caso itaquitinga. veja sentença arbitral de mérito

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

I.A. IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES

REQUERENTES:

ADVANCE CONSTRUÇÕES E PARTICIPAÇÕES LTDA., inscrita no CNPJ sob o nº

02.041.703/0001-93, com endereço na Avenida Professor Magalhães Neto, nº 1.450,

sala 1.005, Pituba, CEP: 41.820-011 – Salvador – BA, doravante denominada

“Advance”.

SOCIALIZA EMPREENDIMENTOS E SERVIÇOS DE MANUTENÇÃO LTDA.,

inscrita no CNPJ sob o nº 40.614.547/0001-00, com endereço na Avenida Estados

Unidos, nº 528, sala 719, Comércio, CEP: 40.010-020 – Salvador – BA, doravante

denominada “Socializa”.

Advogados: Caio Druso de Castro Penalva Vita, OAB/BA 14.133, e-mail:

[email protected]; e Raquel Carneiro S. Pedreira Franco, OAB/BA 17.480, e-

mail: [email protected]., com escritório na Avenida Tancredo Neves, nº 620,

conjunto 2.305, Caminho das Árvores, CEP: 40.820-020 – Salvador – BA.

REQUERIDO:

ESTADO DE PERNAMBUCO, inscrito no CNPJ sob o nº 10.571.982/0001-25, com

endereço no Palácio do Campo das Princesas, Praça da República, S/Nº, Santo

Antônio, CEP: 50.010-040 – Recife – PE, doravante denominado “Requerido”.

Representantes: Antônio César Caúla Reis, OAB/PE 14.709, e-mail:

[email protected]; e Ernani Varjal Medicis Pinto, OAB/PE 22.648, e-mail:

[email protected], com endereço na Rua do Sol, nº 143, 1º andar,

Gabinete do Procurador Geral. Santo Antônio, CEP: 50.010-470 – Recife – PE.

I.B TRIBUNAL ARBITRAL

[1] Rafael Peteffi da Silva, brasileiro, advogado, inscrito na OAB/SC sob o nº

16.170, com escritório na Rua Pastor William Richard Schisler Filho, nº 900, apto.

813 – CEP 88034-140 – Florianópolis – Santa Catarina, e-mail: [email protected],

que substituiu o coárbitro Otavio Luiz Rodrigues Junior, indicado pelas

Requerentes, que apresentou renúncia em 18 de janeiro de 2016;

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[2] Marco Tulio Caraciolo Albuquerque, brasileiro, advogado, inscrito na OAB/PE

sob o nº 8.372, com escritório na Avenida Abdias de Carvalho, nº 1.111, sala

205/207, Bairro do Prado, CEP 50.830-000 – Recife – PE, e-mail:

[email protected], indicado pela Requerido;

[3] Selma Maria Ferreira Lemes, brasileira, advogada, inscrita na OAB/SP sob o

nº 53.524, com escritório na Avenida Brigadeiro Faria Lima, nº 1768, 6º andar,

conjunto 6D, CEP: 01451-001 – São Paulo – SP, e-mail: [email protected],

indicada pela Diretoria da CAMARB.

I.C SÍNTESE DO LITÍGIO

1. Constituem objeto da arbitragem as controvérsias abaixo relacionadas,

surgidas no “Contrato de Concessão Administrativa” e no “Contrato de Compra e

Venda de Ações e outros Pactos”. As controvérsias foram submetidas à solução

arbitral, de conformidade com o Regulamento de Arbitragem da CAMARB - Câmara

de Arbitragem Empresarial –Brasil.

2. Em 20 de fevereiro de 2014, as Requerentes requereram a instituição da

presente arbitragem e, em 09 de março de 2015, as Partes firmaram o Termo de

Arbitragem.

I.C.1 As Pretensões Deduzidas pelas Partes nesta Arbitragem

3. Conforme consta do item III do Termo de Arbitragem, as pretensões das

Partes foram assim formuladas:

III – MATÉRIA OBJETO DA ARBITRAGEM

3.1 – As Requerentes entendem que constituem objetos da arbitragem as

controvérsias abaixo relacionadas, surgidas na relação contratual firmada

entre as Partes por meio do “Contrato de Concessão Administrativa”

(“Concessão”), do “Contrato de Compra e Venda de Ações e outros Pactos”

(“Compra e Venda”), e dos documentos conexos a tais instrumentos, todos

relativos à construção e à exploração do Centro Integrado de Ressocialização

de Itaquitinga (“CIR”), e à transferência à DAG Construções Ltda. (“DAG”) da

posição e das atribuições das Requerentes na SPE Reintegra Brasil S/A

(“SPE”), no CIR e em suas obras.

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3.2 – A Requerida entende que constituem objetos da arbitragem as

divergências surgidas com referência ao “Contrato de Concessão

Administrativa” com as ressalvas feitas nas petições apresentadas em 20 de

março de 2014 e 9 de março de 2015.

3.3 – Nenhuma das Partes ao firmar este Termo de Arbitragem está

subscrevendo ou aceitando o sumário de pleitos apresentado pela parte

contrária.

3.4 – Pleitos das Requerentes:

i) Reconhecimento da ineficácia e da invalidade da notificação n. Of.

165/2013-CGPE (Anexo 13), em que o Requerido se manifestou pela

desconstituição da anuência antes dada à cessão da posição e das obrigações

das Requerentes, no CIR, à DAG, em cumprimento às próprias orientações

do Requerido, observando o item 8.3 do Regulamento.

ii) A condenação da Requerida no pagamento das custas e despesas da

arbitragem, e de honorários de sucumbência arbitrados pelo Tribunal

Arbitral, nos termos do artigo 22 do Estatuto da Advocacia e da OAB. Não

haverá ressarcimento de honorários advocatícios contratados.

3.5– Pleitos do Requerido:

Observada a ressalva do item 3.2 retro, seja declarada eficaz a notificação n.

Of. 165/2013-CGPE, julgando-se improcedentes os pleitos formulados pelas

Requerentes.

ii) A condenação das Requerentes no pagamento das custas e despesas da

arbitragem, e de honorários de sucumbência arbitrados pelo Tribunal

Arbitral, nos termos do artigo 22 do Estatuto da Advocacia e da OAB. Não

haverá ressarcimento de honorários advocatícios contratados.

I.C.2 O Desenvolvimento do Procedimento Arbitral

4. No Termo de Arbitragem firmado entre as Partes em 09 de março de 2015,

restou estabelecido o cronograma provisório das manifestações das Partes.

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5. Em atendimento ao referido cronograma, em 24 de março de 2015, as

Requerentes apresentaram suas Alegações Iniciais e, em 29 de abril de 2015, o

Requerido apresentou sua Resposta. Em 20 de maio de 2015 as Requerentes

apresentaram sua Réplica e, em 11 de junho de 2015, o Requerido apresentou sua

Tréplica. Em 29 de junho de 2015 as Partes especificaram provas.

6. Em 04 de agosto de 2015, o Tribunal Arbitral emitiu a Ordem processual nº

01, por meio da qual decidiu questões preliminares pendentes de avaliação. Com

relação à arbitrabilidade subjetiva, este Tribunal Arbitral entendeu que as

Requerentes são Partes legítimas nesta arbitragem, pois a SPE foi constituída por

elas. As licitantes foram vencedoras no certame e a elas, Requerentes, foi

adjudicado o objeto da licitação, não havendo que se falar em inarbitrabilidade

subjetiva.

7. No que diz respeito à arbitrabilidade objetiva, o Tribunal Arbitral entendeu que

a matéria objeto da presente arbitragem é arbitrável. Restou consignado na referida

Ordem Processual que em que pese as Requerentes concentrarem seu pleito na

validade ou não da revogação da autorização para transferência do controle acionário

da SPE para a DAG, não se discute na arbitragem a legalidade do ato administrativo,

mas sim suas consequências patrimoniais, não havendo que se falar, pois, em

inarbitrabilidade objetiva. Como se destacou, a matéria abordada está delimitada e

vinculada à seara contratual (Contrato de Concessão Administrativa).

8. Com relação às demais preliminares levantadas pelo Requerido em sua

Resposta, quais sejam: (i) que os limites objetivos da convenção de arbitragem não

foram respeitados pelas Requerentes, por entender que as controvérsias

submetidas aos árbitros não seriam decorrentes, não estariam diretamente

relacionadas e não se resolveriam pelas disposições do contrato em que consta a

cláusula compromissória; (ii) ausência de condição da ação em razão da inadequação

e inutilidade da via arbitral; e (iii) ausência de interesse de agir por falta de utilidade

do provimento reclamado, o Tribunal Arbitral entendeu que elas se confundiam com

o mérito e com ele seriam analisadas.

9. O Tribunal Arbitral também analisou o valor envolvido na controvérsia, fixando

o valor do litígio em R$ 72.109.685,00, montante este que representa a quantia

envolvida na transferência das ações da SPE Reintegra Brasil S.A., quantificando e

valorando a cessão dos direitos à concessão administrativa para construção e

exploração do Centro Integrado de Ressocialização de Itaquitinga (Contrato de

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Compra e Venda de Ações e Outros Pactos firmado entre as Requeridas e DAG

Construtora Ltda em 29 de abril de 2013).

10. Na mesma Ordem Processual nº 01 este Tribunal Arbitral analisou as provas

requeridas pelas Partes, indeferindo o pedido de exibição de documentos formulado

pelas Requerentes e deferindo o pedido de expedição de ofícios para obtenção de

informações de terceiros. O Tribunal determinou a produção da prova oral,

concedendo prazo para as Partes arrolarem suas testemunhas e informou que

apreciaria o pedido de produção de outras provas após a realização da audiência.

11. Em que pese o Tribunal Arbitral ter determinado a produção da prova oral e

concedido prazo para que as Partes arrolassem suas testemunhas, as Requerentes

informaram não ter prova testemunhal a produzir e o Requerido não se manifestou

a respeito. Diante de tal fato e tendo em vista a resposta ao ofício enviada pelo

Banco do Nordeste, o Tribunal Arbitral emitiu a Ordem Processual nº 02, em 21 de

outubro de 2015, concedendo prazo para que as Partes apresentassem seus róis de

testemunhas e para que se manifestassem sobre a resposta ao ofício apresentada

pelo Banco do Nordeste.

12. Considerando as manifestações apresentadas pelas Partes em 05 de

novembro de 2015 e diante do entendimento deste Tribunal quanto à

indispensabilidade da oitiva dos Representantes Legais que efetivamente

participaram das negociações para formação de seu convencimento, foi emitida a

Ordem processual nº 03, em 13 de novembro de 2015, por meio da qual se

concedeu prazo para que as Partes indicassem seus Representantes Legais.

13. Tendo em vista a manifestação apresentada pelo Requerido em 03 de

dezembro de 2015, informando a propositura de Ação Declaratória de Nulidade de

Sentença Arbitral perante a 6ª Vara da Fazendo Pública do Estado de Pernambuco

(processo nº 0058732-98.2015.8.17.0001), na qual foi concedida liminar

determinando a suspensão do procedimento arbitral “até decisão antecipatória

quando então será ou não confirmada a suspensão”, o Tribunal Arbitral emitiu a

Ordem Processual nº 04, em 09 de dezembro de 2015, determinando a suspensão

do procedimento arbitral, até decisão ulterior do juízo competente.

14. Diante do ofício expedido pelo Juízo da 6ª Vara da Fazenda Pública da

Comarca de Recife, recebido pela Câmara de Arbitragem em 04 de janeiro de 2016,

comunicando decisão que tornou sem efeito a suspensão do procedimento arbitral, e

tendo em vista a manifestação apresentada pelo Requerido em 30 de maio de

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2016, por meio da qual levantou questão prejudicial (perda do objeto da

arbitragem), este Tribunal Arbitral emitiu a Ordem Processual nº 05, em 01 de junho

de 2016, determinando a retomada do procedimento arbitral, concedendo prazo para

que as Requerentes se manifestassem sobre tal petição e informando que após

deliberaria a respeito da questão prejudicial levantada.

15. Considerando o Aditamento ao Termo de Arbitragem, datado de 29 de março

de 2016, firmado diante da renúncia apresentada pelo árbitro inicialmente nomeado,

Dr. Otavio Luiz Rodrigues Junior, que foi substituído pelo Dr. Rafael Peteffi da Silva, e

considerando as manifestações apresentadas pelas Partes, o Tribunal Arbitral emitiu

a Ordem Processual nº 06, em 02 de agosto de 2016, afastando primeiramente a

questão prejudicial levantada pelo Requerido. Para tanto, este Tribunal ponderou

que a caducidade da Concessão Administrativa contratada com a SPE Reintegra

Brasil S/A, decretada pelo Requerido, não implica na perda de objeto do presente

procedimento arbitral, uma vez que o rompimento do Contrato não afeta o direito

das Requerentes de ver examinadas as questões submetidas a este Tribunal

Arbitral em torno do ato de orientação e anuência à transferência da sociedade a um

terceiro e os efeitos dessa conduta. Este Tribunal também apontou que os contornos

da lide não se cingem apenas ao literalmente exposto no Termo de Arbitragem, mas

também aos pedidos descritos e delimitados nas Alegações Iniciais que com ele

guardem relação lógica, em linha com o disposto no item 8.3 do Regulamento, e que

o encerramento da Concessão Administrativa pelo Poder Público (caducidade) não

acarreta a perda do objeto de demanda proposta em virtude de ato precedente.

16. Na mesma Ordem Processual o Tribunal Arbitral designou audiência para a

oitiva dos representantes legais das Partes e informou que ao final da audiência

discutiria com as Partes sobre eventuais questões pendentes, inclusive com relação à

necessidade de se produzir outras provas e a forma de sua produção. O Tribunal

ainda informou que analisaria oportunamente as demais questões levantadas pelo

Requerido, quando da análise do mérito do presente procedimento.

17. No dia 28 de outubro de 2016 realizou-se a audiência, na qual foram colhidos

os depoimentos dos Representantes Legais das Partes. Ao final da audiência foi

fixado prazo para que as Partes comentassem as notas taquigráficas e para que

apresentassem suas Alegações Finais.

18. Em 13 de janeiro de 2017 as Partes apresentaram suas Alegações Finais.

19. É o Relatório.

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II. MOTIVAÇÃO

Síntese das Alegações das Requerentes

20. As Requerentes pretendem nesta arbitragem (i) a declaração de nulidade e

ineficácia da reversão manifestada pelo Requerido à anuência que havia dado para

a transferência a uma terceira empresa das suas participações na SPE Reintegra

Brasil S/A; (ii) a declaração de que é vedado ao Requerido proceder à reversão

noticiada; e (iii) a restituição da anuência manifestada pelo Requerido ao estado

anterior ou, na impossibilidade de se restaurar tal anuência, a condenação do

Requerido ao pagamento de indenização, devendo ser fixado o quantum debeatur

em fase de liquidação de sentença.

21. Em breve síntese, as Requerentes fundamentam seus pedidos (i) na

presença de cláusula compromissória constante do Contrato de Concessão em que

foi prevista a anuência; (ii) na arbitrabilidade objetiva do conflito, por serem

disponíveis a matéria contratual e seus efeitos econômicos; (iii) na alegada

inexistência de procedimento regular na reversão à anuência; (iv) na alegada

inexistência de qualquer condicionante estabelecido pelo Requerido quando

formalizou a anuência; (v) na qualificação da anuência, com o aval do Requerido,

para a transferência das participações das Requerentes à terceira empresa; e (vi) e

no suposto abuso de direito intentado por um ato de reversão que, em alegado

desvio de finalidade, teria se destinado a frustrar seus direitos.

22. Os contornos dos pedidos das Requerentes e de seus fundamentos constam

detalhadamente de suas Alegações Iniciais, apresentadas em 24 de março de 2015.

Da alegada insubsistência do ato de reversão da anuência à transferência das

participações das Requerentes na SPE

23. As Requerentes defendem que o Requerido não observou o devido processo

legal necessário à reversão do ato jurídico perfeito e acabado de anuência para a

alienação das suas participações na SPE a um terceiro. Esta causa de pedir está

delineada nas Alegações Iniciais das Requerentes, que apontam que a única defesa

oposta pelo Requerido contra ela é a descabida tese de que o ato de anuência não

confere qualquer direito às Requerentes, por ser prerrogativa do Poder

Concedente.

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24. De acordo com as Requerentes, a possibilidade de contraponto à reversão do

ato de anuência, que não lhes foi assegurada, é requisito essencial de validade do

ato da administração, mormente quando, após conferir a alguém o direito de

transferir a outrem suas participações em concessionária de serviço público, subtrai

do parceiro este direito. Segundo elas, por ser inválido e inexistente, o procedimento

de reversão é insubsistente, assim como a própria reversão da anuência, pelo que se

justifica o acolhimento dos seus pedidos.

Da alegada violação dos direitos das Requerentes sob o ângulo substancial

25. As Requerentes defendem que o Requerido violou as cláusulas 10.5 e

11.2.3 do Contrato de Concessão e direitos ali emergentes quando reverteu e

desconstituiu o ato jurídico perfeito da anuência à transferência das suas

participações na SPE Reintegra Brasil S/A. Destacam que a cláusula 10.5 do Contrato

de Concessão estabelece que “durante o prazo de vigência deste Contrato, o controle

societário da concessionária só poderá ser modificado com prévia autorização da

concedente” e que a cláusula 11.2.3 especifica que “a autorização do controle da

concessionária, caso seja concedida pelo concedente, será formalizada, por escrito,

indicando as condições e requisitos para sua realização”.

26. As Requerentes asseveram que a anuência foi dada pelo Requerido sem

condicionantes ou qualquer requisito, respondendo o pedido de “autorização prévia

do Concedente para proceder com a transferência das ações e, por consequencia, do

controle acionário desta Sociedade de Propósito Específico” (doc. R-2), manifestando

sua “concordância com o pleito formulado” (doc. R-1). Elas manifestam que ao

reverter a anuência o Requerido violou seus direitos, razão pela qual devem ser

acolhidos os pedidos formulados nesta arbitragem.

Do alegado venire contra factum proprium e violação da boa-fé

27. As Requerentes defendem que mais do que simples anuência, o ato objeto

da reversão debatida nesta arbitragem foi autêntica indução ou orientação de

conduta, que o Requerido não poderia contrariar sem que, com isso, não infringisse

os direitos e as legítimas expectativas que elas tinham quanto ao tema.

28. As Requerentes afirmam estar comprovado neste procedimento que antes do

negócio jurídico objeto da anuência cuja reversão se discute, elas encontraram em

mercado uma solução para suprir a necessidade de recurso adicional gerada pelo

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inadimplemento do Requerido, de modo a dar seqüência ao projeto, que teve

avaliação de risco A-(bra) pela FitchRatinGs (doc. A-7). Manifestam que conseguiram

da Vinci Partners a aprovação para subscrição de debêntures a serem emitidas pela

SPE Reintegra Brasil S/A, no valor de R$ 60.000.000,00 (doc. A-8), e que em 28 de

dezembro de 2012 e 09 de janeiro de 2013, a Vinci Partners solicitou ao Requerido

as diligências a seu encargo para tornar possível a operação, sem, contudo, obter

retorno.

29. As Requerentes ressaltam, ainda, que em 24 de janeiro de 2013, a Vinci

Partners recebeu um e-mail do Banco do Nordeste do Brasil (instituição financiadora

das obras da concessão) informando que as empresas Odebrecht e DAG e o próprio

Procurador Geral do Estado Requerido intervinham no assunto (doc. A-9).

Ressaltam, ademais, que em 31 de janeiro de 2013 o Requerido veio a público para

informar que, com o aval do Governo, a empresa DAG iria adquirir 95% do controle

acionário da Advance e do consórcio Reintegra Brasil, e que ao assumir o controle

iria sanear a Advance, quitar as dívidas com fornecedores e assumir os direitos

trabalhistas com os empregados, com a retomada das obras no fim de março e

término em 980 dias. Colocam que na mesma nota oficial a Segov informou que

faltava em torno de 15% para conclusão das obras, que o Contrato tinha um prazo

de 33 anos, e que a CIR de Itaquitinga teria capacidade para 3.126 internos.

30. As Requerentes também defendem que a compra e venda objeto da

anuência cuja reversão é discutida e a empresa adquirente (notoriamente ligada ao

grupo Odebrecht) foram solução estabelecida pelo próprio Requerido e por seus

agentes, conforme consta da ata notarial de 24 de março de 2015, relativa a reunião

de 02 de setembro de 2013 (doc. A-20). E de modo a confirmar a proximidade entre

os agentes do Requerido e a pessoa que entraria para tentar salvar o negócio,

assim como de onde se originou a operação cuja anuência se debate, as

Requerentes destacam que a adquirente das suas participações na SPE era

patrocinada pelo mesmo escritório de advocacia do Procurador Geral do Requerido

à época (doc. A-17).

31. As Requerentes ainda defendem que, à parte quaisquer juízos legais ou

morais sobre a simbiose entre o público e privado, está provado neste procedimento

que ao conceder a autorização para o ingresso da empresa adquirente em sua

substituição (doc. A-12), o Requerido assumiu a obrigação de não reverter tal ato.

Afirmam que mais do que ilícita, a reversão lhes foi danosa, uma vez que ao mesmo

tempo em que procedia dessa forma, o Requerido deixava de mitigar riscos que,

com a reversão, pretendeu fazer retornar a elas. Manifestam que não fosse só pelo

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longo período de tempo que as obras da concessão ficaram paralisadas após a

autorização para a transferência da SPE para a terceira adquirente, o Requerido não

acionou o seguro pertinente, com importância segurada de R$ 35.806.000,53 (doc.

A-35), além de ter permitido que este se extinguisse ao não solicitar a sua renovação

(Cláusula 37.4 do Contrato).

32. As Requerentes afirmam que não houve nenhum ato do Requerido para

conferir efeito prático ao aval que dera para a transferência das suas participações

na SPE ao terceiro adquirente, especialmente após o declarado comprometimento de

seus agentes em buscar a solução. E logo após o Requerido o reverteu, como se

assim estivesse a encontrar uma solução para a questão. Afirmam os Requerentes

que o Requerido violentou o devido procedimento necessário à desconstituição do

direito diante daquele aval, e de infringir as cláusulas 10.5 e 11.2.3 do Contrato de

Concessão. Desta forma o Requerido atentou contra o dever geral de boa-fé na

execução desse Contrato.

33. As Requerentes pedem que se considerem os efeitos danosos (para o direito

em concreto e também para o sistema de concessão em geral) da conduta com que

o Poder Concedente desconstituiu sua anuência, após ter se comprometido como

parceiro privado, autorizando, induzindo e avalizando uma operação de alienação do

controle de uma concessionária, sem base legal ou contratual, sujeitando-as a

experimentar os danos formados entre a anuência e sua reversão e aqueles

consumados após tal reversão.

Síntese das Alegações do Requerido

Questões Preliminares

Da alegada inarbitrabilidade subjetiva do litígio

34. Antes de entrar no mérito da controvérsia, o Requerido levantou diversas

questões preliminares. O Requerido defendeu, primeiramente, a inarbitrabilidade

subjetiva do litígio, sob o argumento de que o Contrato de Concessão, com cláusula

compromissória, não teria sido firmado pelas Requerentes, mas sim pela SPE

Reintegra Brasil S/A, por elas constituída. Coloca que na qualidade de sócias da SPE,

as Requerentes não figuram como parte no contrato de concessão, sendo

irrelevante o fato de elas serem as únicas sócias da concessionária e terem vencido a

licitação.

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35. Diante, pois, da alegada ilegitimidade ativa das Requerentes para postularem

a solução da lide suscitada pela via arbitral, o Requerido pede a extinção do

procedimento, sem resolução de mérito, com esteio nas cláusulas 63 e 64 do

Contrato de Concessão e com fulcro nos arts. 4° e 32, IV, da Lei nº 9.307/1996.

Da alegada inarbitrabilidade objetiva do litígio

36. O Requerido também defendeu a inarbitrabilidade objetiva do litígio, por

entender que a pretensão deduzida pelas Requerentes extrapola os limites da

arbitragem em contratos administrativos, uma vez que pretende submeter à

apreciação dos árbitros questão que estaria fora do âmbito de disponibilidade das

Partes e que não ostenta caráter patrimonial, não sendo arbitrável.

37. O Requerido ressalta que o entendimento do Tribunal Arbitral exarado na

Ordem Processual nº 01, no sentido de que o que se discute são os efeitos do ato e

não o ato administrativo em si, é contrário à expressa pretensão das Requerentes,

que estão postulando efetivamente que se anule o ato do Poder Concedente e que o

vincule em termos definitivos no tocante ao exercício de uma prerrogativa legal que

é exclusivamente sua, qual seja, a de conceder ou deixar de conceder a anuência em

questão. Assevera não haver exercício retórico que possa modificar o fato de que a

pretensão das Requerentes é justamente o reconhecimento da ineficácia e da

invalidade da notificação n. Of. 165/2013-CGPE pelo juízo arbitral, o que implica em

se emitir juízo de valor negativo sobre o ato e apontar-lhe algum vício de validade,

não havendo como tangenciar essa questão.

38. De acordo com o Requerido, a questão é se esse controle de legalidade

proposto está relacionado com direitos patrimoniais disponíveis e, assim, sujeitos à

via arbitral, o que entende não é o caso dos autos, já que o que as Requerentes

pretendem é exercer o controle sobre o exercício de uma prerrogativa afeta ao jus

imperium estatal, com o propósito de obrigar o Poder Público de se abster do

exercício de tal prerrogativa.

39. Quanto às consequências pecuniárias pretensamente decorrentes do ato

impugnado, o Requerido afirma que, mesmo que existisse relação de causalidade,

tais consequências não serviriam para definir o caráter disponível da questão

submetida à arbitragem, ressaltando que a questão relacionada à transferência do

controle acionário da SPE não é questão contratual envolvendo as Partes, mas sim

uma questão superveniente que tem por pressuposto o inadimplemento contratual

por parte da SPE que, para evitar a deterioração do objeto, inclui terceiro estranho

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ao processo para preservar o seu objeto, recorrendo ao Poder Concedente apenas

para que este anua e realize o controle de legalidade do processo de substituição do

licitante sem ofensa aos princípios e normas de direito público.

40. Pelo exposto, diante da alegada inarbitrabilidade da questão posta ao crivo

desse juízo arbitral, o Requerido pugna pela extinção do procedimento, sem

resolução de mérito, com esteio nas cláusulas 63 e 64 do Contrato de Concessão e

com fulcro nos arts. 1°,4° e 32, IV, da Lei n° 9.307/1996.

Do alegado desrespeito pelas Requerentes dos limites objetivos da convenção de

arbitragem

41. O Requerido defende que os limites objetivos da convenção de arbitragem

não foram respeitados pelas Requerentes, por entender que as controvérsias

submetidas aos árbitros não seriam decorrentes, não estariam diretamente

relacionadas e não se resolveriam pelas disposições do contrato em que consta a

cláusula compromissória.

Da alegada ausência de condição da ação em razão da inadequação e inutilidade da

via arbitral

42. O Requerido defende a ausência de condição da ação em razão da

inadequação e inutilidade da via arbitral. Ele afirma ter demonstrado que as

Requerentes e a DAG Construtora Ltda. possuem idêntico interesse jurídico no

desate da controvérsia suscitada, na qual se postula a declaração de ineficácia do

Ofício nº 165/2013 - CGPE, já que por intermédio do referido ato o Poder

Concedente reavaliou precisamente a anuência anterior (Ofício CGPE nº 001/20013),

pela qual havia concedido às Requerentes e à DAG autorização para que

procedessem à pretendida transferência de controle acionário, propósito para o qual

viriam a firmar, em 29/04/2013, o correspondente instrumento particular de compra

e venda.

43. O Requerido ressalta que enquanto as Requerentes se insurgem contra a

"retirada" da anuência, seja lançando mão da presente demanda arbitral, seja

acionando a DAG Construtora Ltda. em juízo para cobrar o cumprimento do contrato

de compra e venda de ações que firmaram, essa última tem invocado o mesmo ato

do Estado como um dos fundamentos pelos quais postula a resolução do contrato

que firmou com as Requerentes, sendo precisamente esse o objeto da ação judicial

Page 14: Caso Itaquitinga. Veja sentença arbitral de mérito

14

CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

nº 051768-26.2014.8.17.0001, que tramita perante a 16a Vara Cível da Comarca do

Recife.

44. O Requerido afirma, contudo, que a DAG Construções Ltda. não firmou e não

figura como parte no instrumento que contém a cláusula arbitral e, por essa razão,

não pode ser compelida a litigar nessa via. E pondera que se assim o é, deflui que

eventual sentença arbitral de mérito que decida a lide posta, interferindo

diretamente na esfera da DAG, padecerá de nulidade, porquanto desbordará dos

limites da convenção de arbitragem ao pretender impingir efeitos sobre a esfera

jurídica de quem não era parte no instrumento e tampouco firmou cláusula

compromissória alguma.

45. O Requerido destaca que não há como decidir a lide posta sem interferir na

esfera jurídica de terceiro que, entretanto, não pode ser demandado nessa via

arbitral. E destaca, ainda, que eventual sentença de mérito forçosamente incorrerá

em nulidade, não tendo aptidão para gerar os efeitos preconizados pela Lei

9.307/1996 e solucionar qualquer controvérsia de forma definitiva e eficaz, estando

evidente a falta de interesse de agir ante a inadequação da via eleita.

46. Por exposto, o Requerido pede a extinção do processo arbitral, sem

resolução de mérito, com fulcro no art. 32, IV, da Lei nº 9.307/1996, em face da

inadequação da via eleita e a inutilidade do provimento de mérito reclamado, o que

desvela insofismável ausência de condição da ação.

Da alegada ausência de interesse de agir por falta de utilidade do provimento

reclamado

47. O Requerido também suscitou a ausência de interesse de agir das

Requerentes por falta de utilidade do provimento reclamado, ante a circunstância

de que a restauração do ato de anuência, desfeita pelo ato impugnado, não teria o

efeito prático de viabilizar o objeto anuído, ou seja, a pretendida transferência do

controle acionário, porque embora seja controversa a existência de uma verdadeira

negativa de anuência por parte do BNB, é incontroverso que essa anuência do BNB à

pretendida transferência não foi jamais concedida. Pondera que esta situação

perdura até o presente momento, inviabilizando a eficácia do Contrato de Compra e

Venda firmado em 29/04/2013 com esse propósito, que sempre esteve subordinado

ao implemento dessa condição suspensiva, nos termos de sua cláusula 20.1.

Page 15: Caso Itaquitinga. Veja sentença arbitral de mérito

15

CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

48. O Requerido ressalta que a segunda razão reside na circunstância de a

referida condição suspensiva (anuência do BNB) não haver se aperfeiçoado dentro do

prazo de 180 (cento e oitenta) dias previsto na cláusula 20.3 da referida avença, o

que teve por efeito conferir às contratantes a faculdade de persistirem na persecução

do objeto inicialmente pactuado, ou convolar em mútuos os pagamentos efetuados

pela promissária compradora. Nesse quadro, coloca que a partir do incontroverso

decurso do prazo em questão, não implementada a condição suspensiva a que

estava condicionada a eficácia do contrato, entende que as partes estavam liberadas

do compromisso de venda, resolvendo-se o contrato, se qualquer uma delas o

desejasse, pela convolação dos pagamentos efetuados pela compradora em mútuo.

49. O Requerido manifesta que a par da ausência da anuência formal e

tempestiva do BNB, a efetivação da transferência acionária em questão encontra-se,

desde o implemento do mencionado prazo, à mercê da vontade da compradora,

aspecto sobre o qual ele não pode interferir, ainda que desejasse reverter a anuência

antes concedida. E ressalta que a DAG já manifestou o seu desinteresse formal na

concretização daquela operação de aquisição do controle acionário da SPE, o que no

seu entender não tem como único fundamento a questão da anuência estatal, pois

com ou sem tal anuência a DAG não mais pretendeu dar seguimento ao negócio,

tanto que busca o seu desfazimento judicial e indenizações correlatas pelos aportes

financeiros que diz ter feito.

50. Tais razões, segundo o Requerido, denotam a absoluta ausência de utilidade

do provimento arbitral postulado, pois a restituição da anuência ao seu estado

anterior, como pretendem as Requerentes, lhes será absolutamente inócua, o que

revela nitidamente faltar-lhes interesse de agir. Ressalta que na eventualidade de se

entender que a retirada da anuência deveria ser invalidada, a consequência não seria

reconhecer qualquer direito em favor das Requerentes, salvo se fosse possível

afirmar que este fora o único motivo da não concretização daquela operação de

transferência do controle acionário da SPE, o que implicaria desconsiderar a vontade

da DAG.

51. O Requerido assevera que eventual invalidação da retirada da sua anuência

em nada alteraria o fato de que as Requerentes fracassaram em todas as

alternativas de viabilizar uma solução financeira que permitisse a conclusão do

Contrato que firmaram, inclusive na derradeira alternativa de transferência do

Controle Acionário da SPE. Requer, diante desses argumentos, a extinção do

processo arbitral por ausência de interesse de agir.

Page 16: Caso Itaquitinga. Veja sentença arbitral de mérito

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

Da alegada desvinculação dos pedidos ao Termo de Arbitragem

52. O Requerido ainda defende preliminarmente que os pedidos formulados pelas

Requerentes desbordariam os limites fixados no Termo de Arbitragem. O

Requerido sustenta que as Requerentes, em suas alegações iniciais, teriam

inovado a sua pretensão ao alterar o objeto arbitral e pretender conferir maior

amplitude dos seus pleitos, para muito além do que estava delineado na solicitação

de arbitragem. Nesse quadro, o Requerido pede que sejam declarados como

estranhos e não comportados pelos limites do compromisso arbitral, os pedidos

contidos nos itens 4.1.3 e 4.1.4 das Alegações Iniciais das Requerentes.

Mérito

Da alegada desestruturação financeira e do Inadimplemento Contratual da SPE

Da ausência de Orientação de Conduta por parte do Requerido quanto às tratativas

para a busca de Alternativas Financeiras para o Empreendimento

53. O Requerido afirma estar evidenciado que tendo firmado o Contrato de

Concessão em 09/10/2009, e devendo a obra de construção do CIR estar pronta e

entregue em 09/10/2012, a SPE Reintegra Brasil se encontrava, pelo menos a partir

do início do ano de 2012, em um quadro de gravíssima desestruturação financeira e

total falta de recursos para concluir a obra, tanto quanto as Requerentes, o que

inclusive ensejou a paralisação das obras já em meados do ano de 2012. Destaca

que ao final do prazo ajustado a obra se encontrava inconclusa, como está até hoje,

dando ensejo à decretação de caducidade do Contrato já no ano de 2016,

impingindo-lhe inúmeros prejuízos e, por conseguinte, à coletividade e ao interesse

público que lhe compete prover, o que decorre substancial e primariamente da

condição de inadimplente da SPE Reintegra Brasil.

54. De acordo com o Requerido, prova desses fatos é a busca, por parte das

Requerentes, já em meados do ano de 2012, de múltiplas alternativas de

alavancagem de recursos para honrar as dívidas da SPE e buscar viabilizar o

saneamento financeiro da empresa. Mas coloca que as Requerentes, sem êxito,

buscaram negar esse fato e, ao mesmo tempo, insinuaram que ele decorreria de sua

culpa, que não teria deferido um pleito de reequilíbrio econômico do contrato,

materializado sob a forma de um pedido de prorrogação do prazo de conclusão da

obra e de ressarcimento de custos que formularam em 09/08/2012, por meio do Of.

SPE 038/2012-CIR (doc. A-33).

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55. De acordo com o Requerido, o aludido pedido de ressarcimento, no valor de

R$ 16.385.229,21, se destinaria a fazer face aos custos em que a SPE teria

supostamente incorrido em decorrência do não cumprimento de obrigações que,

segundo alegam, caberiam a ele. Mas afirma que tal requerimento não serve a elidir

a situação de inadimplente da SPE na data em que anuída a transferência do controle

acionário (11/04/2013), e o quadro de desestruturação financeira da concessionária

que motivou o ato de anuência. Não há, segundo o Requerido, como as

Requerentes eliminarem o fato de que estavam contratualmente obrigadas, por

força das disposições expressas da Cláusula 18 do Contrato de Concessão, em

especial o disposto no item 18.1.

56. O Requerido também defende que as disposições da Cláusula 24 do Contrato

de Concessão deixam claras as obrigações da SPE em se responsabilizar

integralmente pela construção da Obra, suportando todos os eventuais custos. Desse

modo, afirma que quanto ao pedido de prorrogação do prazo de execução da obra, o

que se constata é que o Ofício CGPE N° 094/2012 apenas sinalizou para a

possibilidade de prorrogação até o mês de fevereiro de 2013, nos termos em que

requerido pela SPE no Ofício SPE 038/2012-CIR, mas sem concordar com o pleito

financeiro correlato (o que, segundo ressalta, sequer chegou a ser formalizado). O

Requerido pondera que mesmo que o pedido de prorrogação tivesse sido deferido,

a obra não está concluída até hoje, culminando na decretação da caducidade do

Contrato de Concessão, por intermédio de Decreto do Chefe do Poder Executivo

estadual (Decreto nº 42.770 de 15 de março de 2016).

57. O Requerido sustenta que a tese de que não havia um quadro de

desequilíbrio financeiro da SPE não resiste à cronologia dos fatos, uma vez que a

concessão da anuência para a troca do controle da SPE se deu em 11/04/2013,

sendo que desde o segundo semestre do ano de 2012 as Requerentes já buscavam

alternativas para solucionar a situação de inadimplência por que passava o projeto,

mantendo intensa negociação com o mercado (doc. A-6). Assevera que embora o

negócio tentado com a Odebrecht não tenha prosperado, há provas nos autos que a

SPE continuou buscando alternativas para alavancar recursos e dar seguimento ao

projeto, sem o seu envolvimento, seja por meio da emissão de debêntures, seja pela

alienação do controle acionário da SPE, que terminou sendo a solução última

buscada pelas Requerentes, igualmente sem sucesso, mas já com uma terceira

empresa (a DAG).

58. O Requerido manifesta não haver qualquer indício de prova de que tenha

determinado a alienação do controle acionário ou dado qualquer orientação de

Page 18: Caso Itaquitinga. Veja sentença arbitral de mérito

18

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conduta nesses caminhos buscados pela SPE. Afirma que a tese de que teria

orientado a conduta das Requerentes quanto à alienação do controle acionário não

passa de ficção, inexistindo indícios de que estaria envolvido em discussões com a

Odebrecht, KPMG, Banco Gerador ou Vinci. O Requerido ressalta que a tese das

Requerentes está amparada nas suas próprias afirmações, unilateralmente feitas e

sem qualquer respaldo documental, ao passo que a sua defesa está fundada em

provas do estado de insolvência porque elas passavam ao longo do ano de 2012 e

início de 2013, o que justificaria, aos seus olhos, a busca por uma alternativa de

viabilização do projeto, ainda que mediante a alienação do controle acionário da SPE,

que é uma alternativa expressamente prevista em lei.

59. O Requerido assevera que as questões tangenciais suscitadas pelas

Requerentes ao longo da lide em nada socorrem as suas pretensões, não servindo

a rechaçar as graves e sérias objeções suscitadas nas razões de defesa, que

convergem para a total improcedência do pedido, ante a plena legalidade e eficácia

do ato impugnado (de reavaliação e negativa expressa da anuência) e a total

ausência de nexo de causalidade entre qualquer conduta sua e os pretensos danos

alegados e que são invocados como fundamento para o pedido de perdas e danos.

60. O Requerido manifesta estarem evidenciadas a existência e a legitimidade

dos motivos determinantes, todos de interesse público, tanto do ato anterior de

concessão da anuência para a transferência do controle acionário, tanto do posterior

ato de reavaliação que, segundo ele, em nada contrariou a lei, o contrato ou

quaisquer princípios regentes da atuação da Administração Pública. Destaca que o

inadimplemento contratual que supostamente ensejaria a invocação da cláusula

arbitral (a retirada da anuência para a transferência do controle da SPE) decorreria

de ato pretérito das próprias Requerentes, que vinham buscando alternativas para

solucionar um problema financeiro de sua inteira responsabilidade, vez que

contratualmente toda a responsabilidade pelo financiamento da obra até sua entrega

era da SPE.

61. O Requerido ressalta que não teve qualquer envolvimento ou participação

(quando muito teve ciência por provocação da SPE) nessas questões financeiras de

total responsabilidade e interesse da SPE, porque não lhe competia tal obrigação,

sendo procurado apenas quando da solicitação para que anuísse com a transação

envolvendo as Requerentes e a empresa DAG, o fazendo nos limites da expressa

previsão legal contida no art. 27 da Lei Federal nº 8.987/95, bem assim no art. 12, §

1° da Lei Estadual n° 12.765/2005 e na Cláusula 11ª do Contrato de Concessão,

atendendo a requerimento formulado pelas ditas empresas, com a finalidade de

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viabilizar a "(...) implementação de operações societárias e financeiras na SPE

objetivando promover a sua reestruturação financeira, com vistas a assegurar o fiel

cumprimento das obrigações assumidas no Contrato de Concessão". (doc. A-22).

62. O Requerido conclui não haver dúvidas do inadimplemento contratual da SPE,

sobretudo o atraso no cronograma das obras e paralisação das atividades, suspensão

do pagamento de empregados e fornecedores (que até hoje cobram na justiça esses

valores), o que foi a razão que levou a SPE a ir ao mercado, por meio das

Requerentes, buscar alternativas de alavancagem de recursos, sem qualquer

indução ou intervenção sua.

Do real estágio das obras e do inadimplemento que deu causa à caducidade do

Contrato

63. O Requerido defende que carece de veracidade a alegação das Requerentes

que a obra estaria 95% pronta. Aponta que como esclareceu o seu representante

legal, esse estágio físico das obras representava algo em torno de 65%, e com a

presença de erros de projeto, o que no seu entendimento foi a provável causa da

negativa de aporte de recursos pela DAG e desistência do negócio. O Requerido

afirma que tais fatos foram posteriormente comprovados por ocasião do processo de

intervenção e posterior processo administrativo de caducidade do Contrato de

Concessão do CIR de Itaquitinga, conforme restou apurado no Relatório Final da

Comissão de Processo Administrativo do Governo do Estado, nos autos do Processo

Administrativo de Caducidade da Concessão (doc. A-38), onde consta que se

detectaram importantes vícios de construção na obra.

64. O Requerido destaca que dentre outros aspectos, ali restou comprovado que

ocorreu o termo final do contrato em 09/10/2012 sem que a obra tenha sido

concluída, sendo o último diário de obras de 31/05/2012. Indica como provas o

Relatório de Visita Técnica elaborado pela então Secretaria de Governo dando conta

da paralisação das obras desde o início do mês de julho de 2012, bem assim relatório

do BNB atestando que a obra fora paralisada logo após a liberação da última parcela

de financiamento, em 31/05/2012, tendo a SPE requerido a prorrogação do prazo,

sem resposta, para fevereiro de 2013.

65. Destaca, ainda, que foram constatadas diversas desconformidades técnicas na

execução das obras do CIR de Itaquitinga e que diversos outros aspectos do projeto

não foram executados ou foram executados com defeito. Também destaca as

inconsistências do projeto frente às determinações e especificações das normas do

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20

CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, bem como às normas da

ABNT, e que outros documentos coligidos a tal relatório comprovam a evidência de

impropriedade técnica das obras, inclusive infrações de natureza ambiental.

66. O Requerido afirma, ademais, que se detectou e comprovou a perda das

condições financeiras do parceiro privado o que, no seu entendimento, também foi

um dos motivos que fundamentou a decretação da caducidade, com base em vários

documentos que evidenciavam a total desestruturação financeira da SPE (inclusive

ordens judiciais de bloqueio de valores) e ofício do BNB indicando a existência de

parcelas vencidas e devidas pelo SPE no valor de cerca de 45,5 milhões de reais, em

27/11/2013 (antes de ele retirar a anuência concedida).

67. O Requerido assevera que foi daí que, passados oito meses da concessão da

anuência e diante do claro cenário de desequilíbrio financeiro da SPE sem que a

solução de alienação do controle fosse implementada, não lhe restou alternativa

senão retirar formalmente a anuência prévia concedida, diante da constatação de

que as Requerentes e a empresa DAG não mais dariam seguimento à pretendida

operação societária, em virtude da ausência de implementação de condição essencial

para o negócio pretendido (anuência do BNB, nunca concedida) e diante do fato de

que passados 180 dias da assinatura do Contrato de Compra e Venda de Ações não

mais havia obrigação firme de prosseguimento do negócio.

68. Não há dúvida, de acordo com o Requerido, de que a retirada da anuência,

tratada como causadora dos supostos prejuízos experimentados pelas

Requerentes, é fato posterior à situação de inadimplemento contratual por parte da

SPE e decorreu da constatação do insucesso na solução de uma prévia situação de

inadimplemento contratual e que diz respeito à notória incapacidade da SPE de

honrar com as suas obrigações financeiras e de dar seguimento adequado aos

termos do Contrato.

Das razões para a retirada da anuência para a transferência do controle

acionário da SPE para a DAG

69. O Requerido afirma que caberia às Requerentes comprovar (i) que ele

havia assumido obrigações contratuais ou extracontratuais exigíveis para com a SPE

e as teria descumprido e que, apenas em decorrência disso, a SPE teria entrado em

condição de insolvência; (ii) que ele teria imposto à SPE buscar a troca do seu

controle acionário e teria indicado a empresa que deveria assumir tal controle (a

DAG Construtora Ltda.) que, juntamente com as Requerentes, subscreveu o

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respectivo requerimento de autorização, datado de 05/02/2013 e; (iii) que a retirada

da anuência para a transferência do controle acionário da SPE teria sido a causa para

o fracasso do empreendimento.

70. O Requerido defende, contudo, que as Requerentes não se desincumbiram

do ônus de comprovar as suas alegações e os inúmeros aspectos necessários a

conferir plausibilidade à tese sob a qual repousam as suas pretensões. Aponta que os

únicos elementos de prova que supostamente dariam suporte às alegações das

Requerentes, como emails e gravações de áudio, são imprestáveis a tal finalidade.

E que as Requerentes não apresentaram qualquer elemento que confirmasse os

aspectos de sua tese autoral e que ele teria exercido algum tipo de coação sobre seu

representante legal, e não trouxeram uma única testemunha para atestar a

veracidade das suas alegações.

71. O Requerido coloca que além da confusa prova documental, as Requerentes

se valeram do depoimento do seu representante legal, produzindo provas contra elas

próprias, tendo restado claro que o projeto apresentou sérias dificuldades financeiras

ao longo do ano de 2012, o que as levou a procurar alternativas de alavancagem de

recursos para honrar suas obrigações financeiras, ao menos em duas frentes

distintas e paralelas, a Vinci Partners (emissão de debêntures) e a Odebrecht

(alienação de participação acionária).

72. O Requerido destaca ter restado confirmado ao final da instrução processual

o que sempre foi dito por ele neste procedimento, de que a SPE Reintegra Brasil S/A,

no curso da execução do Contrato de Construção do CIR Itaquitinga, perdeu as

condições de dar continuidade ao negócio e, portanto, entrou em estado de

inadimplemento contratual, com clara possibilidade de extinção do contrato, o que

ensejou a busca de soluções para a sua retomada, o que partiu primeiro da própria

SPE, ainda sob o comando das Requerentes (por meio da Odebrecht e da KPMG) e

depois com a sua ciência por intermédio da DAG, sem que, contudo, tenha havido

qualquer tipo de indução sua para que esse fosse o caminho a ser seguido.

Sobre o Pedido de Indenização formulado pelas Requerentes

73. Quanto ao pedido de perdas e danos, o Requerido alega que a cronologia dos

fatos e a interpretação das cláusulas do instrumento particular firmado entre as

Partes evidenciam que os fatores causais determinantes do não aperfeiçoamento da

transferência acionária (e, assim, dos danos cogitados) seriam: (i) a não obtenção

da anuência junto BNB, dentro do prazo previsto na avença, motivo primeiro e

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determinante invocado pela DAG e que, a rigor, permitiria que as partes optassem

por não prosseguir no contrato e, assim sendo, imporia às Requerentes que

retornarem à administração da SPE; (ii) a conduta da DAG e das próprias

Requerentes na execução, interpretação e cumprimento das obrigações

decorrentes do contrato que firmaram, tendo em vista as acusações de parte a parte

suscitadas nas ações judiciais que propõem uns contra os outros; (iii) as

divergências de entendimento a respeito das obrigações contratuais que lhe

caberiam na hipótese de não obtenção das anuências necessárias à operação, dentre

outros aspectos que escapam ao conhecimento do Estado por não ter sido parte

naquelas negociações de cunho privado.

74. O Requerido assevera, ainda, que o seu ato editado em 24/12/2013 nunca

seria por si só capaz de impingir quaisquer danos às Requerentes, seja porque a

sua anuência, ainda que restaurada, não seria suficiente para viabilizar a operação,

seja porque àquela altura o imbróglio já estava instaurado e os eventos danosos já

vinham ocorrendo, seja ainda porque o próprio ato ressalvou a possibilidade de

reavaliação da autorização se as Partes solucionassem as pendências obstativas do

negócio, o que, entretanto, nunca chegou a ocorrer.

75. Por outro lado, o Requerido afirma que a anuência que se pretende restaurar

não teria o condão de viabilizar a transferência de controle acionário, o que sempre

esteve à mercê de outra condição que jamais se aperfeiçoou. E pondera que hoje, e

já a partir do momento em que fluiu o prazo previsto na cláusula 20.3 do contrato

firmado entre as Partes, estaria também a mercê da vontade das Partes, sendo

evidente que uma delas não mais deseja prosseguir na avença. O Requerido coloca,

ainda, que a partir da resposta expedida pelo BNB à DAG, passou também a

depender do implemento de condições que uma das Partes admite não ostentar e

que seriam impossíveis de se cumprir. Nesse cenário, assevera ter-se evidente que a

cogitada "eventual impossibilidade de execução do contrato de compra e venda", a

que se condiciona o pedido de perdas e danos, não pode e jamais poderá ser a ele

imputada, o que evidencia a total improcedência também do pedido indenizatório.

76. Diante dos argumentos acima, o Requerido pede: a) em acolhimento às

preliminares suscitadas, a extinção do presente procedimento arbitral sem resolução

de mérito; em pleito sucessivo, admitindo-se como certo que as controvérsias

relacionadas ou surgidas do Contrato de Compra e Venda de Ações e Outros Pactos

não são objeto da arbitragem, que sejam declarados como estranhos e não

comportados pelos limites do compromisso arbitral os pedidos contidos nos itens

4.1.3 e 4.1.4 das Alegações Iniciais, indeferindo-se, em conseqüência disso, o pleito

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de ampliação do objeto da arbitragem, restando adstrito ao contido no Termo de

Arbitragem; e b) no mérito, apenas em atenção ao princípio da eventualidade, que

sejam julgados totalmente improcedentes os pedidos contidas nas Alegações Iniciais,

condenando-se as Requerentes nos ônus de sucumbência.

Decisão do Tribunal Arbitral sobre as Questões Preliminares

Da alegada inarbitrabilidade subjetiva do litígio

77. O Requerido defendeu, preliminarmente, a inarbitrabilidade subjetiva do

litígio, sob o argumento de que o Contrato de Concessão, com cláusula

compromissória, não teria sido firmado pelas Requerentes, mas sim pela SPE

Reintegra Brasil S/A, por elas constituída.

78. As Requerentes, por sua vez, defenderam a arbitrabilidade subjetiva do

conflito por entenderem que além de envolver Partes com capacidade plena de agir e

executar suas obrigações contratuais, estas se vincularam à cláusula compromissória

e, especialmente, ao Termo de Arbitragem. Asseveraram, ainda, que o

comportamento das Partes ao pactuar a concessão pública, com instituição da SPE

sob a sua titularidade exclusiva, é indicativo de sua vinculação à cláusula

compromissória e à previsão que submeteu a transferência da SPE à anuência do

Requerido (Cláusula 10.5 do Contrato).

79. Após analisar os argumentos apresentados pelas Partes, o Tribunal Arbitral

entendeu que as Requerentes são sim Partes legítimas nesta arbitragem, pois a

SPE foi constituída por elas. As licitantes foram vencedoras no certame e a elas,

Requerentes, foi adjudicado o objeto da licitação, não havendo que se falar em

inarbitrabilidade subjetiva, ratificando nesta Sentença Arbitral o exarado na Ordem

Processual nº 1.

Da alegada inarbitrabilidade objetiva do litígio

80. O Requerido defendeu a inarbitrabilidade objetiva do litígio, por entender que

a pretensão deduzida pelas Requerentes extrapola os limites da arbitragem em

contratos administrativos, uma vez que pretende submeter à apreciação dos árbitros

questão que estaria fora do âmbito de disponibilidade das Partes e que não ostenta

caráter patrimonial, não sendo arbitrável.

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81. As Requerentes, por sua vez, defenderam ser descabida a oposição do

Requerido à arbitrabilidade do litígio porque, vinculada ao controle de legalidade do

ato de reversão à anuência com que formalizou sua orientação de conduta pela

transferência das suas ações na SPE, e os seus efeitos patrimoniais, a arbitragem

envolve interesses contratuais, disponíveis e patrimoniais.

82. O Tribunal Arbitral entendeu que a matéria objeto da presente arbitragem é

arbitrável e mantém sua decisão consoante esclarecido na Ordem Processual nº 01,

ora ratificada:

“O Tribunal Arbitral entende que a matéria objeto da presente arbitragem é

arbitrável. Em que pese as Requerentes concentrarem seu pleito na validade

ou não da revogação da autorização para transferência do controle acionário

da SPE para a DAG, não se discute na arbitragem a legalidade do ato

administrativo, mas sim suas consequências patrimoniais, não havendo que se

falar, pois, em inarbitrabilidade objetiva. A matéria abordada está delimitada e

vinculada à seara contratual (Contrato de Concessão Administrativa). No que

concerne aos seus efeitos patrimoniais são perfeitamente disponíveis e

arbitráveis, estando na órbita dos interesses secundários ou derivados do

Requerido, na qualidade de agente público.1

O objeto da controvérsia gira em torno do ato de autorização da transferência

da participação societária das Requerentes na SPE, por força da Cláusula 10.5

do Contrato.

Ressalve-se que a decisão arbitral a ser proferida observará estes limites.

Ademais, encontram-se no âmbito da arbitragem as questões decorrentes dos

efeitos patrimoniais, cujos fundamentos remotos vinculam-se a uma esfera

alheia a este procedimento. Impedir o exame da matéria pelo fundamento

deduzido pelo Requerido seria equivalente a restringir a discussão patrimonial

1 “O interesse público secundário ou derivado tem natureza instrumental referindo-se às pessoas jurídicas que os administram e existem para que os interesses primários sejam satisfeitos, resolvendo-se em direitos patrimoniais e, por isso, tornam-se disponíveis.” Assim esclarece que, “..são disponíveis, nesta linha, todos os interesses e os direitos deles derivados que tenham expressão patrimonial, ou seja, que possam ser quantificados monetariamente, e estejam no comércio, e que são, por esse motivo e normalmente, objeto de contratação que vise a dotar a Administração ou os seus delegados, dos meios instrumentais de modo a que estejam em condições de satisfazer os interesses finalísticos que justificam o próprio Estado.” (Diogo de Figueiredo MOREIRA NETO, “Arbitragem nos Contratos Administrativos”, Revista de Direito Administrativo, 218/84, jul./set. 1997). (negrito acrescentado)

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

sobre atos de revogação ou de anulação de procedimentos licitatórios. Mais

ainda, seria inviabilizar por completo a arbitragem envolvendo entes públicos,

na medida em que boa parte dos atos determinantes de litígios são de caráter

administrativo, mas que se desenvolvem, quanto a seus efeitos, na esfera

privada. Violar expectativas legítimas é algo que não se admite no âmbito

público e a incidência do princípio da boa-fé é também possível quando

existem pessoas jurídicas de direito público na relação jurídica.

É de se recordar o célebre caso da instalação da Ford do Brasil no Estado do

Rio Grande do Sul, que foi objeto de tratativas entre os interessados e

resultou na interrupção desse ato por superveniente decisão administrativa.

Na apreciação do litígio, deixou-se evidente que “consolidada a ruptura da

relação negocial quando da retirada da empresa do empreendimento, não faz

sentido análise das alegadas nulidades de que padeceria o contrato, impondo-

se, sim, em um primeiro momento, tal e qual procedido pela sentença, à luz

dos elementos carreados ao processo, e aos efeitos de distribuir

responsabilidades indenizatórias, tão somente definir quem deu causa a esse

rompimento”2

Do alegado desrespeito pelas Requerentes dos limites objetivos da convenção de

arbitragem

83. O Requerido defende que os limites objetivos da convenção de arbitragem

não foram respeitados pelas Requerentes, por entender que as controvérsias

submetidas aos árbitros não seriam decorrentes, não estariam diretamente

relacionadas e não se resolveriam pelas disposições do contrato em que consta a

cláusula compromissória.

84. As Requerentes defendem, contudo, que a preliminar não tem fundamento.

Elas ponderam que o objeto da arbitragem não é o contrato firmado com a terceira

adquirente das suas ações na SPE, mas sim a reversão operada pelo Requerido à

autorização que este tinha dado para a transferência daquelas ações à terceira

adquirente, nos termos de cláusula 10.5 do Contrato de Concessão.

85. As Requerentes destacam que a cláusula 10.5 do Contrato de Concessão

especifica que durante a sua vigência o controle societário da concessionária só

poderá ser modificado com prévia autorização do concedente e que as controvérsias

2 TJRS. AC 70057424830 RS. Relator Marcelo Bandeira Pereira. Julgamento: 25/03/2015. Órgão Julgador: Vigésima Primeira Câmara Cível. DJRS 31/03/2015.

Page 26: Caso Itaquitinga. Veja sentença arbitral de mérito

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

sobre regras como estas serão resolvidas por arbitragem, se não puderem ser

resolvidas amigavelmente.

86. O Tribunal Arbitral decide que não assiste razão aos Requeridos, pois a

arbitrabilidade objetiva, tal como mencionado no item precedente, refere-se à

disposição prevista no Contrato de Concessão (Cláusula 10.5) e não a contrato

firmado com terceiros.

Da alegada ausência de condição da ação em razão da inadequação e inutilidade da

via arbitral

87. O Requerido defende a ausência de condição da ação em razão da

inadequação e inutilidade da via arbitral.

88. As Requerentes defendem, no entanto, que a assertiva não condiz com o

objeto da arbitragem e que a preliminar não subsiste. Elas manifestam que a

anuência cuja reversão se discute foi dada pelo Requerido, tendo a empresa

adquirente figurado como simples interveniente no pedido de autorização. As

Requerentes manifestam, ainda, que a situação jurídica da empresa adquirente é

subordinada à sua situação jurídica, sendo delas a titularidade do direito de fazer

valer a palavra empenhada pelo Requerido quando expressou sua anuência sem

qualquer condição.

89. As Requerentes também asseveram que não há na arbitragem qualquer

pedido de sujeição da terceira adquirente aos efeitos desta Sentença, restringindo-se

seus pleitos à regulação de sua própria relação com o Requerido. Afirmam que, de

resto, os pedidos formulados se direcionam exclusivamente ao Requerido, que

deverá responder pela reversão questionada e seus efeitos patrimoniais.

90. O Tribunal arbitral decide rejeitar esta preliminar, uma vez que nenhum dos

pedidos diz respeito a direito de terceiro, e sim à relação jurídica entre as Partes.

91. Sustenta o Requerido, em preliminar, ausência de condição de ação em razão

da inadequação e inutilidade da via arbitral, sustentando que, o provimento de

mérito não teria condições de “prosperar, porquanto, inexoravelmente, tendo a lide

de ser solucionada de modo uniforme para todas as partes envolvidas na

controvérsia, afetaria interesses jurídicos de terceiro, qual seja, a DAG

CONSTRUTORA LTDA., que, entretanto, não firmou convenção de arbitragem e,

portanto, não pode ser compelida a litigar nessa via.”

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

92. Sem razão o Requerido. O fato da empresa DAG CONSTRUTORA LTDA não

haver firmado a cláusula arbitral e não ser parte na presente arbitragem não a

inviabiliza e não impede que se conheça e decida a lide na forma como posta.

93. O pedido principal das Requerentes consiste no reconhecimento da ineficácia

e invalidade do Ato do Requerido, consubstanciado no Ofício nº 165/2013 – CGPE,

datado de 23 de dezembro de 2013, através do qual o Requerido se manifestou

pela desconstituição da anuência antes dada à cessão da posição e das obrigações

das Requerentes no CIR à DAG através do Ofício nº 046/2013 – CGPE, datado de

11 de abril de 2013, decorrendo daí todos os demais pedidos.

94. O primeiro ato tratou-se de autorização dada pelo Requerido, a pedido das

Requerentes, com base no disposto na Cláusula 11 do Contrato de Concessão, para

transferência de suas participações na SPE Reintegra Brasil S/A, e o segundo ato, o

que tornou sem efeito dita autorização.

95. O ato do Estado em discussão não se dirige à DAG, foi ato praticado pelo

Requerido em relação às Requerentes, autorizando a transferência das

participações das Requerentes na SPE a pedido das mesmas, com base em cláusula

contratual pactuada no Contrato de Concessão, mesmo instrumento onde pactuada a

cláusula arbitral.

96. Portanto, a DAG é que não teria legitimidade para discutir ato praticado pelo

Requerido em relação às Requerentes, em decorrência de cláusula contratual

pactuado em negócio jurídico do qual não foi parte. Repita-se, o ato do Estado não

foi dirigido à DAG.

97. Os negócios jurídicos celebrados na sequência entre as Requerentes e a

DAG, sua validade e execução estes sim é que fogem ao objeto desta arbitragem.

98. O vínculo contratual entre as Requerentes e a DAG CONTRUTORA LTDA e

suas consequências, não estão em discussão nesta arbitragem, que tornasse

obrigatória a participação da DAG CONSTRUTORA LTDA neste procedimento.

99. Consoante esclarecido pelo Tribunal Arbitral na Ordem Processual nº 01, ao

decidir sobre a arbitrabilidade objetiva, não se discute na arbitragem a legalidade do

ato administrativo, mas sim suas consequências patrimoniais, logicamente que neste

aspecto as consequências patrimoniais em relação às Requerentes e ao

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

Requerido, e não em relação à DAG, que caso queira discuti-las o terá que fazer em

procedimento próprio, o que aliás, segundo noticiado, já vem ocorrendo.

Da alegada ausência de interesse de agir por falta de utilidade do provimento

reclamado

100. O Requerido defende que faltaria utilidade e, assim, interesse de agir na

arbitragem, porque seu objeto giraria em torno apenas de uma das duas condições

de eficácia do Contrato de Compra e Venda das ações das Requerentes na SPE por

um terceiro, sendo tais condições a anuência do Requerido e a anuência do Banco

do Nordeste do Brasil. As Requerentes afirmam, todavia, que o objeto da

arbitragem não é o Contrato de Compra e Venda das suas ações, limitando-se à

reversão operada pelo Requerido à anuência que antes havia dado para a

transferência dessas ações. Ponderam que o interesse de agir na demanda arbitral

reside na aferição das obrigações do Requerido em face da reversão que operou

sobre a anuência, e que subsistiria mesmo se o caso fosse de obter sentença

meramente declaratória ou constitutiva.

101. O Tribunal Arbitral esclarece que esta questão está vinculada à análise do

mérito a ser efetuada em seção específica desta Sentença Arbitral (itens 113 e 143).

Da alegada desvinculação dos pedidos ao Termo de Arbitragem

102. O Requerido alega que os pedidos formulados pelas Requerentes

desbordariam os limites fixados no Termo de Arbitragem. As Requerentes

manifestam, contudo, que seus pleitos são decorrência lógica do objeto estabelecido

pelas Partes no Termo de Arbitragem, como demonstrado desde suas Alegações

Iniciais, pelo que pertinentes e suscetíveis de exame e acolhimento no julgamento do

mérito da causa. Destacam que conforme o item 8.3 do Regulamento da Arbitragem,

os pedidos se formulam nas Alegações Iniciais do procedimento e, na medida em que

mantenham vínculo com o objeto estabelecido no Termo de Arbitragem, devem ser

apreciados.

103. O Tribunal Arbitral decide que não assiste razão ao Requerido, pois esta

arbitragem é institucional (art. 5º da Lei nº 9.307/96) e, como dispõe o art. 8.3 do

Regulamento de Arbitragem da CAMARB, as Partes podem complementar seus

pleitos nas Alegações Iniciais. Portanto, é a partir deste momento que se estabiliza a

demanda arbitral.

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

Decisão do Tribunal Arbitral sobre as Questões de Mérito

104. Esta arbitragem é de Direito e como tal o Tribunal Arbitral deve se ater, pois

está vedado o uso da equidade.

105. O Tribunal Arbitral passa a analisar os pleitos formulados pelas Requerentes.

a) Reconhecimento da ineficácia e da invalidade da notificação n. Of.

165/2013-CGPE

106. Este pleito das Requerentes encontra-se formulado no Termo de Arbitragem

firmado em 13.03.2015: “i) Reconhecimento da ineficácia e da invalidade da

notificação n. Of. 165/2013-CGPE (Anexo 13), em que o Requerido se manifestou

pela desconstituição da anuência antes dada à cessão da posição e das obrigações

das Requerentes, no CIR, à DAG, em cumprimento às próprias orientações do

Requerido, observando o item 8.3 do Regulamento.” Também nas Alegações Iniciais

de 24.05.2015, no item 4.1.2, p. 22: “As Requerentes pedem que, por sentença

arbitral, após a instrução devida, seja invalidada e declarada ineficaz a reversão,

manifestada pela Requerida através do Oficio n. 165/2013-CGPE, da orientação de

conduta e da anuência formal que emprestou à celebração do contrato de

transferência à DAG das ações das Requerentes na SPE, das obras do CIR e da

concessão respectiva, devendo a sentença arbitral valer como título executivo

judicial, nos termos do art. 475-N, I e IV, do CPC.”

107. Entende o Tribunal Arbitral que este pleito das Requerentes extrapola os

limites de sua competência, já que se refere a um ato administrativo que encontra

correspondência na legislação aplicável. Tal fato, contudo, não elide a possibilidade

de se analisar as consequências patrimoniais da conduta do Requerido, tal como

será efetuado em seção abaixo desta Sentença Arbitral.

108. Julga, portanto, improcedente este pleito das Requerentes.

b) as Requerentes pedem que seja declarada, com efeito e autoridade de

caso julgado, a existência da relação jurídica pela qual a Requerida

determinou às Requerentes, com orientação de conduta e anuência

final, a transferência à DAG de suas participações na SPE, das obras do

CIR e da concessão contratada, declarando-se também que, por isto, à

Requerida é vedado reverter ou desautorizar tal orientação, devendo a

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

sentença arbitral, também aqui, valer como título executivo judicial.

(Alegações Iniciais de 24.05.2015, item 4.1.3, p. 22).

109. Na linha do decidido no item anterior é de se verificar que o fato de o

Requerido conceder a anuência para a transferência da concessão a outra empresa,

segundo o previsto na Lei Federal nº 8.987/95, art. 27, e na Lei Estadual nº

12.765/2005, art. 12, § 1º e na cláusula 11 do contrato, não significa que não

poderia posteriormente reformá-la.

110. Por outro lado, tal proceder não elide a possibilidade de serem apreciadas

nesta arbitragem as conseqüências patrimoniais de sua conduta.

111. O Tribunal Arbitral julga improcedente este pleito das Requerentes.

c) Como efeito da anulação e da declaração de ineficácia do ato praticado

pelo Requerido, as Requerentes pedem que, nos termos do art. 182 do

Código Civil, seja determinada a restituição da orientação de conduta e

da anuência praticadas pela Requerida ao seu estado original, devendo

a Requerida observar e dar cumprimento a estes atos. (Alegações

Iniciais de 24.05.2015, item 4.1.4, p. 22).

112. Como corolário lógico dos pleitos anteriores, este pedido das Requerentes é

julgado improcedente.

d) Não sendo possível a restituição da orientação e da anuência a seu

estado anterior, por eventual impossibilidade de execução do contrato

de compra e venda, também na forma do art. 182 do Código Civil, as

Requerentes pedem, ao fim, que este seu direito seja convolado em

perdas e danos, mediante sentença parcial na qual se assente o na

debeatur (item 10.9 do Regulamento), hipótese em que o quantum

debeatur deverá ser fixado em liquidação posterior, na instância

arbitral, com posterior readequação do valor econômico do litígio.”

(Alegações Iniciais de 24.05.2015, item 4.1.4, p. 22)

113. Este pleito das Requerentes possui reflexos patrimoniais e passa a ser

analisado por este Tribunal Arbitral.

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31

CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

114. Desnecessário afirmar que a pretensão indenizatória, no Direito Brasileiro,

somente pode ser admitida quando exista a satisfação de alguns requisitos básicos.

Entre esses requisitos básicos encontram-se a antijuridicidade na conduta do

agente/ofensor e o nexo de causalidade entre a conduta antijurídica e os prejuízos

alegadamente sofridos pela vítima3.

115. Os árbitros vislumbram dificuldades intransponíveis em relação à procedência

do pedido indenizatório formulado pelas Requerentes, exatamente pela inexistência

de comprovação dos requisitos aludidos.

116. As Requerentes alegam estar eivada de antijuridicidade a conduta do

Requerido, que não poderia ter revertido a anuência anteriormente concedida para

a transferência da SPE para a DAG.

117. Em primeiro lugar, mister delimitar-se qual a ação ou omissão que faz parte

do objeto da presente arbitragem. Destarte, apesar de muito debatido pelas Partes,

as eventuais falhas do Requerido em relação às obras de infraestrutura necessárias

para um correto cumprimento contratual por parte das Requerentes não devem ser

aqui analisadas.

118. Os prejuízos sofridos pelas Requerentes em relação a essas eventuais falhas

do Requerido devem ser objeto de ação específica, pois as próprias Requerentes

delimitaram que as ações, alegadamente antijurídicas, que serviriam de base para os

pleitos indenizatórios, seriam aquelas relacionadas com a “relação jurídica pela qual

a Requerida determinou às Requerentes, com orientação de conduta e anuência

final, a transferência à DAG de suas participações na SPE, das obras do CIR e da

concessão contratada” (Alegações Iniciais de 24.05.2015, item 4.1.3, p. 22). Como

consectário lógico, as Requerentes também alegam que seria antijurídica a

“notificação n. Of. 165/2013-CGPE (Anexo 13), em que o Requerido se manifestou

pela desconstituição da anuência antes dada à cessão da posição e das obrigações

das Requerentes, no CIR, à DAG, em cumprimento às próprias orientações do

Requerido” (Termo de Arbitragem). A análise dever ser circunscrita, portanto, a

essas ações ou condutas do Requerido.

119. Constata-se, nos documentos juntados pelas Requerentes, alguns indícios

que poderiam sugerir uma relação próxima entre a DAG e o Requerido, como se

pode notar pela contratação do escritório de advocacia do então Procurador Geral do

3 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. 4 ed. São Paulo: Saraiva. 2013, p. 490 e seguintes.

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

Estado de Pernambuco para prestar serviços para a DAG. Contudo, tais indícios, por

si só, não levam às conclusões pretendidas pelas Requerentes.

120. Os documentos probatórios juntados pelas Requerentes não suportam as

suas alegações. Nas mensagens eletrônicas trocadas entre os agentes envolvidos na

tentativa de dar viabilidade econômica à construção da CIR (doc. A-8 e A-9), não se

vislumbra nenhum tipo de coação por parte do Requerido, no sentido de

constranger as Requerentes a abandonar as soluções financeiras apresentadas pelo

grupo Vinci Partners e aceitar as propostas feitas pela DAG. Com efeito, a primeira

mensagem que sugere uma conversa com os representantes da DAG parte do

próprio BNB (fls. 960) e não de algum agente do Requerido.

121. Não há dúvidas de que o Requerido estava intimamente envolvido nas

negociações entre as Requerentes e a DAG, mas tampouco as conversas

presenciais gravadas pelas Requerentes, ainda que clandestinamente, conseguem

comprovar uma coação por parte do Requerido para que as Requerentes viessem

a concretizar a sua relação comercial com a DAG. (Doc. A-20 e A-21)

122. Mesmo que se admitisse uma ação indevida do Requerido, no sentido de

coagir as Requerentes a abandonar as suas tentativas pretéritas de readequação

financeiras do projeto de construção da CIR e assinar o contrato com a DAG, não se

poderia admitir como provada a antijuridicidade do ato administrativo que é

considerado, pelas Requerentes, como a principal causa dos prejuízos sofridos:

revogação da anuência efetuada pelo Requerido (notificação n. Of. 165/2013-CGPE

- Anexo 13)

123. Destarte, este Tribunal entende que há alguns fatos que podem justificar a

ação estatal, afastando, por exemplo, a incidência do Venire Contra Factum

Próprium, alegado pelas Requerentes.

124. O contrato firmado entre as Requerentes e a DAG (doc. A-10) contém

algumas condições suspensivas de sua eficácia típica. A cláusula vigésima estipula,

com clareza, que a anuência do Requerido e do BNB seriam requisitos essenciais

para que o contrato se tornasse eficaz. Ademais, o contrato estabelecia que as

referidas anuências deveriam ser buscadas em um prazo máximo de 180 dias, ao

final do qual, caso não fossem satisfeitas as condições suspensivas, as partes

envidariam esforços para tentar encontrar novas soluções para o prosseguimento do

contrato.

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

125. É incontroverso que, apesar da anuência do Requerido, as condições

suspensivas do contrato não foram totalmente satisfeitas. Como o BNB não concedeu

a anuência buscada pelas partes, o contrato firmado entre DAG e as Requeridas

não pôde adentrar ao plano da eficácia.

126. Desse modo, passados os 180 dias indicados no contrato sem a anuência

incondicionada por parte do BNB, a construção da CIR passou a ser caracterizada por

absoluta indefinição. Ademais, mesmo com a cláusula vigésima do contrato firmado

entre DAG e as Requerentes prescrevendo que as Partes envidariam esforços para

encontrar soluções no caso de não satisfação das condições suspensivas, não parece

crível que isso aconteceria, pois, na data de envio do ofício que determinou a

reavaliação da anuência anteriormente concedida pelo Requerido (doc. A-22), DAG

e as Requerentes já litigavam entre si (doc. A-14).

127. Diante desse cenário de inúmeros fatos supervenientes é que se observa o

ofício enviado em dezembro de 2013, revertendo a anuência. Portanto, este Tribunal

entende não estar provada a ilicitude na conduta do Poder Concedente, já que

algumas fundadas razões para a reversão da anuência anteriormente concedida são

verificadas na espécie.

128. Ainda que se pudesse admitir a antijuridicidade da conduta do Requerido, a

falta de comprovação do nexo de causalidade entre esta conduta e os prejuízos

sofridos é outro empecilho instransponível para a procedência do pedido

indenizatório efetuado pelas Requerentes.

129. São inúmeras as teorias que tentam explicar o fenômeno causal na disciplina

da Responsabilidade Civil. Importante uma sintética análise das teorias mais

prestigiadas em nosso ordenamento jurídico: teoria da causalidade adequada e

teoria do dano direto e imediato.4

130. A teoria da causalidade adequada entende uma conduta como adequada

quando, além de se constituir como conditio sine qua non, ela seja considerada

idônea para gerar o evento, levando-se em conta o curso normal dos

acontecimentos5. Essa teoria, portanto, além de diferenciar as verdadeiras causas

jurídicas das meras condições, identifica o primeiro grupo com as consequências

4 MULHOLLAND, Caitlin Sampaio. A responsabilidade civil por presunção de causalidade. Rio de Janeiro: GZ. 2009. P. 188 5 CAVALIERI, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9 ed. São Paulo: Atlas. 2010, p. 49

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CAMARB - CÂMARA DE ARBITRAGEM EMPRESARIAL – BRASIL

previsíveis e prováveis de determinada conduta ou atividade6. Um fato pode ser

considerado causa de um dano se, de acordo com os dados da ciência e da

experiência, no momento da sua produção, fosse possível prever que tal fato geraria

o dano7. Buscam-se, entre as diversas causas do dano, aquelas que apresentam a

“possibilidade objetiva do resultado”.

131. Antonio Lindbergh Montenegro afirma que “se o dano foi uma consequência

normal ou típica desse ou daquele fato, caracterizada está a sua causa adequada. A

relevância jurídica de uma causa decorre de uma especial eficácia ou de ter sido

decisiva para o resultado.”8 Fernando Noronha ilustra a aplicabilidade da teoria:

Se o lesante praticou um fato suscetível de causar dano, ou se esse fato

aconteceu dentro de sua esfera de risco, sobre ele deve recair o ônus de

provar que, apesar da condicionalidade, não houve adequação entre tal fato e

o dano. Assim, a circunstância de uma pessoa conduzir o seu automóvel a

velocidade superior à permitida e o fato de ter acontecido um acidente não

impedem que ela faça prova de que este teve como causa o fato de um

terceiro, que inadvertidamente cortou a via preferencial por onde aquele

seguia. Também o fato de o médico não ter solicitado biópsia para verificar a

natureza de um tumor, que depois se apurou ser cancerígeno e que causou a

morte do paciente, não impede aquele de fazer prova de que já àquele tempo

uma eventual intervenção cirúrgica seria inútil, e até poderia ter antecipado o

evento letal, devido ao adiantado estado de desenvolvimento do câncer.9

132. Não menos prestigiada, mormente em terras brasileiras, é a teoria do dano

direto e imediato, tendo em vista que vários autores a consideram a teoria vigente

no ordenamento jurídico brasileiro10.

133. Agostinho Alvim explica a teoria sempre sob a ótica das excludentes da

causalidade, ou seja, enfrenta as hipóteses em que o alegado nexo de causalidade

entre dano e conduta do indigitado responsável pode ser interrompido por fato da

6 MULHOLLAND, Caitlin Sampaio. A responsabilidade civil por presunção de causalidade. Rio de Janeiro: GZ. 2009. P. 136 7LE TOURNEAU, Philippe; CADIET, Loic. Droit de la responsabilité. Paris: Dalloz, 1998. p. 269, MAZEAUD, Henri; LEON; Jean, CHABAS, François. Leçons de Droit Civil. 9. ed. Paris: Montchrestien, 1998. v. 1, t. 2, p. 658, VINEY, Geneviéve; JOURDAIN, Patrice. Traité de Droit Civil. 2. ed. Paris: LGDJ, 1998. v: Les conditions de la responsabilité civile. p. 161. 8 MONTENEGRO, António Lindbergh. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2ed. 1996, p. 335 9 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. 4 ed. São Paulo: Saraiva. 2013, p. 632. 10 ALVIM, 1955, p. 370 e seguintes e TEPEDINO, Gustavo. Notas sobre o nexo de causalidade. Revista Trimestral de Direito Civil. v. 6, abr./jun. 2001

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própria vítima, fato de terceiro ou caso fortuito ou de força maior11. Nesse diapasão,

afirma: “a ideia central, enunciada e repetida pelos autores, é, pois, a de que o

aparecimento de outra causa é que rompe o nexo causal e não a distância entre a

inexecução e o dano.”12

134. As teorias até agora abordadas são as mais utilizadas em sede doutrinária e

jurisprudencial e, atualmente, sofrem, indubitavelmente, certo sincretismo conceitual

e operacional, principalmente pelos tribunais pátrios.13

135. Além da similaridade operacional existente entre as teorias apresentadas, elas

apresentam um requisito comum, que deve ser observado em toda e qualquer

análise de nexo de causalidade no direito brasileiro: a necessidade de comprovação

de “condição necessária”, isto é, a chamada conditio sine qua non. A verificação

mais básica, portanto, anterior à fase valorativa típica das teorias da causalidade

adequada e do dano direito e imediato, é a existência da condição necessária. Nesse

sentido leciona Caio Mário da Silva Pereira:

“não basta, esclarece Savatier, que um dano tenha coincidido com a

existência de uma culpa ou de um risco para estabelecer uma

responsabilidade. Coincidência não implica em causalidade”.14

136. Conforme Sérgio Cavalieri Filho,

para se saber se uma determinada condição é causa, elimina-se mentalmente

essa condição, através de um processo hipotético. Se o resultado desaparecer,

a condição é causa, mas, se persistir, não a será. Destarte, condição é todo

antecedente que não pode ser eliminado mentalmente sem que venha a

ausentar-se o efeito.15

137. Citem-se adicionais manifestações doutrinárias nacionais, sobre a necessidade

das teorias analisadas dependerem da prévia comprovação da conditio sine qua non.

Em relação à teoria da causalidade adequada, asseverou-se:

11 ALVIM, 1955, p. 372. 12 Ibidem, p. 388. Expressando ideias semelhantes sobre o pensamento de Alvim veja-se MULHOLLAND, 2009, P. 166-174. 13 TEPEDINO, Gustavo, 2001, p. 13. e PETEFFI DA SILVA, Rafael. Responsabilidade civil pela perda de uma chance. 3ed. São Paulo: Atlas 2013, p. 41 14 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade Civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 75. 15 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 48.

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“Não obstante, a forma mais interessante de começar a explanação da teoria

da causalidade adequada não é pela diferença que esta guarda com a teoria

da equivalência de condições, mas pela característica que une as duas teorias,

isto é, a necessidade de que as possíveis causas analisadas possuam a

característica de se constituírem em conditio sine qua non”.1617

138. Em relação à teoria do dano direito e imediato, foi dito de maneira muito

semelhante:

“Consoante os ensinamentos de Agostinho Alvim, grande mentor da teoria do

dano direto e imediato, considera-se que esta teoria, quando presentes várias

causas possíveis, também trabalha com condições necessárias, ou seja, com

as chamadas conditio sine qua non.18 Desta forma, uma causa somente pode

ser considerada direta e imediata se, sem ela, o dano não ocorrer”.19

139. Diante do exposto, pode-se concluir que independente da teoria do nexo de

causalidade que se possa aplicar ao caso concreto, não se poderá escapar da

verificação da necessariedade entre a alegada conduta antijurídica do Requerido e os

prejuízos que constituem a base da pretensão indenizatória das Requerentes.

140. Se aplicarmos a fórmula sugerida por Sérgio Cavalieri, facilmente se constatará

que inexiste um nexo de causalidade: Se imaginássemos que o Requerido não

tivesse enviado o ofício n. 165/2013 (doc. A-22), em dezembro de 2013, o contrato

firmado entre a DAG e as Requerentes poderia ser considerado eficaz?

141. A resposta a essa pergunta é forçosamente negativa, pois outros fatores de

eficácia do negócio jurídico, como a anuência do BNB, não foram observados. Além

disso, como já afirmado, a possibilidade da DAG e as Requerentes conseguirem

entabular outra solução para o prosseguimento do negócio é pouco crível, pois,

quando da confecção do ofício n. 165/2013, elas já litigavam judicialmente.

16

NORONHA, Fernando, 2013, p. 627. “Como se vê, também a teoria da causalidade adequada parte de uma relação de pura condicionalidade: o fato a ser tido como determinante do dano há de ter sido uma das conditiones sine quibus non do resultado final.” No mesmo sentido COUTO E SILVA, Clóvis Veríssimo do. O dever de indenizar. In: FRADERA, Vera Maria Jacob de (Org.). O Direito Privado Brasileiro na Visão de Clóvis do Couto e Silva. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 195. 17 PETEFFI DA SILVA, 2013, p. 23. 18

Nesse sentido ALVIM, Agostinho, 1955, p. 367. “Observa Savatier, com referência às causas regressivas, que a causa de todo dano é infinitamente complicada, uma vez que o número delas, à medida que olhamos para trás, cresce em progressão geométrica; e sendo certo que cada uma merece o nome de causa, uma vez que sem ela o dano não se teria verificado, surge a dificuldade de se saber qual delas escolheremos como sendo a responsável por ele”. No mesmo sentido TEPEDINO, Gustavo, 2001, p. 5. 19 PETEFFI DA SILVA, 2013, p.27.

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142. Diante do exposto, não se pode observar, na espécie, nexo de causalidade

entre a conduta do Requerido e os alegados danos sofridos pelas Requerentes, pois

a conduta do Requerido não se apresenta como uma conditio sine qua non. Caso a

reversão da anuência efetuada pelo Requerido não houvesse existido, a situação

fática e jurídica das Requerentes seria a mesma.

143. Isto posto, o Tribunal Arbitral julga improcedente este pleito das

Requerentes.

Pleitos de Condenação nas Custas, Despesas e Honorários de Sucumbência

144. Ambas as Partes formularam pedidos de fixação de custas e despesas da

arbitragem, e de honorários de sucumbência arbitrados pelo Tribunal Arbitral, nos

termos do artigo 22 do Estatuto da Advocacia e da OAB. Não haverá ressarcimento

de honorários advocatícios contratados.

145. Considerando que todos os pleitos das Requerentes foram julgados

improcedentes e que não houve pedido contraposto formulado pelo Requerido, o

Tribunal Arbitral condena as Requerentes a assumirem integralmente as despesas e

custas desta arbitragem. Cada Parte deve assumir os honorários de seus advogados,

não havendo condenação em honorários sucumbenciais, haja vista a divergência

entre as Partes com referência a sua fixação (item 9.8 do Termo de Arbitragem),

bem como por ausência de previsão a esse respeito na Lei n. 9.307/96.

III. DISPOSITIVO

146. Isto posto, o Tribunal Arbitral, por unanimidade:

1) Julga improcedentes todos os pleitos das Requerentes;

2) Condena as Requerentes nas custas e despesas integrais desta arbitragem.

3) Determinar que cada Parte arque com os honorários advocatícios de seus

Patronos, não havendo condenação em honorários de sucumbência.

Esta sentença arbitral deve ser cumprida pelas Partes, no prazo de 15 dias, a partir

de sua ciência.

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