capítulo xi danos morais e assédio moral na relação de emprego · 881 danos morais e assédio...

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881 Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego CAPíTULO XI DANOS MORAIS E ASSÉDIO MORAL NA RELAÇÃO DE EMPREGO SUMÁRIO • 1. Generalidades – 2. Natureza da responsabilidade do empregador – 3. Conceito – 4. Ação ou omissão ofensiva – 5. Espécies de dano moral e sua prova em juízo – 6. Dano moral e mero dissabor, aborrecimento ou transtorno – 7. Indenização – 8. Casuística e jurisprudência. 8.1. Reconhecimento do dano moral na relação de emprego; 8.2. Não configuração do dano moral; 8.3. Revista pessoal; 8.4. Alegação de justa causa – 9. Assédio moral: 9.1. Previsão legal; 9.2. Conceito, denominações e características; 9.3. Espécies; 9.4. Assédio sexual; 9.5. Danos e outras consequências; 9.6. Casuística e jurisprudência – 10. Informativos do TST sobre a matéria – 11. Qua- dro sinóptico – 12. Questões 1. GENERALIDADES O dano, inclusive o de natureza moral, constitui um dos elementos integrantes do instituto da responsabilidade civil, ao lado da ação ou omissão, do nexo de cau- salidade e da culpa. O ordenamento trabalhista nacional não cuida, de forma específica, do dano moral, razão pela qual o aplicador do direito deve socorrer-se das regras con- tidas no Direito Comum, utilizando-se do permissivo contido no parágrafo único, art. 8º, da CLT, observando os princípios do Direito Laboral. Dessa forma, o que se pode comentar sobre o dano moral nas relações de traba- lho é, justamente, as peculiaridades e casuísticas observadas nesse âmbito específico das relações sociais. Em diversas passagens desta obra, relacionaram-se as questões tipicamente tra- balhistas com a possível verificação do dano moral, como, por exemplo, no que diz respeito à falsa imputação de justa causa (itens 3.12 e 3.13, Capítulo VIII, Parte I) e à prescrição (alínea “h”, item 4.8, Capítulo VIII, Parte I). Essa matéria passou a ser enfocada pelos intérpretes e aplicadores do Direito do Trabalho a partir da consolidação do entendimento de que a Justiça do Trabalho seria competente para apreciar e julgar litígios envolvendo pedido de indenização por danos morais decorrentes da execução do contrato de trabalho. Cita-se a decisão histórica do STF que reconheceu a competência da Justiça Laboral, nesse particular:

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

Capítulo XI

Danos Morais e asséDio Moral na

relação De eMpregoSUMÁRIO • 1. Generalidades – 2. Natureza da responsabilidade do empregador – 3. Conceito – 4. Ação ou omissão ofensiva – 5. Espécies de dano moral e sua prova em juízo – 6. Dano moral e mero dissabor, aborrecimento ou transtorno – 7. Indenização – 8. Casuística e jurisprudência. 8.1. Reconhecimento do dano moral na relação de emprego; 8.2. Não configuração do dano moral; 8.3. Revista pessoal; 8.4. Alegação de justa causa – 9. Assédio moral: 9.1. Previsão legal; 9.2. Conceito, denominações e características; 9.3. Espécies; 9.4. Assédio sexual; 9.5. Danos e outras consequências; 9.6. Casuística e jurisprudência – 10. Informativos do TST sobre a matéria – 11. Qua-dro sinóptico – 12. Questões

1. GeneralIdades

O dano, inclusive o de natureza moral, constitui um dos elementos integrantes do instituto da responsabilidade civil, ao lado da ação ou omissão, do nexo de cau-salidade e da culpa.

o ordenamento trabalhista nacional não cuida, de forma específica, do dano moral, razão pela qual o aplicador do direito deve socorrer-se das regras con-tidas no Direito Comum, utilizando-se do permissivo contido no parágrafo único, art. 8º, da CLT, observando os princípios do Direito Laboral.

Dessa forma, o que se pode comentar sobre o dano moral nas relações de traba-lho é, justamente, as peculiaridades e casuísticas observadas nesse âmbito específico das relações sociais.

Em diversas passagens desta obra, relacionaram-se as questões tipicamente tra-balhistas com a possível verificação do dano moral, como, por exemplo, no que diz respeito à falsa imputação de justa causa (itens 3.12 e 3.13, Capítulo VIII, Parte I) e à prescrição (alínea “h”, item 4.8, Capítulo VIII, Parte I).

Essa matéria passou a ser enfocada pelos intérpretes e aplicadores do Direito do Trabalho a partir da consolidação do entendimento de que a Justiça do Trabalho seria competente para apreciar e julgar litígios envolvendo pedido de indenização por danos morais decorrentes da execução do contrato de trabalho.

Cita-se a decisão histórica do STF que reconheceu a competência da Justiça Laboral, nesse particular:

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José Cairo Júnior

Justiça do Trabalho. Competência. Constituição. art. 114: Ação de empregado contra empregador, visando a observância das condições negociais da promessa de contratar formulada pela empresa em decorrência da relação de trabalho. 1. Compete à Justiça do Trabalho julgar demanda de servidores do Banco do Bra-sil para compelir a empresa ao cumprimento da promessa de vender-lhes, em dadas condições de preço e modo de pagamento, apartamentos que, assentindo em transferir-se para Brasília, aqui viessem a ocupar, por mais de cinco anos, permanecendo a seu serviço exclusivo e direto. 2. A determinação da competên-cia da Justiça do Trabalho não importa que dependa a solução da lide de questão de direito civil, mas sim, no caso, que a promessa de contratar, cujo alegado conteúdo é o fundamento do pedido, tenha sido feita em razão da relação de emprego, inserindo-se no contrato de trabalho.1

após a promulgação da eC nº 45/2004, essa competência passou a ser ex-plícita, conforme disposto no art. 114, VI, da Carta Maior de 1998: “Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: VI – as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho”.

Sobre a competência da Justiça do Trabalho para julgar as ações de indenização por danos morais, houve uma questão no concurso público para o cargo de Magis-trado do Trabalho do TRT 2ª:

Exemplo de questão sobre o tema

XX (MAGISTRATURA DO TRABALHO – TRT 2ª – 2009 – ADAPTADA) Julgue o item a seguir:IV. Não compete à Justiça do Trabalho julgar as ações de indenização por dano moral e material,

inclusive a decorrente de acidente de trabalho que levou o trabalhador a óbito, promovida pela viúva e seus herdeiros.

Resposta: Item errado

2. natureza da responsabIlIdade do empreGadorA responsabilidade do empregador, que por sua ação ou omissão implique dano

moral, é de natureza contratual. Isso porque as determinações legais, inclusive aquelas previstas pelo Direito Civil, mas aplicáveis à relação de trabalho, incorpo-ram-se automaticamente ao pacto laboral em forma de cláusulas contratuais.

O efeito da identificação da natureza jurídica da responsabilidade civil do em-pregador é de atribuir-lhe o ônus da prova em relação à inexistência do elemento subjetivo, mais precisamente o dolo ou a culpa.

Registre-se que a responsabilidade objetiva, inclusive a de cunho trabalhista, só é admitida nas hipóteses expressamente previstas em lei ou quando a atividade do ofensor implicar risco para os direitos de outrem, na forma preconizada pelo art. 927, parágrafo único, do Código Civil:

1. STF. Conflito de Jurisdição n. 6.959-6-DF. Rel. Min. Sepúlveda Pertence. Suscitante Juiz de Direito da 1ª Vara Cível de Brasília. Suscitado Tribunal Superior do Trabalho. DJ 22.02.91.

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art. 927. parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independente-mente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normal-mente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Em razão disso, é de extrema importância identificar a natureza jurídica da res-ponsabilidade do ofensor, se é contratual ou extracontratual, objetiva ou subjetiva.

3. ConCeIto

o dano moral corresponde ao resultado de uma ação ou omissão que im-plique, de forma necessária, ofensa a um bem não avaliável economicamente. Quando esse dano efetiva-se em decorrência do cumprimento de obrigações deri-vadas da execução e extinção do contrato de trabalho, seja pelo empregado ou pelo empregador, recebe a denominação de dano moral trabalhista, classificado como efeito indireto ou conexo do contrato de trabalho.

Os principais bens dessa natureza são: a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem, que são tutelados pela atual Carta Maior, em seu art. 5º, X, além da inco-lumidade física e psíquica da pessoa.

Verifica-se, portanto, que os efeitos indiretos ou conexos do contrato de tra-balho decorrem da necessidade que seus sujeitos têm de observarem os direitos e garantias individuais de cada um, pois antes de assumirem a posição de empregado e empregador, são pessoas detentoras de direitos inatos.

4. ação ou omIssão ofensIva

A ação ou omissão que implique dano ao patrimônio não-econômico do em-pregado pode ser efetivada tanto pelo próprio empregador quanto por seus prepos-tos, que exerçam ou não cargo de direção, desde que tenham atrelamento direto com a atividade empresarial.

Desse modo, a empresa responde, também, por omissões e atos praticados pelos seus diretores, gerentes, chefes e demais colegas de trabalho do empregado ofendido, na forma prevista pelo art. 932, III, do Código Civil: “São também responsáveis pela reparação civil: III – o empregador ou comitente, por seus em-pregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”.

O empregado, mesmo na condição de hipossuficiente e subordinado, também pode ser classificado como agente da conduta ofensiva, figurando o empregador, nessa hipótese, como ofendido.

Assim, o efeito indireto ou conexo do contrato de trabalho estabelece obriga-ções dessa natureza tanto para o empregador quanto para o empregado.

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5. espéCIes de dano moral e sua prova em juízo

O agravo aos bens de natureza ideal pode gerar o dano moral puro, representa-do pela dor subjetiva não detectável ou aferível externamente por terceiros. Por conta disso, não há como provar, materialmente, o dano moral puro, de natureza interior.

Em tais situações, o julgador deve valer-se das regras da experiência, daquilo que normalmente acontece (presunções hominis), para reconhecer a existência do dano, na forma prevista pelo art. 335 do CPC:

art. 335. Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.

A jurisprudência dominante posiciona-se nesse sentido:RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.496/2007. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – COMPROVAÇÃO – Comprovada a existência de dano e de nexo causal com a conduta ilícita praticada pelo Reclamado, o abalo moral, subjetivo e psicológico, prescinde de comprovação fática.2

Conclui-se, assim, ser equivocada a decisão interlocutória do juiz no sentido de valer-se de elementos probatórios, principalmente o testemunhal, para aferir o grau de tristeza, infelicidade, perda da autoestima ou incômodo da vítima, como se tais elementos fossem detectáveis por meio dos sentidos.

Essa espécie de prova só serviria para fixar o grau externo do dano (repercussão exterior do dano) ou para identificar a boa reputação da vítima, circunstâncias ne-cessárias apenas para efeito de fixação do valor da indenização.

Pode ocorrer, entretanto, que o dano moral puro venha acompanhado de outra espécie de dano, como o dano físico, incluindo o estético. Muito comum nos acidentes do trabalho, o dano físico consiste naquele provocado a algum órgão do corpo humano do ofendido (lesão corporal ou perturbação funcional), podendo ser constatado a “olho nu”, como a perda de um braço, por exemplo, ou por meio de exames médicos, nas hipóteses de perturbação funcional.

Nesse último caso, a prova em juízo é feita por meio de perícia médica. Já na primeira hipótese, trata-se, também, de dano estético, tendo em vista que altera a forma considerada “normal” do ser humano, modificando o padrão biológico e social de beleza.

2. TST. RR-26200-18.2004.5.05.0009. 7ª T. Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula. DEJT 02.12.2011.

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

Conclui-se, assim, que dano moral e estético não são institutos distintos. O que existe, no caso, é uma relação de gênero e espécie, ou seja, todo dano estético é um dano moral, mas nem todo dano moral é considerado dano estético.

O STJ editou a Súmula nº 387 para deixar claro o seu posicionamento quanto a possibilidade de cumulação de indenização por danos morais e danos estéticos: “É possível a acumulação das indenizações de dano estético e moral”.

Portanto, uma vez detectada a ocorrência de um dano estético, além do dano moral genérico, a indenização a ser fixada deve levar em consideração esses dois eventos, por meio de um valor global ou em valores destacados, desde que, no pri-meiro caso, a sentença deixe claro que a indenização se refere ao dano moral e ao dano estético.

Nesse sentido, a decisão a seguir transcrita:1. É possível a cumulação de indenização por danos estéticos e moral, ainda que derivados de um mesmo fato, desde que um dano e outro possam ser reconheci-dos autonomamente, ou seja, devem ser passíveis de identificação em separado. Precedentes. [...] 3. Ainda que derivada de um mesmo fato – erro médico de profissionais da rede municipal de saúde –, a amputação do braço direito do re-cém-nascido ensejou duas formas diversas de dano, o moral e o estético. O pri-meiro, correspondente à violação do direito à dignidade e à imagem da vítima, assim como ao sofrimento, à aflição e à angústia a que seus pais e irmão foram submetidos, e o segundo, decorrente da modificação da estrutura corporal do lesado, enfim, da deformidade a ele causada 3

6. dano moral e mero dIssabor, aborreCImento ou transtorno

Efetivamente, a relação de emprego constitui campo bastante fértil para a ocor-rência do dano moral, levando-se em consideração, principalmente, o estado de subordinação do empregado e o exercício do poder de direção do empregador.

Como consequência dessa constatação, deve-se estabelecer e identificar os limi-tes da atuação patronal, para que não se ofenda o princípio da dignidade humana do trabalhador, coibindo atos humilhantes e vexatórios, e, ao mesmo tempo, resguar-dando o ius variandi do patrão.

nem toda atitude empresarial mais enérgica pode ser classificada como causa de dano moral, a despeito de desagradar e aborrecer o empregado. Ges-tos e palavras de caráter organizacional, fiscalizatório ou disciplinar, que estejam dentro dos limites da razoabilidade, são considerados como mero dissabor,

3. STJ. REsp. 910794 / RJ. 1ª T. Rel. Min. Denise Arruda. DJU 04.12.2008.

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aborrecimento ou transtorno, que, apesar de atingir em grau leve o patrimônio ideal do empregado, não representa uma ofensa indenizável.

Seguem alguns exemplos fornecidos pela jurisprudência:DANO MORAL. INDEVIDO. Mero dissabor, aborrecimento, desconforto emocional e mágoa, extrapolam o conceito de dano moral, não configurando lesão a direito personalíssimo a autorizar a compensação indenizatória.4

Dano moral. Indenização. Não cabimento. O dano moral não decorre de qual-quer dissabor, de qualquer contrariedade ou adversidade. Exige, ao contrário, grave e clara agressão ao patrimônio moral. Hipótese em que a recorrente refere situações que fazem parte da vida de qualquer um. Dificuldades, aborrecimen-tos, angústias e tropeços, tudo isso é da própria condição humana e de quem vive em sociedade. Recurso do autor a que se nega provimento.5

No mesmo sentido, o inadimplemento do empregador, no que diz respeito às verbas tipicamente trabalhista (salário, 13º salário, FGTS etc.), não gera, por si só, dano moral. aceitar tese contrária implicaria banalizar a aplicação desse importante instituto, visto que, em qualquer situação, o dano material viria acompanhado de dano moral.

É necessário, pois, fixar limites, sob pena de admitir-se que toda violação de direitos ou interesses, de natureza contratual ou não, teria cunho de ofensa moral, circunstância que tornaria a indenização respectiva um mero acessório da indeniza-ção por danos materiais.

Por isso, o inadimplemento contratual deve vir acompanhado de uma ação ou omissão, que caracterizaria o plus ofensivo, necessário para a constatação de uma ofensa moral indenizável.

A classificação do dano moral em mero dissabor equivale à adoção do princípio da insignificância ou da bagatela do Direito Penal no Direito do Trabalho, o que exi-ge o exame de cada caso para verificação ou não da gravidade da conduta ofensiva.

Registre-se, por fim, que determinadas condutas do empregador podem ser consideradas como antijurídicas sem que sejam classificadas como produtoras de dano moral indenizável. A responsabilidade civil, seja contratual ou extracontratual, exige o dano como elemento para sua configuração, o que não ocorre, necessaria-mente, com as ações antijurídicas, que prescindem do dano ou prejuízo para serem assim consideradas.

Quando, por exemplo, o empregador deixa de registrar a jornada de trabalho dos seus empregados em sistema manual, mecânico ou eletrônico, apesar de possuir

4. TRT 7ª R. 0063100-4720075070006. 1ª. T. Rel. Juiz Emmanuel Teófilo Furtado. DEJT 28.11.2011.5. TRT 2ª R. RO 01832-2008-061-02-00-8. 11ª T. Rel. de Azevedo Silva. DOESP 07.07.2010.

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mais de 10 trabalhadores no estabelecimento, pratica ato antijurídico, mas não pode ser condenado a pagar uma indenização aos empregados em razão dessa omissão. Nesse caso, a sanção é, exclusivamente, de ordem administrativa.

7. IndenIzação

A indenização por danos materiais tem o objetivo de recompor o patrimônio econômico do ofendido, tendo como parâmetro a diferença monetária entre o esta-do atual e aquele existente antes da ofensa (dano emergente) ou aquilo que deixou de ingressar no patrimônio econômico da vítima, por conta da ação ou omissão do ofensor (lucro cessante).

Já a indenização por danos morais tem dupla finalidade: pedagógica e com-pensatória. No primeiro caso, a condenação do ofensor funciona como punição, objetivando evitar que ações idênticas ou semelhantes não mais se repitam. Já o caráter compensatório da indenização tem o escopo de propiciar conforto e alegria ao ofendido, como forma de contrabalançar a tristeza e o desconforto sofrido em decorrência da ação lesiva.

Diante da conhecida dificuldade para se fixar o valor da indenização por danos morais, considerando, principalmente, a natureza não econômica do bem viola-do, o juiz deve utilizar o seu prudente arbítrio, observando os seguintes critérios: a razoabilidade, a proporcionalidade, a extensão do dano, o grau da culpa, e a capacidade financeira do ofensor e do ofendido, de forma que não seja irrisório nem importe enriquecimento ilícito da vítima.

Em se tratando de dano moral na relação de emprego, a indenização pode ser fixada em quantidade de salários do obreiro e não, necessariamente, em número de salários mínimos, como comumente se observa nos casos apreciados pela Justiça Ordinária.

Ainda que seja fixada em salários mínimos, a condenação deve ser convertida ao valor em moeda corrente à época da decisão, aplicando-se a partir de então os índices de correção monetária. Tal procedimento é necessário para não afrontar o princípio constitucional da desvinculação do salário-mínimo para efeito de atualiza-ção, como vem decidindo o STF reiteradamente.

Considerando que, não raro, as ofensas morais perpetradas pelo empregador possuem caráter de continuidade, o tempo de serviço, a depender do caso concre-to, pode servir como elemento para definir o valor da consequente indenização.

Como a apreciação valorativa do juiz efetiva-se no momento da condenação, por meio da sentença, a atualização monetária do valor respectivo deve levar em consideração esse momento e não aquele concernente à data em que o dano efetivamente ocorreu.

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Nesse sentido é o entendimento do STJ, explicitado por meio da Súmula 362: “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”.

O TST adotou posição intermediária em relação a essa questão, por meio da Súmula nº 439:

súmula no 439 do tst. DANOS MORAIS. JUROS DE MORA E ATUA-LIZAÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL - Res. 185/2012, DEJT divul-gado em 25, 26 e27.09.2012 Nas condenações por dano moral, a atualização monetária é devida a partir da data da decisão de arbitramento ou de alteração do valor. Os juros incidem desde o ajuizamento da ação, nos termos do art. 883 da CLT.

Diante do seu caráter nitidamente indenizatório e por expressa disposição legal contida no Decreto 3.000/99, art. 39, XVII, os valores recebidos a título de inde-nização por danos morais por acidente do trabalho não sofrem a incidência do imposto de renda.

Esse é o posicionamento dominante na doutrina e na jurisprudência:Não incide imposto de renda sobre o valor da indenização pago a terceiro. Essa ausência de incidência não depende da natureza do dano a ser reparado. Qual-quer espécie de dano (material, moral puro ou impuro, por ato legal ou ilegal) indenizado, o valor concretizado como ressarcimento está livre da incidência de imposto de renda. A prática do dano em si não é fato gerador do imposto de renda por não ser renda. O pagamento da indenização também não é renda, não sendo, portanto, fato gerador desse imposto. (...) Configurado esse panora-ma, tenho que aplicar o princípio de que a base de cálculo do imposto de renda (ou de qualquer outro imposto) só pode ser fixada por via de lei oriunda do poder competente. É o comando do art. 127, IV, do CTN. Se a lei não insere a “indenização”, qualquer que seja o seu tipo, como renda tributável, inocor-rendo, portanto, fato gerador e base de cálculo, não pode o fisco exigir imposto sobre essa situação fática. (...) Atente-se para a necessidade de, em homenagem ao princípio da legalidade, afastar-se as pretensões do fisco em alargar o campo da incidência do imposto de renda sobre fatos estranhos à vontade do legisla-dor” (“Regime Tributário das Indenizações”, Coordenado por Hugo de Brito Machado, Ed. Dialética, pg. 174/176).6

As questões relativas à prescrição em ações envolvendo pedido de indenização por danos morais na relação de emprego já foram analisadas no item 4.8, “h”, capí-tulo VIII, desta obra.

A seguir, o resumo com as principais características da indenização por danos morais:

6. STJ. Recurso Repetitivo PARADIGMA RESP 1.152.764 – CE (2009/0150409-1). Rel. Min. Luiz Fux. DEJT de 01.07.2010.

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

PRIncIPAIS cARAcTeRíSTIcAS DA InDenIzAçãO

POR DAnOS MORAIS:

• natureza jurídica �

• Pedagógica: funciona como punição do ofensor, com o objetivo de evitar a repetição da ação ou omissão danosa

• compensatória: visa proporcionar conforto e alegria ao ofendido para compensar uma tristeza sofrida em decor-rência da ação lesiva

• critérios para

fixação �

• Razoabilidade• Proporcionalidade• Extensãododano• Graudaculpa• Capacidadefinanceiradoofensor• Capacidadefinanceiradoofendido

Na tabela abaixo é possível ter uma ideia dos valores atribuídos aos procedimen-tos considerados como antijurídicos pelo TST e o valor da respectiva indenização:

Ato antijurídico número do processo Valor

Anotação de ação trabalhista em CTPS 00480-35.2010.5.24.0001 R$2.000,00

Divulgação de ofensas à imagem de empregado despedido na imprensa, sem

nominar a pessoa623081-76.2000.5.17.0008 R$3.000,00

Queimaduras de 1º grau por condições inseguras 116000-33.2008.5.12.0038 R$4.000,00

Atraso salarial de três meses 32400-09.2009.5.09.0094 R$5.000,00Transporte de valores por empregado sem

qualificação de vigilante 61600-71.2009.5.09.0053 R$10.000,00

Problemas na coluna provocada por que-da em serviço 0062600-68 2006.5.04.0662 R$30.000,00

Lide simulada (Dano moral coletivo) 12400-59.2006.5.24.0061 R$50.000,00Problemas na coluna provocada por que-

da em serviço 0134400-52.2005.5.04.0611 R$50.000,00

Problemas na coluna provocada por que-da em serviço 0014500-52.2009.5.04.0541 R$50.000,00

Assaltos sucessivos (08) à empresa de ônibus, provocando distúrbios mentais 1191740-19.2007.5.11.0013 R$50.000,00

Discriminação por idade 313800-84.2000.5.02.0052 R$100.000,00Maus tratos e humilhação, como vestir

fraldão, fazer flexões etc 99500-47.2007.5.04.0005 R$100.000,00

Amputação completa do braço 030614-20. 2002.5.02.0262 500 S.M

8. CasuístICa e jurIsprudênCIa

Procedendo-se a uma rápida pesquisa jurisprudencial, observa-se maior índice de declaração de ofensa à moral do empregado nas hipóteses de: atrasos salariais

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constantes,7 acidente do trabalho típico e doença ocupacional; revista íntima; pro-cedimentos discriminatórios, principalmente no ato da admissão e despedida do obreiro por questões de raça, credo, cor, opção sexual etc.; trabalho escravo; impu-tação falsa de pratica de atos de improbidade; humilhações, em face do não cumpri-mento de metas; assédio moral e sexual; rebaixamento; limitação às necessidades fi-siológicas do empregado; filmagens clandestinas; anotações desabonadoras na CPTS do empregado; uso indevido de imagem; inclusão do nome do empregado em listas negras; transporte de valores etc.

8.1. reconhecimento do dano moral na relação de emprego

A seguir, transcrevem-se diversas decisões nas quais o dano moral no âmbito da relação de emprego restou reconhecido pelos Tribunais trabalhistas:

DANO MORAL. ATRASO NOS SALÁRIOS. CONFIGURAÇÃO. Con-forme disponibilizado no v. acórdão recorrido, a Reclamada, sem motivo, reiteradamente atrasava o pagamento dos salários do Reclamante. Resta ca-racterizada, pois, a culpa do empregador. O dano, evidentemente, ocorreu, na medida em que o Reclamante, tendo como único meio de subsistência o salário, que não lhe foi pago no momento próprio, certamente não possuía recurso para saldar dívidas e compromissos financeiros assumidos em face da necessidade premente de sobreviver e na certeza de que, vencido o mês, rece-beria seu salário. Ora, quando o Exmo. Juiz Relator, no e. Tribunal Regional, diz que a mora da reclamada causou problemas ao autor, o julgador está se valendo de uma presunção geral, plenamente aceitável, porque ocorre na vida de um trabalhador que, ao final do mês, não tem dinheiro para saldar seus compromissos, para comprar seus alimentos, especialmente nos meses mais cruciais do ano, que são dezembro e janeiro. Recurso de Revista conhecido e não provido.

DANO MORAL. VALOR DA INDENIZAÇÃO – O valor fixado a título de dano moral deve levar em conta duas finalidades: punir o infrator e compen-sar a vítima, e valor razoável, o suficiente para que se reprima o ato lesivo, sem ser um valor irrisório ou que propicie o enriquecimento sem causa. Assim, a indenização no quantum estipulado – R$ 10.000,00 (dez mil reais) – mostra-se consentânea com os fatos indicados nos autos.8

DANO MORAL – CONFINAMENTO DE TRABALHADOR ACI-DENTADO E SEQUELADO EM SALA DE VIDRO APELIDADA DE ‘GAIOLA DAS LOUÇAS’ E ‘CEMITÉRIO’ – Aguardo, por prazo indefini-do, de recolocação em posto de trabalho compatível. Situação vexatória que desencadeou chacotas e zombarias. Rotulação depreciativa dos trabalhadores acidentados, mantidos afastados dos demais, sem qualquer atividade, de ‘se-qüelados’, ‘gardenal’, ‘rivotril’, ‘vagabundos’, ‘zero à esquerda’, etc. A conduta

7. Em relação ao atraso no pagamento de salários como elemento provocador do dano moral, a jurispru-dência do TST ainda é vacilante.

8. TST. RR-22900-85.2008.5.09.0562.3ª T. Rel. Min. Horário Sena Pires. DEJT 24.06.2011.

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

patronal de manter todos os trabalhadores acidentados, com recomendação médica de readaptação, isolados em sala especial, com proibição de saída e aplicação de punição de suspensão, configura tratamento desumano, humi-lhante, insultuoso, e portanto, ofensiva à dignidade humana. Inconteste o dano moral e a responsabilidade do empregador. Inteligência dos artigos. 1º, III, 5º, caput e inciso X da CF.9

DANO MORAL – SUBMISSÃO DE EMPREGADO AO TESTE DO PO-LÍGRAFO – Configuração de violação da intimidade, da honra e da vida privada com perguntas sobre opção sexual, uso de drogas, prática de crimes e problemas com dependência alcoólica na família. Ofensa à imagem da pessoa com posteriores comentários em reuniões sobre o resultado desses exames. Caracterização de prática abusiva, gerando lesão ao ofendido passível de repa-ração pela via indenizatória. Recurso provido.10

DANO MORAL – USO COMERCIAL E NÃO AUTORIZADO DA IMA-GEM DO EMPREGADO – PROCEDÊNCIA – Nos termos do art. 5º, X, da CF e do art. 20 do CC, o uso comercial e não autorizado da imagem do empregado deve ser indenizado. O uso da imagem não se insere nas ativida-des normais do trabalhador, fugindo à regra do art. 456 da CLT. Além disso, não é exigível do empregado que se oponha ao fato no curso do contrato de trabalho, uma vez que tal atitude poderia inviabilizar sua permanência no emprego. Recurso do reclamante provido.11

DANO MORAL – SUPOSTA OPÇÃO SEXUAL – DISCRIMINAÇÃO – DISPENSA INDIRETA – ATO LESIVO DA HONRA E BOA FAMA – CABIMENTO – Enseja indenização por dano moral, de responsabilidade da empresa, atos reiterados de chefe que, no ambiente de trabalho, ridiculariza subordinado, chamando pejorativamente de ‘gay’ e ‘veado’, por suposta op-ção sexual. Aliás, é odiosa a discriminação por orientação sexual, mormente no local de labor. O tratamento dispensado com requintes de discriminação, humilhação e desprezo à pessoa do reclamante afeta a sua imagem, o íntimo, o moral, dá azo à reparação por dano moral, além de configurar a dispensa in-direta por ato lesivo da honra e boa fama do trabalhador, eis que esses valores estão ao abrigo da legislação constitucional e trabalhista (arts. 3º, IV, e 5º, X, da CF; art. 483, e, da CLT).12

DISCRIMINAÇÃO – ÔNUS DA PROVA – DANO MORAL – Demons-trada a contradição de teses de forma a evidenciar a tentativa de encobrir o verdadeiro motivo da dispensa e, tendo o autor comprovado o tratamento discriminatório a que fora submetido ao comunicar a empresa ser portador de hanseníase, que culminou com a sua dispensa imotivada quando necessitava do próprio salário para medicar-se, vulnera, a reclamada, além do princípio

9. TRT 2ª R. RO 02098-2004-465-02-00. 6ª T. Relª Juíza Ivani Contini Bramante. DOESP 06.10.2006.10. TRT 2ª R. RO 01262-2002-316-02-00. 6ª T. Rel. p/o Ac. Juiz Rafael E. Pugliese Ribeiro. DOESP 13.01.2006.11. TRT 15ª R. RO 2436-2004-082-15-00-4. 7ªC. Rel. Juiz Manuel Soares Ferreira Carradita DOESP

24.11.2006. p. 48.12. TRT 15ª R. RO 00872-2005-015-15-00-8. 6ª T. Rel. Juiz Edison dos Santos Pelegrini. DJ 07.04.2006.

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da igualdade (artigo 5º, caput, da CF), os princípios constitucionais da digni-dade da pessoa humana (artigo 1º, inciso I, da CF), valorização do trabalho humano (artigos 1º, inciso IV, c/c artigo 170, caput, da CF) e função social da empresa (artigo 170, inciso III, da CF c/c artigo 47 da Lei nº 11.101/2005). O dano moral é flagrante, daí decorrendo o direito à indenização, na forma do inciso X do artigo 5º da CF. Recurso ordinário a que se dá provimento.13

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – COMUNICAÇÃO DE FATO CRIMINOSO – O empregador lesado por atitudes desonestas do seu emprega-do, não comete ofensa alguma à honra deste ao comunicar os fatos criminosos à autoridade policial. O instituto do dano moral, já tão banalizado, não encontra guarida no caso em comento. Provimento negado, por unanimidade.14

DANO MORAL – DISCRIMINAÇÃO RACIAL – A discriminação é extre-mamente perversa e deve ser coibida. O fato de ignorarmos a discriminação racial, sabendo que ela existe, é inadmissível. O direito, aliás, tem mesmo este papel de corrigir as nossas deficiências, coagindo-nos a atuar de modo diverso, no sentido do ideal, e o ideal neste tema é respeitar a condição humana ou, em outras palavras, não-discriminar. O artigo 3º da Constituição Federal, em seu inciso IV, estabelece como um dos objetivos fundamentais da República: “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. “ Portanto, a prática de referir-se aos empregados utilizando-se de termos, tais como, “negrinho”, “pretinho”, evi-denciam a discriminação racial, sendo devida a reparação por danos morais.15

VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. O Tribunal Re-gional consignou que o reclamante teve sua honra maculada perante toda a comunidade acadêmica, por ato da reclamada, porquanto esta, ilicitamente, anotou na CTPS do autor data de saída anterior ao seu efetivo desligamen-to. Esta 7ª Turma Julgadora estabeleceu os parâmetros a observar na fixação do valor da indenização: extensão do dano, o comprometimento no plano da projeção patrimonial e do alcance moral (em conjunto), além “do alerta pedagógico” à empresa, para maior cautela na condução de suas atividades. Assim, quanto ao valor da indenização, a decisão regional, ao majorá-lo para R$ 125.000,00, violou o artigo 944 do Código Civil, que vincula a indeni-zação à extensão do dano. Não houve a perfeita observância de tal preceito. Recurso de revista de que se conhece parcialmente e a que se dá provimento.16

ATO DISCRIMINATÓRIO – DANO MORAL – Demonstrado nos autos que a reclamada mantinha a lista “PIS-MEL”, onde eram incluídos nomes não apenas de trabalhadores que haviam ajuizado reclamação trabalhista, mas também daqueles que, com base em critérios subjetivos (como ato de mera insubordinação), contavam com algum dado “negativo”. Evidenciado que a lista era repassada ao menos para as empresas do grupo econômico e para

13. TRT 23ª R. RO 00611.2005.022.23.00. Cuiabá. Rel. Juiz Paulo Brescovici. DJ 18.01.2006.14. TRT 24ª R. RO 01855/2005-002-24-00-2 – Rel. Juiz Marcio Vasques Thibau de Almeida. DJ 31.07.2006.15. TRT 9ª R. Proc. 00804-2004-019-09-00-6. Rel. Juiz Arnor Lima Neto. DJ 12.07.2005.16. TST. RR 1658/2004-063-01-00.8. 7ª T. Rel. Min. Pedro Paulo Manus DEJT 25.11.2011.

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aquelas que lá constavam como empregadoras, bem como que era consultada para admissão de empregados. Além de a existência de listagem dificultar o acesso ao mercado de trabalho, empresta falso caráter desabonador à pessoa cujo nome nela está incluído, o que fere a dignidade e a imagem do traba-lhador, expressamente asseguradas na Constituição da República (artigo 1º, inciso III, e artigo 5º, inciso X), atraindo a incidência do artigo 186, do atual CCB. A conduta das reclamadas configurou ato de discriminação, na forma do artigo 1º, item 1, letra “b”, da Convenção nº 111 da OIT, promulgada no Brasil pelo Decreto nº 62.150/68.17

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – ESTABELECIMENTO BAN-CÁRIO – TRANSPORTE DE DOCUMENTOS COM EXPRESSÃO MONETÁRIA – APLICAÇÃO DA TEORIA PUNITIVE DAMAGES OU EXEMPLARY DAMAGE – INOBSERVÂNCIA DAS DISPOSIÇÕES DA LEI Nº 7.102/1983 – O transporte de valores e documentos com expressão econômica exige a observância de critérios objetivos traçados pela legislação infraconstitucional, de forma que o exercício de tais atividades por emprega-do não habilitado revela a ocorrência da figura jurídica conhecida por mob-bing, expondo-o a risco potencial e constante, devendo a fixação do quantum observar, além do dano em si considerado e a capacidade econômica da insti-tuição financeira, a teoria do punitive damages ou exemplary damage, de forma a servir a sua imposição em exemplo para a não-reincidência pelo causador do dano e também para prevenir a ocorrência de futuros casos de lesão.18

ABANDONO DE EMPREGO. PUBLICAÇÃO DE AVISO EM JORNAL. IMPROPRIEDADE. DANO MORAL. Não há previsão, muito menos exi-gência legal de publicação de edital com o nome do empregado, convocan-do-o para retornar ao serviço, sob pena de caracterização de abandono de emprego. Referida publicação, ainda que se tenha tornado uma praxe (e o erro comum não faz o direito), remete ao conhecimento público o que deveria per-manecer na esfera privada das partes contratantes e macula a honorabilidade profissional do trabalhador, que passa a ser visto como irresponsável, imaturo e inconfiável. A notificação para retorno deve ser feita por via postal, cartório de títulos e documentos, pessoalmente ou mesmo judicialmente, caso assim o prefira o empregador, nunca de forma pública (edital).19

8.2. não configuração do dano moral

Determinados atos praticados pelos empregadores, como proibição do uso de barba, limitação do uso do banheiro, atrasos nos salários20 etc., não foram reconhe-cidos como capazes de produzir dano ao patrimônio não econômico do empregado, como se pode conferir das seguintes decisões:

17. TRT 9ª R. Proc. 00213-2004-091-09-00-6. Relª Juíza Eneida Cornel. DJ 15.07.200518. TRT 23ª R. Proc. 00110.2007.009.23.00.8. 1ª T. Rel. Juiz Paulo Brescovici. DJ 28.11.2007.19. TRT. 12ª R. RO 00853-2009-033-12-00– 3. Rel. Juiz José Ernesto Manzi. DJ 17.03.2010.20. Em relação ao atraso no pagamento de salários como elemento provocador do dano moral, a jurispru-

dência do TST ainda é vacilante.

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DANO MORAL NÃO CONFIGURAÇÃO – CONTROLE DE USO DO TOALETE FINALIDADE DE IMPEDIR A SAÍDA DE VÁRIOS OBREI-ROS DOS POSTOS DE TRABALHO AO MESMO TEMPO. 2. Na hipóte-se dos autos, em que se discute a ocorrência de dano moral, o Regional assentou que a simples limitação das saídas de todos os obreiros de seus postos de traba-lho até mesmo para ir ao banheiro, a fim de impedir que um grande número de operadores o fizessem ao mesmo tempo, não configura situação vexatória capaz de justificar a vindicação de indenização por dano moral. Recurso de revista não conhecido.21

RECURSO DE REVISTA – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – ATRASO NO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS – Incabível o deferimento da indenização por danos morais apenas pelo fato do atraso no pagamento dos salários, porquanto do acórdão regional não se verifica a ocorrência de nenhu-ma situação objetiva que demonstre a ocorrência de constrangimento pessoal, da qual pudesse se extrair a hipótese de abalo dos valores inerentes à honra do reclamante, em especial, porque o próprio Regional acentua que não há prova de que o reclamante tenha sofrido os prejuízos materiais alegados. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido.22

“DANO MORAL COLETIVO – NORMA EMPRESARIAL – PROIBIÇÃO DE BARBA E CABELOS GRANDES – NÃO CONFIGURAÇÃO – A con-duta expressa na edição da referida norma empresarial pela qual se limita o uso de barba grande é medida adequada, necessária e proporcional à regular disciplina no desempenho da atividade de segurança e transporte de valores. Tal conduta, portanto, não expressa poder concreto de violação ao núcleo essencial da dignidade do trabalhador. De tal sorte não comporta ilicitude capaz de justi-ficar a condenação ao pagamento de danos morais coletivos. Não conhecido.”23

8.3. revista pessoal

A revista íntima ou pessoal dos empregados, quando da saída dos estabeleci-mentos nos quais prestam serviços, é utilizada por algumas empresas para diminuir a quantidade de furtos de mercadorias de sua propriedade.

Essa questão tem sido bastante debatida nos Tribunais trabalhistas, que ainda não chegaram a um consenso sobre a legalidade dessa prática, quando limitada à revista de pertences dos empregados, denominada de revista pessoal.

Já a revista íntima, não no seu conceito jurídico, mas significando o procedi-mento por meio do qual o empregado mostra partes pudendas do seu corpo (geral-mente aquelas encobertas por peças íntimas) ou quando é apalpado por seguranças ou similares, vêm sendo considerada ilícita e causadora de danos morais ao traba-lhador.

21. TST. RR 1.369/2007-010-18-00.3. 7ª T. Rel. Min. Mª Doralice Novaes. DEJT 16.10.2009.22. TST. RR 299/2007-662-04-00.0. Relª Minª Dora Maria da Costa. DEJT 26.11.2010.23. TST. RR 115700-62.2004.5.05.0020. 5ª T. Rel. Min. Emmanoel Pereira. DEJT 30.03.2010.

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Todavia, mesmo na sua forma mais branda, quando o empregador inspeciona pertences do empregado, como bolsas, mochilas, sacolas etc., o procedimento da re-vista não viola apenas o direito à intimidade (no seu conceito jurídico, resguardado pela CF/88, art. 5º, inciso X e pelo art. 373-A, VI, da CLT), mas também a honra do trabalhador.

Contudo, constitui procedimento antijurídico a revista com a intenção de en-contrar objetos possivelmente furtados. O trabalhador sente-se ultrajado em sua honra quando o empregador desconfia da sua probidade.

A prática da revista íntima implica desconsideração de elemento fundamental na composição da relação empregatícia, qual seja, a fidúcia. Não há como admitir que o empregador, diariamente, utilize o referido procedimento em debate, sem desconsiderar a existência da confiança que permeia o contrato laboral. E no caso concreto, a relação derivada do aludido contrato só não se rompeu pela ausência da fidúcia em função da extrema necessidade econômica do hipossuficiente que tinha no salário a sua única ou principal fonte de renda própria e para a sua família.

A jurisprudência, no âmbito da Justiça Comum, é majoritária no sentido de reconhecer como antijurídico o ato de revista feito pelas empresas em seus consumi-dores, condenando-as no pagamento de indenização por danos morais.

Tal entendimento deve ser aplicado com muito mais rigor nas relações de em-prego, visto que a empresa pode adotar métodos quando da escolha de seus em-pregados, rejeitando aqueles trabalhadores que não merecem confiança, o que não pode ser feito na relação de consumo, que é formada mesmo contra a vontade do empresário.

Apesar do direito de propriedade também ser resguardado pela atual Carta da República, tem natureza jurídica de direito disponível. Aplicando-se o princípio da ponderação, deve prevalecer, em primeiro lugar, no caso concreto, o princípio da dignidade da pessoa humana.

O TST ainda não consolidou a sua jurisprudência. Há decisões que consideram lícito o procedimento da revista em bolsas e sacolas, sob o argumento de que cons-titui exercício legal do poder diretivo do empregador:

RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RE-VISTA EM BOLSAS E SACOLAS. A mera revista visual nos pertences do empregado, como bolsas e sacolas, não configura, por si só, ofensa à sua moral/intimidade, constituindo, na realidade, exercício regular do direito do empre-gador, inerente ao seu poder de direção e fiscalização. Sendo essa a hipótese dos autos, o recurso encontra óbice na Súmula nº 126 do TST e no artigo 896, § 4º, da CLT. 24

24. TST. RR 400400-83.2009.5.12.0030. 8ª T. Rel. Min. Dora Maria da Costa. DEJT 10.02.2012.

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Já outros acordãos adotam entendimento oposto, afastando a licitude de qual-quer espécie de revista:

RECURSO DE REVISTA. REVISTA DE BOLSAS. HIPÓTESE EM QUE HAVIA FORNECIMENTO DE ARMÁRIOS NA ENTRADA DA EMPRE-SA PARA GUARDA DE PERTENCES. POSSIBILIDADE DE OS EMPRE-GADOS EVITAREM A REVISTA. RAZOABILIDADE. DANO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. Não se olvida que o poder empregatício engloba o poder fiscalizatório (ou poder de controle), entendido este como o conjunto de prerrogativas dirigidas a propiciar o acompanhamento contínuo da presta-ção de trabalho e a própria vigilância efetivada ao longo do espaço empresarial interno. Medidas como o controle de portaria, as revistas, o circuito interno de televisão, o controle de horário e frequência e outras providências correlatas são manifestações do poder de controle. Por outro lado, tal poder empresarial não é dotado de caráter absoluto, na medida em que há em nosso ordenamento ju-rídico uma série de princípios limitadores da atuação do controle empregatício. Nesse sentido, é inquestionável que a Carta Magna de 1988 rejeitou condutas fiscalizatórias que agridam a liberdade e dignidade básicas da pessoa física do trabalhador, que se chocam, frontalmente, com os princípios constitucionais tendentes a assegurar um Estado Democrático de Direito e outras regras impo-sitivas inseridas na Constituição, tais como a da – inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade – (art. 5º, caput), a de que – ninguém será submetido (...) a tratamento desumano e degradante – (art. 5º, III) e a regra geral que declara – invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem da pessoa, assegurado o direito à indenização pelo ano material ou moral decorrente de sua violação – (art. 5º, X). Todas essas regras criam uma fronteira inegável ao exercício das funções fiscalizatórias no contexto empregatício, colocando na franca ilegalidade medidas que venham cercear a liberdade e dignidade do trabalhador. Há, mesmo na lei, proibição de revistas íntimas a trabalhadoras – regra que, evidentemente, no que for equânime, tam-bém se estende aos empregados, por força do art. 5º, caput e I, CF/88 (Art. 373-A, VII, CLT). Nesse contexto, e sob uma interpretação sistemática e razoável dos preceitos legais e constitucionais aplicáveis à hipótese, este Relator entende que a revista diária em bolsas e sacolas, por se tratar de exposição contínua da empregada a situação constrangedora no ambiente de trabalho, que limita sua liberdade e agride sua imagem, caracterizaria, por si só, a extrapolação daqueles limites impostos ao poder fiscalizatório empresarial, mormente quando o em-pregador possui outras formas de, no caso concreto, proteger seu patrimônio contra possíveis violações. Contudo, na hipótese, o eg. TRT deixou consignado que a Reclamada fornecia armários na entrada da empresa para os empregados que optassem por não ser revistados, ou seja, havia a possibilidade de os empre-gados evitarem as revistas. Ressalte-se ter sido também assentado pelo Regional que as revistas se justificavam pelo fato de a Reclamada dispor de informações privilegiadas e de questões afetas à segurança industrial, pelo fato de produzir equipamentos aeronáuticos para a indústria civil e militar. Assim, em face das particularidades do caso concreto, conclui-se que as revistas realizadas não po-dem ser consideradas abusivas ou arbitrárias.25

25. TST. RR-56300-58.2007.5.15.0045. 6ª. T. Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado. DEJT 30.09.2011.

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

Por fim, admite-se a realização de revistas nos empregados, excepcionalmente com o objetivo de encontrar armas ou aparelhos que possam provocar danos à inte-gridade física e psíquica de outras pessoas, pois nesse caso prevalece a necessidade de resguardar a segurança coletiva.

8.4. alegação de justa causa

O contrato de trabalho pode ser extinto por iniciativa do empregado, do em-pregador ou, em casos excepcionais, pelo decurso do tempo, nos casos em que a lei permite a celebração de contrato por prazo determinado. Cada uma dessas formas de extinção produz efeitos financeiros diversos, sendo a despedida sem justa causa a mais vantajosa para o empregado.

A justa causa nada mais é do que um motivo que autoriza o empregador finali-zar o contrato de trabalho sem qualquer ônus financeiro. Por esse motivo, exigem-se alguns requisitos para a sua aceitação em juízo, como a previsão específica no art. 482 da CLT, a gravidade da falta cometida pelo empregado, bem como a certeza da materialidade do fato e de sua autoria, questões que já foram analisadas no item 3.11, capítulo VII desta obra.

Dentre as causas previstas pelo legislador, a mais comum que se observa no dia a dia das demandas judiciais trabalhistas é a acusação de ato de improbidade, ou seja, da prática de algum ato por parte do empregado que revele seu caráter desonesto, notadamente aqueles relacionados com o patrimônio da empresa.

Não é raro observar alegações de furto de mercadorias como justificadores da despedida do trabalhador, sem que a empresa tenha se preparado para fazer a prova de que tal fato tenha ocorrido e de que tenha sido confirmada a autoria desse ato ilícito.

A garantia do contraditório e da ampla defesa deve ser aplicada não só nas relações existentes entre o cidadão e o Estado, mas também em algumas relações privadas, dentre elas à relação de emprego, caracterizada pela subordinação.

Sendo assim, antes de despedir por justa causa o empregador deve informar ao trabalhador que ele está sendo acusado de ter praticado um ato ilícito e conferir-lhe o exercício do direito de defesa. Somente depois dessa formalidade a empresa poderá concluir o processo de rompimento do vínculo trabalhista.

Como se trata de fato criminoso, a imputação infundada de sua autoria, ao empregado, macula a sua honra e dignidade. Portanto, caso não haja a prova da au-toria e da materialidade do ilícito em juízo, o trabalhador pode ingressar com outra ação pedindo a condenação do empregador no pagamento de uma indenização por danos morais.

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A jurirprudência dominante posiciona-se nesse sentido:DESPEDIDA POR JUSTA CAUSA. IMPROBIDADE AFASTADA POR DECISÃO JUDICIAL. DANO MORAL CONFIGURADO. Se não havia prova robusta, o empregador não poderia atribuir ao empregado ato desabona-dor à sua reputação pessoal e profissional, qual seja, improbidade. Da injusta imputação é lícito inferir que tenham decorrido para o empregado danos como o comprometimento da auto-estima, com sentimentos íntimos de vexame e constrangimento perante a sociedade, mais diretamente perante amigos e até mesmo familiares. No caso, a existência de prejuízos, autorizadora da percepção de indenização, advém de dois pressupostos doutrinariamente assentados, quais sejam: a) o prejuízo moral, em si mesmo, fica evidenciado com o seu próprio motivo, não estando, assim, sujeito a encargo probatório; b) pela teoria do refle-xo que distingue o dano moral do patrimonial –, segundo a qual o que se toma por base não é o ato lesivo em si, mas as ressonâncias que se operam na esfera jurídica da pessoa atingida. Neste caso sob análise, as repercussões do dano nos âmbitos familiar e social do autor são facilmente presumíveis. Recurso de revista conhecido e provido.26

Os reflexos processuais da alegação de prática de justa causa devem ser analisa-dos com bastante cuidado. Com efeito, em determinadas situações o empregador depara-se com dificuldades involuntárias para se desincumbir do encargo probatório que lhe cabe e sucumbe na sua pretensão deduzida em juízo.

Portanto, na demanda em que o trabalhador pretende a condenação do empre-gador no pagamento de uma indenização por danos morais, deve ser investigado o motivo utilizado para não reconhecer, por sentença, a justa causa:

DANO MORAL – JUSTA CAUSA NÃO RECONHECIDA POR INSUFI-CIÊNCIA DE PROVAS – INDEFERIMENTO – 1. O fato de o empregador ter rompido o vínculo empregatício sob a alegação de cometimento de falta grave, e, perante o poder judiciário não ter logrado comprovar os fatos em que fulcrou sua argumentação, é insuficiente para que se reconheça o direito do trabalhador em ser indenizado por danos morais. 2. Tal indenização será cabível apenas quando restar inequívoco que a empresa utilizou-se desse subterfúgio com a única finalidade de escapar das obrigações rescisórias, ou quando nos autos restar absolutamente comprovada a inexistência da falta grave – Jamais quando o não reconhecimento judicial da justa causa decorreu da mera insu-ficiência de provas quanto ao fato alegado. 3. Recurso não provido. 4. Decisão unânime.27

9. assédIo moral

Como visto, a responsabilidade civil é constituída por quatro elementos: ação (ou omissão), culpa, nexo de causalidade e dano. Por meio da visualização desse ins-tituto, o assédio moral classifica-se como conduta (ação ou omissão), enquanto que

26. TST. RR 41900- 26.2001.5.24.0004. 8ª T. Rel. Min. Dora Maria da Costa. DJ 29.8.2008.27. TRT 24ª R. RO 1664/2004-001-24-00-3. Rel. Juiz Amaury Rodrigues Pinto Junior. DJ 13.07.2006.

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o dano moral, como a própria denominação sugere, representa o último elemento, qual seja, o dano.

o assédio moral não pode ser confundido com o dano moral. Na verdade, há uma relação de causa e efeito entre ambos, uma vez que o assédio moral implica dano ao patrimônio moral da vítima nos grupos sociais, como na família, na escola, na igreja, no trabalho etc.

De acordo com a literatura especializada, esse fenômeno foi observado, inicial-mente, entre animais, e depois entre crianças que eram inseridas em grupos sociais já consolidados, inclusive de trabalho, constatando-se a exclusão inicial desse novo integrante.

No âmbito laboral, a verificação de comportamento semelhante intensificou-se com a globalização e consequente adoção de novas técnicas e métodos de organiza-ção do trabalho, sempre voltadas para o crescimento da produtividade e do lucro, necessários em face do aumento da competitividade.

Contudo, quando as ações empresariais dessa espécie não observam os limites éticos e legais relativos ao tratamento digno que deve ser dispensado ao trabalhador como ser humano, abre-se espaço para o aparecimento do assédio moral, transfor-mando o meio ambiente do trabalho em terreno fértil para o desenvolvimento dessa prática, mormente quando se leva em consideração o exercício desregrado do poder disciplinar do empregador.

9.1. previsão legal

Cumpre ressaltar, inicialmente, que a figura do assédio moral não foi con-templada expressamente pelo ordenamento jurídico-laboral de forma específi-ca, apesar de existir diversos projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional.

Extrai-se a delimitação dos contornos do assédio moral por meio de obras que são fruto de pesquisas de ciências não-jurídicas, principalmente da psicologia, pos-teriormente aplicadas ao meio ambiente laboral.

Na administração pública já existem algumas normas regionais que concei-tuam e vedam a prática do assédio moral, a exemplo da Lei nº 3.921, art. 1º, de 23.08.2002, do Estado do Rio de Janeiro:

Art. 1º – Fica vedada, no âmbito dos órgãos, repartições ou entidades da admi-nistração centralizada, autarquias, fundações, empresas públicas ou sociedades de economia mista, do Poder Legislativo, Executivo ou Judiciário, inclusive concessionárias ou permissionárias de serviços estaduais de utilidade ou interes-se público, o exercício de qualquer ato, atitude ou postura que se possa caracte-rizar como assédio moral no trabalho, por parte de superior hierárquico, contra funcionário, servidor ou empregado e que implique em violação da dignidade desse ou sujeitando-o a condições de trabalho humilhantes e degradantes.

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Apesar da lacuna normativa específica, o ordenamento jurídico pátrio, por in-termédio de dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, obstam a prática de condutas antijurídicas e garantem às vítimas de danos morais o direito à reparação, incluindo aqueles decorrentes da prática do assédio moral.

Na atual Carta Maior, encontram-se diversos dispositivos dessa espécie, como o art. 1º, III (proteção à dignidade da pessoa humana), art. 5º, X (são invioláveis a in-timidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à in-denização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação) , art. 170, caput.

A Lei nº 11.514/07, art. 96, § 1º, V, (Lei das Diretrizes Orçamentárias) veda a concessão ou renovação de quaisquer empréstimos ou financiamentos pelas agências financeiras oficiais de fomento às instituições cujos dirigentes tenham sido condena-dos por assédio moral ou sexual.

A Portaria SIT/DSST nº 9, de 30.03.2007, que aprova o anexo II da NR-17 – Trabalho em Teleatendimento/Telemarketing, veda, expressamente, a prática do assédio moral:

5.13. É vedada a utilização de métodos que causem assédio moral, medo ou constrangimento, tais como: a) estímulo abusivo à competição entre traba-lhadores ou grupos/equipes de trabalho; b) exigência de que os trabalhadores usem, de forma permanente ou temporária, adereços, acessórios, fantasias e vestimentas com o objetivo de punição, promoção e propaganda; c) exposição pública das avaliações de desempenho dos operadores.

9.2. Conceito, denominações e características

A expressão assédio moral foi adotada pelos principais estudiosos desse compor-tamento, mas também é denominado de violência moral no trabalho, humilha-ção no trabalho, terror psicológico no trabalho e hostilização no trabalho.

Em outros países, recebeu os seguintes apelidos: acoso moral, nos países de lín-gua espanhola; bullying na Inglaterra; harassment, nos Estados Unidos da América; harcèlement moral, nos países de língua francesa; mobbing, na Itália, Alemanha e países escandinavos; ijime, no Japão.

Identifica-se o assédio moral no trabalho como o comportamento por meio do qual o empregador ou seus prepostos escolhe um ou alguns empregados e inicia um processo deliberado de perseguição insistente, composto por atos repetitivos e prolongados, com o objetivo de humilhar-los, constrangê-los, in-feriorizá-los e isolá-los dos demais colegas de trabalho, provocando danos à sua saúde psicofisiológica e à sua dignidade.

Assemelha-se a conduta classificada pelo senso comum como perseguição, re-presentada por atitude que aborrece a pessoa até o limite humanamente suportável, de forma que pode até ser considerada tortura psicológica velada.

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

Para Marie France Hirigoyen, o assédio moral é: "Toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade físi-ca ou psíquica de uma pessoa, por em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho”. 28

Já Rodolfo Pamplona oferece um conceito mais sintético:"O assédio moral pode ser conceituado como uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo, de forma reiterada, tendo por efeito a sensação de exclusão do ambiente e do convívio social" 29

O art. 2º da referida Lei estadual do Rio de Janeiro apresenta o seguinte conceito:

Considera-se assédio moral no trabalho, para os fins do que trata a presente Lei, a exposição do funcionário, servidor ou empregado a situação humilhan-te ou constrangedora, ou qualquer ação, ou palavra gesto, praticada de modo repetitivo e prolongado, durante o expediente do órgão ou entidade, e, por agente, delegado, chefe ou supervisor hierárquico ou qualquer representante que, no exercício de suas funções,abusando da autoridade que lhe foi conferi-da, tenha por objetivo ou efeito atingir a auto-estima e a autodeterminação do subordinado, com danos ao ambiente de trabalho, aos serviços prestados ao público e ao próprio usuário, bem como, obstaculizar a evolução da carreira ou a estabilidade funcional do servidor constrangido.

Frise-se, também, que a agressão à dignidade, integridade psíquica ou física do trabalhador não é característica do assédio moral, mas sim conseqüência dele. Representa, de fato, o próprio dano moral.

Verifica-se, contudo, a prática crescente no âmbito forense de classificar toda conduta antijurídica, mormente aquela que provoca humilhação, como sendo as-sédio moral, sem, no entanto, observar os contornos principais desse instituto, o que é um equívoco grave.

Assim, para que seja considerado como assédio moral, o comportamento da pessoa deve ter as seguintes características principais: existência de um grupo so-cial, repetição prolongada no tempo da conduta e escolha de uma ou algumas vítimas determinadas para efetivar o cerco.

A decisão a seguir transcrita ilustra essa generalização que se faz do assédio moral, confundindo-o com outros atos classificados como antijurídicos:

28. HIRIGOYEN, Marie France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. Tradução de Rejane Janowitzer. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. p. 17.

29. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Noções Conceituais sobre o Assédio Moral na Relação de Emprego. Revista LTr, São Paulo/SP, ano 70. Set-2006. p.1079/1089.

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AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. ASSÉDIO MORAL. VALOR DA INDENIZAÇÃO. Trata-se de hipótese em que a Corte Regional, valorando fatos e provas, firmou seu convencimento (art. 131 do CPC) no sentido de que restou configurado o assédio moral alegado pelo autor, em face da prática reiterada da reclamada de efetuar excesso de cobranças e de fixar metas difíceis de serem alcançadas. 30

O assédio moral, na verdade, um conjunto de pequenas ofensas, muitas vezes dissimuladas, que, isoladamente avaliadas, não chegariam a abalar o patrimônio ideal do trabalhador. Por conta dessas características principais, a prova em juízo do assédio moral não constitui tarefa fácil para o empregado que alega ser vítima dessa prática.

Entende-se, por exemplo, que o procedimento do empregador pelo qual são estabelecidas metas coletivas de trabalho inatingíveis, não pode ser classificado como conduta assediadora, apesar de poder implicar dano moral, uma vez que não se encaixa da delimitação conceitual oferecida pela doutrina, principalmente pelo fato de ser destinada a todos os empregados do estabelecimento empresarial, desconfigurando a característica do isolamento grupal.

Quando as vítimas do terror psicológico são todos os trabalhadores de uma empresa, estabelecimento ou setor, a conduta passa a ser classificada como straining e não assédio moral, apesar de, na maioria dos casos, implicar dano moral, reservando a amplitude coletiva do prejuízo para o primeiro.

Márcia Guedes revela as características dessa prática empresarial:No trabalho, straining é uma situação de estresse forçado, na qual a vítima é um grupo de trabalhadores de um determinado setor ou repartição, que é obrigado a trabalhar sob grave pressão psicológica e ameaça iminente de sofrer castigos humilhantes [...] No straining, todo o grupo, indistintamente, é pressionado psicologicamente e apertado para aumentar a taxa de produtividade, atingir me-tas, bater recordes nas vendas de serviço e de produtos, debaixo de reprovações constrangedoras, como a acusação de “falta de interesse pelo trabalho”, “falta de zelo” e “colaboração” para com a empresa, e a ameaça permanente e subjacente, lançada de modo vexatório, de perder o emprego, ou, ainda, sofrer uma punição ainda mais dura e humilhante.31

A jurisprudência já se manifesta expressamente sobre esse assunto:ASSÉDIO MORAL. STRAINING. GESTÃO PELO ESTRESSE – O strai-ning, modalidade de assédio moral cuja premissa é a gestão pelo estresse, dá-se quando o empregador, a título de cobrança de metas, extrapola o limite do razoável e da decência, impondo prendas e punições vexatórias, humilhando os empregados etc. Porém, para o reconhecimento judicial da prática de straining, a prova há de ser robusta, ante a “linha tênue” entre o abuso alegado e o regular poder empregatício da empresa.32

30. TRT 2ª R. AIRR 3874-43.2010.5.10.0000. 1ª T. Rel. Min. Walmir Oliveira da Costa. 01.07.2011.31. GUEDES, Márcia Novaes. Assédio moral e straining. Revista LTr, São Paulo, ano 74, n. 02, p. 165-173,

fev.2010.32. TRT. 8ª R. RO 0000004-65.2011.5.08.0014. 3ª T. Rel. Des. Odete de Almeida Alves. 09.09.2011.

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL. GESTÃO POR ESTRESSE. STRAINING. PRÁTICA CONSISTENTE NO INCENTIVO AOS EMPRE-GADOS DE ELEVAREM SUA PRODUTIVIDADE, POR MEIO DE MÉ-TODOS CONDENÁVEIS, COMO AMEAÇAS DE HUMILHAÇÕES E RI-DICULARIZAÇÕES. DEVIDA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COLETIVOS. REDUÇÃO DO QUANTUM FIXADO PELA INSTÂNCIA A QUO. A gestão por estresse, também conhecida como assédio moral organi-zacional ou straining consiste em uma “técnica gerencial” por meio da qual os empregados são levados ao limite de sua produtividade em razão de ameaças que vão desde a humilhação e ridicularização em público até a demissão, sendo con-sideravelmente mais grave que o assédio moral interpessoal (tradicional) por se tratar de uma prática institucionalizada pela empresa, no sentido de incrr seus lu-cros às custas da dignidade humana dos trabalhadores. Caracterizada tal situação, é devida indenização pelo dano moral coletivo causado, que deve ser suficiente, sobretudo, para punir a conduta (função punitiva) e para desincentivar os infra-tores (função pedagógica específica) e a sociedade (função pedagógica genérica) a incorrerem em tal prática, mas também para proporcionar, na medida do pos-sível, a reparação dos bens lesados, como preceitua o art. 13 da Lei 7.3 47/85.33

Portanto, apesar das duas figuras serem bastante próximas e produzirem os mes-mos efeitos no âmbito jurídico (dano moral), é preciso diferenciá-las em respeito à evolução histórica e científica de ambos os institutos, além de ser necessária para efeito probatório.

O concurso público para Auditor Fiscal da Receita Federal trouxe o seguinte questionamento sobre assédio moral:Exemplo de questão sobre o tema

XX (AUDITOR FIScAL DA ReceITA FeDeRAL – eSAF – 2009) Os seguintes atos do empregador: medida destinada à exclusão do empregado de sua atividade profissional, atacando, injusti-ficadamente, seu rendimento pessoal; manipulação da reputação pessoal e profissional do empregado, mediante rumores e ridicularização; abuso do poder com atitudes de menospre-zo e controle desmedido do desempenho do empregado:

(A) minam a autoestima e a dignidade do trabalhador, destruindo sua capacidade de resistência, levan-do-o a pedir dispensa do emprego e possibilitam apenas indenização por dano patrimonial.

(B) criam uma situação vexatória de forma continuada, incutindo no empregado sentimento de inca-pacidade profissional, dando azo tão somente ao pedido de demissão e percepção do salário.

(C) geram constrangimento na relação trabalhista por desrespeitarem o lesado em sua intimida-de, honra e nome, mas não responsabilizam civilmente o empregador, visto que não acarre-tam no empregado nenhuma desestabilização emocional.

(D) constituem assédio moral suscetível de gerar apenas o direito de reclamar, judicialmente, as verbas resultantes de resilição contratual indireta.

(E) configuram assédio moral no trabalho, fazendo pressão para que o obreiro lesado se demita, possibilitando que reclame, em juízo, não só as verbas oriundas de resilição contratual, mas também indenização por dano moral e patrimonial, pois geram responsabilidade civil do em-pregador, visto que sua conduta trouxe humilhação no ambiente laborativo e interferiu na vida do assediado, comprometendo sua saúde física e mental.

Resposta: E

33. TRT. 16ª R. 00772-2008-016-16-00-5. Rel. Des. José Evandro de Souza. 26.04.2011.

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9.3. espécies

Existem várias espécies de assédio moral no trabalho: vertical ascendente, verti-cal descendente e horizontal.

O caso mais frequente é de assédio vertical descendente, quando o superior hierárquico é o assediador e o subordinado, o assediado. Nessa situação, o assédio moral é mais preocupante posto que é acrescentado o agravante do agente ser o de-tentor do poder diretivo e a vítima ter receio de perder o emprego.

O assédio vertical ascendente é mais raro e ocorre quando se verifica que o autor da perseguição é o subordinado e a vítima, o superior hierárquico. Pode-se citar, por exemplo, a hipótese em que um novo chefe inexperiente, de pouca idade e inseguro, é admitido ou transferido e passa a ser assediado por um empregado subal-terno que tenha largo conhecimento da prática laboral em sua atividade.

Por fim, o assédio horizontal é aquele que se verifica entre colegas do mesmo status laboral, decorrente, na maioria dos casos, do processo de competição estabele-cido pelos dirigentes da empresa.

9.4. assédio sexual

O assédio moral difere do assédio sexual, uma vez que neste último caso o agente tem como meta obter favores sexuais da vítima, utilizando-se das prerro-gativas do seu cargo dentro da empresa.

Inclusive, tal comportamento já é tipificado como crime, conforme se vê do art. 216-A do Código Penal, acrescentado a esse Diploma legal pela Lei nº 10.224, de 15.05.2001:

art. 216-a. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favoreci-mento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Pena – de-tenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos.

Da leitura do referido dispositivo legal extrai-se que a tipificação penal só é estabelecida quando há superioridade hierárquica, o que afasta a possibilidade do assédio sexual vertical ascendente e horizontal.

ATençãO! A tipificação do assédio sexual, no âmbito trabalhista, é mais ampla do que no âmbito penal, uma vez que prevê como conduta criminosa aquela decorrente de chanta-gem, mas exclui a ação feita por intimidação. Além disso, o Código Penal só tipificou a hipó-tese de o assédio sexual ser praticado por um superior hierárquico, excluindo da ilicitude o assédio sexual ascendente.

A respeito das distinções traçadas acima, já houve inclusive questionamento em concurso público:

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

Exemplo de questão sobre o tema

XX (MInISTÉRIO PÚBLIcO – GO – 2009 – ADAPTADA) Julgue o item a seguir:II. O assedio sexual é mais amplo no âmbito dos efeitos trabalhistas do que em sua tipificação

no Direito Penal brasileiro, pois este prevê o assédio sexual “por chantagem”, não incluindo o assédio “por intimidação”, além de não abranger o “assédio ascendente”, praticado pelo inferior hierárquico.

Resposta: Item correto

9.5. danos e outras consequências

Os principais danos provocados nas vítimas do assédio, além da ofensa à dig-nidade da pessoa do trabalhador, são de ordem psíquica, como relatado pela litera-tura médica, assim considerados os distúrbios de comportamento, a depressão, a agressividade acentuada, a desestabilização emocional etc.

Tais distúrbios provocam, de fato, o surgimento de moléstias de natureza diver-sa, como hipertensão, doenças gastrointestinais, tremores etc.

Constatadas essas debilidades, em muitos casos o empregado pede demissão por não mais suportar a pressão do agressor, sofrendo prejuízos de ordem material que também devem ser indenizados.

Contudo, essa conduta, quando o empregado é a vítima, pode ser enquadrada com hipótese para rescisão indireta do contrato de trabalho, prevista pelo art. 483, b, da CLT: “for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo”.

Se o empregado é o assediador, pode ser despedido por justa causa, enquadran-do-se no tipo previsto pelo art. 482, “j”, da CLT (vertical descendente) ou art. 482, “l” (vertical ascendente).

9.6. Casuística e jurisprudência

Enquadram-se como conduta assediante, desde que verificadas as condições do caso concreto: ameaça constante de dispensa do emprego; isolamento físico do trabalhador no meio ambiente de trabalho, provocando o isolamento social; criação e difusão de cognomes (apelidos) humilhantes; criação e difusão de comentários infundados ou maledicências, também conhecidas popularmente como fofoca; utili-zação de comunicação indireta com o trabalhador, sempre com o uso de um interlo-cutor; indiferença; brincadeiras sutis e discriminatórias; utilização de frases irônicas de menosprezo.

Por outro lado, não pode ser classificada como assédio moral, por exemplo, a prática do empregador que limita a utilização das instalações sanitárias da empresa, apesar de ser possível considerar a conduta como antijurídica e, consequentemente, sujeita ao dever de indenizar.

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A casuística já é explorada pela doutrina e acolhida pelos Tribunais pátrios, conforme se verifica das decisões a seguir transcritas, nas quais se afasta o assédio moral:

DANOS MORAIS – ASSÉDIO MORAL – CARACTERÍSTICAS – NÃO CONFIGURAÇÃO – O assédio moral caracteriza-se pela exposição do tra-balhador a situações humilhantes e constrangedoras, de forma repetitiva e prolongada, durante a jornada de trabalho, de modo a desestabilizar a relação do mesmo com o ambiente de trabalho e com a própria empresa, forçando-o a desistir do emprego. Muito embora a prova oral noticie a existência de uma pressão geral do banco para que os funcionários aposentados e aposentáveis aderissem ao PDV, não restou caracterizada qualquer situação específica de humilhação e/ou constrangimento do autor, de modo a configurar o assédio moral reconhecido na origem. Recurso ordinário do reclamado a que se dá provimento para afastar o pagamento de indenização a título de danos mo-rais. 34

DANOS MORAIS – ASSÉDIO MORAL – CARACTERÍSTICAS – NÃO CONFIGURAÇÃO – O assédio moral caracteriza-se pela exposição do tra-balhador a situações humilhantes e constrangedoras, de forma repetitiva e prolongada, durante a jornada de trabalho, de modo a desestabilizar a relação do mesmo com o ambiente de trabalho e com a própria empresa, forçando-o a desistir do emprego. Muito embora a prova oral noticie a existência de uma pressão geral do banco para que os funcionários aposentados e aposentáveis aderissem ao PDV, não restou caracterizada qualquer situação específica de humilhação e/ou constrangimento do autor, de modo a configurar o assédio moral reconhecido na origem. Recurso ordinário do reclamado a que se dá provimento para afastar o pagamento de indenização a título de danos mo-rais.35

ASSEDIO MORAL INSTITUCIONAL OU GERENCIAL. CARACTERI-ZAÇÃO. Assédio moral é a atitude abusiva, de índole psicológica, que ofende repetidamente a dignidade psíquica do indivíduo ou de um grupo. A conduta agressiva com os subordinados na empresa pode caracterizar o assédio moral institucional, em que todos os empregados ou uma determinada coletividade podem ser considerados vítimas. SÍNDROME DE BURNOUT. O desgaste emocional sofrido, em razão do assédio moral, levou a autora a propor o acordo verbal para a extinção do contrato de trabalho. Os sintomas descritos pela reclamante enquadram-se na denominada Síndrome de Burnout, termo psicológico que compreende o estado de exaustão prolongado e a diminuição de interesse em relação ao serviço ou ao emprego decorrente de ambiente de trabalho estressante. 36

34. TRT 15ª R. AP 184-2005-066-15-00-0. 6ª C. Relª Juíza Ana Paula Pellegrina Lockmann. DJ 16.03.2007.35. TRT 15ª R. AP 184-2005-066-15-00-0 (10250/07). 6ª C. Relª Juíza Ana Paula Pellegrina Lockmann. DOE

16.03.2007.36. TRT 17ª R. RO 00267.2007.009.17.00.6 RO. Rel. Juiz Cláudio Armando Couce de Menezes. DJ 04.03.2009.

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

10. InformatIvos do tst sobre a matérIaResponsabilidade civil objetiva. configuração. Técnico em informática. condução de veículo em rodovias intermunicipais. Óbito. culpa exclusiva de terceiro. Teoria do risco da atividade econômica. Ação de regresso.

A SBDI-I, por maioria, negou provimento aos embargos, mantendo a decisão da 8ª Turma, que reconhecera a responsabilidade objetiva da empregadora no caso em que o trabalhador, técnico em informática, cuja atividade envolvia a condução de veículo em rodovias intermunicipais, veio a falecer em decorrência de acidente automobilístico causado por culpa exclusiva de terceiro. Na espécie, asseverou o relator que as más condições nas rodovias brasileiras são fato notório, razão pela qual o perigo ocasionado ao reclamante permite classificar o trabalho por ele exercido como atividade de risco. Assim, ainda que ausente culpa do empregador, a teoria do risco da atividade econômica atrai a responsabilidade da empresa pelos danos gerados, facultando-lhe, tão somen-te, o ajuizamento de ação de regresso contra aquele que efetivamente provocou o dano objeto de reparação. Vencidos os Ministros Ives Gandra, Brito Pereira e Renato de Lacerda Paiva. TST-E-RR-1299000-69.2008.5.09.0016, SBDI-I, rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 16.2.2012 (TST. Info nº 1).

Dano moral. Indenização indevida. Revista visual de bolsas, sacolas ou mochilas. Inexistência de ofensa à honra e à dignidade do empregado. Poder diretivo e de fiscalização do empregador.

A revista visual em bolsas, sacolas ou mochilas, realizada de modo impessoal e indiscriminado, sem contato físico ou exposição do trabalhador a situação constrangedora, decorre do poder di-retivo e fiscalizador do empregador e, por isso, não possui caráter ilícito e não gera, por si só, vio-lação à intimidade, à dignidade e à honra, a ponto de ensejar o pagamento de indenização a título de dano moral ao empregado. Com base nessa premissa, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu do recurso de embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, negou-lhe provimento. Vencidos os Ministros Delaíde Miranda Arantes e Augusto César Leite de Carvalho. TST-E-RR-306140-53.2003.5.09.0015, SBDI-I, rel. Min. Brito Pereira, 22.3.2012 (TST. Info nº 3).

Dano moral. configuração. Imputação de ato de improbidade. Descaracterização da justa causa em juízo.

A descaracterização da despedida por justa causa em juízo, quando imputado ato de improbidade ao empregado (alínea “a” do art. 482 da CLT), gera direito a indenização por dano moral porquanto se verifica ofensa à honra subjetiva do trabalhador. Com esse entendimento a SBDI-I, por unanimi-dade, conheceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, negou-lhes provimento, vencidos os Ministros Ives Gandra Martins Filho, relator, Brito Pereira e Maria Cris-tina Peduzzi. Na espécie, consignou-se que a falta (entrega de mercadoria a clientes sem receber o respectivo pagamento, em desacordo com as normas internas da empresa) não foi suficientemente grave para ensejar a imputação de ato de improbidade, principalmente em razão de o empregado, uma vez detectado o desfalque, ter ressarcido a empresa, não gerando qualquer dano patrimonial ao empregador. TST-E-RR-20500-90.2003.5.07.0025, SBDI-I, rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho, red. p/ acórdão Min. José Roberto Freire Pimenta, 3.5.2012 (TST. Info nº 7).

Dano moral. Quebra de sigilo bancário de empregado de banco sem prévia autorização judicial. Auditoria interna. Violação do direito à privacidade e à intimidade.

O exame da movimentação financeira na conta corrente do empregado de instituição bancária, sem seu prévio consentimento e sem autorização judicial, durante auditoria interna, importa quebra ilegal de sigilo bancário a ensejar indenização por danos morais, em decorrência da violação do direito à intimidade e à privacidade, sendo irrelevante, para a configuração do dano, a ausência de divulgação dos dados sigilosos. Com esse entendimento, a SBDI-I, por maioria, conheceu dos embargos quanto ao tema, por violação do art. 5º, X, da CF, e, no mérito, deu-lhes parcial provi-mento para restabelecer a sentença quanto ao deferimento ao autor do pagamento de indenização

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por danos morais. Vencidos os Ministros Ives Gandra Martins Filho e Renato de Lacerda Paiva, que entendiam não se amoldar a hipótese ao conceito legal de quebra de sigilo bancário. TST-E-ED-RR-254500-53.2001.5.12.0029, SBDI-I, rel. Min. Lélio Bentes Correa, 31.05.2012 (TST. Info nº 11).

Revista impessoal e indiscriminada de bolsas dos empregados. Dano moral. não configuração. Indenização indevida.

A inspeção de bolsas, sacolas e outros pertences de empregados, desde que realizada de maneira generalizada e sem a adoção de qualquer procedimento que denote abuso do direto do empregador de zelar pelo próprio patrimônio, é lícita, pois não importa em ofensa à intimidade, à vida privada, à honra ou à imagem dos trabalhadores. Na espécie, não obstante a revista em bolsa da reclamante, muitas vezes, fosse realizada por seguranças do sexo masculino, restou consignada a inexistência de contato físico, e que a inspeção era impessoal, englobando todos os empregados, não se podendo presumir, portanto, dano ou abalo moral apto a ensejar o pagamento de indenização. Com esse en-tendimento, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos por divergência jurisprudencial e, no mérito, por maioria, negou-lhes provimento. Vencidos os Ministros José Roberto Freire Pimenta, que não admitia revista masculina em bolsa feminina, e Augusto César Leite de Carvalho e Delaide Miranda Arantes, que não admitiam qualquer revista. TST-E-ED-RR-477040-40.2001.5.09.0015, SB-DI-I, rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, 9.8.2012 (TST. Info nº 17).

Dano moral. Revisão do quantum indenizatório em sede de embargos. Limitação a casos tera-tológicos.

Tendo em conta a função uniformizadora da SBDI-I, não cabe à Subseção, em sede de recurso de embargos, fazer a dosimetria do valor fixado a título de indenização por dano moral, com exceção das hipóteses em que constatada a ocorrência de teratologia na decisão atacada. Com esse fundamento, e não vislumbrando divergência específica apta a impulsionar o conhecimento do recurso, a SBDI-I, por maioria, não conheceu dos embargos, vencidos os Ministros Renato de Lacerda Paiva, relator, Ives Gandra Martins Filho, Brito Pereira e Maria Cristina Irigoyen Peduzzi. Na hipótese, a Turma, vislumbrando ato ilícito do reclamado, que impôs ao trabalhador bancário, sem a devida proteção e fora dos parâmetros legais, o desempenho de atividade relativa ao trans-porte de valores, manteve a indenização em R$ 76.602,40, fixada em atenção ao caráter pedagó-gico da pena, não verificando afronta aos arts. 5º, V, da CF e 944 do CC, porque não evidenciada qualquer desproporção entre o dano causado e a reparação. TST-E-RR-34500-52.2007.5.17.0001, SBDI-I, rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, red. p/acórdão Min. José Roberto Freire Pimenta, 23.8.2012 (TST. Info nº 19).

Justa causa. Ato de improbidade. Descaracterização em juízo. Dano moral. não configuração.

É indevido o pagamento de indenização por danos morais se o trabalhador não produzir prova do prejuízo moral sofrido em razão da dispensa por justa causa fundada em imputação de ato de improbidade, quando descaracterizado em juízo. A despedida em tais circunstâncias não constitui prática de ato ilícito por parte do empregador, e se ele agiu de boa-fé, não dando publicidade ao fato, não imputando, de forma leviana, o ato ao trabalhador, e não abusando do direito de dispensa, não há de se falar em abalo à honorabilidade do empregado apta a configurar dano moral. Ademais, o sistema jurídico brasileiro adota, como regra, a teoria da responsabilidade subjetiva, sendo inde-vida a indenização quando não configurada a culpa. Com base nesse entendimento, a SBDI-I, por maioria, não conheceu do recurso de embargos no tema, vencidos os Ministros Lelio Bentes Corrêa, relator, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Augusto César Leite de Carvalho, José Roberto Freire Pimenta e Delaíde Miranda Arantes. TST-E-RR-774061-06.2001.5.02.0023, SBDII, rel. Min. Lelio Ben-tes Corrêa, red. p/ acórdão Min. João Oreste Dalazen, 4.10.2012 (TST. Info nº 24).

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

Acidente do trabalho. Morte do empregado. Indenização por danos morais e materiais. Am-biente de trabalho. negligência. Responsabilidade do empregador.

Havendo negligência do empregador com o ambiente de trabalho e a segurança do trabalhador, não se pode retirar a responsabilidade da empresa, ainda que comprovada a culpa concorrente da vítima. Na hipótese, o empregado rural, que exercia a atividade de “bituqueiro”, ou seja, recolhia a cana-deaçúcar que a máquina deixava de colocar no caminhão, foi atropelado por veículo da empresa que fazia manobra, enquanto descansava, de madrugada, sobre a cana cortada, vindo a falecer. Não obstante o quadro fático delineado nos autos revelar que houve o fornecimento dos equipamentos de segurança ao trabalhador acidentado, e que as reclamadas ministravam treina-mento a todos os contratados e os alertavam a não dormir na lavoura, ressaltou-se não ser viável, no caso, atribuir culpa exclusiva à vítima. Se a atividade demanda descanso, cabe ao empregador atribuir local seguro para o momento de pausa, adotando critérios de prudência e vigilância, a fim de evitar o dano, ainda que potencial, especialmente quando o trabalho é prestado em ambiente adverso, de difícil acesso e de baixa visibilidade, a exemplo da lavoura de cana-de-açúcar. Com esse entendimento, a SBDI-I, por maioria, vencido o Ministro Renato de Lacerda Paiva, conhe-ceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, ainda por maioria, negou-lhes provimento, mantendo a decisão turmária, que conheceu do recurso de revista por violação do art. 927 do CC, e, no mérito, deu-lhe parcial provimento para condenar as rés, solidariamente, ao pagamento de indenização pelo dano moral e de pensão mensal, a título de dano material. Vencidos os Ministros Ives Gandra Martins Filho, Brito Pereira e Maria Cristina Irigoyen Peduzzi. Ressalvou fundamentação o Ministro Renato de Lacerda Paiva, porquanto entendia presente a culpa “in eligendo” e “in vigilando”, mas não reconhecia a responsabilidade objetiva. TST-E-ED-RR-470-43.2010.5.15.0000, SBDI-I, rel. Min. Aloysio Côrrea da Veiga, 25.10.2012 (TST. Info nº 27).

Dano moral. Configuração. Uso indevido da imagem. Uniforme com propagandas comerciais. Ausência de autorização.

A veiculação de propagandas comerciais de fornecedores da empresa nos uniformes, sem que haja concordância do empregado, configura utilização indevida da imagem do trabalhador a ensejar o direito à indenização por dano moral, nos termos dos arts. 20 do CC e 5º, X, da CF, sendo desneces-sária a demonstração concreta de prejuízo. Com esse entendimento, a SBDI-I, em sua composição plena, conheceu do recurso de embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, negou-lhe provimento. Vencidos os Ministros Aloysio Corrêa da Veiga, relator, Brito Pereira e Maria Cristina Irigoyen Peduzzi. TST-E-RR-40540-81.2006.5.01.0049, SBDI-I, rel. Min. Aloysio Corrêa da Vei-ga, red. p/ acórdão Min. João Oreste Dalazen, 13.12.2012 (TST. Info nº 34).

Acidente do trabalho ocorrido na vigência do Código Civil de 1916. Responsabilidade objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil de 2002. Aplicação.

A teoria da responsabilidade objetiva, consagrada no art. 927, parágrafo único, do Código Civil de 2002, aplica-se aos casos em que o acidente do trabalho, fato gerador do falecimento do empregado durante o desempenho de atividade de risco em rede elétrica, ocorreu na vigência do Código Civil de 1916. Mesmo antes da nova codificação civilista, o ordenamento jurídico brasileiro já contemplava a respon-sabilidade objetiva, seja por leis esparsas, a exemplo do Decreto nº 2.881/1912, da Lei nº 8.123/91 e do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), seja por meio da jurisprudência, conforme revela a Súmula nº 341 do STF, segundo a qual “é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”. Ademais, o próprio art. 2º da CLT sempre autorizou a aplicação da culpa presumida no âmbito do Direito do Trabalho, ao estabelecer que recai sobre o empregador os riscos da atividade econômica. Assim, não se pode dizer que o Código Civil de 2002 trouxe uma absoluta inovação legislativa, a impedir a sua aplicação retroativa, mas apenas condensou entendimento juris-prudencial e doutrinário há muito consagrado sobre a teoria do risco. Com esse entendimento, a SBDI-I, em sua composição plena, conheceu, por maioria, dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, também por maioria, negou-lhes provimento. Vencidos, no conhecimento, os Ministros Horácio

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Raymundo de Senna Pires e Aloysio Corrêa da Veiga, e, no mérito, os Ministros Brito Pereira, relator, Antônio José de Barros Levenhagen, Ives Gandra Martins Filho, Maria Cristina Irigoyen Peduzzi e Renato de Lacerda Paiva, os quais entendiam que a aplicação retroativa do parágrafo único do art. 927 do CC é vedada com base nos arts. 6º da LICC e 5º, XXXVI, da CF. TST-E-ED-RR-40400-84.2005.5.15.0116, SBDI-I, rel. Min. Brito Pereira, red. p/ acórdão Min. Augusto César Leite de Carvalho, 13.12.2012 (TST. Info nº 34).

Acidente do trabalho. Responsabilidade civil objetiva. Configuração. Motociclista. Atividade de risco.

A SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mé-rito, por maioria, negou-lhes provimento, mantendo a decisão da 8ª Turma, que reconhecera a responsabilidade objetiva da empregadora, intermediadora de mão de obra junto a concessio-nária de energia elétrica, no caso em que o trabalhador, no desempenho da função de oficial eletricista, foi vítima de acidente do trabalho no trânsito, sofrendo amputação da perna direita, decorrente da colisão entre sua motocicleta e outro automóvel. Na espécie, além de o infortúnio ter ocorrido durante o expediente, restou consignado que o veículo de propriedade da vítima era utilizado para a prestação dos serviços de corte e religação de energia elétrica em unidades consumidoras de baixa tensão, em virtude do contrato de locação firmado com a empregadora, restando demonstrado, portanto, o nexo de causalidade entre o dano sofrido e o trabalho rea-lizado. Ademais, a condução de motocicleta configura-se atividade de risco, na medida em que os condutores desse tipo de veículo estão mais sujeitos a acidentes, com consequências mais nocivas, distanciando-se, portanto, das condições dos demais motoristas. Noutro giro, ainda que o risco, a que se refere parágrafo único do art. 927 do Código Civil, esteja relacionado à natureza da “atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano”, a interpretação teleológica do referido dispositivo, aliada à concepção histórica da responsabilidade objetiva, permitiria con-cluir que o conceito de atividade de risco deve advir do ofício concretamente desempenhado pelo trabalhador, e da exposição acima dos níveis considerados normais a que submetido, ainda que o empreendimento não contenha, por si só, elementos de risco. Finalmente, não há falar em inaplicabilidade do art. 927, parágrafo único, do CC aos casos anteriores à entrada em vigor do Código Civil, pois a teoria do risco em atividade perigosa não foi inaugurada com a nova co-dificação civilista, mas, ao contrário, é fruto da interpretação sistêmica do arcabouço histórico, legal e doutrinário sobre o tema. Vencidos os Ministros Ives Gandra Martins Filho, relator, e Brito Pereira. TST-E-ED-RR-81100-64.2005.5.04.0551, SBDI-I, rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, red. p/ acórdão Min. João Oreste Dalazen. 29.11.2012 (TST. Info nº 32).

Dono da obra. Acidente de trabalho. Indenização por danos morais, materiais e estéticos. Pre-tensão de natureza civil. Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-I. Não incidência. Envolvi-mento na execução dos serviços. Omissão em relação à segurança do ambiente laboral. Culpa comprovada. Responsabilidade solidária.

A aplicação da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-I tem sua abrangência restrita às obriga-ções trabalhistas, não alcançando pleitos de indenização por danos morais, estéticos e materiais de-correntes de acidente de trabalho, na medida em que apresentam natureza civil, oriundos de culpa por ato ilícito (arts. 186 e 927, “caput”, do Código Civil), não constituindo, portanto, verba trabalhis-ta “stricto sensu”. Ainda que assim não fosse, o quadro fático delineado nos autos revelou o envolvi-mento do dono da obra na execução dos serviços contratados e no desenvolvimento das atividades do reclamante, bem como a culpa pelo acidente que vitimou o trabalhador, ante a comprovada omissão em relação à segurança do ambiente laboral, atraindo, assim, a responsabilidade solidária pelo pagamento das indenizações pleiteadas. Com esse entendimento, a SBDI-I, por maioria, não conheceu dos embargos no tópico. Vencidos os Ministros Ives Gandra Martins Filho, Brito Pereira, Maria Cristina Irigoyen Peduzzi e João Oreste Dalazen. TST-E-RR-9950500-45.2005.5.09.0872, SBDI-I, rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho, 22.11.2012 (TST. Info nº 31).

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

Dispensa decorrente do ajuizamento de reclamação trabalhista. caráter retaliativo e discrimi-natório. Abuso de direito. Obstáculo à garantia de acesso à justiça. Reintegração. Devida.

A dispensa do trabalhador, quando motivada pela não desistência de reclamação trabalhista ajui-zada contra o empregador, possui conotação retaliativa e discriminatória, configurando abuso de direito e obstáculo à garantia de acesso à justiça. Com base nessa premissa, a SBDI-I, por unanimi-dade, conheceu dos embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, deu-lhes provimen-to para, decretada a nulidade dos atos de despedimento, condenar a reclamada à reintegração do autor, bem como ao pagamento dos salários e demais vantagens referentes ao período de afastamento. Na espécie, ressaltou o Ministro relator que o exercício do direito potestativo de denúncia vazia do contrato de trabalho sofre limites em razão dos princípios da função social da propriedade e da dignidade da pessoa humana, e dos valores sociais do trabalho, revelando-se aviltante a conduta da Infraero quando, cumprindo ameaças, demitiu os empregados públicos que não desistiram da ação em que pleiteavam adicionais de insalubridade e periculosidade. TST-E-RR-7633000-19.2003.5.14.0900, SBDI-I, rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho, 29.3.2012 (TST. Info nº 4).

11. Quadro sInÓptICo

CapítUlO XI – DanOS MORaIS e aSSéDIO MORal na RelaçãO De eMpRegO

Danos morais na relação de emprego

Instituto conteúdo Item

Responsa-bilidade do em pregador

contratual x extracontra-

tual

A responsabilidade do empregador, que por sua ação ou omissão implique dano moral, é de natureza con-tratual. Isso porque as determinações legais, inclusive aquelas previstas pelo Direito Civil, mas aplicáveis à re-lação de trabalho, incorporam-se automaticamente ao pacto laboral em forma de cláusulas contratuais.

2

Objetiva x subjetiva

A responsabilidade objetiva, inclusive a de cunho trabalhis-ta, só é admitida nas hipóteses expressamente previstas em lei ou quando a atividade do ofensor implicar risco para os direitos de outrem, na forma preconizada pelo art. 927, pa-rágrafo único, do Código Civil.

conceito

O dano moral corresponde ao resultado de uma ação ou omissão que implique, de forma necessária, ofensa a um bem não avaliável econo-micamente. Quando esse dano efetiva-se em decorrência do cumpri-mento de obrigações derivadas da execução e extinção do contrato de trabalho, seja pelo empregado ou pelo empregador, recebe a denomi-nação de dano moral trabalhista.

3

Ação ou omissão

A ação ou omissão que implique dano ao patrimônio não-econômico do empregado pode ser efetivada tanto pelo próprio empregador quanto por seus prepostos, que exerçam ou não cargo de direção, desde que tenham atrelamento direto com a atividade empresarial.

4

espécies de dano moral Puro

É aquele representado pela dor subjetiva não detectá-vel ou aferível externamente por terceiros. Por conta disso, não há como provar, materialmente, o dano mo-ral puro, de natureza interior.

5

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Dano moral e aborrecimento

Físico

Consiste naquele provocado a algum órgão do corpo humano do ofendido (lesão corporal ou perturbação funcional), podendo ser constatado a “olho nu”, como a perda de um braço, por exemplo, ou por meio de exames médicos, nas hipóteses de perturbação funcional.

6estético É aquele que altera a forma considerada “normal” do ser humano, modificando o padrão biológico e social de beleza.

Gestos e palavras de caráter organizacional, fiscalizatório ou disciplinar, que estejam dentro dos limites da razoabilidade, são considerados como mero dissabor, aborrecimento ou transtorno, que, apesar de atingir em grau leve o patrimônio ideal do empregado, não representa uma ofensa indenizável.

Indenização

A indenização por danos morais tem dupla finalidade: pedagógica e compensatória. No primeiro caso, a condenação do ofensor funciona como punição, objetivando evitar que ações idênticas ou semelhantes não mais se repitam. Já o caráter compensatório da indenização tem o escopo de propiciar conforto e alegria ao ofendido, como forma de con-trabalançar a tristeza e o desconforto sofrido em decorrência da ação lesiva.

7

Assédio moral na relação de emprego

conceito

Comportamento por meio do qual o empregador ou seus prepostos es-colhe um ou alguns empregados e inicia um processo deliberado de per-seguição insistente, composto por atos repetitivos e prolongados, com o objetivo de humilhar-los, constrangê-los, inferiorizá-los e isolá-los dos demais colegas de trabalho, provocando danos à sua saúde psicofisioló-gica e à sua dignidade.

9.2Denominações

• Violênciamoralnotrabalho;• Humilhaçãonotrabalho;• Terrorpsicológiconotrabalho;• Hostilizaçãonotrabalho.

características• Existênciadeumgruposocial;• Repetiçãoprolongadanotempodaconduta;• Escolhadeumaoualgumasvítimasdeterminadasparaefetivarocerco.

espécies

Vertical descendente

Aquele por meio do qual o superior hierárquico é o asse-diador e o subordinado, o assediado.

9.3Vertical ascendente

Ocorre quando se verifica que o autor da perseguição é o subordinado e a vítima, o superior hierárquico.

Horizontal É aquele que se verifica entre colegas do mesmo status laboral.

Assédio sexual

Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárqui-co ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função (CP. Art. 216-A).

9.4

Danos e outras consequências

• Ofensaadignidadedotrabalhador;• Distúrbiosdecomportamento;• Depressão;• Agressividadeacentuada;• Desestabilizaçãoemocional.

9.5

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Danos Morais e Assédio Moral na Relação de Emprego

12. Questões

1. (PGe/PI/Procurador/2008) Após ser demitido sem justa causa da empresa Ave do Sertão, onde trabalhou por dois anos, Francisco moveu reclamação trabalhista contra a empresa, pleiteando indenização por danos morais. Segundo Francisco, seu salário era pago sempre fora do prazo legal, o que acarretou momentos de insegurança e preocupação social e familiar, podendo o constrangimento gerado por essa situação abalar sua honra e sua imagem perante a sociedade. Acerca dessa situação hipotética, assinale a opção correta.(A) Não é cabível a discussão a respeito de indenizações por danos morais na justiça do trabalho.(B) Não se pode enquadrar o caso apresentado como gerador do direito à indenização por dano

moral, uma vez que não foi demonstrado nem invocado o constrangimento perante terceiros causado por eventual dificuldade financeira provocada pelo atraso no recebimento dos salá-rios.

(C) O atraso no pagamento de salários corresponde à inadimplência por parte da empresa, e tal fato enseja o pagamento de danos morais, já que afeta a imagem e a honra do empregado de forma direta.

(D) É devido o pagamento do dano moral, pois ficou comprovado o nexo causal entre a conduta do empregador e o dano efetivo sofrido pelo empregado.

(E) Como não existe prazo preestabelecido para pagamento de salário, de forma que não houve atraso, mas sim inadimplência de pagamento, não há que se falar em dano moral no caso apresentado.

2. (Magistratura do Trabalho. 23ª/2011) Analise as seguintes proposições, assinalando ao final a alternativa CORRETA.I. Assédio sexual é o ato de constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favoreci-

mento sexual, prevalencendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascen-dência inerentes ao exercício do emprego, cargo ou profissão.

II. O assédio sexual pode se configurar tanto pelo constrangimento verbal, quanto não verbal.III. Se o assédio é cometido por empregado contra colega de trabalho, poderá ele ser dispensado

por justa causa na modalidade indisciplina.IV. A responsabilidade por todos os danos causados pela prática do assédio sexual é personalíssima.(A) As alternativas I, II estão corretas e as alternativas III e IV incorretas;(B) As alternativas II e III estão corretas e as alternativas I e IV incorretas;(C) As alternativas I, II e III estão incorretas e a alternativa IV correta;(D) Todas as alternativas estão incorretas;(E) As alternativas I e IV estão corretas e as alternativas II e III incorretas.

3. (eSAF – 2009 – Receita Federal – Auditor Fiscal da Receita Federal) Os seguintes atos do em-pregador: medida destinada à exclusão do empregado de sua atividade profissional, atacando, injustificadamente, seu rendimento pessoal; manipulação da reputação pessoal e profissional do empregado, mediante rumores e ridicularização; abuso do poder com atitudes de menos-prezo e controle desmedido do desempenho do empregado:(A) minam a autoestima e a dignidade do trabalhador, destruindo sua capacidade de resistên-

cia, levando-o a pedir dispensa do emprego e possibilitam apenas indenização por dano patrimonial.

(B) criam uma situação vexatória de forma continuada, incutindo no empregado sentimento de incapacidade profissional, dando azo tão somente ao pedido de demissão e percepção do salário.

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(C) geram constrangimento na relação trabalhista por desrespeitarem o lesado em sua inti-midade, honra e nome, mas não responsabilizam civilmente o empregador, visto que não acarretam no empregado nenhuma desestabilização emocional.

(D) constituem assédio moral suscetível de gerar apenas o direito de reclamar, judicialmente, as verbas resultantes de resilição contratual indireta.

(E) configuram assédio moral no trabalho, fazendo pressão para que o obreiro lesado se demi-ta, possibilitando que reclame, em juízo, não só as verbas oriundas de resilição contratual, mas também indenização por dano moral e patrimonial, pois geram responsabilidade civil do empregador, visto que sua conduta trouxe humilhação no ambiente laborativo e interfe-riu na vida do assediado, comprometendo sua saúde física e mental.

4. (PGT – 2009 – PGT – Procurador do Trabalho) Analise os itens abaixo:I. O crime de assédio sexual foi introduzido no Código Penal, sendo seu conceito aplicável no

âmbito das relações de trabalho. O crime consiste em constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.

II. Não há previsão explícita de assédio sexual na CLT mas, pode ser enquadrado como ilícito trabalhista, hipótese na qual o empregado poderá postular a rescisão indireta do contrato de trabalho, quando o empregador ou seus prepostos praticam contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama.

III. Não há previsão explícita de assédio sexual na CLT mas, pode ser enquadrado na hipótese: pelo empregador, na demissão por justa causa de empregado que pratica o ato, quando ele (o empregado) incorre em incontinência de conduta ou mau procedimento e, ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa.

Marque a alternativa CORRETA:(A) todos os itens são corretos;(B) apenas os itens I e II são corretos;(C) apenas os itens I e III são corretos;(D) apenas os itens II e III são corretos;(E) não respondida.

Gab. Fundamentação legal e jurisprudencial Onde encontro no livro?

1 B

a) CF/88. Art. 114, VI a) Item 1

b) CF/88. Art. 114, VI b) Item 1

c) CF/88. Art. 114, VI c) Item 1

d) CF/88. Art. 114, VI d) Item 1

e) CF/88. Art. 114, VI e) Item 1

2 A Lei nº 10.224. Código Penal. Art. 216-A Item 9.4

3 e Lei nº 10.224. Código Penal. Art. 216-A Itens 9.4 e 9.5

4 A Lei nº 10.224. Código Penal. Art. 216-A Item 9.4