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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE FaC CURSO DE SERVIÇO SOCIAL LUANA DE CASTRO SILVA “PERMANEÇO NA VIOLÊNCIA PORQUE GOSTO DE APANHAR?- MULHERES QUE ARQUIVAM AÇÃO JUDICIAL DE LEI MARIA DA PENHA EM FORTALEZA FORTALEZA 2014

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE – FaC CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

LUANA DE CASTRO SILVA

“PERMANEÇO NA VIOLÊNCIA PORQUE GOSTO DE APANHAR?” - MULHERES QUE ARQUIVAM AÇÃO JUDICIAL DE LEI MARIA DA PENHA EM FORTALEZA

FORTALEZA 2014

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LUANA DE CASTRO SILVA

"PERMANEÇO NA VIOLÊNCIA PORQUE GOSTO DE APANHAR?” - MULHERES

QUE ARQUIVAM AÇÃO JUDICIAL DE LEI MARIA DA PENHA EM FORTALEZA

Monografia submetida à aprovação do Curso de bacharelado em Serviço Social da Faculdade Cearense – Fac, como requisito parcial para obtenção de título de bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Profa. Ms. Francis Emmanuelle Alves Vasconcelos

FORTALEZA 2014

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LUANA DE CASTRO SILVA

"PERMANEÇO NA VIOLÊNCIA PORQUE GOSTO DE APANHAR?” - MULHERES

QUE ARQUIVAM AÇÃO JUDICIAL DE LEI MARIA DA PENHA EM FORTALEZA

Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do título de bacharelado em serviço social, outorgado pela Faculdade Cearense – Fac, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelas professoras.

DATA DE APROVAÇÃO: ____/____/____

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________ Profa. Ms. Francis Emmanuelle Alves Vasconcelos

(Orientadora)

______________________________________________

Profa. Ms. Silvana Maria Pereira Cavalcante

______________________________________________

Profa. Ms. Socorro Letícia Fernandes Peixoto

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Aos meus pais, Maria Marlene (In

Memorian) e Raimundo Januário, pelo

apoio, companheirismo e incentivo que

sempre estiveram nesta caminhada

acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer primeiramente a Deus, pois sem Ele seria impossível

realizar mais esta etapa de um sonho. Agradeço-O por ter sempre me dado forças

para a minha caminhada. Por não ter me deixado desistir nos momentos de tristeza

e perda do bem mais precioso da minha vida: Minha Mãe. Nos momentos de

desânimo e angústia, o Senhor sempre esteve comigo me impulsionado a seguir.

Aos meus pais, Maria Marlene (In Memorian) e Raimundo Januário, me faltam

até palavras para agradecê-los por todo o apoio e atenção que sempre estiveram

por mim.

Aos meus irmãos, pelo apoio, companheirismo: obrigada pela paciência nos

dias em que eu estava estressada e preocupada por causa da faculdade e por vocês

estarem sempre dispostos a me ajudar no que fosse preciso.

Às minhas amigas da faculdade em especial: Claudia Andrade, Erisleide

Assunção, Laiana Farias, Iracema da Silva, Marzorie Grazielle e Tamara Machado

que sempre estiveram comigo nos momentos de dificuldades, por dividir minhas

angustias, desespero e tristeza com vocês.

Às minhas queridas supervisoras de estágio, Camila Maria Frota Alves e a

Elidiane Serpa, pelo carinho, atenção e a acolhida nos momentos de desespero em

que eu precisei de uma supervisora de campo e que contribui bastante para a minha

formação acadêmica. Aqui deixo o meu muito obrigada! A todos que fazem a

Secretaria de Assistência Social de Cascável, por terem me aceitado como

estagiária. Meus sinceros agradecimentos.

Aos professores (as) que fazem parte do corpo docente do curso de Serviço

Social da Faculdade Cearense, obrigada pelo conhecimento que foi repassado.

À minha Orientadora, Professora e Mestra Francis Emmanuelle Alves

Vasconcelos, por ter me aceitado como sua orientanda. Por a sua experiência,

simplicidade e competência que foram ferramentas essenciais nessa caminhada.

À minha banca: Ma. Silvana Maria Pereira Cavalcante e Ma. Leticia Peixoto

pela disponibilidade e atenção.

E a todos da equipe do JVDFM, em especial à Dra. Rosa Mendonça, que

permitiu minha pesquisa, a assistente social Jordianne Guedes e a psicóloga

Clarissa, a qual que me acolheu com tanta atenção, estavam sempre dispostas a me

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ajudar. E a todas as mulheres que contribuíram para a realização da minha

pesquisa, o meu muito obrigada.

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“A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém viu, mas pensar o que ninguém ainda pensou sobre aquilo que todo mundo vê.” (Arthur Schopenhauer)

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RESUMO

O tema desta pesquisa é a Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. O objetivo geral busca compreender quais são os fatores que levam às mulheres atendidas pelo Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a mulher da Comarca de Fortaleza, que sofrem violência, a permanecer com seus companheiros, namorados ou maridos. Os objetivos específicos são: analisar os dados existentes sobre a incidência da violência contra a mulher no Brasil, Ceará e em Fortaleza; identificar as políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher existentes em Fortaleza e conhecer o perfil biográfico das mulheres entrevistadas nesta pesquisa que sofrem com a violência. A pesquisa adotou a metodologia qualitativa e a análise de dados quantitativos. As categorias analíticas principais usadas na análise dessa questão foram: Violência contra a mulher, Gênero e Família e a coleta de dados se deu através das entrevistas, que foram aplicadas às mulheres que desejavam arquivar o processo ou desistirem da ação judicial. Utilizou-se também os formulários com dados estatísticos que foram fornecidos pelo JVDFM e a observação nos grupos de reflexão, usando como suporte os diários de campo. Concluímos que a desistência do processo judicial ocorre não apenas pela dependência financeira, sendo a dependência afetiva um dos fatores que foram citados nas entrevistas e nos dados do Juizado, os motivos pelos quais as mulheres ainda permanecem em um relacionamento violento, são por causa dos filhos, amor e do afeto que ainda persiste através da reconciliação e sempre na esperança de mudança por parte do companheiro. Palavras-Chave: Violência contra a mulher. Gênero. Família. Conjugalidade.

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ABSTRACT The theme of this research is the Domestic and Family Violence Against Women. The overall objective seeks to understand what are the factors that lead women served by the Juvenile Court d Domestic and Family Violence against women in the District of Fortaleza, suffering violence, to stay with their partners, boyfriends or husbands. The specific objectives are: to analyze the existing data on the incidence of violence against women in Brazil, Ceará and Fortaleza; identify public policies to address domestic and family violence against women exist in Fortaleza and know the biographical profile of the women interviewed in this survey who suffer from the violence. The research adopted a qualitative methodology. The main analytical categories used in the analysis of this question were: Violence, Gender and Family and the data collection was through interviews, that women who wanted to close the case or drop out of the lawsuit were applied. We also used the forms with statistical data that were provided by the JVDFM and observing the reflection groups, using as support field diaries. We conclude that the withdrawal of the judicial process takes place not only by financial dependence, and the dependence of the affective factors that were cited in interviews and data from the Juvenile Court, the reasons for which women still survive a violent relationship, moreover sons and the love that still persists through reconciliation and always hoping for change from their partner. Keywords: Domestic Violence. Gender. Family. Conjugality.

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LISTA DE GRÁFICOS

Figura 1 - Tipos de Violência ..................................................................................... 49

Figura 2 - Tipos de Violência (B) ............................................................................... 51

Figura 3 - Motivos da Desistência ............................................................................. 52

Figura 4 - Motivo de Desistência 2014 ...................................................................... 54

Figura 5 - Dependência Financeira 2014 .................................................................. 55

Figura 6 - Relação entre os cônjuges (2013) ............................................................ 56

Figura 7 - Relação entre os cônjuges (2014) ............................................................53

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS B.O: Boletim de Ocorrência

DDM: Delegacia de Defesa da Mulher

JVDFM: Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher da Comarca de

Fortaleza

CEDAW: Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação

contra a Mulher

CEPAM: Coordenadoria Especial de Políticas Públicas para as Mulheres

CLADEM: Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher

CERAM: Centro Estadual de Apoio e Referência à Mulher

LMP: Lei Maria da Penha

PRONASCI: Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania

SUS: Sistema Único de Saúde

SPM: Secretaria de Políticas para as Mulheres

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11

2 VIOLÊNCIA, RELAÇÕES DE GÊNERO E FAMÍLIA ............................................. 16

2.1 Violência Contra a Mulher ................................................................................ 16

2.2 Relações de Gênero: Uma Análise das Políticas no Atual Contexto ............ 22

2.3 Famílias e a Conjugalidade .............................................................................. 25

3 POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO À VIOLENCIA CONTRA A

MULHER E A LEI Nº 11.340/2006 ......................................................................... 29

3.1 Políticas Públicas: Uma Análise das Políticas no Atual Contexto ................ 29

3.2 A Lei Maria da Penha nº 11.340 de 2006 .......................................................... 35

4 PERCURSOS METODOLÓGICOS........................................................................ 39

4.1 O Campo de Pesquisa: Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a

Mulher da Comarca de Fortaleza ...................................................................... 40

4.2 Serviço Social no Espaço Sociojurídico ......................................................... 42

4.3 Dificuldades Metodológicas ............................................................................. 44

4.4 Perfil Biográfico das Mulheres Entrevistadas ................................................ 45

5 “NÃO CONSIGO VIVER SEM ELE” RELATOS E HISTÓRIAS DAS MULHERES

QUE DESISTEM DA AÇÃO JUDICIAL ................................................................. 49

5.1 Violência “Tudo Aquilo que me Deixa Marcas” .............................................. 49

5.2 Amor “Apaixonada por Ele, Não Consigo Viver sem Ele” ............................. 52

5.3 Família - “A Família é a Base de Tudo” ........................................................... 56

5.4 Relações de Gênero: “A liberdade que homem tem, e que a mulher não

tem” ..................................................................................................................... 58

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 61

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 63

APÊNDICES ............................................................................................................. 66

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1 INTRODUÇÃO

Esta pesquisa1 tem como tema a violência doméstica e familiar contra a

mulher. O objetivo geral é buscar compreender quais são os fatores que levam as

mulheres atendidas pelo Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher

da Comarca de Fortaleza, que sofrem violência, a permanecer com seus

companheiros, namorados ou maridos. Objetivou-se também analisar os dados

existentes sobre a incidência da violência contra a mulher no Brasil, Ceará e em

Fortaleza; identificar as políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica e

familiar contra a mulher existentes em Fortaleza e conhecer o perfil biográfico das

mulheres entrevistadas nesta pesquisa que sofreram com a violência.

A violência, em sua acepção mais geral, são ações que machucam as

pessoas de alguma forma, seja com palavras, sejam com agressões físicas. Todos

temos o direito de sermos livres de qualquer tipo de violência, porém, ainda hoje,

existem mulheres que vêm sofrendo com estes tipos de violência no mundo e no

Brasil. Podemos ver que os dados são alarmantes no Ceará, de acordo com os

quais se destacam a cidade de Fortaleza e a região do Cariri, em consonância com

o que dizem Frota e Santos (2012): os assassinatos de mulheres que são realizados

com extrema perversidade (2012, p. 79). Em 2010, conforme as informações

publicadas no jornal O Povo, foram quatro assassinatos para cada grupo de 100 mil

mulheres, com 174 homicídios de pessoas do sexo feminino no Estado do Ceará.

Fortaleza é a 16ª entre as capitais mais violentas, com 76 mortes e taxa de 5,8 por

100 mil mulheres (FROTA E SANTOS, 2012). Os índices de violência contra a

mulher nas capitais são mais elevados, de acordo com as informações do Mapa da

Violência (2012) diz que o estado do Espírito Santo vem liderando o ranking, com

taxa de 9,6 homicídios femininos em cada 100 Mil mulheres.

Em Fortaleza, de acordo com o Observem2, que divulga dados fornecidos

pela Secretaria de Segurança Pública do Estado do Ceará, somente este ano foram

registrados, no mês de fevereiro de 2014, 640 casos de violência contra a mulher

em Fortaleza. Os dados vêm em uma crescente, mesmo após o advento da Lei

Maria da Penha.

1 Peço licença ao leitor, leitura em 1ª pessoa.

2 O OBSERVEM é um espaço de monitoramento das condições de vida da mulher cearense e da violência que se

abate sobre elas. Trata-se de uma experiência de acompanhamento das políticas públicas e sociais desenvolvidas

local e nacionalmente para efetivação da Lei Maria da Penha.

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Na região Nordeste historicamente prevaleceu aquela imagem de homem

valente, o “cabra macho” que foi construído simbolicamente pelo imaginário dos

povos desta região, e é nesta realidade que está situada a região do Ceará, com

altos índices de violência de gênero especificamente o feminicídio3 (FROTA E

ALVES, 2012). Esse privilégio simbólico de uma masculinidade viril, agressiva

favorece uma cultura machista.

Geralmente quando pensamos em violência associamo-la ao

espaço público, mas para muitas mulheres o espaço doméstico tem se

constituído em um local para maus tratos. De acordo com o Painel SUS (2008), a maioria

dos casos de violência acontece na residência, e 31% são atos de repetição, ou

seja, costumam ser frequentes.

O meu interesse em estudar esta temática surgiu a partir de situações de

violência exercidas tanto pelos companheiros de alguns familiares, quanto de uma

amiga que sofreu, dentro no âmbito doméstico e familiar, agressões físicas e

psicológicas do seu marido, sem falar das palestras e dos seminários que tratavam

dessa temática.

As questões de gênero estão sempre presentes no meu cotidiano, tanto

familiar como em casa – por meio dos veículos de comunicação,- no meio social, por

meio da faculdade e em espaços públicos, em razão de relatos de mulheres que

ainda hoje sofrem com este trauma, e que não conseguiram romper com este ciclo

da violência.

A violência contra a mulher se tornou um tema instigante, já que hoje

atinge milhares de mulheres, crianças, idosos e adolescentes, por esta razão

despertou-me a curiosidade de entender como uma mulher que sofre violência há de

permanecer em um mesmo ambiente familiar com o seu companheiro. Presumimos

que o ambiente familiar e doméstico seja o lugar do afeto, do carinho, do amor, em

que o casal estabeleça uma relação de afeto e de respeito mútuo; que os homens

respeitem a mulher. Diante da ausência desses sentimentos: quais são os fatores

que levam as mulheres a permanecer na situação de violência? Buscamos entender

o ciclo da violência que estão inseridos nesses relacionamentos.

Na minha família sempre prevaleceram relações de gênero patriarcais. Eu

e minhas irmãs deveríamos ouvir os conselhos dos meus irmãos mais velhos, por

3 O feminicidio é o assassinato de mulheres que na maioria das vezes, ocorre por esta em uma condição de

mulher, ocorrendo assim por conta das cruéis relações desiguais de gênero. (FROTA E SANTOS, 2012).

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serem homens, os afazeres de casa sempre eram voltados para as mulheres,

enquanto os homens ficavam isentos desse trabalho. Além disso, as mulheres não

tinham a liberdade que os homens da família tinham como, por exemplo, sair com os

amigos para alguma festa.

Minha mãe, uma mulher que fazia tudo dentro de casa, enquanto o meu

pai muitas vezes ficava descansando. Nas relações conflituosas do meu pai e da

minha mãe, ela sempre sofreu muito, pois meu pai era o tipo de homem tido como

“garanhão”, ou seja, que tinham várias mulheres, até que um dia ela sofreu algumas

agressões físicas de uma das mulheres com quem ele mantinha vínculo afetivo.

Historicamente era comum as mulheres serem submissas aos seus

maridos e aceitar tudo que lhes acontecia caladas, prendendo-se assim por diversos

fatores, fortalecendo as desiguais relações de gênero, (re)construindo e

estruturando assim papeis e funções do que era ser homem e do que é ser mulher

em uma mesma sociedade, ocorrendo relações desiguais estas que pode facilitar a

ocorrer a violência de gênero (MADEIRA E COSTA, 2012). Caberia à mulher

preservar o casamento, apesar de tudo: traições e violências físicas e simbólicas.

Nascida e educada nesse contexto, no entanto, isso se tornou uma questão

conflituosa, porque não era natural para mim.

O meu interesse para fins de monografia era analisar o que levava uma

mulher que era violentada há anos a continuar convivendo com seu companheiro, e

denunciá-lo na delegacia, isso me inquietou a estudar este tema tão visível, ale do

mais, hoje, tais situações estão sendo denunciadas como formas de violência contra

a mulher.

O meu primeiro contato empírico com a temática se deu no quarto

semestre do curso de Serviço Social, na disciplina de políticas setoriais, quando a

professora sorteou em sala algumas leis, para irmos visitar e apresentar em sala,

dentre elas a lei Maria da Penha, atividade por meio da qual tive a oportunidade de

visitar o Centro de Referência e Atendimento à Mulher Francisca Clotilde4.

Chegando neste Centro me deparei com diversas mulheres que estavam sendo

atendidas. A assistente social que nos acolheu falou de todo o procedimento que

ocorria quando a mulher chegava pela primeira vez, e falando um pouco de toda a

4 Centro de Referencia e Atendimento à Mulher Francisca Clotilde. Este centro oferece um atendimento integral

e humanizado à mulher vítima de violência, seja física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.

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rede de enfrentamento à violência doméstica contra a mulher. Com isso

apresentamos em sala a Lei 11.340/2006 especificamente com base na experiência

de observação do Centro de Referência.

Ainda no mesmo semestre, cursei a disciplina de Pesquisa em Serviço

Social I, no qual ocorreu a construção prévia de um projeto de pesquisa, então

decidi pelo tema da violência contra a mulher.

A mulher atualmente deveria gozar os mesmos direitos que os homens,

expressos na Constituição Federal de 1988, na Declaração Universal dos Direitos

Humanos (1948). Hoje a maioria das mulheres já tem reconhecimento profissional e

ocupa uma grande parte das vagas no campo universitário. No entanto essas

garantias legais, muitas vezes, não se expressam no cotidiano simbólico.

Apesar de toda a luta empenhada pelos movimentos de mulheres e

feministas5, responsáveis por colocar nos espaços públicos diversas temáticas

relacionadas aos problemas enfrentados pelas mulheres no âmbito privado:

campanhas pelos direitos das mulheres, pelo direito da mulher à sua autonomia,

pelo direito ao aborto e direitos reprodutivos, direito à proteção contra a violência

doméstica. Estes movimentos contribuíram sistematicamente para o Brasil se tornar

um país bem mais democrático.

Ressalta-se, assim, que a violência domestica é a principal causadora da morte e

deficiência entre as mulheres de 14 á 44 anos de idade, o Brasil é um dos países que mais vêm

sofrendo com a violência doméstica, no entanto a cada 15 segundos a mulher está sendo

agredida no Brasil (CARTILHA DIREITOS DA MULHER PREVENÇÃO À VIOLÊNCIA E AO

HIV/AIDS, p. 5).

Contudo, na perspectiva de mudar a realidade na qual estamos inseridas, surgiu a Lei

Maria da Penha de numero 11.340/2006, lei esta que busca criar mecanismos eficazes para

prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher e também dispõe sobre a criação dos

Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e estabelece medidas

de assistência e proteção às mulheres nestas situações de violência.

Em Fortaleza existem diversos equipamentos que discutem e trabalham

esta problemática, que estão inseridos dentro da rede de Enfrentamento á violência

contra as mulheres. No entanto, me detive ao Juizado de Violência Doméstica e

5 Os movimentos feministas são, sobretudo, movimentos políticos cuja meta é conquistar a igualdade de direitos

entre homens e mulheres, isto é, garantir a participação da mulher na sociedade de forma equivalente à dos

homens.

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Familiar contra a mulher da comarca de Fortaleza, sendo este meu campo de

pesquisa.

O tema é de suma importância para o curso de Serviço Social, pois irá abrir

horizontes e discussões acerca da temática, possibilitando assim criar alternativas favoráveis para

o seu enfrentamento, buscando assim efetivar as políticas públicas e as redes de enfretamento

existentes em Fortaleza. È um dos desafios a serem enfrentadas pelo assistente social, já

que nas suas diversas áreas de atuação, a mulher é seu público alvo prioritário e

entender o motivo pelo qual a violência vem se instalando em nosso cotidiano de

forma tão gradativa.

Assim, o trabalho se encontra dividido em quatro capítulos. No primeiro

capítulo abordaremos o desenvolvimento do trabalho, com a problemática da

violência contra a mulher na sociedade, as categorias que estão sendo analisadas

neste trabalho são: a família, a violência e gênero. Por meio dessas categorias,

debater sobre o que se constitui a violência contra a mulher.

O segundo capítulo se destina a discutir as políticas públicas existentes

dentre os níveis, federal, estadual e municipal no Brasil e no Ceará, e a Lei 11.340

conhecida como a Lei Maria da penha, como uma das formas de enfrentamento à

violência doméstica e familiar contra a mulher.

Já o terceiro capítulo irá falar do percurso metodológico de investigação,

descrevendo a natureza da pesquisa, as técnicas utilizadas para a coleta dos dados,

o campo de pesquisa que foi voltado para o Juizado de Violência Doméstica e

Familiar contra a mulher da Comarca de Fortaleza, as interlocutoras da pesquisa,

que foram as mulheres que estavam desistindo do processo ou da ação judicial.

No quarto capítulo discorremos acerca dos resultados da pesquisa dando

ênfase na fala das entrevistadas e relacionando com os temas das entrevistas que

foram violência, relações de gênero, amor e família.

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2 VIOLÊNCIA, RELAÇÕES DE GÊNERO E FAMÍLIA

A fim de discutir a temática da violência doméstica e familiar contra a

mulher, tomamos como parâmetros de análise três categorias: Violência, Relações

de gênero e Família, estabelecendo assim, diálogos com diversos autores que

abordam esta temática.

2.1 Violência Contra a Mulher

Segundo o Dicionário Houaiss (2009), violência é a “ação ou efeito de

violentar, de empregar força física (contra alguém ou algo) ou intimidação moral

contra (alguém); ato violento, crueldade, força”. Podemos dizer que existem diversos

tipos de violência, como a violência física, psicológica, moral e sexual.

A violência contra a mulher começou a se tornar pauta de discussões no

âmbito público a partir do movimento feminista, que surgiu com base na perspectiva

desafiadora de romper com a ordem conservadora vigente em questão da exclusão

da mulher.

O atual feminismo brasileiro teve influências das feministas em nível

internacional, as quais iniciaram com as lutas e manifestações dos direitos políticos,

o movimento sufragista tomou forma e se expandiu por toda a Europa e os Estados

Unidos. Construindo assim um vasto feminismo organizado no mundo. No Brasil, da

primeira fase do feminismo em meados do século XIX, que teve como foco a luta

das mulheres pelos direitos políticos, como o direito ao voto, a participação delas

tanto como eleitoras e candidatas. Este embate de lutas esteve ligado ao nome de

Bertha Lutz6, uma das lideranças presentes na década de 1920 (PINTO, 2003).

Em 1910 o grupo de mulheres fundou o Partido Republicano Feminino,

“que defendiam o direito ao voto, lutavam pelo fim da exploração sexual,

emancipação e independência da mulher, atribuindo a elas qualidades para exercer

a sua cidadania no mundo da política” (p. 18).

Uma das primeiras feministas que lutou por esta causa no Brasil foi

Bertha Lutz, principal líder na década de 1930, que lutava pela inclusão da mulher

6 Bertha Lutz era uma feminista brasileira, que exerceu uma inegável liderança acerca do sufragismo.

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como portadora de direitos políticos e principalmente o direito ao voto e de serem

votadas. Direitos esses que eram negados pelo Estado.

Em meados dos anos de 1960 e 1970, nos Estados Unidos e na Europa,

contudo se formavam assim os movimentos sociais. Em 1960 o movimento jovem

não teve importância apenas na política, mas colocou em xeque os valores

conservadores da organização social nos âmbitos públicos e privados. (PINTO,

2003).

Foi aproximadamente na década de 1970 e ao longo deste período que

veio se desenvolvendo, no Brasil, o movimento feminista, com a participação de

mulheres das classes médias e populares do Brasil. Foi organizado através de lutas

que reconhecesse a mulher para além do âmbito privado e passar a intervir no

âmbito público. Constituídos de diversas transformações nos papeis sociais, que

eram impostos acerca da desigualdade social, fatos que só fazia com que a luta a

cada dia aumentasse mais. Tratando desse movimento, o novo feminismo nasce e

se emerge no período da ditadura militar em 1964.

O feminismo brasileiro nasce, nos anos 70, no panorama internacional

que instituía o Ano Internacional da Mulher (1975), favorável, portanto, à discussão

da condição feminina e, ao mesmo tempo, no amargo contexto das ditaduras latino-

americanas, que calavam, implacáveis, as vozes discordantes. (SARTI, 2001)

Pinto (2003) vem falar que o movimento feminista brasileiro é um

movimento que luta pela autonomia da mulher nos espaços designados como

públicos e privados, pois estamos em uma sociedade que é marcada por parcelas

da população na mesma condição de dominada por seus companheiros.

Já na sua segunda fase, o movimento feminista em meados do século XX

trouxe à tona as discussões acerca dos direitos sexuais e reprodutivos das

mulheres, como a questão do aborto, e a luta pela violência contra a mulher no

Brasil passou a ser debatida a partir do momento em que estava atingindo as

classes favorecidas, como o que aconteceu no ano de 1976, um crime que abalou

toda a elite carioca, o qual ficou conhecido como o caso de Doca Street, no qual

este matou sua ex-mulher Ângela Diniz. Tal caso virou notícia nos principais jornais

do país, provocando uma das primeiras campanhas públicas das feministas no

Brasil. Fazendo com que surgisse, no Brasil, inúmeras organizações de apoio à

mulher vítima de violência, tal como a criação do SOS MULHER, em 1981, que

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ganha uma repercussão a âmbito nacional a luta das feministas de apoio aos

direitos e a violência contra a mulher (PINTO, 2003).

Os movimentos feministas tiveram ampla participação na luta contra a

violência em relação à mulher, pois sua atuação esteve ligada à perspectiva de

denunciar a violência contra a mulher, buscando assim através de ações e

movimentos para que os direitos das mulheres fossem resguardados e garantidos

em lei.

Antes da Lei Maria da Penha já existiam no Brasil alguns mecanismos

que buscavam coibir a violência contra a mulher, como instituições especializadas

na defesa da mulher, como as delegacias, defensorias que eram voltados para o

apoio e a defesa da mulher em situação de violência utilizando assim o Código

Penal.

A proteção legislativa nacional da mulher vítima de violência, era a

Constituição de 1988 que em seu parágrafo 8°, art. 226, diz que: “O estado

assegurará a assistência á família na pessoa de cada um dos que a integram,

criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”. É

constituído como marco importante, pois obriga o estado a criar mecanismos de

combate à violência no âmbito das relações familiares.

No ano de 1995, foi criado um dos mecanismos para coibir a violência ,o

qual foi promulgado como a lei de nº 9.099 de 26 de setembro de 1995, tratando do

poder judiciário previu com que os estados criassem juizados especiais, providos por

juízes togados e leigos competentes para a execução das causas cíveis de menor

potencial ofensivo, cria–se o Juizado Especial Criminal(Jecrim), que “ficou conhecido

pela comunidade jurídica como símbolo da revolução judicial em marcha, houve o

rompimento com o tradicional processo penal criando assim um novo sistema”

(TELES E MELO, 2002, p. 86) que regulamenta os criminais e os civis. Foi criado

para controlar o processo de arquivamento, pois já estava em quantidades

altíssimas.

Mesmo com todos esses mecanismos que foram sendo criados

historicamente, estes ainda não foram tão eficazes, pois eram mulheres que

intimavam os homens devido à violência cometida contra elas, mas o homem tinha

como pena o pagamento de algumas cestas básicas, ou penas alternativas, a saber:

realizar algum trabalho voluntário por um tempo, no qual ocorria no qual os homens

acabavam retornando ao seu lar, e as mulheres voltavam a sofrer muitas vezes a

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violência e ficando desacreditadas por não ter obtido êxito perante a justiça (TELES

E MELO, p. 86, 2002).

Segundo a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a

Violência contra a Mulher (1994), a violência é tida como qualquer ato ou conduta

baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou

psicológico a mulher tanto na esfera pública como na esfera privada.

De acordo com Saffioti (2004), a violência é tida como a ruptura de

qualquer forma de integridade da vítima: integridade física, psíquica, sexual e a

moral, são ações que venham destruir a integridade da mulher.

Podemos então pensar a violência como sinônimo da força física,

psicológica ou moral que vai em busca de obrigar uma pessoa a fazer qualquer

coisa contra a sua vontade (OSTERNE, 2008).

Contudo Strey (2001) vem falar que a violência é o momento em

expressarmos nossos comportamentos, modo de vida das pessoas, sociedades e

outros fenômenos humanos. O mundo em que vivemos está se tornando cada vez

mais violento, nesse sentido a violência está sendo um dos ingredientes da vida

humana.

De acordo com o artigo 7° da Lei Maria da penha de número 11.340/2006

vem elencar os cinco tipos de violência, que são: Violência física “é entendida como

qualquer conduta que venha ofender a integridade física ou a saúde corporal da

mulher”, ou seja, empurrões, chute, tapas, cortes e dentre outros; a violência

psicológica “é aquela que causa qualquer dano emocional, que venha ocorre a

diminuição da autoestima como agressões verbais, humilhações, isolamento,

causando assim prejuízo a saúde psicológica” e o deu desenvolvimento pessoal.

Já a violência sexual “é aquela em ocorre a obrigação da pratica sexual

contra a vontade da mulher, obtendo assim uma relação sexual indesejada e que

venha a ocorre o uso da força”, ou seja, estupro, abuso sexual dentre outros; a

violência patrimonial “é qualquer conduta que configure a destruição ou a retenção

de alguns objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais”, ou seja,

qualquer ato que implica algum dano.

A violência moral “é algo que venha se configurar como calúnia,

difamação” ou ate mesmo a injuria e a reputação; a violência contra a mulher é

entendida como qualquer ato que venha a enfraquecer a autoestima da mulher que

foi agredida, seja ela entendida como violência física que deixe hematomas ou não

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pelo corpo, psicológica, sexual, moral, patrimonial venha impossibilitar a sua

sobrevivência e a violência tem-se evidenciado como um fenômeno estruturado

pelas relações desiguais historicamente demonstradas entre os sexos (FROTA E

SANTOS, 2012). As desigualdades existentes sejam elas biológicas, sejam físicas

entre o homem e a mulher são um dos fatores para que venha ocorre algum tipo de

violência, a partir do momento que impera o machismo7 entre as famílias.

Muitas vezes, está sendo praticada no âmbito familiar, como podemos ver

em reportagens nos meios de comunicação que estão a toda hora encontrando

mulheres que sofrem dessa violência. Segundo os dados do Instituto Patrícia Galvão

diz que 70% da população de mulheres sofrem mais violência dentro de casa do que

nos espaços públicos. Mas podemos ressaltar que a violência contra a mulher ela é

estabelecida de diversas expressões.

A violência hoje é dita como uma das manifestações da questão social. A

violência doméstica é aquela que na maioria das vezes ocorre dentro de casa, em

seu domícilio e nas relações familiares como pai e mãe, mães e filhos e entre pais,

podendo ter uma de suas características bem relevantes de acordo com a autora na

concepção de Saffioti seria a rotinização (OSTERNE, 2008). A rotinização ocorre, na

maioria das vezes, com as mesmas vítimas dentro do âmbito doméstico, tornando

habitual praticar a violência.

Já a violência familiar “é aquela que envolve membros de uma mesma

família extensa ou nuclear, levando em conta a consanguinidade e a afinidade”

(SAFFIOTI, 2004). Ocorre através do relacionamento com os membros, sejam eles

da família nuclear como pai, mãe, filho ou extensa como tios, padastro, sejam de

pessoas com que tenham alguma afetividade ou afinidade para viverem juntas.

O comportamento de homens e mulheres em nossa sociedade é baseado

na ideia de inferioridade e na subordinação da mulher ao homem, pois os homens

tende a acreditar e passar a praticar a violência a partir do momento em que se

acham no direito de disciplinar os atos e comportamentos das mulheres.

No tocante aos meios de comunicação, estes reforçam a velha imagem

de que o sexo masculino detém poder e as do sexo feminino a obrigação de

obedecer tendo sua dignidade humana atingida, pois estão sendo controladas e

7 Machismo é um conjunto de práticas, comportamentos e frases considerados ofensivos contra o gênero

feminino.

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infligindo assim a sua postura como cidadã de direitos garantida na constituição

federal de 1988.

Entretanto, podemos entender que a mulher tem o total direito de viver

sem nenhuma forma de violência podendo assim buscar ajuda em outros

equipamentos. Lutando para que seus direitos humanos sejam garantidos da

mesma forma que os dos homens.

Hoje em dia, a incidência da violência doméstica está alarmante pois

atinge milhares de crianças, adolescentes, idosos e mulheres. E as pessoas que

sofrem com a violência não tem coragem de ir ate a delegacia e denunciar os

agressores, tomando sempre a atitude de calar-se perante sua família e a

sociedade. Estando assim constantemente sendo vítimas da violência.

Diante desta lógica do pensamento, eliminar esta violência, muitas vezes,

não depende apenas da construção de mais rede de proteção, mas sim de uma

mudança cultural em relação ao machismo, o momento em que o homem se coloca

superior à mulher que ainda é realizada no interior das famílias, para depois na

sociedade buscar prevenir este fenômeno.

Na violência doméstica está contido o ciclo da violência que é composto

por três fases, que segundo Soares(2005) são: a Primeira Fase está presente o

acúmulo de tensões, que te se manifestado com agressões verbais, crises de ciúme,

ameaças. Nas quais as mulheres, frequentemente, acreditam que podem fazer algo

para impedir que sua raiva se torne cada vez maior; a Segunda Fase é a da

explosão da violência, ocorrendo assim um descontrole marcado por agressões do

tipo mais agudas, atingindo assim o ponto máximo, contendo assim o descontrole

das tensões que vem sendo acumuladas, chegando ao ponto de serem explodidas;

a Terceira fase é a da lua de mel, na qual ocorre o arrependimento do companheiro,

pois tem medo de muitas vezes perder sua companheira, pretendendo mudar,

implorando pelo perdão, jurando que nunca mais irá fazer algo. E pretendendo

mudar nos dias futuros.

Neste caso podemos ver que ainda existem milhares de mulheres que

sofrem violência dentro da própria casa, na maioria dos casos por seus maridos,

namorados ou companheiros. De acordo com dados do ligue 1808, nos primeiros

8 Ligue 180 é um serviço ofertado pela SPM com o objetivo de receber denúncias ou relatos de violência,

reclamações sobre os serviços da rede e de orientar as mulheres sobre seus direitos e sobre a legislação vigente,

encaminhando-as para os serviços quando necessário.

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meses do ano 2014, destacam-se que em 94% dos casos atendidos o autor da

violência contra a mulher foi o parceiro, e que, em 82,82%, são cometidas a

violência nas relações afetivas. Mas este quadro está a cada dia mudando, pois

podemos ver que depois da Lei Maria da penha as mulheres já conseguem

denunciar. De acordo com o Ligue 180, nos primeiros meses do ano 11% das

mulheres denunciaram a violência recebida. Por isso é muito importante o estado

busca implementar políticas favoráveis para o enfretamento deste fenômeno,

promovendo assim medidas para a execução de direitos previstos em leis.

2.2 Relações de Gênero: Uma Análise das Políticas no Atual Contexto

Para Heilborn (1995) gênero é um conceito das ciências sociais que se

refere à construção social do sexo. Significar dizer que a palavra sexo, designa [...]

da caracterização anatomofisiológica dos seres humanos e atividade sexual, ou

seja, a qualidade de ser homem ou mulher são atribuídos pela cultura, são

construções culturais impostas aos seres humanos.

Gênero é entendido por muitos estudiosos como algo que retrata as

desigualdades entre homens e mulheres. Constituídos, muitas vezes, dentro do

âmbito familiar traços recorrentes ao gênero feminino e o masculino, este

diferenciado de uma comunidade para outra, facilitando para que venha a ocorrer a

violência de gênero contra a mulher, porque é algo que não nasce com a pessoa,

mas sim construído culturalmente através das relações existentes.

O termo gênero é bastante amplo, empregado com diferentes sentidos. Pode significar espécie, como quando falamos do gênero humano. Outras vezes, é empregado com o sentido de tipo. É o que ocorre quando usamos as seguintes expressões: “Que gênero de gente é esse?; “Que gênero de música?” Tem a ideia de estilo ou da natureza de uma manifestação artística, quando se fala em gênero literário ou gênero dramático, entre outros tantos. (TELES E MELO, 2002, p. 16).

No interior de diversas famílias desde pequenos e até mesmo dentro do

útero de nossas genitoras, nossos gêneros já são moldados a partir da descoberta

do sexo da criança. No decorrer do tempo podemos ver diferenças estereotipadas,

como a cor azul para homem e a cor rosa para a mulher. Podendo assim o homem

brincar com os carros e a mulher brincar de bonecas e, na maioria das vezes,

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exercer afazeres domésticos, enquanto o homem não, como afirma Heilborn (1995)

“a qualidade de ser homem e ser mulher é realizado pela cultura”.

Para entendermos essas relações de gênero, temos que compreender

primeiramente a diferença entre o sexo e gênero. O sexo está ligado diretamente às

características anatômicas, biológicas do feminino e do masculino. Já o gênero é

tudo que foi construído culturalmente em cima dos sexos.

Para Saffioti (2004) o “conceito de gênero não equivale somente às

desigualdades entre homens e mulheres, mas sim como símbolos culturais de

representação”.

Entende-se o gênero como algo que busca demonstrar as representações

do masculino e do feminino, são imagens dos papeis que são construídas pela

sociedade, imagem estas que se solidificam na relação de dominação e exploração

das mulheres em detrimento dos homens.

De acordo com Bourdieu (2002) as condições femininas obedecem à

lógica do modelo tradicional de que os homens continuam a dominar o espaço

público e área do poder (sobretudo econômico, sobre a produção), ao passo que as

mulheres ficam destinadas ao espaço privado(doméstico, lugar da reprodução).

O gênero é construído pela sociedade, podendo variar de cultura para

cultura, sendo modificado constantemente. Dotados assim de comportamentos a

serem seguidos e respeitados que nos ajuda a compreender os problemas que hoje

estão na vida rotineira da mulher, seja na sua vida social, profissional ou política.

Teles e Melo (2003) afirmam que a categoria gênero demonstra e

sintetiza as desigualdades socioculturais existentes entre homens e mulheres, que

têm repercussão tanto na vida pública como na privada entre ambos os sexos,

impondo muitas vezes papeis sociais diferenciados criando assim a submissão e a

dominação.

É neste papel das desigualdades que permeiam a sociedade que

podemos ver a relação de dominação do homem e a subordinação da mulher.

Utilizando assim de papeis impostos às mulheres e que são reforçados por

ideologias patriarcais acarretando traços familiarizados na noção de papeis para

homens e para mulheres. Deixando o poder circular entre as mãos dos homens até

dentro das nossas próprias casas.

Para Scott (1990) a questão do “gênero é um dos primeiros modos de

significar as relações de poder” existentes “ao gênero não explicita, mas constitui, no

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entanto, uma dimensão decisiva da organização da igualdade e desigualdade [...]

baseiam-se em compreensões generalizadas da relação [...] natural entre homens e

mulher” (p. 10). Todavia podemos ver, no que se refere aos papeis do homem e da

mulher, é que estes são construídos culturalmente através da divisão sexual do

trabalho, que visa assim ditar os papeis dos sujeitos sociais que estão inseridos na

sociedade.

Esta expressão gênero segundo a autora vai buscar designar os padrões

de comportamento, visando à “prevenção da organização social de gênero”

(LISBOA, 2005).

Entretanto é necessário compreender que o gênero é um elemento

essencial nas relações sociais. Podendo assim ser compreendidas entre os sexos,

as relações existentes de poder de um sobre o outro.

As relações de gênero estruturam papeis e funções do que é ser homem

e do que é ser mulher em uma mesma sociedade, no entanto esses papeis

constituíram e fomentaram as relações desiguais, em um valo de superioridade

masculina e da inferioridade feminina (MADEIRA E COSTA, 2012).

Gênero é algo que não trata necessariamente das diferenças entre os

sexos, mas sim da relação social entre homens e mulheres e buscando assim

compreender como eles se constrói enquanto sujeitos sociais.

Para Osterne (2001) “As relações de gênero, portanto, não são

consequências da existência de dois sexos, macho e fêmea” (p. 119), ou seja ela

afirma que o gênero dos indivíduos é definido pelas relações sociais ou pela cultura,

considerando assim espaços no quais o indivíduo está inserido e não pelas

diferenças entre os sexos.

Estudar as relações de gênero, muitas vezes nos remete a compreender

como se constituem as relações sociais entre os indivíduos e suas representações

em relação às pessoas.

Podemos entender que gênero é uma categoria útil de análise, pois nos

dá ferramentas necessárias para entender as desigualdades existentes entre o

homem e a mulher e os seus papeis construídos pela sociedade culturalmente, pois

é um dos principais fatores que levam a ocorrer a violência contra a mulher, criando

assim polos de dominação e submissão. No grupo do JVDFM9, podemos ver

9 Grupo Reflexos para mulheres que desistem do processo judicial.

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expressões ditas como o que é ser homem e mulher na sociedade. Entretanto é

necessário implementar medidas que promovam a execução dos plenos direitos a

classe feminina.

Vale ressaltar que gênero diz respeito às relações homem-homem,

mulher-mulher e homem – mulher. Compreendemos que hoje o gênero, portanto,

não se refere apenas ao masculino e o feminino, mas também as diversas

masculinidades e feminilidades não hegemônicas, tais como gays, lésbicas, travestis

e transexuais.

2.3 Famílias e a Conjugalidade

Inicialmente falar de família requer um cuidado especifico,

principalmente quando vamos expor conceitos. Contudo podemos dizer que família

é um conjunto de pessoas que possuem algum grau de parentesco entre si, ou até

mesmo vínculos afetivos, e que convivem na mesma casa.

De acordo com Bruschini (2000), falar de família o primeiro passo seria:

Dissolver sua aparência de naturalidade, percebendo-a como criação humana mutável, observando que as relações muitas vezes coincidentes que conhecemos atualmente entre grupo conjugal, rede de parentesco, unidade doméstica/residencial podem se apresentar como instituições bastante diferenciadas em outras sociedades ou em diferentes momentos históricos (p. 50).

Para o autor a família tem traços diferenciados, como o sexo, idade e até

mesmo os graus de parentescos e suas divisões de papéis que mudam conforme a

sociedade e o momento histórico, sendo esta família um grupo social que possui

diversas variações dentro da dinâmica social que estão inseridos. “E um conjunto

vivo, contraditório e cambiante de pessoas com sua própria individualidade e

personalidade” (p. 77). No entanto o modelo nuclear de família como pai, mãe e os

filhos, só se consolidou na década XVIII.

A família é constituída enquanto grupos de pessoas que mantém entre si,

diversas relações sejam elas de aliança, descendência ou ate de consanguinidade,

mas segundo Durham (2004) não são necessariamente unidades básicas de

parentesco.

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Para Giddens (2004) a família é um grupo de pessoas diretamente unidas

por conexões parentais, cujos membros adultos assumem a responsabilidade pelos

cuidados das crianças.

A família no sertão cearense, segundo Vieira Junior (2004), durante os

anos de 1780 a 1850, era marcada ações violentas. A família poderia ser

evidenciada a partir da interação com a presença cotidiana da violência. A vasta

trajetória de violência ajudava a construir ao longo de várias gerações a ideia de

unidade familiar.

Sendo assim a família é uma sociedade que é constituída de elementos

que formam os laços afetivos entre eles, sejam de consanguinidades ou de

afetividade. Utiliza-se de valores e padrões de comportamento, valores éticos que

norteiam a sociedade.

Poster (1979) vem falar que a família a todo o momento muda de sentido,

deixando de ser uma unidade econômica e tende a tornar-se um lugar de refúgio,

afetividade, local no qual se estabelecem a relação, o sentimento entre o casal e os

filhos, contudo tornando o pai de família uma figura moral e respeitada perante a

sociedade.

Segundo o autor a “história da família é descontinua, não-linear e não-

homogênea, consistindo em padrões familiares distintos, cada um com sua própria

história”, ou seja, é com essa pluralidade de arranjos familiares, que nos mostra que

a família nuclear burguesa, ela não é a única que existe.

Nos séculos XVI e XVII no tempo da aristocracia as famílias viviam nas

ruas, nas festas. As famílias não tinham em comum funções afetiva e socializadora,

mas visavam na maioria das vezes a conservação dos bens e tinham em comum a

ajuda mutua entre eles (POSTER,1979).

O autor relata quatro tipos diferentes de família: A família nuclear

burguesa tem como “modelo a assimetria sexual, não é um modelo único, mas são

fenômenos que são historicamente construídos”, no entanto atribuía pouco valor aos

aspectos de privacidade e em relação à afetividade.

A família camponesa tinha traços em comum com aristocracia do que com

a moderna burguesia. A sua unidade básica não era a família conjugal, mas a

aldeia. Em relação ao casamento, as relações entre marido e mulher e entre pais e

filhos era tudo compartilhado por todos os aldeões. Repartindo assim o amor e a

autoridade.

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A família burguesa o padrão emocional era definido pela autoridade dos

pais, que teriam um profundo amor parental pelos filhos, os usos de ameaças de

amor, a título de punição, em vez de castigos físicos. Modelo de homem e mulher

vivendo juntos no âmbito doméstica com seus filhos.

E um modelo de família da classe trabalhadora que surgiu no período da

industrialização. O lar da classe proletariada não era um “ninho de domesticidade”.

Mas as condições eram precárias e a garantia de sobrevivência só era garantida

com a ajuda de todos os membros da família e não tinha distinção de sexos.

Nesta classe, as relações entre homens e mulheres, se diferenciavam do

padrão burguês, pois as mulheres além de exercer os afazeres de domésticos,

trabalham também em fabricas e se contrapondo a trabalhos explorados, com a

permanência de trabalhos infantil e mulheres sendo exploradas por tantas e tantas

horas de trabalho.

A família no Brasil, perante os engenhos de cana nos séculos XVI e XVII

predominava a estrutura patriarcal que Bruschini (2000), citando Gilberto Freyre, que

achou muito importante o núcleo conjugal e a autoridade masculina em consonância

com a figura do patriarca, mas sempre existindo os tipos de famílias.

Com as diversas transformações sociais que ocorreram no mundo,

podemos perceber nos estudos que, a partir do século XIX, as famílias são

compreendidas como espaço de reprodução social. Existe assim uma maior

desigualdade de gênero, no final desse século as mulheres passaram a ingressar no

mundo do trabalho, exercendo atividades com boa remuneração, valorizando assim

a capacidade intelectual entre os membros familiares.

Atualmente cresce a quantidade a respeito de novos arranjos familiares,

que estão se inserindo na sociedade, dentre elas: a família nuclear, a família

extensa, famílias adotivas, famílias monoparentais, famílias homossexuais e dentre

outras.

A transição para o casamento é uma das maiores mudanças que o

sistema familiar pode passar. É o momento onde os indivíduos deixam seu núcleo

familiar, onde convivem com os pais e passam a formar sua própria família.

Foi a partir do século XVIII o casamento tomou forma de instituição de

direito de todos. Inicia-se, então, uma tentativa de união entre amor e casamento,

que até então eram considerados aspectos separados da vida conjugal (MENEZES,

2006)

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O casamento hoje em dia está se tornando cada vez mais frágil, muitos

casais não prezam o afeto, perante a si mesmo ou ate mesmo sua família, ele é

considerado uma condição natural aos indivíduos e satisfação entre ambos os lados.

O casal deve estar ciente da conjugalidade que estão inseridos a partir

dos seus arranjos amorosos nos quais chegam até o casamento, que é a relação em

que o casal estabelece entre si, a partir do momento em que se escolhem

mutuamente como companheiros para a vida.

De acordo com (AMORIM, 2013) “A conjugalidade permanece entre os

casais, sob éticas distintas, como um ambiente de amparo às situações difíceis e

como um espaço de compartilhamento”. Ambiente este que, frequentes vezes,

fornece sentido à vida dos sujeitos, através das trocas que são feitas no dia a dia e

até mesmo pelo amor existente na relação.

“A conjugalidade é sempre construída na relação, não há uma fórmula,

pois os esforços e renovação da vida a dois é contínua” (MARTINS, 2013). Todavia

é importante o casal estarem cientes da relação obtendo assim clareza nos valores

e desafios que unem o casal.

Atualmente as relações estão mais superficiais, descartáveis, surgindo

assim novos arranjos de relacionamento, fazendo também com que venham surgir

outras condicionalidades referentes à relação familiar entre os casais.

De acordo com alguns autores estudados nesta categoria de analise

podemos perceber que a família é o pilar da organização da sociedade.

Atravessando uma visão ampla do que é família na contemporaneidade, não são

constituídos apenas de aspectos da consanguinidade, mas laços afetivos, que dão

maior interação entre os membros de uma família, que são essenciais para a

construção social e dos valores que são transmitidos pelos nossos pais. Descobrir

que atualmente em nossa sociedade estão a cada dia surgindo novas estruturas de

famílias.

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3 POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO À VIOLENCIA CONTRA A MULHER E A LEI Nº 11.340/2006

Neste capítulo discutiremos um pouco acerca das políticas públicas

voltadas para o enfretamento da violência contra a mulher, no atual contexto e a Lei

Maria da Penha de nº 11.340 de 2006, lei esta que proporcionou a criação de

mecanismos para o enfrentamento da violência contra a mulher.

3.1 Políticas Públicas: Uma Análise das Políticas no Atual Contexto

As políticas públicas podem se entender como ações que são criadas

pelo governo em parceria com a sociedade civil que visam corresponder na

construção dos direitos que são atingidos constitucionalmente, direitos estes

universais, ou seja, contido sempre do caráter da igualdade das pessoas aos

programas e projetos (MEIO AMBIENTE, s. d.).

A criação de políticas públicas para mulheres resultou da série de

diversos movimentos feministas que lutavam para coibir a violência contra a mulher

e para que os direitos das mulheres fossem assegurados. Sendo o movimento

feminista de extrema importância para que hoje haja o enfrentamento à violência

contra a mulher, não somente a mulher, mas a toda população que hoje sofre com a

violência. Visto que, muitas vezes, o estado não dá continuação digna às políticas

públicas, pois ela nem sempre responde às demandas da sociedade, de modo

frequente maquiando os problemas sociais existentes.

Mas as políticas públicas buscam romper com a perspectiva do

preconceito e da discriminação que são relacionadas às mulheres. Criando assim

mecanismos para o fortalecimento pessoal e social das mulheres que estão em

situação de violência, criando assim meios especializados para realiza a denúncia.

A criação de uma rede de enfrentamento à violência contra a mulher é

uma rede que faz articulação com as instituições e com os serviços prestados,

visando ao desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção contra a violência,

políticas de empoderamento das mulheres e a garantia de seus direitos, dando

assim uma assistência qualificada às mulheres em situação de violência. É um

conjunto de ações em diferentes setores.

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Entretanto em consonância com a Lei nº 11.340/ 2004 e com as

diversas convenções e tratados internacionais, como: a Declaração Universal dos

Direitos Humanos (1948), a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e

Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará 1994), a

Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a

Mulher (CEDAW, 1981) e a Convenção Internacional contra o Crime Organizado

Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas

(Convenção de Palermo, 2000). A Política Nacional de Enfrentamento à Violência

contra as Mulheres foi elaborada pela Secretaria Especial de Políticas Públicas para

as Mulheres

A Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres

(2011) tem por finalidade estabelecer conceitos, princípios, diretrizes e ações de

prevenção e combate à violência contra as mulheres, visando garantir a assistência

e a efetivação dos seus direitos.

Esta Política Nacional para mulheres está orientada através dos

princípios que propostos no Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (2011),

que é o momento de consolidação e amadurecimento das Políticas Públicas para as

mulheres, voltados para a igualdade e o respeito à diversidade, equidade, autonomia

das mulheres, laicidade do estado, universalidade das políticas, justiça social,

transparência nos atos públicos, participação e controle social.

E através das diretrizes que são orientações postas pela política

nacional, que são: Garantir o cumprimento dos tratados, acordos e convenções

internacionais firmados e ratificados pelo Estado Brasileiro relativos ao

enfrentamento da violência contra as mulheres; Reconhecer a violência de gênero,

raça e etnia como violência estrutural e histórica que expressa a opressão das

mulheres e que precisa ser tratada como questão da segurança, justiça, educação,

assistência social e saúde pública; Combater as distintas formas de apropriação e

exploração mercantil do corpo e da vida das mulheres, como a exploração sexual e

o tráfico de mulheres; Implementar medidas preventivas nas políticas públicas, de

maneira integrada e intersetorial nas áreas de saúde, educação, assistência,

turismo, comunicação, cultura, direitos humanos e justiça; Incentivar a formação e

capacitação de profissionais para o enfrentamento à violência contra as mulheres,

em especial no que tange à assistência; Estruturar as Redes de Atendimento à

mulher em situação de violência nos Estados, Municípios e Distrito Federal.

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(BRASIL, 2011, p. 20).

. Tendo como objetivos principais que são:

Reduzir os índices de violência contra as mulheres; Promover uma mudança cultural a partir da disseminação de atitudes igualitárias e valores éticos de irrestrito respeito às diversidades de gênero e de valorização da paz; Garantir e proteger os direitos das mulheres em situação de violência considerando as questões raciais, étnicas, geracionais, de orientação sexual, de deficiência e de inserção social, econômica e regional, Proporcionar às mulheres em situação de violência um atendimento humanizado e qualificado nos serviços especializados e na Rede de Atendimento (BRASIL, 2011e).

Já o Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência contra as mulheres

busca planejar as ações que visam à consolidação da política nacional de

enfrentamento à violência contra as mulheres, que foi criado em agosto de 2007, na

gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que buscavam um meio de

implementação das políticas públicas de enfrentamento em todo o território nacional.

No entanto, essas ações é que orientam a execução das políticas

públicas de enfrentamento à violência, que é pensada através de quatro áreas

estruturadas que são o fortalecimento dos serviços especializados de atendimento,

proteção dos direitos sexuais e reprodutivos e a implementação do plano integrado

de enfrentamento da feminização da Aids, o combate à exploração sexual e ao

tráfico de mulheres, na promoção dos direitos humanos das mulheres em situação

de prisão.

Tendo em vista que, neste pacto, as políticas são bem mais articuladas,

buscando propor soluções das causas que ocasionam a violência se relacionando

com as diferentes áreas dentre elas são o planejamento, orçamento, justiça,

educação, saúde, trabalho, segurança pública, cultura, no sentido de garantir o

atendimento integral a todos.

Compreende-se que neste pacto busca não apenas a dimensão do

combate à violência contra a mulher, mas também a dimensão da totalidade nos

aspectos da prevenção, assistência, proteção e garantia dos direitos daquelas

mulheres que estão em situação de violência. No que se refere às ações a partir da

transversalidade de gênero, a intersetorialidade, capilaridade dos programas e

políticas.

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O Pacto Nacional tem por base a política de enfrentamento à violência

contra as mulheres, a qual define os objetivos gerais e específicos que são os

mesmos da política nacional.

Para a implementação desse pacto foram compreendidas seis etapas: a

criação ou fortalecimento de organismos de políticas para as mulheres estaduais e

municipais, a elaboração do Projeto Básico Integral (diagnóstico, definição de

municípios-polo e planejamento das Ações do Pacto), a assinatura do acordo de

Cooperação Federativa, constituição das Câmaras Técnicas Estaduais e Municipais

de Gestão e monitoramento do pacto, aprovação das propostas e projetos no âmbito

da Câmara Técnica Estadual e encaminhamento para a Câmara Técnica Federal,

Credenciamento e cadastramento no SICONV (Portal Nacional de Convênios) para

envio de projetos (BRASIL, 2011a).

O organograma do pacto se subdividiu as competências de cada esfera

do governo de acordo com a coordenação se resume nas seguintes

responsabilidades: No âmbito Federal a Secretaria de Políticas para as mulheres

assegurar o cumprimento das ações e o alcance dos objetivos estabelecidos no

Pacto Nacional pelo Enfrentamento da Violência contra as Mulheres; coordenar a

implementação das ações do Pacto junto aos diversos órgãos do Governo Federal

que integram o Pacto Nacional; elaborar, em conjunto com os estados, plano de

trabalho, com detalhamento das ações do Pacto a serem implementadas e

cronograma de execução; monitorar, juntamente com as Câmaras Técnicas de

Gestão Federal e Estadual, as ações do Pacto nos estados (BRASIL, 2011a).

No âmbito Estadual Organismos Estaduais de Políticas para Mulheres

buscavam definir em conjunto com a SPM e demais Ministérios envolvidos no Pacto,

as microrregiões e municípios-polo para implantação das ações do Pacto; articular

com os Municípios-polo para garantir a implementação das ações estabelecidas no

Pacto Nacional pelo Enfrentamento da Violência contra as Mulheres e acordadas

com a SPM; prestar contas, junto à SPM e demais Ministérios envolvidos, dos

convênios firmados pelas instituições estaduais; garantir a sustentabilidade dos

projetos; instituir a “Câmara Técnica de Gestão Estadual”, com a participação de

representantes das 3 (três) esferas de governo, dos organismos de políticas para as

mulheres, dos Conselhos de Direitos da Mulher, da sociedade civil, das

universidades, do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública,

cujas atribuições serão, dentre outras: elaborar plano de trabalho, com detalhamento

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das ações a serem implementadas e seu cronograma de execução; promover a

execução, monitoramento e avaliação das ações do Pacto no estado; assim como,

sugerir o aperfeiçoamento e divulgação dessas ações; incentivar a constituição de

consórcios públicos para o enfrentamento da violência contra a mulher (BRASIL,

2010).

No âmbito Municipal os Organismos Municipais de Políticas para

Mulheres prestar contas, junto à SPM e demais Ministérios envolvidos, dos

convênios firmados pelas instituições municipais; garantir a sustentabilidade dos

projetos; participar da Câmara Técnica de Gestão Estadual; promover a constituição

e o fortalecimento da rede de atendimento à mulher em situação de violência, no

âmbito municipal e/ou regional, por meio de consórcios Públicos.

Em relação às políticas Públicas, em Fortaleza, se destaca a criação da

Coordenadoria Especial de Políticas Públicas para mulheres, criada na gestão da

prefeita Luzianne Lins, em 2005, sendo oficializada pela câmara dos vereadores em

2007. A coordenadoria tem como objetivo coordenar, elaborar e implementar as

políticas públicas que busquem contribuir de forma concreta na vida das mulheres e

nas demais relações de gênero do município. No mesmo período de implementação

dessa coordenadoria, a secretaria de políticas para as mulheres no âmbito federal,

juntamente com a prefeitura, elaboraram o Plano Nacional de Política para as

Mulheres.

Então com o apoio da Política e do Pacto, foram eficazes para a criação

de uma rede de proteção a todas as mulheres que estão em situação de violência,

lutando sempre para que seus direitos sejam efetivados e no combate a qualquer

tipo de violência.

Constituiu então a criação de uma rede de proteção às mulheres em

situação de violência, dentre eles são:

Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher: que é uma unidade

especializada da Polícia Civil para atendimento às mulheres em situação de

violência. Tem caráter preventivo e repressivo, devendo realizar ações de

prevenção, investigação e enquadramento legal, as quais dever ser pautadas no

respeito aos direitos humanos e nos princípios do Estado Democrático de Direito

(Norma Técnica de Padronização - DEAMs, SPM: 2006). A primeira delegacia em

defesa da mulher foi criada no ano de 1985, em São Paulo. E com a promulgação

da Lei Maria da Penha, passaram a desempenhar novas funções, a expedição de

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medidas protetivas de urgência ao juiz no prazo máximo de 48 horas. Segundo o

Jornal O Povo, o Ceará possui 7 delegacias especializadas no atendimento à

mulher.

A Defensoria da mulher tem por finalidade prestar assistência jurídica,

orientar e encaminhar as mulheres que estejam em situação de violência, utilizando

assim dos meios jurídicos especializados. Possui apenas 1(um) Defensoria da

mulher.

O Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher é vinculado

ao tribunal da justiça, que tem competência civil e criminal e tem como objetivo julgar

e processar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. Podendo

então contar com uma equipe multidisciplinar esses poderão contar com uma equipe

de atendimento multidisciplinar a ser integrada por profissionais especializados nas

áreas psicossocial, jurídica e de saúde. No Ceará tem apenas 2(dois) juizados em

Fortaleza e o outro em Juazeiro do Norte.

A Promotoria de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a

Mulher é um equipamento vinculado à Procuradoria Geral de Justiça, conta com o

apoio de dois promotores, tem o intuito de instaurar a ação penal nos crimes de

violência à mulher, ativar a prisão preventiva, realizar medidas de urgência e propor

campanhas educativas de prevenção à violência contra a mulher. Apenas 1(um)

existente no Estado Ceará, que está localizado em Fortaleza.

Centros de Referência: Os Centros de Referência são espaços de

acolhimento/atendimento psicológico e social, orientação e encaminhamento jurídico

à mulher em situação de violência. Que proporcionam o atendimento e o

acolhimento necessários à superação de situação de violência, contribuindo para o

fortalecimento da mulher e o resgate de sua cidadania. No Ceará atualmente há 12

Centros de Referência, só que apenas 2(dois) se localizam em Fortaleza, os quais

são o Centro de Referência e Atendimento à mulher Francisca Clotilde, este centro

foi criado em março de 2006 pela Prefeitura Municipal de Fortaleza, é um

equipamento vinculado à Coordenadoria Especial de Políticas para as Mulheres. O

equipamento atende às mulheres em situação de violência física, psicológica,

patrimonial, moral ou sexual através de uma equipe multiprofissional composta por

advogadas, assistentes sociais, psicólogas, sociólogas e educadoras.

E o Centro Estadual de Apoio e Referência a Mulher (CERAM), o qual

realiza um acolhimento interdisciplinar, conta com uma equipe de médicos

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ginecologistas, psicólogas, assistentes sociais e enfermeira. Recebem um apoio

com a assistência jurídica.

As Casas Abrigos são um equipamento que oferece moradia segura e

protegida e o atendimento integral e multidisciplinar às mulheres em situação de

violência doméstica e familiar contra a mulher. Conta com um serviço sigiloso e

protegido, onde a mulher permanecer por um determinado período com seus filhos.

O objetivo da casa-abrigo é garantir a integridade física e psicológica das mulheres

em situação de risco de vida e de seus(suas) filhos(as) menores de idade,

contribuindo para o rompimento do ciclo da violência, o fortalecimento de sua

autoestima e o exercício de sua cidadania (ZARANZA; GASPAR; MACIEL, 2008).

Fortaleza conta com duas casas abrigos, uma municipal, a Casa Caminho, e a outra

estadual, a Casa Abrigo Margarida Alves.

Desse modo, a violência doméstica já vinha ganhando visibilidade desde

a década de 1980, com as lutas dos movimentos feministas, mas foi a partir da Lei

Maria da Penha que a violência contra a mulher passou a ser crime e reconheceu-se

a violência como uma violação dos direitos humanos das mulheres.

3.2 A Lei Maria da Penha nº 11.340 de 2006

Antes da criação da Lei nº 11.340, os crimes de violência doméstica e

familiar contra a mulher eram julgados nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais e

eram considerados crimes de menor potencial ofensivo, ou seja, as penas referentes

aos crimes de violência contra a mulher eram, dentre elas: pagamento de cestas

básicas, serviços prestados a comunidade por um determinado espaço de tempo.

Com a criação da Lei Maria da Penha, que também veio a criar os

Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as penas passaram a

ser consideradas graves, ou seja, podendo acarretar a prisão do homem agressor. A

partir de então, existem três tipos de homens presos pela Lei Maria da Penha: por

prisão em flagrante de delito, prisão preventiva ou decorrente de condenação judicial

(VASCONCELOS, 2011).

Contudo é criada no Brasil a Lei de n° 11.340, de 7 de agosto de 2006,

um instrumento legal que tem o intuito de eliminar todas as formas de violência

contra a mulher, o qual diz que:

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Art. 2° Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.

A lei nº 11.340/2006 ficou conhecida popularmente como a Lei Maria da

Penha, por ser a Maria da Penha um dos principais ícones na luta contra a violência

doméstica e familiar contra a mulher. Esta lei foi criada e aprovada no dia 7 de

agosto de 2006 na gestão do presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva. Lei

esta de grande conquista para as mulheres brasileiras, pois foi o momento em que o

poder público passou a tomar visibilidade aos casos de violência no Brasil.

Os movimentos feministas tiveram uma total participação para que fosse

criada uma lei de prevenção a violência contra a mulher, pois as ativistas lutavam

por melhores condições de vida para as mulheres e pela erradicação, prevenção e a

punição aos homens que praticam a violência.

No entanto, essa lei ficou conhecida como Maria da Penha, que foi uma

biofarmacêutica, que por diversas vezes sofreu agressões físicas e psicológicas

durante todo o seu casamento. Até que um dia ela sofreu com duas tentativas de

assassinato, o primeiro levou um tiro nas costas quando dormia que a deixou

paraplégica e a segunda com um empurrão na sua cadeira de rodas e com a

tentativa de eletrocutá-la no chuveiro no momento do banho.

A repercussão dos crimes que envolveram Maria da Penha chegou ao

nível internacional, já que o estado brasileiro não dava total importância ao caso. De

maneira que ela teve que recorrer à ajuda de ONGs, como o Centro pela Justiça e o

Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino-Americano e do Caribe para a defesa

dos Direitos da Mulher (CLADEM), enviou o caso para a Comissão Interamericana

de Direitos Humanos (OEA), o caso foi analisado e acatado pela comissão. Então o

Brasil foi condenado internacionalmente, e ela conseguiu finalmente que seu marido

fosse preso. Esta comissão também pressionou para que o Estado viesse a criar

legislações favoráveis à prevenção à violência contra as mulheres.

Esta lei veio procurar corrigir as desigualdades de poder existente entre

os gêneros, que buscam naturalizar a cultura machista dos antepassados. Veio

procurar criar e dar possibilidades para que as mulheres vivam sem violência,

buscando proteger a mulher e punir o agressor.

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Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8

o do art. 226 da Constituição Federal, da

Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências (BRASIL, 2006).

Essa lei em estudo vem considerar a violência doméstica contra a mulher

“qualquer ação ou omissão com base no gênero que lhe cause morte, lesão,

sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”, ou seja, que

venha diminuir a autoestima da mulher no âmbito doméstico.

A lei nº 11.340 ampliou o público enquadrando também a violência

ocorrida entre as relações homoafetivas, ou seja, aquelas que venham a ocorrer no

espaço doméstico, no art.5º, em parágrafo único, vem nos alertar que, independente

de orientação sexual, a Lei Maria da Penha prevalece.

Com a lei 11.340 obtiveram algumas conquistas como a retirada dos

Juizados Especial Criminal para a criação de juizados de violência doméstica e

familiar contra a mulher “com competência civil e criminal para a execução dos

julgamentos”, conforme a Lei nº 11.340/2004): “Os Juizados de Violência Doméstica

e Familiar contra a Mulher que vierem a ser criados poderão contar com uma equipe

de atendimento multidisciplinar, a ser integrado por profissionais especializados nas

áreas psicossocial, jurídica e de saúde” (BRASIl, 2006).

A partir da Lei Maria da Penha, as mulheres, hoje, já podem solicitar as

medidas protetivas no ato da denúncia na delegacia de acordo com as medidas

protetivas de urgência, as que obrigam o agressor, que são de caráter repressivo,

necessitando assim da força policial e as de urgência à ofendida, são medidas de

proteção à mulher. Tais como: a suspensão da posse ou restrição de armas,

afastamento do lar de convivência com a ofendida, a proibição de determinadas

condutas e dentre outros.

Em Fortaleza, inicialmente, a mulher que sofreu a violência vai até a

Delegacia de Defesa da Mulher, faz um boletim de ocorrência, solicita as medidas

protetivas, e estas são encaminhadas para o Juizado da mulher, onde vai ser

orientada sobre os instrumentais de proteção sobre toda a rede de enfrentamento à

violência em Fortaleza. Através do Juizado são feitos encaminhamentos se a mulher

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precisar para o Centro de Referência Francisca Clotilde, nos quais recebera um

atendimento integral a mulher, com a equipe de multidisciplinar partindo para aquele

processo da escuta, necessitando assim de técnica e profissionais especializados

neste processo.

Desta forma se impôs ao Estado adotar políticas públicas que fossem

voltados para resguardar e prevenir os direitos humanos das mulheres, cabendo ao

poder público a criação de políticas que fossem voltados para coibir a violência

doméstica e familiar contra a mulher, buscando ofertar uma vida sem violência,

destacando-se, no entanto valores éticos e sociais referentes à pessoa humana,

fazendo valer as medidas de proteção favoráveis.

Perante toda a rede de enfrentamento existente hoje, escolhemos o

Juizado de Violência Doméstica e familiar da Comarca de Fortaleza para realizarmos

a pesquisa de campo, no qual falaremos detalhadamente no próximo capitulo.

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4 PERCURSOS METODOLÓGICOS

Esta pesquisa é de natureza qualitativa e também de campo, contendo

pesquisas bibliográficas e documentais, tendo por base de estudo as seguintes

categorias: Família, Gênero e Violência.

A pesquisa qualitativa é uma “Pesquisa subjetiva [...] Usada em

população pequena. Seu critério não é numérico. Há uma maior preocupação com o

aprofundamento e abrangência da compreensão das ações e relações humanas”

(GARCIA, 2008). “A pesquisa como o processo formal e sistemático de

desenvolvimento do método científico [...] O objetivo fundamental é descobrir

respostas para o problema mediante o emprego de procedimentos científicos” (GIL,

2006, p. 26).

O delineamento desta pesquisa se deu por meio de levantamentos

bibliográficos, com base nos materiais já elaborados como em livros. A partir da

bibliografia indicada pela orientadora e através de artigos do banco de dados do

evento Fazendo gênero, das revistas Cadernos Pagu e revista estudos feminista.

Posteriormente utilizei a pesquisa documental com base na Lei Maria da Penha, na

Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a violência contra a

mulher-Convenção de Belém do Pará (1994) e nos dados que conseguimos do

JVDFM, que são de 498 fichas referentes ao ano de 2013 e 143 formulários

referentes ao 1° semestre de 2014.

A coleta de dados se deu primeiramente através de uma observação

simples, por duas semanas, nas quais pude me inserir no campo de pesquisa, é o

momento primordial para a pesquisa, pois é a parte em que observamos todo o

cotidiano que envolve o campo “Observando de maneira espontânea os fatos que aí

ocorrem” (GIL, 2008). Criamos familiaridade com os sujeitos da dinâmica

institucional que a figura estranha do pesquisador se torna aos poucos também uma

figura mais familiar.

Foi utilizado entrevistas semiestruturada, necessitando assim da

construção de um roteiro semiestruturado10 que subsidiou as entrevistas, o roteiro foi

pensado previamente e está estruturado em 4(quatro) blocos de perguntas: dados

pessoais da entrevistada; conjugalidade e amor; o processo e a violência.

10 O roteiro de entrevista utilizado segue nos Apêndices.

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A entrevista é uma das técnicas de coleta de dados mais utilizada no âmbito das ciências sociais. Psicólogos, sociólogos, pedagogos, assistentes sociais e praticamente todos os outros profissionais que tratam de problemas humanos valem se dessa técnica, não apenas para coleta de dados, mas também com objetivos voltados para diagnóstico e orientação (GIL, 2008).

Utilizamos também a observação participante que segundo (GIL, 2005) é:

A observação participante, ou observação ativa, consiste na participação real do conhecimento na vida da comunidade, do grupo ou de uma situação determinada. Neste caso, o observador assume, pelo menos até certo ponto, o papel de um membro do grupo. Daí por que se pode definir observação participante como a técnica pela qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior dele mesmo (GIL, 2005).

A observação participante aconteceu em um grupo de mulheres que são

atendidas pelo JVDFM para que pudéssemos realizar nossa pesquisa, já que os

sujeitos dessa amostra eram essas mulheres que estavam desistindo da ação

judicial e que estava convivendo com seus maridos, companheiros ou namorados.

Durante o grupo utilizamos também diários de campo, no sentido de colher a fala

dessas mulheres. Este grupo é formado pela assistente social e pela psicóloga do

juizado e suas estagiárias. As reuniões com estas mulheres aconteciam de 15 em 15

dias. O grupo tinha o intuito de pensar e refletir a condição da mulher que esteja em

situação de violência.

4.1 O Campo de Pesquisa: Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Fortaleza

Os Juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher foram

criados a partir da Lei n° 11.340 de 2006. Esta lei traz no seu primeiro artigo 1°

“dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a

Mulher” voltado para o atendimento a mulheres que estão em situação de violência,

criando assim medidas de assistência e proteção.

Um ano após a criação da Lei Maria da Penha em 2006, o Tribunal de

Justiça do Estado do Ceará criou assim a Comissão de Implantação e

Acompanhamento da Lei Maria da Penha, que tinham a meta de implantar os

Juizados da Mulher, como resultado da promulgação enviada à Assembleia

Legislativa foi aprovada a Lei n° 13.925 de 25 de julho de 2007, foi que criou os

juizados de Fortaleza e do Juazeiro do Norte (VASCONCELOS, 2011).

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O JVDFM de Fortaleza foi criado em 18 de Dezembro de 2007, tinha como sede inicial no bairro de Fátima, posteriormente no dia 7 de janeiro de 2009 mudou-se para a nove sede, que está situada no bairro Benfica. Essa mudança foi proporcionada pela verba advinda do Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania) e ocorreu porque a antiga sede ela não oferecia uma estrutura adequada. Foi o primeiro Juizado da Mulher criado no Ceará e após foi fundado outro em Juazeiro do Norte (VASCONCELOS, 2011).

O Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher é um órgão

que está vinculado ao Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. A equipe do Juizado,

atualmente, é composta por: 2 policiais militares, 1 copeira, 1 motorista, 3 analistas

jurídicos, 4 estagiários de Direito, 1 promotora de justiça, 1 assessora da juíza, 1

juíza, 1 Assistente Social e 3 estagiários, 1 psicóloga e 2 estagiárias.

Este Juizado é composto por uma equipe multidisciplinar que tem como

função de acordo com a Lei 11.340 de 2006 de:

Art. 30. Compete à equipe de atendimento multidisciplinar, entre outras atribuições que lhe forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito ao juiz, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, mediante laudos ou verbalmente em audiência, e desenvolver trabalhos de orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas, voltados para a ofendida, o agressor e os familiares, com especial atenção às crianças e aos adolescentes (BRASIL, 2006).

São diversas as ações da equipe multidisciplinar no juizado de Fortaleza

que é formado por uma a assistente social e a uma psicóloga e suas respectivas

estagiárias, ações como o acolhimento as mulheres que vão para as audiências, o

qual ocorre dias antes da audiência com a juíza - um grupo reflexivo que tem o

objetivo de se pensar e refletir a condição da mulher-, esclarecendo os

procedimentos necessários para ocorrer a audiência, neste processo de acolhimento

as mulheres são orientadas acerca do papel da instituição, os tipos de violência

contidos na Lei Maria da Penha, e chamando a atenção delas para o ciclo da

violência que são momentos característicos de três fases (Tensão, Explosão e Lua

de Mel), que ocorrem em momentos circulares ao longo do tempo, que muitas vezes

pode voltar a acontecer entre os relacionamentos.

Esta instituição atende mulheres que iniciaram a ação de caráter penal na

Delegacia de Defesa da Mulher de Fortaleza, atende demanda de mulheres que já

fizeram o B.O e que pediram ou não as Medidas Protetivas que são elas: O

afastamento do agressor do lar, suspensão de visitas aos filhos menores e a

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suspensão do porte de armas e etc. (VASCONCELOS, 2011).

De acordo com a Lei Maria da Penha recebido o expediente com o pedido

da ofendida, cabe ao juiz, no prazo de 48 horas, conhecer o pedido e decidir sobre

as medidas protetivas de urgência, determinar o encaminhamento da ofendida ao

órgão de assistência judiciária, comunicar ao Ministério Público. Mas sabemos que

essas medidas não são efetivadas no prazo de 48 horas, como estão ditas em Lei.

Essas medidas devem ser apreciadas pelo juiz(a) e no prazo de 48 horas

se for deferida, já é marcado a primeira audiência. Então são enviadas ao Fórum

Clovis Beviláqua as Medidas a serem distribuídas entre os oficiais de justiça, os

quais, em seguida, são entregues nas residências das mulheres e também na do

agressor. O descumprimento dessas medidas poderá acarretar a prisão do homem

(RODRIGUES, 2012)

Em 2013 esse número de Medidas Protetivas no primeiro trimestre. 81%

das mulheres tinham a Medida Protetiva, 13,8%, não tinham essas Medidas e em

7,87% das fichas preenchidas, não foram declaradas11.

Já no primeiro trimestre de 2014 o número de medidas protetivas

aumentaram no primeiro trimestre, pois 83,21% das mulheres tinham as medidas

protetivas, 15,38% não tinham essa medida protetiva e 1,39% das fchas não tinham

respostas12.

4.2 Serviço Social no Espaço Sociojurídico

Nesse sentido, faz-se pensar o trabalho do Assistente social no campo

sociojurídico, tendo em vista que esta pesquisa é um ensaio monográfico de Serviço

Social. O campo sociojurídico foi um dos primeiros espaços de trabalho para o

assistente social, em meados dos anos de 1940, surge então o trabalho profissional

nesta área através da Justiça da Infância e do adolescente, atuando inicialmente

como perito dentro do seu espaço privilegiado e no final dos anos 1940 ele passou a

atuar no Juizado de Menores de São Paulo (FÁVERO, 2005).

Então, no ano de 1979, com o segundo Código de Menores dispunha

sobre a “assistência, proteção e vigilância a menores”, nesta área o profissional de

11

Dados fornecidos pelo Juizado. 12 Dados fornecidos pelo Juizado.

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serviço social passou a ocupar em grande quantidade a área do judiciário, para que

essa lei fosse aplicada teria que levar em conta tanto “o contexto socioeconômico

como o cultural”, em que se encontravam tanto o menor como os seus pais

(FÁVERO, 2005).

No espaço judiciário o assistente social é subordinado

administrativamente a um juiz de direito. Nesse campo, o profissional além de ter o

conhecimento específico da área do serviço social, precisa também ter

conhecimento aprofundado sobre a área especifica em irá atuar, já que o objeto de

estudo é intervir nas sequelas da questão social que estão postas no cotidiano.

As ações realizadas pelo assistente social nesse espaço sociojurídico,

como no Juizado da Mulher são: realizar atendimentos as vítimas, autores e seus

familiares, realizar entrevistas de avaliação, emitir laudos e pareceres,

encaminhamentos para rede socioassistencial, realizar visitas domiciliares, subsidiar

os grupos de reflexivo sobre a violência contra a mulher, realizar estudo mensal

acerca dos dados estatísticos das demandas da equipe multidisciplinar referente ao

processo de desistência das medidas.

A área sociojurídica ainda persiste em práticas de trabalho pautadas na

multidisciplinaridade. O Direito não consegue ainda integrar suas ações às de outras

áreas. Integração a que me refiro é discutir casos conjuntamente, com a produção

de relatórios e pareceres através da integração das diversas áreas

(VASCONCELOS, 2011).

A Lei nº 8.662 de 1993 vem estabelecer as competências do assistente

social, as quais são: “Realizar estudos socioeconômicos com os usuários para fins

de benefícios e serviços sociais junto a órgãos da administração pública direta e

indireta, empresas privadas ou entidades”.

E suas atribuições privativas enquanto assistente social são a de “realizar

vistorias, perícias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres sobre a

matéria de Serviço Social” (FÁVERO, 2005).

A assistente social tem como atribuições específicas dentro do juizado é a

de fornecer informações mediante a relatórios e pareceres à juíza, sobre os casos

específicos, atendimentos as demandas específicas, como prestar informação e

orientação que venham contribuir para a tomada de uma decisão, fornecer

encaminhamentos das mulheres para rede de enfrentamento para que elas recebam

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um atendimento necessários, para o promovido tem também encaminhamentos para

as instituições e os centros que promovem reflexões acerca da violência cometida.

No entanto, a área sociojurídica é uma das áreas que mais exigem o

trabalho do profissional de Serviço Social, através da equipe multidisciplinar, a

relação existente entre a psicologia, o serviço social e o direito, por que ambos

trabalham na garantia dos direitos previstos em lei.

4.3 Dificuldades Metodológicas

Nenhuma pesquisa é linear, daí o nosso interesse em mostrar os

descompassos do percurso metodológico. Desde quando iniciei a construção do

projeto de pesquisa, já estava prevendo as dificuldades que iriam ser encontradas

neste campo da violência, por se tratar de mulheres que ainda convivem com seus

companheiros, seja por amor, seja por dependência financeira.

Primeiramente estava decidida a realizar a minha pesquisa de campo no

Centro de Referência Francisca Clotilde, por se tratar de um campo que atende

mulheres em situação de violência, e também por já ter tido contato com a

coordenadora do Centro, mas não deu certo, porque este centro estava em um local

provisório, e isso dificultava o acesso das mulheres a este centro.

Então, ocorreu o momento em que a minha orientadora apresentou-me

como possibilidade de pesquisa o Juizado de Violência Doméstica e familiar contra a

mulher. Apresentando-me o grupo reflexivo que contava com a presença das

mulheres que queriam desistir da ação judicial.

No mês de Setembro, iniciei a entrada ao campo, participando de um

grupo reflexivo com as mulheres que queriam desistir da ação judicial e que sofrem

profundas estigmatizacões sociais, pois há sempre o discurso que é impregnado

pela cultura de que a mulher está em uma situação de violência é porque “gosta de

apanhar”. Esses grupos tinham encontros marcados de 15 em 15 dias, os quais

contavam com a participação de uma Assistente Social ou de uma Psicóloga. Foram

dias muito angustiantes, porque as mulheres tinham receio de se abrirem para a

entrevista, acho que muitas vezes com medo. As expectativas das entrevistas se

quebravam pelo silêncio e a negativa de muitas mulheres em participar das

entrevistas. Supomos que o silencio também fosse um dado e partimos da hipótese

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de que as mulheres poderiam se sentir amedrontadas por mais que eu, a toda hora,

ficasse esclarecendo acerca do sigilo das informações que eram dadas.

Nas primeiras participações no grupo, apenas duas aceitaram participar

das entrevistas sendo abordadas após o grupo. Mas, na segunda participação tive

um respaldo maior e consegui entrevistar cinco mulheres, porém elas foram

abordadas antes do grupo, no momento em que elas ficavam na sala de espera,

momento este que foi primordial para que elas aceitassem participar da entrevista.

Porém as entrevistas que foram realizadas, as mulheres não aceitaram gravar a

entrevista, mas assinaram o termo de livre consentimento. Em decorrência disso,

tive que prestar atenção no que elas falavam e ao mesmo tempo, tendo escrever

rápido, para não fugir nenhuma ideia da minha cabeça.

A maioria das mulheres que participavam do grupo, já tinha se

reconciliado com seus companheiros e o silêncio, medo e pouco tempo que me

restava para realizar essas entrevistas dificultavam mais ainda seu andamento. O

campo, às vezes, não acompanha os prazos acadêmicos do pesquisador.

Mas aos poucos minhas entrevistas iam sendo realizadas, continuei indo

semanalmente nos dias do grupo para o juizado, perante todas as dificuldades que

ocorreram no momento de realização dessa pesquisa.

4.4 Perfil Biográfico das Mulheres Entrevistadas

Foram, no total, 12 mulheres entrevistadas. Através das entrevistas

colhidas entre os meses de setembro e novembro de 2014, das quais eram

mulheres que entravam com o pedido de retirada ou arquivamento da ação judicial.

Mas todas assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido13, só que

nenhuma aceitou que as entrevistas fossem gravadas.

Os nomes das mulheres que me ajudaram nessa pesquisa não serão

divulgados, por se tratar de uma pesquisa de caráter sigiloso e ético. Utilizarei

nomes das minhas irmãs e sobrinhas, as quais foram sujeitos fundamentais neste

processo.

Leide, 26 anos, morena, natural de Fortaleza, mora atualmente no

bairro Quintino Cunha, frequentou o Ensino Médio completo, seu estado civil de

13 O termo de livre consentimento livre e esclarecido utilizado segue nos Apêndices.

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união estável, tem 2 filhos, trabalha como costureira, sofreu violência por parte do

marido, mora há 4 anos com o homem que lhe agrediu, quando perguntei o porquê

da desistência do processo, disse que: “O fazem com que eu desista do processo é

por que tenho dois filhos para criar, eles sentem falta do pai...” (Leide).

Francisca, 46 anos, branca, natural de Fortaleza, mora atualmente no

Parque São José, está cursando o Ensino Médio. É católica, seu estado civil é

casada, tem 2 filhos, não trabalha, mas é dona de casa, sofreu violência por parte do

seu esposo, mora com ele há 25 anos, quando perguntei o motivo da desistência do

processo, disse que: “A insegurança financeira, medo de enfrentar a vida só com

meus filhos, a falta de apoio da minha família e o medo de represália por parte do

meu esposo” (Francisca).

Maria, 42 anos, branca, natural de Mato grosso do Sul, mora atualmente

no Bairro do Conjunto São Cristóvão, frequentou até o 2° do Ensino Médio, É

católica, seu estado civil é casada, tem 3 filhos, trabalha como corretora de imóveis,

sofreu violência por parte do seu esposo, convive com ele há 9 anos, mas já se

separou três vezes, quando perguntei a razão da desistência, informou: “Quero

desistir do processo é em relação à medida protetiva, para limpar o nome dele,

porque meu intuito quando fui denunciá-lo, na delegacia , era que ele imediatamente

saísse de dentro de casa, e agora ele já saiu, e quero deixá-lo em paz...” (Maria).

Leidiana, 37 anos, morena, natural de Fortaleza, mora atualmente no

bairro Jacarecanga, concluiu o Ensino Médio, É evangélica, seu estado civil é união

estável, tem 2 filhos, trabalha como auxiliar de produção, sofreu violência por parte

do seu marido, convive há 2 anos, quando perguntei a respeito da desistência do

processo disse que: “O motivo pelo qual quero desistir do processo é o meu

arrependimento por ter lo denunciado e aceitado as medidas protetivas...” (Leidiana).

Silvia, 29 anos, parda, natural de fortaleza, mora atualmente no bairro

Passaré, concluiu o Ensino Médio, não tem religião, mas acredita em Deus, não tem

filhos, trabalha como autônoma na função de manicure, sofreu agressões físicas e

psicológicas por parte do namorado, namoram há 4 anos, quando perguntei o

porquê da desistência do processo disse que: “O motivo pelo qual estou desistindo

do processo é porque eu sou apaixonada por ele, não consigo viver sem ele e não

quero que ele seja preso nunca...” (Silvia).

Lívia, 38 anos, morena clara, natural de Fortaleza, mora atualmente no

bairro Conjunto Palmeira, É católica, tem 3 filhos, frequentou a escola até o Ensino

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Médio, não trabalha é apenas dona de casa, sofreu agressões físicas e psicológicas

por parte do seu companheiro, convive há 7 anos, quando perguntei sobre o porquê

da desistência do processo disse que: “O que me leva a desistir do processo é que

nós estamos se reconciliando, ele agora está mudado, está na igreja evangélica...”

(Lívia).

Dani, 28 anos, parda, natural de fortaleza, mora atualmente no bairro Dias

Macêdo, Ensino Médio completo, seu estado civil é solteira, tem 3 filhos, não

trabalha é apenas dona de casa, sofreu violência por parte do seu ex-companheiro,

moravam juntos há 2 anos, quando perguntei o porquê da desistência disse que: “O

que me leva a desistir é por que quero deixar o nome dele limpo...e também por

status financeiro, porque como eu não trabalho, ele tem que me dar pensão. E eu

acho que com as medidas isso dificulta...” (Dani).

Vitoria, 48 anos, branca, natural de Fortaleza, mora atualmente no

Mondubim, estudou até o ensino fundamental, seu estado civil é casada, tem 2

filhos, Trabalha como diarista, sofreu violência por parte do seu marido, são casados

há 22 anos, quando perguntei o porquê da desistência disse que: “O que me leva a

desistir do processo é que agora ele está internado em uma clínica e está totalmente

mudado, quero minha família de volta...” (Vitória)

Heloísa, 33 anos, branca, natural de Fortaleza, tem pós-graduação, mora

atualmente no bairro Centro, tem 2 filhos, é católica, trabalha como coordenadora de

uma ONG, tinha com o seu ex-marido 10 anos de casados, sofreu violência por

parte do seu companheiro. Quando perguntei o porquê da desistência, explicou que:

“Porque quero a restituição da minha família de volta, família não de viver juntos

novamente, mas permitir a presença dele na vida dos meus filhos, por exemplo, eu

estar no mesmo ambiente que ele, pra gente passear juntos, hoje eu já tenho uma

relação harmoniosa com ele, mas como amiga...” (Heloisa).

Dávila, 22 anos, morena, natural de Fortaleza, mora atualmente no bairro

Jardim União, fez até a 7ª série do ensino fundamental, tem 2 filhos, trabalha como

promotora de vendas, tem 4 anos de relacionamento, sofreu violência por parte do

seu companheiro, quando perguntei o motivo da desistência disse que: “Vou

arquivar as medidas, porque eu já voltei com ele, e quero limpar o nome dele”.

Lorena, 39 anos, morena, natural de Jaguaribe, mora atualmente no

bairro Mondubim, Ensino Médio completo, não tem filhos, trabalha como autônoma,

tinha 16 anos de relacionamento, sofreu violência por parte do seu ex-companheiro,

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quando perguntei o porquê da desistência disse que: “Eu hoje moro só, já estou na

paz e ele já está no canto dele, quero deixar ele em paz” (Lorena).

Sara, 24 anos, parda, natural de Fortaleza, mora atualmente no bairro

Praia do Futuro, Ensino Médio incompleto, não tem filhos, trabalha como atendente,

tinha 8 anos de relacionamento, sofreu violência por parte do seu ex-companheiro,

quando perguntei o porque da desistência disse que: “Por que agora ele mudou e

não mim procurou mais, agora quero limpar o nome dele” (Sara).

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5 “NÃO CONSIGO VIVER SEM ELE” RELATOS E HISTÓRIAS DAS MULHERES QUE DESISTEM DA AÇÃO JUDICIAL

Neste tópico, discutiremos um pouco a respeito dos resultados da

pesquisa, relacionando com as categorias analíticas e com as falas das mulheres

que desistiram do processo ou da ação judicial do Juizado de Violência Doméstica e

Familiar contra a Mulher.

5.1 Violência “Tudo Aquilo que me Deixa Marcas”

Por meio de alguns relatórios que foram fornecidos pelo JVDFM durante a

pesquisa de campo, e a partir dos atendimentos às mulheres que solicitaram a

desistência da ação judicial e que foram tabuladas durante os meses de janeiro a

Dezembro de 2013, podemos ver no gráfico abaixo14 que tipos de violência são

manifestos:

Figura 1 - Tipos de Violência

Fonte: Próprio Autor

Podemos ver que 53,61% das mulheres afirmaram que sofreram violência

psicológica, muitas vezes o que ocorre após a psicológica é a violência física.

Algumas mulheres não sabiam relacionar os tipos de violência que sofriam. 51,40%

14 Gráfico: Dados fornecidos pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de

Fortaleza.

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estava relacionada às mulheres que sofreram a violência moral; 41,56% declaram

ter sofrido violência física; 9,23% relataram que sofrem violência patrimonial e 3,01%

relataram que sofreram violência sexual. Portanto observamos a mescla de variados

tipos de violência, ou seja, dificilmente um tipo acontece de forma isolada. Como

corroboram algumas falas15 reproduzidas a seguir: “Porque ele me bateu e, o pior:

na frente dos meus filhos!” (Leide); “...não houve motivos, ele não queria que minha

sobrinha dormisse na minha casa e no meio de discussão ele me agrediu

fisicamente” (Francisca).

A primeira vez que ele me bateu foi uma coisa assim sem motivos [choro]... ele chegou em casa do trabalho à noite, e eu estava lavando roupa e cuidando dos meninos, aí ele chegou e foi tomar banho lá do banheiro ele gritou: amor, me traz a toalha, aí eu disse: amor, não posso levar agora não, tenho que ir na mercearia comprar um creme de leite, aí ele começou a me esculhambar e falando que ele que estava mandando e que eu tinha que obedecer a ele, com isso imediatamente ele saiu do banheiro foi em minha direção e me deu uns tapas, só por que não fui deixar a toalha a ele no banheiro.(Depoimento colhido no dia 29/10/2014).

Observamos que nas cenas de violência relatadas anteriormente também

há questionamentos das próprias mulheres sobre as situações vivenciadas. No ano

de 2014, durante os meses de Janeiro a Junho, a violência psicológica também foi a

mais citada entre as mulheres. Analisando os dados e relatos podemos ver que a

maioria das mulheres apontaram que sofreram um tipo ou mais de um tipo de

violência.

15 Depoimento colhido no dia 29/10/2014.

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Figura 2 - Tipos de Violência (B)

Fonte: Próprio Autor

Podemos observar, nesse gráfico, que a violência psicológica, ela vem

com uma porcentagem maior do que a de 2013, com 67,83% no ano de 2014, e em

seguida temos a violência moral com 57,34%, e em terceiro a violência física com

53,85%. Isso nos mostra que as mulheres em questão estão, na maioria das vezes,

mais expostas à violência psicológica que à física. Como reforçado pela seguinte

fala: “aí foi o momento que ele começou a me esculhambar e já partiu para me

agredir me dando uns tapas e aí não aguentei e ai no outro dia estava de cabeça

quente e já fui na delegacia e denunciei ele ...” (Maria).

Notamos que a resistência também figura nas ações dessas mulheres: na

denúncia, no fato de responder ao homem. Tendemos, contudo, a enxergar a

resistência no tocante apenas ao rompimento do relacionamento, quando na

verdade é algo mais complexo: “fui bater no trabalho dele para conversar com ele,

disse um monte de coisa a ele, a esculhambei e aí ele partiu pra cima de mim, me

deu uns empurrões e eu empurrei ele...” (Leidiana).

Como afirma Saffioti, “a violência é uma das formas de ruptura de

qualquer integridade da vítima”, ou seja, a violência mexe com a autoestima da

mulher, tanto no aspecto moral, psicológico, sexual como físico.

Durante toda a pesquisa realizada no JVDFM, podemos perceber que

entre as mulheres, por mais que a Lei Maria da Penha seja uma lei reconhecida por

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milhares e milhares de pessoas, existe a falta de conhecimento em relação às

formas violências que são sofridas por elas, na maioria das vezes só conseguem

visualizar a violência atrelada à agressão física. A dependência afetiva ainda

percorre pelos depoimentos ouvidos, pois as mulheres em muitos casos trabalham e

não dependem financeiramente dos seus companheiros, maridos ou namorados.

5.2 Amor “Apaixonada por Ele, Não Consigo Viver sem Ele”

Podemos analisar nas entrevistas que, entre os motivos da desistência,

estão a reconciliação do casal, um dos maiores motivos que aparece nos relatos,

muitas vezes por não querer prejudicar o companheiro no trabalho, a pressão

familiar de ambas as partes, por medo, dentre outros motivos os quais as

entrevistadas não quiseram relatar em entrevista, utilizando-se do silêncio como

resposta.

Podemos observar, no gráfico de 2013, os motivos que as mulheres

ensejaram para a desistência, de modo que 62,5% se reconciliaram com o

promovido, 27,7% não querem prejudicar o promovido, 1,3% por pressão familiar,

muitas vezes, a família tem medo do que venha a ocorrer futuramente e influenciam

as mulheres a desistir do processo, 12,5% das mulheres revelaram que existiam

outros motivos para a desistência e 2,7% fichas sem respostas.

Figura 3 - Motivos da Desistência

62,50%27,70%

1,30%

12,50%2,70%

Motivos da Desistencia em 2013

Reconciliação

Não quer prejudicar o promovido

Pressão Familiar

Outros Motivos

Fonte: Próprio Autor

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Já no primeiro trimestre de 2014, assim como em 2013, podemos ver que

a reconciliação das mulheres com seus companheiros foi a mais relatada e utilizada

como justificativa para a desistência do processo e das medidas protetivas.

Há também nas falas a grande esperança de que o companheiro mude.

Já que na própria relação construída a mulher não consegue promover as mudanças

que desejaria, e aí é que ela recorre à Justiça. Como se observa nas seguintes

falas16: “Percebi que ele está mudando, agora ele é outra pessoa” e “Porque já

estamos morando juntos novamente e por causa dos nossos filhos” (Leide).

Há nos relatos a fase da lua de mel muito clara nos depoimentos, a

terceira fase do ciclo da violência que ocorre nos relacionamentos: “A gente estamos

nos reconciliando e ele prometeu que iria mudar (Dávila)”; “Estou desistindo do

processo por que tenho medo de enfrentar a vida só com meus filhos, a falta de

apoio da minha família e o medo de represália por parte do meu esposo”

(Francisca).

No tocante às questões de gênero, a mulher é a mais responsabilizada

que o homem no sentido de manter o casamento e a relação. Como bem representa

a fala delas: “A minha desistência é por que ele melhorou bastante, quero ter a meu

lar de volta e minha família unida e eu estou vendo que ele está se esforçando para

cada vez mais para mudar” (Vitoria).

Vejamos no gráfico com os dados do primeiro trimestre de 2014 que:

50,34% das mulheres se reconciliaram com o promovido, 30,76% das mulheres não

querem prejudicar o promovido, 6,29% das mulheres desistem por pressão familiar,

a família nesta decisão tem grande influência, 10,48% são outros motivos que levam

à desistência e 2,09% ficaram sem respostas.

16 Depoimentos colhidos em 29/11/2014

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Figura 4 - Motivo de Desistência 2014

Fonte: Próprio Autor

No entanto, a grande maioria das mulheres entrevistadas procura a

Equipe Multidisciplinar do JVDFM para desistir do processo ou da medida, porque

retomou com o relacionamento afetivo com o promovido. Vejamos nos relatos a

seguir: “Quero desistir do processo é em relação à medida protetiva, para limpar o

nome dele...” (Maria).

Ora, o homem que é denunciado pela LMP, passa a ter em sua ficha

criminal o trâmite do processo que ele está respondendo. Sendo assim, muitas

empresas negam emprego: “O motivo pelo qual quero desistir do processo é o meu

arrependimento por tê-lo denunciado...” (Leidiana); “O motivo pelo qual estou

desistindo do processo é porque eu sou apaixonada por ele, não consigo viver sem

ele...” (Silvia); “...me leva a desistir do processo é que nós estamos se

reconciliando...” (Lívia).

O ciclo da violência se expressa não sua na relação conjugal, mas

também nas próprias instituições da rede, pois na DDM a mulher costuma agir no

“calor das emoções” e no Juizado, com todos os fatores discutidos aqui, ela

repensar a atitude na promessa de mudança do homem especificamente na (Lua de

mel) e ai arquivam o processo.

A violência conjugal pode ser manifestada no âmbito doméstico e junto

acarretar um processo doloroso de separação, a ruptura com o cônjuge (TELES E

MELO, 2003). Momento este que é muito difícil para a mulher, visto que muitas

mulheres não conseguem viver sem o companheiro, necessitando sempre da

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presença de um homem, pois isso é uma exigência cultural que pesa sobre a

mulher: se é solteira, tem que ter um namorado e, se é casada, tem que manter o

casamento.

Um dos nossos objetivos com a pesquisa foi compreender quais seriam

os fatores que levariam as mulheres a permanecer em uma relação violenta com

seus companheiros, se seria a dependência financeira ou não. Segundo os dados

coletados da Equipe Multidisciplinar e a partir das entrevistas realizadas, podemos

concluir que não é a dependência financeira do homem o único fator de

permanência dessas mulheres na relação violenta. Contudo, por muito tempo foi e é

para muitas mulheres a permanência com seus companheiros, maridos ou

namorados, não se restringe apenas a dependência financeira ate por que as

maiorias das entrevistadas trabalham e não dependem financeiramente dos seus

companheiros. Na maioria dos casos o “lado emocional” ainda fala mais alto, a

dependência afetiva é bastante utilizada como justificativa, a falta que os filhos

sentem dos pais, a expectativa de mudança do companheiro dentro de casa, é

bastante utilizada nos discursos das mulheres.

Vejamos, no gráfico do ano de 2014, nos relacionamentos afetivos, se a

promovente depende financeiramente do promovido:

Figura 5 - Dependência Financeira 2014

40,29%

58,95%

0,74%

Dependencia Financeira 2014 (1° Semestre )

Dependem

financeiramente do

Promovido

Não dependem

financeiramente do

promovido

Sem Resposta

Fonte: Próprio Autor

Podemos perceber no gráfico que 58,95% das mulheres não dependem

financeiramente do promovido, 40,29% dependem financeiramente, concluímos que

os fatores que levam a mulher realizar o pedido da desistência e permanecer em um

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relacionamento com o promovido, vai além da dependência financeira, está mais

para a dependência afetiva em ambas as partes.

5.3 Família - “A Família é a Base de Tudo”

A maioria das mulheres que procuram o JVDFM com o intuito de desistir

das Medidas Protetivas ou do processo, mantém um relacionamento afetivo com o

agressor. Segundo alguns dados colhidos e os relatórios que nos foi fornecido pela

equipe multidisciplinar do juizado esse relacionamento afetivo das mulheres

equivalem ao relacionamento conjugal de ambas as partes, a união. O

relacionamento familiar segundo o relatório é aquele em que algum grau de

parentesco entre a vítima e o homem que cometeu a violência, como por exemplo,

nos dias atuais, com novos arranjos familiares como Mãe e os filhos, irmãos. Já no

que diz respeito ao relacionamento doméstico, segundo o relatório fornecido pelo

JVDMF é quando não há nenhum grau de parentesco entre as partes, mas há a

convivência doméstica, ou seja, não há necessariamente a permanência de

parentescos em conjuntos, mas um agrupamento de pessoas na maioria dos casos

por afinidades e afetos

Vejamos o gráfico a seguir:

Figura 6 - Relação entre os cônjuges (2013)

Fonte: Próprio Autor

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No ano de 2013, 74,29% das mulheres afirmaram que tinha relação

afetiva com o promovido17, ou seja, aquela referente à conjugal, como já explicamos

anteriormente, 21,68% das mulheres diziam que tinha um relacionamento familiar e

4,01% das mulheres tinhas um relacionamento apenas doméstico. Vale ressaltar a

seguinte fala: “Daqui pra frente, eu quero minha família de volta” (Vitória).

Já em 2014, os relacionamentos afetivos foi o mais citado nas entrevistas

e nos relatórios, com 93,70% das mulheres afirmaram ter um relacionamento afetivo

com o promovido, 5,59% o familiar e 0,69% aparece o doméstico.

Figura 7 - Relação entre os cônjuges (2014)

Fonte: Próprio Autor

A pesquisa até então já tinha perpassados alguns obstáculos em sua

trajetória, durante duas semanas estive observando as mulheres que eram

atendidas no juizado, com isso percebi as feições das mulheres, porque é bastante

delicado para a mulher que sofreu violência ir até a delegacia e denunciar o seu

companheiro. Por conta disso, muitas delas sofriam violência psicológica e moral. Ao

perguntar se poderiam participar das entrevistas, percebi que as mulheres com a

aparência fragilizadas, e o silêncio era utilizado como resposta diante da

complexidade dos problemas por que elas estavam passando, mas não perdiam a

esperança de viverem uma vida sem violência, eram os sonhos que elas tinham em

mente, como atestam algumas de suas falas: “A Família é tudo na vida da pessoa...”

17 Promovido: termo científico voltado para homens que respondem processo no Juizado.

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(Leide). “Família é um projeto de Deus...” (Vitória) e “Família é o nosso porto

seguro...” (Francisca).

Compreendemos aqui também como a religião pode figurar como fator de

permanência na relação de violência e um imaginário de família como “tudo”, “porto

seguro” ainda quando esta vem a se configurar como violenta.

Para muitas mulheres atendidas pelo JVDMF a família se torna um berço

acolhedor, porque, na maioria das vezes, com os problemas e situações que

ocorrem em nossas vidas públicas e até mesmo dentro do âmbito doméstico,

procuramos primeiramente a nossa família, como meio de solucionar os problemas.

Dentre os muitos relatos das mulheres na sala de espera do juizado,

instigaram-me ainda mais chegar para elas e conversar, puxando assunto sobre o

tema para depois entrarmos na entrevista, mesmo com as medidas, as mulheres

utilizavam muito da afirmação “Meu Marido”, sempre na perspectiva de refazer a

família de volta, posto que, muitas vezes, os filhos sentiam falta do pai dentro de

casa, iam em busca da proteção total da sua família, na expectativa que de ele fosse

mudar ou que já tivesse mudado. Diante de todo o sofrimento pelos quais elas

passaram, podemos concluir que a busca pela felicidade plena era bastante e de

viverem em paz.

5.4 Relações de Gênero: “A liberdade que homem tem, e que a mulher não

tem”

Durante as entrevistas que foram realizadas, pude observar que todas as

mulheres falam que a diferença entre homem e mulher é exatamente a liberdade

que o homem tem e que a mulher não tem, liberdades essas que, na maioria das

vezes, são direcionadas apenas ao homem, características ainda de um modelo

machista, de que a mulher tem que ficar em casa para cuidar dos filhos e o homem

não. Como afirma Chauí (1985) “A liberdade não é, pois, a escolha voluntária ante

várias opções, mas a capacidade de autodeterminação para pensar, querer, sentir e

agir. É autonomia”.

De acordo com o pensamento de Scott (1990), gênero está atrelado à

relação fundamental de duas proposições, em que gênero é um elemento

constitutivo das relações sociais sobre as diferenças de sexo, e é o primeiro modo

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de significar as relações de poder, existentes através da igualdade e da

desigualdade nas organizações.

Diante disso, podemos observar as formas como as mulheres relatavam a

sua relação com o seu companheiro, marido ou namorados, que, na maioria das

vezes, eram relacionamentos com discussões, brigas ou até mesmo humilhações,

nas quais imperavam traços recorrentes do machismo, que procurava usar

palavrões e palavras que baixavam a sua autoestima, deixando bem claros “que ele

era o homem da casa”, ou até mesmo o poder de posse da mulher como “minha

mulher”, passando sempre à condição de superiores às mulheres, que acabavam

reproduzindo as desigualdades entre os sexos, como revelam certas falas: “Nosso

relacionamento era muito ruim, com muitas brigas e ciúmes” (Leidiana);

“Relacionamento é bastante complicado, ele é muito grosseiro e briguento”

(Francisca).

De acordo com Heilborn (1995), a capacitação para uma determinada

tarefa não é produzida originalmente pela natureza dos sexos, mas pela cultura que

simboliza as atividades como masculinas ou femininas, ou seja, a cultura é que

direciona os afazeres entre os sexos, como afirma a entrevistada a seguir, quando

direcionamos a pergunta para ela o que é ser homem e mulher hoje: “O homem é

sem vergonha, não presta para nada, por que ele não pode ajudar em nada dentro

de casa” (Dávila).

As mulheres já questionam os papéis que historicamente lhes foram

atribuídos como prerrogativas únicas delas:

Eu trabalho e meu marido também, quando eu chego em casa, eu só faço trocar de roupa e já tenho que ir cuidar dos meninos, meu marido não, ele troca de roupa e já vai sair pra jogar bola, isso acontece de domingo a segunda, a semana toda, tem dias que eu nem vejo a hora que ele chega... (Depoimento colhido no dia 29/10/2014).

Dia de domingo, eu tiro o dia para lavar a roupa da semana e meu marido também está em casa, se eu pedir para ele apenas para olhar as crianças, pronto já é um motivo de briga dentro de casa. Por que ele diz que quem tem que cuidar dos meninos sou eu e não ele (Depoimento colhido no dia 29/10/2014).

“Ah... a mulher é para trabalhar, cuidar dos filhos e da família e de casa”

(Dávila). Contudo, algumas delas, atualmente, é atribuído a elas incorporar o papel

subalterno atribuído à mulher. Entretanto, essa é a forma de demonstrar a

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masculinidade de alguns homens, pois muitos deles pensam que por ser homem

não podem e não devem ajudar nos afazeres domésticos, podemos ver na fala da

entrevistada a não aceitação dela, e de forma representativa a de outras

entrevistadas, a resistência delas a esse padrão imperoso em nossa sociedade.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A violência contra a mulher é algo que está cada vez mais visibilizado em

nossa sociedade. Através de alguns dados coletados e os dados que foram

fornecidos pelo Juizado da mulher, podemos observar que um dos principais

motivos de desistência da ação judicial ou da medida protetiva é a reconciliação da

mulher com o homem. Isso nos mostra que o retorno ao casamento, não é algo

voltado apenas para o financeiro, a dependência afetiva também se faz presente nas

entrevistas. Contudo outros fatores que fazem com que a mulher permaneça em um

relacionamento violento, muitas vezes, são os filhos, o medo de prejudicar o homem,

retomar a vida sem ele, mas sem prejudicá-lo, a expectativa de mudança por parte

do companheiro.

Podemos observar perante as informações colhidas das entrevistadas,

que a maioria das mulheres trabalham, tem a sua própria independência,

pouquíssimas são a que não trabalham. A maioria é casada, isso nos mostrar que

mesmo que ocorra a situação de violência dentro do próprio domicílio, elas não

buscam romper com os relacionamentos querem apenas que o companheiro mude

para viverem em harmonia um com o outro, a dependência afetiva também é um dos

fatores que mais as mulheres falam.

Na maioria dos casos o que prevalece é a importância da mulher pensar

na condição da formação familiar, pois nos relatos colhidos das entrevistas as

mulheres afirmaram que a família é a base de tudo, pois mesmo que elas estejam

em situação de violência, ou que já estão com as medidas protetivas, procuram

mesmo assim dar mais uma chance ao companheiro. Muitas vezes por medo de

enfrentar o resto da vida sozinha com seus filhos e a falta da presença masculina na

criação dos filhos, são um dos motivos que fazem com que ela retorne ao

casamento, sempre na busca de paz.

Nos primeiros dias no campo, durante a minha pesquisa, me deparei com

muitas mulheres que iam ao juizado na expectativa de desistir do processo, muitas

delas com a autoestima baixa, a expressão no olhar do sofrimento que elas

passavam, me incentivava a cada dia mais estudar este tema violência contra a

mulher, com o foco nas mulheres que conviviam com seus companheiros, maridos

ou namorados mesmo em situação de violência.

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Logo nos primeiros dias foi bastante complicado, pois lidar com os

sentimentos dos outros é muito difícil e ainda falar com mulheres vítimas de

violência, que estavam magoadas e o medo que elas tinham de falar, me davam

como resposta o silencio.

Naquele espaço do juizado, na sala de espera, eu como pesquisadora

estava ali em instantes criando coragem para iniciar minhas entrevistas, mulheres

essas que chegavam, sentavam e começavam a dialogar umas com as outras, na

maioria das vezes desabafando suas angustias e todo o sofrimento que elas

estavam passando umas dizendo para outras e com a presença de dois policiais.

Era momento muito constrangedor para elas, porem ter que relatar novamente todo

o sofrimento não era para qualquer uma não.

O meu pensamento em relação a essa pesquisa, é por que embora a

mulher esteja em situação de violência, ela ainda não conseguiu vencer o amor, tem

sempre em mente a esperança de viverem em paz e com o desejo de ter sua família

de volta. Minha postura enquanto profissional é voltar a repensar na violência contra

a mulher e de ter um estudo mais aprofundado da realidade social no qual estamos

inseridos, voltados assim para viabilizar os programas, serviços e políticas que estão

voltadas para o enfrentamento dessa violência.

Esta temática violência contra a mulher e a Lei Maria da Penha veio para

romper com práticas machistas de que muitas pessoas falam que em briga de

marido e mulher não se mete a colher, o meu vê se mete sim, as políticas públicas

hoje não têm alcançado muito êxito nas suas formulações enquanto política que

busca lutar pelo enfrentamento da violência. Muitas mulheres utilizam a Lei Maria da

Penha não apenas para punir seus companheiros pela violência cometida, mas sim

como forma de amedrontá-los e fazê-los mudar.

Pretendo dar continuidade nas leituras recorrentes a violência contra a

mulher, já que é umas das expressões da questão social que necessitam de uma

intervenção do Assistente Social, na luta de discutir criticamente a violência recebida

diariamente por muitas mulheres no mundo inteiro. Através desse trabalho espero

que outras pessoas possam ter como exemplo, para fins de outras pesquisas.

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APÊNDICES

APÊNDICE A - Roteiro de Entrevista

Dados Pessoais

1. Idade: 2. Você se considera de que cor? 3. Naturalidade: 4. Você já estudou? 5. Se sim, qual a sua escolaridade? 6. Bairro: 7. Você tem alguma religião? Se sim, qual? 8. Estado civil: 9. Tem filhos? Se sim, quantos? 10. Trabalha? 11. Qual a sua profissão? 12. Qual a sua renda? 13. Você chefia a sua família? Ou: de quem é a maior renda na sua casa? Conjugalidade e Amor

14. O que você entende por amor? 15. O que você entende por Casamento? 16. Como vocês se conheceram? 17. O que você entende por Família? O processo 18. O que você acha da Lei Maria da Penha? 19. Quem foi a pessoa denunciada? Qual o seu vínculo com a pessoa? 20. Quanto tempo de relacionamento vocês tem? 21. Como é o relacionamento de vocês? 22. O que levou você a denunciar? 23. Quais são os fatores que lhe levam a arquivar o processo? 24. O que achou do grupo no Juizado? Violência 25. O que você entende por violência?

a. Você conhece os Tipos de violência? Física, moral, patrimonial, sexual, psicológica...

26. Você lembra quando ocorreu o primeiro episódio de violência? 27. Se sim, como foi? 28. Atualmente você convive com o homem que foi denunciado? 29. Se sim? Quais são os fatores que levam você permanecer com seu companheiro? 30. O que você espera do seu relacionamento daqui pra frente?

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APÊNDICE B - Termo de Consentimento

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

O Sr. está sendo convidado a participar da pesquisa Violência

Doméstica e familiar contra a Mulher: Os fatores que levam a mulher a permanecer em uma relação violenta, que tem o objetivo de compreender os fatores que levam as mulheres atendidas pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher da Comarca de Fortaleza, que sofrem violência, a permanecer com seus companheiros, namorados ou maridos.

Dessa forma, pedimos a sua colaboração nesta pesquisa, respondendo a uma entrevista semiestruturada sobre o tema acima proposto que poderá ser gravado se o Sr. concordar. Garantimos que a pesquisa não trará nenhuma forma de prejuízo, dano ou transtorno no processo que tramita no Juizado da Mulher de Fortaleza, para aqueles que participarem. Todas as informações obtidas neste estudo serão mantidas em sigilo e sua identidade não será revelada. Vale ressaltar, que sua participação é voluntária e o Sr. poderá a qualquer momento deixar de participar desta, sem qualquer prejuízo ou dano. Comprometemo-nos a utilizar os dados coletados somente para pesquisa e os resultados poderão ser veiculados através de artigos científicos, revistas especializadas ou encontros científicos e congressos, sempre resguardando sua identificação.

Todos os participantes poderão receber quaisquer esclarecimentos acerca da pesquisa e, ressaltando novamente, terão liberdade para não participarem quando assim não acharem mais conveniente. Contatos com a graduanda Luana de Castro Silva e com a orientadora Francis Emmanuelle Alves Vasconcelos.

A Faculdade Cearense encontra se disponível para os esclarecimentos pelo fone: 32017011. Endereço: Avenida João Pessoa, 3834, bairro Damas, Fortaleza-ce.

Este termo está elaborado em duas vias sendo uma para o sujeito participante da pesquisa e outro para o arquivo do pesquisador.

Eu, _________________________________________________________ tendo sido esclarecido a respeito da pesquisa, aceito participar da mesma.

Fortaleza, ______ de _____________ de ________.

______________________________ _____________________________

Assinatura do participante Assinatura do pesquisador