caritas editorial cáritas portuguesa - agencia.ecclesia.pt · caridade é o nome dado a uma...

20
CADERNOS DA EDITORIAL A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER EM PORTALEGRE FEVEREIRO 2017 Cáritas Editorial Po

Upload: phungdien

Post on 06-Dec-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

CADERNOSDA EDITORIAL

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER EM PORTALEGRE

FEVEREIRO 2017

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

EDITORIAL CÁRITAS

Praça Pasteur, nº 11 — 2.º, Esq.1000 –238 [email protected]. +351 911 597 808, fax. +351 218 454 221

ÍNDICEA ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER EM PORTALEGRE 3

REFLEXÃO: DISSE «CARIDADE»?!P. J.M. Pereira de Almeida 5

ENTREVISTA A ELICÍDIO BILÉPresidente da Cáritas Diocesana de Portalegre — Castelo Branco 7

JOÃO SERRA BONACHO 9

APRESENTAÇÃO DO LIVRO GERONTOLOGIA – GERONTAGOGIA: ANIMAÇÃO SOCIOCULTURAL EM IDOSOS, DE ERNESTO CANDEIAS MARTINSAlexandre Cotovio Martins 11

CUIDAR DO OUTRO 18

CRIANÇAS «SEM» A SUA INFÂNCIA 19

3

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER EM PORTALEGRE

A Cáritas Diocesana de Portalegre – Castelo Branco é, ao nível da Diocese, um organismo oficial da Igreja destinado à promoção e exercício da sua ação social. Na sua missão apoia as comunidades nos âmbitos social, saúde, educação e pastoral, sendo conhecedora das reali‑dades locais, coopera e desenvolve parcerias com outras Instituições e Entidades, públicas, eclesiais e civis, para melhor poder atingir os objetivos a que se propõe.Neste sentido, no passado dia 20 de Outubro, a Cáritas Diocesana de Portalegre – Castelo Branco, em parceria com a Editorial Cáritas e a Escola Superior de Educação e Ciências Sociais (ESECS) do Instituto Politécnico de Portalegre (IPP), realizaram, no Auditório da ESECS uma sessão de apresentação dos livros «Cuidar do Outro», Orgs. de JM Pereira de Almeida; «Crianças «sem» a sua Infância» de Ernesto Candeias Martins; «Gerontologia/Gerontagogia — Animação Sociocultural em Idosos» de Ernesto Candeias Martins, publi‑cados pela Editorial Cáritas.

4

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

No final da sessão, foi celebrado um Protocolo de cooperação entre a Cáritas Diocesana de Portalegre – Castelo Branco, a Cáritas Portuguesa e o IPP – ESECS, com vista a aprofundar o estudo das matérias sociais, estabelecendo um acordo com o objetivo de atribuir um prémio e editar em livro a melhor tese de Mestrado na área de investigação em Serviço Social da ESECS.Nos termos do Protocolo, competia à Cáritas Diocesana escolher a personalida‑de, cujo nome designará o prémio a atribuir. Nesse sentido foi proposto e aceite pela parceria o nome de João Serra Bonacho, tendo em conta a sua dimensão humana e o contributo que, em termos sociais, dedi‑cou à causa dos mais frágeis do Concelho de Portalegre.

Com esta iniciativa, a Cáritas Diocesana e o IPP através das diversas Escolas Superiores, dão corpo a um longo trabalho de coo‑peração que têm desenvolvido ao longo dos tempos, criando agora condições para incentivar os alunos da ESECS a desenvol‑verem processos de investigação na área social, os quais beneficiarão a Escola, as Instituições Sociais e os beneficiários da ação social, sobretudo os mais carentes, que vivem na nossa região, e são objeto do nosso cuidado, com um cunho mais huma‑no e científico.

PortuguesaCaritas´

Cáritas Diocesana de Portalegre

5

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

Temos todos experiência de equívocos. Oiço um ter‑mo e recordo ‑me de outro. Não percebo o significado com que o meu interlocutor carrega as palavras que usa. Eventualmente, usando as mesmas expressões, nem reparo que estamos a dizer coisas diferentes...Falando de «caridade», os desentendimentos são frequentes.Falando de amor, também. Mas, mesmo assim, pode ser que se consiga reunir um consenso mais alargado...É sempre bom recordar que o termo caridade foi forjado para traduzir um certo ‘tipo’ de amor, que em grego se dizia agape (ἀγάπη). Um amor que se dá sem esperar re‑compensa. Um amor que se vive até ao fim.Caridade é o nome dado a uma liberdade que torna mais livre a vida do outro, a uma vida entregue que torna mais viva a vida do outro.

REFLEXÃODISSE «CARIDADE»?!P. J.M. PEREIRA DE ALMEIDA

«Falando de “caridade”, os desentendimentos são frequentes.Falando de amor, também.»

6

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

Os discípulos que seguiram Jesus, desde a Galileia a Jerusalém, perceberam, por ex‑periência, que era esse o amor que o habi‑tava. Um dia perceberam mesmo que Deus é amor. Esse amor. Caridade.De Jesus ressuscitado acolheram o dom do seu Espírito de Amor. E é nesse amor que as frágeis comunidades cristãs crescem. Por causa do dinamismo do amor, da caridade que as animava. Recordam que o Senhor dissera que seria assim que todos poderiam reconhecer que eram seus discípulos: se se amassem uns aos outros (cf. Jo 13,35).«Acreditámos no amor (cf. 1Jo 4,16)». Este é o título do primeiro capítulo da Encíclica Lumen fidei, do Papa Francisco. E o seu pensamento desenvolvesse para, quase a concluir, afirmar: «Devido precisamente à sua ligação com o amor (cf. Gal 5,6), a luz da fé coloca ‑se ao serviço concreto da jus‑tiça, do direito e da paz» (Lumen fidei, 51)».Caridade e justiça. Dando atenção a esta relação, tão central na nossa tradição, afastamo ‑nos claramente de todas as ideias falsas que ligam caridade à injustiça, à ma‑nutenção da (des)ordem estabelecida, à sopa dos pobres, à caridadezinha.Caridade e justiça, caridade e paz: estes binómios falam, pois, de futuro, de solida‑riedade, de desenvolvimento humano (de todos os seres humanos e do ser humano no seu todo): «desenvolvimento integral», para usar a expressão do Papa Bento XVI. Tudo o que ficar aquém não poderá satisfazer ‑nos...

Por isso também a caridade se liga à de‑núncia das injustiças. E ao anúncio, corajo‑so e criativo, de novos céus e de uma nova terra, onde habite a justiça (cf. 2 Ped 3,13). Nada menos.Encontramos aqui, diz ‑nos o Papa Francisco, a especificidade do nosso agir nos dinamis‑mos sociais, empenhados na transformação das «nossas sociedades de modo que cami‑nhem para um futuro de esperança» (Lumen fidei, 51). «As mãos da fé levantam ‑se para o céu, mas fazem ‑no ao mesmo tempo que edificam, na caridade, uma cidade construí‑da sobre relações que têm como alicerce o amor de Deus» (Ibidem).

PortuguesaCaritas´

7

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

Editorial Cáritas (EC): Este mês celebrou ‑se, no passa‑do dia 5, o Dia Internacional do Voluntariado. A ação dos voluntários é essencial para o trabalho da Cáritas junto das comunidades. Qual a importância da formação neste setor tão crucial para a ação da Cáritas? Que con‑tributos poderia a Editorial Cáritas oferecer a este nível?

EliCídio Bilé (EB): A Cáritas Diocesana de Portalegre — Castelo Branco, para além de ser uma Entidade Promotora de Voluntariado tem também sob a sua responsabilidade e coor‑denação, no Concelho de

Portalegre, o Banco Local de Voluntariado que dina‑miza promovendo o ajus‑tamento entre a Oferta e a Procura de Voluntários. A formação dos voluntários é uma condição quer para a sua inscrição no Banco, quer para o desenvolvi‑mento da nossa missão. Ser Cristão implica pôr a render os talentos que o Senhor nos confia, circuns‑tância implícita à condição de batizados, o que pressu‑põe formação desde a ca‑tequese na infância e ado‑lescência, até à formação na fé dos adultos. Logo, o Voluntariado Cristão para além da formação de base

necessita de formação es‑pecífica para o desenvol‑vimento da sua ação em Igreja.Neste sentido, parece ‑nos que a Editorial Cáritas poderia desenvolver, em a colaboração com outros serviços eclesiais, um con‑junto de cadernos forma‑tivos destinados à forma‑ção/catequese de adultos e especificamente desti‑nada a voluntários. Esses cadernos poderiam ser colocados ao serviço da Cáritas em Portugal e das Paróquias, nos mesmos moldes em que o Projeto +Próximo está concebido e é desenvolvido.

ENTREVISTA AELICÍDIO BILÉPRESIDENTE DA CÁRITAS DIOCESANA DE PORTALEGRE — CASTELO BRANCO

8

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

EC: Depois das apresentações das obras da Editorial Cáritas em duas cidades da diocese, qual o balanço que faz desta colaboração?

EB: Tenho dito, em diversas ocasiões, que o trabalho de edição, promoção e divul‑gação de obras de caráter social, com apresentações públicas dessas obras, nas regiões do Interior do País, constituem uma circunstância pouco habitual nestes territórios, onde iniciativas deste género não abundam. O facto da Diocese de Portalegre — Castelo Branco, através da Editorial e da Cáritas Diocesana terem realizado duas sessões de apresentação de livros, representou uma boa opor‑tunidade para a divulgação da Editorial, para trazer à luz obras de investigação social e doutrinária de diversos autores e possibilitou que as diversas Instituições, eclesiais e académicas possam enrique‑cer as suas bibliotecas, proporcionado a leitura, a consulta e o estudo de temáti‑cas, como ferramentas de trabalho para o desenvolvimento das suas atividades. Acresce a circunstância de se ter celebra‑do um Protocolo de colaboração com o Instituto Politécnico de Portalegre que permitiu corporizar um longo trabalho de cooperação que a Cáritas Diocesana e o IPPortalegre têm desenvolvido ao lon‑go dos tempos. Com a celebração deste Protocolo foi criado um novo incentivo

aos alunos e professores da ESECS — Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do IPPortalegre, com a instituição de um prémio à melhor tese de mestrado na área social. Permitiu, ainda, o desenvol‑vimento de processos de investigação nesta área, os quais beneficiarão de forma relevante, a Escola, as Instituições Sociais e os beneficiários da ação social, sobretudo os mais carentes, que vivem na nossa re‑gião, e que são objecto do nosso cuidado, com um cunho mais humano e científico.

EC: O prémio que é atribuído ao vence‑dor da melhor tese de mestrado na área social, tem o nome de uma figura da dio‑cese, neste caso, de João Serra Bonacho. Gostaríamos que nos desse a conhecer um pouco do seu percurso dedicado às comunidades mais pobres da diocese.

EB: A Cáritas Diocesana escolheu João Serra Bonacho como personalidade que dá nome ao Prémio instituído. Ao escolher esta personalidade teve em conta, por um lado a sua contempora‑neidade — viveu o período da criação do Instituto Politécnico de Portalegre e da Cáritas Diocesana de Portalegre — Castelo Branco — e por outro a sua dimensão humana e o contributo que, em termos sociais, dedicou à causa dos mais frágeis do Concelho de Portalegre.

PortuguesaCaritas´

9

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

Natural de S. Salvador da Aramenha, Concelho de Marvão, nasceu no dia 01 –09–1942 e faleceu em Portalegre, onde viveu, no dia 25–08–2014.Viúvo, teve duas filhas: Paula que fale‑ceu com 4 anos de idade e Anabela, sua única descendente, atualmente com 40 anos de idade, que ficou a viver no Lar Residencial da CERCI Portalegre, devi‑do a uma deficiência.Estudou em Portalegre, serviu o Exército Português, em Angola, na década de 60.Desempenhou funções no Governo Civil de Portalegre, trabalhou na Banca, tendo terminado a carreira profissio‑nal em Janeiro de 2001, como gerente bancário.Foi destacado dirigente desportivo (30 anos), tendo desempenhado vários car‑gos diretivos em clubes de futebol e na Associação e Futebol de Portalegre. Pela sua dedicação à causa desportiva, como di‑rigente, foi agraciado com o grau de Sócio

Honorário, da Associação de Futebol de Portalegre.A partir de 1980, data em que foi criada a CRCIPORTALEGRE – Cooperativa de Educação e Reabilitação de Cidadãos com Incapacidades, João Serra Bonacho, desempenhou diversos cargos: Tesoureiro (1982–1984) e Presidente da Direção de 2004 até à data do seu falecimento (25–08–2014).Na CERCI foi grande impulsionador das suas actividades, sempre preocupado com o bem ‑estar dos utentes da Instituição, das condições de trabalho dos colaboradores e da prestação dos serviços sociais nas áreas da Educação, Reabilitação, Formação, Ocupação e Lar Residencial. Contribuiu para que a CERCI fosse declarada, por de‑creto governamental, como Instituição de Utilidade Pública (1983) e como Instituição Particular de Solidariedade Social (1999). Foi ainda, nos últimos meses de vida, que, preocupado com estado de degradação

JOÃO SERRA BONACHO

10

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

das instalações da CERCI, conseguiu o apoio do Centro Social Diocesano de Santo António da Diocese de Portalegre – Castelo Branco, na cedência das Instalações desta Entidade, situadas na Rua D. Olinda Sardinha, Quinta da Lagem – Covões em Portalegre, a partir de Junho de 2014, onde, atualmente, tem a sua sede social e desenvolve a sua atividade.

Na Cáritas Diocesana de Portalegre – Castelo Branco, pertenceu aos órgãos sociais, como Presidente do Conselho Fiscal, desde 01–01–2004, até à data do seu falecimento (25–08–2014).Colaborou em diversas iniciativas de ca‑rácter cívico e humanitário e foi um ci‑dadão zeloso e respeitável, com elevado sentido caritativo e de solidariedade.

PortuguesaCaritas´

11

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

1. Este é um livro que atravessa todo o campo que se divisa desde os pressupostos teóricos fundamentais e epistemológicos do domínio que trata, a intervenção com idosos, até à reflexão e proposta metodológica da intervenção mais orientada, mais aplicada, mais definida na e pela prática. Mais que atravessar, aliás, o autor pro‑cura, com sucesso, em meu entender, articular de forma sistemática estes diferentes planos. É assim que ao leitor é dado cruzar as paisagens mais teóricas sobre os deba‑tes definidores do campo em estudo, desde a definição de gerontologia, gerontologia educativa, gerontagogia, seus pressupostos, implicações e limites, passando por uma análise aprofundada do fenómeno da velhice, com natural ênfase para as suas principais problemáticas na sociedade contemporânea, até terminar — se assim é lícito dizer ‑se, pois talvez seja aí que muito começa – na

APRESENTAÇÃO DO LIVRO GERONTOLOGIA – GERONTAGOGIA: ANIMAÇÃO SOCIOCULTURAL EM IDOSOS, DE ERNESTO CANDEIAS MARTINSALEXANDRE COTOVIO MARTINS

«O que distingue estas duas áreas? Se a geragogia se centra, digamo­­lo de forma muito grosseira, no domínio educativo quando se trabalha com idosos, que distingue este domínio do domínio da gerontologia educativa?»

12

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

sistematização de índole profissional do es‑paço da intervenção do animador sociocul‑tural no domínio do trabalho com os mais velhos.Todo este caminho, por outro lado, é realiza‑do com recurso a forte e alargado domínio de literatura, em que o autor põe em diálogo, com erudição mas sem perder foco analítico, diferentes conhecimentos e níveis de orga‑nização do conhecimento, para sistematizar reflexão madura e produzir, efetivamente, saber de forte orientação técnico ‑científica, numa palavra, saber profissional no verdadei‑ro sentido que os anglo ‑saxónicos conferem ao termo, isto é, saber que articula o conhe‑cimento científico com as práticas situadas nos contextos da atuação dos profissionais.Ora, eu ousaria dizer que tal percurso, de tal modo rico e alargado, não seria possível não fora, precisamente, o perfil do autor do livro, o Professor Ernesto Candeias Martins. Com efeito, o Professor Ernesto Candeias Martins é, desde logo, docente, professor do ensino superior; mas é, igualmente, in‑vestigador — e investigador no domínio da educação; e, também, supervisor de pro‑fissionais em formação. É precisamente o amplo espectro de saberes e competências que convergem nestes diversos domínios de atividade que, em meu entender, acom‑panham, de forma particularmente feliz, a construção desta obra, na sua amplitude, rigor analítico e transversalidade.2. O autor diz ‑nos, na introdução, que o objetivo deste livro é «dar a conhecer as

características das áreas científicas relacio‑nadas com o idoso, a terceira/quarta idade, o adulto de idade avançada, a velhice e/ou o ‘velho/ancião’, compreendendo as suas mu‑danças biológicas, físicas, cognitivas, afetivo‑‑emocionais e sociais, as quais se produzem nesse processo de envelhecimento, assim como os fatores influenciadores na sua qualidade de vida, os aspetos psicológicos

13

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

que lhes aflige e, principalmente, entender o papel que a animação socioeducativa e/ou sociocultural tem na promoção de ativi‑dades práticas e os seus contributos para a sua satisfação de vida» (p.49).Obra complexa e multifacetada, já se vê. Obra, por outro lado, fortemente assen‑te na convergência e sistematização de saberes multidisciplinares, convergência essa que fará vislumbrar uma reflexão técnico ‑científica e uma prática profissio‑nal verdadeiramente interdisciplinar no trabalho com idosos. Interdisciplinaridade, acrescente ‑se, que é, hoje, tanto quanto a literatura autorizada o define, mas também

tanto quanto as melhores práticas profis‑sionais o aconselham, a pedra angular de uma intervenção com idosos de qualidade.Não se pense, porém, que a amplitude e complexidade dos temas abarcados pelo livro conduzem o autor à escrita de obra insondável, de obra que, em função dessa amplitude e complexidade, tornaria espe‑cialmente difícil a compreensão da articu‑lação entre os diferentes temas tratados e respetivos ângulos de análise.Muito pelo contrário, o autor empreende uma exposição a três tempos que trata, de forma muito feliz e muito clara, preci‑samente de articular todo o campo que

14

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

parte, repitamo ‑lo, da reflexão teórica e epistemológica sobre os fundamentos da gerontologia e da gerontagogia, para em seguida se debruçar sobre as problemá‑ticas do envelhecimento e da velhice e, finalmente, estabelecer as bases de uma intervenção no quadro da animação socio‑cultural com idosos que possa promover a respetiva qualidade de vida. São, de facto, estes três eixos de análise que configuram o esteio fundamental a partir do qual se estrutura esta obra. Olhemos para eles.

3. Temos, assim, um primeiro eixo de análise, que toma forma no primeiro capítulo do livro, intitulado «Uma saga de áreas cien‑tíficas intercetadas e com semelhanças». Ora, o título explicita precisamente o de‑bate em que o autor nos fazer entrar – e do qual nos faz sair mais conhecedores. É aqui que Ernesto Candeias Martins discute, com assinalável fôlego teórico, os processos histórico ‑sociais de institucionalização dos diferentes saberes técnico ‑científicos no domínio do estudo, mas também da inter‑venção com as pessoas idosas mas, além desses processos histórico ‑sociais de insti‑tucionalização, aborda também o plano das definições disciplinares e das relações entre elas. Um esforço clarificador assinalável, que eu designaria de fundamental e extrema‑mente oportuno, tanto mais quanto, antes deste trabalho, não estava, tanto quanto me é dado saber, feito, no nosso País e com este nível de sistematização e aprofundamento.

O autor trabalha, assim os próprios concei‑tos de geriatria, gerontologia, gerontologia educativa, gerontagogia, gerogogia, apenas para citar alguns dos principais. E é aqui, naturalmente, que define, que estabelece um campo ou, se quisermos, um território firme para avançar para posteriores inda‑gações científicas e profissionais.Uma distinção fundamental, que aliás titula a própria obra, é precisamente a distinção entre os domínios científicos da gerontolo‑gia e da geragogia. Não me atrevendo aqui a retomar a discussão realizada pelo autor, que de tão alargada, com certeza merece‑ria espaço mais específico que a apresen‑tação, genérica, da obra, gostaria, porém, de salientar deste debate precisamente a distinção que o autor faz, como forma de esclarecer um pouco do que trata este debate fundamental na obra e de aguçar a curiosidade dos presentes para a respetiva leitura que, evidentemente, se recomenda.Após discutir definições disciplinares como a de geriatria, mais orientada para uma perspetiva médica e de saúde e a de ge‑rontologia social, mais abrangente e focada no estudos dos processos de envelheci‑mento e no estabelecimento de políticas no domínio do envelhecimento, o autor centra ‑se na distinção entre aquilo a que se convencionou chamar «gerontologia educativa» e «geragogia». O que distingue estas duas áreas? Se a geragogia se cen‑tra, digamo ‑lo de forma muito grosseira, no domínio educativo quando se trabalha

15

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

com idosos, que distingue este domínio do domínio da gerontologia educativa? A resposta, dá ‑no ‑la o autor: «a gerontologia educativa realça a vertente gerontológi‑ca, pondo, assim, ênfase nos aprendentes, enquanto pessoas de idade ou idosos, do que na educação em si mesma. (…) A ge‑rontologia coloca o interesse no estudo do envelhecimento e no adulto idoso e a gerontologia educacional nos aspetos edu‑cativos do envelhecimento. A gerontagogia, por seu lado, orienta o seu interesse para o estudo da prática educativa, no quadro do ensino/aprendizagem de pessoas inse‑ridas num dado contexto, que procuram desenvolver com qualidade e satisfação as suas vidas pessoais e sociais. Neste ótica epistemológica, a educação assume uma prioridade sobre o envelhecimento e as pessoas idosas. (…) [A] gerontagogia, em‑bora não prescinda da gerontologia, deverá ser vista como uma área científica que re‑sulta da conjugação de várias especialida‑des (…) quando nos interrogamos ‘sobre o quê, como e o para quê da educação das pessoas seniores’. (…) No nosso entender a gerontagogia deve ser vista mais como uma prática do que como uma disciplina científica. Deste modo, o gerontagogo será mais um interventor (social) do que um in‑vestigador ou teórico. Não questionamos o transmitir unicamente conhecimentos com o objetivo de produzir bons alunos ou bons cidadãos, mas sim contribuir para que os idosos ou pessoas da terceira idade

consigam melhorar as suas competências e habilidades, podendo gerir com mais ca‑pacidade e liberdade as suas próprias vidas (…)» (pp. 94–95).

4. Um segundo eixo de análise da obra está enformado no capítulo 2, designado «Envelhecer e velhice na biografia vital do indivíduo». Neste capítulo, o autor mobiliza, uma vez mais, um conhecimento multidis‑ciplinar muito significativo, fazendo ‑o con‑vergir no tratamento dos conceitos talvez mais fundamentais que se trabalham quan‑do se reflete ou intervém sobre esta área, os conceitos de velhice e envelhecimen‑to. Aqui, uma vez mais, Ernesto Candeias Martins brinda o leitor com uma aturada discussão dos aspetos histórico ‑sociais, mas também semânticos, que enformam aquelas noções, recorrendo necessaria‑mente, para o efeito, aos conhecimentos oriundos da história social, da psicologia, da sociologia do envelhecimento, entre outros. Mas, o autor não se limita a esta análise, diga‑mos, semântica, recortando significados pre‑cisos, mas anteriormente problemáticos, da inevitável polissemia que povoa este domínio conceptual. Também, com particular felicida‑de, aborda, em seguida, alguns dos principais preconceitos, mitos e estereótipos sobre a velhice e o envelhecimento presentes nas nossas sociedades, num gesto que tem tanto de analítico quanto de pedagógico, pois impõe a reflexão sobre as representações, tantas

16

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

vezes negativas e com efeitos deletérios, que vamos, enquanto indivíduos numa sociedade determinada, produzindo, por vezes de for‑ma involuntária. Para apenas enunciar alguns «mitos» trabalhados pelo autor, as ideias de que os idosos são «naturalmente conserva‑dores», que a «doença e a velhice vão jun‑tas», que os «idosos constituem um coletivo homogéneo», que os idosos são apenas uma «sobrecarga social», ou em geral «pobres». Esta reflexão, sobre os mitos em torno do envelhecimento, mas também a discussão, que lhe é solidária, do idadismo, isto é, do preconceito contra as pessoas idosas, é hoje não só atualíssima e premente, como deve constituir a base para se pensar qualquer in‑tervenção junto da população mais velha, seja ao nível macro, da definição das políticas, seja ao nível da intervenção profissional.E é precisamente ao nível das políticas sociais da velhice que o autor coloca, precisamente, as secções de «fecho», se assim pode dizer, deste capítulo: que ins‑trumentos conceptuais são aí utilizados? O que significa envelhecimento ativo, produ‑tivo, satisfatório? Que respostas e medidas existem, designadamente no plano da insti‑tucionalização das pessoas idosas e o que significa institucionalizar idosos? Etc. Sem dúvida, leitura obrigatória para quantos se dedicam ao trabalho com idosos, nas suas múltiplas vertentes, na atualidade.

5. Chegamos, enfim, ao terceiro eixo de or‑ganização da obra, que culmina a mesma e,

se é justo dizê ‑lo desta forma, configura o locus, o ponto onde desagua o conjunto do intenso labor técnico e científico desenvol‑vido pelo autor nos capítulos anteceden‑tes. E aqui, o Professor Ernesto Candeias Martins convida ‑nos, desde logo, a pensar a animação como prática sustentada no âm‑bito da pedagogia social. Nas suas próprias palavras, «Em termos gerais, a ‘animação’ é um estilo, um enfoque ou um modo de pensar em prol das pessoas, grupos ou co‑munidade, correspondendo no campo pro‑fissional ao perfil de ‘animador’. Sabemos que a pedagógica ocupa ‑se da animação, já que esta é uma práxis social, pedagógica e cultural, geradora de processos de partici‑pação e pressupondo intencionalidade. Por isso, a animação vincula ‑se ao social e ao educativo, ou seja, à conceção de educação não formal e informal (…). A animação apa‑rece, desde a perspetiva pedagógica, como uma modalidade ou âmbito que permite responder às necessidades socioeducativas e culturais dos indivíduos no aprender ao longo da vida. Configura instrumentos de intervenção que induzem dinamismo, par‑ticipação e satisfação nas pessoas» (p. 231). Com este ponto de partida, a obra detalha todo um debate em torno do conceito de animação, em torno das suas aceções diversas, dos seus objetivos, valores e ca‑racterísticas, das suas modalidades. Não ignorando esta dimensão, gostaria porém de salientar que o autor realiza, neste capítulo, a concretização, no plano

17

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

da intervenção profissional, dos princípios, orientações e quadros de reflexão e análi‑se detalhados anteriormente na obra. Ou seja, o autor, se me é permitido o jogo de palavras, anima todo o trabalho anterior‑mente desenvolvido, fazendo ‑o reverter para a prática profissional do animador sociocultural que trabalha com idosos. E fá ‑lo detalhando objetivos de interven‑ção, princípios e metodologias de atuação, modalidades de trabalho, modos de orga‑nização de atividades com cidadãos mais velhos. Assim, Ernesto Candeias Martins presenteia ‑nos com um excelente guia me‑todológico, se assim lhe podemos chamar, para a animação sociocultural de idosos, no qual pormenoriza desde o que é e como se deve estruturar um projeto de animação, nas suas diversas fases, até às tipologias de contextos de atuação ou às técnicas de in‑tervenção e a organização das atividades com idosos. Termina mesmo este capítulo com a ilustração de diferentes modalidades de organização de roteiros específicos de animação na intervenção com idosos.

6. Penso que se pode dizer que estamos perante uma obra completa. Retomando as palavras iniciais, recordo que disse então que este é um livro que atravessa todo o campo que se divisa desde os pressupos‑tos teóricos fundamentais e epistemológi‑cos do domínio que trata até à reflexão e proposta metodológica da intervenção mais orientada, mais aplicada, mais defini‑

da na e pela prática. Mais que atravessar, aliás, o autor procura, com sucesso articu‑lar de forma sistemática estes diferentes planos. Creio que se compreende, agora melhor, porque o afirmei desde o primeiro momento.Trata ‑se, sem dúvida, de obra de significa‑tivo valor científico e pedagógico, muito abrangente, sistemática e aprofundada que, como fui também sugerindo, interessa a to‑dos e todas quantos se debrucem, por uma ou outra razão, sobre o envelhecimento e a velhice e sobre e intervenção junto dos cidadãos mais velhos. É um contribu‑to fundamental, que aliás vem preencher uma lacuna nesta área, inaugurando assim, sem dúvida, um campo de estudos e de reflexão sobre a intervenção, mas também de proposta de modalidades e planos de intervenção. Por tudo isto, resta ‑me agra‑decer, enquanto docente e investigador ligado a estes domínios, o aturado trabalho do Professor Ernesto Candeias Martins e felicitá ‑lo por mais esta obra significativa.

PortuguesaCaritas´

*Docente no Instituto Politécnico de Portalegre

18

CáritasEditorial

PortuguesaCaritas´

Em 1974–1975, poucos anos após o encerramento do Concílio Vaticano II, ocorria em Roma a XXXII Congregação Geral da Companhia de Jesus, sendo Prepósito Geral o P. Pedro Arrupe. Os Decretos dessa Congregação con‑tinuam a recordar, hoje, a identidade dos jesuítas e a sua missão no mundo contemporâneo, mas iluminam também percursos de vocação de companhei‑ros de Jesus que, naqueles anos, viviam, no âmbito da Companhia de Jesus, o mesmo regresso às origens e a mesma liberdade de perspetivas que tinham ca‑racterizado a Igreja conciliar: um retor‑no à Palavra e à escuta do humano, uma fé vivida como profecia na busca da jus‑tiça, segundo o carácter que marcara a própria origem da Igreja como recipro‑cidade de fé e de vida e o discernimen‑to de Inácio de Loyola como caminho de bem ‑aventurança no seguimento de Jesus Cristo pobre e crucificado.Creio que não se pode explicar a razão deste texto sem uma referência ao ho‑rizonte expresso na conhecida formula‑ção evocada e no percurso unitário de vocação e de vida de Sergio Bastianel, a quem queremos dedicá ‑lo com gratidão,

no seu septuagésimo aniversário. Hoje, o Papa Francisco recorda ‑nos o empenha‑mento de unidade entre Evangelho e vida, adverte ‑nos para considerarmos que a fidelidade a Deus implica o dar razão da verdade inscrita na vida dos pobres e da fraqueza crucificada na história, porque é aqui que Deus é glorificado, ou seja, é encontrado como Senhor. Mas a voz do Papa, também ele jesuíta, alimenta ‑se de uma experiência muito mais antiga, partilhada com muitos companheiros de Inácio ao longo dos séculos e, na se‑gunda parte do século XX, com muitos companheiros mártires, da unidade pos‑sível entre fé e justiça neste mundo. No mais silencioso empenhamento de ajuda à oração, na presença complexa nas peri‑ferias do humano, sobretudo as evidente‑mente originadas por estruturas de pe‑cado, na assunção de responsabilidades pela formação cultural e académica, no encargo do cuidado da vida comum, para um discípulo do Senhor deveria tratar ‑se sempre de segui ‑lo, acolhendo o dom da sua graça, sem qualquer motivo de vai‑dade ou de recompensa. Sergio Bastianel optou por seguir este caminho.

PortuguesaCaritas´

CUIDAR DO OUTRO HTTP://CARITAS.PT/LIVRARIA/INDEX.PHP/LIVROS/93 ‑CUIDAR ‑DO ‑OUTRO?SHOWALL=1&LIMITSTART=

19

A ALIANÇA DO PENSAR E DO FAZER

Muitas famílias e/ou pais tutores têm procedimentos e ações relativamente às crianças que prejudicam o seu desen‑volvimento, a socialização, os seus pro‑jetos de vida e bem ‑estar. Muitas delas passam a infância sem a viver como devia ser: manifestar ‑se como criança, brincar, relacionar ‑se e aprender em felicidade, alegria e despreocupação. Estas crianças

CRIANÇAS «SEM» A SUA INFÂNCIA HTTP://CARITAS.PT/LIVRARIA/INDEX.PHP/LIVROS/99 ‑CRIANCA ‑SEM ‑SUA ‑INFANCIA?SHOWALL=1&LIMITSTART=

são homúnculos que, desde muito cedo, conhecem privações, amarguras e con‑tingências, por vezes, dramáticas de vida e aprendem a sobreviver e não a viver como ‘CRIANÇAS’.Falar do futuro da infância, exige uma assunção de que há diferentes crianças, diferentes infâncias e que não há um pa‑drão comum. O reconhecimento das di‑ferenças é fundamental para programar projetos de intervenção que permitam às crianças ‘VIVER’ e não sobreviver na sua infância.

PortuguesaCaritas´

TÍTULOS PUBLICADOS

O Amor que Transforma o Mundo | René CosteDar ‑se de Verdade: Para um desenvolvimento Solidário | váriosProtecção social e (re)educação de Menores| Ernesto Candeias MartinsCónego José M. Serrazina | váriosTeresa de Saldanha | Helena Ribeiro de CastroCriminalidade, Geração e Educação de Menores| Ernesto Candeias MartinsMoralidade Pessoal na História | Sergio BastianelGerontologia/Gerontagogia | Ernesto Candeias MartinsHumanizar a Sociedade | Georgino Rocha

Cartas de Ozanam | Diogo Castelbranco de Paiva Brandão

Entre Possibilidades e Limites | Sergio BastianelPerspectivas sobre o Envelhecimento Ativo | váriosProcissão dos Passos | Abel VarzimServiço Social e Desemprego de Longa Duração | Aida FerreiraMaritain e Bento XV | Diogo MadureiraCristãos Pensadores do Social | Jean Yves CalvezUm Intelectual ao Serviço dos Pobres | Gérard CholvyUm Genocídio de Proximidade | Teresa Nogueira PintoCaminhos para uma vida Solidária | Carlos AzevedoPobreza e Relações Humanas | Delfim Jorge Esteves GomesRendimento Social de Inserção | Mafalda SantosCuidar do Outro — Estudos em homenagema Sergio Bastianel sj | vários autoresCrimes e Criminosos no norte de Portugal | Alexandra EstevesA Consciência Social da Igreja Católica — 124 Anos de História1891–2015 | Domingos Lourenço VieiraCrianças «sem» a sua infância. História Social da Infância: Acolher/Assistir e Reprimir/Reeducar | Ernesto Candeias MartinsÉtica e Teologia — Declinações de uma Relação | Américo PereiraO Impacto da Doutrina Social da Igreja no Trabalhador e no Empresário | Hermenigildo Moreira EncarnaçãoO Padre das Prisões Portuguesas | Inês LeitãoPalavras de Liberdade | váriosO Pensamento Social do Papa Francisco| J. M. Pereira de Almeida (Org,)O Cuidar como Relação de Ajuda — Por uma ética teológica do cuidar | Antonino Gomes de SousaO Problema do Mal | Étienne BorneRosto Social da Religião | Roberto Mariz