boletim novas alianças #11: sinase

7
N o caso do atendimento de adolescen- tes em conflito com a lei, há apenas dois caminhos: ou a rede de garantia dos direitos se articula pela superação do ato infracional ou meninos e meninas continuarão imersos em seu histórico de violação de direi- tos. Desde 2002, ano em que foram iniciadas as primeiras discussões sobre o Sistema Nacio- nal de Atendimento Socioeducativo, a temática da execução das medidas em meio aberto tem ganhado cada vez mais espaço dentro de fó- runs, conselhos, gabinetes, rodas de conversa e debates sobre as políticas públicas da infância e da adolescência. No entanto, em muitas loca- lidades do país permanece a lógica da interna- ção como sendo o principal encaminhamento aos adolescentes que cometem ato infracional. No intuito de regulamentar a execução dessas medidas e tornar claro o papel dos di- ferentes atores e instâncias dentro desse pro- cesso, o Sinase, até então validado como uma normativa nacional, passou a vigorar como lei federal em abril deste ano. A lei 12.594 traz de forma clara a responsabilidade dos três entes federados em relação ao atendimento socioe- ducativo, além de apresentar orientações para uma política mais integrada, capaz de envolver as diferentes áreas, como saúde, educação e assistência social. Dentro desse Sistema, governos, con- selhos e sociedade civil são chamados a tirar as diretrizes do papel e incentivar o diálogo en- tre os diferentes atores que compõe o Sistema de Garantia dos Direitos (SGD). É importante que os municípios repensem e discutam as for- mas como esses adolescentes têm sido atendi- dos de modo a aprimorar a oferta das medidas em meio aberto. Será que os programas disponíveis no município têm possibilitado ao adolescente em conflito com a lei novas alternativas para a superação do ato infracional? As medidas em meio aberto têm tratado adolescentes a partir do viés da proteção integral, preconi- zado pelo Estatuto da Criança e do Adoles- cente? A rede de garantia dos direitos tem conseguido articular soluções para os desa- fios que surgem em torno do atendimento socioeducativo? O boletim Novas Alianças pretende orientar os municípios acerca dos aspectos necessários à implementação do Sinase, fo- mentar a reflexão em torno deste Sistema em âmbito local e contribuir para que novas alter- nativas sejam consideradas, tendo em vista a articulação entre as várias políticas. Neste material, estão disponíveis informações sobre a estruturação das medidas socioeducativas em meio aberto, a atuação da rede de garantia dos direitos e as formas de financiamento dos programas de atendimento ao adolescente au- tor de ato infracional. ALIANÇAS 11 BOLETIM INFORMATIVO DO PROGRAMA NOVAS ALIANÇAS JULHO DE 2012 1 OU NO CENTRO DAS POLÍTICAS? n vas EDITORIAL NOS CENTROS DE INTERNAÇÃO? SINASE AGORA É LEI

Upload: oficina-de-imagens

Post on 03-Apr-2016

222 views

Category:

Documents


9 download

DESCRIPTION

De 2009 a 2013, a Oficina de Imagens produziu boletins informativos do Programa Novas Alianças, iniciativa voltada para a formação sobre orçamento público e direitos da criança e do adolescente.

TRANSCRIPT

Page 1: Boletim Novas Alianças #11: Sinase

No caso do atendimento de adolescen-tes em conflito com a lei, há apenas dois caminhos: ou a rede de garantia

dos direitos se articula pela superação do ato infracional ou meninos e meninas continuarão imersos em seu histórico de violação de direi-tos. Desde 2002, ano em que foram iniciadas as primeiras discussões sobre o Sistema Nacio-nal de Atendimento Socioeducativo, a temática da execução das medidas em meio aberto tem ganhado cada vez mais espaço dentro de fó-runs, conselhos, gabinetes, rodas de conversa e debates sobre as políticas públicas da infância e da adolescência. No entanto, em muitas loca-lidades do país permanece a lógica da interna-ção como sendo o principal encaminhamento aos adolescentes que cometem ato infracional.

No intuito de regulamentar a execução dessas medidas e tornar claro o papel dos di-ferentes atores e instâncias dentro desse pro-cesso, o Sinase, até então validado como uma normativa nacional, passou a vigorar como lei federal em abril deste ano. A lei 12.594 traz de forma clara a responsabilidade dos três entes federados em relação ao atendimento socioe-ducativo, além de apresentar orientações para uma política mais integrada, capaz de envolver as diferentes áreas, como saúde, educação e assistência social.

Dentro desse Sistema, governos, con-selhos e sociedade civil são chamados a tirar

as diretrizes do papel e incentivar o diálogo en-tre os diferentes atores que compõe o Sistema de Garantia dos Direitos (SGD). É importante que os municípios repensem e discutam as for-mas como esses adolescentes têm sido atendi-dos de modo a aprimorar a oferta das medidas em meio aberto.

Será que os programas disponíveis no município têm possibilitado ao adolescente em conflito com a lei novas alternativas para a superação do ato infracional? As medidas em meio aberto têm tratado adolescentes a partir do viés da proteção integral, preconi-zado pelo Estatuto da Criança e do Adoles-cente? A rede de garantia dos direitos tem conseguido articular soluções para os desa-fios que surgem em torno do atendimento socioeducativo?

O boletim Novas Alianças pretende orientar os municípios acerca dos aspectos necessários à implementação do Sinase, fo-mentar a reflexão em torno deste Sistema em âmbito local e contribuir para que novas alter-nativas sejam consideradas, tendo em vista a articulação entre as várias políticas. Neste material, estão disponíveis informações sobre a estruturação das medidas socioeducativas em meio aberto, a atuação da rede de garantia dos direitos e as formas de financiamento dos programas de atendimento ao adolescente au-tor de ato infracional.

ALIANÇAS

11BOLETIM INFORMATIVO DOPROGRAMA NOVAS ALIANÇASJULHO DE 2012

1

OU NO CENTRO DAS POLÍTICAS?

n vas

EDITORIAL

NOS CENTROS DE INTERNAÇÃO?

SINASE AGORA É LEI

Page 2: Boletim Novas Alianças #11: Sinase

Como o próprio nome já diz, o Sinase é o sistema responsável por integrar as diversas políticas para o atendimento de adolescentes que cometem ato in-

fracional. Saúde, educação, esporte, cultura, convivência familiar e comunitária são direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente e devem ser garantidos a garo-tos e garotas, inclusive aos que se encontram em conflito com a lei. No entanto, em muitos municípios, os serviços direcionados ao atendimento desses cidadãos ainda não são encarados como política pública, o que pode preju-dicar a superação do ato infracional e a integração dos adolescentes na comunidade e na família.

No intuito de regulamentar a execução das medi-das, o Sinase, sancionado em janeiro pela presidente Dil-ma Roussef, se tornou lei em abril deste ano. Desde 2006, o Sistema tem sido implementado no país a partir da reso-lução 119 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que trata de sua organização e apresenta parâmetros para a execução das medidas. A lei 12.594 vem então aperfeiçoar e ratificar o que já vinha sendo construído e responsabilizar aqueles que não zela-rem pelo seu cumprimento. “A lei é muito mais rigorosa do que a resolução do Conanda. Ela já define como vai ser a responsabilização dos atores do SGD que estão envolvi-dos no cumprimento e execução da medida socioeducati-va que não se atentarem ao que diz a legislação”, afirma a presidente do Conanda, Miriam Santos. Nos artigos 28 e 29 da nova lei estão dispostas as medidas previstas para os operadores e gestores que desrespeitarem o seu cum-primento.

A legislação traz também outros pontos importan-tes acerca da implementação do Sistema em todo o país. Dentre eles, estão as atribuições dos municípios, estados e União no que se refere à gestão, financiamento do Sinase e à elaboração dos planos de atendimento socioeducati-vo. Outra novidade trazida pela lei é que parte dos recur-sos dos Fundos da Infância e da Adolescência deverão ser obrigatoriamente direcionados ao Sistema. A lei também cria o Sistema Nacional de Informações sobre Atendimen-

to Socioeducativo e o Sistema Nacional de Avaliação e Acompanhamento do Sinase e define os direitos individu-ais dos adolescentes em conflito com a lei.

De acordo com o Sinase, é responsabilidade do município implementar e manter em funcionamento os programas de medida socioeducativa em meio aberto, ou seja, Prestação de Serviço à Comunidade (PSC) e Liber-dade Assistida (LA). No entanto, ainda não são todos os municípios que executam essas medidas. Para Mari-lene Cruz, coordenadora nacional da Pastoral do Menor, organização que tem participado das discussões sobre o Sinase desde 2002, mesmo quando as medidas socioedu-cativas são ofertadas pelos municípios, nem sempre elas são encaradas como uma política. “O atendimento ao adolescente autor de ato infracional é implementado sem uma preparação prévia dos técnicos, sem um estudo de como devem ser essas medidas e sem um programa espe-cífico. Não adianta só atender o menino. Ele vai lá toda a semana, mas ele precisa ser acompanhado na escola, na saúde, no esporte, na cultura”, comenta.

Nos municípios, a unidade do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) responsável pela execução das medidas de PSC e LA é o Centro de Referência Especiali-zado de Assistência Social, o Creas. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), das 2.116 unidades de Creas contabilizadas em 2011, 1.437 ofereciam o serviço de atendimento aos adolescentes que cumprem medida de PSC e LA. A falta de preparação das equipes dessas unidades para realizar o atendimento es-pecializado ao adolescente que comete ato infracional e o fato do Creas não estar universalizado em todos os mu-nicípios brasileiros têm sido colocados como os principais desafios relacionados à oferta desse serviço.

Para o procurador aposentado do estado da Bahia, Wanderlino Nogueira Neto, cada município deve discutir a política de atendimento socioeducativo de forma articula-da a fim de construir alternativas apropriadas à sua realida-de. “O município deve tentar articular a política de direitos humanos de criança e adolescente e a política de assis-tência social. A solução passa pela formação e capacita-ção das equipes do Creas. Outra possibilidade é repassar a execução da medida judicial socioeducativa pra ONGs, equipes especializadas”, comenta.

Os municípios podem estabelecer convênios com entidades e organizações não governamentais para ofer-tar esse serviço ou até mesmo consórcios com municípios mais próximos que executem as medidas em meio aber-

UM SISTEMA, VÁRIAS ENGRENAGENS

2

Além das medidas de meio aberto PSC e LA, existem outras quatro: advertência, obrigação de reparar o dano, inserção em regime de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional. No caso de PSC, os adolescentes realizam tarefas de relevância comunitária em entidades assistenciais e organizações. A LA consiste em um processo de acompanhamento, auxílio e orientação ao adolescente.

Políticas em funcionamento

LINHA DO TEMPO DO SINASE

O ECA traz desde sua promulgação, a questão da municipalização das medidas socioeducativas em meio aberto.

Começam os primeiros encontros para se pensar os parâmetros de execução das medidas em meio aberto. O Conanda e a Secretaria de Direitos Humanos (SDH), em parceria com a Associação Brasileira de Magistrados e Promotores da Infância e Juventude (ABMP) e o Fórum Nacional de Organizações Governamentais de Atendimento à Criança e ao Adolescente (FONACRIAD) realizaram encontros pelo país com o objetivo de subsidiar o Conanda na elaboração de diretrizes sobre o atendimento socioeducativo.

2002A SDH, por meio da Subsecretaria Especial de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, juntamente com o Conanda e o Unicef sistematizam a proposta do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo.

2004

Page 3: Boletim Novas Alianças #11: Sinase

to. Caso não tenham Creas, os municípios também podem ofertar as medidas por meio de uma equipe vinculada à secretaria de as-sistência social especializada no atendimento dos adolescentes que cometem ato infracio-nal.

Para Andrea Carelli, coordenadora do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça da Infância e Juventude de Minas Gerais, é importante que o Conselho Estadu-al dos Direitos da Criança e do Adolescente oriente os municípios acerca da oferta dessas medidas por meio de diretrizes e do Plano Es-tadual de Atendimento Socioeducativo, que juntamente com o Plano Nacional, deve sub-sidiar a elaboração dos Planos Municipais.

O atendimento socioeducativo de ado-lescentes em conflito com a lei deve ser tratado como política pública. Por isso, a importância de se assegurar os recursos para que os servi-ços sejam ofertados de forma continuada. A lei 12.594 assegura que municípios, estados e União devem se responsabilizar pelo financia-mento do Sinase, dentro das atribuições que lhe cabem. A legislação também traz uma no-vidade em relação ao financiamento de algu-mas ações pelos Fundos da Infância e da Ado-lescência: é obrigatório que os Conselhos dos Direitos das três esferas definam anualmente o percentual do FIA que será direcionado ao Sinase.

No entanto, os recursos do FIA não podem ser investidos na estruturação do ser-viço, mas em outras atividades, como capaci-tação de equipes e ações de monitoramento do Sistema. “O FIA não deve bancar política pública. Quem banca política pública é o orça-mento público. Mas como os entes federativos não alocam os recursos necessários, acabam alocando o FIA em vez de cobrar que o gestor banque a política”, alerta Andrea Carelli.

Para a presidente do Conanda, Miriam Santos, a formação da equipe técnica res-ponsável pelo atendimento dos adolescentes, identificada como um dos gargalos do Sistema no município, pode vir dos Fundos da Infância, do Fundo da Assistência Social ou outro fundo

do município, a partir da articulação do Con-selho dos Direitos.

É importante que o recurso para a execução das medidas também esteja asse-gurado no orçamento municipal. Verificada a necessidade de se oferecer formas de execu-ção dessa medida, o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente pode se articular junto a Câmara dos Vereadores, Mi-nistério Público e demais atores da rede para garantir que o município resguarde um recurso para a oferta desse serviço, por meio de orga-nizações não governamentais, entidades sem fins lucrativos, entre outros.

Atualmente, existe uma linha de fi-nanciamento federal por meio do Ministério do Desenvolvimento Social referente à oferta de serviços pelo Creas. O MDS co-financia a oferta do Serviço de Proteção Social a Adoles-centes em Cumprimento de Medida Socioedu-cativa de Liberdade Assistida e de Prestação de Serviços à Comunidade: são disponibiliza-dos aos municípios 2.200 reais para cada gru-po de 40 adolescentes. O valor é acrescido ao Piso Fixo de Média Complexidade repassado para os municípios de pequeno, médio e gran-de porte, metrópoles e Distrito Federal, para a oferta de serviços do Creas. Para a diretora, os estados também devem assumir o apoio fi-nanceiro a esse tipo de serviço.

Uma experiência da Pastoral do Me-nor juntamente com a Cáritas no município de Serra (ES) é um exemplo de que a política pode ser financiada pelos três entes federa-dos. A Casa Sol Nascente que hoje trabalha com 250 adolescentes em cumprimento de medida em meio aberto é financiada com recursos do município, estado e União: os recursos assegurados no orçamento munici-pal são direcionados à manutenção da equi-pe técnica e às despesas de infraestrutura, como luz, água e telefone; a ampliação do quadro de profissionais do programa e os cursos de profissionalização para os ado-lescentes são garantidos pelo estado; e a União financia o transporte dos meninos e meninas que participam do programa a par-tir de convênio.

3

Para mais informações sobre o financiamento do MDS, acesse o site www.mds.gov.br e entre na área “Assistência Social”. Na coluna da direita, clique em “Perguntas Frequentes” e em seguida procure o tópico “Pisos PSE”/“Pisos de Média Complexidade”.

Financiamento e responsabilização

Conheça a trajetória do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo desde sua concepção até sua aprovação como lei

O Sinase é apresentado na Câmara dos Deputados como projeto de lei.

2007Foi aprovado, pela resolução 119/2006 do Conanda, o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, documento que tem como objetivo apresentar orientações e estratégias para a execução das medidas socioeducativas em meio aberto e fechado.

2006A resolução 109 do Conselho Nacional de Assistência Social, de novembro de 2009, tipifica o serviço de proteção social a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de Liberdade Assistida e Prestação de Serviço à Comunidade como pertencente ao serviço de proteção especial de média complexidade do SUAS.

2009

O Sinase é sancionado pela presidente Dilma Roussef no dia 18 de janei-ro e passa a vigorar como lei em abril deste ano.

2012

Page 4: Boletim Novas Alianças #11: Sinase

EXPEDIENTE Programa Novas Alianças | Coordenação executiva: Oficina de Imagens – Comunicação e Educação | Coordenadora do Programa: Simone Guabiroba | Aliados estratégicos: ANDI Comunicação e Direitos, Instituto Ágora em Defesa do Eleitor e da Democracia, Frente de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Minas Gerais, Fundação Avina, Fundação Vale e Instituto C&A | Parceiros: Assembleia Legislativa de Minas Gerais – Comissão de Participação Popular e Frente Parlamentar dos Direitos da Criança e do Adolescente, Ministério Público de Minas Gerais | BOLETIM Redação e edição: Oficina de Imagens – Comunicação e Educação | Jornalistas responsáveis: Andrea Souza e Carolina Silveira (11162/MG) | Projeto gráfico: Henrique Milen | Diagramação: Délio Faleiro | Impressão: Artes Gráfica Formato | Tiragem: 2.000 exemplares | Informações (31) 3465-6806 | [email protected]

4

“Quando o adolescente chega ao ponto de cometer um ato infra-cional, é porque todas as políticas

já falharam. Então tem que resgatar tudo isso que ele perdeu.” Segundo Marilene Cruz, da Pastoral do Menor, é a partir de ações articula-das entre os atores do município que será pos-sível garantir o atendimento adequado a meni-nos e meninas em conflito com a lei. “O Sinase coloca o adolescente autor de ato infracional no centro e as diversas políticas formando um sistema de atendimento a esse adolescente”, avalia.

Para a coordenadora da Casa Sol Nas-cente, Serra (ES), Sonia Amâncio, sem uma rede articulada e o envolvimento da comunida-de nesse processo, torna-se muito mais difícil a oferta desse tipo de serviço. São realizadas no município, ao menos uma vez ao mês, reu-niões da rede, onde os atores do SGD são con-vidados a discutir a forma como o atendimento tem sido realizado a esses adolescentes que cometem ato infracional. “A gente discute to-das nossas questões mais emergentes, desde a saúde mental até a questão da ausência de vaga e discriminação no meio escolar. Quando não conseguimos discutir, fazemos uma espé-cie de capacitação para pensarmos o que sig-nifica trabalhar junto, o que é atender o ado-lescente em conflito com a lei e o que precisa ser feito de mais imediato”, comenta Sônia.

Em seu artigo 8º, a lei do Sinase diz que os Planos de Atendimento Socioeducativo de-

REDE EM DIÁLOGO, POLÍTICAS INTEGRADAS

vem prever, obrigatoriamente, ações articula-das nas áreas de educação, saúde, assistência social, cultura e capacitação para o trabalho e esporte aos adolescentes atendidos. Para tra-tar de todas essas políticas, é importante que a rede de garantia dos direitos da criança e do adolescente conheça os programas e serviços existentes no município a partir de um diagnós-tico das políticas da infância e da adolescên-cia. A realização deste diagnóstico é atribuída ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, que deve elaborar seu Plano de Ação de acordo com um conhecimento pré-vio da situação do município.

A partir das informações adquiridas, o município tem condições para pensar a políti-ca de atendimento socioeducativo de acordo com a estrutura existente naquela localidade e construir, de forma conjunta, seu Plano Muni-cipal de Atendimento Socioeducativo. “A par-tir de uma roda de conversa entre as políticas, vamos elaborar um planejamento conjunto. Às vezes o esporte tem lá todos os seus projetos, a própria educação faz o seu atendimento, assim como outros serviços, mas não atende o adolescente autor de ato infracional, nem sabe se ele tem algum papel nesses serviços”, comenta Marilene Cruz. Mesmo que seja dis-cutido com toda a rede, é responsabilidade do gestor municipal elaborar o plano.

De acordo com a lei, os planos dos es-tados, Distrito Federal e municípios devem ser elaborados em até 360 dias a partir da aprova-ção do Plano Nacional. É importante que eles apresentem as diretrizes do serviço que será ofertado no município a fim de dar soluções efetivas à condição dos adolescentes autores de ato infracional e planejem as formas mais adequadas de atendimento a esses jovens. Para Andrea Carelli, o documento auxilia na organização dos papéis dos atores envolvidos na implementação do Sistema. “No plano, to-dos esses acordos vão estar fechados, servin-do até como um instrumento para fixação do fluxo municipal acerca do funcionamento do Sistema”. É importante que também conste no Plano as fontes de financiamento dos progra-mas e as formas de monitoramento e avalia-ção de sua implementação.

Sinase

SUS

SUAS

Sistema Educacional

Sistema de Justiça e Seg.

Pública

Sistema de Garantia dos Direitos

O esquema, encon-trado no documento do Sinase aprovado pelo Conanda em 2006, ilustra a relação do Sistema com políticas públicas essenciais ao seu funcionamento, como saúde, assistên-cia, educação e segu-rança pública.

Page 5: Boletim Novas Alianças #11: Sinase
Page 6: Boletim Novas Alianças #11: Sinase

que precisam ser respeitados durante todo o processo de cumprimento da medida socioeducativa. O adolescente tem o direito, por exemplo, de ser acompanhado por seus pais ou responsável e por seu defensor durante todos os procedimentos.

Outro aspecto é que o adolescente pode peticionar, seja por escrito ou verbalmente, a qualquer autoridade ou órgão público, e deve ser obrigatoriamente respondi-do em até 15 dias. Ele também pode ter acesso ao anda-mento de seu plano individual de atendimento e solicitar sua reavaliação. Caso o adolescente tenha filhos que possuam entre 0 e 5 anos, a lei reforça que essas crian-ças devem ter o direito de atendimento em creche e pré--escola garantido. Esses e outros direitos estão dispostos no artigo 49 da lei. No caso de adolescentes casados ou que vivam em união estável, é garantido o acesso à visita íntima (artigo 68).

O Sinase traz algumas alternativas em relação ao de-senvolvimento de atividades de educação e profissiona-lização aos adolescentes que cometem ato infracional, além de projetos relacionados à questão da drogadição. A nova lei (artigos 76 a 80) cita as escolas do Senai, do Senac e do Senar, no caso de formação profissional rural, como formas de inserir meninos e meninas que cumprem medida socioeducativa em cursos de capacitação. A lei também pontua que o Codefat (Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador) poderá financiar pro-gramas e projetos de educação básica relativos ao Sina-se. No caso da saúde, a legislação identifica a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), órgão gestor do Fundo Nacional Antidrogas (Funad), como possível fi-nanciadora de entidades ligadas ao Sistema.

Outra novidade é que os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, nos três níveis federados, deve-rão direcionar obrigatoriamente parte do Fundo da Infân-cia e da Adolescência ao Sinase. Para mais informações, veja página 3 do boletim.

definiçõesnovas

Em seu artigo 35, o Sinase aponta alguns princípios que precisam ser respeitados no que diz respeito à execução das medidas socioeducativas. Tais aspectos consideram o adolescente em conflito com a lei um sujeito de direitos que deve ter sua “individualidade, capacidades e circunstâncias pessoais respeitadas”. O artigo também pontua que a medida deve ser aplicada pelo princípio da legalidade e, por isso, o adolescente não pode receber tratamento mais gravoso do que o conferido ao adulto. Devem ser priorizadas, sempre que possível, práticas e medidas que sejam restaurativas. O fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários e a não discriminação do adolescente também são princípios presentes na lei.

A nova lei institui o Sistema Nacional de Avaliação e Acompanhamento do Atendimento Socioeducativo. O Sistema tem quatro objetivos: contribuir para organizar a rede de atendimento socioeducativo; assegurar conhe-cimento sobre as ações do atendimento socioeducativo e seus resultados; promover a melhora da qualidade da gestão e do atendimento socioeducativo; e disponibilizar informações sobre o atendimento socioeducativo (artigo 19). A proposta é que o sistema seja informatizado e con-siga apresentar um retrato do Sinase nas instâncias mu-nicipais, estaduais e nacional.

Outra novidade pontuada pelo Sinase em relação à avaliação e acompanhamento é que sejam realizadas avaliações periódicas da implementação dos Planos de Atendimento Socioeducativo em intervalos não superiores a três anos. Esse processo será de responsabilidade da União, em articulação com os estados, o Distrito Federal e os municípios (artigo 18).

Meninos e meninas não deixam de ter seus direitos as-segurados pela legislação mesmo que cometam ato infra-cional. O Sinase traz os direitos individuais desses cidadãos

Execução da medida socioeducativa

Avaliação e acompanhamento do Sinase

Direitos individuais dos adolescentes em conflito com a lei

Novos financiamentos

O Sinase traz uma série de definições importantes acerca da execução das medidas socioeduca-tivas e, apesar de colocar aspectos já presentes na resolução 119/2006 do Conanda, a lei federal 12.594 também avança e pactua novos prazos e ações. Confira abaixo, alguns pontos importan-tes levantados pela nova legislação:

espe

cial

1

Page 7: Boletim Novas Alianças #11: Sinase

Com a regulamentação do Sinase, é importante que os Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente estejam atentos a seus papéis junto às medidas socioeducativas. Vale destacar que a legislação não cria novas funções para o Conselho dos Direitos, mas ratifica suas atribuições dentro do Sistema. Confira quais são elas:

- A resolução 106 do Conanda determina ao Conselho a elaboração de seu plano de ação, que deve estar respaldado por um conhecimento prévio do território. Esse mapeamento da infância e da adolescência no município pode contribuir para que a rede visualize as políticas já existentes e estruture as formas mais adequadas de atendimento dos adolescentes em conflito com a lei.

- De acordo com o artigo 5º, § 3o do Sinase, o Plano Municipal de Atendimento Socioeducativo deve passar pela deliberação do Conselho Municipal dos Direitos, órgão responsável por deliberar e controlar ações do Sistema Municipal de Atendimento Socioeducativo (art. 5°, § 2º).

- É responsabilidade dos Conselhos Municipais realizar o registro dos programas de aten-dimento socioeducativo bem como das entidades executoras. Esta atribuição está prevista no artigo 10º do Sinase e no artigo 91 do ECA.

- De acordo com a resolução 137 do Conanda, o Conselho Municipal é responsável pela ges-tão do Fundo da Infância e da Adolescência e por isso, pela elaboração do Plano de Aplicação desses recursos. A partir de determinação do Sinase, cabe a este órgão destinar um percentual do FIA ao Sistema a fim de financiar ações de capacitação, sistemas de informação e de avaliação. (art. 31)

- Como um órgão responsável pelo acompanhamento da política, é importante que o Conselho Municipal também participe do processo de avaliação do Sinase, como está previsto no artigo 19 da lei.

- De acordo com a nova lei, é papel dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, em todos os níveis federados, juntamente com o sistema de educação pública e as entidades de atendimento, garantir até abril de 2013, a inserção de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa na rede pública de educação.

espe

cial

2

A fim de regularizar o Sistema de Atendi-mento Socioeducativo, foram definidos prazos para que entidades, Conselhos e governos possam se ajustar aos parâmetros da nova lei. Seguem abaixo as principais mudanças e ajustes que devem ser realizados por essas instâncias.

- As entidades que desenvolvem programas de atendimento tinham até julho de 2012 para encaminhar ao respectivo Conselho Estadu-al ou Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente proposta de adequação da sua inscrição, sob pena de interdição. (Artigo 81)

- Os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente municipais, estaduais e nacio-nal, juntamente com os órgãos do sistema de

educação pública e as entidades de atendi-mento, deverão, até janeiro de 2013, garantir a inserção de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa na rede pública de educação, independente da faixa etária e do nível de ensino do adolescente. (Artigo 82)

- Os programas de atendimento socioedu-cativo sob a responsabilidade do Poder Judi-ciário deverão ser obrigatoriamente transferi-dos ao Poder Executivo até janeiro de 2013. (Artigo 83)

- Os programas de internação e semiliber-dade sob a responsabilidade dos Municípios deverão ser obrigatoriamente transferidos para o Poder Executivo do Estado até janeiro de 2013. (Artigo 84)

O CONSELHO MUNICIPAL DOS DIREITOS NO SINASE

PRAZOS IMPORTANTES PACTUADOS PELO SINASE