capítuloxv odio na contratransferência

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  • 8/11/2019 CaptuloXV Odio Na Contratransferncia

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    2000. WINNICOTT, D.W. (1947). O dio na contratransferncia. In: Da pediatria psicanlise.Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988.

    O dio na contratransferncia

    NO PRESENTE TRABALHO, gostaria de examinar um dos aspectos do tema ambivalncia, asaber, o dio na contratransferncia. Creio que a tarefa do analista (chamemo-la analistapesquisador) que assume a anlise de um psictico intensamente afetada por essefenmeno, que a anlise de pacientes psicticos revela-se impossvel a no ser que o dio doprprio analista esteja muitssimo discernvel e consciente. Isto equivale a dizer que o analistadeve ser ele mesmo analisado, mas implica tambm em afirmar que a anlise de um psictico irritante, se a compararmos com a de um neurtico, e que isto lhe inerente.

    O manejo de um psictico inevitavelmente irritante, e aqui no me refiro ao tratamentopsicanaltico. De tempos em tempos tenho feito crticas contundentes s atuais tendncias dapsiquiatria, com seus choques eltricos fceis demais e suas leucotomias drsticas demais(Winnicott, 1947,1949). Justamente em razo dessas crticas por mim expressas, gostaria deser o primeiro a reconhecer a extrema dificuldade inerente a o trabalho do psiquiatra, eespecialmente da enfermagem psiquitrica. Os pacientes insanos representam sempre umapesada carga emocional para os que deles cuidam. Devemos perdoar aos que se envolvemcom esse tipo de trabalho por fazer em coisas horrveis. Isto no significa, todavia, quedevemos aceitar qualquer coisa que os psiquiatras e os neurocirurgies faam como sendolegtimas do ponto de vista da cincia.

    Portanto, ainda que apresente reflexo refira-se a psicanlise, ela verdadeiramenteimportante para o psiquiatra, mesmo para aquele cujo trabalho apresentado Jamais o leva aestabelecer um relacionamento do tipo analtico com os seus pacientes.

    A fim de ajudar aos que praticam a psiquiatria geral, o psicanalista deve estudar os estgiosprimitivos do desenvolvimento emocional do indivduo enfermo, mas deve estudar tambm anatureza da carga emocional que recai sobre o psiquiatra ao fazer o seu trabalho. O que nspsicanalistas chamamos de contratransferncia algo que precisa ser compreendido tambmpelos psiquiatras. Por mais que estes amem os seus pacientes, no podem evitar odi-los e

    tem-los, e quanto melhor eles o souberem mais difcil ser para o medo e o dio tomarem-seos motivos determinantes do modo como ele tratam esses pacientes.

    Possvel classificar os fenmenos contratransferncias da seguinte maneira.

    A normalidade nos sentimentos contratransferncias, e relacionamentos e identificaespadronizados e reprimidos do analista. O comentrio a esse respeito o de que o analistapreciso de mais anlise, e costumamos acreditar que trata se de um problema menos graveentre os psicanalistas do que entre os psicoterapeutas em geral.

    As identificaes e tendncias oriundas da experincia e do desenvolvimento pessoal do

    analista, que fornecem as bases positivas do seu trabalho analtico e tornam esse trabalhodiferente do de outros analistas.

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    Destes dois tipos de fenmeno eu distingo a contratransferncia verdadeiramente objetiva ou,se isto for difcil, o amor e o dio do analista em reao personalidade e aoscomportamentos reais do paciente, com base numa observao objetiva.

    Sugiro que se um analista prope-se a analisar pacientes psicticos ou antissociais ele deve

    estar to profundamente consciente de sua contratransferncia, que lhe seria possvelidentificar e examinar as suas reaes objetivas ao paciente. Estas incluiro o dio. Fenmenoscontratransferncias representaro, em certos momentos, o elemento central da anlise.

    Gostaria de sugerir que o paciente reconhece no analista apenas o que ele mesmo capaz desentir. Quanto s motivaes: um obsessivo tender a pensar que o analista faz o seu trabalhode modo obsessivamente vazio. Um hipomanaco incapaz de sentir-se deprimido a no ser poruma guinada extrema do humor, e em cujo desenvolvimento emocional a posio depressivano foi alcanada com toda a solidez, no sendo, portanto capaz de sentir culpa,responsabilidade e concernimento de modo profundo, no conseguir perceber que o

    trabalho do analista tem por objetivo fazer reparaes a respeito de seus prprios sentimentosde culpa do analista.

    Um paciente neurtico tender a ver no analista uma ambivalncia em relao a ele(paciente), e a esperar por uma ciso entre o amor e o dio do analista. Esse paciente se tiversorte, recebe o amor porque alguma outra pessoa est recebendo o dio. Assim sendo, no bvio que se um paciente psictico encontra-se num estado de amor e dio coincidentes eleter aprofunda convico de que o analista s capaz de relacionar-se com ele a partir dessemesmo fenmeno brutal e perigoso de amor e dio coincidentes? Neste caso, se o analistademonstrar amor ele certamente matar o paciente no mesmo instante. A coincidncia de

    amor e dio algo que sempre aparece caracteristicamente na anlise de psicticos, dandomargem a problemas de manejo que podem facilmente exigir do analista mais do. Essacoincidncia de amor e dio qual me refiro algo distinto da agressividade que complica oimpulso do amor primitivo, e implica em que na histria desse paciente ocorreu um fracassodo ambiente poca dos primeiros impulsos instintivos em busca do objeto. Se for inevitvelque ao analista sejam atribudos sentimentos brutais, melhor que ele esteja consciente eprevenido, pois lhe ser necessrio tolerar que o coloquem nesse lugar. A cima de tudo ele nodeve negar o dio que realmente existe dentro de si. O dio que legtimo nesse contextodeve ser percebido claramente, e mantido num lugar parte para ser utilizado numa futurainterpretao.

    A fim de nos tornarmos capazes de analisar pacientes psicticos, devemos alcanar em nossasanlises os nveis mais primitivos em ns mesmos, e este apenas mais um exemplo de que asrespostas para muitos problemas obscuros da prtica psicanaltica encontram-se na anliseadicional do psicanalista. (A pesquisa em psicanlise seria, talvez, em algum grau, umatentativa do analista de levar a sua prpria anlise a um nvel mais profundo que aquele quelhe foi possibilitado pelo seu analista.) Uma das tarefas mais importantes na anlise dequalquer paciente a de manter a objetividade em relao a tudo aquilo que o paciente traz,e um caso especial desse tema a necessidade de o analista ser capaz de odiar o pacienteobjetivamente. E no que realmente existem muitas situaes em nosso trabalho normal nasquais nosso dio se justifica? Durante vrios anos senti que um de meus pacientes, um

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    obsessivo muito grave, era praticamente insuportvel. Eu me sentia muito mal em relao aisto at que a anlise deu uma guinada e passou a ser possvel gostar dele, e ento eu me deiconta de que o fato de que era impossvel sentir amor por ele era na verdade um sintomainconsciente- mente determinado. Foi realmente um dia maravilhoso para mim, quando pudecontar a ele (muito tempo depois) que eu e seus conhecidos o detestvamos, mas que eleestava muito doente para que lhe dissssemos isso. Esse dia foi importante para ele tambm,representando um tremendo avano em seu ajustamento realidade'. Nas anlises maiscomuns no difcil para o analista administrar o seu prprio dio. Esse dio mantm-selatente. O ponto importante aqui, obviamente, que atravs de sua prpria anlise o analistatenha se livrado de amplos estoques de dio inconsciente pertencente ao passado e aos seusconflitos internos. H outras razes pelas quais o dio permanece oculto e mesmodespercebido enquanto tal:

    A psicanlise a profisso que escolhi, o modo pelo qual posso lidar melhor com a minhaprpria culpa, atravs dela que posso expressar-me da maneira mais construtiva. Sou pago,ou estou em formao a fim de conquistar um lugar na sociedade atravs do meu trabalhopsicanaltico.

    Estou fazendo descobertas. Tenho gratificaes imediatas ao identificar-me com meu pacienteque est melhorando, e espero gratificaes ainda maiores no futuro, quando o tratamentoterminar. Alm do mais, enquanto analista, eu tenho meios de expressar meu dio. O dio expresso pela existncia do final da' sesso'. Acredito que isto verdade mesmo quando noocorre dificuldade alguma e o paciente fica contente em ir embora. Em muitas anlises tudoisto bvio, e portanto poucas vezes mencionado, e o trabalho da anlise se faz por meio deinterpretaes verbais da transferncia que emerge do inconsciente do paciente. O analistaassume o papel de uma ou outra figura confivel da infncia do paciente. Ele fatura o sucessodaqueles que fizeram o trabalho braal, quando o paciente era um beb. Tudo isto faz parte dadescrio do trabalho psicanaltico rotineiro, que na maioria dos casos lida com pacientes cujossintomas so de natureza neurtica. Na anlise de psicticos, porm, o analista est sujeito auma tenso cuja qualidade e dimenso so inteiramente diferentes, e precisamente essa.Diferena que estou procurando descrever.

    Relembrando: Este trabalho de 1947. Foi s em 1952 que a ideia do falso-eu, que pe emquesto a ideia mesma de um ajustamento realidade, tornou-se clara para Winnicott(Psicose e Cuidados Maternos, apresentado em marode1952) (embora em A ReparaoRelativa Defesa Organizada da Me contra a Depresso de 1948, j seja possvel vislumbrarseus primrdios).

    Recentemente ocorreu que, durante alguns dias, tive a sensao de estar trabalhando mal.Cometi erros a respeito de cada um de meus pacientes. A dificuldade era minha, e era emparte pessoal, mas estava associada em sua maior parte a um clmax ao qual eu havia chegadocom uma de minhas pacientes psicticas (de pesquisa). A dificuldade esclareceu-se quandotive um sonho que chamamos de 'curativo'. (Diga-se de passagem, que durante a minhaanlise e nos anos seguintes ao seu trmino tive uma longa srie desses sonhos 'curativos',que apesar de serem muitas vezes desconfortveis, marcaram cada uma minha chegada a umnovo patamar de desenvolvimento emocional.) Nesse episdio especfico percebi o significado

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    experincias positivas no incio, pois estas podem ser descobertas na transferncia, e aquelescujas experincias iniciais foram to deficientes ou distorcidas que o analista ter de ser aprimeira pessoa na vida do paciente a fornecer certos elementos essenciais do ambiente. Notratamento de pacientes deste ltimo tipo, muitas coisas normais da tcnica analtica tomam-se de importncia vital, coisas que passam por bvias no tratamento de pacientes do tipoanterior.

    Perguntei a um colega se ele fazia anlise no escuro, e ele disse: 'Ora, no nosso trabalhoconsiste certamente em proporcionar um ambiente comum, e a escurido seria um elementosingular. 'Ele ficou surpreso com a minha pergunta. Sua orientao dirigia-se anlise daneurose. No entanto, no fossem as inevitveis ressonncias do termo, eu teria essa provisoe manuteno de um ambiente rotineiro pode ser em si mesma de importncia vital na anlisede psicticos, e de fato pode revelar-se, por vezes, mais importante at que as interpretaesverbais que tambm devem ser feitas. Para o neurtico, o div, o calor e o conforto podemsimbolizar o amor da me. Para o psictico seria mais correto dizer que essas coisas so aexpresso fsica do amor do analista. O div o colo ou o tero do analista, e o calor o calorvivo do corpo do analista. E assim por diante.

    Espero que esteja havendo uma progresso no modo como formulo a questo. O dio doanalista fica em geral latente, e pode continuar assim com muita facilidade. Na anlise depsicticos o analista encontra-se sob uma presso muito maior para manter o seu dio latente,e s poder faz-los e estiver plenamente consciente do mesmo. Gostaria de acrescentar queem certos estgios de certas anlises o dio do analista na verdade buscado pelo paciente, enesses momentos necessrio expressar um dio que seja objetivo. Quando o paciente est procura de um dio legtimo, objetivo, ele deve ter a possibilidade de encontr-lo, casocontrrio no se sentir capaz de alcanar o amor objetivo.

    Aqui seria talvez relevante mencionar os casos de crianas que vm de lares desfeitos ou queno tm pais. Uma criana nessas condies vive inconscientemente em busca de seus pais. Aideia de levar Uma criana dessas para casa e am-la notoriamente inadequada. Ocorre queaps algum tempo a criana assim adotada readquire a esperana, e passa a testar o ambientepor ela encontrado a fim de reunir provas de que os que dela cuidam so capazes de odiarobjetivamente. Ao que parece, a criana poder acreditar que amada somente depois queconseguir sentir-se odiada.

    Durante a Segunda Guerra Mundial um menino de nove anos foi internado numa instituiopara crianas, tendo sido mandado para fora de Londres no em razo das bombas, mas porvadiagem. Eu esperava poder trat-lo minimamente durante a sua estada na instituio, masseus sintomas venceram e ele fugiu como sempre fez em todos os lugares desde que fugira decasa aos seis anos. No entanto, eu havia estabelecido um contato com ele numa dadaentrevista, em que pude perceber e interpretar atravs de um desenho seu que, ao fugir, eleestava inconscientemente tentando salvar o interior de seu lar e protegendo a sua me de seragredida, ao mesmo tempo em que procurava fugir de seu mundo interno cheio deperseguidores.

    No fiquei muito surpreso quando ele apareceu na delegacia de polcia mais prxima minhacasa. Essa era uma das poucas delegacias em que ele ainda no era um velho conhecido.

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    Minha esposa trouxe-o para casa generosamente e o manteve conosco por trs meses, trsmeses de inferno. Ele era a mais encantadora e a mais enlouquecedora das crianas, e muitavez parecia completamente louco. Felizmente sabamos o que esperar. Lidamos com aprimeira fase, dando-lhe total liberdade e um shilling sempre que ele saa'. Ele precisavaapenas telefonar para que ns fssemos apanh-lo na delegacia para onde tinha sido levado.

    Logo ocorreu a esperada mudana, e o sintoma da vadiagem transformou-se numadramatizao do assalto ao mundo interno. Isto acarretava uma trabalheira em tempointegral, e quando eu estava fora aconteciam os piores episdios.

    Era preciso interpret-lo a qualquer minuto do dia ou da noite, e muitas vezes a nica maneirade resolver a crise era encontrar a interpretao correta, como se o menino estivesse emanlise. A interpretao correta era o que ele valorizava acima de tudo.

    O ponto importante em relao a este trabalho o modo como o desenvolvimento da

    personalidade do menino provocava dio em mim, e o que eu fiz a esse respeito.Bati nele? A resposta no, nunca. Mas eu teria tido que bater nele se no soubesse tudo arespeito do meu dio, e se no o fizesse saber tambm. Nas crises eu o pegava com toda aminha fora fsica, sem raiva ou acusaes, e o colocava para fora pela porta da frente, fossequal fosse o tempo que estivesse fazendo de dia ou noite. Havia uma campainha especialque ele podia tocar, e ele sabia que se a tocasse ns o traramos para dentro e nenhumapalavra seria dita sobre o que se passou. Ele tocava a campainha, assim que o ataque manacoamainava.

    O importante que sempre que eu opunha para fora eu lhe dizia algo. Eu lhe dizia que o queele havia feito levou-me a sentir dio por ele. Isto era fcil porque era a pura verdade.

    A meu ver, essas palavras eram importantes do ponto de vista do seu progresso, mas elaseram importantes principalmente porque me permitiam tolerar a situaes em medescontrolar, sem perder a cabea e sem assassin-lo de vez em quando.

    A histria completa desse menino no pode ser contada aqui. Ele foi internado numreformatrio. Seu relacionamento profundamente enraizado conosco ficou sendo uma daspoucas coisas estveis em sua vida. Esse episdio da vida cotidiana pode servir para ilustrar otema geral do dio legtimo no presente. preciso distinguir esse fenmeno do dio que s se

    justifica num outro contexto, mas que deflagrado por algum ato de um paciente.

    Dada a grande complexidade do problema do dio e suas razes, gostaria de resgatar umdeterminado aspecto, pois acredito que ele seja especialmente importante para os analistasde pacientes psicticos. Sugiro que a me odeia o beb antes que este a odeie, e antes que elepossa saber que sua me o odeia.

    Antes de prosseguir, gostaria de mencionar uma ideia de Freud. Em Os instintos e suasvicissitudes (1915), onde apresenta tantas coisas originais e esclarecedoras sobre o dio, elediz: somos capazes de dizer sem pensar muito que o instinto 'ama' o objeto pelo qual anseia

    para fins de satisfao, mas se dissermos que o instinto 'odeia' um objeto isto nos soar muitoestranho, e assim percebemos que as atitudes de amor e dio no podem caracterizar o

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    relacionamento do instinto como objeto, mas devem ficar restritas ao _ relacionamento doego como um todo com os seus objetos... Acredito que esta uma afirmao verdadeira eimportante. Significaria isto que a personalidade deveria estar integrada antes que possamosdizer que o beb odeia? Tao cedo quanto possa ocorrer a integrao - e talvez ela aconteaantes num auge de excitao ou raiva - h um estgio teoricamente anterior no qual o quequer que o beb faa que seja capaz de machucar no feito a partir do dio. Utilizei aexpresso amor impiedoso para descrever esse estgio. Seria isto aceitvel? medida que obeb torna-se capaz de se sentir uma pessoa inteira, o termo 'dio' passa a ter sentido paradescrever certo conjunto de seus sentimentos.

    A me, no entanto, odeia o seu beb desde o incio. Acredito que Freud achava possvel que ame, em determinadas circunstncias, sentisse apenas amor por seu beb do sexo masculino.Mas disto podemos duvidar. Conhecemos o amor da me e o admiramos por ser to forte eto real. Permitam-me apresentar certos motivos pelos quais a me odeia o seu beb, mesmoque seja um menino:

    O Beb no uma concepo (mental) sua.O beb no aquele das brincadeiras da infncia, um filho do papai, ou do irmo etc.O beb no produzido magicamente.O beb um perigo para o seu corpo durante a gestao e o parto.

    O beb interfere com a sua vida privada, um obstculo para a sua ocupao anterior. Maisou menos intensamente, a me sente que o beb algo que a sua prpria me deseja, e ela oproduz para aplac-la.O beb machuca os seus mamilos mesmo quando suga, o que inicialmente implica em

    mastigao. Ele impiedoso, trata-a como lixo, uma serva sem pagamento, uma escrava.Ela tem que am-lo, com suas excrees e tudo o mais, pelo menos no incio, at que elevenha a ter dvidas sobre si prprio.

    Ele tenta machuc-la, volta e meia a morde, e tudo por amor.

    Ele se decepciona com ela. Seu amor excitado um 'amor de tigela', significando 'amorinteresseiro', de modo que ao conseguir o que queria ele a joga fora como uma casca delaranja.

    No incio o beb dita a lei. preciso protege Io de coincidncias, a vida deve fluir no ritmo dele,

    e tudo isso exige da me um contnuo e detalhado estudo.

    Por exemplo, ela no deve ficar ansiosa quando o segura etc. No incio ele no faz ideia algumado quanto ela faz por ele, do quanto ela sacrifica por ele.

    Impossvel para ele suportar principalmente o seu dio.

    Ele desconfiado, recusa a comida to boa que ela preparou e faz com que ela duvide de simesma, mas com a tia ele come tudo.

    Depois de uma manh horrvel, ela sai com ele e ele sorri para um estranho, que diz: 'No.

    uma gracinha?

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    Se ela falha com ele no incio, sabe que ele se vingar para sempre. Ele a excita, mas a frustraela no pode devor-lo nem fazer sexo com ele.

    Creio que na anlise de psicticos e nas ltimas fases da anlise de pacientes normais oanalista ir encontrar-se numa posio comparvel da me de um beb recm-nascido.

    Numa regresso profunda o paciente no tem como identificar-se como analista ou apreciar oseu ponto de vista, da mesma forma que um feto ou um beb recm-nascido incapaz desentir-simpatia pela me.

    A me deve ser capaz de tolerar o sentimento de dio contra o beb sem fazer nada a esserespeito. Ela no pode express-lo para ele. No caso de temer a sua prpria reao, ela noconseguir odiar adequadamente quando machucada, e poder cair no masoquismo, e a meuver isto que leva falsa teoria de um masoquismo natural s mulheres. O ponto maisinteressante a respeito da me a sua capacidade de ser to agredida e sentir tanto dio porseu beb sem vingar-se dele, e sua aptido para esperar por recompensas que podem vir ou

    no muito mais tarde. Quem sabe recebe alguma ajuda das canes de ninar que ela canta eque felizmente o beb no pode compreender?

    Rockabye baby on the tree topWhen the wind blows the cradle will rockWhen the bough breaks the cradle will faliDown will come baby cradle an dall

    Nana nenm no galho l em cima,

    Se o vento sopra o bero se inclina,Se o galho se parte o bero despenca,O beb cai no cho e o bero arrebenta.

    Penso na me (ou no pai) brincando com o beb. O beb adora a brincadeira, e no sabe que opai ou a me esto expressando dio com suas palavras, por vezes em termos de smbolosligados ao nascimento. No se trata de uma cano sentimental. O sentimentalismo no temutilidade para os pais, pois consiste numa negao do dio, e do ponto de vista do beb osentimentalismo na me muito prejudicial.

    No creio que uma criana humana ao desenvolver-se seja capaz de tolerar toda a extenso deseu dio num ambiente sentimental. Ela precisa de dio para poder odiar. Se isto verdade,no podemos esperar que um paciente psictico em anlise consiga tolerar o seu dio peloanalista a no ser que o analista possa odi-lo. Se tudo isto for aceito, fica para ser discutida aquesto de como interpretar o dio do analista pelo paciente. Trata-se obviamente de umproblema que implica em perigo, exigindo o mais cuidadoso timing possvel. Creio, porm, queuma anlise permanecer incompleta, enquanto mesmo em sua ltima fase no seja possvelao analista contar ao paciente o que ele, analista, fez sem que o paciente soubesse, por estarto doente nas fases iniciais. Enquanto esta interpretao no for feita, o paciente

    permanecer de algum modo na condio de uma criana-incapaz de entender o que ela deve sua me.

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    O analista deve dispor de toda a pacincia, tolerncia e confiabilidade da me devotada aobeb. Deve reconhecer que os desejos do paciente so necessidades. Deve deixar de ladoquaisquer outros interesses a fim de estar disponvel e ser pontual e objetivo. E deve parecerquerer dar o que na verdade precisa ser dado apenas em razo das necessidades do paciente.Pode ocorrer um longo perodo inicial no qual o ponto de vista do analista no poder serapreciado (mesmo inconscientemente) pelo paciente. No possvel Esperar porreconhecimento porque, na primitiva raiz do paciente que est sendo pesquisada, no existe acapacidade para a identificao como analista. E obviamente est fora do alcance do pacienteperceber que o dio do analista muitas vezes de flagrado precisamente por aquilo que opaciente faz a partir de seu modo bruto de amar. Na anlise (de pesquisa) ou no manejorotineiro de pacientes de tipo psictico, uma forte tenso imposta ao analista (psiquiatra,enfermeira psiquitrica) ,tomando importante o estudo dos modos pelos quais as ansiedadesde natureza psictica e tambm o dio so provocados nos que trabalham com pacientespsiquitricos gravemente doentes .Somente desta maneira poderemos evitar as terapias que

    se adaptam mais s necessidades do Terapeutado que s necessidades do paciente.