check up

108
www.socesp.org.br Volume 16 — N o 3 — Jul/Ago/Set de 2006 REVISTA DA SOCIEDADE DE CARDIOLOGIA DO ESTADO DE SÃO PAULO ISSN 0103-8559 SOCESP “CHECK- UPCARDIOLÓGICO EDITOR CONVIDADO: NELSON KASINSKI I NFLAMAÇÃO E DOENÇAS CARDIOVASCULARES EDITOR CONVIDADO: CARLOS VICENTE SERRANO JR. Figura 2 (página 167) Figura 2 (página 217)

Upload: api-3697642

Post on 07-Jun-2015

1.204 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: check up

www.socesp.org.br

Volume 16 — No 3 — Jul/Ago/Set de 2006

REVISTA DA

SOCIEDADE

DE CARDIOLOGIA

DO ESTADO DE SÃO PAULO

ISS

N 0

103-

8559

SOCESP

“CHECK-UP”CARDIOLÓGICOEDITOR CONVIDADO:NELSON KASINSKI

INFLAMAÇÃO E DOENÇAS

CARDIOVASCULARESEDITOR CONVIDADO:CARLOS VICENTE SERRANO JR.

Figura 2(página 167)

Figura 2(página 217)

Page 2: check up
Page 3: check up

RSCESPJUL/AGO/SET 2006

REVISTA DA

SOCIEDADE DE CARDIOLOGIA DO ESTADO DE SÃO PAULO

i

Diretoria da SOCESPBiênio 2006/2007

Presidente: Bráulio Luna FilhoVice-Presidente: Ari TimermanPrimeiro-Secretário: Ibraim Masciarelli PintoSegunda-Secretária: Ieda Biscegli JatenePrimeiro-Tesoureiro: João Nelson Rodrigues BrancoSegundo-Tesoureiro: Miguel Antonio MorettiDiretor de Publicações: Edson StefaniniDiretor de Regionais: Márcio Jansen de O. FigueiredoDiretor Científico: Fernando NobreAssessor deInfra-estrutura: Carlos Vicente Serrano Jr.Assessor de Informática: Moacyr Fernandes GodoyAssessor de DefesaProfissional: José Henrique Andrade Vila

Presidentes RegionaisABCDM: José Luiz AzizAraçatuba: Celso BiagiAraraquara: José Geraldo BonfáAraras: Daniel Izzet PotérioBauru: Christiano Roberto CamposBotucatu: Beatriz Bojikian MatsubaraCampinas: Alexander BraunFranca: Carlos Alves PereiraJundiaí: Alberando Gennari FilhoMarília: Carlos Benedito A. PimentelPiracicaba: Humberto Magno PassosPresidente Prudente: Luis Carlos PontesRibeirão Preto: Brasil Salim MelisSantos: Carlos Alberto Cyrillo SelleraSão Carlos: José César BrigantiSão José do Rio Preto: Luis Antonio GubolinoSorocaba: Luiz Miguel Gaspar HenriquesVale do Paraíba: Maurício Garcia Lima

Editor: Edson StefaniniEditores assistentes: Pedro Silvio Farski, Luiz Francisco Cardoso, Maria Tereza Nogueira Bombig Manzoli

Conselho EditorialArritmias e Eletrofisiologia:Angelo Amato Vicenzo de Paola,Maurício Ibrahim ScanavaccaCardiomiopatia:Beatriz Bojikian Matsubara, Dirceu de AlmeidaCardiopatias Congênitas:Ieda Biscegli Jatene, Ulisses Alexandre Croti,Maria Virgínia Tavares SantanaCirculação Pulmonar:Antonio Augusto Lopes, Nelson KasinskiCirurgia Cardiovascular:Luiz Felipe P. Moreira, Paulo M. Pego Fernandes,João Nelson Rodrigues BrancoDoença Arterial Coronária:Edson Stefanini, Carlos V. Serrano Jr.,Luiz Antonio Machado Cesar, Otávio Rizzi CoelhoDoença Valvar:Flávio Tarasoutchi, Valdir Ambrosio Moisés,Auristela RamosEcocardiografia:Benedito Carlos Maciel, Henry Abensur,José Lazaro S. de Andrade

Emergências Cardiovasculares:Ari Timerman, Miguel MorettiErgometria e Reabilitação:Romeu Sergio Meneghelo, Willian Azem Chalela,Luiz Eduardo MastrocollaExperimental:Alexandre da Costa Pereira, Kleber FranchiniHemodinâmica eCardiologia Intervencionista:Amanda Guerra Moraes Rego Sousa,Expedito Ribeiro da Silva, Valter Correia LimaHipertensão Arterial:Dante Marcelo Artigas Giorgi, Fernando Nobre,Rui PóvoaInsuficiência Cardíaca Congestiva:Fernando Bacal, João Manoel Rossi Neto,Marcus Vinicius SimõesMedicina Nuclear:Paola Smanio, José Soares Jr.,Carlos BuchpiguelRessonância Magnética eTomografia Computadorizada:Carlos Eduardo Rochitte, Ibraim Masciarelli Pinto

A Revista da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (ISSN 0103-8559) é editada trimestralmente pelaDiretoria de Publicações da SOCESP, Avenida Paulista, 2073 — Horsa I, 15º andar, cj. 1512 — CEP 01311-300 —Cerqueira César — São Paulo — SP / Tel.: (11) 3179-0044 / E-mail: [email protected] / Website: www.socesp.org.brAs mudanças de endereço, a solicitação de números atrasados e as cartas ao Editor deverão ser dirigidas àSociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, na sede da SOCESP. É proibida a reprodução total ou parcial dequaisquer textos constantes desta edição sem autorização formal e expressa de seus editores.Produção Editorial e Gráfica: CEV - Casa Editorial Ventura / Impressão: AquaPrint Gr. e Ed. Ltda.Para pedidos de reprints, por favor contate: SOCESP — Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo /Diretoria de Publicações / Tel.: (11) 3179-0044 / E-mail: socesp@[email protected]

Page 4: check up

RSCESPJUL/AGO/SET 2006

Revista da Sociedade de Cardiologia do Estado de São PauloSão Paulo - SP, Brasil. v. 1 - 1991 -Inclui suplementos e números especiais.Substitui Atualização Cardiológica, 1981 - 91.

1991, 1: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A)1992, 2: 1 (supl A), 2 (supl A), 2 (supl B), 3 (supl A), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)1993, 3: 1 (supl A), 2 (supl A), 2 (supl B), 3 (supl A), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)1994, 4: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 3 (supl B), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)1995, 5: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 3 (supl B), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)1996, 6: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 3 (supl B), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)1997, 7: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 3 (supl B), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)1998, 8: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 4 (supl A), 4 (supl B),

5 (supl A), 6 (supl A)1999, 9: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 3 (supl B), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)2000, 10: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 3 (supl B), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)2001, 11: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 3 (supl B), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)2002, 12: 1 (supl A), 2 (supl A), 2 (supl B), 3 (supl A), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)2003, 13: 1 (supl A), 2 (supl A), 2 (supl B), 3 (supl A), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)2004, 14: 1 (supl A), 2 (supl A), 2 (supl B), 3 (supl A), 4 (supl A),

5 (supl A), 6 (supl A)2005, 15: 1 (supl A), 2 (supl A), 3 (supl A), 4 (supl A), 5 (supl A),

5 (supl B), 6 (supl A)2006, 16: 1 (supl A), 2 (supl A), 2 (supl B), 3 (supl A)

ISSN 0103-8559RSCESP 72594

CDD16 616.105NLM W1

WG100CDU 616.1(05)

Órgão Oficial da Sociedade de Cardiologia do Estado de São PauloPublicação Trimestral / Published QuarterlyDados de Catalogação na Publicação Internacional (CIP)

Associação Paulista de Bibliotecários / Grupo de Bibliotecários BiomédicosNormas para catalogação de publicações nas bibliotecas especializadas.

São Paulo, Ed. Polígono, 1972.

Indexada no INDEX MEDICUS Latino AmericanoImpressa no Brasil

Tiragem: 6.500 exemplaresi i

Page 5: check up

RSCESPJUL/AGO/SET 2006

SUMÁRIO

iii

iv Carta do Editor ConvidadoNelson Kasinski

v Carta do Editor ConvidadoCarlos V. Serrano Jr.

INFLAMAÇÃO E

DOENÇAS CARDIOVASCULARESEDITOR CONVIDADO:CARLOS VICENTE SERRANO JR.

178 Síndromes coronárias agudas e inflamaçãoAcute coronary syndromes and inflammationJuliano Lara FernandesAlexandre SoeiroCésar Biselli FerreiraCarlos V. Serrano Jr.

187 Aterosclerose e inflamaçãoAtherosclerosis and inflammationCarlos M. C. MonteiroFrancisco A. H. Fonseca

193 Fatores de risco e inflamação vascularRisk factors and vascular inflammationDikran ArmaganijanLuciana Vidal ArmaganijanMauricio Rodrigues Jordão

202 Inflamação e insuficiência cardíacaInflammation and congestive heart failureFernando BacalChristiano P. SilvaVictor Sarli Issa

213 Células-tronco e inflamaçãoStem cells and inflammationPaulo Ferreira Leite

“CHECK-UP”CARDIOLÓGICOEDITOR CONVIDADO:NELSON KASINSKI

127 “Check-up” cardiológico: avaliação clínicae fatores de riscoHeart check-up: clinical examination andrisk factorsJoão Lourenço Villari HerrmannJosé Augusto Marcondes de Souza

138 Eletrocardiografia e teste ergométrico no“check-up” cardiológicoElectrocardiography and stress test inroutine cardiovascular evaluation (check-up)Luiz Eduardo MastrocollaJoão Manoel RossiSusimeire Buglia

154 A ecocardiografia no “check-up”cardiológicoRole of echocardiography in routinecardiovascular evaluation (check-up)Orlando Campos FilhoWercules A. Alves OliveiraAdriana Cordovil

163 Estratificação de risco coronário pelatomografia computadorizadaCoronary risk stratification by computedtomographyIbraim Masciarelli F. PintoWalther IshikawaRoberto Sasdelli NetoAmanda G. M. R. Sousa

172 Análise crítica dos métodos não-invasivospara avaliação cardiológicaCritical analysis of noninvasive methods incardiologic evaluationFausto Haruki HironakaGustavo Ken Hironaka

Edição Anterior: Hipertensão PulmonarEditor Convidado: Antonio Augusto Lopes

Próxima Edição:Atualização em Perioperatório de CardiopatasSubmetidos a Cirurgia Não-CardíacaEditores Convidados: Bruno Caramelli/Cláudio Pinho

Anticoagulação para o CardiologistaEditor Convidado: Cyrillo Cavalheiro Filho

vi Comunicado Importanteviii Eventos

Nelson Kasinski

Page 6: check up

RSCESPJUL/AGO/SET 2006

iv

CARTA DO

EDITOR

CONVIDADO

“CHECK-UP” CARDIOLÓGICO

Antes prevenir do que remediar. Esse antigo ditado expressa a importância daprevenção primária em Cardiologia, com ênfase especial à doença arterial coronária, já quealgumas conseqüências dela advindas podem ser catastróficas no momento de suainstalação clínica.

A verdadeira prevenção demanda aferição de sua eficácia. Para tanto, são importantesas informações obtidas do paciente nas esferas epidemiológica e clínica. Essa avaliaçãose completa com os dados objetivos oriundos de exames subsidiários, que compõem,assim, o verdadeiro “check-up” cardiológico.

As avaliações que pretendiam afastar problemas cardiocirculatórios sofreraminicialmente numerosas críticas por sua baixa sensibilidade e baixa especificidade.Entretanto, essas limitações foram desaparecendo com a rápida evolução de métodosdiagnósticos não-invasivos, determinando o desenho de uma programação com elevadosíndices de acerto no que tange ao conceito de coração normal.

Nesse contexto, para esta edição da Revista da Sociedade de Cardiologia do Estadode São Paulo foram escolhidos temas descritos por especialistas proeminentes e experientes,que analisam com cuidado, critério e crítica o conjunto de exames que devem compor emdiferentes circunstâncias o “check-up” do coração.

A escolha de procedimentos como a eletrocardiografia convencional, o teste deesforço, a ecocardiografia nas suas diferentes modalidades e a sofisticada utilização damedicina nuclear, da angiotomografia e da ressonância magnética não foi casual, tendocomo objetivo trazer ao conhecimento do cardiologista as verdadeiras aplicações elimitações desses procedimentos.

Dessa forma, acredito que as informações contidas nesta edição possam servir de guiapara a realização e a interpretação das avaliações daqueles que buscam conhecer a saúdedos corações.

Nelson KasinskiEditor Convidado

Page 7: check up

RSCESPJUL/AGO/SET 2006

v

CARTA DO

EDITOR

CONVIDADO

INFLAMAÇÃO E DOENÇAS CARDIOVASCULARES

Nesta edição da Revista da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo,“Inflamação e Doenças Cardiovasculares” é o segundo tema abordado, cuja organizaçãocontou com a colaboração de colegas de renome de várias instituições do Estado de SãoPaulo. São cinco capítulos ao todo, em que vários aspectos relevantes são analisados, comodados epidemiológicos e pesquisa básica, além de métodos diagnósticos e terapêuticos.

O ponto de vista sobre os mecanismos fisiopatológicos das doenças cardiovascularestem se desviado de modo marcante nesta última década. No passado, acreditava-se quetanto as estenoses arteriais, com repercussão no fluxo sanguíneo, como os índicesfuncionais de isquemia de órgãos poderiam direcionar nossas terapias. Culpávamos asestenoses críticas como sendo responsáveis pelas complicações isquêmicas daaterosclerose. Achados clínicos recentes importantes têm nos obrigado a reconsideraresses conceitos. As evidências atuais têm estabelecido a importância dos aspectosqualitativos das placas como determinantes na propensão a levar a complicações agudas.Entre as características funcionais das placas, em associação à vulnerabilidade, a inflamaçãotem surgido como mecanismo fisiopatológico fundamental, oferecendo alvos terapêuticospotenciais e novas estratégias de estratificação de risco. É nessa linha de raciocínio queos tópicos aterosclerose, fatores de risco coronário e síndromes coronárias agudas forambaseados.

Por outro lado, dentro da fisiopatologia da insuficiência cardíaca, a inflamação exercepapel importante, principalmente, na fase avançada da falência cardíaca, em que o estadode hipercatabolismo está predominando, assunto que também é discutido.

A resposta inflamatória vascular desencadeada pelos fatores de risco induz disfunçãoendotelial, caracterizada por apoptose e perda da integridade endotelial. Esse cenáriofacilita a entrada de lipoproteínas aterogênicas e a migração de leucócitos para o espaçoendotelial. Evidências recentes sugerem que as células progenitoras circulantes têm papelregenerador importante no endotélio na presença de fatores de risco aterosclerótico.

Dentro desse raciocínio, esperamos ter cumprido nosso objetivo de abordar a atualizaçãodos avanços dessa interação “inflamação” e “doenças cardiovasculares”.

Carlos Vicente Serrano Jr.Editor Convidado

Page 8: check up

RSCESPJUL/AGO/SET 2006

vi

COMUNICADO IMPORTANTE

Estamos republicando, nesta edição da Revista da Sociedade de Cardiologia do Estado de SãoPaulo, as figuras que ilustraram o artigo "Aspectos fisiopatológicos e estruturais da vasculopatiapulmonar", de autoria da Dra. Vera Demarchi Aiello, veiculado no trimestre Abril/Maio/Junho de2006, Volume 16, No 2, às páginas 71 a 78. Na época, por problemas técnicos com as figuras originais,a qualidade final de impressão saiu prejudicada. Nestas páginas, as figuras estão publicadas correta-mente, em cores.

Figura 2. Artérias pré-acinares comproliferação intimal oclusiva e alar-gamento adventicial. Coloração pelahematoxilina-eosina, objetiva 20X.

Figura 3. Fotomicrografia de lesãocomplexa (plexiforme) em artériapulmonar periférica. Coloração pelahematoxilina-eosina, objetiva 20X.

Page 9: check up

RSCESPJUL/AGO/SET 2006

vii

Figura 4. Veia pulmonar ocluída porfibrose intimal, mostrando desorgani-zação e proliferação de fibras elásti-cas (em preto). Coloração pela técni-ca de Muller para fibras elásticas,objetiva 40X.

Figura 5. Múltiplos pequenos vasosinfiltrando o parênquima pulmonar ea parede de um bronquíolo (metadedireita e canto superior direito), emcaso de microvasculopatia pulmonar.Coloração pela hematoxilina-eosina,objetiva 40X.

Figura 6. Fotomicrografia de artériaintra-acinar com inflamação na pare-de. O corte histológico foi submetidoa reação de imuno-histoquímica paramarcação de macrófagos. Objetiva40X.

Page 10: check up

RSCESPJUL/AGO/SET 2006

viii

2007

28, 29 e 30 de Abril

XXVIII Congresso da

Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo

São Paulo — SP

Eventos sujeitos a alterações.Confirmar data e local no “website” da SOCESP:

www.socesp.org.br

Informações:SOCESP EVENTOSwww.socesp.org.br

[email protected].: (11) 3179-0044 — ramal 2

EVENTOS SOCESP

Page 11: check up

127RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.

“Check-up”cardiológico:

avaliação clínicae fatores de risco

INTRODUÇÃO

As doenças cardiovasculares se tornarão, embreve, a principal causa de morte em todo o mun-do.1 No Brasil, as doenças cardiovasculares repre-sentam atualmente a causa principal de morte emtodas as capitais dos Estados e no Distrito Fede-ral.

A mortalidade por doença cardiovascular deveser medida pelo que ela representa proporcional-mente ao total de óbitos. Assim, no biênio 1980-1981, correspondeu a 33,3% do total de óbitos,enquanto no biênio 1999-2000 representou 34,8%dos óbitos.

No biênio 1980-1981, o número de óbitos pordoença cardiovascular foi de 190.743, passandopara 258.867 no biênio 1999-2000 (Tab. 1), ou seja,aumento de 35,7%. Houve aumento do número ab-

“CHECK-UP” CARDIOLÓGICO: AVALIAÇÃO CLÍNICA

E FATORES DE RISCO

JOÃO LOURENÇO VILLARI HERRMANN

JOSÉ AUGUSTO MARCONDES DE SOUZA

Universidade Federal de São Paulo – EPM

Endereço para correspondência:Rua Castro Alves, 806 – ap. 31 – CEP 01532-000 – São Paulo – SP

A importância crescente das doenças cardiovasculares como principal causa de morbidade emortalidade é conhecida. A manifestação inicial da doença pode ser devastadora. Oconhecimento de alguns fatores de risco, que, quando presentes, tornam a pessoa maisvulnerável à aquisição da doença, constitui os alicerces da profilaxia das doençascardiovasculares. O exame clínico é parte essencial do “check-up” cardiológico e aliado àanálise dos fatores de risco seleciona os exames complementares adequados. A partir doexame clínico e dos fatores de risco presentes utiliza-se o modelo de previsão de eventos deFramingham; para aqueles mais vulneráveis, adota-se uma atitude mais enérgica sobre osfatores de risco, devendo, quando necessário, ser indicada terapêutica medicamentosa.

Palavras-chave: doenças cardiovasculares, exame clínico, fatores de risco, previsão deeventos.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:127-37)RSCESP (72594)-1606

soluto de óbitos por doenças cardiovasculares, oque é, em parte, resultado do crescimento popula-cional, e, em parte, decorrente da redução da mor-talidade por outras causas, particularmente pordoenças infecciosas.2

O “check-up” cardiológico é um procedimen-to que permite fazer diagnóstico das condições mo-mentâneas de funcionamento do coração, além deavaliar a presença de risco para cardiopatia isquê-mica.

Nos pacientes que apresentam risco elevadopara doença coronariana, a mudança enérgica doestilo de vida e o controle rigoroso dos fatores derisco podem modificar o prognóstico da doença.

Para justificar a procura de uma doença antesda fase sintomática, algumas condições devem sersatisfeitas: a doença a ser investigada deve serimportante, em relação tanto ao risco de morbida-

Page 12: check up

128RSCESPJUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.“Check-up”cardiológico:avaliação clínicae fatores de risco

Tabela 1. Mortes por doença cardiovascular no Brasil.

1980-1981 1999-2000Doença n % n %

Doença reumática crônica 1.521 0,8 1.869 0,7Doença hipertensiva 12.830 6,7 22.917 8,9Doença isquêmica do coração 53.486 28 77.540 30,0Acidente vascular cerebral 63.154 33,1 84.082 32,5Outras 59.752 31,3 72.459 28,0Total 190.743 100 258.867 100,0

de e mortalidade como ao impacto sobre a quali-dade de vida; o método empregado para seu diag-nóstico deve ser eficaz; e, acima de tudo, o trata-mento precoce, na fase pré-sintomática da doen-ça, deve diminuir sua morbidade e mortalidade.3

As duas doenças cardiovasculares responsáveispelo maior número de internações hospitalares ede óbitos são a cardiopatia isquêmica e a insufici-ência cardíaca.

O “West of Scotland Coronary Prevention Stu-dy” (WOSCOPS” – Estudo de Prevenção Primá-ria) demonstrou que pacientes com hiperlipidemiamoderada sem antecedente de infarto agudo domiocárdio, quando recebiam pravastatina, apresen-tavam redução da incidência de infarto e de mortecardiovascular, quando comparados a pacientes nasmesmas condições que não usaram estatina.

A pravastatina reduziu em 20% o nível de co-lesterol plasmático e em 26% o nível de coleste-rol ligado à lipoproteína de baixa densidade (LDL-colesterol). Acompanhando essa redução, foi ob-servada diminuição de 31% na ocorrência de in-farto agudo do miocárdio não-fatal ou morte car-diovascular.

Em conclusão, em homens com hipercoleste-rolemia moderada, sem infarto agudo do miocár-dio prévio, o tratamento com pravastatina redu-ziu, de maneira significativa, a ocorrência de in-farto e de morte cardiovascular.4

O “Air Force/Texas Coronary AtherosclerosisPrevention Study” (AFCAPS/TexCAPS) analisouos possíveis benefícios da prevenção primária, es-tendida a homens e mulheres com níveis normaisde LDL-colesterol e níveis baixos de colesterolligado à lipoproteína de alta densidade (HDL-co-lesterol) submetidos a tratamento prolongado com20 mg/dia a 40 mg/dia de lovastatina. Após perío-do médio de 5,2 anos, o grupo tratado apresentouredução do risco de evento coronariano agudo, semproduzir aumento do risco de morte não-cardio-vascular ou câncer.5

Os dois estudos citados anteriormente demons-traram de maneira inequívoca que o tratamento

de determinados grupos de indivíduos assintomá-ticos previne a cardiopatia isquêmica.

O tratamento de pacientes assintomáticos comcomprometimento da contração ventricular sem-pre mereceu muito descrédito por parte dos cardi-ologistas.

Com o objetivo de elucidar essa dúvida, paci-entes assintomáticos com fração de ejeção igualou inferior a 0,35 foram randomizados para rece-ber maleato de enalapril ou placebo. O objetivoera verificar se a droga poderia diminuir o núme-ro de mortes ou o desenvolvimento de insuficiên-cia cardíaca. Após acompanhamento médio de 37,4meses, o grupo que recebeu enalapril apresentouredução de 29% no objetivo composto (morte einsuficiência cardíaca). Em conclusão, em assin-tomáticos com disfunção sistólica ventricular, oinibidor da enzima conversora da angiotensina(enalapril) reduziu significantemente a incidênciade insuficiência cardíaca. Houve também tendên-cia a menor número de mortes nesse grupo.6

Como demonstrado até agora, a importânciado exame cardiológico preventivo periódico éenorme. Além das razões mencionadas, a doençacardíaca pode ter como primeira apresentaçãomorte súbita ou infarto agudo do miocárdio, even-tos que podem ser acompanhados de grande mor-bidade. A detecção de indivíduos suscetíveis deserem vítimas desses eventos e a atuação enérgicasobre os fatores de risco podem atenuar o númerode casos.

A doença isquêmica do coração é isoladamen-te a maior causa de morte de homens e mulheresnos Estados Unidos: 50% dos homens e 64% dasmulheres vítimas de morte súbita não apresenta-vam sintomas prévios da doença. Entre 70% e 89%das mortes cardíacas súbitas ocorrem em homense a incidência anual é três a quatro vezes mais altaem homens que em mulheres.7

O “check-up” cardiológico é composto do exa-me clínico, da investigação dos fatores de risco,da solicitação de exames complementares basea-dos nos dados encontrados nos dois primeiros, e

Page 13: check up

129RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.

“Check-up”cardiológico:

avaliação clínicae fatores de risco

na recomendação de intervenções preventivas.

EXAME CLÍNICO

O exame clínico é composto de história clíni-ca e exame físico.

História clínicaA história clínica tem sido subestimada e sua

realização muitas vezes é delegada, pelo cardio-logista, a um assistente, a uma técnica em enfer-magem ou a um questionário previamente prepa-rado e aplicado igualmente a todos os pacientes.Essa prática é desaconselhada, pois a anamnesediligente e interessada representa um elo impor-tante na relação médico-paciente, que deve seramigável e impregnada de confiança bilateral.

Estão bastante difundidas no universo da prá-tica médica as diretrizes brasileiras e internacio-nais, os consensos e as forças-tarefa, que padroni-zam o atendimento médico e preconizam a apli-cação prática da medicina baseada em evidências.

Estudantes, estagiários, residentes, pós-gradu-andos e médicos fazem uso de recursos de infor-mática que lhes permitem acesso instantâneo a bi-blioteca médica atualizada.

As diretrizes têm como preocupação principalo tratamento, usando, via de regra, alguns resulta-dos de exames para orientar as diversas opçõesterapêuticas. Assim, por exemplo, na síndromecoronariana aguda, o resultado eletrocardiográfi-co norteia as diferentes opções terapêuticas.

O atendimento ambulatorial de especialidadeno sistema público é precário, de tal maneira queos pacientes cardiopatas são atendidos com fre-qüência nos serviços de emergência. Os socorris-tas, pela necessidade de decisões imediatas, sãoobjetivos no atendimento, fazendo anamnese cur-ta e dirigida e um exame físico rápido. Essa con-juntura assistencial faz com que o exame clínicoseja desvalorizado. A subutilização costumeira dahistória clínica faz com que o médico comece aperder a técnica para sua realização.

Cada médico, em geral, desenvolve sua pró-pria técnica de anamnese, permitindo aos pacien-tes a exposição espontânea de seus problemas,para, a seguir, com perguntas pertinentes, apro-fundar as características de suas queixas. As quei-xas mais comuns na anamnese cardiológica sãodor torácica, dispnéia, síncope, edema, palpitação,tosse, cianose e dor abdominal.

A dor torácica é o sintoma mais importante dacardiopatia isquêmica. A dor anginosa possui ca-racterísticas bem definidas, que, quando investi-gadas cuidadosamente, permitem o diagnóstico.Localiza-se na região precordial ou retroesternale é desencadeada por esforço físico ou estresse

emocional. Apresenta caráter de aperto ou quei-mação e dura em geral de 2 a 5 minutos, mas podeter a duração de segundos ou estender-se por até15 a 20 minutos. Pode ter outras localizações, alémde apresentar irradiação e melhora com o repousoou com o uso de nitratos sublinguais. Outras afec-ções cardíacas e extracardíacas podem produzirdor torácica, porém as características em geral sãodiferentes.

A dispnéia é definida como a percepção de des-conforto ou dificuldade para respirar. É um dosprincipais sintomas das doenças cardíacas e pul-monares. Quando ocasionada por cardiopatia, re-sulta de congestão pulmonar secundária ao aumen-to da pressão de enchimento ventricular ou do átrioesquerdo. Em alguns portadores de insuficiênciacoronariana, principalmente idosos e diabéticos,o episódio de isquemia miocárdica se exteriorizaclinicamente por dispnéia sem dor precordial(equivalente isquêmico).

A síncope, definida como perda de consciên-cia, resulta, com freqüência, da redução abruptada perfusão cerebral. Pode decorrer de bloqueioatrioventricular (Stokes-Adams), de taquicardiaventricular e de obstrução da via de saída do ven-trículo esquerdo (estenose aórtica ou cardiomio-patia hipertrófica). A anamnese é muito importantepara diagnosticar a causa da síncope, inclusive paraexcluir episódio convulsivo.

Os outros achados são menos comuns, porémdevem ser interrogados.

O interrogatório complementar, parte impor-tante da história clínica no “check-up” cardioló-gico, compreende os seguintes itens:– Hábitos e antecedentes epidemiológicos: local

de nascimento – se é zona rural ou urbana; tipode moradia – se pode haver epidemiologia po-sitiva para doença de Chagas; tabagismo – não-fumante, ex-fumante ou fumante (em caso po-sitivo, número de cigarros e há quanto tempofaz uso da droga); uso de drogas mais pesadas– como, por exemplo, cocaína; hábito alcoóli-co – com informação sobre quantidade e tipoingeridos, diariamente ou semanalmente.

– Antecedentes pessoais: é parte importante daanamnese, particularmente doenças pregressasque podem ter relação com eventuais afecçõescardíacas futuras.

– Fatores de risco de aterosclerose: questionarsobre a presença de diabetes e hipertensão ar-terial, sobre a realização de exames periódi-cos, e sobre os valores da pressão arterial – sejá fez uso de hipotensores. Questionar também:conhecimento dos valores dos lípides plasmá-ticos, inatividade física, atividade profissional,nível de estresse compatível com o desempe-nho da atividade profissional, e presença de

Page 14: check up

130RSCESPJUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.“Check-up”cardiológico:avaliação clínicae fatores de risco

obesidade e de síndrome metabólica.– História familiar: interrogar sobre manifestações

de cardiopatias em familiares – existência decardiopatias congênitas em familiares (é co-nhecida a incidência familiar da comunicaçãointeratrial). Sabe-se que a complicação maistemível da cardiomiopatia hipertrófica é amorte súbita. Dois fatores são considerados derisco para esse evento: aparecimento da doen-ça na juventude e antecedente de morte súbitaem parente jovem de primeiro grau. As infor-mações sobre antecedentes familiares e seusfatores de risco devem ser habitualmente maisdetalhadas: valores do colesterol plasmático,existência de diabetes, hipertensão arterial eoutras manifestações ateroscleróticas nos pa-rentes, e existência de outros casos de cardio-patia isquêmica na família. São mais impor-tantes as doenças que acometem os parentesde primeiro grau, principalmente homens commenos de 55 anos de idade e mulheres commenos de 65 anos.

Exame físicoDeve ser dividido em exame geral, exame car-

diovascular e pesquisa de outras manifestações dedoença aterosclerótica.

O exame geral é feito como em todo paciente,com análise de cabeça-pescoço, tórax e abdômen.Devem ser preocupação de todo cardiologista opeso e a altura do paciente, para estimativa do ín-dice de massa corporal e da medida da cintura ab-dominal.

O exame cardiovascular inicia-se com a deter-minação da pressão e do pulso. A seguir, deve serrealizado exame do sistema cardiovascular, compalpação do icto, pesquisa de frêmitos e auscultacardíaca, para detecção de sopros, arritmias e pre-sença de 3a e 4a bulhas, estalidos de abertura devalvas ou estalido mesossistólico característico deprolapso da valva mitral.

O exame de outras manifestações de ateros-clerose deve ser uma preocupação do “check-up”cardiológico, compreendendo: características dopulso arterial, endurecimento das artérias, presençade xantelasma e xantomas, sopro carotídeo, pul-sos palpáveis nas artérias dos membros inferiorese palpação da aorta abdominal para diagnósticode aneurisma da aorta abdominal.

FATORES DE RISCO

Em relato sobre o estudo de Framingham, Kan-nel e colaboradores usaram pela primeira vez otermo “fator de risco” associado ao aparecimentoda cardiopatia isquêmica.8

O termo fator de risco geralmente aplica-se a

um parâmetro que pode prever um evento cardio-vascular futuro. O importante a respeito de umfator de risco é sua capacidade preditiva, a facili-dade de obtê-lo e o custo para sua obtenção.

Os fatores de risco para doença coronária sãoclassificados em tratáveis e não-tratáveis. Os tra-táveis compreendem: tabagismo, hipertensão ar-terial sistêmica, LDL-colesterol alto, HDL-coles-terol baixo, e diabetes melito. Os não-tratáveiscompreendem: sexo masculino, sexo femininoapós a menopausa, história familiar de doença ate-rosclerótica prematura em parentes de primeirograu (homem < 55 anos; mulher < 65 anos), e ida-de (homem > 45 anos; mulher > 55 anos).

A estimativa do risco cardiovascular em paci-entes sem cardiopatia conhecida é ferramenta im-portante na avaliação de pacientes assintomáticos,definindo estratégia para abordagem diagnósticanessa população e possível implementação demedidas terapêuticas e mudança de estilo de vida.Sabe-se que 90% dos pacientes com doença ate-rosclerótica apresentam pelo menos um fator derisco para essa condição, e a associação de um oumais fatores tem efeito aditivo. Por outro lado, apresença de doença aterosclerótica é muito me-nos freqüente em pacientes sem fatores de risco.9

O escore de risco de Framingham (Tab. 2) éum dos mais antigos e mais utilizados na práticamédica. Incorpora variáveis como idade, sexo, ní-veis de colesterol, pressão arterial, tabagismo epresença de diabetes no cálculo estimado do riscode desenvolvimento de doença coronária ateros-clerótica em 10 anos. Uma revisão desse escorepelo “National Cholesterol Education ProgramExpert Panel on Detection, Evaluation, and Treat-ment of High Blood Cholesterol in Adults” reco-mendou a retirada do diabetes do escore e elevousua condição a equivalente de doença coronária.

Com base na presença desses fatores, os indi-víduos são classificados em:

a) baixo risco (< 10% de incidência de doençacoronária em 10 anos);b) risco intermediário (10% a 20% de incidên-cia de doença coronária em 10 anos);c) risco elevado (> 20% de incidência de do-ença coronária em 10 anos).Outros escores de risco existem e foram de-

senvolvidos com o propósito de melhorar sua acu-rácia e, especialmente, para ser aplicados em de-terminadas populações.

A despeito de suas limitações, sabe-se que aimplementação de medidas agressivas para con-trole dos fatores de risco tem importante impactoprognóstico.

TabagismoVários são os estudos que relacionam o taba-

Page 15: check up

131RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.

“Check-up”cardiológico:

avaliação clínicae fatores de risco

gismo ao aumento da incidência de doença vascu-lar aterosclerótica, nos quais observa-se risco re-lativo de morte por doença coronária de 1,7.10

Muitas são as evidências de que o abandono dohábito de fumar tem efeito contrário, diminuindoo risco pela metade após um ano, e caindo a ní-veis próximos aos dos não-fumantes após váriosanos sem fumar.11, 12 Por tudo isso os tabagistasdeveriam ser incentivados a abandonar esse vício.

Hipertensão arterial sistêmicaÉ importante fator de risco para doença coro-

nária, para doença cerebrovascular e para insufi-ciência cardíaca. A hipertensão tanto sistólicacomo diastólica contribui para esse aumento deincidência. Vários são os estudos que demonstramo benefício da redução da pressão arterial na di-minuição de eventos cerebrovasculares e na inci-dência de insuficiência cardíaca.13 O benefício comrelação à diminuição de eventos coronários não étão claro.14

Segundo as recomendações do “Seventh Re-port of the Joint National Committee on Preventi-on, Detection, Evaluation, and Treatment of HighBlood Pressure” (JNC 7), a terapêutica da hiper-tensão arterial deve levar em conta os níveis pres-sóricos e a presença de outros fatores de risco.Mesmo pacientes com hipertensão arterial leve esem outros fatores de risco se beneficiam da nor-malização da pressão arterial.14

A introdução do tratamento farmacológi-co deve ser uma continuidade das medidasnão-farmacológicas de controle da hiperten-são arterial.

Perda de peso e estímulo à atividade física re-gular devem ser as recomendações iniciais na abor-dagem de todo paciente hipertenso.

Pacientes considerados portadores de pressãonormal a elevada com diabetes melito ou presen-ça de lesão em órgão-alvo devem ser considera-dos para tratamento farmacológico, dando-se pre-ferência aos inibidores da enzima de conversão daangiotensina ou aos bloqueadores dos receptoresda angiotensina II.

DislipidemiaVários são os estudos que demonstram que a

redução dos níveis de colesterol é benéfica na pre-venção primária da doença aterosclerótica. O es-tudo WOSCOPS demonstrou diminuição de even-tos cardiovasculares em homens de meia-idadetratados com estatinas e que apresentavam LDL-colesterol médio de 155 mg/dl.4 Vários outros es-tudos demonstraram o mesmo achado, como oAFCAPS/TexCAPS e o “Anglo-Scandinavian Car-diac Outcomes Trial-Lipid Lowering Arm” (AS-COT-LLA).15, 16

Inatividade físicaEstudos observacionais demonstram relação

inversa entre nível de atividade física e risco dedoença coronária, e ainda parece haver um gradi-ente no qual quanto maior o nível de atividade fí-sica menor esse risco. No que tange à prevençãoprimária, deve-se recomendar um mínimo de 20minutos de atividade física, como caminhar, dequatro a seis vezes por semana. A realização deuma prova isquêmica, como o teste ergométrico,deve ser recomendada para todos os sedentáriosque planejam se engajar em uma atividade físicamais vigorosa.17

ObesidadeEstá associada a vários dos fatores relaciona-

dos à doença cardiovascular, como hipercoleste-rolemia, resistência à insulina, baixos níveis deHDL-colesterol e hipertrigliceridemia, entre ou-tros. Segundo o estudo de Framingham, existe as-sociação positiva entre peso ponderal e presençade coronariopatia, assim como sua distribuição,estando os pacientes com obesidade predominan-temente abdominal com o maior risco.18, 19

A presença de obesidade também eleva o riscode insuficiência cardíaca e de acidente vascular ce-rebral. Todos os indivíduos obesos devem ser escla-recidos quanto aos benefícios da redução de peso.

Diabetes melitoÉ importante fator de risco para o desenvolvi-

mento de coronariopatia e doença oclusiva cere-brovascular. No entanto, se o controle glicêmicorigoroso parece ser importante na diminuição dasmicroangiopatias, o mesmo não parece ser tãoóbvio com relação às macroangiopatias, comoangina instável, infarto do miocárdio e acidentevascular cerebral.

Por outro lado, o controle de outros fatores derisco, como hipertensão arterial, dislipidemia e ta-bagismo, a perda de peso e o consumo diário debaixas doses de ácido acetilsalicílico em pacien-tes diabéticos parecem ter grande influência so-bre a redução da mortalidade cardiovascular.20, 21

SÍNDROME METABÓLICA

Reaven, em 1988, introduziu o conceito de sín-drome X, que atualmente passou a ser chamadade síndrome metabólica.

A síndrome metabólica, cuja prevalência é es-timada em 20% a 25% da população geral, au-menta com o avançar da idade, chegando a 42%em indivíduos com mais de 60 anos de idade.22

A gordura visceral é avaliada pela medida dacircunferência da cintura, e é o método mais usa-do na literatura para avaliar adiposidade visceral.

Page 16: check up

132RSCESPJUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.“Check-up”cardiológico:avaliação clínicae fatores de risco

Tabela 2. Escore de risco de Framingham.

Idade H M

20-34 -9 -735-39 -4 -340-44 0 045-49 3 350-54 6 655-59 8 860-64 10 1065-69 11 1270-74 12 1475-79 13 16

IdadeColesterol 20-39 40-49 50-59 60-69 70-79total (mg/dl) H M H M H M H M H M

< 160 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0160-199 4 4 3 3 2 3 1 1 0 1200-239 7 8 5 6 3 6 1 2 0 1240-279 9 11 6 8 4 8 2 3 1 2> 280 11 13 8 10 5 10 3 4 1 2

Idade20-39 40-49 50-59 60-69 70-79

Cigarros H M H M H M H M H M

Não 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0Sim 8 9 5 7 3 4 1 2 1 1

HDL-colesterol(mg/dl) H M

> 60 -1 -150-59 0 040-49 1 1< 40 2 2

H = homens; M = mulheres.continua na página seguinte

Valores acima de 88 cm para mulheres e de 102cm para homens estão associados à presença derisco cardiovascular muito aumentado.23 Essesvalores integram os critérios do “National Cho-lesterol Education Program” (NCEP-ATPIII).

Diversos fatores agrupados sob o denomina-dor comum de resistência à insulina são compo-nentes dessa síndrome: obesidade visceral, into-lerância à glicose, hipertensão arterial sistêmica,hipertrigliceridemia, e níveis baixos de HDL.

Embora o valor do LDL-colesterol não faça

parte dos critérios utilizados para o diagnósticode síndrome metabólica, analisando mais profun-damente as alterações lipídicas nos estados de re-sistência à insulina observa-se aumento do núme-ro de partículas pequenas e densas dessa lipopro-teína, reconhecidamente mais aterogênicas que aspartículas maiores.24

ASPIRINA

Vários são os estudos que demonstram o be-

Page 17: check up

133RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.

“Check-up”cardiológico:

avaliação clínicae fatores de risco

Tabela 2. Escore de risco de Framingham (continuação).

Pressão arterial Não-tratada Tratadasistólica (mmHg) H M H M

< 120 0 0 0 0120-129 0 1 1 3130-139 1 2 2 4140-159 1 3 2 5> 160 2 4 3 6

Total Risco absoluto – 10 anos (%)de pontos H M

< 0 < 10 11 12 13 14 15 26 27 38 4 < 19 5 110 6 111 8 112 10 113 12 214 16 215 20 316 25 417 > 30 518 619 820 1121 1422 1723 2224 27> 25 > 30

H = homens; M = mulheres.

nefício da aspirina na prevenção de eventos vas-culares coronários. A redução de eventos vascula-res cerebrais é menos consistente e o efeito prote-tor parece ser mais claro em homens que em mu-lheres. Outro ponto a ser levado em conta é que obenefício deve superar as possíveis complicações,como o risco de sangramento.

Por esse motivo, devem ser identificados indi-víduos com risco suficiente para que se justifiqueseu emprego. Em geral, as principais sociedadesmédicas recomendam que a aspirina seja prescri-

ta para indivíduos que apresentem risco de eventocardiovascular superior a 10% em 10 anos.25, 26 Adose recomendada varia entre 75 mg e 160 mgpor dia.

TESTES NÃO-INVASIVOS PARAAVALIAÇÃO DE ISQUEMIA SILENCIOSA

Eletrocardiografia de esforçoPoucos são os dados a respeito desse exame

em pacientes assintomáticos. Apenas a positivi-

Page 18: check up

134RSCESPJUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.“Check-up”cardiológico:avaliação clínicae fatores de risco

dade desse teste com carga baixa teria valor prog-nóstico relevante, eventualidade bastante rara nessapopulação. Sua realização nesse subgrupo parecesó ser justificável na presença de pelo menos umfator de risco para coronariopatia.27, 28

Ecocardiografia com estresse (farmacológicoou esforço)

Baseia-se na premissa de que a isquemia mio-cárdica induz alteração da contratilidade miocár-dica. Não existem dados que justifiquem seu em-prego em indivíduos assintomáticos de risco bai-xo ou de risco intermediário. Pode ter algum va-lor em pacientes do sexo feminino e idosos (> 75anos) com risco intermediário.29

Cintilografia miocárdica de perfusão(farmacológico ou esforço)

Seu emprego parece não ser justificado em pa-cientes de baixo risco. Da mesma forma que a eco-cardiografia com estresse, pode ter alguma utili-dade em mulheres na menopausa e idosos (> 75anos) de risco intermediário.30

Monitorização ambulatorial daeletrocardiografia

É recomendação classe III (não deve ser indi-cada) para pacientes assintomáticos na tentativade estimar o risco de eventos maiores, como in-farto agudo do miocárdio ou morte súbita, por nãofornecer informação prognóstica.31

Tomografia por emissão de pósitronsAlém de procedimento diagnóstico de alto cus-

to, não oferece vantagem sobre outros testes maissimples, como eletrocardiografia de esforço.32

Avaliação do escore de cálcioA presença de calcificação coronária é exce-

lente marcador da presença de processo ateroscle-rótico e pode ser detectada com precisão pela to-mografia helicoidal. No entanto, não existem da-dos de longo prazo determinando a utilidade desua detecção e o desenvolvimento de eventos co-ronários. A presença de baixo escore de cálcio estáligada a baixa probabilidade de eventos coronári-os.

Proteína C-reativa ultra-sensívelMarcador sanguíneo com alta sensibilidade na

detecção de processos inflamatórios, em especiala inflamação vascular. Pode ter valor na detecçãode eventos coronários futuros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base no exame clínico e nos fatores de

risco, são recomendados os exames complemen-tares necessários.

Quando há suspeita de cardiopatia solicita-seo exame apropriado. A eletrocardiografia faz par-te da avaliação cardiológica inicial.

Caso haja suspeita de valvopatia, insuficiên-cia cardíaca ou cardiomiopatia, a ecocardiografiaé o exame que mais pode auxiliar o cardiologista.

Quando a queixa é de arritmia, o Holter de 24horas auxilia no diagnóstico do tipo de arritmia.

Finalmente, quando há suspeita de cardiopatiaisquêmica, a ergometria e os testes não-invasivosde imagem são os recomendados.

A maior parte dos pacientes submetidos a “check-up” cardiológico não apresenta evidências de doen-ça cardíaca estrutural. É para esse grupo que aconduta é mais controversa.

Em pacientes assintomáticos de baixo riscopara doença coronariana (< 10% de doença co-ronária em 10 anos), o teste ergométrico positi-vo tem grande possibilidade de ser um falsopositivo, levando a condutas inadequadas, comomenor investigação e exposição do paciente aexames invasivos, que se acompanham da pos-sibilidade de complicações, podendo acarretarestigma psicológico e conduzir a tratamentosdesnecessários.

No extremo oposto, a rigidez na indicação deexames pode não detectar o portador de obstruçãograve, cuja primeira manifestação pode ser a mor-te súbita.

Os diabéticos constituem um grupo particular-mente importante. Considerando a elevada inci-dência de doença cardiovascular como causa deóbito (75%) e a freqüência e a importância da is-quemia silenciosa nos diabéticos, a investigaçãode assintomáticos é desafiadora.

O estudo “Detecção de Isquemia em PacientesDiabéticos Assintomáticos” (DIAD) relatou ima-gens de perfusão miocárdica alteradas em 16% dospacientes, porém apenas 1% apresentavam defei-to grande.33

Outros estudos não apresentaram dados tão be-nignos em assintomáticos. A síndrome metabóli-ca é outra condição que parece acarretar granderisco cardiovascular.

A abordagem dos assintomáticos nessas duassituações ainda não é satisfatória e constitui moti-vo de grande controvérsia.

A utilização de exames não-invasivos que de-tectam isquemia miocárdica deve ser mais liberalnessas duas situações. O resultado do teste isquê-mico indicativo de mau prognóstico deve ser acom-panhado da cinecoronariografia.

No “check-up” cardiológico, a arte médica con-siste no encontro do equilíbrio que traga seguran-ça ao paciente e tranqüilidade ao médico.

Page 19: check up

135RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.

“Check-up”cardiológico:

avaliação clínicae fatores de risco

REFERÊNCIAS

1. Murray CJL, Lopes AD. The Global Burden ofDisease. Cambridge, M.A.: Harvard School ofPublic Health; 1996.

2. Laurenti Rui. Mortalidade por doenças cardio-vasculares no Brasil. Tratado de Cardiologia –SOCESP. São Paulo: Manole; 2005.

3. Martins MA. Check-up do check-up. Rev. As-soc. Méd. Bras. 2005;51(3):121-32.

4. Shepherd J, Cobbe SM, Ford I, Isles CG, Lori-mer AR, McFarlane PW, et al. Prevention ofcoronary disease with prasvatatin in men withhypercholesterolemia – West of Scotland Co-ronary Prevention Study Group. N Engl J Med.1995;333(20):1301-7.

5. Downs JR, Clearfield M, Weis S, et al. Primaryprevention of acute coronary events with lo-vastatin in men and women with average cho-lesterol levels: results of AFCAPS/TEXCAPSAir Force/Texas Coronary Atherosclerosis Pre-vention Study. JAMA. 1998;279:1615.

6. The SOLVD Investigators. Effect of enalaprilon mortality and the development of heart fai-lure in asymptomatic patients with reduced leftventricular ejection fractions. N Engl J Med.

HEART CHECK-UP: CLINICAL EXAMINATION

AND RISK FACTORS

JOÃO LOURENÇO VILLARI HERRMANN

JOSÉ AUGUSTO MARCONDES DE SOUZA

The increasing importance of heart diseases as a major factor for morbidity and mortality iswell known. The onset of the disease may be devastating. The knowledge of the riskfactors presented by some patients is the basis for prophylaxis of heart diseases. Clinicalexamination is essential to heart check-up and together with risk factors for coronaryatherosclerosis analysis, suggest suitable additional examination. Through clinicalexamination and presented risk factors, we’ve used the Framingham risk model and forthose patients more vulnerable, strong measures on the risk factors and medicationwhen necessary.

Key words: heart disease, clinical examination, risk factors, event prediction.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:127-37)RSCESP (72594)-1606

1992;327:685-91.7. Heart Disease and Stroke Statistics. 2006. Up-

date A.N.A.8. Kannel WB, Dawber TR, Kagan A, et al. Fac-

tors of risk in the development of coronaryheart disease – six years follow-up experien-ce: The Framingham Study. Ann Intern Med.1961;55:33-50.

9. Stamler J, Stamler R, Neaton JD, WentworthD, Daviglus ML, Garside D, et al. Low risk-factor profile and long-term cardiovascular andnoncardiovascular mortality and life expectan-cy: findings for 5 large cohorts of young adultsand middle-aged men and women. JAMA.1999;282(21):2012-8.

10. US Department of Health and Human Servi-ces. The health benefits of smoking cessation:a report of Surgeon General. Rockville, Ma-ryland, US Department of Health and HumanServices, 1990. DHHS Publication 90-8416.

11. Kawachi I, Colditz GA, Stampfer MJ, WillettWC, Manson JE, Rosner B, et al. Smoking ces-sation and decreased risk of stroke in women.JAMA. 1993;269(2):232-6.

12. Wannamethee SG, Shaper AG, Whincup PH,Walker M. Smoking cessation and the risk of

Page 20: check up

136RSCESPJUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.“Check-up”cardiológico:avaliação clínicae fatores de risco

stroke in middle-aged men. JAMA. 1995;274(2):155-60.

13. Hebert PR, Moser M, Mayer J, Glynn RJ, Hen-nekens CH. Recent evidence on drug therapyof mild to moderate hypertension and decrea-sed risk of coronary heart disease. Arch InternMed. 1993;153(5):578-81.

14. Collins R, Peto R, MacMahon S, Herbert P,Fiebach NH, Eberlein KA, et al. Blood pres-sure, stroke, and coronary heart disease. Part 2– Short-term reductions in blood pressure:overview of randomised drug trials in theirepidemiological context. Lancet. 1990;335(8693):827-38.

15. Downs JR, Clearfield M, Weis S, Withiney E,Shapiro DR, Beere PA, et al. Primary preven-tion of acute coronary events with lovastatinin men and women with average cholesterollevels: results of AFCAPS/TexCAPS – AirForce/Texas Coronary Atherosclerosis Preven-tion Study. JAMA. 1998;279(20):1615-22.

16. Sever PS, Dahlof B, Poulter NR, Wedel H,Beevers G, Caulfield M, et al. Prevention ofcoronary and stroke events with atorvastatinin hypertensive patients who have averageor lower-than-average cholesterol concentra-tions, in the Anglo-Scandinavian CardiacOutcomes Trial-Lipid Lowering Arm (AS-COT-LLA): a multicentre randomised con-trolled trial. Lancet. 2003;361(9364):1149-58.

17. Williams PT. Relationship of distance run perweek to coronary heart disease risk factors in8,283 male runners. The National Runners’Health Study. Arch Intern Med. 1997;157(2):191-8.

18. Hubert HB, Feinleib M, McNamara PM, Cas-telli WP. Obesity as an independent risk factorfor cardiovascular disease: a 26 year follow-up of participants in the Framingham HeartStudy. Circulation. 1983;67(5):968-77.

19. McGill HC Jr, McMahan CA, Herderick EE,Zieske AW, Malcom GT, Tracy RE, et al. Obe-sity accelerates the progression of coronaryatherosclerosis in young men. Circulation.2002;105(23):2712-8.

20. Yudkin JS. How can we best prolong life? Be-nefits of coronary risk factor reduction in non-diabetic and diabetic subjects. Br Med J.1993;306(6888):1313-8.

21. Gaede P, Vedel P, Larsen N, Jensen GV, Par-ving HH, Pedersen O. Multifactorial interven-tion and cardiovascular disease in patients withtype 2 diabetes. N Engl J Med. 2003;348(5):383-93.

22. Ford ES, Giles WH, Dietz WH. Prevalence ofthe metabolic syndrome among US adults: fin-dings from the Third National Health and Nu-trition Examination Survey. JAMA.2002;287:356-9.

23. Ribeiro Filho F, Mariosa L, Ferreira S, Zane-lla MT. Gordura visceral e síndrome metabó-lica: mais que uma simples associação. ArqBras Endocrinol Metab. 2006;50/2:230-8.

24. Pierre AC, Ruel IL, Cantin B, Dagenais GR,Bernard MP, Depres JP, et al. Comparison ofvarious electrophoretic characteristics of LDLparticles and their relationship to the risk ofischemic heart disease. Circulation. 2001;104:2295-9.

25. Pearson TA, Blair SN, Daniels SR, et al. AHAGuidelines for Primary Prevention of Cardio-vascular Disease and Stroke: 2002 Update:Consensus panel Guide to Comprehensive RiskReduction for Adult Patients Without Corona-ry or Other Atherosclerotic Vascular Diseases.American Heart Association Science Advisoryand Coordinating Committee. Circulation.2002;106:388.

26. US Preventive Services Task Force. Guide toclinical preventive services, 3rd ed., 2000-2002.www.ahrq.gov/clinic/prevnew.htm

27. Smith Jr SC, Greenland P, Grundy SM. Pre-vention Conference V: Beyond secondary pre-vention – Identifying the high-risk patient forPrimary Prevention Executive Summary. Cir-culation. 2000;101:111-6.

28. Bruce RA, DeRouen TA, Hossack KF. Valueof maximal exercise tests in risk assessmentof primary coronary heart disease events inhealthy men: five years’ experience of the Se-attle Heart Aatch Study. Am J Cardiol.1980;46:371-8.

29. Sawada SG, Ryan T, Conley MJ, Corya BS,Feigenbaum H, Armstrong WF. Prognosticvalue of a normal exercise echocardiogram. AmHeart J. 1990;120:49-55.

30. Schwartz RS, Jackson WG, Celio PV, Richar-dson LA, Hickman JR Jr. Accuracy of exerci-se 201–TI myocardial scintigraphy in asymp-tomatic young men. Circulation. 1993;87:165-72.

31. Fisch C, DeSanctis RW, Dodge HT, ReevesTJ, Weinberg SL. Guidelines for ambulatoryelectrocardiography: a report of the Ameri-can College of Cardiology/American HeartAssociation Task Force on Assessment of Di-agnostic and Therapeutic CardiovascularProcedures (Subcommittee on AmbulatoryElectrocardiography). J Am Coll Cardiol.

Page 21: check up

137RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HERRMANN JLVe col.

“Check-up”cardiológico:

avaliação clínicae fatores de risco

1989;13:249-58.32. Gould KL, Ornish D, Scherwitz L, Brown S,

Edens RP, Hess MJ, et al. Changes in myocar-dial perfusion abnormalities by positron emis-sion tomography after long-term, intense risk

factor modification. JAMA. 1995;274:894-901.33. Wackers FJT, Young LH, Inzucchi SE, et al.

Detection of silent myocardial ischemia inasymptomatic diabetic subjects: The Diad Stu-dy. Diab Care. 2004;27:1954-61.

Page 22: check up

MASTROCOLLA LEe cols.Eletrocardiografia eteste ergométricono “check-up”cardiológico

138RSCESPJUL/AGO/SET 2006

ELETROCARDIOGRAFIA E TESTE ERGOMÉTRICO

NO “CHECK-UP” CARDIOLÓGICO

LUIZ EDUARDO MASTROCOLLA

JOÃO MANOEL ROSSI

SUSIMEIRE BUGLIA

Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia

Endereço para correspondência:Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 – Ibirapuera – CEP 04012-180 – São Paulo – SP

Não existe estudo epidemiológico, até o momento, avaliando diretamente quando aeletrocardiografia deveria ser usada como ferramenta de triagem para doençascardiovasculares em grandes populações. Em jovens atletas e pacientes de alto risco ou comsuspeita de cardiopatia, porém, a eletrocardiografia deve ser parte integrante da avaliaçãoinicial. O teste ergométrico em pacientes assintomáticos não encontra aceitação consensuale tem relação custo-efetividade questionável. No entanto, diretrizes destacam o sugestivovalor da ergometria em pacientes diabéticos que planejam se exercitar, em pacientes commúltiplos fatores de risco que necessitam orientação médica para a prevenção secundária,em homens com mais de 45 anos de idade e em mulheres com idade superior a 55 anos quepretendem iniciar programa de atividades físicas intensas, e naqueles envolvidos emocupações de alto risco e que envolvam a coletividade ou com elevado risco para doençaarterial coronária em decorrência de co-morbidades como insuficiência renal crônica edoença vascular periférica. Adicionalmente ao conhecimento das limitações da análise doinfradesnível do segmento ST à população assintomática, variáveis não-eletrocardiográficasaplicadas nessa população têm sido incorporadas e comprobatórias na valorizaçãoprognóstica dos testes de esforço, como: a) capacidade funcional; b) incapacidade de afreqüência cardíaca elevar-se normalmente durante o exercício ou incompetênciacronotrópica; c) retorno ou recuperação lenta da freqüência cardíaca após a interrupção doesforço; e d) arritmia ventricular na fase de recuperação do teste ergométrico. Com oobjetivo de detecção e tratamento da aterosclerose subclínica, recentemente tem-se levadoem consideração a avaliação de pacientes assintomáticos com métodos de imagem e ainclusão do teste ergométrico como parte desse processo de triagem nos homens de 45 a 75anos e nas mulheres de 55 a 75 anos.

Palavras-chave: eletrocardiografia, teste ergométrico, assintomáticos, triagem.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:138-53)RSCESP (72594)-1607

INTRODUÇÃO

Tem sido considerada normal a prática comumde incluir a eletrocardiografia como parte de exa-

mes de rotina, antes de procedimentos cirúrgicose em admissões hospitalares de pacientes sem evi-dências de doença cardíaca e sem fatores de riscomaiores. Esses exames podem ser importantes na

Page 23: check up

MASTROCOLLA LEe cols.

Eletrocardiografia eteste ergométrico

no “check-up”cardiológico

139RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

detecção de anormalidades desconhecidas, apre-sentando valor para eventos cardiovasculares fu-turos, prestando-se também à análise evolutivaquando traçados anteriores são disponíveis1. Nãohá evidências científicas comprobatórias de talprática, e a sensibilidade da eletrocardiografia clás-sica de 12 derivações para identificar doentes comafecções específicas que desencadearão eventosou que sofrerão modificações diagnósticas e tera-pêuticas é habitualmente limitada e não poderiareforçar a aplicação universal do método comotriagem2-4. Em diretriz recente publicada5 objeti-vando a avaliação de atletas jovens, destaca-se anecessidade da pré-participação médica na libe-ração para atividades esportivas competitivas, ten-do como base: a) eficácia comprovada da triagemsistemática pela eletrocardiografia de 12 deriva-ções (associada à história e ao exame físico) paraidentificar hipertrofia ventricular e cardiomiopa-tia, principais causas de morte súbita relacionadaao esporte; e b) potencial de triagem na detecçãode outras doenças cardiovasculares letais associa-das a anormalidades do eletrocardiograma.

Da mesma forma, a realização da eletrocardi-ografia na rotina pré-operatória de cirurgias de pe-queno porte é questionável, considerando-se omenor poder de estratificação de risco e a peque-na chance de adequações decorrentes nos proce-dimentos pré, intra e pós-operatórios. Nessas si-tuações, a indicação torna-se vinculada mais aojulgamento clínico que baseada em diretrizes mé-dicas ou protocolos estabelecidos. Por outro lado,quando na presença de doença cardíaca conheci-da, há indicação formal para seu emprego comoparte do exame clínico inicial, após terapêutica queproduza modificações eletrocardiográficas queestejam relacionadas aos efeitos do tratamento, àprogressão da doença ou a efeitos adversos. Adi-cionalmente, é apropriada no seguimento de mo-dificações dos sinais ou sintomas ou, ainda, dian-te de achados laboratoriais pertinentes, por vezesmesmo sem alterações clínicas. Em pacientes con-siderados de alto risco ou com suspeita de cardio-patia, a eletrocardiografia encontra também apli-cação consensual, sendo integrante da avaliaçãoinicial6. Nesse contexto, incluem-se, além dos por-tadores de fatores de risco como tabagismo, dia-betes, doença vascular periférica, hipertensão ar-terial, história familiar de doença cardíaca (sín-drome do QT longo, pré-excitação, etc.) ou demorte súbita prematura de causa desconhecida, ospacientes em uso de medicações cardíacas espe-cíficas, durante “follow-up” de eventos clínicosou em intervalos prolongados (habitualmenteiguais ou superiores a um ano), e diante de estabi-lidade clínica como pré-operatório de intervençõesmaiores, etc.

Ressalta-se, finalmente, a ampla variedade desituações para a aplicação da eletrocardiografia,considerando-se sua simplicidade de realização ebaixo custo, embora sempre deva ser dependenteda avaliação conjunta pelo médico, baseada emdados como idade, sexo, história clínica e examefísico.

TESTE ERGOMÉTRICO

Entre os portadores de doença arterial coroná-ria, principal causa de morte nos países desenvol-vidos e em crescente e alarmante freqüência nospaíses em desenvolvimento, muitos dos que apre-sentam implicações prognósticas importantes sãoassintomáticos7. No entanto, a investigação clíni-ca complementar por provas não-invasivas nessegrupo de indivíduos não encontra aceitação con-sensual e de relação custo-efetividade questioná-vel, existindo recomendações recentes contráriasà aplicação dos testes de esforço como ferramentade “screening”8. Entre as evidências para a justifi-cativa de tais posturas ressaltam-se as limitaçõesdas alterações do segmento ST desencadeadasdurante e após o esforço para o diagnóstico dedoença arterial coronária, especialmente em mu-lheres, resultando em investigação e tratamentosconsiderados não apropriados (classe III de indi-cação)7. Adicionalmente, a ausência de estudosrandomizados com número elevado de adultosassintomáticos, na tentativa de demonstrar bene-fícios clínicos da aplicação de tais provas, reforçaas recomendações, além do conhecimento de quefatores metodológicos como modificações da in-terpretação do segmento ST, análise de outras va-riáveis e avaliação preferencial prognóstica pos-sam ter subestimado o poder prognóstico dos tes-tes de “check-up”9. No entanto, diretrizes desta-cam o sugestivo valor da ergometria em diabéti-cos assintomáticos que planejam se exercitar (clas-se IIa), em pacientes com múltiplos fatores de ris-co que necessitam orientação médica para a pre-venção secundária (classe IIb), em homens commais de 45 anos e mulheres com idade superior a55 anos que pretendem iniciar programa de ativi-dades físicas intensas, naqueles envolvidos emocupações de alto risco e que envolvam a coletivi-dade ou com elevado risco para doença arterialcoronária em decorrência de co-morbidades comoinsuficiência renal crônica e doença vascular pe-riférica (classe IIb), entre outros10. Estudos recen-tes11 recomendam que indivíduos classificadoscomo de baixo risco de eventos após avaliaçãoglobal de risco cardiovascular pelo escore de Fra-mingham ou chance inferior a 0,6% por ano nãonecessitam avaliação complementar, ao passo queaqueles com possibilidade estabelecida superior a

Page 24: check up

MASTROCOLLA LEe cols.Eletrocardiografia eteste ergométricono “check-up”cardiológico

140RSCESPJUL/AGO/SET 2006

2% demandam investigação e tratamento agressi-vo12, 13. Para as avaliações intermediárias de risco,entre 0,6% e 2,0% de chance de eventos no segui-mento de um ano, provas como eletrocardiografiade esforço, ultra-som de carótida, detecção de cál-cio nas coronárias e índice tornozelo-braquial (ra-zão entre a maior pressão obtida por técnica deDoppler em artérias tibiais posteriores ou pedio-sas e artéria braquial) destacaram-se como de va-lor incremental nessas populações11.

ANÁLISE BAYESIANA E MULTIVARIADANA INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOSDO TESTE ERGOMÉTRICO

A capacidade diagnóstica de um teste de es-forço é relacionada ao tipo de população selecio-nada, podendo-se criar vícios ou vieses, como, porexemplo, quando seletivamente se encaminhampacientes com resultados “positivos”, “alterados”ou “isquêmicos” para estudo cinecoronariográfi-co, o que poderá diminuir a especificidade ou acapacidade do método em selecionar os indivídu-os sadios de uma população (aumentará a chancede ser um falso positivo)14, 15. Por outro lado, a es-pecificidade será extremamente elevada se a po-pulação caracterizar-se por mínima probabilidadepré-teste de doença ou, ao contrário, a sensibili-dade será expressivamente elevada naqueles en-caminhados com alta prevalência de sintomas. Emestudo que incluiu 814 pacientes com história dedor torácica, os quais concordaram com a realiza-ção de teste ergométrico e cinecoronariografia demodo independente dos resultados e conseqüen-temente com redução de vieses metodológicos,foram evidenciadas menor sensibilidade e maiorespecificidade (45% e 84%, respectivamente)16,comparativamente a publicações prévias. Adicio-nalmente observou-se que a análise computadori-zada do segmento ST foi similar à análise visualpara a caracterização de isquemia, e o emprego deequações incorporando variáveis não-eletrocardi-ográficas aumentou o poder diagnóstico. Reafir-ma-se, portanto, a importante participação do teo-rema de probabilidades condicionais ou de Bayes,segundo o qual um teste diagnóstico não pode seradequadamente interpretado sem a referência daprevalência da doença na população avaliada, es-tabelecendo-se que a probabilidade pós-teste é fun-ção também, além da prevalência pré-teste, da sen-sibilidade e da especificidade. A partir da demons-tração da prevalência angiográfica de coronario-patia aterosclerótica obstrutiva em estudo clássi-co de 4.952 pacientes17, 18, demonstrou-se que aprobabilidade pré-teste pode ser determinada apartir da idade, do sexo e dos sintomas (Tabs. 1 e2) e utilizada no manuseio clínico depois de co-

nhecidos os resultados do teste aplicado. Pode-se,ainda, estabelecer a máxima eficiência do teste deesforço em indivíduos com probabilidade inter-mediária de doença, beneficiados de modo maisapropriado e após reavaliação clínica das provasassociadas à cintilografia miocárdica de perfusão19-21.Tais populações incluem também indivíduos as-sintomáticos com teste de esforço “isquêmicos”,com dois ou mais fatores de risco consideradosmaiores, como, por exemplo, diabetes e hiperco-lesterolemia. Outros métodos de medida de pro-babilidade pré-teste de doença também têm sidodescritos, incorporando dados como idade, sexo efatores de risco22.

Torna-se, portanto, dedutiva a informação deque nenhum teste diagnóstico é perfeitamente sen-sível e/ou específico, de que os resultados são afe-tados pela probabilidade pré-teste de doença, e deque a interpretação das alterações de ST/T deveser feita à luz da análise multifatorial, combinan-do respostas clínicas e hemodinâmicas. Além demelhora da acurácia diagnóstica, nitidamente adi-ciona valor prognóstico à prova23 que resgata, demodo racional, o teste de esforço dentro de algo-ritmos de decisão clínica24, 25. No entanto, na prá-tica, faz-se mister o conhecimento de que a sensi-bilidade e a especificidade de vários testes diag-nósticos variam entre os diferentes centros, sob ainfluência de fatores como população analisada,controle de qualidade, técnica empregada, experi-ência e conhecimento médicos. Adicionalmente,as limitações da cineangiografia coronária comopadrão de comparação tornam claras as possibili-dades da prova e otimizam a análise dos resulta-dos (Tab. 3).

Finalmente, além da análise bayesiana, as téc-nicas estatísticas que empregam a análise multi-variada para a estimativa de risco pós-teste tam-bém podem fornecer informações diagnósticas deimportância, com a vantagem de não requerer queos testes sejam independentes entre si ou que osíndices diagnósticos (sensibilidade e especificida-de) sejam mantidos constantes em populações comdiferentes prevalências de doença26.

PARTICIPAÇÃO DO TESTE ERGOMÉTRICONO PROCESSO DE DECISÃO CLÍNICA

Considerando-se as evidências disponíveis naliteratura, as publicações que documentam a acu-rácia diagnóstica do teste ergométrico para doen-ça arterial coronária incluem, de modo predomi-nante, estudos de meta-análise27, naturalmente nãoisentos de vícios ou vieses28. Esses estudos, em-bora evidenciando larga variabilidade de resulta-dos, quando reunidos englobam uma populaçãode 24.074 indivíduos (147 trabalhos), submetidos

Page 25: check up

MASTROCOLLA LEe cols.

Eletrocardiografia eteste ergométrico

no “check-up”cardiológico

141RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

a testes ergométricos e cinecoronariografia, tor-nando os resultados de credibilidade aceitável natomada de decisão. A sensibilidade foi de 68%,com variação de 23% a 100% (desvio padrão de16%), e a especificidade foi de 77%, com varia-ção de 17% a 100% (desvio padrão de 17%). Cum-pre ressaltar que quando são excluídos pacientescom infarto prévio, respeitando-se, de modo mais

Tabela 1. Classificação da probabilidade pré-teste de doença coronária aterosclerótica, considerando-se sintomas (dortorácica), sexo e idade em indivíduos do sexo masculino. Prevalência de doença coronária aterosclerótica: mínima, < 5%;baixa, < 10%; intermediária, entre 10% e 90%; e elevada, > 90%.

Dor Dor atípica/Idade Assintomáticos incaracterística provável angina Angina

30-39 Mínima Baixa Intermediária Intermediária40-49 Baixa Intermediária Intermediária Elevada50-59 Baixa Intermediária Intermediária Elevada60-69 Baixa Intermediária Intermediária Elevada

Obs.: o termo “incaracterística” foi empregado como dor “não-anginosa”, diferente de “dor atípica”, na qual há possibilida-de clínica de manifestação de equivalente anginoso. (Modificado de Gibbons e cols.10)

Tabela 3. Algumas limitações da cinecoronario-grafia convencional como padrão de compara-ção.

– Disparidade entre anatomia e função. – Dificuldade de interpretação tanto qualitativa

como quantitativa entre observadores. – Impossibilidade de visibilização da microcir-

culação. – Avaliação da reserva coronária, especialmente

em vasos pequenos. – Detecção de isquemia oriunda de espasmos ou

de constrição de pontes miocárdicas, induzi-das pelo exercício.

Tabela 2. Classificação da probabilidade pré-teste de doença coronária aterosclerótica, considerando-se sintomas (dortorácica), sexo e idade em indivíduos do sexo feminino. Prevalência de doença coronária aterosclerótica: mínima, < 5%;baixa, < 10%; intermediária, entre 10% e 90%; e elevada, > 90%.

Dor Dor atípica/Idade Assintomáticos incaracterística provável angina Angina

30-39 Mínima Mínima Mínima Intermediária40-49 Mínima Mínima Baixa Intermediária50-59 Mínima Baixa Intermediária Intermediária60-69 Baixa Intermediária Intermediária Elevada

Obs.: o termo “incaracterística” foi empregado como dor “não-anginosa”, diferente de “dor atípica”, na qual há possibilida-de clínica de manifestação de equivalente anginoso. (Modificado de Gibbons e cols.10)

apropriado, as exigências para se analisar testesdiagnósticos, a sensibilidade média foi de 67% ea especificidade, de 72%. Também devem estarincluídos, na análise dos resultados, fatores queinterferem no desempenho dos testes diagnósti-cos, como utilização de fármacos (digital e beta-bloqueadores), presença de hipertrofia ventricu-lar esquerda, alterações eletrocardiográficas de ST/

T em repouso, tipos de protocolos e sistemas demonitorização e registro empregados, quantidadede trabalho total realizado, porcentual alcançadode frequência cardíaca, etc. Uma vez que todosesses fatores sejam de conhecimento do médicoassistente, bem como a tríade fundamental de in-formações obtidas pelos testes ergométricos (di-agnósticas, prognósticas e funcionais), algoritmosclínicos podem ser sugeridos e implementados, deacordo com as características da população estu-dada. Na população assintomática encaminhadapara “check-up” e considerada inicialmente comoclasse IIB de indicação para pesquisa de doençacoronária naqueles indivíduos com múltiplos fa-

Page 26: check up

MASTROCOLLA LEe cols.Eletrocardiografia eteste ergométricono “check-up”cardiológico

142RSCESPJUL/AGO/SET 2006

tores de risco, a prevalência de teste de esforçoalterado varia de 5% a 12%29 em homens a partirda quarta década e de 20% a 30% em mulheres,exteriorizando-se por si só a limitação do métodona avaliação diagnóstica quando são empregadoscritérios isolados como análise morfológica e in-fradesnível de segmento ST. A despeito de o riscorelativo de aparecimento de angina na evoluçãoser cerca de nove vezes maior nos indivíduos comresultados anormais, o valor preditivo positivo emcinco anos de seguimento é baixo (em torno de25%). Este é ligeiramente mais elevado quando ovalor de corte considerado para infradesnível desegmento ST foi > 2 mm ou de ocorrência dentrodos seis minutos iniciais de exercício ou, ainda,em freqüência cardíaca alcançada durante o es-forço menor ou igual a 163 – 0,66 x idade30. En-tretanto, para alguns subgrupos assintomáticos,aparentemente saudáveis, obesos e com idade su-perior a 45 anos, a análise do segmento ST e doconsumo máximo de oxigênio foi discriminante,ao final de sete anos de seguimento, para eventoscomo angina, revascularização do miocárdio, an-gioplastia transluminal coronária, infarto do mio-cárdio e morte31. De forma geral, o manuseio clí-nico dessa população deve levar em consideraçãoos fatores interferentes, como: a impossibilidadede se estabelecer a acurácia da prova (populaçãoassintomática não é encaminhada a estudo cine-coronariográfico); a larga variação de valores pre-ditivos positivos; a limitação do método para le-sões “não-significativas”, considerando-se quemuitos eventos coronários ocorrem por rotura deplacas em lesões menores; além da necessidadede avaliar os resultados com o envolvimento deoutros parâmetros clínicos e hemodinâmicos ob-tidos no teste. Além disso, diante das considera-ções prognósticas de grandes estudos32 eviden-ciando risco relativo de eventos até 30 vezesmaior somente em pacientes com um ou maisfatores de risco e alterações específicas ao testede esforço (dor torácica, tempo de exercíciomenor que dois estágios no protocolo de Bruce,freqüência cardíaca alcançada menor que 90%do valor predito ou infradesnível de segmentoST) e que a modificação dos fatores de riscopode ganhar maior adesão após o resultado po-sitivo de um teste, otimiza-se, de modo racio-nal, a aplicação do teste de esforço e o manu-seio clínico desses indivíduos33 (Fig. 1). O co-nhecimento de novas evidências de aterosclero-se subclínica, como a detecção de cálcio nascoronárias, em indivíduos assintomáticos, co-incidente com outros fatores de risco convenci-onais e testes ergométricos isquêmicos, associa-se com risco aumentado para eventos, tornandoa intervenção clínica obrigatória.

VARIÁVEISNÃO-ELETROCARDIOGRÁFICASAPLICADAS À POPULAÇÃOASSINTOMÁTICA

Adicionalmente, ao lado do conhecimento daslimitações da análise do infradesnível do segmen-to ST nessa população (inabilidade em refletir acarga e a intensidade da isquemia miocárdica)34,presença de vícios de seleção nos estudos de lite-ratura35, utilização de padrão de referência inade-quado, etc., outras variáveis têm sido incorpora-das e comprobatórias na valorização prognósticados testes de esforço, como: a) capacidade funci-onal36; b) incapacidade de a freqüência cardíacase elevar normalmente durante exercício ou incom-petência cronotrópica37; c) retorno ou recuperaçãolenta da freqüência cardíaca após a interrupção doesforço38, 39; e d) arritmia ventricular na fase derecuperação do teste ergométrico40.

CAPACIDADE FUNCIONAL

Destaca-se provavelmente como a de maior im-portância para a classificação de risco cardiovas-cular e para a previsão de mortalidade, especial-mente em indivíduos assintomáticos e sobrepujan-do fatores de risco demográficos e clássicos41, 42.Estudo envolvendo grande número de homensverificou que a aparente associação entre obesi-dade e risco aumentado poderia ser justificada pelainerente limitação funcional dessa população43.Adicionalmente e com base em avaliações popu-lacionais incorpora-se também como forte predi-tora independente de risco em mulheres44. Da abor-dagem de 5.721 indivíduos do sexo feminino sub-metidos a teste de esforço limitados por sintomase/ou máximos com a avaliação da capacidade fun-cional em unidades metabólicas (MET), estabele-ceu-se um nomograma para permitir estimar osvalores porcentuais da capacidade de exercíciopredita baseando-se na idade e na capacidade al-cançada de esforço. O nomograma foi aplicadotanto na coorte inicial de mulheres como em umapopulação encaminhada composta por 4.471 mu-lheres com sintomas cardiovasculares igualmentesubmetidas a teste de esforço limitadas por sinaise/ou sintomas. A equação de regressão linear paraa capacidade de exercício (em MET) em relação àidade nas mulheres assintomáticas foi: MET pre-dito = 14,7 - (0,13 x idade), sendo o risco de mor-te para aquelas cuja capacidade alcançou menosde 85% do valor predito o dobro em relação àsque atingiram ou ultrapassaram o valor estabele-cido45 (Fig. 2 A/B/C/D/E). A despeito da não acei-tação consensual de valores de corte de gasto me-tabólico ou consumo de oxigênio alcançado em

Page 27: check up

MASTROCOLLA LEe cols.

Eletrocardiografia eteste ergométrico

no “check-up”cardiológico

143RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

MET (estimado de acordo com o protocolo apli-cado) para indivíduos assintomáticos, sugerem-selimites < 5 MET, entre 5 e 8 MET e > 8 MET, consi-derados respectivamente como estratificadores derisco alto, médio e baixo46. Outros estudos utilizamvalores anormais derivados de idade e sexo43, 47.

INCOMPETÊNCIA CRONOTRÓPICA

Em indivíduos normais, a elevação da freqüên-cia cardíaca durante o exercício é resultado da des-carga adrenérgica por aumento do tônus simpáti-co e inibição concomitante da atividade parassim-pática. Já em portadores de diferentes graus deinsuficiência cardíaca pode ocorrer menor aumentoda freqüência cardíaca diante de estímulos habi-tuais por sensibilidade diminuída do nó sinusal àestimulação simpática48. O comportamento dian-te do esforço obedece relação linear com o au-

Figura 1. Manuseio clínico em indivíduos assintomáticos, com pelo menos dois fatores maiores derisco.FR = fatores de risco; masc = masculino; TE = teste de esforço; CVAS = cardiovascular; ECG = eletro-cardiografia; GATED-SPECT = cintilografia tomográfica de perfusão e função sincronizada com ociclo cardíaco (intervalo RR); Intermed = intermediário.

mento do consumo de oxigênio em função do tem-po e das cargas aplicadas dentro de determinadoslimites, sendo inversamente proporcional à idadee os valores máximos estimados derivados de equa-ções de regressão estabelecidas. São várias asmaneiras empregadas para a caracterização da in-suficiência cardíaca, como o porcentual alcança-do da freqüência cardíaca máxima estimada, oporcentual utilizado da reserva de freqüência car-díaca e a observação simples do pico da freqüên-cia cardíaca, todas de valor prognóstico estabele-cido37, 49 (Tab. 4).

Finalmente, e à semelhança da capacidade fun-cional determinada pelo teste ergométrico, estu-dos de populações com indivíduos assintomáticostêm evidenciado que a incompetência cronotrópi-ca se associa a taxas mais elevadas de eventos car-díacos maiores, incluindo morte, mesmo apósabordagens pelo escore de Framingham42.

Page 28: check up

MASTROCOLLA LEe cols.Eletrocardiografia eteste ergométricono “check-up”cardiológico

144RSCESPJUL/AGO/SET 2006

Tabela 4. Métodos comuns para a avaliação da resposta cronotrópica7.

� Valor atingido da freqüência cardíaca ou freqüência cardíaca de pico.

� Porcentual da reserva cardíaca utilizada < 80% = alto risco.

FC pico ou alcançada - FC repouso/(220 - idade) - FC repouso x 100

� Freqüência cardíaca alcançada em função da idade < 0,85 (220 - idade)

� Incapacidade de a freqüência cardíaca alcançar valores no esforço que se situem abaixode dois desvios padrão da freqüência cardíaca máxima estimada, em torno de 24 batimentos.

FC = freqüência cardíaca.

RECUPERAÇÃO DA FREQÜÊNCIACARDÍACA APÓS A INTERRUPÇÃODO ESFORÇO

É expressão da reativação vagal após a cessa-ção da estimulação simpática predominante na fasede esforço, uma vez que a queda rápida da fre-qüência cardíaca na fase imediata de recuperaçãopode ser prevenida pela injeção de atropina50 emindivíduos assintomáticos normais e atletas. Apartir do conhecimento da associação entre riscocardíaco e tônus vagal alterado, estudos objetivan-do a análise da recuperação da freqüência cardía-ca na etapa de recuperação do teste ergométricoverificaram que a queda lenta nos minutos inici-ais após o exercício se associou à maior incidên-cia de morte no seguimento39, 51. Houve validaçãodos mesmos achados em vários estudos de coortee epidemiológicos envolvendo indivíduos assin-tomáticos38. Os valores de corte para a queda dafreqüência cardíaca no primeiro e segundo minu-tos da recuperação são relacionados ao protocoloempregado e a diferença é calculada a partir dafreqüência cardíaca de pico. No que emprega arecuperação ativa (caminhando na velocidade de1,5 mph) a diminuição > 12 batimentos no pri-meiro minuto é considerada normal, com poderdiscriminante para melhor evolução em relação aorisco de morte.

ARRITMIA VENTRICULAR

A prevalência de arritmia ventricular freqüen-te durante e após o exercício em assintomáticos épequena, mas tem sido associada a risco aumen-tado de morte40, podendo representar instabilida-de elétrica ou alterações do tônus autonômico. Emum grande estudo de coorte de população enca-minhada a realização de teste de esforço, foi evi-denciado que a atividade ectópica ventricular du-

rante a fase de recuperação foi maior preditora derisco que quando a arritmia predominou durante afase de exercício. Foram avaliados 29.244 indiví-duos, 70% do sexo masculino, com média de ida-de de 56 anos (desvio padrão 11), sendo conside-rada arritmia ventricular freqüente sete ou maisextra-sístoles por minuto, bigeminismo ou trige-minismo, episódios pareados, em salva, taquicar-dia ventricular, “flutter” ventricular, “torsade depointes” ou fibrilação ventricular. Apenas 945(3%) desenvolveram os episódios durante o exer-cício, 589 (2%) na fase de recuperação, e 491 (2%)em ambas as etapas. Houve 1.862 mortes na po-pulação total no período médio de seguimento de5,3 anos, sendo a arritmia durante o exercício pre-ditora de risco aumentado de morte quando com-parada à ausência da arritmia (9% x 5%; p < 0,001),mas de maior poder quando exclusiva da etapa derecuperação (11% x 5%; p < 0,001), mesmo quan-do após correção de variáveis de confusão40 (Fig.3 A/B/C).

AVALIAÇÃO DE ASSINTOMÁTICOSCONSIDERANDO-SE MODALIDADES DEIMAGEM RECENTES E INCLUSÃO DOTESTE ERGOMÉTRICO COMO “CHECK-UP”

Atualmente existem diretrizes para “screening”ou “check-up” cardiovascular por métodos não-invasivos na população assintomática considera-da de alto risco, incluindo homens de 45 a 75 anose mulheres de 55 a 75 anos, objetivando a detec-ção e o tratamento de aterosclerose subclínica52.Modificam inclusões e aplicações do teste ergo-métrico a populações com características especí-ficas, justificadas pela tentativa do encontro demelhor relação custo-efetividade. Tal estratégia,considerada conservadora, advém da percepçãoque mais dados são necessários para a demonstra-ção e a comprovação de que a investigação por

Page 29: check up

MASTROCOLLA LEe cols.

Eletrocardiografia eteste ergométrico

no “check-up”cardiológico

145RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

Figura 2 (A, B, C, D e E). NKN, 56 anos, sexo feminino, encaminhada em 12/4/2006 para a realizaçãode teste ergométrico associado a cintilografia miocárdica de perfusão com 99mTc-MIBI, objetivandoavaliação periódica e prática de atividades esportivas. Assintomática, com antecedentes pessoais dedislipidemia e hipertensão controladas, em uso de bloqueadores dos receptores da angiotensina e esta-tina. Antecedentes familiares para doença arterial coronária. Pratica exercícios físicos diariamente. Emconseqüência de teste ergométrico “alterado”, realizou cintilografia “normal” em 1999. Prova atual emuso da medicação. Realizou 10 minutos do protocolo de Ellestad (V estágio), freqüência cardíaca = 134bpm (82% da freqüência cardíaca máxima), respostas clínica e hemodinâmica normais.99mTc-MIBI = 2 metoxi-isobutil-isonitrila marcada com tecnécio 99 meta-estável.

2 A) Eletrocardio-grama clássico de12 derivações, comalterações inespecí-ficas da repolariza-ção ventricular.

2 B) Eletrocardio-grama clássico de12 derivações nafase imediata de re-cuperação, eviden-ciando intensifica-ção das alteraçõesprévias.

Page 30: check up

MASTROCOLLA LEe cols.Eletrocardiografia eteste ergométricono “check-up”cardiológico

146RSCESPJUL/AGO/SET 2006

2 C) Derivaçõesmodificadas, apenascom alterações darepolarização ven-tricular discretas.

2 D) Derivaçõesmodificadas duran-te pico de exercício,evidenciando-se in-fradesnível do seg-mento ST até 2,5mm medido após 80ms do ponto J, nasderivações MC5 (I),II e aVL modifica-das.MC5 = derivaçãobipolar utilizada emergometria, com oeletrodo do braçodireito (negativo)posicionado no ma-núbrio e o eletrododo braço esquerdo(positivo), na posi-ção original de V5.

novos métodos sobrepujará a avaliação do riscopor meio de fatores convencionais, como tabagis-mo, hipertensão, hipercolesterolemia e diabetesmelito, considerando ainda que não são ferramen-tas difundidas e implementadas na prática clínicadiária. Ainda, no conhecimento de que as estraté-gias de prevenção primária, com a estratificaçãobaseada nos fatores de risco, têm a capacidade deidentificar de modo apropriado indivíduos de bai-xo ou elevado risco para eventos cardíacos maio-res e acidente vascular cerebral no seguimento de10 anos, e que a maior parte de uma população

pertence à classificação intermediária de risco, emque o poder preditivo dos fatores de risco é me-nor, torna-se dedutiva a limitação no estabeleci-mento de metas e tratamento para a orientaçãoindividual. Dessa forma, como muitos pacientesdeixarão de ser classificados e investigados demodo adequado, recomenda-se o uso de testes não-invasivos que possam identificar estrutura e fun-ção arteriais anormais como opções para aborda-gem profunda e estratificação avançada de riscoem indivíduos selecionados, especialmente aque-les pertencentes ao grupo intermediário ou inde-

Page 31: check up

MASTROCOLLA LEe cols.

Eletrocardiografia eteste ergométrico

no “check-up”cardiológico

147RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

2 E) Imagens por cinti-lografia tomográfica deperfusão nos eixos me-nor, maior horizontal emaior vertical, com cap-tação homogênea do ra-diofármaco.

terminado, com múltiplos fatores de risco. Indiví-duos com testes negativos para aterosclerose sub-clínica, como escore de cálcio coronário avaliadopor tomografia computadorizada = 0 ou espessu-ra das camadas íntima/média da carótida por ul-tra-som distribuída abaixo do percentil 50%, semplaca carotídea, são considerados como de baixorisco, na ausência de fatores de risco. Na presençadesses fatores, os indivíduos são reclassificadospara moderado risco, devendo como metas de tra-tamento alcançar níveis de lipoproteína de baixadensidade (LDL) < 130 mg/dl53. Os indivíduos comtestes positivos traduzidos por escores de cálcio >1 ou espessura das camadas íntima/média da ca-rótida > percentil 50% ou presença de placa caro-tídea são reestratificados de acordo com a magni-tude da carga de aterosclerose em subcategorias(Tab. 5).

Dentro do cenário para a avaliação do grupoproposto à aplicação de testes não-invasivos de ate-rosclerose subclínica, considerado como “vulne-rável” e candidato a tratamentos individualizados,testes de isquemia miocárdica, como o teste ergo-métrico, estariam indicados apenas para o grupode risco muito elevado. Tais indivíduos, na pre-

sença de resposta isquêmica, têm indicação deestudo invasivo, objetivando o binômio revascu-larização/melhora da sobrevida ou qualidade devida. Adicionalmente, algumas consideraçõesmerecem destaque no que concerne à prevençãoprimária e ao enfoque dos novos testes:

a) A presença de diabetes não seria considera-da equivalente de risco de doença arterial coroná-ria na ausência de aterosclerose subclínica54. Des-sa forma, o teste ergométrico como “check-up”nessa população não encontra indicação consen-sual, a não ser naqueles que pretendem ou estãoem prática de atividades físicas. Na condição deprovas comprobatórias de aterosclerose clínica,passam a ser considerados como de alto risco, se-guindo a logística habitual de investigação.

b) Outros testes podem ser considerados paraaplicação opcional, como, por exemplo, proteínaC-reativa elevada55.

c) Provas adicionais para avaliação estruturale funcional, como ressonância nuclear magnéticade aorta e artérias carotídeas56, e abordagem dadisfunção endotelial57 e da perda da elasticidadearterial, entre outras, têm se mostrado preditorasde eventos.

Page 32: check up

MASTROCOLLA LEe cols.Eletrocardiografia eteste ergométricono “check-up”cardiológico

148RSCESPJUL/AGO/SET 2006

Figura 3 (A, B e C). MCT, 45 anos, do sexo masculino, encaminhado em 13/4/2006 para a realizaçãode teste ergométrico, objetivando “check-up” e prática de atividades esportivas. Assintomático, comantecedentes familiares de insuficiência vascular cerebral. Peso = 85 kg; estatura = 1,82 m. Considera-do como baixa probabilidade pré-teste de doença arterial coronária. Realizou 8,5 minutos do protocolode Ellestad (IV estágio), com freqüência cardíaca de 175 bpm (100% da freqüência cardíaca máxima)e respostas clínica e hemodinâmica normais.

Tabela 5. Categorias de risco baseadas na presença de aterosclerose subclínica52.

Risco moderado/elevado– Escore de cálcio < 100 (mas > 1) e < percentil 75; ou CMIT < 1 mm e < percentil 75 (> 50), semplaca evidenciável em carótida.Risco elevado– Escore de cálcio entre 100 e 399 ou > percentil 75; ou CMIT > 1 mm; ou > percentil 75; ou placaevidenciável em carótida com lesão < 50%.Risco muito elevado– Escore de cálcio > 100 e > percentil 90; ou escore de cálcio > 400; ou estenose carotídea > 50%.

CMIT = espessura das camadas íntima/média da carótida.

3 A) Eletrocardiograma de 12 derivações modificadas, em que I corresponde à derivação MC5, não severificando anormalidades morfológicas. MC5 = derivação bipolar utilizada em ergometria, com oeletrodo do braço direito (negativo) posicionado no manúbrio e o eletrodo do braço esquerdo (positi-vo), na posição original de V5.

Page 33: check up

MASTROCOLLA LEe cols.

Eletrocardiografia eteste ergométrico

no “check-up”cardiológico

149RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

3 B) Registros durante exercício máximo, observando-se episódios de taquicardia ventricular não-sus-tentada.

3 C) Adicionalmente aos episódios de taquicardia ventricular não-sustentada, até 10 batimentos, infra-desnível de pequena magnitude de segmento ST nas derivações aVL e V5 modificadas, imediatamenteapós o registro da arritmia. Ecocardiograma normal. Encaminhado pelo médico assistente a Holter,cintilografia de perfusão com radiofármacos e ressonância nuclear magnética, objetivando afastar car-diopatia estrutural.

Page 34: check up

MASTROCOLLA LEe cols.Eletrocardiografia eteste ergométricono “check-up”cardiológico

150RSCESPJUL/AGO/SET 2006

REFERÊNCIAS

1. Goldberger AL, Mirvis DM. Electrocardiogra-phy. In: Zipes DP, Libby P, Bonow RO, Brau-nwald E, editors. Braunwald’s Heart Disease.A Textbook of Cardiovascular Medicine. 7thed. Philadelphia, Pennsylvania: Elsevier Saun-ders; 2005. p. 107-51.

2. Khunti K, Squire I, Abrams KR, Sutton AJ.Accuracy of a 12-lead electrocardiogram inscreening patients with suspected heart failurefor open access echocardiography: a systema-

ELECTROCARDIOGRAPHY AND STRESS TEST

IN ROUTINE CARDIOVASCULAR EVALUATION

(CHECK-UP)

LUIZ EDUARDO MASTROCOLLA

JOÃO MANOEL ROSSI

SUSIMEIRE BUGLIA

No epidemiologic study directly approached the question of whether the electrocardiogramshould be used to screen large populations for cardiovascular disease. However, in youngathletes, in high risk patients or in patients with suspicion of cardiopathy, theelectrocardiogram must be part of the initial evaluation. The value of treadmill test inasymptomatic patients is not consensual and its cost-effectiveness is questionable. However,guidelines emphasize the value of the treadmill test in diabetic patients looking to start afitness program, in patients with multiple risk factors that need medical orientation forsecondary prevention, in men more than 45 years of age and in women more than 55 yearsof age beginning an intense fitness program, those involved in occupations responsible forpeople’s life, and those at high risk for coronary artery disease due to comorbidities aschronic renal failure and peripheral vascular disease. Additionally to the knowledge of thelimitations of the analysis of the ST segment depression in the asymptomatic population,non-electrocardiographic variables applied in this population, have been incorporated andevidential in the prognostic value of the exercise test, as: a) functional capacity; b)incapacity of the heart rate to normally raise during the exercise or chronotropicincompetence; c) return or slow recovery of the heart rate after the interruption of the effort;d) ventricular arrhythmia in the recovery phase of the exercise test. With the aim to detectand treat sub-clinical atherosclerosis in asymptomatic men ranging from age 45 to 75 yearsand in women from 55 to 75 years, imaging methods and treadmill test have been recentlyincorporated to the screening evaluation.

Key words: electrocardiography, treadmill test, stress test, asymptomatic, screening.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:138-53)RSCESP (72594)-1607

tic review and meta-analysis. Eur J Heart Fail.2004;6(5):571-6.

3. Donnelly DK, Howard TM. Electrocardiogra-phy and the preparticipation physical exami-nation: is it time for routine screening? CurrSports Med Rep. 2006;5(2):67-73.

4. Lesho E, Gey D, Forrester G, Michaud E, Em-mons E, Huycke E. The low impact of scree-ning electrocardiograms in healthy individu-als: a prospective study and review of the lite-rature. Mil Med. 2003;168(1):15-8.

5. Corrado D, Pelliccia A, Bjornstad HH, Vanhees

Page 35: check up

MASTROCOLLA LEe cols.

Eletrocardiografia eteste ergométrico

no “check-up”cardiológico

151RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

L, Biffi A, Borjesson M, et al. Cardiovascularpre-participation screening of young competi-tive athletes for prevention of sudden death:proposal for a common European protocol.Consensus Statement of the Study Group ofSport Cardiology of the Working Group ofCardiac Rehabilitation and Exercise Physio-logy and the Working Group of Myocardial andPericardial Diseases of the European Societyof Cardiology. Eur Heart J. 2005;26(5):516-24.

6. Ashley EA, Raxwal V, Froelicher V. An eviden-ce-based review of the resting electrocardio-gram as a screening technique for heart disea-se. Prog Cardiovasc Dis. 2001;44(1):55-67.

7. Lauer M, Froelicher ES, Williams M, KligfieldP. Exercise testing in asymptomatic adults: astatement for professionals from the AmericanHeart Association Council on Clinical Cardi-ology, Subcommittee on Exercise, CardiacRehabilitation, and Prevention. Circulation.2005;112(5):771-6.

8. Fowler-Brown A, Pignone M, Pletcher M, TiceJA, Sutton SF, Lohr KN. Exercise tolerance tes-ting to screen for coronary heart disease: a sys-tematic review for the technical support for theU.S. Preventive Services Task Force. Ann In-tern Med.;140(7):W9-24.

9. Lauer MS. Exercise electrocardiogram testingand prognosis. Novel markers and predictiveinstruments. Cardiol Clin. 2001;19(3):401-14.

10. Gibbons RJ, Balady GJ, Bricker JT, ChaitmanBR, Fletcher GF, Froelicher VF, et al. ACC/AHA 2002 guideline update for exercise tes-ting: summary article: a report of the Ameri-can College of Cardiology/American HeartAssociation Task Force on Practice Guideli-nes (Committee to Update the 1997 ExerciseTesting Guidelines). Circulation. 2002;106(14):1883-92.

11. Greenland P, Smith SC Jr, Grundy SM. Im-proving coronary heart disease risk assessmentin asymptomatic people: role of traditional riskfactors and noninvasive cardiovascular tests.Circulation. 2001;104(15):1863-7.

12. Executive Summary of The Third Report ofThe National Cholesterol Education Program(NCEP) Expert Panel on Detection, Evaluati-on, And Treatment of High Blood CholesterolIn Adults (Adult Treatment Panel III). JAMA.2001;285(19):2486-97.

13. D’Agostino RB Sr, Grundy S, Sullivan LM,Wilson P. Validation of the Framingham coro-nary heart disease prediction scores: results ofa multiple ethnic groups investigation. JAMA.2001;286(2):180-7.

14. Weintraub WS, Madeira SW Jr, Bodenheimer

MM, Seelaus PA, Katz RI, Feldman MS, et al.Critical analysis of the application of Bayes’theorem to sequential testing in the noninvasi-ve diagnosis of coronary artery disease. Am JCardiol. 1984;54(1):43-9.

15. Patterson RE, Eng C, Horowitz SF. Practicaldiagnosis of coronary artery disease: a Bayes’theorem nomogram to correlate clinical datawith noninvasive exercise tests. Am J Cardiol.1984;53(1):252-6.

16. Froelicher VF, Lehmann KG, Thomas R, Gol-dman S, Morrison D, Edson R, et al. The elec-trocardiographic exercise test in a populationwith reduced workup bias: diagnostic perfor-mance, computerized interpretation, and mul-tivariable prediction. Veterans Affairs Coope-rative Study in Health Services #016 (QUEX-TA) Study Group. Quantitative Exercise Tes-ting and Angiography. Ann Intern Med.1998;128(12 Pt 1):965-74.

17. Gibbons RJ, Balady GJ, Beasley JW, BrickerJT, Duvernoy WF, Froelicher VF, et al. ACC/AHA Guidelines for Exercise Testing. A re-port of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force onPractice Guidelines (Committee on ExerciseTesting). J Am Coll Cardiol. 1997;30(1):260-311.

18. Diamond GA, Forrester JS. Analysis of pro-bability as an aid in the clinical diagnosis ofcoronary-artery disease. N Engl J Med.1979;300(24):1350-8.

19. Iskandrian AS, Wasserman LA, Anderson GS,Hakki H, Segal BL, Kane S. Merits of stressthallium-201 myocardial perfusion imaging inpatients with inconclusive exercise electrocar-diograms: correlation with coronary arteriogra-ms. Am J Cardiol. 1980;46(4):553-8.

20. Iskandrian AS, Segal BL. Value of exercisethallium-201 imaging in patients with diagnos-tic and nondiagnostic exercise electrocardio-grams. Am J Cardiol. 1981;48(2):233-8.

21. Mastrocolla LE, Oliveira CAR, Smanio PEP,Duarte OS. Interpretação atual do teste ergo-métrico - participação no processo de decisãoclínica. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo.2001;11(3):529-49.

22. Pryor DB, Shaw L, McCants CB, Lee KL,Mark DB, Harrell FE Jr, et al. Value of the his-tory and physical in identifying patients at in-creased risk for coronary artery disease. AnnIntern Med. 1993;118(2):81-90.

23. Mark DB, Shaw L, Harrell FE Jr, Hlatky MA,Lee KL, Bengtson JR, et al. Prognostic valueof a treadmill exercise score in outpatients withsuspected coronary artery disease. N Engl JMed. 1991;325(12):849-53.

Page 36: check up

MASTROCOLLA LEe cols.Eletrocardiografia eteste ergométricono “check-up”cardiológico

152RSCESPJUL/AGO/SET 2006

24. Shaw LJ, Peterson ED, Shaw LK, Kesler KL,DeLong ER, Harrell FE Jr, et al. Use of a prog-nostic treadmill score in identifying diagnos-tic coronary disease subgroups. Circulation.1998;98(16):1622-30.

25. Poornima IG, Miller TD, Christian TF, HodgeDO, Bailey KR, Gibbons RJ. Utility of myo-cardial perfusion imaging in patients with low-risk treadmill scores. J Am Coll Cardiol.2004;43(2):194-9.

26. Chaitman BR. Exercise stress testing. In: Brau-nwald E, Zipes DP, Libby P, editors. Heart Di-sease. A Textbook of Cardiovascular Disease.6th ed. Philadelphia: WB Saunders Company;2001. p. 140-1.

27. Detrano R, Gianrossi R, Froelicher V. The di-agnostic accuracy of the exercise electrocardi-ogram: a meta-analysis of 22 years of resear-ch. Prog Cardiovasc Dis. 1989;32(3):173-206.

28. Reid MC, Lachs MS, Feinstein AR. Use ofmethodological standards in diagnostic test re-search. Getting better but still not good. JAMA.1995;274(8):645-51.

29. Rautaharju PM, Prineas RJ, Eifler WJ, Fur-berg CD, Neaton JD, Crow RS, et al. Prognos-tic value of exercise electrocardiogram in menat high risk of future coronary heart disease:Multiple Risk Factor Intervention Trial expe-rience. J Am Coll Cardiol. 1986;8(1):1-10.

30. Ekelund LG, Suchindran CM, McMahon RP,Heiss G, Leon AS, Romhilt DW, et al. Coro-nary heart disease morbidity and mortality inhypercholesterolemic men predicted from anexercise test: the Lipid Research Clinics Co-ronary Primary Prevention Trial. J Am CollCardiol. 1989;14(3):556-63.

31. Katzel LI, Sorkin JD, Goldberg AP. Exercise-induced silent myocardial ischemia and futurecardiac events in healthy, sedentary, middle-aged and older men. J Am Geriatr Soc.1999;47(8):923-9.

32. Bruce RA, DeRouen TA, Hossack KF. Valueof maximal exercise tests in risk assessmentof primary coronary heart disease events inhealthy men. Five years’ experience of the Se-attle heart watch study. Am J Cardiol.1980;46(3):371-8.

33. Mastrocolla LE, Meneghelo RS, Barreto ACP.Apoio do teste ergométrico à decisão clínica.Arq Bras Cardiol. 1996;67(1):69-75.

34. Okin PM, Prineas RJ, Grandits G, RautaharjuPM, Cohen JD, Crow RS, et al. Heart rate ad-justment of exercise-induced ST-segment de-pression identifies men who benefit from a riskfactor reduction program. Circulation.1997;96(9):2899-904.

35. Miller TD, Hodge DO, Christian TF, Milavetz

JJ, Bailey KR, Gibbons RJ. Effects of adjust-ment for referral bias on the sensitivity andspecificity of single photon emission compu-ted tomography for the diagnosis of coronaryartery disease. Am J Med. 2002;112(4):290-7.

36. Snader CE, Marwick TH, Pashkow FJ, Har-vey SA, Thomas JD, Lauer MS. Importance ofestimated functional capacity as a predictor ofall-cause mortality among patients referred forexercise thallium single-photon emission com-puted tomography: report of 3,400 patientsfrom a single center. J Am Coll Cardiol.1997;30(3):641-8.

37. Azarbal B, Hayes SW, Lewin HC, Hachamo-vitch R, Cohen I, Berman DS. The incremen-tal prognostic value of percentage of heart ratereserve achieved over myocardial perfusionsingle-photon emission computed tomographyin the prediction of cardiac death and all-cau-se mortality: superiority over 85% of maximalage-predicted heart rate. J Am Coll Cardiol.2004;44(2):423-30.

38. Morshedi-Meibodi A, Larson MG, Levy D,O’Donnell CJ, Vasan RS. Heart rate recoveryafter treadmill exercise testing and risk of car-diovascular disease events (The FraminghamHeart Study). Am J Cardiol. 2002;90(8):848-52.

39. Cole CR, Blackstone EH, Pashkow FJ, SnaderCE, Lauer MS. Heart-rate recovery immedia-tely after exercise as a predictor of mortality.N Engl J Med. 1999;341(18):1351-7.

40. Frolkis JP, Pothier CE, Blackstone EH, LauerMS. Frequent ventricular ectopy after exerci-se as a predictor of death. N Engl J Med.2003;348(9):781-90.

41. Erikssen G, Bodegard J, Bjornholt JV, LiestolK, Thelle DS, Erikssen J. Exercise testing ofhealthy men in a new perspective: from diag-nosis to prognosis. Eur Heart J. 2004;25(11):978-86.

42. Balady GJ, Larson MG, Vasan RS, Leip EP,O’Donnell CJ, Levy D. Usefulness of exercisetesting in the prediction of coronary diseaserisk among asymptomatic persons as a functi-on of the Framingham risk score. Circulation.2004;110(14):1920-5.

43. Wei M, Kampert JB, Barlow CE, NichamanMZ, Gibbons LW, Paffenbarger RS Jr, et al.Relationship between low cardiorespiratoryfitness and mortality in normal-weight,overweight, and obese men. JAMA.1999;282(16):1547-53.

44. Mora S, Redberg RF, Cui Y, Whiteman MK,Flaws JA, Sharrett AR, et al. Ability of exerci-se testing to predict cardiovascular and all-cau-se death in asymptomatic women: a 20-year

Page 37: check up

MASTROCOLLA LEe cols.

Eletrocardiografia eteste ergométrico

no “check-up”cardiológico

153RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

follow-up of the lipid research clinics preva-lence study. JAMA. 2003;290(12):1600-7.

45. Gulati M, Black HR, Shaw LJ, Arnsdorf MF,Merz CN, Lauer MS, et al. The prognostic va-lue of a nomogram for exercise capacity inwomen. N Engl J Med. 2005;353(5):468-75.

46. Gulati M, Pandey DK, Arnsdorf MF, Lauder-dale DS, Thisted RA, Wicklund RH, et al. Exer-cise capacity and the risk of death in women:the St James Women Take Heart Project. Cir-culation. 2003;108(13):1554-9.

47. Aktas MK, Ozduran V, Pothier CE, Lang R,Lauer MS. Global risk scores and exercise tes-ting for predicting all-cause mortality in a pre-ventive medicine program. JAMA.2004;292(12):1462-8.

48. Colucci WS, Ribeiro JP, Rocco MB, QuiggRJ, Creager MA, Marsh JD, et al. Impairedchronotropic response to exercise in patientswith congestive heart failure. Role of postsy-naptic beta-adrenergic desensitization. Circu-lation. 1989;80(2):314-23.

49. Lauer MS, Okin PM, Larson MG, Evans JC,Levy D. Impaired heart rate response to gra-ded exercise. Prognostic implications of chro-notropic incompetence in the FraminghamHeart Study. Circulation. 1996;93(8):1520-6.

50. Imai K, Sato H, Hori M, Kusuoka H, Ozaki H,Yokoyama H, et al. Vagally mediated heart raterecovery after exercise is accelerated in athle-tes but blunted in patients with chronic heartfailure. J Am Coll Cardiol. 1994;24(6):1529-35.

51. Shetler K, Marcus R, Froelicher VF, Vora S,

Kalisetti D, Prakash M, et al. Heart rate reco-very: validation and methodologic issues. J AmColl Cardiol. 2001;38(7):1980-7.

52. Naghavi M, Falk E, Hecht HS, Jamieson MJ,Kaul S, Berman D, et al. From vulnerable pla-que to vulnerable patient — Part III: Executi-ve summary of the Screening for Heart AttackPrevention and Education (SHAPE) Task For-ce report. Am J Cardiol. 2006;98(2A):2H-15H.

53. Grundy SM, Cleeman JI, Merz CN, BrewerHB Jr, Clark LT, Hunninghake DB, et al. Im-plications of recent clinical trials for the Nati-onal Cholesterol Education Program Adult Tre-atment Panel III guidelines. Circulation.2004;110(2):227-39.

54. Raggi P, Shaw LJ, Berman DS, Callister TQ.Prognostic value of coronary artery calciumscreening in subjects with and without diabe-tes. J Am Coll Cardiol. 2004;43(9):1663-9.

55. Khera A, de Lemos JA, Peshock RM, Lo HS,Stanek HG, Murphy SA, et al. Relationship be-tween C-reactive protein and subclinical athe-rosclerosis: the Dallas Heart Study. Circulati-on. 2006;113(1):38-43.

56. Lipinski MJ, Fuster V, Fisher EA, Fayad ZA.Technology insight: targeting of biological mo-lecules for evaluation of high-risk atheroscle-rotic plaques with magnetic resonance ima-ging. Nat Clin Pract Cardiovasc Med.2004;1(1):48-55.

57. Bonetti PO, Lerman LO, Lerman A. Endothe-lial dysfunction: a marker of atheroscleroticrisk. Arterioscler Thromb Vasc Biol.2003;23(2):168-75.

Page 38: check up

154RSCESPJUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.A ecocardiografiano “check-up”cardiológico

INTRODUÇÃO

Qualquer processo de investigação diagnósti-ca envolve a relação custo-benefício do examediante de determinada situação clínica. Particular-mente no “check-up” cardiológico, a predisposi-ção do paciente assintomático a certas cardiopati-as (fatores de risco ou antecedentes familiares)constitui o principal determinante para a escolhaindividual dos métodos apropriados para detecçãoprecoce de condições cardiológicas subclínicas.

A ECOCARDIOGRAFIA NO “CHECK-UP”CARDIOLÓGICO

ORLANDO CAMPOS FILHO

WERCULES A. ALVES OLIVEIRA

ADRIANA CORDOVIL

Setor de Ecocardiografia – Escola Paulista de Medicina – UNIFESP

Endereço para correspondência:Rua Maestro Cardim, 1251 – cj. 53 – CEP 01323-001 – São Paulo – SP

A versatilidade da ecocardiografia como ferramenta diagnóstica justifica seu uso naavaliação individual de pacientes assintomáticos expostos a fatores de risco para doençacardiovascular, embora não seja recomendado no rastreamento de cardiopatia na populaçãogeral. Subgrupos especiais de indivíduos assintomáticos que podem se beneficiar daavaliação ecocardiográfica incluem hipertensos, diabéticos, dislipidêmicos, obesos e os comantecedentes familiares de doença cardiovascular, na tentativa de se identificar possíveisalterações estruturais (dilatação e/ou hipertrofia ventricular/atrial) ou funcionais (disfunçãosistólica global/regional, disfunção diastólica) sugestivas de comprometimento cardíacosubclínico passível de intervenções profiláticas. Outra área atual de interesse do uso daecocardiografia em indivíduos assintomáticos é na complementação da avaliaçãocardiovascular para a prática de exercícios físicos, a fim de se excluir doenças miocárdicasincipientes, sobretudo naqueles com histórico de cardiopatia, aortopatia ou morte súbita nafamília. Por fim, este artigo avalia o papel diagnóstico e o valor prognóstico daecocardiografia sob estresse com esforço na detecção da doença arterial coronariana latente,particularmente em mulheres e diabéticos assintomáticos.

Palavras-chave: ecocardiografia, “check-up” cardiológico.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:154-62)RSCESP (72594)-1608

Como método não-invasivo, a ecocardiografiaé considerada segura, largamente disponível e al-tamente acurada no diagnóstico de alterações ana-tomofuncionais da maioria das doenças estrutu-rais cardíacas. No entanto, seu custo impede queseja sistematicamente indicada no rastreamento emlarga escala de possíveis cardiopatias na popula-ção geral assintomática, sem fatores de risco car-diovascular conhecidos1. Por outro lado, tem im-portante papel na avaliação individual de pacien-tes assintomáticos expostos a determinados fato-

Page 39: check up

155RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.

A ecocardiografiano “check-up”

cardiológico

res de risco (hipertensão arterial sistêmica, obesi-dade, dislipidemia, diabetes melito e história fa-miliar de cardiopatia), visando à prevenção pri-mária de cardiopatias a eles relacionadas2.

A disfunção ventricular esquerda decorrentedesses fatores de risco pode ser identificada pelaecocardiografia em seus estágios iniciais, com opaciente ainda assintomático. Geralmente, antesda disfunção se tornar clinicamente manifesta,ocorrem mudanças na morfologia e na geometriado ventrículo esquerdo, chamadas de remodela-mento ventricular. Essa mudança estrutural, alémde reduzir progressivamente o desempenho me-cânico cardíaco, está fortemente relacionada ao au-mento da mortalidade cardiovascular3. Na fase la-tente da disfunção ventricular, tais alterações re-fletem a expressão de mecanismos adaptativos quepodem ser reconhecidos precocemente à ecocar-diografia e envolvem a avaliação das dimensõescavitárias e da massa miocárdica, além das fun-ções sistólica e diastólica globais ou regionaispelos índices tradicionais. Embora novos elemen-tos de função regional venham sendo progressiva-mente agregados à análise ecocardiográfica con-vencional, como o Doppler tecidual e seus deriva-dos (“strain”, “strain rate”), ainda não se conheceo significado diagnóstico e o valor prognóstico dealterações incipientes desses índices em uma po-pulação assintomática para doença cardiovascu-lar.

Dessa forma, a ecocardiografia pode ser po-tencialmente aplicável a uma série de situaçõesclínicas em que se objetiva a identificação preco-ce de anormalidades cardíacas latentes em indiví-duos assintomáticos, porém com maior probabili-

dade de desenvolvimento futuro de doença cardi-ovascular. Por outro lado, doenças estruturais,como certas cardiomiopatias na ausência de coro-nariopatia, podem ser definidas facilmente pelaecocardiografia. A Tabela 1 apresenta algunsexemplos de subgrupos especiais de indivíduos as-sintomáticos, com ou sem fatores de risco paradoença cardiovascular, em que a ecocardiografiapoderia ser útil.

Neste artigo, serão discutidos aspectos parti-culares de cada subgrupo, avaliando implicaçõesprognósticas da ecocardiografia e eventual impactona modificação da história natural da doença car-diovascular latente assintomática. Cabe lembrarque, nessas circunstâncias, o ecocardiograma deveser avaliado no contexto clínico, integrado a ou-tras modalidades diagnósticas não-invasivas (ele-trocardiografia, teste ergométrico, monitorizaçãoambulatorial da pressão arterial, etc.) para umaanálise mais abrangente.

RASTREAMENTO DE DISFUNÇÃOVENTRICULAR ESQUERDA EMINDIVÍDUOS ASSINTOMÁTICOS

As atuais diretrizes para diagnóstico e trata-mento da insuficiência cardíaca crônica2 identifi-cam quatro estágios na história natural dessa sín-drome, sendo os dois primeiros (A e B) no paci-ente assintomático. O estágio A consiste no altorisco de desenvolvimento dessa afecção (diabetesmelito, aterosclerose e hipertensão arterial sistê-mica), porém sem alterações cardíacas estruturais.Já o estágio B é definido como presença de altera-ção estrutural cardíaca (remodelamento e disfun-

Tabela 1. Condições clínicas em indivíduos assintomáticos com potencial indicação de ecocardiografia.

Avaliação cardiológica do adulto para prática esportiva- Rastreamento de cardiomiopatia dilatada ou hipertrófica- Rastreamento de displasia arritmogênica do ventrículo direito- Rastreamento de miocárdio não compactado- Rastreamento de síndrome de Marfan

Avaliação cardiológica de atleta profissional- Idem

Avaliação de grupos de risco para doença cardiovascular- Familiar de primeiro grau com cardiomiopatia ou antecedente de morte súbita- Portadores de hipertensão arterial sistêmica- Pacientes com diabetes melito- Indivíduos com obesidade significativa- Pacientes com síndrome metabólica

Condições especiais em valvopatias- Indivíduos jovens com sopro cardíaco supostamente inocente- Mulheres grávidas com sopros sistólicos funcionais- Idosos com discreto sopro ejetivo

Page 40: check up

156RSCESPJUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.A ecocardiografiano “check-up”cardiológico

ção sistólica) no paciente assintomático. Com basenessa nova classificação, a ecocardiografia tempapel fundamental na tomada da decisão clínica,já que pode detectar precocemente a cardiopatiaestrutural em pacientes assintomáticos (estágio B),bem como identificar pacientes com alto risco deinsuficiência cardíaca (estágio A) ainda sem car-diopatia.

HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA

Na hipertensão arterial sistêmica, o remodela-mento ventricular é, a princípio, uma forma útilde compensar a sobrecarga hemodinâmica anor-mal ao miocárdio. No entanto, é também o pri-meiro indício do desenvolvimento de síndromesclínicas, como insuficiência cardíaca, isquemia mi-ocárdica e arritmias cardíacas. A identificação eco-cardiográfica da hipertrofia ventricular esquerdaem populações assintomáticas representa um for-te preditor de mortalidade cardiovascular4, e a re-dução da massa ventricular dos pacientes hiper-tensos com hipertrofia ventricular esquerda estáassociada à redução do risco de doenças cardio-vasculares5.

Dentre as principais informações a serem ob-servadas pela ecocardiografia no paciente assin-tomático com hipertensão arterial estão o tipo e ograu de hipertrofia ventricular esquerda. Além dis-so, a ecocardiografia permite caracterizar a geo-metria ventricular a partir da relação entre a mas-sa ventricular indexada pela superfície corpórea(índice de massa de ventrículo esquerdo) e a es-pessura relativa das paredes miocárdicas6. Assim,podem ser estabelecidos diferentes padrões geo-métricos com significado clínico diverso: hiper-trofia ventricular esquerda (aumento do índice demassa de ventrículo esquerdo) concêntrica (espes-sura relativa das paredes > 0,42) ou excêntrica (es-pessura relativa das paredes < 0,42) e remodela-mento concêntrico do ventrículo esquerdo (espes-sura relativa das paredes > 0,42 sem aumento doíndice de massa de ventrículo esquerdo). Essa clas-sificação tem relevância clínica na indicação daterapia medicamentosa nos pacientes com hiper-tensão arterial sistêmica limítrofe6, além de apre-sentar valor prognóstico, uma vez que maioresíndices de morbidade e de mortalidade tardia fo-ram observados em pacientes com geometria con-cêntrica (hipertrofia ou remodelamento) em rela-ção àqueles com geometria excêntrica7.

Outro elemento ecocardiográfico com relevân-cia prognóstica no hipertenso assintomático é ovolume atrial esquerdo, presente em cerca de 44%dos casos, mesmo em vigência de função diastóli-ca normal8. Apesar de associar-se à hipertrofia ven-tricular esquerda, o aumento do volume atrial es-

querdo é considerado fator de risco independentepara eventos cardiovasculares, especialmente fi-brilação atrial e acidente vascular cerebral.

Outra situação relacionada à hipertensão arte-rial sistêmica é a disfunção sistólica do ventrículoesquerdo assintomática (fração de ejeção à eco-cardiografia < 0,50) sem sinais ou sintomas de in-suficiência cardíaca. Desenvolve-se em cerca de4% dos pacientes hipertensos sem doença arterialcoronariana e correlaciona-se com o aumento damassa ventricular esquerda. É um fator preditorde eventos cardiovasculares nessa população epode ser reversível com adequado tratamento anti-hipertensivo.9

Associada ou não à disfunção sistólica, a dis-função diastólica em seus diversos graus, sobre-tudo a de grau leve (alteração de relaxamento),está presente em aproximadamente 40% dos pa-cientes hipertensos assintomáticos. Embora a dis-função diastólica relacionada à hipertensão arte-rial, com ou sem hipertrofia ventricular esquerda,seja motivo de intensa investigação atual, seu va-lor prognóstico ainda não está totalmente esclare-cido nessa população.

DIABETES MELITO

A freqüente associação entre diabetes melito eoutros fatores de risco determina sabidamentemaior prevalência de doença coronariana nessesubgrupo de pacientes, com distribuição difusa eevolução acelerada, mesmo com manifestaçõesatípicas que incluem o infarto do miocárdio silen-cioso. Nessa situação, a ecocardiografia conven-cional pode ser útil na detecção de alterações con-tráteis segmentares sugestivas de comprometimen-to coronariano assintomático. Isso acontece ami-úde nos pacientes com neuropatia diabética, nosquais é mais freqüente a isquemia miocárdica si-lenciosa10.

O alto risco de eventos coronarianos nessa po-pulação justifica meios de investigação de doençacoronariana latente, que incluem eletrocardiogra-fia, teste ergométrico, Holter e até mesmo ecocar-diografia sob estresse com esforço físico.

Mesmo na ausência de hipertensão arterial sis-têmica e coronariopatia associadas, o paciente por-tador de diabetes melito pode apresentar maiortendência a disfunção miocárdica, tanto sistólicacomo diastólica, resultantes dos efeitos diretos dadoença sobre o coração, constituindo a assim cha-mada cardiomiopatia diabética. Possivelmente essefenômeno decorra do acúmulo de produtos meta-bólicos no interstício miocárdico, com conseqüen-te aumento de sua espessura e diminuição de seudesempenho mecânico.11, 12

Ao se utilizar técnicas mais modernas (Dop-

Page 41: check up

157RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.

A ecocardiografiano “check-up”

cardiológico

pler tecidual e “color M-mode”), são descritas ele-vadas taxas de disfunção diastólica em até 75%dos portadores de diabetes do tipo 2 normotensose sem coronariopatia.13 Essa anormalidade ocorrea despeito do controle glicêmico adequado e pa-rece estar correlacionada à duração do diabetes ea outras microangiopatias diabéticas, tais como re-tinopatia e neuropatia13, 14.

Portadores de diabetes do tipo 1, normotensose assintomáticos do ponto de vista cardiovascular,apresentam aumento da massa miocárdica15, as-sociado por alguns à albuminúria e à duração dadoença16. Embora anormalidades na função sistó-lica de pacientes com diabetes do tipo 1 ocorramtardiamente, há consenso de que a disfunção dias-tólica nesses pacientes represente a manifestaçãocardíaca pré-clínica mais precoce da cardiomio-patia diabética, com função sistólica preservada17.Em pacientes com diabetes do tipo 1, a disfunçãodiastólica precoce (padrão de relaxamento anor-mal ao Doppler convencional) tem sido relacio-nada tanto a complicações microvasculares não-cardíacas (retinopatia, nefropatia e neuropatia di-abéticas) como a duração da doença e controlemetabólico inadequado17, 18, o que tem sido con-testado por outros15. Mais recentemente, estudoscom Doppler tecidual têm demonstrado alteraçõesdiastólicas em ambos os ventrículos17, sobretudoem adolescentes do sexo feminino sem sintomascardiovasculares19.

OBESIDADE

Algumas particularidades são observadas noecocardiograma de indivíduos obesos assintomá-ticos. Embora fisiologicamente os diâmetros dascavidades cardíacas aumentem conforme o índicede massa corporal, a obesidade é um fator de riscoindependente para o desenvolvimento de hipertro-fia ventricular esquerda caracterizada ao ecocar-diograma. Isso ocorre, provavelmente, como con-seqüência do aumento do volume intravascular, doaumento do débito cardíaco e do aumento do con-sumo global de oxigênio associados à maior mas-sa adiposa. Somados ao risco de desenvolvimentode disfunção miocárdica inerente à hipertrofiaventricular, estão presentes também os fatores derisco que acompanham o paciente obeso, tais comohipertensão arterial sistêmica, dislipidemia, ate-rosclerose e diabetes, que podem concorrer para odesenvolvimento de doença arterial coronariana.

As alterações morfológicas que acontecem nocoração do paciente obeso podem estar relaciona-das ao acúmulo de gordura entre as fibras cardía-cas, com conseqüente degeneração miocelular edisfunção cardíaca. Todas essas alterações estru-turais no miocárdio dos indivíduos obesos pare-

cem ser mais evidentes quanto maior o grau ou otempo da obesidade.20

Estudos hemodinâmicos e ecocardiográficosdemonstraram elevadas pressões de enchimentoem ventrículo esquerdo associadas a índices demassa corporal aumentados, mesmo naqueles in-divíduos com fração de ejeção normal no repou-so. Isso decorre primordialmente da disfunção di-astólica concomitante ao remodelamento ventri-cular nos pacientes obesos21. Por sua vez, tem sidodemonstrado que a redução do peso em obesos degrau avançado pode resultar na normalização dadisfunção diastólica prévia22. Nessa população deobesos graves, a disfunção sistólica assintomáticafoi observada em até 36% dos casos.

Além das alterações miocárdicas nos obesosgraves, também é descrito aumento da pressãomédia da artéria pulmonar estimada à ecodoppler-cardiografia, que pode estar associado à síndromeda apnéia obstrutiva do sono, muito freqüente nogrupo obeso.20

O CORAÇÃO DO ATLETA

A doença cardiovascular, conhecida ou não,está entre as principais causas de eventos fataisdurante atividade física. Assim, a avaliação cardi-ológica tem como objetivo identificar alteraçõesestruturais e funcionais que poderiam aumentar orisco de morbidade e de mortalidade durante aprática esportiva, bem como analisar o impactodo treinamento sobre o sistema cardiovascular.23

Antes de analisar o ecocardiograma do atleta,é necessário conhecer os achados fisiológicos des-sa condição. O “coração de atleta”, descrito hámais de dois séculos, caracteriza-se por inúmerasadaptações morfofuncionais de caráter benigno etransitório relacionadas à maior demanda energé-tica. Em termos gerais, consiste no aumento damassa miocárdica a níveis que podem atingir aque-les dos pacientes com cardiomiopatia hipertrófi-ca24. As alterações estruturais do coração do atletadependem da intensidade, do tipo de esforço, daduração, da idade e da raça.24, 25 Ghorayeb e cola-boradores24 demonstraram, em maratonistas pro-fissionais, valores significantemente maiores dacavidade ventricular esquerda, da espessura dias-tólica do septo ventricular e da parede posterior, eda massa ventricular esquerda determinada ao eco-cardiograma, quando comparados com um grupocontrole de sedentários sadios.

Os esportes, de forma geral, têm sido classifi-cados em dois grandes grupos: esportes de forçaou estáticos, em que predominam exercícios iso-métricos (como, por exemplo, halterofilismo), eos esportes de resistência, em que predominam asformas isotônicas de exercícios dinâmicos (como,

Page 42: check up

158RSCESPJUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.A ecocardiografiano “check-up”cardiológico

por exemplo, maratonismo). Na maioria das ve-zes, no entanto, os dois componentes estão pre-sentes no condicionamento físico. Há uma tendên-cia de que o aumento da massa ventricular esquer-da seja do tipo concêntrico nos atletas cujo esfor-ço seja predominantemente isométrico e excêntri-co nos esforços predominantemente isotônicos. Ahipertrofia concêntrica tem sido considerada umaresposta à sobrecarga de pressão e a hipertrofiaexcêntrica, uma adaptação à sobrecarga de volu-me24, 25.

A diferenciação entre cardiomiopatia hipertró-fica e resposta fisiológica ao exercício físico é umaquestão controversa na literatura. Entretanto, emtermos práticos, pode ser feita pela análise dasfunções sistólica e diastólica do ventrículo esquer-do, de forma que o encontro de disfunção ventri-cular, sistólica ou diastólica, concomitante comhipertrofia cardíaca deve levantar a suspeita decardiomiopatia hipertrófica.24, 26 Técnicas ecocar-diográficas recentes para o estudo da função mio-cárdica global e regional, envolvendo o Dopplertecidual e suas variantes (“strain” e “strain rate”),podem auxiliar na caracterização de disfunçãoventricular nessa situação clínica. A ecocardiogra-fia sob estresse com esforço físico pode ser útil nadetecção de uma resposta anormal do miocárdiohipertrófico ao exercício26, seja por alterações dafunção sistólica ao esforço seja pelo desenvolvi-mento de obstrução subaórtica dinâmica com gra-diente sistólico ausente em repouso, sugestivo decardiomiopatia hipertrófica com obstrução laten-te.

O CORAÇÃO NA GRAVIDEZ NORMAL

A avaliação de sopros funcionais pela eco-cardiografia na gestante assintomática pressu-põe o conhecimento das adaptações fisiológi-cas cardíacas durante a gravidez. O aumento dodébito cardíaco e da volemia determina discre-tos aumentos reversíveis das cavidades atriais eventriculares, dentro dos limites da normalida-de. A função sistodiastólica está preservada, ehá maior prevalência de refluxos funcionaismultivalvares (pulmonar, tricúspide e mitral,mas não aórtico) relacionados à dilatação osti-al, sem repercussão clínica27.

O CORAÇÃO DO IDOSO

A ecocardiografia pode identificar facilmenteelementos estruturais e funcionais muito prevalen-tes no idoso saudável, não necessariamente pato-lógicos: septo interventricular sigmóide, esclero-se valvar aórtica e calcificação focal do anel mi-tral associados a refluxos valvares discretos sem

repercussão hemodinâmica, disfunção diastólicaleve (alteração do relaxamento ventricular) e ate-romatose discreta do arco aórtico. Tais aspectosdevem ser levados em consideração ao se utilizara ecocardiografia no paciente idoso assintomáti-co.

HÁ LUGAR PARA A ECOCARDIOGRAFIASOB ESFORÇO FÍSICO NO “CHECK-UP”?

A ecocardiografia sob estresse com esforçofísico constitui a integração de imagens ecocardi-ográficas ao teste ergométrico convencional, emindivíduos com capacidade física preservada. Alémde custo-efetivo, a ecocardiografia sob estressecom esforço físico tem ótimo perfil de seguran-ça28, equivalente ao teste ergométrico isolado napopulação geral.

Estudos recentes confirmam a superioridadedo teste ergométrico sobre a análise isolada dosfatores de risco na previsão de eventos cardíacosem indivíduos assintomáticos com baixa probabi-lidade para doença arterial coronária, justificandoseu uso em “check-up” de rotina29. Entretanto, nãohá evidências atuais que suportem essa indicaçãopara a ecocardiografia sob estresse com esforçofísico. Ao contrário, as diretrizes vigentes da So-ciedade Brasileira de Cardiologia consideramcomo classe III a indicação desse teste na avalia-ção inicial de indivíduos assintomáticos com bai-xa probabilidade de doença arterial coronária, ouseja, ecocardiografia sob estresse com esforço fí-sico nesses indivíduos é desnecessária ou não apli-cável1. É necessário enfatizar que a ecocardiogra-fia sob estresse com esforço físico não substitui oteste ergométrico quando a análise eletrocardio-gráfica é adequada, mesmo em assintomáticos.Nossas diretrizes, porém, recomendam o uso daecocardiografia sob estresse físico ou farmacoló-gico em indivíduos assintomáticos quando o testeergométrico é positivo ou duvidoso (classe IIa) ou,eventualmente, com bloqueio de ramo esquerdo,para reduzir a probabilidade de doença arterial co-ronária1.

Os estudos sobre valor diagnóstico e prognós-tico da ecocardiografia sob estresse com esforçofísico na população geral avaliam uma ampla fai-xa de probabilidade pré-teste de doença arterialcoronária, que incluem desde indivíduos assinto-máticos com fatores de risco até pacientes comdoença arterial coronária definitiva. Os resultadosderivados desses pacientes, portanto, não podemser extrapolados para uma população assintomá-tica. Contudo, em uma grande série de pacientesde ambos os sexos (61% homens), de meia-idade(média de idade, 62 anos), na maioria assintomá-tica ou com dor atípica (90%), porém com alguns

Page 43: check up

159RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.

A ecocardiografiano “check-up”

cardiológico

fatores de risco presentes, observou-se excelenteprognóstico naqueles com ecocardiografia sobestresse com esforço físico negativa para isque-mia miocárdica, independentemente da probabi-lidade pré-teste30. Já em pacientes com baixa pro-babilidade pré-teste de doença arterial coronária,os resultados da estratificação de risco de doençaarterial coronária pela ecocardiografia sob estres-se com esforço físico são controversos. Algunsacreditam que para pacientes com dor torácica atí-pica e baixa probabilidade de doença arterial co-ronária, a ecocardiografia sob estresse com esfor-ço físico possa ser mais custo-efetiva que o testeergométrico convencional31. Em outro estudo, po-rém, embora a ecocardiografia sob estresse comesforço físico tenha identificado alguns dessespacientes com risco de eventos futuros, não foiconsiderada custo-efetiva pela baixa taxa de des-fechos clínicos32.

Apesar dessas considerações, acredita-se queo exame sob esforço físico pode ser válido emsubgrupos específicos de indivíduos assintomáti-cos. Assim, a ecocardiografia sob estresse comesforço físico pode ser útil no “check-up” cardio-lógico nas seguintes condições: presença de alte-rações eletrocardiográficas em repouso que pos-sam prejudicar a interpretação do eletrocardiogra-ma no esforço; indivíduos com história familiarde cardiomiopatia hipertrófica; pacientes com in-dicação de realizar ecocardiografia além do testeergométrico (avaliação para academia, atletas,etc.), e, sobretudo, quando houver maior probabi-lidade de testes falsos positivos (mulheres) e emindivíduos assintomáticos com risco elevado paradoença arterial coronária (diabéticos). Um estudorecente propõe um protocolo para avaliação car-diovascular em indivíduos normais que vão se sub-meter a treinamento físico aeróbico, que inclui arealização de ecocardiografia sob estresse comesforço físico além do teste cardiopulmonar paraestabelecer a segurança da atividade física e me-

lhor orientar a prescrição do nível de exercício33.Particularmente em mulheres, nas quais sabi-

damente o teste ergométrico apresenta menor acu-rácia diagnóstica em relação ao sexo masculino,as diretrizes das sociedades americanas de cardi-ologia sugerem que um teste de estresse com ima-gem pode ser uma alternativa inicial eficiente aoteste ergométrico34. A ecocardiografia sob estres-se com esforço físico em mulheres é reconhecida-mente mais sensível, mais acurada e mais custo-efetiva que o teste ergométrico para o diagnósticode doença arterial coronária35, além de apresentarvalor prognóstico independente e adicional às in-formações clínicas e aos resultados do teste ergo-métrico36. O valor prognóstico do exame sob es-tresse em mulheres pode ser otimizado se, ao in-vés da simples análise dicotômica do resultadopositivo ou negativo, for avaliada quantitativamen-te a resposta do teste pelo escore de motilidadeparietal37. Mesmo não havendo estudos exclusi-vos de ecocardiografia sob estresse com esforçofísico em mulheres assintomáticas, é possível queas vantagens desse exame possam também bene-ficiar esse subgrupo ao se submeter a “check-up”cardiológico.

Em diabéticos, o uso de exames de imagemcom estresse farmacológico ou físico para avalia-ção de isquemia tem sido recomendado pela “Ame-rican Heart Association”. Nos diabéticos em ge-ral, a ecocardiografia sob estresse com esforço fí-sico tem valor prognóstico incremental aos dadosclínicos e à eletrocardiografia de esforço, acres-centando informações para previsão de eventoscardiovasculares futuros, sobretudo quando o tes-te ergométrico for não-diagnóstico38. Embora de-rivados de um estudo com diabéticos sintomáti-cos e assintomáticos, esses dados reforçam a im-portância da avaliação ecocardiográfica tanto emrepouso como ao esforço nesse subgrupo de paci-entes, justificando, em nossa opinião, sua realiza-ção em diabéticos assintomáticos.

Page 44: check up

160RSCESPJUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.A ecocardiografiano “check-up”cardiológico

ROLE OF ECHOCARDIOGRAPHY IN ROUTINE

CARDIOVASCULAR EVALUATION (CHECK-UP)

ORLANDO CAMPOS FILHO

WERCULES A. ALVES OLIVEIRA

ADRIANA CORDOVIL

Echocardiography is a versatile diagnostic noninvasive tool that can be applied in thecardiac evaluation of asymptomatic subjects with risk factors for cardiovascular diseases,although not recommended for routine screening in large populational studies. Specialsubgroups of asymptomatic individuals for echocardiographic evaluation includeshypertensive patients, diabetics, dislipidemic, obeses, in an attempt to identify structural orfunctional signs of subclinical cardiac abnormalities which can lead to profilaticproceedings. Cardiac evaluation of candidates to physical activities constitutes anotherapplication of echocardiography for asymptomatic subjects, mainly with familial story ofcardiac disease or sudden death, in order to exclude latent myocardial or aortic diseases.Finally, this article discusses the diagnostic and prognostic role of exerciseechocardiography in diagnosing latent artery coronary disease, particularly in asymptomaticwomen and diabetics.

Key words: echocardiography, check-up.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:154-62)RSCESP (72594)-1608

REFERÊNCIAS

1. Campos Filho O, Zielinsky P, Ortiz J, MacielBC, Andrade JL, Mathias W Jr, et al. Diretrizpara Indicações e Utilização da Ecocardiogra-fia na Prática Clínica. Arq Bras Cardiol.2004;82:11-34.

2. Hunt SA, Abraham WT, Chin MH, et al. ACC/AHA 2005 Guideline Update for the Diagno-sis and Management of Chronic Heart Failurein the Adult: A Report of the American Colle-ge of Cardiology/American Heart AssociationTask Force on Practice Guidelines. J Am CollCardiol. 2005;46:154-235.

3. Milani RV, Lavie CJ, Mehra MR, et al. Leftventricular geometry and survival in patientswith normal left ventricular ejection fraction.Am J Cardiol. 2006;97:959-63.

4. Kannel WB, Gordon T, Offutt D. Left ventricu-lar hypertrophy by electrocardiogram. Preva-lence, incidence, and mortality in the Framin-gham study. Ann Intern Med. 1969;71:89-105.

5. Verdecchia P, Angeli F, Borgioni C, et al. Chan-ges in cardiovascular risk by reduction of leftventricular mass in hypertension: a meta-analy-sis. Am J Hypertens. 2003;16(Pt 1):895-9.

6. Lang RM, Bierig M, Devereux RB, et al. Re-commendations for chamber quantification: areport from the American Society ofEchocardiography’s Guidelines. J Am SocEchocardiogr. 2005;18:1440-63.

7. Muiesan ML, Salvetti M, Monteduro C, et al.Left ventricular concentric geometry duringtreatment adversely affects cardiovascularprognosis in hypertensive patients. Hyperten-sion. 2004;43:714-5.

8. Pavlovic B. Left atrial size in patients with ar-terial hypertension. Srp Arh Celok Lek.2006;134:100-5.

9 .Verdecchia P, Angeli F, Gattobigio R, et al.Asymptomatic left ventricular systolic dys-function in essential hypertension: prevalen-ce, determinants, and prognostic value. Hyper-tension. 2005;45:412-8.

Page 45: check up

161RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.

A ecocardiografiano “check-up”

cardiológico

10. Davis TM, Fortun P, Mulder J, et al. Silentmyocardial infarction and its prognosis in acommunity-based cohort of type 2 diabeticpatients: the Fremantle Diabetes Study. Dia-betologia. 2004;47:395-9.

11. Vineranu D, Nicolaides E, Tweddel ACC, etal. Subclinical left ventricular dysfunction inasymptomatic patients with type 2 diabetes me-llitus, related to serum lipids and glycated ha-emoglobin. Clin Sci (Lond). 2003;105:591-9.

12. Annonu AK, Fattah AA, Mokhtar MS, et al.Left ventricular systolic and diastolic functio-nal abnormalities in asymptomatic patientswith non-insulin-dependent diabetes mellitus.J Am Soc Echocardiogr. 2001;14:885-91.

13. Boyer JK, Thanigaraj S, Schechtman KB, etal. Prevalence of ventricular diastolic dysfunc-tion in asymptomatic, normotensive patientswith diabetes mellitus. Am J Cardiol.2004;93:870-5.

14. Zabalgoitia M, Ismaeil MF, Anderson L, et al.Prevalence of diastolic dysfunction in normo-tensive, asymptomatic patients with well-con-trolled type 2 diabetes mellitus. Am J Cardiol.2001;1:87(3):320-3.

15. Carugo S, Giannattasio C, Calchera I, et al.Progression of functional and structural cardi-ac alterations in young normotensive uncom-plicated patients with type 1 diabetes mellitus.J Hypertens. 2001;19:1675-80.

16. Kimball TR, Daniels SR, Khoury PR, et al.Cardiovascular status in young patients withinsulin-dependent diabetes mellitus. Circula-tion. 1994;90:357-61.

17. Karamitsos DT, Parharidis GE, Louridas GE.Early diastolic impairment of diabetic heart:the significance of right ventricle. Int J Cardi-ol. 2006 (in press).

18. Raev DC. Which left ventricular function isimpaired earlier in the evolution of diabetic car-diomyopathy? An echocardiographic study ofyoung type 1 diabetic patients. Diabetes Care.1994;17:633-9.

19. Suys BE, Katier N, Rooman RP, et al. Femalechildren and adolescents with type 1 diabeteshave more pronounced early echocardiogra-phic signs of diabetic cardiomyopathy. Diabe-tes Care. 2004;27:1947-53.

20. Ramires FJA, Fernandes F, Dantas S. O mio-cárdio na obesidade. Rev Soc Cardiol Estadode São Paulo. 2003;4:399-403.

21. Powell BD, Redfield MM, Bybee KA, et al.Association of obesity with left ventricular re-modeling and diastolic dysfunction in patientswithout coronary artery disease. Am J Cardi-ol. 2006;98:116-20.

22. Alpert MA, Lambert CR, Terry BE et al. Effect

of weight loss on left ventricular diastolic fi-lling in morbid obesity. Am J Cardiol. 1995;76:1198-201.

23. Borjesson M, Nylander E. Sudden cardiac de-ath in athletes is usually caused by undiagno-sed heart disease. Cardiac screening of youngathletes under discussion. Lakartidningen.2005;102:560-3.

24. Ghorayeb N, Batlouni M, Pinto IMF, Giuse-ppe S. Hipertrofia ventricular esquerda do atle-ta. Resposta adaptativa fisiológica do coração.Arq Bras Cardiol. 2005;85:191-7.

25. Dzudie A, Menanga A, Hamadou B, et al. Ul-trasonographic study of left ventricular func-tion at rest in a group of highly trained blackAfrican handball players. Eur J Echocardiogr.2006 (in press).

26. Caso P, D’Andrea A, Caso I, et al. The athlete’sheart and hypertrophic cardiomyopathy: twoconditions which may be misdiagnosed and co-existent. Which parameters should be analy-sed to distinguish one disease from the other?J Cardiovasc Med (Hagerstown). 2006;7:257-66.

27. Campos Filho O, Andrade JL, Bocanegra A,Ambrose J, Harada K, Carvalho AC, et al. Phy-siologic multivalvular regurgitation duringpregnancy: a longitudinal Doppler echocardi-ographic study. Int J Cardiol. 1993;40:265-72.

28. Varga A, Garcia MA, Picano E. Safety of stressechocardiography (from the InternationalStress Echo Complication Registry).Am J Car-diol. 2006;98:541-3.

29. Cournot M, Taraszkiewicz D, Galinier M, etal. Is exercise testing useful to improve the pre-diction of coronay events in asymptomatic sub-jects? Eur J Cardiovasc Prev Rehabil.2006;13:37-44.

30. McCully RB, Roger VL, Mahoney DW, et al.Outcome after normal exercise echocardiogra-phy and prediction of subsequent cardiacevents: follow-up of 1,365 patients. J Am CollCardiol. 1998;31:144-9.

31. Colon P, Mobarek S, Milani R, et al. Prognos-tic value of stress echocardiography in the eva-luation of atypical chest pain without knowncoronary artery disease. Am J Cardiol.1998;85:545-51.

32. Elhendy A, Shub C, McCully R, et al. Exerci-se echocardiography for the prognostic strati-fication of patients with low pretest probabili-ty of coronary artery disease. Am J Med.2001;111:73-4.

33. Swank AM, Funk DC, Manire JT. Echocardi-ographic evaluation for stress test for determi-ning safety of participation in strength training.J Strenght Cond Res. 2005;19:389-93.

Page 46: check up

162RSCESPJUL/AGO/SET 2006

CAMPOS FILHO Oe cols.A ecocardiografiano “check-up”cardiológico

34. Gibbons R, Balady G, Beasley J, et al. ACC/AHA guidelines for exercise testing: a reportof the American College of Cardiology/Ame-rican Heart Association task force on practiceguidelines (Committee on Exercise testing). JAm Coll Cardiol. 1997;30:260-315.

35. Marwick T, Anderson T, Williams MJ, et al.Exercise echocardiography is an accurate andcost-efficient technique for detection of coro-nary artery disease in women. J Am Coll Car-diol. 1995;26:335-41.

36. Heupler S, Mehta R, Lobo A, et al. Prognostic

implications of exercise echocardiography in wo-men with known or suspected coronary arterydisease. J Am Coll Cardiol. 1997;30:414-20.

37. Cordovil A, Mathias W, Andrade J, CamposO, Moisés V, Gil M, et al. Role of dobutamine-atropine stress echocardiography in prognos-tic evaluation of 300 women. Echocardiogra-phy. 2004;21:113-8.

38. Elhendy A, Arruda A, Mahoney DW, PellikkaP. Prognostic stratification of diabetic patientsby exercise echocardiography. J Am Coll Car-diol. 2001;37:1551-7.

Page 47: check up

163RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.

Estratificação de riscocoronário pela

tomografiacomputadorizada

INTRODUÇÃO

A tomografia computadorizada de múltiplosdetectores vem ganhando grande aceitação comoforma de avaliação não-invasiva das artérias coro-nárias. Uma de suas principais aplicações é a deidentificar subgrupos de pacientes em maior riscopara apresentar eventos cardíacos adversos, taiscomo procedimentos de revascularização, interna-ção por angina, infarto e morte súbita cardíaca.Isso ocorre porque esse exame fornece dados so-bre o índice de calcificação coronária, sobre a pre-sença de placas não-calcificadas e, mais recente-mente, sobre a função ventricular. O objetivo des-

ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO CORONÁRIO PELA

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA

IBRAIM MASCIARELLI F. PINTO

WALTHER ISHIKAWA

ROBERTO SASDELLI NETO

AMANDA G. M. R. SOUSA

Serviço de Tomografia ComputadorizadaInstituto Dante Pazzanese de CardiologiaHospital do Coração (HCor) – Associação do Sanatório Sírio

Endereço para correspondência: Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 – Ibirapuera –CEP 04012-180 – São Paulo – SP

A tomografia computadorizada por múltiplos detectores pode ser empregada para aavaliação não-invasiva de indivíduos com suspeita de apresentar doença coronária, uma vezque ela possibilita calcular o escore de cálcio coronário e realizar a angiotomografia não-invasiva daqueles vasos. A experiência mundial revela que esse exame apresenta elevadosvalores preditivos negativo e positivo. O exame também logra revelar a presença deobstruções coronárias e pode ser utilizado para o acompanhamento não-invasivo depacientes submetidos a cirurgia de revascularização do miocárdio por possibilitar aestratificação de risco nesses casos.

Palavras-chave: tomografia computadorizada, insuficiência coronária, prognóstico.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:163-71)RSCESP (72594)-1609

te artigo é rever, de modo objetivo e crítico, o de-sempenho da tomografia computadorizada pormúltiplos detectores na complementação da estra-tificação de risco não-invasiva.

PRINCÍPIOS FÍSICOS, AVALIAÇÃODO ESCORE DE CÁLCIO EANGIOTOMOGRAFIA CORONÁRIA

A tomografia por múltiplos detectores das ar-térias coronárias baseia-se na emissão de raios Xpor um tubo gerador que gira ao redor do pacienteem velocidades de, pelo menos, 400 ms por ciclo.A radiação incide sobre múltiplas fileiras de de-

Page 48: check up

164RSCESPJUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.Estratificação de riscocoronário pelatomografiacomputadorizada

tectores, que podem variar de 4 a 64, dependendodo modelo utilizado. Nesses detectores, então, aradiação incidente gera uma corrente elétrica queserá submetida à conversão análogo-digital, dan-do lugar às imagens fontes.1, 2

Paralelamente, o traçado eletrocardiográfico dopaciente é registrado durante todo o período deaquisição. Ao término da aquisição o operadorrealiza o pareamento entre as imagens e as dife-rentes fases do ciclo cardíaco. Desse modo, todasas estruturas cardíacas, inclusive as artérias coro-nárias, podem ser avaliadas em todas as etapas damovimentação do coração.1, 2

Uma forma alternativa de obter imagens do co-ração inclui o registro da anatomia cardíaca emfases predeterminadas do ciclo cardíaco, nummodo conhecido como aquisição prospectiva. Essaopção tem a vantagem de expor o paciente a dosesmenores de radiação, mas, por outro lado, é maissujeita à presença de artefatos de movimento, umavez que a sincronização entre a fase do ciclo car-díaco e as imagens registradas pode não ser per-feita.3, 4

A dose de radiação incidente sobre o pacientetem sido alvo de controvérsia e pode variar de acor-do com o fabricante, com o modelo de tomografiautilizado e com o protocolo de exame. Todos osenvolvidos lançam mão de recursos eletrônicospara reduzir a dose total de radiação necessáriapara a realização do exame, mas esta é semelhan-te àquela necessária em outros exames de imagem,sendo muito baixa para a realização do escore decálcio e algo mais elevada para a realização daangiotomografia.3

A determinação do índice de calcificação dasartérias coronárias compreende uma etapa única,sem necessidade de procedimentos adicionais. Poroutro lado, a realização da angiotomografia tam-bém exige a aquisição de imagens radiográficassimultaneamente à injeção de meio de contrasteiodado, com a finalidade de opacificar aquelesvasos assim como as cavidades cardíacas e facul-tar a visibilização não-invasiva das estruturas docoração.3, 5-7

A análise das imagens exige que todas as es-truturas sejam revistas em estações de trabalhocomputadorizadas que possibilitam a reconstru-ção das artérias coronárias e das cavidades cardí-acas em diferentes planos, inclusive as tridimen-sionais. A primeira fase é o cálculo do escore decálcio coronário, realizado de modo simples, emque o operador delimita a área das artérias coro-nárias nas quais pode haver calcificação e o com-putador determina automaticamente a taxa de cál-cio naquela região.3, 5-7 Em seguida, são feitas re-construções longitudinais e transversais das arté-rias coronárias e das cavidades cardíacas, para que

se possam localizar as obstruções, para que estaspossam ser quantificadas e também para que sepossa estimar a composição das placas. As recons-truções volumétricas, por sua vez, são úteis para aavaliação da função ventricular e para documen-tar a anatomia coronária (Fig. 1). Essas imagenssão, por fim, documentadas para fornecer ao mé-dico solicitante todas as informações necessáriaspara a estratificação de risco.

ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO:PAPEL DO ESCORE DE CÁLCIO

A potencial contribuição do escore de cálciopara determinar a faixa de risco dos pacientes ava-liados tem sido sugerida há mais de uma década8.Pesquisas nesse sentido foram realizadas a partirdo conhecimento da relação clara que existe entrea presença de aterosclerose e a existência de cál-cio8-11. Sabe-se que a presença de placas de atero-ma na parede arterial é acompanhada da presençade diferentes graus de calcificação, que são facil-mente identificáveis pela tomografia computado-rizada. Assim, estabeleceu-se desde logo a asso-ciação entre o grau de cálcio na parede das artéri-as coronárias e a maior possibilidade de existirdoença coronária9.

Detrano e Molloi9 defendiam a aplicação dométodo de análise das tomografias das artérias co-ronárias desenvolvido por Agatston e colaborado-res8, por entender que o depósito de fosfatos decálcio nas placas de ateroma que se formam nasartérias coronárias é um fenômeno relativamenteprecoce e que poderia trazer implicações clínicasrelevantes. Mais tarde, o mesmo grupo12 relatouos resultados da utilização desse método em 491indivíduos assintomáticos e que foram submeti-dos a quantificação do escore de cálcio coronárioe também a cinecoronariografia invasiva. Os au-tores definiram, arbitrariamente, o valor de 200como o nível que caracterizava escore elevado.Eles relataram 13 óbitos cardíacos e 1 infarto não-fatal, chamando a atenção para o fato de que aquantidade de cálcio nas artérias coronárias foi umpreditor de eventos mais significativo que o nú-mero de vasos comprometidos por estenoses. Con-tudo, os autores caracterizaram a relação entre oíndice de calcificação e a incidência de eventoscomo sendo moderada, uma vez que houve a pre-sença de eventos adversos mesmo em percentisde risco não muito elevados12.

O interesse pelo uso desse método ampliou-see o mesmo grupo confirmou a utilidade da reali-zação do escore de cálcio em pacientes de alto-risco, mesmo que assintomáticos13. Avaliando1.461 pacientes, esses autores determinaram nú-mero de vasos calcificados, idade, colesterol to-

Page 49: check up

165RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.

Estratificação de riscocoronário pela

tomografiacomputadorizada

tal, diabetes e hipertrofia ventricular ao eletrocar-diograma como preditores independentes de even-tos coronários adversos. Kennedy e colaborado-res14 acompanharam 366 casos em quatro centrose lograram demonstrar que o grau de calcificaçãonas artérias coronárias e o sexo masculino foramos únicos preditores independentes de eventos ad-versos. Além disso, de 71 pacientes que não de-monstravam nenhum resquício de cálcio nas arté-rias coronárias, 64 apresentavam exames invasi-vos completamente normais, demonstrando, des-sa forma, que a determinação de escore de cálcio

Figura 1. A) Imagens de tomografia computadorizada sem injeção de contraste, que servem parademonstrar a presença de cálcio (setas). Essa informação é a base para a determinação do escore decálcio coronário. B) Reconstruções tridimensionais e longitudinais do coração e das artérias coronárias,que permitem a visibilização e a análise das artérias coronárias.

negativo tem elevado poder preditivo negativo(90%, na experiência dos autores)14.

Um dos mais importantes trabalhos avaliandoo impacto da mensuração do cálcio coronário foio estudo de Shaw e colaboradores, que acompa-nharam 10.377 indivíduos assintomáticos subme-tidos a esse exame, com média de idade de 53 anose com 60% desses indivíduos do sexo masculi-no15. Nesse trabalho foi utilizada a divisão, hojeaceita em quase todos os centros mundiais, dosvalores do escore de cálcio como 10 ou menos, de11 a 100, de 101 a 400, de 401 a 1.000, e maior

A

B

Page 50: check up

166RSCESPJUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.Estratificação de riscocoronário pelatomografiacomputadorizada

que 1.00015. Os pacientes foram acompanhados porcinco anos e no final desse período a mortalidadeajustada foi de 1% para os casos de cálcio de 10ou menos e de 5% quando o escore era maior que1.000. Um importante achado foi o de que a inci-dência de eventos aumentava de acordo com a pro-porção do cálcio coronário (Tab. 1)15. Avançandona análise dos dados, os pacientes foram dividi-dos em três subgrupos, de acordo com o escore derisco de Framingham, isto é, baixo com 1.302 ca-sos, moderado com 5.876 indivíduos e alto com3.194 pacientes. Em todos houve relação diretaentre o maior escore de cálcio e a mortalidade portodas as causas. Os próprios autores reconhecemque o trabalho incluiu casos que apresentavam al-guns fatores de risco por terem sido referidos porseus médicos e isso pode não refletir o desempe-nho do exame na população geral. Eles concluem,afirmando que o cálculo do índice de cálcio esta-ria indicado em especial nos indivíduos que mos-trassem perfil de risco pré-teste intermediário.

A relação entre presença de calcificação nasartérias coronárias e existência de insuficiência co-ronária foi confirmada em trabalho de Moser e co-

Anand e colaboradores17, que empregaram proto-colo semelhante em 220 pacientes com média deidade de 61 anos e dos quais 85% eram homens.Com resultados semelhantes aos do estudo deMoser16 e colaboradores, os autores demonstraramque houve isquemia à cintilografia em 18% dos119 pacientes que apresentavam índice de cálcioentre 101 e 400, incidência que aumentou para45% nos 101 casos nos quais o escore de cálcioera maior que 40117.

Greenland e colaboradores também abordarama associação entre a determinação dos fatores derisco clássicos e o índice de cálcio coronário18. Elesavaliaram 1.461 pacientes assintomáticos e de-monstraram que naqueles nos quais o escore decálcio era superior a 330 a chance de ocorrênciade eventos adversos aumentava 3,9 vezes. Contu-do, ao subdividir os pacientes conforme o escorede risco de Framingham, os autores demonstra-ram que quando perfil de risco pré-teste era me-nor que 10% o índice de cálcio não apresentounenhum impacto nos pacientes. O impacto da de-terminação do índice de cálcio coronário se apre-sentava em sua plenitude quando os pacientes apre-

Tabela 1. Mortalidade por todas as causas e taxa de risco relativo em cada uma das faixas de escore decálcio, revelando que esse índice teve impacto em todos os subgrupos avaliados. (Adaptado de Shawe cols.15)

MortalidadeEscore Número de por todas Taxa dede cálcio pacientes as causas (%) risco relativo

< 10 5.946 1,0 —11-100 2.044 2,6 2,5101-400 1.432 3,8 3,6401-1.000 632 6,3 6,2> 1.000 332 12,3 12,3

laboradores16. Esses autores estudaram 794 paci-entes que também foram submetidos a cintilogra-fia do miocárdio. Dos indivíduos incluídos no es-tudo, 422 apresentavam escore igual ou inferior a100 e nestes não houve nenhum caso de defeitotransitório ou fixo no exame de perfusão miocár-dica. Por outro lado, dos 59 pacientes que apre-sentavam escore de cálcio entre 101 e 400 houve6% de defeitos transitórios à cintilografia e nos38 casos com índice de cálcio maior que 400 aproporção de casos de isquemia no teste de medi-cina nuclear aumentou para 35%16.

A associação entre cálcio coronário e isque-mia miocárdica foi confirmada no trabalho de

sentavam taxa de risco acima de 10%. Era nesteúltimo subgrupo que a prevalência de eventos au-mentou 3,9 vezes (intervalo de confiança: 2,0-10,4). Embora com menor casuística, esse estudoconfirma as impressões de Moser e colaborado-res, que especularam que, embora taxas de cálcioelevado sejam elementos de pior prognóstico paratodos os casos, o impacto desse parâmetro é maisimportante nos indivíduos que apresentam perfilde risco pré-teste intermediário. Conclusões seme-lhantes foram recentemente relatadas por Hecht ecolaboradores em revisão feita do tema19.

É importante lembrar que em todos os traba-lhos descritos houve grande destaque para o fato

Page 51: check up

167RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.

Estratificação de riscocoronário pela

tomografiacomputadorizada

de que com índices de cálcio reduzidos, em espe-cial quando esse valor é zero, a possibilidade deexistir doença coronária é reduzida20, 21.

Por outro lado, existem limitações relaciona-das à quantificação do índice de cálcio coronário,tais como o fato de que esse parâmetro não deveser utilizado para o seguimento dos pacientes, alémde que ele não se reduz ao longo da vida do paci-ente, por mais eficaz que seja o tratamento em-pregado, e, de modo muito importante, a avalia-ção do escore de cálcio não faculta a análise daparede do vaso ou a identificação de placas não-calcificadas. Isso fez com que alguns centros pas-sassem a realizar a complementação do exameutilizando para tanto a injeção de contraste ioda-do, a fim de realizar a angiotomografia das artéri-as coronárias.

ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO:ANGIOTOMOGRAFIA DASARTÉRIAS CORONÁRIAS

A angiotomografia das artérias coronárias é umexame não-invasivo, que utiliza a técnica dos exa-mes de tomografia computadorizada por múltiplosdetectores associada à injeção de meio de contrasteiodado para revelar a anatomia das artérias coro-nárias, para identificar a presença de obstruçõesarteriais coronárias e também para permitir o es-tudo das placas de ateroma.

Knez e colaboradores6 demonstraram que,mesmo com os equipamentos de primeira gera-ção, que adquiriam oito imagens por segundo, jáera possível demonstrar a anatomia da árvore ar-terial coronária e detectar a presença de obstru-ções. Leber e colaboradores22 confirmaram os re-sultados favoráveis e o trabalho de Nieman e co-laboradores23 revelou que a avaliação tridimensi-onal do coração a partir das imagens da tomogra-fia computadorizada de múltiplos detectores fa-cultava a completa análise das artérias coronáriase a identificação da presença de obstruções. Osautores apontaram algumas limitações do exame,tais como a dificuldade em realizar a análise com-pleta das artérias coronárias e alguma imprecisãona quantificação das obstruções intermediárias,mas concluíram que esse exame apresentava gran-de potencial.

Tanto a sensibilidade como a especificidade doexame foram sendo aprimoradas conforme a téc-nica progredia; com o lançamento dos equipamen-tos de 64 imagens por rotação, a literatura passoua relatar valores de 83% e 97%, respectivamente,para identificar obstruções que diminuíssem emmais de 75% a luz dos vasos24.

Tais resultados favoráveis estimularam o em-prego mais amplo dessa técnica também para es-

tratificar o risco de eventos coronários. A experi-ência de nosso serviço demonstrou que o examepode realizar, de modo efetivo, a estratificação derisco após a revascularização cirúrgica do miocár-dio. O exame pode, com facilidade, demonstrar apatência de enxertos arteriais e venosos utiliza-dos, além de identificar a presença de obstruçõesnaqueles vasos (Fig. 2). Avaliando 136 pacientessubmetidos a angiotomografia e a cinecoronario-grafia, encontramos sensibilidade de 91% e espe-cificidade de 96% para encontrar obstruções nasartérias coronárias. Acompanhando esses pacien-tes por 14 meses, determinamos valor preditivopositivo de 94% para definir a incidência de even-tos adversos.

A mesma estratégia pode ser empregada no es-tudo das artérias coronárias nativas. Nikolaou ecolaboradores25 demonstraram que até 30% dasplacas encontradas nas artérias de pacientes cominsuficiência coronária eram puramente não-cal-cificadas. Estudo posterior do mesmo grupo26 re-velou que as imagens conseguidas pela tomogra-fia computadorizada por múltiplos detectores po-deria ser efetivamente empregada para determi-nar a carga total de aterosclerose que comprome-tia cada paciente em particular.

A avaliação das artérias coronárias nativas com

Figura 2. Angiotomografia das artérias coronáriasdemonstrando a presença de uma anastomose deartéria torácica interna esquerda com a artériadescendente anterior e uma ponte de safena para aartéria marginal que se encontram pérvias.

Page 52: check up

168RSCESPJUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.Estratificação de riscocoronário pelatomografiacomputadorizada

a tomografia computadorizada de múltiplos detec-tores demonstrou bons resultados conseguidos naavaliação dos enxertos (Fig. 3). Nossa experiênciademonstra que temos sensibilidade de 89% e espe-cificidade de 93%, além de valor preditivo positivode 91%. Chama muito a atenção o fato de que o va-lor preditivo negativo do exame foi de 97%.

Uma importante aplicação desse método sur-giu com os trabalhos de Kunimasa e colaborado-res27 e de Hoffmann e colaboradores28, que de-

monstraram a possibilidade de utilizar a angioto-mografia das artérias coronárias para tipificar acomposição das placas que comprometam essesvasos. Nossa experiência nesse sentido demons-tra que é possível revelar diferenças entre síndro-mes coronárias utilizando a tomografia computa-dorizada de múltiplos detectores. Comparando 150pacientes com síndromes coronárias agudas com150 pacientes portadores de angina estável, de-monstramos que o índice de cálcio era igualmenteelevado nos dois subgrupos, mas que o coeficien-te de atenuação das placas, isto é, o modo como

Figura 3. Angiotomografia das artérias coronárias nativas demonstrando doença coronária extensa naartéria descendente anterior, na qual existem placas de ateroma significativas.

os ateromas interagem com os raios X, permitiadistinguir os portadores de síndromes instáveis.

Nossa experiência também demonstrou que adeterminação de placas não-calcificadas contribuipara a estratificação de risco de pacientes comsuspeita de insuficiência coronária. Acompanha-mos 643 pacientes, calculando neles o índice decálcio e a quantidade de placas não-calcificadas(Fig. 4). Ao final de 30 meses de evolução, foramobservados eventos adversos em 54 pacientes.

Nestes, o índice de cálcio era superior àquele en-contrado nos indivíduos sem eventos (242 + 73vs. 64 + 8; p < 0,001), havia mais diabéticos (18,33% vs. 62, 10,5%; p < 0,05), e escore de placasnão-calcificadas (258 + 57 vs. 42 + 21; p < 0,0001).A análise estatística multivariada demonstrou es-ses elementos como os únicos preditores indepen-dentes dos eventos adversos.

CONCLUSÃO

A tomografia computadorizada por múltiplos

Page 53: check up

169RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.

Estratificação de riscocoronário pela

tomografiacomputadorizada

detectores vem ocupando posição de destaque naestratificação de risco de pacientes com suspeitade apresentar doença coronária, assim como emindivíduos sintomáticos e após revascularizaçãocirúrgica do miocárdio. A realização combinadado cálculo do índice de cálcio coronário e da an-giotomografia dá ao exame valor preditivo nega-

Figura 4. Reconstrução longitudinal de angiotomografia mostrando a forma como se procede paradeterminar o escore de cálcio (áreas em bege) e o escore de placas lipídicas (áreas em azul) quecomprometem as artérias coronárias.

tivo de 97% e mostra sensibilidade e especificida-de acima de 90%. Naturalmente o exame apresen-ta ainda algumas limitações e exige que certosavanços sejam feitos, mas seu uso clínico podeidentificar subgrupos de maior risco e contribuirde modo muito importante para a prática clínicada cardiologia.

Page 54: check up

170RSCESPJUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.Estratificação de riscocoronário pelatomografiacomputadorizada

REFERÊNCIAS

1. Klingenbeck-Regn K, Schaller S, Flohr T,Ohnesorge B, Kopp AF, Baum U. Subsecondmulti-slice computed tomography: basicsand applications. Eur J Radiol.1999;31(2):110-24.

2. Ohnesorge B, Flohr T, Klingenbeck-Regn K.Efficient object scatter correction algorithm forthird and fourth generation CT scanners. EurRadiol. 1999;9(3):563-9.

3. Flohr TG, Schaller S, Stierstorfer K, Bruder H,Ohnesorge BM, Schoepf UJ. Multi-detectorrow CT systems and image-reconstructiontechniques. Radiology. 2005;235(3):756-73.

4. Shemesh J, Apter S, Itzchak Y, Motro M.Coronary calcification compared in patientswith acute versus in those with chroniccoronary events by using dual-sector spiral CT.Radiology. 2003;226(2):483-8.

5. Knez A, Becker C, Ohnesorge B, Haberl R,Reiser M, Steinbeck G. Noninvasive detectionof coronary artery stenosis by multislice helicalcomputed tomography. Circulation.2000;101(23):E221-E222.

6. Knez A, Becker CR, Leber A, et al. Usefulness

CORONARY RISK STRATIFICATION BY

COMPUTED TOMOGRAPHY

IBRAIM MASCIARELLI F. PINTO

WALTHER ISHIKAWA

ROBERTO SASDELLI NETO

AMANDA G. M. R. SOUSA

Multi slice computed tomography may be a useful tool to the non-invasive evaluation ofpatients with suspected coronary artery disease. It offers the possibility of calculating thecoronary calcium score and to perform the non-invasive angiography of the coronaryarteries. The medical literature reports high positive and, specially, negative predictivevalues. It is also possible to detect the presence of obstructions in the coronary arteries andmay be used to the follow-up of patients undergoing surgical myocardial revascularizationfor it allows the risk stratification even in this subset of patients.

Key words: computed tomography, coronary artery disease, prognosis.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:163-71)RSCESP (72594)-1609

of multislice spiral computed tomographyangiography for determination of coronaryartery stenoses. Am J Cardiol. 2001;88(10):1191-4.

7. Kopp AF, Ohnesorge B, Becker C, et al.Reproducibility and accuracy of coronarycalcium measurements with multi-detector rowversus electron-beam CT. Radiology.2002;225(1):113-9.

8. Agatston AS, Janowitz WR, Hildner FJ, ZusmerNR, Viamonte M Jr, Detrano R. Quantificationof coronary artery calcium using ultrafastcomputed tomography. J Am Coll Cardiol.1990;15(4):827-32.

9. Detrano R, Molloi S. Radiographicallydetectable calcium and atherosclerosis: theconnection and its exploitation. Int J CardImag. 1992;8(3):209-15.

10. Wong ND, Vo A, Abrahamson D, Tobis JM,Eisenberg H, Detrano RC. Detection ofcoronary artery calcium by ultrafast computedtomography and its relation to clinical evidenceof coronary artery disease. Am J Cardiol.1994;73(4):223-7.

11. Wong ND, Kouwabunpat D, Vo AN, et al.Coronary calcium and atherosclerosis by

Page 55: check up

171RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

PINTO IMFe cols.

Estratificação de riscocoronário pela

tomografiacomputadorizada

ultrafast computed tomography inasymptomatic men and women: relation to ageand risk factors. Am Heart J. 1994;127(2):422-30.

12. Detrano R, Hsiai T, Wang S, et al. Prognosticvalue of coronary calcification andangiographic stenoses in patients undergoingcoronary angiography. J Am Coll Cardiol.1996;27(2):285-90.

13. Detrano RC, Wong ND, Doherty TM, ShavelleR. Prognostic significance of coronary calcificdeposits in asymptomatic high-risk subjects.Am J Med. 1997;102(4):344-9.

14. Kennedy J, Shavelle R, Wang S, Budoff M,Detrano RC. Coronary calcium and standardrisk factors in symptomatic patients referredfor coronary angiography. Am Heart J.1998;135(4):696-702.

15. Shaw LJ, Raggi P, Schisterman E, Berman DS,Callister TQ. Prognostic value of cardiac riskfactors and coronary artery calcium screeningfor all-cause mortality. Radiology. 2003;228(3):826-33.

16. Moser KW, O’Keefe JH Jr, Bateman TM,McGhie IA. Coronary calcium screening inasymptomatic patients as a guide to risk factormodification and stress myocardial perfusionimaging. J Nucl Cardiol. 2003;10(6):590-8.

17. Anand DV, Lim E, Raval U, Lipkin D, LahiriA. Prevalence of silent myocardial ischemiain asymptomatic individuals with subclinicalatherosclerosis detected by electron beamtomography. J Nucl Cardiol. 2004;11(4):450-7.

18. Greenland P, LaBree L, Azen SP, Doherty TM,Detrano RC. Coronary artery calcium scorecombined with Framingham score for riskprediction in asymptomatic individuals.JAMA. 2004;291(2):210-5.

19. Hecht HS, Budoff MJ, Berman DS, Ehrlich J,Rumberger JA. Coronary artery calciumscanning: clinical paradigms for cardiac riskassessment and treatment. Am Heart J.2006;151(6):1139-46.

20. Gertz SD, Cherukuri P, Bodmann BG, et al.

Usefulness of multidetector computedtomography for noninvasive evaluation ofcoronary arteries in asymptomatic patients. AmJ Cardiol. 2006;97(2):287-93.

21. Hergott LJ. Update on coronary artery calciumimaging. J Insur Med. 2005;37(2):120-8.

22. Leber AW, Knez A, Becker C, et al. Non-invasive intravenous coronary angiographyusing electron beam tomography and multislicecomputed tomography. Heart. 2003;89(6):633-9.

23. Nieman K, Rensing B, Munne A, van GeunsRJ, Pattynama P de FP. Three-dimensionalcoronary anatomy in contrast-enhancedmultislice computed tomography. Prev Cardiol.2002;5(2):79-83.

24. Leber AW, Knez A, von ZF, et al. Quantificationof obstructive and nonobstructive coronarylesions by 64-slice computed tomography: acomparative study with quantitative coronaryangiography and intravascular ultrasound. JAm Coll Cardiol. 2005;46(1):147-54.

25. Nikolaou K, Sagmeister S, Knez A, et al.Multidetector-row computed tomography ofthe coronary arteries: predictive value andquantitative assessment of non-calcified vessel-wall changes. Eur Radiol. 2003;13(11):2505-12.

26. Nikolaou K, Becker CR, Wintersperger BJ, etal. Evaluating multislice computed tomographyfor imaging coronary atherosclerosis.Radiologie. 2004;44(2):130-9.

27. Kunimasa T, Sato Y, Sugi K, Moroi M.Evaluation by multislice computed tomo-graphy of atherosclerotic coronary arteryplaques in non-culprit, remote coronary arteriesof patients with acute coronary syndrome. CircJ. 2005;69(11):1346-51.

28. Hoffmann U, Moselewski F, Nieman K, et al.Noninvasive assessment of plaque morphologyand composition in culprit and stable lesionsin acute coronary syndrome and stable lesionsin stable angina by multidetector computedtomography. J Am Coll Cardiol. 2006;47(8):1655-62.

Page 56: check up

172RSCESPJUL/AGO/SET 2006

HIRONAKA He col.Análise críticados métodosnão-invasivospara avaliaçãocardiológica

EPIDEMIOLOGIA DA DOENÇA ARTERIALCORONARIANA ATEROSCLERÓTICA

Aterosclerose é moléstia crônica que acometede forma generalizada as artérias do corpo huma-no. O processo fisiopatológico tem componentegenético mas é afecção predominantemente adqui-rida e evolui desde tenra idade de forma progres-siva. Forma tardia de manifestação é a doença ar-terial clínica, com sintomas agudos de isquemiaou necrose da região irrigada. Entretanto, grandeparcela da população portadora de ateroscleroseevolui assintomática, chamada de fase pré-clíni-ca, e a compreensão dessa fase da moléstia se fazpor meio de estudos populacionais. O estudo deFramingham possibilitou acompanhar a históriaclínica da doença durante 50 anos na populaçãogeral, e estabelecer sem viés de seleção a real im-portância da doença coronariana aterosclerótica1.Constatou-se que: a) aos 40 anos, um em cada doishomens e uma em cada três mulheres desenvolve-rão a doença durante a existência2; b) dois terços

ANÁLISE CRÍTICA DOS MÉTODOS NÃO-INVASIVOS

PARA AVALIAÇÃO CARDIOLÓGICA

FAUSTO HARUKI HIRONAKA

GUSTAVO KEN HIRONAKA

Departamento de Radiologia – Faculdade de Medicina – FMUSP

Endereço para correspondência:Rua Dr. Ovídio Pires de Campos, s/no – CEP 05430-010 – São Paulo – SP

Por conseqüência da importância da doença vascular aterosclerótica assintomática namorbidade e na mortalidade das doenças cardiovasculares, tornaram-se prioritários aidentificação e o tratamento adequado dos pacientes de alto risco. A detecção dessespacientes de alto risco deve ser baseada em fatores de risco maiores. A utilização demétodos complementares de imagem em adição aos índices derivados de fatoresde risco é discutida.

Palavras-chave: aterosclerose, diagnóstico por imagem, doenças vasculares, fatores derisco, isquemia miocárdica.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:172-7)RSCESP (72594)-1610

das mortes por doença arterial coronariana ocor-rem fora do hospital, metade das mortes ocorre deforma súbita e inesperada, e metade das mortessúbitas ocorre sem história clínica de doença arte-rial coronariana3; c) um em cada seis síndromesisquêmicas agudas se manifesta por meio de mor-te súbita como primeiro, último e único sintoma1;d) um em cada três infartos agudos de miocárdio ésilencioso ou não reconhecido, embora o prognós-tico seja semelhante ao sintomático3, 4. Existe, por-tanto, na população geral, um contingente de por-tadores de doença arterial coronariana ateroscle-rótica cuja história natural pode ser modificadacom identificação e tratamento.Como a ateroscle-rose se apresenta como um contínuo de intensida-des de comprometimento e existem várias alter-nativas de tratamento, há necessidade de se ade-quar a intensidade do tratamento à do comprome-timento, tornando possível maiores ganhos abso-lutos nos casos de maior gravidade. Assim, para aação clínica, torna-se indispensável estratificar riscoindividual para evento coronariano grave. Define-se

Page 57: check up

173RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HIRONAKA He col.

Análise críticados métodos

não-invasivospara avaliação

cardiológica

como evento coronariano grave a morte súbita deorigem coronariana e o infarto agudo do miocárdio.

LIÇÕES DE ANATOMIA

A trombose é o acontecimento determinanteda instabilidade da doença arterial coronariana ate-rosclerótica e responsável pelo evento grave5, 6.Acontece por duas principais lesões na placa ate-rosclerótica, denominada de placa vulnerável:1) Erosão endotelial – na superfície de capa fibro-sa, que é a estrutura que separa o núcleo lipídicoda luz vascular. Ocorre freqüentemente em artéri-as com estenoses significativas e artérias de me-nor calibre5.2) Rotura da capa fibrosa – mais freqüente, inde-pendentemente do grau de estenose. A seguir es-tão descritos os fatores locais que predispõem àrotura: a) maior infiltração de monócitos, respon-sáveis pela produção de proteases, como as meta-loproteinases, que destroem a matriz colágena (alesão instável é caracterizada por intenso proces-so inflamatório, especialmente nas proximidadesda linha de rotura)7; b) apoptose de fibra muscularlisa da capa fibrosa8; c) as lesões com rotura agu-da de placa têm freqüentemente núcleo lipídicocujas dimensões ocupam área de 34% + 17% daárea total da placa e medem em média 3,8 mm2 +5,5 mm2 e 9 mm de comprimento9; d) capa fibrosafina, definida como espessura menor que 65 mi-cra quando está associada a 95% das roturas agu-das de placa (para identificá-la por método deimagem, a capacidade de resolução espacial deveestar no mínimo em 50 micra)8, 9.

CALCIFICAÇÃO DE PLACA

A deposição de cálcio ocorre precocementeno núcleo lipídico e em região com presença delípides extracelulares. A extensão da calcifica-ção correlaciona-se com a soma dos estreitamen-tos maiores das artérias coronárias10. Mas a fra-ca correlação com o grau de estenose não per-mite inferir a artéria de maior estenose em de-terminado coração. Não há achados que justifi-quem a idéia de que a calcificação provoqueinstabilidade de placa, pois se trata de respostaorgânica secundária8, 10.

AVALIAÇÃO DE RISCOCARDIOVASCULAR

Avaliação de risco cardiovascular inicialno consultório

Consta de identificação e determinação da gra-vidade dos fatores de risco. Os fatores de riscomaiores são independentes, tendo sido identifica-

dos no estudo de Framingham os seguintes fato-res: tabagismo, hipertensão arterial, hipercoleste-rolemia, diabetes melito, e baixa taxa de coleste-rol associado à lipoproteína de alta densidade(HDL-colesterol). Esses fatores de risco justificam90% do excesso de risco dos portadores de doen-ça arterial coronariana11. A idade é fator de riscopor representar a somatória do tempo de exposi-ção aos outros fatores de risco, aumentando a car-ga aterosclerótica e a probabilidade de rotura ouerosão de placa. São também fatores de risco ina-tividade física, história familiar de doença arterialcoronariana e obesidade, denominados de predis-ponentes. Avaliação de risco global são modelosmatemáticos em que se obtêm, por meio da pon-deração de fatores de risco, números que repre-sentam a somatória total de risco. São derivadosdo estudo de Framingham, e é possível estimar orisco de evento coronariano grave em 10 anos. Paratanto, incorpora as seguintes variáveis: idade, sexo,colesterol total, HDL-colesterol, tabagismo, pres-são arterial sistólica e tratamento de hipertensão12.Permite classificar os indivíduos em: baixo risco(6% de eventos em 10 anos), sem fatores de risco;médio risco (6% a 20% de eventos em 10 anos),com pelo menos um fator de risco; e alto risco(20% de eventos em 10 anos), que é o nível dadoença arterial coronariana sintomática estável. Nogrupo de alto risco estão também os portadores dedoença vascular em outra artéria que não as coro-nárias (aneurisma de aorta, doença vascular peri-férica, lesão carotídea sintomática)12. Estima-seque na população adulta americana 35% se en-quadrem no grupo de baixo risco; 40%, no grupode médio risco; e 25%, no grupo de alto risco13.Os doentes portadores de diabetes melito são con-siderados de alto risco.

Métodos de imagem na avaliação de riscocardiovascular: o coração como alvo

A importância da caracterização e da quantifi-cação da aterosclerose pré-clínica em cada paci-ente decorre da premissa de que cada indivíduoapresenta, além da suscetibilidade genética, inte-ração e potencializações específicas dos fatores derisco e tempo de exposição individualizado aosmesmos. Acrescente-se que o que não é mensurá-vel certamente não pode ser ponderado, o que fazcom que hábitos de vida não sejam comumentecontabilizados em índices de riscos. Apesar delógica e racional, a comprovação dessa idéia nãoé simples, pois a população com aterosclerose pré-clínica tem baixa ocorrência de eventos graves, oque implica o estudo de grande número de paci-entes além de acompanhamento em longo perío-do. Tem especial importância no grupo de médiorisco quando a informação fundamenta a decisão

Page 58: check up

174RSCESPJUL/AGO/SET 2006

HIRONAKA He col.Análise críticados métodosnão-invasivospara avaliaçãocardiológica

de estabelecer tratamento intensivo apropriadopara alto risco ou acompanhamento adequado parabaixo risco.Eletrocardiografia

A eletrocardiografia, apesar de ser o méto-do complementar mais utilizado, não é métodode rastreamento eficiente em indivíduos assin-tomáticos14, 15. Entretanto, no grupo de alto ris-co os achados positivos estabelecem diferentespatamares de gravidade.Teste de esforço

O uso diagnóstico de teste de esforço e dostestes de indução de isquemia é limitado pela sen-sibilidade e pela especificidade imperfeita. Comose trata de população de baixa prevalência de situ-ações com reserva coronariana comprometida, ofato repercute na baixa capacidade preditiva doteste positivo e, portanto, no elevado número defalsos positivos. Digno de nota são os estudos desensibilidade, com exclusão do viés de verifica-ção, em que a sensibilidade do teste de esforço foide 45%16, o que tende a diminuir a acurácia predi-tiva. O uso prognóstico, porém, tem sido preconi-zado, por meio de mensurações não relacionadasao segmento ST17.Tomografia computadorizada por meio defeixe de elétrons

A calcificação está associada ao processo ate-rosclerótico e a tomografia computadorizada é mé-todo acurado para medir a quantidade de cálcionas artérias coronárias. O índice de cálcio está re-lacionado à quantidade de aterosclerose coronari-ana, e é um possível marcador de instabilidade deplaca18. Não é apropriado para rastreamento de do-ença arterial coronariana, e o valor aditivo à infor-mação obtida por meio dos índices de risco é con-trovertida19, 20.Tomografia computadorizada e ressonânciamagnética

A imagem do coração e das artérias coronári-as requer do equipamento resolução tanto tempo-ral como espacial. Como parâmetro de compara-ção, a cineangiocoronariografia tem resoluçãotemporal de 4 ms a 7 ms e resolução espacial de0,1 mm. Os tomógrafos com multidetectores têmresolução espacial de 0,4 mm e temporal de 60 msa 300 ms21. Embora a possibilidade de estudar asalterações induzidas pela aterosclerose na parededas artérias coronárias em pacientes por meio detomografia ou ressonância seja idéia atraente, hojea resolutividade técnica dos métodos está abaixodo apropriado.

Métodos de imagem na avaliação do riscocardiovascular: o sistema vascular como alvo

A detecção de alterações decorrentes de ate-rosclerose em outros territórios vasculares tem im-

portância prognóstica para eventos cardiovascu-lares, pelo fato de ser afecção caracteristicamentesistêmica. A intensidade do comprometimentopode ser mensurada por meio de um contínuo devalores, e pode-se inferir que haja acometimentoparalelo nas artérias coronárias.Índice de pressão sistólica tornozelo braço

A relação das pressões sistólicas nos membrosinferior e superior é método de detecção de obs-trução vascular periférica de alta sensibilidade(90%) e alta especificidade (98%) para lesões es-tenótica maiores que 50%22. O índice tem valorprognóstico para mortalidade cardiovascular, mes-mo após ajuste multivariado para fatores de ris-co23.Ultra-sonografiaa) Espessura íntima média

A espessura íntima média das carótidas, quan-do adequadamente sistematizada e padroniza-da, por ser segura e relativamente pouco one-rosa, é extremamente apropriada para estudosepidemiológicos. Esses estudos demonstramrelação com eventos cardiovasculares e incre-mento progressivo de risco com aumento deespessura. A associação com eventos perma-nece mesmo após ajustes para fatores de riscotradicionais24-27. A repetição da medida permi-te detectar progressão da espessura íntimamédia, e a eventual regressão após interven-ções terapêuticas28.

b) Estudos de função endotelialO ácido nítrico produzido pelas células endo-teliais tem papel relevante na fisiopatologia daaterosclerose. Participa também da resposta va-sodilatadora pós-isquêmica, estimada medin-do-se a variação do diâmetro ultra-sonográfi-co das artérias. É método extremamente sensí-vel, sendo influenciado por tabagismo recen-te, ingestão de refeição gordurosa e ciclo mens-trual22. Necessita sistematização e padroniza-ção, mas é método promissor na avaliação derisco cardiovascular.

A CARDIOPATIA ATEROSCLERÓTICASUBCLÍNICA

O estudo populacional “Multi-Ethnic Study ofAtherosclerosis” (MESA)29 demonstrou a presen-ça de disfunção cardíaca em indivíduos assinto-máticos. A função ventricular medida pelo encur-tamento circunferencial, que decorre de torção (ro-tação inversa do ápice em relação à base), está glo-bal e regionalmente comprometida. Existe corre-lação inversa entre encurtamento circunferenciale espessura íntima media da carótida30. A reservacoronariana está diminuída nesses indivíduos e secorrelaciona inversamente ao índice de Framing-

Page 59: check up

175RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HIRONAKA He col.

Análise críticados métodos

não-invasivospara avaliação

cardiológica

ham31. A reserva coronariana regional está tam-bém deprimida e se correlaciona inversamente aoíndice de cálcio da artéria coronária correspon-dente32. A correlação direta da disfunção ventri-cular regional com a menor resposta vasodilata-dora está igualmente sugerida no estudo MESA33.É possível, portanto, constatar que a doença coro-nariana subclínica não é distinta da sintomática, eque evolui paralelamente à arteriopatia sistêmica.A detecção de doença aterosclerótica subclínica é

preditor independente de risco34, mesmo em gru-po de alto risco, como o dos portadores de diabe-tes melito35. O valor prognóstico da detecção dacardiopatia aterosclerótica subclínica ainda pre-cisa ser definido. O método de diagnóstico porimagem, hoje, apesar das limitações apontadas,representa alternativa concreta para individua-lizar a investigação e o tratamento, paradigmada medicina exercida com qualidade e compe-tência.

REFERÊNCIAS

1. Kannel WB. The Framingham study: ITS 50year legacy and future promise. J AtherosclerThromb. 2000;6:60-6.

2. Lloyd-Jones DM, Larson MG, Beiser A, LevyD. Lifetime risk of developing coronary heartdisease. Lancet. 1999;353:89-92.

3. Gordon T, Kannel WB. Premature mortalityfrom coronary heart disease: the Framinghamstudy. JAMA. 1971;215:1617-25.

4. Kannel WB, Abbott RD. Incidence and prog-nosis of unrecognized myocardial infarction:an update on the Framingham study. N Engl JMed. 1984;311:1144-7.

5. Davies MJ. Stability and instability: two facesof coronary atherosclerosis. The Paul DudleyWhite Lecture 1995. Circulation. 1996;94:

CRITICAL ANALYSIS OF NONINVASIVE METHODS

IN CARDIOLOGIC EVALUATION

FAUSTO HARUKI HIRONAKA

GUSTAVO KEN HIRONAKA

As consequence of importance of asymptomatic atherosclerotic vascular disease related tomorbility and mortality of cardiovascular disease, identification and adequate treatment ofhigh risk patients became a priority. The detection of high risk patients must be performedbased on major risk factors. The utilization of complementary imaging methods in additionto scores derived from risk factors is discussed.

Key words: atherosclerosis, diagnostic imaging, myocardial infarction, risk factors,vascular diseases.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:172-7)RSCESP (72594)-1610

2013-20.6. Falk E, Shah PK, Fuster V. Coronary plaque

disruption. Circulation. 1995;92:657-71.7. Libby P. Current concepts of the pathogenesis

of the acute coronary syndromes. Circulation.2001;104:365-72.

8. Kolodgie FD, Burke AP, Farb A, Gold HK, YuanJ, Narula J, et al. The thin-cap fibroatheroma:a type of vulnerable plaque. The major precur-sor lesion to acute coronary syndromes. CurrOpin Cardiol. 2001;16:285-92.

9. Burke AP, Virmani R, Galis Z, HaudenschildCC, Muller JE. 34th Bethesda Conference: Taskforce # 2 – What is the pathologic basis fornew atherosclerosis imaging techniques? J AmColl Cardiol. 2003;41:1874-85.

10. Burke AP, Weber DK, Kolodgie FD, Farb A,Taylor AJ. Pathophysiology of calcium depo-

Page 60: check up

176RSCESPJUL/AGO/SET 2006

HIRONAKA He col.Análise críticados métodosnão-invasivospara avaliaçãocardiológica

sition in coronary arteries. Herz. 2001;26:239-44.

11. Wilson PW, D’Agostino RB, Levy D, Belan-ger AM, Silbershatz H, Kannel WB. Predicti-on of coronary heart disease using risk factorcategories. Circulation. 1998;97:1837-47.

12. Expert Panel on Detection, Evaluation, andTreatment of High Blood Cholesterol in Adults.Executive summary of the third report of theNational Cholesterol Education Program(NCEP) Expert Panel on Detection, Evaluati-on, and Treatment of High Blood Cholesterolin Adults (Adult Treatment Panel III). JAMA.2001;285:2486-97.

13. Greenland P, Smith SC, Grundy SM. Impro-ving coronary heart disease risk assessment inasymptomatic people: role of traditional riskfactors and noninvasive cardiovascular tests.Circulation. 2001;104:1863-7.

14. Sox HC Jr., Garber AM, Littenberg B. The res-ting electrocardiogram as a screening test: aclinical analysis. Ann Intern Med.1989;111:489-502.

15. Ashley EA, Raxwal V, Froelicher V. An evi-dence-based review of the resting electrocar-diogram as a screening technique for heart di-sease. Prog Cardiovasc Dis. 2001;44:55-67.

16. Froelicher VF, Lehmann KG, Thomas R, Gol-dman S, Morrison D, Edson R, et al. The elec-trocardiographic exercise test in a populationwith reduced workup bias: diagnostic perfor-mance, computerized interpretation, and mul-tivariable prediction. Ann Intern Med. 1998;128:965-74.

17. Lauer MS. Exercise testing. Part 1: Lookingbeyond the ST segment. Cardiology Rounds.2002;6(5).

18. O’Rourke RA, Brundage BH, Froelicher VF,Greenland P, Grundy SM, Hachamovitch R, etal. American College of Cardiology/AmericanHeart Association expert consensus documenton electron-beam computed tomography forthe diagnosis and prognosis of coronary arterydisease. Circulation. 2000;102:126-40.

19. Detrano RC, Wong ND, Doherty TM, Shavel-le RM, Tang W, Ginzton LE, et al. Coronarycalcium does not accurately predict near-termfuture coronary events in high-risk adults. Cir-culation. 1999;99:2633-8.

20. Greenland P, LaBree L, Azen SP, Doherty TM,Detrano RC. Coronary artery calcium scorecombined with Framingham score for risk pre-diction in asymptomatic individuals. JAMA.2004;291:210-5.

21. Schoenhagen P, Halliburton SS, Stillman AE,Zuzmiak SA, Nissen SE, Tuzcu EM, et al. No-ninvasive imaging of coronary arteries: current

and future role of multi-detector row CT. Ra-diology. 2004;232:7-17.

22. Greenland P, Abrams J, Aurigemma GP, BondG, Clark LT, Criqui MH, et al. Prevention con-ference V: beyond secondary prevention: iden-tifying the high-risk patient for primary pre-vention: noninvasive tests of atheroscleroticburden. Writing Group III. Circulation.2000;101:e16-e22.

23. Criqui MH, Langer RD, Fronek A, FeigelsonHS, Klauber MR, McCann TJ, et al. Mortalityover a period of 10 years in patients with peri-pheral arterial disease. N Engl J Med.1992;326:381-6.

24. Bots ML, Hoes AW, Koudstaal PJ, Hofman A,Grobbee DE. Common carotid intima-mediathickness and risk of stroke and myocardialinfarction: the Rotterdam study. Circulation.1997;96:1432-7.

25. Chambless LE, Heiss G, Folsom AR, Rosa-mond W, Szklo M, Sharrett AR, et al. Associ-ation of coronary heart disease incidence withcarotid arterial wall thickness and major riskfactors: the Atherosclerosis Risk in Commu-nities (ARIC) Study, 1987-1993. Am J Epide-miol. 1997;146:483-94.

26. O’Leary DH, Polak JF, Kronmal RA, ManolioTA, Burke GL, Wolfson SK. Carotid-arteryintima and media thickness as a risk factor formyocardial infarction and stroke in olderadults. N Engl J Med. 1999;340:14-22.

27. Lorenz MW, von Kegler S, Steinmetz H, Ma-rkus HS, Sitzer M. Carotid intima-media thi-ckening indicates a higher vascular risk acrossa wide age range: prospective data from theCarotid Atherosclerosis Progression Study(CAPS). Stroke. 2006;37:87-92.

28. O’Leary DH, Polak JF. Intima-media thick-ness: a tool for atherosclerosis imaging andevent prediction. Am J Cardiol. 2002;90Suppl:18L-21L.

29. Bild DE, Bluemke DA, Burke GL, Detrano R,Roux AV, Folsom AR, et al. Multi-ethnic stu-dy of atherosclerosis: objectives and design.Am J Epidemiol. 2002;156:871-81.

30. Fernandes VR, Polak JF, Evardsen T, Carva-lho B, Gomes A, Bluemke DA, et al. Subclini-cal atherosclerosis and incipient regional myo-cardial dysfunction in asymptomatic individu-als: the Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis(MESA). J Am Coll Cardiol. 2006;47:2420-8.

31. Wang L, Jerosch-Herold M, Jacobs DR, ShaharE, Folsom AR. Coronary risk factors and myo-cardial perfusion in asymptomatic adults: theMulti-Ethnic Study of Atherosclerosis(MESA). J Am Coll Cardiol. 2006;47:565-72.

32. Evardsen T, Detrano R, Rosen BD, Carr JJ,

Page 61: check up

177RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

HIRONAKA He col.

Análise críticados métodos

não-invasivospara avaliação

cardiológica

Liu K, Lai S, et al. Coronary artery atheros-clerosis is related to reduced regional left ven-tricular function in individuals without historyof clinical cardiovascular disease: the Multie-thnic Study of Atherosclerosis. ArteriosclerThromb Vasc Biol. 2006;26:206-11.

33. Rosen BD, Lima JA, Nasir K, Evardsen T, Fol-som AR, Lai S, et al. Lower myocardial perfusi-on reserve is associated with decreased regionalleft ventricular function in asymptomatic parti-cipants of the Multi-Ethnic Study of Atheroscle-rosis. Circulation. 2006;114:289-97.

34. Kuller LH, Arnold AM, Psaty BM, RobbinsJA, O’Leary DH, Tracy RP, et al. 10-year fo-llow-up of subclinical cardiovascular diseaseand risk of coronary heart disease in the Car-diovascular Health Study. Arch Intern Med.2006;166(1):71-8.

35. Kuller LH, Velentgas P, Barzilay J, BeauchampNJ, O’Leary DH, Savage PJ. Diabetes melli-tus: subclinical cardiovascular disease and riskof incident cardiovascular disease and all-cau-se mortality. Arterioscler Thromb Vasc Biol.2000;20:823-9.

Page 62: check up

178RSCESPJUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.Síndromescoronárias agudase inflamação

SÍNDROMES CORONÁRIAS AGUDAS E INFLAMAÇÃO

JULIANO LARA FERNANDES

ALEXANDRE SOEIRO

CÉSAR BISELLI FERREIRA

CARLOS V. SERRANO JR.

Unidade Clínica de Coronariopatia Aguda − Instituto do Coração (InCor) – HC-FMUSP

A ruptura abrupta da capa fibrótica de placas de aterosclerose, com conseqüente agregaçãoplaquetária e trombose, é responsável por cerca de 75% dos casos de síndromes isquêmicasagudas, incluindo angina instável, infarto agudo do miocárdio e mortes súbitas. No entanto,a presença dessas placas não prediz totalmente um evento coronário agudo, de modo que osmecanismos responsáveis pelo enfraquecimento da capa fibrótica e ruptura subseqüenteainda precisam ser totalmente elucidados. Nesse contexto, grande número de trabalhos vemdemonstrando que o processo inflamatório está intimamente ligado à fisiopatologia daruptura da placa aterosclerótica e conseqüente expressão clínica das síndromes coronáriasagudas. Nesta revisão serão apresentados os principais mecanismos que envolvem osprocessos inflamatórios e trombóticos nas síndromes coronárias agudas, além de serdemonstrado como o processo pode ser identificado clinicamente e seu possível manejo.

Palavras-chave: síndrome coronária aguda, inflamação, trombose.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:178-86)RSCESP (72594)-1611

INTRODUÇÃO

A ruptura abrupta da capa fibrótica de pla-cas de aterosclerose, com conseqüente agrega-ção plaquetária e trombose, é responsável porcerca de 75% dos casos de síndromes isquêmi-cas agudas, incluindo angina instável, infartoagudo do miocárdio e mortes súbitas1. Algunstipos de placas são mais suscetíveis a rupturas,denominadas “placas vulneráveis”2, usualmen-te caracterizadas por núcleo lipídico rico e capafibrosa afilada, em geral com diâmetros inferi-ores a 65 µm. Entretanto, sabe-se que, em umdado paciente, ocorrem dezenas de placas comessas características ao mesmo tempo, emboraa maioria delas permaneça intacta e nunca serompa3. Assim, fica claro que a mera presençadessas placas não prediz totalmente um eventocoronário agudo e que os mecanismos respon-sáveis pelo enfraquecimento da capa fibrótica epela subseqüente ruptura ainda precisam ser to-talmente elucidados.

Na última década, grande número de traba-

lhos vem demonstrando que o processo infla-matório está intimamente ligado à fisiopatolo-gia da ruptura da placa aterosclerótica e à con-seqüente expressão clínica das síndromes coro-nárias agudas4. Células inflamatórias locais po-dem gerar e expressar uma série de citocinascom potencial para ativação endotelial, rever-tendo parte de sua estrutura naturalmente antia-desiva e anticoagulante. Além disso, a reduçãoda síntese da matriz de colágeno na placa, alémdo aumento de proteinases que degradam a mes-ma, também contribui para a aceleração do pro-cesso. Finalmente, esse mesmo ambiente pró-inflamatório intensifica a expressão de fatorespró-coagulantes e oxidantes, não só aumentan-do a reatividade celular a mais células inflama-tórias como ativando o sistema de coagulação,criando situação sistêmica não mais da existên-cia de “placas vulneráveis” mas de “pacientevulnerável”, com a tríade disfunção endotelial,inflamação e pró-coagulação caracterizandouma situação de aterotrombose5, 6.

Nesta revisão serão apresentados os princi-

Page 63: check up

179RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.

Síndromescoronárias agudas

e inflamação

tidades aumentadas dessa imunoglobulina, sen-do aqui, mais uma vez, a expressão de citocinasinflamatórias fundamental para que isso ocor-ra, sobretudo por meio da formação do fator denecrose tumoral alfa (TNF-α)11. Depois de fi-xados, os leucócitos migram, então, para o es-paço subendotelial pelas junções intercelularesdo endotélio, guiados pelo gradiente de citoci-nas e, principalmente, pela lipoproteína de bai-xa densidade (LDL) oxidada.

LDL oxidada, resposta inata e respostaadaptativa

A presença de LDL oxidadas no espaço su-bendotelial promove o aumento da resposta in-flamatória inicial, descrita anteriormente, pelaativação de uma resposta imunológica inata eadaptativa12. A resposta inata é mediada sobre-tudo por receptores “scavengers”, principalmen-te o SR-A e o CD-36, responsáveis pela inter-nalização de LDL oxidadas no macrófago, trans-formando-as em células espumosas. Essa res-posta inata também promove a ativação de me-canismos intracelulares mediados pelo NF-ka-ppa-B, promovendo a amplificação do sinal in-flamatório com a síntese de novas quimiocinas,como MCP-1 e M-CSF. Outro mecanismo deresposta inata também ativada pelas LDL oxi-dadas ocorre por meio dos receptores “toll-like”(TLRs). Esses receptores, como, por exemplo,o TLR4, que se localiza junto às placas de ate-rosclerose em artérias coronárias, reconhecemespecificamente lipopolissacarídeos bacteria-nos, sendo capazes de interagir também com afibronectina e com as proteínas “heat shock”.

A resposta adaptativa envolve mecanismosmuito mais complexos que a imunidade inata epode levar até semanas para estar totalmente mo-bilizada, envolvendo células bastante específi-cas (Fig. 2). Dentre essas células específicas,destacam-se, no processo de aterosclerose, oslinfócitos T do tipo CD4+ e os monócitos capa-zes de reconhecer antígenos protéicos, e tam-bém a LDL oxidada13, inclusive com a forma-ção de anticorpos anti-LDL oxidada14. Essesdois tipos celulares têm sido encontrados infil-trando as placas de ateroma15, 16, modulando oequilíbrio entre respostas pró-inflamatória eantiinflamatória, e fazendo com que as placasadquiram um fenótipo mais ou menos estável17, 18.A evolução para estabilidade ou instabilidadeda placa de aterosclerose é determinada a partirda definição de como essas células se comuni-cam entre si, com sinais que podem estimularou bloquear sua ativação. Essa comunicação érealizada por meio de diversas citocinas produ-zidas no local da placa e também em sítios re-

pais mecanismos que envolvem os processos in-flamatórios e trombóticos nas síndromes coro-nárias agudas, além de ser demonstrado como oprocesso pode ser identificado clinicamente eseu possível manejo.

MECANISMOS INFLAMATÓRIOS EIMUNOLÓGICOS NAS SÍNDROMESCORONÁRIAS AGUDAS

Disfunção endotelialA disfunção endotelial, um dos primeiros

processos que dão origem à formação das pla-cas aterotrombóticas, é caracterizada pela redu-ção da expressão e síntese do óxido nítrico7. Adisfunção endotelial está intimamente ligada aosprocessos inflamatórios, permitindo a entrada ea oxidação de lipoproteínas circulantes à regiãosubendotelial, atraindo monócitos e linfócitospara o local e promovendo um estado pró-trom-bótico dentro da luz do vaso (Fig. 1). Mediadaspor diversos fatores de risco tradicionais (hiper-tensão arterial sistêmica, diabetes melito, taba-gismo, hipercolesterolemia), as células endote-liais passam inicialmente a expressar molécu-las da superfamília das selectinas (E- e P-selec-tinas). As selectinas são proteínas que se ligama sítios comuns de carboidratos, cuja funçãoprincipal é a de promover a migração de leucó-citos para diversos tecidos, sobretudo o endoté-lio. Essas selectinas promovem a redução davelocidade de circulação de monócitos e linfó-citos sanguíneos, permitindo o contato íntimodessas células inflamatórias com a parede en-dotelial8, 9.

A partir do rolamento celular inicial, é ne-cessário um próximo passo para a fixação defi-nitiva desses leucócitos ao local da lesão. Cito-cinas e quimiocinas atuando localmente são fun-damentais nessa etapa, ativando os leucócitospor meio da expressão, nessas células, das inte-grinas β2. Destacam-se aqui as quimiocinasCCL2 (MCP-1), fatores quimiotáticos específi-cos para monócitos/macrófagos, e CXCL9 eCXCL10 com receptor CXCR3, grupo de qui-miocinas ligadas à resposta do tipo T “helper”(Th)-110.

Na resposta inflamatória inicial das placasde aterosclerose, a etapa seguinte correspondeà fixação dos leucócitos previamente ativadosao endotélio. Nessa etapa, é fundamental a in-teração entre integrinas leucocitárias, expressasanteriormente, e moléculas da superfamília dasimunoglobulinas, como molécula de adesão in-tercelular 1 (ICAM-1) e molécula de adesão dacélula vascular 1 (VCAM-1), expressas na cé-lula endotelial8. A célula endotelial produz quan-

Page 64: check up

180RSCESPJUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.Síndromescoronárias agudase inflamação

Figura 1. Processo de disfunção endotelial e inflamação.ICAM = molécula de adesão intercelular; VCAM = molécula de adesão da célula vascular.

motos. Na aterosclerose, essas citocinas e os ti-pos celulares selecionados da circulação sanguí-nea determinam um estereótipo de resposta bas-tante específico, conhecido como resposta Th110, 19.Essa resposta caracteriza-se, principalmente,pela presença do interferon gama20, interleuci-na (IL)-1221 e TNF-α)22, 23, todas elas agindo si-nergicamente no processo imunológico.

A presença desse tipo de resposta imunoló-gica na aterosclerose foi demonstrada em diver-sos estudos prévios. Nas chamadas placas vul-neráveis ou propensas a se romper, observa-sea presença de altas concentrações das citocinaspró-inflamatórias Th1, como interferon gama24, 25

e IL-1226, 27. Essa ativação particular do sistemaimune pode também ser identificada não só peloaumento local mas também pela amplificaçãosistêmica dos níveis séricos desses marcadoresinflamatórios10, 28-30. Essa amplificação sistêmi-ca pode também ser demonstrada, ainda que deforma inespecífica, pelo aumento de proteínasque caracterizam uma resposta inflamatória debaixa magnitude, como proteína C-reativa31, IL-632 ou, mais recentemente, pelo fator de cresci-mento placentário33. A proteína C-reativa é co-nhecida como uma proteína de fase aguda, cu-jos níveis plasmáticos se elevam em respostasinespecíficas a agentes infecciosos e não-infec-ciosos34. Mais sensível que a velocidade de he-mossedimentação ou que a contagem leucoci-tária, a proteína C-reativa é produzida no fíga-do e se eleva rapidamente após o estímulo in-flamatório. A principal citocina que estimula aprodução da proteína C-reativa é a IL-635. Di-

versas células são capazes de sintetizar a IL-6,entre elas os monócitos, os fibroblastos e as cé-lulas endoteliais, sendo a citocina atuante comodiferenciador de linfócitos B e fator de ativaçãode linfócitos T. A IL-6, em conjunto com as de-mais citocinas pró-inflamatórias mencionadasanteriormente, determinam ampla resposta imu-nológica frente a estímulos na fase aguda deinstabilização da placa de aterosclerose.

Instabilização da placa: ruptura e erosãoRuptura de placa

O que faz exatamente com que uma “placavulnerável” se rompa diante das dezenas de ou-tras que permanecem estáveis ou regridem? Umprovável mecanismo está relacionado com asforças físicas envolvidas no local de formaçãodas placas, principalmente em suas extremida-des, em que o impacto do fluxo sanguíneo e daangulação da placa é mais intenso36. Uma análi-se mais profunda desse mecanismo foge, porém,do escopo desse texto. Um segundo mecanismomais específico envolve a ativação inflamatóriapresente na placa, por meio do processo de de-gradação da matriz extracelular pela secreçãode enzimas proteolíticas, como as metaloprotei-nases e as proteases cisteínas37. Estas são cons-tituídas por colagenases, elastases, gelatinases,entre outras, capazes de degradar a capa fibró-tica protetora da placa, deixando-a predispostaà ruptura38. As metaloproteinases e demais pro-teases são produzidas a partir do estímulo in-flamatório local da placa, sobretudo a partir decitocinas do tipo Th1, especialmente o interfe-

Page 65: check up

181RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.

Síndromescoronárias agudas

e inflamação

Figura 2. Resposta imunológica do tipo T “helper” 1 presente em placas ateroscleróticas.Th1 = T “helper” tipo 1; TNF-alfa = fator de necrose tumoral alfa; IL-1 = interleucina 1.

ron gama39. A regulação das metaloproteinasesé feita por alguns inibidores específicos (conhe-cidos como inibidores teciduais de metalopro-teases), cujos níveis séricos estão inversamentecorrelacionados com o prognóstico em pacien-tes com síndromes coronárias agudas40.

Embora muito promissores, os estudos des-sas proteases e seus inibidores têm gerado da-dos ainda contraditórios. Alguns trabalhos de-monstram o aumento da extensão das placas coma maior expressão das metaloproteinases, en-quanto outros evidenciam exatamente o contrá-rio. De qualquer forma, o bloqueio das metalo-proteinases parece constituir um possível me-canismo terapêutico na tentativa de se evitar aprogressão de placas instáveis para a ruptura eo surgimento de eventos agudos. Estudos clíni-cos já estão sendo investigados nesse sentido41.Erosão

A erosão é freqüentemente implicada noseventos agudos de indivíduos do sexo femini-no, idosos e portadores de diabetes melito e hi-pertrigliceridemia1. Diferentes mecanismosmoleculares e celulares justificam a erosão su-perficial. A degradação excessiva de moléculasda matriz e a apoptose de células endoteliais,ambas as condições promovidas por estímulosinflamatórios, facilitam a descamação do endo-

télio e, portanto, a erosão da placa1. Além dis-so, o fator tecidual proveniente de células en-doteliais apoptóticas pode favorecer a trombo-se nesses locais1.

Após a erosão de um ateroma, o grau detrombose originado depende profundamente dapresença de fatores de risco coronário e da quan-tidade de fator tecidual circulante2. Fatores comotabagismo, dislipidemia e diabetes melito estãoassociados com aumento da trombogenicidadesanguínea. Em pacientes com diabetes melito,por exemplo, observa-se hiperatividade e agre-gabilidade plaquetárias, gerando aumento dadeposição de plaquetas sobre a parede do vasosanguíneo2, 8. O tabagismo aumenta a atividadenervosa simpática e a liberação de catecolami-nas, que potencializa a ativação plaquetária eaumenta os níveis de fibrinogênio8. Moléculasde colesterol de lipoproteína de baixa densida-de (LDL-colesterol) também induzem a expres-são de fator tecidual em macrófagos e diminu-em a atividade anticoagulante do endotélio porinterferir com a expressão de transmodulina einativam a via de inibição do fator tecidual. Es-tudos recentes sugerem que o estado trombogê-nico associado a dislipidemia, tabagismo e dia-betes melito podem apresentar uma via comum,pela ativação da interação entre leucócitos e pla-

Page 66: check up

182RSCESPJUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.Síndromescoronárias agudase inflamação

quetas associada à produção de fator tecidual ede ativação de trombina2, 8.

MARCADORES INFLAMATÓRIOS NASSÍNDROMES CORONÁRIAS AGUDAS

Proteína C-reativaNas síndromes coronárias agudas, os meca-

nismos imunológicos descritos são extremamen-te redundantes e complexos. Dessa forma, aná-lises individuais de apenas um determinado pas-so desse intricado sistema mostraram-se poucoespecíficas para a determinação tanto diagnós-tica como prognóstica de pacientes que se apre-sentam com quadros coronários agudos. Entre-tanto, a determinação da proteína C-reativa pelométodo ultra-sensível vem se mostrando o mé-todo mais robusto para a caracterização práticano dia-a-dia clínico da identificação da infla-mação em situações agudas, com importantesinformações prognósticas e com possíveis re-percussões terapêuticas. A proteína C-reativa éo único marcador atualmente aceito para iden-tificação do estado inflamatório de pacientescom doença arterial coronária, sendo sua utili-zação orientada em diretrizes específicas nosEstados Unidos42, 43, incluindo situações de sín-dromes coronárias agudas (recomendação IIa).

Não se sabe ao certo qual o papel da proteí-na C-reativa na modulação da resposta inflama-tória nas fases crônica ou aguda da doença. As-sim, ainda é debatido se a proteína C-reativa tempapel ativo ou é simplesmente um marcador in-flamatório sem participação ativa na fisiopato-logia da doença44. Independentemente dessasconclusões, sabe-se que níveis elevados de pro-teína C-reativa na fase aguda estão associados aalto risco de eventos futuros, mesmo em situa-ções em que a troponina não é detectada45.

Mais que o interesse apenas em mostrar quea proteína C-reativa é útil para determinaçãoprognóstica, os estudos mais atuais vêm centran-do sua atenção na observação de que as estati-nas parecem reduzir os níveis da proteína C-re-ativa de uma maneira independente da reduçãode LDL, sugerindo, assim, que os benefícios daestatina podem estar também relacionados à re-dução da inflamação e não apenas à redução dosníveis de colesterol46. Dados de grandes estu-dos recentes, como o “Pravastatin or Atorvasta-tin Evaluation and Infection Therapy” (PROVE-IT)47 e o “Reversal of Atherosclerosis With Li-pitor” (REVERSAL)48, demonstram que o tra-tamento com estatinas baseado no valor de até30 dias da proteína C-reativa após um eventoagudo pode ter algum benefício clínico.

No estudo PROVE-IT, os valores obtidos

com a redução da proteína C-reativa foram tãoimportantes quanto os obtidos com os níveis deLDL após o seguimento de aproximadamente2,5 anos, sendo a melhor sobrevida obtida emindivíduos com LDL < 70 mg/dl e proteína C-reativa ultra-sensível < 2 ml/l (Fig. 3). Deve-seressaltar que a sobrevida foi independente dotipo ou da dose de estatina utilizada no traba-lho, demonstrando que a obtenção dos valores éimportante, não a forma de obtê-los.

O estudo REVERSAL também demonstrouesse fato, acrescentando que os valores de pro-teína C-reativa não podem ser preditos pela que-da da LDL, sendo independentes entre si. O es-tudo REVERSAL demonstrou não a regressãoclínica mas a própria progressão da placa de ate-rosclerose medida por ultra-som intracoronário.

Seguindo a mesma linha proposta pelo PRO-VE-IT e pelo REVERSAL, o estudo “A-to-Z”demonstrou que a dosagem da proteína C-reati-va aos 30 dias ou 4 meses após o evento agudofoi preditiva para mortalidade em 2 anos49. Essemesmo estudo também demonstrou que pacien-tes que fizeram uso de estatina de forma maisintensa (80 mg/dia de sinvastatina) tiveram mai-or probabilidade de atingir níveis menores deproteína C-reativa no seguimento crônico. Jun-tando os dados dos três trabalhos, pode-se con-cluir que o uso da proteína C-reativa ultra-sen-sível na fase aguda tem, além de importânciaprognóstica, também importância na determina-ção precoce da terapia com estatinas nesses pa-cientes.

Recentemente, um estudo comparando osachados do PROVE-IT e do “A to Z”, em que osautores demonstram que o primeiro, com umaredução mais rápida da proteína C-reativa queo segundo, obteve melhores benefícios em até30 dias, sendo os achados crônicos semelhan-tes50. Propõe-se, assim, que a terapia intensivacom estatinas ainda na fase aguda pode ter be-nefícios mais significativos em pacientes comsíndromes coronárias, embora essa hipótese ain-da precise ser testada num estudo randomizadoe desenhado para tal aspecto. Fica ainda a dúvi-da se essa proposta terapêutica teria valia ape-nas em pacientes que estivessem com níveismais elevados de proteína C-reativa ou poderiaser aplicada em qualquer situação de proteínaC-reativa inicial.Outros marcadores

Além da proteína C-reativa ultra-sensível,novos marcadores têm sido apresentados recen-temente com potencial para adicionar informa-ções na fase aguda das síndromes coronárias.Entretanto, nenhum deles demonstrou agregartantas informações quanto a proteína C-reativa, não

Page 67: check up

183RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.

Síndromescoronárias agudas

e inflamação

devendo, portanto, ainda ser utilizados de forma ro-tineira na prática clínica. Uma lista mais extensa detodos os marcadores inflamatórios estudados nas sín-dromes coronárias agudas pode ser encontrada narevisão de Tsimikas e colaboradores51.sCD40 ligante

O CD40 é uma proteína de sinalização en-contrada em leucócitos e plaquetas. Valores ele-vados de sCD40 ligante foram encontrados empacientes com síndromes coronárias agudas comimportante valor prognóstico. Entretanto, a di-ficuldade em se estabelecer medidas precisasdesse marcador tem limitado seu uso de roti-na52.Mieloperoxidase

A mieloperoxidase está presente em sítiosde inflamação ativa e é liberada por monócitosem respostas oxidativas. A mieloperoxidase pa-rece estar envolvida em processos de modifica-ção da LDL, e, portanto, tem implicação diretana fisiopatologia da formação e da instabiliza-ção da placa aterosclerótica. Em pacientes com

Figura 3. Níveis de sobrevida livre de eventos (infarto agudo do miocárdio ou morte cardiovascular)estratificadas pela proteína C-reativa ultra-sensível e LDL após tratamento com estatinas. (Comautorização de Ridker e colaboradores.47)LDL-colesterol = colesterol ligado à lipoproteína de baixa densidade; PCR = proteína C-reativa.

síndromes agudas, os níveis de mieloperoxida-se foram preditores de eventos cardiovascula-res após seis meses, independentemente dos ní-veis de troponina iniciais53.Fosfolipase A2 lipoproteína-associada(Lp-PLA2)

A Lp-PLA2 atua na hidrólise de fosfolipí-deos oxidados, dando origem a um ácido graxooxidado e a lisofosfaditilcolina, criando doispotenciais elementos pró-inflamatórios e pró-aterogênicos de apenas uma partícula inicial.Secretada por diversas células inflamatórias pre-sentes na fase aguda da instabilização de placasateroscleróticas, a Lp-PLA2 mostrou estar as-sociada a pior prognóstico em pacientes comdoença arterial coronária54, embora seu fatoraditivo aos níveis de LDL ainda não pôde seresclarecido, limitando seu potencial clínico. Nafase aguda, estudos com esse marcador são ain-da menos numerosos55, não se tendo ainda umaresposta definitiva sobre seu valor nessa situa-ção clínica.

Page 68: check up

184RSCESPJUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.Síndromescoronárias agudase inflamação

ACUTE CORONARY SYNDROMES AND INFLAMMATION

JULIANO LARA FERNANDES

ALEXANDRE SOEIRO

CÉSAR BISELLI FERREIRA

CARLOS V. SERRANO JR.

The abrupt rupture of atherosclerotic plaques has been considered the major cause of acutecoronary syndromes, including unstable angina, acute myocardial infarction and suddendeath. However, the mechanisms responsible for the weakness of the fibrous cap and itssubsequent rupture are not completely understood. Some recent studies have shown that theinflammatory process is narrowly related to the pathophysiology of the atheroscleroticplaque rupture. In this revision, we have shown the major mechanisms involving theinflammatory and atherothrombotic processes in acute coronary syndromes, besides themanner how to identify and treat the clinical event.

Key words: acute coronary syndromes, inflammation, thrombosis.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:178-86)RSCESP (72594)-1611

REFERÊNCIAS

1. Virmani R, Kolodgie FD, Burke AP, Farb A,Schwartz SM. Lessons from sudden coronarydeath: a comprehensive morphological classi-fication scheme for atherosclerotic lesions.Arterioscler Thromb Vasc Biol. 2000;20:1262-75.

2. Virmani R, Burke AP, Kolodgie FD, Farb A.Vulnerable plaque: the pathology of unstablecoronary lesions. J Interv Cardiol. 2002;15:439-46.

3. Falk E. Pathogenesis of atherosclerosis. J AmColl Cardiol. 2006;47:C7-12.

4. Libby P, Theroux P. Pathophysiology of coro-nary artery disease. Circulation. 2005;111:3481-8.

5. Fuster V, Moreno PR. Atherothrombosis as asystemic, often silent, disease. Nat Clin PractCardiovasc Med. 2005;2:431.

6. Fuster V, Moreno PR, Fayad ZA, Corti R, Badi-mon JJ. Atherothrombosis and high-risk pla-que: part I: evolving concepts. J Am Coll Car-diol. 2005;46:937-54.

7. Forstermann U, Munzel T. Endothelial nitricoxide synthase in vascular disease: from mar-

vel to menace. Circulation. 2006;113:1708-14.8. Frenette PS, Wagner DD. Adhesion molecules

— Part II: Blood vessels and blood cells. NEngl J Med. 1996;335:43-5.

9. Frenette PS, Wagner DD. Adhesion molecules— Part I. N Engl J Med. 1996;334:1526-9.

10. Fernandes JL, Mamoni RL, Orford JL, GarciaC, Selwyn AP, Coelho OR, et al. Increased Th1activity in patients with coronary artery disea-se. Cytokine. 2004;26:131-7.

11. Picchi A, Gao X, Belmadani S, Potter BJ, Fo-cardi M, Chilian WM, et al. Tumor necrosisfactor-alpha induces endothelial dysfunction inthe prediabetic metabolic syndrome. Circ Res.2006;99:69-77.

12. Binder CJ, Chang MK, Shaw PX, Miller YI,Hartvigsen K, Dewan A, et al. Innate and ac-quired immunity in atherogenesis. Nat Med.2002;8:1218-26.

13. Stemme S, Faber B, Holm J, Wiklund O, Wit-ztum JL, Hansson GK. T lymphocytes fromhuman atherosclerotic plaques recognize oxi-dized low density lipoprotein. Proc Natl AcadSci U S A. 1995;92:3893-7.

14. Fernandes JL, Orford JL, Garcia C, CoelhoOR, Gidlund M, Blotta MH. Differences in

Page 69: check up

185RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.

Síndromescoronárias agudas

e inflamação

human antioxidized LDL autoantibodies inpatients with stable and unstable angina. JAutoimmun. 2004;23:345-52.

15. Benagiano M, Azzurri A, Ciervo A, AmedeiA, Tamburini C, Ferrari M, et al. T helper type1 lymphocytes drive inflammation in humanatherosclerotic lesions. Proc Natl Acad SciUSA. 2003;100:6658-63.

16. Frostegard J, Ulfgren AK, Nyberg P, Hedin U,Swedenborg J, Andersson U, et al. Cytokineexpression in advanced human atheroscleroticplaques: dominance of pro-inflammatory (Th1)and macrophage-stimulating cytokines. Athe-rosclerosis. 1999;145:33-43.

17. Mills R, Bhatt DL. The Yin and Yang of arteri-al inflammation. J Am Coll Cardiol.2004;44:50-2.

18. Shah PK. Mechanisms of plaque vulnerabilityand rupture. J Am Coll Cardiol. 2003;41:15S-22S.

19. Szabo SJ, Sullivan BM, Peng SL, GlimcherLH. Molecular mechanisms regulating Th1immune responses. Annu Rev Immunol.2003;21:713-58.

20. Gupta S, Pablo AM, Jiang X, Wang N, TallAR, Schindler C. IFN-gamma potentiates athe-rosclerosis in ApoE knock-out mice. J ClinInvest. 1997;99:2752-61.

21. Seder RA, Gazzinelli R, Sher A, Paul WE. In-terleukin 12 acts directly on CD4+ T cells toenhance priming for interferon gamma produc-tion and diminishes interleukin 4 inhibition ofsuch priming. Proc Natl Acad Sci USA.1993;90:10188-92.

22. Tipping PG, Hancock WW. Production of tu-mor necrosis factor and interleukin-1 by ma-crophages from human atheromatous plaques.Am J Pathol. 1993;142:1721-8.

23. Barath P, Fishbein MC, Cao J, Berenson J,Helfant RH, Forrester JS. Tumor necrosis fac-tor gene expression in human vascular intimalsmooth muscle cells detected by in situ hybri-dization. Am J Pathol. 1990;137:503-9.

24. Hansson GK, Holm J, Jonasson L. Detectionof activated T lymphocytes in the human athe-rosclerotic plaque. Am J Pathol. 1989;135:169-75.

25. Zhou X, Paulsson G, Stemme S, Hansson GK.Hypercholesterolemia is associated with a Thelper (Th) 1/Th2 switch of the autoimmuneresponse in atherosclerotic apo E-knockoutmice. J Clin Invest. 1998;101:1717-25.

26. Uyemura K, Demer LL, Castle SC, Jullien D,Berliner JA, Gately MK, et al. Cross-regula-tory roles of interleukin (IL)-12 and IL-10 inatherosclerosis. J Clin Invest. 1996;97:2130-8.

27. Lee TS, Yen HC, Pan CC, Chau LY. The roleof interleukin 12 in the development of athe-rosclerosis in ApoE-deficient mice. Arterios-cler Thromb Vasc Biol. 1999;19:734-42.

28. Liuzzo G, Vallejo AN, Kopecky SL, Frye RL,Holmes DR, Goronzy JJ, et al. Molecular fin-gerprint of interferon-gamma signaling in uns-table angina. Circulation. 2001;103:1509-14.

29. Szmitko PE, Wang CH, Weisel RD, de Almei-da JR, Anderson TJ, Verma S. New markers ofinflammation and endothelial cell activation:Part I. Circulation. 2003;108:1917-23.

30. Maury CP, Teppo AM. Circulating tumournecrosis factor-alpha (cachectin) in myocardi-al infarction. J Intern Med. 1989;225:333-6.

31. Liuzzo G, Biasucci LM, Gallimore JR, GrilloRL, Rebuzzi AG, Pepys MB, et al. The prog-nostic value of C-reactive protein and serumamyloid a protein in severe unstable angina. NEngl J Med. 1994;331:417-24.

32. Biasucci LM, Vitelli A, Liuzzo G, Altamura S,Caligiuri G, Monaco C, et al. Elevated levelsof interleukin-6 in unstable angina. Circulati-on. 1996;94:874-7.

33. Lenderink T, Heeschen C, Fichtlscherer S,Dimmeler S, Hamm CW, Zeiher AM, et al.Elevated placental growth factor levels are as-sociated with adverse outcomes at four-yearfollow-up in patients with acute coronary syn-dromes. J Am Coll Cardiol. 2006;47:307-11.

34. van Leeuwen MA, van Rijswijk MH. Acutephase proteins in the monitoring of inflamma-tory disorders. Baillieres Clin Rheumatol.1994;8:531-52.

35. Hirano T, Akira S, Taga T, Kishimoto T. Bio-logical and clinical aspects of interleukin 6.Immunol Today. 1990;11:443-9.

36. Falk E, Shah PK, Fuster V. Coronary plaquedisruption. Circulation. 1995;92:657-71.

37. Liu J, Sukhova GK, Sun JS, Xu WH, Libby P,Shi GP. Lysosomal cysteine proteases in athe-rosclerosis. Arterioscler Thromb Vasc Biol.2004;24:1359-66.

38. Shah PK, Galis ZS. Matrix metalloproteinasehypothesis of plaque rupture: players keep pi-ling up but questions remain. Circulation.2001;104:1878-80.

39. Hansson GK. Inflammation, atherosclerosis,and coronary artery disease. N Engl J Med.2005;352:1685-95.

40. Cavusoglu E, Ruwende C, Chopra V, Yanama-dala S, Eng C, Clark LT, et al. Tissue inhibitorof metalloproteinase-1 (TIMP-1) is an inde-pendent predictor of all-cause mortality, car-diac mortality, and myocardial infarction. AmHeart J. 2006;151:1101.e1-8.

41. Tziakas DN, Chalikias GK, Parissis JT, Hatzi-

Page 70: check up

186RSCESPJUL/AGO/SET 2006

FERNANDES JLe cols.Síndromescoronárias agudase inflamação

nikolaou EI, Papadopoulos ED, TripsiannisGA, et al. Serum profiles of matrix metallo-proteinases and their tissue inhibitor in pati-ents with acute coronary syndromes. Theeffects of short-term atorvastatin administrati-on. Int J Cardiol. 2004;94:269-77.

42. Pearson TA, Mensah GA, Alexander RW, An-derson JL, Cannon RO 3rd, Criqui M, et al.Markers of inflammation and cardiovasculardisease: application to clinical and public he-alth practice: a statement for healthcare pro-fessionals from the Centers for Disease Con-trol and Prevention and the American HeartAssociation. Circulation. 2003;107:499-511.

43. Smith SC Jr, Anderson JL, Cannon RO 3rd,Fadl YY, Koenig W, Libby P, et al. CDC/AHAWorkshop on Markers of Inflammation andCardiovascular Disease: Application to Clini-cal and Public Health Practice: report from theclinical practice discussion group. Circulati-on. 2004;110:e550-3.

44. Scirica BM, Morrow DA. Is C-reactive pro-tein an innocent bystander or proatherogenicculprit? The verdict is still out. Circulation.2006;113:2128-34; discussion 2151.

45. Lindahl B, Toss H, Siegbahn A, Venge P, Wal-lentin L. Markers of myocardial damage andinflammation in relation to long-term mortali-ty in unstable coronary artery disease. FRISCStudy Group (FRagmin during InStability inCoronary artery disease). N Engl J Med.2000;343:1139-47.

46. Albert MA, Danielson E, Rifai N, Ridker PM.Effect of statin therapy on C-reactive proteinlevels: the pravastatin inflammation/CRP eva-luation (PRINCE): a randomized trial and co-hort study. JAMA. 2001;286:64-70.

47. Ridker PM, Cannon CP, Morrow D, Rifai N,Rose LM, McCabe CH, et al. C-reactive pro-tein levels and outcomes after statin therapy.N Engl J Med. 2005;352:20-8.

48. Nissen SE, Tuzcu EM, Schoenhagen P, CroweT, Sasiela WJ, Tsai J, et al. Statin therapy, LDL

cholesterol, C-reactive protein, and coronaryartery disease. N Engl J Med. 2005;352:29-38.

49. Morrow DA, de Lemos JA, Sabatine MS, Wi-viott SD, Blazing MA, Shui A, et al. Clinicalrelevance of C-reactive protein during follow-up of patients with acute coronary syndromesin the Aggrastat-to-Zocor Trial. Circulation.2006;114:281-8.

50. Wiviott SD, de Lemos JA, Cannon CP, Bla-zing M, Murphy SA, McCabe CH, et al. A taleof two trials: a comparison of the post-acutecoronary syndrome lipid-lowering trials A toZ and PROVE IT-TIMI 22. Circulation.2006;113:1406-14.

51. Tsimikas S, Willerson JT, Ridker PM. C-reac-tive protein and other emerging blood bioma-rkers to optimize risk stratification of vulnera-ble patients. J Am Coll Cardiol. 2006;47:C19-31.

52. Apple FS, Wu AH, Mair J, Ravkilde J, Pante-ghini M, Tate J, et al. Future biomarkers fordetection of ischemia and risk stratification inacute coronary syndrome. Clin Chem. 2005;51:810-24.

53. Baldus S, Heeschen C, Meinertz T, Zeiher AM,Eiserich JP, Munzel T, et al. Myeloperoxidaseserum levels predict risk in patients with acutecoronary syndromes. Circulation.2003;108:1440-5.

54. Pai JK, Pischon T, Ma J, Manson JE, Hankin-son SE, Joshipura K, et al. Inflammatory ma-rkers and the risk of coronary heart disease inmen and women. N Engl J Med. 2004;351:2599-610.

55. O’Donoghue M, Morrow DA, Sabatine MS,Murphy SA, McCabe CH, Cannon CP, et al.Lipoprotein-associated phospholipase A2 andits association with cardiovascular outcomesin patients with acute coronary syndromes inthe PROVE IT-TIMI 22 (PRavastatin Or ator-Vastatin Evaluation and Infection Therapy-Thrombolysis In Myocardial Infarction) trial.Circulation. 2006;113:1745-52.

Page 71: check up

187RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

MONTEIRO CMCe cols.

Aterosclerosee inflamação

INTRODUÇÃO

A aterosclerose é a doença mais prevalente dasociedade moderna. Durante muitos anos, pensou-se que a aterosclerose fosse o resultado da deposi-ção lipídica na parede arterial, contínua, inerenteà idade; mas, com o tempo, a evolução do conhe-cimento mostrou que, apesar da origem multifa-torial, a aterosclerose possuía vários mecanismoscomuns e era fortemente influenciada pela mag-nitude da atividade inflamatória. De fato, a inten-sidade do processo inflamatório, freqüentemente,está associada à falta de melhor controle de fato-

res de risco, como hipertensão arterial, dislipide-mias, tabagismo, resistência à insulina, obesida-de, sedentarismo e diabetes, entre outros.

ENDOTÉLIO E INFLAMAÇÃO

O endotélio normal participa ativamente da re-gulação do tônus vascular, produz uma série desubstâncias relacionadas com a inflamação, alémde influenciar fortemente o balanço da hemosta-sia e a própria resposta imune.

As células endoteliais produzem uma das subs-tâncias de maior importância clínica, o óxido nítri-

ATEROSCLEROSE E INFLAMAÇÃO

CARLOS M. C. MONTEIRO

FRANCISCO A. H. FONSECA

Setor de Lípides, Aterosclerose e Biologia Vascular – Disciplina de Cardiologia –Universidade Federal de São Paulo

Endereço para correspondência:Rua Pedro de Toledo, 458 – Vila Clementino – CEP 04039-001 – São Paulo – SP

A aterosclerose é considerada uma doença inflamatória da parede vascular. De fato, desde oinício do processo de formação da placa é característica a presença de células inflamatóriascomo macrófagos, linfócitos, neutrófilos e mastócitos, participando ativamente do processode aterogênese, influenciando a remodelação vascular e a desestabilização de placas maisavançadas e vulneráveis a complicações, por meio de estímulos a maior expressão eliberação de citocinas inflamatórias, fatores de crescimento, metaloproteases e fatoresquimiotáticos.Assim, com o reconhecimento da aterosclerose e suas complicações como doençainflamatória, passou-se a buscar marcadores desse processo que adicionassem valorprognóstico a suas principais complicações, como acidente vascular cerebral ou desfechoscoronarianos, e que também pudessem refletir sua progressão anatômica. E que, em caso deredução da atividade inflamatória, permitissem o reconhecimento de uma situação de maiorestabilidade clínica e dos efeitos do tratamento de fatores de risco associados, comodiabetes, hipertensão ou dislipidemias. Dentre vários marcadores propostos, a proteína C-reativa adiciona valor prognóstico, apresenta boa reprodutibilidade, e possui padronizaçãolaboratorial e disponibilidade para auxílio à prática clínica.

Palavras-chave: aterosclerose, inflamação, disfunção endotelial, citocinas.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:187-92)RSCESP (72594)-1612

Page 72: check up

188RSCESPJUL/AGO/SET 2006

MONTEIRO CMCe cols.Aterosclerosee inflamação

co, fundamental na proteção vascular, pelas múl-tiplas propriedades desse gás, que influencia for-temente o tônus vascular, além de possuir efeitosrelevantes como antiagregante plaquetário e exer-cer efeitos antiinflamatórios e atenuar a atividadeproliferativa das células musculares lisas.

A presença de fatores de risco como hiperco-lesterolemia, hipertensão arterial, diabetes melitoe tabagismo promove reações químicas intracelu-lares que levam à disfunção endotelial e, conse-qüentemente, à menor produção de óxido nítrico,além de aumentar a produção de espécies reativasde oxigênio, expressão da interleucina-6 (IL-6),da expressão de moléculas de adesão ou recruta-mento vascular, como a proteína quimiotática demonócitos (MCP-1), e de moléculas de adesão dacélula vascular (VCAM-1). Essas alterações noendotélio promovem inflamação do vaso, permi-tindo o estabelecimento das lesões iniciais da ate-rosclerose1.

A infiltração de leucócitos entre as células en-doteliais e seu acesso às camadas mais profundasda íntima vascular são mediados por moléculasde adesão, como VCAM-1, ICAM-1 e E-selecti-na, entre outras. A maior expressão dessas molé-culas de adesão é induzida por citocinas, geral-mente sintetizadas em pequenas concentraçõespelo endotélio arterial, como interleucina-1ß (IL-1 ß), interleucina-4 (IL-4) e interleucina-6 (IL-6),mas que podem, principalmente na presença defatores de risco não controlados, também ser esti-muladas pela maior expressão de angiotensina IIe de seu receptor AT1, proteína C-reativa, recep-tor da LDL oxidada (LOX-1) e CD40/CD40L.

Nas disfunções endoteliais, caracterizadas poralterações de vasorreatividade ou do balanço dehemostasia, verifica-se maior inativação do óxidonítrico, geralmente por estresse oxidativo, associ-ado com substancial aumento das citocinas, de-terminando maior expressão das moléculas de ade-são e favorecendo o recrutamento e a adesão dosmonócitos à superfície endotelial2.

AS CÉLULAS INFLAMATÓRIAS E AATEROSCLEROSE

Os macrófagos são as células inflamatóriasmais importantes no processo aterosclerótico.Quando ativados, produzem fator de necrose tu-moral alfa (TNF-α), Fasl e angiotensina II, quesão citotóxicos. Produzem e secretam várias in-terleucinas (IL-6, IL-8, IL-18), além de espéciesreativas de oxigênio, que contribuem para mantero processo inflamatório. Sintetizam e secretam me-taloproteases de matriz 1 e 9, que degradam com-ponentes da matriz extracelular (colágeno, elasti-na) e da matriz pericelular, aspectos muito rele-

vantes na instabilização da placa. Os macrófagosincorporam grande quantidade de lipoproteínasmodificadas, principalmente LDL oxidada, o quedetermina, nessas células, a presença de grandequantidade de lipídeos (células espumosas), quetardiamente estão associadas a morte celular pro-gramada (apoptose), o que propicia a formaçãode depósitos lipídicos extracelulares. Esses ma-crófagos também estão associados a maior produ-ção de catepsinas, que degradam a matriz3.

Outra célula de grande importância no proces-so de aterosclerose é o linfócito. Uma família dequimiotáticos linfocitários atrai linfócitos T parao subendotélio. Linfócitos CD4+ e CD8+ são en-contrados em grande quantidade nas lesões ate-roscleróticas, especialmente em síndromes agudas.

Os linfócitos são a fonte principal de interfe-ron gama, cuja ação principal sobre as célulasmusculares lisas é impedir a síntese da matriz ex-tracelular, além de induzirem apoptose dos ma-crófagos e das células musculares lisas, pela esti-mulação do receptor-1 de TNF-α e caspase-84.

Além de macrófagos e linfócitos, os mastóci-tos são células inflamatórias que também são en-contrados na parede arterial e quando ativadospodem contribuir para um estado inflamatório epara a progressão das lesões ateroscleróticas.

Os mastócitos ativados produzem proteasesséricas, citocinas e proteoglicanos. Substânciascomo triptase, TNF-α e histamina ativam célulasendoteliais para expressar moléculas de adesão,especialmente P-selectina e VCAM-1. Ao produ-zirem TNF-α e fator de crescimento tumoral beta(TGF-ß), estimulam a produção de MCP-1, suge-rindo que os mastócitos facilitam o recrutamentode leucócitos para a região subendotelial, além deinduzir apoptose das células musculares lisas ecélulas endoteliais5.

Finalmente, os neutrófilos também são encon-trados em lesões ateroscleróticas, especialmentenas síndromes coronarianas agudas e em locais dedesnudação endotelial.

Estão ativados na circulação coronariana des-ses pacientes com síndromes coronarianas agudas,não exclusivamente no território da artéria culpa-da, mas em todo o sistema arterial coronário6.

INFLAMAÇÃO E ATIVAÇÃO DESINAIS INTRACELULARES

O fator nuclear “kappa” B (NFKB) integra umafamília de fatores de transcrição redox presentesem células endoteliais, células musculares lisasvasculares, macrófagos, leucócitos, cardiomióci-tos e fibroblastos7.

O NFKB encontra-se em forma inativa no ci-toplasma, ligado a proteínas inibitórias chamadas

Page 73: check up

189RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

MONTEIRO CMCe cols.

Aterosclerosee inflamação

IKB. Entretanto, essas proteínas podem ser fosfo-riladas por diversos estímulos, incluindo espéciesreativas de oxigênio, lipopolissacarídeos, citoci-nas e anoxia, tornando a proteína ativa que passaa influenciar no núcleo a transcrição de váriosgenes relacionados à atividade inflamatória e àhemostasia. Como exemplo, o NFKB permite amodificação da expressão gênica que codifica ci-tocinas, iNOS, COX-2, moléculas de adesão, imu-norreceptores, IL-8, proteínas da fase aguda emetaloproteinases da matriz.

O NFKB pode ser ativado por citocinas comoo TNF-α, IL-1, hiperglicemia, força de cisalha-mento vascular, LDL oxidada e estresse oxidati-vo. O NFKB pode contribuir para a progressão doprocesso aterosclerótico, pois a maioria dos ge-nes pró-inflamatórios expressos nas células endo-teliais durante a fase inicial da lesão e em respostaa mediadores inflamatórios é dependente dessefator nuclear8.

FISIOPATOLOGIA DA INFLAMAÇÃOE ATEROSCLEROSE

Uma das propriedades do endotélio vascular,particularmente via secreção de óxido nítrico, épromover inibição crônica da adesão e infiltraçãodas células inflamatórias no espaço subendoteli-al. Essa ação do óxido nítrico decorre da inibiçãoda expressão das moléculas de adesão na paredevascular. Assim, um déficit da biodisponibilidadedo óxido nítrico significa primariamente um es-tímulo pró-inflamatório.

A disfunção endotelial está associada a umdesequilíbrio redox, que, pelas razões descritas,contribui para o processo inflamatório. Esse dese-quilíbrio redox, além de resultar do acúmulo daquantidade de LDL oxidada, também está associ-ado com a geração intracelular de espécies reati-vas de oxigênio decorrente de proliferação, mi-gração e apoptose, ou seja, com todas as etapas deformação da placa.

Dentre os fatores pró-inflamatórios sensíveisao estresse oxidativo, o fator de trascrição NFKBdeflagra um programa gênico ligado à respostainflamatória, desde moléculas de adesão e citoci-nas até enzimas antioxidantes9.

Um dos aspectos interessantes do ateroma ins-tável é a redução do número de células muscula-res lisas responsáveis pela formação da capa fi-brosa, e que pode estar associado a aumento deapoptose.

A apoptose dessas células, bem como das cé-lulas inflamatórias do ateroma, contribui para aformação do centro necrótico da placa, que é alta-mente trombogênico.

A apoptose de células endoteliais também pode

contribuir para iniciar alterações estruturais daplaca, como ulcerações e fissuras, favorecendo oinício do processo trombogênico10.

A quantidade de matriz em um tecido é deter-minada pelo equilíbrio entre síntese e degradação.A síntese da matriz secretada por células muscu-lares lisas de fenótipo sintético e não contrátil éum fenômeno conhecido na formação do atero-ma, na resposta vascular à angioplastia e no es-pessamento da parede vascular associado com ahipertensão arterial. Entretanto, o remodelamentoda matriz extracelular é um importante fenômenoda reparação tecidual, como a que ocorre na ate-rosclerose.

Tanto as células musculares lisas ativadas comoos macrófagos da placa do ateroma podem produ-zir e ativar metaloproteases, enzimas relaciona-das com a degradação da matriz, principalmentede colágeno, com perda da resistência da capa fi-brosa do ateroma, propiciando sua rotura e com-plicações11.

O ateroma se manifesta clinicamente pela de-posição de um trombo mural oclusivo. A forma-ção do trombo pela via intrínseca da coagulação ébem conhecida e é desencadeada pela exposiçãode elementos trombogênicos subendoteliais, comocolágeno tipo IV, ou pelo núcleo necrótico da pla-ca.

Nos últimos anos, a importância da via extrín-seca da coagulação mediada pelo fator tecidual temsido mais reconhecida. O fator tecidual é uma pro-teína expressa principalmente pelo endotélio, mastambém pelo macrófago e por outras células vas-culares.

Essa maior expressão do fator tecidual pelosmacrófagos determina maior trombogenicidade daplaca e maior potencial para complicações locaisde maior gravidade. Do ponto de vista conceitual,a via do fator tecidual representa uma importanteconexão entre inflamação e trombose12.

Outro aspecto relacionado com a inflamação éo vasoespasmo. Os mediadores do vasoespasmoestão associados à ativação plaquetária e incluema serotonina e o tromboxano A2.

Mediadores inflamatórios como leucotrienostambém podem estar envolvidos. O efeito de to-dos esses mediadores é modulado pela função en-dotelial e amplificado por uma deficiência da bio-disponibilidade do óxido nítrico13.

A fosfolipase A2 (enzima lisossomal dos leu-cócitos) atua sobre os fosfolipídeos das membra-nas celulares, levando à formação de ácido ara-quidônico, que, sob ação da cicloxigenase, origi-na a formação de prostaglandinas.

As prostaglandinas podem amplificar a infla-mação vascular. Por meio de uma segunda viametabólica, mediada pela 5-lipoxigenase, o ácido

Page 74: check up

190RSCESPJUL/AGO/SET 2006

MONTEIRO CMCe cols.Aterosclerosee inflamação

araquidônico é convertido em uma série de leuco-trienos, potentes mediadores da resposta inflama-tória, que promovem aumento da permeabilidadevascular e da adesão de leucócitos à parede vas-cular.

No início da década passada, descobriu-se quea cicloxigenase existe sob duas isoformas: ciclo-xigenase-1 (cox-1) e cicloxigenase-2 (cox-2). Acox-1 está presente uniformemente nas células etecidos, mas a cox-2 é expressa principalmente emresposta a processos inflamatórios, ou seja, é in-duzida diante de determinados estímulos que al-teram a homeostasia vascular.

A importância da cox-2 no sistema cardiovas-cular reside no fato de essa enzima estar presentena placa de ateroma, endotélio e macrófagos. Foiobservado que a maior expressão de cox-2 intra-vascular está também associada a maior prolife-ração de células musculares lisas.

A atividade inflamatória vascular mediada pelacox-2 pode estar associada com o caráter evoluti-vo da doença aterosclerótica14.

MARCADORES INFLAMATÓRIOS

Com esse novo conceito de que a ateroscle-rose é um fenômeno inflamatório, a identifica-ção de marcadores clínicos tem sido investiga-da de forma a contribuir para que esses marca-dores se tornem indicadores da intensidade ouda gravidade da aterosclerose, como a prediçãode eventos cardiovasculares, ou mesmo ferra-mentas de monitoramento ou alvo de aspectosterapêuticos.

Marcadores plasmáticos têm sido analisados,incluindo fibrinogênio, amilóide sérico A, proteí-na C-reativa e lipoproteína-fosfolipase A2 (Lp-PLA2).

A proteína C-reativa parece influenciar a evo-lução da aterosclerose. Na placa, liga-se à LDL,ativando o sistema de complemento que participada formação do ateroma. Também estimula osmacrófagos a produzirem o fator tecidual, um dosresponsáveis pela trombose que ocorre nas síndro-mes vasculares agudas.

Estudos prospectivos em portadores de doen-ça coronariana, acidente vascular cerebral e insu-ficiência circulatória periférica indicam que a pro-teína C-reativa elevada está associada a maior in-cidência de complicações e de mortalidade15.

CONCLUSÃO

O processo inflamatório não só causa disfun-ção endotelial como desencadeia proliferação emigração celulares, estresse oxidativo, degrada-ção da matriz extracelular, apoptose, trombose enecrose celular. Os marcadores inflamatórios plas-máticos estão sendo avaliados para diagnosticarprecocemente a aterosclerose, bem como identifi-car pacientes de alto risco para o desenvolvimen-to de eventos cardiovasculares futuros. Dentre es-tes, a quantificação da proteína C-reativa propiciainformações clínicas relacionadas ao risco cardi-ovascular que podem ser particularmente úteis naestratégia terapêutica, sobretudo para pacientescom risco intermediário dos principais desfechoscoronarianos.

Page 75: check up

191RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

MONTEIRO CMCe cols.

Aterosclerosee inflamação

ATHEROSCLEROSIS AND INFLAMMATION

CARLOS M. C. MONTEIRO

FRANCISCO A. H. FONSECA

Atherosclerosis is now considered an inflammatory disease of vascular wall. In fact, sinceits beginning, plaque formation is a process characterized by the presence of inflammatorycells, such as macrophages, lymphocytes, neutrophils and mastocytes, influencing vascularremodeling and plaque destabilization. These processes are also mediated by a variety ofstimuli by cytokines, growth factors, metalloproteinases and chemo attractant factors.Therefore, atherosclerosis has been recognized as an inflammatory disease and efforts havebeen made to identify inflammatory markers that may add prognostic value for majorcomplications such as stroke or coronary events and its anatomic progression as well.Furthermore, reduction in inflammatory markers can be related to plaque stabilization andmay reflect the results of risk factors treatment, as diabetes, hypertension or dyslipidemias.Among several markers, C-reactive protein add prognostic value, its measurement is wellestablished and is currently available for clinical practice.

Key words: atherosclerosis, inflammation, endothelial dysfunction, cytokines.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:187-92)RSCESP (72594)-1612

REFERÊNCIAS

1. Ross R. Atherosclerosis: an inflammatory dise-ase. N Engl J Med. 1999;340(2):115-26.

2. Libby P. Inflammation in atherosclerosis. Na-ture. 2002;420(6917):868-74.

3. Oorni K, Sneck M, Bromme D, Pentikainen MO,Lindstedt KA, Mayranpaa M, et al. Cysteineproteases cathepsin F is expressed in humanatherosclerotic lesions, is secreted by culturedmacrophages, and modifies LDL particles invitro. J Biol Chem. 2004;279(33):34776-84.

4. Inagaki Y, Yamagishi S, Amano S, Okamoto T,Koga K, Makita Z. Interferon-gamma-inducedapoptosis and activation of THP-1 macropha-ges. Life Sci. 2002;71(21):2499-508.

5. Kelley JL, Chi DS, Abou-Auda W, Smith JK,Krishnaswamy G. The molecular role of mastcells in atherosclerotic cardiovascular disea-se. Mol Med Today. 2000;6(8):304-8.

6. Naruko T, Ueda M, Haze K, van der Wal AC,van der Loos CM, Itoh A, et al. Neutrophil in-filtration of culprit lesions in acute coronarysyndromes. Circulation. 2002;106(23):2894-900.

7. Valen G, Yan Z, Hansson GK. Nuclear factor

kappa-beta and the heart. J Am Coll Cardiol.2001;38(2):307-14.

8. Collins T, Read MA, Neish AS, Whitley MZ,Thanos D, Maniatis T. Transcriptional regula-tion of endothelial cell adhesion molecules:NF-kappa B and cytokine-inducible enhancers.FASEB J. 1995;9(10):899-909.

9. Flohe L, Brigelius-Flohe R, Saliou C, TraberMG, Packer L. Redox regulation of NF-kappaB activation. Free Radic Biol Med.1997;22(6):1115-26.

10. Cheung WM, D’Andrea MR, Andrade-Gor-don P, Damiano BP. Altered vascular injury res-ponses in mice deficient in protease activatedreceptor-1. Arterioscler Thomb Vasc Biol.1999;19(12):3014-24.

11. Wainwright CL. Matrix metalloproteinases,oxidative stress and the acute response to myo-cardial ischemia and reperfusion. Curr OpinPharmacol. 2004;4(2):132-8.

12. Da Luz PL, Uint L. Endotélio na aterosclero-se; interações celulares e vasomotricidade. In:da Luz PL, Laurindo FRL, Chagas ACP, edi-tors. Endotélio e doenças cardiovasculares. Riode Janeiro: Editora Atheneu; 2003. p. 133-60.

13. Laurindo FRM, Liberman M, Leite PF. Subs-

Page 76: check up

192RSCESPJUL/AGO/SET 2006

MONTEIRO CMCe cols.Aterosclerosee inflamação

tâncias vasodilatadoras produzidas pelo endo-télio. In: da Luz PL, Laurindo FRL, ChagasACP, editors. Endotélio e doenças cardiovas-culares. Rio de Janeiro: Editora Atheneu; 2003.p. 33-42.

14. Chagas AC, Júnior AC. Participação da ciclo-xigenase-2 no processo inflamatório da placa

aterosclerótica. Rev Soc Cardiol Estado de SãoPaulo. 2002;12:530-40.

15. da Luz PL, Laurindo FRM. Inflamação eaterosclerose. In: Nobre F, Serrano Jr CV,editors. Tratado de Cardiologia SOCESP.São Paulo: Editora Manole; 2005. p. 369-80.

Page 77: check up

193RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.

Fatores de risco einflamação vascular

FATORES DE RISCO E INFLAMAÇÃO VASCULAR

DIKRAN ARMAGANIJAN

LUCIANA VIDAL ARMAGANIJAN

MAURICIO RODRIGUES JORDÃO

Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia

Endereço para correspondência:Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 – Ibirapuera – CEP 04012-180 – São Paulo – SP

A inflamação vascular foi identificada em todas as etapas evolutivas das lesõesateroscleróticas e a reação inflamatória é uma resposta aos estímulos nocivos. Fatores comohipercolesterolemia, hipertensão arterial, diabetes, obesidade e tabagismo, entre outros,danificam o endotélio e estimulam uma reação inflamatório-proliferativa na parede vascular.Os mediadores da relação entre os lípides e a aterosclerose envolvem polimorfos nucleares(monócitos/macrófagos, linfócitos) e células musculares lisas. A demonstração de que aspartículas de colesterol ligado à lipoproteína de baixa densidade acetiladas são rapidamenteassimiladas pelos macrófagos, em pacientes expostos a níveis elevados de colesterol, sugereque essas lipoproteínas penetram na camada íntima e são submetidas a oxidação. Os efeitospró-inflamatórios da hipertensão arterial aumentam a produção de peróxido de hidrogênio eradicais livres, substâncias que reduzem a produção do óxido nítrico endotelial e aumentama aderência leucocitária e a resistência periférica. O endotélio é essencial na distribuição dainsulina e sua integridade pode ser comprometida por ação de citocinas, lipoproteínasoxidadas, tabagismo e estresse crônico, em pacientes portadores de diabetes do tipo 2.Várias citocinas têm sido amplamente estudadas no tecido adiposo: fator de necrose tumoralalfa (TNF-alfa), interleucina 6 (IL-6), adiponectina, leptina, resistina e PAI-1. Aadiponectina é uma proteína plasmática do tipo colágeno-específica, exclusivamenteexpressa no tecido adiposo humano; a resistina é expressa predominantemente no tecidoadiposo; e a leptina é um hormônio derivado do adipócito e está intensamente ligada àscitocinas pró-inflamatórias. A ligação entre adipocinas e risco cardiovascular foidemonstrada pela relação existente entre níveis sanguíneos de adipocinas, IL-6 e proteína C-reativa. A IL-6 promove a liberação de moléculas de adesão endotelial quimocinas eaumenta os níveis sanguíneos da proteína C-reativa. A contribuição da inflamação vascularna doença aterosclerótica dos fumantes foi demonstrada em estudos que avaliaram os níveisséricos da proteína C-reativa em fumantes e não-fumantes.

Palavras-chave: fatores de risco, inflamação, aterogênese.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:193-201)RSCESP (72594)-1613

Page 78: check up

194RSCESPJUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.Fatores de risco einflamação vascular

INTRODUÇÃO

A inflamação vascular foi identificada em to-das as etapas evolutivas das lesões ateroscleróti-cas e a reação inflamatória é uma resposta aos es-tímulos nocivos, caracterizada pelo movimento decélulas sanguíneas para o interior da parede vas-cular, sob a influência de fatores quimiotáticosproduzidos no local da lesão. A persistência des-ses estímulos mantém o processo inflamatório crô-nico infiltrado por células imunitárias (macrófa-gos, linfócitos e células plasmáticas). A respostaparietal inadequada compromete a função e a ana-tomia vascular, originando a placa ateroscleróti-ca.

A liberação de mediadores inflamatórios e suadosagem sanguínea podem constituir possíveisidentificadores do ciclo inflamatório. Nos estudosepidemiológicos moleculares, a identificação e adosagem desses marcadores inflamatórios têm sidoutilizadas para prevenção, diagnóstico e tratamentoda doença aterosclerótica. Contudo, há necessi-dade de se estabelecer quais são os marcadoresinflamatórios ideais, padronizar os métodos labo-ratoriais, demonstrar seus efeitos aditivos quandoassociados aos fatores de risco clássicos, e reava-liar os resultados dos estudos epidemiológicosprospectivos.

Estímulos nocivos, tais como hipercolestero-lemia, hipertensão arterial, diabetes, obesidade etabagismo, entre outros, danificam o endotélio eestimulam uma reação inflamatório-proliferativana parede vascular. A reação inflamatória aumen-ta a secreção de citocinas pró-inflamatórias pri-márias (interleucina 1 – IL-1 e fator de necrosetumoral alfa – TNF-alfa), responsáveis pela ex-

pressão de moléculas de adesão leucocitária (mo-lécula de adesão intracelular – ICAM-1 e selecti-nas P, E e L) e pelo aumento da produção de subs-tâncias quimiotáticas (proteína quimiotática deri-vada de monócitos – MCP-1 e fator estimuladorde colônia de monócitos – MCSF), ambas ampli-ficadoras da cascata inflamatória (Fig. 1).

Os monócitos intraparietais adquirem carac-terísticas de macrófagos tissulares e células espu-mosas, secretam espécies reativas de oxigênio, ci-tocinas pró-inflamatórias, metaloproteinases(MMP), fatores de crescimento e fator tissular,amplificando a reação inflamatória. No interior doateroma, os linfócitos T podem se converter emcélulas secretoras denominadas Th1 e Th2. Ascélulas Th1, em maior número, secretam citoci-nas pró-inflamatórias (IL-6, TNF-alfa e interfe-ron gama – IFN-gama) e as células Th2 secretamcitocinas antiinflamatórias (IL-4 e IL-10).

O núcleo lipídico da placa aterosclerótica con-tém células espumosas, macrófagos e restos ne-cróticos. A capa fibrosa estável tem maior espes-sura e é constituída por colágeno e células muscu-lares lisas. A capa fibrosa vulnerável é compostapor pouco colágeno, passível de ruptura; quandorota, expõe o tecido conjuntivo subendotelial, pro-piciando maior incidência de trombose vascular.

Os linfócitos T secretam IFN-gama e reduzema síntese de colágeno, adelgaçando a espessura dacapa fibrosa. Os macrófagos secretam MMP, de-gradam a matriz extracelular, favorecem a rupturada placa e expõem elementos pró-trombóticos (fa-tor tissular), mediadores da trombose intravascu-lar.

A reação inflamatória aumenta os níveis san-guíneos das proteínas de fase aguda, cuja concen-

Figura 1. Recrutamento dos monócitos sanguíneos pelas moléculas de adesão das células endoteliais.

Page 79: check up

195RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.

Fatores de risco einflamação vascular

tração sérica aumenta (proteínas positivas) ou di-minui (proteínas negativas), em pelo menos 25%,durante o processo inflamatório. As citocinas pro-duzidas no local do processo inflamatório podemestimular a produção de outras citocinas, tantolocais como à distância. A IL-6, citocina pró-in-flamatória secundária, estimula a síntese hepáticade proteínas da fase aguda produzidas em baixaconcentração (proteína C-reativa – PCR e subs-tância amilóide A – SAA) e de proteínas da faseaguda produzidas em alta concentração (fibrino-gênio).

DISLIPIDEMIAS E INFLAMAÇÃOVASCULAR

Em 1970, Goldestein descreveu a hipercoles-terolemia familiar como uma doença monogênicaligada às mutações do receptor de colesterol liga-do à lipoproteína de baixa densidade (LDL-coles-terol) e demonstrou que concentrações sanguíne-as elevadas dessa lipoproteína induziam ateroscle-rose acelerada. Simultaneamente, vários estudosrelacionaram a doença aterosclerótica a níveis sé-ricos baixos de colesterol ligado à lipoproteína dealta densidade (HDL-colesterol), principalmenteem mulheres e idosos, e níveis séricos elevadosde triglicérides, ambos considerados importantesfatores de risco cardiovascular. Os mediadores darelação entre os lípides e a aterosclerose envol-vem polimorfonucleares (monócitos/macrófagos,linfócitos) e células musculares lisas parietais. As

lesões ateroscleróticas iniciais, formadas por pe-quenos depósitos de lípides na íntima, podem evo-luir para lesões complicadas e denominadas pla-cas ateroscleróticas.

Embora os macrófagos sejam responsáveis pelaformação das células espumosas, em culturas detecido essas células não têm a mesma capacidadede absorver as gorduras, pela sua reduzida expres-são de receptores de LDL-colesterol. A demons-tração de que as partículas de LDL-colesterol ace-tiladas são rapidamente assimiladas pelos macró-fagos, em pacientes expostos a níveis elevados decolesterol, sugere que essas lipoproteínas penetramna camada íntima e são submetidas a oxidação pormeio de três mecanismos:1) ação de íons metálicos – cobre e ferro;2) ação de espécies reativas – oxigênio, peróxidode hidrogênio, radical hidroxila, óxido nítrico eperoxinitrato;3) ação de enzimas – lipoxigenases, mieloperoxi-dases, dinucleotídeo de nicotinamida adenina fos-fato (NADPH) oxidase e citocromo P-450.

O LDL-colesterol oxidado é fagocitado pelosmacrófagos e dá início à formação das células es-pumosas (Fig. 2).

O acúmulo de lípides modificados ativa as cé-lulas endoteliais e estimula a migração de célulasinflamatórias e o recrutamento de células muscu-lares lisas responsáveis pela síntese da matriz epela formação da capa fibrosa. Os fatores de cres-cimento também aumentam o recrutamento de cé-lulas musculares lisas e a formação da capa fibro-

Figura 2. LDL e células espumosas.

Page 80: check up

196RSCESPJUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.Fatores de risco einflamação vascular

sa. A degradação da matriz e a apoptose de célu-las musculares lisas estimulam a ruptura da placa,expõem o tecido conjuntivo subendotelial, aumen-tam a agregação de plaquetas e estimulam a trom-bose.1

Os macrófagos são responsáveis pela remoçãoe pelo seqüestro das partículas de LDL-colesterolna parede vascular. A morte celular programadadesses macrófagos pode ter efeitos benéficos oumaléficos. A apoptose benéfica remove os corposapoptóicos e reduz a destruição de fibras coláge-nas. A apoptose maléfica acumula corpos apop-tóicos na parede vascular, ativa a trombina e, con-seqüentemente, aumenta a incidência de trombo-se intraparietal. Os macrófagos secretam a proteí-na quimiotática (MCP-1) e o fator estimulador decolônia de macrófagos (MCSF), responsáveis pelorecrutamento de novos macrófagos e retenção demacrófagos preexistentes. A ativação desses ma-crófagos expressa genes que estimulam a produ-ção de citocinas, fatores de crescimento e altera-ções fenotípicas das células musculares lisas, au-mentando a proliferação e sua migração para ou-tros segmentos vasculares.2

Os macrófagos e os linfócitos têm importantepapel na formação da placa vulnerável, liberandocitocinas responsáveis pela inflamação vascular.Citocinas, TNF-alfa, IL-1, IL-6 e INF-gama am-plificam a resposta imunológica e alteram a fun-ção da célula endotelial, favorecendo o processopró-trombótico. A IL-6 e o TNF-alfa têm papel de

destaque e sua elevação nos níveis sanguíneosaumenta a incidência de eventos coronários.

Os efeitos protetores do HDL-colesterol naplaca aterosclerótica advêm de vários mecanismos:1) aumenta o efluxo do colesterol – remoção docolesterol dos tecidos periféricos para o fígado oupara os órgãos denominados esteroidogênicos, queutilizam o colesterol na síntese de alguns hormô-nios;2) inibição e oxidação do LDL-colesterol da pla-ca aterosclerótica – transferência dos hidroperó-xidos lipídicos das partículas de LDL-colesterolpara as partículas de HDL-colesterol, lipoproteí-na rapidamente metabolizada pelas células hepá-ticas e redutora da oxidação do LDL-colesterol pormeio da via enzimática (paroxinase);3) estimula a produção de óxido nítrico via sinali-zação de membrana, inibindo a expressão da mo-lécula de adesão nas células endoteliais e redu-zindo o processo inflamatório. A ação deletéreadas citocinas e das lipoproteínas provoca no leitovascular alterações da lipase lipoprotéica, colabo-rando para o aumento de triglicérides e para a re-dução do HDL-colesterol.

O crescimento progressivo das estrias gordu-rosas modifica a anatomia vascular, inicialmentecom remodelamento positivo, sem alterações defluxo sanguíneo, permitindo ao paciente hiperco-lesterolêmico evoluir de forma assintomática du-rante décadas. No “Women’s Health Study”3, em28.262 mulheres pós-menopausa, aparentemente

Figura 3. Inibição da aterosclerose pela HDL.

Page 81: check up

197RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.

Fatores de risco einflamação vascular

normais, foi avaliado o risco de doença arterialcoronária, infarto não-fatal, acidente vascular ce-rebral e necessidade de revascularização miocár-dica. Durante o seguimento de três anos, os níveissanguíneos dos marcadores inflamatórios erammais elevados nas mulheres que tiveram eventoscardiovasculares. Os níveis sanguíneos elevadosde LDL-colesterol e de apoproteína B-100 e a re-lação colesterol/HDL-colesterol estiveram direta-mente relacionados com os níveis elevados dosmarcadores inflamatórios.

HIPERTENSÃO ARTERIAL EINFLAMAÇÃO VASCULAR

A função endotelial normal resulta do estadode equilíbrio entre as substâncias produzidas noendotélio e os elementos celulares adjacentes. Nes-se estado de equilíbrio funcional há predisposiçãopara vasodilatação, inibição do crescimento celu-lar, e ações antiagregante, antioxidante e antiin-flamatória. A disfunção endotelial predispõe avasoconstrição, inflamação, adesão tanto plaque-tária como leucocitária, trombose, proliferaçãocelular, aterosclerose e hipertensão arterial.

Pacientes hipertensos com disfunção endote-lial têm resposta paradoxal à acetilcolina e, nes-ses pacientes, os níveis sanguíneos de angiotensi-na II freqüentemente estão elevados. A angioten-sina II é um potente vasoconstritor, age sobre ascélulas endoteliais e essa ligação é feita por meiode receptores do tipo AT1. Nessas células, a angi-otensina II ativa a enzima NADH/NADH oxida-se, aumentando a produção de superóxido e dimi-nuindo a produção de óxido nítrico. A ligação daangiotensina II com as células musculares lisas éfeita por meio de receptores específicos que ati-vam a produção da enzima fosfolipase C, respon-sável pelo aumento da concentração de cálcio in-tracelular e pela contração muscular. Simultanea-mente, a angiotensina II aumenta a atividade dalipoxigenase, propiciando maior oxidação doLDL-colesterol e inflamação vascular.

Os efeitos pró-inflamatórios da hipertensão ar-terial aumentam:1) a produção do peróxido de hidrogênio e radi-cais livres (ânion superóxido e radicais hidroxi-la);2) as substâncias que reduzem a produção do óxi-do nítrico endotelial;3) as substâncias que aumentam a aderência leu-cocitária e a resistência periférica.

Assim, a angiotensina II estimula os fatoresde crescimento responsáveis pela hipertrofia tan-to cardíaca como vascular, aumenta a secreção damatriz extracelular, aumenta a produção de cito-cinas inflamatórias, ativa os monócitos, estimula

a reação inflamatória, aumenta a produção de ra-dicais livres e diminui a produção de óxido nítri-co.4

DIABETES DO TIPO 2 EINFLAMAÇÃO VASCULAR

Estudos têm demonstrado que a inflamaçãovascular está implicada na gênese do diabetes dotipo 2. O estresse crônico e a ingestão de alimen-tos ricos em gordura saturada, em pacientes pre-dispostos, aumentam a secreção de citocinas, IL-1, IL-2 e TNF-alfa e a resistência à insulina. Ade-mais, a associação entre aumento da resistência àinsulina e níveis sanguíneos elevados de PCR, PAI-1, fibrinogênio e leucocitose corrobora a impor-tância dessas afirmações nos pacientes diabéticos.

O endotélio é essencial na distribuição da in-sulina e sua integridade pode ser comprometidapor ação de citocinas, lipoproteínas oxidadas, ta-bagismo e estresse crônico em pacientes portado-res de diabetes do tipo 2. A persistência dessesagentes nocivos produz alterações capilares da li-pase lipoprotéica, aumentando os níveis de LDL-colesterol e triglicérides e reduzindo os níveis sé-ricos de HDL-colesterol. Tais alterações reduzema perfusão capilar, diminuem a produção de óxidonítrico, e aumentam os níveis sanguíneos de PAI-1 e do fator de von Willebrand, agravando a dis-função endotelial. O comprometimento da barrei-ra endotelial reduz a perfusão tecidual da insulinae disponibiliza menor quantidade desse hormônioaos receptores na membrana celular. Essa barrei-ra endotelial aumenta a resistência à insulina.

Em estudos experimentais, os níveis sanguí-neos elevados de marcadores inflamatórios aumen-taram o risco de desestabilização da placa ateros-clerótica em pacientes com aumento de resistên-cia à insulina. Nesses estudos, a incubação de PCRrecombinante com células endoteliais promoveua inibição da síntese do óxido nítrico, aumentou aprodução do fator tissular pelos macrófagos, pro-piciou maior ligação dos macrófagos às lipopro-teínas, principalmente do LDL-colesterol e docolesterol ligado à lipoproteína de densidade muitobaixa (VLDL-colesterol), facilitando sua agrega-ção e acúmulo nas lesões ateroscleróticas incipi-entes. Outra evidência da importância dos marca-dores inflamatórios é a relação observada entredoenças inflamatórias crônicas e níveis sanguíne-os do TNF-alfa. Nas doenças periodontais, os ní-veis sanguíneos do TNF-alfa são até 32 vezesmaiores que o normal e a freqüência de infartosdo miocárdio e acidentes vasculares cerebrais podeser 2,8 vezes maior que nos não-portadores dedoença inflamatória.5

Os níveis de PCR correlacionam-se com o ín-

Page 82: check up

198RSCESPJUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.Fatores de risco einflamação vascular

dice de massa corpórea. Em pacientes com diabe-tes do tipo 2 e aumento da circunferência abdomi-nal, a perda de 10% do peso reduz significativa-mente os níveis sanguíneos da PCR.

OBESIDADE E INFLAMAÇÃO VASCULAR

A prevalência da obesidade nas sociedades oci-dentais tem aumentado nos últimos anos e o riscode doença cardiovascular nos obesos é superiorao dos não-obesos.

O tecido adiposo, considerado armazenadorpassivo de gordura, tem importante atividade en-dócrina e participa efetivamente do metabolismoorgânico. Os adipócitos produzem citocinas, mo-léculas de baixo peso molecular farmacologica-mente ativas e com efeitos autócrinos e parácri-nos.6 Várias citocinas têm sido amplamente estu-dadas no tecido adiposo: TNF-alfa, IL-6, adipo-nectina, leptina, resistina e PAI-1. O tecido adipo-so é a principal fonte de TNF-alfa, cujos efeitosincluem importante ação pró-inflamatória.7 Ape-nas 30% da IL-6 circulante têm origem no tecidoadiposo e dois terços advêm do tecido adiposovisceral. A adiponectina é uma proteína plasmáti-ca do tipo colágeno-específica, exclusivamenteexpressa no tecido adiposo humano. A resistina éuma molécula rica em cisteína, expressa predo-minantemente no tecido adiposo, detectável nosoro e com atuação em outros sítios de forma se-melhante à de outras adipocinas. A leptina é umhormônio derivado do adipócito e está intensamen-te ligada às citocinas pró-inflamatórias. Sabe-sepouco sobre o envolvimento e a interação entreinflamação e tecido adiposo; na aterogênese, asadipocinas exercem importante papel na relaçãoentre inflamação, resistência à insulina e diabe-tes.

Diversos estudos têm demonstrado vinculaçãoentre TNF-alfa e doença cardiovascular, indepen-dentemente da sensibilidade à insulina. Os efeitosdo TNF-alfa sobre o endotélio podem ser diretosou indiretos, por meio da liberação de outros me-diadores produzidos nos próprios adipócitos ou emcélulas de outros tecidos orgânicos. Nas células, oTNF-alfa aumenta a adesão de leucócitos no en-dotélio, ativa as vias pró-inflamatórias e induz àexpressão da molécula de adesão de célula vascu-lar (VCAM-1) e da endotelina.8-10

A ligação entre adipocinas e risco cardiovas-cular foi demonstrada pela relação existente entreníveis sanguíneos de adipocinas, IL-6 e PCR. AIL-6 promove a liberação de moléculas de adesãoendotelial, quimocinas, e aumenta os níveis san-guíneos da PCR.

A concentração sérica baixa de adiponectinana obesidade, no diabetes do tipo 2 e na doença

arterial coronária sugere efeitos protetores dessaproteína. “In vitro”, a adiponectina recombinantehumana suprime a expressão endotelial das molé-culas de adesão, a proliferação do músculo lisovascular e a transformação de macrófagos em cé-lulas espumosas. Em células endoteliais aórticashumanas, a adiponectina inibe a adesão de monó-citos, induzida pelo TNF-alfa, e suprime níveis deRNAm e VCAM-1. A leptina participa da etiolo-gia da doença hipertensiva e da doença cardiovas-cular pelos seus efeitos sobre o sistema nervososimpático no tecido adiposo, no rim e na glândulaadrenal.

A redução do peso melhora os fatores hemos-táticos associados às doenças cardiovasculares, in-cluindo o antígeno PAI-1 e o antígeno ativador te-cidual do plasminogênio. A melhora da função en-dotelial macrovascular está associada à reduçãodo peso e dos marcadores da ativação endotelial,da inflamação e da coagulação, incluindo reduçãode ICAM-1, TNF-alfa, PCR e PAI-1.11

TABAGISMO E INFLAMAÇÃOVASCULAR

O tabagismo é um importante fator de riscomodificável e tem consistente associação epide-miológica com doenças cardiovasculares, tanto emhomens como em mulheres. Aproximadamente50% dos pacientes de meia-idade portadores dedoença cardiocirculatória são fumantes ou ex-fu-mantes.12 As alterações vasculares decorrentes dotabagismo envolvem disfunção endotelial, altera-ções da coagulação sanguínea e anormalidades dometabolismo lipídico. A contribuição da inflama-ção vascular na doença aterosclerótica dos fuman-tes foi demonstrada em estudos que avaliaram osníveis séricos da PCR em fumantes e não-fuman-tes. No “Women’s Health Study”, foram analisa-dos cinco marcadores inflamatórios sistêmicos emmulheres aparentemente normais. No grupo dasmulheres fumantes, os níveis séricos de PCR (p =0,032), IL-6 (p < 0,002), ICAM-1 (p < 0,001),selectina P (p = 0,025) e selectina E (p = 0,007)foram significativamente maiores que no grupo dasnão-fumantes. Na análise multivariada, após ajusteda idade, índice de massa corpórea, história dehipertensão, diabetes, consumo de bebida alcoó-lica, atividade física, história familiar de infartodo miocárdio antes dos 60 anos de idade, terapiade reposição hormonal, e níveis séricos de LDL eHDL, as pacientes fumantes apresentaram níveisséricos mais elevados em quatro dos cinco marca-dores inflamatórios avaliados nessa população:PCR (p = 0,034), IL-6 (p = 0,002), ICAM-1 (p <0,001) e selectina E (p = 0,036).13 Resultados se-melhantes foram observados numa população de

Page 83: check up

199RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.

Fatores de risco einflamação vascular

médicos em que se utilizou a PCR como marca-dor de inflamação.

A relação entre níveis de PCR e tabagismo éproporcional ao número de cigarros fumados. Noestudo de Mendall e colaboradores14, a elevaçãodos níveis séricos de PCR e IL-6 em homens foidiretamente proporcional ao número de cigarrosconsumidos. Nas mulheres, os níveis séricos deselectina P foram o melhor indicador do númerode cigarros consumidos.15

ATEROSCLEROSE E INFLAMAÇÃOVASCULAR

A relação entre aterosclerose, inflamação e fa-tores de risco sugere a existência de múltiplos me-canismos fisiopatológicos. Em pacientes jovens,a trombose e a ruptura de placa respondem pelaevolução rápida da doença aterosclerótica. Nes-ses pacientes, o endotélio pode estar relativamen-te intacto e com pouca evidência de ativação da

coagulação. Contudo, a ruptura da placa estimulaa trombose e o trombo sanguíneo é fundamentalna evolução da doença. Em pacientes idosos, aplaca aterosclerótica é complexa e resulta de umprocesso evolutivo lento. Participam desse proces-so mecanismos lentos de coagulação, rupturasmúltiplas da placa e complicações clínicas, taiscomo morte súbita e insuficiência cardíaca.

A doença vascular crônica ativa a coagulaçãosanguínea e o trombo pode não estar associado àevolução da doença, porém freqüentemente parti-cipa do processo inflamatório.

Considerando essas hipóteses verdadeiras, asmedidas preventivas controlariam uma fração im-portante da população jovem e com doença ate-rosclerótica, fato que tem se observado nos últi-mos anos. Nos processos ateroscleróticos crôni-cos, a redução da doença sugere a necessidade dese controlar os componentes inflamatórios, inclu-sive das co-morbidades freqüentemente presentesna população idosa.

Page 84: check up

200RSCESPJUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.Fatores de risco einflamação vascular

REFERÊNCIAS

1. Weissberg PL. Atherogenesis: current unders-tanding of the causes of atheroma. Indian He-art J. 2000;52:467-72.

2. Ross R. Atherosclerosis – an inflammatory di-sease. N Engl J Med. 1999;340:115-26.

3. Ridker PM, Buring JE, Shih J, Matias M, Hen-nekens CH. Prospective study of C-reactiveprotein and the risk of future cardiovascularevents among apparently healthy women. Cir-culation. 1998;98:731-3.

4. Kencic Jr L. Hipertensão e Dislipidemia – daTeoria à Prática. In: Martinez TLR, ed. SãoPaulo: Editora Atheneu; 2004. p. 81-93.

RISK FACTORS AND VASCULAR INFLAMMATION

DIKRAN ARMAGANIJAN

LUCIANA VIDAL ARMAGANIJAN

MAURICIO RODRIGUES JORDÃO

Vascular inflammation was identified in all stages of atherosclerotic lesions and theinflammatory reaction is a response to noxious stimuli. Hypercholesterolemia, hypertension,diabetes mellitus, obesity and smoking, among others, damage the endothelium andstimulate an inflammatory reaction in the vascular wall. The mediators between lipids andatherosclerosis involve nuclear polymorphs (monocytes/macrophages, lymphocytes) andsmooth muscle cells. The confirmation that oxidized LDL-cholesterol particles are rapidlyassimilated by macrophages, in patients submitted to high levels of cholesterol, suggest thatthese lipoproteins penetrate the inner layer and get oxidized. The pro-inflammatory action ofhypertension increases the formation of hydrogen peroxide and free radicals; thesesubstances reduce the formation of nitric oxide by the endothelium, and increase leukocyteadhesion and peripheral resistance. The endothelium is essential in insulin distribution andits structure may be impaired by cytokines, oxidized lipoproteins, smoking and chronicstress, in patients with type 2 diabetes. Various cytokines have been widely researched in theadipose tissue: TNF-α, IL-6, adiponectine, leptine, resistine and PAI-1. The adiponectine isa specific-collagen plasmatic protein, exclusively expressed in human adipose tissue; theresistine is mainly expressed in the adipose tissue and the leptine is a hormone derived fromadipocyte and is linked to pro-inflammatory cytokines. The binding between adipocines andcardiovascular risk was demonstrated by the relation among plasma levels of adipocines, IL-6 and CRP. IL-6 releases adipocytes, cytokines and increases CRP levels. The contributionof vascular inflammation in the atherosclerotic disease of smokers was demonstrated instudies that evaluated the blood levels of CRP in smokers and non-smokers.

Key words: risk factors, inflammation, atherogenesis.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:193-201)RSCESP (72594)-1613

5. Nogueira Filho J Dislipidemia na síndromemetabólica. In: Dislipidemia – da Teoria à Prá-tica. In: Martinez TLR, ed. São Paulo: EditoraAtheneu; 2004:59-80.

6. Bergman RN, Mittelman SD. Central role ofthe adipocyte in insulin resistance J Basic ClinPhysiol Pharmacol. 1998;9:205-21.

7. Hotamisligil GS, Arner P, Caro JF, et al. Incre-ased adipose tissue expression of tumor necro-sis factor-alpha in human obesity and insulinresistance. J Clin Invest. 1995;95:2409-15.2001;

8. Ashton AW, Ware GM, Kaul DK, et al. Inhibiti-on of tumor necrosis factor alpha-mediated NFKappa B activation and leucocyte adhesion,

Page 85: check up

201RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

ARMAGANIJAN De cols.

Fatores de risco einflamação vascular

with enhanced endothelial apoptosis, by G pro-tein-linked receptor (TP) ligands. J Biol Chem.2003;278:11858-66.

9. Bilsborough W, O’Driscol G, Stanton K, et al.Effect of lowering tumor necrosis factor-alphaon vascular endothelial function in type II dia-betes. Clin Sci. 2001;103:163-9.

10. Ouchi N, Kihara S, Arita Y, et al. Adipocyte-derived plasma protein, adiponectin suppres-ses lipid accumulation and class A scavengerreceptor expression in human monocyte-deri-ved macrophages. Circulation. 2001;103:1057-63.

11. Ziccardi P, Nappo F, Gingliano G, et al. Re-duction of inflammatory cytokine concentra-tions and improvement after weight loss over

one year. Circulation. 2002;105:804-9.12. Willett WC, Green A, Stampfer MJ, et al. Re-

lative and absolute excess risks of coronaryheart disease among women who smoke ciga-rettes. N Engl J Med. 1987;317:1303-9.

13. Bermudez EA, Rifai N, Buring J, et al. Relati-on between markers of systemic vascular in-flammation and smoking in women. Am J Car-diol. 2002;89:1117-9.

14. Mendall MA, Patel P, Ballam L, et al. C-reac-tive protein and its relation to cardiovascularrisk factors: a population based cross sectio-nal study. Br Med J. 1996;312:1061-5.

15. Ridker PM, Buring JE, Rifai N. Soluble P-se-lectin and the risk of future cardiovascularevents. Circulation. 2001;103:491-5.

Page 86: check up

202RSCESPJUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.Inflamação einsuficiênciacardíaca

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, diversos estudos demons-traram o papel significativo de processos inflama-tórios no desenvolvimento de diversas doenças car-diovasculares, muitas delas anteriormente consi-deradas “degenerativas”, como aterosclerose e es-tenose aórtica1. De maneira similar, foi demons-trada a importância da inflamação no desenvolvi-mento e na progressão da cardiomiopatia dilatadae da síndrome da insuficiência cardíaca.

O entendimento da fisiopatologia da insufici-ência cardíaca tem mudado muito nos últimosanos. Primeiramente acreditava-se no mecanismopuramente hemodinâmico, com comprometimen-to tanto da pré- como da pós-carga e da contratili-dade ventricular. Posteriormente introduziu-se oconceito neuro-hormonal, com ativação do siste-ma renina-angiotensina-aldosterona e do sistema

adrenérgico, inclusive com sua participação como“gatilho” para o processo de remodelamento ven-tricular.

Mais recentemente, identificou-se a atividadepró-inflamatória como peça importante, tanto naprogressão da insuficiência cardíaca como no agra-vamento da doença. Diversos estudos têm com-provado o aumento dos níveis de citocinas infla-matórias nos pacientes com insuficiência cardía-ca, como o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α)e a interleucina (IL-6), tanto no plasma como nosleucócitos circulantes. A primeira descrição doachado de concentrações elevadas de fator de TNF-α em pacientes com insuficiência cardíaca foi fei-ta em 1990, por Levine e colaboradores2 (Fig. 1).

Níveis plasmáticos de citocinas inflamatóriasestão relacionados diretamente com a deteriora-ção da classe funcional e a fração de ejeção ven-tricular3. Análises secundárias de alguns estudos,

INFLAMAÇÃO E INSUFICIÊNCIA CARDÍACA

FERNANDO BACAL

CHRISTIANO P. SILVA

VICTOR SARLI ISSA

Unidade de ICC e Transplante – Instituto do Coração (InCor) – HC-FMUSP

Endereço para correspondência:Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar, 44 – Cerqueira César – CEP 05403-904 – São Paulo – SP

A ativação pró-inflamatória exerce papel importante na fisiopatologia da insuficiênciacardíaca. Os mediadores inflamatórios envolvidos no estado de hipercatabolismo, que marcao estágio avançado da doença, são: fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), interleucina-6,interleucina-1 e endotelina. Valores plasmáticos elevados dessas substâncias secorrelacionam com piora da classe funcional, tolerância ao exercício, caquexia cardíaca eóbito. Até o presente momento as drogas que visam ao bloqueio específico dessesmediadores pró-inflamatórios não demonstraram o impacto esperado, do ponto de vista demelhora do prognóstico dos pacientes portadores de insuficiência cardíaca. Novos estudosestão em andamento, com o objetivo de documentar o real impacto e a necessidade dobloqueio do sistema pró-inflamatório.

Palavras-chave: disfunção ventricular, atividade pró-inflamatória, fator de necrose tumoral.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:202-12)RSCESP (72594)-1614

Page 87: check up

203RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.

Inflamação einsuficiência

cardíaca

como o “Studies Of Left Ventricular Dysfuncti-on” (SOLVD)4 e o “Vesnarinone Trial” (VEST)5,demonstraram ainda implicação prognóstica ne-gativa em pacientes com elevação dos níveis séri-cos de citocinas inflamatórias.

ASPECTOS CLÍNICOS EFISIOPATOLOGIA

As principais fontes de citocinas inflamatóri-as são: miocárdio (não necessariamente relacio-nado com a morte de miócitos), leucócitos circu-lantes, plaquetas, células endoteliais, pulmões, fí-gado e macrófagos teciduais.

Pacientes com insuficiência cardíaca freqüen-temente manifestam sinais compatíveis com do-enças inflamatórias, como anorexia, anemia e ca-quexia. Marcadores inflamatórios, como a proteí-na C-reativa (PCR), encontram-se elevados em pa-cientes com insuficiência cardíaca.6 Essas obser-vações e a descoberta de que a caquexia de paci-entes com câncer é mediada por citocinas levarama investigações do papel dessas substâncias em pa-cientes com insuficiência cardíaca.

Nesse contexto, na prática clínica costumeira-mente identificamos emagrecimento progressivoe anorexia em portadores de insuficiência cardía-ca em suas fases mais avançadas. O paciente podeemagrecer em decorrência do baixo débito e daconseqüente má perfusão esplâncnica. A insufici-ência cardíaca direita pode, ainda, levar a empa-

Figura 1. Disfunção ventricular levando ao estado de hipercatabolismo, com participação dos media-dores pró-inflamatórios.

chamento pós-prandial e má absorção dos alimen-tos. Pode, também, ocorrer inapetência, motivadapela orientação de dieta hipossódica, pelo efeitocolateral dos medicamentos e, finalmente, pela li-beração do TNF-α, antigamente denominado ca-quectina.

A liberação dessa citocina é principalmente deorigem miocárdica, secundariamente a baixo dé-bito, hipoxia e aumento de estresse intramiocár-dico, embora também tenha sido identificada li-beração intestinal, como resposta à má perfusãotecidual e à translocação bacteriana tanto intesti-nal como esplâncnica. Diversos estudos confirma-ram esses resultados, demonstrando que pacien-tes com insuficiência cardíaca de etiologia isquê-mica, hipertensiva ou idiopática têm níveis plas-máticos de TNF-α elevados e que esses níveisaumentam de acordo com a gravidade da insufici-ência cardíaca7-9 Além disso, essas citocinas têmvalor prognóstico independente de classe funcio-nal, consumo de oxigênio ou fração de ejeção doventrículo esquerdo.10

Estudos em animais geneticamente modifica-dos demonstraram, ainda, que a expressão aumen-tada de TNF-α em miócitos cardíacos induz o sur-gimento de cardiomiopatia dilatada11 e que podeser atenuada por antagonistas do TNF-α.12 Estu-dos imuno-histoquímicos comprovaram a presen-ça de TNF-α em amostras de miocárdio de paci-entes com cardiomiopatia dilatada.13

O TNF-α tem diversos efeitos que podem es-

Page 88: check up

204RSCESPJUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.Inflamação einsuficiênciacardíaca

tar relacionados ao desenvolvimento da insufici-ência cardíaca: redução da contratilidade miocár-dica,14 apoptose de miócitos cardíacos, remodela-ção da matriz extracelular,15 alterações da perme-abilidade capilar, hipotensão arterial, acidose me-tabólica e indução de caquexia16 (Tab. 1).

Esses efeitos são mediados por dois tipos dereceptores na superfície celular: TNF-R1 e TNF-R2. Após a ligação do TNF-α a seus receptores,estes são liberados da membrana celular, dandoorigem a suas formas solúveis sTNF-R1 e sTNF-R2. Esses fragmentos de receptores mantêm a ca-pacidade de se ligar ao TNF-α e podem inibir oupotencializar seus efeitos, na dependência do mo-delo estudado. As concentrações plasmáticas desTNF-R1 e de sTNF-R2 podem ser úteis para ava-liar a atividade do sistema do TNF-α e encontram-se aumentadas em pacientes com insuficiência car-díaca, principalmente naqueles mais sintomáticos.De maneira similar ao observado com o TNF-α,seus valores aumentam de acordo com a classefuncional, tendo importante valor prognóstico,independentemente de variáveis clínicas ou fun-cionais. Em mais uma evidência a favor da impor-tância do TNF-α na insuficiência cardíaca, o an-tagonismo da ação do TNF-α com etanercept, umamolécula sintética derivada do sTNF-R2, parecemelhorar a função ventricular.17

Estudos epidemiológicos têm sugerido que,associados ao TNF-α, níveis séricos elevados deproteína C-reativa podem constituir risco poten-cial para o desenvolvimento de insuficiência car-díaca18. Também tem sido descrito que o aumentoda proteína C-reativa eleva a mortalidade em pa-cientes com cardiomiopatia dilatada19. A proteínaC-reativa é uma proteína inflamatória associada àsecreção de outras citocinas, como TNF-α, IL-6 eIL-1. Modelos “in vitro” demonstram que a pro-teína C-reativa induz a liberação de TNF-α pelosmacrófagos humanos. Provavelmente há uma açãosinérgica entre o TNF-α e a proteína C-reativa napatogênese da cardiomiopatia dilatada20.

A IL-6 também foi estudada em diversos gru-

Tabela 1. Efeitos do TNF-α na insuficiência car-díaca.

1. Disfunção vascular2. Estresse oxidativo3. Apoptose4. Proteólise5. Ativação imune6. Efeito inotrópico negativo7. Aumento do metabolismo basal8. Anorexia

pos de pacientes com insuficiência cardíaca. Em1996, Torre-Amione e colaboradores descreveramque os níveis plasmáticos de TNF-α e de IL-6 seencontravam elevados em portadores de insufici-ência cardíaca em classes funcionais I a III.21 Mun-ger e colaboradores relataram o achado de con-centrações elevadas de IL-6 no plasma de pacien-tes em classes funcionais II a IV.22 Anker e cola-boradores descreveram níveis plasmáticos eleva-dos de IL-6 em portadores de insuficiência cardí-aca e caquexia cardíaca.23 Orus e colaboradoresrelataram que a IL-6 era um fator de risco paraóbito, necessidade de hospitalização por insufici-ência cardíaca ou necessidade de transplante car-díaco, independentemente da classe funcional ede outros marcadores de ativação neuro-hormo-nal e inflamatória.24 Mais recentemente, Deswal ecolaboradores, em um estudo de 1.169 pacientes,encontraram níveis aumentados de IL-6 em cercade 30% dos pacientes em classes funcionais III eIV, e demonstraram que níveis mais elevados deIL-6 estão associados a pior prognóstico.25

Outra citocina, a endotelina, também tem re-levante impacto na fisiopatologia da insuficiênciacardíaca26. Esse peptídeo vasoativo tem importan-te papel vasoconstritor, resultando em remodela-mento vascular pulmonar e conseqüente hiperten-são e hiper-resistência vascular pulmonar, aspec-tos fundamentais na evolução clínica, no prognós-tico e no planejamento do tratamento cirúrgico, jáque pode se tornar fator limitante para indicaçãode transplante cardíaco.

Outras citocinas pró-inflamatórias (IL-1, IL-18) também foram estudadas em pacientes cominsuficiência cardíaca, mas os resultados obtidosainda não permitem definir um quadro claro deseu comportamento na insuficiência cardíaca.27, 28

Alguns trabalhos sugerem que as concentra-ções de citocinas antiinflamatórias, como IL-10e “transforming growth factor beta 1”, tambémse encontram elevadas em pacientes com insu-ficiência cardíaca, possivelmente não sendo su-ficiente para compensar o desequilíbrio existentee que favorece a manutenção do processo infla-matório.29, 30

RELAÇÃO ENTRE INFLAMAÇÃO EETIOLOGIA DA CARDIOMIOPATIA

As evidências disponíveis sugerem que a in-suficiência cardíaca é um estado pró-inflamatórioe que a inflamação crônica pode estar relacionadaà evolução da doença e ao prognóstico dos paci-entes. Entretanto, esse modelo não é uniformemen-te aplicável. Apenas uma fração (40% a 60% namaioria dos estudos) dos pacientes tem concen-trações aumentadas de citocinas pró-inflamatóri-

Page 89: check up

205RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.

Inflamação einsuficiência

cardíaca

as no plasma, e há evidências de que a ativaçãoinflamatória seja modulada pela etiologia da do-ença cardíaca.

Hogye e colaboradores estudaram portadoresde cardiomiopatia dilatada em classe funcionalavançada e pacientes com cardiomiopatia hiper-trófica sem disfunção ventricular importante (emclasse funcional média 1,5 da “New York HeartAssociation” – NYHA)31. Os níveis séricos de IL-6 e TNF-α foram encontrados elevados nos dila-tados, mas apenas a IL-6 permanecia elevada noshipertróficos, o que sugere a possibilidade de essacitocina não se relacionar apenas com o grau dedisfunção ventricular.

Mocelin e colaboradores investigaram a ativa-ção inflamatória na cardiopatia chagásica, em tra-balho desenvolvido no Instituto do Coração (In-Cor/HC-FMUSP). Essa afecção, caracterizada pormiocardite crônica, poderia resultar em padrõesde atividade inflamatória diferentes dos descritosem outras etiologias de insuficiência cardíaca.Nesse trabalho foram comparadas as concentra-ções de TNF-α, sTNF-R1 e IL-6 no plasma depacientes com insuficiência cardíaca decorrentede cardiopatia chagásica ou de cardiomiopatia di-latada idiopática32. Foi observado que: a) as con-centrações plasmáticas de TNF-α e IL-6 em por-tadores de cardiomiopatia chagásica foram signi-ficativamente maiores que em indivíduos normais;b) as concentrações plasmáticas de TNF-α e IL-6em portadores de etiologia chagásica foram signi-ficativamente maiores que as observadas em paci-entes dilatados idiopáticos, após estratificação pelaclasse funcional (Figs. 2 e 3); c) as concentraçõesde sTNF-R1 foram significativamente menores nospacientes chagásicos que nos portadores de cardi-omiopatia dilatada idiopática, após estratificaçãopela classe funcional; e d) as concentrações plas-máticas de IL-6 estiveram significativamente as-sociadas à ocorrência de óbito ou transplante car-díaco em situação de prioridade para ambos osgrupos de pacientes.

Acredita-se que também em pacientes com car-diomiopatia dilatada idiopática o sistema inflama-tório possa ter papel fisiopatológico. Aceita-se atu-almente que essa etiologia reúna grupo heterogê-neo de pacientes. Possíveis etiologias para cardi-omiopatias categorizadas como idiopáticas são: 1)condições clínicas cuja relação causal com a car-diomiopatia não é evidente ou não é passível com-provação em bases clínicas (como, por exemplo,diabetes melito e obesidade); 2) mutações genéti-cas, que podem envolver diferentes proteínas docitoesqueleto e do sarcômero de cardiomiócitos,encontradas em 30% a 50% dos pacientes comcardiomiopatia dilatada idiopática33 (algumas for-mas da doença têm caráter familiar, encontrando-

se doença cardíaca em 20% a 65%4 das famíliasde pacientes com cardiomiopatia dilatada); 3) auto-imunidade, hipótese formulada a partir do achadode infiltrado inflamatório na ausência de agentesinfecciosos identificáveis em tecido miocárdico,aumento da expressão de moléculas do complexomaior de histocompatibilidade e presença de auto-anticorpos circulantes em pacientes com cardio-miopatia dilatada;34, 35 4) miocardite infecciosa, emque o genoma viral tem sido detectado em 10% a71% dos pacientes com cardiomiopatia dilatada36-38.Outros agentes etiológicos também têm sido des-critos.39 Entretanto, a relação causal entre o acha-do de agentes infecciosos e o desenvolvimento dedoença ainda é motivo de debate. Os mecanismospelos quais agentes infecciosos podem levar a le-são miocárdica incluem agressão direta a cardio-miócitos, imunomodulação e indução de defeitosnos mecanismos de contração e relaxamento mio-cárdicos.40 O modelo atualmente proposto prevêocorrência de lesão tecidual inicial causada poração direta do agente infeccioso. Acredita-se quedurante o processo inflamatório decorrente daagressão infecciosa possam surgir fenômenos auto-imunes, envolvendo tanto a imunidade celularcomo a imunidade humoral.41, 42 Agressões repeti-das ao miocárdio, seja por exposição recorrenteao agente infeccioso seja por processo inflamató-rio persistente, culminariam com o desenvolvimen-to de cardiomiopatia dilatada.

PAPEL DO TRATAMENTOANTIINFLAMATÓRIO NAINSUFICIÊNCIA CARDÍACA

O tratamento moderno da insuficiência cardí-aca ainda não é suficiente para conter os signifi-cativos números relacionados à mortalidade dospacientes, o que pode sugerir que algum outro me-canismo fisiopatológico importante mantém-seativo e sem modalidades terapêuticas específicas.A atividade inflamatória na insuficiência cardíacapode ter papel nesse processo, o que desperta in-teresse na descoberta de agentes específicos parainibir a imunopatogênese da doença.

Adamopoulos e colaboradores demonstraramque o treinamento físico pode reduzir citocinas in-flamatórias, como TNF-α e IL-6, enquanto o “des-treinamento” tem papel oposto43.

O primeiro imunomodulador a mostrar bene-fício na insuficiência cardíaca foi a pentoxifilina.Em portadores de cardiomiopatia dilatada, o usodessa medicação melhorou os sintomas e aumen-tou a fração de ejeção do ventrículo esquerdo. En-tretanto, esses efeitos podem ter maior relação como fato de a pentoxifilina ser um inibidor de fosfo-diesterase que com sua ação imunomoduladora44.

Page 90: check up

206RSCESPJUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.Inflamação einsuficiênciacardíaca

As estatinas possuem ação imunomoduladora,antitrombótica, protetora da função endotelial eantiinflamatória, e também reduzem o colesterol45.Além de inibir a produção de citocinas, como aIL-1ß, no endotélio, as estatinas têm mostrado re-duzir a inflamação e a produção de radicais livresna parede vascular46. Estudos “in vitro” e em mo-delos animais têm demonstrado prevenção do de-senvolvimento de hipertrofia miocárdica com o usode estatinas, o que sugere o potencial benefício douso dessas medicações na insuficiência cardíaca47.

Por causa do importante papel do TNF-α nafisiopatologia da insuficiência cardíaca, a modu-lação terapêutica dessa citocina tem recebido muita

Figura 2. Distribuição das concentrações plasmáticas de IL-6, de acordo com a etiologia e a classefuncional. (Adaptado de Mocelin e colaboradores32.)

atenção (Tab. 2). Entretanto, estudos clínicos cometanercept (Fig. 4)48, droga redutora da bioativi-dade do TNF-α (“Randomized Etanercept World-wide Evaluation” – RENEWAL49), foram inter-rompidos precocemente pela falta de eficácia, eum estudo com infliximab (anticorpo monoclonalanti-TNF-α) foi associado a aumento de hospita-lizações e mortalidade no grupo intervenção(“Anti-TNF Therapy Against Congestive Heartfailure” – ATTACH50).

Da mesma forma, a tentativa de bloquear pro-cessos inflamatórios e imunológicos relacionadosao desenvolvimento de cardiomiopatia após infec-ção levou diferentes autores a experimentar regi-

Page 91: check up

207RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.

Inflamação einsuficiência

cardíaca

Figura 3. Distribuição das concentrações plasmáticas de TNF-α, de acordo com a etiologia e a classefuncional. (Adaptado de Mocelin e colaboradores32.)

mes de imunossupressão em pacientes tanto nasfases iniciais da doença (miocardite aguda) comonas fases tardias (cardiomiopatia dilatada). Emanálise de pacientes com diagnóstico etiológicode miocardite e presença de disfunção ventricularesquerda, o uso de imunossupressores não trouxebenefício adicional ao tratamento;51 nessa condi-ção, a presença de elevação de marcadores de ati-vidade inflamatória (elevação de imunoglobulinas,elevação da contagem de leucócitos em sangueperiférico, aumento da atividade de células “natu-ral killer” e de macrófagos) foram fatores de pro-teção, relacionados e de melhor prognóstico. Dessaforma, acredita-se que em fases iniciais do pro-cesso fisiopatológico a inflamação seja protetorae o uso de imunossupressores não traga benefício.

Entretanto, em pacientes com cardiomiopatiadilatada idiopática crônica, foi testada imunossu-pressão com prednisona. Houve melhora transitó-ria da fração de ejeção com a administração deprednisona, especialmente nos pacientes com evi-dências histológicas miocárdicas e laboratoriais de

atividade inflamatória.52

Os resultados obtidos com essas experiênciasiniciais sugerem que os pacientes com cardiomio-patia dilatada de possível origem infecciosa po-dem se apresentar em diferentes estágios fisiopa-tológicos da doença, podendo ser variável o papeldo agente infeccioso e do processo inflamatóriopara cada um desses momentos. Por conseguinte,a interferência terapêutica em cada um dos mo-mentos produz resultados diversos. Vale ressaltarque tais estágios são eventos fisiopatológicos des-contínuos ao longo do tempo, de caráter recorren-te e superpostos, e que sua determinação com baseem dados clínicos é limitada. A comprovação daparticipação de cada um desses componentes emdeterminado momento evolutivo da doença care-ce de demonstração histopatológica e caracteriza-ção imunológica.

Buscando encontrar grupos de pacientes commelhor resposta a tratamento, estudo com 202 pa-cientes portadores de cardiomiopatia dilatada en-controu evidência histológica de atividade infla-

Page 92: check up

208RSCESPJUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.Inflamação einsuficiênciacardíaca

Figura 4. Análise de Kaplan-Meyerpara “end-point” primário no “Ran-domized Etanercept Worldwide Eva-luation” – RENEWAL. (Adaptado deMann e colaboradores.48)

matória (definida como aumento de expressão demoléculas do HLA) em 84 pacientes. Esses paci-entes foram, então, randomizados para receberimunossupressão (prednisona + azatioprina) ouplacebo por três meses. Houve melhora no grupoque recebeu imunossupressão no que se refere aclasse funcional, fração de ejeção, diâmetro dias-tólico ventricular esquerdo e volume diastólicoventricular esquerdo.53 Não houve diferença namortalidade. Sugere-se, portanto, que subgruposde pacientes com cardiomiopatia dilatada e per-sistência de inflamação podem se beneficiar de tra-tamento imunossupressor.

Finalmente, estudos recentes têm avaliado oimpacto da administração de interferon a pacien-

Tabela 2. Principais estudos clínicos com anticitocinas.

Objetivos ObjetivosEstudo n primários Resultados secundários Resultados

RENEWAL 2.048 Morte ou p = 0,33 Mortalidade geral p = 0,39hospitalizaçãopor insuficiênciacardíaca

RENAISSANCE 925RECOVER 1.123ATTACH 150 Morte ou p < 0,05* — —

hospitalizaçãopor insuficiênciacardíaca

* Diferença encontrada entre placebo e infliximab 10 mg/kg. Não foi encontrada diferença entre pla-cebo e infliximab 5 mg/kg.n = número de pacientes; RENEWAL = “Randomized Etanercept Worldwide Evaluation”; RENAIS-SANCE = “Randomized Etanercept North American Estrategy to Study Antagonism of Cytokines”;RECOVER = “Research into Etanercept: Cytokines Antagonism in Ventricular Dysfunction”; ATTA-CH = “Anti-TNF Therapy Against Congestive Heart failure”.

tes com cardiomiopatia dilatada. Os interferons fo-ram originalmente identificados e nomeados porsua capacidade de interferir com a replicação vi-ral. Por possuírem efeitos imunomoduladores, sãocapazes, por exemplo, de aumentar a expressãomolecular do complexo maior de histocompatibi-lidade e estimular os efeitos líticos de linfócitos Tcitotóxicos e de macrófagos. Um estudo avaliou oefeito do interferon beta em 22 pacientes com car-diomiopatia dilatada e persistência de genoma deenterovírus (14 pacientes) e adenovírus (8 paci-entes) no miocárdio.9 Houve aumento da fraçãode ejeção e redução dos diâmetros do ventrículoesquerdo após o tratamento. Não há, entretanto,estudos que tenham avaliado de maneira contro-

Page 93: check up

209RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.

Inflamação einsuficiência

cardíaca

lada e prospectiva essa questão.Estudo recente selecionou 82 pacientes com

achado de genoma viral e existência de atividadeinflamatória (segundo critérios imuno-histológi-cos, que incluíam a contagem de células CD2, bemcomo expressão de HLA I, HLA II, CD 68, e CD54) para receber imunossupressão (prednisolona)ou interferon beta. O tratamento foi seguro e hou-ve melhora em todos os grupos de tratamento.54

A aplicação de imunoglobulinas por via intra-venosa também é controversa na insuficiência car-díaca. Esses agentes parecem ter papel duplo so-bre as citocinas, promovendo aumento em algunsmediadores, como IL-10, e diminuição em outros,como IL-8 e IL-155.

Devemos lembrar também que as citocinas for-mam uma rede altamente complexa e redundante,

com efeitos múltiplos e predominantemente pará-crinos. É possível que a inibição de apenas umdos componentes desse sistema não seja eficaz,como foi observado em estudos de pacientes comsepse,56 e que apenas com o desenvolvimento denovas estratégias anticitocinas possamos modifi-car, com sucesso, esse mecanismo fisiopatológi-co. Até o presente momento, as estratégias tera-pêuticas que visaram ao bloqueio específico dascitocinas, por meio de novas drogas ou até mesmode anticorpos monoclonais, não atingiram os re-sultados esperados. No entanto, o controle dessecomplexo sistema de ativação pró-inflamatóriopermanece alvo de investigações, principalmentepelo fato de sua relação direta com a pior evolu-ção e o prognóstico dos pacientes portadores deinsuficiência cardíaca.

REFERÊNCIAS

1. Kaplan RC, Frishman WH. Systemic inflam-mation as a cardiovascular disease risk factorand as a potential target for drug therapy. He-art Dis. 2001;3(5):326-32.

INFLAMMATION AND CONGESTIVE HEART FAILURE

FERNANDO BACAL

CHRISTIANO P. SILVA

VICTOR SARLI ISSA

The pro-inflammatory activation plays an important role in the pathophysiology of cardiacheart failure. The inflammatory markers involved in this process specially in end stage ofheart failure progression are tumoral necrosis factor (TNF-α), interleuquin-6, interleuquin-1and endotelin. Elevated plasmatic levels of this citokines are related with worse prognosis,functional class, exercise tolerance, caquexia and death. At this moment, the drugs tested toblockade the citokines activation didn’t show improvement in the prognosis of patients withheart failure, however new studies are being performed to explain the real importance of thepro-inflammatory process, activated in patients with heart failure.

Key words: ventricular dysfunction, citokines, pro-inflammatory activation, tumoralnecrosis factor.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:202-12)RSCESP (72594)-1614

2. Levine B, Kalman J, Mayer L, Fillit HM, Pa-cker M. Elevated circulating levels of tumornecrosis factor in severe chronic heart failu-re. N Engl Med. 1990;323:236-41.

3. Kurian KC, Rai P, Sankaran S, Jacob B, ChiongJ, Miller AB. The effect of statin in heart failu-

Page 94: check up

210RSCESPJUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.Inflamação einsuficiênciacardíaca

re: beyond its cholesterol lowering effect. JCard Fail. 2006;12(6):473-8.

4. Seta Y, Shan K, Bozkurt B, Oral H, Mann DL.Basic mechanisms in heart failure: the cytoki-ne hypothesis. J Card Fail. 1996;2:243-9.

5. Deswal A, Petersen NJ, Feldman AM, YoungJB, White BG, Mann DL. Cytokines andcytokine receptors in advanced heart failure:an analysis of the cytokine database from theVesnarinone Trial (VEST). Circulation.2001;103:2055-9.

6. Alonso-Martinez JL, Llorente-Diez B, Echega-ray-Agara M, Olaz-Preciado F, Urbieta-Eche-zarreta M, Gonzalez-Arencibia C. C-reactiveprotein as a predictor of improvement and rea-dmission in heart failure. Eur J Heart Fail.2002;4(3):331-6.

7. Satoh M, Nakamura M, Saitoh H, et al. Tumornecrosis factor-alpha-converting enzyme andtumor necrosis factor-alpha in human dilatedcardiomyopathy. Circulation. 1999;99:3260-5.

8. Satoh M, Nakamura M, Akatsu T, et al. Toll-like receptor 4 is expressed with enteroviralreplication in myocardium from patients withdilated cardiomyopathy. Lab Invest.2004;84:173-81.

9. Cicoira M, Bolger AP, Doehner W, RauchhausM, Davos C, Sharma R, et al. High tumour ne-crosis factor-alpha levels are associated withexercise intolerance and neurohormonal acti-vation in chronic heart failure patients. Cytoki-ne. 2001;15:80-6.

10. Rauchhaus M, Doehner W, Francis DP, DavosC, Kemp M, Liebenthal C, et al. Plasma cytoki-ne parameters and mortality in patients withchronic heart failure. Circulation. 2000;102:3060-7.

11. Kubota T, McTiernan CF, Frye CS, SlawsonSE, Lemster BH, Koretsky AP, et al. Dilatedcardiomyopathy in transgenic mice with car-diac-specific overexpression of tumor necro-sis factor-alpha. Circ Res. 1997;81:627-35.

12. Kubota T, Bounoutas GS, Miyagishima M,Kadokami T, Sanders VJ, Bruton C, et al. So-luble tumor necrosis factor receptor abrogatesmyocardial inflammation but not hypertrophyin cytokine-induced cardiomyopathy. Circula-tion. 2000;101(21):2518-25.

13. Habib FM, Springall DR, Davies GJ, OakleyCM, Yacoub MH, Polak JM. Tumour necrosisfactor and inducible nitric oxide synthase indilated cardiomyopathy. Lancet. 1996;347:1151-5.

14. Kelly RA, Smith TW. Cytokines and cardiaccontractile function. Circulation. 1997;95:778-81.

15. Li YY, Feng YQ, Kadokami T, McTiernam CF,

Draviam R, Watkins SC, et al. Myocardial ex-tracellular matrix remodeling in transgenicmice overexpressing tumor necrosis factor al-pha can be modulated by anti-tumor necrosisfactor alpha therapy. Proc Natl Acad Sci USA.2000;97:12746-51.

16. Beutler B, Cerami A. Cachectin: more than atumor necrosis factor. N Engl J Med.1987;316:379-85.

17. Bozkurt B, Torre-Amione G, Warren MS,Whitmore J, Soran OZ, Feldman AM, et al.Results of targeted anti-tumor necrosis factortherapy with etanercept (ENBREL) in patientswith advanced heart failure. Circulation.2001;103:1044-7.

18. Vasan RS, Sullivan LM, Roubenoff R, et al.Inflammatory markers and risk of heart failu-re in elderly subjects without prior myocardialinfarction: the Framingham Heart Study. Cir-culation. 2003;107:1486-91.

19. Kaneko K, Kanda T, Yamauchi Y, et al. C-re-active protein in dilated cardiomyopathy. Car-diology. 1999;91:215-9.

20. Satoh M, Nakamura M, Akatsu T, Shimoda Y,Segawa I, Hiramori K. C-reactive protein co-expresses with tumor necrosis factor-alpha inthe myocardium in human dilated cardiomyo-pathy. Eur J Heart Fail. 2005;7:748-54.

21. Torre-Amione G, Kapadia S, Benedict C, OralH, Young JB, Mann DL. Proinflammatorycytokine levels in patients with depressed leftventricular ejection fraction: a report from theStudies of Left Ventricular Dysfunction (SOL-VD). J Am Coll Cardiol. 1996;27:1201-6.

22. Munger MA, Johnson B, Amber IJ, CallahanKS, Gilbert EM. Circulating concentrations ofproinflammatory cytokines in mild or mode-rate heart failure secondary to ischemic or idi-opathic dilated cardiomyopathy. Am J Cardi-ol. 1996;77:723-7.

23. Anker SD, Ponikowski PP, Clark AL, Leyva F,Rauchhaus M, Kemp M, et al. Cytokines andneurohormones relating to body compositionalterations in the wasting syndrome of chronicheart failure. Eur Heart J. 1999;20:683-93.

24. Orus J, Roig E, Perez-Villa F, Pare C, AzquetaM, Filella X, Heras M, Sanz G, et al. Prognos-tic value of serum cytokines in patients withcongestive heart failure. J Heart Lung Trans-plant. 2000;19:419-25.

25. Deswal A, Petersen NJ, Feldman AM, YoungJB, White BG, Mann DL. Cytokines andcytokine receptors in advanced heart failure:an analysis of the cytokine database from theVesnarinone Trial (VEST). Circulation.2001;103:2055-9.

26. Cody RJ, Haas GJ, Binkley PF, et al. Plasma

Page 95: check up

211RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.

Inflamação einsuficiência

cardíaca

endotelin correlates with the extent of pulmo-nary hypertension in patients with chronic con-gestive heart failure. Circulation. 1992;85:504-9.

27. Testa M, Yeh M, Lee P, Fanelli R, Loperfido F,Berman JW, et al. Circulating levels of cytoki-nes and their endogenous modulators in pati-ents with mild to severe congestive heart fai-lure due to coronary artery disease or hyper-tension. J Am Coll Cardiol. 1996;28(4):964-71.

28. Yamaoka-Tojo M, Tojo T, Inomata T, MachidaY, Osada K, Izumi T. Circulating levels of in-terleukin 18 reflect etiologies of heart failure:Th1/Th2 cytokine imbalance exaggerates thepathophysiology of advanced heart failure. JCard Fail. 2002;8(1):21-7.

29. Yamaoka M, Yamaguchi S, Okuyama M, To-moike H. Anti-inflammatory cytokine profilein human heart failure: behavior of interleu-kin-10 in association with tumor necrosis fac-tor-alpha. Jpn Circ J. 1999;63(12):951-6.

30.Aukrust P, Ueland T, Lien E, Bendtzen K, Mul-ler F, Andreassen AK, et al. Cytokine networkin congestive heart failure secondary to ische-mic or idiopathic dilated cardiomyopathy. AmJ Cardiol. 1999;83(3):376-82.

31. Hogye M, Mandi Y, Csanády M, Sepp R, Bu-zás K. Comparison of circulating levels of in-terleukin-6 and tumor necrosis factor-alpha inhypertrophic cardiomyopathy and in idiopathicdilated cardiomyopathy. Am J Cardiol.2004;94:249-51.

32. Mocelin AO, Issa VS, Bacal F, Guimarães GV,Cunha E, Bocchi EA. The influence of aetio-logy on inflammatory and neurohumoral acti-vation in patients with severe heart failure: Aprospective study comparing Chagas’ heartdisease and idiopathic dilated cardiomyopathy.Eur J Heart Fail. 2005;7:869-73.

33. Burkett EL, Hershberger RE. Clinical and ge-netic issues in familial dilated cardiomyopa-thy. J Am Coll Cardiol. 2005;45(7):969-81.

34. Herskowitz A, Ahmed-Ansari A, Neumann DA,et al. Induction of major histocompatibilitycomplex antigens within the myocardium ofpatients with active myocarditis: a nonhistolo-gic marker of myocarditis. J Am Coll Cardiol.1990;15:624-32.

35. Caforio ALP, Bonifacio E, Stewart JT, et al.Novel organ-specific circulating autoantibodi-es in dilated cardiomyopathy. J Am Coll Car-diol. 1990;15:1527-34.

36. Kühl U, Pauschinger M, Schwimmbeck PL,Seeebrg B, Lober C, Noutsias M, et al. Inter-feron-beta treatment eliminates cardiotropicviruses and improves left-ventricular function

in patients with myocardial persistence of vi-ral genomes and left ventricular dysfunction.Circulation. 2003;107:2793-8.

37. Kühl U, Pauschinger M, Noutsias M, SeebergB, Bock T, Lassner D, et al. High prevalenceof viral genomes and multiple viral infectionsin the myocardium of adults with “idiopathic”left-ventricular dysfunction. Circulation.2005;111:887-93.

38. Why HJF, Meany BT, Richardson PJ, OlsenAGJ, Bowles NE, Cunningham L, et al. Clini-cal and prognostic significance of detection ofenteroviral RNA in the myocardium of pati-ents with myocarditis or dilated cardiomyopa-thy. Circulation, 1994;89:2582-9.

39. Calabrese F, Thiene G. Myocarditis and in-flammatory cardiomyopathy: microbiologicaland molecular biological aspects. CardiovascRes. 2003;60:11-25.

40. Wessely R, Klingel K, Santana LF, Dalto N,Hongo M, Lederer J, et al. Transgenic expres-sion of replication-restricted enteroviral geno-mes in heart muscle induces defective excita-tion-contraction coupling and dilated cardio-myopathy. J Clin Invest. 1998;102:1444-53.

41. Woodruff JF, Woodruff JJ. Involvement of Tlymphocytes in the pathogenesis of coxsackieB3 heart disease. J Immunol. 1974;113:1723-6.

42. Weller AH, Simpson K, Herzum M, Van Hou-ten N, Huber AS. Coxsackievirus-B3-inducedmyocarditis: virus receptor antibodies modu-late myocarditis, J Immunol. 1989;143:1843-50.

43. Adamopoulos S, Parissis J, Karatzas D, Krou-pis C, Georgiadis M, Karavolias G, et al. Phy-sical training modulates proinflammatorycytokines and the soluble Fas/soluble Fas li-gand system in patients with chronic heart fai-lure. J Am Coll Cardiol. 2002;39:653-63.

44. Skudicky D, Bergemann A, Sliwa K, CandyG, Sareli P. Beneficial effects of pentoxifylli-ne in patients with idiopathic dilated cardio-myopathy treated with angiotensin-convertingenzyme inhibitors and carvedilol. Circulation.2001;103:1083-8.

45. Kwak B, Mulhaup F, Myit S, Mach F. Statinsas a newly recognized type of immunomodu-lator. Nat Med. 2000;6:1399-402.

46. Bohm M, Hjalmarson A, Kjekshus J, Laufs U,McMurray J, van Veldhuisen DJ. Heart failureand statins: why do we need a clinical trial? ZKardiol. 2005;94:223-30.

47. Takemoto M, Node K, Nakagami H, Liao Y,Grimm M, Takemoto Y, et al. Statins as antio-xidant therapy for preventing cardiac myocytehypertrophy J Clin Invest. 2001;108:1429-37.

Page 96: check up

212RSCESPJUL/AGO/SET 2006

BACAL Fe cols.Inflamação einsuficiênciacardíaca

48. Mann DL, McMurray JJV, Packer M, et al.Targeted anticytokine therapy in patients withchronic heart failure: results of the Randomi-zed Etanercept Worldwide Evaluation (RE-NEWAL). Circulation. 2004;109:1594-602.

49. Louis A, Cleland JGF, Crabbe S, Ford S, Tha-ckray S, Houghton T, et al. Clinical trial upda-te. Eur J Heart Fail. 2002;3:381-7.

50. Lisman KA, Stetson SJ, Koerner T, StetsonSJ, Koerner MM, Farmer JA, et al. The role oftumor necrosis factor-alpha in the treatment ofcongestive heart failure. Congest Heart Fail.2002;8:275-9.

51. Mason JW, O’Connell JB, Herskowitz A, RoseNR, McManus B, Billingham ME, et al., andthe Myocarditis Treatment Trial Investigators.A clincal trial of immunosuppresive therapyfor myocarditis. N Engl J Med. 1995;333(5):269-75.

52. Parillo JE, Cunnion RE, Epstein SE, ParkerMT, Suffredini AF, Brenner M, et al. A pros-pective randomized controlled trial of predni-sone for dilated cardiomyopathy. N Engl J

Med. 1989;321:1061-8.53. Wojnicz R, Nowalany-Kozielska E, Wojcie-

chowska C, Glanowska G, Wilczewski P, Nik-lewski T, et al. Randomized placebo-control-led study for imunosuppressive treatment ofinflammatory dilated cardiomyopathy: two-year follow-up results. Circulation. 2001;104(1):39-45.

54. Zimmermann O, Kochs M, Zwaka TP, KayaZ, Lepper PM, Bienek-Ziolkowski M, et al.Myocardial biopsy based classification and tre-atment in patients with dilated cardiomyopa-thy. Int J Cardiol. 2005;104(1):92-100.

55. Gullestad L, Aukrust P. Review of trials inchronic heart failure showing broad-spectrumanti-inflammatory approaches. Am J Cardiol.2005;95 Suppl:17C–23C.

56. Huber TS, Gaines GC, Welborn MB 3rd, Ro-senberg JJ, Seeger JM, Moldawer LL. Anti-cytokine therapies for acute inflammation andthe systemic inflammatory response syndro-me: IL-10 and ischemia/reperfusion injury asa new paradigm. Shock. 2000;13(6):425-34.

Page 97: check up

213RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco e

inflamação

REGENERAÇÃO ENDOTELIAL PELASCÉLULAS PROGENITORAS ENDOTELIAIS

A integridade e a atividade funcional da ca-mada endotelial têm papel crítico na formação daaterosclerose. Lesão do endotélio promovida pe-los fatores de risco induz uma cascata de eventospró-inflamatórios na parede vascular, resultandona infiltração de monócitos e na proliferação decélulas musculares lisas vasculares1, 2. No campomolecular, a disfunção endotelial é caracterizadapela redução da biodisponibilidade de óxido nítri-

CÉLULAS-TRONCO E INFLAMAÇÃO

PAULO FERREIRA LEITE

Unidade Clínica de Coronariopatias Crônicas – Instituto do Coração (InCor) – HC-FMUSP

Endereço para correspondência:Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar, 44 – CEP 05403-904 – São Paulo – SP

A inflamação tem papel importante na doença cardiovascular. Fatores tradicionais de riscocomo diabetes, tabagismo, hipertensão arterial e dislipidemia podem induzir respostainflamatória nas células endoteliais, promovendo apoptose e perda da integridade endotelial.Como conseqüência, ocorre aumento da permeabilidade endotelial vascular, facilitando amigração de monócitos e a proliferação de células musculares lisas, formando a lesãoaterosclerótica. Evidências recentes sugerem que células progenitoras endoteliais circulantesprovenientes da medula óssea parecem ter função regeneradora importante no endotéliovascular sob certos estresses. Essa regeneração pode ocorrer pela secreção de fatoresangiogênicos ou talvez pela incorporação direta de tais células na parede vascular, limitandoassim a doença aterosclerótica. Todavia, fatores de risco promotores da inflamação vascularreduzem o número e a atividade funcional de células progenitoras endoteliais circulantes,diminuindo seu potencial terapêutico. Neste artigo são discutidos o conceito e asdificuldades em caracterizar uma célula progenitora endotelial, além de se explorar de queforma o ambiente inflamatório pode interagir com tais células circulantes. Por fim, sãodestacadas algumas terapias que parecem melhorar a função reparadora das célulasprogenitoras endoteliais, reduzindo assim a influência dos fatores pró-ateroscleróticos naparede vascular.

Palavras-chave: inflamação, células progenitoras endoteliais, endotélio, fatores de risco,aterosclerose.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:213-22)RSCESP (72594)-1615

co3. Esses processos podem levar a formação deaterosclerose, ruptura da placa e infarto do mio-cárdio, que é ainda a principal causa de morte nosdias atuais1. Dessa forma, a manutenção da inte-gridade endotelial é crucial na prevenção dos pro-cessos. Evidências recentes sugerem que fatoresde risco para doença coronária promovem apop-tose e descamação de células endoteliais4, 5. Célu-las que descamam do endotélio são hoje chama-das de células endoteliais circulantes, sendo usa-das como biomarcadores de presença e avanço dalesão endotelial (Fig. 1)6. Pela citometria de fluxo

Page 98: check up

214RSCESPJUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco einflamação

é possível enumerá-las e caracterizá-las. Marca-dores como anexina V (apoptose), CD31/146 (en-dotélio) e CD106 (marca ativação das células en-doteliais pela inflamação) são usados na quantifi-cação de tais células no sangue6. Como essas cé-lulas são extremamente raras no sangue periféri-co de humano adulto (0,01%), é necessário usarquantidade maior de sangue (ou seja, 200 µl) quan-do se utiliza a citometria de fluxo (comunicaçãopessoal).

Até recentemente, acreditava-se que a renova-ção das células endoteliais era muito lenta e feitapela proliferação e pela extensão de células endo-teliais vizinhas (angiogênese). Em condições fisi-ológicas, vasos sanguíneos de adultos se regene-ram lentamente. A meia-vida de uma célula endo-telial de um adulto foi descrita como sendo de 3,1anos. Mais recentemente, contudo, alguns estudos

Figura 1. Regeneração endotelial após lesão vascular. A) Fatores de risco para doença arterial coroná-ria lesam o endotélio e, como conseqüência, causam apoptose e descamação de células endoteliais.Essas células são denominadas células endoteliais circulantes (CECs) e podem ser mensuradas pelacitometria de fluxo no sangue periférico. B) O processo regenerativo endotelial pode ocorrer por duasvias: 1) pela proliferação e migração de células endoteliais maduras localizadas na vizinhança da célulaendotelial lesada (angiogênese); e 2) pela migração de células-tronco da medula óssea na parede vascu-lar, liberando fatores angiogênicos, ou talvez pela incorporação direta de células progenitoras endote-liais (EPCs) circulantes no endotélio (vasculogênese). Esse processo ainda não está claro.

demonstraram que existe um mecanismo adicio-nal de reparação do endotélio vascular. Enxertosde dácron implantados em vasos de cachorros fo-ram rapidamente cobertos com células CD34+ de-rivadas de medula óssea7. Estudos adicionais de-monstraram que a transfusão sistêmica ou a mo-bilização intrínseca de células progenitoras endo-teliais aceleram a restauração do endotélio lesadomecanicamente, resultando no menor espessamen-to da camada neo-intimal8. O grau de incorpora-

ção de células CD34+ na parede vascular é direta-mente proporcional à extensão da lesão, ou seja,quanto mais intensa for a lesão mecânica vascularmaior será a incorporação de células-tronco pro-venientes da medula óssea no vaso9. Esses acha-dos indicaram a existência de uma fonte celularlocalizada na medula óssea que poderia ser recru-tada no sítio de reparação vascular, contribuindo

Page 99: check up

215RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco e

inflamaçãopara a expansão da trama vascular, num processodenominado vasculogênese (Fig. 1).

DEFINIÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DECÉLULAS PROGENITORAS ENDOTELIAIS

Células-tronco são definidas por duas caracte-rísticas: devem ser capazes de se renovar por sisó, e devem ter a capacidade de diferenciar emdiferentes tipos celulares10. As células progenito-ras endoteliais, por sua vez, são células circulan-tes derivadas de uma população de células da me-dula óssea que parecem participar tanto da forma-ção de novos vasos (vasculogênese) como da ho-meostase vascular10. Essa população única de cé-lulas mononucleares existente no sangue periféri-co (0,0001%) tem um perfil que se assemelhamuito ao das células-tronco hematopoiéticas, e in-corpora no vaso em situações de estresse em res-posta a vários fatores de crescimento angiogêni-cos11-15. Muito do que se conhece hoje sobre essascélulas pode ser creditado a dois estudos pionei-ros. Asahara e colaboradores, em 1997, isolaramangioblastos circulantes de sangue periférico co-lhido de humanos adultos, que tinham o potencialde diferenciar “in vitro” em células endoteliais econtribuíam para a angiogênese após isquemiavascular “in vivo”16. Logo depois da publicaçãode Asahara, Shi e colaboradores cultivaram célu-las CD34+ provenientes da medula óssea e desco-briram que tais células tinham a capacidade dediferenciar em células endoteliais7. Desde então,diversos grupos têm procurado definir essa popu-lação de células mais profundamente. Como ascélulas progenitoras endoteliais e as células-tron-co hematopoiéticas têm em comum muitos mar-cadores de superfície, não existe uma definiçãosimples de células progenitoras endoteliais. As-sim, o termo células progenitoras endoteliais en-globa um grupo de células que existe numa varie-dade de estágios, desde hemangioblastos até cé-lulas endoteliais. No estágio atual das pesquisas,é impossível diferenciar células progenitoras en-doteliais mais “imaturas” (ou seja, células menosdiferenciadas) das células-tronco hematopoiéticasprimitivas, uma vez que estas últimas comparti-lham os mesmos marcadores de superfície, como,por exemplo, CD133, CD34, e VEGFR2 (KDR).Na prática, são utilizados os marcadores CD133 eVEGFR2 numa população de células CD34+17.CD133 é um marcador que diferencia células pro-genitoras endoteliais mais primitivas. À medidaque essas células se diferenciam, os marcadoresCD133 e VEGF são extintos11, 13, 18. Nesse estágio,são utilizados marcadores endoteliais como VEcaderina e E-selectina19, 20. Contudo, algumas li-mitações devem ser consideradas quando se utili-

zam tais marcadores na citometria de fluxo, por-que nenhum deles é específico para células pro-genitoras endoteliais. Por exemplo, CD34 é ummarcador hematopoiético e pode ser achado emoutras células-tronco provenientes da medula ós-sea6. Na realidade, a população CD34 de célulasrepresenta uma pequena fração de células-troncoda medula ou de sangue periférico21. CD34 podetambém ser encontrado nas células endoteliais cir-culantes22. Assim, CD34 deve ser sempre usadoem conjunto com outros marcadores17.

Admite-se que a função óbvia das célulasprogenitoras endoteliais seria uma contribuiçãodireta na parede endotelial. Contudo, dois fenóti-pos celulares diferentes têm emergido de dadossobre a diferenciação de células progenitoras en-doteliais: como já mencionado, um se integrariadiretamente ao endotélio e o outro tomaria resi-dência imediatamente próximo ao endotélio (Fig.1). A função deste segundo grupo celular seria pre-sumidamente providenciar sinais parácrinos àscélulas endoteliais17, 22, 23. Estudos recentes de-monstram que tais células constituem a maioriadas células progenitoras endoteliais e são diferen-ciadas pela citometria de fluxo pelos marcadoresCD14+ e CD3421. De fato, esses monócitos “pró-angiogênicos” parecem secretar fatores de cresci-mento às células endoteliais adjacentes24. Alémdisso, células CD14+ exibem em cultura algumascaracterísticas funcionais que têm sido utilizadasem muitos estudos para caracterizar células pro-genitoras endoteliais CD34+. Por exemplo, taiscélulas incorporam DiLDL e fixam lectina25. Éinteressante observar que células CD14+ isoladasimediatamente do sangue periférico e não expan-didas em cultura não aumentam a vasculogênese,chamando atenção para o fato de quanto o meiode cultura pode influenciar o comportamento ce-lular26. Células progenitoras multipotentes deriva-das da medula óssea, assim como células tecidu-ais (tecido adiposo, células progenitoras cardía-cas e células neuroprogenitoras), também possu-em a habilidade de diferenciar em células proge-nitoras endoteliais27. Juntas, essas informaçõespermitem concluir dois pontos importantes: 1) éconcebível que células provenientes da medulapoderiam ajudar no estabelecimento de novos ca-pilares, providenciando sinais parácrinos impor-tantes e não apenas incorporando na parede endo-telial; e 2) esses monócitos “pró-angiogênicos”pela definição atual não são células progenitorasendoteliais. As observações apresentadas acimamudam o paradigma da vasculogênese, cuja visãosimplista seria baseada num único tipo celularcomo responsável pelo crescimento vascular emhumanos adultos. Novos dados sugerem que vas-culogênese e/ou regeneração endotelial são pro-

Page 100: check up

216RSCESPJUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco einflamação

cessos em que múltiplos grupos celulares prove-nientes da medula óssea parecem estar envolvi-dos.

INFLAMAÇÃO VASCULAR E CÉLULASPROGENITORAS ENDOTELIAIS

Observações de pacientes com doença ateros-clerótica ou com fatores de risco para aterosclero-se enfatizam o papel das células progenitoras en-doteliais na manutenção da saúde vascular20, 28-31.Estudos demonstram que a presença de doençavascular ou de fatores de risco para doença vascu-lar tem correlação com número diminuído e comredução da capacidade funcional de células pro-genitoras endoteliais circulantes20, 28-31. Em paci-entes sem doença cardiovascular documentada,existe correlação inversa entre escore preditor derisco de doença cardiovascular de Framingham enúmero de células progenitoras endoteliais28. Defato, esse estudo demonstrou que o número decélulas progenitoras endoteliais circulantes foimelhor preditor de reatividade vascular preserva-da que a presença de fatores tradicionais de riscopromotores da aterosclerose, reatividade essa re-lacionada à atividade funcional do endotélio e aoprognóstico de pacientes com doença arterial co-ronária28. Em sintonia com tal achado, Werner ecolaboradores determinaram em 519 pacientescom doença arterial coronária, documentada pelaangiografia, que número aumentado de célulasCD34+/KDR+ se correlacionava com menor mor-talidade cardiovascular18. Em outro estudo, célu-las progenitoras endoteliais circulantes colhidasde pacientes com múltiplos fatores de risco apre-sentavam alta taxa de envelhecimento “in vitro”quando comparadas às daqueles com poucos fato-res de risco18, 28. Uma hipótese que explicaria taisachados é que pacientes expostos a lesão endote-lial contínua pelos fatores de risco teriam exauri-do depósitos presumidamente limitados de célu-las progenitoras endoteliais localizadas na medu-la óssea28. Essa hipótese é suportada pela obser-vação de que células progenitoras endoteliais co-lhidas de camundongos ApoE-/- estão reduzidasem número e habilidade em participar na repara-ção vascular32. Em pacientes sem doença cardio-vascular, correlação inversa também existe entreidade e número de células progenitoras endoteli-ais na circulação periférica28. Tal achado sugereque número diminuído de células progenitorasendoteliais pode explicar, em parte, o aumento sig-nificativo de mortalidade cardiovascular observa-do com o aumento da idade.

Vários outros fatores de risco promotores deeventos cardiovasculares estão associados com re-dução de número e função de células progenitoras

endoteliais. Antecedente positivo de morte prema-tura familiar por doença coronária19, homocistei-nemia33 e aumento da proteína C-reativa34, 35 sãoalguns exemplos. A proteína C-reativa é um mar-cador importante de inflamação e está associado àdisfunção endotelial e à aterosclerose. Quandocélulas progenitoras endoteliais são incubadas comproteína C-reativa, esta diretamente inibe a dife-renciação, a sobrevivência e a função de célulasprogenitoras endoteliais35.

Síndromes isquêmicas agudas estão relaciona-das a número elevado de células progenitoras en-doteliais, indicando que a movimentação de célu-las progenitoras endoteliais com o objetivo de re-parar o vaso e o tecido é um evento fisiológico36, 37.Contudo, células progenitoras endoteliais prove-nientes da medula óssea estão deprimidas funcio-nalmente nessas circunstâncias38. Resultado simi-lar foi obtido em outro ambiente de inflamaçãocrônica e diminuição de óxido nítrico (ou seja,pacientes com insuficiência cardíaca). Heeschene colaboradores demonstraram, num modelo deisquemia em camundongos imunodeficientes(“nude mice”), que células progenitoras endoteli-ais colhidas desses indivíduos com insuficiênciacardíaca eram menos capazes de aderir ao vaso nomembro isquêmico de camundongos, além de pos-suírem menor capacidade migratória29.

Em estudos investigando células progenitorasendoteliais em pacientes com insuficiência renalcrônica e sem evidência de doença arterial coro-nária, a insuficiência renal está associada com re-dução marcada de número e colônias de célulasprogenitoras endoteliais39. Esses achados parecemocorrer independentemente dos fatores de riscopara eventos cardiovasculares. Em concordânciacom os achados mencionados, pacientes com ar-trite reumatóide apresentam número reduzido decélulas progenitoras endoteliais circulantes, quemelhoraram marcadamente após receber terapiacom inibidor de fator de necrose tumoral alfa40.Esses dados permitem especular que a inflama-ção crônica diminui o número e a função de célu-las progenitoras endoteliais, contribuindo para oaumento da morbidade e da mortalidade cardio-vasculares (Fig. 2).

MECANISMOS PELOS QUAIS AINFLAMAÇÃO PODE INTERFERIRCOM AS CÉLULAS PROGENITORASENDOTELIAIS

A redução do número e da função de célulasprogenitoras endoteliais na presença de inflama-ção pode ter diferentes causas: a) exaustão do“pool” de células progenitoras endoteliais residen-tes na medula, conforme discutido anteriormente;

Page 101: check up

217RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco e

inflamação

b) redução da mobilização; e c) redução de sobre-vida ou diferenciação (Fig. 3). A influência diretados fatores de risco para doença coronária no mi-croambiente da medula óssea ainda não está cla-ra. Estroma medular ósseo consiste parcialmentede células endoteliais. Dado que fatores de riscosistemicamente diminuem a função de células en-doteliais e a biodisponibilidade do óxido nítricovascular, pode-se especular que células endoteli-ais localizadas no estroma medular podem apre-sentar atividade funcional diminuída.

De fato, a deficiência de óxido nítrico sintaseendotelial (eNOS) diminui a mobilização de célu-las progenitoras endoteliais pelo VEGF, reduzin-do a capacidade de recuperação da medula ósseaapós mielossupressão3, 41. Em modelos “knock out”para eNOs, não houve aumento de células proge-nitoras endoteliais após exercício físico42. Da mes-ma forma, células progenitoras endoteliais colhi-das de tais camundongos revelaram reduzida ca-pacidade para aumentar a vascularização após is-quemia. Como a biodisponibilidade do óxido nítri-co está reduzida em pacientes com doença coro-

Figura 2. Inflamação e células progenitoras endoteliais (EPCs) circulantes. Fatores de risco para doen-ça arterial coronária promovem inflamação vascular, que induz apoptose de células endoteliais. Célulasque sofreram apoptose precisam ser regeneradas para que o endotélio permaneça íntegro. Contudo, ainflamação gerada reduz a capacidade regenerativa de células endoteliais maduras e de EPCs. Assim,apoptose aumentada e reparação reduzida podem levar a um círculo vicioso, formando a placa ateros-clerótica.

nária e insuficiência cardíaca, pode-se especularque a redução de óxido nítrico pode diminuir tan-to a mobilização como a atividade funcional decélulas progenitoras endoteliais da medula óssea.

Outra possibilidade em relação à diminuiçãode células progenitoras endoteliais seria apoptoseou inibição de sua capacidade de diferenciar. Aanálise do antígeno primitivo CD133 pela citome-tria de fluxo em pacientes com angina estável eem obesos mórbidos com síndrome metabólica se-lecionados para serem submetidos a cirurgia bari-átrica (dados não publicados) não revelou diferen-ça comparativamente ao grupo controle, sugerin-do que a diminuição de tais células ocorre numestágio mais abaixo de diferenciação celular20.Além disso, foi demonstrado que a angiostatina,uma molécula antiangiogênica que está aumenta-da na inflamação, bloqueia a proliferação de célu-las progenitoras endoteliais43.

Outro fator a ser considerado seria a alteraçãona diferenciação de células progenitoras endoteli-ais por fatores locais, que alterariam o balançoentre células comprometidas com a linhagem en-

Page 102: check up

218RSCESPJUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco einflamação

Figura 3. A inflamação pode interferir com as células progenitoras endoteliais, mediando proteçãovascular por diferentes mecanismos. Fatores de risco para doença coronária podem interferir com célu-las-tronco hematopoiéticas na medula óssea, reduzindo sua mobilização ou afetando sua sobrevivênciapela queda de suas defesas antioxidantes ou, ainda, por efeito em sua diferenciação. De forma seme-lhante, a inflamação pode bloquear intracelularmente a resposta ao VEGF, dificultando a incorporaçãode células progenitoras endoteliais na parede vascular.EPCs = células progenitoras endoteliais; NO = óxido nítrico.

dotelial e células musculares lisas. Quando se al-tera o meio de cultura de células CD34+, esta podese diferenciar em monócitos. Além disso, a admi-nistração de lipoproteína de baixa densidade(LDL) oxidada bloqueia a diferenciação de célu-las progenitoras endoteliais “in vitro”44. Assim, al-terações locais ou sistêmicas gerando inflamaçãopoderiam promover um desvio na diferenciaçãode células progenitoras endoteliais no sentido decélulas musculares lisas, levando ao desenvolvi-mento da lesão aterosclerótica.

Finalmente, outro mecanismo aventado pode-ria ser uma resposta diminuída das células proge-nitoras endoteliais ao VEGF na presença de fato-res de risco. Vias de sinalizações VEGF-depen-dentes (como, por exemplo, AKT) estão alteradasquando células são incubadas com LDL oxidada45.Similarmente, células progenitoras endoteliais iso-ladas de sangue periférico de pacientes com do-ença coronária demonstram capacidade migrató-ria reduzida na presença de VEGF, apesar de estar

mantida a expressão de VEGF, sugerindo que aresposta ao VEGF está bloqueada intracelularmen-te20. Em resumo, os fatores de risco podem inter-ferir na proteção vascular mediada pelas célulasprogenitoras endoteliais por diferentes mecanis-mos e assim modular o processo de regeneraçãoendotelial (Fig. 3).

REGULAÇÃO DAS CÉLULASPROGENITORAS ENDOTELIAIS

Se os fatores de risco para eventos coronáriosreduzem o número e a função de células progeni-toras endoteliais e contribuem para a progressãoda doença aterosclerótica, o oposto (ou seja, o au-mento das células progenitoras endoteliais) é bas-tante atrativo (Fig. 4). Evidências recentes suge-rem que as estatinas aumentam o número e a ati-vidade funcional de células progenitoras endote-liais “in vitro” em camundongos e em pacientescom angina estável8, 19, 46. Assim, parte dos efeitos

Page 103: check up

219RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco e

inflamaçãopleiotrópicos das estatinas, melhorando a funçãoendotelial e reduzindo os eventos cardiovascula-res, decorreria do aumento de células progenito-ras endoteliais. Algo similar também ocorre comos inibidores da enzima de conversão ativada.Mecanismo postulado seria a redução do envelhe-cimento e a apoptose de células progenitoras en-doteliais8, 19, 46. O estrógeno parece também aumen-tar o número e a função de células progenitorasendoteliais, reduzindo o espessamento neo-intimalnum modelo experimental de lesão mecânica vas-cular47. A eritropoietina aumenta as células pro-genitoras endoteliais em animais e em homens, eesse hormônio está diretamente relacionado como número de células progenitoras endoteliais empacientes com doença arterial coronária48, 49. Oexercício físico também aumenta o número decélulas progenitoras endoteliais42. Todos esses fa-tores promovem aumento das células progenito-ras endoteliais pela estimulação da 3-quinase/AKT, sugerindo que essa pode ser uma via co-mum na sobrevivência de células progenitorasendoteliais45, 49. Deve-se ressaltar que dois autoresindependentemente demonstraram que células pro-genitoras endoteliais estão equipadas com um sis-tema de enzimas antioxidantes, permitindo a so-brevivência dessas células em condições aumen-

tadas de estresse oxidativo50, 51. Notadamente, foidemonstrado que as enzimas superóxido dismuta-se manganês (localizada nas mitocôndrias, dismutao ânion superóxido), catalase (dismuta o peróxi-do de hidrogênio) e glutationa peroxidase tinhamsuas expressões aumentadas nas células progeni-toras endoteliais quando comparadas às célulascontroles. Esses resultados sugerem que célulasprogenitoras endoteliais estão equipadas com umsistema eficiente de proteção, tornando essas cé-lulas atrativas para terapia celular.

CONCLUSÕES

Populações de células distintas dentro do or-ganismo adulto possuem habilidade de contribuirpara a homeostase vascular ou vasculogênese.Contudo, a caracterização da principal célula pre-cursora endotelial ainda não está clara. Talvez ofoco correto não seja identificar a célula precur-sora endotelial, mas entender quais são os meca-nismos que levam uma célula progenitora endote-lial a reparar o endotélio lesado. Identificar meiosde cultura adequados para tais células também énecessário, uma vez que o meio tem papel funda-mental na diferenciação de células progenitorasem células endoteliais. Além disso, é necessário

Figura 4. Moduladores da quantidade de células progenitoras endoteliais. Terapias, tais como estati-nas, inibidores da enzima de conversão ativada (IECAs), eritropoietina e estrógenos, assim como exer-cícios físicos promovem aumento de células progenitoras endoteliais circulantes, constituindo umaopção agradável na prevenção da doença arterial coronária. O mesmo pode ser observado com VEGF,fator derivado do estroma (SDF-1), fator estimulador celular-granulócito macrófago (GM-CSF), e óxi-do nítrico (NO). Esse aumento por ser verificado pela imunofluorescência (células em laranja), após ascélulas progenitoras endoteliais captarem DiLDL (vermelho) e fixarem lectina. As imagens revelamcélulas progenitoras endoteliais circulantes cultivadas em meio especial por 7 dias (x 10), e nem todosos resultados acima se referem a experimentos com humanos.

Page 104: check up

220RSCESPJUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco einflamação

comparar o impacto terapêutico de células colhi-das do sangue periférico e de células mononucle-ares extraídas da medula óssea.

Apesar de as células progenitoras endoteli-ais serem provenientes de diferentes fontes, éinegável que tais células possuem uma intera-ção com o endotélio lesado, por mecanismosparácrinos ou talvez pela incorporação direta,e, dessa forma, limitam a formação da ateros-clerose. Métodos que possam contribuir para a

melhora funcional de tais células em ambientede inflamação vascular constituem uma opçãoatrativa. Assim, parece imperativo conhecer opapel específico das várias enzimas antioxidan-tes na função das células progenitoras endoteli-ais. Enquanto o tratamento prévio da doençaaterosclerótica estava limitado à eliminação dasfontes de lesão endotelial, novas abordagenspodem agora focar na reparação vascular pelarestauração de células progenitoras endoteliais.

REFERÊNCIAS

1. Libby P, Theroux P. Pathophysiology of coro-nary artery disease. Circulation. 2005;111(25):3481-8.

STEM CELLS AND INFLAMMATION

PAULO FERREIRA LEITE

Inflammation is central to cardiovascular disease. Traditional risk factors such as diabetes,smoking, hypertension, and increased lipid levels can induce an inflammatory response inendothelial cells by promoting apoptotic suicide and loss of endothelial integrity. Theconsequences are an increased vascular permeability of the endothelium followed byfacilitated migration of monocytes and vascular smooth muscle cell proliferation, resultingin atherosclerotic lesion. Recent evidences suggest that circulating endothelial progenitorcells from bone marrow play an important role in endothelium regeneration under certainstresses. Endothelial progenitor cells can enhance the restoration of endothelium byproviding paracrine signals to nearby endothelial cells or perhaps by their direct contributionto endothelial wall, therefore limiting atherosclerotic lesion formation. However, risk factorspromoting coronary artery disease reduce the number and functional activity of thesecirculating endothelial progenitor cells, potentially restricting the therapeutic potential ofendothelial progenitor cells. This contribution discusses the concept and difficulties incharacterize an endothelial progenitor cell. In addition, we explored the role ofinflammation interfering with circulating endothelial progenitor cells, and finally, sometherapies suitable for increase endothelial progenitor cells number and functional capacity,therefore decreasing the influence of proatherosclerotic factors.

Key words: inflammation, endothelial progenitor cells, endothelium, risk factors,atherosclerosis.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2006;3:213-22)RSCESP (72594)-1615

2. Libby P. Inflammation and cardiovascular dise-ase mechanisms. Am J Clin Nutr. 2006;83(2):456S-460S.

3. Dimmeler S, Zeiher AM. Nitric oxide - an en-dothelial cell survival factor. Cell Death Di-

Page 105: check up

221RSCESP

JUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco e

inflamaçãoffer. 1999;6(10):964-8.

4. Dimmeler S, Haendeler J, Galle J, Zeiher AM.Oxidized low-density lipoprotein inducesapoptosis of human endothelial cells by acti-vation of CPP32-like proteases. A mechanis-tic clue to the “response to injury” hypothesis.Circulation. 1997;95(7):1760-3.

5. Dimmeler S, Haendeler J, Zeiher AM. Regula-tion of endothelial cell apoptosis in athero-thrombosis. Curr Opin Lipidol. 2002;13(5):531-6.

6. Khan SS, Solomon MA, McCoy JP Jr. Detecti-on of circulating endothelial cells and endo-thelial progenitor cells by flow cytometry.Cytometry B Clin Cytom. 2005;64(1):1-8.

7. Shi Q, Rafii S, Wu MH, Wijelath ES, Yu C, Ishi-da A, et al. Evidence for circulating bone mar-row-derived endothelial cells. Blood.1998;92(2):362-7.

8. Walter DH, Zeiher AM, Dimmeler S. Effects ofstatins on endothelium and their contributionto neovascularization by mobilization of en-dothelial progenitor cells. Coron Artery Dis.2004;15(5):235-42.

9. Sata M, Nagai R. Inflammation, angiogenesis,and endothelial progenitor cells: how do en-dothelial progenitor cells find their place? JMol Cell Cardiol. 2004;36(4):459-63.

10. Carmeliet P. Mechanisms of angiogenesis andarteriogenesis. Nat Med. 2000;6(4):389-95.

11. Urbich C, Dimmeler S. Endothelial progeni-tor cells functional characterization. TrendsCardiovasc Med. 2004;14(8):318-22.

12. Urbich C, Dimmeler S. Endothelial progeni-tor cells: characterization and role in vascularbiology. Circ Res. 2004;95(4):343-53.

13. Iwami Y, Masuda H, Asahara T. Endothelialprogenitor cells: past, state of the art, and fu-ture. J Cell Mol Med. 2004;8(4):488-97.

14. Ishikawa M, Asahara T. Endothelial progeni-tor cell culture for vascular regeneration. StemCells Dev. 2004;13(4):344-9.

15. Asahara T, Kawamoto A. Endothelial proge-nitor cells for postnatal vasculogenesis. Am JPhysiol Cell Physiol. 2004;287(3):C572-C579.

16. Asahara T, Murohara T, Sullivan A, Silver M,van der ZR, Li T, et al. Isolation of putativeprogenitor endothelial cells for angiogenesis.Science. 1997;275(5302):964-7.

17. Salven P, Mustjoki S, Alitalo R, Alitalo K, RafiiS. VEGFR-3 and CD133 identify a populationof CD34+ lymphatic/vascular endothelial pre-cursor cells. Blood. 2003;101(1):168-72.

18. Werner N, Kosiol S, Schiegl T, Ahlers P, Wa-lenta K, Link A, et al. Circulating endothelialprogenitor cells and cardiovascular outcomes.N Engl J Med. 2005;353(10):999-1007.

19. Vasa M, Fichtlscherer S, Adler K, Aicher A,Martin H, Zeiher AM, et al. Increase in circu-lating endothelial progenitor cells by statintherapy in patients with stable coronary arterydisease. Circulation. 2001;103(24):2885-90.

20. Vasa M, Fichtlscherer S, Aicher A, Adler K,Urbich C, Martin H, et al. Number and migra-tory activity of circulating endothelial proge-nitor cells inversely correlate with risk factorsfor coronary artery disease. Circ Res.2001;89(1):E1-E7.

21. Romagnani P, Annunziato F, Liotta F, LazzeriE, Mazzinghi B, Frosali F, et al. CD14+CD34low cells with stem cell phenotypic and func-tional features are the major source of circula-ting endothelial progenitors. Circ Res.2005;97(4):314-22.

22. Peichev M, Naiyer AJ, Pereira D, Zhu Z, LaneWJ, Williams M, et al. Expression of VEGFR-2 and AC133 by circulating human CD34(+)cells identifies a population of functional en-dothelial precursors. Blood. 2000;95(3):952-8.

23. Rajantie I, Ilmonen M, Alminaite A, OzerdemU, Alitalo K, Salven P. Adult bone marrow-derived cells recruited during angiogenesiscomprise precursors for periendothelial vascu-lar mural cells. Blood. 2004;104(7):2084-6.

24. Rehman J, Li J, Orschell CM, March KL. Pe-ripheral blood “endothelial progenitor cells”are derived from monocyte/macrophages andsecrete angiogenic growth factors. Circulati-on. 2003;107(8):1164-9.

25. Lougheed M, Moore ED, Scriven DR, Stein-brecher UP. Uptake of oxidized LDL by ma-crophages differs from that of acetyl LDL andleads to expansion of an acidic endolysosomalcompartment. Arterioscler Thromb Vasc Biol.1999;19(8):1881-90.

26. Urbich C, Heeschen C, Aicher A, Dernbach E,Zeiher AM, Dimmeler S. Relevance of mono-cytic features for neovascularization capacityof circulating endothelial progenitor cells. Cir-culation. 2003;108(20):2511-6.

27. Reyes M, Dudek A, Jahagirdar B, Koodie L,Marker PH, Verfaillie CM. Origin of endothe-lial progenitors in human postnatal bone mar-row. J Clin Invest. 2002;109(3):337-46.

28. Hill JM, Zalos G, Halcox JP, Schenke WH,Waclawiw MA, Quyyumi AA, et al. Circula-ting endothelial progenitor cells, vascular func-tion, and cardiovascular risk. N Engl J Med.2003;348(7):593-600.

29. Heeschen C, Lehmann R, Honold J, AssmusB, Aicher A, Walter DH, et al. Profoundly re-duced neovascularization capacity of bonemarrow mononuclear cells derived from pati-

Page 106: check up

222RSCESPJUL/AGO/SET 2006

LEITE PFCélulas-tronco einflamação

ents with chronic ischemic heart disease. Cir-culation. 2004;109(13):1615-22.

30. Tepper OM, Galiano RD, Capla JM, Kalka C,Gagne PJ, Jacobowitz GR, et al. Human endo-thelial progenitor cells from type II diabeticsexhibit impaired proliferation, adhesion, andincorporation into vascular structures. Circu-lation. 2002;106(22):2781-6.

31. Eizawa T, Murakami Y, Matsui K, TakahashiM, Muroi K, Amemiya M, et al. Circulatingendothelial progenitor cells are reduced in he-modialysis patients. Curr Med Res Opin.2003;19(7):627-33.

32. Rauscher FM, Goldschmidt-Clermont PJ, Da-vis BH, Wang T, Gregg D, Ramaswami P, etal. Aging, progenitor cell exhaustion, and athe-rosclerosis. Circulation. 2003;108(4):457-63.

33. Chen JZ, Zhu JH, Wang XX, Zhu JH, Xie XD,Sun J, et al. Effects of homocysteine on num-ber and activity of endothelial progenitor cellsfrom peripheral blood. J Mol Cell Cardiol.2004;36(2):233-9.

34. Suh W, Kim KL, Choi JH, Lee YS, Lee JY,Kim JM, et al. C-reactive protein impairs an-giogenic functions and decreases the secreti-on of arteriogenic chemo-cytokines in humanendothelial progenitor cells. Biochem BiophysRes Commun. 2004;321(1):65-71.

35. Verma S, Kuliszewski MA, Li SH, SzmitkoPE, Zucco L, Wang CH, et al. C-reactive pro-tein attenuates endothelial progenitor cell sur-vival, differentiation, and function: further evi-dence of a mechanistic link between C-reacti-ve protein and cardiovascular disease. Circu-lation. 2004;109(17):2058-67.

36. Leone AM, Rutella S, Bonanno G, Abbate A,Rebuzzi AG, Giovannini S, et al. Mobilizationof bone marrow-derived stem cells after myo-cardial infarction and left ventricular functi-on. Eur Heart J. 2005;26(12):1196-204.

37. Massa M, Rosti V, Ferrario M, Campanelli R,Ramajoli I, Rosso R, et al. Increased circula-ting hematopoietic and endothelial progenitorcells in the early phase of acute myocardialinfarction. Blood. 2005;105(1):199-206.

38. Werner N, Nickenig G. Influence of cardio-vascular risk factors on endothelial progenitorcells: limitations for therapy? ArteriosclerThromb Vasc Biol. 2006;26(2):257-66.

39. de Groot K, Bahlmann FH, Sowa J, Koenig J,Menne J, Haller H, et al. Uremia causes endo-thelial progenitor cell deficiency. Kidney Int.2004;66(2):641-6.

40. Grisar J, Aletaha D, Steiner CW, Kapral T, Stei-

ner S, Seidinger D, et al. Depletion of endo-thelial progenitor cells in the peripheral bloodof patients with rheumatoid arthritis. Circula-tion. 2005;111(2):204-11.

41. Aicher A, Heeschen C, Dimmeler S. The roleof NOS3 in stem cell mobilization. Trends MolMed. 2004;10(9):421-5.

42. Laufs U, Urhausen A, Werner N, Scharhag J,Heitz A, Kissner G, et al. Running exercise ofdifferent duration and intensity: effect on en-dothelial progenitor cells in healthy subjects.Eur J Cardiovasc Prev Rehabil. 2005;12(4):407-14.

43. Ito H, Rovira II, Bloom ML, Takeda K, Fer-rans VJ, Quyyumi AA, et al. Endothelial pro-genitor cells as putative targets for angiosta-tin. Cancer Res. 1999;59(23):5875-7.

44. Imanishi T, Hano T, Matsuo Y, Nishio I. Oxi-dized low-density lipoprotein inhibits vascu-lar endothelial growth factor-induced endothe-lial progenitor cell differentiation. Clin ExpPharmacol Physiol. 2003;30(9):665-70.

45. Dimmeler S, Zeiher AM. Akt takes center sta-ge in angiogenesis signaling. Circ Res.2000;86(1):4-5.

46. Walter DH, Dimmeler S, Zeiher AM. Effectsof statins on endothelium and endothelial pro-genitor cell recruitment. Semin Vasc Med.2004;4(4):385-93.

47. Strehlow K, Werner N, Berweiler J, Link A,Dirnagl U, Priller J, et al. Estrogen increasesbone marrow-derived endothelial progenitorcell production and diminishes neointima for-mation. Circulation. 2003;107(24):3059-65.

48. Bahlmann FH, DeGroot K, Duckert T, Nie-mczyk E, Bahlmann E, Boehm SM, et al. En-dothelial progenitor cell proliferation and di-fferentiation is regulated by erythropoietin.Kidney Int. 2003;64(5):1648-52.

49. Bahlmann FH, de Groot K, Spandau JM, Lan-dry AL, Hertel B, Duckert T, et al. Erythro-poietin regulates endothelial progenitor cells.Blood. 2004;103(3):921-6.

50. He T, Peterson TE, Holmuhamedov EL, Ter-zic A, Caplice NM, Oberley LW, et al. Humanendothelial progenitor cells tolerate oxidativestress due to intrinsically high expression ofmanganese superoxide dismutase. ArteriosclerThromb Vasc Biol. 2004;24(11):2021-7.

51. Galasso G, Schiekofer S, Sato K, Shibata R,Handy DE, Ouchi N, et al. Impaired angioge-nesis in glutathione peroxidase-1-deficientmice is associated with endothelial progenitorcell dysfunction. Circ Res. 2006;98(2):254-61.

Page 107: check up

XXVIII CONGRESSO DA

SOCIEDADE DE CARDIOLOGIA

DO ESTADO DE SÃO PAULO

28 A 30 DE ABRIL DE 2007ITM-EXPO — SÃO PAULO

TEL.: 11 [email protected]

WWW.SOCESP.ORG.BR

SOCESP

Page 108: check up