caderno de poesias
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“ En la lucha de clases
todas las armas son buenas
piedras, noches, poemas” (Paulo Leminski)
Caderno dePoesias
Executiva Nacional de Estudantes de Educação Física
A Executiva Nacional de Estudantes de Educação Física apresenta com
muita satisfação o seu primeiro Caderno de Poesias construído pelos estudantes
componentes do movimento estudantil de educação física e organizado pela gestão
2012/2013 da entidade.
O Caderno de Poesias da ExNEEF nasce da necessidade de produção de
materiais que dialoguem sobre a necessidade da transformação social com os
estudantes de educação física do Brasil por outras vias que não a de textos e
panfletos como o Jornalex e o Caderno de Debates.
A construção do material se dá também, a partir da compreensão de que as
expressões artísticas como a literatura e a poesias são manifestações da realidade
social que vivemos e que por consequência podem e devem assumir características
contestadoras e revolucionárias.
No atual momento histórico qual o capitalismo se desenvolve pela
degradação cada vez maior da vida humana e da natureza, pela crescente retirada de
direitos por contrarreformas ou cortes sucessivos de gastos sociais e pelo
aprofundamento das contradições como a fome e o desemprego, nos parece
essencial uma arte que se coloque na defesa da vida humana e não do capital, e da
liberdade de expressão como manifestação da individualidade humana perante o
autoritarismo e todas as formas de opressão.
Por conta disso, este caderno traz textos de intelectuais e militantes
conhecidos do campo da esquerda nacional e internacional como Bertolt Brecht,
Mario Benedetti e Mauro Iasi, como também poesias construídas por militantes do
próprio movimento estudantil de educação física, como forma de expressar a
necessidade de superação do atual modo de produzir e reproduzir a vida no qual
vivemos.
Assim, desejamos a todxs uma ótima leitura, que sirva como ferramenta de
reflexão para a transformação do mundo e de nós mesmos!
EDITORIAL
“ En la lucha de clases todas las armas son buenas piedras, noches, poemas”
(Paulo Leminski)
ESCADA(Adriano Donin Neto)
Não há poesia sem dor
Não há construção sem sofrimento
Sempre que escrevo sofro
Não há coração que não transborde
E olhos que não umedeçam
Vejo na dor uma ponta de coragem
Uma fagulha do que resta
Em minha alma errada
Quando grito, pasmem!
Me calam.
Quando espumo de raiva
E choro pelos outros, pasmem!
Chamam-me fraco.
Quando transbordam minhas veias de amor, pasmem!
Chamam-me sentimentalóide.
Quando peço mais calma e perdão, pasmem!
Riem.
Enquanto não se souber amar
E honestidade for sinônimo de fraqueza
Não há bem que vença
É na imundície que se criam os “porcos”
Os apáticos, os atônitos, os perdidos [como às vezes eu
Fazem parte do lodo que os “suínos” pisoteiam
Peço perdão aos animais pelas metáforas [são bem melhores que muitos
homens
Peço perdão aos oprimidos por ser tão fraco
Pois lhes ajudo em pouco
Ou em quase nada
Vejo
Naquele
Que está
Estático
Uma Escada
Para baixo
Homens percorrem os mananciais De diferenciado
E trancafiam enjauladode sua menteComo besta infantilizada e Entrevistam seu ego com
agressivamicrofones amplificadosComo massa passiva e silenteReassumem posições nas cadeiras
Como objeto inanimado que não estofadas da vidasenteOs homens sábios reavaliam suas
Todo sofrimento eloquenteposturasToda dor que se apresenteOs estúpidos avaliam as mentesNão há o direito de surtarPrescrevem de forma métrica e
Nem o de lhe apontar o dedointocável
Nem o de protestarSeus saberes científicos
Há o direito de calarDesumanizados -
De ser engolidodesumanizadores
Por essa propagando podreEis que protocolaram a vida
Essas mãos higienizadasDiagnosticaram a desrazão
Essa indústria destrutivaPrivatizaram a mente
Nós, que vivemos comendo o Sucumbiram a loucura
estrumeCortaram, assim como nos
A bosta podre que Prometeu comiacanaviais
Do corvo que lhe dilacerava o Que depois de queimados
fígadoSe arremetem aos facões afiados
Não podemos esperar acorrentadosFeito os filhos finados de famílias
Que Hércules venha nos salvarfamigeradas
Rasgue a camisa de forçaPrenderam o diferente
Tire esse discurso vomitado da E lhe meteram goela abaixo
bocaToda medicina
Seja humanoE suas filhas, criadas para
Viva e morrasubmissão
Todo santo diaTravestidas de jalecos brancos
Só não mateQue pipoqueiros também usam
A vida dos outrosPorém com menos arrogância
Chamam o diferente produtivo
(Adriano Donin Neto)
2 53
PRIVATIZAÇÃO DAS MENTES
Há quem viva numa fila
Há quem viva numa fila esperando...
Há quem não precise esperar...
Desconstruo minha aversão à fila, vou tentar...
Pois sou criança, e burlo fila desde pequeno porque não a
entendo
sequer a
compreendo
Educo você para sair da fila,
Para que vejas o que está mais para lá...
Experimentes
Educo você para respeitá-la,
Para futuramente não sofrer represálias
Para alinhar-se
Não gosto de filas!
Mas posso amá-las, porque nelas encontro
PESSOAS
PESSOAS que sofrem represálias
PESSOAS que vivem “isoladas”
PESSOAS que têm a seus semelhantes, muitos tão diversos...
Essas PESSOAS ainda possuem a força para arrancar pela
raiz
para semear muito mais que
ordem e progresso.
(Ricardo Wareja)Esperança de Mãe
Na insensatez de um modo (Capitalista)
Armas dilaceram e anestesiam...
Um mar de homens e mulheres
crianças e jovens
famílias!
Num abraço fraterno (de mãe)
Sinto e vejo a realidade de quem perdeu
sonhos
E tem juntas enrijecidas.
Mas que não deixa de amar,
De pingar na mão do filho estudante o suor
do laborar...
E tal modo o filho estudante passa a
questionar!
(Ricardo Wareja)
4 33
Homens me notam eu lhes apresento as mulheres
de e conquistei muitas admirações
Antenasnão por ser fútil,
que não seremos influenciadasmas por ser guerreira de
discurso útil não seremos mais oprimidas
estamos antenadas
pode me achar linda e atraente
por qualidades físicas ou o que reconstruindo formas de
carrego na mente pensamento
deixo transparecer meu gênio ensinando a verdade desde a
impreciso escola
mas a única curva que você que não existe atividades ou
deve admirar é a do meu sorriso brincadeiras separadas
menino também tem boneca e
menina também joga bolapreconceito e opressão
foram passados desde sempre
lugar de mulhersexo frágil?
é onde ela quiserúnico "frágil" carrego em meu
ventre sou Sargenta do meu tanque
me entrego sempre, em lágrimas,
suor e sangue"atrás de um grande homem há
uma grande mulher"
dizer completamente errado eu tenho de me expressar na
cama e fora delanão é passar pra frente ou para
traz, estar à cima, à baixo pedir e exigir o que quero, ser
do nosso jeitoé ser respeitada e caminhar ao
seu lado. não seja machista, seja homem
pois o que mais me atrai é o seu
respeitosou de luta, sou de guerra
e estou me posicionando apenas
não pense que paramos no
tempo
e ainda somos mulheres de
Atenas
(Pedro Santos)
Nos corredores e vielas
Ainda ocorrem ofensas, desgastes e constrangimentos
Rugidos como bravos leões e fogo como grandes dragões
Nos becos e frente a portas
Ignora-se a paz e o espaço de aprendizado
Com censura de palavras e outras sendo cuspidas mais bravas
Nas ruas e nas escolas
A destruição e apreensão de material
Disputa de poder por ódio de quem deveria nos proteger
Falso corajoso, usando sua autoridade
Para desqualificar os demais
E só realizar a sua própria vontade...
Impedindo o debate e a voz
E quem quer construir uma nova universidade
Dos que sempre estendem a mão, e são estapeados por lutarem
por uma outra formação
Que a vida vai além do capital
Que não se deve arrancar as flores
Não se deve destruir a arte de um cartaz, que o melhor para
todos, não é ditado só por um rapaz
Ainda acredito que isso possa ser superado
Esquecendo o egoísmo e a vaidade de querer ser superior
Se ainda temos algo em comum é o que sentimos pela escola o
mesmo amor.
MULHERES(Pedro Santos)
CARTAZES
4 33
A madrugada é como se fosse o passado
O clima nostálgico do seu silêncio escuro
É o momento que olhamos pra trás e aprendemos com
nossos erros
Que paramos de dar com a cara no muro
É quando temos a história na mão para construirmos a
base
É o tempo de liminaridade
Até que o sol rompa com a barra do horizonte, permitindo
ver o que antes não se via
A madrugada é quem antecede o dia
O dia é como se fosse o presente
Momento que o sol aparece
Brilhando pra alguns
Servindo apenas quem lhe interesse
É o momento que solidificamos a base
Que lutamos por um mundo melhor
Embaixo de sol quente, derramando muito suor
Fazendo que a teoria, com a prática se case
Já a noite... a noite é como se fosse o futuro
Momento que o presente não parece ser tão duro
Com todo seu encanto e mistério
Com toda sua beleza e possibilidades
Estrelas? Aos Milhares
Olhando pra elas é que temos certeza que o futuro é nosso
Que podemos transformar
Acredito que podemos, porque podemos SONHAR!
(Rian Rodrigues)
Quando ele nasceu
ela só queria ser mãe.
Quando ele deu seu primeiro passo
ela só queria ampará-lo.
Quando ele falou
ela só queria escutá-lo.
Quando ele cresceu
abriu-se nela um abismo.
Quando ele se tornou comunista
ela só queria persuadi-lo.
Quando a ditadura o levou
ela só queria morrer.
Quando ele desapareceu
ela só queria encontrá-lo.
Quando a noite engoliu seu corpo
ela só queria reinventar o dia
e acreditar que tudo era mentira.
Passou a gritar as luzes
nos necrotérios e nos quartéis
nos tribunais e repartições
nos comitês e nas reuniões
nas praças e nas ruas.
E quando comia o pão da amargura
e bebia o vinho da ausência,
enquanto aprendia a dura pedagogia
da militar prepotência,
nem percebeu a metamorfose
que acontece naqueles que buscando os outros
encontram a si mesmos:
Hoje ela não quer mais
nem a bandeira da tristeza
nem a impossibilidade da alegria,
ela agora só quer
aquilo que seu filho queria.
A ANALOGIA TEMPORAL(Mauro Iasi)
METAMORFOSE DE MÃE
2 53
As flores da primavera não foram embora
O inverno demora e não mata mais
Crianças na escola
Aos professores agora
Respeito demais
O sol aquece e brilha pra todos
Os espinhos aos poucos
Não ferem mais
Pessoas nas ruas
as vidas são suas
Vivemos em tempos de paz
Às vezes não acredito
Em tamanha felicidade
O tempo deixou marcas
Tempos de perversidade
Mas sempre que vejo o sorriso de uma criança
Lembro-me do forte desejo de mudança que nos
preenchia
O povo que nada tinha e o muito que a poucos
pertencia
Hoje não tenho mais medo desse tempo voltar
Porque sei que foi o povo trabalhador
Que se organizou, lutou e os tirou de lá.
(Rian Rodrigues)
Nem tudo tem sua hora
Nem sempre a vida é agora
A vida é sem hora
Vai com o vento
A vida é senhora do tempo
Num momento demora
No outro, devora
Mas se o vento não sopra
Façamos a vida nós mesmos.
TEMPOS DE PAZ SENHORA DO TEMPO(Rian Rodrigues)
6 13
Oh Juventude, cadê tu?
Por onde anda tua vontade de mudar?
Parece que o espírito revolucionário se
escondeu!
Estamos nas ruas?
Fazendo o que?
Nos rendendo aos “sonhos” consumíveis?
Ou se tornando passíveis diante da barbárie?
Não há onde se esconder!
Os fatos nos demonstram cada vez mais que...
Ou Lutamos ou perdemos!
Chega de agüentar a imposição!
Basta de viver imerso na ilusão da passividade!
Os tempos estão mudando...
Precisamos tomar nossa posição!
Está na hora do escondido aparecer!
E que os que nos impõem sintam medo!
Por que a Juventude reaparecerá!
Com força e vontade de lutar!
A mudança é inevitável!
(luiz carlos machado)
Crescemos lado a lado, mas distantes.
Compartilhando sentimentos, felicidades e frustrações,
e por nossos temperamentos parecidos, calados.
Mas engana-se aquele que acha que nosso silencio é
sinônimo de tristeza!
Sei, mais que antes, que compartilho com você o sonho de
um mundo melhor!
Diferenças existem, e qual o problema? Nenhum!
Pois, como dizia Maiakovski... onde tudo é aceito, desconfio
que não há amor.
Trilhamos caminhos diferentes, aprendemos coisas
diferentes
construímos nossas personalidades, construímos nossas
vidas.
Mas vejo que nossos caminhos se cruzam, o tempo todo,
e sei, que estamos juntos, em algum momento, na mesma
estrada.
Não sei o que pensam ao meu respeito, e não ligo para o
que pensam,
mas queria que soubessem que sou movido por vocês,
eu sou o que vocês são, e você é uma parte de mim.
Sonhos são reais a medida que mais pessoas sonham juntas,
meu desejo é que seus sonhos sejam os sonhos de muitas
pessoas,
e a medida que se torne real, o mundo mude,
e que a partir disso possamos chamar a todos de irmãos,
irmão.
CADÊ A JUVENTUDE? UM CHAMADO... IRMÃO(Luiz Carlos Machado)
0 73
Tem uma Vila Autodromo no meio do
caminho,
no meio do caminho tem uma Vila Autodromo,
e não está passivo quem lá se encontra,
acordam todos os dias com vontade de lutar.
Querem remover a pedra no meio do caminho,
mas, a pedra é viva e resistente,
quanto mais a golpeam e tentam remove-la,
mais ela cresce e se solidifica.
Tem uma Vila Autodromo no meio do
caminho,
e lá ela permanecerá,
pois, quando é um privilégio poder morar,
a nossa tarefa é resistir e ocupar!
(luiz carlos machado)
Quando a noite parece eterna
e o frio nos quebra a alma.
Quando a vida se perde por nada
e o futuro não passa de uma promessa.
Nos perguntamos: vale a pena?
Quando a classe parece morta
e a luta é só uma lembrança.
Quando os amigos e as amigas se vão
e os abraços se fazem distância.
Nos perguntamos: Vale a pena?
Quando a história se torna farsa
e outubro não é mais que um mês.
Quando a memória já nos falta
e maio se transforma em festa.
Nos perguntamos: vale a pena?
Mas, quando entre camaradas nos encontramos
e ousamos sonhar futuros.
Quando a teoria nos aclara a vista
e com o povo, ombro a ombro, marchamos.
Respondemos: vale a pena viver,
quando se é comunista.
UMA VILA AUTODROMO NO MEIO DO CAMINHO “VALE A PENA VIVER, QUANDO SE É COMUNISTA”.
ANTONIO GRAMSCI (Mauro Iasi)
8 92
“Há hora de somar Não mais em nosso nome!
E hora de dividir. Não mais nosso suor, o teu
descanso.Há tempo de esperar
Não mais nosso sangue, tua E tempo de decidir.vida.Tempos de resistir.
Não mais nossa miséria, tua Tempos de explodir.riqueza.Tempo de criar asas, romper as
Tempos de dizercascasQue não são tempos de calarPorque é tempo de partir.
Diante da injustiça e da Partir partido,mentira.Parir futuros,
É tempo de lutarPartilhar amanheceresÉ tempo de festa, tempo de Há tanto tempo esquecidos.
cantarLá no passado tínhamos um As velhas canções e as que futuro
ainda vamos inventar.Lá no futuro tem um presenteTempos de criar, tempos de Pronto pra nascer
escolher.Só esperando você se decidir.
Tempos de plantar os tempos Porque são tempos de decidir,
que iremos colher.Dissidiar, dissuadir,
É tempo de dar nome aos bois,Tempos de dizer
De levantar a cabeçaQue não são tempos de esperar
Acima da boiada,Tempos de dizer:
Porque é tempo de tudo ou Não mais em nosso nome!
nada.Se não pode se vestir com
É tempo de rebeldia.nossos sonhos
São tempos de rebelião.Não fale em nosso nome.
É tempo de dissidência.Não mais construir casas
Já é tempo dos corações Para que os ricos morem.
pularem fora do peitoNão mais fazer o pão
Em passeata, em multidãoQue o explorador come.
Porque é tempo de dissidência
É tempo de revolução”
(Mauro Iasi)
Oxigênio Enfrenta sempre mais
que te quero e prepara-te imbecil
pleno para as batalhas pacato
In-tensão cotidianas passivo
total de dessa luta de classes INTIMIDADO!!!
músculos e nervos
inconclusa Rompe, rasga
Rigidez quase absoluta desrespeita a ti e a
- Que puta luta falar !! Empenha-te quem mais se oponha
Expressar ódios em nessa luta, subverte,
repouso Filho da puta! esses valores
repulsas e medo em Precisamos de você que nunca
desordem foram teus.
Leve Explode
Buscar iguais !! solto tua jugular
militante e como que rompendo
Ar - far e dirigente hidrelétricas
em - frentar caudaloso
as intimidações, de quadros e não e feliz
Intimidá-las molduras FALE
De massas, dos sonhos,
Guerra aos inimigos mas falante pelos que juntos
das falas mansas transformaremos
e aos oradores cotovelos em planos de ação.
vazios. aos borbotões
Abarrotados
Guerra aos inimigos pleno de sonhos de táticas e estratégias
externos e internos planos e tomemos de assalto
impostos e aceitos, o amanhã e suas
sempre a espreita convicções generosas criaturas
de qualquer tentativa revolucionárias de falas livres e
tua. ouvidos previlegiados
Cala a boca
Pisa na garganta já morreu, quem manda
dos que selam as bocas na minha boca , sou eu
Assalta e o prazer
Grita de transformar os homens
Esperneia e suas relações
tuas inquietações
Pratica
Tua indignação teu último ensaio.
frente a tanta injustiça Pois a burguesia
mas feita de silêncios tão recria
repletos. formas & jeitos
de te fazer
DISSIDÊNCIA OU A ARTE DE DISSIDIAR CALA A BOCA JÁ MORREU(Luiz Carlos Scapi)
8 92
Todo mandato é minucioso
e cruel
eu gosto
das frugais transgressões
por exemplo inventar o bom
amor
aprender
nos corpos e em seu corpo
ouvir a noite e não dizer
amem
traçar
cada um o mapa de sua audácia
mesmo que nos esqueçamos
de esquecer
é certo
que a recordação nos esquece
obedecer cegamente deixa
cego
crescemos
somente na ousadia
só quando transgrido alguma
ordem
o futuro
se torna respirável
todo mandato é minucioso
e cruel
eu gosto
das frugais transgressões
(Mario Benedetti)
Mi táctica es
mirarte
aprender como sos
quererte como sos
Mi táctica es
hablarte
y escucharte
y construir con palabras
un puente indestructible
Mi táctica es
quedarme en tu recuerdo
no se como, ni se
con qué pretexto
pero quedarme en vos
Mi táctica es
ser franco
y saber que sos franca
y que no nos vendamos
simulacros
para que entre los dos
no haya telón
ni abismos
Mi estrategia es
en cambio más profunda y más simple
mi estrategia es que un día cualquiera no se como, ni
se
con qué pretexto
por fín me necesites.
TRANSGRESSÕES TACTICA Y ESTRATEGIA (Mario Benedetti)
0 71 2
Desconfiai do mais trivial ,
na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece
habitual.
Suplicamos expressamente:
não aceiteis o que é de hábito como coisa
natural,
pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada, de arbitrariedade
consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural nada deve
parecer impossível de mudar.
I II
Eu vivo em tempos sombrios. Eu vim para a cidade no tempo da
Uma linguagem sem malícia é sinal de desordem,
estupidez, quando a fome reinava.
uma testa sem rugas é sinal de Eu vim para o convívio dos homens no
indiferença. tempo
Aquele que ainda ri é porque ainda não da revolta
recebeu a terrível notícia. e me revoltei ao lado deles.
Que tempos são esses, quando Assim se passou o tempo
falar sobre flores é quase um crime. que me foi dado viver sobre a terra.
Pois significa silenciar sobre tanta Eu comi o meu pão no meio das batalhas,
injustiça? deitei-me entre os assassinos para dormir,
Aquele que cruza tranqüilamente a rua Fiz amor sem muita atenção
já está então inacessível aos amigos e não tive paciência com a natureza.
que se encontram necessitados? Assim se passou o tempo
É verdade: eu ainda ganho o bastante que me foi dado viver sobre a terra.
para viver. III
Mas acreditem: é por acaso. Nado do que Vocês, que vão emergir das ondas
eu faço em que nós perecemos, pensem,
Dá-me o direito de comer quando eu quando falarem das nossas fraquezas,
tenho fome. nos tempos sombrios
Por acaso estou sendo poupado. de que vocês tiveram a sorte de escapar.
(Se a minha sorte me deixa estou perdido!) Nós existíamos através da luta de classes,
Dizem-me: come e bebe! mudando mais seguidamente de países
Fica feliz por teres o que tens! que de
Mas como é que posso comer e beber, sapatos, desesperados!
se a comida que eu como, eu tiro de quem quando só havia injustiça e não havia
tem fome? revolta.
se o copo de água que eu bebo, faz falta a Nós sabemos:
quem tem sede? o ódio contra a baixeza
Mas apesar disso, eu continuo comendo e também endurece os rostos!
bebendo. A cólera contra a injustiça
Eu queria ser um sábio. faz a voz ficar rouca!
Nos livros antigos está escrito o que é a Infelizmente, nós,
sabedoria: que queríamos preparar o caminho para a
Manter-se afastado dos problemas do amizade,
mundo não pudemos ser, nós mesmos, bons amigos.
e sem medo passar o tempo que se tem Mas vocês, quando chegar o tempo
para em que o homem seja amigo do homem,
viver na terra; pensem em nós
Seguir seu caminho sem violência, com um pouco de compreensão.
pagar o mal com o bem,
não satisfazer os desejos, mas esquecê-los.
Sabedoria é isso!
Mas eu não consigo agir assim.
É verdade, eu vivo em tempos sombrios!
NADA É IMPOSSÍVEL DE MUDAR AOS QUE VIRÃO DEPOIS DE NÓS (Bertolt Brecht)(Bertolt Brecht)
6 12 1
Eis minhas mãos: Enganam-se os que crêem Cavalgarei estrelas
não tenho porque esconde- que as estrelas nascem ainda que passageiras
las, prontas. pois não almejo tê-las
ainda que, por teimosia, São antes explosão em frio metal
tragam verrugas nos dedos brilho e ardência ou descartável plástico.
por apontar estrelas. imprecisas e virulentas
Este é o nosso ofício: herdeiras do caos Simplesmente delas anseio
cavalgar verdades cadentes, furacão na alma roubar a luz e o calor
eternos/caducos presentes calma na aparência. sentir o vento fértil de seu
que comem a si mesmos rastro
mastigando seus próprios Enganadoras aparências… tocar, indecente,
dentes. meu sextante no seu astro
Extintas, brilham ainda: na certeza do movimento
Assim são estrelas: Mortas no universo ainda que lento, que corta
tempo que tece a própria a noiteresistem na ilusão da teia retina. desde a aurora dos tempos.
que o atrela, cavalo que
cavalga Velhas super novas Eis aqui minhas mãos:a própria sela. pontuam o antes nada não tenho receio de mostra-
las,na mentira da visão Distanciamento repentina. antes com verrugas que
Objeto em bolsos guardadas.
Estranhamento Sim
Espera são infiéis e passageiras. Eis minhas verrugas,
como pintor ensandecido Mas poupem-me os orgulho-me em tê-las,
que reprova a própria tela. conselhos, é parte do meu ofício
não excluo os amores de construtor de estrelas.
Este é o nosso ofício, por medo de perdê-los.
este é o nosso vício. Gastarei as verrugas
Cego enlouquecido, Os que amam as estrelas na lixa da prática,purasvisão por trevas tomada queimarei as verrugastão precisamente insiste em apontar estrelas com o ácido da críticadesenhadasmesmo em noites nubladas. e aprenderei com as marcasfazem para si mesmos que as estrelas se fazem ao estrelas finamente Ainda que seja por nada fazê-lasacabadas.insisto em aponta-las por isso são estrelas.
mesmo sem vê-lasTão perfeitas e irreaiscom a certeza que mesmo que não brilham por si nas trevasmesmasescondem-se estrelas.nem se sustentam fora das
bandeiras
e do branco firmamento dos
papéis.
Assim se constroem estrelas
puras
sem os riscos de verrugas.
(Mauro Iasi)
"Do rio que tudo arrasta se
diz que é violento
Mas ninguém diz violentas as
margens que o comprimem”
SOBRE O OFÍCIO DE CONSTRUIR ESTRELAS E OS RISCOS DAS VERRUGAS DA VIOLÊNCIA (Bertolt Brecht)
2 51 2
Como sei pouco, e sou pouco,
faço o pouco que me cabe
me dando inteiro.
Sabendo que não vou ver
o homem que eu quero ser.
Já sofri o suficiente
para não enganar a ninguém:
principalmente aos que sofrem
da própria vida, a garra da opressão,
e nem sabem.
Não, não tenho o sol escondido
no meu bolso de palavras.
Sou simplesmente um homem
para quem já a primeira e
desolada pessoa do singular
– foi deixando, devagar, sofridamente,
de ser para transformar-se,
- muito mais sofridamente –
na primeira e profunda pessoa do plural.
Não importa que doa:
é tempo de avançar de mão dada
com quem vai no mesmo rumo,
mesmo que longe ainda esteja
de aprender a conjugar o verbo amar.
É tempo sobretudo de deixar de ser apenas
a solitária vanguarda de nós mesmos.
Se trata de ir ao encontro.
(Dura no peito, arde a límpida verdade de nosso erro.)
Se trata de abrir o rumo.
Os que virão, serão povo, e o saber serão, lutando.
(Thiago Melloi)
Sempre que o nosso casaco se rasga
vocês vêm correndo dizer: assim não pode ser;
isso vai acabar, custe o que custar!
Cheios de fé vão aos senhores
enquanto nós, cheios de frio, aguardamos.
E ao voltar, sempre triunfantes,
nos mostram o que por nós conquistam:
Um pequeno remendo.
Ótimo, eis o remendo.
Mas onde está
o nosso casaco?
Sempre que nós gritamos de fome
vocês vêm correndo dizer: Isso não vai continuar,
é preciso ajudá-los, custe o que custar!
E cheios de ardor vão aos senhores
enquanto nós, com ardor no estômago, esperamos.
E ao voltar, sempre triunfantes,
exibem a grande conquista:
um pedacinho de pão.
Que bom, este é o pedaço de pão,
mas onde está
o pão?
Não precisamos só do remendo,
precisamos o casaco inteiro.
Não precisamos de pedaços de pão,
precisamos de pão verdadeiro.
Não precisamos só do emprego,
toda a fábrica precisamos.
E mais o carvão.
E mais as minas.
O povo no poder.
É disso que precisamos.
Que tem vocês
a nos dar?
PARA OS QUE VIRÃO CANÇÃO DO REMENDO E DO CASACO(Bertolt Brecht)
4 32 1
A injustiça avança hoje a passo firme.
Os tiranos fazem planos para dez mil anos.
O poder apregoa: as coisas
continuarão a ser como são.
Nenhuma voz além da dos que mandam.
E em todos os mercados proclama a exploração:
Isto é apenas o meu começo.
Mas entre os oprimidos muitos há que agora dizem:
Aquilo que nós queremos nunca mais o alcançaremos.
Quem ainda está vivo nunca diga: nunca.
O que é seguro não é seguro.
As coisas não continuarão a ser como são.
Depois de falarem os dominantes, falarão os
dominados.
Quem pois ousa dizer: nunca?
De quem depende que a opressão prossiga? De nós.
De quem depende que ela acabe? De nós.
O que é esmagado, que se levante!
O que está perdido, lute!
O que sabe e o que se chegou, que há aí que o retenha?
Porque os vencidos de hoje são os vencedores de
amanhã.
E nunca será: ainda hoje.
O pior analfabeto
é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala,
nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo da vida,
o preço do feijão, do peixe, da farinha,
do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político
é tão burro que se orgulha
e estufa o peito dizendo
que odeia a política.
Não sabe o imbecil que,
da sua ignorância política
nasce a prostituta, o menor abandonado
e o pior de todos os bandidos:
O político vigarista,
pilantra, corrupto e lacaio
das empresas nacionais e multinacionais.
ELOGIO DA DIALÉTICA O ANALFABETO POLÍTICO(Bertolt Brecht)(Bertolt Brecht)
4 31 2
I Sem lhe importar saber o que é
Diz ele que não sei ler desporto.
Isso que tem? Cá na aldeia
Não se arranjam dúzia e meia VI
Que saibam ler e escrever. Interessa é ganhar de qualquer
maneira.
II Enquanto em campo o dever se
P'ra escolas não há bairrismo, atropela,
Não há amor nem dinheiro. Faz-se outro jogo lá na
Por quê? Porque estão primeiro bilheiteira,
O Futebol e o Ciclismo! Que enche os bolsinhos aos que
vivem dela.
III
Desporto e pedagogia VII
Se os juntassem, como irmãos, Convém manter o Zé bem
Esse conjunto daria, distraído
Verdadeiros cidadãos! Enquanto ele se entrega à
Assim, sem darem as mãos, diversão,
O que um faz, outro atrofia. Não pode ver por quantos é
comido
IV E nem se importa que o comam,
Da educação desportiva, ou não.
Que nos prepara p'ra vida,
Fizeram luta renhida VIII
Sem nada de educativa. E assim os ratos vão roendo o
queijo
V E o Zé, sem ver que é palerma,
E o povo, espectador em altos que é bruto,
gritos, De vez em quando solta o seu
Provoca, gesticula, a direito e bocejo,
torto, Sem ter p'ra ceia nem pão, nem
Crendo assim defender seus conduto.
favoritos
Estuda o elementar: para aqueles
cuja hora chegou
não é nunca demasiado tarde.
Estuda o abc. Não basta, mas
Estuda. Não te canses.
Começa. Tens de saber tudo.
Estás chamado a ser um dirigente.
Freqüente a escola, desamparado!
Persegue o saber, morto de frio!
Empunha o livro, faminto! É uma arma!
Estás chamado á ser um dirigente.
Não temas perguntar, companheiro!
Não te deixes convencer!
Compreende tudo por ti mesmo.
O que não sabes por ti, não o sabes.
Confere a conta. Tens de pagá-la.
Aponta com teu dedo a cada coisa
e pergunta: "Que é isto? e como é?"
Estás chamado a ser um dirigente.
DESPORTO E PEDAGOGIA LOUVOR AO ESTUDO(Bertolt Brecht)(Antonio Fernandes Aleixo)
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Derruba uma floresta esmaga cem
Homens,
Mas tem um defeito
- Precisa de um motorista
O vosso bombardeiro, general
É poderoso:
Voa mais depressa que a tempestade
E transporta mais carga que um elefante
Mas tem um defeito
- Precisa de um piloto.
O homem, meu general, é muito útil:
Sabe voar, e sabe matar
Mas tem um defeito
- Sabe pensar
Quem construiu Tebas, a das sete portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as pedras?
Babilònia, tantas vezes destruida,
Quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas
Da Lima Dourada moravam seus obreiros?
No dia em que ficou pronta a Muralha da China para onde
Foram os seus pedreiros? A grande Roma
Está cheia de arcos de triunfo. Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os Césares? A tão cantada Bizâncio
Sò tinha palácios
Para os seus habitantes? Até a legendária Atlântida
Na noite em que o mar a engoliu
Viu afogados gritar por seus escravos.
O jovem Alexandre conquistou as Indias
Sòzinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos
Quem mais a ganhou?
Em cada página uma vitòria.
Quem cozinhava os festins?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?
Tantas histórias
Quantas perguntas
O VOSSO TANQUE GENERAL, É UM CARRO FORTE PERGUNTAS DE UM OPERÁRIO QUE LÊ(Bertolt Brecht)(Bertolt Brecht)
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"Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua
hora de amar e seu direito de pensar.
É da empresa privada o seu passo em
frente,
seu pão e seu salário. E agora não contente
querem
privatizar o conhecimento, a sabedoria,
o pensamento, que só à humanidade
pertence."
”o futuro se aproxima / devagar / mas vem / hoje
está mais além / das nuvens que escolhe / e mais
além do trovão / e da terra firme / demorando-se
vem / qual flor desconfiada / que vigia ao sol /
sem perguntar-lhe nada / iluminando vem / as
últimas janelas / lento mas vem / o futuro se
aproxima / devagar / mas vem / já se vai
aproximando / nunca tem pressa / vem com
projetos / e sacos de sementes / com anjos
maltratados / e fiéis andorinhas / devagar mas
vem / sem fazer muito ruído / cuidando sobretudo
/os sonhos proibidos / as recordações dormidas / e
as recém-nascidas / lento mas vem / o futuro se
aproxima / devagar / mas vem / já quase está
chegando / com sua melhor notícia / com punhos
com olheiras / com noites e com dias / com uma
estrela pobre / sem nome ainda / lento mas vem o
futuro real / o mesmo que inventamos / nós
mesmos e o acaso / cada vez mais nós / mesmos / e
menos o acaso / lento mas vem / o futuro se
aproxima / devagar / mas vem / lento mas vem /
lento mas vem / lento mas vem /”.
PRIVATIZADO O FUTURO SE APROXIMA(Mario Benedetti)(Bertolt Brecht)
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Nasci num continente cortava o ar em cruz, o e uma semente no seu São olhos de Camilo,
perdão era dado olhoque olhava para o chão são olhos de Havana,
ou o infeliz executado. que chamou dignidade.Pupilas perdidas na terra, é meu olho no teu rosto
na relva, nas raízes, que outro olho reclama.
Gracias señor O deus-patrão nos alerta:na pedras da
humilhiação pelo pão, pelo castigo "Não olhem nestes olhos O veneno me tomou
pela morte, pelo destino. de serpente peçonhenta, e já posso ler no chão,
Nasci num continente é praga que alastra onde antes era vergonha
que olhava para o chão. Nasci num continente e destrói tua colheita." leio agora Revolução
Olhava e não via que olhava para o chão.
seu rosto mutilado Mas um dia leu ali "Não olhem nestes olhos Já viram as fotos de Che
no rosto de seu irmão entre ossos calcinados que se rebela a harmonia, morto?
o verbo de seu sangue seco é o fim da religião, da Seus olhos permanecem
casa abertosPerguntava e não ouvia pelo povo derramado.
e da família." olhando sereno o céuseu canto entrecortado.
do continente onde nasci.Numa surdez medonha Leu nos olhos simples
Mas são olhos tão simples,o velho chão só respondia: Nas águas dos regatos.
úmedos de dor e Alturas, depois de Che,vergonha No suor vertido em braçosesperança. meu povo não teme vê-las,Pelo povo explorado.São olhos tão brilhantes meu continente hoje leva Si señor, no señor...com olhos de criança. os olhosLeu ali o seu espanto
até o brilho das estrelas.Com o perdão da palavra nas pedras reviradasSão olhos de Marti,a palavra era culpada. nas raízes descobertassão olhos de Sandino,Um deus patrão com mãos pelo povo rebelado.são olhos das montanhasrecém-lavadas
que nos mostram o Guardou, então, no seu caminho.caderno de terra
a gramática revelada
OS OLHOS DO CONTINENTE (Mauro Iasi)
para o Comandante Che Guevara
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