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CAPA ENTREVISTA RICARDO HENRIQUES: PAÍS CONSEGUIU REUNIR CONDIÇÕES PARA UM GRANDE SALTO EDUCACIONAL COMO COMBATER A BUROCRACIA E MAIS GOVERNO ANUNCIA A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO NOVOS PRÊMIOS MEXEM COM A PRODUÇÃO LITERÁRIA Ano 8 nº 88 junho 2008

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CAPA

ENTREVISTA RICARDO HENRIQUES: PAÍS CONSEGUIU REUNIR CONDIÇÕES PARA UM GRANDE SALTO EDUCACIONAL

COMO COMBATER A BUROCRACIA

E MAISGOVERNO ANUNCIA

A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO

PRODUTIVO

NOVOS PRÊMIOSMEXEM COM A

PRODUÇÃO LITERÁRIA

Ano 8nº 88junho2008

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Armando Monteiro Neto, presidente da CNI – Confederação Nacional da Indústria

Fator de competitividadePara a Indústria, o único modo de ganhar espaço no mercado global é por meio do conhecimento. Esse caminho exige que o País construa uma educação de qualidade

a cNi tem a educação como marca desde que foi fundada há 70 anos por roberto simonsen e euvaldo lodi, líderes empresariais que con-sideravam o investimento em capital humano algo de fundamental importância para o desen-volvimento do País. a prioridade ao tema está inscrita no Mapa Estratégico da Indústria 2007-2015, o eixo das ações da cni e do setor industrial.

no ano passado, foi lançado o programa Educação para a Nova Indústria, com metas cla-ras e ambiciosas para a expansão dos serviços do senai e do sesi. as duas entidades, braços do sistema indústria respectivamente na área da educação Profissional e da educação básica, deverão ampliar em 30% o número de vagas até 2010. o primeiro balanço do programa é alen-tador. o senai atingiu 103,2% da meta total de matrículas estabelecida para 2007. no caso do sesi, as matrículas de educação continua-da ficaram em 94,8% da meta e as da escola em tempo integral em 90,7%.

no mês passado, a cni instalou seu con-selho temático da educação, novo passo no es-forço de transformar o conhecimento no grande fator de competitividade do País. seus 24 inte-grantes são pessoas de significativa contribuição à área, incluindo dois ex-ministros. o conselho terá como atribuições estimular o debate sobre o tema, promover estudos e recomendar ações. Mas deverá, sobretudo, ser um centro gerador de idéias, altamente criativo e com descortinada visão do futuro.

a inserção global do brasil deve se dar cada vez mais por meio da agregação de valor e da ino-vação. e não é possível trilhar esse caminho sem que tenhamos escola de qualidade em todos os níveis, algo que ainda está para ser feito. nossa agenda educacional é complexa. temos de supe-rar obstáculos que já deixaram de ser preocupa-ção de nossos competidores e ao mesmo tempo enfrentar novos desafios. o mundo desenvolvido investe hoje pesadamente na educação. devemos avançar a velocidade superior à desses países para efetivamente encurtar a distância que nos separa da fronteira do conhecimento.

as políticas públicas de universalização no bra-sil não garantiram uma educação básica de qua-lidade. conquistá-la deve ser o foco principal da estratégia educacional, ainda que não o único. É lamentável observar que em pleno século 21 mais da metade dos brasileiros ainda padecem do cha-mado analfabetismo funcional, algo que precisa ser revertido com urgência. as deficiências do ensino superior também são conhecidas: faculdades de má qualidade se multiplicam, frustrando os jovens e a sociedade. o mercado de trabalho não contrata diplomas, mas sim capacidade profissional.

Por meio de seu novo conselho temático, a cni passará a contribuir de modo ainda mais significativo à construção de um sistema educa-cional de qualidade em todos os níveis. Para a indústria, é clara a idéia de que o brasil somente terá crescimento sustentado quando contar com recursos humanos qualificados à altura dos de-safios que se impõem.

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www.cni.org.br

DIRETORIA DA CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA - QUADRIÊNIO 2006/2010

Presidente: Armando de Queiroz Monteiro Neto (PE);Vice-Presidentes: Paulo Antonio Skaf (SP), Robson Braga de Andrade (MG), Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira (RJ), Paulo Gilberto Fernandes Tigre (RS), José de Freitas Mascarenhas (BA), Rodrigo Costa da Rocha Loures (PR), Alcantaro Corrêa (SC), José Nasser (AM), Jorge Parente Frota Júnior (CE), Francisco de Assis Benevides Gadelha (PB), Flavio José Cavalcanti de Azevedo (RN), Antonio José de Moraes Souza (PI);1º Secretário: Paulo Afonso Ferreira (GO);2º Secretário: José Carlos Lyra de Andrade (AL);1º Tesoureiro: Alexandre Herculano Coelho de Souza Furlan (MT); 2º Tesoureiro: Alfredo Fernandes (MS); Diretores: Lucas Izoton Vieira (ES), Fernando de Souza Flexa Ribeiro (PA), Jorge Lins Freire (BA), Jorge Machado Mendes (MA), Jorge Wicks Côrte Real (PE), Eduardo Prado de Oliveira (SE), Eduardo Machado Silva (TO), João Francisco Salomão (AC), Antonio Rocha da Silva (DF), José Conrado Azevedo Santos (PA), Euzebio André Guareschi (RO), Rivaldo Fernandes Neves (RR), Francisco Renan Oronoz Proença (RS), José Fernando Xavier Faraco (SC), Olavo Machado Júnior (MG), Carlos Antonio de Borges Garcia (MT), Manuel Cesario Filho (CE).

CONSELHO FISCALTitulares: Sergio Rogerio de Castro (ES), Julio Augusto Miranda Filho (RO), João Oliveira de Albuquerque (AC);Suplentes: Carlos Salustiano de Sousa Coelho (RR), Telma Lucia de Azevedo Gurgel (AP),Charles Alberto Elias (TO).

UNICOM - Unidade de Comunicação Social CNI/SESI/SENAI/IELGerente executivo - Marcus Barros PintoTel.: (61) 3317.9544 - Fax: (61) 3317.9550e-mail: [email protected]

ISSN 1519-7913Revista mensal do Sistema Indústria

Coordenação editorial IW Comunicações - Iris Walquiria Campos

ProduçãoFSB ComunicaçõesSHS Quadra 6 - cj. A - Bloco E - sala 713CEP 70322-915 - Brasília - DF Tel.: (61) 3323.1072 - Fax: (61) 3323.2404

RedaçãoEditor: Paulo Silva Pinto Editora de arte: Ludmila AraujoRevisão: Shirlei NatalineColaboraram nesta edição: Carlos Haag, Luiz Felipe de Alencastro, Rodrigo Ledo, Sandra Manfrini e Sergio de Sá

PublicidadeMoisés Gomes - [email protected].: (61) 3323-1072

Impressão - Gráfica Coronário

Capa - Matthias Kulka/zefa/Corbis

As opiniões contidas em artigos assinados são de responsabilidade de seus autores, não refletindo, necessariamente, o pensamento da CNI.

16 Capa cni lança campanha contra a desburocratização, em que empresários

poderão contribuir com propostas para reduzir o problema

22 Educação conselho temático de educação, instalado pela cni no mês

passado, irá reunir estudos e propor ações para melhorar o ensino brasileiro em todos os níveis

26 Política Industrial o governo lança a Política de desenvolvimento Produtivo, mais

abrangente que a política de incentivos setoriais apresentada em 2004

32 Tributação Proposta de reforma tributária avança na câmara dos deputados,

apesar das críticas da oposição e mesmo da base governista quanto à timidez das medidas

36 Negócios redução do poder de compra faz empresas de vários setores buscarem

o conceito de baixo custo, criado por companhias aéreas

42 Literatura especialistas discutem os efeitos na produção literária em língua

portuguesa dos novos prêmios, que não se limitam a meras esculturas simbólicas

SEçõES

10 ENTrEvISTa ricardo Henriques afirma que o brasil perdeu a chance de um salto

educacional nos anos 1970, mas ressalva que finalmente reunimos as condições para consegui-lo

30 TENdêNCIaS aumentos nos preços de alimentos faz a inflação crescer no brasil e

em vários países emergentes, que não usam a política econômica para reverter o processo

46 CuLTura livro conta a história da relação entre os modernistas e seus mecenas,

que tiveram grande influência sobre o nacionalismo do movimento artístico

50 CENa GLobaL luiz Felipe de alencastro afirma que o brasil precisa se adequar às novas

características de sua população, incluindo quem mora no exterior

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AgendA AmbientAl

represeNtaNtes da cNi e do miNistério do meio ambieNte estão empenhados na construção de uma agenda comum, que privilegie o

crescimento econômico e a preservação de recursos naturais. a cni foi convidada pelo governo para colaborar na agenda ambiental, o que, segundo o gerente-executivo da unidade de competitividade industrial da cni, Maurício Mendonça, é um avanço importante para a indústria. Para Mendonça, a participação do setor produtivo poderá facilitar a solução dos impasses, principalmente nas áreas de licenciamento e

compensação ambiental e de gestão de resíduos sólidos. a cni prepara um documento em que apontará os diversos obstáculos e instâncias de

negociação das questões ambientais. com essas informações, o governo e a indústria definirão um calendário de reuniões periódicas para debate e

acompanhamento de propostas.

SobrA virA coSmético e combuStível

Fabricação de cosméticos, sabão, biocombustível, vedação para vidros e janelas e ração de animais. esses são alguns dos usos que têm os 200 litros de óleo saturado produzidos mensalmente pelo sesi de joinville (sc). a iniciativa faz parte de um programa do sesi catarinense, que recicla quase todo o óleo utilizado em suas cozinhas industriais. no ano passado, a entidade reciclou 96% do óleo saturado produzido nas cozinhas industriais que opera em santa catarina, Minas gerais, Mato grosso, Paraná e rio grande do sul, e procura alternativas para dar o mesmo tratamento aos 4% que ainda vão para os aterros sanitários.

tecnologiA em pAutA

de 4 a 6 de juNho, o seNai capixaba realiza o 2º seminário de instrumentação e eletroeletrônica. o objetivo é difundir a tecnologia e promover a troca de experiências entre profissionais da indústria, empresários, professores e estudantes do senai. o evento contará também com minicursos com representantes de empresas que são referência no setor. as inscrições podem ser feitas no site do senai do estado (www.es.senai.br/seminario). a taxa de inscrição é r$ 25,00. Mais informações pelo telefone (27) 3334-5225.

iel e bid

o iel e o baNco iNteramericaNo de deseNvolvimeNto (bid) estão realizando um estudo para avaliar processos inovadores em Minas gerais, santa catarina e Paraíba. a idéia é fortalecer o sistema regional de informação, a partir de informações concretas sobre a interação entre agentes do poder público, academia e setor produtivo. “avaliando os modelos existentes nesses três estados, a nossa expectativa é que possamos ter algumas fórmulas recomendáveis para diferentes cenários nacionais”, diz o superintendente do iel, carlos cavalcante.

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lupa

geStão eStrAtégicA no inSeAd

estão abertas as iNscrições para os programas gestão estratégica para dirigentes empresariais e estratégia de negócios para o Mercado asiático, realizados pelo iel, em parceria com o insead. o primeiro está na sua oitava edição e será realizado de 18 a 22 de agosto, em Fontainebleau, na França (foto). o programa na Ásia está em seu segundo ano e ocorrerá em cingapura e Xangai, de 6 a 15 de outubro. Mais informações na página eletrônica do iel (www.iel.org.br) ou pelo telefone (61) 3317-9432.

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cAfé mineiro

o empresário Niels douqué, um dos maiores compradores mundiais de café, visitou em maio duas cooperativas de cafeicultores do sul de Minas gerais. ele avaliou a qualidade da produção e o cumprimento das exigências socioambientais na união dos Pequenos Produtores de café especial dos Martins (unipcafem) e na união dos Pequenos Produtores de santana da Vargem (unipasv), que fazem parte do movimento Fairtrade (comércio justo), do serviço brasileiro de apoio à Micro e Pequena empresa (sebrae) em Minas. o programa tem como princípios a transparência, o preço justo, e o respeito ao meio ambiente e à legislação trabalhista. É uma iniciativa do sebrae para qualificar o produto exportado, que beneficia atualmente 12 grupos de cafeicultores do sul de Minas e da Zona da Mata. nove grupos já estão certificados e os outros três estão na fase inicial dos trabalhos.

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eScolA de pAnificAção

o seNai do paraNá iNaugurou No mês passado a primeira escola de panificação e confeitaria do estado. o empreendimento, que visa atender a um dos setores com maior carência de mão-de-obra qualificada da região, conta com a parceria do sindicato das indústrias de Panificação e confeitaria do estado e de empresas. o senai é responsável pelo local do curso, técnicos e professores, e os sindicatos e indústrias parceiras fornecem os equipamentos. Mais informações pelo telefone (41) 3233-7643 ou por e-mail ([email protected]).

pólo de cAmAçAri

No dia 27 de juNho, em salvador, No hotel bahia othoN, será realizado o Fórum empresarial Pólo 30 anos. o evento faz parte das comemorações pelo aniversário do pólo industrial baiano de camaçari (ba). contará com a presença de empresários, representantes da Fieb e do governo, e servirá para discutir oportunidades e perspectivas para as próximas décadas. Hoje, o Pólo envolve investimentos de us$ 11 bilhões, emprega cerca de 35 mil pessoas e contribui com r$ 1 bilhão por ano na arrecadação do imposto sobre a circulação de bens e serviços (icMs) da bahia. É também responsável por 35% das exportações do estado. a programação das comemorações inclui também a inauguração de um memorial, na cidade de camaçari, e diversos workshops sobre temas ligados à economia e o desenvolvimento da região.

melhoreS do mercAdo

um dosador de precisão de FertilizaNtes, da agromac, de Passo Fundo; uma impressora térmica com autenticador, da Pertoprinter, de gravataí; e a unidade terminal remota para seccionadores de distribuição, da bcM engenharia, de Porto alegre, equipamento eletrônico para controlar o chaveamento de redes de distribuição de energia elétrica. esses foram os três produtos gaúchos vencedores do Prêmio distinção indústria 2008, promovido pela Fiergs. a premiação ocorreu no dia 20 de maio e teve como objetivo destacar os avanços tecnológicos da indústria gaúcha, aliados à viabilidade mercadológica dos produtos.

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lupa

AnáliSe de AlimentoS em rondôniA

em breve, as iNdústrias de carNes e laticíNios de roNdôNia não precisarão mais encomendar análises para seus produtos de laboratórios em outros estados. os testes poderão ser feitos no laboratório de análises físico-químicas e microbiológicas que vai ser instalado no município de rolim de Moura. o projeto, que está em fase de licitação, é resultado de uma parceria entre a prefeitura, empresas, a Fiero e o senai do estado. os produtos aprovados poderão receber a certificação do serviço de inspeção Federal (siF), uma exigência do Ministério da agricultura, emitida pelo próprio laboratório.

miSSão à penínSulA ibéricA

a Fiesp e o ceNtro das iNdústrias do estado de são Paulo (ciesp) organizam de 12 a 21 de junho uma missão multissetorial para a espanha e Portugal. o objetivo é apresentar as indústrias brasileiras a clientes potenciais e ampliar as relações comerciais com os dois países da Península ibérica, que têm servido como portas de entrada para produtos brasileiros na europa. as relações econômicas com esses países são das mais intensas. a espanha é o quinto país que mais investe no brasil, com destaque para o setor de infra-estrutura. já o comércio entre brasil e Portugal apresentou um crescimento de 20% de 2006 para 2007 e há ainda um grande potencial a ser explorado, na avaliação de especialistas.

portAl deSign

o seNai vai laNçar duraNte a FashioN rio, que ocorre de 7 a 13 de junho, na Marina da glória, o Portal senai design (www.senai.br/design). a página eletrônica, em formato de revista, trará atualidades das áreas de vestuário, mobiliário, calçados e artefatos. apresentará conceitos que inspirem projetos inovadores, atualizados e com foco nos clientes. o objetivo é atender às

necessidades de atualização de profissionais da indústria e do comércio, de profissionais e

estudantes da área.

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Hora de recuperar o tempo perdidoEconomista afirma que o Brasil perdeu a grande oportunidade de dar um salto educacional nos anos 1970. Mas agora, afirma, finalmente reunimos todas as condições para isso

por pAulo SilvA pinto

quaNdo se Fala em década perdida, a primeira que vem à cabeça dos brasileiros é a de 1980, pelo misto de altas taxas de inflação, moratória da dívida externa e taxas medíocres de crescimento do Produto interno bruto (Pib). segundo o economista ricardo Henriques, porém, a verda-deira década perdida foi a de 1970. É uma tese ousada quando se levam em conta as taxas anuais de dois dígitos de crescimento do Pib que o País conseguiu na época, e que nunca mais voltou a ver. Mas é no paradoxo, explica Henriques, que está o âmago da questão: naquele momento, em que sobravam recursos e a população era menor que hoje, o País deveria ter feito sua grande revolução educacional, levando escola com qualidade para todas as crianças e jovens.

as carências educacionais não foram resolvidas na época, explica Henriques, porque isso não era visto como um problema. À esquerda e à direita do espectro ideológico, era uma minoria que considerava a escola de qualidade um grande instrumento de transformação social do País. não mais. Hoje, diz ele nesta entrevista a Indústria brasileira, há ampla compreensão na sociedade de que esse é o caminho do desenvolvimento sustentado. secretário de educação continuada do Ministério da edu-cação entre 2004 e 2007, Henriques trabalha hoje no banco nacional de desenvolvimento econômico e social (bndes) e integra o conselho temático de educação da cni (veja reportagem na página 22).

apesar do consenso em torno do tema, não será fácil para o País avan-çar na área educacional, alerta Henriques. Porque hoje quase todos os países, incluindo os que estão bem à frente do brasil, investem pesada-mente para reformar seus sistemas de ensino. “Precisamos caminhar a uma velocidade maior do que a deles para reduzir a distância.”

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ricArdo Henriques

Indústria brasileira – Por que a educação no Brasil é pior do que gostaríamos que fosse?ricardo Henriques – a grande oportunidade perdida pelo País foi na década de 1970, em que o brasil vivia o boom econômico do pós-guerra e ainda tinha uma população relativamente pe-quena. duas coisas explicam isso: por um lado a dimensão conceitual-política, que é uma idéia das elites de que a educação não era tão impor-tante. isso existia tanto à esquerda quanto à di-reita. a tradição da esquerda era que o conflito de classes deveria se resolver de um modo em que a educação seria complementar, e a tradi-ção da direita era de que a educação deveria ser proporcionada só a quem já estava na elite. a educação não era vista como irrelevante, mas como algo secundário. Por outro lado, a agenda social naturalizou a desigualdade.

Ib – A desigualdade não era vista como um pro-blema?rH – o País criou a auto-ilusão de que o cres-cimento econômico seria suficiente para resolver a pobreza. e durante o Milagre econômico, o crescimento realmente atenuou a condição de precariedade extrema. Mas o que a história de-monstra é que no caso brasileiro – esta não é uma tese universal – a origem da pobreza está na de-sigualdade. ao longo da história não houve uma agenda para combatê-la. o primeiro período em que registramos crescimento com redução da de-sigualdade é de 2004 para cá. Para reduzir desi-gualdade é necessário distribuir ativos: terras – a nossa dívida histórica mais significativa –, crédito e educação. nos anos 1970, o ensino universitá-rio e a pesquisa cresceram fortemente, proporcio-nando uma nova inserção ao brasil. Mas houve

um descasamento entre isso e a educação básica, algo totalmente artificial, porque para ter ótima educação de 1ª a 8ª série é preciso ter uma óti-ma universidade. a educação básica só teve um salto de acesso nos anos 1990 e expandiu-se sem qualidade. certamente é possível trabalhar agora para construir essa qualidade, mas o esforço terá de ser maior. o foco continua a ser o mesmo de antes: é preciso trabalhar não só as crianças, mas também os pais e os irmãos, que já estão fora do sistema educacional.

Ib – As condições estão dadas para que ocorra agora o grande salto educacional?rH – sim. nos últimos anos, vários segmentos da população passaram a dar atenção ao proble-ma na sociedade organizada, incluindo os em-presários. todos entendem que não é possível ter um olhar de médio e longo prazo sem en-frentar o desafio educacional. de outro ponto de vista, o Plano de desenvolvimento da edu-cação [Pde, do governo federal] cria âncoras para esse trabalho. É um programa amplo, com mais de 40 ações, mas o que mais importa são duas ou três: com o Fundeb passa a existir uma linha de financiamento para toda a educação básica [incluindo a Fundamental e a Média] e de reequilíbrio regional. além disso, cria um padrão de desempenho do que se espera dos alunos e professores, com métricas que defi-nem metas a serem alcançadas em determina-do período. se nós conseguirmos pactuar com um sistema de financiamento e, com apoio da sociedade, criar compromissos em torno dessas metas, estamos com várias pré-condições dadas para o salto educacional. Podemos caminhar para a educação em tempo integral, em que não só se aumenta a capacidade de transmissão do conteúdo das disciplinas, mas se parte para uma educação mais ampla, com espaço para lazer e cultura. É necessária também a valorização de professores em termos salariais e em capacita-ção, incluindo métodos de ensino, gestão esco-lar e administração de conflitos. isso permitirá que a gente reduza nossas distâncias em relação ao resto do mundo.

A educação deve incluir não só quem

vai à escola, mas também pais e irmãos

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EntrE v ista

Ib – O Brasil é pior do que outros países do mesmo nível de desenvolvimento em termos educacionais?rH – o brasil está muito fraco em várias mé-tricas, o que está relacionado ao fato de que con-tinuamos com uma desigualdade muito grande, tanto social quanto educacional. um complica-dor é que no mundo contemporâneo a dimen-são do conhecimento tem valor cada vez maior. e a nossa desigualdade frente à fronteira, ao mundo desen-volvido, que tem universalida-de e qualidade maiores, não é fixa. a fronteira se move para frente. então a gente precisa caminhar a uma velocidade superior à dos demais países.

Ib – Temos avançado à velocidade necessária?rH – É difícil dizer, falta base empírica para isso. o fato é que nos últimos 15 anos, os pa-íses desenvolvidos têm investido muito mais do que antes em educação. Hoje, o que se diz é que as crianças têm de aprender a aprender, tendo a capacidade de leitura, a de cálculo e a

de pensar. a distância que há hoje entre os pais e as crianças, por conta da informática, é muito maior do que havia antes. e a distância relativa entre as crianças que não têm acesso à tecno-logia e as que têm é maior hoje do que era em décadas passadas. a desigualdade educacional no século 21 tem efeito ainda mais perverso do que teve na segunda metade do século 20.

Ib – Os alunos e os pais, principalmente nas ca-madas mais baixas, vêem a educação como uma maneira de ascen-são social?rH – acho que sim. Veja o Prouni [progra-

ma do governo federal de financiamento para os estudantes em faculdades particulares]: os jovens do ensino Médio enxergam a possibili-dade de entrar na universidade e passam a ter um desempenho muito melhor. Mas há tam-bém um lado negativo no ensino Fundamen-tal: as crianças vêem os irmãos mais velhos sem

A educação integral, com lazer, reduziria a evasão. Escola que não encanta é frágil

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14 indústr i a br asileir a junHo 2008

ricArdo Henriques EntrE v ista

emprego depois de 12 anos de estudo, o que é conseqüência do ensino de baixa qualidade, descontextualizado. É óbvio que ficam céticas.

Ib – O ceticismo é predominante nas escolas?rH – a cada 100 crianças que entram no ensi-no Fundamental, 60 terminam a 8ª série. Par-te dessa evasão está associada à desmotivação. É algo que poderia ser resolvido com a agenda da educação integral. uma educação que não á capaz de encantar, de seduzir, de mobilizar o aluno, é muito frágil, porque não consegue de-monstrar suas virtudes aos estudantes. Por que na alfabetização não posso trabalhar a idéia de alfabetização com letras de hip hop ou música sertaneja, que são as músicas ouvidas em casa pelos irmãos e pais dessas crianças? Por que eu não posso trabalhar com manifestação artística usando o grafite? são motivações que podem tornar o ambiente de aprendizado mais rico e aumentar a probabilidade de avanço dos estu-dantes. até mesmo a idéia da formação preci-sa ser relativizada. É enorme a quantidade de pessoas que têm determinada formação e vão trabalhar em áreas completamente diferentes

daquelas em que supostamente estavam aptas a atuar. e conseguem isso porque desenvolveram a idéia do aprender a aprender, de contexto, da adaptação, da capacidade de trabalhar em equi-pe, da liderança, de produzir conhecimento co-letivo. são essas as variáveis contemporâneas.

Ib – Há recursos para uma boa educação integral para todos?rH – Hoje a educação mobiliza no brasil cerca de 4,5% do Pib [Produto interno bruto]. com 8% poderíamos ter uma educação de grande qualidade, mas a partir de 6% do Pib já tería-mos algo significativo. É fundamental caminhar em direção à idéia de que a educação deveria ser o epicentro da política pública preocupada com a melhoria da qualidade de vida e garan-tia de maior dinamismo econômico-social. os recursos têm que ser direcionados a esse núcleo. É preciso também ter metas de desempenho e modos de controle. gastar bem é cobrar resul-tados a partir de condições dadas, desde que as condições sejam dadas.

Ib – Estamos caminhando nessa direção?rH – a evolução dos últimos anos vai nessa di-reção. daí a importância de rever casos de su-cesso que estão conseguindo orientar essa desti-nação orçamentária para desempenho, tanto nos estados quanto nos municípios. nós temos hoje uma arquitetura educacional, uma consciência educacional, uma determinação do Poder Públi-co e experiências que deram certo. o brasil já está maduro.

Ib – A educação pública do Brasil é hoje pior do que no passado?rH – algumas pessoas vivem repetindo isso, que não é verdade. É o mantra da idealização de um cenário. a escola pública dos anos 1950 era para muito poucos. Quando eu tenho poucos, eu consigo fazer com que ela tenha muita qua-lidade com mais facilidade. o grande desafio hoje é massificação com qualidade. Mas para isso precisamos de outro nível de investimento, outra tecnologia, outros parâmetros.

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todos contra a burocraciaA CNI está atrás de queixas contra o excesso de regras nos negócios e de sugestões para reduzir o problema. Com isso, levará propostas ao governo e ao Legislativo

SAndrA mAnfrini

o dia-a-dia do empresário brasileiro é repleto de Formulários a serem preeNchidos para a obtenção de licenças e atestados. É um emaranhado de papéis que consome recursos e incentiva a informalidade, prejudicando o ambiente de negócios no País. alguns procedimentos têm ficado mais fáceis com a criação do cadastro sincronizado nacional e da rede nacional para a simplificação do registro e da legalização de empresas e negócios (redesim). Mas a burocracia ainda é um grande obstáculo ao crescimento. o relatório Doing Business 2008, do banco Mundial, classifica o País na 122ª posição em termos de facilidades para fazer negócios, num ranking com 178 economias do mundo.

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o brasil, segundo o estudo do banco Mun-dial, está entre os países que exigem maior nú-mero de procedimentos para a abertura de uma empresa: 18 no total. em média, são necessários 152 dias para um empresário conseguir abrir seu negócio. dentre todas as economias pesquisadas, o País só é mais ágil que o congo, Haiti, guiné-bissau e suriname. se abrir um novo negócio é um pesadelo, fechar uma empresa pode ser ainda pior. o levantamento do banco Mundial indica que, no brasil, são necessários em média quatro anos para conseguir encerrá-la. e o custo disso para cada empresa fica, na média, em 12% da renda per capita do País (que no momento em que foi feito o estudo era de us$ 4.730).

a desburocratização é uma das dez priori-dades elencadas no documento Crescimento - A visão da Indústria, publicado pela cni, em 2006. É identificada também no Mapa Estra-tégico da Indústria 2007-2015, apresentado em 2005, como uma das bases necessárias para o desenvolvimento do País. de acordo com a cni, a desburocratização tem que ser discutida no mais elevado nível de governo para que as regras, normas e procedimentos sejam simplifi-cados, racionalizados e integrados. um dos de-safios é priorizar o tema no âmbito dos governos federal, estadual e municipal.

Para contribuir com esse processo, a cni está abrindo um canal de comunicação no qual re-

ceberá sugestões para superar os problemas coti-dianos das empresas brasileiras com a burocracia. isso poderá ser feito por meio de um espaço na página eletrônica da entidade (www.cni.org.br), que será implantado a partir deste mês. segun-do o gerente-executivo da unidade de Pesquisa, avaliação e desenvolvimento da cni, renato da Fonseca, todas as sugestões serão analisadas por uma equipe técnica e jurídica, levando em conta a importância e validade legal. a partir disso, a cni poderá construir uma proposta de ato nor-mativo, para o executivo, ou um projeto de lei, a ser encaminhado para o legislativo. “Quando tivermos um número relevante de propostas, va-mos apresentá-las e negociá-las com o governo e com o congresso”, afirma Fonseca.

foco nAS empreSAS

o foco do Projeto desburocratização da cni são as empresas, industriais ou não, porque são onde se sente o excesso de regulamentação de forma mais aguda. Poderão ser enviadas suges-tões, por exemplo, de simplificação de formulá-rios e cadastros; diminuição do número de pro-cedimentos e instâncias para aprovação de um registro ou certidão; e definição de prazos para respostas e prestação de serviços. Vale qualquer idéia de mudança que possa dar maior agilidade ao cotidiano das empresas.

A burocracia tira competitividade do brasil...Ranking de facilidade para os negócios em 178 países

...e a posição relativa do país tem pioradoDentre os 178 países, em cada item

Cingapura Japão Chile México China Argentina Índia Brasil

1

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33

44

83

109

120 122

FONTE: DOING BUSINESS 2008, BANCO MUNDIAL FONTE: DOING BUSINESS 2008, BANCO MUNDIAL

Fechamento de empresa

Comércio exterior

Pagamento de tributos

Obtenção de crédito

Registro de propriedade

Contratação de empregados

Licenciamento

Abertura de empresa

0 25 50 75 100 125 150

20072008

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cApA

o excesso de papéis, regras e procedimen-tos é um problema antigo no brasil e já ensejou até mesmo a criação de um Ministério da des-burocratização, no governo joão Figueiredo. o então titular da pasta empresta hoje o nome ao instituto Hélio beltrão, entidade sem fins lu-crativos que defende a causa da desburocratiza-ção. seu presidente, o advogado joão geraldo Piquet carneiro, afirma que a participação de entidades de classe e de empresas é fundamental para isso. “se o empresariado não se mobilizar, de fora para dentro, não conseguiremos mudar grande coisa. temos que despertar uma pressão política”, defende ele, do alto de sua experiência como consultor jurídico do programa liderado por beltrão na década de 1980 e de presidente da comissão de Ética Pública da Presidência da república de 1999 a 2004.

Piquet carneiro explica que a burocracia é um custo alto e crescente para o País e para as empresas. todas as facilidades recentes que surgi-ram, destaca, foram vinculadas à aplicação da lei geral da Micro e Pequena empresa. “as demais empresas estão submetidas a uma pesadíssima bu-rocracia, que é essencialmente tributária”, lembra (veja reportagem na página 32). segundo ele, a burocracia não só atrapalha o crescimento, como incentiva uma enorme injustiça social, pois impe-de o surgimento espontâneo de novas empresas. “Poucas empresas nascem grandes. se qualquer acidente de percurso impede o empresário de cres-cer, o que se está fazendo é congelar uma quanti-dade de empresas num certo nível”, alerta.

a cni implementou um programa de com-bate à burocracia em 1996, com ênfase para a desregulamentação. Foram sugeridas mudanças na legislação, com respostas positivas por par-te do executivo. um exemplo são as restrições que havia à utilização de créditos do imposto sobre Produtos industrializados (iPi). uma lei de 1996 estendeu a compensação para qualquer tributo federal. “o problema é que quando a co-brança pára, a burocracia volta”, nota Fonseca. Por isso, o Projeto desburocratização, que está sendo lançado agora, será mantido por tempo indeterminado.

todos os passos do projeto serão apresenta-dos pelo público de forma transparente, desde a coleta das sugestões até as respostas que virão do governo. o acompanhamento será disponibili-zado também na internet, no portal da cni.

o documento Crescimento - A Visão da In-dústria destaca que a burocracia excessiva gera custos elevados para as empresas, o governo e a sociedade em geral. estimativas apontam que até 25% do tempo útil da administração de uma empresa seja gasto para atender a exi-gências burocráticas. segundo a edição 2006 do estudo Doing Business, os procedimentos para obtenção de licenças impõem às empresas bra-sileiras um custo de 184% da renda per capita do País.

embora tenham sido beneficiadas por nova legislação, a micro e a pequena empresa conti-nuam a enfrentar problema. uma das proprie-tárias da confecção remar, de Manaus, emma-nuelle Pampolha, critica o excesso de certidões exigidas para o funcionamento do negócio. anualmente, a remar precisa renovar certidões em vários órgãos, incluindo a certidão ambien-tal junto ao instituto de Proteção ambiental do estado do amazonas (iPaaM). Pampolha conta que a certidão só tem validade depois de emitida quando a empresa publica o fato em jor-nal de grande circulação no estado. “os custos burocráticos e de publicidade são muito altos”, queixa-se a empresária.

PIQUET CARNEIRO: sem pressão política não haverá solução

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o iPaaM informa que segue determina-ção do conselho nacional do Meio ambiente (conama), válida para todo o País. no ama-zonas há ao menos dois atenuantes, por reso-lução do governo do estado: as empresas estão livres de anunciar os pedidos de licenciamento (a obrigação se restringe a concessões e renova-ções) e de anunciar no Diário Oficial (basta um jornal de grande circulação).

em brasília, a empresária cláudia salim de araújo por pouco não perdeu o cadastro de sua loja no simples nacional em conseqüência de erro de um órgão público e da demora em corrigir o procedimento. atuando há vinte anos no ramo de locação de roupas para casamento, cláudia percebeu, no ano passado, que algumas guias do imposto sobre serviços (iss) foram pagas com valores diferentes do que foi arrecadado.

ao constatar o erro, ela procurou a secreta-ria de Fazenda do governo do distrito Federal (gdF) e pagou a diferença. Passado um ano, recebeu uma cobrança do mesmo imposto. ao procurar o órgão responsável, verificou que o comprovante em seu recibo estava com erro de

digitação. durante um mês, ela foi toda sema-na a repartições públicas para tentar resolver a pendência.

“demorou um ano para que eles pudessem dar baixa em uma dívida que não existia. eu precisei recorrer a pessoas conhecidas para agili-zar o processo e não perder o prazo de cadastra-mento no simples”, conta. segundo ela, a baixa da dívida veio no último dia para adesão ao pro-grama simplificado de tributação para a micro e pequena empresa. “os funcionários reconhe-ciam que eu estava certa, mas não podiam fazer nada”, desabafa.

o problema que a empresária brasiliense en-frentou não é exceção no dia-a-dia de seus ne-gócios. Processos demorados, filas e dificuldades fazem parte do cotidiano do micro e pequeno empresário. outra grande queixa de araújo é dirigida à complexidade das leis trabalhistas, que prejudicam a agilidade nos negócios. ela teve de demitir uma funcionária competente que deixaria um cargo de chefia e voltaria a ser vendedora, porque a lei não permite a redução salarial.

EMMANUELLE PAMPOLHA

critica o excesso de

licenças necessárias

para seus negócios de

confecção em Manaus

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cApA

o Doing Business 2008 também aponta o brasil como um dos países com encargos sociais mais altos, em média de 37% sobre o salário, sem contar benefícios indiretos, como férias, 13º salário, fundo de garantia etc.

Para empresas que trabalham com ativos do conhecimento, há um outro complicador burocrático: pedidos de registro, certificação e patente, processos caros e complicados. segun-do o estudo mais recente do banco Mundial, o brasil ocupa a 110ª posição no ranking de facilidades para registro de propriedades. são necessários, em média, 14 procedimentos.

prejuízo no combAte à dengue

esse difícil e custoso caminho já é conhecido dos sócios da agribio, uma empresa carioca in-tegrante da incubadora de empresas de base tecnológica em agronegócios da universidade Federal rural do rio de janeiro. juntos, o bió-logo Marcelo castilho e a engenheira agrônoma Kátia castilho encontraram, há cinco meses, um inseticida natural contra o mosquito transmissor da dengue, o Aedes Aegypti. no entanto, até hoje o produto não pode ser comercializado.

“É frustrante. a gente trabalha, tem algo que pode ajudar a população e não consegue fazer nada”, conta castilho. ela explica que são vários os passos ainda a serem percorridos para a liberação do produto ao consumidor, o que pode ainda levar até um ano e meio. o bioin-seticida desenvolvido usa a bactéria presente na larva do mosquito. como se trata de um micro-organismo, a patente só pode ser obtida nos es-tados unidos – a legislação brasileira não aceita o registro de seres vivos.

“somos uma microempresa e não temos ca-pital para buscar esse registro nos estados uni-dos. corremos o risco de ter a propriedade da descoberta perdida para uma grande empresa”, afirma Kátia castilho.

a autorização depende da agência nacional de Vigilância sanitária (anvisa). todos os do-cumentos têm que ser protocolados em brasília pessoalmente ou por meio de escritórios profis-

sionais que fazem esse serviço. “sai muito caro”, queixa-se a agrônoma.

com a ajuda da universidade Federal rural do rio de janeiro e da incubadora de empre-sas da qual faz parte, a agribio vai fazer os tes-tes de impacto ambiental do inseticida, redu-zindo custos para cumprir uma das exigências da anvisa. o custo de todo esse processo para liberalização do comércio deve ficar em torno de r$ 20 a r$ 30 mil, segundo Kátia.

um edital recentemente lançado pela Fun-dação carlos chagas Filho de amparo à Pes-quisa do estado do rio de janeiro (Faperj) deu novo alento à agribio. a entidade vai selecionar projetos de inovação tecnológica a serem patro-cinados, o que poderá permitir à empresa obter a patente nos estados unidos.

CLÁUDIA ARAÚJO quase perdeu o registro da loja que tem em Brasília por um erro de digitação

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a base de tudoCNI instala o Conselho Temático da Educação, que discutirá as estratégias e ações para o fortalecimento de todos os níveis de ensino, mas principalmente do básico, identificado como alicerce para o desenvolvimento

por pAulo SilvA pinto

educação é base para a competitividade do país e da indústria. Por isso, a área é contemplada no Mapa Estratégico da Indústria 2007-2015, con-junto de ações de longo prazo para o desenvolvi-mento sustentável do País. Foi com esse espírito que a cni instalou no dia 8 de maio o conselho temático da educação, cuja atribuição será estimu-lar o debate sobre o tema no País; reunir, promover e divulgar estudos; e recomendar ações, com ênfase para o ensino do empreendedorismo. o conselho é presidido por eduardo eugênio gouvêa Vieira, presidente da Firjan e vice-presidente da cni.

os 24 integrantes (veja quadro na página ao lado) do conselho são figuras públicas de noto-riedade, com contribuições significativas à área, como o deputado Paulo renato souza (Psdb-sP), ministro da educação durante os dois man-datos do presidente Fernando Henrique cardoso, e o senador cristovam buarque (Pdt-dF), titular da pasta no início do primeiro mandato do presi-dente lula. “Vejo este conselho como um centro gerador de idéias, altamente criativo e com descor-tinada visão do futuro”, disse o presidente da cni, armando Monteiro neto, na cerimônia de insta-lação, na sede da entidade, em brasília.

os empresários vêm, há muito tempo, dispen-sando particular atenção ao tema. sabem que o futuro da indústria depende da educação e do co-nhecimento. a concorrência no mercado global se dá com países nos quais os recursos humanos têm maior e mais sólida escolaridade e competência. o presidente da associação brasileira da indús-tria de Máquinas e equipamentos (abimaq), luiz aubert, hoje integrante do conselho, observa que uma das maiores dificuldades da indústria brasilei-

ra é encontrar mão-de-obra qualificada. “esse é o nosso gargalo.” na visão do economista e consul-tor da cni josé Pastore, as profissões industriais exigem qualificação cada vez maior, premidas pela velocidade da inovação: “um gráfico há 30 anos vivia com o macacão sujo de graxa. Hoje, opera um computador”.

a educação básica deve ser um dos principais focos do conselho. “sem isso, não temos enge-nheiros lá na frente”, afirma aubert, da abimaq. “o brasil não é uma economia de baixos salários, e portanto deve competir por meio da inovação, o que não pode ocorrer sem qualidade na educação básica”, diz, por sua vez, o diretor-executivo da cni, josé augusto Fernandes.

gouvêa Vieira, presidente do conselho, chama a atenção para o fato de que países desenvolvidos, como a França, investem pesadamente para ga-nhar qualidade em seu sistema educacional. “a fronteira se move e precisamos caminhar a veloci-dade superior à dos demais países”, opina o econo-mista ricardo Henriques, ex-secretário de educa-ção continuada do Ministério da educação (veja entrevista na página 10).

o brasil deixou de dar o grande salto edu-cacional na década de 1970, critica Henriques, quando as condições econômicas para enfrentar o problema eram mais favoráveis que hoje. o atraso reforçou, segundo ele, a grande disparidade social do País, algo também apontado pelo presidente do conselho. gouvêa Vieira lembrou que em 1827, na criação da entidade que originou a cni, a es-cravidão era considerada por industriais “a grande chaga” brasileira. “Hoje a nossa escravidão é a dife-rença abissal de educação no País”, criticou.

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educAção

Paulo renato reconhece o papel decisivo dos empresários no debate sobre a educação no brasil: “o atual governo adotou a agenda do compromisso todos pela educação por pressão empresarial”. armando Monteiro rememora que a cni nasceu com a marca da educação, mos-trando a preocupação em relação ao tema já os-tentada na década de 1940 pelos fundadores da entidade, roberto simonsen e euvaldo lodi.

além de ser uma das prioridades do Mapa Estratégico, a educação é central nas ações do sistema indústria. o programa Educação para a Nova Indústria, lançado no ano passado, visa ao incremento de 30% nas matrículas do senai, braço do sistema indústria para a educação Profissional, e do sesi, que tem como foco a educação básica. o programa articula educa-

conselho temático de educação da cniPRESIDENTEEduardo Eugênio Gouvêa VieiraPresidente da FIRJAN e vice-presidente da CNI

MEMbROSPaulo DelgadoEx-deputado federal, consultorPaulo Renato de SouzaEx-ministro da Educação, deputado federal (PSDB-SP)Cristovam buarqueEx-ministro da Educação, senador (PDF-DF)Cláudia CostinVice-presidente da Fundação Victor CivitaCláudio Moura de CastroConsultorLuis Carlos ScavardaPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ)José PastoreConsultor da CNIRicardo HenriquesBNDESRegina Célia EstevesSuperintendente-executiva da Alfabetização Solidária (Alfasol)Celso AntunesProfessor da Universidade de São Paulo (USP)Gustavo IoschpeColunista da revista VEJAMaria Helena Guimarães de CastroSecretária de Educação do estado de São Paulo

Ednilton Gomes de SoaresConselho Temático de Educação da FiecLuiz Fernando Santos ReisPresidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon)Milú VillelaCoordenadora da Comissão de Articulação do Compromisso Todos pela EducaçãoLuiz Aubert NetoPresidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq)Marcelo Ribeiro TunesDiretor de Assuntos Minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram)Eduardo Tadao TakahashiFundação Padre Leonel FrancaRicardo Menna barreto FelizzolaDiretor da FiergsViviane SennaPresidente do Instituto Ayrton SennaCarlos Roberto Rocha CavalcanteSuperintendente do IELAntonio Carlos brito MacielDiretor-superintendente do SESIJosé Manuel de Aguiar MartinsDiretor-geral do SENAI

ção básica, continuada e Profissional, com me-tas objetivas, que segundo o primeiro balanço vêm sendo atingidas e até mesmo superadas.

até 2010, o sesi deverá ter 40% das ma-trículas em período integral. Para 2007, o nú-mero de matrículas em período integral ficou em 8.165, o que representa 90,7% da meta de 9.000 matrículas estabelecida para o ano. as 948,4 mil matrículas na educação continua-da do sesi representaram 94,8% do número fixado para o ano. o senai superou em 3,2% o a meta total de matrículas prevista para 2007, de 2.109.089 (houve 2.175.928 matrículas). na educação superior, a cni mantém o programa Inova Engenharia, que tem por objetivo moder-nizar o ensino das engenharias no País, com vistas à inovação tecnológica.

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políticA industriAl

só é possível ao brasil crescer de Forma robusta e sustentada com uma indústria forte, inovadora e com presença relevante no mercado global. a idéia fundamenta a Política de desen-volvimento Produtivo (PdP), lançada em mea-dos do mês passado na sede do banco nacional de desenvolvimento econômico e social (bn-des), no rio de janeiro, diante de 10 governa-dores e 11 ministros.

a PdP é um conjunto de medidas que tem por objetivo elevar investimentos no País e também a quantidade e a qualidade das exportações. “Que-remos consolidar a vitória sobre 25 anos de incer-tezas e crescimento baixo”, afirmou o presidente luiz inácio lula da silva. na avaliação da cni, é um grande mérito do governo trazer a política industrial ao primeiro plano das discussões nacio-nais. o problema é que faltam muitas condições no ambiente de negócios do País para transformar as intenções do governo em realidade. construir essas condições exige, antes de mais nada, um grande esforço fiscal e a aprovação de reformas constitucionais, incluindo a tributária.

as metas da PdP são ousadas. o total de investimentos em relação ao Produto interno bruto (Pib) deverá crescer dos 17,64% registra-dos no ano passado para 21% em 2010. no caso dos investimentos privados em pesquisa, o au-mento deverá ser de 9,8% no período, passando de 0,51% do Pib para 0,65%. a participação brasileira nas exportações mundiais deverá pas-sar dos atuais 1,18% para 1,25% daqui a dois anos. e o número de pequenas e micro empre-

sas exportadoras deverá crescer 10% ao ano (veja quadro abaixo).

Para chegar lá, o governo oferece incentivos a diversos setores, com renúncia fiscal estima-da em r$ 21,4 bilhões até o final de 2010. o bndes reduzirá juros em vários de seus pro-gramas, abrindo mão de r$ 1 bilhão em re-ceita no período. Há um grande número de programas e ações (veja quadro na página 27),

construindo o desenvolvimentoA nova política industrial, mais abrangente que a anterior, busca aumentar os investimentos e as exportações. Permanecem, porém, dois obstáculos para conseguir isso: juros altos e desequilíbrio cambial

por pAulo SilvA pinto e AuguSto gAzir, do rio de jAneiro

metas

INVESTIMENTOS

21% do PIb até 2010No ano passado, os investimentos de R$ 450 bilhões fo-ram equivalentes a 17,6% do Produto Interno Bruto (PIB). O objetivo é chegar a R$ 620 bilhões até 2010.

PESQUISA DAS EMPRESAS

0,65% do PIb até 2010Os investimentos das empresas em pesquisa e desenvol-vimento se limitaram a 0,51% no ano passado. Precisam chegar a 0,65% em 2010, um aumento de 9,8%.

ExPORTAÇõES

1,25% do comércio mundial até 2010Atualmente, o Brasil detém 1,18% do comércio mundial.

MICRO E PEQUENA ExPORTADORA

12.971 empresas até 2010Segundo os dados mais recentes, de 2006, o País tinha 11.792 micro e pequenas empresas exportadoras. O objetivo é que esse número cresça 10% ao ano até 2010, chegando a 12.971 micro e pequenas empresas exportadoras.

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algumas das quais consistem na prorrogação de medidas já anunciadas anteriormente, por exemplo na MP do bem.

Foram contemplados na PdP 25 setores. “ou-tros poderão ser acrescentados”, afirmou o presi-dente do bndes, luciano coutinho, ao explicar que a PdP será constantemente avaliada e atua-lizada. a responsabilidade sobre a governança da PdP é do ministro do desenvolvimento, indústria e comércio exterior, Miguel jorge, que irá se reu-nir com todas a Federações de indústrias do País para discutir as medidas.

empresários elogiaram a PdP, embora façam ressalvas aos obstáculos macroeconômicos para atingir os objetivos que o governo propõe. o presi-dente da cni, armando Monteiro neto, afirmou em seu discurso na cerimônia do anúncio das me-didas que desde o primeiro mandato do presiden-te lula a política industrial “voltou para a agenda nacional”, estabelecendo uma diferença em rela-ção a outros momentos em que se acreditava que a gestão responsável da macroeconomia era suficien-te para fomentar o desenvolvimento industrial. Monteiro neto considera a PdP um programa abrangente e bem focado. afirmou, porém, que os juros altos impedem as empresas de investir mais. criticou também o desequilíbrio cambial, que re-

ÁREAS ESTRATéGICAS

Equipamentos médicos

Energia nuclear

Tecnologias de informação e comunicação

Nanotecnologia

Biotecnologia

Defesa

CONSOLIDAÇÃO DE LIDERANÇA

Bioetanol

Petróleo, gás natural e petroquímica

Aeronáutico

Celulose, papel, mineração e energia

Carnes

FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE

Automotivo

Bens de capital

Naval

Têxtil

Couro

Madeira e móveis

Agroindústria

Biodiesel

Construção civil

Serviços

Higiene e cosméticos

Plásticos

Setores industriais contemplados com programas específicos

duz a competitividade das exportações brasileiras. Para o presidente da cni, é necessário buscar o controle da inflação por meio de cortes nos gastos de custeio da administração pública. “a política industrial tem de ser articulada com a política ma-croeconômica. a manutenção da estabilidade tem recaído sobre a política monetária, porque não tem havido contrapartida fiscal”, afirmou.

outro ponto que precisa melhorar, segundo os empresários, é o diálogo entre os empresários e o governo. também no discurso na cerimônia de apresentação da PdP, Monteiro neto cobrou a retomada das atividades do conselho nacional de desenvolvimento industrial (cndi). criado por sugestão da cni para o acompanhamento da polí-tica industrial, o conselho não se reúne há um ano e meio. o presidente da Fiesp, Paulo skaf, afirmou na cerimônia que é necessária maior participação do setor produtivo na formulação das políticas. “nós sugerimos, fomos ouvidos (sobre a PdP) e contemplados. Mas, a formatação do projeto foi a portas fechadas, no âmbito governamental, e isso não é correto”, criticou o presidente da Fiesp. sobre a política em si, skaf afirmou que toda de-soneração é positiva. “Vamos agora analisar, nos debruçar sobre o plano, aplaudir e apoiar tudo de positivo e buscar eventuais correções de rumo.”

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políticA industriAl

principais medidas Prorrogação até 2010 da depreciação acelerada em 50% do prazo e do crédito de 25% do valor anual da depreciação contra a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL)

Redução do prazo de apropriação de créditos derivados da aquisição de bens de capital de 24 para 12 meses

Eliminação da incidência do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 0,38% nas operações de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep)

Redução de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para determinados setores

Ampliação do funding do BNDES (participação em empresas), com desembolso total projetado para indústria e serviços entre 2008 e 2010 de R$ 210,4 bilhões

Redução de 20% no spread básico médio do conjunto de linhas de financiamento do BNDES, de 1,4% para 1,1% ao ano

Redução de 40% do spread básico de 1,5% para 0,9% ao ano para linhas de financiamento de bens de capital

Duplicação do prazo para a indústria de bens de capital no Finame (linha do BNDES), de cinco para dez anos

Redução da taxa de intermediação financeira de 0,8% para 0,5%

Criação do Fundo Soberano, por meio do qual será financiada a expansão de empresas brasileiras no exterior

TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO

Dedução em dobro, para determinação da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da CSLL, das despesas com programas de capacita-ção de funcionários

Permissão para que as empresas possam deduzir da base de cálculo do IRPJ e da CSLL os dispêndios de pesquisa e desenvolvimento multiplicados por um fator de até 1,8

Redução para 50% do percentual de exportação requerido para usufruto dos incentivos fiscais

Redução para o setor de tecnologia da informação da contribuição patronal para a seguridade social sobre a folha de pagamento para até 10% e da contribuição para o Sistema S para até zero, de acordo com a participação das exportações no faturamento da empresa

Implantação de novo Prosoft (para o financiamento do setor softwares): R$ 1 bilhão entre 32007 e 2010

ExPORTAÇõES

Aumento do orçamento do Proex para R$ 1,3 bilhão em 2008

Implantação de novo programa Revitaliza Exportações, com taxas de juros equalizadas de 7% ao ano, bônus de adimplência e dotação de R$ 9 bilhões por ano até 2010

Ampliação do Drawback verde e amarelo: suspensão de pagamento de PIS/COFINS na compra de insumos para bens de exportação e redução de IRPJ

Extensão do Fundo de Garantia à Exportação (FGE) a empresas com exportação anual de até US$ 1 milhão

o presidente da agência brasileira de Promo-ção de exportações e investimentos (apexbrasil), alessandro teixeira, também chama a atenção para o fato de que a PdP depende de boa coor-denação dentro do governo e de um bom diálogo com o setor produtivo. segundo ele, a elaboração do plano já representa um entrosamento melhor entre governo e iniciativa privada. “a política tem de ser construída a cada dia e pactuada com o setor privado. É importante a cobrança do pre-sidente da cni de que precisamos de uma maior interação”, disse. a governança política da PdP estabelece que o ministro Miguel jorge coorde-nará o bndes, os ministérios da Fazenda e da ciência e tecnologia e a associação brasileira de desenvolvimento industrial (abdi), dependen-do do programa. a casa civil também acompa-nhará os trabalhos, e os relatórios serão apresen-tados ao cndi. “a arquitetura de diálogo com o governo estimula a auto-organização dos setores: quem for organizado tende a encontrar uma ja-nela”, afirmou o diretor-executivo da cni, josé augusto Fernandes.

a versão anterior da política industrial, anun-ciada em 2004, concentrava-se em quatro setores: softwares, fármacos, bens de capital e semicondu-tores. sem excluí-los, a PdP é bem mais abran-gente. os setores foram divididos em três grandes grupos. o primeiro inclui aqueles considerados estratégicos para o País: complexo industrial da saúde, tecnologias de informação e comunicação (tics), energia nuclear, complexo industrial de defesa, nanotecnologia e biotecnologia. no segun-do grupo, estão os setores em que o governo quer fortalecer a competitividade das empresas indus-triais brasileiras: complexo automotivo, bens de capital, têxtil, mobiliário, higiene e cosméticos, construção civil, naval, couro e calçados, biodiesel e plásticos, entre outros. no terceiro grupo, estão incluídas empresas brasileiras que já possuem lide-rança mundial, mas precisam consolidar e ampliar sua participação no mercado. É o caso das indús-trias aeronáutica, de petróleo, mineradora, de eta-nol, siderúrgica, de celulose e de carnes.

além de incluir grande número de setores, a PdP é muito detalhada nos programas e medidas

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28 indústr i a br asileir a junHo 2008

políticA industriAl

destinadas a cada setor. somente no caso da in-dústria de softwares e de serviços de tecnologia da informação, por exemplo, há 15 medidas, quatro das quais consistem em desoneração tributária. se conseguirem aumentar as exportações, as empre-sas poderão ter desconto na contribuição patronal à seguridade social. Para que isso não aumente o déficit da Previdência, o tesouro nacional vai compensar esse pagamento. o presidente da as-sociação brasileira de empresas de tecnologia de informação e comunicação (brasscom), antonio gil, afirma que a medida terá grandes resultados para o setor, pois a mão-de-obra representa 70% do custo total da indústria. “Hoje quase toda a produção está concentrada na Ìndia, e o mundo busca alternativas”, disse. gil estima que a medida vai gerar 100 mil novos empregos. “o brasil ex-porta apenas us$ 800 milhões anuais, para um mercado interno de us$ 20 bilhões. o potencial é exportar us$ 5 bilhões em 2010.”

o presidente da associação brasileira da indús-tria elétrica e eletrônica (abinee), Humberto bar-bato, afirmou que esperava que essa medida de de-

soneração da folha de pagamentos fosse estendida também aos setores de produção de equipamentos. “nem todas as reivindicações que apresentamos ao governo foram atentidas, mas várias foram. a PdP é positiva. dou nota oito”, afirmou. o presi-dente da associação nacional dos Fabricantes de Veículos automotores (anfavea), jackson schnei-der, disse que a PdP fará grande diferença para o setor e para a economia do País. “Vejo a PdP com muito bons olhos. desafios existem, mas podem ser superados”, afirmou. ele considera necessário aos empresários prestar atenção e cobrar a regula-mentação das medidas anunciadas.

Para o presidente do conselho de Política in-dustrial da cni, rodrigo da rocha loures, um dos aspectos mais importantes da PdP é que contempla a perspectiva de formulação de po-líticas regionais ou estaduais complementares. “não é possível imaginar que as dimensões con-cretas da política industrial possam ser iguais em todas as partes do País. Há especializações regionais significativas na estrutura industrial”, afirmou loures.

FÁBRICA DA EMBRAER:

o setor aeronáutico

é um dos que foram incluídos na nova política

industrial com o objetivo de consolidar a

liderança que o País já possui

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tEndência s Econômica s inflAção

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Preços de alimentos pressionam a metaRecrudescimento da inflação é fenômeno mundial, em especial entre países emergentes, que não usam instrumentos de política econômica para reverter o processo

por flávio cAStelo brAnco

uci e horas trabalhadas na produçãoÍndice, Base: 1996 = 100

Indicador UCI Horas trabalhadas

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jan/06 abr/06 jul/06 out/06 jan/07 abr/07 jul/07 out/07 jan/08

ipcA e igp-diVariação acumulada em 12 meses

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abr/06 jul/06 out/06 jan/07 abr/07 jul/07 out/07 jan/08 abr/08

a ampliação das pressões exterNas sobre a inflação e a manutenção de um forte ritmo da ati-vidade econômica são os destaques da economia no momento. ressalte-se que a sustentação da atividade ocorre simultaneamente à maturação de investimentos realizados no passado. esses investi-mentos levaram à expansão da capacidade produ-tiva na indústria, o que reduz os riscos de elevação da inflação por razões internas.

o aumento da atividade industrial nos primei-ros meses de 2008 não veio acompanhado de pres-são sobre o grau de utilização da capacidade insta-lada na indústria. os dados da cni, referentes ao primeiro trimestre de 2008, registram ampliação de 2,1% das horas trabalhadas na produção na in-dústria, comparativamente ao último trimestre de 2007, após ajuste sazonal. no mesmo período, o nível médio de utilização da capacidade instalada permaneceu estável, em torno de 83%. isso mos-tra que as empresas industriais estão produzindo mais, sem gerar pressões sobre a oferta de produ-

tos. essa situação tornou-se possível em função dos ganhos de produtividade ou da expansão do parque fabril.

a fonte maior do crescimento vem da demanda interna, que se mantém em vigorosa expansão. as vendas no varejo aumentaram 12% no primeiro trimestre de 2008, relativamente ao mesmo perí-odo de 2007. com a demanda em alta, torna-se imprescindível que o ritmo de realização de inves-timento também se intensifique, para que o cres-cimento econômico permaneça equilibrado e não gere pressões sobre preços de origem doméstica.

as pressões atuais sobre a inflação são, prepon-derantemente, de origem externa e têm contribu-ído para que o iPca acumulado em doze meses ultrapasse os 5% – acima, portanto, do centro da meta de inflação. o grupo alimentação ainda é o maior responsável pela pressão inflacionária ao consumidor: contribuiu com 52% da inflação nos últimos 12 meses (até abril). no entanto, os núcle-os de inflação também registraram movimento de

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inflação: comparação entre brasil, países emergentes e países desenvolvidosVariação anual (%)

Brasil Países em desenvolvimento Países desenvolvidos

12,5

9,3

5,7

3,1 4,5

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5,5

7,4

2,1 1,6 2,4 2,4 2,0

-

3

6

9

12

15

2002 2003 2004 2005 2006 2007

7,6

2,9

FONTE: WORLD ECONOMIC OUTLOOK/FMI

aceleração, o que denota a existência de dissemina-ção das pressões pontuais.

os índices de preços gerais e no atacado – como o igP e o iPa – já alcançam dois dígitos em doze meses. os preços no atacado seguem pressionados pelas matérias-primas brutas (com alta de 28,1%) – especialmente as comercializáveis (44%) e de processamento industrial para fins de alimentação (25,7%). a continuidade dessa ten-dência leva ao receio de disseminação das altas de preços e elevação das expectativas de inflação não apenas para 2008, como também para 2009, por conta de futuros reajustes de preços indexados a esses índices.

esse cenário levou o banco central a elevar os juros em abril e, claramente, sinalizar um novo ciclo de aperto monetário de dimensão e intensi-dade ainda não explicitadas. a decisão de aumen-tar os juros de forma mais agressiva expressa um descompasso entre as políticas fiscal e monetária. a resposta mais eficaz e com menor ônus ao se-tor produtivo é a melhor coordenação da política econômica, com a adequação da política fiscal às necessidades da estabilidade. avaliamos que há ne-cessidade de reverter a atual política fiscal expan-sionista, que impõe à política monetária a ancora-gem primordial da inflação. a elevação da meta de superávit primário, um esforço de contenção fiscal que exige redução no ímpeto do crescimento dos gastos, é um movimento que daria maior coerên-cia e robustez à política macroeconômica.

claramente há espaço para um maior contro-le fiscal. o primeiro trimestre de 2008 foi muito favorável às contas públicas, em especial no que se refere ao resultado do governo central. o superávit primário do setor público consolidado alcançou r$ 43 bilhões, contra r$ 27,3 bilhões no mesmo período do ano passado. a ampliação de r$ 18,4 bilhões para r$ 31,8 bilhões no resultado do go-verno central responde por 85% do crescimento do superávit primário total.

embora o forte crescimento da receita líquida no último trimestre tenha contribuído para a melho-ria nas contas primárias do governo central, houve alguma redução no ritmo de crescimento das des-pesas. no primeiro trimestre de 2008, comparati-

vamente ao ano anterior, as despesas totais tiveram um aumento real de 3,5%, contra 8,8% no mesmo período de 2007. Parte desse menor crescimento se explica pela demora na aprovação do orçamento da união, que impede determinadas liberações de gasto, e não pelo maior rigor fiscal nos gastos. ao contrário, novas despesas foram anunciadas após a aprovação do orçamento.

devido à elevação dos juros domésticos, o real continua em nítida trajetória de valorização – es-pecialmente frente ao dólar. a forte entrada de mo-eda estrangeira é, em parte, devida à classificação de grau de investimento, atribuída ao brasil por duas das agências classificadoras de risco. adicio-nalmente, os papéis brasileiros seguem muito atra-tivos, por conta dos agressivos cortes nas taxas de juros norte-americanas, aliadas à recente retomada de uma política monetária restritiva no brasil.

Finalmente, cabe ressaltar que a aceleração da inflação é um fenômeno mundial, em especial um problema crescente entre os países emergen-tes. a inflação dos alimentos é a maior fonte de pressão, pois na maioria dos países emergentes a cesta de alimentos tem peso bastante elevado nos índices na maioria desses países. esse processo re-flete alterações mais permanentes nos padrões de consumo dos emergentes e deve significar uma mudança de preços relativos. É também impor-tante observar que inexistem ações de política econômica, nesses países, voltadas a conter as pressões inflacionárias atuais.

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superando obstáculosProposta de Reforma Tributária avança na Câmara dos Deputados com boa chance de aprovação, apesar das críticas da oposição e da própria base aliada

por rodrigo ledo

após mais de uma década de teNtativas, a reforma tributária enviada pelo governo ao congresso nacional em fevereiro deste ano ca-minha para emplacar, após sucessivas frustra-ções, resultados efetivos para simplificar a legis-lação, reduzir distorções e acabar com a guerra fiscal entre os estados. a tramitação da Propos-ta de emenda à constituição (Pec) 233/2008 avançou nos últimos meses na câmara dos de-putados preservando-se o texto-base do gover-

no, apesar das queixas da oposição e até mesmo dos aliados sobre a timidez das medidas previs-tas e dos trechos que podem dar margem à cria-ção de novos impostos.

a reforma teve aprovado o parecer de cons-titucionalidade na comissão de constituição e justiça (ccj) no início de abril e segue com o apoio da maioria governista na câmara. a co-missão especial que analisa a matéria deve vo-tar o relatório final até o final deste mês, o que

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congresso

permitirá votação no plenário em julho, se tudo ocorrer conforme os planos do relator da maté-ria, o deputado sandro Mabel (Pr-go).

a equipe econômica do governo e o relator afirmam que se trata de uma reforma “possível”, em vez da “ideal”. eles admitem que a Pec não ataca diretamente e em curto prazo problemas do atual sistema tributário. o principal é o tamanho excessivo da carga sobre o contribuinte – a re-forma passa longe do tema, limitando-se a re-distribuir receitas. outro senão é o fato de que contribuintes mais pobres pagam proporcional-mente mais do que os outros, algo que não de-verá ser reduzido pelo grande peso dos impostos que incidem sobre o consumo.

segundo parlamentares aliados do governo, porém, a limitação da reforma é exatamente o que proporciona chances razoáveis de aprova-ção no congresso. “se formos mais longe que isso e começarmos a incorporar idéias de todos os lados, a reforma empaca novamente”, aler-ta Mabel. “devemos fazer a base de um novo sistema tributário agora e aprimorá-lo depois.” o deputado Paulo renato souza (Psdb-sP), segundo-vice-presidente da comissão especial que trata da matéria, discorda: “uma proposta ousada traria mais benefícios e, portanto, teria mais chances de ser aprovada.”

o coração da reforma são as mudanças no imposto sobre circulação de Mercadorias e ser-viços (icMs) e a criação do imposto sobre Valor adicionado Federal (iVa-F). no primeiro eixo, a Pec unifica o icMs ao introduzir uma legisla-ção nacional em substituição às 27 leis estaduais existentes e à do distrito Federal. a infinidade de alíquotas existente hoje cai para no máximo cinco. trata-se de uma contribuição significativa para reduzir o cipoal que existe atualmente no País segundo o instituto brasileiro de Planeja-mento tributário (ibPt): 3.200 leis, normas e decretos para regulamentar 61 tributos.

o novo icMs acabará com a guerra fiscal e diminuirá a insegurança jurídica que prejudica o planejamento tanto do Poder Público quanto do setor privado. Mas anulará isenções ou des-contos do icMs feitos pelos governos estaduais

para atrair investimentos, principalmente nas regiões norte, nordeste e centro-oeste. Para compensar, haverá o Fundo nacional de de-senvolvimento regional (Fndr). os governos estaduais querem que a nova regra seja aplicada apenas em relação a novos incentivos – a pro-posta atual estabelece que os benefícios já con-cedidos sejam financiados pelo Fndr. o novo fundo deverá contemplar as três regiões citadas e microrregiões pobres do sul e sudeste, com verbas provenientes do imposto sobre Produtos industrializados (iPi) e do imposto de renda (ir). o percentual da arrecadação desses tribu-tos para o Fndr crescerá, gradualmente, dos atuais 4,1% destinados aos mecanismos vigen-tes de fomento até 4,8%, no ano de 2016.

origem e deStino

outra modificação, para transações interesta-duais, é a transferência da cobrança do tributo, que ocorre hoje quase integralmente na origem – o estado de onde sai a mercadoria – para o destino. em vez dos 12% ou 7% (dependen-do da destinação da venda) cobrados no local de partida, a alíquota passará para 2%. a cada ano, um ponto percentual será subtraído. isso representa perdas expressivas de receita para os estados produtores, como são Paulo e Minas gerais. Para compensá-las, foi prevista a criação do Fundo de equalização de receitas (Fer). É grande, porém, a chance de aprovação de uma emenda à Pec elevando a alíquota interestadu-al de 2% para 4%, de forma a reduzir as perdas dos estados produtores. “além de são Paulo, vá-rios estados concordam com essa proposta”, diz o secretário de Fazenda paulista, Mauro ricar-do Machado costa.

a parte federal da reforma consiste em subs-tituir várias contribuições pelo iVa-F, sem redu-zir a carga total. isso inclui a contribuição para o Financiamento da seguridade social (cofins), o Programa de integração social (Pis), o salário-educação e a contribuição de intervenção no do-mínio econômico incidente sobre a comerciali-zação de combustíveis (cide). já a contribuição

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social sobre lucro líquido (csll) será incor-porada ao imposto de renda da Pessoa jurídica (irPj), também sem redução da carga.

o secretário de Política econômica do Mi-nistério da Fazenda, bernard appy, argumenta que, embora as mudanças não acarretem menor desembolso para o contribuinte, têm o mérito de simplificar o sistema e corrigir distorções como a da centralização de receitas pela união. como impostos, esse tributos serão divididos também com estados e municípios, o que não ocorre com contribuições.

Muitos, porém, vêem o iVa-F como algo limitado demais. empresários e tributaristas defendem a inclusão do iPi na lista de tributos a serem aglutinados. o governo resiste à idéia sob o argumento de que isso inviabilizaria a concessão de benefícios da Zona Franca de Ma-naus. o senador Francisco dornelles (PP-rj) tem uma idéia ainda mais radical. ele propõe a criação de um iVa nacional, englobando tanto o iVa-F quanto o icMs. secretário da recei-ta Federal no governo Figueiredo e ministro da Fazenda no início do governo sarney, dornelles

preparou um relatório em substituição à refor-ma proposta pelo governo, que foi apresentado à comissão de assuntos econômicos (cae) do senado – não se trata, porém, de uma proposta em tramitação. dornelles ressalta que um iVa nacional reduziria o complexo código tributá-rio. e não haveria risco de centralização dos re-cursos, que poderiam ser divididos facilmente pelos bancos na arrecadação. grande parte das emendas apresentadas pelo Psdb na câmara baseia-se na proposta de dornelles, ironicamen-te um senador da base governista.

os argumentos governamentais foram pos-tos à prova nas audiências públicas realizadas pela câmara dos deputados desde abril, em que as críticas se sobrepuseram aos elogios. “não é plausível aprovar uma reforma que não atenda o contribuinte, sob argumento de que é a alteração possível”, observa o presidente do ibPt, gilberto amaral. ele critica o texto so-bre o iVa-F por dar margem à criação de um novo tributo federal, abrangendo a circulação de bens e serviços, mesma base de incidência do icMs. “a proposta do governo é ampliar a base

brasil lidera complexidadeHoras gastas pelas empresas, por ano, nos procedimentos para pagar impostos

2500

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Impostos sobre salários

268 271 290 296

552 615

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2600

350350

FONTES: BANCO MUNDIAL (BIRD) E CONSULTORIA PRICE WATERHOUSE COOPERS

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congresso

de cálculo. isso significa que o imposto poderá incidir sobre tudo – movimentação financeira, bens e serviços –, além de abrir possibilidade para cobrança de pessoas físicas.”

o presidente da confederação nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski, manifesta receio semelhante. “da forma como está, a reforma abre possibilidade de aumento da carga”, diz Ziulkoski, embora veja benefícios na Pec, como a simplificação das leis e o compartilhamento das verbas do iVa-F com os municípios.

a única alteração de tributo federal com promessa de diminuição da carga, e mesmo assim na legislação complementar, é a redução da contribuição das empresas à Previdência so-cial, hoje fixada em 20% do valor do salário do trabalhador. o assunto deverá ser regulado por legislação complementar. uma vez aprovada a nova lei, a cada ano haverá redução de um pon-to percentual até chegar ao patamar de 14%.

Para o presidente da cni, armando Montei-ro neto, “é preciso haver garantias concretas de que não teremos aumento da carga tributária”. ele afirma que a manutenção de impostos sobre operações financeiras configura outra lacuna da Pec no aspecto da competitividade das empre-sas e facilidade de consumo das famílias. “a re-forma não oferece solução para a tributação sobre o crédito”, lamenta armando Monteiro.

o relator sandro Mabel promete corrigir pelo menos o que dá margem a dúvidas. como exem-plo, a regulamentação dos fundos de compen-sação do novo icMs. “estamos pegando idéias para criar uma proposta robusta e tranqüilizar os governadores, demonstrando que eles não terão perdas”, explica. o otimismo também marca o discurso do presidente da comissão especial na câmara, deputado antonio Palocci (Pt-sP). segundo ele, apesar das queixas e demandas, a base governista aprovará a reforma: “as condi-ções são razoáveis para votá-la ainda no primeiro semestre e remetê-la ao senado.”

Para o presidente da central única dos traba-lhadores (cut), artur Henrique santos, a maior preocupação reside na diminuição da contribui-ção patronal ao ao instituto nacional do seguro

social (inss) e a extinção das contribuições que revertem para as áreas de saúde e assistência so-cial. “não podemos correr o risco de não termos garantidos os recursos, no percentual necessário, para a Previdência social, a assistência e a saúde”, defende santos. o sindicalista aponta o novo icMs como indutor do crescimento econômico ao extinguir a guerra fiscal, considerando que “os estados atraem investimentos de forma a prejudi-car o conjunto da população”.

o posicionamento de parte da oposição nos debates deixou antever a possibilidade de apro-vação da reforma, como demonstrou o Psdb. a despeito de terem apresentado emendas que chegavam a mudar toda a Pec 233, os tucanos não se furtaram a fazer elogios ao texto-base. “a reforma tem dois princípios bons, o da simplifi-cação e o de acabar com a guerra fiscal, mas os instrumentos são insuficientes, temos que aper-feiçoá-los”, pondera o deputado Paulo renato de souza.

A PROPOSTA DE DORNELLES para a Reforma serviu de base a emendas do PSDB

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negócios

a onda do baixo custoEmpresas se inspiram no setor aéreo e buscam a redução radical de custos para oferecer produtos baratos – o que nem todas conseguem

os descoNtos chegaram de Forma decidida às grandes lojas do grupo têxtil espanhol cortefiel e ao francês decathlon, de material esportivo. É uma conseqüência da queda no volume de ven-das no varejo na espanha. o cortefiel decidiu rebaixar em 30% os preços de seus produtos. no decathlon, as reduções foram pontuais. essas não são as únicas empresas que tentam solucionar a tormenta econômica responsável por um verdadeiro rombo no bolso dos consu-midores europeus. É conseqüência, entre outras coisas, do aumento das taxas de juros e da infla-ção e dos índices de desemprego.

“em períodos de recessão, os consumidores procuram descontos com maior freqüência”, ob-serva o professor de marketing alejandro Mollá descals, da universidade de Valência, na es-panha. “os varejistas constataram isso durante os últimos meses, usando vários artifícios para reduzir preços.” algumas redes de varejo, como o carrefour, a inditex e el corte inglês, infor-maram que não vão oferecer descontos especiais porque acreditam na força de suas marcas.

com ou sem desaceleração econômica, o fato é que os consumidores se mostram cada vez mais sensíveis aos preços. Muitos não es-tão dispostos a gastar nem um centavo a mais, mesmo que isso os obrigue a visitar diversas lo-jas. É cada vez maior o número de empresas de diferentes setores que recorrem ao modelo do baixo custo. criado no setor aéreo, o modelo tem na companhia irlandesa ryanair o exem-plo máximo. de acordo com a professora de estratégia rosário silva, da escola de negócios instituto de empresa (ie), também da espa-nha, a ryanair consegue aplicar o modelo de baixo custo em sua totalidade, graças a uma estrutura enxuta. “É tudo muito simples, rápi-do, mínimo”, afirma ela.

a ryanair é mestra no controle de custos e na obsessão em reduzi-los, explica silva. “a empresa chega a extremos de austeridade, proibindo os funcionários de recarregar a ba-teria do celular em suas instalações. e o que é mais difícil, tem se mantido fiel a essa forma de gestão ao longo de toda sua história. isso não é nada fácil.” outras companhias aéreas de baixo custo da europa têm muita dificul-dade em competir com a ryanair, segundo a professora.

o fenômeno do baixo custo surgiu há cerca de dez anos, “depois que o setor aéreo foi desre-gulamentado na europa”, explica o professor de marketing josep Francesc Valls, da escola su-perior de administração de direção de empre-sas (esade), também na espanha. especialista no assunto, ele é autor do livro O fenômeno do baixo custo: impacto sobre o fator de preço, que deverá ser lançado em breve. “até o fim dos anos 1990, o mercado aéreo europeu era mo-nopolizado pelas companhias aéreas de bandei-ra”, afirma Valls. ele explica que nos estados unidos a desregulamentação e o surgimento de novas companhias, com passagens aéreas mais baratas, ocorreu já nos anos 1970.

segundo Valls, há dois movimentos que hoje avançam com grande velocidade. “as em-presas produtoras de bens e serviços de todo tipo, não só as aéreas, passaram a comerciali-zar seus bens a preços mais em conta depois de baratear os custos de produção. e os clientes acostumaram-se a encontrar, a qualquer mo-mento, produtos a preços reduzidos. ninguém despreza um doce.” com isso, ocorre uma mu-dança na percepção do consumidor em relação ao preço. a qualquer momento, em qualquer lugar ou meio, o consumidor pode conseguir preços mais baratos.

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Valls acrescenta que o fenômeno é conseqüên-cia de uma série de fatores novos como a globa-lização da economia. “cresce a cada instante o número de produtos e serviços disponíveis no mercado. isso faz crescer a obsolescência, que desencadeia uma guerra de preços como estra-tégia de penetração. além disso, é preciso levar em conta também o desenvolvimento de novas tecnologias, que permitem testar formas radi-calmente distintas de negociar e de oferecer produtos aos consumidores”, afirma o professor da esade.

desde a revolução de baixo custo, os passa-geiros dos aviões se acostumaram a viajar a um preço que consideram justo – sem refeições gratuitas a bordo, pousando em aeroportos se-cundários e comprando passagens na internet sem a mediação de empregado algum. assim, outras empresas ligadas ao setor de turismo, como os carros de aluguel ou grandes cadeias hoteleiras, também decidiram optar pelo baixo custo. nos quartos desses hotéis paga-se ape-nas pelo que se utiliza, incluindo itens que em qualquer outro estabelecimento seriam incluí-

dos na conta, como serviço de toalhas, produtos de higiene pessoal e televisão. um dos líderes desse segmento é a rede britânica travelodge, que oferece quartos a 20 euros mediante reserva on-line. a empresa deverá investir um bilhão de euros na abertura de hotéis na espanha.

outro setor, o de transportes, também en-saia seus primeiros passos no modelo de baixo custo. o grupo indiano tata pretende lançar o automóvel tata nano, por 2.000 euros. Há também companhias elétricas, de comunica-ções e de serviços jurídicos investindo no novo modelo, que atinge até mesmo hospitais, onde podem-se marcar cirurgias, explica Valls.

bArAto não é bAixo cuSto

nem tudo que se apresenta como baixo custo, porém, se encaixa nesse conceito. “Produto ba-rato não é necessariamente de baixo custo, ex-plica Valls. “em determinado momento, pode-mos nos deparar com sobras de estoque de um produto específico.” assim, é possível encontrar marcas de primeira linha a preços reduzidos.

A REDE DECATHLON

decidiu reduzir preços de

alguns produtos para enfrentar a queda de poder

aquisitivo dos espanhóis

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negócios

Mas o modelo de baixo custo é outra coisa, no que concorda silva, do ie. “nos últimos anos surgiram muitas empresas que se autodeno-minam de baixo custo, na expectativa de que seus clientes associem à idéia de preços baixos algo que não têm de fato. É uma estratégia que apresenta um número grande de insucessos.” ela cita como exemplo a air Madrid, compa-nhia aérea espanhola de baixo custo para vôos de longa distância que encerrou suas operações no final de 2006.

especialistas observam que depois do fecha-mento da air Madrid, ficou claro que é impos-sível operar vôos baratos em rotas de longa dis-tância. a empresa teve de espremer ao máximo o uso de sua pequena frota. um pequeno atraso por problemas técnicos ou meteorológicos reper-cutia por toda a rede, multiplicando seu efeito. o grande problema é que a air Madrid não era

totalmente de baixo custo: vendia passagens por intermédio de agências de viagens, não com a in-ternet, e tinha classe executiva. além disso, fazia vôos transatlânticos, na europa e no interior da espanha, o que não lhe permitia seguir seu obje-tivo principal: controlar os custos ao máximo.

silva nota que algumas empresas entendem o baixo custo apenas como redução de servi-ços. “isso é fácil de imitar. o difícil é fazer o que fizeram empresas que reconfiguraram de forma inédita todas as suas atividades.” Para que uma empresa não seja malsucedida nesse modelo, a professora aconselha a pensar antes de mais nada no serviço básico desejado pelo cliente. “a primeira inovação consiste em rede-finir esse serviço; a segunda, em redefinir suas atividades, para que sejam mais difíceis de se-rem imitadas”, explica. além disso, porém, é necessário que a redefinição do serviço básico

RECARREGAR O CELULAR na empresa é proibido aos funcionários da Ryanair, a companhia que leva mais a sério o conceito de baixo custo

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não prejudique demasiadamente a percepção de qualidade. os riscos que o modelo oferece são, em sua opinião, os de que a empresa baixe a qualidade percebida do produto ou que não seja capaz, devido à sua estrutura de custos, de chegar a um preço mínimo que lhe permita sobreviver no mercado.

receitA do bAixo cuSto

Para Valls, da eseade, os fatores de sucesso na estratégia de baixo custo são, em primeiro lugar, a redução drástica e eficaz das despesas opera-cionais. “isso requer a flexibilização da estrutu-ra da empresa”, afirma. em segundo lugar, os preços têm de ser dinâmicos. “devem ser es-truturados de tal forma que possam flutuar de acordo com a inclinação da demanda”, explica. “Por último, é preciso que os preços mais bara-tos sejam anunciados de tal forma que a ima-gem da empresa se reflita neles.”

Valls acredita que, diante das perspectivas

negativas da economia, é possível que o con-ceito de baixo custo ganhe um espaço cada vez maior. “observo, por exemplo, como o setor imobiliário começa a pôr em prática uma série de estratégias que podem consolidar empresas de baixo custo.” Para Valls, em um futuro não muito distante, haverá um novo grupo de em-presas que, na medida em que enfrentem crises ou deparem com quadros de recessão ou cená-rios negativos diversos, acabarão optando por estruturas de baixo custo.

Para silva, porém, esse movimento independe do vaivém da demanda. “Há uma mudança que é de caráter estrutural: o gosto dos clientes. Há um novo tipo de consumidor que leva efetivamente muitos setores a pensar sobre esse tipo de estraté-gia. são clientes que querem apenas o serviço bá-sico porque não estão dispostos a pagar mais por isso, e não porque tenham uma renda baixa.”

Valls afirma que é preciso contrapor o mun-do das marcas, por um lado, das empresas de prestígio, exclusivistas, aos demais mundos

RODAS PARA TODOS:

o empresário indiano Ratan

Tata e o carro de 2.000 euros que pretende lançar

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negócios

constituídos por marcas brancas, ou subalter-nas, de preços baixos. “dependendo da hora, das circunstâncias, os mesmos consumidores que querem produtos de baixo custo querem também produtos de marca, exclusivos.” e acrescenta: “Há diretores de empresas dispostos a viajar com a mínima comodidade, sem ne-nhum benefício extra, mas tão logo chegam a seu destino hospedam-se em hotéis caros.” Valls diz que, atualmente, há duas atitudes cruzadas: “Há uma batalha, uma percepção muito delica-da do que é qualidade e do que é prestígio”.

os produtos e serviços de preço elevado, no mercado de luxo, continuam atraindo o mes-mo número de clientes de sempre, com ou sem desaceleração econômica, explica Valls. “ofer-

tas sofisticadas continuarão a fazer o sucesso de sempre.’’ o inegável, afirma, é que atualmen-te todas as empresas estão procurando reduzir custos. Mas o professor chama atenção para o fato de que esse é um caminho difícil. a maior parte das empresas de baixo custo já nasce as-sim, trabalhando desde o início com um nú-mero reduzido de pessoas. “não conheço, no momento, casos de empresas estabelecidas que tenham se convertido em empresas de baixo custo.” contudo, para transformar uma empre-sa tradicional em empresa de baixo custo, Valls recomenda, em primeiro lugar, “uma redução drástica de custos, flexibilização das estruturas, presença forte na internet, divulgação dos bai-xos custos praticados e preços dinâmicos”.

Republicado com autorização de UniversiaKnowledge@Wharton (http://wharton.universia), o jornal on-line sobre pesquisa e análise de negócios de The Wharton School of University of Pennsylvania. A Wharton mantém parceria com o IEL para a formação de executivos.

HIGH-LOW: alguns executivos aceitam viajar em companhias aéreas baratas, mas querem se hospedar em hotéis sofisticados

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Vale quanto pagaPrêmios literários de alto valor aquecem o presente e incentivam o futuro da criação literária no País

por Sérgio de Sá

com o receNte aNúNcio da chegada ao país da maior empresa editorial portuguesa, a leya, e jun-to com ela a criação de um prêmio de 100 mil euros para obras inéditas em língua portuguesa, fechou-se a equação: nunca se viu tanto dinhei-ro em disputa no sistema literário brasileiro. os investimentos da companhia gaúcha Zaffari & bourbon, da Portugal telecom e dos governos de Minas gerais e são Paulo criam momento especial no reconhecimento da qualidade na literatura.

os prêmios estão longe do território de altas ci-fras dos best-sellers, mas são capazes de montar bom mapa contemporâneo de leitura e de incentivar a ampliação do campo literário em longo prazo. o melhor exemplo disso talvez seja o Man booker Prize, que há 40 anos mobiliza por completo auto-res, editores e leitores no mundo de língua inglesa. “os prêmios são bem-vindos. e a médio e a longo prazo podem influir, sim, na melhoria do texto li-terário”, assegura o escritor e doutor em literatura ronaldo costa Fernandes, ganhador do casa de las américas.

no presente, há uma saudável concorrência para ver quem oferece mais. se tudo começa com os 100 mil euros do Prêmio camões, dados anu-almente pelos governos do brasil e de Portugal ao conjunto da obra de um autor, e chega ao Prêmio leya, aberto a todos os países de língua portugue-sa, internamente o maior passo foi dado pelo go-verno de são Paulo, no final de maio. o Prêmio são Paulo de literatura dará r$ 200 mil para o melhor livro de ficção de autor brasileiro publica-do no ano e outros r$ 200 mil para a melhor obra

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literAturA

talento em altaOs principais prêmios de literatura em língua portuguesa

Prêmio Desde Periodicidade Valor O quê

Camões 1989 anual 100 mil euros Conjunto da obra de autor da língua portuguesa

Passo Fundo Zaffari & Bourbon 1999 bienal R$ 100 mil Romance em língua portuguesa, publicado no

Brasil

Portugal Telecom de Literatura 2003 anual R$ 150 mil, divididos entre

os três primeiros lugaresObra – romance, conto, poesia ou biografia – em língua portuguesa, publicada no Brasil

Governo de Minas Gerais de Literatura 2007 anual R$ 170 mil Conjunto da obra e livros de prosa e poesia

inéditos

Leya 2008 anual100 mil euros

25 mil euros para finalistas, a critério do júri

Romance inédito em língua portuguesa

São Paulo de Literatura 2008 anual R$ 400 mil, divididos entre

dois livros Obras de ficção de autores brasileiros

de um estreante, também de ficção. segundo o secretário de cultura do estado, joão sayad, tudo ocorrerá nos moldes do booker, com a primeira edição ainda este ano.

em Minas gerais, são r$ 170 mil em disputa, nas categorias conjunto da obra (r$ 120 mil), tex-tos inéditos em Poesia (r$ 25 mil) e Ficção (r$ 25 mil), além de uma bolsa de produção exclusiva para jovens autores mineiros que distribuirá r$ 42 mil. “É importante que o reconhecimento intelectual seja também financeiro, independentemente da área cultural”, explica a secretária de cultura mi-neira, eleonora santa rosa. “o que se fez foi robus-tecer o patamar de premiações voltadas à literatura no brasil para brindar e reconhecer o que precisa ser valorizado em termos de literatura no País.”

a premiação escolheu o intelectual antonio candido como primeiro contemplado pelo con-junto da obra, em dezembro de 2007. “trata-se de um nome incontestável”, afirma o ensaísta wander Melo Miranda, professor titular da uni-versidade Federal de Minas gerais (uFMg) e membro da comissão julgadora. no ano passado, Miranda também foi um dos curadores do Prê-mio Portugal telecom de literatura. a avaliação é clara: “Há uma movimentação nova no mercado editorial e na vida literária nacionais”.

tanto o Prêmio Portugal telecom, anual, como o Zaffari & bourbon, concedido a cada dois anos durante a jornada nacional de literatura de Passo Fundo, no rio grande do sul, contemplam obras

publicadas em nosso mercado editorial, escritas originalmente em língua portuguesa. “criado em 2003, o prêmio partiu da divulgação da literatura brasileira para, a partir de 2006, evoluir para um prêmio de língua portuguesa”, conta o presiden-te da Portugal telecom no brasil, shakhaf wine. “com isso, a Portugal telecom busca estimular o intercâmbio cultural entre os países que comparti-lham a identidade da língua portuguesa.”

os últimos vencedores do Portugal telecom e do Zaffari & bourbon comprovam a troca cultu-ral. o português gonçalo M. tavares levou os r$ 100 mil destinados ao primeiro lugar do Pt, pelo romance Jerusalém. o moçambicano Mia couto, com o romance O outro pé da sereia, abocanhou a mesma quantia em Passo Fundo, em agosto do ano passado. “eu é que deveria trazer um prêmio de Moçambique e entregar aos brasileiros. a ques-tão, meus amigos, seria: a quem? agora não tenho dúvida nenhuma: às jornadas de literatura de Pas-so Fundo”, exaltou couto ao ser premiado.

o encontro na pequena cidade do sul, que re-cebeu o título oficial de capital nacional da li-teratura, foi pioneiro no estabelecimento de valor considerado inicialmente alto para prêmios literá-rios no país. Parecia exagerado, agora não mais. “estão no ponto adequado, principalmente quan-do vemos o que ocorre em outros países”, compara wander Melo Miranda. Para o escritor e ensaísta silviano santiago, ele próprio segundo colocado no Portugal telecom de 2006 (r$ 35 mil, pelo

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Indústria brasileira - Para que servem prêmios literários no Brasil? Recompensa ou compensação?Silviano Santiago - no brasil, ou em qual-quer outro país do ocidente, os prêmios li-terários servem para reconhecer o valor esté-tico, filosófico, social e político de uma obra de arte literária. recompensa, sem dúvida. recompensa pela dedicação ao ofício, pelo trabalho insano e solitário e pela contribuição inteligente e sensível ao patrimônio cultural da nação no conjunto das nações. Pena que a língua portuguesa não fa ça de maneira clara a distinção entre wisdom (sabedoria) e knowledge (conhecimento). assim como se recompensam os cientistas pelo experimento na área do co-nhecimento técnico-científico, os artistas são recompensados pelo experimento (a não ser confundido com o mero experimentalismo formal) na área da sabedoria humana. o prê-mio mais conhecido e tradicional, o nobel, reconhece as duas formas de contribuição, sem hierarquizá-las.

Ib - Consegue ver alguma legitimação junto ao leitor? Ou os prêmios apenas alimentam egos e, mais recentemente, também contas bancárias? SS - a questão do leitor passa por tantas ins-tâncias intermediárias, negligenciadas ou su-bestimadas no brasil, que seria difícil saltar – sem rede de proteção – da alta qualidade do produto literário (que, em princípio, é o que merece o prêmio) e seu consumo pelo público brasileiro. em termos de público estrangei-ro, teria de fazer longa digressão sobre a lín-

Recompensa pelo expeRimento

o mineiro radicado no rio de janeiro silviano santiago, 71 anos, é um analista arguto da cena literária contemporânea, capacidade demons-trada em livros de ensaios que costumam trans-formar-se rapidamente em clássicos, como Vale quanto pesa (1982), Nas malhas da letra (1989) e Ora (direis) puxar conversa (2006). Por e-mail, ele respondeu às seguintes perguntas de Indús-tria brasileira:

gua portuguesa, a última flor do lácio des-conhecida e bela. certos escritores, é óbvio, se legitimam junto ao público pelas listas de mais vendidos. arte ou mercado? como disse guimarães rosa, “pão ou pães, é questão de opiniães”.

Ib - Se a boa literatura anda desprestigiada no imaginário contemporâneo, por que empresas e governos investem em prêmios a ela destinados? Literatura virou renúncia fiscal?SS - necessariamente, mas não obrigatoriamen-te. a empresa atira no que não leu e, no melhor dos casos, os jurados acertam no que leram.

Ib - Os valores ficaram altos ou a literatura é que andava mal acostumada, se pensarmos, por exemplo, no que se investe em cinema?SS - o nobel, já mencionado, é de altíssimo valor. nos países europeus e nos estados uni-dos os prêmios são tradicionalmente polpu-dos. aqui, era apenas uma pequena escultura, em geral de mau gosto, com uma placa come-morativa. chegamos lá. afinal, a idéia de o escritor aspirar à condição de profissional das letras é muito recente no brasil.

Ib - Como se confrontam política e estética em julgamentos que devem hierarquizar obras de arte?SS - É sempre bom não confundir política na literatura com literatura política. de novo rosa: “tem um não em todo sim, e as pessoas são muito variadas”.

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literAturA

romance O falso mentiroso), finalmente saímos do tempo da estatueta de mau gosto (veja entrevista).

segundo a consultora literária selma caetano, o valor do Portugal telecom, que se repete com al-gumas variações nos outros prêmios, foi calculado a partir de uma linha de pensamento tão simples quanto imaginária: quanto um escritor precisaria para ficar 365 dias apenas trabalhando com lite-ratura? “um ano de respaldo para ficar numa ilha deserta, o sonho de todos os escritores”, frisa ela, que também assessora o grupo leya no brasil.

a academia brasileira de letras trabalha em maior silêncio no Petit Trianon, sua sede, no rio de janeiro. Mantém premiações com valores nada desprezíveis. no prêmio denominado Machado de assis, criado em 1945, os imortais escolhem anu-almente o conjunto da obra de um escritor, que, entretanto, pode não ser alguém versado em prosa de ficção e poesia. com verba do governo fede-ral, paga os cada vez mais habituais r$ 100 mil, descontada, como de praxe, a parte que cabe ao imposto de renda. a abl também elege livros do ano nos gêneros ficção e poesia, entre outros.

Perto de comemorar 50 anos de existência, o tradicional Prêmio jabuti, da câmara brasileira do livro, é o único que continua se contentando em distribuir mais prestígio (que tem de sobra) do que verba. o jabuti se destaca por ser a maior festa da indústria editorial brasileira e, portanto, não estamos falando apenas de literatura. ainda assim, o livro do ano na área da ficção, eleito com a participação de editores e livreiros de todo o país, recebe r$ 30 mil.

propAgAndA e reSpeito

os significados do valor, literal e simbólico, de um prêmio literário vêm da voz de um dos principais escritores brasileiros contemporâneos, o paulista Marçal aquino, 50 anos de idade. diz o autor do romance Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios: “Prêmio sempre confere prestígio. alguns mais, outros menos. e se envolvem gra-na, melhor ainda, sempre ajuda. É sabido como, com as exceções de praxe, escrever é uma atividade economicamente inviável. não se pode esquecer também o fator ‘marketing’, já que prêmios, às ve-

zes, acabam alavancando a venda dos livros. tem muito leitor seduzido pela menção a prêmios.”

consagração e sobrevivência temporária para o escritor. Marketing para os patrocinadores, sejam governos, instituições ou empresas (públicas e pri-vadas) – tenham ou não a melhor das intenções. e, por último, mas não menos relevante, incentivo à leitura. “É importantíssimo que os prêmios exis-tam e que sejam vários. eles geram mídia para a literatura. transmitem a informação de que ela é importante para o indivíduo e para a sociedade”, aposta a doutora em teoria literária ligia cademar-tori, ex-professora da universidade de brasília.

Para o crítico wander Melo Miranda, o inves-timento em prêmios mostra que a literatura, mes-mo em baixa na sociedade contemporânea, é uma linguagem nobre. “apesar da mídia, o status dela não se perde. É um lugar artístico, ainda de muito valor”, afirma. com ele concorda o romancista e poeta ronaldo costa Fernandes: “temos simpatia pela empresa só de saber que apóia uma ativida-de cultural. no caso da literatura, uma atividade com público interessado muito mais reduzido que a música, por exemplo. Mas um público seletivo e com alto poder de influenciar e multiplicar através dos meios de comunicação, principalmente a mí-dia não-eletrônica.”

com as pequenas tiragens atuais, os prêmios fazem parte de uma cadeia de vantagens ligadas à publicação da obra, mas não à vendagem. Prêmios entram para os currículos dos escritores, mas não despertam a procura por livros em larga escala no brasil. “Hoje, o ganho suplementar é o que vale para o escritor: bolsas, palestras, entrevistas, via-gens e prêmios”, explica wander Melo Miranda. Vive-se de literatura: não necessariamente da ven-da de livros.

nesse sentido, o incentivo fiscal colabora na criação dos prêmios. a empresa Zaffari & bour-bon, por exemplo, considera a renúncia funda-mental para a viabilização do patrocínio. “como não há mercado consolidado para o bom escritor, os prêmios são mecenato, uma maneira de remu-nerar, indiretamente, esse escritor. seria como uma bolsa de produção que nasce como iniciativa pro-gramática do estado para fortificar e homenagear a literatura”, avalia a professora cademartori.

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o mecenato modernistaCom reproduções dos trabalhos de Lasar Segall em decoração, livro demonstra a influência que os patrocinadores do Movimento de 1922 exerceram sobre os artistas

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a célebre máxima do carNavalesco joãosiNho triNta de que os iNtelectuais é que gostam de miséria, porque os pobres preferem mesmo a riqueza, pode ser boa de citar, mas nem sempre foi verdadeira. artistas e intelectuais gostam, sim, da riqueza e foi graças a ela que o nosso modernismo pôde florescer em meio a goles de champanhe e bocados de caviar nos salões da elite dos anos 1920 e 1930. a própria semana de 1922, aliás, só teve espaço no vetusto theatro Municipal de são Paulo por graça e obra de um advogado famoso na época, rené thiollier. ele também deu sua contribui-ção à história de são Paulo participando na fundação e construção da sede da academia Paulista de letras e do teatro brasileiro de comédia (tbc). além de thiollier, não é possível imaginar a semana sem o empenho pessoal do empresário Paulo Prado. rimando modernidade com sociabi-lidade, a nossa vanguarda cresceu e adquiriu seu caráter nacional graças ao inesperado apoio de um grupo de endinheirados, nos moldes do que fizeram as elites européia e norte-americana.

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culturA

“o horizonte de sociabilidade pautado pela alegria e beleza da renovação modernista que Mário de andrade desejava consolidar só pode desenhar-se no âmbito das elites econômicas. Vale registrar que o poeta é quem negocia com os organizadores do baile Futurista, promovido em 1924 pelo automóvel clube (entidade que reúne a alta sociedade paulistana), a contratação do pintor lasar segall para realizar a decoração do evento. o que mostra uma associação ideo-lógica já consolidada entre eles no momento”, observa Fernando antonio Pinheiro Filho, o professor de sociologia da universidade de são Paulo (usP), e autor de Lasar Segall: arte em so-ciedade, livro que será lançado pela editora co-sacnaify, baseado em sua tese de doutorado. o estudo de Pinheiro mostra o trabalho do pintor na decoração de espaços como o tal baile Futu-rista, do Pavilhão de artes Modernas de olívia guedes Penteado, e dos bailes de carnaval da sociedade Pró-arte Moderna (spam). Mas vai além. revela que o mecenato não apenas permi-tiu a existência do modernismo como deu-lhe o caráter nacionalista, sua marca essencial. Pou-

cos, porém, sabem que, por trás da arte, havia o apoio dos ricos.

“a análise da sociabilidade travada em tor-no dos salões procurou enfatizar esse aspecto, mostrando a lógica implícita na associação entre setores da elite e promotores de uma estética que se dirige à destruição dos instrumentos tradicio-nais de representação do meio aristocrático”, ex-plica Pinheiro. assim, longe de enfants terribles, os modernistas buscaram formas de sociabilida-de, redes de circulação de trabalhos e espaços de convivência em torno de uma clientela de abas-tados, num verdadeiro network de clientes. che-garam mesmo a usar suas experiências pessoais de emigrados (como o lituano lasar segall, que chegou ao brasil em 1923) para tocar o coração de seus mecenas, igualmente imigrantes que ha-viam construído suas fortunas fora dos países de origem. como observa o sociólogo Paulo Mi-celi, orientador da tese de Fernando Pinheiro, a elite “reconheceu de pronto nessas obras uma imagem tocante de suas próprias experiências de vida, passando a enxergar tais artistas como seus porta-vozes em matéria de identidade social, re-

ESBOÇOS DE SEGALL para decoração da residência Penteado, na página anterior, e de figurinos para baile de carnaval: O porta-bandeira, à esquerda, e O prefeito, acima

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pique étnico, calibre afetivo, orientação política e inclinação estética”.

Foi mesmo necessário criar um eufemismo para a aceitação do apoio e do entendimento des-se mecenato rico, a “elite espiritual”, nas palavras de Mário de andrade. “uma elite não-econômi-ca, de linhagem, justamente aquela cujo modo de consumo ‘espiritual’ tem por palco os salões”, explica o pesquisador. daí o tom do elogio a se-gall feito por Mário: “ele encontrou aqui uma elite já adaptada ao movimento moderno das ar-tes. a essa elite, eivada da tradição cubista e um pouco da futurista também, segall vinha opor o exemplo importante da sua evolução de artis-ta em busca do essencial expressivo. Foi esse um benefício enorme que alargou a visão de nossa elite e dos nossos artistas”. como nota Fernando, “com o conceito de ‘elite espiritual’, Mário opera uma denegação de sua condição social, de quem depende de seu trabalho e das benesses advindas das relações mantidas com a elite para sobrevi-ver; segall serve-lhe de âncora para um posicio-namento de destaque nesse meio”.

a própria trajetória de segall é reveladora da aproximação produtiva com a elite. nascido em 1891, na lituânia (morreu em 1957, em são Paulo), o pintor inicia sua carreira de artista com obras cujos temas são as cenas populares da sua cidade natal, Vilna. após passar pela alemanha, onde estudou, ele investe na deformação cubo-expressionista e será “no cenário expressionista alemão que sua obra tomará corpo”. já tendo

passado pelo brasil em 1913, quando expôs em campinas e são Paulo, segall retorna de vez ao país uma década mais tarde, apesar dos avisos dos amigos de que a arte no brasil não tinha ressonância internacional.

“o segall que chega é um pintor seguro de seus recursos, em plena posse de sua dicção pessoal, mas em busca do reconhecimento que julga adequado ao seu projeto”, nota o pesqui-sador. em 1925, ele já está separado da esposa e casado com jenny Klabin, filha de uma família da elite industrial paulista. Passa, então, a ter acesso aos salões da elite, onde tinham presença ga-rantida os barões do café em declínio, industriais ascendentes, políticos, lite-ratos, poetas, artistas plás-ticos. dois espaços fizeram época: a Villa Kyrial, do senador Freitas Valle, e a residência de olívia gue-des Penteado. “a Villa é um ponto de encontro de intelectuais e artistas que convivem com a elite polí-tica e econômica, fazendo o tipo de sociabilidade tí-pica dos salões, incluindo a familiarização com ve-leidades de extração fran-cesa do anfitrião, cultor

ESTUDO para decoração da residência de Olívia Guedes

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das artes aplicadas à vida, como a gastronomia, a degustação de vinhos finos.” e não só: Frei-tas Valle também estava à frente da comissão Fiscal do Pensionato artístico do estado, com poder para conceder bolsas que levavam artistas para temporadas na europa. “Mesmo a presen-ça de Mário pode ser interpretada pela sedução de obter financiamento”, afirma Pinheiro.

importante notar é que a proximidade en-tre mecenas e artistas não tinha base apenas na identidade, mas nas diferenças e nos contrastes, em relações humanas entre pessoas que pintam

e pessoas que apreciam, reconhecem, avaliam e compram. o mesmo se deu com olívia guedes Penteado (1872-1934), que tendo enviuvado em 1914, aproximou-se dos círculos de escritores e ar-tistas da primeira geração modernista. em 1923, em companhia de tarsila do amaral e de oswald de andrade, ela comprou em Paris a primeira cole-ção de quadros de artistas modernistas brasileiros e estrangeiros. no ano se-guinte, encarregaria se-gall da decoração de um pavilhão de sua mansão.

“a senhora Penteado vem de uma família tra-dicional. Mas ela, como o senhor Paulo Prado, romperam com o preconceito, incorporando-se ao movimento renovador da arte e bafejando-o com sua sombra protetora. são destas almas de elite que as atuais e mais ousadas correntes espi-rituais estão recebendo, há alguns anos, o apoio de um incentivo amigo e generoso”, escreveu o jornalista assis chateaubriand, em 1925, na inauguração do pavilhão decorado por segall. “com sua aguda inteligência, ela realiza este-ticamente o subconsciente do industrial mo-derno, que é o artífice por excelência da época trepidante em que vivemos.”

como nota Miceli, será esse grupo de reno-mados homens de negócios, banqueiros e po-líticos que ocupavam posições de destaque no comando oligárquico de são Paulo, os respon-sáveis pela consagração do modernismo. assim como seus congêneres europeus e norte-ameri-canos (basta lembrar os museus e parques de nova York feitos com dinheiro dos Morgan, dos rockefeller, dos Frick, entre outros), a elite se cercou de artistas. consolidou, assim, uma demanda por produções nacionais que tradu-zissem o “bom gosto” europeu. “nesse sentido, teriam iniciado o processo de nacionalização artística que explodiu no modernismo. esse universo permitiu o início da nacionalização que criou condições para a recepção singular das novas tendências da vanguarda européia”, observa Miceli.

DECORAÇÃO feita por Segall para o baile de carnaval da Sociedade Pró-Arte Moderna, em 1933

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Luiz Felipe de Alencastro, professor titular de História do Brasil da Universidade de Paris-Sorbonne

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os Números globais sobre a população brasileira são conhecidos. de 1500 até 1850 (fim do tráfico negreiro), chegaram no brasil cerca de 650.000 portugueses e perto de 4,3 milhões de africanos, os quais entraram em contato com cerca de 1,4 milhão de índios espalhados no espaço do atual território nacional. na eta-pa posterior, de 1850 até 1950, desembarcaram aproximadamente cinco milhões de imigrantes europeus, levantinos e asiáticos. Mas a popu-lação de origem africana foi majoritária até o último quartel do século 19 e manteve um peso importante nas décadas seguintes. daí a evolu-ção constatada num novo estudo do instituto de Pesquisa econômica aplicada (ipea), de-monstrando que a partir deste ano a população negra (auto-identificada nos censos como negra e parda) passa a ser mais numerosa do que a população branca brasileira. a tendência pare-ce irreversível e os afrodescendentes formarão a maioria absoluta dos brasileiros em 2010. a de-mografia restabelece uma realidade que existiu até as últimas décadas do século 19: somos uma nação majoritariamente negra. o ensino públi-co, as instituições federais, as Forças armadas, a cultura e a diplomacia brasileira devem incor-porar essa nova dimensão da identidade nacio-nal que tem uma longa história atrás de si.

no plano externo, uma virada demográfica decisiva ocorreu nos anos 1930, quando o volu-me de imigrantes entrados no País foi ultrapas-sado pela migração interestadual (essencialmen-te nordestinos se deslocando para são Paulo e

Paraná). em seguida, a imigração declinou e, recentemente, sobreveio outra mudança capital: em 2003, o número de emigrantes foi maior que o de imigrantes. Pela primeira vez desde a che-gada da frota de cabral, houve menos estran-geiros se estabelecendo no brasil do que gente saindo para viver e trabalhar no exterior. sobre-tudo nos estados unidos, onde se encontra 1,3 milhão dos cerca de 2,7 milhões de brasileiros que se estabeleceram mundo afora.

Muitos brasileiros conseguem refazer suas vidas em terras estrangeiras. outros comem o pão que o diabo amassou, subsistindo na preca-riedade e sob a ameaça de expulsão dos países onde residem. o segmento mais dramático da emigração ilegal do País apresenta um recorde humilhante: 75.000 brasileiras se prostituem atualmente na europa, segundo a organização internacional de Migrações, agência das nações unidas sediada em genebra. boa parte desses compatriotas que são humilhados e ofendidos no exterior considera o brasil como uma pátria ma-drasta, cuja dureza e malquerença os levou a sair despreparados pelo mundo. um fenômeno des-sa dimensão deveria suscitar um debate no País. não é o que se vê. nenhum emigrante brasileiro tem representante no congresso, ao contrário do que acontece em outras democracias. emigrantes formam circunscrições extraterritoriais que ele-gem seus deputados para o legislativo de seus países. o brasil tem uma nova cara e os brasilei-ros vivem nas quatro partes do mundo. chegou a hora de descobrir o óbvio.

o brasil em movimeNtoNos planos interno e externo, muda o perfil da população brasileira. Está na hora de quem vive fora do País ter voz no Congresso Nacional