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Computaçao Vestível
Glauber De Bona
Monografia apresentadano
Instituto de Matemática e Estatísticada
Universidade de São Paulocomo
projeto da disciplinade
Computaçao Móvel
Professor: Prof. Dr. Alfredo Goldman vel Lejbman
São Paulo, junho de 2013
Resumo
Este trabalho trata da computação vestível, inciando pela investigação do próprio conceito de
computador vestível. Estudamos o desenvolvimento da história de tal tecnologia, exempli�cando
com os principais marcos. Avaliamos o tamanho do mercado atual e sua tendência de crescimento,
apresentando produtos comercializados e pesquisas acadêmicas contemporâneas relacionadas. Os
principais problemas que podem desacelerar o desenvolvimento de computadores vestíveis são apon-
tados juntamente com alternativas para sua solução.
Palavras-chave: wearable computing, computaçao vestível.
i
Sumário
Lista de Figuras v
1 Introdução 1
1.1 Objetivos do Trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.2 Organização do Texto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
2 Computação Vestível? 3
2.1 Tentativa Ingênuas de De�nir . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
2.2 Propriedades Desejáveis de um Computador Vestível . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
2.3 O Computador Vestível na Prática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
3 Histórico 7
3.1 Computação Vestível Antes do Computador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
3.2 1960 a 1980: Computadores e Roletas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
3.3 1980: Computadores sobre a Cabeça . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
3.4 1990: MIT, Empresas e Conferência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
3.5 Início dos Anos 2000 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
4 Computação Vestível Atualmente 13
4.1 O Mercado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
4.2 Exemplos de Produtos Comercializados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
4.2.1 Computadores Programáveis Vestíveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
4.2.2 Relógios Inteligentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
4.2.3 Roupas Inteligentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
4.2.4 Sensores e Acessórios Vestíveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
4.3 Google Glass . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
4.4 Pesquisas Relacionadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
4.5 Problemas e Possíveis Soluções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
5 Conclusões 23
Referências Bibliográ�cas 25
iii
Lista de Figuras
3.1 Anel com ábaco completamente funcional. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
3.2 Primeiro computador digital que se veste. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
3.3 Steve Mann e seu computador vestível em 1981. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
3.4 Starner vestindo o seu sistema Lizzy. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
3.5 Computador de pulso de Edgar Matias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
3.6 WearArm. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
3.7 Tinmith: realidade aumentada manipulada com a mãos. . . . . . . . . . . . . . . . . 12
4.1 Divisão geográ�ca do mercado de dispositivos vestíveis em 2014. Fonte: Jupiter Re-
search. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
4.2 Tendência de crescimento do mercado de dispositivos vestíveis, em milhões de unidades. 14
4.3 Zypad WR 11xx, da Eurotech. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
4.4 SmartWatch da Sony. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
4.5 TshirtOS e seu esquema de funcionamento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
4.6 Jaqueta Mp3Blue reprodutora de música. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
4.7 Headset com bluetooth Plantronics M50. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
4.8 Pulseira Nike+ Fuelband. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
4.9 Google Glass sendo usado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
4.10 Estimativa de vendas de Google Glasses, em milhares. Fonte: IHS IMS Research,
Abril de 2013. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
4.11 Prasnav Mistry usando o sistema SixthSense. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
4.12 SixthSense projetando sobre a foto de um jornal um vídeo relacionado a notícia em
questão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
v
Capítulo 1
Introdução
A recente história do uso do computador por parte de nossa espécie mostra evidências de que
tal dispositivo deve nos acompanhar por muito tempo. Ao desenvolver-se algo que computa, nos
perguntamos se o próprio pensamento não seria um tipo de computação, da onde surgem as teorias
computacionais da mente. Se a mente é de alguma maneira um processo computacional, seria absolu-
tamente natural sua integração, a �m de melhoria, com computadores digitais. Independentemente
de tal questão �losó�ca sobre a ontologia da mente, é fato que a computação pode oferecer-lhe me-
mória e processamento, o que já acontece em nossa rotina, quando usamos calculadoras, planilhas
e bancos de dados digitais, por exemplo.
A utilidade dos computadores digitais faz com que queiramos tê-los sempre rapidamente aces-
síveis. Não só queremos estar sempre acompanhados deles, o que a computação móvel já supre
com seus tablets e telefones celulares, como também nos interessa que as funcionalidades sejam
oferecidas com o menor esforço. Claro que, quanto mais integrada for a mente à máquina, menor
o tempo para sua comunicação. Quer-se eliminar a burocracia de pegar e ligar (ou desbloquear) o
smartphone, e depois passar por várias telas até conseguir fazer o que se quer. Mais ainda, deseja-se
que o computador preveja que funcionalidade ou que informção possa interessar ao usuário em uma
dado contexto.
A computação vestível, literalmente interassada em computadores que se vestem, está preocu-
pada em resolver os problemas supracitados. Apenas usar o computador como roupa ou acessório
pode diminuir o tempo de acesso e deixar nossas mãos livres, mas os objetivos desse ramo vão
muito além e buscam a integração completa da mente com a máquina. Desta forma, o conteúdo
oferecido pelo computador poderia ser acessado naturalmente, como nossas próprias memórias, e
veríamos as funcionalidades digitais como extensão de nossas próprias faculdades mentais. Claro
que estamos distantes de tais metas, mas os computadores vestíveis são provavelmente apenas uma
etapa, embora necessária, nesse caminho para a construção de uma inteligência aumentada, quando
os computadores serão parte de nós.
No percorrer de seu longo caminho, vimos a computação vestível pesquisar sistemas monta-
dos sobre a cabeça do usuário, projetando informação permanentemente no seu campo de visão,
acompanhados pela miniaturização dos componentes e o impulsionados pelo desenvolvimento da
computação móvel. Embora esteja ainda na sua infância, a computação vestível já mostra sinais
de rápida evolução na direção de seus objetivos. Num sentido mais amplo, os computadores vestí-
veis podem ser simples computadores que vestimos, e nesse sentido também há uma explosão na
variabilidade das aplicações.
1
2 INTRODUÇÃO 1.2
1.1 Objetivos do Trabalho
O presente trabalho tem por objetivo fazer um panorama da computação vestível, acompa-
nhando sua evolução. Quer-se entender o que é a�nal um computador vestível, o que se tem feito
na área e o que se espera para o futuro próximo. Para entender o estado atual das coisas, precisa-
mos passar pela história, e para melhor avaliar as perspectivas futuras, é necessário um exame dos
desa�os e problemas enfrentados na área.
1.2 Organização do Texto
Começamos a empreitada com uma análise do próprio signi�cado do termo computador vestível
no Capítulo 2. Feito isso, passamos pela história de tais dispositivos, principalmente nas útimas
décadas, no Capítulo 3. Então no Capítulo 4 avaliamos os desenvolvimentos contemporâneos na
área e seus possíveis entraves. Finalmente, as impressões deixadas pela computação vestível são
sintetizadas no Capítulo 5.
Capítulo 2
Computação Vestível?
Em um sentido amplo, poderíamos dizer que a computação vestível é o estudo, projeto ou
construção de dispositivos computacionais carregados pelo corpo, ou vestidos (Mann, 2013). De
certa maneira, tal de�nição engloba telefones celulares e até pequenos computadores portáteis, o
que pode ser não desejável. Outros autores exigem que computadores vestíveis sejam mais que
portáteis, mas o próprio termo portátil deriva do francês porter, que signi�ca vestir � o que não
colabora com a clareza da de�nição. Tendo em vista tamanha vagueza na básica delimitação do
escopo deste trabalho, este capítulo é dedicado ao esclarescimento do que pode se entender por
computação vestível, ou por computador vestível (wearable computer, em inglês), listando algumas
de suas características.
2.1 Tentativa Ingênuas de De�nir
Se admitirmos como escopo da computação vestível qualquer dispositivo portátil que computa,
somos obrigados a aceitá-la como superclasse de toda computação móvel, por exemplo. Além disso,
um relógio analógico de bolso, que computa o tempo tipicamente, também seria objeto de estudo
da área em questão, o que certamanente não é nosso foco.
Por outro lado, alguém pode trazer à tona a diferença entre portátil e vestível, o primeiro sendo
carregável ou móvel, de alguma maneira, e o segundo sendo um acessório, roupa, ou parte destes.
Com tal re�namento, eliminaríamos o relógio de bolso, mas continuaríamos com o relógio de pulso.
Adicionalmente, se um telefone celular é carregado preso a um colar, como um acessório, e não no
bolso, também ainda estaríamos na computação vestível, mas ainda não é o que queremos dizer.
Claro que um computador vestível deve ser algo que realiza alguma computação ao mesmo tempo
que é usado como uma roupa, mas o que frequentemente se espera de um computador vestível inclui
propriedades realcionadas ao seu uso e interface, como descrevemos na próxima seção.
2.2 Propriedades Desejáveis de um Computador Vestível
Embora esteja longe de um consenso a de�nição que procuramos, muitos autores concordam
com as propriedades que os computadores vestíveis devem ter. Esta seção é baseada principalmente
em (Starner, 2001a), (Amft e Lukowicz, 2009) e (Mann, 2013). A primeira é a portabilidade/mo-
bilidade, já que um computador vestível deve ser um computador móvel, acompanhando o usuário
onde este for. Até aqui pode se aceitar o telefone celular como um computador vestível. Se exige-se
3
4 COMPUTAÇÃO VESTÍVEL? 2.3
que tal dispositivo seja de fato parte de roupa ou acessório de vestuário, se não a própria roupa
ou acessório, então o telefone pendurado no colar ainda é um computador vestível, bem como um
relógio de pulso.
Para ser entendido como computador, uma exigência bem aceita é que o dispositivo seja multi-
propósito, o que exclui relógios de pulso, mas mantém celulares. Um simples sensor vestível, como
uma pulseira que conta passos, também não tem a generalidade que aqui se cobra, não sendo com-
putação, embora vestível. Como tais sensores vestíveis normalmente são conectados a smartphones,
iPads, e outros computadores móveis, pode-se considerar o sistema como vestível.
Mais próximo de uma peça de vestuário, pode se querer que um computador vestível permita a
execução de tarefas em paralelo por parte do usuário. Assim como o fato de ter vestida uma camiseta
não impede normalmente alguém de fazer outra coisa ao mesmo tempo, também o dispositivo
vestível não deve requerer total atenção do usuário para ser usado. Isto é bem exempli�cado pelo
aguardado Google Glass. Um smartphone normalmente demanda atenção para ser utilizado, mas
ainda pode ser um computador vestível se usado para reproduzir música enquanto realiza-se outras
atividades.
Uma outra característica relacionada é o fato de um computador vestível estar sempre em
atividade, ou ligado. Isso se relaciona com a próxima propriedade desejável, a baixa latência, ou a
rapidez de uso. Quer-se utilizar um computador vestível com a velocidade que se vê as horas em
um relógio de pulso, naquilo que é chamado de microinterações do usuário com o sistema (Starner,
2013). Assim como não desligamos o relógio, para não termos que ligá-lo toda vez que queremos
ver as horas, mantemos o computador vestível pronto para realizar a tarefa que precisamos em
poucos segundos. Normalmente uma tarefa em um smartphone, como uma pesquisa na internet ou
a gravação de um vídeo, toma tempo superior aos dez segundos, o que faz com que o usuário use
menos tais funcionalidades (Starner, 2013). Uma cena que mereça ser fotografada, por exemplo,
pode não perdurar por tal tempo.
Mais distante da realidade, mas já em pesquisa, está o requisito de antecipar a computação,
dando ao usuário informação que lhe é útil antes mesmo de este solicitar. O exemplo rudimentar
disto é a função auto-completar que sugere palavras inteiras e até expressões para completar um
texto quando o usuário digita apenas as primeiras letras. Na computação vestível quer-se que o
computador em questão, tendo acesso ao que o usuário vê e ouve, por exemplo, in�ra que tipo de
informações possam ser úteis e as retorne antes que lhe sejam solicitadas.
Uma vez que a computação é antecipada, é conveniente que tal informação seja acrescentada
de alguma forma ao mundo real, formando uma realidade aumentada, para não destrair a atenção
do usuário de sua realidade. A capacidade de modi�car a realidade do usuário, aumentando-a ou
diminuindo-a, é assim outro critério para identi�car o computador vestível. Isto ocorre tipicamente
pela inserção de informações no campo de visão do usuário, via uma tela sobre uma lente trans-
parente próxima ao olho ou através de projeções na própria realidade, que outros sujeitos teriam
acesso.
2.3 O Computador Vestível na Prática
O que se tem chamado tipicamente de computador vestível é algum computador preso ao usuário
de alguma maneira, na cabeça, em um colar ou pulseira, que o acompanhe onde quer que ele for.
2.3 O COMPUTADOR VESTÍVEL NA PRÁTICA 5
De maneira mais comum, tais computadores são "instalados"sobre a cabeça (head-up), com
uma espécie de saída visual próxima ao olho do usuário, acompanhado de um computador portátil
vestido de alguma maneira. O fato de o computador estar de alguma forma vestido na cabeça o
aproxima dos principais órgãos sensoriais do usuário, facilitando a saída de dados e permitindo ao
mesmo tempo que o computador "veja"e "ouça"o que o usuário vê e ouve. Como o sistema nervoso
central se concentra também na cabeça, esta é o lugar natural para um dispositivo que queira trocar
dados com a mente do usuário diretamente através da atividade elétrica de seus neurônios, o que
de certa forma já ocorre em algum nível.
Outra forma do computador vestível na literatura é o computador-relógio, que atende boa parte
das propriedades listadas na seção anterior. Embora demande uma atenção maior do usuário, que
precisa focar sua visão do relógio para usá-lo, este possui uma latência relativamente baixa para a
realização de tarefas simples, em relação a um smartphone por exemplo.
Computadores pendurados no pescoço são mais raros, já que sua posição não favorece a saída de
dados visuais para o usuário, porém veremos interessantes aplicações com projetores que contornam
tal problema.
Uma de�nição mais especí�ca que se confunde com o computador vestível é a roupa inteligente.
Ainda longe de ser de propósito geral, alguns tecidos com circuitos permitem a confecção de peças
de vestuário que realizam tarefas computacionais especí�cas, como reprodução de músicas, e tais
sistemas têm sido tratado também dentro da computação vestível.
Finalmente, como já mencionado, são comumente rotulados como dentro da computação vestível
todo tipo de sensores carregados junto ao corpo, como pulseiras, sensores de batimento cardíaco,
sensores nos calçados, etc.
Depois de sugerir o grau de incerteza na inclusão de algum estudo no campo que aqui nos inte-
ressa, o presente trabalho não pretende se ater a alguma de�nição especí�ca de computação vestível.
Os próximos capítulos pincelarão o passado, presente e (possível) futuro de alguns dispositivos tidos
como computadores vestíveis por pelo menos parte da comunidade especializada.
Capítulo 3
Histórico
Neste capítulo pretende-se mostrar a evolução do conceito de computador vestível, acompanhado
obviamente da evolução tecnológica que lhe suporta, através de exemplos de projetos realizados
principalmente nos últimos 50 anos. Antes, descrevemos o que pode ser entendido como os primeiros
computadores vestíveis em um setindo amplo.
3.1 Computação Vestível Antes do Computador
Quando se conta a história da computação vestível, através dos computadores vestíveis, nor-
malmente se passa no ocidente pelos primeiros relógios portáteis, primeiramente de bolso e depois
de pulso, ou no oriente por ábacos miniaturizados para serem usados em anéis ou colares. Tendo
em vista a discussão do capítulo anterior, ambos os dispositivos di�cilmente seriam aceitos como
computadores vestíveis nos dias de hoje, mas a título de curiosidade, comecemos por eles.
Embora um ábaco não possa ser reprogramado pelo usuário e tenha suas funcionalidades res-
tritas a operações aritméticas, tais operações tem uma variedade considerável para considerar este
dispositivo multi-propósito de certa forma. A Figura 3.1 mostra um ábaco chinês que data da Di-
nastia Qing (1616-1911)(Mann, 2013) e chama a atenção pela perfeição de sua miniaturização, que
mantém o ábaco utilizável em todas as suas funções, enquanto tão pequeno quanto um anel.
Figura 3.1: Anel com ábaco completamente funcional.
De propósito menos especí�co que o ábaco, o relógio portátil tem na sua popularidade até hoje
7
8 HISTÓRICO 3.3
o motivo de sua importância histórica. Assim como ábacos de bolso, também não nos interessa o
relógio de bolso, distante do conceito de vestível. Partindo então para o relógio de pulso, sua história
começa com o relojoeiro suíço Breguet, que já em 1810 teria feito um bracelete com relógio para
a rainha de Nápoles. Na época, sua invenção foi ignorada, e por muito tempo o relógio de pulso
permaneceu apenas como acessório feminino.
Em 1904, Santos Dumont encomendou a Louis Cartier um relógio de pulso para que pudesse
pilotar seus protótipos de avião com as mãos livres (Wikipedia, 2013). Cartier colocou um de seus
modelos femininos em uma pulseira de couro para atender a encomenda, e o relógio de pulso entrou
de vez para o universo masculino. Sua popularidade foi concretizada na primeira guerra mundial,
dada sua utilidade, evidenciada na economia de tempo que proporciona.
3.2 1960 a 1980: Computadores e Roletas
Com o advento do computador digital como conhecemos hoje, não demorou para aparecer os
primeiros dispositivos vestíveis. Em 1961, Edward Thorp e Claude Shannon, famoso pela teoria da
informação, desenvolveram um computador "calçável"(Thorp, 1998). Tal máquina tinha o propósito
especí�co de prever o resultado de uma roleta, estimando o octante em que esta pararia, para guiar
o apostador em cassinos � daí a necessidade de escondê-la em um sapato. A Figura 3.2 mostra tal
dispositivo.
Figura 3.2: Primeiro computador digital que se veste.
Note que tal computador ainda não é programável pelo usuário, uma vez vestido, apenas pode
prever o resultado de roletas, mas já usava um processador digital que é de propósito geral por
natureza. Podemos dizer que era um computador e que era vestível, mas talvez ainda não fosse
um computador vestível. Invenções semelhantes foram desenvolvidas por Alan Lewis na década de
1970, também com o propósito de transformar a roleta em um "jogo de sorte".
3.3 1980: Computadores sobre a Cabeça
Na década de 1980, a miniaturização e disponibilização de partes de computadores deram aos
inventores as peças necessárias para construção de seus próprios computadores ambulantes. Um
3.4 1990: MIT, EMPRESAS E CONFERÊNCIA 9
destes inventores é Steve Mann, conhecido como o primeiro cyborg do mundo, e até hoje um dos
líderes mundiais em computação vestível. Em 1981, Mann construiu um computador em um mochila
atrelado a um dispositivo sobre a cabeça com um tela para um olho (Mann, 1997). Tal computador
tinha capacidades de áudio, vídeo e texto, e uma espécie de teclado de uma mão só permitia até
que tal computador fosse programado, o caracterizando como uma máquina de propósito genérico.
Tal sistema pode ser considerado o primeiro computador vestível, dada sua programabilidade, e é
ilustrado na Figura 3.3.
Figura 3.3: Steve Mann e seu computador vestível em 1981.
No �nal da década de 1980, surgiu o Private Eye, uma espécie de monitor para ser acoplado em
um olho, com um sistema de LEDs de resolução relativamente baixa, mas su�ciente para visualização
de texto (Becker, 1992). Como tal monitor ocuparia apenas parte do campo de visão do usuário,
permitiria a realização de tarefas em paralelo por parte deste, uma das propriedades desejáveis de
um computador vestível. O Private Eye foi peça comum em dispositivos da década seguinte.
3.4 1990: MIT, Empresas e Conferência
Peças como o Private Eye facilitaram a montagem de computadores vestíveis. Em 1991 Doug
Platt apresentou o Hip-PC, baseado no processador Intel 80286. Já em 1993, Thad Starner, criador
do Projeto de computação vestível do MIT e envolvido atualmente no Google Glass, adaptou o
sistema de Platt para criar o Lizzy (Starner, 1999), que pode ser visto na Figura 3.4. Também no
MIT, Mann criou a câmera portátil wireless em 1994.
Nesta década, as primeiras companhias voltadas para o mercado de computação vestível sur-
giram. A Xybernaut e a ViA produziram dispositivos especí�cos voltados para funcionalidades
especí�cas (Amft e Lukowicz, 2009). A Matias Corporation, liderada por Edgar Matias, apresentou
em 1994 um computador de pulso com meio teclado no outro braço (Amft e Lukowicz, 2009), como
ilustrado na Figura 3.5. Muitas outras companhias desenvolveram produtos semelhantes para serem
vestidos no braço, e algumas obtiveram relativo sucesso, como por exemplo a Vocollect.
10 HISTÓRICO 3.5
Figura 3.4: Starner vestindo o seu sistema Lizzy.
Figura 3.5: Computador de pulso de Edgar Matias.
Em 1996, DARPA e Boeing realizaram workshops reunindo acadêmicos, industriais e militares
(Rauch, 1999). A primeira conferência acadêmica em computação vestível aconteceu um ano depois.
Sediada pelas universidades de Carnegie Mellon, MIT e Georgia Tech, o Simpósio Internacional
sobre Computação Vestível (ISWC) contou com 382 inscritos e teve artigos publicados sobre temas
desde hardware e sensores a aplicativos para computadores vestíveis.
3.5 INÍCIO DOS ANOS 2000 11
3.5 Início dos Anos 2000
Nos anos 2000, duas razões di�cultam o contar da história da computação vestível. Primei-
ramente, a explosão da computação móvel trouxe uma miríade de sistemas com funcionalidades
especí�cas que podem de algum modo ser considerados computadores móveis. Uma segunda di�cul-
dade diz respeito à proximidade da década passada, ainda recente. Parte dos projetos de pesquisa
então iniciados continuam até hoje e, por isso mesmo, estão em outro capítulo. Desta maneira,
nesta seção nos contentamos em apontar alguns projetos e produtos do início dos anos 2000 que se
aproximam de marcos na história da computação vestível.
Na ETH de Zurique, em 2001, pesquisadores desenvolveram o WearARM com uma arquitetura
distribuída envolvendo circuitos especializados locais além de um processador central de propósito
genérico (Amft e Lukowicz, 2009). Tal computador foi desenvolvido para ser facilmente integrável
ao vestuário do usuário, sem ser desconfortável, com um controle avançado de energia, gerenciando
o consumo no nível de componentes. A Figura 3.6 mostra um usuário com o WearARM .
Figura 3.6: WearArm.
Bruce Thomas liderou na Austrália a equipe que introduziu em 2001 o Tinmith (Piekarski e Thomas,
2002). Tal dispositivo apresentava ao usuário uma realidade aumentada, com overlays sobre a visão
natural da realidade. O sistema incluía luvas para manipular objetos virtuais vistos pelo usuário,
além de um computador-mochila conectado a um capacete com óculos que modi�cam a realidade
do usuário. A Figura 3.7 mostra um usuário com o Tinmith supostamente manipulando um objeto
12 HISTÓRICO 3.5
virtual com suas mãos.
Figura 3.7: Tinmith: realidade aumentada manipulada com a mãos.
Capítulo 4
Computação Vestível Atualmente
Após uma tentativa de explicar o que se entende por computação vestível e uma listagem de
exemplos históricos, o presente capítulo pretende investigar o estado atual, e do futuro próximo,
dos computadores vestíveis. Primeiramente, passaremos por uma rápida estimativa de mercado,
para então exempli�car com produtos já comercializados, ou com lançamento próximo, em diversas
áreas. Adicionalmente, mostraremos os caminhos sendo seguidos pelos pesquisadores na academia,
com seus protótipos ilustrando as tendências. Finalmente, discute-se os problemas e desa�os que
são o gargalo da massi�cação dos computadores vestíveis.
4.1 O Mercado
Devido à grande diversidade de produtos considerados como computadores vestíveis, apenas es-
timativas grossas do tamanho do mercado são possíveis. Em um estudo recente, de 2012, a Jupiter
Research estimou que naquele ano seriam vendidos aproximadamente 800 milhões de dólares em
dispositivos vestíveis inteligentes � algo mais abrangente do que um computador vestível, provavel-
mente incluindo sensores vestíveis de uso especí�co. No mesmo estudo, foi projeto um crescimento
do mercado de mais de 80% em dois anos, atingindo a cifra de 1,5 bilhões de dólares em 2014. A
Figura 4.1 mostra um grá�co com a participação das regiões do globo neste mercado em 2014, onde
Estados Unidos e Europa Ocidental somados representariam mais de 60% do mercado.
Figura 4.1: Divisão geográ�ca do mercado de dispositivos vestíveis em 2014. Fonte: Jupiter Research.
Outro levantamento, feito pela BI Intelligence, apresentou estimativas de diferentes fontes para
o crescimento do mercado, em número de unidades entregues, de 2010 em diante. O grá�co da
13
14 COMPUTAÇÃO VESTÍVEL ATUALMENTE 4.2
Figura 4.2 mostra estimativas de diferentes fontes para o número de dispositivos computacionais
vestíveis vendidos anualmente e para o crescimento de tal quantidade.
Figura 4.2: Tendência de crescimento do mercado de dispositivos vestíveis, em milhões de unidades.
Apesar das grandes diferenças entre as fontes, a maioria delas concorda em um ponto próximo
a 10 milhões de unidades entregues em 2011. Considerando que o grá�co diz respeito a dispositivos
vestíveis, e não a computadores propriamente, devemos pensar que boa parte deste número repre-
senta sensores como pulseiras para serem usados em conjunto com uma unidade de processamento
móvel, como um smartphone por exemplo. Daí, se supusermos um valor de 50 dólares por unidade
vendida, chegamos a um mercado de 500 milhões de dolares em 2011, razoavelmente compatível
com a estimativa da Jupiter Research de um mercado de 800 milhões de dólares em 2012.
Já em 2016, último ano em que as 6 fontes incluídas no levantamento apresentam estimativas,
temos números variando da casa do 40 até os 360 milhões de unidades vendidas. A média e a
mediana destes 6 números �cam próximas aos 150 milhões de unidades vendidas. Novamente, se
supusermos 50 dólares por dispositivo, isto levaria a um mercado de 7.5 bilhões de dólares em 2016 �
um crescimento mais do que exponencial em relação às estimativas da Jupiter Research. Se, a título
de comparação, partindo da estimativa da Jupiter para 2014, projetamos de 2014 para 2016 o mesmo
crescimento que esta estimou de 2012 para 2014, chegamos a um mercado de aproximadamente 3
bilhões de dólares anuais para o mercado de dispositivos vestíveis inteligentes em 2016.
4.2 Exemplos de Produtos Comercializados
Os produtos já no mercado de computação vestível variam de computadores de fato vestíveis a
sensores acopláveis ao corpo, passando por roupas inteligentes. Estruturamos esta seção de modo a
categorizar os aparelhos.
4.2 EXEMPLOS DE PRODUTOS COMERCIALIZADOS 15
4.2.1 Computadores Programáveis Vestíveis
Poucos computadores programáveis multi-propósito que se vistam estão aparentemente no mer-
cado. Um dos poucos aparelhos encontrados é o Zypad, no mercado desde 2007 (Amft e Lukowicz,
2009). Produzido pela Eurotech, é um computador de pulso, exempli�cado pela linha WR11xx,
ilustrado na Figura 4.3.
Figura 4.3: Zypad WR 11xx, da Eurotech.
Com uma tela de até 640x480 pixels, sensível ao toque, este computador tem antena integrada
Bluetooth e wireless 802.11b/g. Além de conector USB e mini-SD, este modelo possui uma capa a
prova d'água e uma caneta para tocar a tela. Possui acelerômetro e leitor biométrico de dedo, para
ler batimento cardíaco, por exemplo. Tem uma CPU de 416MHz e 256 de memória RAM. Pesa 600
gramas! Outras versões possuem conectividade 3G e entrada para SIM GMS, o que permite usá-los
como telefone.
4.2.2 Relógios Inteligentes
Uma categoria diferente de produto inclui relógios inteligentes, que se conectam tipicamente ao
smartphone do usuário para lhe apresentar informações mais rapidamente. Uma vez com acesso ao
telefone, o relógio pode exibir noti�cações, como a chegada de mensagens ou emails, além de poder
exibir conteúdos simples, como a previsão do tempo ou pequenas mensagens. Para exempli�car tal
linha de produtos, usamos o Sony SmartWatch (Bieber et al., 2012), de 2012, mostrado na Figura
4.4.
No mercado americano por aproximadamente 100 dólares, este relógio se conecta via BlueTooth
a smartphones com Android. Noti�cações de chegada de email, SMS, do Facebook e chamadas são
16 COMPUTAÇÃO VESTÍVEL ATUALMENTE 4.2
Figura 4.4: SmartWatch da Sony.
apresentadas na sua tela sensível ao toque. Desta tela, se pode controlar a música no telefone, man-
dar uma chamada para caixa de mensagem, ler emails/mensagens ou mesmo responder mensagens
com frases padrão. Pesa 14 gramas!
4.2.3 Roupas Inteligentes
Mais vestíveis do que computadores são as roupas inteligentes - peças de roupa com circuitos
digitais embutidos para oferecer funcionalidades típicas de computadores móveis, como reproduzir
música, tirar fotos e até ver mensagens e receber chamadas telefônicas. Normalmente necessitam
estar conectados a algum dispositivo como um smartphone.
A TshirtOS é uma camiseta com um display de LEDs (baixíssima resolução), alto falante,
microfone e até acelerômetro. Depende de um computador para controlá-la, como um telefone
celular, como mostra a Figura 4.5.
Ainda existe apenas como protótipo da CuteCircuit, esperando uma massa crítica registrar
interesse para sua produção em massa. Promete tirar fotos, exibir imagens, tocar música e até
mostrar tweets.
Outro exemplar desta categora é uma jaqueta reprodutora de música chamada de Mp3Blue. No
mercado europeu por 249 euros, esta jaqueta possui um microfone, fones de ouvido e um módulo que
reproduz música no formato mp3, com capacidade de armazenar até 128 MB. Pode ser conectada
via Bluetooth a um smartphone, para poder receber chamadas. Possui um painel de controle para
gerenciar a execução das músicas. Tirando o módulo mp3, é completamente lavável!
4.2.4 Sensores e Acessórios Vestíveis
Mais comuns, mas mais distantes do conceito de computação vestível, estão os sensores e aces-
sórios diversos de funcionalidade especí�ca que são vestidos de alguma maneira e ligados a um
computador, normalmente um smartphone.
Provavelmente o acessório computacional vestível mais comum é o headset conectado via blueto-
oth ao telefone celular, a �m de conversar ao telefone com as mãos livres. Normalmente são apoiados
na própria orelha e se diferenciam de um simples fone/microfone por apresentar funcionalidades
4.2 EXEMPLOS DE PRODUTOS COMERCIALIZADOS 17
Figura 4.5: TshirtOS e seu esquema de funcionamento.
Figura 4.6: Jaqueta Mp3Blue reprodutora de música.
extras. O modelo mostrado na Figura 4.7, por exemplo, além de reproduzir música do smartphone
e permitir conversação, possui alertas de voz para conectividade, volume e �ltra ruído e vento - e
custa apenas 30 dólares nos Estados Unidos!
Outro aparelho comum atualmente é uma pulseira que mede atividade física através de um
acelerômetro. O Nike+ Fuelband (Figura 4.8), por exemplo, estima o gasto de calorias, o número
de passos e NikeFuel (uma medida inventada por eles) consumidos ou executados pelo usuário.
18 COMPUTAÇÃO VESTÍVEL ATUALMENTE 4.3
Figura 4.7: Headset com bluetooth Plantronics M50.
Com metas de atividade, o usuário acompanha ao longo do dia como está seu dia em relação a
tal objetivo, o que supostamente o estimularia a realizar atividade �sica. Embora funcione como
medidor independentemente, precisa de um computador ou smartphone para operá-lo por completo.
Custa 149 dólares nos Estados Unidos.
Figura 4.8: Pulseira Nike+ Fuelband.
4.3 Google Glass
Tamanha é a expectativa pelo Google Glass (Starner, 2013), que aqui merece uma seção à
parte. Produzido pela gigante da computação Google, tem lançamento esperado para o início de
2014 e promete ser um marco na computação vestível, mudando a rotina de um grande número de
consumidores de tecnologia móvel.
O Google Glass (Figura 4.9), embora não seja um computador de propósito genérico, possui
muitas das características desejáveis para os computadores vestíveis. Por ter uma tela pequena
próxima a um dos olhos, permite que o usuário realize outras tarefas enquanto o usa, já que dispõe
de quase todo seu campo de visão e das mãos livres, uma vez que os óculos se suportam sobre as
orelhas. O dispositivo �ca sempre ligado, de modo a agilizar o uso de suas funcionalidades, que
podem ser invocadas por comandos de voz ou por uma das hastes, sensível ao toque. Embora não
faça tudo o que se espera de um computador, pode ser considerado de propósito genérico até um
certo ponto, pois, por si só, oferece funcionalidades como a captura de vídeos e fotogra�a, a leitura e
escrita de mensagens, reprodução de música e gravação de som. Se conectado a um smartphone, pode
4.4 GOOGLE GLASS 19
realizar chamadas telefônicas e exibir noti�cações de rede sociais, além de compartilhar conteúdo
nestas. Embora o Google Glass possua 12GB de memória por si só, antena wi-� para se conectar
à internet e até um GPS, ele funciona melhor como extensão de um smartphone, que lhe pode dar
conexão constante à internet.
Figura 4.9: Google Glass sendo usado.
A navegação funciona por cartões de tempo. A cada busca feita, mensagem trocada ou imagem
captudara, o Google Glass cria um cartão minimalista para futura navegação via linha do tempo.
O usuário pode editar os textos de tais cartões com o reconhecimento de voz do Google Glass. Uma
di�culdade para os não falantes da língua inglesa seria a inserção de texto no dispositivo, já que
aparentemente esta é a única entrada de texto possível no aparelho.
O Google Glass está sendo vendido apenas para desenvolvedores por 1500 dólares, mas se espera
que chegue ao mercado no ano que vem por volta de 500 dólares, embora não haja nenhuma
informação o�cial sobre o assunto. A IHS IMS Research, como mostra o grá�co da Figura 4.10,
estima um mercado de 6 milhões de unidades do Google Glass em 2016. Supondo o preço unitário
de 500 dólares, somamos 3 bilhões de dólares, uma parcela signi�cativa do mercado total de vestíveis
estimados em 7,5 bilhões de dólares na Seção 4.1.
Figura 4.10: Estimativa de vendas de Google Glasses, em milhares. Fonte: IHS IMS Research, Abril de
2013.
20 COMPUTAÇÃO VESTÍVEL ATUALMENTE 4.5
4.4 Pesquisas Relacionadas
À parte dos produtos já comercializados no mercado, ou em desenvolvimento especi�camente
para tal propósito, pesquisas acadêmicas, sem �m imediato de gerar itens de prateleira, investigam
conceitos e tecnologias na direção daquilo que realmente queremos de um computador vestível, já
comentado na Seção 2.2.
Um dos projetos que mais chama a atenção é o SixthSense (SextoSentido), desenvolvido prin-
cipalmente pelo pesquisador Prasnav Mistry, do MIT - ambos na Figura 4.11. O SixthSense é um
sistema de computação vestível que aumenta a realidade do usuário com informação digital, con-
tando com uma interface gestual. O que mais chama a atenção nesse projeto é a antecipação da
informação, entregue antes de o usuário procurá-la, e a projeção de tal informação na realidade
física deste, que não precisa olhar para a tela de um computador (Mistry e Maes, 2009).
Figura 4.11: Prasnav Mistry usando o sistema SixthSense.
O sistema é composto basicamente por uma câmera e um projetor pendurados no pescoço do
usuário, que se comunicam com um dispositivo computacional móvel no bolso. O projetor usa
quaisquer superfícies, como paredes, papéis e até camisetas de pessoas, para projetar informação
no campo visual do usuário. A câmera monitora o ambiente do usuário, identi�cando os objetos do
seu campo de visão para acrescentar-lhes informação que possa ser útil, além de rastrear marcas
coloridas nas pontas dos dedos da mão do usuário, para reconhecer seus gestos, que atuam como
instruções de interação para as aplicações cuja interface está sendo projetada.
As aplicações são das mais diversas possíveis. Uma delas projeta um mapa, em que o usuário
pode navegar. Outra permite desenhar em paredes, usando projeção, através dos comandos gestuais.
Com um microfone em uma folha de papel, faz-se uma tela sensível ao toque, para que o usuário
tenha seu próprio tablet projetado. Na direção da computação antecipativa, o SixthSense pode
reconhecer objetos e projetar sobre eles informação adicional relacionada ao objeto em questão. A
Figura 4.12 mostra o usuário lendo um jornal. O sistema reconhece o tema de uma manchete e
projeta um vídeo sobre o assunto no espaço ocupado por uma foto.
4.5 PROBLEMAS E POSSÍVEIS SOLUÇÕES 21
Figura 4.12: SixthSense projetando sobre a foto de um jornal um vídeo relacionado a notícia em questão.
4.5 Problemas e Possíveis Soluções
A computação vestível herdou da computação como um todo, e especialmente da computação
móvel, metodologias e tecnologias de software e hardware, coisas necessárias para o desenvolvimento
da área. Entretanto, não há um desenvolvimento de um arcabouço especí�co para a computação
vestível, levando em conta suas particularidades, especialmente de interface, mas também de comu-
nicação, energia, entre outros. Esta seção é principalmente baseda em (Starner, 2001a) e (Starner,
2001b)
Um problema bem conhecido da computação móvel é a energia para alimentar os dispositivos
tipicamente distantes de fontes de alimentação contínua. Embora o poder de processamento, ou a
quantidade de transistor por unidade de volume, há décadas cresça de modo aproximadamente ex-
ponencial, a capacidade das baterias de energia elétrica, para um tamanho �xo, aumenta quase que
linearmente com o tempo, e com uma inclinação relativamente baixa. As necessiadades de comu-
nicação sem �o entre diferentes dispositivos de um sistema vestível, como um par óculos, pulseira,
headset e o smartphone, apenas agravam o problema, já que antenas para a comunicação sem �o,
especialmente para a transimissão, demandam energia considerável. Alternativas para a solução
desta questão passam por processos naturais de recarregamento. Por exemplo, uma ideia razoável
é investigar a extração de energia da própria movimentação natural do usuário, como já fazem
alguns relógios de pulso que na prática nunca precisam ser recarregados, ou ter as pilhas trocadas,
já que seu balançar no pulso lhes garante autonomia. Outra tecnologia que apenas engatinha é a
transmissão sem �o da própria energia elétrica, que poderia recarregar os computadores vestíveis
de maneira imperceptível, aproveitando os momentos rotineiros onde o usuário permanece parado,
como no trabalho, no carro, ou mesmo no almoço.
Uma questão correlata ao consumo de energia é a dissipação do calor. Tal quesito já é um fator
limitante na computação móvel e laptops de última geração possuem sistemas relativamente caros
apenas para resfriamento. Para computadores vestíveis queremos dispositivos mais leves, menores,
o que só acarreta uma maior di�culdade no espalhamento da energia térmica. A característica de
ser vestível permite ao computador novas maneiras de se resfriar. Por exemplo, enquanto o usuário
22 COMPUTAÇÃO VESTÍVEL ATUALMENTE 4.5
caminha, um dispositivo vestido externamente tem contato com um �uxo de ar que naturalmente
colabora com a manutenção de sua temperatura em um nível apropriado ao funcionamento. Outra
alternativa é a passagem de calor para o próprio usuário, o que seria muito bem-vindo em locais com
temperatura ambiente baixa, típicas de regiões com alta latitude, como Europa e Estados Unidos,
mas não conveniente em um país tropical como o nosso. Claro que a pesquisa de circuitos eletrônicos
termicamente mais e�cientes é uma abordagem paralela e necessária.
A comunicação via rede na computação vestível pode ser classi�cada em duas esferas: entre os
dispositivos vestíveis e uma infraestrutura �xa de rede e entre as próprias unidades vestíveis. O
primeiro deles é de interesse da telefonia móvel, com pesquisa contínua. Ainda assim, sempre há
pontos e regiões onde telefones celulares não têm conectividade. Uma alternativa interessante é usar
automóveis como replicadores de sinal, dada sua energia abundante em relação aos celulares, mas tal
proposta depende de padronizações na comunicação. Outra saída seria o armazenemento massivo
na memória (cache) dos dados da internet de provável requisição do usuário, aprendendo do seu
comportamento o que vale a pena ser guardado antecipadamente para solicitações em momentos
sem conectividade. Para a comunicação entre os próprios dispositivos, a já padronizada tecnologia
Bluetooth é a solução comum. Uma exigência decorrente de seu uso é que cada dispositivo vestível
tenha sua própria bateria. Para pequenos acessórios que precisam transmitir pouca informação, a
tecnologia usada em rótulos de identi�cação por frequência de rádio (RFID) pode ser uma saída
para dispensar bateria.
A interface com usuários de computadores vestíveis está na fronteira da interação homem-
máquina, dicotomia que se prentende inclusive eliminar. Além de atender aos requisitos de mobili-
dade, portabilidade e usabilidade, os computadores vestíveis são reféns da estética em certo grau,
já que compõem o visual do usuário. Isto deve ser levado em conta no projeto de tais dispositivos
e sua interface com o usuário. Por exemplo, as pessoas não se sentem muito à vontade com um
teclado preso a um braço, daí a solução do reconhecimento de fala, como no Google Glass. Mesmo
este, ainda impõem o uso de óculos, que se deve querer evitar como meta, quiçá com o uso de lentes
de contato. O problema aqui é tecnológico, pois mesmo distantes de uma discreta lente-monitor,
as alternativas para entrada discreta de dados tem sua pesquisa na infância, pois mesmos gestos
ao vento ocupam as mãos e chamam a atenção, o que poderia ser evitado com algum método mais
invasivo. Pesquisas têm mostrado progresso na interface cérebro-máquina, que permitiria o controle
de computadores com "a força do pensamento", sem necessidade de digitar ou falar. Questões éticas
começam a ser levantadas quando cogitamos um maior mesclamento entre os circuitos digitais do
computador e os neurônios analógicos do usuário, mas isto esta fora do escopo deste trabalho. Cabe
aqui apenas notar que tal tendência parece ser inevitável, embora distante.
Capítulo 5
Conclusões
Nesta monogra�a, apresentamos um panorama da pesquisa e do desenvolvimento na crescente
área da computação vestível. Vimos que tal termo não é bem de�nido, o que dá margem para
muitos autores usarem-no em contextos relativamente diferentes. Rastreamos as origens históricas
dos computadores vestíveis até seus desdobramentos atuais, vendo a magnitude e o impacto espe-
rados nos próximos anos, com crescimento vertiginoso previsto para o mercado. Por �m, discutimos
algumas questões técnicas que poden ser possíveis obstáculos no andamento do ramo, e discutimos
possíveis soluções.
Tendo em vista o tipo de sistema que vem sendo apresentado, e produtos com lançamento
próximo, como o Google Glass, a computação vestível está atualmente interessada mais em sistemas
vestíveis do que computadores vestíveis. Acessórios como o Google Glass e o SmartWatch da Sony
dependem de uma unidade maior de computação, como um smartphone no bolso, logo, não vestido.
Isso parece ser uma tendência, já que estamos longe de miniaturizar tais dispositivos de modo
a embuti-los nos acessórios vestíveis. A disseminação da computação móvel também incentiva o
desenvolvimento de acessórios apenas incrementais aos telefones celulares, já possuídos por grande
parte da população consumidora de tecnologia. Entendemos ainda que este é apenas um passo
intermediário, e esperamos que, com o tempo, os sistemas de computação pessoal não dependam de
algo no bolso, que já esteve em uma mochila, e possam ser completamente vestíveis sobre o corpo,
se não integrados dentro do próprio corpo do usuário.
Embora a maioria dos dispositivos que atendem pelo nome de vestível esteja distante das pro-
priedades desejadas, como a modi�cação da realidade e antecipação da computação, projetos como
o SixthSense se aproximam de tais ideais, mostrando possíveis caminhos para o avanço da compu-
tação vestível na direção de seus objetivos essenciais. Há tecnologia de hardware para sensoriar e
interferir na realidade que rodeia o usuário, acrescentando-lhe informação útil, mas aparentemente
a di�culdade ainda é a ausência de bom software para transformar dados crus de vídeo e áudio,
principalmente, em objetos signi�cativos para o usuário. Além disso, um passo distante e extrema-
mente importante é a relação do computador com o estado subjetivo da mente do usuário. Espera-se
que um dia a máquina possa sensoriar também uma cena imaginada pelo usuário, e não apenas a
realidade que o cerca. E, por que não?, ler os desejos inconscientes do usuário para antecipar-lhe
soluções.
A �nitude de nossa existência faz com que queiramos extrair o máximo dela, e a ajuda dos
computadores é a alavanca que diminui o tempo necessário para a realização de tarefas que nos
interessam. A computação vestível propõe inicialmente que nos livremos de tratar o computador
23
24 CONCLUSÕES 5.0
como um objeto ao qual dedicamos nossa atenção total, para conviver com ele de modo mais natural,
interagindo com o dispositivo juntamente com a própria realidade. Isso passa hoje por acessórios
vestíveis ligados a uma central de processamento, mas esperamos que no futuro a integração da
computação digital com aquela que ocorre em nossas mentes seja tal que nos esqueçamos por
momentos que estamos usando um chip ligado ao cérebro.
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25
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