congo - no coração da África o dilema entre independência e ditadura

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ano 4 • nº 45 • 09 a 15/12/07 • ISSN1809-6182 Especial 13/12/2007 - Congo: no “coração” da África o dilema entre independência e ditadura ............................................................................................................. p.01 A República Democrática do Congo, antigo Zaire, tem sido palco de conflitos étnicos e disputas pelas riquezas naturais desde sua independência em 1960. Entre ditaduras, desastres humanitários e intervenções internacionais, o país atualmente tenta reconstruir-se. Análise 10/12/2007 - Política externa brasileira: alguns fatos dos 1805 dias do governo Lula ..................................................................................................................... p.09 Desde o início do seu mandato, o presidente Lula vem executado sua política externa pautado na estratégia de ação multilateral com autonomia, visando o pragmatismo como meio ação nas relações internacionais e buscando o desenvolvimento do país. Resenhas 13/12/2007 – Kosovo: independência ou autonomia ..................................... p.14 Após mais de 10 anos desde a perda de autonomia, a independência da província sérvia parece mais próxima. Com a chegada do final do prazo para a elaboração de resoluções e o apoio dos EUA e da EU, uma declaração unilateral de independência parece a solução mais provável. 18/12/2007 – O novo relatório sobre o programa nuclear iraniano ............. p.18 O Conselho de Inteligência Nacional do governo dos Estados Unidos publicou, no dia 3 de dezembro de 2007, uma Estimativa da Inteligência Nacional, relatório no qual são revisados os dados segundo os quais a República Islâmica do Irã possui um programa nuclear.

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  • ano 4 n 45 09 a 15/12/07 ISSN1809-6182

    Especial

    13/12/2007 - Congo: no corao da frica o dilema entre independncia e ditadura ............................................................................................................. p.01

    A Repblica Democrtica do Congo, antigo Zaire, tem sido palco de conflitos tnicos e disputas pelas riquezas naturais desde sua independncia em 1960. Entre ditaduras, desastres humanitrios e intervenes internacionais, o pas atualmente tenta reconstruir-se.

    Anlise

    10/12/2007 - Poltica externa brasileira: alguns fatos dos 1805 dias do governo Lula ..................................................................................................................... p.09

    Desde o incio do seu mandato, o presidente Lula vem executado sua poltica externa pautado na estratgia de ao multilateral com autonomia, visando o pragmatismo como meio ao nas relaes internacionais e buscando o desenvolvimento do pas.

    Resenhas

    13/12/2007 Kosovo: independncia ou autonomia..................................... p.14

    Aps mais de 10 anos desde a perda de autonomia, a independncia da provncia srvia parece mais prxima. Com a chegada do final do prazo para a elaborao de resolues e o apoio dos EUA e da EU, uma declarao unilateral de independncia parece a soluo mais provvel.

    18/12/2007 O novo relatrio sobre o programa nuclear iraniano ............. p.18

    O Conselho de Inteligncia Nacional do governo dos Estados Unidos publicou, no dia 3 de dezembro de 2007, uma Estimativa da Inteligncia Nacional, relatrio no qual so revisados os dados segundo os quais a Repblica Islmica do Ir possui um programa nuclear.

  • www.pucminas.br/conjuntura

    Congo: no corao da frica o dilema entre independncia e ditadura

    Especial Segurana

    Rodrigo Corra Teixeira e Luciana Mendes Barbosa

    13 de dezembro de 2007

    A Repblica Democrtica do Congo, antigo Zaire, tem sido palco de conflitos tnicos e disputas pelas riquezas naturais desde sua independncia em 1960. Entre ditaduras, desastres humanitrios e intervenes internacionais, o pas atualmente tenta reconstruir-se.

    trao retilneo dos limites territoriais dos Pases Africanos pode ser visto em Angola, Arglia, Bostsuana,

    Chade, Lbia, Mali, Mauritnia, Nambia, Nger, Qunia, Repblica Democrtica do Congo, Saara Ocidental, Somlia, Tanznia e Zmbia. Essa configurao geopoltica por parte dos europeus, trouxe reflexos tambm, no litoral, antigo ponto estratgico de penetrao do continente, desde o tempo das feitorias portuguesas. Pases como Sudo, Guin, Nigria, Repblica dos Camares, Repblica Centro-Africana, Congo, Qunia, tem pouca ou nenhuma fronteira martima. A Repblica Democrtica do Congo tem cerca de 9.200 quilmetros de fronteiras terrestres e no chega a ter 50 quilmetros de litoral.

    O Reino do Congo, na segunda metade do sculo XV, abrange um extenso territrio, com a administrao descentralizada com governos locais hereditrios e um bem organizado sistema comercial. Os navegadores portugueses, em 1485, ao chegarem foz do Rio Congo, esperavam obter o domnio de uma zona do territrio africano atravs da cristianizao e da "penetrao pacfica". Foram trocadas as embaixadas entre as cortes de Portugal e do Congo e, em 1491, foi enviado o primeiro de vrios contingentes de sacerdotes e artfices

    qualificados a fim de dar incio transformao do reino num Estado cristo sob a proteo portuguesa.

    A capital do Reino do Congo foi denominada So Salvador e reconstruda segundo os padres das cidades europias da poca. Passados quase vinte anos, os objetivos da coroa portuguesa ainda no haviam sido concretizados. Os planos oficiais para o monoplio real sobre o comrcio do Congo iam de encontro s atividades j anteriormente estabelecidas por comerciantes assentados em So Tom, cujos interesses se concentravam no trfico de escravos.

    Em 1526, o Rei Dom Afonso do Congo procurou expulsar todos os europeus, com exceo dos sacerdotes e eliminar o trfico mas, ento, as autoridades regionais j estavam de tal modo envolvidas, que a captura e o trfico de escravos havia se tornado uma atividade econmica importante. Afonso tentou, ento, colocar o trfico sob o controle real. Em conseqncia, os traficantes de So Tom procuraram uma rea mais ao sul que no estivesse sob o controle direto do Rei do Congo e se estabeleceram na regio onde se situa Angola. O sucessor do rei Afonso, Dom Diogo (1545-1561), procurou reprimir as iniciativas daquela regio, mas foi derrotado. O seu sucessor, Dom lvaro I,

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    restaurou a ordem interna, no entanto buscou diretamente no Vaticano.

    No comeo do sculo XVII, os reis de Portugal afirmavam que o Congo estava sob a suserania, mas, na verdade, o projeto de dominar o reino fora abandonado. Os interesses de Portugal voltaram-se para a regio de Angola e, em 1571, foi criada uma capitania hereditria, doada ao nobre Paulo Dias, que empreendeu a ao de conquista. Os comerciantes de So Tom j estavam instalados nas ilhas defronte a Luanda, atual capital de Angola, e os representantes do governo de Portugal enfrentaram mais de um sculo de hostilidades, completando com diversos povos da regio e tambm uma invaso holandesa de 1641 a 1648.

    Os sonhos iniciais referentes existncia de minas de prata no interior tinham se esvaecido, a colonizao agrcola fracassou e o empreendimento reduziu-se constituio de caravanas comerciais e de assaltos a aldeias a fim de obter o maior nmero possvel de africanos escravizados para o trabalho nas minas e na agricultura do Brasil. neste perodo de grandes combates e incertezas que se destaca a figura da Rainha Ginga, de Matamba, como resistente implantao da colnia portuguesa e o trfico de escravos.

    Os comerciantes portugueses estavam, porm, mais interessados no comrcio de escravos e, para desenvolv-lo, fomentaram intrigas na Corte de Manicongo e insurreies que acabaram por fragmentar o reino e por estender as guerras por longos perodos. Dessa sucesso de guerras internas, a tradio popular guarda, no Brasil, o nome da rainha Ginga de Matamba, que aparece em vrios folguedos da festa de reis-negros do Rosrio, no qual reis-do-congo1 catlicos lutam contra reis que no aceitam o cristianismo. A rainha Ginga aliou-se aos

    1 Os reis coroados nesta festa, mas tambm designao para o folguedo oriundo da festa de reis-negros do Rosrio em que se atribua a etnia congo ao grupo de brincantes, presente em vrias regies do Brasil.

    holandeses para a tomada de Luanda, em 1640. Somente em 1656 assinou a rendio aos portugueses. grande herona do povo angolano, consagrada como governante politicamente hbil e firme opositora dos conquistadores europeus.

    Um dos processos mais sangrentos de independncia aconteceu no Congo Belga, depois chamado de Zaire, o segundo maior pas africano em extenso territorial, depois do Sudo. O antigo Congo havia sido um presente da Conferncia de Berlim2 ao Rei Leopoldo II, da Blgica, em 1885. Um presente e tanto: um vasto territrio rico em cobalto, ferro, potssio e... diamantes.

    Com a Conferncia, a ento Associao Internacional do Congo (AIC) se torna Estado Independente do Congo (EIC), cujo soberano Leopoldo II, tendo como sede do governo a cidade de Boma na provncia do Baixo Congo, depois Leopoldeville, atual Kinshasa; dando incio ao imperialismo e intensificao do colonialismo no novo territrio do Congo.

    At 1908, o Congo era tratado como propriedade pessoal do rei Leopoldo. S naquele ano tornou-se uma colnia da Blgica. Com tantas riquezas naturais disposio, os belgas resistiram com uma forte represso ao movimento de independncia do Congo. A luta dos nacionalistas fez nascer um novo lder negro na frica: Patrice Lumumba. A luta pela independncia no Congo Belga ganhou intensidade em meados da dcada de 1950. Em 1958, no Congresso Pan-africano, o lder nacionalista Patrice Lumumba faria um discurso anticolonialista que lhe daria prestgio e fortaleceria a causa de seu pas.

    Os confrontos entre nativos e colonos belgas se intensificaram at a conquista definitiva da independncia, em junho de 1960. Conflitos entre o novo governo e provncias

    2 A Conferncia de Berlim realizada entre 1884-85 na Alemanha tinha como objetivo a partilha da frica entre potencias coloniais europias, suprimindo demarcaes territoriais tnicas e histricas j existentes.

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    separatistas, no entanto, fizeram Lumumba, j no cargo de primeiro-ministro, pedir a interveno militar da ONU e da Unio Sovitica, chamando a ateno dos Estados Unidos, que apoiaram Joseph Desir Mobutu a realizar um golpe de Estado, suspendendo o governo parlamentar.

    Contudo, a tentativa de golpe fracassou e o governo foi devolvido ao presidente Joseph Kasavubu. Em setembro de 1960, Lumumba foi afastado do cargo e preso, por ordem de Kasavubu. Em fevereiro de 1961, o governo anunciou oficialmente sua morte. Patrice Lumumba recebeu homenagens da Unio Sovitica, que batizou com o nome dele uma universidade em Moscou destinada a alunos estrangeiros. Iniciativas desse tipo faziam parte da luta ideolgica da Guerra Fria.

    A ditadura de Mobutu e Kabila

    Em 1965, em meio a um novo perodo de instabilidade poltica, Mobutu deflagra um novo golpe militar, e se auto-proclama presidente da segunda Repblica do Congo, eliminando todos os vestgios de democracia no pas. Em 1971, sob o governo de Joseph Mobutu, decide alterar o nome do pas, que passou o Congo Belga que passou a se chamar Zaire. Todos os zairenses com nomes europeus foram obrigados a adotar nomes africanos. O prprio presidente passou a Mobutu Sese Seko. Alguns pases ocidentais ao perceberem Mobutu como homem forte do Zaire, trataram logo de apoi-lo para manterem seus interesses capitalistas no corao do continente africano.

    Com o avano do socialismo entre os pases vizinhos (Angola, Repblica do Congo-Brazzaville, Moambique, Guin Bissau, Guin Conacri, Benin), em plena Guerra Fria, muitos pases da Europa ocidental, como Blgica, Frana, Alemanha e Estados Unidos apoiaram o regime ditatorial e sangrento de Mobutu.

    Durante os 30 anos de ditadura Mobutu, o pas passou por crises econmicas e sociais

    graves e sucessivas, enfraquecendo o regime de um lado, e abrindo espao para a emergncia de movimentos oposicionistas, de outro. Essas manifestaes contrrias suscitaram graves violaes dos direitos humanos no Congo, suscitando crticas da Anistia Internacional.

    Em 1993, aps ampla presso exercida por seus aliados ocidentais, Mobutu cria uma nova legislao autorizando o retorno da pluralidade partidria, enquanto que a crise econmica e social se aprofunda, alimentando ainda mais a violncia do regime. Sentindo-se acuado, em virtude das presses domsticas e internacionais, Mobutu convoca em 1993 uma Conferncia Nacional com o intuito de solucionar a crise e preparar a transio para um novo governo, ainda que atravs de manipulaes e controle do jogo poltico, na tentativa de estender sua permanncia no comando do Zaire.

    Entre 1996-97, Mobutu obrigado a retirar-se da presidncia do pas em decorrncia de uma doena grave, nomeando em seu lugar o Primeiro-Ministro Kengo Wa Ndondo, que no consegue controlar a situao no Norte do pas e no Kivu. Enquanto lderes da Conferncia Nacional e dos partidos de oposio mais representativos tentavam reconstruir a ordem, uma ao inusitada surpreendeu a todos: a AFDL (Aliance des Forces Democratiques pour la Libration du Congo), liderada por Laurent-Dsir Kabila e apoida pelos tutsis3,conhecidos como Banyamulenges, entrou pelo leste do pas na fronteira com Uganda, Ruanda e Burundi - para libertar o Zaire da ditadura de Mobutu Sese Seko. As tropas de Mobutu corrodas pela corrupo foram incapazes de entrar em confronto com as foras da AFDL, que acabaram por tomar a capital Kinshasa. A mudana era inevitvel e foi intermediada por Nelson Mandela em 1997, quando Kabila se auto-proclama presidente da Repblica Democrtica do Congo (RDC).

    3 Os tutsis estavam refugiados na fronteira leste do Congo em decorrncia dos massacres ocorridos em seu pas de origem: Ruanda.

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    Apesar do novo nome dado ao pas, Kabila nunca convocou eleies democrticas no pas e manteve a antiga rede de clientelismo que marcara o governo de Mobutu. O retorno ditadura provocou revoltas entre os partidos polticos, que foram obrigados novamente a silenciarem-se. Assim como a permanncia de um modelo ditatorial e clientelista de governo na RDC, foram mantidos tambm milcias e grupos armados de refugiados provenientes da regio dos Grandes Lagos, tendo como ponto de apoio o territrio congols. As medidas adotadas por Kabila, provocariam posteriormente, a ciso entre o governo e seus antigos aliados tutsis.

    importante ressaltar que a permanncia de Mobutu frente do Congo, antigo Zaire, durante um longo perodo, s foi possvel graas ao apoio dos Estados Unidos da Amrica (EUA) e de outros pases ocidentais, na medida em que o Congo localizado no corao da frica desempenhava um papel estratgico na conteno do avano sovitico na regio em pela Guerra Fria.

    Conflitos tnicos na regio dos Grandes Lagos

    Uma das maiores causas da instabilidade presente na regio dos Grandes Lagos na frica a decadncia do Estado e instrumentos de governo do Congo. nessa tica que se inserem os conflitos dos Estados na regio, cujo nome derivado de um sistema de lagos e drenagens tributrias da poro central do Grande Vale do Rift na frica4. Geograficamente a regio composta por nove estados: Repblica Democrtica do Congo, Uganda, Kenya, Ruanda, Burundi, Tanznia, Zmbia, Malawi e Moambique, embora o nome Grandes Lagos refira-se

    4 A regio conhecida como Great Rift Valley (nome em ingls) um complexo de falhas tectnicas, datando de 35 milhes de anos, geradas a partir da separao das placas tectnicas africana e arbica, cuja extenso atinge 5000 metros na direo norte-sul, desde o norte da Sria at a rea central de Moambique.

    convencionalmente a um ncleo da regio, cujos membros so o Congo, Ruanda, Burundi ex-colnias belgas - Uganda e Tanznia ex-colnias britnicas. O alto nvel de integrao cultural e transaes econmicas informais foram fragmentados por interesses polticos e sociais, o que tm causado inmeros tumultos desde 1959.

    O momento que define a histria da regio durante as ltimas dcadas do sculo XX foi o genocdio em Ruanda em 1994. Contudo, as razes do genocdio repousam na histria da construo da identidade tnica e mobilizao contra o regime colonial. O traado de muitos desses pases, feito de maneira arbitrria, resultou na aglomerao de inmeras tribos rivais no interior de um mesmo Estado colonial, gerando conflitos posteriores. Entretanto, os territrios de Ruanda e Burundi mantiveram as antigas divises e prticas tradicionais preservadas, sendo exploradas inclusive pelas colnias europias atravs da implementao de uma administrao indireta.

    Aproveitando-se de uma estrutura social preexistente5, os alemes, e posteriormente os belgas, criaram diferenas cada vez mais acentuadas entre tutsis e hutus, atravs do emprego dos tutsis em atividades administrativas e militares e da segregao social dos hutus. Essa situao de excluso levou organizao dos hutus, que em 1959 fundaram o Partido do Movimento de Emancipao Hutu (Parmehutu), que reivindicava a incluso social do grupo e uma maior participao poltica. Nesse mesmo perodo eclode uma rebelio, em que camponeses hutus entraram em conflito violento com os tutsis, resultando na primeira onda de refugiados tutsis de Ruanda para pases vizinhos, dentre eles o Congo.

    5 Essa estrutura social altamente ordenada era composta por trs diferentes etnias: os tutsis, que desempenhavam atividades pastoris e apresentavam maior estatura; os hutus, de tradio agrcola, que tinham baixa estatura e pele mais escura; e os twasdescendentes de pigmeus, sendo a minoria tnica.

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    Um dos resultados dessa revoluo foi a abolio da estrutura feudal no campo e a tomada de poder pelos hutus. Entretanto, os tutsis, refugiados nas fronteiras dos pases vizinhos se organizaram e empreenderam inmeros ataques ao governo de Ruanda, que os reprimia de forma violenta, num movimento que se estendeu por cerca de quarenta anos.

    Na regio do Congo, em contraste composio tnica relativamente simples daqueles pases, onde dois grupos tnicos tutsis e hutus - representavam 99% da sociedade e no havia muitas diferenas culturais entre eles, vivia cerca de 200 pequenos grupos tnicos distintos com grande diversidade cultural, poltica, religiosa e lingstica.

    Guerra Civil no Congo

    Desentendimentos entre Kabila e seus aliados tutsis de Ruanda, Burundi e Uganda resultaram em rebelies anti-Kabila em 1998, lideradas pelo Rassemblement Congolais pour la Dmocratie et la Libration du Congo (RCD, sigla em francs), liderada por Laurent Nkunda, numa aliana com as tropas de Ruanda e, Uganda. Cabe ressaltar que Kabila apoiava claramente os movimentos insurgentes, cujas bases encontravam-se no interior das fronteiras do Congo, gerando grande instabilidade e desavenas entre os pases vizinhos que, sob a alegao de estarem zelando por suas fronteiras, invadiram o leste do Congo caa dos dissidentes, em sua maioria localizados em campos de refugiados.

    Kabila, sentindo-se ameaado, convoca a ajuda das tropas de Angola, Nambia e Zimbbue para conter o avano da RCD na poro leste do territrio congols, enquanto que um outro movimento de rebelio chamado de Movimento Nacional para a Libertao Congo (MNLC) e liderado por Jean-Pierre Bemba, abre uma outra frente de resistncia no nordeste do Congo contra tropas governamentais. Os embates gerados no leste do pas provocaram um intenso deslocamento das

    populaes para fora da zona de conflito, sem contar as mortes, que chegaram a atingir 3,5 milhes de pessoas.

    Paralelamente, Kabila autoriza o retorno dos partidos polticos, a emergncia de novos e o exerccio legal de suas atividades. Alm disso, Kabila convoca um debate nacional, e encontros com representantes de governos e rebeldes de pases africanos (como Zmbia, Angola, Nambia, Zimbbue, Ruanda e Uganda), que resultaram no Acordo de Lusaka6. Nesse acordo, Ruanda e Uganda se comprometeram a retirar suas foras militares da regio leste do pas, caso o governo da RDC desarmasse os grupos dissidentes de refugiados de Ruanda, Uganda e Burundi que agiam no pas. A desmilitarizao e desmobilizao dos refugiados no Congo era o principal ponto do acordo; e seu cumprimento resultaria na desocupao do territrio congols e no reconhecimento a soberania do pas.

    Em 1999, foi estabelecida pela ONU a criao da MONUC (Comisso da ONU na Repblica Democrtica do Congo), que tinha como objetivo supervisionar os esforos de cessar-fogo entre os pases beligerantes e auxiliar na desmobilizao e desarmamento dos grupos insurgentes que atuavam no pas, que fora paulatinamente alcanado.

    Nesse nterim (16 de Janeiro de 2001), Kabila foi assassinado, gerando um novo perodo de instabilidade poltica e social na RDC. A partir dos esforos de Joseph Kabila, filho e sucessor do presidente assassinado, em promover o dilogo entre os diversos grupos envolvidos no conflito no pas, Ruanda e Congo assinaram um acordo de

    6 Esse acordo, assinado em 1998, teve como objetivo por fim guerra iniciada neste mesmo ano na regio de Kivu, localizada na poro leste do Congo, contra a administrao de Laurent Dsir Kabila. Nele estava previstos o trmino das hostilidades, a retirada das foras estrangeiras (Ruanda, Uganda, Angola e Zimbbue), a presena da ONU para a manuteno da paz, alm da busca de solues entre os pases envolvidos para a questo da segurana.

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    paz7 em 2002, intermediados pela MONUC. Nesse novo acordo a retirada das tropas ruandesas do territrio da RDC foi mais uma vez negociada, exigindo-se como contrapartida a garantia do governo congols de que desarmaria os grupos e milcias dissidentes instaladas em territrio congols.

    O governo provisrio, presidido por Joseph Kabila, e mais quatro vice-presidentes, dentre eles o lder rebelde da MNLC, Jean-Pierre Bemba, permitia a existncia de foras independentes, paralelas ao governo central, motivando inmeros episdios de escala de violncia interna no perodo de transio na RDC.

    Com os sucessivos episdios de instabilidade poltica, a economia da Repblica Democrtica do Congo - um pas com vasta riqueza potencial - declinou drasticamente. Os dois recentes conflitos, que se iniciaram em 1996, reduziram dramaticamente a produo nacional e as receitas do governo, aumentaram a dvida externa e resultaram em talvez uns 3,8 milhes de vtimas (cerca de 7% da populao total), entre as vtimas diretas, as causadas pela fome e as devidas a doenas. As empresas estrangeiras retraram-se em razo da incerteza quanto ao resultado dos conflitos, falta de infra-estruturas e ao difcil ambiente empresarial.

    A guerra civil intensificou o impacto de problemas bsicos como uma estrutura legal incerta, corrupo, inflao e falta de abertura nas polticas econmicas e operaes financeiras do governo. As condies melhoraram no fim de 2002 com a retirada de uma grande percentagem das tropas estrangeiras presentes no pas. Algumas misses do FMI e do Banco Mundial reuniram-se com o governo para ajud-lo a desenvolver um plano econmico coerente, e o presidente Joseph Kabila comeou a implementar reformas.

    7 O acordo Sun Ciy, assinado na frica do Sul, previa o estabelecimento de um governo transitrio que governaria por 2 anos at a realizao de novas eleies.

    Eleies no Congo Rumo democracia?

    O Congo (RDC) tem um papel tradicionalmente importante na estabilidade geopoltica da frica Subsaariana8. As eleies de julho de 2006, previstas no Acordo de Sun City e realizadas com atraso, geraram muitos tumultos, na medida em que houve embates entre as foras dos dois principais candidatos presidncia: o ento Presidente Joseph Kabila e seu vice Jean-Pierre Bemba. [Ver tambm: Os embates na Repblica Democrtica do Congo em perspectiva histrica]. Ademais, a falta de maioria absoluta no 1 turno conduziu a disputa para o 2 turno, no qual Joseph Kabila obteve vitria com 58% dos votos, contra os 42% recebidos por Bemba.

    Essas eleies tiveram um papel importante na histria do Congo, j que fora a primeira de carter livre desde a independncia do pas, em 1960. Apesar de Joseph Kabila ter ganhado as eleies, ele no foi capaz de interditar, com base na constituio, o ex vice-presidente Bemba e seu exrcito particular, que s fora contido pela expedio de um mandato de priso pelo Procurador-Geral da Repblica, Tsaimanga Mukenda, resultando em sua fuga para a frica do Sul.

    As eleies do dia 30 de julho de 2007 foram as primeiras de carter multipartidrio em mais de 40 anos, contando com o comparecimento de quase 80% de eleitores s urnas, cerca de 27,5 milhes de pessoas, segundo o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento ( PNUD).

    A comunidade internacional voltou as atenes para o pas para que as eleies transcorressem com transparncia e tranqilidade. Para tanto, mais de 1700 observadores internacionais supervisionaram as eleies, alm dos 35 mil do prprio pas. As eleies custaram 500

    8 A regio conhecida como frica subsaariana est localizada na poro meridional do continente africano e dividida ao norte pelo deserto do Saara, que corta o continente no sentido leste - oeste.

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    milhes de dlares para a ONU. Uma das expectativas era de que o candidato eleito de maneira legtima possa governar o pas, que tem 58 milhes de habitantes, e acabar com anos de guerra no Congo.

    Apesar da identificao de algumas irregularidades durante a votao e apurao por observadores internacionais muitos grupos disseram que no viram nada de irregular no processo de validao dos votos. Autoridades da ONU afirmaram que as primeiras eleies multipartidrias da Repblica Democrtica do Congo em 40 anos ocorreram sem grandes problemas e foram marcadas por uma grande participao dos eleitores.

    O pas teve a guerra civil formalmente suspensa h trs anos, depois da assinatura de um acordo de paz envolvendo diferentes faces e o governo, mas as milcias no se desfizeram e ainda h confrontos em vrias regies do pas.

    Contudo, a recente democracia no pas est ameaada por um velho conhecido general rebelde no Congo: Laurent Nkunda, lder tutsi do RCD. Auxiliado por foras ruandesas, Nkunda ocupa a Provncia de Kivu do Norte, na poro leste do pas, mantendo um exrcito paralelo de aproximadamente 5000 homens. Em outubro de 2007, Nkunda prometeu ao Presidente Kabila cooperar com o acordo para desarmamento do grupo guerrilheiro.

    No entanto, novos embates entre o exrcito congols e as foras rebeldes voltaram a ocorrer em decorrncia da resistncia de Nkunda. Agora em dezembro, Kabila enviou cerca de 20 mil soldados, juntamente com artilharia pesada na luta contra Nkunda. Porm, o grupo rebelde aps uma primeira derrota recuperou-se e conseguiu retomar o controle da regio.

    Esses conflitos tm gerado grande instabilidade poltica para o recm-governo democrtico de Kabila, acarrentando inclusive temores internacionais de que um novo conflito violento e de carter regional volte a ocorrer, como a guerra civil.

    Na tentativa de dissolver a milcia liderada

    por Nkunda, o governo do Congo props um novo plano a ser iniciado em maro, contudo Nkunda exige a permanncia de seu exrcito em Kivu do Norte sob o pretexto de que suas famlias estariam protegidas. Uma outra exigncia de Nkunda a deportao e desmantelamento da milcia hutu de Ruanda, liderada por antigos genocidas do episdio ocorrido em 1994. No entanto, segundo informaes publicadas pelo New York Times, o governo congols e as Naes Unidas, argumentam que Nkunda um senhor da guerra que busca proteger poderosos interesses polticos e financeiros e est simplesmente utilizando a motivos tnicos como pretexto.

    Ainda neste ms, dezembro de 2007, o Conselho de Segurana da ONU votar sobre a renovao do mandato da fora de manuteno de paz local, a MONUC, no pas.

    Ao mapear os conflitos no Congo, pde-se perceber que suas razes mais recentes encontram-se no Genocdio em Ruanda (1994) e na conseqente desestabilizao da regio oriental do pas, envolvendo pelo menos 9 pases. A dimenso externa do conflito tem sido as invases do territrio congols por coalizes de pases vizinhos, que reclamavam ameaas sua segurana, enquanto que sua dimenso interna envolve mltiplas rebelies internas. Ambas as dimenses do conflito esto conectadas s redes de interesses dos pases ocidentais no abundante territrio congols, beneficiando-se amplamente de um estado colapsado, bem como de competies tnicas, fomentadas por estes mesmos pases.

    Referncia

    Livros:

    Nzongola-Ntalaja, Georges. The Congo From Leopold to Kabila: A People's History. Zed Books, London, 2002.

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    Artigos:

    Kabenguele, Munanga. A Repblica Democrtica do Congo RDC. Disponvel em: http://www.funag.gov.br. Acesso em 18 de dezembro de 2007.

    Sites:

    L Monde Diplomatique:

    http://diplo.uol.com.br

    Instituto de Estudos Estratgicos e Internacionais:

    http://www.ieei.pt/post.php?post=427

    PNUD:

    http://www.pnud.org.br/administracao/reportagens/index.php?id01=2171&lay=apu

    Congo Digital:

    www.digitalcongo.net

    All Africa:

    www.allafrica.com/congo-kinshasa

    L' Observatoire de l'Afrique Centrale:

    www.obsac.com

    G1:

    http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL216598-5602,00- CONFLITO+NO+CONGO+AMEACA+CRIAR+NOVA+CRISE+REGIONAL.html

    Ver Tambm:

    25-04-2007: Os embates de maro de 2007 na Repblica Democrtica do Congo em perspectiva histrica

    Palavras-chave: Repblica Democrtica do Congo, frica, Grandes Lagos, Tutsis, Hutus, Kabila, Bemba, Ditadura, Eleies, Rodrigo, Teixeira, Luciana, Mendes.

  • www.pucminas.br/conjuntura

    Poltica externa brasileira: alguns fatos dos 1805 dias do governo Lula

    Anlise Desenvolvimento

    Joana Laura Marinho Nogueira

    10 de dezembro de 2007

    Desde o incio do seu mandato, o presidente Lula vem executado sua poltica externa pautado na estratgia de ao multilateral com autonomia, visando o pragmatismo como meio ao nas relaes internacionais e buscando o desenvolvimento do pas.

    m 01 de janeiro de 2003, assume a presidncia do Brasil o senhor Luiz Incio Lula da Silva, ex-torneiro

    mecnico e ex-lder sindical. Este fato inaugura uma nova fase na recente histria democrtica do pas, quando pelo voto livre e direto, 52 milhes de brasileiros elegeram um candidato de esquerda para governar o pas. Quadro replicado quando, em 2006, o candidato do Partido dos Trabalhadores foi reeleito para o cargo, desta vez com mais de 58 milhes de votos considerando que o Brasil desde 2003 j tinha mais de 120 milhes de eleitores.

    Esta aparente ruptura poltica, ocorrida em 2003, no efetivamente verificada em todas as linhas polticas do atual governo. No h dvidas quanto continuidade da poltica macroeconmica, que vem seguindo o vis ortodoxo, mantendo ainda o forte controle da inflao de forma semelhante a do governo de seu antecessor, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (doravante denominado FHC).

    Todavia, apesar de todas as estratgias polticas estarem interligadas, no h como entender as demais linhas polticas do governo sem considerar a poltica econmica. O presente trabalho se prope a analisar as linhas estratgicas da poltica

    externa do atual governo brasileiro, buscando considerar as questes gerais que informam as aes governamentais.

    Antes de considerarmos efetivamente a poltica do atual governo, retomaremos alguns pontos dos dois mandatos de FHC, entre 1994 e 2002, em que algumas aes e sujeitos tm seu momento de origem, de modo que o entendimento da continuidade ou ruptura venha a ser esclarecido.

    Inserido num contexto interno de manuteno da recm-adquirida estabilidade econmica, a poltica externa do governo FHC baseava-se, segundo o professor da Unb, Alcidez Vaz, em trs linhas gerais, a saber: a definio de um projeto regional brasileiro, a obteno de melhores condies de acesso e abertura de novos mercados e a construo de novas parcerias internacionais. No entanto, devido s crises econmicas internacionais, e aos atentados de 11 de setembro de 2001, estas linhas sofreram fortes constrangimentos, o que levaram o governo a reconsiderar sua estratgia de ao.

    Desse modo, o governo de Fernando Henrique teve sua estratgia externa muito condicionada a ganhos econmicos. Neste sentido, cabe destacar as questes iniciadas com a Reunio Ministerial de

    E

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    Doha1 da Organizao Mundial do Comrcio (OMC), em novembro de 2001, que ainda est em curso e chamada a Rodada do Desenvolvimento. E ainda, as questes relacionadas criao da ALCA2, alm das novas regras impostas pelo governo estadunidense no ps-11 de setembro.

    O Professor Amado Luiz Cervo denomina que o governo Cardoso baseava-se em eixos liberais que se desdobraram em erros estratgicos e tornaram a dcada de noventa uma era das iluses.

    Diante desta conjuntura que o governo Lula erguer seu governo, devendo corrigir rumos, retomar a diretriz das relaes internacionais e principalmente refazer algumas reestruturaes nas linhas da poltica externa para que a estrutura esteja slida e possa resistir a possveis crises ou abalos sistmicos.

    Logo em seu discurso de posse o novo presidente apresenta duas linhas que iro pautar suas decises polticas. A primeira diz respeito ao dficit social do pas e a segunda promessa de maior autonomia para o pas.

    O diplomata Paulo Roberto de Almeida nos ajuda a pensar aquilo que poca se poderia esperar do novo governo: atendidas algumas nfases conceituais e a defesa afirmada da soberania nacional, a poltica externa do governo que inicia seu termo em janeiro de 2003 no destoar, substancialmente, da diplomacia conduzida de maneira bastante

    1 A Rodada do Desenvolvimento, tambm

    conhecida como Rodada de Doha, ainda segue sem um acordo, pois h grandes divergncias entre os pases em desenvolvimento, que exigem maior liberalizao em temas relacionados com a agricultura, enquanto os pases desenvolvidos insistem em temas como propriedade intelectual e compras governamentais.

    2 A ALCA light foi um termo criado para denominar as tentativas de acordos da ALCA, que eram propostas, no entanto, estas no consideravam temas mais controversos para os pases envolvidos.

    profissional pelo Itamaraty no perodo recente, conformando alis uma concordncia de princpio com a tradicional diplomacia do desenvolvimento..

    Antes, porm, da anlise do que se efetivou como poltica de governo para o setor externo, cabe apontar que Celso Amorim, Ministro das Relaes Exteriores; Samuel Pinheiro Guimares, Secretrio-Geral do Itamaraty e Marco Aurlio Garcia, Assessor Especial da Presidncia da Repblica de Relaes Internacionais, so juntamente com o Presidente Lula, os formuladores destas estratgias poltica. Passa-se a discorrer sobre alguns dos principais vetores da poltica externa do governo Lula.

    Amrica do Sul

    O papel do subcontinente sul-americano, nele includo as questes do Mercosul, e mais especificamente de pases como Bolvia e Venezuela, se tornou bastante importante e tem ganhado importncia especial na agenda presidencial.

    No contexto da Amrica do Sul, a posio brasileira de retomar a liderana natural do pais no subcontinente, uma vez que o pas tem metade do territrio e a maior economia da sub-regio. O governo anterior vinha seguindo nesta direo, exemplo disso a realizao da primeira reunio dos presidentes sul-americanos, em 2000. Neste novo governo, executam-se aes mais efetivas na defesa do interesse nacional, principalmente a partir do incremento nas relaes com seus vizinhos [ver tambm: A Poltica Externa Brasileira e a Amrica do Sul].

    Uma maior proximidade com os pases fronteirios acarreta no apenas ganhos, mas tambm alguns choques de interesses, a exemplo do ocorrido quando o presidente boliviano, Evo Morales, nacionalizou a produo dos hidrocarbonetos e tempos depois nacionalizou as plantas produtoras das empresas estrangeiras em territrio boliviano, como a Petrobras.

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    Tais aes do governo boliviano causaram constrangimentos internacionais, principalmente entre os pases vizinhos, e no Brasil, as reaes mais crticas foram dos grupos de interesses e da oposio, frente aparente imobilidade governista. Reao essa que a posteriori se mostrou apropriada, j que possibilitou a renegociao dos contratos e da relao entre a empresa e o governo boliviano, que foi finalizada a contento com a venda das plantas da empresa brasileira ao governo local [ver tambm: Bolvia e a nacionalizao dos hidrocarbonetos].

    Resolvidos os percalos com Morales, a diplomacia brasileira teve, em 2007, mais uma questo de atrito na vizinhana. Numa retomada das aes para o Mercosul, o novo governo assumiu a defesa da ampliao e fortalecimento do bloco, para isso a entrada da Venezuela tornou-se fundamental.

    O presidente venezuelano, Hugo Chvez, em seus arroubos discursivos, muito atrapalhou na aceitao do seu pas como membro efetivo do bloco, uma vez que se faz necessria autorizao pelo Congresso de cada um dos membros a entrada de um novo pas ao Mercosul. E, aes do presidente venezuelano causaram constrangimentos ao Congresso brasileiro, levando ao atraso na votao e a necessidade de uma participao mais efetiva do executivo frente s comisses legislativas responsveis pela aprovao do pedido de entrada da Venezuela no bloco [Ver tambm: A Venezuela no Mercosul].

    H de se considerar que o presidente Chvez em muitas oportunidades disputa carisma e onipresena na regio com o Presidente Lula, o que requer jogo de cintura e uma competente estrutura diplomtica, tendo sem dvida sido bem sucedida, j que nenhum atrito foi criado.

    O universalismo e a cooperao Sul-Sul

    No vis universalista de poltica externa, o incremento do modelo de cooperao Sul-Sul pauta desde o incio do governo

    petista as aes externas. Alm do fortalecimento das relaes com os vizinhos, houve a retomada dos parceiros africanos, e, ainda, a busca por relaes estratgicas com potncias regionais como a iniciativa IBAS - Frum de dilogo ndia, Brasil e frica do Sul -, alm de incentivo manuteno de fruns multilaterais de cooperao e dilogo com diversas outras regies do globo, a exemplo da FOCALAL Frum de Cooperao sia do Leste e Amrica Latina e outros [Ver tambm: Foro de Cooperao Amrica Latina e sia do Leste] .

    A prevalncia da cooperao Sul-Sul no invalida, contudo, as relaes do pas com o mundo desenvolvido. Com os Estados Unidos da Amrica (EUA), mesmo sem proferir apoio s aes no Iraque e apesar dos chefes do executivo dos dois pases terem vises polticas bastante distintas, os presidentes vm mantendo uma relao de equilbrio. Esta relao vem permitindo que, mesmo apresentando posies contrrias, especialmente na questo ambiental, os pases desenvolvam projetos de produo de biocombustveis. Alis, questo fundamental para a recente poltica externa .

    Sob o pretexto da diplomacia do etanol, o presidente Lula vem propagando a imagem do Brasil pelo mundo. Com intuito de assinar acordos para o setor, o Presidente brasileiro j fez viagens dos Pases Nrdicos frica. Esta posio refora o vis universalista e pragmtico da atual forma de execuo e implementao da poltica externa.

    Com a agenda internacional tomada por questes ambientais e os constantes aumentos no preo do petrleo e a insegurana energtica em termos de gs natural, a agroenergia3 tornou-se uma estratgia oportuna para universalizao das relaes internacionais. Ainda, estando o Brasil avanado tecnologicamente no setor, cria-se uma

    3 Vide Glossrio.

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    oportunidade impar a ser explorada pelo pas.

    A chamada diplomacia do etanol vem sendo oportunamente explorada pelos formuladores de poltica externa no Brasil e no apenas como possibilidade de vender a tecnologia desenvolvida pelo pas, mas tambm pelo vis desenvolvimentista includo no tema. Uma vez que, a questo ambiental est contida na poltica, assim como a possibilidade de produo deste bem por pases pouco desenvolvidos, ampliando a pauta de exportao dos mesmos.

    Esta poltica tambm vem possibilitando o aumento no nmero de parceiros comerciais do pas, na medida em que a cada nova viagem presidencial, pautada na poltica do etanol, seguem na comitiva presidencial representantes do empresariado brasileiro, que se renem com seus parceiros locais para promover intercmbios e ainda mais comrcio.

    O relacionamento mais dependente com as potncias globais vai aos poucos sendo substitudo por relaes mais eqidistantes e equilibradas nas mais diversas regies do globo. Do deslumbramento estadunidense dos anos Collor, ao kantianismo ingnuo do governo Fernando Henrique, os anos petistas vem se mostrando um pouco mais pragmticos na insero internacional do Estado brasileiro.

    Todavia, deve-se considerar que a poltica externa do governo Lula vem apelando pela liderana a qualquer custo. Primeiro numa busca incessante por uma vaga permanente no Conselho de Segurana das Naes Unidas (CSNU), desejo esse que levou ao reconhecimento da China como economia de mercado, em troca da promessa chinesa da defesa de uma profunda reforma na instituio. No h dvidas que uma reforma na Organizao necessria, mas que tambm no para logo.

    A diplomacia brasileira investiu tanto neste tema que se associou ao Japo,

    Alemanha e ndia no chamado G-4, a fim de pressionar pela reforma. No entanto, h de se pensar que a China no apoiaria a entrada do Japo e os EUA seriam reticentes quanto entrada da Alemanha, pois daria Unio Europia mais um membro no Conselho.

    Ademais, no se imagina uma reforma que agrade a todos, j que sem retirar poderes dos 5 membros permanentes ou estender esses poderes a outros membros no haveria qualquer mudana no atual cenrio. S nos resta acreditar que ainda h muita negociao e diplomacia para acontecer.

    No h dvidas, porm, que o Brasil um pas de grande influncia na Amrica do Sul, mesmo por seu tamanho geogrfico, sua economia e sua populao. No entanto, disputar com qualquer pas o papel de lder, ou mesmo correr atrs desta liderana, talvez no seja uma estratgia muito adequada. Ao buscar consolidar seu espao no sistema internacional e considerando suas capacidades naturais, o pas exercer influncia natural, podendo seguir com mais autonomia e independncia, conquistando a necessria credibilidade.

    Ainda possvel pontuar alguns fatos ocorridos durante o atual governo que informam sobre algumas outras linhas mais perifricas da poltica do atual governo, a saber: questes diplomticas quanto entrada de brasileiros em territrio estadunidense e a reciprocidade das aes; o enriquecimento do urnio, as potencialidades deste comrcio e as inspees no autorizadas da Agncia Internacional de Energia Atmica (AIEA); impasse nas negociaes da ALCA e da OMC quanto a questo agrcola; entre outros fatos mais pontuais que s corroboram com a estratgia de busca da autonomia e do pragmatismo que vem sendo objetivado pelo atual governo.

    Pode-se dizer, portanto, que Lula assumiu uma postura de reviso de rumos da ao externa, numa perspectiva coerente com

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    as mudanas sistmicas do ps-11 de setembro e os compromissos domsticos, todavia, sem se opor diretamente s vertentes do governo anterior. Isto posto, pode-se entender que muito menos do que uma ruptura houve apenas uma reordenao nos rumos da poltica externa.

    O sistema internacional dinmico e as fragilidades do pas so inmeras e esto muito aparentes. Buscar uma insero segura no sistema requer que sejam considerados no apenas os constrangimentos externos, a poltica domstica deve ser considerada, pois equvocos desta ordem podem causar prejuzos considerveis.

    A consolidao da democracia, da estabilidade econmica e do desenvolvimento so etapas que so paulatinamente alcanadas. E, desde a ingnua abertura comercial nos anos 1990 at a atual poltica para o desenvolvimento de Lula, houve um contnuo aprendizado poltico. Neste perodo, em que erros foram corrigidos, etapas superadas. Resta ao governo buscar ainda mais, para tanto uma maior politizao das questes externas parte importante neste aprendizado.

    O gigante, adormecido em bero esplendido, aos poucos vai acordando e buscando seu lugar no sistema internacional. As possibilidades so apresentadas pela conjuntura, resta inferir qual dos caminhos o melhor. No obstante, o governo deve per si criar suas prprias oportunidades, talvez haja um excesso de otimismo no ar. Ponderar custos importante na poltica, mesmo sabendo-se que, o risco parte do jogo. Resta-nos esperar os prximos 1116 dias do governo Lula.

    Referncia Artigos:

    ALMEIDA, Paulo Roberto de. A Poltica Externa do novo Governo do Presidente Lus

    Incio Lula da Silva retrospecto histrico e avaliao programtica. Disponvel em: . Acessado em : 03 dez. 2007.

    CERVO, Amado Luiz. A poltica exterior de Cardoso a Lula. Revista Brasileira de Poltica Internacional. Vol. 46, No 01, pp. 5-11, 2003.

    VAZ, Alcides Costa. La politica exterior del Gobierno Lula. Nueva Sociedad. Vol. 187, pp. 139-152, 2003.

    LIMA, Maria Regina Soares. A poltica externa brasileira e os desafios da cooperao Sul-Sul. Revista Brasileira de Poltica Internacional. Vol. 48, No. 1, pp. 24-59, 2005.

    Sites:

    Ministrio das Relaes Exteriores

    http://www.mre.gov.br

    Ver Tambm:

    14/11/2003: A Poltica Externa Brasileira e a Amrica do Sul

    14/11/2003: A poltica externa brasileira e a cooperao entre os pases em desenvolvimento

    01/06/2006: Brasil e o contexto sul-americano

    10/11/2006: Brasil 2006: A poltica externa brasileira na campanha presidencial

    25/07/2007: A Venezuela no Mercosul

    27/08/2007: Foro de Cooperao Amrica Latina e sia do Leste

    19/09/2007: Visita de Lula aos pases nrdicos

    10/10/2007: 62a Assemblia Geral das Naes Unidas

    31/10/2007: Presidente Lula em visita a quatro pases do continente africano

    Palavras-chave: poltica, externa, Lula, multilateralismo, autonomia, cooperao, desenvolvimento, Joana, Laura, Nogueira.

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    Kosovo: independncia ou autonomia

    Resenha Segurana

    Luiz Fernando Damaceno Moura e Castro

    13 de dezembro de 2007

    Aps mais de 10 anos desde a perda de autonomia, a independncia da provncia srvia parece mais prxima. Com a chegada do final do prazo para a elaborao de resolues e o apoio dos EUA e da EU, uma declarao unilateral de independncia parece a soluo mais provvel.

    situao atual de Kosovo ocorre em decorrncia de uma srie de conflitos tnicos e religiosos que fizeram parte da regio balcnica

    no sculo XX. Desde a Iugoslvia de Tito1 de 1945, at o desmembramento total daquele pas, os conflitos entre srvios, bsnios, albaneses, kosovares, em suas variantes muulmanas e crists compuseram o cotidiano dos habitantes da regio.

    Em dezembro de 2007, uma opo da Organizao das Naes Unidas (ONU) e do governo srvio sobre a independncia, de Kosovo, que deveria ser declarada. Entretanto, at dia 10 de dezembro, as negociaes no haviam atingido nenhum resultado satisfatrio. A situao balcnica j foi muito mais violenta, impelindo atores internacionais a agirem, no entanto o status oficial do Kosovo, se autnomo ou independente, ainda causa distrbios na regio dos Blcs.

    O Kosovo uma regio montanhosa localizada ao nordeste da Albnia, sudeste de Monte-Negro, norte da Macednia e ao sudoeste da Srvia, sendo que o pas engloba a regio como uma de suas

    1 O General Josip Broz Tito organizou a resistncia

    anti-fascista durante a Segunda Guerra Mundial. Aps a guerra, Tito resistiu ao alinhamento com EUA ou URSS, governando a Iugoslvia autonomamente, sem se alinhar a um dos lados, at sua morte em 1980.

    provncias. Tradicionalmente uma regio multitnica, hoje a populao kosovar composta de 90% de albaneses muulmanos e 6% de srvios cristo-ortodoxos. Todavia, as identidades nacionais so definidas principalmente atravs do idioma, seja o srvio ou albans.

    Durante o desmembramento da Iugoslvia2, os kosovares albaneses foram a primeira nacionalidade a organizar uma fora militar, o Exercito de Liberao do Kosovo (Ushtria lirimtare e Kosovs ou UK). O grupo lutava pela independncia de Kosovo em relao Iugoslvia e Srvia.

    Kosovo j havia sido informalmente autnoma desde 1945 e formalmente desde o final da dcada de 1980, sendo que, a partir dessa data, milhares de srvios saram da regio, declarando que foram expulsos por ameaas e violncia dos albaneses-kosovares. A populao srvia pediu maior controle da situao por parte do governo, declarando que sem o apoio de outros pases, o governo srvio deveria sozinho acabar com a violncia na

    2 Com a decadncia do comunismo mundial,

    iniciada pelo desmembramento da ex-URSS, a Iugoslvia tambm sofreu um processo de fragmentao. Durante esse processo vrios conflitos surgiram na regio que, em sua maioria, eram relativos reivindicao de autonomia e independncia.

    A

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    regio.

    Em 1990, o presidente srvio Slobodan Milosevic revogou o status autnomo de Kosovo como maneira de repreender os atos de violncia albaneses, substituindo lderes locais e reincorporando completamente a regio Srvia.

    A reincorporao foi um golpe duro para os Kosovares: suas instituies polticas foram banidas, como a assemblia kosovar; as foras policiais albanases foram trocadas por srvias; o albans deixou de ser a lngua oficial da provncia; as indstrias, em sua maioria estatais, passaram ao controle srvio; jornais e transmisses de rdio em albans foram proibidas; e mais da metade dos estudantes universitrios foram expulsos da universidade de Prstina (capital e maior cidade da regio).

    A represso srvia sob a direo do presidente Milosevic, contra o grupo guerrilheiro UK, foi generalizada em relao populao albanesa da regio, no se limitando ao Exrcito de Liberao do Kosovo. Iniciou-se, ento, um processo de limpeza tnica no qual uma populao, utilizando foras militares ou para-militares e organismos polticos, buscou expulsar toda uma etnia de uma regio especfica. As foras srvias perseguiram civis e para-militares albaneses, de maneira a forar a sada dos kosovares albaneses em direo Albnia. Os atos dos militares srvios foram considerados mais tarde como crimes de guerra3.

    Essa condio do conflito impeliu a Organizao do Tratado do Atlntico Norte (OTAN) a intervir militarmente na regio em 1999. Ataques areos foram realizados contra os srvios na primeira operao da organizao internacional contra um pas europeu e soberano. Os

    3 Milosevic foi indiciado em 1999 pela ONU, atravs

    do Tribunal Criminal Internacional para a Ex-Iugoslavia, por cometer crimes contra a humanidade no Kosovo.

    ataques se concentraram inicialmente em alvos militares em Kosovo e na Srvia, mas se estenderam posteriormente a outras instalaes, como pontes, refinarias e centrais de comunicao. Durante os ataques, milhares de kosovares albaneses fugiram da regio, reportando violncia execues e expulso por parte das foras srvias.

    Desde a interveno de 1999, Kosovo esteve sob tutela da ONU atravs de uma srie de instituies especialmente criadas, mesmo que continuando oficialmente como uma provncia da Srvia. A United Nations Interin Administration Mission in Kosovo4 (UNMIK), foi instaurada para administrar a regio e a Kosovo Peace Implementation Force5 (KFOR) para garantir a segurana dos habitantes.

    Em 2001, a UNMIK estabeleceu instituies provisrias de autogoverno, atravs das quais seria gradualmente transferido o controle administrativo da regio para a populao local. O objetivo central dessas instituies, e da UNMIK como um todo, era o de definir uma srie de critrios de governabilidade estveis para que o status do Kosovo pudesse ser discutido e definido.

    Para presidir a UNMIK foi designado como enviado especial da ONU o ex-presidente da Finlndia Martti Ahtisaari. Entretanto, o processo foi extremamente lento, o que acarretou em revoltas por parte da populao albanesa e na descrena da populao srvia em uma resoluo eficaz. Dessa maneira, apenas em 2006 as negociaes comearam efetivamente, tendo como participantes representantes de Belgrado (capital da Srvia), Prstina (Capital do Kosovo) e um Grupo de Contato do qual participam Estados Unidos (EUA), Reino Unido, Frana, Itlia, Alemanha e Rssia.

    As posies se contrabalanavam com Rssia e Srvia em favor da autonomia e

    4 Misso interina de administrao no Kosovo 5 Fora de implementao da paz no Kosovo

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    kosovares albaneses e os outros membros do Grupo de Contato a favor da independncia6.

    Como resultado das negociaes, foi elaborado em 26 de maro de 2007 o Plano Ahtisaari, que deveria estabelecer as diretrizes para determinar o futuro status de Kosovo e as condies em que o processo de transio deveria ocorrer. A proposta foi apresentada ao Secretrio das Naes Unidas, Ban Ki-moon, que, ento o encaminhou com todo apoio ao Conselho de Segurana.

    O plano Artisaari estabelece que Kosovo deveria se concretizar em uma sociedade multitnica independente e sob a superviso de atores internacionais7. O plano prev ainda que: a regio tem direito a estabelecer uma srie de smbolos nacionais como bandeira e hino; a possibilidade de comercializar independentemente com outros pases; e a manuteno da KFOR para manuteno da segurana de albaneses e da minoria srvia. Como primeiro passo, Kosovo deveria adotar uma comisso constitucional de 21 membros, dos quais trs deveriam ser de origem srvia e trs de outras minorias. Aps a aprovao da Constituio pela assemblia kosovar, eleies deveriam ocorrer aps nove meses. Em suma, o plano especifica a criao de um Estado Kosovar semi-independente.

    A negociao da implementao do plano, porm, no foi bem sucedida, alongando o

    6 Diferentemente da independncia, que criaria um

    estado kosovar completamente independente da Srvia, a autonomia permitiria que o Kosovo possusse instituies polticas e nacionais, mas seria dependente da Srvia em aspectos relativos segurana e economia internacional.

    7 1.1 1 The international community shall supervise, monitor and have all necessary powers to ensure effective and efficient implementation of this Settlement, as set forth in Annexes IX, X and XI. Kosovo shall also issue an invitadon to the international community to assist Kosovo in successfully fulfilling its obligalions to this end.

    prazo para a entrega de um documento final para dia 10 de dezembro de 2007. A Conferncia de Baden8, nos dias 26 e 28 de novembro, representou a tentativa mais recente de negociao diplomtica entre as partes, agora reduzidas Troika9 (EUA, Unio Europia e Rssia), Srvia e Kosovo. Todavia, a posio Srvia apoiada pela Rssia representou, mais uma vez, um obstculo intransponvel para a implementao imediata do plano.

    A presso do grupo formado por EUA e pela Unio Europia (UE) tende a facilitar o processo de independncia. Esse fator relevante principalmente dada a posio da prpria Srvia diante da Europa, j que aquela procura construir seu futuro como um Estado integrado UE. Entretanto, outros pases como Grcia e Eslovnia, j dentro da comunidade, podem se declarar contrrios proposta, dado seu prprio histrico de movimentos separatistas. Para a UE essencial demonstrar a unidade da poltica de segurana do bloco, de maneira a garantir sua posio como um ator influente na poltica internacional dentro e fora da Europa. A participao internacional no mbito militar foi bem sucedida, garantindo a paz na regio, todavia, a concluso do processo diplomtico ainda se encontra em dificuldades.

    Desde a dcada de 1990, Kosovo se encontra em estado dbio sobre a declarao de seu status em diferentes nveis de anlise, interno, regional e internacional. Os processos para a definio de sua condio tm envolvido atores internacionais como a ONU e a OTAN que, entretanto, no conseguiram atingir nenhum progresso expressivo.

    8 A conferncia foi realizada Baden, ustria, com a

    participao de EUA UE e Russia, tendo trs dias de durao. Foi importante, principalmente, para reforar o compromisso das duas partes, Kosovo e Srvia, de no buscarem a violncia nas negociaes.

    9 Palavra em russo que significa grupo de trs ou trade.

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    Aliado a isso, a posio do governo srvio, com o apoio da Federao Russa, contra a criao de um Estado Kosovar, compe as principais condies desfavorveis para a resoluo do conflito.

    A interveno internacional do Kosovo, principalmente por parte da OTAN, deu incio a algumas das misses pioneiras que estabeleceram o padro das operaes humanitrias por parte da organizao e auxiliaram na organizao de futuras misses da ONU. Mas a situao poltica vai muito alm do conflito armado entre milcias kosovares e foras srvias.

    Alm disso, a histria conflituosa entre as comunidades tnicas e a continuidade dos sentimentos agressivos entre elas apresentam dificuldades na elaborao de uma soluo definitiva para o povo Kosovar. Cada vez mais insatisfeitos com os prprios dirigentes e com os organismos internacionais, os kosovares aos poucos perdem a f nas solues diplomticas, o que poderia levar a mais confrontos na regio balcnica. Em contraposio soluo srvia, relacionada a uma grande autonomia da regio, a soluo mais aparente para o conflito seria uma declarao unilateral de independncia dos kosovares, apoiada por outros pases e rgos internacionais.

    Referncia Sites:

    South Eastern Times

    http://www.setimes.com

    Crisis Group

    http://www.crisisgroup.org

    Plano Artissaari (Comprehensive Proposal)

    http://www.unosek.org/docref/Comprehensive_proposal-english.pdf

    Meridiano 41

    http://meridiano47.info/

    BBC News

    http://news.bbc.co.uk

    OTAN

    http://www.nato.int

    United Nations Special Envoy for Kosovo

    http://www.unosek.org

    Palavras-chave:

    Kosovo, Srvia, Artissari, Luiz Fernando, Moura e Castro.

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    O novo relatrio sobre o programa nuclear iraniano

    Resenha Segurana

    Anna Claudia de Santana Menezes

    19 de dezembro de 2007

    O Conselho de Inteligncia Nacional do governo dos Estados Unidos publicou, no dia 3 de dezembro de 2007, uma Estimativa da Inteligncia Nacional, relatrio no qual so revisados os dados segundo os quais a Repblica Islmica do Ir possui um programa nuclear.

    m relatrio divulgado na segunda-feira, dia 3 de dezembro de 2007, apresenta novas perspectivas sobre o programa nuclear

    iraniano. O documento uma Estimativa da Inteligncia Nacional (NIE, sigla em ingls), que representa um consenso entre 16 agncias de inteligncia estadunidenses.

    Os NIEs so os documentos mais importantes e com maior autoridade de julgamento na Comunidade de Inteligncia (CI, sigla em ingls) do governo dos Estados Unidos da Amrica (EUA). Eles analisam todos os assuntos relacionados segurana nacional e tm como objetivo auxiliar no desenvolvimento de polticas para a proteo dos interesses nacionais dos EUA.

    O relatrio, denominado National Intelligence Estimate Key Judgments: Iran: Nuclear Intentions and Capabilities1, foi realizado a pedido do Congresso estadunidense, e tem como meta avaliar o status do programa nuclear iraniano e qual ser sua projeo nos prximos 10 anos.

    1 Julgamentos-chave da Estimativa da Inteligncia

    Nacional: Intenes e Capacidades nucleares do Ir.

    O documento atesta que o programa nuclear iraniano foi suspenso em 2003, e continua da mesma forma atualmente. Provavelmente, declara o NIE, a deciso de interromper seu programa foi conseqncia do aumento da investigao internacional minuciosa e da presso resultante da exposio do projeto iraniano nuclear no declarado..

    Alm disso, relata que o pas continua a enriquecer urnio, o que poderia prover Teer com material suficiente para a produo de arma nuclear em meados da prxima dcada. No obstante, nega as previses feitas por agncias de inteligncia em 2005, segundo as quais o Estado islmico teria um projeto secreto de construo de defesa nuclear.

    O relatrio no posiciona o Ir como um Estado Paria2 que age de forma irracional para adentrar o clube das potncias nucleares. Alega que as decises iranianas no se baseiam em um mpeto para a obteno de armas nucleares sem antes considerar os custos polticos,

    2 O termo Estado Paria se refere aos Estados que,

    de acordo com o governo dos Estados Unidos da Amrica, patrocinam o terrorismo, rejeitam os direitos humanos, esto determinados a adquirir armas de destruio em massa e desrespeitam as leis do Direito Internacional.

    U

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    militares e econmicos; ao contrrio, guiam-se por clculos custo-benefcio.

    O NIE chega concluso que, se Teer fosse retomar seu programa, isso demoraria no mnimo dois anos antes que o pas pudesse enriquecer o urnio necessrio para construir uma bomba nuclear. De acordo com o documento, seria muito improvvel que o Ir atingisse esse objetivo antes de 2013, devido a previsveis problemas tcnicos e no programa..

    Por fim, o documento exprime que seria complicado e difcil fazer com que os lderes iranianos desistam de obter uma bomba nuclear, uma vez que esta tem grande importncia nos objetivos estratgicos do pas no Oriente Mdio.

    A administrao George W. Bush insiste que, apesar de tais concluses do NIE, o Ir e seu programa nuclear continuam a ser uma grande ameaa segurana regional. Segundo o Secretrio de Defesa, Robert Gates, no h dvida que a poltica iraniana de desestabilizao uma ameaa aos interesses estadunidense e de qualquer pas do Oriente Mdio.. Exemplos dessa poltica so, de acordo com o Secretrio de Defesa: a tentativa de desequilbrio do Afeganisto e Iraque; o apoio ao Hamas3 e Hizballah4; e o desenvolvimento de msseis de mdio alcance.

    Com a finalidade de pressionar os aliados

    3 Hamas, Movimento de Resistncia Islmica, um

    grupo palestino que tem como meta principal o estabelecimento do Estado palestino e a eliminao completa de Israel em uma guerra santa. considerada uma organizao terrorista pelos Estados Unidos da Amrica e pela Unio Europia.

    4 Hizballah um grupo armado que integra o Parlamento e gabinetes libans. Possui a meta de expulsar as foras israelenses do pas, combater o imperialismo ocidental e instituir no Lbano uma repblica islmica que seria o nico modo de garantia de igualdade entre os libaneses. reconhecidamente auxiliada pela Sria e Ir, e caracterizada como terrorista pelo governo estadunidense.

    no Golfo, Gates reafirmou o compromisso de Washington com a regio, encorajou acordos bilaterais com os EUA para contrabalanar o Ir, alm de oferecer uma rea frtil de cooperao na qual sero compartilhadas informaes e defesa area, martima e mssil..

    Alguns lderes da regio, entretanto, declararam que preferem uma soluo diplomtica e pacfica para a questo. Sheikh Hamad bin Jassim bin Jabr al Thani, Primeiro-Ministro do Qatar, argumentou que os EUA no devem tentar excluir o Ir da regio, mas sim comear a dialogar diretamente com o pas. Gary More, analista do Conselho estadunidense para Relaes Internacionais, alegou que essas crticas so reflexos das preocupaes sobre as intenes da Casa Branca: os pases do Golfo esto inseguros e ressentidos, mas esto em uma posio muito fraca..

    Opinio diferente possui o Estado de Israel. Servios de inteligncia israelense estimam que o Ir interrompeu seu programa nuclear em 2003, mas retomou suas atividades em 2005, acelerando o enriquecimento de urnio e o desenvolvimento de msseis balsticos. Contudo, de acordo com Tel Avi, o projeto iraniano est limitado pela presso internacional e por dificuldades econmicas e tcnicas.

    George W. Bush declarou que o relatrio no um motivo para relaxar e desistir, mas sim uma confirmao de que o que aconteceu no passado pode se repetir, ou seja, que a Repblica Islmica do Ir possa retomar seu projeto nuclear. Ademais, confirmou que os EUA continuaro a isolar Teer, afirmando que o NIE um alerta para a comunidade internacional. Isso porque o Ir poderia retomar o programa e conduzi-lo de forma clandestina, o que colocaria em perigo o mundo.

    O servio de inteligncia estadunidense estima que a publicao do documento acontece em um momento inapropriado,

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    pois coloca em xeque os esforos da administrao para impor uma terceira sano ao Ir na Organizao das Naes Unidas (ONU). O primeiro pacote de sanes foi aprovado em dezembro de 2006 e requer que todos os pases parem de fornecer material e tecnologia que poderiam ser usados pelo pas em seus programas nuclear e mssil. O segundo pacote, homologado em maro de 2007, bane armas de origem iraniana e aprofunda a lista de companhias e indivduos sujeitos a ter suas posses bloqueadas.

    O presidente do Ir, Mahmoud Ahmadinejad, classificou o relatrio como uma declarao de vitria do povo iraniano sobre as grandes potncias. Teer caracterizou o NIE como um passo positivo que, se seguido por outros passos similares, reverter a situao, liberando o caminho para equacionar as questes regionais e bilaterais. Todavia, o Ministro das Relaes Exteriores iraniano, Manouchehr Mottaki, disse que 70% do relatrio esto corretos, mas os 30% restantes esto errados, pois os EUA se recusam a confessar a verdade com receio de perder toda a sua reputao.

    O documento neutraliza a retrica do presidente Bush, que vinha evocando a possibilidade de uma terceira guerra mundial caso o mundo no agisse rpido para deter os iranianos de adquirirem conhecimento e urnio suficientes para construir uma bomba nuclear.

    No entanto, presidente Bush afirmou que o relatrio no trar mudanas na poltica de Washington com relao ao Ir, pois o pas continua sendo uma ameaa comunidade internacional. Dessa forma, os EUA daro prosseguimento tentativa de insular o pas islmico. O NIE foi um mostrou claramente que o Ir precisa ser levado srio como uma ameaa paz internacional, argumenta George W. Bush.

    Referncia Sites:

    Herald Tribune

    http://www.heraldtribune.co

    National Intelligence Estimate Key Judgments: Iran: Nuclear Intentions and Capabilities

    http://www.dni.gov/press_releases/20071203_release.pdf

    The Guardian

    http://www.theguardian.co/

    The Nacional Security Strategy of the United States of America

    http://slomanson.tjsl.edu/NSS.pdf

    The New York Times

    http://www.nytimes.com/

    Ver Tambm:

    16-07-2006: Eixo do Mal, Segunda Rodada

    16-01-2005: Hamas (perfil)

    05-11-2004: Hezbollah (perfil)

    16-06-2006: O programa nuclear do Ir, novos acontecimentos

    Pa

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    lavras-chave: Estados Unidos, Ir, NIE, programa nuclear, Anna Claudia, Menezes.

    Pontifcia Universidade Catlica MG

    Presidente da Sociedade Mineira de Cultura: Dom Walmor Oliveira de Azevedo

    Gro-Chanceler: Dom Walmor Oliveira de Azevedo

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    Assessor especial da reitoria: Prof. Jos Tarcsio Amorim

    Chefe de Gabinete do Reitor: Prof. Osvaldo Rocha Trres

    Conjuntura Internacional

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    Coordenao do Curso de Relaes Internacionais: Prof. Javier Alberto Vadell

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