comentarios ao código processo civil tomo 9

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COMENTÁRIOS AO CODIGO DE PROCESSO CIVIL TOMO IX (Arts. 566-611) LIVRO II DO PROCESSO DE EXECUÇÃO TITULO 1 DA EXECUÇÃO EM GERAL 1)Pretensão à execução das sentenças e ação executiva de títulos extrajudiciais 2)Conceito de execução 3)Função do juiz da execução 4)Tutela própria e executividade5 )Prestação jurisdicional e execução 6)Dois sentidos de executar: execução judicial e “executividade” 7)Eficácia executiva das sentenças de condenação 8)Prestação jurisdicional e execução 9)Força de exedutividade, efeito mediato e referência legal a sentenças e títulos executivos CAPÍTULO 1 Das partes 1)Execução estatal 2)Ações executivas de cognição incompleta 3)Judicialização da execução forçada 4)Força executiva e efeito executivo 5)Ação executiva de cognição incompleta e execução de sentença 6)Pretensão à tutela jurídica executiva 7)Critérios de obrigatoriedade e de facultatividade do procedimento executivo 8)Fundamento da execução com incompleta cognição 9)Ações executivas e ações de condenação; cumulações 10)Ação executiva pessoal e ação executiva real 11)Ação executiva dos credores quirografários 12)Nomeação de bens à penhora 13)Execução e insolvência 14)Adiantamento de execução (técnica legislativa) 15)Titulo extrajudicial e execução adiantada 16)Responsabilidade do exeqilente pelos danos que aexecuçãocausa 17)Execuções desconstitutivas (ou negativas) eexecuçõesdentro dos autos 18)Causa da executividade Arts. 566 e 567 1)Legitimação ativa à execução forçada 2)Credor a quem a lei confere título executivo 3)Ministério Público 4)Titulo judicial do vencedor na ação com eficácia executiva 5)Credor por titulo executivo extrajudicial 6)Sucessores “mortis causa” 7)Espólio

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Page 1: Comentarios Ao Código Processo Civil Tomo 9

COMENTÁRIOS AO CODIGO DE PROCESSO CIVIL TOMO IX (Arts. 566-611) LIVRO II DO PROCESSO DE EXECUÇÃO TITULO 1 DA EXECUÇÃO EM GERAL 1)Pretensão à execução das sentenças e ação executiva de títulos extrajudiciais 2)Conceito de execução 3)Função do juiz da execução 4)Tutela própria e executividade5 )Prestação jurisdicional e execução 6)Dois sentidos de executar: execução judicial e “executividade” 7)Eficácia executiva das sentenças de condenação 8)Prestação jurisdicional e execução 9)Força de exedutividade, efeito mediato e referência legal a sentenças e títulos executivos CAPÍTULO 1 Das partes 1)Execução estatal 2)Ações executivas de cognição incompleta 3)Judicialização da execução forçada 4)Força executiva e efeito executivo 5)Ação executiva de cognição incompleta e execução de sentença 6)Pretensão à tutela jurídica executiva 7)Critérios de obrigatoriedade e de facultatividade do procedimento executivo 8)Fundamento da execução com incompleta cognição 9)Ações executivas e ações de condenação; cumulações 10)Ação executiva pessoal e ação executiva real 11)Ação executiva dos credores quirografários 12)Nomeação de bens à penhora 13)Execução e insolvência 14)Adiantamento de execução (técnica legislativa) 15)Titulo extrajudicial e execução adiantada 16)Responsabilidade do exeqilente pelos danos que aexecuçãocausa 17)Execuções desconstitutivas (ou negativas) eexecuçõesdentro dos autos 18)Causa da executividade Arts. 566 e 567 1)Legitimação ativa à execução forçada 2)Credor a quem a lei confere título executivo 3)Ministério Público 4)Titulo judicial do vencedor na ação com eficácia executiva 5)Credor por titulo executivo extrajudicial 6)Sucessores “mortis causa” 7)Espólio

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8)Sub-rogado, cessionário ou sucessor, e legitimaçãoativa 9)Prova da sucessão para a legitimação ativa 10)Fiador ou abonador da solvência do fiador,legitimação ativa 11)Inserção não efetuada de sucessor 12)Cessionário 13)Sub-rogado Art. 568 1)Atingimento da ação executiva 2)Devedor e prova de eficácia executiva contra ele 3)Sucessores e legitimação passiva 4)Fiador e fiador judicial 5)Novo devedor, por ter assumido, com o consentimento do credor, a divida 7)Terceiro e execuções reais 8)Legitimação processual e eficácia Art. 569 1)Credor ou qualquer legitimado à propositura da ação executiva 2)Desistência e conteúdo 3)Medidas executivas Art. 570 1)Execução provocada pelo vencido em ação de que resultou a eficácia para a propositura da ação executiva 2)Execução pelo vencido e sua natureza 3)Defesa do credor demandado em execução Art. 571 e §§ 1.0 e 2.~ 1)Condenação alternativa 2)Direito de escolha 3)Prazo para escolha e execução da sentença 4)Natureza da escolha 5)Obrigações recíprocas alternativamente ligadas 6)Escolha por terceiro 7)Litisconsórcio 8)Passagem do direito de escolha ao exequente 9)Obrigações com alternatívidade de objeto 10)Alternatividade e escolha pelo credor li)Prazo para escolha pelo credor, na alternativa 12)Solução pela determinação 13)Ação para escolha Art. 572 1)Executabilidade e determinações mexas 2)Direitos formativos geradores 3)Termos e condições 4)Espécies de condição e de termo Art. 573 1)Execuções cumuláveis 2)Incumulabilidade 3)Causas da sucessividade 4)Competência do juízo 5)Forma do processo e insolvência 6)Embargos do devedor

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Art. 574 1)Ressarcimento ao devedor, quando se declarava inexistente no todo ou em parte, a obrigação que deu lugar à execução 2)Execução provisória de sentença 3)Ineficacízação e atingimento 4)Pedido e liquidação dos danos CAPÍTULO 1 1 2)Pressupostos objetivos 3)Obrigado a prestar Seção 1 Do inadimplemento do devedor Da competência 1)Juízo competente para a execução 2)Grau de competência Art. 575 1)Critérios para a determinação da competência 2)Problema de técnica legislativa quanto à competência 3)Sentenças dos tribunais superiores 4)Sentença dos juízos de primeiro grau 5)Juiz transferido, promovido ou aposentado 6)Sentenças arbitrais 7)Competência civil para execução de sentença penal condenatória 8)Sentenças de partilha 9)Cumulação material de processos e cumulação de ações 10)Embargos de terceiros Art. 576 1)Execução de título extrajudicial e competência 2)Precisões Art. 577 1)Determinação dos atos de execução 2)Regra jurídica que afaste a atividade do juiz Art. 578 e parágrafo único 1)Execução fiscal 2)Pluralidade de devedores 3)Pluralidade de domicílios 4)Origem da dívida Art. 579 1)Força policial 2)Prisão Art. 580 e parágrafo único 1)Eficácia executiva

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2)Sentença e título extrajudicial 3)Inadimplemento 4)Obrigação, e não só dever (direito) Art. 581 1)Cumprimento da obrigação 2)Recusa pelo credor 3)Reparação Art. 582 e parágrafo único 1)Adimplemento da obrigação pelo credor 2)Adimplemento insatisfatório 3)Credor-devedor que perde a execução 4)Atitude alternativa do devedor CAPÍTULO III Dos requisitos necessários para realizar qualquer execução. Seção II Do titulo executivo 1)Titulo executivo 2)Natureza do título executivo Art. 583 1)Titulo executivo judicial 2)“Ação executiva de sentença” e sentença; se preexisteção ou se nasce da sentença 3)Titulo executivo extrajudicial Art. 584 e parágrafo único 1)Títulos executivos judiciais 2)Sentença condenatória proferida no processo civil 3)Sentença penal condenatória 4)Sentença homologatória de transação, de conciliação ou de laudo arbitral 5)Sentença estrangeira homologada pelo Supremo Tribunal Federal 6)Eficácia dos títulos (formal e certidão de partilha) 7)Sentenças que têm eficácia executiva Art. 585 e §§ 1.0 e 2.0 1)Ações executivas e critério “a priori” para a enumeração das espécies 2)Declaração e execução 3)Títulos executivos sentenciais e títulos executivos extra-judiciais 4)Outras espécies previstas em lei 5)Pacto executivo e cláusula executiva 6)Títulos executivos cambiários e cambiariformes 7)Letra de câmbio 8)Nota Promissória 9)Duplicatas mercantis 10)Cheque 11)Credores por dívida de quantia determinada e obrigados a entregar coisa fungível 12)Instrumentos públicos e instrumentos particulares 13)Instrumentos assinados a rogo; poder de representação 14)Assinatura do devedor 15)Negócio jurídico de hipoteca, penhor, anticrese e caução 16)Executivo de crédito com a garantia hipotecaria 17)Ação executiva de penhor

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18)Anticrese 19)Execução de caução 20)Seguro de vida e de acidentes pessoais; executividade 21)Enfiteuse, foro e laudêmio 22)Executivo por alugueres 23)Rendas de imóveis 24)Condomínio 25)Crédito de serventuário da justiça 26)Peritos, intérpretes e tradutores 27)Dívida ativa da Fazenda Pública das entidades estatais 28)Títulos executivos em virtude de lei especial 29)Ação de invalidade 30)Títulos executivos extrajudiciais oriundos do estrangeiro 31)Ações executivas de que não falam os arts. 584 e 585 Art. 586 e §§ 1.0 e 2.0 1)Certeza e liquidez 2)“Quaestio luris” 3)Título executivo sentencial e procedimento executivo 4)Contaminação e não-contaminação da Invalidade 5)Ilíquido não prejudica liquido 6)Perdas e danos que se liquidaram na execução 7)Problemas que surgem e suas soluções 8)Execução e liquidação da sentença 9)Simultaneidade da propositura 10)Titulo certo em parte líquido e em parte ilíquido Art. 587 1)Sentenças que são títulos executivos 2)Trânsito em julgado e eficácia executiva 3)Ação executiva de títulos extrajudiclais .4rt. 588 e parágrafo único 1)Conceito e pressupostos da execução provisória 2)Estado interínal e execução de sentença 3>Reforma da sentença provisoriamente executada 4)Fundamentos da indenização 5)Reparação dos danos 6)Reforma e negação da suspensividade do efeito do recurso 7)Rescisão de sentença e execução declarada injusta 8)Má-fé em direito processual 9)Ação de ressarcimento e execução de sentença 10)Atos de alienação contrários a direito 11)Caução e execução de sentença 12)Reforma parcial da sentença 13)Execução provisória Injusta 14 Reparação dentro dos autos 15)Restituição no estado anterior 16)Reposição no estado anterior e impossibilidade Art. 589 1)Execução definitiva 2)Execução provisória e carta de sentença Art. 590 e parágrafo único 1)Carta de sentença 2)Requisitos da carta de sentença

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3)Habilitação incidental CAPITULO IV Da responsabilidade patrimonial Art. 591 e 592 1)Devedor e responsabilidade 2)Bens do sucessor singular 3)Bens do sócio e execução 4)Bens em mãos de terceiro 5)Bens da meação conjugal 6)“Fraus executionis” e execução nos bens alienados ou gravados 7)Fraude contra credores 8)Incursão injustificada na esfera jurídica do terceiro.... 9)Pagamento e prejuízo a credores Art. 593 1)Conceito 2)Litispendência de ação fundada em direito real 3)Insolvência e fraude à execução 4)Transcrição de aquisição posterior à demandado art. 593, II 5)Casos expressos em lei 6)Dação em soluto e dívida vencida 7)Processo simulado 8)Alienações em fraude à execução 9)Ineficácia, e não nulidade 10)Processo fraudulento e simulação 11)Terceiro não-comparecente 12)Ineficácia dos atos em fraude de execução Art. 594 1)Direitos de retenção e ordem nas penhoras 2)Direito de retenção (continuação na posse) Art. 595 e parágrafo único 1)Fiador e penhora 2)Nomeação de bens do devedor pelo fiador 3)Fiador e sub-rogação pessoal Art. 596 e §§ 1.0 e 2.0 1)Bens particulares dos sócios 2)Nomeação de bens 3)Sócio que paga a divida Art. 597 1)Execução contra os herdeiros 2)Bens da herança e bens dos herdeiros CAPITULO V Das disposições gerais Art. 598 e 599 1)Subsidiariedade de regras jurídicas processuais 2)Função do juiz Art. 600

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1)Fraude à execução, procedimento atentatório à dignidade da justiça 2)Malícia, ardis e meios artificiosos 3)Resistência injustificada às ordens judiciais 4)Nomeação de bens e indicação dos lugares em que se encontram Art. 601 e parágrafo único 1)Sanções 2)Relevação da pena Art. 602 e §§ 1.0, 2.0, 3~0 e 4•0 1)Prestação de alimentos 2)Renda ou pensão 3)Reversão do capital 4)Prestações devidas e tempo 5)Inalienabilidade e impenhorabilidade do capital 6)Determinação sentencial 7)Modificação da situação econômica do devedor 8)Cancelamento de cláusula CAPÍTULO VI Da liquidação da sentença 1)Liquidação de dívidas e de créditos 2)Conceitos 3)Liquidação de crédito ou de dívida 4)Particularidade do direito brasileiro 5)Acordo dos figurantes e efeito da liquidez 6)Frutos, danos e interesses 7)Títulos judiciais e iliquidez 8)Alegações e provas necessárias à liquidação 9)Processo da ação de liquidação de créditos ou dívidas 10)Fixação do conceito de liquidação de sentença 11)Falta de liquidação 12)Execução em caso de iliquidade 13)Integração da liquidação no processo executivo 14)Operação de liquidação 15)Três meios de liquidação 16)Procedimento Art. 603 1)Determinação do valor 2)Objeto razão individuado Art. 604 1)Cálculo e operação liquidatória 2)Juros e rendimentos 3)Valor dos gêneros que tenham cotação em bolsa 4)Títulos da divida pública e ações de sociedade com cotação em bolsa Art. 605 e parágrafo único

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1)Cálculo e audiência das partes 2)Mandado executivo, cálculo e sentença 3)Cotação em bolsa e taxa geral máxima 4)Prova da cotação 5)Erro de cálculo 6)Sentença de liquidação Art. 606 1)Pressupostos 2)Escolha pelos figurantes 3)Necessidade de provar 4)Objeto da liquidação Art. 607 e parágrafo único 1)Nomeação do perito (arbitrador) 2)Julgamento do arbitramento Arts. 608 e 609 1)Conceito de liquidação por artigos 2)Procedimento da liquidação Art. 610 1)Integridade da sentença liquidanda 2)Matéria da contestação Art. 6111)Ação de liquidação e sentença 2)Devedor autor da ação de liquidação 3)Ligação eventual dos processos da ação de liquidação e da ação de execução 4)Citação do demandado na ação de execução LIVRO II DO PROCESSO DE EXECUÇÃO DA EXECUÇÃO EM GERAL 1)~9) 1)PRETENSÃO À EXECUÇÃO DAS SENTENÇAS E AÇÃO EXECUTIVA DE TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS. (a) Antes de dar início ao trato do Livro II, queremos deixar assente que se hão de considerar (1) a estrutura da relação jurídica processual, (2) o “isolamento” e estudo das combinações das cinco pretensões (de declarar, de constituir, de condenar, de mandar e de executar) e (3) a natureza da ação executiva das sentenças e a da ação executiva de títulos extra judiciais, os três temas teórica e praticamente capitais da ciência do processo. São o ABC do Direito Processual Civil. A conquista jurídica maior no século XIX e começo deste foi elevar tais temas à categoria de problemas científicos, buscando-lhes soluções com os coordenados recursos de historiadores, etnologistas, juristas e filósofos das ciências sociais. O tema da pretensão a executar, que é o tema (3), foi o último a conseguir esclarecimento suficiente, já em nosso tempo, com os trabalhos de ANTON MENGER (Beitrãge zur Lebre von der Execution, Archiv fiir die Civilistische Praxis, 55, 371-418), de FRIEmucE STEIN (Grunclfragen der Zwangsvollstreckung, especialmente 18 s.), de JOSEF KõHLER (tiber executorische Urkunden, Archiv flir die Civilistische Praxis, 72, 1-41), de JAMES GOLDSCEMIDT (Ungerechtfertigter Vollstreckungsbetrieb, 56 5.) e de outros que citaremos nos lugares próprios, entre os quais RUDoU4’ POLLAK (System, 339-44).

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Na etimologia, sequi está abaixo de todas as formas posteriores, sequor, secutus. Enorme a quantidade de palavras que dai vieram. Pense-se em secundum, segundo, em secundar, sequela, seqilência sectário, segundo (divisão do tempo), obséquio, subsequente, perseguir, conseqiléncia, inconseqúência, séquito, consecução, executar, execução. O executar é ir extra, é seguir até onde se quer. Compreende-se que se fale de execução, de ação executiva, quando se tira algo de um patrimônio e se leva para diante, para outro. Compreende-se também que se vá ao extremo de se ligar à execução, lato senso, qualquer cumprimento de sentença, mas essa dilatação de sentido é a cientifica. Temos, na ciência do direito, de atender à classificação quinária das ações e das sentenças. Tudo aconselha a que se evite a palavra “executar” ou “execução”, para se nomear o atendimento ao cumpra-se, à ordem; a fortiori, a aplicação da lei. “Executar” mandado, ordem, ou lei, é termo impróprio, porque não atende a que a ciência do direito exige terminologia exata e precisa. Daí termos de afastar dilatações conceptuais, como aparece, por exemplo, em AFONSO FRAGA (Teoria e Prática da Execução das Sentenças, 13 s.). A crítica que se faz à expressão “execução forçada” é descabível, porque a pessoa adimple, executa, tira, voluntariamente, do seu patrimônio o que há de ir ao de outrem: tem-se, então, execução voluntária. O único ponto intercalar é o de quem paga no momento em que vai ser citado: e. g., ao chegar o oficial, mostra que já depositou na conta do credor. A citação já não tem a eficácia da angularização. O emprego de “execução” como que abrange todos os adimplementos é que se há de evitar para que se não perturbe a classificação quinária. Em vez do que se afirma comumente, quanto a ter-se de começar toda indagação científica do processo de execução pela análise do conceito de título executivo, é pela análise da sentença exequível que se tem de começar. Não porque esse ponto de partida nos dê o fio histórico, desde os primórdios. Certamente, o título executivo, não-judicial, a actio iudicati concedida extra ordinem, como a manus iniectio, sem ser precedida de sentença (isto é, sem ser manus iniectio pro iucticato), foram posterius em relação à actio iudicati, ou à manus iniectio pro iudicato. Antes de haver a execução somente nos bens, é certo que já se havia operado a passagem da pretensão executiva às dividas reconhecidas perante o magistrado (in. iure) e à dívida do aeri.s confessus, com maioria de razão à dívida do nexus. As duas transformações são, até certo ponto, paralelas. Porém, remotamente, a execução era privada, sem monopólio estatal, obra do credor. O que nos faz acentuar o valor da execução de sentença como prius lógico é o ter-se falado, depois, em equiparação dos títulos à sentença. Vale a pena prestar-se atenção a esse ponto: desde que passou ao Estado o monopólio das execuções forçadas, a ação de execução da sentença também se firmou como priws, em relação à ação de execução de títulos não-sentenciais. Tem-se, pois, de atender a que uma transformação influiu na outra. A diferença entre a ação executiva de títulos extrajudiciais e a ação executiva de sentença está em que, nessa, há cognição completa, preestabelecida pela eficácia executiva (pelo menos, peso 3) sentencial. Ao título extrajudicial o sistema jurídico atribuiu, condicionalmente, eficácia executiva. (b) No antigo direito romano, a execução era pessoal (manus iniectio), imposição judicial da mão, para fazer escravo, pela dívida, o devedor, e o deferimento de tal pedido (comunicação de vontade) do credor tinha a consequência de fazer servi loco a parte contrária, e só terceiro, o vindex, poderia retirar a mão do juiz, manum~ depeilere. Esse terceiro ou pagava imediatamente a divida, ou, negando o cabimento de manus iniectio, entrava como pólo de relação jurídica processual, e arriscava-se a pagar o duplo (G. DEMEUUs, CÓDIGO DE PRocEsso CIVIL Die Confessio, 56). Assim foi que se criou a ação (actio legis) per manus iniectionem. Na manus iniectio nota-se a execução de moto próprio, mal transferida ao Estado; porém o pedido tinha, desde esse estádio primitivo, de ser examinado, ou já o ter sido. Esse era o caso ordinário, o de cognição completa anterior, contida na sentença proferida in juclicio. Outro era o do aeris confessus, que se equiparava ao iudicatus (manus iniectio pro iudicato). Sempre se encontra a alusão a dívidas equiparadas à sentença, de modo que o Estado, ao receber a missão de se substituir às partes e de criar a relação jurídica processual (o processo mesmo!), fez a actio iudicati dependente da sentença. Quando a técnica acentuou os casos de títulos executivos equiparados ao julgado, naturalmente teve de abrandar o rigor da primitiva manus iniectio. Não se justificaria que o devedor, que ainda não foi julgado (isto é, contra o qual não houve cognição completa), estivesse exposto a ser reduzido à escravidão, sem ser ouvido, sem se defender. Permitiu-se que ele fosse o seu próprio vindex, que se pudesse livrar do golpe de mão de outro, por si mesmo (manum sivi depeilere, sendo peliere oriundo de puisum, golpe, cf. KARL BRUGMANN, GrundrisS der vergleichendefl Grammatilc, 1, 2.~ ed., 466). Assim, chegou o direito romano a ter dois procedimentos diferentes da actio per manus iniectionem: o da actio p. m. i. pro iuclicato; e o da actio p. m. i. pura, com a possível defesa pelo próprio devedor. Aqui, convém

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notar-se, porque éassaz importante para a interpretação do Livro II do Código de Processo Civil, como base do estudo científico da pretensão de executar, que a manus iniectio, que se realizava in iure, continuou sendo o objeto do processo e da sentença, e não prevaleceu a cognição in iudicio, porque a actio derivava da manus iniectio, e não do direito material (RUDOLPE SOHM, Institutionen, Geschichte und System des rõmischen Privatrechts, 291). Merece isso toda a atenção . Cai por terra a tese dos que pretendem que proveio do direito germânico a defesa do réu nos processos executivos. O que se infiltrou de germânico foi apenas a preponderância do elemento comunicação de conhecimento, em relação ao de comunicação de vontade. A base continuou sendo a actio iudicati romana, que foi a revelação prática da autonomia da pretensão de executar. A ação de execução da sentença éque é o protótipo da ação executiva “jato sensu”. A ação de execução de títulos extrajudiciais (Código de Processo Civil, art. 585) e outras ações de execução são apenas “equiparações”. Equiparações do direito processual, como o nexus e a cláusula executiva (quando o sistema jurídico o permita), ou equiparações de d~reito material. O título executivo extrajudicial é aquele em que se elide, ou em que se retarda a cognição completa. O art. 745 do Código de Processo Civil sobre embargos à execução de título extrajudicial dá prova suficiente disso. A elisão da cognição completa traduz-se pela equiparação integral do título à sentença. O retardamento, pela anteposição da execução à cognição. O adiantamento da executividade importa essa inversão. Muito cedo, isto é, já ao tempo da manus iniectio pura, o direito colheu a realidade desse fato, e teve de admitir que o devedor mesmo se defendesse. A história posterior é simples acentuação de pormenores, que o exame dos fatos sugeria. Antes de H~s KARL BRIEGLEB (Geschichte des Executiv-Prosesses, 2Y- ed., 8-32; Einleitung in die Theorie der summarischen Prosesse, 512 5.), já os juristas reinícolas distinguiam o elemento germânico do processo executivo. O nexus foi equiparação primitiva da executividade estabelecida pelo próprio credor à executividade, através da cognição pelo Estado, à execução da sentença. A solenidade, pela qual o que tomava de empréstimo se obrigava a responder com o seu corpo, foi forma de ato constitutivo de direito material, imitante do direito processual da manus Iniectio: a manus iniectio era a sanção da pretensão a executar; o nexus, a constituição da pretensão a executar, no plano do direito material. (Há reminiscência disso nos sistemas jurídicos que permitem adotarem os contratantes “ação executiva” para suas obrigações, ou que o estipule o credor: são sistemas com a idade do nexus, ou de algum momento shylockiano de regressão psíquica ao nexus.) As Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 78, § 12, ainda possuíam resquícios do título que se levava ao juiz para ser reconhecido in iure. Tratando das escrituras, aludia a “quaisquer (outros) contratos e convenças, que se fizeram entre as partes, posto que as ditas escrituras de consentimento das partes, por maior jirme~a, se hajam de julgar per sentença de alguns julgadores”. Ato judicial constitutivo integrativo da forma, per modum voluntariae iurisdictionis. Os juristas portugueses discutiam se era da sentença (a) ou do título (b) que nascia a pretensão a executar, não se podendo dizer que do lado (b) ficava SILvESTRE GOMES DE MORAIS (Tractatus de Executionibus, 1, 31 e 32), pois o processualista insigne, embora intitulasse “de scriptura contractus sententia iudicis confirmati” o § 1.0 do Capítulo IV de seu Tratado, no texto não merece a crítica de MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA (Tratado prático do Processo Executivo Sumário, 113), sempre ferino. SILVESTRE GOMES DE MORAIs reconheceu parata executio ao instrumento, “sic sententia est”, e levantou a hipótese, tratada igualmente por ele, de tal elemento ser constitutivo integrativo, oriundo de confissão, ou de preceito, em juízo contencioso; porque nessas espécies ele é o mesmo e produz executividade, posto que nem todas as sentenças o produzam. Ainda nesses casos de confirmação “de maior firmeza”, a sententia indicis partium contractum confarmante não se Identificava com a sentença proferida na cognição completa (cf. Alvará de 13 de março de 1772). Os juristas falavam de quasi re iudicata, porque se não havia discutido a validade intrínseca do instrumento. O negócio jurídico extrajudicial não ficava coberto pela sentença. Hoje, sabe-se um pouco mais a respeito. (c)A prisão por dívidas é o resto da velha execução pessoal da manus iniectio, depois que desapareceu a capitis deminutio maxima, a escravidão. Ainda em WILLIAM BLAcKsTONE (Commentaries, III, 415) se podem ver muito bem a execução pessoal e, se foi proferida pelo credor, a perda da execução nos bens. Assim era no direito romano clássico (cp. F. L. voN KELLKR, Der rõmische Civiiprozess, 2.~ ed., 353). Não tínhamos a prisão por dividas; tínhamos a prisão pela não-entrega do depósito. As grandes empresas estrangeiras fabricantes de aparelhos para agricultura pleiteavam, desde muitos anos, a prisão por dívida dos compradores a prazo, e conseguiram o Decreto-lei n. 1.271, de 16 de maio de 1939, art. 3~O, e os Decretos-leis n. 1.625, de 23 de setembro de 1939, e n. 3.169, de 2 de abril de 1941, art. 2.~, de cuja interpretação trataremos. Era o tempo propício para a compressão internacional. Tinha-se feito, para isso, uma ditadura no país. Cp. Constituição de 1946, art. 141, § 32; e Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 153, § 17.

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2)CONCEITO DE EXECUÇÃO. A execução é o atendimento ao enunciado que se contém na sentença se esse enunciado não é, em si mesmo, bastante. Há, em qualquer execução, ato, e não só pensamento. Sentenças há (as declarativas e as condenatórias) em que o ato não aparece, nem nelas está: carecem de ato. Sentenças há (as constitutivas e a executiva do art. 641) em que o ato a execução, pois está incluso no pensamento. Sentenças há em que o ato é imediato ao pensamento: tais as das ações mandamentais. Sentenças há em que o ato é anterior ao pensamento, é prévio: as das ações executivas de títulos extrajudiciais. ~ ato anteposto ao enunciado da condenação. Sentenças há em que o ato de cada uma é ela mesma, quase sem pensamento, razão por que, de regra, não têm o conteúdo discursivo das outras sentenças: e é o que ocorre nas ações executivas, cujo ato é mediato a algum pensamento que pode estar noutra sentença, proferida noutro processo. As Tabelas de pesos de eficácia que temos feito, nos Comentários e no Tratado das Ações, mostraram-nos tudo isso, e foram resultado de nossos penosos trabalhos de aplicação da lógica contemporância ao direito processual. A execução, em sentido estrito, é a execução em que o ato é mediato ao pensamento. Essa mediatidade permite que se tratem no mesmo processo a preparação do pensamento, a que tende a série de atos processuais nas ações condenatórias, e a preparação do ato, com os seus trâmites de prática, ou que se separem os processos. Seja como for, a unicidade de processo, dependente de simpatias do legislador processual, não pode elidir a dualidade das pretensões e ações, condenatória e executiva. Só se destrói essa distinção indo-se até o plano pré-processual, onde às vezes é possível fazerem-se constitutivas ou mandamentais a pretensão e a ação, que seriam, historicamente, ou pela mais fácil sugestão da experiência, binárias (condenatória, executiva). A execução não tem a função de juridicizar o não-jurídico que a sentença apontou. Alguns juristas ousaram dizê-lo. Não é isso o que se passa. A execução é praticada, como as sentenças declarativas, as condenatórias, as constitutivas e as mandamentais, no plano processual, onde pode ser injusta como aquelas sentenças o poderiam ser. Também ela reflete a falibilidade dos juizes; também ela não tem a finalidade gnosiológica de fazer do branco preto e do preto branco. O jurista tem de sofrer que haja dois planos que deveriam coincidir, e talvez, in casu, não coincidam. ~ a discordância possível às vezes trágica entre a incidência e a aplicação da regra jurídica. Não raro entre a própria sentença e o seu cumprimento. Por onde se vê como as “ações” executivas e as demais servem ao homem, sem infalibilidade. (Quem sofre a execução forçada não aliena, nem renuncia, nem abandona, nem perde por desapropriação. Mas algo ocorre que tornou o seu patrimônio exposto à intervenção do Estado, que a todos prometeu, na espécie, satisfazer a pretensão à tutela jurídica. A situação de quem sofre a execução forçada é semelhante à de quem abandona e à de quem renuncia, mas pode dar-se que não tenha provindo do devedor o fato pelo qual responde, e isso bastaria para se mostrar a que extremos de erros levaria qualquer assimilação da perda por execução forçada à perda pelo abandono ou pela renúncia.) 3)FUNÇÃO DO juiz DA ExEcuçÃo. A função do juiz, executando, é função judicial, e não função do Poder Executivo. A pretensão a executar e a ação de execução são pretensão e ação, como as outras. O Estado exerce ai, em vez da execução pelo próprio obrigado (~ executando), a execução sua ou execução forçada. Tal como, tratando-se de ato em que pudesse haver defesa própria do autor, exerceria esse a defesa. Onde o titular do direito poderia, em formas sociais primitivas, declarar, constituir, condenar, ou mandar, o Estado hoje declara, constitui, condena, ou manda (monopólio estatal da justiça). Esse monopólio estende-se à execução forçada. Considerar-se, aí, executiva (isto é, de Poder Executivo) a função, e não judicial, provém do uso das mesmas palavras (executiva, execução); bem como do erro de se considerarem pertencentes, na fonte, sempre, ao direito material, privado ou não, que rege a res in iudicium deducta, as pretensões declaratória, constitutiva, condenatória, executiva e mandamental. Essas pretensões são às vezes estranhas ao direito material (res in iudicium deducta) e pré-processuais. A pretensão à tutela jurídica é a mesma, em espécies diferenciadas, conforme a res deducta. O princípio Iurisdictio in sola notione consistit não só foi tornado obsoleto como também, no seu tempo mesmo, era falso. 4)TUTELA PRÓPRIA E EXECUTIvIDADE. (a) Tem-se procurado apontar casos em que a ação de execução ainda se haja deixado à própria pessoa. Um deles seria típico: o da defesa do autor, ou réu, vencedor quanto ao direito de retenção. Ora, quando a sentença declarativa ou condenatória reconhece direito de retenção, não se pode dizer que tenha deixado ao titular de tal direito a execução. A pretensão à declaração é uma; a pretensão a defender a sua posse é outra. Quando o vencido tenta retomar a coisa retida (bastou declarar-se o direito de retenção, porque a coisa estava com o vencedor), a defesa própria é a do possuidor turbado ou esbulhado, que, de imediato, com a sua própria força, ou se mantém ou faz restituir-se-lhe o bem, e essa defesa contém as duas pretensões e ações (a de cognição e a executiva). Dar-se-ia o mesmo se não tivesse havido sentença declarativa ou condenatória. Apenas, ao defender a sua posse imediata, o titular do direito de retenção tem a seu favor a

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sentença declarativa ou de condenação em que se lhe declara esse direito; quer dizer: está subjetiva e objetivamente dispensado de o declarar, por si só, pois que tem esse direito: está manifestada, a seu favor, a função judicial declaradora do Estado, de modo que, subjetiva e objetivamente, prescinde da tutela própria, assaz primitiva. Não há falar-se, portanto, em executividade, a propósito de exceção de ius retentionis. (b)A ação de execução pode deixar de ser ação autônoma, para se fundir noutra ação, se essa é mandamental. O ato, que seria prévio, ou mediato, passa a ser imediato. (c)A ação de execução desaparece se o ato, que se esperaria, está Incluso no pensamento; vale dizer: se a ação se fez constitutiva. Também a ação deixa de ser executiva para ser mandamental quando o ato passa a ser ato mandado praticar pelo juiz da sentença proferida. (d)A ação condenatória pode ser desmunida de execução. ~ o que se passa, de regra, com as açoes condenatórias contra a Fazenda Pública. Em todo caso, veja-se o art. 731 do Código de Processo Civil. Se a ação condenatória não tem pelo menos 3 de executividade, não basta à execução. 5)PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E EXECUÇÃO. A prestação jurisdicional é, de regra, a sentença, a decisão; mas, vulgarmente, quando se fala de fim do processo, ou de força vinculativa da sentença, toma-se a palavra “sentença” em sentido estrito. Ora, no processo de execução, o conteúdo da sentença perde aquela compactitude, aquela unidade, que tem a sentença declarativa, ou a condenatória, ou a constitutiva, ou a mandamental. Há toda uma série de atos dos quais o mais típico, o especificamente executivo (adimplente), é o levantamento do preço pelo exeqiiente, a adjudicação ao exeqitente, ou a remição, com o conseqúente levantamento do preço, a entrega da coisa sem ser mediante caução, tratando-se de execução dos arts. 621-628, ou a entrega do total do custo da obra, ou da obra, ou a sentença do art. 641. Em todos os casos, menos no último, a sentença como que se dilui pela incompactitude do seu conteúdo que vem sendo composto, desde a citação, com o mandado de adimplir. A sentença, quer nas ações executivas, quer nas outras, passa-se no plano do direito processual. O que ela “realiza” tem o seu lugar no direito material, sem que mude o preto em branco, ou o branco em preto, como pretendia a teoria inaterialística do processo. Não é a sentença que faz ter sido executada, ou executar-se a obrigação: é o fato que daí resulta. Se A diz que pagou a B, e pagou, mas B contesta, e vence, a sentença estabelece aquele novum, que é a declaração pelo juiz, e talvez não possa, sequer, ser rescindida: ‘o plano do direito material lá está, não tendo o juiz do Estado o poder de mudar a realidade, os fatos da vida; o que lhe é dado é declarar, constituir, condenar, executar, mandar, sem ter outro poder que o de decidir, que é algo transcendente à realidade, e com o fundamento de realizar o direito objetivo e de pacificar. A realização do direito objetivo às vezes passa à frente da outra função que se atribui à Justiça. Nas execuções forçadas, o Estado executa pelo que devia executar: o Estado diz que alguém deve decisão no plano processual, e entrega, dizendo que entregou pelo executado, o que talvez não coincida com a realidade no plano do direito material, ou porque o réu não devesse, ou porque o objeto da entrega seja diferente, ou não exista, ou não tivesse sido realmente entregue. A rescindibilidade de algumas sentenças tem por fim atenuar, em certos casos, essa discordância entre o fáctico e o sentencial. 6)DOIS SENTIDOS DE EXECUTAR: ExEcuçÃo JUDICIAL E EXECUTIVIDADE”. Alguns juristas entendem distinguir a execução (estatal) administrativa e a execução (estatal) judicial como se fossem espécies de execução. As medidas de polícia seriam exemplo daquela. Porém, embora velada, está aí, mais uma vez, a confusão entre função judicial de execução e função executiva (contraposta e função legislativa e judicial) de segurança pública ou prevenção. A execução administrativa pode ser similar à execução (judicial) forçada, quando se trate de executar por alguém, como se passou ao Município execução que caberia a particulares; e pode ser distinta da execução (judicial) forçada, quando se trate de execução pelo próprio Estado, execução (voluntária), ainda que provocada (administrativa ou judicialmente), de obrigação sua, ou de dever seu. Por onde se vê que é perigoso apurar-se muito a distinção quanto à função, pois mais toca ao órgão. Aqui, só nos interessa a função executória judicial; portanto, a atividade dos órgãos judiciários. Outra atitude a eliminar-se é a dos que limitam as sentenças executivas à execução das obrigações de crédito: estariam fora as execuções em que não há o devedor de direito das obrigações constrangido a executar, ou a assistir, e sofre a execução pelo Estado, dita forçada. Tal vício tão fundo foi que, ao se falar de execução, de teoria das execuções, só se pensava na execução pela falta de pagamento de alguma dívida. Daí dizer-se que toda execução supõe sentença preferida, após condenação do devedor. Não reparavam esses juristas em que, assim, reduziam a eficácia executiva das sentenças à espécie “sentença executiva proferida em processo que foi efeito de sentença condenatória”. Em vez de verem os fatos do mundo contemporâneo após as sinteses, tentadas e experimentadas, com a tese romana e a antítese germânica, esses juristas são vítimas do romanismo, quando,

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aliás, o próprio direito romano não limitava às ações de direito das obrigações a actio iudicati. 7)EFICÁCIA EXECUTIVA DAS SENTENÇAS DE CONDENAÇÃO. A “execução”, no sentido em que o Livro II emprega a palavra, pouco mais significa que o “efeito executivo” das sentenças de condenação, que leva à ação. No correr dos comentários, estudamos os casos em que se trata de realização de “força executiva”. De modo nenhum se cogita, no Livro II, do cumprimento das sentenças mandamentais em geral, ou das sentenças constitutivas, ou das sentenças declarativas. Quanto à força executiva das sentenças proferidas em processos nos quais se adiantou a execução (cf. arts. 576, 614, 615, IV, e 745), somente regra jurídica é aplicável, em tais processos, como conteúdo, e não como execução “da sentença”. A pretensão a executar é que está à base de todo o Livro II. Pretensão que é, hoje, como o monopólio executivo do Estado, pretensão a obter a execução. A palavra “execução” tem dois sentidos: um, estrito, que se refere à ação de execução da sentença, ou do título extra-judicial; e outro, largo, que abrange a execução da obrigação, qualquer que seja. Nesse sentido, “executa o devedor a sua obrigação”, “o juiz ordena que se execute a sentença mandamental, ou constitutiva”; de modo que não há, aí, a execução da sentença ou do titulo extrajudicial. A ação dos arts. 639-641 termina por sentença executiva, e não só por sentença exequível: tal sentença tem força; e não só efeito executivo, como se dá com ações de execução de sentença e de execução de títulos extrajudiciais. Aconselhavel é que se fale, a propósito das sentenças não-executivas, de cumprimento, e não de execução. (O sentido amplissimo que se dá à execução de sentença, que é o de cumprimento das sentenças, aparece nas leis, aqui e ali. Todavia, aqui, o sentido, que nos interessa, é o de atividade determinada pela força executiva, 5, ou pela eficácia executiva, 4 ou 3, das sentenças.) A execução da sentença sempre foi ação, a ação correspondente à pretensão a executar. Nas Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 91, pr., está claro que se citava o réu condenado e se lhe assinavam dez dias para entregar a coisa certa, porque assim “disseram os sabedores antigos que compilaram as leis imperiais”. A princípio, tudo isso se passou de pessoa a pessoa; depois foi que se iniciou o tomar-se a coisa, “forçosamente per a Justiça”. Tratando-se de ação pessoal, também devia (§ 5) a parte ser citada “ante da execuçam”. Cf. Tribunal Regional do Trabalho, 28 de dezembro de 1960 (D. da J. de 30 de dezembro): “ai sabido, como aliás ensina o mestre PONTES DE MIRAXTDA, que a execução não é parte integrante da própria ação, mas outra ação diversa, segundo estabelece o art. 165 do Código de Processo Civil de 1939. Como ação lhe são aplicáveis os arts. 182, 196, 207, etc., enquanto às sentenças são aplicáveis os arts. 798-801 do mesmo diploma legal citado, onde se trata de outra ação que para as regras de determinação da competência acham-se estabelecidas nos itens do art. 884.” Já dissemos que o ter obtido o autor a sentença favorável, exequível, não lhe tira qualquer outra pretensão. Só lhe dá, a mais, a de executar. Se ele podia, antes da sentença, pedir, por exemplo, arresto, ou seqUestro, continua a dispor desses remédios jurídicos preventivos. (O problema de se saber se é possível pedir-se medida cautelar quando já se está habilitado à ação de execução de sentença era aquele, de que se serviam os nossos maiores, para exemplificar a aplicação da regra “Quem pode o mais pode o menos”. (Cp. CÂ~~DIDO MENDES DE ALMEIDA, Auxiliar Jurídico, 438 s. Non debet cui plus licet, quod minus est, non licere.) As duas pretensões, a pretensão a executar e a pretensão à cautela, são inconfundíveis. 8)PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E EXECUÇÃO. (a) A entrega da coisa devida, em vez do seu valor, contém o desapossamento de um, que deve, e a posse por outro, que pediu a execução. Assim se passa na ação de reivindicação, na entrega executiva de coisa certa, na ação de posse recuperatória. A ação de reivindicação é executiva, posto que nela se contenha a parte cognitiva, a que é cumulada. Sobre a ação de reivindicação, Tratado de Direito Privado, Tomo XIV, ~ § 1.571-1.583 e 1.585 (tabela). (b) A entrega do valor, em vez da coisa, supõe que não seja o caso de ser entregue coisa certa. Há algo de substitutivo, comparando-se com a espécie (a); porém, em muitos casos, devido à natureza da obrigação, não há qualquer alusão à substituição. É o direito material que diz o que é que se há de prestar. Não o direito processual. A natureza da prestação influi na técnica legislativa daquele. A sua política jurídica, por exemplo, é que dá os limites da executabilidade pela entrega material, ou pelo valor, ou pela execução do fato ou do não-fato (desfazimento, nas obrigações de não fazer). Há dificuldades na execução forçada de obrigações de fazer ou não fazer, de modo que os legisladores se saem dos embaraços reduzindo-as à de perdas e danos, ou com a cominação de quantia igual ou acima do valor da obrigação. O legislador brasileiro, que desse expediente lançara mão na espécie em que o locatário, notificado, deixa de restituir a posse imediata (Código Civil de 1916, art. 1.196), de regra o evita. Não tínhamos nós a “astreinte” de tipo francês e hispano-americano; muito poderiamos ganhar em admiti-la sempre que a conversão em perdas e danos, ou outra constrição, fosse ilusória ou difícil. (O art. 302, XII, do Código de Processo Civil de 1939 veio admitir a cominação adstritiva, em termos largos, ao lado de outros casos como o do art. 367.) Vejamos, hoje, o que se estatui nos arts. 901-906 do Código

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de Processo Civil de 1973, a cujos comentários nos reportamos. Se o devedor tem de pagar em dinheiro, mesmo por se ter substituído a obrigação de pagar coisa certa pela de pagar perdas e danos, e dinheiro não há, ou não se encontra, o caminho lógico é extrair dinheiro, pela venda, a bem ou a bens do executado. ~ quase a regra, nos fatos da vida, essa espécie de execução a que se pospõe o processo de redução de bens a dinheiro, colhendo-lhes o valor. A penhora, que éa medida constritiva típica, apanha o bem, em inicio de execução (elemento que, por certo, não surge, a despeito do que pretenderam alguns juristas, no arresto e no sequestro , decisões mandamentais cautelares, preventivas). Se a penhora acautela é somente porque prende, constrição, porém, de finalidade já decidida: execução forçada da obrigação. Teremos ensejo de acentuar, mais uma vez, o papel da conversão, que, nas ações executivas, se consubstancia com a executividade, isto é, se entrosa na sequência de atos executivos. (c)A execução de sentença tem por si haver sido precedida pela ação de condenação, ou outra, cuja sentença, com 3 de executividade, se executa. Quer dizer: a ação executiva é, aí, pura, única (sem cumulação). Distingue-se daquelas em que a sentença da qual exsurgiria o efeito mediato executivo ainda vai ser proferida, e talvez não no seja. Tais as ações de título extrajudicial e outras da mesma natureza A ação executiva do art. 641 é diferente: nela, são contemporâneas a sentença condenatória e a executiva; donde preponderar esse elemento, que é mais enérgico, por ser ato. Cumpre ter-se todo o cuidado em não se confundir: a) a pretensão a que o obrigado execute, que está no plano da res in iudicium deducta, e existe antes de sentença, com b) a pretensão a que o Estado execute, que é pré-processual, porém não a do plano da res in iudicium deducta, e com c )aactzo iudicati, que nasce dessa pretensão. No correr dos comentários, quando falamos de pretensão a executar, sem aludir ao direito material (e. g., ao Código Civil), é a b) que nos referimos. A prescrição da actio iudicati não obsta à declaratória dessa ação (J. F. BALBO, Tractatus de Praescriptionibus, 544, Secunda Pars principalis, pr., n. 12). (d)A condenação nas custas, essa, é sentença em ação condenatória proposta na ação que é julgada, qualquer que seja. Sentença inserta noutra sentença, que não precisa ser de condenação, e até pode ser sentença que julgue improcedente a ação principal. A noção de inserção ou cumulação implícita traduz melhor o que se passa do que a de acessoriedade, mais adequada a processos. O efeito executivo da sentença quanto às custas, e não da outra. 9)FORÇA DE EXECUTIVIDADE, EFEITO MEDIATO E REFERENCIA LEGAL A SENTENÇAS E TITULOS EXECUTIVOS. No Código de Processo Civil de 1973, art. 584, V, pôs-se como um dos títulos executivos judiciais como o formal e a certidão de partilha. Antes, no Código de 1939, o art. 510 estabelecia: “O formal e a certidão de partilha terão força executiva contra o inventariante, os herdeiros e seus sucessores a título universal ou singular, sendo o processo o mesmo das demais execuções”. Como a sentença nas ações de partilha, quer se trate de herança, quer de sucessão entre vivos, quer de comunhão, ou de sociedade, é de força executiva (5), não poderia pensar em que se tivesse de propor outra ação para a execução, como se a sentença de partilha fosse simples sentença condenatória. O assunto, diante da remissão do texto de 1939, ao mesmo processo das demais execuções, criou discussões e divergências. Agora, em vez de apenas se falar de ser o processo “o mesmo das demais execuções”, por estar o artigo no capítulo sobre partilha, inseriu-se no art. 584 o inciso V que foi o último na enumeração dos títulos executivos judiciais. Pergunta-se: ~o legislador agiu como se pudesse apagar o peso 5 de executividade da sentença de partilha para pôr em seu lugar apenas a eficácia mediata de executividade, que é, de ordinário, o peso executivo das sentenças condenatórias? Temos de cogitar da matéria sob o art. 589 e sob o art. 1.027. Tem-se de dar solução que atenda a afirmativas de ciência do direito sem se considerar não-escrito o que está no art. 584, V. 1) ExEcuçÃo ESTATAL. O Estado, diante do exercício da pretensão executiva, faz passar ao patrimônio do autor da ação o bem que se achava no patrimônio do devedor. A espécie é, tipicamente, intercalar: n~o há alienação, ato divestitivo do devedor, nem há desapropriação, ato expropriativo do Estado; o Estado retira a propriedade do devedor, sem ser em virtude de seu poder de desapropriar, poder especial, outorgado pela Constituição, na esteira histórica do direito brasileiro; o devedor, que sofre a execução forçada, não “alienou”, mas praticou ato ou foi responsável por fato de que advieram o dever de prestar e a pretensão executiva do credor. A pretensão à execução, de que se trata, ou é: (a) a que se exerce, tendo-se sentença condenatória ou outra com carga suficiente (mediata) para execução (= sentença com peso de, pelo menos, 3 de executividade, e. g., sentenças dos arts. 584, 587-590, ou (b) a que se exerce tendo-se título executivo extrajudicial, conforme os arts. 576 e 585, ou (c) a que se exerce como conteúdo da carga de eficácia executiva imediata 4, qualquer que seja a sentença, ou (d) a que se exerce como em ação executiva sem sentença prévia e sem título que seja

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conforme os arts. 576 e 585 do Código de Processo Civil. Na justiça de mão própria, era o credor que executava: retirava ao devedor o que ele havia de prestar, ou o que a isso equivalesse. O Estado sucedeu aos credores nessa função de retirar do patrimônio do devedor a coisa devida, ou o valor que tem de prestar, pois que, devendo prestar por ato próprio, não o prestou. A função do juiz que executa é função judiciária, e não de poder executivo. A execução, quer se trate de execução de títulos a que se conferiu eficácia executiva, quer se trate de execução de sentença, é em açio executiva. Ação executiva tem quem é titular de pretensão executiva, pretensão de direito material, privado ou público, que se não confunde com a pretensão pré-processual à execução forçada. A execução torna efetiva, através do Estado, por ato dele, em prestação jurisdicional, o adimplemento que competia ao devedor. Nem toda pretensão a que alguém preste coisa ou valor é pretensão exequível pelo Estado. Daí perguntar-se se o que pede que o Estado execute forçadamente (= em lugar do devedor) pode exigir do Estado que preste. Nem sempre pode o Estado prestar em lugar do devedor, ao simples pedido de execução. Por isso mesmo, além das pretensões não munidas de ação, há as pretensões não munidas de ação executiva, razão por que se há de primeiro obter a sentença judicial com eficácia executiva (pelo menos 3 de executividade). Quem pede que o Estado preste pelo devedor, com os bens desse, alega que o devedor deveria prestar (pretensão de direito material). Mas só tem direito a pedi-lo se, na espécie, o Estado prometeu a tutela jurídica para a execução (:rz se há, na espécie, pretensão pré-processual à execução). A perda da propriedade ocorre quando o credor adjudicatário ou o terceiro arrematante, ou adquirente por compra-e-venda permitida pelo juiz, se a lei, na espécie, o permite, se torna dono da propriedade. Não importa se a ação executiva foi iniciada com incompleta cognição, ou se o foi com a cognição completa que se exprime na coisa julgada da condenação anterior. Casos há em que o sistema jurídico permite o salto, o juiz, em vez de somente condenar a declaração de vontade, condena a isso e a cumpri-la desde logo, o que equivale a adjudicar (art. 639); cf. Decreto-lei n. 58, de 10 de dezembro de 1937, arts. 16 e 22. No momento em que transita em julgado a sentença, perde o direito de propriedade o dono do imóvel, posto que ainda haja discordância entre o registro e a história jurídica do bem. As inconveniências desse lapso são obviadas pela averbação do pré-contrato, nas espécies do art. 16 do Decreto-lei n. 58, ou a inscrição nas espécies do art. 22 do mesmo Decreto-lei n. 58; nas demais espécies, podem ser pela inscrição cautelar da ação, conforme fora posto no art. 178, a), VII, do Decreto n. 4.857, de 9 de novembro de 1939. Os dois ordenamentos jurídicos, o material e o processual, são distintos, suscetíveis de linhas discretivas, mais ou menos precisas; porém isso não quer dizer que não haja contactos e reações, que levem, de um a outro, maior eficiência, ou a diminuem. Ninguém pode negar ou não perceber o reforçamento à atendibilidade do direito material que ao direito, à pretensão e à ação comunicam o fato de ser ter, no direito processual, incluído o título do direito como executivo, o fato de se ter feito executiva a pretensão e o fato de se atribuir executividade à ação. Nem se pode menosprezar o que ministra ao direito processual o direito material quando edicta regras jurídicas sobre prova. Na expressão “título executivo” alude-se ao título, tituius e não só ao documento, à prova. A atribuição de executividade não exige a cártula, posto que, de regra, os títulos executivos extrajudiciais consistam em cártulas. N~ há cártulas, que sejam objeto de posse, nos direitos com ação executiva, que se mencionam no art. 585, V e IV (ações do serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, para cobrança de custas e honorários, contados conforme o regimento e aprovados por decisão judicial, ação dos credores por foros, laudêmios, renda de imóvel, e função em condomínios proveniente de contrato escrito). A definição de título executivo extrajudicial pertence ao direito pré-processual. Quando o direito material alude a título executivo, é à eficácia pré-processual executiva que se refere. O conceito mesmo é pré-processual. Se alguma regra jurídica, de direito material, fala de título executivo, ou de ação executiva, ou recebe o efeito processualístico, ou a regra jurídica mesma é heterotópica. Como heterotópico seria o art. 585, se a técnica legislativa não tivesse adotado inserir-se na lei processual o que é referente à tutela jurídica. As ações executivas ou são restitutivas (vindicatórias, possessórias de reintegração ou restitutivas) ou extrativas de valor. Nos direitos reais de garantia, por exemplo, a ação executiva hipotecária e a ação executiva pignoratícia são extrativas do valor do bem gravado, e a ação do titular do direito de anticrese é só restitutória, vindicativa ou possessória. As ações executivas ou são pessoais ou reais. Quando o titular de algum direito real de garantia exerce ação executiva para extração do valor do bem gravado, a ação dele é real. Não assim a ação do portador da letra de câmbio, da nota promissória ou da duplicata mercantil. A ação do portador do cheque é real. Real é a ação do portador do conhecimento de depósito ou do warrant, ou da letra hipotecária, ou da cédula hipotecária, ou pignoratícia, ou mista. Tem-se de verificar a legitimação ativa, nas ações executivas. Os poderes ou são poderes de presentação ou

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poderes especiais. Lê-se no Decreto-lei n. 70, de 21 de novembro de 1966, art. 29: “As hipotecas a que se referem os arts. 9~O e 10 e seus incisos, quando não pagas no vencimento, poderão, àescolha do credor, ser objeto de execução na forma do Código de Processo Civil (arts. 298 e 301) ou deste Decreto-lei (arts. 31 a 38) “. E no parágrafo único: “A falta de pagamento do principal, no todo ou em parte, ou de qualquer parcela de juros nas épocas próprias, bem como o descumprimento das obrigações constantes do art. 21, importará, automaticamente, salvo disposição diversa do contrato de hipoteca, em exigibilidade imediata de toda a dívida”. No art. 31: “Vencida e não paga a hipoteca no todo ou em parte, o credor que houver preferido executá-la de acordo com este Decreto--lei participará o fato, até seis meses antes da prescrição do crédito ao agente fiduciário, sob pena de caducidade do direito de opção constante do art. 29”. E no § 1.0: “Recebida a comunicação a que se refere este artigo, o agente fiduciário, nos dez (10) dias subsequentes, comunicará ao devedor que lhe é assegurado o prazo de vinte (20) dias para vir purgar o débito”. Ainda no ~ 2.0: “As participações e comunicações deste artigo serão feitas através de carta entregue mediante recibo ou enviada pelo Registro de Títulos e Documentos ou ainda por meio de notificação judicial”. 2)AçõEs EXECUTIVAS DE COGNIÇÃO INCOMPLETA. O Estado, quando reputa a causa, ou algum documento, inclusive a sentença, suficiente para execução estatal, que é a única que ele admite, depois que proibiu a ajuda prária ofensiva, de que falamos no Tomo V, alia a essa condição de especialidade da causa ou certeza jurídica o conferimento de pretensão a executar, pretensão à tutela jurídica, como todas as outras. A certeza está longe de ser a mesma para todos os casos de eficácia executiva. A cognição da pretensão de direito material pode não ter sido definitiva, antecipando--se-lhe a execução; porque, em tais casos (raciocina o legislador), o que mais acontece é merecer o conferimento de efeito executivo o pedido, o documento ou a sentença. Alguma cognição há: não há completa. As razões que tem o legislador para antecipar a executividade, ou advêm da natureza da obrigação e da cártula em que se inscreve (1), ou da natureza circulatória do título (2), como se dá com os títulos cambiários, ou devido à pessoa do credor e ao valor probante dos seus escritos (b). (b)Nas espécies (a), o efeito executivo é superficial; nas espécies (b), parcial ou com ressalva, porque só se admitem algumas exceções do réu; nas espécies (c), a particularidade é subjetiva, salva a defesa do devedor (processo, já evoluído, injuncional). A parcela de cognição, com que se começa, justifica, no plano da construção jurídica, que se “adiante” ao autor a prestação jurisdicional de execução. “Parcela”, dissemos, para que o termo possa compreender a) o simples adiantamento (cognição adiantada), correspondente à provisoriedade característica da execução, b) a cognição parcial (quer dizer: “salvo” exceções admitidas), c) a cognição de primeiro exame ou superficial. Em qualquer desses processos, há cognição, maior ou menor, posto que incompleta; em todo caso, menor que a operada na execução da sentença (arts. 587, 588, 570, 594, 736 e 740). A correspondência entre a dose de cognição e a espécie de executiva é dado de técnica legislativa; de lege lata, constitui elemento de interpretação das regras de direito pré-processual. Como espécie de procedimento especial, o processo executivo caracteriza-se pela prevalência da eficácia executiva, em comparação com a eficácia declarativa, condenatória, constitutiva, mandamental, portanto em comparação com a função declarativa, constitutiva, de condenação e de mandamento do juiz. Não que essa cognição não se complete: apenas se adianta a prestação jurisdicional, que passa a ser, nas execuções provisórias, isto é, nas espécies (a), completa quanto ao objeto e incompleta no tempo (portanto, provisória); ou se adianta em parte, quanto ao objeto pela possibilidade de se contra-executar, tal como acontece às espécies (b); ou se adianta nas espécies (c), em virtude de primeiro e superficial exame, como ato de fé no valor mesmo dos escritos. Em todas as três classes, ressalta que a prestação juriscional se completará por ocasião da sentença final (art. 740). Portanto, o executivo dos arts. 585 e 586 é apenas aquele em que em vez de separado do processo cognitivo puro, em que a execução é outro processo, com a sua particularidade de inversão o efeito executivo é atendido antes de se completar a cognição, que tem, nele, dois momentos: um, inicial, e outro, final. O processo ordinário e outros processos, de cognição completa final (e nenhuma, que se possa levar em grande conta, inicial), constituem os processos normais; os executivos com o início antes da cognição plena, anormais. A base desses está favor, e o interesse de execução vem à frente da simples e serena convicção completa do órgão do Estado. O processus executivus, de origem medieval, que ainda se encontra no Código, foi o resultado da experiência em que se não prosseguiu de se estabelecer forma processual correspondente à espécie de pretensão à tutela jurídica. Os velhos juristas portugueses chamavam à execução da sentença (que se proferiu causa cognita, quer dizer, com a completa cognição) execução mera e aos juizes da execução executores meri, porque só lhes cabia tratar da execução das sentenças, não da justiça delas (“debent tractare de executione sententiae, neque de iustitia ililus possunt se ulIo modo intromittere”). As ações executivas de cognição incompleta diziam-se mistas, porque, embora sejam causa non cognita, se evidenciam executivas per concessionem factam per Principem. A

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defesa faz-se para atacar a concessão (PEDRO BARBOSA, Commentarii ad inter pretationem Tituli Pandectarum de iudicis, 462). Nas ações de coguição ações declarativas em sentido larguíssimo, de que não usamos há enunciados sobre incidência (toda aplicação de lei é enunciado sobre incidência) e certa quantidade de raciocínio que o juiz deve fazer. Nas ações executivas, ou há também, pela duplicidade de elementos (cognitivo, executivo), esse raciocínio, como é o caso das ações de títulos executivos extrajudiciais; ou ficou para trás, noutro processo, a cognição, como ocorre com as ações de execução de sentença. O enunciado sobre incidência, nas ações executivas, é mínimo, e não tem raciocínio posterior, que leva a se preciso confirmá-la. “O título é dito executivo: se deferido o pedido de execução”. A defesa do executado pela sentença em embargos, não em contestação, e a do terceiro também em embargos ou pelo recurso (com elemento mandamental negativo) do terceiro prejudicado (art. 499 e ~ 1/’), são ataques noutro processo, que, ainda no caso do recurso, conserva toda a reminiscência da ação autônoma. Nas ações executivas de títulos extrajudiciais, os dois elementos, o executivo e o condenatório, enchem o processo, de modo que a ação não deixa de ser (ou já é) executiva, embora se tenha de desenvolver o processo de cognição. A execução provisória e a medida cautelar não se hão de confundir. Medida cautelar não executa. Tampouco se confunde com a medida cautelar a execução superficial, ou a parcial. Na execução provisória, o juiz adianta a execução, devido à sentença com força executiva a despeito de ainda não haver coisa julgada formal. 3)JUDICIALIZAÇÃO DA EXECUÇÃO FORÇADA. Em todo tratamento da execução, deve-se ter sempre em vista: a) que se judicializou a execução forçada, qualquer que seja; quer dizer: a execução somente pertence ao direito processual, e não ao resto do direito público, sendo absurda, por exemplo, a opinião de E. G. LIPARI (Struttura e funzione della sentenza dichiarativa di faílimento, Circulo giuridico, 1931, fasc. 1), que considera provimento administrativo a sentença de abertura de falência ou de concurso; b) que a penhora, o arresto, o sequestro, a extensão executiva do concurso de credores (art. 613), a constrição concursal da arrecadação e quaisquer outras medidas constritivas são elementos executivos, porque invadem a esfera jurídica de alguém, podendo a ação ser executiva ou mandamental (preponderância do mandamento); c) as ações executivas em que se pospõe a cognição completa, satisfazendo-se o Estado, para o adiantamento da execução, com a cognição incompleta, se o título executivo é extrajudicial, são ações em que o Estado apenas desloca, no tempo, cognição e execução; d) os processos preventivos, ou, em geral, cautelares (alguns casos dos arts. 675-688), têm elemento executivo e elemento de cognição, porém falta a todos eles composição definitiva da lide, não há verdadeira execução porque essa não se completa (vai, até o fim, como provisória) e não passa da constrição, de modo que se põe à frente a medida constritiva e se pode definir a pretensão à asseguração como pretensão a execução incompleta e cognição igualmente incompleta. São pontos dignos de meditação. 4)FORÇA EXECUTIVA E EFEITO EXECUTIVO. Os que tentam negar a especificidade da pretensão à execução e, pois, da eficácia executiva (força executiva e efeito executivo), têm de introduzir tal pretensão e tal eficácia na classe da pretensão à cognição (declarativa, constitutiva ou condenatória), ou conceber o mandado como o momento decisivo de toda execução (mandamentalidade). FRANCESCO CARNELUTTI procurou reduzir o processo executivo ao de cognição, sem dizer a qual dos três. Outros acentuaram a mandamentalidade, identificando processos cautelares e processos definitivos ou satisi ativos. Outros especializaram a cognição, como ENRIco TuLLIo LIEBMAN (Le Op~posizioni de merito nel processo di esecuzione, 143), que entendeu ser o título executivo ato jurídico que tem eficácia constitutiva, porque é fonte imediata e autônoma da ação executiva, que, na sua existência e no seu exercício, independe do crédito. Primeiro, havemos de observar que aí se desatende ao fato de poder ser constitutiva a eficácia sem ser preponderante. O que se passa com a eficácia constitutiva (não preponderante) da ação de execução e da sentença executiva, como do título executivo, passa-se com a eficácia condenatória (não preponderante) da ação e da sentença de nulidade de casamento, que é, preponderantemente, constitutiva negativa. Já aí a argumentação de ENRíco TuLLIo LIEBMAN abstrai de outros elementos, inclusive o que prepondera, de título executivo. Ninguém nega o elemento constitutivo do título executivo, como seria absurdo negar-se o elemento declarativo da ação ou da sentença de condenação. Também o homem é animal, como outros animais; e não só animal, nem preponderantemente. Ainda mais. A pretensão à execução específica a pretensão à tutela jurídica. Se há de vir depois ou antes da coguição completa, isso depende da lei processual. Quem fala de título executivo emprega proposição elíptica: “Titulo em que se encontram os requisitos necessários e suficientes, para que, com a apresentação dele e a dedução do direito em juízo, se dê ingresso à execução, porque se tem a pretensão a executar e se sabe que ela basta”. Já não há questão de ser antes ou depois da cognição completa; pois isso não depende do título executivo, ou da pretensão à execução, mas da pretensão à sentença de cognição: a sentença como título

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executivo prescinde da cognição, porque já é cognição completa; os outros títulos executivos têm de dar ingresso à execução mediante cognição incompleta, porque, não sendo eles sentença ou ato estatal de igual força, estão sujeitos a que se elida aquela afirmação de cognição incompleta com que se começou, ou se complete a cognição, reafirmando-se. Nenhuma diferença há entre a pretensão a executar nas ações executivas de títulos extra judiciais, por exemplo, e nas ações de execução de sentença: toda a diferença só se verifica quando se indaga da carga de cognição com que se começa. Por esse quadro pode-se ver que o título executivo sentencial pressupõe, de ordinário, a condenação, ao passo que o não-sentencial a pospõe ao ingresso da execução. A constitutividade do título sentencial ou não-sentencial é anterior ao processo executivo, de modo que falar de ação ou de sentença constitutiva nos processos executivos seria descreverem-se os dois elementos finais (ação e execução de sentença) ou os três elementos finais (ação de titulo executivo extra-judicial, estando-se a ver, no direito pré-processual, o título (executivo). Definir o arresto ou sequestro como ação executiva viria confundi-la com a ação pos posta (pós-su posta). Sempre que se trata de sentença cuja eficácia seja executiva de negócio jurídico já constituído (ação de título executivo extrajudicial, actio iudicati, ação do art. 639), a sentença é executiva. Sempre que se trata de sentença cuja eficácia é constitutiva do negócio jurídico ou da situação jurídica, a sentença é constitutiva. A sentença do art. 639 é sentença executiva. A sentença proferida na ação que se baseie no art. 81 do Código Civil não é executiva alternada com a de condenação a indenizar perdas e danos, é ação a duplo pedido, alternado, de condenação: o juiz não executa, “autoriza”, isto é, condena a que sofra o ser a obra feita por outrem. A execução, então, é extra judicial, efeito da sentença de condenação, como seria judicial a actio iudicati, nos outros casos. O título executivo que permite a execução com a “maior” dose de cognição, dita completa, é a sentença. De modo que, no terreno dos princípios, se alcança concepção unitária do efeito executivo e da particularidade processual, que coincide com as fontes históricas da execução da sentença e da execução dos créditos documentados, etc. Não infirma uma e outra conclusão o erro de técnica do Código de 1939, art. 196, corrigido em 1973, art. 262, nem, sequer, a ênfase do “mandado executivo”, expressão com que se pretendia substituir a velha “carta de sentença”. Os títulos executivos ou são do Estado ope íurisdictionis, ou de direito privado, ou do Estado ope gestionis. (Evite-se a distinção entre judiciais e preconstituidos, para se não excluirem os judiciais constitutivo5, às vezes integrativos, que têm natureza mista.) O exercício da pretensão a executar, independente e antes de qualquer decisão sobre a pretensão à sentença, foi o início histórico da execução forçada. A forma estatal é posterior; posterior a execução “das sentenças”. Por isso mesmo, a tomada de posse, a prenda do velhissimo direito lusitano, que teve correspondentes na Babilônia e em Roma, tantos séculos antes não é baseada no penhor, como pareceu a JO5EF KOHLER (Prosessrechtiiche Forschungen, 59); e sim na executabilidade privada. A noção de penhor que se introduziu depois (“penhora”) resultou da intenção organizatória do Estado, à medida que as prendas se diferenciaram em preventivas e para execução pelo Estado. No começo, a diferenciação não existia e há sistemas jurídicos que ainda não chegaram à distinção entre o “embargo” e a “penhora”, entre o expropriar da posse sem o chamar a si o poder de dispor e o expropriar a posse com o chamar a si esse poder. A despeito de hoje nos parecer que a pretensão a executar só deva ser exercida depois de o ser a pretensão à sentença, verdade é que, no processo extrajudicial, ainda nos povos antigos (Babilônia, Roma, etc.), a citação privada e o exercício da pretensão a executar (sabâtu, assírio, manus iniectio, romana) vêm, paradoxalmente, antes. A regra era que a própria ação de cognição fosse “ação” do réu contra o autor (A. WALTHER, Das altbabylonische Gerichtswesefl, 213). A forma mais primitiva é, portanto, a ação executiva pura, contra a qual o réu faz valer a sua “ação” contrária. Essa ação do réu executado mantém durante muito tempo a forma de contra-”ação”, de embargos do executado, ditos embargos do devedor, ação que foi exercida perante o Estado e através dos seus órgãos; antes de o ser a própria ação de execução. Entre o cognitio e o iudicium há diferença de amplitude: o iudicium da ação executiva que deixou atrás a cognição (e. g., a actio iudicati) não tem mais esse exame; em compensação, de algumas questões prejudiciais há cognitio, não iudicium. O que faz a coisa “julgada” é o iudicium. A prejudicialidade também abrange questões de fato, em si mesmas; de modo que não seria possível recair o judicium sobre elas, desligadas das questões de direito. Quando, nas ações de execução de títulos extrajudiciais, inclusive cominatórios, o juiz manda que se cite, com a alternativa de execução, ou com o cominatório, a incompleta cognição, tida como suficiente para esse resultado, possui o que faz o mandado conter algo de sentencial. O adiantamento, que se opera, como que faz o mandado ser metade mandado e metade sentença. Tanto quanto o mandado, na execução de sentença, é mais

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sentença do que mandado a sentença “de execução que se processa”. Os embargos do terceiro contra o mandado, nos casos de ações executivas de títulos judiciais e extrajudiciais e os embargos do devedor, nos casos de execução de títulos judiciais e extrajudiciais são ações de impugnação desse mandado-sentença. Se não há contestações desses mandados, é porque há as impugnativas próprias, nas quais se há de deduzir o que se pode alegar contra eles (embargos do devedor). A ação exaure-se, a cognição completa- -se, o mandado-sentença adquire toda a sua culminância sentencial, quando o exeqúente obtém a satisfação do seu petitum executivo. 1.A distinção entre ações e sentenças declarativas e ações e sentenças de condenação já estava prefigurada, no terreno filosófico, pela distinção das funções da regra, regra de vida e regra de dirimência de dissídios (Lebensnorm, Streitentscheidung), segundo KARL BINDING (Die Normen and ihre tJ’bertretung, 1, 14). A ação condenatória supõe infração de regra jurídica. (Em todo caso, repilamos a insinuação de que ali o juiz serve e aqui domina, que vem em EUGEN RosENsTocK, Der ewige Prozess des Rechts gegen den Staat, 5 5.). Na tutela que corresponde à ação executiva, a pretensão, que aparece, é a execução pelo Estado, dita forçada, porque se supõe que a parte não executou. A diferença, que se reflete, variavelmente, no processo começou na classificação das pretensões à tutela jurídica. Quando alguns juristas escrevem que falta à ação executiva autonomia (a condenação precede-a; ou sucede-a, mediante adiantamento), a ponto de ser mais ônus que ação, caem no mesmo erro em que caíram os sustentadores da redução da condenatória à declarativa. Demais, nos casos de documento executivo em que não haja defesa, salvo a defesa contra a declaração (a história conhece exemplos), a condenação é, por bem dizer, nenhuma, e a força executiva está apenas colada à declaração. Também se entendeu que a ação executiva tende a obter ato do juiz que somente pode ser favorável. A esses, provavelmente negadores da pretensão à tutela jurídica pré-processual, seria de se perguntar: ~,então , que é que se passa quando o juiz repele a ação executiva? A pretensão a executar é pretensão á tutela jurídica e pré-processual. Por isso, e somente por isso, a resolução judicial pode ser desfavorável: à pretensão de direito material é que corresponde “ação executiva” (direito material); não à pretensão à tutela jurídica que no caso é pretensão à tutela jurídica de execução, por abreviação “pretensão à execução”, ou “a executar” II. A ação executiva de títulos extrajudiciais é a ação correspondente à pretensão à execução, aí à frente (e preponderando) em relação à ação de condenação, correspondente à pretensão à condenação. As duas pretensões se exercem no mesmo processo, mediante a “ação executiva”, adiantando-se a cognição, para que se possa começar pela eficácia executiva da causa petendi. Pela mesma razão, a ação executiva de sentenças é ação correspondente à pretensão a executar, que então se exerce após a cognição completa, tal como resultou da força de sentença condenatória. Ao ser intentada a actio íudicati, a condenação já é fato consumado, pela eficácia da sentença, um de cujos raios é essa actio iudicati. Um dos raios, entenda-se, que pode não existir se a sentença condenatária é, embora excepcionalmente, desprovida dele, e ser sem cabimento, sem razão de ser, se o próprio devedor executou a obrigação. Pode mesmo ter sido “enervada”, isto é, ter perdido a eficácia, a sentença em virtude de preceito cominatório, como além teremos ensejo de mostrar. Atendendo a isso, o Código manteve a separação das suas ações a de cognição (condenatória) e a de execução e o art. 214 é explícito quando exige, para validade, a citação (cf. arts. 621, 629, 632, 652, 654 e 732). As partes podem ser, até, diferentes. Havendo duas ou mais de duas pessoas condenadas, os processos de execução são relativos a diferentes relações jurídicas processuais de execução. A ação executiva de títulos extrajudiciais tem a característica de ser “ação” de duas finalidades pré-processuais, portanto, em verdade, duas ações, uma das quais prepondera e lhes dá o nome, na classificação das ações. O dito de BALDO DE UBALDIS Ex ipsa sententia oritur novum ius tem de ser entendido como se esse “ius” significasse “poder”, no sentido, por exemplo, em que se chama à cláusula de inalienabilidade “restrição de poder”; e não se há de querer o imperdoável anacronismo de se supor que, tantos séculos antes de se isolarem pretensão e ação, BALDO DE UBALDIs entendesse por ius executivum a pretensão à execução e a dissesse nascida da sentença. Ora, nada clarcia mais a natureza da ação executiva das sentenças do que o estudo das ações executivas de títulos extrajudiciais. Nelas, é evidente que a pretensão a executar já existe antes da sentença, e foi metáfora dos velhos juristas falar dos títulos executivos como títulos com força de sentença. ~J certo que, nos casos de ação de condenação em que o título não permitiria propor-se a ação executiva de títulos extrajudiciais, não há processo executivo, nem há relação jurídica processual com o conteúdo executivo; porém isso, por si só, não autorizaria a concluir-se que ainda não existe a pretensão à execução. O problema merece exame, que adiante se faz. Alguns juristas, devido a ter-se sumarizado a execução (execução per officium iudicis) e a falar-se, em textos portugueses, de poder-se recorrer, também, à actio iudicati, entendem que a ação de execução deixou de ser ação autônoma. Ora, por mais curta, rápida, que se tornasse a execução, actio iudicati continuaria de ser, tendo apenas atravessado as vicissitudes históricas pós-

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-romanas (germânico-canônicas). As Ordenações Filipinas, Livro III, Título 25, § 8, concebido por mestre, falou de “ação que nasce da sentença”, no sentido do Ex ipsa sententia oritur novum ius. A única diferença entre a actio iudicati romana e a nossa é que a nossa está mais esvaziada do que aquela de elemento de cognição (condenatório ou simplesmente declarativo), é mais pura, de elemento executivo quase que só. No fundo, a nossa actio iudicati corresponde a mais rigorosas precisões das duas pretensões e dos dois processos. Os embargos do devedor, onde alguma discussão cognitiva surge, revelam, ainda assim, a necessidade de se combinar com a construção da ação de execução da sentença (ação executiva) ou de título extrajudicial a ação mandamental dos embargos do devedor. III.O art. 585 recolhe casos de processo executivo em que se começa por executar antes de se ter plena cognitio. ~ impossível reduzi-los todos à origem única e muitas vezes princípios romanos (e. g., O., de confessis, 7, 59: “Confessos in iure pro iudicatis haberi píacet. quare sine causa desideras recedi a confessione tua, cum et solvere cogeris”) eram invocados para atender a construções novas, inspiradas pelas Circunstâncias materiais da vida. O ter-se o instrumento público como confissão, e não somente como prova preconstituida, como instrumenta guarantigiata ou confessionata, éelemento insigue; e BÁRTOLO DE SAxoFEmTo pôs os seus trechos sobre os instrumentos públicos (feitos perante o tabelião, iudex chartuiarius) sob a L. única do Codex lustinianus, de confessis, 7, 59. Essa equiparação geral à sentença, para permitir a execução antes da sentença condenatória, não chegou até à nova lei processual (cp. art. 585, II). E foi bem que acontecesse, por serem de exigir-se, de íure condendo, a determinação da dívida mesma. Só assim se lhe há de reconhecer a parata executio (execução parada ou aparelhada), que é como se disséssemos que só assim a escritura prova que, além da pretensão à execução, pré-processual, está habilitado o credor a usar, desde logo, da via executiva. Cedo foi visto que os casos dos arts. 585 e 584 tinham muito de comum; porém, ainda assim, não eram idênticos. Tempo houve em que não se exigia, para a execução da sentença trânsita em julgado, nem mesmo a citação do executado, tão claro parecia tratar-se de plena cognitio, já estranha à relação jurídica processual da execução. No entanto, à equiparação dos instrumentos públicos à sentença se opunha a dilatação do prazo ao devedor réu para apresentar defesa, sempre que era de instrumento do tabelião, e não de sentença, que se cogitava. Cognição anterior, suficiente para o exercício da pretensão executiva, havia, sem a qual se teria de dar à ação caráter preparatório ou de simples asseguração (pretensão à segurança, cf. arts. 796-889). Mas tal cognição era incompleta: a parte cognitiva assente autorizava a execução; a parte cognitiva ainda não assente tinha de discutir-se no processo executivo. Se essa parte ia ser versada em rito ordinário, ou sumário, não nos importa, salvo no estudo das formas do procedimento executivo-cognitivo. Na classificação das ações, segundo a sua eficácia, esse elemento formal não entra, nem poderia entrar. O que 50mente importa é saber-se se a pretensão, que se exerce, é pretensão à execução, e prima, na espécie. O mandado inicial de solvendo foi o sinal desse primado da executividade dos instrumentos. Naturalmente, quando se exigiu a citação do executado, nas execuções de sentença, por se ter visto que algo poderia ocorrer que justificasse defesa do executado, teve de ser usado o mandado de solvendo. Ocorrera, porém, que a sumariedade do processo executivo-cogritivO (execução de títulos extrajudiciais) sacrificava o trato de certas questões, razão por que, às vezes, se chegou a cisão em dois processos, o executivo-cognitivo (imperfeitamente cognitivo, devido à via summaria) e o cognitivo puro, posterior àquele. Tal dualidade, que, afinal de contas, punha a ação e a sentença de execução antes da ação e sentença condenatórias inversão, a priori, possível, se bem que, na prática, dê alguns maus resultados teve de exprimir os seus intuitos de política jurídica em certos brocardos e princípios peculiares à dupla processualidade das duas ações: *Pronunci~atio iudicis facta in causa summaria, super aliquo artículo incidenti, non praeiudicat. *Succumbenti in iudicio executivo reservatur iura in ordinario. Tudo isso serve de material para se ver o sentido da evolução que se operou. É compreensível que, diante das duas ações executivas, a dos títulos extrajudiciais e a das sentenças, alguns países (e. g., Itália e Alemanha) acentuassem a diferença, e outros, os traços em comum (França), chegando, respectivamente, à dualidade processual e à unidade processual. A Ordenança (1539) de Francisco 1, da França, traduziu a última tendência, vindo, no século XIX, a refletir-se na Ordenação alema. Na península ibérica, o processo executivo nasceu sumaríssimo, se assim se pode dizer. Começou com a prenda privada (execução própria), até que, provavelmente antes do século XI, se judicializaram o arresto e a penhora (~e com que reações!). Lei de Afonso II (cp. Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 9, § 1; Leges et Consuetudines, 1, 172, n. 15)exigiu a prova prévia, isto é, a cognição (verbis “outro senom aquel que poder provar que he seu devidor ou fiador. E aquel aí fazer seia peado en quinhentos soldos e correga o dano ao que no rreçebeo”). IV. A elaboração do processo executivo português foi autônoma, tendo sido os elementos intelectuais, alemães e italianos, posteriores. Aliás, a finura dos juristas portugueses e dos legisladores encontrou a via media entre Itália--Alemanha e França, de que fala SILVESTRE GOMES DE Moi~ís (Tractatus de Executionibus, 1, 5, 6, e 8), em trecho que merece ser transcrito: “In Tuschia, & fere per totam Italiam causa abreviandarum iltium

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certus procedendi modus inventus est desumptus ex ipsa iuris communis meduíla, qui ita se habet: Tabeilio per statuta iliorum Regnorum creatur iudex cum iurisdictione ad praecipiendum in confessum, vocaturque iudex cartularius. . .“ “Quod ille de iure communi non concedebatur. . ~ “...coram ipso, tanquam coram iudice.. .“ .... . in Italia instrumenta sunt exequibilia...~’ “Istud praeceptum notarii dicitur praeceptum guarentigiae, & contractus, seu instrumenta dicuntur guarantigiata, quia guarentare in lingua Thusca significat firmum & stabile facere. . “ “In Francia omnia contractuum instrumenta si sigillo aliquo authentico... habent quase paratam executionem.” “In regnis tandem Castellae parum dissimilis stylus servatur. . .“ Depois de tão precisa compreensão do direito dos outros povos, SILVESTRE GOMEs DE Moiuus que, no sumário, anunciou tratar, sob o n. 28, de que “Nostra Lex Regia mediam viam elegit inter legs Regnorum exterorum” (Tractatus de Executionibus, 1, 2), diz no dito número (1, 8): “En vides notatis legibus, statutis & stylis exterorum Regnorum, quantum Lex Regia Lusitaniae mediam viam sectans inter praedicta iura sancte, prudenter, humaniterque se habeat, nam neque executionem incipi captis pignor. inaudito debitore voluit, cum tanta ipsius molestia, & gravamine, ut servant leges Castellae, Franciae, statutaque Italiae, neque’convictum debitorem per publicum instrumentum litem in tempus protelare passa est, corrigendo in hoc segnitiem legum Romanorum, media enim via semper tutior est, prudentia est medium in omnibus eligere”. Consciência das próprias fontes, do direito comparado, e inteligência da técnica portuguesa, buscando a linha de prudência (e não só média) entre os sistemas jurídicos da Itália, da França e de Castela, A concepção foi a da ação decendiária, que representava o encurtamento próprio do processus executivus (forma abreviada), mantida a executividade prévia, não-suspensão pela apelação e permissão da via ordinária, noutro processo. Havendo “embargos do executado”, a causa transformava-se em ordindria, isto é, em causa para satisfação da pretensão à condenação. E PASCOAL JosÉ DE MELO FREIRE (Institutiones, IV, 75) notou-o: “non agitur executive, sed summarie”. Na execução dos instrumentos, as Ordenações Filipinas, no Livro 1, Título 78, § 12, exigiam prévio julgamento “por sentença de alguns julgadores”, algo de juízo in iure, que SILVESTRE GOMES DE MORAIS nos informa ter sido per modum voluntariae iurisdictionis. Isso mostra que se ligava a eficácia executiva das “escrituras de consentimento das partes” ao caráter judicial que tiveram os depois chamados notários ou tabeliães. Tal julgamento, que se tornou, mais tarde, a cooperação notarial na preconstituição do instrumento, era usado por maior firmeza”. Os juristas de séculos anteriores viam em tal sentença algo de sentença prejudicial, de “condenação de preceito como confitentes”, ex Ord., Livro III, Título 66, § 9 (MANUEL DE ALMEIDA E SousA, Processo Executivo, 112 s.); finalmente, como sentença declarativa prévia. MANUEL DE ALMEIDA E SousA estava tão convencido disso que achou errada a rubrica do estudo de SILVESTRE GOMES DE MORAIS, que foi “De scriptura contractus sententia iudicis confirmati”, e entendia que a verdadeira rubrica seria “De sententia ludicis partium contractum et eius officium improrantium confirmanti”. A citação era de exigir-se, não bastando a relação jurídica processual em linha reta (sem angularidade), sob pena de nulidade (não de inexistência). Sobre a natureza da “confirmação” de que falavam as Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 78, § 12, sabemos, pelos juristas portugueses (o espaço dos Comentários não nos dá margem a transcrições, que seriam preciosas), que não tinha a eficácia das sentenças de condenação: não sanava nulidades (cp. DIOGO GUERREIRO, na questão 41 das Decisiones ct Quaestiones Forenses); embargada, suspendia-se-lhe a eficácia, o que se pode ver em MANUEL DE ALMEIDA E SousA (Processo Executivo, 113), e a confirmação por alvará não a equiparava à sentença no contencioso (Alvará de 13 de março de 1772). Era a confirmação in communi forma, sem plena discussão. V. (1) De regra, têm efeito executivo as sentenças de condenação. Não, quase sempre, as declarativas, as constitutivas e as mandamentais, essas porque, nelas, a realização é judicial e têm força própria. Se efeito executivo há, deve-se a outro elemento (executivo, ou provindo, mediatamente, de elemento de condenação). (2) Têm força executiva, plena, ou não, certos documentos e certas situações jurídicas. Por aí já se vê que, não sendo o efeito executivo necessário à ação e sentença de condenação, a executividade é pretensão à parte, que se há de levar em conta em classificação, assim das ações como das sentenças. Já a teimosia em se querer que as ações e sentenças de condenação e as de declaração fossem uma e única espécie se desmoralizara diante da essencial diferença entre declaratividade, que atende ao que é tal como juridicamente é, e a condenatoriedade, que atende ao fato, e às suas conseqüências , pelo qual se condena, em vez de se ater a simples sulgamento de existência, positivo ou negativo (inclusive de existência de autenticidade). O juiz da condenação não se restringe a isso: o caso, concreto como os outros, já lhe exige mais do que considerar a norma como caixilho em que as relações da vida se moldam para ser, no mundo jurídico, isto é, no mundo das regulações jurídicas; e a norma, que ele examina, é invocada como regra para dirimir questões, que uma parte provocou, por infringência. Se o réu, na ação declaratória negativa, é de crer-se haja afirmado existência, o réu, na ação de condenação, é de se supor ter agido contra regra jurídica. Vê-se bem que já se passou do plano do pensamento para o plano de ação. O que é interessante é que o juiz, na sentença,

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continua nesse plano, introduzido o elemento volitivo, que falta à sentença declarativa. Nas ações executivas, assim nas de títulos extrajudiciais como nas executivas de sentença, supõe-se que o réu não tenha executado (não tenha havido omissão) e o Estado execute. O plus da ação condenatória, em relação à declarativa, é inegável, e têm razão KONRAD HELLWIG (System, 1, 39) e todos os que vieram nas suas pegadas, até entre nós (ALFREDO ARAúJO LoPES DA COSTA, Dieito Processual Civil Brasileiro, 1, 79; sem razão, ENRíco TULIO LIEBMAN, Execução e Ação executiva, R. F., 94, 215). Não se trata de caso qualificado de sentença declarativa (espécie da prestação), nem de declaração de ato ilícito. O plus da ação executiva, em relação à de condenação, ressalta quando se compara a ação (ou a sentença) na ação em que pleiteio, por via ordinária, o pagamento da nota promissória, e a ação em que, fundado no art. 585, 1, intento a execução da mesma nota promissória. Nessa, a pretensão a executar passa à frente da outra. Tem-se afirmado que a relação jurídica processual de execução é unilineal (unilateral), isto é, somente entre exequente e Estado (juiz). São levados a isso alguns juristas pelo fato de serem ação os embargos do executado, ditos embargos do devedor. Ora, ação contra ação, como os embargos do executado, tem de ser outra linha, com que também se estabelece a angularidade. A relação jurídica processual tanto se angulariza com a execução dos títulos extrajudiciais como com a dos títulos judiciais. A defesa em ação também supõe que a relação se angularizou. Mas a citação bastou, e ocorreu antes. A citação é que é o elemento indispensável à angularidade. Se ela ocorre, quer se admita a defesa em contestação, ou em impugnação, ou em ação, o ângulo perfez-Se com a citação. Temos, portanto, de repelir a construção da relação jurídica processual da execução unilineal. há a citação. Depois é que pode advir outra ação: a de embargos do devedor. Demais, a lei distingue o procedimento executivo, que prossegue, a despeito dos embargos do devedor, se esses, na espécie, não são suspensivos, e o procedimento dos embargos do devedor. O citado, que sofreu a execução, apesar dos seus embargos serem suspensivos, figura na relação jurídica processual, como sujeito passivo. Dá-se o mesmo se o executado não opóe embargos do devedor, ou se esses não foram admitidos, ou julgados improcedentes. Cumpre não se confundir a relação jurídica processual da execução com a relação jurídica processual dos embargos do devedor, em que o embargante, o devedor, é o autor, e réu é o exeqúente, dito embargado. Também aí há a angularidade (embargante devedor, Estado; Estado, embargado exeqúente). O que angulariza a relação jurídica proce5sual~ em todas as ações, é a citação, que tem o efeito de inserir no processo o citado; não a contestação, a impugnação, ou a ação de embargos do devedor, que são atos praticados após angularização. 5)AçÂO EXECUTIvA DE ÇoGNIção INCOMPLETA E ExEcUçÃo DE SENTENÇA. Operou-se quanto à ação executiva de títulos extrajudiciais maior diferenciação em relação à execuçãO das sentenças, diferenciação que só se realiza no plano das preferências e distinções intencionais do legislador, porque execução de sentença e ação executiva nunca perdem seus parentescos históriCos e empíricos. Por mais que os legisladores levem às leis os seuS pendores~ não conseguem fazer quadrado o redondo, nem redondo O quadrado. A execução é ação, junta ou não à ação em que se profere a sentença exeqüenda não se lhe apaga o caráter que os juristas portugueses lhe reconheciam e a ciência moderna confirma. No século XVI, FRANCISCO DE CALDAS, no século XVII, MA.NUEL ALVARES piGAS, no começo do século XVIII, SILVESTRE GOMES DE MORAIS, depois MANUEL GONÇALVES DA SILVA, e no século XIX, MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA, todos acentuavam a actio iudicati, que está na execução. As ordenaçOe5 Filipinas, Livro III, Titulo 25, § 8, eram significativas: “E queremos que isto, que dito é das dívidas, que se demandam por escrituras públicas~ haja lugar em qualquer dívida, que se dever e demandar por virtude de alguma sentença, que passar em coisa julgada, quando se demarcatórias por via de ação que nasça dessa 5entença.” A despeito de não distinguirem, então, a pretensão à tutela jurídica e o remédio jurídico processual, a ação processual e a forma do proCe55o~ tal como a ciência de hoje procedes os juristas reinícolas viram bem que a forma não mudava o cerne comum às ações executivas e às execuções. Gente que meditava e correspondia ao esplendor da situação econômica e moral de portugal, ou dos princípios da sua decadência. O título executivo foi definido, na espécie, com precisão. A eficácia executiva de certos documentos e a eficácia executiva das sentenças só se distinguem em gradação. O trato delas é semelhante. o Estado proibe tanto a aluda própria defensiva quanto a ofensiva; e somente em casos expressos abre exceções. Nem O legitimado por sentença, nem o legitimado por documento, que tenha eficácia executiva, pode, por si mesmo, executar, isto é, fazer-Se pagar (no sentido lato). Os seus pedidos diretos, amáveis ou intimidantes, não chegam a ser executivos. Tem de recorrer ao Estado. Em lugar da ajuda própria ofensiva (offensive Selbsthilfe), o Estado confere ao credor do documento ou da sentença pretensão à tutela jurídica que ponha a seu serviço a atuação coativa do Estado. É ai que surge a pretensão executiva.

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Toda pretensão à tutela jurídica é contra o Estado, e não contra a outra parte; e o mesmo ocorre a “todo processo executivo”. A todo “processo executivo” (seja um só, como a velha assinação de dez dias, sejam dois, por teimosia do legislador ou razões que tem fundamentos práticos) corresponde, por trás, a pretensão à tutela jurídica de caráter executivo comum à executividade dos documentos e à das sentenças. Dai haver a pretensão à execução (Vollstreckungsanspruch) e os processos executivos (Exekutionsverfahren). A pretensão à execução é de direito público, como o é a forma dos processos executivos. Naturalmente, não se pode confundir com a pretensão executiva a pretensão de direito material que está, diferente em cada espécie, nos arts. 583-586 do Código. Quer no processo executivo dos documentos, quer no processo executivo das sentenças, três pessoas ocorrem, como se passa em todos os processos que correspondem a exercício das pretensões à tutela jurídica, formando a relação jurídica processual em ângulo (autor, Estado; Estado, réu). O juiz, como órgão do Estado, é que é o sujeito passivo da pretensão à execução (RUDOLF POLLAX, Syst em, 40). A relação jurídica processual em ângulo é apenas consequência da pretensão de execução, por ser contra princípio de política jurídica vigente (às vezes, em graus baixos de evolução política não existe) executar sem a participação do réu. Por isso mesmo, é possível a execução contra o réu desconhecido ou incerto (art. 231, 1), sem qualquer dificuldade de construção teórica. A inexecutabilidade contra o Estado resistiu à evolução liberal do Ocidente, e continua, como se permanecesse incólume às transformações econômicas. A tentativa da Constituição brasileira de 1934, art. 182(nossos Comentários, II, 556-558), foi, em todo caso, meio--termo digno de referência, e ainda se apresentou nos arts. 730 e 731 (Constituição de 1946, art. 204; Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 117 e § § 1.0 e 2.0). Outra imunidade é a das pessoas exterritoriais. Corta-se, por causa específica, na executividade do título. O exercício da pretensão à tutela jurídica, quando consiste em execução, é o processo executivo, que toma duas formas símiles no Código: a dos arts. 584, 585 e 586, 587-590,603-611. Seria erro pensar-se que as duas formas exaurem as ações executivas. Há ação executiva sempre que se obtém a prestação sem ou antes de haver constituição ou mandamento. Com a simples declaração, ou constituição, não se obtém a prestação. Assim, se se consegue a prestação, sem ser por sentença de mandamento ou de constituição, a ação é executiva, lato sensu. Teremos ensejo de apontar ações de tal espécie, fora das ações executivas de sentença e das ações executivas de títulos extrajudiciais. 6) PRETENSÃO À TUTELA JURIDICA EXECUTIVA. A pretensão à tutela jurídica executiva é uma só, quer para as chamadas ações executivas, sensu lato, quer para as execuções de sentença. A distinção entre as formas do procedimento depende da lei, que tem certa liberdade de variação, desde que não se afaste do dado (eficácia executiva com prestação jurisdicional incompleta adiantada). Muito obscurece o problema de se saber se execução de sentença é ação o fato de confundirem os partidários de um e de outro lado a pretensão a executar e o exercício dela, que é o procedimento executivo. 7)CRITÉRIOS DE OBRIGATORIEDADE E DE FACULTATIVIDADE DO PROCEDIMENTO ExECUTIvO. De lege ferenda, pode conceber-se o procedimento executivo (a) como obrigatório para todos os casos de ações executivas de títulos extrajudiciais, ou somente (b) como facultativo para todos os casos, ou (c) como obrigatório para alguns e facultativo para outros. A nossa tradição e a tradição européia, a despeito de alguns inovadores, que o queriam transformar em obrigatório, são no sentido da facultatividade. Posto que o Código não o diga, essa é a sua solução, coincidente, aliás, com a sugestão dos maiores processualistas (e. g., KONRAD HELLWIG, Justizreform, 42). Manteve-se, além disso, a linha histórica da cognição inicial pelo juiz (e não pelo escrivão, ou até pelo advogado), modernismo jurídico doentio, capitalístico, que se propôs desde 1908, entre alguns juristas. 8) FUNDAMENTO DA EXECUÇÃO COM INCOMPLETA COGNIçÃo. (1) O fundamento contemporâneo do poder executivo nas ações executivas de títulos extrajudiciais é o de existirem causas, em que o quod plerum que accidit é não ocorrerem exceções do réu, incidentes, ou discussões bem sucedidas contra a prova. Há, pois, à base da concepção de certas ações de condenação como executiva, antepondo-se à resolução judicial de execução, que normalmente viria depois, como efeito da sentença de condenação, atendimento a certa distinção prática entre as ações em que há grave probabilidade de discussão da prova ou de afirmações contrárias e as ações em que é pouco provável que isso se dê. A existência do procedimento executivo de títulos extrajudiciais é, pois, de ordem técnica legislativa. Quem diz técnica, diz artifício construído, em vez de dado. Todos os procedimentos executivos de ações de títulos extrajudiciais poderiam não existir. Quer dizer: todas as ações de tal espécie seriam suscetíveis de se tratarem com o rito do procedimento de cognição. Não há dúvida quanto a isso. Daí a preferência do legislador bem compreensível pela facultatividade do processo executivo das ações de títulos extrajudiciais. Mas processo e ação não se confundem. Ainda que as ações de títulos extrajudiciais sejam processadas como

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condenatórias, nem por isso deixam de ter sentença com eficácia executiva. E a razão é simples: tratando-se de tais ações executivas de títulos extrajudiciais, houve inversão dos “processos” das ações, tendo a de execução passado ao primeiro lugar. Atende-se à pretensão de executar; depois, à de obter condenação. Contra o que seria, aos olhos de muitos, o normal. O fato de se eliminar essa posposição não cancela as duas pretensões, a de executar e a de condenar. O procedimento deixa de ser executivo, porque não se compreenderia que fosse executivo o processo sem se exercer, já então, a pretensão a executar. (2)Discute-se se os processos executivos de títulos extrajudiciais são (a) abreviações do processo de cognição, ou (b) se são adiantamentos de execução, ou (c) se são processos de cognição preposta. No primeiro caso, a execução seria concedida e esperada a preclusão no prazo para a “contestação”, que não seria ação de oposição, pois se aboliria a assimilação da defesa aos embargos do devedor, nem simples inversão das ações. No segundo, tudo que ocorre seria apenas inversão das duas ações, a de condenação e a de execução, que pulou para a frente da outra. No terceiro que poderia ter sido a concepção do direito anterior a 1939 a defesa do executado seria ação de oposição, “embargos”. A segunda solução foi a que o Código de 1973 adotou, repelindo a solução legislativa de 1939. É inegável que há a inversão das ações, antepondo-se a de execução à de condenação. Não são aceitáveis, no sistema do Código, as concepções a) e c): primeiro, porque há os embargos, e não mais se fala de contestação; segundo, porque a cognição é incompleta, não “anteposta” (o que se antepõe é parte dela, não ela). Hoje, há a concepção (b), porque a abreviação é somente para efeito da inversão (exercício da pretensão a executar, antes do exercício da pretensão a obter condenação) abreviar e antepor parte são conceitos diferentes. Por isso mesmo, não se pode dizer que, apresentados os embargos, o executado recuse a forma do procedimento. Essa afirmativa de A. SKEDL (Das Mah.nverfahren, 129) não se enquadraria no direito brasileiro nem em qualquer sistema jurídico de penhora que se faça antes do prazo e permaneça após os embargos: o art. 737, 1, não exclui o procedimento executivo; esse chegou ao seu primeiro termo, de qualquer maneira. Apenas há a exigência de se segurar o juízo. Nem seria de se admitirem os embargos como declaração de vontade ou comunicação de vontade pelos quais o executado passa do processo executivo para o contraditório. O processo dos embargos do devedor não é mais, aí, do que o processo normal para o exercício da ação de cognição (de condenação, para ser mais restrito). Toda construção do art. 745 como de “contestação”, pela qual a ação “executiva” se resolve em simples citação (resoivitur in vim sim piicis citationis), destoa dos fatos: ~a penhora lá está! De iure condendo, poder-se-ia chegar a melhor organização do procedimento executivo devido às diferenças entre as ações de títulos extra-judiciais. Mas, de iure condito, o Código não se presta a outras concepções, inclusive a dos embargos do devedor como pedido de mandamento negativo. A atitude do executado é, então, a de réu de ação de execução e de autor da ação dos embargos do devedor e só secundariamente de “executado”. A sentença nos embargos é integrativa da executiva e condenatória; o levantamento da penhora, efeito mandamental. Esse ponto é assaz importante na interpretação do Código. 9) AçõEs EXECUTIVAS E AçõEs DE CONDENAÇÃO; CUMULAÇõES. A noção de executiviclade não se restringe àqueles casos em que se pede a expropriação de alguns bens, mais precisamente em que se pede a expropriação do poder de dispor, e posterior entrega do equivalente ao autor exeqúente. Também abrange aqueles casos em que se entrega o bem específico, ou a prestação específica (e. g., a parte do bem antes indiviso). Por isso mesmo, a ação de execução de sentença que a entregar a coisa certa supõe ação de condena ção não cumulada com a de execução. A cumulação verifica-se nas ações possessórias (art. 920-940) e na imissão de posse por exemplo, cuja sentença ~á expede o mandado de execução. Sempre que esse elemento executivo prepondera, tal como se dá com as ações executivas de títulos extra-judiciais, a ação é executiva (e mandamental) e prescinde de actio iudicati. 10)AçÃo EXECUTIVA PESSOAL E AÇÃO EXECUTIVA REAL. As ações executivas ou são reais ou pessoais. Nas ações executivas reais, a posição do demandado é a de pessoa imediatamente interessada, passivamente, na execução: de algum modo a tem de tolerar. Nas ações executivas pessoais, a posição do demandado é a de quem sofre a execução, por sair do seu patrimônio o bem com que se satisfaz a pretensão oriunda do titulo executivo, extrajudicial ou judicial. Falsa noção do que caracterizava o direito real e o direito pessoal no direito romano tem quem quer que não atenda à evolução daquele sistema jurídico. No fundo, o que os distinguiu, através dos tempos e sem descontinuidade, foi a pretensão ou a ação que se irradiava de cada um: a actio in personam, que se dirige contra determinada pessoa, para lhe exigir atividade; a actio in rem, contra quem quer que seja óbice ao exercício do direito. Percebe-se isso no nascedouro mesmo, quando se examinam as fórmulas das legis actiones: para a ação do proprietário, “hunc ego hominem ex iure Quiritium meum esse aio”; para a ação pessoal, “aio te sestertium decem milia dare oportere”. No processo formular, respectívamente: “si paret

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hominem quo de agitur Auli Agerii esse”; “si paret Numerium Negidium Aulo Agerixo sestertium decem mula dare oportere”. A actio quasi Serviana era actio in rem. Na interpolação à L. 66, pr., D., de evictionibus et duplae stipulatione, 21, 2, diz-se: “haec enim etsi in rem actio est, nudam tamen possessionem avocat et soluta pecunia venditori dissolvitur”. Na interpolação à L. 16, § 3, D., de pignoribus et hypothecis et qualiter ea contrahantur et de pactis eorum, 20, 1, atribui-se a AELIUS MARCIANUS o “quid proderat in rem actio”; e na L. 3, § 3, D., ad exhibendum, 10, 4, de ULPIANO, interpolou-se a classificação como ação real: “Est autem personalis haec actio” a ação de exibição “et ei competit qui in rem acturus est qualicumque in rem actione, etiam pigneraticia Serviana sive hypothecaria, quae creditoribus competunt”. A actio pigneracticia Serviana e a actio hypothecaria sempre foram ações reais. Os juristas do tempo de Justiniano haviam meditado mais sobre a natureza das ações e não perderam o ensejo de classificá-las. O devedor deve ser citado, na ação executiva hipotecária, se foi cumulada a executiva pessoal, porque, nessa, só ele é parte. Quando o credor, cujo crédito foi garantido, somente exerce a ação condenatória ou a ação executiva própria do crédito garantido, a ação só se dirige contra o devedor, e não contra o proprietário. Se são a mesma pessoa, há apenas coincidência ocasional de legitimações passivas. Ação de execução ou é do título extrajudicial ou é ação de execução da sentença proferida de regra na ação condenatória. As exceções oponíveis são as que derivam da relação jurídica entre credor e devedor. Ao cessionário do crédito podem ser apresentadas exceções que não cabem contra o titular da hipoteca, como as que a fé pública do registro afasta. 11)AÇÃO EXECUTIVA DOS CREDORES QUIROGRAFÁRIOS. O credor quirografário pode executar os bens do devedor, ou do doador da hipoteca, ou do adquirente da hipoteca, incluído o bem hipotecado, se há insolvência; se não há insolvência, o credor quirografário, posterior, não pode executar o bem hipotecado: tem de ir, antes, contra os outros bens, pelo princípio da par condicio, a que se submetem os créditos pessoais. Não se vai com a penhora sobre o bem dado em garantia se o devedor tem outros bens com que possa satisfazer os créditos: O exeqúente tem o ônus da prova da insolvência, para se declarar o efeito que lhe atribui o direito material (ter-se por vencida a dívida). Se o devedor nomeia à penhora o bem gravado, caracteriza-se a situação que dá ao credor a ação de cobrança, porém não ainda a de se ter por vencida a divida: de modo que pode ser cobrado, desde logo, o crédito garantido. Tem-se, contudo, de considerar, atentamente, a espécie. 12)NOMEAÇÃO DE BENS À PENHORA. A nomeação de bens pelo executado, nas ações executivas pessoais ou reais, que não sejam a ação executiva real da hipoteca vencida sem hipoteca anterior, tem de ser de bens livres e desembaraçados, se os há. Feita a nomeação, o exequente pode exigir em prazo razoável (não renovável), os títulos de propriedade e certidões negativas de hipoteca, usufruto, uso, habitação e anticrese e de ônus, se os disse livres e desembaraçados. A nomeação é impugnável; se não o foi, ou se foi repelida a impugnação, reduz-se a termo a nomeação, assinando o executado, e têm-se os bens, desde a assinatura, por penhorados (art. 657, 1.a parte). Se o executado não faz a nomeação, ou a faz contra o que se estatui na lei, ao exequente é que cabe fazê-la (art. 657, 2.R parte). O que se disse sobre a hipoteca entende-se também quanto ao penhor em que o dono tem a posse imediata. Se a nomeação não foi impugnada, a despeito da infração da regra jurídica do art. 656, IV, e se reduz a termo, está penhorado bem gravado de hipoteca, sem se terem penhorado os que deveriam ter sido. O crédito garantido vence-se por força do direito material, e têm de ser intimados os credores hipotecários (art. 698). Esses credores hipotecários têm interesse em que primeiro se executem os bens livres e desembaraçados. Ao tempo da nomeação podem, por embargos de terceiro, impugná-la; após ser reduzida a termo, continua o cabimento dos embargos de terceiro, por parte do titular do direito de hipoteca sobre o bem penhorado (arts. 1.046-1.054). 13)ExEcuçÃo E INSOLVÊNCIA. Alguns julgados afirmam, em tom peremptório, que não se pode executar o bem gravado se ainda não há insolvência (1.R Turma do Supremo Tribunal Federal, 26 de dezembro de 1938, R. de J. B., 44, 290; Supremo Tribunal Federal, 8 de maio de 1939, R. F., 81, 144; 5•~ Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 5 de novembro de 1931, A. J., 120, 524); mas é preciso atender-se a que: a) a nomeação, com infração do art. 656, IV, é apenas impugnável e, não impugnada, reduz-se a termo (art. 657); b) somente após a nomeação, ou, a fortiori, após a penhora, segundo o art. 657, cabem embargos de terceiro (art. 1.046); c) não se pode apurar se houve insolvência, ou se não houve, sem que alguém venha contra a penhora; d) pode não haver outros bens, sem haver insolvência. A execução, sem os embargos de terceiro, prossegue, até

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que se intimem da arrematação os credores hipotecários (art. 698). Nos embargos de terceiro, que ao titular do direito de hipoteca se oponham, podem o exequente e o executado alegar, além das defesas comuns contra a alegação de direito de hipoteca, que não há outros bens, ou que há estado de insolvência do devedor, ou, se é o caso, do dador da hipoteca ou do adquirente do bem gravado, e o já estar vencida a hipoteca (2.a Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 21 de junho de 1927, R. de D. 86, 599; Câmaras Cíveis do Tribunal da Relação de Minas Gerais, 8 de junho de 1932, 1?. F., 59, 116; 3•~ Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, 15 de março de 1935, e 5~a Câmara Civil, 14 de agosto de 1935, R. dos T., 98, 118, e 103, 115, onde aliás, em vez de se citarem as regras jurídicas do direito brasileiro anterior, a que o art. 656, IV, do Código de 1973 (antes, art. 923, IV, do Código de 1939) corresponde, impertinentemente se disse que do art. 813 do Código Civil de 1916 se podia tirar, por analogia, o princípio de ser preciso haver insolvência ou estar vencida a hipoteca, para ser penhorado, por credor quirografário, o bem gravado; também certas na conclusão, e erradas no fundamento, a 4.~ Câmara Civil, a 26 de setembro de 1945, R. dos T., 159, 653, e as Câmaras Cíveis do Tribunal de Relação de Minas Gerais, a 18 de abril de 1931, A. J., 19, 56, e R. F., 56, 518). Pode dar-se que o titular do direito de hipoteca não embargue de terceiro. Não pode ser decretada a nulidade da penhora, por infração do art. 656, IV, porque a espécie a despeito das palavras “não valerá” empregadas sem respeito à terminologia e à técnica, no art. 923, pr. do Código de 1939, não era nem é de nulidade. O Código de 1973, art. 656, pr., corrigiu o erro: tem-se por “ineficaz”. Por ocasião da arrematação, ou ato que se lhe equipare, tem de ser intimado o titular do direito de hipoteca, se por alguma outra razão já não era parte (cf. art. 698). Ainda que não esteja vencida a hipoteca, podem os credores quirografários penhorar o bem gravado, se há insolvência , ou se não há outros bens. Pode somente haver um bem, e bastar para o pagamento de todos os credores. Então, não há insolvência, e o art. 656, IV, foi atendido. Pode haver muitos bens livres e desembaraçados, e haver insolvência, o que faz vencer-se a dívida garantida pela hipoteca e executável a hipoteca. Alguns juizes e juristas sustentam que, ainda insolvente o devedor, não podem os credores quirografários executar 05 bens hipotecados, antes de vencida a hipoteca (e. g., 2º Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 25 de novembro de 1930, R. dos T., 76, 113). Não está nas leis brasileiras. Para que o credor quirografário possa penhorar o bem gravado de hipoteca, basta que haja insolvência (caso em que a própria hipoteca se vence, antecipadamente), ou o bem seja o único, ou tenha de ser penhorado, por falta de outro ou outros que bastem (art. 656, IV), caso em que o crédito garantido pode ser cobrado. A leviandade com que, logo após a saida do Código Civil de 1916 e ainda alguns anos passados, se afirmou não existir no direito brasileiro o instituto da insolvência civil, foi, afinal, evidenciada. O art. 1.554 do Código Civil de 1916 fora explícito: “Procede-se ao concurso de credores, toda vez que as dívidas excedem à importância dos bens do devedor”. Os arts. 954, 1, e 762, II, do Código de 1916 foram expressivos. Porém não só a insolvência permite a penhora do bem gravado, pelos credores quirografários: basta que não haja outros bens em que se proceda à execução (Código de Processo Civil art. 656, IV). Seria absurdo que todo o valor do bem ficasse subordinado ao vencimento da hipoteca que pode ser sobre o mesmo bem, porém por fração do valor. Foi para se ajustar o direito material ao formal e vice-versa que se redigiram o art. 954, II, do Código Civil de 1916, e o art. 923, IV, do Código de Processo Civil, de 1939, hoje Código de 1973, art. 656, IV, que nada tem com a insolvência. A ~ Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, a 7 de junho de 1936 (R. dos T., 104, 454), insinuou que somente após se verificar a insuficiência do bem ou dos bens hipotecados é que pode o titular do direito de hipoteca “executar o devedor pelas formas das execuções em geral”. O ser titular da hipoteca não tira ao credor a sua ação como credor (ação condenatória, com sentença que se possa executar, ou ação executiva pelo título executivo extrajudicial, se é o caso). Se tem a ação executiva pelo crédito garantido pela hipoteca e a ação executiva hipotecária, que é real, pode propor aquela, e não essa, ou essa, e não aquela, ou ambas, cumulativamente. Se houve cumulação, primeiro se ultima a execução do bem hipotecado ou dos bens hipotecados, porém nada impede que sendo insuficiente o bem gravado ou sendo insuficientes os bens gravados desde logo se penhorem outros, além do que é objeto da hipoteca. 14)ADIANTAMENTO DE ExEcuçÃo (TÉCNICA LEGISLATIVA). (1) É ineliminável, nas ações executivas, quer de títulos, quer de sentenças, o elemento declarativo. Não se executa sem se declarar. Tampouco, seria possível eliminar-se o elemento condenatório. Não se executa, sem se condenar, ou sem já se haver, antes, condenado. Por isso, na ação executiva de sentença mais se manda e se declara do que se condena. A condenação ficou atrás, provavelmente em sentença, já trânsita em julgado. Aí está a diferença entre o título executivo sentencial e os outros títulos

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executivos. Não se diga que o título executivo extrajudicial contém declaratividade, o que o faz executivo. A confusão seria lamentável, e os juristas que o aventaram não se dão conta de que a distinção entre títulos extrajudiciais executivos e não executivos está na atribuição de executividade àqueles, em virtude de regra jurídica especial, e de não-atribuição, portanto, a esses. Se algo se declara, é isso. Eles, em si, não são executivos porque declarem; os outros também declaram. O fato de se poder empregar a via executiva, em se tratando de títulos extrajudiciais, antes de se obter sentença de condenação, que se pudesse executar, deriva de se ter permitido a cumulação. De modo nenhum se pode dizer que a causa esteja em se conter declaração no título extrajudicial executivo. Mesmo porque a própria sentença declarativa não produz a ação executiva. Se algum efeito, como plus, se lhe confere, esse efeito é de ordem condenatória, efeito, evidentemente, por adiantamento, uma vez que se pode elidir, o que não acontece às sentenças eficazes. Quando se diz que o título extrajudicial executivo é pressuposto necessário, porém não suficiente, para o exercício da ação, traduz-se em termos de pressupostos o que a afirmação de haver incompleta cognição inicial diz em termos de apreciação pelo juiz. Se a ação é julgada improcedente (mérito), não se pode dizer que não houve ação executiva, nem que foi só aparente: houve-a; a condenatoriedade não se completou, a non plena cognitio não foi destruida, mas tida por incompletável, o que a faz cair. A atribuição de executividade é plus. Quando se compõe o titulo, o direito material não o faz executivo; de modo que as velhas teorias que aludam à certeza expressa no título mesmo têm de ser postas de lado. Então, <a que ramo do direito pertence a regra jurídica que faz executivos os títulos extrajudiciais? Em todo crédito há a eventual executividade, porque a pretensão à tutela jurídica estatal não fez mais do que se substituir à pretensão à tutela jurídica privada. O direito material não criou a executividade das dívidas. Todas podem vir a ser executadas, embora a organização estatal exija a umas a prévia condenação e a outras atribua executividade imediata, ficando dependente de condenação posterior o efeito executivo por adiantamento. Portanto, as pretensões são nascidas no direito material, mas o Estado (o direito público, o direito pré-processual) procede à distinção entre títulos e documentos extra-judiciais não executivos e títulos e documentos extrajudiciais executivos, considerando-se tais os que antes de qualquer condenação dão ingresso à execução. Somente por isso é que alguns juristas (e. g., PAUL LANGHEIxEKEN, Der Urteilsanspruch, 163, e JAMES GOLDSCHMIDT, Uugerechtfertigter Vollstreclcungsbetrieb, 37) aludem a ser a ação executiva de títulos e documentos extrajudiciais imediatamente condicionada à existência do direito material. A existência do direito material é condicionada, imediatamente, qualquer ação, inclusive a declarativa; e aí condicionada imediatamente à existência de direito material não é a ação executiva, mas a ação condenatória que se cumula. Há de advertir-se em que passa à frente o exame da executividade, tanto que pode ter direito o autor para a condenação e o título não bastar à execução. Então, não se condena no processo executivo, devido à ligação entre as duas ações cumuladas, ligação que só permite condenar-se se há legitimação à execução, embora faça dependente da condenação completar-se a cognição. (2) O problema dos títulos executivos extrajudiciais éde grande sutileza e relevância. Simples rótulos não lhe poderão trazer esclarecimentos para distinção entre o mandado executivo em caso de sentença e o mandado executivo em caso de execução de títulos extrajudiciais. Os mandados são iguais. Nem basta chamar-se ao título executivo ordem de execução, ora por ato do juiz, ora da lei. Tampouco basta referir-se a “possibilidade de agir”, como JAMES OOLDSCHMIDT (Ungerechtfertigter Vollstreckungsbetrieb, 37 s.), ou a “facilidade de execução” (JAKoE WEIsMANN, Lehrbuch, II, 7 s.). O legislador, para fazer executivos alguns títulos e documentos extrajudiciais e outros não, atende, certamente, a sugestões oriundas da natureza do negócio jurídico, ou da fonte da obrigação, e a exigências da vida prática, porém, ai, o direito material apenas dá os dados com que, de lege ferenda, trabalha o legislador. É ir demasiado longe tirar-se desse atendimento, que pode não ocorrer, a conclusão de que se evita, com ele, discrepância entre a consistência eficacial do ato em direito privado (ou, em geral, material, concernente à res deducta no juízo condenatório) e em direito público (e. g., JULIUS BINDER, Pro~ess und Recht, 247). O ato jurídico é fundo e forma. ~A que teria de prestar atenção, ou de prestar maior atenção, o legislador? Compreende-se que alguns juristas, como JULIUS Bn.mER, considerem que uns títulos legitimem formalmente,e outros, materialmente. Em tudo isso, está-se a descer à. elaboração das leis, o que aqui não tem razão de ser. O título extrajudicial, quando se apresenta para ação executiva, exerce duas funções distintas: uma, que é a de ingresso à execução, e outra, que é a de documento do crédito, ou de título incorporante do crédito. Essa função é assaz relevante e indispensável no tocante à condenação, que sobrevém, e aquela, para o início da execução e para o complemento da cognição não-plena, efeito logicamente contemporâneo à condenação. Todas as teorias, e são muitas, que não atendem à duplicidade das funções de cada titulo extrajudicial executivo conturbam o material de investigação. A função para o exercicio da ação executiva pode existir sem que exista a função para exercício da ação de condenação, como se o título, embora apto à executividade da ação, já foi

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pago, ou se o exequente dera ressalva. Para se empregar imagem (mas apenas com papel de imagem), pode-se dizer que a força executiva é efeito da pele do titulo extrajudicial, ao passo que a eficácia, quanto ao objeto da demanda (res in iudicium deducta), é carne. A pretensão executiva persiste, ainda que haja acabado a pretensão condenatória, posto que, para o julgamento, uma vez que não houve condenação prévia, de que resultasse a actio iudicati, se tenha no plano do direito processual de submeter a execução à eventual condenação do executado, no processo das ações cumuladas (executiva e condenatória). Nas ações de execução de títulos extrajudiciais, a ordem é: executividade (mandado executivo ou de penhora), condenação, execução; ou executividade, não-condenação, não-execução. Nas ações de execução de sentenças, outra é a ordem: (condenação em ação anterior), executividade, execução ou julgamento da extinção da dívida. A legitimação de quem pode apresentar o título extrajudicial, posto que já solvida a dívida, ou por ser, por alguma outra causa, incobrável, não é aparente (sem razão, GIU5EPPE CHIOVENnA, Istizioni, 1, 280; F’IiANcEsco CARNELUTTI, Lezioni, Processo di esecuzione, 1, 128; SALVATORE SATTA, L’Esecuzione forzata, 1~a ed., 56). Cumpre ainda observar-se que a discussão em torno do assunto, no sentido de se apurar se há prova legal no que concerne ao título extrajudicial executivo, ou se não há, é de todo impertinente. A prova é do fato da apresentação do título suficiente ao ingresso da execução e do fato da dívida; nada tem com a natureza da pretensão à execução. Diga-se o mesmo quanto a identificar-se a legitimação à execução ao desenvolvimento de prova legal, explicação em que se refugiou FRANcESCO CARNELUTTI (Teoria General del Diritto, 3.~ ed., 392), batido por ENiuco TULLIo LIEBMAN (Le Opposizioni di merito nel processo d’esecuzione, 135-138; Titolo esecutivo riguardo ai terzi, Rivista di Diritto Processuale Civile, 11, 1,128 s.). Quando, a propósito do problema da natureza da ação executiva de títulos extrajudiciais, se traz ao tablado a conceituação de prova, prova legal, prova suficiente e outros elementos de apreciação da formação dos atos jurídicos e da veracidade do enunciado de existência sobre fatos jurídicos, a deslocação das questões torna infrutífera toda investigação, até que se elimine a intrometida e confundida argumentação. O título extrajudicial não contém declaração, mais um erro de FRANCESCO CARNELUTTI, nem sanção, como quis ENRICO TULLIo LIEEMAN Q~como poderia haver sanção antes da infração?). O que se há de explicar é aquela “potencial executividade”, a que se referia KMiL AUGU5T BETTERMANN (Die Vollstreclcung des Zivilurteils, 38 5.), como eficácia executiva com a introdução da ação, por adiantamento. Para a “concessão” desse adiantamento, o legislador pesou argumentos, pró e contra, e nem sempre foi acertado no incluir ou preexcluir alguns títulos extrajudiciais. Esse legislador estava a redigir lei pré-processual, porque a determinação do momento em que se há de satisfazer a pretensão executiva dos credores é matéria de legislação pré-processual. O direito material diz se o credor pode executar forçadamente, porém não diz quando o Estado o fará. A regra jurídica do art. 730, que atende a não se poder executar o Estado como se executam as outras pessoas, admite a ordem de pagamentos pela ordem de requisições, é regra jurídica de direito pré-processual, porque é pré-processual a de inexecutabilidade dos bens do Estado. Mas a regra jurídica de inexecutabilidade das dívidas de jogo (Código Civil, arts. 1.477 e 1.480) é de direito material. Aí, o que falta falta ao direito material. Todas as dívidas são suscetíveis de declaração, condenação e execução, salvo corte pelo direito material, mutilando o crédito, por lhe retirar pretensão e ação, ou só ação. A de clarabilidade e a. condenabilidade não estão em causa quando se tem de saber se o título extrajudicial é executivo desde já. A determinação do momento agora, após apresentação e prazo, ou registro, ou só após sentença condenatória toca ao direito pré-processual. Também se pensou explicar a executividade dos títulos judiciais e dos títulos extrajudiciais como oriunda, respectivamente, de documento de fato jurídico da emissão de provimento e de conclusão de negócio jurídico. Documento de efeito exterior. Ora, o efeito executivo das sentenças de carga mediata (3) de executividade nada tem de externo, que se documente. Nem é externo o efeito executivo dos títulos extra-judiciais. Não se atende à sentença, para execução, como fato; mas sim como sentença que tem carga imediata ou carga mediata de executividade. Nem se atende ao título extrajudicial executivo, para execução, como fato, mas sim como título a que se conferiu precipitar, digamos assim, a execução. Daí ser inadmissível a construção que propôs EDoAnno GARBAGNATI (Ii Concorso di creditori nell’espropria~ione, 125-127). (As ações executivas que não supõem ter havido sentença, nem haver título executivo extrajudicial,essas ações são exercidas por terem 5 de executividade. Nem têm por pressuposto sentença anterior, com 3 de executividade, nem o adiantamento de execução, como ocorre nas ações executivas de títulos extrajudiciais. Pode dar-se, até, que tenha 4 de executividade, o que permite execução na própria ação que não tinha força executiva. Cf. Tratado &zs Ações, Tomo VII, Tabelas.) 15)TÍTULO ExTRAJUDICIAL E EXECUÇÃO ADIANTADA. O que se aprecia quando se apresenta, no

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juízo de execução, o título extrajudicial executivo é o titulo em si, como elemento, que legitima o ingresso à execução. O despacho da petição é, como todo despacho de petição que haja de ser acompanhada de documento, decisão sobre existência de títulos, existência necessária e suficiente a que se estabeleça a cognitia non plena. Tudo que se afirma é essa suficiência, que nada tem, ainda, de definitivo sobre a procedência da ação executiva. O que o juiz enuncia é que a pretensão à tutela jurídica executiva podia ser exercida, como foi. Nada julgou do mérito, da tres in indicium deducta, que aí é a execução mesma. Está-se no plano pré-processual; e nele se fica, se o executado alegar que o título extrajudicial (ou judicial) não é executivo. Se o juiz completa a cognitio, é porque foi ao plano do direito material para condenar e executar. Daí ser de repelir-se qualquer declaratividade do despacho inicial no que se refere ao direito material: ainda se está no plano pré-processual (sem razão, VITToRIo DENTI, L’Esecuzione forzata in forma specifica, III, 104). Mas, igualmente, a redução do pedido de execução, à vista do título, a ato real (ato-fato jurídico): a apresentação, sim, o é; não o pedido de execução imediata (= com adiantamento), firmado no titulo (até essa redução pretendeu chegar CRIsANTO MANDRIOLI, L’Aziofle esecutiva, 356 s.), o que seria desatender a que o titulo extra-judicial legitima para execução com adiantamento: não é a apresentação que estabelece a relação jurídica processual, mas sim o pedido de execução, que é ineliminável (Sobre as apresentações, Tratado de Direito Privado, II, §§ 235, 9, 236, 2 e 237, 2; III, § 251, 10; VI, § § 680, 6, 683, 686, 7, 684; X, § 1.069, 6; XI, § § 1.245, e 1.251; XV, § 1.832, 2). A relação jurídica processual nasce com o despacho do juiz, e a angularidade com a citação. É preciso, em tudo isso, não se esquecer que o processo tem por fim obter a ação do direito, de jeito que o direito material é que se “satisfaz” com a execução. Se se executa forçadamente, é porque o direito material supõe que se execute obrigação. Como se há de chegar até ai, se não há execução voluntária, depende do direito pré-processual, ou do direito processual, conforme se trate de regra jurídica quanto à pretensão à tutela jurídica, ou de regra jurídica sobre o exercício daquela pretensão e a relação jurídica que se forma com ele. As teorias que vêem no titulo extrajudicial executivo declaratividade, à parte do negócio jurídico a que se refere, exageram aquele elemento de declaração que há nas manifestações de vontade, ainda quando o negócio jurídico mesmo não é declarativo. Por outro lado, se é certo que, para estabelecer provas legais, o legislador pesou circunstâncias e de certo modo admitiu provas futuras (donde as frases felizes de GIU5EPPE CHIOvENDA, Principii, 811: “Nella prova legale il momento probatorio si presenta alla mente del legislatore anzichê a quella del giudice: il legislatore, partendo daila considerazione di normalità generale, fissa in astratto ii modo di raccogliere determinati elementi di decisione, sottraendo questa operazione logica a queile che il giudice compie per formare la sua convizione”), não há por onde ver-se no titulo extrajudicial, por lhe ter sido atribuida executividade, qualquer decisão sobre prova. Invocar as frases de GIUSEPPE CHIO-VENDA para se sustentar a existência de declaratividade no título extrajudicial executivo é mergulhar-se no passado, na época da elaboração da lei, e querer-se que o “momento probatório”, a que GIU5EPPE CHIOvENDA se referiu, se desloque para o presente. Seria isso o que resultaria de tentativas de CARLO FURNO (Contributo alia Teoria de la Prova legale, 160 5.; Disegno sistematico deile Opposizioni nel processo esecutivo, 31, 35 e 67). Já aí, e além daí, fora JuLIUs SIEGEL (Die privatrechtiichen Funktionen der Urkunde, Archiv fúr die civilistische Praxis, 111, 1 5.), sem lograr acolhida fora de pequeno grupo (cf. Tratado de Direito Privado, III, § 349, 3). O elemento declarativo, que há em todo negócio jurídico como em toda decisão, pode ser ínfimo. Nos títulos extrajudiciais executivos, ainda quando se refiram a negócios jurídicos declarativos, não há declaratividade própria que os distinga dos outros títulos. Nem a legitimação emana do negócio jurídico de direito material, nem da documentalidade do título, nem de prova que se fez fato, nem de semelhantes fantasias com que se evita a dificuldade da classificação da ação executiva de títulos extrajudiciais. Tampouco seriam de admitir-se teorias que se refiram à legitimação em virtude de se tratar de titulo de negócio jurídico em que as obrigações sejam obrigações abstratas, ou por serem títulos incorporantes: há obrigações abstratas, que provêm de títulos não executivos, e títulos incorporantes que não dão o adiantamento de execução. Pode-se imaginar pretensão à execução procedida imediatamente (= por adiantamento) a favor de créditos não incorporados, ou, até, não documentados, ou não documentais de manifestações de vontade do obrigado (créditos de impostos, apenas, lançados pelo Estado). O título extrajudicial executivo habilita ao exercício da pretensão à tutela jurídica executiva, permitindo a cumulação sucessiva do adiantamento de execução, da condenação e da execução. Admitida a ação executiva, somente a reforma do despacho, ou decisão de nulidade, ou a condenação, ou a extinção sem julgamento do mérito pode pôr fim à demanda. Até então há a eficácia da formação da relação jurídica processual, que se firmou no título. O que determina a formação da relação jurídica processual, após o pedido de execução, é o despacho do juiz que defere o pedido de citação do executado, para angularização da relação jurídica processual. Quem deve e é obrigado tem de pagar (executar voluntariamente). Se não paga, ou há a execução pelo próprio credor, que, de regra, é, hoje, proibida, ou a execução forçada, que é feita pela justiça estatal, sucedânea da justiça de mão própria. A pretensão e a ação executivas existem já no direito material, mas o modo de proceder-

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se depende do regramento pelo direito pré-processual e pelo direito processual. Por isso, a ação executiva, a actio, pode preceder à própria criação de título extrajudicial ou judicial executivo, como se a divida ainda não foi documentada, ou incorporada em titulo que baste ao adiantamento de execução. Oelemento executivo da pretensão e da ação de direito material vai ao fim do processo, até que se declare não se poder completar a non plena cognitio, isto é, o efeito de adiantamento, ou até que se complete e se cumpra (entrega do que foi executado). O elemento executivo da pretensão à tutela jurídica (portanto, pré-processual) somente foi posto antes da condenação por força de regra jurídica pré-processual, mercê da técnica do adiantamento de execução, com a non plena cognitio, que inverte a ordem de início das ações (executiva, antes da condenação), sem inversão da ordem das sentenças (condenação e completação da executividade que se adiantara, ou declaração de não se poder completar). Quando se inicia a ação executiva de título executivo extrajudicial, adianta-se execução: a ação executiva, como quaisquer outras, tem força própria, 5: nela, de executividade (força de sentença favorável). Adianta-se 2: se a ação condenatória, que se cumula, for julgada procedente a decisão terá mais 3 de executividade, como qualquer sentença condenatória normal; se for julgada improcedente, nenhuma eficácia executiva terá com que se possa completar a carga inicial, que se adiantou (2), por se tratar de sentença declarativa. A condenação é hipotética. A carga 3 de executividade, que teria sido a da sentença de condenação, se antes houvesse sido proposta, somente vai ocorrer no próprio processo executivo, que começou com menos do que teria a carga de executividade da sentença (com 2, em vez de 3). Esse elemento executivo, com que se inicia, só se eliminaria com a decisão de invalidade do título, ou do processo, desde a petição. Foi esse elemento, pequeno, que o direito pré-processual atribuiu ao título, fazendo-o quase-sentença. Com esse expediente, concebeu a ação executiva de título extrajudicial. Por isso mesmo, é erro dizer-se que a sentença, que julga procedente a ação de embargos, é desconstitutiva. O elemento, aí, foi atendido e não se oblitera com o julgado: o processo acaba por incompletabilidade do adiantamento, que se torna imprestável (= incompletável). A sentença que julga improcedente a ação executiva de modo nenhum desconstitui. Talvez não se discutira isso, na defesa; pelo menos, na hipótese. Discutiu-se mérito. A carga da executividade, que foi adiantada, resolve-se, porque não foi satisfeita a condição para se completar (= ocorreu a condição que a resolve). O efeito não é de sentença que acolhe os embargos do devedor. O efeito é autógeno, resulta de haver no adiantamento determinação mexa. A eficácia adiantada esvai-se, porque não se completou, e não mais se pode completar. Certamente, após a sentença, algo deixa de subsistir; mas tal mudança não provém de eficácia da sentença, provém do implemento da condição para se resolver a eficácia executiva adiantada. Pode-se negar, na ação, que se pudesse invocar qualquer regra jurídica permissiva da executabilidade do título extrajudicial, que foi apresentado, mas isso é outra questão: Quando o Estado cria a pretensão à tutela jurídica não se obriga ao proferimento da sentença favorável: obriga-se a examinar o caso e, atendendo à pretensão à tutela jurídica, dizer quem tem razão. Demandante e demandado têm pretensão à tutela jurídica e ambos a exercem, mesmo se o demandado é revel. O título é necessário, e a sentença que acolhe os embargos do devedor no concernente ao mérito é declarativa; porém a queda dos atos executivos adiantados não deriva da sentença declarativa, e sim da incompletabilidade do adiantamento, efeito que só persistiria se completado (= se não acolhidos os embargos do devedor). A sentença que os acolhe declara implicitamente essa incompletabilidade; portanto, estar realizada a condição resolutiva (= não pode ser completada a eficácia executiva). Um dos argumentos que se empregam para se atribuir à sentença que acolhe os embargos do devedor eficácia declarativa (o que está certo), e a essa eficácia, quanto ao direito material, a queda dos atos executivos até o momento (o que é falso), tem sido o de se chegar ao mesmo resultado com ação declaratória da ineficácia do título extrajudicial para execução. Primeiramente, tal ação declaratória seria quanto a não existir o efeito 2, de adiantamento, o que nada teria com o mérito dos embargos do devedor. A contestação, na ação executiva de títulos extrajudiciais, não tem por fito normalmente negar a eficácia do título extrajudicial a que se concedeu a adiantabilidade de execução, mas negar que tenha autor-exeqtiente pretensão ou ação, que possa levar à execução. É de grande relevância frisarmos, mais uma vez, que houve, no inicio da ação, 2 de executividade, que se completa com 3, se favorável a sentença, ou não se completa com isso (para que haja 5), e então o adiantamento foi resolvido pelo não-implemento da condição. Não só. A discussão entre ser ex tunc ou ex nunc a eficácia da sentença que acolhe os embargos do devedor é sem alcance. Sentença declarativa, não é de se estranhar que tenha eficácia ex tunc, no que normalmente aprecia o mérito; e, ainda na afirmação implícita de ser incompletável a eficácia adiantada, declara, implicitamente, que, com o trânsito em julgado do que decidiu, a eficácia executiva (2) é incompletável (não mais se pode ter 2 ± 3). Quem adianta, ou adianta para se completar, ou para ser restituído o que se adiantou, se não se completa. O titulo extrajudicial executivo é prova do direito, pretensão e ação de direito material e suporte fáctico de regra jurídica pré-processual, que confere ao autor pretensão à tutela jurídica, por adiantamento.

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Quando o executado embarga (no tocante a mérito), afirma que a sentença não pode condenar, portanto que a carga 2 é incompletável. Só a sentença condenatória, com os seus 3 de executividade, completaria o que se adiantou, o 2 da non plena cognitio. Quem vê na sentença que absolveu o executado-demandado sentença declarativa que desfaz a declaração inserta no titulo, comete dois erros: atribuir ao título declaratividade e, contradição evidente, conceber sentença declaratória como idônea à desconstituicão de declaração. A sentença, que absolve, declara não existir base para a sanção e ser incompletável a carga de executividade que se adiantou: acolher os embargos do executado é não condenava e não completar a carga de executividade. Estarmos a falar de embargos do devedor em que se argúi matéria de mérito, e não matéria processual, ou pré-processual: a alegação de falta de interesse, de inexistência de pretensão à tutela juridica, de nulidade da citação e outros semelhantes podem dar ensejo a decisões de eficácia ex tunc. Se só se alega matéria de mérito, não se desfaz o elemento 2 de executividade que se adiantou; deixa-se de conferir 3 (eficácia ex nunc). Não se declara que 2 não podiam ser atendidos, mas sim que não podem ser completados. Sem razão: RICHARD SCHMIDT (Lehrbuch, 2Y~ ed., 1012), OTTO GEIB (Rechtsschutzbegehren uná .4n.spruch8bestàtigung, 122), PAUL LANGHEINEKEN (Der Urteilsanspruch, 162 e 179), GIusEPPE CHIOVENDA (Principii, 243), PIERO CALAMANDREI (11 Procedimento monitorio nella legislazione italiana, 5) e MARCO TULLIo ZANZUCCHI (Diritto Processuale Civile, III, 164). O que impressiona aqueles que vêem cair os atos praticados com adiantamento, inclusive a penhora, a ponto de os levar a afirmarem a eficácia desconstitutiva, ex tunc, da sentença que nega a procedência da ação (= não condena = absolve), é exatamente aquela queda. Mas a queda provém da natureza do próprio adiantamento de execução, que só persiste se é completado. A eficácia do título extrajudicial não depende da existência do crédito; mas a eficácia daquele somente subsiste se se imple a condição de ser completada a carga de eficácia: a determinação mexa é que determina a queda dos atos execucionais que foram praticados. A sorte da eficácia está na regra de direito pré-processual que concedeu a propositura da ação executiva por adiantamento, condicionado à completação. É de repelir-se, portanto, que se considerem os embargos do devedor negação da subsistência do direito pré-processual (ou processual), da pretensão à tutela jurídica. Está superado o que escreveram, além de L. SEUFFERT, RícliAim SCHMIDT (Lehrbuch, 1012), PAUL LANGHEINEKEN (Der Urteilsanspruch, 162 5.), R. FALKMANN (Die Zwangsvollstreckung, 2.~ ed., 383), FRIEDRICH HELLMANN (Lehrbuch des deutschen Civilprosessrechts, 831), HOPFNER (tJber materiellrechtlzche Einwendungen gegen die Vollstreckung von Urteilen, 26 e 39) e outros. As teorias que vêem, aí, nos embargos do devedor (noutros sistemas jurídicos, contestação) impugnação da ação executiva são equivocas: <impugnação à pretensão àtutela jurídica ou à ação de direito material? As ações (de direito material) de execução são sujeitas, para serem satisfeitas, ao exercício da pretensão à tutela jurídica pelo Estado, que o regula, que monopolizou a justiça, excluindo, portanto, Quando JÂMES GoLDSCHMIDT (Ungerechtfertigter Vollstrec*ungsbetrieb, 37) falava de ação executiva imediatamente condicionada à subsistência do direito material não atendia a que o 2 de B é apenas concessão do direito pré-processual e a que, em verdade, a ação executiva, a que aludia, era a ação executiva em A. Quando SALVATORE SATTA (L’Esecuzione forzata, 2.~ ed., 27; Diritto Processuale Civile, 476 e 379) reduz o título extrajudicial a pressuposto necessário e suficiente somente para o desenvolvimento externo, portanto, a pressuposto formal, coloca 5 em B, porque há 5 em A, sem explicar o adiantamento. A pretensão à tutela jurídica foi dada apenas para inicio de processo, para a formação da relação jurídica processual, com o dilema: ou a eficácia executiva conferida se completa, ou ela cal. A eficácia adiantada é sob condição de se completar (== sob a condição resolutiva de não haver completação). Até o fim do processo no direito brasileiro, ainda que não haja embargos do devedor a eficácia é 2, o que de si só lhe mostra a precariedade. Exerce-se a ação de condenação, adiantando-Se execução. A sentença que desconstitui é a que afirma a inexistência da pretensão à tutela jurídica (declara, previamente, a existência da pretensão à tutela jurídica e desconstitui a eficácia adiantada), ou a nulidade da petição inicial ou da penhora (decisão constitutiva negativa). A própria sentença que acolhe os embargos do devedor, por ter ocorrido fato extintivo ou impeditivo posterior à formação do título, não desconstitui (sem razão F’RANCESCO ÇARNELUTTI, Instituziofli, II, 673). Toda sentença que julga improcedente a ação, pois que apenas diz “não há”, é declarativa. A contestação do executado, conforme o Código de 1939, não era episódica, porque no sistema jurídico brasileiro de então, à diferença do que se passa noutros sistemas jurídicos não havia oposição de mérito (embargos do devedor), havia contestação; e não se estatuía que, não contestada a ação proposta, se tivesse por completada a executívídade, automaticamente (antes, conforme as Ordenações Filipinas, Livro iíí, Título 86, ~ 1; SILVEsTRE GoMEs DE MoRAIs, Tractatus de ExecutiOflibus, 1, 44, e 84; idem, Reg. n. 737, de 25 de novembro de 1850, art. 312). O Código de 1973 riscou a contestação, que existia, e igualizou o que se passa com a execução de título judicial e com a execução de título extrajudicial. Há os embargos do devedor (arts. 736-740 e 745). Apenas se fez ação o que antes era contestação.

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Quando FRIEDRICI! 5TEIN (Grundfragen, 12 s.) percebeu que o elemento essencial do título executivo não está no que declara quanto à pretensão de direito material (note-se a impropriedade, aí, em se falar de declaração), mas sim no fato de o declarar exeqúível, deixou de apontar a diferença maior entre as duas funções do instrumento, a de prova de pretensão de direito material e a de prova da exercitabilidade da pretensão à execução (à tutela jurídica) desde logo, isto é, antes da sentença condenatória. o direito pré-processual é que permite o adiantamento de execução; o resto somente pode resultar do efeito da decisão condenatória, que se vai proferir no mesmo processo. Não sendo procedente a ação de condenação, aí metida, não há efeito executivo que se possa completar; e a sentença que julga improcedente a ação declara-o, e declara, implicitamente, a incompietabllidade da eficácia que se adiantou (= declara que se põe termo ao processo executivo por adiantamento, por não haver condenação). As mesmas observações havemos de fazer a MITTAG (Der ~0flstreCkUngstiteí, 79, s.) e a KARL AuGU5T BETTERMANN (Die ~ollstreckUng des Zivilurteils, 33 s.). O título judicial, a sentença com produção de actio indicati, 1á tem 3 de executividade, o que permite iniciar-Se a ação de execução de sentença com quase toda a carga: o resto é completado neceSSariamente, salvo ataque à própria sentença por não ter transitado em julgado, ou por ter havido a nulidade prevista no art. 741, 1. O resto do peso, 2, depende do julgamento dos embargos do devedor, com fundamento no art. 741, 1. O direito material é que determina a carga de eficácia das ações. o direito pré-processual diz até onde, quando e em que plano (administrativo, judiciário) se tem a pretensão à tutela jurídica e diz a ordem em que se exerce, considerando-se preestabelecida~ mas mudável, a ordem em que estão, no direito material, os efeitos. Exercida a pretensão à tutela jurídica, segundo exigências pré-processuais e processuais para inicio da relação jurídica processual~ o processo é que regula todo o procedimento até a terminação da relação jurídica processual, extinção, sentenciação e ataques à sentença. É dado experiencial que, julgando-se os embargos do devedor e sendo acolhidos, sem algo se alegar contra a propositura da ação executiva, se nega a pretensão de direito material sem se negar a admissibilidade da via executiva. Não há qualquer contradição a superar-se. O adiantamento de eficácia executiva prende-se à atividade política do Estado, em sua função de distribuidor de justiça: é expediente para a tutela jurídica, fora da pretensão à execução, que têm os credores. Fato semelhante ocorre quando, a respeito de sentenças, o direito pré-processual concede que se executem, provisoriamente, as sentenças de que se recebeu recurso em efeito somente devolutivo (art. 520, 2.~ parte). No art. 588, III, a lei processual explicita que a execução provisória da sentença fica sem efeito (sic) desde que sobrevém sentença pela qual se modifique ou se decrete a nulidade da sentença de que provisoriamente se iniciou a execução. A execução superveniente não é, ai, da mesma natureza em todos os casos: se retira a condenação, declara; se decreta a nulidade da outra sentença, desconstitui, mas, nessa espécie, a simetria é com as alegações fora do mérito. 16)RESPONSABILIDADE DO EXEQUENTE PELOS DANOS QUE A EXECUÇÃO CAUSA. O art. 18 do Código de Processo Civil cogita da má-fé no processo, figura em que há o pressuposto da culpa. No art. 588, 1, atribui-se ao executado pretensão à reparação dos danos, sendo de entender-se que o elemento da culpa não é necessário, conforme resulta dos termos da regra jurídica, que, aí, não se refere à má-fé ou à culpa. Pergunta-se: se o titulo extrajudicial foi utilizado para execução, portanto para execução por adiantamento, <o art. 588, i, é invocável, por analogia da execução, por adiantamento de tempo, com a execução provisória? O assunto é de grande relevância, porque se têm de considerar a espécie em que a decisão acolhe a alegação de inadmissibilidade e a em que a decisão acolhe os embargos do devedor (quanto ao mérito). Se não havia admissibilidade, rege o art. 588, 1. No que concerne aos embargos do devedor, tendentes a negar a pretensão de direito material ou a sua eficácia (e. g., prescrição), regem os arts. 16-18. Se, na execução provisória, há a regra jurídica do art. 588, 1, com maioria de razão em se tratando de título extrajudicial: tanto ali quanto aqui, o adiantamento é condicionado. Contra essa assimilação da execução de título extrajudicial à execução de sentença ainda não passada em julgada não é argumento, que pese, a de ser diferente o trato a respeito das medidas cautelares (art. 811), porque, nos processos preventivos, preparatórios ou nao, de sequestro ou de arresto, há exame judicial da fundamentação (arts. 799, 804 e 807) e podem ser revogadas ou modificadas (art. 807). N~ havia, no sistema jurídico brasileiro de 1939, regra jurídica, como a do art. 574 do Código de 1973, a respeito de ações executivas (idem, no direito alemão, cf. FEIEDEICH STxIN, Grundfragen, 19 5.; RICHARD SCHMLDT, Lehrbuch, 1042; WERNER NIESE, DoppelJunktionefle Prozesshandlungen, 120 s. e 123 s.). Não se podia invocar literatura italiana, por se não ter, então, no Código de Processo Civil brasileiro o que se disse no Processo Civil italiano, art. 96, alínea 2.~-. Não há nenhuma contradição em se permitir a execução provisória ou o adiantamento de execução e fazer-se objetiva a responsabilidade (sem razão, CALDA, L’Impugnativa dei credito nefl’Esecuzione forzata, 35 s.). No Código de 1973, o art. 574 foi explícito e a inovação merece elogio.

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17)EXECUÇõES DESCONSTITUTIVAS (OU NEGATIVAS) E EXECUÇõES DENTRO DOS AUTOS. a) Nas execuções desconstitutivas, isto é, naquelas em que, tendo sido reformada a sentença, tem o juiz de desconstituir, após o cumpra-se, a penhora, o arresto, o sequestro, ou outra medida constritiva, ainda se se trata de medida sobre coisa certa, não é preciso o prazo do art. 621, porque o bem está constrito. Se a medida foi de liberação, sim. b)Resta o problema da execução dentro dos autos, em que a sentença mesma é executiva, ou tem carga 4 de executividade. Tem-se a) de intimar nos termos do art. 621: portanto com dez dias, ou b) a intimação é para a entrega imediata e apreensão do bem? Nas Ordenações Fiiipinas, Livro III, Titulo 86, § 15, a solução a) foi mantida, pois nas Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 91, pr., já se dizia: “Disseram os Sabedores antiguos, que compilaram as Leys Imperiaes, que, se o Reo he condenado em alguuma auçam real, ou pessoal, que entregue alguuma cousa certa ao vencedor, deve-lhe o Juiz da execuçam assinar termo de dez dias a que a entregue; o qual termo passado, se a nam entreguar, deve-lhe ser tomada forçosamente per a Justiça, segundo o caso requerer, sem mais ser a parte condenada para elo citada.” A assinação é na própria sentença, que se intima. Se a omitiu o juiz, pode, de ofício, fazê-lo, ou atender à parte que o reclame. Não há nova citação; aliter, nas ações a que falta peso 5 ou 4 de executividade, porque, nessas, “deve a parte condenada ser citada ante da execuçam, perque a condenaçam nam foi feita em certa e especificada cousa, em que se aja de fazer execuçam” (Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 91, § 5; cl. Ordenações Manuelinas, Livro III, Título ‘11, pr.). Não se precisava de nova citação, porque não se trata de actío judicati. Findos os dez dias, tirava-se a carta de posse, depois dito mandado de imissão (cf. L. 68, D., de rei vindicatione, 6, 1). O prazo não pode ser aumentado, nem d~-ninuído (ANTóNIO DA GAMA, DecisioneS, d. 277, n. 1), nem prorrogado (MANUEL QONÇALVES DA SILVA, Commentaria, 1, 118). j,Tem-se, hoje, a exigência dos dez dias? A solução b) era a do direito comum e SILVESTRE GoMEs DE MORAIS (Trac tatus de Executionibus, VI, 314) sabia disso: “Discrepat vero praedicta Ord. a iure communi; illa enim decem dies condemnato indulget ad rem tradendum, cum tamen ius com-mune nulium concedat terminum, et dilationem, imo potest confestim, condemnato non tradente, res manu militari auferri”. No Código de 1973, como no de 1939, nao há regra jurídica que permita ter-se de marcar o decêndio para se executar dentro dos autos, salvo se se trata de execução desconstitutiva, que é aquela a que procede o juiz. Na execução desconstitutiva, como se houve adiantamento de execução e titulo extrajudicial, ou se houve execução provisória de sentença, ou liberação, quem recebeu o bem em virtude de ato judicial, mas sobreveiO outra sentença que reformou a sentença, tem de ser intimado a restitui-lo, à semelhança do que se passa com a execução de sentença sobre coisa certa. A eficácia é como se tivesse havido outra ação, em sentido contrário. Na execução de sentença que já contém eficácia executiva imediata, por definição não se precisa de actio judicati. 18)CAUSA DA EXECUTIVIDADE. (a) Para que haja executividade, é preciso que se repute título executivo o instrumento da dívida ou que haja sentença com carga suficiente de executividade. Quando se pede ao juiz que execute a dívida (exercício das pretensões pré-processual e processual à execução), teir o juiz de examinar se o título é executivo, seja judicial, seja extrajudicial. (b)O título extrajudicial, para o ingresso da ação executiva, há de ser suficiente. O serventuário de justiça, que apresenta pedido de execução, para cobrança de custas, tem de juntar documentos de seu cargo e da contagem das custas, com aprovação do juízo (art. 585, V). Se, nas vinte e quatro horas, a que se refere o art. 652, o citado alega que não há prova do cargo de justiça, ou que o demandante não é serventuário de justiça, ou que não houve aprovação do juízo, ou que a prova (o documento de investidura) ou da aprovação é falsa, o juiz tem de decidir sobre isso, antes da eficácia da alternativa (pagamento ou penhora). Dá-se o mesmo a respeito dos peritos, intérpretes, ou tradutores. Se alguma pessoa, como condômino, cobra conta, executivamente, e o demandado nega que tivesse tal encargo, o ônus da prova incumbe, nas vinte e quatro horas, à pessoa que se diz condômino, seja síndico ou não. Somente açx5s a decisão do juiz pode ser eficaz a alternativa. Se alguém propõe ação executiva por dívida garantida por alguma caução judicial, ou hipoteca, a alegação de falsidade ou insuficiência do titulo há de ser julgada antes de qualquer eficácia de penhora, porque não se refere à relação jurídica de direito material, mas sim à própria pretensão à executividade. Dá-se o mesmo quanto a letras de câmbio, notas promissórias, duplicatas e cheques. Se algum credor de foros, laudêmios ou rendas de imóveis exerce a pretensão à execução, mas o pretenso devedor alega, nas vinte e quatro horas, que a assinatura é falsa, ou que o nome é de outrem, a despeito da parecença, tem isso de ser decidido antes da eficácia alternativa (pagamento da penhora). Se alguém entende que pode cobrar dívida que consta de instrumento público, ou particular, assinado pelo devedor e por duas testemunhas, e o demandado dentro das vinte e quatro horas argúi que o instrumento público é falso, e que a sua assinatura, ou de alguma testemunha o é, tem ojuiz de apreciar o caso antes de ter o

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devedor de pagar ou sofrer penhora. Trata-se de negação de executividade do titulo. Pode mesmo alegar que o instrumento público não foi devidamente assinado. As letras de câmbio, as notas promissórias, os cheques e outros títulos cambiariformes são líquidos: porém a certeza há de resultar do que está escrito, da veracidade das assinaturas e da observância das exigências legais. Se o sacador ou o aceitante da letra de câmbio, dentro das vinte e quatro horas, diz que a sua assinatura é falsa, ou que o nome é igual, ou parecido, porém não foi ele que se vinculou ao título cambiário ou cambiariforme, o juiz tem de decidir quanto a isso, porque está em exame a pretensão à execução, e não o mérito da causa. Art. 566. Podem 1) promover9) a execução forçada: 1 o credor a quem a lei confere titulo executivo2) 4) 5); li o Ministério Público, nos casos prescritos em lei 3)• Art. 567. Podem também 10) promover a execução, ou nela prosseguir á): 1 o espólio 7), os herdeiros ou os sucessores do credor, sempre que, por morte deste, lhes for transmitido o direito resultante do título executivo 11); ii o cessionário 12), quando o direito resultante do titulo executivo lhe foi transf e-rido por ato entre vivos 8); 111 o sub-rogado 13), nos casos de sub--rogação legal ou convencional. 1)LEGíTIMAÇÃO ATIVA À EXECUÇÃO FORÇADA. Para a execução, seja de sentença, seja de título extrajudicial, que são as duas espécies de que cogita o art. 566, é preciso que a sentença tenha 3 de executividade, ou que a lei haja atribuído ao título extrajudicial a eficácia executiva. Isso de modo nenhum significa que não existam, fora do Livro II, outras ações executivas. Algumas não dependem de sentenças anteriores, como a de reintegração da posse, a de vindicação da posse, a de imissão de posse, a de indenização no caso de nunciação de obra nova, a de inventário e partilha, a de dissolução e liquidação da sociedade, a de exibição de livro ou de coisa ou de documento em caso de não poder ser negada. Todas elas são ações com força eficacial de executividade (5). Há muitas e muitas outras. Há também ações em que a eficácia executiva é imediata (4); e aqui apenas damos exemplos: a ação de habilitação em inventário e partilha; a ação de desquite amigável; a ação de alimentos provisionais; a ação de posse, em nome do nascituro. Não só sentenças em ações condenatórias têm 3 de executividade (eficácia mediata), que é a das sentenças a que se refere o art. 584, 1. Pense-se na ação de autorização de venda (constitutiva), de apreensão de embarcações ou de venda de navio (constitutiva), a ação do titular do direito de preferência contra o terceiro para indenização (condenatória), a ação do pré-contraente vendedor para exigir o preço (condenatória). Os legitimados à execução forçada são, principalmente, os credores que têm o título executivo, judicial ou extrajudicial. O Ministério Público, quando, e. g., curador de incapazes ou à lide, representa, sem que seja, portanto, titular do direito de crédito. Chamou-se à liquidação do credor legitimado ativo, legitimação ordinária, e às demais legitimação extraordinária (cf. ENRICo REDENTI, Ii Giudicio civile conpluralitá di parti, 258; EDOARDO GARBAGNATI, La Sostituzione processuale, 186), ou a essa anômala (PIERO CALAMANDREI, Istituzioni di Diritto Processl.Lale Civile, 122), o que seria mais próprio. No art. 567, 1, diz-se que podem promover a execução, ou nela prosseguir, os herdeiros ou sucessores do credor, sempre que, por morte deste, lhes for transferido o direito resultante do titulo executivo. Em todas essas espécies, o sucessor, entre vivos ou a causa de morte, tem o título executivo, como o credor do art. 566, 1. Apenas, no art. 567, 1, há explicitação. 2)CREDOR A QUEM A LEI CONFERE TITULO EXECUTIVO. ~a lei que atribui à sentença eficácia executiva mediata (3).Se a eficácia que ele reconheceu é imediata (4), não se precisa a tal sentença fazer suceder a ação executiva dos arts 566 e 584, 1: no mesmo processo pode dar-se a execução. Se o credor é titular de direito a que a lei atribuiu eficácia executiva, tem ele a ação executiva dos arts. 566 e 585. A lei considera títulos executivos as sentenças em que haja 3 de executividade e a quaisquer títulos extrajudiciais a que se atribua eficácia de executividade; de ordinário, com atendimento à natureza e à finalidade dos títulos. O art. 566 fala de “credor”, mas nada obsta a que a executividade do título apenas dependa da posse. O portador de título ao portador pode propor a ação executiva mesmo se não é o proprietário. Pode mesmo acontecer que seja apenas tenedor e nos embargos do devedor se alegue e prove que não é proprietário, ou possuidor. O Código somente cogitou no Livro II das ações executivas de credores. Muitas outras ações executivas existem. Delas adiante falaremos. O art. 566, 1, refere-se ao legitimado ativo à ação executiva de titulo judicial ou extrajudicial. A alusão explícita é ao titular do crédito, dito credor. O art. 566, II, ao Ministério Público, se a lei prevê o seu “direito de ação”, casos em que lhe cabem os mesmos poderes e ônus que as partes, se tenha de sujeitar-se aos arts. 19, § 2.0

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(adiantamento das despesas processuais), 27 (condenação às despesas), ou a honorários . Responde pelas custas de retardamento (art. 29). Além dos arts. 81-85 do Código de Processo Civil pode haver lei especial. Não é credor, posto que possa ser órgão do credor, entidade estatal que ele presenta. Credor é, no art. 566, 1, o titular de ação. Pode ser que tenha adquirido a pretensão e a ação, sem ter adquirido o direito, como se, arrendatário da fazenda, o arrendante lhe transferiu a pretensão e ação ao exercício do direito de vizinhança e, tendo negado tal atribuição, houve sentença contra o vizinho e a favor do arrendatário. 3) Ministerio PÚBLICO. Conforme expusemos sob os arts. 81-85, por vezes o Ministério Público tem função de legitimado ativo. Só a lei pode apontar as espécies de ações em que isso tem de acontecer, mas a interpretação dos textos pode ser mais acertada do que aquilo que se poderia tirar da simples redação. O Ministério Público exerce o direito de ação (melhor:a pretensão à tutela jurídica, que o Estado prometeu, e a pretensão processual) se a lei lhe deu tal incumbência. Propondo a ação, ou defendendo algum direito de outrem, tem ele os mesmos poderes e o mesmo ônus que têm as partes (art. 81). Compreende-se que tal função se lhe dê quando se trata de interesse de incapazes, quer como interveniente, quer, se a lei o prevê, como legitimado ativo à ação, à reconvenção, ou às próprias ações executivas. Se há interesse público, não se precisa, sequer, de regra jurídica especial. Nessas espécies, ele não intervém como fiscal da lei, razão por que, acertadamente, o art. 566, II, a ele se referiu. Não se diga que o Ministério Público, na função que lhe atribui no art. 566, II, substitui. Tem ele a legitimação processual ativa. Legitimado ad causam é o credor. O Ministério Público, em muitos casos, presenta o Estado, ou alguma entidade estatal; noutros, representa (e. g., se a lei, na falta de representante de incapaz, dá ao Ministério Público o dever de propor ação executiva em que é credor o incapaz). Não se confunda tal função com a que tem como interveniente (art. 82, 1). 4)TíTULO JUDICIAL DO VENCEDOR NA AÇÃO COM EFICÁCIA EXECUTIVA. A regra jurídica do art. 566 concerne à legitimação ativa; traduz em forma de regra jurídica sobre pressuposto subjetivo a regra jurídica de atribuição de pretensão a executar. O vencedor, na ação da espécie estudada à nota 1) ao art. 587, ou na parte da ação, seja o autor, seja o reconvinte, seja qualquer das partes, nos juízos dúplices, tem a pretensão a executar. Não se trata de regra sobre capacidade processual. O vencedor na ação tem o seu nome no título; o sucessor sub-rogado ou o cessionário não no tem. Em princípio, seria de exigir-se novo título, uma vez que se trata de executar o julgado; porém as leis costumam prescindir de título novo, admitindo o reconhecimento processual da transmissão operada no terreno do direito material ou de outro processo. Se a sucessão sensu jato, particular ou universal, se deu, por força de lei, negócio jurídico ou execução forçada, transíativa, ou constitutiva sem translação (e.g., se foi embargado o título executivo), antes ou depois de iniciada a litispendência, mas antes de proferida a sentença exequenda, o mandado, pois se faz nos autos principais, ou a carta de sentença, se em atos suplementares (art. 589), deve conter o conhecimento do fato da sucessão. 5)CREDOR POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. Além do credor, que venceu na lide, e a sentença favorável tem 3 de executividade, o portador do título executivo ao portador, ou quem figura no título executivo como titular, por ser nominativo o título, ou como endossatário, ou quem o guarda com outorga de poderes para cobrança, tem legitimação ativa para a ação de execução. ~ de notar-se que, em vez de 3 de executividade, que tem a sentença, a lei atribui tal eficácia ao título extrajudicial. Quem tem crédito com direito real de garantia pode exercer a ação específica, ou simplesmente a ação do credor de título extrajudicial. As garantias, se garantias reais, já gravam a coisa, já lhe retiram valor para segurança de dívida, mas, a despeito disso, ainda não se dá, com a simples gravação, a execução. Por isso mesmo, não há inconveniente em que se fale de execução forçada em se tratando de títulos executivos extra-judiciais pessoais e de títulos executivos extrajudiciais reais, aqueles, executáveis contra todo o patrimônio do devedor, e esses, somente sobre o bem gravado. Em algumas ligações (e. g., Código Civil de 1916, art. 759) fala-se de “excussão” da coisa hipotecada, ou empenhada, em vez de “execução”. Porém a expressão excutere, excussio é estranha às fontes clássicas, e o nome benejicium excussionis, dado ao benefício de primeiro se executarem os bens do devedor, foi arranjo dos juristas posteriores, a propósito da exceção chamada exceptio excussionis personalis (Nov. 4, cap. 2) ou realis. Quem excute, sacode, abala, bate, faz em pedaços, empurra, espreme, mói. Quem executa segue, faz seguir, tira de um patrimônio para outro. O quatio de excussão, que melhor se escreveria “execução” (excutio), nada tem com o “sequor” de execução. O termo “excutir”, no art. 759 do Código Civil de 1916, éimpróprio: não alude à seqUela, à execução. O gravame tem efeitos semelhantes aos da penhora e às demais constrições. Ainda não é execução. O valor do bem está sujeito à garantia; não foi ainda extraído, para se solver a divida.

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6)SUCESSORES “MORTIS CAUSA”. Em virtude da sai-sina, os direitos, as pretensões e ações do decujo transmitiam--se automaticamente aos herdeiros e outros sucessores a causa de morte. Têm eles a legitimação ativa, no plano do direito processual e no plano material. Tratando-se de ação de execução de sentença, o vencedor na ação em que se proferiu a sentença, como autor ou como reconvinte, ou qualquer das partes nos juízos dúplices tem a pretensão a executar. Se a sucessão sensu lato, particular ou universal, ocorreu, por força de lei, ou de negócio jurídico, ou execução forçada, transíativa ou constitutiva sem translação (e. g., se foram opostos embargos do devedor à ação do título executivo, antes ou depois de iniciada a litispendência, mas antes de proferida a sentença exeqílenda, a carta de Sentença deve conter o conhecimento do fato da sucessão (art. 590, parágrafo único). 7) EsPóLIO. Toda pessoa que se acha, de conformidade com os princípios jurídicos, no exercício de direitos, pretensões e ações, tem capacidade para estar em juízo. Criou-se, com a inventariança, a representação dos sucessores e, pois, da herança, razão por que o art. 12, V, foi explícito (cf. art. 12, § 1.0): Espólio é a herança, o todo dos bens que ficam por morte do titular de direitos a alguém, expressão que se introduziu, lamentavelmente, na linguagem jurídica, e havíamos de repelir. Adiante, in une. No sistema jurídico brasileiro, não há bens de que não haja quem receba a herança. Se faltam os herdeiros ou outros sucessores que a lei ou o testamento prevê, recebe o espólio o Estado. O Código, no art. 567, 1, fala de espólio, herdeiros ou sucessores• sucessores, aí, são os sucessores a causa de morte. A sucessão a causa de morte é toda sucessão em que há o prefalecido e o sobrevivente, ou os sobreviventes, que recolhem a herança, senso lato, isto é, os herdeiros, os legatários e outros beneficiados. Quando se fala de sucessões, como se só existissem sucessões a causa de morte, emprega-se o termo em sentido limitativo, porque, em terminologia juri dica, há a sucessão a causa de morte e a sucessão entre vivos. Numa e na outra há a subentrada (sub, cedere). Há sucessores que não são a causa de morte. Nem se pode dizer que só haja sucessão universal se mortis causa. Nem cabe sublinhar-se que na sucessão entre vivos há quem perca e quem adquira, porque o alienante ou perdente está vivo. Há sucessão a causa de morte sem ser de universitas, como há sucessão de universitas entre vivos. Há opiniões que vêem na herança universitas iuris, porque os herdeiros respondem pelas dividas, e. g., LoDOvICo BARAssI, La Succesione legittima, 33). Tampouco se há de dizer que só a sucessão a causa de morte seja successio in ius, ou successio in omne jus, ou successio per universit atem, de jeito que todas as sucessões entre vivos seriam successio in rem, ou successio in rerum singularum dominium. Herança, em sentido largo, compreende a herança, os legados e outros benefícios. Herança, em senso estrito, o que passa do morto a outra pessoa, ou outras pessoas, como patrimônio ou parte de patrimônio. Então, hereditas nihil aliud est quam successio in universum ius quod dejfunctus habuit (L. 24, D., de verborum significatione, 50, 16). A sucessão a causa de morte nada tem com a personalidade do morto. Herdeiros sucedem nos bens, não na pessoa do decujo. O erro veio de textos romanos (L. 59, D., de diversis regulis inris antiqui, 50, 17: “Heredem eiusdem potestatis lurisque esse, cuius fuit defunctus, constat”; L. 1, § 13, D., quod legatorum, 43, 3; Nov. 48, pr.). Nem seria admissível que se falasse de representação do defunto pelos herdeiros: o decujo morreu; não é mais. No momento da morte o patrimonio transmite-se. A sucessão mortis causa pode ser a titulo universal, ou a título particular. A contraposição não deixa margem a que se atribuam os bens sem que alguém fique responsável pela satisfação das dívidas. O legatário, que é sucessor a título particular, não pode suceder em bem que seria atingido pelo pagamento dos débitos da massa hereditária. Se solve dívida da herança, tem ação contra o herdeiro, ou contra os herdeiros; mas, se, por exemplo, há o legado e é quase sem valor o todo do espólio, e o herdeiro e os herdeiros nada receberiam, por ser mais do que o valor do restante o passivo do decujo, tem-se de reduzir o legado, ou o legatário, para recebê-lo, há de prestar o que resta de dívida. De sucessão a causa de morte, nos primitivos, somente se poderia cogitar quanto às armas de sílex duro, que eles cortavam para a defesa contra os animais, quando se fez carnívoro pela escassez das frutas. Quando desceu das árvores para se alojar perto das águas e em planaltos areentos, onde havia as matérias-primas de que necessitava, teve após milênios de construir vivendas e o pêlo já lhe não bastava para se proteger contra o frio. Compreende-se que os sobre-viventes permanecessem na choupana e inumassem o falecido. Alguns objetos eram postos perto dele. Enquanto não apareceu a propriedade individual, o conceito de sucessão a causa de morte não podia corresponder ao dos tempos de hoje. Os filhos já eram titulares do direito em comum. Telêmaco, ao falar dos bens de Ulisses, dizia que eram “bens seus”, bem próprios, (Odisséia, XVI, 128). Está em PLUTARCO (Licurgo, 16) o que se passava no direito espartiata. Desde o nascimento, a compropriedade era adquirida pelo filho. Tal como na tndia (Mitakchatra, 41, 44 e 45). Nos poemas homéricos alude-se à partilha, seja entre mortais, seja entre deuses, mais tais poemas devem ser do tempo da propriedade individual (cf. P. GUIRAUD, La Propriété jonciêre en Grêce jusqu’â la conquête romaine, 55). Textos da Lei de Gortina (V. 28-34) mostram

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que em Creta ainda havia repulsa à partilha sucessoral, razão por que se estabeleceram medidas constritivas (cf. W. RõNNBERG, Das Erbrecht von Gortyna, 22 5.). Os parentes eram os que comiam na mesma mesa e se aqueciam perto do mesmo fogo. As palavras gregas são expressivas. O testamento apareceu tarde no direito ático até a legislação solônica, no direito de Gortina e no direito germânico. As leis de Hamurabi regularam o direito sucessório (162-184). Pelo que se sabe através dos papiros, a divisio parentum interliberos foi freqúente no Egito, após tempos (VINcENzo ARANGIO-RUIZ, La Successione testamentaria secondo i papiri greco-e gizii, 11; ERNST RABEL, Elterliche Teilung, Festschrift zur 49. Versammlung deutschen Philologen und Schulmanner in Basel im Jahre 1907, 512-538). Havia diferenças entre o instituto egípcio e o romano. Fingia-se, naquele, ter havido venda, com os dois títulos de transmissão (o da propriedade e o da posse> e com a transmissão imediata da propriedade, de modo que os genitores ficavam como administradores e usufrutuários. No direito greco-egípcio, os outorgados pagavam o imposto de transmissão. Quanto à sucessão legítima, o sistema de graus do direito romano e a distinção entre agnação e cognação, para a sucessão, não existiam. Ainda a sucessão era, em primeiro plano, da comunidade familiar. Fugindo ao antigo direito grego, com a preferência pelos parentes masculinos, fez-se a pacificação. O primogênito tinha quota maior. A morte é fato jurídico. O ser humano deixou de ser pessoa. Houve a morte civil. Ele não existe mais. No direito romano, herdeiros somente havia de quem os tinha com status libertatis, status civitatis, e era pessoa sui iuris (L. 11, D., de fideiussoribus et mandatoribus, 46, 1; L. 4, C., communia de successionibus, 6, 59). Se algum efeito se irradiou no momento mesmo em que o decujo faleceu, tem-se de considerar adquirido o direito, ou a pretensão, ou a ação, ou a exceção. Momento mesmo da aquisição e da morte é momento que dificilmente se fixa. Daí ter-se de supor anterior à morte a irradiação da eficácia (Momentum mortis vitae tribuitur). A declaração de morte é medida que se toma mesmo se não se trata de sucessão. Dela teremos de cogitar, extensivamente, porque o sistema jurídico lhe atribui a eficácia do fato jurídico da morte. A morte só se refere às pessoas físicas. Não há morte das pessoas jurídicas: há extinção. Se ocorre a morte, ou se há a declaração de morte, há a transmissão automática aos herdeiros. Aberta a sucessão, a titularidade dos direitos, pretensões, ações e exceções, bem como a posse, que se compreendem na herança, transmit,em-se, desde logo, aos sucessores legítimos e testamentários. Não só os direitos de propriedade, nem só, a fortiori o domínio e a posse se transmitem, automaticamente; o que era transmissível transmitiu-se no momento da morte. O sucessor de algum crédito, mesmo que não seja o único, é legitimado à propositura da ação executiva. Pode ser legatário, ou pode acontecer que dois ou mais sejam os sucessores do título executivo. Não se pode dizer, como fazia TEIXEIRA DE FREITAS, que o testamenteiro “universal, nomeado em testamento, onde nenhum herdeiro foi instituído, faz as vezes do herdeiro” (Primeiras Linhas sobre o Processo Civil acomodadas ao Foro do Brasil, 1, 310). Ora, tal substituição seria apenas no plano processual. Dá-se o mesmo com o testamenteiro, que em tal situação foi nomeado pelo juiz; e semelhante, porém com algo mais <pois ocorre a legitimação no tocante aos direitos oriundos da comunhão pós-matrimonial), no tocante ao cônjuge meeiro: não sucede, no plano do direito material, mas continua em comunhão, que vai ser extinta; e o Código de Processo Civil, arts. 988, 1 (que põe antes de qualquer herdeiro o cônjuge sobrevivente, cf. art. 987) e 990 (que dá legitimação ativa à função do inventariante, nomeado pelo juiz, em primeiro lugar, ao cônjuge sobrevivente casado sob o regime de comunhão de bens, desde que estivesse vivendo com o outro cônjuge, ao tempo da morte). ~ preciso que não se confunda com a função processual o que compreende a posição de quem é comunheiro em virtude da sucessão ou de comunhão matrimonial. Se entre os cônjuges havia a comunhão. Antes da morte do outro cônjuge existia o direito à meação; o que advém, com a devolução da sociedade conjugal, ou com a morte do outro cônjuge, é a pretensão à partilha, a que corresponde a ação. Por isso, é parte (tem legitimação ativa) para promover a execução (art. 566, 1), pois é credor com titulo executivo, se a ela corresponde a metade do valor. Após a morte do cônjuge, o cônjuge sobrevivente pode ceder o seu direito (que é à parte ideal) e o cessionário pode invocar o art. 567, II. De tal invocação não precisaria o cônjuge comuneiro sobrevivente, porque ele era e é credor, posto que só da metade. No caso de morte de cônjuge meeiro, em cujo nome fora emitido algum título executivo, ou fora proferida a sentença, o cônjuge supérstite é titular do direito pela metade. Somente com a eficácia da partilha é que extingue a meação, a comunhão, e o título passou a ser, todo ele, do cônjuge supérstite, ou deixou de ser, ou lhe cabe alguma fração maior ou menor do que a metade. Tudo isso depende do que se deliberou, definitivamente, quanto à partilha. A nomeação do cônjuge como testamenteiro, quer em testamento quer pelo juiz, apenas lhe atribui funções que se referem à testamentária .

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A atuação dos herdeiros ou legatários, ou outros sucessores de credores, rege-se pelos princípios concernentes ao inventário e à sucessão entre os vivos. Os herdeiros ou legatários dos credores têm, antes de qualquer propositura de ação executiva, quer judicial quer extrajudicial o título executivo, de habilitar-se na ação de inventário e partilha (arts. 1.055-1.062). Pode ter acontecido a propositura da ação executiva pelo credor, ou apenas a da ação de condenação, não há de ser suficiente a certidão de óbito, acompanhada de certidão de sucessão legitima ou testamentária. Ou o interessado apresenta a certidão de óbito e a de habilitação na ação de inventário e partilha, ou foi diretamente promovida de acordo com o art. 1.060. No art. 1.060, V, diz-se que, oferecidos os artigos de habilitação, se a parte reconhecer a procedência do pedido e não há oposição de terceiro, nos autos da ação principal (aí, ação de condenação ou de execução), a habilitação é independente de sentença. Dá-se o mesmo se o cônjuge ou o herdeiro necessário prova o óbito e a qualidade para prosseguir. Os sucessores, entre vivos, dos credores podem ser a titulo singular ou universal (o que é raro). A sucessão entre vivos pode ser por cessão (o art. 567, II, fala de “cessionário”, cf. arts. 42, § 1.0, e 1.061), ou por outro meio, como se houve arrematação da massa ou do crédito. O Código emprega a palavra “cessionário” em sentido amplissimo. O art. 567, 1, só se refere ao espólio (ao que era do falecido), aos herdeiros e aos sucessores do credor a causa de morte. Não se alude a qualquer origem entre vivos. Pode ocorrer que o título executivo seja intransmissível ex lege (art. 267, IX). No art. 567, II, a transferência é sempre entre vivos. No art. 567, III, só se cogita de sub-rogação, seja legal seja negocial. Por exemplo: feita a penhora em direito e ação de devedor, e não tendo este oferecido embargos, ou sendo rejeitados, o credor fica sub-rogado nos direitos do devedor até a concorrência do seu crédito (art. 673). 8)SuB-RoGADo, CESSIONAIRIO OU SUCESSOR, E LEGITIMAÇÃO ATIVA. Sub-rogado, ou cessionário, ou sucessor, a que cabe a legitimação ativa, é o sub-rogado, ou o cessionário, ou o sucessor na pretensão a executar. Se a sucessão, sub-rogação, ou cessão, se operou em virtude da própria sentença que se vai executar, o título executivo já tem o nome do sucessor, do sub-rogado ou do cessionário. O princípio, que domina o assunto, é o de que só se exige título executivo novo se o sucessor, mesmo sub-rogado ou cessionário, precisa praticar atos para que a execução se inicie. Então, se executasse com o titulo do vencedor e o seu título de sucessão ainda não estivesse integrado para o exercício da ação executiva da sentença, elidíría essa exigência integrativa. ~ o caso, por exemplo, do herdeiro que precisa habilitar-se, do sucessor que precisa de autorização do Governo, ou de prestar caução. A esse respeito, tudo o que se diz para a execução definitiva cabe também para a execução provisória (art. 588). O réu executado ou o devedor pode alegar a ineficácia do título com outro nome para. a sucessão stricto sensu, a sub-rogação ou cessão (aliter, se a sentença se referiu a essa sucessão lato sensu, porque, aí, a impugnativa é à sentença, e não à execução). Claro que tem o mesmo direito de impugnar o sucessor lato sensu do executado ou do devedor. Também lhes é dado a todos eles alegar a eficácia limitada ou parcial do título. Adiante, sob o art. 585, VII. O assunto não é tão simples quanto parece. Casos há em que a transmissão se opera a favor de pessoas distintas dos sucessores, tal como ocorre quanto a certas incumbências dos testamenteiros, ou dos herdeiros. No direito brasileiro, não se exige para o sucessor, ou o cessionário, ou outro legitimado a executar, título novo. Exige-se-lhe apenas a prova da sua qualidade, ao lado do título do vencedor ou certidão dele, ainda que provisória a execução. A legitimidade, de que se trata, é a legitimidade ad causam. Não se há de aludir a alguns titulares da pretensão a executar e da actio indicati. Assunto de mérito, nas espécies dos arts. 566 e 567; fora deles, não em todos os casos. ~ regra jurídica, que se costuma pôr em direito material, aquela segundo a qual, quando o credor, sem justa causa, demora a execução iniciada contra o devedor, pode o fiador, ou o abonador promover-lhe o andamento. Promover o prosseguimento, não o início. Legitimação ad processum, portanto. As leis processuais deviam contê-la. O síndico da falência, o inventariante, o curador de bens .arrecadados podem promover a execução; não são legitimados ~ad causam, e sim legitimados processuais. As outras pessoas (sub-rogado, cessionário, sucessor) e essas têm a pretensão a executar (pré-processual), mas, enquanto aquelas são legitimadas ad causam, essas não no são. São-no só ad processum. Na jurisprudência, diz-se, às vezes, que terceiros interesLados não podem promover a execução (e. g., o advogado, contra, Supremo Tribunal Federal, 15 de abril de 1943, A. J., 68, 14; R. dos T., 146, 393). Esse terceiro, por exemplo, pode .constar do título mesmo, se no contrato com o réu se previa x para o advogado, que o credor incluiu no pedido. O litisconsorte necessário, revel, é parte. A rescisão da sentença que excluiu o terceiro, que se disse litisconsorte unitário, investe da pretensão a executar e dota de legitimação ad causam, na execução, ou para a execução, o terceiro vencedor ~da ação rescisória. No caso de execução provisória, o terceiro vencedor do ~recurso é legitimado.

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Se não houve acordo com o demandado, a respeito de bonorários de advogado, nem sentença que se referiu aos honorários do advogado, que desse a esse legitimação ad cau8am, não há pensar-se em poder o advogado propor a ação iudicati: não foi parte na ação, de que proveio a sentença exeqtienda; nem se fez parte. Quem lhe deve honorários de advogado é o seu cliente, e não o vencido. O Supremo Tribunal Federal vacilou (A. J., 68, 174 5.), mas acabou por prevalecer, em recurso extraordinário com base no art. 119, III, d), da Constituição, a tese da negação da legitimidade do advogado ad causam e ad processum, em tais circunstâncias. Cf. Lei n. 4.215, de 24 de abril de 1963, art. 99, § 1)PROVA DA SUCESSAO PARA A LEGITIMAÇÃO ATIVA. preciso que a transmissão seja notória (art. 334, 1) para o juiz, ou que se prove por documento público ou particular com os requisítos do direito processual na espécie, e homologado em juízo, se for o caso. Mas, se o juiz se firma na notoriedade, há de essa constar do mandado, ou do despacho na petição de ação executiva do julgado. No caso de laudaUo’ auctoris (art. 62), a certidão do cartório basta. Quando a lei exige que a transmissão seja notificada, a execução não pode ser iniciada sem a ela preceder a notificação. Sendo a impugnação aos requisitos da transmissão oposição à execução, processa-se como embargos do devedor (arts. 736-740), sem suspensão da execução (art. 741). Se impugnação à intervenção ou substituição, partindo do executante, processa-se como impugnação do autor à legitimação do terceiro. O terceiro, em embargos de terceiro, pode impugnar a legitimação do executado, ou do executante. 10)FIADOR OU ABONADOR DA SOLVÊNCIA DO FIADOR, LEGITIMAção ATIVA. Além dos casos acima mencionados, há aqueles em que fiador, ou abonador da solvência do fiador, pode promover o andamento da execução iniciada contra o devedor, se esse, sem justa causa, demora a execução da sentença ou da ação executiva de outro título. A figura processual não é de sucessor lato sensu, mas de legitimado processual (capacidade processual). Não é parte, mas tem legitimidade (sem razão, AMILCAR DE CASTRO, Comentários, X, 29, que o diz parte). A sua situação é como a do inventariante, a do testamenteiro, a do tutor, a do curador. Na espécie, representante por força de lei, ex ratiofle legis; não, porém, parte de ofício. A legitimação processual do fiador ou do abonador, se o credor, sem justa causa, demora a execução contra o devedor, não opera substituição subjetiva, ainda que só processual. O afiançado, ou o fiador abonado, continua legitimado. 11)INsERção NAO EFETUADA DE SUCESSOR. Enquanto não se efetua a inserção do sucessor lato sensu, de que acima falamos (sub-rogado, sucessor universal ou singular), o sucedido continua na relação jurídica processual; tanto ela é relação de direito processual e independente da relação de direito material. Aquela se iniciou com a citação. A ação continua com o fiduciário, com o cedente, com o antecessor na sub-rogaçãO, posto que possa ter relevância a relação de direito material. A sentença tem efeitos contra o sucessor, se correu com o sucedido. 12)CEssIONÁRIO. Se foi transferido entre vivos, o título executivo, seja judicial, seja extrajudicial, passou a outrem a pretensão a executar. Não basta o uso do título executivo. É preciso que tenha havido a sucessão . O executado, o devedor, pode alegar ineficácia do título, por falta da transmissão, salvo se a própria sentença aludia à transmissão. Não se exige título novo; exige-se apenas a prova da sua qualidade, ao lado da prova do título vencedor, ou da certidão dele, ainda que provisória a execução. Trata-se, ai, de legitimação ad causam. 13)SuB-ROGADO. Nos casos de sub-rogação pessoal, Legal ou negocial, o sub-rogado pode promover a execução, ou lhe cabe nela prosseguir. O direito romano e o direito comum desconheceram a acepção atual, larguíssima, de sub-rogação de uma pessoa por outra. Evolveu o conceito com o direito canônico, facilitado pela filosofia que estava à sua base, chegando-se ao conceito de sub-rogação pessoal, pela mudança do sujeito do direito, tal como acontece com o pagamento com sub-rogação, ou em caso de dissolução de sociedade. Art. 568. São sujeitos passivos 1) 7) 8) na execução: i o devedor, reconhecido como tal no título executivo 2); ii o espólio, os herdeiros ou os sucessores do devedor3); lii o novo devedor, que assumiu, com o consentimento de credor, a obrigação resultante do título executivo5); IV o fiador judicial4); V o responsável tributário, assim definido na legislação própria6). 1)ATINGIMENTO DA AÇÃO EXECUTIVA. No art. 568 alude-se às pessoas a que a ação executiva atinge. Todas elas têm de ser citadas. Cumpre, porém, advertir-se que o bem ou bens penhorados, ou a cuja entrega está obrigado o devedor, podem estar gravados, e aí a eficácia apenas se refere ao interesse de alguém que é titular

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do direito real limitado, inclusive de garantia. Os interessados com tal situação não são partes. Têm de ser intimados. Parte é o credor com direito real de garantia que executa ou que se litisconsorcia na execução promovida por outrem. O art. 615, III, é explicito quanto aos titulares de direitos reais limitados que têm de ser interessados: credor pignoratício, hipotecário, o titular do direito de anticrese, ou de usufruto (ou de uso, ou de habitação). Sem a intimação, é ineficaz contra qualquer deles que não foi intimado. Cf. art. 698. 2)DEVEDOR E PROVA DE EFICÁCIA EXECUTIVA CONTRA ELE. A eficácia executiva de titulo contra o devedor ou resulta de ter ele sido condenado em sentença, seja ele o único vencido ou um dos lítisconsortes unitários, ou resulta de título executivo extrajudicial. A sentença pode ser executada contra os réus ou contra os réus litisconsortes unitários. O título executivo extrajudicial é o título a que a lei atribuiu a eficácia executiva, um tanto à semelhança da sentença. Cumpre que não se confunda com a comunidade de interesse, que faz o litisconsórcio, a comunidade jurídica no patrimônio, porém não no interesse. A dívida passiva que veio do decujo é executável na herança indivisa; não assim, a do herdeiro ou do legatário. A dívida do condômino, ou de qualquer comuneiro do bem (e. g., co-usufrutuário, co-usuário), só é executável na parte ideal, se se trata de comunhão pro indiviso, ou na parte divisa, se a espécie é de comunhão pro diviso. No caso de dívida de herdeiro, ou de legatário, o outro herdeiro ou legatário pode opor embargos de terceiro. Tal como ocorre sendo o caso de comunhão. Todo o capital ou patrimônio de sociedade não pode sofrer execução pela dívida de qualquer sócio, ou de todos os sócios. Somente pode ser executado por dívida da sociedade. A sociedade irregular pode sofrer execução em todo o seu capital pela sua dívida (pois que tem capacidade de ser parte) e pelas dívidas de todos os seus sócios, sendo alegável o limite da cota. Quem foi citado para a ação de cognição, como o cônjuge do executado, não está dispensado de o ser na execução. Nem sempre se entendeu assim, no velho direito, como, por exemplo, FRANCISCO DE CALDAS, MANUEL BARROSA e DIOGO GuEmIRo; porém MANUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, II, 167), criticando a FRANCISCO DE CALDAS, pôs termo ao senão da doutrina: e. g., a mulher, citada para a ação de cognição sobre bens imóveis, é preciso citar-se na execução (“si sententia lata est super re immobili, practici tenent citandam esse simul eius uxorem ad executionem”). Entenda-se o mesmo a propósito de todas as pessoas que tinham de ser citadas na ação de cognição. Na comunhão universal de bens, basta a sentença contra o vencido, se não se trata de condenação em ação real de imóveis; ou a sentença contra a mulher, salvo se, na espécie, não é responsável pelas dívidas a comunhão, ou o marido. Depois de dissolvida a comunhão matrimonial de bens, é preciso sentença contra ambos os cônjuges, ou contra cada um de per si (e. g., ação .executiva, proposta depois da condenação do cônjuge). A expressão “vencido” compreende o litisdenunciado pelo réu, se veio a juízo e assim se inseriu na relação jurídica (art. 75) e o nomeado à autoria (art. 65). O devedor pode ser chamado ao processo se a ação foi proposta contra o fiador (art. 77, 1) e o outro ou os outros fiadores, se só um foi citado (art. 77, II). Aí, o fiador ou os fiadores são partes, como acontece no caso de dois ou mais devedores solidários (art. 77, III). No caso de fiador do arrematante, ele assumiu o dever e a obrigação, diretamente, perante o Estado, ele é parte. O fiador judicial (art. 568, IV) é parte, por ser sujeito passivo da execução. Idem, quando o fiador é executado (art. 595) ou quando executa (art. 595, parágrafo único). No art. 819, II, fala-se da suspensão do arresto se o devedor deu fiador idôneo. Esse fiador passou a ser sujeito passivo da relação jurídica de direito material e de sujeito passivo da relação jurídica de direito processual. No Código Civil, art. 1.498, diz-se: “Quando o credor, sem justa causa, demorar a execução, iniciada contra o devedor, poderá o fiador ou o abonador (art. 1.482) promover-lhe o andamento”. No art. 1.482, o que se estatui é que, “se o fiador tiver quem lhe abone a solvência, ao abonador se aplicará o disposto, neste capítulo, sobre fiança”. O que se atribui ao fiador e ao próprio abonador é a legitimação ativa a promover o andamento do processo. Note-se bem: o andamento do processo. Portanto, o fiador ou o abonador não se faz parte ativa, como se já se pusesse na situação de credor, nem a de parte ativa, como se já se pusesse na situação de executado. É absurdo deixar-se de atender a que a legitimação foi apenas de incoação do processo. Não houve substituição. O que ocorreu foi legitimação processual a incoar o processo. Sem razão, também ALCIDES DE MENDONÇA LIMA (Comentários ao Código de Processo Civil, VI, 1, 113). 3)SUCESSORES E LEGITIMAÇÂO PASSIVA. A sucessão passiva suscita casos de executabiidade contra outra pessoa que aquela que consta, como vencida, do título executivo (sentença). Naturalmente, se foi feita habilitação (e. g., art. 1.055) ou inserção na relação jurídica processual independentemente de processo (e. g., arts. 1.060, I-V, e 1.061), não se tem de pensar no art. 568, pois o sucessor já era parte, e não sucessor da parte, e é o “vencido”. Caso a sentença não haja aludido a ele, deve o interessado apresentar embargos de declaração.

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O art. 568 supõe que não conste dos autos qualquer inclusão processual do sucessor. Advirta-se que o primeiro pressuposto necessário é, no tocante a herdeiros ou sucessores, que sejam herdeiros da pessoa condenada (do “vencido”). Herdeiros e sucessores de quem não foi condenado de maneira nenhuma podem ficar expostos à propositura, contra eles, da ação executiva. Somente pode ser executada a sentença contra o vencido, ou, se esse, pessoa física, faleceu, ou pessoa jurídica, se extinguiu, a ação pode ser contra os “seus” herdeiros ou contra os “seus” sucessores. Para a execução, não é preciso prévia habilitação ou qualquer procedimento para inserção. Não há relação jurídica processual entre o trânsito em julgado da sentença exequenda e a propositura da ação de execução de sentença. Os arts. 1.055-1.062 supõem lide pendente; regulam o incidente. 4)FIADoR E FIADOR JUDICIAL. Os dois conceitos aparecem no art. 568, IV (fiador judicial), e no art. 595, parágrafo único (“fiador”). O art. 568 exclui a execução da sentença contra o fiador que não seja judicial, pois só se refere ao fiador judicial. Afastou, na esteira das Ordenações Filipinas, Livro III, Título 92, pr. (fonte), e do Livro IV, Título 59, a litisconsorcialidade verdadeira do fiador na ação de execução se não foi litisconsorte na ação de condenação. O fiador, executado segundo o art. 568, pode nomear à penhora bens desembargados do devedor (art. 595; beneficium excussionis realts). 5)Novo DEVEDOR, POR TER ASsUMIDO, COM O CONSENTIMENTO DO CREDOR, A DÍVIDA. A sub-rogação pode ser em virtude de negócio jurídico unilateral. O devedor, ou quem representa, pode, em declaração unilateral receptícia de vontade, feita ao credor, ou a quem o represente, preestabelecer a sub-rogação. Por essa declaração, o devedor desvincula-se, como devedor, que é, e continuará de ser em relação a quem faça a prestação e solva a dívida. É requisito essencial a essa sub-rogação pessoal que tenha havido a recepção da declaração do devedor, pelo credor, no tocante ao adimplemento. A assunção de dívida alheia, ou, simplesmente, assunção de dívida, é o contrato pelo qual alguém assume divida em lugar de outrem, que era, até o momento, o devedor. O contrato é abstrato. Não importa se concluído foi o contrato entre o assumente e o credor, ou se entre aquele e o devedor, assentindo o credor. Se houve negócio jurídico causal, subjaz: não é parte do contrato de assunção de dívida. A invalidade do negócio jurídico de que resulta a relação jurídica subjacente não se contagia ao negócio jurídico da assunção de dívida. Cabe, todavia, a condictio ou a exceção se, em consequência do adimplemento, se enriquece ou se enriqueceria, injustificadamente, o credor. No art. 568, III, apenas se cogita da assunção de dívida, se o credor consentiu em que se extinguisse a dívida de quem foi devedor. Trata-se, ai, de novo devedor, de modo que há sub-rogação pessoal com a eliminação de quem antes era o devedor. A assunção, com o consentimento do credor, pode-lo’ser de uma, de duas ou de mais dívidas, bem como das dívidas de duas ou mais pessoas. 6)DEVEDOR DE TRIBUTOS. Os tributos compreendem os impostos, as taxas e as contribuições. Imposto é prestação pecuniária, que o Estado (União, Estado-membro, Distrito Federal, Território, Município) pode exigir, em virtude de competência de imposição que a Constituição distribui entre as unidades estatais. O dever de pagar imposto corresponde ao poder de império, que é efeito de regra jurídica de competência de imposição. Se a entidade competente decreta o imposto, é ele devido. O emprego do imposto não é ligado, em princípio, ao poder de decretar o imposto; de modo que o contribuinte nenhuma pretensão ou ação tem para a verificação da aplicação de imposto. Em princípio, os impostos são apenas subordinados a pressupostos de competência de imposição, materiais e formais, de respeito ao princípio de igualdade perante a lei (Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 153, § 1.~’) e o de inserção no orçamento (art. 153, § 29). O imposto não se confunde com a taxa. A taxa é preço de direito público. Preço do domínio, ou preço de uso. Preço atribuído, preço a que é forçado, unilateralmente, o contribuinte, pelo fato de serem postos à sua disposição a obra, a administração, ou o serviço público. Há taxas administrativas, como a que se paga por certos certificados, e taxas de utilização, como a que se paga por passagem em cabo de ligação entre dois montes. As taxas obrigatórias e gerais, queremos dizer as taxas à semelhança do imposto e não contraprestacionais, só se podem impor em virtude de lei. Se nenhuma prestação é dada pelo Estado, não pode haver taxa. Tratar-se-ia de imposto. Rigorosamente a dicotomia “taxa e imposto” é exaustiva. Todo tributo pecuniário ou é imposto ou é taxa. Nessa, o dever de tributo é correspectívo à prestação do Estado, considerada como divisível, ou a determinada atividade cio Estado. Terceira forma, não-pura de imposição pública, é a contribuição, que constitui a parte com que entra. A lei tem de indicar como contribuintes as pessoas mais interessadas, patrimonialmente, nas obras ou serviços (e. g.,

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moradores de uma rua, proprietários dos terrenos ou prédios marginais de um rio, trabalhadores de determinada zona palustre onde se fundou a caixa de seguros de doença). A contribuição seria terceira espécie, que se forma com o conceito de imposto ou com o de taxa, de modo que é tributo especial, uma vez que, com ele, se supõe ter havido, haver ou ir haver vantagem econômica particular do contribuinte, ou estar nele a causa de despesa ou majoração de despesas do Estado. O tributo, em que contribuinte não équem dele tira vantagem econômica particular, nem quem dá causa a despesa ou maj oração de despesa a que com ele se provê, não é, absolutamente, contribuição. Se o tributo é decretado para a abertura do canal, e pagam todos os cidadãos, inclusive quem não reside na região em que se vai fazer o canal, há, ai, imposto, e não contribuição. Se o tributo é decretado para as obras de eletrificação e recai sobre o consumo de energia elétrica, trata-se de taxa, e não de contribuição. Contribuição há, se se prevê que a eletrificação da estrada de ferro aumente o valor das terras e se tributa o incremento de valor. O sistema tributário não pode conter regras jurídicas de compras, ou de vendas, compulsórias, nem de qualquer ato desapropriativo, salvo se em execução de dívida de imposto, taxa ou contribuição legal. Qualquer prestação com parcelas da produção, ou do preço dos produtos, ao Estado, ou a alguma entidade estatal, parestatal, ou particular, somente pode resultar de acordo ou convenção entre os contribuintes (ou a entidade que os representa) e o Estado, ou, se lei o permite, entre aqueles e a entidade que recebe a prestação. No plano do direito privado, rege a lei dos contratos particulares. Qualquer imposição ou taxação ou exigência de contribuição tem de ter base em lei. Não se pode deixar a arbítrio de qualquer outro Poder a determinação do quanto. Quanz~o alguma regra jurídica fala de proporcionalidade, ou de correção monetária segundo critério certo, não delega poderes. Aliter, se atribui a outro Poder a competência para a fixação. (a) Nada importa para a verificação da competência tributária o nome que a entidade política dê ao tributo. Pode chamar taxa ao imposto, imposto à taxa, contribuição ou imposto especial ao tributo que não é especial. A classificação dos tributos é deixada à ciência, tanto mais quanto as Constituições mesmas aludem, ao enumerá-los, a conceitos formados historicamente. Volveremos, mais de espaço, em lugar mais próprio, a esse assunto do nome Se o Estado estabelece imposto sob nome de taxa, é como imposto que se há de tratar a tributação, e não como taxa; inclusive a observância dos princípios constitucionais tem- -lhe de ser exigida como imposto, pois que imposto é. Quando se tem de examinar alguma lei sobre imposto, ou taxa, não é o nome do imposto, ou de taxa, que há de servir para se verificar se os pressupostos para a incidência da regra jurídica estão satisfeitos, mas o suporte fáctico da regra jurídica; isto é, tem-se de Verificar (a) se há, nele, todos os elementos que, em composição, satisfazem o conceito do imposto, ou (b) se, pelos elementos que compõem o suporte fáctico, esse corresponde ao de regra jurídica sobre outro imposto, ou não corresponde a qualquer regra jurídica sobre imposição. Respectivamente ali, a regra jurídica, que se diz sobre o imposto a, descreve, como seu suporte fáctico, o que a Constituição previu; aqui, a regra jurídica, que se diz sobre o imposto a, descreve, como seu suporte fáctico, o que não corresponderia a esse imposto. Na última espécie, pode ser que o suporte fáctico não corresponda a nenhum conceito de imposto. Por isso mesmo, é de toda importância o conceito do imposto (e. g., imposto sobre importação, imposto de consumo, imposto de exportação, imposto de exportação de lubrificantes e de combustíveis líquidos, imposto sobre a propriedade territorial urbana, imposto sobre circulação de mercadorias territorial não-urbana, imposto sobre circulação de mercadorias, imposto de indústrias e profissões, imposto de licença). (b) Os conceitos que correspondem às diferentes espécies de impostos, se constam da Constituição, são conceitos de direito constitucional, e não de legislação ordinária. O legislador ordinário somente pode trabalhar com as variáveis que determinam o valor do imposto ou de algum dos elementos do suporte fáctico (e. g., tantos por cento, se a renda excede de x); não pode alterar, de modo nenhum, o conceito do imposto. Imposto de transmissão de propriedade imobiliária, como o imposto sobre circulação de mercadorias, éo que se considera tal na Constituição: a revelação do que ele é entra na classe das questões de interpretação da Constituição. Como todos os outros conceitos, inclusive quando ela emprega dois conceitos contidos num só (e. g., sobre propriedade territorial urbana, sobre propriedade territorial não -urbana). Tem-se de desenvolver, completamente, o pensamento que nela se exprimiu, porque ai está o conceito, de que a Constituição precisou, para a elaboração das regras jurídicas constitucionais sobre competência, ou sobre direitos fundamentais, ou outras regras jurídicas da Constituição. Sobre esses conceitos é que se edifica o direito tributário.. Uma das primeiras consequências e a de se ter de repelir a interpretação analógica (KARL F1iIEDRIcHs, Gruncizuge des Steuerrechts, 40). A decretação dos tributos pode ser contrária à Constituição; também pode ser contrária à Constituição a destinação deles. A destinação pode ser contrária à Constituição sem que o tenha sido a decretação. Se isso ocorre, o imposto decretado é cobrável e perceptível; a destinação especial é que se tem por conteúdo de regra

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jurídica nula, por inconstitucionalidade. Pode dar-se o caso, a respeito de serviços mistos (federais, estaduais; federais, municipais, estaduais; federais, estaduais ou municipais; estaduais, municipais), de precisar-se de determinado tributo, ou percentagem de tributo ou de renda tributária global. O caminho para a cooperação é, então, o acórdão federal-estadual, ou interestadual, ou federal- (estadual) -municipal. A propósito, frisamos (Parecer de 12 de junho de 1949, sobre imposto de estatística) que a técnica é a da convocação das entidades políticas interessadas para que estabeleçam convênio. Quem pode dispor pode convencionar. (c)Quem está adstrito ao imposto é devedor do imposto, independentemente do fato de ser aplicado, direta ou indiretamente, em seu proveito, ou da exatidão e exação com que, se tinha destinação, foi destinado, ou, dentro do seu destino, empregado. O que o contribuinte pode exigir é que a imposição seja de acordo com as regras jurídicas de competência , o principio de isonomia ou igualdade perante a lei e a inserção no orçamento. O contribuinte nada tem com a política financeira, que se seguiu para a decretação do imposto; nem com a política e a técnica da destinação. Se é inconstitucional a destinação, nem por isso se tem por inconstitucional a decretação. Mas o art. 153, § 31, pode ser invocável. A regra jurídica de tributação incide sobre suporte fáctico, como todas as regras jurídicas. Se ainda não existe suporte fáctico, a regra jurídica de tributação não incide; se não se pode compor tal suporte fáctico, nunca incidirá. O crédito do tributo (imposto ou taxa) nasce do fato jurídico, que se produz com a estrada do suporte fáctico no mundo jurídico. Assim, nascem o débito, a pretensão e a obrigação de pagar o tributo, a ação e as exceções. O direito tributário é apenas ramo do direito público; integra-se, como os outros, na Teoria Geral do Direito. No direito brasileiro, de regra, é preciso que se insira no orçamento a receita. Tal inserção não diz respeito ao suporte fáctico; concerne à eficácia da lei. De modo que, após a lei impositiva, ou de taxação, é preciso que se complete, pela inserção do imposto, ou da taxa, no orçamento, para que ela caia sobre o suporte fáctico. O que antes poderia compor suportes fácticos não se faz fato jurídico, porque ainda não se pode dar a incidência. Tem-se pretendido que a dívida fiscal somente nasce com o lançamento. Sem razão: tais escritores confundem a dívida e a pretensão com o exercício da pretensão. O lançamento e a sua comunicação são exigência da dívida. Com a mora, nasce a ação. 7)TERCEIRO E EXECUÇÕES REAIS. O terceiro proprietário do bem sujeito a direito real de garantia, inclusive hipoteca judiciária, não é terceiro, no sentido próprio: prestou garantia real a favor de outrem. A redução dos direitos reais de garantia a eficácia de natureza processual, e. g., extensão da ação executiva, é fantasia de catadores de novidades, ou, em certos juristas reacionários, o fato psíquico, já estudado, que também se encontra nos artistas de idéias políticas retrógradas que o compensam com a escapada das escolas artísticas extremamente revolucionárias. Nada mais perigoso do que se tentar a explicação das categorias do direito materiai pelo que acontecerá se for a juízo titular do direito: naturalmente, toda aplicação do direito há de conter muito do direito aplicado. Do excesso que levava a se eliminar, quase, o direito processual, alguns juristas, processualizando a toda a brida, tentaram o oposto: a eliminação do direito material. Mais grave ainda, porque o direito processual supõe que se não tenha dado a aplicação espontânea do direito que incidiu, ou não seja de esperar a aplicação espontânea do direito que há de incidir. Nas ações reais, demandado é alguém, dentre todos, que, pelas circunstâncias, é o interessado mais evidente na defesa, como o possuidor nas ações de reivindicação e de vindicação dos direitos reais, ou nas próprias ações executivas reais para extração do valor (ação pignoratícia, ação hipotecária). A relação jurídica processual estabelece-se entre o autor e o citado como um dos sujeitos passivos, porque a ação,ex hypothesi, é ação contra todos, por ser oriunda de relação jurídica a sujeito total (Tratado de Direito Privado, Tomos V,§ § 609, 610, XII, § 1.292, 1, XX, § § 2.426, 2.506, 2.510, e XXI, § § 2.600, 2.613 e 2.615). Dai a necessidade da citação edital para que haja a eficácia contra todos os interessados (cf. art. 231, 1). 8) LEGITIMAÇÂO PROCESSUAL E EFICÁCIA. Quanto à legitimação passiva para a ação de execução, as Ordenações Filipinas, Livro III, Título 25, § 10, diziam que a ação só se entendia “nas próprias pessoas”; porém MANUEL DE ALMEIDA E SousA (Tratado sobre as Execuções, 18, 19) ressalvava aqueles casos em que a sentença tem eficácia inter alios. Nas Segundas Linhas (1, 692-698), havia enumerado alguns casos, entre os quais o da sentença contra o herdeiro ou legatário gravado, que prejudica o fideicomisso (sem razão), a sentença contra o condômino, no caso de servidão indivisível, a sentença sobre o testamento contra o herdeiro, que prejudica aos legatários, e outras, que não entram na classe da necessitas defensionis, pois alguém processa em nome próprio sobre direitos e obrigações alheias (chamada por JosEF KOHLER substituição na legitimação, operada por força da lei, ou de certas autorizações para agir, e. g., se o adquirente do imóvel autoriza o alienante a pedir retificação do registro do imóvel no próprio nome).

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Art. 569. O credor 1) tem a faculdade de desistir2) de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas3). 1)CREDOR OU QUALQUER LIGITIMADO A PROPOsITURA DA AÇÃO EXEcUTIvA. O art. 569 apenas fala de “credor”, mas havemos de entender qualquer legitimado ativo, no plano do processo. Não se trata, aí, de renúncia à ação de direito material. Apenas se cogita da desistência da propositura da ação executiva, que pode voltar a ser proposta, ou de algum ou alguns atos processuais que foram praticados (ou pedidos) para o procedimento da execução. O autor da ação executiva pode desistir, por exemplo, da penhora dos bens a, ou dos bens a, b e c, ou a e x; ou, antes ou depois do juiz fazer a advertência do art. 599, II, retirar o que acontecera. Os próprios atos de liquidação da sentença podem ser objeto de desistência. Bem assim o emprego de uma espécie de execução, para que se proceda conforme outra espécies (e. g., em vez de entrega de coisa incerta, obrigação de fazer ou de não fazer, ou de coisa certa; ou vice-versa). Oart. 569, que é algo de novo no sistema jurídico, somente concerne às ações executivas, quer de títulos judiciais, quer de títulos extrajudiciais, e aos atos processuais nelas praticados como medidas executivas. Nas ações de processo cognoscitivo, a solução proibitiva não sofreu a execução do art. 569. Aliás, a interpretação que se está dando ao art. 264, no sentido de nada se poder alterar feita a citação, desatende a que pode haver outra citação, com novo prazo para a contestação. Devemos evitar apagamento à letra da lei. No art. 267, § 4~o, estatuiu-se: “Depois de decorrido o prazo para a resposta, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação”. (Advirta-se que dizer que “feita a citação” é defeso ao autor modificar o pedido seria negar-se ao autor fazer eficaz outra citação, com a ineficacização da primeira.) Quanto à desistência, pode o autor desistir da ação se o processo é cognoscitivo, sem consentimento do réu, até a resposta (art. 267, § 4.0), ou com o consentimento do réu, a qualquer tempo, até se proferir a sentença. Se a ação é executiva, não há limite temporal, quer para toda a execução, quer apenas para alguma ou algumas medidas executivas. Levou-se em consideração que a desístencia, em ação de execução, é sempre favorável ao réu, razão por que se lhe ressalvam o direito, a pretensão e a ação contra o exeqüente que lhe causara dano com a execução ou com à medida executiva. Não se há de confundir com a renúncia da ação, que é, no plano do direito material, a desistência da “ação”, no sentido do direito processual. Ali, há julgamento de mérito (arts. 269, V, 330, 1, e 456). Aqui, não: há sentença sem julgamento do mérito (art. 267, VIII). Em conseqtência, extingue-se o processo, e há proponibilidade, porque desistir não é renunciar, e tal extinção não obsta a que o autor proponha nova ação executiva, cuja petição só édespachável se há prova do pagamento ou do deposito das custas e dos honorários de advogado (arts. 268 e 598). Isso não afasta a indenizabilidade de prejuízos, como, e. g., se houve penhora, que obstou a venda de bem ou de bens, ou entrega de coisa certa, ou prática de ato, ou abstenção, por parte do devedor. Se a execução foi de título extrajudicial (art. 585), ~.tem-se de atender ao art. 267, § 4.% que faz dependente de ter decorrido o prazo para a resposta a desistência sem consentimento do réu? Aí, há o adiantamento de execução (cognição, digamos “condenação, mais execução, que é posta antes”). Se o devedor já opôs os embargos, houve outra ação (embargos do devedor são ação), seria e é de afastar-se que se extinga a contra-ação pela extinção da ação. Há a regra jurídica, que serve à analogia: a do art. 317, onde se diz que “a desistência da ação, ou a existência de qualquer causa que a extinga, não obsta ao prosseguimento da reconvenção”. Quanto às custas e honorários de advogado, bem como indenizações, está vinculado o exequente desistente e, se vai Propor outra ação executiva, incide, por sua generalidade, o~ art. 268, 2.~ parte. Se a execução foi de título judicial, já houve sentença a favor do credor, já foi condenado o devedor a pagar custas e honorários, salvo se beneficiado pela assistência judiciária gratuita (art. 19). Na execução do título judicial, como de título extrajudicial, não se admitem os embargos do devedor antes de seguro o juízo pela penhora na execução de quantia~ certa, ou pelo depósito na execução para entrega de coisa (art. 737), ou com juntada aos autos do mandado de imissão de posse, ou de busca e apreensão, na execução para entrega de coisa (arts. 738, III, e 625). Cf. art. 582, parágrafo único. Se o devedor satisfez a obrigação, extinta está a ação executiva (art. 794, 1). Não há desistência do que se extinguiu. Dá-se o mesmo se ocorre entre credor e devedor negócio jurídico, como o de transação, que importe remissão da dívida. (art. 794, II), ou se o credor renunciou ao crédito (art. 794, III). A desistência não vai até aí: apenas extingue o processo sem julgamento do mérito, sem descer ao direito material. Se, antes da oposição de embargos do devedor, o credor desiste da ação de execução, pode intentar outra ação, com prova das custas que o devedor tenha pago na execução. Se já houve os embargos do devedor, e,a desistência depende do consentimento dele? Seria de aplicar-se o art. 267, § 4~O, que exige o consentimento do demandado; mas tal consentimento não afastaria o prosseguimento dos embargos, se deles também o demandado embargante não desiste. Embargos do devedor são ação. 2)DESISTENCIA E CONTEUDO. O ato de desistência há de ser preciso e claro, porque está em causa interesse do autor da ação de execução. Se há dúvida quanto ao conteúdo, ou o juiz faz o desistente ser de maior

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precisão e clareza, ou interpreta o ato sem qualquer dilatação. A interpretação há de ser estrita. A desistência, na ação executiva, pode ser do todo, de modo que tudo se extingue sem julgamento do mérito. Da sentença homologatória pode ser exigida certidão, quer pelo devedor, quer pelo credor; mas tal certidão não é óbice à propositura de nova ação. Pode dar-se que tenha havido cumulação de execuções (art. 573), e a desistência só se referir a uma delas, ou a algumas delas, que a todos os títulos, sejam judiciais ou extrajudiciais, ou sejam judiciais e extra- judiciais. 3) MEDIDAS ExEcuTívAR. As medidas executivas, a que se refere o art. 569, são as medidas que têm por fim a execução do título judicial ou extrajudicial, como a sub-rogação (art. 673), a alienação em praça (art. 732 e parágrafo Único), a prisão do devedor (art. 733 e § § 1.0, 2.0 e 3.0), a pena pecuniária por dia de atraso no cumprimento (arts. 632, 642 e 644). A desistência de novas medidas não depende de consentimento, porque em verdade se retira algo que era coercivo para o devedor. Dá-se o mesmo com o arresto ou o sequestro, com cuja desistência pelo credor se beneficia o devedor. Todas as despesas são por conta do credor. Se os embargos do devedor são acolhidos de modo que fique provada a inoportunidade das medidas, a despeito de posterior desistência, há pretensão do devedor à indenização. Art. 570. O devedor 1) pode requerer ao juiz que mande citar o credor a receber em juízo o que lhe cabe conforme o título executivo judicial 2); neste caso, o devedor assume, no processo, posição idéntica à do exeqúente 3)• 1)EXECUÇÃO PROVOCADA PELO VENCIDO EM AÇÃO DE QUE RESULTOU A EFICACIA PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO EXECUTIVA. Em vez de aguardar que o vencedor proponha a ação executiva, pode o vencido propor ação para exequir. A execução passa a ser, precipitadamente, pelo próprio devedor vencido. Donde haver as três execuções: a) a execução voluntária, que pode ser fora de juízo, ou no juízo; b) a execução forçada pedida pelo devedor (art. 570) e c) a execução forçada, que tem de ser promovida pelo vencedor. A execução é dever do vencido; vencedor não executa. Quando se diz que vencedor executou o vencido, havemos de entender que o vencedor pediu ao Estado que fizesse o devedor executar, adimplir, ou forçá-lo a isso. Só o Estado executa, no sentido estrito de executar. Se o devedor não adimple (não executa) antes da sentença, nascem ao credor, que obteve a sentença favorável, a) a ação executiva do julgado (ação que vai ser de 5 de executividade), proveniente de 3 de executividade (se foi de 4, executa-se a sentença na mesma ação), e b) a ação para reclamar perdas e danos pela inexecução do julgado (disputas das perdas e danos pela inexecução da obrigação, se há elemento constitutivo na sentença de condenação). A extinção do contrato não é efeito do processo de execução, mas efeito de direito material. A solução do art. 570 já não corresponde à síntese que se formou após a tese da execução pelo réu, em virtude de seu interesse de se livrar da antiga execução pessoal, ou pelo autor, e a antítese da uniproponibilidade da actio ludicati, vedada, pois, a provocatio ad exequendum. A antítese foi a solução do direito luso-brasileiro ao tempo dos Estilos da Casa do Porto (n. 189 da sistematização de MANUEL BORGEs CARNEIRO): “. . . salvo havendo nela (na sentença) nulidade, no qual caso pode usar do ardil de o fazer novamente citar sobre o mesmo assunto de que manda a sentença e, opondo ele a exceção rei iuclicatae, documentada com a sentença, deduzir na réplica a matéria da nulidade”. A síntese poderia ter sido a) a provocação a executar, de estrutura cominatória, e foi o caminho que o Código de 1939 seguira; ou b) a dupla atribuição ao executando de pedir exibição da sentença, à custa do vencedor, e de suscitar, depois, o processo de execução; ou c) a promoção da execução diretamente, como interessado passivo, sendo a exibição simples incidente, o que foi a solução que foi criada pelo Código de 1973. A execução pelo devedor é voluntária, mas em ação executiva. Se o credor não promove a execução forçada, conforme o titulo executivo judicial, há algo de meio-termo entre a execução voluntária (antes da citação do devedor ou após citação do devedor, arts. 621, 631, 632, 642 e 652) e a execução forçada, pedida pelo credor. O elemento a mais, aí, éo exercício da pretensão à tutela jurídica. Atende a isso o Código quando, no art. 570, diz que o devedor “assume, no processo, posição idêntica à do exequente”. Ambos têm a pretensão à tutela jurídica, que é pré-processual, e recebem da lei processual a pretensão processual. Não se diga que a ação do art. 570 é mandamental, a despeito de se estatuir que o devedor pode pedir ao juiz que “mande citar o credor a receber em juízo o que lhe cabe conforme o título executivo judicial”. Há mandado de citação e, incluso, contenutístico, o mandado de vir receber; mas a ação é executiva, com eficácia mandamental imediata (4). Com o exercício da ação executiva do art. 570, o devedor evita todas as consequências do retardamento em adLmplir, como juros de mora, correção monetária (se é caso disso), do deterioramento da coisa devida, ou de

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destruição, ou de repercussão moral da sentença exequenda. (No direito anterior, dizia o Código de 1939, art. 886: “Se, dentro de trinta dias, contados da data em que se tornar exequível a sentença, o vencedor não lhe promover a liquidação ou a execução, o vencido poderá citá-lo para instaurar a execução no prazo de dez dias, sob pena de não responder pelos juros da mora e danos resultantes de força maior”. o Código de 1973 afastou tal cominatória, razão para não mais se pensar no que antes se passava.) 2)EXECUÇÃO PELO VENCIDO E SUA NATUREZA. Ao vencido incumbe executar aquilo a que foi condenado. Tem a obrigação de executar (no sentido do direito material), a pretensão à tutela jurídica e a pretensão processual. O vencedor tem a pretensão a que o Estado execute o vencido, a que corresponde a ação de execução de sentença. Alguns créditos têm apenas a ação de perdas e danos, ou a ação para se constituir alguma relação jurídica; outros não produzem actio iudicati, como se, na ação de condenação do pactum de mutuo accipiendo, se condena o réu a receber a soma emprestada. Por onde se vê que existem sentenças de condenação sem o efeito executivo do Livro II, porém elas têm outro efeito. A ação de execução de sentença, que tem o vencedor, o art. 570 faz corresponder, no tocante ao vencido, a ação de instauração da execução contra si mesmo, por parte do perdente da ação, a pretensão e a ação a ser executado: o vencido pode fazer citar o vencedor para instaurar a execução, mais pode, com o art. 570, propor a ação de execução contra o credor. Ele tem interesse em adimplir. Não há paridade perfeita com o depósito em consignação de pagamento (art. 890-900), nem com a ação de prestar contas, porque, na consignação ou solução da dívida e na prestação de contas, pedidas pelo obrigado, há execução voluntária da obrigação, ao passo que, na ação do art. 570, o vencido pede, em ação executiva, a “execução forçada”. A parecença mais resulta do duplo sentido da palavra “execução” na língua portuguesa: “adimplemento” e passagem do direito de dispor ao Estado (execução forçada). Na história e na ciência, os dois conceitos são insubstituíveis. Aquele é conceito de direito material; esse, de direito processual. A ação do art. 570 é ligada à pretensão do vencido, nascida no direito pré-processual, a que o vencedor receba a expropriação do direito de dispor. Tal a construção jurídica. A utilidade de tal ação era maior ao tempo das legislações locais (Distrito Federal, art. 962; Santa Catarina, art. 1.655; Pernambuco, art. 1.318, parágrafo único; São Paulo, art. 947; Espírito Santo, art. 855), quando não se usava a ação declaratória para se propor a mesma matéria, que, iniciada a execução pelo vencedor, só seria apreciada em embargos do devedor. Em todo caso, não se confunda a ação do art. 962 e parágrafo único do Código de Processo do Distrito Federal com a ação do art. 570 do Código de 1973 (cf. Código de 1939, art. 886): naquela, havia ação da mesma natureza que a ação do art. 916 (do obrigado a prestar contas) e a dos arts. 890-900 (de prestar contas) do Código de 1973, pois, àquele tempo, o vencido, que pedia a citação do vencedor tardio em executar, procedia ao depósito da importância da condenação (execução voluntária), acrescida da quantia suficiente para cobrir juros e custas futuras, ainda que tivesse de fazê-lo sob protesto; o que não acontece de modo algum com a ação do art. 570 do Código de 1973. Também a ação do art. 570 não se confunde com a construção dos Códigos de Processo de São Paulo, art. 947, e do Espírito Santo, art. 855, que era ação do vencido contra o vencedor com a matéria dos futuros embargos do devedor (verbis “oferecendo logo os embargos que tiver”). A ação de liquidação da sentença promovida pelo vencedor ou pelo vencido, que já estava na legislação anterior a 1939 (Códigos de Processo Civil de São Paulo, art. 964; do Espírito Santo, art. 872), era da mesma natureza que as ações dos arts. 916 e 890-900 do Código de Processo Civil de 1973, e não da natureza da ação do art. 570. A ação do art. 917, parágrafo único, do Código de 1939 não era ação inversa da ação de execução de sentença: era ação sobre o liquido. O Código de 1973 eliminou o texto do art. 917, paragrafo único, do Código de 1939 (“Quando a liquidação for promovida pelo executado, far-se-á o depósito da quantia liquidada, se o exeqUente se recusar a recebê-la”). Mas tal regra jurídica era de dispensar-se, porque não se fez, nos arts. 603- -611, qualquer limitação: autor, na ação de liquidação, é o credor ou o devedor, e embora no art. 611 se diga que, julgada a liquidação, a parte promoverá a execução, citando pessoalmente o devedor. A liquidação pode ser pedida pelo credor ou pelo devedor. Mais: pode-se pedir liquidação de sentença e liquidação de crédito ou de dívida, para que se possa exercer a tutela jurídica em ação executiva (arts. 566, 567 e 570). O juiz julga a liquidação. Se o exequente faz citar o devedor, promove a execução. Se o não faz, não se pode afastar a incidência do art. 570. O que é comum às ações dos arts. 914, 890-900 e 570 é o serem fundadas em pretensões a satisfazer, com o pius (satisfazer através da execução pelo Estado), que tem a ação do art. 570. Delas distingue-se a do art. 914, porém sem a inversão (desvio em ângulo, e. g., o fiador aciona para que o redor acione o devedor). A matéria que seria a de embargos tem ação própria. Não há embargos do vencido apresentados desde logo; a ação do art. 570 é ação executiva; e não de condenação, como a concebiam os Códigos de são Paulo (art. 947) e do Espírito Santo (art. 855), nem executiva só lato sensu, à semelhança da consignação que estava no Código de Processo Civil do Distrito Federal.

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3)DEFESA DO CREDOR DEMARDADO EM EXECUÇÃO. Se o credor não concorda com o recebimento, ou com o modo de prestar, uma vez que não corresponde, exatamente, àquilo que consta da sentença, ou por não ter havido a liquidação, surge o problema da defesa do credor. ~Como tem ele de defender-se: a) pela contestação, ou b) pelos embargos, que aí seriam do credor? A solução a) reduziria a ação executiva do art. 570 à ação de consignação em pagamento, o que seria como completo riscamento do art. 570: ao legislador teria bastado dizer que se aplicam, quanto à execução de sentenças, os arts. 890-900, ou, até, os arts. 901-906, concernentes à ação de depósito. O art. 570 foi explícito: se o devedor “requerer ao juiz que mande citar o credor a receber em juízo o que lhe cabe conforme o titulo executivo judicial”, “o devedor assume, no processo, posição idêntica à do exeqílente”, não a de demandado em ação de consignação em pagamento. A defesa do credor é em embargos à execução, aí, embargos do credor (conseqUência da “posição idêntica à do exeqúente”, que aí é a do devedor). Em. nenhum lugar o Código de 1973, tratando de execução, fez remissão ao Livro IV (Dos procedimentos especiais). Temos de dar solução de iure condito, e não de jure condendo. ~Que é que pode alegar nos embargos o credor? Primeiramente, tratando-se de sentença trânsita em julgado, pode o credor alegar que, apesar de ser vencedor, não foi ele o autor da ação em processo de conhecimento, ilegitimidade das partes (dele, credor, ou do devedor), cumulação indevida de execuções, deficiência da execução ou nulidade da ação executiva do devedor, qualquer causa impeditiva, modificativa (e. g., falta de cômputo de juros ou de correção monetária), ou mesmo extintiva da obrigação (ninguém tem dever de receber o que não se lhe deve, por já ter havido, por exemplo, pagamento total ou parcial, novação, compensação, transação ou prescrição superveniente à sentença), incompetência do juízo da execução, ou suspeição ou impedimento do juiz (cf. art. 741). Se o título executivo é extrajudicial (ou mesmo se não e executivo tal título) e o credor não propôs ação de condenação, ou outra, que tenha 4 ou 3 de executividade, ou o devedor tenta prestar voluntariamente o que deve, ou, se a divida é ilíquida, propõe a ação de liquidação e, depois, a de consignação em pagamento (arts. 890-900), ou, se liquida, desde logo a ação de consignação em pagamento. Uma vez que o devedor condenado em sentença propõe a ação executiva ou faz o depósito, ou na citação diz o dia em que, em juízo, prestará, isto é, o momento em que o credor tem à sua disposição o que lhe é devido, não fica o devedor vinculado a juros, nem a correção monetária, nem a eventuais multas, ou perdas e danos. O credor pode alegar e provar que o depósito ou o que lhe ia ser posto à disposição não corresponde ao que se havia de prestar conforme as conclusões da sentença (art. 581). O juiz tem de proceder como procederia se a ação executiva tivesse sido proposta pelo credor. Tratando-se de entrega ou depósito de coisa, lavra-se o auto e dá-se por finda a execução, salvo se tiver de prosseguir para o pagamento de frutos e ressarcimentos de perdas e danos (art. 624). Se houve benfeitorias indenizáveis, feitas no bem. pelo devedor, a liquidação prévia é obrigatória (art. 628, 1.a parte). Se há saldo a favor do devedor, tem o credor de depositá-lo, ao receber a coisa, ou ao retirá-la do depósito (art. 628, 2.R parte). Se se trata de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, ou o devedor já a deposita e a entrega individualizada, se lhe cabe a escolha, indicando-a na petição inicial, ou, se a escolha toca ao credor, a citação do credor, que não escolheu, é para que escolha antes de qualquer depósito a tempo de ser feito, com o prazo de quarenta e oito horas para a impugnação (arts. 629 e 630). Se o credor não escolheu, o o direito de escolha passa ao devedor (analogia com o .art. 571, § 1.0). Tratando-se de obrigação de fazer, o credor é citado para o cumprimento da sentença pelo devedor, no prazo que o juiz assinar, se outro não foi determinado (art. 632>. Nada obsta a que do mandado de citação conste o nome do terceiro que há de executar, se a prestação pode ser feita por terceiro (art. 634). Condenado a desfazimento de algum ato, pode o devedor propor a ação do art. 570, assinando o juiz o prazo para isso (art. 642). Se o credor obsta ao cumprimento da obrigação, pode o devedor pedir que o credor a) seja condenado a pena pecuniária, por atraso no cumprimento, contado o prazo da data estabelecida pelo juiz, se também há interesse do devedor no adimplemento (por analogia, arts. 644 e 645), ou b) que julgue extinta a obrigação. Se a dívida é de quantia determinada, há o depósito ou recebimento direto pelo credor, no prazo de vinte e quatro horas (art. 652), pois que o devedor assume no processo a posição de exequente. Art. 571. Nas obrigações alterna tivas 1) ~) 12), quando a escolha2’) ~) 7) couber ao devedor, este será citado para exercer a opção4) e realizar 3) a prestação dentro de dez (10) dias, se outro prazo não lhe foi determinado em lei, no contrato, ou na sentença 5)~ § 19. Devolver-se-á ao credor a opção, se o devedor não a exercitou no prazo marcado8). § 2.0. Se a escolha 13) couber ao credor, este a indicará na petição inicial da execução10) 11).

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1)CONDENAÇÃO ALTERNATIVA. O art. 571 refere-se à obrigação alternativa, isto é, quando existem duas ou mais prestações, uma das quais deva ser executada. Toda obrigação é alternativa quando é a vontade do credor, ou a do devedor, ou de terceiro, que decide qual das duas ou mais prestações deve ser cumprida. Se já se está a executar a sentença de condenação, qual a que deve ser “executada” (stricto sensu). Ficam excluídos aqueles casos em que não há alternação das prestações, decidível pela escolha, e sim pelo advento de alguma circunstância. Noutros termos: quando um objeto deveria ser prestado e, se o não foi, outro deve substitui-lo (e. g., perdas e danos, valor da coisa entregue ao reivindicante). Nesses casos, o art. 571 não incide. Não se trata de obrigação condicional porque não há incerteza quanto à questão de se saber se alguma coisa é devida, ou se alguém deve, e sim qual das duas prestações deve ser executada (lato sensu). A indeterminação concerne ao conteúdo; há mais de um objeto que o pode determinar. A prestação é como cápsula que um desses objetos vai encher. Cada. uru dos objetos pode ser indicado individualmente (“coisa certa”) ou pelo gênero (“quantia certa”, “em espécie”). Nesse caso, se ambos os objetos estão determinados pelo gênero, há o contrato com o direito mesmo do gênero que se há de escolher. 2) DIREITO DE ESCOLHA. É o direito material (não só o direito civil) que responde a quem toca a escolha. Se toca ao devedor, o art. 571 rege a forma da execução: em vez da citação para solver em vinte e quatro horas, ou em dez dias, ou outro prazo (arts. 652, 621 e 632), cita-se para cumprir a prestação (solver conforme a que se escolheu). Com isso, fica determinado o objeto e se prossegue, atendendo-se ao objeto escolhido e não prestado, isto é, de acordo com os arts. 730-732, 735, 621-628, 632-638, 639-641, ou se ultima a execução pela entrega. Se o devedor não se manifesta no prazo legal, que é, de regra, o de dez dias, ao credor passa a escolha, de modo que escolha e prosseguimento são um só ato, expedindo-se o mandado de penhora (art. 652), ou de imissão (art. 625), ou o de busca e apreensão (art. 625, in tine), ou requerendo o credor o pagamento da multa ou das perdas e danos (art. 633), ou as providências dos arts. 633-636,ou a condenação do art. 638, parágrafo único. No caso do art. 641, há força executiva de sentença, e não só efeito executivo (execução da sentença: a citação do art. 571 é de mister, porque a condenação foi alternativa; é determinado o objeto, segundo o art. 571; a declaração de vontade é tida como emitida, ao passar em julgado a sentença de condenação. Serviu a citação apenas à escolha pelo devedor. Se esse não escolheu, basta que o credor comunique a sua escolha ao juiz, que fará prosseguir o processo de execução. Não se trata, porém, de efeito da sentença de condenação, menos ainda da resolução judicial de encerramento da execução; mas de força da sentença de condenação-execução. Se todos os objetos da obrigação alternativa são declarações de vontade, a execução da sentença é supérflua: art. 571 e seus § § 1.0 e 2.~ aplicam-se como processo de determinação do objeto. 3)PRAZo ESCOLHA E EXECUÇÃO DA SENTENÇA. Se o contrato deu outro prazo para a escolha, ou se consta outro, que não o de dez dias, na sentença dispensado está o prazo de dez dias, que é processual, como os prazos dos arts. 652, 621 e 632, mas o Código de 1973, art. 571, foi explícito na ressalva. Tal ressalva não existia no Código de 1939. Se o contrato tinha prazo, ou já a sentença de condenação o apreciou ou o marcou, e a intimação inicia-lhe o curso. Se a lei de direito material o determina, da intimação da sentença é que se há de contar. Findos tais prazos, é que se pode pensar em execução da sentença. A citação é para “escolher e cumprir”, uno actu. O executado, citado para cumprir, escolhe “realmente”, e, pois, cumpre. Se se interpretasse diferentemente o art. 571, ter-se-ia de proceder a nova citação para pagar (cumprir), ou sofrer execução, e, no entanto, segundo o princípio de economia e as palavras do art. 571 (verbis ‘‘exercer a opção e realizar a prestação’’) , não é isso preciso. Se negócio jurídico, lei ou sentença não disse quem há de escolher, a legitimação é do devedor. É princípio de direito material que, se nada foi estabelecido, é ao devedor que cabe a escolha. Advirta-se que a escolha pode ser, desde logo, pelo devedor, se vai prestar, ou se propõe a ação executiva do art. 570, como pode ser resultante de interpelação promovida pelo credor se o devedor tem de escolher algum tempo antes do vencimento da dívida (cf. arts. 867-873). 4)NATUREZA DA EScOLHA. A escolha, no art. 571 e seus § § 1.0 e 2.0, é declaração unilateral de vontade, sem dependência, portanto, de aceitação, ainda se feita pelo devedor (contra B. W’INDsÇHEID, Lehrbuch, II, 27 5.), repelida a velha concepção da declaração unilateral do devedor dependente da aceitação do credor. Trata-se de direito formativo, pelo qual se altera o negócio jurídico, elemento do crédito ou da divida, e transferível aos cessionários e sub-rogados. Depende só de recepção; porém, no caso do art. 571, a escolha e a execução podem ser uno actu, e assim as concebeu a lei processual. Veja Tratado de Direito Privado, Tomo XXII § § 2.680, 2.703-2.707. A escolha pode ser tácita; e. g., por parte do credor, se lhe incumbe optar, e a citação mesma, pedida por ele, implica escolha. O devedor é citado para optar (escolher) e prestar. Ou opta e presta, ou opta e não presta, ou nem opta nem

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presta. Se tivesse prestado, implicitamente teria optado. Se não optou, a opção passa ao credor. Se optou e não prestou, está citado para prestar, e a ação executiva prossegue porque já se angularizou a relação jurídica processual. Se a sentença não determinou o valor ou não individuou o objeto da condenação (art. 603), tem de anteceder à aplicação do art. 571 a liquidação da sentença, que é ação. Somente após o julgamento da liquidação pode o credor fazer citar o devedor para escolher e executar. ~Como há de manifestar a sua vontade o devedor, ao ter de escolher? ~No momento da citação pode ele dizer o que escolhe, verbalmente? Não. Seria perigoso atribuir-se a oficial de justiça tal informação, sem que haja qualquer documento escrito. Ou o devedor envia ao juiz a sua declaração escrita de vontade, ou a faz perante o escrivão, para que lavre termo nos autos. Pode ser tácita se atendeu à realização da prestação. Se ele não se manifestou a tempo, ou não adimpliu no prazo (o que seria escolher e prestar), ao credor passou o direito de opção. O devedor perdeu o direito, e outro direito nasceu ao credor, razão para se não falar em devolução (nada, aí, como no art. 657, se devolve, onde a expressão foi infeliz). O exercício da escolha pelo devedor de modo nenhum constitui renúncia a alegações contrárias à execução. Por isso mesmo permanece a sua legitimação à oposição de embargos do devedor, mesmo se a alegação concerne a não ser tal exigência da escolha elemento necessário à exigibilidade do título (e. g., não havia alternatividade), ou, se extrajudicial, ser matéria de cognição (arts. 741, 1, e 745). Se o devedor não escolheu, o credor pode escolher, em petição ao juiz ou em termo dos autos, e se entende renunciar ao direito de escolha isso de modo nenhum obriga o devedor, que perdera o direito, a escolher. 5)OBRIGAÇÕES RECÍPROCAS ALTERNATIVAMENTE LIGADAS. O Código não previu o caso de obrigações recíprocas alternativamente ligadas (A vende a B a casa a por oitocentos mil cruzeiros ou a casa b por seiscentos mil). É um dos problemas, não recentes, de interpretação das leis. L. ENNECCERUS (Lehrbuch, II, 74) entendia que cada parte somente pode executar de maneira que deixe a escolha à outra parte. Contra isso, tem-se dito que o “outro devedor” também édevedor. Mas a verdade é que figura como credor, na relação juridica processual da execução. 6) ESCOLHA POR TERCEIRO. Se em negócio jurídico ou em lei foi estabelecido que a escolha cabe a terceiro, cujo nome foi apontado, por analogia tem-se de intimar o terceiro quando se peça a citação do devedor. Se não foi previsto o prazo em negócio jurídico, nem se deixou ao juiz, tem-se de entender que o prazo há de ser conforme o art. 571. A escolha prevista pode ser por dois ou mais terceiros. Se os escolhedores têm de ser dois ou mais terceiros,. tem-se de entender que regem os mesmos princípios concernentes aos devedores e aos credores. Não se há de invocar o art. 1.123 do Código Civil, porque esse nada tem com as obrigações alternativas. Nem se diga que a obrigação passa. a ser condicional se terceiro é que escolhe ou terceiros é que escolhem (sem razão, Jos~ ALBERTO DOS REIS, Processo de Execução, 2.~ ed., 453; e EuRIco LOPES CARDosO, Manual da Ação Executiva, 3.~ ed., 212). Se o terceiro ou os terceiros não escolhem, a opção passa ao devedor, respeitados o art. 571 e o § 1.0. 7) LITISCONSORCIO . Pode acontecer que a escolha caiba a um ou a alguns dos devedores litisconsortes, ou a todos. Ai não há terceiro, porque a litisconsorcialidade fez a todos partes na ação executiva. A escolha por um ou por alguns é eficaz para todos, bem assim a omissão no escolher. Se a escolha era de um ou de alguns, os outros não podem escolher. A falta de observância do que estava previsto leva à consequência de passar ao credor a escolha. No caso de litisconsórcio sem se ter previsto qual o litisconsorte ou quais litisconsortes que teriam de escolher, a solução é a de se considerar necessária a declaração de todos, o acordo. Se um escolheu e contra não se manifestaram os outros, tem-se de ter por implicito o acordo entre todos. Se há divergência, com empate, nada feito: ao credor passa o direito de escolha. A escolha pela maioria (= pelos devedores a que corresponda metade + x das dívidas) há de ser tratada como se não tivesse havido divergência. Não devemos dar primazia ao número de devedores, mas sim ao importe das dívidas. Também não se há de acolher a solução de se deixar ao juiz a escolha, se há divergência. Salvo, entendamos, se, no negócio jurídico entre credor e devedores, foi prevista essa função do juiz para evitar empate ou simples divergência. Se a escolha cabia a um ou a alguns dos credores passa-se o mesmo: ou há a escolha tal como se previu, ou não há. Todavia, havemos de entender que, se o credor que tinha de escolher, ou os credores que tenham de escolher, se recusam, ‘temos, por analogia, de considerar transferida ao devedor a ~escolha, se esse, ao ser citado, verifica que os credores não ~optaram. Sempre que a escolha há de ser por dois ou mais credores, e pela maioria (de valor), a escolha por um ou alguns .sem divergência tem-se por eficaz.

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8)PASSAGEM DO DIREITO DE ESCOLHA AO EXEQUENTE. O executando, no art. 571, foi citado. Se não optou, não cumpriu a prestação, caso em que cumprir seria optar ou optar e executar; a escolha passa ao exequente, que prosseque na execução, escolhendo. O art. 571 e § 1.0 excluem a regra jurídica do direito comum de poder o credor executar ‘um objeto, se não lhe cabe a escolha, ficando ao devedor a faculdade de se liberar prestando o outro objeto. Vale a pena dar-se atenção ao alcance da solução, comparando-a com outras: a) o credor teria de propor ação para a escolha e ação para execução, solução que parece ter sido a de Huoo OsRE, em nota ao art. 72 do Código suíço das Obrigações; b) se o devedor não escolhe, teria o credor de propor a ação de perdas e danos (HEEMANN BECKER, ao mesmo art. 72 do Código suíço das Obrigações); c) o credor propõe a ação segundo entende e o devedor pode liberar-se (Código Civil alemão, § 264, í.a alínea); d) o credor cita o devedor para que cumpra a prestação que esse escolher: se o devedor cumpre, tollitur quaestio; se não cumpre, ao credor fica a negativa do devedor, que não cumpriu, tendo-se respeitado a escolha, e há prosseguimento da execução. O art. 571 e § 1.0 já são execução, contra as soluções das letras a) e b); não adiantam a execução além da citação com a alternativa processual, contra a letra c). A solução brasileira é a melhor, porque é posta no terreno processual e com a tradição ~‘ os prazos processuais para cumprir. 9)OBRIGAÇÕES COM ALTERNATIVIDADE DE OBJETO. Se há duas obrigações, com alternatividade de objeto para elas,o devedor que cumpre uma, e não a outra, somente se sujeita à aplicação do art. 571 quanto àquela que não cumpriu. No mesmo sentido, a 7ª~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 20 de dezembro de 1950, e a 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 5 de junho de 1951 (R. F., 138, 83). Veja Tratado de Direito Privado, Tomo XXII, § 2.703, 3. O devedor não pode apenas escolher. O art. 571 e § 1ª não regulam interpelação ou notificação; são meio único de execução. Tem o devedor de cumprir. Os prazos dos arts. 652 e 632 são inaplicáveis, sempre que se trate de obrigação alternativa à escolha do devedor. A lei adotou meio-termo, critério aproximado entre eles. O prazo coincide com o do art. 621. 10)ALTERNATIVIDADE E ESCOLHA PELO CREDOR. Se há alternatividade a favor do credor, a declaração unilateral de vontade, que constitui exercício do direito formativo modificativo, e a execução mesma são uno actu. Com a citação, o citado recebe a declaração e a alternativa processual “solver ou sofrer execução” (arts. 621, 632 e 652). Não é preciso que se repita a citação. A regra de que o credor não pode exercer ação antes de haver escolhido (ANDREAS VON TUHR, Der Alígemeine Teil, 1, 286) é de direito material; mas, no terreno do direito processual, desde que se tem o “solva, ou sofra execução”, seria supérfluo. Salvo se o ingresso na execução não tornasse definitiva a escolha (e. g., se o devedor “também” tem de escolher; cp. KON~R&I~ HELLWIG, Anspruch und Klagrecht, 110). A regra jurídica não é nova no direito processual brasileiro e podia ser redigida como está, sem quebra dos princípios. Na execução por coisa certa, ou em espécie, há o prazo de dez dias, que corre depois da citação, com a declaração unilateral de vontade do credor e a alternativa processual (solver ou sofrer a execução). Na execução por quantia certa, o de vinte e quatro horas, sendo que a ciência da citação contém a recepção da declaração unilateral de vontade e a cognição de alternativa processual. Nas obrigações de fazer ou de não fazer, a construção ainda é mais simples, porque fixa o prazo o juiz. Em todos esses casos, supõe-se ser suficiente, e não só necessária, a deliberação do credor exequente. 11)PRAZO PARA ESCOLHA PELO CREDOR, NA ALTERNATIVA. A alternativa a favor do credor não lhe dá o prazo do art. 571; se a obrigação é de coisa certa, ou de gênero, ou de outra natureza, a citação é com o prazo que lhe corresponde, segundo a lei processual. Esse é ponto a que se tem de prestar toda atenção. A sua declaração unilateral de vontade e a sua comunicação de vontade de executar são uno actu, e pode ser tácita aquela. Se a alternativa se refere a prestações que correspondem a diferentes espécies de execução (prestação de coisa, prestação de fazer ou de não fazer, prestação de quantia certa e líquida), o credor, que escolhe, tem de atender à espécie de execução. Se é o devedor que tem de escolher e ocorre o que acima se disse, a citação do devedor é para optar e cumprir, mas o prazo é sempre o do art. 571 (“dentro em dez dias, se outro prazo não lhe for determinado em lei, no contrato ou na sentença”). Tal prazo é para escolher e realizar a prestação, de modo que atender-se, quanto ao devedor,

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ao prazo da prestação escolhida seria apagar-se o prazo para escolher. A escolha vem à frente para o prazo, o que não ocorre com a escolha pelo credor, porque esse não tem de prestar: só escolhe para que o devedor cumpra a obrigação. Ou o credor é o legitimado à escolha e na petição inicial já indica a prestação escolhida; ou foi feito legitimado por se ter omitido o devedor (art. 571, § 1.0), caso em que, extinto o prazo para o devedor, ou manifestada por esse a vontade de não escolher, desde logo tem o credor de indicar o que escolhe. Se a obrigação é substituível por outra, como se o contrato diz “entregar o animal a, se estiver vivo, ou se não desapareceu, ou o valor b, se morreu ou desapareceu”, não há alternatividade das prestações; o que há é substituição. Mas há alternativa se o devedor se vinculou a prestar um dos apartamentos do edifício da rua tal, número tal. Se há dois ou mais credores, sem se ter estabelecido qual deles ou quais deles escolheriam, o litisconsórcio unitário tem de ser tratado com o princípio de igualdade: ou a) todos escolhem, ou a escolha foi por maioria (dos valores, não do número de pessoas com legitimação ativa); ou b) um escolhe ou alguns escolhem, sem que, na petição inicial, se haja manifestado contra o que deixara de escolher, ou que se hajam manifestado contra os que deixaram de escolher, no momento de entrar ou de entrarem no processo; ou c) a divergência ocorreu, sem a maioria de que falamos. No caso c) a solução, por analogia, há de ser a de passar ao devedor a opção. 12)SOLUÇÃO PELA DETERMINAÇÃO. Com a escolha, a determinação sucede à indeterminagem. A alternatividade desaparece. Um só objeto é devido. Com a solução, nada mais se deve. Se se afirma que se prestou a porque não se sabia que era de prestar-se a ou b), não houve escolha. A solução da dívida, que deveria ter sido com a concentração implícita, não a continha. Antes do pagamento, ou com ele, teria de haver a escolha: o erro consistiu em se prestar a, como se não pudesse ser prestado b. Não se trata de erro invalidante, porque o pagamento é ato-fato jurídico; mas sim de erro que gera a condictio. O que fora prestado não fora escolhido. Se o devedor tem, ou não, o dever de exibir os objetos a que se refere o direito de eleição, depende da vontade dos figurantes e das circunstâncias. Na dúvida, procura-se a presumível vontade deles, ou dele; e tem-se por estabelecido o dever de exibição, se se trata de coisas certas, que o titular do direito de escolha não conhece e sem cujo conhecimento não poderia fundamentar preferência (cf. L. ENNECCERU5, Lehrbuch, II, 31.a~35.a ed., 74). Se, em vez de só duas prestações estarem em alternativa (ou a ou b), estão três (ou a ou b ou c), ou mais, a impossibilidade originária quanto a uma ou duas, restando outras, não exclui a alternatividade da obrigação. Se as prestações se tornam impossíveis, ou se uma já o era ou algumas já o eram e a outra se torna ou as outras se tornam, sem culpa do devedor ou do credor, extingue-se a obrigação. Mas, se a primeira se tornou impossível por culpa do devedor e a segunda fortuitamente, o devedor continua responsável pela indenização relativa à primeira (FEODOR KLEINEIDAM, Unmoglichkeit und Unvermógen, 103), se a escolha competia ao credor ou não. Se a impossibilidade de uma das prestações é só em parte: ou a escolha é do credor e pode ele escolher o que resta da prestação parcialmente impossibilitada, ou a escolha é do devedor e pode esse eleger esse resto (WILHELM KíscH, Die Wirkung der nachtrúiglich eintretenden Unmõglichkeit der Erfullung, 237; FRIEDRICH SCHOLLMEYER, Recht der Schuldverhaltnisse, 71; contra: FiiíTz LITTEN, Die Wahlschuld, 208; HEINRICE TITzE, Die Unmôglichkeit der Leistung, 197 s.), salvo se, com a impossibilitação parcial, a prestação toda ficou imprestável (= sem interesse para o credor). Se o devedor conhecia a impossibilidade de uma das prestações, tem de indenizar o interesse negativo, se a escolha, tocava ao credor, se não quer a outra prestação. Se a escolha tocava ao devedor, a ele caberia escolher e poderia escolher a que subsiste. Se a outra prestação se torna, supervenientemente, impossível, a indenização é que pode acudir ao credor, valor da última que se impossibilitou mais perdas e danos. Quanto às impossibilidades supervenientes, há: a) a impossibilidade somente quanto a uma das prestações, cabendo a escolha ao devedor; b) a impossibilidade quanto às duas ou mais, se houve culpa do devedor; c) a impossibilidade quanto às duas ou mais, sem culpa do devedor; d) a impossibilidade somente quanto a uma das prestações, com culpa do devedor, cabendo a escolha ao credor; ou e) sem culpa do devedor. A distinção entre culpa e sem culpa interessa em todas as espécies, exceto em a). Se a culpa da impossibilidade de uma das prestações foi do credor, que tinha a escolha, pode ele escolher a prestação impossibilitada por ele e assim se libera da indenização pelo ato ilícito. Se a escolha tocava ao devedor, a impossibilitação de uma das prestações pelo credor, que não podia escolher, dá ao devedor o poder de escolher a que foi impossibilitada pelo credor ou de fazer a outra prestação e exigir do credor a indenização das perdas e danos. 13) AçÃo PARA ESCOLHA. Se o credor não propõe a ação de execução, nem escolhe, nenhum dos objetos “prestáveis” é a “coisa devida”. Não se pode exigir do devedor que consigne os dois. Tem ele a interpelação, com prazo marcado na petição como cominação (arts. 867-873). Nos casos em que o credor é obrigado a

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escolher, a ação do devedor, para que o credor escolha, pode ser concebida como ação com pedido alternativo “escolher ou pagar perdas e danos”, oriundos da mora no escolher. (A mora no escolher é menos rara e não se confunde com a infração do dever de receber.) Veja Tratado de Direito Privado, Tomo XXII, § § 2.703, 3, e 2.705, 1. Art. 572. Quando o juiz decidir relação jurídica sujeita ~) 2) a condição ou termo 4), o credor não poderá executar a sentença sem provar que se realizou a condição ou que ocorreu o termo3). 1)EXECUTABILIDADE E DETERMINAÇÕES INEXAS. Ainda estamos em terreno de interpretação da sentença, como ocorre ao § 751 da Ordenação Processual Civil alemã. Faltava, evidentemente, ao art. 893 do Código de 1939, um “só” entre “execução” e “poderá”, para se ajustar à verdade e à sua fonte. O Código de 1973 teve melhor redação. A execução supõe que a prestação já seja exigível. O art. 572 implica que ainda não haja ocorrido, ao ser publicada a sentença, a condição, ou atingido o termo, nem que tenha isso, ou aquilo, acontecido no momento em que se pensa em executar. Espera-se o advento da condição, ou termo, para que se possa executar a sentença. Tem-se de alegar e provar o advento. 2)DIREITOS FORMATIVOS GERADORES. O art. 572 não atinge os direitos formativos geradores que tenham de ser exercidos com o pedido de execução. 3) TERMOS E CONDIÇÕES. Os termos e as condições referem-se à eficácia; uns e outros determinam quando há de começar ou quando há de acabar algum efeito, ou quando hão de começar ou de acabar alguns ou todos os efeitos dos atos jurídicos, menos um ou mais. Somente atos jurídicos stricto sensu e negócios jurídicos são suscetíveis de termos e de condições. Não se atermam, nem se condicionam fatos jurídicos stricto sensu, nem atos ilícitos, nem atos-fatos jurídicos, lícitos ou ilícitos. Termos e condições são determinações necessariamente insertas nos atos jurídicos; são neles, in nexam, porque de dentro deles lhes traçam, no tempo, limite de eficácia; não se ligam a eles, não se lhes anexam; são, por isso, ditas determinações mexas. O nexo é interno, e não externo. Termos e condições determinam no tempo. Se se pudesse conceber o termo ou a condição que concernisse à existência do ato jurídico, o que praticasse o ato jurídico poderia estabelecer: “no dia tal, ou se ocorrer o fato tal, a promessa de recompensa, que agora faço, não terá sido feita”; ou “determinamos que, ao morrer A, ou se A se casar com E, a compra-e-venda, que neste ato concluímos, não terá sido”. O direito não suporta tal invasão no tempo e no mundo dos fatos, para se ir ao passado e tornar não sido o que foi. Se algum manifestante de vontade diz isso, há-se de entender que apenas se referiu ao plano da eficácia: “no dia tal, ou se ocorrer o fato tal, a promessa de recompensa, que agora faço, não terá qualquer eficácia” (= “ficará totalmente sem efeitos”); “determinamos que, ao morrer A, ou se A se casar com B, a compra-e-venda, que neste ato concluímos, não terá eficácia~~ (= “ficará sem efeito”). Assim, em toda a exposição que se segue somente aludiremos ao plano da eficácia. Erraríamos se cogitássemos de outro. Há pressupostos ou requisitos para a irradiação do efeito que não são pressupostos (requisitos, elementos) do suporte fáctico. Portanto, já ocorreu a entrada desse no mundo juridilco, como fato jurídico; apenas falta algum elemento fáctico, para que, fora de qualquer referência à existência (ou existência e validade) do fato jurídico, se expanda o efeito. Quando se está diante de fato, com cuja ocorrência coincida o começo de eficácia, é da maior importância apurar-se se faz parte do suporte fáctico do fato jurídico, de que se irradia a eficácia, ou se apenas suscita o começo dessa. Os juristas, por insuficiência de rigor lógico, deixam de precisar a que plano se refere o termo, ou a condição, se ao plano da existência, ou ao plano da eficácia. Se ao plano da existênnão há fato jurídico antes de se atingir o termo, ou de se dar a condição; se ao plano da eficácia o fato jurídico ocorreu, e o termo ou a condição suspensiva apenas diz respeito ao começo dos efeitos. Ora, toda condição e todo termo são concernentes ao plano da eficácia dos atos jurídicos stricto sensu e dos negócios jurídicos. De modo nenhum se referem à existência do ato jurídico stricto sensu ou à existência do negócio jurídico. Daí é que se há de partir. Todas as determinações de termo ou de condição protraem a eficácia do ato jurídico, a colocam em momento futuro, ou em momento futuro colocam a cessação ou o apagamento da eficácia que houve. Quanto aos atos-fatos jurídicos e aos fatos jurídicos, só a regra jurídica pode determinar esse protraimento; por conseguinte, neles não há, nem pode haver, termo ou condição, em sentido próprio. Termos e condições são determinações temporais, mexas. mexam-se à manifestação de vontade, para que o efeito ou os efeitos dos atos jurídicos somente se dêem, a começar-se de termo inicial, ou somente durem até que acontecimento futuro e certo se dê (termo final), ou para que o efeito ou os efeitos dos atos jurídicos somente comecem a partir-se de acontecimento futuro e incerto (condição suspensiva), ou durem até que o acontecimento futuro e incerto se dê (condicão resolutiva). A eficácia do termo ou da condição pode, além disso, ir ao passado.

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As condições e os termos não são manifestações anexas de vontade, como o modus; são mexas. O nexo, que entre elas e o ato jurídico existe, é interior, íntimo. Não são conexas, nem anexas. A conexidade torna em relação as manifestações de vontade, mas sem se dar a inserção de uma na outra, o que a inexão supõe. No direito hodierno, como, aliás, entre os juristas romanos, a melhor divisão das determinações temporais é a que põe na classe dos termos somente os termos puros e na classe das condições as condiciones e aqueles casos em que no dies incertus se insere condição ou na condicio dia incerto. Assim, o dies incertus an certus quando (e. g., quando fizer vinte anos) e o dies incertus an incertus quando (e. g., quando for promovido) são condição; ao passo que o dies certus an incertus quando (no dia da morte de B) é termo (veja, para o direito comum, L. ENNECCERUS, Rechtsgeschãft, Bedingung und Anfangstermmn, 192 s.). Cumpre, porém, observar-se que, excepcionalmente, pode ocorrer que o dies incertus an certus quando seja termo: se o testador, por exemplo, dispôs que a herança ou o legado será entregue ao herdeiro ou legatário à maioridade; porque se trata de termo, e não de condição, o art. 119 do Código Civil de 1916 não incide (cf. ANDREAS VON TUHE, Der Aligemeine Teu, III, 273). A condição permite ao figurante querer, sem temer o futuro: por ela, o que não se quereria, sem auxílio de hipótese, pode ser querido. Se bem que os sistemas jurídicos prefiram não definir condição, o Código Civil brasileiro definiu-a (art. 114): “Considera-se condição a cláusula, que subordina o efeito do ato jurídico a evento futuro e incerto”. É parte da manifestação de vontade; não é manifestação anexa. Ainda que se inserisse posteriormente, far-se-ia parte essencial. Seria erro concebê-la como alternativa da existência da vontade, como fizera JosEPH UNGER (System, II, 5.~ ed., 56; ainda recentemente. Rota romana, 8 de junho de 1929, Foro, 1930, 260). A vontade existiu e existe com o seu conteúdo; o ato jurídico perfez-se: apenas, se a condição ocorre, há o efeito; se não ocorre, não no há. Seria erro também apontar-se nexo entre a condição e o efeito: a condição é parte do conteúdo do ato jurídico; é parte da manifestação de vontade, é elemento do suporte fáctico, independente do que advenha. O conceito de condição exige que o evento seja futuro; a tal pressuposto de ser in futurum concepta alude o art. 114; outrossim, à incerteza do evento. Não se precisa, para se explicar a condição, dizer-se que ela restringe a vontade; o que ela faz é alterar o suporte fáctico vulgar do negócio jurídico ou do ato jurídico atricto sensu: porque a vontade que nele se pôs é que é a vontade, modificando a estrutura vulgar do suporte fáctico e, pois, do ato jurídico ~R. F. voi~ CANSTEIN, Zeitschrift flir deutschen Civilpro~ess, 1, 319: .... . a condição suspensiva não é restrição da vontade, mas alteração do suporte fáctico legal de negócio jurídico em causa; de modo que o negócio jurídico condicionado é espécie particular do negócio jurídico, que se distingue do correspondente negócio jurídico incondicionado como de qualquer outro negócio jurídico. No negócio jurídico condicionado, não é, também, vontade restrita, mas inteiramente diferente da vontade no negócio jurídico incondicionado”), O adjetivo “vulgar” não atribui ao que se quis incondicionalmente qualquer prioridade sobre o que condicionalmente se quis. Onde se deixou campo à autonomia da vontade, ainda se o sistema jurídico possui regra jurídica dispositiva, a liberdade é homogênea (sobre isso, P. J. BAUMANN, De condicione pendente, 118 s.). Quem quis condicionalmente já quis, se bem que só o futuro possa responder se o que se quis se podia dar. Mas isso não é fundamento para se ter como querido desde agora, se no futuro se realiza a condição, pois agora só se quis com a condição. A condição é mexa (não atendeu a isso A. SCHUFPENHAUER, Die Riickwirkung der Resoiutivbedingung, 6 a 10). Só o efeito é que depende da condição, não o ato jurídico. O “se ocorrer...” que está implícito, ou explícito, no ato jurídico condicionado, opera como dilema ao futuro efeito: ou será, se ocorre o fato; ou não no será, se não ocorre. Não se trata de plano da existência do ato jurídico, e sim de plano de eficácia, isto é, do plano em que se produzem, ou não, os efeitos. É preciso que se entenda a condição, para se saber de que fato o futuro se cogita. Por isso mesmo, a condição ininteligível, ou contraditória (condicio perpiexa), é nula e faz nulo o ato jurídico (art. 116, 2.~ parte). A condição é accidentale negotim; o ato jurídico poderia ser sem qualquer condição. Serve ela, em grande escala, àautonomia privada: por ela, o manifestante da vontade como que ajusta o futuro ao presente; obvia à imprevisibilidade; leva em conta fatos que podem vir a acontecer, ou não acontecer; motivos que, de ordinário, não seriam relevantes tornam-se elemento do suporte fáctico, mas somente para a eficácia. Quando se entende que o efeito se há de produzir no momento em que se dê fato futuro e incerto (dies incertus an), mas, se isso não ocorreu, ainda assim é devida a prestação, que se pode exigir, inclusive judicialmente, não há condição que suspenda o direito, a pretensão, ou a ação, apenas se diferiu o adimplemento para a realização do fato ou da sua irrealização. As vezes, suspende-se só a pretensão, ou só a ação, e pode tratar-se de condição; e. g., “A deve x a C, que pagará quando B se resolver a embarcar para a Europa”, A deve x a C, que somente lho poderá cobrar judicialmente quando B marcar viagem”. Se no instrumento do negócio jurídico se insere condição, pode ela referir-se ao negócio jurídico ou ao ato de disposição, pelo qual se cumpre, ou a ambos. Se há dúvida, a entrega da prestação antes de se realizar a condição é de entender-se condicionada; salvo tratando-se de prestação pecuniária, pela natureza fungível da prestação, e irreivindicável. Se o ato jurídico é incondicionado, e não no é o ato de disposição, a condição só apanha esse.

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O mesmo evento pode ser condição final a favor de B e condição suspensiva a favor de C; por exemplo, A vende a B, sob condição final negativa de B não se mudar e, ao mesmo tempo (no mesmo ato ou noutro), a O, sob a condição suspensiva positiva de B se mudar. Há negócios jurídicos que são incondicionáveis, tal como acontece com o casamento, a adoção, o reconhecimento de filho, a aceitação da herança (posto que possa ser só de parte). A cláusula mexa ao negócio jurídico (e não só a contrato, porque se pode inserir em negócio jurídico unilateral, como a promessa de recompensa e o titulo ao portador) pode ser no mesmo instrumento do negócio jurídico ou noutros. Todavia, se não foi prescrita a ocorrência, quase sempre necessária ao completamento, há modificação do negócio jurídico ou substituição. Nada obsta a que haja pluralidade de cláusulas condicionais, ou que a mesma cláusula contenha duas ou mais condições, ou que advenham algumas ou alguma nova cláusula. Nos negócios jurídicos unilaterais, é elemento necessário que a cláusula não atinja eficácia já produzida, ou vincular-mente já preestabelecida porque se alguém já tem direito e pretensão e ação, ou direito e pretensão, ou só direito, há ofensa à esfera jurídica de outrem. 4) EsPÉCIEs DE CONDIÇÃO E DE TERMO. Para a execução, o credor apenas tem de provar que se impliu o termo ou a condição suspensiva. Nada tem o art. 572 com o termo ou a condição resolutiva. Se houve resolução, trata-se de assunto para os embargos do devedor, posto que ao ser pedida a citação do devedor possa o juiz, de oficio, diante do documento e dos fatos que sejam notórios, indeferir a petição. Assim é que se entende e se tinha de entender. No Código de Processo Civil português, art. 804, há explicitude: “condição suspensiva”. Otermo, a que se refere o art. 572, é o inicial, e não o final, porque o termo final é semelhante à condição resolutiva. Se o termo é inicial, tem o credor de provar que ocorreu o termo, para que então se tenha como nascido o direito à execução. Se não há termo nem condição, de modo nenhum se pode invocar o art. 572. Pergunta-se: uma vez que o art. 572 se refere a ter o juiz decidido quanto a relação jurídica sujeita a condição ou termo, j,tem o credor de provar o advento do termo ou o implemento da condição se a execução é de título extra-judicial? A interpretação escrita do art. 572 não permitiria a afirmativa; mas resulta dos mesmos princípios que levaram o legislador a inserir a regra jurídica do art. 572. Seria absurdo que o juiz pudesse deferir o pedido da citação na ação executiva de titulo extrajudicial se dele consta o termo ou a condição suspensiva. Pense-se no documento público, ou no particular, assinado pelo devedor e subscrito por duas testemunhas, do qual conste a obrigação de pagar quantia determinada, ou de entrega fungivel (art. 585, II), se nele se diz que há condição ou termo. Se o credor não prova o que lhe incumbia conforme o art. 572, não cabe o exercício da ação executiva. O que pode acontecer é que já tenha transitado em julgado sentença proferida em ação declaratória, no tocante ao implemento da condição ou adoção do termo. Art. 573. É lícito ao credor, sendo o mesmo o devedor’), cumular várias execuções , ainda que fundadas em títulos diferentes, desde que2) para todas elas seja competente4) o juiz e idêntica a forma do processo 3) 5) 6)• 1) ExECuçõEs CUMULÁvEIs. Pode haver cumulação objetiva de execuções contra o mesmo executado, desde que a competência seja a mesma e a mesma a forma do processo. Cada condenação tem a sua execução; se as execuções são de processo diferente, podem ser simultâneas, porém não cumuladas. Tumultuaria o processo citar-se com as vinte e quatro horas do art. 652 e os prazos dos arts. 621 e 632. Assim, somente há cumulação de execuções se são de competência do mesmo juiz e com o mesmo procedimento; se são de competência diferente, a lei exige separação. A cumulação, ai, é das ações executivas que foram objeto da mesma sentença, ou de diferentes sentenças, ou de sentenças e de titulo extrajudicial ou de títulos extrajudiciais, não sendo diferentes as formas do processo. Cada pedido se refere a uma ação. A lei faculta que se debulhe o decisum, porque é múltiplo, de modo que, em vez de cumulação, que é a regra, se dê a distribuição em diferentes processos, um dos quais nos próprios autos. Restaria saber-se se o art. 292 tem de ser respeitado, tratando-se de execuções de sentença. Execuções de idêntica forma do processo, em se tratando de sentenças do mesmo juízo, ou não, se a mesma a competência, podem ser cumuladas. O art. 573 diz ser licito ao credor, sendo o mesmo o devedor, cumular várias execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, desde que para todas elas seja competente o juiz e idêntica a forma do processo. O art. 573 permite; não veda, em geral, nem em particular. Por isso mesmo, se as execuções resultantes da sentença são sujeitas à mesma forma de processo, podem ser processadas nos mesmos autos. Se a condenação se divide, em parte liquida e parte ilíquida, ou se liquida, antes, o ilíquido, para se executar no mesmo processo, ou se há de

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atender a que têm de correr em autos suplementares (Supremo Tribunal Federal, 28 de outubro de 1940, O D. IX, 260). Credores litisconsortes podem cumular ações executivas de títulos judiciais, ou extrajudiciais, uma vez que se atenda aos pressupostos exigidos pelo art. 573. O devedor tem de ser um só, salvo se a ação executiva é de título judicial ou extrajudicial contra dois ou mais devedores, porque, aí, a despeito da pluralidade subjetiva, há a unidade objetiva. Pode mesmo ocorrer que isso se passe, distintamente, com duas ou mais ações cumuláveis. Outra espécie de pluralidade subjetiva é a da sentença ou ele título extrajudicial contra uma pessoa, que faleceu, e as pessoas que a substituiram, pela superveniência, sejam herdeiros ou outros sucessores. Se os títulos executivos são de quantia certa e líquida, um judicial e outro ou outros não, ou alguns judiciais e outro ou outros não, não há problema. Se a sentença se refere a quantia ilíquida, ou o mesmo se passa com duas ou mais, tem-se antes de proceder à liquidação, para depois se exercerem as pretensões e ações executivas, cumulatívamente. A matéria dos embargos não está sujeita à mesmidade. As alegações podem ter conteúdo diferente. Nas petições dos embargos de devedor pode ser articulado o que corresponde a cada ação cumulada. O art. 573 fala de ser “idêntica a forma do processo”. Forma do processo, e não dos títulos executivos. Se a ação executiva de sentença ou de título extrajudicial é de quantia certa e a outra ou as outras são de fazer ou de não fazer, ou de entrega de coisa certa ou incerta, o processo é diferente. Não se podem cumular os pedidos de citação para entrega de coisa certa (prazo de dez dias, art. 621), ou de citação para entrega de coisa incerta (arts. 629-631), e para fazer ou não fazer (arts. 632-641 e 642 e 643) ou para pagar ou nomear bens à penhora (arts. 652-654). A forma do processo das ações de entrega de coisa certa e das ações de entrega de coisa incerta é a mesma (art. 631: “Aplicar-Se-á à execução para entrega de coisa incerta o estatuído na seção anterior”). A forma do processo para ações executivas para fazer ou não fazer não tem a mesma forma de processo (na Seção III, Das disposições comuns às seções precedentes, não se diz o mesmo do que se disse no art. 631). Se a sentença, título executivo, não condena em quantia certa (= liquida), faz-se primeiro a liquidação, para que ~‘. ação se possa cumular com outra ação executiva de sentença, que condena a quantia líquida, ou com outra ação de título extrajudicial (art. 586: “A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título líquido, certo e exigível”). As ações executivas de títulos fiscais (art. 585, VI) são cumuláveis entre si, se satisfeitos os pressupostos do art. 573, ou com outras ações executivas de títulos judiciais ou extra-judiciais. Se a coisa tem de ser entregue por dois ou mais demandados em ação executiva, o devedor plúrimo é tratado como “mesmo” devedor. Dá-se o mesmo, se há pluralidade de devedores da mesma quantia. Se adveio sucessão do legitimado passivo por duas ou mais pessoas, a dívida é uma só, mesmo porque a execução vai contra os bens do sucedido, e não se fazem distinções que afetem o crédito. (Tem-se de ter cuidado com os que dizem que as ações executivas contra os sucessores são ações cumuláveis. Aí, a ação é uma só.) 2) INCUMULIBILIDADE. As execuções incuniuláveis processam-Se em autos diferentes, de modo que pode haver actiones judicati da mesma sentença, em pluralidade de processos. Se a mesma sentença condena a coisa certa ou incerta e a fazer ou não fazer, ou a prestação de quantia, ainda que a causa da condenação foi a mesma, há a necessidade das proposituras separadas (não cumuladas). Seria absurdo que se fizesse citar o credor para a, b e c, sem se observar a diversidade das formas de processo. Se a petição contém todos os pedidos, há mesmidade de petição, e não de forma do processo. Têm-se de atender às regras jurídicas processuais relativas a cada forma de processo. O titular pode propor, simultaneamente (sem a cumulação), as ações que lhe tocam, ou sucessivainente (hoje, uma; depois, outra, ou outras, ou, ainda depois, outra ou outras). Não se fale, no direito brasileiro, de “cumulação sucessiva . Não há erro. Se A propós a ação executiva a, e depois modifica o pedido, ou a causa de pedir, de modo que ao pedido feito, a; junta outro, b, o que depende do consentimento do demandado (art. 264), não há cumulação sucessiva; há modificação do pedido, para a cumulação. 3)CAUSAS DA 5UCES5IVILADE. A sucessividade pode resultar de ser diferente o tempo em que se pode executar a sentença passada em julgado (e. g., arts. 572 e 615, IV), ou de ter havido execução provisória de parte da sentença (arts. 587, 2.~ parte, 588 e 589). Promovida a execução das prestações vencidas, nada obsta a que, nos mesmos autos, se vá pedindo a execução das que se forem vencendo, mediante penhoras sucessivas. Somente cessa essa possibilidade com a terminação da relação jurídica processual, isto é, com o trânsito em julgado da última decisão do juiz, que signifique fechamento da instância. Não se reabre para nova execução (cf. 1.0 Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 31 de janeiro de 1950, R. dos T., 185, 207, que reformou o acordo da 2.~ Câmara Civil, a 4 de outubro de 1949, 193, 243). 4) COMPETÊNCIA DO Juízo. O juízo tem de ser competente, porque há explícítude no art. 573. Se, para alguma

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das ações, é impedido, ou suspeito, um dos juízos, tem o devedor de arguir, em exceção, a incompetência relativa, para que seja declarada, conforme o art. 112, porque há a prorrogabilidade prevista no art. 114. Quanto à incompetência absoluta, essa pode ser alegada, a qualquer tempo, ou declarada de ofício. Se isso ocorre, não houve propositura da ação executiva para a qual absolutamente era incompetente o juízo. Idem, se declarada a incompetência relativa. Não se pode cumular execução se o outro título ou outros títulos têm de ser objeto de ação executiva perante os juizes diferentes (estadual, federal; federal comum, trabalhista, etc.). Em princípio, o juiz que proferiu a sentença é competente para a execução (art. 575, II), mas pode advir incompetência, como se o juiz que julgou a ação se tornou relativamente incompetente (e. g., o juiz herdou ou adquiriu negocialmente o título executivo; o cônjuge do juiz ou parente conforme o art. 134, IV, se fez advogado do exeqtiente ou do executado; alguma das partes passou a ser credora do juiz, ou do seu cônjuge, ou de parente, conforme o art. 135, II; o juiz passou a ser herdeiro presuntivo de alguma das partes, art. 135, III). Mais: entre a sentença e a propositura da ação executiva alguma lei mudou a competência do juízo. Se há incompetência para uma ação executiva, ou para algumas ações executivas, porém não para as outras, quanto a essas pode dar-se a cumulação. 5)FORMA DO PROCESSO E INSOLVÊNCIA. A forma do processo das ações cumulandas há de ser idêntica, assunto de que, incidentemente, já tratamos. Aqui, apenas vamos referir-nos à “execução por quantia certa contra devedor insolvente” (arts. 748-786) e dizemos que o art. 573 não é invocável, devido à especialidade do tratamento, oriunda da declaração de insolvência. 6) EMBARGOS DO DEVEDOR. Além das exceções que pode opor, o devedor pode embargar as ações cumuladas, ou só algumas, ou só uma. A despeito de poder o juiz rejeitá-los liminarmente (art. 739), ou terem efeito suspensivo (art. 741), os embargos são autuados em apenso. Não se há de exigir que o devedor ofereça os embargos, num só dia e na mesma petição de embargos. O que importa é que embargue dentro do prazo. Se o faz numa só petição, referente a todas as ações cumuladas, ou juntamente só a algumas, ou separadamente, é assunto que cabe à vontade do embargante. Todos têm de ser apensados aos autos das ações cumuladas. Art. 574. O credor ressarcirá 1) 3) ao devedor os danos que este sofreu, quando a sentença, passada em julgado2), declarar inexistente, no todo ou em parte, a obrigação 4), que deu lugar à execução. 1)RESSARCIMENTO AO DEVEDOR, QUANDO SE DECLARAVA INEXISTENTE NO TODO OU EM PARTE, A OBRIGAÇÃO QUE DEU LUGAR À ExECUÇÃO. O art. 574 atinge qualquer ação executiva, quer de sentença, quer de título extrajudicial. A declaração de inexistência da relação jurídica, de que resultaria obrigação do devedor e, pois pretensão e ação do credor, supõe que a sentença tenha declarado que não existia a relação jurídica, ou que, por invalidade, dela não podia irradiar--se obrigação. Temos exemplo na sentença, que transitou em julgado, mas que foi desfeita pela ação rescisória de sentença em que se afastou a existência, ou a validade do que ela tivera por existente e válido. O que mais acontece é que a própria sentença, que se vai executar, julgou não existir obrigação, no todo ou em parte, a despeito de se ter proposto a ação executiva de sentença. A parte vencida, em princípio, é condenada a pagar à parte vencedora as despesas que antecipou e os honorários advocatícios (art. 20). Se houve despesas de atos protelatórios, impertinentes ou supérfluos, paga-as a parte que os haja promovido ou praticado, se a outra parte os impugnou (art. 31); e aí se abstrai do julgamento desfavorável da causa. Já o art. 16 estatui que responde por perdas e danos quem pleiteia de má-fé, quer seja autor, quer seja réu, ou quer seja assistente. O art. 17 enumera as espécies de má-fé e o art. 18 diz que o litigante de má-fé tem de indenizar à parte contrária os prejuízos que essa sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou. No art. 18, § 1.0, cogita-se de haver dois ou mais litigantes de má-fé; e no art. 18, § 2.0, de como se há de pagar. O dano é oriundo do exercício da pretensão processual, mesmo em se tratando de defesa. Todas essas regras jurídicas processuais incidem no processo de execução (art. 598). Ainda a respeito dos processos de execução há o art. 588, 1, que a respeito da execução provisória diz que corre por conta e responsabilidade do credor, que presta caução, obrigando-se a reparar os danos causados ao devedor. O art. 574 concerne a qualquer execução, se for declarada inexistente, no todo ou em parte, a obrigação que se alegou para o exercício da ação executiva. Supõe-se ter havido o processo de execução e, como o julgamento dos embargos do devedor, ter sido julgada como inexistente a obrigação. Note-se bem: a obrigação, e não a dívida; se foi declarada inexistente a dívida, toilitur quaestio; se apenas foi declarada inexistente a obrigação, basta para a incidência do art. 574. Dívida pode existir sem que exista (ou ainda exista) obrigação. O dano que se tem de ressarcir, na espécie do art. 574, é o que provém de inexistência da obrigação. Outros textos legais podem ser invocados fora dai (arts. 588, III, e parágrafo único; 31 e 18). Seria perder-se tempo estar-se a buscar o que dizem juristas estrangeiros, cujo sistema jurídico não contém regra jurídica igual, tal como acontece nos § § 302, 600 e 945 da Ordenação Processual Civil alemã, no Código de Processo Civil italiano, art. 96, onde se

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põe a mais o ter agido sem “normal prudência”, e no Código Civil português, art. 456, que é regra jurídica geral e onde se põe o pressuposto da má-fé (cp. ARTUR ANSELMO DE CASTRo, A Ação executiva singular, 291). Trata-se, no Código de Processo Civil de 1973, art. 574, de regra jurídica que apenas apresenta um pressuposto para a indenização: ter havido, depois da execução, sentença que, trânsita em julgado, declarou não ter existido, no todo ou em parte, a obrigação. Entenda-se, portanto, obrigação que daria ensejo à execução, se tivesse existido. Pergunta-se: ~,incide o art. 574 se a sentença, trânsita em julgado, diz que ainda não existia a obrigação, ou que deixa~ra de existir? A resposta tem de ser afirmativa, pois a referência não é à dívida, mas à obrigação. Se a obrigação estava prevista, ~,é invocável o art. 574? Não devemos importar discussões e soluções estrangeiras, como as que se apegam à sentença injusta e à execução injusta. Obrigação prescrita não é obrigação que não existia: existia e existe, apenas havia a possibilidade de opor-se a exceção o que cobriria a sua eficácia. Pode haver mesmo exceção a direito, ou a pretensão. Mas não se diz, com o exercício da exceção, que o direito, ou a pretensão, ou a exceção não existiu, ou não existe. A exceção diz respeito à eficácia do jus exceptionis e àeficácia do direito, da pretensão, ou da ação, ou da exceção, que ela “excetua”. Não é alegação de nulidade, nem de anulabilidade, nem de rescisão, nem de resolução, ou de resilição, ou de outra causa de extinção. Essas defeituosidades, mais ou menos graves, não são exceções; são espécies de não-validade e espécies de cortabilidade vertical (rescindere) ou resolução (resolução, resilição), ou simplesmente de extinção. Exceção é outra coisa. A exceção não ataca o ato jurídico, nem o direito em si mesmo. Exatamente, o fim da exceção é fazer-se atender, ainda mesmo a despeito da existência, validade, ou irrescindibilidade, ou irresolubilidade, ou irresibilidade do ato jurídico. Se, também, há nulidade, anulabilidade, ou rescindibilidade, ou resolubilidade, ou resilibilidade, é outra questão. Há prazo para se exercer ação constitutiva; não há prazo para se exercer a ação declarativa que há na exceção. Nos primeiros tempos, KONRAD HELLWIG (Anspruch und Klagrecht, 10) ainda confundia a eficácia da exceção com a eficácia do direito de impugnação e com as anulabilidades; e os escritores alemães nunca se forraram, depois, de todo, a essas analogias com os direitos formativos, extintivos ou modificativos, e com as pretensões constitutivas negativas. Posteriormente, KONRAD HELLWIG (Lehrbuch, 1,147,254), sem classificar, precisamente, as exceções, teve por errado o que dissera em 1900. Não temos mais a exceção de nulidade por vício de forma e a de rescisão. Já ai não cabe excepcionar; mas acionar, ou contra-acionar (em reconvenção, ou em embargos). A exceção, pois que não elimina no todo, nem em parte, o direito, a pretensão, ou a ação, ou outra exceção, e só lhe atinge a eficácia, para a encobrir, até onde vá a do direito, pretensão, ou ação, de que emana, não torna teoricamente ineficaz o direito, a pretensão, ou a ação, ou exceção, contra que se dirige, apenas os torna praticamente ineficazes, porque, encoberta, a sua eficácia não pode contra-ocorrer, temporal ou definitivamente. Essa noção técnica de encobrimento evita negação do direito, da pretensão, da ação, ou da exceção, e da própria eficácia deles. A exceção não nega, sequer, a eficácia do direito, da pretensão, da ação, ou da exceção do excetuado, só a encobre. Do conceito de exceção é ineliminável que depende do demandado, ou devedor, exercê-la. A vontade do titular do direito de exceção é que pode cobrir a eficácia do direito, da pretensão, da ação ou da exceção de quem vai contra ele. De um lado, há direito, pretensão, ação, ou exceção que existe e tem exposta a ser encoberta a sua eficácia; do outro, a exceção, que existe, e não tem a eficácia de encobrir a outra eficácia, enquanto não se exerce. Naturalmente, esses desníveis entre existir e ser eficaz, máxime se atendemos a que a exceção, depois de exercida, encobre, desde que ela existe, a eficácia do direito, da pretensão, da ação, ou da exceção, a que se opõe , intrigaram profundamente os juristas. A alguns parecia estranho (e suspeito de insuficiente estudo) que se pudesse recusar a prestar, sem se cortar a pretensão, a ação ou a exceção, pelo menos em algo mínimo: nota-se logo o substancialismo a que se subordinava a filosofia jurídica deles. Se a sentença, trânsita em julgado, declara inexistente o direito, ou a pretensão, de que resultaria a obrigação, a fortiori disse ser inexistente a obrigação. Tal sentença ou é a que julga os embargos do devedor, ou os embargos do terceiro, inclusive a sentença referente a embargos à execução de titulo extrajudicial. Na execução de títulos executivos judiciais, os embargos do devedor podem ter fundamento no art. 741, II ou VI, ou mesmo no art. 741, III, se se diz que há obrigação, porém não obrigação do devedor perante o credor. Se o titulo executivo é extrajudicial (art. 745), dá-se o mesmo, se a sentença diz inexistente a obrigação. Não se pode interpretar o art. 574 como se não protegesse o terceiro que, sem ter qualquer obrigação, sofreu a execução. No art. 574 fala-se de “devedor”, mas havemos de entender “demandado na ação executiva de título judicial ou extrajudicial”. Se, durante a ação executiva (entenda-se apenas não trânsita em julgado a sentença a respeito), ou depois do trânsito em julgado, advém sentença em ação rescisória que declarou inexistente a obrigação, pode o executado exercer o direito que lhe atribui o art. 574. Se foram julgados improcedentes os seus embargos, mas ocorreu que foi vencido o proponente da ação rescisória da sentença executada, ou mesmo o terceiro embargante que pedira a rescisão do julgado nos seus embargos, o art. 574 é invocável. Surge o problema de ter sido proposta a ação de execução de título extrajudicial e estar pendente ou vir a iniciar-se a ação declaratória da inexistência da obrigação. O demandado somente não pode propor a ação declaratória da

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inexistência da obrigação, se já transitou em julgado a sentença que nos embargos a julgou existente, porque haveria ofensa à coisa julgada. Se pendentes os embargos, há a alegabilidade da conexão em contestação da ação declaratória negativa (arts. 301, VII, e § 4~o, 103 e 106). Se o demandado não apresentou embargos de devedor, tudo se há de resolver conforme o julgamento da ação declaratória, ou da ação rescisória da sentença exequenda ou mesmo já executada. A declaração de inexistência da obrigação pode referir-se a uma das obrigações que foram alegadas para a execução, ou a algumas, ou a todas. Tem-se de verificar qual o dano, ou quais os danos, que resultaram de cada obrigação que dera fundamento à execução. 2)ExEcuçÃo PROvISóRIA DE SENTENÇA. O que mais pode interessar é a execução provisória de sentença, por ter o recurso apenas o efeito devolutivo. Julgado o remédio jurídico recursal contra o credor, pode dar-se o que se prevê no art. 574. Aliás, o art. 588 cogita de responsabilidade do credor em caso de sentença desfavorável a ele, a despeito de ter havido a execução provisória. O art. 588, III, e o parágrafo único tratam de sentença proferida, após execução provisória que fica sem efeito se sobrevém outra que a modifique ou revogue (a expressão “anule” é imprópria), tendo-se de restituir “as coisas ao estado anterior”. Se só em parte foi atingida a sentença, só aí fica sem a eficácia executiva, que se retirou. 3)INEFIcAcIzAÇÃo E ATINGIMENTO. Tem-se de atender, no art. 574, a que nem sempre a nova sentença, que revogou, no todo ou em parte, a sentença de que proveio a execução provisória, chega a tempo de se restituir o que foi penhorado e passou por atos posteriores. Se foi a tempo da restituição, a aplicação do art. ~ é mais simples, sem que mesmo a restitutio in integrum afaste o dever e a obrigação de ressarcimento dos danos. Se não há mais possibilidade de restituir-se o todo, ou a parte, que a nova sentença desfez, tem-se de considerar integral o dever de ressarcimento. Qualquer dano que da execução da sentença anterior proveio é indenizável, invocando-se o art. 3•O, sob o qual falamos do “interesse”. Se houve o não-conhecimento ou a improcedência do recurso interposto, que deu ensejo à execução provisória, tudo se trata como se a execução tivesse sido definitiva. Se houve conhecimento e se julgou procedente o recurso, resta saber-se qual a conclusão: pode ter ocorrido declaração de inexistência da obrigação, e então o art. 574 é a regra jurídica invocável. Se a procedência do recurso não foi até ai (declaração de inexistência da obrigação), regem o art. 588, 1 e III, e o art. 588, parágrafo único. Se foi, o art. 574 pode ser aplicado, posto que o devedor possa preferir a medida do art. 588, 1. 4)PEDIDO E LIQUIDAÇÃO DOS DANOS. Além da verificação dos danos, tem-se de proceder à liquidação. A ação executiva é outra, porque a sentença que declarou a inexistência pode ter condenado. Se não houve a condenação, a ação de quem sofreu os danos é ação condenatória, de que há de derivar a execução. A ação para haver a indenização (art. 574), com a liquidação ou sem ela, em todos os casos é outra ação, com outro processo. Dá-se o mesmo se a indenização é baseada nos arts. 587, 2.a parte, 588-590. 1)Juízo COMPETENTE PARA A ExECUÇÃO. A executividade da sentença consiste no peso de eficácia com que se inicia a execução. Por isso mesmo, tem-se de atender à competência para a ação e a sentença que se prol eriu. Em se tratando de título executivo extrajudicial, a lei há de cogitar de regras jurídicas gerais, porque não houve julgamento anterior de que proveio a eficácia executiva. ~ possível que o titular de tais direitos haja proposto, antes, ação declarativa, mas, aí, a sentença não é a base da execução, porque lhe falta suficiente peso de executividade. Aliter, se foi condenatória a ação que se julgou, espécie em que se substituiu a eficácia executiva do titulo executivo extrajudicial pela eficácia executiva da sentença condenatória. Os arts. 575-579 somente concernem à jurisdição civil. Dentro dela é que se cogita da competência para a execução. Quem é competente tem, nos limites da lei, o poder de dizer o direito, iurzsdictio. A jurisdição civil é pressuposto para a competência de executar. Não se diga, portanto, o que erradamente aparece em livros de alguns juristas, isto é, que a competência é parte da jurisdição (e. g., EDUARDO J. CouTURE, Fundamentos dei Derecho Procesal Civil, 3.~ ed., 29). Não se há de confundir pressuposto, que se supõe antes, como parte, que é fração, quinhão, porção. A competência para as ações executivas de títulos extra-judiciais tinha de atender a que apenas se antecipa a execução, sem se excluir a cognição. Daí terem-se de observar as regras jurídicas do Livro 1 (Do Processo de conhecimento), Título IV, Capítulos II e III (art. 576). Nas ações de títulos executivos judiciais, o que se há de pôr em relevo é já ter sido proferida a sentença e a ela se liga a eficácia (3) de executividade, que faz superior a ação executiva. Mesmo se o sistema jurídico (e não é o caso do sistema jurídico brasileiro) permite, ou impõe, que se proponha a ação executiva de sentença de tribunal superior em juízo inferior (e. g., Código de Processo Civil português, art. 91, 1), não se desatende a só existir uma ação, que vem após a outra. No Código de 1939, todo o assunto da competência, em se tratando de ação executiva, estava no art. 884, só

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referente às ações executivas de sentenças. Quanto às ações executivas de títulos extrajudiciais, nada se disse em especial: a competência era das ações em geral, porque punha as ações executivas de títulos extrajudiciais entre as ações especiais, sujeitas ãs regras jurídicas gerais de competência. Acertadamente, o Código de 1973 pôs no Livro II (Do processo de execução) todas as ações executivas de títulos judiciais e de títulos extrajudiciais e eliminou a defesa inadequada, que era a de “contestação”, pois, sendo executiva a ação (5 de executividade, que adveio de 3 de executividade que têm as sentenças; e, em virtude de lei, 5 de executividade dos títulos extrajudiciais), a defesa tinha de ser em todas as espécies, com embargos do devedor. A competência nas ações de execução de sentença será assunto dos comentários ao art. 575. 2)GRAU DE COMPETENCIA. Sempre que se tem de verificar a competência para ação executiva, com fundamento em sentença, tem-se de verificar onde se originou a ação em que se proferiu a sentença. No Código de 1973, os arts. 575 e 576 tiveram de cogitar das espécies, por haver, em algumas, elementos a mais do que o de competência originária e o de grau de jurisdição. Art. 575. A execução, fundada em título judicial ~) ‘~) lo), processar-se-á perante2) 8): 1 os tribunais superiores 3), nas causas de sua competéncia originária; II o juízo5) que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição4); 111 o juízo que homologou a sentença arbitral 6); IV o juízo cível competente, quando o título executivo for a sentença penal condenatória 7)• 1)CRITÉRIOS PARA A DETERMINAÇÃO DA COMPETENCIA. (a) O Código de 1973 tinha de estabelecer dois critérios para a determina çã~o da competência: um, para as sentenças de juízos nacionais; outro, para as sentenças estrangeiras de árbitros e as sentenças estrangeiras. As sentenças estrangeiras e as de juízo arbitral homologados são executadas pelo juiz homologador, conforme as regras do sistema jurídico. O Código de 1973 não fez referência especial à homologação da sentença estrangeira, certamente por se tratar de causas da competência originária do Supremo Tribunal Federal (Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 119, 1, g), 2Y- parte). As outras seguem a regra jurídica de serem executadas no mesmo juízo em que se proferiram. A questão maior que surgia era a da natureza desse dado determinador de competência (mesmidade do juízo), se é determinação ratione materize, ou simplesmente ratione connexitatis. Se se trata de competência pela razão da matéria, não será possível a prorrogação da competência. Se, em vez disso, o foro, forum connexitatis (posto que não materzae; de modo que não obrigasse à simultaneidade do processo, simultaneus processus, nem sequer, à continuidade dele), a prorrogação poderia ocorrer. O Código de 1973, art. 575, II, em vez de falar de juiz da ação, acertadamente disse ser competente o juízo que decidiu a causa em primeiro grau de jurisdição. Nos Comentários ao Código de Processo Civil de 1939 (Tomo XIII, 79) sugerimos a solução que hoje está no art. 575, II. Previnamos que a determinação de competência, segundo o art. 575, 1, e II, de modo nenhum autoriza a dizer-se, como fazia a 1.a Câmara do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 15 de setembro de 1941 (R. dos T. 134, 97), que “a execução é parte integrante da própria causa que o juiz julgou”. Primeiro, porque é outra ação. Segundo, como ação, que é, são lhe aplicáveis, em separado, os arts. 304, 265-269, 263 e 264. Terceiro, às sentenças são aplicáveis os arts. 485-495. Quarto, se não se tratasse de outra ação, não se precisaria de regras jurídicas de determinação da competência, como são as do art. 575. São pontos, esses, de certa relevância. (b) Os tribunais não executam sentenças que não sejam da sua competência originária. Por isso mesmo, se o tribunal confirma a sentença favorável, ou se reforma a sentença desfavorável, ainda é cedo para os embargos de terceiro, que, se a sentença de primeiro grau está sendo provisoriamente executada, os embargos se apresentam na instância recorrida, por onde se executa e, pois, se dá a constrição. A expressão “execução”, no art. 575, concerne à força executiva, ou ao efeito de qualquer sentença, sem se poderem distinguir ações contenciosas ou não (Câmaras Reunidas do Tribunal de Apelação do Rio de Janeiro, 13 de agosto de 1941, A. J., 60, 83). Nem se puderem discriminar, por seu lugar na classificação quinária, relativa à eficácia preponderante. Toda a carga 3 de executividade, qualquer que seja a força da sentença, basta para a ação iudicati. Não há exceção. 2)PROBLEMA DE TECNICA LEGISLATIVA QUARTO À cOMPETENCIA. De quatro maneiras se pode conceber, de lege ferenda, a determinação da competência para se executar a sentença: a) A execução da sentença, actio iudicati, tem o seu foro, e o juízo da causa em que se proferiu a sentença éapenas

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um dos dados para a determinação. De modo que ou se dá (a) a prevenção de jurisdição quando se propõe, ou (b) a lei exclui a prevenção, permitindo tantas ações iudicatz quantos os juizes em que se acham os bens, ou até os domicílios do réu. Parece que esses eram os princípios ao tempo de Ar.TTÔNIO MENDES AROUcA (Alie gationes luris, 122). SILVEsTRE GOMES DE MoRAIS (Tractatus de Executionibus, VI, 257) era claro em dispensar a cognição pelo juiz da ação (ou domicilio do réu ao tempo dela), e, pois, as “precatórias”: “non ita cum per actionem in factum ex iudicato, tunc enim precatorium nom requiritur, sed actori sufficit rem probare iudicatam, quoniam quilibet, quam habet actionem, potest ubique, ubi alius reus forum sortiatur, exercere”. Admire-se a precisão com que SILvEsTRE GoMEs DE MORAIS distinguia o título executivo, constituído pela sentença, e as eventuais “cartas precatórias executórias”, expedidas durante a cognição da ação iudicati. A “carta de sentença” era título; a carta precatória executória, que supunha a cognição pelo juiz executante, era ato processual durante o processo. MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA (Tratado sobre as Execuções, 18) leu-o, porém não foi tão feliz nas expressões, posto que tenha de ser colocado entre os partidários da solução a). b)A execução da sentença faz-se no juízo de qualquer dos foros competentes concorrentes, o da ação (de regra, o de domicilio do réu ao tempo dela), o da situação dos bens,o do novo domicílio, devendo preceder carta precatória,ad instar das cartas rogatórias interestatais, se algum ou alguns dos bens estão alhures. Supõe-se prevenção parcial. não total. Tal concepção abre certa autonomia ao autor da. ação executiva. c) A execução pertence a um dos juizes do sistema b). sem graduação, precedendo cognição por um deles, com pre. venção total, de modo que dos embargos do devedor conhecem o deprecante (MANUEL MENDES DE CASTRO, Practica Lusitana, II, 178, 179; “. . . ad iudicem, qui precatoriam misit.. .“). ANTÔNIO JOAQUIM RIBAS, na sua Consolidação das Leis do Processo Civil, arts. 1.238 e 211 (firmando-se no Reg. n. 737, de 25 de novembro de 1850, art. 52, a que, aliás,. o art. 490, § 2.0, não remetia), ficou com a solução c). Portanto, admitiu no mesmo pé de igualdade, como dados de.. terminantes da competência, o juízo prolator da sentença, de regra o do domicílio do réu, o da situação dos bens ou do novo domicilio, ficando com o juízo deprecante (não necessariamente o da sentença exeqilenda, dito “da ação”) o conhecimento dos embargos de devedor opostos no juízo deprecado. Assim, se procedia em qualquer caso de prevenção de jurisdição (cp. SILVEsTRE GOMES DE MoRA:IS, Tractatus de Executionibus, III, 28 s.). d)A execução compete ao juiz da ação; se há bens alhures, enviam-se cartas precatórias executórias, que sao deprecações incidentes, e não cartas de sentenças para servirem de título executivo. De acordo com tal solução, não há outros dados determinantes da competência: o juízo em que se profere a sentença, esse, ipso facto, adquire a competência exclusiva. Não era isso o que estava no Reg. n. 737, art. 490, evidente regra jurídica de determinação de competência (juízo da ação, ou juiz da situação dos bens); e os processualistas brasileiros bem o interpretaram. O art. 575, II, filiou-se aos partidários de d). Posto que só se dispensasse a carta precatória executória (titulo executivo) no caso de ação iudicati, e o próprio SIL VESTBE GoMEs DE MORAIs exigisse a carta para execução alhures (Tractatus de Executionibus, III, 257), verdade é que a isenção da carta precatória executória (título executivo) se estabelecera por expediente do costume e estilo forense. MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, III, 242) falava da precatória dirigida ad omnes magistratus; e SILVEsTRE GOMES DE MoRMs (III, 256, 258) foi explícito sobre esse “estilo e praxe do reino”, pelo qual se concebia a deprecação a quem quer que fosse apresentada a carta de sentença, cometendo-lhe a própria cognição das exceções. Mas esse estilo não era mais do que a regra jurídica da competência para a ação judicati, de que a outra regra jurídica, a das Ordenações Filipinas, Livro III, Título 86, pr., fora reminiscência. Há semelhança e não identidade entre as regras jurídicas sobre competência no processo de execução e as regras jurídicas sobre competência no processo de cognição. Basta que se leia os arts. 575 e 576 e as regras jurídicas gerais. Se o título executivo é judicial, tem-se de volver ao momento em que se propôs a ação de cuja sentença resultou o título. Convem frisar-se que se deu relevo à competência originária, de modo que a confirmação da sentença pelo órgão coletivo, a que foi o processo, não tem a conseqúência de fazer competente o tribunal superior, a que foi o recurso. Se o titulo executivo é sentença penal condenatória (art. 584, II), tem-se de ir ao juízo civil competente para tal missão (art. 575, IV). Se houve juízo arbitral (art. 1.098), a com:petência é do juiz que homologou a sentença arbitral (art. 575, III). Quanto ao juiz que profere a sentença exeqiienda, regem os arts. 94-124 e 575, II. Quanto ao tribunal de que proveio o acórdão, se oniginariamente competente, é ele, e só ele, o órgão competente para a ação executiva (Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 119, 1, n); e Código de 1973, art. 575, 1: “os tribunais superiores, nas causas de sua competência originária”). A regra jurídica constitucional sobre competência do Supremo Tribunal Federal para a execução das suas sentenças, se originária a competência, não aparece quanto aos Tribunais Federais de Recursos. A ratio legis está em que não há competência dos Tribunais Federais de Recursos, análoga à do Supremo Tribunal Federal (art. 119, 1,. c): “litígios entre Estados estrangeiros ou organismos internacionais e a União, os Estados, o Distirto Federal ou os Territórios”; art.; art. 119, 1, d): “as causas e conflitos entre a União e os Estados ou Territórios ou entre uns e outros, inclu-~ sive os respectivos órgãos de administração indireta”). O Supremo Tribunal Federal julga, originariamente, “a execução das sentenças, nas causas de sua competência originária, facultada a delegação de atos processuais” (Constituição de 1967, com a

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Emenda n. 1, art. 119, 1, n), o que seria impróprio meter-se no art. 122, 1, referente aos Tribunais Federais de Recursos, porque não há tais sentenças, com 3 de executividade, de sua competência originária. Não se diga que há tal competência dos Tribunais Federais de Recursos, em se tratando de mandado de segurança e de ação rescisória (art. 122,. 1, a), in fine, e c), porque a ação de mandado de segurança é ação mandamental, e não condenatória, e tem apenas 2 de executividade (da sentença não poderia derivar ação executiva), e a ação rescisória de sentença, ação em que o peso preponderante (a força) de eficácia é constitutiva negativa, exceto se rescisória de sentença declarativa, porque então há 5 de declaratividade e 4 de constitutividade negativa. Se a sentença rescindida é executiva, há 5 de constitutividade negativa e 4 de executividade. Em nenhuma das espécies se pode falar de ação executiva resultante de sentença de mandado de segurança, ou de rescisão de sentença. A atitude do legislador constitucional foi acertada: não há ação de execução de sentença proferida em causa da competência originária dos Tribunais Federais de Recursos. Quanto às sentenças proferidas em juízo singular de primeiro grau, tinha-se: de assentar a sua competência para as ações executivas de sentença que ele proferiu (art. 575, II). Feitos esses exames do passado, advirta-se que o Código de 1939, art. 884, III, disse competir a ação de execução de sentença “ao juiz da ação”, e o Código de 1973, art. 575, II, estatui que a execução fundada em título judicial se processa perante “o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição”. O apego à continuidade da competência permanece. 3)SENTENÇAS DOS TRIBUNAIS SUPERIORES. Nas causas de competência originária, foi atribuida ao Supremo Tribunal Federal a competência para a execução das suas sentenças, pelo princípio (exclusivo, em vez de concorrente) de que o juízo que proferiu a sentença é competente para executá-la. Ai, porém, a razão da determinação ratione materiae contagia-se ao dado de conexão formal e faz a competência improrrogável contra o Supremo Tribunal Federal, nas execuções. O art. 483 não torna “dispositivo” o art. 575, 1. Diz a Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 119: “Compete ao Supremo Tribunal Federal: 1 processar e julgar originariamente: n) a execução das sentenças, nas causas de sua competência originária, facultada a delegação de atos processuais.” A respeito, leia-se o que dissemos nos Comentários á Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, III, 2.~ ed., nota 25) ao art. 119. Vale para os Tribunais de Justiça o que acima se disse quanto ao Supremo Tribunal Federal e quaisquer outros tribunais. A regra jurídica é ratione materiae. A delegação é permitida, se a lei de organização não a veda. Quanto à homologação de sentença estrangeira, na Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 119, 1, g), 2.~ parte, diz-se que o Supremo Tribunal Federal é competente para processar e julgar, originariamente, a homologação das sentenças estrangeiras. No art. 125, X, acrescenta-se que tem a competência para a execução das sentenças estrangeiras,homologadas pelo Supremo Tribunal Federal, os juizes federais. A homologação da sentença estrangeira é importação da eficácia da sentença de outro Estado. Homologa-se a sentença e não se conferem efeitos que a sentença estrangeira não tinha: a sentença estrangeira não passa a ser sentença do Supremo Tribunal Federal. Diferente é o que se passa com a homologação do laudo arbitral, em que nada se importa e apenas se faz judicial o que não era, posto que fosse julgamento, mas julgamento extrajudicial. Se há duas sentenças executandas, entre cujos conteúdos há conexão (“o objeto ou a causa de pedir”, art. 103), pode o juízo, perante o qual se iniciaram, ordenar a reunião das ações propostas em separado (art. 105), porque aí está interesse do Estado. A competência do juízo da ação executiva de sentença é exigência que não faz coincidirem execução da sentença proferida numa ação e unicidade do processo executivo. Se a mesma sentença condena a prestar coisa certa, coisa incerta, a fazer, ou a não fazer, ou a fazer e a não fazer, e prestar quantia, a cada uma das espécies de condenação corresponde uma ação, com o seu procedimento especifico. No juízo em que se proferiu a sentença, ou o acórdão (se houve a competência originária do tribunal superior), a ação executiva de título judicial é que se há de propor, conforme as regras jurídicas dos arts. 575, 1 e II, e de certo modo conforme o art. 575, III. Se o devedor mudou de domicílio (arts. 94 e § § 1.0, 2.0, 3•o e 4~o, 98, 100, III) ou de residência (art. 100, 1 e II), tal circunstância de modo nenhum influi no tocante à competência para a propositura da ação executiva de sentença. O juízo que julgara está em posição de melhor executar o que decidira. A regra jurídica do art. 575, 1, como a do art. 575, II, atende a isso, à prioridade decorrente da ligação entre o processo de cognição e o de execução. Se, por exemplo,alguma regra jurídica de organização judiciária alterou a competência pelo valor das causas, para mais, ou para menos, o que importa é a competência ao tempo da propositura da ação e da sentença com 3 de executividade. (Dissemos “ao tempo da propositura da ação e da sentença”, porque pode ter ocorrido que lei intercalar haja passado os processos pendentes a outro juízo. Então, competente é o juízo da sentença.) Uma vez que a lei só se refere aos tribunais superiores, nas causas de sua competência originária, e ao juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição, não se tem de pesquisar qual o juízo competente no momento da propositura da ação executiva de título judicial. Todavia, se alguma nova Constituição, ou alguma emenda constitucional, alterasse o art. 119, 1, n), da Constituição de 1967, com o Emenda n. 1, retirando a competência para a execução das sentenças do Supremo Tribunal Federal, ou lhe atribuísse competência para executar as

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sentenças estrangeiras que ele homologasse, ou desse tal competência a algum juízo especial, o texto constitucional passaria à frente do art. 575 1 e II. 4)SENTENÇA DOS juizos DE PRIMEIRO GRAU. Já vimos à nota 1) que o art. 575, II, contém regra jurídica da mesma classe que a regra jurídica do art. 575, 1, e não de classe superior, em que as espécies se incluissem. Lê-se como dissesse “o juízo do primeiro grau que julgou a ação”. Porque o Supremo Tribunal Federal e os outros tribunais, na espécie do inciso 1, também são juizes “da ação”. A conveniência técnica em se miudearem as espécies está em se poder confundir a natureza da competência ratione materiae do art. 575, 1, com a competência connexitatis formalis, causa do art. 575, II, aquela absoluta e essa relativa. O juízo da ação está, no art. 575, II, por juízo da ação em que se proferiu a sentença de carga 3 de executividade. Não se trata do “juiz” que proferiu a sentença (cf. art. 132). Se, durante a ação, ocorreu algum dos pressupostos do art. 132, sim: o art. 132 incide. Após a sentença, de modo nenhum (1.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 8 de agosto de 1950, R. dos T., 188, 741; 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco, 14 de setembro de 1951, A. F., 308, quanto ao Código de 1939). Se a nova lei de organização judiciária ou alguma emenda fez os casos de competência para a ação de condenação ser de outro juízo, a competência para execução acompanha a da ação, como se a ação de condenação tivesse de ser proposta sob a vigência da nova lei (no mesmo sentido, as Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 11 de maio de 1951, R. F., 139, 184). Juízos de primeiro grau são o juízo federal (Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, arts. 123-126) e os juízos estaduais, que se subordinam às regras jurídicas da organização judiciária. Os titulares das ações executivas de sentenças estão vinculados ao mesmo juízo em que se proferiu a sentença; e tem de respeitar a regra jurídica processual o próprio juízo julgador, mesmo se houve recurso e foi reformada a sentença, inclusive se ela fora desfavorável à condenação. O que transitou em julgado é o que importa. O art. 575, II, fez bem em referir-se a “juízo”, e não a juiz, porque se trata do órgão, e não de quem exerce a função. 5)Juiz TRANSFERIDO, PROMOVIDO OU APOSENTADO. (a) O art. 132 é aplicável ao processo da execução para efeito de ter de proferir as sentenças o juiz (identidade física) que dirigiu a fase executória (3.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 11 de setembro de 1940, R. dos T., 128, 139). Não, porém, para obrigar ao mesmo juiz (identidade física) da ação o proferimento das sentenças, ou, sequer, para a iniciação do processo executivo. (b) Não cabe, ainda mais, discutir se o juiz a, que proferiu a sentença a, foi competente por prorrogação, ou tinha competência própria (SILVESTRE GOMES DE MORAIS, Tractatus de Ezecutionibus, III, 269). Naturaimente, se improrrogável a jurisdição, o juiz pode, desde logo, denegar execução. Mas o art. 87 ai não se aplica, porque se trata de outra ação; e a superveniência da competência ratione materiae prevalece contra o art. 575, II. Idem, outras competências supervenientes. (c) ~ possível que o juiz da ação esteja dentro da sua alçada (e. g., nos casos de sentença ilíquida cuja condenação caiba na alçada e cuja liquidação exceda) e a execução não esteja. Pergunta-se, ~,mantém-se a competência do art. 575, II? A resposta tem de ser afirmativa, pela prevalência das regras jurídicas de processo em relação à regra de organização judiciária (de fonte legislativa múltipla) e pelo princípio, que lhe corresponde, de não as quebrar. Idem, no direito particular territorial, no tocante ao direito geral; mas a 1 •a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de S~ Paulo, a 10 de julho de 1941 (R. F., 89, 507), adotou atitude contraditória: ainda que o valor apurado na execução não caiba na alçada do juiz, é ele o competente para a execução; todavia, afirmou que a regra jurídica, então correspondente à do art. 575, II, está subordinada (?!) aos princípios da lei de organização judiciária. Ora, regra jurídica sobre alçada não quebra regra de determinação da competência como as dos arts. 86-111. (d) Se a regra jurídica do art. 575, ii, é regra jurídica de competência ratione materiae, ou pela hierarquia, não há prorrogação possível. Se não é, a conexão formal do art. 575, II, determina competência relativa e pode haver forum prorogatum. Teve toda a razão, nesse ponto, AMILCAR DE CASTEO (Comentários, X, 23), que, aliás, não distinguiu, como fora de mister, as espécies do art. 575, 1 (então Código de 1939, art. 884, 1 e II), e a do art. 575, II (antes, art. 884, III). Se a sentença foi proferida pelo juiz de primeiro grau, a regra jurídica do art. 575, II, não é ratione materiae. Se foi proferida, em competência originária, pelo Supremo Tribunal Federal, ou por outro tribunal superior, o critério determinativo da competência foi funcional, portanto ratione materiae. Não há prorrogação. 6)SENTENÇAS ARBITRAIS. O art. 575, III, apanha as sentenças homologatórias de laudos arbitrais (arts. 1.095- -1.098), quanto a quaisquer negócios jurídicos que tendam à exigência de prestação e façam nascer pretensão a executar. Não as sentenças estrangeiras homologatórias de laudos arbitrais, porque essas só se executam depois de

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homologadas pelo Supremo Tribunal Federal (arts. 483 e 484). Já nas Ordenações Filipinas, Livro III, Título 16, § 2, se dizia que à sentença proferida pelos árbitros “se dará execução pelos Juizes ordinários, quer no compromisso fosse posta pena, quer não, assim como se daria à execução, sendo dada pelos Juizes ordinários”. Aliás, já isso estava nas Ordenações Manuelinas, Livro III, Título 81, § 2. Havia o problema da competência para execução, além do problema da função dos árbitros com o laudo arbitral, que se chamava sentença, como está no Código de 1973, art. 1.078 (nos arts. 1.081 e 1.095-1.100 está “laudo”). Aí, “sentença” está em sentido amplo, como decisão pelos árbitros. Proferida pelo juiz arbitral, ou pelos juizes arbitrais, functus est off icio suo. O ofício acaba sem se prescindir de homologação; com a homologação judicializa-se a sentença e tal judicialização permite a execução. Qual o juízo que deva executar depende de regra jurídica de competência. Já se não trata da função dos árbitros. Tem-se pretendido que a permissão do juízo arbitral se choca com o art. 153, § 4~O, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, como se chocava com o art. 141, § 4~o, da Constituição de 1946. Sem razão, porque a execução depende de homologação e a escolha do árbitro ou dos árbitros foi de livre vontade dos interessados. Salvo cláusula contrária do negócio jurídico do compromisso (art. 1.078), a “sentença” (laudo arbitral) não fica sujeita a recurso. ~ necessária a homologação, com o processo que se regula nos arts. 1.098--1.102. Há o recurso da sentença homologatória ou que negou a homologação, recurso que é o de apelação, mesmo se houve cláusula de se não se poder recorrer da sentença que homologou ou não (art. 1.101 e parágrafo único). O laudo arbitral tem de ser homologado. A homologação é por sentença (art. 1.096). Depois de homologado, isto é, depois do ato judicial que torna sentença aquilo que não era sentença, mas sim laudo dos árbitros, a eficácia é a da sentença judiciária, diz o art. 1.097, o que não está errado, porque apenas se distingue da sentença judiciária (stricto sensu) a sentença homologante. O sistema jurídico repele que se chame sentença ao laudo arbitral que ainda não foi homologado, feito sentença. No art. 575 diz-se “juízo que homologue a sentença arbitral”, o que dilataria o conceito de sentença. O laudo arbitral fez-se sentença com a sentença que o homologa (= que torna igual, idêntico à sentença), porém não antes. 7)COMPETÉNCIA CIVIL PARA EXECUção DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. O art. 575, IV, supõe que se saiba qual o juízo competente para a execução da sentença penal condenatória. No direito processual penal prevêem-se condenações que tenham 3 de executividade, para se apurar o que há de ser prestado e como há de ser prestado, ou somente como se há de prestar. No art. 584, II, diz-se que é título executivo judicial a sentença penal condenatória, transitada em julgado. Ao tempo do Código de 1939, que era omisso, invocava-se a respeito o Código de Processo Penal de 1941, art. 63: “Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para efeito de reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros”. A redação não era boa, porque nem todas ascondenações são de reparação do dano stricto sensu. No direito material penal disse-se que o tornar certa a obrigação de indenizar é um dos efeitos da condenação. O que se há de frisar é que, antes, havia duas ações condenatórias, a do juízo criminal e a do juízo civil, de modo que, tendo havido a sentença penal condenatória, se propusesse a ação condenatória civil, com base na sentença proferida na ação penal, para que nascesse a ação executiva sentencial, que seria ação executiva de título judicial civil. A inovação foi acertada, porque se fez bastante a sentença penal condenatória, sem se precisar de ação civil condenatória intercalar. Mas já estava no Código de Processo Penal, art. 63. Sempre que a sentença penal condenatória entra na classe das sentenças executáveis no juízo cível, tal juízo éo competente para a execução. 8)SENTENÇAS DE PARTILHA. A execução das sentenças de partilha (ari. 1.027 e parágrafo único) faz-se mediante formal de partilha, ou mediante a certidão. Discutiu-se se alguma das regras jurídicas que estão hoje no art. 575 lhe é aplicável, notadamente o art. 575, II e III. (a) Se é, compete ao juiz da ação a execução da sentença, expedindo precatória, depois da propositura da ação executiva do titulo. (b)Se não é, o formal ou a certidão é titulo executável onde se acharem os bens, não sendo preciso a precatória. As Câmaras Reunidas do Tribunal de São Paulo, a 13 de agosto de 1941 (A. J., 60, 83), entenderam que é verdadeira a solução (a). Os argumentos, que poderiam ter seriam: o de que o processo é o mesmo das demais execuções; o art. 575 é regra jurídica de competência, regra de direito processual; lege non distinguente, (a) é preferível à solução (b). Contra, teríamos: no art. 575 não se admitiu o mandado como expediente de execução das partilhas, exigiu-se o formal ou a certidão; haveria conveniência prática em se terem como competentes os juizes da situação (forum rei sitae). O primeiro argumento contrário é fragílimo; vimos em nota anterior que o mandado foi apenas criação commoditatis causa, e não necessitatis causa; o segundo pouco pesa, pois a concentração de execução também é razão de comodidade. Temos agora de encarar o assunto diante dos textos de 1973. No Código de 1939, art. 510, dizia-se que “o formal e a certidão de partilha terão força executiva contra o inventariante, os herdeiros e seus sucessores a título universal

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ou singular, sendo o processo o mesmo das demais execuções”. No Código de 1973, art. 1.027, estatui-se que, trânsita em julgado a sentença de partilha, recebe o herdeiro os bens que lhe tocam e um formal de partilha. No art. 1.028 permite-se emenda na partilha, convindo as partes, se houve erro de fato na descrição dos bens. O que mais importa é saber-se que a sentença em ação de inventário e partilha é ação executiva (5) com 4 de eficácia declarativa (eficácia imediata), 3 de mandamentalidade (eficácia mediata). Por isso, na própria ação pode ser pedida a execução, por mandado. 9)CUMULAÇÃO MATERIAL DE PROCESSOS E CUMULAÇÃO DE AÇÕES. O Código não foi explícito em permitir que a execução da sentença corra, por comodidade do exequente (Tribunal de Justiça de São Paulo, 28 de janeiro de 1932, R. dos T., 81, 289), nos próprios autos da ação (cf. mesmo Tribunal, 25 de abril de 1933, 1?. dos T., 87, 371); mas essa unicidade material de processo se entende permitida, não-obrigatória, pois é rompível quando pareça ao juiz ser conveniente ao interesse de justa e fiel execução (cp. art. 105). Trata-se de cumulação material de processo, não de ações. A unicidade é só material. A cumulação de ações ou é de duas ou mais ações executivas, ou é de cumprimento de sentença, por ser a sentença de carga de eficácia executiva imediata (4), de modo que cumpri-la é executá-la. Então, não há ação iudicati (= não se propõe outra ação, que seria a de execução de sentença): execução, aí, é eficácia imediata e não mediata da própria sentença, por ser a sentença condenatória-executiva, ou constitutiva-executiva, ou declarativa-executiva, ou mandamental executiva. São ações declaratórias executivas a ação de habilitação em inventário e partilha e a de habilitação incidente, se tem saisina, ou não na tem, o sucessor. São ações constitutivas-executivas a ação de decretação de nulidade, a ação de anulação com eventual cumulação da ação de restituição ou de indenização com o equivalente, a ação de desquite amigável, a ação de alimentos provisionais e a ação de arrematação. São ações condenatórias-executivas as de ressarcimento à parte lesada (art. 881, parágrafo único), em se tratando de atentado em ações executivas de títulos executivos extrajudíciais. São ações mandamentais-executivas as ações de entrega de bens próprios e as ações de posse em nome do nascituro (arts. 877 e 878). 10)EMBARGOS DE TERCEIROS. Quando os embargos de terceiros contêm questão que não pode ser incluída na competência do juízo da execução, o conhecimento e o julgamento deles pertencem ao juiz ratione materiae ou pela hierarquia, atendidos os arts. 111, 1Y~ parte, e 113 (cf. art. 99, parágrafo único). O art. 87 não é invocável, pois nele se diz, com toda explicitude: “Determina-se a competência no momento em que a ação é proposta. São irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posterior-mente, salvo quando suprimirem o órgão judiciário ou alterarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia”. A competência absoluta é que mais importa. Sobre o assunto, Tomo II, 151-160. Quanto aos embargos do devedor, a competência é sempre do juízo ou tribunal em que se iniciou a ação executiva. A diferença atende aos princípios. Não se compreenderia, por exemplo, que o terceiro, que alega ser o dono do bem penhorando, que se acha em litígio entre Estado estrangeiro e a União, ou algum Estado-membro, ou o Distrito Federal ou algum Território, ficasse sujeito a sentença do juízo exeqúente (cf. Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 119, 1, c). Art. 576. A execução, fundada em título extra judicial ‘), será processada perante o juízo competente, na conformidade do disposto no Livro 1, Título IV, Capítulos II e III 2)• 1)ExEcuçÃo DE TITULO EXTRAJUDIcIAL E COMPETÊNCIA. A competência do juiz, se se trata de ação executiva de titulo extrajudicial, é regida pelos arts. 86-124. O foro do domicílio vem em primeiro lugar. Se há dois ou mais domicílios, no foro de qualquer deles. Se incerto ou desconhecido o domicilio do devedor, onde for encontrado, ou no foro do domicílio do credor. Se não tem domicílio nem residência no Brasil, no foro do domicílio do autor; se ambos não têm, em qualquer foro (art. 94 e §§ 1.0, 2.0 e 3.0). Se há dois ou mais devedores, com diferentes domicílios, a ação pode ser proposta no foro de qualquer deles (art. 94, § 4.0). Se o devedor faleceu, mesmo se fora do Brasil, o foro é o do seu último domicílio (art. 96). Se não tinha domicílio certo, o foro é o da situação dos bens. Se, em tal caso, tinha bens em lugares diferentes, o foro é o do lugar em que ocorreu o óbito (art. 96, parágrafo único). Se faleceu no estrangeiro, sem ter domicilio certo no Brasil, temos de entender que se pode propor a ação em qualquer lugar em que sejam situados os bens ou alguns deles. O foro do Brasil é o do devedor, qualquer que seja a sua nacionalidade, se domiciliado no Brasil; e a ação executiva de título judicial brasileiro ou de título extrajudicial que haja de ser adimplido no Brasil, tem de ser proposta no Brasil (cf. art. 88, II). A respeito da competência para as ações executivas, em se tratando de título extrajudicial, pode haver competência ratione materiae ou pela hierarquia. Pense-se na Constituição

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de 1967, com a Emenda n. 1, art. 119, 1, n), o que não consta do art. 122, que é sobre a competência dos Tribunais Federais de Recursos. As leis de organização judiciaria dos Estados--membros, do Distrito Federal (art. 17) e dos Territórios (art. 124) podem estabelecer regras jurídicas semelhantes, cf. art. 99 e parágrafo único do Código de Processo Civil. Observemos que a referência à incompetência absoluta (art. 485, II, 2.a parte) que foi posta em vez de incompetência ratione materiae, que estava no Código de 1939, art. 798, 1, a), 2.a parte e no Regimento n. 737, de 25 de novembro de 1850, art. 680, § 1.0, foi acertada. A incompetência absoluta abrange a ratione materiae e a pela hierarquia. A melhor solução foi essa, que de algum modo estava no pensamento de J. A. PIMEI.ITA Bu~o (Apontamentos sobre as formalidades do Processo Civil, 40), quando se referiu a não ser “prorrogável a juxisdição do juízo comum para as causas que a lei submeteu a juízos privilegiados ou especiais”, pois “não é prorrogável a jurisdição desde que a lei expressa ou implicitamente impediu a dilatação do poder do magistrado, e ela impede já quando ela cria juizes privativos para conhecer delas, já e independentemente disso quando não lhes dá autorização para conhecer de certas matérias, ou dá-lhes o poder, embora geral, todavia limitado quanto a algum assunto”. ~ erro dizer-se que se hão de considerar sinônimas as expressões “incompetência ratione materiae” e “incompetência absoluta”, como fizeram E. GLAssoN e A. TISSIER (Traité Théorique et pratique d’Organisatiou judiciaire, de Com pétence et de Procédure civile, 1, 3.a ed., 674). Sem razão os comentários do Código de 1973, que não atendem à dupla: incompetência ratione materiae e incompetência pela hierarquia. As duas classes enchem o conceito de incompetência absoluta. Afirmar-se a sinonímia da competência ratione materiae e da competência pela hierarquia choca-se com os arts. 111, 113 e 485, II. Se, por exemplo, se chama competência ratione materiae a do Supremo Tribunal Federal para as ações de mandado de segurança contra o Presidente da República, da Mesa da Câmara dos Deputados ou do Senado, do Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas da União, e para as ações de mandado de segurança propostas pela União contra Governo estadual (Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 119, 1, i), há deturpação do conceito. Ai, a competência atende à hierarquia, e não à matéria. Idem, no tocante ao art. 122, 1, c), que é relativo à competência originária do Tribunal Federal de Recursos. Tratemos de levar em consideração o sistema jurídico brasileiro e o Código de 1973. 2) PRECISõES. A despeito da solução uniformizadora que se deu aos processos de execução, de títulos judiciais e de títulos extrajudiciais, tinha-se de aludir a que, no processo de execução de títulos extrajudíciais, há a cognição. Esse elemento a mais tinha de levar à diferença das regras jurídicas dos arts. 575 e 576, porque a competência tinha de ser, quanto aos títulos judiciais, a do juízo da sentença proferida na ação de que resultou a sentença com 3 de executividade, e os embargos do devedor, nas execuções de títulos extrajudiciais, tinham de conter a matéria alegável nos embargos do devedor opostos à ação executiva de títulos judiciais mais qualquer outra que seria deduzível como defesa (contestação) no processo de conhecimento (art. 745). Nas ações executivas de títulos judiciais já houve antes a sentença, com 3 de executividade, proferida na ação de cognição (nem sempre ação condenatória típica). Nas ações executivas de títulos extrajudiciais, dois julgamentos vai haver, porque apenas a lei atribuiu aos títulos eficácia executiva sem coisa julgada a respeito. Não se diga que tal tratamento desfavorece o credor de título extrajudicial: ele foi beneficiado, excepcionalmente, pela antecipação da execução, pondo-se na mesma ação a de cognição e a execução. Quanto à competência, a ação executiva de título extra-judicial é movida no juízo em que seria intentada a ação de condenação, de modo que o tratamento, no fundo, é o mesmo: competente o juízo a para a ação de condenação também o é para a ação executiva de titulo extrajudicial e para a ação executiva de título judicial, porque ai no juízo a se propôs a ação de que resultou a sentença. Aplica-se quanto à competência para as ações executivas de títulos extrajudiciais o que se estatui no Livro 1, Título IV, Capítulos II e III. E não podia deixar de ser assim, porque nenhuma ação as precedeu, de modo que tal ocorrência pudesse influir nas regras jurídicas de competência. Portanto, quanto à competência no plano internacional, regem os arts. 88-90; quanto à competência no plano interno, os arts. 91-124. Assim, a ação executiva de titulo extrajudicial tem de ser proposta no Brasil se o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, está domiciliado no Brasil, ou se no Brasil tem de ser cumprida a obrigação, ou se a ação se originou de fato ocorrido ou praticado no Brasil (art. 88, 1-111). Para o fim do que se diz no art. 88, 1, reputa-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que aqui tem agência, filial ou sucursal (art. 88, parágrafo único). Além disso, compete à Justiça brasileira, exclusivamente, conhecer das ações relativas a imóveis situados no Brasil, e proceder a inventário e partilha de bens, situados no Brasil, ainda que o falecido fosse estrangeiro e haja residido fora do território brasileiro (art. 89, 1 e II). Se a ação executiva de títulos extrajudiciais, que tinha de ser intentada no Brasil, não o foi, mas o foi no estrangeiro não houve nem há litispendencia. Nada impede que se proponha no Brasil a ação executiva de título extrajudicial e até mesmo ação conexa (art. 90). Passemos a falar da competência no plano interno. Os primeiros elementos para a determinação, que o Código de

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1973 aponta, são o valor da causa e a matéria, conforme as regras jurídicas da organização jurídica. Se há pluralidade de títulos executivos extrajudiciais, somam-se os valores de todos. A matéria leva a distinções de juízos, como acontece com as execuções em que credora ou devedora é a União. A organização judiciária estadual pode fazer discriminações. O Código, art. 92, 1, fez competente exclusivo o juiz de direito para processar e julgar o processo de insolvência. A ação executiva de títulos extrajudiciais pode ser proposta no foro do domicílio do réu, o que é a regra jurídica precípua (art. 94). Se o réu tem dois ou mais domicílios, no foro de qualquer deles (art. 94, § 1.0). Se incerto ou desconhecido o domicilio, onde for encontrado ou no foro do domicílio do autor (art. 94, § 2Y). Se o réu não tem domicilio nem residência no Brasil, a ação executiva há de ser no foro do domicílio do autor (art. 94, § 3i~, 1.a parte). Se também o autor não tem domicílio, nem residência no Brasil, a propositura é em qualquer foro (art. 94, § 3i~, 2.~ parte). Mas tudo isso tem de atender a que, no art. 100, IV, d), se estatui que écompetente o foro do lugar onde a obrigação há de ser satisfeita, para a ação em que se lhe exigir o cumprimento. Portanto, se no título executivo extrajudicial explícita ou implicitamente consta o lugar em que se há de prestar a divida, aí é que se tem de propor, pondo-se de lado outras regras jurídicas. Se a prestação é de bem imóvel, rege o art. 95, onde se diz que, nas ações fundadas em direito real sobre imóveis, é competente o foro da situação; mas pode o autor optar pelo foro do domicílio ou da eleição. Os arts. 102-111 (modificações da competência) e 112-124 (declaração de incompetência) incidem. Têm-se de observar os arts. 92, 1 (caso de insolvência) e 99, parágrafo único, 1 (se o foro seria o da capital do Estado-membro ou do Território). Têm-se, portanto, em tudo que se aplica quanto a competência para a ação executiva de títulos extrajudiciais, a ligação às regras jurídicas concernentes às ações de processo de conhecimento, de iflicio, e a ligação, para a ação executiva de sentença, às mesmas regras jurídicas, mas por terem sido as que regeram a competência para a ação de cuja sentença resultou o peso 3 de executividade. Sobre a execução fiscal, sob o art. 578 e parágrafo único. Se alguém tem de propor ação que está atingida por eficácia de litispendência, oriunda de citação em processo em que houve esvaziamento (Erledigung) do objeto da demanda, da res in iuclicium deducta, ou pede, antes, a declaração de esvaziamento (Erledigungserklãrung), para que cesse a litispendência (LEO ROSENBERG, Lehrbuch des Zivilprozessrechts, ~ ed., 572), ou, se a eficácia da ação a propor-se se contaria na da ação em que se deu esvaziamento, a propõe como ação incidental, autuado o seu processo em apenso aos autos da ação em que o esvaziamento se deu. A apensação, aqui, é sujeita à condição resolutiva de declaração do esvaziamento. Se foi pedida a apensação e cumulativamente a declaração de esvaziamento, a qualquer momento pode ser deferido esse pedido, desapensando-se, em consequência, os autos. Porém, ainda se não foi pedida a declaração de esvaziamento, entende-se que a apensação se desconstitui com a superveniente declaração de esvaziamento. Nos processos executivos de títulos extrajudiciais, há adiantamento de execução, por se ter admitido, no sistema jurídico que se conhece com cognição não plena. Há, portanto, cumulação de ações: de condenação e de execução. Nos processos executivos de títulos judiciais (sentenças> já se julgou a ação de condenação, ou outra, em que a sentença tenha eficácia executiva 3. Nesses processos, a citação para satisfazer ou sofrer a penhora não é citação para ação de condenação e para ação de execução. Só o é para ação de execução. Naqueles, não: a citação é para as duas ações, cumuladas, em virtude de memoráveis sugestões históricas. Art. 577. Não dispondo a lei de modo diverso2), o juiz determinará os atos executivos’) e os oficiais de justiça os cumprirão. 1)DETERMINAÇÃO DOS ATOS DE EXECUÇÃO. A citação do devedor é, de ordinário, para pagar ou nomear bens àpenhora. Os atos que se seguem são atos do oficial de justiça (art. 652 e §§ 1.0 e 2.0, e art. 653), inclusive quanto ao arresto, de que é intimado o credor. Quanto a quaisquer atos que dependam de pedido ou requerimento das partes, ao juiz cabe determinar que se pratiquem. Não só está aí função fiscalizadora do juiz; cumpre-lhe fazer eficiente o procedimento executivo, sem que com isso se deixe de invocar qualquer relevaniento da missão das partes ou dos serventuários da justiça. Atos executivos são quaisquer atos que sejam elementos da execução, conforme a lei. Os atos podem ser do devedor, ou de terceiro, ou do órgão judicial, e até mesmo, excepcionalmente, do credor, porque, por exemplo, tem de contra-prestar (art. 582 e parágrafo único), ou teve de promover a liquidação da sentença (art. 603), ou há o levantamento da coisa depositada (art. 623), ou a determinação da coisa pelo credor (art. 629), ou o adiantamento a que se refere o art. 634, § 70 2)REGRA JURÍDICA QUE AFASTE A ATIVIDADE DO juiz. Sempre que cumpre à parte praticar os atos executivos, dentro do prazo, ou diante de regras jurídicas processuais como as do art. 265, não tem o juiz o dever de velamento e de atividade. O adimplemento da obrigação executanda pode ser diretamente feito pelo devedor, ou pelos devedores, se há dois

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ou mais, ou por algum deles ou alguns deles. Aí há execução voluntária, a despeito da citação. A execução forçada supõe ato executivo do juízo, pois não houve vontade do devedor ou dos devedores e de certo modo tudo se passa contra sua vontade. Pode acontecer que o Estado não possa ir até a solução da dívida, tal como se esperava, razão para se substituir a prestação pelo ressarcimento de perdas e danos. O juiz é o órgão que atende à pretensão à tutela jurídica que o exequente exerceu. Os atos para se chegar à execução são, de ordinário, através de auxiliares de justiça, dentre os quais estão em primeiro plano os oficiais de justiça. Se o fato (quase sempre o ato) pode ser prestado por terceiro, pode o juiz, a requerimento do credor, determinar que o terceiro o realize à custa do devedor (art. 634). No art. 634, os § § 1.0, 2.0 e 30 tratam da nomeação de perito para a avaliação do custo da prestação, do edital de concorrência pública, das propostas e da escolha. Art. 578. A execução fiscal (art. 585, VI) será proposta no foro do domicilio do réu; se não o tiver, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado 1)• Parágrafo único. Na execução fiscal, a Fazenda Pública poderá escolher o foro de qualquer um dos devedores2), quando houver mais de um, ou o foro de qualquer dos domicílios3) do réu; a ação poderá ainda ser proposta no foro do lugar em que se praticou o ato ou ocorreu o fato que deu origem à divida, embora nele não mais resida o réu, ou, ainda, no foro da situação dos bens, quando a dívida deles se originar4). 1)EXECUÇÃO FISCAL. Com a certidão de divida ativa da Fazenda Pública da União, de Estado-membro, do Distrito Federal, de Território ou de Município, pode ser pedida a execução de título extrajudicial. A ação executiva de título extrajudicial, que a entidade estatal propõe, há de ser no foro do domicílio do réu; se não o tem, no de sua residência, ou no do lugar onde for encontrado. A lei cogitou no art. 578, parágrafo único, das hipóteses em que o réu não tem domicílio nem residência, ou lugar em que se encontre. O legislador de 1973 reproduziu, pondo no Código, o que constava do Decreto-lei n. 960, de 17 de dezembro de 1938, evitando que se tivesse de invocar lex specialis. Não há grande diferença em relação às regras jurídicas concernentes às outras execuções. Se é de notar-se que se supõe a falta de domicilio para a propositura ser no foro da residência, no que foi omisso o art. 94, havemos de entender que o art. 578 serve para a própria interpretação do art. 94, a que não se pode furtar o entendimento, diante do art. 94, § 3.~ (“o réu não tiver domicílio nem residência”). O lugar em que for encontrado o devedor basta para o foro da competência se não tem domicilio nem residência (ou não se saiba onde seja). Se não tem domicilio nem residência, e não se encontra em algum lugar, ~qual a solução? Há o art. 100, IV, d), que reputa competente o foro do lugar onde a obrigação deve ser satisfeita, para a ação em que se lhe exige o cumprimento. Mas o art. 578, parágrafo único, foi explícito. 2)PLURALIDADE DE DEvEDORES. Se a dívida, a mesma divida, é de duas ou mais pessoas (e. g., comuneiros de terras, condôminos de edifício, cônjuge, herdeiros do devedor), a Fazenda Pública pode escolher o foro de qualquer dos devedores, salvo se já foi proposta alguma ação em que os comuneiros sejam representados, como ocorre com a divida do decujo, transmitida aos herdeiros que já constam da ação de inventário e partilha, ou se a dívida concerne a bem imóvel cujos condôminos alienaram a uma só pessoa. Ai, bá ligação do elemento subjetivo ao elemento objetivo. 3)PLURALIDADE DE DOMICÍLIOS. A dívida fiscal pode ser cobrada em execução no foro de qualquer dos domicílios do devedor, o que de certo modo abstrai de ser a dívida oriunda de um dos lugares em que tem domicílio do devedor, e não de outro em que também tem domicílio, sem que aí tenha surgido a divida (e. g., imposto predial). Na parte final do art. 578, parágrafo único, alude-se ao lugar em que ocorre o fato de que se originou a dívida, mesmo se nele não residia, ou não mais resida o réu, e ao foro da situação dos bens. 4)ORIGEM DA DIVIDA. A despeito da ordem em que estão as regras jurídicas do art. 578, parágrafo único, havemos de entender que vem em primeiro lugar por ser mais aconselhável o foro da situação dos bens, se deles se originou a dívida, ou o do ato ou fato de que ela se irradiou; depois, qualquer um dos domicílios do devedor. Art. 579. Sempre que, para efetivar a execução, for necessário o emprego2) da força policial 1), o juiz a requisitará. 1)FORÇA POLICIAL. No processo executivo, duas emergências aparecem em que o juiz pode requisitar força policial para a prática de atos processuais: qualquer que seja o ato necessário à execução pode o juiz requisitar a força policial, que fica a seu serviço e sob suas ordens (art. 579); se está por ser feita, ou a fazer-se a penhora, e há

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necessidade de a força policial auxiliar os oficiais de justiça (art. 662). Um dos exemplos se tem no caso de o devedor fechar as portas da casa, ou os portões dos terrenos. Aqui, o oficial de justiça comunica o fato ao juiz, que dá a ordem de arrombamento, com mandado aos oficiais de justiça (art. 661; “dois”), a quem a força policial ajuda. Se o devedor ou possuidor ou tenedor do bem penhorável resiste, há a prisão (arts. 662 e 663). Não se precisa de requerimento do credor, porque há o interesse do Estado em que se atenda ao que o orgão judicial decidir quanto às medidas necessárias à execução (“para efetivar a execução”). A atitude do juízo supõe que o emprego da força pública seja indispensável (“necessário”). A força pública é a estadual, ou a do Distrito Federal, ou de Território, salvo se no local não há e pode ser empregada a força pública federal. A Justiça federal, se lhe cabe o emprego da força federal, pode, conforme as circunstâncias, chamar a força estadual, distrital ou territorial. Não se precisa de requerimento do autor da ação; ao órgão judicial é que incumbe a providência. O requerimento pelo autor da ação seria algo de comunicação de fato e de vontade. Não é necessário (erro do Código de 1939, art. 934), mas pode ser feito. Juiz, no art. ~ é qualquer orgão a que caiba a competência para a execução; portanto, o juiz do primeiro grau, ou, nos casos de competência originária de tribunal (art. 575, 1), o Presidente ou o relator, conforme o Regimento Interno. Idem, o juízo deprecado. 2)PRIsÃO. A prisão é para que se torne sem dificuldade a abertura da porta ou do portão, e pode ser solto imediatamente se deixa, plenamente, de resistir. Mas os atos positivos e negativos do dono possuidor ou tenedor dos bens podem ser causa de ação penal. O Código de 1939, arts. 933 e 934, previa as espécies. O Código de 1973 não se refere a elas, mas o objetivo da requisição é “efetivar a execução”, somente em lei penal podem estar limitações, que não sejam as do próprio conceito (“efetivar a execução”). CAPÍTULO III DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA REALIZAR QUALQUER EXECUÇÃO 1)~3) 1)EXECUÇÃO E REQUIsITOs. Há dois requisitos necessários, sem os quais, portanto, não há executabilidade, quer se trate de título judicial, quer de título extrajudicial, o titulo e o inadimplemento. ~ verdade que vem em primeiro lugar o título; depois, o inadimplemento. No Código, a ordem está invertida, mas isso é sem relevância. Para qualquer execução, os dois elementos hão de estar juntos. O título executivo pode existir, e ainda não tenha havido inadimplemento, como pode ter havido inadimplemento, sem que o credor tenha título executivo, como se ainda não houve sentença que possa levar à execução, seja definitiva ou provisória, ou se a lei não conferiu executividade ao titulo extrajudicial. As regras jurídicas dos arts. 580-582 incidem a respeito de qualquer espécie de execução. Os arts. 583 e 586 concernem à execução que se funda em titulo executivo judicial e à que resulta de título executivo extrajudicial. Os arts. 584, 586, § § 1.0 e 2.0; 587, í.a e ~ parte; 588 e parágrafo único; 589 e 590 são relativos a sentenças. Mas o art. 587, 2.~ parte, também alude à execução de titulo extrajudicíal. 2)PRESSUPOSTOS OBJETIVOS. Os requisitos de que tratam os arts. 580-582 (Seção 1) e os arts. 583-590 (Seção II) são de caráter objetivo, pois que se atêm à obrigação e ao titulo, aquele requisito contenutístico e esse formal (executividade da sentença ou executividade de título extrajudicial. Requisitos de caráter subjetivo estão na Seção III. No Capitulo II, cogita-se da função do juízo. 3)OBRIGADO A PRESTAR. Fala-se, aqui e ali, de devedor, mas qualquer ação executiva tem de ir contra o obrigado a prestar. Supõe-se que tenha obrigação o devedor. Quem deve está em posição de ter o dever de adimplir. Pode não estar ou ainda não estar obrigado a isso. Então, há o dever, e não há a obrigação. Os que, em matéria de ciência jurídica, empregam “divida” e “obrigação” como se fossem sinônimos, procedem como quem falasse do “arqueiro”, referindo-se a homem que não tem arco, embora o pudesse ter e costumasse andar armado de arco. Que é “arqueiro”? perguntaria algum ouvinte; e com razão. Arqueiro é o fabricante de arcos; arqueiro é o que luta com arco; e arqueiro é o jogador de futebol que fica à entrada do arco, para impedir que a bola entre. O crédito é como o arqueiro, o homem que peleja com o arco. Pode estar armado e pode não estar. A arma é a pretensão. Crédito sem pretensão é crédito mutilado, arqueiro sem arco. Existe o crédito, porém não se pode exigir. Quem deve e não é obrigado não pode ser constrangido a adimplir, nem sofre conseqUências do inadimplemento. Quem faz o que o arqueiro quer, embora esteja ele desarmado, écomo o devedor, que não é obrigado, mas paga, presta. Quem deve e não está obrigado, como quem deve e está obrigado, e presta, satisfaz e libera-se. Se deve e não está obrigado, e não adimple, nada pode contra o devedor o credor. Se deve e está obrigado, e não adimple, incorre em

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mora. Expõe-se a que o credor exerça direito de resolução ou de resilição por inadimplemento. Responde pelas perdas e danos a que a sua mora deu causa. Se o devedor não tem (ou ainda não tem) obrigação, pode adimplir, sem poder repetir, isto é, reaver do credor. Tal devedor não presta, e não há inadimplemento de obrigação, de modo que o art. 580 não é invocável. (Se advém prescrição, há obrigação, mas encobrível pela oposição de exceção. No caso de ser exercida a ação executiva, o devedor pode excetuar, embargando, com fundamento no art. 741, VI, uma vez que superveio à sentença.) Se o credor não tem título executivo, seja judicial, seja extrajudicial, o inadimplemento só por si não basta à ação executiva. Quem inadimple, sem que ao credor toque a eficácia sentencial ou a de título executivo extrajudicial, está sujeito a ação condenatória, ou outra ação, que corresponda à obrigação, porém não à ação de execução. Inadimplente foi, porém não ofendeu a executividade da sentença ou do título extrajudicial. SEÇÃO 1 Do inadimplemto do devedor Art. 580. Verificado o inadimplemento do devedor, cabe ao credor promover a execução 1)~ Parágrafo único. Considera-se Inadimplente o devedor3), que não satisfaz espontaneamente o direito reconhecido pela sentença4), ou a obrigação, a que a lei atribuir a eficácia de título executivo 2) 1)EFICÁCIA EXECUTIVA. Diz-se no art. 580 que, verificado o inadimplemento do devedor, cabe ao credor promover a execução; mas, frisemos, que nem todo inadimplemento dá ensejo à execução. É preciso que o credor, com o inadimplemento, proponha a ação de condenação, ou outra, cuja sentença favorável tenha, pelo menos, 3 de executividade, ou que a lei haja atribuído eficácia executiva ao titulo extra-judicial, que seja o do crédito. Daí ter sido necessário o parágrafo único. Sobre as expressões “devedor”, “direito”, nota 4). 2)SENTENÇA E TÍTULO EXTRAJUDICIAL. Lê-se no art. 580, parágrafo único, que se considera inadimplente o devedor que não satisfaz, espontaneamente, o direito “reconhecido” pela sentença. Em primeiro lugar, acentuemos que o reconhecimento de um direito pode ser apenas reconhecimento em ação declaratória e de modo nenhum a sentença declarativa contém 3 de executividade. Na ação condenatória, sim, porque há declaratividade prévia, há condenatoriedade (5) e há executividade (3), razão por que, com essa eficácia executiva mediata, pode o credor propor a ação executiva. Há outras ações com sentença de 3 de executividade, o que dá ao julgado, mesmo em ação que não é condenatória, a suficiência para se promover a execução. (Se a executividade é4, não se precisa propor ação executiva, uma vez que, no mesmo processo, com a executividade imediata, se obtém a execução.) O que importa é saber-se quais as sentenças que são títulos executivos e quais os títulos, extrajudiciais, que legitimam à execução. As regras jurídicas sobre adimplemento ou inadimplemento são a do direito que rege o crédito, a pretensão e a ação. De ordinário, trata-se de direito material, mas seria errado dizer-se que só o direito material pode incidir. Pense-se, por exemplo, no dano processual (arts. 16-18), em multas (arts. 30 e 34, 161, 233, 196, 424, parágrafo único, 433, parágrafo único, 488, II, e 494, 538, parágrafo único, e 634, § 6.~). O adimplemento há de ser no momento determinado ou dentro de prazo, no lugar da prestação, e conforme o objeto da obrigação (coisa certa, coisa incerta, fazer, não fazer, quantia certa). A regra jurídica do art. 580, parágrafo único, como que definiu inadimplemento, mas apenas se referiu à obrigação que se declarou na sentença, ou a que deriva de título extrajudicial. Se o devedor adimpliu conforme a lei material ou outra que regeu a obrigação, qualquer invocabilidade do art. 580, parágrafo único, porque o adimplemento conforme a conclusão da sentença, mesmo se injusta foi essa, afasta a propositura da ação executiva. Idem, se resultou de título extrajudicial; embora pudesse a sentença, na ação executiva, vir a ser diferente. Sem que haja a obrigação (que supõe o dever, mas esse pode existir sem ainda ser obrigado o devedor), não há exigibilidade. Se já é exigível a prestação, em consequência ocorre inadimplemento pelo devedor, e tem o credor a pretensão à tutela jurídica e a ação contra o devedor. Não é adstrito a exercê-las; fica a seu arbítrio a deliberação. Se houve sentença, pode ser que tenha declarado que a exigibilidade fora muito anterior a ela, ou haja determinado o momento em que terá de ser feita a prestação. As vezes, a condenação refere-se à prestação devida e não adimplida e às prestações sucessivas, inclusive posteriores à sentença. Se o credor, antes de se verificar inadimplemento, entra com a ação executiva, quer se trate de titulo judicial, quer de título extrajudicial, diz-se, de ordinário, carente de ação, como ocorre se lhe falta a pretensão à tutela jurídica (e. g., a ação não poderia ser proposta no Brasil), ou legitimação processual (e. g., deu poderes irrevogáveis a outrem para a execução), ou a ação (de direito material), como se renunciasse à ação. Nos arts. 295, III, e 267, VI, fala-se de autor a que falta interesse processual. No art. 301, X, de “carência de ação”. Carência de ação é termo largo: carece de ação o que não tem ação; carece de ação o que não tem a pretensão de

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direito material; carece de ação o que não é titular do direito; carece de ação o que não tem a pretensão à tutela jurídica... Em tudo isso, ora se julga aludindo-se à res deducta, ora, às vezes, a muito antes dela, pré-processualmente (e. g., quando se diz que carece de ação executiva, fundada no Brt. 575 ou 576 do Código de Processo Civil). Nenhum esclarecimento trouxe o acórdão da 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 14 de outubro de 1948, nem em grau de embargos, o de 9 de dezembro de 1948 (R. F., 122, 192 s.). No acórdão de 3 de outubro de 1949, a 2.R Câmara Cível considerou carecedor de ação o não-legitimado ad causam; no acórdão de 2 de fevereiro de 1950 (R. F., 133, 476), a 1.a Câmara aludiu à titularidade do direito. Não é só o interesse processual o que falta ao credor que promove a execução sem ter ocorrido inadimplemento pelo devedor, de modo que se há de indeferir a petição inicial (arts. 295, III, e 598). Falta-lhe a ação (de direito material). Se o devedor tinha de prestar ou já tem de prestar, pode tomar as providências para isso (e. g., a ação de consignação em pagamento, a ação executiva passiva, contra o credor, para que receba o que, conforme a sentença, tinha ou tem de prestar, pode invocar o art. 570). 3)INADIMPLEMENTo. Preliminarmente, evite-se distinguir, nos seus efeitos, o inadimplemento, sem se atender ao direito material. Nem se confunda tal distinção com a que se faz quanto às causas. Quem inadimple porque pareceu o bem, ou porque não foi encontrado, ou porque se deteriorou, pode ter tido contra si o dies interpellat pro homine, ou ter sido interpelado. É erro falar-se de inadimplemento -mora. Para que haja mora, é preciso que tenha havido demora. Por isso mesmo, o devedor em mora responde pela impossibilidade da prestação que ocorre, em caso fortuito, ou de força maior, se já iniciado o atraso (Código Civil, art. 957). Mora vem de memor, lembrar, recordar, tal como “memória”. Originariamente, assistir pensando. Se o que devia e tinha de adimplir não adimpliu, de modo que o que tinha direito não recebeu, e esse exigiu e não se lhe prestou, ou aquele foi adimplir e viu recusada a prestação, ficam a meditar, a recordar, pelo tempo afora. O que não adimpliu ou o que recusou a receber se põe em retardo, se atrasa, e esse escorrer de tempo, essa demora, em que se pode prestar e não se presta, ou em se poder receber e não se recebe, é o tempo da mora; por abreviação, a mora. Mora do devedor (mora debitoris) é o retardo, a demora, contrária a direito, da prestação, por alguma causa imputável a ele. Mora do credor (mora creditoris, mora accipiendi) é o retardo no adimplemento pelo credor, porque o credor omite a cooperação i~ndispensável. Não há mora sem demora; por isso mesmo, se a prestação não mais pode ser feita, não há mora: há impossibilitação da prestação. Já os juristas dos séculos XVI a XVIII ou achavam difícil (MMYLIus FERRETUS, Libeilus de Mora et Interesse, n. 10; cf. HUGO DONELO, Opera omnia, 10, 110 s.> a definição de mora (tanto mais quanto já o teria dito POMPÔNIo, segundo MARCIANO, na L. 32, pr., D., de usuris et fructibus et causis et omnibus accessionibus et mora, 22, 1: “difficilis est huius rei definitio”), ou impossível (ARUMAEUS, Commentarius methodicus de Mora, 2). Mas o texto de POMPÔNIO é referente à definição da eficácia, e não da mora em si mesma (huius rei definitio). Todas essas vacilações não provinham de pesquisa, e o esforço por definir mora acentuou-se até nossos dias. A executabilidade pode ser tal que, não executada a prestação, no dia, a mora do devedor se estabeleça, e, recusada, fique em mora o credor. Se, porém, a prestação não admite demora (só há mora se a prestação admite demora), dá-se impossibilidade da prestação: o devedor não mais pode oferecer; nem o credor reclamar a prestação. Somente há, aí, incenização pela não-execução, segundo os princípios. Outro termo que há de ser empregado em sentido próprio é falta. Falta é omissão, vem de *fallita, feminino de *fallitus, de faílere, em vez do clássico falsus. A língua portuguesa tem os dois substantivos: falta e culpa. Na língua francesa há “faute”, e não há palavra que corresponda a culpa, posto que tenha “coupable”, “disculper”; teve-a, e deixou que envelhecesse. Ainda no século XVII se falava de “coulpe” dos médicos e cirurgiões. Evitemos que o significado de “faute” se contagie a “falta”. Falta e culpa não podem ser confundidas. BARTOLOMEU DE SALICETO definia: “Mora est debiti sol-vendi vel crediti recipieni a iure improbata et punita dilatio”. Frisam-se o atraso, a contrariedade a direito e as sanções. Em sua singeleza, diz muito. Huoo Doxi~Lo dizia: “Mora est cunctatio creditoris vel debitoris in praestando eo, quod quis alteri debeat”. E AxuMARus viu mora onde ocorre “frustratio opportune non recipientis vel offerentis debitum”. Em GIovANxI SAPORTA, J. CujÃcío e C. G. WEHRN (Doctrina iuris explicatrtx, 292) foi que estalou a impertinente alusão à culpa ou ao dolo e à culpa. A mora altera a relação jurídica obrigacional. A mora ainda não é a resolução ou a resilição, ou a indenização, ou outra das suas consequências. Daí dever-se tratar de mora na parte do direito das obrigações em que se analisam as alterações das relações jurídicas obrigacionais. A mora ou é efeito imediato do fato jurídico ou do advento do termo, por mínimo que seja, ou da condição (suporte fáctico como o dies: incidência do art. 960, alínea 1.a), ou é efeito da interpelação, ato jurídico stricto sensu (sem razão, ERNST ZITELMANN, Selbstmahnung des Schuldners, Fest gabe flir PAUL KItUGER, 286, que a tinha como negócio jurídico). A discussão em torno da natureza da mora, para se lhe saber o lugar na classificação dos

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fatos jurídicos, parte de erro inicial: mora é efeito, não é fato. Efeito do advento do dies (fato jurídico stricto sensu). A mora sem interpelação resulta da incidência da regra jurídica Dies interpellat pro homine (art. 960, alínea í.a: “O inadimplemento da obrigação, positiva e liquida. no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor”) sobre o suporte fáctico em que há o dies, isto é, o acontecimento do advento do dia ou termo. A mora, compreendendo a do que cometeu o ato ilícito stricto sensaL, era a mora em sentido largo (K. F. F. KNu~P, Die Mora des Schuldners, 1, 27), que também compreendia a do esbulhador, a dos créditos de menores, a do devedor que se não encontrava (excluídos os outros casos que K. F. F. KNIEP, 1, 27 s., II, 183 s., e Fa. MOMMSEN, Die Lehre von der Mora, 127 s., apontavam). Finalmente, conforme o étimo (menor), a memória está em causa. O termo, a condição e a interpelação lembram. De ordinário, a mora traça linha, no tempo, e durante o percurso consumam-se as suas consequências. Oart. 580 apenas se refere ao inadimplemento como pressuposto para a ação executiva. Se o devedor quer alegar impossibilidade da prestação, o que faz inexequível o título (arts. 615, IV, e 741 II) mete tal alegação nos embargos do devedor seguro o juízo (art. 621). 4)OBRIGAÇÃO, E NAO 50 DEVER (DIREITO). No Código, art. 580, parágrafo único, diz-se que se considera inadimplente o devedor, “que não satisfaz espontaneamente o direito reconhecido pela sentença, ou a obrigação, a que a lei atribuir a eficácia de titulo executivo”. A redação é reprovável. Se a sentença apenas reconhece um direito, ou um direito e uma pretensão, não há executabilidade. Tanto a respeito de título extrajudicial quanto de titulo judicial, é preciso que haja “obrigação”. Falar-se de direito certo, liquido e exigível, como faz o Código de Processo Civil italiano, art. 474, também é repelível. Aliás, os próprios críticos do texto dizem que um crédito pode ser líquido ou ilíquido, não um direito (e. g., PAoLo D’ONoFRIo, Commento ai Codice di Procedura Civile, II 2.~ ed., 3). Se a divida a que se referiu a sentença, de que nasceu a executabilidade, não é líquida, tem o credor de promover a liquidação. Só após isso é executável a sentença. O próprio devedor pode exercer a pretensão à tutela jurídica, pedindo que seja liquidada a dívida. Quanto à eficácia sentencial, pode dar-se que, na espécie, caiba a execução provisória, pendente recurso. O credor expõe-se a eventualidade de ser reformada a sentença. Quanto ao devedor, se o recurso foi recebido nos dois efeitos, devolutivo e suspensivo, não há qualquer desatenção à sentença, até que definitivamente se julgue. (Não se diga, como fez FRANCESCO CARNELUTTI, Processo di Ezecuzione, 1, 5, que, até que transite em julgado a sentença, há pretensão contestada, e, depois, a pretensão insatisfeita. Confusão entre pretensão e ação, porque pode ter havido negação do direito, da pretensão e da ação, ou do direito, ou da pretensão, pretensão e também da ação ou só da ação. Ação, aí, é ação de direito material.) Art. 581. O credor não poderá iniciar a execução, ou nela prosseguir, se o devedor cumprir ) a obrigação; mas poderá recusar2) o recebimento da prestação, estabelecida no título executivo, se ela não corresponder ao direito ou à obrigação;3) caso em que requerera ao juiz a execução, ressalvado ao devedor o direito de embargá-la. 1)CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. Se o devedor cumprir a obrigação, afastada está qualquer razão para se propor a ação executiva, trate-se de executivo judicial ou de titulo extrajudicial, ou para que o credor prossiga na execução já iniciada. O adimplemento ruim não basta para que o credor fique sem a pretensão e a ação. Enquanto não ocorre o inadimplemento pelo devedor, não pode ser proposta a ação executiva. A ação ainda não nasceu, mesmo se já há direito e pretensão. (A referência a “direito”, que aparece nos arts. 580, parágrafo único, e 581, é imprópria; há de haver ação, no sentido de direito material, de que resulte a “ação”, lide, no sentido de direito processual. Se o devedor quer prestar, mas a prestação não é aquela a que tem direito o credor, pode esse recusar-se a recebê-la. A violação da relação jurídica por ato ilícito relativo não provém somente do não-adimplemento. N~ cumprindo a obrigação pelo modo devido (e. g., lugar, tempo), responde o devedor por perdas e danos. Há a violação negativa e a violação positiva: paga, porém mal, causando dano à pessoa, ou ao seu patrimônio, como se tem de pagar a quem vai viajar, ‘no cais, alta quantia, e o faz em notas de dez cruzeiros, ou se paga à porta do banco A, como se estipulara, mas no momento exatamente em que se fechava a porta, ou se, tendo de pagar um milhão de cruzeiros, pretende que se recebam dólares, ainda que, facilmente, dêem aquele preço, ou mais. Aqui, nem está em exame a impossibilidade superveniente da prestação, nem o atraso em ser feita; o adimplemento foi defeituoso, ou melhor, ruim, inclusive se, em se tratando de prestações sucessivas, quando o credor delas precisava, pelo negócio jurídico, ou pelo ato jurídico stricto sensu, “em globo”, posto que “sucessivamente” (os alugueres para pagar juros de hipoteca do prédio), o devedor deixa de entregar uma delas; o devedor falha à. permanência na cooperação e assim exclui a confiança, ou quebra a continuidade mesma do interesse (HERMANN STAUB, Die positiveu

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VertragsverletZungen, 2.a ed., 50 s.). Pretendeu HERMANN STAUB criar outra classe de violação, que seria aquela de comunicação do devedor, prévia, de que se recusa ao adimplemento (= comunicação de que não adimplira; portanto, comunicação de ato futuro). Contra isso arguiu-se: se o devedor, de antemão, manifesta a vontade (irrelevante!) de não adimplir, ou se exterioriza, ainda que comunique, o conhecimento do fato próprio negativo futuro (“não adimplirá”), apenas põe em perigo, ou mostra ter posto em perigo a execução do que lhes incumbe; ainda não violou a relação jurídica, ameaçou-a apenas. ~ verdade que somente se cogita da caução se há diminuição do patrimônio do devedor; mas a prévia recusa é causa suficiente de resolução, ou de caução. Deve-se a Nichterfúllung und Schlechtererfullung, Fest gabe fiir PAUL KRUGER, 265 5.) a expressão “adimplemento ruim”, que é melhor do que adimplemento defeituoso, porém menos abrangente do que “violação positiva do contrato”. Por outro lado, HERMANN STAUB (Die positiven Vertragsverletzungen, em 1902, 29-56, e em 1904, 1 s.) falava de “violação positiva do contrato”, mas há outros créditos e obrigações que podem ser violados positivamente, sem pertencerem ao direito das obrigações, ou a fortiori, àclasse das obrigações oriundas do contrato. A violação positiva ocorre quando o adimplemento é defeituoso; é preciso, portanto, que haja, no suporte fáctico do ato ilícito relativo, o adimplemento e o defeito, ou a prévia exclusão de adimplemento em consequência da defeituosa reparação. A execução há de ser conforme o modo e o tempo devidos. Não só da violação negativa como também da Impossibilidade culposa se distingue a violação positiva; também se distingue do ato ou omissão que ofende a esfera jurídica do credor, sem ser violação da relação jurídica entre o credor e devedor, ainda quando se ache em relação exterior de tempo ou de lugar, ou de lugar e tempo (e. g., o empregado que faz a limpeza do escritório furta a carteira de cédulas ou outro objeto). Aí há ato ilícito absoluto. A violação da obrigação de não fazer não é violação positiva, se bem que se haja operado por ato positivo. Por exemplo: alguém que se obrigou a não tocar piano, entre meio-dia e dezesseis horas, toca-o (OTTo WENDT, Unterlassungen und Versaumnisse, 65), viola negativamente a obrigação; idem, se permite que alguém toque flauta, que antes não se tocava, ou se o obrigado mesmo o faz. Toma-se, assim, sem alcance a discussão sobre se a obrigação era de qiLaiquer pessoa não tocar qualquer coisa, embora só se falasse do obrigado e de piano; ou se houve, realmente, abstenção com violação positiva do contrato (contra, O~rro WENDT, Unterlassungen und Versaumnisse, 65; RICHARD TREITEL, Die Unmõglichkeit der Leistung, 16; cp.; ERIcH PAASCHE, UnmõgUchkeit der Leistung unci Verzug, 22; FEODOR KLEINEIDAM, Unmõgiichlceit und Unvermõgen, 12; HEINmcH ANTON, Geben positive VertragsverletzUngefl des Gegners em Rucktrittsrecht?, 5). 2)RECUSA PELO CREDOR. Sempre que a prestação que o devedor voluntariamente, inclusive após citação na ação executiva, não corresponde ao que o devedor era obrigado a prestar, pode o credor recusar-se a receber. A legitimação ativa à ação executiva continua. A recusa precisa ter fundamento. Se, por exemplo, o credor não quis receber, proposta a ação executiva, e de modo nenhum a prestação destoaria do que era devido, pleiteia de má-fé (art. 16), com a responsabilização por perdas e danos. Dá-se o mesmo se o credor já havia proposto a ação executiva e o devedor citado quer entregá-la e o credor a rejeita, ou o devedor deposita para poder opor embargos. Cumpre advertir-se que pode haver, na espécie, além da prestação, juros da mora e outras obrigações de direito material, desde que à prestação estejam ligados. Se já proposta a ação executiva, custas, honorários de advogado e outras dívidas decorrentes do processo. No art. 581, 1.a parte, cogita-se do devedor, para ressaltar que o adimplemento pode ser voluntário e que só o inadimplemento permite a quem teve sentença com 3 de executividade ou tem título executivo extrajudicial a propositura da ação executiva. Na 2.~ parte, o art. 581 diz quais os pressupostos para que o credor possa recusar a prestação; mas,ainda aí, deixa ao devedor a pretensão à tutela jurídica e a pretensão processual através da ação de embargos do devedor, que é ação contra a ação executiva. Foi acertado não se pensar em contestação, porque já se está a atender a adimplemento por via da execução estatal. Se o título executivo é extrajudicial, o Estado entendeu pôr na frente da ação condenatória, ou de outra que tinha 3 de executividade, a ação executiva, em adiantamento de execução. A recusa pelo credor pode ser preexcluída ou cancelada por algum acordo, inclusive transação, entre o credor e o devedor, o que dá ensejo a impedir a execução, ou extinguir o processo executivo. Se não houve prestação exata nem causa para afastamento da ação executiva, faz-se a execução, ou nela se continua. Não importa qual a natureza da obrigação, porque há os arts. 603-611 sobre a liquidação, 621-628, sobre obrigação para entrega de coisa certa, 629 e 630, sobre execução para entrega de coisa incerta, 632-643, sobre execução de obrigação de fazer ou de não fazer, e 646-654, sobre execução de quantia certa. Pode dar-se que o credor já saiba que há impossibilidade da prestação pelo devedor e já o queria alegar na petição da ação executiva. Para isso, tem de promover, com prova suficiente, a ação de liquidação, porque já se trata de indenização. Dá-se o mesmo com o devedor que quer prestar (arts. 603-611 e 570). Se a impossibilidade sobreveio à propositura da ação de execução, mesmo se proposta pelo devedor (art. 570), tem de ser mudado o procedimento

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executivo. Advirta-se que, embora o devedor haja querido prestar ou depositar o que não corresponde à obrigação (evite-se falar de “não corresponder ao direito ou à obrigação”, o que e de lamentar-se ter-se posto no art. 581 e noutros textos), pode o credor consentir na falta e até mesmo desistir da ação. O levantamento a que se refere o art. 623, antes de se julgarem os embargos do devedor, não significa consentimento. Para a eficácia extintiva, seria preciso, com o levantamento, desistência, mas tal desistência do processo de execução não atingiria os embargos do devedor. Se esse obtém decisão favorável, pode o credor ter de restituir o que levantou ou responder por perdas e danos. Uma vez que o credor recusou e pediu ao juiz a execução, de modo nenhum se afasta a embargabilidade, conforme a espécie do titulo executivo (arts. 741 e 745). 3)REPARAçÃO. No direito comum, RUDOLF vON JHERING (Culpa in contrahendo, Jahrbilcher fiir clie Dogmatik, IV, 52) fundava a reparação na culpa; FR. MOMMSEN (Die Unmõglichkeit der Leistung, 109), no dolo, tropeçando em casos em que se não exigia esse elemento; HEINRICH DERNBURG (Pandekten, II, 4.~ ed., 28), na culpa levis; A. KOEPPEN (Der obligatorische Vertrag unter Abwesenden, Jahrbilcher, 11, 283 5.) voltou a pensar em fundamento contratual, de que Fx~. MOMM5EN e HEINRICH DERNBURG se haviam livrado, mas afastava o pressuposto necessário da culpa, devido a tratar-se de segurança do tráfico; OTTO BÁHR (tiber Irrungen im Kontrahiren, Jahrbucher, VI, 286 5.) pretendeu resolver o problema com a teoria da declaração; B. WINDSCHEID (Lehrbuch, II, 1.~ ed., § 307) e FERDINAND REGELSEERGER (Erõrterungen, 33) aludiam a contrato tácito de garantia, construção que eles mesmos, depois, repeliram. O problema apresentou-se como tendo de ser resolvido fora da teoria da vontade e fora da exigência da culpa. Finalmente, assentou-se: que não se trata de efeito de negócio jurídico, portanto não há pensar-se em infração in contra flendo; que a culpa não érequisito necessário; que a culpa do outro figurante preexclui o direito à reparação; que a reparação é só do interesse negativo. São espécies mais freqUentes: a responsabilidade pelo dano causado pelo ato não-sério (oferta ou acei tação pilhérica, promessa pilhérica de recompensa, título cambiário para ensino, RUDOLF voN JHERING, IV, 74, e OrTo BXHR, 14, 412), pela nulidade por impossibilidade já existente da prestação, e por erro, inclusive inexata transmissão de manifestação de vontade (FRANZ LILIE, Schadenersatz bei unwirksamen Vertrãgen, 34 5.). A opinião que pretendia submeter às regras jurídicas sobre impossibilidade superveniente da prestação a violação positiva do contrato (e. g., FEODOR KLEINEIDAM, Unmõglichkeit und Unverm.õgen, 85 s. e 155 5.; HEINRICH TITZE, Unmõglischkeit der Leistung, 31, 43 e 255 s.) foi afastada. Bem assim a que baseava a reparação no ato ilícito absoluto. A violação positiva do contrato tanto é violação quanto a negativa; toda violação positiva de obrigação é espécie, como a negativa, do gênero violação de obrigação. As consequências são as mesmas: mora, indenização, resolução, tanto mais quanto, no tocante à resolução por inadimplemento, o sistema jurídico brasileiro formulou princípios amplos que se afastaram da casuística da doutrina e de outros sistemas j juridicos. O que se tem de saber é, in casu, qual seria a conseqtiência da violação negativa da obrigação (cp. WALTER Lu”rz, Zur Frage der positiven Vertragsverletzungen, 96 s.). Art. 582. Em todos os casos em que é defeso a um contraente, antes de cumprida a sua obrigação 1), exigir o implemento da do outro, não se procederá à execução, se o devedor se propõe satisfazer a prestação, com meios considerados idóneos pelo juiz, mediante a execução da contraprestação pelo credor, e este, sem justo motivo, recusar a oferta 2) Parágrafo único. O devedor4) poderá, entretanto, exonerar-se da obrigação, depositando em juízo a prestação ou a coisa; caso em que o juiz suspenderá a execução, não permitindo que o credor a receba, sem cumprir a contraprestação, que lhe tocar 3)~ 1)ADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO PELO CREDOR. Chamam-se contratos bilaterais aqueles contratos em que cada um dos figurantes assume o dever de prestar para que outro ou outros lhe contraprestem. A contraprestação é, precisamente, a prestação que o outro figurante ou os outros figurantes têm de fazer. Nas relações inter-humanas, o papel dos contratos bilaterais é enorme. A maioria dos negócios jurídicos que se concluem cada dia são contratos bilaterais. Desde a compra-e-venda e a locação até os contratos de serviços ou de trabalho e as empreitadas. É o do ut des, o dou para que dês, em cada figurante A somente assume o dever de prestar a B porque B tem de contraprestar e B somente tem de prestar porque A assume o dever de prestar a B. Daí a sorte do contrato ser tal que a ineficácia da dívida de um tem como conseqúência a ineficácia da dívida do outro. (Nos textos do Código, em vez de se falar de exeqüente e de executado, fala-se de credor e devedor. Mas, se há a obrigação de prestar e contraprestar, cada um dos figurantes é credor e devedor, de modo que só se atende à posição de quem vai exigir, de quem quer executar.) O sinalagma é quanto à estrutura, à construção mesmo do negócio jurídico, e quanto à eficácia (sinalagma

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funcional). A respeito de contrato bilateral, convém frisar-se que a sociedade é negócio jurídico bilateral, ou plurilateral; porém não é, como a muitos pareceu e ainda escapa a alguns (PAUL KNOKE, Das Recht der Gesellschaft, 42 5.; FRANZ LEONHARD, Besonderes Schuldrecht des BGB., 279), contrato bilateral. Por isso mesmo, não se pode invocar, a respeito de dívida do sócio, o art. 582 (cf. KARL LARENZ Lehrbuch des Schuldrechts, II, Besonderer Teil, 224). Não é de mister, para que seja bilateral o contrato, a equivalência segundo critério objetivo das prestações; o que importa é que cada um tenha a prestação do outro figurante como equivalente à sua. Dizer-se que o contrato é bilateral, porque também ex-surgem dívidas e obrigações para o outro figurante, seria inexato, porque o mandato, por exemplo, é contrato unilateral e o mandatário, aceitando-o, fica ligado ao seu cumprimento e a entregar ao mandante o que acaso haja recebido, no exercício do mandato. As dívidas do mandante e as do mandatário não estão em relação recíproca. Por outro lado, nem todas as dívidas e obrigações que se originam dos contratos bilaterais são dívidas e obrigações bilaterais, em sentido estrito, isto é, em relação de reciprocidade. A contraprestação do locatário é o aluguer; porém não há sinalagma no dever de devolução do bem locado, ao cessar a locação, nem na dívida do locatário por indenização de danos à coisa, ou na dívida do locador por despesas feitas pelo locatário. A bilateralidade prestação, contraprestação faz ser bilateral o contrato; mas o ser bilateral o contrato não implica que todas as dívidas e obrigações que dele se irradiam sejam bilaterais. Temos de frisar que a obrigação do credor pode ser de origem não-negocial, como se dá com o direito de retenção pelo possuidor de boa-fé, até que haja a indenização de benfeitorias necessárias e úteis. Em relação ao devedor, pode qualquer credor, se sobrevém diminuição no patrimônio do devedor, a ponto de poder comprometer a prestação, ou torná-la duvidosa, recusar-se à contraprestação, até que o devedor satisfaça a sua prestação ou dê garantia bastante de satisfazê-la. Trata-se de regra de direito material. Há exceção non adimpleti contractus: o credor exige, injustificadamente, a prestação; o devedor, a quem, com isso, nasce a exceção, opóe-na. O devedor que opõe a exceção non adimpleti contractus mantém consigo o que é seu, pois apenas está na obrigação de prestar. O art. 1.092 do Código Civil brasileiro de 1916 é superior, em boa técnica linguística, ao § 237 do Código Civil alemão. Aliás, já eram no mesmo ritmo do direito brasileiro, em 1904, FRANZ SCHLEGELBERGER, Das Zurúckbehaltungsrecht, 101 e 148, e, em 1903, PAuL LANGHEINEKEN, Anspruch und Einrede, 335). É erro grave de juristas, inclusive alemães, confundirem o direito em que se funda o art. 582 com o direito de retenção (cf. Tratado de Direito Privado, Tomo XXII, § 2.734, 4). Nas obrigações naturais (pelo menos, sem ação) e nas dívidas sem pretensão (direito mutilado), não há mora. A mora supõe a exigibilidade e a eficácia da exigibilidade. Em razão disso, pode dizer-se que só há mora se há a) pretensão, pessoal ou real, b) eficaz, e c) sem encobrimento da eficácia. Se falta a pretensão, ou se falta a eficácia, ou se essa está encoberta, não há mora. São os casos, respectiva-mente, do crédito cujo termo não foi atingido, da pretensão do credor hipotecário se, no momento, o prédio lhe pertence, e da pretensão contra a qual se opôs a exceção. Se a exceção é peremptória, a mora está excluída: é efeito da pretensão, e a eficácia da pretensão está peremptoriamente excluída. Se a exceção é dilatória, o encobrimento é enquanto a exceção não se extingue; e. g., se se trata de exceção non adimpleti contractus, o devedor incorre em mora, se não presta quando o credor oferece a sua. As regras jurídicas do art. 582 e parágrafo único apenas se referem a processo de execução, seja sentencial seja extra-judicial o títuio executivo. Nas ações de cognição pode acontecer que a outra parte alegou a falta da contraprestação, mas ao assunto são estranhas as regras jurídicas de direito processual civil relativas à execução. Se a bilateralidade da prestação consta de título executivo extrajudicial, invocáveis são o art. 582 e seu parágrafo único. Aliter, se do título executivo não consta. Se consta de título extrajudicial, que não é executivo, tem-se de propor a ação adequada, para que na sentença que venha a proferir-se tenha 3 de executividade. Nos contratos bilaterais, o credor também é o devedor, de modo que, se o devedor, que é credor, não quer adimplir, o devedor, que é credor, se pode recusar a adimplir. A exceção de contrato inadimplido somente pode ser admissível se entre a prestação do promitente e a contraprestação do promissário ao promitente há equivalência. Se não há toma-lá-dá-cá, ou se não está vencida a dívida do promissário, não há pensar-se em exceção nou adimpleti contractus. Se A não adimpliu e devia adimplir, ~por que B, credor que sofre o inadimplemento, há de ter de adimplir? A implicação da bilateralidade leva a essas conseqúências. Toda prestação é contraprestação. Somente a vontade dos figurantes do contrato pode estabelecer que A cumpra primeiro. Mas, ainda ai, se B não cumpriu, ambos não adimpliram, e a solução mais acertada é que, exigindo uns a prestação, que se lhe deve, o outro possa opor a exceção de não-adimplemento. Enquanto um dos figurantes não satisfaz, o outro pode retardar o adimplemento. Se a execução é de título judicial, a exceptio non aclimpleti contractus já foi oposta, ou deixou de ser oposta, no processo de cognição. Se a execução é de título executivo extrajudicial, nos embargos do devedor pode ser alegado

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inadimplemento. Se a condenação apanha prestações futuras, dependentes de contraprestações, nos embargos do devedor pode ser argUida a falta. Pergunta-se:diante da diferença entre o texto de 1973, art. 582, e o de 1939, art. 892, ~,tem o juiz de só deferir a expedição do mandado executivo se há prova da contraprestação, que cabia ao autor da ação executiva? No art. 892 do Código de 1939 dizia-se: “Não se expedirá mandado executivo se a execução depender de prova de contraprestação devida ao executado pelo credor”. A resposta, hoje, é afirmativa. Não se precisava de regra jurídica explícita, porque cabe ao juiz, de ofício, verificar se a petição inicial satisfaz os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283 (cf. art. 598). Não se diga que não pode o juiz, ou lhe seja difícil, indeferir a petição inicial da ação executiva, tendo assim de aguardar que, por via de embargos do devedor, se levante a questão, que seria de excesso de execução (art. 741, V), ou da falta de contraprestação (art. 743, IV). O que se lhe vedava e se lhe veda é a expedição de mandado com cláusula de contraprestar: ou defere, expondo o devedor a ter de embargar; ou indefere. No fundo, o exame imediato, que é fácil, revela a eficiência jurídica e moral do juiz. Não se precisa de exceptio nou adimpleti contractus, mas a alegação do devedor antes de embargar pode dar ensejo ao juiz de, ouvido o autor, retirar o mandado. Aí, como na exceptio non adimqaleti contractus e na argUição de falta de cumprimento da contraprestação, há elemento comum às três situações: Non servendis fidem non est fides servanda. Tratando-se de petição inicial de ação executiva de sentença, o juiz tem o dever de ler e de interpretar a sentença exequenda. Se o não faz e erra, a solução é a do devedor fazer a alegação rapidamente, ou argUir nos embargos. A advertência há de conter a declaração do devedor de que satisfeita a prestação, como é de mister, se o credor contraprestar. Se o credor recusa, sem justo motivo, a ação executiva não prossegue. A 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 13 de junho de 1950 (D. da J., 27 de março de 1952, 1.574), frisou a diferença entre a condenação a prestar, dependente da contraprestação, e a exceptio non adimpleti contractus, que poderia ter sido objeto de discussão, mas isso passou por ter sobrevindo sentença: “Como dilucida PONTES DE MIRANDA, não se trata, no caso, de exceptio non adimpieL contractus, exceção oponível no decurso da demanda”. No Código de 1973, ao cogitar-se de execução de títulos extra-judiciais, o art. 745 diz que o devedor pode “alegar, em embargos, além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento”. Pergunta-se: ~se a execução é de sentença e tem de haver prestação e contraprestação, e o juiz não atendeu a isso, mesmo se houve a declaração do devedor, conforme o art. 582, como há de proceder o devedor? O meio é o de o devedor opor embargos. 2)ADIMPLEMENTO INSATISFATóRIO. Pergunta-se: ~Se o adimplemento foi ruim, como se há de tratar o devedor? O adimplemento insatisfatório (adimplimento ruim) dá ensejo à exceção non rite adimpleti contractus, que é exceção dilatória, como a exceção non adimpleti contractus. Não importa se a deficiência é quantitativa ou qualitativa (FR. HAY1VIANN, Anfechtung, SachmÉingelgewõrh und Vetragserfiillung, 39). O figurante contra que se opóe tem de aumentar ou melhorar a prestação feita, inclusive, se possível, pela substituição do objeto insatisfatoriamente prestado. Não se leva em conta como essentialia a equivalência das prestações: equivalem-se, porque assim se concebeu o contrato bilateral; a equivalência foi estabelecida pelo fato do acordo. 3)CREDOR-DEVEDOR QUE PERDE A EXECUção. Não se procede à execução se, pedida, o devedor obriga, perante o juízo, a contraprestar. Pode ocorrer que, a despeito da atitude do devedor, o credor recuse a oferta. O juiz tem de examinar se a manifestação de vontade pelo citado havia de ser tida por satisfatória, isto é, “com meios considerados idôneos Nada obsta a que o autor de execução na própria petição, ou depois, diga que está pronto a prestar, caso em que o juiz pode admitir que ambas as partes, em juízo, prestem e contraprestem. A execução só não se procede se a recusa da oferta não é com fundamento suficiente. Na petição de ação executiva em que o credor teria de contraprestar, tem ele de provar que o fez. Não se há de pensar em protesto de provas pelo credor, porque seria intrometer no processo de execução instrução probatória. Se o juiz deferiu a petição inicial, com a citação do devedor, e não surgiu o que se prevê no art. 582, o que pode ocorrer que nos embargos o devedor alegue a inexigibilidade do título (art. 741, II) ou a falta de contraprestação (arts. 741, V, e 743, IV). Nada obsta a que o credor, em processo cautelar (arts. 846-851), ou em justificação (arts. 861-866), faça alegação de haver contraprestado. O Código de 1973 não contém as regras jurídicas da Ordenação Processual Civil alemã, § § 726 e 765, que se referiu à prova da contraprestação pelo credor (“wenn der Beweis durch ôffentliche oder óffentllch beglaubigte Urkunden gefíihrt wird”; “wenn der Beweis dass der Schuldner befriedigt oder im Verzug der Annahme ist, durch óffentliche oder “óffentlich beglaubigte Urkunden gefuhrt wird und eine Abschrift dieser Urkunden bereits zugestellt ist”). Pode ser, no direito processual civil brasileiro, como no alemão, que o credor faça prova de que o outro figurante está incurso em mora por não ter aceito a contraprestação. Não era preciso que descesse a tais pormenores o Código de 1973. Se o credor propós a ação executiva sem ter contraprestado, a sentença que extinguiu o processo, ou que julgou favoravelmente os embargos do devedor, com base no art. 743, IV, 741, V, e 745, revela o dano processual (arts.

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16-18). 4)ATITUDE ALTERNATIVA DO DEVEDOR. Ou o devedor se manifesta com a oferta, a que se refere o art. 582; ou desde logo deposita a quantia ou a coisa, o que suspende a execução, uma de cujas consequências é não poder o credor receber a prestação, enquanto não contrapresta; ou deposita apenas para poder embargar. Se o devedor não está disposto a satisfazer a obrigação, nada pode alegar contra o credor que pediu a execução, mesmo se, em virtude de negócio jurídico ou de lei, a sua prestação teria de ser após a do credor exequente. Aí, falta temporalmente a exigibilidade do titulo, e não podia o credor exigir a prestação antes de contraprestar, mas nada obsta a que o devedor declare que está disposto a prestar quando oportuno e a que incide o art. 582. Na espécie do art. 570, o devedor, para evitar a execução, pode fazer citar o credor para que receba a prestação, desde que contrapreste, e convém que deposite o que tem de prestar somente podendo levantá-lo o credor depois de contraprestar. Ai, não pode o credor invocar o art. 623, porque o depósito não foi para oposição de embargos, mas para que o credor contrapreste (depósito condicional). Idem, quanto aos arts. 631 e 623. SEção II Do título executivo i)2) 1) TÍTuLO ExECUTIVo. Título, na terminologia jurídica, é atribuição (e. g., titular de propriedade, titular de direito real, titular de direito, de pretensão ou de ação, herança a título universal), ou documento, instrumento (e. g., escritura pública ou particular, título cambiário, título cambiariforme). No assunto de que se trata no art. 583, título é o instrumento, de titulus, inscrição (subscrição, sobrescrição), que proveio de titus, pombo, titiare, garrular. O documento mostra, como se garrulasse a alguém ou a todos. Otítulo pode ter conteúdo diferente do que em Verdade é o seu; pode mesmo ser sem conteúdo. As vezes, somente serve a prova, ou não serve sequer a prova. Muitos títulos fazem, por força de lei, prova, ou para ela concorrem. Pode mesmo acontecer que tal eficácia resulte de negócio jurídico unilateral, bilateral ou plurilateral, ou de atividade estatal, como acontece com a certidão de dívida fiscal (art. 585, VI). Tinha a lei de atender à eficácia executiva da sentença, mas se nela há 5, 4 ou 3 de executividade. Se há 5, tudo feito. Se há 4, no próprio processo se executa. Se há 3, está criada outra ação, que é a executiva de sentença. Diante da experiência multissecular de haver títulos que, além da pública fé, precisam de tratamento especial, os sistemas jurídicos apontaram títulos suficientes à propositura de ação executiva. Como que os elevaram à situação da sentença, porém sem preeliminar a cognição, que a sentença já exaurira. Alguns títulos resultam de atividades exercidas na justiça (serventuários de justiça, peritos, intérpretes, tradutores, art. 585, V), ou de atos de administração fiscal (certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, de Estado-membro, do Distrito Federal, de Território, ou de Município, art. 585, VI). Não se diga que aí se dispensou documento. Nas espécies do art. 585, V, as custas, emolumentos ou honorários têm de ser aprovados por decisão judicial, que documento é. Nas espécies do art. 585, VI, os créditos hão de estar “inscritos na forma da lei”. 2)NATUREZA DO TITULO ExECUTIVO. Título é documento; mas título executivo é título a que se permite, com ele, propor-se ação de execução. Aí, há algo acima da eficácia probatória, há a eficácia executiva, que derivou de ter sido sentença com 3 de executividade, ou instrumento de que a lei conferiu 3 de executividade, como se sentença fosse. O efeito probatório (prova legal) a que se atinha FRANCESCO CARNELUTTI (Titolo esecutivo, Rivista di Diritto Processuale Civile, VIII, 313-320; Processo di Esecuzione, 216) de modo nenhum explica a executabilidade. Por outro lado, a referência a se tratar de efeito constitutivo, que serviu às afirmações de Exníoo TuLLIo LIEBMAN (Ii Titolo esecutivo riguardo aí terzi, Rivista, 11, 127; já antes, Le Opposizioni di merito nel processo di esecuzione, 143, que já exprobráramos nos Comentár los ao Código de Processo Civil de 1939, VI, í.a ed., 332, e XV, 2.a ed., 293). A eficácia de executívidade vem da sentença ou do titulo extrajudicial. Ali, 3; aqui, 5, com adiantamento. Ambas as ações são executivas (5 de executividade).

Art. 583. Toda execução tem por base título executivo judicial’) 2) ou extra judicial 3)• 1) TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. Para que o titulo judicial seja executivo, é preciso que ele tenha força executiva. ~ o que ocorre com a sentença condenatória com 3 de executividade, porque, se a ação tem 5 ou 4, não se precisa de título, pois ela mesma basta à execução, por ser de força ou de eficácia imediata a sua executividade. Ocredor, ao propor a ação de cognição, de cuja sentença pode resultar a ação executiva, por ter a sentença 3 de

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executividade, põe-se em posição menos segura do que aquela em que estará na ação executiva. Nessa, com o titulo executivo judicial, já o credor não mais precisa alegar e provar o que alegara e provara a respeito do seu direito, pretensão e ação. O credor está mais seguro do que ao promover a ação de cognição. O devedor, diante disso, somente se pode defender sem atingimento do que foi conhecido e julgado pelo juiz. Daí a enumeração taxativa para fundamentos dos seus embargos (arts. 741-744). Os fundamentos ou são de direito material ou de direito processual. Não se diga que os embargos do devedor são ação constitutiva negativa: a sua constitutividade é de peso 3, se se trata de embargos do devedor com alegação de falta ou nulidade de citação no processo de conhecimento (art. 741, 1);. ou se ocorre o que se prevê no art. 741, VI. 2)“AçÃo EXECUTIVA DE SENTENÇA” E SENTENÇA; s~ PREEXISTE A AÇÃO OU SE NASCE DA SENTENÇA. Discute-se se: (1)a ação executiva de sentença preexiste à sentença (construir-se-ia, então, como declarativa de tal ação a sentença mesma, o que nos mostraria o caso único de sentença preponderantemente declarativa e exequível, ou mandamental de execução, apagando-se a linha separativa, entre ações de mandamento e condenatórias); ou se (2) a ação executiva de sentença nasce da sentença. No entanto, os juristas que suscitaram e alimentaram tal discussão foram vítimas de confusão entre ação e pretensão. Nem a ação executiva depende da prova da ação de condenação nem da prova do crédito; a ação executiva da sentença somente depende da sentença, quando essa é constitutiva (talvez só constitutiva integratíva) da ação executiva. Não é o ato declarativo do juiz que se faz ato constitutivo da ação executiva, nem, a fortiori, a condenação em si, mas o elemento constitutivo ou declarativo (da pretensão a executar) que há na sentença de condenação, posto que em segunda plana. Nas cognições incompletas, o adiantamento da execução mostra que o elemento executivo é separável, uma vez que já nascera a pretensão a executar; nas ações de cognição completa, esse elemento pode não chegar a constituir a pretensão a executar (e. g., ação declaratória do art. 4~o, ou constituí-la com a sentença, simplesmente ou sob reserva, ou, assaz expressiva-mente, na própria sentença (arts. 639-642). (a)Ligar a ação executiva à declaração do juiz é fora de toda a ciência: as ações declarativas mais puras por exemplo, a do art. 4~O do Código de 1973 (antes Código de 1939, art. 2.0, parágrafo único) não dão ensejo a sentença que tenha eficácia de título executivo. Ligá-la à ação de condenação é tomar como essencial o que é acidental: a condenação nas ações executivas de títulos extrajudiciais vem depois do início da execução. Desde que se não tome a pretensão a executar, o elemento executivo, como autônomo, inconfundível com outras pretensões ou elementos (declarativo, constitutivo, condenatório, mandamental), posto que associável com eles, erra-se. o elemento executivo é irredutivel a qualquer deles. Os outros também são irredutíveis uns aos outros. Basta pensar-se em que as ações executivas reais prescindem da condenação prévia ou cumulada. (b)Outro erro é pôr-se o dilema: ou declaratividade no sentido larguíssimo ou executividade; porque se borra, com isso, distinção, que é de grave importância para a discussão da pree2dstência ou pós-existência da ação executiva das sentenças. Se a sentença simplesmente declarasse a preexistente ação executiva, de que seria, apenas, formalidade de ingresso à execução, a sentença na ação declarativa tato sensu (não latissimo sensu), ou na ação declaratória (ação declarativa stricto sensu) seria declarativa dessa preexistente ação executiva. E não valeria o argumento de que ai não se dá a autorização a executar, porque a sentença tem de ser prova do crédito e a sentença do art. 4~O não no é: então, seria preexistente à sentença o que aí se exige provar. Se àsentença de condenação fosse peculiar e somente a ela constituir a ação executiva, então seria difícil explicar-se a condenação após a execução, em se tratando de título extra-judicial, e a execução mandamental, ou a impilcita à. condenação (arts. 639-641). A condenação somente produz a ação quando a pretensão, ou, pelo menos, a ação para executar não preexiste; não na produz quando a pretensao a executar nem preexista nem pode ser constituída, ou a ação não preexistia, nem se pode constituir (sentenças de condenação não exequíveis, como as sentenças em que é condenada a Fazenda Pública a fazer o que não poderia fazer). Quando se tem título executivo título cambiário, por exemplo e se propõe ação ordinária, dir-se-á que a sentença de condenação mostra o que nela é constitutivo, a despeito da pretensão à execução e da ação executiva que já se tinha e não se exerceu: na execução da sentença estão excluidas as exceções da ação executiva de título extrajudicial (no exemplo, as exceções peculiares à cognição parcial, inicial, do título cambiário). Mas sem razão: nada aí se “constitui”, esse efeito é o da coisa julgada material, portanto efeito do elemento declarativo da sentença. A história da execução supõe que se tenha atribuído ao Estado a atuação executiva, o monopólio da execução forçada, a pretensão à execução é pretensão a executar através do Estado. Não importa somente ter a pretensão; é preciso pedir a execução ter a ação executiva e exercê-la. De modo que, de regra, a pretensão a executar preexiste. Só não preexiste se nasce de infração de dever processual, e. g., de preceito judicial, de multa, de condenação nas custas, porque aí a pretensão surge durante a lide e por causa da lide. Mas a ação, essa, pode ser

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contemporânea da pretensão de direito material, ou posterior. Na ação executiva por títulos extrajudiciais, pretensão e ação existem ao mesmo tempo, antes da litispendência. Nas ações de execução de sentença, a ação pode ter sido constituída pela sentença, a despeito de existir, antes, a pretensão; ou ter sido supérflua a “constituição” de ação preexistente (e. g., condenação, no processo ordinário do réu contra o qual existia a ação executiva de título extrajudicial, fato semelhante ao de quem pede “declaração”, mediante ação do art. 4•O, de relação jurídica constante de “sentença” de partilha); ou ter nascido durante a lide, e a sentença, constitutiva integrativa, havê-las revelado. Há sempre elemento de cognição em todas as execuções, porque o Estado não executa como automático; não é aparelho de executar, como esses em que se põe o níquel e sai o bombom; não é agente de reflexos incondicionados. Nas execuções de títulos extrajudiciais mais expeditas, inaudita altera parte; a cognição a “reflexão” pelo juiz existe, e essa cognição vai até a sentença final, quando se completa. O adiantamento supõe cognição “provisória”, “parcial”, ou “superficial”; a sentença torna-a “definitiva”, “de todas as partes”, ou “profunda”, ou “nenhuma”. Essa definitivação, essa totalização ou esse aprofundamento da cognição já não diz respeito à execução, mas à sua confirmação pelo complemento da cognição, ou à sua eliminação. Nas execuções de sentença, tudo isso ficou para trás, tal como soia acontecer na distinção básica, jurisdicional, do processo romano, entre o iudicium e o ius, o júri (popular, pela fonte na escolha ou sorteio das partes) e o magistrado. Juiz único, ou colegial, o iudex sentenciava, não executava. O processo novo corresponde ao da manus iniectio, ou ao sucedáneo pretoriano, que foi a execução “sobre os bens”, em vez da execução “sobre a pessoa”. (Sobre ser “sucedâneo” dessa, e não forma posterior da execução sobre certos bens, contra A. UBEELORDE, em O. E. HARTMANN, Der ordo iudiciorum und die iudicia extraordinaria der Romer, 1, 496, veja também P. F. GIRARD, Manuel élémentaire de Droit Romain, 4.~ ed., 1037 e nota 3.) Em quaisquer casos, o exercício da ação executiva é dependente de resolução judicial, ou de cognição incompleta (simples deferimento da petição), ou de cognição completa, na execução de sentença trânsita em julgado. Assim se estatalizou a execução das pretensões. Se o procedimento estatalizante da actio iudicati romana se simplificou e encurtou, dando mais eficiência aos pedidos de execução, deve-se isso ao contacto do direito romano com o germânico, que conservava o valor primitivo da afirmação (mais comunicação de conhecimento do que de vontade) do credor. Na actio iudicati romana, o réu era acusado de se ter oposto à execução e o autor pedia (mais comunicação de vontade, menos comunicação de conhecimento). A primitividade voltou o povo português quando se permitiu a constrição própria (execução, ou segurança, como arresto, sequestro, etc.), em todo o direito dos forais antes do século XI; depois, o Estado procurou chamar a si todas as medidas constritivas, mas já a actio iudicati existia, de modo que nem tudo se passava como nos tempos primitivos. A regressão só se operara a respeito das dívidas ainda não julgadas, isto é, somente quanto aos “adiantamentos de execução”. (c) A pretensão a executar, isto é, a pretensão a exigir do Estado que leve a cabo a execução forçada, nada tem com a pretensão a que o devedor execute: aquela é pré-processual, de direito público; essa, pertence ao direito material da res iudicium deducta. Por isso mesmo, a prescrição da pretensão contra o devedor é uma; a prescrição da actio iudicati é outra, porque a pretensão a executar o julgado é outro momento na vida da pretensão à execução (forçada), o momento em que se conseguiu o título para se iniciar a execução. A pretensão à execução não nasce aí (erro de ANDREAS voN TUHR, Der Alígemeine Teil, 1, 177, nota 20); a pretensão a executar vem de antes e aí se mune do titulo, se a lei não a muniu dele, antes mesmo de qualquer sentença condenatória. Temos, aí, o divisor das águas. Sem essas precisões não se pode conhecer a fundo a pretensão à execução. Pretensão a executar forçadamente é pretensão à prestação que o Estado promete desde que se constituiu o direito suscetível de levar à execução. O Estado promete a execução contra aquele que acaba de deixar de pagar a outrem o empréstimo, ou causou o dano. Apenas é da natureza das coisas, e não mera artificialidade, que as pretensões se enCadeiem (declaração, contituição, condenação, mandamento, execução), e tenha de ser declarado o crédito, condenado o devedor, constituindo-se o título, para que, através de mandado, se inicie a execução. A lei pode preferir combinações, como o adiantamento de cognição para se começar pela execução, por ser extrajudicial o título; porém não é normal. A lei é que marca o início da coristrição executiva. Se é a sentença, que se exige, tal sentença habilita, mas a pretensão à execução já existia. Executar a sentença é expressão elíptica de ~‘executar forçadamente a prestação, que o devedor prometeu, uma vez que o Estado presta esse serviço diante da sentença”. Propor ação de execução de sentença (acUo iudicati) é propor a ação que se fez exercivel depois que se obteve a sentença, reputada necessária para se exigir a prestação jurisdicional correspondente à pretensão à execução forçada. A actio judicati é ação; de modo nenhum propriedade da eficácia da sentença condenatória. Sói haver, na carga de eficácia das sentenças condenatórias, esse elemento executivo; porém não é necessário que haja. E esse elemento aparece na sentença

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como explicitação da pretensão à execução, que ainda se não dotara da habilitação. A execução sã se inicia com a propositura da ação; não se iniciou com a condenação. Sem o exercício da ação de execução de sentença, a sentença condenatória nada conseguiria: o seu efeito executivo é mediato; resulta de haver no processo da ação de condenação alusão à finalidade posterior e pedido implícito de preparação de titulo (habilitação documental). Se se esgotou o tempo para poder ser exercida a pretensão de direito material (res deducta), deu-se a prescrição dela. A pretensão à tutela jurídica continuou, e. g., para a declaração; cessou para a condenação e, pois, para o mandamento e a execução. Se, em vez de estar prescrita aquela pretensão, é proferida a sentença condenatória, a ação executiva do julgado não nasceu com o julgado, mas, eficaz ele, a pretensão a executar está habilitada com ele: há ação iudicati. O tempo para se exercer a ação iudicati desde aí começa de escoar-se, porque nada tem com o tempo da res in indicium deducta. Se o autor vencedor da ação condenatória não a executa, nem alega a coisa julgada material, em nova lide com o réu, ou do réu com ele, nada obsta a que se julgue prescrita a ação da res in iudicium deducta. A ação de execução do julgado é outra coisa. A ação de execução de sentença, que é efeito mediato de ação de condenação, ou de outra dotada de efeito executivo 3, contém, de regra, forte carga mandamental junto à sua força executiva. Dissemos: de regra. Não dissemos sempre. Percorrendo-se as tabelas das ações, isso ressalta. JOAQUIM INÁCIO RAMALHO (Praxe Brasileira, 639) entendia que, sendo a execução no juízo em que se proferiu a sentença, se dispensava o mandado, porque, dizia ele, “na sentença já vai incluído o mandado”. Se de outro juiz, o mandado seria indispensável. Para afirmar a distinção, invocou ALEXANDRE CAETANO GoMEs (Manual Prático, 89), que, em verdade, o disse, e GABRIEL PEREIRA DE CASTRO (Decisiones, 13), que o não disse. Seria difícil a GABRIEL PEREIRA DE CASTRO, exatíssimo, confundir força executiva (5) com efeito executivo mediato (3) das sentenças. Cogitava ele de causas da Cúria de Filipe II sobre Portugueses quando era, ou não, necessária “carta requisitória. ALEXANDRE CAETANO GOMES ficara à superfície do problema. MANUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, 1, 163), que ele citou, nada proferiu sobre o assunto. A concepção da execução de sentença como “remate da causa” (2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 9 de maio de 1950, D. da J. de 28 de fevereiro de 1952) é aventura sem fundamento, que se choca com a exigência de citação inicial para a ação de execução de sentença. Igual inexatidão é a de dizer-se que a ação proposta se estende até a satisfação de seu objetivo (Tribunal Superior do Trabalho, 25 de outubro de 1946). Tudo isso é falso. A 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 11 de dezembro de 1945 (D. da J. de 14 de dezembro de 1948, 2269), disse que a sentença tem efeito puramente interruptivo da prescrição, não origina direito novo. Essa eficácia interruptíva atribuida à sentença foi contra lei expressa: no Código Civil de 1916, art. 172, IV, deu-se a qualquer ato judicial, que constitua em mora o devedor, o efeito de interromper a prescrição; os atos judiciais que constituem em mora são a interpelação, a notificação e o protesto, mais a citação, porque contém interpelação. O art. 1.064 do Código Civil de 1916 não bastaria para a conclusão que tirou o acórdão. A sentença, por si, não interrompe prazo prescrípcional. (d) Foi a definição de jurisdição como solução de controvérsia que mais perturbou a teoria das funções do juiz e retardou as investigações para a fixação das espécies de pretensão à tutela jurídica. Foram as doutrinas francesa e italiana do direito comum que introduziram a falsa concepção de que a execução apenas continha ato de império, de administração. Traduziu-a o principio *Iurisdictio in sola notione consistit (a jurisdição só consiste em conhecer; a jurisdição Consiste no só julgar). De modo que ficava de fora qualquer relação jurídica processual (e, mais atrás, qualquer pretensão) em que os juristas de outrora não vissem (ou melhor, não vissem preponderar) a cognição. Os juristas lusitanos souberam defender-se dessa forma evolvida, posterior, da noção tida como romana; e J. J. C. PEREIRA E SOUSA (Primeiras Linhas, 1, 8, nota 29) tinha plena consciência dessa separação. O direito comum francês e italiano transladou para o campo dos conceitos (cognição, execução) a distinção referente à organização judiciária dos romanos, cometendo duplo erro. O ius dicere foi, apenas, no nascedouro, imposição a comprometerem-se em árbitros as partes, sem a estatalização da função de julgar, e é exatamente a cognitio que não se encontra no iudicium imperio continens. O julgar stricto sensu e o executar foram privados, antes de serem estatais. O conceito de notio é obscuro (MoRrrz WLASSAK, Cognitio, Realenzyklopâdie) e ao direito comum faltou seguir o fio histórico da justiça estatal. Os juristas alemães do século XIX forraram-se à erronia de negar jurisdição ao juiz executor. Na Europa, é freqúente citar-se, a respeito, A. VON BETHMANN-HOLLWEG (1864), a G. W. WETZELL e a W. KAEMPFE (Der Begriff der íurisdictio, 1876, 4 5.); mas, antes deles, o nosso PASCOAL JosÉ DE MELO FREIRE (Institutiones, 1, 34), ap~5s referir-se à disputa dos juristas em torno da L. 3, D., de iurisdictione, 2, 1, informava que, entre nós (“apud nos”), nenhuma diferença se fez e, só excetuados os árbitros (“si arbitros excipiamus”), todos os juizes têm iurisdictio. A í.a edição das Institutiones saiu em 1815, o que importa pouco, uma vez que sempre assim se entendeu no direito português. Quando alguns juristas aludiam a distinções, apenas comentavam os textos romanos. Hoje, podemos analisar as pretensões e apontar na própria execução de sentença simples preponderância do elemento executivo, efeito de cognição completa que ficou atrás, sem se negar, portanto,

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certo elemento, ínfimo embora, de cognição na própria ação executiva de sentença. A atitude dos juristas lusitanos que repeliram o ~ dictio in sola notione consistit, no qual “notio” tinha sentido estritíssimo, que foi, depois, a dos três juristas germânicos acima citados, corresponde à da ciência de hoje (ADOLF WACH, Hancfbuch, 314, 321 5.; RICHARD SCHMIDT, Lehrbuch, 2.~ ed., 201 5.; RUDOLF POLLAK, System, 857). As teorias de FRANCESCO CARNELUTTI para reduzir a função judicial à decisão de lide, segundo os conceitos dele, constituíram tentativa de regressão ao direito comum italiano e francês, com a sua variante de processualismo atento à “luta de classes”, vendo a tudo em termos de “contenda” e de “poder sobre súditos”. O antípoda do materialismo histórico, porém confirmador, por isso mesmo, desse. Falta de cultura filosófica. E Viena estava perto. Não a viram; ou não a queriam ver. No fundo, metafísica contra metafísica, em luta renhida. (e)Para se propor a ação executiva de sentença, ~é preciso que haja o interesse a que se refere o art. 3.0; ou esse interesse já foi provado, ou, melhor, “julgado” (res indicata), pela sentença exequenda? O art. 570 fala da provocatio ad agendum pelo vencido na ação, de feitio cominatório, mas, aí, a actio é outra que a actio iudicati. O art. 568 tratou da legitimação passiva da actio iudicati. Os arts. 566, 1; 567, 585, e 584, 1-1V, falam de legitimação de quem venceu; os arta. 594 e 615, de “credor”. Essas referências de pouco nos serviriam para argumentar. Em verdade, o Código, com os arts. 567 e 568, deixou à doutrina dizer quais são os legitinvidos ativos da ação executiva de sentença, invocando-se o art. 567 ou o art. 568. ~ óbvio que se há de partir da incidência, ou não, do art. 3~0~ o art. 4~O diz que o interesse do autor poderá limitar-se à declaração. Com isso não abriu exceção ao art. 3•0, que aqui não nos cabe estudar de iure condendo. Há, pois, a exigência do interesse na declaração, ligado à existência ou não-existência de relação, ou à autenticidade ou falsidade de documento. Porém essa explicitação do art. 4~O de jeito nenhum obrigaria a terem de ser explicitadas todas as espécies de interesse, correspondentes ao exercício das diferentes pretensões à tutela jurídica.

Ao conceito de interesse de agir tem-se procurado substituir o de “existência de lide” (FwrcEsco CARKELUTTI), ou “causa legítima” (FRANCESCO INvERA); mas aquela noção é demasiado estrita e inexata (não há “lide”, no sentido de Fw~’cEsco CAXNELUTTI, em muitos processos) e “causa legítima” é o mesmo que “interesse legitimo”, conceito com que se compuseram tantas proposições tautológicas, assim nas leis como nos livros e nos julgados. A ação declaratória do art. 4~O não precisa de violação para que nasça. Não se confunda com o elemento indispensável às ações de condenação o que faz nascer as ações declarativas. Se a escritura pública foi feita em tabelião de que se acusa, publicamente, de não ter livros, o outorgado na escritura tem ação declaratôria para que se lhe declare a existência da escritura. Dá-se o mesmo no caso de suspeito de não-existência de processo e sentença. Há, aí, o interesse na declaração, sem haver culpa do réu. O interesse provindo de ato negante do réu basta, porém não é necessário. As circunstâncias podem compor outros interesses igualmente suficientes. Ser e declarar ser não são a mesma coisa. O que é é, ainda que não esteja ou não seja declarado; o que se declara ser é, e fica declarado. O enunciado de declaração é sobre a existência, não é a existência. A pretensão a ser não é a pretensão a ser declarado. O interesse na declaração, pois que é na declaração de ser ou não ser, independe da relação jurídica material cuja existência ou inexistência se quer declarar. Mas, se assim é, a declaração está acima do ser e do não ser da relação jurídica, e o interesse na declaração é o interesse do enunciado de existência. ~Qual é, pois, a relação jurídica de direito material que está à base da ação declarativa? Nenhuma, diz-se, salvo a relação de direito pré-processual (autor-Estado), que é a da pretensão à tutela jurídica; mas a tutela jurídica se refere a alguma coisa que se tutela. Esse quid é a relação entre o autor e o réu, em sua existência ou inexistência. Procedente a ação declarativa negativa, declara-se que a relação jurídica não existe; tal como se declararia, se procedente a ação declarativa positiva, que a relação jurídica existe. A declaração negativa supõe interesse na negação judicial da relação jurídica: supõe que, sem essa negação, a esfera jurídica seja injustificadamente atingida. Quase o mesmo se passa com a pretensão à execução e o interesse em executar. Mal suspeitamos que ele exista, de regra, antes de ser condenado o réu; a fortiori, antes de se propor a ação de condenação. Máxime, digamos, depois que a execução forçada passou ao Estado. O interesse em executar preexiste, no entanto, a esses exercícios de outras pretensões. Existe mesmo quando A empresta a B, posto que a dívida só se vença depois de alguns anos e talvez B voluntariamente a solva. Seja como for, o interesse em executar é pré-processual, não é, portanto, mérito, como é mérito a legitimação ad causam para executar. Também o executado tem o seu interesse em opor-se à execução, como todo réu; e os embargos do devedor são a sua ação mais característica. O interesse é em que se lhe entregue prestação jurisdicional, que, aí, é a execução (entrega da coisa ou do seu valor, ou prestação do ato ou da omissão) em resolução judicial, com força específica. N~ o simples interesse na propositura da ação iudicati, ou outra ação executiva, mas o interesse na resolução judicial in spe. Sempre que, sem essa resolução executiva (de um jacto ou em sequência de atos executivos, não importa), não seria removido o estado de fato contrário ao direito, há o interesse de executar e resta apenas saber-se quem o tem. Não se distingue,

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para exclusão, do interesse de origem processual, como o que nasce do atentado ou da cominatória, o interesse de origem extraprocessual; porque, se é aquele que está em causa, a regra, que o legitima, é regra de direito material público, que se introduziu no bloco codificativo de regras de direito formal. Não têm razão aqueles que separam o interesse de direito pré-processual e o interesse de direito processual: são vítimas da ambigUidade da palavra “ação”, que, em sentido próprio, é ação de direito material, e não o remédio, a forma. Se esse interesse é diferente do interesse anterior ao estado de insatisfação, nada tem com o assunto a distinção: aquele interesse é o protegido pelo direito, criando-lhe direitos subjetivos e pretensões. O interesse de agir não se confunde com a legitimatio ad causam, porém os dois se situam no direito fora do direito processual, um, no direito pré-processual, e outro, no direito material. O interesse de agir executivamente há de ser atual, ser interesse atual em que se entregue a prestação executiva: pode faltar desde já, porém é no momento da entrega do bem ou do seu valor que se exige. Não se dá início à execução se ainda não há esse interesse, mas, se foi dado, a aparição dele impede que se indefira o pedido. Nas medidas cautelares, o interesse de agir é a provável existência de dano, o periculum in mora ou outra base para a ação de segurança. O recurso extraordinário exige que haja interesse em recorrer; porém devem os juizes evitar, se os pressupostos estão satisfeitos, que se postule ser teórico o interesse, e, pois, se deixe de dar provimento ao recurso, como procedeu a 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal (a 25 de outubro de 1943, R. F., 100, 278), tanto mais quanto, se os pressupostos estão satisfeitos, em qualquer das espécies do art. 119, III, a) a d), da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, de regra o resultado da boa aplicação da lei seria diferente. Há interesse, por exemplo, a que, pelo fundamento da decisão, essa não seja rescindível. Apenas um exemplo. O Estado não executa antes de saber se deve executar. Aliás, ele nada decide antes de se informar. O princípio Ab executione non est inchoandum apenas nos diz que a eficácia executiva só se inicia depois de decidido que se deve executar. Porém há as exceções ao princípio, que são aquelas em que se adianta a execução, porque se permite começar com certa dose de cognição que depois se complete. O cumprimento espontâneo (voluntário) da obrigação supõe também que o obrigado conheça que o é; tanto assim que o direito material tira conseqüências da execução voluntária (e. g., Código Civil de 1916, arts. 969-971). 3)TITULO ExECUTIvO EXTRAJUDICIAL. O título executivo extrajudicial já independe de qualquer manifestação prévia da Justiça, porque se concebeu o processo executivo como de incompleta cognição, para se atender à eficácia que se atribui ao título. A ação executiva de título judicial e a de título extra-judicial são ações com 5 de executividade. Se não o fossem, não seriam ações executivas. A diferença entre as duas é que a de título judicial nasce da eficácia mediata de executividade (3), a de título extrajudicial não deriva de eficácia mediata de sentença, porque o título executivo extra-judicial não tem antecedência, mas antecipa-se à sentença de cognição. O Estado admitiu que se supunha que a futura sentença seja favorável quanto à cognição, o que fez antecipada a execução. Antecipa-se, mas o julgamento desfavorável ao título, nos embargos, tudo dissipa. O credor, no processo de execução, quer se trate de ação executiva de título executivo judicial, quer de título executivo extrajudicial, tem por si algo que resultou da sentença ou que proveio de atitude excepcional da lei a respeito do título extrajudicial. Ou não precisa mais de qualquer cognição, ou essa foi posta após o início da execução. Se o título executivo é extrajudicial, os embargos do devedor podem levar à lide de conhecimento, pois que apenas se antecipou a executividade. No título executivo está o documento que permite a ação de execução. Não se diga, porém, que só há executividade se o peso é 3; nem que o título executivo não a perca. Ele tem conteúdo de direito material, e a ação, ou a pretensão de direito material ou o direito desapareça, ou a encubra a exceção de prescrição. Apenas, diante do título executivo, o juiz, ao despachar a petição, pode julgá-la inepta, por se tratar, por exemplo, de dívida de jogo (art. 295, 1, e parágrafo único, III), ou se ainda não venceu o prazo, ou não se impliu a condição (art. 295, III), ou se o portador não teve a posse ou a pessoa que se diz sucessor não no é(art. 295, II). Em todas essas espécies, fica o juiz com o dever de exame; após o deferimento da petição inicial, é que pode vir contra o credor a ação de embargos do devedor. Aí, o devedor pode pedir a declaração de que fora solvida a dívida, mesmo se o título executivo é sentencial e a solução sobreveio à sentença. O que importa é que exista e seja válido o título executivo, sendo que a invalidade para obstar o deferimento da petição inicial somente pode ser aquela decretável de ofício, porque aí se evidencia a inexigibilidade do título. Nunca há ação de execução sem título executivo, posto que possa haver execução sem titulo para propositura de ação, o que impõe conteúdo mais preciso do brocardo Nuila executio sine titulo. Se houve sentença com 5 ou 4 de executividade, não há ação executiva, há execução na mesma ação em que se proferiu a sentença. A ação executiva nasceu da eficácia material (3 de executividade) ou do título executivo, a que a lei conferiu tal eficácia homóloga à da sentença. Não se diga, portanto, que a ação executiva tem por pressuposto, puramente formal, situação da fato resultante do documento (e. g., UGO ROCCO, Tratatto di Diritto Processuale Civile, 212). A situação é jurídica, e não fáctica, passa-se na dimensão do direito processual, mas, como todas as outras

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classes de ações, tem os pressupostos da pretensão à tutela jurídica e a pretensão oriunda do direito material. Certamente, ao propor a ação executiva, quem tem o título não precisa provar que tem o direito à prestação e à ação (de direito material); mas apenas porque executar é exse quere (ex, sequere), seguir até o fim. A sentença com 3 de executividade, como o título executivo extrajudicial, leva à ação executiva (5 de executividade): foi o caminho, passando por 3, para chegar a 5: exse quere. Uma vez que há 3, o devedor somente pode impedir a ação executiva se a petição foi inepta, ou quem se diz credor com a titularidade da ação executiva não a tem, por ser parte manifestadamente ilegítima, ou lhe falta interesse processual, ou se extinguiu o direito ou está prescrita a ação (art. 295, 1-1V, ou ocorre alguma das circunstâncias do art. 295, V e VI (arts. 39, parágrafo único, e 284). Se o titulo judicial ou extrajudicial deixa de existir (e. g., foi destruído por incêndio, ou desapareceu por ter sido roubado), o que era direito, pretensão e ação não-executiva continua, se não há regra jurídica que ligue à cártula qualquer eficácia da relação jurídica. Quase sempre, portanto, pode ser provada por outro meio a obrigação, inclusive em outra ação, em processo de conhecimento. Se o que deixou de existir, materialmente, foi a sentença com 3 de executividade, outra ação, se proponível, pode levar à outra sentença, com 3 de executividade. Se o título executivo extrajudicial desapareceu, regem os arts. 907-913 do Código de Processo Civil (títulos ao portador), ou as regras jurídicas de direito material concernente aos títulos cambiários e cambiariformes, às letras hipotecárias, aos títulos de armazéns-gerais e outros. Alguns juristas, arraigados, como KARL EINERT (Das Wechselrecht nach dem Bediirfnis des Wechselgeschdfts, 88), a convicções formalísticas, viam na amortização antinomia com o próprio caráter dos títulos cambiários e cambiariformes, por lhes parecerem que titulo perdido ou destituído é direito perdido, ou destruído. Ora, o processo de amortização recorre a forma na qual se aloje o direito ameaçado pelo extravio ou pela destruição do titulo. Não há nada de antinômico entre o rigor formal do título e o processo de amortização, que também se submete a rigor formal (cf. ERNST JACOBI, Dei Wertpapiere ais Legitimationsmittel, 18). O título executivo é documento que contém a relação jurídica, de que se irradia a obrigação. Nos embargos do devedor vai-se apreciar, além dos elementos para o exercício da “ação” (de direito processual), o exercício da ação (de direito material). Não se diga que a cobrança de divida fiscal inscrita (art. 585, VI) é exceção à exigência do titulo executivo extrajudicial. Não se fale, aí, de ficção. O que se passa é que a técnica legislativa reputou título executivo a inscrição, ato unilateral da entidade estatal. Aliás, tem ela de, ao propor a ação executiva, juntar a certidão. A discussão entre os que vêem na função do juiz imparcialidade e os que entendem que ele é favorável a quem tem razão é sem pertinência. O juiz apenas tem a função de aplicar a lei e, após verificar a incidência in casu, sentencia. Imparcialmente ele busca, com os dados e as provas, a solução, que é relativa à verdade. Depois, ele diz qual a parte que tem razão. A jurisdição pode ser mesmo voluntária. Nas ações executivas, a função do Estado foi posterior à que lhe cabia nos processos de conhecimento. Mas também aí o juiz diz o direito, porque lhe toca, hoje, a iurisdictio na execução. Seria perder-se tempo apontarem-se as concepções, muitas errôneas e algumas inadequadas, que juristas estrangeiros, principalmente italianos, quiseram lançar e lançaram sobre a natureza dos títulos executivos. Uns dizem que é a fonte autônoma da ação executiva. Outros, que é instrumento de legitimação. Outros, que o título apenas prova o direito do exeqúente, prova ora dita legal ora integral. Outros, ainda, que os títulos executivos apenas irradiam a eficácia executiva. Aqui é que temos de atender à eficácia atribuida ao título que se tem por título executivo. A pretensão à tutela jurídica, que pré-processual, já existia. No direito material, já se estabeleceu que o devedor deve cumprir as suas obrigações; portanto, há a pretensão e a ação executivas. Mas ficou a regras jurídicas especiais fixação dos pressupostos para o exercício da pretensão à execução e da ação executiva. É o direito público que substitui a autotutela, a defesa de mão-própria, pela tutela estatal. O direito estatal é que há de dizer quais os títulos suficientes, por si, à execução forçada. Cientificamente, o Estado está diante de muitas sentenças de diferentes pesos e tinha-se de atender a que a ação executiva nasce de qualquer sentença que tenha 3 de executividade. Os sistemas jurídicos, embora deficientes de pesquisas dos pesos das sentenças, tomaram como titulo executivo judicial a sentença condenatória. A princípio, em alguns Estados (e. g., França, Alemanha, Itália), órgãos estatais não-judiciários executavam, e ainda hoje persiste a “ordem” de executar posta na sentença exequenda (Código de Processo Civil italiano, art. 475, ]..~ alínea: “Le sentenze e gli altri provvedimenti dell’autorità giudiziaria e gli atti ricevuti da notaio o da altro pubblico officiale; per valere come titolo per l’esecuzione forzata, debbono essere muniti della formula esecutiva, salvo che la legge disponga altrimenti”; Ordenação Processual Civil alemã, § 725: “Die Vollstreckungsklausel: “Vorstehende Ausfestigung wird dem usw. (Bezeichnung der Partei) zum Zweck der Zwangsvollstreckung esteilt” ist der Ausfertigung des Urteils am Schluss beizuf~igen, von dem Urkundsbeamten der Geschãftsstelle zu u2nterschreiben und mit dem Gerichtssiegel zu versehen”. Nem no direito brasileiro, ou luso-brasileiro, nem antes, tivemos a cláusula ou fórmula executiva. Acertadamente, abstraiu-se de qualquer eficácia que não fosse a da própria sentença, ou do título extrajudicial a que a lei conferiu a eficácia executiva.

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Discutiu-se se o título executivo é ato ou documento. De início, exprobramos o erro de se dizer que o titulo executivo prova o direito subjetivo material: o título é executivo,porque nele está o ato jurídico, que há de satisfazer os pressupostos contenutisticos e formais, para ter a eficácia executiva. O documento apenas tem a função de instruir, docere; e pode, se se perde, ou se destrói, ser substituido. Portanto, não se trata do ato jurídico em si; porém sim do ato jurídico mais a eficácia executiva que lhe dá a lei, como sentença ou como título extrajudicial. Se os figurantes atenderam à lei, não foram eles que atribuíram ao título a eficácia executiva mas sim a incidência da regra jurídica a respeito (arts. 584 e 585), que aliás pode fazer limitações (art. 584, parágrafo único) e extensões (art. 585, § 2.0). A incidência pode não ter sido sequer prevista ou desejada pelos figurantes, ou pelo único figurante do negócio jurídico unilateral. Mais ainda: o título executivo pode consistir em formal e certidão de partilha (art. 585, V), que não se pode reduzir a mero fato jurídico, porque houve as citações e impugnações (arts. 999 e § § 1.0, e 2.0, 3•0 e 4~0, 1.000 e 1.001), há as colações, o pagamento das dívidas e o esboço da partilha e a sentença, que se profere (art. 1.026) e é sentença com eficácia de título executivo. Com a sentença, o sistema jurídico atende a que houve julgamento, de modo que já há certeza, liquidez e exigibilidade, ou somente certeza, devendo-se liquidar o ilíquido. Há razão, portanto, para que o Estado já se ponha em situação de quem deve a tutela jurídica. Antes, não; porque a obrigação do devedor tinha de ser cumprida por ele, conforme a lei ou as cláusulas negociais. Permite-se mesmo a ação executiva provisoriamente, se ainda não há trânsito em julgado, mas o recurso interponível ou interposto apenas devolve o julgamento: nada, com ele, se suspendeu. Quanto aos títulos extrajudiciais, o legislador, com exame profundo das espécies, atribui-lhes eficácia executiva, que aí constitui adiantamento, porque se tem de entrar na cognição. (A solução de ser a ação como se só de cognição fosse e tivesse de haver contestação, tal como se estabelecia no Código de 1939, foi repelida. Bem assim, a de sistemas jurídicos estrangeiros que impõem a propositura da ação de conhecimento se há embargos do devedor, o que se choca com a natureza de tais embargos, que são ação. O legislador de 1973 andou certo. Repila-se o que escreveram alguns juristas quanto a ser abstrata a ação executiva, isto é, independente da relação de direito material. Se o título é judicial, nele já estão a declaração e a condenação, de modo que com isso contam o autor e o juiz da ação executiva. O que se dá é que ela é distinta da ação de cognição. Há duas ações. Se extrajudicial o titulo executivo, há o exame do direito material feito pelo próprio juiz da ação executiva, uma vez que apenas se adianta execução e os embargos do devedor podem conter qualquer das matérias previstas para os embargos do devedor à execução de sentença, “qualquer outra que lhe seria licito deduzir como defesa no processo de conhecimento” (art. 745). Não importa arguir-se que a defesa do devedor somente pode ser apreciada em embargos de devedor, que é outra ação. Contra-ação, frise-se. O fato de alguma defesa ter de ser em ação de modo nenhum justifica estar-se a dizer que o juiz não aplica direito material, o mérito. Tudo isso mostra o ridículo de se falar de ação executiva como abstrata. O processo da ação executiva não é simples fase do processo da ação de cognição, nem no é, sequer, o da ação de liquidação. Cita-se para a ação de liquidação, e cita-se para a ação executiva, como se citou para a ação e cognição. Há sentenças em ações com 3 de executividade que não são condenatórias. Por exemplo: a ação de manutenção provisória da posse em caso de pluralidade de pessoas que se dizem possuidoras (ação mandamental); a sentença na ação de embargos de terceiro contra a arrecadação (ação mandamental); a sentença na ação de abertura da sucessão provisória (ação mandamental); a sentença na habilitação,acudindo à provocatio ad agendum, e na ação de ausente que aparece depois da sucessão definitiva (ações mandamentais); a sentença nas ações de atentado (ação mandamental); a sentença na ação de revisão de aluguer (ação mandamental); a sentença na ação de concordata (ação constitutiva). Em todos esses casos, há execução sentencial, porém não a execução de sentença título judicial ou de titulo extra-judicial de que cogitam os arts. 584 e 585. Dizer-se que a sentença condenatória que tem 3 de executividade seja sempre a sentença condenatória civil ordinária, como fez VIRGILIO RoGNoNI (La Condanna in futuro, 117) não é de acolher-se; não há qualquer extraordinariedade em que a sentença seja ilíquida, ou tenha parte iliquida, ou seja alternativa a obrigação, ou dependa de escolha o objeto a ser prestado. Diante de títulos de crédito, os legisladores tinham de atender a que, por sua natureza formal e contenutistica, alguns contêm grande probabilidade de certeza do crédito. O conteúdo é levado em consideração. A certeza não é igual à da sentença, porque ainda se há de apreciar, a despeito da dose de possibilidade, em cognição. A lei confere ao título extrajudicial, que ela fez titulo executivo, ser bastante para a legitimação ativa na ação executiva e a de dever dos órgãos judiciários. Aliás, isso é princípio geral, porque Nemo iudex sine actori. O título executivo extrajudicial é posto entre os títulos que não servem a mais do que à condenação e a sentença com 3 de executividade. Daí a cognição e a execução no mesmo processo, como a contra-ação, que são os embargos do devedor, que se substituam à contestação.

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Art. 584. São títulos executivos judiciais 1): 1 a sentença condenatória pro ferida no processo civil 2); II a sentença penal condenatória transitada em julgado3); III a sentença homologatória de transação, de conciliação, ou de laudo arbitral 4); IV a sentença estrangeira, homologada pelo Supremo Tribunal Federal 5); V o formal e a certidão de partilha 6)• Parágrafo único. Os títulos a que se refere o número V deste artigo têm força executiva 7) exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título universal ou singular.

1) TíTuLos EXECUTIVOS JUDICIAIS. O art. 534 enumerou os títulos executivos judiciais. O primeiro dos quais é a sentença condenatória proferida em processo civil, o que é de atender como primeiro exemplo, pela executividade 3 que têm as sentenças condenatórias. Em segundo lugar, vem a sentença penal condenatória trânsita em julgado, pois o peso e o mesmo. O que é preciso que tal sentença tenha a eficácia para o processo civil. Em terceiro lugar, pôs a sentença homologatória de transação, de conciliação, ou de laudo arbitral, uma vez que a executividade mediata, 3, também dela se irradia. Em quarto lugar, está a sentença estrangeira, homologada pelo Supremo Tribunal Federal, mas havemos de entender que tal sentença há de ser inserível no art. 584, 1, ou II, ou III, ou tenha 3, pelo menos, de executividade. Em quinto lugar, estão o formal e a certidão de partilha. Admita-se que se pôs aí o formal ou certidão de partilha, porque se tem de executar o que se deliberou quanto à partilha, decisão com 5 de declaratividade, 3 de constitutividade, 2 de condenatoriedade, 4 de mandamentaliade e 1 de executividade. Se a execução tiver de ser noutra ação, a eficácia executiva da sentença que julga a partilha estaria reduzida, em sua eficácia executiva, a 3. Ora, à deliberação do art. 1.022 feita nos autos segue-se a sentença que julga a partilha, nos mesmos autos, e trânsita em julgado há a imediata execução (art. 1.027), e ainda se permitem emendas nos mesmos autos do inventário, a ponto de o juiz, de oficio ou a requerimento da parte, poder corrigir inexatidões materiais. Não se vai a outro juízo, nem se propõe no mesmo juízo outra ação. Aí, no mesmo juízo, é que se podem opor embargos de terceiros. Não há embargos de devedor na ação de inventário e partilha. O art. 584, V, não foi feliz. O legislador ignorava a distinção entre 3, 4 e 5 de executividade. A sentença com 5 já é executiva, porque é preponderantemente executiva; se tem 4, na própria ação se pede a execução. Se tem 3, sim: a ação teria de ser outra ação, agora com 5. Ao falar de título executivo judicial, o art. 584, 1, referiu-se à sentença condenatória proferida no processo civil. Mas há sentenças condenatórias, proferidas em processo civil, que não têm 3 de executividade, de modo que escapam ao art. 584, 1. Por exemplo: a) com 4 de executividade, a ação para prestar contas, ou pedir contas, havendo saldo, a ação de resposta à imprensa, a ação por atentado, embutida em ação de execução por título extrajudicial (art. 881, parágrafo único), porque aí a eficácia da ação principal influi na carga de eficácia da sentença quanto ao atentado (a executividade, que seria mediata, passa a ser imediata); b) somente com 2 de executividade, a ação de pedido de prêmio ao achador, a ação confessória e a ação negatória (cf. Tratado das Ações, Tomo V, 89 s.). Uma vez que a ação executiva é fundada em sentença condenatória com 3 de executividade, a defesa do devedor, que sofre a execução, não pode volver ao que seria alegável no processo de cognição. Daí a diferença entre o possível conteúdo dos embargos do devedor opostos à ação executiva de sentença (arts. 741-744) e os embargos do devedor opostos à ação executiva de título extrajudicial (art. 745: “além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento”). Há ações em que a sentença tem 3 de executividade, sem serem ações condenatórias. Por exemplo: a ação de sub-rogação de bens inalienáveis, a ação de negócios jurídicos sobre bens de incapazes, a ação de separação de corpos, a ação de reconciliação de cônjuges, a ação para venda de mercadorias da carga do navio, a ação de venda de navio, a ação de anulação, a ação de titular do direito de preferência, a ação do obrigado à preferência, a ação de nova cártula em caso de destruição, a ação de desempossamento de título ao portador para obter novo título, a ação de autorização de venda, a ação de denúncia vazia, a ação de denúncia cheia, a ação para venda, locação ou administração da coisa comum, a ação de destituição ou dispensa de cabecel, a ação de parede-meia ou tapume-muro, a ação redibitória (remissão), a ação quanti minoris, a ação de diminuição de aluguer, a ação de concordata, a ação de sonegados, a ação de apresentação de testamento, a ação para cumprimento de testamento, a ação para alienação ou gravação de bens dotais, a ação de desquite litigioso, a ação de venda de salvados marítimos. Em geral, nas sentenças de tais ações, apesar do peso 3 de executiviclade, não há titulo executivo judicial no sentido do art. 584, se não se trata de crédito e de obrigação de prestar, de modo que não se possam invocar as regras jurídicas sobre processo de execução. Se se trata de crédito e de obrigação de prestar, sim. Demos exemplo: se houve vicio redibitório e o adquirente propôs a ação redibitória, a sentença, que é constitutiva negativa, permite que se proponha a ação executiva de título judicial, o que evidencia que a expressão “ação condenatória”, que está no art. 584, 1, vai além da classe a que se daria o nome.

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O elemento condenatório preponderante, a força sentencial, pode ser apenas de um ponto ou pontos da sentença, bem assim o elemento executivo mediato (3 de executividade). O que acontece, por exemplo, com a sentença que julgou procedente ou improcedente o pedido e condenou nas custas e nos honorários de advogado o autor ou o réu da ação (cf.art. 20 e § § 1.0, 2.0, 3~0, e 4.0). 2)SENTENÇA CONDENATÓRIA PROFERIDA NO PROCESSO CIVIL. Devemos entender que não só se trata da ação condenatória típica, mas sim de qualquer ação em que a sentença tinha 3 de executividade. Por exemplo: se na petição inicial se inseriu cominação. O Código de 1973 não dedicou artigos especiais às ações ditas cominatórias. Tais ações, de direito material, razão por que depende de haver em lei a pretensão a cominar, são de 5 de condenatoriedade e 3 de executividade. No art. 584, 1, diz-se que é título executivo a sentença condenatória proferida no processo civiL Não se pense que à referência é a classe da sentença, isto é, às sentenças condenatórias em que o peso de condenatoriedade é 5. Há ações executivas de sentenças que não entram na classe das ações condenatórias típicas (5 de condenatoriedade, 3 de executividade): a sentença na ação de apreensão de embarcações (5 de constitutividade, 4 de condenatoriedade, 3 de executividade.) Cf. art. 1.218, XI, isto é, sentenças que dão ensejo à execução com titulo judicial, que não são condenatórias. Sempre que a sentença tem eficácia condenatória, a que se soma o peso de executividade mediata (3), tem-se de incluir na classe dos títulos executivos judiciais. Unia vez que se extinguiu o processo com o julgamento do mérito (ou que se vai extinguir, o que dá, nos casos previstos na lei, a execução provisória), e houve acolhimento do pedido de condenação, não importa distinguir-se de ter o juiz acolhido, só diante das pessoas, o pedido, ou de ter sido homologatória a sua sentença, como se o réu reconheceu a procedência do pedido (art. 269, II), ou se as partes transigiram (art. 269, III). 3)SENTENÇA PENAL CONDENATORIA. Quase todas as sentenças penais são condenatórias, isto é, têm 5 de condenatoriedade; porém nem todas as sentenças condenatórias trânsitas em julgado são executáveis nos juízos civis. Nas ações penais incidentais quanto a crimes de falsidade de documento contidos em processo penal (3 de declaratividade, 5 de constitutividade, 4 de condenatoriedade, 2 de manda-mentalidade e 1 de executividade), não há executividade no cível. Tudo se passou no plano do direito processual penal. Reconhecida a falsidade e desconstituída, portanto, qualquer eficácia constitutiva, o juiz manda retirar o documento e remetê-lo, com os autos do processo incidente, ao Ministério Público. A ação condenatória penal pode advir da atividade do Ministério Público, ou de quem foi ofendido pelo ato da falsidade. Somente a sentença nessa ação é que pode ser considerada com a eficácia prevista no art. 584, II. Se a ação no processo penal não foi incidental (e. g., moeda falsa, ou papel-moeda de curso legal no Brasil ou no estrangeiro, falsificação de cédula, de nota ou de bilhetes, de selo postal, ou de talão de cheques, ou cheques, ou outros documentos), a condenação penal à indenização é executável no juízo cível. Nela, a sentença para o juiz civil tem 4 de declaratividade, 1 de constitutividade, 5 de condenatoriedade, 2 de mandamentalidade e 3 de executividade. Expliquemos melhor. No direito anterior ao Código de Processo Penal de 1941, não havia eficácia civil da sentença penal. Se se queria a responsabilidade civil, a ação de indenização pelo ato ilícito ou fato ilícito havia de ser proposta no juízo civil, para aí ser julgada. O direito processual civil não importava a eficácia sentencial da sentença penal. Tinha-se de exercer a pretensão processual civil, para que a sentença então proferida fosse executada. Com o Código de Processo Penal de 1941 (art. 63: “Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para efeito da reparação do dano, o ofendido, sem representante legal ou seus herdeiros”). Se não houve propositura de ação penal, ou se está pendente, pode o ofendido propor a ação civil. Mas ao juiz permite-se que suspenda a ação cível até que se julgue, definitivamente, a ação penal em curso (Código de Processo Penal de 1941, art. 64, parágrafo único). Tal regra jurídica, heterotopicamente posta no Código de Processo Penal, foi acertada, deixa ao juiz o ensejo de, examinada a petição, ou, durante o procedimento, evitar que possa haver futuros choques entre as duas sentenças. Apenas, o que lhe é dado é“suspender” o curso da ação, não o servir-se de tal fundamento para indeferir a petição. Se era de deferir-se a petição inicial, tem-se de fazer a citação e suspender-se o procedimento. Assim, ou a) há só a ação civil, ou só a ação penal, ou b) há as duas, com ou sem suspensão do procedimento, ou c) com o trânsito em julgado da sentença penal, se propõe a ação executiva civil, com base do título executivo judicial, que é a ação penal condenatória. A legitimação ativa à propositura da ação executiva da ação penal condenatória está nos arts. 566 e 567 do Código de Processo Civil de 1973, porque, se houve choque entre o texto processual penal de 1941 e o texto processual civil de 1973, a heterotopia estaria afastada; a fortiori, por ser o texto processual civil posterior ao outro. Se o ofendido já faleceu, tem-se de verificar se a ofensa foi ao tempo em que ele vivia, ou após. A indenização, por ter havido injustiça ou calúnia a cônjuge falecido, pedida pelo viúvo ou pela viúva, ou a pai ou a mãe, ou pedida pelo descendente, ou vice-versa, pode consistir em prejuízos para o patrimônio do falecido (e. g., empresa que passou aos sucessores, mas a injúria ou a calúnia causa danos), ou em prejuízos para o autor da ação. Não se pense que da

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injúria ou da calúnia à pessoa já falecida não possa resultar dano moral ao cônjuge ou a descendente ou a ascendente. A exigência de só ter legitimação ativa para a ação de indenização o viúvo ou a viúva se o casamento era sob comunhão universal de bens é apenas conforme a espécie. Sempre que a indenização é só ao falecido, o que é raro acontecer, ou não há sucessão, ou há. Se há, a ordem dos que são titulares do crédito é a das regras jurídicas sobre herança. Se no processo penal não se apurou qualquer dano resultante de crime, ou, a fortiori, não houve condenação, ou sequer pronúncia, ou só houve pronúncia, a ação civil pode ser proposta. A ação civil de execução, essa, sim, é que depende da sentença condenatória penal, cujo peso de executividade é importado pelo direito processual civil. Quem foi condenado na ação penal é que tem de sofrer a ação civil de execução. O patrimônio dele ou a herança está sujeita às exigências legais, como todo. Se já não é possível atingir o todo, há a responsabilidade dos sucessores conforme o que receberam. Para a incidência do art. 584, II, não importa se o juiz do processo penal se referiu explicitamente à responsabilidade civil. O que se exige é que tenha havido a ação condenatória penal. A condenação há de ter 3 de executividade, porque o titulo executivo judicial, de que cogita o art. 584, II, é a sentença penal condenatória transitada em julgado, que tem mais. Se a sentença penal não se referiu a danos, a ação civil seria a ação condenatória, para que dela resultasse a executatividade. Não se diga que a sentença penal não pode, ao condenar o ofensor, aludir a danos (sem razão, EDUARDO EsPiNOLA FILHo, Código de Processo Penal Brasileiro, II, 24). Tem de aludir; se não aludiu, não foi sentença condenatória penal com 3 de executividade para o juízo civil. O que se passa, de extraordinário, diante do art. 584, II, é que se supõe ter havido a pena criminal e a referência a danos causados (e. g., destruição de coisa, roubo de dinheiro ou de jóias). Na sentença penal de condenação, não se diz “fica condenado a prestar x”; mas apenas há de conter o elemento condenatório com referência ao ato ilícito. Uma vez que a sentença penal concluiu pela ocorrência de homicídio (Código Civil, art. 1.540), ou de lesões corporais (arts. 1.538-1.540), ou de usurpação ou esbulho (arts. 1.541-1.544), ou mau exercício profissional (arts. 1.545 e 1.546), ou injúria ou calúnia (art. 1547 e parágrafo único), ou ofensa à honra feminina (arts. 1.548 e 1.549), ou à liberdade pessoal (arts. 1.550-1.552), há o suporte fáctico comum a regras jurídicas de direito penal e a regras jurídicas de direito civil. A condenação penal vai até à condenação civil, embora deixadas ao direito processual civil as medidas executivas, inclusive de liquidação. Tem-se de evitar qualquer opinião que exija a condenação expressa em perdas e danos (e. g., ENiuCo TuLLIo LIEBMANN, Processo de Execução, 114). No caminho da solução certa, JosÉ FREDERICO MARQUES (InstituiçõeS de Direito processual Civil, V, 100), ANTôNIO Luís DA CÂMARA LEAL, ComentárioS ao Código de Processo Penal Brasileiro, 1, 233; ALCIDES DE MENDONÇA LIMA, ComentáriOs ao Código de Processo Civil, VI, Tomo 1, 303 5.). Tem-se de lembrar o próprio Código de Processo Penal de 1941, art. 63, em que se disse que, “transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo civel, para efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros”. Aliás, já o Código Penal de 1940, art. 74, estatuja que são efeitos da condenação “tornar certa a obrigação de indenizar o dano resultante do crime”. Uma vez que se declara o ilícito penal e há a condenação penal, tem-se como declarado pela sentença penal o ilícito civil, que ao ilícito penal corresponde. Temos de atender a que a sentença penal não é tipicamente condenatória, porque, em vez de 4 de declaratividade, 2 de constitutividade, 5 de condenatoriedade, 1 de manda-mentalidade e 3 de executividade, o que caracteriza a sentença condenatória, tem 3 de declaratividade, 1 de constitutividade, 5 de condenatoriedade, 2 de mandamentalidade e 4 de executividade (Tratado das Ações, V, 375 e 376). Assim, a sentença penal não cria outra ação, a de execução, como acontece com a sentença condenatória civil; mas o sistema jurídico brasileiro, para evitar outra ação condenatória (civil) e a execução civil no juízo penal, diminuiu nesse ponto o peso de executividade para o juízo civil, o que dá ensejo à ação de execução civil. Uma vez que há 4 de executividade, no plano do direito processual penal, a técnica legislativa brasileira diminuiu para 3, com referência ao plano do direito civil. Sob o Código de Processo Civil de 1939, havia os que negavam ser título executivo a sentença homologatória da transação e os que o afirmavam. Para se afastar a controvérsia, pôs-se, na classe dos títulos executivos sentenciais a sentença homologatória de transação. Mas temos de atender a que o elemento contenutístico da sentença homologatória está na transação, e não se pode atribuir eficácia de título executivo sentencial à sentença homologatória de transação que não tem, pelo menos, 3 de executividade. Temos, hoje, de interpretar o art. 584, III, como se nele estivesse escrito: “a sentença homologatória de transação em que haja condenação”. Assim, com a transparência da sentença de homologação, se vê o que se vai executar. Se a transação diz que o figurante tem direito à entrega do bem a, ou dos bens a e b, a citação é para, dentro de dez dias, satisfazer a sentença, ou, seguro o juízo, opor embargos de devedor, ou, se o prefere, para isso, depositar a coisa (arts. 621 e 622). Pergunta-se: ~,como se há de resolver, se a transação contém cláusula de condição ou de prazo para que se entregue a coisa? Diante do art. 584, III, que fez, como lei, sentença com eficácia executiva a sentença homologatória da transação, o que se há de resolver é que,

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com a alegação e prova do implemento da condição ou do advento do termo, feitas pelo credor exeqúente, a citação dá o prazo de dez dias para que o devedor entregue a coisa, ou, para oferecer embargos do devedor, segure o juízo, ou deposite a coisa. Se a transação determinou a coisa pelo gênero e qualidade, a citação é para entregá-la individualizada, se lhe cabe a escolha, porque, se cabe ao credor, já se fez a indicação na petição inicial (art. 629). O que antes dissemos sobre condição e prazo tem-se de observar. Se o objeto da execução é obrigação de fazer, a citação é para que cumpra o julgado (aliás, a sentença transparente, que homologou a transação), que fixou o prazo, ou, se o não fixou, no prazo que o juiz assinar (art. 632). Em vez de prazo, pode dar-se que se trate de condição, cujo implemento se há de alegar e provar. Se a obrigação, constante da transação judicialmente homologada, é de não fazer, o prazo é para o devedor, que praticou o ato, desfazê-lo, dentro do prazo assinado (art. 642). Em caso de recusa ou de mora do devedor, o credor requer ao juiz que mande “desfazer o ato à sua custa, respondendo o devedor por perdas e danos” (art. 643). Se não pode ser desfeito, há a indenização, por perdas e danos (art. 643, parágrafo único). Se a obrigação é de quantia certa, cabe a aplicação dos arts. 646-731. Se a obrigação é de quantia indeterminada, ou de coisa que não foi determinada pelo gênero e pela quantidade, cabendo a escolha ao devedor ou ao credor (art. 639), tem-se, antes, de exercer a ação de liquidação. Assim, respeitado fica o efeito de titulo executivo sentencial, que à sentença homologotória conferiu a lei (art. 584, III), bem como o sistema jurídico, no tocante à eficácia executiva de qualquer sentença que não determine o valor, ou não individue o objeto da condenação (art. 603). Aí, a condenação está na transação, mas a sentença homologatória fez seu, com a transparência que a caracteriza, o conteúdo da transação, mero negócio jurídico regido pelo direito material. Todas as regras jurídicas concernentes aos meios de liquidação são invocáveis (arts. 604-609). Só após é que se pode citar, pessoalmente,o devedor, para que cumpra o que deve cumprir (art. 611). Trata-se de outra citação, pois outra é a ação, com as regras jurídicas especiais ao elemento contenutístico da dívida. 4) SENTENÇA HOMOLOGATORIA DE TRANSAção, DE CONCILIAção OU DE LAUDO ARBITRAL. Para que a sentença, que homologou transação, conciliação, ou laudo arbitral, tenha eficácia executiva, é preciso que o conteúdo da transação, da conciliação, ou do laudo arbitral seja, no todo ou em algum ou alguns pontos, relativamente a uma das partes, ou a algumas, ou a todas, condenatória; isto é, declarou-se a divida e a homologação fez sentencial a condenação. De transação, conciliação ou laudo arbitral, de que não resulta alguém ser devedor e ter de pagar, não se pode irradiar 3 de executividade. Diante da sentença homologatória, o juiz, no exame da petição inicial da ação executiva, tem de verificar se foi declarada a dívida e se houve a condenação, que pode ser implícita e não só explícita na sentença homologatória. A despeito de os títulos executivos de que cogita o art. 584, III, terem procedência negocial, a executividade da sentença homologatória provém da sentença, e não do negócio jurídico que foi homologado. A sentença fez homólogo judicial aquilo que judicial não era, mesmo em se tratando de laudo arbitral. Acertado foi que o Código de 1973 pusesse as sentenças homologatórias no art. 584, III. As críticas que fazem a se chamar sentença a sentença homologatória é absurda. Não se chame “ato judicial impróprio”, como fez FRANCEsCo CARNELUTTI, porque a sentença homologatória é título judicial próprio, nem “ato contratual judicial” (PAoLo D’ONoVIiío, Commento ao Codice di Procedura Civile, II, 3.a ed., 40), nem mesmo “titulo parajudicial” (Ai~rux ANSELMO DE CAsmo, A Ação Executiva Singular, Comum e Especial, 11 e 34), posto que não seja inadmissível. No art. 1.097 do Código de 1973 se estatui, acertadamente, que, quanto ao laudo arbitral, “contendo condenação da parte, a homologação lhe confere eficácia de título executivo”. ~ preciso que tenha o peso de condenatoriedade (5), pois há laudos arbitrais que não na têm. Dá-se o mesmo com a transação e a conciliação. Se não há, na transação, ou na conciliação, o peso de condenatoriedade (5), a sentença homologatória não poderia ser título para a execução. O art. 584, III, supõe que, em qualquer das três espécies (transação, conciliação ou laudo arbitral), haja a condenação. Se não há, de modo nenhum se há de pensar em invocação do art. 584, III. Tratando-se de transação ou de conciliação quando o ato é de direito material, praticado fora ou dentro do processo, não se diga que ele basta à extinção do processo. Seria confundir-se com a relação jurídica de direito material a relação jurídica de direito processual. Se o processo já está em curso, não se diga, por exemplo, que a transação o extingue, sem que o juiz profira sentença, nem que a composição da lide resulta do ato de vontade das partes, que excluem a solução jurisdicional. Não há o “equivalente jurisdicional” de que falava FRANCEsCo CARNELUTTI. A relação jurídica processual, o processo, só se extingue com a sentença de homologação. Se uma das partes que transigiram não leva à homologação o negócio jurídico, que é de direito material, e vai a julgamento a ação, o juiz tem de decidir sem levar em consideração, salvo como prova, o ato transacional que se não submeteu à sua sentença. Influências de FRANCESCO CARNELUTTI levaram comentadores do Código de 1973 ao erro, a que acima nos referimos.

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O fato de o Código Civil, no art. 1.030, dizer “a transação produz entre as partes o efeito de coisa julgada, e só se rescinde por dolo, violência, ou erro essencial quanto à pessoa ou coisa controversa”, de modo nenhum significa que com ela se extingue o processo, a relação jurídica processual. A terminologia do art. 1.030 foi má: não há paridade da transação com a sentença; trata-se de “anulação”, e não de “rescisão” (nosso Tratado de Direito Privado, XXV, § 3.038, 3). O direito material diz qual a causa de anulação. Se houve homologação, houve sentença, que pode ser rescindível. Rescinde-se a sentença e rescindem-se os atos jurídicos de direito material, se seriam anuláveis. Não têm razão os comentadores do Código de Processo Civil de 1973 quando escrevem que, quanto à transação, a mesma “produz entre as partes o efeito de coisa julgada”, segundo o art. 1.030 do Código Civil; e concluem (e. g., ALCIDEs DE MENDONÇA LIMA, Comentários ao Código de Processo Civil, VI, 1, 307) que, “por conseguinte, como coisa julgada, quer procedida por escritura pública, quer homologada pelo juiz, se torna título executivo. Assim sendo, era natural que fosse a sentença homologatória incluída entre os mesmos A sentença homologatória de conciliação é sentença. Quando, no direito português atual, se retirou a referência à sentença homologatória de transação e de conciliação como título executivo, criou-se problema de interpretação, que só se há de resolver com o enchimento em branco, concernente ao que o legislador entendeu ser recomendável. Dizer-se que a sentença homologatória da transação ou da conciliação não é sentença, no sentido técnico, orça pelo absurdo: a prestação jurisdicional foi feita. O que resultou da transação ou da conciliação contém todos os elementos sentenciais, qualquer que seja a eficácia, declarativa, constitutiva, condenatória, madamental ou executiva. O que as partes disseram, como conclusão, passou a ser não semelhante, análogo, ao conteúdo da sentença: a sentença fez seu, homólogo, o conteúdo da transação ou da conciliação. As partes auxiliaram o juiz a prestar-lhes aquilo que o Estado prometera. Pensar -se, aí, em título executivo judicial impróprio foi um dos muitos erros de FRANCESCO CARNELUTTI, o que grande mal tem feito a juristas brasileiros; e mais grave foi o de retirar -se no Código de Processo Civil português a referência à conciliação. Acertada foi a atitude do Código de Processo Civil de 1973, art. 584, III, 1.a e 2.~ partes, quando incluiu na enumeração dos títulos executivos judiciais a sentença homologatória da transação e a da conciliação. A função, que tem em juízo a sentença homologatória da desistência, é a de extinção da relação jurídica processual, sem julgamento de mérito. A da sentença homologatória da transação (de re dubia lite incerta neque finita) é a de extinção da relação jurídica processual, com julgamento de mérito, pois que se julgou a res, diante do que as partes acertaram. Se não houve homologação judicial da transação, a eficácia é apenas negocial. Houve negócio jurídico e ainda não o examinou o juiz, para proferir a sentença. Houve entre os juristas do século passado quem levasse (em 1855) o assunto à quase-assimilação transação e sentença (C. RIsCH, Die Lehre vom Ver gleiche, 26 s. e 32). Todavia, nem chegara até às últimas conseqüências , nem o que ele escrevera resistiu às críticas que lhe foram feitas, especialmente a de OsKAR BULOW (Absolute Rechtskraft, Archiv fitr dze civilistische Praxis, 83, 85 s., nota 95). A sentença homologatória tem como fundo o negócio jurídico da transação. A sentença éque transita em julgado. Pense-se em dois casos: A propôs ação contra B, apresentando os documentos, e B, na contestação, alega que haviam transigido, conforme a escritura pública ou particular que assinaram. O juiz, ao julgar, apenas aprecia todos os documentos, inclusive o da transação, como elementos probatórios, e profere a sentença atendendo ao que se havia mudado, com a transação, à relação jurídica de direito material. Tal sentença não é sentença homologatória. Não houve a integração judicial da transação. Se, porém, pendente à lide, as partes transigem e levam o negócio jurídico da transação ao exame e à sentença de homologação, então o juiz sentencia com decisão de conteúdo homólogo ao do negócio jurídico. A sentença de homologação da transação é sentença como as outras que julgam mérito. O juiz afirmou, explícita ou implicitamente, que existiu a transação, que é válida e eficaz. A sentença que homologa o laudo arbitral é título executivo extrajudicial (art. 584, III, 3.a parte). No art. 1.097 está dito: “O laudo arbitral, depois de homologado, produz entre as partes e seus sucessores os mesmos efeitos da sentença judiciária; e contendo condenação da parte, a homologação lhe confere eficácia de título executivo (art. 584, número III)”. Se houve compromissão arbitral pendente a lide, com o compromisso arbitral extingue-se o processo sem julgamento do mérito (art. 267, VII). Se não pendia a lide, ou se pendia, é de mister a homologação do laudo arbitral, para que se lhe atribua a eficácia sentencial, de que uma das espécies é a executividade, se é o caso. Dizer-se que, na técnica jurídica, seria aconselhável a dispensa da homologação, tal como se passou na mesma legislação processual civil portuguesa, é algo a repelir-se. Idem, dizer-se que, aí, a homologação éexcesso de formalismo e foge ao princípio da economia processual (e. g., ARTUR ARsELMO DE C&sTiio, A Ação Executiva Singular, Comum e Especial, 25; com razão, contra, Jos~ ALBERTO DOS REIS, Processo de Execução, 138). Atribuir, por exemplo, eficácia de título executivo extrajudicial (a fortiori, judicial) a laudo arbitral, como se tivesse passado aos árbitros ou ao árbitro função estatal, choca-se com a boa técnica de direito processual e com a tradição do direito brasileiro. Com a transação e a conciliação, não poderia dispensar a atividade do órgão estatal, uma vez que houve monopólio da Justiça e o Estado prometeu atender a pretensão à tutela jurídica.

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Para que o laudo arbitral, homologado, possa ter eficácia sentencíal positiva, é preciso que, na classificação das ações , tenha peso que lha atribua. Se ele desconstituiu, nada se tem de exigir a mais; se apenas declarou, tudo se prestou; se condenou, quase sempre há o 3 de executividade, que é aquilo a que se refere o art. 584, III, 3.~ parte. Se tem preponderância mandamental, ou eficácia mandamental imediata, a intimação da sentença homologatória contém o mandado. Se a sentença homologatória recebe a executividade preponderante, ou imediata, não se precisa propor a ação executiva de título judicial: a intimação já levou ao que se decidiu. Não se diga que, qualquer que haja sido o laudo arbitral, tenha o juiz o dever de homologá-lo. O juiz pode e deve examinar o conteúdo do compromisso, se toda a matéria tinha de ser ou podia ser objeto da arbitragem; mais: se o árbitro ou os árbitros obedeceram às regras do compromisso e às que constam da lei sobre a função. Quando se diz que o termo “credor”, no art. 566, 1, corresponde a qualquer titular de pretensão e ação de direito penal ou de direito real, como fazem alguns juristas, bá confusão. Há ações oriundas de direito pessoal ou real que não legitimam à execução. Para a executabilidade, é de mister a obrigação de pagar ou de entregar a coisa certa ou incerta, ou de fazer ou de não fazer. A ação de reivindicação, que é ação real, não entra na classe das ações executivas de títulos judiciais ou extrajudiciais, posto que seja ação executiva. As ações possessórias, executivas, nada têm com as ações do Livro II. Nem sempre o titular de direito é credor. Convém não se embaralharem conceitos. 5)SENTENÇA ESTRANGEIRA HOMOLOGADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Os arts. 483 e 484 trataram, brevemente, da homologação de sentença estrangeira. Nem toda sentença estrangeira, que o Supremo Tribunal Federal homologa, tem 3, 4 ou 5 de executividade. Se tem 5, não se precisa propor ação executiva da sentença estrangeira: a homologação bastou. Se tem 4, com a homologação, ou se requereu ao Supremo Tribunal Federal que expeça o mandado de execução, ou se agiu conforme as regras jurídicas do Regimento Interno (art. 93). Se tem 3, então, com o documento sentencial da homologação, pede-se a execução: propõe-se ação executiva de sentença, porque a sentença estrangeira, condenatória, foi homologada e competente é a Justiça do Brasil, conforme os princípios. Foi acertado que o Código de Processo Civil de 1973 explicitasse que é título executivo judicial a sentença homologatória de sentença estrangeira, posto que fale de “sentença estrangeira, homologada pelo Supremo Tribunal Federal” (art. 584, IV). A homologação importou a eficácia de sentença estrangeira, de modo que o conteúdo eficacial do título é tudo que a sentença homologatória importou. O que não importou ficou fora; e de jeito nenhum pode estar no título executivo judicial. A importação deriva de sentença em ação constitutiva. Conforme se vê na Tabela II que está no Tomo III, 605, do Tratado das Ações, qualquer que seja a eficácia da sentença estrangeira, a eficácia da sentença homologatória é sempre a mesma: 3 de declaratividade, 5 de constitutividade, 2 de condenatoriedade, 4 de mandamentalidade e 1 de executividade. Eficácia executiva da sentença estrangeira há de ser de sentença estrangeira executiva (5) ou de sentença estrangeira condenatória, que, com 3 de executividade, leva à actio iudicati. Otítulo executivo é a carta de sentença extraída dos autos da homologação (art. 484, 1.a parte), porque aí está a decisão do Supremo Tribunal Federal, que importou a eficácia da sentença estrangeira e vai ser atendida como se fosse eficácia de sentença brasileira, que tivesse a mesma natureza e conforme as regras jurídicas a que a sentença brasileira teria de obedecer para ser feita a execução (art. 484, 2. parte). Quanto ao art. 15, parágrafo único, da Lei de Introdução ao Código Civil, lá está dito que “não dependem de homologação as sentenças estrangeiras declaratórias do estado das pessoas”. No Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, art. 210, pôs-se que “as sentenças, cíveis ou criminais, não serác exequíveis no Brasil, sem prévia homologação do Supremo Tribunal Federal, salvo as meramente declarativas de estado”. Já tratamos do assunto sob o art. 483. Frisemos aqui que a apresentação de tais sentenças em juízo permite ao juiz (e é dever dele) o exame da competência do Estado estrangeiro, a validade da sentença e a sua eficácia como prova. Aliás, não há executividade de sentença declarativa (força eficacial, 5 de declaratividade), salvo excepcionalmente (ação de abertura da sucessão definitiva de ausente, 5 de declaratividade, 2 de constitutividade, 1 de condenatoriedade, 4 de mandamentalidade, 3 de executividade; ação de ausente cujos bens foram arrecadados, acudindo à vocatio in ius, que tem os mesmos pesos da outra). Há ações declarativas com eficácia imediata (4) de executividade: ação de habilitação em inventário e partilha; a ação de habilitação incidente àherança sem necessidade de sentença; ação de habilitação incidente à herança se não há saisina. Aí, não há ação executiva que se tenha de propor. A sentença estrangeira, de que fala o art. 584, IV, e qualquer sentença que foi proferida por órgão judicial que não é brasileiro (e. g., de outro Estado, ou interestatal, ou sobreestatal). Pode acontecer que tal sentença estrangeira tenha sido de homologação de laudo arbitral, ou de conciliação ou de transação. O que se importa, então, é a eficácia da sentença homologatória estrangeira, importação que depende de homologação pelo Supremo Tribunal Federal (Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 119, 1, g). Pergunta-se: se a entidade estrangeira não exige, na espécie, a homologação, para que seja executada a transação, a conciliação ou o laudo arbitral, ~,como se há de resolver? Seria importação de efeito de negócio jurídico, e não de sentença,

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porque sentença, ex hypothesi, não houve. O negócio jurídico, como documento, porém não título executivo, pode ser posto em autos de ação pendente no Brasil, porém não paramentar, desde logo, ação executiva. O Supremo Tribunal Federal não pode homologar negócios jurídicos; só homologa sentenças estrangeiras. Homologada pelo Supremo Tribunal Federal alguma sentença estrangeira, que se vai executar, porque se importou eficácia executiva, nos embargos do devedor não pode ser alegado que houve falta ou nulidade da citação no processo estrangeiro, ou outro fato semelhante, porque o Supremo Tribunal Federal já apreciou toda a sentença estrangeira para homologá-la. Os títulos administrativos são títulos extrajudiciais. Se as dívidas, que deles constam, deram ensejo a sentença condenatória com 3 de executividade, na verdade foram reforçados pela sentença, judicializando-se. Se a lei lhes atribuiu executividade, entram na classe dos títulos executivos extra-judiciais, para que não se chamem judiciais as decisões das autoridades administrativas. Há exemplo no art. 585, VI, e alguns outros podem caber no mesmo Inciso. 6)EFICÁCIA DOS TITULOS (FORMAL E CERTIDÃO DE PARTILUA). O art. 584, parágrafo único, limita subjetivamente a eficácia da sentença na ação de inventário e partilha ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título universal ou singular. Trata-se de partilha, regida pelo direito material; de modo que: entregues os bens, podem terceiros pleitear contra a legitimação hereditária, contra terem sido do decujo os bens e contra outras intromissões no seu patrimônio . Contra eles não tem eficácia a partilha, porque, para a partilha, é preciso que haja direito real ou direito pessoal partilhável ou precluível em partilha, e somente terceiro que tenha interesse em que o quinhão b seja de B, em vez de A, é que pode alegar a propriedade de B. O efeito externo da partilha entre as partes que na ação figuraram é que Importa aos terceiros. Não foi a eficácia declarativa que teve a partilha, mas sim a força executiva, que dá aos terceiros a perspectiva da separação dos quinhões. Daí ser impróprio o que está dito no art. 584, parágrafo único. A força executiva, com 4 de declaratividade, pode depender de registro, se esse requisito é exigível quanto ao bem ou quanto aos bens partilhados. Trata-se, no art. 584, V, de qualquer formal e certidão de partilha, e não só de partilha de herança. Há partilha em desquite, quer amigável quer litigioso, ou em dissolução de sociedade. A ação de partilha é ação executiva, de modo que o formal e a certidão bastam. Não se trata de ação executiva que se haja de propor após o trânsito em julgado de sentença proferida em outra ação de que resulte a eficácia mediata executiva, como ocorre nas espécies do art. 584, 1 ou II, mas sim de execução da própria sentença. A ação de partilha já é executiva (4 de declaratividade, 2 de constitutividade, 1 de condenatoriedade, 3 de mandamentalidade e 5 de executividade). Antes da sentença de partilha, houve a deliberação da partilha (5 de declaratividade, 3 de constitutividade, 2 de condenatoriedade, 4 de mandamentalidade, 1 de executividade). Dizer-se como se tem dito, em comentários, que a referência do art. 584, V, é apenas à partilha a que se procede em espólio, que é o conjunto de bens do falecido, transmitido aos herdeiros, é erro. O art. 584 cogita de qualquer partilha, pois o próprio art. 584, parágrafo único, explicita que “os títulos a que se refere o número V deste artigo têm força executiva exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a titulo universal ou singular”. No desquite litigioso, há julgamento como qualquer outro e a partilha ocorre se há bens comuns. Se por mútuo consentimento, a sentença é homologatória e se houve partilha tem a eficácia da partilha da herança. A averbação basta àexecução (art. 1.124), se não se precisa de imissão na posse. A dissolução de sociedade, de que se cogita no art. 1.218, VII, foi assunto dos arts. 655-674 do Código de 1939, que continuou em vigor até que se ponham em lei especial: em tal ação, há o Inventário, o plano de partilha (art. 664), que tem de ser homologado por sentença (art. 665). No art. 671 foi dito que a “divisão e a partilha dos bens sociais serão feitas de acordo com os princípios que regem a partilha dos bens de herança”. Pode acontecer que, à semelhança do que se passa com a herança, advenha sobrepartilha (art. 671, parágrafo único). Se não há contrato ou instrumento de constituição da sociedade, que regule direitos e obrigações dos sócios, a dissolução judicial é pedida em ação de processo ordinário e a liquidação faz-se pelo modo estabelecido para a liquidação das sentenças (art. 673). Uma das espécies éa da sociedade de fato entre concubinos, e acertada foi a Súmula n. 380 quando tornou explicito que aí “é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”. O art. 584, V, e o parágrafo único são aplicáveis a todas as espécies de que falamos. Com o formal de partilha, tem-se que a distribuição da herança foi declarada, quanto aos herdeiros e aos legatários, e tal eficácia, que foi preponderante na distribuição, teve àfrente, com a sentença (art. 1.026), a executividade, que antes fora infima. A certidão a que se refere o art. 584, V, é aquela a que se alude no art. 1.027, parágrafo único: a certidão pode substituir o formal de partilha se o quinhão não excede cinco vezes o salário-mínimo vigente no local. A força executiva (5) da sentença de partilha é apenas em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título universal ou singular. Quem foi parte na ação de partilha está sujeito a que o juiz, com a sentença trânsita em julgado, mande que se cumpra. Mas pode ocorrer que alguma das partes ou algumas das partes tenham assumido

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obrigação de prestar (e. g., ficou com o quinhão que lhe cabia mais x, razão por que há de prestar a outro sucessor ou a outros sucessores o que corresponde a x). Aí, a sentença que consta do formal de partilha (art. 1.027, V) pode ser empregada para a execução com o ritual das ações executivas de sentença. Se a parte B está com o bem a e o bem c, mas o bem a foi atribuído, na partilha, à parte A, basta que o juiz faça expedir-se o mandado de entrega a A. Não se precisa propor a ação, com o processo dos arts. 621-628. Mesmo em se tratando de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o mandamento basta: a parte E tem de entregá-la individualizada, se lhe cabe a escolha; se não lhe cabe, o mandado tem de conter a manifestação de vontade feita por A. Se a obrigação da parte B era de fazer, o juiz manda que a cumpra no prazo que ele designe. Idem, se o mandado é para desfazer o ato a que B tinha de se abster. Se há recusa ou mora de B, pode A requerer ao juiz que mande desfazer o ato à sua custa, respondendo o devedor por perdas e danos (ai, outra ação), tal como se impossível o desfazimento. Na hipótese de B se ter vinculado a prestar ao espólio x, em dinheiro, o juiz pode mandar que pague. Se não paga, caracterizado está o inadimplemento, e o formal ou a certidão de partilha basta para que, com invocação do art. 584, V, B proponha a ação executiva dos arts. 646-731. Nas espécies de que acima falamos, concernentes a perdas e danos, o formal de partilha ou a certidão é titulo executivo sentencial, de modo que, se não se sabe qual o valor da indenização, se tem de proceder à liquidação. A solução atende ao texto do Código de Processo Civil de 1973, art. 584, V, sem se afastar do que se apurou na ciência do direito. O que acima dissemos, a respeito de inventariante, herdeiros, sucessores de herdeiros sobre bens partilhados, tambem alcança as outras partilhas, como entre cônjuges, entre concubinos, partes em partilha de bens de sociedade dissolvida e outras espécies. 7)SENTENÇAS QUE TÊM EFICÁCIA EXECUTIvA. Ações de que provêm sentenças de efeito executivo são quaisquer que esse efeito tenham. De regra, as sentenças que, na classificação quinária e na coluna do elemento executivo, apresentam a carga 3 ou 4. No direito brasileiro de hoje, diz-se que, “transitada em julgado a sentença condenatória, podem promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros”. A regra jurídica faz de carga executiva processual civil (3) a sentença condenatória penaL Tudo se passa, portanto, no plano da eficácia, e, ainda assim, da eficácia mediata. Confere-se actio iudicati (civil) à sentença penal. A sentença criminal, por certidão, é o título executivo, a que se refere a regra de direito processual penal, devendo dele constar que transitou em julgado. Isso não impede que, antes de proferida e trânsita em julgado a sentença penal, ou se a sentença penal, sem excluir ressarcimento, deixou de condenar em reparação, se proponha, no juízo cível, a ação de condenação. A ação para ressarcimento do dano pode ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for o caso, contra o responsável civil. Intentada a ação pena], o juiz da ação civil pode suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela. O juiz pode; não é obrigado a suspender: há arbítrio, posto que não seja arbítrio puro. Por outro lado, é preciso atender-se a que, aí, não há exceção de litispendência entre o juiz cível e o penal, ou vice-versa. A ação civil pode ser intentada antes ou depois da ação penal, salvo se já há coisa julgada material sobre o ponto da reparação. É esse também o pensamento que se há de pôr em relevo. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhece ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. A influência somente se dá com o trânsito em julgado; não há exceção de litispendência, nem eficácia pré-preclusão. Ainda na estrada dos mesmos princípios, explica-se que, não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil pode ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato. Categoricamente, que aparece em textos,aí está por decisivamente, isto é, quando a sentença penal nega que o fato material se tenha dado (existido). Também não impedem a propositura da ação civil: a) o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação; b) a decisão que julgar extinta a punibiidade; c) a sentença absolutória que decidiu que o fato imputado não constitui crime. Esses enunciados e os autos deixam incólume o art. 1.525 do Código Civil, regra de direito civil, ao passo que são regras de direito processual civil as dos arts. 65-67 do Código de Processo Penal (heterotopia). É útil frisar-se isso. Diz o Código de Processo Penal, art. 68: “Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (art. 32, § § 1.0 e 2.0), e execução da sentença condenatória (art. 63) ou a ação civil (art. 64) será promovida, a seu requerimento, pelo Ministério Público”. Essa regra jurídica é de legitimação processual, ali penal e aqui, heterotopicamente, civil. Basta que o ofendido pobre peça a intervenção do Ministério Público, juntando a prova de pobreza, sem ser preciso, quando se trate de condenação por sentença criminal, que junte a certidão. Ao Ministério Público, à vista das informações constantes do requerimento, cabe providenciar. Se a legitimação processual é dúplice (e g., incapacidade do ofendido), o requerimento é supérfluo, por ser dever do Ministério Público, ex hypothesi. De iure condendo, ou a) se atribui só ao juízo criminal a competência para a ação de indenização pelo delito; ou b)

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se separam a ação (criminal) de condenação e a actio iudicati cível (assim fora o direito brasileiro ao tempo do Código Criminal de 1830, art. 31: “A satisfação não terá lugar antes da condenação do delinqúente por sentença em juízo criminal passada em julgado”); ou c) se reconhece a competência cumulativa dos juízos criminal e cível para a sentença de condenação e a competência do cível, só, para a actio iudicati (Código de Processo Penal, arts. 63-68); ou d) se exclui a competência criminal para a condenação na indenização (e. g., Lei n. 261, de 3 de dezembro de 1841, art. 68, 1.a parte, que dizia: “A indenização em todos os casos será pedida por ação cível, ficando revogados o art. 31 do Código Criminal e o § 5•o do art. 269 do Código de Processo”). O Código Criminal de 1830, que seguira a solução b) de técnica legislativa, abria exceção para os casos de delinquente ausente, ou falecido (ação contra herdeiros), e se o ofendido preferia a ação cível (art. 32). Os civilistas, TEIXEIRA DE FREITAs inclusive, festejaram a solução cl). Não escondemos a nossa simpatia pela solução do Código de Processo Civil, combinado com os arts. 63-68 do Código de Processo Penal, que é a solução c).

Art. 585. São títulos executivos 1) 2) 31) extra judiciais 3) ~): 1 a letra de câmbio6) 7), a nota promissória 8), a duplicata 9) e o cheque 10); li o documento público, ou o particular assinado 12) 13) pelo devedor e subscrito por duas testemunhas 14), do qual conste a obrigação de pagar quantia determinada, ou de entregar coisa fungivel 11);

Iii os contratos 15) de hipoteca 16), de, bem penhor ), de anticrese ) e de caução como de seguro de vida e de acidentes pessoais 20) de que resulte morte ou incapacidade; IV o crédito decorrente de foro, laudêmio2’), aluguel22) ou renda de imóvel23), bem como encargo de condomínio, desde que comprovado por contrato escrito24); V o crédito de serventuário de justiça 25), de perito, de intérprete, ou de tradutor26), quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por decisão judicial; VI a certidão de dívida ativa da Faze*zda Pública 27) da União, Estado, Distrito Federal, Território e Município, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;

Vil todos os demais títulos, a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva4) 28)

§ 1.0. A propositura de ação anulatória de débito fiscal não inibe a Fazenda Pública de promover-lhe a cobrança29). § 2.0. Não dependem de homologação pelo Supremo Tribunal Federal, para serem executados, os títulos executivos extrajudiciais, oriundos de país estrangeiro. O título, para ter eficácia executiva, há de satisfazer aos requisitos (de formação exigidos pela lei do lugar de sua celebração e indicar o Brasil como o lugar de cumprimento da obrigação 30)•

1)AçõEs EXECUTIVAS E CRITÉRIO “A PRIORI” PARA A ENUMERAÇÃO DAS ESPÉCIES. ~Existe critério a priori para se saber se a quem tem título judicial ou não judicial deve corresponder, ou não, pretensão à tutela jurídica executiva? Naturalmente, se A apenas afirma ser credor de B, sem grande probabilidade de o ser (o quod plerum.que accidit exerce, aqui, toda sua fundamentação intelectual), seria desaconselhável (se a probabilidade é pequeníssima, seria absurdo) que se permitisse começar pela execução, processo no qual a sentença final teria igual ou maior probabilidade de ser injusta. De modo que, teoricamente, é a probabilidade de ser favorável ao autor a futura prestação jurisdicional completa (sentença final favorável ao autor) que constitui o “dado” para as construções da técnica legislativa; no caso, de atribuição da pretensão à tutela jurídica, à eficácia executiva provável. A confiança na escrita ou na função pública do autor está à base da concepção legal de probabilidade. A escrita pública, acima da particular; a escrita pública judicial, acima de todas. (O que determina a mais fácil e eficiente execução das sentenças.) A enumeração do art. 585 é enumeração de títulos executivos extrajudiciais. Não é a única, mas só a lei escrita diz o que é suficiente para constituir título executivo, e somente o título executivo permite ingresso à execução; donde o princípio (tautológico): Nuila executio sine titulo. 2) DECLARAÇÃO E EXECUÇÃO. A ação declarativa, sentido lato, excede o conceito de declaratividade preponderante, razão por que evitamos chamar-lhe “ação declaratória” (e. g., a do art. 4.0) e a ação executiva é fundir dois dos cinco tipos fundamentais de pretensão à tutela jurídica (pré-processual). Foram, talvez, uma só ajuda própria, ofensiva ou defensiva, ao tempo em que a justiça podia ser feita pelas próprias mãos. O homem de hoje, nos lugares de civilização mais retardada, que, de posse de sentença, a vai executar, parte em dois o ato declarativo-executivo. Se, porém, nos valemos do que a pré-história, a etnologia e a psicologia nos permitem, de informes e ilações, o próprio homem, fruto da reflexão antes da ação, apareceu com a cisão mesma entre

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declaração e executividade. A confusão conceptual denuncia distúrbio psíquico ou neurótico. De modo que à psicobiologia cabe interessar-se pela distinção; e essa se apresenta como dado humano psíquico e de conduta. Nas relações inter-humanas, o Estado chamou a si condenar e executar, conferindo às pessoas a pretensão à tutela jurídica (Rechtsschutzanspruch), a cujo exercício (processo, relação jurídica processual) corresponde o dever do Estado a entregar a prestação jurisdicional, em sentença ou em execução. A “ação executiva” emana de fato que a lei reputa suficiente para a execução; e esse fato tem de ser suficiente para “motivar” ~ação de condenação. Não é preciso que essa condenação esteja em ação; e foi o crerem-se inseparáveis condenação e execução, que levou os juristas (e ainda leva muitos) ao erro milenar de meterem as ações executivas como subclasse ou fase eventual da ação de condenação. As ações de condenação e as ações executivas são duas classes que às vezes se injetam no mesmo processo. Mas são tão diferentes quanto a pretensão à sentença e a pretensão à execução. Daí resulta que, se, ao completar a cognição , o juiz verifica que foi indevida a execução, a que se procedeu com incompleta cognição, se desfaz o que foi feito (= se retoma a prestação jurisdicional adiantada) e pode originar-se outra ação, a de enriquecimento ilícito ou a de abuso do direito processual (arts. 16 e 17). 3)TÍTULOS EXECUTIvos SENTENCIAIS E TÍTULOS EXECUTIvos EXTRAJUDICIAI5. Retomando a classificação, que antes mostramos, os títulos executivos ou são judiciais (sentenças) ou negociais (evite-se falar de contratuais, porque, na maior parte, são declarações unilaterais de vontade). Os primeiros resultam de sentenças em jurisdição contenciosa, ou na jurisdição dita voluntária (partilhas amigáveis, divisão de bens comuns dos cônjuges sem demanda). Na jurisdição contenciosa, há a sentença executável, ou a sentença de adjudicação de crédito no próprio processo executório, ou a sentença no concurso de credores, etc. Os títulos executivos mais relevantes são as sentenças a que se referem os arts. 583 e 584. Depois, vêm as sentenças “com reserva”, como se o réu alegou ter título cambiário e poder compensar, mas estar privado de exibi-lo na ocasião, ou antes da sentença, se os juizes, pelo conjunto das provas, acham prudente a reserva. A única legislação preocupou-se com os títulos executivos que sejam sentenças e dos que não sejam sentenças. E as sentenças estrangeiras com os laudos arbitrais e as partilhas dependem do processo de homologação; não os títulos estrangeiros extra-judiciais (art. 585, § 2.0). 1. O Código de 1973, art. 585, II, fala de “quantia”. Quantia, antigo “contia”, é a soma, a porção, o importe. Nas Ordenações Afonsinas, Livro V, Título 59, § 6.0, falou-se de “pequena conthia”, valor das causas. Havia “conthias” de terras e de cavalos. No Livro II, Título 59, § 22, empregou-se a expressão como valor: “vista a necessidade do Regno, que taes Terra fossem contadas nas conthias d’aquelles, a que forem dadas”. Se não houvesse no art. 585, II, a parte final (“ou de entregar coisa fungível”), teríamos de dar larga interpretação ao inciso II, de modo que abrangesse as próprias extensões determinadas de terras. Mas a alusão a coisa fungivel foi introduzida no Código de 1973, razão por que temos de interpretar o art. 585, II, como se lá estivesse escrito: “o documento público, ou o particular assinado pelo devedor e subscrito por duas testemunhas, do qual conste a obrigação de pagar quantia determinada, seja em notas nacionais ou estrangeiras, seja em moeda de ouro, ou de outra espécie, seja em cheque de viagem, ou em algo semelhante, de que se possa determinar o valor, ou obrigação de entregar coisa fungivel”. A fungibilidade, aí e ali, é elemento essencial, porque se incluem na classe das quantias determinadas as cédulas que não estejam em circulação, ou qualquer bem que se fez bem infungível. Temos, pois, de assentar que na 1.~ parte do art. 585, II, se atendeu ao valor; na segunda, ao objeto, com o pressuposto da fungibilidade. O art. 585, II, somente se refere a coisa fungível: “entrega de coisa fungível”. Fungibilidade é a substituibiidade qualitativa e quantitativa. Em vez de se levar em conta a individualidade da coisa, atende-se ao gênero, que é classe. A formação da classe édeterminada pelo tráfico habitual, e não arbitrariamente (Jos~ KOHLER, em F. v. HOLTZENDORFF, Enzyklopcidie, II, 7.~ ed., 20). A fungibilidade não se confunde com a determinação da coisa pelo gênero e pela quantidade, a que se refere o Código Civil, art. 875, pois essa determinação não advém do tráfico, e sim de enunciados do negócio jurídico (J.MEIsNEE, Das Biirgerliche Gesetzbuch, 1, 74; sem razão, PAUL LANGHEINEKEN, Vertrebare und Gattungssachen, Zeitschrzft flir Rechtspflege in Bayern, 7, 176); nem se pode tornar infungivel, por alguma proposição do negócio jurídico, a coisa que o é (H. NEUMANN, Handsaus gabe, 1, 83). Segundo o Código Civil, art. 50, são fungiveis os móveis que podem, e não fungíveis os que não podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Somente se trata de coisas móveis; nunca de imóveis. A opinião isolada de PAUL OEBTMANN (Allgemeiner Teu, 251) foi repelida. O conceito é assaz relevante para o conceito de mútuo, o de depositum irregulare e o de assinação (Answeisung). Todas as moedas correntes, os cereais, os panos e as roupas são fungíveis. Também os papéis de valor (títulos de crédito), os livros da mesma edição, as máquinas que não foram feitas especialmente para o lugar ou para alguma indústria (portanto, sem razão, OTTo WENDT, Wie etwas heisst und was es ist!, Archiv flir die civilistische Praxzs, 103, 441 s., que as exclui sempre, e os demais que sempre as incluem, e. g., G. PLANCK, Kommentar, 1, 4.~ ed., 179). As circunstâncias, em que as coisas se destinavam a algum fim, não lhes apaga a qualidade de fungiveis. Todavia,

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peças de mobiliário, se, sem lhes prejudicar a destinação, não podem ser retiradas do conjunto, hão de ser tidas como infungíveis (HUGO REHBEIIT, Das Elirgeliche Gesetzsbuch, 1, 96; Orro WABNEYEE, Kommentar, 1, 121); bem assim, a roupa feita sob medida com pano especial (FmEDEIcH ENDEMANN, Lehrbuch, 1, 8.~ e 9.~ ed., 256). O art. 585, II, não falou de bens imóveis, que são bens infungíveis. A respeito de bens infungíveis, imóveis ou não, pode haver ação executiva, mas antes o processo é de cognição; salvo se se trata de crédito que tem como prestação bem infungível, móveis ou imóvel. Porque: a) a pessoa condenada a entregar a coisa certa qualquer que seja é sujeita ao processo executivo dos arts. 62 1-628 (relativos à entrega de coisa certa) ou dos arts. 629-631 (relativos à entrega de coisa dita incerta); ou b), sendo pessoa que se vinculou a concluir contrato (arts. 639-641) é acionável para cumprir a obrigação de fazer. No Código de 1973, a respeito das ações executivas de títulos extrajudiciais, deu-se à ação a executividade com o mesmo rito processual, no que muito se distinguiu do direito anterior o direito agora vigente. Tratando-se de cognição parcial (e. g., títulos cambiários), a própria admissão das exceções pessoais que a lei cambiária exclui importa mudança da demanda. Quanto ao fato de não poder a sentença produzir coisa julgada material se ultrapassa o campo das exceções admissíveis, não se deve explicar por ser sentença de condenação com reserva. Tal sentença é rescindível (art. 485, V). Tal sentença existe, em toda a sua extensão; e pode ser rescindida. Antes de ser rescindida, tem eficácia. Se a sentença respeitou o direito cambiário, se não ultrapassou o campo das exceções admissíveis, faz coisa julgada material, como a outra; apenas não infringiu, nesse ponto pelo menos, a lei (art. 485, V): não vencerá a ação para rescindi-la. a) Não se precisa dizer, quanto às exceções inadmissíveis no direito cambiário, que a sentença respeitadora da lei cambiária passa formalmente em julgado, e não produz coisa julgada material: não poderia produzir coisa julgada material onde nada declarou que concirna ao mérito. b) Não se pode dizer, quanto às exceções inadmissíveis no direito cambiário, que a sentença, desrespeitadora da lei cambiária, passa formalmente em julgado, e não produz coisa julgada formal: produz, sim; é mesmo o tipo da sentença eficaz, posto que rescindível. c) Se a sentença rejeita as exceções extracambiárias, isto é, não as entende admissíveis, ou se as julga provadas ou não provadas, dá-se o respeito à lei cambiária, ou se dá a infração, respectivamente. A introdução do conceito de sentença com reserva (que se vê, por exemplo, em GIUSEPPE CHIOvENDA, Principii, 1189) é impertinente. As consequências práticas seriam graves. II. Tanto na ação executiva de títulos extrajudiciais, quanto na ação ordinária cambiaria, a cognição é restrita ao direito material especial. A sentença que exorbite do direito cambiário é rescindível; mas tem eficácia enquanto não rescindida. Na ação ordinária não cambiária é que a cognição se abre, mas restrita ao direito material das exceções. Se foi proposta a ação ordinária cambiária, a sentença produz coisa julgada material e é titulo executivo, permitindo a “redução de sentença”. A prescrição é então a ordinária. Essa é a tradição do direito brasileiro, acorde com os princípios de ciência do direito. Nas ações executivas, quer de títulos judiciais, quer de títulos extrajudiciais, o 5 de executividade faz iniciar-se, desde já, com a relação jurídica processual, a execução. Não há sentença que possa dizer “tem razão”, ou “não tem razão~~. Só, como contra-ação, os embargos do devedor podem atingir a relação jurídica processual da execução. 4)OUTRAS ESPÉCIES PREVISTAS EM LEI. Além dos casos de executividade dos arts. 584 e 585, prevê a lei processual a pretensão de execução criada por outras leis, repetindo, no particular, o princípio inicial. Se a lei especial concede a pretensão de execução, o Código reconhece-a com a lei extravagante de direito pré-processual, e ordena que o seu processo executivo seja o comum. ~ assim que se interpretam, de acordo com a ciência, os arts. 585 e 586. A subsistência de dois processos executivos, o anterior ao Código de 1939, para cobrança da divida pública da União do Estado-membro, do Distrito Federal, de Território e de Município em todo o território nacional, e os dos arts. 585 e 586, seria contra os princípios de interpretação das normas posteriores. De lege Jerenda, bem dispensável multiplicidade. De lege lata, só esse processo escaparia à unidade da forma executiva dos arts. 585 e 586. As leis posteriores ao Código têm de ser interpretadas como leis derrogativas ou revogativas em tudo que não coincidirem com o Código de Processo Civil, sendo esse, porém, supletivo nas lacunas das leis novas, que cortem, explícita ou implicitamente, o ordenamento processual vigente. A forma do processo executivo é a que foi prometida por lei especial, criadora da pretensão de execução, porém não criadora da forma do procedimento; e. g., Decreto n. 2.475, de 13 de março de 1897, art. 93 (corretores de fundos), Lei n. 492, de 30 de agosto de 1937 (penhor rural e cédula pignoratícia), ari. 28, § 2.0; depois do Código de 1939, Decreto-lei n. 2.627, de 26 de setembro de 1940, art. 76 (sociedades anônimas), Decreto-lei n. 3.855, de 21 de novembro de 1941 (Estatuto da Lavoura Canavíeira), art. 39, § § ~ principalmente § 2.~ (cf. art. 96), etc. Se o assunto é de direito público, só o texto da lei pode fazê-lo objeto material invocável em processo civil, razão por que o Código de Processo Civil, regulando o processo executivo e revogando as leis de processo executivo, não revogaria, por

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exemplo, o processo da cobrança de imposto (RUDOLF POLLAX System, 35). Advirta-se que o art. 1.0 do Código de 1973 difere do art. 1.0 do Código de 1939, onde se dizia, quanto ao processo: “salvo o dos feitos por ele não regulados, que constituem objeto de lei especial”. O que hoje se chocaria com o ad. 1.0 do Código de 1973, no tocante ao processo, foi revogado. O processo passou a ser o dos arts. 566-795. Só lei especial, explícita, poderia, por exemplo, voltar à duplicidade de processo, que existia antes do Código de 1973, entre a execução de títulos extrajudiciais e a execução de sentença. O que se pôs no art. 585, VII, é o reconhecimento da atribuição de eficácia executiva a outros títulos extrajudiciais não inclusos no art. 585, 1-VI. Vamos a exemplo. Na Lei n. 2.083, de 12 de novembro de 1953, sobre liberdade de imprensa, depois de se cogitar da punição por abuso de liberdade de imprensa e do exercício do direito de resposta, falou-se do pedido de retificação, citado o responsável para dar as razões por que não publicou a resposta (art. 19). Frisou-se que da decisão proferida cabe apelação (art. 20). Reformada, na instância superior, a decisão do juiz, tem o jornal ou periódico direito de haver do autor da resposta as despesas com a publicação, de acordo com a tabela de preços (art. 24). A ação para haver essa despesa é a ação executiva (art. 24, parágrafo único). A tabela de preços justifica a execução de título extrajudicial.

No Código de 1939, o art. 298, III, IV, V, VII, XI, XV, XVI e XVIII, falava de títulos executivos consistentes em documentos: a) dos corretores, para cobrança das despesas e comissões de corretagem, e dos leiloeiros ou porteiros, para as despesas e comissões das rendas judiciais; b) dos condutores e comissários de fretes; c) dos procuradores judiciais, médicos, cirurgiões, dentistas, engenheiros e professores, para cobrança de seus honorários, desde que comprovada inicial-mente, ou no curso da lide, a prestação do serviço contratado por escrito; d) dos credores por obrigações ao portador (debêntures), por letras hipotecárias e cupões de juros de ambos esses títulos; e) dos credores de prestação alimentícia e de renda vitalícia ou temporária; f) dos portadores de warrants, ou de conhecimento de depósitos, na forma das leis que regem os armazéns gerais; g) do liquidatário da massa falida, para haver do acionista de sociedade anônima, ou em comandita, ou de sócio de responsabilidade limitada a integralização de suas ações ou quotas, e para cobrar do arrematante o preço da arrematação, se os bens da massa falida tivessem de ir a novo leilão, ou nova praça, e se o arrematante não pagar à vista, ou dentro do prazo legal; li) dos credores cessionários dos créditos especificados acima, ou neles sub-rogados. Quase tudo isso constava e consta de leis especiais, de modo que se incluem nos títulos executivos extrajudiciais de que cogita o art. 585, VII. Mas, pergunta-se, se não há lei especial quanto a professores, cirurgiões-dentistas e engenheiros, ~deixaram eles de ter a ação executiva de que hoje cogita o art. 585, VII, uma vez que não havia lei especial quanto a eles e a executividade apenas lhes provinha do texto de 1939 (art. 298, V)? Duas soluções: ou a) se interpreta que, faltando lei especial, com “disposição expressa” (Código de 1973, art. 585, VII), não se pode admitir que a lei geral (Código de 1939) permaneça como lei especial; ou b) se interpreta que o Código de 1939 lhe havia revelado o que se tinha de reconhecer a tais profissionais. A solução acertada seria, de iure condendo, a solução b), porque o art. 298, III, IV, V, VII, XI, XV, XVI e XVIII, como que captara o que constava da doutrina e apontou tais execuções como se fossem assunto de leges special es. De inre condito, o que mais importa émanter-se a integridade do sistema jurídico; por isso é de esperar-se que se protejam, em leis especiais, os que tal proteção merecem. A ação de cobrança de honorários de advogados é, hoje, a do art. 585, VII, “desde que ajustados mediante contrato escrito, ou arbitrados judicialmente em processo preparatório”, “devendo a petição inicial ser instruída com o instrumento do mandato, como presunção da prestação do serviço contratado” (Lei n. 4.215, de 27 de abril de 1963, sobre o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, arts. 100, parágrafo único, e 97). “O advogado substabelecido com reserva de poderes não pode cobrar honorários sem a intervenção daquele que lhe conferiu o substabelecimento” (art. 101). “Devem ambos, substabelecente e substabelecido, acordar-se, previamente, por escrito, na remuneração que lhes toca, com a intervenção do outorgante” (art. 101, parágrafo único). A Ordem dos Advogados do Brasil tem legitimação ativa à ação executiva para. a cobrança das contribuições, taxas e multas a que estão sujeitos os inscritos nos seus quadros (Lei n. 4.215, art. 142). Quanto ao Decreto-lei n. 21, de 17 de setembro de 1966, sobre a assistência financeira, pelas Caixas Econômicas Federais, às empresas, têm de ser observados os seus arts. 6.0 e 7•0, mas, em vez de remissão aos arts. 963 e 964 do Código de 1939, entenda-se feita aos arts. 686 e 687 do Código de 1973. A defesa do devedor é em ação de embargos, que hão de ser opostos no prazo de dez dias (Código de 1973, art. 738), contados após a assinatura do auto de arrematação (arts. 693 e 694), ou a publicação da sentença de adjudicação, ou de remição (cf. arts. 715, § § 1.0 e 2.0, e 790). Os créditos com garantia hipotecária, a que se referem os arte. 9~O e 10 do Decreto-lei n. 70, de 21 de novembro de 1966 (sobre funcionamento de associações de poupança e empréstimos; a cédula hipotecária e outros assuntos), se não pagos à data do vencimento, podem, à escolha do credor, ser objeto de execução (Decreto-lei n. 70, art. 29) na forma dos arte. 566-747 do Código de 1973 (antigos, arte. 298-301), ou conforme se prevê nos arte. 31-38 do

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Decreto-lei n. 70. Quanto aos títulos de crédito rural (Decreto-lei n. 167, de 14 de fevereiro de 1967, arts. 41 e 71), tem-se hoje de observar o que estatui o Código de 1973, arts. 1.113-1.119, que correspondem aos arte. 704 e 705 do Código de 1939. O art. 71 do Decreto-lei n. 167 estabelece que, “em caso de cobrança em processo contencioso ou não judicial ou administrativo, o emitente da cédula de crédito rural, da nota promissória rural, ou o aceitante da duplicata rural responderá ainda pela multa de dez por cento sobre o principal e acessórios em débito, devida a partir do primeiro despacho da autoridade competente na petição de cobrança ou de habilitação de crédito”. Quanto aos títulos de crédito industrial, o Decreto-lei n. 413, de 9 de janeiro de 1969, art. 41, diz que, “despachada a petição, serão os réus, sem que haja preparo ou expedição de mandado, citados pela simples entrega de outra via do requerimento, para, dentro de vinte e quatro horas, pagar a divida”. O prazo não colide com o do Código de 1973, art. 652. Acrescenta o art. 41, 2.0), do Decreto-lei n. 413: “não depositado, naquele prazo, o montante do débito, proceder-se-á àpenhora ou ao sequestro dos bens constitutivos da garantia ou, em se tratando de nota de crédito industrial, à daqueles enumerados no art. 1.563 do Código Civil (art. 17 deste decreto-lei) ‘~. O art. 1.563 do Código Civil aponta os bens atingidos pelos privilégios. Feita a penhora, a impugnação, hoje, é em embargos do devedor, que se opõem no prazo de dez dias (e não de quarenta e oito horas). Quanto ao recurso e à sua eficácia, havemos de entender que o Código de 1973 incide, razão para a Lei n. 6.014, de 27 de dezembro de 1973, não ter cogitado do assunto (Código de 1973, art. 1.217). A Lei n. 5.741, de 1.0 de dezembro de 1971 (sobre proteção do financiamento de bens imóveis vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação), no art. 1.0, estatui: “Para a cobrança de crédito hipotecário vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação criado pela Lei n. 4.380, de 21 de agosto de 1964, é lícito ao credor promover a execução de que tratam os arts. 31 e 32 do Decreto-lei n. 70, de 21 de novembro de 1966, ou ajuizar ação executiva na forma da presente lei”. A petição inicial há de preencher (art. 2.0) os requisitos do art. 282 do Código de 1973, que corresponde ao art. 158 do Código de 1939. Tem de ser “apresentada em três vias, servindo a segunda e terceira de mandado e contrafé, e sendo a primeira instruída com: 1 o título da dívida devidamente inscrita; II a indicação do valor das prestações e encargos cujo não-pagamento deu lugar ao vencimento do contrato; III o saldo devedor, discriminadas as parcelas relativas a principal, juros, multa e outros encargos contratuais, fiscais e honorários advocatícios; IV cópia dos avisos regulamentares reclamando o pagamento da divida, expedidos segundo instruções do Banco Nacional da Habitação”. Tudo isso está no art. 2.0 do Decreto-lei n. 5.741 e que tem de ser respeitado. O prazo (art. 3.0) para pagar ou sofrer a penhora coincide com o que está no Código de 1973, art. 652. Quanto à defesa, o art. 5» do Decreto-lei n. 5.741 já a tornara ação de embargos do devedor. Quanto ao efeito suspensivo dos embargos do devedor, tal ocorre desde que o devedor alegue e prove: “1 que depositou por inteiro a importância reclamada na inicial; II que resgatou a divida, oferecendo desde logo a prova da quitação” (art. 5•0, com a redação que lhe deu a Lei n. 6.014, de 27 de dezembro de 1973, art. 14). Há, ainda, os arts. 7.o~12, que têm de ser atendidos. No art. 10 está explícito: “A ação executiva, fundada em outra causa que não seja a falta de pagamento pelo executado das prestações vencidas, será processada na forma do Código de Processo Civil, que se aplicará, subsidiariamente, à ação executiva de que trata esta lei”. Hoje, a forma é a dos arts. 566--747do Código de 1973. Na Lei n. 4.728, de 14 de julho de 1965 (sobre mercado de capitais e medidas para o seu desenvolvimento), diz o art. 75: “O contrato de câmbio, desde que protestado por oficial competente para o protesto de títulos, constitui instrumento bastante para requerer a ação executiva.” E o § 2.0: “Pelo mesmo rito, serão processadas as ações para cobrança dos adiantamentos feitos pelas instituições financeiras aos exportadores, por conta do valor do contrato de câmbio, desde que as importâncias correspondentes estejam averbadas no contrato, com anuência do vendedor.” Não se diga que a execução de título extrajudicial tem de ser, sempre, de coisa fungível. A referência a coisa fungível está apenas no art. 585, II, relativo a “o documento público, ou o particular assinado pelo devedor e subscrito por duas testemunhas, do qual conste a obrigação de pagar quantia determinada, ou de entregar coisa fungível”. Na classe do art. 585, VII, podem estar títulos extrajudiciais, a que lei especial atribuiu executividade, em que a prestação não seja de coisa certa (“coisas determinadas pelo gênero e quantidade”, art. 629). Mais ainda: nada obsta a que a lei especial permita executar-se título em que há a obrigação de entrega de coisa infungivel, ou a obrigação de fazer ou de não fazer. O art. 585, II, não pode influir na interpretação do art. 585, VII. Além disso, seria absurdo limitar-se a incidência do art. 585, II, à sentença penal condenatória de coisa fungível. Pode a prestação ter de ser de coisa incerta, de fazer ou de não fazer. 5)PACTO EXECUTIVO E CLAUSULA ExECUTIVA. O pacto ou cláusula executiva negocial não tem efeito executivo. O Reg. n. 737, art. 245, permitia-o; e alguns Códigos estaduais o repetiram. A pretensão de execução, como toda pretensão à tutela jurídica, é criada pelo Estado, e não pelas pessoas contratantes ou declarantes unilaterais (RUDOLF POLLAX, System, 43). O Código de 1939 riscou a regra do direito anterior, que estabelecia a pretensão de execução quando as partes pactuassem. Sem lei expressa, a pretensão de execução não pode nascer. O título executivo por convenção, ou declaração unilateral de vontade, fora das provas de direito material a que o Estado confere a pretensão, deixou de existir. Aliás, essa submissão do

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credor, com os pacta executiva, de origem italiano-canônica, atendiam à cupidez dos credores, aos Shylocks daquele tempo, e deles demos notícias ao estudarmos, em livro vasto, a história dos títulos ao portador. De lege Jerenda, seria instituto socialmente perigoso. O pacto executivo foi, porém, permitido a entidades de direito público pelo Decreto-lei n. 960, de 17 de dezembro de 1938, art. 1.0, parágrafo único. 6) TÍTULO5 EXECUTIVOS CAMBIÁRIOS E CAMBIARIFORMES. Desde 1908, passou o direito cambiário brasileiro por transformação radical. De um só golpe, foi substituído o texto do Código Comercial, inspirado em teoria contratualística, por texto em que a doutrina germânica dominou sem limitações. A princípio, a prática comercial estranhou e exprobrou a nova legislação. Mas, pouco tempo depois, os comerciantes, os advogados e os juizes, em geral os homens de negócios, se mostraram aptos a raciocinar, na feitura dos títulos e na previsão dos seus efeitos, como se fossem técnicos da nova concepção. Hoje, se acaso volvesse a antiga teoria, o espanto e a reprovação seriam maiores do que aqueles que se observaram com a reforma de 1908. Se é certo que a mentalidade humana resiste, quando pode, às inovações, não é menos certo que todo degrau subido de evolução se conta como definitivo, o que da ao desenvolvimento e ao destino humanos certo sentido unívoco e certa segurança. Marcha-Se, ascende-se. O que se sabia em 1908 foi aproveitado na Lei n. 2.044, de 31 de dezembro de 1908, uma das melhores leis que se fizeram no Brasil e a melhor lei sobre títulos cambiários do seu tempo e ainda hoje. Mas é preciso ter-se em vista que, durante esse tempo, no Brasil e no mundo, uma geração passou. Novas inteligências retomaram, na doutrina europeia e anglo-americana, os problemas que as gerações anteriores haviam versado e suscitaram outros. Nos próprios tribunais, foram eles encarados sob luzes novas. A tentativa vitoriosa de legislação uniforme, pluriestatal, concorreu para que as teorias se pusessem à prova, e os técnicos houvessem de optar por algumas das estradas que cada país ou cada grupo teórico pretendia fossem as melhores. Nos títulos cambiária, ao elemento real anda assaz ligado o elemento pessoal, com forte preponderância daquele, preponderância que se acentua nos casos de letra de câmbio ao portador, que o direito brasileiro conhece, de letra de câmbio e nota promissória com o nome do tomador em branco e de qualquer endosso em branco. Em todo caso, é preciso que não se exagere o valor do elemento real, em que a vontade se concretiza, sem prejuízo dessa. O direito cambiário chegou a tão grande harmonia de técnicas, e a técnica tão longe levou o seu intuito de harmonizar interesses particulares e do público, que o sacrifício de qualquer elemento significa, sempre, erro de justiça. Para o título cambiário ser o que é, não se teve somente de recorrer a um ou a alguns dos expedientes~ dos muitos que conhece o direito comum. Nele, em verdade, se observa complexo de experientes técnicos, de que surgiu, como disciplina comum de vários institutos singulares, o instituto do título cambiário. (a)Primeiramente, o título cambiário é título formal, porque a lei, acentuando a literalidade exigida, só admite vontade cambiária que se expresse e se declare no titulo, de modo que créditos e dívidas resultem imediatamente do texto cambiárlo. ~ velho dito, em que se traduz o exclusivismo formal da letra de câmbio e da nota promissórias Quod flOfl est in cambio nou est in mundo, a que os escritores alemães fazem corresponder o principio chamado da Gesch lossenheit cle8 WechseiVerhditnsses (A. Lição Einfi-Lhruflg in das einheitiiClie WechselreCht, 57 e 70): principw de plenitude da relação camlyiária. Tudo o que há de cambiário está rio título, posto que tudo que pode estar no título não seja cambiário. A lei intervém para dizer qual a forma que ela reputa segura para a expressão da vontade cambiária, sem tornar cego esse formalismo, porque foi feito para servir à circulação, aos possuidores de boa-fé, e não para lhes causar prejuízos. (Umas das teorias do título formal fez desse elemento a chave do problema das obrigações cambiárias, sem atender, portanto, a que é apenas um dos elementos: a FormaiaktStll~eorie.) A compreensão das exigências formais como a serviço de tal finalidade serve enormemente ao intérprete e ao juiz na aplicação do direito cambiário. O órgão foi feito para a função, e não para danificá-la, o que facilmente se compreende. (b)Também ~ título abstrato O título cambiário, de modo que já lhe conhecemos dois caracteres: é formal e é abstrato. Sem isso, falharia ele à função econômica a que se destina. Diz-se abstrato, porque nele se abstrai da causa, não porque a vontade privada o tenha imposto, e sim porque a lei o quer. É abstrato por força de lei. Assim, além de direito autônomo, que adquire o possuidor, tem ele direito abstrato, com que a sua posição se fortalece, fazendo-o livre do contágio de quaisquer causas das relações jurídicas em que estiveram os possuidores precedentes. Diante dele está o conteúdo objetivo de uma promessa, e uma lei, que a faz vinculativa. Em verdade, não está só uma promessa, estão diversas promessas, mas todas, posto que lançadas no mesmo título, mais ou menos sistematicamente, autônomas, formais e abstratas. (A abstração do título esteve à base das teorias alemães, mais ou menos abertamente, desde K.u~L EINERT. A abstração é, porém, um fato, e a teoria da cambial não se pode fundar somente num fato, ou num elemento da cambial.) (c)Há ainda a terceira característica dos títulos cambiários: poder o mesmo título conter pluralidade de vinculações e essa pluralidade, a despeito de autonomia levada às conseqúências máximas, é servida por principio de solidariedade em relação ao titular do direito cambiário, que se afasta profundamente do direito comum. (A

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pluralidade de vinculações levou as velhas teorias à explicação do endosso e do aval como saques, isto é, assimilando-os à obrigação do sacador, sem atenderem a que há endosso e aval na nota promissória. A natureza das vinculações cambiárias é que é a mesma. As teorias pecaram em tomar um fato, a pluralidade obrigacional, como característica única do título cambial. Por outro lado, os títulos endossáveis são títulos em que aparece o elemento que se pretendeu caracterizasse a letra de câmbio e a nota promissória. Ainda mais: há títulos-valor endossáveis e avalizáveis sem serem cambiários ou cambiariformes.) (d)Quarto caráter é o de fungibilidacie da prestação cambidria, com o que se facilita a sua função econômica, afastando-se tudo que pudesse ser dificultado no pagamento por um obrigado, em vez de outro. Pelo fato de ser a letra de câmbio concebida, necessariamente, como promessa de soma de dinheiro, as leis procuram impedir-lhe a circulação ao portador. Excepcionalmente, alguns sistemas permitem tal cláusula; é o que ocorre com o Brasil, que, em todo caso, a proibiu na nota promissória. (A escola cambiária de Lípsia, que chegou ao auge com KARL EINERT, exagerou a significação desse elemento, fazendo-o quase único, na expressão célebre: a cambial é o papel-moeda do comerciante.) (e)O quinto caráter da cambial é ser título comercial, quer se trate de letra de câmbio, quer se trate de nota promissória, quaisquer que sejam os vinculados cambiários, inclusive os vinculados originários e os vinculados diretos. São vinculados originários, na letra de câmbio, o sacador e, na nota promissória, o subscritor; são vinculados diretos, na letra de câmbio, o aceitante e, na nota promissória, o subscritor, sendo vinculados originários ou diretos, conforme as firmas que avalizam, os avalistas. A comercialidade dos títulos cambiários tem como conseqüência , no método de fontes e interpretação do direito cambiário, incidirem em primeira plana os princípios de direito comercial, sempre que se tem de recorrer ao direito comum como base para a rigorosa extração de princípios do direito cambiário. No direito brasileiro, confere-se ao título cambiário eficácia processual particular, que é a executividade do processo, porém tal propriedade, que lhe vem da qualidade de documento formal, não constitui elemento característico, dada a pequena importância que, hoje, tem o direito cambiário processual, uma vez que o direito material chamou a si a estruturação das prerrogativas cambiárias. Demais, muitos são os títulos dotados de executividade, o que diminui, enormemente, a vantagem que poderia representar, para a letra de câmbio e a nota promissória, o processo executivo. Os títulos cambiários são títulos de apresentação. Sem a posse do título, ou de legitimação judicial em casos de amortização, não é possível exercer-se o direito cambiário; e alguns direitos são exerciveis com a simples tença. A obrigação cambiâria é quérable, perseguível , de ida ao obrigado, e a reclamação só se realiza mediante a apresentação do título, quer se trate de pagamento quer de aceite. Os termos de vencimento não produzem, com o último momento, a mora do possuidor do título. Além disso, exige a lei que a prova da falta de aceite, ou de pagamento, ou de recusa de aceite, ou da recusa de pagamento, seja formal: o protesto. São eles, também, títulos de resgate (Einliisungspapi0re). Quem paga deve exigir que se lhe entregue o título e, por isso mesmo, quando a entrega não é possível, a lei lhe dá direito a duas quitações, uma no titulo, e outra em separado. O aval é uma das vinculações típicas, por declaração unilateral de vontade, sustentáculo de alguma das vinculações pessoais insertas no título. Tem de estar no título, como o endosso. Qualquer declaração, por mais explícita que seja, de constituir aval, se fora do título ou do pedaço que se lhe juntou, pode valer como garantia, se o direito comum lhe atribui existência e eficácia, porém não como aval. O sistema jurídico pode admitir que se lance em ato separado (cf. Tratado de Direito Privado, XXXIV, § 3.892, 1). No Brasil, não ocorreu tal importação de regra jurídica estrangeira. Aval não é fiança. O aval é declaração unilateral de vontade; a fiança é contrato. Quem avaliza assume dever independente, razão por que a invalidade da declaração unilateral de vontade, a que se refere, não se lhe contagia. É gerador de dívida abstrata. Não se pode falar de aval oneroso ou gratuito. O negócio jurídico subjacente, simultâneo, ou sobrejacente é que pode ser oneroso ou gratuito. O avalista promete o cumprimento pelo vinculado que ele avalizou. Não criou o titulo, nem transferiu a posse, nem pôs aceite, mas promete o cumprimento por algum desses vinculados. Mesmo se o avalizado se vinculou por favor (subscrição de favor, aceite de favor, ou endosso de favor),não importa. Assume responsabilidade, sem ter subscrito, sem ter aceito, sem ter endossado. No fundo, essa é a sua função característica. Também a promessa do avalista é abstrata. Também ela vale e é eficaz, mesmo se a assinatura avalizada não no é, salvo se a nulidade é oriunda de defeito de forma. Por outro lado, o aval prende-se à firma avalizada; não ao título todo, nem a quaisquer outra firmas. A firma avalizada pode ser falsa, ou falsificada, ou ser nula a declaração cambiária a que ela se refere, se isso não é resultante de defeito de forma da declaração. O título precisa ser cambiario, para que cambiário seja o aval. Se o título não é cambiário, mas entrou no mundo jurídico com outra classe, tem-se de indagar se, em tal classe, é permitido o aval. O aval é declaração unilateral de vontade somente autônoma em relação aos vinculados que não foram referidos

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por ele. Se o foram, há pluralidade de avales. Quem avaliza a vinculação que seria a de incapaz, mesmo se absolutamente incapaz, vincula-se. O avalista assumiu também a posição do avalizado. Para dizer que a obrigação do aval, como as demais obrigações cambiárias, é abstrata, a jurisprudência tateia à procura de expressões, não raro infelicissimas: é obrigação subsistente por si mesma (Tribunal da Relação do Rio de Janeiro, 10 de outubro de 1932); tem em si mesma a causa da obrigação (Tribunal da Relação do Rio de Janeiro, 5 de agosto de 1933); é obrigação perfeita (Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de março de 1934); etc. Porque é abstrato o negócio jurídico unilateral cambiário, não se precisa, nem se lhe pode exigir a concreção, porque se sai dele e se cai no negócio jurídico subjacente. Daí ser errado pôr-se a regra jurídica de que ele se presume oneroso, e não gratuito (e. g., 2.~ Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 18 de agosto de 1914, R. de D., 38, 179 s.); aliás, como seria errado presumi-lo gratuito. A discussão, em torno de ser o título gratuito ou a titulo oneroso o aval, é completamente sem sentido. O negócio jurídico de que surgiu o aval é que pode ser oneroso ou gratuito; não o aval. Surpreende que ainda se procure solução, como se os sistemas jurídicos, hostis aos títulos abstratos, recebendo a nova legislação cambiária, pudessem permanecer com as suas arraigadas convicções (e. g., Enciclopedia dei Diritto, IV, 1959, 579). A primeira figura subjetiva, a cuja vinculação se podem dar avales, é a do sacador, sem que isso signifique não valer o que se prestar, antes da assinatura pelo sacador, à firma do aceitante que se apressou em aceitar a letra de câmbio. Se na face do titulo aparece firma que não é a do sacador, nem a daquele que no contexto figura como sacador, tem-se como de avalista do sacador. A Lei n. 2.044, art. 15, se aceito o título, quer que se considere avalizado o aceitante. É permitida a pluralidade de avalistas. Todos os obrigados respondem solidariamente. O pagamento por um exonera os outros. Qual a relação entre os co-avalistas, não nos diz o direito cambiário, nem é matéria do seu terreno. Só o direito comum pode responder, pois que foi ele o regedor do negócio jurídico entre os que prestaram o aval. Nem se conclua, a priori, que a relação é regida pelo direito civil, ou comercial. É possível que seja aquele, ou esse, ou o direito estrangeiro que incidiu sobre a referida relação jurídica, ou outro ramo do direito brasileiro. O direito competente, e não o direito cambiário, é que dá a ação entre eles: não têm, portanto. entre si, a ação cambiária. O aval pode ser dado ao próprio avalista (2.a Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 8 de abril, 6 de julho e 18 de novembro de 1927; Tribunal da Relação do Estado de Minas Gerais, 12 de setembro de 1931, com decisões discordantes antes e depois). É o aval de aval, com avalista do avalista, ou aval sucessivo, que se não confunde com a pluralidade de avales a que acima nos referimos. Entre avalistas da mesma obrigação não há relações jurídicas cambiárias; entre avalistas sucessivos, sim, porque o segundo avalista que paga tem direito cambiário contra o primeiro avalista (Câmaras Conjuntas de Agravo da Corte de Apelação do Distrito Federal, 2 de junho de 1931). Se dois avales, ambos em preto, aparecem no titulo cambiário, são cumulativos. Se só o primeiro é em preto, o segundo tem de ser considerado como cumulativo, não assim se só o segundo é em preto, porque a lei diz equiparar-se o avalista àquele abaixo de cuja assinatura lançar a sua e o segundo avalista, em preto, assim procedeu. Se os avales são ambos em branco, ou se, tratando-se de muitos, todos o são, têm-se como sucessivos (2.a Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 18 de novembro de 1927), ainda que se intercalem alguns em preto. O endosso é negócio jurídico unilateral acessório, pelo qual o possuidor, que lança a declaração, por ser tomador ou endossatário, cria elemento necessário não o único, frise-se para a transmissão da promessa que fez o subscritor, ou, se anterior ao aceite, tratando-se de saque, para a apresentação ao sacado e a transmissão da promessa contida no aceite. A acessoriedade do endosso apenas consiste em que se apõe no título endossável e tem a finalidade da circulação cambiária. Acessoriedade formal, que se não deve entender no sentido vulgar de accessoriedade, porque as dívidas e obrigações resultantes não dependem de outras. O endossante ou avalista do título cambiário, em que foi falsificada, ou é falsa a assinatura do subscritor, pode estar vinculado. O endosso tem de ser incondicionado e integral. Não se admite a condição suspensiva, nem a condição resolutiva. Seria perturbante da circulação que se estivesse a indagar do implemento ou do não-implemento de condição. Tem-se a condição, qualquer que seja, como não-escrita. O endosso, a despeito da declaração mexa, tem todos os efeitos: é endosso incondicionado. O considerar-se não-escrita a condição ou a parcialidade do endosso atende a interesses de circulação. O endosso parcial é proibido, porque restringiria a responsabilidade, porém não o endosso que restringe a transmissão de posse (em vez de posse própria só a posse imediata imprópria). A eficácia do endosso consiste em permitir que a posse se transfira ao endossatário, com a determinação da relação jurídica de dívida, o direito à apresentação e, pois, a que a relação jurídica de obrigação se irradie e, ao mesmo tempo que a posse se transfere, seja vinculativa contra o endossante a declaração unilateral de vontade contida no endosso. O endosso é declaração unilateral de vontade, que permite a circulação do título cambiário. Uma vez assinado, perfeito está como negócio jurídico unilateral. A posse pelo endossatário é algo que corresponde à posse pelo tomador e à própria posse pelo portador do título inominado. Daí ser da máxima importância não se confundir

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com a perfeição do endosso, negócio jurídico unilateral, a transmissão da posse do título endossado, fatos que são equivalentes à subscrição do título cambiário pelo emitente ou sacador e ao contacto com o alter digno, de que a emissão pelo emitente ou pelo sacador é espécie. O Endosso não é negócio jurídico real, nem transmite posse. A tradição da posse, após o endosso, ou antes do endosso, ou simultânea ao endosso, sim; mas a tradição de posse não é negócio jurídico, como erradamente pensava WALTER BIGIAvI (11 trasferimento dei titoli di credito, Rivista trimestral e di Dritto e Procedura Civile, IV, 46 5.). A tradição é ato-fato jurídico (Tratado de Direito Privado, Tomo II, § 159, in fine). A função traslativa que se atribui ao endosso não é dele, é da tradição, que, conforme sabemos, pode ser por outrem que não o endossante (e. g., pelo ladrão ou pelo achador). O endosso apenas fornece um dos elementos para a transiação. Elemento restringente, porque, se o título fosse ao portador, não se precisaria de endosso. O título endossável é titulo em que explícita ou implicitamente se diz que a tradição não basta para a transmissão; mas, a fortiori, também não basta o endosso, que é mera declaração unilateral de vontade. A relação jurídica de dívida não é transmitida; o que se transmite é a posse do titulo: se ocorre boa-fé, originariamente se estabelece a relação jurídica de dívida. 7) LETRA DE CÂMBIO. Ao que tem em mãos a letra de câmbio tocam, com a pretensão à tutela jurídica, a pretensão a executar e as pretensões à condenação e à declaração. Dai ser-lhe possível propor ação declaratória, intentar ação de cobrança com rito ordinário, processo cuja prestação jurisdicional será sentença de condenação, seguida de execução de sentença, ou usar da ação executiva de título extra-judicial. Em vez de se ter a seqúência (a) ação declarativa (art. 4.0), para se declarar existente a relação jurídica cambiária, (b) ação de condenação para se exigir a prestação, (c) ação de execução de sentença, tem-se, com a ação executiva de título extrajudicial, o adiantamento da prestação, mediante cognição incompleta, seguido, afinal, da sentença de completamento da cognição, de tipo (a) mais (b), pois que declara, de modo completo, a existência, e condena, de modo completo, o réu. Mas tal sentença é nos embargos do devedor. Sem a processualística própria, menor havia de ser a significação prática do direito cambiário, posto que, já hoje, a parte de direito material seja muito mais importante que a de direito formal. Em verdade, porém, o direito cambiário material e o direito cambiário processual nasceram unidos, criando, juntos, os princípios essencialmente cambiários. Vê-se bem isso no célebre estudo de CARL FREUNDT sobre o direito cambiário dos pós-glosadores e nos de FRIEDRICH STEIN e A. SKEDL sobre o processo cambiário. No começo, é de notar-se que à necessidade de execução rápida não foi estranha a inoponibilidade das exceções, matéria que, todavia, não ficou ao direito processual. O que hoje se vê é um todo incindível, apto e exigido para a edificação de um sistema. Mas o direito cambiário tornou-se quase exclusivamente material. Se restringimos o problema ao processo judicial, notamos que Genebra pôde levar a cabo a sua grande obra de uniformização sem cogitar do processo judicial, e a lei brasileira se limitou ao processo da amortização e às duas indicações de rito, a que se referiu, para o processo da ação de enriquecimento cambiário (a ação do portador, para esse fim, é a ordinária), e, para o processo da ação cambiária especifica, que é a ação executiva. A evolução cambiária prescindiu dos fundamentos processualisticos, à medida que se atingiu a abstração. Em verdade, porém, a rapidez processual não é essencial à concepção dos direitos e das obrigações que o direito cambiário suscita. As diferenças sensíveis nos vários sistemas mostram bem que o direito cambiário contemporâneo é precipuamente material: as regras jurídicas de forma são, de ordinário, regras de direito material, e não de direito formal. O direito cambiário brasileiro satisfaz-se com dizer que a ação cambiária especifica tem como remédio jurídico processual próprio o executivo. Com isso, equipara o título cambiário a certos atos do poder público, como os fiscais, ou os dotados de fé pública. Entra assim na classe dos chamados processos executivos. Não vai a lei cambiária além da escolha do rito. O processo e a execução, bem como os recursos e as exceções processuais, não constituíram objeto das suas regras jurídicas. Ao direito pré-processual é que cabe regular a executividade, quer por meio do capítulo comum a todos os títulos executivos, quer por meio de regras jurídicas especiais ao processo executivo dos títulos cambiários. Na vigência da Constituição de 1891, tinha importância saber-se qual o conteúdo da expressão “processo executivo”, pois aos Estados-membros competia a legislação processual. Desde a Cons tituição de 1934, já não teve significação prática, por ser o mesmo legislador que edicta as regras do direito cambiário e as regras do direito processual. Em todo caso, no campo teórico, processo executivo é aquele que começa pela execução, pela apreensão de bens do devedor, por ordem do juiz. Rigorosamente, ao direito pré-processual é que toca dizer se o título extrajudicial é executivo, pois isso consiste em determinar-se de quando começa a exercitabilídade da pretensão à execução. Ainda ao tempo da pluralidade de legislações, seria de admitir-se que a União edictasse a regra jurídica sobre a executividade dos títulos extrajudiciais. O art. 585, VII, exige que a lei, no tocante à executabilidade dos títulos que não cabem no art. 585, 1-VI, seja expressa. Mas a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata e o cheque estão no art. 585, II De ordinário, o direito tributário contém regras jurídicas pré-processuais.

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O remédio jurídico processual pode ser usado contra qualquer dos obrigados principais e de regresso, desde que, se obrigado de regresso o autor, anteriores esses a ele. Não se regressa para os posteriores. Não importa se já foi empregado inutilmente contra um, ou se foram chamados dois ou mais, ou se o autor desistiu do processo contra um para ir contra outro, ou, tendo-se executado o obrigado mais remoto, se volve contra outro menos remoto. Nada obsta a que sejam processados, de uma vez, dois ou mais obrigados, sem qualquer observância da ordem dos endossos. O possuidor que recebe o pagamento parcial não fica prejudicado na ação cambiária para haver o restante, usando, se quiser, do processo executivo. Em conseqüência , pode ele ir contra aquele mesmo que pagou parcialmente, ou contra qualquer outro obrigado cambiário. É preciso atender-se a que a ação cambiária já existia antes da concepção da obrigação cambial como abstrata, isto é, ao tempo em que a causa cambii cobria o fundamento de negócio jurídico subjacente, ou sobrejacente ou justa jacente, portanto em que não havia abstração. A substituição mais do que transformação operou-se no plano do direito material; e é o direito material que dá o conceito de título cambiário” (letra de câmbio, nota promissória, etc.) e todas as suas limitações. Mostrada a aquisição formal da cambial (~. g., último endossatário e apresentação do título), já está excluída qualquer referência a relação jurídica causal entre autor e réu. Se alude a isso, a via cambiária foi mal escolhida. Porém o juiz deve ater-se à declaração, e não à intenção. A petição é que decide. A ação não pode ser mudada, posto que a sentença passada em julgado sane a nulidade. Ao réu mesmo é dado opor-se a que se saia do terreno cambiário, embora não seja jurídico eliminar-se a causa entre o emitente e o credor imediato, em certos títulos de favor. O Tribunal da Relação de Minas Gerais entendeu, por duas vezes, que o título cambiário, pago em parte, sem se fixar o que foi pago, perde o direito ao remédio jurídico processual executivo (22 de junho de 1924, 24 de janeiro de 1931). Essa solução aberrara e aberra dos princípios: o ônus da prova de ter pago, e de quanto foi pago, cabe ao obrigado que pagou, e não se pode prejudicar o possuidor do título, negando-se-lhe remédio jurídico processual específico. Ou os pagamentos parcelados constam do título e de modo nenhum alteram a certeza e liquidez da dívida, ou dele não constam, e constituem objeto de exceção, na contestação, na ação de condenação, ou nos embargos do devedor, na ação executiva. Tem-se também discutido se, no processo executivo, feito exame de escrita e apresentados documentos, que provem a alteração da soma cambiária, deve o juiz negar o uso do remédio jurídico processual específico ao título, remetendo as partes ao processo ordinário, ou se deve, desde logo, decidir. A Corte de Apelação de Minas Gerais (10 de novembro de 1934, R. F., 64, 59) entendeu ser inábil o título para o remédio executivo, parecendo remeter as partes ao processo ordinário. Sem razão, posto que, no processo ordinário, não deixe de ser cambiária a ação (no sentido do direito material, que é o próprio). No trato das exceções, deve o juiz começar pelo exame das exceções literais da declaração cambiária (falta de legitimação material, incapacidade, carência ou insuficiência de representação, falta de vontade cambiariamente suficiente). De regra, delas deve conhecer o juiz e decidir de oficio. Cumpre, porém, advertir-se que a de falsa subscrição e a de irrepresentação exigem prova que não consiste na literalidade cambiária, de modo que seria contra os princípios que o juiz as julgasse, sem provocação. O ônus da prova da autenticidade da assinatura, uma vez que se tenha negado com pertinência, e da existência da representação competem ao autor. Por igual, a da veridicidade do contexto do titulo cambiário visivelmente modificado, ou do valor para o obrigado de um texto que se falsificou. O réu, mostrando não ser sua a assinatura, ou não ter dado poderes ao representante, põe o autor na contingência de provar que a assinatura é do obrigado, ou que houve os poderes, ou, se os não houve, que ocorreu suprimento da vontade ou expressão de vontade cambiariamente suficiente. A incapacidade, a falta de legitimação material, a falsificação do texto e outras exceções semelhantes dão a prova ao réu. São processuais as exceções concernentes à penhora, a falta de executividade, Cf. art. 745. No correr do processo, o juiz, chamado a aplicar o direito cambiário, deve libertar-se, precipuamente, das peias que o trato quotidiano dos princípios de direito comum, civil ou comercial, lhe deixam no espírito. Poucas vezes terá de recorrer ao direito comercial comum e ao direito civil, para a extração de princípios gerais de direito cambiário, e tudo o aconselha a fugir a tais ramos do direito, enquanto não se manifesta, com toda a pertinência, a necessidade de prover a casos não previstos pela lei ou por seus princípios imediatos. Os grandes erros da jurisprudência em matéria cambiária são efeitos de incursões indevidas no direito comum. Vencido e pago o título, ou pago antecipadamente, com as cautelas que a lei aponta, e em mãos do solvedor, a discussão sobre o direito à posse é sobre o dinheiro pago, e não sobre o título, que está como “morto” (4.a Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 11 de março de 1937). A competência para a ação de cobrança é a do domicílio do emitente, ou a do domicílio de cada obrigado, obedecendo-se às regras de direito processual comum e de organização judiciária. (Dissemos “ação de cobrança”, e não “ação executiva”, mas o foro da ação cambiária de cobrança é o mesmo do processo executivo, o geral. Sem razão, portanto, a Corte de Apelação de São Paulo, a 14 de setembro de 1935, que entendeu ser o foro do domicílio dos réus, se se preferir o rito ordinário. O foro que seria o de cada obrigado, no processo executivo, será o do processo ordinário; não muda com a forma do processo.) A ação de enriquecimento cambiário propõe-se no domicílio do enriquecido, que é o réu.

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A ação executiva cambiária propõe-se no foro do domicílio do emitente, que pode coincidir, ou não, com o lugar da execução. Não há regra jurídica especial sobre o foro para as obrigações cambiárias. As regras jurídicas que há são as do art. 94, (domicílio do réu), do art. 94, § 1.0 (um dos domicílios), do art. 94, § 2.0 (onde for encontrado), art. 94, § 3~0 (em qualquer foro), ou do art. 94, § 4~o (onde forem encontrados), donde poder-se propor a ação contra o endossante, ou contra o avalista, no foro do domicílio do emitente, por efeito de conexão, ou no foro do domicílio do obrigado cambiário. Não importa o que pensem juristas estrangeiros, que estão sob sistema jurídico diferente, nem certo pendor “colonializante” de alguns escritores brasileiros (certo, a 1~a Câmara do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 27 de março de 1945, R. F., 118, 498). O lugar do pagamento é indicação de domicílio, salvo ressalva. Se o réu obrigado cambiário não é o obrigado cambiário direto, pode ser acionado no seu domicílio, ou no do obrigado cambiário direto, que pode ser o lugar do pagamento (cf. 2A- Turma do Supremo Tribunal, 21 de setembro de 1948, R. F., 124, 121). O direito processual é que responde se cabe reconvenção em processo cambiáriO, ou se o título pode ser apresentado, em reconvenção, quando executivo o processo instaurado. Não há solução a priori. Se há processo contra o emitente e contra. outro obrigado ou outros obrigados, esses têm de comparecer. Aliás, qualquer obrigado, exceto o emitente, tem de comparecer perante o foro do outro conforme as regras 3urídícas de conexão e de prevenção. No processo executivo, toda a defesa é na contra-ação (embargos do devedor). O remédio jurídico processual da ação de cobrança pode ser usado contra qualquer dos obrigados principais e de regresso, desde que, obrigado de regresso o autor, anteriores esses a ele. Os dogmas da solidariedade e da autonomia das obrigações cambiárias permitem que se vá inutilmente contra um obrigado e, depois, contra outro, ou que se chamem a juízo dois ou mais; ou que se desista do processo contra um, para se ir contra outro; ou, tendo-se executado obrigado mais remoto, se volte contra outro menos remoto. Na propositura da ação contra dois ou mais obrigados, não importa a ordem deles. O possuidor, ou obrigado que pagou, se recebeu pagamento parcial, continua com o remédio jurídico processual executivo, pelo restante, podendo ir contra aquele que pagou parcialmente, ou contra qualquer obrigado cambiáriO. A cobrança contra um, dois ou mais obrigados não significa renúncia da responsabilidade dos outros pelo total. Se o título cambiário foi pago em parte, sem se fixar o que foi pago, não fica sacrificado o remédio jurídico processual executivo, e examinamos, em nosso Tratado de Direito Cambiario (1, 420), a discordância entre as decisões judiciárias. Cf. Tratado de Direito Privado, Tomos XXXIV e XXXV. Se há prova da alteração da soma cambiária, sem ser aparente no título, o juiz deve decidir a questão no processo executivo; somente se aparente a alteração, pode enviar as partes ao processo ordinário. As dúvidas que surjam quanto à autenticidade da assinatura ~1o obrigado cambiário não bastam, se não destroem a fé que tem a aparência, para a exclusão do rito executivo. É matéria para embargos do devedor. O juiz deve começar pelo exame das exceções literais da declaração cambiária, das quais decide de ofício. Mas a falsa subscrição e a falta de representação precisam de provocação da parte. O autor tem o ônus da prova da autenticidade da assinatura. Outrossim, da veridicidade do contexto do título cambiário visivelmente modificado, ou do valor para o obrigado de um texto que se falsificou. A incapacidade, a falta de legitimação material, a falsificação do texto e outras exceções semelhantes devem ser provadas pelo réu. Se o réu alega que o titulo não foi junto ao processo executivo, nem se juntou a sentença de amortização, não pode prosseguir o feito; tem-se, antes, de recorrer à amortização do título, finda a qual, com a sentença, se propõe o executivo. A amortização é ação constitutiva negativa. O avalista do avalista, que paga o título, ou o avalista, que o paga, tem a ação executiva (nosso Tratado de Direito Cambiário, 1, 239). Quanto à instrução da petição inicial, o titulo ou a certidão da sentença de amortização é indispensável. Se, porém, o título está sub iudice, por outro motivo que o da ação executiva que se vai propor, sendo impossível ou obstado o desentranhamento, pode a ação executiva ser intentada com a certidão do titulo. Certo, ontem e hoje, o Tribunal de Minas Gerais (R. F., 70, 563). Se o autor prefere o processo de conhecimento, só se muda o rito. A ação cambiária é a mesma, com as mesmas de- fesas e exceções de direito material, que seriam oponiveis se executivo o processo. Não vale a cláusula literal, inserta no titulo cambiário, ou constante de pacto, pela qual o titular do direito cambiário renuncia à executividade do remédio jurídico processual. O fato de se tratar de títulos para garantia de saque, ou referidos em algum negócio subjacente ou sobrejacente, ou justajacente, não lhes tira a executividade, nem a autonomia e a abstração. Deve-se evitar nulidade de processo por motivo de confusão terminológica na determinação da figura cambiária do réu, conforme tem assente a jurisprudência, porque as obrigações cambiárias têm o mesmo escopo e quase todas a mesma eficácia. O titular de qualquer crédito constante de letra de câmbio, nota promissória, cheque ou duplicata tem ação executiva contra o aceitante da letra de câmbio, contra o emitente da nota promissória, ou do cheque e contra o comprador contra o qual vai a duplicata, bem assim contra avalista ou avalistas de quaisquer deles. Há a ação executiva regressiva (portanto, subsidiariamente) contra o sacador, na ]etra de câmbio, contra os endossantes anteriores e seus

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avalistas, qualquer que seja o titulo extrajudicial de que cogita o art. 585, 1. O autor pagara. O instrumento de protesto feito no cartório competente é elemento indispensável para a ação regressiva. 8) NOTA PROMIsSóRIA. A nota promissória é o título cambiário em que o criador do título assume, por promessa direta (isto é, de fato seu, que é pagar), dever e obrigação direta e principal. Endossada, após o vencimento, a nota promissória, vale o endosso, posto que somente com efeitos civis. A despeito da divergência quanto a ter, ou não, ação executiva o endossatário, a verdadeira opinião é a que liga o processo executivo à existência do título cambiário como tal, e o titulo com endosso posterior ao vencimento continua título cambiário; portanto, com o processo executivo. A nota promissória é pressuposto indispensável para o exercício do remédio jurídico cambíario especifico, quer executivo, quer de rito diferente. Só o supre a sentença de amortização. O título deve estar completo. O título em branco precisa ser completado. Contudo, se o juiz deixou que saísse o mandado executivo, posto que em branco o título, acertado anda se ordena que se encha, salvo se, já então, prejudicaria a defesa do réu. No caso de título que está sub iudice, falamos antes. O emitente pode depositar as importâncias, para que o tomador, enquanto não se desconstitui o negócio jurídico subjacente, sobrejacente ou justa jacente, atingindo-se, assim, a eficácia da nota promissória, execute, sem poder levantar, devido à litispendência. Pode esperar que o tomador venha com a ação executiva, assumindo, assim, a responsabilidade pela cobrança de dívida sem causa; pode pedir ao juiz da ação de invalidade que comunique ao tomador a intenção do emitente de depositar para execução. 9)DUPLICATAS MERCANTIS. Nas vendas por atacado, o comerciante vendedor extrai a fatura dos gêneros vendidos, em duplicata. Assinada pelo comprador, era a fatura objeto da pretensão à tutela jurídica para a ação de dez dias (Reg. n. 737, art. 247, § 7.0). Depois, em 1939, a lei processual trocou tal pretensão pela de executividade. Em 1936, foram criadas as duplicatas mercantis, ou especialização cambiarizável das contas assinadas (Lei n. 187, de 15 de janeiro), processualmente equiparadas às letras de câmbio, a despeito de serem títulos, até o endosso ou o aceite, títulos causais. Cognição parcial, essa. Hoje, há a Lei n. 5.474, de 18 de julho de 1968, sobre as duplicatas. No art. 298, XIV, o Código de 1939 dava executividade às ações de credor por fatura assinada, ou conta assinada, ou conta corrente reconhecida pelo devedor. Era de discutir--se se, verificada judicialmente a conta, nascia a pretensão executiva. A ação de verificação, que se concebera, sem técnica, ao tempo do Decreto n. 917, de 24 de outubro de 1890, não seria ação declaratória, seria ação constitutiva de prova (cf. o que, ao tempo do Código de 1939, dissemos na 1•a ed. dos Comentários ao Código de Processo Civil, VI, 131 e 424), limitada à documentação necessária ao pedido de falência (Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, art. 1.0, § 1.0, verbis “torna-se líquida, legitimando a falência, a obrigação provada por conta extraída dos livros comerciais e verificada, judicialmente”). A ação declaratória (hoje, art. 4.0), em que se chega a liquidez, é ação declarativa com elemento constitutivO. Dá o preceito, não a executividade. ,Não se pode, com a verificação judicial para falência, propor a ação executiva de título extrajudicial (art. 585, 1)? Não; o que se pode é propor a ação executiva fundada no art. 585, II, porque a sentença constitutiva contém dívida determinada (certa e líquida), provada por instrumento publico. As contas correntes não são títulos de crédito, de modo que se distinguem das duplicatas ou contas assinadas. Há forma de conta corrente e há contrato de conta corrente. ~Aquela ou a esse já se referia o Código de 1939? É certo que, em 1850, o Reg. n. 737 falava, no art. 152, § 5/-’ de “contas comerciais ou não reclamadas, ou escritas, ou assinadas pelas partes contra as quais se produzem”; mas o art. 152, § 59, apenas pertencia ao capítulo sobre provas. Na parte sobre ação executiva não se cogitara de tais contas; na parte sobre ação de dez dias, apenas de “faturas e contas de gêneros vendidos em grosso, não reclamados no prazo legal, sendo assinadas pelas partes”. Seria errado entendermos que se deu ação executiva a tudo que toma a forma gráfica de deve e haver, seguida de soma das respectivas parcelas e saldo. A forma de conta corrente é sugestão material da escrituração dos livros, das informações, às vezes sem intuitos jurídicos, do estado dos negócios da casa ou dos clientes, e quase sempre a remessa das contas se faz com a cláusula de “salvo erro ou omissão”. No contrato de conta corrente há mais do que isso. Há o recebimento de tais contas quando as pessoas se acham em estado de conta corrente, isto é, em relação jurídica de conta corrente, com os direitos e deveres que caracterizam o instituto. Já existe mais do que memória sobre o que se vendeu e o que se pagou, ou o que foi entregue e recebido: existe o movimento mesmo do negócio jurídico; as entradas e saidas alimentam a relação jurídico, com acertações periódicas, saldos a serem reconhecidos, fechamento ou encerramento final. O não-uso não a extingue. Nem, sequer, as contas provam definitivamente no terreno processual, uma vez que, ainda se o autor lançou mão do processo executivo, os recibos, cheques, faturas, contas assinadas, etc., podem ser prova de defesa. Daí o legislador lhes haver concedido, se reconhecidas, a executividade, mas o reconhecimento tem de ser com os pressupostos do art. 585, II (subscrição e duas testemunhas).

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A cognição incompleta, superficial, era o fundamento, à diferença dos casos do art. 585, 1 (cognição parcial). Por essa razão, o Código de 1939 se satisfazia com serem “reconhecidas pelo devedor”, e não exigia serem assinadas por esse. O reconhecimento das contas correntes pode ser por escrito ou não. Se o contrato prevê o caso de apresentação das contas, ou balanços periódicos, e a falta de acusação do recebimento, com a cominação de se terem por bons e reconhecidos, reconhecimento há. Se não há a cláusula (ou se não há uso ou costume, cuja prova teria de ser feita com a petição), a não-impugnação (Reg. n. 737, art. 152) cria pre sunção hominis de aceitação, porém essa era insuficiente para. dizer-se “reconhecida” no sentido do art. 298, XIV, do Código de 1939. Hoje, é indispensável o que se exige no art. 585, II, salvo se há lei especial (art. 585, VII). O simples escrito ou gráfico de deve e haver não faz certa e líquida a divida (2.a Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, 11 de dezembro de 1952, R. dos T., 208, 480). A própria conta corrente precisa de ter sido “reconhecida” com os pressupostos legais. Todavia, se foi admitida a conta corrente, isto é, concluído o contrato de conta corrente, com os requisitos do art. 585, II, é de entender-se que há os balanços periódicos, para liquidez e contagem de juros sobre os saldos; e, sempre que é de entender-se haver prazo para que o recebedor do escrito ou gráfico se manifeste, há de equivaler ao reconhecimento escrito o reconhecimento pelo silêncio. A conta corrente não precisa ser conta corrente de contrato de conta corrente. Pode ser conta corrente de abertura de crédito em conta corrente, ou o contrato de depósito bancário em conta corrente, ou a conta corrente bancária. O que importa é que se haja de pensar em conta corrente reconhecida, ainda pelo silêncio, satisfeitos os pressupostos do art 585, II, ou do art. 585, VII. 10)CHEQuE. Cheque é a declaração unilateral de vontade, pela qual alguém, observando a forma da lei (negócio formal), ordena entrega, à vista, de parte ou de todo o fundo disponível. A ação executiva competente é contra o emitente do cheque e os seus avalistas, os endossadores e seus avalistas. Ao cheque é aplicável, no que não destoa da sua natureza, o que se disse sobre a letra de câmbio e a nota promissória. A ação regressiva (contra endossadores e avalistas) depende de protesto, ad instar daqueles títulos. Também tem ação cambiária o emitente contra o sacado. Cognição parcial. 11)CREDORES POR DÍVIDA DE QUANTIA DETERMINADA E OBRIGADOs A ENTREGAR 0015A FUNGIVEL. A consideração da prova, o escrito e a certeza, é o fundamento da atribuição de pretensão de executar. A lei permite que o juiz, antes de dar a sentença com a cognição completa, se satisfaça com a cognição superficial que ele tem, e execute o obrigado,“como se” houvesse proferido a sentença. No fundo, parcela, no tempo, a cognição, conforme dissemos. A lei não aludiu à exigibilidade, porque essa é pressuposto geral, e não particular, do exercício das ações, exceto a declaratória (art. 4Y). É de exigir-se a certeza do titulo, posto que no art. 585, II, disso não se fale explicitamente; quer dizer: ser ou estar conhecido o crédito quanto à sua existência (verbis “documento público, ou particular, . . . do qual conste a obrigação de pagar”). Além disso, tem de haver a determinação da quantia (“quantia determinada”); portanto, ser ou estar conhecido quanto à importância devida. Se a existência não é, a exame comum, controvertível, certo é o direito, o crédito. Se está, ou se é determinado o quanto devido, líquido é ele. Quanto à exigibilidade, aos créditos do art. 585, II, também se aplica o art. 290. O que se supõe é a exigibilidade de uma prestação, sem particularidade, tal como é requisito para todas as demandas (exceto a ação declarativa, cf. art. 4.0). A lei fez pressupostos: a) o escrito e não qualquer escrito, só o instrumento particular assinado pelo devedor e subscrito por duas testemunhas, isto é, prova preconstituída, ou o instrumento público; b) existir e se determinar a quantia, ou se tratar da coisa fungível. Atenção à diferença em relação ao art. 585, 1. A dúvida sobre interpretação da lei não cria incerteza. A lei não exige que se trate da dívida de dinheiro. Não encontramos qualquer elemento no Código que autorizasse alguns comentadores a afirmá-lo. Nem essa é a tradição do nosso direito, nem o exemplo europeu. Por que então? A antiga assinação de dez dias não distinguia (Ordenações Filipinas, Livro III, Titulo 25, pr.): “Porque as demandas, que são fundadas em escrituras públicas, devem brevemente ser acabadas, mandamos que tanto que alguma pessoa em juízo demandar outra por razão de alguma coisa, ou quantidade, que lhe seja obrigada dar, ou entregar,...” A lei, non distinguente, repele que se interpole no texto “dívidas por dinheiro”. Os credores do art. 585, II, têm a pretensão à execução que os outros credores do art. 585 têm; mas discute-se se (a) as exigências de serem certas e liquidas as dívidas e existirem as provas escritas segundo o art. 585, II, se referem à pretensão (pré-processuais), ou se (b) são pressupostos de admissibilidade processual. Subindo os autos dos embargos de devedor, conforme o art. 453, § 2.0, se o juiz entende que as provas não eram bastantes, tem, se (a) é verdadeiro, de repelir a ação executiva, ou, se (b) é que é verdadeiro, mesmo assim tem de com as provas oferecidas prosseguir na execução, com o julgamento dos embargos do devedor. O mesmo ocorreria se, ao julgar normalmente, se encontrar convencido, a despeito de terem faltado, a princípio, os elementos referidos no art. 585, 1, em que a defesa do réu fica restrita ~s exceções de que fala a lei cambiária (os pressupostos são verdadeiros pré-supostos:

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entendem com a pretensão cambiária e a respectiva obrigação cambiária do réu). No art. 585, II, é superficial; não, parcial. Excluem-se os instrumentos particulares assinados a rogo; têm-se os assinados por quem tenha poderes, segundo as regras de direito material. Subscrito; não precisa ser confirmado. O processo do art. 585, II, é de cognição incompleta, superficial. O juiz não tem de ouvir as testemunhas, desde logo. De modo que, se, a despeito das firmas opostas, alegam que não subscreveram o escrito, como, por exemplo, que não era aquela declaração de vontade a que se achava sob a sua assinatura, o juiz só por isso não há de negar o executivo (sem razão, o Tribuna] de Apelação de Minas Gerais, 14 de janeiro de 1928, A. J., 9, 292, e 6 de fevereiro de 1932). A parte que a lei processual reputou necessária e suficiente ao exercício da pretensão à tutela jurídica lá está, conforme resulta do art. 585, II; oresto concerne ao complemento da cognição e constitui matéria de embargos do devedor. “Documento público” está, no art. 585, II, em sentido técnico do direito; como ocorre com “documento particular”. Não se trata apenas de escritura pública, em senso estrito, nem de escrito particular. Qualquer documento feito perante autoridade pública, mesmo se não é tabelião, é documento público, porque a sua constituição não foi particular. Para que o instrumento seja documento público é preciso que seja pública no sentido de fé pública a documentalidade. Supõe-se a autoridade para a função, seja judiciária ou não. O que é preciso é que, conforme a lei, o oficial público possa funcionar na feitura do documento. O que mais importa é que o art. 585, II, equiparou ao documento público, assinado pelo devedor e por duas testemunhas, o documento particular que satisfaça as mesmas exigências (assinatura do devedor; assinaturas de duas testemunhas). Assinatura do devedor, entenda-se: a assinatura do próprio devedor, ou a assinatura do representante ou presentante do devedor. Se, no caso, há incapacidade relativa, a do devedor e a do assistente. No instrumento particular não pode haver assinatura a rogo do devedor ou de testemunha. Se o devedor é analfabeto, ou, por alguma impossibilitação de escrever, não pode assinar, a solução é a do instrumento público perante tabelião, mesmo a rogo. Pergunta-se: ~é necessário o reconhecimento da assinatura do devedor ou da assinatura das testemunhas? É verdade que é aconselhável que sejam reconhecidas as firmas do instrumento particular, porque dívidas podem surgir, principalmente como assunto de afirmações dos embargos do devedor. As vezes, tem de ser feita a perícia técnica, como se do cartório não consta a firma. No art. 585, II, supõe-se que a dívida é de quantia determinada ou de coisa fungível. Nem as espécies do art. 585, III,í.a parte, nas do art. 585, VII, têm de ser de coisa fungível. Se a algum título extrajudicial, cujo objeto da prestação consiste em coisa infungível, se confere executividade, a espécie entra no art. 585, VII. De iure condendo, melhor seria que se não houvesse feito, no art. 585, II, referência a “coisa fungível”. No art. 621 fala-se de quem foi condenado a entrega de coisa certa. O art. 631, em que se diz que à execução para entrega de coisa incerta se aplica o que se estatuiu na seção anterior (em que está o art. 621), de modo nenhum se há xecução de títulos judiciais ou extrajudiciais. Se algum titulo extrajudicial é de obrigação de prestar coisa certa (o de interpretar como se também se supusesse atinente a título executivo judicial. Os arts. 629-63 1 são concernentes à eque depende da lei especial), o art. 621 é invocável, porque, com a atribuição de executividade ao título extrajudicial com objeto infungível (coisa certa), implicitamente se subordinou o procedimento ao que se estatui nos arts. 621-628. Acertado fora que o Código de 1973, no qual se apagou a diferença entre o processo da execução de título extrajudicial e o da execução de título judicial, não houvesse cogitado, no art. 621, de ter sido “condenado” o devedor, e no art. 632, de cumprimento de “julgado”. O título extrajudicial pode ser com obrigação de fazer; depende do texto legal (art. 585, VII). 12)INSTRUMENTOS PÚBLICOS E INSTRUMENTOS PARTIcULAREs. Os instrumentos públicos ditos documentos públicos fazem prova de sua formação e dos fatos que o escrivão, o tabelião, ou o funcionário declara que ocorreram na sua presença (art. 364). Advirta-se que o documento, se feito por oficial público incompetente, ou sem observância das formalidades legais, sendo subscritos pelas partes, tem a mesma eficácia do documento particular (art. 367). Mas, para que possa dar ensejo à ação executiva de título extrajudicial, épreciso que seja assinado pelo devedor e subscrito por duas testemunhas (art. 585, II, 2.~ parte). Surge o problema do telegrama, radiograma ou outro meio de transmissão, se o original foi assinado pelo devedor e por duas testemunhas. A resposta é no sentido de ter a eficácia de título executivo, se preenche os outros requisitos do art. 585, II, 2.~ parte. Quanto à inserção de declaração de dívida em testamento, pode acontecer que alguém queira cobrar a dívida antes da morte do testador, mas havemos de negar executividade a tal declaração, que é unilateral e inserta em negócio jurídico revogável. Pode ser que o credor tenha outro título, e tal testamento público, ou particular, que o testador divulgou ou registrou apenas pode conter elemento para a prova do crédito. De modo nenhum, o testamento cerrado, porque esse só se abre com a morte.

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Morto o testador, o testamento já em via de inventário e partilha, devido ao cumpra-se, serve para se conhecer o ativo e o passivo da herança, mas as dívidas que o testador apontou podem ter sido falsamente declaradas (não existiam) e não cabem na parte disponível, ou as declarações terem sido por erro, ou coação, o que as faz anuláveis. Se qualquer pessoa, que se diz credora da herança, requer, no inventário, o pagamento da dívida constante de qualquer documento, revestido das formalidades legais (Código Civil de 1916, art. 1.796, § 1.0), inclusive do testamento do falecido, é preciso que isso constitua prova bastante da obrigação, e pode haver impugnação. Se é de ter havido pagamento, tal prova põe fora do inventário a divida. Se não é de se ter solvido a divida, há a reserva de bens suficientes, em poder do inventariante, para a solução, e sobre eles recair a execução. Tal credor tem o prazo de trinta dias para iniciar a ação de cobrança, sob pena de se tornar de nenhum efeito a providência indicada (Código Civil, art. 1.796, § 2.0). Se, pela espécie de negócio jurídico, teria ele, conforme o direito material brasileiro, de obedecer a lei brasileira, tal como acontece se se trata de renda ou doação de imóvel sito no Brasil e a lei brasileira exige a escritura pública, o título em instrumento particular não basta para que o vendedor cobre executivamente o preço não pago, invocando o art. 585, II. O que pode acontecer é que o comprador haja pago com notas promissórias e então, nos embargos do devedor, pode ele alegar que a escritura de compra-e-venda não tem acolhida no Brasil. Tal alegação somente pode ser contra o vendedor executante, e não contra endossatário de nota promissória. Depois da morte do testador, o que consta como dívida do falecido é título executivo. Se foi posto crédito em porção do herdeiro, ou em legado, o assunto é para os embargos do devedor, se foi iniciada a ação executiva de título extrajudicial. Pode bem ser que o testador tenha declarado dívida que não existia, ou até mesmo que não poderia contrair, mas isso pode ser arguido nos embargos do devedor, ou dos devedores, porque o art. 745 se refere a quaisquer matérias, que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento, além das que o art. 741 menciona. O que consta de testamento é divida causa mortis. O argumento de que pode haver divida oriunda de declaração unilateral de vontade (e são tantas!) de modo nenhum pode transformar em declaração de vontade inter vivos o que, pela própria finalidade, e mortzs causa. Após a morte, o que consta do testamento, se corresponde ao que se exige aos títulos executivos extrajudiciais, é elemento suficiente para a ação executiva. Não se pode deturpar o que estatui, acertadamente, o Código Civil, art. 1.626: “Considera-se testamento o ato revogável pelo qual alguém, de conformidade com a lei, dispõe, no todo ou em parte, do seu patrimônio, para depois da sua morte”. 13)INSTRUMENTOS ASSINADOs A ROGO~ PODER DE REPRESENTAÇÂO. Excluem-se os instrumentos particulares assinados a rogo; e incluem-se os assinados por quem tenha poderes, segundo as regras de direito material. Os órgãos assinam pela pessoa jurídica presentada. 14)ASSINATURA DO DEVEDOR, COM DUAS TESTEMUNHAS. Subscrito; não precisa ser confirmado. O processo do art. 585, II, é de coguição incompleta, superfical. O juiz não tem de ouvir as testemunhas, desde logo; mas essas podem alegar a falsidade, ou afirmá-lo o demandado. De modo que, se, a despeito das firmas apostas, alegam que não subscreveram o escrito, sem negar que seja sua a assinatura, como, por exemplo, que não era aquela declaração de vontade a que se achava sob a sua assinatura, o juiz só por isso não há de negar o executivo (sem razão, o Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 14 de janeiro de 1928, A. J., 9, 292, e 6 de fevereiro de 1932). A parte que a lei processual reputou necessária e suficiente ao exercício da pretensão à tutela jurídica lá está, conforme resulta do art. 585, II; o resto concerne ao completamento da cognição e constitui matéria de defesa, nos embargos do devedor. 15)NEGÓcIo JURÍDICO DE HIPOTECA, PENHOR, ANTICRESE E CAUÇÃO. O art. 585, III, fala de “contratos de hipoteca, de penhor, de anticrese e de caução, bem como de seguro de vida e de acidentes pessoais de que resulte morte ou incapacidade”. Quanto à hipoteca, ao penhor, à anticrese e ~ caução, não foi feliz a redação, porque o crédito, nesses casos, que dá ensejo à execução de título extrajudicial, é o crédito garantido por hipoteca, penhor, ou anticrese, ou caução, e não o contrato de hipoteca, penhor, anticrese, ou e caução. Hipoteca, penhor, anticrese e caução são direitos reais limitados, e as expressões “crédito hipotecário”, “credito pignoraticio” e “crédito anticrético” “crédito caucionário” são expressões elipticas (= crédito garantido com direito real de hipoteca, crédito garantido com direito real de penhor, crédito garantido com direito real de anticrese, “crédito garantido com direito real de caução”. Se o preço do bem imóvel, ou do bem móvel sujeito a direito real limitado, não basta para solver as dividas, é com o preço que se hão de satisfazer os credores concorrentes, se foi alienado o bem, deducto o direito real; se não foi, isto é, se a alienação foi de todo ele (e. g., propriedade + direito real), então primeiro se solve a dívida que corresponde ao direito real de garantia. Tais direitos são sobre o valor. (Observe-se que não há, no direito brasileiro, regras jurídicas como as do art. 2.748 do Código Civil italiano.) O crédito garantido com hipoteca, penhor, anticrese, ou caução, pode não ser irradiado de negócio jurídico

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contratual. O texto do art. 585, III, devia ter dito: crédito decorrente de negócio jurídico com direito real de garantia (hipoteca, penhor, anticrese, ou caução). Aliás, no art. 585 devia--se ter falado de crédito nos incisos 1, II, III, VI e VII, como se fez nos incisos IV e V. O credor privilegiado tem o mesmo privilégio quanto às custas e mais despesas que derivaram do exercício da pretensão à tutela jurídica concursal, desde a propositura da ação condenatória ou executiva, que propôs. O que determina tal extensão do privilégio às custas e mais despesas é o princípio Accessorium sequitur principale, porque o fundamento da atribuição das custas e despesas ao vencedor, nas ações executivas, não bastaria para a extensão do privilégio. A opinião dos que somente entendem extensivamente privilegiadas as custas e despesas do concurso de credores é de repelir-se: as custas e despesas, e. g., em ação declaratória, ou outra, que tenha sido preciso intentar-se, para se obter a solução da divida e a decisão, depois, em concurso de credores, são elementos necessários do crédito. 16)EXECUTIVO DE CREDITO COM A GARANTIA HIPOTECÁRIA. Credores por dívida garantida por hipoteca podem exercer a pretensão à tutela jurídica executiva de títulos extra-judiciais. Ao crédito, com a hipoteca (de onde vem a pretensão de direito material), atribui-se, no art. 585, III, pretensão à tutela jurídica: pretensão à execução. A hipoteca é direito real, em que se conglomeraram elementos históricos gregos e romanos, que se fundiram ou depuraram. A ação real, Serviana, que corrigiu a limitação da aplicação dos interditos às partes, foi acréscimo tardo, havido, pelo praetor peregrinus do direito grego (cf. Orro KABLOWA, Rõmische Rechtsgeschichte, II, 1279-1281). A ação Serviana era, como foi a quase-Serviana, da espécie da rei vindicatio. A vinculação do bem é efeito de direito material (a pretensão de seqúela), sem mais a recuperação romana, de que tivemos traços no verbo “empenhar” das Ordenações Filipínas, Livro IV, Titulo 56, pr. A “realidade” e o efeito erga omnes, ligado ao da executividade (processual), fazem característico o executivo de crédito com a garantia hipotecária. De lege ferenda, seria possível apagar-se, no direito material, o direito real de hipoteca, e fazê-la instituto só processual (aliás, deixar-se só a pretensão de execução, contra o sujeito passivo atual do crédito); mas, de lege lata, os resíduos históricos continuam. Seja como for, não é o crédito,mas o direito real de hipoteca, que permite a execução do crédito, e a construção recorre ao efeito real para obter o resultado, sem apagar a ligação da executividade ao crédito. Por isso, o credor pode propor ação em processo ordinário, ou outro, contra o devedor, ainda que haja esse alienado o prédio (errado, o acórdão do Tribunal de São Paulo, R. F., 80, 133). No processo executivo hipotecário, o demandado pode objetar inexistência, nulidade ou ineficácia do título (7.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 14 de dezembro de 1951, R. de D., 1, 14, 61), além do que concerne à pretensão à tutela jurídica e ao processo. Não é preciso que haja apuração prévia do saldo devedor (4.ft Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 27 de abril de 1950, R. dos T., 187, 151; 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, 12 de junho de 1951, Parané 1.,54, 231). Negar-se ao titular do direito de crédito com a garantia de hipoteca a ação executiva porque, com o direito real, se garantiu abertura de crédito, ou conta corrente, é absurdo. A inexatidão do saldo, conforme foi apresentado, é matéria de defesa. (a) O direito do credor com garantia hipotecária é sobre o valor do imóvel, só lhe passando à frente, na pref erência para a solução da dívida, a que provém de trabalhador agrícola, no que concerne ao produto da colheita para a qual haja concorrido (Código Civil de 1916, arts. 759, parágrafo único, e 1.563). Do preço do imóvel hipotecado deduzem-se as custas judiciais da execução de crédito com garantia hipotecária, entenda-se, não as de outras execuções e as despesas de conservação com eles feitas por terceiro, mediante consenso do devedor e do titular do direito real de hipoteca. Ainda que a execução seja iniciada por terceiro, que tenha título extrajudicial executivo ou sentença executável, a quantia obtida em hasta pública, ou conforme se prevê na lei processual, não pode ser atribuida a outrem, antes de se solver, com o importe, a dívida garantida por hipoteca. Em razão disso, não pode o juiz, em tais execuções, dispensar o depósito do preço da arrematação, pois tal depósito só é de dispensar-se se não há protesto por preferência, ou rateio: o principio resulta dos princípios mesmos que regem a preferência do titular dos direitos reais e de outros direitos de preferência ou de direito a rateio; por isso mesmo, constava do direito luso-brasileiro e dos Códigos de Processo Civil anteriores e constava do Código de 1939, art. 977, § 1.0, regra jurídica explícita. Se há arrematação ou adjudicação ao credor exequente, sem se respeitar o direito real, tudo é nulo. Se o exequlente arrematou e não depositou o restante do preço, deduzido o que corresponde ao seu crédito (art. 690, § 2.0), desfaz-se a arrematação, e a própria carta de arrematação, que sobre-venha, é nula (MANUEL GONÇALVES DA SILVA, Commentaria ad Ordinationes Regni Portugalliae, III, 3.~ ed., 387: “Et ideo subhastatio fieri non debet sine interventu pecuniae, invitis aliis creditoribus pro deposito protestantibus, cum accidere possit, ut in iudicio concursus iudicetur solutio illi, qui tardius venit, ante tamen addictionem pignoris”). Desde que há direito real, tem-se de respeitar a preferência, e em consequência não pode o exequente pretender que se lhe dispense o depósito de que excede a divida, ainda que tardos hajam sido os titulares do direito real, especialmente o titular do direito de hipoteca. Antes do Código de 1973, não podia compensar e muito menos reter o preço (“compensationem et

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retentionem precii facere non potest in praeiudicium priorum creditorum ius potentius, ad illud exigendum habentium”). Ainda que já se houvesse tirado carta de arrematação e com ela se houvesse transferido domínio e posse, sem esse pagamento seria nula a arrematação (J. J. C. PEREIRA E SoUsA, Primeiras Linhas sobre o Processo Civil, III, nova ed., 64 nota 855). O art. 690, ~ 2/’ é, hoje, de grande relevância e, de iure condendo, acertado. Tendo havido recebimento de embargos de terceiro, não se procede à praça. Se houve artigos de preferência, o que estabelece concurso de credores, ou não se procede à praça, ou se a ela se procede, não se pode dispensar o depósito pelo exequente arrematante, no que excede o seu credito. Se houve carta de arrematação ou sentença de adjudicação, o gravame continua, pela nulidade da carta de arrematação ou da sentença de adjudicação, e, não produzindo efeito o nulo, posse e domínio não se transferem. (b) Se os credores executantes desembolsam para reparações necessárias do imóvel, têm eles preferência em relação aos outros titulares de direitos, inclusive o titular do direito real de hipoteca. Lê-se no art. 1.564 do Código Civil de 1916:“Do preço do imóvel hipotecado, porém, serão deduzidas as custas judiciais de sua execução, bem como as despesas de conservação com ele feitas por terceiro, mediante consenso do devedor e do credor, depois de constituída a hipoteca”. O art. 1.564 e o art. 1.566, III, permitem que se deduza o que se inverteu com obras necessárias de conservação, se iniciada já fora a execução hipotecária ou outra execução. A hipoteca é indiferente a quaisquer atos de alienação do domínio e a quaisquer atos que venham a causar aquisição do domínio por outrem. Nela, há garantia contra os atos de alienação; e garantia de prelação ou preferência, em qualquer circunstância de concurso de credores. Gravado está o valor, porque gravado está o bem. (c) A garantia que a hipoteca produz é a garantia real. Tal garantia existe à parte, ou preexiste à pretensão à execução, que toque ao crédito garantido. Nada mais perturbante da inte ireza do sistema jurídico do que se escrever que, constituída por terceiro a hipoteca, o que se confere ao credor é o que ele não teria se constituinte do direito real de garantia tivesse sido o próprio devedor. Não há qualquer diferença. Se a hipoteca foi constituída pelo credor, há para o crédito pretensão à execução sobre os bens do devedor e, para a garantia, sobre o bem gravado. Se a hipoteca foi constituída pelo terceiro, há para o crédito a mesma pretensão à execução sobre os bens do devedor e a pretensão sobre o bem gravado. Nada muda. Se devedor e credor, ou terceiro e credor fazem pacto pelo qual somente responda quanto a determinado bem, não há, aí, qualquer efeito que se assimile à hipoteca, tanto que, transferida a propriedade do bem, nenhuma conseqüência tem o pacto. A confusão entre a executividade do crédito, como título extrajudicial, ou após sentença, e a executividade do crédito com a garantia hipotecária levou a erros graves. Um deles é o de se entender que apenas se “localizou” no bem a pretensão à extensão, que há em todo crédito. Foi essa afirmação que levou a sustentar-se a impossibilidade de se garantirem com hipoteca ou com penhor ou com anticrese ou com caução as obrigações naturais e as obrigações prescritas. No direito brasileiro, o terceiro adquirente responde pelos danos causados ao direito de hipoteca, inclusive, pois, ao valor do bem gravado, como o constituinte da hipoteca. Igualmente, o credor que não é dono do bem ou enfiteuta ou possuidor próprio. A relação jurídica real da hipoteca é entre titular do direito de hipoteca e todos. Todos têm o mesmo dever de abstenção. Nos sistemas jurídicos em que se dão tratamento diferentes ao constituinte, ao terceiro adquirente e ao possuidor próprio, é evidente que ainda se não desprendeu o pensamento legislativo da suposição da existência de vínculo entre o titular do direito de hipoteca e o proprietário, ou entre aquele e o constituinte, ou o adquirente. O fato de ser alguém dono (ou enfiteuta) do bem gravado não o põe na situação de único sujeito passivo, o que faria do terceiro constituinte ou do adquirente do prédio devedor. Essa concepção, falha, foi superada desde muito. (d)Quando o titular do direito de hipoteca pede a tutela jurídica e se inicia a ação executiva real, não é o crédito que ele executa, é a hipoteca. Pode cumular os pedidos, o que teria conseqüências diferentes. Se, na ação executiva pessoal, verifica que a posse está com outrem, tem de ser recuperada pelo depositário ou por atos processuals que sejam exercício da ação de reivindicação, que, com o domínio, foi penhorada. A execução pessoal não vai, automaticamente, contra essa posse, porque no sistema jurídico a posse é protegida. Não se pode atribuir à hipoteca, com a sua publicidade, o efeito de impedir tomadas e transferências de posse. O dano que ao valor do bem gravado possa causar a posse por outrem somente haveria de ser afastado ou ressarcido como o poderia ser por parte do dono. Por isso mesmo, toda alusão ao adquirente da propriedade, como se só ele fosse o sujeito passivo da relação jurídica, destoa do conceito mesmo de hipoteca. Quando se penhora o bem gravado, penhoradas ficaram as ações de reivindicações, as outras ações reais e as ações possessórias. Se o credor, que é titular do direito de hipoteca, não exerce a ação de execução hipotecária, mas apenas a ação executiva de titulo extrajudicial, pessoal, a ação que pode propor contra o possuidor em próprio nome é a que toca ao devedor. Proposta ação de execução hipotecária, o valor do bem, como se possuído por estranho não estivesse, é destinado à solução de hipoteca: O possuidor atual, não-dono, não pode pretender mais do que lhe caberia se já houvesse

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usucapido. Com essas noções claras, evita-se ter-se de propor ação de reivindicação ou possessória, pendente a execução. Se a posse própria estivesse com o proprietário, a ação executiva estabeleceria três posses: a posse própria do dono; a posse mediata do Estado (juiz); a posse imediata do dono depositário. Devido a, ex hypothesi, não ter posse o dono, em lugar daquele ou desse estará o possuidor próprio não dono. Tudo foi penhorado, domínio e posse, porque se penhorou o bem, para se lhe extrair o valor. Se o bem é nuflius, não se altera a situação jurídica: penhorou-se O bem, para se lhe extrair o valor, abstraindo-se não ter dono, porque sujeitos passivos da relação jurídica real são todos, e não só o dono do bem gravado. Quem executa hipotecariamente não precisa reivindicar nem agir possessoriamente. A hipoteca não se dirige contra o possuidor própriO, como não se dirige contra o adquirente do bem gravado, ou contra o constituinte da hipoteca; dirige-se contra todos. A pretensão à execução, que tem o credor, titular do direito de hipoteca, no tocante ao bem gravado, resulta do direito real, e não só do direito garantido. Por isso mesmo, não se dirige somente contra adquirentes do domínio: dirige~-se contra todos e, processualmente contra quem está com o dominio, ou com o domínio e a posse do bem gravado, ou apenas com a posse. No novo Código Civil italiano, procurou--se evitar alusão ao possuidor. Mas isso não pode ter conseqüências em ciência, ou os intérpretes terão de enveredar por trilhas bem tortuosas. O bem gravado pode ser nullzus e alguém se achar na posse dele. Mais: o bem pode ter proprietário e haver possuidor, cuja posse não se pode desconhecer, cabendo àquele a pretensão reivindicatória. De qualquer maneira, com a penhora, a que se proceda, não se recusar respeito à posse própria de alguém: só judicialmente se pode afastar o obstáculo, segundo os princípios. O Estado penhora, sem retirar a posse própria e, de regra, sem desalojar da posse imediata o possuidor, nomeado ou não depositário. e) O credor que obteve garantia hipotecária para o seu crédito tem duas ações inconfundíveis: a ação pessoal para satisfação do crédito pessoal, que pode ser executiva (e é provável que o seja) se a lei faz do título extrajudicial, que se alega, titulo executivo, e a ação real, pela qual se pede o importe da hipoteca, com os interesses. A ação pessoal, se executiva, vai sobre todos os bens do devedor, ao passo que a ação real só apanha o bem gravado. A ação pessoal dirigi--se contra o devedor, que pode não ser o proprietário do bem gravado; a ação real dirige-se contra o proprietário, o possuidor em nome próprio e contra todos que possam obstar à extração do valor do bem gravado, para se satisfazer à hipoteca. Se devedor e proprietário não são a mesma pessoa, a ação executiva pode partir com a constrição do bem gravado e a constrição do patrimônio, mas aí a cumulação de ações executivas se caracteriza, o que pode dar ensejo a algumas dificuldades práticas, a respeito de exceções. As execuções reais apresentam, de regra, certas vantagens, e a constrição de todos os bens, em virtude de ação executiva pessoal, expõe o juízo às verificações concursais. Se só se propôs a ação executiva real, a ação dita hipotecária, não há, então, pensar-se em concurso, salvo excepcionalmente. Por outro lado,a competência para a ação executiva real é sempre a do juízo do lugar em que se situa o imóvel (arts. 95 e 107>; a competência para a ação executiva pessoal é segundo as regras jurídicas gerais (art. 94 e § § 1.0 - 4.0). No direito romano, o titular do direito de hipoteca tinha ação para entrega do bem hipotecado, com o fim de privadamente o vender. No direito comum, persistiu a ação. No direito brasileiro, não há tal ação, nem o titular do direito de hipoteca tem qualquer pretensão à posse do bem gravado. Somente tem a ação executiva hipotecária. (f) Posto que se diga, a respeito de ação executiva hipotecária, que se “condena o demandado”, referindo-se o juiz ao proprietário do bem gravado, que foi citado, em verdade apenas se executa, e condenação somente há quanto a todos, incluído o proprietário do bem gravado. Aí, erraram KONRAD HELLWIG (Anspruch und Klagrecht, 361; Leh~rbuch des deutschen Zivilprozessrechts, 1, 204; JULIUs BINDER, Zur Lehre von Schuld und Haftung, Jherings Jahr?~iicher, 77, 182), porque seria ver-se relação jurídica entre o titular do direito de hipoteca e o proprietário, o que de modo nenhum se há de admitir, embora, se o proprietário é devedor, possa haver relação jurídica. Tampouco, tem guarida a opinião dos que recorrem a condenação condicional” (= condenação àprestação de x, se quer evitar a execução forçada), que Tn~oDOR Kipp (B. WIND5CHEID, Lehrbuch, 1, 9~ ed., 1197) insinuava. Nem se pode reduzir a eficácia sentencial a ponto de se fazer declaratória a ação, o que importaria dizer-se que a sentença há de julgar que o demandante se pode satisfazer sobre o bem gravado, ou simplesmente condenação a tolerar a execução (O. STRECKER, em G. PLANCK, Kommenftr, III, 4Y~ ed., 906; RIcIIAIU HORN, Die Eigentiimerhypothek, 10 5.; certamente sem razão, WOLFGANG HEIN, Duldung der Zwangsvollstreckung, 154 5.; KONRAD HELLWIG, Anspruch und Klagrecht, 361). Nem rebaixar a decisão a mera execução adiantada, que se dá por junta em seu pedido, como se a sentença houvesse de enunciar que “se pode prosseguir na execução forçada” (O’rro GEIB, Rechtsschutzbegehren und Anspruchsbestãtigung, 146). A sentença é nos embargos do devedor. Ainda quando o próprio, citado, alega que não há crédito, ou que não mais o há, não exaure a posição de sujeito passivo: o devedor, que não é proprietário, poderia alegá-lo, para excluir a execução segundo a par conc~icio; o proprietário argúi a inexistência para provar que a hipoteca pode ser cancelada. Sempre é certa a solução dos problemas jurídicos quando o intérprete não se afasta dos princípios. Se o proprietário, que consta do registro, faleceu, têm de ser citados os herdeiros. O proprietário verdadeiro pode

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intervir no processo e o seu interesse é tão respeitável quanto qualquer outro, inclusive o da pessoa que consta do registro como proprietário sem o ser. O juiz tem de examinar o que esse legitimado articula contra a hipoteca, ainda que não tenha obtido qualquer julgado o seu direito. Há embargos do devedor e embargos de terceiro. (g) O art. 848 do Código Civil de 1916 teve redação que revela a falta de terminologia jurídica científica dos que lhe deram forma. Direito real de hipoteca somente há quando se inscreve o acordo de constituição de hipoteca, ou o negócio jurídico unilateral de hipoteca; antes disso, apenas há o efeito vinculativo do acordo de constituição ou do negócio jurídico unilateral de constituição. É isso o que se deve ler. Esse efeito não dá a ação executiva hipotecária. O art. 848 tinha de ser entendido com a precedência lógica do art. 676, onde se disse, claramente, que os direitos reais sobre imóveis, constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem depois do registro. Antes da inscrição, há o acordo de constituição ou o negócio jurídico unilateral de constituição, que pode ser precedido de algum contrato ou declaração unilateral de vontade, que o haja prometido. N~ há ação executiva hipotecária antes da inscrição (Supremo Tribunal Federal, 6 de setembro de 1933. A. J., 31, 218; Corte Suprema,7 de junho de 1935, 37, 213; errados, os acórdãos das Câmaras Cíveis da Corte de Apelação de Santa Catarina, a 30 de junho de 1930, R. F., 66, 312; da 2.~ Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, a 18 de dezembro de 1936, R. dos T., 106, 569; e da 3 Câmara Civil, a 24 de novembro de 1949,184, 237). O acordo de constituição e o negócio jurídico unilateral de constituição não geram ação executiva hipotecária nem ação executiva pessoal. A vinculação dá ação condenatória, ação de preceito e ação mandamental para que se faça a inscrição. Ação executiva pode resultar de negócio jurídico básico, como se foi prometida da declaração para o acordo de constituição (arts. 639, 640 e 641); ou do título do crédito que se pretende garantir com a hipoteca (e. g., conhecimento de depósito, warrant, nota promissória, duplicata mercantil aceita). No acórdão da 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, datado de 3 de março de 1942 (R. F., 91, 157), foi dito que, alienado o bem hipotecado sem ter sido paga a dívida, é contra quem se obrigou que há de ser proposta a ação de cobrança, embora assista ao credor de apreender o bem nas mãos de quem quer que seja. E acrescentou-se: para ser cumprida a obrigação, deve o credor dirigir-se a quem lhe prometeu o pagamento, e somente se não foi atendido é que pode seqúestrar o bem. A falta de técnica, de terminologia e de ciência do direito, nesse acórdão, são perturbantes. Se se vence a hipoteca isto é, se já pode ser executada o titular do direito de hipoteca tem a ação executiva real em que há de ser citado o adquirente do bem, e pode não ser citado, sequer, o devedor. Como credor, e não como titular do direito de hipoteca, tem a ação condenatória, e pode ter ação executiva (real, e. g., se a hipoteca foi em garantia de conhecimento de depósito ou de warrants; ou pessoal), se o título extrajudicial o legitima à execução. Não precisa propor ação contra o devedor para poder executar o adquirente do bem hipotecado. Se houve acordo de constituição de hipoteca ou negócio jurídico unilateral de constituição de hipoteca e ainda não se deu a inscrição, a ação do outorgado, vencendo-se o prazo, ainda que antecipadamente, é a ação executiva pessoal, ou outra que o título de que emana o crédito garantido permita, e não a ação executiva hipotecária, que é real e somente nasce com a inscrição. Confundiu as duas ações a 4.~- Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 27 de julho de 1944 (R. dos T., 152, 220). A ação executiva hipotecária começa pela constrição, que ai soma à eficácia do gravame o que é peculiar à penhora, razão por que não haveria, na feitura das leis, a impropriedade no uso da expressão “penhora”. Se comparamos a solução processual brasileira com as de outros países, facilmente se põe em relevo a simplicidade da que se adotou, máxime com a fusão do processo das ações executivas de títulos judiciais e as dos títulos extrajudiciais. As exceções que o proprietário ou possuidor em nome próprio pode opor, se só se propôs a ação executiva real, não podem ter a extensão que teriam as que são cabíveis em ação executiva pessoal. A pretensão pessoal pode estar prescrita, e não estar prescrita a ação real. De outro lado, a pretensão real pode já ter desaparecido, por excedido o tempo de eficácia da inscrição e ainda ser plenamente eficaz o crédito pessoal. As vezes, ao iniciar a ação executiva real, já o titular do direito de hipoteca tem sentença trânsita em julgado que lhe baste como título executivo. Se se vence a hipoteca, a ação executiva pela hipoteca dirige-se contra todos, mas, pelas circunstâncias, há de ser citado o dono do prédio hipotecado, ou o enfiteuta, se a hipoteca recaiu na enfiteuse. O devedor há de ser citado se é dono do prédio, ou se foi cumulada a ação executiva pessoal. A 2.R Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 3 de março de 1942 (R. dos T., 139, 217), baseada em erradas proposições doutrinárias, cometeu a cinca de entender que, sendo de terceiro, adquirente, o prédio gravado, a ação executiva hipotecária é contra o devedor, e não contra o que tem de atender à extração do valor que garante. O relator do acórdão baralhou a ação executiva (que in casu pode existir ou não) contra o devedor, ação pessoal, que apanha quaisquer bens do devedor, e a ação executiva real, que só constringe o bem gravado de hipoteca. Certo decidiu a í.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 9 de novembro de 1942 (R. dos T., 161, 676). h)O sistema jurídico somente permite a execução hipotecária por posterior hipoteca se a anterior está vencida. Vence-se a posterior, porém a pretensão à execução ainda não pode ser exercida. Por isso não se considera insolvente o devedor, por falta ao pagamento das obrigações garantidas por posteriores hipotecas à primeira. O que primeiro se

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há de perguntar é se “primeira” hipoteca, em tal espécie, está por anterior às outras, ou, desde o inicio, a primeira. A resposta é no sentido de se entender a regra jurídica como referente à hipoteca que, no momento, é a primeira. Otitular do direito de hipoteca tem o ánus de alegar e provar o vencimento da a. Se se trata de falta de pagamento de interesses, o executado tem de dar a prova contrária.

hipotec

O pacto que retira do titular do direito de hipoteca o ônus de provar os fatos mencionados no art. 762, 1-1V, do Código Civil de 1916, é nulo (AwrHtm NU5SBAUM, Kriegsprobieme, 64). (i)Na ação real, se proprietário ou possuidor próprio é pessoa distinta do devedor, as objeções e exceções que pode opor são diferentes das que teria o devedor, na ação pessoal, ainda executiva. Oproprietário do bem gravado pode objetar e pode excetuar, na ação executiva hipotecária. Objeção e exceção são como exceções, porque está o demandado diante do titulo executivo, oriundo do livro de registro. As objeções negam que haja hipoteca. As exceções propriamente ditas encobrem a eficácia da hipoteca. As exceções que tem o proprietário são as que teria o devedor cuja divida foi garantida, exceto a de prescrição de ação do credor contra o devedor e a de responsabilldade limitada do herdeiro. Não raro, os juristas confundem com a prescrição das ações oriundas do crédito a prescrição da ação executiva hipotecária, que é ação real. O proprietário não pode opor exceção de prescrição da pretensão do credor; porque a pretensão que emana da hipoteca é outra pretensão, ainda quando se exercem as duas ações, a ação executiva do crédito e a ação executiva hipotecária. A pretensão hipotecária pode prescrever sem que a pretensão do crédito garantido esteja prescrita; e vice-versa. ~exemplo de exceção peremptória a exceção de enriquecimento injustificado, se a hipoteca foi constituída com o fim de adimplemento de obrigação que, depois, se verificou não existir. De exceção dilatória, a de ter-se concedido espera ao devedor. Há, também, as exceções fundadas em relação jurídica entre o proprietário e o credor, como a de espera ou moratória concedida ao proprietário e a de fidúcia. Otitular do direito de hipoteca ou é satisfeito pela execução forçada, que vá até final, extraindo o valor do bem gravado, ou pela remição que o legitimado a remir leve a cabo. Em primeiro lugar, sem se aludir, entenda-se, às exceções de direito processual, são alegáveis pelo demandado na ação real as objeções e exceções que se fundem em regras jurídicas sobre fundo e forma da hipoteca e sobre registro, ou em convenções pessoais entre ele e o titular do direito de hipoteca, como, por exemplo, pacto de prazo para pagamento. Depois, assistem-lhe as objeções exceções que assistiriam ao devedor pessoal contra o titular do direito de hipoteca, como a exceção non adimpleti contractus, ou a de caução, se, depois de concluído o contrato, sobrevém a um dos contraentes diminuição do seu patrimônio, que pode afastar ou tornar duvidosa a prestação, e outro contraente se recusa a prestar em primeiro lugar, até que o outro satisfaça ou garanta a satisfação ou a exceção quanti minoris, para exigir redução no preço. Não tem a de prescrição, ainda que a dívida garantida esteja prescrita e haja o devedor alegado prescrição, nem a de beneficio de inventário se o devedor morre e os herdeiros podem invocar ou invocaram o art. 1.796 do Código Civil (beneficio de inventário). Contra o adquirente da hipoteca, o demandado na ação real somente pode alegar o que conste do registro, quer se trate de exceções que digam respeito à pretensão real, quer digam respeito à pretensão pessoal. No sistema jurídico brasileiro, há regra jurídica que tem repercussão notável em todo ele: as obrigações nulas não são suscetíveis de fiança, exceto se a nulidade resulta apenas de incapacidade pessoal do devedor. Todavia, é retirada a ação do mutuante contra o mutuário, que contratou quando menor, contra seus fiadores, ou abonadores. Passando em termos rigorosamente técnicos: “As dividas que derivariam de negócios jurídicos, se esses não fossem nulos, não podem ser garantidas por fiança, exceto se a nulidade resulta apenas de incapacidade pessoal do devedor e não se tratar de mútuo a menor”. Assim, em matéria de garantia real, tem o interprete de atender ao que acima se disse como regra jurídica geral concernente a garantias pessoais e reais. A matéria de decisão, a favor do devedor, trânsita em julgado, é alegável pelo demandado na ação real; porém não é oponivel a ele a decisão, trânsita em julgado, contra o devedor (G. PLANÇX, Kommentar, HI, 868). Odemandado, devedor conjunto, na ação real não pode opor a exceção que haveria um dos devedores conjuntos se

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só deu garantia à sua dívida (JOHANNE5 BIERMANN, Sachenrecht, 419). Odemandado na ação real pode opor a prescrição da ação real e a prescrição da ação real ou pessoal das pretensões a juros e outras prestações reiteradas (G. PLAXCK, Kommentar, II, 868; JOHANNE5 BIERMANN, Sachenrecht, 491). As objeções de não existir, ou de já não existir, como a de ter sido solvida a dívida, é alegável pelo demandado. A renúncia pelo titular do direito de hipoteca é objeção própria do demandado na ação real, porém a remissão da divida pelo credor, embora concernente à relação jurídica entre credor e devedor, é alegável pelo demandado na ação real. Resta saber-se qual a influência do art. 1.503 do Código Civi] de 1916 no trato da hipoteca. “O fiador”, diz o art. 1.503, “ainda que solidário com o principal devedor (arts. 1.492 e 1.493), ficará desobrigado: 1. Se, sem consentimento seu, o credor conceder moratória ao devedor. II. Se, por fato do credor, for impossível a sub-rogação nos seus direitos e preferências. III. Se o credor, em pagamento da dívida, aceitar amigavelmente do devedor objeto diverso do que este era obrigado a lhe dar, ainda que depois venha a perdê-lo por evicção”. ~ princípio de interpretação que o demandado na ação real de penhor ou de hipoteca pode opor as objeções e exceções que o fiador poderia opor. Por isso, no direito brasileiro, o que o fiador, invocando o art. 1.503, poderia objetar, o demandado na ação real de hipoteca também pode. (O prazo de espera e a renúncia à hipoteca, prometida, embora ainda não registrada, são exceção e objeção do demandado na ação real, mas, ai, oriundas de relação jurídica pessoal entre titular do direito de hipoteca e demandado. Não passam ao sucessor particular do proprietário ou possuidor próprio do prédio gravado, cf. a. PLANCK, Kommentar, III, 867, mas podem ser opostas ao sucessor do titular do direito de hipoteca, cf. OTTo WARNEYER, Kommentar, II, 352.) demandado na ação real não tem a exceção de prévia ação, exceção de ordem ou beneficio de excussão <Einrede der Vorausklage), que tem o fiador, com base no art. 1.491 do Código Civil, salvo se a hipoteca garante dívida de fiador, porque aí é própria do débito garantido (Jo1Ii~xEs BIERMANN, Sachenrecht, 491; K&RL KOBER, J. v. Staudingers Kommentar, III, 776; G. PLARCIC, Kommentar, II, 869; FEBD. KRETZscm~x, Das Sachenrecht, 489). Odemandado na ação real pode opor as exceções que teria o devedor se não houvesse renunciado a elas. O demandado na ação real pode compensar a sua dívida com a do titular do direito de hipoteca ao devedor. Não importa se há dois ou mais créditos do devedor contra o titular do direito de hipoteca e aquele escolhe outro, e não o que o devedor apontaria, ou apontou; nem se, tendo o titular do direito de hipoteca outros créditos contra o devedor, quer a compensação com outro, ou outros, e não com o crédito garantido pela hipoteca (G. PLANCK, Komment ar, III, 869; JOHAKNE5 BTERMM~N, Sachenrecht, 491; MAx HACHENBURG, Vortrage, 550; divergiram TURNAU-FÓE5TER, Das Liegenschaftsrecht, 1, 836, e HEINRICH WILLENBÚCHER, Das Liegenschaftsrecht, 181). Se a hipoteca é em garantia de dívida, por prestações, e uma das prestações não é feita, executável torna-se a hipoteca. Quer dizer: executável pelo total (cf. Câmaras Civeis do Tribunal da Relação de Minas Gerais, 20 de fevereiro de 1929, R. dos T., 70, 426). Ainda que só se trate de juros (4.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 27 de abril de 1931, 84, 397; 4~a Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, 7 de novembro de 1934, 95, 339), salvo cláusula em contrário (5.a Câmara Civil, 9 de outubro de 1935, 108, 139). Contra, sem razão, a 2.~ Câmara Civil, a 29 de novembro de 1935 (104, 435); certas, as Câmaras Conjuntas, a 24 de março de 1936 (107, 276). Vencida a prestação e não paga, as prestações posteriores vencem-se, porém não os juros correspondentes às prestações antecipadamente vencidas (Código Civil de 1916, art. 763: “0 antecipado vencimento da dívida, nas hipóteses do artigo anterior, não importa o dos juros correspondentes ao prazo convencional por decorrer”). (j) Lê-se no Código Civil de 1916, art. 813: “Salvo o caso de insolvência do devedor, o credor da segunda hipoteca, embora vencida, não poderá executar o imóvel antes de vencida a primeira”. No parágrafo único: “Não se considera insolvente o devedor por faltar ao pagamento das obrigações garantidas por hipotecas poteriores à primeira”. Do art. 813 resulta que o credor da anterior hipoteca ou da que tenha grau anterior, se o credor da segunda propõe a ação executiva hipotecária, pode opor embargos de terceiro (cf. 2.~ Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 21 de junho de 1927, 1?. de D., 86, 599). A penhora, nas ações executivas reais, como a ação executiva do crédito com a garantia hipotecária, não tem a

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eficácia de não poder ser transferida a propriedade do imóvel; de modo que, se o proprietário aliena o domínio, é eficaz a alienação e o adquirente pode suceder ao alienante, na relação jurídica processual. Se houve cumulação das ações executivas, real e pessoal, o adquirente do imóvel gravado, se não é sucessor universal, está livre de vir contra ele a execução por ação pessoal. (1) Lê-se no art. 767 do Código Civil de 1916: “Quando, excutido o penhor, ou executada a hipoteca, o produto não bastar para pagamento da divida e despesas judiciais, continuará o devedor obrigado pessoalmente pelo restante”. O art. 767 apenas explicitou que a ação executiva real é distinta da ação de condenação, ou, se é o caso, da ação executiva pessoal que se irradia do crédito. As pretensões são inconfundíveis. “Obrigado pessoalmente”, lê-se no art. 767. Todavia, pode acontecer que a ação oriunda do crédito também seja a) executiva, ou b) executiva real, se a lei lhe atribui tal eficácia. Basta, por exemplo, que se trate, a) respectivamente, de hipoteca em garantia de custas (Código de 1973, art. 585, V), letras de câmbio ou notas promissórias (art. 585, 1), ou b) em garantia de conhecimentos de depósito ou de warraflts ou de letras hipotecárias. Adstrita a ação executiva hipotecária ao objeto, não se conferiu a ação do titular do direito de hipoteca executividade contagiante: o restante só se cobra pessoalmente, salvo se o crédito mesmo pode ser cobrado executivamente. 17) AÇÃO EXECUTIVA DE PENHOR. No direito anterior aos Códigos de Processo Civil estaduais, concebia-se o processo executivo do penhor, dito de excussão, como processo de cognição parcial (Reg. n. 737 de 1850, art. 284), como ocorria com os títulos cambiários. O Código de Processo Civil de São Paulo, art. 762, ainda limitava os embargos à nulidade do título ou do processo, à extinção total ou parcial de obrigação ou do penhor, ao não estar vencida a dívida e ao excesso do pedido. Não estava certo. Os legisladores confundiam com a cognição parcial e cognição superficial. Depois, passou-se a tratar o crédito pignoraticio na sua categoria própria. (A razão da exclusão das restrições ou reservas, que antes havia, não foi de modo algum o não mais se exigir o depósito prévio da coisa apenhada, como pareceu ao Tribunal de Apelação de Minas Gerais, no caso Pinto versus Philips, a 17 de junho de 1940, R. E., 84 142, explicação com cuja lógica não atinamos; nem pelo fato de ser declarativo (?) o processo da ação executiva, como sustentava Luís MACHADO GUIMARÂE5, Comentários, IV, 79; porque a mesma declaratividade, mínima aliás, existe quanto ao processo das debêntures, letras hipotecárias e dos títulos cambiários. Não se confunda falta de cognição e cognição incompleta. Nem se menospreze o elemento executivo, que, nas ações executivas de títulos extrajudiciais, passa à frente do elemento declarativo e, mesmo, do condenatório). A tradição é exigida pelo sistema jurídico brasileiro; exceto nos casos de penhor agrícola ou pecuário. Vários outros casos as leis processuais previram: no Decreto-lei n. 1.271, de 16 de maio de 1939, art. 3~O, sobre o devedor que fica com máquinas e aparelhos utilizados na indústria em seu poder; no Decreto-lei n. 1.625, de 23 de setembro de 1939, sobre penhor de produtos da suinocultura (art. 3.0), e no Decreto-lei n. 3.169, de 2 de abril de 1941, art. 2.0, sobre penhor de sal e coisas destinadas à exploração de salinas. Sobre penhor rural e cédula pignoratícia, a Lei n. 492, de 30 de agosto de 1937, e sobre cédulas rurais pignoratícias e mistas, a Lei n. 3.253, de 27 de agosto de 1957. Veja Decreto-lei n. 2.064, de 7 de março de 1940, e Decreto-lei n. 4.312, de 20 de maio de 1942 (carnes). Ocredor que obteve garantia pignoratícia para o seu crédito tem duas ações inconfundiveis; a ação pessoal para satisfação do crédito pessoal, que pode ser executiva (e é provável que o seja), uma vez que a lei faz do titulo extra-judicial, que se alega, título executivo, e a ação real pela qual se pede o importe do penhor, com os interesses. A ação pessoal, se executiva, vai sobre todos os bens do devedor, ao passo que a ação real só apanha o bem gravado. A ação pessoal dirige-se contra o devedor, que pode não ser o proprietário do bem gravado; a ação real dirige-se contra o proprietário, ou o possuidor em nome próprio, e contra todos os que possam obstar à extração do valor do bem gravado, para se satisfazer o penhor. Se devedor e proprietário não são a mesma pessoa, a ação executiva pode iniciar-se com a constrição do bem gravado e a constrição do patrimônio, mas aí a cuinulação de ações executivas se caracteriza, o que pode dar ensejo a algumas dificuldades práticas, a respeito de exceções. As ações reais apresentam, de regra, certas vantagens, e a constrição de todos os bens, em virtude de ação executiva pessoal, expõe o juízo às verificações concursais. Se só se propôs a ação executiva real, a ação pignoraticia, não há pensar-se em concurso, salvo excepcionalmente. (Pode dar-se que o direito que se garante também seja munido de ação real, o que não é freqúente. Por exemplo: o penhor foi constituído em garantia de pretensão à reivindicação, ou de pretensão real a frutos ou uso. Então, há duas ações executivas reais: uma, oriunda do direito garantido; e outra, oriunda do direito real de garantia. Nada obsta a que se garanta com penhor a pretensão emanada de outro penhor, como se o subscritor e emissor do warrant dá outros bens móveis em garantia da satisfação do que se promete no warrant.) Posto que se dissesse, a respeito de ação executiva pignoratícia, que se “condena o demandado”, referindo-se o juiz ao proprietário do bem gravado, que foi citado, em verdade apenas se executa, e condenação somente há quanto a todos, incluído o proprietário de bem gravado. Repitamos o que dissemos antes sobre o crédito com a garantia hipotecária, mutandis mutandi. Nesse ponto, errou Koxx~ HELLWIG, porque seria ver-se relação jurídica entre o

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titular do direito de penhor e o proprietário, o que de modo nenhum se há de admitir, embora, se o proprietário é o devedor, possa haver relação jurídica. Tampouco, se há de admitir a opinião dos que recorrem a “condenação condicional” (= condenação àprestação de x, se se quer evitar a execução forçada). Nem se pode reduzir a eficácia sentencial a ponto de se fazer declaratória a ação (o que importaria dizer-se que a sentença há de julgar que o demandante se pode satisfazer sobre o bem gravado), ou simplesmente condenação a tolerar a execução. Nem se poderia rebaixar a decisão a mera execução adiantada, que se dá por inserta em seu pedido, como se a sentença houvesse de enunciar que “se pode prosseguir na execução forçada” (OTTO GElE). Ainda quando o proprietário, citado, alega que não há crédito, ou que não mais o há, não exaure a posição de sujeito passivo: o devedor, que não é proprietário, poderia alegá-lo, para excluir a execução segundo a par condicio; O proprietário argúi a inexistência, para provar que não há penhor. A ação executiva pignoraticia começa pela constrição, que, aí, soma á eficácia do gravame o que é peculiar à penhora, razão por que não ressaltou, na feitura da lei, a usualidade da expressão “penhora”. Se comparamos a solução processual brasileira com as de outros países, facilmente se põe em relevo a simplicidade do que se adotou. As exceções que o proprietário ou possuidor em nome próprio pode opor, se só se propôs a ação executiva real, não podem ter a extensão que teriam as que são cabíveis em ação executiva pessoal. A pretensão pessoal pode estar prescrita, e não estar prescrita a ação real. Do outro lado, a pretensão real pode já ter desaparecido, e ainda ser plenamente eficaz o crédito pessoal. Se se vence o penhor, a ação executiva pignoratícia dirige-se contra todos, mas, pelas circunstâncias, há de ser citado o dono ou possuidor do bem empenhado. O devedor só é citado se é dono ou possuidor do bem empenhado, ou se foi cumulada a ação executiva pessoal. Na ação real, se o proprietário ou o possuidor próprio é pessoa distinta do devedor, as objeções e exceções que pode opor são diferentes das que teria o devedor, na ação pessoal, ainda executiva. O proprietário do bem gravado pode objetar e pode excetuar, na ação executiva pignoratícia. Objeção e exceção são como exceções, porque está o demandado diante do título executivo. As objeções negam que haja penhor. As exceções propriamente ditas encobrem a eficácia do direito real. As exceções que tem o proprietário são as que teria o devedor cuja dívida foi garantida, exceto a de prescrição de ação do credor contra o devedor e a de responsabilidade limitada do herdeiro. Não raro, os juristas confundem a prescrição das ações oriundas do crédito com a “prescrição” da ação executiva pignoratícia, que é ação real. O proprietário não pode opor exceção de prescrição da pretensão do credor; porque a pretensão que emana do penhor é outra pretensão, ainda quando se exercem as duas ações, a ação executiva do crédito e a ação executiva pignoratícia. A pretensão desaparece ou prescreve sem que a pretensão do crédito garantido esteja extinta ou prescrita; e pode prescrever a ação do crédito sem que haja prescrito a ação pignoratícia. Nos casos de constituto possessório, o executado não tem exceção de prescrição. É exemplo de exceção peremptória a exceção de enriquecimento injustificado, se o penhor foi constituído com o fim de adimplemento de obrigação que, depois, se verificou não existir. De exceção dilatória, a de ter-se concedido espera ao devedor. Há, também, as exceções fundadas em relação jurídica entre o proprietário e o credor, como a de espera ou moratória concedida ao proprietário e a de fidúcia. O titular do direito de penhor ou é satisfeito pela execução forçada, que vá até final, extraindo o valor do bem gravado, ou pela remição que o legitimação a remir leve a cabo. Estamos a repetir por ser necessário, o que dissemos quanto à hipoteca. Em primeiro lugar, sem se aludir, entenda-se, às exceções de direito processual, são alegáveis pelo demandado na ação real as objeções e exceções que se baseiem em regras jurídicas sobre fundo e forma do penhor e sobre registro, ou em convenções pessoais entre ele e o titular do direito de penhor, como, por exemplo, pacto de prazo para pagamento. Porém não lhe assistem certas exceções que assistiriam ao devedor pessoal contra o titular do direito de penhor como a exceção non adimpleti contractus, ou a de caução ou a exceção quanti minoris, para se exigir redução no preço. Não tem a de prescrição, ainda que a dúvida garantida esteja prescrita e haja o devedor alegado prescrição, nem a de beneficio de inventário se o devedor morre e os herdeiros podem invocar ou invocaram benefício de inventário. O terceiro dador do penhor não tem o beneficium excussionis, que o fiador teria. Sobre a questão, no que concerne ao direito romano, HE¶NEIcH DERNEURO (Das Pfandrecht, 1, 1, 462 s.), MAX SCHRõDER (Das Klagerecht des Forderungspfandglãubigers gegen den Drittschuldner, 26 5.), WILLY MosLm~ (Das beneficium excussionis pessonalis, 40 s.) e Orro SCHUMANN (Konstruktion und Streitfragen des pignus nominis, 38 s.). Se houve pagamento parcial, ou não, é sem importância para a admissão do procedimento executivo (RUDoLF POLLAK, System~, 916). No penhor, a executividade encontra mais do que na hipoteca, porque a posse está com o autor; se não estiver, isso não obsta ao efeito executivo, que independe da guarda ou posse imediata e é de direito material. Duas pretensões inconfundíveis. A hipoteca e o penhor representam adaptações da técnica aos dados da imobilidade e da mobilidade das duas classes principais de coisas. O Código desinteressou-se do efeito de direito

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material: a execução processa-se indiferente ao fato da posse. Se o penhor foi concebido com a posse imediata, a execução encontra o bem em poder imediato do exequente. Se esse somente recebeu a posse mediata, a execução busca o bem com quem esteja, provavelmente o constituinte do penhor. A ação executiva do titular de direito de penhor dirige-se contra o dono ou possuidor próprio do bem empenhado porque é o interessado mais perceptível. O direito de penhor é direito real e, pois, a sujeito passivo total. O Código de 1939 não revogara as penas de prisão estabelecidas em leis sobre penhor, quer a da Lei n. 492, de 30 de agosto de 1937, quer a do Decreto-lei n. 1.271, de 16 de maio de 1939, art. 3~O, ambos de violência extrema, contrária à indole do povo brasileiro. Mas fizemos votos para que se não sacrificasse o desenvolvimento do crédito agrícola e industrial, que é necessário ao desenvolvimento do país, à ganância dos fabricantes de máquinas e utensílios e dos usurários, estrangeiros e brasileiros, à maneira de Shylock,uma vez que havia o art. 141, § 32, da Constituição de 1946, que passou ao art. 153, § 17, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1. Credor pignoratício ou quem se sub-rogue nos seus direitos, e. g.; o último endossatário da cédula pignoratícia contra o devedor, os endossantes e avalistas, solidariamente, para haver a importância que faltar para o pagamento integral da dívida, juros, despesas e custas (Lei n. 492, art. 28, § 2.0); o endossatário, para haver do respectivo endossante a importância que houver pago (Lei n. 492, art. 28, § 3.0). O caso do art. 27 da Lei n. 492, que é do credor pignoratício, se não foi expedida a cédula, contra o devedor, para haver o saldo do crédito, e é insuficiente o produto da venda amigável da coisa apenhada, depende do penhor existente antes da cédula, e cabe no art. 585, III. Nas excussões pignoratícias de que tratou a Lei n. 492, de 30 de agosto de 1937, disse o art. 23, § 2.0, que, “não realizado o depósito, pode o credor requerer o sequestro dos bens ou animais empenhados, dando-se-lhe depositário judicial”, e o art. 25 acrescenta: “Feito o depósito ou o sequestro, tem o devedor o prazo de seis dias para defender-se por via de embargos” e (§ 1.0), “sendo estes irrelevantes, pode o juiz desprezá-los, condenando o devedor ao pagamento pedido, despesas judiciais e custas”, ou, “sendo relevantes, pode recebê-los e mandar contestar, dando ao processo o curso sumário”. A venda, em caso de condenação, é imediata (art. 25, § 3.0). O nome “sequestro” foi impróprio. Trata-se de medida constritiva executiva; portanto, de penhora, e não de sequestro. Penhora é o que se dá quanto se executa divida pignoratícia mediante depósito prévio da coisa apenhada, salvo a hipótese de não ter havido tradição, ou dívida proveniente de warrants. Quanto aos penhores rurais, o devedor é citado para, no prazo de quarenta e oito horas, pagar ou depositar em juízo as coisas ou animais empenhados (Lei n. 492, art. 23). Se o penhor foi dado por terceiro, a citação a esse é para que efetue o depósito se não tiver sido pago o débito. Não realizado o depósito, faz-se a penhora, depositando-se os bens empenhados (art. 23, § 3.0). Tem-se, aí, ação exetiva, como executiva era a ação que se regulou nas Ordenações Filipinas, Livro IV, Titulo 56, pr., 2.~ parte, e § 1.0, e Livro III, Titulo 78, § 7•0, MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, III, 170 5.) não falou de sequestro. Nem de sequestro falou, antes, MANUEL MENDES DE CASTEO (Pratica Lusitana, II, 21), que da ação pignoratícia tratou junto da ação de execução hipotecária. Nenhuma função tinha o sequester na actio Serviana, nem a tem na execução contemporânea do penhor sem posse (mercantil ou rural). Para que se possa pensar em sequestro, é preciso que haja dúvida quanto ao direito à coisa sequestrada e isso não ocorre em ações que executam e tiram, de início, pela constrição executiva em adiantamento, a posse. A ação executiva que se concebe, hoje, para o penhor civil e o mercantil (sem posse pelo credor) ou rural (também sem posse pelo credor) prende-se à técnica da actio Serviana, ação pretória, com que se pode obter a posse da coisa empenhada, por não ter havido a entrega ao credor. A actio Serviana passou a ser a ação reipersecutória, ação pignoratícia real, donde, às vezes, a denominação “vindicatio pignoris”. Com a actio Serviana, adquiria o credor a posse. A solução de hoje é a entrega da posse imediata a depositário judicial, sendo o Estado possuidor mediato e o devedor possuidor mediato de grau superior (Tratado de Direito Privado X,§ 1.092, 4). A penhora, impropriamente chamada, na Lei n. 492, arts. 23 e 25, sequestro , o que, em toda exposição do direito processual brasileiro, máxime após o Código de 1939, se haveria de corrigir, inicia a execução. Por isso mesmo, não há invocar-se o que concerne a medidas cautelares, ou a medidas preparatórias (acertadamente, a 3•~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 18 de setembro de 1947, 1?. dos T., 171, 289), mesmo preparatórias. Advirta-se que, hoje, o prazo para os embargos do devedor é dez dias (art. 738). 18) ANTICRESE. No direito romano, quando se permitia que o credor, cujo crédito foi garantido com algum objeto a ele entregue, percebesse os frutos em lugar dos interesses, dizia-se que se dava, por eficácia do pacto, anticrese. O crédito, esse, continuava garantido pelo penhor (MARCIANO, L. 11, § 1, D., de pignoribus et hypothecis et qualiter ea contrahantur et de pactis eorum, 20, 1: “Se se fez anticrese e alguém foi introduzido no fundo, ou em casa, retém a posse em vez de penhor, até que se lhe pague seu dinheiro, posto que pelos interesses perceba os frutos, ou dando em arrendamento, ou percebendo ele mesmo; e assim, se houver perdido a posse, sói usar da ação in factum”; L. 33,

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D., de pigneraticia actione veZ contra, 13, 7: “Se o devedor houver pago a dívida, pode usar da ação pignoratícia para recuperar a anticrese; pois, enquanto haja penhor, a palavra poderá ser usada”). O pacto anticrético distingue-se da anticrese, direito real, porque a percepção dos frutos, na anticrese, é conteúdo do direito. Do pacto anticrético só se irradiam direitos, pretensões e ações pessoais. Os papiros mostram muitas anticreses e muitos pactos anticréticos. Se o titular do direito real de garantia percebia os frutos sem que se houvesse estabelecido anticrese, tinha o dever de aplicar o valor no pagamento dos interesses do capital, entregando o excesso ao empenhante. Se fora convencionada a anticrese, tinha de aplicar o percebido ao pagamento dos frutos, e não do capital, que permanecia garantido pelo penhor (cf. ALFRED MANIGK, Glàubigerbefriedigung durch Nutzung, 48 5.; Antichretische Grundstúckshaftung im grãko -ãgyptischen Recht, Fest gabe flir Dr. K. GUTERBOCK, 284 5.). A obrigação de cuidar do bem ao perceber os frutos deve ter sido revelação posterior do direito. No direito dos papiros, anticrese e penhor estão nitidamente separados. Mais se cogita do pacto anticrético. As raízes greco-egípcias ressaltam. Só em dois textos, ambos de MARCIANO, aparece no Cor pus luris o termo “anticrese”, aliás em grego. Não faltou quem visse na anticrese romana direito real apenas sobre imóvel (e. g., G. MIRABELLI, Dei Diritto dei terzi, secondo ii Codice Civile italiano, 564); mas em verdade incidia em bens imóveis e em bens móveis. Quanto a poder ser tácita a anticrese, o que hoje podemos assentar é que não se dá conta, na discussão, da diferença entre pacto anticrético e anticrese. O pacto anticrético podia ser tácito; a anticrese, direito real, se existia, não. O direito de percepção que resulta de simples pacto anticrético não é conteúdo de direito real. A expressão grega não era usual entre os romanos. O instituto preexistia a seu emprego, como por todos os povos antigos (assírio-babilônico, siríaco, greco-egípcio, helênico). O elemento comum é a contraí ruitio, a contrafruição, a fruição no lugar de algo, ou contra algo. Na L. 33, § 1, D., de pigneraticia actione veZ contra, 13, 7, a anticrese é pignoratícia; na L. 11, § 1, D., de pignoribus et hypothecis et qualiter ea contra flantur et de pactis eorum,20, 1, fala-se de anticrese que não é pignoratícia (ALFRED MANIGK, Glõubigerbefriedigung durch Nut~ung, 8 e 48). Os dados históricos sobre a anticrese esclarecem-nos sobre as fontes do instituto, porém não nos devem perturbar, ao termos de construir o direito real limitado, que o Código Civil concebeu. O direito de anticrese é inconfundível com o direito de hipoteca e com o direito de penhor: não recai sobre o valor, mas sim sobre a produtividade do bem imóvel Donde não se poder extrair o valor para se solver a dívida. O titular do direito de anticrese usa ou usa e frui, porém não pode executar, como anticresista, o bem. No direito luso-brasileiro, a anticrese tanto se referia a móveis quanto a imóveis. O titular do direito de anticrese podia perceber os frutos, naturais e civis, por si ou por outrem. Tinha por si a tutela possessória (ANTÔNIO DE SousA DE MACEDO, Decisiones, 194 5.~ MANUEL GoNçALvEs DA SILvA, Commentaria, II, 7). Nas Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 39, o penhor tanto recaía em bens móveis como em bens imóveis. Idem, nas Ordenações Manuelinas, Livro IV, Título 26, e nas Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 56. No que respeita ao conteúdo do direito de anticrese, os deveres do titular do direito de anticrese eram os mesmos do titular do direito de penhor; mas havia de pagar os encargos, prelevando-os dos interesses, e prestar contas, exceto se se estipulou renda certa, ou se os rendimentos foram para paga dos interesses, quaisquer que fossem aqueles (MANUEL DE ALMEIDA E SousA, Notas de uso prático, 1, 317 s., que se inspirou em SAMUEL Smi~x e JOHANN VOET), salvo se havia usura (M. A. COELHO DA ROCHA, Instituições, II, 528, com invocação do Preussisches Aligemeines Landrecht, 1, 20, § 231). O que sobrasse dos rendimentos, PASCOAL JosÉ DE MELO FREIRE (Institutiones, II, 182 s.) queria que se imputasse ao capital. Os três institutos, hipoteca, penhor e anticrese, são inconfundíveis; e não se poderia definir um, partindo-se de qualquer dos outros. A anticrese não é hipoteca com posse e percepção dos frutos; nem penhor com percepção dos frutos. Ainda quando, no ato de instituição de penhor, se pactuam a percepção e a imputação dos frutos, não há anticrese. Nem pactos adjectos que dessem ao titular do direito de hipoteca a posse do bem imóvel e a percepção e imputação dos frutos a tornariam anticrese. É erro ver-se na anticrese alienação do uso e da fruição; o uso e a fruição enchem, aí, o conteúdo do gravame: a propriedade é que fica, com a anticrese, gravada; de modo que se hão de repelir aproximações fáceis, mas enganosas, como “alienação de gozo”, “alienação de uso e fruição”, “alienação de frutos futuros”, “delegação de frutos por parte do devedor”. Anticrese é o direito real pelo qual se garante o adimplemento por percepção dos frutos do bem imóvel e imputação ao quanto devido. Não se garante para o caso de não se adimplir; garante-se, com a percepção, a solução, por imputação. A anticrese pode ser extintiva (os frutos são imputados à satisfação das pretensões de capital e à satisfação das

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prestações de interesses), ou compensativa (os frutos são imputados só à satisfação das prestações de interesses). A última pode ser concebida como de imputação, à medida que haja frutos, ora mais ora menos, ou como satisfação dos interesses, totalmente, a cada período, quaisquer que sejam os frutos (fructus in vicem usurarum). Numa e noutra espécie, o anticresista, com a fruição, adimple, em vez do constituinte da anticrese. Não adimple por procura, nem adimple porque o constituinte não adimpliu: adimple, porque o direito real de anticrese lhe permite perceber e imputar. No direito brasileiro só se tem a anticrese como compensatória se há juros e não se diz quais foram os fixados, ou se em garantia de crédito de que se não determinou a quantia, nem ficou para ser determinada. Então, há álea. Se o que o anticresista usou ou o que fruiu, ou usou e fruiu não perfaz o que havia de ser prestado, perde o anticresista; se perfaz e excede, ganha o anticresista. Aproveita e prejudica. Na anticrese total ou extintiva, há uso ou fruição, ou uso e fruição em lugar de algo, que se deve. Na anticrese extintiva, que é anticrese em garantia do crédito e dos créditos por interesses, se os há, o crédito vai-se extinguindo conforme a percepção (ou o que teria de perceber o anticresista). Pode-se pensar em anticrese extintiva só do crédito, mas no direito brasileiro tal restrição depende de cláusula do acordo de constituição. Temos, assim, três figuras: a) a anticrese extintiva do crédito e dos créditos por interesses, que é a figura normal ou típica, permitida a restrição no tocante ao crédito principal; b) a anticrese extintiva só do crédito (dela não cogitam as leis brasileiras, mas era a espécie mais usual e a que se tinha, em geral, como anticrese extintiva); c) a anticrese compensativa, expressão feliz, que seria a anticrese satisfativa só de interesses, que se permite no art. 805, § 1.0, do Código Civil. No direito brasileiro, é preciso atender-se a que existe regra jurídica dispositiva, não-escrita, que diz: “Se não se declara que a anticrese somente garante as prestações dos interesses, é de entender-se que ela garante o crédito e os créditos acessórios pelos interesses”. A anticrese compensativa, pelo uso, pode ser concebida como em lugar dos interesses, mas, ai, em verdade, apenas não se mencionou o valor dos interesses. Esse valor é o valor do uso. O capital continua devido, sem qualquer diminuição. Aí, também a renúncia à anticrese é possível; e há de ser entendido que só a extinção do débito extingue o direito real de anticrese. (Os dois sentidos de compensatividade quando se fala de anticrese compensativa obriga-nos a verificar qual o conceito que cada jurista ou juiz emprega. Em verdade, não só interesses podem ser compensados; e ao falar-se de anticrese compensativa, quer-se frisar que, na espécie, há mais do que imputação: a automaticidade cresce de ponto. Assim, em sentido estrito, anticrese compensativa é aquela em que o uso e a fruição compensam, pois compensar é compensar; em sentido largo, pode-se aludir à compensação e não só imputação entre o crédito, ou o crédito e os interesses, e o uso e a fruição. Uns entram no lugar dos outros, porque se pesam ao mesmo tempo e pesam o mesmo, compensando-se.) No pacto anticrético, seja concernente a imóvel seja a móvel, o que o outorgado percebe é iure debitoris. Na anticrese, é iure proprio. Tampouco se confunde a anticrese com a procuração em causa própria. Nessa, sem posse, o outorgado recebe o que outrem colhe ou paga. Na anticrese, há a posse, com a percepção e a imputação à dívida. O procurador in rem suam exerce direito do devedor, posto que para si; o anticresista exerce o seu próprio direito. Também com a cessão de uso e fruto não se confunde a anticrese. Ali, há transferência, e não percepção e imputação por direito real. Quem cede desde logo aliena, e recebe a contraprestação, ou paga. Quem dá em anticrese ainda não paga, nem deixa para depois: o anticresista mesmo se paga. No direito de retenção, há algo de pressão psíquica sobre o devedor. Na anticrese, não: o anticresista tem poder, que oconstituinte da anticrese, ou seu sucessor, não pode tirar. Esse poder lhe advém do próprio direito. Nem há dação em pagamento na anticrese. Na datio in solutum, o devedor solve; na anticrese, garante. Quem dá em anticrese não solve; quem recebeu em anticrese pode renunciar à anticrese, deixando incólume o vínculo do crédito. Quem dá em soluto solve; quem recebeu não pode renunciar; porque o crédito se extinguiu. Na própria cessio p~o solvendo,nenhum gravame há. O cessionário é adquirente dos frutos e produtos, sem qualquer direito sobre o imóvel. O anticresista não é adquirente de uso e de fruição; nem cessionário, ainda pro solvendo. É titular de direito real limitado. O exercício do usufruto pode ser cedido. Mas anticrese não é cessão de exercício de usufruto. Ainda quando se constitui usufruto em segurança, ou se cede, em segurança, o exercício do usufruto, a anticrese não perde as características. O usufrutuário em garantia percebe e imputa, mas percepção e imputação são fins que o meio excede. Dá-se o mesmo com o titular do exercício do usufruto. A anticrese também não se confunde com a) o usufruto constituído em dação do pagamento. Aí, o usufruto não é para garantia, nem se transforma em anticrese. O pagamento é feito com a constituição do usufruto, que é o que se dá. A cláusula de poder ser solvida a dívida antes do termo, se o negócio jurídico de que proveio a divida o permitia, ou não (porque o usufruto-dação supõe pagamento à data da constituição, e então o credor abriu mão do termo a seu favor), tem de interpretar-se como cláusula de resolução. Se o usufruto foi constituído b) para se ir solvendo a

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dívida, não há usufruto-dação, mas usufruto em garantia. O negócio jurídico (acordo de constituição de usufruto), de que se irradiou, com o registro, o direito real de usufruto, é abstrato. Não há descer-se à causa do negócio jurídico subjacente, sobrejacente ou justajacente. A espécie a) e a espécie li) não são anticreses. Por isso, seria impertinente invocar-se o art. 760 do Código Civil (prazo preclusivo de quinze anos). Só circunstâncias raras poderiam configurar fraus legis. Nem cabe buscar-se ao instituto da anticrese qualquer princípio especial para inseri-lo no instituto do usufruto com dação in solvendo, ou do usufruto garantia. No direito de usufruto, ou de uso, ou de habitação, os poderes independem de qualquer dívida: grava-se, sem qual- quer acessoriedade. Na anticrese, não: grava-se porque alguém deve. O devedor é o constituinte, ou terceiro. Na anticrese, o satisfazer-se com o uso e a fruição, ou somente com aquele, ou somente com essa, é jure proprio: adjecto ao acordo de constituição de penhor, não se dá isso: está no conteúdo da anticrese que o anticresista use e frua, ou só use, ou apenas frua. No pacto de uso ou de frutos, não está no conteúdo do penhor o direito, que do pacto de uso ou de frutos se irradia. O direito oriundo do pacto é pessoal. Nas locações combinadas com os negócios jurídicos de mútuo, o locatário usa ou usa e frui, porém em compensação sucessiva. Na anticrese, não há compensação: há percepção e imputação, por direito real sobre o imóvel. O pacto comissório na anticrese é proibido, tal como na hipoteca e no penhor. A execução forçada do imóvel somente pode ser em ação executiva, real ou pessoal, concernente ao crédito garantido, ou a outra garantia real (hipoteca). O conteúdo da anticrese pode ser dilatado, ou diminuído; porém não a ponto de se atribuir ao titular do direito de anticrese ação executiva real, extrativa de valor, porque isso a transformaria em hipoteca com pacto anticrético, ou em figura dupla (hipoteca + anticrese). É da maior relevância não se confundirem as ações executivas restitutivas, que tem o usufrutuário, o usuário, o habitador e o anticresista (ações executivas reais), com as ações executivas extrativas de vaor, que tocam ao titular do direito de hipoteca, ao titular do penhor, ou ao portador do título incorporante de hipoteca ou de penhor (ações executivas reais, como aquelas), e aos credores por títulos executivos pessoais (ações executivas pessoais). São esses pontos por vezes descuidados pela doutrina estrangeira onde não se chegou a dar balanço às investigações científicas sobre as ações executivas. A distinção entre as três subclasses de ações executivas (restitutivas, extrativas; extrativas reais e extrativas pessoais) é do maior interesse técnico. É indispensável à ciência e à prática. O que acima dissemos tão profundamente interessa ao direito material e ao processual que, com as simples noções, se evitam muitos erros, frequentes na doutrina e na jurisprudência. O dono do bem gravado ou o titular da enfiteuse gravada de anticrese tem a ação declaratória negativa, a condenatória, a rei vindicatio e a de preceito. Os princípios são semelhantes aos que regem as ações do titular do domínio sobre o bem em usufruto. O dono ou enfiteuta do prédio gravado de anticrese tem a tutela possessória, como qualquer possuidor mediato, se admite a anticrese; se nega a anticrese e afirma a posse imediata, tem a ação possessória contra quem se diz, ou não, titular do direito de anticrese e não teve a posse, ou não a tem mais. Todavia, na ação possessória, o problema da existência do direito real limitado não pode ser discutido. Se a anticrese foi constituída por pessoa que não era legitimada a constituí-la, dita, por abreviação, anticrese a nom domino, o possuidor, que estava de boa-fé, é tratado segundo os arts. 510, 511, 514 e 516 do Código Civil de 1916, e o que estava de má-fé, segundo os arts. 513, 515 e 517. No sistema jurídico brasileiro, a posse imprópria, mediata ou imediata do anticresista há de ser tratada como qualquer outra posse, O possuidor mediato ou imediato, que recebeu do anticresista a posse, responde ao anticresista e por ele responde o anticresista ao constituinte da anticrese, mas a boa-fé, em que estava o possuidor mediato inferior ao anticresista, ou o possuidor imediato, é alegável perante o dono, ou enfiteuta, que reivindica ou exerce outra ação de restituição. É da máxima importância observar-se que o sistema jurídico brasileiro não contém regra jurídica como a do § 957 cio Código Civil alemão, concernente à aquisição dos frutos pelo terceiro de boa-fé, se de má-fé quem lhe deu a posse inferior; nem a do art. 1.153 do Código Civil italiano, que ~se chocaria com o sistema jurídico brasileiro a respeito de aquisição da propriedade mobiliária. A posse gera os direitos de que se trata nos arts. 510-516 do Código Civil, independentemente de ser própria a posse, ou de ser imprópria, mediata ou imediata. O titular do direito de anticrese tem a ação declaratória da relação jurídica real de anticrese ou de qualquer direito que dela irradie. O titular do direito real de anticrese tem ação condenatória por violação do seu direito ou ofensa do bem gravado de anticrese. No direito brasileiro, se não se entregou a posse ao outorgado da anticrese, a ação, que ele tem, é só pessoal, a ação decorrente do acordo, com a eficácia, erga omnes, do registro. Não tem o outorgado ação executiva por

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adiantamento (art. 585, III); tem ação declaratória, com o efeito sentencial de preceituação, e a ação de condenação, de cuja sentença, por eficácia mediata, decorre a ação executiva. Se a anticrese somente garante os créditos de interesse, o anticresista, cuja prestação do capital não foi satisfeita, pode ir com a ação condenatória e, depois, com a ação judicati, ou desde logo, com a ação executiva, se ao título a lei deu a ação executiva do art. 585, II ou VII, fazendo penhorar-se o próprio bem gravado de anticrese. Tudo se passa à semelhança do que ocorreria se o bem imóvel estivesse gravado de anticrese e de hipoteca posterior. A penhora não atinge o uso e a fruição, que toca ao anticresista como anticresista, mas a execução pelo total da dívida elimina, com a extração do valor, a dívida, e a anticrese há de cessar quando não mais houver dívida de que resultem juros. Se a anticrese somente garante o capital, o anticresista pode executar pelos juros. Nada obsta a que penhorado seja o próprio bem dado em anticrese, respeitados, aqui como na espécie anterior, os princípios de ordem dos bens para penhora. Também assiste ao titular do direito de anticrese a pretensão à cominação, segundo os princípios. Bem assim lhe cabem as ações cautelares, se forem satisfeitos os pressupostos. Como a qualquer titular de direito real limitado, tem o anticresista a ação confessória. Nela contém-se a ação de vindicação da anticrese, de que se pode ter exemplo no caso do credor com direito de anticrese que executa por inadimplimento da dívida, ou permite que outro execute, e não opõe o seu direito de retenção. O titular do direito de anticrese, se também é titular do direito de hipoteca, pelo mesmo crédito, somente pode propor a ação executiva real depois de prestar contas do que fruiu, diretamente ou indiretamente, como anticresista. A sentença que julga a prestação de contas é que dará o título certo e líquido para a ação hipotecária, que é ação executiva real (Juízo de Direito da 2.R Vara da Fazenda Pública, 21 de junho de 1941, R. de J. B., 52, 195; Câmaras Cíveis do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 20 de abril e 1939, R. F., 79, 302). Se não se trata de anticrese, mas de simples pacto de anticrese, a matéria dos recebimentos ou valor de uso e fruição pelo titular do direito de hipoteca só se pode alegar nos embargos do devedor ao pedido na ação executiva real, que o titular do direito de hipoteca proponha; ou na contestação em ação de prestação de contas, a que o titular do direito de hipoteca é obrigado como procurador, salvo se houve cessão de créditos de frutos. Os credores quirografários podem executar o bem gravado de anticrese. o que eles não podem penhorar são o uso e os frutos. 19) ExECUÇÃO DE cAUção. Caução, aí, está em sentido lato, de garantia. A caução judicial ou (a) garante exercício de direito processual, preventivamente (arts. 826-838) ou incidentemente, ou (b) não é disciplinada nos procedimentos preventivos ou incidentes, porém prestada no processo. Em qualquer caso, a petição inicial deve instruir-se com a prova de estar constituída a garantia (art. 829), isto é, de haver sido homologada e de se haver tornado exigível. No caso de ser provisório o valor, liquidar-se-á o quanto no curso do processo. O Código refere-se a algumas espécies: a caução às custas (art. 835); a caução de rato (cf. art. 37); a caução do autor manutenido ou reintegrado, no caso do art. 925; a caução do terceiro embargante (art. 1.051); a caução para entrega dos bens partilhados aos herdeiros habilitados do ausente; a caução do exeqüente que pretende o levantamento do depósito em dinheiro, se se trata de execução provisória; a caução ao preço da remição ; a caução do arrematante em caso de concorrência por meio de hasta pública. Cognição superficial. 20)SEGURO DE VIDA E DE ACIDENTES PESSOAIS EXECUTIVIDADE. As leis prevêem diversas espécies de seguros de vida:para caso de vida, ação executiva proposta pelo segurado, ou por outrem, beneficiário; para caso de morte, pelo herdeiro ou beneficiário; misto, segurado, herdeiro ou beneficiário. Não se falou no estipulante do seguro de vida de outrem (Código Civil, art. 1.472), se o podia fazer conforme a lei, porque beneficiário é. O Instituto de Resseguros do Brasil é litisconsorte necessário sempre que tenha responsabilidade no pedido (Decreto-lei n. 9.735, de 4 de setembro de 1946, art. 36). Têm de ser citados, portanto, a sociedade de seguros e o Instituto (Decreto-lei n. 9.735, art. 36, § 2.0). Se foi voluntária, ou não, a morte, é matéria de defesa, a cargo do segurador. O art. 585, III, in. fine, só se refere à ação executiva pela soma estipulada nas apólices de seguros de vida, ou de acidentes pessoais, de que resultou incapacidade. Tais seguros podem ser de vida, ou de incapacidade, resultante de acidentes pessoais. Tem-se de juntar a certidão de óbito. Não se falou de outros seguros. Nesses, os danos têm de ser avaliados e têm de ser apreciadas as circunstâncias do sinistro (cf. Tribunal Federal de Recursos, 6 de março de 1950, R. F., 134, 120). 21) ENFITEUSE, FORO E LAUDEMIO. Enfiteuse é dita domínio somente útil. O enfiteuta paga foros ao senhoria e, ao ser alienado o bem enfitêutico, a titulo oneroso, cabe a esse a opção entre adquirir o prédio ou receber o laudêmio. Assim, quanto aos foros como quanto ao laudêmio, tem o senhorio pretensão de execução, a que se dá, aqui, no art. 585, IV, a ação executiva. a) Contra o enfiteuta tem o senhorio a ação de cobrança do foro, ou a ação de laudémio, ou as ações de indenização, e tais ações, no que tocam a foro e laudêmio, ou são a)a ação condenatória; ou b) a ação executiva de

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cognição incial incompleta; ou c) a ação de comisso, que é constitutiva negativa e apenas tem por fito a extinção da enfiteuse; d) a ação desconstitutiva executiva por incursão em comisso, em que se somam a ação de comisso e a de vindicação, dando-nos a figura de ação desconstitutiva-executiva, com carga de eficácia imediata de executividade. Se o senhorio somente propôs a ação de comisso, de que se fala em c), há, com a sentença, desconstituição da relação jurídica de enfiteuse, condenatoriedade e declaratividade. A ação que tem de ser proposta, depois, é a de reivindicação. Para que a ação 4) tenha eficácia de coisa julgada material, não é preciso que ao pedido se junte o de declaração. As cargas das ações a), b) e c) são as seguintes: A ação de reivindicação é a que tem de ser proposta depois da sentença na ação c) porque falta a carga mediata de executividade e “emphyteuta, qui incidit in commissum, ab eo tempore vitiose videtur possidere respectu domini directi, et ideo iuste dominus potest ingredi fundum ratione suae civilis, et licite turbare emphyteutam in ea naturali iniusta” (PEDRO BARBOSA, Commentarii de Iudiciis, 408). (b) A ação para haver o laudêmio pareceu a alguns ação real, ação hipotecária (A. FALBER, S. GRATIANUs, B. CARPzov e G. H. AYRER). Nenhuma lei havia em que se pudesse estear tal afirmação. Pretendeu J. C. C. SCHRÕTER (Theoretische und pralctische Abhandlung von der Lehnware, 711) que caberia a actio confessoria utilis; e EPH. CHR. VON DABELOW (Ausfilhrliche Entwicklung der Lehre von Concurs der GUlubiger, 607), após 1. F. RívíNus (Programmata ex vario iure, 4, par. II) e C. F. WALCH (Introductio in controversias iuris civilis, 799), que a pretensão ao laudêmio seria extrinsecação da propriedade. Mas nem a pretensão laudemial éservidão, nem se vai contra ela, se só se deixa de pagar. A ação é pessoal e assim se assentou, na melhor doutrina, desde os juristas portugueses, a que se seguiram A. DE LEYSER (Meditationes ad Pandectas, s. 104, c. 2), J. II. BOEHMER (Doctrina de Actionibus, seção II, c. VII, § 166) e GODOFR. LuDov. MENCKE (Introductio in doctrina de actionibus for.,. 278). No mesmo sentido, J. L. ScHMIDT (Praktisches Lehrbuch von gerichtlichen Klagen und Einreden, § 1015). Ainda se discutiu qual seria essa ação pessoal: se a ação enfitêutica, derivada do contrato (actio emphyteuticaria), se a condictio ex lege ultima codicis de emphyteutico iure. Os autores acima referidos acolhiam a primeira solução; FE. KARL voN Bum (Ausfilhrliche ErWuterung, 213), a segunda, mas sem razão, porque a ação pelo laudêmio foi anterior à L. 3, C., de emphyteutico iure, 4, 66, e a condictio ex lege supunha ser nova a lex (cf. L. unica, D., de condictione ex lege, 13, 2), ou não se ter determinado a classe da ação sobre certum (cf. LUDWIG MITTEIs, Zur Lehre von der sog. condictio generalis, Jherings Jahrbiicher, 39, 153 5.). Querendo reforçar, processualmente, a pretensão do senhorio, alguns sistemas jurídicos atribuíram-lhe o procedimento da ação hipotecária (cf. FR. KARL VON BURI, Ausfiihriiche Erlãuterung, 215), ou a executividade (Lei de 4 de julho de 1768; Código de 1939, art. 298, IX, e Código de 1973, art. 585, IV, verbo “laudémio”). Temos, portanto, quanto ao laudêmio, ação executiva pessoal. FRANcIscO PINHEIRO (De Censu et Emphyteusi Tractatus, 289) conhecia a disputa sobre ser real ou pessoal, com as duas filas de nomes pela afirmativa (MANUEL BAImosA, Remissiones doctorum, L. IV, Título 38, pr., n. 56; AGOSTINHO BARBOsA, Collectanea Doctorum, ad cap. potuit de locato, n. 43; 5. J. BATISTA FRAGOSO, Regiminis Reipublicae Christianae, II, d. 13, § 1, n. 5), que se deixaram levar pela assimilação medievalesca à décima (gabella); e pela negativa (FRANcIsCo DE CALDAS, Syntagma universi Iu~ris emphyteutici, IV, c. 16, 88, e ALVARO VALASCO, Quaestionum Iuris emphyteutici, q. 4, n. 7) e argumentou: “. . .tacita hypotheca nunquam admittitur, nisi iure expresso reperiatur inducta. Nuílo autem iure cautum reperitur, ut res emphyteutica sit hypothecata, aut obligata pro laudemio”. SILVESTRE GOMES DE MORAIS (Tractatus de Executionibus, V, 63 5.) não tinha dúvida sobre ser pessoal a ação de laudêmio, negando-lhe a executividade se ilíquido o laudêmio, mas atribuindo-lhe rito sumário, com a liquidação depois. Quando ao laudêmio, a melhor doutrina luso-brasileira já lhe atribuía a eficácia de título executivo (analogia com a pensão, PANTALEÁO DE ARAÚJO NETO E GUERRA, Commentaria ad Ordinationes, 200; cp. Lei de 4 de julho de 1768; SILVESTRE GOMES DE MORAIS, Tractatus de Executionibus, V, 63 s.). O art. 585, IV, do Código de 1973, como o do Código de 1939, é explícito. A pretensão e a ação são pessoais. A via executiva em virtude de sentença somente prescreve, hoje, em vinte anos. Prescrevia em trinta pelo direito anterior ao Código Civil ou pelo Código Civil, antes da Lei n. 2.437, de 7 de março de 1955, art. 1.0; hoje prescreve em vinte anos, em virtude da Lei n. 2.437, art. 1.0. (c) Quanto à prescrição da ação executiva pelos foros, entendia ANTôNIO TELES LEITÃO DE LIMA que o prazo seria o das ações reais e, com ele, MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA (Tratado Prático e Crítico de todo o Direito Enfitéutico, II, 276); com razão: a ação é real; e a lição dos jurisconsultos no sentido do prazo das ações pessoais é de repelir-se. Afirmação de não ser real a ação do senhorio quanto à pensão enfitêutica origina-se de confusão entre ánus real de renda, o que ocorre na enfiteuse e na renda imobiliária, e a dívida imobiliária, onde existe e não tem a natureza da “Gtilt” do Código Civil suíço, art. 847. A dívida de taxa ou de contribuição de melhoria, ainda a particulares, é dívida imobiliária, sem ser renda imobiliária. A dívida imobiliária é bem móvel; a renda imobiliária, não. O alienante do prédio tem de pagar a dívida imobiliária, ainda que da divida tenha ciência o adquirente; o alienante da

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enfiteuse, não; nem o do prédio sujeito a renda imobiliária. (d) A ação de comisso simples e a ação de comisso cumulada com a de reivindicação também são reais, e prescrevem (PETRUS MAIiCELLINUS CORRADINUS, Tractatus de lure Praelationis, p. 4, n. 42) nos prazos do art. 177 do Código Civil. F. DE P. LACEEDA DE ALMEIDA (Direito das Coisas, 1, 469) entendia ser pessoal a ação de comisso, mas deixou de dar qualquer argumento, ou invocar qualquer texto ou autoridade. Trata-se de ação, que, quer simples, quer se lhe cumule a reivindicatória, desconstítui a relação jurídica real, por força da sentença. (e) No direito anterior a 1939, não se exigia para a ação de cobrança de foros e laudêmios a plena cognitio, o que se vê em MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, II, 204: “Limitatur tandem, ut non procedat, si agatur actione personali ex contractu emphyteutico pro pensionibus, et iuribus dominicalibus; tunc enlm probatur dominium per solam investituram, et non potest emphyteuta domino referre quaestionem dominii”), que se apoiava em ALVARO VALASCO (Quaestionum luris emphyteutici, q. 9, n. 15) e em PEDRO BARROSA. Hoje, não podemos manter tal proposição, porque a alegação e a prova do direito real limitado têm de ser feitas, quer na ação condenatória típica, quer na ação executiva do art. 585, IV, cuja cognição não-plena se completa com a exigência do rito dos arts. 88-124, 598-602 e 745, tanto mais quanto o registro é essencial. Quanto a terceiro, é preciso que exista o direito real limitado, o que só se prova com a certidão do registro: a escritura pública, por si só, não basta (GABRIEL PEREIRA DE CAsT1W, Decisione, 122), ainda que antiga a investidura. Perderam interesse as questões sobre ter eficácia de coisa julgada material, ou não, a decisão em que se atendeu ao reconhecimento da dívida de foro pelo réu; o reconhecimento poderia ser da dívida, não da relação jurídica real. 22) ExECUTIVO POR ALUGERES. Alugueres, como preferira o Código Civil, é a prestação que o locatário dos imóveis e móveis paga ao locador. O art. 585, IV, só se refere aos alugueres dos imóveis. O pré-capitalismo absolutista português pretendeu emprestar fundo de direito real a essa executividade (havia hipoteca tácita ou legal sobre os móveis que guarnecem o prédio, do que veio o penhor legal do art. 776, II, do Código Civil brasileiro de 1916); mas sem razão: em dogmática jurídica e em história, a executividade tem outra origem. A pretensão é semelhante a todas as outras que se instituem no art. 585, e recaí a penhora sobre todos os bens do devedor de alugueres, quer bens móveis, quer imóveis, dentro ou fora do prédio locado. Nenhum efeito erga omnes dilatou a legitimação passiva, de modo que a ação do locador somente pode ser contra o locatário e a do sublocador contra o sublocatário, o direito do réu como sublocador é penhorável. Os bens de terceiros, dentro do prédio, não podem ser penhorados na ação movida pelo locador. O sublocatário responde ao senhorio pela importância que deve ao sublocador, quando o locador demandar o locatário e pelos alugueres que se vencerem durante a lide, se foi citado na ação e a título subsidiário. Tais regras jurídicas permitem a cobrança daquela importância e desses alugueres vincendos, em ação de cognição completa, com a cumulação de pedidos (pretensões de direito material). N~ poderá, porém, o locador cumular as duas pretensões executivas, uma subsidiária da outra, porque a segunda somente nasce quando a substituição subjetiva se opera. A cumulação é possível, eventual, quanto à condenação; não no é quanto à execução. As regras jurídicas do direito material são de cumulação eventual condenatória, mas a execução contra o sublocatário somente pode ser mais tarde, quando se tiver de penhorar bem do sublocatário que não pagou ao sublocador inadimplente perante o locador. Quanto aos alugueres que se vão vencendo, a citação significa que é ao depositário que se tem de entregar os alugueres, porque está penhorada a pretensão do locatário a tal prestação. A medida que são prestados pelo sublocatário os alugueres, a penhora, que incidia sobre a pretensão, recai na prestação que se fez para a satisfazer. O aluguer tem de ser comprovado por documento escrito. É o que está no Código, art. 585, IV, e não há possível discussão. Foi riscado o que estava no Código de 1939, art. 298, IX (“provenientes de contrato escrito ou verbal”). O locador, que alugou sem exigir contrato escrito de locação, tem a ação condenatória por inadimplemento, porém não a ação executiva de título extrajudicial. Se vence na ação, a sentença condenatória tem o peso 3 de executívidade, o que enseja a propositura da ação executiva de titulo judicial. A ação de despejo rege-se pelos textos do Código de 1939,arts. 350-353, conforme foi explícito o Código de 1973, art. 1.218, II. Pode acontecer que o demandado na ação de despejo, mesmo se o contrato foi verbal, purgue a mora. Se o valor da causa não excede o de vinte vezes mais o salário-mínimo vigente no país (art. 275, 1), a ação condenatória pode ter o rito sumaríssimo. Se excede, tem de ser o ordinário. A penhora por falta de pagamento de alugueres rege-se pelos princípios gerais e de modo nenhum se restringe a bens móveis postos no bem locado. A dívida é pessoal. O que se estatui quanto ao locador e ao locatário também apanha os sublocadores e os sublocatários. O contrato escrito é pressuposto necessário para a ação executiva de alugueres. Se só há contrato escrito entre sublocador e sublocatário, só esse está sujeito à ação executiva de título extra-judicial. Se o locador teve contrato escrito, ou obteve a condenação do locatário, pode ele, com a penhora do crédito do sublocador, passar à situação de sub-rogado (art. 673 e § 2.0). Oart. 585, IV, alcança qualquer espécie de contrato de locação (urbana, rural; residencial, não-residencial,

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comercial, comercial especial). Quanto ao que por aí se afirma, que, se o fiador se obrigou como principal pagador, ou devedor solidário, é, como fiador, réu na ação executiva por alugueres, há grave confusão. O fiador que se diz, no documento escrito, “principal pagador ou devedor solidário” não deixou de ser fiador: apenas renunciou ao benefício da ordem e da excussão (Código Civil, art. 1.492, II). Se, no documento, a expressão “fiador” foi empregada, não se há de interpretar que a pessoa deixou a categoria em que, conforme a terminologia, estava. Se do texto constam, por exemplo, os nomes A e B, e se diz que a residência (ou o uso do prédio não-residencial, ou do apartamento ou da loja) é de E e o principal pagador é A, ou apenas firmaram A e B o contrato, como devedores solidários, então sim: não há fiador. Há devedores em ordem, ou solidários. Iniciada a ação executiva, tem o réu de alegar, nos embargos do devedor, que não é locatário, ou que não deve o que o locador diz que é devido, ou que o aluguer não é da importância que se atribui (6a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 26 de dezembro de 1951, D. da J., de 15 de abril de 1952: “. . .náo contestado o aluguer convencionado, deve ser, em princípio, aceita como verdadeira a alegação do autor relativamente ao número de meses em débito, sendo, como é, facílimo ao réu a prova em contrário no caso de ser inexata a afirmação do autor, bastando para isso apresentar os recibos dos pagamentos que tenha efetuado, ou, pelo menos, eventualmente, a prova de os haver perdido, ou de se terem extraviado. Quedando-se o locatário inerte, limitando-se a negar a dívida, não há como deixar, nesse caso, de julgar procedente a ação, na forma do pedido”). Cognição superficial. No art. 585, IV, do Código de 1973 atribui-se ao credor por alugueres. ou rendas de imóveis, provenientes de contrato escrito, a ação executiva. Pergunta-se: ~os alugueres, de que aí se cogita, são apenas os alugueres de imóveis, ou são quaisquer alugueres? Neutros termos: <o art. 585, IV, alude a) a alugueres de bens imóveis e de bens móveis e a renda de imóveis, ou b) só a alugueres de imóveis e a renda de imóveis? A resposta é no sentido de b). A dívida proveniente de aluguer de bem móvel pode estar incluída nas dívidas de que cogitam o art. 585, 1, e o art. 586. Há, porém, a questão do aluguer do bem imóvel de que fazem parte os móveis que a ele se ligam. Temos de atender à natureza da ligação, ligação fáctica, mas que pode entrar, ou não, no mundo jurídico. Os sistemas jurídicos, ao se referirem às coisas, têm de empregar termos que correspondam aos conceitos de partes integrantes (= o que compõe a coisa), de pertenças, de frutos, de produtos e de outras coisas em relação com outra. Pertença não é parte integrante, nem essencial, nem não-essencial (SIEGFRIED UMRATH, Der Begriff des wesentlichen Bestandteils, 74 s.). O fim econômico da coisa prende a ela a pertença. A pertença é coisa ajudante, ainda que não seja propriedade do dono do prédio; pode a coisa, estante noutra coisa, pertencer ao mesmo dono, sem ser pertença da coisa. O que não é parte integrante da coisa, mas se destina a servir ao fim, econômico ou técnico, de outra coisa, inserindo-se em relação específica, que corresponda a esse serviço (relação de pertinencialidade), salvo se a transitoriedade do serviço, ou o uso do tráfico preexclui, ou exclui, a relação específica, chama-se pertença Não há pertenças de direitos, só as há de coisas; porque o relação de pertinencialidade épré-jurídica, econômica ou técnica, regida pelo uso do tráfico: o direito apenas a encontra. A coisa, a que se liga a pertença, é dita coisa principal. A outra chama-se coisa anexada (res annexa), coisa pertencente, ou, em sentido equívoco, porque há mais coisas acessórias do que pertenças, coisa acessória. A pertença não é parte integrante da coisa, nem essencial, nem não-essencial. Se o direito real parece que se fez pertença de algum imóvel, em verdade foi a coisa que se fez tal; e. g., o terreno enfitêutuico passou a ser pertença de outro terreno. A locação ou foi do terreno que não está atingido por enfiteuse, ou do terreno não atingido, mais a pertença. No Código Civil alemão, § 97, verbis “bewegliche Sachen” (coisas móveis), só as coisas móveis podem ser pertenças. Não assim no direito brasileiro. Dir-se-á que, devido ao registro de imóveis, terra ou construção somente pode ser a) ou parte integrante de bem imóvel, ou b) bem imóvel independente. O registro é que importaria, não haveria possibilidade de pertença de imóvel a imóveL A questão merece exame. No plano dos negócios jurídicos, que não é o plano das relações entre coisas, pode dar-se que as manifestações de vontade recaiam sobre coisas per verba universalia. Aqui, em verdade, não se está a debuxar classificação de coisas, está-se a referir algumas coisas, que cabem num só nome. Há, então, regra jurídica interpretativa, não escrita, que diz: “Omnia, quae in regula sub universitate et generalitate verborum possunt includi, censeantur absolute et generaliter compreensa”, ou “Si fiat concessio per verba universalia, una etiam censentur concessa, in quibus specialis mentio erat facienda, ac si esse expresse concessa”. Essa regra jurídica, aplicada no direito luso-brasileiro (MAiIUEL ÁLVEEES P.~GAS, Resolutiones Forenses, 1, 431 s.), e implícita no sistema jurídico brasileiro, é a que corresponde às regras jurídicas alemãs, interpretativas. A regra jurídica do art. 59 do Código Civil de 1916 é dispositiva; no tocante a bens imóveis, tem de ser lida como se dissesse: “Se do registro de imóveis constam as pertenças, elas, os frutos, produtos e rendimentos e benfeitorias estão compreendidos na sorte do imóvel; para que escapem à mesma sorte, é preciso que sejam excluídos”. A legislação imobiliária permite que se ligue, pertinencialmente, um imóvel a outro: o campo de tênis, separado, espacialmente, do hotel; o pavilhão de doentes,

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no topo do morro, pertencente ao imóvel do hospital. Sobre os problemas quanto às pertenças, Tratado de Direito Privado, Tomo II, § § 132, 2; 139, 2; 143, 1-3; 144-149. ~Cabe o processo executivo contra o fiador da locação do prédio? A jurisprudência, no direito anterior, pendeu para a afirmativa se, no contrato de fiança, há a cláusula de principal pagador, implicando renúncia ao benefício de ordem ou de excussão (Código Civil de 1916, 1.492). Sem razão, porque, quanto à pretensão de origem pré-processual, como é a da ação executiva, não se opera a substituição subjetiva; nem a solidariedade de direito material produz, só por si, a igualdade de tratamento processual. Se sub-rogação pessoal houvesse, só seria, ainda assim, de excluir-se, na falta de texto da lei processual, tanto que, quando a sub-rogação se produz, o Código de 1939 entendeu necessário restabelecer a pretensão de execução, e o fiador, por isso mesmo, tinha ação executiva contra o locatário que afiançou, pelo fato de se dar a sub-rogoção (Código Civil, art. 1.495). Sem razão, o Tribunal de Apelação do Rio de Janeiro, caso Pinto versus Philips, 22 de julho de 1942 (A. J., 63, 456). É preciso atender-se a que as leis processuais não podem ser dilatadas segundo opiniões do direito material. A sua interpretação é mais restrita. Sob o Código de 1973, cumpre observar-se que o art. 567, III, faz legitimado processual o sub-rogado nos casos de sub-rogação legal ou convencional, e o art. 567, II, o cessionário, quando o direito resultante do título executivo lhe foi transferido por ato entre vivos. Se o fiador solveu, pode executar o afiançado. 23) RENDAS DE IMÓVEIS ~“Rendas de imóveis” ou “rendas sobre imóveis?” Essas são rendas constituídas sobre imóveis, direito real com obrigação de prestações periódicas. A propósito do texto de 1939, que dizia o mesmo, havíamos escrito: “Aqueles seriam apenas alugueres, tendo, então, o legislador empregado os termos como sinônimos: “Alugueres e rendas de imóveis”, uma vez que logo após se falou de serem ‘‘provenientes de contrato escrito ou verbal’’ e, no art. 298, XI, de renda vitalícia ou temporária. A última interpretação é a certa (sem razão, J. M. DE CARvALHO SANTOS, Código, IV, 202, e AMORIM LIMA, Código, II, 37; com razão, Luís MACHADo GUIMARÃES, Comentdrios, IV, 85). Incuria legis. Não nos esqueça que hoje está riscado o adjetivo “verbal”. No Código de 1973, art. 585, IV, volveu-se à mesma expressão (“renda de imóvel”), de modo que estão incluídos nas rendas de imóveis (bis in icfem) os alugueres e as outras rendas de imóveis, que não sejam direito a alugueres (e. g. contrato de participação nos lucros) e as rendas sobre imóveis, direito real. (a) A regra jurídica abrange as rendas constituídas por negócio jurídico entre vivos sobre imóveis, e as constituídas por ato causa mortis. Se direito real, efeitos erga omnes. Resta saber se, quando a lei estatui que, no caso de transmissão do prédio gravado a muitos sucessores, o ônus real sobre “todas as suas partes” determina a solidariedade (assim CLóvís BEVILÁQUA, Código Civil Comentado, III, 314, sem razão, uma vez que a solidariedade não se presume e CLóvís BEVILÁQUA não atendeu às suas próprias fontes). No Código Civil suíço, art. 792, em que se diz mais ou menos o mesmo, e o projeto de CLóvís BEVILÁQUA recebera o art. 754 do Projeto suíço (através do Projeto de COELHO RODRIGuES, art. 1.617), entende-se que é a relação jurídica entre os adquirentes que determina a natureza da obrigação, inclusive a responsabilidade e legitimação do administrador do imóvel (HEINUcH LEEMAI.TN, em MAX GMUR, Kommentar, IV, 657). No direito alemão (Código Civil, § 1.108, alínea 2.a), sim, quanto às rendas e ao efeito real, porque se inseriu outra regra jurídica (§ 1.107), semelhante ao que se estabeleceu quanto à hipoteca, e dos dois a jurisprudência e a doutrina tiraram a assimilação da renda à hipoteca. Aliás, tal regra jurídica não existe quanto à dívida fundiária e à renda fundiária do direito alemão. Acima, falamos de rendas, constituídas por negócio jurídico em vida, porque a alusão a contrato poderia ser insuficiente se a renda sobre imóvel se originasse de negócio jurídico unilateral, como o de promessa e recompensa. Aliás, a expressão “contrato”, que está no art. 585, IV, foi imprópria. (b) A divida de renda sobre imóvel pode ser de renda vitalícia ou de renda temporária; não se exigiu para a executividade o ter-se inscrito no Registro de Imóveis, o ter-se constituído o direito real. O negócio jurídico de renda vitalícia ou temporária basta, ainda que não esteja vinculada a imóvel, ou não seja direito real em virtude da saisina. Se a renda foi constituída sem ser direito real o efeito do negócio jurídico, ou sem ainda o ser, há executividade da pretensão, porém a ação é ação executiva pessoal, ou ainda o é, e não a ação executiva real de que se cogitou em (a). A pertinencialidade nasce de ato-fato jurídico, que é o ato de submeter a coisa ao serviço ou à utilidade de outra, ao perpetuus usus. Todavia, houve discussão a respeito. a)JosEF KOHLER (Zur Lehre von den Pertinenzen, Jahrbúcher fitr die Dogmatik, 26, 74) sustentava que a pertinencialidade (PertinenzirungQ é negócio jurídico, porque exige ato de determinação pelo dono (?) da coisa

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principal e a submissão da coisa-pertença, com o fato de tal serviço de uma coisa àoutra; FERDINAND REGEISBERGER (Pandekten, 1, 388) falava de ato jurídico volítivo, portanto de negócio jurídico; FRAKCESCO FERRARA (Trattato, 1, 781) era explícito. b) Contra essa classificação do ato, logo se pronuciaram G. PLANCK (Kommentar, 1, 4Y~ ed., 207) e Orro voiq GIEm (Deutsches Privatrecht, II, 74, nota 18). c) Terceira opinião seria a dos que prescindiriam de ato humano, portanto de negócio jurídico, de ato jurídico stricto sensu e de ato-fato jurídico: o fato natural, o elemento extra-humano, criaria, ou poderia criar a pertinencialidade (assim, em contradição com a af irmação de ser ato jurídico, G. ANDREOLI, Le Pertinenze, 217 s.). Argumenta-se com as regras jurídicas como a do Código Civil de 1916, ari. 43, 1 (é bem imóvel “o solo com a sua superfície, os seus acessórios e adjacências naturais, compreendendo as árvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo”), para se dizer que os peixes, pássaros e animais bravios, que povoam o terreno, são do dono desses, ainda que ele não saiba existirem, nem hajam praticado qualquer ato para isso. Logo ressalta a confusão entre acessão (imobilização) e pertinencialização, conceitos distintissimos. A união de coisas móveis a terrenos ou leva a converter em parte integrante aquelas, essencial, ou não essencial, ou não altera as relações de propriedade. Os peixes, passáros e animais bravios são sem dono; se o proprietário do terreno prende os peixes em lago, ou trecho de rio, que lhes vede a descida, ou em piscina, ou os cria com espécies adquiridas, ou engaiola, ou enviveira os pássaros, ou de outro modo cerca os animais, dono é ele, deixaram de ser a déspotas tais animais. A imobilização sem ato humano é a proveniente da formação natural de ilha, da aluvião, da avulsão ou do florestamento ou gramado natural (acessão). Muito diferente é o que se passa com a pertinencialização, que implica ato-fato jurídico. A pertinencialização é ato-fato jurídico, precisemos, e não negócio jurídico, nem ato jurídico stricto sensu. Aliás, não se pode dizer que é ato jurídico (lato sensu), ou ato-fato jurídico, e admitir que o fato natural possa causá-la (e. g., G. ANDREOLI, Le Pertinenze, 217 e 162, contra 218 s.). 24) CONDOMÍNIO. A comunhão pro diviso dos imóveis reentrou no direito brasileiro, mais ampla, pela Lei n. 5.481, de 25 de junho de 1928, o que atendeu à necessidade de se regular a situação jurídica que fatos econômicos e de concentração criaram à vida urbana. A pretensão de executar (1) só se perfazia, com o Código de 1939, art. 298, X, a favor do administrador da comunhão pro diviso, (2) quanto às despesas gerais, quer dizer, comuns aos cornuneiros, divisamente. Há também, de regra, o orçamento prévio para obras que interessem à estrutura do edifício. São também tidas como “despesas gerais” as que interessam a todos os moradores, sem serem de conservação: telefone comum, iluminação, elevador, esgotos, água, vigilância, limpeza, portaria, etc. Bastariam os três pressupostos acima referidos para que houvesse a pretensão à execução a favor do administrador, salvo se a outrem foi conferido o poder para representar, em alguma obra ou serviço geral, os comuneiros, e. g., ao construtor da piscina, ao advogado dos comuneiros. Sem razão, AMORIM LIMA (Código de Processo Civil Brasileiro, II, 52) e J. M. CARvALHO SANTOS (Código, IV, 204); com razão,Luís MACHADO GtII1VIARÃES (Comentários, IV, 93). A penhora deve recair segundo o valor da propriedade de cada um, ou segundo o disposto no ato constitutivo. A ação executiva é pelo quanto que se alega, mas há a exigência de se tratar de dívida certa e líquida (art. 586). Se o demandado entende ser exagerado o quanto, ou estarem incluídas verbas que não são despesas comuns de comunhão pro diviso (4.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 12 de junho de 1951, R. F., 146, 284), ou que não houve a autorização necessária pela assembléia dos comuneiros, tem de fazê-lo em embargos do devedor (8.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 12 de outubro de 1951, R. de D. 1., 14, 62: “Com efeito ao estabelecer a regra de que, além das previstas em lei, serão processadas pela forma executiva as ações do administrador para cobrar do co-proprietário do edifício de apartamentos a quota relativa às despesas gerais fixadas no orçamento, segundo o texto do art. 298, X, do Código de Processo Civil” (hoje, Código de 1973, art. 585, IV, in fie), o legislador nada mais fez do que subordinar o direito ao uso deste processo especial a três condições: a) que a divida seja cobrável pelo administrador do condomínio; b) que seja proveniente de despesas gerais, incluídas nesta última expressão todas as que resultaram da prestação de serviços necessários à conservação e utilização normal da coisa de propriedade comum e da execução de obras que interessem à estrutura do edifício de apartamentos; c) que a quota corresponda ao que foi fixado em orçamento. Esta conclusão é corolário lógico, natural, das disposições contidas nos arts. 8.0, 9•0 e 10 do Decreto n. 5.481, de 25 de junho de 1928, o que levou PONTES DE MIRANDA a afirmar, com muita propriedade, que bastam os três pressupostos acima referidos para que haja a pretensão a favor do administrador, salvo se a outrem foi conf e-rido o poder para representar (Comentários ao Código de Processo Civil, III, 58) “. Cf. Juízo de Direito da 10.a Vara Cível do Estado da Guanabara, novembro de 1960 (D. da J. de 29 de novembro). .... . a administradora, a que alude o art. 298, X, do Código de Processo Civil (de 1939), não é outro que não o síndico. Basta que esse prove a sua qualidade, para ser considerado parte legítima. O síndico, para esse efeito, não é representante do condomínio, mas seu substituto processual. A eventual impugnação da validade da assembléia que o elegeu constitui matéria de defesa. Como acentua PONTES DE MIRANDA, “se o demandado entende ser exagerado o quanto, ou estarem

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incluídas verbas que não são despesas comuns de comunhão pro indiviso, ou que não houve autorização necessária pela assembléia dos comuneiros, tem de fazê-lo em defesa” (Comentários ao Código de Processo Civil, IV, 2.~ ed., 358). São cobráveis os honorários do advogado na ação executiva contra o comuneiro ou os comuneiros do edifício de apartamentos (1.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 5 de maio de 1952, D. da J. de 13 de agosto de 1952). Cognição superficial. Sobre apartamentos, nosso Tratado de Direito Privado, Tomo XII, § § 1.303-1.411. O que mais acontece é que o legitimado ativo à ação executiva de título extrajudicial, de que cogita o art. 585, IV, in fine, é o síndico, ou administrador do condomímo. Pode ser, conforme já dissemos, qualquer credor com contrato escrito. Pode mesmo acontecer que o síndico ou administrador se haja feito substituir no crédito pelo terceiro. Aí, o contrato é entre os dois, e não entre os condôminos e o terceiro. Se o administrador apenas incumbe alguém de proceder ao que foi aprovado pela assembléia, aí o terceiro vai contra o condomínio, e não contra o síndico ou administrador. Estatuiu a Lei n. 4.591, de 16 de dezembro de 1964, art. 12: “Cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na Convenção, a quota-parte que lhe couber em rateio”. E no § 1.0: “Salvo disposição em contrário da Convenção, a fixação da quota do rateio corresponderá à fração ideal do terreno de cada unidade”. E no § 2.0: “Cabe ao síndico arrecadar as contribuições, competindo-lhe promover, por via executiva, a cobrança judicial das quotas atrasadas”. E no § 3.0: “O condômino que não pagar a sua contribuição no prazo fixado na Convenção fica sujeito ao juro moratório de 1 % ao mês, e multa de até 20% sobre o débito, que será atualizado, se o estipular a Convenção, com a aplicação dos índices de correção monetária levantados pelo Conselho Nacional de Economia, no caso da mora por período Igual ou superior a seis meses”. E no § 4.0: “As obras que interessarem a estrutura integral da edificação ou conjunto de edificações, ou ao serviço comum, serão feitas com o concurso pecuniário de todos os proprietários ou titulares de direito à aquisição de unidades, mediante orçamento prévio aprovado em assembléia-geral, podendo incubir-se de sua execução o síndico, ou outra pessoa, com aprovação da assembléia”. E no § 5.0: “A renúncia de qualquer condômino aos seus direitos, em caso algum, valerá como escusa para exonerá-lo de seus encargos”. Note-se bem, para se interpretar, hoje, o art. 585, IV, in fine. Aliás, ao exigir-se o contrato escrito não se afasta a simples aprovação pela assembléia, desde que disso se haja prova escrita, que há de ser a cópia de ata, ou pelo menos parte pertinente às despesas que dão ensejo à ação executiva de título extrajudicial com base no art. 585, IV, in fine. Tratando-se de pessoa que não é condômino, a legitimação processual ativa depende de relação entre ela e o condomínio. “Encargos de condomínio” são as despesas nas partes indivisas do imóvel e no que concerne a aparelhos, máquinas, calefação, refrigeração, telefones e demais peças ou instalações de uso comum. Cf. Lei n. 4.591, de 16 de dezembro de 1964, art. 12: “Cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na Convenção, a quota-parte que lhe couber em rateio”; e § 2.0: “Cabe ao síndico arrecadar as contribuições, competindo-lhe promover, por via executiva, a cobrança judicial das quotas atrasadas”. A situação do administrador ou síndico (art. 12, IX) é semelhante à do curador de herança jacente (arts. 1.143 e 1.144, II), à do inventariante, quanto à herança (arts. 12, V, e § 1.0, 991, 1), e à do síndico, na massa falida (arts. 12, III). Na ação executiva, tem o síndico de apresentar prova das funções em que está investido, conforme a lei e a convenção dos condôminos, o orçamento geral aprovado pela assembléia-geral ordinária, o número de unidades conforme certidão do Registro de Imóveis, as quotas de cada condômino nas despesas, o balancete mensal com a relação das despesas e demais encargos, o texto da convenção e qualquer outro elemento probatório necessário à prova das alegações. 25)CREDITO DE SERVENTUÁRIO DA JUSTIÇA. Velho “privilégio executivo” é o dos serventuários para a cobrança executiva das custas e mais despesas. Hoje, todos os créditos devidos aos serventuários de Justiça têm a ação executiva. Alguns ou são cobrados ao vencido, amigavelmente, ou na ação executiva da sentença, como um dos itens (3.a Turma de Câmaras Reunidas do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 17 de outubro de 1951, D. da J. de 31 de março de 1952; 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 13 de março de 1951, R. dos T., 192, 233). A regra jurídica do direito anterior podia ser estendida aos peritos louvados ou nomeados (4.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 10 de maio de 1951, R. dos T., 193, 698); mas, acertadamente, o Código de 1973, no art. 585, V, a estendeu aos peritos, intérpretes e tradutores, cujos emolumentos ou honorários, após aprovação pelo juiz, podem ser cobrados executivamente. A exigência da aprovação alcança os serventuários da Justiça.

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Se a parte vencedora pagou as custas, ou outras despesas, fez-se cessionária do crédito, o que lhe dá, após o trânsito em julgado da sentença em que foi vitoriosa, a ação executiva de título extrajudicial, ou a ação inclusa na ação de execução de sentença para haver o necessário ao pagamento das custas que fez, ou que ainda está por fazer. O papel que exerce a parte vencedora, executando pelas custas, ou outras despesas, que solveu, é o de cessionário de crédito. Porém não é esse o que ela exerce quando executa por custas ou despesas devidas e não pagas. Tem a parte vencedora legitimação processual para isso, mas age como responsável aos credores de custas ou despesas. Tem ela interesse em que o vencido as solva, porque, se é insolvente o vencido, as tem ela de pagar, embora vencedora, porque foi a autora da ação. Foi ela que deu causa aos atos processuais de que derivam dividas de custas. As custas, os emolumentos e honorários têm de estar “aprovados por decisão judicial”. N~ basta que constem de regimento. Não basta simples visto ou rubrica do juiz. Têm de estar aprovados por ele, razão por que se fala de decisão judicial. Muito diferente do que se passa com o que é devido à parte vencedora, porque essa, com o título judicial, é legitimada ativa (art. 20: “A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocaticios”; arts. 566, 1, 568, II, e 584, 1). Os credores a que se refere o art. 585, V, são legitimados ativos à execução de títulos extrajudiciais, por ter havido aprovação judicial. A tal aprovação não se atribui eficácia sentencial; apenas integra o título extrajudicial, como pressuposto para a executividade. As custas, os emolumentos e honorários, a que se refere o art. 585, V, podem ser atinentes a atos praticados fora do processo, como se foi determinada extração de certidões em cartórios diferentes. Se a parte vencedora pagou o que cumpria à outra parte pagar e não consta da sentença, pode suscitar a aprovação pelo juízo, para que exerça a ação executiva de título extra-judicial. As decisões sobre custas ou despesas são declaratórias. A fixação de custas, ou despesas, por sentença, é que é constitutiva. Quem arbitra constitui, não quem diz quanto por lei é devido. A ação dos serventuários, peritos, intérpretes e tradutores é com adiantamento de execução, havendo cognição superficial. Por serventuários entendem-se distribuidores, oficiais de registro, tabeliáes de notas, escriváes, contadores, partidores, avaliadores, escreventes, porteiros dos auditórios, oficiais de justiça, inventariante judicial, testamenteiro nomeado judicialmente, tutor judicial, depositário judicial, liquidante judicial. Foi o que já se explicitara no Decreto-lei n. 2.035, de 27 de fevereiro de 1940 (organização judiciária do Distrito Federal). O critério para se determinarem os serventuários de Justiça, de que se lançava mão (cf. Jogo MENDES JÚNIOR, Direito Judiciário, 78), era fundado em situação ocasional; portanto, extremamente precário: as suas retribuições serem pagas em custas, emolumentos e percentagens, e não em vencimentos fixos, prestados pelo Estado. O critério do Código é o de ser a pessoa a encarregada de serviços judiciais sem ter participação, ainda postulacional, na relação jurídica processual. Estão excluídos, assim, os juizes e os órgãos do Ministério Público. Caem fora do art. 585, V: a) as despesas judiciais não previstas no regimento de custas; b) as custas que se contam a favor dos juizes e dos órgãos do Ministério Público; e) as custas dos advogados e solicitadores. As custas e despesas dos escriváes ad hoc, ou dos porteiros ad hoc, ou oficiais de justiça ad hoc, são cobráveis por ação executiva, por todos, de cognição superficial. As custas são contadas pelo contador, por serem constantes do regimento de custas. A ação de direito material tem prazo de prescrição. Os dizeres “aprovados por decisão judicial” também se estendem às custas. Se não foram na forma da lei, é assunto para defesa. As dívidas de custas e despesas entre partes cobram-se no processo de execução das sentenças, e o prazo da prescrição é o das dívidas em geral. Isso não significa que, se não foram cobradas e pagas, não se exerça a ação de execução de título extrajudicial. 26)PERITOS, INTÉRPRETES E TRADUTORES. Os peritos estão incluidos no art. 585, V, posto que possa haver perito oficial, com cargo para isso, o que depende da legislação da organização judiciária, ou de alguma lei especial. Têm o mesmo trato os técnicos, que têm de manifestar-se nos processos, ou em determinados processos especiais. Exige-se o ato aprobativo do juiz. Sempre que os emolumentos foram taxados “em regimento”, e não só “regimento de custas judiciais” ou da justiça civil, no sentido que tem “civil” na expressão “processo civil”, há a executividade de título extrajudicial. O direito deles é próprio, e não por equiparação aos serventuários da Justiça (sem razão, Luís MACHADo GUIMARÃES, Comentários, IV, 47, 48), ponto importante, porque evitou a interpretação errônea de se circunscrever a aplicação do art. 585, V, aos atos “para juízos civis”. Tem-se de exigir aprovação judicial. O perito ad hoc, o tradutor ad hoc e o intérprete ad hoc têm ação executiva, porque são perito, in casu, tradutor público in casu, e intérprete in casu, por incumbência estatal. Também a têm aqueles a quem alguma lei atribuir função de traduzir ou de ser intérprete, e. g., os corretores de navios, nos casos do Código Comercial e de leis especiais. 27)DÍVIDA ATIVA DA FAZENDA PÚBLICA DAS ENTIDADES ESTATAIS. Se a divida é à União, a Estado-

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membro, ao Distrito Federal, a Território, ou a Município, e consiste em divida regida pelo direito tributário, basta para a executividade do título que a ela corresponda escrita feita de acordo com a lei (e. g., seria inexecutável o crédito do Estado-membro se para o tributo só é competente a União, ou o Município) e que se apresente a certidão. Não basta o aviso de dívida, nem sequer a intimação, ou ato semelhante. Se a dívida é de bem comprado à União, ao Estado-membro, ou ao Território, ou ao Município, não basta tal certidão. O que se há de exigir, ai, é que o título satisfaça os pressupostos do art. 585, II. Crédito decorrente de laudêmio, foro, aluguer, ou renda de imóvel, não cabe no art. 585, VI: rege-o o art. 585, IV. Nos executivos fiscais, o próprio credor faz o título, unilateralmente; de modo que não só com ele prova o seu crédito, cabendo ao devedor impugná-lo e provar que não deve (assunto dos embargos de devedor), como faz o titulo extrajudicial entrar na classe dos títulos executivos extrajudiciais. 28)TÍTULOS EXECUTIV’O5 EM VIRTUDE DE LEI ESPECIAL. O art. 585, VII, refere-se a “todos os demais títulos, a que, “por disposição expressa, a lei atribuir força executiva”. Ai, o pressuposto necessário é a lex speczalis, que há de caracterizar objetiva e subjetivamente o título. Temos de dar exemplos, apenas para que se preste atenção ao conteúdo do art. 585, VII. (a)A todo cessionário dos credores a título universal ou particular, por lei, negócio jurídico, ou execução de sentença, concede-se a executividade, desde que o cedente tenha a pretensão à execução. Trata-se, no fundo, de regra jurídica de sucessão na pretensão à tutela jurídica. Tal sucessão pode dar-se após a litispendência, para continuação, ou para propositura de outra ação. Se o cedente propôs a ação executiva contra alguém e só cedeu outras ações de que o título também é instrumento, a pública-forma nos termos do art. 334 é bastante para a propositura da outra ação. A sub-rogação também autoriza a executividade. Nem sempre o direito formal tem a idade do direito material, a respeito de cessionárias. Permaneceram muito tempo, no direito processual português, as conseqüências dos erros provindos do conceito romano dos direitos e das pretensões do cedente, do credor (já se vê), agarrados a ele ut lepra cuti, como a lepra à pele, qual se dizia em livros de velhos juristas. O cessionário tinha de agir em nome do credor, porque o crédito continuava colado ao credor, e GAIO, pondo em si o exemplo, avisava que o cessionário teria de agir “ex persona mea”, “quasi cognitor aut procurator meus”. Dai recorrer-se à figura do mandatum (FluDoLIN EISELE, Cognitur und Prokuratur, 113). A evolução posterior referiu-se à aquisição de actio suo nom4ne, o que foi criação utilitatis causa, a actLo utilts (sobre isso, E. voN SALPIuS, Novatiou und Dele gation, 394 5.). As duas eras baralhavam-se na cabeça dos juristas romanos e mais ainda, depois, na dos juristas da glosa e da pós- -glosa. No direito processual reflete-se a concepção hodierna da cessão, que é a do direito material, porém noutros lugares deixa de revelá-la, ou não é explícito. A concepção hodierna, a despeito da lição memorável, na Península Ibérica, de PAULO DE MouRA E IARABA, ainda perdurou, como se vê da dissertação de MANUEL ALVARES PÉGAS (Resolutiones Forenses, 1, 46), através de PEDRO BARROSA e de MANUEL MENDES DE CAs1~O. ~ digno de nota que MANUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, II, 191) e o praxista MANUEL ALVARES PÉGAS (Resolutiones Forenses, 1, 46: .... . quanvis contrarium teneat, et iudicatum referat Mend...”) deram noticia de haver reação ao romanismo da cessão, sendo que o último só se rendia a ele devido ao “somente nas próprias pessoas que fizeram as escrituras; e nao em outras” das Ordenações Filipinas, Livro III, Titulo 25, § 10. Não se diga concepção de Cim. F.MimLENBRUCH, nem de A. KOEPPEN, ou de E. voN SALPIUS. A despeito da nota de MANUEL MENDES DE CASTRO, antes desses juristas alemães, os reinícolas já andavam sacudindo de si a pátina da distinção romana das actiones directae e das actiones utiles, e a voz de PAULO DE MOURA E lARADA ressoava, zurzindo o romanismo tardio e insensato. O que ressoa, hoje, é a opinião anônima, desprezada,mas verdadeira, que SILVESrRE GOMES DE MORAIS (Tractatus de Execution.ibus, V, 26), rechaçou de todo, com o apoio em TOMÉ VAZ (Allegationes, a. 76, n. 76) e MIGUEL DE REINOsO (Obser’vationes Practicae, 86), além de MANUEL MENDES DE CASTRO e MANUEL ALvARES PÉGAS, todos agarrados às funestas palavras da Ordenação: “nas próprias pessoas”. Ainda ANTÔNIO JOAQUIM RIBAS (Consolidação, art. 723) e outros mais juristas recentes. Para que os cessionários ou sub-rogados pessoais tivessem a pretensão e a ação dos cedentes e a das pessoas a que se sub-rogaram, não precisaria o Código de dizê-lo, como fez o Código de 1939, art. 298, XVIII, e agora está no art. 567, II e III, do Código de 1973. Resultaria dos princípios. O Código de 1939 não falava dos sucessores causa mortis, mas são eles, pela estruturação subjetiva dos direitos, como as próprias pessoas a que se refere o art. 585, nos diferentes itens. A lei, e não só a convenção, determina a sucessão. Quanto à substituição passiva, o Código de 1939 não se preocupou com ela, uma vez que mais interessa ao direito material, porém está no Código de 1973, art. 563. A pretensão à execução dirige-se ao Estado, e não ao réu. O Código de 1973 foi explícito (art. 567, 1). Veja a Sistemática do Livro II. (b)Os acionistas de sociedades por ações ou outros sócios de responsabilidade limitada são obrigados a integralizar as ações ou quotas subscritas para o fundo social, ainda que o contrário disponham os estatutos ou o contrato social

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(Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, art. 50 e § § 1.~ e 2.0). Dá-se, portanto, vencimento antecipado da divida à sociedade falida. A cobrança do saldo integralizante é feita judicialmente, depois de avisados os devedores para satisfazê-lo amigavelmente, ou segundo o Decreto-lei n. 2.627, de 26 de setembro de 1940, arts. 74-77. A ação é contra todos~ ou alguns, em cumulação subjetiva, ou contra cada um de per si, ou contra os que se acham em estado de solvência, ou contra cedentes. Não há solidariedade, salvo quando se trata de sociedades por quotas de responsabilidade limitada (Lei n. 3.708, de 10 de janeiro de 1919, arts. 2.0 e 9.0) ou entre o cedente e o cessionário de ações não integralizadas (Decreto-lei n. 2.627, de 26 de setembro de 1940, art. 75). (c) Quanto à massa falida e à arrecadação, regia a espécie o art. 122 da Lei n. 5.746, que dizia no art. 4.0: “Se o arrematante não pagar o preço à vista ou, o mais tardar, dentro de vinte e quatro horas depois de arrematação, será o objeto levado a novo leilão, ou hasta pública, por sua conta e risco, ficando obrigado a pagar ou a completar o preço por que o comprou e perdendo, em benefício da massa, o sinal que houver dado”. Já, na segunda alínea, a Lei de Falências conferia a executividade, e dizia dever “a petição inicial ser instruída com certidão passada pelo escrivão”. Cf. Código de Processo Civil, art. 695 e § 1.0. O art. 39 do Decreto n. 21.981, de 19 de outubro de 1932, não atingira o art. 122 da Lei n. 5.746, nem seus parágrafos. O Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, art. 117 e § § 1.0 e 2.0, rege, hoje, a espécie. (d) No Decreto-lei n. 21, de 17 de setembro de 1966, os arts. 1.~’-5.’~ referem-se à assistência financeira, feita pelas Caixas Econômicas a empresas. No art. 6.0 diz-se que, “vencido o prazo fixado no inciso 1 do art. 3~0, sem que o mutuário haja cumprido a obrigação ou pago a divida, os bens hipote.cados às Caixas serão vendidos em leilão público a simples requerimento da Caixa credora e independente de qualquer ~outra formalidade processual, salvo os avisos e editais de lei, por intermédio do Juízo da Vara a que competir julgar os feitos da União Federal ou do Juízo da falência, se for o caso, iiotificado o síndico, observando-se o que dispõem os arts. 962 <?) e 964 do Código de Processo Civil”. Tratava-se do Código de 1939. Hoje, os textos correspondentes estão nos arts. 686 e 687. No art. 6.0, § 1.0, do Decreto-lei n. 21, de 17 de setembro de 1966, está dito: “Quaisquer alegações do devedor só poderão ser apresentadas e conhecidas pelo juízo, depois de efetivado o leilão, na forma do inciso n. II do art. 1.009 do Código de Processo Civil”. Tal texto do Código de 1939 corresponde ao art. 738 do Código de 1973, que fixa em dez dias oprazo para a oposição dos embargos do devedor, observados o art. 746 e o parágrafo único. Lê-se no § 2.0 do art. 6.0 do Decreto-lei n. 21: “O leilão de que trata o presente artigo poderá ser feito extrajudicialmente, a requerimento do mutuário, a quem caberá indicar o leiloeiro. Fora dessa hipótese, será o leiloeiro nomeado pelo juiz”. No art. 6.~, § 3~0, diz-se: “Aplicar-se-á ao leilão o disposto acima, no § 1.<~ do art. 3~0, devendo os anúncios consignar esta circunstância, como também avaliação dos bens feita pelas Caixas. Terá preferência o licitante que oferecer o pagamento à vista, tanto por tanto, e, sucessivamente, o que pleiteie menor financiamento das Caixas, ou, em igualdade de condições, prazo menor”. No § 4.~: “A comissão do leiloeiro será devida unicamente pelo arrematante, e não ultrapassará, em todos os casos, a meio por cento do valor do lance”. No § 5.0: “Se, no primeiro leilão, os bens não alcançarem lance igual ou superior à sua avaliação realizada pela respectiva Caixa Econômica, proceder-se-á a segundo leilão, com o abatimento de vinte por cento e intervalo de dez dias, no mínimo, quando então serão vendidos pelo maior lance, observado o disposto no § 2.0 deste artigo”. No art. 7.~: “Do produto do leilão será pago preferencialmente o crédito da Caixa Econômica, devendo o saldo, depois de deduzidos as custas, os impostos e as taxas, ser restituído ao mutuário, ou depositado à disposição do juiz competente, no caso de concordata ou falência do devedor ou interveniente hipotecante”. (e) O Decreto-lei n. 70, de 21 de novembro de 1966, autorizou o funcionamento de associações de poupança e empréstimo e instituiu a cédula hipotecária. As associações de poupança e empréstimo foram postas no sistema financeiro de habitação (Lei n. 4.380, de 21 de agosto de 1964, art. 8.0, IV, e legislação complementar). Os arts. 9.o~28 concernem à cédula hipotecária. No art. 29 estatui-se que, nao pagas as dívidas no vencimento, podem ser objeto de execução na forma do Código de 1939, arts. 298 e 301 (hoje são os arts. 566-747 do Código de 1973), ou conforme os arts. 31-38 do Decreto-lei. O art. 29, parágrafo único, do Decreto-lei n. 70, é de grande interesse: “A falta de pagamento do principal, no todo ou em parte, ou de qualquer parcela de juros, nas épocas próprias, bem como o descumprimento das obrigações constantes do art. 21, importará, automaticamente, salvo disposição diversa do contrato de hipoteca, em exigibilidade imediata de toda a divida”. Dies interpellat pro homine. O Decreto-lei n. 70, de 21 de novembro de 1966, art. 1.0, § 2.0, submeteu as associações de poupança e empréstimo e seus administradores às mesmas regras jurídicas (“preceitos”) e “normas”, regras internas, atinentes às instituições financeiras a que se refere a Lei n. 4.595, de 31 de dezembro de 1964. O Conselho Monetário Nacional é que pode autorizar o funcionamento de tais associações, como sociedades civis de âmbito regional restrito, para propiciar ou facilitar a aquisição de casa própria aos associados, captar, incentivar e disseminar a poupança (art. 1.0). Lá se fala de “poderão ser autorizadas”, mas afaste-se a interpretação que exclua o controle judicial de tal autorização. No art. 10 da Lei n. 70, cria-se a “cédula hipotecácia para hipotecas inscritas no Registro Geral de Imóveis, como instrumento hábil para a representação dos respectivos créditos hipotecários, a

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qual pode ser emitida pelo credor hipotecário nos casos de: 1 operações compreendidas no Sistema Financeiro de Habitação; II hipotecas de que sejam credores instituições financeiras em geral e companhias de seguro; III hipotecas entre outras partes, desde que a cédula hipotecária seja originariamente emitida em favor das pessoas jurídicas a que se refere o inciso II, supra”. Lê-se no art. 10, § 1.0: “a cédula hipotecária poderá ser integral, quando representar a totalidade do crédito hipotecário, ou fracionária, quando representar parte dele, entendido que a soma do principal das cédulas hipotecárias fracionárias emitidas sobre uma determinada hipoteca e ainda em circulação não poderá exceder, em hipótese alguma, o valor total do respectivo crédito hipotecário em nenhum momento”. No § 2.0: “Para os efeitos do valor mencionado no parágrafo anterior, admite-se o cômputo das correções efetivamente realizadas, na forma do art. 9~0, do valor monetário da dívida envolvida”. E no § 3.0: “As cédulas hipotecárias fracionárias poderão ser emitidas em conjunto ou isoladamente a critério do credor, a qualquer momento antes de vencimento da correspondente dívida hipotecária”. Permite-se no art. 11 a emissão de cédula hipotecária sobre segunda hipoteca, com o pressuposto necessário de ser expressamente declarado, “com evidência”, “taí circunstância”, isto é, tratar-se de cédula hipotecária sobre segunda hipoteca. Quanto ao valor nominal de cada cédula hipotecária, vinculada ao Sistema Financeiro de Habitação, pode ser expresso pela sua equivalência em Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional ou Unidades-padrão de Capital do Banco Nacional da Habitação e representado pelo quociente da divisão do valor inicial da dívida ou da prestação, prestações ou frações de prestações de amortizações e juros da dívida originária pelo valor corrigido de uma Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional ou Unidade-padrão de Capital do Banco Nacional da Habitação no trimestre de constituição da dívida (art. 12). Diz o § 1.0: “O valor real ou o valor corrigido de cada cédula hipotecária corresponderá ao produto de seu valor nominal, definido neste artigo, pelo valor corrigido de uma Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional ou Unidade-padrão de Capital do Banco Nacional da Habitação no momento da apuração desse valor real”. E o § 2.0: “O valor nominal discriminará, na forma deste artigo, a parcela de amortização de capital e a parcela de juros representados pela cédula hipotecária, bem como o prêmio mensal dos seguros obrigatórios estipulados pelo Banco Nacional da Habitação”. Lê-se no art. 13: “A cédula hipotecária só poderá ser lançada à circulação depois de averbada à margem da inscrição da hipoteca a que disser respeito, no Registro-Geral de Imóveis, observando-se para essa averbação o disposto na legislação e regulamentação dos serviços concernentes aos registros públicos, no que couber”. E no parágrafo único: “Cada cédula hipotecária averbada será autenticada pelo Oficial do Registro-Geral de Imóveis competente, com indicação de seu número, série e data, bem como do livro, folhas e a data da inscrição da hipoteca a que corresponder a emissão e à margem da qual for averbada”. Quanto à execução, arts. 2941. (f) O Decreto-lei n. 167, de 14 de fevereiro de 1967, concerne aos títulos de crédito rural. Está no art. 41: “Cabe ação executiva para a cobrança de cédula de crédito rural”. No § 1.0: “Penhorados os bens constitutivos de garantia real, assistirá ao credor o direito de promover, a qualquer tempo, contestada ou não a ação, a venda daqueles bens, observado o disposto nos arts. 704 e 705 do Código de Processo Civil” a que correspondem, hoje, os arts. 1.113-1.119 do Código de 1973, e não mais se há de pensar em contestação, pois há os embargos do devedor “podendo ainda levantar desde logo, mediante caução idônea, o produto liquido da venda, à conta e no limite de seu crédito, prosseguindo-se na ação”. No § 2.0: “Decidida a ação por sentença passada em julgado, o credor restituirá a quantia ou o excesso levantado, conforme seja a ação julgada improcedente, total ou parcialmente, sem prejuízo doutras cominações da, lei processual”. A partir da vigência do Código de 1973, havemos de entender que a sentença de que se trata é a sentença proferida nos embargos do devedor e os arts. 1.113-1.119 é que têm de ser observados. No § 3.0: “Da caução a que se refere o § 1.0 dispensam-se as cooperativas rurais e as instituições financeiras públicas (art. 22 da Lei n. 4.595, de 31 de dezembro de 1964),inclusive o Banco do Brasil S. A.” No art. 71: “Em caso de cobrança em processo contencioso ou não judicial ou administrativo, o emitente da cédula de crédito rural, da nota promissória rural, ou o aceitante da duplicata rural responderá ainda pela multa de dez por cento sobre o principal e acessórios em débito, devida a partir do primeiro despacho da autoridade competente na petição de cobrança ou de habilitação do crédito”. A conseqúência mais profunda da incorporação do crédito no titulo, ou de qualquer direito real de garantia no título, se a lei atribui a esse título a circulabilidade, está em que cessa, a respeito do crédito ou do direito, o que se exigiria para a sua transferência. Quem adquire crédito, por transferência, tem de adquiri-lo segundo as regras jurídicas concernentes à cessão de créditos. Quem adquire direito, por transferência, há de o adquirir conforme o que se estabelece para a cessão de direitos. Por isso mesmo, está exposto às exceções que o direito material comum estabelece (Código Civil de 1916, arts. 1.069 e 1.072) e à compensação contra o cedente de que fala o art. 1.021, 2Y~ parte, do Código Civil, se o devedor não foi notificado. O que se transmite, se houve incorporação do direito no título, é a propriedade do título, razão por que também pode ser empenhado. Há, no crédito, relação jurídica entre credor e devedor, determinadas pessoas; na propriedade do título, o sujeito passivo é total, de jeito que, incorporando-se nele o crédito, se apaga a relação jurídica entre determinadas pessoas, para se fazer mais

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relevante a relação jurídica com sujeito passivo total. Torna-se possível, assim, a circulabiidade. A evolução jurídica caracterizou-se pela passagem do regime da Incedibilidade dos créditos para o da cessão por meio de representação in rem propriam, iniciaimente só processual, e do negócio jurídico a favor de terceiro, e desse para o da cessão de crédito tal como hoje se tem. A incorporação do crédito nos títulos circuláveis veio permitir que os créditos, embutidos nos títulos, facilmente circulem. (g) O Decreto-lei n. 413, de 9 de janeiro de 1969, trata dos títulos de crédito industrial, isto é, de cédula de crédito industrial, em caso de financiamento concedido por instituições financeiras a pessoa física ou jurídica que se dedique à atividade industrial (art. 1.0), em conta vinculada à operação. Lê-se no art. 11: “Importa em vencimento antecipade da dívida resultante da cédula, independentemente de aviso ou de interpelação judicial, a inadimplência de qualquer obrigação do emitente do título ou, sendo o caso, do terceiro prestante da garantia real”. No § 1.0: “Verificado o inadimplemento, poderá, ainda, o financiador considerar vencidos antecipadamente todos os financiamentos concedidos ao emitente e dos quais seja credor”. Além disso, conforme o § 2.0, a inadimplência “facultará ao financiador a capitalização dos juros e da comissão de fiscalização, ainda que se trate de crédito fixo”. A diferença da cédula de crédito industrial, que é “promessa de pagamento em dinheiro, com garantia real, cedularmente constituída (art. 9.0), a nota de crédito industrial é “promessa de pagamento em dinheiro, sem garantia real” (art. 15). A nota de crédito industrial tem privilégio especial (art. 17) sobre os bens apontados no Código Civil, art. 1.563. Independetemente da inscrição no Cartório de Registro de Imóveis (Decreto-lei n. 413, art. 30), o processo judicial para a cobrança da cédula de crédito industrial rege-se pelo art. 41, 1.0, que já fazia de vinte e quatro horas o prazo para pagar a dívida, o que coincide com o que se estatui no art. 652 do Código de 1973. No art. 41, 2.0, distingue-se da constrição doa bens constitutivos da garantia, em se tratando de cédula de crédito industrial, a constrição dos bens que o art. 1.563 do Código Civil enumera, se o título é nota de crédito industrial. O art. 41, 3~0, já remetia aos textos do Código de 1939, a que hoje correspondem os dos arts. 659-676 do Código de 1973. (No art. 41, 2.0, fala-se de sequestro . Erradamente. A cultura jurídica de um povo é algo que se há de proteger contra a influência de sistemas jurídicos inferiores. De certo tempo para cá, leituras estrangeiras estão a perturbar, lamentalveimente, a terminologia jurídica brasileira, tesouro que se haveria de guardar e defender. O sequestro supõe litigiosidade. ~ medida constritiva cautelar. Outra coisa é a medida constritiva executiva, que é inicio de execução, e não somente cautela. Os legisladores têm de empregar os termos jurídicos que o nível da civilização fixou. Não podem fazer tábua rasa da cultura e da ciência. N~ podem chamar ferro ao ouro; nem sequestro à penhora; nem ilha à península. O doutrinador pode ter de explicar a diferença entre o sequestro e o depósito cautelar, trazendo à tona discussões de outrora, que já se desanuviaram. Não pode perder tempo com os que confundem com a penhora o sequestro. Tais erros são imperdoáveis.) (h) A Lei n. 5.741, de 10 de dezembro de 1971, é sobre a proteção do financiamento de bens imóveis vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação. Está no art. 1.0: “Para a cobrança de crédito hipotecário vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação criado pela Lei n. 4.380, de 21 de agosto de 1964, é lícito ao credor promover a execução de que tratam os arts. 31 e 32 do Decreto-lei n. 70, de 21 de novembro de 1966, ou ajuizar a ação executiva na forma da presente lei”. Inicia-se o processo com a petição escrita, com os requisitos, hoje, do art. 282 do Código de 1973, que sobreveio ao art. 158 do Código de 1939, “em três vias”, servindo a segunda e a terceira de mandado e contrafé, e sendo a primeira com:lugar ao vencimento do contrato; III o saldo devedor~~ discriminadas as parcelas relativas à principal, juros, multa e outros encargos contratuais, fiscais e honorários advocaticios; IV cópia de avisos regulamentares reclamando o pagamento da dívida, expedidos segundo instruções do Banco Nacional de Habitação” (art. 2.0). Lê-se no art. 3.0: “O devedor será citado para pagar o valor do crédito reclamado ou depositá-lo em juízo no prazo de vinte e quatro horas, sob pena de lhe ser penhorado o imóvel hipotecado”. Não há diferença com o que se passa no Código de 1973, porque o prazo é de vinte e quatro horas. No art. 3~o, § 1.~, cogita-se da citação do réu ou do seu representante legal, e acrescenta: “Mas a do marido dispensa a da mulher, quando aquele for o devedor”. Entenda-se: quando só ele for o devedor. No art. 3~0, § 2.~: “Se o executado e seu cônjuge se acharem fora da jurisdição da situação do imóvel, a citação far-se-á por meio do edital, pelo prazo de dez dias, publicado, uma vez, no órgão oficial do Estado e, pelo menos, duas vezes, em jornal local de grande circulação, onde houver”. Há a penhora, se não foi pago o que era devido, ou não for feito o depósito, há a penhora. Dela cuidam o art. 4•0 e seus parágrafos. O prazo para os embargos do devedor é de dez dias (art. 5.0). Tal como ocorre no Código de 1973, art. 738. No art. 10, explicita-se que “a ação executiva, fundada em outra causa que rio a falta de pagamento pelo executado das prestações vencidas, será processada na forma do Código de Processo Civil, que se aplicará, subsidiariamente, à ação executiva de que trata esta lei”. Cf. Código de 1973, arts. 566-747. (i) Chamam-se armazéns-gerais os estabelecimentos que recebem em depósito mercadorias, qualquer que seja o intuito dos depositantes (vendê-las, exportá-las, reexportá-las, importá-las, guardá-las, ou pó-las em trânsito), e o destino principal deles é a intensificação da mobilidade das mercadorias: o reduzir coisas a títulos negociáveis. O escopo é conseguido pela emissão de dois títulos que se entregam ao depotante ao mesmo tempo, e separáveis à

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vontade (cf. a respeito, em 1921 o nosso Dos Títulos ao Portador): um é o recibo especial, passado pelo armazém para efeitos entre o depositante e terceiros, o título de domínio, com os efeitos erga om.nes da propriedade ou da posse, e com ele o depositante, o endossado, ou o portador (nos endossos em branco) vende as mercadorias, nele se lança o endosso, ou, endossado, antes, em branco, se entrega a outrem, chama-se conhecimento de depósito; o outro, em vez de título de disposição, apenas o é de empenhabilidade, com direito real de penhor até a concorrência do valor que as mercadorias têm, conforme assenta o primeiro endosso, que é o elemento determinante do conteúdo jurídico do segundo título, chamado warrant, e por ele se tira do laço pignoratício o efeito de circulação de valor pelo endosso, ou pela tradição (endosso em branco). Juntos, os dois títulos transferem, livre e desembaraçada-mente, a propriedade de mercadoria; separados, o conhecimento de depósito só transfere a propriedade das coisas, gravadas de penhor, e o warrant só o direito real de penhor. Emitidos o conhecimento de depósito e o warrant, as mercadorias não mais podem ser objeto de arresto, sequestro ou penhora, ou qualquer outro embaraço que lhes prejudique a livre circulação ficta. Mas podem ser penhorados ou seqúestrados por dívidas do portador o conhecimento de depósito e o warrant (desde a Lei n. 1.102, de 21 de novembro de 1903, art. 17), ou qualquer deles. As mercadorias como que morrem, para que, em vez delas e por elas, vivam os títulos. Ambos são títulos que têm de ser apresentados, à semelhança dos títulos cambiários. O crédito nasce então. Antes, a cadeia de fatos só se explica como declaração unilateral de vontade, segundo as longas exposições que fizemos em Da Promessa de Recompensa, Dos Títulos ao Portador e Tratado de Direito Cambiário (depois, no Tratado de Direito Privado, Tomos XXXI-XXXVII). É esse crédito, exigivel, após o pro testo, cambiariforme. A lei processual dá-lhe a pretensão de execução. Cognição parcial. Ao portador do warrant cabe o uso do procedimento executivo: a) contra o primeiro endossante do warrant e contra o primeiro endossante do conhecimento de depósito; b) contra os endossatários anteriores, solidariamente, para haver o principal e os juros. Tem de apresentar o warrant ao primeiro endossante e ao armazém-geral, se consignado aí o produto da venda ou qualquer substituto objetivo. O depósito em consignação, se completo, é liberatório. No caso de falta de pagamento, cabe fazer o protesto. Tem-se criticado a lei por conferir ao portador do conhecimento de depósito a ação executiva. Tudo isso resulta de não se haver atendido à natureza dos títulos circuláveis só explicáveis, representem mercadorias ou crédito, como títulos constitutivos de declaração unilateral de vontade. O “crédito”, ainda nos títulos cambiários, somente nasce à apresentação para pagamento (a respeito, nossos livros Dos Títulos ao Portador, 1, 42-268; Tratado de Direito Cambi ci rio, 1, 8 s). A conferência de executividade aos conhecimentos não écontra os princípios, uma vez que, apresentado o conhecimento, o portador não recebe a mercadoria, nem o preço, deduzido o pagamento do penhor. Todas as ações, que tinha, antes, o portador do conhecimento de depósito, têm, agora, processo executivo; e não se diga que não no tinham. (j) As duplicatas mercantis e às trLplicatas mercantis aplica-se o que se estatui a respeito das letras de câmbio, portanto, hoje, o art. 585, 1, do Código de 1973 (Lei n. 5.474, de 18 de julho de 1968, art. 25). Lê-se na Lei n. 5.474, art. 15: Será processada pela forma executiva a ação do credor por duplicata ou triplicata, aceita pelo devedor, protestada ou não, e por duplicata ou triplicata não aceita e protestada desde que esteja acompanhada de qualquer documento comprobatório da remessa ou da entrega da mercadoria” (Decreto n. 436, de 27 de janeiro de 1969). Há os § § 1.o~13: § 1.0: “Distribuída a petição inicial, apresentada em três vias, determinará o Juiz, em cada uma delas, independentemente da expedição do mandado, a citação do réu, que se fará mediante a entrega da terceira via, e o reconhecimento do correspondente recibo do executado na segunda via, que integrará os autos”. § 2.0: “Havendo mais de um executado, o autor entregará, com a inicial, mais uma via por executado, para fins da citação de que trata o parágrafo anterior”. § 3i~: “Não sendo paga a dívida no prazo de vinte e quatro horas, proceder-se-á à penhora dos bens do réu”. § 4f’: “Feita a penhora, o réu terá o prazo de cinco dias para contestar a ação”. § 5.0: “Não contestada a ação, os autos serão, no dia imediato, conclusos ao Juiz, que proferirá sentença no prazo de quarenta e oito horas”. § 6.0: “Contestada a ação, o Juiz procederá a uma instrução sumária, facultando às partes a produção de provas dentro de um tríduo e decidirá, em seguida, de acordo com o seu livre convencimento, sem eximir-se do dever de motivar a decisão, indicando as provas e as razões em que se fundar”. § 7.0~ “O Juiz terá o prazo de vinte e quatro horas para proferir os despachos de expedientes e as decisões interlocutórias e o de dez dias para as decisões terminativas ou definitivas”. § 8.0: “O recurso cabível da sentença proferída em ação executiva será o de agravo de instrumento, sem efeito suspensivo”. § 9.o: “A sentença que condenar o executado determinará, de plano, a execução da penhora, nos próprios autos, independentemente da citação do réu”. § 10: “Os bens penhorados de valor conhecido serão leiloados no prazo de dez dias, a contar da data da sentença, e os não conhecidos sofrerão avaliação, no prazo de cinco dias”. § 11: “Da quantia apurada no leilão, pagar- -se-á ao credor o valor da condenação e demais cominações legais, lavrando o escrivão o competente termo homologado pelo Juiz”. § 12: “A ação do portador contra o sacador, os endossantes e respectivos avalistas obedecerá sempre o rito executivo, quaisquer que sejam a forma e as condições do

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protesto”. § 13: “Será também processada, pela forma executiva, a ação do credor, por duplicata ou triplicata não aceita e não devolvida, desde que o protesto seja tirado mediante indicações do credor ou do apresentante do título, acompanhado de qualquer documento comprobatório da remessa ou da entrega da mercadoria, observados os requisitos enumerados no art. 14”. (1) Corretores são os que exercem na praça a atividade de mediação em operações, com caráter acessório, na atividade negocial de duas ou mais pessoas. São, na função, por vezes, serventuários públicos. A lei desinteressa ser livre ou oficial o corretor ou leiloeiro, de ser oficial ou ad hoc o porteiro. Se é do corretor, ainda ad hoc, que se trata, a comissão pela venda judicial é a das leis, se há. Ao porteiro ad hoc aplica-se o que se teria aplicado ao oficial. Quanto aos corretores e leiloeiros, ou o regimento cogita das percentagens ou lei especial o fez, ou se há de admitir, permitindo-o a capacidade das partes, a verificação convencional. Incluem-se as despesas e comissões, referentes a leiloeiros e porteiros; e as comissões de corretagem, referentes a corretores. Desde que o corretor ou leiloeiro livre tenha operado como auxiliar do procedimento, cabe-lhe a ação executiva, porque serviu à Justiça. Quer dizer: se na autorização judicial foi referida a intervenção do corretor livre, ou do leiloeiro livre, ou se foi aprovada pelo juiz a autorização. A petição do corretor público deve ser instruída “com as faturas ou minutas das negociações ou certidões” extraídas dos seus livros (Reg. n. 737, art. 309, § 3~0, aplicável não como lei de processo, mas por ser lei de direito material comercial, no que se refere à prova de negócios jurídicos comerciais, e em virtude dos arts. 282, VI, e 283 do Código de 1973). Os leiloeiros somente têm a ação executiva do art. 585, V, se funcionaram em venda judicial ou em ato judicial semelhante. Casos, todos, de cognição superficial. O assunto apanha a venda judicial ou qualquer negócio jurídico processual, como a arrematação, ou se o juiz ordenou o arrendamento de bens de incapazes por leilão público, ou em praça de juízo. Quando o leiloeiro público, ou corretor público, funciona em tais atos, tem fé, qual oficial público, como os porteiros; não ocorre o mesmo aos corretores livres, incumbidos do ato pelo juiz. Em todo caso, é imprudente fundar-se essa conclusão em Código de Processo Civil revogado, ou no Decreto n. 858, de 10 de novembro de 1851, art. 18, alínea 2v-. A regra jurídica, hoje, somente pode resulta.r da combinação “publicidade mais função auxiliar do juízo”, aliás, do fato de serem serventuários quase serventuários. Lê-se na Lei n. 4.021, de 20 de dezembro de 1961, sobre profissão de leiloeiro rural, art. 10, parágrafo único: “A não se realizar o pagamento no prazo estipulado, o leiloeiro ou o proprietário do estabelecimento ou dos animais terá opção para rescindir a venda, perdendo o arrematante o sinal dado, ou para demandá-lo, pelo preço com os juros de mora, por ação executiva, instruída com certidão do leiloeiro em que se declare não ter sido completado o preço da arrematação no prazo marcado no ato do leilão”. (m) A tendência à oficialização de todos os que têm função nos negócios jurídicos processuais exclulu das funções dos leiloeiros “as vendas imóveis nas arrematações por execução de sentença ou hipotecárias; das massas falidas ou liquidandas, quando gravadas de hipoteca; dos bens pertencentes a menores sob tutela e de interditos e dos que estejam gravados por disposições testamentárias” (Decreto n. 21.981, de 19 de outubro de 1932, art. 19; Decreto n. 22.427, de 1.0 de fevereiro de 1933). O Código de 1939 derrogou a regra jurídica no tocante às arrematações por execução de sentença. Não distinguiu entre bens móveis e bem imóveis (certo, Luis MACHADO GUIMARÂE5, Comentários, IV, 52, contra,DE PLÁcIDo E SILVA, Comentários, II, 988). Sempre que o ato é processual, é necessária a aprovação judicial. O leiloeiro e o porteiro cobram, por ação executiva, comissão e despesas com o desempenho das suas funções, incluindo-se, está claro na lei (art. 293), os juros legais. Para se chegar a essa conclusão, não se precisa invocar o Decreto n. 21.981, art. 22, >9. (n) Temos de referir a condutores e comissários a frete. As espécies nada têm com a judicialidade de atos, ao contrário das espécies do art. 585, V. O que importa é a legitimação subjetiva. Atualizados os conceitos de condutor e comissário de frete, neles cabem, respectivamente, todas as pessoas que exerçam a profissão de transportar, ou de receber de alguma pessoa (comitente) bens, para os remeter a outrem, ou a outro lugar (Código Comercial, arts. 99, 118, 165, 170 e 566). Quaisquer que sejam os transportes, desde as mulas dos tropeiros e as barcaças até o transatlântico, o transmulticontinental, e o avião ou o submarino. São documentos com que se instrui a petição, a cautela e o recibo dos bens transportados, ou a carta de fretamento ou conhecimento de frete e recibo de descarga e entrega (Reg. n. 737, art. 309, § § 1.0 e 2.0, regras de direito material comercial). A cautela é o documento que o carregador e o condutor devem exigir-se mutuamente (Código Comercial, art. 100). A carta de fretamento, ou carta de partida, é o instrumento de contrato de fretamento (Código Comercial, art. 567, inciso 6). Conhecimento é o instrumento do contrato feito à carga, colheita ou prancha (Código Comercial, arts. 566 e 575, inciso 4). Presentemente, cf. Decreto n. 19.473, de 10 de dezembro de 1930, que regulou os conhecimentos de transporte de mercadorias por terra e ar, o Decreto n. 19.754, de 19 de março de 1931, e o Decreto-lei n. 483, de 8 de junho de 1938 (Código Brasileiro do Ar), arts. 74 s., que modificaram o Decreto n. 19.473. O Decreto n. 19.473, art. 2.0, VII, deu o direito de retenção da mercadoria aos transportadores. A pretensão, de

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que se trata, é de direito material, e não de direito processual. A do art. 585, VII, de direito pré-processual, razão por que está revogado o art. 318, § 1.0, do Reg. n. 737: quaisquer bens do devedor podem, hoje, ser penhorados. (o)No art. 621 do Código de 1973 supõe-se a condenação à entrega de coisa certa; portanto, somente se cogitou do título executivo sentencial (art. 584). Aqui, no art. 585, VII, fala-se de títulos a que, “por disposição expressa, a lei atribuir força executiva”. Se a lei atribui o direito de propriedade, ou o direito de propriedade e o de posse, a A, e o bem está com B, tem A a ação de reivindicação, ou a ação de vindicação da posse, ou a de imissão de posse. Todas as três são executivas. O titulo é extrajudicial, porque é título registrado que atribui a propriedade, ou a propriedade e a posse. A todo direito corresponde uma ação que o assegura (Código Civil, art. 75). A ação de reivindicação é ação executiva, a que basta o título a que se confere a eficácia da aquisição da propriedade. A respeito da posse, dá-se o mesmo com a ação de vindicação da posse. Executiva é a ação de imissão de posse, que daquelas se diferença, como se diferença das ações possessórias. Porém a classificação quinária das ações é classificação no plano do direito material. A executividade de que se fala no Livro II é apenas no plano do direito processual: só se refere ao processo de execução. Há ações executivas que são de processo de cognição, o que antes já expressamos. (p) Quanto a títulos a que a lei não o Código de 1973 atribui força executiva (5 de executividade), um dos exemplos é a contribuição sindical (Consolidação das Leis do Trabalho, de maio de 1943, arts. 578 e 606). No art. 606 diz-se que “às sociedades sindicais cabe, em caso de falta de pagamento da contribuição sindical, promover a respectiva cobrança judicial, mediante ação executiva, valendo como titulo de divida a certidão expedida pelas autoridades regionais do Ministério do Trabalho e Previdência Social”. A redação foi a que deu ao art. 606 o Decreto-lei n. 926, de 10 de outubro de 1969. Trata-se de atribuição de eficácia executiva ao título extrajudicial. 29) AçÂo DE INVALIDADE. O art. 585, § 1.0, estatui que “a propositura de ação anulatória de débito fiscal não inibe a Fazenda Pública de promover-lhe a cobrança”. Aliás, nenhuma propositura de ação de nulidade ou de anulação de ato jurídico, unilateral ou bilateral, ou mesmo plurilateral, impede que legitimado ativo para a execução de título extra-judicial proponha a ação executiva por já ter o devedor proposto a ação de nulidade, ou de anulação, ou, até, a de declaração. Tudo isso é matéria para os embargos do devedor, sem prejuízo de continuação de ação antes proposta. (Aliás, no texto, o nome “ação anulatória” foi infeliz, porque sempre convém que se não confundam a ação de nulidade e a de anulação, mesmo quando se emprega “anulatório” em sentido amplo, o que se há de evitar. Melhor é falar-se de ação de invalidade.) O art. 585, § 1.0, concerne, como dissemos, às ações de invalidade. Mas temos de advertir que, a fortiori, de modo nenhum a ação declaratória negativa inibe a Fazenda Pública de promover a ação de cobrança, mesmo executiva, de dívida fiscal. Aliás, é de repelir-se o que anda por aí quando se chamam as ações de invalidade (anulação e decretação de nulidade), ou só as de nulidade, ações declararativas negativas. Invalidade decreta-se, não se declara: o que é declarável é o que existe, ou não existe; o que é inválido existe. Quanto à inserção do art. 585, § 1.0, é de observar-se que se quis apenas explicitar, pois de modo nenhum a propositura da ação de invalidade produz litispendência (cf. art. 301, § 3.0). A causa petendi é outra. Nem é o mesmo o objeto do pedido. Dissemos que somente ocorre explicitação, porque o que no art. 585, § 1.~, se estatui corresponde a tudo mais que possa acontecer com a ação de invalidade ou de declaração de inexistência da relação jurídica de direito material. 30)TÍTULOS EXECUTIVOS EXTRAJUDIcIAIs ORIUNDOS Do ESTRANGEIRO. Por títulos oriundos do estrangeiro havemos de entender titulo assinado e datado no estrangeiro. Se foi assinado no estrangeiro, com a indicação do lugar como tendo sido no Brasil, é título oriundo do Brasil, o que pode dar ensejo, nos embargos do devedor, a qualquer alegação que possa afastar a veracidade da assinatura, ou da divida, sem que a circunstância baste. O título oriundo do estrangeiro, uma vez que extrajudicial, não é sentença; portanto, não depende de homologação. Se, porém, o título foi assinado e emitido por imposição da sentença estrangeira, pode o devedor alegar nos embargos que a sentença não poderia ser homologada no Brasil e em conseqtiência dela foi que assinou e emitiu o título extrajudicial. Tem-se, aí, de verificar se havia razão para tal defesa, bem como o juiz pode julgar que primeiro se homologue a sentença. Já a Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei n. 4.657, de 4 de setembro de 1942), no art. 9•o, disse: “Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do pais em que constituírem”. No § 1.0: “Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato”. E no § 2.0: “A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente”. A expressão “residir” não foi feliz, porque o contrato pode ser oriundo de proposta feita no lugar em que se acha o proponente, sem ser o do seu domicílio, nem da sua residência. O Código de 1973, art. 585, § 2Y, cogitou dos títulos extrajudiciais, se oriundos de país estrangeiro. Tais títulos,

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para terem eficácia executiva, hão de “satisfazer os requisitos de formação exigidos pela lei do lugar da sua celebração e indicar o Brasil como lugar de cumprimento da obrigação”. Não há homologação pelo Supremo Tribunal Federal, porque não se trata de título executivo judicial (cf. art. 584, IV). A lei do lugar da celebração, lex loci, pode ser insuficiente se, na espécie, o direito brasileiro exige ato ou forma especial (e. g., a escritura pública para a compra-e-venda de imóvel, Código Civil, art. 134, II). Se a obrigação não pode ser executada no Brasil, o título extrajudicial não basta. No art. 585, § 2.0, estatui-se que o título extrajudicial, oriundo de país estrangeiro, há de satisfazer os requisitos de formação exigidos pela lei do lugar de sua celebração e “indicar o Brasil como o lugar de cumprimento da obrigação”. No art. 13 da Lei de Introdução ao Código Civil está dito: “A prova dos fatos ocorridos em pais estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar quanto ao ônus e aos meios de produzir-se, não admitindo os tribunais brasileiros provas que a lei brasileira desconheça”. Basta que o Brasil seja o lugar de cumprimento da obrigação, ou um dos lugares; então, não é preciso que no titulo se indique, explicitamente, “o Brasil como lugar de cumprimento da obrigação”. Pode acontecer que nenhum dos figurantes seja domiciliado ou residente no Brasil (cf. art. 88, II). Se uma das partes, ou algumas, ou todas as partes, são domiciliadas no Brasil, regem os arts. 94-101. Se redigido em língua estrangeira o título, tem de haver a tradução em língua portuguesa (arts. 156 e 157). Se o título extrajudicial não é tido, na lei estrangeira que o rege, como título executivo, isso obsta a que o seja no Brasil, mesmo se a lei brasileira o faz tal. Seria ir-se contra a letra do art. 585, § 2.0, 1.a parte: “os títulos executivos extrajudiciais, oriundos de país estrangeiro”. Fala-se de títulos executivos “extrajudiciais”, e não de títulos estrangeiros, quaisquer que sejam. Não se vá ao excesso de se dizer, por exemplo, que qualquer titulo estrangeiro, “documento particular, assinado pelo devedor e subscrito por duas testemunhas”, a que a lei estrangeira não confere executividade, seja título executivo extrajudicial no Brasil. Se o título extrajudicial estaria na classe do art. 585, VI, se titulo brasileiro fosse, porém não no é, o art. 585, VI, não é invocável, porque aí só se cogita de divida à Fazenda Pública da União, do Estado-membro, do Distrito Federal, de Território ou de Município, e não de entidades estrangeiras. O que pode acontecer é que tal titulo estrangeiro caiba, por exemplo, no art. 585, II, e seja executivo conforme a legislação estrangeira e a do Brasil. 31)AçõEs EXECUTIvAs DE QUE NÃO FALAM 05 ARTS. 584 E 585. Nem todas as ações executivas cabem no art. 584, que supõe eficácia sentencial, nem no art. 585, que menciona as espécies de títulos extrajudiciais que criam a ação executiva. Árt. 586. A execução para cobrança de crédito 2) 6), fundar-se-á sempre em titulo liquido, certo 1) e exigível. § 1.0. Quando o título executivo for sentença3), que contenha condenação genérica 7), proceder-se-á primeiro à sua liquidação. § 2.0. Quando na sentença há uma parte líquida 5) e outra ilíquida8) 10), ao credor élícito promover simultaneamente 9) a execução daquela e a liquidação desta4). 1)CERTEZA E LIQUIDEZ. A certeza e a liquidez do título são exigidas aos credores que pretendem inserir-se na relação jurídica processual, como exequentes. A execução para cobrança de crédito tem-se de fundar em título certo, líquido e exigível (art. 586). Se o título é judicial (sentença), mas a condenação é genérica, primeiro se procede à liquidação (art. 586, § 1.0). Se uma parte é líquida e outra iliquida, podem ser simultâneas a execução daquela e a liquidação dessa (art. 586, § 2.0). Há liquidação da sentença se ela não determinou o valor ou não individuou o objeto da condenação (art. 603). Há a liquidação por meio de cálculo feito pelo contador (art. 604), por arbitramento (arts. 605-607) por artigos (arts. 608 e 609). No art. 611 diz-se que, julgada a liquidação, a parte promoverá a execução, citando processuaimente o devedor (art. 611). Certeza do crédito é ausência de dúvida quanto à sua existência, tal como está no título executivo extrajudicial, posto que, nos embargos do devedor possa esse alegar causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, se superveniente à sentença (art. 741, VI). A incerteza não existia. Para ser certo o crédito é preciso: que o sistema juridico que incide, espacial e intertemporalmente, tenha como criável tal crédito; que tal crédito possa ter o objeto que se diz ter (coisa certa, coisa incerta, ato ou abstenção do devedor); que, no caso, se se diz que há escolha, ou pelo devedor, ou pelo credor, que tal declaração de vontade possa ser estipulada; se há termo ou condição que o sistema jurídico o admita; que possa haver, no caso ou na espécie, alternatividade; que, se houve transferência, seja de acordo com o sistema jurídico. Se se sabe que o objeto da dívida é coisa certa, ou incerta, dizer-se que não cabe falar-se de crédito é absurdo: há crédito de coisa certa, de coisa incerta, ou de quantia determinada ou ainda por se determinar. É insistir-se num absurdo dizer-se que os direitos de crédito têm, necessariamente, por conteúdo coisas fungíveis. Há créditos de coisas infungíveis. Se não se sabe qual o quanto devido, tem-se de liquidar a sentença (e. g., foi condenado alguém

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a prestar a propriedade da casa a e b ou da casa a, b e e, desde que o vuior total delas, na data da sentença, seja x. Se se sabe qual o quantum clebeatur, há liquidez. Pode dar-se que, no momento,não se conheça o montante, como se o crédito é de x mais os juros e a correção monetária. Trata-se de determinação puramente aritmética. A liquidez é pressuposto essencial para a execução de título extrajudicial (art. 586); para a sentença, não: se nela há algo de ilíquido, ou só há ilíquido, tem-se de propor, antes, a ação de liquidação. As medidas que se tomam quando há alternatividade da obrigação, ou execução de sentença criminal, ou escolha, têm por finalidade saber-se realmente o que se deve. Se a prestação ou as prestações que o devedor tem de pagar hão de ser no futuro (prazo, condição), pode o crédito ser certo e liquido e, ai, apenas a exigibilidade ainda não começou. Há a pretensão à execução futura e não a ação. A propósito dos concursos de credores, a omissão do Código de 1973 é lamentável. Apenas, a respeito da entrega do dinheiro, se diz no art. 711: “Correndo vários credores, o dinheiro ser-lhes-á distribuído e entregue consoante a ordem das respectivas prelações; não havendo título legal à preferência, receberá em primeiro lugar o credor que promoveu a execução, cabendo aos demais concorrentes direito sobre a importância restante, observada a anterioridade de cada penhora”. No art. 712: “Os credores formularão as duas pretensões, requerendo as provas que irão produzir em audiência; mas a disputa entre eles versará unicamente sobre o direito de preferência e a anterioridade da penhora”. No art. 713: “Findo o debate, o juiz proferirá a sentença”. Advirta-se, porém, que esses arts. 711-713 estão no Título II, Capítulo IV (Da execução por quantia certa contra devedor solvente), de modo que as medidas sobre entrega de dinheiro, na execução por quantia certa contra devedor insolvente, é assunto do Título IV, e a doutrina é que há de resolver o problema. Se o credor por quantia certa (liquida, entenda-se) pede a declaração da insolvência, tem de pôr na petição a relação nominal de todos os credores, com a indicação do domicílio de cada um, bem como da importância e da natureza dos respectivos créditos (art. 760, 1). As Ordenações Filipinas, Livro III, Título 66, § 2, exigiam à sentença ser “certa” (cf. art. 461) e acrescentavam que, sendo incerta, não valeria, “salvo se pudesse ser certificada pelos autos do processo”, ou se “se pudesse liquidar na execução” (confusão entre incerteza e iliquidez). Lendo essa passagem, MANUEL GONÇALvES DA SILVA (Commentaria, II, 306 e 307) deu algumas regras quanto à limitação ao Nulia est sententia lata super re incerta, porém entre elas estavam as que concerniam à liquidabilidade. O primeiro principio do art. 891 do Código de 1939 veio-nos do Assento de 24 de março de 1753, de onde tirou ANTÔNIO JOAQUIM RIBAs (Consolidação, art. 1.202). O Código de 1973 não pôs o texto de 1939, onde se diz, art. 891: “A sentença deverá ser executada fielmente, sem ampliação ou restrição do que nela estiver disposto. Compreender-se-á, todavia, como expresso o que virtualmente nela se contenha”. Rigorosamente, temos: a) há de haver fidelidade na execução da sentença; b) a interpretação ampUante é vedada; c) a interpretação restringente também o é; d) o que virtualmente nela se contém entende-se expresso. Na execução não se pode alegar que a sentença julgou ultra petita (1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 2 de junho de 1949, R. F., 126, 450), ou citra petita, porque seria querer-se, sem ação própria, rescindir a sentença. Nem que houve erro quanto a ter-se condenado o réu a pagamento de custas integrais (2.a Turma, 19 de outubro de 1949, 129, 442). Nem se incluem honorários de advogado, de que não cogitou a sentença (1Y. Turma, 31 de outubro de 1949, 129, 142; ~ Câmara Cível do ~i ribunal de Justiça do Distrito Federal, 27 de novembro de 1951, D. da J. de 27 de novembro de 1952). (a) A regra jurídica de interpretação fiel não é mais do que a de se entender o escrito segundo o seu teor, sem malícia do intérprete, e como resolução que tem em si mesma os seus limites. O Assento de 24 de março de 1753 frisava: “sem alterar ou reformar a primeira sentença”. Essa regra, porém, não autoriza a que se sacrifique à literalidade a relação entre sentença e os pedidos. Sententiae dubiae interpretatio sumitur ex actis et probationibiis et processu; cum praesumatur lata ex cause, quae ex actis apparet et in eis fuerit adducta. (b) A interpretação, que ampliasse, faria julgado o que o não fora. Cedo, foi denunciado o erro por MANUEL BARBOSA, MANUEL TEMUDO DA FONSECA e MANUEL ALVARES PíGAS. (c) A sentença há de ser interpretada estritamente (MANUEL DE ALMEIDA E SousA, Segundas Linhas, 1, 716-719); porém não de modo que algo se lhe corte no que dispõe. O juízo da execução nenhuma injustiça tem a reparar; posto que, na dúvida quanto a duas inteligências, lhe caiba adotar a que é justa. Sententia debet interpretari ut non contineat iniustitiam. Tem-se como explícito o que está implícito. A função precipua do juízo da execução é essa explicitação da sentença exeqúenda, função que se não confunde com a do juiz dos embargos de declaração (arts. 463, II, 464, 465, 496, IV, 535-538 do Código de 1973), embora se aproxime dela. Mais se vê a sentença na sua eficácia executiva. O Assento de 1753, depois de falar de se executar “sem alterar, nem roformar”, acrescentava “nem interpretar (!) a primeira sentença”, o que era. demasiado vedar. O juízo da execução interpreta. Nem poderia deixar de interpretar. Nas execuções, devem-se distinguir a ação de execução (sentença ou acórdão) ou de título extrajudicial e os

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processos acessórios, incidentes, que ocorrem na execução e por causa dela. A explicitação da sentença concerne à verificação do título executivo, da sentença, base do processo de execução, sujeita aos seus próprios limites e efeitos. Antes de tudo, importa saber-se contra quem tem força material de coisa julgada a sentença; depois, a quem condenou e contra quem tem força condenatória; depois, contra quem tem o efeito executivo. Porque a sentença, em si, tem força material de coisa julgada; a executividade é efeito dela como título. Se assim não fosse, se tivesse força, em vez de efeito executivo, seria ela sentença executiva, e não sentença de condenação. Há, ex hypothesi, sentença de cognição completa, que se vai executar. Tem, por certo, eficácia formal de coisa julgada. Precisa ter efeito executivo, porque, se (a) a executividade fosse intrínseca à sentença, a ação ou, pelo menos, a sentença, seria executiva, e não se poderia pensar em execução de novo; se (b) não o tivesse, não seria exeqúível. As sentenças, de que se trata, são, portanto, sentenças dotadas de efeito executivo: não têm força de execução; nem podem ser destituídas de efeito executivo, como as sentenças do art. 4~O• o mandado executivo e o ato de penhora são fatos e atos inconfundíveis, aquele indelegável, esse da competência normal dos oficiais de justiça, órgão executor. A impugnação ao mandado executivo e a impugnação àpenhora são subordinadas a princípios diferentes: (1) aquela ou concerne a) a alegações do devedor contra a admissão de qualquer medida executiva; b) ou contra a medida executiva in casu, ou c) quanto a defeito de forma do mandado; essa (2) cabe ou a) quando o credor tem consigo penhor ou objeto retido (direito de retenção) que basta para solver a dívida (art. 594), ou b), se penhorávei o uem, quando não foi observad~. a ordem dos bens da penhora (arts. 650 e 655’>, ou c) quando se tenha deixado de praticar ato necessário àexecução, ou d) quando se executar a sentença por quantia superior à de condenação, ou por coisa diferente daquela sobre que versar a ação de execução (art. 743, 1 e II). Entram na classe (1), a), as impugnativas da classificação da sentença como sentença de condenação, a impugna tiva à afirmação de corresponder à pretensão a executar a executabiidade do patrimônio do devedor (imunidade subjetiva, como a da Fazenda Pública), a impugnativa à pretensão a executar contra terceiro (efeito executivo só inter partes, etc.). Tais impugnativas são por parte do réu executado ou de terceiro. Não são, propriamente, embargos, posto que se processem como embargos do devedor. No último caso, são oposição de terceiro, e não embargos do devedor. Todos os outros casos são de embargos. Em classe (1), b), entram os motivos de impugnação fundados em pagamento, novação, compensação com execução aparelhada, concordata judicial, transação (não apreciados pela sentença ou apreciáveis nos embargos do devedor), ou prescrição superveniente à sentença. são matéria de embargos, porque a pretensão existiu ao tempo da sentença, que é o titulo, como existe se o título executivo é extra-judicial. Note-se a diferença em relação à classe (1), a). Alguns processualistas fundem a classe (1), a), e a classe (1), b), tendo-as a ambas como ações de impugnação da execução; mas o Código considerou de embargos a classe (1), b), tendo- -se de recorrer à explicação sucinta que demos acima. A execução é pedida ao Estado, contra o devedor. Contra o seu patrimônio. Se em seu poder se encontram bens de terceiro sobre o que se faz penhora, a penhora tem de ser levantada em virtude de oposição desse terceiro à execução. O direito teve de aceitar que essa penhora eventual dos bens de terceiros não fosse tratada como inválida, pleno iure; porque, se assim não se entendesse, o oficial encarregado de penhorar os bens teria de proceder a investigações minuciosas, difíceis, sobre a procedência dos bens e sobre a discriminação do que pertence aos devedores e do que não lhes pertence. A penhora prevalece, até que os embargos de terceiro sejam julgados e transite em julgado a sentença. A sentença é de mandamento (negativo da penhora), porque desfaz o mandado de penhora, não “executa” a proteção possessória ou do domínio (a despeito do mandado de manutenção a que se refere o art. 1.051). O Código não tratou dos embargos de terceiro nem da oposição, no Livro II, salva a alusão feita nos arts. 1.046 (“penhora”) e 1.048 (“no processo de execução”). Tratou da oposição, no Livro 1, e dos embargos de terceiro, no Livro IV (procedimentos especiais). São as demandas a que se dá, em terminologia científica, o nome de demandas de oposição, ou o de intervenção na ação ou na execução. Têm por fim os embargos de terceiro à execução a declaração da inadmissibilidade da medida executiva impugnada (elemento declarativo), porém seria erro considerar-se declarativa a ação (assim, WILHELM KIscH e outros), ou a sentença, pois que se dirige contra ato judicial, a penhora, e tem por fito prático o levantamento dessa. O elemento mandamental prepondera. O Código de 1973, como o de 1939, possui, em relação ao direito anterior, a extraordinária vantagem de se haver referido à posse, ao cogitar dos embargos de terceiro. N~ coube mais discussão. Por outro lado, os embargos de terceiro à execução protegem toda esfera jurídica do terceiro, e não só o seu domínio e posse, ou domínio, ou posse, e. g., o testamenteiro, o inventariante, o administrador. Mas o credor hipotecário (que não tem domínio, nem posse), o que tem direito de preferência sobre a coisa, relativamente ao credor executante, e outros têm todos a pretensão a exercer o seu direito, depois da arrematação, não precisam de embargos de terceiro. Então, o preço da avaliação não pode ser levantado e aplicam-se os princípios. A impugnação à execução ou intervenção na execução propriamente dita, com fundamento no art. 56, intenta excluir executante e executado, e firma-se na alegação de que a sentença de condenação não tem eficácia de coisa

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julgada material contra o opoente. Tal é a situação do terceiro, dono de coisa certa, que se opóe a execução de condenação à entrega de coisa certa, por faltar à coisa julgada eficácia material contra ele, situação bem diferente é a do dono da coisa simplesmente penhorada, penhora que se embarga. Ali, há oposição à ação de execução de sentença, o que antecede à penhora, razão por que tal oposição pode ser feita antes da execução do mandado. A sentença que então se profere não é de mandamento, é declaratória (ad instar do art. 4.0), e o levantamento da penhora, se foi feita, ou da entrega da coisa, ou do mandado de imissão, deriva apenas da responsabilidade do juiz inerente a toda execução, uma vez que lhe cabe verificar os limites da coisa julgada material. Esses pontos são extremamente importantes na prática e na teoria. Têm de ser atendidos, escrupulosamente. Quando o juiz tem de deferir o pedido de execução de sentença examina a espécie como o juiz da execução de títulos extrajudiciais examinaria o título executivo que não é sentença de condenação. Quanto à penhora, iá se supõe que o juiz sabe qual a cognição completa expressa na sentença, ou qual a eficácia do título extrajudicial. Feita a penhora, a ação declarativa, seria fraca se contra o ato constritivo. Posto que a penhora, que dá ensejo à abertura de concurso, sem ser na execução de sentença, seja, de regra, a penhora do título certo e líquido, a execução contra devedor insolvente (arts. 748-786) não depende de tal espécie. Em nenhum texto de lei se disse que o concurso de credores somente cabe se a penhora foi por não-adimplemento de dívida certa e líquida. Na falta da liquidez (não se confunda com a certeza), ao título extrajudicial não se pode atribuir o que o direito somente confere ao crédito líquido. Todo devedor por dívida ilíquida e todo credor por divida ilíquida têm ação de liquidação da divida ou do crédito, ou a lei prevê a medida. O crédito diz-se liquido (ou diz-se líquida a divida) quando, além de ser claro e manifesto (= efficere claram et ma nifestam probationem debiti), dispensa qualquer elemento extrínseco para se lhe saber o importe (non requiratur aliquod extrinsecus ad probandum). Sabe-se que é e o que e. Para se obter qualquer efeito a que se exija a liquidez, a liquidade, o ser líquido, tem-se de tornar líquido, antes, o que é ilíquido. A qualidade e a quantidade dependem tanto da certeza que a ação de liquidação só se há de conceber como mescla de ação declarativa e da ação constitutiva. Declara-se o crédito, como é, e constitui-se-lhe a liquidez. Tanto se precisa liquidar o crédito ilíquido ou a divida ilíquida, que consta de escritura pública, quanto o crédito ilíquido ou a divida ilíquida que consta de instrumento particular (SILVESTRE GOMEs DE MORAIs, Tractatus de Executionibus, III, 11). A própria sentença diz-se, por elipse, ilíquida, se a condenação depende da liquidação. MANUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, 1, 124 s.) falou da ação de liquidação e referiu vários casos julgados em 1607, em 1608 e em 1609. A ação de liquidação pode ser dispensada se os elementos para a liquidação se produzem desde logo, convincentemente, ou ser inserta na ação que se propõe como questão prévia se ao ingresso para essa não se exige a liquidez do crédito (“quando in incontinenti liquidatio offertur”, “paria enini sunt instrumentum esse liquidum aut in continenti liquidandum”). 2) “QuEsTío Iuius”. O art. 586 tem de ser interpretado como se dissesse: “a execução para cobrança de crédito fundar-se-á em título extrajudicial certo e líquido e exigível (e. g., não houve prescrição), salvo se a lei confere a exigibilidade executiva a determinada classe de título extrajudicial a que é de mister a liquidação no processo executivo, ou se houve acordo quanto à liquidez”. 3)TITULO ExECUTIvO SENTENCIAL E PROCEDIMENTO ExECUTIvO. Quando se investiga, em ciência, a natureza da ação executiva da sentença abreviadamente, “execução de sentença” o que logo ressalta é ser pressuposto objetivo comum a quaisquer execuções o titulo executivo. Esse título ou é a própria sentença em sua sobrevivência ao processo em que se proferiu, ou outro documento em que se corporifique, excepcionalmente a força executiva da sentença. Tal força executiva não é intrínseca à sentença (se o fosse, a ação e a sentença seriam executivas), nem é inerente ao mandamento que fosse o conteúdo dela (do contrário, seriam mandamentais a ação e a sentença). Não se poderia transformar em mandamental a sentença que se profere nas ações de condenação e se executa segundo as regras jurídicas, pela mesma razão por que não se pode fazer maior ou menor de dois retos a soma dos ângulos do triângulo. E. g., definindo-se a execução de sentença como execução de sentença de condenação, claro que não se pode, à vontade, mudar em sentença de mandamento a de condenação, nem vice-versa. Portanto, não importa o nome que se dê à coisa: carta de sentença, certidão, traslado, mandado, cópia, carta executória, etc. O grande mal dos legisladores é o de pensarem que podem alterar os conceitos sem se arrebentarem os sistemas lógicos dentro dos quais eles vivem. A Ordenação Processual Civil alemã (§ 724) preferiu referir-se à cópia. O velho direito português, cerimonioso, entendia que o juiz da ação deveria deprecar o outro, ou os outros, para que executassem a sua sentença. A época de sensível decadência dos estudos de direito processual, que foi, para nós, o fim do século XIX e o começo do século XX, exatamente quando, na Europa, chegava ao máximo de rigor a pesquisa científica, não pôde empregar um pouco da sua faina legislativa em apurar a função processual do título executivo de origem judicial. O título é o

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documento essencial à execução da sentença: a sentença não é executiva, tem efeito executivo. A esse efeito, ao seu desenvolvimento e à exaustão mesma, serve o titulo. A ação que se propõe, sim, é executiva (5 de executividade). Considerações de comodidade das partes, ou do exequente só, não bastam para se eliminar ou modificar o que a ciência assentou sobre pretensão a executar, ação iucUcati e ação de título executivo. O titulo formal, que se exige, prova a legitimação ativa e passiva, contém a pretensão e ação de executar, com força probatória formal. É documento essencial, no sentido dos arts. 283 e 570. Só é suscetível de umsucedâneo identificativo, o do art. 1.065, ou do art. 1.067. A transformação da concepção do título (a sentença mesma, a carta precatória, a carta de sentença e o mandado) obedece à tendência à simplificação e ao maior cômodo ou conveniência do exequente ou das partes. Mas em plano de aproveitamento material do processo findo. Quanto à estrutura da relação jurídica processual, não houve fusão, nem soldamento. O chamamento da ação iudicati continuou, com a citação do art. 214, sob pena de nulidade. Nulidade “cominada”, portanto nulidade a que se refere o art. 250 e a que não se aplica o art. 244. Ainda que iniciado por outra forma que a citação o processo da execução de sentença, se atingiu o fim da ação, nulo está, porque faltou a citação. Tal nulidade independe de ter sido arguida pelo interessado na citação, e quem quer que seja pode argui-la. Felizmente, o Código de 1973 apagou a simples razão de comodidade para se preferir o mandado, e tão superficial, no terreno da técnica das execuções, que a lei conhecia a carta de sentença. Palavras não bastam para se ocultar o real. Em verdade, o mandado de citação, nos processos executivos, não é da classe daqueles mandados que são conteúdo da sentença como o do juiz da ação de levantamento de depósito, ou de nulidade de patentes e marcas de indústria ou de comércio. É carta de sentença mais ordem do juiz aos seus próprios auxiliares. Efeito do efeito da sentença, postenor a essa, e não contido nela; posterior, talvez, ao tempo, no caso do art. 570. A citação, assim na espécie dos arts. 652 e 659 como na espécie dos arts. 214 e 570, é chamamento e mandado executivo, tanto que em ambas se dispensa (ou melhor, se exclui) novo mandado. O que a prática conseguiu e os legisladores entenderam adotar foi a fusão do chamamento com a ordem de execução, sem que pesasse contra isso a existência de dois momentos de observância pelo oficial, o da citação com preceito e o de penhora. A falta do titulo da sentença exeqüenda é causa de nulidade não-cominada. Sobre o art. 278, § 2.0, do Código de 1939, hoje arts. 248 e 249 do Código de 1973, a 4.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 14 de novembro de 1940 (R. dos T., 129, 263). Despachada a petição de execução, deve o juiz, de ofício, fiscalizar o cumprimento do mandado executivo, porque: a) é do interesse do Estado (MANUEL GONÇALVES DA SILVA, Commentaria, III, 327; b) a relação jurídica processual da execução é angular (exequente, Estado; Estado, executado); c) se trata de mandado judicial de citação, com as eficácias especificas. Antes da penhora, há fase, curta, mas dilatável, de pesquisa do que se há de penhorar. Essa fase, quase só de inquisitividade, obedece a regras jurídicas próprias. 4)CONTAMINAÇÃO E NAO-CONTAMINAçÃO DA INVALIDADE. Em todos os casos em que se precisa de liquidação, a falta produz nulidade de todos os atos, desde esse momento (art. 248). MANUEL ALvAREs PÉGAS (Resolutiones Forenses, VII, 295) ressalvava a parte líquida, se não conexa, pela regra Utile per mutile non vitiatur. A própria arrematação é nula (MANUEL GONÇALvEs DA SILVA, Commentaria, III, 261). Discutia-se se a falta da liquidação é suprível com o processo posterior. MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, III, 262) levantou a questão, em termos de resguardar os interesses de terceiro adquirente. Se foi antes da arrematação, suprida está a falta (art. 250). Idem, acrescente-se, quanto à liquidação nula. O suprimento da falta depende do art. 250. Mas a nulidade, na espécie, é não-cominada. 5)ILíQUIDO NÃO PREJUDICA lIQUIDO. (a) O ilíquido não prejudica o liquido; não se confunda com “certeza” a “liquidez” da dívida, pois o crédito pode ser certo e ilíquido (e. g., condenação a pagar o valor do dano causado), líquido e não-certo (e. g., se A vender a casa x a B, até 31 de dezembro), “incerto e liquido” (Ordenações Filipinas, Livro IV, Titulo 78, § 4). A carta de sentença é de mister se os autos sobem, em virtude de recurso sem efeito suspensivo. Se o efeito é suspensivo, não há pensar-se em execução. (b)A sentença que adiantasse sobre a liquidação (a) não seria como a sentença que difere à cognição completa posterior parte do pedido (b), nem seria cautelar (c). A sentença (b) supõe que o juiz possa, no sistema de direito positivo de que se trata, protrair parte da decisão. Se não há texto que abra exceção ao princípio da co-extensão entre pedido e sentença, a resposta é negativa. Por outro lado, não há no direito brasileiro o principio de que fique ao juiz apreciar se deve, ou não, conceder medidas cautelares, nem o princípio de pretensão geral à cautela, que se

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exprimiria nos seguintes termos: a toda ação cuja sentença importa delonga corresponde pretensão à segurança da prestação. Outra coisa é a permissão de cindir o julgado em parte liquida e parte ilíquida. (c) A execução prossegue quanto à parte líquida, enquanto se procede à liquidação da parte ilíquida. O princípio -vem-nos das Ordenações Filipinas, Livro IV, Titulo 78, § 4, onde se distinguia a “quantidade” liquida e a ilíquida, mas extraído por MANUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, II, 164) e, melhor, por MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, III, 258 e 261): “Propter illiquidum non suBpenditur executio liquidi” (ementa); fazendo-se ressaltar a diferença em relação ao incerto, porque, se o há, “prius cleducendum esset, non ideo in eo, quod est liquidum, suspenditur executio propter illiquidum”. Entre os dois juristas houve ANTÔNIO MENDES DE AROUCA (Allegationes Iuris, 130 e 132), que primeiro “enunciou” o principio: “Executio liquidae sortis non suspenditur per illiquidum interesse” (ementa); ..... sufficit pro nunc certitudo sortis, cuius executio, quae est liquida, non potest suspendi per interesse ilílquidum, cum omnia tendant in favorem creditoris”. As vezes, a parte líquida e a ilíquida estão ligadas, e JOAQUIM INÁcIO RAMALHO (Praxe Brasilei)ra, 620 e 621) pretendeu lançar regra jurídica de exceção; mas o erro de lógica foi evidente: porque só existem parte líquida e parte ilíquida se são separáveis; fora daí, não há parte “líquida”. JOAQUIM INACIO RAMALHO lera a MANUEL ALVARES PÉGAS (Resolutiones Forenses, 1, 230); e MANUEL ALVARES PÉGAS, por sua vez, a certa decisão dos Desembargadores de Lisboa, a 23 de dezembro de 1679, em que se tinha como líquida a obrigação, porém sujeita a compensação, e se mandou, suspensa a compensação: “o Corregedor lhe nomeie contadores que tomem a dita conta e, determinada ela, deferirá à dita execução como lhe parecer justiça”. Tendo considerado ilíquida a conta, somente porque haveria compensação (matéria de embargos!) MANUEL ALvJUUs PÉGAS teve de ajustar o conceito do acórdão e o seu, dentro de alguma regra jurídica que tivesse sentido. E redigiu o seu comentário (231), depois de dizer que: “Propter non liquidum non retardetur liquid] executio”, a fim de ressalvar o conceito “errado”: “tamen praedicta regula limitatur, quando liquidum, et illiquidurn ex eadem causavel ex eadem administratione descendunt, cum sit iniquum, quod ante liquidatam hinc inde rationem executio fiat, pro ifla parte, quae forsan praestltis rationibus compensari poterit”. No caso, o crédito era ilíquido: o executante era fiador principal pagador e procurador, ao mesmo tempo, de todos os negócios do executado, de modo que o erro vinha de trás, o executado não chamara a contas o administrador e fiador. Algumas vezes, a sentença condenatória de quantia ilíquida considera acima de toda dúvida quanto à liquidez alguma parcela, e ai só se liquida o ilíquido; outras vezes, não podendo considerar líquida alguma das parcelas, considera devido pelo menos parte (o que pode ter sido objeto mesmo de prova em quesito direto), e então essa pars liquida do ilíquido é adiantamento de liquidação. Não há, nisso, necessariamente, cautela; pode havê-la em certos casos, e os alimentos provisionais são exemplo, posto que se haja feito ação preventiva, à parte, acessória. 6)PERDAS E DANOS QUE SE LIQUIDARAM NA EXECUÇÃO. A sentença que condena “às perdas e aos danos que se liquidarem na execução”, sem ter qualquer enunciado que diga que houve dano e qual o dano, essa sentença infringe, evidentemente, o princípio Tantum iudicatum quantum dispu. tatum, segundo o qual o juiz tem de dizer “sim~~, ou “não ”, a tudo sobre que houve discussão. Ai, a teratologia da sentença assume caráter grave, embora possa passar em julgado e ser sentença que existe e vale, posto que rescindível (art. 485, V), por infração do art. 461. Desde que a ação se afasta do art. 461, a sentença de condenação, ou outra qualquer sentença, amputa-se a si mesma. Se é sentença em ação de condenação, e por modo tal e a tal ponto foi amputada que não condenou, talvez tenha ficado, apenas, teratologicamente, em processo de ação de condenação, sentença declarativa. Se a tal ponto não chegou a amputação, algo lhe resta de condenatório, e aí o elemento de condenação é como o coto de braço cortado. Os juristas têm discutido, com todo o empenho, a natureza de sentença, porém não prestam atenção a que há mais de uma espécie de sentença amputada, e as teorias explicativas que arquitetaram, podem corresponder a alguma delas, ou a algumas delas, e não a todas. O método, que empregamos, de partir dos fatos da vida do direito, obriga-nos a não tomarmos o partido de uma, ou de outras, e buscar aos fatos mesmos o que eles mostram. Não se pode deixar de atender a que a amputação pode ser um ponto, até todos menos um ponto. O assunto necessita de clara e precisa dissertação, tal a sua relevância. Vejamos algumas explicações, todas viciadas pela restrição a uma espécie ou a n x espécies, e, pois, insuficientes, como teorias: (1)Os juristas alemães têm a sentença de condenação. no que se liquidar, como sentença declarativa. Assim, principalmente, PAUL LANGHEINEKEN (Der Urteilsanspruch, 147). Essa concordância dos juristas alemães deriva de se não ter levado aos mais extremos pontos da pesquisa o problema da distinção entre “condenação” e “declaração”, de um lado, bem como, do outro, entre “condenação” e “condenação a prestar p”. Quem condena a prestar p condena a prestação de quantia determinada. (2)Alguns juristas italianos, tendo o efeito executivo da sentença de condenação como força específica de tal sentença, o que mostramo-lo, não é exato (há sentenças de condenação sem esse efeito), concluem que as

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sentenças amputadas, em que só se condena “no que se apurar na execução”, e as sentenças normais em ações de condenação, em que o autor não pediu a condenação no dano concreto, são ainda de condenação, e, pois, reconhecem a natureza condenatórza de tais sentenças. Assim, F. VAsSALLI (La Sentenza condizionale, 198). (3) A teoria de Pumo CALAMANDREI (Studi, III, 220--252; La condanna “generica” aí danni, Rivista, X, 1933, Parte 1, 357-387) mantém a qualificação de sentença declarativa, alude à cognição superficial da sentença, e reduz toda a sentença de condenação “genérica” ao dano a sentença declarativa e de cognição incompleta (principalmente à p. 379), a nada mais nada menos que a “provimento cautelar larvado”. O maior dos processualistas italianos de então, GIUSEPPE CHIOVENDA não foi, nessas investigações, à altura de si mesmo. Ao tratarmos dos processos cautelares, poremos ao vivo as diferenças entre as medidas constritivas. Assim, teremos ensejo de acertadas distinções. Sem classificação rigorosa e exaustiva das sentenças, nada feito. (4)O problema merece ser posto em terreno mais sólido. As partes é que cabe determinar a res in iudicium deducta, fixar o thema decidendum, que o juiz há de examinar e a respeito do qual há de exercer o seu “dever de obrar”. Pertence ao (mesmo sistema lógico do) processo o principio Tantum iudicatum quantum disputatum. Se o juiz se afasta dos dois princípios, o princípio de determinação dispositiva do tema decidendo e o princípio da simetria entre o julgado e a disputa (ou o pedido), amputa a sentença. O thema decidendum tem, naturalmente, de atender à natureza e extensão do direito, da pretensão e da ação, que o direito material confere ao autor, e até a certa “cindibilidade” desses. Porém, para o nosso assunto, o que importa édeterminar-se o que foi deduzido em juízo para se saber se com ele coincidiu, ou não, o que foi julgado. Para podermos pôr em termos rigorosamente científicos o problema, componhamos a tabela dos casos de discordância entre a extensão da sentença proferida no processo de ação condenatória e o thema decidendum, tal como o concebeu a parte. Assim, teremos todos os casos de amputação da sentença que haveria de ser condenatória: O autor pode escolher a ação que propõe, bem como a sua extensão; de modo que lhe é dado propor ou a ação condenatória A, ou a ação condenatória B, ou a ação condenatória C, ou qualquer das ações declaratórias, a que correspondem, normalmente, as sentenças D e E. ~ mesmo possível contentar-se com a ação declaratória A, ou B, ou C, coextensiva à de condenação A, ou B, ou C. A Tabela apenas diz que a ação restrita a D ou E já não é condenatória: o juiz deve tratá-la como declaratória, posto que traga nome errado. Outra observação que se tem de fazer é relativa à razão, confessável ou inconfessável, para o autor, ou para o juiz, de ter preferido B, C, D ou E. Tal conduta, elemento subjetivo, não tem relevância para a solução do nosso problema, que há de ser tratado em termos objetivos da eficácia da sentença efetivamente proferida e trânsita em julgado. Não nos importa se o autor pretendeu intimidar o réu, provando- -lhe a culpa (C), ou a culpa e o dano (B) ou só a iniuria (D), e forçá-lo a liquidar por mais do quanto devido. Nem se foi por preguiça de examinar o processo de determinação do dano, ou do quanto, que o juiz violou o princípio Tantum iudicatum quantum disputatum, e, assim, deixou de julgar secundum petita partium. A separação, em verdade, não é em duas fases, mas separação no conteúdo da sentença. Não é em duas fases, porque, de qualquer modo, há duas ações para se chegar a receber a prestação (a de condenação e a actio iudicati ou de execução da sentença), e apenas se desloca para a fase anterior à execução (liquidação) mais do que fora de esperar-se. Naturalmente, se admitimos que não haja, na sentença condenatória (!), qualquer enunciado de fato sobre a existência do dano, ou se permitimos sentença com eficácia condenatória mas suscetível de ser cancelada pela sentença de liquidação que negue a existência de dano, caímos em contradictio in adiecto. Por isso mesmo se há de escolher: ou (a) se entende que o juiz, proferindo sentença amputada, em que nenhuma afirmação fez sobre a existência de dano, nem o mostrou, ditou sentença só declaratória em processo de ação de condenação e se precisa de outra ação de condenação; ou (b) se entende que tal sentença autoriza a ação de execução de sentença, porque a ação era de condenação, e ainda há elemento condenatória suficiente, embora o juiz tenha encurtado a sentença: então, o processo de liquidação (arts. 603-611) não ganha elemento de cognição, que não teria, segundo a letra da lei, e apenas exerce a sua função de proclamar “zero” onde “nada encontrou”. A adoção da solução (b) exige que se apontem quais as sentenças da tabela que ainda têm o elemento condenatório suficiente para que se ingresse na execução sem (outra) ação de condenação e, pois, quais aquelas que, ad instar das sentenças normalmente proferidas nas ações declaratórias, positivas ou negativas, não podem passar à actio judicati dos arts. 587-589. Posta nesses termos, a questão toma aspecto rigoroso, em ciência e na prática. As sentenças C, D e E de modo nenhum podem levar à ação de execução de sentença. As sentenças A’, B’ e C podem. As sentenças A e B são o caso mais vulgar de sentenças de condenação. A tabela tem a vantagem de classificar as sentenças amputadas e marcar a fronteira entre a sentença amputada que ainda é condenatória e a sentença amputada que já não é condenatória. Nela, a sentença A é coextensiva à ação A; igualmente a sentença B é coextensiva à ação B; e a sentença C, coextensiva à ação C. Sentenças amputadas são

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apenas: A’, B’ C’; não, D e E. Outro proveito da tabela é provar que PlEno CALAMANDREI (Rivista, X, 372, 378-386) incorreu em contradição: a) afirmando que as sentenças das espécies B’ e C são declaratórias e permitem execução (actio iudicati), quando, se permitem actio iudicati, é porque ainda são condenatórias; 1,) dizendo que as sentenças B’ e C são declaratórias e, no entanto, produzem o efeito anexo da hipoteca judiciária ou legal, quando esse efeito é somente ligado à sentença condenatória; c) em falar de cognição incompleta, superficial, das sentenças B’ e C, contra os princípios que ligam a sentença definitiva e a sua preclusão à completitude da cognição. O que não foi amputado foi conhecido completamente. A prática de condenações que param no an debeatur, e não vão, portanto, ao quantum debeatur, é cheia de inconvenientes. Com elas, transita em julgado a condenação, mas deixa-se ao juiz a determinação do quanto. A sentença de condenação foi pouquíssimo além da declaração da relação jurídica. É sentença de condenação de carga mínima; quase se quedou no declarar: pisou, apenas, o terreno da condenatoriedade. Mas seria erro ver em tal sentenca, como pretendeu PIERO CALAMANDREI, providência cautelar: seria dilatar-se, em demasia, o sentido de cautelaridade, ou diminuir-se, desnaturalmente, a sentença condenatória “mutilada”. Tanto mais quanto, se a mutilação a reduzisse a simples declaração, ainda assim essa sentença declarativa não se rebaixaria à classe da sentença de medida cautelar. A Tabela também nos mostra que sentença de condenação e sentença de prestação podem não ser o mesmo, uma vez que ao juízo da liquidação é permitido dizer que não pôde apurar o dano a ser prestado. Isso é de extraordinária relevância, porque os juristas costumam dizer que o juízo da liquidação, negando o dano, profere sentença de completamento da cognição que na sentença de ação de condenação fora incompleta. Pela tabela, vemos que as sentenças B’ e C, na ação de condenação, são sentenças de condenação, embora amputadas, condenam; e o juízo de liquidação apenas não tem meios para apurar o dano. Não nega a iniuria, nem a culpa, nem a condenação. Nega que se “possa” liquidar o dano. Se a sentença é da classe A, A’ ou E, então é o tipo mesmo da sentença a que se reportam os arts. 603-611 ,houve o dano causado pela destruição do prédio, que fora avaliado em x, há anos, e está valorizado desde aí, pelas obras e pela alta dos preços, e o juiz condena em x mais o que se apurar na execução. Nas sentenças provisionais tem-se procurado ver: a) sentença declarativa sobre os pontos prejudiciais da iniuria e da culpa; b) sentença de condenação sobre o ponto da provisional, nos limites do dano apontado; e) provimento cautelar quanto ao dano presumido. Sem razão: a sentença é da classe mista de E’ ou C e A’ ou E. Passando ao assunto da sentença de condenação aos danos que se apurarem, temos: (1) Tese: F. VASSALLI (Suila condanna, Corte di Cassazione, 1924, 1, 424-427) entende, contra PIERO CALAMANDREI, que todas as sentenças de condenação genérica obrigam o juízo da liquidação a liquidar danos. (2) Antítese: Pznno CALAMANDREI vê nas sentenças B’ e C julgamento de probabilidade, porque a sentença da liquidação pode dizer de zero o dano. Mas esquece-se que, tendo respondido “sim” quanto ao an debeatur, à iniuria e à culpa, o juízo da ação de condenação já pronunciou a condenação. A liquidação é operação que nada tem com a condenação: precede-a, ou sucede-lhe. (3)Síntese: se o dano não foi apurado, o que se há de entender é que a sentença de condenação produziu toda a sua eficácia..condenatória : a ação iudicati é que foi movida em vão, tal como a ação de execução contra o devedor sem bens. O que se deve aconselhar aos juizes é que não dêem sentenças da classe B’ e C, sem “apontar” os danos, ainda que iliquidamente, isto é, ficando a sentença mais para perto da classe B ou A’, embora não chegue à classe A’, ou B, menos aluda à classe A. Ao juiz da liquidação corre o dever de, na dúvida, ter como “apontados” pela sentença os danos a que ela se refere, nos considerandos, como danos pedidos, de modo que tenha como próxima, pelo menos, de A’ e B a sentença exequenda. Para a liquidação das sentenças, elementos dos considerandos revelam, por vezes, elementos do decisum, que apenas não foram explicitados. 7)PROBLEMAS QUE SURGEM E SUAS SOLUÇÕES. No art. 586 fala-se de “cobrança de crédito”. Entenda-se: a exigência da prestação, porque a execução do crédito depende de já haver “obrigação”. O objeto da prestação há de ser certo e líquido. Título certo e líquido é título a cujo crédito correspondem pretensão e obrigação de prestar algo certo e líquido. Certo, porque existe, sem dúvida; e líquido, porque não depende de liquidação. Evitemos dizer que o título há de ser de declaração de crédito: nem o conter, nem o incorporar a si significa “declarar”. Evitemos o emprego da expressão “declaração” em sentido que não é o adequado e estrito, tal como fizeram alguns escritores europeus. O juiz há de examinar se o titulo é judicial e contém a condenação, o que dá a certeza; ou se é extrajudicial e, conforme o sistema jurídico, faz certa a obrigação. Para se afastar o que resulta da sentença, ou do titulo extra-judicial, é preciso que se alegue e se prove, nos embargos do devedor, o que basta para eliminar a eficácia executiva, como ocorre se houve pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição. A certeza, que o juiz aprecia, é a da existência da obrigação, diante apenas do titulo executivo(sentença, ou título extrajudicial), e não só dos pressupostos formais do título executivo. A certeza da obrigação e a liquidez da prestação podem

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constar do título, sem que a lei o repute título executivo. Se a execução é para entrega de coisa certa, certa e líquida há de ser a obrigação. Se para a entrega de coisa incerta (determinada pelo gênero e pela quantidade, art. 629), há a escolha pelo credor, ou a citação para a individuação, conforme o caso. Se para obrigação de fazer, há execução conforme os arts. 632-641; se de não fazer, incidem os arts. 642-645. Em todas as espécies, há crédito, pretensão e ação. O art. 586 não apanha apenas os créditos, as pretensões e ações para se haver quantia certa. Certeza e liquidez não se restringem a dívidas pecuniárias. Além de falar da certeza e da liquidez (embora, errada-mente, quanto à colocação dos adjetivos, “titulo líquido e certo”), o art. 586 alude a ser “exigível”. A divida pode ser certa e líquida: sabe-se que existe e sabe-se qual é, sem se precisar de liquidação; mas ainda não ser exigível porque ainda não chegou o momento em que tem de ser cumprida a obrigação. É preciso que se verifique que é, de quanto e quando se há de exigir. A propósito das obrigações alternativas, não se há de dizer que o fato de caber ao credor, ou ao devedor, a escolha, faz ilíquidas as obrigações. Tais obrigações são certas e a alternatividade (ou a, ou b) de modo nenhum leva à iliquidez, como não é ilíquida a própria obrigação alternativa em que o devedor se vinculou a pagar x cruzeiros ou y dólares, mesmo se a determinação fica à escolha do devedor. Se a obrigação estava ligada a prazo, ou a condição, o escoamento daquele ou o implemento dessa basta à exigibilidade. Já havia certeza e liquidez, faltava apenas o fazer -se exigi-la a dívida. Já havia direito (crédito) e pretensão; esperava-se a obrigação: surgiu. A iliquidade exige que seja afastada, isto é, que se proceda à liquidação. Após isso, faz-se exigível a dívida. Compreende-se, portanto, que se ponha antes da execução o processo liquidatório (art. 586, § § 1.0 e 2.0). Otitular de crédito ilíquido, como o próprio devedor, pode pedir que se proceda à liquidação. Ou aquele propõe a ação condenatória se o devedor não reconheceu a dívida, a pretensão e a obrigação, ou, se esse nenhuma objeção apresenta, promove a ação de liquidação: a sentença, na ação de liquidação, faz líquida a dívida, de modo que o título executivo extrajudicial se transformou em título de dívida líquida, porque o elemento sentencial se lhe juntou. Se, mesmo ilíquida a divida, houve título, escrito à parte, em que o devedor declara que o valor líquido é x e tal documento satisfaz as exigências do art. 585, II, há a executividade do título complementar que agarra o anterior: a iliquidez desaparecera, com a eficácia declarativa e executiva do título posterior. A inexigíbilidade é sempre alegável nos embargos do devedor (arts. 741, II, 566-568 e 745). Na execução com título judicial, pode tudo estar provado (certeza e liquidez), e não no estar a exeqttibilidade do titulo, porque a condenação pode ter sido quanto a dívida sujeita a termo ou condição. Dá-se o mesmo com a execução de título extrajudicial. Quanto à liquidação, há o processo preparatório da liquidação (arts. 605-611), se o título é judicial, ou, se o título é extrajudicial, a ação de liquidação, que é autônoma e sem caráter de preparativididade. Se o devedor anui em que se liquide a dívida para que possa pagar, a ação de condenação seria intempestiva, porque só se condena quem causa ou vai causar dano. Proposta a ação de liquidação, que, ai, éde jurisdição voluntária (arts. 1.103-1.111, 24 e 174, 1), há o processo especial de que fala o art. 1.103 (“Quando este Código não estabelecer procedimento especial, regem a jurisdição voluntária as disposições constantes deste Capítulo”), mas atendidos os arts. 604-610). Também o devedor pode pedir a liquidação, posto que o art. 570 somente se refira a título judicial para a legitimação ativa do devedor na ação de execução de dívida. Se a dívida é genérica qualitativamente (há escolha pelo devedor, ou pelo credor, ou por ambos, ou por algum ou alguns dos devedores, ou algum ou alguns dos credores, ou por terceiro ou terceiros), não se há de falar de liquidação. O que ocorre é o que se prevê, com explicitude, nos arts. 629--631: ou o credor individualiza na petição a coisa, se a escolha lhe cabe; ou faz citar-se o devedor para que escolha. Ai, repitamos, não se pode falar de liquidação. O que pode ocorrer é que não se haja previsto quem tenha de fazer a individualização da coisa, mas isso é questão para se resolver perante o direito material. A respeito da pretensão à liquidação, quer por parte do credor, quer por parte do devedor, temos ainda de assentar que a ela não só corresponde a ação de liquidação: pode ser proposta a ação cautelar de liquidação (cf. art. 798: “Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave ou de difícil reparação”). Satisfeito o que se exige nos arts. 844-85 1, pode ser pedido o exame pericial, se é o caso para a liquidação. 8)EXECUÇÃO E LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA. Quem tem a seu favor, ou contra si, sentença de que se origine ação executiva, pode pedir, antes da propositura de tal ação, a liquidação. Se o peso de executividade é 4, nos próprios autos do processo requer-se a liquidação, porque se trata de eficácia imediata. Se o peso da executividade é 3, tem-se de propor outra ação, que é a ação de liquidação, após o julga-

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mento da qual tem o interessado de promover a ação de execução, com a citação do devedor. Houve duas ações. 9)SIMULTANEIDADE LA PROPOSITURA. Se, na sentença, há uma parte, que é líquida, e outra, que é ilíquida, a lei (art. 586, § 2.~) permite que, em vez do que se apontou na nota 2), as duas ações sejam propostas simultaneamente: a de liquidação e a de execução. Propositura simultânea supõe citação para as duas ações. Com isso afastado fica o art. 611. O devedor é citado para, no prazo de vinte e quatro horas pagar ou nomear bens à penhora; e para as formalidades processuais da ação de liquidação, que, conforme a petição, já está proposta. 10)TÍTULO CERTO EM PARTE LIQUIDO E EM PARTE ILÍQUIDO. O art. 586, § 2.0, só aludiu à sentença em parte líquida e em parte ilíquida. Surge o problema dos títulos executivos extrajudiciais, em que haja parte líquida e parte ilíquida. fl de perguntar-se se as duas ações podem ser simultâneas. Os arts. 603-611 somente cogitaram, como o art. 586, § 2.0, da liquidação de sentença. Se a parte liquida de modo nenhum depende da liquidação da outra parte, nem essa daquela, é de interesse das partes que não se separem as ações, a da liquidação e a de execução: o devedor já tem de satisfazer, quanto à parte liquida, no prazo de vinte e quatro horas (art. 652: “pagar ou nomear bens à penhora”). Quanto à parte ilíquida, procede-se à liquidação, porque não é só de dividas em sentença que se faz liquidação. O credor (aliás, também o devedor) pode propor ação de liquidação de crédito (ou de dívida) e aqui só tínhamos de falar da simultaneidade e da insimultaneidade. Art. 587. A execução é definitiva, quando fundada em sentença’) transitada em julgado ou em título extra judicial 3); é provisória, quando a sentença for impugnada mediante recurso, recebido só no efeito devolutivo2). 1)SENTENÇAS QUE SÃO TÍTULOS EXECUTIVOS. (a) <Quais as sentenças que são títulos executivos? Aqui, um dos temas mais em foco no direito das execuções. A ação executiva pode surgir: de certos fatos que poderiam levar a demanda de condenação; da sentença na ação de condenação ou de elemento condenatório suficiente (efeito). O que importa é o peso 3, pelo menos, de executividade. Algumas vezes é a sentença que constitui o título (e. g., arts. 639-641, ação executiva lato sensu, sendo possível que a sentença também constitua título e esse titulo já seja execução). Portanto, é o título, aí, que é execução. O processo regula-se pelos arts. 632 e 636 com o parágrafo único; não pelas outras regras jurídicas. Donde a afirmativa a científica de que as sentenças declarativas e as constitutivas não são sentenças exequíveis; só as de condenação (RUDOLF POLLAK, System, 544) e as de elemento condenatório suficiente. As mandamentais, essas, não são suscetíveis, de regra, do processo de execução, porque, como ocorre com a executiva do art. 641, está implícita nelas a executividade. Quando a ação de mandamento precisa de execução do que se manda na sentença, essa “executividade” é elemento mesmo da sentença, e não efeito. Não se cria título executivo, que tenha vida posterior, posto que às vezes se atinja medida cautelar ou título executivo (e. g., se revoga ou modifica medida preventiva, art. 807, ou julga inexeqúível a sentença com que se iniciou a execução ou nulo o mandado do art. 586, ou nulo por defeito segundo os arts. 615, IV e 572). Há, porém, sentenças mandamentais com peso 3 de executividade. Todas as sentenças possuem parte referente a custas; e essa parte, que é sentença de condenação, se executa con forme a execução de sentença. Há sentença inserta em sentença. Ou são declarativas de não se deverem custas. (b) A regra é a de toda ação de execução ou todo título executivo ter por trás de si pretensão a executar. Há pretensões a executar sem ação, o que bem se vê quando o Estado sucede como devedor na dívida do réu. Mas ação sem pretensão tinha-se por possível, porém não era encontrado um caso. RUDoLF POLLAK (System, 544) mostrou um: o chamamento da testemunha numa justificação (art. 863), por exemplo, com aplicação, ou não, a essa ré, do art. 412, § 1.0. A sentença não precisa de especificar cada uma das verbas ou parcelas da condenação se o decisum, só por si, delimita a condenação, e há dados, no processo, apreciados pela sentença, que bastem ao seu entendimento (demasiado longe, nesse caminho, foi a ~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 3 de março de 1944, D. da J. de 19 de junho). A sentença que infringiu o art. 458 é rescindível; a ininteligível é inexecutável. Não se pode executar o ininteligível; donde ser ineficaz a sentença.

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A ininteligibilidade produz ineficácia. O pedido de citação que foi deferido formou a relação jurídica processual, mas a impossibilidade de se entender a sentença a faz ineficaz e, pois, não suscetível de execução. (c)SILVESTRE GOMES DE MoRMs (Tractatus de Executionibus, II, 229) colhia, com sagacidade, o elemento cognitivo, declarativo, da ação iudicati ou ação de execução de sentença. Para ele, a sentença tem força formal de coisa julgada e força probatória formal (“. . . cum pro veritate habeatur, nihil amplius quaeri potest, nec iterum sententia ferri”) e para evitar dificuldade, “ut evitetur omnis difficultas”, deve o juiz pronunciar: “Declaramus iudicatum, et exequi mandamus”. No livro Resolutiones Forenses, de MANUEL ALvARES PÉGAS (VII, 499), vem hipótese curiosa, a de ter-se proposto ação entre a ação em que se pro feriu a sentença exeqUenda e a ação iudicati, não tendo o réu oposto exceção de coisa julgada, de modo que renunciara aos efeitos indicati ex sententia. Aliás, o problema vem do pós-glosador PAULO DE CASTRO. A possibilidade de mudança da relação jurídica depois da coisa julgada e por motivo posterior nada tem com a cognição completada. É outra cognição. Teremos de tratar do assunto quando houvermos de cogitar da demanda de oposição à execução, nome que se deve a JosEF KOHLER; mas adiantemos que é irrenunciável a pretensão a executar. Essa só desaparece se desapareceu a situação jurídica material (assim, JOSEF KOHLER, tiber executorische Urkunden, Archiv fi.ir die civilistische Praxis, 72, 39; Ungehorsam und Vollstreckung im Zivilprozess, Archiv, 80, 147). Portanto, a coisa julgada fica intacta, ainda aí. Salvo extinta a ação rescisória da segunda sentença. Juiz que defere o pedido de execução declara a executividade. Os juristas exageram tanto o valor do efeito executivo das sentenças que MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, II, 241) considerava “frustra” a sentença que se não executasse, e os escritores dos séculos XVII e XVIII lhe chamavam “campana sine pistillo”, ou trovão sem chuva, “tronítrus sine pluvia”. No entanto, a civilização de um povo pode medir-se pelo respeito às sentenças declarativas e pelo uso delas, acima, nas estatísticas, das sentenças de condenação, mandamentais e de execução. A pretensão à tutela jurídica, no caso de ação executiva de titulo extrajudicia] ou de sentença, é limitada aos casos em que cabe. Daí conseqUência extremamente importante: quando o autor usa, indevidamente, da executividade, isto é, sem que lhe caiba ação executiva (de títulos extrajudiciais ou de sentença), fica obrigado a restituir e a ressarcir perdas e danos. O abuso do direito processual mais facilmente se caracteriza; porque se trata de “erro grosseiro”. Ou de má-fé. (d)Falavam as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 96, § 22, das cartas de partilha, dizendo que, “sendo a partilha acabada, se meterão os herdeiros de posse de seus quinhões, conforme as cartas de partilha, que lhe foram passadas, sem embargo de quaisquer embargos, com que as outras partes a isso venham”. A diferença entre a sentença nas ações de partilha e as sentenças nas ações de condenação intrigou os grandes juristas portugueses dos séculos XVI a XVIII, não se conhecendo então a hodierna classificação das ações em declarativas, constitutivas, condenatórias, mandamentais e executivas, e sendo a ação de partilha executiva lato sensu, segundo vimos antes, com efeito executivo eventual além da sua própria eficácia imediata. ALVARO VALAsco (Praxis Partitionum, 663) notou o fato; ANTÔNIO DE SoUsA DE MACEDo (Decisiones, 198) advertiu, com tino de cientista: “imo est sententia maioris vis, quam aliae sententiae”. “Efeito” executivo colado a sentença em ação já de si mesma executiva lato sensu. MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, III, 399 e 403) gostou da expressão, mas observou que por outro lado essa sentença nenhuma força de coisa julgada material tinha contra os credores dos herdeiros. O “efeito” executivo do art. 1.154 não dependia de citação; não se considerava ação iudicati. Mas discordava MANUEL ALVAXES PÉGAS (Resolutiones Forenses, 1, 380), que exigia a citação, contra ANTÔNIO LOPE5 LEITÃO (Praxis Finium Regundorum, 195 5.) e outros. O Código, verbis “terão força executiva”, “sendo o processo mesmo das demais execuções”, adota a solução da sentença lisboeta de 25 de julho de 1680, que vem em MANUEL ALVARES PÊGAS (1, 380), confirmada pelo Senado. Ocaso das partilhas, cuja sentença é de força executiva, de modo nenhum se confunde com o das execuções de sentenças de condenação, cuja eficácia executiva é apenas efeito mediato, e não força. Não é verdade que em Portugal e no Brasil se houvesse reservado a actio iudicati “para quando se pedir coisa em que há condenação”. Quando SILVESTRE GOMES DE MORAIS (Tractatus de Executionibus, 1, 106) escreve: .... . cum executio per officium iudicis postulatur”, e MELO FREIRE (Institutiones, IV, 164); “...iudicis auxilio implorato, et ab eo speciali mandato decernitur, quod exsecutoriale vocant”, de modo nenhum quiseram dizer que não fosse de actio iudicati que se tratava. MANUEL DE ALMEIDA E SOUsA (Se gundas Linhas, 1, 706) foi claro: um dos efeitos da sentença condenatória “é constituir nova causa de divida”. “Sim: porque a sentença faz débito do indébito e produz a nova ação iudicati”, de que tratam as Ordenações Filipinas, Livro III, Título 25, § 10. MANUEL DE ALMEIDA E SoUsA remeteu os leitores sobre essa espécie de “ação iudicati” a SILvESTRE GOMES DE MORAIS (Tractatus de Executionibus, II, 226 5.) e a MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Com fl7entaria, 1, 178 s.). Não só: outro efeito é terminar o oficio do juiz. Mais propriamente finaliza a instância pela sentença, que passou em julgado; porque a sua execução é um novo juízo e uma nova instância” (1, 707). Tal a verdade, como a ciência,

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depois, mostrou. Há, aqui e ali, quem sustente, sem base, a continuidade da relação jurídica processual, uma vez que se fala de prosseguimento. Mas a contradição é gritante: com o trânsito em julgado da sentença final, não há pensar-se em continuidade: a relação jurídica processual cessou. O que depois se estabelece é outra relação jurídica processual, em virtude da carga de eficácia executiva que se obteve com a sentença proferida na ação cuja relação jurídica processual evidentemente se extinguiu. Havia dois ritos para ação iudicati: o das Ordenações Filipinas, Livro III, Título 86, e o das mesmas Ordenações, Livro III, Título 25. Mas ambas eram ação iudicati, ou rei iudicatae. Quando algum contemporâneo diz que a ação do Título 25 é que era a actio iudicati e excepcional para as sentenças, pois mais própria para os instrumentos, comete dupla confusão: a actio iudicati não poderia ser própria para os instrumentos, uma vez que esses não eram res iudicata;segundo, quando se fala de actio jucUcati, não se alude a remédio, e sim a ação (no sentido próprio, romano e científico, que é o de ação de direito material, res in judicium deducta, que foi, e agora é, res judicata). Por tudo isso é responsável a ambigúldade da expressão ação: ação, entidade de direito material, ligada à res in iudicium deducta (e. g., ação de filiação, ação de cobrança, ação de reivindicação), e “ação”, no sentido de ação processual (ação ordinária, ação de dez dias, ação sumária). A ambiguidade ainda é mais incômoda e arriscada quando não se desfaz com a posposiçãe do adjetivo (ação possessória, a actio e o processo; ação executiva, a actio e o rito); mas, em “ação judicati” isso não pode dar, porque seria deturpar-lhe o sentido a ponto de cairmos no erro de J. 1. RAMALHO OU de JoÃo MONTEIRO, de que adiante se tratará. Em todas as ciências, não se chega à verdade sem precisão. 2)TRÂNSITO EM JULGADO E EFICÁCIA EXECUTIVA. (a) O enunciado do art. 587 ou entende-se como se contivesse e necessário às sentenças, dotadas de efeito executivo, para serem exeqúlveis, que hajam transitado formalmente em julgado, ou que, interposto o recurso, esse não tenha efeito suspensivo”, ou é falso. Tem de conceber-se como regra jurídica de pressupostos das sentenças dotadas de efeito executivo. A sentença que pode ser título executivo pode ser usada como tal quando já tem força formal de coisa julgada, ou quando, ainda não na tendo, o efeito do recurso é só devolutivo. (b)As sentenças condenatórias em causas que digam respeito a prestação de deveres sexuais escapam à execução de sentença. Não era assim no velho direito português, que antes do Acórdão do Juízo da Coroa, de Lisboa, a 26 de abril de 1766, ainda admitia a coerção violenta. (e)O Código somente cogita da execução forçada fora da falência. A falência, embora seja instituto de direito processual, ficou de parte. Também não fala das liquidações coativas ainda se não comerciante o devedor. (d)Os meios ordinários de execução são a entrega da coisa certa, de que o devedor tem a posse, considerando-se momento liberativo do devedor (PFENNINGER, Die Realexecution, 69) o da imissão do autor da execução na posse, se se trata de imóvel, ou de móvel ou o da busca e apreensão, se se trata de móvel. 3)AçÃo EXECTYIIVA DE TITULOS EXTRAJUDICIAIS. Quanto aos títulos extrajudiciais, a execução tem de ser definitiva, porque foi posta antes cio julgamento cognoscitivo. Não há, portanto, sentença, da qual se possa recorrer com eficácia só devolutiva. Qualquer matéria de cognição, na ação executiva de títulos extrajudiciais, é objeto dos embargos do devedor, que são ação, e não recurso. É preciso que o devedor, qualquer que seja o título executivo, segure o juízo (art. 737). Antes de se julgarem os embargos cio devedor por título extrajudicial, não é possível execução que seja provisória. Se não há embargos, é definitiva; se os há, só se pode pensar em sentença que os julgue, quer a alegação caiba no art. 741, ou seja relativa ao conhecimento (art. 745). Assim, a despeito do adiantamento da execução, não se admitiu que se executasse sem o julgamento dos embargos do devedor. Adiantou-se; portanto, toda execução que se pede, nas ações executivas de títulos extrajudiciais, é execução definitiva. Não houve sentença, nem recurso. Muito diferente o que se passa com as ações executivas de sentença. Foi medida excepcional permitir-se que se execute, provisoriamente, a sentença com peso 3 de executividade; e a ratio legis está em que, se o recurso só tem efeito devolutivo, algo se quis levar em consideração, não obstante ainda poder não haver coisa julgada. Dissemos “poder não haver”, porque, se de tal recurso não se conheceu, coisa julgada houve, como teria havido se o recurso interposto tivesse tido efeito suspensivo e dele não se conhecesse. Se há coisa julgada, a execução é definitiva; se não a há, ou se ainda pende remédio jurídico recursal que pode ser conhecido, de modo nenhum se pode pensar em execução definitiva. A permissão da execução provisória (art. 587) é apenas para a sentença de que se interpôs recurso sem efeito suspensivo. A eficácia executiva sentencial persiste, porque o recurso não a suspendeu. Se o recurso tem efeito suspensivo, não se pode falar de execução. Se do recurso, que se interpusera sem efeito suspensivo, não se conheceu, a execução provisória desprovisariza-se, e é ou já foi definitiva, com a coisa julgada. Se dele se conheceu e se confirmou a sentença, a definitivização

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começa daí, porque só daí se pode pensar em coisa julgada. Se o recorrente desiste do recurso, a referência à provisoriedade se faz impertinente. O efeito da suspensão cessa com o desaparecimento da causa, que foi a interposição do recurso. No direito brasileiro, diferente de outros sistemas jurídicos, de modo nenhum a execução provisória depende de declaração do juiz (cp. Código de Processo Civil italiano, art. 282). De iure condendo, a solução brasileira, de velha herança, é a melhor. O credor expõe-se, porque assim quer, às consequências do julgamento desfavorável do recurso, razão por que se estatui o que se lê no art. 588, 1. Art. 588. A execução provisória 1) da sentença far-se-á2) do mesmo modo que a definitiva, observados os seguintes princípios: 1 corre por conta e responsabilidade do credor 8), que prestará caução 11), obrigando- -se a reparar os danos causados ao devedor5) 9) 13) 14); II não abrange os atos que importem alienação 10) do domínio, nem permite, sem caução idónea, o levantamento de depósito em dinheiro; lii fica sem efeito 6) 7), sobrevindo sentença que modifique ou anule 3) a que foi objeto da execução, restituindo-se as coisas no estado anterior4) 15) 16) Parágrafo único. No caso do número Iii, deste artigo, se a sentença provisoriamente executada for modificada ou anulada apenas em parte, somente nessa parte ficará sem efeito a execução 12). 1)CONcEITO E PRESSUPOSTOS DA EXECUÇÃO PROvISÓRIA. A execução provisória é adiantamento da execução no juízo da execução, à diferença do adiantamento de execução no juízo da pretensão à sentença, que ocorre com a execução dos títulos extrajudiciais. Não há combinação do adiantamento da execução com a cognição provisória, nem com a cognição parcial, nem com a cognição superficial. Houve cognição completa; o que pende é a sorte dessa cognição. É preciso prestar-se toda a atenção ao que aí ocorre: não se acautela, conforme já antes exprobramos; nem se tem como formalmente passada em julgado a sentença que em julgado não passou; apenas se adianta execução, porque houve cognição completa, mas pende recurso, e esse recurso não tem efeito suspensivo. A essa solução se chegou atendendo-se a três exigências técnicas: a de se reconhecer o aparelhamento da execução, pelo proferimento da sentença e a sugestão, na espécie, de não ser suspensivo o recurso, ou de não ser suspensivo, em qualquer hipótese, o recurso que cabe; a de não se expor o réu a execução injusta, pois que ainda não transitou em julgado a decisão; a de haver recursos não suspensivos. (a)No direito brasileiro, não se permite que o juiz imprima ou deixe de imprimir força executória ou efeito executório ao título. A executividade da sentença provém da lei, que atende à natureza da sentença conforme foi fixado pela doutrina, tal como se disse sob o art. 587, e condescende com a execução provisória (arts. 587, 2.~ parte, e 588). Vaie, pois, o princípio que os velhos escritores franceses repetiam com expressivo laconismo: “Provision est due au titre”. No título sentencial está a executividade como a lei a pôs no título extrajudicial. A execução provisória é de título executivo sentencial. Princípio da executividade por lei. (b) O segundo princípio que domina a execução provisória é o de eventual equipolência: só se executa provisoriamente sentença que, se tivesse passado em julgado, já poderia ser executada. Assim, também, fica dependente de prova de contraprestação do credor ao executado (art. 615, IV), ou do termo ou da condição (art. 572), a que se tenha de atender. Casos há em que da sentença constitutiva, positiva ou negativa, nasce título executivo, mas aí não é a sentença que é o título, e não se poderia pensar em execução provisória. Outras vezes o titulo provém de sentença executiva lato sensu (e. g., art. 641), porém também aí não é a sentença que éo título. Não se pode pensar em aplicação dos arts. 587, 2.~ parte, e 588. Se proponho ação de anulação de escritura de quitação de título executivo, o elemento constitutivo negativo deixa de pé, com a procedência da ação, o título executivo, porém essa sentença constitutiva negativa de modo nenhum é exeqúível, menos ainda provisoriamente. A despeito do elemento de condenação, tem de ser tratada como sentença constitutiva. O mesmo raciocínio deve ser feito a propósito de ações de mandamento; ou de ações declaratórias do art. 4•o, quando a declaração recai sobre a existência da relação jurídica que implique título executivo, ou sobre a inexistência de relação jurídica que exclua o título ou a executividade do título, ou sobre a autenticidade ou falsidade de título executivo. A execução provisória não pode concernir a despesas e custas, nem a multas que dependem do fato do sucumbimento processual da parte (GIUSEPPE CHIOvENDA, Principii, 205 e 245); ainda que seja a título de dano, como se dá nos casos do art. 29 (J. W. PLANCK, Lehrbuch, II, 640; certo, RICHARD SCHMIDT,

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Lehrbuch, 2.~ ed., 887; aliás, data isso pelo menos de sentença do Parlamento de Paris, a 18 de fevereiro de 1545). Proposta a ação rescisória (2.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 10 de março de 1942, R. dos T., 136, 645), ou, até, proferida sentença positiva, sem que tenha passado em julgado, a execução continua, e não perde o seu caráter de definitiva para ser-lhe aplicada a regra jurídica sobre execução provisória, inclusive quanto à pretensão do executado à caução (3.a Câmara Civil, 18 de fevereiro de 1942, R. dos T., 136, 646). Só o trânsito em julgado da ação rescisória atua na ação executiva. Diga-se o mesmo a respeito da revisão criminal, no caso de se ter atendido ao art. 584, II. 2)ESTADO INTERINAL E ENE~U~A~ DE SENTENÇA. Chama-se estado interinal o em que se executa provisoriamente a sentença, desde a citação à passagem em julgado da sentença exeqúenda ou executada. Esse estado pode ultrapassar a sentença que julga os embargos do devedor e o seu trânsito em julgado. Se cessa antes dessa sentença, transforma em definitiva a execução, que fora provisória, e imprime à sentença proferida nos embargos do devedor, que passou formal-mente em julgado, o caráter de sentença livre da resolução com efeitos ex tunc, que derivaria da reforma da sentença executada. (A construção, se há ação rescisória, é diferente; porque, tendo passado em julgado ambas as sentenças, a sentença exequenda, a do art. 740, in fine, não se pode pensar em execução condicionada de resolução. A desconstituição vai, aí, contra a coisa julgada formal. Idem, no caso de revisão criminal.) Durante o estado interinal, os atos de disposição têm o sinal de negócios sob condição resolutiva (cf. Código Civil, art. 119). Se houve caução, restitui-se (art. 588, III). A sentença e toda a execução provisória ficam sem ei icácia. Quer dizer: perdem-na. Todo o processo passa a ser nenhum. O adiantamento de execução foi como se não tivesse existido todo o processo, inclusive a citação. A sentença desfavorável, que se substitui àquela a cuja execução provisória se procedeu, repercute sobre essa, segundo o art. 588. Essa repercussão apresenta alguns problemas sutis, mas de grande importância na teoria e na prática. Aliás, também se reflete na execução a sentença mais favorável. Aqui, tem de atender-se ao plus de executabilidade. Primeiro (A), se a execução provisória que se faz de sentença, que foi, depois, reformada desfavoravelmente, se tem por nula, desfeita ou ineficaz, a) Se nula, o efeito repercutivo (anexo) quanto a ela é constitutivo negativo e o cumpra-se do juiz executor mandamental negativo. b) Se desfeita, todos os atos praticados valiam, e houve resolução, e não decretação de nulidade: o efeito anexo ainda é constitutivo negativo, o cumpra-se mandamental negativo. c) Se ineficaz, o efeito anexo é menor, apenas desconstitutivo da eficácia, com o mesmo elemento mandamental negativo do cumpra-se, porém, sobrevindo rescisão da sentença desfavorável, a execução lá estaria, apta a recobrar eficácia. Se nos fôssemos guiar pela expressão “sem efeito” do art. 588, III, a explicação c) seria a verdadeira. Contra ela há o argumento decisivo de que nada resta da execução provisória, com o trânsito em coisa julgada formal da sentença desfavorável: essa foi e valia, teve eficácia quase igual à da execução definitiva (art. 588, II, verbis “não abrange”); o que se atacou, com o efeito anexo, não foi a eficácia, nem a nulidade, mas a existência mesma; não se tornou só sem efeito, nem se lhe decretou a nulidade, cortou-se no seu próprio ser, e não só em sua validade, em sua eficácia. Segundo (B), havemos de indagar se a) a reparação dos danos é efeito anexo condenatório (não ad instar do efeito executivo das sentenças condenatórias, porque aí o efeito é próprio das sentenças, e não anexo), ou se b) é efeito condenatório próprio, ou se c) a sentença desfavorável apenas atua como coisa julgada material implícita, a respeito da responsabilidade. A construção verdadeira é a da solução a), que coincide com os argumentos do desembargador MANUEL CARLO5, no acórdão do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 15 de fevereiro de 1944 (R. dos T., 150, 115): “Não é necessário que a decisão reformatória da sentença provisoriamente executada o estatua: o direito de pedir indenização decorre da anulação. Em rigor, não há, no caso, execução de sentença, visto que a sentença provisoriamente executada veio a ser revogada. O que, então, a lei determina é que se restabeleça a situação anterior, facultando-se ao executado reclamar, nos próprios autos da ação, as indenizações a que tiver direito. Há, por assim dizer, ação de ressarcimento, consecutiva, à ação que findou com a decisão de última instância e que se processa nos mesmos autos, com Instrução adequada, quando houver necessidade de alegar e provar fatos que devem servir de base à liquidação” 3)REFORMA DA SENTENÇA PROVISORIAMENTE EXEcUTADA. A sentença, que foi executada provisoriamente, perde toda a eficácia se foi totalmente reformada. Em consequência disso, a execução provisória, que foi efeito dela, passa a não ter existido, ainda que se tenham processado os embargos do devedor e tenha havido sentença de primeira ou superior instância sobre eles. A relação jurídica processual existiu, mas foi desfeita. Quanto aos embargos de terceiro, esses, são ação que é estranha à execução, e o terceiro tem por si ou contra si sentença própria.

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Se a sentença foi reformada em parte a que não corresponde a condenação que se executa, a execução provisória nada sofre. Se em parte que corresponde a toda condenação que se executa, perde toda a eficácia o processo da execução. Se em parte que corresponde a determinada prestação, a execução fica sem efeito quanto a essa prestação e persiste, com toda a eficácia, quanto ao resto (e. g., se foi reformada somente quanto aos juros, Corte de Apelação do Distrito Federal, 11 de dezembro de 1917, R. de D., 47, 592). O exequente, na execução provisória, assume o risco de não ser vencedor na via recursal. A volta ao status quo por vezes acarreta Indenização de danos, inclusive morais. Não se Indaga se houve dolo, ou culpa (2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 9 de abril de 1948, R. F., 121, 98; 25 de janeiro de 1951, R. dos T., 209, 470). O ato de executar provisoriamente entra no mundo jurídico como ato-fato lícito, que dá causa à reparação, por se ter de repor o status qua ante. Tem-se, aí, ponto de suma relevância, no tocante à fonte da divida. 4)FUNDAMENTOS DA INDENIzAÇÃO. A teoria que baseava na culpa, ou no dolo, o ressarcimento dos danos causados pela execução foi posta de lado, porque, a respeito de execução forçada e com mais forte, porém supérflua razão de execução provisória, a indenização corresponde ao princf pio de que a execução indevida engendra por si só a obrigação de restituir e a de ressarcir danos e perdas. N~ é preciso, na maioria dos casos, recorrer-se aos arts. 16 e 17, posto que o simples pedido de execução, fora dos casos legais, possa não ser de má-fé. A infração do respeito à esfera jurídica de outrem, em que importa a execução indevida, basta para compor a figura penal da tentativa de locupletamento ilícito se há conhecimento da falta de direito a executar. O juiz mesmo pode ser responsabilizado, civil (culpa!) e criminal-mente; e o Estado responde por seu funcionário. A sua responsabilidade e a do juiz executor limitam-se a carência ou defeito na verificação da eficácia do título executivo. Em todo caso, se o título é que contém falso, ignorado do juiz executor, o Estado pode responder, sem que responda o juiz executor. Não há responsabilidade objetiva do juiz executor; sempre se há de apoiar em culpa ou dolo. A reposição no estado anterior faz-se nos próprios autos da execução, com a citação e defesa dos exeqúentes transformados em réus e, afinal, executados (3.a Câmara do Tribunal de Apelação de São Paulo, 9 de dezembro de 1942, R. dos T., 144, 156), pois que se trata de ação de condenação e de ação de execução, metidas no processo de execução que ficou atingido. O art. 588 tem incidência, quer se trate de execução de sentença de carga 3, que é id quod plerum que fit (execução de sentença condenatória, ou outra, de carga de executividade mediata, actio iudicati), quer se trate de execução de sentença executiva (sentença de carga 5 de executividade, como as sentenças proferidas nas ações de reivindicação, de petição de herança, do titular do direito de preferência contra o terceiro para haver a coisa, de quem perdeu ou a quem foi furtado título ao portador, ou na ação de despejo). Pode acontecer que só se haja dado provimento ao recurso em parte; de jeito que somente fica sem efeito a execução naquilo em que a sentença for reformada. Se o autor houvesse esperado o julgamento do recurso e o trânsito em julgado para propor a ação executiva, teria de ser nos autos dessa qualquer alteração à execução. Não tendo aguardado a coisa julgada formal, a reforma da sentença ou de parte dela desfaz tudo que se fez em virtude de sentença que não foi mantida, ou só o foi em parte. Daí ser nos próprios autos da ação em que se proferira a sentença com eficácia mediata de executividade (3). Tratando-se de sentença com eficácia preponderantemente executiva (5), ou com eficácia imediata (4), não há dois processos, de forma que a solução somente poderia ser a que se deu para as execuções de sentenças com carga 3 de eficácia executiva. 5) REPARAÇÃO DOS DA;NOs. A reparação do art. 588, 1,é nos autos do processo da ação executiva provisoriamente intentada (art. 589, 2.a parte), e não nos autos da ação condenatória, ou outra de cuja sentença proveio a executividade provisória (cf. 5•~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 2 de março de 1951, R. F., 146, 234). A reforma da sentença, por exemplo, na ação de despejo, que se executou provisoriamente, dá causa à reparação dos danos e à reposição do status quo ante (art. 588, 1 e III); portanto, à volta do locatário (cf. Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 24, § 1: “E achando-se, depois, que o mandou lançar maliciosamente e sem justa causa, o alugador seja logo tornado a ela, e poderá nela morar em tresdobro o tempo que lhe ainda ficava para morar quando dela foi lançado”). N~ temos mais a prestação do tresdobro, de que falavam as Ordenações Filipinas; temos apenas a reposição do status quo ante; segundo o art. 588, 1 e III. Se é possível a reposição, é de fazer-se; se não, há a indenização. Tampouco se precisa, hoje, de apurar dolo ou culpa do exequente. Pela volta do locatário pelo tempo que ainda tinha, ao ser despejado, a 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 25 de janeiro de 1951 (R. dos T., 209, 470), o Conselho de Justiça do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 8 de setembro de 1950 (R. de J. B., 94, 58), a 5•a Câmara Cível, a 8 de maio e 21 de dezembro de 1951, (D. da J. de

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14 de março de 1952; A. J., 102, 292); sem razão, a 4.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 2 de março e a 6 de maio de 1951, (R. F., 135, 462, e D. da J., de 16 de abril de 1953). Com a solução certa, a 2.~ Câmara Civil do Tilbunal de Justiça de São Paulo, a 23 de maio de 1950 (R. dos T., 187, 209), que afastou a tese da só a indenizabilidade. Se tem de ser devolvida a coisa executada, (a) ~,têm-se de observar os arts. 621-631 (execução por coisa certa, ou em espécie), cabendo embargos do devedor? Nesse sentido, a 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 19 de setembro de 1950 (R. dos T., 189, 458) e a 6 de março de 1951 (190, 832), e a 5~a Câmara Cível, a 8 de maio de 1951. Outra solução (b) seria a de adotar-se o mesmo rito da ação que fora proposta, e. g., o rito da ação de despejo, se a sentença, provisoriamente executada e reformada, fora em ação de despejo (5.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 21 de dezembro de 1951, A. J., 102, 292). Há, ainda, a solução (c) de se tratar a espécie, simplesmente, como de injusto desapossamento. Tem-se de dar a correção do que fora feito. Não se pode equiparar a posição do autor que perdeu à do autor que tem sentença a executar, nem à do demandado que venceu. O demandado que sofreu injustamente a execução não tem titulo judicial executivo, que dependa do processo da ação iudicati. ~ pessoa injustamente desapossada, que tem ius à posse que perdera. A 5~a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 2 de março de 1951 (D. da J. de 7 de fevereiro de 1952), considerou caso de imissão de posse, por efeito mandamental da sentença reformadora. Tudo nos próprios autos, como ocorre com a liquidação dos danos que a execução provisória causara. Tem-se de corrigir a terminologia: a espécie não é de imissão, mas sim de restituição. Quanto às alegações de novação, ou de prescrição superveniente à decisão reformadora ou ao último ato praticado no processo (Código Civil, arts. 172, IV, e 173), são matéria para ser atendida pelo juiz, antes de se expedir o mandado de restituição da posse, ou após o cumprimento dele, dentro dos próprios autos, sem caráter de embargos do devedor. A situação é dependente da eficácia que se atribui a fato que se há de declarar. A declaração é ex tunc. Se se conhece do recurso extraordinário e não se lhe dá provimento, o trânsito em julgado só se opera após o prazo que se conta da decisão no recurso extraordinário, porque recurso ainda cabia e só transitam em julgado as decisões quando não há mais recurso, e não quando só há recurso com efeito suspensivo. Não se pode saber se a sentença transitou em julgado antes de se saber se cabia recurso extraordinário e dele se conheceu. Se o tribunal conhece do recurso extraordinário e lhe dá provimento, tudo se passa como se não lhe houvesse dado provimento, porque o trânsito em julgado não ocorre antes de esgotados todos os recursos, suspensivos ou não. Se o tribunal não conhece do recurso extraordinário, então, sim, houve o trânsito em julgado ao tempo em que se esgotou o prazo contado da decisão recorrida. O que se disse quanto ao recurso extraordinário tem toda pertinência em relação a qualquer recurso sem efeito suspensivo. (A Insuspensividade do recurso é alusão prévia à possibilidade de execução provisória.) Se houve execução, a despeito de se haver interposto recurso extraordinário, ou outro recurso sem efeito suspensivo, só se pode saber quando a sentença transitou em julgado depois que se julga o recurso; e só então é que se pode qualificar de definitiva ou provisória a execução da sentença. É erro dizer-se que, em qualquer caso de julgamento (conhecimento, não-conhecimento, provimento, não-provimento), a execução é definitiva (e. g., Câmaras Cíveis Reunidas do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 25 de novembro de 1947, R. dos T., 182, 365; 2? Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 29 de janeiro de 1951, J. M., III, 633): houve execução, porque se permitia, uma vez que o recurso interposto não tinha efeito suspensivo; mas foi provisória. Se do recurso não se conhece, definitiva fez-se ela; se do recurso se conhece, não houve trânsito em julgado, e a reforma pode destruir tudo que se adiantou. Os que dizem que o recurso extraordinário não torna provisória a execução (e. g., 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 2 de janeiro de 1950) não prestaram atenção ao que liam. O art. 587, 2.a parte, estatui que se permite a execução provisória se há recurso só com o efeito devolutivo. Portanto, se o recurso tem efeito suspensivo, a execução seria Intempestiva. Execução definitiva somente há se nenhum recurso cabe. É Incrível como se lança em acórdãos que, havendo recurso extraordinário, a execução é definitiva. Os repositórios de jurisprudência estão cheios de julgados tais. É digno de menção que um juiz da 3.~ Vara da Fazenda Pública (CLóvIs RODRIGUXS), conforme despacho publicado no D. da J. de 14 de agosto de 1953, haja lido, com acerto, a regra jurídica: “Na pendência do recurso extraordinário, a execução é provisória, exigindo-se, para a sua admissibilidade, a prestação de caução”. Erradíssimos os acórdãos da 1.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 11 de novembro de 1948 (R. dos T., 187, 956), da ~•a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 22 de abril de 1949 (R. F., 131, 151), da 6? Câmara Civil do Tribunal de Justiça de são Paulo, a 17 de novembro de 1950 (R. dos T., 190, 360) e a 5 de outubro de 1951 (195, 296), da 3.~- Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, a 15 de dezembro de 1951 (Paraná J., 55, 40), da Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, a 29 de janeiro de 1953 (J. e D., IX, 166), e da 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 23 de janeiro de 1953 (R. dos T., 209, 269), e a 16 de março de 1950 (192, 214), que dispensaram a caução hoje, do art. 588, 1 contra a letra da lei.

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A afirmação de que, a despeito do recurso extraordinário,a sentença transita em julgado, revela nenhum conhecimento da noção de coisa julgada formal. Nenhum maior absurdo do que admitir sempre coisa julgada formal.., pendente de recurso a sentença (e. g., 3.~ Câmara Civil do Tribunal deJustiça de São Paulo, 18 de dezembro de 1947, R. dos T., 172,620; 2? Câmara Civil, 29 de junho e 24 de agosto de 1948, 176,315 e 669; Conselho de Justiça do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 5 de fevereiro de 1948, R. F., 123, 461; 5? Câmara Cível, 22 de abril de 1949, 131, 151). Só a irrecorribilidade define a coisa julgada formal. Interposto recurso extraordinário, ou qualquer recurso sem efeito suspensivo, só se pode saber se passou em julgado a sentença se o tribunal não conhece do recurso. Se dele conhece e o julga improcedente o trânsito em julgado da sentença é o trânsito em julgado da decisão desfavorável: recurso houve, cabia, e não ocorreu provimento. Se dele conheceu e deu provimento, não há res iudicata da sentença; há do acórdão. 6)REFORMA E NEGAÇÃO DA SUSPEN5IVIDADE DO EFEITO DO REcuRso. Se o réu, condenado no juízo do primeiro grau, apelou, ou foi condenado noutro grau, não tendo sido aceito o recurso com o efeito suspensivo que devera ter, e se procede à execução, mas o juízo do grau superior reforma a sentença, aplica-se, a fortiori, o art. 588. (O mesmo ocorreria nos casos de ação executiva de títulos extrajudiciais, se o réu acabasse por ser absolvido, pois a execução definitiva foi ilegal.) 7)REsCIsÃO DE SENTENÇA E EXECUÇÃO DECLARADA INJUSTA. Sendo definitiva a execução e havendo rescisão da sentença exeqüenda , a responsabilidade do exeqilente rege-se (a) pelos arts. 16 e 17 e (b) pela responsabilidade fundada no ilícito. Essa, à diferença daquela, suscita a questão de serem definidos os pressupostos, os das ações de dolo processual, fundadas na culpa (cp. art. 811), ou os da ação especial do art. 588, 1 (responsabilidade objetiva). A distinção entre a apresentação sem entrega da prestação jurisdicional, que é o caso de execução provisória de “sentença” ainda sujeita a recurso, e a entrega, que é o da sentença rescindível (art. 485), decisão passada em julgado (art. 587,1.a parte), basta para se dever responder que o art. 588, 1, não rege a responsabilidade do exeqüente de sentença “existente” e “rescindível”. 8)MA-FE EM DIREITO PROCESSUAL. No processo executivo, quer nas ações de execução de títulos extrajudiciais, quer nas execuções de sentença, quer em outras ações executivas, pode dar-se md-f é (arts. 16 e 17). A reparação dos danos sofridos pelo que foi provisoriamente executado é independente da culpa: trata-se de responsabilidade objetiva do que confiou em que seria mantida a sentença de cognição. Resta saber-se se há ação de reparação pelos danos causados pela execução definitiva. Claro que está fora de exame o que poderia ter ocorrido durante o processo de cognição, que é outro processo e já ficou atrás. O que executa a sentença executa ato estatal, cuja injustiça não mais se discute e cujos precedentes de conduta já se cobriram com a preclusão, para que se invoque a eficácia da sentença. O que nos interessa é a conduta das partes na execução. O exequente, na execução, está amparado na sentença exequenda. As ações e sanções dos arts. 16, 17 e 18, são comuns aos processos de cognição e aos executivos. Basta, para que se dêem, que a conduta reprovada tenha acontecido no processo de execução. A ação contra ato de má-fé não pode bastar a embargos do devedor; não é, de modo nenhum, ação mandamental contrária: é ação de condenação. Nem é cumulável com a matéria dos embargos do devedor, posto que a má-fé possa resultar, por exemplo, do excesso de execução (arts. 741, V, e 743). Aliter, se se tratasse de embargos de terceiro (arts. 1.046-1.054). As alegações do art. 18 e § § 1.~ e 2.0 são, de iure concluendo, admissíveis nos embargos do devedor, se referentes à conduta da outra parte no processo de execução, isto é, e melhor, posterior à formação do título executivo. O excesso de execução a execução hetero-objetiva (execução de um bem, em vez de outro) e a execução im pronta (art. 743, III), que o Código junta sob a denominação englobante de “excesso de execução” é fato de que provavelmente também resulta a acionabilidade pela má-fé, ou pelo dolo, etc. Bem assim as execuções, extinta a eficácia executiva da sentença (pagamento, pacto de non petendo, concordata judicial, prescrição superveniente, transação). Porém a prestação dos danos se há de pedir em processo a parte. Resta apenas saber-se se, junto a esse elemento declarativo da existência da extinção da eficácia, ou da moratória, ou do excesso de execução, é permitido ao executado pedir, desde logo, que se declare existir a relação jurídica de obrigação pelo ilícito (an debeatur), sem se entrar na determinação do quantum. Veja-se, a respeito, o quadro sobre as sentenças condenatórias amputadas: até onde os pedidos ainda são de sentença declarativa, os embargos de devedor os podem conter, pela Intima ligação à declaração dos embargos mesmos, que faz caberem no pedido mandamental negativo. O princípio de economia exige-o; mas é o modo que se pode conceder de cumulação objetiva. Admita-se que se tem de deixar fora toda discussão da culpa. Se assim não se procedesse, a sentença passaria a ter elemento condenatório, impróprio aos embargos do devedor, o que só se concebe em caso de exceção legal aos princípios (e. g., art. 18 e seus parágrafos).

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As considerações que acima foram feitas excluem, de si sós, evidentemente, qualquer articulabilidade do dolo nos embargos do devedor. Os embargos do devedor, ação mandamental, cujo rito processual é restrito, não podem cobrir ação condenatória, salvo se a lei mesma excepcionalmente o permite. Nos embargos do devedor, o elemento condenatório é secundário. 9)AçÃo DE RESSARCIMENTO E EXECUÇÃO DE SENTENÇA. Se procuramos “isolar” as diferentes construções do art. 588, 1, encontramos:a) As velhas teorias de ser a regra jurídica do art. 588, 1, simples alusão a que ai também se permite a ação de ressarcimento do dano pela culpa ou dolo, que foram postas de lado. Tal construção reduziria a regra jurídica a zero, pois que a veria como se fosse simples remissão ao direito comum. Desconhece, além disso, o problema de técnica legislativa que se formou através dos tempos e exsurge, em solução, no art. 588, 1: não atende ao princípio de igual tratamento das partes pendente a lide, isto é, antes da coisa julgada formal; nem à circunstância de que foi erro do juiz e a utilização dele pelo exeqilente, que fez o executado, ora ganhante, sofrer os danos. De modo que, se o executar a sentença antes de passar em julgado não é, de si só, pressuposto suficiente para ressarcimento dos danos, pode ser que não tenha havido culpa do exequente e o executado sofrerá todos os danos que resultaram da execução provisória. No fundo, teria o art. 588, 1, simples significação de explicitude. Além de provir, em parte, da falsa concepção de que a sentença de primeiro grau é sentença firme, subordinada àcondição resolutiva, a atitude a) tem raízes noutra concepção romanística, hoje superada, a de que os direitos vivem sem se tocarem, a de que o exercício de cada direito independe do dano que cause a outrem, concepção absolutista que estudamos e criticamos sob os arts. 16 e 17 (*Neminem laedit quí suo iure utítur). Todos sabemos, hoje, que há relatividade dos direitos. Ora, o restabelecimento do status quo ante é consequência necessária da reforma da sentença, no que lhe retirou a eficácia executiva, que o legislador entendeu (os seus propósitos de política jurídica não vêm ao caso) conferir àsentença (art. 588, 1). O exeqúente usou dele; e o art. 588, 1, tem a função, no sistema jurídico, de sancionar a conduta, reformada a sentença, ainda que não tenha havido dolo,ou culpa, ou, sequer, abuso do direito. Se responde também por alguma dessas é outro problema. b) A teoria de que o art. 588, 1, estabelece presunção de culpa, de modo que o exeqílente, perdente do recurso, pode eximir-se, fazendo a prova de que não teve culpa. Se presunção há, foi elemento inspirador da regra jurídica do art. 588, 1, e não presunção criada pela regra jurídica. Nem se há de interpretar texto de lei processual, redigido em termos de regra jurídica cogente, como se fosse regra jurídica dispositiva. Perdendo a causa, o exequente, que se apressou, fica na situação de quem não se conduziu conforme o direito; e qualquer prova de que procedeu sem culpa, pois a sentença tinha probabilidades enormes, in casu, de prevalecer, implica apreciação dela e da decisão que a reformou. Cair-se-ia na contradição de se permitir ao juiz, no resolver sobre o an debeatur, reexaminar o mérito, e a título de apurar a não-culpa do exeqúente de achar que a sentença reformada tinha fundamentos jurídicos. Certo, nos arts. 587, 2.~ parte, e 588, 1, a lei tem a reforma como sendo menos provdvel do que a confirmação, mas esse critério serviu ao legislador, e nada tem com as partes. Alguns sistemas jurídicos adotam mesmo a solução (legislativa) de dar ao juiz a apreciação da oportunidade, envolvida, naturalmente, com a probabilidade da reforma. Ainda aí não são as partes que têm de medir a probabilidade de ser mantida ou reformada a sentença provisoriamente exequível. Toda a apreciação fica, aqui como ali, do lado do Estado. E foi isso o que não viram os adeptos da atitude b). Tem de ser repelida. c) A teoria dita do risco ou teoria da responsabilidade objetiva (isto é, sem o elemento subjetivo das duas outras teorias, culpa ou presunção de culpa). A execução provisória é facultativa; por outro lado, o exeqúente tem a pretensão a executar a sentença do art. 584, 1, expondo-se, porém, no caso da perda da causa, às conseqUências previstas pelo art. 588, 1. Argumento a favor de tal tese, que é a verdadeira, consiste em se apontar nas teorias a) e b) reminiscência da concepção da sentença de primeira instância como sentença subordinada a condição resolutiva, concepção já hoje varrida da ciência do direito processual Tem-se, aí, simples aplicação do resultado da discussão científica. A jurisprudência francesa, acentuando tratar-se de exercício de “direito legitimo e incontestável” (o de execução provisória), logo notou que a conduta do exequente era a seu risco e perigo (“à ses risques et périls”), como se dizia em arestos de 1863 e 1923 (Louís JoSSERAND, De l’Esprit des Droíts, 61). N~ há culpa; o exeqi.iente tinha, antes da execução, dois caminhos: o de executar a sentença sujeita a recurso sem efeito suspensivo e, pois, arriscar-se à sanção prevista no art. 588, 1; ou não na executar. Executando-a, apressou-se; se perde, expõe-se às conseqüências da sua escolha. Não há, aí, questão de culpa (menos ainda de dolo), nem de exercício abusivo do direito, nem de temeridade, ou de imprudência. Há, apenas, assunção de risco, isto é, há, apenas, exercício de direito e de pretensão, que, eventual-mente, gera responsabilidade. O que se acentuou na doutrina e o que aqui precisamos resumem a verdade. (Certa jurisprudência francesa procurou distinguir a sentença provisoriamente exeqUível, somente sujeita a recurso extraordinário lato sensu, como a que admite o recurso extraordinário dos arts. 541-546, e a sentença

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provisoriamente exeqUível, sujeita a recurso ordinário, para só considerar aplicável nesse caso a regra jurídica de responsabilidade objetiva. Mas foi arbitrária, artificial, a distinção, o que provocou percuciente nota de Louis JOSSEEAND, em 1923. N~ tendo passado em julgado a sentença, todos os recursos são iguais, para a aplicação do art. 588, 1. Em vez do Neminem laedít, é ao princípio Qui sentit commoda, et incomoda sentíre debet que se prende o art. 588, 1. O exeqUente, escolhendo o caminho da execução provisória, somente viu o seu interesse, e investiu, através do Estado, contra a esfera jurídica do executado; em simetria, o Estado dá ao executado o ressarcimento com base no art. 588, 1, porque o exeqUente, segundo ficou assente (decisão reformante), escolhera errado. Somente levando em conta as vantagens, para si, da execução provisória, o exequente expôs-se à álea. Não houve fortuidade na escolha, nem na reforma: o exeqUente escolheu, de sua livre vontade; os juizes, competentes para isso, reformaram a sentença mesma que lhe permitiu o dilema: executar, a seu risco, a sentença; ou esperar. 10)ATos DE ALIENAÇÃO CONTRÁRIOS A DIREITO. Se acaso foram praticados os atos de alienação que o art. 588, II, veda, tém os bens de ser restituidos, ainda que se achem com terceiro. A ação é a de ineficácia, com o pedido de restituição executiva (cf. MANUEL GONÇALvES DA SILVA, Commentaria, III, 265). Quanto aos frutos e às benfeitorias, depende do direito material; quanto aos frutos das benfeitorias, não se compensam com essas, ainda que de má-fé o possuidor (MIGUEL DE REINOsO, Observationes Practicae, 389 s., contra a opinião de ALv~o VALASCO, Decisionum, 1, 192, e MANUEL GoNÇALvES DA SILVA, Commentaria, III, 270). Frise-se bem que a ação é de ineficácia. A sentença da parte sentencial a respeito é declaratória. O art. 588, II, onde se diz que a execução provisória não abrange os atos que importem alienação do domínio, nem permite, sem caução idônea, o levantamento do depósito em dinheiro, evita que, na possível volta ao estado anterior sejam prejudicados os terceiros, ou o próprio devedor, que fizera depósito. Resta saber se a ação declaratória de ineficácia, com infração do art. 588, II, seria preciso propor-se. A resposta seria negativa, se a espécie coubesse no art. 588, III, que torna ineficaz o que antes eficazmente se fizera; porém não cabe. Nem houve fraude de execução (ari. 593, III); por parte do devedor, o que afasta qualquer invocação de regra jurídica sobre fraude do devedor. O que houve foi ato do juízo que desobedeceu ao art. 588, II, mesmo se foi suscitado pelo credor. Há ineficácia. A ação seria declaratória, e pode promover-se nos próprios autos, em que se pede a restituição das coisas no estado anterior. Se o recurso não tem efeito suspensivo, há a executabilidade provisória (dissemos “executabilidade”, porque é a libito do autor propor, ou não, desde logo, a execução). Há a eficácia executiva, mas provisória. Os atos foram permitidos, mas sujeitos à possível ineficacização, com sentença trânsita em julgado. Se houve infração do art. 588, II, então a ineficácia já ocorrera. Ineficácia ex tunc, e não ineficacização. 11)CAUÇÃO E ExECUÇÃO DE SENTENÇA. A respeito de caução, tinha-se procurado distinguir dos outros recursos (apelação, agravo, embargos infringentes do julgado) o recurso extraordinário (Câmaras Civis Reunidas do Tribunal de Apelação de são Paulo, 23 de julho de 1943, R. F., 96, 663); porém isso não estava na lei, nem se explicava, a despeito da insistência de tal jurisprudência (4.a Câmara Civil, 12 de agosto e 25 de novembro, R. dos T., 149, 575; 150, 136; 1.a Câmara Civil, 22 de novembro de 1943, 147, 606). Não há execução definitiva se cabe qualquer recurso; sendo, portanto, provisória a execução, o art. 588, II, tem de incidir. Não há execução definitiva se pende recurso; e não há qualquer diferença entre as execuções provisórias por motivo de distinção entre os recursos: recurso de efeito suspensivo, nenhuma execução; recurso sem efeito suspensivo, permitida, não obstante e apenas, a execução provisória. N~ há, de modo nenhum, terceira espécie. A jurisprudência que, pendente recurso extraordinário, afirmava que a execução é provisória, por não ser suspensivo o efeito do recurso, mas dispensa a exigência da caução, a que se refere o art. 588, II, 2.~ parte, seria contraditória. Se a execução é provisória (art. 587, 2.~ parte), o art. 588, II,2.~ parte, incide, como incide o art. 588, II, 1.a parte, ou o art. 588, 1, ou o art. 588, III. O acórdão da 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de são Paulo, a 16 de março de 1951 (R. dos T., 188, 268), como o da 6Y~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 6 de janeiro de 1951, foi contra direito. ~ absurdo dizer-se que, interposto recurso extraordinário, a execução é definitiva, como fez o Conselho de Justiça do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 9 de setembro de 1948. As decisões da 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 11 de novembro de 1948 (D. da J. de 9 de junho de 1950, 1746) e da 2.~ Turma, a 25 de agosto de 1959 (D. da J. de 24 de julho de 1961, 236), foram sem fundamento admissível. 12)REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. Se a decisão no recurso sem efeito suspensivo foi favorável ao recorrente, no todo do recurso, ou em parte dele, mas sem elidir a condenação, pelo menos no quanto aproximado da sentença exeqüenda , não se desfaz, com isso, a execução iniciada, apenas se procede à alteração que se faz mister. E. g., se a decisão no recurso se limitou a mandar aplicar o art. 602 e § § 1.<~ e 2.0, antes arts. 911 e 912 do Código de Processo Civil de 1939 (3.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal,

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25 de novembro de 1943, D. da J. de 26, 4542). 13)EXECUÇÃO PROVISÓRIA INJUSTA. Execução provisória é aquela a que se procede se pende recurso no efeito somente devolutivo e do recurso interposto se conhece. Se não se conheceu do recurso pendente, ou dele e de outro que também depois se interpusera, ou se do recurso não se conheceu, porém em outro recurso que se interpusera da decisão de cognição e se julgou que não cabia o recurso, a execução que se pensava ser provisória não no foi. Ignorava-se a definitividade e talvez tudo se haja passado como se provisória fosse a execução. Por mais que interessados e juizes conheçam o direito, não podem adivinhar o que se vai julgar na instância superior, que tanto pode estar certa como pode errar. Se foi prestada a caução a que se refere o art. 588, III, levanta-se; e, se alguma alienação se cria ilegal, foi legal. A execução provisória pode ser injusta, se a sentença de que provinha a eficácia executiva foi reformada, eliminando-se ou diminuindo-se o quanto, ou se foi decidido que o efeito do recurso era suspensivo, e não só devolutivo. A execução provisória não é execução contrária a direito. OEstado, ao prometer a tutela jurídica, considerou título executivo provisional a sentença de que caiba recurso sem efeito suspensivo. Se pode o credor vir a ser responsabilizado, isso resulta apenas de se ter deixado a seu risco exercer, ou não, a ação executiva. Trata-se de dever de reparação ou de indenização por ato jurídico lícito (WOLFGANG BERNHARDT, Vollstreckungsgewalt und Amtsbetrieb, 48 5.). No Tratado de Direito Privado (Tomos II, § 186, 4 e 9; XIV, § 1.609), mostramos outros casos de indenização ligada a atos jurídicos licitos, e até por fatos jurídicos stricto sensu lícitos (XV, § § 1.708, 1.712, 3). A teoria da antijuridicidade da execução provisória é de repelir-se, mesmo quando somente reputa ilícito ou contrário a direito o exercício da pretensão à execução, o impulso executivo, que o credor, que conhece o estado da causa, promovera (e. g., FRIEDRICH STEIN, Grundfragen der Zwangsvollstreclcung, 18; O. GEIB, Rechtsschutzbegehren und Anspruchsbestatigung, 113). Em todo caso, se o título executivo judicial é inexistente, ou nulo, há ilicitude, porque, ex hypothesi, não há pretensão à execução, nem havia. Houve tempo em que se considerava lícito o exercício da pretensão à tutela jurídica e ilícito o pedido de adimplemento (pretensão de direito material, res in iudicium deducta), mas a licitude ou ilicitude, ai, só se há de apurar quanto ao exercício da pretensão à tutela jurídica, quanto ao ingresso, com o titulo, em juízo. Aliás, também se há de afastar que haja ilicitude quanto ao exercício da pretensão à tutela jurídica e quanto ao petitum, que seriam um só corpo, confusão grave e evidente em Juuus BINDER (Pro~ess und Recht, 220 e 237 s.). Há ilicitude se a pretensão à execução não existe (e. g., título inexistente ou nulo ou ineficaz). O título judicial não é só documento da divida, é titulus, é a sentença mesma, com o seu peso 3 de eficácia executiva. Se ele existe e vale e é eficaz, a jurisdicidade da execução ressalta, mesmo se a sentença trânsita em julgado foi injusta, ou se, na execução provisória, vem a ser reformada. 14)REPARAÇÃO DENTRO DOS AUTOS. Se houve danos ao executado, em execução provisória de sentença, tem o executado, ou quem sofreu com a execução injusta (e. g., o inquilino do prédio locado), ação de reparação dos danos causados pela execução provisória, e tal ação é incidental (art. 588, 1). Tem-se de considerar como legitimação o terceiro alcançado pela constrição executiva, ou que devido a ela sofreu dano. A liquidação é ação que se exige antes da constrição executiva, mas o Código de Processo Civil embutiu-a no processo da execução (arts. 603-611). Se dela se precisava e não se fez, a execução é ilegal. A ação de reparação, de que estamos a falar, há de ser concebida como nos autos da ação executiva. Se a injustiça foi apenas decorrente de ter sido precipitada a execução, os danos são os decorrentes da execução a despeito da suspensividade do recurso. 15)RESTITUIÇÃO NO E5TADO ANTERIOR. Restituição no estado anterior é a volta ao que era materialmente, antes da execução. A execução provisória fica sem efeito se sobrevém sentença que retire, no todo ou em parte, a pretensão à execução. O art. 588, III, do Código de Processo Civil prevê tal emergência, determinando que se proceda à reposição em natura, o que não é raro ser incabível, pois o art. 588, II, diz que a execução provisória não abrange os atos que importem alienação do domínio. 16)REPOsIçÃo NO ESTADO ANTERIOR E IMPOSSIBíLIDADE Se é impossível a restituição em natura, tem-se de pedir a indenização do dano sofrido. Cf. art. 588, 1. Art. 589. A execução definitiva 1) far-se-a nos autos principais; a execução provisória, nos autos suplementares, onde os houver, ou por carta de sentença, extraída do processo pelo escrivão e assinada pelo juiz 2)~

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1) ExEcUÇÃO DEFINITIVA. O art. 589 cogita do procedimento da execução, se definitiva ou se provisória, mas apenas no tocante aos autos. A execução é definitiva trate-se de titulo judicial, se da sentença não cabe recurso, isto é, se passou em julgado, ou de título extrajudicial. Se de título judicial, já houve autos da ação de cognição, e neles corre a ação executiva. Não são, propriamente, autos “principais”, porque a simples antecedência não principaliza. O que ocorre é mesmidade de autos, como que divididos pela sentença (até a sentença; depois da sentença). Se o titulo é extrajudirial, autos não houve, porque a lei apenas antecipa à cognição a execução. Não se poderia falar, de modo nenhum, de autos “principais” em tal execução definitiva. Devemos entender o art. 589 como se nele estivesse escrito: A execução definitiva de título judicial faz-se nos autos em que se proferiu a sentença; a execução definitiva de titulo extrajudicial tem os seus próprios autos; a execução provisória, nos autos suplementares aos autos de ação de execução, que são os mesmos em que se proferiu a sentença, ou por meio de carta de sentença, que o escrivão extrai do processo e o juiz assina. Não há execução provisória de título extrajudicial, razão por que o art. 589 devia ter dito: “A execução definitiva dos títulos judiciais far-se-á nos autos em que se proferira a sentença. A execução definitiva é a normal para os títulos judiciais, pois que para eles anormalmente pode haver execução provisória. A execução de títulos extrajudiciais só é definitiva. O que pode acontecer é que, com o julgamento de algum ponto de cognição dos embargos do devedor (art. 745), se desfaça tudo que foi feito. Não havia provisoriedade; havia defínitividade; e a sentença na ação de embargos do devedor apagou a execução. Se a execução foi definitiva e não houve embargos do devedor e os houve mas foram julgados improcedentes, a ação rescisória de sentença pode ir contra o que transitou em julgado (art. 485), mas, aí, o que sobrevém é o cindir do que existia. Se, com o julgamento do recurso, a execução se fez definitiva, as peças necessárias que se achavam nos autos suplementares, ou nos autos que resultaram da carta de sentença, são apensadas aos autos da ação em que se proferiu a sentença exequenda. Com os chamados autos suplementares, a execução provisória parte da sentença que consta dos autos da ação de cognição, isto é, daqueles a que os da execução se suplementam. Se, na falta de regra jurídica sobre autos suplementares, ou, por exemplo, por se terem extraviado os autos, não se puder pensar em autos suplementares, a solução é a de o escrivão extrair do processo a carta de sentença e o juiz assiná-la, ou entregar carta que já havia extraido e o juiz assinara, ou atender ao pedido ou à apresentação da carta de sentença (cp. arts. 521, 545, parágrafo único, 589 e 590). 2)EXECUÇÃO PROVISóRIA E CARTA DE SENTENÇA. Nos casos de execução provisória (arts. 587 e 588), não tendo pois efeito suspensivo, portanto, o recurso, os autos, ou (a) permanecem em cartório (e. g., art. 497), ou (b) sobem com o recurso (e. g., art. 520). Se ocorre existirem autos-cópias ou suplementares, a solução no caso (b) é fácil, e a isso provê o art. 589. Se os não havia, usava-se extrair traslado dos autos (Tribunal de Justiça de São Paulo, 28 de maio de 1910, S. P. J., 23, 82), se não bastasse a carta de sentença. Baixando os autos, pela confirmação da sentença, por eles deviam guiar-se os encarregados da execução. O Código de 1939, após emenda por que passou, permitiu a execução por meio de carta de sentença, extraida dos autos pelo escrivão e assinada pelo juiz. Tal a solução do art. 589 do Código de 1973. A ratio legis tem de ser lembrada, em muitos casos, para se decidirem questões. O Supremo Tribunal Federal, a 28 de outubro de 1940 (O D., IX, 260), entendeu, sem razão, que, havendo parte líquida e parte a ser liquidada, é caso de extração de carta de sentença. Com isso, dividir-se-ia o processo, o que não está na lei. Nada impede que, não havendo recurso, se prossiga nos mesmos autos a execução quanto ao líquido, enquanto se liquida o ilíquido. Se há recurso, a carta de sentença tem de ser extraída, quer haja parte liquida, quer não. Em verdade, o Supremo Tribunal Federal, no citado acórdão, feriu o princípio Propter illiquidum non suspenditum executio Ziquidi. Pode acontecer que haja autos suplementares (arts. 159 e § § 1.0 e 2.0, 167, 1.063, parágrafo único, e 1.067, § 2.’~), ou não os haja. Se o juiz entende ser difícil e prejudicial a execução da parte líquida e a liquidação nos mesmos autos ou àquela se procede nos autos suplementares, se os há, ou se não os há, com a carta de sentença, e à essa nos autos da ação de conhecimento em que se proferira a sentença exeqúenda. (Se o titulo executivo é extrajudicial, a execução é só da parte liquida. A outra parte é objeto de ação de liquidação, ou de medida cautelar de liquidação, conforme antes dissemos, sob o art. 586, § 2.0.)

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Art. 590. São requisitos da carta de sentença 1): 1 autua ção; II petição inicial e procuração das partes; 111 contestação; IV sentença exequenda; V despacho do recebimento do recurso 2) Parágrafo único. Se houve habilitação3), a carta conterá a sentença que a julgou. 1)CARTA DE SENTENÇA. A carta de sentença é documento em que, em vez de só certificar, como acontece com as certidões, é algo de duplicação do que consta dos autos como sentença. ~, pois, sentença em documento fora dos autos em que está a sentença. A legislação processual civil foi diminuindo o seu uso e acertadamente persuadiu-se dela para a execução das sentenças, uma vez que à execução nos próprios autos basta a própria sentença que deles consta. Daí o art. 521 dizer que, recebida a apelação só no efeito devolutivo, o apelado poderá promover, desde logo, a execução provisória da sentença, extraindo a respectiva carta. Se ocorre recurso extraordinário, pode o recorrido, que tem a seu favor sentença com 3 de executividade, requerer, quando for o caso, carta de sentença para execução do acórdão recorrido (art. 545, parágrafo único). Para a execução de sentença estrangeira, que foi homologada, extrai-se carta de sentença, que aí consta dos autos da homologação (art. 484). Os arts. 589 e 590 são referentes à execução provisória, se tem de ser feita com a carta de sentença, se não há, no lugar, autos suplementares. Temos de frisar que a carta de sentença, no direito brasileiro, não se pode conceituar como simples cópia ou certidão. Cópia há nos autos suplementares, onde os há (arts. 159 e § § 1.0 e 2.0, e 167). Mesmo no direito processual civil alemão, onde o § 724 da Ordenação Processual Civil não coincide exatamente com o que se estatui no sistema jurídico brasileiro, há a tendência para se distinguir da simples cópia ou certidão. Ao mencionar os requisitos da carta de sentença, o art. 590 deixa evidente que há muito de estranho à simples certidão ou cópia de sentença. O conter a sentença exequenda é apenas um deles (art. 590, IV). Nem poderia deixar de ser assim, porque os outros requisitos são necessários: o devedor contra o qual vai a execução precisa de dados que podem não estar na sentença para as suas alegações nos embargos. 2)REQUISITOS DA CARTA DE SENTENÇA. No tocante à execução provisória, é nos autos suplementares, se os há, que ela se procede; se os não há, é pela carta de sentença, extraida do processo, pelo escrivão e assinada pelo juiz. Tinha-se de enumerar os pressupostos necessários da carta de sentença e foi o que fez o art. 590. Exigem-se, como extrações, a autuação, a petição inicial e a procuração das partes, a contestação, a sentença exequienda e o despacho do recebimento do recurso, porque assim se verifica a sua eficácia só devolutiva. O primeiro requisito é que nela esteja a autuação, isto é, a ocorrência de ter havido a ação de que resultou a sentença exeqüenda e ter a carta de sentença de servir à execução (autos à parte). O segundo é o da petição inicial e das procurações das partes. Terceiro, o da contestação. Quarto, o da sentença exequenda, que tem antes o que levou ao seu proferimento e depois o despacho do recebimento do recurso, que é o quinto requisito. 3)HABILITAção INCIDENTAL. A habilitação a que se faz referência no art. 590, parágrafo único, é a habilitação incidente depois de publicada a sentença (art. 1.062); porque, se ocorreu antes de se encerrar a instrução, em qualquer grau, tendo dia para julgamento, é supérflua a inclusão da petição de habilitação e da sentença: os habilitados foram os vencidos e os seus nomes devem ter constado da sentença exeqúenda. Se após a publicação da sentença, sim: a carta de sentença tem de conter a petição da habilitação e a sentença que a julgou. Pode acontecer que, oferecidos os artigos de habilitação, a parte reconheceu a procedência do pedido e não houve oposição de terceiro, caso em que se dispensa a sentença (art. 1.060, V). Há outros casos em que não se exige a sentença: a habilitação foi promovida pelo cônjuge ou herdeiro necessário ou herdeiros necessários, com a prova documental do óbito e a qualidade do promovente ou dos promoventes; noutra causa, com sentença trânsita em julgado, foi declarada a qualidade de herdeiro ou de sucessor entre vivos ao habilitando; no inventário foi incluído, sem qualquer oposição, o herdeiro; foi declarada ausência, ou determinada a arrecadação da herança jacente (art. 1.060, 1-1V). Tratando-se de cessionários de herdeiros, que só se habilitaram depois de publicada a sentença exequenda, a petição ou habilitação e a respectiva sentença precisam ser incluídas. A prova da cessão é em documento autônomo. Havendo habilitações sucessivas, todas têm de constar, com os requisitos que a lei exige. CAPÍTULO IV

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DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL Art. 591. O devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações> com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei ‘). Art. 592. Ficam sujeitos à execução os bens: 1 do sucessor a titulo singular2), tratando-se de execução de sentença pro ferida em ação fundada em direito real; II do sócio 3), nos termos da lei; Iii do devedor, quando em poder de terceiros 4) 8); 1V do cônjuge, nos casos em que os seus bens próprios, reservados ou de sua meação respondem pela dívida 5); V alienados ou gravados com ônus real em fraude de execução 6) 7) 9). 1)DEVEDOR E RESPONSABILIDADE. O devedor responde, para adimplir as obrigações, com todos os seus bens, presentes e futuros, exceto se há limitação legal, ou se alguma restrição foi feita, com observância de lei, em virtude de alguma cláusula. Aliás, no art. 568, já se disse que a execução atingirá o devedor, reconhecido como tal no título II executivo, judicial ou extrajudicial. Se se trata de restrição negocial, ou foi o devedor, ou o testador, ou outra pessoa, que o pudesse estabelecer que inseriu cláusula vedativa negocial. A cláusula de inalienabilidade importa a de impenhorabilidade, salvo por dívidas de tributos estatais dos bens inalienáveis, se o devedor não tem outros bens. A lei não autoriza a executá-lo para se pagarem as dívidas; a lei cede diante do estado de necessidade, criado pela imposição fiscal não satisfeita. Executado o bem, e apurado o que restar do seu preço, o juiz o manda à conversão, não, porém, em prédio, porque o primeiro se perdeu por culpa do proprietário gravado. A solução óbvia é a compra de apólices ou de outros títulos de dívida não sujeitos a tributos. Para que se comprasse outro prédio, seria preciso que se segurasse o juízo contra outra falta igual do proprietário. Certa vez, no Juízo da Provedoria do Rio de Janeiro interessados propuseram, e foi deferido o requerimento, de nomeação de alguém que recebesse previamente os alugueres de dois meses, figurasse, pelo juiz, nos contratos de aluguer, fiscalizando, com o dinheiro do trimestre pagasse os tributos, depositasse certa quantia a título de conservação do prédio, e entregasse ao proprietário a sobra. Juridicamente, era possível fazer-se, porque se tratava de matéria contratual por parte do proprietário, se bem que, feito em juízo e como cautela, criasse certo caráter erga omnes pela acessoriedade à cláusula de inalienabilidade, na qual era interessado o juízo. <Quid iuris, se esse proprietário, mancomunado com o inquilino, recebesse o trimestre? Não seria fácil ocorrer, porque o contrato com o inquilino, revisto em Juízo, previa isso. Se acontecesse, o locatário teria de pagar duas vezes. 2)BENS Do SUcESSOR SINGULAR. A sentença pode executar-se em bens do sucessor singular, quer na relação possessória quer no direito real; portanto: contra o adquirente ou o possuidor da coisa litigiosa ou objeto de ação real, ou in rem scripta, como a ação ad exhibendum, a pauliana, a quod metus causa. O art. 592, 1, somente falou de ação real, porém a ciência inclui as ações in rem scripta, pela definição mesma dessas ações. Se o sucessor singular entende que não se acha no caso do art. 592, 1, defende-se por embargos de terceiro (arts. 1.046-1.054). 3)BENS DO sócio E EXECUÇÃO. A execução nos bens do sócio obedece a certos princípios em que se apóiam as regras de direito material, regras jurídicas que dão ao vencedor na ação a pretensão à cobrança, wZo ainda a de executar nesses bens. Sempre que a responsabilidade pelas dívidas sociais existe, segundo o direito material, existe pretensão do credor à condenação desse obrigado sócio e, em consequência, por força do art. 592, II, a pretensão a executar nos bens do sócio a dívida social. Sem o art. 592, II, ter-se-ia de primeiro propor a ação de condenação contra o sócio, depois de se requerer ação contra a sociedade devedora, ou cumulada com essa. A atuação da regra jurídica é a criação da pretensão à execução nos bens pessoais do sócio, sem necessidade de tal ação prévia, figura muito diferente da que se observa do fiador que paga integralmente a dívida, em que há substituição subjetiva, e não só ação própria contra outra pessoa. Se o sócio tem a responsabilidade, cabe-lhe o beneficium excussionis, o que não depende do direito material, uma v~z que o art. 592, nesse ponto, não reenviou a ele. Pode, nos embargos à penhora, levantar a sua exceção de excussão, se a tem em virtude do direito material respectivo, e, antes disso, em virtude de o art. 592, II, apresentar o seu requeri me nto obstativo da imediata penhora (arg. ao art. 659, § 2.0). Assunto de direito pré-processual, pode ser trazido a exame antes da defesa (embargos do devedor), ou durante ela (art. 741, V). Se a sociedade é irregular, os arts. 592 e 596 são inaplicáveis, porque a execução pode ser direta, por força do titulo mesmo. Em vez de ser responsabilizada ao lado, como, de regra, ocorre com os sócios que o direito material tem como responsáveis, a sociedade irregular é transparente e deixa ver, de frente, os sócios

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responsáveis pela obrigação. 4) BENS EM MAOS DE TERcEIRO. Se os bens do vencido se acham em mãos de terceiro, continuam bens do vencido, e o Estado pode apanhá-los, porque não existe obstáculo jurídico. O que importa, na execução forçada como na execução voluntária, é o poder de dispor. Penhorando os bens do vencido que se acham em mãos de outrem (posse imediata, detenção), ainda que seja o achador ou o ladrão, o Estado não atinge mais do que o poder de disposição. O que varia é o que serve de substrato objetivo a esse poder. Penhorar bens do senhorio, ou do enfiteuta, ou do locador, ou o contrato do locador com o locatário, é o mesmo ato estatal, posto que diferente o que vai ser alienado pelo Estado. A cláusula de continuar vigente a locação, a despeito da alienação do prédio pelo locador, não é óbice à penhora do bem: é restrição ao objeto alienável; vende-se, em hasta pública, o prédio, e conserva-se a locação. A cláusula opera como obrigação que o sucessor tem de assumir. Somente isso. Aliás, se não existe a cláusula, o contrato só se resolve depois que se vende a coisa e corre o prazo para a extinção da locação com a notificação; porque a penhora ainda não é a venda. Expropriar o abusus ainda não é expropriar o bem. Se o terceiro entende que o poder de dispor está com ele, e não com o vencido, defende-se por embargos de terceiro (arts. 1.046-1.054). O terceiro do art. 592, III, não precisa ser citado. 5)BENS DA MEAÇÃO CONJUGAL. Os bens próprios da mulher casada e a sua parte nos bens comuns respondem pelas dívidas, segundo os princípios de direito civil. Quando isso ocorre, o direito material dá a pretensão à cobrança,não ainda à execução. Exatamente como são os casos do art. 592, II: o direito processual permite a extensão da execução aos bens da mulher, criando ao credor de tais dívidas a pretensão a executar nesses bens. Mas a mulher tem limitações de direito material a seu favor, alegáveis em embargos de terceiro (arts. 1.046-1.054) e, por força da expressão, “nos casos em que.. .“ do art. 592, IV, em requerimento obstativo da execução mesma, pois o juiz fé-la parte sem o ser. Por exemplo: a) No regime da comunhão universal de bens, se se trata de dívidas anteriores ao casamento, é preciso, para que se lhe penhorem os bens comuns, que provenham de despesas com os aprestos do casamento, ou que se dê prova de terem revertido em proveito comum (Código Civil de 1916, art. 263, VII), e nada justificaria que o juiz concedesse a penhora, desde logo, sem tal apreciação, que diz respeito à ação de condenação. Não há pretensão a executar nos bens em tais casos, porque a responsabilidade não é verificável sem cognição. b) Não assim, no regime da comunhão universal de bens, em quaisquer outros casos de dívidas, exceto as de obrigações provenientes dos atos ilícitos ou de fiança prestada pelo marido sem outorga da mulher. Quanto à repulsa ao mandado, a mulher somente precisa de embargar de terceiro se o juiz insiste em penhorar-lhe a sua parte nos bens comuns ou os seus próprios. Sobre casos de responsabilidade da mulher, a despeito de ser a divida proveniente de ato ilícito nossos Tratado de Direito de Família, 1.a ed., 153 5.; 3.~, II, 234, e Tratado de Direito Privado, VIII, § 898). c) No regime da comunhão parcial de bens, não há a pretensão a executar antes de sentença de condenação contra a mulher (litisconsórcio unitário, art. 47), se o credor invoca regra jurídica, de direito natural, concernente à administração pelo cônjuge e terem sido as dívidas de proveito do outro cônjuge, ou de ambos. Existe,porém, por se aplicar o art. 592, IV, nos casos de dívidas. contraídas pela mulher com o consentimento do marido, ou a presunção disso, ou se não é de exigir-se, na espécie, o consentimento. d) No regime da separação, não há aplicação do art. 592, IV. Se no pacto foi• estabelecida quota para as despesas do casal (nossos Tratado de Direito de Família, 1.~ ed., 177; 3Y~, II, 276 5.; Tratado de Direito Privado, VIII. ~ 913), ou se a mulher contraiu dívidas de acordo com a regra jurídica sobre presumir-Se na espécie o consentimento do marido, a mulher é litisconsorte unitário: deve ter sido condenada, e) No regime dotal, se as dívidas do marido são anteriores ao casamento, só se pagam por seus bens particulares, e as da mulher, pelos bens extradotais. Se contraídas por ambos os cônjuges, por essas deve ter sido condenada a mulher, litisconsorte unitário. Nos casos em que se trata de requerimento obstativo da execução não confundir com o requerimento obstativo da imediata execução, que assenta, por exemplo, na exceptio excussionis) a mulher é terceiro, e pode opor embargos de terceiro. 6 EXECUTIONIS” E EXECUÇÃO NOS BENS ALIENADOS OU GRAvADOS. Se o devedor alienou ou hipotecou bens (ou os gravou) em fraude da execução, os bens alienados, empenhados, hipotecados, ou entregues em anticrese podem ser penhorados. O conceito central é o de fraude da execução, que se acha no art. 593: 1) quando sobre eles pender ação fundada em direito real; II) quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência; III) nos demais casos expressos em lei. Não é possível iniciar-se a penhora sobre tais bens antes de se fazer a prova da fraude à execução. O Código, tratando de ação executiva, tomou a atitude de quem só está a executar sentença de cognição completa, e a situação do adquirente ou do credor do crédito real longe está de ser semelhante à do vencido na demanda. A ação adequada

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dir-se-ia a de condenação ou a ação pauliana. Em verdade, a fraude de execução é instituto processual, cujos pressupostos podem coincidir, ou não, com os pressupostos da fraude contra credores do direito material. No art. 592, V, trata-se do vício litigiosi (art. 219), do vício litigiosi por extensão conceptual ou proposicional. Salvo ficção de que lance mão algum texto de lei especial, a fraude à execução supõe infração da determinação do objeto litigioso por força de litispendência noutra ação, cuja sentença teve ou é susceptível de ter força ou apenas suficiente efeito executivo. Para que se caracterize a fraude de execução, basta que ocorra um dos suportes fácticos. Tratando-se da espécie do art. 592, V, o que importa é que a alienação ou o gravame dissemos, de propósito, gravame, e não ônus tenha sido após a propositura de ação que possa determinar a insolvência do devedor (cf. 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 25 de setembro de 1950, D. da J. de 31 de julho de 1952). Os negócios jurídicos que têm por objeto bens em execução, isto é, sujeitos a penhora ou outra medida constritiva executiva, são ineficazes; não são nulos. Aqui, o corte passa-se no plano do direito processual e o instituto não se confunde com o da fraude contra credores, que é de direito material. Não há inexistência, nem nulidade, da relação jurídica; há ineficácia, tal como ocorre com a compra-e-venda da coisa alheia. Se o direito material contém regra jurídica sobre inexistência (não provável!), nulidade ipso iure ou anulabilidade, é outra questão. No plano do direito processual, é impertinente discutir-se o consilium fraudis: basta o fato da alienação ou gravame. As vezes se fala de fraude à execução, mas a fraude, no caso, está in re ipsa. A fraude à execução não se exige, pois, má-fé, ou culpa do adquirente ou possuidor. Nas Ordenações Filipinas (Livro III, Titulo 86, § 16, e Livro IV, Título 10, § 9) distinguiam-se, para o tratamento processual, o terceiro sabedor da fraude e o não-sabedor: esse não precisava ser condenado em ação de cognição; aquele tinha de ser ouvido sumariamente, antes da execução, portanto em ação. A interpretação dos textos reinícolas encontra-se em SíLvEsT~ GOMES DE MORAIS (Tractatus de Executionibus, VI, 111) e era mais técnica: se não-sabedor, precisaria ser condenado antes; se sabedor, duvidava-se se era preciso propor-se a ação de condenação, porém as Ordenações Filipinas, Livro III, Título 86, § 16, e Livro IV, Titulo 10, § 9, eram “expressas” em dispensar. De modo que, a priori, seria de mister a condenação, em quaisquer casos; porém o direito processual tratava o assunto no campo da pretensão do credor a executar em tais bens. MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, III, 297) era mais claro: “si autem nec scivit, vel scire debuit tale litigium, citandus est, et summarie auditur, cognita veritate, absque alio processu”. Foi, porém, ANTÔNIO DE SoUsA DE MACEDO (Decisiones, 189) quem estabeleceu essa interpretação, de que se serviram, depois, SILVESTRE GOMES DE MORAIS e MANUEL CONÇALVES DA Sn.~vA: “Sed de iure nostri Regni per Ordinationes supra allegatas, si novus possessor, quando possessionem adeptus est, scivit, vel scire debuit litem agi, privabitur sine ulla mora, aut citatione; si autem nec scivit, nec scire debuit, citabitur, et de iure suo audietur summarie, cognita veritate absque alio processu”. Não temos mais essa distinção, nem o terceiro do art. 592, V, tem de ser citado (aliter, nos casos do art. 592, 1, II e IV, porque são devedores e têm de ser citados para que tenham o ensejo de pagar). Os embargos em que se alega a inexistência de fraude à execução são embargos de terceiro (arts. 1.046-1.054). Tem ele direito às benfeitorias necessárias, que se descontam do valor da coisa. Não se construa o caso da regra jurídica sobre deduzir-se do preço do imóvel hipotecado as custas judiciais da execução e as despesas de conservação por terceiro, se consentiram devedor e credor, como de ação contra o credor, ou contra o devedor; as despesas diminuem, no terreno objetivo, o valor da coisa, a ação nasce quando a posse imediata da coisa passa a outrem, ao dono da coisa, seja o devedor, seja o adquirente. Se se faz a penhora da coisa, na execução da sentença, ou na ação executiva de título extrajudicial, e não se retirou a coisa, o terceiro está com ela: a dedução das benfeitorias, no processo da execução, é simples preparação para liquidar o valor da coisa. Se se retirou, o quanto é devido pelo devedor enquanto o valor todo está com ele; depois, contra o que recebeu o preço da coisa (valor todo). Assim, nem AzEvedo MARQUES (A Hipoteca, 53), que considerava, sempre, sujeito passivo da relação o vencido executado, nem CLóvIS BEVILÁQUA, que tinha por devedor o credor hipotecário, devem ser seguidos. Tais interpretações tiveram o defeito de não atender a que se estava em processo, com o trânsito jurídico do valor da coisa do devedor executado para o credor hipotecário, através da expropriação estatal do poder de dispor. A questão entre os dois juristas era posta em termos de direito material, quando tinha de ser posta no plano do direito processual. Os bens submetidos a medidas constritivas, outras que as executivas, como os bens sequestrados ou arrestados, ficam, por força da sentença (provavelmente mandamental), sujeitos à constrição; e a alienação ou gravame deles seria ineficaz. Deles não se falou no art. 592, porque seria aludir-se à força de alguma sentença. O conceito de fraude à execução é mais largo do que o de alienação ou simples gravame da coisa litigiosa. Só se incide no vício litigiosi pela litispendência, sive scienter sive ignoranter; e a pretensão a executar apanha o terceiro que adquiriu, ou se fez credor hipotecário, ou qualquer terceiro que se lhe seguiu. 7)FRAUDE CONTRA CREDORES. Nos casos em que só a fraude contra credores poderia ser alegada,

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precisa-se de sentença em ação prévia anulatória, dita, antes, rescisória (actio Pauliana). Não há a pretensão a executar do art. 592, V. É fácil dito “O patrimônio do devedor é garantia (?) do credor”. Nada tem de jurídico; é proposição que não pertence ao sistema lógico que corresponde ao direito brasileiro, nem aos outros. Se o crédito nasceu, na verdade, dessa consideração, trata-se de motivo psicológico e econômico, não jurídico. Se o devedor procede em fraude contra credores, há ato ou atos dele que determinam a pretensão do credor à desconstituição do negócio jurídico do devedor, que se substituiu à actio Pauliana. Não foi aquela garantia (!) que as determinou. ~Qual a eficácia da sentença favorável na ação referida? Pode-se responder: a) que é constitutiva negativa, em ação de nulidade, ou b) em ação de anulação; c) que é constitutiva negativa, em ação de rescisão; d) que é constitutiva negativa, em ação de desconstituição de eficácia; e) que émandamental negativa de eficácia, o que só se entenderia se incidental de embargos de devedor ou de embargos de terceiro; 1) que é declarativa negativa da existência da eficácia, ou da existência do negócio jurídico; g) que é ação real (condenatória-executiva, ou executiva); h) que é uma extensão da execução. Ora, a construção tem de atender à história, tão ineliminável nos institutos jurídicos quanto em nosso corpo, à dogmática do direito, à sugestão dos fatos quanto à comodidade e eficiência da categoria jurídica, ou, pelo menos, a um desses critérios que satisfaça. Historicamente, deu o Pretor ao curator bonorum (administrador do concurso, dito hoje da massa) restituição in integrum contra alienação fraudulenta e, contra o adquirente, ação rescisória (actio rescissoria) in rem, como se não tivesse havido alienação; mas a qualquer credor conferia a pretensão a interdictum fraudatorzum contra o adquirente,bem como actio arbitraria (in personam) para restituição da coisa. A actio arbitraria é que se chamava actio Pauliana. A diferença é irrelevante para o direito material e foi grande mérito de Til. REINHJUIT, em 1871, ter mostrado que a distinção só se passava (em direito clássico) no plano do direito processual. Com os recursos de hoje, procedemos às investigações de textos e de história e chegamos às seguintes conclusões: a actio da L. 1, pr., D., quae in fraudem creditorum 1 acta sunt ut restituantur, 42, 8, a que, na L. 38, § 4, D., de usuris et fructibus et causis et omnibus accessionibus et mora, 22, 1, se chamou PauUana actio, era ação constitutiva negativa, em ação de rescisão (os textos não falam de nulidade, mas de revocatio pelo Pretor, pois que houve delito, tal como nas ações de dolo e quod metus causa, tendo-se estendido a quem aproveitou do delito, ainda sem o conhecer); a restitutio in integrum (na actio rescissoria in rem) era a executivização da actio da L. 1 (cumulação objetiva), donde a força constitutiva negativa e a força executiva, em ação de rescisão; o interdictum fraudatarium era como a actio, mas adipiscendae possessionis, portanto limitado a coisas corpóreas. Foi esse interdito, provavelmente, a primeira ação, completado, depois, pela actio da L. 1, pr., e mais tarde munido da in integrum restitutio; não provável a anterioridade da restitutio, vindicatio utilis da coisa alienada (HEINRIcm DERNBURG, Pandekten, II, 7.~ ed., 389; contra, P. F. GIRARD, Manuel, 4.~ ed., 426, nota 2). Aliás, essa discussão é sem relevância para o nosso problema: primeiro, porque, ainda que mesclada de contradição a construção, os textos justinianeus fundiram as três ações; segundo, é provável que a actio arbitraria, a que se chamou actio Pauliana, não fosse meio jurídico autônomo (OTTo LENEL, Die Anfechtung von Rechtshandlungen des Schuldners, Festschrift zu A. 5. SCHULTZE, passim; Das Edictum perpetuum, 2.~ ed., 419 s., 475 s.); terceiro, havia, à base da vindicatio, a rescisão da alienação, portanto, a ação de cognição. Nas Institutas, § 6, de actionibus, 4, 6, que se referirani à vindicatio, aludiu-se à prévia rescisão (reseissa traditione), recorrendo-se à ficção de não terem sido entregues os bens aos adquirentes (eam rem tradita non esse). Portanto, juízo rescindente e, depois, rescisório, como, de regra, ocorria nas in integrum restitutiones. O interdictum fraudatorium era para alienações, ciente o adquirente, dentro de um ano (L. 10, pr., D., quae in fraudem creditorum facta sunt ut restituantur, 42, 8). A causa prejudicial da rescisão, embora implicita, era evidente, pelas exigências de afirmação e prova. Ação, portanto, executiva, mas de ineliniinável causa prévia (rescisão). Construí-lo como ação executiva, de questão prévia declarativa, seria forçar. (Sobre a interpolação da parte final da L. 10, pr., OTTO LENEL, Palingenesia, II, 852) Cf. Tratado de Direito Privado, IV, § § 482-492. A ação arbitrária, essa, por definição, tinha de ter, antes da condenação, a sentença interlocutória, não imediatamente executiva (a L. 68, D., de rei vindicatione, 6, 1, foi interpolada; cf. O. G. BiluNs, Kleinere Schriften, 1, 360; A. PERNICE, Parerga, II, 32). Ora, nenhum texto poderia permitir que se tratasse a rescisão das alienações e gravames como eficácia declarativa, de modo que se pudesse conceber a ação como declaratória da inexistência de tais negócios jurídicos fraudulentos. Nem, sequer, como decretação de nulidade ipso iure (solução a). Alguns autores quase todos, aliás aludem àanulabilidade (anulação), que seria a solução b), acima (e. g., TH. REINHAXT, P. GRÚTZMANN; Código Civil de 1916, arts. 106-113). A solução d), que recorre à desconstituição da eficácia, deixaria intacto o negócio jurídico, de modo que a posterior aquisição de coisa pelo alienante tornaria eficaz o negócio jurídico. Em verdade, porém, não há paridade com o caso de compra-e-venda de bem pertencente a outrem, de que temos tratado noutros lugares (especialmente, Tratado de Direito Predial, II, 176 s.; III, 305). A ação tem de ser proposta. Nem seria possível reduzir o instituto dos arts. 106-113 do Código Civil a Instituto meramente

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processual, sem rompimento com a história e a dogmática jurídica. A redução dos efeitos da fraude contra credores a efeitos quanto ao processo foi obra artificial, tentada por alguns juristas italianos. Tratar-se-ia de extensão da responsabilidade executiva ao bem alienado in fraudem creditoris ou creditorum (L. CONFORTI, FRANCESCO CARNELUTTI, EIuuCo TuLLIo LIEBMA2N). Mas, além de desgarrar da história e da dogmática, essa teoria quebraria a técnica legislativa e violaria princípios de lógica. A lei, em todos os países, exige a ação que decrete a rescisão ou a invalidade (diremos, depois, porque preferiríamos, na espécie, “rescisão”, em vez de “anulação”). Ora, a extensão da eficácia executiva é pura ilusão de que foram vítimas os que dela lançaram mão; porque, se houve sentença (constitutiva negativa), se desfez a relação jurídica em que se haviam praticado os atos fraudulentos: quando se procede à penhora, os bens são do devedor, como quaisquer outros. A situação nada tem, nesse ponto, com a alienação de bens litigiosos ou sujeitos a direitos reais. A ação de fraude contra credores é instituto de direito material; a sentença, constitutiva negativa, podendo a técnica legislativa variar de a) a e). Afirmar-se que a verdadeira eficácia, ou “resultado” (ENRIcO Tu1.Lío LIEBMAN, Processo de Execução, 171) da ação pauliana é estender a ação e a responsabilidade executória a determinados bens do terceiro, precisamente aqueles que foram objeto do ato fraudulento, importa ver-se antes da força da sentença (constitutiva negativa), em qualquer das soluções a) a e), de que falamos, e acima dela, o simples efeito de expor os bens à eventual execução forçada. Quem obtém sentença favorável em ação anulatória não obtém execução; o efeito não é, sequer, o das sentenças condenatórias: é efeito de expor à execução; melhor: é a consequência expositiva da desconstituição do negócio jurídico. O argumento de que a sentença na ação referida deixa subsistir entre as partes o negócio jurídico rescindido de nada vale diante da regra jurídica, de direito material, segundo a qual, anulados os atos fraudulentos, a vantagem reverterá em proveito do acervo em concurso de credores, que fugiu à parte da doutrina francesa e da italiana, mas ficou com a concepção histórica da ação pauliana, acompanhada da in integrum restitutio. A má-fé, com que negociou o devedor, não é o fundamento da ação; mas sim o pressuposto do prejuízo ao credor. A ação é pessoal e os vencidos hão de repor a situação das coisas como se nada tivesse sido alienado, atque se nihil alienatum esset (L. 38, § 4, D., de usuris et fructibus et causis et omnibus accessionibus et mora, 22, 1). A ação de reivindicação é cumulável com a ação anulatória. A ação de reivindicação somente nasce se o condenado a restituir não entrega a coisa. Tal ação não existe antes de se dar a anulação; portanto, antes do trânsito em julgado da sentença constitutiva negativa, com eficácia condenatória a restituir, posto que se possa pedir, desde logo, com a inicial da ação anulatória, a reivindicação. O sistema jurídico brasileiro não estabeleceu, na regra jurídica, de direito material, segundo a qual, anulado o ato, se restituem os figurantes ao estado anterior, ou, se impossível, são indenizados, a cumulação sucessiva; nem essa se entende existir sem regra jurídica especial, que, na espécie, a crie. De modo que se tem de pedir, também, a ~entrega, ou de executar a sentença. A discussão em torno da natureza da ação (real ou pessoal) ou proveio do texto das Institutas, § 6, de actionibus, 4, 6 (em verdade, esse remédio era raro, ao contrário daquele que se baseava na L. 1, pr., D., quae in fraudem creditorum facta sunt ut restituantur, 42, 8>, ou foi consequência de se não atender a que a eficácia (força) da sentença favorável é a constitutiva negativa erga omnes, ao passo que efeito secundário o de coisa julgada material. São pontos que exigem meditação. 8)INCURSÃO INJUSTIFICADA NA ESFERA JUBIDICA DO TERCEIRO. A invasão ilegal da esfera jurídica do terceiro é afastada, se efetiva, ou iminente, pelos embargos de terceiro, a ação mandamental que adiante estudaremos (arts. 1.046--1.054). Até onde a lei permite que vá, subjetiva e objetivamente, a execução, não há invasão ilegal (tautologia) da esfera jurídica do terceiro, nem das limitações e das restrições de poder (inalienabilidade, impenhorabilidade). Os embargos de terceiro pressupõem invasão de ordem subjetiva. Não se propõe a ação de embargos de terceiro para se fazer prevalecer a cláusula de inalienabilidade, por exemplo. A ação, criada pelo Imperador Caracala, era de cognição incompleta e sumária (“summatim cognoscere”) e ~concernia ao “pígnus in causa iudicati captum”! Hoje, a cognição pode ser completa, tanto mais quanto, se o terceiro não acudir em tempo, a execução terá as suas conseqtiências jurídicas, através da alienação (arrematações) e da adjudicação. Tem-se procurado ver em todas as sentenças proferidas em embargos de terceiro sentenças de cognição incompleta ou sentenças com reserva. Ora, os embargos de terceiro são ação que não é (por definição) entre as partes da sentença exequenda, ou entre pessoas a que atinge a sua eficácia; de modo que podem ter de estabelecer res iudicata entre o terceiro e o executado, ou entre o terceiro, o executante e o executado, qualquer que tenha sido o tribunal ou juiz prolator da sentença exeqúenda (MANUEL MENDEs DE CASTRO, Practica Lusitana, 1, 103), inclusive do Supremo Tribunal Federal (“etiam si executio fiat propter sententia Principis”), pois que se admite contra qualquer sentença, ainda do mais alto tribunal, a restitutio dos embargos de terceiro. A afirmação do Tribunal de Apelação de são Paulo (10 de janeiro de 1944, R. F., 98, 378) de que os direitos do

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terceiro não podem ser declarados na sentença dos embargos de terceiro, mesmo quando tenham sido deduzidos, é estranha ao nosso direito. O ritus Regni das Ordenações Filipinas, Livro III, Título 41, § 4, de modo nenhum implicava cognzção incompleta: o rito era sumário; mas a cognição, em certos casos, completa, segundo os princípios, quer quanto às prejudiciais quer quanto ao resto do mérito. Aliás, suspensa, ou não, a execução, o processo era ordinário (MA.NUEL MENDES DE CAsTRO, Practica Lusitana, 1, 105), porque a summaria probatio era apenas para a primeira fase (GABRIEL PEREIRA DE CASTRO, Decisiones, 309; Código de 1973, art. 1.049). Depois, segundo JORGE DE CABEDO, no aresto n. 50, havia “contrarietas, replicatio et triplicatio”. O Código, nessa fase, manda seguir-se o rito próprio. A cognição incompleta não foi recebida pelo direito luso--brasileiro (MANUEL GONÇALVES DA SILVA, Commentaria, III, 292), nem pelo direito português afonsino. Os embargos de terceiro são ação mandamental, de forte dose declarativa. 9)PAGAMENTO E PREJUÍZO A CREDORES. Quanto à questão do prejuízo aos credores, pelo pagamento a alguns deles, o direito romano dava a solução negativa da actio Pauliana (L. 6, § 7, D., quae in fraudem creditorum facta sunt ut restituantur, 42, 8), exceto se só natural a obrigação (L. 19 e 20). Restituia-se apenas aos credores a vantagem do interusurium, pelo pagamento antecipado. A teoria da gratifica ção combateu essas injustiças, no direito comum (LAsPEYRE5, Vber Anfechtung von Zahlungen mit der actio Pauliana, Archiv flir die civilistische Praxis, 21, 35 5.). A teoria da gratificação foi recebida em nosso direito (FELICIANO DA CUNHA FRANÇA, Additiones aureae que lílustrationes, 1 281). A regra jurídica, de direito material, segundo a qual o credor quirografário, que recebe do credor insolvente o pagamento de dívida ainda não vencida, é obrigado a repor o que recebeu, é prova dessa recepção (Código Civil, art. 110). O estudo da extensão em que temos a teoria pertence, portanto, ao direito material. O exequente não pode alegar a fraude contra credores para invocar o art. 592, V; somente a fraude à execução. Nem o embargante terceiro pode alegá-la, nos seus embargos. Árt. 593. Considera-se9) em fraude de execução 1) a alienação ou oneração de bens”) 12): 1 quando sobre eles pender ação fundada em direito real2) 7) 10); II quando, ao tempo da alienação8) ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência 3) 4) 6); III nos demais casos expressos em lei5). 1) CONCEITO. A fraude ã execução é instituto de direito processual, que se não confunde, posto que em muitos pontos coincida com a fraude contra credores, que pertence ao direito material. O patrimônio está sempre in fieri, bens e frutos entram, bens e frutos saem, sendo de notar-se que pode existir (e é provável que exista) núcleo de bens que permanecem ou permanecem mais. As diferentes eras econômicas da história traçam série de transformações da estrutura dos patrimônios, até se chegar à concepção das ações preferenciais e a voto plural, sinal de perturbação senil do capitalismo tardio, bem distinto do capitalismo criador das inversões efetivas de capitais, quase à imagem da democracia empreendedora e de intenções de igualdade formal. Quando a economia repousava na propriedade da terra, o devedor, que pretendia fraudar a execução, alienava os latifúndios, as fazendas e os engenhos. A prisão por divida atenuava, então, a importância prática das regras jurídicas do art. 593. Sendo impossível descer-se, no tempo, para se inquirir de quando começou a alteração anormal do patrimônio, o direito fixa a litispendéncia , salvo casos especiais que as leis estabeleçam por outros motivos. Entendia LAFAIETE RODRIGUL~ Pis~IRA (Direito das Coisas, II, 156) que a teoria da executabilidade dos bens alienados em fraude de execução, no caso do art. 895, II, do Código de 1939, hoje art. 593, II, fora ampliação das Ordenações Filipinas, Livro III, Título 86, § 16 (“apoiando-se” os tribunais e praxistas “nos textos do direito romano acerca da ação pauliana”). E citou a MANUEL ALVABEs PiGA5 e a MANUEL GONÇALVES DA SILVA, que J. J. C. PEREIRA E SousA citara. MANUEL ALVARES PÉGAS (Resolutiones Forenses, 1, 455) não o autorizaria a dizê-lo, nem MANUEL GONÇALVES DA SILvA (Commentaria, III, 255). ANTÔNIO DE SousA DE MACEDO (Decisiones, 189) entalhou, com exatidão, a teoria, mas invocando a L. 5, O., de litigiosis, 8, 36, que nada tinha com a actio Pauliana, sendo errada a afirmação de LAFAIETE RoDRIGUES PEREIRA e a do acórdão da 3•~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 10 de maio de 1945 (J., 26, 382), que o citou. A doutrina tradicional é a da dimensão do ius exequendi: o vício litigioso, nos casos do art. 593, permite que até esses bens, em fraude de execução, essa se desenrole, apanhando-os, porque res effecta fuerat litigiosa et inalienabilis. A razão, quanto aos casos do art. 593, 1, deu-a

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ANTÔNIO DE SoUsA DE MACEDO (Decisiones, 188): ‘~... tertius non inceperit possidere postquam res iam capta erat in pignus, tunc enim iam transferri non poterat”, sem falar de nulidade; e, quanto aos do art. 593, II, porque, a de~peito de não serem os mesmos casos do art. 593, 1, “nos termos de direito se pode fazer execução contra terceiro” (Desembargo do Paço, 4 de fevereiro de 1679). 2)LITISPENDENCIA DE AÇÃO FUNDADA EM DIREITO REAL. A litispendência de ação real Impede a alienação ou gravame da coisa litigiosa, que se há de considerar ineficaz por fraude à execução. Quer dizer: tudo se passa no terreno do direito processual, posto que a regra de direito processual tenha repercussões relevantes no direito material. O Código de 1973, art. 593, 1, falou em ação fundada em direito real. Retirou o que se achava no Código de 1939, art. 895 (“. . . sobre eles for movida ação real ou reipersecutória”). A nossa crítica à expressão “ação reipersecutória “foi acolhida. Mas convém que volvamos a exprobrar o que se empregou no passado, porque é assaz relevante a exatidão científica dos conceitos. Advertimos, há mais de cinquenta anos (em nota à Doutrina das Ações, de J. H. CORREIA TELES, 39), no perigo de se usar o conceito “ação reipersecutória” e mostramos que três dos nossos processualistas (J. H. CoiUIRIA TELES, TEIXEIRA DE FREITAS e PAULA BATIsTA) empregavam três diferentes conceitos. Nem o direito romano se firmara num só. Inserindo-o em lei, ou o Código cria perplexidade, ou temos de achar o que é que ele entende por ação reipersecutória. Supomos lida a nossa nota ao livro de J. H. COREEIA TELES (1918). O melhor método científico para se encontrar o exato conceito quando, na doutrina, há muitos da mesma palavra, é saber qual o conceito com que historicamente se formou ~z proposição. No direito anterior, as Ordenações Filipinas, Livro III, Titulo 86, § 16, falavam do que “maliciosamente deixou de possuir a coisa julgada, por se não fazer em ela execução, depois da lide com ele contestada em diante”, e de “dita coisa litigiosa”. No Livro IV, Título 10, § 9, referiam--se a “emalhear-se” a “coisa litigiosa”. “Ação real” e “ação reipersecutória” estavam, no Código de 1939, art. 895, 1, por ações em que a coisa fica “litigiosa”. A “coisa” fica litigiosa nas ações reais; e nas ações em que se pede coisa certa ou em espécie. A sentença executa-se, nesses casos, com a citação para pagar; se o citado não paga, expede-se mandado de imissão na posse ou mandado de busca e apreensão. “Emalhear”, v. Em-alhear; depois, emalhear (Ordenações Manuelinas, Livro IV, Titulo 45, § 9; Ordenações Filipinas,Livro IV, Titulo 10, § 9). A pronúncia como “em-ader”, em vez de “emader”, teria sido a inicial, tanto mais quanto nas Ordenações Afonsinas, Livro IV, Titulo 71, se tentou “enalhear”, “enalheamento”, que as Ordenações Manuelinas, Livro IV, Titulo 45 (rubrica), substituiram por “enalheamentos”, e as Ordenações Filipinas, Livro IV, Titulo 10, por “alheações”. Nós, hoje, poriamos “alienações”. Verdade é, porém, que tanto as Ordenações Manuelinas como as Filipinas conservaram “emalhear”. Se, antes de qualquer alienação pelos que constam da adjudicação, ou da partilha, que foi transcrita, alguém inscreve, provisionalmente, a ação de petição de herança (hereditatis petitio), conforme o art. 167, a), VII, do Decreto-lei n. 1.000, de 21 de outubro 1969, está excluida, por negação provisional, a fé pública do registro. (No direito italiano, para se explicar o texto tinha-se falado de se tornar inadmissível, após a “transcrição” da ação de petição de herança, a boa-fé do terceiro, cf. C. MAIORCA, Deila Trascrizione, Commentario de D’AMELIO, 235 s., F. MEssíNEo, Dottrina generale del contratto, 3.a ed., 319; mas a concepção brasileira é diferente.) Toda alusão a presunção absoluta ou relativa é descabida. A fé pública, que se originara da transcrição, foi eliminada. Tampouco é de admitir-se que a litispendência sobre o título do autor equivalha à inscrição provisional. O art. 593, 1, do Código de Processo Civil considera em fraude execução a alienação do bem quando sobre ele for movida ação fundada em direito real, exatamente as ações cuja citação pode ser inscrita mas, aí, há apenas ineficácia relativa a favor do exequente, enquanto não se transcreve o título do adquirente. A inscrição provisional impede a transcrição. A fé pública está removida. Não importa se terceiro adquiriu do terceiro, se ambos não tiveram os seus títulos transcritos antes da inscrição provisional. Escusado é advertir-se que a inscrição de nenhum modo obsta à aquisição originária. Se a sentença foi contrária ao autor, todos os títulos apresentados para a transcrição prenotados e não transcritos passam a ser transcritiveis, pela extinção ex tunc da eficácia da. citação inscrita. Por isso mesmo, a ação que o terceiro proponha ou a citação para a relação jurídica processual (e. g., Código de Processo Civil, arts. 49, 50, 70 e 76), cuja citação foi inscrita, é, por sua vez, inscritível. Inscritas as ações reais, ou pessoais reipersecutórias, inclusive possessórias, quando for o caso, e a retificação de registro, pelas certidões das citações com os requisitos legais, averbando-se as decisões, os recursos e seus efeitos, ficam, desde logo, consideradas bens litigiosos para o efeito de apreciação de fraude de posteriores alienações, se não advém o cancelamento. Os três conceitos “ações reais”, “ações pessoais reipersecutórias” e “ação de retificação de registro” são alusivos a um dos elementos necessários do suporte fáctico. O que se leva a registro é a certidão de citação com que se estabelece a litispendência. O art. 593, 1, do Código de Processo Civil diz hoje considerar-se em fraude de execução a alienação ou oneração de bens “quando sobre eles pender ação fundada em direito real”. Não há contradição entre o que se diz na legislação sobre registro e no art. 593, 1, do Código de Processo Civil.

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Mesmo sem a inscrição de que cogita a legislação registrária há fraude à execução, se a parte aliena ou grava ou de qualquer modo faz atingido o bem sobre que versa a ação fundada em direito real. Enquanto não se inscreve a certidão de citação, há ineficácia dos atos do figurante da relação jurídica processual, e isso é conseqúência ordinária, especifica, da litispendência; mas ineficácia relativa, pois só existe a respeito das pessoas que figuram no litígio. A inscrição provisional impede a transcrição ou a inscrição de algum direito sobre o bem. Se uma parte aliena o bem e o adquirente, por sua vez, o aliena a terceiro, a transcrição daquela alienação e a da segunda alienação serão ineficazes, porque a fé pública foi removida. O que se disse sobre a segunda transcrição cabe quanto a qualquer inscrição de direito real. 3)INSOLVINCIA E FRAUDE A EXECUÇÃO. A insolvência não basta para a figura da fraude à execução. Outro pressuposto é o de existir ~ Toda~ indagação da má-fé é estranha à concepção do instituto, em. qualquer dos inciSOS do art. 593. A jurisprudência às vezes discute quanto à exigência da inscrição da penhora na ação (pela afirmativa, aa Câmaras Reunidas do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 7 de janeiro de 1943, E. F., 100, 289; contra, a l.a Câmara do Tribunal de Apelação do Paraná, a 7 de junho de 1944, Paraná J., 40, 20, 2 de abril de 1945). Em verdade, desde que passou em julgado a sentença de condenação, há execução aparelhada e os atos do condenado podem ser fraudosos. Resta, apenas, saber-Se se é preciso ter-Se proposto a ação de execução de sentença, ou não. O acórdão do Tribunal de Apelação do Paraná, acima citado, dispenSou~o, indo até a satisfazer-Se com o protesto do título executivo. Esse é que é o ponto verdadeiramente importante. As ~rdenaçõe5 Filipinas (Livro III, Título 86, § 16) falavam de “depois da lide com ele (condenado) contestada em diante”. O Código de 1939, art. 895, II, de quando “já pendia contra o alienante”. O Código de 1973, art. 593, II, de “quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência”. Não há dúvida que se não exige o já ter sido feita a penhora, menos ainda inscrita; mas exige-se o curso, a pendência~ portanto a citação, pelo menos iniciada (e. g., publicado5~ um dia que seja, os editais). Porém o problema muito se agrava se vamos satisfazer-nos com a pendência, o correr, da ação de condenação, antes, pois, do aparelhamento da execução. Tratando-se de titulo executivo que não seja sentencial, a alienação nas vésperas da execução, pois ainda não pende demanda (Tribunal de Apelação da Paraíba, 14 de outubro de 1942, relator AGRIFINO DE BAEEO~)~ seria in fraudem creditorum, ou simulação. De qualquer modo, dependente de propositura de ação ~í.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de são Paulo, 18 de janeiro de 1943, E. dos T., 144, 146). A inscrição não é pressuposto necessário. O protesto do título cambiário ou cambiariforme não determina, só por si, que se considere em fraude de execução a alienação. protesto não é medida constritiva. No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal, a 21 de julho de 1950 (D. da J. de 18 de abril de 1952), a ~.a Turma, a 1.~ de junho de 1951 (R. F., 140, 180), e a 15 de janeiro de 1952 (D. da J. de 15 de fevereiro de 1952), fundada na 1~a edição dos Comentários ao Código de 1939, VI, 112, e as Câmaras Civeis Reunidas do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a 27 de dezembro de 1950; a 2•a Câmara Civil do Tribunal de JuStiça de São Paulo, a 27 de maio de 1952 (E. dos T., 202, 285), e~o 1.0 Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo (E. dos T., 207, 151), em decisão confirmativaa do acórdão da 2•a Câmara Civil, a 27 de maio de 1952 (202, 285). Sem razão, a 1•a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, a 7 de fevereiro de 1950 (Paraná J., 51, 379). O que pode ter havido é fraude contra credores. Os erros cometidos pela jurisprudência quase todos emanaram de confusão entre a ineficácia resultante da fraude ã execução e a anui abílida4l2 por fraude contra credores (certos, os acórdãos do 3•O Grupo das Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 28 de março de 1952, R. dos T., 201, 202, e da 6.~ Câmara Civil, a 19 de novembro de 1951, 198, 271, e O D., 74, 278, e a 2•a Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, a 3 de setembro de 1952, R. 9., 150, 310). A diferença implica a das ~entença5 a respeito: essa é, ali, declarativa; aqui, desconstitutíva. A fraude à execução, insistamos, é lnconfundivel com a fraude aos credores. É preciso que se não intrometa no assunto da fraude à execução o elemento da culpa, nem, tampouco, do lado do adquirente, o elemento da má-fé. Quem faz transcrever a alienação depois da decretação da falência frauda a execução, ainda que não tenha tido culpa o alienante em se retardar a transcrição, e ainda que de boa-fé o adquirente. O suporte fáctico da fraude à execução nada tem com o suporte fáctico da fraude contra credores. O acórdão da 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 26 de junho de 1952 (R. F., 150, 158), só se entende com referência à fraude contra credores. O acórdão da 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 2 de maio de 1950 (R. dos T., 187, 327), baralhou elementos do suporte fáctico da fraude à execução com elementos do suporte fáctico da fraude contra credores. Mais grave ainda o erro da 3.~. Câmara Civil, a 24 de agosto de 1950 (190, 203), e do 2.0 Grupo de Câmaras Civis, a 3 de maio de 1951 (193, 177). A fraude à execução por ter havido decretação de falência, basta que a transcrição tenha sido posterior. A fraude

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à execução por já existir demanda, é preciso que o ato de alienação o tenha sido. Assim, se o ato de alienação foi antes da decretação da falência e a transcrição depois, houve fraude à execução. Se a alienação foi posterior, a fortiori. Se o ato de alienação foi antes da demanda e a transcrição depois, não incide o art. 593, II. Cf. 3.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 31 de maio de 1951 (R. dos T., 193, 910; R. 9., 142, 253). O elemento da insolvência é comum à espécie do art. 593, II, e com mais forte razão, se foi feita a transcrição depois de decretada falência. Isso não precisa pôr-se em lei. A prova só se há de exigir se a espécie é a do ari. 593, II; se houve decretação de falência, feita está a prova da insolvência. Idem, se foi decretada liquidação coativa por insolvência. As espécies do art. 593, II, são as seguintes: a) Cabe a execução nos bens do terceiro se esse os adquiriu depois de ter passado em julgado sentença de condenação com efeito executivo, porque se trata de execução aparelhada e a aquisição foi in fraudem paratae executionis (MANUEL ÁLVARES Pi~GA5, Resolutiones Forenses, 1, 452, que o tirou de ANTÔNIO DE SousA DE MACEDO, Decisiones, 188), ainda que os tenha adquirido de sucessor do vencido, ou recebido em dote (Senado português, em 1680), em fideicomisso; e uma vez que se satisfaça o outro pressuposto (redução à insolvência). b) A fortiori, se já se propôs a ação de execução de sentença, porque, aí, além da completitude da cognição com a eficácia executiva, há a propositura da execução, talvez mesmo a penhora (não necessariamente). c) O terceiro que propôs causa depois da litigiosidade segundo o art. 593, 1, ou com os pressupostos do art. 593, II, não está isento da execução, mas sua antecedência na penhora dá-lhe a invocação do art. 613. O enunciado vale, ainda que a segunda ação tenha sido proposta apenas após a citação da primeira (MANUEL AINARES P~GAS, Resolutiones Forenses, 1, 455). d) A alienação após a pendência (art. 219) da lide de ação executiva, ou de ação em que a sentença favorável possa ter efeito executivo (e. g., ação de condenação), é ln fraudem executionis, se ocorre o outro pressuposto fixado pela lei. 4)TRANSCRIÇÃO DE AQUISIÇÃO POSTERIOR À DEMANDA DO ART. 593, II. Transcrita a aquisição, qualquer que seja o negócio jurídico de alienação, se corria contra credor demanda do art. 593, II, a litispendência fez ineficaz pela fraude à execução o negócio jurídico. O acesso do Estado ao bem para a execução forçada é, por isso, livre. Cumpre ainda atender--se ao art. 52, III, VII e VIII, do Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945. 5) CAsos EXPRESSOS EM LEI. Os “casos expressos em lei” são os que constam de leis em vigor e os que forem criados e se subsumam no art. 593, III. O Código mesmo possui o art. 671, 1. são casos expressos na lei os dos arts. 816, § 3•o, e 824 do Código Civil, porém não os dos arts. 1.396 e 1.407 do Código Civil e do art. 350 do Código Comercial, que nada têm com a fraude de execução e entram na figura do art. 592, II. 6) DiçÃo EM SOLUTO E DVIDA VENCIDA. Tem-se procurado excluir da nota de fraude à execução a datio in solutum, se a divida estava vencida. Mas, ai, pretende-se atribuir à precedência da divida consequência acima do conteúdo do princípio legal, que não distingue a causa: no art. 593, 1, porque o vicio litigiosi é o mesmo; no art. 593, II, porque se caracterizou a insolvência, e nada justificaria que se não subordinassem as dívidas a tratamento mais equílidoso; no art. 593, III, pela especialidade da regra jurídica. 7) A fraude à execução pode dissimular-se, mediante, por exemplo, o processo simulado de que fala o art. 129. Desde que já se decidiu a ação do art. 593, 1, o juiz a que se pede a execução não tem de levar em conta a ação ainda não julgada. N~ lhe cabe aplicar o art. 129, que só diz respeito ao juiz do processo simulado; porém deve tratar o outro processo pendente como em fraude à execução. A fraude à execução deixa livre o campo para o acesso do Estado aos bens alienados ou gravados in fraudem executionis, sem ser preciso exercício de ação de anulação (aliter a fraude contra credores, Código Civil, arts. 106-113; o pronunciamento de oficio, segundo o art. 129 do Código de Processo Civil). 8) ALIENAÇOES EM FRAUDE À ExECUÇÃO. As alienações feitas in fraudem executionis, em diferentes momentos, estabelecem série no tempo. Essa série cria, por sua vez, ordem inversa de acessos do Estado ao poder de dispor, à penhora.É efeito reflexo do ato ineficaz do fraudante. A regra jurídica é semelhante à das anulações das doações do art. 1.176 do Código Civil. Desenvolveu-a, em nosso direito, MANUEL DE ALMEIDA E SousA (Tratado sobre as Execuções, 49). A alienação do único bem pertencente ao devedor, nas vésperas da ação de cobrança (1.~ Câmara do Tribunal de Apelação de São Paulo, 2 de setembro de 1940, R. dos T., 128, 142), não é em fraude á execução. Sê-lo-ia, se a citação já houvesse sido feita ao se transcrever o titulo de alienação. Poderia existir fraude contra credores.

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Confusão entre as duas fraudes, no acórdão da 3•~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, a 28 de novembro de 1940 (R. F., 87, 470). A 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de são Paulo, a 26 de novembro de 1940 (R. F., 86, 133), entendeu, sem razão, que a existência de título protestado por falta de pagamento induz fraude à execução. Fraude contra credores, talvez não fraude à execução. (No mesmo sentido e a reprodução do que escrevemos, a decisão do Juiz de Direito da 4•~ Vara Cível do Distrito Federal, VIVALDE BRANDÃO Cotrro, 9 de junho de 1961, D. da J. de 28 de junho.) A renúncia ao direito material, homologada em desistência, quando já reduzido à insolvência o devedor, depois de litispendência, a fortiori depois de confirmada sentença condenatória, é fraude à execução (3.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 13 de maio de 1942, R. dos T., 140, 197). 9)INEFICÁCIA, E NÃO NULIDADE. A Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Santa Catarina (16 de abril de 1945, J., 1945, 159) falou de serem “absolutamente nulas” (nulas ipso iure) as alienações; mas seria difícil tal construção, não só porque o não serem alegadas as nulidades faz persistir o negócio jurídico, como porque esse, ainda alegadas, não se trata como nulo. Tem-se a mesma alusão à nulidade em acórdãos da 2.~ Câmara Cível (19 de abril, R. F.,99, 469) e da 1.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul (25 de julho de 1944, J., 25, 567), e 2.R do Tribunal de Apelação de Minas Gerais (19 de fevereiro de 1945, R. F., 104, 286). A 1.a Câmara do Tribunal de Apelação do Paraná (20 de setembro e 25 de dezembro de 1943, Paraná J., 38, 192; 39, 34) falou de decretação de nulidade, em embargos de terceiro: o que realmente se passa é declaração de ineficácia. Antes, também o Supremo Tribunal Federal (18 de setembro de 1940, R. F., 86, 97) e a 1.~ Turma (3 de dezembro de 1942), que se referiu a poder ser “anulada”, posto que se dispense a ação (!). Já é tempo de assentarmos (estamos a dizer isso há mais de meio século) boa terminologia, atendendo ao que realmente ocorre. A compra-e-venda de coisa legalmente inalienável (Código Civil, art. 69) é nula (Código Civil, art. 145, II); não assim a da coisa sujeita à cláusula de inalienabilidade absoluta, ou relativa, que confira imunidade eficacial a atos de alienação. A compra-e-venda de coisa alheia não é nula, nem anulável; é ineficaz, podendo tornar-se eficaz se o vendedor vem a adquirir a coisa. Dá-se o mesmo quanto à venda da coisa litigiosa, ou, mais especialmente, da venda em fraude à execução. A compra-e-venda em fraude de credores é anulável; a em fraude à execução, ineficaz. Por isso mesmo, se o que vendeu, ou o que comprou, in fraudem creditorum, solve a dívida, torna-se eficaz. Existiu e valia, posto que ineficaz; agora, existe, vale e tem eficácia. Se fosse nula, não seria possível convalidar-se. Entre o terceiro e outros valem os contratos e outros modos de transmissão; apenas são ineficazes. Valem mesmo atos do executado. ANTôNIO DE SousA DE MACEDO (Dicisiones, 190) exemplificou-o com a comunhão entre cônjuges, o dote, a divisão, o testamento, a desapropriação por utilidade pública. São exemplos assaz expressivos. 10)PRocEsso FRAUDULENTO E SIMULAÇÃO. (a) O processo fraudulento é o promovido por terceiro, em conluio com o devedor, ou pelo devedor, para perder, em conluio com o terceiro, dando causa a prejudicar os credores, ou algum credor. No direito luso-brasileiro, J. H. CoI~REIA TELES (Doutrina das Ações, edição de 1918, 139) admitia essa oposição à coisa julgada; mas verdade é que, aí, se teria de arrombar a barreira da preclusão para se julgar, por dentro, o processo, e isso importaria rescindir-se a sentença trânsita em julgado, fora dos casos do art. 485, ou em se admitir, contra os princípios, nulidade ipso iure do negócio jurídico, ou do processo fraudulento (sem razão, a sugestão de ENRICO TtJLLIO LIERMAN, Processo de Execução, 172 5). O processo fraudulento não é um não-processo (Nichtprozess), nem um processo aparente (Scheinprozess); aquele é inexistente, e esse ineficaz; e sim processo em que ocorreu fraude. O credor nada pode fazer contra a sentença trânsita em julgado, posto que, para outros efeitos, possa provar que houve fraude; e. g., se essa fraude é pressuposto para a punição do credor. Aí, não há violação da coisa julgada, pois o juiz do processo fraudulento não julgou a fraude. Lembre-se que a intenção não é pressuposto. (b) A simulação de contrato, se alegada, em vez da fraude à execução, rege-se pelo Código Civil, arts. 102-105; tem, antes, de ser julgada, à semelhança do que ocorre à fraude contra credores; porém nada obsta a que o seja na reconvenção aos embargos de terceiro. A fraude à execução, essa, pode sempre ser defesa nos embargos de terceiro. (Aqui, é preciso não se confundir a qualificação da invalidade por simulação no direito anterior ao Código Civil e no Código Civil, art. 147, II. Antes, a simulação fazia nulo ipso iure o negócio jurídico. velut umbra et corpus sine anima, cf. MANUEL Ax.~vAREs PÉGAS, Resolutiones Forenses, 1. 458.) A sentença que decreta a invalidade por simulação é constitutiva negativa. Mas, no direito vigente, há anulação, e não decretação de nulidade.

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11)TERCEIRO NÁO-COMpARECENTE. (a) Se o terceiro foi citado para a causa de cognição e não compareceu, não pode impedir a execução (decisão do Senado português de 1662, baseada em AGOSTINHO BAaBosA). MANUEL ALVARES PÉGAS (Resolutiones Forenses, 1, 448) explicou: ..... si tertius habuerit scientiam litis, super re sua, et possessa a se, etiam absque citatione tenetur comparere, et se defendere”. A lei não permite que os particulares eludam o juízo; e esse terceiro o eludiria se pudesse, na execução, opor embargos de terceiro. ANTÔNIO DE SOUSA DE MACEDO (Decisiones, 190) ferira, antes dele, o ponto: até esse terceiro fora a eficácia da sentença, deixando de o ser, o que também ocorre naqueles casos em que, ainda não citado, até ele vai a eficácia da sentença (ex natura causae). A sentença teve-o como parte, e não como terceiro. Pode ser terceiro nos casos em que a parte o poderia ser. (b) Também recai sobre os bens do terceiro a execução se, proferida a sentença, que se pretende executar, foi, antes de transitar em julgado, intimado ou citado o terceiro (MANUEL MENDES DE CASTRO, Practica Lusitana, 1, 105) e não se livrou da extensão. (c) Se o terceiro adquiriu bem gravado com cláusula de non alienando, devidamente registrada, não pode furtar- -se à execução, ainda que seja comuneiro (Aresto n. 57 de MELCEIOR FEBO; e MANUEL A.LVARES PÉGAS, Resolutiones Forenses, 1, 457). (d) Não é terceiro o cônjuge que responde pela dívida, segundo o direito de família (MANUEL ALVARES PÉGAS, Resolutiones Forenses, 1, 457). (e) Não é terceiro o que aceitou pagar a divida (Juízo da Conservadoria do Comércio, 1680; e. g., o que telegrafou ou escreveu responsabilizando-se). (f) Não pode impedir a execução o terceiro que adquiriu bem do Estado, antes de se levantar a inalienabilidade (MANUEL ALvARES PÉGAS, Resolutiones Forenses, 1, 489). 12) INEFICÁCIA DOS ATOS EM FRAUDE DE EXECUÇÃO. A regra jurídica, de direito material, onde se estabelece que os credores quirografários e os que têm hipoteca não inscrita somente por ação ordinária ou rescisória podem obter invalidade da que foi inscrita antes, tem por fito a restauração da verdade dos negócios jurídicos, no tocante ao registro. A regra jurídica pertence ao direito material, civil e registrário ; ao direito processual é que compete regular a ineficácia dos negócios jurídicos em fraude de execução. JoÃo MoEmo queria que essa matéria pertencesse ao direito civil; mas sem razão: primeiro, porque não se trata de nulidade de contratos, como a ele parecia e estranhava estivesse em lei processual, porque a eficácia da execução é à lei das execuções, lei processual, que compete fixar. Aliás, o processualista (Programa, III, 3) não estudara o instituto da fraude à execução e apenas lhe dedicou as linhas em que transcreveu os arts. 494 e 686 do Reg. n. 737. A ineficácia é que dispensa, hoje, a ação constitutiva negativa, mesmo porque nada se tem, no art. 593, de desconstituir, a decisão é declarativa, inserta no mandamento. O que importa é não se confundir a ineficácia com a nulidade. Na hipoteca constituída em fraude de execução pode ser apreciada a fraus executionis no próprio momento de se pedir a penhora (Seção Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, j~O de setembro de 1944, R. dos T., 153, 239); mas as nulidades e “rescisões” da hipoteca, de modo nenhum: o art. 847 do Código Civil não foi atingido (sem razão, a 4.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 20 de janeiro de 1944, R. dos T., 148, 613). Art. 594. O credor, que estiver, por direito de retenção, na posse de coisa2) pertencente ao devedor, não poderá promover a execução sobre outros bens senão depois de executada a coisa que se achar em seu poder ~). 1)DIREITOS DE RETENÇÃO E ORDEM NAS PENHORAS. A retenção ou a posse imediata da coisa pelo credor dá ao devedor, que ‘~ dono dela, a exceptio excussionis realis positiva, de modo que se tem de executar, primeiro, a coisa que o credor já retêm ou possui. O caucionante de títulos de crédito goza do mesmo benefício de precipua execução. Somente quando o valor da coisa retida ou possuída é inferior ao valor da dívida é que se pode prosseguir na penhora de outros bens. É matéria para embargos do devedor a impugnação do réu, porém nada obsta a que, nas vinte e quatro horas em que tem de pagar ou nomear bens à penhora (art. 652), nomeie em primeiro lugar o bem retido ou possuido pelo credor. Se há mais de um que baste, a escolha, na dúvida, pertence ao réu. Sobre direito de retenção, Tratado de Direito Privado, Tomo XXII, § § 2.734-2.739. Sendo muitos os pedidos com alternação, a execução faz--se à medida que se exerce ou exaure o direito de escolha. 2)DIREITO DE RETENÇÃO (CONTINUAÇÃO NA POSSE). O direito de usar, ou de fruir, não é direito de retenção. O art. 594 refere-se, apenas, ao ius retentionis.

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Árt. 595. O fiador, quando executado1), poderá nomear à penhora bens livres e desembargados do devedor. Os bens do fiador ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação do direito do credor2). Parágrafo único. O fiador, que pagar a divida, poderá executar o afiançado nos autos do mesmo processo 3), 1)FIADOR E PENHORA. A fiança põe-se em garantia; portanto, após a dívida. O art. 568, IV, tem o “fiador judicial”como sujeito passivo da execução; mas, aqui, no art. 595, trata-se de qualquer fiador: extrajudicial, isto é, negocial, civil ou comercial, e judiciaL Trata-se da ordem das constrições : primeiro, a dos bens do devedor; depois, a dos bens do fiador, O benefício da ordem, que é o de serem excutidos em primeiro lugar os bens do devedor, tem base no objeto, e não no sujeito. Se a sentença condenatória não se referiu ao fiador, porque não foi citado (a fortiori, se o foi e a sentença não acolheu a inclusão), a execução vai apenas contra o devedor. Não se executam bens do fiador. Se não há bens do devedor ou se os bens do devedor não bastam, tem-se de propor ação de conhecimento contra o fiador, e então a sentença que se proferiu é título executivo contra o fiador. Aliter, se foram devedor e fiador os réus, porque executados são ambos, posto que ao fiador caiba o beneficium ordinis. Só não o tem se a ele expressamente renunciou, ou se se obrigou como principal pagador ou como devedor solidário, ou se está insolvente ou falido o devedor (cf. Código Civil, art. 1.492). Se não foi demandado na ação de condenação e, ao ser executado o devedor, ou antes disso, ocorre a insolvência ou a falência, à data em que se iniciou a eficácia da decisão de insolvência ou de falência foi encoberto o benefício de ordem. 2)NOMEAÇÃO DE BENS DO DEVEDOR PELO FIADOR. O fiador, quando executado, ou por ser fiador judicial (art. 568, IV), ou porque foi condenado, ou porque o caso cabe no art. 1.492, 1, II e III, do Código Civil, ou no art. 258, 1.a alínea, do Código Comercial, pode nomear bens desembargados do devedor. Se aparece arresto, penhora, ou oposição, que se julgue procedente, ou se são insuficientes os bens nomeados, a execução alcança os bens do fiador, até que se complete o valor da dívida. Tal nomeação de bens do devedor é o atendimento processual do beneficium excussionis do direito material (Código Civil, art. 1.491), e pode existir a despeito de haver desaparecido o beneficio de cognição ou discussão, beneficium ordinis. O beneficium excussionis personalis (seu ordinis!) é o da Nov. 4, 1, 2, de Justiniano, em que se pretendeu que tivesse vindo de Papiniano (L. 166, D., de verborum significatione, 45, 1, onde só se trata de fideiussio indemnitatis!). Se o credor, que poderia demandar o devedor, demanda o fiador, esse pode exigir que primeiro se discuta com o afiançado (donde o nome de benefício de discussão), salvo se esse não tem com que pagar. O momento para o fiador exercer essa pretensão de nomear é o do ari. 652, as vinte e quatro horas depois da citação. No direito anterior, havia a exceção de excussão, e naturalmente ainda se pode opor em embargos do devedor, se não nomeou bens do devedor ao ser citado. Não obsta ao benefício de excussão7 e à respectiva exceção o não ter o fiador, na ação de condenação, em que foi parte, oposto a sua pretensão a serem primeiro excutidos os bens do devedor. Na ação, o beneficio é de discussão (arg. ao Código Civil, art. 1.491). (O beneficium excussionis realis ou exceptio excussionis realis supõe a responsabilidade objetiva geral e a especial, deixando ao devedor exigir que primeiro se executem os bens especialmente sujeitos à execução.) Se, no prazo das vinte e quatro horas contadas da citação (art. 652), o fiador não exerce a sua pretensão ao benefício de ordem, há duas respostas quanto à pergunta e quanto ao que daí há de resultar: ou a) se entende que houve renúncia, o que não estaria certo, porque o direito sentencial exige que seja expresso tal ato jurídico (Código Civil, art. 1.492, 1); ou 7,), tem-se em a) sua omissão como puramente processual e deixa-se-lhe o ensejo de referir-se ao seu direito à ordem, quando opuser embargos do devedor, com a indicação dos bens do devedor; ou c) admite a solução b), salvo quanto aos seus bens já penhorados. A solução c) é a melhor porque se houve a penhora, os embargos do devedor só teriam eficácia suspensiva se ocorreu algum dos casos do art. 741. É preciso que os bens estejam livres e desembaraçados, além de serem insuficientes. A avaliação é que vai mostrar se eram insuficientes, ou não no eram. Se não no eram, foi ineficaz a nomeação e até mesmo a penhora. O Código Civil, art. 1.491, parágrafo único, exige que os bens do devedor sejam sitos no Município em que se propôs a ação executiva. No art. 656, III, do Código de 1973 tem-se por ineficaz a penhora, “salvo convindo o credor”, se, havendo bens no foro da execução, outros hajam sido nomeados. Não se falou da indicação pelo fiador, mas as regras juridicas relativas à nomeação pelo devedor hão de ser observadas. 3)FIADOR E SUB-ROGAÇÃO PESSOAL. O fiador (qualquer fiador que tenha pretensão a cobrar-se), se pagou a divida do réu, pode servir-se, ipso iure, da sentença, e através dela exercer a sua pretensão a executar, excluída assim (pulada) a ação de condenação que normalmente teria de propor. Não há substituição subjetiva processual do credor pelo devedor, nem inserção do fiador na relação jurídica processual, ou na sentença. A

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realidade é toda outra. No plano do direito material, o fiador, que paga, sub-roga-se nos direitos (e pretensões) do credor; de modo que se sub-roga na pretensão a executar, donde ser-lhe dado propor a ação de execução da sentença condenatória, ou da sentença um de cujos efeitos (3) é o executivo. Tal regra jurídica é útil ter-se escrito. Mas seria de revelar-se em qualquer Código, ainda se na letra não estivesse. Nas ações executivas de títulos extra-judiciais inclui-se o princípio do art. 595, parágrafo único; e também o fiador, que paga, pode continuar contra o devedor a ação que o credor intentara. Não se diga que tal regra jurídica não estava no Código de 1939; lá estava, como art. 887, parágrafo Único. O art. 595, parágrafo único, refere-se a qualquer fiança. Se a sentença foi executada contra o fiador judicial, tem ele de sofrer a execução; a sub-rogação só se dá quando se reputa solvida a divida, de modo que não está na mesma situação do fiador que pagou a dívida, para executar, como a sentença, o devedor (sem razão, AMILCAR DE CASTRO, Comentários, X, 42). Não saberíamos como construir, processualmente, esse réu-autor, com os prazos do processo da execução, etc. Se ele paga, ao ser citado, no prazo adequado (arts. 646, 652 e 621), é diferente: é fiador, que pagou, como qualquer outro. Se o fiador solveu toda a divida, a execução é do total pago. Se apenas tinha de solver o que restara por serem insuficientes os bens do devedor, ou só pagou o restante, ou os seus bens só a isso serviram, executa-se o valor correspondente à solução. Não importa se o fiador teve o beneficio de ordem, ou se não o teve, O que importa é saber-se quanto sofreu com a execução. Se o devedor não tem bens que possam ser atingidos por ação do fiador, tem ele de aguardar que o devedor venha a obtê-los. Para evitar que ocorra prescrição, pode o fiador exercer as medidas necessárias à interrupção (cf. Código Civil, arts. 172-176). O fiador não precisa iniciar novo processo executivo, porque a execução corre no mesmo. Não se diga que ele não tem de propor outra ação, porque o seu ato para a execução no mesmo processo é exercício da pretensão pré-processual, da pretensão de direito processual e da pretensão de direito material. O que é o mesmo é o processo. A finalidade da regra jurídica é facilitar o exercício da pretensão de direito processual. Se, depois de feita a penhora de bens do fiador o devedor adquiriu bens (e. g., herdou ou ganhou em loteria ou mesmo em jogo de mesa), ou se veio a saber que tinha bens, por todos, ou somente por outras pessoas por ele ignorados, o fiador pode requerer ao juiz que se proceda a penhora desses bens e, uma vez feita com suficiência, revogue a outra penhora, ou até onde os bens advindos ou os agora conhecidos bastem ao pagamento da divida. Art. 596. Os bens particulares dos sócios 1) não respondem pelas dividas da sociedade senão nos casos previstos em lei; o sócio, demandado pelo pagamento da divida, tem direito a exigir que sejam primeiro excutidos os bens da sociedade. § 1.0. Cumpre ao sócio, que alegar o beneficio deste artigo, nomear2) bens da sociedade, sitos na mesma comarca, livres e desembargados, quantos bastem para pagar o débito. § 2.0. Aplica-se aos casos deste artigo o disposto no parágrafo único do artigo anterior3). 1) BENS PARTICULARES sócios. O beneficio de excussão, de que ai se trata, é personalis, a regra jurídica nada tem com a legitimação passiva dos sócios. Sempre que se podem executar bens dos sócios por dividas da sociedade o que o art. 596 supõe cabe ao sócio o beneficio, a que corresponde exceção semelhante à da nota ao art. 595. O art. 596 não confere ao executante pretensão a executar bens dos sócios. O princípio que regeria a espécie seria o art. 592,11. Aqui, o art. 596 parte da premissa de poderem ser executados os bens do sócio. Cumpre distinguir-se do benefício de excussão o beneficio da chamada em primeiro lugar. Naquele, há de ser feita a execução prévia; nesse, há de ser proposta, antes, a ação contra o principal responsável. No art. 596, o benefício é apenas de prévia execução dos bens da sociedade (cf. Código Civil, art. 1.396; Código Comercial, art. 350). Há renunciabilidade do beneficio de excussão, desde que se faça explícita e especial a renúncia (W. GIRTANNER, Die Biirgschaft nach gemeinem Civilrecht, 1, 436; W. HASENBALG, Die Biirgschaft des gemeinen Civilrechts, 604). Idem, se o sócio assumiu, pessoalmente, a obrigação de pagar em determinado termo, ou condição, ou se declarou que assume a dívida como só sua (W. GIRTANNER, Die Biirgschaft nach g0-meinem Civilrecht, 1, 240 s. 319 s.). Se a sociedade não tem bens e sócios se retiraram, ostensivamente, mas continuaram a operar na sociedade, os bens deles podem ser penhorados (1.a Turma do Supremo Tribunal Federai, 27 de outubro de 1949, R. dos T., 204, 633). Primeiro se hão de executar os bens da sociedade e a isso tem direito o sócio. Diante de atitude desfavorável e ilegal do juiz, ~tem ele de opor embargos de terceiro (arts. 1.046-1.054), e não embargos de devedor? A resposta que a isso dá, no direito processual português, JosÉ ALBERTO D~8 REIS (Processo de Execução, 1, 2.~ ed., 253), é de repelir-se, ~Por que se há de considerar terceiro quem foi citado como devedor e o é? O que o juiz

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entendeu foi que o sócio, feito devedor, tem de sofrer execução, como responsável, subsidiariamente. Para se dizer que não se é devedor, tem-se de exercer a pretensão à ação de embargos de devedor, e não de terceiro. Nos embargos, tem de alegar e provar que ainda não é devedor, uma vez que a responsabilidade da sociedade antecede à sua. O sócio tem o beneficium excussionis. Se a pessoa citada não é sócio, parte não é, e ai, sim, pode opor embargos de terceiro. (Sobre o assunto já me manifestara nos Comentários ao Código de 1939, XIII, 95, e também AMILCAR DE CASTRO, Comentários ao Código de 1939, X, 1, 68.) Os bens do sócio são sujeitos à execução “nos termos da lei”. No Código Civil, há o art. 1.396 e parágrafo único e o art. 1.407. O art. 1.396 diz que, “se o cabedal social não cobrir as dividas da sociedade, por elas responderão os associados, na proporção em que houverem de participar nas perdas sociais”; e o parágrafo único: “Se um dos sócios for insolvente, sua parte na divida será na mesma razão distribuída entre os outros”. E o art. 1.407: “Subsiste, ainda após a dissolução da sociedade, a responsabilidade social para com terceiros, pelas dívidas que houver contraído”. O Código Comercial, no art. 292, cogitou de credor particular de um sócio e de execução nos fundos líquidos que o devedor possua na sociedade. 2) NOMEAÇÃO DE BEN5. Sócio que alega o benefício de excussão tem de nomear bens da sociedade, sitos na mesma comarca, livres e desembaraçados, com valor que baste para se solver a divida. 3) Sócio QUE PAGA A DIVIDA. O sócio que paga a divida tem direito, pretensão e ação para a execução dos bens da sociedade. Com isso, a despeito do seu gesto, continuou a ter direito ao beneficio. O processo executivo é nos mesmos autos da ação contra a sociedade. Art. 597. O espólio responde pelas dividas do falecido 1); mas, feita a partilha, cada herdeiro responde por elas na proporção da parte que na herança lhe coube 2)• 1)EXECUÇÃO CONTRA 05 HERDEIROS. As dívidas da herança executam-se nos bens da herança, e não nos outros bens dos herdeiros (Código Civil, art. 1.587). Antes da partilha, só os bens da herança podem ser executados pelas dívidas da herança. Depois da partilha, ou se previu o pagamento das dividas (a) e se separaram ou reservaram bens (b), ou não se cogitou disso (c), ou há dividas que não se apontaram (d). Nos dois últimos casos, as dividas são executadas na proporção da quota hereditária de cada um dos herdeiros (ou nas deixas aos legatários). 2)BENS DA HERANÇA E BENS DOS HERDEIROS. Se os herdeiros não fizeram partilha e os bens estão misturados com os próprios, ao herdeiro executado cabe fazer a prova do excesso (Código Civil, art. 1.587, 2Y- parte). Se há inventariante, a ação corre contra ele (art. 12, V), sendo litisconsorte o herdeiro (art. 46).DAS DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 598. Aplicam-se subsidiariamente à execução as disposições que regem o processo de conhecimento 1)• Art. 599. O juiz pode, em qualquer momento do processo2): 1 ordenar o comparecimento das partes; II advertir ao devedor que o seu procedimento constitui ato atentatório à dignidade da justiça. 1)SUBSIDIARIEDADE DE REGRAS JURÍDICAS PROCESSUAIS. Sempre que falte alguma regra jurídica para qualquer questão processual e seja necessário algum despacho ou decisão, ou ato processual do juiz, das partes ou de serventuário, tem-se de buscar no processo de conhecimento o que sirva para se saber como se tem de agir. Teremos muito ensejo de referir-nos a regras jurídicas que não constam do Livro II do Código. O art. 598 apenas explicitou o que se haveria de entender, mesmo se ele não existisse. Quando o juiz manda que se cite para penhora, ou para a entrega da coisa, ou outra execução, não sentencia definitivamente, no sentido de “sentença definitiva”, que é sentido implícito do art. 513. Sem dúvida, há certa cognição na resolução judicial, que é o despacho na petição de execução,porém não se trata de “sentença apelável”. A porção sentencial cognitiva do despacho é superada pelo mandado de execução. ~ contra essa mandamentalidade da resolução, citando-se com a cominatória executiva, que vão os embargos do devedor, ação mandamental negativa.

2)FUNÇÃo DO JUIZ. Acertadamente, o art. 599 estatui que, em qualquer momento do processo de execução, pode o juiz ordenar o comparecimento das partes (entendamos:dos interessados, porque é possível, entre outras circunstâncias, que haja embargos de terceiro). Mais: o procedimento do devedor, ou de quem lhe faça as vezes,

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pode ser atentatório à dignidade da justiça. Nem todo o seu procedimento éinjusto: pode o próprio devedor ter motivos para se submeter à execução, a despeito de ser devedor solvente. O art. 599, II, embora não o diga, somente considera atentatório à dignidade da justiça o procedimento de má-fé, ou com simulação, dissimulação, ou fraude, ou ato omissivo de respeito e de dignidade. O art. 600 deu exemplos. Árt. 600. Considera-se atentatório àdignidade da justiça o ato do devedor que: 1 frauda a execução 1); 11 se opôe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios artificiosos2); III resiste injustificadamente às ordens judiciais 3); IV não indica ao juiz onde se encontram os bens sujeitos à execução4). 1)FRAUDE À EXECUÇÃO, PROCEDIMENTO ATENTATÓRIO ÀDIGNIDADE DA JUSTIÇA. A fraude à execução é ofensa que podia vir em primeiro lugar na enumeração, porque a má-fé é elemento contenutistico ineliminável ao conceito. O art. 593 deferiu a fraude de execução. 2)MAIIcIA, ARDIS E MEIOS ARTIFICIOsOS. Em todos os atos a que o art. 600, II, alude, há a má-fé, que o juiz tem de reprovar, com advertência ou sanção, que caiba no direito processual civil, ou envio às autoridades competentes para julgamento das penas. 3)REsISTÉNcIA INJUSTIFICADA AS ORDENS JUDICIAIS. “Ordens”, aí, está em uso largo. Uma vez que se iniciou ou se há de supor que vai advir a injustificada resistência, cabe ao juiz (não se pense que seja de seu livre arbítrio) advertir o devedor. Com a advertência, ou sem ela, pode haver o contestado à dignidade da Justiça. 4)NOMEAÇÃO DE BENS E INDICAÇÃO DOS LUGARE5 EM QUE SE ENCONTRAVAM. O devedor, citado na ação executiva, tem de nomear os bens à penhora, bem como dizer onde se encontram. Na execução para a entrega de coisa, ou o devedor a entrega, ou a deposita, ou nada diz a respeito, em embargos suspensivos da execução (art. 625), ou diz onde ela se encontra, contra a sua vontade, ou mesmo por lhe parecer descabida a execução. De qualquer modo, se sabe onde ela está, ou onde se localiza, e não o revela, incide no que se estatui nos arts. 599 e 600. No caso de execução para entrega de coisa incerta, igual dever incumbe ao devedor, porque, se lhe cabe a escolha, tem de individuar a coisa incerta, ou, se cabe ao credor, tem de indicar onde se encontra. Art. 601. Se, advertido, o devedor perseverar na prática de atos definidos no artigo antecedente, o juiz, por decisão, lhe proibirá que daí por diante fale nos autos. Preclusa esta decisão, é defeso ao devedor requerer, reclamar, recorrer, ou praticar no processo quaisquer atos, enquanto não lhe for relevada a pena 1)• Parágrafo único. O juiz relevará a pena, se o devedor se comprometer a não mais pra- ticar qualquer dos atos definidos no artigo antecedente e der fiador idôneo, que responda ao credor pela dívida principal, juros, despesas e honorários advocatícios2). 1)SANÇÕES. O devedor, em qualquer das espécies de que se falou sob os arts. 599 e 600, há de ser advertido, se a advertência ainda pode ter efeito de evitar-se o ato atentatório, positivo ou negativo. Se o devedor, advertido, desatende à advertência, o juiz, em decisão fundamentada, proibe-o, daí em diante, de falar nos autos. A pena pode ser relevada. Enquanto tal não ocorre, o devedor não pode requerer, nem reclamar, nem praticar qualquer ato no processo. Isso não significa que não possa opor embargos de devedor, nem que da própria decisão não possa recorrer, porque seria interpretar-se o art. 601 (verbis “reclamar, recorrer, ou praticar no processo quaisquer atos”), como se se atribuisse ao juiz ato despótico, a seu arbítrio e sem remédio jurídico corretivo. Juiz também pode ofender a dignidade da Justiça. Nenhum ato, quanto ao processo da ação executiva, pode o devedor praticar, inclusive o de interposição de recurso, exceto no tocante à própria decisão que impôs a pena. O recurso é o de agravo de instrumento. Primeiro há a advertência. Se o devedor insiste, o juiz proibe-lhe que, daí em diante, fale no processo. Há a recorribilidade em agravo de instrumento, pois a decisão não é de mero expediente e tem de ser fundamentada, máxime diante dos prejuízos que possa causar ao devedor. Também pode ocorrer que, em proteção ao devedor, tenham surgido dados que possam ser afastados por ordem do juiz, inclusive resposta do devedor, e aí o juiz não se exime do dever de providenciar. Somente após a preclusão, portanto após ter passado em julgado a decisão do juiz, é que fica o devedor privado de falar nos autos. Preclusão é, aí, a decisão de que não foi interposto o agravo de instrumento. Cumpre atender--se a que o agravo de instrumento não tem efeito suspensivo, mas o fato de estar na lei o requisito eficacial da preclusão, evidencia-se que a suspensividade, aí, não seria pressuposto, porqUe so

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se suspende o que é, o efeito que já existe, e na espécie do art. 601 ele ainda não se irradiou. Só se irradia quando já preclusa a decisão. Não é o agravo de instrumento que impede a aplicação da pena; o que impede é o não estar preclusa a decisão. A suspensividade, na espécie do art. 601, é apenas alusão ao trânsito em julgado, isto é, ao tempo em que ainda não o há. Evitemos falar de efeito suspensivo obrigatório: o que o art. 601 estatui é que, não trânsita em julgado a decisão, não tem ela eficácia. Só se suspende o que já é, prende-se para baixo, retira-se o que já havia subido. Na espécie do art. 601, nada havia, que se suspendesse. Após a preclusão da decisão, o devedor não pode “requerer, reclamar, recorrer ou praticar no processo quaisquer atos”. Para cessar tal eficácia da pena processual, é de mister que haja a relevação (art. 601, parágrafo único). Requerer é pedir lato senso. Se o juiz tem de proceder, de ofício, a alegação não é requerimento. Requerer, no art. 601, está em sentido amplo, desde que se entenda incluído o pedido, porém não mais do que isso. A “petição inicial” está fora. Depois, fala-se de reclamar, que alude ao instituto da reclamação (e. g., Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, art. 161: “Caberá reclamação do Procurador-c3eraí da República, ou do interessado na causa, para preservar a competência do Tribunal ou garantir a autoridade das suas decisões”; art. 164: “Qualquer interessado poderá impugnar o pedido do reclamante”). O Código de 1973, como o de 1939, não poderia eliminar o que estava no sistema jurídico sem regra jurídica expressa que proviesse do Poder Legislativo, mas sem qualquer ofensa ao direito constitucional Basta o fato de o Código de 1973 empregar no art. 601 “reclamar” para se considerar permitida em Regimentos Internos a “reclamação”. (O mandado de segurança é ação, de modo que a petição inicial não pode estar no “requerer”, nem no “reclamar”, nem no “recorrer” do art. 601. De lure condendo, o texto do art. 601 podia ser melhor, mas ele não deixou sem recurso a decisão. Só a preclusão leva ao extremo. A “reclamação” ao Tribunal pode subsistir, se consta da lei de organização judiciária ou do Regimento Interno. O mandado de segurança é inafastável, diante da Constituição. 2)RELEVAÇÃO DA PENA. O juiz pode relevar a pena, a qualquer momento, que lhe pareça conveniente, mesmo se na decisão disse até que data estava proibida a prática de atos processuais. Para que possa relevar a pena, é preciso que o devedor se comprometa a não mais praticar qualquer dos atos definidos no art. 600, e dê fiança. Mas, diante de tal promessa do devedor, não pode o juiz deixar de relevar a pena, isto é, retirá-la, porque relevatio é ato de retirada. O fiador há de ser idôneo e a responsabilidade, perante o credor, é pela dívida principal, juros, despesas e honorários advocatícios. A relevação da pena exige pressupostos que são o de declarar o devedor que se vincula a não mais praticar qualquer dos atos que os arts. 599, II, e 600 apontam, e o de dar fiador idôneo, isto é, moral e economicamente admissível. ‘Tal fiador terá de responder pela dívida, pelos juros, despesas e honorários advocatícios, se a execução contra o afiançado for até o fim. Se o devedor solve a dívida e as outras despesas, não há responsabilidade do fiador. Pergunta-se: ,em vez de dar fiador, pode haver a relevação da pena se o devedor presta garantia real suficiente, de modo que fique assegurada a prestação da divida, dos juros e dos honorários do advogado, caso o devedor não obtenha, com os embargos, o afastamento da execução? A lei não cogitou disso; mas seria desacertado que não se admitisse, em vez da garantia pessoal, a garantia real. O devedor pode assumir a obrigação de não mais praticar qualquer ato atentatório à dignidade da justiça e fazer o depósito do quanto suficiente para aquilo de que cogita o art. 601. Advirta-se que o juiz não tem arbítrio para relevar, ou não , a pena, satisfeitos os dois requisitos referidos no art. 601, parágrafo único. Nada tem com o assunto o credor, porque se trata de relação jurídica entre o devedor e a Justiça (o Estado). Se houve relevação da pena e o devedor volve à prática de atos atentatórios à dignidade da justiça, tem de haver, de novo, a advertência, que permite recurso, e a possível nova aplicação da pena. Pergunta-se: <o art. 600 só apanha a) os atos praticados e praticáveis no processo da ação executiva, ou b) também os atos praticados e praticáveis no processo da ação de embargos do devedor? A resposta é no sentido de b. Pode também acontecer que a atitude atentatória do devedor ocorra no processo de embargos de terceiro à execução. A relevação da pena independe de ter havido recurso de agravo de instrumento, tendo sido negada cognição ou provimento. Se o agravo de instrumento foi provido, pena deixou de existir. O que pode acontecer é que novos atos atentatórios à dignidade da justiça dêem ensejo à advertência e à decretação da pena. Se os atos do devedor, que o juiz considerou atentatórios à dignidade da justiça, também causaram ou causam danos ao credor, a legitimação ativa do credor nada tem com o que o juiz julgou. Tais danos podem ter diferente causa, ou até resultarem de atos que não se consideraram atentatórios à dignidade da justiça. Art. 602. Toda vez que a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos 1),

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DISPOSIÇÕES GERAIS (ART. 602)489 O juiz, quanto a esta parte, condenará o devedor ,a constituir um capital3), cuja renda assegureo seu cabal cumprimento 2) 4)• § 1.0. Este capital, representado por imóveis ou por títulos da dívida pública, será inalienável e impenhorável ~): 1 durante a vida da vítima; Ii falecendo a vítima em consequência do ato ilícito, enquanto durar a obrigação do devedor. § 2.0. O juiz poderá substituir a constituição do capital por caução fidejussória, que será prestada na forma do artigo 829 e seguintes 6)• § 30 Se, fixada a prestação de alimentos, sobrevier modificação nas condições económicas, poderá a parte pedir ao juiz, conforme as circunstánci as, redução ou aumento do encargo 7)• § 49. Cessada a obrigação de prestar alimentos, o juiz mandará, conforme o caso, cancelar a cláusula de inalienabilidade e impenhorabiidade ou exonerar da caução o devedor 8) 1)PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS. O art. 602 tem a sua história. O Código Civil de 1916, arts. 1.537-1.539, mandara pagar alimentos a quem o defunto os devia. A jurisprudência teve de lutar para se uniformizar: queriam uns (a) a entrega de capital, que produzisse os alimentos; outros, (b) as prestações periódicas (pensões alimentares); outros, ainda, (c) a entrega de capital, que, no tempo a se exaurir, durante a vida, ou enquanto permaneça a obrigação de prestar. Nos vários julgados, percebiam-se as diferentes doses de equidade na psique dos juizes, o reflexo mesmo das convicções econômicas. Não viam os que lutavam pelas soluções (a) e (c) que o capital leva consigo o seu risco, e a solução (c) seria ilusória e dispendiosa, e que a fórmula (1>) não <lispensaria a caução para assegurar as prestações futuras. Prevaleceu a solução (a). Isso, em 1939 e em 1973, ficou assente em lei. A palavra “alimento” tem, em direito, acepção técnica. Na linguagem comum significa o que serve à subsisténcia animal; juridicamente, os “alimentos” compreendem tudo que é necessário ao sustento, à habitação, à roupa (Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 88, § 15: “. . .o que lhes necessário for para seu mantimento, vestido e calçado e todo o mais em cada um ano”), ao tratamento de moléstias (CoEuIo DA ROCHA, Direito Civil português, 1, 219) e, se o alimentário é menor, às despesas de criação e educação (Ordenações Filipinas, Livro 1, Titulo 88, § 15: “E mandará ensinar a ler e escrever aqueles, que forem para isso até a idade de doze anos”.) Alimenta futura são os alimentos que se prestam em virtude de sentença, trânsita em julgado e a partir da coisa julgada, ou em virtude de acordo e a partir desse. Alimenta praeterita são os anteriores a qualquer desses momentos. Os alimentos pretéritos são devidos desde que se compõe o suporte fáctico da regra jurídica sobre alimentos. A obrigação de alimentar também pode começar antes do nascimento e depois da concepção, pois, antes de nascer, existem despesas que tecnicamente se destinam à proteção do concebido e o direito seria inferior à vida, se acaso recusasse atendimento a tais relações inter-humanas, solidamente fundadas em exigências de pediatria. Outro caso, em que o nascituro pode figurar como autor na ação de alimentos, é aquele que se depreende da lei civil brasileira, onde se estabelece que a indenização por homicídio consiste não só no pagamento das despesas com o tratamento da vitima,seu funeral e o luto da família, como também na prestação de alimentos às pessoas a que o defunto os devia. Por outro lado, as despesas de “alimentos” ao nascituro podem envolver e freqUentemente envolvem as de alimentos à mãe. ~A pensão alimentícia pode ser (perguntava-se) em capital que dê renda? Responderam negativamente WILHELM HENLE (Burgerliches Gesetzbuch, 9.~ ed., nota 3 ao § 1.612), K. UNZNER (em G. PLANCK, Biirgerliches Gesetzbuch, 3~a. ed., IV, 456), WILHELM vON BLUiVIE (Das Familienrecht, 478); com eles, OTTO WARNEYER (Kommentar, II, 766); afirmativamente, TH. ENGELMANN-KEIDEL (Familienrecht, J. v. Staudingers Komment ar, 7.~-8Y- ed., IV, 838)~. Parece-nos que se deve distinguir: a entrega de capital com livre disposição desatende aos fins dos alimentos; a entrega por meio de doação, de usufruto, ou de bem gravado com inalienabilidade mediante a figura da renda constituída sobre imóvel, ou a figura da anticrese, pelo montante das pensões até a extinção da obrigação alimentar, é perfeitamente aceitável. O art. 602 supõe que haja ação de indenização “por ato ilicito”, mas admitamos que se empregou a expressão em sentido amplo (ato ilícito, ato-fato ilícito, fato ilícito), porque as ações de indenização não se fundam sempre em atos a que se refere o Código Civil, no art. 159: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste Código, artigos 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553”. Sempre que há responsabilidade por força maior ou caso fortuito, a ilicitude é de fato ilícito. Se a indenização

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provém de mau uso da propriedade, ou da tomada de posse por violação da posse de outrem, ou de gestão de negócios contra a vontade processual ou manifestada do dono (Código Civil, art. 1.332), há ato-fato ilícito. As espécies do art. 159 são de atos ilícitos estrito senso. Cf. Tratado de Direito Privado, Tomo II, § § 160-181, principalmente a Tabela da p. 186. A indenização pode ser derivada a) de ilicitude que dê ensejo a prestarem-se os alimentos, ou b) de ilicitude que leve a reparação na qual se inclua a prestação de alimentos. Apesar de se falar de “ato ilícito”, cuja indenização “incluir prestação de alimentos”, havemos de entender que o art. 602 tanto concerne a b) como a a); aliás, a fortiori. O art. 602, a despeito de se achar no Livro II (Do processo de execução)~ dirige-se primeiro ao juiz do processo de conhecimento, para dizer que o juiz “condenará o devedor a constituir um capital, cuja renda assegure o seu cabal cumprimento”. No direito anterior (Código de 1939, arts. 911 e 912), a matéria estava na “liquidação da sentença”, de modo que está evidente que o Código de 1973 inseriu o dever do juiz do processo de conhecimento, para que, ao chegar-se à liquidação, se atenda ao que ele decidiu. O lugar próprio para se estabelecer o dever do juiz seria no Livro 1, Capítulo VII (Da audiência) ou Capitulo VIII (De sentença e da coisa julgada). O que está nos § § 1.0, 2.0, 3~0 e 4•0, se não aparecesse no Capítulo VII ou no Capítulo VIII, teria de ser posto no Livro II, Título 1, Capítulo VI (Da liquidação da sentença). As regras jurídicas do art. 602 e § § 1.0, 2.0. 3~0 e 4~0 não são ius cogens. As partes, se são capazes para isso e se não há regra jurídica cogente a respeito, podem acordar quanto à forma de pagamento, e assinar transação a respeito. Quanto às prestações vencidas, a condenação não pode levar a entrega de capital que as produza: já são devidas. O condenado já está exposto à ação executiva de sentença. Vencidas são todas as dívidas que se venceram até o dia do trânsito em julgado. O capital que se constitui é para o adimplemento do que ocorrer após a sua constituição. Os alimentos podem ser da vítima ou de seus dependentes, se faleceu, ou dela e dos seus dependentes. Tudo isso é assunto de direito material. Idem, quanto à fixação dos alimentos e da sua periodicidade. 2) RENDA OU PENsÃo. Ao texto original, de 1939, o Decreto-lei n. 4.565, de 11 de agosto de 1942, cortou as expressões “. . . e levada em conta a duração provável da vida da vítima”, que somente se havia de referir às pensões vitalícias (obrigação de alimentar até morrer). Como a obrigação pode ser até à maioridade, foi bom riscá-las. A 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 28 de janeiro de 1943 (D. da J. de 21 de outubro, 4137), aplicou, por analogia, em matéria de dano por culpa contratual, as regras jurídicas de hoje, art. 602 e § § 1.0~4.o, a que correspondiam os arts. 911 e 912, e insistiu-se nisso (1Y Turma, 10 de julho e 3 de agosto de 1944, A. J., 72, 114 e 189, R. F.,104, 253 e 101, 310; 2.~ Turma, 5 de novembro de 1943, R. F.,97, 627, e 4 de outubro de 1944, D. da J. de 24 de outubro,4901), seguida pela ~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 19 de março, 11 de maio e 8 de junho de 1943, R. F., 95, 588, e 97, 399, e 15 de março de 1944, A. .1., 70, 46 (contra: Câmaras Reunidas, 13 de maio, 15 de junho e 16 de setembro de 1943, A. J., 68, 328, e 69, 435, R. F., 93, 373; ~ Câmara Cível, 8 de dezembro de 1942,A. J., 65, 332; 3•R Câmara Cível, 15 de setembro de 1943, D. da J. de 17 de dezembro; 4.a Câmara Cível, 21 de maio e 26 de outubro de 1943, A. J., 67, 175, R. F., 99, 431, e 2 de maio de 1944, 101, 318; a favor: 3•ft Câmara Cível, 25 de janeiro de 1944, A. J., 70, 219; Câmaras Cíveis Reunidas, 28 de agosto de 1948, R. F., 124, 147). Tratando-se de pessoa ou de pessoas a quem o morto devia alimentos e, por analogia, a quem tinha de alimentar e o prestador foi a vitima, nada afasta que se alegue e prove que a pessoa prestava ajuda ao sobrevivente espontaneamente, mesmo se menor, por serem parcos os seus recursos (1.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 23 de julho de 1942, R. F., 93, 506 e 21 de outubro de 1946, R. dos T., 112, 122; 3•~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 27 de janeiro de 1947, R. F., 114, 407; 3.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 1.0 de abril de 1954, R. dos T., 226, 204; sem razão o Supremo Tribunal Federal, a 17 de novembro de 1941; a 2.a Turma, a 21 de julho de 1941, A. J., 60, 230). Pode ocorrer que o menor precise de alimentos, ou não cesse a necessidade se advém a maioridade (7.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 20 de setembro de 1946, R. R., 112, 151). Se há outra pessoa que deveria prestar alimentos, suficientemente, antes do falecido, a regra jurídica não é invocável (3.a Câmara Cível, 10 de julho de 1942, 94, 71); aliter, se a ajuda era sem dever jurídico ou assumido tacitamente. Alimentos não são apenas a pensão alimentícia, em virtude de lei (acertadamente, com explicitude, a ~•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 22 de junho de 1951, R. dos T., 194, 743; a respeito de mãe que contribuía com o pai dos menores para alimentos e educação dos filhos, a 6.~ Câmara Civil, 13 de abril de 1951).

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As regras jurídicas só se referem às prestações vincendas, e não às vencidas (1.R Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 16 de agosto de 1943, R. dos T., 146, 214). O art. 602 tanto se refere a prestações à vítima quanto aos que, sem terem sido vítimas, têm direito à indenização. Duração, nas espécies do art. 602 (durante a vida da vítima, e enquanto durar a obrigação do devedor), é o tempo em que se há de prestar a renda ou pensão (a pensão é a renda que se retira da renda do imóvel, se foi feita alusão à quantia devida e se permite que vá ao devedor o restante) à vítima, isto é, o credor da prestação alimentar, o tempo em que se há de fazer a prestação, relativa a outras pessoas, ou a outra pessoa que tenha direito, pela morte da vítima, à prestação alimentar. Na segunda espécie, o juiz determinou da duração (e. g., até que fique maior o filho A, ou enquanto não se casar a filha, ou enquanto não ficar casada a filha enferma, ou a viúva não se casar). 3)REVERSÃO DO CAPITAL. O capital inalienável e impenhorável, cessando a obrigação, reverte ao obrigado (Câmaras Reunidas do Tribunal de Apelação de São Paulo, 30 de outubro de 1942, R. dos T., 144, 245). Porém a indenização de lucros cessantes, em caso de perda de bem, é de capital, e não de lucros cessantes. Transcorrido o prazo para a prestação de renda ou pensão, o capital reverte ao devedor que se liberou com o último pagamento (cf. 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 3 de agosto de 1948, R. dos T., 190, 474). Se há segurança da execução, pode ser adotado outro modo de solução (e. g., 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 12 de outubro de 1948, R. dos T., 188, 492: “Fazenda Pública, mesmo quando condenada a satisfazer indenização proveniente de ato ilícito, paga juros simples, a partir da efetivação da condenação, e os lucros cessantes por ela devidos se convertem em prestação de renda durante o tempo presumido de vida da vítima e enquanto seus herdeiros não se tornarem capazes”). Enquanto a vítima deve alimentos, esses alimentos são parte da dívida indenizatória. No art. 602, § 4~o, diz-se que, cessada a obrigação de prestar alimentos, o juiz mandará, conforme o caso, cancelar a cláusula de inalienabilidade e impenhorabilidade, ou exonerar da caução o devedor. Portanto, a cessação decorre de ter acontecido morte da vítima ou chegado à extinção a obrigação do devedor, (art. 602, § 1.0, cf. 602 e § § 2.0 e 3.0). O juiz tem de fazê-lo tão logo lhe chegue a prova de que faleceu a vítima, ou quando, conforme os autos, cessar a duração da obrigação, ou, se depende de fato ou ato que ocorra fora do juízo, no momento da informação suficientemente provada. Se houve prestação, restitui-se. Com a extinção da obrigação de prestar alimentos ~e houve gravame da inalienabilidade (que contém a impenhorabilidade) ou da impenhorabilidade, tem de extinguiu-se a garantia e com ela o que atingiu os bens. Daí o cancelamento, isto é, a declaração pelo juízo de que se extinguiu e se tem de proceder a qualquer medida para que cesse a eficácia gravativa (e. g., cancelamento da inscrição no registro de imóveis). 4)PREsTAÇõEs DEVIDAS E TEMPO. O juiz da condenação deve fixar, sempre que possível, na ação condenatória, as prestações devidas e o tempo. Sempre que possível. Na ação de execução de sentença, determina-se a quantia que há de produzi-las. Se isso não foi feito, não há nulidade, posto que possa ser responsabilizado o juiz; e proceder-se-á à liquidação das prestações devidas, à fixação do tempo e à da quantia. 5)INALIENABILIDADE E IMPENHORAiBILIDADE DO CAPITAL. Um dos argumentos contra a solução (a), de que se falou à nota 1), era o da devolução do capital, morto o credor de alimentos, ou cessada a obrigação de prestar alimentos. A lei deu boa solução: inalienável e impenhorável (o que é consequência da inalienabilidade) durante a destinação, o capital; restituível ao obrigado, cessada a obrigação de prestar a renda. Em técnica legislativa, perfeitamente aceitável; e não temos dúvidas em achar que foi a melhor solução. 6)DETERMINAÇÃO SENTENCIAL. Apesar da expressão “devendo” que se encontrava no art. 912 do Código de 1939, que ou a) significava tratar-se de ius cogens, ou b) regra jurídica para somente se não seguir quando não for possível, pelos dados da causa (verUs “sempre que possível”), a 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal a 12 de outubro de 1942 (R. de D., 145, 486) falou de se dispensar o depósito, o que, sem justificação para o caso, de modo nenhum era de se admitir. A 5•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal (4 de abril de 1941, A. .T., 59, 55) leu a regra jurídica como ius cogens. Ainda depois, considerou a solução a) como de ordem pública, para incidir sobre fatos de processos pendentes. A solução verdadeira era a solução a); pois o “sempre que possível” era quanto a ser logo estabelecida a indenização na sentença de condenação. No Código de 1973, no art. 602 e § 2.0 mostra os caminhos: ou o capital cuja renda assegure o cumprimento da obrigação, ou a caução fidejussória que será prestada na forma dos arts. 829-838. A garantia pode ser, desde logo, em caução, como pode ser em constituição de capital. Se fora em constituição de capital pode ser substituida pela caução. Pergunta-se: <~,se o foi mediante caução, pode ser substituida pela constituição de capital? A resposta há de ser afirmativa, porque não se poderia compreender que o que pode ser

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substituido não possa substituir o que fora posto como caução. 7)MoDurícAÇÃo DA SITUAÇÃO ECONÔMICA DO DEVEDOR. A regra jurídica do art. 602, § 3~o, foi inovação do Código de 1973, e acertada. Se o juiz condenou a prestação de alimentos, com o capital, que há de assegurar, a todo tempo, a prestação de alimentos, capital inalienável e impenhorável ou substituiu a constituição do capital por alguma caução feita por outrem, tinha-se de levar em consideração o que ocorreu na situação econômica. Situação econômica, não do devedor, ou do caucionante, mas da rentabilidade do capital ou da caução. Nada tem a ver com a situação econômica do obrigado ou do credor da renda. A propósito da expressão “caução fidejussória”, lembremos o que está escrito no Tratado de Direito Privado, Tomo XLIV, § 4.783, 1: “Por vezes, em leis e decretos de pouca atenção à terminologia, aparece a fiança, como caução, e a caução como espécie de fiança, ou vice-versa; e. g., “prestará caução”, “prestará fiança” (no sentido de fiança ou caução). O intérprete tem de descer no exame do que se diz na lei, a despeito das palavras; e ao expositor compete limpar de tais erronias ou confusões a terminologia. Dificilmente, quando se exige caução se pode considerar suficiente a fiança, que é garantia pessoal. (As próprias expressões “caução fidejussória” e “fiança caucionável” devem ser evitadas.)” Na L. 3, D, de solutionibus et liberationibus, 46, 3, AFRICANO digamos-lhe o nome, SEX. CAECILIiJS AFRICANUS, que foi discípulo de JULIANO empregou a expressão “fideiussor” (idem, na L. 20, D., 60, 1) e JAVOLENO (L. 20, D., de fideiussoribus et mandatoribus, 60, 1), fideiussio. Fiança é caução pessoal; caução, senso estrito, caução real. A palavra “fiança”, essa, é de fé, fiar, como confiar. Mas, às vezes, alguns livros empregam “fiança” em sentido amplo, que apanharia a própria caução real. A terminologia jurídica precisa ser exata. Já no Código Civil, art. 401, estava dito: “Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na fortuna de quem os supre, ou na quem os recebe, poderá o interessado reclamar do juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução, ou agravação do encargo”. Na Lei n. 5.478, de 25 de julho de 1968, art. 13, alude-se à “revisão de sentenças proferidas em pedidos de alimentos e respectivas execuções”; e art. 15: “A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado (?!) e pode a qualquer tempo ser revista em face da modificação da situação financeira dos interessados”. Foi erro grave dizer-se que não transita em julgado: a alteração do conteúdo de qualquer sentença, se é permitido devido a mudança de circunstâncias, inclusive econômica, de modo nenhum supõe que tal sentença não haja transitado em julgado. Res judicata houve e às vezes cabe contra sentenças a proposição de ação de modificação. O art. 602, § 3~O, teve melhor redação do que a do Código Civil, porque não se referiu apenas à “mudança da fortuna” de quem presta os alimentos ou de quem os recebe. Ao devedor pode ter diminuído a fortuna, mas o valor do aluguer do prédio ou parte de prédio que é objeto da garantia ter permanecido o mesmo, ou diminuído. O que importa é que as circunstâncias hajam mudado e estabeleçam diferença entre o que se devia prestar e o que se está prestando ou se vai prestar. O capital que consiste em bens imóveis pode dar ensejo a que a sua renda não mais dê para a satisfação das dívidas de alimentos. O Código a isso não se referiu, mas, mesmo assim, exigiu o “cabal cumprimento”, o que suscita, na interpretação do art. 602, § 3~o, que se cogite das modificações no plano econômico, relativas aos alimentos (e. g., cresceram os preços) e também das modificações no plano econômico que atingiam a renda do capital, quer se esse consiste em imóveis, quer em títulos da dívida pública. Assim, pode o alimentando, ou quem o represente, pedir o aumento, ou o prestante pedir a redução (e. g., o prédio que era alugado por x foi aproveitado para hotel, que paga x + y. 8)CANCELAMENTO DE cLAUSULA. Se houve cláusula de inalienabilidade ou de impenhorabilidade, por ter sido constituído capital, para renda que seja suficiente à prestação de alimentos, cabe ao juiz, se extinta a obrigação, mandar que se cancele a cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade. Quanto à outra espécie, que é a da caução (arts. 602, § 2.0, e 829-838), com a extinção da obrigação fica exonerado o devedor, mas é preciso despacho do juiz para a eficácia declarativa e mandamentaL CAPÍTULO VI DA LIQUIDAÇÃO DA SENTENCA 1)46) 1)LIQuIDAçÃo DE DIVIDAS E DE CREDITOS. Se bem que o Capítulo VI, com os arts. 603-611, só se refira à liquidação de sentença, convém que, de início, examinemos os conceitos de ilíquido e de liquidação, para que se distingam, depois, as duas ações; a ação de liquidação de créditos ou de dívidas e a ação de liquidação de

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sentença, que é o assunto do Capítulo VI. A inclusão da ação de liquidação no Título 1, que é sobre a execução em geral, pode levar leitores do Código a reduzirem a liquidação a simples “incidente”. Não há dúvida que, nas espécies em que se exige, a liquidez é necessária à propositura da ação executiva. Porém não devemos reduzir a ação de liquidação de sentença a simples acidente, ou a ser a única espécie de ação de liquidação. Sempre que o devedor quer pagar, ou o credor quer cobrar, sem ser pela ação executiva, pode propor a ação de liquidação, se não está em dívida se deve (an debeatur), ou se não deve. Na ação de liquidação apenas se busca saber quantum debeatur (quanto se deve). Quem foi condenado e não há na sentença a determinação do valor, ou a indicação do objeto, condenado foi, com sentença que tem 3 de executividade, mas o que está sujeito a algo de intercalar entre a sentença condenatória e a ação de execução é apenas o elemento para a petição inicial, que há de ser o de se saber qual o valor ou qual o objeto individuado. A ação de liquidação da sentença, aí, écomo, para as dividas constantes de documento público, ou particular, assinado pelo devedor e subscrito por duas testemunhas, a ação de liquidação de divida. Em todo caso, o Código de 1973 corrigiu o texto do Código de 1939, art. 906, que dizia: “A execução terá início pela liquidação, quando a sentença exeqúenda não fixar o valor da condenação ou não lhe individuar o objeto”. Hoje, o art. 603 apenas estatui: “Procede-se à liquidação, quando a sentença não determinar o valor ou não individuar o objeto da condenação”. Há a sentença de liquidação (arts. 605, verbis “o juiz, em seguida, decidirá”; 607, parágrafo único, verbis “o juiz proferirá a sentença ou designará audiência de instrução e julgamento, se necessário”; art. 609, que se refere ao “procedimento ordinário, regulado no Livro 1”). Somente depois de julgada a liquidação é que se pode promover a citação para a ação executiva (art. 611). Aí, o Código de 1973 corrigiu o Código de 1939, art. 917, que erradamente fazia “independente de nova citação pessoal” a ação executiva e falava de “prosseguimento”. 2)CONCEITOS. Líquido, liquidez, liquidade ou liquldidade (Liquiditãt) são palavras que vieram de liqueo, liquere, liquo, liquare, como “licor”, “delícia”, “prolixo”, “lixa” e “lixo”, a despeito de tantas fantasias de filólogos. O que é líquido flui, escorre. Mas líquido adquiriu, muito mais tarde, o significado de ter posição exata, ter limites claros. Compreende-se que os menos avisados confundam com a clareza a liquidez, que a supõe. O claro pode não ser líquido, mas o líquido há de ser claro, razão por que, a cada momento, verberamos a expressão “líquido e certo”, em vez de “certo e líquido”. Nos textos reinicolas, a expressão “líquido” aparece, por vezes, desacompanhada de qualquer outro adjetivo. Compreende-se facilmente, porque não pode ser dívida líquida a dívida que se não reputa certa. ~,Como se poderia saber que se deve o líquido a, se não se sabe, conceptualmente, antes, que se deve a? É preciso que se saiba que se deve, o quê e quanto. Liquida-se procurando-se o líquido do deve e do haver. Liquida-se, reduzindo-se a dinheiro, pecúnia, o que há de dano, ou deterioração. Liquida-se, para que os sócios, ou comuneiros se apartem e saiam da sociedade, ou comunhão, ou para que a sociedade ou. comunhão se acabe. Ou para que a fundação se extinga, ou para que os bens da fundação tenham o destino que foi previsto. A ação de liquidação de sentença não é a única ação de liquidação. Se há iliquidez e ainda não adveio sentença condenatória, ou qualquer outra sentença com eficácia executiva imediata ou mediata, pode ser proposta a ação de liquidação da dívida certa (Tratado de Direito Privado, Tomo LIV, § 5.567, 1). A ação de liquidação, aí, é de título extrajudicial (não executivo), porque o executivo tem de ser certo e líquido, e não se confunde com a ação de liquidação de sentença, que é ação fásica, por ser um dos momentos para a execução da sentença. A ação de liquidação de título extrajudicial éde processo ordinário, salvo se há regra jurídica de lex specialis, como ocorre com a liquidação quando encerrado o inventário, ou com a liquidação de sociedade. Não se precisa por em texto de Código de Processo Civil regra jurídica sobre ação de liquidação de crédito a que não corresponde titulo executivo. A sentença pode ser sobre crédito ilíquido; daí os arts. 603-611. O título extrajudicial liquido já conceptualmente supõe não se poder pensar em ação de liquidação. Mas, se ilíquido, não tem executividade, e pode haver interesse do devedor, ou do credor, em propor a ação de liquidação: aquele, para saber o que há de pagar; esse, para exigir o pagamento, inclusive com a propositura da ação de condenação, ou, menos recomendável, a de declaração. 3) LIQuIDAçÃo DE CRÉDITO OU DE DÍVIDA. Liquida-se o crédito a pedido do credor; a dívida a pedido do devedor. Devedor e credor podem liquidar as suas contas. Podem, outrossim, encarregar a terceiro de sua liquidação. Se não há acordo de liquidação, que é negócio juridico declaratório, com elemento constitutivo, tem o devedor ou o credor a pretensão à liquidação, para a qual o Estado promete tutela jurídica (pretensão à tutela jurídica). No Código de 1939, art. 917, parágrafo único, falava-se de poder a liquidação ser promovida pelo executado (aliás, tinha-se de entender “pelo executando”). O Código de 1973 não se referiu a isso. Em princípio, não era

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necessário, porque, na ação executiva, há interesse do devedor: vem em primeiro lugar o interesse de quem tem de prestar (executar), pois, se não prestou, é que pode o credor propor a ação executiva, e na ação de liquidação tanto o devedor quanto o credor são interessados em que se liquide o que é ilíquido. Quanto à ação executiva, o art. 570 do Código de 1973 frisou a legitimação ativa do devedor, que assume, no processo, posição idêntica à do exeqúente credor. No Código de 1939, havia os arts. 886, 917 e 997. Quando à liquidação, é certo que no Código de 1973 se não inseriu regra jurídica que correspondesse ao art. 917, parágrafo único, do Código de 1939. O Código de 1973, no art. 611, diz que, julgada a liquidação, “a parte promoverá a execução, citando pessoal-mente o devedor”; mas o simples fato de estar expresso no art. 570 que o devedor pode propor a ação executiva basta para se ter como legitimado ativo à liquidação o devedor. Todavia, se não existisse o art. 570 do Código de 1973, como se não tivessem existido as regras jurídicas explícitas do Código de 1939, ter-se-ia de assentar, como principio de direito, que a legitimação ativa quer na ação executiva, quer na de liquidação tanto os credores como os devedores a têm. 4)PARTICULARIDADE DO DIREITO BRASILEIRO. Na falta da liquidez (não se confunda com a certeza), ao titulo extra-judicial não se pode atribuir o que o direito somente confere ao crédito líquido. Todo devedor por dívida ilíquida e todo credor por crédito ilíquido têm ação de liquidação da dívida ou do crédito. O crédito diz-se líquido (ou diz-se líquida a dívida) quando, além de ser claro e manifesto (= effícere claram et manifestam probationem debiti), dispensa qualquer elemento extrínseco para se lhe saber o importe (non requiratur aliquod extrinsecus ad probandum). Sabe-se que é e o que é. Para se obter qualquer efeito a que se exija a liquidez, a liquidade, o ser liquido, tem-se de tornar líquido, antes, o que é ilíquido. A qualidade e a quantidade dependem tanto da certeza que a ação de liquidação só se há de conceber como mescla de ações declarativa e constitutiva. Declara-se o crédito, como é, e constitui-se-lhe a liquidez. Tanto se precisa liquidar o crédito ilíquido ou a dívida ilíquida, que consta de escritura pública, quanto o crédito ilíquido ou a divida ilíquida que consta de instrumento particular (SILvEsTRE GOMEs DE MORAIS, Trac tatus de Executionibus, III, 11). A própria sentença diz-se, por elipse, ilíquida, se a condenação depende da liquidação. MANUEL MENDES DE CASTRa (Pratica Lusitana, 1, 124 s.) falou da ação de liquidação e referiu vários casos julgados em 1607, em 1608 e em 1609. A ação de liquidação pode ser dispensada se os elementos para a liquidação se produzem desde logo, convincente-mente, ou ser inserta na ação que se propõe como questão prévia, se ao ingresso para essa não se exige a liquidez do crédito (“quando in incontinenti liquidatio ofiertur”, “pariaenim sunt instrumentum esse liquidum aut in continenti liquidandum”). 5)AÇÃO DOS FIGURANTES E EFEITO DA LIQUIDEZ. O crédito ilíquido ou a dívida ilíquida pode ter o efeito da liquidez se os interessados acordam em que o tenha. Assim, a despeito de se não saber qual o saldo, ou em quanto importa a dívida, podem credor e devedor acordar em que, antes da liquidação, se execute a dívida até determinada quantia (SILVESTRE GOMES DE MORAIS, Tractatus de Executionibus, III, 11: “Limitatur tamen primo praedicta resolutio, quando inter partes conventum est in instrumento quod possit ad eius executionem procedi, liquidatione non praecedente, in eo namque eventu etiam instrumentum illiquidum habebit executionem”). 6)FRUTOS, DANOS E INTERESSES. Se é ilíquido o crédito, mas líquido é o que se deve por juros, frutos naturais ou danos, o que é líquido tem os efeitos que se atribuem àliquidez (SILvEsmE GOMES DE MORAIS, Tractatus de Executionibus, III, 13). Há de entender-se o mesmo quanto aos títulos judiciais. 7)TÍTULOS JUDICIAIS E ILIQUIDEz. Se o título judicial, a sentença ou o acórdão, é ilíquido, também não se lhe pode atribuir efeito que o sistema jurídico reservou à liquidez. É preciso que se não reduza a liquidação a simples “incidente”, que desvia do caminho de sempre a ação executiva. A sentença tanto pode ser condenatória de prestação líquida como de prestação ilíquida, ou de uma e outra espécie. O elemento executivo, 3, que leva à ação executiva (5 de executividade), não se altera com a diferença nas prestações. Apenas acontece que se intercala a ação de liquidação, ação por isso incidental, que fica entre a ação condenatória, ou outra, com 3 de executividade, e a propositura da ação de execução. Não há simples incidência, mas intercalação. Não é excepcional, anormal, a condenação por dívidas ilíquidas. Se o crédito é ilíquido, no todo ou em parte, tem~se de fazer líquido o que é ilíquido. Se comparamos a ação de liquidação com a ação de execução, logo percebemos que foi essa, com a. iliquidade da prestação, ou das prestações, que levou à necessidade da tutela jurídica, com o processo liquidativo. O Código de 1973 riscou a regra jurídica do Código de 1939, art. 917, pois hoje há o art. 611, que exige a nova citação para a ação executiva. Os dois processos são de certo modo ligados, mas é evidente a duplicidade de relação jurídica

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processual. Não se pode iniciar a ação executiva de título sentencial ilíquido sem que se proceda à liquidação. Mas, ai, tornar-se líquido o crédito é exigência para a propositura da ação executiva. Donde ter-se de exercer a ação de liquidação. A ligação leva a ser competente para a ação de liquidação o juízo da ação de execução. Mas a competência pode passar a outro juízo, como se, pendente a liquidação ou após o julgamento, o devedor falece, sem herdeiros nem legatários, e seus bens passam à União, a Estado-membro ou ao Distrito Federal (art. 1.143). A competência refere-se ao juízo, e não ao juiz, de modo que, se o juiz na outra ação se tornou suspeito, ou impedido (e. g., passou a ser parte por ter herdado o crédito, ou a dívida, de algum parente seu, conforme o art. 134, IV, se casou com uma das partes, ou se ocorre alguma das espécies do art. 135, muda o juiz, não o juízo. 8)ALEGAÇõES E PROVAS NECESSÁRIAS À LIQUIDAÇÃO. Quem pede liquidação, alguma prova já produz, e propõe-se a provar o que resta provar-se para se ter por líquido o crédito, ou por líquida a divida, a) O modo mais simples é o de se juntarem documentos que bastem para se conhecer a qualitas ou a quantitas, ou se conhecerem a qualitas e a quantitas da prestação (JORGE DE CABEDO, Decisiones, d. 33, n.10; MIGUEL DE REINOSO, Observationes Practicae, 315; MANUEL MENDES DE CASTRO, Practica Lusitana, 1, 124; SILvEsTRE GOIVIES DE MORAIS, Trac tatus de Executionibus, 1, 16). Talvez só se precise, após isso, contar. b) Pode ser que seja de mister esclarecimento ou comunicação de fato por parte do credor, demandado, ou do devedor, se o demandado é ele. Então, é de requerer-se o depoimento pessoal do demandado, com a cominação de confesso (Código de Processo Civil, art. 343, § 1.0). A lição de PAULO DE CASTRO (Consiliorum, e. 301, 2) e D. ~OVARRUVIAS A LEYVA (Variarum Resolutionum iuridicarum et iure pontificio, regio et caesareo libri IV, II, c. 11, n. 1) passou a JORGE DE CABEDO (Decisiones, 1, d. 33, n. 9), a MANUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, 1, 124) e a SILVESTRE GOMES DE MORAIS (Tractatus de Executionibus, III, 20). c) O autor pode articular tudo quanto se refira ao que tem por indispensável à liquidação. A ação de liquidação é ação distinta da liquidatio in pracambulo ante ingressum iudicii, como se dá na ação de depósito em consignação para adimplemento, se o autor a prefere a ter de deixar à discussão os artigos, e da liquidatio post sententiam (Código de Processo Civil, arts. 603-611), in executionis iudicio. Ambas são, corno frisava SILVESTRE GOMES DE Mor~ís (Trac tatus de Executionibus, III, 16), liQuidationcs, mas às vezes acessórias. A ação de liquidação é constitutiva, porque se faz líouido o que líquido não era. Dir-se-á que, sendo assina, o negócio jurídico bilateral de liquidação havia de ser constitutivo, e não declaratório. Mas, no acordo de liquidação, o que se declara é a relação jurídica de dívida, que pode ser declarada como divida ilíquida e como dívida líquida. Não há o elemento de liquidação, como prestação jurisdicional, que se pode alcançar, ainda que algum dos sujeitos da raiação jurídica (credor, devedor) não esteja de acordo. A constitutividade provém de se tratar de realização de promessa do Estado, de que proveio a pretensão à tutela jurídica. 9) PRocEsso DA Ação DE LIQUIDAÇÃO DE CRÉDITos OU DÍVIDAS. Fora das espécies em que a ação de Liquidação tem de seguir o rito da ação de que é acessória, tem ela, por ser independente, de seguir o procedimento previsto nos arts. 603--611do Código de Processo Civil, ou o rito ordinário. É de examinar-se questão primeira: tratando-se de título extra-judicial, inclusive por escritura pública, ~,tem-se de adotar para o procedimento o rito dos arts. 603-609, mais o que se estabelece no procedimento ordinário do Código de Processo Civil? A resposta é afirmativa, porque, se os arts. 603-611 supõem ter havido sentença que condenou o demandado, isso não impede que, não alegada a incerteza da divida, se processe a ação, com a apreciação da dívida em si e os elementos para a liquidação. A sentença condenatória já declarou, com a sua carga típica de eficácia imediata (4). Não há isso quanto aos títulos extrajudiciais. Esses por vezes bastam a início de execução, com a atribuição, por lei, de serem suficientes para non plena cognitio. Porém, no tocante à declaratívidade, falta-lhes exatamente o que a sentença exeqiienda tem. Em conseqúência, o rito há de ser, a fortiori, o ordinário, como se se tratasse de ação de execução de sentença ou de ação declaratória (Código de Processo Civil, art. 4~o e parágrafo único). Não nos esqueça que a carga da ação de liquidação é, expressivamente, de 5 de constitutividade e 4 de declaratividade, ainda em se tratando de ação de liquidação de crédito já munido de sentença condenatória. A liquidação pode consistir em simples conta feita pelo contador do juízo, ou em arbitramento, ou por artigos, tal como se passa na liquidação em juízo de execução de sentença. Os arts. 604, 605 e 608 do Código de Processo Civil são invocáveis. Bem assim o art. 607. Em se tratando de contrato de conta corrente, se expirou o prazo para a conta corrente, sem cláusula contratual para início de nova conta, a falta de reconhecimento do saldo faz nascer a ação de liquidação judicial da conta corrente, a fim de que, apurado o saldo, se pague ao figurante credor, que pode não ser o autor da demanda. Se há de suceder nova conta corrente, em virtude do contrato, o saldo é lançado na nova conta. Não se trata, portanto, de ação de prestação de contas. O que se alega e que se tem de provar é que houve omissão, entrada indevida, ou erro, e o que se pede é a declaração do quanto devido a qualquer dos figurantes e a constituição do saldo. A carga de eficácia da sentença é 5 de constitutividade,. 4 de declaratividade, 3 de

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condenatividade, 2 de mandamentalidade e 1 de executividade. Se a lei processal civil, como é o caso do Código de Processo Civil, art. 585, II, confere ação executiva aos créditos certos e líquidos, a sentença, como título, tem eficácia executiva, embora não esteja isso na sua carga de eficácia. É plus que a lei processual lhe atribui, como título que é. Só se pode mudar de rito se a liquidação é acessória, ou inclusa em alguma ação de rito especial. Vale dizer-se: se pode ser invocado, por analogia, o art. 393, ou se os artigos correspondentes cabem na petição da ação. A eficácia da sentença de liquidação é ex tunc, posto que a sentença seja de força constitutiva. É outro caso de sentença constitutiva com eficácia ex tunc. (Até pouco tempo se enunciava não haver sentenças constitutivas com força ou com eficácia ex tunc, mas isso foi posto de lado, desde que se apontaram tantos casos, inclusive os das ações constitutivas negativas.) Conheciam-lhe a eficácia constitutiva. ex tunc J. MENóQUIO (Consiliorum sive Responsorum, c. 858) e outros, inclusive SILVESTRE GOMES DE MoRiuS (Trac tatus de Executionibus, III, 28); frisavam-lhe a eficácia declarativa e, pois, a eficácia de coisa julgada material, 5. ScAcciA (Tractatus de Sententia et Re iudicata, q. 17, 29, n. 36) e outros. Se foi pedida a citação, na ação de execução de sentença e essa se refere a crédito ainda não líquido, o executando pode opor a exceção de iliquidez (exceptio de illiquiditate). Discutia-se se, em se tratando de título extrajudicial ou de titulo judicial, se suspendia o prazo para solver ou sofrer a execução (cf. Código de Processo Civil, arts. 621, 632, 652 e 733. JORGE DE CABEDO (Decisiones, 1, d. 30) respondia negativamente, seguido por MANUEL BARBOSA; afirmativamente, invocando as Ordenações Filipinas, Livro III, Titulo 25, § 6, MANUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, 1, 137). O argumento de se tratar de exceção dilatória não procede, porque a iliquidez é matéria de mérito. A opinião de MANUEL MENDES DE CASTRO seria de admitir-se nas execuções de sentença; não, nas execuções por títulos extrajudiciais. Aliás, havia divergência entre julgados da Casa da Suplicação (1608). A iliquidez tem de ser alegada nos embargos do devedor, que são oferecidos nos dez dias (art. 738), contados da intimação da penhora (art. 669), ou do termo de depósito (art. 622), ou da juntada aos autos do mandado de imissão na posse (ou de busca-e-apreensão), na execução para a entrega da coisa (art. 625), ou da juntada dos autos do mandado de citação, na execução das obrigações a fazer. Se o foi dentro dos prazos dos arts. 652, 621 ou 632, ou é prematura (art. 652), ou pode ser extemporânea (arts. 621 e 632). Da decisão que julga a liquidação do titulo é interponivel o recurso de apelação, sem efeito suspensivo (Código de 1973, art. 520, III). Antes, sob o Código de 1939, discutia-se e ainda pode surgir discussão, porque o Código de 1973, art. 520, III, só se refere a “liquidação de sentença” ~Quid iuris, se a liquidação é de título extrajudicial? A despeito de a lei processual de antes e de agora não se haver referido a essa liquidação, ~,a solução havia de ser a de se aplicar o Código de 1939, art. 830, III, e, hoje, o Código de 1973, art. 520, III? A tradição era no sentido afirmativo (MANUEL MENDES DE CASTRO, Practica Lusitana, 1, 96: MANUEL ALVARES PÊGAS Resolutiones Forenses, II, 1017; Decisão do Senado português em 1607, caso Simão Pires Sólis versus Roque Antunes; e Decisão de 1660, caso Augusto Figueroa de Mendonça versus Fracisco Rodrigues). Haveríamos de ater-nos a ela, obviamente, se não tivesse surgido a regra jurídica do art. 830, III, do Código de 1939, a que corresponde o art. 520, III, do Código de 1973. Portanto, se a sentença era quanto a titulo extra-judicial, cuja executividade dependia da liquidação, era de afastar-se que a decisão na ação de liquidação fosse “quasi pronuntiatio de exequendo”, como argumentava SILVESTRE GOMES DE Mo~ís (Tractatus de Executionibus, 1, 28); o recurso, nas ações executivas, não tinha efeito suspensivo (Código de 1939, art. 830, II). Isso não passou; continuou afastado o “quasi pronuntíatio de exequendo”, que está no Tratatus de Executionibus. O art. 830, II, do Código de 1939 ficou com se fosse a fonte do art. 520, 2.a. parte: “Será, no entanto, recebida só no efeito devolutívo, quando interposta de sentença que: III julgar a liquidação de sentença”. Temos, portanto; a) liquidação de título judicial: recurso sem efeito suspensivo; b) liquidação de título extrajudicial: recurso com efeito suspensivo”. 10) FIxAçÃo DO CONCEITO DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. Liquida ção da sentença é o processo pelo qual se torna liquido o objeto ilíquido do pedido de condenação. Pergunta-se se éato, ou mero incidente, ou processo incidente, ou preparatório da execução. A estrutura, que se lhe dava, no Código de 1939, era a de processo incidente dentro do processo da execução. A despeito da decisão de liquidação, com que termina, não poderia ser tratado como os processos incidentes acessórios, nem mesmo como os acessórios preparatórios, que são anteriores à citação para a causa. A citação para a liquidação já era excepcionalmente citação para toda a execução. Mas isso mudou. Enquanto o Código de 1939, art. 917, dizia que, proferida a sentença de liquidação, a execução prosseguiria, “independentemente de nova citação pessoal”, o Código de 1973, art. 611, foi explícito: “Julgada a liquidação, a parte promoverá a execução, citando pessoalmente o devedor”. Duas ações: a de liquidação e a de execução. O que há, na espécie, é acessoriedade preparatória, sem que isso afas~e poder qualquer credor ou

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devedor pedir, em ação de plena autonomia, a liquidação da dívida: o que era ilíquido passou a ser liquido, para a eficácia da relação jurídica. Sempre que é preciso a liquidação, a sua falta causa a nulidade dos atos que se lhe seguem. Não se confunde com a liquidação, parte integrativa da ação de execução da sentença, a ação de liquidação, que o devedor para que se liquide a sua divida que, julgada como foi, é ilíquida. Tal ação éação autônoma, e termina pela sentença de liquidação (sem ser anormalmente, como se dá se o devedor pediu a liquidação e, diante de provas insuficientes, foi julgada improcedente e condenado nas custas e despesas o devedor. Na permissão de apropriar-se, como na promessa de frutos, promissio fructuum, subentende-se “se nascerem» (SILVESTRE GOMES DE Mo~as, Tractatus de Executionibus, II, 57: .... . ut procedat tam in condicione expressa quam in subintellecta, ut in exemplo promissionis dotis, in qua a iure, et mente partium tacite subintelligitur condicio, si matrimonium sequatur, et antea agi non potest, quam constet condicionem esse purificatam”). Daí poder a sentença ser sobre os que nascerem (1, 291, 292 e 294); Ordenações Filipinas, Livro III, Título 66, § 2: “E se der sentença incerta, não valerá, salvo se a dita sentença incerta pudesse ser certificada pelos autos do processo, ou se pudesse liquidar na execução dela, assim como os frutos e interesses de que acima falamos, quando pela prova dada aos artigos não puder bastantemente confiar da quantidade dos ditos frutos, ou inte-. resses, para sobre eles pronunciar sentença certa”). 11) FALTA DE LIQUIDAÇÃO. A falta de liquidação, se a divida executada não é líquida, importa nulidade da penhora, no que corresponde ao ilíquido. Resta saber-se se tal nulidade, não-cominada, pode ser regida pelos arts. 244 e 249. A resposta foi negativa quanto à convalidação (a respeito, usa do termo MANUEL DE ALMEIDA E SoUsA, Processo Executivo, 157), e deu-a o Desembargo do Porto, a 26 de maio de 1682, mas, se lemos a sentença, a tenção do juiz relator e a do vogal (MANUEL ALvARES PÉGAS, Resoiutiones Forenses, VII, 290-295), notamos que havia, se não impossibilidade, pelo menos dificuldade de se sanar a nulidade, ou suprir a falta de liquidação (“quasi impossibile sane erit ín praesentiarum executionem approbare quoad debitum in sententiis compraehensum, eam nanque dispicere quoad aliam partem, quae frumenti respicit summam ac aestimationem, ut exactis convincitur dillucide”). Havia discussões no foro ainda ao tempo de MANUEL DE ALMEIDA E SousA e procurou ele conciliar as correntes, a tese de HONTALBO e de PÓSTIO e a antítese, que é de supor-se portuguesa. Enquanto a tese excluia a convalidação da arrematação ou adjudicação pela liquidação posterior (addictio in subhastatione facta, non convalidatur liquidatione superveniente), MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA permitia a liquidação “no progresso da execução”, antes da arrematação ou de ato de igual porte; ainda se o executado embargou, porque se pode suprir ou sanar. Mas, se a arrematação se fez sem aquela, “é tudo nulo”, dizia ele. Conciliação, essa, bem escassa. Ora, aos embargos do devedor à penhora quase sempre já precluiu o prazo, e a nulidade foi na penhora de que se intimou o executado (art. 669). Adiante, nota ao art. 741. Preclusão, apenas. Não pode ela desfazer a iliquidade. Tem-se de suprir a falta de penhora, pela liquidação. Não há razão para se atacar a arrematação, salvo se, por ser novo o fundamento dos embargos do devedor, e. g., ação rescisória superveniente, que torne líquido o crédito, ou parte dele, ainda se podem opor. Na relação jurídica processual entre o exequente e o executado é que a entrega do valor está eivada pela iliquidade, e cumpre proceder-se à liquidação. Cf. arts. 245 e 249, § 2.0. 12) EXECUÇÃO EM CASO DE ILIQULDADE. GABRIEL PEREIRA DE CASTRo (Decisiones, 163) dizia que a liquidação é parte e preâmbulo da execução; faltando ela, quando há ilíquido na sentença, nula é a execução (MIGUEL DE REINoso, Observationes Practicae, 69; também, MANUEL MENDES DE CAsmo, Practica Lusitana, II, 174; e MANUEL ALv&iu~s P~GAS, Resolutiones Forenses, 1, 349). Mas a liquidação, sendo preâmbulo, não se segue que seja parte, no sentido de ser, a priori, uma e só a relação jurídica processual, desde a liquidação até o final da execução: se se diz que a execução terá início pela liquidação e que a execução prossegue, independentemente de nova citação pessoal, tal como era no direito processual civil anterior a 1939, levar-se-ia a crer-se que, a posteriori, o Código a concebeu como pars et praeambulum executionis, segundo as expressões de GABRIEL PEREn DE CAsmo; todavia, certo é, também, que a sentença de liquidação era apelável, o que lhe tirava e tira todo o caráter de interlocutória. Duas ações, fundadas em duas pretensões diferentes, uma a liquidar e outra a executar, dois processos ligados pela finalidade, o que explica a diferença de tratamento da liquidação pelas duas colidentes proposições do Código de 1939, art. 917 (a execução independeria de nova citação pessoal; é sentença a decisão judicial da liquidação). Duas ações, portanto; e um só veículo processual, com separação no tempo. Foi corrigido isso, conforme a crítica que fizemos, no art. 611, e exige-se a nova citação processual do devedor. Acertadamente, o Código de 1973 antendeu à distinção inafastável das duas ações e frisou a dualidade de remédios jurídicos processuais: o procedimento da ação de liquidação

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é o procedimento ordinário (art. 609). Há a citação para a ação de liquidação, conforme se estatui a respeito do procedimento ordinário. Julgada a liquidação, a parte promove a citação pessoal do devedor (art. 611), para que se crie a relação jurídica processual, com angularidade, da ação de execução da sentença. A pretensão a liquidar é pretensão constitutiva, e não declarativa, elemento que se encontra mesclado ao de execução, nas ações e sentenças de partilha, permitindo a eficácia executiva imediata do formal ou da certidão da sentença de partilha (art. 1.027), em vez do efeito executivo 3. Foi a ligação da liquidação à sentença cuja quantidade se liquida e, por outro lado, à execução, como simples momento constitutivo transicional entre a sentença e a execução, que fez MA&UEL ANTÔNIO MoNrinlo (Tratado Prático,10) escrever, no século XVIII: “Dissemos que a liquidação era parte da execução,... e é sem dúvida ser também da sentença que se liquida”. Quer dizer: a constituição do líquido, que devera achar-se na sentença, ficou fora dela e tem, agora, de preceder à execução. MANUEL ALvAREs PAGAS, no Opusculum de Maioratus possessorio interdicto, sob o n. 828, viu-o também. 13) INTEGRAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO NO PROCESSO EXECUTIVO. O art. 906 do Código de 1939 era tautologia. ~ preciso liquidar-se quando for ilíquida a condenação, mas, aí, ainda não se está executando. Antes, o art. 889, § 1.0, do Código de 1939 dizia que, sendo ilíquida a condenação, não se impedia a execução da parte líquida. Ali, errado; aqui, certo. A preparatoriedade da liquidação é em relação à tomada, pelo Estado, do poder de dispor da coisa; não faz preparatório o processo. Vai-se executar, devido a se ter de citar o executando, que, aliás, é intimado da decisão. Ainda não se iniciou a constrição executiva, nem a ação executiva. A ação executiva pode advir, com a citação pessoal do devedor. 14) OPERAÇÃO DE LIQUIDAÇÃO. Sendo ilíquida a condenação, uma citação é para se liquidar e outra para poder ser iniciada a execução (citação para ação executiva) com a relação jurídica processual em ângulo. Se, no Código de 1939, o art. 917 não existisse e tivesse de ser proferida a sentença de liquidação, nova citação teria de ser feita. Foi isso o que se determinou, explicitamente, no art. 611 do Código de 1973. Proferida a sentença de liquidação, nova citação tem de ser feita, além da intimação. Se o quanto é apurável mediante cálculo pelo contador, não se precisa de liquidação por artigos (Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 28 de julho de 1942, D. da J. de 24 de setembro, 2628); mas precisa-se de liquidação (Tribunal de Apelação, 3 de março de 1944, D. da J. de 19 de junho, 2528). Cf. Supremo Tribunal Federal, 14 de abril de 1950 (D. da J. de 30 de janeiro de 1952): “Outra disposição legal, que, na versão do recorrente, teria sido vuínerada pelo acórdão... é a do art. 907 do Código de Processo Civil (de 1939) ... Segundo o recorrente, foi ofendido esse preceito, porque não foram eles citados para verem proceder-se à conta, sobre a qual nem se lhes tomou audiência. Vê-se, desde logo, ainda que procedesse a alegação, o preceito do art. 907 (de 1939) ficaria incólume. De resto, como ensina PONTES DE MIRANDA, se a quaestio é apurável mediante cálculo pelo contador, não se precisa de liquidação por artigos (Comentários ao Código de Processo Civil, VI, í.~ ed., 132) “. A regra jurídica do art. 907 do Código de 1939 foi retirada no Código de 1973, caracterizando-se a necessidade da nova citação, outra citação, pois que se caracterizou a diferença entre a ação de liquidação e a ação executiva. Dir-se-á que, sendo distinta, com sentença trânsita em julgado, e de força constitutiva, não se justificaria a colocação no Livro II, Do processo de execução. Seria sem razão: o Livro II cogita do processo de execução, e não só das ações executivas, e seria desaconselhável pôr-se no Livro IV, referente aos procedimentos especiais, diante da circunstância de se tratar de liquidação da sentença, o que completa, pela finalidade do processo, o que constava da sentença de condenação, e que, sendo ilíquido o objeto da sentença, leva à necessária liquididade. 15) TRES MEIOS DE LIQUIDAÇÃO. O Código conhece três meios de liquidação: a) por simples cálculo do contador (arts. 604 e 605); b) por arbitramento (arts. 606 e 607); c) por artigos (arts. 608 e 609). As citações do art. 621, dos arts. 632, 642 e 652 ou são à parte ou são cumuladas. 16) PROCEDIMENTO. A ação de liquidação começa com a petição inicial, o despacho do juiz, que estabelece a relação jurídica processual, e a citação do demandado (pode ser o devedor, ou o credor, conforme explicamos adiante), que leva à angularização. As regras jurídicas sobre processo de conhecimento são aplicáveis. Não há, a respeito da ação de liquidação, o art. 598, que é concernente à ação executiva, mesmo porque a ação de liquidação é ação de processo de conhecimento e seria supérfluo dizê-lo. “A citação é o ato pelo qual se chama a juízo o réu ou o interessado a fim de se defender” (art. 213); e “para a validade do processo éindispensável a citação Inicial do réu” (art. 214). No art. 217 diz-se que se aplicam a todas as causas o procedimento comum, salvo se em contrário se estatui no Código ou em lei especial. Portanto, seria bis in idem enunciar-se que tal procedimento comum apanha a ação de liquidação.

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Art. 603. Procede-se à liquidação, quando a sentença não determinar o valor’) ou não individuar o objeto2) da condenação. 1) DETERMINAÇÃO DO VALOR. Se não foi determinado o valor preço, valor para alienação, ou outro tem-se de buscar o elemento de liquidade: a dívida é de quantia ilíquida. Tem-se de chegar à liquidade. Dá-se o mesmo se não foi individuado o objeto da condenação. Uma coisa é o objeto da prestação, a que alguém é condenado, outra, a própria prestação. Toda prestação há de ser determinada. O art. 603 cogita da indeterminação do valor, ou de não se ter individuado o objeto da condenação. Aí, como ali, tem de haver a liquidação. 2)OBJETO NÃO INDIVIDUAL. O cerne, nas relações de direito das obrigações, é o dever de prestar. Aí está o fim mesmo do negócio jurídico, ou o fim que o direito estabeleceu para a reparação dos danos e eliminação dos enriquecimentos injustificados. Obtido o fim, a relação jurídica extingue-se; mas, para isso, é preciso que a satisfação seja completa. Daí a transitoriedade de todas as dívidas, de todos os créditos, em contraste com as relações jurídicas de propriedade, que são permanentes. Quando se fala de dividas duradouras, ainda assim se alude a duração que não é, de modo nenhum, a do domínio. Quanto a essa, ainda se há de direito de resolução ou resilição, ou condição resolutiva ou resilitiva, ou termo resolutivo ou resilitivo, a titularidade muda, mas a relação jurídica de domínio continua, em sua eficácia contra todos. Na doutrina, os juristas surpreendem-se com o fato de, já extinta a divida, poder o que foi figurante do negócio jurídico, ou sujeito de relação jurídica irradiada de outra fonte de obrigação, poder exercer pretensão e ações. Pré-eliminemos o que facilmente se explicaria; e. g., a pretensão a perdas e danos nos casos em que a resolução, ou a resilição, ou a rescisão, ou a própria invalidação, dá a algum dos interessados essa pretensão. A pretensão tem, aí, a mesma causa do fato extintivo ou do ato extintivo. Se, em vez disso, a pretensão surgiu após a extinção, como se o que teria de restituir danificou o bem restituendo, a origem da pretensão é em situação que só historicamente se prende à que existia ao tempo da relação jurídica extinta. A dívida de restituição deriva da extinção da relação jurídica (= tem a mesma causa), mas a responsabilidade pelo fato posterior supõe relação jurídica criada pelo fato novo, posterior à extinção. Por outro se vê como é frequentíssima a aparição de valor indeterminado e de objeto não-individuado de condenação. O devedor tem de fazer a prestação, o credor tem direito de recebê-la. Só excepcionaimente (de regra, em virtude da cláusula expressa) há, para o credor, o dever de receber. Se o há, então, se se recusa a receber, incorre em duas moras, a mora creditoris e a mora debitoris. A expressão “individuar” aparece no art. 603, quando se enuncia proceder-se à liquidação quando a sentença não determinar o valor, “ou não indivisualizar o objeto da condenação”, e no art. 629 quando se diz que o devedor é citado para a entrega das coisas “individualizadas”, se lhe cabe a escolha. Não há qualquer divergência entre o texto que permite a execução para entrega da coisa dita coisa incerta (Título II, Capítulo II, Seção II) e o texto que exige a liquidação para se individuar o objeto da condenação (Título 1, Capítulo VI, art. 603). A liquidação da sentença é necessária se o objeto da ação executiva não foi determinado pelo gênero e pela qualidade. Se o foi, de liquidação não se precisa, porque a escolha ou cabe ao devedor, que para escolher é citado, ou ao credor, que já indica na petição inicial o que escolheu. No direito das obrigações, só o devedor, pessoa determinada, tem de prestar. Se são dois ou mais os devedores, solidários ou não, todos são pessoas determinadas. Daí dizer-se que, no direito das obrigações, os créditos se dirigem, necessariamente, contra pessoa determinada. ~ o direito relativo, a que corresponde o dever relativo. Mas a doutrina tem prestado pouca atenção a que direitos relativos podem surgir da infração de direitos absolutos,como o direito de personalidade, o de propriedade e os direitos reais limitados. ~ como se do alto do monte víssemos segundo plano onde se acham os direitos das obrigações. Verdadeiramente, somente parte do Direito das Obrigações está no alto do monte: o que se infringe já é direito das obrigações. O homicida infringe lei penal e as sanções são do mesmo plano e do plano inferior (responsabilidade civil). O figurante do contrato, ao infringir, já infringe relação jurídica de direito das obrigações. Se no juízo ou fora dele não há contador oficial que preste o serviço, tem o juiz de nomeá-lo. Põe-se o nomeado na situação do serventuário, que existisse, ou que, por alguma circunstância de força maior, não possa funcionar. Se não podia fazer o cálculo a pessoa que o fez, seja ela contador oficial, seja ad hoc, há nulidade não-cominada, com as consequências que a lei prevê. A atribuição do cálculo ao próprio exequente, como alguns juristas queriam, por lhes parecer que qualquer advogado poderia fazê-lo, seria tão suscetível de divergências como se feito pelo contador. O fato de poder o autor da ação executiva (credor ou devedor) calcular, nem sempre é tão rápido o cálculo, como entendiam alguns juristas. Nem se há de admitir que qualquer cálculo, em se tratando de divida ilíquida, que caiba no art. 604, 1, II e III, é facílimo. O legislador, em vez de tal solução e da que está no Código de 1973, art. 604, como estava no direito anterior, poderia ter admitido, explicitamente, ou uma ou outra, porque casos há em que o expediente

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apenas juntaria à petição os documentos do valor conforme a cotação em bolsa. Mas, mesmo aí, há o problema da data da cotação que raramente é o do dia anterior à propositura da ação de liquidação. Se o autor (credor ou devedor) apresenta as provas, ao levar o despacho a petição, e o demandado as admite, dispensada foi a Interferência do contador. Não se precisaria aí de regra jurídica especial. ~ o que havemos de entender, no sistema jurídico processual brasileiro. Pode acontecer, até, que o credor (ou o devedor) proponha, desde logo, a ação executiva, em vez da ação de liquidação, juntando na petição inicial, como se tratasse de ação executiva de dívida líquida, as provas suficientes do cálculo. Se o executado (devedor ou credor) nada alega contra isso, então concordou com a liquidação. O processo é o dos arts. 646-731, ou dos arts. 748-786. Se houve o pedido de execução e o demandado não concorda com a atitude do demandante que procurou satisfazer a liquidação com a juntada de documentos, tem o juiz de indeferir o pedido da ação executiva, por ainda faltar a liquidez, e o autor da ação executiva há de volver ao ponto em que, conforme a lei, teria de estar: o da propositura da ação de liquidação. As espécies de que se cogita no art. 604, 1, II e III, são exemplificativas. Pode haver necessidade de cálculo, sem se tratar de juros ou de rendimentos de capital, ou de valor de gêneros que tenham cotação em bolsa, ou de títulos da dívida pública, ou ações ou obrigações de sociedades que tenham cotação em bolsa. Por exemplo: correção monetária ou incidência de alguma ou de algumas regras jurídicas sobre alugueres, salários, indenizações. Pode mesmo acontecer que se faça cotável em bolsa o valor de gêneros, ou de títulos da dívida pública, ou ações ou obrigações de sociedade, mesmo porque à expressão “generos” se pode dar conceito larguíssimo. Art. 604. Far-se-á a liquidação por cálculo do contador 1>, quando a condenação abranger: 1 juros ou rendimento do capital, cuja taxa é estabelecida em lei ou contrato2); Ii o valor dos géneros, que tenham cotação em bolsa3); Iii o valor dos títulos da dívida pública, bem como de ações ou obrigações de sociedades, desde que tenham cotação em bolsa 4)~ 1)CÁLCULo E OPERAÇÃO LIQUIDATÓRIA. A condenação é liquidada pelo contador, que a calcula, sempre que depende de cálculo de aritmética. O art. 604 é exemplificativo. Há outros casos, como o de alugueres, o de preços taxados pelo poder público e o de prestação com a variável de tempo. Se é preciso que se prove algum fato, não seria de atribuir-se ao contador qualquer função a esse respeito. A função, que se lhe daria, seria de decisão constitutiva integrativa, o que de modo nenhum se justificaria (firmado em conceitos nossos, o Presidente da Junta de Conciliação e Julgamento do Distrito Federal, Doutor PIRES CHAVEs, a 1.0 de setembro de 1959, D. da J. de 8 de setembro). 2) JUROS E RENDIMENTOs. Os juros a que se refere o art. 604, 1, tanto podem ser os juros da mora quanto os outros juros. Entende-se por juros o que o credor pode exigir pelo fato de ter prestado ou de não ter recebido o que se lhe devia prestar. Numa e noutra espécie, foi privado de valor, que deu, ou de valor, que teria de receber e não recebeu. Desde muito, quase só se cogita de interesses ou juros em dinheiro, porém nada obsta a que se estipulem interesses em natura, tratando-se de dívidas de outras coisas fungíveis. Dois elementos conceptuais dos juros são o valor da prestação, feita ou a ser recebida, e o tempo em que permanece a dívida. Daí o cálculo percentual ou outro cálculo adequado sobre o valor da dívida, para certo trato de tempo. ~ o fruto civil do crédito; no plano econômico, renda do capital. Juro deve vir de iura, direitos, e não de usura (ujura?), Créditos do dinheiro. lur, em vez de ius, acha-se em negócio jurídico de troca que fez Dom Dinis, em documento de 1306. Deve ter-lhe sido acrescentado o o, em vez do a, que seria a forma plural primitiva. Enviar os títulos era mittere iura. Interesses são quantidades de coisa ordinariamente fungíveis, não necessariamente dinheiro, que se exigem como rendimento da obrigação de capital, em proporção da importância do capital (ou do seu valor) e do tempo durante o qual o credor fora privado da utilização do que prestou, ou teria de receber. O crédito de juros nasce a determinado momento, periodicamente, como se pingasse da quantia devida, sem a dirumuir. fl em função do tempo, pro rata tem poris; e verte-se enquanto subsiste não a pretensão que nasce do crédito, mas o crédito mesmo, de modo que os créditos, a que falta ou se encobriu a pretensão (= está prescrita a pretensão), podem produzir juros, que nascem sujeitos à sorte dos créditos de que emanam. A fluência ou acumulação dos juros independe da exigibilidade dos créditos. Juros são a prestação que enche o lugar ao que se tirou do patrimônio do credor, atendendo ao valor real do bem, verum rei pretium, vera rei aestimatio; posto que as fontes por vezes incluam os juros no valor real, e outras os contraponham a esse (L. 179 e L. 193, D., de verborum significatione, 50, 16; L. 1, § 4, D., si quis ius dicenti non obtemperavit, 2, 3; L. 9, § 8, D., ad exhibencZum, 10, 4; L. 68, D., de rei vindicatione, 6, 1; cf. R.

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COHNFELDT, Die Lehre vom Interesse, 64 5.). Os interesses ou juros são remuneração em fração da quantidade devida, prestável periodicamente, pelo uso do que se recebeu em dinheiro ou coisa fungível. Não só de dinheiro. Há de ter havido prestação de capital. Sem dívida de capital não há pensar-se em divida de juros. A quantidade é determinada desde a origem da dívida, ou por lei, se se prende a fato anterior, ou posterior. A participação nos lucros conforme o importe desses não é interesse ou juro. Nem são juros o que amortiza o capital, isto é, o que se tem de prestar por conta do capital. Mas é rendimento (art. 604, 1). Os juros, quer quanto à quantia, quer quanto ao tempo, quer quanto ao momento em que hão de ser pagos, são fixados por vontade humana, ou por lei. a) Quanto aos juros moratórios, inclusive os juros a que implicitamente alude o Código Civil, art. 962, determinou o art. 1.062: “A taxa dos juros moratórios , quando não convencionada (art. 1.262), será de seis por cento ao ano”. b) Quanto aos juros estipulados como frutos, e não como oriundos do fato da mora, porém sem fixação da taxa, e aos juros, não moratórios, que por lei são devidos, estatuiu o art. 1.063: “Serão também de seis por cento ao ano os juros devidos por força de lei, ou quando as partes os convencionarem sem taxa estipulada”. De ordinário, os juros são fixados percentualmente; mas nada obsta a que se taxem diferentemente. Se houve estipulação de juros, têm eles de ser prestados enquanto não se solve a dívida ou não incorre o credor em mora, depositando-se em consignação para adimplemento o devido. Se os juros foram fixados acima da taxa legal, são os que se hão de prestar, haja ou não haja mora. A regra jurídica do art. 1.062 do Código Civil é dispositiva (não interpretativa, como escapou à Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, 2 de fevereiro de 1953, R. J., IX, 164). Se há juros estipulados, não há pensar-se nos juros legais conforme o art. 1.062 do Código Civil (2.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 28 de janeiro de 1947, R. dos T., 166, 730; ~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de novembro de 1932, 86, 504). Se são devidos os juros e não foram pagos, sobre esses correm, desde a citação, os juros legais, porque, aí, são inclusos nas perdas e danos (Código Civil, art. 1.061). Não são juros de juros, que o Decreto n. 22.626, de 7 de abril de 1933, art. 4•o, haja proibido: são juros da mora, juros indenizatórios da falta de pagamento. A regra jurídica do art. 4~O do Decreto n. 22.626 somente atinge o período pré-processual, em que a ratio legis encontra perigo em se acumularem juros, a pretexto de não terem sido pagos a tempo. A sentença condena a x, podendo dizer desde quando começam os juros da mora. Se o não disse, nem se referiu à mora, que se iniciara, na execução da sentença só se incluem os juros da mora após a condenação. Não se vai ao passado, investigando-se (o que teria cabido à sentença) de quando começaram de fluir juros. O art. 1.0, § 3~0, do Decreto n. 22.626, de 7 de abril de 1933, alterou o art. 1.064 du Código Civil. Os juros moratórios contam-se da mora. Se, antes da ação, não houve mora, contam-se da propositura da ação. Mas a sentença há de atender a esses juros. Se nada disse, a execução é que há de os estabelecer. A jurisprudência que mandasse contá-los, na execução, desde a propositura da ação de que provém a sentença exeqilenda, desatende ao principio de ter-se o juiz da execução de observar, rigorosa-mente, a sentença exeqiienda. Ou a sentença a) expicitamente decidiu sobre eles, ou b) implicitamente o fez. Se não ocorre a), nem b), seria arbitrariedade ir-se a ponto de se condenar, na execução, a juros. O julgado da 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 13 de novembro de 1950 (R. do J. B., 96, 161; R. dos T., 215, 492) e o do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, a 14 de março de 1951, foram errados: não se prestou atenção a que juízo da execução não condena, nem pode ir além da interpretação da sentença que se está a executar. Acertada andou a 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 21 de dezembro de 1951 (R. F., 147, 120; R. J., VI, 55), ao dizer que, na execução, não se podem incluir juros que foram omitidos pela sentença exeqúenda. Fez bem a 8.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 12 de abril de 1954, ao negar provimento ao recurso contra decisão que, na execução, não computara juros não incluídos na sentença. A inclusão pode ser implícita, como se a sentença disse que a indenização seria a partir do dia tal, ou da petição inicial (e. g., 5•~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 27 de novembro de 1952). Se a mora é de obrigação por ato ilícito, a sentença que condena à indenização é sentença que se há de interpretar como sentença que condenou às perdas e danos mais os juros da mora desde que ocorreu o ato ilícito. Lamentavelmente, em vez de empregar tais expressões, que aplicam os princípios, às vezes a jurisprudência fala de se computarem os juros, mesmo se a eles não condenou a sentença (e. g., 2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 28 de julho de 1950, R. F., 137, 81). Se a sentença errou, omitindo os juros, o que se tem de fazer é propor ação rescisória da sentença. O pedido de juros tem de ser expresso, salvo se a lei o reputa incluído no pedido do principal. Se houve pedido expresso, é questão de fato; se a lei o considera incluído, questão de direito. A questão de se saber se a sentença condenatória compreendeu, ou não, os juros é questão de fato: ou foram pedidos, e houve condenação expressa, ou não houve; ou não foram pedidos, e houve condenação extra petita, ou não houve condenação, ou houve condenação e, na espécie, lex specialis permitia condenar-se nos juros. Tais os

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princípios. Quanto aos juros legais, diz o art. 293 do Código de Processo Civil: “Os pedidos são interpretados restritivamente, compreendendo-se, entretanto, no principal os juros legais”. Em nenhum passo das leis brasileiras se diz que a sentença condenatória compreende os juros. O assunto é processual e qualquer sentença há de ser executada fielmente, sem ampliação ou restrição do que dela conste. O art. 293 estabelece que se hão de interpretar, restritamente, os pedidos, “compreendendo-se, entretanto, no principal os juros legais”. São os juros legais da mora, segundo as regras jurídicas do Código Civil, arts. 909, 1.062, 1.064, 1.450, 1.497, 1.536 e § 2.0, 1.544, 1.693, do Código Comercial, arts. 248, alínea 1.a, 2.~ parte, e alínea 2.~, e 249, Decreto-lei n. 581, de 1.0 de agosto de 1938, art. 13, Decreto n. 22.626, de 7 de abril de 1933, art. 5•0, e Decreto n. 22.785, de 31 de maio de 1933, art. 3~O, regra jurídica que foi contrária à Constituição de 1946, art. 141, § 3~0, hoje revogada pela Lei n. 4.414, de 24 de setembro de 1964, e outros juros constantes da lei. Se houve pedido de juros, mas, a despeito da implicitude ou da explicitude de tal pedido, a sentença não se referiu a ele, ao condenar o réu, não há por onde se entender que a condenação abrange os juros (2.a Turma do Tribunal Federal de Recursos, 16 de janeiro de 1952, D. da J. de 3 de julho: “Embora compreendidos no pedido, não estarão contidos na condenação, se não houver expressa referência a eles. Em casos tais, em que os juros foram pedidos e não concedidos pelas decisões exequendas, entra em função a regra jurídica processual”. Juros legais da mora compreendem-se no pedido; e não na sentença. Se o juiz não condenou nos juros, não se há de executar a sentença pelo principal e pelos juros. O interessado deve exercer, em tempo, a pretensão à declaração da sentença, ou o recurso cabível, em que se argua a injustiça da sentença, ou, no prazo preclusivo, a ação rescisória. Restam dois problemas: a) se foram explicitamente pedidos juros, e não foram incluídos na condenação, <podem ser pedidos mais uma vez, sem que se possa opor a res iudicata?; b) se foram pedidos por incidência do art. 293, 2.~ parte, do Código de Processo Civil, que tem por implícito pedido de juros, apodem ser pedidos de novo, sem ser oponível a res iudicata? Não. Ora, podiam ser pedidos os juros, se a dívida era ilíquida ou líquida, desde a citação (o art. 1.064, verbis “desde que lhes esteja fixado o valor pecuniário por sentença judicial” foi revogado pelo art. 1.0, § 3~0, do Decreto n. 22.626;e por arg. ao art. 153, § 2.0, do Código de Processo Civil de 1939). Se não foram pedidos, o fato de o juiz não haver condenado nas prestações vincendas de jeito nenhum preexclui a demanda sobre elas, após o trânsito em julgado da sentença;e o mesmo se passa quanto aos juros em que não houve condenação, se posteriores à sentença. A afirmação de que, pedido o principal, não se podem mais pedir, noutra ação, os juros, é romanismo extemporâneo, que começou a ser em declínio desde a L. 23, D., de exceptione rei iudicatae, 44, 2 (ULPI~o). De qualquer modo, singularidade do direito romano (MrroN RAKDA, Zur Lehre von den Zinseu, 24), com a consumptio (função negativa da coisa julgada). Se não houve pedido de juros, ou se só houve condenação nos juros legais, por invocação do art. 293, 2.~ parte, do Código de Processo Civil, pode ser feito, após a sentença, aquele pedido, ou pedido o restante. Não, porém, na execução. preciso separarem-se das regras jurídicas sobre o petitum as regras jurídicas sobre a sentença. A 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 22 de janeiro de 1951 (D. da J., de 2 de março de 1953, 729), disse muito bem: “Pode, pois, e deve o juiz, na sentença, determinar o pagamento dos juros de mora, embora não pedido às expressas, porque se compreendem no principal, como determina a lei. Esta, porém, não estabelece façam deles parte da condenação, posto que desmencionados na sentença. Esta há de ser executada ut verba sonant, fielmente, sem dilatações e encurtamentos. Por outro lado, dispõe o art. 916 do mesmo Código de Processo Civil (hoje, acrescentemos, art. 610 do Código de 1973) não ser possível, na liquidação, modificar-se ou invocar-se a sentença liquidanda, ou discutir-se matéria pertinente à causa principal” (sem razão: a 1.a Turma, a 13 de novembro de 1950, 1?. dos T., 215, 472; o Tribunal de Justiça de Alagoas, a 19 de julho de 1949, R. de J. B., 86, 69; a 2Y~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 18 de novembro de 1952, R. dos T., 207, 287, e R. F., 150, 307). Certas, a 2~a Turma do Tribunal Federal de RecurSos, a 16 de janeiro de 1952 (D. da J. de 3 de julho de 1952, 2896), e a 4•a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 20 de fevereiro de 1951 (D. da .7. de 29 de abril de 1954, 1407). O que, antes do trânsito em julgado e no prazo respectivo, teria de fazer o autor seria embargar de declaração ~2.a Turma do Tribunal Federal de Recursos, 23 de agosto de 1950, R. F., 136, 457). A í.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 5 de dezembro de 1949 (D. da J. de 6 de novembro de 1951, 3974), disse, na esteira da processualística brasileira: “A sentença deve ser restrita à matéria em litígio, de sorte que nada deixe sem decisão formal, nem julgue mais do que se contém nas respectivas conclusões das partes, exceto o que está virtualmente compreendido nelas, como os frutos e acessões do principal, ou o que pertence ao oficio do juiz, como as custas e mais interesses acrescidos depois da ~jtisconte5tação”. Aliás, devia dizer da litispendência. A sentença pode conter implícita condenação ao adimplementO das dívidas de juros, quer tenham sido

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estipulados, quer não, se julga procedente a ação, no todo (integralmente), ou se no relatório se referiu aos juros, ou argumentou com regras jurídicas relativas a juros. Então, cabe invocar-se o princípio da impucitude, segundo o qual a interpretação da sentença há. de atender ao que foi pedido implícito. Ora, se a sentença apesar de terem sido pedidos, expressamente, os juros estipulados, ou os legais não condenou a solvê-los o demandado, a sentença foi omissa. O meio para se obter o esclarecimento são os embargos de declaração. Se a sentença transita em julgado, só a ação rescisória. É sutil, mas necessária, a diferença entre sentença omissa quanto aos juros e sentença que contém condenação implícita quanto aos juros. Não seria possível, em todos os casos, entender-se que a sentença, que deixou de condenar explicitamente quanto aos juros, implicitamente haja condenado. Há três hipóteses a) a da sentença que condenou explicitamente quanto aos juros: b) a da sentença que não condenou, explícita ou implicitamente, quanto aos juros; e) a da sentença que condenou, implicitamente, quanto aos juros. Não se pode, na espécie b), executar, quanto a juros, sentença que a eles não se reportou, explícita ou implicitamente. A questão torna-Se quaestio facti, pois que de interpretação da sentença, em vez de quaestio iuris. Sobre a condenação implícita, a 6~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 24 de outubro de 1947 (R. dos T., 171, 316). Pedido o principal, entendem-se incluídos os pedidos de juros legais, vencidos e vincendos (juros moratórios legais, ~.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 17 de outubro de 1947, O D., 50, 225). Não os juros que não foram taxados por lei; salvo se, no caso de não serem fixados por vontade do devedor, seriam devidos na taxa legal, porque, aí, se abstrai do que se estipulou, e se aplica a lei. Sempre que se devem juros “legais”, podem e devem ser incluidos na sentença, ainda se não foram explicitamente pedidos. Se houve fixação de taxa acima da legal, precisam ser pedidos para que não seja ultra petita a sentença que condene a prestá-los, portanto, o juiz pode e deve condenar aos juros legais, se podiam ser pedidos os juros acima deles e não no foram. Os juros de mora correm, se não houve fluência ~~5O jure, ou anterior, provocada, desde a citação inicial. Se o juiz não condenou o réu ao pagamento dos juros, desateudendo ao art. 293, 2•a parte, a sentença é suscetível de recurso, inclusive, satisfeitos os pressupostos, de embargos de declaração; mas, se a sentença omitiu a condenação nos juros legais não pedidos e transitou em julgado, não se pode dizer, como fez a 1•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 17 de julho de 1943 (R. dos T., 169, 353), que não mais são devidos. Daí não se tire, tampouco, como fez a 8.R Câmara do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 27 de outubro de 1947 (O D., 51, 320), que os juros da mora (legais) se compreendem, virtualmente, na sentença condenatória, ainda se na petição inicial ou na contestação não houve referência a eles (certa, a 2.~- Turma do Supremo Tribunal Federal, a 11 de agosto de 1949, O D., 50, 225): a sentença rege-se por seus princípios, que não são os do pedido. A questão não tem sido tratada com rigor científico. Há três conceitos inconfundíveis, que aparecem na discussão, e a respeito de cada um há de ser levantada: a) o conceito de fluência dos juros; b) o conceito de pedido de juros, que, na espécie do art. 293, 2.~ parte, e nas espécies de indenização integral, se entende incluido no pedido principal; e) o conceito de condenação nos juros que não se confunde, tampouco, com o conceito de condenabilidade, pois, se não houve condenação, houve desatendimento ao pedido. Se não há estipulação de juros, nem a lei determina que fluam, não há dívida de juros. Os juros a que o art. 293, 2.~ parte, do Código de Processo Civil se refere são só os juros legais. Não os estipulados. Se, in casu, houve estipulação permitida acima da taxa legal, sendo de fluência legal os juros, o juiz somente pode condenar aos juros da taxa legal, porque não houve pedido expresso quanto ao mais. Se não foram pedidos os juros extralegais juros estipulados e o juiz deixa de condenar o réu a pagá-los, a decisão não tem eficácia de coisa julgada para que se não possa propor a ação de cobrança deles. N~ se pode trazer à tona o art. 293, 2.~ parte, do Código de Processo Civil, porque essa regra jurídica processual só se refere aos juros legais. Esses é que estão compreendidos no pedido, implicitamente; aqueles, não. É preciso atender-se a que os juros estipulados, se foram pedidos, são os vencidos e os vincendos. Se a taxa não é conhecida, procede-se, então, a arbitramento. A taxa teria de advir de regra jurídica, ou de cláusula negocial. Não digamos “contratual”, porque há taxas negociais, que não são contratuais. 3)VALOR DOS GENEROS QUE TENHAM COTAÇÃO EM BOLSA. A expressão “gêneros”, que está no art. 604, II, compreende qualquer mercadoria, e a liquidação por meio de cálculo é permitida se há cotação em bolsa, o que há de constar do pedido. A cotação é a do momento em que se procede ao cálculo, mas se, no caso, for a da data do pagamento, pode ser requerida a retificação. 4)TÍTULOS DA DIVIDA PUBLICA E AçõEs DE SOCIEDADE COM COTAÇÃO EM BOLSA. Quanto aos títulos da dívida pública e às ações de sociedade que tenham cotação em bolsa, passa-se o mesmo que dissemos

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quanto aos gêneros que sejam cotados em bolsa. Art. 605. Elaborado o cálculo 3), sobre este manifestar-se-ão4) as partes 1) no prazo comum de cinco (5) dias; o juiz, em seguida, decidirá 5)• Parágrafo único. Do mandado executivo constará, além do cálculo, a sentença2) 6)• 1)CÁLCULO E AUDIÉNCIA DAS PARTES. Elaborado o cálculo, as partes têm de ser ouvidas no prazo comum de cinco dias e o juiz logo em seguida há de decidir. Não há emendas de cálculo sem que se hajam manifestado as partes, tendo-se por aprovação de cada um a abstenção de manifestar-se. Trata-se de rito especial, porém que não pode ser omitido.. Disso não cogitava o direito anterior. O proponente da ação de liquidação (que pode ter sido o credor, ou o devedor) fez citar-se o demandado. N~ há prazo para que ele se manifeste quanto à propositura da ação de liquidação; por exemplo: para dizer que o caso seria de liquidação por arbitramento, ou por artigos, e não por simples cálculo do contador. Toca ao juiz, ao despachar a petição inicial, examinar se cabe liquidar-se por cálculo a dívida. Até pode dar-se que haja inépcia na petição. O art. 604 foi explícito quanto aos pressupostos para tal forma de liquidação e não pode o juiz ignorar a lei. O próprio contador pode alegar ao juiz que o caso não é de cálculo. Feito o cálculo, as partes manifestam-se, dentro do prazo, e nada obsta a que arguam ou alguma delas argua que não era admissível o que se fez. Ao ter de sentenciar, pode o juiz acolher inicial. Não há audiência, nem produção de prova, dada a natureza simplesmente matemática das operações. Da sentença que acolheu a objeção contra a espécie de liquidação interponivel é o recurso de apelação; se a rejeita, o de agravo de instrumento, porque não houve extinção do processo (art. 522). Pode o interessado requerer a retenção nos autos (art. 522, § 1.0), para ser julgado antes da apelação o que foi alegado. Há apelabilidade. Uma vez que na lei não se falou de contestação, ou a) é de supor-se que houve dispensa legal, ou b) que se deixou ao juiz, no despacho para citação, marcar prazo para que sobre o pedido e o despacho fale o demandado, sendo invocável o art. 185. Mas a solução sintética é c) a de se deixar ao juiz a escolha de a), ou de b), em cada caso. O despacho desfavorável à objeção é confirmativo; se favorável, trata-se como despacho de indeferimento. 2)MANDADO EXECUTIVO, CÁLCULO E SENTENÇA. Do manilado para que as partes se manifestem há de constar a manifestação de cada uma. Mas a lei vai adiante: tem de constar do mandado executivo, além do cálculo, a sentença. Com a liquidação por cálculo, à sentença integra-se o que lhe faltava, razão por que o mandado há de conter o cálculo e a sentença; melhor diríamos a sentença com o cálculo. Se foi interposta apelação, isso não obsta a que se proponha a ação executiva, quer pelo credor quer pelo devedor. Aliás, qualquer deles pode ter sido o apelante. 3)COTAÇÃO EM BOLSA E TAXA GERAL MÁXIMA. Se os gêneros têm cotação em bolsa, ou se têm taxa geral máxima, a certidão da bolsa, ou da repartição fixadora, basta para que se mandem os autos ao contador. 4) PROVA DA COTAÇÃO. Todos os títulos cotáveis em bolsa são suscetíveis de simples cálculo pelo contador, para se liquidar a condenação. A certidão da última cotação ou o jornal em que venha oficialmente publicada (art. 682) deve ser junto. A falta não causa nulidade; supre-se a qualquer tempo. A parte pode exigir a juntada até à sentença da liquidação . 5) ERRO DE CÁLCULO. O erro de cálculo pode ser corrigido de ofício ou a requerimento da parte (art. 463, 1). Há preclusão no caso de erro de cálculo que foi cometido pelo juiz (resolução judicial, qualquer que seja) e não mais há recurso. ~ verdade que alguns autores falam em que a coisa julgada não faz incorrigível o erro aritmético, porque não podia entrar na intenção do juiz (!). Outros assuntos, e não só esse, não podiam entrar na intenção do juiz, e aparecem~ na sentença. JOAQUIM Josi CArrANo PEREIRA E SOUSA (Primeiras Linhas, III, 87) era menos radical: “erro de conta. nunca passa em julgado, e pode alegar-se a todo o tempo; exceto se sobre ele já houve disputa e sentença”. Eram alegáveis em embargos, seguro o juízo com o depósito contado (SILVESTRE GOMES DE MORAIS, Tractatus de Executionibus, II, 59). O estilo era não se ouvir a parte, salvo depositando. N~ temos mais isso. Se houve erro de cálculo e se vai executar a sentença, tal como se liquidou (sentença de liquidação), contra a sentença de liquidação, que aprovou o cálculo, se houve erro, cabe apelação. Se surgiu ex novo, é matéria para embargos do devedor.

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6) SENTENÇA DE LIQUIDAÇÃO. Os cálculos do art. 604 dependem de sentença de liquidação. Daí ser possível apelação (sem razão, a 4.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 16 de setembro de 1943, R. dos T., 149, 608). Por isso mesmo, após sentença, intimam-se as partes; mas para o trânsito em julgado se não for interposto o recurso. O juiz somente pode mandar corrigir antes do trânsito em julgado (sem razão, o Tribunal de Apelação de Sergipe, a 27 de setembro de 1940, J., 197), ou em se tratando de inexatidões materiais, ou erros de cálculo (art. 463). Quanto à liquidação por cálculo, o juiz decide (art. 605) e do mandado executivo há de constar, além do cálculo, a sentença. Tem de haver a citação de que fala o art. 611, que ~concerne às três espécies de liquidação. Art. 606. Far-se-á a liquidação por arbitramento1) quando: 1 determinado pela sentença ou convencionado pelas partes2); 11 o exigir a natureza do objeto da liquidação3) 4). 1)PREsSUPOsTOs. A liquididade obtém-se por arbitrainento quando não cabe a liquidação por simples cálculo do e Contador, há necessidade de se provar fato novo; portanto, quando não é caso de uma das duas outras espécies. A referência à determinação da sentença vem das Ordenações Filipinas, Livro III, Título 86, § 2, cuja alusão a juiz da execução constituía quebra-cabeças. “A convenção das partes”, está em ANTÔNIO JOAQUIM RIBAS (Consolidação, art. 1.258, § 2.”), e dá-nos outro caso. ~Que convenção é essa? Se a do negócio jurídico, a sentença de condenação já resolveu o assunto, já o cobriu, e não se tem de aludir a ela. Se é de pensar-se em convenção ao ser aberta ou depois de aberta a instância da liquidação, quando, por exemplo, devendo ser feita por artigos, as partes convencionam que se faça por arbitramento, está claro que a referência é pertinente. Há, então, transação (MANUEL MENDES DE CASTRO, Practica Lusitana, II, 165); conforme o aresto 40 de MELCHIOR FEnO, em ato separado. Se o contrato ou outro negócio jurídico previu liquidação por arbitramento, tal forma está determinada pela sentença (art. 609, 1.a parte). A respeito da liquidação por arbitramento cumpre que se evitem confusões terminológicas. O arbitrador é perito; o árbitro julga: é, a despeito de não ser completa a sua decisão, juiz. A terminologia jurídica, para ser precisa e evitar erros a que a sinonímia levaria, chamou “arbitramento” a atividade ou o ato do arbitrador e “arbitragem” a atividade ou o ato do árbitro. O arbitrador não julga. Posto que mais aconteça arbitramento durante produção de provas (arts. 420-439, 392, 383, parágrafo único), inclusive com antecipação (arts. 848-851), o arbitramento de que aqui cogitamos tem a mesma natureza, mas já ocorre após a sentença de que resultam a ação de execução e a de liquidação. O arbitrador é o perito, porque não se trata de nada mais do que de perícia. A sentença pode ter determinado que a liquidação se faça por arbitramento, o que torna obrigatório tal meio de liquidar. Também pode ter sido estipulado em negócio jurídico. O art. 606, 1, diz “ou convencionado pelas partes”, o que pode acontecer em negócio jurídico fora do processo, ou dentro do processo. A expressão “convencionado” está em sentido impróprio, porque o negócio jurídico pode ter sido unilateral, se fora do processo (e. g., a promessa de recompensa contém tal cláusula de arbitramento). (De modo nenhum podemos deixar que se inserisse no direito brasileiro o que erradamente se pôs no direito português, ao se pôr a arbitragem em lugar de arbitramento.) Não se trata apenas de liquidação de sentença, que condenou o valor, sem o determinar; também ocorre se não se individou o objeto (obrigação de fazer, ou de não fazer, o que não é de considerar fora do art. 606), ou se o bem desapareceu ou se deteriorou, mas há elementos para se dizer o seu valor ou o que a ele pode substituir, ou se a obra pode ser feita por terceiro, à custa do devedor. Advirta-se que, na espécie do art. 627, que é a de coisa que se deteriorou, ou não foi encontrada, ou não foi reclamada ao terceiro, na do art. 631 (entrega de coisa incerta) e na do art. 633 (sobre indenização em caso de obrigação de fazer), a liquidação éde perdas e danos. Se houve circunstância superveniente, que se tenha de levar em conta, segundo a própria sentença, ou por ser da natureza da sentença, somente por artigos pode ser a liquidação. Exemplo disso tem-se na condenação a pagar aluguer de determinada casa, ou a pagar conta de hospital, se os alugueres ou preços sobem. A liquidação por artigos ou se completa com o arbitramento, ou com o cálculo, ou desde logo se determina o quanto. 2)ESCOLHA PELOS FIGURANTES. As partes podem adotar a liquidação por arbitragem e arbitramento ainda que não seja o caso ordinário. Não Importa o tempo em que se faz o acordo (negócio jurídico bilateral). 3) NECESSIDADE DE PROVAR. Se há necessidade de se provar fato novo, a parte da liquidação que disso

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depende não pode ser entregue a arbitradores; porque seria deixar-lhes apreciar prova, o que é função do juiz. “Liquidatio fieri debet per artículos, ubi materia ajiter liquidari non potest, et tantum datur contrarietas ad eos; nec per arbitros fieri potest, ubi per articulos fieri debet” lê-se em MANUEL GONÇALvES DA SILVA (Commentaria, III, 258). Vê-se que o jurista português distinguira bem os casos em que há comunicações de conhecimento e, pois, se faz preciso dar oportunidade às afirmações contrárias (arts. 319 e 333), e os casos em que não é preciso. Aprendera-o em MANUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, II, 164), que fora excelente: “liquidatio (per artículos) causae cognitione requirit”. 4)OBJETO DA LIQUIDAÇÃO. Muitas espécies há em que seria contra a lei não haver o arbitramento, razão por que o art. 606, II, alude a ser exigido o arbitramento dada a natureza do objeto da liquidação, isto é, se não se pode saber o que se há de pagar, ou de exigir, sem que se tenha procedido ao arbitramento. Art. 607. Requerida a liquidação por arbitramento, o juiz nomeará o perito e fixará o prazo para a entrega do laudo 1)• Parágrafo único. Apresentado o laudo, sobre o qual poderão as partes manifestar-se no prazo de dez (10) dias, o juiz pro ferirá a sentença ou designará audiência de instrução e julgamento, se necessário2). 1)NOMEAÇÃO DO PERITO (ARBITRADOR). Logo que se requer a liquidação por arbitramento, tem o juiz de nomear o arbitrador, e fixar o prazo para a entrega do laudo. O arbitrador é o auxiliar do juízo, espécie de perito, que determina o valor líquido da condenação ilíquida. As partes manifestam-se no prazo de dez dias, porque se trata de fixação quesupõe perícia toda perícia contém comunicações de conhecimento, e as comunicações de conhecimento obrigam a que as leis permitam a contrariedade. Na petição inicial tem-se de indicar a causa para a liquidação poder ser por arbitramento, o demandado ~ citado e tudo que mencionamos a respeito da liquidação por arbitramento aqui tem de ser observado. O perito é nomeado e funciona conforme os arts. 420-439. Há tempo para a apresentação do laudo. ~ o juiz que o fixa e pode dar-se a prorrogação, por força maior. Ao manifestarem-se as partes, qualquer delas pode requerer que se designe audiência de instrução e julgamento e pode designá-la, de ofício, o juiz. Se foi designada a audiência, os arts. 450-457 são de atender-se. O arbitramento só afasta invocabilidade dos arts. 440-443 (inspeção judicial). Não se diga que a inspeção pelo juiz é ato decisório; é apenas probatório, porque tem apenas o fim de esclarecer algum fato, ou alguns fatos, que interessam à decisão da causa. 2) JULGAMENTO DO ARBITRAMENTO. O juiz tem de julgar: ou profere, desde logo, a sentença, ou designa audiência de instrução e julgamento, se necessário. Já anteS dissemos que as partes têm de ser ouvidas, para que se saiba se concordam (mesmo por omissão dentro do prazo), ou se contrariam o que foi manifestado pelo arbitrador. A sentença, na espécie do art. 607, como na do art. 605 e na dos arts. 608 e 609, é extintiva com julgamento do mérito e dela cabe apelação, com efeito apenas devolutivo (art. 520, III). Assim, fica o apelado com a possibilidade de propor a ação executiva, expondo-Se a que advenha reforma da sentença. Para a propositula da ação executiva, é necessário que o mandado contenha a sentença liquidanda e a de liquidação. Art. 608. Far-se-á a liquidação por arti~o5, quando, para determinar o valor da condenação, houver necessidade de alegar e prove fato novo 1) Art. 609. Observar-Se-a, na liquidação por artigOs, o procedimento ordinário, regulado no Livro 1 deste Código.2). 1)CONCEITO DE LIQUIDAÇÃO POR ARTIGOS. A liquidação por artigoS supõe a cognição, conforme pusera em relevo, com linguagem do século XX, o maior processualista português dos séculos XVI e XVII, MA21~TUEL MENDES DE CASTRO (Practica Lusitana, II, 164): “cognitio”. Há. çomunicações de conhecimento por parte do exequete, e comunicações de conhecimento por parte do réu (art. 333); há provas, há apreciação das provas, e há julgamento. ~ a alegação de “fato novo”, isto é, que não foi alegado na ação, ou o juiz, abusiva-mente, deixou, de modo explícito, para a execução. Nas Ordenações Filipinas, Livro III, Título 86, havia o § 19: “E sendo natural tal que se devam fazer artigos de liquidação, o Juiz os mandará fazer, e não haverá mais que os ditos artigos e contrariedade a eles, e em tudo se procederá sumariamente”. A liquidação por artigos pode ser preferida pelas partes, embora, no Código, não haja a regra jurídica (art. 606, II) que, em se tratando de liquidação por arbitramento, não aluda a negócio jurídico a respeito.

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Na petição inicial tem-se de artiCular o que se tem de liquidar. Se só se falou de liquidação por artigos sem se lançarem os artigos, não há senão a interpretação de que o autor da ação supôs ser supérflua a articulação, de modo que, Se o juiz tem dúvidas a respeito dos Itens tidos por implicitos, deve fazer intimar o autor para que preste os esclarecimentos suficientes, para que se prove o fato alegado,ou se provem os fatos alegados. A falta daria ensejo à nulidade não cominada. Temos de atender, sempre, a que se fez requisito da liquidação por artigos o alegar-se e provar fato novo. Tal fato novo tem de ser ligado à sentença, ao seu conteúdo; portanto, por exemplo, se o juiz condenou no principal e omitiu a condenação nos juros, ou se a própria petição na ação de que resultou a ação executiva o autor não fez explícita referência aos juros. Se a sentença condenou com a ressalva “se provada, na execução, que a coisa não pode ser prestada”, cabe liquidação por artigos. Também é fato novo e consiste em indenização por ter se agravado, depois da sentença, o prejuízo sofrido pelo credor. O que não se pode discutir é o fato do dano, e não qualquer consequência posterior. Circunstâncias posteriores são fatos novos. Qual a natureza da sentença? AMiLCAR DE CASTRO (Comentários, X, 129-131) reputou-a declarativa, declarativa da sentença anterior. Não é isso aceitável. A ação de execução de sentença é executiva; a liquidação faz-se para integrar o título executivo, de modo que não se declara, constitui-se. É constitutiva integrativa a sentença. Sem razão também, portanto, o “accertamento posterior” de MÃiiiio BELLAvrrIs (Studi di Diritto processuale in onore di GIUSEPPE CHIOVENDA, 28). A sentença é sentença constitutiva integrativa. Manifestou-se a Presidência do Tribunal de Justiça do Estado da Guanabara, a 7 de junho de 1963 (D. da J. de 12 de junho de 1963): “A ação de execução, no ensinamento de PONTES DE MIRANDA, é executiva, fazendo-se a liquidação para integrar o titulo executivo”. Se há necessidade de alegar e provar fatos, há cognição. Não se podem dispensar os artigos de liquidação. O processo seria nulo (1.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 10 de julho de 1952); mas não cominada a nulidade. A execução da sentença que condenou a pagar aumento que se verifique nas despesas de educação e criação de menor,aleijada por desastre, há de processar-se por artigos, e não por arbitramento, por ser de mister que se façam comunicações de conhecimento e produção de prova (cf. ~•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 4 de maio de 1951, R. dos T., 193, 335). A sentença criminal condenatória, suscetível de execução no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, tem de ter liquidação por artigos, porque necessariamente há comunicações de fatos, que se têm de fazer, e provas que se hão de produzir. Mas esgarrou dos princípios (e. g., do art. 250) o acórdão da 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 10 de agosto de 1951 (R. dos T., 194, 808), que, sem ocorrer o caso da regra jurídica que estava no art. 201, 1, do Código de 1939, que é hoje a do Código de 1973, art. 267, 1 (art. 285), absolveu o réu da instância (terminologia de então). Se os fatos foram apontados, tornando-se fácil verem-se artigos nos enunciados de existência, estavam mencionados na sentença criminal, e tem-se de entender a petição como remissiva aos considerandos e conclusões da sentença criminal. Mais acertado, no sistema do Código de 1939, como no de hoje, cujos artigos citamos, teria sido dizerem-se lançados, implicitamente, os artigos, ou despachar-se a petição com a exigência de explicitá-los. O que importa é que o demandado possa contestar o que está na petição (4.a Câmara Civil, 4 de junho de 1931, 193, 921). A decisão de 10 de agosto de 1951 foi injusta. Finda a liquidação por artigos, que se processa conforme a regra jurídica remissiva, havia a sentença de liquidação, cuja intimação era, excepeionalmente, incoativa do processo de execução, de jeito que, no prazo, ou o devedor pagava o que fora fixado, ou sofria a execução. Só então (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 20 de junho de 1950, R. dos T., 188, 213; ~ Câmara Civil, 24 de novembro de 1950, 190, 878), com a intimação de que falava o art. 917 do Código de 1939 ou da que se referia no então art. 948,dentro do qúinqúíneo se poderiam opor embargos do’ ere~cutado (Código de 1939, arts. 1.008-1.011, 1.013-1.016). A 2.R Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, a 22 de junho de 1950 (Paraná J., 53 216), entendeu que os embargos do executado tinham de ser opostos nos cinco dias contados da citação na ação de liquidação (Código de 1939,. art. 907, verbis “a citação terá por objeto a liquidação, que se fará por cálculo do contador, por arbitramento ou por artigos”), e não nos cinco dias contados da intimação. conforme o então art. 948, ou da citação conforme os arts. 992, 998 e 1.007, nem da intimação da sentença de liquidação (art. 917), ou do mandado (art. 889). Impressionou os juizes o art. 917, no qual se dizia que, “proferida a sentença de liquidação, a execução prosseguirá, independentemente de nova citação pessoal”. Ora, proferída a sentença, tinha de haver intimação, para que se pudesse proceder à penhora. Sem a intimação segundo o art. 917 do Código de 1939, não poderià correr o prazo para embargos do executado, se a matéria concernia à penhora. Naquela intimação ia a cominatória do art. 918, ou outra, que a da. espécie. Em verdade, economizou-se uma das comunicações,. porém não se dispensou a intimação da sentença indispensável ao trânsito em julgado, nem a cláusula cominatória, nela inserta, ommoditatis causa, nem se fez inoperante o art. 948 do Código de 1939. Tal problema foi afastado pelo Código de 1973. O art. 611 diz que, julgada a liquidação, a parte promoverá a execução, citando pessoalmente o devedor. Não se dispensou a nova citação. Pergunta-se se a) tal regra jurídica

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dispensa a intimação, ou b), feita a intimação e ocorrendo o trânsito em julgado, é que se pode fazer a citação. A liquidação é ação, e não simples ato processual; razão por que temos de entender a solução b), em vez da solução a). A questão maior é a de se saber se, hoje, a cláusula pague ou sofra penhora” precisa ser explícita, ou está im plícita. Tínhamos de admitir, sob o Código de 1939, que estivesse implícita, porque o demandado fora citado e sabia que a cláusula se transferiu da citação para a intimação. A vocatio in ius fora feita, para as duas ações postas aí no mesmo processo, por se tratar de liquidação para ezecução. O demandado sabia que, ao ser intimado para o trânsito em julgado da sentença, tinha de solver ou sofrer penhora e que, após a citação, lhe correria o prazo para embargos do executado. Se recorria e a decisão foi mantida, ou somente reformada em ponto cuja alteração não importasse exclusão da executividade, a intimação do acórdão era incoativa e com a alternativa, pague ou sofra penhora, se não houve execução provisória. Não mais existe, hoje, tal discutibilidade; a citação é após a decisão sobre a liquidação. Oprazo para embargos do devedor não se conta da sentença dos arts. 607 e 609, mas sim da citação segundo o art. 611. 2)PROCEDIMENTO DA LIQUIDAçÃo. No art. 609, fala-se de procedimento ordinário. No art. 271, diz-se que “aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei especial”. No art. 272, define-se procedimento comum como ordinário e sumarissimo. Havemos de entender que o procedimento há de ser o ordinário, se não ocorre alguma das espécies do art. 275, 1 e II, mesmo porque, se ocorre, a própria sentença liquidanda foi proferida em processo sumarissimo, como se o valor da causa atende ao que o Decreto n. 75.704, de 8 de maio de 1975, prevê, ou se a causa, qualquer que seja o valor, cabe em algumas das regras jurídicas do art. 275, II, b), c), que se refere à responsabilidade pelo pagamento de impostos, taxas, contribuições, despesas e administração de prédio em condomínio, d) que é concernente a ressarcimento por danos em prédio urbano ou rústico, e), de reparação de dano causado em acidentes de veículos, g), porque pode ocorrer dívida, h), i), que é relativa à cobrança de quantia devida a titulo de retribuição ou indenização a depositário ou leiloeiro, m), que é quanto à cobrança de honorários de profissionais liberaís ressalvado o disposto em legislação especial. Seria absurdo que a ação de cognição em que houve a condenação, com 3 de executividade, tenha sido com o procedimento sumaríssimo, e a ação de liquidação para se chegar à execução tivesse de ter o procedimento ordinário. O Código de 1973 deveria ter dito apenas que se há de observar, na liquidação, o procedimento “regulado no Livro 1 deste Código”, ou, em vez disso, o procedimento comum. Na ação de liquidação, o demandado pode alegar tudo que se pode prender ao assunto do processo liquidativo, como impedimento ou suspeição do juiz, ou que seja concernente aos fatos novos apreciáveis pela liquidação. N~ se pode contestar com assuntos apenas que seriam examinados em embargos do devedor. Ainda não se está executando; e sim somente liquidando. Tem-se de aguardar o momento para se embargar a execução. Nada obsta, porém, a que ele argua: que, sendo revel na ação de cognição, não houve a sua citação, ou a citação foi nula; que não há sentença de que se precise fazer liquidação; que não é a pessoa contra a qual podia ser proposta a ação de liquidação. Art. 610. É defeso1), na liquidação, discutir de novo a lide, ou modificar a sentença, que a julgou2). 1)INTEGRIDADE DA SENTENÇA LIQUIDANDA. No processo de liquidação somente se integra a sentença liquidanda, no ponto relativo a quanto da condenação. Nas espécies de que aqui se trata, a condenatividade é 5 e 3 da executividade, de modo que se teria, desde logo, de propor a ação de execução, ou, segundo outra solução de técnica legislativa, que foi a do direito brasileiro, proceder-se a ação de liquidação, e só após iniciar-se a ação executiva. Quanto à novação, à transação, ao pagamento, à compensação com execução aparelhada, ou prescrição, supervenientes à sentença, pode ser matéria da contestação. Sim, mas pode haver interesse de quem pediu a liquidação, ou mesmo do demandado, em que se liquide o que foi atingido por alguma cousa impeditiva ou modificava da obrigação. A alegabilidade, aí, não afasta que a outra parte manifeste ao juiz o seu interesse em que se proceda à liquidação. De modo nenhum se discute de novo a lide, nem se quer modificar a sentença que a julgou (art. 610). O que passou em julgado, sim, no mais pode ser negado. O que o juiz pode fazer é interpretar a sentença, inclusive revelar-lhe o que nela está implícito (e. g., juros da mora, honorários de advogado, custas). O que faltou à sentença teria sido assunto para embargos de declaração, ou recurso de apelação. Se não foi, houve o trânsito em julgado. Uma vez apenas se vai tornar líquido o ilíquido, não seria possível pensar-se em modificação ou qualquer aumento, ou decréscimo na sentença, transformando-se a ação constitutiva integrativa, a despeito da coisa julgada formal, em embargos infringentes do julgado, ou em algo semelhante àação rescisória de sentença.

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O juiz da liquidação interpreta a sentença segundo as regras jurídicas de método de interpretação das decisões judiciais; porém nenhuma apreciação da justiça da sentença lhe cabe, porque seria, pelo menos, dispor-se a alterá-la. Se os juros moratórios, e. g., hão de ser computados, ou não, responde o direito material; se esse é afirmativo, ou indiferente, incide o art. 293 como regra interpretativa da sentença. Não há solução a priori, nem ius cogens. Mas os juros sobre o quanto da condenação correm sempre, segundo os princípios (cf. Câmaras Civis Reunidas do Tribunal de Apelação de São Paulo, 14 de julho de 1944, R. F., 101, 528). Não se admite, na ação de liquidação, assunto de embargos de declaração, pois tiveram prazo para serem apresentados, e não foram. Embargos de declaração somente cabem quando proferida a sentença do art. 611, mas tais embargos de modo nenhum são opostos à sentença que deu ensejo à ação de liquidação. 2)MATERIA DA CONTESTAÇÃO. Na contestação à ação de liquidação, podem ser incluídos, além de infrações de direito processual na própria ação: a) o que diga respeito à interpretação da sentença liquidanda; b) o que aponte desconformidade do pedido de liquidação com a sentença; c) o que seja comunicação de conhecimento de fatos ocorridos depois do encerramento do debate oral ou da conclusão dos autos ao juiz, ou durante o processo, e não analisados na sentença, por não ser possível ou não ser necessário fazê-lo (e. g., os frutos percebidos foram em menor porção do que os pedidos na liquidação, os danos menores, a coisa pareceu sem culpa do contestante); d) direito à escolha (obrigação alternativa, art. 571 e § § 1.0 e 2.0), que não foi referido (MANUEL DE ALMEIDA E SousA, Tratado sobre as Execuções, 64). ~ matéria só pertinente à causa principal em que se proferiu a sentença liquidanda: qualquer enunciado (afirmação) sobre erro in iudicando; qualquer alegação de nulidade da relação jurídica processual ou de atos processuais, inclusive falta ou nulidade da citação (assunto para embargos do devedor, quando já se estiver no processo da ação executiva de sentença, artigo 741, 1); exceções de pagamento, novação, compensação, transação, ou prescrição superveniente (art. 741, VI). Só em embargos do devedor é que se pode alegar e provar qualquer desses assuntos. A inexistência da relação jurídica processual de que se diz ter provindo a sentença liquidanda ou a inexistência da sentença pode, todavia, ser trazida a exame, a qualquer momento da ação de liquidação. Não o error in judicando ou in procedendo. No processo da ação de liquidação, além do que acima apresentamos, pode o demandado alegar que não há mais a dívida, porque houve causa extintiva da obrigação. Art. 611. Julgada a liquidação’), a parte 2) promoverá a execução3), citando 4) pessoalmente o devedor. 1)AçÃo DE LIQUIDAÇÃO E SENTENÇA. O juiz tem de julgar a liquidação total da dívida, razão por que, se houve liquidação por meio de cálculo ou por meio de arbitramento e por artigos, ou por meio de cálculo e por meio de arbitramento, ou por todos os meios, tem de haver diferentes decisões e as sentenças quanto aos meios não podem bastar à liquidação total, porque é de exigir-se que se juntem os resultados. Assim, nenhuma daquelas decisões caberia na sentença do art. 611. Não mais se elide a citação para a ação executiva: não a perfazem as intimações das decisões quanto à liquidação pelo contador, pelo perito e por artigos. Se só um meio de liquidação basta, então não se obsta a que o autor da ação de liquidação requeira a intimação da decisão e promova a citação penal do devedor, para que se inicie a ação executiva de sentença. Tudo isso é muito diferente do que se passava sob o Código de 1939, que fazia anterior à ação de liquidação a propositura da ação executiva da sentença: só havia uma citação; dispensava-se o processo de liquidação porque era embutido no processo da execução e parte material dele; as citações podiam ser cumuladas. Hoje, se a dívida é ilíquida, primeiro se liquida e se julga para que se possa citar para a execução. 2)DEVEDOR AUTOR DA AÇÃO DE LIQUIDAÇÃO. O devedor pode pedir a liquidação da sentença, como poderia pedir a liquidação da dívida. Então, há ação de liquidação (passiva), que é autônoma, como o é, hoje, a ação de liquidação (ativa), que é proposta pelo credor. A sentença em qualquer das duas é sentença constitutiva integrativa da sentença. Não se confunda, porém, a propositura pelo devedor, que é provocatio, conforme o art. 570, com a que ele propõe se o credor, sem ter pedido a liquidação, pede a citação na ação executiva. 3)LIGAÇÃO EVENTUAL DOS PROCESSOS DA AÇÃO DE LIQUIDAçÃo E DA AÇÃO DE EXECUÇÃO. Ao contrário da solução que dera o Código de 1939, arts. 918, 906 e 907, que fizera a citação para as duas ações ser a mesma, como se só uma ação existisse, o Código de 1973, art. 611, acertadamente atendeu a que a existência de duas ações impunha duas citações, após as quais as duas relações jurídicas processuais se angularizam. Assim, foi evitado o embutimento do processo da ação de liquidação no processo da ação executiva de sentença. Tem de haver a intimação da sentença proferida na ação de liquidação.

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Não devemos admitir, diante da ação de liquidação (passiva ou ativa), que é sempre outra ação, autônoma, que se acolha o que escreveram alguns juristas, ao considerarem a ação de liquidação mera etapa, com um só processo (e. g., EDUARDO J. COUTURE, Fundamentos dei Derecho Procesal Civil, 3.~ ed., 458), mesmo se o sistema jurídico, erradamente, como aconteceu com o Código de 1939, art. 917, faz prosseguir o processo sem nova citação para a ação executiva. Dissemos que o estatuía “erradamente”, porque o próprio autor da ação de liquidação, obtido o julgamento, pode não ter interesse em propor a ação executiva. ~,Por que se haveria de impor o prosseguimento do processo se o autor da ação de liquidação não tinha interesse na ação executiva? O que se quis e se pediu foi apenas que se procedesse à liquidação. Tanto o credor como o devedor pode ter interesse em saber o quanto que se lhe deve, ou o quanto que deve. Demais, a ação de liquidação pode ser para se firmar qual o bem ou quais os bens que são devidos, se dentro de universalidade (herança, dote, capital ou patrimônio social), ou se apenas a respeito de frutos e rendas de objeto de divida líquida. Aí, a liquidação é somente quanto a frutos pendentes, colhidos~ (já consumidos ou não), ou consumidos. Mais: pode a liquidação ser de danos emergentes, ou de lucros cessantes. Pode a liquidação ter sido pedida pelo credor e esse abster-se de propor a ação executiva, e o devedor exercer a pretensão e a ação de que cogita o art. 570. Se pedida pelo devedor, o credor pode fazer citá-lo para a ação executiva. Trata-se de duas ações, para as quais tem legitimação ativa qualquer das partes. 4)CITAÇÃO DO DEMANDADO NA AÇÃO DE EXECUÇÃO. A ação executiva, como todas as ações, tem de ter processo que começa com a petição inicial e com o despacho e se angulariza com a citação. Citado é o sujeito passivo na ação executiva, que pode ser o devedor, ou o próprio credor (art. 570). O art. 611, diante do art. 570 e dos próprios princípios gerais, é de redação errônea. Cita-se pessoalmente o sujeito passivo da relação jurídica processual e nem sempre é o devedor. Diz o art. 611 que a citação há de ser pessoal. Entenda--se: a citação é ao demandado, ou seu representante legal, ou procurador que tenha poderes para isso, conforme a lei. Ou é por mandado, ou hora certa, ou por edital, tal como se estatui na lei. Para promover ou ser demandado na ação de execução, há de ter poderes quem representa o demandante ou o demandado. A sentença na ação de liquidação, antes ou depois de trânsita em julgado, é que leva ao exercício da ação executiva, se qualquer das partes resolve propó-la. Não importa qual foi a espécie da forma liquidativa (por cálculo do contador, por arbitramento, ou por artigos). A despeito da expressão “promoverá”, que está no art. 611, o que havemos de entender é que não há qualquer dever de propor a ação executiva. O que se cria, com a sentença na ação de liquidação, é apenas a exercitabilidade da ação executiva, mesmo se dela se apela. Da sentença proferida na ação de liquidação cabe apelação, com o efeito só devolutivo (art. 520, III). Como em todas as outras execuções provisórias, o exeqúente, credor ou devedor, se expõe ao risco de ter provimento o recurso de apelação. Em todas as formas de liquidação (pelo cálculo, pelo arbitramento ou pelos artigos), há a sentença como a citação após o despacho na petição inicial. A parte não tem dever de, com a sentença na ação de liquidação, promover a ação executiva da sentença que foi liquidada. Promove se o quer. A outra parte, que foi demandada na ação de liquidação, quer tenha sido o credor quer o devedor, também apenas está legitimada a propositura da ação executiva que dependia de ser liquidada do crédito ou da dívida.