos podem reduzir suas expectativas, gerando seja o esvaziamento dos conselhos, seja uma adaptação conformada aos seus limites como arenas decisórias (burocratização) (CARVALHO, 1997, p. 97).

Nesse sentido, torna-se primordial destacar que, apesar da Lei 8.142/90 garantir

aos conselhos competência deliberativa, cabem ao Executivo a decisão final e a

implementação das políticas públicas.

Se as deliberações a aprovações do Conselho não são de fato homologadas e

cumpridas, o descrédito pode gerar insatisfação e descrença dos conselheiros.

Com isso, a motivação inicial pode ir se modificando ao longo do mandato.

Para Bispo Júnior e Gerschman (2013, p. 14), “as deliberações do Conselho são

parte de um processo muito maior, complexo, demorado e incerto. As resoluções

dos conselhos não constituem um ciclo completo nem se pretendem finalísticas”.

Na visão de Pedrini, Adams e Silva (2007, p. 35), “a participação e o controle

social são estratégias fundamentais para a construção das políticas públicas”.

Entretanto, mesmo que sejam conquistas importantes da sociedade civil

organizada, os conselhos, por si só, se não estiverem articulados com fóruns e

processos mobilizadores de lutas mais amplas, podem burocratizar-se e não

alcançar as metas para as quais foram criados.

Outro ponto merecedor de destaque é que das seis reuniões extraordinárias

solicitadas, 67% delas foram instadas por representantes do governo para

apreciação dos seguintes assuntos: apresentação do Termo de Compromisso de

Gestão, do Pacto pela Saúde, do Plano Anual de Vigilância em Saúde, do Plano

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Anual de Saúde Mental, prestação de contas (sobre construção de unidades

básicas de saúde, construção da Farmácia de Minas, Programa Saúde em Casa),

apresentação da programação anual de saúde, avaliação do Relatório Anual de

Gestão (RAG) e votação do orçamento fiscal.

Este último item requer uma consideração especial. A votação do orçamento

fiscal é de elevada relevância e requer criteriosa análise pelos conselheiros, pois

é por meio dele que se torna possível o cumprimento pelos municípios da

aplicação mínima de 15% da receita total municipal no setor da saúde. Constata-

se, com a leitura das atas, que não houve questionamento por parte dos

conselheiros sobre o orçamento utilizado pelo município. Em São Gonçalo do Rio

Abaixo, segundo relato do gestor (constado em ata e confirmado pelo presidente

do Conselho), a receita aplicada no setor da saúde ultrapassa sempre os 15%.

Porém, mesmo o valor investido sendo mais alto do que o obrigatório, seria

relevante que ocorresse uma discussão mais aprofundada sobre quais setores

receberam mais investimento, se houve resultados satisfatórios, se a demanda da

população está sendo atendida, se existem “vazios” assistenciais a serem

preenchidos, enfim, discussões que não foram levantadas, como se constatou

pela análise das atas.

Para todos os assuntos listados e comentados anteriormente, é exigida dos

gestores a ata de aprovação pelo CMS local, ou seja, é uma obrigação dos

gestores que esses assuntos sejam apresentados e discutidos nos conselhos.

Emerge, então, mais uma dúvida: se não se tratasse de obrigação formal,

estariam esses assuntos sendo tratados nos CMS? A população teria acesso a

esse tipo de informação?

Para Lüchmann (2009), há uma ambiguidade no quesito da obrigatoriedade legal

da participação da sociedade civil no âmbito dos Conselhos Gestores de Políticas

Públicas, pois ao mesmo tempo em que essa obrigatoriedade torna os conselhos

espaços com caráter meramente formal-legal, permite, por outro lado, mais

explicitação dos conflitos sociais, na medida em que não depende única e

exclusivamente do projeto político do governo.

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Os conselhos, quando consolidados para tal fim, poderiam provocar constantes

inquietações e romper com as estruturas tradicionais dos governos ditos

democráticos, buscando realmente modificar as condições limitantes e

promovendo mudanças nas suas realidades locais.

Porém, estudo realizado por Vieira e Calvo (2011) ressalta que há uma grande

limitação na autonomia dos conselhos. Observa-se que, na prática, segundo os

autores, muitos representantes do governo ou do sistema privado agem buscando

reduzir o papel fiscalizador ou deliberativo do Conselho a meros rituais de

legitimação de políticas e decisões supostamente democráticas.

Rocha et al. (2013, p. 108) ponderam que:

[...] o controle social do SUS tem função de acompanhar e fiscalizar as despesas públicas relacionadas à saúde no Brasil. No entanto, para que os conselhos possam cumprir adequadamente as suas funções, é necessário que conheçam como funciona o orçamento da saúde, para que se efetivem como órgãos de controle e de transparência nas

decisões e ações do poder público.

Considerando as vocalizações por segmento representado, ocorreram durante as

31 reuniões 28 vocalizações de representantes do governo, 22 do segmento dos

usuários e quatro de outros participantes, externos ao Conselho, conforme a TAB.

1.

TABELA 1 - Vocalizações por segmento no CMS de SGRA, nas reuniões de 2010 a 2012

Segmento de representação Número de vocalizações Percentual de vocalizações por segmento %

Governo 28 52

Prestador de Serviço 0 0,00

Usuários 22 41

Trabalhadores 0 0,00

Participantes externos 04 7

TOTAL 54 100

Fonte: elaboração própria, com base na análise das atas.

Os dados dessa tabela são expressivos e encontram eco em estudo realizado por

Avritzer (2010) com conselhos de cinco capitais brasileiras (Belo Horizonte,

Florianópolis, Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo), onde o segmento

representante do governo se manifestava de maneira mais efetiva.

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Para Santos, Vargas e Lucas (2011, p. 490), “quem detém o poder de construir a

informação e divulgá-la também tem o poder de considerá-la verdade, à revelia

das demandas para quem foram construídas”.

Cotta, Cazal e Martins (2010) questionam o grau de democratização interno das

organizações de saúde, pois em muitas situações o fluxo do processo decisório é

manipulado pelos interesses do governo municipal sobre os demais segmentos.

Para as autoras:

Essa relação assimétrica de poder, em que o espaço de deliberação política se faz inacessível e fragilizado, pode ter um efeito de burocratização dos conselhos, que deve ser insistentemente combatida para que o conselho seja um espaço efetivamente democrático, legitimando os direitos conquistados pelos cidadãos (COTTA; CAZAL;

MARTINS, 2010, p. 2444).

Outro ponto levantado na análise do quadro é que não sobreveio vocalização dos

representantes dos trabalhadores e dos prestadores de serviço. Percebe-se total

mutismo, um silêncio promovido por eles mesmos, pela conjunta, pelo

desconhecimento dos assuntos tratados ou pelo receio de expressar seus

sentimentos e pensamentos? Afinal, a participação dos trabalhadores é condição

imprescindível para a discussão de assuntos pertinentes às condições de trabalho

e dificuldades vivenciadas pelas classes representadas. A não participação

desses segmentos revela, então, uma pequena e incipiente representatividade na

discussão das pautas apresentadas e/ou sugeridas pelo Conselho.

Cruz et al. (2012) avaliam que o conflito entre trabalhadores e conselhos de

saúde pode ser explicado sob duas óticas. A primeira é que em muitas situações

a população seria convidada apenas para legitimar decisões técnicas já tomadas

pela equipe. O outro ponto está no fato de que usuários e usuários-conselheiros

apresentam críticas ou sugestões para a organização do trabalho da equipe que

são percebidas pelos trabalhadores e trabalhadores-conselheiros como

fiscalização do seu trabalho.

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A baixa vocalização dos trabalhadores deixa vazio um espaço que poderia ser

utilizado para reivindicação de melhorias nas condições de trabalho, para apoio

técnico nas deliberações relativas às ações de saúde e também momento de

diálogo com os usuários.

No âmbito dos conselhos, observa-se muito a ocorrência do poder condicionado.

Para Pedrini, Adams e Silva (2007), esse poder caracteriza-se por obter

submissão do outro por meio do sistema de crenças estabelecido, seja pela

persuasão pessoal, seja pela própria cultura.

As leituras e releituras de cada ata desvelaram a ocorrência do exercício desse

tipo de poder, pelo convencimento eficaz de tomada de decisões que favorecem o

órgão gestor. Das 31 reuniões realizadas, em apenas uma o assunto colocado em

pauta não foi aprovado (ata de reunião ocorrida em 10/05/11). Nesse dia,

debateu-se acerca da aprovação de uma casa para acolhimento de usuários de

álcool e outras drogas, porém a pauta não foi aprovada após argumentação do

gestor de que muitos pontos sobre esse assunto deveriam ser considerados antes

da aprovação, o que acabou sendo consenso entre os demais conselheiros.

Pedrini, Adams e Silva (2007, p. 79) consideram, ainda, que:

[...] a gestão político-democrática, o controle social e a promoção da cidadania se efetivam a partir de representações, práticas sociais e relações de poder exercidas. Mas se efetivam também pelas identidades sociais construídas num contexto sociocultural de valores e crenças sobre as formas centralizadas e clientelistas do fazer político.

Esses dizeres corroboram, na sua grande maioria, a concepção e o exercício de

participação como simples presença de representantes de entidades da

sociedade civil no espaço dos conselhos. A participação não é exercida como

simples presença corporal nas reuniões. Participar convoca ser ativo, dizer o seu

pensar, discutir ideias e fazeres, tomar posição, acatar ou discordar, entre outros,

em prol da comunidade, do município e do país. Torna-se, portanto,

imprescindível quebrar o mito da participação popular, como presença passiva,

ouvinte e de aceitação nos conselhos.

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Na TAB. 2 foram estabelecidas categorias de acordo com o tipo de manifestação

observada durante a leitura das atas do CMS de SGRA.

TABELA 2 - Tipos de manifestação por segmento de representação no CMS de SGRA

Segmento Questio-namento

Proposição Informação Demanda Consulta Denúncia Contestação TOTAL

Part.externo 0 01 0 0 02 0 01 04

Seg. gov. 0 0 24 0 04 0 0 28

Seg.usuário 13 04 0 03 0 01 01 22

Seg. trab. 0 0 0 0 0 0 0 0

Seg.prest. 0 0 0 0 0 0 0 0

TOTAL 13 05 24 03 06 01 02 54

Fonte: elaboração própria, com base na análise das atas.

Os dados da TAB. 2 revelam que 24 vocalizações foram de cunho informativo,

sendo que o segmento do governo foi responsável por 100% dos

esclarecimentos, indicando centralização e autocracia em um espaço que é

democrático, político e de discussões fundamentadas no bem-estar coletivo e não

de cunho pessoal e clientelista.

Luchmann (2009) reforça que a paridade numérica não representa paridade

política, pois o segmento governamental consegue produzir consensos com mais

facilidade do que a sociedade civil, que precisa convencer para tentar gerar

concordância junto aos demais representantes.

Para Silva, Cruz e Melo (2007), é necessário que sejam democratizados o acesso

às informações, pois o aparato que envolve a informação em saúde deve estar a

serviço dos sujeitos políticos. Considera, ainda, que a informação possui uma

dimensão política e estratégica para pautar as decisões dentro do Conselho.

No campo do controle social, conforme afirmam Cotta, Cazal e Rodrigues (2009),

o acesso à informação expande a capacidade de argumentação dos conselheiros

nos processos decisórios. Dessa forma, poderiam os conselhos intervir e deliberar

sobre as políticas de saúde.

Os assuntos abordados em pauta foram questionados em 13 participações

apenas, oriundos do segmento dos usuários. Os conselheiros deveriam aproveitar

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melhor esse espaço de discussão e socialização das informações, buscando

efetivar o exercício do seu poder como conselheiro a partir de proposições e

questionamentos.

Como afirma Machado (2004, p. 7):

[...] o exercício do controle social ultrapassa a dimensão da questão financeira. Além de fiscalizar, o controle social significa propor, monitorar, acompanhar, participar conjuntamente dos critérios de formulação das políticas públicas, as estratégias de viabilização dessas políticas, enfim, ter acesso à construção desse processo.

Apesar de a informação ser um ponto extremamente positivo da atuação do

Conselho, ou seja, possibilitar que os conselheiros sejam informados sobre os

diversos assuntos abordados, é preocupante o fato de que o segmento do

governo tenha sido o mais atuante nesse sentido. Ou seja, o esclarecimento pode

ir somente até onde o gestor desejar, até o ponto que seja de interesse que sejam

informados.

Para Guizardi e Pinheiro (2006 apud LANDERDHAL et al., 2010, p. 2434), “a

relação assimétrica de poder no Conselho pode levar à burocratização dos

mesmos, tornando-os meramente informativos e dificultando a elaboração comum

de políticas públicas”.

Ainda nesse sentido, como asseveram Pedrini, Adams e Silva (2007, p. 103),

“esse espaço pode tornar-se contraditório, pois os conselheiros(as) podem tornar-

se burocratas da máquina estatal, confundindo o seu papel com o do gestor”.

Para driblar essa situação, os conselheiros deveriam sair do espaço interno e

burocrático dos conselhos, ampliando a discussão com os segmentos que

representam.

Em consonância com essa afirmação, Lüchmann (2009) considera que os fatores

impeditivos para os processos participativos envolvem questões de natureza

política, econômica, social e cultural e que dizem respeito a uma sociedade

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estruturalmente com base no clientelismo, no autoritarismo e nas desigualdades

sociais.

Do total das 31 atas, encontramos apenas cinco vocalizações propositivas, ou

seja, em apenas cinco momentos advieram discussões baseadas na proposição

de ideias, o que remete às ponderações de Cotta, Cazal e Rodrigues (2009) de

que a dificuldade para uma participação mais dinâmica entre os representantes

do governo e da sociedade civil está na desigualdade de poder e de acesso à

informação.

Para que o exercício do controle social aconteça efetivamente no âmbito dos

conselhos gestores, é importante que se faça, realmente, discussão para a

construção de políticas que estejam verdadeiramente a serviço da população e

condizentes com as suas necessidades e aspirações.

Das 31 reuniões realizadas, em apenas sete (23%) houve a fala de

representantes dos usuários sobre assuntos relacionados à sua comunidade,

conforme os trechos destacados a seguir, transcritos literalmente como descrito

nas atas.

a) [...] membro do Conselho relatou sobre um encaminhamento à fisioterapia;

procurou o ACS para acompanhamento no município... como não teve

retorno procurou tratamento em João Monlevade mesmo [...](trecho da ata

nº 126).

b) [...] “conselheiro” questionou sobre o [Programa Saúde da Família] PSF

Recreio e “gestor” explicou que no serviço público a burocracia emperra o

andamento das obras, mas que a licitação já está em andamento [...] (ata

sem numeração, ocorrida 17/09/2010).

c) [...] “conselheiro” questionou a construção do PSF em Santa Efigênia e a

dificuldade de encontrar lote para a futura construção. “Conselheira”

questionou a distância do PSF Guanabara. “Conselheira” ressaltou a

importância do Peixe Vivo que, além das dificuldades, também funciona

como [Centro de Atenção Psicossocial] CAPS. “Conselheiro” ressaltou a

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importância das agentes comunitárias de saúde que trabalham muito bem,

são bem instruídas, falam a mesma língua [...] (trecho da ata nº 127).

d) [...] “conselheiro” aproveitou para questionar a respeito da vacinação contra

raiva e foi explicado pela responsável da [Vigilância Sanitária] VISA que a

falta de vacina pelo Estado deverá ser concluída até janeiro [...] (trecho da

ata nº 129).

e) [...] foram apresentadas diversas críticas sobre o atendimento da farmácia

municipal - críticas que foram trazidas pelos conselheiros devido a

reclamações de usuários [...] (trecho da ata da reunião extraordinária

ocorrida em 30/05/2011).

f) [...] questionada pelo “conselheiro” sobre o assunto da criação de uma

casa de passagem para acolhimento de usuários de álcool e drogas no

município [...] (trecho da ata nº 107ª).

g) [...] devido à reclamação de alguns usuários do serviço de fisioterapia em

relação ao não cumprimento do horário do profissional, em que esse

deveria estar à disposição do município para a realização de suas

atividades... nós do Conselho Municipal de Saúde solicitamos que averigue

os fatos e que nos informe se está ocorrendo o descumprimento da carga

horária pelo profissional [...] (trecho da ata da reunião extraordinária

realizada em 14/10/2011).

Essa incipiente e quase nula vocalização é preocupante, considerando que os

conselheiros representantes dos usuários deveriam atuar como ponte entre a

gestão e a comunidade. Por outra, percebe-se que as falas direcionam muito mais

para uma “queixa, informação” que se perde no vazio do que gera discussões e

conscientização de todos os presentes a respeito da situação de saúde do

município.

Kleba et al. (2010) referem que os atores sociais trazem a esses espaços uma

visão fragmentada de reivindicação e setorizada, voltada para interesses

específicos e corporativos, dificultando uma visão que contemple a complexidade

da realidade e dos problemas sociais.

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Alguns estudos que buscaram avaliar a relação entre representantes e

representados nos conselhos gestores constataram a existência de baixo grau de

prestação de contas e/ou retorno entre eles (CORREIA, 2000; GUIZARDI;

PINHEIRO, 2006; LABRA, 2002; LUCHMANN, 2009).

Santos, Vargas e Lucas (2011, p. 489-490) afirmam ser desejável “que a relação

do Conselho com a sua base seja o mais próxima possível, que o representante

conheça e conviva com seu grupo, caso contrário pode correr o risco de ser um

representante de si mesmo”.

A partir do momento em que se tornam representantes de um grupo, o

conselheiro assume a responsabilidade de buscar resolver situações voltadas

para o bem comum.

Tão importante quanto trazer as demandas da sociedade seria também a

divulgação, a publicidade das deliberações do Conselho, ou seja, o conselheiro

deveria informar também aos seus pares sobre os acontecimentos e decisões do

Conselho; seria dar visibilidade ao órgão do qual ele é participante e

representante.

Para Cotta, Cazal e Martins (2010, p. 2441), “a visibilidade dos conselhos é um

ponto crucial para o exercício do controle social, caracterizando-se pela

transparência das ações, na criação de canais de comunicação com a

população”.

Duarte e Machado (2012, p.136) afirmam que o controle social sem o

conhecimento e aval da própria sociedade pode tornar-se apenas uma falácia.

Neste sentido, devem surgir, nos próprios conselhos, iniciativas de aproximação

com a população. Por conseguinte, ocorreria a difusão de informações acerca de

sua atuação.

Tais achados levam ao questionamento sobre a existência de diferentes escalas

de poder dentro dos conselhos. Aqueles que detêm mais conhecimento acabam

dominando e direcionando os diálogos. Com isso, a falta de participação e

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envolvimento nas reuniões pode suscitar desmotivação nos conselheiros

representantes de outros segmentos que não seja o do governo.

De acordo com a análise de Simionatto e Nogueira (1997, p. 31) em estudo sobre

o Conselho Municipal de Saúde de Florianópolis:

Observa-se, assim, que certos atores vão se projetando em relação aos demais. Essa projeção parece ocorrer, por um lado, pela dominância de um saber científico, e, por outro, pela autoridade conferida à representatividade política. Isso pode ser observado na prevalência das posições dos representantes dos sindicatos, profissionais de saúde e governo [...] os representantes das entidades populares, não possuindo o mesmo saber, abstêm-se das discussões, permanecendo em uma posição de passividade e desmotivação no acompanhamento do processo [...] ocorre mais a presença física do que a capacidade de influir na formação de consensos [...] enquanto protagonistas.

A realidade desvelada por meio das atas no Conselho Municipal de Saúde de São

Gonçalo do Rio Abaixo, no momento atual, é a fotografia apresentada por

Simionatto e Nogueira em 1997. Ou seja, passados mais de 15 anos a história se

repete, mostrando não um dinamismo, um avanço, mas um retrocesso quando se

pensa nas mudanças velozes operadas em todos os setores da sociedade.

Verifica-se, portanto, que a participação dos conselheiros no Conselho estudado

ainda pode ser considerada incipiente, reprodutiva do status quo, considerando-

se a necessidade de busca pela criação de espaços democráticos e para a

discussão de políticas públicas condizentes com as necessidades locais.

5.2 Entrevistas com os conselheiros do CMS de São Gonçalo do Rio Abaixo

Antes de iniciar propriamente a análise das entrevistas realizadas, cabe enfatizar

neste estudo o desencontro de informações acerca dos conselheiros que

compõem o CMS de SGRA.

Conforme relatado anteriormente, ao serem procurados pelo entrevistador,

surgiram relatos de conselheiros que não sabiam sequer que estavam compondo

o Conselho. Outros declararam que já não eram mais conselheiros e havia

também conselheiros que já não residiam mais no município.

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Ao associar essa informação dada pelos conselheiros com as informações

contidas nas atas, verificou-se que existiam participantes do Conselho que

compareceram somente à primeira reunião, de formação do Conselho, e não

participaram mais.

Apesar de instigadora, tal situação conflitante não foi aprofundada neste estudo,

tendo-se que o seu objetivo principal foi analisar as dificuldades vivenciadas pelos

conselheiros e, para isso, esses conselheiros deveriam ser considerados

partícipes desse Conselho.

Concluiu-se também nessa fase inicial que o segmento dos prestadores de

serviço está sem representação no Conselho e o segmento dos trabalhadores

está com dois representantes titulares, mostrando o descumprimento da

legislação vigente (Lei Municipal nº 552/2002 – SGRA, 2002).

Essa distribuição irregular da paridade deveria ser objeto de questionamento por

parte dos conselheiros e da sociedade, pois a atual distribuição está com um

membro a mais da gestão, o que pode favorecer o processo de deliberação do

Conselho.

Ao que se pôde averiguar, a falta de representatividade no segmento dos

prestadores de serviço foi substituída por representantes dos trabalhadores em

saúde. Dessa forma, a distribuição atual no Conselho está sendo de: 50% de

representantes dos usuários, 30% do governo e 20% representantes dos

trabalhadores.

Observar essa distribuição paritária é importante para se avaliar o nível de

democratização e autonomia dos conselhos. Ao investigar esse formato

institucional, Carvalho (1995), observou que a paridade discrimina positivamente

segmentos que possuem mais dificuldades de vocalização, de exposição de suas

demandas.

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5.2.1 Perfil dos sujeitos

Dos 10 conselheiros, membros titulares, que compõem o CMS de SGRA, três são

do sexo masculino e sete do sexo feminino.

Em relação à idade, seis conselheiros estão na faixa etária entre 25 e 45 anos e

quatro estão na faixa etária acima de 45 anos.

No quesito escolaridade, dois conselheiros possuem o ensino fundamental, quatro

o ensino médio e quatro o ensino superior.

Sobre possuir escolaridade mais elevada no Conselho, Labra (2008, p. 114),

considera: se, por uma parte, em muito favoreça o bom desempenho no

Conselho, por outra, apontaria para outro fenômeno, qual seja, a “elitização” dos

representantes dos usuários no Conselho.

No Conselho em estudo, apurou-se distribuição regular da escolaridade. Para o

conselheiro compreender e participar conscientemente, algumas aptidões

mínimas são necessárias.

Para Duarte e Machado (2012, p. 132), essas aptidões envolvem desde a

capacidade mínima de compreensão textual e conhecimento básico dos princípios

e funcionamento do SUS, até a postura democrática necessária às discussões

coletivas.

Discorrendo acerca da ocupação, sete deles são servidores públicos e três são

aposentados.

Em relação ao mandato no Conselho, cinco encontram-se no primeiro mandato

no CMS, os outros cinco já estão há dois ou mais mandatos. Essa realidade pode

apresentar um lado positivo e outro negativo

O aspecto positivo dos mandatos subsequentes é de adquirir familiaridade com os

assuntos discutidos no Conselho, pois isso leva tempo e requer dedicação do

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conselheiro (LABRA, 2008). Dessa forma, aqueles conselheiros que já

participaram em outros mandatos já estariam mais “preparados” para a discussão

desses assuntos.

Alguns autores mencionam a “profissionalização” do conselheiro, o que pode

comprometer a democratização do Conselho, devido à falta de rotatividade

(DELGADO; ESCOREL, 2008; LABRA, 2008).

Nesse sentido, Santos, Vargas e Lucas (2011, p. 493) assinalam algumas

hipóteses que poderiam justificar a permanência dos conselheiros por vários

mandatos:

A dificuldade com a informação, o fato de o conselheiro aprimorar sua linguagem e distanciar-se da base, a dificuldade quanto à sensibilização para o voluntariado, o pouco engajamento político, resultado de um passado de pouca abertura política, podem não formar uma reserva de sujeitos para proporcionar o rodízio. Assim, corre-se o risco de que esses conselheiros se “profissionalizem” e fiquem cada dia mais distantes de sua base.

A permanência prolongada no Conselho pode levar a certa “comodidade”. A

rotatividade dos conselheiros abre espaço para o novo, para a apresentação de

novas demandas, a busca de novos desafios e a formação de novos atores

sociais.

Dos 10 conselheiros entrevistados, sete participam de alguma outra associação

ou Conselho no município.

Pode-se inferir, a partir dessa informação, que muitos desses conselheiros estão

presentes também em outros espaços participativos e deliberativos. Deve-se

considerar que esses conselheiros são pessoas engajadas e voltadas para a

busca de soluções para suas comunidades, mas, também, considerando o

tamanho do município, percebe-se que são as mesmas pessoas que acabam

participando das associações e grupos gestores na cidade.

Sobre esse aspecto, Labra (2008, p. 115) afirma que existem algumas tendências

concomitantes, que se reforçariam mutuamente.

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Uma delas tem a ver com a “oligarquização” das associações, deduzida da prolongada permanência das lideranças na direção da associação, do controle da cúpula sobre a escolha dos dirigentes, da simbiose entre estes e os conselheiros e a “profissionalização” e “elitização” desse grupo, sendo, o mais relevante, a mínima participação da sociedade nessas escolhas. Depreende-se desse “círculo vicioso” que os cidadãos comuns, além de serem pouco ouvidos, praticamente não têm oportunidade de serem indicados pelas associações para representá-las nos conselhos.

Há que se destacar, então, a necessidade de se buscar espaços para a escuta da

população, buscar também formas de associação não centralizadas, baseadas

em novas relações sociais, em formas de participação efetivas voltadas para o

conhecimento das demandas sociais.

5.2.2 Análise dos dados coletados nas entrevistas

Após delinear o perfil dos conselheiros de saúde do CMS, passa-se à abordagem,

a partir desse momento, das informações colhidas durante as entrevistas, com

extração dos diálogos, pontos que podem facilitar a compreensão do objeto deste

estudo, tal seja, a efetividade da participação cidadã e o exercício do controle

social.

Visando à preservação da identidade dos sujeitos da pesquisa, as entrevistas

foram enumeradas aleatoriamente de um a 10, seguidos da letra C quando

houver referência à fala de algum conselheiro.

Questionados sobre a frequência das reuniões, os conselheiros foram unânimes

nas respostas: todos (100%) responderam corretamente que a frequência das

reuniões do Conselho é mensal.

A legislação determina a realização de reuniões ordinárias no mínimo uma vez ao

mês e extraordinariamente conforme disposto no Regimento Interno (BRASIL,

2003). Dessa forma, o referido Conselho cumpre a norma e sinaliza para um bom

grau de comprometimento dos seus integrantes, que estão cientes da frequência

dessas reuniões.

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Para Zambon e Ogata (2011, p. 896), “uma forma simples de verificar se um

Conselho de Saúde funciona é identificar a ocorrência de reunião de forma

regular e averiguar se possui alguma estrutura administrativa”.

Em relação à forma de comunicação sobre as reuniões, as informações foram

variadas: cinco conselheiros informaram que são comunicados das reuniões por

e-mail (50%), três relataram serem informados de maneira informal (30%) e dois

por comunicado (20%).

Dessa forma, entende-se que são utilizadas maneiras diversificadas de

comunicação entre os conselheiros. Tal situação pode ser considerada positiva,

pois apesar da informatização estar acessível a uma grande parcela da

população, ela não pode ser considerada a única opção, pois podem existir

conselheiros que não têm acesso ou conhecimento de fontes virtuais. A utilização

de formas variadas de comunicação pode favorecer a participação de todos os

conselheiros nas reuniões.

Sobre o encaminhamento das pautas, três (30%) conselheiros reportaram que a

pauta é encaminhada com uma semana de antecedência, porém sete (70%)

citaran que as pautas das reuniões do Conselho não são encaminhadas

previamente.

Essa situação está em desacordo com a atual legislação vigente. A Resolução do

CNS nº 453/2012 determina que o material de apoio para as deliberações do

Conselho deva ser encaminhado aos conselheiros com antecedência mínima de

10 dias (BRASIL, 2012).

O desconhecimento prévio dos assuntos que serão discutidos e analisados pode

resultar em uma avaliação precipitada pelos conselheiros. Dessa forma, assuntos

relevantes podem estar sendo deliberados sem avaliação criteriosa, minuciosa.

Essa situação pode estar sendo propositalmente planejada, pois, dessa forma, os

assuntos acabam sendo deliberados pelo Conselho, favorecendo a gestão.

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Sobre a forma de inserção no Conselho, três (30%) dos conselheiros foram

convidados pela gestão da Secretaria de Saúde para compor o Conselho; três

(30%) mencionaram terem sido indicados pelo governo e quatro (40%)

informaram que foram convidados por outros conselheiros.

Ressalta-se que as organizações que compõem o Conselho já estão definidas em

lei municipal. Na ausência de normatização nacional, cada Conselho pode definir

as entidades de usuários que o irão compor. Alguns conselhos buscam escolher

entidades voltadas para o movimento social local ou engajadas em alguma causa

social.

Shimizu et al. (2013) sugerem que para garantir legitimidade das instituições que

compõem esse espaço público, a escolha dessas organizações deveria ocorrer

em fóruns organizados pela sociedade civil.

Porém, são poucos os municípios que elegem seus representantes dos conselhos

em conferências municipais. A maior parte das eleições dos membros ocorre em

assembleias, das quais muitas vezes a população não tem conhecimento sequer

de sua ocorrência e em muitos casos capta-se interferência de prefeitos e

secretários municipais.

Registrou-se, dessa forma, que 60% dos conselheiros foram indicados ou pela

gestão da Secretaria de Saúde ou pelo governo. Nenhum dos conselheiros

alegou ter procurado participar do Conselho por iniciativa própria. Em muitos

locais existe desconhecimento da população local acerca da existência dos

conselhos gestores. A população, que vivencia a maior parte dos problemas

existentes, muitas vezes não sabe nem como ingressar nessas instituições. A

indicação pela gestão e governo leva a questionar se já não ocorre um

favorecimento já no processo de escolha dos conselheiros. Indivíduos

simpatizantes ao governo, provavelmente, serão menos questionadores acerca

dos assuntos abordados e deliberados pelo Conselho.

Coelho e Veríssimo (2004 apud SIPIONI; ZORZAL e SILVA, 2013) notaram que a

existência de vínculo prévio com os setores governamentais é crucial para a

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escolha das instituições que serão convidadas a compor o Conselho. Outras

instituições, mesmo que mais ativas e representativas, ficam de fora.

Para Shimizu et al. (2013, p. 2281), “um conselho só é representativo quando

agrega uma diversidade de segmentos da sociedade civil e, portanto, uma série

de distintas entidades a serem representadas no CS”.

A não variedade de representações pode levar à saturação das demandas

apresentadas pelo grupo, o que provavelmente vai ao desencontro dos anseios

da população.

Pretendendo identificar o engajamento dos conselheiros na política, serão

analisados três pontos abordados durante as entrevistas: grau de interesse por

política, participação nas eleições municipais e filiação partidária.

Indagados sobre o seu grau de interesse por política, conforme observado na

TAB. 3, encontra-se reduzido grau de interesse por política, como mostra o relato

dos conselheiros.

TABELA 3 - Interesse por política

Respostas N %

Muito interesse 4 40

Pouco interesse 5 50

Nenhum interesse 1 10

TOTAL 10 100

Cabe ressaltar que alguns conselheiros, ao manifestarem seu interesse por

política, diferenciaram a política partidária da política não partidária, para justificar

suas opções, como desvelado nas unidades de registro a seguir:

[...] eu sou a favor do que politicamente o povo possa se beneficiar, então, é a política não partidária, é a política pra fazer melhorias pra comunidade, já que vão ser representantes do povo [...] (C10). [...] porque ser um político hoje é estar junto do povo, trabalhando pelo interesse do povo e ajudando o povo [...] (C2).

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[...] se a gente pegar política no sentido que ela foi criada, né, que veio do grego... do cuidar da polis... do cuidado coletivo da cidade, eu sou extremamente interessado... nesse sentido, eu sou muito dedicado à política sim, a fazer o bem comum, a estar sempre zelando pelas pessoas... no sentido agora de política governamental... é melhor você estar perto dela e conhecê-la e poder estar interpretando e usufruindo dela, do que você ficar alheio [...] (C7). [...] dependemos da política o tempo todo, porque através da política que é decidido os investimentos, então se as pessoas desinteressam dela, ne, para ver como estão caminhando as coisas... aí não resolve...aí para que a democracia? [...] (C8).

Ao ponderarem sobre participação nas eleições municipais, seis (60%) dos

conselheiros consideraram-se não participantes. O QUADRO 2 ilustra como se

deu a distribuição de opiniões nesse item.

QUADRO 2 - Participação nas eleições municipais

Tipo de Participação Característica N

Participante Apoiador 1

Boa atuação 1

Formador de opinião 1

Não participante Observador 4

Somente votando 2

Participação razoável Auxiliando sem envolvimento partidário 1

A leitura desses dados realça que apenas um conselheiro afirmou ter participado

como formador de opinião durante as últimas eleições municipais:

[...] busquei estar na linha de frente, até porque justamente quando você é formador de opinião, você enxerga o que vai ser um bom caminho para o município, [...] acho que a gente tem que demonstrar para os outros aquela vivência também... então, fui linha de frente nas eleições municipais... nas últimas que tiveram (C7).

Contudo, nesse componente, a grande maioria não admitiu estar envolvida nas

eleições municipais: “[...] fui uma observadora do que estava acontecendo,

observando e avaliando, mas sem participação” (C10).

À inquisição sobre filiação partidária, tão somente três (30%) dos conselheiros

relataram serem filiados a algum partido político. Dessa forma, as informações

colhidas comprovam que a grande maioria dos conselheiros não está diretamente

envolvida com política. Em contrapartida, aqueles que estão envolvidos exibiram-

se como agentes ativos no contexto político.

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Os dados revelam que a maioria dos conselheiros que compõem o Conselho em

estudo possui baixo engajamento político, pois possui pouco ou nenhum interesse

por política, não se envolveu nas eleições municipais e apenas pequena parte é

filiada a algum partido político.

Esse dado contradiz o estudo realizado por Fuks, Perissinotto e Ribeiro (2003) em

conselhos municipais de Curitiba, onde se encontrou alto grau de interesse e

participação dos indivíduos em relação aos assuntos políticos.

Para os autores:

Se, de um lado, parece evidente que a participação nos conselhos amplia aquela presente nas instituições políticas tradicionais, por outro as pesquisas existentes indicam a emergência dos conselhos gestores de políticas públicas, que não superou a distinção entre uma minoria de cidadãos politicamente ativos e a maioria passiva (FUKS; PERISSINOTTO; RIBEIRO, 2003, p. 129-130).

Carvalho (1995) avalia que a passividade constatada no campo da ação política é

uma avaliação negativa no contexto da participação.

Em seu estudo, Fuks, Perissinotto e Ribeiro (2003) enfatizam que mais importante

do que verificar a congruência ou discrepância entre o interesse por política e o

engajamento eleitoral é ressaltar que vistos como recursos, ambos os fatores

podem potencializar positivamente a ação política nos conselhos.

Bispo Júnior e Gerschman (2013, p. 13) explicitam que a “frágil mobilização social

e a apatia política têm se constituído em grandes entraves ao funcionamento dos

conselhos”.

Apesar da expansão das instituições participativas, nota-se considerável apatia e

resignação dos cidadãos brasileiros, geradas pela inércia e corrupção dos

governantes. Tal situação leva ao ceticismo ao considerar política como

instrumento de transformação.

Perguntados sobre o que representava o Conselho para eles, qual o seu

significado, foram obtidas diversas opiniões, listadas no QUADRO 3.

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QUADRO 3 - Significado do Conselho de Saúde

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

Pilar da saúde pública (C7) Decidir sobre os problemas de saúde (C2)

Acompanhar os processos da saúde (C10)

Controlar as políticas de saúde (C3)

Compromisso e interesse pela saúde (C9)

Formulação e avaliação das políticas públicas vigentes (C7)

Formular estratégias (C3)

Aprovar leis (C4)

Órgão fiscalizador (C10)

Diversificar as leis (C4)

Mecanismo de empoderamento social (C7)

Papel de reivindicação (C2)

Espaço democrático (C3)

Ferramenta a favor da população (C5)

Meio de informação (C6)

Controle social da saúde (C8)

Constata-se, por conseguinte, que os conselheiros sabem da importância e

significado desse órgão para a formulação e acompanhamento das políticas

públicas. Essa consciência é necessária a partir do momento em que essas

pessoas passam a compor o Conselho.

Algumas falas reafirmam os dizeres:

[...] seu principal significado para mim é de uma grande ferramenta, que se for composta por pessoas interessadas, preocupadas e responsáveis, se utilizará dele para manter a saúde no padrão desejado para qualquer população (C5). [...] um Conselho bem direcionado e que trabalhe, que sabe do seu papel, ele consegue melhorar significativamente as condições de saúde de uma população... Então o Conselho, para mim, ele é um mecanismo de empoderamento social dentro do processo de saúde (C7).

Cruz et al. (2012) consideram que a participação social na gestão das políticas

públicas deve representar uma oportunidade de assumir uma postura crítica, ativa

e criativa dos sujeitos no conjunto da atenção e promoção da saúde.

Ressaltam também que “a mobilização da população demonstra a sua força no

exercício do controle social, refletindo nos avanços da democratização

relacionada à saúde e no remanejamento efetivo do poder e do saber” (CRUZ et

al., 2012, p. 1097).

Nesse sentido, cabe aos conselheiros serem interlocutores junto à sociedade,

para que ocorra a luta por conquistas que vão ao encontro dos interesses da

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comunidade, tornando o usuário corresponsável pelo processo de tomada de

decisão.

Questionados então sobre o seu papel como conselheiros, podem-se classificar

as respostas da seguinte maneira:

QUADRO 4 – Papel dos conselheiros de saúde

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

Papel formal dos conselheiros (C7) Aconselhar (C8)

Votar (C4)

Estar atento ao que acontece no Conselho (C1)

Frequentar as reuniões (C1)

Elo entre a gestão e a população (C7) Conhecer os anseios da população (C7)

Vivenciar a realidade (C7)

Reivindicar (C2)

Auxílio no planejamento e gestão das ações de saúde (C7)

Fiscalizar a saúde (C2), (C5), (C6), (C8), (C9)

Analisar os atos da administração (C7), (C8)

Acompanhar o trabalho realizado na saúde (C10)

Sugerir melhorias (C2), (C10)

Colaborar com a gestão do sistema (C7)

Formulação de políticas públicas coerentes com a realidade municipal (C3), (C7)

Avaliar projetos importantes para a saúde (C9)

Discutir as políticas públicas vigentes (C3)

Diversificar as leis (C4)

Para Rocha et al. (2013, p. 107):

[...] é fundamental que os conselheiros tenham consciência da importância e da responsabilidade dos seus papéis perante a sociedade e busquem aperfeiçoar as suas atuações pautadas na ética e na cidadania. É necessário que os mesmos saibam agir de forma direcionada, com ações eficazes e eficientes, conhecendo os limites para o exercício de suas funções a fim de não exercerem ações arbitrárias e sem respaldo ético e legal.

É interessante observar que, entre tantos papéis atribuídos ao conselheiro, aquele

que mais foi citado foi o de fiscalização, citado por 50% dos conselheiros, como

se segue:

[...] meu papel é acompanhar...”probremas” de despesa [...] (C2). [...] meu papel é ajudar na fiscalização da saúde [...] (C9). [...] enquanto conselheira eu analiso todos os atos da administração com relação à parte referente à saúde... Então o meu papel, além de fiscalizador, é de aconselhar como se faz (C8). [...] o principal é fiscalizar [...] (C6). [...] o fundamental é fiscalizar [...] (C5).

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Moreira (2008, p. 16), analisando os conselhos de saúde, pondera que é preciso

reforçar o papel de controle fiscal dos conselhos ao mesmo tempo em que é

preciso efetivar a participação social como bem político.

Para Rocha et al. (2013, p. 110), “essa consciência de fiscalizar o orçamento

público na saúde, primando pela participação popular, ajuda para que se

prevaleçam práticas que tenham como essência a democratização”.

Para exercer essa fiscalização de fato, é necessário que o conselheiro esteja

acompanhando e discutindo sobre os assuntos deliberados nas reuniões para que

esse papel não seja cumprido às cegas. O questionamento, a argumentação e a

discussão deveriam ser constância nas reuniões do conselho. Cruzando essas

informações com a análise documental, observou-se que existe muito

esclarecimento e informação por parte da gestão, mas há também pouco

questionamento e contestação por parte dos outros segmentos dos conselheiros.

Apesar da consciência e definição do seu papel como conselheiros, a prática

revelou-se diferente do discurso apresentado. Os documentos comprovaram que

é baixa a interferência na gestão e há pouca proposição advinda dos segmentos

representados.

Bispo Júnior e Gerschman (2013, p. 13) revelam que “estudos convergem na

constatação da insuficiente participação de atores sociais, frágil relação dos

representantes com a base representada e relações de poder marcadamente

assimétricas no interior dos conselhos de saúde”.

A Resolução 333/03 traçou as competências dos conselhos de saúde,

principalmente na mobilização e articulação contínua da sociedade, na defesa dos

princípios que regem o SUS e no controle social da saúde. A Resolução define,

ainda, como competência dos conselhos a definição de diretrizes para a

elaboração dos planos de saúde, considerando a capacidade organizacional dos

serviços. Cabe aos conselhos, também, discutir, elaborar e aprovar propostas de

concretização das demandas advindas das Conferências Municipais de Saúde e o

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desenvolvimento de ações para acompanhamento da gestão do SUS no âmbito

de atuação do conselho (municipal, estadual ou nacional) (BRASIL, 2003).

Ao discorrerem acerca das competências do Conselho Municipal de Saúde, as

seguintes menções foram feitas:

QUADRO 5 – Competências dos CMS

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

Fiscalização (C3), (C5), (C6), (C8), (C10) Aprovar ou não as despesas (C2), (C8)

Fiscalizar o trabalho realizado (C10)

Atuar como ponte junto à comunidade (C2) Atender às reivindicações (C2)

Promover melhorias para o usuário (C10)

Ser parceiro da Secretaria de Saúde (C9) Busca de alternativas para a melhoria da saúde da população (C7)

Complementar a Secretaria de Saúde (C9)

Avaliação das políticas públicas vigentes (C7) Discussão, proposição e formulação de propostas (C3), (C7)

Aprovação das leis (C4)

Controle social (C7), (C8)

Verifica-se então, que os conselheiros do CMS de SGRA têm conhecimento

acerca das competências que estão estabelecidas em lei para serem cumpridas

no Conselho.

[...] é onde a gente tem a junção dos segmentos que compõem esse processo... Tem os usuários, a gestão, os prestadores de serviço, os profissionais, em prol de uma solução, de alternativas viáveis para a melhoria da qualidade de vida, da saúde da população [...] (C7).

Um dos conselheiros, apesar de pontuar qual seria a principal competência do

conselho, expôs a sua opinião sobre a realidade observada por ele:

[...] a fiscalização é a principal competência do Conselho, mas ela deve ser realmente feita da maneira correta. Particularmente eu acho que nosso Conselho peca muito em relação a isso. Eu tenho a sensação que se não todos, mas a maioria dos membros, se lembram que são conselheiros municipais de saúde somente quando são convocados para as reuniões ordinárias e extraordinárias (C5).

Percebe-se, dessa forma, que muitas vezes não ocorre o envolvimento

necessário para que se promova efetivamente uma mudança nos paradigmas

existentes. A função do conselheiro acaba sendo meramente formal.

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Outro ponto a ser considerado é que as competências do Conselho são inúmeras

e variadas, o que impede uma dedicação específica para determinado tema e até

mesmo limitações para uma atuação mais crítica de determinados pontos

discutidos.

Tal afirmativa condiz com o pensamento de Bispo Júnior e Gerschman (2013, p.

13):

Aos conselhos competem numerosas tarefas internas e externas que sobrecarregam demasiadamente o trabalho dos conselheiros. Atividades como deliberar sobre a política de saúde, acompanhar sua implementação e fiscalizar os aspectos econômicos e financeiros do setor requerem conhecimentos específicos e uma disponibilidade de tempo incompatível para a maioria dos conselheiros.

Kleba et al. (2010) atestam que o elevado número de atribuições dos conselhos,

que vão desde a aprovação até à fiscalização de ações e serviços, sobrecarrega

os atores e inviabiliza a realização de debates mais aprofundados. Outro ponto a

considerar seria que, diante das condições previstas para a participação (caráter

voluntário, tempo restrito para os encontros, falta de estrutura física e operacional,

entre outras), as atribuições são por demais complexas para estarem sendo

deliberadas de maneira legítima.

Sobre a categoria “ser parceiro da Secretaria de Saúde”, é necessário ressalvar

que para que surjam resultados efetivos dos conselhos de saúde, essa parceria

com a Secretaria é fundamental. Do contrário, as resoluções do Conselho podem

não ser homologadas pelo Executivo.

Apesar da Lei 8.142/90 garantir poder deliberativo aos conselhos, a legislação

falha ao não aplicar alguma punição aos municípios que não cumprem essas

deliberações (BRASIL, 1990b).

Criar um ambiente favorável que possibilite a troca de opiniões, aspirações e

demandas pode favorecer a atuação do Conselho. Deve-se, contudo, ter cuidado

para que tal parceria não seja transformada em meio de manipulação.

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Como afirmam Duarte e Machado (2012), o amadurecimento na relação de

parceria entre conselhos de saúde e os gestores do SUS já é vivenciado em

algumas realidades. Assim, “o gestor sábio e comprometido será diligente em

viabilizar meios de fortalecer o Conselho de Saúde, para, inclusive, tê-lo como

parceiro, não no sentido de mascarar suas falhas, mas para legitimar e consolidar

sua gestão” (DUARTE; MACHADO, 2012, p. 137).

Buscando avaliar a autonomia dos conselheiros, questionou-se então, como se dá

a participação dos mesmos nas decisões emanadas pelo órgão, incluindo-se as

proposições para plenária, controle e avaliação das atividades do conselho.

Para Afonso (2011, p. 459), “a autonomia é um trabalho intersubjetivo, coletivo e

social que resulta da possibilidade de construção de instituições que favoreçam a

autonomia da própria sociedade”.

Nesse quesito, as opiniões ficaram assim divididas:

QUADRO 6 - Participação nas decisões do Conselho

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

Participação efetiva (C3), (C7) Atuação nas decisões do conselho (C2), (C5), (C8)

Atuação como formador de opinião (C7)

Atuação com sugestões e opiniões (C2), (C4), (C5), (C6), (C9)

Atuação como esclarecedor (C8)

Participação incipiente (C10) Ausência nas decisões (C10)

Apenas com o voto (C1)

A maior parte dos conselheiros relatou ter as suas opiniões e sugestões

respeitadas no Conselho. Os discursos permitiram concluir que o Conselho abre

espaço para a participação dos seus integrantes.

[...] todas as sugestões são ouvidas, aceitas ou não aceitas, mas geralmente o que a gente conversa lá dentro “tá” dentro do contexto e é realmente aceita (C2). [...] sempre quando necessário eu sou ouvida e tenho, junto com os demais membros, a oportunidade de votar, deliberando ou não quando for necessário e benéfico para a população (C5).

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[...] eu vejo a minha participação nas decisões... ela é bem incisiva... a minha opinião, ela ajuda os demais a formarem a opinião deles... então eu sou criterioso justamente porque eu sei que essa questão de formador de opinião... muitas vezes, você está induzindo as pessoas a te acompanharem no voto sem ter uma análise mais detalhada do assunto, mas tenho consciência desse papel que eu tenho [...] (C7). [...] eles respeitam a minha opinião e de todas as pessoas que participam do Conselho... tudo é feito com o consentimento das pessoas e nós devemos mesmo participar porque é através dessa participação, dessa fala, que nós temos voz no Conselho (C9).

As falas de C2, C5, C7 e C9 representam exatamente o sentido do controle

social, que é fazer se escutar nos espaços de discussão e negociação dos

interesses públicos, nas deliberações que envolvem a sociedade. A presença sem

voz não configura a participação social.

Cruz et al. (2012, p. 1095) consideram que a relevância do controle social está em

estabelecer-se como uma oportunidade para democratização da gestão, por meio

da interlocução dos saberes e no estímulo à compreensão da saúde como direito

humano.

A liberdade de expressão e a possibilidade de diálogo dentro do Conselho podem

ser consideradas um fator positivo, pois em muitos conselhos não existe abertura

para as discussões. Pela fala dos conselheiros, pôde-se notar que existe um

respeito mútuo, as relações são harmoniosas dentro do CMS de SGRA.

Bispo Júnior e Gerschman (2013, p. 14) afirmam que “os conselhos só

conseguem exercer eficazmente o papel de instância democrática, participativa e

deliberativa em ambientes onde os valores democráticos são respeitados e

valorizados”.

Perguntados, então, se os conselheiros teriam alguma dificuldade em participar

do Conselho, foi obtida uma divisão sistemática das opiniões: 50% dos

conselheiros encontram dificuldades e 50% responderam que não possuem

alguma dificuldade em participar do Conselho, que são ouvidos e têm suas

opiniões respeitadas.

As dificuldades relatadas foram:

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A) Dificuldade no acesso à informação

Segundo C7, “[...] por a gente estar numa cidade de interior, a gente tem uma

maior dificuldade de acesso à informação e a uma série de outras coisas [...]”.

O acesso aos documentos, às informações deveria estar à disposição de todos os

membros do Conselho, independentemente de ser uma cidade de interior ou uma

grande metrópole. Iniciativas como os portais de transparência têm possibilitado

consultas diversas a toda a população, porém são soluções que demoram a

chegar ao conhecimento da sociedade.

Sendo um órgão deliberativo, o Conselho tem o poder de exigir todos os

documentos necessários para avaliação e aprovação dos assuntos deliberados

em pauta. Cabe ao gestor e demais setores da administração providenciar para

que tais documentos estejam acessíveis aos conselheiros.

O Brasil ainda está atrelado às práticas dominadoras dos detentores do poder e

da informação. Para Bispo Júnior e Gerschman (2013, p. 13), “práticas

clientelistas, nepotismo, oligarquização das cúpulas, autoritarismo, pouca

transparência nas decisões e na prestação de contas não são realidades

distantes de boa parte dos conselhos”.

A necessidade de reafirmação do poder é um dos fatores que dificultam a relação

de cooperação e transparência na geração de dados relevantes ao processo de

decisão dos conselheiros.

Para Kleba et al. (2010, p. 801), “os conselheiros devem ampliar sua atuação no

campo da comunicação, qualificando sua capacidade de acessar e processar

informações, criando e fortalecendo canais e processos de diálogo com diferentes

atores sociais”.

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B) Falta de preparo

Como entende C1, “[...] a gente não tem um preparo, assim... um bom preparo,

‘né’, mas a gente vai participando assim mesmo”.

Para Santos, Vargas e Lucas (2011, p. 490), “os conceitos são sempre

carregados de noções técnicas e há uma dificuldade muito grande na apropriação

do conteúdo das políticas públicas”.

Os temas discutidos nos conselhos são diversos e muitas vezes carregados de

informações de Contabilidade, termos técnicos, termos políticos, entre outros. A

familiaridade com esses temas requer tempo e capacitação.

Os autores consideram, ainda, que “no caso da saúde, as políticas acabam sendo

criadas PARA e não COM os sujeitos, comprometendo todo o processo”

(SANTOS; VARGAS; LUCAS, 2011, p. 490).

Ao considerar-se despreparado, o conselheiro pode deixar de se envolver em

discussões e de emitir opiniões acerca dos assuntos deliberados nas reuniões.

Dessa forma, deixam de exercer a participação cidadã no espaço dos conselhos.

Existem algumas iniciativas de capacitação para conselheiros oferecidas pelo

Conselho Nacional de Saúde e até mesmo iniciativas de grupos específicos como

ONGs e universidades. A dificuldade, porém, é tornar acessível a todos os

municípios e conselheiros essas capacitações.

No Conselho em estudo, por exemplo, averiguou-se nas atas que nos dois anos

de funcionamento foi oferecida pelo Estado uma única oportunidade de curso.

Mesmo assim, o Conselho pôde encaminhar apenas dois conselheiros.

Shimizu et al. (2013) acreditam que a carência das capacitações é um dos pontos

que dificultam o exercício das funções dos conselheiros, entre elas a fiscalização

das ações de saúde, a deliberação sobre a definição de políticas e prioridades no

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setor da saúde e também a função consultiva, que seria a avaliação dos

convênios ou outras questões de saúde.

Seria importante que esses conselheiros se sentissem bem orientados e

capacitados para o exercício de suas funções. A educação seria um caminho para

o empoderamento desses sujeitos.

A capacitação poderia incitar nos sujeitos o desejo de participar, atuando como

estímulo ao exercício do controle social. Oliveira, Ianni e Dallari (2013, p. 2335)

indicam que “essa participação só será possível quando a sociedade, em sua

diversidade, tiver o aporte de conhecimentos que promovam não só a sua efetiva

participação, mas, principalmente, o gosto em participar”.

C) Falta de tempo

[...] a minha maior dificuldade em participar do Conselho é muito em relação à vida profissional que eu “tô” tendo atualmente... bem apertada... então eu não consigo dedicar suficientemente o que eu gostaria de dedicar ao Conselho, para ser um bom conselheiro [...] (C7).

Para exercer a função de conselheiro, mais do que o tempo propriamente dito, é

necessário envolvimento. Quando a causa que é defendida está bem incorporada

pelo sujeito, a participação é exercida de maneira espontânea.

Para Bispo Júnior e Gerschman (2013, p. 13):

Ampliar a democracia em direção à sua natureza substantiva está condicionado ao compromisso ético e cidadão de representantes populares e tomadores de decisão, na garantia dos resultados das políticas e manutenção de direitos fundamentais para toda a sociedade.

Ao assumir a posição de conselheiro de saúde, deve-se assumir também o

compromisso com a sociedade na busca de soluções que garantam melhorias

nas condições e ofertas de serviços à população. Para isso, é de suma

importância a efetiva ocupação desses espaços deliberativos.

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Rocha et al. (2013) avaliam que é necessário que os conselheiros tenham

convicção de suas responsabilidades para que possam exercer suas funções de

controle e fiscalização e resolução de conflitos em busca de um SUS fortalecido e

que atenda às necessidades da sociedade.

D) Estrutura física

[...] dificuldade estrutura física que o Conselho tem... Às vezes como conselheiro a gente tem que estar perto, conhecer a rede, a estrutura e a gente tem dificuldade... O Conselho não dispõe de certos recursos, de certas estruturas que seriam interessantes para o bom funcionamento do Conselho [...] (C7).

A Resolução nº 333 (BRASIL, 2003) prevê que os governos garantam autonomia

aos conselhos conferindo-lhes estrutura administrativa e dotação orçamentária,

cabendo aos próprios conselhos de saúde definir a estrutura administrativa

necessária para a realização de suas atividades.

A falta ou deficiência de estrutura física e recursos nos conselhos pode levar a

certa dependência da Secretaria de Saúde para a efetivação das ações

operacionais do órgão (realização de comunicados, espaço para receber a

população, atividades de fiscalização, entre outros).

Zambon e Ogata (2011, p. 895) consideram que “a precariedade nas garantias de

infraestrutura administrativa e financeira aos CMS demonstra o não

reconhecimento dessas instâncias por parte dos governos locais”.

E) Horário das reuniões

[...] o horário para mim é uma grande dificuldade, pois é sempre no meu horário de serviço [...] (C5). [...] dificuldade pelo horário, por ser no horário de trabalho... Às vezes estou ocupada no meu trabalho e não consigo participar [...] (C10).

Se o horário das reuniões é impeditivo para mais de um conselheiro poder

participar, deveria ocorrer um envolvimento no sentido de viabilizar horários mais

flexíveis e adaptáveis à realidade dos envolvidos.

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Segundo Oliveira, Ianni e Dallari (2013), existe ainda imaturidade nos conselhos

para sua autorregulação, para o estabelecimento de suas próprias regras.

Kleba et al. (2010, p. 801) avaliam que “os conselheiros devem ser liberados para

dedicar maior tempo ao debate sobre questões políticas; para estudar, propor e

deliberar sobre prioridades que superem as demandas da rotina de ‘apagar

incêndios’”.

F) Leitura prévia dos documentos

Na visão de C4, “[...] em certos momentos, a gente precisa ler mais as coisas ‘pra’

gente aprovar, só que a gente às vezes não tem tanto prazo ‘pra’ responder”.

Essa fala revela que há pouco prazo para o conselheiro entender sobre o que

está em votação; os prazos são curtos diante do volume de informações. Esse

curto espaço de reflexão associado à baixa experiência participativa podem levar

à ocorrência de decisões que vão ao desencontro dos reais anseios e

necessidades da população, que fica alheia às decisões do Conselho.

Shimizu et al. (2013, p. 2280) consideram que

[...] não considerar a população como sujeito político é uma forma de organização centralizada e burocrática, pois impede que os sujeitos dialoguem com sua experiência e com os desejos nele implicados, revelando-se pouco porosos à produção de novas possibilidades de

construção de projetos coletivos.

Essa “pressa” necessária para as deliberações é forçosamente gerada pela elite

dominante, que precisa do documento formal de aprovação, mas que não quer

dar espaço à reflexão e ao pensamento crítico.

Escorel (2013, p. 1939) afirma que:

[...] fica evidente nos estudos a assimetria de poder que mantém a dominação dos gestores que detêm o poder de agenda, exercem a chantagem da pressa da decisão para evitar o debate ou mascaram os verdadeiros interesses e as consequências das ações sob uma linguagem técnica, apolítica.

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Para uma mudança efetiva nessas práticas clientelistas e dominantes, deveria

ocorrer mudança na postura dos gestores.

Na perspectiva de Cotta, Cazal e Martins (2010), para a garantia de intervenções

justas e éticas para a sociedade, os gestores deveriam atuar no sentido de

deslocamento de regiões verticais para regiões horizontais. Ou seja, deveriam

democratizar as informações de maneira equânime.

Apesar das dificuldades apresentadas, a experiência no Conselho pareceu ser

enriquecedora para os entrevistados. Questionados sobre o interesse em

participar novamente de alguma Associação ou Conselho, apenas dois (20%)

responderam que não, mas justificaram suas negativas pelo fato de já

participarem de outras associações. Outros dois (20%) responderam que

dependeria dos objetivos da instituição e seis (60%) dos conselheiros

responderam que sim, que se interessava em participar, pois ser conselheiro é

uma forma de se tornar útil para a sociedade, por meio da sugestão de melhorias.

Escorel (2013, p. 1940) refere que “é nas instâncias de participação social que

ainda pulsam a utopia e o desejo de justiça social”.

5.3 Observação participante

A observação participante foi realizada na reunião do CMS de SGRA ocorrida na

data de 6 de abril de 2013.

O fato de o pesquisador ser também conselheiro não causou desconforto aos

sujeitos da pesquisa, o que facilitou o processo de observação.

Estavam presentes à reunião dois conselheiros representantes do governo, dois

representantes do segmento dos usuários e dois representantes do segmento dos

trabalhadores.

A reunião ocorreu em caráter extraordinário e a pauta em questão era a

apresentação do Plano Municipal de Vigilância Sanitária para a vigência em 2013.

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Apesar de o encontro estar agendado para as 13.00 horas, houve atraso no início

das atividades, pois não havia o quórum necessário para a aprovação da pauta.

Tal situação fez alguns participantes entrarem em contato com outros

conselheiros para que viessem à reunião, pois o assunto precisava ser deliberado

naquela data.

Com a chegada de mais um conselheiro (representando o segmento dos

usuários), a reunião foi iniciada e o assunto apresentado.

Registrou-se que os conselheiros tinham o primeiro contato com o documento em

questão, em virtude das dúvidas levantadas. Por se tratar de um plano tão

importante que interfere diretamente no cotidiano das pessoas, o conteúdo

poderia ter sido encaminhado com antecedência para apreciação cuidadosa dos

conselheiros. Apesar dessa situação, havia um representante do setor da

Vigilância em Saúde que estava à disposição para esclarecer as dúvidas que

foram sendo levantadas durante a apresentação.

Ocorreram vocalizações dos representantes dos usuários e do governo.

Observou-se também que existiram espaço e liberdade para a discussão. Dois

conselheiros, representantes do segmento de usuários, fizeram várias

considerações ao plano, o que foi válido, pois traziam dúvidas comuns aos

demais membros (DIÁRIO DE CAMPO, 06 DE ABRIL DE 2013).

Outro ponto a ser abordado é que o assunto tratado em pauta era

demasiadamente longo, com muitos pontos importantes. Dessa forma, seria mais

prudente que houvesse mais tempo para a discussão e negociação ou até mesmo

a divisão do assunto em duas reuniões. Após a leitura e esclarecimento das

dúvidas, o plano foi submetido à votação e aprovado.

O envolvimento dos participantes do Conselho deveria ser espontâneo, essa

“convocação” às pressas vai contra o processo participativo. O primeiro passo

para a participação deveria ser o interesse próprio em participar, até mesmo por

serem representantes dos segmentos da sociedade.

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6 CONTRIBUIÇÕES TÉCNICAS: PROJETO DE INTERVENÇÃO

BLOG CONSELHO DE SAÚDE DE SÃO GONÇALO DO RIO

ABAIXO

6.1 Introdução

Os anos de 1980 e 1990 marcaram no Brasil uma época de mudanças nos canais

de participação da sociedade. A Constituição Federal de 1988 e a Lei 8.142/90

possibilitaram importantes mudanças no cenário nacional no tocante à

participação social em diversos setores, especialmente no setor da saúde

(BRASIL, 1990).

Os CMS foram instituídos como espaços para a discussão das políticas públicas

de saúde e para a democratização das decisões. A participação da comunidade

em cada esfera de governo é um dos requisitos para o pleno funcionamento dos

conselhos. A respeito dos CMS, a Lei 8.142 regulamenta:

O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera de governo (art. 1º, inc. 2º). “[...] a representação dos usuários nos Conselhos de Saúde e Conferências será paritária em relação ao conjunto dos demais segmentos” (art. 1º, inc. 4º) (BRASIL, 1990).

Diante do exposto, a condição do conselheiro é considerada de relevância

pública, visto não somente a paridade de sua participação, mas também o poder

decisório que compartilha com os representantes dos demais segmentos.

Contudo, para participar desses espaços, a sociedade precisa mobilizar-se. A

mobilização social é muitas vezes confundida com manifestações públicas, com

grupos de pessoas reunidos em passeatas, concentrações em praças e

caminhadas de conscientização, entre outras formas. Mas isso por si só não

caracteriza uma mobilização. Uma verdadeira mobilização social requer o

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estabelecimento de objetivos e necessidades que vão além dos interesses

individuais; é necessário o envolvimento com o coletivo.

Participação e mobilização são atos de escolha. Todos podem ser convidados a

participar de um movimento ou grupo, mas cabe ao indivíduo a decisão de estar

ou não realmente inserido nesse espaço. É importante a identificação com a

causa e a vontade de produzir mudanças.

Voltando aos CMS, o segmento de usuários é composto, na sua grande parte, por

representantes de associações de moradores ou outras organizações. Em muitos

conselhos, esses representantes chegam sem saberem sequer sobre os assuntos

dos quais passarão a discutir ou deliberar. Os representantes muitas vezes

acabam sendo direcionados pelos gestores.

Os conselheiros de saúde assumem importante papel em nossa sociedade à

medida que tomam ciência, antes da grande maioria da sociedade, sobre o

destino da saúde pública na sua cidade, no estado e no país, por intermédio das

diretrizes traçadas por essas respectivas instâncias.

Diversas são as dificuldades vivenciadas pelos conselheiros em todo o país, mas

a confiança na evolução desse importante canal de participação deve continuar

sendo objeto de diversos estudos e iniciativas.

Nesse sentido, como forma de contribuir para o exercício da participação cidadã e

fortalecimento do controle social exercido nos CMS, esse projeto de intervenção

visa a subsidiar os conselheiros de saúde para uma atuação mais reflexiva, crítica

e consciente.

Tal projeto resultou da pesquisa realizada junto aos atores sociais do Conselho

Municipal de Saúde de São Gonçalo do Rio Abaixo, complementada por pesquisa

documental na forma de leitura e análise das atas de reuniões realizadas pelo

órgão nos dois primeiros anos de mandatos dos referidos conselheiros.

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Por projeto de intervenção será considerado o conceito apresentado por

Deslandes e Lourenço:

Um conjunto articulado de ações e pessoas motivadas para o enfrentamento de determinado problema ou contexto gerador que se pretende alterar e/ou aprimorar, por meio de estratégias previstas, num tempo determinado (início, meio e fim), com recursos limitados e sob constante avaliação (DESLANDES; LOURENÇO, 2012, p. 103).

Almeja-se, com a implantação do projeto, facilitar o estabelecimento de parcerias

que possam perpetuar os laços de cooperação, mesmo após o findar da pesquisa

realizada no âmbito deste Conselho.

Espera-se, também, que as experiências realizadas no município possam servir

de exemplos a serem seguidos por outros conselhos, principalmente a partir da

divulgação dos resultados e das ações.

6.2 Resultados da pesquisa e análise

Na análise dos dados obtidos na pesquisa junto ao Conselho Municipal de Saúde

de São Gonçalo do Rio Abaixo (SGRA), por meio de entrevistas realizadas com

os conselheiros, da análise documental das atas de dois anos de funcionamento

do atual Conselho e da observação participante, ficou demonstrada a baixa

efetividade participativa dos segmentos representantes dos usuários e dos

trabalhadores de saúde nas deliberações do Conselho.

A presença dos conselheiros foi diminuindo ao longo do mandato, sugerindo uma

desmotivação quanto à participação nesse espaço. Outro ponto levantado na

pesquisa é que das seis reuniões extraordinárias solicitadas, 67% delas foram

instadas por representantes do governo, para apreciação de assuntos ligados à

gestão e que necessitavam de aprovação em ata do Conselho. Questionou-se

então se o espaço dos conselhos não tem sido utilizado apenas como um

cumprimento legal, formal.

O levantamento das vocalizações nas 31 atas analisadas possibilitou medir o

percentual de vocalizações dos atores sociais que compõem o CMS, por meio do

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registro das falas dos segmentos representativos. O segmento que apresentou o

mais alto número de vocalizações foi o governamental, seguido dos usuários. Não

sobreveio vocalização dos representantes dos trabalhadores e dos prestadores

de serviço, indicando uma pequena e incipiente representatividade desses

segmentos.

Tais descobertas levaram ao questionamento sobre o grau de democratização

dentro do espaço dos conselhos gestores.

Foram categorizados os tipos de manifestação realizada por cada segmento.

Apurou-se que a maioria das vocalizações do segmento governamental foi

informativa e que somente esse segmento foi responsável por esse tipo de

manifestação. O segmento dos usuários manifestou-se de forma mais

questionadora. Obteve-se, também, que somente em cinco momentos ocorreram

vocalizações propositivas.

Estes dados mostram centralização e autocracia em um espaço que é

democrático, político e de discussões fundamentadas no bem-estar coletivo, e

não de cunho pessoal e clientelista. Questionou-se, então, a existência de

assimetria de poder dentro dos conselhos.

Do total das 31 atas, foram encontradas apenas sete vocalizações sobre assuntos

relacionados à comunidade, sendo esse dado preocupante, pois se acredita que

os conselhos deveriam atuar como elo entre a gestão e a comunidade.

A realidade contida nas atas contrastou com o relato dos conselheiros. Apesar de

considerarem-se pouco engajados no campo político, esses sujeitos mostraram-

se conscientes de seus papéis, conhecem as competências inerentes aos

conselhos e consideram-se participantes efetivos nas decisões do Conselho.

Contudo, os conselheiros entrevistados afirmaram encontrar dificuldades para o

exercício da participação no Conselho, como: dificuldade no acesso à informação,

falta de preparo para exercer a função, falta de tempo para se dedicar às funções

inerentes aos conselhos, pouca estrutura operacional para o exercício das

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funções, horário incompatível com as atribuições cotidianas dos conselheiros e

acesso prévio aos documentos, dificultando o processo de deliberação

consciente.

Verificou-se, portanto, que a participação dos conselheiros no Conselho estudado

ainda pode ser considerada incipiente, reprodutiva do status quo, tendo-se a

necessidade de busca pela criação de espaços democráticos e para a discussão

de políticas públicas condizentes com as necessidades locais.

6.3 Problema

O problema que este projeto visa a minimizar consiste na verificação de que os

conselheiros de saúde do município de São Gonçalo do Rio Abaixo se sentem

despreparados para o exercício da função. Esse despreparo tem gerado diversas

dificuldades no exercício dos papéis dos conselheiros e das competências do

Conselho de Saúde, especialmente na formulação de políticas públicas que sejam

condizentes com os anseios da coletividade.

6.4 Justificativa

O diagnóstico proporcionado pela pesquisa apresentou diversos problemas que

poderiam gerar vários projetos de intervenção. Porém, optou-se por atacar o

problema de falta de preparo dos conselheiros, por considerar que essa

dificuldade é a principal causa geradora dos demais problemas encontrados.

Ao se sentir despreparado, o conselheiro pode deixar de exercer suas funções

por se sentir desmotivado e pode participar do Conselho apenas para executar o

voto.

Essa situação favorece o convencimento e a manipulação por parte do segmento

governamental, que por serem os detentores do poder da informação, acabam

por “convencer” o grupo a apoiar as propostas sugeridas.

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Vieira e Calvo (2011, p. 2324) realçam que “a autonomia de atuação dos

conselhos ainda é um processo em desenvolvimento”.

O empoderamento dos cidadãos é o caminho proposto para fortalecer as arenas

de discussão das políticas públicas. O conhecimento empodera, estimula a

autonomia e permite o debate justo dentro dos conselhos gestores.

Nesse sentido, após avaliação de todo o material, optou-se por trabalhar em uma

demanda que foi apresentada em uma das reuniões do Conselho, registrada em

uma das atas avaliadas para a análise documental.

Definir a priori uma intervenção sem considerar a real necessidade do grupo

poderia gerar uma ação fragmentada, em divergência com as reais necessidades

existentes. A exclusão dos envolvidos com a pesquisa poderia gerar insatisfação

e até mesmo pouco comprometimento com o projeto idealizado.

Matthaus (2010) considera que no processo de democratização do planejamento

voltado para os cidadãos é necessário que os atores sociais saibam o que está

sendo planejado para eles.

Na ata da reunião ocorrida no dia 28 de julho de 2011, a presidente do Conselho

sugeriu a criação de um blog do Conselho no intuito de aproximá-lo da

comunidade. A pauta foi aprovada por todos os conselheiros presentes, porém

isso ainda não foi efetivado, apesar de registrado e aprovado em ata.

Dessa forma, a criação do blog possibilitaria a troca de informações entre os

próprios conselheiros, criaria uma ponte entre o Conselho e a comunidade por

meio da divulgação das ações realizadas e poderia ser um instrumento de

formação e capacitação dos conselheiros pelo conteúdo das informações contidas

na página.

Na era da tecnologia, os meios virtuais têm ocupado espaço na formação dos

indivíduos. O blog possibilitaria a troca de informações com outros conselhos de

saúde do país, construindo uma rede interligada de cidadania.

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Para Braga (2010, p. 374):

[...] o aumento e a diminuição de custos envolvidos no acesso à informação e à interação a distância viabilizados pela Internet ampliam, ou mesmo criam, novos espaços para a participação social, os quais carregam em si um potencial transformador.

A autora enfatiza, ainda, que as tecnologias de informação e comunicação (TIC)

não modificam os modos de participação social, mas “potencializam novas

alternativas” (BRAGA, 2010, p. 389).

O blog irá possibilitar um processo contínuo de informação e capacitação, porque

mesmo ao findar dessa gestão atual do conselho, esse instrumento estará

disponível com todas as informações necessárias para a continuidade do

processo democrático.

Cotta et al. (2010, p. 869) informam que:

A capacitação permanente e continuada dos conselheiros ainda é um desafio a ser trabalhado, para que eles possam intervir efetivamente no fortalecimento do controle social, de forma coerente com os princípios e diretrizes do SUS, melhorando a qualidade dos serviços e a vida de todos os cidadãos.

Além dos conselheiros de saúde e do pesquisador, diversos outros segmentos ou

organizações podem ser parceiros desse projeto de intervenção.

É importante considerar também as reais possibilidades de ação, para não criar

expectativas difíceis de serem alcançadas. Uma maneira de se evitar tais

situações é criar ações que dependam mais dos outros do que dos próprios

participantes do grupo.

Dessa forma, criado o blog, esse instrumento será entregue ao Conselho, para

que eles deem continuidade ao projeto intermediado pelo pesquisador.

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6.5 Objetivos

6.5.1 Objetivo geral

Contribuir para o fortalecimento da participação cidadã no Conselho Municipal de

Saúde de São Gonçalo do Rio Abaixo, para que esse canal de participação seja

decisivo no processo de elaboração, acompanhamento e fiscalização das

políticas públicas no campo da saúde.

6.5.2 Objetivos específicos

a) Desenvolver um blog que possibilite aos conselheiros atuar como um canal

direto com a comunidade e que se constituam em agentes de mudança

junto à comunidade/organização que representam.

b) Possibilitar, por meio do blog, que os conselheiros tenham acesso às

informações necessárias para o exercício do seu papel fiscalizador e

deliberativo.

c) Despertar na sociedade o desejo da participação cidadã e consciente.

d) Fornecer um instrumento de continuidade às ações do Conselho para que

não ocorra um retrocesso no momento da troca de mandatos.

6.6 Metodologia

O blog é um espaço na web, no mundo virtual, que permite de maneira simples o

registro cronológico, frequente e imediato de opiniões, imagens, documentos,

entre outros.

O blog foi criado com linguagem simples, de maneira a facilitar a compreensão

por qualquer cidadão que deseje acessar.

Foram introduzidos documentos, leis e registros com o intuito de divulgar as

informações acerca da legalidade do Conselho de Saúde e das possibilidades de

atuação desses órgãos.

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Como o blog é um processo de construção coletiva, as informações atuais, como

a composição do Conselho, telefones de contato e atualidades, ficarão a cargo de

complementação pelo presidente e/ou outros conselheiros.

6.7 Considerações finais do projeto de intervenção

Esperar o pontapé dos governantes e gestores para dar início ao processo de

mudança na construção de políticas públicas mais condizentes com as reais

necessidades da população é acomodar-se diante de um grande desafio.

A participação social é condição essencial para que os cidadãos tenham

representatividade e voz nos espaços de decisão.

Em um espaço democrático, torna-se necessária a valorização dos diversos

saberes. Os ditos “técnicos” devem saber dialogar com os saberes daqueles que

vivenciam os problemas. A união do saber teórico com o prático tende a produzir

mais resolutividade diante das situações conflituosas.

Para Cordioli (2010), “participar vai muito além de estar presente”. Significa

contribuir, fazer parte do processo, respeitar a diversidade de opiniões, valorizar

as discussões e, principalmente, envolver-se. Ainda segundo Cordioli, é um

processo que requer treino e também envolve mudança de comportamento e de

atitude.

Instrumentalizar-se para atuar como sujeitos ativos é responsabilidade de todos e

a contribuição para esse processo de construção, de formação de gestores

sociais é um caminho a ser percorrido por aqueles que desejam deixar sua marca

na sociedade.

A democracia só se faz com a participação dos cidadãos e estes devem ocupar

todos os espaços e canais que lhes foram garantidos por direito.

Que este trabalho sirva não somente como uma contribuição ao Conselho

Municipal de Saúde local, mas que ele sirva de exemplo para outros conselhos do

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município, do estado, do país; e que fomente em diversos cidadãos o desejo de

mudança, de engajamento social e da participação cidadã.

E que a saúde pública não seja ofertada apenas como dever do Estado, mas que

garanta à população ações e serviços de qualidade, acessíveis a todos os

cidadãos.

FIGURA 1 - Layout do blog do Conselho de Saúde de São Gonçalo do Rio Abaixo

REFERÊNCIAS

BRAGA, D.B. Tecnologia e participação social no processo de produção e consumo de bens culturais: novas possibilidades trazidas pelas práticas letradas digitais mediadas pela Internet. Trab Linguist Apl. [online], v. 49, n. 2, pp. 373-391, 2010. ISSN 0103-1813. BRASIL. Lei nº 8.142 de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências. Diário Oficial da União, 1990.

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DESLANDES, K., LOURENÇO, E. Por uma cultura dos direitos humanos na escola: princípios, meios e fins. Belo Horizonte: Fino Traço, 2012. CORDIOLI, S. Enfoque participativo no trabalho com grupos. In: BROSE, M. (org). Metodologia participativa: uma introdução a 29 instrumentos. Porto Alegre: Tomo, 2010. COTTA, R.M.M. et al. Controle social no Sistema Único de Saúde: subsídios para construção de competências dos conselheiros de saúde. Physis [online], v. 20, n. 3, pp. 853-872, 2010. ISSN 0103-7331. MATTHAUS. H. Oficina do futuro como metodologia de planejamento e avaliação de projetos de desenvolvimento local. In: BROSE, M. (org). Metodologia participativa: uma introdução a 29 instrumentos. Porto Alegre: Tomo, p. 21-42, 2010. VIEIRA, M.; CALVO, M.C.M. Avaliação das condições de atuação de Conselhos Municipais de Saúde no estado de Santa Catarina, Brasil. Cad Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 27, n. 12, p. 2315-2326, dez. 2011.

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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A garantia da participação da população nos espaços de decisão das políticas

públicas representou uma conquista da sociedade brasileira. A sociedade, que

vivenciou períodos de repressão e de cooptação de suas demandas, passou a ter

garantido legalmente o direito de intervir nas políticas públicas por meio dos

conselhos gestores. A CF de 1988 e as Leis 8.080/90 (BRASIL, 1990a) e

8.142/90 (BRASIL, 1990b) tornaram possível a legitimidade da participação.

Muitos foram os avanços conquistados e hoje os conselhos de saúde estão

instituídos em todos os municípios brasileiros, pois a existência desses conselhos

é pré-requisito para o repasse de verbas e de outros incentivos aos municípios.

Os conselhos e conferências de saúde são, sem dúvida, um marco de conquista

da sociedade brasileira, que passou a ocupar os espaços antes vazios de voz

popular. Contudo, constata-se que a cultura política em desenvolvimento no país

ainda é um processo que está se desenvolvendo lentamente. Ainda existem

traços das práticas autoritárias e clientelistas que permearam o cenário dos

governos brasileiros.

Diversos são os entraves encontrados nas práticas cotidianas dos conselhos e

essa foi a mola propulsora que instigou a realização deste trabalho.

A busca pela compreensão do processo que envolve esse canal de participação

elegeu como cenário o Conselho Municipal de Saúde de São Gonçalo do Rio

Abaixo. O objetivo geral proposto neste estudo contempla a análise das

dificuldades enfrentadas pelo CMS de SGRA e a efetividade desse canal de

participação no acompanhamento, controle e fiscalização das políticas públicas

para o exercício do controle social.

Para o alcance desse objetivo, este trabalho, apoiado no referencial teórico

consultado: a) conhece os processos vivenciados para a formação do atual CMS;

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b) verifica o sentido atribuído pelos conselheiros à sua participação nos conselhos

e à parceria com a comunidade que representam; c) discute o discursar político e

a dimensão técnica vinculada à participação nos conselhos.

A hipótese que orientou esta investigação foi a ocorrência da baixa participação e

atuação dos trabalhadores e usuários nos processos de decisão nos conselhos

devido à existência de distanciamento entre estes e o segmento governamental.

Apesar da garantia da participação da sociedade na formulação das políticas

públicas, acreditava-se na existência de mecanismos de manipulação e de

diferentes escalas de poder nesses espaços de deliberação, dificultando a efetiva

representação da sociedade civil.

No intuito de estabelecer um paralelo entre o relato dos próprios conselheiros e o

exercício de sua prática, procurou-se conhecer a percepção desses atores sociais

por meio de entrevistas semiestruturadas e também avaliar o desempenho

desses atores na realidade vivida, pela análise de atas de reuniões ocorridas na

vigência de dois anos de exercício dessa função (período de 2010 a 2012). A

observação participante também foi utilizada como instrumento para avaliar a

realidade a ser estudada.

As entrevistas permitiram traçar um perfil dos conselheiros, mas acima de tudo

captaram a visão dos envolvidos nesse sistema de participação. A análise das

atas possibilitou visualizar as vocalizações desses atores sociais por segmentos

de representação e conhecer os tipos de manifestações que estão surgindo nesse

espaço. A observação participante permitiu vivenciar a experiência da

participação desenvolvida nesse espaço de discussão e negociação.

A organização dos dados foi baseada no processo de categorização proposto por

Bardin (2011).

A amostra selecionada contou com a participação de 100% dos conselheiros

titulares. No referido Conselho, é respeitada a paridade numérica no segmento

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dos usuários; detectou-se também que após a saída de um membro o segmento

dos prestadores de serviço está sem representação no Conselho.

Já no processo de escolha dos segmentos que irão participar desses órgãos,

existe a definição prévia de quais associações irão indicar representantes para

compor os órgãos, sugerindo interferência da gestão nessa etapa. No estudo foi

confirmada a hipótese de que os integrantes são convidados pela gestão,

indicando um processo de elitização, que é comum em muitos conselhos

gestores. A indicação dos integrantes indica uma tendência à manipulação,

evitando o surgimento de grandes conflitos no momento das deliberações.

A indicação no processo de formação dos mandatos nos conselhos pode gerar

uma realidade encontrada no estudo: participação incipiente. Inferiu-se a

existência de conselheiros que compareceram somente à reunião de formação do

conselho e não retornaram em outros encontros; havia conselheiros que não

sabiam que eram integrantes do grupo. Consequentemente, a frequência nas

reuniões foi decaindo ao longo do mandato.

Quando a participação é exercida sem o envolvimento necessário e os objetivos a

serem conquistados não estão bem definidos, existe a probabilidade de

esvaziamento desses espaços, por não existir uma razão suficiente que evoque

no indivíduo o desejo em participar.

Considerando a reincidência de mandatos, metade dos conselheiros já estava no

Conselho há mais de um mandato, confirmando o que estudos exibem como a

“profissionalização” do conselheiro.

Dessa forma, o mesmo grupo acaba por se fixar nos espaços deliberativos, o que

pode comprometer o processo democrático. As demandas passam a ser daquele

grupo e corre-se o risco de que a representatividade perca o sentido de trazer

para o espaço de discussão os anseios dos representados.

A frequência das reuniões é regular e a realização de reuniões extraordinárias

não foi uma constância no Conselho. Tal situação reflete que existe um

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compromisso de realização dos encontros e que o Conselho não é acionado

somente nos casos de “urgência” de aprovação.

Apesar disso, os assuntos em pauta foram na maior parte ligados à aprovação de

orçamentos, de prestação de contas, apresentação de relatório de gestão, entre

outros assuntos intimamente ligados à gestão e para os quais é exigida a

aprovação em Conselho.

Dessa forma, a realidade é que, nos dois anos avaliados, em poucos momentos

as falas foram direcionadas para contestações, denúncias, proposições ou

demandas.

A reflexão que se faz, em diálogo com autores que também abordaram o assunto,

é que o espaço dos conselhos pode ter se tornado mero instrumento burocrático

nas mãos dos gestores.

Analisando as vocalizações dos sujeitos da pesquisa, o segmento governamental

foi o que apresentou maior número de vocalizações, seguido dos usuários. Os

trabalhadores não se manifestaram, deixando de aproveitar um espaço que

poderia gerar retornos positivos para suas condições de trabalho.

Apesar do relato dos conselheiros sinalizar para a existência de liberdade de

manifestação no Conselho estudado, verificou-se um protagonismo

governamental, considerando que a concentração da informação e do

direcionamento das discussões está nas mãos dos representantes da gestão.

A existência de assimetria de poder nos conselhos foi confirmada, tendo-se que o

segmento governamental arcou com 100% das manifestações informativas

ocorridas. Somente esse segmento foi responsável pelo caráter de explicação e

esclarecimento no Conselho. Isso sugere a hierarquização desses espaços.

A atual forma de organização e as regras definidas para o seu funcionamento têm

levado a essa burocratização e hierarquização no espaço dos conselhos

gestores. E as decisões sobre as necessidades de saúde, que deveriam ser o

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foco de atuação do Conselho, cedem espaço para assuntos que vão de encontro

aos anseios dos governantes.

A realidade contida nas atas contrasta com o relato dos conselheiros. Apesar de

se considerarem pouco engajados no campo político, esses sujeitos mostraram-

se conscientes de seus papéis, conhecem as competências inerentes aos

conselhos e consideram-se participantes efetivos nas decisões do Conselho.

Esse paradoxo corresponde à realidade encontrada e confirmada pela literatura:

mesmo bem intencionados, os representantes de segmentos da sociedade não

estão conseguindo traduzir em ações as suas reais demandas e principalmente

as demandas da base que representam dentro do espaço dos conselhos

gestores.

As causas para a ocorrência desse fenômeno estão nas dificuldades enfrentadas

pelos conselheiros, a saber: dificuldade no acesso à informação, falta de preparo

para exercer a função, falta de tempo para se dedicarem às funções inerentes aos

conselhos, pouca estrutura operacional para o exercício das funções, horário

incompatível com as atribuições cotidianas dos conselheiros e acesso prévio aos

documentos, dificultando o processo de deliberação consciente.

As dificuldades encontradas no CMS de SGRA são condizentes com as

dificuldades vivenciadas em diversos conselhos do país, conforme verificado na

literatura que subsidiou esta pesquisa.

Tanto na parte operacional como nas questões conceituais, a fragilidade dessas

instituições ainda se faz presente.

Questões que vão desde a seleção de entidades para a composição dos

conselhos até decisões mais rotineiras, como a definição dos horários das

reuniões, acabam sendo definidas sem a participação dos conselheiros.

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Ressalta-se que a questão política foi avaliada por considerar que o engajamento

político pode potencializar a ação dentro dos conselhos, reduzindo a passividade

no campo da ação política.

As experiências de participação ainda estão sujeitas à cooptação e dominação

por aqueles que se sentem ameaçados pelo poder de interferência que esses

órgãos podem exercer quando munidos de armas como o conhecimento, vontade

política, envolvimento, engajamento cívico e desejo coletivo.

Torna-se mister fortalecer esses canais de participação conquistados pela

sociedade.

A construção de valores democráticos é um processo gradual que a sociedade

brasileira está aprimorando aos poucos, exigindo ainda aperfeiçoamento. As

manifestações ocorridas no ano de 2013 em todo o país indicam que a

necessidade de reivindicação é grande e em diversos campos sociais. A

população clama para que suas necessidades sejam ouvidas pelas autoridades.

Quantos desses manifestantes estão presentes nos espaços de discussão e

deliberação de políticas públicas? Será que a grande maioria da população sabe

da existência desses espaços?

Os conselhos constituem espaços legítimos onde a sociedade pode participar e

pressionar os governos para a formulação de políticas condizentes com as

necessidades reais da população. Para serem de fato representativos da

sociedade, precisam utilizar processos democráticos já no seu processo de

composição, promovendo a troca de experiência e respeitando as diferenças.

Os conselhos devem atuar como elo entre a sociedade e o governo, trazendo

para o espaço de discussão os interesses coletivos. Cria-se, dessa forma, um

reconhecimento desses espaços para a representação social.

As deliberações aprovadas nesses órgãos devem ir ao encontro dos anseios da

sociedade e não apenas de um grupo. Todos os segmentos devem se fazer

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representativos dentro desses espaços, ocupando os “vazios” políticos e sociais

existentes.

A participação da sociedade nos conselhos torna-se um desafio, no sentido de

que é necessário romper com a cultura política tradicional, clientelista e

excludente.

A gestão social no ambiente dos conselhos de saúde é exercida a partir do

momento em que todos os interessados participam do processo de elaboração,

no estabelecimento das prioridades e na busca de soluções voltadas para a

melhoria dos serviços prestados.

O empoderamento dos cidadãos é o caminho proposto para fortalecer as arenas

de discussão das políticas públicas. O conhecimento empodera, estimula a

autonomia e permite o debate justo dentro dos conselhos gestores.

Dessa forma, acredita-se que a simetria de poder interno nos conselhos gestores,

e em especial nos conselhos de saúde, será consolidada com a participação de

atores sociais capacitados, conscientes de sua responsabilidade, munidos de

conhecimento e de desejo de mudança, lutando pela construção de políticas que

promovam uma saúde pública de qualidade.

Assim, com base nos objetivos que originaram este trabalho, os principais

questionamentos iniciais que motivaram o estudo foram respondidos,

especialmente o conhecimento acerca das dificuldades enfrentadas pelos

conselheiros de saúde e a efetividade desse canal no direcionamento das

políticas públicas. A hipótese inicial foi confirmada pela constatação de baixa

atuação dos usuários e trabalhadores no processo participativo. Em contrapartida,

a participação do segmento dos gestores é acentuada, reforçando o

distanciamento existente entre eles. As respostas encontradas possibilitaram,

ainda, perceber que mesmo com a ampliação dos debates e das arenas de

discussão introduzidos pela Constituição de 1988 ainda existem “vazios” a serem

ocupados pela população brasileira, no sentido de criar condições para que a

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democracia seja exercida em sua plenitude. Nesse ponto, sugerem-se a

possibilidade e a necessidade de realização de novas pesquisas.

Contudo, no campo da saúde pública, os conselhos representam a melhor

alternativa para a participação da sociedade civil no processo de definição das

políticas públicas de saúde. A participação social é condição essencial para que

os cidadãos tenham representatividade e voz nos espaços de decisão.

Acredita-se que os resultados desta pesquisa poderão contribuir para ampliar o

debate no município de São Gonçalo do Rio Abaixo, no sentido de fortalecer o

controle social exercido pelo Conselho de Saúde, por meio de iniciativas voltadas

para a qualificação do exercício participativo, incluindo toda a sociedade nesse

processo.

Instrumentalizar-se para atuar como cidadãos ativos é responsabilidade de todos

e a contribuição para esse processo de construção, de formação de gestores

sociais é um caminho a ser percorrido por aqueles que desejam deixar sua marca

na sociedade.

Nesse sentido, almeja-se, também, contribuir para a promoção de debates que

fortaleçam a formação de sujeitos políticos, na luta contínua por uma nova

realidade social, mais justa.

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REFERÊNCIAS

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APÊNDICES E ANEXOS

APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado conselheiro,

Eu, Cíntia Alves Araújo, enfermeira, convido-o(a) a participar da pesquisa

intitulada “Construindo a Gestão Social em Conselhos de Saúde”. Trata-se da

minha dissertação de mestrado no Centro Universitário UNA, sob orientação da

Profª. Drª. Matilde Meire Miranda Cadete. O objetivo desta pesquisa é analisar a

efetividade dos canais de participação, acompanhamento e fiscalização das

políticas públicas para o exercício do controle social no âmbito dos Conselhos

Municipais de Saúde. Sua participação é de fundamental importância para a

realização deste trabalho e seu consentimento em participar deve considerar as

seguintes informações:

1- Sua participação é voluntária e você pode desistir a qualquer momento, caso

deseje, sem risco de qualquer natureza.

2- Seu nome será mantido em anonimato, ou seja, não será revelado a ninguém,

bem como o sigilo de todos os dados prestados.

3- Sua entrevista, se concordar, será gravada para não perdermos suas

informações.

4- Você não terá qualquer tipo de despesa e não receberá gratificação alguma

para participação na pesquisa.

5- Não há qualquer benefício direto pela sua participação, mas o conhecimento da

sua opinião a respeito deste tema é muito importante para a discussão sobre as

possibilidades futuras para programas de capacitação para Conselhos Municipais

de Saúde. Suas respostas serão usadas exclusivamente para este estudo.

6- Este termo de consentimento ficará sob minha guarda até finalização da

pesquisa e após será incinerado/queimado. Os fragmentos/frases de suas

respostas, sem a sua identificação, serão reproduzidos nos trabalhos para

publicação e/ou apresentação em reuniões científicas.

7-Você poderá entrar em contato com os pesquisadores a qualquer momento que

lhe convier ou com o Comitê de Ética em Pesquisa da UNA.

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TERMO DE CONSENTIMENTO

Eu, ________________________________, após ter lido este termo de

consentimento e esclarecido minhas dúvidas, concordo em participar da pesquisa

“Construindo a Gestão Social em Conselhos de Saúde”, uma vez que fui

devidamente orientado(a) sobre a finalidade e objetivo do estudo, bem como da

utilização dos dados exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, sendo

que meu nome será mantido em sigilo.

Assinatura do profissional Assinatura do pesquisador mestrando

Cíntia Alves Araújo Telefones: (31)8623-4005 / (31)3833-5397 /(31)3833-5408

Matilde Meire Miranda Cadete Telefones: 3262-0861 / (31)9972-8033

São Gonçalo do Rio Abaixo, MG. Data: ___/___/____

Centro Universitário UNA. Rua Guajajaras, 175, 4º andar, Centro,

Belo Horizonte, MG, telefone: 3508-9110

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APÊNDICE B - Instrumento de coleta de dados

Número de Identificação:__________________

Data:____/____/____ Local:_________________________________

Horário de início:____________ Horário do término:_______________

Identificação/Nome:_________________________________________________

Idade:___________Sexo:_____________Escolaridade________________

olaridade________________

Ocupação:________________ Categoria que representa no Conselho:_________

Primeiro mandato? ( ) sim ( ) não ___ mandato

É integrante de algum partido político? ( ) sim ( ) não Qual:______________

Participa de alguma outra associação ou conselho? ( ) sim ( ) não Qual:_____

1- Qual a frequência das reuniões do conselho?

( ) semanal ( ) quinzenal ( ) mensal ( ) não sei

2- Como você é comunicado das reuniões extraordinárias, ou seja, aquelas

que não estavam agendadas previamente?

( ) e-mail ( ) comunicado ( ) aviso informal ( ) não sou comunicado

3- A pauta da reunião é encaminhada a você com quanto tempo de

antecedência?

( ) 01 mês ( ) 15 dias ( ) 01 semana ( ) não é encaminhada com antecedência

4- Como você foi convidado a participar do Conselho Municipal de Saúde?

5- Qual o significado do Conselho Municipal de Saúde para você?

6- Qual o seu papel como conselheiro de saúde?

7- Para você, quais são as competências do Conselho Municipal de Saúde?

8- Você encontra alguma dificuldade em participar do conselho? Se sim,

quais?

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9- Como você avalia a sua participação nas decisões determinadas pelo

Conselho (incluem-se as proposições para plenária, controle e avaliação

das atividades do Conselho)?

10- Como você avalia o seu grau de interesse por política (muito, pouco ou

nenhum)? Comente por favor.

11- Nas eleições municipais, como você avalia a seu grau de participação?

12- Após participar do Conselho Municipal de Saúde, você se interessa em

participar de alguma outra associação ou Conselho? Qual?

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ANEXO A - Lei nº 401 de 21 de agosto de 1992, que “institui o Conselho

Municipal de Saúde e dá outras providências”

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ANEXO B - Parecer consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa

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