caminhos para a gestão social de políticas públicas

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Políticas Públicas de Trabalho e Renda:Caminhos para a Gestão Social

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Ministro do Trabalho e EmpregoRicardo José Ribeiro Berzoini

Secretário de Políticas Públicas de Emprego / MTERemígio Todeschini

Governador do Estado de Mato Grosso do SulJosé Orcírio Miranda dos Santos

Secretária de Estado de Trabalho, Assistência Social e Economia SolidáriaEloísa Castro Berro

Diretor-Presidente da FUNTRABAnanias Costa dos Santos

Coordenador de Qualificação Profissional/FUNTRABDavid Santos Melgarejo

Ministro da EducaçãoTarso Genro

Reitor da Universidade Federal de Mato Grosso do SulManoel Catarino Paes - Peró

Vice-reitor da UFMSMauro Polizer

Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Estudantis/UFMSRosa Maria Fernandes de Barros

Presidente da República Federativa do BrasilLuís Inácio Lula da Silva

Projeto Escola de Conselhos - Departamento de Jornalismo/UFMSCoordenação: Edson Silva

Projeto de Extensão Capacitação de Gestores de Políticas Públicas de Trabalho e RendaCoordenação: Eduardo Ramirez Meza

Curso de Gestão Social de Políticas Públicas de Trabalho e RendaCoordenação Pedagógica: Maria de Lourdes Jeffery Contini

Edição publicada com recursos do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador / Ministério do Trabalho e Emprego

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Fundação de Apoio ao Desenvolvimento da Educação de Mato Grosso do SulEscola de Conselhos – Departamento de Jornalismo/UFMSCampo Grande, 2004

Eduardo Ramirez Meza

(Organizador)

Políticas Públicas de Trabalho e Renda:

Caminhos para a Gestão Social

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SULDEPARTAMENTO DE JORNALISMOESCOLA DE CONSELHOS

POLÍTICAS PÚBLICAS DE TRABALHO E RENDA: CAMINHOS PARA A GESTÃO SOCIAL

Realização:Projeto Escola de Conselhos/[email protected]

Edição de Textos:Eduardo Ramirez [email protected]

Revisão:Eduardo Ramirez MezaMaria de Lourdes Jeffery Contini

Projeto Gráfico e Editoração Eletrônica:Edir Jesus dos [email protected]

Capa, Fotolitos e Impressão:Gráfica e Editora Pontual Ltda.Rua Eduardo Elias Zahran, 110 - Jd. PaulistaCEP: 79050-010- Campo Grande (MS)Tel./Fax: (67) [email protected]

Tiragem desta Edição:200 exemplares

Os artigos são de inteira responsabilidade de seus autores.É permitida a reprodução total ou parcial desta publicação desde que citada a fonte.

Projeto Escola de Conselhos - Departamento de Jornalismo/UFMS

Fone/Fax: (67) 345-7609 / 345-7647 / E-mail: [email protected] Universitária s/nº - Caixa Postal 549 /CEP 79070-900 - Campo Grande-MS

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Apresentação, 7

Política e Estado Democrático: algumas interrogações pontuais, 11David Victor-Emmanuel Tauro

Direitos Humanos e Direitos Sociais: desafios e perspectivas, 23Maria de Lourdes Jeffery Contini

As Políticas Públicas e Sociais, 29Regina Estela Andreoli de Almeida

Globalização e Desigualdade Social, 37Inara Barbosa Leão

Globalização, Meios de Comunicação e Mercado de Trabalho, 43Márcia Gomes Marques

Transformações Mundiais Recentes e Mercado de Trabalho, 47Ricardo José Senna

Políticas Públicas de Trabalho e Renda, 51Regina Estela Andreolli de Almeida

História da Educação Profissional no Brasil, 65Inara Barbosa Leão

Introdução à Macroeconomia, 91Cícero Antônio de Oliveira Tredezzini

Comunicação é Obrigação Social, 95Davi Trigueiro dos Santos

O Controle Social no Sistema Tripartite de Gestão, 99Eduardo Ramirez Meza

ANEXO: Resolução nº 80, de 19 de Abril de 1995, 112

Sumário

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Apresentação

OPlano Plurianual 2004-2007 do Governo Federal pretende-se instrumento capaz de colocar em novas bases a Política Pública de Qualificação para que esta,na condição de política social, assuma caráter de centralidade no planejamento

e na integração das diferentes ações governamentais. Desta forma o fortalecimento dosespaços públicos ganha realce de gestão participativa e controle social. Um dos desafi-os colocados neste panorama é promover a integração da Política de Qualificação com asdemais Políticas Públicas de Trabalho e Renda, assim como encontrar as interfaces des-tas com a educação e com o desenvolvimento sustentável. Isso implica um resgate docompromisso público com a mudança na vida do trabalhador.

Por seu turno, o Plano Nacional de Qualificação Social e Profissional – PNQ colocacomo desafio o “empoderamento” dos espaços públicos de gestão participativa e contro-le social, onde enquadra-se determinante o papel da Comissão Estadual de Emprego, nosentido de que suas ações sejam reflexo, de fato, de seu caráter público, tendo em vistaser um órgão de participação cidadã e espaço de partilha dos diferentes interesses dossegmentos da sociedade. O canal de participação da sociedade, através da ComissãoEstadual de Emprego, está aberto. O que parece faltar, contudo, é uma maiorconscientização de seus membros, bem como dos gestores governamentais, sobre aimportância, o papel de cada qual e as estratégias que podem e devem ser utilizadas para arealização de seus poderes, outorgados pela sociedade, na definição, no acompanhamento eno controle das Políticas Públicas de Trabalho e Renda em Mato Grosso do Sul.

Partindo de tais premissas e em atendimento à demanda inscrita no PlanoTerritorial de Qualificação - PLANTEQ/MS pela Comissão Estadual de Emprego e peloGoverno do Estado de Mato Grosso do Sul, por considerar de fundamental importânciaa capacitação dos atores que ocupam este espaço de gestão pública, foi elaborado pelaUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS o projeto de extensão Capacitaçãode Gestores de Políticas Públicas de Trabalho e Renda, que resultou no Contrato firmadoentre a Fundação do Trabalho e Economia Solidária – FUNTRAB, através da Coordenadoriade Qualificação Profissional, e a Fundação para o Desenvolvimento da Educação de MatoGrosso do Sul – FADEMS.

A partir do precitado projeto e do correspondente contrato foi organizado o Curso

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de Gestão Social de Políticas Públicas de Trabalho e Renda, tendo como público-alvoatores que, pelo papel desempenhado na representação da sociedade ou pela funçãodesenvolvida no âmbito do Governo Estadual, se enquadrem no grupo Gestores de Polí-ticas Públicas. Foram considerados prioritários, para efeitos de preenchimento das 32vagas abertas, dois subgrupos: 1) Membros da Comissão Estadual de Emprego e 2) Gestores/as de Políticas Públicas de Emprego e Renda, respectivamente com 15 e 17 vagas.

O objetivo geral do curso é capacitar membros da Comissão Estadual de Empregoe Gestores Governamentais de Mato Grosso do Sul em Políticas Públicas de Trabalho eRenda. São objetivos específicos da proposta:

- Reduzir as diferenças de domínio teórico, político e operacional dos participan-tes, no que diz respeito às Políticas Públicas de Trabalho e Renda;

- Incentivar a adoção de uma cultura de gestão participativa e controle social paraa construção de Políticas Públicas de Trabalho e Renda em Mato Grosso do Sul;

- Promover a integração da Política Pública de Qualificação com as demais PolíticasPúblicas de Trabalho e Renda; e

- Discutir meios de integração entre Políticas Públicas de Qualificação, Educação eDesenvolvimento Sustentável.

Para fazer frente aos objetivos acima elencados o Curso, totalizando uma cargahorária de 120 horas/aula, foi organizado a partir das articulações entre 19 aulas/disci-plinas nomeadas resumidamente: 1) Política e Estado Democrático; 2) Direitos Huma-nos e Sociais; 3) Políticas Públicas e Sociais; 4) Controle Social; 5) Economia do Trabalho;6) Desenvolvimento e Direitos Sociais; 7) Globalização, Trabalho e Emprego; 8)Globalização e Desigualdade Social; 9) Globalização, Meios de Comunicação e Mercadode Trabalho; 10) O Pensamento Complexo na Gestão de Políticas Públicas; 11) Comuni-cação e Participação Social; 12) Políticas Públicas de Trabalho e Renda; 13) SistemaTripartite de Gestão; 14) Indicadores de Trabalho e Emprego; 15) Qualificação Profissio-nal no Brasil; 16) Plano Nacional de Qualificação; 17) O Papel da Avaliação; 18) Supervi-são Operacional, e 19) Interfaces da Política de Qualificação.

A definição dos ministrantes que integram o corpo docente do Curso teve como refe-

rência, para efeitos de escolha, a experiência acadêmica dos professores, com formação e

pesquisas desenvolvidas nas respectivas áreas. O corpo docente é integrado, também, por

profissionais que, comprovadamente engajados e atuantes nas correspondentes áreas, pos-suem reconhecida experiência e competência para ministrar as aulas/disciplinas propostas.

Apresentação

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Desta forma presume-se possível articular a teoria produzida no interior daacademia e a prática de profissionais, selecionados na condição de ministrantes,com as experiências exercitadas por um grupo de atores que ocupam papel de des-taque no processo de Gestão de Políticas Públicas, no caso, os que integram o corpodiscente e a quem destinam-se os textos ora apresentados.

Esta publicação contém, pois, textos-base livremente produzidos a partir da arti-culação do respeitável grupo de ministrantes. Este caderno, além de servir de guia paraos/as educandos/as, poderá ser distribuído a outros/as gestores e membros da ComissãoEstadual de Emprego que não se matricularam no curso, bem como a cada ministrante,além da própria FUNTRAB.

É necessário afirmar, por fim, que o conteúdo do Curso não está integralmen-te aqui representado, até mesmo porque os textos ora publicados foram produzidosanteriormente ao desenvolvimento das aulas, certamente enriquecidas por leiturascomplementares e pelos debates e discussões promovidas pelos ministrantes e cor-po discente. Espera-se, ademais, que o presente caderno encontre acolhida parauma boa leitura.

Eduardo Ramirez MezaCoordenador Geral do Projeto

Maria de Lourdes Jeffery ContiniCoordenadora Pedagógica do Curso

Apresentação

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Oobjetivo deste pequeno texto é apenas suscitar reflexões contínuas, em comum, sobre a política e as atividades cívicas ligadas ao funcionamento da sociedade e à procura da resolução de seus conflitos no quadro social-histórico, do

que passa por um Estado democrático no Brasil contemporâneo. É apenas aconscientização dos cidadãos quanto a seus papéis na comunidade, que pode levar ogrupo alvo deste texto à plena realização de suas tarefas cotidianas no contexto de suasfunções profissionais e políticas.

1. Da política e de suas instituições

Atualmente, a própria palavra “política” chegou a ser tão gasta, a ponto de adqui-rir uma conotação negativa: tornou-se sinônimo de malandragem, de corrupção, de ca-rência de escrúpulos, de ausência de compromisso com a população, etc. Estamos longeda definição originária grega, onde a “política” a ser entendida referia-se à atividadeexplícita da comunidade (polis), em prol da felicidade, da virtude e do bem comum deseus membros. Estamos ainda longe de entender que a verdadeira atividade política é

Política e Estado Democrático: algumasinterrogações pontuais1

1 Reações eventuais a este texto podem ser enviados ao seguinte email: [email protected] várias fontes da obra de Susan George, em geral apenas disponíveis em inglês. Minha grati-dão é extendida por sua compreensão. Vide bibliografia in fine.

Para Susan George, pesquisadora e ativista política

David Victor-Emmanuel Tauro

Doutor em Sociologia pela École desHautes Études en Sciences Sociales, Paris,e Professor Adjunto do Departamento deCiências Humanas/CCHS da UniversidadeFederal de Mato Grosso do Sul.

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aquela que realiza a nossa humanidade2. Em outros termos, são pelas idéias, represen-tações, instituições e atos que os homens encenam e realizam a sua humanidade. E,seguindo nosso mestre, o Estagirito, a dotação de linguagem é o atributo que sela essanatureza humana dos homens, os distingüindo dos animais (Ibid). É pelo processo dehumanização e socialização que os seres humanos se tornam aptos à sobrevivência comoseres humanos mais ou menos sociais.

Os homens se instituem num mundo social-histórico de tal forma que o caráterhumano-social da espécie é sempre reinstituída como “sentido”, como “história”, como“memória” dos elementos marcantes nas vidas individuais e coletivas. A coletividade,condição sine qua non da sobrevivência humana, se fez numa multiplicidade incontávelde comunidades, cada uma com suas próprias maneiras de instituir as diversas facetasda vida cotidiana e das expressões das relações sociais simples e complexas. As formaspolíticas, expressões diretas do enfoque sobre a felicidade e bem-estar coletivos, variamem duas expressões radicalmente separáveis: sociedades com ou sem essa instituição,o Estado. O Estado, como instituição, é essa criação social separada e pairando acima dasociedade civil, subtraindo dela suas prerrogativas e elementos, expressados pelo exer-cício do poder e do monopólio da violência, usurpando o direito supremo da comunida-de: de propor, discutir, escolher e executar - ela mesma e diretamente - suas própriasdecisões. Se nem todas as sociedades são sociedades a Estado3, todos os Estados sãosociedades fundadas na divisão social antagônica e visam a perpetuação desta.

A complexidade das sociedades e das relações sociais entre homens nas socieda-des apresenta dificuldades para análise, sobretudo, relativas às tipologias delas caracte-rísticas. No caso do mundo contemporâneo, a quase totalidade das sociedades huma-nas são, mais ou menos, totalmente integradas no que costumamos chamar o mundodas relações sociais capitalistas, onde a razão capitalista domina com toda a sua fúria. Aexpansão ilimitada do domínio racional, no qual o lucro baseado na exploração humanaé sua maior expressão.

As sociedades a Estado, na sociedade capitalista, assumem formas diversas nassuas expressões políticas, isto é, as formas pelas quais essas sociedades se expresssamcomo regimes políticos são variáveis. E o padrão global, permitindo a diferenciação namedida, pelo grau de participação da população na proposição de regras, nas discussõesprecedentes, nas tomadas de decisões e na implementação delas. Para novamente citarAristóteles, a democracia é o regime onde os cidadãos podem pretender se governarem

2 O ser humano é um zoon politikon, um ser vivo feito para viver em comunidade – ARISTÓTELES,Política. Trad. Mário Gama Kury. Brasília: UnB, 1990. Livro I.3 Sociedades a Estado são sociedades dotadas da institutição estatal, cujo aparelho paira acima dasociedade civil, dominando-a e privando-a de suas possibilidades de autogoverno e autonomia.

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e serem governados (Op. Cit., Livro IV). Abraham Lincoln reformulou a concepção demodo mais direto: o governo do povo, pelo povo e para o povo. Tanto a política quantoa democracia são regimes que, pelo menos nas suas origens (e até a época recente),instituem sua humanidade através da participação mais ou menos direta das pessoasque compõem essas comunidades. E, nessas comunidades, com a participação direta dasociedade nas discussões na tomada das decisões, consideramos que a democracia édireta e, logo, dispensam essas instituições chamadas “Estados”, já que não existe insti-tuição político-administativo alguma pairando acima da sociedade. Voltaremos à ques-tão da democracia mais adiante.

Em casos de sociedades a Estado, chamamos de sociedade civil aquele segmentoda sociedade subordinada à instituição estatal. É dessa sociedade civil que surge as for-mas políticas, alimentando a instituição estatal de homens, idéias, representações einstituições subalternas, aparelhando o Estado, permitindo que seja tecida uma ideolo-gia4 mais ou menos plausível para os membros da sociedade em questão. Como vere-mos, no caso de liberalismo e neoliberalismo, por exemplo, as ideologias são criaçõesvivas, muitas vezes adquirindo caminhos próprios, independentes, fora do controle deseus criadores.

Todas as sociedades precisam instituir modos de tratar os assuntos que dizemrespeito à busca de finalidades comuns que elas se dão. A maneira mais básica pararealizar seus projetos políticos é com a instituição do governo, forma de regime onde asdecisões são propostas, discutidas, decididas e executadas. Os governos manifestamessa relação com as decisões através do manuseio de um instrumento efetivo: o poder.É através da forma de manuseio da força que nós podemos desvelar o modo da institui-ção política de cada sociedade.

A característica principal em relação à instituição do político como espaço públicotem sido a luta dos homens para viver a liberdade, que é evidenciado pela lógica dahistória humana através dos tempos. Se a frase “A história da humanidade é a históriade lutas de classes” (Marx) tem algum sentido, com certeza ela é validada em termos delutas dos homens para não serem mais dominados pelos semelhantes. A luta pela liber-dade caracterizou a emergência das poleis gregas na Antigüidade. Assim, a democracianas cidades gregas antigas, celebrada no caso de Atenas, é uma criação social que emer-giu da sociedade humana.

Essa luta pela liberdade caracterizou, também, as lutas sociais nas pequenas cida-des do norte da Itália, a partir do século XI. Bem antes do liberalismo se tornar uma

4 Conjunto de idéias mais ou menos coesivas relativas a uma realidade, não para esclarecê-la etransformá-la, mas para velá-la e justificá-la no imaginário.

David Victor-Emmanuel Tauro

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doutrina política na Europa ocidental ou nos EEUU., o grito, “Libertà!!!” ecoava em voltados Alpes. Era o grito para o direito de se governar, da autonomia.5 Não por acaso,tampouco, a Suiça vizinha se tornou um dos primeiros países europeus onde a demo-cracia toma raízes pela segunda vez. Ali, num pequeno país, onde há quatro línguasoficiais, encontramos o sistema político mais aberto e efetivamente “democrático” nomundo hoje. É lá que o povo tem o direito efetivamente possibilitado e exercido depropor, discutir, plebiscitar e ter proclamadas suas leis. Claro, o peso dessa “democra-cia” ainda não é total, perfeito, acabado. Como processo, a luta pela democratização davida nos persegue sem cessar. Mas, o fato de que os Suiços se dão a possibilidade devotar cada fim de semana para opinar sobre seus projetos locais e nacionais de lei, emnada cessa as atividades do país, nem os inibe a produzir armas, chocolates, relógios oude urdir suas vacas com a regularidade que se tornou classicamente helvêtica. É umaquestão de cultura “democrática” popular.

Nos tempos modernos, com a criação de Estados Nacionais e, sobretudo, demegalópoles urbanas, a participação popular foi efetivamente cerceada. Primeiro, oindividualismo possessivo restringiu a participação popular, via voto censitário. O votorepresentativo veio para legitimar a negação da participação direta e efetiva da popula-ção inteira, afinal, para os poderosos, a soberania do povo sempre representará umaameaça. Numa de suas cartas aos Genebrenses, Rousseau6 já os fustigava, dizendo quea democracia ateniense não seria compatível com o ethos deles, dado que seus negóciostomariam tempo demasiado para permitir uma atividade política livre. É por isso, ape-sar da democratização da vida política elevada, que a Suíça ainda tem um Parlamentocom a Câmara de Deputados, etc.

Quando pensamos na questão da representação, surge imediamente uma outracorrelata, a questão da legitimação. Toda representação, para fazer jus ao termo, precisatambém ser referenciada: essa “referência” é a legitimação. No sistema político moder-no, em praticamente todas as esferas e todos os casos, não há uma participação diretanos processos da prática democrática. Estamos acostumados à delegação do direito depropor, discutir, opinar, escolher e executar. Essa prática se concretiza pela escolha/delegação de “representantes” – concidadãos que se colocam em nossos lugares ou agempor nossas contas. Será que eles realmente podem fazer isso? Será que eles realmentepodem agir em nosso lugar e por nossa conta? Mais ainda: será que eles podem agir pornossa conta e suas contas ao mesmo tempo? Neste caso, eles se representam e nos

5 Cf. SKINNER, Quentin. Fundações do Pensamento Politico Moderno. São Paulo: Companhia dasLetras, 1994, Cap. 1. e Liberty Before Liberalism, Cambridge: Cambridge University Press, 1998.6 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Cartes sur la montagne, in Oeuvres Complètes. Paris : nrf Gallimard,col. La Pléiade, 1979.

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representam ao mesmo tempo? O que acontece quando nossos interesses e os interes-ses deles entram em conflito? Eles se sacrificam por nossa conta? Ou nos sacrificampor suas contas?

A legitimidade se põe num plano contíguo: quantos votos do povo valem um votodo representante? Nas eleições do dia 3 de outubro de 2004, na cidade de Campo Gran-de (MS), o mais votado dos vereadores municipais recebeu um pouco mais de 11 milvotos, o eleito menos votado menos de 3.500 votos. Será que isso realmente é umarepresentação legítima da população citadina de mais de 750 mil em Campo Grande? Alegitimidade se põe em outros termos: como qualificar a eleição de um jovem de 18 anoscomo edil, cuja única qualidade é de ser sobrinho neto de seu tio avó político? Como nocaso do prefeito-eleito e de seu irmão, o citado mais votado na cidade, ambos filhos deum pai, político tradicional. Ou o caso parecido, do candidato a prefeito derrotado,sobrinho do governador em exercício. Será que a política é apenas um assunto de vidafamiliar, onde o pater familia é, ipso facto, o maior juiz político na praça? A política podeser reduzida a uma profissão exercida por vocação familiar? Ou será que nós todos nãodetemos juízo político suficiente e dever compatível para exercer nossas vocações polí-ticas nós mesmos? Nestes casos, como é que ficou a participação dos cidadãos nosassuntos públicos da cidade? São estes entes simplesmente relegados a serem especta-dores passivos a uma apresentação teatral que deve durar pelos próximos quatro anos.E os perdedores? Quem vai os representar, os vitoriosos? Neste caso, por que foram elescandidatos com plataformas políticas distintas? A lista de problemas é tão enorme, queé preferível terminar com a mensagem articulada durante a campanha eleitoral: nãoabstenha nem anule seu voto. Caso contrário, não terá o direito de cobrar dos eleitos nofuturo. Dispensamos de comentários maldosos – a autoria da mensagem é do próprioTribunal Superior Eleitoral.

2. Do liberalismo à paleo-selvageria

Na modernidade, o sistema político repõe num quadro filosófico determinado: odo liberalismo. O liberalismo é um credo que surge a partir do ideal da liberdade aplica-do à instituição social do individualismo possessivo, impresso como parte integrantedo imaginário central da sociedade capitalista. Sistematizado por John Locke, o paradigmado homem moderno é um ser dotado de direitos – à vida, a liberdade e à propriedade7.Bem entendido, esse direito à propriedade não é ilimitado: é ele circunscrito pordeterminantes sociais. Para o filósofo liberal, os limites da propriedade são os quepermitem o ganho de um sustento apropriado para seu dono e... nada mais. A idéia deque podemos ter propriedade privada ilimitada é um fantasma patológico. No mundointeiro, os governos são vigilantes o suficiente para taxar o que conseguem limitar como

David Victor-Emmanuel Tauro

7 LOCKE, John. O Segundo Tratado sobre o Governo Civil. In Obras. São Paulo: Abril Cultural,Col. Os Pensadores, 1972.

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propriedade – fonte de imensos recursos para eles. No quadro do liberalismo clássico,o Estado é destinado a gerenciar o uso dos recursos sociais para garantir o bem-estar e afelicidade comum, sem criar entraves excessivos à iniciativa individual, privada. Evi-dentemente, aos poucos, o crescimento da riqueza aumentou a pressão social na dire-ção da redução do papel intervencionista do Estado, pressão expressada pela frase fran-cesa, “Laissez faire, laisser passer!” (Deixa fazer, deixa passar!), slogan proposto para olivre comércio das mercadorias. Junto com essa posição, é a posição teorizada por AdamSmith onde uma mão invisível é tida ser responsável pela saudável andança do sistema,livre de intervenção do Estado.

No entanto, no quadro da criação do sistema capitalista, como sistema mundialglobalizado, desde o começo, o Estado moderno é instituído como parte integrante,senão protagonista e ator principal. O soberano João I não se designou: “Senhor daterra, da guerra, do mar e do comércio”? Quando o Estado não era o protagonista, agiucomo instrumento hábil nas mãos da burguesia para proteger e promover seus interes-ses, usando sua legitimidade como símbolo, unificando a vontade nacional. O Estadodeve agir nos melhores interesses gerais do seu povo.

Como a natureza do sistema capitalista concorrencial é de desembocar em crisesde superprodução (dado o fato que a própria concorrência não deixa os produtores aterem, em qualquer momento dado, conhecimentos completos do estado geral do mer-cado para planejar a produção) e de resultantes desperdícios de seus recursos, articula-dos com guerras entre povos, o Estado precisou intervir para arbitrar os conflitos eliderar povos nos momentos belicosos. Ao longo dos séculos, pelo menos desde 1400,os Estados-nações sucessivamente criados participaram em guerras coloniais e mercan-tis, assim como arquitetos de projetos capitalistas via companhias de comércio. O indi-vidualismo possessivo veio, tardiamente, após a pilhagem e a roubalheira dos tesourosdas Américas e das Índias, como no caso da Inglaterra relativa à Espanha.

As crises cíclicas do capitalismo, embutidas em sua lógica própria, levou o Estadoa ser chamado a intervir nas diversas economias e, desde as últimas décadas do séculoXIX, essa intervenção tornou-se urgente. No século XX, após a I Guerra Mundial e oCrash de 1929, seguida pela Grande Depressão, foram introduzidas políticas econômi-cas de caráter fortemente intervencionista, como se testemunha nas políticas do WelfareState8 e do New Deal9 (Roosevelt), de Keynes (Inglaterra) ou pelas políticas especiais deHitler e de Mussolini, na Alemanha e na Italia, respectivamente. Essas saídas à crise

8 Estado de Previdência.9 Política econômica americana adotada pelo presidente Roosevelt para combatrer os efeitos malé-ficos da Grande Depressão dos anos 1930.

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foram conjugadas pela criação do terceiro setor na economia, o setor de serviços ofereci-dos por servidores públicos nas áreas de administração direta: educação, saúde, segu-rança, habitação, assistência social, etc.

O Estado também continuou investindo maciçamente em setores onde os inves-timentos exigidos eram pesados e os lucros poucos, ou esparsamente realizáveis, ouapenas vislumbráveis num longo prazo. Para isso, usou parte dos impostos diretos eindiretos recolhidos ou financiou os empreendimentos com empréstimos de organis-mos financeiros internacionais. Criou imensos setores industriais nacionalizados parafornecer matérias-primas e utilidades para o setor privado, a preços módicos, muitasvezes até abaixo dos custos de produção.

Inevitavelmente, a burocratização dessas empresas surgiu. Percebeu-se que, ne-las, não se produziam sob critérios de concorrência rigorosa, devido à situação estatalmonopólica: não havia quem pudesse fazer a exigência de comportamento capitalistazeloso. Ademais, os beneficiários, as empresas capitalistas privadas, não tinham motivoalgum para pedir uma racionalização dos custos, visto que essa ação redundaria sobreelas mesmas, sob forma de preços mais “justos”. Mais importante, Max Weber, queninguém pode suspeitar ter convicções anarquistas, já havia teorizado que é da próprialógica do capitalismo a emergência de relações burocratizadas de trabalho e de gestãocomo parte do processo de racionalização que lhe era inerente.10

Efetivamernte, durante o século XX, as empresas capitalistas cresceram e as bem-sucedidas expandiram em grandes conglomerados multinacionais, burocratizados desuas próprias maneiras. A pletora de cursos de graduação, e especializações (mascaradassob a forma fajuta de MBAs – Master in Business Administration, logo, cursos demestrado!!!) aqui no Brasil, tanto quanto os outros cursos de gerenciamento, eterna-mente oferecidos, são testemunhas o fracasso da gestão capitalista das empresas e desua pesada burocratização. As maciças despesas em propaganda e marketing das merca-dorias são outras manifestações dessa burocratização ineficaz.

No âmbito do caso do Estado brasileiro, a partir da década de 30 do século XX, opeso da parte estatizada da economia cresceu, tornando-se cada vez mais importante.Fazia parte de uma política econômica geral a pesada industrialização como substituiçãodas importações, que deveria permitir o estímulo de vários outros cíclos produtivos. Noperíodo pós-guerra, pelo menos durante os 30 Anos Gloriosos (1944-73), na maioria dospaíses do mundo ocidental era universalmente aceito que o Estado deveria ter um papelimportante nos processos de tomadas de decisões políticas e sociais, que o mercado não

10 Cf. WEBER, Max. Economia y sociedad. Mexico:Fondo de Cultura Económica, 1970, capítulosobre a burocracia.

David Victor-Emmanuel Tauro

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deveria ter uma inflüência preponderante nas transações cotidianas11, que as grandescorporações multinacionais deveriam ser vigiadas, que os sindicatos deveriam ser li-vres e ter uma participação aberta nas decisões das empresas e que os cidadãos deveri-am ter uma cobertura de proteção social generalizada.

Não que devamos entender a época e esta política estatizante como qualquer for-ma de socialismo. A prova: durante os 20 anos da ditadura militar brasileira, de 1964 a1984 (de que ninguém acusou até agora de ser comunista!), os índices econômicos doIBGE ou do IPEA atestam que mais de 60% da então economia brasileira era dominada/controlada direta ou indiretamente pelo Estado. Sob os militares, o Estado passou acontrolar até setores de serviços; não apenas setores produtivos como petróleo ou aço,mas outros setores improdutivos como hotelaria. Por aproximar-se do absurdo, os cus-tos sociais destas aventuras improdutivas chegaram a serem obscenos.

Na Europa, além do custo altíssimo da II Guerra Mundial e os custos elevados demanter militares e armas nucleares em estado de alerta durante a Guerra Fria, o PlanoMarshall providenciou a reconstrução da Europa destruída durante a II Guerra Mundiale renovou o comércio entre a Europa ocidental e os EEUU, agora consagrada como amaior potência econômica mundial. No momento de suas criações, tanto o BancoMundial quanto ao Fundo Monetário Internacional eram projetados para promover apaz pela reconstrução e desenvolvimento das economias nacionais e pela solução deproblemas temporários (tipo, equilíbrio de balanço de pagamentos). Teria sidoimpensável encontrá-los pressionando governos sobre políticas econômicas quaisquer,ainda menos intervindo nas políticas econômicas nacionais – o que tornou-se corriquei-ro nas últimas décadas. Junto com o Plano Marshall, o Welfare State e as políticaspúblicas intervencionistas coroaram o conjunto de políticas econômicas internacionaisfavorecendo o pleno emprego (ou quase!), uma tremenda revolução tecnológica e a trans-formação das sociedades do mundo ocidental em enormes sociedades de consumo debens e serviços. No final de seu magnum opus acima citado, Polanyi achava que asociedade capitalista já havia tomado medidas suficientes para tornar as políticas dosistema econômico subordinadas à lei da sociedade, logo, sem deixar a sociedade a mer-cê da economia (Ibid., p.251).

Durante este tempo, os proponentes das políticas econômicas monetaristas quecriaram a doutrina dita “neoliberalismo”, eram apenas uma pequena seita encasteladana Universidade de Chicago, em volta do austríaco naturalizado britânico, Frederich vonHayek [1899-1992] e de seus pupilos, o mais conhecido sendo Milton Friedman. Na

11 Um exemplo liberal, a partir de uma obra pulicada pela primeira vez em 1944, é suficiente: “Deixaro mecanismo do mercado ser o único diretor da sorte dos seres humanos e de seu ambiente natural… resultaria na demolição da sociedade..” Karl Polanyi, The Great Transformation. New York,1957, p. 73.

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origem, Hayek era um simples neurologista que aos poucos fez sua carreira em econo-mia. Em reação as formas de totalitarismo (nazismo, fascismo e stalinismo) consagra-das nos regimes políticos dos anos 1920 e 1930, publicou seu O Caminho à Servidão(1944) e, em seguida, dedicou o restante de sua vida a defender ideais de um capitalis-mo de livre mercado.

Aos poucos, de uma pequena seita, o grupo de Hayek atraiu a atenção dos setoresmais conservadores do capitalismo, que financiaram uma rede substancial de institui-ções, empregaram pesquisadores, cujos trabalhos e relatórios finais resultaram em pu-blicações, apresentados em eventos públicos e outras atividades para promover umanova ideologia que veio a ser chamada de “neoliberalismo”. A burguesia soube usar asuniversidades e outros “thinktanks” muito melhor do que as outras classes sociais.Como é facil recordar, não há nada de liberal nesta proposta, pelo menos no que dizrespeito à tradição liberal praticada no mundo capitalista: o laissez-faire, laisser passerfoi mais uma ideologia que nunca foi seriamente implementada exatamente por que oEstado nunca cessou de participar ativamente nos negócios das grandes potências capi-talistas. O prefixo “neo” vale ainda menos: a política em vigor que vai por este nome hámais em comum com a idade de selva do que qualquer coisa “nova”. E essa política,numa idade de exclusão, pode ser classificada de modo mais apta de “paleo-selvageria”.

Melhor refletir sobre o que veio compor essa ideologia de neoliberalismo. Aolongo da segunda metade do século XX, as políticas sociais do Estado levaram ao au-mento de funcionários públicos trabalhando no setor terciário de serviços públicos deeducação, saúde, segurança, habitação, etc. O emprego maciço destes contingentes per-mitiu atingir uma alta taxa de emprego, gerando um ciclo econômico de crescimento ede prosperidade baseado no aumento de consumo que durou aproximandamente 30anos. Mas, durante estes anos, os EEUU perseguiu sua procura por hegemonia comopotência capitalista, liderando a luta contra o comunismo e nesta luta travou guerras nomundo inteiro. As despesas militares americanas, em homens e materiais, aumentoude tal forma que criou-se deficits bilionários, ao ponto de enfraquecer o dólar comomoeda internacional.

Finalmente em 1971, o dólar foi desligado do padrão-ouro e, diante aa perda dovalor do dólar, os países produtores de petróleo decidiram aumentar o preço do barril.A crise havia começado de novo: já que o mundo capitalista é baseado num modelo deconsumo predominado pelo uso de petróleo e de seus diversos derivados, o aumentodo preço do barril de petróleo repercutiu no planeta como um efeito dominó. Perante acrise fiscal do Estado americano, exacerbada pela queda de atividades econômicas e derendas do Estado, surgiram novas políticas para enfrentar os problemas de queda detaxas de lucros e rendas. Primeiro, houve uma mudança no enfoque da política externaamericana: tentativas de aliviar as tensões no mundo com planos de paz no Oriente

David Victor-Emmanuel Tauro

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Médio, golpes fomentados nas Américas Central e Latina, saídas diplomáticas escon-dendo as derrotas no Vietnam, Campuchea e Laos. Em seguida, veio o ataque maciço nositema econômico. Perante as dificuldades engendradas pela crise fiscal do Estado, ha-via apenas uma política possível: o Estado mínimo. E, em 1979, quando a ideóloga maisfamosa no “neoliberalismo” entrou em campanha para ser eleita líder do Partido Con-servador da Grã Bretanha, Margaret Thatcher emendou, “There Is No Alternative (TINA)”.Não há alternativa! A intervenção do Estado será substituída pela Mão Invisível domercado livre e a prioridade será o desregulamento das atividades econômicas, a libera-ção do mercado dos entraves estatais (controles, subsídios, ncentivos, descontos, etc.),para que as pessoas, as famílias, as empresas, os négocios de toda espécie, as cidades, asregiões, os países e os blocos, sejam obrigados a se submeterem apenas a uma lei eprática: a concorrência. Foi particularmente gratificante que as únicas exceções a essaexigência foram exatamente aquelas que deveriam ser submetidas à concorrência: osconglomerados multinacionais. Nas últimas três décadas, foi o grupo que menos prati-cou a concorrência e que mais se beneficiou pelas políticas estatais sob forma dereestruturações, “mergers”, compras, etc. A lei da selva, (sobrevivência dos mais aptos!)é aplicável a todos, em relação a todos os recursos, humanos, físico-materiais e financei-ros, menos às Corporações Multinacionais. Junto com seu grande amigo, o ator dosfilmes série B, o presidente americano, Ronald Reagan, Thatcher avançou que a desi-gualdade natural entre as pessoas não deveria ser combatida com políticas públicas. Aocontrário: era necessário deixar a natureza funcionar enriquecendo os meritosos. Quan-to aos pobres e os que são perdedores: a culpa é deles, não da sociedade! De 1979 emdiante, além da Grã-Bretanha e dos EEUU., países diversos como Austrália ou Grécia,Bélgica, Alemanha, França, Espanha, Chile, Argentina ou Brasil, aplicaram políticas deri-vadas deste paradigma, pouco importando se for democrata ou republicano, conserva-dor ou trabalhista, democrata cristão, social cristão, social democrata ou socialista. Opensamento único havia triunfado.

Em que consistiu o programa econômico dos proponentes da nova ideologia? Es-sencialmente em três pontos:

A) liberalização dos entraves no comércio dos bens e serviços em todos os níveis, local,regional, nacional e internacional;

B) liberalização de todos os entraves à circulação do capital, também em todos os níveis;

C) liberalização dos entraves a todo nível para o investimento internacional.

No Brasil, a implementação deste programa começou com a presidência de FernandoCollor. Em seguida, tomou rumos diversos. Em primeiro lugar, o Estado começou acortar drasticamente todos suas despesas, diretas e indiretas; em seguida, vieram cortesde contingentes de funcionários servidores do Estado, em nome do combate àburocratização e à improdutividade do funcionalismo público. Depois, vieram as

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privatizações de empresas estatais: serviços de energia elétrica, telefonia e comunica-ções, água, ferrovias, coleta de lixo, assim como diversas empresas estatais produtivasde mercadorias primárias de metalurgia. Onde foi possível, os monopólios do Estadoforam privatizados. Em seguida, veio a liberalização das barreiras comerciais e mercan-tis, favorecendo a inundação de mercadorias a preços módicos muito abaixo dos pratica-dos no Brasil, seja em razão da alta taxação, seja em razão da prática tradicional demonopólios internos. Depois, veio a reforma da previdência, assinalando mudançasfundamentais na estruturação dos benefícios atuais e futuros dos trabalhadores contri-buintes, aposentados e pensionistas. Por fim, veio uma série de políticas públicas, emen-das de resoluções e tratados feitos ao nível internacional acordando a liberalização decontroles estatais ou internos no país. Os setores mais atingidos serão o comércio e aprestação dos serviços. Nova legislação relativa à participação do capital privado, nacio-nal e internacional, no fornecimento de serviços de saúde e educação, está tramitando coma colaboração de organismos internacionais tais como a OMS e a OIT. E o grande final destasérie dramática será a reforma trabalhista, a ser promovida nos próximos meses.

Antes de concluir, um pouco sobre o impacto desta política. Ao nível internacio-nal, vimos o empobrecimento maciço de vários países: índices internacionais de fontesinsuspeitas com do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional atestam aocrescente hiato entre os países mais ricos e os mais pobres. Dentro de cada país queadotou essa política, o retrato é parecido: a pobreza crescente ao nível internacionalredundou no empobrecimento crescente dentro de cada país e o hiato aprofundadoentre os setores rico e pobre em cada sociedade. A PNAD de 2002 divulgado, pelo IBGEneste mês, acabou de indiciar os governos brasileiros dos últimos sete anos com taxassucessivas de perdas de renda, cerca de 20% segundo os cálculos oficiais. Ao contrário doprometido, altas taxas de desemprego, crescentes altas nos números de novos pobres emoradores de cidades sem teto, crescentes taxas de repetência (quando não camuflada)e/ou evasão escolar entre jovens e adultos sem a esperança de um emprego pela frente,retração de atividades econômicas devido a políticas de contenção de gastos e demissões,escorchantes taxas de juros para o crédito pessoal, alta de preços de mercadorias e serviçosapós a recessão e seguindo a privatização. O governo FHC instituiu uma nova forma decapitalismo no Brasil: o de empresas privatizadas de serviços que podem operar sem o riscode ter perdas. O lucro é obrigatoriamente embutido nas taxas cobradas nas contas.

Para coroar essa situação, a alternância política esperada com a vitória de Lula edo Partido de Trabalhadores nas eleições de 2002 simplesmente não aconteceu. A políti-ca econômica antes praticada pelo o PSDB, ainda está em vigor, um tanto exacerbada,sob a batuta de homens de confiança do sistema capitalista liderados por HenriqueMeirelles, membro do establishment bancário internacional. O czar da política econô-mica do país, o ministro Palocci, repete o refrão bordado de Margaret Thatcher, “Não háalternativa!”.

David Victor-Emmanuel Tauro

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3. Em lugar de uma conclusão

Quando refletimos sobre a política e o Estado democrático, uma série de interro-gações perpassa qualquer tentativa de se reconciliar com a vida cotidiana: para começar,o que significa “política” para nós hoje e o que deveria significar? Em seguida, o quesignifica a representação em relação à democracia... se a democracia realmente significao poder do povo (tradução literal da palavra grega)? Quais são os deveres do Estado emrelação à sociedade civil? De que maneira o governo é responsável pelo bem-estar e afelicidade da sociedade civil? Como é que os representantes eleitos pelo povo poderãoagir com a responsabilidade exigida pelo cargo que ocupam? Como é que as políticaspúblicas poderiam ser usadas para efetivamente fazer reinar a justiça social no país?Enquanto nós não nos endereçamos essas ou outras interrogações conexas relativas àpolítica econômica e às políticas públicas, devido aos desunidos neste país, e lutar paraefetivas políticas que possam responder à altura os problemas que assolam, continuare-mos a viver na Era da Exclusão.

BIBLIOGRAFIA

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_________. Another World is Possible. In The Nation Magazine, New York, February 16,2002. http://www.thirdworldtraveler.com/Dissent/AnotherWorldPossible.htm, consul-tado em 01/10/2004.

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WEBER, Max. Economia y sociedad. Mexico:Fondo de Cultura Económica, 1970.

Política e Estado Democrático: algumas interrogações pontuais

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Acidadania é sustentada por um tripé que envolve as conquistas históricas dohomem, no que concerne às garantias dos direitos civis, às dos direitos políticose às dos direitos sociais. O momento atual mostra que as duas primeiras já con-

seguem ter um ‘status’ mais estabelecido junto à sociedade, diferentemente dos direi-tos sociais, que em muitos países, como no caso do Brasil encontram-se em níveis mui-to precários.

As políticas sociais, que deveriam garantir os direitos básicos do indivíduo, comoeducação, saúde, habitação, transporte e lazer, não foram implementadas pelo PoderPúblico e é no “terreno baldio das políticas sociais” que aparecem os destinatários edemandatários da assistência social, ou seja, aqueles que foram excluídos dos direitossociais básicos. Os excluídos passam a conviver com a miséria, a fome e a morte, carac-terizando uma vida imersa em “situações de risco”. No Brasil a situação é agravada pelosalarmantes níveis de desemprego; é possível verificar um grande número de famíliasexpostas a essa condição, o que as torna vulneráveis e frágeis na garantia da sua sobre-vivência e sem nenhuma perspectiva de futuro para as suas vidas.

Tal situação, fruto de anos de uma política excludente e concentradora de renda,passa a ser alvo de fortes críticas por parte de segmentos da sociedade civil organizada,especialmente na década de 80, que se posicionam fortemente em favor da revisão daCarta Constitucional. Esse movimento popular conquista, através da pressão e da parti-cipação, avanços no que se refere aos direitos sociais, na promulgação da Constituiçãode 1988. A nova Carta estabeleceu um re-ordenamento político-institucional das compe-tências da Federação, dos Estados e dos Municípios, fortalecendo o movimento de par-ticipação popular na constituição e execução de políticas públicas. Essa participaçãofortaleceu os Direitos Humanos no Brasil.

Para podermos fazer uma análise desse movimento de participação popular e for-talecimento dos Direitos Humanos, é necessário voltarmos um pouco mais na históriada própria constituição dos Direitos Humanos, com vistas a compreender as condiçõeshistóricas e sócio-econômicas que propiciaram tal conquista para a humanidade.

Direitos Humanos e Direitos Sociais:desfios e perspectivas

Maria de Lourdes Jeffery ContiniDoutora em Educação pela Unicamp, Campinas.Professora do Departamento de Ciências Humanas/CCHS daUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul

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A Evolução histórica dos Direitos Humanos

Para desenvolver este tópico, utilizaremos da cronologia discutida por Pallazzo(1998) a respeito da evolução dos Direitos Humanos e suas novas dimensões. O concei-to de Direitos Humanos, segunda a autora, deve ser compreendido dentro de dois pris-mas: Valorativo – propõe que sejam os Direitos Humanos um ideal comum da humani-dade para a formação de uma “consciência moral universal”; Jusnaturalista - são direi-tos inatos, inerentes da pessoa humana. Por conseqüência são anteriores e se sobre-põem ao direito positivo.

A evolução dos Direitos Humanos depende do crescimento da consciência coleti-va através do tempo, com isso emerge do conflito entre os que lutam por uma novaordem e os que nada querem mudar. Dessa forma, sua história não é linear, mas contémgrandes avanços e dramáticos retrocessos.

Marshall divide os Direitos Humanos, a partir de uma perspectiva histórica queabarca três contextos: Direitos de Primeira Geração - liberdades civis e direitos políticos;Direitos de Segunda Geração - direitos econômicos, sociais e culturais; Direitos de Ter-ceira Geração - os direitos dos povos, desenvolvimento, solidariedade e outros.

Os Direitos de Primeira Geração abarcam as Liberdades Civis e Direitos Políticos.As declarações de Virginia (1776) e a Francesa (1789) se converteram para a grande arran-cada, para uma nova etapa da evolução histórica dos Direitos Humanos, pois os direitoscivis foram incorporados à ordem jurídica. Consagra-se a igualdade de todos os homensperante a lei e os direitos naturais e imprescritíveis dos homens são proclamados: aliberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão. Sendo garantidas, tam-bém, a liberdade de pensamento e opinião.

Os Direitos de Segunda Geração são os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.As condições históricas para uma nova etapa no estado de consciência, sobre as necessi-dades básicas do homem foram dadas pela Revolução Industrial. As transformações so-ciais econômicas tiveram seu efeito mais dramático na conformação de operários assa-lariados, submetidos a desumanas condições de exploração. A nova ordem imposta pelaburguesia enfrenta críticas dos pensadores socialistas que reclamam uma radical modi-ficação das condições materiais de existência do proletariado. As primeiras incorpora-ções dos direitos econômicos e sociais à ordem jurídica de um Estado ocorrem no Séc.XX com a Constituição Mexicana de 1917, a da Rússia em 1918 e do Uruguai em 1934.

As diferenças entre os direitos civis e políticos e os econômicos e sociais nãoreside exclusivamente no conteúdo dos direitos. Para Pallazzo (1998), os direitos civis epolíticos são garantias do indivíduo frente ao Estado, que assume o papel de protetor emantenedor desses direitos. Já os direitos econômicos e sociais exigem do Estado umaintervenção e uma política concreta para dispor meios que tornem efetivo esses direitos.

Os Direitos de Terceira Geração – Direitos dos Povos - surgem no contexto da

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Segunda Guerra Mundial, quando 51 países assinaram a carta fundadora das NaçõesUnidas. Em 1948 proclamam a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Em 1966foram firmados dois pactos: Pacto dos Direitos Civis e Políticos e Pacto dos DireitosEconômicos, Sociais e Culturais. Ambos reafirmam em seus artigos I, que “Todos ospovos têm o direito a sua livre determinação”.

A história dos povos que conquistaram sua independência, no entanto, foi suficientepara demonstrar que a autodertiminação era, em grande parte, fictícia, visto que os direitosacabavam perdendo o seu sentido, na medida em que as nações careciam, cada vez mais, dosmeios para satisfazer as necessidades mínimas dos seus povos.

Outra questão importante citada por Pallazzo (1998) foi a forma como os dois grandesblocos de poder político e econômico, criados durante a Guerra Fria, tratavam de forma dis-tinta os Direitos Humanos. O Bloco capitalista priorizava os Direitos de Primeira Geração,apegando-se mais a aspectos formais dos direitos da pessoas humana. No Ex- Bloco comunis-ta, eram os Direitos de Segunda e Terceira Geração os de maior ênfase aos direitos sociais ecoletivos e aos direitos dos povos do que aos direitos individuais.

Em 1968 realiza-se, em Teerã, a I Conferência Mundial dos Direitos Humanos das Na-ções Unidas. Nesse encontro, embora limitado pela realidade bipolar, já começa a tentativade romper com a dicotomia entre direitos civis e políticos e direitos econômicos e sociais,proclamando a indivisibilidade e interdependência entre todos eles. Esse processo se com-pleta na II Conferência Internacional dos Direitos Humanos em 1993, em Viena.

Um importante avanço nessa direção foi a Carta de Argel, em 1976, quando umgrupo de países do mundo não-desenvolvido proclama a Declaração dos Direitos dos Po-vos, reconhecendo a existência de direitos cujos titulares são os povos, tanto individualcomo coletivamente.

Os Direitos proclamados nesta ocasião foram: o direito à existência dos povos; à livredisposição dos recursos naturais próprios; o direitos ao patrimônio natural comum da huma-nidade; à autodeterminação; à paz e segurança; à educação; à informação e comunicação e aum ambiente são e ecologicamente equilibrado.

Podemos observar que o corolário desses direitos todos é o direito ao desenvolvimen-to, de cuja realização se deriva, com efeito, o respeito à maioria dos direitos e liberdades dospovos. Em 1986, as Nações Unidas adotam uma declaração sobre o direito ao desenvolvimen-to, em que se coloca a pessoa como sujeito central do processo.

A vinculação do direito ao desenvolvimento com a pessoa humana resultou num con-ceito de desenvolvimento humano. Este tipo de desenvolvimento envolve não só variáveiseconômicas mas também, a expectativa de vida, o conhecimento derivado da educação, onível de vida, a liberdade política, a proteção ambiental entre outras. Este breve históricodemonstra os caminhos construídos pela coletividade humana buscando, cada vez mais,ampliar os conceitos de Direitos Humanos, Direitos Sociais e Desenvolvimento Humano.

Maria de Lourdes Jeffery Contini

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A evolução dos mecanismos de proteção dos Direitos Humanos no Brasil

No Brasil, segundo Pallazzo (1998), a Constituição Imperial de 1824, seguida pelaPrimeira Constituição republicana de 1891, já estabelecia determinadas categorias de liber-dades civis. A Constituição de 1934 contemplava novos direitos num capítulo sobre a or-dem econômica e social, que prevaleceu estagnada nas constituições de 1946,1967 e 1969.

Será na Década de 70 e nos anos 80 que começam a surgir os Centros de Defesa dosDireitos Humanos por todo o país, tornando-se importantes atores no processo deredemocratização, criando e fortalecendo a luta e a organização popular.

O grande marco na nossa história foi a Constituição de 88, ao introduzir um mode-lo orgânico institucional para o trato das políticas públicas. Isso possibilitou a construçãode novos espaços políticos e estimulou o exercício de prerrogativa pública pelos cidadãos.O processo de redemocratização permitiu uma maior participação da sociedade civil na vidapolítica do País e garantiu a implementação dos direitos civis e políticos, constitucionalmente.

No entanto, a ideologia política do mercado liberal gera um processo, ainda em cur-so, de desregulamentação das políticas sociais e da conceituação do Estado Mínimo. Surge,assim , uma nova bandeira de luta para os movimentos sociais, que vão em busca dagarantia dos direitos conquistados ao longo da história. Atualmente os Direitos Humanos,mais que uma bandeira de luta, fazem parte da agenda política do País.

Em 13 de maio de 1996 é criado o Programa Nacional de Direitos Humanos, conten-do as diretrizes básicas dos Direitos Humanos no Brasil. O conteúdo do Programa se con-centra mais nos direitos civis, embora contenha algumas medidas que, se efetivadas, po-dem contribuir para a promoção dos direitos sociais.

Em relação aos acordos internacionais, o País foi o terceiro a cumprir formalmenteas recomendações de Viena em institucionalizar a Proteção Nacional dos Direitos Huma-nos através do Programa Nacional de Direitos Humanos. Essa breve retrospectiva históricamostra a importância das lutas internacionais para a construção dos Direitos Humanoscomo padrão universal que garante os direitos dos cidadãos.

O grande desafio imposto, na lógica atual do sistema capitalista em que vivemos, érealizar, num regime democrático e de participação popular legítima, o desenvolvimentoeconômico traduzido em riquezas materiais e de vida, tendo como conseqüência o verda-deiro desenvolvimento humano.

Direitos Humanos, Democracia e Desenvolvimento

Todos os países reivindicam perseguir o crescimento econômico rápido e sus-tentável, traduzido em desenvolvimento; participação política popular, própria dademocracia e, o respeito aos direitos de seus cidadãos que definem os direitos huma-nos naquela sociedade.

Direitos Humanos e Direitos Sociais: desafios e perspectivas

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Donnelly (1998), discute a questão dos direitos humanos e de sua legitimidadepolítica. Para o autor os Direitos Humanos especificam um conjunto inalienável de bens,serviços e oportunidades individuais que o Estado e a sociedade são, em circunstânciacomuns, chamados a respeitar e prover. Já a legitimidade de um Estado, numa perspec-tiva dos Direitos Humanos, é uma função do quanto ele respeita, protege e realiza osdireitos humanos ou “naturais” dos seus cidadãos.

É importante, no entanto, observar que na maioria dos países, especialmente daAmérica Latina com a presença do regime democrático, o Desenvolvimento junto comos Direitos Humanos permanece ainda de forma parcial e frágil, no que se refere à suaefetivação real.

Parece, então, que a Democracia por si só não garante a inter-relação entre Desen-volvimento e Direitos Humanos. O que é possível afirmar é que a Democracia, em mui-tos casos, pode beneficiar o bom governo, na medida em que o povo deve ser a fonte daautoridade do governo para governar. Para Donnelly (1998) a participação do povo podecontrolar o desenvolvimento, assegurando que o crescimento econômico ocorra com-prometido com o desenvolvimento nacional e não apenas com interesses de enriqueci-mento privado. Diz o autor que “as redistribuições exigidas pelos direitos econômicos esociais procuram assegurar, igualmente que a prosperidade seja difundida em toda soci-edade, ao invés de co centrada numa elite minoritária”. (p.173).

Outra questão importante é o fato de que o Desenvolvimento pode tornar-se umfator de fortalecimento da Democracia e do usufruto concreto dos Direito Humanos, namedida em que cria-se na sociedade condições materiais (bolo econômico grande) paraque a população possa obter rendas melhores para si própria, possibilitando uma quali-dade de vida para os seus membros.

É necessário estarmos atentos para atual conjuntura do capitalismo, identificado atra-vés dos modelos de civilização globalizada e planetária, onde a lei econômica do livre merca-do têm privilegiado os indicadores macroeconômicos em detrimento de oferecer soluções,como aponta Herrera (1998), “aos problemas simplesmente humanos” (p. 611).

O resultado dessa visão unilateral é a oferta global de empregos. Para Dupas (1998),essa nova lógica está afetando a qualidade e a quantidade da oferta global de empregosde forma complexa e desafiadora. O autor comenta as principais tendências que seapresentam nesta ótica. São elas: “redução da geração de empregos qualificados e for-mais por investimento direito adicional; contínua flexibilização da mão-de-obra em to-dos os níveis(...); clara inter-relação entre agentes econômicos formais e informais namedida em que se encaminha para a base das cadeias produtivas, procurando abrigar otrabalho informal e a mão-de-obra barata (low-wage)” (p.121).

Este panorama, segundo o autor, exige uma reflexão do papel dos Estados Nacio-nais frente as instituições internacionais na economia global. Não é mais possível falarem “Estado Mínimo” frente a essa complexa situação gerada pela fracionamento da

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cadeia produtiva do capitalismo atual. Para Dupas(1998) “o desenvolvimento econômi-co e social sustentável mostra-se, pois, impossível sem um Estado ativo”(p.123). Vistoque este Estado é que deverá dar um suporte para uma “proteção social” às crescentesmassas de pessoas excluídas socialmente. O último relatório da OIT (1997/1998) lembraque o processo de globalização contemporâneo requer grandes e não pequenos Estados,ou seja, caberá ao Estado o papel central de manter e restaurar a coesão social, que se vêseriamente ameaçada pelo crescimento da exclusão.

O que podemos concluir com essa pequena reflexão é que o fortalecimento dosDireitos Humanos e Direitos Sociais está diretamente ligado com a questão do emprego naeconomia atual, visto que será pela renda que a população terá acesso aos bens e serviçosdisponíveis na sociedade, podendo garantir, ou não, o direito a uma vida de dignidade.

Dupas (1998), ao discutir esse aspecto considera que “o paradigma do empregoestá em definitiva mudança. E um dos direitos mais fundamentais do homem contem-porâneo – o de um posto de trabalho que lhe dê renda e dignidade – parece cravado deincertezas ao se aproximar o próximo século”(p.130).

No entanto, entendemos que o necessário lidar com esta contradição e complexi-dade dos nossos tempos, construindo práticas coletivas, no nosso caso através do con-trole social previsto constitucionalmente, para podermos explorar a correlação entreDireitos Humanos e Direitos Econômicos e Sociais, acreditando no que aponta Donnelly(1998), que tais práticas são possíveis “quando o objetivo primordial é todos os direitoshumanos para todos”(p.204). Este deve ser o nosso compromisso e desafio com o atualséculo que se inicia.

Bibliografia Básica

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HERRERA, Maria Belela. Desafios que o tema Direitos Humanos coloca para o Século XX.In: PINHEIRO, P.S. e GUIMARÃES, S.P. (org.) Direitos Humanos no século XXI. Brasília:Senado Federal: IPRI, 1998. pp.607-622.(Parte I).

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As Políticas Públicas Sociais

Regina Stela Andreoli de AlmeidaDoutora em Serviço Social pela Unesp, São Paulo.Professora do Curso de Serviço Social da UniversidadeCatólica Dom Bosco.

1. Política: um conceito e uma ação

BOBBIO (1998, p.954) afirma que o termo política, embora signifique, por derivar depólis (politikós), “tudo o que se refere à cidade e, conseqüentemente, o que é urbano,civil, público, e até mesmo sociável e social (...)”, após a publicação da obra de Aristóteles– Política – adquiriu outra conotação, como veremos adiante.

O mesmo autor ensina que o conceito de política, usado originalmente para refe-rir-se ao estudo das “coisas do Estado”, foi sendo substituído com o tempo, passando areferir-se às atividades ou práxis humanas, sempre associado ao poder de um ou maisseres humanos sobre outros, já que tais atividades envolvem processos desencadeadospor algum tipo de interesse1. Objetivando avaliar os diferentes tipos de poder, vemosem BOBBIO (1998, p.955) que:

“Há várias formas de poder do homem sobre o homem; o poder político é apenas uma delas.Na tradição clássica, que remonta especificamente a Aristóteles, eram consideradas três for-mas principais de poder: o poder paterno, o poder despótico e o poder político. Os critériosde distinção têm sido vários (...). Em Aristóteles se entrevê a distinção baseada no interessedaquele em benefício de quem se exerce o poder: o paterno se exerce pelo interesse dosfilhos; o despótico, pelo interesse do senhor; o político, pelo interesse de quem governa e dequem é governado, o que ocorre apenas nas formas corretas de Governo (...)”.

Tendo como objetivo a defesa de algum tipo de interesse, torna-se evidente ocaráter teleológico da política, uma vez que, antevendo os resultados ideais, as ativida-des que lhe são intrínsecas são voltadas para determinado fim. Por isso o termo tambémé utilizado para designar conjuntos de ações voltadas para a consecução de objetivos,que, conforme PEREIRA (1994, p.02) “requerem participação ativa do Estado no planeja-mento e execução de procedimentos e metas voltados para a satisfação coletiva”, comoas políticas sociais, educacionais, econômicas, agrárias ou ambientais, dentre outras.

1 O autor, explicitando a associação existente entre política e poder, cita HOBBES, que define opoder como meios adequados à obtenção de qualquer vantagem” e RUSSELL, que o define como“conjunto de meios que permitem alcançar os efeitos desejados” (BOBBIO, 1998, p.954).

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Embora a política deva ser entendida como uma atividade humana - desenvolvidaem qualquer situação, portanto, face aos interesses definidos neste estudo, restringire-mos nossa análise ao campo das políticas sociais.

2. As Políticas Sociais Públicas

Segundo DEMO (1996, p.14), as políticas sociais podem ser ou não públicas, umavez que deve ser considerada a existência das políticas sociais empresariais, sindicais,acadêmicas e religiosas, além das decorrentes dos segmentos organizados da sociedade(sociedade civil).

Concentrando nossa atenção nas Políticas Sociais Públicas e valendo-nos, ainda,do raciocínio de DEMO (1996, p.14), podemos afirmar que estas são propostasinstitucionais que objetivam a redução das desigualdades sociais e supõem planejamen-to, por representarem possibilidades de intervenção no processo histórico.

Aqui encontramos, entretanto, as primeiras controvérsias, uma vez que, emborapossa haver consenso no fato de que qualquer política social deve ter como pressupostoa existência de desigualdades, a interpretação de suas causas, associada a alguns concei-tos - como pobreza e direitos -, pode indicar diferentes caminhos na busca por alternati-vas de solução, o que significa afirmar que as políticas sociais são delineadas ou não,segundo a visão que se tem da própria desigualdade.

Neste contexto DEMO (1996, p.14-18) apresenta, inicialmente, três diferentesposturas referentes ao caráter da desigualdade, que pode ser entendida como decorren-te de aspectos históricos, histórico-estruturais e/ou apenas estruturais, conforme deta-lhamos a seguir.

Histórica - a desigualdade surge na história, com a “introdução da propriedadeprivada e em seguida do trabalho assalariado”. Neste caso a desigualdade está relaciona-da ao surgimento do capitalismo e poderá ser suprimida com a eliminação da mais-valia. Segundo DEMO (1996, p.15), nesta situação as políticas sociais perdem a finalida-de, uma vez que a desigualdade pode e deve ter outra solução, encontrada também nahistória, através da mudança de sistema econômico.

A segunda postura – estrutural - confere à desigualdade características estrutu-rais, ou seja, de uma forma ou de outra estará sempre presente, podendo, entretanto,ser minimizada pela adoção de estratégias corretas, como o desenvolvimento de proces-sos efetivamente democráticos e, neste caso, conforme afirma DEMO (1996, p.16), a“Política Social é importante e necessária”.

Visão histórico-estrutural – oposta à primeira concepção, vê a desigualdade comodeterminada pela história.Neste contexto a Política Social “(...) poderia reconhecer aigualdade e arquitetar modos de acomodação, mas nunca chegar a propostas de reduçãosubstancial” (DEMO, 1996, p.16).

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Como se pode observar, apenas os que interpretam a desigualdade segundo avisão estrutural defendem a adoção de políticas voltadas para sua redução. DEMO men-ciona, ainda, considerações de alguns autores de que a política social torna-se inviávelno sistema capitalista pelo fato da exploração ser dele imanente, ponderando, posteri-ormente, que é exatamente no capitalismo, pelas desigualdades existentes, que tal po-lítica é mais necessária.

A desigualdade, neste caso, é sempre relacionada à pobreza material - classificadapor DEMO (1996, p.19-23) como pobreza socioeconômica - por tratar-se do aspecto apa-rente, que pode ser quantificado, deixando de ser percebidos ângulos muito mais pro-fundos, nos quais estão configurados os maiores obstáculos para a superação daquiloque poderia ser uma etapa na vida de alguns segmentos sociais: a pobreza política,resultado da pressão exercida pelos valores hegemônicos existentes na superestrutura,que impede grande parcela da população brasileira de:

- ter consciência de si e de mundo, de ver-se, portanto, num mundo para-si;

- perceber a sociedade em sua totalidade, com as desigualdades e contradições aipresentes;

- identificar os próprios interesses, observando que seus problemas não são sóseus, mas são comuns aos que pertencem à sua classe social;

- organizar-se para, defendendo os interesses comuns, tornar-se efetivamente su-jeito da própria existência;

- exercer a cidadania, deixando de ser objeto de manipulação dos poderosos.

Esta análise nos auxilia a perceber que a política social, além de compensatória,uma vez que deve atender às necessidades mínimas dos que dela se utilizam, deve sercaracterizada também como preventiva, contribuindo de maneira efetiva para que de-terminadas situações sejam evitadas, redistributiva, na medida em que interfere naconcentração de renda, universal, possibilitando a todos, de maneira equânime, o aces-so às oportunidades e emancipatória, associando, no dizer de DEMO (1996, p.23) a“autonomia econômica com autonomia política”, o que certamente favorecerá o exercí-cio da cidadania, possibilitando o surgimento de um nova sociedade: mais justa e, por-tanto, menos desigual.

PEREIRA (1994, p. 1) observa que nunca se falou tanto em política social como atual-mente, embora, no Brasil, não haja clareza quanto ao sentido que o termo apresenta, o quepodemos complementar: pela ocorrência da pobreza política, como denomina DEMO. Polí-tica Social, no entanto, “tem identidade própria” no dizer da autora, que conclui:

“Refere-se a programa de ação que visa, mediante esforço organizado, atender necessidadessociais cuja resolução ultrapassa a iniciativa privada, individual, espontânea, e requer decisãocoletiva regida e amparada por leis impessoais e objetivas, garantidoras de direitos (...) a política

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social é uma espécie, dentre outras, do gênero política pública (...) embora as políticas públicassejam reguladas e freqüentemente providas pelo Estado, elas englobam preferências, escolhase decisões privadas podendo (e devendo) ser controladas pelos cidadãos. Política pública ex-pressa, assim, a conversão de decisões privadas em decisões e ações públicas, que afetam atodos”. (PEREIRA,1994, p.1-2)

A política social pública deve ser o instrumento utilizado pelo poder público comvistas ao respeito devido aos direitos sociais garantidos pela Constituição Federal emvigor2. Por isso, segundo o mesmo autor, deve ser entendida como direito e não comouma mera concessão de favores, devendo, pelas características que apresenta, ser de-senvolvida em três linhas, que se complementam: políticas assistenciais, políticasparticipativas, e políticas socioeconômicas.

2.1 Políticas assistenciais

As políticas assistenciais envolvem a assistência, por parte do poder público,direcionada aos segmentos populacionais que não dispõem de condições para o atendi-mento das necessidades básicas, - sendo, portanto, compensatórias - devendo garantir-lhes o direito, não somente à sobrevivência, mas a uma vida digna.

Considerando situações diversas, DEMO (1996, p.26-32), lembra que a própriaConstituição determina a prestação de assistência aos grupos vulneráveis3, devendo emtais grupos ser incluídos tanto a criança e o adolescente em situação de risco, quanto osdeficientes impossibilitados de trabalhar; os idosos que não dispõem de quem deles seresponsabilize; os presos; os que apresentam doenças infecto-contagiosas e os mendi-gos, dentre outros.

2.2 Políticas participativas

Quanto às políticas participativas, são assim classificadas aquelas que, através dooferecimento de determinados serviços, favorecem o exercício da cidadania sendo men-cionadas à guisa de exemplos, por DEMO (1996, p.39-40), as políticas educacionais, cul-turais, de comunicação, de defesa da cidadania, de conquista de direitos, de organizaçãoda sociedade civil, partidárias, de justiça, sindicais e de segurança pública. São, comovemos, emancipatórias, preventivas e redistributivas.

O próprio autor considera, porém, que as políticas participativas, embora públi-cas, são originárias da própria sociedade civil, sendo apenas normatizadas pelo Estado.Acrescentamos, a este raciocínio, o fato da cidadania ser sempre objeto de conquistapopular, não podendo, portanto, ser entendida como concessão do poder público.

2 Cf. Constituição Federal, p. artigo 6º, complementado pelos artigos 192 e 193.3 “A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuiçãoà seguridade social” - Art. 203.

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2.3 Políticas socioeconômicas

As políticas socioeconômicas põem em relevo as características redistributiva eemancipatória da política social e, associando as áreas social e econômica, voltam-separa a reinserção dos excluídos no processo produtivo e/ou elevação da renda familiar,como forma de reduzir as desigualdades existentes. Dentre as políticas que DEMO (1996,p.33-37) define como socioeconômicas, destacamos:

a) “(...) políticas de emprego, que são ao mesmo tempo a forma mais estrutural de redistribuirrenda, seja no setor dito formal, seja no setor dito informal (...);

b) políticas de apoio às formas de microprodução, com vistas a ocupar espaço sólido nomercado agrícola ou urbano (...);

c) políticas de profissionalização da mão-de-obra, algo certamente dependente do mercado detrabalho (...) mas relevante como estratégia de preparação, adequação, retreinamento, etc.; (...)”.

A esses, o autor acrescenta os programas como o do Seguro-Desemprego e o daReforma Agrária. Aí entra a política, face à diversidade dos interesses envolvidos e éinteressante observarmos que, à medida em que a história foi sendo tecida, é que osatores puderam, com mais clareza, ser identificados.

Com o surgimento do Estado Moderno uma nova forma de organização políticafoi instaurada, diferente das até então conhecidas ARISTOCRACIA e DEMOCRACIA, tra-zendo em seu bojo uma nova concepção da coisa pública. Vemos, então, que se anteshavia a aristocracia e a plebe, nesta nova organização conceitos precisavam ser construídospara explicar os espaços ocupados por governantes e governados, assim como os relati-vos aos papéis a serem desempenhados.

Foi o que HEGEL fez, no século XIX, quando afirmou que SOCIEDADE CIVIL é tudo oque não é contemplado pela estrutura jurídica e política (que constitui o ESTADO). Navisão hegeliana, a sociedade civil, por envolver relações econômicas e familiares era umcírculo restrito, com interesses limitados, enquanto o Estado, pela abrangência das ações,apresentava caráter universalista.

O Estado que, sabemos, nem sempre esteve tão próximo assim da Sociedade Ci-vil, à medida que o capitalismo foi se instalando, em razão inversa, mais e mais foi sedistanciando. No que concerne ao nosso país é interessante que alguns pontos sejamobservados:

- no Brasil nunca houve tal aproximação;

- os governantes não foram e não são questionados pelo povo, que ainda nãoconheceu a verdadeira democracia pelo fato de ainda não ter sido conquistada;

É importante ressaltar que a organização social, como afirmamos inicialmente,preexiste ao Estado, cuja criação dela decorre.

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A existência do Estado está, pois, condicionada à sociedade, não havendo possi-bilidade daquele modificar-se, sem que esta se transforme. Daí a preocupação, dentreos que detêm o poder, em engendrar toda a sorte de obstáculos, de forma a impedirque mudanças sejam efetivadas. VIEIRA (1997:44) explica que o conceito de sociedadecivil vem sendo associado às lutas desenvolvidas pelos movimentos sociais, que emer-giram em contraposição aos regimes totalitários - de direita ou de esquerda - vigentes,por longos períodos, em várias partes do mundo.

De acordo com VIEIRA (1997:44-48) - que por sua vez se apóia em Cohen e Arato -,entre o Estado e a sociedade civil, duas outras esferas são encontradas: a sociedadepolítica e a sociedade econômica, o que nos permite afirmar que a sociedade estariaorganizada com base na interação de quatro grandes esferas, conforme representaçãográfica a seguir.

Como o esquema demonstra, a sociedade econômica e a sociedade política sãooriundas da sociedade civil, da qual provêm, também, aqueles que organizam, coman-dam e atuam nas instituições que constituem o Estado.

Deve ser observado, porém, que a sociedade civil é constituída por segmentos

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SOCIEDADE POLÍTICA

Instituições que representam aorganização política e jurídica dasociedade

Partidos políticos, organizaçõespolíticas e parlamento

Organizações de produção edistribuição, cooperativas,empresas e firmas

Segmentos organizados dasociedade

SOCIEDADE ECONÔMICA

SOCIEDADE CIVIL

ESTADO

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com realidades, anseios, problemas e interesses distintos e, por vezes, antagônicos4.Diante disto, vemos ser impossível, para qualquer grupo político, representar a socieda-de em sua totalidade, posto que, é impossível defender, simultaneamente, os interes-ses de uns e de outros.

A sociedade política deveria ser a esfera intermediária, que procura identificaros problemas que afetam o segmento que representa (das sociedades civil ou econômi-ca) para, junto aos poderes constituídos (ou Estado), envidar esforços no sentido deviabilizar o apoio necessário para que as soluções mais adequadas sejam encontradas epara que todos os direitos de cidadania, duramente conquistados ao longo dos últimosséculos, sejam respeitados.

Aí vemos, como pano de fundo, o papel do Estado, em seus três níveis (federal,estadual e municipal): viabilizar a implantação de um efetivo Estado Democrático deDireito, tendo como fundamentos, conforme o art. 1º da Constituição Federal:

“I – a soberania;

II – a cidadania;

III – a dignidade da pessoa humana;

IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V – o pluralismo político”

A chamada Constituição-Cidadã vai muito mais longe, uma vez que no art. 3ºsão definidos como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

“I – Construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II – Garantir o desenvolvimento nacional;

III –Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais eregionais;

IV –Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, idade equaisquer formas de discriminação.”

4 No sistema capitalista o antagonismo sempre está presente, uma vez que nas relações detrabalho vemos, de um lado o empregador, cujo objetivo é o lucro e, de outro, o trabalhador queprocura, através da remuneração obtida com a venda da mão-de-obra, melhores condições devida, o que significa melhor salário. Ora, para satisfazer os anseios do trabalhador, o lucro dopatrão será reduzido, o mesmo ocorrendo em relação ao lucro por este obtido, que sabemos serproveniente da mais-valia.

Regina Stela Andreli de Almeida

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Bibliografia

BOBBIO, N., MATEUCCI, N. e PASQUINO, G. Dicionário de Política. 11. ed. Brasília, DF:UnB, 1998.

BRASIL,. Leis. Constituição: 1988. Texto constitucional de 5 de outubro de 1988 com asalterações adotadas pelas emendas Constitucionais nº. 1/92 a 16/97 e emendas Consti-tucionais de Revisão nº. 1 a 6/94. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Ediçõestécnicas, 1997.

DEMO, P.. Política Social, educação e cidadania. 2. ed. Campinas, SP: Papirus, 1996.

PEREIRA, P. A. Concepções e propostas das políticas sociais em curso: tendências, pers-pectivas e conseqüências. Brasília, DF: NEPPOS/CEAM/UnB, 1994.

VIEIRA, Liszt. Cidadania e globalização. Rio de Janeiro: Record, 1997.

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Globalização e Desigualdade Social

Inara Barbosa LeãoDoutora em Psicologia Social pela PUC, SãoPaulo. Professora do Departamento deCiências Humanas/ CCHS da UniversidadeFederal de Mato Grosso do Sul.

Devido à complexidade da realidade e às múltiplas possibilidades do conhecimento, o assunto em pauta: as desigualdades sociais presentes no mundoglobalizado podem ser analisadas a partir das suas determinações econômicas,

sociais, políticas, entre outras. Optamos em discuti-las a partir de seus condicionanteshistóricos. Isto porque a história tomada como método envolve a consideração de todosos aspectos anteriormente citados, ainda que a finalidade didática deste texto não per-mita faze-lo exaustivamente.

As relações sócio-econômicas e culturais entre as diferentes partes do mundo têmseu marco fundamental nas expedições empreendidas pelos navegantes a partir do sé-culo XVI. Um dos exemplos dessas e das suas conseqüências e a chegada dos espanhóis,portugueses, franceses e holandeses ao continente americano e, especialmente, ao Bra-sil no período de 1400 a 1500, portanto entre os séculos XV e XVI.

Nestes episódios já são visíveis as implicações sociais, culturais e político-econô-micas acarretadas para ambas as sociedades e culturas envolvidas. O princípio de desi-gualdade passa a ser a tônica das relações estabelecidas, pois os mais desenvolvidos eque, de maneira geral, detinham maiores aparatos econômico e de conhecimentos obti-veram o controle da natureza física e social e se sobrepuseram aos outros. Um dessesaparatos é o tecnológico. Entretanto, vamos nos dedicar aqui, mais especificamente, aoprocesso que se desenvolve na contemporaneidade.

No começo do século XX parecia que se havia descoberto a maneira de distribuirpelo menos parte da enorme riqueza produzida pelos homens durante os séculos ante-riores, com um certo grau de justiça entre os trabalhadores dos países mais ricos: osistema social-democrata da Europa e o sistema socialista na União Soviética mostra-vam tais tentativas e possibilidades. Porém, no final do século, a desigualdade voltoua prevalecer e penetrou inclusive nos ex-países socialistas, onde antes imperava

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uma certa igualdade, ainda que de pobreza.

A humanidade era agora muito mais culta: pela primeira vez na história a maioriados seres humanos era alfabetizada, continuava-se o desenvolvimento de tecnologiasbaseado nas ciências, cuja manifestação mais revolucionária se deu nos transportes enas comunicações, que praticamente anulou o tempo e a distância e que, para as ques-tões práticas anulou as vantagens culturais da cidade sobre o campo.

Entretanto, ao contrário do século XIX que foi de progresso material, moral eintelectual contínuo, no qual se dava a melhoria das condições de vida civilizada, noséculo XX houve regressão dos padrões então tidos como normais nos países desenvol-vidos e nos ambientes de classe média e que se acreditava que iriam se ampliar para asregiões mais atrasadas e para as camadas menos esclarecidas da população. SegundoHobsbawm (19995, p. 22-24), em quem vamos nos basear para esta exposição, pode-se con-siderar que marcaram o século XX e caracterizam o início do século XXI três aspectos:

O primeiro é que o mundo havia deixado de ser eurocêntrico, com o declínio dopoder, riqueza, intelecto e “civilização ocidental”. A Europa havia tido sua populaçãoreduzida de um terço para um sexto da humanidade; as indústrias, em que a Europafora pioneira, migraram para ouros lugares; as grandes potências européias haviam de-saparecido. O conjunto dos países industrializados do século XIX ainda era a maiorconcentração de riqueza e poder econômico e científico-tecnológico, bem como sua po-pulação tinha o mais alto padrão de vida, que se mantinha devido à acumulação anteriorque compensava a desindustrialização e a mudança da produção para outros continen-tes. Porém, os Estados Unidos já se tornara a grande economia mundial, modelo e forçada produção em massa e da cultura de massa que conquistaram o mundo.

A segunda transformação é que no fim do século XX o globo era uma unidadeoperacional única, principalmente em questões econômicas, na qual as unidades “maisvelhas” como as economias nacionais, definidas pelas políticas de Estados territoriais,estavam reduzidas a complicações para as atividades transnacionais. O século XXI seinicia com a tensão entre o processo de globalização cada vez mais acelerado e a incapa-cidade conjunta das instituições públicas e do comportamento coletivo dos seres huma-nos de se acomodarem a ele. Parece que o comportamento humano privado teve menosdificuldades para adaptar-se ao mundo da televisão por satélite, ao correio eletrônico eao emprego em qualquer parte do mundo.

A terceira transformação é a desintegração de velhos padrões de relacionamentosocial humano e, com ela, a quebra dos elos entre as gerações, entre o passado e opresente. Há a predominância dos valores de um individualismo associal absoluto, tan-to nas ideologias oficiais como nas não oficiais e estas mesmas tendências são reforça-das pela erosão das sociedades e religiões tradicionais e também pela destruição, ouautodestruição, das sociedades do “socialismo real”. Percebe-se que a combinação des-

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tas condições foi a maneira mais eficaz de se construir uma economia industrial basea-da na empresa privada: combina-la com motivações que nada tivessem a ver com alógica do livre mercado (com a ética protestante); com a abstenção da satisfação imedia-ta; com a ética do trabalho árduo; com a noção de dever e confiança na família; mas simdesacreditar a noção de rebelião dos indivíduos.

A manutenção e aprofundamento das desigualdades sociais no período atualtiveram no fim da União Soviética condição determinante importante, pois, além dasupressão de um elemento ideológico, representou o fim de esforços políticos e de in-vestimentos econômicos para a emancipação universal pela construção de uma alterna-tiva melhor para a sociedade capitalista. Este objetivo inspirara desde a primeira gera-ção pré-Revolução de Outubro, os que pretendiam eliminar tudo o que era mal e fazeruma sociedade sem infelicidade, opressão, desigualdade e injustiça. Tanto que em pou-co mais de trinta anos após a Revolução Soviética um terço da raça humana vivia sobregimes comunistas.

O segundo grande movimento contra as desigualdades surge no combate aofascismo. Ideologicamente, este baseou-se nos valores e aspirações partilhadas doIluminismo e das Revoluções: progresso pela aplicação da razão e da ciência; educação egoverno popular; nenhuma desigualdade baseada em nascimento e origem; sociedadesvoltadas mais para o futuro que para o passado. As aspirações não eram distantes darealidade comum. O capitalismo ocidental, os sistemas comunistas e o Terceiro Mundoestavam igualmente comprometidos com direitos iguais para todas as raças e ambos ossexos, mas não de uma forma que distinguisse um grupo do outro. Eram todos Estadosseculares (em contraposição ao que se refere ou pertence à Igreja; temporal, civil, mun-dano), que rejeitaram a supremacia do mercado e acreditaram na administração e plane-jamento da economia pelo Estado. Os governos capitalistas de então estavam convenci-dos de que só o intervencionismo econômico podia impedir um retorno às catástrofeseconômicas do período entreguerras e evitar os perigos políticos de pessoas radicalizadasa ponto de preferirem o comunismo, como antes tinham preferido Hitler. Países doTerceiro Mundo acreditavam que só a ação pública podia tirar as suas economias doatraso e dependência. No mundo descolonizado, seguindo a inspiração da União Sovié-tica o caminho para o fim das desigualdades parecia ser o socialismo e o planejamentocentralizado. Todas as três regiões do mundo avançavam no pós-guerra com a convicçãode que a vitória abria uma nova era de transformação social.

Porém, assim que não houve mais o fascismo para uni-los, o capitalismo e o co-munismo voltaram a se preparar para enfrentar um ao outro como inimigos mortais. Apartir de então a diminuição das desigualdades sociais se deveu aos esforços de recu-peração das conseqüências das Guerras Mundiais. Foi os Estados Unidos da América,que dominou a economia do mundo após a Segunda Guerra Mundial, pois, simples-mente continuaram a expansão dos anos da guerra, pois não sofreram danos, aumenta-

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ram seu PNB em dois terços da produção industrial mundial. Entretanto, o grande desen-volvimento pertenceu a todos os países do capitalismo desenvolvido, ainda que os paísessocialistas apresentassem taxas de desenvolvimento superiores a dos capitalistas.

Neste momento o desenvolvimento foi um fenômeno mundial embora a riquezageral não chegasse a maioria da população do mundo, as populações cresceram, a expec-tativa de vida ampliou em até dezessete anos. Inicialmente, a explosão econômica pós-guerra pareceu apenas uma versão do que acontecia antes: uma globalização da situaçãodos EUA pré-1945 e de certa forma era mesmo.

Contudo o mais impressionante nesse período é extensão em que o surto econô-mico era movido pela revolução tecnológica: radar, motor a jato, a eletrônica e a tecnologiade informação. Entretanto, o alto custo da pesquisa e desenvolvimento dos produtosreforçou a enorme vantagem das economias de mercado desenvolvidas sobre as demais.Tanto que um país desenvolvido típico mantém em atividades para este fim cerca demil engenheiros e cientista para cada milhão de habitantes.

Estas novas tecnologias são de capital intensivo e exigem pouca mão-de-obra ou asubstituem. Portanto, precisa de gente cada vez mais, apenas como consumidores. En-tretanto, o ritmo de crescimento econômico até a década de 1980 não deixou esta condi-ção clara, pois se continuou a ampliar os postos de trabalho. Além disso, o sistema deprevidência parecia assegurar as condições vigentes em caso de desemprego, para sempre.

Desde o período de expansão econômica do pós-guerra houve uma reestruturaçãoe reforma do capitalismo com um avanço na globalização e internacionalização da eco-nomia, conforme o modelo dos EUA.

A primeira reestruturação produziu uma “economia mista”, que ao mesmo tempotornou mais fácil aos Estados planejar e administrar a modernização econômica e aumen-tou enormemente a demanda. Ao mesmo tempo, o compromisso político dos governoscom o pleno emprego e com a redução da desigualdade econômica, isto é, um compromissocom a seguridade social e previdenciária, pela primeira vez proporcionou um mercado deconsumo de massa para bens de luxo que passaram a ser aceitos como necessidades.

A segunda reestrutuação multiplicou a capacidade produtiva da economia mundi-al, tornando possível uma divisão de trabalho internacional muito mais elaborada esofisticada. Assim, pode-se perceber que a reestruturação do capitalismo e o avanço nainternacionalização da economia foram fundamentais para melhorar as condições devida. Porém, a revolução tecnológica não é a única explicação para tal, pois muito daindustrialização nesse período deveu-se à disseminação para novos países de processosbaseados em velhas tecnologias. O impacto da tecnologia gerada pela pesquisa avançadana indústria civil só se torna importante após a crise de 1973, quando se deu a grandeinovação na tecnologia de informação e na engenharia genética.

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O que parece caracterizar este período e a redução de desigualdades sociais que pro-moveu foi a conjunção de liberalismo econômico e democracia social, com substanciaisacréscimos da URSS quanto ao planejamento econômico. Por isso políticos, autoridades ehomens de negócio do Ocidente do pós-guerra estavam convencidos de que um retorno aolaissez-faire e ao livre mercado original estava fora de questão. Alguns objetivos políticoscomo: pleno emprego, contenção do comunismo, modernização de economias atrasadas ouem declínio tinham prioridade e justificavam a presença mais forte dos governos.

Outro aspecto a ser considerado é as mudanças culturais. Entende-se que a Revo-lução Cultural de fins do século XX caracteriza-se como a vitória do indivíduo sobre asociedade. O que acarretou o rompimento dos vínculos dos seres humanos com a textu-ra social, pois essa textura não consistia apenas nas relações factuais entre os sereshumanos e suas formas de organização, mas também nos modelos gerais dessas rela-ções e os padrões esperados de comportamento das pessoas umas com as outras; seuspapéis eram prescritos. Daí a insegurança muitas vezes traumática quando velhas con-venções de comportamento eram derrubadas ou perdiam sua justificação; ou aincompreensão entre os que sentiam essa perda e aqueles que eram jovens demais parater conhecido qualquer coisa alem da sociedade anômica.

Na maior parte do mundo, as velhas texturas e convenções sociais, embora defa-sadas pelas transformações sociais e econômicas, estavam tensas, mas não em desinte-gração. Isso era uma felicidade para a maior parte da humanidade, sobretudo os pobres,pois a rede de parentesco, comunidade e vizinhança eram essenciais para sobrevivênciaeconômica e, sobretudo para o sucesso num mundo em mudança.

Nas sociedades mais tradicionais, as tensões iriam se mostrar basicamente na medi-da em que o triunfo da economia comercial destruía a legitimidade da ordem social atéentão aceita, baseada na desigualdade, tanto porque as aspirações se tornavam mais iguali-tárias quanto porque as justificativas funcionais da desigualdade estavam desgastadas. Asinstituições mais solapas pelo individualismo moral doas a família tradicional e as igrejasorganizadas tradicionais no Ocidente, que desabaram de no último terço do século.

As conseqüências materiais do afrouxamento dos laços familiares tradicionaisporque era um mecanismo de cooperação social e como tal, foi essencial para a manu-tenção das economias agrárias e das primeiras economias industriais, locais e globais.Quando esses laços e solidariedades de grupos não econômicos foram minados, tam-bém o foram os sistemas morais que os acompanhavam por não serem mais aceitascomo parte de um modo de ordenar a sociedade que ligava as pessoas e que ligava aspessoas entre si, assegurando a cooperação social e a reprodução, desapareceu a maiorparte de sua capacidade de estruturar a vida social humana. Foram reduzidas a manifes-tações de preferências individuais e reivindicações de que a lei reconhecesse a supre-macia dessas preferências. A partir da 1969 estas condições encontraram expressão ide-ológica em várias teoria do extremo liberalismo do mercado ao “pós-modernismo”, quetentam contornar o problema do julgamento moral e valores, ou reduzi-las ao único

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denominador da irrestrita liberdade do indivíduo. Isso se tornou evidente na área daideologia neoliberal quando o termo subclasse entrou no vocabulário sociopolítico porvolta de 1980 para de referir às pessoas que, nas sociedades de mercado desenvolvidasapós o fim do pleno emprego, não conseguiam ou não queriam ganhar a vida para simesmos e sua famílias na economia de mercado e que implicava uma exclusão da soci-edade “normal”. Essas subclasses dependiam da habitação, e da previdência pública,mesmo quando complementavam suas rendas com atividade na economia informal ouno crime, que não estão submetidos ao controle fiscal do Estado e que sem a proteçãofamiliar ficavam sem “sustentação”.

Assim, vemos que os problemas próprios da desigualdade social: pobreza, desem-prego em massa, miséria e instabilidade foram parcialmente eliminados por cerca de qua-renta anos nos países desenvolvidos. Porém, reapareceram após 1973. o crescimento econô-mico foi interrompido por várias crises e depressões distintas. A pobreza e a miséria volta-ram na década de 1980. Como os sistemas de previdência e proteção social não puderammanter o nível de cobertura do período anterior, isto vem contribuindo para o colapso depadrões políticos tradicionais. O que se percebe é não é que o capitalismo já funciona tãobem como nos período anterior, mas que suas operações se tornaram incontroláveis e aspolíticas de governo coordenadas nacional e internacionalmente não estão funcionandomais. Esta condição permitiu o ataque ideológico dos defensores do liberalismo à garantiado pleno emprego e do controle do estado promovendo a defesa do livre-mercado.

Entretanto, a transferência de postos de trabalho para países de mão-de-obra maisabundante e barata já estava deixando de ser estratégia vantajosa para o capital, pois estespassaram a adotar as tecnologias inovadoras e mecanizaram a produção. Aumentava-se aprodução, ampliava-se o consumo e o trabalho continuou a diminuir, uma vez que o custodo trabalho humano não pode ser reduzido abaixo dos custos necessário para mante-losvivos num nível aceitável como tal em sua sociedade. Portanto, quanto mais alta a tecnologia,mais caro o componente humano de produção comparado com o mecânico. Portanto,depreende-se que o problema a enfrentar é o da distribuição da riqueza e da produção e nãoa sua geração. A Questão que se apresenta é quem a fará, senão os governos?

Bibliografia

BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. Crise Econômica e reforma do Estado no Brasil: parauma nova interpretação da América Latina. São Paulo: Ed. 34, 1996.

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Globalização e Desigualdade Social

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Márcia Gomes Marques

Doutora em Ciências Sociais pelaPontificia Universitá Gregoriana, Roma.Professora do Departamento deJornalismo/CCHS da UniversidadeFederal de Mato Grosso do Sul.

Globalização, Meios de Comunicação eMercado de Trabalho

Opropósito deste artigo é discutir sobre a relação entre formação para o mercadode trabalho, globalização e meios de comunicação. Vivemos em um mundo sem-pre mais globalizado, onde os meios de comunicação tornaram-se mediadores

da relação que os seres humanos estabelecem com a realidade que lhes circunda. Aglobalização e a presença dos meios de comunicação trazem conseqüências não somen-te para o mundo do trabalho, e sim para a vida social em geral; mas para inserir-se emanter-se de modo competitivo no mercado de trabalho é necessário, no entanto, terem mente alguns dos aspectos centrais e que marcam o modo de ser da sociedade atual,como é o caso da crescente globalização e da ubiqüidade dos meios de comunicação navida hodierna. Vamos debater, então, sobre a interdependência entre meios de comuni-cação e processo de globalização, e sobre alguns dos aspectos a serem levados em consi-deração quando nos propomos a formar para o mercado em um mundo globalizado,onde os meios de comunicação atravessam cada vez mais o contato entre as partes.

E por que preocupar-se com a globalização na planificação que se faz na formaçãopara o mercado de trabalho? Há algo de singular nesta nova realidade que justifique estaatenção? O que têm os meios de comunicação a ver com essa configuração social que seafirma de forma avassaladora sobre a sociedade como um todo? Devemos, antes de maisnada, entender o papel dos meios na sociedade contemporânea. Para responder estasquestões é importante, também, definir alguns dos rasgos do que entendemos aqui porglobalização, visto que este conceito aparece insistentemente em distintos contextos, enem sempre os seus usos coincidem por completo.

Quanto à importância de discutir os meios de comunicação quando falamos deglobalização, devemos considerar que estamos em uma sociedade onde a comunicação e

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a informação adquiriram uma importância inaudita, ocupando, inclusive, parte consi-derável de nossas atividades e atenções cotidianas. Vivemos em uma sociedade da in-formação e da comunicação, onde as mensagens são transmitidas ininterruptamente,transpondo grandes distâncias sem deixar sinais aparentes disso: tudo aparece quaseque instantaneamente, como se fosse simples saltar de um lado a outro do mundo,como se não houvesse dificuldades para superar as barreiras espaço-temporais. O con-tato quase simultâneo que temos com o que ocorre “do outro lado do mundo” atenua,quase eclipsando, a separação espacial e temporal, que antes de fato obstaculizava oconhecimento sobre os eventos e acontecimentos então vistos como “remotos”. Estecontato sempre mais fácil e veloz se deve, principalmente, ao melhoramento das vias decomunicação, dos meios que dispomos para transportar corpos e idéias: a potencializaçãodesses meios de transporte de notícias e de pessoas faz com que a nossa percepção dasdistâncias se transforme, que passemos a não dar-nos conta de quão longínquos são ospequenos fatos que compõem a nossa realidade cotidiana.

Justamente colocado neste contexto, um primeiro fator que caracteriza isto quechamamos de globalização é, então, a reordenação das nossas noções sobre o espaço e otempo, que se acentua permanentemente pela crescente e constante interconexão en-tre as diferentes partes do mundo. À diferença de outras épocas, onde também haviacontato inter-regional ou entre certas partes do globo terrestre – vide os processos deinternacionalização e transnacionalização, por exemplo –, a globalização se distingüeporque nela as atividades ocorrem em uma arena global, organizadas, planejadas e coor-denadas em escala global, implicando interdependência e reciprocidade entre as partes.A interconexão, neste caso, é sistemática e recíproca, e os acontecimentos e ações têmalcance global. Além das notícias serem transmitidas quase que instantaneamente, arepercussão de algumas delas também acontece velozmente, e a sensação de que vive-mos em uma “aldeia global” é sempre mais difusa. Não só estamos todos em contatouns com os outros: estamos em relação, estamos relacionados e posicionados dentrouma rede de interdependência e reciprocidade. Apesar de estarmos sempre mais relaci-onados e conectados uns com os outros, este contato é cada vez menos direto, e sempremais mediado, intermediado pelos meios de comunicação. Queremos saber do que acon-tece com os “outros” porque necessitamos dessa informação para desempenhar-nosmelhor, de forma mais competitiva e com resultados sustentáveis no tempo. Eis por-que, em parte, devemos refletir sobre a globalização e a presença dos meios de comuni-cação em nossas vidas quando pretendemos formar, educar para que se obtenha umbom desempenho, a longo prazo, no mercado de trabalho.

Dizer que estamos sempre em relação significa, por um lado, que estamos física ementalmente conectados: sabemos da existência “dos outros” e entendemos que osrumos que tomem eles têm conseqüências, também, para os nossos planos e ativida-des. Significa, por outro lado, que para sermos eficazes na concepção das estratégias quenos permitirão alcançar os nossos objetivos, devemos compreender onde estamos emrelação aos outros, e que brechas há no conjunto de elementos dispostos para subverter

Globalização, Meios de Comunicação e Mercado de Trabalho

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os aspectos que não julgamos favoráveis à concretização de nossos planos. No caso deMato Grosso do Sul, por exemplo, é importante identificar de que tipo é o mercado detrabalho para o qual pretendemos formar e atualizar a mão-de-obra. Para entender paraonde vai o mercado de trabalho na região é necessário, também, compreender comoMato Grosso do Sul se localiza com relação aos outros estados da Federação, e como oBrasil se insere dentro (dos rumos) da economia global. Em outras palavras, como noslocalizamos dentro da divisão nacional e internacional do trabalho, e o que podemos fazerpara reverter os aspectos de nossa posição que não favorecem os nossos planos de futuro.

Em síntese, vivemos em um mundo de imagens e de informações, de comunica-ção generalizada, onde o uso da tecnologia propiciou uma mudança em nossas possibi-lidades de contato com as outras partes de mundo, que nos permite pretender velocida-de e imediatismo em nossas atividades em geral. Com a intervenção tecnológica nosmeios de comunicação, a partir da metade do século passado eles se tornaram meios demassa, ligando e incrementando o vínculo entre as partes, tornando visível as feições hete-rogêneas dos “outros” e a presença deles nos desdobramentos do que ocorre a todos nós.

Como parte deste panorama, podemos identificar uma série de desafios para ide-ar uma formação que propicie uma inserção bem-sucedida no mercado de trabalho. Emprimeiro lugar, em uma sociedade interligada, onde o que ocorre com uns se repercutenas atividades dos outros, o mercado de trabalho é necessariamente dinâmico. Destamaneira, as habilidades desenvolvidas na formação para o trabalho devem ser maleáveise permitir usos plurais, de modo a que se ajustem às permanentes alterações nas exi-gências do mercado. A formação deve, adicionalmente, promover o interesse pela buscaconstante de atualização e pela aquisição permanente de novos saberes, pois a dinâmicasocial faz com que os conhecimentos já obtidos “envelheçam” rapidamente. Em segun-do lugar, vivemos em uma sociedade tecnológica, em uma realidade maquínica, de ma-neira que a formação deve desenvolver a aptidão para lidar com essas tecnologias. Emterceiro lugar, em um mundo onde a interconexão é sistemática e recíproca, a formaçãodeve despertar a atenção para as implicações dessa interdependência e reciprocidadeentre as partes. A ênfase na volatilidade social que caracteriza o mundo globalizadoevidencia a necessidade de buscar informações para poder entender para onde “vai omercado”, para compreender como as mudanças que (sempre) estão por vir podem afe-tar a posição-situação de cada qual no mundo do trabalho.

Entre os desafios mais urgentes em uma sociedade globalizada e “impregnada” demeios de comunicação, podemos ressaltar a importância de que a formação possibilite acompressão do papel dos sistemas de comunicação e de informação. Podemos ressaltar,por outro lado, que o trabalhador seja formado para utilizar sistematicamente os meiosde comunicação e as tecnologias de informação. A formação deve habilitar, então, para ouso dos meios de comunicação como “espaço público”, pois hoje, mais que nunca, éatravés dos meios que “encontramos” com os demais cidadãos do mundo, e é atravésdeles que podemos informar-nos sobre o que está acontecendo em nossa comunidade e

Márcia Gomes Marques

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na sociedade em geral. A formação para uma inserção sustentável no mercado de traba-lho deve, também, promover competências para utilizar os meios como instrumentosde atualização permanente: como lugar onde buscar novos saberes, onde ampliar eaprofundar o discernimento que se tem sobre aspectos pontuais, de acordo com as de-mandas do momento. Finalmente, a formação em um mundo que cambia deve ensinaros indivíduos a “aprender a aprender”, a buscar autonomamente novas informaçõesque preencham suas necessidades. A formação de mão-de-obra em uma sociedade dinâ-mica e globalizada deve, portanto, sensibilizar acerca da importância do uso dos meiosde comunicação como ambiente de aprendizagem, de auto-aprendizagem e deinteraprendizagem.

Bibliografia

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Globalização, Meios de Comunicação e Mercado de Trabalho

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Transformações Mundiais Recentes eMercado de Trabalho

Ricardo SennaMestre em Economia Política pela PUC/SP.Técnico de nível superior e professor colaboradordo Centro de Ciências Humanas e Sociais daUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Nas últimas três décadas tem ocorrido mudanças substanciais no ambiente econômico que tem provocado alterações importantes nas relações econômico-financeiras internacionais e nas formas de organização dos mercados.

Tais mudanças foram cunhadas sob o nome genérico de globalização, entretanto,seus contornos mais marcantes referem-se aos processos de abertura comercial e finan-ceira e às permanentes influências sobre o desempenho do padrão de crescimento daseconomias nacionais, dado o quadro de excessiva vulnerabilidade externa de economi-as em desenvolvimento.

O texto apresenta uma breve síntese dos principais movimentos que marcamessas transformações recentes e analisa suas implicações sobre o mercado de trabalho.

As mudanças no ambiente econômico

Os anos 1970 foram marcados pela crise energética, provocada pelos dois choquesdo petróleo (1973 e 1979), o que provocou a necessidade de ajustamento, em geralrecessivo, das economias nacionais. Além disso, destaca-se a ruptura do padrão dólar-ouro pelos Estados Unidos, inaugurando o sistema de taxas de câmbio flutuantes, o queprovocou a instabilidade das paridades entre as diversas moedas. Destacam-se também, aintensificação das exportações e o subseqüente processo de internacionalização bancária.

Durante a década de 1980, a crise da dívida latino-americana foi um dos fatores

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que impediu o desenvolvimento pleno das economias da região. Boa parte dessa crisefoi em função da elevação abrupta da taxa de juros norte-americana, que impôs à econo-mia internacional um severo processo de ajustamento recessivo.

Dada a combinação de taxas cambiais flutuantes e juros em elevação, o nível deinstabilidade dos mercados aumentou substancialmente, o que implicou na necessida-de de se criar mecanismos de proteção dos negócios frente às intempéries econômicas.Em função do desenvolvimento observado nas áreas de telecomunicações e informática,houve o surgimento dos mercados de derivativos como forma dos investidores se prote-gerem das instabilidades. O resultado disso foi a gradativa consolidação da importânciada esfera financeira sobre a esfera produtiva, o que tem impacto decisivo sobre os pro-cessos de geração de trabalho.

Os anos 1990 foram marcados pela retomada das idéias liberais: a crise dokeynesianismo1 em meados dos anos 1970 e a crise da dívida na América Latina nosanos 1980 abriram espaço para o surgimento do que se convencionou chamar de Con-senso de Washington.

Economistas e técnicos das instituições multilaterais com sede em Washington eoutros das economias latino-americanas reuniram-se no ano de 1989 para repensar oprocesso de desenvolvimento dos países da região. Em síntese, o entendimento do gru-po reunido foi o de que a crise se deu em função da excessiva intervenção estatal e a máutilização dos instrumentos de política econômica. As soluções propostas tratavam depromover os processos de privatização e abertura de mercado, de redefinir o papel doestado e garantir os direitos de propriedade, ou seja, um retorno às idéias liberais, base-adas na defesa do livre mercado e na redução do intervencionismo estatal.

Todas essas mudanças provocaram impactos significativos sobre o funcionamen-to das economias:

- aumento da instabilidade dos preços relativos e das taxas de juros;

- aumento do nível de incerteza;

- as decisões de negócios foram afetadas negativamente;

- mudança de foco da política econômica;

- aumento da importância da esfera financeira sobre a produtiva;

- enfoque da gestão macroeconômica no curto prazo.

Os impactos que serão destacados tratam das mudanças provocados no mer-cado de trabalho. Isso será discutido a seguir.

1 John Maynard Keynes foi um economista inglês que defendia a intervenção estatal como formade se minimizar as flutuações da atividade econômica, especialmente, em momentos de recessão.Sua teoria defende que o governo execute uma política fiscal expansiva, ou seja, o uso dos gastospúblicos como forma de aumentar os níveis de produção, emprego e renda na economia.

Transformações Mundiais Recentes e Mercado de Trabalho

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Os novos paradigmas do mercado de trabalho

Pode-se definir mercado de trabalho como o local de compra e venda dos serviçosde mão-de-obra. No mercado de trabalho, trabalhadores e empresários se confrontam,com algum grau de intervenção governamental, negociam e determinam salários, em-pregos e condições de trabalho.

Sua importância é decisiva para o ambiente econômico pois influencia os níveisde produção, demanda agregada, o nível global de empregos, o cotidiano dos trabalhado-res, o nível de produtividade, a pobreza, dentre outras variáveis.

O seu funcionamento é afetado pelo ambiente. Em geral, desequilíbriosmacroeconômicos impactam negativamente sobre o mercado de trabalho. Podem ocor-rer quedas do salário real, elevação do desemprego, deterioração das condições de vidados trabalhadores e das condições de trabalho, etc.

Por essas razões, o mercado de trabalho é sensível às variações do nível deatividade econômica: se há crescimento desse nível, os salários reais sobem, a pro-dutividade aumenta, ampliam-se as oportunidades de trabalho (seja pelo aumentode vagas ou por novas ocupações), aumenta a qualificação dos trabalhadores e osníveis de rotatividade. Numa fase recessiva do ciclo econômico, há perda de dina-mismo e desarticulação do mercado.

Em função disso, todas as transformações recentes da economia mundial descri-tas acima tiveram um papel decisivo na reorganização do mercado de trabalho. Os novosparadigmas dominantes apontam uma tendência para o conhecimento e a tecnologiacomo fontes do processo de crescimento econômico. Num ambiente desse tipo, defen-de-se a tese de que os ambientes estão em mudança permanente e, portanto, há neces-sidade de aprender e desaprender com a mesma velocidade, além de se ter um grau deespecialização e flexibilidade superiores para se competir no mercado.

Na chamada sociedade pós-moderna ou pós-industrial, há mudanças estruturaisno mercado de trabalho, como o deslocamento da força de trabalho da indústria para osetor de serviços, a passagem do trabalho assalariado para o trabalho autônomo, a ne-cessidade de se promover o trabalho em equipe em detrimento o trabalho isolado, ossalários indiretos ganham mais força no novo ambiente, por exemplo.

Considerações finais

As características do novo paradigma do mercado de trabalho podem ser sin-tetizadas abaixo:

- necessidade de se adquirir habilidades e competências específicas;

- promoção da ética e da cidadania;

Ricardo José Senna

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- aumento da competição no mercado dado seu caráter globalizante;

- o conhecimento, a informação e a tecnologia assumem um papel decisivo comofontes do crescimento econômico;

- o capital tradicional cede espaço para o capital humano e intelectual;

- os mercados possuem clientes cada vez mais exigentes;

- há um rápido avanço tecnológico.

Portanto, em função de todos os processos de mudança em curso nas últimasdécadas, um dos maiores desafios para os formuladores de políticas públicas é o depromover o desenvolvimento econômico de forma sustentável buscando a dinamizaçãodo mercado de trabalho levando-se em consideração que há uma necessidade cada vezmenor de emprego de mão-de-obra por unidade de produto e de investimento. Ou seja,os níveis de produtividade aumentam, elevando os padrões de vida da população, po-rém, com menor utilização do trabalho humano.

Transformações Mundiais Recentes e Mercado de Trabalho

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Políticas Públicas de Trabalho e Renda

Regina Stela Andreoli de AlmeidaDoutora em Serviço Social pela Unesp, São Paulo.Professora do Curso de Serviço Social da UniversidadeCatólica Dom Bosco.

Para que tenhamos condições de avaliar o alcance das políticas públicas de trabalhoe renda, é importante que entendamos, em princípio, os problemas para os quaisque tais políticas são direcionadas. Com este intuito procuraremos tecer conside-

rações pertinentes ao desemprego e à exclusão.

1. Desemprego: causas e conseqüências

O desemprego encontra-se em debate. Obras publicadas em todo o mundo alertamo trabalhador para as transformações do mercado de trabalho e, no Brasil, notícias vei-culadas pelos meios de comunicação revelam a preocupação dos governantes em rela-ção ao desemprego e divulgam as medidas que vêm sendo adotadas para que a situaçãoseja, mais do que contornada, revertida. CATTANI (2000, p. 43) afirma que

“(...) segundo relatório preparatório ao Encontro Mundial sobre o Desenvolvimento Social,realizado na Dinamarca, em 1995, o Bureau Internacional do Trabalho estimou que, no iní-cio de 1994, 820 milhões de pessoas estariam desempregadas ou em situação de subempregotão precárias e mal-remuneradas, que equivaleriam a estar sem emprego. Ou seja, aproxima-damente 1/3 da população ativa mundial – apta para o trabalho e necessitando trabalhar –não só está fora do mercado de trabalho regular, como não tem perspectivas de encontraremprego a curto prazo”.

A situação apresenta tal abrangência e intensidade que as condições de trabalho equestões salariais deixaram de ser centro das negociações desenvolvidas entre patrões eempregados. Estas, permeadas pela ameaça que o desemprego significa, favorecem oempregador, que vem obtendo avanços como a flexibilização e a desregulamentação.

As causas apontadas têm sido múltiplas e entendemos ser fundamental uma abor-dagem que contemple as concepções relativas ao fenômeno, suas causas e suas conse-qüências, assim como os diferentes elementos presentes neste contexto.

SANCHIS (1997, p. 59-79), em sua análise, afirma que o desemprego vem sendodebatido sob dois enfoques:

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a) mais do que explicações específicas, são expostas visões referentes ao funcionamento dosistema econômico;

b) tentativas de explicações sobre o desequilíbrio entre a oferta e a demanda no mercado detrabalho.

O autor associa o primeiro enfoque às interpretações neoclássica, keynesiana emarxista, que detalharemos a seguir, e, o segundo, a questões pertinentes aos cresci-mentos demográfico e tecnológico.

Visão Neoclássica - esta visão, segundo o autor, se baseia na Lei de Say “todaoferta gera sua demanda”. O desemprego é tido, então, como imperfeição do mercado,apresentando-se sob duas formas:

a) desemprego friccional - manifestado em alguns setores, enquanto vagas, na mesma medi-da, existem em outros;

b) desemprego voluntário - aquele que existe em decorrência das exigências do trabalhador.

Podemos inferir que nos dois casos o trabalhador é culpabilizado pelo desempre-go, no primeiro, por não aceitar outra ocupação, e, no segundo, por desrespeitar as leisde mercado ao apresentar-se com nível de aspiração incompatível com o nível de possi-bilidades. Para os adeptos da visão neoclássica, sempre será registrada a “taxa natural dedesemprego”, já que o chamado pleno emprego só existiria num mercado perfeito, algoimpossível de ser conquistado pela inadequação do capital humano às necessidadesvigentes (e aí vemos, ainda, a culpa do trabalhador).

Visão Keynesiana - na visão keynesiana o enfoque é deslocado: o mercado deixade ser percebido como auto-suficiente, sendo consideradas possíveis alterações decor-rentes do “mau funcionamento do sistema econômico” (SANCHIS, 1997, p.66). O de-semprego deixa de ser considerado como um problema meramente conjuntural, pas-sando a ser visto como estrutural e como um problema endógeno ao sistema econômi-co. Política intervencionista do Estado pode atenuar as ineficiências do sistema.

Visão Marxista - segundo o autor, na visão marxista o desemprego é “(...) algointimamente ligado à lógica da economia capitalista”. (SANCHIS, 1997, p.67). Interessaao capitalismo na medida em que, tendo sido o trabalho transformado em mercadoria,a mera existência de um contingente de desempregados regula o valor do salário, segun-do as próprias leis de mercado, favorecendo, ainda, a manutenção da disciplina. É ochamado exército de reserva.

A visão marxista estabelece diferenças entre o trabalho (realização efetiva da ati-vidade produtiva) e a força de trabalho (capacidade potencial de realizar determinadaatividade produtiva) e entende que a formação do salário depende muito mais de uma“lei social”, considerados os aspectos de conflito entre as classes sociais: organização dotrabalho, distribuição e o modo de consumo.

Políticas Públicas de Trabalho e Renda

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A busca por alternativas para a redução do desemprego pode ter início com aopção por uma das três vertentes apresentadas, já que os procedimentos a serem adotadosdependem das causas consideradas verdadeiras. Sanchis deixa transparecer, com niti-dez, a relação íntima que a adoção do ideário neoliberal – que trouxe em seu bojo asaberturas comercial, econômica e financeira - tem com o desemprego.

SINGER (2000, p.59-81) também classifica as diferentes concepções, referindo-se,em seu trabalho, às visões individualista e estruturalista. No primeiro grupo, que se-gundo sua leitura é constituído pelos neoliberais1, a exclusão social é entendida comoresultado de fatores individuais, enquanto que no segundo estão inseridos os paradigmasmarxista e keynesiano.

Segundo Singer os individualistas, como vimos em Sanchis, defendem a acumula-ção do capital humano, rejeitam as políticas de bem-estar e afirmam que o pobre deveser estimulado a ajudar-se a si próprio, defendendo, para tanto pressupostos como aliberdade e a igualdade.

Os estruturalistas têm em comum a visão de que o Estado deve responsabilizar-sepela economia, nela interferindo tanto através do estímulo a investimentos financei-ros, quanto através de políticas de bem-estar.

Os marxistas estabelecem distinção entre a exploração e a exclusão. SINGER (2000,p.73), neste sentido afirma, que: “Marx escreveu certa vez que pior do que ser exploradopelo capital é não ser explorado por ele, quer dizer, estar excluído do mercado de trabalho”.

Quanto ao segundo enfoque - tentativas de explicações sobre o desequilíbrio entre aoferta e a demanda no mercado de trabalho – isto é, sobre o desemprego, muitos auto-res desenvolveram estudos que, conforme nosso entendimento, longe de se contrapo-rem, terminam se complementando.

FORRESTER (1997, p.7-22) dá ao tema outro tratamento: mais do que estabelecernexos entre as leis de mercado e o desemprego, enfoca a realidade do desempregado eos interesses que podem estar sendo defendidos. Afirma que vivemos um engodo dian-te de um mundo desaparecido, que teimamos em não reconhecer como tal. Assim, aoesperarmos a superação de uma crise, aguardamos que a situação anterior a ela retorne– o que não acontecerá -, deixando de buscar alternativas adequadas. Enquanto isso,complementando a farsa:

- governos divulgam dados estatísticos manipulados;

- milhares de pessoas são colocadas “entre parênteses” perdendo, com o emprego, o teto, a

1 Pelas características percebidas por Singer na concepção neoliberal, podemos inferir que setrata da visão denominada por Sanchis como neoclássica.

Regina Stela Andreoli de Almeida

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credibilidade, a autoconsideração, a auto-estima, enquanto outra multidão aceita tudo paranão se ver em situação semelhante;

- os desempregados são julgados pelos critérios vigentes em tempos em que os empregoseram abundantes;

- os excluídos do sistema produtivo introjetam uma representação social, de acordo com aqual são incompatíveis com uma sociedade da qual são produtos e acusam-se daquilo de quesão vítimas;

- os excluídos são enfraquecidos pela vergonha, numa sociedade na qual útil é aquele queproduz e/ou consome – o que transforma os desempregados em inúteis. As estatísticas tra-balham com percentuais, sem considerar os efeitos da miséria nos indivíduos.

Conclui FORRESTER que é assim que se constrói uma sociedade de escravos. Seugrito tem a pretensão de alertar-nos que, desconsiderando as causas, concentramo-nosapenas nas conseqüências: o desemprego e a pobreza, deixando de encontrar alternati-vas que revertam a situação.

Prosseguindo na coleta de dados que nos auxiliem a entender o desemprego, parapodermos classificar as políticas vigentes em nosso país a ele relacionadas, procuramosconhecer a visão de MARTINS relativa à exclusão.

Para MARTINS (1997, p.25-38), estamos diante não da exclusão, mas da inclusãomarginal2. O autor afirma que o uso do termo EXCLUSÃO demonstra a existência deuma nova consciência da sociedade diante de situações antigas que não éramos capazesde perceber; que o processo exclusão/inclusão tem sua origem no capitalismo, que fazdo mercado e da mercadoria sua lógica. Assim, tudo tem que ser “desenraizado”, paraser submetido às leis de mercado. Afirma que, na Europa, o processo se desenvolve há,pelo menos, 300 anos, podendo ser utilizado como exemplo o caso dos imigrantes euro-peus que se fixaram no Brasil. Vieram por terem sido “desenraizados”, para que o capi-tal se apossasse de suas terras e, com a adoção de sistemas modernos, elevasse a produ-tividade. Foram desenraizados - como ainda o são todos os excluídos do processo produ-tivo - para que servissem melhor ao capital: como operários, assalariados, vendedoresda força de trabalho, como mercadoria.

Exclusão e inclusão, explica-nos o autor, são faces da mesma moeda: “a sociedadecapitalista desenraíza, exclui para incluir”. (MARTINS, 1997, p.32) É na inclusão que seencontra o problema. Nos últimos anos, porém, novos fatos passaram a ocorrer:

- o intervalo entre as duas fases do processo tornou-se maior;

- o modo que o trabalhador encontra para ser reincluído retrata degradação, a ponto de

2 FORRESTER (1997, p.15) comunga com Martins neste sentido ao afirmar, p. “... eles são chamadosde excluídos. Mas, ao contrário, eles estão lá, apertados, encarcerados, incluídos até a medula”.

Políticas Públicas de Trabalho e Renda

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reaparecer o trabalho escravo no Brasil. “Essas formas extremas e dramáticas de inclusãoindicam que o modo de absorver a população excluída está mudando”. (1997, p.33)

Prosseguindo em sua análise, percebe diferenças neste processo já antigo: a situaçãovivenciada na transição da exclusão para a inclusão está se tornando padrão de vida e,embora reincluído no sistema produtivo, o indivíduo não consegue a inclusão social.

Para MARTINS, o processo vem criando uma sociedade paralela: includente noponto de vista econômico e excludente nos aspectos social, moral e político. Nessassociedades paralelas os sistemas de justiça também paralelos – justiceiros e traficantesque controlam morros, assim como casos de chacina. A justiça popular, o autor nãocomenta, mas representa um retrocesso a tempo anterior à Lei de Talião3: primeiratentativa de organização das idéias penais.

São duas formas de humanidade na mesma sociedade, uma das quais é compostapor cidadãos de segunda categoria, o que parece nos reconduzir à sociedade feudal,quando vigorava o Estado de Nascimento, ajudando-nos a compreender porque umasociedade imita a outra, até com falsificações de “griffes”.

O raciocínio de Martins é complementado pela reflexão de SINGER (2000, p.60-63), quando este conclui que a exclusão social é um processo que representa a associa-ção de diversas formas de exclusão. Este processo está relacionado à desigualdade epode até elevá-la, mas não pode ser entendido como dela resultante. A exclusão apre-senta-se em diferentes graus, do mais leve, decorrente da baixa renda, ao mais grave,apresentado pelos sem-teto.

A desigualdade e a pobreza, ao contrário, são situações distintas, embora apre-sentem imbricações. SINGER (2000, p.60) explicita que desigualdade “refere-se à renda,ao consumo ou acesso a serviços e oportunidades”. Quanto às suas causas, enquanto osindividualistas a concebem como decorrente da diversidade apresentada pelos indiví-duos entre si, os estruturalistas a vêem como conseqüência de distorções relativas àdistribuição de renda apresentadas pela economia de mercado.

A pobreza é uma situação que, para ser mensurada, exige a adoção de parâmetroscomo os “mínimos sociais”, que se referem ao atendimento das necessidades básicas.Conforme o autor, “implica padecimento por privação do mínimo necessário para man-ter a pessoa viva e saudável”. (SINGER, 2000, p.61)

Sobre possíveis reflexos da globalização no índice de desemprego registrado,SINGER (2000, p.19-20) afirma que se trata de um “processo que se realiza sem soluçãode continuidade já há mais de cinqüenta anos (...)”.

3 “Até o século XVIII, a vingança era a única forma de reação à ofensa, conhecida e aplicada. Tratava-se, a princípio da vingança privada, quando a parte ofendida, revidava” (ALMEIDA, 1993, p. 23-24).

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Segundo o autor, a globalização “não reduz de forma sistemática e contí-nua” o nível de empregos, mas, na medida em que, pela abertura comercial, o volumedas importações torna-se maior que o das exportações, o índice de desemprego eleva-se:trata-se do desemprego estrutural. Conclui o autor que

“O desemprego estrutural, causado pela globalização, é semelhante em seus efeitos ao de-semprego tecnológico: ele não aumenta necessariamente o total de pessoas sem trabalho,mas contribui para deteriorar o mercado de trabalho para quem precisa vender sua capacida-de de produzir. Neste sentido, a Terceira Revolução Industrial e a globalização se somam”.SINGER (2000, p.23)

POCHMANN trabalha com os mesmos elementos, mas, na relação causa/conseqü-ência, faz uma leitura distinta da realidade constatada no âmbito internacional. Para eleo processo de globalização, tornando mais acirrada a concorrência, exige a reestruturaçãodas empresas, objetivando a redução do custo de produção. O processo tem como ori-gem a modernização conservadora. Citando Tavares4, o autor afirma que os problemasque hoje se destacam (desemprego, precarização do trabalho e desregulamentação, den-tre outros)

“(...) são decorrentes da Terceira Revolução Industrial, sob a forma de modernização conser-vadora”(...) resultantes das “mudanças estruturais, tecnológicas, produtivas e organizacionaisem meio ao colapso da velha ordem econômica internacional e das instituições que articu-lam os diferentes Estados e interesses nacionais”. (POCHMANN, 1999, p.25-27)

POCHMANN, ao contrário de SINGER, conclui que:

“... a crise do desemprego não é irreversível nem inevitável (...) Ela tem implicações diretasque decorrem do processo dominante de globalização financeira e de adoção generalizadade políticas neoliberais. (...) a instabilidade no mundo do trabalho, a precarização das condi-ções e relações de trabalho e a permanência de elevadas taxas de desemprego devem serreferidas ao movimento do capitalismo contemporâneo neste final de século, que ocorredesprovido de uma coordenação favorável à produção e ao emprego para todos entre osprincipais países avançados”.(1999, p.47)

Em nosso cotidiano testemunhamos as situações e processos aqui demonstrados. Naúltima década muitas foram as matérias publicadas que se referiam ao desemprego, desta-cando dentre suas causas: a) avanço tecnológico; b) crescimento econômico inadequado; e c)altas taxas de juros, além da eliminação de milhares de postos de trabalho na área rural eurbana. São dados que nos permitem observar que os autores mencionados estão corretosem sua análise, já que a ampliação de mercados para uns, representa restrições para outrose, neste contexto, como ocorre entre as classes sociais, a exploração dos países chamadosemergentes ocorre de maneira explícita por parte dos de capitalismo avançado.

4 A obra citada é “Ajuste e reestruturação nos países centrais, p. a modernização conservadora”, deM. TAVARES, publicada em Economia e Sociedade nº 1. Campinas, SP, p. IE/Unicamp, 1992.

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Por essas razões a estrutura social brasileira vem sendo contornada por uma fai-xa, que se alarga cada vez mais: o “locus” dos excluídos. No que concerne à exclusão,muito há para ser discutido e VAZ (2002, p.105-127) nos auxilia neste sentido, apresen-tando síntese de pensamentos que, ao se complementarem, retratam, de maneira im-portante a realidade vigente. Inicia sua reflexão conceituando como exclusão social si-tuação de privação coletiva no exercício da cidadania plena, o que envolve trabalho esalário digno, educação, participação social, política e comunitária.

Os autores citados por Vaz, favorecem nosso posicionamento:

a) Xiberras observa que a dificuldade para que a exclusão possa ser identificada e classifica-da encontra-se na multiplicidade de formas sob as quais esta se apresenta, dentre as quaispodem ser destacadas: as visíveis; as que não são vistas, mas são sentidas; as que são vistas,mas não são comentadas; e as invisibilizadas. Prossegue sua análise afirmando que a exclu-são pode ocorrer: tanto pela incapacidade de superar determinada etapa da educação for-mal, (processo que efetivamente será prejudicial se for acompanhado pela pobreza e/oudesemprego, lócus da forma mais chocante de exclusão), quanto pela incapacidade que acar-reta na participação no mercado de trabalho e no mercado de consumo.

b) Wanderley também sinaliza a esfera produtiva ao tratar da exclusão, mas prossegue emsua análise, abordando os desdobramentos que se iniciam no preconceito, materializam-sena discriminação e se cristalizam no estigma.

c) Demo desloca o foco do desemprego para o desempregado ao afirmar que o excluído hojetem melhor e maior preparo e pode reagir à exclusão e complementa: o trabalhador nãopode ser detentor de apenas força de trabalho, mas inteligência do trabalho (VAZ, 2002, p. 114).

Algumas questões começam a tornar-se mais claras e a mais significativa delas éque a resignação não é o único caminho. Medidas podem ser tomadas, conduzindo oinevitável processo de transformação para um norte: a justiça social.

É uma prática constante e efetiva. O grande problema é que os interesses não sãocoincidentes e quase sempre os que são defendidos são os das classes dominantes.Vejamos o que foi planejado e realizado na última década, procurando identificar osresultados obtidos.

2. A proposta governamental e o desenvolvimento local

Objetivando o desenvolvimento de ações voltadas para a redução dos problemasdecorrentes do desemprego, em 1995 a Secretaria de Formação e Desenvolvimento Pro-fissional - SEFOR, do Ministério do Trabalho publicou o documento “Educação Profissi-onal: um projeto para o desenvolvimento sustentado”, contendo proposta de ação.

O documento enfatizava que as empresas - e isto vem sendo percebido nas últi-mas décadas -, sentindo a necessidade de adequação às exigências do mercado, vêminvestindo na qualificação de seus empregados, buscando, assim, tanto elevar o padrãode qualidade dos produtos, quanto compensar a baixa escolaridade dos trabalhadores.

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O Ministério do Trabalho, através da SEFOR, entendeu que, ante o fato de doisterços dos trabalhadores brasileiros apresentarem apenas quatro anos de escolaridade(o que nem sempre equivale à aprovação nas quatro séries iniciais), o treinamento ofe-recido pela empresa interessava (como continua interessando) também ao trabalhador.Observou, porém, que parcela significativa da população brasileira, pela situação dedesemprego, permanecia à margem deste processo, o que tornava a cada dia mais remo-tas as possibilidades de reinserção no mercado de trabalho. Assim, sendo a qualificaçãoprofissional de interesse das empresas e dos trabalhadores, buscou, dentre as alternati-vas de solução, uma estratégia que favorecesse o atendimento de todo e qualquer traba-lhador5 e não somente o que se encontrasse empregado. Com este intuito, a SEFORpropôs o estabelecimento de parcerias entre governo, empresas, trabalhadores e educa-dores, objetivando a educação ou qualificação profissional, prioritariamente dos excluí-dos, que são, segundo o próprio documento “(...) os que sobrevivem na informalidade,os que ‘sobram’ da modernização ou sequer lograram se inserir no processo”. (1995, p.9)

Há três anos, conforme vemos em ALMEIDA (2001) propusemo-nos a avaliar emque medida as práticas adotadas pelos órgãos governamentais, relativas à qualificaçãodo trabalhador, reduziram o desemprego registrado em Campo Grande/MS, no períodocompreendido entre 1996 e 1998.

Logo no início detectamos a primeira falha do sistema. A então denominada Se-cretaria de Estado de Trabalho, Emprego e Renda/MS, que desenvolvia, através de dife-rentes superintendências, atividades que podem ser consideradas complementares6,não se valeu da própria estrutura para acompanhar, controlar e avaliar os programas emdesenvolvimento. Desta forma, as atividades de uma Superintendência foramdesconsideradas pela outra, já que na Intermediação de Emprego não foram efetuadosregistros de participação de trabalhadores em cursos de formação, assim como nos Progra-mas de Qualificação não foi mencionado o número de trabalhadores reinseridos no merca-do. Nenhum dado foi registrado no sentido de recomendar ou não as atividades que desen-volviam, o que impossibilitou, segundo nos parece, pela falta absoluta de controle, as corre-ções sempre necessárias na execução de qualquer plano, programa ou projeto.

Apesar de, no estudo desenvolvido, termos procurado reconstruir a trajetória dotermo qualificação, com todas as conotações que lhe foram conferidas nas últimas déca-das de nossa história, não encontramos, em nenhum momento, embasamento teóricoque nos autorize a afirmar que um processo de treinamento pode preencher as lacunas

5 Neste estudo o termo trabalhador é utilizado para designar os integrantes da PEA – PopulaçãoEconomicamente Ativa – ocupados ou não – uma vez que, pelo fato de encontrar-se desempregado,o indivíduo não deixa de ser trabalhador.6 À guisa de exemplo podemos citar: captação de vagas no mercado de trabalho, emissão de Carteirasde Trabalho e Previdência Social, cadastramento, seleção e encaminhamento de mão-de-obra, segurodesemprego e oferecimento de cursos de qualificação e/ou requalificação profissional.

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deixadas pelo ensino básico, ao passo que muitas foram as alusões procurando demons-trar o contrário.

Em Campo Grande, de 1996 a 1998, pelas informações reunidas podemos afirmarque, por um lado, houve certo bom senso na eleição dos cursos ministrados, já que opercentual mais elevado (31,15%) indica a área da informática, posicionando-se, em se-gundo lugar, os voltados para o setor terciário e para a área administrativa do setorsecundário. Trata-se da qualificação da mão-de-obra realmente absorvida por um merca-do informatizado e direcionada para a prestação de serviços. Resta-nos saber se, com onível de escolaridade apresentado, (pois, conforme o relatório de 96, a população alvo,em sua maioria, não conseguiu concluir o ensino fundamental), os alunos dispunhamdos organizadores prévios exigidos para a aquisição dos conhecimentos propostos.

Observamos, ainda, na qualificação de trabalhadores da Construção Civil, um cur-so que se destaca pela simplicidade e importância: a utilização do bambu na construçãocivil, que deveria até ter sido expandido para assentamentos rurais (mas não o foi),onde o plantio do bambu poderia ser adotado como meio de recomposição das matasciliares, evitando-se, assim, o assoreamento dos rios e favorecendo, “a posteriori”, autilização do bambu também no revestimento de poços convencionais, segundo antigatécnica chinesa.

Por outro lado, observamos:

- a alocação de recursos em cursos inadequados para os dias de hoje, como os de Datilogra-fia, ministrados para 413 alunos, que dificilmente vão poder exercitar os conhecimentosadquiridos, já que máquinas de escrever quase não são mais encontradas;

- que, numa época em que a formação de professores é tão discutida e a Lei de Diretrizes eBases da Educação Nacional – LDB, de novembro de 1996, mais rigorosa7, em 1998, após,portanto, a lei ser sancionada, dentre os cursos da categoria Serviços Pessoais, encontramosum que se propunha a Qualificar Professores Leigos, com 208 alunos;

- que o próprio Estado foi o maior beneficiado com o desenvolvimento dos programas: 20,26%dos alunos, em Campo Grande, são servidores públicos, fato que não fica tão claro sem ocruzamento de informações, pelo fato dos cursos da área de informática serem computadosà parte. Se os servidores que se matricularam nos cursos de informática forem incluídos noitem destinado ao Serviço Público, o número de alunos passa de 2465 para 5687 e a diferen-ça, em termos percentuais, entre Serviço Público e Informática, é reduzida de 22,72% para0,69%. Assim, a configuração dos dados sofre alteração, uma vez que o setor de informáticacontinua ocupando o primeiro lugar, agora com 20,13%,(e não mais os 31,15% anteriores),

7 “A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso delicenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida,como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeirasséries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal”. - Art. 62 da LDB.

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mas o segundo lugar, passa a ser ocupado pela Administração Pública, cujo percentual de8,43% eleva-se para 19,44% (uma elevação da ordem de 11,01%). Esta postura parece-noscontraditória quando nos lembramos da proposta governamental, exposta neste estudo, deacordo com a qual o segmento a ser atingido, através do desenvolvimento dos programas,deveria ser, prioritariamente, o dos desempregados ou, conforme o texto original “(...) osque sobrevivem na informalidade, os que ‘sobram’ da modernização ou sequer lograram seinserir no processo”. SEFOR (1995, p.9).

- preocupação com os trabalhadores de empresas em fase de privatização, como eram, naépoca, os da Rede Ferroviária, assim como com os atingidos pela automação, como os Bancá-rios, o que parece demonstrar a intenção de minimizar os efeitos negativos de outras políti-cas estatais, decorrentes da adoção do ideário neoliberal.

- no que concerne à comunidade indígena, observamos que, embora muitas equipes, consti-tuídas por antropólogos, pedagogos e historiadores, dentre outros, atuem junto aos povosindígenas com vistas à preservação das raízes culturais, os cursos a eles oferecidos parece-nos não demonstrar tal preocupação8.

Outros aspectos merecem destaque

- só em 1996 os adolescentes autores de atos infracionais9 foram beneficiados com cursosque poderiam favorecer sua efetiva reinserção social. Não nos parece fácil entender tal fato,uma vez que o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente, no inciso XI, do art. 124, afirmaque “são direitos do adolescente privado de liberdade (...) receber escolarização eprofissionalização”;

- o mesmo ocorreu em relação aos detentos e egressos do Sistema Penitenciário que, segun-do dados do Departamento do Sistema Penitenciário, abrigava, em Campo Grande, 1.294internos (DSP, 2000:4). Neste universo, apenas 41 foram beneficiados pelo Programa deQualificação/96, não sendo oferecidos cursos nos anos subseqüentes, embora haja amparolegal para o desenvolvimento de atividades laborais em Estabelecimentos Penais de RegimeFechado, através da Lei nº. 7.210, de 11/07/8410, e a Divisão de Trabalho do Departamentonão tenha condições de contribuir para que a legislação seja cumprida.

São observações que podem conduzir os planos futuros, evitando que a legislaçãovigente seja desconsiderada, que os recursos sejam mal utilizados, que questões volta-das para o desenvolvimento local sejam consideradas.

Tais aspectos não passaram desapercebidos pelo MTE que, focalizando os ângulosnegativos do PLANFOR, como a permanência no nível compensatório, o enfoque quan-

8 Lembramos que, de acordo com o Quadro nº. 17, em 1998 foram matriculados 274 indígenas noscursos: Introdução à Informática, Confecção de malhas, Embelezamento pessoal, Pintura em tecido,Doces caseiros, Pequenos Reparos Domésticos, Conservação e Higiene de Produtos Alimentares,Pedreiro em Geral, Eletricista de Auto, Salgadinhos para Festas, Panificação e Mecânica.9 Os documentos mencionam, erroneamente, Jovens Tipificados Judicialmente, referindo-se aosque são recolhidos nas Casas de Guarda e Assistência ao Adolescente por ordem judicial.10 Esta mesma lei protege o egresso do Sistema Penitenciário em seu primeiro ano de liberdade.

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titativo e a desarticulação com outras políticas, dentre outros, em 15/07/2003 implantaseu substituto: o Programa Nacional de Qualificação – PNQ, trazendo em seu bojo pro-posta mais abrangente, integrando as esferas administrativas em ações voltadas para odesenvolvimento local, o que efetivamente apresenta muito mais sentido.

Para entendermos tal afirmação, busquemos em MARTINS e MARTINS (2001, p. 153)alguns conceitos de desenvolvimento local.

a) André Joyal em Le développement local au Canadá, afirma que são

“(...) estratégias pelas quais os representantes locais dos setores privado, público ou associativotrabalham pela valorização dos recursos humanos, técnicos ou financeiros de uma coletivi-dade, se associando em torno de uma estrutura de trabalho, privado ou público, dotado deum objetivo central de crescimento da economia local.”

b) Cristopher Bryant, em La participation communnautaire et le développementlocal, complementa

“(...) é todo desenvolvimento planejado surgido do meio local, que utiliza os recursos einiciativas locais com o objetivo de melhorar as condições de vida dos habitantes e atingirmetas coletivas da comunidade”

c) F. Albuquerque, em Desenvolvimento econômico local e distribuição do pro-gresso técnico, diz que Desenvolvimento Local

“(...) não é resultado da busca de equilíbrios irreais de grandes agregados estatísticosmacroeconômicos, e sim dos esforços e compromissos dos atores sociais, em seus territóri-os e meio ambiente concretos”

d) Para o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, é o

“(...) processo de articulação, coordenação e inserção dos empreendimentos associativos e indi-viduais, comunitários, urbanos e rurais a uma nova dinâmica de integração socioeconômica dereconstrução do tecido social, de geração de oportunidades de emprego e renda.”

Mesmo tendo acesso a tantas concepções, não dimensionaremos corretamenteDESENVOLVIMENTO LOCAL, temos antes estabelecer a correlação entre CRESCIMEN-TO e DESENVOLVIMENTO.

Importante observar que, enquanto o primeiro é voltado para a economia e, porisso mesmo, mensurado pelo PIB, o último diz respeito à elevação das condições de vidada população, aspecto não contemplado pelo crescimento face à concentração de renda.

Podemos dar razão a Franco, quando este afirma que o desenvolvimento localdinamiza diferentes tipos de capital:

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Martins e Martins caracterizam o Desenvolvimento Local como: 1) Endógeno eformativo; 2) Localizado; 3) Participativo e democrático; 4) Sustentável Estratégia gera-dora de emprego e renda; 6) Resgata valores tradicionais e culturais da comunidade; 7)Apóia as micro e pequenas empresas; 8) Exige a descentralização; 9) Favorece a inova-ção; 10) É solidário e cooperativo; 11) É um conjunto de estratégias integradas e equili-bradas; 12) É um processo contínuo de ações.

Diante do exposto podemos entender porque a proposta governamental, sendodirecionada para o desenvolvimento local, favorece o atendimento das questões não resol-vidas pelo PLANFOR, podendo oferecer soluções para muitos dos problemas existentes.

O I Relatório de Avaliação dos Planos Territoriais de Qualificação aponta aspectos quemerecem destaque:

1) a preocupação do governo estadual em dividir o Estado em regiões segundo a vocaçãoeconômica;

2) a criação, por região, dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento – COREDES, que con-ta com a participação da sociedade civil, com a competência de elaborar o Plano Regional deDesenvolvimento, associando crescimento, desenvolvimento e proteção ao meio ambiente;

Parece-nos que os avanços são significativos, mas muito há para ser alcançado,posto que, discussões devem ser desenvolvidas, ajustes propostos e políticas definidaspara que o desenvolvimento local se torne uma realidade. O mesmo relatório apresentaindícios que permitem tal interpretação, pois, no que se refere ao Turismo, foramregistradas as opiniões que transcrevemos:

Eu não acho o turismo. Eu acho que nós não temos nenhuma estrutura ainda, porque pragente desenvolver alguma coisa a gente precisa ter programa. Que programa nós temos emMato Grosso do Sul?

[...] Então, isso é muito limitado. Qual plano de expansão de turismo que nós temos quepode ser agregado a esse desenvolvimento de atividades específicas que o turismo exige?Nós não temos isso. Porque se você tivesse um programa estruturado que falasse: Não, nós

CAPITAL

ECONÔMICO

CAPITALHUMANO

+ EMPRESAS

+ REDESCAPITAL SOCIAL

EMPREENDEDORES +INICIATIVAS=

INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS

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vamos ter tantos hotéis e não sei o que dentro do Estado. Pega um município e vai olhar o queeles estão formando: garçom, camareira; nem precisa, tem município que não tem nem hotel.

Em outro ponto do mesmo documento são mencionadas tentativas de direcionaras atividades para o desenvolvimento local sustentável: 1) na Aldeia Urbana “Marçal deSouza”; e 2) na Comunidade são Benedito.

As experiências não alcançaram o sucesso possível e desejado por não terem, osexecutores, conferido a devida importância ao encontro com as próprias raízes, na cons-trução da identidade. Segundo os depoimentos registrados o material a ser utilizado naprodução do artesanato “indígena” não correspondia às tradições e na Comunidade dequilombolas não houve o atendimento das aspirações locais. São pequenos problemasque representam sérios obstáculos à consecução dos objetivos.

3. Políticas de Trabalho e Renda

A legislação será discutida em sala de aula e as cópias, que se encontram emanexo, são referentes à instituição de 1) Seguro-Desemprego; 2) Abono Salarial; 3) Micro-crédito; e 4) Programas de investimento.

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Políticas Públicas de Trabalho e Renda

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* Texto elaborado para o curso de Gestão Social da Políticas Públicas de Trabalho e Renda, daEscola de Conselhos da UFMS.

Tomamos como marco histórico para a análise da Educação Profissional no Brasil oSéculo XIX, marcado política e socialmente pela chegada do Príncipe Regente DomJoão VI e sua corte ao Brasil. Tal fato criou a necessidade de profissionais capacita-

dos para as atividades administrativas, as questões vinculadas as condições econômicase de qualidade de vida demandada pela transformação do País em sede de governo Por-tuguês. Entende-se, então, que as providências tomadas por Dom João VI inauguram osesforços governamentais para a profissionalização.

Dada as preocupações acima, as suas ações para a Educação Profissional voltaram-se para a criação de Escolas Superiores: a Academia Real da Marinha, a Academia RealMilitar, que mais tarde foi transformada na Escola Militar de Aplicação, no Rio de Janei-ro; cujas principais características educacionais eram a oferta de cursos superiores semcaráter teológico e com direcionamento profissional. Tanto que a Academia Real Militartinha a finalidade de formar engenheiros civis.

Posteriormente, implanta Cursos Técnicos Superiores no Brasil através da criação doGabinete de Química, no Rio de Janeiro e do Curso de Agricultura da Bahia – em 1812.

História da Educação Profissionalno Brasil: uma abordagem sintética dasua trajetória histórica*

Inara Barbosa LeãoDoutora em Psicologia Social pela PUC, SãoPaulo. Professora do Departamento deCiências Humanas/ CCHS da UniversidadeFederal de Mato Grosso do Sul.

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Estas iniciativas, no contexto social do Império determina que a Educação Profis-sional se torne a única oferta de ensino para aqueles que não compunham a aristocra-cia. Pois, a educação do povo que só se dava pela escola primária, jesuítica, a partir deentão, tem a escola profissionalizante.

Economicamente as iniciativas de profissionalização surgem como contraponto asituação econômica nacional, que fundada na agricultura rudimentar e no trabalho es-cravo, mantinha atividades de produção que não exigiam preparo qualificado, nem paraa administração nem para a mão-de-obra. E, portanto, alimentava o desinteresse pelaeducação profissional, prevalecendo o interesse por uma educação literária e humanista,característica das elites aristocráticas da época.

A análise da trajetória que a Educação Profissional vai cumprir permite afirmar queestas características fizeram com que se estabelecesse desde o início da educação no Brasil,um forte dualismo que continua a permear nosso sistema educacional, no qual há umabaixa qualidade no ensino que é oferecido ao trabalhador e um bom padrão educacional queé reservado à elite gerencial, permitindo-lhe inclusive a ascensão social e econômica.

Em meados do século XIX inicia-se a expansão da Educação no País, então Colô-nia, através autorização para a instalação de instituições educacionais com caráterprofissionalizante nas capitais das Províncias. Estas ações de educação profissional de-rivaram do Decreto Imperial, de 1854 para a fundação de estabelecimentos especiaispara menores abandonados, denominados de “Asilo da Infância dos Menores Desvali-dos”. Um projeto assistencialista do Império que continuou a criar várias sociedadescivis destinadas a amparar as crianças órfãs e abandonadas, que tiveram como princi-pais características educacionais a proposição do ensino das primeiras letras e, em se-guida, o encaminhamento às oficinas públicas e particulares. Portanto, ofereciam ins-trução básica e iniciação ao ensino industrial. Estas especificidades são próprias dasdeterminações econômicas da época, que segundo Romanelli (1985:45) respondiam aofato de que

Uma vez que a economia não fazia exigências à escola em termos de demanda econômica derecursos humanos; que a herança cultural havia sido criada a partir da importação de mode-los de pensamento provenientes da Europa; que a estratificação social, predominantemen-te dual na época colonial, havia destinado à escola apenas parte da aristocracia ociosa; queessa demanda social de educação, mesmo quando englobou no seu perfil os estratos médiosurbanos, procurou sempre na escola uma forma de adquirir ou manter status, alimentando,além disso, um preconceito contra o trabalho que não fosse intelectual e uma vez, enfim,que todos estes aspectos se integravam, é possível afirmar-se que a educação escolar existen-te, com origem na ação pedagógica dos Jesuítas, correspondia à exata necessidade da socie-dade como um todo.

Em um segundo momento no século XIX, o pouco interesse pela qualificação dotrabalhador se deveu ao avanço tecnológico que simplificou ao máximo as tarefas, des-locando a formação da força de trabalho para um segundo plano.

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A forma como a educação, em particular a profissional, foi tratada no século XIX,perdurou até as primeiras décadas do século XX quando o processo crescente de urbani-zação e o avanço do modelo econômico industrial sobre o agrário-exportador começa-ram a exigir uma escola e uma formação profissional que atendesse as exigências feitaspela economia em transformação.

Estas exigências têm as suas explicitações dadas no período do governo de Getú-lio Vargas, principalmente nas mudanças promovidas no “Estado Novo”. Isto porque, nocampo da educação, o governo instituído pela Revolução de 1930. A partir de 1931, espe-cificamente na formação para a força de trabalho, o governo provisório de Vargas iniciaa sua atuação no que se refere ao ensino para pessoal indiretamente ligado à produção,reorganizando o Ensino Comercial, que é instituído como um sistema paralelo, conten-do um grau primário, um técnico e um superior.

Outras iniciativas tomadas a partir de 1937 demonstram a importância gradativaque a formação para a força de trabalho estava ganhando: o Ensino Comercial passa apossibilitar aos formandos ingressar em cursos de Auxiliar de Comércio, nos cursostécnicos, que incluíam as modalidades de secretário, guarda-livros, administrador, ven-dedor, atuário e perito-contador. Os certificados conferidos por estes dois últimos cur-sos: Ensino Comercial e Auxiliar de Comércio possibilitavam, por sua vez, a oportunida-de de matrícula no curso superior de Administração e Finanças.

No caso das escolas de aprendizes-artífices, a Inspetoria do Ensino Profissional eTécnico, criada em 1931, transformou-se, em 1934, na Superintendência do Ensino Pro-fissional, diretamente ligada ao ministro (CUNHA, 2000, p. 23). Dá-se, então a criaçãodas Escolas Técnicas Secundárias com a finalidade de oferecer cursos exclusivamenteindustriais e comerciais. Este projeto foi implementado até a demissão de Anísio Teixeiraem 1935. Ainda para o desenvolvimento da educação para a força de trabalho AnísioTeixeira buscou entre 1932 e 1934, minimizar as diferenças de qualidade das escolas pósprimárias, direcionadas para os futuros operários, e as secundárias que tinham comofunção formar profissionais liberais e burocratas para os cargos públicos.

Entendemos que as principais determinações políticas das ações para a EducaçãoProfissional neste período deveram-se ao fato de que a Revolução de 1930, que levouGetúlio Vargas ao comando do governo provisório, altera as condições históricas do Bra-sil, uma vez que as características econômicas modificaram-se. Até então, a economiabrasileira se fundamentava em base agrícola cujo modelo estava voltado para a exporta-ção de alimentos e matérias-primas e na importação de bens industrializados; mas apartir de 1937, o Estado assumiu um novo papel de intervenção na gestão da economianacional passando a promover a industrialização.

Isto exigiu ações de educação profissional também para a área de infraestrutura,que se deram pela introdução do Ensino de Oficio no Brasil, principalmente, os vincula-dos à criação das estradas de ferro. Este se inicia com a Escola Prática de Aprendizes das

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Oficinas, fundada em 1906 no Rio de Janeiro e mantida pela Estrada de Ferro Central doBrasil. Suas principais características educacionais foram que o ensino de Ofício associ-ava oficina e escola e era, portanto, uma aprendizagem mais sistemática, baseada naexperiência, das empresas ferroviárias de manterem escolas para a formação de operá-rios destinados à manutenção de equipamentos, veículos e instalações. Em 1924, foicriada a Escola Profissional Mecânica, cujo funcionamento se deveu a um acordo quequatro empresas ferroviárias fizeram com o Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo peloqual cada uma enviava dois aprendizes para freqüentarem um curso de quatro anos,realizando estágio nas oficinas de uma delas.

O desenvolvimento do Ensino Unificado de Ofícios se deveu a participação do enge-nheiro suíço Roberto Mange, que juntamente com outros, fundaram em 1931, o Instituto deOrganização Racional do Trabalho (IDORT). O IDORT ganhou força nas empresas, particu-larmente nas ferroviárias devido as suas características educacionais, que difundiam a dou-trina da Organização Racional do Trabalho, sistematizada por Frederick Taylor. Baseado nassoluções tayloristas propunha a implantação de um programa que buscasse evitar desperdí-cios de tempo, de força de trabalho e de matéria-prima; combater a desorganização adminis-trativa das empresas, assim como implantar o controle eficiente de custos.

Em 1934, foi criado o Centro Ferroviário de Ensino e Seleção Profissional (CFESP)que se distinguia das demais escolas de aprendizagem de oficio espalhadas pelo paísporque estabeleceu a relação do Estado com as empresas, o que garantiu as regras doprojeto, além dos recursos mínimos necessários para o funcionamento desse mecanis-mo. O CFESP atendia exclusivamente aos filhos dos ferroviários, e direcionava a forma-ção para as estradas de ferro; adotava o método taylorista de administração de empresa,através das séries metódicas, as quais, mais tarde, serão utilizadas em todo o País peloServiço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). Este modelo do CFESP se expan-diu para os demais estados brasileiros, principalmente a partir do momento em que oprojeto industrialista foi lançado pelo Estado Novo.

A Segunda Grande Guerra Mundial e o envolvimento direto da Europa e dosEstados Unidos neste conflito criaram as condições para a implantação de um pro-jeto que substituísse as importações por produtos feitos no Brasil. A partir daí, épossível deduzir que o Estado Novo iria precisar de mão-de-obra qualificada, casocontrário não poderia alcançar esta emancipação. Desta forma, cresceu a importân-cia da qualificação para a força de trabalho. Tanto que a Constituição de 1937, noartigo n.º 129, estabelece que

O ensino pré-vocacional e profissional destinados às classes menos favorecidas é em maté-ria de educação o primeiro dever do Estado. Cumpre-lhe dar execução a este dever, fundan-do institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos estados, dos municí-pios ou associações particulares e profissionais. É dever das indústrias e dos sindicatos eco-nômicos criar, na esfera de sua especialidade, escolas de aprendizes destinadas aos filhos de

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seus operários ou de seus associados. A lei regulará o cumprimento desse dever e os poderesque caberão ao Estado sobre essas escolas, bem como os auxílios, facilidades e subsídios alhes serem concedidos pelo poder público (CUNHA, 2000, p. 28).

Em 1938, o Estado deu início à regulamentação deste dispositivo com a elaboração dedois anteprojetos. O primeiro estipulava a criação de escolas de aprendizes industriaismantidas e dirigidas pelos sindicatos dos empregadores e pelas indústrias. Caberia ao go-verno a responsabilidade de criar e manter escolas de aprendizes onde sindicatos e indústri-as não fossem capazes de bancar este empreendimento. A responsabilidade de fiscalizaçãoe de punição aos infratores caberia aos Ministérios da Educação e do Trabalho.

Quando o anteprojeto chegou à direção das indústrias houve resistência por partedos empresários devia às despesas para a sua implantação e manutenção. Diante disso,o governo publica o Decreto-Lei n.º 1.238/39 que visava “assegurar aos trabalhadores,fora do lar, condições mais favoráveis e higiênicas para a sua alimentação e assegurar-lhes, ao mesmo tempo, o aperfeiçoamento da educação profissional” (CUNHA, 2000, p. 30).

Apesar das alterações no anteprojeto derivadas as discussões entre governo e em-presários, somente depois de alguns anos a Confederação Nacional da Indústria (CNI),ao reconhecer a importância da aprendizagem sistemática para o segmento empresari-al, acatou a legislação e criou o SENAI com a seguinte explicação:

Inspirados na experiência do Centro Ferroviário do Estado de São Paulo, líderes industriaisidealizaram e defenderam, junto ao empresariado e ao governo federal, uma solução seme-lhante para as indústrias de todo o País. Em 1939, o Governo criou uma ComissãoInterministerial para estudar o problema da formação da mão-de-obra industrial e regula-mentar os cursos para trabalhadores da indústria, previstos no Decreto n.1.238, de maio de1939. Essa Comissão sugeriu ao Governo a instituição de um sistema nacional de aprendiza-gem industrial, custeado pelas empresas e integrado ao Ministério da Educação. Antecipan-do-se a qualquer providência neste sentido, a Confederação Nacional da Indústria, obtevedo governo, por meio do Decreto n. 4.048, de janeiro de 1942, a autorização para criar oServiço Nacional de Aprendizagem Industrial – Senai, cabendo-lhe todos os ônus da execu-ção e manutenção e, ainda, as responsabilidades pela organização e direção da instituição,que lhe ficaria subordinada. (FONTES, apud, CUNHA, 2000, p. 34).

Abordaremos mais detalhadamente o processo de criação e implantação do SENAIporque se entende que ele foi o grande responsável por delinear no país o pensamentopedagógico empresarial sobre a educação profissional, mesmo que esta tenha sido pre-ponderantemente sobre o trabalho no setor industrial.

A implantação do SENAI foi rápida e ganhou a confiança de empresários e gover-no, particularmente pela eficiência no trato com a formação da força de trabalho. E,apesar dos desafios impostos pela guerra, o SENAI conseguiu iniciar vários cursos deaprendizagem em 1944, particularmente no setor metal-mecânico. Naquele momentohistórico, devido às conseqüências da Segunda Guerra Mundial, a atuação do SENAI foidecisiva na formação de mão-de-obra qualificada para suprir bens e produtos que nãomais estavam sendo importados.

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O SENAI posteriormente passou a atuar em quatro grandes linhas: Aprendiza-gem, cujo processo volta-se para jovens, na faixa etária estabelecida pela legislação (14 a18 anos), em complementação à escolaridade regular, adquirem a prática metódica daexecução de operações e tarefas de determinada ocupação e os conhecimentos e atitu-des necessários para desempenha-la com eficiência; Qualificação: processo de formaçãoque capacita o indivíduo para o exercício de uma ocupação, dirigindo-se para adolescen-tes ou adultos que, tendo ou não completado o primeiro ou segundo grau, submetem-sea uma formação específica de médio em longo prazo; Treinamento: atende às necessida-des especificas do indivíduo e da empresa através de cursos de pequena e média dura-ção, estágios, seminários, etc. Tem por objetivo sanar deficiências de desempenho naexecução de tarefas específicas de uma ocupação e/ou carências de informações emconhecimento ou atitudes profissionais compatíveis com sua área de atuação e objetivaeliminar dificuldades circunstanciais, superar obstáculos, inovações, visando ao aumentoda produtividade e à maximização dos lucros da empresa e Habilitação: cursos técnicosregulares, de longa duração, de 2º Grau, que forma técnicos de nível médio em váriasocupações. (SENAI, RELATÓRIO ANUAL, 1992 apud RODRIGUES 1998, p. 18-19).

Porém, nas décadas de 1950 e 1960 a aprendizagem sistemática foi substituídapor cursos rápidos de treinamento, às vezes com duração de algumas dezenas de horas.Na década de 1970, outra vertente na formação profissional ganhou corpo: cursos técni-cos de nível médio. Além da ampliação da rede física, o SENAI também ampliou e mo-dernizou seus conceitos e suas metas na formação profissional. Mais recentemente,nos anos 90, o SENAI adotou outra linha no seu processo de formação: oferecer aostrabalhadores um treinamento continuado, uma vez que o setor produtivo atual deman-da uma força de trabalho dotada de uma educação geral muito mais longa e complexa doque aquela dos anos 1940.

Durante os cinqüenta anos de existência do SENAI, suas atividades sofreram ainfluência das mudanças ocorridas no setor produtivo, levando as suas ações educativasa se concentrarem em

Treinamentos que passam a atender às necessidades especificas do indivíduo e da empresaatravés de cursos de pequena e média duração, estágios, seminários, etc. e têm por objetivosanar deficiências de desempenho na execução de tarefas específicas de uma ocupação e/oucarências de informações em conhecimento ou atitudes profissionais compatíveis com suaárea de atuação e objetiva eliminar dificuldades circunstanciais, superar obstáculos, inova-ções, visando ao aumento da produtividade e à maximização dos lucros da empresa; e asHabilitações, concebidas como cursos técnicos regulares, de longa duração, de 2º Grau, queforma técnicos de nível médio em várias ocupações. (SENAI, RELATÓRIO ANUAL, 1992 apudRODRIGUES 1998, p. 18-19).

A criação do SENAI em 1942 foi um passo importante para a formação e desenvol-vimento da força de trabalho no Brasil. Atualmente, extrapolou suas origens e, comcursos de alto grau de sofisticação e tecnologia, constitui-se na maior rede latino-ameri-

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cana de qualificação profissional. Esta (con)formação, segundo Rodrigues (1998), man-tém-se em estreita relação com a perspectiva de competitividade industrial do atualdesenvolvimento tecnológico.

O segundo anteprojeto elaborado pelo Ministério da Educação foi direcionado aoaprendizado dos menores não trabalhadores da faixa-etária de 11 a 14 anos. Tratava-se decriar escolas pré-vocacionais direcionadas aos filhos e irmãos dos operários sindicalizados eque deveriam ser mantidas pelos sindicatos dos empregados. A idéia era desenvolver nosadolescentes a destreza manual, o conhecimento de ciências e desenho, além do cultivo dacultura geral. Era, portanto, uma espécie de preparação para o mercado de trabalho.

Dado o contexto sócio-político vigente no País naquela década recheada de pro-messas de progresso e também pela incerteza de acirrada luta de classes incentivadapela guerra fria, e as condições históricas vividas na primeira metade do século XX,quando no contexto mundial dava-se o prestígio da antiga URSS, o início da chamadaGuerra Fria, a crescente mobilização social provocada pelas Teorias da Libertação não sóno Brasil, mas na América Latina; o pensamento pedagógico dos empresários não seresumiu à formação técnica, mas avançou, também, pelos caminhos do “social e dacidadania” com a criação do SESI. Segundo documento da CNI, publicado por Rodrigues(1998), a criação do Serviço Social da Indústria (SESI), deveu-se aos diagnósticos quepareciam demonstrar que os empresários precisavam ir mais além da simples oferta deempregos, salários e qualificação profissional, levando às seguintes conclusões: Era in-dispensável ganhar a luta ideológica no chão da fábrica, demonstrando a superiorida-de do capitalismo no dia-a-dia (CNI, n.º 295, 1996, p. 7 apud RODRIGUES, 1998, p. 22).

Essa preocupação dos empresários revela a necessidade de buscarem controlar edirecionar os operários para a produção. E isso passou a ser feito com a qualificaçãoprofissional e por meio de ações sociais, ofertando novas opções de lazer, educação,alimentação e assistência médica para o trabalhador e sua família. Com isso, visavamcombater a pobreza e promover a “justiça social” contribuindo, ainda, com a aproxima-ção e a conciliação das classes sociais.

Por isso, em 1946, por meio do Decreto-Lei 9.043, o SESI foi instituído pelo entãoPresidente da República Eurico Gaspar Dutra e entregue à CNI para que esta fizesse valer asua criação tomando medidas que contribuíssem para o bem-estar dos trabalhadores daindústria, para a melhoria do padrão geral de vida no país, para o aperfeiçoamento moral,cívico e do desenvolvimento do respeito e da boa convivência entre as classes.

Com a criação do SENAI e do SESI as funções das instituições patronais estavamdefinidas e aquilo que seria destinado para o trabalhador, também. Ao SENAI caberiaatender os interesses dos empresários qualificando profissionalmente o trabalhador. OSESI, por sua vez, tinha como objetivo conformar moral e civicamente a força de traba-lho oferecendo soluções para problemas básicos de existência, tais como: saúde, ali-mentação, habitação, instrução, trabalho, economia, lazer e convivência social.

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Na continuidade da trajetória da formação histórica da educação profissional noBrasil encontra-se a criação, os objetivos e a dimensão da Educação Profissional no Ser-viço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), órgão responsável pela formaçãoprofissional no setor terciário.

O SENAC foi criado em 10 de janeiro de 1946, através dos Decretos-Lei n.º 8.621 e8.622, por iniciativa de um grupo de empresários que, inspirados naqueles que fomentarama criação do SENAI, reivindicaram junto ao Governo Federal a delegação para organizar,manter e administrar um organismo nacional de formação profissional para o setor terciário.

Os Centros de Formação Profissional e as Unidades de Formação Profissional execu-tam as atividades, cujas metas principais são: proporcionar preparo profissional específicopara as diversas funções exigidas pelo setor terciário; promover cursos do nível básico etécnico da Educação Profissional, organizar atividades de formação profissional para empre-sários, gerentes, profissionais liberais, autônomos e futuros empreendedores do setor ecolaborar com outras instituições ligadas ao comércio que estejam possibilitando progra-mas de aperfeiçoamento profissional. Entretanto, instaladas as Unidades Operativas, deno-minadas Centros de Formação Profissional e Unidades de Formação Profissional, o tipo deeducação desejada e oferecida pelas diversas instituições acompanhará as mudanças ocorri-das no modo de produção e, portanto, as exigências que o mercado venha a fazer.

O Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial também se fundamentou nas mu-danças que o modo de produção capitalista sofreu desde a década de 1970, para repensar aqualificação profissional oferecida aos trabalhadores do setor terciário e adota, em temposde flexibilização, a proposta de se voltar para a polivalência e a competência, entendidascomo formas de superação do modelo tecnicista. A formação assume como finalidade capa-citar indivíduos que tenham condições de disponibilizar durante seu desempenho profissi-onal os atributos adquiridos na vida social, religiosa e política preparando-os para lidar coma incerteza, com a flexibilidade e com a rapidez na resolução de problemas.

Assim, o “perfil” de um formando dos cursos de qualificação profissional do SENAC,deve ser o que aponta para um profissional que:

[...] além do domínio operacional de um determinado fazer e do saber tecnológico, precisater uma compreensão global do processo de trabalho, ser capaz de transitar com desenvoltu-ra em uma área profissional, atendendo a várias demandas desta área. Nessa perspectiva,ele não fica restrito a uma qualificação/habilitação vinculada especificamente a um posto detrabalho (SENAC, 2001).

A formação para o trabalho desenhada pelos referenciais atuais para a educaçãoprofissional do SENAC tem como finalidade “criar” um trabalhador que seja capaz dedar o máximo de si, reunindo todas as suas experiências de formação religiosa, escolar,social e política, para o aumento da produtividade da empresa. Entendem que está ex-tinto aquele tipo de trabalho no qual só se executava operações mecânicas, limitando ofuncionário à escravidão das atividades repetitivas. As novas formas de produção capi-

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talista não podem mais sobreviver com este modelo de organização de trabalho. Paratanto, a educação assume novamente a incumbência de (con) formar a mão-de-obra àsexigências do capital.

Pelo exposto, considera-se que a Educação Profissional no Brasil começa a se deli-near de forma mais complexa a partir da década de 1940, com a criação das duas institui-ções anteriormente apresentadas. Até o final do ano de 1941, a organização do ensinoindustrial no Brasil era bastante diferenciada e confusa, situação que insiste em perma-necer assim até os dias atuais.

Havia escolas de aprendizes artífices, mantidas pelo Governo Federal e direcionadasaos alunos pobres. Os Estados também mantinham suas próprias escolas industriaiscom normas distintas das do governo federal. Instituições privadas também mantinhamescolas de artífices enfatizando seu papel assistencial. As forças armadas, por sua vez,tinham suas próprias instituições de ensino de ofícios instalados junto às fábricas dematerial bélico e estaleiros.

No intuito de padronizar tamanha diversidade, o Governo Federal por meio doMinistério da Educação estabeleceu uma comissão para elaborar um projeto de Diretri-zes do Ensino Industrial para o Brasil. No final de 1941, estava pronto o anteprojeto deLei Orgânica do Ensino Industrial que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4.078, de 30 dejaneiro de 1942. A principal modificação que esta Lei trouxe foi o deslocamento de todoo ensino profissional para o Grau Médio, que passou a selecionar seus membros, nãomais só pelo item pobreza ou pela condição de desvalido, mas pela realização de vesti-bulares e testes de aptidão física e mental.

A Lei Orgânica do Ensino Industrial estabelecia que o Ensino Primário destinava-se a todas as crianças de 7 a 12 anos. O Ensino Médio, para os jovens de 12 anos paracima e tinha como objetivo formar os cidadãos que, futuramente, iriam comandar asociedade. A Exposição de motivos que defendia a aprovação do anteprojeto de reformaapregoava que

[...] o ensino secundário se destina à preparação das individualidades condutoras, isto é, doshomens que deverão assumir as responsabilidades maiores dentro da sociedade e da nação,dos homens portadores das concepções e atitudes espirituais que é preciso infundir nasmassas, que é preciso tornar habituais entre o povo. (CUNHA, 2000, p. 41).

Outra importante novidade que a Lei Orgânica do Ensino Industrial trouxe foi oscursos técnicos. Também nesta a organização do ensino, em particular o desenvolvidopara a força de trabalho, dava-se pelas necessidades da realidade mercadológica, pois,segundo Cunha (2000), os fatores que influenciaram a criação dos cursos técnicos, comoos de mecânica, metalurgia, química, eletrotécnica, eletrônica, foram: o aumento daprocura por técnicos industriais devido ao crescimento da produção em determinadossetores da economia; o crescimento da necessidade de racionalização do uso de matéri-as-primas e recursos energéticos; a substituição do pessoal estrangeiro de alta qualifica-

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ção, além da sempre imperiosa necessidade de qualificar os docentes para os cursos deaprendizagem. Quanto aos demais ramos do ensino médio, estes tinham a finalidadede formar uma força de trabalho específica para os diferentes setores da economia: oensino agrícola para o setor primário; o ensino industrial para o setor secundário e oensino comercial para o setor terciário.

Essa primeira LDB equiparou o ensino profissional, do ponto de vista da equiva-lência e da continuidade de estudos em níveis subseqüentes, para todos os efeitos, aoensino acadêmico, sepultando, pelo menos do ponto de vista formal, a velha dualidadeentre ensino para ‘elites condutoras do país’ e ensino para ‘desvalidos da sorte’. Todosos ramos e modalidades de ensino passaram a ser equivalentes. Estimulou uma série deexperimentos educacionais orientados para a formação profissional e para o desenvol-vimento da força de trabalho. Entre eles o Ginásio Orientado para o Trabalho (GOT) e oPrograma de Expansão e Melhoria do Ensino (PREMEN).

Em fins da década de 1960, o Conselho Federal de Educação ter recomendado umarevisão da LDB n.º 4.024/61, particularmente no que se referia aos ensinos primário emédio. Após dois anos de trabalho, depois de passar pelo Congresso Nacional a Lei nº5.692/71 foi promulgada e, entre outras coisas, previa que suas inovações deveriam serimplantadas de forma gradativa, uma vez que necessitaria de recursos humanos e mate-riais para alcançar seus objetivos. Entretanto, foi justamente neste aspecto que a referi-da lei encontrou dificuldades de sustentação, caindo num fracasso de dimensões e con-seqüências enormes para o desenvolvimento do ensino nacional.

De fato, a reforma prevista para o ensino de 2º Grau não pôde se realizar plena-mente porque não levou em conta a realidade objetiva de carência de recursos humanose materiais das escolas, especialmente das públicas.

As principais inovações previstas na lei no tocante ao ensino profissional (CU-NHA, 2000, p. 174) foram: o ensino de 1º grau, de 1ª a 4ª séries, teria seu currículocomposto de disciplinas que abordassem conteúdos generalizantes; de 5ª a 8ª séries, onúmeros de disciplinas vocacionais, voltadas para a sondagem das aptidões e iniciaçãopara o trabalho, aumentaria conforme se avançasse nas séries; o ensino de 2º Grau, porsua vez, seria generalizadamente profissional fazendo com que seus conteúdos prevale-cessem sobre a educação geral, assim como o objetivo geral da referida lei seria o depossibilitar a habilitação profissional de cada aluno.

No Parecer n.º 45/72, o Conselho Federal de Educação especificou o conteúdoprofissional do 1º e 2º graus, definindo a iniciação para o trabalho como ‘um conjuntode atividades que o educando deveria cumprir a fim de leva-lo a um conhecimento dosdiversos campos de trabalho, dos diferentes sistemas de produção e serviços, assimcomo a prática inicial na execução de tarefas que envolvam organização, produção,criatividade e qualidade’.

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Conforme Cunha (2000, p. 175), o objetivo de (con)formar trabalhadores, inclusi-ve aqueles que ainda estavam se preparando para o trabalho, ao mercado de trabalho,está confirmado no Parecer n.º 339/72, quando atribui à iniciação profissional, objetivos,dos quais citaremos alguns: desenvolver no aluno o interesse pelos assuntos relacionadoscom o mercado de trabalho dos setores econômicos, processos de produção, ocupações eoutros aspectos relativos à função desempenhada pelo homem no desenvolvimento econô-mico do país; desenvolver no aluno o sentimento de orgulho pelo trabalho útil e bem feitoe a preocupação de empregar os momento de lazer em atividades sadias; formar no aluno ohábito de planejar o trabalho e de realizá-lo de acordo com o planejado e preparar o alunopara a adequada utilização de equipamentos simples ou execução de serviços e proporcio-nar-lhe conhecimentos técnicos referentes a materiais e processos de trabalho nas tarefas aserem executadas na escola e durante a vida profissional futura.

Algumas conseqüências da Lei n.º 5.692/71, não só para a história da educaçãoprofissional, mas para a educação brasileira como num todo, são relacionadas em umtexto do CNE/99 (1999, p. 13-14), que afirma:

[...] a introdução generalizada do ensino profissional no segundo grau se fez sem a preocu-pação de preservar a carga horária destinada à formação de base; o desmantelamento, emgrande parte, das redes públicas de ensino técnico então existentes, assim como adescaracterização das redes do ensino secundário e normal mantidas por estados e municí-pios; a criação de uma falsa imagem da formação profissional como solução para os proble-mas de emprego, possibilitando a criação de muitos cursos mais por imposição legal e moti-vação político-eleitoral que por demandas reais da sociedade.

Segundo este mesmo documento federal, a Lei n.º 5.692/71, acabou gerando fal-sas expectativas relacionadas com a educação profissional ao se difundirem, sem umaorganização devida, habilitações profissionais dentro de um ensino de 2º grau que, efe-tivamente, não estava e nunca esteve preparado para tarefa de tamanha envergadura.Tal situação criou a necessidade de se repensar a Lei de Diretrizes e Bases que regia aeducação no Brasil.

Para o CNE/99, a Lei Federal n.º 9.394/96, atual Lei de Diretrizes e Bases da Educa-ção Nacional, configura o Ensino Médio como sendo a etapa final da Educação Básica eque deve representar a consolidação dos conhecimentos adquiridos no ensino funda-mental, possibilitando ao aluno a continuidade dos estudos e uma preparação básicapara o trabalho. Na verdade, se fundamenta no processo continuado do aprendizado, a fimde que o aluno tenha mais e melhores oportunidades de adaptar-se, com flexibilidade, àscontínuas mudanças políticas, econômicas e tecnológicas presenciadas nos dias de hoje.

Em se tratando da Educação Profissional a Lei n.º 9.394/96 defende em seu primeiroartigo que a mesma deve estar integrada às diferentes formas de educação, trabalho, ciênciae tecnologia conduzindo permanentemente o cidadão à vida produtiva. Além disso, afirmaque o conhecimento adquirido em cursos de qualificação profissional, poderá ser objeto deavaliação e certificação para prosseguimento ou conclusão de cursos.

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Do exposto acima, destaca-se que a educação profissional, é a formação para otrabalho que historicamente tem sido planejada e executada pelos empresários semuma participação mais efetiva do trabalhador, o que ficou evidente com a criação doSESI, SESI e SENAC. Isto significa que a organização de cursos é feita à revelia dos inte-ressados; seguindo um programa que o empresariado acredita ser o melhor para o au-mento de sua própria produtividade. Em outras palavras, tradicionalmente a EducaçãoProfissional teve o viés da oferta e não da demanda.

Outra observação é com relação a dualidade presente na educação brasileira desde oPeríodo Colonial e que ainda sobrevive nas formas de organização do ensino nacional: aEducação Profissional é ainda destinada para a classe trabalhadora. Sua finalidade é prepa-rar os executores de funções, enquanto que outra parcela da população recebe a educaçãoque a levará à condução da sociedade, seja esta política, econômica, social ou cultural.

As políticas públicas que nortearam a qualificação profissional no Brasil tiveramsua continuidade a partir de 1996 com a criação da Secretaria Nacional de Formação eDesenvolvimento Profissional (SEFOR) no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) edo Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador (PLANFOR).

O PLANFOR foi estruturado em 1995 com base nas Diretrizes Sociais do GovernoFederal e, implementado a partir de 1996. Seu objetivo era atingir, paulatinamente, aoferta de Educação Profissional permanente conforme a demanda de mercado assim oexigisse, de modo a qualificar e ou requalificar a cada ano 20% da População Economica-mente Ativa (PEA) do Brasil.

O PLANFOR pretendeu reconstruir ou redefinir a institucionalidade hegemônicada educação profissional no Brasil

“por meio da união de todas as forças, capacidades e competências de Educação Profissionalexistente no País, auxiliados, evidentemente, por recursos públicos e privados, e que foi anun-ciado nos seguintes termos: “a agenda da nova institucionalidade da EP pode ser sintetizada nanecessidade de mobilização, articulação, integração e reorientação de toda capacidade instaladano País, com foco na formação massiva do cidadão produtivo” (MTE/SEFOR, 1999, p. 27).

Entretanto, o PLANFOR não foi concebido como simples programa de treinamentode massa, mas, como estratégia de inclusão da educação profissional na pauta da políticapública de trabalho e geração de renda. Para tanto apresentou os seguintes objetivos:

O Avanço Conceitual propunha: a superação de concepções e metodologias deeducação profissional que não estivessem em consonância com a demanda do setorprodutivo; com os interesses dos trabalhadores, empresariado, comunidade e com afinalidade de elevar a produtividade e a qualidade do trabalho, estendendo a possibili-dade do trabalhador em empregar-se e se manter empregado, além de melhorar as con-dições de vida da população.

Assim, a primeira tarefa era transformar a ideologia predominante nos planeja-

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mentos, na sistematização, na metodologia e na operacionalização da qualificação pro-fissional então existente. A intenção era incentivar uma educação profissional que sepreocupasse com a demanda de mercado e com as características de cada populaçãoalvo, incluindo aqui a participação de empresários e comunidade de trabalhadores, umaeducação profissional como direito do cidadão e que não substituísse o Ensino Básico;que estivesse presente em diferentes ações (palestras, seminários, vídeos, etc.) e não sóem cursos específicos e, finalmente, uma educação profissional que atendesse à diversi-dade social, econômica e regional da PEA, dando preferência àqueles tidos como mais“vulneráveis” econômica e socialmente, ou seja, os pobres e os marginalizados.

Em outras palavras, o Avanço Conceitual dizia respeito a uma mudança de postu-ra frente ao conhecimento da dinâmica de reestruturação produtiva do País e seus im-pactos sobre o trabalho e a qualificação. Tratava-se de assumir a nova natureza do traba-lho que estaria deixando de possuir características de fragmentação para se tornar cole-tivo, polivalente e multifuncional. Privilegia a qualificação e a requalificação contínuas,superando a mentalidade anterior, cuja predominância era a do treinamento em senti-do estrito. Nesta nova concepção a qualificação deixa de ser entendida como estoque deconhecimento para estar sujeita a um aprendizado contínuo, além de apresentar umanova relação entre educação básica e formação profissional, em que uma completa aoutra, superando a postura anterior, em que a segunda substitui a primeira.

O segundo objetivo do PLANFOR era a Articulação Institucional, relativa às parce-rias. Entendia que eram necessárias boa vontade e participação de todos para sensibili-zar, catalisar e unir as forças em torno desta grande tarefa. Portanto, a estratégia foienvolver entidades públicas e privadas; nacionais e internacionais; governamentais,não governamentais; religiosas, filantrópicas etc., para que assumissem o papel doschamados “executores” do processo de formação. São novos atores, garantindo nas suasatuações, um enfoque mais amplo da educação profissional, antes incipiente no país.

O terceiro objetivo do PLANFOR, trata do Apoio à Sociedade Civil. O desafio eraampliar a oferta de formação, particularmente para aqueles grupos que tradicionalmen-te têm menor chance de acesso a ações de qualificação e requalificação profissional. AResolução n.º 194/98 do CODEFAT distinguiu quatro grupos de população-alvo que de-veriam receber maior atenção e a maior parte da verba federal para programas de quali-ficação profissional. Segundo o documento do MTE/SEFOR (1999), esta escolha se justi-ficava pela trajetória destas categorias, sua situação atual, suas dificuldades e chancesdiante da concorrência acirrada por uma vaga no mercado de trabalho.

São eles: trabalhadores desocupados: os beneficiários do seguro-desemprego ecandidatos ao primeiro emprego, tanto no campo como na cidade; pequenos e micro-produtores urbanos e rurais, particularmente aqueles que são beneficiados por financi-amentos bancário; trabalhadores sob risco de desocupação, aqueles “ameaçados” pelorápido avanço tecnológico, pelas mudanças da política econômica que ocorrem de gover-

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no para governo, pela privatização de empresas estatais, etc. e os trabalhadores autôno-mos, cooperados, autogestionados (mercado formal e informal), este grupo está especi-almente ameaçado pela sazonalidade que pode comprometer o fluxo de trabalho e, por-tanto, de renda das famílias que dependem destes trabalhos temporários.

Este novo enfoque dado pelo PLANFOR à educação profissional pretendia supe-rar as distorções que marcaram e ainda marcam a oferta tradicional de qualificação damão-de-obra no Brasil: quebrando a hegemonia na organização e oferecimento de cur-sos por parte de instituições patronais, o que por si só constituiria um grande avanço notermos de possibilidade, criatividade e alteridade; mostrar a possibilidade de se pensaruma educação profissional a partir da necessidade e da demanda local e que os cursosnão fossem oferecidos a partir da oferta, isto é, daquilo que determinada instituiçãotem pronto no seu estoque ou na “prateleira”. Isso significaria mais participação e vozativa da comunidade e dos trabalhadores. Outra distorção que deveria ser superada é ado viés assistencialista que propõe uma qualificação imediata com a responsabilidadede resolução dos problemas sociais e do próprio interessado, o que não passaria de umagrandiosa e perigosa ilusão porque influenciaria o trabalhador inclusive a abandonar acontinuidade de seus estudos de graduação, por exemplo.

Diante do que foi apresentado anteriormente, temos que o PLANFOR se consti-tuiu em uma ação do Governo Federal, que visou transformar as concepções de forma-ção de mão-de-obra até então existentes no Brasil, adaptando-as aos novos desafios im-postos às forças produtivas do país pelas novas tecnologias e pelas novas formas dereorganização do trabalho.

Em sintonia com a nova organização do Capitalismo, que tem como uma de suascaracterísticas o modelo de administração conhecido como ohnismo/toyotismo, a for-mação almejada pelas diretrizes do PLANFOR gera, portanto, a necessidade de organizare estimular a flexibilidade das ações, pois o trabalhador muda de indivíduo executantede tarefas/operações estanques para trabalhador capaz de operar em equipes. Portanto,este programa de educação profissional, responde, obviamente, às novas exigências fei-tas pelo capital.

Os trabalhadores, nos mais diversos setores, se vêem obrigados a ampliar seucampo de conhecimento e seu âmbito de ação. Sua qualificação deveria deixar de focargestos, ações e movimentos, para traduzir-se cada vez mais na capacidade de julgamen-to, decisão e intervenção nas mais diversas situações, particularmente diante do novo edo imprevisto. Este novo perfil exigido valoriza, portanto, o trabalhador “competente”,“polivalente”, capaz de aprender a aprender, em detrimento do “operário-padrão”, queapenas executa bem suas tarefas com horário e local pré-determinados. Por isso, a edu-cação profissional preconizada na política do MTE/SEFOR é parte de um projeto maiorem que se pretende investir na educação como um todo, fazendo com que a mesmaresponda aos novos requisitos que emergem do processo de inovação tecnológica e

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organizacional e às novas exigências do atual modo de produção capitalista, transfor-mando-se, desta forma, numa ferramenta para melhorar a qualidade e a competitividadeno setor produtivo, além de elevar a produtividade do trabalho.

Sendo assim, o PLANFOR passou a definir a Educação Profissional, não mais comouma ação que se limitasse a qualificar para um simples domínio de habilidades motoras,mas que, efetivamente, ultrapassasse esta concepção e incluísse uma formação com amplae sólida base tecnológica. Incrementou a idéia que não basta mais ao trabalhador saberexecutar a tarefa, mas precisa conhecer os componentes que a envolvem, ter iniciativa,desenvolver espírito de equipe, o que significa trabalhar mais, saindo mais tarde do serviçoauxiliando os demais na execução de seu trabalho, e acima de tudo, saber aprender.

Por isso, o PLANFOR (1999, p. 41), apresenta as Habilidades Básicas, Específicas ede Gestão como conteúdos das ações de Educação Profissional a serem desenvolvidas.As Habilidades Básicas compreendiam a capacidade de comunicar-se verbalmente e porescrito, a leitura e compreensão de textos, entre outras, consideradas vitais para o mer-cado de trabalho e a construção da cidadania. As Habilidades Específicas voltavam-separa as competências e conhecimentos relativos aos processos, métodos e técnicas eoutros conteúdos específicos das ocupações e as Habilidades de Gestão seriam os co-nhecimentos relativos às atividades de gestão e autogestão no processo produtivo. Issopretende a melhoria na produtividade de micro e pequenos estabelecimentos, nas tare-fas desenvolvidas pelo trabalhador autônomo ou do próprio trabalhador individual.

Como mostramos no artigo: Uma nota da psicologia sobre a educação profissionalproposta no PLANFOR/BR (2001), publicado na revista Intermeio do Mestrado em Edu-cação da UFMS, uma questão grave que envolve a educação é justamente o conceito quese tem dela e ao destacar as habilidades como conteúdos das ações da educação profissi-onal, o governo federal corrobora uma concepção de educação que dá ao capital o enfoqueprincipal na tarefa de definir políticas para a formação da força de trabalho. Nesta con-cepção de educação, não está considerada a possibilidade de uma educação que influen-cie todos os aspectos da vida e que se constitua em instrumento para o exercício políti-co. Ao contrário, o PLANFOR, quando privilegia as habilidades, demonstra que os traba-lhadores são submetidos a treinamentos que os tornam capazes de agir com destreza,flexibilidade e competência diante dos desafios e problemas que possam ter pela frenteno exercícios de suas tarefas. Isto significa que

[...] não se tem indagado, nem zelado para que estas aprendizagens sejam ministradas e apreen-didas como forma de interferência na estrutura sócio-política e econômica e, nem na estruturapsico-física de cada indivíduo. Desta forma, vem se conformando – no sentido de formar dealguma maneira já sabida e portanto intencional – formas de agir, pensar e mediar a relaçãocom o mundo pouco produtivas e incompatíveis com o desejável (LEÃO, 2001, p. 47).

A proposta de desenvolver apenas habilidades no trabalhador carece de funda-mento porque, as mesmas perderam sua preponderância na ação humana a partir do

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momento em que os homens construíram funções psíquicos superiores, desenvolvidasa partir das necessidades dos grupos sociais organizados pela atividade e pelo trabalhocriativo. (Leão 2001).

No movimento histórico da formação profissional no Brasil, destaca-se a rupturaque se instalou entre a educação formal e a qualificação para o trabalho a qual fez comque a educação do trabalhador fosse pensada e colocada em prática pelas instituiçõespatronais, o que significa que o trabalhador não participou da escolha de seus própriosinteresses, tanto em nível profissional quanto em se tratando direitos sociais.

Diante destes fatos históricos, nossa posição é que a concepção de educação quemelhor corresponde às necessidades do trabalhador não pode se erguer e se fundar emconceitos que nos remetem ao adestramento do trabalhador e ao máximo de limitaçãoda criatividade do homem, reduzindo ao mínimo a sua capacidade de agir por si mesmo.Antes disso, a ação da formação profissional deve possibilitar aos trabalhadores a opor-tunidade de ampliar as possibilidades de sua consciência, entendidas aqui como o con-junto de estruturas de operações que permite a ele entender e analisar o mundo que orodeia resolvendo problemas que se lhe apresentam.

Em 2003 é apresentado o Plano Plurianual (PPA) 2004-2007, tido como uma peça-chave do planejamento social e econômico do Governo Federal. Sua intenção é inaugu-rar um modelo de desenvolvimento de longo prazo, para além de 2007, destinado apromover profundas transformações estruturais na sociedade brasileira.

Nesse Plano, considera-se que os problemas fundamentais a serem enfrentadossão a concentração de renda e riqueza, a exclusão social, a baixa criação de empregos eas barreiras para a transformação dos ganhos de produtividade em aumento de rendi-mentos da grande maioria das famílias trabalhadoras.

Desse modo, o Plano Plurianual visa nortear e integrar todas as demais políticas,estabelecendo para o período, três grandes objetivos: a) inclusão social e redução dasdesigualdades sociais; b) crescimento com geração de trabalho, emprego e renda(ambientalmente sustentável e redutor das desigualdades regionais); e c) promoção eexpansão da cidadania e fortalecimento da democracia.

A partir daí, a Política Pública de Qualificação (PNQ), em consonância com o PPA,reorientou sua política, instituindo o Plano Nacional de Qualificação (PNQ), que se fun-damenta em seis dimensões principais, apresentadas em sua Introdução: “política, éti-ca, conceitual, institucional, pedagógica e operacional”. Essa política se afirma como umfator de inclusão social, desenvolvimento econômico com geração de trabalho e distri-buição de renda, compreendendo a qualificação como uma construção social.

Desse modo, a qualificação passa a ser tratada como “Qualificação Social e Profis-sional”, capaz de permitir a inserção e a atuação cidadã no mundo do trabalho, comefetivo impacto para a vida e o trabalho das pessoas.

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A condição da Política Pública de Qualificação, como política social, ganha maiorcentralidade, pois a maior relevância passa a ser a participação e o controle social, demodo que a qualificação profissional seja um direito e um bem de acesso universal.

Em 2003 (Resolução n. 333, de 10 de julho, do CODEFAT), foi instituído o PlanoNacional de Qualificação (PNQ) no âmbito do Programa do Seguro-Desemprego, para asações de qualificação social e profissional (QSP), como aquelas que permitem a inserçãoe a atuação cidadã no mundo do trabalho, promovendo a integração das políticas públi-cas e as articulações das ações vinculadas ao emprego, ao trabalho, à renda e à educação,devendo, gradativamente, promover o direito dos trabalhadores à qualificação.

O Plano Nacional de Qualificação (PNQ) é operacionalizado de forma nacionalmentearticulada, sob diretrizes e procedimentos institucionais comuns. Conduzido de forma des-centralizada, por meio de dois mecanismos distintos e complementares: os Planos Territoriaisde Qualificação (PlanTeQs) e os Projetos Especiais de Qualificação (ProEsQs).

Os Planos Territoriais de Qualificação (PlanTeQs) contemplam projetos e ações dequalificação social e profissional circunscritos a um território, com aprovação e homolo-gação obrigatórias da Comissão/Conselho Estadual de Trabalho/Emprego ou das Comis-sões/Conselhos Municipais de Trabalho/Emprego referentes ao território.

Em Mato Grosso do Sul, o Plano Territorial de Qualificação - 2003 (PlanTeQ/MS-2003)teve os mesmos objetivos adotados no Plano Nacional, contemplando ações com vistas àformação integral dos trabalhadores, ao aumento da probabilidade de obtenção de trabalhoe emprego, à elevação da escolaridade dos trabalhadores, à inclusão social e ao combate àdiscriminação, ao aumento da probabilidade de permanência no trabalho, à elevação daprodutividade e ao fortalecimento do Sistema Nacional de Formação Profissional.

O PPA 2004-2007 pretende configurar-se como instrumento para colocar em no-vas bases a Política Pública de Qualificação do País, por sua condição de política social,com maior centralidade, no planejamento e na integração das diferentes ações governa-mentais. Dessa forma, visa estabelecer novas potencialidades com a adoção de umaperspectiva de desenvolvimento de caráter sustentável, centrada em objetivos sociais,voltadas para a geração de trabalho, para a distribuição de renda e para a diminuição dasdisparidades regionais.

O empoderamento dos espaços públicos ganha realce na gestão participativa econtrole social, por meio do fortalecimento do sistema CODEFAT, com destaque para ascomissões estaduais e municipais de emprego. Ao lado de tal desafio, adquire maiorênfase a integração da Política de Qualificação com as demais Políticas Públicas de Tra-balho, Emprego e Renda e com aquelas dos campos da educação e do desenvolvimentosustentável. Expressa-se, sobretudo, por meio dos espaços de gestão multipartite, comdestaque a forma de elaborar e consolidar a integração com as demais Políticas de Traba-lho e Renda, visando à construção de um Sistema Público de Trabalho, Emprego e Ren-

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da, à consolidação de uma rede nacional de educação profissional permanente (consti-tuída por entidades públicas e privadas), para atuar na qualificação da PEA, como umapolítica conduzida em bases participativas, realizada de maneira descentralizada e arti-culada sob um prisma efetivamente público.

Nesta nova concepção da Política Pública de Qualificação Profissional para o paíssão enfatizadas: a ampliação da participação da sociedade na construção dos PlanosEstaduais e dos arranjos institucionais; o desenvolvimento econômico e social, a gera-ção de trabalho e renda como objetos de planejamento público.

Pretende influir e reorienta o modelo de desenvolvimento do País, centrando-o naestratégia de crescimento pela expansão do mercado de consumo de massa e na incorpora-ção progressiva das famílias trabalhadoras ao mercado consumidor das empresas moder-nas, apontando para uma nova política de desenvolvimento regional, privilegiando o de-senvolvimento solidário entre as diversas regiões do País, promovendo a adoção de critériossócio-ambientais para as políticas Públicas, conduzindo o País a uma nova inserção interna-cional por meio da adoção de uma nova postura diplomática, do fortalecimento dacompetitividade exportadora e de uma estratégia de substituição de importações e apostan-do na educação e formação dos trabalhadores e nas atividades nacionais de inovação.

Com estas intenções quer participar do fortalecimento da democracia e da sobera-nia nacional. Por isso, seus objetivos são: Inclusão social e redução das desigualdadessociais; crescimento com geração de trabalho, emprego e renda, ambientalmente sus-tentável e redutor das desigualdades regionais e promoção e expansão da cidadania efortalecimento da democracia.

As suas dimensões fundamentais são explicitadas nos seguintes termos:

1) no âmbito Político – torna-se central a compreensão da qualificação profissional comodireito, como Política Pública, como espaço de negociação coletiva e como um elementoconstitutivo de uma política de desenvolvimento sustentável;

2) a dimensão Ética – sob o propósito de garantir transparência no uso e gestão dos recursospúblicos, ganha evidência por meio de procedimentos tais como: incorporação das reco-mendações da Secretaria Federal de Controle – SFC, Corregedoria Geral da União – CGU e doTribunal de Contas da União; regularização do quadriênio 199-2002 (adimplência) e adoçãode mecanismos permanentes de monitoramento dos contratos; uniformização dos contra-tos e convênios; disponibilização de informações atualizadas via Internet; aplicação de pro-cedimentos de redução de custos intermediários (passagens, diárias, etc.); garantia da auto-nomia do sistema de avaliação frente à gestão e à realização dos planos; garantia de umsistema de monitoramento, em tempo real e de modo eficiente;

3) no campo Conceitual – adquire prevalência noções como: educação integral; formas soli-dárias de participação social e gestão pública; empoderamento dos atores sociais (na pers-pectiva de sua consolidação como cidadãos como cidadãos plenos); qualificação social e profis-sional; território (como base de articulação do desenvolvimento local); efetividade social; quali-

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dade pedagógica; reconhecimento dos saberes socialmente produzidos pelos trabalhadores;

4) na dimensão Pedagógica – busca-se garantir aumento da carga horária média; a uniformi-zação da nomenclatura dos cursos; articulação prioritária com a educação básica (ensinofundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos); exigência para as instituiçõesque vierem a ser contratadas para a realização dos Planos Territoriais e Projetos Especiais, deformulação e implementação de projetos pedagógicos; garantia de investimentos na forma-ção de gestores e formadores; constituição de laboratórios para a discussão de referenciaisnos campos metodológico, das Políticas Públicas de Qualificação e da certificação; investi-mento na sistematização de experiências e conhecimentos; desenvolvimento de sistemascertificação e orientação profissional e o apoio à realização do censo da educação profissio-nal pelo Instituto Nacional de Estudos e pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP/MEC;

5) quanto à dimensão Institucional, passam a ser estratégicas a integração das Políticas Pú-blicas de Emprego, Trabalho e Renda entre si e destas em relação às Políticas Públicas deEducação e Desenvolvimento, dentre outras; o papel do Conselho Deliberativo do fundo deAmparo ao Trabalhador – CODEFAT e das Comissões Estaduais e Municipais de Trabalhopara garantir uma efetiva participação e controle social; a participação do municípios, umavez que antes, estavam excluídos do acesso aos recursos da qualificação, passam a ser agen-tes do processo, vinculado ao desenvolvimento local. Assim, ganha maior importância tam-bém: o papel das Delegacias Regionais de Trabalho – DRTs como representações do MTE nosestados; a articulação institucional das Políticas Públicas de Qualificação no plano interacional(prioritariamente, no âmbito do MERCOSUL e África) e a nova Resolução do CODEFAT (nº333) que institucionaliza estas novas concepções.

6) no que se refere à dimensão Operacional, propõe-se a garantir: o planejamento comoponto de partida e de chegada na elaboração dos planos e projetos; um sistema integrado deplanejamento, monitoramento, avaliação e acompanhamento de egressos dos PNQs em to-dos os seus níveis de realização; a reestruturação do SIGAE e SOP; mecanismos de efetividadecontinuidade; adoção de critérios objetivos de distribuição dos recursos do FAT entre osPlanos Territoriais e Especiais; estabelecimento de um calendário plurianual, semreprogramação. Bem como a diminuir a quantidade do número de parcelas de desembolsode recursos; instrumentos de análise das prestações de contas.

Vale destacar que uma das bases desta Política Pública de Qualificação Profissio-nal é a introdução da idéia da Qualificação como Construção Social. Pretende-se assimque a Política Pública de Qualificação se firme como um fator de inclusão social, dedesenvolvimento econômico, com geração de trabalho e distribuição de renda. Esta con-cepção deve se contrapor àquelas que se fundamentam na aquisição de conhecimentoscomo processos estritamente individuais e como uma derivação das exigências dos pos-tos de trabalho, contemplando as dimensões: Epistemológica, na qual o trabalho é en-tendido como fonte de construção de conhecimento (técnico e sócial); Social e Política,que considera os processos e mecanismos que marcam as relações conflituosas e res-pondem pela produção e apropriação dos conhecimentos e Pedagógica, que se volta paraos processos de construção, transmissão e acesso ao conhecimento, por procedimentosformais e informais. Perde o caráter educativo exclusivamente técnico.

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Também a abordagem da Qualificação como Direito e como Política Pública é introduzidaneste momento e atende às discussões da OIT, que entende a Qualificação como: Direi-to e condição para a garantia do trabalho decente e a Qualificação Profissional e Socialcomo devendo permitir a inserção e atuação cidadã no mundo do trabalho, com efetivoimpacto para a vida e o trabalho das pessoas.

Daqui deriva que as Políticas Públicas de Qualificação devem promover integraçãodas Políticas, articular as ações de qualificação social e profissional e articular as açõesde QSP com outras políticas e ações vinculadas ao emprego, trabalho, Renda e à Educa-ção Básica com Formação Profissional. O que permitiria o ajuste às Diretrizes das políti-cas Nacional, Regional, Estadual, mesorregional e local de desenvolvimento.

No que se refere às atividades Político-pedagógicas, orienta que devem estar base-ados em Metodologias Inovadoras, que contemplem o pensamento emancipatório deinclusão, os trabalhos como princípio educativo, o direito ao trabalho como valorestruturante da cidadania e a qualificação como política de inclusão social e suporteindispensável do desenvolvimento sustentável.

Outros elementos orientativos são os objetivos pretendidos pelo CODEFAT. Des-tes destacamos: a Formação Integral; o aumento da probabilidade de obtenção de em-prego e trabalho/participação em processos de geração de oportunidades de trabalho erenda – perspectiva de reduzir desemprego e subemprego; a elevação da escolaridade –política pública EJA; a inclusão social, redução da pobreza; o aumento da probabilidadede permanência no mercado de trabalho; a elevação da produtividade, melhoria dos servi-ços prestados, aumento da competitividade e das possibilidades de elevação do salário ouda renda e a contribuição para articulação e consolidação do Sistema Nacional de Formaçãoprofissional com o sistema Público de Emprego e Sistema Nacional de Educação.

Destacamos os pontos acima para reafirmarmos alguns pontos da análise já apre-sentada anteriormente1, quando destacamos que as novas Diretrizes ora adotadas peloPlano Nacional de Qualificação são necessárias e relevantes. Entretanto, a aferição dosgraus de suas efetividades mostra-se como de difícil consecução, uma vez que, além deum processo consistente de acompanhamento dos egressos das ações de qualificação,exige que se estabeleçam parâmetros para o entendimento do que seja “a relevância dosbenefícios econômicos, sociais e culturais efetivamente trazidos pelas Políticas Públicasde Qualificação para os/as educandos/as”.

Como exemplo das dificuldades a serem enfrentadas tem-se a Diretriz deEfetividade Social e Política, na qual se “pressupõe” que, para além dos critérios daeficiência (basicamente reportado ao grau de cumprimento de metas) e da Eficácia (rela-

1 Relatório de Avaliação dos Planos Territoriais de Qualificação de Mato Grosso Do Sul -

PLANTEQs – 2003, Campo Grande,UNITRABALHO/UFMS março de 2004.

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cionado ao grau de cumprimento de metas financeiras), deve-se dar relevância aos be-nefícios econômicos, sociais e culturais efetivamente trazidos pelas Políticas Públicasde Qualificação para os/as educandos/as.

Devido ao baixíssimo nível das condições econômicas e sócioculturais da maioria dapopulação brasileira, qualquer ação que a atinja pode parecer efetiva. Entretanto, algunscritérios gerais, como os apresentados a seguir, podem se mostrar auxiliares valiosos.

a) Ao tomar-se como parâmetros os pressupostos que vêm sendo enunciados comobasilares para o PNQ, ou seja, a preparação de trabalhadores para manterem-se no mer-cado de trabalho nas condições geradas pelo ordenamento pautado no chamado modeloeconômico Globalizado, principalmente, no que tange a novas formas de organização daprodução, que estariam sob o predomínio da robotização, da informatização, dos equi-pamentos computadorizados e da organização dos trabalhadores por equipesmultifuncionais, bem como das formas de gerenciamento sob as exigências de metas deprodução por equipe, da diminuição dos níveis de hierarquia intermediária degerenciamento, controle e o aprofundamento da divisão do trabalho em apenas doisníveis: concepção e execução; tendo em vista o barateamento da produção e a conse-qüente ampliação das possibilidades de concorrência no âmbito internacional; coloca-nos diante de algumas interrogações.

A principal explicitação necessária é referente ao tipo de inserção que se propõepara o Brasil nas relações econômicas internacionais. As análises dos especialistas têmapontado que ao País estaria reservada a parte do processo produtivo que demandamão-de-obra abundante e barata, para a função de execução manufaturada, ficando o“trabalho intelectual” de concepção e planejamento reservado para os países centraisdo capitalismo. Acatadas tais análises como verdadeiras, teríamos uma necessidade dequalificação que não apresentaria exigências para além da concatenação entre infra-estrutura de produção instalada ou em vias de se instalar e preparação geral de partedos trabalhadores para disputar as vagas existentes ou previstas.

Nessas circunstâncias, o parâmetro para a avaliação dos PlanTeQs deveria ser oPlano de Desenvolvimento Local. Isso porque a vigência do ideário de um Estado Míni-mo, que privilegia a iniciativa privada sem coordenação de uma macropolítica de desen-volvimento nacional, remete à busca de maiores facilidades de expansão do capital ofe-recidas pelos governos locais (incentivos ficais, oferta de infra-estrutura, etc.), como umdos poucos indicadores existentes, para a previsão quantitativa e qualitativa de deman-da por mão-de-obra.

b) A relevância dos benefícios sociais efetivamente trazidos pelas Políticas Públi-cas de Qualificação para os educandos, parece-nos que está sendo indicada, principal-mente, pela ênfase no conceito de cidadania. E esse conceito tem sido marcado pelo seuaspecto de garantia de direitos. Nesse sentido, a qualificação social e profissional talcomo orientada nos termos da Resolução nº 333/2003, do CODEFAT, e das Diretrizes do

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PNQ dela emanadas, indicam os conteúdos e a carga horária mínima a serem observa-dos na organização das ações de qualificação para desenvolvimento das Habilidades comoexpressões do que qualificaria para tal.

Porém, no embate das forças dentro da nossa sociedade, a possibilidade de cons-trução da consciência social e o exercício dos direitos se concretiza pela hegemonizaçãode uma classe social, que garante direitos por apropriar-se política e institucionalmentede aparelhos de estado e instrumentaliza-los para a consecução de seus interesses.

Essa realidade, explicitada pelas enormes disparidades sociais do País, não podeser solucionada no âmbito dos Planos de Qualificação Profissional. Ela exige o entendi-mento da cidadania como exercício de poder político. Esse exercício tem sido preparadopor uma escolarização formal que, no caso do Brasil, vem sendo oferecida às classeshegemônicas por cerca de dezoito anos de escolarização. Para os trabalhadores, essapossibilidade se mostra, como objeto a ser conquistado, e a qualificação social e profis-sional, nos moldes ora anunciados, só pode contribuir para tal, se voltada para a eleva-ção das exigências mínimas de preparação escolar formal e, nunca, como incentivadorado fornecimento de informações pontuais. Essas informações seriam eficazes, se osseus destinatários já apresentassem constituídas as funções intelectuais, um conjuntode conhecimentos e um repertório de comportamentos, a partir dos quais pudessemelaborar análises e deduções elucidativas da realidade; além de terem espaçossociopolíticos, onde o exercício da defesa de seus interesses fosse capaz de gerar altera-ções estruturais que garantissem o atendimento das suas necessidades. Na ausência detais condições, a prática desmente a teoria.

c) A relevância dos benefícios culturais efetivamente trazidos pelas Políticas Públicasde Qualificação, para os educandos, está na dependência direta de aspectos anteriores.

O parâmetro de benefícios culturais, para a população brasileira, é o modeloprevalente na classe média, calcado no consumo de produtos da industria cultural compadrões de sofisticação internacional. O que é gerado pelas classes populares, cujosintegrantes são a clientela dos PlanTeQs, é considerado como inferior por não atenderas aspirações impostas pelo próprio processo de globalização da produção e do consu-mo. A recuperação e a valorização da cultura autóctone se mostram difíceis por nãomais permitir o atendimento das necessidades das populações pobres.

Assim sendo, os benefícios culturais a serem perseguidos, durante a QualificaçãoSocial e Profissional, no âmbito do PNQ deveriam ser referenciados a um padrão míni-mo de qualidade de vida desejada, o que não tem sido claramente definido pelas Políti-cas Públicas de Educação, Cultura ou mesmo de Trabalho, Emprego e Renda. A cultura,que sustenta as representações sociais e as práticas que elas demandam, deriva-se ne-cessariamente da base material onde se desenrola a vida e, no caso do Brasil, essa basetem-se mostrado desfavorável à maioria da população.

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Entendemos que a educação deve propor novas representações para organizarnovas práticas, que se pretende que sejam mais efetivas e eficazes e, no caso da Educa-ção Profissional, esse processo exige referências que indiquem uma perspectiva de exer-cício profissional e configure projetos individuais consistentes com a realidade social,que não lhes é favorável.

Nessas condições, as ações de qualificação profissional precisam ser avaliadastambém pelas suas capacidades de orientar, de se mostrarem como os indicadores daconcretização dessas Diretrizes do PNQ para os PlanTeQs. Para tanto, propomos que taisações deverão ser discutidas e consideradas nos seguintes termos:

a) Verificarmos se as ações consolidam o PNQ como uma política permanente e aptaa lidar com as transformações intensas e contínuas que vêm marcando a dinâmica do mun-do do trabalho, seja para inovações técnicas e gerenciais, seja para a diversificação das for-mas de trabalho – trataremos dessa verificação pela articulação demonstrada entre o Planode Desenvolvimento Local e as ações eleitas para serem oferecidas aos trabalhadores. Aarticulação considerará as negociações efetivadas no interior das CMEs e da CEE.

b) Verificarmos se as ações propiciam o empoderamento, como sujeitos individu-ais e coletivos, dos públicos envolvidos, seja como trabalhadores assalariados, seja comotrabalhadores autônomos, assim como cooperados.

Deveríamos iniciar as análises pela crítica ao termo “empoderamento”, uma vezque se trata de uma adaptação da expressão inglesa “empowerment”, que significa auto-rização; deriva-se do verbo “empower”, que designa o ato de autorizar, dar poderes ouprocuração ou ainda capacitar, permitir, habilitar. Sempre no sentido de conceder. Con-forme nos alerta Moraes (2003, p. 512) essa expressão foi introduzida, nos textos ediscursos dos organismos internacionais, ligados aos movimentos sociais, principalmenteao de mulheres, como

[...] um neologismo para designar a orientação política de tornar a mulher (assim comooutros segmentos sociais) sujeitos de seus atos. Tornar-se mais poderosa para enfrentar asdescriminações. E mais consciente do próprio valor.

Entretanto, a constituição dessa consciência não se dá pela informação ou pelaprática discursiva. Ela exige a ação e o enfrentamento social, os quais, ao desvelar ascontradições e os impedimentos reais para o atendimento das suas necessidades, levamaqueles que buscam alcançar soluções para suas problemáticas a entenderem os limitesimpostos pelo ordenamento social e os mobilizam para ações políticas reivindicatórias,em geral, exigindo organização social e/ou institucionalização.

Essa forma de enfrentamento social não se dá pela outorga de poder, mas semprepela conquista. Não há a possibilidade de que o poder seja oriundo de uma autorização,mas sempre é uma conquista alcançada pelo enfrentamento que obriga, politicamente,o reconhecimento da legitimidade da representação do outro.

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Portanto, não podemos buscar que, nas ações de qualificação profissional, o trata-mento desse tema o contemple com efetividade, uma vez que teríamos o Estado explicitandoa sua própria condição de detentor do poder em detrimento daqueles a quem deveria repre-sentar. Não deveria “empoderar”, mas sim atuar conforme as exigências daqueles que ape-nas lhe ‘outorgaram’ o poder, por serem eles próprios a origem do poder social.

Empoderar, na situação de desemprego, significaria o quê? Devolver à populaçãoa decisão sobre uma política governamental que promova as condições de existência deemprego, ou reconhecer que o poder próprio da população, que sustenta um sistemademocrático, lhes foi suprimido e não é utilizado para os seus próprios interesses.

c) Analisarmos se a garantia de participação e controle social na elaboração, con-dução e avaliação da Política Pública de Qualificação se efetiva por meio do fortaleci-mento do papel do CODEFAT e das CEEs e CMEs. No que tange ao CODEFAT, parece-nosque a sua participação e o seu controle na elaboração, na condução e na avaliação daPolítica Pública de Qualificação já está garantida, até porque é a instância máxima para adiscussão e a resolução do que diz respeito às diretrizes gerais e aos recursos parafinanciadores dessa Política Pública.

Diferente é a situação das Comissões Estaduais e Municipais de Emprego que,assim como as demais Comissões e Conselhos criados a partir da Constituição de 1988,como elementos de democratização da elaboração e consecução das políticas públicas naci-onais, vêm carregando suas dificuldades desde então. No caso específico das Comissões deEmprego, que são tripartites, de maneira geral apresentam como principais limitações: adiferença de domínio teórico, político e operacional dos seus vários membros.

Esses aspectos que permeiam as suas ações são de conhecimento dos represen-tantes do Governo que, em geral, hegemonizam a Comissão. A bancada dos empregado-res, além de ter seus representantes com boa formação educacional e profissional, apre-senta seus interesses como coincidentes com os do Estado, por ser o segmento capaz deoferecer o objeto-fim da política (emprego), assim, têm poder de determinação. A banca-da dos trabalhadores, que deveria ser o segmento determinante, por representar aque-les a quem a Política Pública se destina, tem sua atuação prejudicada pela parca formaçãopolítica, desconhecimento do vocabulário e das rotinas do serviço público e que, devido àmesma política que incita agora a qualificação profissional, sofreu a perda do seu poderpolítico e de pressão devido às ações de desmobilização e de destruição dos sindicatos. Asoutras condições que enfraquecem a representação dos trabalhadores são a sua baixaescolarização, o que impede a análise das condições das políticas e a dedução das suascausas e conseqüências, bem comoo fato de terem vínculos empregatícios que os subordi-nam aos seus próprios empregadores, limitando os seus espectros de atuação e decisão.

d) Quanto ao fomento à introdução de claúsulas relacionadas com a qualificaçãoprofissional, nas pautas das negociações coletivas, estabelecidas entre entidades em-

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presariais e sindicais, tendo como horizonte a construção de processos mais amplos decontratação coletiva; dadas as condições acima consideradas, principalmente no quetange aos trabalhadores e às suas diferentes condições de organização, o enfraqueci-mento dos sindicatos e a própria dificuldade de se conseguir e manter empregos, essaproposição se torna viável para poucas categorias e em poucas regiões do País.

Sobre a garantia de procedimentos eticamente recomendáveis quanto ao uso dosrecursos públicos, por todos os segmentos envolvidos na execução do PNQ em seusdiversos níveis, acreditamos que a avaliação dos PlanTeQs e de seus projetos pode serum dos elementos que participem desse aspecto, mas de maneira menos efetiva e efi-caz que os organismos institucionalmente incumbidos de tal fiscalização e verificação.

Bibliografia

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História da Educação Profissional no Brasil

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Introdução à Macroeconomia

Cícero Antônio de Oliveira TredezziniDoutor em Geografia pela Unesp, São Paulo.Professor do Departamento de Economia eAdministração/ CCHS da Universidade Federalde Mato Grosso do Sul.

No alvorecer do século XXI, fala-se muito da nova economia, tecnologia da infor-mação, em ajuste externo e interno, em globalização dos mercados etc. Assisti-mos às evidências do impacto destas mudanças no nosso dia-a-dia as vezes sem

nos preocuparmos muito com suas conseqüências. Mas, quais são exatamente os efei-tos dessas mudanças? Como afetam os padrões de vida e a taxa de crescimento da eco-nomia? Como as mudanças na economia atingem o emprego e o desemprego, os preçose o equilíbrio do balanço de pagamentos? Por que razão as rendas são atualmente maiselevadas do que em 1970 e por que, em 1970, eram mais altas do que tinham sido em1930? Por que razão alguns países têm inflação alta enquanto outros têm preços está-veis? Quais as causas da recessão e da depressão e como as políticas públicas podemevitá-las?

Segundo Stiglitz e Walsh (2003), a melhor forma de entender as repostas a essasperguntas é recorrer às ferramentas da economia. De acordo com esses autores, “aspercepções básicas que gerações de economistas auferiram com o estudo da economiacontinuam sendo fundamentais para o entendimento da economia da informação glo-bal de nossos dias” (Stiglitz e Walsh 2003, p. 3). Portanto, se desejamos compreenderessas mudanças, os impactos das mesmas no dia das pessoas e dos países, precisamosfazer uso de conceitos econômicos, buscando compreender em última instância o fun-damento das leis econômicas. Diante disso, esse curso vai tratar de algumas leis econô-micas e de como elas podem ser utilizadas para entender o mundo real.

O principal objetivo da teoria econômica é estudar como são determinados ospreços e as quantidades dos bens produzidos e dos fatores de produção existentes naeconomia. A economia, atualmente, está dividida em duas partes, ou dois ramos princi-pais: microeconomia e macroeconomia. O foco central do curso vai ser a macroeconomia.Mas, o que é a macroeconomia?

Enquanto a microeconomia procura analisar o processo de determinação de pre-

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ços e quantidades preservando em seu estudo as características individuais de cada beme de cada fator de produção, a macroeconomia é o estudo da economia como um todo. Amacroeconomia lida com a economia agregada, não o estudo dos níveis de emprego edos preços num ramo de atividades especifico, mas o estudo do emprego e do desem-prego totais e do nível de preços de toda a economia. Os macroeconomistas são cientis-tas que procuram explicar o funcionamento da economia como um todo. Reúnem dadossobre renda, preços, desemprego e outras variáveis em diferentes épocas e diferentespaises. Procuram, então, elaborar teorias gerais que ajudem a explicar esses dados.

Segundo Mankiw (1998, p. 4),

“a macroeconomia é, sem duvida, uma ciência jovem e imperfeita. O economista tem tantacapacidade de prever os acontecimentos futuros quanto o meteorologista para prever o tem-po no mês que vem. Mas você vai ver que hoje já sabemos uma grande quantidade de coisasa respeito do funcionamento da economia. Não estudamos macroeconomia apenas paraexplicar os fatos econômicos; também queremos aperfeiçoar a política econômica”.

A macroeconomia procura trabalhar a economia como se ela fosse constituída porcinco mercados: mercado de bens e serviços, o mercado de trabalho, o mercado monetá-rio, o mercado financeiro e o mercado cambial.

O mercado de bens e serviços procura fazer uma agregação de todos os bens pro-duzidos pela economia durante certo período. A partir desta agregação definiremos oproduto agregado, produto interno bruto e produto nacional. A medida do valor da ativi-dade econômica é o produto interno bruto (produto nacional) Esse produto representaa agregação de todos os bens produzidos pela economia em um determinado tempo.Fica claro , então, que o PIB ou PNB é uma medida de desempenho econômico. O preçodesse produto, uma média de todos os preços produzidos, é o chamado nível geral depreços, portanto, um indicador de inflação, assim como o deflator do PIB que mede opreço da unidade típica de produto em comparação com seu preço no ano base.

O mercado de trabalho também representa uma agregação de todos os tipos detrabalhos existentes na economia. Nesse mercado, determinamos a força de trabalho, ataxa salarial e o nível de emprego, taxa de desemprego, taxa de participação da força detrabalho. O desemprego é o problema macroeconômico que afeta os indivíduos de for-ma mais dura e direta. Para a maioria, a perda de um emprego significa redução dopadrão de vida. Assim, não é nada surpreendente que o desemprego apareça corriquei-ramente como um tópico freqüente do debate político. Segundo Mankiw (1998), muitospolíticos estão tentando usar o chamado índice de miséria (soma das taxas de inflaçãoe de desemprego) para medir a saúde da economia e o sucesso ou insucesso das políti-cas econômicas. Portanto, os economistas estudam o desemprego para identificar suascausas e ajudar a melhorar as políticas públicas que afetam os desempregados.

O mercado monetário (financeiro) procura analisar o comportamento da moeda.A moeda tem um papel fundamental em todas as economias modernas. É parte do

Introdução à Macroeconomia

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nosso dia-a-dia, e o seu uso é de tal forma generalizado que seria impossível imaginarum sistema econômico sem moeda. A moeda é um artefato social desenvolvido parafacilitar as trocas no mercado entre agentes individuais. Para entender o papel e asfunções que cumpre a moeda é necessário estudar a natureza e a forma dos mercadosnos quais a moeda é usada. No mercado monetário são determinadas as taxas de juros ea quantidade de moeda necessária para efetuar as transações econômicas.

As economias modernas são economias abertas. Estão ativamente envolvidas nocomércio internacional e relacionadas com os mercados financeiros mundiais. Diantedisso, percebe-se que um país realiza uma série de transações com o resto do mundo,envolvendo mercadorias, serviços e transações financeiras. Para melhor compreender eestudar essas relações, onde os preços dos diferentes países devem ser comparados, e amoeda de um país deve ser convertida nas moedas dos outros, torna-se fundamentalconhecer o mercado cambial. A taxa de câmbio entre dois países é o preço pelo qual seefetivam tais transações. É o preço relativo das moedas de dois países.

Portanto, podem-se resumir os objetivos da análise macroeconômica como sen-do o de estudar como se determinam as seguintes variáveis agregadas: nível de produto(PIB, PNB), nível geral de preços (IGP, IPC, IPCA etc), taxa de salários, nível de emprego,taxa de desemprego, taxa natural de desemprego, desemprego sazonal, desempregofriccional, desemprego estrutural e desemprego cíclico. Papel das expectativas nos des-locamentos da curva de ajuste da inflação no curto prazo. Taxa de juros, quantidade demoeda, preço e quantidade de títulos, e taxa de câmbio.

Assim, o objetivo deste curso vai ser o de mostrar sucintamente as principaisvariáveis macroeconômicas, discutindo suas relações e suas implicações na formu-lação das políticas econômicas. Como elas são calculadas e disponibilizadas pelosinstitutos de pesquisa, órgãos governamentais e órgãos representativos de classe. Épreciso entender inicialmente que o objetivo do estudo de Economia é formularpropostas para resolver ou minimizar os problemas econômicos, de forma a melho-rar a qualidade de vida das pessoas.

Em linhas gerais podem-se resumir os objetivos de política econômica em trêsgrandes linhas: crescimento da produção e do emprego, controle da inflação e equilíbrionas contas externas e melhor distribuição da renda gerada no país. Outros objetivospoderiam ser incluídos, como redução da poluição, liberdade econômica, regulação etc.Noentanto, estes são objetivos menos explícitos em termos de economia brasileira, ou quepodem ser incluídos no conjunto dos anteriores.

Uma das questões centrais em economia, muitas vezes desconsideradas peloscríticos ou análises menos aprofundadas, refere-se à existência de conflitos entre osobjetivos perseguidos pela autoridade governamental através do uso da política econô-mica. É preciso ter clareza de que os objetivos de política econômica não são indepen-

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dentes, sendo, no mais das vezes conflitantes. Afinal, a economia é uma ciência social.

A disciplina “Indicadores de trabalho e emprego” vai procurar dar ao alu-no elementos teóricos para melhor entender os desdobramentos das políticaseconômicas (salarial, fiscal, monetária e cambial), através do acompanhamentodos seus principais indicadores*. A experiência da economia brasileira atravésdo acompanhamento da conjuntura econômica mostrará por outro lado aos dis-centes, o campo prático e real destes indicadores e suas implicações no proces-so de desenvolvimento do país, por extensão às suas vidas.

Bibliografia

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STIGLITZ, J. E & WALSH, C.E. Introdução à macroeconomia. Rio de Janeiro: Campus,2003.

Introdução à Macroeconomia

* Por outro lado, a experiência da economia brasileira, através do acompanhamento da conjuntura

econômica, mostrará aos discentes o campo prático...

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Comunicação é Obrigação Social

David Trigueiro dos SantosMestre em Comunicação Social pelo IMS, São Bernardodo Campo. Técnico de nível Superior e professorvoluntário do Departamento de Jornalismo/CCHS daUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Nas aulas sobre comunicação social e mesmo em conversas com pessoas em geralquase sempre surgem as perguntas: “A comunicação é algo inerente ao Ser Hu-mano? O Estado tem obrigação de informar o cidadão sobre suas ações constitu-

cionais?” Este artigo objetiva responder essas duas importantes questões.

Uma das características mais humanas é a comunicação. No entanto, nem sempreela é bem utilizada nas relações entre as pessoas. Com o surgimento das cidades e dasinovações tecnológicas, principalmente nas áreas de informação e telecomunicações, oprocesso de comunicação social vem ganhando a cada dia mais impulso e eficiência.

Os adventos do rádio, da televisão, do cinema, da imprensa escrita e da Internetratificam a tendência de se desenvolver mais e melhores condições do Ser Humano, emse comunicar coletivamente.

Contraditoriamente, essa mesma tecnologia que facilita a comunicação social tam-bém estimula a individualidade, o isolamento, o ficar só. Veja que o telefone celular, ocomputador e a própria Internet, o vídeo game, o vídeo cassete, o DVD Rom entre outrastraquitanas caminham nessa direção.

Essa contradição é sentida pelas pessoas em geral, que a manifestam em compor-tamentos “extravagantes” e até exóticos. Porque, conforme já demonstrado pela ciênciae pela história, a Humanidade é gregária, quer dizer, tende a viver coletivamente parapoder cumprir o seu designo neste mundo, na busca de tornar este um lugar digno de seviver. As organizações em geral, principalmente as públicas, nem sempre se pautam poresse entendimento, no que se refere à comunicação. Isto tem causado imensos proble-mas para as pessoas.

Vale lembrar que todo agente público, em qualquer lugar do mundo, deve satisfa-

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ção às pessoas, à população em geral. Aqueles que costumamos chamar de contribuin-tes são os mesmos que pagam, custeiam toda essa estrutura que os agentes públicosfazem funcionar.

O contribuinte é a razão e o principal “cliente” das organizações públicas. Sendoassim, ele tem direito e deseja ser bem atendido e informado sobre os serviços que eleinclusive já pagou antecipadamente, via impostos e tarifas arrecadadas compulsoriamente.

Portanto, um dos principais deveres do agente público é o de informar, da melhormaneira possível, ao cidadão em geral, sobre o que, como, onde e quando os serviçosque lhe são devidos serão executados. O cidadão é o patrão.

Assim, a busca de desenvolvimento das habilidades de comunicação precisa seruma meta permanente para todo agente, em especial aqueles que lidam diretamentecom a população. Nas constituições de todos os países, sob regime democrático, háreferências claras e diretas sobre o direito à informação e à comunicação do cidadão emrelação aos atos do Estado.

Na Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), promulgada em 1988também existem referências claras e diretas sobre o direito do cidadão brasileiro àinformação e à comunicação dos atos dos seus agentes públicos. Já no seu Preâmbu-lo, a CRFB diz:

“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituintepara instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociaise individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e ajustiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,fundada na harmonia social e comprometida, na ordem internacional, com a solução pacífi-ca das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DAREPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL”.

Ora, se os princípios e valores nela explicitados pugnam pela busca da soluçãopacífica das controvérsias e à busca da harmonia social, logicamente está falando daadoção de uma política de comunicação social, que essencialmente tem também essamissão inalienável.

Ainda na CRFB, no Capítulo “Dos Princípios Fundamentais”, nos seus Artigos 3º e4º, respectivamente nos incisos I e VI e VII, volta a ratificar essa vocação pacifista, viacomunicação social - “I - construir uma sociedade livre, justa e solidária”; VI - defesa dapaz; VII - solução pacífica dos conflitos.”

No tópico acerca “Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”, no Artigo 5º,inciso XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte,quando necessário ao exercício profissional; não deixa qualquer dúvida sobre o assun-to, do ponto de vista legal.

Comunicação é Obrigação Social

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E mais, no tópico que rege a Administração Pública, sua Seção I, nas DisposiçõesGerais, do Artigo 37 há um reforço sobre as obrigações do Poder Público nessesassuntos.

Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes daUnião, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legali-dade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte:

Ainda neste tópico da CRFB há a redação do Parágrafo 1º que ratifica o entendimento sobreo assunto:

§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicosdeverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constarnomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servi-dores públicos.

Em face ao ora exposto, fica evidenciado e comprovado que a comunicação socialé um dever e uma vocação do Estado democrático brasileiro. Tanto do ponto de vistaessencial (natureza humana), quanto de natureza legal (constitucional). E que os seusagentes devem se pautar por esse princípio e premissa básicos em todas as suas ações ecomportamentos, no exercício de suas funções profissionais.

David Trigueiro dos Santos

Bibliografia

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O Controle Social no SistemaTripartite de Gestão

Eduardo Ramirez Meza

Acadêmico do Curso de Ciências Sociais da UFMS,Campo Grande. Assessor de Projetos do Departamentode Comunicação Social – Jornalismo/CCHS daUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Oobjetivo do presente texto é compartilhar com os leitores algumas reflexõesacerca do processo de institucionalização dos conselhos de políticas públicas,de maneira geral, e, mais especificamente, a partilha de decisões e responsabi-

lidades entre sociedade civil e governo, circunscritas ao âmbito dos conselhos de políti-cas públicas da área de emprego e renda na forma do sistema tripartite de gestão.

As considerações aqui apresentadas são produto de algumas indagações que, se-não evidentes para todos, certamente poderá ser motivo de um olhar mais atento apartir das coerentes afirmações e insinuações possibilitadas pela leitura dos textos epelas discussões havidas durante as aulas do Curso de Gestão Social de Políticas Públi-cas de Trabalho e Renda, através dos quais já deveremos ter visto, até agora, entre outrosassuntos: condições e ideais políticos que originaram o surgimento do aparelho de Esta-do no contexto da democracia; a democracia representativa se firmando em detrimentoda democracia direta; processo histórico de construção dos direitos humanos e sociais eforma como se fazem inscrever em políticas sociais públicas; potencialidades e, tam-bém, fragilidades do controle social de políticas públicas; globalização e desigualdadesocial; papel da comunicação no mercado do trabalho mundializado; economia do tra-balho e desenvolvimento social; Políticas Públicas de Trabalho e Renda – PPTR e, dentrodesta, política de qualificação profissional.

Os conselhos de políticas sociais públicas

Segundo Ricci (19—), a estrutura burocrática estatal foi um elemento distintivoda constituição dos movimentos sociais do século XX. Como interface da estruturaburocrática, os movimentos sociais deste século acabaram por movimentar-se na estei-ra das políticas estatais ou na busca de interlocução com as agências estatais burocratizadas.

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No bojo da redemocratização do país, o processo político desenvolvido a partir de1984 conduziu à institucionalização de uma série de mecanismos e canais de interlocuçãoentre sociedade civil e Estado. Uma nova safra de secretários procurou implementarnovas práticas governamentais, tendo como mote a descentralização dos serviços atra-vés da aproximação e da organização de grupos de interesse.

É neste contexto que surgiram os conselhos setoriais, atualmente generalizados ecom implementação compulsória a partir do governo federal, como veremos mais adi-ante. Importa reter, agora, ter prevalecido a concepção de conselho enquanto mecanis-mo que visa garantir a participação, a democratização e a transparência, consti-tuindo-se em canal “legítimo” para a administração de conflitos e de relaçãoentre Estado e sociedade civil.

Os conselhos de políticas sociais são, pois, fruto de iniciativas bastante recentesda sociedade e do governo, sobretudo a partir de legislações que regulamentaram eimplementaram alguns dispositivos constitucionais. Para Draibe (1998), estes tipos deconselho “institucionalizam, na etapa de consolidação da democracia, os novos meca-nismos de expressão, representação e participação de interesses forjados pelos movi-mentos sociais desde a primeira hora da democratização”. Assim, constatamos que acriação de conselhos setoriais vem como reconhecimento de uma promessa de par-ticipação da população comum nas discussões e decisões sobre questões que afe-tem a coletividade.

Enquanto produto da correlação de forças entre movimento sociais e governo, osconselhos de políticas públicas, embora não fosse novo, inaugurou na história recenteuma tentativa de resgate dos princípios de democracia direta, em contraposição à demo-cracia participativa. Dois aspectos desse arranjo precisam ser discutidos: a setorialização,enquanto forma reconhecida pelo governo de intermediação de interesses sociais, e a“imposição” federal de sua institucionalização, nos âmbitos estadual e municipal.

Por estarem sendo constituídos em torno de discussões que circundam pontosespecíficos dos interesses de sociedade, a participação popular nestes conselhos vê-sediante de um palco de debates no interior dos quais, ao menos em princípio, não háespaço para a inclusão de assuntos que fujam da temática a que eles imediatamente sevinculam. São as chamadas “caixinhas”, constituídas a partir do espelhamento com aestrutura burocratizada do Estado.

Por outro lado, a estruturação de conselhos nos âmbitos estadual e municipaltornou-se compulsória, na medida em que a burocracia estatal se apropria dessa con-quista social. Coloca-se, então, a necessidade de os conselhos setoriais sereminstitucionalizados como condição preliminar para o acesso a parcelas específicas dosrecursos federais. Sem conselho não tem merenda, não tem Fundef, não tem bolsa-escola, não tem recursos do FAT e assim por diante. Por conta desta situação, para aten-der a uma exigência burocrática, imposta de cima para baixo, alguns conselhos podem

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estar sendo criados sem que haja nenhuma discussão de iniciativa da comunidade ousem que a mesma tenha a preparação para assumir, de fato, novas atribuições e compe-tências no conselho.

Levada a uma consideração extrema, poderia ser elaborada a seguinte expressão:“Conselho? Invente o seu, é apenas questão de cumprir a uma formalidade mesmo”. Seesta expressão fizer parte do conteúdo escamoteado por trás dos princípios participativose de controle social, que o discurso oficial intenta defender, os conselheiros podemestar sendo escolhidos sem os critérios adequados, como por exemplo entre amigos oupartidários do chefe do executivo ou da pasta correspondente (setorial). Tal proposição,se verdadeira, desencastelaria os conselhos setoriais da posição de novos canais de par-ticipação popular e de espaços que possibilitam a democracia participativa. Sua existên-cia estaria sob o controle de quem deveria estar sendo vigiado.

Exemplo concreto de certo grau de subordinação dos conselheiros ao represen-tante do executivo pode ser extraído das falas de dois conselheiros municipais de saúdede Campo Grande-MS, contidas em entrevistas realizadas em 2002 (Meza et al.):

[No] nosso regimento [a presidência] é aberta a qualquer conselheiro. A Secretária Munici-pal de Saúde foi eleita presidente do conselho pela participação profissional, pelo desempe-nho dela na Secretaria de Saúde Pública. Então eu acredito que (...) todos foram unânimesnela por capacidade mesmo (....) Não tinha outra candidatura, foi por aclamação. (conselhei-ro 1)

Foi quase que unanimidade. [a presidente do conselho] é a Dra. Beatriz, a Secretária. Masisso foi porque a gente quis, na época (...). Eu, quando estava no primeiro mandato, doisanos eu fiquei voando igual ‘barata tonta’. Então você precisa de um certo tempo maior pravocê ter mais conhecimento (...). Na época eu achava que não, que tinha que ser ela, masagora eu já tenho meu pensamento que, se eu fosse reconduzida novamente, eu ia mecandidatar a presidente, eu não ia deixar mais.” (conselheiro 2)

Não obstante, apesar da previsão legal de controle social, poucos cidadãos têm seinteressado em participar dos conselhos. Mesmo sendo um processo de cima para bai-xo, a criação dos conselhos municipais pode despertar a sociedade civil para a necessi-dade de se organizar? Esta é uma possibilidade e, como tal, precisa ser exercitada perma-nentemente (dada a natural rotatividade dos conselheiros) e, assim, constatada na prá-tica. A participação da sociedade civil nos conselhos, em muitos casos, pode ter sidoprovocada externamente. Até por isso, sua atuação às vezes se restringe aos limites deextensão da burocracia estatal, o que nos permite considerar a necessidade de avançarna qualidade política da participação, aí incluídas as marcas propostas por Demo (1996:44-58): representatividade, legitimidade, participação da base e planejamento participativoauto-sustentado. Fora desses horizontes, para o autor, a participação ou aproxima-se dafarsa ou é incompetente.

No trabalho realizado no município de Campo Grande-MS (Meza et al., 2002, op.cit.), ao serem questionados quanto à participação da sociedade civil no processo de

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institucionalização do conselho, encontramos entre as respostas oferecidas pelos con-selheiros municiais de saúde as seguintes:

“Ele foi criado de cima pra baixo, por determinação legal. Inclusive os primeiros conselhosque fizeram, nós costumávamos chamar de biônicos. Porque era indicado pelo prefeito, pelacâmara de vereadores. (...) Aí quando a sociedade civil queria participar, e viu que haviaindicação, aí começou a estudar as leis, verificando qual que era realmente o objetivo dacriação de conselhos, e viu então que estava errado o nosso. (...) Então o fórum foi imediata-mente reconhecido pelas autoridades, alterou-se as leis, mudou, trocou-se os conselheiros.Aí começou, daí pra cá, começou a funcionar corretamente como manda a lei. Isto na capital.O interior nós vivemos problemas até hoje com conselhos biônicos.” (conselheiro 1)

“(...) O que eu sei, houve uma necessidade de se criar os conselhos, até porque o poderpúblico me parece que não estava conseguindo administrar este gigante que é o Brasil, queé a grande população e entendeu que era necessário chamar a sociedade civil, e foi quandofoi atendido (...)”. (conselheiro 3)

“O conselho, na verdade, é (...) uma luta por cidadania mesmo, que foi uma luta nacional, aíse conseguiu as leis, a lei que cria a saúde pública. (...) Antes da Constituição Federal tinhaaquele antigo INPS. (...) Quem tinha carteirinha era um incluído na saúde, e quem não era,quem não tinha, era indigente. (...) E com a reforma, criou-se, foi uma luta muito grande, anível de Brasil, e aí conseguiram, através da Lei 8.080, a reforma da saúde, o Sistema Únicode Saúde, que é o SUS.”. (conselheiro 2)

Verifica-se, na resposta do conselheiro 1 (representante do segmento dos usuári-os) que houve, de fato, um processo percebido como externo e superior (“de cima parabaixo”). Mas a sociedade civil, ao se deparar com as incongruências na forma de suarepresentação no conselho, buscou informações, se auto-organizou e exigiu a modifica-ção daquela situação. Já o conselheiro 3, representante do segmento dos usuários, citoua participação da sociedade civil, embora entenda que esta estaria, através do conselho,atendendo a um chamado do governo. Uma outra conselheira coloca o conselho comoresultante das lutas sociais, ainda que estas estivessem sendo articuladas no âmbitonacional, não mencionando, portanto, a articulação da sociedade no âmbito municipal.

Constata-se, diante do processo de institucionalização do Conselho Municipal deSaúde de Campo Grande, que o fator determinante para sua criação foi a lei federal, e éde se presumir que em outros conselhos a situação tenha sido muito similar. Estaassertiva nos remete ao questionamento da origem do poder de participar e, mais afundo, a própria liberdade para este exercício. Afinal, participar e exercer plenamente aliberdade é realmente um direito inato das pessoas, dos cidadãos, ou seria um direitoque cabe ao governo controlar e que, por pressão da sociedade, acaba concedendo àpopulação? A pergunta, de tão óbvia, parece exigir, ela própria, a resposta em favor daprimeira proposição. A tal interrogação sugere-se acrescentar um pensamento formula-do por Demo (1996: p. 18) para instigar o debate:

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A desigualdade funda não só a necessidade institucional de preservar os privilégios, masigualmente a inevitabilidade da resistência e do desejo de mudança, do ponto de vista dodesigual. Assim, no princípio está a opressão. A redução da desigualdade não cai do céu pordescuido, mas será conquistada historicamente, não como produto definitivo, mas proces-sual. Por isso, participação só pode ser conquistada. Aquela doada é presente de grego,porque vem do privilegiado, não do desigual. A redução da desigualdade que o desigual quersó pode ser aquela que ele mesmo constrói. E aí está a sua competência. (grifos nossos).

Lembrando as Políticas Públicas de Trabalho e Renda

Antes de falarmos do sistema tripartite de gestão, cabe fazer um breve resgate dahistória recente das Políticas Públicas de Trabalho e Renda – PPTR no Brasil. A garantiade assistência ao desempregado foi prevista desde a Constituição Federal de 1946, sen-do regulamentada, tardiamente, apenas em 1965. Na regulamentação daquela lei, o fun-do, que deveria dar o lastro financeiro e, portanto, as condições concretas de realizaçãodo direito do trabalhador, foi constituído apenas pela contribuição sindical – obrigatória– dos trabalhadores.

Na Constituição de 1967 a garantia de assistência ao desempregado foi mantida,porém a regulamentação deste direito viu-se sem garantias de sua efetividade. O Progra-ma do Seguro Desemprego ganhou novas regras em 1970 e em 1986, mas os recursoscontinuaram a se constituir no “gargalo” do programa, devido à insuficiência do fundopara o seu custeio.

Esta impossibilidade material de efetivação do direito só vai ser resolvida a partirda Constituição Federal de 1988, com a indicação expressa da destinação de recursos doPIS/PASEP, e com a constituição do Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT pela Lei n°7.998, de 11 de janeiro de 1990. A referida Lei regula o Programa do Seguro-Desempregoe o abono de que trata a Constituição Federal nos artigos 7º (inciso II), 201 (inciso IV),além de criar o mecanismo de controle social do fundo, o Conselho Deliberativo doFundo de Amparo ao Trabalhador – CODEFAT.

Na condução da PPTR, além do Programa do Seguro Desemprego, há outros ele-mentos como por exemplo o dever do Estado de desenvolver políticas públicas de gera-ção de empregos e organização do Sistema Nacional de Emprego – SINE, além de alavancaro desenvolvimento do parque industrial brasileiro – visando gerar novos empregos. Sãocongregados, assim, políticas promotoras de emprego com políticas de compensaçãopara o caso de desemprego involuntário.

As PPTRs podem ser classificadas de várias formas. Conforme conceituação pro-posta por Azeredo (1998), a questão do trabalho comporta duas vertentes:

- Programática: congregam as medidas de fomento ao trabalho, à educação, à qua-lificação e proteção ao trabalhador. É o conjunto dos programas e atividades destegrupo que formam o Sistema Público de Emprego.

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Normativa: compreende as políticas de relações de trabalho, incluindo a moderni-zação de instituições que regem relações do capital-trabalho. O conjunto de ações,medidas, leis, entidades e programas relacionados com a questão das relações econdições de trabalho compõem o Sistema de Relações de Trabalho.

Essas duas frentes de intervenção, por sua vez, desdobram-se em políticas cha-madas de ativas e passivas:

Ativas: As que geram trabalho e melhoram a empregabilidade do trabalhador. Temum papel a cumprir em termos de socialização e integração dos excluídos do mer-cado do trabalho, de preservação da qualificação da força de trabalho desocupada,de geração de atividades à margem do setor moderno da economia, mas capazes degarantir a sobrevivência de indivíduos e comunidades. São exemplos: financia-mento de programas de desenvolvimento econômico; programas de investimento(Proger e Programas de Crédito Produtivo Popular); qualificação profissional (PNQ);flexibilização da legislação (maior facilidade de contratação).

Passivas: As que protegem o trabalhador desempregado, atenuando os impactosnegativos do desemprego. Forma atualmente a base das políticas públicas de em-prego. A trajetória deve ser no sentido de produzir melhorias nas políticas públi-cas, permitindo adequação dos seus benefícios à nova situação de desempregoestrutural. São exemplos: Seguro-desemprego; Abono Salarial; Intermediação demão-de-obra (Agências de intermediação, SINE, Postos); Informação sobre merca-do de trabalho.

O Tripartismo

Não há uma definição precisa nem uma elaboração teórica desenvolvida sobre otripartismo, apesar de se empregar habitualmente na literatura jurídica, social e nospróprios documentos de diversos organismos internacionais, entre eles e fundamental-mente a Organização Internacional do Trabalho – OIT.

A OIT, criada pelo Tratado de Paz assinado em Versalhes em 1919, é a Agênciamais antiga do Sistema das Nações Unidas. Considerando – como ficou consignado naConstituição da Organização – que “só se pode fundar uma paz universal e duradouracom base na justiça social”, a OIT foi estabelecida com o objetivo de definir e promoverpolíticas sociais, em nível internacional, numa fase marcada pela revolução industrial.

Desde a origem, a OIT integrou representantes dos governos, das organizaçõessindicais e das organizações patronais. A participação de representantes dos emprega-dores e dos trabalhadores, colaborando em pé de igualdade com os representantes dosgovernos, tendo em vista a procura de consensos para promover o bem comum –tripartismo ou cooperação tripartida – constitui um traço distintivo da OIT em relaçãoàs demais Organizações das Nações Unidas.

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Em 1944, a Conferência Internacional do Trabalho – a assembléia-geral da Organi-zação – reunida em Filadélfia, nos Estados-Unidos, aprovou uma declaração relativa aosfins e objetivos da OIT, conhecida pela Declaração de Filadélfia. Numa época do pós-guerra e da reconstrução, a Declaração reafirma os princípios orientadores da OIT, nosquais se deveria inspirar a política dos países membros. Esses princípios são os seguin-tes: 1) o trabalho não é uma mercadoria; 2) a liberdade de expressão e de associação éuma condição indispensável para um progresso constante; 3) a pobreza, onde quer queexista, constitui um perigo para a prosperidade de todos, e 4) todos os seres humanos,qualquer que seja a sua raça, a sua crença ou o seu sexo, têm direito de efetuar o seuprogresso material e o seu desenvolvimento espiritual em liberdade e com dignidade,com segurança econômica e com oportunidades iguais.

Tendo em conta estes princípios, a OIT definiu quatro objetivos estratégicos queorientam atualmente a sua ação: 1) Promover e aplicar os princípios e direitos funda-mentais no trabalho; 2) Desenvolver as oportunidades para que os homens e asmulheres tenham um emprego digno; 3) Alargar a proteção social, e 4) Reforçar otripartismo e o diálogo social.

Alguns autores situam o tripartismo na convergência de duas grandes correntescontemporâneas: de um lado, a tendência à maior participação de todos os elementosda sociedade no processo de desenvolvimento; de outro lado, na aspiração de indivídu-os e grupos sociais a interferir efetivamente na elaboração e aplicação das decisões quelhes afetam. Compreende-se o tripartismo como uma tentativa de participação, em péde igualdade, dos representantes de trabalhadores e empregadores nas discussões edecisões que lhes afetam na esfera pública, consoante ao disposto no parágrafo primei-ro do artigo 4 da Convenção 88 da OIT, de 1948:

Medidas apropriadas devem ser tomadas por meio das comissões consultivas, no sentidode assegurar a cooperação de representantes dos empregadores e dos trabalhadores e naorganização e no funcionamento do serviço de emprego, assim como no desenvolvimentoda política do serviço ao emprego. (grifos nossos).

Corroborando o fato de o Brasil ser signatário desta Convenção, sua recomenda-ção foi incorporada no texto constitucional de 1988:

Art. 10 – É assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dosórgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto dediscussão e deliberação.

O CODEFAT, instituído a partir da Lei n° 7.998/90, é um órgão colegiado de natu-reza deliberativa, composto de forma tripartite e paritária por representantes de entida-des nacionais de trabalhadores, empregadores e poder público, em atendimento à reco-mendação da OIT e da previsão constitucional. Participam do CODEFAT:

- Bancada de trabalhadores: Central Geral de Trabalhadores (CGT), Força Sindical(FS), Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Social Democracia Sindical (SDS).

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- Bancada de empregadores: Confederação Nacional da Indústria (CNI), Confedera-ção Nacional do Comércio (CNC), Confederação Nacional das Indústrias Financei-ras (CNF) e Confederação Nacional da Agricultura (CNA).

- Bancada do poder público: Ministério do Trabalho (MTE), Ministério da Previ-dência Social (MPS), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social(BNDES) e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

Na esfera estadual atua a Comissão Estadual de Emprego – CEE, órgão colegiadode caráter permanente e deliberativo, composto de forma tripartite e paritária por re-presentantes de entidades estaduais de trabalhadores, empregadores e poder público.Participam da CEE:

- Bancada de trabalhadores: Central Única dos Trabalhadores (CUT/MS), CentralGeral de Trabalhadores (CGT/MS), Federação dos Trabalhadores na Agricultura(FETAGRI/MS), Federação dos Trabalhadores nas Indústrias (FTI/MS) e Federaçãodos Trabalhadores no Comércio (FETRACOM/MS).

- Bancada de empregadores: Federação da Agricultura do Estado de Mato Grosso doSul (FAMASUL), Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso do Sul (FIEMS),Federação do Comércio do Estado de Mato Grosso do Sul (FECOMÉRCIO/MS), Sin-dicato das Agências de Propaganda de Mato Grosso do Sul (SINDAPRO/MS) e Sindi-cato das Empresas de Transporte de Passageiros no Estado de Mato Grosso do Sul.

- Bancada do poder público: Delegacia Regional do Trabalho (DRT), Secretaria deEstado de Produção e Turismo (SEPROTUR), Secretaria de Estado de Educação (SED),Fundação do Trabalho e Economia Solidária (FUNTRAB) e Secretaria de Estado deMeio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMA).

Na esfera municipal, a Comissão Municipal de Emprego – CME tem igualmentecaráter permanente e deliberativo, e composição tripartite e paritária de representantesde entidades municipais de trabalhadores (sindicados ou cooperativas), empregadores(associações comerciais, industriais e agrícolas, clubes de lojistas, sindicados patronais)e poder público (órgãos do executivo municipal, sendo um representante do governoestadual). Para que as Comissões Estadual e Municipais sejam reconhecidas e homolo-gadas pelo CODEFAT, sua criação, composição e estrutura devem obedecer ao dispostona Resolução 80/94-CODEFAT (e suas alterações – ver anexo).

O órgão colegiado pode ser instituído diretamente por decreto do executivo, queé o meio mais rápido, e receber a denominação de Comissão. Neste caso, contudo, háque se considerar a sua fragilidade, já que a revogação, anulação ou alteração de umdecreto, em princípio, pode ser realizada a qualquer tempo e dependendo quase queexclusivamente da vontade do chefe do executivo. Assim, não há garantias sobre o cará-ter de permanência e independência política necessários para um órgão colegiado desta

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natureza. A alternativa que se coloca é a instituição de um Conselho, a partir da aprova-ção, pelo legislativo, de lei específica. Pode parecer uma simples alteração de nomencla-tura, mas o fato é que, criado desta forma, o órgão colegiado não estará tão vulnerável àsalternâncias de grupos políticos no poder local, comuns em nossa realidade, havendogarantia legal quanto ao caráter de permanência e independência política.

Aliás, esse é o caminho processual de todos os conselhos de políticas públicas:sua institucionalização inicia-se com a promulgação da lei de sua criação, que deve sersancionada pelo executivo. O passo seguinte é a regulamentação da lei, realizada medi-ante decreto e, somente após estes dois passos, é elaborado o regimento interno doconselho, tarefa de competência dos próprios conselheiros empossados. Caberia, por-tanto, perguntar, quais motivos exigem, para a área de emprego e renda, a adoção demetodologia processual diferente.

Dificuldades de operacionalização

A participação da base é a alma do processo, pois a participação autêntica é a dabase, que é a sua origem, o poder de baixo para cima. Na cúpula, a liderança representa-tiva exerce o poder de serviço, não autônomo. Ocorre muitas vezes que, por omissão damaioria, os presentes passam a representar, sem mais nem menos, o todo e a decidirpor ele, liquidando desta forma a constituição democrática (Demo, 1996: 49-52).

Assim como a legitimidade de um governo se extrai da Constituição, algo similardeve acontecer nas organizações menores. É legítimo o processo participativo, fundadoem estado de direito, que regulamente de modo democrático e comunitário as regras dojogo da vida comum. Normalmente esta regulamentação é o estatuto da organização,onde explicita quem é/pode ser membro, direitos, deveres, como escolhem-se os seusdirigentes, como se podem mudar as regras, etc. (Demo, 1996: 44-46). A liderança repre-senta democraticamente a confiança e a esperança da comunidade e, justamente poristo deve, ser rotativa, deve prestar contas, deve entender-se a serviço da comunidade.

A representação das categorias sociais e profissionais no CODEFAT, assim comonas Comissões Estadual e Municipais de Emprego, é do tipo vinculada. Ou seja, se dá apartir da indicação feita pelas organizações sindicais e patronais. Conciliar os imperati-vos da justiça social com a competitividade das empresas e o desenvolvimento econô-mico é o desafio que se coloca.

Com relação à rotatividade de membros representantes e da presidência da Co-missão de Emprego, a Resolução nº 80 do CODEFAT (vide compilação das resoluções emanexo) determina que “o mandato de cada representante é de até 3 anos, permitida umarecondução” e que a Presidência da Comissão “será exercida em sistema de rodízio,entre as bancadas do governo, dos trabalhadores e dos empregadores, tendo o man-dato do Presidente a duração de 12 (doze) meses e vedada a recondução para perío-do consecutivo”.

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Em contraposição a esta determinação, tivemos em Mato Grosso do Sul um fatocurioso: o antepenúltimo presidente da Comissão Estadual de Emprego, oriundo dabancada dos empregadores, esteve por dois mandatos consecutivos na presidência (demaio de 2001 a maio de 2003), isso por escolha e, conseqüentemente, com a aprovaçãodos próprios membros da referida Comissão. Mesmo que não se pretenda fazer qual-quer tipo de juízo de valor, esta postura contraria a orientação emanada pelo CODEFATna forma de Resolução daquele colegiado.

A prática setorialista, a falta de interlocução entre os próprios movimentos e en-tidades, a disputa por espaços e recursos são alguns dos obstáculos que precisam serenfrentados. Assim sendo, a ação de movimentos e entidades nos conselhos não deve-ria se restringir a quatro paredes das salas de reuniões. Seria o caso de se criar fóruns earticulações horizontalizadas, com ações conjuntas e que, portanto, reúnam atoresde vários setores.

Um dos empecilhos para se articular ações conjuntas parece ser, como o acompa-nhamento tem demonstrado, a exigüidade de recursos nos últimos 4 anos (veja quadro1). Some-se a isto a delimitação da Política Pública de Trabalho e Renda à qualificaçãoprofissional custeada com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador.

QUADRO 1

Recursos do FAT repassados pelo MTE ao Governo do Estado de Mato Grosso do Sulpara custear ações de qualificação profissional (2000-2004)

Ano Montante do Repasse (em R$) Percentual Relativo (1)

2000 4.140.000,00 100,00%

2001 2.421.000,00 58,48%

2002 1.450.000,00 35,02%

2003 574.410,76 13,87%

2004 (2) 1.059.347,00 25,59%

(1) Os números apresentados referem-se ao percentual de cada ano em comparação ao ano 2000, considerado,apenas para efeitos destes cálculos e como um demonstrativo, como marco inicial.(2) Em 2004 o repasse de recursos consiste de R$ 832.547,00 (para clientelas da qualificação profissional) maisR$ 226.800,00 (específicos para custear o Serviço Civil Voluntário).

Fonte: Coordenadoria de Qualificação Profissional/FUNTRAB

Registre-se que, além dos recursos do FAT, por força da exigência contida no pró-prio convênio firmado junto ao Ministério do Trabalho e Emprego, o Governo do Estado

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investe, pelo menos, 10% do montante repassado, a título de contrapartida. O diferenci-al é que até 2002 esta contrapartida vinha sendo contabilizada em termos de pagamen-tos efetuados com pessoal técnico contratado ou do quadro permanente do própriogoverno. Somente a partir de 2003 é que o governo passou a oferecer contrapartida emtermos de número de alunos qualificados, ultrapassando também a exigência contratualde no mínimo 10% de contrapartida estadual.

Considerações finais

Apesar de estarem vinculados à estrutura administrativa e precisarem que suasdecisões sejam homologadas pelo chefe do poder executivo, os conselhos são, teorica-mente, autônomos. Seu funcionamento interno é regido por regras e procedimentosformulados (ou, ao menos, aprovados) por seus membros. A autonomia das decisões vaidepender da correlação de forças na estrutura de poder, da organização da sociedadepara acompanhar, avaliar e dar suporte às ações propostas.

Como vimos, os conselhos setoriais nascem sob coordenação estatal, de governo.Caberia à coordenação, segundo nosso entendimento, a tarefa de promover a articula-ção dos diferentes aspectos e decisões, a fim de dar organicidade às ações do grupocomo um todo. Porém, querendo ou não, à medida em que o grupo se engaja, aprendeno próprio processo de trabalho e torna-se mais capaz para se autodirigir. Ocorre, assim,um acréscimo no conhecimento dos sujeitos, ao qual corresponde um decréscimo nadiretividade da coordenação.

Não se pode, contudo, superestimar o papel desse arranjo institucional e neleapostar todas as energias dos movimentos sociais. Os conselhos são mais um espaço deluta, de negociação, de articulação, mas contêm limitações e ambigüidades, bem comooferece oportunidades e novos desafios. Há muito a avançar. Apontam-se necessidadescomo a adoção de um sistema de divulgação, a articulação inter-conselhos e inter-políti-cas e a maior participação da sociedade civil, para impedir que a representatividade sejadesviada para atendimento dos próprios benefícios.

A realidade deve ser compreendida como um processo dinâmico, não como algoestático e imutável. Na medida em que haja melhor compreensão da realidade, pelotrabalho cooperativo, pela descoberta de relações não visíveis nos fatos em si, pela in-terpretação dos indicadores de interdependência presentes nos fenômenos sociais,as pessoas e os grupos deverão organizar o próprio pensamento, desocultando asideologias interessadas em separar a compreensão da realidade da necessidade desua transformação.

Cabe à comunidade a tarefa de entender-se como a principal “peça” que compõe arealidade social. Daí decorre a exigência de algo grau de comprometimento de todoscom e por todos ou, em outras palavras, um forte sentido de lealdade comunitária.Onde houver dificuldade individual, que o debate coletivo possa, na riqueza das discus-

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sões dos interesses contrários que se fazem presentes em toda sociedade humana,desvencilhar-se dos entraves imediatos e reformular-se coletivamente, sempre quenecessário.

Pode-se perceber que a sociedade, de maneira geral, tem se comportado de formaum tanto quanto apática, mesmo quando está diante de temas tão intimamente relacio-nados ao seu próprio dia-a-dia. No caso, as políticas públicas. Contudo as possibilidadesestão, na teoria e na lei, colocadas à disposição do controle social. O que pareceestar faltando, portanto, é de fato o esclarecimento coletivo, o que só pode ser al-cançado partindo-se do conhecimento da realidade em que tais possibilidades estãosendo colocadas.

Caso queiramos entender que a história seja construída em espaço e tempo deter-minado, somos obrigados a reconhecer que ela não se repete. Assim sendo, de pouco ounada valeria copiar de outros contextos históricos soluções que neles teria dado certo. É,portanto, no atual contexto histórico, político, econômico e social que devem ser gestadasas fórmulas adequadas ao exercício do controle social.

Em que pesem os possíveis “vícios” presentes no processo de institucionalizaçãodos conselhos setoriais, ao que tudo indica estes ainda configuram-se como possíveiscanais de mediação dos interesses coletivos e das políticas governamentais; espaçosadequados, portanto, para o estabelecimento de políticas públicas.

Finalizando, se a realidade é, de fato, muito mais rica que qualquer teoria, qual-quer pensamento e qualquer discurso que sejamos capazes de elaborar sobre ela, comopropôs Minayo (1994), o presente artigo não foge à regra. É bom que se frise, portanto,que o presente trabalho não teve, nem de longe, a pretensão de esgotar os assuntos aquiabordados. Pretendia, antes de mais nada, tão somente provocar reflexões que permi-tam contribuir para o crescimento da coletividade. É, por isto, apenas mais umfomentador dos muitos debates que devem ser instalados nos contextos sociais paraimprimir, no fazer social, o sentido que dele desejamos e aí, necessariamente, sob osaspectos políticos, econômicos e sociais.

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Eduardo Ramirez Meza

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Altera a Resolução nº 63, de 28 de julho de 1994, que estabelece critérios parareconhecimento, pelo CODEFAT, de comissões de emprego constituídas em nível Estadual, do Distrito Federal e Municipal, no âmbito do sistema público

de emprego.

O CONSELHO DELIBERATIVO DO FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR - CODEFAT,no uso de suas atribuições legais, em face do disposto no inciso V, do artigo 19, da Lei nº7.998, de 11 de janeiro de 1.990, e, tendo em vista o necessário aprimoramento do Siste-ma Público de Emprego,

RESOLVE:

Art. 1º - Alterar a Resolução nº 63, de 28 de julho de 1994, que estabelece critérios parareconhecimento, pelo CODEFAT, da Comissão de Emprego, a ser instituída por ato doPoder Executivo dos Estados, Distrito Federal e Municípios, nas condições previstasnesta Resolução, que tem por finalidade consubstanciar a participação da sociedade organi-zada, na administração de um Sistema Público de Emprego, em nível nacional, confor-me prevê a Convenção nº 88, da Organização Internacional do Trabalho - OIT.

Art. 2º - Será reconhecida pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalha-dor - CODEFAT, Comissão Estadual/Municipal de Emprego, instituída e definida comoum órgão ou instância colegiada, de caráter permanente e deliberativo, que observará oscritérios de funcionamento previstos nesta Resolução.

§ 1º - A Comissão de Emprego, de que trata esta Resolução, é considerada instânciasuperior em relação as Comissões Municipais que a ela estarão vinculadas, salvo emcasos excepcionais, por decisão conjunta do MTb/CODEFAT e Estados/Comissão.

§ 2º - É facultada a instituição de Comissão, por microrregião, ao nível municipal, quan-do for constatada a inviabilidade de sua instalação em cada município, de per se, face à

ANEXO: Resolução nº 801,de 19 de Abril de 1995

Regula o Programa de Seguro-Desemprego, oAbono Salarial, institui o Fundo de Amparo aoTrabalhador - FAT, e dá outras providências.

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realidade local, ou ante a necessidade do atendimento de interesses regionais.

Art. 3º. A Comissão, composta de no mínimo 6 (seis) e no máximo 18 (dezoito) mem-bros, constituída de forma tripartite e paritária, deverá contar com representação daárea urbana e rural, em igual número, de trabalhadores, de empregadores e do governo.[nova redação dada pela Resolução nº 114/1996]

§ 1º - Os representantes, titulares e suplentes, dos trabalhadores e empregadores serãoindicados pelas respectivas organizações, dentre as mais representativas, de comum acordocom o MTb/CODEFAT e com a Comissão Estadual quando se tratar de Comissão municipal.

§ 2º - Caberá ao Governo Estadual, do Distrito Federal e Municipal designar os seusrespectivos representantes, limitando a um por órgão que atue com a questão doemprego.

§ 3º - Ao Ministério do Trabalho e Emprego, representante do Governo Federal, caberáuma representação no âmbito estadual e do Distrito Federal e, ao Governo Estadual,uma representação no âmbito municipal. [nova redação dada pela Resolução nº 365/2003]

§ 4º. O mandato de cada representante é de até 3 anos, permitida uma recondução,observado o parágrafo 1º deste artigo. [nova redação dada pela Resolução nº 114/1996]

§ 5º - As instituições, inclusive as financeiras, que interagirem com as Comissões, pode-rão participar das reuniões, se convidadas, sendo-lhes facultado manifestar-se sobre osassuntos abordados, sem, entretanto, ter direito a voto.

Art. 4º - A Presidência da Comissão será exercida em sistema de rodízio, entre as banca-das do governo, dos trabalhadores e dos empregadores, tendo o mandato do Presidentea duração de 12 (doze) meses e vedada a recondução para período consecutivo.

§ 1º - A eleição do Presidente ocorrerá por maioria simples de votos dos integrantes daComissão.

§ 2º - Em suas ausências ou impedimento eventual, o Presidente da Comissão serásubstituído, automaticamente, por seu suplente.

§ 3º - No caso de vacância da Presidência, será eleito um novo presidente dentre os mem-bros representativos da mesma bancada, de conformidade com o caput deste artigo.

Art. 5º - Competirá à Comissão: [artigo e alíneas com nova redação dada pela Resoluçãonº 262/2001]

a) aprovar seu Regimento Interno, observando-se os critérios desta Resolução;

b) homologar o Regimento Interno das comissões instituídas no âmbito municipal ou

Anexo: Resolução 80, de 19 de Abril de 1995

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por microrregião;

c) subsidiar, quando solicitado, as deliberações do Conselho Deliberativo do Fundo deAmparo ao Trabalhador - CODEFAT;

d) propor aos órgãos executores das ações do Programa Seguro-Desemprego (Plano Naci-onal de Formação Profissional - PLANFOR, Intermediação de Mão de Obra - IMO, paga-mento do benefício do seguro desemprego), com base em relatórios técnicos, medidasefetivas que minimizem os efeitos negativos dos ciclos econômicos e do desempregoestrutural sobre o mercado de trabalho;

e) articular-se com instituições públicas e privadas, inclusive acadêmicas e de pesquisa,com vistas à obtenção de subsídios para o aperfeiçoamento das ações do Programa Segu-ro-Desemprego, executadas no âmbito do Sistema Nacional de Emprego, e dos Progra-mas de Geração de Emprego e Renda (PROGER Urbano e Rural, PRONAF, PROTRABALHOe PROEMPREGO);

f) promover o intercâmbio de informações com outras comissões estaduais, do DistritoFederal, bem como com as instituídas no âmbito municipal e por microrregião,objetivando, não apenas a integração do Sistema, mas também a obtenção de dadosorientadores de suas ações;

g) proceder ao acompanhamento da utilização dos recursos destinados à execução dasações do Programa Seguro-Desemprego e dos Programas de Geração de Emprego e Ren-da, no que se refere ao cumprimento dos critérios, de natureza técnica, definidos peloCODEFAT;

h) participar da elaboração do Plano de Trabalho do Sistema Nacional de Emprego, emarticulação com as comissões instituídas no âmbito municipal ou por microrregião, bemcomo proceder a sua aprovação e homologação, podendo propor alocação de recursos,por área de atuação;

i) aprovar, mediante parecer, o relatório das atividades descentralizadas, executadas noâmbito do Sistema Nacional de Emprego;

j) indicar, obrigatoriamente, à Secretaria Executiva do CODEFAT e às Instituições Finan-ceiras, as áreas e setores prioritários para alocação de recursos no âmbito do Programade Geração de Emprego e Renda;

l) avaliar a focalização das ações do Programa de Geração de Emprego e Renda, acompa-nhando os seus resultados e o cumprimento das diretrizes estabelecidas pelo CODEFAT,com vistas à constante melhoria do desempenho do Programa;

m) articular-se com entidades da rede de educação profissional, conforme definido noparágrafo 1º da Resolução CODEFAT 258/00, visando estabelecer parcerias que maximizemo investimento do FAT em programas de qualificação profissional, intermediação de

Anexo: Resolução 80, de 19 de Abril de 1995

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mão-de-obra, geração de emprego e renda e outras ações do sistema público de emprego;

n) aprovar e homologar o Plano Estadual de Qualificação, articulando e definindo priori-dades a partir das demandas das comissões municipais de emprego ou por microrregião,conforme estabelecido nos parágrafos 1º e 2º do artigo 3º da Resolução CODEFAT 258/00;

o) manifestar-se quanto ao cumprimento dos requisitos mínimos de qualificação técni-ca de entidades executoras de programas de qualificação profissional, quando de suacontratação direta, por dispensa ou inexigibilidade, conforme estabelecido no inciso Vdo artigo 5º e anexo I da Resolução CODEFAT 258/00;

p) acompanhar a execução físico-financeira das ações do PEQ, em articulação com ascomissões municipais de emprego ou por microrregião, manifestando-se sobre a obser-vância do objeto e o cumprimento de metas e cronograma do respectivo convênio.

q) criar, Grupo de Apoio Permanente (GAP), com composição tripartite e paritária, emigual número de representantes dos trabalhadores, dos empregadores e do governo, oqual poderá, a seu critério, constituir subgrupos temáticos, temporários ou perma-nentes, de acordo com as necessidades específicas. [alínea incluída pela Resoluçãonº 270/2001]

Art. 6º. A Secretaria Executiva da Comissão será exercida pela Coordenação Estadual doSINE e, no caso de Comissão Municipal, pelo órgão da prefeitura responsável pelaoperacionalização das atividades inerentes ao Sistema Nacional de Emprego, na locali-dade, a ela cabendo a realização das tarefas técnicas e administrativas. [nova redaçãodada pela Resolução nº 114/1996]

Art. 7º - Pela atividade exercida na Comissão, os seus membros, titulares ou suplentes,não receberão qualquer tipo de pagamento, remuneração, vantagens ou benefícios.

Art. 8º. As reuniões da Comissão serão realizadas no mínimo uma vez a cada trimestre,em dia, hora e local marcados com antecedência mínima de 7 (sete) dias, sendo precedi-da da convocação de todos os seus membros. [nova redação dada pela Resolução nº114/1996]

§ 1º - Caso a reunião ordinária não seja convocada pelo Presidente da Comissão, qual-quer membro poderá fazê-lo, desde que transcorridos 15 (quinze) dias do prazo previstoneste artigo.

§ 2º - As reuniões ordinárias da Comissão serão iniciadas com a presença de, pelo me-nos, metade mais um de seus membros.

Art. 9º - As reuniões extraordinárias poderão ocorrer a qualquer tempo, por convocaçãodo Presidente da Comissão ou de 1/3 de seus membros.

§ 1º - Para a convocação de que trata este artigo, é imprescindível a apresentação de

Anexo: Resolução 80, de 19 de Abril de 1995

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comunicado ao Secretário-Executivo da Comissão, acompanhado de justificativa.

§ 2º - Caberá ao Secretário-Executivo a adoção das providências necessárias à convoca-ção da reunião extraordinária, que se realizará no prazo máximo de 15 (quinze) diasúteis a partir do ato de convocação.

Art. 10 - As deliberações da Comissão deverão ser tomadas por maioria simples de votos,com “quorum” mínimo de metade mais um de seus membros, cabendo ao Presidentevoto de qualidade.

§ 1º - As decisões normativas terão a forma de Resolução, numeradas de forma seqüenciale publicadas no Diário Oficial.

§ 2º - É obrigatória a confecção de atas das reuniões, devendo as mesmas ser arquivadasna Secretaria Executiva, para efeito de consulta.

Art. 11 - Caberá aos Governos Estadual, do Distrito Federal e Municipal as providênciasformais para a constituição e instalação das Comissões de Emprego, encaminhando aoMTb/CODEFAT, para reconhecimento, uma cópia do ato de sua constituição e do Regi-mento Interno, publicados no Diário Oficial.

Parágrafo Único - O apoio e o suporte administrativos necessários para a organização,estrutura e funcionamento das Comissões, ficarão a cargo dos governos referidos nesteartigo, por intermédio das Unidades Estaduais do SINE.

Art. 12 - O MTb/CODEFAT prestará assessoramento à implantação da Comissão de Em-prego no âmbito estadual e do Distrito Federal e esta, por sua vez, procederá da mesmaforma em relação às Comissões Municipais.

Art. 13. É condição necessária para a transferência de recursos do FAT a existência deComissão Estadual de Emprego nos termos da presente Resolução. [nova redação dadapela Resolução nº 227/1999]

§ 1º - A transferência prevista neste artigo englobará o custeio de despesas a seremefetivadas pelo Estado com as atividades desenvolvidas pelos municípios, inerentes àsações de competência do Sistema Público de Emprego, observados os valores consolida-dos no Plano de Trabalho aprovado pelo MTb/CODEFAT.

§ 2º - Na ausência de convênio com o Estado, face à ocorrência de qualquer impedimen-to para a sua celebração, o MTb/CODEFAT poderá decidir sobre a transferência de recur-sos diretamente para o município.

Art. 14 - Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que já contarem com Comissõesou Conselhos deverão adequar-se aos critérios desta Resolução num prazo máximo de90 (noventa) dias, a partir de sua publicação.

Anexo: Resolução 80, de 19 de Abril de 1995

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Art. 15 - Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposi-ções em contrário.

Art. 16 - Os casos omissos e as dúvidas existentes quanto à aplicação desta Resoluçãoserão dirimidos pelo MTb/CODEFAT.

LUCIO ANTONIO BELLENTANI2

Presidente do CODEFAT

NOTAS:

1 A Resolução nº 80 foi escolhida como o texto-base para esta compilação pois traz umareedição completa do texto da Resolução nº 63 (ou seja, dispensa consulta ao texto da Reso-lução anterior, embora esta nunca tenha sido revogada). As demais resoluções limitaram-se aintroduzir alterações e, portanto, obrigam a consulta ao texto da Resolução nº 80. Assim,sendo, o presente documento apresenta o texto completo, a partir da Resolução nº 63 e comalterações introduzidas, pelo CODEFAT, através da Resolução nº 114, de 1º de agosto de1996; Resolução nº 227, de 9 de dezembro de 1999; Resolução nº 262, de 30 de março de2001; Resolução nº 270, de 26 de setembro de 2001, e Resolução nº 365, de 11 de janeirode 1990 (na verdade esta Resolução é do ano de 2003, mas está publicada, no site do MTE,com a data equivocada).

2 Tendo em vista que o presente documento foi elaborado tendo como base a Resolução nº80, preservou-se, aqui, a assinatura do presidente do CODEFAT à época. Os presidentes doCODEFAT à época de cada uma das Resoluções aqui compiladas foram:

· VALMIR DANTAS, Resolução nº 63, de 28 de julho de 1994

· ALENCAR NAUL ROSSI, Resolução nº 114, de 1º de agosto de 1996

· PAULO JOBIM FILHO, Resolução nº 227, de 9 de dezembro de 1999

· PAULO JOBIM FILHO, Resolução nº 262, de 30 de março de 2001

· FRANCISCO CANINDÉ PEGADO DO NASCIMENTO, Resolução nº 270, de 26 de setem-bro de 2001

· LOURIVAL NOVAES DANTAS, Resolução nº 365, de 11 de janeiro de 1990 (na verdadeesta Resolução é do ano de 2003, mas está publicada, no site do MTE, com a data equivo-cada).

. . .

Anexo: Resolução 80, de 19 de Abril de 1995

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