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Além do mar e do amor – eternamente CAMÕES

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Além do mar e do amor – eternamente CAMÕES

VIDANascimento: 1524. Filho de Simão Vaz de Camões e de Ana de Sá

Macedo.Família: fidalgos decadentes. Escolaridade: Universidade de Coimbra. Exército: serviu como militar no Norte da África.Exílio: África e Ásia (Macau – China) – 17 anos.Retorno: 1570.Os Lusíadas: publicado em 1572.Dedicatória: D. Sebastião, rei de Portugal.Pensão: 15000 réis por ano.Falecimento: 1580.Obras: poesias líricas, uma poesia épica, três peças

para teatro e algumas cartas.

Camões líricoMaior poeta lírico português. Obra dual: herança tradicional - redondilhas; enquadradas no Renascimento. Principais temas abordados:Poesia Tradicional – redondilhas: herança das

cantigas trovadorescas (de amigo)- o mar, a fonte, a natureza:

Cantiga

“Cantiga alheia: Na fonte está Lianor Lavando a talha e chorando, Às amigas perguntando: - Vistes lá meu amor?”

Voltas “Posto o meu pensamento nele,Porque a tudo o amor obriga,Cantava, mas a cantigaEram suspiros por ele.Nisto estava LianorO seu desejo enganando, Às amigas perguntando:- Vistes lá o meu amor?”

O AmorTema mais rico da lírica camoniana.É visto como ideia (neoplatonismo) e como

manifestação de carnalidade. Enquanto ideia ou espiritualidade: conduz à

idealização da mulher - influência de Petrarca e Dante Alighieri.

Mundo sensível: amor terreno, erótico, carnal: a própria vida atribulada do poeta, sua experiência concreta .

Síntese desses dois amores: contradição, manifestada no uso abusivo de antíteses.

Busque Amor novas artes, novo engenho,Pera matar-me, e novas esquivanças;Que não pode tirar-me as esperanças,Que mal me tirará o que eu não tenho. Olhai de que esperanças me mantenho!Vede que perigosas seguranças! Que não temo contrastes nem mudanças,Andando em bravo mar, perdido o lenho. 

Mas, conquanto não pode haver desgostoOnde esperanças falta, lá me escondeAmor um mal que mata e não se vê; Que dias há que na alma me tem postoUm não sei quê, que nasce não sei onde,Vem não sei como, e dói não sei por quê.

O desconcerto do mundoTema perturbador

quanto: às injustiças – prêmio

aos maus e o castigo aos bons;

“Os bons vi sempre passarNo mundo graves tormentoE, para mais me espantar,Os maus vi sempre nadarEm mar de contentamentos.

 

Cuidando alcançar assim

O bem tão mal ordenado,

Fui mal. Mas fui castigado.

Assim que só para mimAnda o mundo

concertado.”

Ser e dever ser

“Quem pode ser no mundo tão quietoOu quem terá tão livre o pensamento(ao) Ver e notar do mundo o desconcerto?”

à ambição - guardar bens; aos sofrimentos constantes - aniquilam as

prováveis conquistas.

Amor CarnalSete anos de pastor Jacob serviaLabão, pai de Raquel, serrana bela;Mas não servia ao pai, servia a ela,E a ela só por prêmio pretendia.  Os dias, na esperança de um só dia, Passava, contentando-se com vê-la;Porém o pai, usando de cautela,Em lugar de Raquel lhe dava Lia.  

Vendo o triste pastor que com enganos

Lhe fora assi negada a sua pastora,

Como se não a tivera merecida,  Começa de servir outros sete

anos,Dizendo: - mais serviria, se não

foraPêra tão longo amor tão curta a

vida!

 

AmorXamorBusque Amor novas artes, novo

engenho,Pera matar-me, e novas esquivanças;Que não pode tirar-me as

esperanças,Que mal me tirará o que eu não

tenho.

 Olhai de que esperanças me

mantenho!Vede que perigosas seguranças! Que não temo contrastes nem

mudanças,Andando em bravo mar, perdido o

lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto

Onde esperanças falta, lá me esconde

Amor um mal que mata e não se vê; Que dias há que na alma me tem

postoUm não sei quê, que nasce não sei

onde,Vem não sei como, e dói não sei por

quê.

Amor é fogo que arde sem se ver;

É ferida que dói e não se sente;

É um contentamento descontente;

É dor que desatina sem doer; 

É um não querer mais que bem querer;

É solitário andar por entre a gente;

É nunca contentar-se de contente;

É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;

É servir a quem vence, o vencedor;

É ter com quem nos mata lealdade.

 Mas como causar pode seu favorNos humanos amizade,Se tão contrário a si é o mesmo

Amor?

Alegoria da caverna

Em a República, Platãoo mundo sensível e o mundo inteligívelCompara-os às sombras que se projetariam no fundo de uma

caverna escura se por diante da entrada dessa caverna passassem objetos iluminados pelo sol. Do mesmo modo que entre as sombras projetadas por esses objetos e os objetos mesmos há um abismo de diferença, e, sem embargo, as sombras são em certo modo partícipes da realidade dos objetos que passam, desse modo os seres que contemplamos na nossa existência sensível, não são mais que sombras efêmeras, transitórias, imperfeitas, passageiras, reproduções ínfimas, inferiores, dessas ideias puras, perfeitas eternas, imperecíveis, indissolúveis, imutáveis, sempre iguais a si mesmas, cujo conjunto forma o mundo das ideias.

Os LusíadasEstrutura - Estrofes: 1102 Cantos: 10 Estrofes: 8 versos

(oitavas) Total de versos do

poema: 8816 Versos: decassílabos Rimas: AB AB AB CC Canto I: 106 Canto II: 113 Canto III: 143

Canto IV: 104Canto V: 100Canto VI: 99Canto VII: 87Canto VIII: 99Canto IX: 95CantoX: 156

TítuloCamões foi buscar a palavra lusíada numa

epístola escrita por André de Resende, em 1531. A palavra significa os lusitanos. Os lusíadas são os próprios Lusos, em sua alma como em sua ação.

HeróiO herói de Os Lusíadas não é Vasco da Gama,

mas sim todo o povo português (do qual Vasco da Gama é digno representante). O próprio poeta afirma que vai cantar “ as armas e os barões assinalados” que navegaram “ por mares nunca dantes navegados” , ou seja, todo o povo lusitano navegador que enfrenta a morte pelos mares desconhecidos.

TemaO poeta deixa expresso o tema nas duas

primeiras estrofes: a glória do povo navegador português, que “ entre gente remota edificaram/Novo Reino que tanto sublimaram” isto é, os navegadores que conquistaram as Índias e edificaram o Império Português no Oriente, bem como as memórias dos reis portugueses que tentaram ampliar o Império: “ E também as memórias gloriosas/Daqueles reis que foram dilatando A Fé, o Império...” Portanto, Camões cantará as conquistas de Portugal, as glórias dos navegadores, os reis do passado, a história de Portugal.

Estrutura ProposiçãoOs 10 cantos que

formam o poema aparecem divididos em cinco partes, comuns aos poemas épicos clássicos:

É a apresentação do poema, com destaque para o tema e o herói. São as estrofes 1, 2 e 3 do Canto I:

Estrofe 1 “ As armas e os Barões

assinalados Que, da Ocidental praia

Lusitania, Por mares nunca dantes

navegados, Passaram ainda além da

Taprobana, Em perigos e guerras

esforçados, Mais do que prometia a força

humana, E entre gente remota

edificaram Novo Reino, que tanto

sublimaram;”

Vocabulário: Armas: no sentido de feitos

militares. Barões: o mesmo que varões,

homens. Assinalados: famosos,

célebres; há também uma conotação religiosa, no sentido de ter o sinal divino. Camões sempre associou os feitos marítimos à expansão da fé cristã.

Taprobana: ilha localizada no oceano Índico, a sudeste da Índia, atual Sri Lanka.

Gente remota: referência aos povos asiáticos.

Novo Reino: Império Português na Ásia.

Estrofe 2E também as memórias

gloriosasDaqueles Reis que foram

dilatandoA Fé, o Império, e as terras

viciosasDe África e de Ásia andaram

devastadoE aqueles que por obras

valerosasSe vão da lei da Morte

libertando:Cantando espalharei por

toda parte,Se a tanto me ajudar o

engenho e arte.”

Vocabulário E também...: atentar para um verbo

subentendido – cantar -, que aparece no sétimo verso dessa mesma estrofe e no quinto verso da estrofe seguinte. Na Proposição, o poeta apresenta o assunto que será cantado.

Daqueles Reis: os reis da história de Portugal, que serão celebrados nos Cantos III e IV.

Terras viciosas: as terras da África e da Ásia, não-cristianizadas e, portanto, tidas como “ viciosas” .

E aqueles...: também aqui está subentendido o verbo cantar.

Engenho e arte: para os poetas clássicos, o ideal de poesia era a comunhão entre o pensamento (engenho) e arte.

Estrofe 3Cessem do sábio Grego e do

TroianoAs navegações grandes que

fizeram;” Cale-se de Alexandre e de

TrajanoA fama das vitórias que

tiveram;.Que eu canto o peito ilustre

Lusitano,A quem Netuno e Marte

obedeceram.Cesse tudo o que a Musa

antiga canta,Que outro valor mais alto se

alevanta.”

Vocabulário: Sábio Grego: referência a Ulisses,

personagem do poema Odisséia, de Homero.

Troiano: referência a Enéias, personagem do poema Eneida, de Virgílio.

Alexandro: Alexandre, o Grande, imperador da Macedônia entre 336 e 323 a.C., conquistador de terras orientais.

Trajano: imperador romano responsável por grandes conquistas em terras orientais. Nos quatro versos iniciais da estrofe 3, o poeta cita personagens épicos e grandes conquistadores para, em seguida, cantar um herói superior aos que o antecederam.

Peito ilustre Lusitano: aqui aparece o herói coletivo do poema- o povo lusitano.

Netuno: deus dos mares e dos oceanos. Marte: deus da guerra.

- Invocação: o poeta pede inspiração às Tágides, ninfas do rio Tejo, para que lhe deem um “ engenho ardente” e “ um sol alto e sublimado, um estilo grandíloco. A invocação inicial é feita nas estrofes 4 e 5 do Canto I.

- Dedicatória; o poema é dedicado a D. Sebastião, rei de Portugal à época da publicação do poema. A dedicatória se estende da estrofe 6 à 18 do Canto I.

- Narração: é a longa parte narrativa na qual o poeta desenvolve os episódios da viagem de Vasco da Gama e a história de Portugal. Estende-se da estrofe 19 do Canto I até a estrofe 144 do Canto X, totalizando 1072 estrofes.

Canto I- A narração se inicia com a frota portuguesa em pleno oceano Índico – portanto, já no meio da viagem:

“Já no largo Oceano navegavam,As inquietas ondas apartando;Os ventos brandamente respiravam,Das naus as velas côncavas inchando.”

VocabulárioO concílio dos deuses: ao iniciar a narração,

Camões mostra o Concílio dos deuses no monte Olímpo, situado na região centro-norte da Grécia, onde, segundo a mitologia, seria a morada dos deuses.

Júpiter é o deus que domina o Olímpo.Vênus é a deusa do amor; é a grande defensora

dos lusitanos no Olímpo e protetora de Vasco da Gama durante toda a viagem.

Baco é o deus do vinho; estava contra a viagem de Vasco da Gama, pois não queria perder seus domínios em terras asiáticas.

Netuno, deus dos mares, também estava contra os portugueses por se sentir invadido em seus domínios.

Marte, deus da guerra, defende os portugueses por duas razões: nutria um profundo amor por Vênus e admirava os portugueses, nobres guerreiros.

Surgem os primeiros obstáculos. O destino dos navegadores é decidido no Concílio dos deuses no Olímpo. Baco e Netuno estão contra os portugueses, Vênus e Marte estão a favor: Júpiter decide pela continuidade da viagem, atendendo aos pedidos de Vênus. A viagem prossegue até Mombaça.

Estrofe 106

“No mar tanta tormenta e tanto dano,Tantas vezes a morte apercebida!Na terra tanta guerra, tanto engano,Tanta necessidade aborrecida!”“Onde pode acolher-se um fraco humano,Onde terá segura a curta vida,Que não se arme e se indigne o Céu serenoContra um bicho da terra tão pequeno?”

Canto II

Narra a viagem de Mombaça a Melinde. Mais uma vez, Baco tenta destruir a frota portuguesa, que é salva pela interferência de Vênus. Ao chegar a Melinde, Vasco da Gama é recebido pelo rei, o qual lhe pede que conte a História de Portugal:

“ – Mas antes, valeroso Capitão,Nos conta (lhe dizia), diligente,Da terra tua o clima e regiãoDo mundo onde morais, distintamente;E assi de vossa antiga geração,E o princípio do Reino tão potente,Cós sucessos das guerras do começo,Que, sem sabê-als, sei que são do preço.”

Canto III – estrofe 119Vasco da Gama inicia a narração da história de Portugal;

neste Canto, é contada a história da primeira dinastia portuguesa (desde a formação do Estado independente até a Revolução de Avis). Ao narrar o governo de D. Pedro, Camões escreve o mais belo episódio lírico do poema: o caso de Inês de Castro.

“ Tu, só tu, puro amor, com força crua,Que os corações humanos tanto obriga,Deste causa à molesta morte sua,Como se fora pérfida inimiga.Se dizem, fero Amor, que a sede tuaNem com lágrimas, tristes se mitiga,É porque queres, áspero tirano,Tuas aras banhar em sangue humano.”

Estrofe 120

“Naquele engano da alma, ledo e cego,Que a fortuna não deixa durar muito;Nos saudosos campos de Mondego,De teus fermosos olhos nunca enxuito,Aos montes ensinando e às ervinhasO nome que no peito escrito tinhas.”

Canto IV – Estrofe 95 Vasco narra ao rei de Melinde, a

história da segunda dinastia, período que vai desde a Revolução de Avis até a saída da frota de Gama, já no governo de D. Manuel. No final do Canto, quando a frota vai iniciar a viagem, surge na praia do Restelo um velho que faz sérias críticas às navegações, mostrando que o povo, alheio aos lucros, é quem navega e morre; o rei e a burguesia lucram.

“ Ó glória de mandar, ó vã cobiça Desta vaidade a quem chamamos Fama Ó fraudulento gosto, que se atiça C´uma aura popular, que honra se

chama! Que castigo tamanho e que justiça Fazes no peito vão que muito te ama! Que mortes, que perigos, que

tormentas, Que crueldades neles experimentas!”

Vocabulário: Fama: com maiúscula, isto é, a

personificação da Glória; reparar que o poeta relaciona a Fama à vaidade.

Aura popular: em outras palavras, em nome da honra e do povo cometem-se determinadas fraudes.

Peito vão que muito te ama: uma referência ao povo português, sujeito a perigos e mortes, em nome do lucro, de triunfos, de fama etc.

Estrofe 97“A que novos desastres

determinasDe levar estes Reinos e

esta gente?Que perigos, que mortes

lhe destinas,Debaixo dalgum nome

preminiente?Que promessas de reinos e

de minasDe ouro, que lhe farás tão

facilmente?Que famas lhe prometerás?

Que histórias?”

Vocabulário: Reinos e esta gente:

observar que Camões não prevê um desastre apenas para o povo (gente), mas também para os Reinos (império português); logo, nem o povo nem a pátria lucram com as navegações. Lucram o rei e a burguesia.

Premininte: o mesmo que proeminente; que sobressai.

Estrofe 81 “ E foi assim que, de doença

crua e feia, A mais que eu nunca vi,

desampararam Muitos a via, e em terra

estranha e alheia Os ossos para sempre

sepultaram. Quem haverá que, sem o ver,

o creia Que tão disformemente ali lhe

incharam As gengivas na boca, que

crescia A carne e juntamente

apodrecia?”

Nesta estrofe há a remissão ao Escorbuto, nome de uma doença provocada pela falta de carência da vitamina C. Surgem placas esbranquiçadas pelo corpo, as gengivas incham e sangram, há hemorragias internas e externas. Em pouco tempo, as gengivas apodrecem e os doentes falecem.

O escorbuto atacava os navegadores portugueses principalmente na região próxima ao trópico de Capricórnio, nas costas africanas, daí o escorbuto também ser conhecido como ‘ mal de Luanda’ – capital de Angola.

Canto X

Descrição da Ilha dos Amores e dos favores das ninfas.Há uma descrição do universo e a exaltação dos feitos

portugueses. Regresso a Lisboa.“ Destarte, enfim, conformes já as fermosasNinfas cós seus amados navegantes,Os ornam de capelas deleitosasDe louro e de ouro e flores abundantes.As mãos alvas lhe davam como esposas;Com palavras formais e estipulantesSe prometem eterna companhia,Em vida e morte, de honra e alegria.”

EpílogoEpílogo: é o final do poema, abrangendo as estrofes 145 a

156, do Canto X. O Epílogo inicia-se com uma das mais belas e angustiadas estrofes de todo o poema, na qual o poeta mostra-se triste, abatido, desiludido com a Pátria, que não merece mais ser cantada:

Estrofe 146“ No’ mais, Musa, no’ mais, que a lira tenhoDestemperada e a voz enrouquecida,E não do canto, mas de ver que venhoCantar a gente surda e endurecida,Não no dá a Pátria, não, que está metidaNo gosto da cobiça e na rudezaDuma austera, apagada e vil tristeza.’

Vocabulário:No’ mais, Musa: aqui se inicia o Epílogo, com o poeta

invocando a Musa, desiludido, e mostrando-se cansado, não de cantar, mas de ver que a Pátria não mais merecia ser cantada.

Destemperada: aqui, no sentido de desafinada.Oito anos depois da publicação do poema, as

preocupações de Camões tornaram-se realidade: Portugal perde a autonomia, passando para o domínio espanhol. Camões, mesmo exaltando Portugal, nunca perdeu a consciência da realidade vivida por seu país; desde o governo insano de D. Sebastião, podia-se prever um futuro tenebroso para Portugal.