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Pesquisa Debate SUS Unifesp divulga dados sobre famílias de usuários de drogas Pág. 3 Liberação da maconha causa controvérsia no mundo Págs. 6 e 7 Novo serviço se volta aos presos com transtornos mentais Pág. 8 CONFIRA TAMBÉM IMPRESSO E ON-LINE - BOLETIM Nº 24 NOV/DEZ - 2013 E JAN - 2014 ANO 07 Crack: o caminho pode ser a conciliação

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Pesquisa Debate SUSUnifesp divulga dados sobre famílias

de usuários de drogas Pág. 3Liberação da maconha causa controvérsia

no mundo Págs. 6 e 7Novo serviço se volta aos presos com

transtornos mentais Pág. 8

Confira Também

imPrESSo E on-LinE - boLETim nº 24noV/DEZ - 2013 E Jan - 2014

ano 07

Crack: o caminho pode

ser a conciliação

Ronaldo Laranjeira

Há anos a situação de crise acompanha os hospitais psiquiátricos no Brasil. Conside-rado um mal necessário, esses estabelecimentos têm recebido tratamento negativa-mente diferenciado em relação aos demais serviços de saúde que prestam assistência pública aos usuários do SUS.

Se já é de conhecimento público que as tabelas não são atualizadas de acordo com a necessidade, na psiquiatria os valores são ainda mais achatados. Lembro-me do tempo em que a diária hospitalar era remunerada em U$ 9,00 (nove dólares) e era imperioso ter um reajuste para não fechar todos os hospitais do país. A situação de precariedade era tamanha que os dirigentes dos serviços especializados se reuniram e decidiram fazer uma entrega coletiva de leitos. A decisão gerou grande preocupação por parte do Ministério da Saúde e a solução veio da noite para o dia. Foi criado um Índice de Valorização Hospitalar (IVH) que mais que dobrou o valor da diária, possibilitando a reorganização do setor por mais um tempo. Note-se que a solução foi única para todos os hospitais psiquiátricos do país. Com o processo de municipalização da gestão, começou-se a criar um racha no tratamento das instituições que, na grande maioria, passaram a não mais se reportar ao Estado, mas sim ao município de sua localidade. É o preceito de dividir para governar. Ademais, os hospitais têm naturezas jurídicas distintas; há os públicos, os privados filantrópicos e os privados com fins lucrativos. Os públicos não dependem apenas das diárias do SUS eis que têm aporte de capital para seus investimentos. Os privados filantrópicos tiveram no passado subvenções, hoje menos, que ajudavam no gerenciamento do cotidiano, além das isenções de praxe. Os privados com fins lucrativos ficaram restritos às Autorizações de Internação Hospitalar (AIH), aumen-tando a defasagem em relação aos primeiros.

Nesse sentido, há uma nítida sensação de expulsão do capital privado do setor saúde, sobretudo pelo viés ideológico governamental que desestimula qualquer investimento na área. Estando agora habilitados na gestão plena do sistema municipal, salvo exceções, os hospitais estão submetidos ao gestor local, que varia de município para município. Tanto há regiões de concentração de leitos especializados, como outras em que há carência dos mesmos. Diversos são também os partidos políticos distribuídos pelos municípios, o que provoca ainda mais a diferenciação no relacionamento com os serviços de saúde. A partir daí, as soluções encontradas para a sustentabilidade do setor dependem das referidas variáveis, o que confirma que não há mais saídas uniformes para os hospitais em geral, mas sim uma a uma, que vai depender em princípio da necessidade local do gestor, da natureza política do mesmo e da natureza jurídica do serviço.

Numa região de concentração de leitos psiquiátricos do Estado de São Paulo, há uma política de fecha-mento dos prestadores no prazo previsto de três anos. Noutra região em que há carência de vagas para dependentes químicos, o gestor está fazendo investimentos, com valores diferenciados de diá-ria, o que tem propiciado avanços importantes no tratamento aos portadores de transtornos mentais.

Não há, como se vê, uma política uniforme para tratar a questão da saúde mental no Estado. E nenhuma perspectiva de que este cenário se mo-difique. Enfim, sobrevivemos. E só.

* Ricardo Mendes coordena o departamento de Saúde Mental do SINDHOSP

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CanaL abErTo EXPEDiEnTE

Sobrevivendo na

DIRETORIA:

EFETIVOYussif Ali Mere Jr. (presidente)

EDITORA:

Ana Paula Barbulho (MTB 22170)

REDAçãO E REVISãO:

Ana Paula Barbulho, Aline Moura, Fabiane de Sá e Rebeca Salgado

EDITORAçãO ELETRônIcA:

Carlos Eduardo, Thiago Alexandre(Marketing)

cOLAbORARAm nESTA EDIçãO:

Ricardo Mendes, coordenador de Saúde Mental do SINDHOSP, e Carlos Eduardo Silva (Marketing)

TIRAGEm:

2.000 exemplares

cIRcuLAçãO:

Entre diretores e administradores de hospitais psiquiátricos e clínicas

PERIODIcIDADE:

Trimestral

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Saúde mental em Foco é uma publicação do SInDHOSPcriSe

PESQUiSa

28 milhõeS de peSSoaS tÊm algum parente com dependÊncia química Divulgado em dezembro, levantamento nacional mapeou usuários em reabilitação

O documento ainda aponta que 58% dos casos de internação foram pagos pelo próprio familiar e o impacto do tratamento afetou 45,4% dos entrevistados. Em 9% dos casos houve cobertura de algum tipo de convênio. O uso de hospitais públicos, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), foi citado por 6,5% das famílias de usuários em reabilitação. Para 46,8% dos entrevistados, as más com-panhias influenciaram seu familiar no uso de drogas. Já 26,1% culpam a baixa autoestima como responsável pela procura por entorpecentes.

Essa é a terceira pesquisa sobre o tema divulgada pela Unifesp. Em agosto de 2012, o Lenad revelou que cerca de 1,5 milhão de adolescentes e adultos usam maconha diariamente no Brasil. Já em setembro do mesmo ano, pesquisadores constataram que o país era o segundo consumidor mundial de cocaína e deri-vados, atrás apenas dos Estados Unidos. Mais de seis milhões de brasileiros já experimentaram cocaína ou derivados ao longo da vida. Desse montante, dois milhões fumaram crack, óxi ou merla alguma vez.

Já no ano de 2013, o segundo estudo realizado pela instituição apontou um au-mento de 20% na quantidade de pessoas que consomem álcool frequentemente. A pesquisa informou que 54% dos entrevistados alegaram consumir bebidas alcoólicas uma vez na semana ou mais – aumento proporcional de 20% em comparação ao Lenad de 2006. O crescimento foi maior entre as mulheres: 39% das entrevistadas admitiam beber uma vez por semana ou mais (seis anos atrás este índice era de 29%). Outro dado importante mostrou que 27% dos homens que bebem com menos de 30 anos já se envolveram em brigas com agressão.

O Levantamento Nacional de Famílias dos De-pendentes Químicos (Lenad Família), realizado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e divulgado em 3 de dezembro, revelou um dado preocupante: 28 milhões de pessoas no Brasil têm algum parente em tratamento contra a dependência química. A pesquisa teve como objetivo mapear quem são os usuários que estão em reabilitação e qual o perfil de suas famílias, além de registrar como elas são impactadas ao ter um ou mais parentes usuários de drogas.

De acordo com o pesquisador Ronaldo Laranjeira, um dos coordenadores do estudo, “o conhecimento destas informações é de fundamental importância para o planejamento de tratamentos mais amplos e eficientes e de políticas de saúde pública com foco no amparo desta população”. O documento aponta que as mulheres (66%) são responsáveis pelo tratamento do dependente de álcool e/ou de substâncias ilícitas, além de serem a maioria das entrevistadas (80%). Elas ainda sofrem fortes impactos negativos e “têm uma sobrecarga de cuidar do filho dependente e serem responsáveis pelos cuidados da família”.

A maioria dos pacientes em tratamento tinha entre 12 e 82 anos, com média de idade de 32 anos. Entre as substâncias utilizadas regularmente pelos pacientes, o Lenad levantou que a maioria fazia uso de mais de uma droga ao mesmo tempo, sendo mais da metade consumidores de maconha (68%), álcool (62%), cocaína (60,7%) e crack (42%). Entre os familiares que relataram ter conhecimento que o paciente con-sumia droga, a pesquisa aponta que quase todos já a utilizavam por um tempo médio de nove anos e que a recusa por parte do dependente era o principal motivo na demora em iniciar o tratamento. Somente 30% dos familiares procuraram ajuda assim que souberam sobre o uso de substâncias pelo paciente. Dos pacientes, quase um terço tinha ensino superior incompleto ou completo.

Yussif Ali mere Jr.

mário Sérgio Sobrinho

Em maio de 2013, o governo paulista informou manter 1.024 leitos especializa-dos e que a meta era contar com mais de 1,3 mil leitos este ano. O investimento total previsto era de R$ 250 milhões. Além disso, a Secretaria de Estado da Saúde prometeu implantar, ainda em 2014, um grande centro de saúde para de-pendentes químicos na Rua Helvétia, no bairro de Santa Cecília, região central de São Paulo, com emergência psiquiátrica e leitos de enfermaria para os casos mais agudos de crises e intoxicação.

Apesar das ações anunciadas, já postas em prática, o problema do crack recru-desce em São Paulo, especialmente na capital. Em novembro último, os usuá-rios que até então viviam em prédios abandonados e que foram demolidos na região das ruas Dino Bueno, Barão de Piracicaba, Helvétia e Duque de Caxias, ergueram barracos nas calçadas. O local passou a ser conhecido como “Favela do Crack” e tornou-se a nova cracolândia.

Pressionada por moradores que sentiram a falta de liberdade e a presença do cra-ck bater em suas portas, a administração municipal deu início, na primeira quin-zena de janeiro, à operação Braços Abertos. A ação consiste em ofertar moradia, alimentação e emprego a 400 dependentes químicos, moradores de rua. Sem a presença da polícia, cerca de 300 pessoas que viviam na favela surgida ali há 90 dias começaram a se cadastrar no programa e a desmontar os próprios barracos.

A ação, estruturada pelas secretarias municipais da Saúde, Assistência Social, Trabalho e Segurança Urbana, consistiu em alojar os dependentes químicos e seus familiares que ali moravam em quartos de cinco hotéis reformados pela pre-feitura. Os usuários de drogas têm de trabalhar uniformizados 4 horas diárias na limpeza pública e também na zeladoria de parques públicos, e passar por mais duas horas de capacitação profissional. Em troca, além do alojamento recebem três refeições diárias, oferecidas no Bom Prato da região, e uma remuneração por dia de trabalho de R$ 15, paga semanalmente, através de um cartão. No total, os usuários receberão R$ 450 por mês. O pagamento pode ser sacado toda sexta--feira com o cartão. Se faltarem ao trabalho, R$ 15 são descontados por dia de au-sência. Mas se um dia o dependente não for trabalhar porque não teve condições, por causa da droga, mas for procurar ajuda na rede de saúde, segundo a secretária de Assistência Social, Luciana Temer, ele vai receber o salário normalmente.

E é na questão da saúde que está a polêmica do programa, pois pouca coisa deve mudar em relação ao que já vem sendo feito. O alvo das críticas está exatamente aí, já que os dependentes não serão obrigados a fazer tratamento médico, mas o que quiserem vão ser encaminhados. “O tratamento é para que essa pessoa reconstrua sua vida e possa ver que ainda pode ser feliz. Que possa buscar no trabalho a reestruturação dos amigos, da família e da saúde. Acho importante para isso buscar o seu bem-estar integral”, afirma o secretário municipal da Saúde, José de Filippi Junior.

Os programas de tratamento, em parceria com o governo do Estado, vão conti-nuar. O que foi feito, segundo o secretário, foi o aumento na quantidade de leitos

maTéria DE CaPa

Há um ano, o governo do Estado de São Paulo lançou o famigerado Plantão Judiciário ao lado do Cratod (Centro de Referência de Álcool, Tabaco e outras Drogas), no centro da capital paulista. A ideia era promover a internação, mesmo que compulsó-ria, de dependentes sobretudo de crack. O anúncio da medida gerou enorme polêmica, já que envolvia Ministério Público, Tribunal de Justiça e Ordem dos Advogados do Brasil. A impressão inicial era de que juízes, de canetas em punho, estavam prontos para mandar internar quem estivesse sob iminente risco de vida. A desconfiança da sociedade com a iniciati-va se justificava por conta da truculenta ação da Po-lícia Militar, meses antes, na tentativa de dispersar usuários da região da cracolândia. A controvérsia em torno da internação “forçada”, no entanto, logo se dissolveu, dando lugar a um fenômeno: filas de espera, de pessoas que buscavam desesperadamente por ajuda. Em especial de familiares de dependen-tes químicos, clamando por vagas. A parceria aca-bou não internando ninguém deliberadamente. Mas também não se tornou efetiva como se esperava.

“O que houve foram poucas internações voluntárias e inúmeras involuntárias, feitas a partir da solici-tação de um familiar do dependente para que esse fosse internado e tratado, depois de o pedido feito por escrito e aceito pelo médico psiquiatra. Foram dias de filas e até hoje ainda temos um atendimento intenso no Cratod”, explica o desembargador que coordena o Plantão Judiciário desde o início de sua implantação, Antonio Carlos Malheiros.

O plantão no Cratod faz parte do programa Reco-meço do governo do Estado, que prevê inicialmente um trabalho de abordagem social. A ação consiste na abordagem do dependente de drogas, principalmen-te o crack, no resgate e oferecimento de proteção e acompanhamento multiprofissional.

maTéria DE CaPa

A interferência do Judiciário neste trabalho, segundo Malheiros, tem sido muito importante para que se consiga o tratamento adequado ao dependente químico. “Não se tem outra maneira de se conseguir a vaga para o tratamento ideal e es-pecífico do dependente sem a intervenção do Judiciário. Então continuamos lá, agora com um juiz, de segunda a sexta-feira, das 9h às 13h, para ajudar a equipe de profissionais do Cratod e o Ministério Público a garantir o atendimento ao usuário de drogas, principalmente de crack, que na maioria das vezes já se en-contra em um estado deplorável”.

Segundo dados divulgados pela secretária estadual de Justiça e Defesa da Ci-dadania de São Paulo, Eloisa de Sousa Arruda, no jornal Folha de S. Paulo, no início de janeiro, no primeiro ano do Plantão Judiciário houve apenas dois casos de internação compulsória. Ao todo, foram 26.988 encaminhamentos, sendo que 13.586 pessoas foram atendidas diretamente pelo Cratod. Para o coordena-dor de Políticas sobre Drogas, da Secretaria da Justiça, Mário Sérgio Sobrinho, o objetivo do programa vem sendo alcançado de maneira satisfatória. “O servi-ço gratuito, sem burocracia, aproxima a população da Justiça e permite ao pro-fissional dessa área compreender melhor como a dependência química atinge o usuário e, normalmente, desestrutura sua família“. Para ele, no entanto, ainda há muito a ser feito. “A manutenção das ações de prevenção e ampliação do tratamento, com olhar voltado à reinserção social do dependente químico, são as melhores opções para atender ao grave problema da dependência do álcool e de outras drogas no Brasil.”

O governo paulista também pretende levar o programa Recomeço para o litoral e algumas cidades do interior, como Campinas, Mogi das Cruzes e Santos, ini-cialmente, e, depois, para todo o Estado. Em maio passado deu mais um passo e lançou o Cartão Recomeço, considerada uma iniciativa para assegurar a opor-tunidade de efetiva recuperação dos dependentes por meio de financiamento de uma etapa crucial do tratamento. Após a fase de estabilização, os pacientes são supervisionados em comunidades terapêuticas credenciadas pelo governo ou em moradias assistidas. O crédito para o tratamento é de R$ 1.350 mensais, depositado diretamente ao serviço contratado. O valor não é entregue ao depen-dente ou a seu familiar. A assessoria de Comunicação do governo do Estado não informou quantos dependentes já foram atendimentos ou estão em tratamento por intermédio do Cartão Recomeço. No entanto, desde o início do programa, o governo esbarra no problema de leitos para a internação para o tratamento de dependentes, seja em clínicas próprias ou em serviços contratados, custea-dos integralmente pelo tesouro estadual. Para o presidente da FEHOESP e do SINDHOSP, Yussif Ali Mere Jr, o problema da falta de vagas se agravou nos úl-timos anos, e pode por em risco qualquer programa de reabilitação de usuários. “O fechamento de leitos psiquiátricos compromete a assistência. É inegável que, em algum momento, um usuário vai precisar de tratamento especializado, e de internação. E as parcerias do governo do Estado para pactuar leitos com a iniciativa privada só nos ajuda a reforçar a tese de que faltam leitos, sim”.

de internação na rede de 18 hospitais já existentes na cidade, e o comprometimento do governador de vagas nas casas de transição e nas comunidades te-rapêuticas, além de vagas hospitalares nos casos de internação em hospitais estaduais ou através de con-vênio firmado pelo Estado com instituições privadas.

A assessoria de Comunicação foi contundente ao afir-mar que o objetivo da operação Braços Abertos não é acabar com o vício dos dependentes químicos e, que ao longo do programa, não será exigido deles nada neste sentido. “O trabalho se desenvolverá sob uma ótica de redução de danos”, segundo comunicado.

Uma entidade privada escolhida pela prefeitura está acompanhando a operação, a ONG União Social Brasil Gigante, que vai manter um agente monito-rando cada grupo de 20 atendidos pelo programa. “Se for observado que a pessoa não tem interesse em participar, ela terá de sair do hotel”, explica Luciana.

Para o desembargador Antonio Malheiros, a iniciati-va da prefeitura é “um gol de placa” e vai estimular as internações voluntárias para o tratamento, além da diminuição do consumo de drogas, principal-mente na região central da cidade de São Paulo. “A pessoa que começa a ser tratada como gente, limpa, com trabalho, com dinheiro e com comida saudável se sente mais digna. Esses dependentes do crack, que passavam dias sem comer e vão ter três refei-ções por dia, vão querer mudar de vida”, aposta.

Mas ele ressalta que outras ações precisam ser fei-tas em conjunto para um efeito mais eficaz. “Prefei-tura, Estado e governo federal precisam agir juntos. Tem que ter a atuação nas áreas de fronteira do país e divisa dos Estados para combater o tráfico de dro-gas; fazer a aproximação com as famílias desses de-pendentes para que os apoiem e ajudem a cuidar; e proporcionar o tratamento de inúmeras doenças que eles, em sua maioria, portam, como tuberculose, sífilis, hepatite e aids. Não é tarefa fácil. Mas esta operação que está sendo feita em São Paulo mostra que existem caminhos.”

Dezesseis de janeiro foi o primeiro dia de trabalho para cerca de 80 dependentes químicos na capital paulista. Eles foram escolhidos, segundo a prefeitu-ra, por apresentarem melhores condições de saúde e manifestarem vontade imediata de atuar na var-

rição das ruas do centro da cidade. No entanto, na hora do almoço, repórteres de veículos de

comunicação que acompanhavam a operação flagraram uma dependente comprando droga e outros consumindo. “Por isso digo que não basta dar emprego, comida, moradia. Isso tudo vai ter que culminar em um tratamen-to, mesmo que a médio e longo prazos, e a

prefeitura e o Estado precisam estar prepara-dos para fazer os tratamentos em regime aber-

to e fechado, se for necessário”, diz Malheiros.

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o caminho

da conciliação Experiências de ontem e hoje revelam

novos rumos possíveis no combate ao crack

José Pepe mujica, presidente do uruguai

DEbaTE

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O debate é antigo, mas reacendeu sua chama nos últimos meses, quando o Uruguai se tornou o pri-meiro país a legalizar o consumo e o cultivo de maconha em seu território. Ao mesmo tempo, o estado do Colorado, nos Estados Unidos, finalmente anunciou a liberação da venda para recreação. A medida fora votada em plebiscito em 2012 por seus eleitores, e colocada em prática em janeiro último. O próximo da lista será Washington, que já aprovou a venda recreativa no papel. Em outros 21 estados norte-americanos, o uso medicinal da droga é legal, embora bastante restritivo.

O presidente do Uruguai, José Pepe Mujica, assi-nou a lei de legalização tendo como objetivo tirar o poder do narcotráfico e reduzir a dependência dos uruguaios de drogas mais pesadas. Pelo documento, os uruguaios ou residentes, sendo maiores de 18 anos e registrados como consumidores para uso recreativo ou medicinal da maconha, poderão comprar a erva em farmácias autorizadas. Também poderão cultivá--la, seguindo limites estabelecidos. Na concepção de Mujica, a maconha foi regulada, e não legalizada.

Embora festejada por usuários, a medida causou descontentamento. A Junta Internacional de Fisca-lização de Entorpecentes, órgão das Nações Unidas responsável por supervisionar o cumprimento de convenções sobre drogas, divulgou comunicado oficial afirmando que o Uruguai, como signatário da Convenção Única de 1961, viola o tratado. A conven-ção determina que os países se limitem a permitir que a maconha seja usada apenas para fins terapêuticos e medicinais. No entanto, países como Noruega, Suíça, Equador e México – cujo ex-presidente Vicent Fox é entusiasta da liberação – já mostraram insatisfação com o texto de 1961, em crítica aos resultados da guerra às drogas e de sua proibição.

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, também demonstrou temor em relação às políticas de repressão, e declarou, ao New Yorker, no início deste ano: “Como todo mundo sabe, fumei maconha quando garoto e acho que se trata de um hábito ruim, um vício que não é muito diferente dos cigarros [de tabaco] que fumei durante boa parte de minha vida adulta. Mas não acho que seja mais perigoso que álcool". O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que hoje é um defensor da liberação da erva, também afirmou que “o Brasil deve apoiar a busca de modelos de regulação legal porque acredita-se na redução do poder do crime organizado e ajuda na proteção da saúde e segurança das pessoas". Ele ainda reconhece o fracasso das políticas de proibicionismo, citando-as como um "desperdício de recursos públicos inestimáveis".

Na França, o medicamento Sativex – derivado da maconha – acaba de ser autori-zado pela Agência Nacional de Segurança do país, o primeiro do gênero a receber aval para venda. Desenvolvida no Reino Unido, a droga era comercializada até então em seu país de origem, e na Alemanha.

A utilização do princípio ativo da maconha, o THC, de maneira terapêutica ou medicinal, não é novidade. Um dos primeiros arti-gos a abordar o tema, “Marihuana”, foi publicado em 1969, na revista Scientific American, pelo psiquiatra Lester Grinspoon. Ele também escreveu “Marihuana Reconside-red”, de 1971, e “Marihuana: The Forbidden Medicine”, de 1993. Grinspoon afirma que a canna-bis é o remédio menos tóxico já registrado na literatura médica com potencial terapêutico para uma infinidade de doenças. “Ela será a penicilina de nosso tempo”, afirmou, em entrevista à Folha.

A Organização Mundial da Saúde (OMS), no entanto, divulgou comuni-cado reconhecendo que a maconha pode

DEbaTE

ajudar no tratamento da náusea em pacientes de câncer e aids, mas ressalvando que outras aplicações da erva ainda precisam ser respaldadas por pesquisas. Com relação a efeitos colaterais, a OMS diz que a droga eleva o risco de dano cognitivo de longo prazo, doenças respiratórias e esquizofrenia.

Segundo Thiago Marques Fidalgo, psiquiatra que coordena o Programa de Orien-tação e Atendimento a Dependentes (Proad) da Unifesp, estudos comprovam que fumar maconha antes dos 15 anos de idade diminui o QI, mas que, após os 20 anos, a maconha não traz problemas cognitivos. "Essa diferença tem a ver com a maturação do cérebro, porque na adolescência ele ainda está terminando de se formar. Entre os 15 e os 20 anos é uma faixa nebulosa, onde não foi possível comprovar qual o impacto. Ainda assim, consideramos uma idade de risco", explicou, em entrevista ao UOL.

Para Fidalgo, apesar de a maconha não ter grande incidência de dependência, ela tem potencial para viciar seus usuários. Estima-se que 10% dos que experimentam a droga se tornam dependentes dela. "Em geral, quem começa mais cedo tem mais risco de se tornar dependente, assim como de desenvolver quadros psicóticos, de alucinações e delírios".

De acordo com o World Drug Report 2013, relatório idealizado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, a expansão dos problemas associados com novas substâncias psicoativas aumenta a possibilidade de impactos mortais. Citando o Brasil, uma blitz realizada com aproximadamente 3.500 motoristas descobriu que 4,6% deles atestaram positivo para alguma substância ilícita. Entre os resultados positivos, 39% relataram uso de cocaína, 32% de maconha, 16% de anfetaminas e 14% para benzodiazepinas. Em outro estudo no Brasil, testes de drogas realizados em pacientes que deram entrada em prontos socorros após acidentes de trânsito mostram que, em sua maioria, eles estavam sob maior efeito de maconha do que de alguma bebida alcoólica. O relatório apontou também que grande parte dos países da América Latina e do Caribe tem registrado uma elevação em apreensões de cannabis nos últimos anos. Entre eles, o Brasil, que apreendeu 155 toneladas da erva em 2010 e 174 toneladas em 2011, o terceiro aumento consecutivo.

No Brasil, a maconha é proibida em todos os sentidos, inclusive para uso medi-cinal. A realidade do consumo, no entanto, revela como é fácil conseguir a droga.

Cerca de 1,5 milhão de adolescentes e adultos bra-sileiros usa maconha diariamente, segundo o último Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), da Unifesp. Ainda segundo o estudo, mais de três milhões de adultos - entre 18 e 59 anos - fumaram maconha em 2011 e cerca de oito milhões de pessoas já experimentaram a droga alguma vez. Apesar disso, a maioria das pessoas é contra a legalização: 75%, enquanto que apenas 11% apoia a causa.

Em julho de 2013, foi a vez de o Brasil receber um projeto de lei que propõe a legalização do consumo. Idealizado por consultores jurídicos do Growroom Brasil, grupo ativista pela legalização da droga, o projeto tem como proposta a regulamentação do cultivo, comercialização e consumo de maconha e seus derivados em todo o país, retirando a erva da lista de substâncias controladas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pro-pondo a criação da Agência Brasileira da Canna-bis, entidade que seja responsável pela garantia dos direitos dos cultivadores e usuários, além de financiar pesquisas e estudos sobre o uso medicinal e industrial da maconha, e promover a integração entre as políticas de prevenção do uso abusivo e inadequado da erva.

Para os defensores da liberação da maconha, reprimir não é o melhor caminho. O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, defendeu a discussão sobre a descriminalização da maconha e afirmou que a droga não transforma os usuários em pessoas antissociais. Segundo ele, “os processos que chegam ao STF sobre tráfico de drogas envolvem, com regularidade, pessoas pobres e flagradas com pequenas quantidades de maconha”. Em entrevista ao jornal Zero Hora, a jornalista e ex-candidata a prefei-ta da cidade de São Paulo, Soninha Francine, afirmou que o conservadorismo é o maior problema do país. Ela comparou a maconha à adoção do divórcio, em 1977. “Aprová-lo seria inimaginável. Mas aconteceu e, hoje, ninguém se recorda da polêmica. Pode haver danos à saúde, nós sabemos, mas também há para cigarros e bebidas alcoólicas. Daí a necessidade de se enquadrar a maconha em uma série de obrigações, com restrições de venda para menores, consumo e publicidade”, disse.

Por outro lado, a legalização da maconha seria capaz de impulsionar ainda mais o consumo de outros en-torpecentes no Brasil, fortalecendo o tráfico e impac-tando a saúde pública, principalmente entre jovens e adolescentes. Para o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas na Faculdade de Medicina da Unifesp, “ao traçar um paralelo com a experiência uruguaia, pode-ríamos nos aventurar com a próxima geração. Seria uma espécie de experimento social sem a assinatura de termo de consentimento, como se a população se tornasse cobaia de um mercado estatal”.

a onda

verdeDiversas nações repensam a proibição da maconha. Liberar é o caminho?

estava internado num hospital público na capital do Maranhão, foi devolvido para Pedrinhas e ocupa uma cela próxima a um espaço onde houve decapitação de presos. Apenas 38% da população carcerária brasileira recebe atendimento primário financiado pela União. O atendimento em saúde mental é ainda mais baixo, pela ausência de psiquiatras nas equipes.

A partir da publicação da portaria, estão previstos R$ 10 milhões ao financiamento das equipes nos estados. Cada equipe de profissionais poderá contar com R$ 66 mil mensais para financiar o psiquiatra, o psicó-logo, o enfermeiro, o assistente social e o terapeuta ocupacional (ou um educador ou sociólogo). A gestão caberá às Secretarias Estaduais de Saúde ou mesmo aos municípios interessados, que preci-sam aderir ao serviço e apresentar uma proposta ao Ministério da Saúde.

(Fonte: O Globo)

vera cruz de Sorocaba recebe crédito de r$ 4,5 milhõeS

A Prefeitura de Sorocaba encerrou 2013 com a libera-ção de recursos para custear despesas gerais referentes ao mês de dezembro do Hospital Psiquiátrico Vera Cruz. Conforme o decreto nº 20.923, o prefeito Anto-nio Carlos Pannunzio autoriza a suplementação de um crédito no valor de R$ 4.550.723,00 para a quitação de despesas restantes daquele hospital. De acordo com a Secretaria Municipal de Governo e Segurança Comunitária, esse valor suplementar é para assegurar o pagamento das verbas rescisórias dos profissionais que trabalham no Hospital Vera Cruz, conforme Ter-mo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado entre o município e o Ministério Público do Trabalho. Em pouco mais de um ano, desde que o governo municipal assumiu toda a gestão do hospital, já foram gastos R$ 6.650.723,00. Uma decisão judicial liminar proferida nos autos de uma ação civil pública obrigou a Prefei-tura a assumir toda a gestão do Vera Cruz.

De acordo com o secretário de Governo e Segu-rança Comunitária, João Leandro da Costa Filho,

o Instituto Moriah também já iniciou suas atividades no hospital e trabalha, segundo ele, na contratação de profissionais da área da saúde que atuarão na instituição. Desde janeiro de 2013, a prefeitura é a gestora do hospital, mas, no segundo semestre do ano passado, abriu edital para contratar uma Orga-nização Social (OS) para ser a responsável pela gestão do Vera Cruz por um período de dois anos, já que a administração não teria como suportar a gestão sozinha. O Instituto Moriah foi a única OS a atender às condições para assumir o estabelecimento.

O contrato firmado com a OS prevê também a implantação e gerenciamento de 12 residências terapêuticas e do Centro de Atenção Psicossocial (Caps-III). A Prefeitura de Sorocaba gastará pouco mais de R$ 2 milhões por mês com a gestão. O Hospital Psiquiátrico Vera Cruz de Sorocaba abriga atualmente 333 pacientes do sexo masculino. De acordo com a Secretaria da Saúde, o custo médio mensal do hospital está em torno de R$ 800 mil. Deste total, 48,7% são cobertos pela fatura do SUS, e os restantes 51,3% cobertos pela prefeitura. A intervenção municipal foi determinada pela Justiça a partir de um pedido feito por um grupo de promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Estado de São Paulo.

(Fonte: Cruzeiro do Sul – Sorocaba)

DEU na imPrEnSa

O Ministério da Saúde anunciou em janeiro, por meio da Portaria 94, a criação de um serviço especializado, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), para atender presos com transtornos mentais, detidos ile-galmente em presídios, cadeias públicas e hospitais de custódia. Uma portaria assinada pelo ministro da Saú-de, Alexandre Padilha, e publicada no Diário Oficial, instituiu o serviço, que prevê a criação nos estados de um grupo formado por médico psiquiatra, psicólogo, enfermeiro, assistente social e terapeuta ocupacional para avaliar a situação dos detentos com transtornos.

A avaliação dos chamados incidentes de insanidade mental passa a ser tratada em caráter de “urgência” e não pode exceder a 30 dias. É uma forma de encurtar uma longa fila de espera nos presídios e hospitais de custódia e evitar o cárcere ilegal. A medida pretende diminuir a quantidade de brasileiros que, mesmo com absolvição da Justiça, continuam detidos em presí-dios em razão dos transtornos mentais. Eles cumprem medidas de segurança aplicadas pelos juízes. Essas medidas pressupõem atendimento psiquiátrico e internações, se for o caso, em instituições de saúde. No último relatório do Conselho Nacional de Justi-ça (CNJ) que denunciou a realidade do presídio de Pedrinha (MA), de dezembro de 2013, a situação de presos com transtornos mentais foi mencionada como fator de preocupação. Um grupo de 14 detentos, que

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SuS cria Serviço para preSoS com tranStornoS mentaiS