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69 FERRAMENTAS PARA METODOLOGIA HCS A METODOLOGIA DE ALTA CONCENTRAÇÃO DE CARBONO (HCS): ‘DESMATAMENTO ZERO’ EM PRÁTICA Conservação de Fragmentos de Florestas com Alta Concentração de Carbono: Antecedentes e Princípios Capítulo 5 Por Grant Rosoman, Greenpeace Reconhecimento: O autor gostaria de agradecer Robert Ewers do Imperial College London, Neville Kemp da Ekologika, Rob McWilliam do TFT, Mahew Struebig da University of Kent e Jaboury Ghazoul da ETH-Zurich, bem como colegas da Golden Agri-Resources e Rainforest Alliance, pelos construvos comentários em versões anteriores deste capítulo. CONTEÚDO DO CAPÍTULO P70: Introdução: Integrando a ciência da conservação na análise de fragmentos florestais HCS P71: A influência da fragmentação e efeitos de borda no núcleo de um fragmento florestal P72: A importância do tamanho e formato do fragmento florestal P73: Conecvidade P74: Desenvolvendo indicadores e limiares para a Árvore de Decisão da análise de fragmentos florestais HCS P76: Conclusões Versão 1.0: Março 2015 CAPÍTULO 5 CONSERVAÇÃO DE FRAGMENTOS DE FLORESTAS COM ALTA CONCENTRAÇÃO DE CARBONO: ANTECEDENTES E PRINCÍPIOS

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69FERRAMENTAS PARA METODOLOGIA HCSA METODOLOGIA DE ALTA CONCENTRAÇÃO DE CARBONO (HCS): ‘DESMATAMENTO ZERO’ EM PRÁTICA

Conservação de Fragmentos de Florestas com Alta Concentração de Carbono: Antecedentes e Princípios

Capítulo 5

Por Grant Rosoman, Greenpeace

Reconhecimento: O autor gostaria de agradecer Robert Ewers do Imperial College London, Neville Kemp da Ekologika, Rob McWilliam do TFT, Matthew Struebig da University of Kent e Jaboury Ghazoul da ETH-Zurich, bem como colegas da Golden Agri-Resources e Rainforest Alliance, pelos construtivos comentários em versões anteriores deste capítulo.

CONTEÚDO DO CAPÍTULO

P70: Introdução: Integrando a ciência da conservação na análise de fragmentos florestais HCS

P71: A influência da fragmentação e efeitos de borda no núcleo de um fragmento florestal

P72: A importância do tamanho e formato do fragmento florestal

P73: Conectividade

P74: Desenvolvendo indicadores e limiares para a Árvore de Decisão da análise de fragmentos florestais HCS

P76: Conclusões

Versão 1.0: Março 2015

CAPÍTULO 5 CONSERVAÇÃO DE FRAGMENTOS DE FLORESTAS COM ALTA CONCENTRAÇÃO DE CARBONO: ANTECEDENTES E PRINCÍPIOS

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Introdução: Integrando a ciência da conservação à análise de fragmentos florestais HCS

A maioria de plantações nos trópicos ocorre em paisagens florestais que incluem uma mistura de áreas florestadas, degradadas e abertas, bem como outros tipos de ecossistemas, como zonas úmidas. A análise de imagens e terrenos de campo realizados na primeira fase de estratificação da vegetação de uma avaliação HCS geralmente resulta na identificação de fragmentos de áreas de florestas HCS de diferentes tamanhos, formatos e qualidade.

A principal meta na proteção de áreas de florestas HCS (além da integração com áreas HCV, turfeiras e áreas importantes para as comunidades) é conservar áreas florestais ecologicamente viáveis dentro da paisagem de produção, que possuam o apoio das comunidades locais, bem como sua proteção jurídica1. Isto significa que os desenvolvedores da Metodologia HCS tiveram que determinar um modo de julgar o valor e a viabilidade desses fragmentos de floresta HCS, dado que, do ponto de vista prático, nem todos os pequenos fragmentos florestais podem ser conservados a médio e longo prazo. Ao mesmo tempo, eles tiveram que reconhecer que até mesmo pequenos fragmentos florestais fornecem importante habitat ou conectividade para habitats, bem como oferecem armazenamento de carbono, especialmente em paisagens com pouca cobertura florestal.

Como se trata de uma metodologia baseada na ciência, a Metodologia HCS se apoiou em a pesquisas em ciências da conservação para o desenvolvimento de indicadores de qualidade de fragmentos florestais. Ao longo dos últimos 30 anos, tem havido uma quantidade relativamente grande de pesquisas sobre fragmentação florestal e fragmentos, particularmente em relação aos impactos sobre as espécies e habitat2. No que provavelmente é a mais longa investigação sobre fragmentação da Amazônia, descobriu-se que em paisagens altamente .fragmentadas, proteger os remanescentes florestais é muito desejável, pois eles tendem a ser importantes para a reprodução animal e vegetal, bem como ‘trampolins ecológicos’ para animais percorrem a paisagem (Laurance et al., 2011). Infelizmente, em escala global esta pesquisa está longe de ser conclusiva, particularmente à luz da enorme diversidade das florestas tropicais do planeta, além do fato de que existem muitos fatores que podem ocultar os efeitos da fragmentação (Ewers e Didham, 2006) e que são mediados pela matriz da paisagem circundante (Laurance e Vasconcelos, 2004). Ainda é difícil avaliar o impacto total da fragmentação sobre populações (Ewers et al., 2010).

Portanto, ainda não é possível oferecer uma orientação completa sobre os principais fatores de fragmentação, e sobre os fragmentos florestais, tais como o limite mínimo para o tamanho do fragmento, efeitos de borda, conectividade, forma e configuração que garantirão a viabilidade a longo prazo da floresta. No entanto, é possível derivar princípios gerais sobre a importância de determinados fragmentos em uma dada paisagem. Este capítulo fornece uma visão geral das considerações da ciência da conservação, usadas na elaboração dos princípios e atributos a serem analisados no processo HCS, para determinar a importância de conservar fragmentos individuais de floresta HCS na paisagem, juntamente com o HCV, turfeiras, zonas ribeirinhas e outras áreas de proteção. Embora não sejam explorados aqui, deve também ser observado que existe um grande número de ferramentas GIS já desenvolvidas para analisar fragmentos florestais3.

“A principal meta para proteger áreas de florestas HCS...é conservar áreas florestais ecologicamente viáveis dentro da paisagem de produção, que possuam o apoio das comunidades locais, bem como proteção jurídica”

1. Veja os vários compromissos políticos do ‘Desmatamento Zero’ ou ‘Livre de Desmatamento’, por exemplo Golden Agri- Resources: “Ultimately, the conserved HCS forest area can revert to its natural ecological function as a forest.” In Golden Agri-Resources (2012). “High Carbon Stock Forest Study Report”, página 3

2. E.g. Laurance e Bierregaard (1997); Ewers e Didham (2006); Laurence et al. (2011) e Fahrig (2003)

3. Por exemplo Fragstats, disponível em: http://www.umass.edu/landeco/research/fragstats/fragstats.html

Todas as fotos: Cortesia do TFT ©

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A influência da fragmentação e efeitos de borda no núcleo de um fragmento florestal

“As bordas da floresta são mais secas que o interior devido a uma variedade de fatores, incluindo as condições atmosféricas locais. Até mesmo clareiras estreitas podem ser prejudiciais”

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DISTÂNCIA DE PENETRAÇÃO DA BORDA (m)

Um mosaico de áreas florestais difere de uma floresta contínua tanto em sua composição quanto ecologia (Noss e Cooperrider, 1994; Laurance e Bierregard, 1997). A fragmentação leva ao isolamento genético de espécies de plantas e animais, reduzindo a biodiversidade genética das espécies. Em última instância, a perda ou restrição de um habitat necessário para uma espécie pode, eventualmente, levar à sua extinção local. Se esta espécie é uma ‘espécie-chave’ em termos ecológicos (por exemplo, se ela executa um elo fundamental na cadeia alimentar ou como um agente de dispersão de sementes), sua extinção pode causar uma cascata de extinções, alterando a cadeia alimentar (Myers, 1993).

Outra importante consequência da fragmentação florestal é o aumento de bordas florestais. Ao longo destas bordas existem fortes gradientes microclimáticos que levam a ‘efeitos de borda’. Estes são diversos, mas incluem luz, temperatura, umidade do solo e turbulência do vento, que impactam a ecologia das florestas fragmentadas (Thies et al., 2011). As bordas de floresta são mais secas que o interior devido a uma variedade de fatores, incluindo as condições atmosféricas locais que atraem a umidade para longe da floresta. Até mesmo clareiras estreitas podem ser prejudiciais (Laurence et al., 2011).

Existem muitos impactos biológicos de efeitos de borda, incluindo:

• Reduzida diversidade de espécies, especialmente as de importância de conservação importância (Fitzherbert et al., 2008);

• Aumento da mortalidade de árvores, especialmente de grandes árvores (Laurance et al., 2000);

• Aumento de microclimas ao longo das bordas que são hostis à regeneração, prejudicando a germinação de sementes em fragmentos de floresta tropical (Bruna, 1999);

• Mudanças na estrutura da floresta, queda de folhas e substituição na comunidade vegetal; e

• mudanças abruptas na composição de árvores e outras plantas.

Como observado por Laurance et al. (2011):

“Fenômenos de borda são extremamente diversos. Eles incluem o aumento do estresse de dessecação, cortantes de vento e turbulência de vento, que bruscamente elevam as taxas de mortalidade de árvores e danos. Estas, por sua vez, provocam alterações de grande alcance na composição da comunidade de árvores e lianas. Tais estresses podem também reduzir a germinação e o estabelecimento de espécies de plantas tolerantes à sombra nos fragmentos, levando a mudanças dramáticas na composição e abundância de mudas de árvores.”

A Figure 1 (à esquerda) mostra os impactos que podem ser observados nos fragmentos da floresta amazônica a partir de suas bordas, com um aumento da perturbação do vento notado a até 350m da borda. Para uma revisão abrangente da literatura sobre os impactos da fragmentação nos processos ecossistêmicos, consulte Ellis-Cockcroft e Cotter (2014).

FIGURA 1: RESULTADOS DE UMA INVESTIGAÇÃO DE 22 ANOS SOBRE OS IMPACTOS DA FRAGMENTAÇÃO NA FLORESTA AMAZÔNICA E BIOTA MOSTRANDO AS DISTÂNCIAS DE PENETRAÇÃO DE DIFERENTES EFEITOS DE BORDA (DE LAURANCE ET AL., 2002)

Aumento da perturbação do vento

Mortalidade elevada de árvores

Invasão de borboletas adaptadas a perturbações

Composição alterada de espécies de formigas serapilheiras

Invasão de besouros adaptados a perturbações

Composição alterada de espécies de invertebrados serapilheiros

Abundância e diversidade alterada de invertebrados serapilheiros

Altura alterada da maior densidade folial

Umidade relativa reduzida

Recrutamento mais rápido de árvores adaptadas a perturbações

Altura do dossel reduzida

Umidade do solo reduzida

Menor densidade de folhagem do dossel

Aumento da temperatura do ar

Aumento da temperatura e déficit de pressão de vapor

Redução da abundância de pássaros no sub-bosque

Produção elevada de serapilheira

Aumento da radiação fotossintética ativa no sub-bosque

Umidade relativa reduzida

Aumento do número de clareiras

Maior densidade de sub-folhagem

Aumento do crescimento de plantas juvenis

Invasão de plantas adaptadas a perturbações

Menor teor de água relativo de folhas

Teor reduzido de umidade do solo

Aumento do teor de fósforo das folhas caídas

Densidade reduzida de corpos de frutificação de fungos

0 100 200 300 400

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27NÚCLEO

“A forma de cada fragmento também influencia os efeitos de borda, com a gravidade dos efeitos de borda aumentando com a proximidade de duas ou mais bordas”

A importância do tamanho e formato do fragmento florestal

4. E.g. várias referências citadas em Ewers e Didham, 2006

FIGURA 2: A INFLUÊNCIA DA FORMA NA PROPORÇÃO DE BORDA DE UM FRAGMENTO (ADAPTADO DO GOVERNO DA MALÁSIA, 2009)

Um importante aspecto dos efeitos de borda florestais é que eles aumentam drasticamente com o grau de fragmentação. Isto é especialmente relevante no caso de fragmentos de floresta cercados por terras degradadas – um cenário típico para muitas das concessões agrícolas para as quais a Metodologia HCS foi concebida. A medida que a fragmentação aumenta, a percentagem da área total restante de floresta afetada pela fragmentação também aumenta devido à maior proporção de bordas em cada fragmento.

Dada a natureza degradada geral da floresta em muitas concessões, principalmente devido à exploração madeireira passada, construção de estradas e agricultura itinerante, existem fragmentos florestais de diferentes tamanhos e graus de isolamento, muitos deles com uma elevada proporção de bordas em relação à dimensão global. Para minimizar os ‘efeitos de borda’ em fragmentos florestais o principal fator é o tamanho do fragmento. É bem documentado que áreas maiores proporcionam um melhor habitat, proteção florestal de carbono e viabilidade a longo prazo se comparadas a áreas menores ou mais fragmentadas. Isto é principalmente devido aos reduzidos efeitos de borda e um núcleo maior, relativamente pouco afetado (Laurance et al., 2011; Ewers e Didham, 2006; Laurance e Yensen, 1991). Isto significa que o tamanho do núcleo, ou do interior de uma fragmento pouco afetado pelas bordas, será um fator-chave para analisar a importância de cada fragmento individual em alcançar a conservação florestal.

A forma de cada fragmento também influencia os efeitos de borda, com a gravidade dos efeitos de borda aumentando com a proximidade de duas ou mais bordas (Laurance et al., 2011). A complexidade da forma também tem um grande impacto, com fragmentos de formas mais compactas sendo melhores do que fragmentos com formas irregulares ou complicadas visto haver menos colonização e interrupção do habitat e padrões de distribuição de espécies4. A Figura 2 mostra como o núcleo (>100m da borda do fragmento) é afetado pela forma do fragmento: cada fragmento tem um área total de 100 hectares, mas o tamanho do núcleo varia dependendo da forma. Usar a área do núcleo com um fator primário de análise significaria que fragmentos florestais com uma forma mais regular e menos complicada seriam priorizados.

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Conectividade

FIGURA 3. CORREDORES E TRAMPOLINS (ADAPTADO DO GOVERNO DA MALÁSIA, 2009)

A conectividade física foi escolhida como o segundo fator primário para avaliar a importância de fragmentos individuais. Isso ocorre porque corredores, ligações e áreas de ‘trampolim’ são fundamentais para permitir a circulação da flora e fauna através da paisagem e facilitar a dispersão de sementes, reprodução e interações entre predador e presa, bem como para garantir habitat para espécies residentes (Laurance, 2004). Características fundamentais de corredores que facilitam o movimento de fauna e dispersão de plantas incluem a qualidade do habitat, largura e comprimento do corredor e o grau de dossel e continuidade do corredor (Laurance, 2004). Mesmo onde não há nenhum corredor intacto, se espécies são capazes de se mover através de uma plantação, fragmentos florestais podem agir como ‘trampolins’ para a dispersão e podem ser ainda mais benéficos que corredores ecológicos (Falcy e Estades, 2007).

Ao considerar a conectividade, é importante avaliar e considerar vários fragmentos ao mesmo tempo, bem como ligações com a paisagem mais ampla para garantir que decisões não sejam feitas sobre fragmentos individuais ou fragmentos isolados ou conjuntos de fragmentos. Embora o foco da Metodologia HCS seja em conservar florestas remanescentes, eventualmente reconectar qualquer fragmento isolado através de uma restauração florestal será uma maneira eficaz de criar áreas grandes o suficiente para diminuir a taxa de extinção de espécies.5

Corredores e trampolins

Um corredor de biodiversidade ou de vida selvagem é uma área do habitat que conecta populações de vida selvagem que estão separadas pela atividade humana, como áreas agrícolas ou assentamentos. Corredores possibilitam um intercâmbio de indivíduos entre populações disjuntas, reduzindo a probabilidade de endogamia e promovendo a diversidade genética e portanto, a resiliência das espécies. Corredores também facilitam a migração, permitindo que os animais selvagens evitem o risco de ter que se deslocar por estradas ou através de assentamentos ou fazendas.

Fragmentos de habitat que estão próximos o suficiente para serem usados por animais selvagens para sua mobilidade através da paisagem são chamados de ‘trampolins’, e executam funções ecológicas semelhantes a de corredores totalmente conectados. Dependendo do tamanho do corredor, ou trampolim, ele pode até mesmo fornecer habitat para espécies-chave, não servindo apenas como uma via de trânsito.

O diagrama abaixo ilustra a funcionalidade de corredores e trampolins em uma paisagem florestal fragmentada.

UM CORREDOR DE BIODIVERSIDADE TOTALMENTE CONECTADO

FRAGMENTOS SEM CONECTIVIDADE

TRAMPOLINS UM AGLOMERADO DE TRAMPOLINS FORNECE MAIS VIASK

5. Várias referências citadas em Laurance, 2011. Veja também Bentrup, G. (2008), The Woodland Trust (2000), Peres (2001), e Wearn et al. (2013)

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Desenvolvendo indicadores e limiares para a Árvore de Decisão da Análise de Fragmentos Florestais HCS

Levando-se em conta as considerações de conservação descritas neste capítulo, limiares genéricos para tamanho do fragmento, qualidade e conectividade podem ser desenvolvidos para criar uma ferramenta prática na tomada de decisão sobre a importância de cada fragmento em concessões reais. O processo HCS usas esses limiares em uma simples Árvore de Decisão (descrita no Capítulo 6) para avaliar o valor de cada fragmento HCS, com base em seu valor dentro da concessão e na paisagem mais ampla.

Definindo a área do núcleo e priorizando fragmentos HCS baseado em tamanho

Primeiramente, a Árvore de Decisão HCS atribui uma prioridade para cada fragmento (Alta, Média ou Baixa) com base em sua área do núcleo. Para determinar o núcleo de cada fragmento, um ‘buffer negativo’ é usado para excluir a área do fragmento mais afetada pela borda. Efeitos de borda ocorrem em escalas de aproximadamente 10 metros até um quilômetro a partir da borda e variam bastante (veja acima), de modo que a fixação de um limite adequado não é simples. No entanto, para a Árvore de Decisão e aplicação prática, o limite precisa ser um número redondo simples, então 50 metros, 100 metros ou 200 metros poderiam ser escolhidos. Com base na gama de distâncias relativos aos diferentes efeitos de borda, principalmente da Amazônia Brasileira (Broadbent et al., 2008; Laurance, 2011; Ries et al., 2004), uma distância de efeito de borda e ‘buffer negativo’ de 100m foi adotada.

Uma vez que a área do núcleo tenha sido determindada, a prioridade do fragmento pode ser atribuída. Mais uma vez, porque a Metodologia HCS é projetada para ser usada em paisagens florestais altamente diversas, valores genéricos e redondos precisam ser usados mesmo quando salientando que o tamanho mínimo do habitat varia consideravelmente com o tipo de espécie, as necessidades da espécie, qualidade do habitat e a matriz da paisagem circundante. O tamanho mínimo do habitat pode ser tão pequeno quanto um hectare para alguns invertebrados e plantas ou de até milhares de quilômetros quadrados, necessários para garantir a sobrevivência a longo prazo de grandes predadores de longo alcance (Bryant et al., 1997).

Há um número limitado de pesquisas sobre as diferentes áreas de núcleo, mas algumas pesquisas sobre o tamanho total do fragmento. Um estudo descobriu que para fragmentos da floresta Amazônica menores que 25 hectares (incluindo as bordas), é provável que apenas poucas espécies persistam6. Bierregaard e Dale (2006) sugerem que na Amazônia, “o tamanho absoluto mínimo de um fragmento florestal que possa ser considerado viável para uma percentagem substancial de espécies...é de 100 hectares”. Uma meta-análise de 53 estudos sobre a velocidade com que espécies se extinguem em fragmentos florestais revelou uma alta taxa de extinção em fragmentos de até 60 hectares (Wearn et al., 2013). Além disso, uma compilação de diferentes grupos de espécies indicou uma média de área mínima aproximada de 10 hectares como o tamanho necessário para preservar espécies (Bentrup, 2008).

Dada a falta de evidências conclusivas sobre o tamanho mínimo de fragmentos e variabilidade dos tipos de floresta em que a Metodologia HCS será usada, uma abordagem de precaução foi tomada na definição da área mínima do núcleo de um fragmento. Embora qualquer fragmento florestal com um ‘núcleo’ tenha valor, uma área de núcleo mínima de 10 hectares (correspondente a cerca de 25 hectares de fragmento arredondado incluindo as bordas) foi escolhida para priorização média e alta para a conservação, por ser um valor médio razoavelmente preventivo para uma variedade de espécie, e um tamanho apoiado por estudos. Isto significa que qualquer fragmento com um núcleo menor que 10 hectares é considerado de baixa prioridade, embora seja reconhecido que mesmo pequenos fragmentos degradados possam possuir um considerável valor de biodiversidade, especialmente em paisagens com cobertura florestal de pequeno porte, e podem complementar e aprimorar o habitat para espécies em reservas maiores (Fitzherbert et al., 2008). O limite para fragmentos de alta prioridade foi definido para fragmentos com um núcleo maior que 100 hectares, e fragmentos com um núcleo entre 10 e 100 hectares são considerados prioridade média.

“O tamanho mínimo do habitat pode ser tão pequeno quanto um hectare para alguns invertebrados e plantas ou, para grandes predadores de longo alcance, até milhares de quilômetros quadrados são necessários”

6. Baseado na extinção de 46 espécies de vertebrados, Peres et al. (2001)

Acima: Cortesia G. Rosoman, Greenpeace © Abaixo: Cortesia Corozal Sustainable Future Initiative, Belize ©

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ConectividadePara avaliar a conectividade de fragmentos florestais HCS, uma proximidade simples ou distância entre fragmentos de 200m (correspondendo a um buffer positivo de 100m ao redor do fragmento) foi a selecionada, e com base em pesquisas realizadas na Amazônia indicando que as taxas de dispersão caem a partir de uma distância de mais de 200m da borda da floresta (Laurance, et al. 2006). Portanto se a distância for menor do que 200m (medida de borda a borda) assume-se que os fragmentos estão perto o suficiente para serem considerados conectados. Se a configuração for favorável, foi também considerado como um conjunto de fragmentos que podem fornecer trampolins para fragmentos maiores. Por exemplo, animais podem se deslocar através de uma plantação se eles podem ver um fragmento de floresta natural a até 200m de distância. O limite usado para determinar a conectividade de um fragmento para uma área HCV, como por exemplo em uma zona ribeirinha ou área protegida, é também de 200m.

Definindo paisagens com cobertura florestal de grande e pequeno porte A cobertura florestal varia consideravelmente entre as paisagens nas quais a Metodologia HCS é [comumente] aplicada. É importante levar em consideração a cobertura florestal em nível de paisagem porque ela vai ter um impacto sobre o nível de importância de pequenos fragmentos florestais. Pesquisas sobre os impactos do desmatamento em nível de paisagem na Amazônia sugerem que, uma vez que aproximadamente 20% da cobertura florestal tenha sido removida, ou seja, menos de 80% da cobertura florestal permaneça, o tamanho médio do fragmento é rapidamente reduzido e os fragmentos são mais isolados (Oliveira de Filho e Metzger, 2006). Uma vez que o habitat total caia abaixo de 30%, a fragmentação do habitat (tamanho do fragmento e isolamento) começa a compensar os efeitos diretos da perda de habitat (Andren, 1994). Em outras palavras, se 70% do habitat foi perdido, muito mais foi efetivamente perdido porque a qualidade da floresta remanescente é muito menor devido aos impactos exponenciais da fragmentação florestal.

Com base na avaliação preliminar da pesquisa que define a escala da paisagem, propõe-se utilizar uma área fixa, ou uma abordagem de raio, como aceitável. Para categorizar cobertura florestal, é proposto que uma cobertura florestal de até 80% em uma paisagem seja considerada como cobertura florestal de grande porte e menos de 30% seja considerado como cobertura florestal de pequeno porte.

Uma paisagem é definida aqui como “um mosaico geográfico composto de ecossistemas interativos resultantes da influência de interações geológicas, topográficas, do solo, climáticas e humanas em uma determinada área, ” com base na definição da IUCN7. Definições publicadas do que seja uma ‘paisagem’ variam de menos de um hectare a mais de 200.000 hectares (Ahmed, 2009). No entanto, geralmente uma paisagem é considerada uma unidade de terra de grande escala8. Uma opção para determinar o tamanho de uma paisagem poderia ser simplesmente tomar o tamanho da unidade que compreenda a concessão da plantação e um buffer da área circundante, por exemplo, 50.000 ou 100.000 hectares. Alternativamente, uma maneira simples e prática de definir paisagem poderia ser a utilização de um raio a partir da área de interesse (por exemplo, uma concessão a ser desenvolvida) com base nas

“É importante levar em consideração a cobertura florestal em nível de paisagem porque ela vai ter um impacto sobre o nível de importância de pequenos fragmentos florestais”

7. http://cmsdata.iucn.org/downloads/en_iucn__glossary_definitions.pdf 8. e.g. TELSA: A strategic planning tool for ecosystem management uses 10,000 to 200,000 ha. Disponível em:

http://proceedings.esri.com/library/userconf/proc00/professional/papers/PAP329/p329.htmAcima: Cortesia G. Rosoman, Greenpeace ©

distâncias-chave máximas de dispersão. Por exemplo, foi observado que pássaros da floresta amazônica raramente dispersam além de distâncias de aproximadamente cinco quilômetros (Van Houtan et al., 2007).

Outras considerações Um número de outros fatores físicos de fragmentos, como descrito em Noss (1999), foram considerados, tais como a densidade, comprimento da borda e índices de forma do fragmento; mas quanto à eficiência e praticidade os dois fatores críticos para fragmentos, tamanho do núcleo e conectividade, foram os selecionados. Fatores qualitativos adicionais também foram considerados, como a qualidade do habitat, níveis de biodiversidade, incluindo a presença de espécies raras e ameaçadas, representatividade e naturalidade (Ross e Cooperrider, 1994). No entanto, porque muitos desses fatores já são considerados em avaliações de Alto Valor de Conservação (HCV), e devido ao alto custo de avaliar alguns deles para um valor adicional questionável, foi tomada a decisão de avaliar apenas a qualidade do fragmento para uma seleção final de fragmentos pequenos, de baixa/média prioridade e alto risco antes que sejam frequentemente selecionados para conversão em plantações. A Árvore de Decisão exige uma Avaliação Preliminar de Biodiversidade (APB) dos fragmentos, que permite uma verificação preventiva da biodiversidade, bem como a consideração da qualidade do habitat e sua representatividade. O APB e sua metodologia são descritos no próximo capítulo.

Versão 1.0: Março 2015

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Conclusões

“São necessárias pesquisas adicionais para confirmar a suposição que fragmentos com núcleos maiores sejam condicionantes para valores de biodiversidade elevados”

Mesmo que necessariamente ampla, a fim de ser aplicável a uma vasta gama de tipos de florestas úmidas tropicais, as considerações descritas neste capítulo proporcionam a base científica preliminar sobre conservação para a análise dos fragmentos florestais resultantes da Fase 1 da avaliação HCS, cujo intuito é o de alcançar uma proposta de conservação e plano de uso da terra. Estas considerações advindas da ciência da conservação foram incorporadas a uma Árvore de Decisão que definisse a necessidade [ou não] de conservar fragmentos individuais. Isto representa a segunda fase da Metodologia HCS, que é descrita no próximo capítulo.

Finalmente, deve-se notar que muitas generalizações e aproximações foram feitas a fim de criar uma ferramenta prática para a identificação de fragmentos florestais potencialmente viáveis, e que pode ser implementada imediatamente em concessões em todo o mundo tropical. A ciência por trás de muitos dos parâmetros e limites não é robusta o suficiente, e exige testes suplementares e ensaios para garantir que a melhor abordagem esteja sendo usada para atingir a meta. São necessárias pesquisas adicionais para confirmar a suposição de que fragmentos com núcleos maiores sejam condicionantes para valores de biodiversidade elevados. Além disso, é provável que elementos adicionais possam ter de ser incorporados. O Comitê Científico Consultivo do Grupo de Coordenação da Metodologia HCS tem a função de aconselhar sobre o refinamento desses parâmetros e limites para diferentes ecossistemas florestais de interesse. Conselhos e contribuições de quaisquer especialista em ciências da conservação para atualizar a metodologia são bem-vindos pelo Grupo de Coordenação.

Todas as fotos: Cortesia Corozal Sustainable Future Initiative, Belize ©

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