caminhos das práticas integrativas e complementares na...
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Caminhos das Práticas Integrativas e Complementares na APS
A partir de onde é saúde ou doença?
Claude Bernard (1813 – 1878). Fisiologista francês
A doença não representa
senão um estado quantitativamente diferente do estado de saúde, deixando de lhe ser oposto para se tornar excesso ou falta de alguma substância no organismo, dentro de uma visão determinista e mecanicista.
Paradigma Mecanicista
• Fouquet:
“estando a sensibilidade distribuída por doses em todas as partes orgânicas do corpo, cada órgão vive ou sente a seu próprio modo, e o concurso ou a soma dessas vidas particulares faz a vida em geral, da mesma forma que a harmonia, a simetria e o arranjo dessas pequenas vidas (‘petites vies’) fazem a saúde”.
Paradigma Vitalista
Georges Canguilhem (1904 – 1995)
“A doença não pode ser
compreendida apenas por meio das medições fisiopatológicas, pois quem estabelece o estado da doença é o sofrimento, a dor, o prazer, enfim os valores e sentimentos expressos pelo corpo subjetivo que adoece.”
Racionalismo vitalista antipositivista no século XX
O que é doença?
“ O diagnóstico canibaliza o cuidado.”
Angelmar Norman
“Não há normalidade. O que é natural é manter constante as constantes variações das constantes internas.”
Pioter Anokhin
O Sistema Funcional
Instabilidade do sistema, que pode resultar no seu aniquilamento, deterioração, ou adaptação
Definição de doença segundo Carillo Jr. – O Milagre da Imperfeição
Breve histórico
1980 – Resolução 1000 (CFM) – Reconhecimento da Homeopatia
1978 – Alma Ata: Saúde para todos
1986 – 8ª CNS – Bases do SUS e Recomendação da Homeopatia
na Saúde Pública 1988 – Constituição – Saúde: Direito de todos e dever do Estado 1990 – Regulamentação do SUS
1988 – Resolução 4/88 (CIPLAN) –
Regulamentação
1994 – Criação do PSF – mais tarde ESF
2008 - Portaria GM 154 – NASF
2006 – Portaria 648 - PNAB
1999 – Inclusão no SIASUS
2006 – Portaria 971 - PNPIC
2011 - Portaria 2488 – Nova PNAB
Revisão de diretrizes e normas para a constituição dos NASF - Preocupação da incorporação das práticas integrativas para a promoção da integralidade do cuidado -
Homeopatia
• Os avanços políticos não refletiram na incorporação das Práticas Integrativas junto à Estratégia Saúde da Família: – 810 homeopatas na rede pública
– Presença em 9 capitais (CNTS, 2008)
• No Rio de Janeiro, RJ: – Dados dispersos pelas Coordenações de Áreas de Planejamento
(CAPs), cada qual gerida por uma Organização Social de Saúde (OSS) distinta
– Nenhuma informação quanto à atuação de homeopatas no Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF)
– Impossibilidade de quantificar a produção de homeopatia – indisponibilidade do código do SIASUS nas versões de registro eletrônico da rede
Breve histórico
• Quais as possibilidades e limites do homeopata na Estratégia Saúde da Família (ESF)?
• O médico homeopata, por sua formação afeita à visão sistêmica e integral do sujeito, teria essa percepção sobre seu trabalho junto a ESF?
• O homeopata no NASF: matriciar a quem?
• Qual o papel político da homeopatia e demais práticas integrativas no contexto da APS?
Questões norteadoras
Integralidade do Cuidado
• Um novo paradigma, pois rompe com a fragmentação do sujeito – “[...] diferentemente de outros profissionais que acompanham o NASF, [...] o
homeopata, eu não vejo essa especificidade dele, então acho que ele é importante em diversos momentos do cuidado [...]” (Aline, Gestora NASF)
– Ayres, 2003: transcender a tecné e abarcar uma praxis de interação dialógica, mediada por saberes, objetivando o alívio do sofrimento
• Integralidade – “ [...] nessa perspectiva do individuo inserido dentro de um contexto social que
a gente vai buscar compreender a vida dessa pessoa, [...] sua história de vida, a sua história pregressa, [...] dos sintomas. [...] Então acho que se adequa perfeitamente ao modelo preconizado pela Estratégia Saúde da Família.” (Ametista, gestora presente na construção das PNPIC)
• Resolutividade – Lacerda, 2002: relação médico-paciente como fator de aderência ao
tratamento, satisfação dos pacientes e recuperação
– “[...] até na consulta que o homeopata ou o acumpunturista faz a gente perceber uma atenção maior, uma escuta do outro que não se resume a doença.” (Mirtes, Gestora NASF)
• Humanização – “Na medida em que você tem uma escuta qualificada, que você compreende
aquele indivíduo na sua totalidade, você garante um atendimento humanizado.” (Ametista, gestora presente na construção da PNPIC)
Integralidade do Cuidado
• Tensão entre o número de atendimentos X valorização da escuta – “O gestor não consegue compreender que para se fazer a homeopatia eu
necessito de 30min, 40min, 1 hora para atender o paciente.” (Margarida, gestora presente na construção da PNPIC)
• Necessidade de uma política que contemple uma abordagem centrada na pessoa, baseada na longitudinalidade e no vínculo – Ayres, 2003: atributo reconstrutor do cuidado, capaz de estabelecer
correlação entre as práticas assistenciais realizadas pelos serviços de saúde e a vida, dando origem a uma nova práxis, uma nova maneira de organizar os serviços [...], além da abertura a novos saberes.
Integralidade do Cuidado
Apoio Matricial
• Possibilidade de ampliar a atuação do especialista junto as equipes, buscando resolutividade – “No sentido da gente contar com poucos médicos, isso também é uma vantagem
do NASF; na medida em que ele dá um suporte a um número maior de equipes de saúde da família, ele consegue fazer essa interface.” (Ametista, gestora presente na construção da PNPIC)
• Trabalha não só na dimensão do atendimento médico, mas na promoção da saúde a partir da complexidade de suas determinações – Clínica Ampliada – “ [...] creio que a homeopatia ela tem potencial para prevenção de patologias na
medida em que você pode utilizar a homeopatia frente a alguns sintomas funcionais antes dessa doença surgir, antes do horizonte clínico [...] (Ametista, gestora presente na construção da PNPIC)
Apoio Matricial
• Desvalorização do papel do NASF pela macrogestão – “[...] existe uma dificuldade de profissional médico em relação a ofertas,
questão de, de valor de remuneração do mercado né, que a gente ainda não consegue.” (Aline, gestora do NASF)
– O médico, incluindo o homeopata, opta por trabalhar como médico de família
• Tensão paradigmática: prevalência do núcleo médico X campo do cuidado – “ [...] um médico de uma forma em geral, ele tá muito preso [...] ao
atendimento clínico [...] (Ametista, gestora presente na construção da PNPIC)
– “Existe uma resistência no matriciamento, pela própria formação que tiveram, e principalmente quando envolve profissional não-médico matriciando um profissional médico.” (Aline, gestora do NASF)
– “A gente ainda vê muito em relação ao preconceito de muitas especialidades médicas em relação a homeopatia [...]” (Aline, gestora do NASF)
Convergência dos Limites
• A maior limitante do exercício da homeopatia reside no paradigma hegemônico que fragmenta o cuidado
– Limite ao apoio matricial
– Limite à incorporação de outras racionalidades
Convergência das Possibilidades
• Apoio matricial proporcionando melhor resolutividade do cuidado
– Próximo a equipe de referência, compartilhando o cuidado
– Que incorpore a alteridade presente nas próprias equipes
• Integralidade do cuidado
– Presença do homeopata “na ponta” exercendo o cuidado diretamente na Atenção Primária
Caminhos das PICs
• O homeopata assume naturalmente a medicina de família por considerá-la como responsável pelo cuidado do indivíduo
• Apesar de presente na atenção primária o homeopata atuando como médico de família fica impossibilitado de exercer sua racionalidade – Inúmeras atribuições: acolhimento das demandas,
promoção, prevenção, vigilância
– Tempo de consulta limitado, como reflexo do paradigma hegemônico que fragmenta o cuidado
• O mesmo paradigma tensiona o NASF, não contemplando a necessária interdisciplinaridade e o convívio de saberes distintos a gerir o cuidado.
• Possibilidade do exercício da homeopatia com todas as garantias da PNPIC (tempo adequado de consulta e disponibilização da medicação), pelos médicos de família homeopatas, contemplando parte de seu trabalho prescrito – Matriciamento in loco de equipes vizinhas que
demandassem a homeopatia
• Papel do NASF como articulador dos diversos núcleos de saber presentes no território – Construção de redes locais de referenciação – O homeopata no NASF: orientação desta microrrede,
apoiando-a, discutindo processos com os profissionais das equipes e estabelecer fluxos
– Educação permanente
Caminhos das PICs
“Os mais inestimáveis tesouros são; a consciência
irrepreensível e a boa saúde. O amor a Deus e o
cuidado de si mesmo oferecem
uma; a homeopatia oferece a outra. Esta é a única e
elevada missão do médico: a de restabelecer a saúde do
enfermo, que é o que se chama curar (cuidar).”
Samuel Hahnemann, 1843