ciência como instituição e como prática: a mudança do regime
TRANSCRIPT
-
UNIVERSIDADEDESOPAULOFACULDADEDEFILOSOFIA,LETRASECINCIASHUMANAS
DEPARTAMENTODESOCIOLOGIAPROGRAMADEPSGRADUAOEMSOCIOLOGIA
MARIACARAMEZCARLOTTO
Cinciacomoinstituioecomoprtica:Amudanadoregimedisciplinar/estataldeproduoedifusodo
conhecimentocientficonoBrasilvistaapartirdoLaboratrioNacionaldeLuzSncrotron
SoPaulo2008
1
-
UNIVERSIDADEDESOPAULOFACULDADEDEFILOSOFIA,LETRASECINCIASHUMANAS
DEPARTAMENTODESOCIOLOGIAPROGRAMADEPSGRADUAOEMSOCIOLOGIA
Cinciacomoinstituioecomoprtica:Amudanadoregimedisciplinar/estataldeproduoedifusodo
conhecimentocientficonoBrasilvistaapartirdoLaboratrioNacionaldeLuzSncrotron
MariaCaramezCarlotto
Dissertao apresentada ao Programa de PsGraduao em Sociologia, do Departamento deSociologia, da Faculdade de Filosofia, Letras eCinciasHumanasdaUniversidadedeSoPaulo,paraaobtenodottulodemestreemSociologia.
Orientador:Prof.Dr.RuyBraga
SoPaulo2008
2
-
Paraovov FbioeparaElla a formacomoaparecem,paramim,osextremosdavidapeloexemploepelaesperana.
3
-
AGRADECIMENTOS
Osagradecimentosso,muitasvezes,altimacoisaqueescrevemosaoterminaruma
umateseoudissertaooque,dopontodevistadatotalidadedotrabalho,muitoinjusto.
Depoisdeaproximadamentetrsanos,impossvelsepararestadissertaodaspessoasquea
tornarampossvel.
Assim,nopoderiadeixardeagradecer,emprimeirolugar,aosmeusprofessoresdo
DepartamentodeSociologiadaUSP,emespecial,aomeuorientador,RuyBraga,aquemeu
devoaidiapesquisaroLaboratrioNacionaldeLuzSncrotronepossibilidadederealizaresta
pesquisacomtodaaliberdadeeautonomia;aoAlvaroComin,pelopapeldeterminantenaminha
formao como pesquisadora (o nosso primeiro questionrio a gente nunca esquece!); ao
RicardoMusse,peladedicaoaogrupodeestudosd'OCapitaleoesforoconstantedefazerda
teoriasociolgica,umaferramentadecrtica;eSylviaGarciaquemeensinou,dentretantas
outrascoisas,quesociologiasefazcomtrabalhoepaixo.Nopoderiadeixardeagradecer,
tambm,aoLaymertGarciadosSantos,nospelobrilhantecursoquetiveoportunidadede
acompanhar,naUNICAMP,comopelaformaatentaeperspicazcomeleleuoestetrabalhona
minhabancadequalificao.
Aos grupos de estudo, pesquisa e crtica em que apresentei e discuti partes desse
trabalho: ao luscofusco, quedebateuminhaqualificao,pginaporpgina, emumasala
obscuradareitoriadaUSP;aoGEMARX,adespeitodosacrilgiodediscutiremomesmotexto
nomesmodiado18Brumrio;eaosSeminriosdasQuartas,emqueapresentei,comoPablo
Ortellado, algumas das conseqncias polticas dessa pesquisa. Aproveito para agradecer,
tambm, aos grupos que, embora no tenham discutido diretamente este trabalho, foram
essenciaisparaasuaconcepoerealizao:aogrupodeestudosdos Grundrisse, queme
mostrouacentralidadedeentenderoproblemadacinciadocapitalismo,emespecialaoGuto,a
quem eu devo uma srie de questes de pesquisa as quais, infelizmente, no tive como
desenvolver aqui; ao projeto temtico Cincia, Tecnologia, Valores e Sociedade, cujas
discussesinfluenciaram,emgrandemedida,aorientaotericadestetrabalho;oGPOPAI,
4
-
queeumalvejoahoradepassaraintegrarefetivamente,pormantervivasasquestesque
inspirarama minhapesquisa; ao grupode pesquisa da greve, o lugar ondeaprendi que a
cinciamuitomaisdoqueumaprofisso;eaoCEBRAP,muitoespecialmente,aoFred,com
quemeucompartilhoumasriedequestesdepesquisaqueeuesperocomeararespondercom
essetrabalho.
Estetrabalhoseriacompletamenteinvivelsemaenormecontribuiodaequipedo
LaboratrioNacionaldeLuzSncrotron.Agradeoespecialmentedireodolaboratrio,na
pessoa do professor Jos Antonio Brum, por ter possibilitado o meu acesso a todos os
documentoseinformaesnecessriaseporterautorizadoaaplicaodonossoquestionrio.
SecretariadeApoioaoUsuriodoLNLS,emespecial,agradeoportodooapoionoenvioe
recebimentodosquestionrios.
A todosos 211pesquisadoresqueencontraramum tempo na sua rotina intensa de
trabalhopararesponderaomeuquestionrio,deixoaquiomeusinceroagradecimento.Bem
comoaospesquisadoreseempresriosqueaceitaramfalarsobreoproblemadacinciaeda
tecnologianoBrasil.Semessasentrevistasquerefletem,nasentrelinhas,adedicaodaqueles
que,muitasvezes,fizeramdacinciaedainovaoacausadassuasvidasestapesquisa
perderiagrandepartedoseuinteresse.Citonominalmentepararegistraraimportnciaquecada
umdelesteveparaestetrabalho:Jos.A.Brum,CylonGonalvezdaSilva,RogrioCerqueira
Leite,AntnioRamirez,DanielaZanchet, PedroWongtschowski,AmirO.Caldeira,Wagner
Caradori, Cristina Theodore Assimakopoulos, Roberto Lotufo, Oswaldo Massambami e
ValdemarStelita.
Atodososmeusamigosdequemessadissertaomeafastou(Er,Dedo,Danibas,
Natlia, Rassa, Ilan,Lucas,Contier, Edue Z, entre tantosoutros que jamaisconseguiria
mencionaraqui).AnaeaoThales,euagradeo,dentreoutrascoisas,poralgunsdosmelhores
diasdaminhavidana miBuenosAires querda!; aoMiguelito, pela companhianaBauru
deserta; ao Maurcio, por todo apoio emmomentos importantes, sobretudo no projeto de
mestrado; a Ana Elisa, por agentar, por tantos anos, a minha amizade desleixada; e ao
5
-
Steeveeeeeens(!!!!!!!!)pormelembrar,sempre,queasociologianossoesportedecombate.
Atodososcompanheirosdemovimentoestudantil, emespecial, gestodaAPGe
particularmentePat(paraquemnosabe,elamorena,olhosverdes,1,78m,masusabotasde
caminhada),queapesardeserafsicatipoideal,anicausuriapotencialdoLNLSqueeu
noencarocomoobjetodepesquisa;aoStefan,pelaamizadesemprepresentee,porvezes,
providencial,pelopapelcentralquetevenafasefinaldessetrabalho;eaoFbiodeMarias,um
grandeamigoqueomestradometrouxeedequemesperoumalembrananasagadosuspianos.
Aosrosadospelacompanhianosmomentosdefestaedesespero.
AoFbioCapi,paraosntimosenontimoscomquemmantiveinmerosdilogos
mudosaolongodestetrabalho.
AVerena,a quemeudevoapropriedade intelectualcomoquesto,pelapresena
semprealegreeimportante.
AoOsvaldo,fundamentalemmomentoscrticosdessemestrado,comquemeudivido,
paraalmdequestessociolgicas,umaconcepodoque o trabalhointelectualemum
sentidoprofundoeaquemeudevoumdosmaioresexemplosdoqueasociologiaaindapode
fazer.
AoPablo,meuparceirointelectualepoltico,porquemeumantenhoumaadmirao
profundaeumaamizadeincondicional.
AoCarlos,omeualteregomaispotente,presente,naminhaconscinciasociolgica,a
cadalinhaqueeuescrevia,pelaamizadequeconstrumoseparteconstitutivademim.
AoCaio,porinfinitascoisas, notadamente, porseromeuamigomaispresente,mais
sensvel e mais engraado, pela correo de grande parte deste trabalho, pela companhia
cibernticanasmadrugadasdetrabalhoepelostombosquemepermitiupresenciarnasserrasda
IlhaGrande,aeleeudevoumadasminhasamizadesmaisfundamentais.
APatita,aquemeununcatereicomoagradecerportudoquefez,poressetrabalhoepor
mim.Eusinceramentenoseicomoteriaconseguidoterminarsenofosseasuapresena,asua
amizade, os seusconselhose asuaajuda, literalmenteat oltimosegundo.Nadaqueeu
6
-
dissesseseriasuficienteparaexpressaroqueeutedevo.
Ceclia,aoJorgeeManuela,pelaformacarinhosacomquemesemprereceberamna
suacasa.
AtodaaminhafamliadeMendes,omeulugarnomundo;eminhafamliadeCarlos
Barbosa,especialmenteAnglica,dequemeumorreisempredesaudade.vovinhaevov
Ernesta,porseremtofortes.sminhasprimas:Clara,Mariana,Renata,AnaeClarissa;es
minhastias:Luiza,TerezaePaula,atodaselaseuagradeoporteremtransformadonossoslaos
desangueemlaosdeafetoeamizade.tiaPaulaeuagradeo,tambm,peloexemplodoque
se dedicar pesquisa e pela fora, imprescindvel, para eu viessepara SoPaulo, fazer
sociologia;epequenaElla,pelosorrisoquemeacompanhou,aoladodamesa,emtodoomeu
tempodetrabalho.
Porfim,aoPaulinho,presenasemprediscretaeimportante,portodaapacinciacomos
meusrompantesdefimtese,eFabola,dequemasaudademedilacera,aosdoiseudigo:o
silnciotambmconstricoisas.Aomeupai,ogranderesponsvelporessetrabalho,aquemeu
devosimplesmentetudooquesoueoqueeupossoser.Eminhame,portodososinmeros
sacrifciosparatornaraminhaformaopossvel,portodoocarinhoeportodoapoioeuno
tenhodvidasqueessemestradomaisseudoquemeu.EaoRica,omeumelhoramigoeo
meucompanheiroaquemeudevotantascoisasqueseriaprecisomais400pginaspara
nomelasporfazer,comqueonossocotidianoseja,sempre,maisoumenoscomoouvirBillie
Holliday,tomandowhiskycomgelo,numanoitequente,comasrvoresdaUSPsnossascostas
eSoPauloanossosps.
7
-
Gatsbyacreditounaluzverde,noorgisticofuturoque,anoapsano,seafastavadens.Essefuturonosiludira,masnoimportava:amanhcorreremosmaisdepressa,estenderemosmaisosbraos...E,umabelamanh...E assim prosseguimos, botes contra a corrente, impelidosincessantementeparaopassado.
(FrancisScottFitzgerald,OgrandeGatsby)
8
-
Resumo
ApresentedissertaopartedoestudoempricodoLaboratrioNacionaldeLuzSncrotron(LNLS)para
analisaramudanadoregimepblico/disciplinardeproduoedifusodoconhecimentocientficono
Brasilnoperodoquevaidaaberturademocrticadosanos1980redefiniodapolticanacionalde
cinciaetecnologianos2000.Apesquisaarticuladoispontosdevista:aanlisedamudanajurdico
institucional, queenvolveospadresdeinstitucionalizao,legitimaosocial, organizaoformale
jurdicadacincianopas;eoestudodaalteraodasprticascientficasconcretas,queenvolvemos
padresderealizaodepesquisa,divulgaoderesultadoseformaodenovospesquisadores.Oestudo
emprico dividiuse, portanto, emduas partes: (1) primeiro, analisamos a forma como o LNLS
inicialmentecomoprojeto,depoiscomoinstituiodepesquisainseresenoprocessohistricode
institucionalizaodacincianoBrasil,considerandoamudanadospadresdenegociao,organizao
elegitimaosocialdasinstituiescientficasnacionais.Paratanto,realizamosentrevistascomdiretores
dolaboratrios,membrosdaburocraciacientfica (diretoresdeagnciadeinovao;coordenadoresde
agnciasdefomento,etc)eanalisamosocontedoeoprocessodeformulaoeaprovaodeleis,
portarias,resoluesedocumentosoficiaissobreacincia,atecnologiaesuacomercializao.(2)Ja
segundapartedoestudoempricoconcentrasenacaracterizaodoperfil,dasprticasdepesquisaedos
padresdeformaodospesquisadoresqueusamoLNLScomocentroexperimental.Oobjetivoera,
atravsdaanlisedoquestionrioaplicadocomospesquisadoresexternosdoLNLS,identificarquem
soeoquefazemessespesquisadoreseseecomoelestrabalhamemempresasprivadas,patenteiamseus
resultados de pesquisa e/ou estabelecem, a partir de instituies pblicas de pesquisa, contratos e
parceriascomempresas.
9
-
Abstract
ThepresentmasterdissertationhasasitspointofdeparturethestudyoftheLaboratrioNacionaldeLuz
Sncrotron (National Light Laboratory Sncrotron) to analyse the changes from the disciplinary
productionanddisseminationregimesofscientificknowledgeinBrazil,duringtheperiodcomprised
betweenthepoliticalopeninginthe1980suntiltheredefinitionofthenationalpolicyofscienceand
technologyintheyear2000,articulatingtwopointsofview:theanalysisofthelegalinstitutionalchange,
encompassing patterns of institutionalization, social legitimation, formal and legal organization of
scienceinthecountry;andthestudyreferredtoalterationsofconcretescientificpractices,encompassing
patternsofresearchaccomplishment,broadcastingoftheresultsandformationofnewresearchers.The
empiricalstudywasthusdividedintotwoparts:(1)initiallywestudiedthewayinwhichLNLSfirstas
a project, later as a research institution was inserted into the historic process concerning the
institutionalizationofscienceinBrazil,consideringthechangeofnegotiation,organisationandsocial
legitimation patterns amongnational scientific institutions. Therefore weundertook interviews with
laboratory directors, members of the scientific bureaucracy (directors of innovation agencies;
coordinatorsoffundingagencies,etc.)andanalysedthecontentaswellastheformulationandapproval
processesoflaws,resolutionsandofficialdocumentsonscience,technologyanditscommercialization.
(2) Thesecondpart of the empirical study focuses the characterisationof the profile, the research
practicesandtheformationpatternsofresearchersusingLNLSasanexperimentalcenter.Theobjective
wasto, throughtheanalysisofthequestionnaireansweredbytheexternalresearchersat theLNLS,
identifywhotheyareandwhatisdonebytheseresearchersalongwithifandhowtheyworkinprivate
companies, patent their research results and/or, departing frompublic research institutions, establish
contractsandpartnershipswithcompanies.
10
-
Resumen
LapresentemonografapartedelestudiorealizadoenelLaboratorioNacionaldeLuzSincrotn(LNLS)
paraanalizarloscambiosdelrgimenpblico/disciplinardeproduccinydifusindelconocimiento
cientficoenel Brasil, tomandoel perodoquevadesde laaperturapolticade losaos1980a la
redefinicin de la poltica nacional de ciencia y tecnologa en los 2000. Dos puntos de vista son
articulados: el anlisis de la transformacin jurdicoinstitucional, quecomprende los estndaresde
institucionalizacin,legitimacinsocial,organizacinformalyjurdicadelacienciaenelpas;y el
estudio de la alteracin de las prcticas cientficas concretas, que comprende los estndares de
realizacindelainvestigacin,ladivulgacindelosresultadosylaformacindenuevosinvestigadores.
Atalefecto,elestudioempricosedividiendospartes:(1)enprimerlugar,analizamoslaformacomo
el LNLSprimerocomoproyecto,despuscomoinstitucindeinvestigacinentraenelproceso
histricode institucionalizacinde lacienciaenelBrasil, considerandolas transformacionesde los
estndaresdenegociacin,organizacinylegitimacinsocialdelasinstitucionescientficasnacionales.
Coneseobjetivo,fueronentrevistadosdirectoresdelaboratorios,miembrosdelaburocraciacientfica
(directores de agencia de innovacin; coordinadores de agencias de fomento, etc.) y analizamos el
contenidoyelprocesodeformulacinyaprobacindeleyes,resolucionesydocumentosoficialessobre
laciencia,latecnologaysucomercializacin.(2)Ensegundolugar,elestudioempricoseconcentren
lacaracterizacindelperfil,delasprcticasdeinvestigacinydelosestndaresdeformacindelos
investigadoresqueusanelLNLScomocentroexperimental.Elobjetivofue,atravsdelanlisisdeun
cuestionariodirigidoalosinvestigadoresexternosalLNLS,identificarquinessonyquhacenesos
investigadores,sitrabajanycmolohacenenempresasprivadas,sisusresultadosdeinvestigacinson
patentadosy/oconstituyencontratosycolaboracionesconempresasapartirdeinstitucionespblicasde
investigacin.
11
-
LISTADETABELAS
CAPTULO2
Tabela2.1.Aexplosodopatenteamentonasuniversidadesnorteamericanas
Tabela2.2.OsprincipaismomentosdoprojetoDiretrizesEstratgicasdoMCT
Tabela2.3.OsseisgrandesobjetivosdaPolticaNacionaldeCincia,TecnologiaeInovaoat2012,segundooMinistriodeCinciaeTecnologia
Tabela2.4.AsdiretrizesestratgicasparaaCincia,aTecnologiaeaInovao(20022012)
Tabela 2.5. Detalhamento das aes para a construodo SistemaNacional de InovaosegundooProgramadeDiretrizesEstratgicasparaC,T&IdoMCT
Tabela2.6.Distribuiorelativadosgastosempresariaiseestataisemcinciaetecnologia(2003)
CAPTULO3
Tabela 3.1. Formao do Comit Executivo e do Comit Tcnico Cientfico do Projeto RadiaoSncrotron,ambosnomeadospeloCNPqem1983e1984
Tabela3.2.ComposiodoConselhoDiretordoLaboratrioem1987
Tabela3.3.EstruturadoConselhodeAdministraoABTLuS
Tabela3.4.ComposiodoConselhodeAdministraodaABTLuSem2008
Tabela3.5.OsprogramasqueorganizamasatividadescientficaseadministrativasdoLNLS
Tabela3.6.OsseisgrandesobjetivosdaPolticaNacionaldeCincia,TecnologiaeInovaoat2012,segundooMinistriodeCinciaeTecnologia
Tabela3.7.AsdiretrizesestratgicasparaaCincia,aTecnologiaeaInovao
Tabela3.8.DetalhamentodasaesparaaconstruodoSistemaNacionaldeInovaosegundooProgramadeDiretrizesEstratgicasparaC,T&IdoMCT
12
-
Tabela3.9.OsdezmaioresdepositantesdepatentesdoINPIcomprioridadebrasileira(1999a2003)
Tabela3.10.AestruturadooramentodoLNLS(2001a2007)
Tabela3.11:ContratosindustriaisdoLNLS(2002a2007)
Tabela3.12.Investimentossugeridoserealizadosemnanocinciaenanotecnologia
Tabela3.13.Valoressolicitados,previstoseefetivamenterepassadosparaoLNLS(2006a2009)
Tabela3.14:ComposiodooramentodoLNLSedespesas(2001a2007)
Tabela3.15.ContingenciamentodosrecursosdoprogramadenanotecnologiadoLNLS
CAPTULO4
Tabela4.1.DistribuioRelativadasPrincipaisInstituiesqueutilizamaFontedeLuzSncrotronemrelaoaoseutotaldeprojetosanuais,entre20012007
Tabela4.2.Taxadecrescimentodapsgraduaoporregiobrasileira,entre19962004
Tabela 4.3. Distribuio das trinta maiores instituies usurias do laboratrio pelo nmero depesquisadorescadastradoscomousuriosdoLNLS,entre19972008
Tabela4.4.DistribuiodasempresasprivadasqueutilizaramoLNLScomousuriasdiretasdeacordocomonmerodeusurioscadastrados,entre19972004
Tabela4.5.DistribuioRelativadospesquisadorescadastradosnoLNLSporInstituiodeorigememrelao ao universo da amostra (211 pesquisadores) e em relao ao universo total ( 2480pesquisadores)
Tabela4.6.Distribuiodospesquisadoresdaamostradeacordocomocruzamentoentresuasreasdeformaonagraduaoenodoutorado
Tabela 4.7 Distribuiodos pesquisadores do LNLSde acordo comas instituies a que estovinculados
Tabela4.8.DistribuiodospesquisadoresdoLNLSporEstadoeregiodopas
Tabela4.9.DistribuiodospesquisadoresdoLNLSsegundoanacionalidade
Tabela4.10.Distribuiodospesquisadoresbrasileirosenobrasileirosdaamostraporgnero
Tabela4.11.DistribuiodaspesquisadorasmulheresporreanoLNLSenosGruposdoCNPq
13
-
Tabela4.12.Distribuiodospesquisadoresporgnero,readeformaoenveldeformao
Tabela4.13.Distribuiodospesquisadoresdaamostraportempodeformaoedcadadeconclusodagraduao
Tabela4.14.Distribuiodospesquisadoresqueconcluramodoutoradodeacordocomadcadadeconclusododoutorado
Tabela4.15.Distribuiodospesquisadoresdaamostradeacordocomotipodeinstituiodeorigemearealizaoounodeiniciaocientfica
Tabela4.16.Distribuiodospesquisadoresdaamostraporreadeformaoearealizaoounodeiniciaocientfica
Tabela4.17.DistribuiodospesquisadoresquefizeramICemcadadcadadeconclusodagraduao
Tabela4.18.Distribuiodospesquisadoresquerealizarampsdoutoradopordcadaderealizao
Tabela4.19.Distribuiodospesquisadoresepesquisadorasdaamostraportempodeformao
Tabela4.20.Distribuiodospesquisadoresepesquisadorasdaamostraquefizeramdoutoradodireto
Tabela4.21.Distribuiodospesquisadoresepesquisadorasdaamostraquefizeraminiciaocientfica
Tabela4.22.Distribuiodospesquisadoresepesquisadorasdaamostraqueconcluramopsdoutorado
Tabela4.23.DistribuioRelativadospesquisadoresdeacordocomlocalderealizaodemestrado,doutoradoepsdoutorado
Tabela4.24.Distribuiodospesquisadoresdaamostraquerealizaramodoutoradodeacordocomadcadadeconclusodocursoelocalderealizao
Tabela4.25.Distribuiodospesquisadoresdaamostrapordcadaderealizaodopsdoutoradoelocal,emrelaoaototaldepsdoutoradosconcludospordcadanoBrasil
Tabela4.26.Distribuiodospesquisadorespordcadadeconclusodagraduaoequantorealizaoounodapsgraduaonoexterior
Tabela4.27.DistribuiodospesquisadoresdoLNLSporpasemquerealizaramomestrado
Tabela4.28.DistribuiodospesquisadoresdoLNLSporpasemquerealizaramodoutorado
14
-
Tabela 4.29. Distribuio dos pesquisadores do LNLS por pas em que realizaram o doutoradosanduche
Tabela4.30.DistribuiodospesquisadoresdoLNLSporpasemquerealizaramopsdoutorado
Tabela4.31.Distribuiodospesquisadoresporgneroedeacordocomarealizaoounodepartedapsgraduaoeminstituiesestrangeiras
Tabela4.32DistribuiodospesquisadoresdoLNLSporregiesbrasileirasepornveldeformaorealizado
Tabela4.33Distribuiodospesquisadoresdaamostradeacordocomocarterdainstituioepornveldeformao
Tabela4.34:DistribuiodospesquisadoresexternosdoLNLSquenotrabalharamemempresasoulaboratriosprivados,porrazoapresentada
Tabela4.35.Distribuiodospesquisadoressegundoarespostadadapergunta:Nasuaatualpesquisa, existepossibilidadedeaplicaocomercialoutecnolgica?
Tabela4.36:Distribuiodospesquisadorespelarespostadadaperguntasobreopotencialcomercialoutecnolgicodaspesquisasquerealizam,deacordocomotipodeatividadequerealizam
Tabela4.37:Distribuiodospesquisadoresdaamostrapelarespostadadaperguntasobreopotencialcomercialetecnolgicodaspesquisas,deacordocomasuatitulao
Tabela4.38:Distribuiodospesquisadoresdaamostrapelarespostadadaperguntasobreopotencialcomercialdaspesquisas,deacordocomotipodeinstituioaqueestovinculados
Tabela4.39:Distribuiodospesquisadoresdaamostraporreadeaplicaodassuaspesquisas
Tabela4.40.DistribuiodospesquisadoressegundoarespostadadaperguntaNessapesquisaounoseugrupodepesquisaexistealgumtipodecontrato,convnioouparceriacomempresa?
Tabela4.41:Distribuiodospesquisadoresquemantmounocontratocomempresasegundoocarterdainstituioemqueatua
Tabela4.42.Distribuiodospesquisadoresquemantmcontratocomempresasemrelaoaototaldepesquisadoresporregiobrasileira
Tabela4.43.Distribuiodospesquisadoresquemantmounocontratosouparceriascomempresasemrelaorespostadadasobreapossibilidadedeaplicaocomercialdaspesquisas
15
-
Tabela4.44.Distribuiodospesquisadoresquemantmcontratoscomempresasdentrodecadaumadasreasdeaplicaodesuaspesquisasatuais
Tabela4.45.DistribuiodasempresascomasquaisospesquisadoresdoLNLSestabelecemcontratosdeacordocomonmerodemenesdospesquisadores
Tabela4.46.Distribuiodospesquisadoressegundoarespostadadapergunta:Existealgumcontrato deconfidencialidadee/ouclusulasdepatenteamentodosresultadosdepesquisa?
Tabela4.47.Distribuiodospesquisadoresdeacordocomareadeaplicaodesuaspesquisasatuais,segundoarespostadapergunta:Nessecontratoexistealgumcontratodeconfidencialidadee/ou clusulasdepatenteamentodosresultadosdepesquisa?
Tabela4.48.Listadasempresasqueexigiramclusuladeconfidencialidadenoscontratosuniversidade/empresadanossaamostra
Tabela4.49.distribuiodospesquisadoresquenotmcontratocomempresassegundoajustificativaapresentada
Tabela4.50.DistribuiodospesquisadoressegundoograudeconcordnciaemrelaoafirmaoAsempresasbrasileirasestomuitointeressadasnacinciauniversitria
Tabela 4.51. Distribuiodos pesquisadores segundoa resposta dada pergunta: Noseugrupode pesquisa,existealgumapatenteconcedidaoualgumpedidodepatenteemandamento?
Tabela4.52. Distribuiodos pesquisadores cujosgrupos tmpatentes solicitadas e licenciadas deacordocomaregiobrasileiraemqueatuam
Tabela4.53.Distribuiopercentualdospesquisadoresquepertencemagruposcompatentessolicitadaselicenciadasdentrodecadareadeaplicaodosresultados
Tabela4.54.DistribuiodospesquisadoresdeacordocomarespostaaperguntaAspatentessoumbommecanismodetransfernciadetecnologia?
Tabela4.55.DistribuiodospesquisadoresdeacordocomarespostaaperguntaAspatentessoumbomindicadordedesempenhoacadmico?
Tabela4.56.DistribuiodospesquisadoresdeacordocomoposicionamentoemrelaoafirmaoOpatenteamentodepesquisacontrrioaoespritocientficoporqueprivatizaoconhecimento
Tabela4.57.DistribuiodospesquisadoresdeacordocomoposicionamentoemrelaoafirmaoOpatenteamentodepesquisadeveserincentivadopeloEstado
16
-
LISTADEGRFICOS
CAPTULO2
Grfico2.1.DistribuiodosgastosbrasileirosemP&Dporsetor(governamentaleempresarial)
Grfico2.2.DistribuiodosgastosbrasileirosemP&Dporsetor(estatalenoestatal)
Grfico2.3.Distribuiodasempresasquedesenvolveramatividadeinovadoraemrelaoaototalentre1998e2000eentre2001e2003
Grfico2.4.Caracterizaodasatividadesinovativasdasempresasbrasileiras
Grfico2.5.Distribuiodasempresasqueimplementaramenoimplementaraminovaes
Grfico2.6.Grauderadicalidadedasinovaesemprodutode2001a2003
Grfico2.7.PedidosdepatentesdeprivilgiodeinvenodepositadosnoINPIsegundoorigemdodepositante(19902004)
Grfico2.8.Depsitosdepatentesnosescritriosnacionaisem2004,segundoaOMPI
Grfico2.9.DistribuiodospesquisadorescompsgraduaotrabalhandocomP&Demtempointegralporsetor(2000a2004)
CAPTULO3
Grfico3.1.EvoluododepsitodepatentesdaUNICAMP(19892007)
Grfico3.1.EvoluodoscontratosindustriaisdoLNLS(2001a2007)
Grfico3.2.ComposiodooramentodoLNLS(2001a2007)
Grfico3.3.EvoluodonmerodedepsitosanualdepatentesemnanotecnologianoEPO(19842002)
Grfico3.4.ParticipaodospasesnosdepsitosdepatentesnoEPO(19782005)
Grfico3.5.DistribuioproporcionaldosdepsitosdepatentesemnanotecnologiadoEPOemrelaoaototal(20002002)
17
-
Grfico3.6.Evoluodosgastosfederaisemnanotecnologia
Grfico3.7.ComposiodooramentodoLNLS(2001a2007)
Grfico3.8.ReceitasedespesasdoLNLSde2003a2007
Grfico3.9.RepassesaoprogramadenanotecnologiadoLNLS(1999a2007)
CAPTULO4
Grfico4.1DistribuioRelativadasInstituies(oprprioLNLS,asseis maioresinstituies,outrasinstituiesbrasileiraseoutrasinstituiesestrangeiras)queutilizamaFontedeLuzSncrotonemrelaoaoseutotaldeprojetosanuais,em2001e2007
Grfico4.2DistribuioRelativadasInstituies(doEstadodeSoPaulo,deoutrosEstadosedeoutrospases)queutilizamaFontedeLuzSncrotonemrelaoaseutotaldeprojetosanuais,entre19972007
Grfico4.3DistribuioRelativadosProjetosdoFontedeLuzSncrotondeacordocomsuaorigem(latinoamericanos,europeusenorteamericanos),em2006e2007
Grfico4.4Distribuiodosquestionriosrecebidospordiadeaplicao,de18demaroa30deabrilde2008
Grfico4.5.DistribuiodosLaboratriosdoLNLSdeacordocomautilizaodosusurios
Grfico4.6.DistribuiodosPesquisadoresdaAmostraporperododeutilizaodoLNLS
Grfico4.7.DistribuiodaspesquisasrealizadasnoLNLSdeacordocomseuvnculocomasreasdenanocinciae/ounanotecnologia
Grfico 4.8. Distribuio dos pesquisadores de acordo com a rea de suas pesquisas no LNLS(nanocincia,nanotecnologiaouambas),segundoautoclassificao
Grfico4.9.DistribuioRelativadospesquisadoresdoLNLSdeacordocomocursodegraduaodeorigem
Grfico4.10.DistribuiodoscursosdeorigemdospesquisadoresdaamostraquantoarealizaodepesquisasnoLNLSnareadenanotecnologia
Grfico 4.11. Distribuio dos pesquisadores da amostra de acordo com o tipo de atividade queexerciam(graduao,mestrado,doutorado,psdoutorado,docncia,pesquisacontratada)nomomento
18
-
emqueresponderamoquestionrio
Grfico4.12.Distribuiodospesquisadoresdaamostradeacordocomatitulaomximaalcanadaatomomentodaentrevista
Grfico4.13.DistribuioRelativadospesquisadoresdaamostradeacordocomotipodeinstituio(universidadefederal, universidadeestadual,universidadeprivada,universidadeestrangeira,empresaprivadaelaboratriopblico)aoqualestavamvinculadosnomomentodaentrevista
Grfico4.14.Distribuiodospesquisadoresbrasileirosdaamostraporidade
Grfico4.15.Distribuiodospesquisadoresporidade,emquartis
Grfico4.16.Distribuiodospesquisadoresbrasileirosenobrasileirosdaamostraentreaquelesqueestoemformaoeosprofissionalizados
Grfico4.17.Distribuiodospesquisadoresdolaboratrioporreadeformaoegnero
Grfico4.18.Distribuiodaspesquisadorasporrea(fsica,qumicaecinciasbiolgicas)deacordocomnveldeformao
Grfico4.19.Distribuiodaspesquisadorasdareadeengenhariadeacordocomonveldeformao
Grfico4.20.Distribuiodospesquisadoresdaamostraportempodeformao
Grfico4.21.DistribuiodototaldebolsasnoexteriordoCNPqporano(19802007)
Grfico4.22.Distribuiodospesquisadoresqueestudarameminstituiesdaregiosudeste edeoutrasregiesdagraduaoaopsdoutorado
Grfico4.23.DistribuiodospesquisadoresqueestudarameminstituiesdoEstadodeSoPauloedeoutrosEstadosdagraduaoaopsdoutorado
Grfico4.24.Distribuiodospesquisadoresdaamostradeacordocomocarterdasinstituiesemquerealizaramsuaformao(dagraduaoaopsdoutorado)
Grfico 4.25. Distribuio dos pesquisadores da amostra de acordo como carter das instituies(estaduaispaulistaseoutras)emquerealizaramsuaformao(dagraduaoaopsdoutorado)
Grfico4.26.Distribuiodospesquisadoresqueestiveramforadopasnapsgraduaosegundoocarterdainstituiodeorigem(emquerealizouagraduao)
Grfico4.27. Distribuiodospesquisadoresqueestiveramforadopasnapsgraduaodeacordocomainstituiodeorigem(emquerealizouagraduao)
19
-
Grfico4.28.Distribuiodospesquisadoresdaamostraquetrabalhamnosetorprivadosegundootipodefunoexercida
Grfico4.29.Distribuiodospesquisadoresque trabalharamounoemempresasprivadasequediscordamdaafirmao:Aexperinciacientficanopreparaparaomercadodetrabalho
Grfico4.30.Distribuiodospesquisadoresdaamostraqueestabelecemcontratoscomempresasdeacordocomasuaformaobsica(readocursodegraduao)
Grfico4.31.Distribuiodospesquisadoresquemantmcontratoscomclusulasdeconfidencialidadeepatenteamentoemrelaoao total depesquisadoresdeacordocomo tipode instituioaqualencontramsevinculados(universidadesfederais,estaduaiseinstitutosdepesquisa)
Grfico4.32.DistribuiodaspatentesdepositadasporuniversidadesbrasileirasnoINPIde 1990a2004
Grfico4.33.Distribuiodospesquisadoressegundoaquantidadedepatentessolicitadaspeloseugrupodepesquisa
Grfico4.34.Distribuiodospesquisadoressegundoaquantidadedepatenteslicenciadaspeloseugrupodepesquisa
Grfico4.35. Quantidadedepatentessolicitadase licenciadasnosgruposdepesquisaaqueestoligadososusuriosdoLNLS
Grfico 4.36. Distribuiodos pesquisadores cujos grupos de pesquisa tempatentes solicitadas elicenciadasporcarterdainstituioatual
Grfico4.37.Distribuiodospesquisadorescujosgruposdepesquisapossuempatentessolicitadase/oulicenciadas,deacordocomosdepartamentosaqueestovinculados
20
-
SUMRIO
INTRODUO...............................................................................................................................................24
CAPTULO1:Atransformaodoregimedisciplinar/estatalbrasileirocomoproblemasociolgico:acinciacomoinstituio,comoprticaecomoideologia...............................................................................30
1.1.Oquesignifica,atualmente,estudarcriticamenteoprocessodetransformaodacinciadaperspectivasociolgica?.....................................................................................................................................................32
1.1.1. Acincia como instituioe comoprtica social: os regimes de produoe difusodoconhecimentocientficoesuatransformao....................................................................................46
1.1.2.Acinciacomoobliteraodapoltica:aproduodamudananoregimedisciplinar/estataldeproduodoconhecimento..........................................................................................................50
1.2.InstitucionalizaodacinciaeprticascientficasnoBrasil..................................................................59
1.2.1. Amudanadoregimedisciplinar/estatal deproduoedifusodoconhecimentovistaapartirdoestudodoLaboratrioNacionaldeLuzSncrotron............................................................59
1.2.2.OLaboratrioNacionaldeLuzSncrotroncomoobjetoprivilegiadodepesquisa..................61
CAPTULO2:Anovapolticabrasileiradecinciaetecnologia:dapromoodoconhecimentocientficoaoincentivoinovaotecnolgica................................................................................................................66
2.1.Omodelodapolticabrasileira:aspolticasdeinovaonospasescentrais..........................................68
2.1.1.Aspolticascientficasnointervencionistas:suacriseeseusignificado...........................68
2.1.2. Aemergncia da inovaocomofocoda aodo Estadona promooda cincia e datecnologia..........................................................................................................................................77
2.1.3.Acinciacomoatividadeeconmica:agestoeficientedainovao....................................80
2.1.4.AgestodainovaoeaconstruodosSistemasNacionaisdeInovao.............................88
2.1.5. O novo papel das universidades e laboratrios pblicos de pesquisa: comercializao epatenteamentoderesultadosdepesquisa........................................................................................................93
2.2.AemergnciadainovaocomofocodepolticadeC&TnoBrasil......................................................98
2.2.1. A Nova Poltica Nacional de Cincia, Tecnologia e Inovao a inovaono GovernoFernandoHenriqueCardoso..............................................................................................................98
21
-
2.2.3.ALeideInovaoeaPoltica,Industrial,TecnolgicaedeComrcioExteriorainovaonoGovernoLula...............................................................................................................................106
2.3.OBrasilcomoconsumidordetecnologia:algumascaractersticasdainovaonopas........................114
2.3.1.Osgastosnacionaisemcinciaetecnologia..........................................................................115
2.3.2.Ainovaonasempresasbrasileiras......................................................................................119
2.3.3.Inovaoepropriedadeintelectual:aspectosdadinmicadepatenteamentonoBrasil........125
2.4.Concluso...............................................................................................................................................132
CAPTULO3:OLaboratrioNacionaldeLuzSncrotroneospadresdeinstitucionalizaoelegitimaodacinciabrasileira.......................................................................................................................................135
3.1.OprojetodeconstruodeumaFontedeLuzSncrotronnocontextodeinstitucionalizaodacincianoBrasil.........................................................................................................................................................136
3.1.1.Padresdedesenvolvimentodacinciabrasileiraatadcadade1980.................................136
3.1.2.AnegociaodoprojetoSncrotronnosanos1980:rupturaoucontinuismo?......................160
3.2.Deprojetoinstituio:olaboratrioNacionaldeLuzSncrotronemoperao..................................180
3.2.1.Cinciapblicacomeficinciadegestoprivada:aABTLuS..............................................182
3.2.2.Umanovalgicadeinserodocientistanasociedade?AinteraodoLNLScomosetorindustrial.........................................................................................................................................204
3.2.3. O LNLS e a cincia estratgica para o desenvolvimento: pesquisas emnanotecnologia..................................................................................................................................239
3.2.4.Estratgiastortas?AcrisedoLNLS.....................................................................................253
3.3.Concluso...............................................................................................................................................259
CAPTULO4:OLaboratrioNacionaldeLuzSncrotroneospadresdedesenvolvimentodaatividadecientficanoBrasil.........................................................................................................................................262
4.1.ConcentraoedesconcentraonousodoLNLSeasuaconsolidaocomolaboratrioaberto:umaanliseapartirdosusuriosdaFontedeLuzSncrotron..............................................................................266
4.2.CinciaetecnologianoBrasil:osusuriosdoLaboratrioNacionaldeLuzSncrotronoquestionrioaplicadocomospesquisadoresdoLNLS......................................................................................................277
22
-
4.3.QuemsoeoquefazemospesquisadoresexternosdoLNLS...............................................................289
4.3.1.OspadresdeusodoLNLS...................................................................................................289
4.3.2.AsreasdeconcentraodaspesquisasdoLNLS.................................................................293
4.3.3.OndeestoeoquefazemospesquisadoresexternosdoLNLS............................................299
4.3.4.AnacionalidadedosusuriosnacionaisdoLNLS.............................................................304
4.3.5.Adistribuiodospesquisadoresporfaixaetria..................................................................307
4.3.6.Adistribuiodospesquisadoresporgnero..........................................................................311
4.4.AformaodecientistasnoBrasil:ocasodospesquisadoresdoLNLS................................................318
4.4.1. Acelerao e antecipao do processo de formao de pesquisadores no Brasil: ospesquisadoresexternosdoLNLS....................................................................................................321
4.4.2.Ainternacionalizaodaformaodepesquisadoresbrasileiros:ocasodospesquisadoresdoLNLS...............................................................................................................................................330
4.4.3.Ospesquisadoresbrasileirosentreamargemeocentro:oprocessodeformaodosusuriosexternosdoLNLSosusuriosexternos.........................................................................................340
4.5.Acomercializaoderesultadosdepesquisanoregimedisciplinar/estatalbrasileiro:umaanlisedasprticaseavaliaesdosusuriosexternosdoLNLS....................................................................................352
4.5.1.AexperinciaprofissionaldospesquisadoresdoLNLSnosetorprivado...........................358
4.5.2. O potencial potencial de aplicao comercial e tecnolgica das pesquisas: a viso dospesquisadoresdoLNLS..................................................................................................................369
4.5.3.Arelaouniversidade/empresa..........................................................................................377
4.5.4. Opatenteamentodosresultadosdepesquisa:prticaseavaliaesdospesquisadoresdoLNLS...............................................................................................................................................407
CONCLUSO..............................................................................................................................................426
REFERNCIAS............................................................................................................................................434
ANEXO.........................................................................................................................................................467
23
-
INTRODUO
Urge,pois, parabementendermosnossaproblemtica,queestudemosaeconomiadessanovaindstriaemqueseconverteu,nosltimosdecnios,otrabalhotcnicocientfico.Masseriatrgicoquenosdeixssemoslevarporiluses,comoessasqueestoganhandoforodecidade no Brasil contemporneo, pretendendo que temos condio de fundar nossaindependncia tecnolgica (...) O primeiro atributo do nosso modelo o fato decorresponderaumaformaoperifrica,subdesenvolvida,gravitandoemtornodareamaisdesenvolvidanomundo.Essaformaosedesenvolvepelaabsorodaculturadevanguardadomundo,eaimportaodetecnologiaocernedesseprocesso.Queesseestadodecoisasnoestejafadadoaeternizarse,provaoofatodeestarmosreduzindoadistnciaquenosseparadavanguarda,masseriapuratolicefazerdecontaquenosomosmaisperifricosedependentes. Ao contrrio, o que importa que aprendamos a conhecer bem aspeculiaridades,tantodanossaperifericidadequantodanossadependncia.(RANGEL,1982,p.100)
Opontodepartidadapresentepesquisafoiapercepodeincio,umtantoquanto
abstrata dequea sociologiabrasileiradeveria,urgentemente,voltarseparaa anlisedos
processossociaisquevmalterando,desdeosanos1970,arelaoentrecincia,economiae
Estadocomfocosobreorecrudescimentodosistemanacionaleinternacionaldepropriedade
intelectual.
OprojetodemestradoapresentadoaoprogramadePsGraduaodoDepartamentode
SociologiadaUSPeintituladoCapitalismo,Tecnologiaepropriedadeintelectual:aspesquisas
emnanotecnologiadoLaboratrioNacionaldeLuzSncrotronpartia,assim,deumconjuntode
anlises1 que chamava a ateno para a estreita relao existente entre o processo de
recrudescimentodossistemaslegaisdepropriedadeintelectualeastransformaesestruturais
por que vem passando o sistema capitalista de produo, em especial, nas formas de
organizao,mensuraoecontroledotrabalhoditointelectual.
Partindodessasanlises,ahipteseinicialdestapesquisaeraqueaatividadecientfica
1 Tais como, por exemplo: Bensad, 2004; Bolao, 2000e2002; Boltanski; Chiappelo, 1999; Boyle, 2003;Castells,1999;Dantas,1996,1999,2000e2003;Gorz,2003;Habermas,1987;Husson,2003e2004;Lazzarato,1995;Lazzarato;Negri, 2001;MoulierBoutang,2005e2002;Negri; Hardt, 2002;Offe,1989,1991e1995;Perelman,2003;Prado,2005;Rabinow,1991e1993;Rullani,2000;Santos,1998,2003.
24
-
estariaexperimentandoumamploprocessodemercantilizaoapartirdoqualosprodutosda
cinciasejasobaformaderesultadoscientficos,sejaenquantoaplicaestecnocientficas
tornavamsemercadoria,aomesmotempoemquea atividade cientficatransformavaseem
trabalhoassalariadoprodutordevalor.Nesseduploprocessodemercantilizaodacincia,a
propriedade intelectual especialmente as patentes cientficas parecia assumir um lugar
central.
Para estudar essa hiptese, a presente pesquisa propunha realizar uma investigao
empricaquetivessecomoeixooacompanhamentosistemticode processosdepesquisa em
novasreasdoconhecimentotaiscomoasassimchamadasnanocinciae/ounanotecnologia
equeresultassemempropriedadeintelectualsobaformadepatenteamentodepesquisa.Essas
pesquisaseramtratadas,tericaeempiricamente,comoprocessosdetrabalho oquepermitia
consideraraspatentesquedelasresultassemcomoprodutosdesseprocessotrabalho,ouseja,
comomercadoria.
Emtermosgerais,oobjetivodapresentepesquisapermaneceomesmo,isso,ajudara
compreenderasrelaesexistenteentreacinciaeocapitalismocomespecialatenoparaas
transformaesqueessasrelaesimplicamtantoparaofuncionamentodacinciaquantoparaa
estruturaeadinmicadaeconomiacapitalista,sobretudo,comofoidito,noqueconcerne
organizao,mensuraoecontroledochamadotrabalhocomplexo.
Noentanto,apesardaperguntainicialdestapesquisaser,justamente, comoacincia
brasileira se mercantiliza?, terminadoo processode investigao, anlise e exposiodos
resultados,nopossvelclassificarestapesquisacomoumestudodecasodamercantilizao
dacinciaedotrabalhocientficonoBrasil.Eissonoporque,aoobservarasmudanasque
vmafetandoosdiferentes regimesdeproduodeconhecimentocientfico,noestejamos
diantedeumprocessodemercantilizaoedesubsunodotrabalho,masporqueaescolhade
realizarumestudodecasonosentidodeusarumobjetoempricoparaprovarumahiptese,
ilustrando,assim,umateoria implicavaduasimportanteslimitaes.Emprimeirolugar,a
simples ilustraodoprocessodemercantilizaodacincianoBrasiltornariapraticamente
25
-
impossvelodilogoe,conseqentemente,acrticadosproblemaspostospelaamplamaioriada
literaturacontempornea,sobretudoaquela ligada economiae polticada inovao.Em
segundolugar,eprincipalmente,poistodoprocessodemercantilizao,porseressencialmente
histrico,marcadoporespecificidadesquesotooumaisimportantesdoqueoseuresultado
final,sobretudoemumcontextoemqueapossibilidadedealterarasbasesestruturaisdosistema
social parece to distante, que as oportunidades de atuao poltica radical limitamse
exploraodosespaosecontradiesabertosporessasmesmasespecificidades.Issoimplica
dizer que to importante quanto constatar a cincia est passando por um processo de
mercantilizaonoBrasilentenderComoesseprocessoproduzido?Quaisforassociaiso
engendram?Quaiscontradiesoperpassam?Emsuma,quaissentidoseleassumeporessas
paragens?
Opresentetrabalhobuscar,assim,reconstruiralgunsaspectosdorecenteprocessode
transformaodacinciaedaprticacientficanoBrasil,tentandoentender,apartirdaanlise
doseuvnculocomomundopolticoesocialmaisgeral,asuaproduoeoseusignificado.
Esseprocessodetransformao analisado,nestadissertao,apartirdeduasperspectivas
indissociveis: amudanajurdicoinstitucionaldacinciaeaformacomoessamudanase
refleteounonasprticasconcretasdospesquisadoresbrasileirosatuandoemreasdeponta
taiscomoaspesquisasemnanoeembiotecnologia.
Considerandoessaduplaperspectivaacinciacomoinstituioecomoprtica,as
mudanasqueatingemacinciabrasileirasocontempladasapartirdetrsmovimentosde
aproximao que correspondem, por sua vez, a trs momentos da pesquisa emprica.
Primeiro,atransformaodacinciabrasileiravistaapartirdodiscurso'oficial'dogoverno,
talcomoexpressonaNovaPolticaNacionaldeCincia,TecnologiaeInovao,de2002,na
PolticaIndustrial,TecnolgicaeComrcioExterior,de2004e,porfim,nachamadaLeide
Inovao,aprovadanessemesmoano.Emumsegundomomento,essamesmatransformao
analisadanombitodoesforodeinstitucionalizaodacinciabrasileiraentendase,dos
processosdenegociao,gestoelegitimaoquegarantemgrausmnimosdeautonomiae
26
-
estabilidadesinstituiescientficasbrasileiras.Porfim,atransformaodacinciavistada
perspectivadasprticascientficasdospesquisadoresematividadeemumlaboratriodeponta
noBrasil.
Oproblemageraldapresentepesquisaentender,portanto,aproduododiscursoda
inovaotalcomoaparecenogovernoFernandoHenriqueCardosoenogovernoLulada
perspectiva dos processos de institucionalizao da cincia brasileira, ou seja, como uma
estratgia de (auto)legitimao articulada por alguns setores da comunidade cientfica
nacionalligadogestodacincianacional.Essaestratgia,comoveremos,essencialmente
ambgua na medida em que implica uma transformao cujo objetivo radicalmente
conservador:acinciabrasileiramudaparapermanecercomosempreesteveorganizadaem
instituiesatreladasaoaparelhodeEstadoeadministradasapartirdeumaestruturaburocrtica
altamentefechadaeavessaaprocessosdedemocratizaointerna.
Masaambigidadedaatualtransformaodacinciabrasileiraassumeumsentidoainda
maisprofundoquandoolhamosnosparaaorganizaoinstitucionaldacinciamas,tambm,
para as prticas cientficas. Nesse sentido, se, por um lado, essa transformao implica a
preservaodaatualestruturadepoderdasuniversidadese institutosestataisdepesquisa
mesmodaquelesadministradosdiretamenteporumaassociaodachamadasociedadecivil
poroutro,elaresulta,tambm,napreservaodaprpriacinciacomoatividaderelativamente
autnoma,protegidadeprocessosmaisradicaisdemercantilizao.Aneutralizaodoprocesso
de subsuno da cincia a uma lgica puramente econmica ou poltica dada por sua
institucionalizaoenquantoregimecientfico/disciplinarpossibilita tantoqueacinciase
mantenhacomoumaesferasocialdiferenciada,naqualacertificaodosseusenunciadosas
hipteseseinterpretaescientficaspermaneceatreladaaumalgicainterna,quantoqueo
trabalhocientficocontinuesendoorganizadoecontroladoapartirdosmecanismosinternosao
regimecientfico/disciplinar. Tantoocarterdissimuladodasmudanasemcursonopas
quantooseuefeitodopontodevistadapreservaodacinciapodemsermelhorpercebidos,
justamente,apartirdaanlisedasprticascientficasconcretasdaquelesquetrabalhamcom
27
-
cinciaeminstituiespblicas/estataisnopas,oqueexplicaanossanfasenoestudodos
pesquisadoresdoLNLSdessaperspectiva.
Seguindoessasindicaes,apresentedissertaoestorganizadadaseguinteforma:
Oprimeirocaptulo Atransformaodoregimedisciplinar/estatalbrasileirocomo
problemasociolgico:acinciacomoinstituio,comoprticaecomoideologiaapresentaa
construodoproblemadapesquisatendoemvistaodebatesociolgicosobreatransformao
dacinciaeasespecificidadesdocasobrasileiro.Emoutraspalavras:procuramosmostrarcomo
aescolhaporolharparaacinciaconsiderandooseumarco institucional ouseja, oseu
processodeinstitucionalizaoeasprticassociaisconcretasdosquetrabalhamcompesquisa
cientficasefundamentatantonodebatesociolgicocontemporneoquantonasespecificidades
donossoprprioobjeto,oLaboratrioNacionaldeLuzSncrotron.
O segundocaptulo Anovapolticabrasileiradecinciaetecnologia:dapromoodo
conhecimentocientficoaoincentivoinovaotecnolgicaexpe,emlinhasgerais,omodeloeo
contedodanovapolticanacionaldecinciaetecnologiaqueincorporouainovaocomo
elemento central. O intuito apresentar o discurso oficial da inovao considerando o
contextoemqueeleseaplica,ouseja,oBrasilcomoumapasqueseconfigurabasicamente
comoconsumidordetecnologia.Soosdadoseinformaesapresentadosnessecaptuloque
permitem formular a primeirahiptese da presente pesquisa, qual seja, que o discursoda
inovao segundo o qual a cincia desempenharia umpapel crtico no desenvolvimento
econmiconacionaletodososrearranjosjurdicoinstitucionaisaelecorrespondentesforam
formuladose implementados,ao menos emumprimeiro momento, por setores da prpria
comunidadecientficanacionalsendomelhorentendidos,portanto,comopartedoesforode
institucionalizaodacincianopas.
O terceirocaptulo OLaboratrioNacional deLuz Sncrotrone os padres de
institucionalizao e legitimao da cincia brasileira corresponde justamente ao
desenvolvimentodessaprimeirahiptese.Elemostraoesfororealizadoporpartedocorpode
idealizadoresediretoresdoLNLSparalegitimloperanteoEstadoeperanteasociedade,
28
-
viabilizandooinstitucionalmentedentrodecondiesderelativaautonomiaeestabilidadede
financiamento.OcaptulodescrevecomooesforodeinstitucionalizaodoLNLSumdos
maioresprojetoscientficosbrasileirosdopontodevistadeinvestimentoecomplexidadetcnica
repeeatualizapadrestradicionaisdeinstitucionalizaodacincianoBrasil.Ointuito
mostrarcomooesforodeinstitucionalizaoelegitimaodoLNLSspodesercompreendido
luzdoprocessodeinstitucionalizaodacinciabrasileiraequearecprocaigualmente
verdadeira,oprocessodeinstitucionalizaodacinciabrasileirasobretudoapartirdofimda
ditaduramilitar muitomelhorcompreendidoquandoolhamosparaocasoespecficodo
LNLScomoprojetoestratgico.Odesenvolvimentodocaptulopermiteformulardeformamais
claraa segundahiptesecentraldopresente trabalho,qual seja,queas recentesmudanas
jurdicoinstitucionaisqueafetaramacinciabrasileiravisamconservartantoaatualestrutura
institucionaldacincianopasquantoassuasprticascientficasmaisimportantes.
Assim,oquartoeltimocaptulo OLaboratrioNacionaldeLuzSncrotroneos
padresdedesenvolvimentodaatividadecientficanoBrasil apresentaosresultadosdeum
estudoempricorealizadocomospesquisadoresexternosdoLNLSouseja,aquelesqueo
utilizamcomocentroexperimentalenfatizandoseuprocessodeformaoesuasprticasde
pesquisa,comnfaseespecialsobreassupostasprticasdecomercializaodepesquisatais
como,experincianosetorprivado,patenteamentoelicenciamentodepesquisas,parceriascom
empresasparadesenvolvimentodenovastecnologias,cujoincentivoconsideradoprioritrio
pelanovapolticabrasileiradecinciaetecnologia.Oobjetivoprincipalexploraremque
medidaasprticasdosquetrabalhamcomcinciadepontanoBrasilvmsealterandoeemque
direo.
29
-
CAPTULO1
Atransformaodoregimedisciplinar/estatalbrasileirocomoproblemasociolgico:acinciacomoinstituio,comoprticaecomoideologia
Apartirdadcadade1970,inmerasmudanasincidiramsobreosregimesdeproduo
de conhecimento cientfico2 e sobre a dinmica da sua aplicao econmica, a inovao,
sobretudonaEuropae nosEstadosUnidos.Essastransformaesalteraramasestratgiasdo
Estadonapromoodacincia,da tecnologiae da inovao, o lugardasuniversidadesno
sistema de produo e comercializao do conhecimento e a forma como as empresas
capitalistasconduzemseusprocessosinternosdeinovao.Assim,areestruturaodaspolticas
nacionaisdecinciaetecnologia,asreformasuniversitriasquevmalterandoosobjetivose
prticasdasinstituiesprodutorasdeconhecimentocientficoeasmudanasgerenciaisque
incidiramsobrea organizaoe ocontroledo trabalhodepesquisa e desenvolvimentonas
empresassoexpressesvisveisdesseprocesso.
Paralelamente,oBrasilvempassando,nasltimastrsdcadas,pormudanasestruturais
importantestantonasua dinmicapolticosocial reflexodo processode aberturapoltica
que, aoexpor o aparelhodeEstado lgicada representaopoltica, implicou, em tese,
processos de democratizao em diferentes esferas sociais quanto na sua dinmica
econmica, resultadonosdatransformaodaestruturaeconmicadopasapartirda
abruptaaberturaeconmicadosanos1990,doconseqenteenfraquecimentodasempresasde
capital nacional,do aumento do investimento externo direto, da privatizaodas empresas
2Osestudosacercadaproduodeconhecimentosejamelesdareadesociologia,economia,administraooumesmofilosofiareconhecem,emgeral,avalidadedaidiadequeexistemdiferentesmodos,sistemasouregimesdeproduodoconhecimento, aosquaiscorrespondemformasespecficasdeestrutura institucional,organizaodotrabalho,regimederecompensa,motivaosubjetiva,prticas,valoreseformasdegestodapropriedadeintelectual.(MERTON,1957;BOURDIEU,2004;BIAGIOLI,1998;NELSON,2004;SHINN,1980,2000a,2000b,2008a).
30
-
estataisedoprocessodeliberalizaocomoumtodomas,tambm,daalteraodopapel
polticoeconmicodoEstadomenosemfunodoenfraquecimentodasformasdeaodireta
e indireta sobre a economia do que da reduo da sua funo de agente planejador do
desenvolvimentoindustrialdopas.
Os impactos da confluncia desses processos sociais que se desenrolam no plano
nacionaleinternacionalsobreaatividadecientficabrasileiraesobreadinmicadosprocessos
denegociaoeinstitucionalizaodacincianopassoopanodefundodapresentepesquisa,
cujoobjetodeestudooLaboratrioNacionaldeLuzSncrotron(LNLS)suaspesquisas,seus
pesquisadores,suaorganizao interna,suasestratgiasdelegitimaoe institucionalizao.
Comodissemos,asmudanasqueafetamacinciabrasileiraseroanalisadasapartirdeduas
perspectivasdistintas:adospadresdeinstitucionalizaoelegitimaosocialdacinciaea
dospadresdedesenvolvimentodaatividadecientficaenquantoprticadepesquisaeprocesso
deformaodepesquisadores.
Estudaressadupladimensodacinciacomoconstruoinstitucionalecomoprtica
social paralelamentee emumanicapesquisa nose justificaapenasporuma inteno
descritivaquebuscadarcontadoselementosconstitutivosdacincianassuasespecificidades.
TantoapesquisaempricadoLNLSquantoocontatocomaproduosociolgicaquevem
analisando as transformaes da cincia mostraram que um estudo que pretenda entender
criticamenteoprocessodemudanadacinciadeve,necessariamente,olharparaaformacomo
seproduzemosnovosarranjosjurdicoinstitucionaisquevisamreconfigurarofuncionamento
da cincia ou seja, para as mudanas dos padres de institucionalizao da cincia
considerandoomodocomoessesnovosarranjostransformamasprticasconcretasdaquelesque
trabalhamcompesquisaeformaodepesquisadoresouseja,areconfiguraodaatividade
cientficaenquantoprticasocial.
Essa escolha tericometodolgica tem um duplo fundamento: por um lado, a
emergnciadenovasabordagenssociolgicasque,emrespostasinsuficinciasdaperspectiva
mertoniana,tornaramarelaoentreoprocessodeinstitucionalizaodacinciaeasprticas
31
-
concretas dos cientistas um problema de pesquisa incontornvel; e, por outro, a prpria
especificidadedaestruturadoLNLSeaformacomoeleseinserenahistriaenadinmicada
cinciabrasileira,oqueobrigounosaconsiderlocomoumaduplarealidadeemprica:uma
instituio de pesquisa com suas regras internas e suas estratgias de legitimao e
institucionalizao,asquaissomentepodemsercompreendidasplenamenteluzdospadres
mais gerais de institucionalizao da cincia no Brasil, e, paralelamente, uma plataforma
tecnolgicadepesquisavoltadaparacientistasde todoo pas, que incorporamprticasde
pesquisaetrajetriasacadmicoprofissionaisprprias,permitindoquepormeiodoestudodo
LNLSpossamosretrataraspectosessenciaisdacinciabrasileiracomoumtodo.
Parafinsdeexposio,vamosapresentaraformacomoonossoproblemadepesquisa
atransformaodoregimedisciplinar/estataldeproduoedifusodoconhecimentodoponto
devistainstitucionaleprticoemergedodebatesociolgicocontemporneosobreacincia,
para,depois,construiroproblemaempiricamente,apartirdainvestigaodoLNLS.
1.1. O que significa estudar criticamente o processo de transformao da cincia daperspectivasociolgicacontempornea?
amplamentereconhecidoquea sociologiadacinciaconstituisecomoumcampo
delimitadodepesquisaapartirtrabalhosdeRobertKingMertonsobreascondieshistrico
sociaisdeemergnciaedesenvolvimentodaatividadecientfica(MERTON,1951,1970)esobre
ofuncionamentodaestrutura institucionalenormativa(MERTON,1942,1957,1963,1972,
1973)3.
3Em1938,RobertMertondefendeuasuatesededoutoramentodenominada:Cincia,tecnologiaesociedadenaInglaterradosculoXVII. Merton propunhaanalisar do ponto de vista sociolgico as condies religiosas,econmicas, profissionais e institucionais capazes de explicar a revoluo cientfica e tcnica ocorrida naInglaterradosculoXVII.OdoutoradodeMertontemumaduplaimportncianamedidaemqueofereceumaresposta da sociologia ao problemada origemda cincia moderna, ao mesmo tempoemqueformula umadefiniosociolgicadacincia. Assim,apesardeterhavido,antesdeMerton,estudosdasociologiasobreacincia(Durkheim;Mannheim;PitirimSorokin;LudwigFleckoumesmoKarlMarxeMaxWeber),Mertonconsiderado o pai fundador da sociologia da cincia uma vez que foi o seu arsenal conceitual, a suaterminologiaeoseuprogramadepesquisaqueorientaramostrabalhosdesociologiadacinciapelomenosat
32
-
ApartirdasformulaesiniciaisdeMerton,umafortetradiodepesquisadesenvolveu
sebuscandocompreender tantooprocessohistricosocialde institucionalizaodas regras
internas de funcionamento da cincia sobretudo as regras de controle do trabalho e de
hierarquizaoprofissionalquantoaconsolidaodascondiesideaisdedesenvolvimentoda
atividadecientficasejanoplanodagestodacinciacomoinstituio,social,sejanocontrole
daatividadecientficacomotrabalho.Asociologiamertonianadacinciadedicouse,portanto,
ao estudo da estrutura de funcionamento da cincia com especial ateno a como o
reconhecimentodascontribuiesdospesquisadoresindividuaisaumadadadisciplinasoba
formadepublicaesavaliadasporparesorganizariainternamenteacincia(COLE;COLE,
1967; ZUCKERMAN, 1967; HAGSTROM, 1965, 1972; DE SOLLA PRICE, 1963, 1969).
Partindodisso,atradiomertonianapassouaformularrecomendaessobrecomoincentivaro
desenvolvimentocientfico, tanto no sistemapblico/cientfico de pesquisa por meiodas
polticaspblicasnacionaisdecinciaetecnologia(BENDAVID;ZLOCZOWER,1962;BEN
DAVID; COLLINS, 1965; BENDAVID, 1965, 1974, 1977) quanto no sistema
privado/empresarialatravsdaimplantaodedispositivosetcnicasdecontroledotrabalho
nos grandes laboratrios privados ou governamentais (BROWN, 1954; GLASER, 1965;
KAPLAN,1963,1965;MARCSON,1960;PELZ,1953;PELZ;ANDREW,1966;TAGIURI,
1965)4.
Assim,atradiosociolgicaqueemergedostrabalhosdeMertonnosorganizouo
estudo e a conceitualizao da cincia por vrias dcadas como apresentou, tambm,
desdobramentos importantes no plano das recomendaes polticogerenciais para a
organizao, controle e gesto da cincia. Essas recomendaes orientaram o desenho de
osanos1970.4 Odesdobramentoda teoria mertonianaemtermosdeumadupla formadecontrole controledoarranjoinstitucional da cincia e controle das prticas concretas de pesquisa e do processo de formao de novospesquisadores explicita o reconhecimento de que a cincia essa denominao abstrata e repleta designificadoscorrespondia,naverdade,aumaatividadesocialmarcadaporregrasepadresdeorganizao,controle e diviso do trabalho que apresentava pelo menos duas formas distintas de expresso: a cinciadesenvolvidanosistemapblicoouseja,nasuniversidadeseinstitutospblicoseacinciadesenvolvidanosistemaprivadonoslaboratriosdepesquisaedesenvolvimentodasgrandesempresas.
33
-
polticasnacionaisdecinciae tecnologiaea implementaodemecanismosdegestodo
trabalhocientficoemempresaselaboratriosprivadose,posteriormente,noprpriosistema
pblico.Odesenvolvimentodedispositivosdecontroledaprodutividadeacadmica,baseados
naavaliaodaquantidadee do impacto daspublicaesdepesquisadores individuais,de
instituiescientficasoudepaseseregies,umdosmaisimportanteslegadosdachamada
tradiomertonianadesociologiadacincia(SHINN;RAGOUET,2008,p.3644;WOUTERS,
2006).
Asociologiamertonianadacinciapermaneceupraticamentehegemnicaatadcada
de1970,quandopassouaserduramentecriticadatantonombitodosestudossociolgicosda
cinciaquantonocampododesenhodepolticase mecanismosdegestodacincia.Nesse
sentido,destacamseascrticasspolticasnointervencionistas5decinciaetecnologiaque
vigoraram,dosanos1950aofinaldos1970,primeironosEstadosUnidose,depois,emdiversos
pasesincluindooBrasil.
Noplanointernosociologia,asprincipaisvertentesqueatualmenteorganizamoestudo
sociolgico da cincia emergiram fundamentalmente de crticas mais ou menos radicais
tradiomertonianadesociologiadacincia.SegundoTerryShinnePascalRagouet,essas
correntespodemserclassificadasemdoisgrandesgrupos,asteoriasantidiferenciacionistas(a
Nova Sociologia da Cincia, claramente construtivista) e teorias neodiferenciacionistas
(aquelesque,emboracrticosdasociologiamertoniana,aindaconsideramadiferenciaoda
esferacientficaPierreBourdieu)6.
5Emboraotermomaiscomumsejapolticaslineares(STOKES,2005)ouofertistas(DAGNINO;VELHO,1998)decinciaetecnologia,entendemosqueaexpressomaisadequadasejapolticanointervencionista,nosentidodadoporBennereSandstrmaoanalisaromodelodefuncionamentodeagnciasdefomento(2000,p.300)ouseja,umapolticaquecujaestruturadefinanciamentoeavaliaopartedopressupostoqueacinciadeveseautoadministrarcontrolando,atravsdassuasestruturasdefinanciamentoeavaliao,oprocessodeproduodepesquisas.6Emtermosgerais,aleituradifereciacionostadacinciaenvolve,segundoShinneRagouet(2005,2008),todosossocilogosquereconhecemaespecificidadedacinciacomoinstituiosocialecomosistemacognitivo.RobertMerton(1942,1951,1957,1963,1972)etodosossocilogosqueseguem,diretaouindiretamente,oseutrabalho(COLE;COLE,1967;CRANE,1969,1972;HAGSTROM,1965,1972;ZUCKERMAN,1967;JOSEPHBENDAVID, 1965, 1974, 1977), so representantes da vertente funcionalista ou clssica da sociologiadiferenciacionista, enquantoqueatradio francesafundadaapartirdostrabalhosde PierreBourdieu(1975,
34
-
Noprimeirogrupoestoosautores ligados NovaSociologiadaCincianas suas
diferentes linhas: o chamado Programa Forte (BARNES, 1977; BLOOR, 1976, 1982), a
etnografiadasprticascientficas(KNORRCETINA,1981;LATOUR;WOOLGAR,1996)ea
vertenteportadoradarupturamaisradical,asociologiaconstrutivistadacincia(CALLON,
1986,1998;CALLON;LATOUR,1991;LATOUR,1983,1984,1991,1995,2000,2001)7.
OpontodepartidadasvertentesdepesquisadaNovaSociologiadaCinciaoquelhes
confere unidade a crtica ao silncioda sociologia mertonianaquanto ao processo de
produo/fabricaodeverdadescientficas ouseja,acrtica separaoradicalentre
sociologiaeepistemologia.Aessacrticasomaseapreocupaocomapesquisaemao,ou
seja,comasprticasconcretasdeinvestigaoeformulaodefatoseenunciadoscientficosea
negaodosprocessosdediferenciaodacinciatantosocialasuaconstituiocomoesfera
socialrelativamenteautnomaapartirdasuadiferenciaoemrelaoaoutrasesferasquanto
epistemologicamente a diferenciao em relao a outras formas de produo de
conhecimento.
Assim,paraaNovaSociologiadaCincia,tantoaidiadeautonomiarelativadacincia
suas regras internas e especficas quanto as suasparticularidades epistemolgicas so
veementemente negadas (SHINN; RAGOUET, 2008, p. 11), no existinto diferenas
2004)eRichardD.Whitley(2000)representaumavertentemaisdialticadodiferenciacionismo,medidaemqueentendeacinciaenquantoesferadotadadealgumaespecificidadetantosocial,quantocognitivamesmoquandoreconhecendoasuahistoricidadeeasfortesligaesentreacinciaeasociedade,bemcomoopapeldacincianosprocessossociaisdedominaoe,viceversa,opapeldosprocessossociaisdedominaonointeriordacincia. Nessatradio,almdeBourdieueWhitley,inseremseTerryShinn(1980,2000a;2000b,2002,2008a,2008b)ePascalRagouet(2000)eYvesGingras(GINGRAS,2000,2003;GINGRASetall,2003).Jalinhaantidiferenciacionistas,compostapelosautoresligadosaochamadoProgramaFortedesociologiadacincia(BARNES,1977;BLOOR,1976,1982), etnografiadacincia(KNORRCETINA,1981;LATOUR;WOOLGAR,1986)e linhamaisradical doantidiferenciacionismo,asociologia construtivistadacincia(CALLON,1986,1998;CALLON;LATOUR,1991;LATOUR,1983,1984,1991,1995,2000,2001)7 SegundoShinneRagouet, certosautoressituamseemvriasdessascategorias, namedidaemquesuastomadasdedeciso,evolutivas,nopodemserexclusivamenteexprimidaspor[apenas]umadelas(2008,p.60).Isso explica porque Bruno Latour, por exemplo, tem trabalhos que podem ser classificados tanto na linhaetnogrficadacincia, como,por exemplo, Laviede laboratoire, escrita emparceria comSteveWoolgar(LATOUR,WOOLGAR,1996),quantonaconstrutivistas,comoLesmicrobes:guerreetpaix.(LATOUR,1984); Lemetierdechercheur.Regardd'unanthropologue(LATOUR,1995);eLasciencetellequ'ellesefait(CALLON;LATOUR,1991).
35
-
significativasentrea atividadecientfica financiadapeloEstadoe realizadaeminstituies
pblicas/estataiseaatividadecientficafinanciadaporinvestimentosprivadoserealizadano
interiordasempresascapitalistascomoummomentodoprocessodeproduodemercadorias.
DentreasvertentesdaNovaSociologiadaCincia,asociologiaconstrutivistacuja
expressomaisatualsoaspesquisasfeitasapartirdanoodeator/redeaqueteve,sem
dvida,maiorinfluncianaspesquisassociolgicassobreacincia.Essestrabalhos(CALLON,
1986,1998;CALLON;LATOUR,1991;LATOUR,1983,1984,1991,1995,2000,2001),comoo
prprionomesugere,estopreocupadoscomoprocessodeconstruosocialdacincia,no
enquanto instituio organizada por regras e valores prprios cuja existncia negam
(CALLON, 1986, p. 175) , mas enquanto um discurso que se pretende legtimo e
verdadeiro8.Asociologiaconstrutivistadacinciapartedanegaoradicaldedicotomiastais
comofalso/verdadeiro,cincia/nocincia,observador/objeto,fato/conceitoenatureza/cultura,
demodoqueoproblemaprivilegiadodeinvestigaooprocessosocialdeconstruodessas
diferenciaesnoqualacincia,comodiscursosocialmentelegtimo,desempenhaumpapel
central.Assim,afortepreocupaocomadimensoprodutivadacinciaenquanto discurso
aproximaoconstrutivismodeLatoureCallondasteoriaschamadaspsmodernas.
Oimpactodasociologiaconstrutivistasobreoestudocontemporneodacinciatem,
portanto,doisnveis.Emprimeirolugar,elanegaradicalmenteacompreensodequeacincia
pode ser entendida como uma esfera social diferenciada, constituda por um processo de
institucionalizaoque lhepermite funcionar segundo regras, valores e formasprprias de
8BrunoLatour,umdosnomesmaisimportantesdaNovaSociologiadaCincia,estparticularmenteinteressadonoprocessodeproduo/construodeverdadescientficas,comooprprioautorafirma,asuateoriapodeserconsideradafilosofiadacinciaembasadaempesquisaemprica.Nesseesprito,Latourchamaaatenoparaadiferenaessencialentrea cinciaacabadaeoqueelechama cinciaemao,destacandoaimportnciadeolharmosparaestaltimasequisermosdefatocompreendercomoseproduzemasverdadescientficas.Assim,adifciltarefadeestudaracinciadevecomearpelaportadetrs,ouseja,pelacinciaemconstruo,oqueimplicaconsiderarondaquesto:otpiconoqualcientistaseengenheirostrabalhamarduamente(Latour,2000,pp.1617).Apesardisso,segundoLatour,deformageralosestudossobrecinciasomarcadosporumenormedescaso em relao ao processo que antecede cincia acabada: Apesar do quadro rico, desconcertante,ambguoefascinantequeassimserevela,poucaspessoasdeforajpenetraramnasatividadesinternasdacinciaedatecnologiaedepoissaramparaexplicar,aquemcontinuadoladodefora,comotudoaquilofunciona(...)infelizmente,quaseningumestinteressadonoprocessodeconstruodacincia.(Latour,2000,p.3334).
36
-
organizaoegestodotrabalho,asquaisvariamdeacordocomasformasdefinanciamentoe
controledaatividade.Aoabandonodadimensoinstitucionaldacincia,contrapeseanfase
nasprticasconcretasdospesquisadoresoqueexplicaaescolhapelapesquisaetnogrficade
laboratrioseoutroslocaisdetrabalhoenopapeldosdiscursossupostamentelegtimosda
cincia na construo da realidade a funo da cincia como instrumento de poder,
dominaoeconstruodarealidade(LATOUR,1984,1991,2001).
MasseateoriamertonianadacinciafoiduramentecriticadapelaNovaSociologiada
Cinciaporaceitarocartersupostamenteverdadeiroeuniversaldosenunciadoscientficos
ou seja, por partir do pressuposto que a cincia constitui uma formade cogniomais
racionale,portanto,superioraoutras,silenciandotantoemrelaoaosprocessossociais
deconstruodosfatoscientficosquantoemrelaointeraoentreacinciaeosprocessos
dedominao,aperspectivaqueseoriginaapartirdostrabalhosdePierreBourdieu(1975)
sobreocampocientficovoltasuascrticasparaoutroalvo:avisoexcessivamentefuncionalista
ehomogneadacinciaqueestruturaostrabalhossociolgicosdeinspiraomertoniana.
Ao classificar a tradio mertoniana como estruturalfuncionalista, Bourdieu (1975;
2004) aponta criticamente que essa tradio considera o mundo cientfico como uma
comunidadequesedotousedesenvolveucominstituiesjustaselegtimasderegulaoe
ondenohlutasemtodocaso,nohlutasapropsitodomotivodaslutas(BOURDIEU,
2004,p.24).Oestruturalfuncionalismorevela,dessemodo,asuaperspectivaexcessivamente
finalistadasentidadescoletivas, segundoaqual a cinciaseriaumadessasentidadesque
alcanaosseusfinspormeiodemecanismossemsujeitosorientadosparafinsfavorveisaos
sujeitos (ibdem, 2004,p. 24). Emcontraposioaessaconcepofuncionalista, Bourdieu
propepensaracinciaapartirdoconceitodecampocientficocompreendidocomo:
umsistemaderelaesobjetivasentreasposiesadquiridas,pelaslutasanteriores,eolugar(querdizer,oespaodejogo)deumalutadeconcorrnciaquetemporobjetivo especfico omonoplioda autoridadecientfica inseparavelmentedefinidacomo capacidade e como poder social, ou, se preferirmos, o monoplio dacompetncia cientfica, entendida no sentido de capacidade de falar e de agirlegitimamente(quedizer,demaneiraautorizadaecomautoridade)emmatriade
37
-
cincia,quesocialmentereconhecida(BOURDIEU,1975,p.9192)
Acinciaaparece, dessemodo,comoumespaoessencialmenteconflituoso9 eno,
comopressupunhaMerton,comoumacomunidadedeiguaisosparesnaqualasregras,os
mecanismosdehierarquizaoeasformasdecontrolesojustoseamplamentecompartilhados
porqueincorporadosaoethoscientficoconstituindo,nomais,umespaodeconcorrncia
perfeitaemqueaidiaverdadeiradevenecessariamenteprevalecer10(BOURDIEU,1975,p.
92).
Ocampoumespaodelutacujoobjetivoocontroledaautoridadecientficaque
Bourdieutambmdenominademonopliodacompetnciacientficaqueaparececomouma
disputa peloacmulo de capital cientfico, umaexpressoespecfica do capital simblico,
adquirido por meio do reconhecimento dos agentes do campo quanto importncia das
contribuies dadas a esse mesmo campo sob a forma de publicaes e comunicaes
acadmicas.Oacmulodiferenciadodecapitalcientficoquedefineaestruturadocampo
fazcomqueacinciaconstituasecomoumespaonecessariamenteestratificado,noqualse
luta,pormnoemcondiesdeigualdade,jqueopoderdecadaagenteaautoridade
cientficadadopelasuaposionaestruturadocampo.Ocampocientficoconstituise,
dessemodo,tambmcomoespaodedominaoepoder,dimensoqueradicalmentenegada
pelateoriamertoniana.
Masdizerqueocampocientficoconstituisecomoespaodelutaededominaono
implica afirmar que os cientistas buscam, exclusivamente, o controle dopoder, ou seja, o
9 Anoodecampopermite a Bourdieurompercomumavisoexcessivamentepacficae conciliadoradaatividadecientfica,aquelaqueentendequeacinciaconstituiummundodetrocasgenerosasemquetodososinvestigadorescolaboramparaummesmofim.Essavisoidealistaquedescreveaprticacientficacomoprodutodasubmissovoluntriaaumanormaidealcontraditapelosfatos:oqueseobservasoconflitos,porvezesferozes,ecompetiesnointeriordeestruturasdedomnio.(2004,p.6768)Avisocomunitaristaesqueceque o mundo cientfico fundamentase em disputas pelo monoplio da manipulao legtima dos benscientficosouseja,adefiniodoquesejabonsmtodosboapesquisa,bonsobjetivosetc.10Sobreatradiomertoniana,concluiBourdieu:muitoobjetivista,muitorealista(...)muitoclssica(...)essaabordagemnofazamenorrefernciaformacomosoresolvidososconflitoscientficos.Aceita,defato,adefiniodominante,logicista,dacincia,qualentendelimitarse(2004,p.25).
38
-
reconhecimentodospareseaautoridadecientficaaelecorrespondente.Bourdieuenfatizaque
asdisputascientficassonecessariamentemarcadasporumaambigidadeestrutural:ofatode
serem, inseparavelmente, epistemolgicas e polticas11. Em outras palavras, enquanto
contraposiopoltica,aslutasnocamporealizamsesobaformadedisputasepistemolgicas
quemfaza melhorcincia,ouseja,quemofereceascontribuiesmais relevantese mais
rigorosas, chegando mais perto da verdade mas, ao mesmo tempo, envolvem
necessariamenteumadimensopoltica oacmulodecapitalsimblicoqueconferemais
poderparadefinir,apartirdeumaposiomaisprivilegiada,oqueaboacincia12.
Acompreensodofuncionamentodacinciasegundoadialticainteresse/desinteresse
abuscadesinteressadapelaverdadecorresponde disputainteressadaporpoder, ea
disputainteressadaporpoderassumeaformadeumabuscadesinteressadapelaverdade
diferenciaaposiodeBourdieutantoemrelaotradiomertonianaquenoreconheceo
conflito,portanto,adimensoessencialmentepolticadacinciaquantoemrelaoNova
SociologiadaCinciaquenoreconheceadimensoepistemolgicadasdisputascientficas,
por apresentlas exclusivamentecomoumadisputa de poder, portanto, comoexercciode
dominao.
Bourdieu abre o seu artigo de 1975 La spcificit du champ scientifique et les
conditionssocialesduprgrsdelaraisoncomaseguinteafirmao:
Asociologiadacinciarepousasobreopostuladodequeaverdadedoprodutotratasedesseprodutomuitoparticularqueaverdadecientfica,resideemuma
11 Dir Bourdieu: Umaanlise que tentasse isolar umadimensopuramente poltica dos conflitos peladominaodocampocientficoseriatoradicalmentefalsaquantoaposioinversa,maisfreqente,dereterapenasasdeterminaespuraseepuramenteintelectuaisdosconflitoscientficos(BOURDIEU,1975,p.93)12EssadimensoambguadasdisputascientficasdestacaporBourdieutambmnolivrode2004:Humaespciedeambigidadeestrutural docampocientfico (edocapital simblico) quepoderia ser o princpioobjetivodaambivalnciadoscientistas,jevocadaporMerton,apropsitodasreivindicaesdeprioridade:ainstituioquevaloriza a prioridade(ouseja, a apropriaosimblica), valoriza tambmodesinteressee adedicao desinteressada ao avano do conhecimento. O campo impe, simultaneamente, a competioegosta(...)eodesprendimento(...)Nohdvidadequefoitambmessaambigidadequefezcomquesepudessedescreverastrocasquetmlugarnocampocientficosegundoomodelodatrocadeddivas,emquecadapesquisadordeveofereceraosoutrosanovainformaoquedescobriuparadelesobter,emcontrapartida,reconhecimento(2004,p.77).
39
-
espcieparticulardecondiessociaisdeproduo;querdizer,maisprecisamente,emumestadodeterminadodaestruturaedofuncionamentodocampocientfico.(BOURDIEU,1975,p.1991)
Mas foi no cursodo Collge de France de 20002001 Science de la Science et
reflexivit , posteriormente editado em livro (BOURIDEU, 2004), que o autor saiu
definitivamente em defesa da intrnseca relao existente entre as regras internas de
funcionamentodocampocientficosuaconstituiocomoesferadiferenciadadomundosocial
e a produodeverdades.Emumdilogoexplcito e, porvezes,deumaviolncia
incomum13comaNovaSociologiadaCinciaoautorargumenta:
ofatodeosprodutores[cientficos]tenderematercomoclientesapenasosseusadversrios mais rigorosos, os mais competentes e crticos, portanto, os maisinclinadoseosmaisaptosavalidarasuacrtica,paramimopontoarquimedianoemquenospodemosbasearparaexplicarcientificamentearazodarazocientfica,para libertar a razocientficada razo relativista e explicar queacinciapodeavanarincessantementeparaumamaiorracionalidadesemserobrigadaarecorrerauma espcie de milagre fundador. No necessrio sair da Histria paracompreenderaemergnciaeaexistnciadarazonaHistria.Ofechamentosobresidocampoautnomoconstituioprincpiohistricodagnesedarazoedoexercciodesuanormatividade(BOURDIEU,2004,p.78;grifomeu)
Emoutraspalavras,noprocessodeautonomizaodaesferacientficaqueimpea
necessidadedequeacincia internalize e institucionalizeoprocessodecertificaodosseus
13 Bourdieuafirma,sobreumdostrabalhosdaNovaSociologiadaCincia,inscritonalinhaqueelechamaconstrutivismoradical: Aoafirmarqueos fatos soartificiais nosentidoemquesofabricados, LatoureWoolgardeixamentenderqueosfatossofictcios,noobjetivos,noautnticos.OsucessodasafirmaesdessesautoresresultadoefeitoderadicalidadecomodizYvesGingras(2000),quenascedessedeslizesugeridoeencorajadopelohbil usode conceitos ambguos. Aestratgia de passagemao limite umdosrecursosprivilegiadosdainvestigaodesteefeito,maspodelevaraposiesinsustentveiseindefensveis,porquemuitosimplesmenteabsurdas.Daumaestratgiatpicaconsisteemavanarumaposiomuitoradical(dotipo:ofatocientfico umaconstruooudeslizeumafabricao,portantoumartefato,umafico)paradepoisseretratardiantedacrtica,refugiandoseembanalidades,ouseja,nafacemaisvulgardasnoesambguascomoconstruoetc.(2004,p.43)Econclui,alegandoquesente,pelasteoriasconstrutivistasumasantacleraqueencontraoseufundamentonofatodequeessaspessoas[BourdieurefereseaLatour],querecusamgeralmenteonomeeoestatutodesocilogossemseremrealmentecapazesdesubmetersesexignciasdorigorfilosfico,poderemtersucessojuntoaosmembrosrecmadmitidoseatrasaroprogressodainvestigao,levandoafalsosproblemasquefazemperdermuitotempo.(2004;p.49)
40
-
enunciados que reside, segundo Bourdieu, a fundamentao histrica da racionalidade
cientfica.importantenotar queaformacomoBourdieutrataoproblemadaracionalidade
cientficaaproximaodeumadasquestesmaisessenciaisparaopensamentosociolgicoo
processodeemancipaodasesferasdevaloresuarelaooprocessohistricodeemergncia
damodernidade.
Umdospontoscentraisdainterpretaoweberianasobreoprocessodemodernizao,a
emancipaodasesferasdevalorumadaschavesdecompreensodoqueWeberconsidera
como processo de racionalizao ocidental14. A emancipao, autonomizao ou auto
regulaodasesferassoexpressesusadasparadescreveroprocessoemqueasesferassociais
Weberdestacapelocinco:aeconmica,apoltica,aesttica,aerticaea intelectualou
cientficapassamaseorganizarapartirdecritriosprpriosdelegitimao,ouseja,segundo
umalegalidadeeumconjuntoprpriodecritriosvalorativos.Nocontextomoderno,portanto,a
religionopodemaisdizer,porexemplo,oqueesteticamentebelo,oquepoliticamente
justoouoquecientificamenteverdadeiro.Cabeacadaumadessasesferasaesttica,a
polticaeacientficadefinirseuscritriosinternosdevalidadeeautocertificao.Omundo
modernocaracterizadoporWeber,pelacoexistnciadessasesferasautoreguladas,semque
nenhumasesobreponhasoutras,emoposioaoutrosmomentoshistricoemqueasesferas
encontravamseimbricadasesubordinasesferareligiosa,ouseja,aosentidodadoaocosmo
eexistnciahumanaporumadadateodissiaecondutaracionalizadadevidadeterminada
pelosvaloresemandamentosreligiosos.
14Podemosdizer,emtermosgerais,queomundomoderno,paraWeber,sedefinepelaexistnciadeumsistemaeconmicoorganizadoapartirdalgicaracionalcalculadoracapitalismomodernoepelaracionalizaodasprticas sociais em todasas esferas da vida (COHN, 1979). Ambas as caractersticas podemser encaradas,entretanto, como um duplo aspecto de um mesmo processo mais geral e mais extenso: o processo deracionalizaoocidental. SegundoPierucci(2003),conceitualmente,ousodetermoscomoracionalizao,racionalismo e processo de racionalizao na obra de Weber ambguo, polissmico e, muitas vezes,contraditrio.Omesmo,porm,noacontececomousodotermodesencantamentodomundo,quemuitomaisespecficoerigoroso.Porisso,argumentaPierucci,paraacompreenso,emtermosconceituais,doqueWeberchamaprocessoderacionalizaointeressanteperseguiraconstruodoconceitodedesencantamento.AindasegundoPierucci,existemdoissentidosparaotermodesencantamentoquesousadosporWeberaomesmotempo e o tempo todo. Em termos bastante simplistas, podemos dizer: desencantamento do mundo pelareligioedesencantamentodomundopelacincia.(PIERUCCI,2003,p.2742)
41
-
MasparaentendermelhorporqueBourdieuentendequenoprocessodeautonomizao
daesferacientficaqueresideofundamentodarazocientficanobastarecorrerformacomo
eleseapropriadaobradeMaxWeber.Igualmenteimportantepareceserainflunciaexercida
pelasformulaesdeJrgenHabermas,muitoemboraarelaoentreaobradeBourdieue
Habermassejaaindapouqussimoexplorada.
Deincio,interessantenotarqueosdoisautoresseinseremnomesmodebate,tendo
comointerlocutoresospsestruturalistas,sobretudofranceses.Assim,damesmaformaqueno
seu livro sobrea sociologia da cinciaBourdieuest reagindos crticas formuladaspelo
construtivismo,claramentepsestruturalista, s pretenses racionais a cincia, Habermas
tambmescreve Odiscursofilosficodamodernidade emrespostaaodesafiopropostopela
crticaneoestruturalistarazo(HABERMAS,2002,p.1).Masasaproximaesentreosdois
autoresnoseresumeaosinterlocutoresquetmemcomum.Oproblemaformuladoporeles
tambmextremamenteprximo.
NoprimeirocaptulodeOdiscursofilosficodamodernidadeintituladoConscincia
detempodamodernidadeesuanecessidadedeautocertificao,Habermasapresentaoque
elechamadeoproblemafilosficodamodernidadeque,segundoele,encontraemHegela
suaprimeiraformulaoacabada.SegundoHabermas:
Hegel foi o primeiro a tomar comoproblema filosfico o processo pelo qual amodernidadesedesligadassugestesnormativasdopassado,quelhesoestranhas(...)apenasnofinaldosculoXVIIIoproblemadaautocertificaodamodernidadese aguou a tal ponto que Hegel pde perceber essa questo como problemafilosficoe,comefeito,como oproblemafundamental desuafilosofia. Ofatodeumamodernidadesemmodelos ter de estabilizase combase nas cises por elamesma produzidas causa uma inquietude que Hegel concebe como a fonte danecessidadedafilosofia(HABERMAS,p.24).
Assim, para Hegel, a especificidade da modernidade reside, justamente, na
(auto)conscinciadasuaprpriahistoricidade.Amodernidadenopodeenoquertomarseus
critriosdefundamentaoeorientaodatradio,dopassado,elatemqueextrairdesi
mesmaasuaprprianormatividade(HABERMAS,2002,p12).Oproblemadamodernidade
42
-
estendesesdiferentesesferassociaisporexemplo,aarte,afilosofia,acincia,apoltica
que precisamextrair de si mesmas, os seus fundamentos valorativos, os seus critrios de
validadeeasuasregrasdefuncionamento.
nesseprocessonitidamenteaparentadoqueledescritoporWeberqueresideoque
Habermasentendecomosendoocontedoracionaldamodernidadecultural(HABERMAS,
2002, p. 148). Isso porque, para o filsofo alemo, a emancipao das esferas de valor
potencializaodesenvolvimentodosprocessoscomunicativosnamedidaemquesubstituios
critrios externos de validade como, por exemplo, o pensamento mticoreligioso por
verdadesproposicionais estabelecidascomunicativamente,ouseja,porconsensoracionais
quesedefinemapartirdeprocessoscomunicativos.A ausncia de uma ordem externa que
organizetaisesferas,nospossibilita,comoexigequearazocomunicativasetransformeno
novo critrio de validade. Tal movimento se expande para alm das esferas de valor
individualmente e acabapor provocar umamodernizaodo mundo da vida por meioda
absorodospotenciaisemancipatriosdamodernidadecultural(COHEN;ARATO,1990).
esseprocesso,fundamentadonaautonomiadasesferas,quepermiteumcertograuderesistncia
dasesferasemrelaoaoavanodaracionalidadeinstrumentalinerenteexpansoeconmicae
burocrtica:
[Se,porumlado]certoquecomaeconomiacapitalistaeoEstadomodernosereforatambmatendnciadeseconfinartodasasquestesdavalidadeaohorizontelimitadodaracionalidadeorientadaparafinsdesujeitosqueseautopreservamoudesistemasquesemantmemexistncia,[poroutro,]aestependorparaaregressosocial darazoopese (...) a compulso,quenosepodedeixardeconsiderar,induzidapelaracionalizaodasimagensdomundoedosmundosdavida,paraaprogressivadiferenciaodeumarazoqueassumeumaformaprocessual(...) assimilao naturalista das pretenses de validade e de poder, destruio dacapacidadecrtica,opeseodesenvolvimentodasculturasespecializadasnasquaisuma esfera de validade articulada proporciona s pretenses de verdadeproposicional,justezanormativaeautenticidade,umsentidoprprio(HABERMAS,2002,p.115)
Assim,oproblemadaautofundaodaracionalidadecientfica,chegaaBourdieupela
leituraqueesseautortemdaobradeWebere,muitoprovavelmente,tambmdeHabermas.No
43
-
poracaso,aformacomoBourdieuexpearelaoentreautonomiaeracionalidadecientfica
parecemuitoprximadaformacomoHegeloprimeirofilsofodamodernidade,segundo
Habermasexpeamesmarelao:
Acinciapodeserempregadacomoentendimentoservilparafinsfinitosemeioscausaise,assim,noadquiresuadeterminaoapartirdesimesmamasapartirdeoutrosobjetoserelaes;poroutrolado,elatambmselibertadessaservidoparaseelevarverdadeemumaautonomialivre,naqualelaserealizaindependentementeapenascomseusprpriosfins.(HEGEL,2001,p.32)
Assim,emcontraposioNovaSociologiadaCincia,Bourdieufiliaseatodauma
tradiosociolgicaqueopermite repor, emums movimento,avalidade doconceitode
diferenciaosocialdocampocientficoa possibilidadedepensara cinciacomoesfera
relativamenteautnomaedotadadeumanormativaprpriaqueinteragecomoutrasesferas
sociaisdeformamediadaeapossibilidadedepensarmosacinciacomoumaformaespecfica
de produo de conhecimento especificidade, essa, fundada no processo histrico de
autonomizaoeinstitucionalizaodacinciadoqualemergeasuacapacidadedeproduzir
enunciadosracionaisouseja,vlidosparaalmdoseucontextoespecficodeproduoe
nocomoconstruesculturais,comoentendeaSociologiaConstrutivistanassuasformulaes
maisradicais.
Assim,atransformaodessaesferaaesferacientficadevepassarnecessariamente
peladesconstruodosmecanismoscriadosaolongodesseprocessodeinstitucionalizao.A
teoriadeBourdieuinspiradanatradiosociolgicaquelevaoproblemadaconstituiodas
esferassociaisdeWeberaHabermasfornece,portanto,umachaveinteressanteparaaanlise
damudanadaesferacientfica,entendendoacomoadesconstruodassuasregrasinternas
pormeiodeumprocesso,digamos,dedesistitucionalizaodacincia.Poroutrolado,porpartir
deumateoriasocialqueconcebeasociedademodernasimplesmentecomoumconjuntode
esferasmaisoumenosindependentes,essateorianoresolvesatisfatoriamenteaquestoda
dinmicadasesferas,ouseja,noconcebeoquedeterminaoseufuncionamentosoprocessos
sociaisqueestoparaalmdelaseque,portanto,nopodesereduziraoproblemadainterao
44
-
entreesferas.Essaformaquasemecnicadeentenderosprocessossociaispensadoscomo
interaoentreesferasfazcomqueateoriabourdiananoconsigairalmdapercepode
queasesferasinteragempormeiodeprocessosdesuper,sobreejustaposio.
Assim, se verdadequea cinciapode serpensadacomoumaesfera socialmente
diferenciada,queseconstituiuporprocessosdeinstitucionalizao,nopossvelcompreender
adinmicadasuarelaocomaeconomiaecomapolticasimplesmentecomosefosseum
problemadeinteraoentreesferas.Existemprocessossociaistransversais,quesenoas
transformamasesferasaomesmotempoedamesmaforma, imprimetendnciasqueesto
necessariamenteinterligadas.
Portanto,seBourdieunosobrigaaolharmosparaoprocessodeinstitucionalizaoda
esferacientficacomoumprocessoconstitutivo,nopossvelignorarofatodequeacincia,
aomesmotempo,umaatividadesocial,ouseja,comoumaformadetrabalhocujaorganizaoe
ocontroleimprimemumadinmicaprpriadefuncion