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Projeto gráfico de um jornal-mural. Textos, edição e diagramação.

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clipping ano 1número 113/julho/2007

Recortes do jornalismo

A ética é considerada impres- cindível dentro do jornalismo

– a controvérsia reside na definição dos seus limites. O livro Jornalis-mo, ética e qualidade, publicado pela Editora Vozes, é uma grande contribuição do professor de Ética Jornalística Carlos Alberto Di Franco a este debate. Conserva-dor, ele conversou com Clipping pelo telefone em uma manhã de sexta-feira, e criticou duramente o jornalista Michael Finkel por ter inventado a fonte de uma reporta-gem.Qual é o limite entre a ética jornalística e a liberdade de im- prensa?A liberdade de imprensa é um dos pilares da democracia. A ética tam-bém. Mas a ética defende e esta- belece limites para esta liberdade. Na sua opinião, o código de ética que está em vigor consegue regulamentar também as novas formas de comunicação que es-tão surgindo, como a internet?A internet é complicada ética e juridicamente. São novas re-alidades que o próprio Direito não conseguiu controlar. Não se pode ter um espaço público que incite ao crime. Ainda existe a questão dos provedores fora do Brasil e a legislação não vigora sobre algo que está fora do país. Uma solução seria criar selos de qualidade para sites que difundirem boa informa-ção, privilegiar esses sites. O que o jornalista deve fazer

se for pressionado a quebrar o sigilo da fonte pelo bem da so-ciedade?Deve pensar antes de assumir o compromisso. Não há desculpa para romper o sigilo com a fonte.Existe a polêmica sobre a legiti- midade de certos métodos para a obtenção de informações. Qual a sua opinião sobre o assunto?Acho que o jornalista não pode usar de falsidade ideológica. Não se pode usar métodos que colidem com a lei. O jornalista denuncia fraudes e, por isso, ele não pode fraudar. A objetividade e a imparciali-dade são questões da ética jor-nalística. Você acha possível um jornalismo objetivo e imparcial?Não existe jornalismo objetivo. Toda edição editorial já é subje-tiva. É claro que o jornalismo se apóia na importância objetiva dos fatos. O que se deve fazer é um es-forço de isenção e imparcialidade. No caso relatado em A história verdadeira, com você avalia a gravidade da transgressão ética cometida pelo jornalista Michael Finkel ao inventar uma fonte?Eu acho um absurdo terrível. Inventar fonte é de uma falta de credibilidade, o jornalista vai ficar sempre na cabeça do leitor como duvidoso. Ele poderia ter encon-trado algum personagem. Faltou o empenho que o bom jornalista tem que ter. O jornalismo é o instantâ-neo da realidade, não o ficcional.

Michael Finkel, jornalista da revista dominical do The New York Times, foi à África, em 2001, investigar denúncias de escravidão infantil em fazendas de cacau

da Costa do Marfim. Ao chegar lá, descobriu que não havia escravidão, mas uma situação de miséria. Ainda assim, o fato valia uma

capa. Sua editora concordou, desde que reunisse o horror que presenciou em apenas um personagem. Finkel tinha muitos personagens com boas histórias – nenhum era forte o suficiente. A solução foi fundi-los em um só. Nasceu então o garoto Youssef Male, de 15 anos. A história de Youssef comoveu entidades de direitos humanos, que foram libertá-lo e acabaram por revelar a farsa de Finkel. Despedido, ele sentiu-se humilhado.

Alguns dias antes do The New York Times publicar um editorial sobre o caso, Finkel estava em casa, escondendo-se do mundo. Então o telefone tocou. Era um jornalista. Finkel perguntou-se como ele estaria sabendo da demissão antes da publicação do editorial. Mas o jornalista do outro lado da linha queria perguntá-lo sobre Christian Longo. Christian Longo? Finkel não sabia quem era. O outro esclareceu: Longo matou a família inteira e fugiu para o México usando sua identidade: “Michael Finkel, o jornalista do The New York Times”. Era o que Finkel precisava para sair da clausura. Contatou Christian Longo e começaram a trocar cartas e telefonemas. Criou-se um jogo de interesses – de um lado o réu tentando provar a inocência, de outro, a mea culpa de um jornalista arruinado. A história verdadeira: assassinatos, memórias, mea culpa (2005) conta os entremeios da trama entre Finkel e Longo – escravos da África e assassi-natos de toda uma família. O livro termina com a condenação de Longo à morte... e com a dúvida persistente na cabeça de Finkel sobre a inocência do causador de sua redenção.

Por inocência e redenção

O maior objetivo de Clipping é discutir a relação jornalismo-sociedade e promover

uma auto-análise por parte de quem faz comunicação.

Queremos alimentar esta nova geração de jornalistas

– vocês! – para que pensem mais nas questões éticas

e editoriais da profissão. Cada edição trará recortes

jornalísticos de uma obra – livro, vídeo, revista, jornal.

Para começar escolhemos uma muito interessante de

Michael Finkel, Uma história verdadeira. Baseados neste

livro, que é quase uma carta de desculpas do jornalista

ao público, falaremos sobre a relação fonte-jornalista, da

ética no jornalismo, das conseqüências e desdobramentos

do livro, e até sobre pena de morte. Se não leu o livro,

esperamos que, após este Clipping, você fique empolgado

e comece logo, para, inclusive, nos propor novas pautas. Boa leitura e divirta-se!

Tema comum

Chegou aos cinemas neste mês mais um filme sobre Truman Capote. Confidencial é o segundo em pouco mais de um ano, o que prova a importância do jornalista e sua obra mais famosa e a polêmica que ambos causam: Capote com sua personalidade, A Sangue Frio com suas controvérsias.

Ao terminar o livro, Capote anunciou que havia inaugurado um novo gênero literário: “o romance de não-ficção”. Choveram críti-cas para provar que ele era, no máximo, mais um seguidor deste gênero já batizado de Novo Jornalismo. Capote revidou afir-mando: “Tudo isso que vocês estão dizendo pode ser muito interessante, mas a verdade é que eu escrevi uma obra-prima, e vocês não”. E ele estava certo.

Desde então, surgiram muitas obras deste

gênero, mas segundo a crítica, rara é aquela que traz tantas semelhan-ças com A Sangue Frio quanto A história verdadeira, de Michael Finkel. Ambos os autores estavam em uma situação delicada – Capote devia matérias a The New Yorker, Finkel havia enganado editores e leitores do The New York Times – e viram-se dentro da história de condenados à morte acusados de destruir famílias cruelmente.

A construção da confiança com a fonte permitiu os densos perfis psicológicos e de-talhamento nas obras. Os autores fizeram a história dos acusados trabalhar em benefício próprio. Finkel foi sincero com Christian Longo, seu personagem, e assumiu que es-tava naquela relação por interesses. Capote

foi acusado de negligenciar as provas da in-sanidade de seus personagens, Perry Smith e Richard Hickock, para que eles fossem, de fato, executados - um bom final para o livro.

As fontes também tinham seus próprios interesses: usar os jornalistas para tentar provar inocência.

São muitas as outras semelhanças... e tendem a aumentar. A história verdadeira vai virar filme – pela produtora Plan B, de Brad Pitt, e dirigido por Kevin MacDonald, diretor de O Último Rei da Escócia (2006).

Da redação

Entrevista: Carlos Alberto di Franco Papo de jornalista

“O jornalista não pode fraudar”

Nossa fonte

Em preto e branco e a cores, assassinatos os condenaram à morte: Richard Hickcock, Perry Smith e Christian Longo

Duas histórias verdadeiras

O jornalista Michael Finkel no meio do Saara em 2001 pela revista National Geographic Adventure

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clipping Opinião Suíte

O fornecimento de informações em off é um jogo cooperativo, uma negociação, um acordo entre os dois agentes, fonte e repórter. Esta cooperação não é pura, porque, mesmo em baixa intensidade, exis- tem elementos que podem movi-mentar estratégias contrárias aos interesses de um agente. É um jogo cooperativo também porque é es-truturado através da comunicação entre os dois agentes. A comunica-ção permite estabelecimento de re-gras próprias, ao contrário de jogos competitivos que devem obedecer apenas a legislação governamental, um conjunto de regras coercitivas para qualquer pessoa, porque não é possível a constituição de contratos particulares.

O fornecimento de informações através do off toma a forma de um jogo cooperativo quando os dois agentes buscam ganhos cuja base é aquilo que um pode oferecer ao outro, e para isto estipulam regras, aceitas informalmente. É um jogo seqüencial, de informação assimé-trica (a fonte possui mais informa-ção do que o repórter) e imperfeita (os agentes não sabem o que pode ocorrer em cada etapa).

Pode ocorrer traição ou outra ação prejudicial de um agente a outro. Eles elaboram e acionam estratégias para ganhar e se prote-ger. Tanto para a fonte como para o repórter, a iniciativa e aceitação para o off já é uma estratégia, pois para a fonte, é o modo de satisfazer

seu interesse, a difusão de determi-nada informação, apenas uma etapa de um plano maior. Para o repórter, é o modo de se obter informação de alto valor jornalístico com ex-clusividade. Como o repórter sabe quem é a fonte, pode ser induzida alguma noção da qualidade de suas informações.

Para ele, o que importa é a vera-cidade, o alto valor jornalístico e a exclusividade das informações. En-tre estes três fatores, a veracidade é o que oferece menos controle por parte do repórter. Valor jornalístico é um juízo fácil de ser feito, já que é um conceito rotineiro; e exclusivi-dade admite apenas duas opções, sim ou não.

Em resumo: o “cacife” da fonte é o valor de suas informações; o cacife do repórter é a própria capa-cidade de difusão. A exclusividade da informação, detida pela fonte, é transferida ao repórter. A lógica do fornecimento de informações em off, portanto, é uma relação de necessidade entre fonte e repórter, baseada no anonimato da primeira e no interesse do segundo.

Nossa fonte

A Pena de Morte foi instituída nos Estados Uni-dos em 1976 com o apoio de mais de 80% dos americanos. Mas segundo o relatório “Uma crise de confiança”, elaborado pelo CIPM e baseado em uma pesquisa feita em março pelo Instituo Omnibus, apenas 60% da população apóia a pena capital atualmente e o número de executa-dos caiu de 98, em 1999, para 53, em 2006. Além disso, 87% dos americanos acreditam que pelo menos um inocente foi executado nos últi-mos anos. Veja a seguir alguns métodos usados na execução da Pena Capital:

Abolida para todos os crimes.

Abolida para todos os crimes. Exc: em guerra.

Abolida na prática, mas legal.Legalizada.

Joseph Guillotin (1738 - 1814) achava-a mais humana que o enforcamento ou a decapitação com um machado.

Foi usada em 30 de dezembro de 2006 na execução do ditador iraniano Saddam Hussein. Causa, em tese, uma morte rápida.

Inventada por um dentista em 1886 e utilizada nos EUA a partir de 1890. O condenado recebe tensões elétricas de 20 mil volts.

Proposta por um anestesista, começou a ser usada em 1982. Após a aplicação, a morte ocorre em cerca de 15 minutos.

A crise da confiançaPena de Morte Pelo mundo...

Guilhotina ForcaEletrocussão

Injeção letal

Fonte: Centro de Informação sobre a Pena de Morte, EUA

Pauta livre

O jornalista Michael Finkel no meio do Saara em 2001 pela revista National Geographic Adventure

clipping Contato: [email protected] Edição, reportagem e arte: Grazielle Schneider e Eduardo Wolff Colaborador: Hélio Ade-mar Schuch Fotos: Chris Anderson / Agência Corbis / www.courttv.com / www.humornaciencia.com.br / www.ensp.fiocruz.br / wikipedia.org / www2.ccs.k12.va.us Circulação: nacional, gratuita e dirigida Tiragem: 1500 exemplares Fechamento: 12/07/07 Este jornal-mural foi produzido pelos alunos de Jornalismo da UFSC Eduardo Wolff e Grazielle Schneider na disciplina de Edição Supervisão: Tattiana Teixeira Julho de 2007

A cooperação entre fonte e repórter*Hélio Ademar Schuch **

*Trecho do artigo O jogo do off - uma breve apresentação de pontos conceituais**professor de Jornalismo da UFSC.

Watergate: boa relação jornalista-fonte que culminou na renúncia do

presidente americano em 1974

O Sr. Dicionário vai se casarChristian Longo foi condenado à morte em abril de

2003 e, depois disso, ficou 11 meses sem falar com Mi-chael Finkel. Então, no fim de março de 2004, Longo telefonou para Finkel contando: ele ia casar. “Longo e eu nos falamos pelo telefone num total de 51 horas e essa era a primeira vez em que eu não tinha idéia do que responder”, contou a nossa redação por email.

Em março de 2005, meses após a publicação do li- vro, Finkel foi até a Penitenciária Estadual de Oregon, tentar de convencer as autoridades de que Longo fosse fotografado para uma revista. “Consegui apenas duas horas de conversa”. Ele parecia mais jovem que nunca. Malhado, tinha em sua cela uma televisão com mais de 70 canais, livros e, além disso, escrevia cartas, muitas cartas. Somente para a noiva, escreveu cerca de quatro por dia durante mais de um ano. Ela o tinha como um escritor fantástico e até apelidou-o de Sr. Dicionário.

Meses depois do encontro na prisão, Finkel recebeu outra carta de Longo. Nela, ele revelou o presente que dará a noiva no casamento: a história verdadeira dos assassinatos, do começo ao fim, com todas as lacunas preenchidas - a quarta versão apresentada por ele.

Quanto ao livro, apesar de achar honesta a relação descrita, não lhe agradou nada o tom. “Ele não gostava de ser chamado de vigarista. Quando um jornal fazia isso, ele me ligava ou escrevia reclamando. E foi exa-tamente o que fiz”, revela Finkel. Longo confessou que se arrependeu do contato com o jornalista, porque resultou numa obra que relembrava todo o sofrimento pelo qual sua família havia passado. Apesar disso, mostrou interesse em continuar se comunicando.

O casamento - se ele acontecer-, durará 10 minutos, será na sala de visitas da prisão e não haverá visitas íntimas. Estas são as regras no corredor da morte.

Alg

uns

mét

odos