cap2
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2 ESTADO DA ARTE
2.1 Solues: princpios da solubilidade
2.1.1 Noes bsicas sobre solues e solubilidade
Todos os corpos existentes na Terra, assim como todos existentes no Universo
tm uma caracterstica em comum: so constitudos por matria. Entendemos por
matria tudo o que ocupa espao e possui massa. O diagrama seguinte apresenta a
classificao da matria.
Figura 2-1 Classificao da matria
As substncias puras so substncias cuja composio qumica constante e so
constitudas por um ou vrios elementos qumicos. Neste ltimo caso as quantidades
relativas de cada elemento envolvido so fixas e invariveis. Tm propriedades nicas,
caractersticas e bem definidas. A separao dos diferentes constituintes, quando tal
possvel, s conseguida atravs de processos qumicos. As substncias puras podem
ainda dividir-se em:
Substncias puras compostas (ou compostos) constitudas por dois ou mais elementos que se encontram ligados em proporo fixa e, consequentemente,
apenas podem ser separados nos componentes puros atravs de processos
qumicos. A gua um exemplo de uma substncia pura composta: constituda
por oxignio e hidrognio, sempre numa proporo de 1 para 2.
Substncias puras elementares (ou elementos) so aquelas que, constitudas por um nico tipo de elemento, no podem ser decompostas em substncias mais
Matria
Substncias Puras
Misturas
Compostas (ou compostos)
Elementares
Heterogneas
Homogneas
Coloidais
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simples. Actualmente so conhecidos 119 elementos, mas apenas cerca de 92
existem naturalmente. Um exemplo destas substncias o oxignio, constitudo
por partculas todas iguais entre si. Contudo, ainda dentro desta classificao
podemos encontrar as designadas formas alotrpicas, onde o mesmo elemento
pode aparecer associado de diferentes modos, o que lhe confere propriedades
diferentes. Recorrendo ao mesmo exemplo do oxignio, este gs pode existir
como O2, em que cada partcula representativa constituda por dois tomos de
oxignio (essencial respirao aerbia), ou sob a forma de O3 (ozono), onde
cada partcula representativa contm trs tomos de oxignio (substncia
conhecida pela importncia que desempenha na filtrao dos raios ultravioleta
oriundos do Sol).
As misturas, como a designao indica, so associaes ou combinaes de
diferentes substncias, mas em que estas no perdem a sua identidade. Dentro desta
classificao temos:
Misturas heterogneas, que so misturas de diferentes materiais em que possvel a olho nu, distinguir diferentes fases. As diferentes fases, mesmo que
estejam no mesmo estado fsico, dizem-se imiscveis porque no se dissolvem
mutuamente;
Misturas coloidais, que so misturas de diferentes substncias em que, por simples observao, no se consegue distinguir os diferentes componentes.
No entanto, recorrendo a mtodos de observao mais possantes,
nomeadamente microscpios, j possvel identificar os diferentes
participantes. Normalmente, so misturas que apresentam um aspecto
translcido, como por exemplo, o leite, o nevoeiro, o fumo, os gis, os
aerossis, entre outros. Uma tcnica para a identificao de misturas coloidais
consiste em fazer passar atravs da mesma, um feixe de luz que, ao
atravess-la, vai sofrer uma disperso formando uma luz difusa; este efeito
conhecido como o efeito de Tyndall;
Figura 2-2 Efeito de Tyndall
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Misturas homogneas, que so misturas onde no possvel a identificao dos componentes, quer a olho nu, quer recorrendo a equipamento mais
potente. As misturas homogneas apresentam-se totalmente uniformes, ou
seja, numa nica fase.
Um caso particular das misturas homogneas so as solues. Entende-se por
soluo, uma mistura homognea na qual os componentes se encontram identificados
qualitativa e quantitativamente. Neste caso, as misturas homogneas so tambm
designadas por solues.
Uma soluo uma mistura de duas ou mais substncias numa nica fase. A
substncia que se dissolve ou dispersa (geralmente de menor quantidade) chamada
soluto. A substncia onde a outra se dissolve, geralmente de maior quantidade,
chamada solvente. Diz-se que o soluto se dissolve no solvente para formar uma soluo.
As solues podem ser classificadas, de acordo com o estado fsico dos intervenientes,
em:
Solues gasosas quando se est perante uma mistura de gases miscveis em qualquer proporo. Por exemplo, a soluo gasosa usada em
procedimentos anestsicos, composta por oxignio, xido de azoto e
isoflorano, em propores bem definidas;
Solues lquidas trata-se de misturas onde se encontram dissolvidas no seio de um lquido outras substncias. So exemplos: o oxignio gasoso dissolvido
na gua; lcool etlico dissolvido em gua; sal de cozinha dissolvido em gua;
Solues slidas trata-se de misturas em que o meio suporte um slido. Um exemplo muito comum o da soluo slida de ouro e cobre que os
ourives usam como matria-prima para a elaborao de jias ou peas de
ourivesaria. Assim, quando nos referimos a ouro de 18 quilates, significa que a
soluo slida foi preparada com uma proporo de 18 g de ouro para 24 g de
mistura, ou seja, com 6 g de cobre. Outro exemplo muito conhecido a
amlgama que os dentistas usam para reparao e reconstituio do esmalte
dentrio, cuja composio de 30% de cobre e 70% de mercrio (como este
ltimo metal lquido nas condies normais de presso e temperatura, a
mistura apresenta-se inicialmente pastosa, solidificando pouco tempo depois).
Este captulo concentrar-se- fundamentalmente nas solues lquidas por serem
to importantes na qumica experimental, na indstria e no dia-a-dia. Daremos nfase
particular s solues aquosas, porque a gua o solvente mais vulgarmente usado e
importante em solues biolgicas.
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2.1.2 Concentrao de solues
A composio de uma soluo expressa atravs da indicao da concentrao
dos solutos que a compem. H muitas unidades diferentes de concentrao, mas todas
elas exprimem a composio da soluo como a quantidade de soluto que est presente
numa determinada quantidade de soluo ou solvente.
Concentrao mssica Um dos mtodos para expressar a concentrao de uma soluo, consiste em
indicar a massa de um soluto A que se encontra dissolvida em cada decmetro cbico de
soluo, ou seja:
VmC AA = Eq. 2-1
onde CA a concentrao da soluo (em g dm-3), mA a massa de soluto (g) e V o volume
da soluo (dm3).
Concentrao molar A concentrao de uma soluo pode tambm ser definida como a razo entre a
quantidade de um soluto A e o volume total de soluo. Neste caso:
VnC AA = Eq. 2-2
onde CA a concentrao da soluo (em mol dm-3), nA a quantidade expressa em moles
do soluto A (mol) e V o volume de soluo (dm3).
Para exprimir a concentrao molar (molaridade) de um soluto A tambm se usa a
notao [A]1.
Concentrao molal (molalidade) A molalidade (m) de uma soluo definida como:
mnm A= Eq. 2-3
1 Em rigor, esta notao s vlida para exprimir concentraes molares; no entanto e por razes de facilidade de escrita, verificamos que muitas vezes esta notao usada sempre que se fala de
concentraes, independentemente das unidades em que estamos a trabalhar. Este procedimento, apesar de
no ser rigoroso actualmente aceite pela comunidade cientfica.
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onde m a concentrao da soluo expressa em mol/kg, nA a quantidade do soluto A
(mol) e m a massa de solvente em Kg.
Percentagem em massa O clculo da percentagem em massa, % (m/m), pode ser efectuado para qualquer
dos componentes de uma soluo, calculando-se a razo percentual da massa de um
componente em estudo (mA), relativamente massa total de soluo (m):
100 m
m A (m/m) % de A = Eq. 2-4
A percentagem em massa adimensional.
Este tipo de determinao mais frequente na anlise de solues de gases, que
so misturas homogneas de gases.
Fraco molar
A fraco molar de um componente A ( A ) o quociente entre a quantidade de soluto dissolvido, nA, e o total das quantidades dos componentes da soluo (nA + nB + nC
+ ).
...+++= cBAA
A nnnn Eq. 2-5
A fraco molar adimensional.
Partes por milho (ppm) muito comum a preparao e utilizao de solues de concentraes muito
baixas, onde os solutos se encontram presentes em quantidades vestigiais, o que requer
o uso de unidades mais sensveis, como por exemplo partes por milho, cujo smbolo
ppm. Uma soluo de um dado soluto A, que apresente uma concentrao de 1 ppm,
significa que em 1 milho de gramas de soluo, ou seja, em 1 tonelada de soluo
existe apenas 1 g do soluto A.
2.1.3 Solubilidade
O "desaparecimento" de uma substncia quando misturada com outra um
interessante fenmeno que fascina cientistas h anos, alm de despertar interesses
econmicos e, at mesmo, de sade pblica. Um exemplo que abalou a sociedade
brasileira foi a suspeita de contaminao de um contraste base de sulfato de brio
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(BaSO4), usado em radioscopia e radiografia para destacar rgos, que pode ter causado
a morte de pelo menos vinte e uma pessoas no Brasil. O sulfato de brio usado para
este fim por ser um sal praticamente insolvel em gua (0,0002 g/100 g de gua) e em
solues cidas diludas. Anlises de amostras deste medicamento, produzido por um
determinado fabricante, constataram a presena de carbonato de brio (BaCO3). Embora
o carbonato de brio apresente tambm baixa solubilidade em gua (0,002 g/100 g de
gua), este sal solvel em solues cidas diludas como o suco gstrico, fluido
digestivo cido que contm, entre outras substncias, cido clordrico (Eq 2-6). Alm
disso, o carbonato de brio, em presena de dixido de carbono e gua, forma
bicarbonato de brio, que um sal solvel na gua (Eq. 2-7).
(l) OH (g) CO (aq) Ba (aq) 2H (s) BaCO 222
3 +++ ++ Eq. 2-6 (aq) )Ba(HCO (l) OH (g) CO (s) BaCO 23223 ++ Eq. 2-7
Como todos os compostos de brio solveis em gua ou em cidos so
venenosos, o carbonato de brio tem efeitos nocivos para a sade humana. Este caso
ilustra bem a importncia do conhecimento da solubilidade, pois o engano em relao ao
meio reaccional pode ter sido o motivo que levou morte de vrias pessoas.
A solubilidade definida como sendo a quantidade mxima de soluto que pode
ser dissolvido numa certa quantidade de solvente, a uma dada temperatura, e
representada por S. Na ausncia de indicaes contrrias, admite-se que o solvente a
gua e a temperatura de 25C. Para um determinado solvente e temperatura, as
solues podem ser classificadas em:
solues saturadas so aquelas que esto em equilbrio com um excesso de soluto. A concentrao de uma soluo saturada igual solubilidade;
solues insaturadas so aquelas em que a concentrao do soluto menor que a sua solubilidade;
solues sobressaturadas so aquelas que, em algumas condies, apresentam uma concentrao de soluto temporariamente maior que a sua
solubilidade.
A adio de uma pequena quantidade de soluto a uma soluo uma maneira
simples de distinguir entre solues saturadas, insaturadas e sobressaturadas. Se a
soluo est insaturada, o soluto adicionado dissolve-se, aumentando a concentrao da
soluo. Se a soluo est saturada, a adio de soluto no produz alterao na
concentrao da soluo. Quando a soluo est sobressaturada, a adio de soluto
puro provoca a precipitao do soluto adicional.
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necessrio ter presente que solues saturadas e concentradas no so a
mesma coisa. Por exemplo, a baixa solubilidade do cloreto de prata na gua origina uma
soluo saturada com uma concentrao de aproximadamente 10-5 mol dm-3 (a 25 C), o
que obviamente no corresponde a uma soluo concentrada.
A solubilidade pode ser expressa de diferentes formas. As mais vulgares so a
concentrao mssica, concentrao molar e massa de soluto /100 g de soluo.
O processo de dissoluo bastante complexo. A experincia mostra que alguns
materiais so muito solveis em gua, enquanto que outros so bastante insolveis. A
partir da solubilidade de compostos determinada experimentalmente foi possvel
estabelecer regras de solubilidade. Na Tabela I apresentamos algumas regras simples de
solubilidade.
Para as solubilidades contribuem muitos factores, sendo a variao de entalpia
que acompanha as interaces soluto solvente e a alterao do grau de ordenao do
sistema os mais importantes e aqueles que podem providenciar uma melhor
compreenso dos princpios gerais de solubilidade.
Compostos solveis
Excepes
Quase todos os sais de Na+, K+, NH4+,
Halogenetos: sais de Cl-, Br- e I- Halogenetos de Ag+, Hg22+ e Pb2+
Fluoretos Fluoretos de Mg2+, Ca2+, Sr2+, Ba2+, Pb2+
Sais de NO3-, ClO3-, ClO4-, CH3COO-
Sulfatos Sulfatos de Sr2+, Ba2+, Pb2+ e Ca2+
cido inorgnicos
Compostos Insolveis
Excepes
Sais de CO32-, PO43-, C2O42- e CrO42-, Sais de NH4+ e de caties de metais
alcalinos
Sulfuretos Sais de NH4+, Ca2+, Sr2+ e de caties de
metais alcalinos
Hidrxidos e xidos metlicos Hidrxidos e xidos de Ca2+, Sr2+, Ba2+ e
dos caties de metais alcalinos
Tabela I Regras de solubilidade para compostos inicos em gua2 a 298 K
2 Uma substncia diz-se solvel num dado solvente se for possvel dissolv-la de forma a atingir uma concentrao de 0,01 mol dm-3 ou maior.
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2.1.3.1 Entalpia de dissoluo
A solubilidade de slidos na gua ou noutros solventes a manifestao visvel
da competio entre dois processos diferentes. O primeiro, chamado cristalizao, o
resultado das foras de ligao no slido. responsvel pelo crescimento do cristal
slido exposto a um ambiente que contm os seus prprios ies ou molculas
constituintes. O segundo, chamado dissoluo, o resultado das interaces entre as
molculas de solvente e as molculas ou ies do soluto superfcie da fase slida. Esta
interaco conduz destruio da estrutura do cristal slido e leva formao de uma
soluo cada vez mais concentrada at que toda a fase slida esteja dissolvida, ou at
que se estabelea um equilbrio entre os processos em competio.
A dissoluo de uma substncia no conduz existncia de ies ou molculas
isolados em soluo, uma vez que no seria favorvel em termos energticos ou
entrpicos e, consequentemente, as partculas dissolvidas tendem a sofrer agregao ou
solvatao. Neste momento, interessa-nos compreender os dois processos em causa, a
cristalizao e a dissoluo, respectivamente:
As interaces atractivas entre as partculas de soluto resultam na formao de agregados e, nomeadamente, de precipitados. Neste processo h
estabilizao do conjunto de partculas pois, apesar da diminuio de entropia
que a organizao cristalina implica, h uma forte estabilizao energtica,
denominada energia de rede. Quanto maior for a energia de rede, mais
partculas de soluto so removidas da soluo. Convm lembrar que a
superfcie do precipitado permanece insaturada, isto , os ies ou molculas
que ocupam as posies superfcie possuem locais de interaco que no
so usados. Consequentemente, podem ser observados efeitos particulares
superfcie (adsoro e outros fenmenos de superfcie) ou mais
especificamente, as molculas de solvente interactuam com as partculas de
soluto situadas na superfcie e transferem-nas da superfcie do slido para a
soluo.
Estabelecimento de interaces entre a hipottica partcula de soluto despida e as molculas de solvente. Esta interaco conduz formao de uma
partcula de soluto hidratada ou solvatada, com diminuio da energia do
conjunto e consequente estabilizao global neste processo. Esta interaco
pode-se estender a outras clulas de hidratao, e pequenos ies, em
particular, podem ser incorporados na estrutura do solvente.
Existe, portanto, uma competio entre a cristalizao e a solvatao na soluo.
Na maior parte dos casos, as interaces resultantes da solvatao so mais fracas que
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as interaces slido slido, mas normalmente o seu nmero sobrepe-se ao nmero
de interaces de cada molcula ou io na fase slida.
Resumindo, nos lquidos e nos slidos os corpsculos que os constituem mantm-
se juntos devido s interaces intermoleculares. Estas foras desempenham um papel
fundamental na formao das solues. Quando um soluto se dissolve num solvente, as
partculas do soluto dispersam-se no seio do solvente. As partculas do soluto ocupam
posies que esto normalmente ocupadas por molculas de solvente. A facilidade com
que uma partcula de soluto substitui uma molcula de solvente depende das
intensidades relativas dos trs tipos de interaces:
Interaco solvente solvente; Interaco soluto soluto; Interaco solvente soluto. Para simplificar, podemos imaginar que o processo de dissoluo se d em trs
passos diferentes (Figura 2-3).
O passo 1 envolve a separao das partculas do solvente e o passo 2 envolve a
separao das partculas do soluto. Estes passos necessitam de energia para vencer as
foras intermoleculares atractivas; portanto, so endotrmicos. No passo 3 as molculas
de solvente e de soluto misturam-se. O processo global pode ser exotrmico ou
endotrmico dependendo da intensidade relativa das foras intermoleculares envolvidas.
Figura 2-3 Representao ilustrada dos factores que contribuem para a entalpia de uma dissoluo
Solvente
Passo 1 H1
Passo 2 H2
Soluto
Soluo
Passo 3H3
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A entalpia de dissoluo, dissH, dada por: 321 HHHHdiss ++= Eq. 2-8
Se a estabilizao energtica correspondente ao conjunto das interaces soluto
solvente for mais forte do que a necessria para quebrar as interaces solvente
solvente e soluto soluto, o processo de dissoluo energeticamente favorvel, isto ,
o processo de dissoluo exotrmico (dissH < 0). Se, pelo contrrio a estabilizao energtica resultante das interaces soluto
solvente for mais fraca do que as interaces solvente solvente e soluto soluto, ento
o processo de dissoluo endotrmico (dissH > 0). Em geral, substncias que tenham propriedades semelhantes e, por isso, foras
intermoleculares semelhantes, tero interaces soluto solvente fortes e tendero a
formar solues. A afirmao o semelhante dissolve o semelhante uma simplificao
que frequentemente usada para explicar tendncias na solubilidade. Isto significa que
solutos inicos ou polares se dissolvem em solventes polares. Os solutos no polares
dissolvem-se em solventes no polares. Os solutos inicos e polares no se dissolvem
em solventes no polares.
Notemos que, quando se aplica a regra da solubilidade o semelhante dissolve o
semelhante, verificamos algumas excepes. Esta regra til quando se pretende
comparar a solubilidade de sries de compostos.
2.1.3.2 Espontaneidade
O processo de dissoluo, tal como qualquer processo qumico e fsico, depende
de dois factores. Um deles a energia que determina se o processo de dissoluo
endotrmico ou exotrmico. O segundo factor a tendncia intrnseca para a desordem
que se verifica em todos os processos naturais. Quando as partculas de soluto e
solvente se misturam para formar a soluo h um aumento da desordem. No estado
puro, o soluto e o solvente possuem uma certa ordem, caracterizada pela disposio
mais ou menos regular dos tomos, molculas ou ies no espao tridimensional. Grande
parte dessa ordem destruda quando o soluto se dissolve no solvente. Portanto, o
processo de dissoluo sempre acompanhado por um aumento da desordem (aumento
de entropia). este aumento da desordem do sistema que favorece a solubilidade de
qualquer substncia, mesmo se o processo de dissoluo for endotrmico.
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2.1.3.3 Solubilidade de compostos inicos em gua
A gua o solvente mais comum usado para dissolver compostos inicos. As
variaes de entalpia que ocorrem na formao de solues aquosas so um factor
importante para determinar a solubilidade das substncias inicas. As substncias
inicas so constitudas por ies de cargas opostas, mantidos juntos por foras
electrostticas. Os slidos inicos manifestam uma grande solubilidade na gua mas so
muito pouco solveis nos solventes no polares. Os slidos com interaces
predominantemente inicas so denominados de sais. A solubilidade dos sais diminui
medida que se adicionam solventes orgnicos s solues aquosas. Este facto
normalmente usado nas anlises gravimtricas. Todos os sais puros so electrlitos
fortes e as cores dos slidos e das respectivas solues aquosas so geralmente as
cores dos ies individuais.
Se um composto for solvel, a entalpia de atraco entre os ies no slido tem de
ser comparvel (at cerca de 50 kJ mol-1) entalpia das atraces entre as molculas de
gua e os ies na soluo. As foras que mantm o slido inico unido advm da
atraco electrosttica entre os ies de cargas opostas, e so muito intensas, com
energias da ordem de 400 KJ mol-1 ou superiores.
Consideremos o exemplo da dissoluo do cloreto de sdio (NaCl) em gua. Em
soluo, as molculas polares de gua so atradas pelas cargas dos ies Na+ e Cl-
(Figura 2-4). Vrias molculas de gua so atradas para cada io na soluo. As
atraces do tipo io-dipolo, que se estabelecem entre os ies Na+ e Cl- com a gua, so
suficientemente fortes para separar os ies do cristal.
Figura 2-4 Dissoluo de um cristal de sal na gua (esquerda), hidratao de ies (direita).
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Em soluo, cada catio Na+ rodeado por molculas de gua, orientadas com a
sua extremidade negativa para o catio. Da mesma forma, cada anio Cl- rodeado por
molculas de gua com a sua extremidade positiva orientada para o anio. Esta
interaco dos ies com as molculas de solvente denominada solvatao. No caso de
o solvente ser a gua, designa-se por hidratao.
Uma vez que muitos compostos inicos so solveis na gua, pode-se concluir
que as entalpias de hidratao devem ter valores semelhantes aos das entalpias de rede
cristalina nos compostos slidos (Figura 2-5).
Quando as substncias inicas se dissolvem em gua, o aumento da desordem
do soluto bvio, visto que os ies ficam livres para se movimentarem. Quando as
molculas de gua se separam para criar espaos para os ies, tambm h um aumento
da desordem. Ao mesmo tempo, contudo, a hidratao dos ies restringe a liberdade de
algumas das molculas de solvente, diminuindo a sua desordem. Assim, dependendo do
soluto particular e da sua hidratao pela gua, a desordem do solvente poder aumentar
ou diminuir.
Figura 2-5 Processo de dissoluo endotrmico
2.1.3.4 Solubilidade de compostos moleculares
Os slidos covalentes apresentam geralmente uma baixa solubilidade na gua.
Estes compostos so geralmente electrlitos fracos e tm uma tendncia para sofrer
reaces de complexao em soluo aquosa. Muitas vezes a cor da soluo difere da
cor do slido.
Hrede hidH
dissH
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As foras atractivas entre as molculas de um soluto molecular so foras dipolo
dipolo, foras de disperso de London e/ou ligaes de hidrognio. Consideremos o
exemplo do etanol que miscvel com a gua. No etanol lquido as molculas mantm-se
ligadas por ligaes de hidrognio, tal como as molculas de gua. Por este motivo o
etanol dissolve-se muito facilmente na gua, ocorrendo ligaes de hidrognio entre o
grupo OH das molculas do lcool e o tomo de oxignio das molculas de gua. Nesta
categoria encontra-se uma grande variedade de solues como o acar na gua, lcool
na gua, cidos clordrico e actico na gua.
Figura 2-6 Formao de ligaes de hidrognio entre as molculas de etanol e gua
Por outro lado, existem muitos compostos moleculares, como o iodo, que no so
muito solveis na gua. As atraces intermoleculares existentes entre as molculas de
iodo so foras de disperso de London fracas. As foras intermoleculares entre um
dipolo permanente na molcula da gua e um dipolo induzido na molcula de iodo no
so muito fortes, comparadas com as ligaes de hidrognio existentes entre as
molculas da gua. Portanto, a energia necessria para quebrar as ligaes de
hidrognio no processo de dissoluo muitssimo maior do que a energia libertada
quando as molculas de gua e iodo se atraem umas s outras. Neste caso, o aumento
da desordem da mistura no suficiente para vencer a variao de entalpia desfavorvel,
pelo que dai resulta uma solubilidade muito baixa.
O iodo e o bromo so dois compostos moleculares apolares. Em ambos, as
atraces intermoleculares so fracas (foras de disperso de London). Estas foras,
sendo da mesma ordem de grandeza, so responsveis pela atraco entre as molculas
de iodo e bromo, o que explica a dissoluo do iodo no bromo lquido.
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2.1.4 Equilbrios de solubilidade
No ponto anterior fizemos referncia ao equilbrio de solubilidade. Os equilbrios
de solubilidade so reaces que envolvem a dissoluo e a formao de um slido
(precipitado) a partir de uma soluo. Estes processos so equilbrios heterogneos, pois
envolvem mais do que uma fase.
Equilbrios deste tipo so, frequentemente, observados quer em processos
industriais quer no nosso quotidiano. Por exemplo, as estalactites e estalagmites das
grutas, no so mais do que equilbrios de solubilidade entre os depsitos subterrneos,
constitudos essencialmente por carbonato de clcio (CaCO3) e as guas naturais, como
por exemplo a gua da chuva.
Uma reaco de precipitao importante nos laboratrios de qumica o teste
clssico usado para determinar a presena de ies prata em soluo. Adiciona-se
algumas gotas de soluo de cido clordrico soluo teste; a formao de um slido
branco (cloreto de prata) indica a presena de prata.
Ag+ (aq) + Cl- (aq) ' AgCl (s) Eq. 2-9 Os dois processos competitivos, solubilidade e precipitao, estabelecem um
equilbrio termodinmico o qual deslocado na direco do produto de menor energia.
Neste equilbrio, ocorre uma constante alterao de partculas de soluto na superfcie do
slido. Quando se estabelece um estado de equilbrio pode-se aplicar a lei das
actividades e o equilbrio pode ser expresso atravs de uma constante de equilbrio. Esta
constante de equilbrio tambm deve estar relacionada com a solubilidade do slido na
fase lquida. Walther H. Nernst chamou a esta constante de equilbrio produto de
solubilidade, Kps.
Na seco seguinte discutiremos a relao entre a solubilidade e o produto de
solubilidade. Contudo, salientamos que nem sempre se pode determinar a solubilidade
apenas a partir do produto de solubilidade. Nernst salientou que a solubilidade
determinada a partir do Kps s tem significado quando a soluo em equilbrio com a fase
slida contm os constituintes do soluto slido exclusivamente na forma de ies livres.
Svante Arrhenius j tinha desenvolvido esta teoria de electrlitos fortes e fracos e
demonstrou que mesmo os electrlitos fracos esto completamente dissociados em
solues diludas. Pouco depois de Nernst publicar as suas ideias, Niels Bjerrum
introduziu o conceito de dissociao completa para compostos inicos (sais) numa
soluo electroltica, eliminando as limitaes referidas por Nernst. Durante os anos
seguintes, nem sempre se levou a srio a diferena entre os compostos inicos e os
compostos covalentes. Acreditava-se que as substncias com solubilidade baixa
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(compostos covalentes) tambm estavam completamente dissociadas, uma vez que
apenas se obtinham baixas concentraes, devido s suas baixas solubilidades. Por este
motivo, tambm eram tratados como sais. Esta ideia no muito correcta, como vamos
ver mais frente, e esta concepo alternativa causa alguma confuso, particularmente a
alunos pouco experientes.
2.1.4.1 O produto de solubilidade
Por razes histricas, os equilbrios que envolvem reaces de precipitao so escritos como a dissoluo de um slido (dissociao em ies), o inverso da reaco de
precipitao. Se assumirmos que o soluto est totalmente dissociado (electrlitos fortes,
sais, etc.) o sistema de duas fases pode ser descrito atravs do seguinte equilbrio, no
qual tomamos como exemplo de um electrlito forte, o cloreto de sdio:
NaCl (s) ' Na+ (aq) + Cl- (aq) Eq. 2-10 Apesar de se tratar de um equilbrio heterogneo, a uma temperatura constante,
h uma constante de equilbrio que definida como:
[ ][ ][ ]NaCl
Cl Na -+=K Eq. 2-11
A actividade de uma fase slida pura sempre, por definio, unitria. Como
resultado desta simplificao, obteve-se uma relao conhecida por produto de
solubilidade, Kps:
[ ][ ]-Cl Na +=psK Eq. 2-12 Deste modo, e porque se trata de um equilbrio heterogneo, o produto de
solubilidade de um composto, Kps, definido como o produto das concentraes dos ies
constituintes, elevadas aos respectivos coeficientes estequiomtricos da equao de
equilbrio. Esta constante traduz a maior ou menor solubilidade de um composto em gua
e, tal como seria de esperar, quanto mais insolvel o sal mais baixa a concentrao
dos seus ies em soluo e, consequentemente, mais pequeno o valor da constante do
produto de solubilidade.
Se as cargas dos ies no forem numericamente iguais, a equao
correspondente torna-se mais complicada. Para um sal com uma composio genrica
MaBb, que se dissocia em soluo aquosa nos correspondentes ies, o equilbrio de
solubilidade expresso da seguinte forma:
-
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28
MaBb (s) ' a M+ (aq) + b B- (aq) Eq. 2-13
E o produto de solubilidade
[ ] [ ]bpsK -a B M += Eq. 2-14 No caso da dissociao ser completa e os ies M+ e B- se encontrarem na forma
de ies livres, cada mole de sal dissolvido origina a moles de caties e b moles de anies
na fase aquosa e, neste caso, a solubilidade e o produto de solubilidade esto
relacionados de uma forma simples. A solubilidade S expressa em moles da fase slida
por dm3 de soluo (e no em termos da concentrao de cada io individual) est
relacionada com a concentrao inica de M+ e B- atravs da seguinte expresso:
[ ]+M = a S Eq. 2-15 e
[ ]-B = b S Eq. 2-16 onde S a solubilidade em mol dm-3. O produto de solubilidade pode ser definido como:
[ ] [ ] ( ) ( ) babababps SbabSaSK ++ === -a B M Eq. 2-17 e portanto
( ) ( )ba
baps
baK
S+
=1
Eq. 2-18
Esta equao estabelece a relao entre a solubilidade e o produto de
solubilidade em condies especficas (quando a soluo est em equilbrio com a fase
slida cujos ies se encontram na forma livre) e apenas se forem tidas em conta as
seguintes consideraes:
A relao entre a solubilidade e o produto de solubilidade verifica-se se o composto dissolvido se encontrar completamente dissociado. Se existir em
soluo soluto indissociado, ou se os caties e os anies produzidos na
dissoluo formarem complexos, ento a solubilidade maior do que o valor
determinado a partir do produto de solubilidade.
Se a fase aquosa inicial possuir algum dos ies produzidos pela dissoluo do slido, ento a solubilidade torna-se menor que o valor determinado a partir do
produto de solubilidade.
-
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29
A alterao dos coeficientes de actividade tem um efeito na solubilidade de um electrlito. De um modo geral, os coeficientes de actividade diminuem com o
aumento da concentrao total de electrlito inerte (fora inica) e,
consequentemente, a solubilidade torna-se maior.
A solubilidade no uma grandeza termodinmica, mas o produto de solubilidade
uma expresso termodinmica, desde que nela figurem as actividades das espcies
envolvidas.
2.1.5 Formao de precipitados
As reaces de precipitao so caracterizadas pela formao de um composto
insolvel, que se separa da soluo, e a que se d o nome de precipitado.
Com base nos conceitos de produto de solubilidade e de solubilidade, podemos
agora prever se a mistura de duas solues vai ou no dar origem formao de um
precipitado. De forma a prever a possvel formao destes, recorre-se ao quociente de
reaco (Q). Este quociente envolve o produto das concentraes dos ies envolvidos
elevados aos respectivos coeficientes estequiomtricos, de forma semelhante que se
utiliza para calcular o Kps. Salientamos que o produto de solubilidade corresponde ao
quociente de reaco quando a soluo est saturada, ou seja, quando as concentraes
dos ies correspondem s suas concentraes de equilbrio na presena de excesso do
slido relativamente sua solubilidade. Assim comparando os valores numricos de
ambos (Q com Kps) pode-se observar trs situaes distintas:
Q < Kps, o que significa que se est na presena de uma soluo no saturada ou insaturada, isto , no houve ainda formao de precipitado;
Q = Kps, o que significa que se est na presena de uma soluo saturada, ou seja, atingiu-se o limite mximo de dissoluo;
Q > Kps, o que significa que se est na presena de uma soluo sobressaturada, ou seja, no possvel dissolver mais soluto e h formao
de precipitado.
2.1.6 Alguns factores que influenciam a solubilidade
A solubilidade de um soluto depende de vrios factores, como por exemplo:
temperatura, presso, presena na soluo de um io comum, ocorrncia de reaces
laterais, formao de complexos, pH do meio e dimenses moleculares ou inicas.
-
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30
Como estamos a estudar o caso particular da solubilidade de solutos slidos em
solventes lquidos, nesta seco so discutidos apenas os factores que influenciam a
solubilidade de slidos em lquidos.
2.1.6.1 Efeito da temperatura na solubilidade
Como j referimos, as caractersticas das interaces soluto solvente
influenciam a solubilidade das substncias. A solubilidade de um composto depende
tambm da temperatura.
Podemos preparar uma soluo saturada por mistura do solvente com excesso de
um soluto slido. Este sistema est em equilbrio dinmico, com molculas ou ies que
esto constantemente a abandonar o slido e outros a depositar-se na superfcie do
slido com velocidades iguais. Este processo pode ser representado por:
soluto (s) ' soluto (aq) Eq. 2-19 Uma vez estabelecido o equilbrio no h uma variao observvel da
concentrao da soluo, desde que a temperatura e a presso no sejam alteradas. O
princpio de Le Chatelier aplica-se a qualquer sistema em equilbrio dinmico, pelo que
ser usado para estabelecer a influncia da temperatura na solubilidade de um
composto.
Para elevar a temperatura de uma amostra de matria necessrio fornecer-lhe
calor. O fornecimento de calor a uma soluo saturada em equilbrio com um excesso de
soluto representa uma alterao ao sistema. De acordo com o princpio de Le Chatelier,
ocorrer uma reaco no sentido que contrarie essa alterao exterior. Consideremos em
primeiro lugar um composto cuja dissoluo seja endotrmica. Quando o soluto se
dissolve absorve calor, pelo que um reagente na equao:
calor + soluto (s) ' soluto (aq) Eq. 2-20 Quando se fornece calor ao sistema, a reaco tem de ocorrer no sentido dos
reagentes para os produtos de forma a contrariar o efeito da perturbao introduzida. Por
este motivo, quando o equilbrio restabelecido, a quantidade de soluto em soluo
aumenta. Por outras palavras, quando a entalpia de dissoluo positiva, a solubilidade
do soluto aumenta com a temperatura.
Um composto que tenha uma entalpia de dissoluo negativa liberta calor no
processo, tal como est representado na equao de equilbrio:
soluto (s) ' soluto (aq) + calor Eq. 2-21
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31
Quando se fornece calor a este sistema, a reaco ocorre no sentido inverso,
reduzindo a concentrao de equilbrio do soluto. Resumindo, um aumento da
temperatura faz aumentar a solubilidade de um composto se o processo de dissoluo for
endotrmico e faz diminuir a solubilidade quando o processo de dissoluo exotrmico.
As solubilidades da maioria dos slidos aumentam quando a temperatura da
soluo aumenta. O grfico da Figura 2-7 mostra a solubilidade de diversos compostos
em funo da temperatura.
Figura 2-7 Variao da solubilidade com a temperatura
Em geral, quanto mais endotrmica for a dissoluo, maior ser a variao da
solubilidade com a temperatura. Pode-se observar que a solubilidade do sulfato de crio
(III) vai diminuindo medida que a temperatura aumenta, o que est de acordo com a
entalpia de dissoluo negativa (dissoluo exotrmica).
importante notar que o estado de diviso de um soluto e a agitao da soluo
no aumentam a solubilidade do soluto; apenas interferem no tempo de dissoluo,
mantendo a temperatura constante.
Temperatura (C)
Solu
bilid
ade
(g/1
00 c
m3 d
e g
ua)
-
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32
2.1.6.2 Efeito do tamanho das partculas na solubilidade
As partculas slidas pequenas esto num estado energeticamente menos estvel
que as partculas de maiores dimenses. Isto deve-se ao facto da sua superfcie ser
relativamente grande comparada com o seu volume.
Numa partcula slida de maiores dimenses, apenas uma fraco extremamente
pequena de tomos ou molculas ocupam stios superfcie. Pelo contrrio, as partculas
extremamente pequenas possuem uma fraco significativa de tomos ou molculas nas
posies superficiais. Por este motivo, a energia total de uma partcula pequena mais
afectada pelas contribuies da superfcie. Uma vez que as energias das partculas
pequenas e grandes so diferentes, elas tambm devem exibir diferentes
comportamentos quanto solubilidade. Esta diferena designada macro e micro
solubilidade. Como regra geral, a (macro) solubilidade constante quando o dimetro
das partculas superior a 10-3 mm, enquanto que para cristais menores a solubilidade
depende do tamanho das partculas.
Figura 2-8 Macro e micro solubilidade de um slido cristalino
2.1.6.3 Io comum
At agora tratamos a solubilidade de um electrlito em que a fase slida se
encontra em equilbrio com a gua pura. Convm lembrar que no importante o modo
como o estado de equilbrio alcanado. Obtm-se o mesmo resultado quando um slido
est em equilbrio com uma certa soluo aquosa ou quando um slido formado numa
reaco de precipitao por adio de duas solues aquosas. Na prtica, a precipitao
induzida por solues que contm um reagente de precipitao em excesso.
Est claro que a solubilidade de um slido numa soluo saturada zero e que
pequena numa soluo que j contenha os ies da substncia que se dissolve (io
comum), mas que ainda no esteja saturada. Da mesma forma, ser de esperar uma
Solu
bilid
ade
Tamanho das partculas 10-3 mm
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33
solubilidade reduzida num sistema no qual esteja presente na soluo original apenas um
dos ies constituintes do soluto. Este resultado pode ser deduzido a partir da aplicao
do Principio de Le Chatelier ao equilbrio seguinte:
MaBb (s) ' a M+ (aq) + b B- (aq) Eq. 2-22
O principio de Le Chetelier estabelece que quando os ies M+ ou B- existem em
excesso na soluo, o equilbrio desloca-se no sentido dos reagentes. Isto conduz a uma
solubilidade menor, comparativamente solubilidade num sistema em que os ies M+ ou
B- no esto presentes na soluo original.
A partir destas consideraes, conclui-se que o efeito do io comum reduz a
solubilidade, a expresso do produto de solubilidade continua a ser vlida uma vez que
se trata de uma constante termodinmica.
2.1.6.4 Formao de complexos
A solubilidade dos sais aumenta sempre que soluo saturada se adiciona uma
substncia que reaja com um dos ies. Neste caso particular, a substncia adicionada vai
originar, por reaco com um dos ies, um complexo solvel e estvel, diminuindo assim
a concentrao do referido io. Por exemplo, verifica-se este caso na solubilizao de um
precipitado de cloreto de prata, AgCl, por adio de uma soluo aquosa de amonaco,
NH3.
As equaes qumicas que traduzem as reaces so as seguintes:
AgCl (s) ' Ag+ (aq) + Cl- (aq) Eq. 2-23 Ag+ (aq) + 2 NH3 (aq) ' [Ag(NH3)2]+ (aq) Eq. 2-24
Ao ocorrer a formao do io diaminoprata, um io complexo estvel, existe uma
diminuio da concentrao do catio prata, pelo que a primeira reaco se vai deslocar
no sentido directo, para contrariar a perturbao introduzida ao sistema, inicialmente em
equilbrio, provocando, assim, um aumento da solubilidade do cloreto de prata.
2.1.6.5 pH do meio
O pH das solues afecta a solubilidade dos sais. Vejamos, por exemplo, o efeito
da variao do pH na dissoluo de Ca(OH)2 (s) em gua:
Ca(OH)2 (s) ' Ca2+ (aq) + 2 OH- (aq) Eq. 2-25
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Pelo princpio de Le Chatelier, verificamos que, ao aumentar a concentrao de
ies OH- (aumentando o pH) na soluo, o equilbrio desloca-se no sentido da formao
de Ca(OH)2 slido, reduzindo, assim, a solubilidade deste. Por outro lado, ao aumentar a
concentrao de ies H+ (diminuindo o pH), reduz-se a concentrao de ies OH- em
soluo, pelo que a solubilidade aumenta.
Conclumos, pois, que as bases insolveis se dissolvem mais facilmente em
solues cidas, e que, de forma anloga, os cidos insolveis se dissolvem mais
facilmente em solues bsicas.
2.1.6.6 Troca de ies
A solubilidade de um slido num solvente uma propriedade bem definida de
todos os slidos cristalinos. Nas solues aquosas, a maior parte dos slidos dissocia-se
e existe na forma dos correspondentes caties e anies.
Se a soluo no contm outros electrlitos, os caties e os anies esto
presentes na soluo nas propores estequiomtricas do slido e a solubilidade pode
ser expressa em termos do Kps. Contudo, nem sempre se observa este comportamento.
Muitos minerais comportam-se de uma forma diferente. Tem-se observado que os anies
(por exemplo silicatos) fazem parte de uma estrutura cristalina rgida insolvel e que os
caties esto presentes apenas para compensar o excesso de carga negativa dos anies
da estrutura rgida. Os caties so mantidos na estrutura cristalina por foras
electrostticas puras. No processo de dissoluo, as ligaes polares (electrostticas)
podem ser facilmente quebradas pelos diplos da gua (semelhante dissolve
semelhante), mas as ligaes covalentes so bastante resistentes interaco com as
molculas de gua.
Uma vez que os caties so mantidos na estrutura cristalina por foras
electrostticas, eles ocupam espaos vazios da estrutura, e podem facilmente serem
substitudos por outros caties de carga e tamanho semelhantes. Contudo, caties com
maior carga e menor raio inico so mais fortemente retidos na superfcie do slido do
que os caties com menor carga e maior raio inico.
A argila um exemplo deste tipo de minerais. Neste caso, a estequiometria dos
compostos no fixa. Estes materiais exibem uma baixa solubilidade, mas podem trocar
certos caties na sua estrutura com caties presentes na soluo aquosa (exemplo, gua
do mar, a qual contm cerca de 0,7 mol dm-3 de electrlitos). Esta substituio
chamada de processo de troca de ies.
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35
2.2 Enquadramento do ensino da solubilidade nos curricula portugus
2.2.1 Curricula
O conceito de solubilidade est presente no programa de Cincias Fsico -
Qumicas do 3 Ciclo do Ensino Bsico e no programa da componente de Qumica do 11
ano de escolaridade da disciplina de Cincias Fsico Qumicas.
A primeira abordagem da solubilidade feita no tema C Sustentabilidade na
Terra e no captulo II Reaces Qumicas, da disciplina de Cincias Fsico
Qumicas do 3 ciclo do Ensino Bsico. De seguida, apresentamos uma tabela com os
contedos a abordar (Tabela II), as competncias especficas que os alunos devem atingir
e um conjunto de experincias educativas propostas nas orientaes curriculares de
Cincias Fsicas e Naturais do 3 ciclo do Ensino Bsico (ME Bsico, 2001).
O conceito de solubilidade abordado de uma forma mais complexa no programa
de Fsica e Qumica A do 11 Ano do Ensino Secundrio, mais especificamente na
Unidade 2 Da Atmosfera ao Oceano: Solues na Terra e para a Terra. Nesta
unidade tem-se as solues aquosas naturais como contexto para a abordagem e
aprofundamento de muitos conceitos qumicos importantes, como equilbrio qumico,
cido base, oxidao reduo e solubilidade (Figura 2-9).
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36
Tema C Sustentabilidade na Terra
Captulo II Reaces Qumicas
Subcaptulo
Contedos
Competncias
Experincias Educativas
Tipos de
reaces
qumicas
Reaces de
precipitao
Distinguir entre sais solveis e
insolveis
Interpretar reaces de
precipitao
Reconhecer a aplicabilidade
das reaces
de precipitao
Questionar os alunos acerca da solubilidade de diferentes substncias
em gua. Incentiv-los a pesquisar as
propriedades da gua existente em
diferentes regies do pas, a dureza da
gua em diversas amostras e mtodos
usados para diminuir a dureza da gua
de consumo.
Realizar reaces de precipitao e verificar a formao de sais pouco
solveis (precipitados) a partir de sais
solveis. Este contedo pode ser
relacionado com aprendizagens j
realizadas em Cincias Naturais; por
exemplo, relacionar com a formao de
estalactites e estalagmites nas grutas
calcrias e com a formao de
conchas e de corais.
Incentivar os alunos a escrever as equaes de palavras correspondentes
s reaces qumicas realizadas e a
investigar o que acontece massa das
substncias que tomam parte numa
reaco qumica.
Tabela II Insero do conceito de solubilidade no Programa de Cincias Fsico Qumicas do 3 ciclo do Ensino Bsico
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37
Figura 2-9 Ilustrao da organizao da Unidade 2 Da Atmosfera ao Oceano: Solues na Terra e para a Terra, do programa de Fsica e Qumica A do 11 Ano do Ensino Secundrio (ME 10-11, 2003)
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38
Apresentamos de seguida os objectivos de ensino e os objectivos de aprendizagem enunciados no programa de 11 Ano de Qumica.
Objecto de ensino
2 - Da Atmosfera ao Oceano: Solues na Terra e para a Terra
A gua na Terra e a sua distribuio: problemas de abundncia e de escassez. Os encontros mundiais sobre a gua, com vista resoluo da escassez de
gua potvel.
2.4. Mineralizao e desmineralizao de guas 2.4.1 A solubilidade e o controlo da mineralizao das guas.
Mineralizao das guas e dissoluo de sais. Solubilidade: solutos e solventes. Solubilidade de sais em gua: muito e pouco solveis. Soluo no saturada e saturada de sais em gua. Aplicao da constante de equilbrio solubilidade de sais pouco
solveis: constante do produto de solubilidade (Kps).
Objectivos de aprendizagem
2.4. Mineralizao e desmineralizao de guas 2.4.1. A solubilidade e o controlo da mineralizao das guas.
Relacionar a existncia de determinadas espcies qumicas numa gua com a dissoluo de sais e do dixido de carbono na atmosfera.
Relacionar a concentrao de solues saturadas e no saturadas numa determinada substncia com a solubilidade respectiva, a uma
determinada temperatura e presso.
Diferenciar sais pelo valor da solubilidade em gua (muito, pouco e medianamente solveis).
Caracterizar o fenmeno da dissoluo como o resultado de uma interaco soluto solvente.
Apresentar razes que justificam a no existncia de um solvente universal e a existncia de limite da dissoluo de qualquer soluto, em
solues reais.
Identificar fenmenos do quotidiano como dissolues. Explicitar formas de controlar o tempo de dissoluo (estado de diviso
e agitao) mantendo a temperatura e a presso constantes.
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Compreender que numa soluo saturada de um sal na presena deste no estado slido, o equilbrio dinmico (h trocas recprocas entre
ies da rede e da soluo).
Explicitar o significado da constante de produto de solubilidade - Kps. Compreender as razes pelas quais a presena de algumas espcies
qumicas em soluo pode alterar a dissoluo de outras substncias.
Interpretar a formao de estalactites e estalagmites em grutas calcrias.
Apresentar razes para a facilidade da ocorrncia da poluio das guas e a dificuldade de despoluio das mesmas em termos da
solubilidade.
2.3 Concepes alternativas
2.3.1 Ensino por mudana conceptual
Aprender pressupe um processo pessoal e activo de construo de
conhecimento. Esta perspectiva construtivista ope-se concepo do sujeito receptor
passivo de saberes transmitidos e supe que, num qualquer processo de ensino e de
aprendizagem, o aluno deva ser considerado um sujeito activo, possuidor de vivncias e
objectivos prprios que lhe permitem interagir com o meio fsico e social e que
condicionam, de forma decisiva, as novas aprendizagens. Isto significa reconhecer que, a
par com aprendizagens formais, os alunos possuem ideias ou teorias informais sobre os
mais diversos domnios que afectam a interpretao do quotidiano. Neste sentido, cada
aluno chega escola com uma fsica e uma qumica intuitivas e tambm com um
conhecimento informal sobre o mundo social, histrico e econmico, para alm de uma
psicologia intuitiva que, no seu dia-a-dia, lhe conferem adaptabilidade (Pozo, 1996).
No ensino das Cincias , por isso, fundamental ter em conta as ideias e as
explicaes sobre os fenmenos naturais que os alunos trazem para a escola. Estas
concepes, vulgarmente designadas por concepes alternativas (CAs), podero ser
mais ou menos divergentes dos conceitos cientificamente aceites.
Segundo Cachapuz (1995), a designao de concepes alternativas (CA's) surge
por se tratar de "ideias que aparecem como alternativas a verses cientficas de
momento aceites" no podendo ser encaradas como "... distraces, lapsos de
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40
memria ou erros de clculo, mas sim como potenciais modelos explicativos... resultando
de um esforo consciente de teorizao".
Admitimos alguma controvrsia na definio e importncia atribuda no ensino da
Qumica s CAs. Muitas vezes, por outro lado, as CAs podem ser rtulos
desculpabilizadores de verdadeiros erros ou mesmo falta de estudo e organizao (dos
alunos e professores). A nossa posio de equilbrio: nem o dogmatismos de achar que
os alunos no tm CAs e que elas no importam, nem o fundamentalismo de que basta
saber e trabalhar as CAs dos alunos para ensinarmos e aprendermos QumicaA
mesma posio moderada temos face ao construtivismo que subjaz ao movimento das
CAs. As ideias do construtivismo so boas e cruciais mas nem tudo que behaviorista
negativo no processo de ensino aprendizagem.
A conscincia da existncia destas ideias exige, necessariamente, respostas
didcticas adequadas. Nos ltimos vinte/trinta anos tm sido identificadas CA's em vrias
reas. Pfundt e Duit inventariaram 3500 estudos nesta linha de investigao, publicados
nas mais importantes revistas de divulgao internacional de Educao em Cincias
(Pfundt e Duit, 1994).
Com a finalidade de contribuir para facilitar a utilizao, pelos professores, dos
resultados da investigao em CA's, Furi (1996) enumerou, de forma simples e sinttica,
sete aspectos:
1. os estudantes chegam sala de aula com um conjunto variado de CA's e muitas delas possuem uma certa coerncia interna;
2. as CA's so comuns a estudantes de diferentes meios, idade e gnero; 3. as CA's so persistentes e no se modificam facilmente com estratgias de
ensino convencionais;
4. as CAs apresentam um certo isomorfismo com concepes vigentes em perodos da histria do pensamento cientfico e filosfico;
5. o conhecimento anterior dos alunos interage com aquilo que se ensina na aula e sero de esperar consequncias imprevistas na aprendizagem;
6. as CA's podem surgir a partir de experincias pessoais muito variadas, que incluem a percepo, a cultura, a linguagem, os mtodos de ensino dos
professores, os materiais educativos,;
7. as estratgias que facilitam a mudana conceptual podem ser ferramentas eficazes na sala de aula.
A origem das CA's dos alunos um campo de interesse para muitos autores e
Pozo (1996) prope mesmo trs vias principais para explicar o seu aparecimento:
sensorial, cultural e analgica. Uma origem sensorial, para explicar o que designa por
concepes espontneas na percepo de fenmenos, processos e observaes na
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41
vida quotidiana; uma origem cultural, para explicar as chamadas concepes sociais
resultantes da influncia do meio social e cultural que envolve o aluno, sendo a sua
transmisso feita atravs da linguagem; uma origem analgica, para explicar as
concepes analgicas que aparecem no desempenho de tarefas onde so
estabelecidas analogias com ideias ou esquemas de conhecimentos provenientes de
outras reas. Estes aspectos contribuem certamente para ajudar os professores a
diagnosticar e compreender as ideias dos alunos, a escolher as estratgias mais
adequadas sua abordagem didctica e a reflectir sobre as prprias prticas. Neste
sentido, Cachapuz (1995) chama a ateno para a possibilidade de algumas CA's serem
reforadas nas prprias situaes de aprendizagem, atravs dos manuais escolares ou
do prprio professor, ao serem utilizadas analogias, linguagem e representaes
diagramticas inadequadas ou excessivamente simplistas.
Vrios autores alertam para a dificuldade de, na prtica, se conseguir ultrapassar
algumas CA's dos alunos, j que, como afirma Santos (1992), estas concepes resistem
mudana, constituem verdadeiros obstculos epistemolgicos e impedem (iludem) a
construo do saber cientfico. Para alm desta estabilidade, registam-se ainda, com
frequncia, efeitos regressivos, ou seja, o ressurgimento de concepes que pareciam ter
sido abandonadas.
A existncia de CA's nos alunos no deve, porm, ser encarada de forma fatalista
pelos professores. Opostamente, deve aceitar-se como natural o carcter evolutivo do
aluno, colocando a contribuio do professor no desafio desse desenvolvimento. Os
resultados da investigao afiguram-se muito importantes, no s para o professor
conhecer as ideias dos alunos, como para poder criticar, de forma fundamentada, o
paradigma de ensino pela transmisso verbal de conhecimentos acabados.
Em oposio aos modelos de ensino destinados exclusiva aquisio conceptual
surgem hoje propostas de ensino para a mudana conceptual. Estas enquadram
estratgias que, partindo das CA's, procuram criar situaes onde o aluno construa ou
reconstrua novas estruturas conceptuais.
O reconhecimento da importncia das interaces scio-culturais na
aprendizagem, nomeadamente como fonte de algumas CA's, pode constituir, tambm,
um importante instrumento de reflexo didctica, fazendo prever que a construo dos
conceitos cientficos ser promovida se o aluno tiver oportunidade de, em grupo,
expressar e ouvir outras ideias e interpretaes, dvidas ou explicaes, o que requer,
naturalmente, aulas organizadas nesse sentido.
Mas aprender Cincia pressupe ser-se iniciado numa cultura de Cincia (Driver
et al., 1994), o que significa que a aprendizagem no se pode esgotar nos conceitos,
-
Recursos digitais para o ensino sobre Solubilidade
42
devendo tambm contemplar aspectos relativos natureza do conhecimento cientfico,
aos processos e aos valores envolvidos na sua construo.
O campo de investigao acima referido e inicialmente centrado na identificao
das ideias dos alunos sobre conceitos cientficos alargou-se s estratgias didcticas de
mudana conceptual e, ultimamente, tem posto em evidncia outros aspectos da
aprendizagem em Cincias. Para alm dos conceitos e das relaes entre conceitos,
esto tambm em causa aspectos epistemolgicos, metodolgicos e axiolgicos, como
sejam, respectivamente, as concepes sobre a natureza da Cincia, as concepes
sobre as formas de pensar e proceder na actividade cientfica e o interesse, as atitudes e
os valores dos alunos face aprendizagem em Cincias (Furi, 1996).
Indissociveis da aprendizagem esto tambm as prticas de avaliao. Num
paradigma sensvel s ideias construtivistas no faz sentido avaliar somente os produtos
ou os conceitos, em detrimento dos processos, das atitudes e dos valores que se
reconhecem como fundamentais na construo do conhecimento cientfico. A
investigao nunca fornecer qualquer algoritmo de ensino aos professores, mas
permitir-lhes- analisar as prprias prticas, tomando decises de forma mais coerente e
fundamentada. Neste sentido, o desenvolvimento profissional dos professores
fundamental, sendo de especial importncia a actualizao permanente, a troca de
experincias e a identificao das prprias concepes de ensino e de Cincia.
2.3.2 Principais concepes alternativas em solubilidade
Um grande nmero de investigaes desenvolvidas tem revelado que, antes de
serem sujeitos ao processo de ensino aprendizagem, os alunos j tm algumas ideias
acerca de muitos processos naturais (Driver e Erickson, 1983). Estes estudos mostram
ainda que, frequentemente, estas ideias diferem substancialmente das ideias tidas como
cientificamente verdadeiras e que formam esboos conceptuais difceis de modificar.
Uma das muitas reas da cincia onde os alunos revelam concepes alternativas
na dissoluo de uma substncia noutra. Uma incompreenso do fenmeno de
dissoluo muito importante sob o ponto de vista qumico, uma vez que o tpico da
dissoluo um aspecto bsico em qualquer tema do programa de qumica no ensino.
Existem poucos estudos sobre as ideias dos alunos sobre solues e dissoluo,
embora este assunto seja muitas vezes focado em alguns estudos mais generalistas. Por
exemplo, Driver (1985), num estudo sobre o princpio da conservao da matria usou,
como um dos exemplos, o processo de dissoluo. Este estudo com alunos da Nova
Zelndia, mostra que 25 % dos alunos usam os termos difunde e dissolve com o
mesmo significado e que alguns alunos ficam de tal modo presos s suas ideias
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Recursos digitais para o ensino sobre Solubilidade
43
preconcebidas que consideram que o acar em soluo no permanece a mesma
substncia, por se combinar com a gua. Por ultimo, este trabalho mostra que s alguns
alunos (com 13 anos de idade ou mais velhos) usam as ideias de partculas nas suas
explicaes acerca do processo de dissoluo.
Prieto, Blanco e Rodrigues (1989) realizaram um estudo sobre as ideias de alunos
espanhis, com idades compreendidas entre os 11 e os 14 anos, acerca da natureza das
solues e o processo de dissoluo. De acordo com estes autores, as explicaes do
fenmeno de dissoluo de uma substncia noutra, apresentada pelos alunos, indica a
familiarizao com uma pequena variedade de exemplos concretos deste fenmeno. Os
alunos inquiridos basearam as suas respostas nas suas experincias do dia-a-dia, as
quais podero ter condicionado largamente as ideias dos alunos sobre solues e o
processo de dissoluo. As observaes particulares que podem ser feitas com base
neste estudo so:
existe uma pequena diferena na terminologia usada para descrever o fenmeno de dissoluo pelos alunos dos 6 e 8 anos de escolaridade e
esto relacionadas basicamente com as experincias dirias. Os termos
cientficos encontrados nos livros de texto no surgem como uma parte
importante na terminologia dos alunos;
os exemplos dados pelos alunos tendem a referir-se a casos do dia-a-dia e esto restritos a slidos particulares que se dissolvem em lquidos;
os conceitos que os alunos tm do processo de dissoluo esto muitas vezes misturados com noes que, no sentido restrito, esto pouco relacionados
com a dissoluo.
A maior parte das respostas dos alunos de todos os anos lectivos atribui uma
grande importncia s aces mecnicas envolvidas na dissoluo de substncias, como
por exemplo a agitao e o aquecimento. Outro ponto que emergiu deste estudo foi que
os alunos vem o soluto como o componente mais importante do processo de dissoluo;
o solvente visto como o componente passivo do processo. Apenas os alunos do 8 ano
de escolaridade comearam a reconhecer a importncia das interaces soluto
solvente. Contudo, neste contexto, o processo de dissoluo geralmente visto como
uma transformao qumica.
Jazlin V. Ebenezer e Gaalen L. Erickson (1996) realizaram um estudo mais vasto
sobre as concepes de solubilidade de alunos do 11 ano de escolaridade de Qumica.
Foram realizadas entrevistas a 13 alunos do 11 ano aps a realizao de uma actividade
que serviu de mote para uma discusso, envolvendo trs sistemas:
a) Acar / gua (sistema A) b) gua / lcool / tinta de pintar (sistema B)
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c) Sal / gua (sistema C)
Aps a anlise dos trs sistemas, surgiram seis concepes qualitativas diferentes
a partir das respostas dos alunos entrevistados:
I. Muitos alunos viam o processo de dissoluo como sendo a transformao fsica de um slido na sua forma lquida. Alguns alunos chamaram a este
processo fuso.
II. Alguns alunos tinham a noo que quando se adiciona o acar gua ocorre uma reaco qumica. Aproximadamente metade dos alunos tem a concepo
que o processo de dissoluo um processo de combinao de duas ou mais
substncias.
III. A diferena de densidade entre duas substncias foi apresentada como uma razo para o facto de dois lquidos no se combinarem ou para explicar a
razo pela qual o sal se deposita no fundo de um gobel com gua.
IV. Alguns alunos argumentaram que as substncias no se dissolvem porque no encontram espao suficiente no meio dissolvente.
V. Um aluno afirmou que as partculas do soluto devem ser suficientemente pequenas para que a dissoluo ocorra; se o soluto for dividido em partes
mais pequenas ento dissolve-se no solvente.
VI. Alguns alunos consideram que, para uma substncia se dissolver noutra, o soluto necessita de possuir certas propriedades, contudo no conseguem
especificar essas propriedades.
Angel Blanco e Teresa Prieto (1997) realizaram um estudo com o objectivo de
identificar as ideias dos alunos acerca dos efeitos da agitao e da temperatura na
dissoluo de um sal em gua. O estudo foi realizado com dois grupos distintos de
alunos: um grupo que no tinha qualquer conhecimento em qumica (possuam apenas
as suas ideias); e um outro grupo de alunos com nveis diferentes de conhecimento em
qumica. Verificaram que os alunos que j tinham sido submetidos ao ensino formal em
qumica explicavam o processo de dissoluo tendo em conta os dois factores (agitao
e a temperatura); os alunos que no tinham conhecimentos na rea, ou apenas tinham
tido Cincias Naturais, explicavam o processo de dissoluo tendo em conta apenas um
dos dois parmetros. O mais relevante neste artigo que a maior parte dos alunos tinha
a percepo de que:
A dissoluo um processo reversvel, que pode ser interrompido, fazendo com que o sistema volte ao seu estado original;
A variao da temperatura actua indirectamente na dissoluo; A dissoluo considerada como um fenmeno momentneo.
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Apresentam-se a seguir (Tabela III) algumas das ideias sobre os termos
dissoluo e precipitao retiradas do trabalho de Barker (2004).
Tabela III Ideias dos alunos sobre dissoluo e precipitao
Renem-se de seguida algumas ideias apresentadas pelos alunos sobre
solubilidade e dissoluo. Algumas das ideias so apresentadas na bibliografia da
especialidade mas outras emergem das conversas tidas com alunos e professores de
Qumica (C7). C1 O processo de dissoluo geralmente visto como uma transformao qumica (quando se dissolve o acar na gua, este combina-se com a gua).
C2 Existe uma pequena diferena na terminologia usada por alunos de nveis de escolaridade mais baixos e nveis de escolaridade mais elevados; a terminologia
usada est relacionada essencialmente com as experincias do dia-a-dia.
C3 Os termos derreter e dissolver so muitas vezes usados com o mesmo significado.
C4 Os termos fundir e dissolver so muitas vezes usados com o mesmo significado.
Dissoluo
Precipitao
Os materiais dissolvem-se esmagando e
misturando em gua
O sal no suficientemente duro ou denso
para resistir dissoluo gua tem fora para dissolver um sal
Derreter e dissolver so sinnimos
O sal torna-se lquido quando se dissolve
Ao se dissolver o acar, este derrete-se
Quando se dissolve o acar, a gua fica
com as propriedades do acar e o acar
com as da gua
Perde-se peso na dissoluo
Ao formar-se um precipitado:
A massa aumenta porque um slido
mais pesado do que um lquido
A massa diminui porque ao se formar o
precipitado, produz-se tambm um gs
Alguns alunos referem-se ao lquido da
soluo como o solvente mas raros so
os casos em que descrevem o slido
formado como precipitado.
O acar desaparece quando dissolvido
na gua. Quando o acar se dissolve na gua, o
acar no tem massa, passamos a ter s
gua.
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C5 Os alunos esto familiarizados apenas com alguns processos de dissoluo do dia-a-dia.
C6 O soluto visto como o agente activo da dissoluo. C7 Os alunos consideram que praticamente todas as substncias se dissolvem na gua.
C8 Muitas vezes os alunos explicam o processo de dissoluo considerando apenas uma das aces mecnicas (agitao e temperatura).
2.4 Recursos digitais no Ensino Aprendizagem das cincias
Relativamente aos produtos multimdia interactivos, Lvy (1990) refere que so
particularmente adequados aos usos educativos. Conhece-se h muito o papel
fundamental do envolvimento pessoal do aluno na aprendizagem. Quanto mais
activamente participa na aquisio de um saber, melhor uma pessoa integra e retm
aquilo que aprendeu. Ora, graas sua dimenso reticular ou no linear, o multimdia
interactivo favorece uma atitude exploratria ou mesmo ldica, face ao material a
assimilar. , portanto, um instrumento bem adaptado a uma pedagogia activa.
H muito boa e extrema bibliografia sobre o uso das Tecnologias de Informao e
Comunicao na educao em geral, e na qumica em particular. Optaremos, neste
trabalho, por fazer um resumo sinttico das ideias principais a este propsito.
2.4.1 TIC e educao
Numa sociedade de informao, indispensvel pensar em novas ferramentas
pedaggicas que permitam responder s necessidades de actualizao constante do
conhecimento e uma maior eficincia na forma de comunicar. O dinamismo prprio s
cincias Fsico Qumicas pode ser valorizado e facilmente transmitido com o recurso s
Tecnologias de Informao e Comunicao.
Podemos definir Novas Tecnologias como sendo a reunio dos meios
audiovisuais, informticos e comunicacionais que permitem criar, armazenar, recuperar e
transmitir informao a grande velocidade e em grandes quantidades. A utilizao destas
tecnologias torna-se cada vez mais indispensvel na organizao curricular da
aprendizagem. As novas tecnologias devem ser utilizadas em funo das exigncias
actuais da aprendizagem. Torna-se, assim, importante criar contextos, interaces e
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ambientes de aprendizagem baseados nas Tecnologias de Informao e Comunicao
(TIC).
A sociedade da informao resulta do desenvolvimento destas novas tecnologias.
Portugal acompanha, ao seu ritmo, os outros pases nesta revolucionria forma de
pensar o conhecimento. Os estabelecimentos de ensino tm vindo a adaptar as suas
formas de formar jovens adultos e profissionais s novas exigncias e oportunidades
desta sociedade.
2.4.1.1 As TIC na escola
A implementao das TIC nas escolas representa um dos maiores desafios de
inovao tecnolgica enfrentada pelos sistemas de educao em todo o mundo. Uma
escola que no integre os novos meios informticos, corre o risco de se tornar antiquada.
Como diz Adell (1997): As Tecnologias de Informao e Comunicao no so mais
uma ferramenta didctica ao servio dos professores e alunos elas so e esto no
mundo onde crescem os jovens que ensinamos
Quando se fala de TIC no ensino, podem considerar-se duas vertentes (Paiva,
2002):
O contexto pessoal, isto , a forma como professores e alunos usam o computador como pessoas individuais e no ligadas pela relao pedaggica;
O contexto educativo, disciplinar ou no, em que h interaco directa do professor com os alunos e com a mquina. Aqui se inclui, igualmente, a
relao pedaggica professor/aluno fora da sala de aula, que pode ocorrer nos
mais variados contextos, incluindo comunicao electrnica com a famlia dos
alunos.
No contexto pessoal, as vantagens dos computadores prendem-se com o ganho
de tempo na execuo de tarefas rotineiras (tais como preparar testes, elaborar fichas,
realizar trabalhos de casa, fazer pesquisas, tratar dados, fotografia digital e imagem,
trocar informao via correio electrnico, etc.), bem como com a possibilidade de
formao distncia, participao em trabalhos e experincias conjuntas escala
nacional e internacional, etc.
No contexto educativo, so de referir, entre outras vantagens, a interaco
diferenciada que o professor pode estabelecer com os seus alunos quando recorre a
software especfico, a pesquisa on-line dirigida, a possibilidade de comunicao por
correio electrnico para tirar dvidas, enviar ficheiros, entrar em contacto com os
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encarregados de educao, etc. Neste contexto, o professor tem um papel decisivo na
formao do aluno. Cabe ao professor:
Orientar o aluno, dando-lhe pistas e objectivos concretos; Estabelecer com o aluno uma relao baseada na confiana, no conselho e no
acompanhamento;
Propor o reforo de certas noes abordadas nas aulas; Propor a realizao de projectos de investigao documental informatizada,
para desenvolver a sua motivao, associar o domnio de ferramentas
informticas procura de informaes precisas e, finalmente, melhorar a sua
competncia de leitura;
Abordar projectos baseada na anlise critica e comparativa dos media (televiso, imprensa, Internet).
Na Tabela IV esto enumeradas algumas aplicaes das TIC no ensino e algumas
actividades que, com elas, os alunos podem realizar. Na Tabela V apresentam-se
possveis contextos educativos de utilizao das aplicaes TIC e respectivas
actividades, a desenvolver na escola.
Aplicaes das TIC Actividades realizadas
Processador de texto (Word, Publisher,
etc.) Produo e edio de informao
Programas grficos / de desenho Produo de informao em forma grfica /
Actividades artsticas
Folha de calculo (Excel, SPSS, etc.) Organizao e gesto de informao
Multimdia / CD-ROM Consulta e pesquisa de informao
Correio electrnico Comunicao e intercambio em rede
Internet (www) Simulaes / Jogos
Software pedaggico Recolha e tratamento de dados em
cincias
Software de aquisio de dados
Tabela IV Algumas aplicaes das TIC e respectivas actividades a desenvolver com os alunos (Paiva, 2002)
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Contextos de utilizao das TIC
Disciplinar
Trabalho de rea projecto
Apoio Pedaggico
Apoio a alunos com necessidades educativas especiais
Clubes / Ncleos
Trabalhos de casa
Aulas laboratoriais
Tabela V Alguns contextos educativos do uso das aplicaes TIC na escola (Paiva, 2002)
O uso das TIC no ensino das Cincias Fsico-Qumicas, em particular, tem sofrido
algumas evolues. Se inicialmente os computadores eram usados nos clculos
cientficos (simulaes, anlise numrica, etc.) e como auxiliares de elaboraes tericas,
hoje eles so usados em tempo real na aquisio de dados e como controladores de
experincias. Salienta-se o uso cada vez mais frequente de sistemas periciais quer na
investigao, quer no ensino.
Em Cincias Fsicas e Qumicas algumas das funcionalidades dos computadores
podem ser as seguintes (Correia, 2005):
A. Controlo de Experincias: uma grande parte dos aparelhos laboratoriais tem processadores incorporados para realizar tarefas como deteco de erros,
calibrao, ajuste para condies especiais, etc.
B. Aquisio de dados e controlo experimental: permite utilizar o computador no controlo de experincias com elevada preciso e de onde se tira partido das
potencialidades do computador (rapidez de clculo, grafismo, etc).
C. Modelao e Simulao: a elaborao de modelos conceptuais ajuda na compreenso dos fenmenos naturais. No devem ser esquecidas as suas
limitaes e o papel fundamental do professor na sua utilizao. importante
salientar que uma simulao em computador no substitui a experincia
laboratorial; como as suas potencialidades so diferentes, a sua utilizao deve
ser complementar.
D. Armazenamento de informao: a utilizao dos computadores como base de dados extremamente vantajosa, bem como os programas que permitem
trabalh-las. (ex: bases de dados de espectros de massa, IV, e ressonncia
magntica, Chemical Abstracts, etc).
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E. Resoluo de Problemas: existem programas importantes para a elucidao de estruturas e sntese de compostos complexos.
F. Representao grfica de dados e estruturas: a importncia dos grficos est na possibilidade dos qumicos e dos fsicos os poderem manipular (mudana de
escala, por vrias estruturas complexas em contacto, rotao, etc) e poderem
fazer um tratamento interactivo dos resultados.
G. Clculos numricos: a facilidade e rapidez de clculos dos computadores aproveitada quer na Fsica (Fsica Nuclear, por exemplo), quer na Qumica
(clculos, qunticos, simulao do comportamento de slidos e lquidos, dinmica
das reaces qumicas, etc).
H. Exerccios e prtica: uma modalidade de programa que possibilita o exerccio de certas habilidades. Quando bem elaborado e adequado, pode ser um ptimo
auxilio de treino. Uma das suas grandes vantagens a grande interaco entre
utilizador e programa, porque requer a resposta frequente do aluno, oferece
feedback imediato e explora as caractersticas grficas e sonoras do computador.
Com este tipo de programa, o professor fica munido de uma imensido de
exerccios com diferentes graus de complexidade. Se o software, alm de
apresentar o exerccio, recolher as respostas, o professor verifica a performance
do aluno, embora seja impossvel avaliar as causas dos erros. Este mtodo
pobre em termos pedaggicos mas bastante til.
I. Aplicativos: So programas voltados para aplicaes especficas (processadores de texto, folhas de clculo, bases de dados) que, embora no tenham sido
desenvolvidas com fim educacional podem ser usadas em diversas disciplinas.
J. Jogos: Apesar promoverem a aprendizagem, pretendem ser divertidos. Estes jogos so normalmente executados sob o comando de um conjunto de regras
bastante claras e h sempre um vencedor, mesmo quando o jogador disputa com
o computador! Embora divertidos, a competio desvia a ateno do aluno do
conceito envolvido no jogo, que geralmente simples, e incapaz de discernir
quais as causas de falha do jogador. Para tornear estes problemas, o jogador,
aps falhar, deve reflectir sobre a causa do engano e tomar conscincia do erro
conceptual envolvido.
K. Tutoriais: transmitem a informao de uma forma pedagogicamente organizada, como um livro animado ou um vdeo interactivo. Os contedos dividem-se
segundo um tema central e vrias ramificaes, planeadas para proporcionar uma
instruo mais detalhada e acessvel. O sistema gerador de uma lgica
especfica a ser usada pelo aluno; alm disso, capaz de acumular informao
sobre o aluno e decidir, automaticamente, se o aluno, ao cometer um erro, deve
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passar por uma sequncia instrucional. Estes sistemas no permitem uma
interveno profunda no processo de ensino aprendizagem. Por outro lado,
permite que o aluno aprenda com o seu prprio ritmo e atravs de mtodos mais
apelativos do que o papel: animao, som e interactividade.
L. Sistemas tutoriais inteligentes: baseia-se na articulao de trs mdulos um mdulo de conhecimento (em que reside o conhecimento dos peritos), outro que
modela a aprendizagem, explicando as modificaes cognitivas ocorridas no
aprendiz, e o mdulo tutorial que decide sobre a estratgia a seguir, tendo em
conta o trao de aprendizagem e o campo de conhecimentos.
2.4.1.2 Potencialidades e limitaes das TIC
Para as crianas em idade pr-escolar, o multimdia em CD-ROM, por exemplo,
pode contribuir decisivamente para o desenvolvimento das capacidades de observao e
reflexo e coordenao psicomotora. As potencialidades do multimdia tornam-no um
instrumento quase insupervel j que rene em simultneo a imagem, a cor, o som e
ainda todos os efeitos visuais e sonoros que conseguem prender a ateno da criana.
Porm, h que ter cuidado com as ambiguidades do ludo-educativo (Carrier, 1997),
etiqueta frequentemente usada pelo marketing para atrair as crianas (ludo) e os pais
(educativo) e que muitas vezes tem muito do primeiro e pouco do segundo.
Para todos os alunos (sobretudo do bsico e secundrio), as prticas pedaggicas
que utilizam as TIC duma forma planeada e sistemtica permitem:
P1. o desenvolvimento de uma competncia de trabalho em autonomia (fundamental ao longo da vida), j que os alunos podem dispor, desde muito
novos, de uma enorme variedade de ferramentas de investigao. Se
verdade que nenhuma tecnologia poder jamais transformar a realidade do
sistema educativo, as tecnologias de informao e comunicao trazem dentro
de si uma nova possibilidade: a de poder confiar realmente a todos os alunos
a responsabilidade das suas aprendizagens (Carrier, 1998);
P2. uma prtica de anlise e de reflexo, confrontao, verificao, organizao, seleco e estruturao, j que as informaes no esto apenas numa fonte.
As inmeras informaes disponveis no significaro nada se o utilizador no
for capaz de as verificar e de as confrontar para depois as seleccionar. A
recolha de informaes sem limite pode muito bem provocar apenas uma
simples acumulao de saberes;
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P3. a abertura ao mundo e disponibilidade para conhecer e compreender outras culturas;
P4. a criao de sites (em colaborao com os colegas e professores da sua ou de outras escolas), a qual vai permitir que os alunos realizem um trabalho de
estruturao das suas ideias; uma organizao espacial; uma preocupao
esttica; uma pesquisa histrica, geogrfica e cultural sobre a escola, o local e
a regio onde habitam e estudam; um registo de sons e imagens (fotografia e
vdeo); uma traduo em vrias lnguas;
P5. um acesso informao com rapidez e facilidade (um dos seus principais trunfos);
P6. o trabalho em simultneo com um ou mais colegas situados em diferentes pontos do planeta;
P7. um ensino activo, baseado na descoberta progressiva do conhecimento pelo aluno. O professor intermedirio entre os alunos e a informao, indicando
caminhos e ao mesmo tempo deixando espao livre para a sua autonomia,
reflexo crtica e criatividade. Desta forma, est-se a contribuir para a
formao do cidado, capaz de interagir com o ambiente em que vive,
respeitando-o e procurando solues cientficas para os problemas do dia-a-
dia;
P8. ajudar a reflectir sobre o prprio pensamento (metacognio), permitindo concretizar as questes de domnio formal e ajudando, por isso, os alunos no
desenvolvimento cognitivo e intelectual, em especial o raciocnio lgico formal;
P9. a utilizao de poderosas ferramentas intelectuais para professores e alunos que vo desde as folhas de clculo, s bases de dados, aos processadores de
texto, aos programas estatsticos, manipulao de equaes de funes,
etc.;
P10. uma diversificao na metodologia que conduz a um enriquecimento das aulas;
P11. a motivao do aluno ou at mesmo do professor, para as aulas; P12. um maior volume de informao que est disponvel para os alunos; P13. o seu uso em simultneo com a investigao cientfica, sendo possvel
desenvolver hipteses, test-las, analisar os resultados e aperfeioar os
conceitos;
P14. a interdisciplinaridade; P15. a verificao e confrontao de fontes diversas, permitindo ao aluno
seleccionar o documento que lhe parece mais adequado;
P16. a organizao do pensamento dos alunos;
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P17. proporcionar o recurso a medidas rigorosas de grandezas fsicas e o controlo de equipamento laboratorial com interfaces e sensores adequados
(uma importante utilizao das TIC que, contudo, no ser aprofundada neste
trabalho);
P18. a criao de micromundos de aprendizagem, por exemplo, proporcionando de modo rpido, barato e inofensivo, simulaes computacionais de
experincias que so: rpidas demais para serem controladas, inacessveis
escola, excessivamente perigosas, ou mesmo artificiais exigindo condies
impossveis de obter na prtica;
P19. a utilizao das potencialidades grficas notveis que podem ser rentabilizadas para uma aprendizagem significativa;
P20. o acesso a exploraes ldicas, nomeadamente por meio de actividades didcticas centradas em jogos.
Contudo, ao seleccionar e planificar estratgias usando as TIC devem ser tidas
em conta algumas dificuldades/constrangimentos (Wild, 1996).
D1. A escola uma instituio social muito conservadora que apresenta barreiras s inovaes tecnolgicas. Estas instituies resistem mesmo s mais
pequenas tentativas de mudana, sendo necessrio todo um processo de
sensibilizao da escola;
D2. Muitos alunos (de extractos scio-econmicos baixos) no possuem computador;
D3. A falta de formao dos docentes, quer no incio quer durante o exerccio da profisso docente, para utilizarem as novas tecnologias pedaggicas;
D4. O stress do professor ao ter que lidar com o desconhecido. Os professores sentem-se preocupados com as TIC, principalmente porque muitos desses
professores admitem no compreender bem as novas tecnologias.
D5. Alguns doce