concurso de literatura cataratas conto

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Íris Pseudônimo: Álvaro de Campos Queria ver o mundo por outros olhos. Suas pupilas cansadas, suas íris desgastadas já não enxergavam o brilho e já não brilhavam também. Os dias passavam arrastados. A moça a seu lado carregava o frenesi do tempo. Tudo era muito rápido, nada a entediava. Recorda de quando escreveu para ela e enviou um poemeto por mensagem de texto. Como foi difícil teclar as teclas inexistentes e funcionais do smartphone: Querência por seus olhos Desejando ver o mundo por eles Por seus filtros Que cores refletem? Quando brilham? Por quem abrem? Por quem se fecham? E transbordar? Transbordam? Mais de alegrias, mais de tristezas? Mas,.... Quero ver o mundo pela refração de seus olhos 1

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risPseudnimo: lvaro de CamposQueria ver o mundo por outros olhos. Suas pupilas cansadas, suas ris desgastadas j no enxergavam o brilho e j no brilhavam tambm. Os dias passavam arrastados. A moa a seu lado carregava o frenesi do tempo. Tudo era muito rpido, nada a entediava. Recorda de quando escreveu para ela e enviou um poemeto por mensagem de texto. Como foi difcil teclar as teclas inexistentes e funcionais do smartphone:Querncia por seus olhosDesejando ver o mundo por elesPor seus filtrosQue cores refletem?Quando brilham?Por quem abrem?Por quem se fecham?E transbordar?Transbordam?Mais de alegrias, mais de tristezas?Mas,....Quero ver o mundo pela refrao de seus olhosQueria que visse a siCom meu olharE que o desejo tomasse conta Do seu corpo pelo seu prprio corpo.No, no era cego. Enxergava. Bem para sua idade. Tambm no era velho. Sua viso j estava cansada dos mesmos assombros de sempre. Queria o choque, queria o vislumbramento. E pensava no trgico dia histrico em que europeus avistaram os indgenas. Era aquilo que buscava. Aquele ver sem enxergar. Sim. Queria vislumbrar-se. Dizem que os indgenas no enxergavam as caravelas. Era algo que no fazia parte nem de seus sonhos. Acho que s vemos o que temos palavras para descrever. E assim ele se lembra da primeira vez que viu... ah! Foi como os europeus. Tal como est na carta de Caminha. Vergonhas raspadinhas, pequeninas, sem pudor. A primeira vez que viu uma mulher nua e ficou maravilhado. Depois de tantas (ainda que no tenham sido muitas), tudo ficou comum. E ainda assim, por una cabeza... Faria tudo para sentir aquele frio na barriga, de uma nova conquista. Sabia que no duraria. Ele s as mantinha pelo raciocnio, pelas lembranas, pela cultura e por um sexo regado a horas interminveis de dico. Jamais imaginou que os livros que lera o iriam compensar em algo to prazeroso e carnal. Esta nova era assim... linda. Todas eram lindas. No sabia o que tinha. Talvez, o olhar de cachorro magro. No como aqueles que olham para o frango assado no aougue. No era o olhar dos que tinham fome. Fome era para os jovenzinhos. Era um olhar de desdm. No desdenhava as mulheres que admirava. Desdenhava a vida. Aquela tristeza profunda, interior e sincera, revelava (talvez de forma falsa e inconscientemente mentirosa) uma profundidade de alma. Trocaria, ainda assim, aquela tristeza aguda pela fome adolescente? Talvez, no. Mas, buscava outros olhos. Mas, aqueles verdes, agrestes e selvagens. Aqueles carregados de vio e de viscosidades. Aqueles que, de incio, o olhavam com desejo... Agora, j o olhavam com ternura. Amanh... Ah! O que ser amanh? Talvez, iriam observ-lo por uma ltima vez, pela soleira da porta e sem dizer adeus, partindo.

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