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CENTRO UNIVERSITÁRIO ESTADUAL DA ZONA OESTE COLEGIADO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE ATENÇÃO FARMACÊUTICA AO USO INDISCRIMINADO DE BENZODIAZEPÍNICOS Roberta Soares da Silva Rio de Janeiro 2012

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CENTRO UNIVERSITÁRIO ESTADUAL DA ZONA OESTE

COLEGIADO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE

ATENÇÃO FARMACÊUTICA AO USO INDISCRIMINADO DE BENZODIAZEPÍNICOS

Roberta Soares da Silva

Rio de Janeiro

2012

ii

ROBERTA SOARES DA SILVA

Discente do curso de Farmácia

Matrícula n.° 0823800080

ATENÇÃO FARMACÊUTICA AO USO INDISCRIMINADO DE BENZODIAZEPÍNICOS

Trabalho de Conclusão de Curso, TCC,

apresentado ao Curso de Graduação Plena em

Farmácia do UEZO como parte dos requisitos

para a obtenção do título de Farmacêutica, sob a

orietação do professor Marco Antonio Mota da

Silva.

Rio de Janeiro

Dezembro de 2012

iii

ATENÇÃO FARMACÊUTICA AO USO INDISCRIMINADO

DE BENZODIAZEPÍNICOS Elaborado por Roberta Soares da Silva

Discente do Curso de Farmácia da UEZO

Esse trabalho de Graduação foi analisado e aprovado por:

Rio de Janeiro, 14 de Dezembro de 2012.

_________________________________________________________

Marco Antonio Mota da Silva, Doutor (Orientador/Presidente da Banca)

_________________________________________________________

Alessandra Micherla Rodrigues do Nascimento, Doutora (Examinadora)

_________________________________________________________

Jamila Alessandra Perini, Doutora (Examinadora)

Dezembro de 2012

iv

Dedico este trabalho a Deus que guiou

meus passos nesta árdua caminhada. Aos

meus pais, avós e amigos pelo amor,

compreensão e apoio incondicional.

Amo vocês!

v

AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, pelo amor incondicional, por estar sempre presente,

ter me dado forças e sabedoria para completar mais uma etapa da minha vida e

concluir este trabalho. Por ter posto pessoas maravilhosas no meu caminho que

foram de grande importância para mim ao longo desta árdua jornada.

Aos meus pais Luiz Roberto Barcellos da Silva e Jackeline da Costa

Soares pelo apoio e incentivo que foram de extrema importância para que

conseguisse chegar até aqui. À minha mãe em especial, que sempre foi uma

guerreira e me ensinou a ser forte e lutar pelos meus sonhos e acima de tudo me

completa com seu amor, apoio, compreensão, orgulho, amizade, torcida e

confiança na minha vitória.

Aos meus queridos avós, Clóvis Máximo Soares e Aida Costa Soares por

toda alegria demonstrada a cada passo dado, por terem suprido todas as minhas

necessidades, tanto emocionais quanto materiais. Se não fosse por vocês, nada

disso estaria acontecendo.

A meu falecido avô Roberto José da Silva que onde quer que ele esteja,

deve estar muito feliz por eu ter escolhido seguir sua profissão.

Às minhas irmãs Maria Clara e Maria Júlia que apesar de não terem idade

ainda para entender o valor de uma faculdade, compreenderam minha ausência e

continuaram me dando carinho e amor quando precisei.

A todos os meus amigos, os quais não citarei para não deixar ninguém de

fora, por fazerem parte da minha vida, pelo apoio, pela compreensão de minha

ausência nos jantares, cinema, barzinhos e baladas e por acima de tudo estarem

ao meu lado quando precisei.

vi

Ao meu orientador, Prof. Marco Antonio Mota da Silva, pela amizade,

compreensão, paciência e por me orientar não apenas na formação deste

trabalho, mas também por me aconselhar em minha formação acadêmica e nos

desafios da minha futura vida profissional.

Aos professores que me auxiliaram nesta jornada do conhecimento, em

especial aos mais próximos, que de mestres se tornaram amigos: Profª

Alessandra Micherla, Profª Jamila Perini, Prof. André Luiz Fonseca de Souza,

Prof. Éverton D’andréa e Prof. Leandro Medeiros Motta.

E, é claro, um abraço à PRIMEIRA TURMA DE FARMÁCIA do UEZO. Um

obrigada especial para meus amigos da turma Rosilane, Thays, Tarcila, Bruno,

Juliana, Bárbara, Débora, Samira e Patrícia, e um beijo mais do que especial para

Aline e Mayara, que tornaram esses quatro anos bem mais agradáveis e

divertidos, por estarem ao meu lado quando sorri, quando chorei, quando me

estressei, por me ajudarem nos trabalhos acadêmicos e na vida, por

comemorarem junto comigo as minhas vitórias. A amizade de vocês foi essencial

para eu chegar até aqui. Eu amo vocês demais e tenho certeza que nossa

amizade perdurará para toda a vida.

vii

"Nada é veneno e tudo é veneno, depende da dose”.

(Paracelso)

viii

RESUMO

Os Benzodiazepínicos (BZDs) são fármacos depressores do Sistema Nervoso

Central (SNC), classificados como ansiolíticos. Seu uso deve ser norteado pela

administração das menores doses terapêuticas, pelo menor período de tempo

possível devido aos riscos de dependência e abuso. Seu uso inadequado está

amplamente descrito na literatura e tem implicações individuais e coletivas

constituindo objeto de interesse da saúde pública. Este trabalho busca destacar a

importância do profissional farmacêutico na orientação do uso racional dos BZDs

para tentar minimizar os riscos causados pelo uso indiscriminado e abusivo

desses medicamentos. Através de uma revisão bibliográfica dos principais

estudos dentro da literatura sobre o assunto, sendo possível concluir que a

maioria dos casos os BZDs são prescritos pelos médicos de diversas

especialidades, não havendo a real necessidade ou sem mesmo uma consulta

formal. Estudos apontam que os usuários apresentam histórico de uso prolongado

com finalidades outras que não apenas a terapêutica. Especialistas enfatizam

também a facilidade em adquirir a medicação, apesar de serem medicamentos

controlados pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e a falta de

orientação médica sobre os cuidados necessários durante o tratamento. Assim,

percebe-se que, a ocorrência do uso indiscriminado não envolve apenas o

paciente e o sistema de dispensação, mas uma série de outros fatores, entre os

quais as atitudes dos profissionais de saúde. Diante deste contexto, vale ressaltar

a necessidade do farmacêutico demonstrar a importância do seu papel,

orientando os pacientes, fazendo um acompanhamento farmacoterapêutico do

tratamento e prestando a atenção farmacêutica necessária para promover uma

melhor qualidade de vida ao paciente.

Palavras-Chave: Benzodiazepínicos, Uso indiscriminado, Dependência, Atenção

Farmacêutica.

ix

ABSTRACT

The Benzodiazepines (BZDs) are drugs that depress the central nervous system

(CNS), classified as anxiolytics. It’s use should be guided by the administration of

smaller therapeutic doses for the shortest period of time possible due to the risk of

addiction and abuse. It’s inappropriate use is widely described in the literature and

has individual and collective implications constituting the object of interest of public

health. This paper seeks to highlight the importance of the pharmacist in guiding

the rational use of benzodiazepines to try to minimize the risks caused by the

indiscriminate use and abuse of these drugs. Through a literature review of the

major studies in the literature on the subject, and concluded that the majority of the

cases benzodiazepines are prescribed by doctors of various specialties, so there

is no real need or even without a formal consultation. Studies show that users

have a history of prolonged use for purposes other than just therapy. Experts also

emphasize the ease in acquiring the medication, although prescription drugs by

ANVISA (National Health Surveillance Agency) and the lack of medical guidance

on the care needed during treatment. Thus, it is clear that the occurrence of

indiscriminate use involves not only the patient and dispensing system, but a

number of other factors, including the attitudes of health professionals. Given this

context, it is worth emphasizing the need for pharmacists to demonstrate the

importance of their role, guiding patients, making monitoring pharmacotherapeutic

treatment and providing pharmaceutical care necessary to promote a better quality

of life for patients.

Keywords: Benzodiazepines, Indiscriminate Use, Dependence, Pharmaceutical

Care.

x

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Estrutura Química do Clordiazepóxido................................................18

Figura 2 – Estrutura Benzodiazepina....................................................................20

Figura 3 – Fórmula Geral dos Benzodiazepínicos................................................20

Figura 4 – Estrutura química do Flumazenil. ........................................................21

Figura 5 - Estrutura do Receptor GABAA..............................................................22

Figura 6 – Esquema das principais inter-relações metabólicas entre os

benzodiazepínicos.................................................................................................24

Figura 7 – Fórmulas estruturais dos principais BZDs...........................................26

xi

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Benzodiazepínicos comercializados no Brasil. Nomes e

Estruturas...............................................................................................................21

Tabela 2 – Parâmetros farmacocinéticos dos Benzodiazepínicos representativos

após administração oral.........................................................................................25

xii

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária

BZDs Benzodiazepínicos

FDA Food and Drug Administration

GABA Ácido gama-aminobutírico

GI Gastrointestinal

OMS Organização Mundial da Saúde

OPAS Organização Pan-Americana de Saúde

SNC Sistema Nervoso Central

SNGPC Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados

UNODC United Nations Office on Drugs and Crime

xiii

SUMÁRIO

Resumo................................................................................................viii

Abstract.................................................................................................ix

Lista de Figuras.....................................................................................x

Lista de Tabelas.....................................................................................xi

Lista de Siglas e Abreviaturas...............................................................xii

1- Introdução........................................................................................14

2- Objetivo geral...................................................................................16

2.1- Objetivos específicos...............................................................16

3 – Metodologia....................................................................................17

4 - Revisão Bibliográfica.......................................................................18

4.1- Aspectos Históricos..................................................................18

4.2 - Propriedades dos BZDs..........................................................20

4.2.1 - Estrutura química...........................................................20

4.2.2 – Farmacodinâmica..........................................................22

4.2.3 – Farmacocinética............................................................23

4.3 - Indicações Terapêuticas.........................................................27

4.4 - Efeitos Adversos.....................................................................30

4.5 – Uso, Abuso e Dependência...................................................32

4.6 – Importância da Atenção Farmacêutica na dispensação de

BZDs....................................................................................................37

5 – Discussão.......................................................................................42

6 – Conclusão.......................................................................................44

7 - Referências bibliográficas...............................................................45

14

1- INTRODUÇÃO

Os Benzodiazepínicos (BZDs) são fármacos depressores do Sistema

Nervoso Central (SNC), sendo relatados como o maior grupo de medicamentos

ansiolíticos mais consumidos mundialmente. Seu uso deve ser norteado pela

administração das menores doses terapêuticas, pelo menor período de tempo

possível devido aos riscos de dependência e abuso. Seu uso indiscriminado

está amplamente descrito na literatura e tem implicações individuais e coletivas

constituindo objeto de interesse da saúde pública (SWETTMAN, 2005).

Os BZDs são classificados como sedativo-hipnóticos. Os efeitos mais

proeminentes relacionados a esta classe são a sedação, hipnose, diminuição

da ansiedade, relaxamento muscular, amnésia anterógrada e atividade

anticonvulsivante. A era dos benzodiazepínicos foi inaugurada em 1960, com a

introdução do Clordiazepóxido na medicina clínica. Uma de suas principais

características é a sua capacidade notavelmente baixa de produzir depressão

fatal do SNC, sendo um dos motivos para sua rápida aceitação no mercado

(GOODMAN & GILMAN, 2005).

Os efeitos dos BZDs acontecem devido à sua interação com receptores

de neurotransmissores inibitórios diretamente ativados pelo Ácido Gama

Aminobutírico (GABA). Toda a classe de benzodiazepínicos compartilha o

mecanismo de ação e as propriedades terapêuticas, diferindo quanto ao início,

intensidade e duração de seus efeitos, o que pode ser explicado na maioria dos

casos pelas propriedades farmacocinéticas de cada medicamento dessa classe

(LICATA e ROWELTT, 2008).

Os benzodiazepínicos foram amplamente prescritos no tratamento dos

transtornos ansiosos durante toda a década de 70, como uma opção segura e

de baixa toxicidade. A empolgação inicial deu lugar à preocupação com o

consumo ao final da mesma década: pesquisadores começavam a detectar

potencial de uso nocivo e risco de dependência entre os usuários de tais

substâncias (NASTASY et al., 2008).

15

Recentes achados epidemiológicos sugerem que o abuso desta classe

pode estar em ascensão (LICATA e ROWELTT, 2008). Dados demonstram que

os agentes ansiolíticos, como os benzodiazepínicos, estão entre as

substâncias prescritas com maior frequência e utilizadas regularmente por mais

de dez por cento da população na maioria dos países desenvolvidos, sendo,

portanto, um motivo de preocupação (SILVA et al., 2004).

Atualmente, os BDZs ainda possuem indicações precisas para controle

da ansiedade e como tratamento adjuvante dos principais transtornos

psiquiátricos, mas continuam sendo prescritos de modo indiscriminado, tanto

por psiquiatras quanto por médicos de outras especialidades, o que pode

aumentar a automedicação e dependência destes, mesmo sendo controlados

pela ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária – onde drogarias e

farmácias de manipulação só podem vendê-los mediante receita especial do

médico que fica retida para posterior controle, de acordo com a portaria

SVS/MS nº 344/98 de 12 de maio de 1998 (ANVISA, 1998).

Diante desse quadro, busca-se encontrar uma solução rápida e eficaz

para o problema, conscientizando os profissionais prescritores e através da

orientação da população para o uso racional de medicamentos, fazendo um

acompanhamento farmacoterapêutico do tratamento e prestando assistência

farmacêutica. Nesse contexto, o Farmacêutico tem um papel fundamental, por

ser o profissional do medicamento.

16

2- OBJETIVO GERAL

O presente trabalho tem como objetivo fazer uma revisão na literatura

sobre o uso indiscriminado de Benzodiazepínicos destacando a importância do

profissional farmacêutico na diminuição dos riscos causados pelo abuso desta

classe de medicamentos.

2.1- OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Fazer o levantamento de informações farmacológicas sobre os BZDs;

Apresentar os principais efeitos adversos;

Relatar e discutir dados sobre o abuso e dependência;

Apresentar a importância do profissional farmacêutico na orientação do

uso racional dos BZDs e com isso tentar minimizar os riscos causados

pela automedicação.

17

3- METODOLOGIA

Esta revisão foi elaborada através do levantamento de dados encontrados

na literatura já existente. Foram realizadas pesquisas bibliográficas por meio de

livros dispostos no acervo da biblioteca do Centro Universitário Estadual da

Zona Oeste e em bases de dados como: Science Direct, Scielo, Pubmed,

Google acadêmico e no Portal de Periódicos da Capes, Revistas

Farmacêuticas e Internet, onde foram consultados artigos originais e de revisão

sobre os temas: Benzodiazepínicos, Uso e Abuso de Benzodiazepínicos,

Automedicação e Atenção Farmacêutica, no período de março à dezembro de

2012.

18

4- REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

4.1- ASPECTOS HISTÓRICOS

O primeiro benzodiazepínico foi sintetizado por Leo Sternbach em New

Jersey – EUA – em meados da década de 1950. Como ocorre em muitas

descobertas científicas, um composto foi sintetizado acidentalmente, o

Clordiazepóxido. Nas primeiras experiências clínicas com pacientes

esquizofrênicos não demonstrou ação antipsicótica, mas pôde-se observar que

o mesmo reduzia a ansiedade. Em 1960, foi lançado o Clordiazepóxido que

causou grande impacto no tratamento dos distúrbios de ansiedade devido à

sua eficácia e segurança (COSTA e SILVA In: BERNIK, 1999).

Fig.1 Estrutura química do clordiazepóxido.

Fonte: (SILVA, 2006)

19

Antes da introdução desses compostos na década de 60, os principais

fármacos usados no tratamento da ansiedade eram basicamente sedativos e

hipnóticos, e incluíam meprobamato, glutetimida, barbitúricos e álcool.

Infelizmente, estes compostos apresentam um alto potencial de abuso e um

potente efeito depressor respiratório, o que levou a alta incidência de

dependência, superdosagens e morte. Embora os benzodiazepínicos não

sejam destituídos de efeitos colaterais ou de potencial de abuso, eles têm uma

ampla margem de segurança, sendo a atividade ansiolítica alcançada com

doses que não induzem depressão respiratória clinicamente significativa

(MINNEMAN e WECKER, 2006).

Como os benzodiazepínicos têm um efeito ansiolítico e sedativo rápido,

são utilizados com mais frequência no tratamento imediato da insônia, da

ansiedade aguda, da agitação e da ansiedade associada a qualquer transtorno

psiquiátrico. Além disso, são utilizados como anestésicos, anticonvulsivantes e

relaxantes musculares. Devido ao risco de dependência psicológica e física, a

utilização a longo prazo deve ser acompanhada com psicoterapia e em casos

em que agentes alternativos tenham sido tentados e se mostrado ineficazes ou

mal tolerados (SADOCK et al., 2007).

No final da década de 70, medicamentos como o Diazepam tornaram-se

um dos mais prescritos no mundo inteiro para o tratamento das doenças que

afetam o SNC. A aceitação imediata pela comunidade médica levou a indústria

farmacêutica a desenvolver novos medicamentos com perfil farmacológico

similar aos BZDs. Três décadas depois da descoberta destes fármacos mais de

cinqüenta novas substâncias químicas relacionadas foram introduzidas na

terapêutica (COSTA e SILVA In: BERNIK, 1999).

Em 1992, o triazolam foi proibido de ser comercializado no Brasil pelo

Ministério da Saúde, por causar graves efeitos nocivos à saúde. Apesar disso,

os BZDs ainda são considerados como os principais ansiolíticos, pela sua alta

eficácia e relativa segurança, quando comparados a outros fármacos que

tenham sido recetemente introduzidos na terapêutica com essa finalidade

(SILVA, 2006).

20

4.2 - PROPRIEDADES DOS BZDs

4.2.1 – Estrutura Química

A estrutura química básica dos benzodiazepínicos consiste em um anel

aromático (A) fundido ao anel (B), como mostra a fig. 1. O substituinte 5-aril

(anel C) aumenta a potência, podendo ser substituído por anel de cinco

membros fundido às posições 3 e 4, formando derivado antramicínico. Grupos

aceptores de elétrons na posição 7 do anel A realçam a atividade. O grupo

nitro, por exemplo no clonazepam, é o responsável pelo aumento da potência

anticonvulsivante, com efeitos sedativos menos acentuados. Grupos doadores

de elétrons, grupos substituintes volumosos nessa posição e substituições

variadas nas demais posições do anel A, reduzem a atividade. Grupos

aceptores de elétrons nas posições 2’ ou 4’ do anel C aumentam a atividade e,

em outras posições a diminuem como demonstram a Fig. 3 e a Tabela 1. A

substituição na posição 5 do anel B por carbonila e na posição 4 por grupo

metílico dá origem a fármaco antagonista, o flumazenil representado na Fig. 4

(SILVA, 2006).

Fig. 3 Fórmula geral dos benzodiazepínicos.

Fonte: (SILVA, 2006)

Fig. 2 Estrutura Benzodiazepina.

Fonte: (FERREIRA, 1992)

21

Tabela 1. Benzodiazepínicos comercializados no Brasil. Nomes e Estruturas.

Nome Genérico

R1

R2

R3

R7

R2’

Alprazolam Anel triazólico

fundido

-H -Cl -H

Bromazepam -H =O -H -Br N

Clobazam -CH3 =O -H -Cl -H

Clonazepam -H =O -H -NO2 -Cl

Clorazepato -H =O -COO -Cl -H

Clordiazepóxido -H -NHCH3 -H -Cl -H

Cloxazolam -H =O -H -Cl -Cl Anel

tetraidrooxazólico

fundido em 4 e 5.

Diazepam -CH3 =O -H -Cl -H

Flunitrazepam -H =O -H -NO2 -F

Flurazepam -CH2CH2N(C2H5)2 =O -H -Cl -F

Lorazepam -H =O -OH -Cl -Cl

Midazolam Anel imidazólico

fundido

- -H -Cl -F

Nitrazepam -H =O -H -NO2 -H

Fonte: Adaptado de SILVA, 2006.

Fig. 4 Estrutura química do Flumazenil

Fonte: Adaptado de SILVA, 2006.

22

4.2.2 - Farmacodinâmica

Os benzodiazepínicos são genericamente classificados como

depressores do Sistema Nervoso Central (USP-DI, 2003). Além das

propriedades sedativo-hipnóticas os BZD apresentam propriedades

anticonvulsivante, relaxante muscular e amnésica. Essas ações são mediadas

pela potencialização da atividade do Ácido Gama Aminobutírico (GABA), um

potente neurotransmissor inibitório, no cérebro (SWEETMAN, 2005).

Os Benzodiazepínicos exercem seus efeitos através de interações

alostéricas com o receptor GABA do tipo A. Os receptores GABAA são canais

iônicos pentaméricos operados por ligante, e a estimulação desses receptores

pelo GABA leva ao influxo de cloreto, resultando em hiperpolarização das

células pós-sinápticas. Quando os BZDs ligam-se ao local do receptor

benzodiazepínico, eles induzem uma alteração conformacional no receptor,

resultando em um aumento da frequência de abertura do canal de cloreto e

aumento do influxo deste íon através da estimulação do receptor pelo GABA,

figura 5 (MINNEMAN e WECKER, 2006).

Fig 5. Estrutura do receptor GABA A, mostrando a proteína associada à membrana e os sítios de ligação específicos para o GABA, benzodiazepínicos (BZDs), barbitúricos e anestésicos em geral. Fonte: Adaptado de GOMMERS et al., 2008.

23

Toda a classe de benzodiazepínicos compartilha o mecanismo de ação

e as propriedades terapêuticas, diferindo quanto ao início, intensidade e

duração de seus efeitos, o que pode ser explicado na maioria dos casos pelas

propriedades farmacocinéticas de cada medicamento dessa classe

(GORENSTEIN e POMPÉIA In: BERNIK, 1999).

4.2.3 – Farmacocinética

Normalmente, os benzodiazepínicos são administrados por via oral,

sendo bem absorvidos. Podendo, ainda, ser administrado por via intravenosa e

intramuscular. Esta última apresenta uma absorção muito baixa. Todos s BZDs

são metabolizados no fígado e, por fim, excretados na forma de conjugados de

glicuronídeo na urina (RANG et al., 2007).

Os benzodiazepínicos sofrem intenso metabolismo hepático pelo

sistema citocromo P-450 (Fig. 6). As principais reações de biotransformação

são a N-desalquilação e hidroxilação alifática, seguidas de conjugação a

glicuronídeos inativos que são excretados na urina. Os benzodiazepínicos de

ação prolongada, clorazepato, diazepam, clordiazepóxido, prazepam, e

halazepam, são desalquilados, dando origem ao composto ativo N-

desmetildiazepam (nordiazepam). Este composto possui uma meia-vida de

eliminação de 30 a 200 horas, e é responsável pela prolongada duração da

ação desses compostos. O N-desmetildiazepam é hidroxilado a oxazepam, que

forma um glicuronídeo conjugado. O alprazolam sofre hidroxilação seguida de

glicuronidação, e o lorazepam é diretamente glicuronidado (MINNEMAN e

WECKER, 2006).

24

Com exceção do clorazepato, todos os benzodiazepínicos são

completamente absorvidos de forma inalterada pelo trato gastrintestinal (GI). A

absorção, o tempo necessário para atingir o pico das concentrações e o início

da ação são mais rápidos para o diazepam, o lorazepam, o alprazolam, o

triazolam e o estazolam. O início rápido dos efeitos é importante para pessoas

que usam uma única dose de benzodiazepínicos a fim de acalmar um surto

episódico de ansiedade ou para adormecer rapidamente (SADOCK et al.,

2007).

Diazepam, clordiazepóxido, clonazepam, clorazepato, flurazepam,

prazepam, quazepam, halazepam têm meia-vidas plasmáticas de 30 a até mais

do que 100 horas e são, por isso, benzodiazepínicos de longa duração. As

meias-vidas do lorazepam, do oxazepam, do temazepam e do estazolam são

entre 8 e 30 horas. O alprazolam tem uma meia-vida de 10 a 15 horas, e o

triazolam tem uma meia-vida mais curta (2 a 3 horas) de todos os

benzodiazepínicos administrados por via oral, tabela 2 (SADOCK et al., 2007).

Fig. 6 Esquema das principais inter-relações metabólicas entre os benzodiazepínicos. * Metabólito ativo.

Fonte: (MINNEMAN e WECKER, 2006)

25

Fármaco

Início da Ação*

Meia-vida+

Alprazolam Intermediário Intermediária

Clordiazepóxido Intermediário Longa

Clorazepato Rápido Longa

Diazepam ++ Rápido Longa

Flurazepam Rápido Longa

Halazepam Intermediário Longa

Lorazepam ++ Intermediário Intermediária

Oxazepam Lento Curta

Prazepam Lento Longa

Temazepam Lento Intermediária

Triazolam Rápido Curta

Os BZDs de duração mais curta, como midazolam, flunitrazepam e

oxazepam, são usados mais enquanto indutores do sono, porque não têm

efeito de sonolência ao acordar. Os de duração mais longa, como

clordiazepóxido, lorazepam, alprazolam, diazepam, clonazepam e

bromazepam, são mais usados como ansiolíticos, pois permanecem por mais

tempo no organismo, como pode ser vizualizado na figura 7 (GOODMAN &

GILMAN, 2005).

Fonte: Adaptado de MINNEMAN e WECKER, 2006. *Rápido = 15 – 30 min; Intermediário = 30 – 45 min; Lento = 45 – 90 min. +Curta, < 10 h; Intermediária, 10 – 36 h; Longa, > 48 h.

++Também administrado por via injetável.

Tabela 2. Parâmetros farmacocinéticos de benzodiazepínicos

representativos após administração oral

26

Fig. 7 Fórmulas estruturais dos principais benzodiazepínicos.

Fonte: Adaptado de GOODMAN & GILMAN, 2005.

27

As vantagens dos medicamentos de meia-vida longa sobre os de meia-

vida curta incluem doses menos frequentes, menos variação nas

concentrações no plasma e fenômenos de abstinência menos graves. As

desvantagens incluem acúmulo do medicamento, aumento do risco de

comprometimento psicomotor diurno e aumento da sedação diurna. A insônia

de rebote e a amnésia anterógrada são consideradas mais problemáticas com

os medicamentos de meia-vida curta do que com os de meia-vida longa

(SADOCK et al., 2007).

4.3 INDICAÇÕES TERAPÊUTICAS

Os BZDs são considerados fármacos de primeira escolha no tratamento

das ansiedades, bem como hipnóticos e sedativos. São relativamente seguros,

em relação aos outros fármacos disponíveis, e mais eficazes (SILVA, 2006).

Além disso, podem ser úteis como miorrelaxantes, anticonvulsivantes,

pré-anestésicos, anestésicos propriamente ditos, para transtorno do pânico,

fobia social, transtorno misto de ansiedade-depressão, transtorno bipolar I,

acatisia, Doença de Parkinson e outras indicações psiquiátricas como:

Sintomas de abstinência alcoólica; Agitação psicótica ou induzida por drogas

(exceto anfetamina) e Catatonia (SADOCK et al., 2007).

No tratamento da ansiedade os benzodiazepínicos não devem ser

utilizados por um período superior a seis semanas (MAINE GUIDELINE, 2006;

HEALTH CANADÁ,1992; CSM, 1988 ). O uso por um período que varia entre

seis semanas a seis meses pode levar ao desenvolvimento de dependência e

tolerância. Ultimamente, devido à alta eficácia e segurança dos

benzodiazepínicos como ansiolíticos, vem aumentando o número de casos

relacionados com uso abusivo, com sua consequente dependência e os

problemas relacionados (MAINE GUIDELINE, 2006; LONGO e JOHNSON,

2001; FORD et al., 2005).

28

A utilização de benzodiazepínicos na depressão deve ser feita somente

quando a ansiedade é um componente maior e quando não há um

comportamento agressivo predominante (HEALTH CANADÁ, 1992). De acordo

com o Committee on Safety of Medicines - CSM (1988) os BZD não devem ser

utilizados como monoterapia no tratamento da depressão ou ansiedade

associada com depressão, pois podem precipitar suicídio em alguns pacientes.

Segundo (SADOCK et al., 2007), a insônia pode ser um sintoma de um

distúrbio físico ou de um transtorno psiquiátrico, os hipnóticos não devem se

utilizados por mais de 7 a 10 dias consecutivos sem uma investigação ampla

de sua causa. Contudo, muitos pacientes sofrem dificuldades de sono de longa

duração e se beneficiam enormemente do uso de agentes hipnóticos. O

temazepam, o flurazepam e o triazolam são os benzodiazepínicos mais com

indicação exclusiva para insônia.

Entre as restrições ao uso de benzodiazepínicos destacam-se os

alcoólatras e usuários de outras substâncias depressoras do SNC, e os idosos.

Nos dois primeiros casos, efeitos depressores aditivos com o álcool ou com

outras substâncias depressoras do SNC justificam a restrição. No caso de

idosos, o critério de Beers publicado em 1997, que trata da utilização de

medicamentos por pacientes com idade superior a 65 anos, considera o uso de

BZDs de meia-vida longa (ex. Diazepam) potencialmente inapropriado para

idosos, independente do diagnóstico. Estes medicamentos têm a meia-vida

aumentada em pacientes idosos, produzindo sedação prolongada e aumento

dos riscos de quedas e fraturas. Se o uso for necessário, preferir um BZD de

meia-vida curta a intermediária (ex. Clonazepam). Em pacientes idosos com

quadro depressivo o uso de BZDs com meia-vida longa deve ser evitado, pois

pode produzir ou exacerbar a depressão (BEERS et al., 2003).

29

A prescrição adequada de BZDs, de acordo com a literatura, deve

considerar três aspectos: a necessidade, a intermitência e a curta duração do

tratamento (LONGO e JOHNSON, 2001). A United Nations Office on Drugs and

Crime (UNODC) por meio da Resolução 44/13 – Contribuição para o uso

apropriado de Benzodiazepínicos - (UNODC, 2007) recomenda aos

profissionais de saúde, quando da prescrição de BZDs, que se atenham as

seguintes questões :

- É necessária uma investigação médica para justificar a sua prescrição;

- Identificar a indicação exata e prescrever pelo menor tempo possível;

- É necessária a descontinuação do tratamento;

- Devem-se usar as menores doses possíveis;

- Deve-se esclarecer o paciente quanto ao risco de acidentes para

motoristas e operadores de máquinas;

- Deve-se esclarecer que álcool ou medicamentos psicotrópicos podem

interagir com os benzodiazepínicos.

Segundo os limites impostos pelo FDA (FOOD AND DRUG

ADMINISTRATION), a prescrição de doses acima de 4 mg/dia de alprazolam

ou 40 mg/dia de diazepam é procedimento de risco no que se refere ao

desenvolvimento de abuso de BZDs, exceto no caso de pacientes com

transtorno do pânico, que podem se beneficiar de dosagens duas a três vezes

superiores às preconizadas pelo FDA para o tratamento dos estados ansiosos

crônicos. As doses consideradas seguras, ou seja, em que o risco de abuso é

pequeno, podem ser exemplificadas pelas seguintes doses diárias: 5 mg/dia de

lorazepam, 2 mg/dia de alprazolam , 4 mg/dia de clonazepam, 20 mg/dia de

diazepam e 60 mg/ dia de oxazepam. Outro critério clínico que pode ser

adotado é a prescrição de doses de BZDs inferiores à metade da dosagem

máxima sugerida pelo FDA (LARANJEIRA e CASTRO In: BERNICK, 1999).

30

Os pacientes que usam BZDs abusiva e exclusivamente (por exemplo,

de 20 mg/dia a 100 mg/dia de diazepam) podem manifestar padrões de uso

típicos, que compreendem uso de altas doses de BZDs ingeridas de uma só

vez ou uso de altas doses várias vezes ao longo do dia (LARANJEIRA e

CASTRO In: BERNICK, 1999).

4.4 - EFEITOS ADVERSOS

Os efeitos adversos encontrados com maior frequência com o uso de

benzodiazepínicos são uma extensão de seus efeitos depressores no SNC, e

incluem sedação, tonturas, ataxia e letargia (MINNEMAN E WECKER, 2006).

As reações adversas mais sérias ocorrem quando outras substâncias

sedativas, como o álcool, são ingeridas concomitantemente. Essas

combinações podem levar à sonolência acentuada, desinibição ou mesmo

depressão respiratória. Com pouca frequência, os agonistas de receptores

benzodiazepínicos provocam déficits cognitivos leves que podem comprometer

o desempenho no trabalho. As pessoas que estão usando esses agonistas

devem ser alertadas sobre a necessidade de cautela adicional quando

estiverem dirigindo ou trabalhando com maquinaria perigosa (SADOCK et al.,

2007).

Os BZDs de alta potência, em especial o triaziolam e o zolpidem, podem

produzir amnésia anterógrada. Um raro e paradoxal aumento da agressividade

foi relatado em pacientes que estavam recebendo BZDs, embora esse efeito

possa ser mais comum em pacientes com lesão cerebral preexistente.

Reações alérgicas a esses medicamentos também são raras, mas alguns

estudos relatam exantemas maculo-papulares e prurido generalizado. Os

sintomas de intoxicação pelos benzodiazepínicos incluem confusão, fala

arrastada, ataxia, sonolência, dispneia e hiporreflexia (SADOCK et al., 2007).

31

Uma vantagem em relação aos outros depressores do SNC é o fato de

possuírem um antagonista eficaz para neutralizar os efeitos de superdosagem

aguda, o flumazenil (RANG et al., 2007; MARCOLIN e RUMI, 1999).

Um dos efeitos adversos mais importantes é a dependência. Esta, pode

ser caracterizada pela síndrome da abstinência, uma série de sintomas e sinais

após a suspensão abrupta do uso de qualquer substância. É comum em

pacientes em uso de benzodiazepínicos, mesmo em doses baixas e em pouco

tempo de uso. O abuso do uso de BZDs é comum quando pacientes aumentam

a dose recomendada ou o medicamento é usado sem orientação médica.

Fatores associados, como características pessoais, condições sociais e

profissionais, bem como distúrbios psiquiátricos podem favorecer o abuso

(LARANJEIRA e CASTRO In: BERNICK, 1999).

4.5 – USO, ABUSO E DEPENDÊNCIA

O uso prolongado de BZDs, ultrapassando períodos de 4 a 6 semanas

pode levar ao desenvolvimento de tolerância, abstinência e dependência

(FRASER, 1998; WHO, 1983).

Os BZDs são bem conhecidos por produzirem dependência psicológica

ou fisiológica. O conceito de dependência psicológica está diretamente ligado à

capacidade de um fármaco de reforçar os comportamentos associados ao seu

consumo. Clinicamente, observa-se o comprometimento de repertório de

comportamentos associados à busca, aquisição e consumo da droga (descritos

pela primeira vez por Edwards, 1977, em trabalho intitulado “Síndrome de

Dependência do Álcool”). Dependência fisiológica refere-se a um estado

alterado de funcionamento do organismo, em especial do Sistema Nervoso

Central (SNC), induzido pelo uso prolongado de um fármaco. O epifenômeno

desse estado alterado é o surgimento de sintomas de abstinência, de duração

determinada, quando da interrupção do uso da droga, sintomas esses podem

ser revertidos pela reintrodução da droga ou pelo uso de outra droga da

mesma classe, em fenômeno conhecido como tolerância cruzada (HAEFELY,

1990 In: BERNIK, 1999).

32

São inúmeros os casos de abuso e dependência correlacionados ao uso

tanto terapêutico, quanto irracional de benzodiazepínicos. Sua suspensão

abrupta pode causar reações de abstinência (SILVA, 2006).

Os sintomas relacionados à abstinência incluem: ansiedade, agitação,

irritabilidade, insônia, cefaléia, tremores, tontura, anorexia, náuseas, vômitos,

diarréia, fraqueza, fotofobia, despersonalização e depressão. Esses sintomas

podem surgir até uma semana após a retirada do medicamento. Dependem da

meia-vida, da conversão em metabólitos ativos e respectivas meias-vidas

(SILVA, 2006).

Muitas vezes a retirada de fármacos com meia-vida longa não acarreta o

aparecimento dos sintomas de abstinência. Em outras, com a utilização de

fármacos com tempo de ação curto, chega-se a observar sintomas de

ansiedade entre as doses. Nesses casos existe tendência para aumentar a

dose, entretanto, surge dificuldade de interromper a medicação. Não ficou

ainda esclarecido se, nesses casos, os sintomas estão relacionados à

tolerância ou à abstinência. O alprazolam e lorazepam são os que mais

apresentam esse quadro clínico. Alguns médicos sugerem a substituição por

fármacos de ação prolongada, onde cada miligrama deles pode ser substituído

por um de clonazepam (SILVA, 2006).

Tolerância é a diminuição do efeito inicial atingido por um medicamento

após algum tempo de uso na mesma dose. Em relação ao desenvolvimento de

tolerância, há controvérsias. Em curto prazo (até 32 semanas de uso), parece

não ocorrer e, a longo prazo, há falta de estudos. Quanto a abstinência, nos

estudos realizados com o alprazolam, um percentual variável de pacientes não

foi capaz de reduzir a dose, após um período que variou de 6 semanas a 22

meses. Não fica claro, entretanto, se a dificuldade para reduzir a dose se deve

à abstinência, recrudescência de sintomas de pânico ou às recaídas

(GALDURÒZ, 2001).

33

Os benzodiazepínicos estão entre os medicamentos mais usados de

forma inadequada (WHO, 2002). Em um estudo coordenado pela OMS (WHO,

2005) investigando desordens mentais em diversas cidades do mundo,

incluindo o Brasil, foi constatado que os ansiolíticos (principalmente os BZDs),

hipnóticos e antidepressivos eram as classes mais prescritas.

Estima-se que 1,6% da população adulta sejam usuária crônica de BZDs

e os indivíduos que abusam destes medicamentos geralmente o fazem para

lidar com os problemas cotidianos, tais como as reações de estresse da vida

diária (LARANJEIRA e CASTRO In: BERNICK, 1999).

Foi relatado que os BZDs possuem um alto potencial de abuso. Porém,

evidências sugerem que a dependência psicológica ocorre principalmente em

pessoas com história de abuso de álcool ou drogas (SILVA, 2006).

O abuso recreativo pode estar associado ao uso concomitante com

outros medicamentos, mais comumente opióides (80%). Cerca de 15% dos

usuários de heroína, usam BZDs, diariamente, por mais de um ano (LONGO e

JOHNSON, 2001). Os pacientes que apresentam antecedentes pessoais de

abuso de álcool e outras drogas tendem a experimentar os efeitos dos BZDs

como “reforçador”, o mesmo não é observado em indivíduos normais, ansiosos

ou sem histórico prévio de abuso de drogas (LARANJEIRA e CASTRO In:

BERNICK, 1999). Os BZDs podem ser usados ainda com a finalidade de

buscar prazer e alívio dos sintomas decorrentes do uso das outras drogas e,

nesse caso, estas substâncias são utilizadas, em geral, sem prescrição médica

(AUCHEWSKI et al., 2004).

Um levantamento, feito com os universitários da área de saúde da

Universidade Federal do Amazonas, sobre o uso de psicotrópicos revelou que

9,2% dos estudantes utilizavam ansiolíticos. Este número foi menor quando

comparado ao uso de solventes (11,9%) e maconha (9,4%), mas foi maior que

o uso de cocaína (2,1%) e alucinógenos (1,2%) (LUCAS et al., 2006).

34

O consumo de psicofármacos foi também avaliado por RODRIGUES, em

seu estudo comparativo com 3542 indivíduos, e encontrou 9,9% de usuários na

cidade de Pelotas, RS, sendo que 74% destes estavam utilizando as

substâncias há mais de 3 meses. O maior consumo foi associado ao gênero

feminino, aumento da idade, o diagnóstico médico de hipertensão e a utilização

de serviços médicos. A prevalência entre idosos maiores que 65 anos foi de

21,3% (RODRIGUES et al., 2006).

Huf e colaboradores constataram que o consumo entre mulheres idosas

(mais de 60 anos) atendidas em um centro de convivência do Rio de Janeiro e

verificaram que o bromazepam foi o medicamento mais utilizado. Encontraram,

ainda, que 10 mulheres em 634, embora não tivessem esse medicamento

recomendado por médicos, o consumiam, enquanto 66,7% mencionaram fazer

uso de bebidas alcoólicas, que se constitui em potencializador dos efeitos

tóxicos dos benzodiazepínicos (HUF et al., 2000).

Uma análise da prescrição e dispensação de psicotrópicos foi realizada

em 2002 por Noto e colaboradores em duas cidades no estado de São Paulo.

Verificou-se o processamento de 108.215 prescrições, sendo 76.954 de BZDs

e 29.930 de anorexígenos. Os BZDs mais frequentes foram o diazepam

(31.644), bromazepam (16.911) e clonazepam (7.929). As mulheres em geral

receberam mais prescrições que os homens, variando em uma razão de 2 para

1 a 3 para 1. Concluiu-se nesse estudo que existe uso irracional de

psicofármacos no Brasil, além de várias práticas inapropriadas de prescrição e

dispensação dessas drogas (NOTO et al., 2002)

35

Os valores observados, em alguns estudos sugerem, fortemente, a

conexão entre as prescrições observadas e a busca por padrões estéticos que

a sociedade valoriza, padrões estes historicamente relacionados ao gênero

feminino. Dessa forma, a associação entre regimes para emagrecimento e

prescrições de fármacos psicotrópicos pode ser inferida, quando, por exemplo,

alguns autores referem que o consumo de anfetaminas é normalmente maior

entre mulheres (NAPPO et al., 2002; NOTO et al., 2002). Preocupado com esta

situação, em 1997, o Conselho Federal de Medicina emitiu uma resolução pela

qual não se permite mais a prescrição da associação entre anfetaminas e

benzodiazepínicos. Entretanto, sabe-se que a prática tem sido mantida por

vários médicos, com as receitas sendo dispensadas em separado, mas com

utilização terapêutica simultânea, situação esta incompatível com uma prática

sanitária saneadora. (CFM, 1997)

Os problemas relacionados ao uso inadequado de benzodiazepínicos

são, em grande parte, causados por erros de prescrição médica. No caso

brasileiro esses medicamentos são legalmente controlados e, em princípio, só

seriam acessíveis via prescrição. Em estudo qualitativo realizado na cidade de

São Paulo, os autores confirmam que a prescrição médica é um fator de

grande importância na manutenção do uso crônico de BZDs e que o usuário é,

na verdade, um paciente desinformado. Além disso, o uso do medicamento é

legitimado pela falta de preparo do médico (ORLANDI e NOTO, 2005).

36

Um estudo realizado no município de São Paulo, em 2005, confirmou a

ocorrência de uso indevido de benzodiazepínicos no Brasil. A metodologia que

se baseou em informações fornecidas por informantes-chave, levantou dados

sobre as práticas de prescrição, dispensação e uso indevido de

benzodiazepínicos ao longo dos últimos anos, através de entrevistas com

médicos, psicólogos, farmacêuticos e pacientes com história de uso crônico

destes medicamentos. O principal objetivo foi analisar a disponibilidade e

consumo dos medicamentos, bem como o papel do profissional da saúde

envolvido no sistema de prescrição e dispensação dos mesmos. Segundo esta

pesquisa, fatores como o baixo custo do medicamento, imagem positiva

conferida por usuários crônicos, má indicação e falta de uma melhor

preparação acadêmica no que se refere à prescrição de psicofármacos por

parte dos médicos (relatada pelos próprios profissionais), podem ser fatores

que propiciaram a banalização do uso destes medicamentos (ORLANDI e

NOTO, 2005).

A questão da irracionalidade na prescrição de BZDs por parte dos

médicos também foi discutida num trabalho realizado no ano de 2004, que

supõem um conhecimento falho da psicofarmacologia por parte da classe, que

torna, portanto, a prescrição um ato desbalanceado (AUCHEWSKI et al., 2004).

Além disso, alguns dados revelam que o clínico geral é o profissional mais

atuante em saúde mental no Brasil, o que poderia refletir, em parte, no

consumo indiscriminado desses fármacos de controle especial (LARANJEIRA,

1995).

Vale ressaltar, neste momento, a importância do profissional

farmacêutico, que é o responsável por zelar pelo uso adequado destes

medicamentos, através de uma correta dispensação, que vise minimizar os

potencias riscos, tanto de abuso e dependência, provocados pelo consumo dos

benzodiazepínicos.

37

4.7 IMPORTÂNCIA DA ATENÇÃO FARMACÊUTICA NA DISPENSAÇÃO DE

BZDs

Ao analisar as funções do farmacêutico no sistema de atenção a saúde

a Organização Mundial de Saúde - OMS estende o benefício da atenção

farmacêutica para toda comunidade reconhecendo a relevância da participação

do farmacêutico junto com a equipe de saúde na prevenção de doenças e

promoção da saúde. Na ótica da OMS a atenção farmacêutica é:

Os esforços para a readequação de atividades e práticas farmacêuticas

objetivando o uso racional dos medicamentos é essencial numa sociedade que

os fármacos constituem o arsenal terapêutico mais utilizado (LIPTON et al.,

1995). O uso racional ocorre quando o paciente recebe o medicamento

apropriado à sua necessidade clínica, na dose e posologia corretas, por um

período de tempo adequado e ao menor custo para si e para a comunidade

(MSH, 1997)

A Lei nº 5.991, de 17 de dezembro de 1973, estabelece que o processo

de dispensação de medicamentos na farmácia está sob a responsabilidade do

profissional farmacêutico (BRASIL, 1973). PEPE e CASTRO (2000) ressaltam

que o farmacêutico, como um profissional capaz de interagir com os

prescritores e os pacientes, deve possuir o quesito informação como alicerce

desta relação. A informação repassada deve ser confiável e baseada em

evidências.

“...um conceito de prática profissional na qual o paciente é o principal beneficiário

das ações do farmacêutico. A atenção farmacêutica é o compêndio das atitudes,

os comportamentos, os compromissos, as inquietudes, os valores éticos, as

funções, os conhecimentos, as responsabilidades e as habilidades do

farmacêuticos na prestação da farmacoterapia com o objetivo de obter resultados

terapêuticos definidos na saúde e na qualidade de vida do paciente” (OMS, 1993).

38

As sistematizações das intervenções farmacêuticas e a troca de

informações dentro de um sistema no qual participam vários atores tem grande

potencial de contribuição, seja a nível individual ou coletivo, para o uso racional

de medicamentos. Assim, pode-se dizer que ao farmacêutico moderno é

essencial: conhecimentos, atitudes e habilidades que permitam ao mesmo

integrar-se à equipe de saúde e interagir mais com o paciente e a comunidade,

contribuindo para a melhoria da qualidade de vida, em especial, no que se

refere à otimização da farmacoterapia e o uso racional de medicamentos

(OPAS, 2002).

A importância do farmacêutico enquanto cidadão e profissional da

saúde, na prevenção e diminuição do uso indiscriminado de medicamentos

como os BZDs, pode se resumir em tomada de decisões e ações onde este

poderá atuar:

a) Como especialista em informação sobre medicamentos, atuando em

Centros de Informação sobre Medicamentos (CIM), deve fornecer

informação imparcial, bem referenciada e criticamente avaliada sobre

qualquer aspecto da prática farmacêutica (MENDES, 2008);

b) Deve integrar a equipe multiprofissional de atenção à saúde como

especialista em medicamentos, discutindo alternativas terapêuticas,

alertando para interações e para reações adversas e trazendo

informação sobre formas farmacêuticas, apresentações comerciais,

custos, contribuindo para a individualização da terapêutica.

(MENDES, 2008);

39

c) Deve orientar o paciente quanto ao tratamento: a que horas e como

tomar o medicamento, horário da tomada do medicamento em

relação ao horário das refeições, tratamentos não medicamentosos,

cuidados gerais; advertências quanto à dose máxima diária, a

possíveis interações com outros medicamentos, com álcool, com

alimentos, quanto ao risco de suspender o medicamento; orientações

sobre o efeito do medicamento: objetivo do uso, início do efeito, o

porquê da duração do tratamento; orientações sobre efeitos

adversos: quais esperar, quanto tempo duram, como controlá-los, o

que fazer se ocorrerem (MENDES, 2008);

d) Deve acompanhar os resultados do tratamento: as intervenções

terapêuticas estão sendo efetivas? Ocorreram reações adversas?

Ocorreram erros de medicação? Como está sendo a adesão ao

tratamento? (MENDES, 2008).

A primeira investigação sobre o impacto das ações de atenção

farmacêutica foi realizado nos Estados Unidos utilizando os dados do Projeto

Minnesota de Atenção Farmacêutica. Os resultados mostraram que após um

ano aumentou o número de pacientes que alcançaram resultado terapêutico

positivo. A resolução dos problemas relacionados a medicamentos reduziu a

complexidade da demanda farmacoterápica. Em síntese observou uma relação

custo-benefício favorável (PHARMACEUTICAL,1997; TOMECHKO et al.,

1995).

Apesar da existência de uma regulamentação sobre medicamentos

sujeitos a controle especial, regidos pela portaria - SVS/MS nº 344/98 da

ANVISA (CFF, 1999/2000), que poderia servir como ferramenta para restringir o

uso destes medicamentos, estudos demonstram que pacientes recorrem a

diversas estratégias para a obtenção de receitas, como por exemplo,

solicitação a médicos amigos ou familiares, ou até mesmo, a procura por

diferentes médicos alternadamente. Outro problema relacionado a esta questão

é a existência de mercados clandestinos, que disponibilizam estes

medicamentos sem que haja o menor controle (LARANJEIRA e CASTRO,

1999).

40

Com relação à fiscalização, realizada pela ANVISA, percebe-se algumas

dificuldades quanto à falta de recursos humanos e financeiros, que podem

gerar de alguma maneira, impedimentos para a realização de uma verdadeira

“vigilância”. A permissão muitas vezes concedida pelas farmácias e pelo próprio

farmacêutico, que é o elo de ligação entre o medicamento e o paciente, como,

por exemplo, emitir a venda de receita sem data, rasurada, vencida ou até

mesmo com a ausência desta, também pode ser considerada um fator

facilitador do uso (HUF et al., 2000).

No mês de abril de 2007, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária

(ANVISA) divulgou a criação do Sistema Nacional de Gerenciamento de

Produtos Controlados (SNGPC), um programa informatizado feito para

monitorar a produção, a circulação, o comércio e o uso de medicamentos

sujeitos a controle especial. Espera-se assim, facilitar o controle da prescrição

e distribuição desses medicamentos, incluindo psicofármacos, além de evitar

fraudes e a venda ilícita dos mesmos. O monitoramento do uso dos

medicamentos e o uso de informações coletadas para desenvolver,

implementar e avaliar as estratégicas para mudar o comportamento do uso

inadequado do medicamento são fundamentais para qualquer programa

nacional de promoção do uso racional de medicamentos (ANVISA, 2007).

Objetivando avaliar o cumprimento da legislação quanto à prescrição e

dispensação de medicamentos psicotrópicos das listas B e C1 da Portaria n.º

344/98 – SVS/MS foi realizado um estudo no ano de 2004, em sete farmácias

de manipulação de Ribeirão Preto - São Paulo. Neste estudo foram analisadas

753 receitas do mês de novembro de 2000. O não cumprimento pelas

farmácias está presente em 88,0% das receitas B, enquanto que por parte dos

médicos a porcentagem é de 99,6% para B. Em 89,2% das receitas B a

dispensação ocorreu no prazo fixado por lei. Os anorexígenos predominam

entre as prescrições B (52,3%), seguidos dos benzodiazepínicos (47,7%). A

maioria das prescrições foi emitida por clínicos gerais (51,4%). A quantidade

aviada não apareceu na maioria das receitas, sendo esta uma das falhas mais

frequentes, atingindo 85,8% das receitas B (ANDRADE et al., 2004).

41

Os dados apresentados quanto à legibilidade das receitas apontam

importante dificuldade na dispensação dos medicamentos de controle especial.

É importante destacar os problemas diretamente envolvidos na dispensação,

qual sejam a ilegibilidade da forma farmacêutica (9,3% nas B); da dosagem

(7,4% nas B) e da posologia (5,1% nas B). A dificuldade de legibilidade da letra

do prescritor tem sido responsável por relatos de graves problemas de saúde,

sendo, inclusive, classificada como falta ética pelo Art. 39 do Código de Ética

Médica (CFM, 2003). O aviamento de prescrições nestas condições pode levar

a erros de manipulação com a possibilidade de não se atingir o efeito

terapêutico desejado ou o aparecimento de reações não desejadas e inclusive

fatais. Assim, pode-se dizer que os resultados revelam práticas inadequadas

referentes tanto à prescrição quanto à dispensação de medicamentos de

controle especial, confirmando a necessidade de fiscalização mais rigorosa

(ANDRADE et al., 2004).

Daí vem a importância do papel do profissional Farmacêutico diante

deste contexto, orientando os pacientes quanto ao uso racional de BZDs,

realizando uma correta dispensação e um acompanhamento

farmacoterapêutico do tratamento, prestando a atenção farmacêutica

necessária, visando melhorar a qualidade de vida do paciente.

42

5- DISCUSSÃO

Este estudo confirma a ocorrência de uso indiscriminado de

Benzodiazepínicos. Existem dois perfis principais de usuários crônicos de

BZDs descritos: um deles composto por idosos, que buscam principalmente o

efeito hipnótico da medicação, e o outro composto por indivíduos de meia

idade, predominantemente do sexo feminino, que buscam o efeito ansiolítico.

Essas categorias também são apresentadas em estudos internacionais por

Yanmei (1996), King (1994) e Bernick (1999).

As falhas no processo de dispensação dos BZDs são confirmadas por

outras pesquisas nacionais (NOTO, 2002). Porém, os usuários entrevistados

negaram a utilização de estratégias ilegais de obtenção da medicação nas

drogarias. Embora o grupo de usuários precisasse ser ampliado para verificar

tais conclusões, este dado sugere que o usuário indevido seja, na verdade um

paciente desinformado, que mantém o uso crônico do BZD legitimao pela falta

de preparo do médico.

No que diz respeito à classe médica, o presente estudo confirma a

prescrição médica como fator de grande importância na manutenção do uso

crônico de benzodiazepínicos. A prescrição médica indiscriminada também tem

sido observada em outros países. Em um estudo domiciliar realizado na China,

envolvendo 3.000 famílias, foram encontrados 107 dependentes de BZDs, dos

quais 91,6% adquiriam medicação através de prescrição médica (YANMEI,

1996).

Outro estudo, sobre as características sociodemográficas de usuárias

crônicas de BZDs em Valência, na Espanha, o clínico geral foi o prescritor

regular de benzodiazepínicos em até 100% dos casos (SOBRECASES, 1997).

43

Esta pesquisa também indica a carência de informação por parte dos

usuários a respeito dos efeitos adversos ocasionados pelos benzodiazepínicos.

Estudos realizados em outros países também sugerem a relevância desta

questão. Em uma pesquisa conduzida na Áustria, em que foram entrevistados

pacientes internados que faziam uso de BZDs, apenas 2% consideraram

suficientes as informações providas pelo prescritor, enquanto 66% negaram ter

recebido qualquer informação (LENHART, 2001). A falta de esclarecimento

parece facilitar a cronificação do uso, à medida que o usuário não avaliaria os

riscos aos quais se submete.

No Brasil, a baixa percepção de risco pela população também tem suas

raízes na carência de debate social sobre a questão nos meios de

comunicação, que privilegiam apenas o cenário das drogas ilícitas como

problema. Além disso, entre os psicotrópicos, os BZDs figuram como

medicamentos com razoável margem de segurança e inegável eficácia, o que

justifica sua popularidade junto aos médicos e à população leiga (BERNICK,

1999).

Apesar da segurança oferecida pelos benzodiazepínicos, observa-se na

literatura a recomendação preferencial de outras intervenções que não a

prescrição de BZDs para o tratamento ou alívio sintomático de estado ansioso

e de insônia. São recomendados agentes farmacológicos não pertencentes à

classe dos BZDs, bem como intervenções psicoterápicas ou a combinação de

ambos (LARANJEIRA, 2001).

Essa realidade não vem dispondo de qualquer respaldo junto às políticas

de promoção de saúde. Isso aponta para a necessidade de melhor formação e

atualização dos profissionais, assim como de informação dos usuários,

medidas de prevenção primária, que poderiam resultar em grande impacto

social a um baixo custo. Neste cenário, não apenas a classe médica, mas os

profissionais de saúde em geral como enfermeiros, psicólogos, agentes

comunitários e farmacêuticos, poderiam ser alvo de tais medidas, já que estão

em posição privilegiada para alertar sobre os riscos e monitorar o uso destes

medicamentos junto à população.

44

6- CONCLUSÃO

O uso indevido de benzodiazepínicos parece envolver, além dos

usuários, os médicos que prescrevem a medicação e os farmacêuticos que a

dispensam. A falta de informação e a baixa percepção das consequências

deletérias do uso indevido de BZDs, por estes três personagens (médico,

farmacêutico e usuário), somada a uma série de outras questões discutidas

neste estudo, parecem ser alguns dos principais fatores que favorecem esse

fenômeno. As falhas no sistema de controle, apesar de ocorrerem, não

parecem ser os principais fatores.

Diante disso, podemos concluir que para melhorar essa realidade é

necessário um apoio multiprofissional ao paciente, destacando a importância

do profissional farmacêutico, que é responsável pela dispensação correta e

legal desses medicamentos, prestando a atenção farmacêutica necessária para

que o paciente seja orientado devidamente e alertado quanto aos riscos que os

benzodiazepínicos podem trazer, sendo utilizados tanto em doses terapêuticas,

quanto de forma irracional, promovendo assim, o uso racional de BZDs e

consequentemente a melhoria da qualidade de vida desses pacientes.

45

6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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