breve historia dos judeus no brasl

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    BREVE HISTORIA DOS JUDEUS NO BRASL

    SALOMO SEREBRENICK

    INTRODUO

    A histria dos judeus no Brasil constitui um caso nico; pois de nenhum outropas se pode dizer que nele os judeus tenham vivido ao longo de toda a suaexistncia, contribuindo substancialmente para o seu desenvolvimentoeconmico e social.

    De fato, desde o descobrimento do pas - evento este do qual participaram,tendo inclusive ajudado nos seus preparativos - at a poca presente, os

    judeus, quase sem intermitncia, aberta ou disfaradamente, estiveramintegrados nos processos de formao da nacionalidade.

    Isso no obstante, vale dizer, embora os judeus tenham representadocontinuamente uma parcela da sociedade, a sua histria no acompanhasimplesmente a do Brasil. Longe de um esperado paralelismo, o que severifica a existncia de inmeros desvios e meandros, os quais no raroatingem o grau de contraste.

    guisa de exemplo, mencione-se o perodo da ocupao holandesa, que,traduzindo um fracasso para o pas, constituiu, entretanto, o ponto mais alto dodesenvolvimento da coletividade judaica local, dando-se o inverso com a fasesubseqente, quando, aps a expulso dos invasores, sobreveio adecomposio, o xodo e a disperso dos judeus do Brasil.

    Semelhantemente, as intensas perseguies religiosas da primeira metade dosculo XVIII, de parcos efeitos diretos sobre a populao geral do pas,tiveram influncia especfica marcante sobre a vida dos judeus brasileiros.

    Finalmente, sob outro aspecto, a implantao do regime e disposies liberaisno pas, no incio do sculo XIX, culminando com a proclamao daIndependncia, e que resultou to favorvel ao progresso geral do pas,determinou porm a assimilao quase total dos judeus, efeito este que de seconsiderar negativo do ponto de vista da preservao da comunidade judaica

    brasileira.

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    Por tais motivos, o estudo da histria dos judeus no Brasil no pode ater-se sfases e aos marcos gerais da evoluo poltica e social do pas, seno orientar-se, ao revs, segundo os fatos e acontecimentos histricos que hajamrepercutido especificamente nas condies de vida individual e sobretudocoletiva dos judeus.

    De acordo com tal critrio, impe-se destacar as seguintes oito fases na

    histria dos judeus no Brasil, de 1500 a 1900:

    1500-1570 - FASE PACFICA DE CRESCENTE IMIGRAO ede ampla integrao dos judeus na vida econmica do pas,compreendendo os trs sub-perodos:a) - Primeiras exploraes (1501-1515);

    b) - Primeira colonizao (1515-1530);c) - Colonizao sistemtica (1530-1570)

    1570-1630 - FASE TUMULTURIA, caracterizada pelosurgimento de DISCRIMINAES ANTI-JUDAICAS.

    1630-1654 - Perodo de EXUBERANTE DESENVOLVIMENTO,sob o domnio holands - verdadeiro APOGEU DAORGANIZAO COLETIVA dos judeus do Brasil.

    1654-1700 - Perodo ps-holands, FASE CRTICA na vida dosjudeus brasileiros, compreendendo XODO em massa,desagregao da comunidade, DISPERSO e final acomodaolocal.

    1700-1770 - Perodo das GRANDES PERSEGUIES promovidaspela Inquisio portuguesa.

    1770-1824 - Perodo de LIBERALIZAO progressiva, queda daimigrao judaica e GRADUAL ASSIMILAO dos judeus.

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    1824-1855 - Fase de ASSIMILAO PROFUNDA, subseqente cessao completa da imigrao judaica homognea e igualizaototal entre judeus e cristos perante a lei.

    1855-1900 - Perodo PR-IMIGRATRIO MODERNO,caracterizado pelas primeiras levas de imigrantes judeus, oriundos,sucessivamente, da frica do Norte, da Europa Ocidental, doOriente Prximo e mesmo da Europa Oriental, precursores dascorrentes caudalosas que, nas primeiras dcadas do sculo XX,vieram gerar e moldar a atual coletividade israelita do pas.

    DESCOBRIMENTO DO BRASIL

    (1500)

    Contribuio judaica ao descobrimento do Brasil

    Verificou-se o descobrimento do Brasil numa poca em que Portugal estavano auge da sua expanso no mundo.

    No era ento somente a glria militar ou a busca romanesca de aventuras, ou

    ainda o desejo de dilatar a f catlica, que impeliam os portugueses s suasgrandiosas expedies martimas, em que singravam "mares nunca dantesnavegados", intimoratos aos perigos, insensveis s provaes.

    Ao lado desses motivos, e qui acima deles, o esprito comercialdominava asexpedies. Visavam os portugueses quebrar o monoplio que at ento, porintermdio das caravanas rabes, mantinham venezianos e genoveses sobre ointercmbio mercantil com os portos do Levante, e desse modo assegurar aPortugal a posio de centro as grandes atividades econmicas da poca, afuno de emprio de produtos e especiarias intensamente procurados pelos

    meios consumidores da Europa.

    Fossem quais fossem, entretanto, os mveis do alargamento martimo dePortugal, o certo que ele no lograria produzir-se sem o longo perodo dedescobertas e aperfeioamentos cientficos, que precedeu o grande ciclo dasconquistas, e no qual tiveram papel de sumo relevo os sbios da poca.

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    Desde o sculo XII, alis, vinham os judeus ibricos se distinguindoextraordinariamente nos domnios da matemtica, astronomia e geografia,cincias essas bsicas para a arte nutica, especialmente para a navegaoocenica.

    Merecem meno, entre muitos outros:

    ABRAHAM BAR CHIA

    Autor das obras "Forma da Terra", "Clculo do Movimentodos Astros" e "Enciclopdia";

    ABRAHAM IBN ESRA

    Autor de "Utenslios neos", "Tratado do Astrolbio","Justificao das Tbuas de Kvarismi" e "TbuasAstronmicas";

    JOO DE LUNA

    Que escreveu "Eptomes de Astrologia" e "Tratado doAstrolbio";

    JACOB BEN MACHIRQue escreveu "Tratado do Astrolbio" e inventou uminstrumento de observao, chamado "Quadrante de Israel";

    ISAK IBN SAID

    Que elaborou um resumo concatenado das obras sobreastronomia dos gregos e rabes;

    RAB LEV BEN GERSON (GRSONIDES)

    Que escreveu as obras "Tratado sobre a Teoria e Prtica doClculo", "Dos Nmeros Harmnicos", "Tbuas Astronmicassobre o Sol e a Lua" e "Tratado sobre a Balestilha", e construiu

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    dois importantes instrumentos: a cmara escura e o telescpio,cuja inveno geralmente atribuda a outros;

    ISAAC ZADDIK

    Que escreveu "Tbuas Astronmicas", "Tratado sobreInstrumentos Astronmicos" e "Instrues para o Astrolbio deJacob Ben Machir".

    Esse vicejante movimento cientfico foi de forma excelente aproveitado pelosgovernantes portugueses em prol da ascenso do seu pas posio de grande

    potncia naval.

    Assim, o infante D. Henrique, apelidado "O Navegador", ao fundar, em 1412,a primeira academia de navegao, a tradicional "Escola de Sagres", escolheu

    para sua direo um dos mais famosos cartgrafos do sculo XV, o judeuJehuda Crescas, indo busc-lo, especialmente, nas Ilhas Baleares. JehudaCrescas, tambm conhecido como mestre Jcome de Malorca e aindacomumente chamado "El judio de las Brjulas" - devido sua grandeexperincia na fabricao de bssolas - teve por essencial misso ensinar aos

    pilotos portugueses os fundamentos da navegao e a produo e manejo decartas e instrumentos nuticos.

    Mais tarde, outros judeus de renome cientfico prestaram sua colaborao Escola de Sagres, destacando-se os sbios Jos Vizinho, mestre Rodrigo e,sobretudo, Abraham Zacuto - autor do "Almanaque Perptuo de todos osMovimentos Celestes" - figura de grande influncia em todas as decises quediziam respeito aos interesses do Estado, inclusive portanto s expediesocenicas, uma das quais - a importante e bem sucedida viagem de Vasco daGama que trouxe a descoberta do caminho martimo ndia - foi por ele

    planejada.

    Afigura-se, desse modo, evidente que, em grande parte, a cooperao

    cientfica dos judeus do sculo XV tornou possvel as viagens transocenicas eas descobertas realizadas pela frota lusitana.

    Mas, a contribuio judaica ao descobrimento de novas rotas e de novas terraspara a coroa portuguesa no se limitou ao campo cientfico de feiopreparatria, seno tambm se traduziu na participao direta das temerrias

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    viagens, nas quais os judeus se revelaram de vital utilidade, graas inclusiveao conhecimento que tinham das lnguas e costumes de vrios pases.

    Assim, tambm tomaram parte saliente na expedio que resultou nodescobrimento do Brasil, pois que, na frota dirigida por Pedro lvares Cabral,viajaram como conselheiros especialistas pelo menos dois judeus:

    Mestre Joo, mdico particular do rei e astrnomo equipado com osinstrumentos de Abraham Zacuto, e que tinha como incumbncia realizar

    pesquisas astronmicas e geogrficas; e Gaspar de Lemos, tambm conhecidocomo Gaspar da Gama e Gaspar das ndias, intrprete e comandante do navioque levava os mantimentos, e justamente considerado pelos historiadorescomo co-responsvel pelo descobrimento do Brasil.

    O judeu Gaspar de Lemos, primeiro explorador do Brasil

    A importncia que merece atribuir participao de Gaspar de Lemos daexpedio que descobriu o Brasil ressalta desde logo da circunstncia de haverdecorrido de uma ordem rgia vazada em termos elogiosos, conforme refere

    Gaspar Correia nas "Lendas da ndia":"El-Rei entregou ao Capito-mr Gaspar da Gama (Gaspar de Lemos), o

    judeu, porque sabia falar muitas lnguas, a que El-Rei deu alvar de livre efrro de sua comdia em terra dez cruzados cada ms, muito lherecomendando que o servisse com Pedralves Cabral, porque se bom serviolhe fizesse, lhe faria muita merc; e porque sabia as coisas da ndia, sempre

    bem aconselhasse ao Capito-mr o que fizesse, porque ste judeu tinha dadoa El-Rei muita informao das coisas da ndia mrmente de Ga".

    Divergindo embora os historiadores quanto origem de Gaspar de Lemos e sua vida at haver entrado em contato com os portugueses, a verso maisaceita a que o d como judeu nascido na Polnia, de onde foi expulso outeve que fugir em 1450, quando criana, por no ter querido sua famliaconverter-se ao cristianismo. Aps uma longa peregrinao atravs da Itlia,Terra Santa, Egito e vrios outros pases, teriam resolvido permanecer em

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    Ga, na ndia, ali adquirindo prestgio e vindo a ocupar a funo de capito-mor de uma armada pertencente a um rico mouro na ilha de Arquediva.

    Foi nessa ilha que Vasco da Gama, em 25 de setembro de 1498, ao regressarde uma viagem ndia, conheceu Gaspar de Lemos, que se lhe apresentou a

    bordo como cristo e prisioneiro do poderoso Saboya, proprietrio da ilha.

    No tendo conseguido burlar a perspiccia de Vasco da Gama, este depressaforou-o a confessar que tinha sob suas ordens quarenta navios com instruesde Saboya para, na primeira oportunidade, atacar a frota lusitana.

    Paradoxalmente, o incidente acabou gerando uma slida amizade de Vasco daGama por Gaspar de Lemos, a quem levou consigo para Portugal, onde oapadrinhou no batismo, deu-lhe o seu nome - pelo que passou a chamar-se

    Gaspar da Gama - e apresentou-o ao rei, D. Manoel, que o fez pessoa grata nacrte e o nomeou "cavalheiro de sua casa".

    Na falta de elementos informativos seguros sobre o real papel desempenhadopor Gaspar da Gama no descobrimento do Brasil, h quem admita inclusiveque, apoiado na sua enorme experincia de viagens martimas, tivesse eleintencionalmente induzido Pedro lvares Cabral a afastar-se da frica por

    acreditar na existncia de outras terras na direo oeste da vastido dos mares.Seja como for, e ainda que sem fundamento tais suposies avanadas,

    permanece fora de dvida que Gaspar da Gama fez js ao epteto de "oprimeiro explorador da terra", que lhe d Afrnio Peixoto, e mesmo ao de "co-descobridor do Brasil", que lhe atribui Alexandre von Humboldt.

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    PRIMEIRAS EXPLORAES DO BRASIL(1501 - 1515)

    O arrendamento do Brasil e o ciclo do pau-brasil

    Logo nos primeiros anos aps a descoberta do Brasil, arrefeceu o interesse dorei D. Manoal pela nova terra.

    A expedio enviada costa do Brasil no ano de 1501, e que regressou aPortugal em 1502, no apresentou resultados que fossem de molde aentusiasmar o Governo portugus, cpido do mito do metal, pois no Brasil"nada fra encontrado de proveito, exceto infinitas rvores de pau-brasil, de

    canafstula, as de que se tira a mirra e outras mais maravilhas da natureza queseriam longas de referir" (carta de Amrico Vespucci a Soderini).

    A crte era nequele tempo verdadeiramente uma grande casa de negcio e,como, por um lado, estivesse fundamente absorvida com as dispendiosssimasexpedies ndia, onde pretendia estabelecer um vasto imprio colonial, e,

    por outro lado, no enxergasse lucros apreciveis e imediatos na exploraodo Brasil, este ia sendo relegado a um simples ponto de ligao nas viagens ndia, uma escala de refresco e aguada.

    assim de todo compreensvel que, tendo o monarca recebido em 1502, deum consrcio de judeus dirigido pelo cristo-novo Fernando de Noronha, umaproposta para explorao da nova colnia mediante contrato de arrendamento,ele a aceitasse de bom grado; era a colonizao do Brasil que se lhe oferecia,

    para ser feita a expensas de particulares, sem riscos e sem nus ou quaisquerencargos para o errio pblico, e ainda com a possibilidade de lhe serem

    proporcionado lucros e de, sob certa forma, ser sustentada, ainda quefracamente, a autoridade portuguesa na nova possesso.

    O acordo - que era um monoplio de comrcio e de colonizao - foi firmado

    em 1503, pelo prazo de 3 anos, e compreendia os seguintes principaiscompromissos dos arrendatrios:

    1. Enviar seis navios anualmente;2. Explorar, desbravar e cultivar, cada ano, uma nova regio de 300

    lguas;

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    3. Construir nessas regies fortalezas e guarnec-las durante o prazo docontrato;

    4. Destinar Coroa, no segundo ano do arrendamento, a sexta parte dasrendas auferidas com os produtos da terra, e, no terceiro ano, a quarta

    parte das mesmas.

    Esse contrato foi, com algumas modificaes, sucessivamente renovado em1506, 1509 e 1511, estendendo-se at 1515.

    No prprio ano do contrato inicial - mais precisamente, em maio de 1503 -desferrou de Portugal com destino ao Brasil a primeira frota, composta de seisnavios, sob o presumvel comando pessoal de Fernando de Noronha, tendoaportado em 24 de junho de 1503 a uma ilha at ento desconhecida, queinicialmente recebeu o nome de So Joo, mais tarde trocado para "Fernando

    de Noronha" em reconhecimento aos mritos do seu descobridor, a quemacabou sendo doada pelo rei em 1504.

    Nesse ano de 1504, os navios de Fernando de Noronha voltaram para Portugalcom enorme carregamento de pau-brasil (tambm chamado "madeira

    judaica"), artigo ento grandemente procurado nos mercados europeus para asindstrias de corantes.

    To intenso se tornou o comrcio do pau-brasil durante o arrendamento doBrasil a Fernando de Noronha - exportavam-se nada menos de 20.000 quintais

    por ano - e de tal importncia econmica ele se revestiu, que deu origem denominao de "ciclo do pau-brasil", sob a qual conhecido aquele perodo,alm de ter determinado a adoo do nome definitivo da terra - Brasil, emsubstituio ao de Santa Cruz (ou ainda Terra dos Papagaios), como era antesdesignada.

    Fernando de Noronha, o arrendatrio judeu

    Fernando de Noronha - tambm chamado Ferno de Noronha ou Ferno deLoronha - foi sem dvida uma personalidade marcante na vida pblica dePortugal.

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    Homem de extraordinria atividade e singular viso comercial, no tardou aentrosar muitos e vultosos negcios com a crte, a qual no lhe regateoumanifestaes de reconhecimento pela sua destacada contribuio aodesenvolvimento comercial e martimo do reino, concedendo-lhe vrios ttulosnobilirquicos, afora a permisso de usar o brazo que lhe conferira a CoroaInglesa.

    Admite-se que Gaspar da Gama, ao voltar do Brasil, teria sugerido a Fernandode Noronha a convenincia de ser a nova colnia portuguesa utilizada comorefgio para os judeus perseguidos, e que essa sugesto teria induzidoFernando de Noronha a propor ao Governo o arrendamento do Brasil, visandoassim facilitar a transmigrao judaica.

    Refere-se subsidiariamente, com base em documentos do arquivo da Torre de

    Tombo, que Fernando de Noronha, para ajudar o xodo de numerosos judeus,comprava-lhes as propriedades que, de outro modo, teriam de perder.

    Esses e outros indcios tm levado muitos historiadores a admitirem a origemjudaica de Fernando de Noronha.

    Que tenha ou no tenha sido Fernando de Noronha descendente de judeus,cristo-novo ou cripto-judeu, no envolve especial interesse. Importa antes a

    afirmativa, de consenso geral, de que, nas expedies comerciais do sindicatode Fernando de Noronha, judeus constituam a maioria, cabendo-lhes assim omrito de terem lanado no solo da nova ptria os primeiros marcos dacivilizao.

    PRIMEIRA COLONIZAO(1515 - 1530)

    Expedies de guarda-costas

    http://www.tryte.com.br/judaismo/colecao/br/livro10/l10cap2.htmhttp://www.tryte.com.br/judaismo/colecao/br/livro10/l10cap2.htm
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    Tendem os historiadores a considerar que, at 1530, a Coroa pouco seimportou com o aproveitamento do Brasil, no faltando mesmo quem tache,englobadamente, de "perodo da indiferena" toda a fase de 1500 a 1530.

    Parece, entretanto, haver exagero em tal juzo, que s justamente aplicvelao perodo 1500-1515, durante o qual, como visto no captulo anterior, oBrasil chegou a ser arrendado, todo ele, a uma empresa comercial, dirigida porFernando de Noronha.

    Na verdade, o prprio fato de no ter sido prorrogado em 1515 o contrato dearrendamento com Fernando de Noronha - sem que jamais fosse dadaqualquer explicao dessa soluo de continuidade - leva a supor que oGoverno de Portugal, na altura do ano 1515, despertara para a realidade: teriaque tomar conta do vastssimo territrio brasileiro se no quisesses dispor-se

    ao risco de perder o comrcio com ele e mesmo a soberania.Efetivamente, tal perigo era real, pois, quele tempo, o litoral brasileiro eratambm freqentado grandemente por franceses contrabandistas, que

    procuravam traficar com os indgenas, infringindo assim o monoplioportugus do pau-de-tinta.

    Tudo parece confirmar, portanto, que tenha sido para obviar os aludidosperigos que o Governo de Portugal recorreu a um duplo programa de medidas:por um lado, organizou armadas, ditas de guarda-costa, em cujo comando se

    notabilizou Cristvo Jaques, para reprimir o comrcio dos entrepolos,sabendo-se de trs expedies, entre 1516 e 1519, 1521 e 1523, e entre 1526 e1528; por outro lado, tomou medidas de incentivo colonizao do Brasil,facilitando o embarque de todos quantos quisessem partir como colonos.

    Primeiras tentativas de colonizao dirigida

    Tem-se mesmo notcia de um decreto, baixado em 1516 por Dom Manuel I,rei de Portugal, segundo o qual todo aquele que emigrasse para o Brasilreceberia, por conta da Coroa, o equipamento necessrio para a construir um

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    engenho de acar, no se tendo o decreto descuidado de ordenar que fosseenviado um perito nova colnia a fim de dar a necessria assistncia.

    O decreto dizia explicitamente em certo trecho: "Machadinhas, enchadas eoutros instrumentos devero ser dados s pessoas que vo popular o Brasil eum homem experiente e capaz dever ser enviado ao Brasil para dar incio aum engenho de acar. Dever receber toda a assistncia e materiais einstrumentos necessrios para a construo do engenho".

    A despeito das facilidades concedidas pelo Governo, sabe-se que eram,todavia raros os colonos portugueses cristos que quisessem emigrar para oBrasil - provavelmente em virtude da atrao que sobre eles continuava aexercer a ndia - razo por que, ao lado de criminosos, condenados ouexilados, se destacaram os voluntrios judeus, constituindo a maioria das levas

    imigratrias.Ao que tudo indica, as providncias tomada pelo Governo de Portugaltrouxeram os resultados almejados, pois documentos de 1526 j se referem adireitos alfandegrios pagos em Lisboa sobre acar importado do Brasil.

    Participao dos judeus na introduo da cana de acar

    A suposio de que predominavam os judeus entre esses primeiroscolonizadores do Brasil corroborada pelo fato inconteste de que a indstriado acar j vinha sendo, desde muitos anos antes, a ocupao preferencialdos judeus das ilhas da Madeira e de So Tom, de onde provavelmente foi acana de acar transplantada para o Brasil.

    Assim, pois, nesse perodo de transio, de 1515 a 1530, em que o Governo dePortugal fez os primeiros ensaios de controle e ocupao do territriobrasileiro, parece ter cabido aos judeus uma parcela fundamental nocumprimento dessa tarefa, como primeiros colonizadores do Brasil.

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    COLONIZAO SISTEMTICA(1530 - 1570)

    Expedio de Martim Afonso de Sousa

    Verificando que as esparsas expedies de guarda-costa e os reduzidos ensaiosde colonizao, empreendidos no perodo de 1515 a 1530, eram insuficientes

    para afastar do Brasil os traficantes estrangeiros, j agora acrescidos deespanhis, que, alm de negociarem, mostravam intenes de aqui seestabelecerem, o rei de Portugal, D. Joo III, passou a uma ao decidida,

    visando a uma colonizao sistemtica em larga escala e pois a uma ocupaoefetiva do territrio brasileiro.

    Assim, em 1530, mandou ele aprestar uma armada com 400 homens, sob ocomando do seu amigo Martim Afonso de Sousa, a quem nomeou "Capito-mr e Governador das Terras do Brasil", dando-lhe autorizaes especiais demuita amplitude, que abrangiam "o direito de tomar posse de todo o pas, fazeras necessrias divises, ocupar todos os cargos, exercer todos os poderes

    judicirios, civis e criminais".

    A expedio de Martim Afonso de Sousa, dando cumprimento sua misso,cobriu, em 2 anos, todo o litoral brasileiro, estendendo-se desde o Amazonasat o rio da Prata.

    Bahia e So Vicente

    Merece notar, todavia, que Martim afonso de Sousa concentrou as suasatenes em dois pontos do litoral, pontos esses que perdurariam ao longo de

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    toda a histria do Brasil como focos de progresso: o Nordeste (Bahia-Recife) eo Sueste (Rio-S. Paulo).

    Tal bicentrismo econmico e social, j pouco comum, raramente se estabeleceto cedo na formao de pases como ocorreu no caso do Brasil, onde j em1530 se delinearam os dois focos, que viriam exercer, com alternncia derelevo, uma influncia decisiva sobre a histria econmica do pas, at osnossos dias: o Nordeste predominando nos sculos XVI e XVII - ciclos do

    pau-brasil e do acar; o Sueste se sobressaindo no sculo XVIII, poca daminerao do ouro; um curto ressurgimento setentrional; e, finalmente, um

    predomnio meridional definitivo no sculo XIX, ao influxo da grandeagricultura, especialmente da cultura do caf; tudo isso, sem prejuzo das

    perspectivas de franco progresso que tornam a desenhar-se para o Nordeste,embora sem afetar o centro-sul.

    Constituindo esse bicentrismo um fato em si notvel, acresce, como aspectoparadoxal, a circunstncia de que ambos os focos de progresso do pas selocalizaram longe, e um de cada lado, da regio onde se deu o descobrimento.

    Evidentemente, no pode satisfazer o argumento da maior proximidade dacosta nordestina com relao Europa, quando comparada com a regio dePorto Seguro, pois inclusive no explicaria a preferncia dada regio de SoVicente. Antes, deve-se admitir que havia no litoral sul da Bahia condiesnaturais adversas ao desbravamento e colonizao, no sendo de se excluir o

    fato de ser o clima daquele trecho da costa por demais chuvoso, quase noapresentando uma verdadeira estao seca no decorrer do ano.

    No que respeita questo dos judeus do Brasil, a existncia dos aludidos doiscentros econmicos importantes merece dois reparos: um de carter essencial,relativo s migraes internas dos judeus, os quais, sempre que acossados

    pelas perseguies no Nordeste, escolhiam em boa parte como refgio aprovncia de So Vicente; o outro, de carter ilustrativo, consiste nacircunstncia de, em cada um dos aludidos pontos - Bahia e So Vicente (S.Paulo) - ter Martim Afonso de Souza encontrado um judeu influente -respectivamente, Caramuru e Joo Ramalho - que lhe prestasse decisivoauxlio na sua tarefa colonizadora.

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    Capitanias Hereditrias

    Tendo verificado, pelas sucessivas expedies dos anos anteriores, a grandeextenso litornea do Brasil e julgando os meios at ento empregadosinsuficientes para assegurar a soberania portuguesa na colnia bem como para

    promover o seu povoamento, resolveu D. Joo III, em 1532, criar capitaniassituadas ao longo da costa, medida que ps em prtica entre os anos de 1534 e1536, mediante a diviso do litoral entre Maranho e Santa Catarina em 14lotes, de 10 a 100 lguas de costa, doando essas 14 capitanias hereditrias a 12"donatrios", escolhidos entre os nobres e mais valorosos vassalos, os quais

    deviam explorar e colonizar sua custa as regies que lhes haviam sidoconfiadas, tudo fazendo pelo seu rpido e seguro progresso.

    Apresentou-se a um novo motivo de estmulo para a vinda de judeus aoBrasil. Os donatrios, desejosos de imprimir prosperidade s suas capitanias,

    porfiavam em atrair colonos patrcios e, ainda desta feita, os portuguesescristos preferiam a ndia, cujos efeitos atrativos perduravam. No restava aosdonatrios seno recorrer mais uma vez s famlias israelitas, s quaisconcediam direitos e vantagens iguais aos dos demais colonos.

    Acrescia que os judeus se revelaram excelentes colonizadores: hbeis no tratocom o gentio, a cujos hbitos e lnguas logo se adaptavam, passando a contardepressa com a sua amizade.

    Assim, as possibilidades de progresso das capitanias dependia em bom graudos judeus, e, graas a esta circunstncia, puderam eles gozar de amplaliberdade de costumes.

    *

    Das capitanias, apenas duas se desenvolveram com resultados apreciveis:Pernambuco e So Vicente, justamente nos j aludidos dois focos de progresso- Nordeste e Sueste.

    Prosperidade excepcional conheceu a capitania de Pernambuco, superiormentedirigida por Duarte Coelho Pereira. Tendo verificado, pelas tentativasdesenvolvidas nos anos precedentes, que a regio era favorvel agricultura -

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    fumo, algodo e cana de acar - especialmente para esta ltima, resolveuDuarte Coelho implantar o cultivo intenso e sistemtico de cana e incrementara indstria aucareira.

    Nesse sentido, determinou ele o estabelecimento de grandes plantaes decana de acar e a construo de bom nmero de engenhos, mandando trazer,das ilhas da Madeira e de So Tom, mecnicos, capatazes e operriosespecializados - que em sua maioria eram judeus - para dirigirem engenhos eimpulsionarem a produo do acar.

    Merece lembrar o nome do judeu Diogo Fernandes, que foi o maior tcnicotrazido por Duarte Coelho ao Brasil.

    Governos Gerais

    Por vrios motivos - tamanho excessivo dos territrios, falta de recursos pararepelir os ataques dos selvagens (*) ou as invases estrangeiras, falta de unioentre os donatrios - falhou totalmente o sistema de colonizao das

    capitanias, mesmo com as excees que representavam as de So Vicente ePernambuco.

    (*) No seriam os antigos brasileiros, chamados pelo autor de "selvagens", queestariam tentando repelir a invaso dos estrangeiros portugueses?

    Resolveu, ento, D. Joo III, em 1548, criar um governo geral, com sede naBahia, capaz de, em torno dele, reunir os esforos dos donatarios, dando-lhes"favor e ajuda" e deles recebendo auxlios, inclusive "gente e mantimentos".

    Com a implantao do novo sistema de governo em 1549, no sofreu alteraoa situao dos judeus no Brasil, muito embora na mesma ocasio se fixassemno pas os jesutas.

    As condies eram tais, que estes se viram forados a uma poltica detransigncia e prudncia, merecendo destacar a atividade do padre Jos de

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    Anchieta e do primeiro bispo do Brasil - Pero Fernandes Sardinha - que seopuseram energicamente instalao de tribunais inquisitoriais no pas e aquaisquer outras formas de discriminao e perseguio.

    Na contingncia de ou perderem as esperanas de colonizao do Brasil oulevarem a bom termo a misso de que se achavam incumbidas, as autoridadesoptaram pela ltima alternativa e, para tanto, tiveram que fazer tbua rasa dasexigncias do 5 Livro das Ordenaes da Inquisio e negligenciar asreclamaes dos Inquisidores.

    Em 1554, escrevia o padre Jos de Anchieta "ser grandemente necessrio quese afrouxasse o direito positivo nestas paragens". Semelhantemente, o bispoPero Lopes Sardinha opinava que "nos princpios muitas mais coisas se ho dedissimular que castigar, maiormente em terra to nova como esta".

    Esse panorama de tolerncia contrastava vivamente com a onda de dio ediscriminao que varria Portugal, onde crepitavam ininterruptamente asfogueiras dos autos de f. assim compreensvel o efeito que sobre os judeusde Portugal deviam exercer as notcias ali chegadas sobre a vida judaica noBrasil. Tangidos pela fria avassaladora de perseguio religiosa, sentiam-seos judeus de Portugal impelidos a tentar vida nova no Brasil, que se lhesafigurava como refgio seguro, onde poderiam concretizar-se os seus anseiosde liberdade, as suas esperanas de paz e de tranqilidade.

    Em tais condies, tudo favorecia o estabelecimento de uma intensa eininterrupta corrente imigratria de judeus portugueses para o Brasil, onde,prosperando rapidamente, passaram a formar numerosos ncleos, dandomesmo incio a uma vida coletiva que com o tempo viria assumir nitidamentecaractersticas judaicas como o testemunham as esparsas refernciasencontradas sobre uma sinagoga que funcionava em uma casa de propriedadedo cristo-novo Heitor Antunes, na cidade do Salvador - sede do GovernoGeral - e sobre uma outra que fazia parte de um centro marrano emCamaragibe, capitania de Pernambuco, capitania esta que inclusive chegou acontar com um "rabi" - Jorge Dias do Caia, cristo-novo, calceteiro.

    As figuras histrico-lendrias de Caramuru e JooRamalho

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    Martim Afonso de Souza, ao deter-se, como j foi mostrado, com especial

    interesse nas regies da Bahia e de So Vicente, teve a sorte de encontrarnesses dois pontos duas extraordinrias figuras, respectivamente Caramur eJoo Ramalho, que lhe prestaram decisiva ajuda na sua funo desabrochadorada colonizao do Brasil.

    Esses dois vultos, de vida semi-lendria, justamente considerados os primeiroscolonizadores efetivos do pas, apresentam viva semelhana quanto aodesenrolar das suas longas existncias. Ambos aportaram costa brasileiracomo nufragos, e na mesma poca, por volta de 1510; ambos tiveram que seacomodar com os indgenas, aos quais acabaram impondo a sua autoridade:

    ambos integraram-se na vida dos selvcolas, inclusive casando com ndias; ume outro realizaram uma prodigiosa obra de pacificao e aproximao entre osindgenas e os representantes do Governo de Portugal; finalmente, a ambos, atribuda ascendncia judaica.

    CARAMURU

    Acerca do aparecimento de Caramuru - cujo verdadeiro nome era Diogolvares Correia - existe a seguinte lenda: Em 1509 ou 1510, um navio

    portugus naufragou junto da atual Bahia de Todos os Santos. Quase todos oshomens morreram afogados ou foram devorados pelos ndios Tupinambs.Entre os poucos deixados para serem sacrificados posteriormente, emespetculo festivo, estava Diogo lvares Correia. Quando se aproximava ahora de ser ele sacrificado, uma idia relampejante salvou-lhe a vida: DisparouDiogo o mosquete que retivera do naufrgio e matou um pssaro em plenovo. Os selvagens que presenciavam a cena foram tomados de grande terror,

    pondo-se a gritar: "Caramuru! Caramuru!", o que, na sua lngua, significava"homem do fogo" ou "filho do trovo". (H quem considere, talvez com maisacerto, que o apelido Caramuru se deriva do fato de ser esse o nome com queos indgenas designavam um peixe comum no Recncavo da Bahia, a moria,freqentadora das guas baixas das locas, numa das quais teria sidoencontrado Diogo lvares depois do naufrgio). Passou logo Diogo lvaresCorreia a ser altamente considerado pelos ndios que, da em diante, orespeitavam como a um chefe.

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    Mais tarde, casou-se Caramuru com Paraguassu, filha do chefe Taparic, como que se tornaram mais ntimas e slidas as suas relaes com os indgenas.

    Quando da chegada de Martim Afonso de Souza, Caramuru serviu deintrprete e elemento de ligao entre esse primeiro Governador do Brasil e oschefes ndios, acertando medidas para a introduo de trabalhos agrcolas naregio com o aproveitamento de sementes trazidas por Martim Afonso.

    Papel ainda mais saliente desempenhou Caramuru a partir de 1538, no perododo primeiro Capito-mr, D.Francisco Pereira Coutinho, cujo governodecorreu tumultuoso, em virtude de sucessivos desentendimentos entre os

    portugueses e os indgenas.

    To grande se tornou a fama de Caramuru e to alto o seu prestgio junto ao

    Governo de Portugal, que, ao ser nomeado, em 1548, o primeiro GovernadorGeral do Brasil - Tom de Souza - o rei dirigiu-se em carta a Caramuru,pedindo sua imprescindvel cooperao, nestes termos:

    "Diogo lvares. Eu, El-Rei, vos envio muito saudar. Eu ora mandoTom de Souza, fidalgo da minha Casa, a essa Bahia de Todos osSantos... E porque sou informado pela muita prtica que tendes dessasterras e da gente e costumes delas o sabereis bem ajudar e conciliar, vosmando que, tanto o dito Tom de Souza l chegar, vos vades para le eo ajudeis no que lhe deveis cumprir e vos encarregar, porque fazeis

    nisso muito servio... Sendo necessria vossa companhia e ajuda,encomendo-vos que ajudeis no que virdes que cumpre, como creio queo fareis. Bartolomeu Fernandes a fz em Lisba a 19 de novembro de1548. Rei".

    Caramuru atendeu ao pedido do rei e to proveitoso foi o auxlio prestado aTom de Souza que, em meio a uma plena cooperao dos ndios, pderapidamente ser fundada, em 1549, a cidade do Salvador, Capital do Pas, nolugar onde anteriormente Caramuru estabelecera a aldeia "Vila Velha".

    Quanto origem judaica de Caramuru, na falta de quisquer provas, muitoshistoriadores a admitem levados por simples presunes, inclusive pelo fatode que, segundo muitas indicaes, era tradicionalmente israelita o nome defamlia lvares Correia.

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    JOO RAMALHO

    Embora o historiador Rocha Pombo admita que Joo Ramalho tenha vindoantes da descoberta do Brasil, possivelmente em 1497, poca da expulso dos

    judeus de Portugal, a suposio mais aceita a de ter ele aportado em 1512,salvo de um naufrgio na costa de So Paulo.

    Tal como Caramuru no Norte, conseguiu Joo Ramalho captar depressa aamizade dos indgenas, merecendo especialmente a simpatia de Tibiri, otodo-poderoso chefe dos ndios Guaianases, que, posteriormente, lhe deu emcasamento sua filha Bartira.

    Quando, em 1532, Martim Afonso de Souza alcanou So Vicente, lencontrou Joo Ramalho que, havia vinte anos, vivia com os indgenas.

    Induzido pelas informaes de Ramalho acerca das caractersticas do clima edo solo da regio e estimulado pela situao estratgica da baa, MartimAfonso, com a ajuda substancial de Joo Ramalho, fundou ento a primeiracolnia agrcola, formada de duas povoaes: So Vicente - na plancie da ilhado mesmo nome, e Piratininga - na regio serrana do continente, ao lado daaldeia de Santo Andr da Borda do Campo, onde vivia Ramalho com suafamlia e seus aliados.

    Em considerao aos relevantes servios prestados por Joo Ramalho capitania de So Vicente, Martim Afonso conferiu-lhe o ttulo de "guarda-

    mr", deu-lhe poderes sobre toda a terra de Piratininga e, finalmente, antes doseu regresso para Lisboa, elevou-o ao cargo de "Capito-mr".

    No que toca origem judaica de Joo Ramalho, abundam as conjeturas.

    H, de um lado, os que se associam ilao feita da circunstncia de quenunca perticipara Joo Ramalho dos exerccios religiosos dos jesutas e deque, ao cair seriamente doente, recusou as consolaes religiosas, fatos estesque so interpretados como indicando pertinncia judaica.

    Entretanto, a maior parte dos adeptos da estirpe israelita de Ramalho liga a suaargumentao ao sinal, em forma de um ferradura, que Joo Ramalho incluana sua assinatura, entre o prenome e o nome de famlia. Sobre o assunto,existe uma verdadeira literatura, sendo as mais desencontradas asinterpretaes dadas com respeito ao mencionado smbolo. Enquanto alguns oconsideram um mero ornamento ou simples talism, e outros o julgam umhieroglifo que testemunharia a origem egpcia de Ramalho, a maioria o

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    qualifica como letra hebraica; mesmo estes ltimos, porm, divergem entre si,achando uns que a letra um "caf", representando a letra inicial da palavra"cohen" (sacerdote) ou da palavra "cabir" (forte) ou ainda da palavra "cafui"(cristo-novo), ao passo que outros consideram a letra como sendo um "bes",que seria a abreviao da palavra "ben" (filho), significando a assinatura -"Joo, filho de Ramalho" - e, finalmente, alguns admitem que se trate de um"reich", letra inicial do nome Ramalho.

    Como visto, a questo constituiu-se em objeto de amplas discusses e anlisesde carter exegtico, cujo desenvolvimento evidentemente no apresentanenhum interesse especial a no ser o incentivo ou a satisfao da curiosidadesobre a ascendncia tnica ou religiosa de Joo Ramalho, esse inconfundvel

    personagem que tanto contribuiu para a colonizao de So Vicente.

    O papel dos judeus no perodo de 1530 a 1570

    O perodo de 1530 a 1570 talvez o nico em toda a histria dos primeiros

    quatro sculos do Brasil, do qual se pode dizer que, no seu decorrer, aevoluo da vida judaica se entrosou plenamente com a do pas, numacooperao ativa, uma coexistncia pacfica e uma integrao harmoniosa.

    Para a formao do Brasil, esse perodo foi decisivo. No seu transcurso, fez-sesentir o poderio da metrpole, primeiro atravs das capitanias hereditrias edepois por intermdio do Governo Geral, que unificou politicamente oterritrio, exercendo o poder da Coroa sobre o dos capites-mres;simultaneamente, a lngua portuguesa se imps como elemento de coeso

    entre os ncleos esparsos do povoamento, coeso essa reforada pela unioespiritual desenvolvida pela extraordinria atividades dos jesutas.

    E da maior importncia que, durante esse excepcional perodo de expanso,os judeus tenham desempenhado um papel sobremodo honroso e atuante navida econmica e social do pas.

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    PERODO DAS PRIMEIRAS DISCRIMINAES(1570 - 1630)

    A conjuntura em 1570

    No perodo da colonizao sistemtica (1530-1570), criaram-se, como ficouvisto, todas as condies favorveis ecloso de uma slida comunidadeisraelita no Brasil:

    a) - Suficincia numrica. - O nmero dos judeus, graas intensaimigrao e ao crescimento netural, alcanou uma proporo razovelem confronto com a populao geral, o suficiente para se opor ao riscode assimilao.

    b) - Liberdade de culto. - Havia tolerncia e liberdade bastantes paraque os judeus mantivessem abertamente suas prticas religiosas, aindaque, como de se supor, algo sincretizadas com o catolicismo.c) - Refrescamento imigratrio. - As sucessivas levas imigratrias de

    judeus portugueses exerciam um papel reativante, contra-aculturativo.

    Graas a tal conjuntura, estavam se desenhando perspectivas seguras para que,nos fins do sculo XVI, se corporificasse no Brasil uma coletividade judaica,numerosa e estvel.

    Vrios fatores adversos intervieram, porm, para tumultuar esse processo emmarcha.

    Dificuldades de emigrao judaica de Portugal

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    Nas vizinhanas de 1570, sobreveio uma alterao na poltica emigratria dePortugal. s normas liberais at ento vigorantes substituiu-se uma longa sriede medidas restritivas, entremeadas de permisses, condicionadas e efmeras,concedidas a troco de vultosas somas pecunirias.

    Assim, em 30 de junho de 1567, na regncia do Cardeal D. Henrique, foiexpedido o primeiro alvar qie proibia a sada do reino, por mar ou por terra, atodos os cristos-novos.

    Em 1573, foi essa proibio reforada por D. Sebastio.

    E, embora quatro anos mais tarde, em 1577, o prprio D. Sebastio orevogasse, mediante a contribuio de 250.000 cruzados para o custeio damalograda expedio frica, voltou o alvar a ser revigorado em janeiro de

    1580, pelo Rei-Inquisidor D. Henrique.Nesse mesmo ano de 1580, perdeu Portugal sua independncia para a Espanhae, em 1587, foram confirmadas todas as leis anteriores sobre a proibio dasada de judeus.

    Em julho de 1601 - dada a pssima situao do errio castelhano - foi, porCarta-Patente, concedida aos judeus licena para sair do reino, a troco de200.000 cruzados.

    Mas, nove anos mais tarde, em maro de 1610, foi promulgada uma lei querevogou a concesso de sada, apesar das promessas de que a proibio nomais se repetiria.

    Somente em 1627, voltou a ser concedida aos judeus uma permissocondicionada de sada e, finalmente, em 1629, a lei estabeleceudefinitivamente a livre sada do reino, benefcio para cuja concesso tiveramos judeus que contribuir com a quantia de 250.000 cruzados.

    Tais reviravoltas na poltica emigratria eram determinadas - abstrao feita

    das freqentes incompatibilidades entre a igreja e a coroa - pela situaoprecria das finanas do pas, que impelia ao recurso da extorso de dinheirojudaico, em alternncia com a necessidade de reter os judeus no pas, eis que,emigrando para outros pases, eles concorriam para sua prosperidade,enquanto se depauperava o reino, como chegou a confess-lo o Conselho deFazenda nestes termos: "...estar o comrcio empobrecendo e terem os homensde mais cabedal deixado o Pas".

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    Apesar de todas as restries mais acima enumeradas, fora de dvida que oxodo dos judeus de Portugal em busca do Brasil prosseguia intenso. Tais eto crescentes eram as perseguies a que os judeus se viam expostos, quecertamente eles haviam de encontrar meios de contornar as proibies, nos

    perodos em que no o conseguiam oficialmente atravs das j mencionadascontribuies de vulto.

    Na ltima dcada do sculo XVI, a corrente emigratria dirigiu-sepredominantemente para a Frana e sobretudo aos Pases Baixos, ondeflorescia o comrcio e reinava tolerncia religiosa, o que permitiu a clereformao de uma ampla comunidade israelita, com centro na cidade deAmsterd, justamente cognominada de "Nova Jerusalm".

    Mas, mesmo nesse perodo, de se admitir que continuava a vinda de judeus

    portugueses ao Brasil. H indcios de que, de um modo geral, os paseseuropeus, e em especial a Holanda, eram preferidos pelos emigrantes maisabastados, enquanto ao Brasil se dirigiam os pertencentes s camadas sociaismais modestas, sobretudo os que tinham propenso agricultura.

    Fosse como fosse, o certo que essa simultnea emigrao de judeusportugueses, para o Brasil e os Pases Baixos, propiciou o estabelecimento deum elo comercial e afetivo entre os judeus brasileiros e holandeses, o qual nosanos seguintes veio a ter importante repercusso poltico-social, decorrente doconflito de conscincia em que se viram lanados os judeus brasileiros em

    virtude do tringulo Brasil-Portugal-Holanda que passou a dominar os seusinteresses individuais e suas aspiraes coletivas.

    Os tentculos inquisitoriais no Brasil

    Como visto acima, as sucessivas restries emigrao dos judeus dePortugal, as quais cobriram todo o perodo de 60 anos (1570-1630), no foramde molde a afetar substancialmente a entrada contnua de judeus no Brasil,onde prosseguia crescendo seu nmero e sua prosperidade.

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    Entretanto, fatores outros passaram a toldar a vida judaica no Brasil, at entotranqila e serena. Comearam a surgir sinais indiscutveis de restrio liberdade, que com o tempo se reforaram, fazendo definhar a vida coletiva

    judaica, justamente quando parecia aproximar-se a sua consolidao, eforando os judeus a retornarem, qual na sua me-ptria, a uma vidadisfarada, de forma a guardarem as tradies apenas no recesso da famlia eassim mesmo com a devida cautela.

    A primeira manifestao de intolerncia verificou-se logo em 1573, na cidadedo Salvador, onde foi instalado um auto de f. Paradoxalmente, mas talvez de

    propsito, no era israelita a primeira vtima; era um francs que, acusado deheresia, foi condenado e queimado vivo.

    O balo de ensaio no surtiu, porm, os esperados efeitos. Verificado que os

    espetculos dos autos de f em si no exerciam nenhuma emoo especialsobre os selvcolas - habituados, de resto, incinerao de prisioneiros - e que,por outro lado, permanecia incompreensvel para os gentios que sequeimassem pessoas vivas por respeitarem e servirem outro Deus, o que oslevava a simpatizarem com os prisioneiros da Inquisio, esta encerrou

    brevemente a sua nefanda tentativa.

    Pde assim restabelecer-se o ambiente de tolerncia, alis com o franco apoioda opinio pblica.

    Entretanto, em 1591, acabou vindo ao Brasil o Santo Ofcio, sendo essamisso conhecida como "Primeira visitao do Santo Ofcio s Partes doBrasil pelo licenciado Heitor Furtado de Mendona".

    Na Bahia, permaneceu a Inquisio durante dois anos, at 1593, seguindoento o Inquisidor para Pernambuco, Itamarac e Paraba, onde ficou at 1595.

    Decorridos 25 anos, a Bahia, ento capital do Brasil, foi, entre 11 de setembrode 1618 e 26 de janeiro de 1619, alvo de uma nova visitao do Santo Ofcio,que ficou a cargo do Inquisidor de vora, o bispo D. Marcos Teixeira.

    Diante desta segunda comisso inquisitorial, foram denunciados nada menosde 90 marranos, entre eles muitos senhores de engenhos de acar.

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    Migraes internas

    Merece notar que o Santo Ofcio limitou suas visitas ao Nordeste, jamaistendo tentado instalar-se no Sueste do pas, talvez para no se expor a umfracasso completo, dado o ambiente hostil que certamente ali iria encontrar.

    Essa ciscunstncia teria propiciado o primeiro movimento migratrio internodos judeus do Brasil.

    provvel que, mesmo anteriormente, se viesse processando, em condiesnormais, a disseminao dos judeus pelo territrio brasileiro, e isso sobretudo

    por motivos econmicos, pois no se ocupavam os judeus somente deagricultura; o seu senso inato de mobilidade e de ubiqidade certamente oslevara a monopolizar o comrcio entre os ncleos rurais e urbanos, assim

    penetrando nas mais recnditas partes do pas.

    Mas essas haviam de ser migraes lentas, centrfugas e de carter voluntrio.

    J por ocasio dos inquritos da Inquisio no Nordeste deve ter sido de formaforada, e em mais rpido rtmo, a sada de judeus daquela regio em direo

    da parte mais liberal do pas, onde no medravam preconceitos, e que erasobretudo a capitania de So Vicente - justamente o segundo foco deprogresso do pas, como ficou indicado pginas atrs.

    Intercmbio judaico Brasilo-Holands

    No se sabe ao certo dos motivos das visitaes do Santo Ofcio ao Brasil,pois tornaram os inquisidores ao reino sem que viessem a lume os efeitos dassindicncias.

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    todavia de se presumir que tivessem fundo poltico, receosa como se achavaa Coroa quanto aos negcios dos cristos-novos com a Holanda e quanto acertos indcios de que o inimigo encontraria no Brasil aliados e guias.

    A conjetura tinha certo fundamento, e os registros da visitao de 1618-1619revelaram, efetivamente, que, durante cerca de 25 anos, os marranos do Brasilvinham se mantendo em constante comunicao com os judeus confessos deFlandres e, em especial, com os ex-marranos portugueses que tinhamescapado para Amsterd.

    As susteitas foram reforadas mais tarde com a criao da Companhia dandias Ocidentais, aprovada em 1621 pelo governo holands. Em face do

    programa e dos poderes dessa Sociedade - entre os quais se incluam os denomear e depor governadores, fazer tratados de aliana com os indgenas,

    erquer fortalezas e construir colnias - e da circunstncia de que o capital daempresa era constitudo em grande parte com os cabedais de judeus hispano-portugueses, era lgico desconfiar que o ntimo intercmbio entre os judeus doBrasil e da Holanda pudesse vir a ajudar os propsitos conquistadores dessaltima.

    E a primeira prova real da justeza desse receio foi de fato obtida em 1624,quando os holandeses invadiram e conquistaram a cidade do Salvador, capitaldo Brasil. A populao israelita, que na Bahia era ento mais numerosa do queem qualquer outra cidade do Pas, submeteu-se alegremente aos

    conquistadores, com os quais haviam vindo muitos judeus. Refere-se quecerca de 200 cristos-novos aceitaram desde logo o jugo holands e passarama induzir os demais habitantes de origem judaica a seguirem o seu exemplo.

    O complexo judaico no perodo 1570-1630

    Esse longo perodo de 60 anos foi altamente favorvel ao desenvolvimento e prosperidade da populao judaica do Brasil, mas, em contraste com o perodoanterior (1530-1570), ele no constituiu uma fase tranqila de evoluo.

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    Foi um perodo essencialmente tumulturio, cheio de sobressaltos e de vai-vens que, se no impediram o progresso material dos judeus - os quais em1600 chegaram a possuir uma pondervel porcentagem dos 120 engenhosento existentes no Brasil - solaparam todavia a sua organizao coletiva, quevinha tomando corpo, e feriram fundo as suas esperanas de liberdade. Osfatos e circunstncias caractersticos do perodo em questo podem assim serrecapitulados:

    - Perseguio cada vez maior aos judeus em Portugal e restrio suaemigrao para o Brasil, o que provavelmente provocou entre os judeus

    brasileiros um nimo adverso para com a me-ptria;

    - Surgimento de um auto de f em Salvador (Bahia), embora semconseqncias sensveis; bastante, porm, para suscitar entre os judeus

    brasileiros a idia de que a nova ptria no estava imune a preconceitos e aeventuais perseguies;

    - Vinda de 2 comisses da Inquisio de Portugal, em 1591-95 e 1618-19,com os respectivos processos de acusaes e denunciaes, o que deve terlevado os judeus brasileiros a um retrocesso na evoluo da sua vida coletiva ea uma limitao das prticas religiosas ao mbito da famlia e a formasdisfaradas;

    - Primeira migrao forada de judeus dentro do pas, por motivos de

    perseguio religiosa - do Nordeste para a capitania de So Vicente;

    - Fracasso da invaso na Bahia, em maio de 1624, pois a conquista no chegoua durar um ano, terminando com total derrota dos holandeses em 1 de maiode 1625.

    Em decorrncia de todos esses fatos, os judeus do Brasil foram sendo, cadavez mais, dominados por um sentimento de frustrao, vendo se esboroaremas suas iluses e esperanas quanto segurana e tranqilidade do seu porvirna nova terra.

    Desiludidos com a me-ptria - onde seus parentes e correligionrios sofriamprivaes e perseguies tremendas - e j agora decepcionados com a prpriaNova Lusitnia, onde tudo a princpio parecia sorrir-lhes, mas onde passavama avolumar-se indcios hosts, os judeus do Brasil, instintivamente, na procurade algum outro ponto de apoio, sentiam-se impelidos a um intercmbio cada

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    vez mais estreito com os judeus portugueses residentes na Holanda, onde aliberdade, nos fins do sculo XVI, era absoluta em todos os terrenos.

    Era a possibilidade que eles vislumbravam de vir a ser melhorada a sorte dosjudeus do Brasil graas interveno de uma outra potncia - no caso aHolanda!

    DOMNIO HOLANDS(1630 - 1654)

    Fases da comunidade judaica sob a ocupao holandesa

    A esperana dos judeus no Brasil de que sua sorte melhoraria graas a algumaforma de interveno holandesa no falhou. Finalizando uma srie detentativas frustradas com que visavam tornar a conquistar a Bahia no decorrerdo ano de 1627, os holandeses, aps verificarem que a faanha seria maisexeqvel em Pernambuco - ponto pior defendido e mais fcil de ser depoisfortificado - atacaram-no em 15 de fevereiro de 1630 com uma poderosaesquadra de 70 navios, tripulada e guarnecida por 7.000 homens, iniciandoassim a ocupao do Nordeste brasileiro, a qual iria durar at 1654,

    centralizada na prspera capitania de Pernambuco.

    Esse perodo singular da vida judaica no Brasil de ser considerado em inteiraconexo com a ocupao holandesa, com ela tendo comeado e tambm tidofim, quase abruptamente.

    Mas, o que impressiona no simplesmente essa coincidncia, seno a rapidezcom que os judeus lograram constituir no Nordeste do Brasil uma comunidadedas mais florescentes do mundo de ento. De fato, cabe descontar atumultuada fase de 1630 a 1635, em que se processou a consolidao daconquista e que foi assinalada por lutas incessantes, que a resistncia tenaz dos

    pernambucanos tornou inevitveis; outrossim se deve deduzir a fase dedecadncia do domnio holands, a qual se estendeu de 1645 a 1654; resta,assim, o perodo de 1635 a 1644, que abrangeu o governo liberal e

    progressista do Conde Maurcio de Nassau, espao esse de apenas 10 anos, oqual, entretanto, bastou aos judeus para alarem a um nvel excepcional a sua

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    vida econmica, social e cultural, dentro do arcabouo de uma organizaocoletiva.

    Aspectos da atividade econmica dos judeus

    A ocupao holandesa do Nordeste do Brasil introduziu profundasmodificaes na vida econmica dos judeus, alargando o seu mbito,

    diversificando os seus ramos ocupacionais e erguendo a sua potencialidade aum grau singular.

    Antes da conquista holandesa, os judeus exerciam, em larga escala, asatividades de plantadores de acar, mas os donos de engenho representavamapenas uma percentagem razovel, e os magnatas no passavam de umaescassa minoria. No mais, a colnia judaica era constituda de pequenoscomerciantes e de profissionais manuais mal remunerados.

    Com o advento dos holandeses e a decorrente implantao de uma grande

    tolerncia religiosa, o panorama foi se alterando. Levas ininterruptas e judeusafluiam a Pernambuco de vrios pases, especialmente da Holanda, trazendocabedais, experincia comercial e um prodigioso esprito de realizao.

    Esses judeus vindos da Holanda - e que em grande parte eram ex-refugiadosde Portugal, Espanha e Frana - tinham a vantagem de falar vrios idiomas:espanhol, francs, ladino e holands, afora o mais importante - portugus, queera a lngua falada no Brasil; era-lhes fcil assim servir de intrpretes para os7.000 homens do exrcito e da marinha holandeses, constitudos demercenrios - holandeses, ingleses, franceses, alemes, polacos e outros - queno falavam o portugus.

    De simples intrpretes, foram rapidamente passando a cambiadores ecomerciantes, de um modo geral a intermedirios, profisso que se tornouquase monoplio dos judeus, com os quais no podiam competir os pequenosnegociantes e operrios brasileiros e flamengos.

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    Por volta de 1638, aproveitando-se do confisco dos engenhos pertencentes aosportugueses, feito pelos governantes holandeses, que puseram essaspropriedades em hasta pblica, os judeus fizeram grandes aquisies porpreos irrisrios.

    No tardou assim que os judeus se tornassem grandes proprietrios urbanos erurais, controlando a vida econmica da Nova Holanda; merece lembrar, comotestemunho disso, que a principal rua do Recife era conhecida como "rua dosJudeus" (depois de 1654 - "rua da Cruz") e o porto era chamado "cais dos

    judeus".

    Um documento da poca, vazado em linguagem pitoresca, ainda que algoexagerada, d um retrato expressivo da rapidez com que se efetuou a ascensoeconmica dos judeus no Brasil Holands:

    "Haviam vindo com os holandeses, quando tomaram a Pernambuco,alguns judeus, os quais, no trazendo mais do que um vestidinho rotosobre si, em breve se fizeram ricos com seus tratos e mofatras, o quesabido por seus parentes, que viviam em Holanda, comearam a virtantos, e de outras partes do Norte, cada um com suas baforinhas, queem quatro dias se fizeram ricos e abundantes, porque, como os maisdeles eram portugueses de nao e haviam fugido de Portugal por temorda Santa Inquisio, e juntamente sabiam falar a lngua flamenga,serviam de lnguas entre os holandeses e portugueses e por esta via

    grangeavam dinheiro, e como os portugueses no entendiam osflamengos, nem eles aos portugueses, e no podiam negociar nascompras e vendas, aqui metiam os judeus a mo comprando as fazendas

    por baixo preo e, logo, sem risco nem perigo, as tornavam a revenderaos portugueses com o ganho certo, sem trabalho algum".

    A prosperidade dos judeus na Nova Holanda no se processou todavia semincmodos. O acrscimo do seu bem estar e o desenvolvimento extraordinriodo seu poderio econmico despertaram inveja e geraram uma perigosainimizade da concorrncia crist.

    Se tais ondas de dio coletivo no tiveram maiores conseqncias, o fato sedeve ao equilibrada de Maurcio de Nassau, que, durante a sua regncia desete anos, trabalhara honestamente para fazer a unio de todas as oposiesreligiosas na colnia, distribuindo justia imparcial: era o primeiro a exigirreparao quando provadas infraes legais cometidas por judeus, mas

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    tambm sabia defend-los com o seu brao poderoso quando os via vtimas deatiamento.

    Aspectos scio-culturais da vida judaica. Isaac Aboab daFonseca

    Sob o domnio holands, criaram-se no Nordeste do Brasil todas as condiesfavorveis ecloso de uma slida comunidade judaica com vida coletiva decaractersticas prprias: a)liberdade de culto; b)suficincia numrica econcentracional; c)continuidade imigratria; d)superioridade cultural.

    a) - LIBERDADE DE CULTO. - J quando de sua organizao, a Companhiadas ndias Ocidentais havia declarado que toda e qualquer crena seriarespeitada na Nova Holanda. Ao assumir o governo o conde Maurcio de

    Nassau, a promessa, que j vinha sendo posta em prtica parcialmente, tornou-se realidade.

    No dizer de Hermann Wtjen: "Aos judeus o Conde tolerante permitiuguardarem a santidade do sbado, havendo feito promulgar que os cristos dosdois credos deveriam considerar o domingo como o dia do Senhor. No mais, oGovernador tinha o ponto de vista de deixar cada um ser feliz da sua forma emPernanbuco".

    Estava, assim, implantada a condio bsica para que pudesse desabrocharuma comunidade judaica no Brasil holands.

    b) - SUFICINCIA NUMRICA E CONCENTRACIONAL. - A tolernciareligiosa, embora indispensvel, no era condio bastante. Fatorcomplementar, da maior importncia, foi o crescimento numrico suficienteda populao judaica e sua concentrao preponderante numa rea restrita,tendo a cidade do Recife como centro.

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    Trata-se a, efetivamente, de duas circunstncias essenciais para que um grupotnico ou cultural logre conservar as caractersticas prprias, sem se deixarabsorver pelo meio dominante.

    E o certo que, sob o domnio holands, a populao judaica cresceudesmesuradamente, concentrando-se em Recife, bastando dizer que, enquantoessa cidade, em 1630, apenas possua 150 casas, j em 1639 ali existiam2.000. Havia judeus em tamanho nmero que, primeira vista, se tinha aimpresso de uma cidade puramente judaica.

    Esse crescimento populacional dos judeus do Brasil resultou principalmenteda intensa imigrao que se operou naquele perodo, vindo para o Brasil - qual

    para uma terra da Promisso - judeus de vrios pases, sobretudo da Holanda,de cujo porto Amsterd partiam continuamente naus carregadas de judeus e

    conversos, sendo que s de uma feita, em 1642, embarcarm 600. Aintensidade da emigrao de judeus dos Pases Baixos para o Brasil ressalta deuma nota escrita por Francisco de Souza Coutinho, embaixador de Portugal naHolanda, em 1644, ao conde de Vidigueira: "Esta terra a me dos cristo-novos, e daqui vo para o Brasil".

    Aos imigrantes do estrangeiro, cabe ainda acrescentar os judeus que, de outraspartes do prprio Brasil, vinham para Pernambuco, em busca de liberdadereligiosa.

    No se sabe exatamente o nmero de judeus no Brasil holands, inclinando-sea maioria dos historiadores para a elevada cifra de 5.000.

    Ainda que esse numero seja exagerado - parecendo mais prudente adotar o de1.500 - o certo que, no apogeu do desenvolvimento da comunidade judaicada Nova Holanda, os judeus representavam cerca de 50% de toda a populaocivil, que ento orava em 3.000.

    Para se ter uma idia da importncia de que, naquele tempo, se revestia umncleo israelita de 1.500 almas, basta lembrar que a prpria comunidade

    judaica de Amsterd, no seu pleno fastgio, no era mais numerosa.

    c) - CONTINUIDADE IMIGRATRIA. - Trata-se de um fator supletivo, degrande ao anti-assimilatria. E o que se verificou, durante mais de doisdecnios de domnio holands, foi justamente - em vez de um restrito nmerode imigraes macias - uma ininterrupta entrada de judeus, refrescando

    permanentemente o esprito de grupo dos judeus j aqui residentes.

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    d) - SUPERIORIDADE CULTURAL - Igualmente, constitui fator contra-aculturativo a superioridade cultural do grupo considerado, em relao aomeio dominante. E, no caso em foco, no resta dvida de que os judeusimigrados - especialmente os oriundos da Holanda - eram elementos deexpresso cultural bastante superior existente no Brasil naquela poca.

    Em face das condies favorveis acima apontadas, compreensvel que fosseevoluindo a passo rpido a vida social dos judeus em Pernambuco, at assumira forma de uma coletividade organizada.

    Nesta altura, havia duas sinagogas - uma no Recife, a outra em Santo Antnio- e um cemitrio prprio, na Boa Vista. Possuiam os judeus pernambucanosuma comunidade sagrada - Cahal Cadoch - chefiada por uma diretoria, sendoconhecidos os componentes de uma delas: David Senior Coronel, Dr.

    Abraham de Mercado, Jacob Mucate e Isaac Castanho.Havia ainda a Congregao Sur Israel do Recife, que mantinha um Pinkes(livro de atas) e baixava hascamot (regulamentos). Assim, os "regulamentos"revistos em 1648 estabeleciam que todos os judeus residentes no "Estado doBrasil" e todos os futuros imigrantes tornavam-se automaticamente membrosda Comunidade Judaica e deviam inscrever os seus nomes no Pinkes comodemonstrao de que aceitavam os regulamentos.

    Tambm na ilha de Itamarac formou-se uma comunidade presidida por um

    rabino prprio, Jacob Lagarto, que foi, alis, o primeiro escritor talmdico naAmrica do Sul.

    Em tal ambiente de segurana e de organizao coletiva, a conscincia degrupo avultou, chegando as festas judaicas a serem celebradas publicamentecom procisso nas ruas.

    O auge desse desenvolvimento scio-cultural - de fundo predominantementereligioso - foi atingido pelos judeus de Pernambuco em 1642, quando

    providenciaram a vinda da Holanda de um insigne lder espiritual, Isaac

    Aboab da Fonseca, que veio acompanhado do "hazan" Moiss Rafael deAguiar.

    ISAAC ABOAB DA FONSECA. Era Isaac Aboab originrio dePortugal, de onde emigrara para Amsterd aos 7 anos. Nesta cidade, por suasqualidades excepcionais, fez brilhante carreira, alcanando altas posies,inclusive a de membro do rabinato.

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    Quando se tratou de enviar um chefe espiritual para o Brasil, foi ele oescolhido pelo presidente da comunidade holandesa, o que, alis, serve paracorroborar a importncia que ento se atribuia coletividade israelita do

    Nordeste brasileiro.

    Ao chegar ao Brasil, j encontrou Aboab uma vida judaica florescente, umcampo amplo para aplicar a sua experincia e o seu alto saber.

    Desdobrou-se ele em vrias atividades, destacando-se os seus admirveisdiscursos sobre leis e costumes judaicos, cujo xito era devido no s aos seusvastos conhecimentos, seno ainda sua extraordinria eloqncia e ao fato dedominar a lngua portuguesa.

    Ao lada das suas atividades rabnicas, continuou Isaac Aboab no Brasil os

    seus trabalhos literrios, tendo escrito, em colaborao com o rabino MoissRafael de Aguiar, a obra "Miimei Iehuda", que trata da vida cultural dosjudeus brasileiros.

    Permaneceu Isaac Aboab fielmente testa da comunidade brasileira at a sua"dbcle" em 1654.

    Decadncia e "dbcle"

    Em 1645, comea a entrar em declnio a vida judaica no Brasil. A bem dizer,j a data de 6 de maio de 1644 - em que Maurcio de Nassau, aps uma sriede desinteligncias com a Companhia das ndias Ocidentais, deixa o governo -marca o incio simblico dessa fase que iria terminar um decnio mais tardecom a melanclica liquidao da pujante comunidade que se havia implantado- aparentemente com tanta solidez - no Nordeste do Brasil.

    A sada de Nassau - esse esprito culto e apaixonado pelos supremos ideaispolticos, que se afeioara ao Brasil, onde, no obstante as violncias daguerra, tentara introduzir adiantados processos administrativos e instituiesliberais - favoreceu sobremodo o nascimento da insurreio pernambucana,

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    pois, em substituio quele notvel estadista que havia grangeado assimpatias gerais da populao, ficara a administrao do domnio holandsentregue ao Supremo Conselho do Recife, composto do negociante Hamel, doourives Bass e do carpinteiro van Bollestraten, indivduos completamenteincapazes para a misso.

    Inutilmente, Nassau, no seu testamento poltico, havia apontado a tolernciacomo uma das diretrizes mais importantes do Governo. O triunviriato que osucedeu implantou um regime opressor e tirnico, inclusive passando a trataros catlicos como infiis, dificultando aos seus sacerdotes a celebrao demissas e expulsando os frades do pas, por suspeit-los beleguins doGovernador da Bahia.

    Os judeus de Pernambuco cedo deram-se conta do que a nova situao viriarepresentar para eles. Previram facilmente que, sem a poltica tolerante eapaziguadora do prncipe de Nassau, seria inevitvel o enfraquecimento e aqueda do domnio holands, ficando eles irremediavelmente expostos sanhados insurrectos pernambucanos.

    Em vista disso, iniciaram o processo de retorno Holanda, tendo emigrado emalguns anos cerca de metade da populao judaica, sobretudo os negociantesmais ricos. O comrcio comeou ento a decair, o dinheiro passou a escassear

    e as tropas j se recusavam a combater; ainda mais - mediante suborno, ossoldados holandeses desertavam com freqncia para o exrcito portugus,que, em verdadeira anttese, possua moral elevadssima.

    Para agravar a situao, a Holanda, que ento se achava em guerra com aInglaterra, no podia prestar a necessria ajuda colnia decadente e osreforos, que todavia lhe mandava, eram insuficientes e extemporneos.

    Embora a conjuntura se apresentasse nitidamente desfavorvel aos holandeses,os judeus que permaneceram em Recife - cerca de 700 - resignaram-se a

    aguardar at o ltimo instante o desfecho da luta, ficando fielmente ao ladodos holandeses e com eles compartilhando de todos os horrores do longo cercoda cidade.

    O que os sitiados tiveram de suportar nesse perodo foi descrito de modocomovente pelo chefe da comunidade israelita, rabino Isaac Aboab daFonseca, que assistiu, do incio ao fim, ao combate desesperado:

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    "Livros no seriam capazes de descrever os nossos sofrimentos. O inimigoespalhava-se nos campos e no mato, espreitando aqui despojos e ali vidas.Muitos de ns morreram de espada na mo, outros por carncia de vveres.Jazem agora na terra fria. Ns, que sobramos, estvamos expostos a morrer dequalquer maneira. Os que antes estavam habituados a iguarias, sentiam-sefelizes quando conseguiam po seco o mofado para acalmar a fome".

    Sobre a atitude de inteira fidelidade aos holandeses, assumida pelos judeusremanescentes de Recife, no faltam pronunciamentos desfavorveis. H, comefeito, quem a considere uma espcie de deslealdade ou ingratido ao Brasil. um erro que cabe corrigir.

    Merece notar desde logo que o Brasil no estava propriamente em jogo. Aosjudeus impunha-se escolher entre dois ocupantes, entre duas potnciasestrangeiras: Portugal e Holanda. De um lado - o pas que perseguia,expulsava e queimava vivos os judeus; do outro - a nao que agia para comos judeus, tanto na metrpole como nas colnias, com a maior tolernciareligiosa. De um lado - a inquisio e os autos de f; do outro - a liberdade deconscincia.

    Entre dois senhores - no havia outra possibilidade de escolha!

    E, alis, procedendo como procederam, os judeus guardaram uma linha deimpecvel coerncia. Eles que, por todas as formas a seu alcane, ajudaram osholandeses a conquistar o nordeste brasileiro, na esperana, no desmentida,de obterem no Brasil um lar tranqilo, no poderiam abondonar os aliados e

    protetores da vspera, no momento em que a sorte comeava a faltar-lhes.

    Tal como souberam os judeus da Nova Holanda armar os seus sonhos - quechegaram a ver em boa parte realizados - tambm mostraram saber suportar asua runa, lutando bravamente at a queda final da sua cidadela, com o que sehaveria de encerrar o ciclo mais fastigioso, embora efmero, da vida judaica

    no Brasil colonial.

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    PERODO PS-HOLANDSDISPERSO E ACOMODAO

    (1654 - 1700)

    O grande xodo

    Com a queda de Recife e subseqente capitulao dos holandeses, entrou emplena desagregao a comunidade israelita no nordeste do Brasil.

    Viram-se ento os judeus dessa regio, aps vrios anos de privaes esofrimentos, em face de uma dolorosa encruzilhada: permanecer no Brasil,onde presenciaram a calamitosa destruio da sua vida coletiva e dos seus

    bens pessoais, e onde os ameaavam os horrores de uma implacvelperseguio - no obstante o arranjo feito pelos holandeses com osportugueses no sentido de ficarem impunes os judeus remanescentes - ou

    emigrar em busca de refgio, onde pudessem reconstruir as suas vidas.

    Uma pequena parcela resignou-se permanncia no Brasil, dispersando-sepelo seu territrio, enquanto o grosso optou pela emigrao. Destes, um grupo- constitudo provavelmente dos mais ricos e mais relacionados na Holanda,entre eles o prprio chefe da comunidade rabino Isaac Aboab da Fonseca -decidiu retornar a esse pas - ilha de liberdade no vasto oceano de intolernciaque ento era o continente europeu - ao passo que a maioria, a parte mais

    pobre, preferiu enfrentar o desconhecido, aventurando-se em direo das maislongnquas paragens das trs Amricas.

    Os que regressaram Holanda, ali se reintegraram na comunidade israelita,sem deixarem maiores vestgios. Os outros, pulverizados entre diversascolnias francesas, inglesas e holandesas das Amricas, lanaram nas novas

    ptrias a afirmao pujante da sua vitalidade, contribuindo eficazmente para odesenvolvimento econmico das mesmas e implantando aglomeraes

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    judaicas, uma das quais viria a ser nos tempos modernos a extraordinriacomunidade israelita dos Estados Unidos da Amrica do Norte.

    O destino dos fugitivos nas colnias americanas

    O xodo dos judeus brasileiros para as colnias europias nas Amricas tomoutrs rumos: Guianas, Antilhas e Nova Holanda (Amrica do Norte), dos quais

    o segundo foi que atraiu a maioria.Guianas. - De comeo, um grupo de judeus fugitivos, sob a direo de David

    Nassib, fixou-se em Caiena (1657), donde, por ter sido hostilizado peloshabitantes locais, passou mais tarde para Surinam, que naquele tempo era umacolnia inglesa, somente vindo a ser conquistada em 1667 pelos holandeses.

    Em Surinam, os judeus contriburam substancialmente para odesenvolvimento da colnia, base da cultura da cana de acar, e, graas absoluta liberdade de que gozavam, foram crescendo em nmero e se

    organizando em uma comunidade duradoura que, em fins do sculo XVIII,chegou a contar mais de 1.300 almas. O ncleo mais importante - com 1.045judeus numa populao de 2.000 - ficava nos arredores de Paramaribo e eraconhecido como "Savana Judea".

    Antilhas. - A primeira leva de judeus procurou atingir a Martinica, que gozavada fama de ser bem administrada pelo governador Parquet. Este, entretanto,embora a princpio disposto a aceit-los, resolveu, por influncia dos jesutas,no permitir o desembarque, o que fez com que os forasteiros, em nmero de900, seguissem para Guadalupe, onde foram acolhidos e, bem depressa,

    prosperaram.

    Mais tarde, Parquet, arrependido, permitiu que outras levas de judeus seestabelecessem na ilha, a qual passou ento a experimentar enorme progressona agricultura e no comrcio.

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    Outro grupo atingiu Barbados, onde j havia alguns cristos-novos trazidospelos ingleses e que, acrescidos agora dos judeus brasileiros, deram um forteincremento indstria do acar.

    Finalmente, vrios outros grupos estabeleceram-se em Jamaica e SoDomingos, dedicando-se, como sempre, sua tradicional ocupao - indstriaaucareira.

    Graas a esse concurso dos judeus foragidos do Brasil, conseguiu a AmricaCentral estabelecer o seu monoplio no mercado mundial de acar,monoplio esse que antes estava nas mos do Brasil.

    Forneceram, assim, aqueles judeus s colnias centro-americanas oselementos de riqueza que, por influncia da desastrada poltica dos monarcas

    portugueses, o Brasil desprezara!Amrica do Norte. - Um grupo de judeus, numericamente pequeno, porm deimportncia significativa para a histria dos judeus no Novo Mundo, deixouRecife, logo depois da sua queda, em direo longnqua Nova Amsterd(atual Nova York), ento capital da Nova Holanda norte-americana.

    Quando esse grupo de 23 judeus, levado pelo navio de guerra francs "St.Charles", acampou em 12 de setembro de 1654, margem do Hudson, era suaesperana encontrar ali boa acolhida, por se tratar de uma colnia holandesa.

    Entretanto, o governador da colnia, Pierre Stuyvesant, autcrata e anti-semita, fantico e inflexvel em matria de religio, exigiu a retirada desses"inimigos e blasfemadores do nome de Cristo". E foi somente graas interveno da Companhia das ndias Ocidentais - em cujo seio acionistas

    judeus exerciam influncia - que afinal se permitiu a permanncia dos 23judeus brasileiros na aldeia de Nova Amsterd, com a condio de que "ospobres entre eles fossem mantidos por sua prpria nao", que no exercessemcargos pblicos, que no se dedicassem ao comrcio a varejo, e que nofundassem congregao.

    Evidentemente, tais restries passaram em breve a ser letra morta, pois,decorridos apenas dois anos, j haviam os judeus, sob a liderana de AsserLevy, conseguido adquirir um terreno para um cemitrio prprio.

    Pouco mais tarde, tendo os ingleses se apoderado em 1664 das colniasholandesas da Amrica do Norte, os judeus passaram a gozar de absolutaliberdade de conscincia, podendo assim consolidar a sua comunidade e

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    disseminar-se pelo pas, onde, com o correr dos sculos, viria desenvolver-se amaior das coletividades israelitas do mundo, tendo como principal centro acidade de Nova York, justamente a antiga aldeia de Nova Amsterd onde, emmeados do sculo XVII, um punhado de judeus brasileiros fugitivosestabelecera a primeira aglomerao judaica da Amrica do Norte.

    A acomodao no Brasil

    Como j foi mencionado, o xodo que se verificou aps a expulso dosholandeses no abrangeu a totalidade da populao judaica do nordeste doBrasil. Certo nmero de marranos resolveu permanecer na terra que haviaaprendido a amar, confiando no s no compromisso estipulado no tratado decapitulao dos holandeses no sentido de que os judeus remanescentes noseriam molestados, como ainda no ambiente de relativa tolerncia religiosaque ento reinava em Portugal.

    Contribuiu para tal ambiente a influncia do padre jesuta Antnio Vieira,

    enrgico, persistente e abnegado defensor dos judeus. O ardor com que lutoupela sua causa provinha-lhe da convico de que os judeus no podiam serjamais um perigo para Portugal: e de que, ao contrrio, eles eram a energiavital da nao, tornando-se assim urgente chamar de volta os judeus expulsosou foragidos com o fim de revigorar as foras empobrecidas. O maisimportante dos trabalhos que escreveu em defesa dos judeus intitulava-se:"Proposta feita a el-rei D. Joo IV, em que se lhe representa o miservelestado do reino e a necessidade, que havia, de admitir os judeus mercadores,que andavam por diversas partes da Europa".

    Graas viso esclarecida e aos esforos do padre Antnio Vieira, fundou-se,em 8 de maro de 1649, a Companhia Geral do Brasil, semelhante Companhia anteriormente criada pelos holandeses, tendo os cristos-novosricos do pas subscrito grande nmero de aes da nova sociedade. Comocontrapartida, obtiveram os cristos-novos vrias concesses tais como a

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    iseno do confisco dos seus bens e facilidades para comerciarem e setransportarem ao Brasil.

    Em tais condies, compreende-se que, com a retirada dos holandeses doBrasil, e apagados os primeiros ressentimentos, pudessem os judeusremanescentes difundir-se pacificamente pelo territrio brasileiro, inclusiveem reas do prprio Nordeste, reduzindo ao mnimo as aparncias da suaorigem judaica.

    certo que, decorridos alguns anos, tendo falecido D. Joo IV em 1656, aInquisio conseguiu pr termo tolerncia anteriormente instituda para comos judeus e - sem se esquecer de vingar-se do padre Vieira - fez recrudescer as

    perseguies. Estas culminaram com a promulgao da lei de 9 de setembrode 1683, que determinava a expulso dos cristos-novos e a aplicao da pena

    de morte aos que voltassem ao pas.Os efeitos dessa nova onda de perseguies no alcanaram todavia de formasensvel o Brasil, tendo at contribudo para que se intensificasse a vinda doscristos-novos acossados em Portugal.

    E, assim, pde a populao do Brasil, no somente recompor-se do tremendoabalo sofrido com a desagregao ps-holandesa, mas ainda experimentar umrazovel crescimento numrico.

    Do exposto, cabe concluir, portanto, que a segunda metade do sculo XVII foium perodo de lenta e discreta acomodao dos judeus no Brasil: um perodocertamente sem brilho e sem quaisquer manifestaes de vida coletiva judaica,mas tambm sem grandes abalos, sofrimentos e disabores.

    PERODO DAS GRANDES PERSEGUIES(1700 - 1770)

    Apogeu da inquisio portuguesa e sua repercusso noBrasil

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    A acomodao, to bem levada a efeito pelos judeus brasileiros na segundametade do sculo XVII, no logrou transpor o umbral do sculo seguinte,quando, afinal, a Inquisio de Lisboa, cujas garras at ento mal haviamconseguido arranhar a populao judaica do Brasil, acabou estendendo sobreeste pas a sua implacvel rede de perseguies.

    Essa onda de terror que, com algumas intermitncias, se desdobrou por longos70 anos, com especial virulncia nos perodos de 1707 a 1711 e 1729 a 1739,conferiu primeira metade do sculo XVIII as caractersticas de poca negrada histria dos judeus no Brasil.

    Vrias razes, entre essenciais e subsidirias, contribuiram para esses trgicoseventos.

    Em primeiro lugar, a perseguio aos cristos-novos em Portugal atingiraento justamente o seu apogeu, assumindo ali a obra vandlica da Inquisioaspectos verdadeiramente pavorosos. "Despovoavam-se extensas zonas do

    pas e a Europa contemplava atnita uma nao que se destrua ordem debroncos frades". No admira, pois, que tal fria infrene acabasse tambmrepercutindo nesta banda do oceano.

    Por outro lado, os judeus brasileiros, graas ao seu ajustamento econmico esocial, operado na segunda metade do sculo XVII, haviam voltado aconstituir uma parcela das mais opulentas da colnia; havia, pois, bens a

    confiscar, e com facilidade!

    E, se isso no bastasse, fra designado bispo do Rio de Janeiro - D. Franciscode So Jernimo, que exercera, em vora, o cargo de qualificador do SantoOfcio, ali se distinguindo pela sua intolerncia religiosa e pelo seu rancorcontra a raa hebria.

    To furiosa passou a ser ento a caa aos judeus brasileiros, principalmente noRio de Janeiro e na Paraba, que, s entre 1707 e 1711, mais de 500 pessoasforam levadas prisioneiras para a Inquisio de Lisboa.

    O pnico se fez geral, paralisando por completo o desenvolvimento dasrelaes mercantis da colnia com a metrpole, e a esta causando to srios

    prejuzos que a coroa portuguesa afinal se viu forada a proibir queprosseguisse o confisco dos engenhos de acar, na maioria pertencentes aindivduos de origem judaica.

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    Sucedeu ento uma relativa acalmia, que, entretanto, no chegou a durar 20anos. Tendo neste interregno os judeus se refeito dos abalos anteriores emesmo voltado a enriquecer graas ao incremento da explorao das minas deouro e do comrcio de diamantes, recomeou a sanha dos inquisidores,atrados pelas renascidas perspectivas de macios confiscos.

    A nova fase de perseguies, mais intensa durante o decnio 1729-1739,prosseguiu, praticamente at 1770, quando outras condies vieram extirpar, epara sempre, o cancro da inquisio, que tanto manchara a histria de Portugale tanto fizera decair esse grande imprio dos tempos manoelinos.

    At hoje no se sabe ao certo quantos judeus oriundos do Brasil caramvtimas da Inquisio de Portugal.

    H quem avalie em apenas 400 o nmero dos judaizantes brasileirosprocessados, dos quais no mais de 18 teriam sofrido a pena capital; so cifrasrelativamente modestas, no perfazendo seno 1 a 2% do total de processos econdenaes da Inquisio nos seus 230 anos de funcionamento em Portugal.Mas, tal estimativa parece longe de dar uma idia exata da extenso que naverdade a tragdia assumiu, pois que, ainda hoje, existem nos arquivos daTorre de Tombo, em Lisboa, 40.000 processos da Inquisio, cujos mistriosaguardam o trabalho paciente dos que se disponham a investig-los pararevelar histria toda a sua hediondez.

    Antnio Jos da Silva: "O Judeu"

    Entre as vtimas brasileiras da Inquisio portuguesa, na fase da sua mais

    nefanda atuao, figura Antnio Jos da Silva, nascido no Rio de Janeiro, em1705, e que, por consenso geral, considerado descendente de judeus.

    Aos oito anos de idade, transladou-se ele com seu pai para Lisboa, aondeacabava de ser enviada como prisioneira a sua me, acusada como fra de

    judasmo pelos agentes da Inquisio.

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    Em Portugal, freqentou Antnio Jos colgio e universidade, semprerevelando excepcionais dotes de inteligncia e invulgar pendor literrio. Em

    poucos anos, seu esprito criador enriqueceu a literatura portuguesa denumerosas peas teatrais de singular valor, galgando ele os mais altos degrausda fama e da popularidade.

    Como de suas peas, genialmente arquitetadas, com freqncia extravasasseum sarcasmo sem rebuos contra a torpe atividade da Inquisio, esta omarcou e no mais descansou no af de elimin-lo.

    E ela conseguiu o seu intento, no obstante o prestgio imenso do poeta.Tentara a princpio intimid-lo, confiscando-lhe os bens e esmagando-lhe osdedos - ato este praticado na igreja de So Domingos em 13 de outubro de1726 - na esperana de que assim no mais viesse a manejar a sua pena

    mordaz. Vendo, porm, que com isso ainda mais haviam acirrado o seu dioao monstruoso tribunal, os inquisidores enredaram Antnio Jos da Silvanuma complicada trama de denncias e falsos testemunhos, entre os quais o deque ele ria do nome de Cristo, jejuava s segundas e quintas-feiras, vestiaroupa limpa aos sbados, e rezava o Padre Nosso substituindo, no fim, o nomede Jesus pelo de Abrao e do Deus de Israel.

    E assim, inapelavelmente condenado pena capital em 11 de maro de 1739,foi Antnio Jos da Silva - cognominado "O Judeu" - queimado, em 21 deoutubro do mesmo ano, na praa pblica, no tendo faltado sequer alguns

    requintes de crueldade: foram obrigadas a assistir ao ato - a sua me,septuagenria, sua mulher e sua filha de quatro anos.

    Uma das maiores expresses da genialidade judaico-brasileira acabava depagar com a preciosa vida o seu inconformismo com a bestialidade daInquisio!

    PERODO PR-ASSIMILATRIO(1770 - 1824)

    Disposies liberais em PortugalO Marqus de Pombal

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    Em 1770, teve incio um novo ciclo para a vida judaica no Brasil, sem

    nenhuma semelhana com todo o seu passado. As cinco dcadas seguintesconstituem uma fase de transio para uma poltica liberal, que no maissofreria retrocessos, ampliando cada vez suas conquistas at a eclosodefinitiva em 1824, aps a proclamao da independncia do Brasil e suaconstitucionalizao.

    Em Portugal, o cenrio mudara e a Inquisio acabava de entrar nos seusltimos estertores, golpeada de morte pelo clarividente e poderoso ministroSebastio Jos de Carvalho e Melo, conhecido como o Marqus de Pombal.

    J em 5 de outubro de 1768, como medida precursora, havia esse estadistaexcepcional desarmado os denominados "puritanos", isto , os nobres quetimbravam em no se alinhar a sangue suspeito de cristo-novo: determinou oMarqus um prazo de 4 meses queles que tivessem filhos em idadecasadoura, para que procedessem a enlaces com famlias at ento excludas.

    Poucos anos depois, em 25 de maio de 1773, conseguiu ele junto ao rei, D.Jos I, a promulgao de uma lei que extinguiu as diferenas entre cristos-velhos e cristos-novos, revogando todos os decretos e disposies at entovigorantes com respeito discriminao contra os cristos-novos. As

    penalidades pela simples aplicao da palavra "cristo-novo" a quem quer quefosse, por escrito ou oralmente, eram pesadas: para o povo - chicoteamento em

    praa pblica e banimento para Angola; para os nobres - perda dos ttulos,cargos, penses e condecoraes; para o clero - banimento de Portugal.

    Finalmente, um ano mais tarde, em 1 de outubro de 1774, foi a referida leiregulamentada por um decreto, que sujeitava os veredictos do Santo Ofcio sano real.

    E assim, com essa restrio, estava praticamente anulada a Inquisioportuguesa.

    *

    Sobre o especial empenho do Marqus de Pombal junto ao rei em favor daextino de quaisquer discriminaes contra os cristos-novos, encontra-se na

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    "Histria Universal do Povo Judeu" de S. Dubnov, a seguinte conjetura: "Mas,consta que o rei manifestou o desejo de que os marranos fossem pelo menosreconhecveis por um sinal especial. Ento, Pombal tirou trs chapusamarelos, dos que usavam os judeus em Roma, explicando que um seriadestinado a ele prprio, outro ao inquisidor geral e o terceiro ao rei, vistocomo ningum - disse ele - podia estar certo de que nas suas veias no corria osangue dos marranos".

    Repercusso no BrasilTratado de comrcio de 1810

    Proclamao da Independncia do Brasil

    A repercusso das disposies pombalinas no Brasil foi automtica e eficaz.Aps setenta anos de perseguies tremendas, estavam os cristos-novos

    brasileiros ansiosos de se igualarem aos demais habitantes do pas, dos quais,na realidade, freqentemente em nada se distinguiam, a no ser pela

    discriminao que lhes era imposta. Assim, nesse ambiente j por si propcio -favorecido ainda pelos intensos cruzamentos tnicos e processostransculturativos que se vinham verificando naquela poca, graas mutaoeconmica parcial da base agrria para a de minerao - o liberalismo da novalei foi um franco estmulo completa assimilao dos cristos-novos.

    Bem entendido, esse processo de integrao no se fez de pronto, nem demaneira cabal, pois que no desaparecera a desconfiana com relao sreviravoltas polticas da coroa portuguesa.

    Tanto assim que, masmo 25 anos mais tarde, quando, pelo tratado de comrcioformado em 19 de fevereiro de 1810, na cidade do Rio de Janeiro, entre aInglaterra e Portugal, foi dado mais um passo frente no caminho daliberalizao, ficando oficialmente proibidas as atividades da Inquisio noBrasil, o governo de Porgutal ainda receava os judaizantes.

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    como se explica que, no mesmo artigo n 12 do aludido tratado, em que sedispunha que:

    "nem os vassalos da Grande B