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Biotecnologia: o que a indústria precisa fazer para entrar nesse mercado Biotecnologia: o que a indústria precisa fazer para entrar nesse mercado Revista DISTRIBUIÇÃO GRATUITA Pedro Palmeira fala sobre os desafios da indústria nacional pág. 8 Projeto de Lei propõe novas regras para o acesso à biodiversidade pág. 12 Edição Especial Revista IPD-Farma • Ano V • Edição 10 • 2014 Biotecnologia: o que a indústria precisa fazer para entrar nesse mercado ENCONTRO NACIONAL DE INOVAÇÃO EM FÁRMACOS E MEDICAMENTOS

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setembro de 2014

ENCONTRO NACIONAL DEINOVAÇÃO EM

FÁRMACOS E MEDICAMENTOS

Centro de Convenções Rebouças, São Paulo - SP

Instituto de Pesquisa e Desenvolvimentode Fármacos e Produtos Farmacêuticos

Realização

Apoio Institucional

Federação Brasileira das Redes Associativistas de Farmácias

Patrocínio

Associados IPD-FARMA

Apoio

Apresentação

SBMFAssociação Brasileira

de Medicina Farmacêutica

Associação Brasileira

de Medicina Farmacêutica

Associação Brasileira

de Medicina Farmacêutica

Copatrocínio

Inscreva-se em:www.ipd-farma.org.br

O 8º ENIFarMed vai reunir representantes de toda a cadeia produ�va, academia e governo para propor projetos que alterem o rumo da indústria nacional com foco na elevação da compe��vidade do setor.

Par�cipe desse movimento!

Inovação na indústria farmacêu�ca

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Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento de Fármacos e Produtos Farmacêuticos

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BIOLÓGICOS

ENTREVISTA

REGULAÇÃO

PRÉ-CLÍNICOS

BIODIVERSIDADE

FARMACÊUTICA VETERINÁRIA

Índice Editorial

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Renovação no setor industrial

A indústria farmacêutica nacional vive um importante momento de transição. A expiração de patentes de biofármacos nos próximos anos abre novas oportunidades de mercado para o Brasil e, ao mesmo tempo, impõe desafios para o setor. Esses desafios envolvem toda a cadeia produtiva e, por isso, são tema desta edição especial da Revista IPD-Farma.

A revista apresenta a reportagem sobre a necessidade de adensamento da cadeia de prestadores de serviços tecnológicos e mostra as dificuldades enfrentadas pelas empresas do setor farmacêutico. A edição também traz uma entrevista exclusiva com Pedro Palmeira, chefe do Defarma do BNDES. Ele faz uma análise do mercado farmacêutico brasileiro e comenta as principais ações do banco para fomentar a inovação no País.

Além disso, a revista conta ainda com a notícia sobre o novo marco regulatório de acesso ao patrimônio genético e os entraves da pesquisa pré-clínica no Brasil. Esses e outros temas relacionados à inovação na indústria farmacêutica serão tema de debate no 8º Encontro Nacional de Fármacos e Medicamentos (ENIFarMed), que acontecerá nos dias 08 e 09 de setembro, em São Paulo.

O evento vai contar com a presença de representantes de toda a cadeia produtiva, academia e governo com o objetivo de definir as estratégias para o desenvolvimento de medicamentos de alta tecnologia no País. Mais do que mobilizar o setor em prol da inovação tecnológica, o 8º ENIFarMed irá reascender antigas discussões para propor projetos que levem à construção de políticas públicas de sucesso, alterando o rumo da indústria nacional.

Boa leitura.

Roberto Nicolsky,Diretor-geral do IPD-Farma

Indústria caminha lentamente quanto à estruturação de uma cadeia produtiva de biotecnológicos. Escassez de prestadores de serviços é o principal gap do setor

Pedro Palmeira, chefe do Defarma do BNDES, fala sobre as oportunidades e desafios do mercado farmacêutico

Excesso de regras e falta de sinergia com as normas internacionais são os gargalos que dificultam o desenvolvimento de produtos inovadores

Mercado apresenta boas oportunidades e atrai a atenção da indústria farmacêutica de saúde humana

Pressão da sociedade para o fim do uso de animais nos testes pré-clínicos evidencia a necessidadede investimentos no desenvolvimento de alternativas

Projeto de Lei em votação no Congresso Nacional deve modernizar a regulamentação de acesso do setor produtivo ao patrimônio genético

Expediente Revista IPD-Farma • Ano V • Edição 10

A Revista IPD-Farma é uma publicação da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica

Acesse: www.ipd-farma.org.br

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Tiragem: 2.500 exemplares

Jornalista responsável: Jessica Gama - MTB 34995 RJ

Colaboração: Claudia Miranda

Coordenação: Mariana Sandroni

Diagramação: Jessica Gama

Diretor-geral: Roberto Nicolsky

Coordenadora: Mariana Sandroni

Gerente de Marketing e Eventos: Alexandre Nicolsky

Webmaster: Ukla Fernandes

Diretor de Arte: Ricardo Meirelles

Comunicação: Jessica Gama

Captação de recursos: Michele Murta

Secretaria: Ingrid Medeiros

Estagiárias: Claudia Miranda e Lívia Sandroni

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Indústria nacional tem como principal desafio adensar a cadeia de serviços de pesquisa e desenvolvimento para ampliar a produção de biológicos no País

indústria farmacêutica brasileira cresceu de forma acelerada na última A década, impulsionada principalmente pela fabricação de medicamentos genéricos e similares de síntese química. No entanto, a alteração do cenário

farmacêutico global com a expiração de patentes de diversos medicamentos biológicos – produtos de alta tecnologia desenvolvidos a partir de células vivas – cria um novo desafio para o setor: a criação de uma indústria de biotecnologia no País. Porém, mesmo com as maiores oportunidades de mercado concentradas nesse campo, o Brasil ainda caminha lentamente quanto à estruturação de uma cadeia produtiva de biotecnologia. Como reflexo, em razão da crescente demanda interna, a importação desses produtos tem aumentado exponencialmente e já representa 35% das compras de medicamentos realizadas pelo País, o que tem contribuído para a elevação do déficit comercial farmacêutico. Os entraves que levam ao atraso da produção de medicamentos biológicos no País serão tema de debate do 8º Encontro Nacional de Fármacos e Medicamentos (ENIFarMed).

Cadeia produtiva precisa se fortalecer para entrar no mercado de alta tecnologia

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Serviços tecnológicos

O desafio da produção de biológicos no País está na alta complexidade do processo produtivo. A produção de produtos biotecnológicos envolve com-petências e etapas complexas como a identificação da nova molécula, desenvol-vimento de um banco de células, definição da formulação farmacêutica pretendida, produção de escala-piloto, ensaios pré-clínicos e clínicos. Esses serviços exigem a formação de uma infraestrutura tecnológi-ca e humana diversificada, que muitas empresas nacionais não possuem ou não estão habituadas a fazer, o que gera a necessidade de contratação de serviços especializados em cada fase da produção.

Entretanto, a oferta de serviços no campo da biotecnologia no País ainda é insuficiente. O baixo investimento das grandes empresas no desenvolvimento de biológicos desestimula o crescimento da cadeia produtiva do setor, o que torna a produção desses medicamentos em terri-tório nacional mais lenta e onerosa. De acordo com João Paulo Pieroni, gerente setorial do Departamento de Produtos para Saúde do BNDES, a principal difi-culdade das empresas que compõem a cadeia de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de biológicos é a insuficiência de demanda da indústria.

“Até recentemente, não havia em-presas envolvidas em atividades de desen-volvimento e produção de medicamentos biológicos com escala suficiente para sustentar empresas na cadeia. Isso trazia outros problemas a reboque, como infra-estrutura inadequada em função dos elevados custos fixos para a manutenção das certificações necessárias e dificuldade de formação e manutenção de recursos humanos qualificados”, explica Pieroni.

Para o gerente, esse cenário levou a cadeia de fornecedores e prestadores de serviços tecnológicos a se tornar o elo frágil da estratégia de difusão da bio-tecnologia no País. A afirmação se deve a demanda criada pelas Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDPs) que ainda é pequena e, por isso, não gera o volume de trabalho necessário para justificar a existência dos negócios.

“É provável que a recente demanda criada pelos grandes projetos de biotecno-logia deva sustentar etapas pontuais da cadeia de P&D, mas ainda não será suficiente para um maior adensamento nas atividades de desenvolvimento tec-nológico conduzidas no País”, alerta.

Como solução para o problema, Pieroni espera que uma reorganização do setor com a formação de parcerias entre

empresas nacionais e parceiros tecnológicos estrangeiros, além da atuação das políticas públicas por meio do poder de compra, financiamento e regulação pos-sam fortalecer o setor. “A visão de longo prazo do BNDES é que o sucesso da estratégia atual de construção das atividades pro-dutivas gere, no futuro, uma de-manda consistente de serviços tecnológicos para a cadeia. O adensamento da cadeia de P&D é fundamental para a construção e a fixação das competências asso-ciadas à biotecnologia moderna no País”, defende.

O problema da falta de demanda da cadeia produtiva de biotecnologia pode ser atribuído à concentração de investi-mentos na produção de biossimilares. Apesar de serem produtos de alta com-plexidade, esses medicamentos não são inovadores por se tratar de um produto similar a um medicamento biológico exis-tente, o que desestimula os aportes na pesquisa de novas moléculas.

Thiago Guia, gerente médico e científico da Bionovis, acredita que uma das causas desse cenário é a inexperiên-cia da indústria brasileira em desenvolver e produzir medicamentos biológicos de maior complexidade como, por exemplo, os anticorpos monoclonais terapêuticos. “A baixa demanda local por uma cadeia de P&D para essas moléculas e para a inovação farmacêutica em geral fez com que um ciclo vicioso se mantivesse, no qual não havia estímulo para que fossem implantados no País centros de pesquisa e empresas de base tecnológica capazes

de oferecer os diversos serviços necessá-rios para complementar as atividades dessa indústria”, ressalta.

Segundo Guia, o desinteresse no desenvolvimento de produtos inovadores tem levado as indústrias a encontrar empresas sem o domínio regulatório e de gestão necessários para oferecer serviços de forma competitiva para a indústria bio-farmacêutica. “No momento de realizar a etapa analítica, na qual serão dosadas as concentrações séricas do biossimilar e do produto referência, temos que enviar essas amostras para o exterior, onde há empresas com as metodologias necessári-as já implementadas e validadas”, explica.

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O adensamento da cadeia de P&D

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Modelo de negócios

As dificuldades enfrentadas pelos prestadores de serviços não se restringem à falta de demanda da indústria. As empresas de base tecnológica que compõem a cadeia produtiva de biotecno-logia enfrentam fatores como o alto custo para montagem da infraestrutura dos laboratórios, escassez de recursos hu-manos qualificados e a elevada carga tributária e trabalhista que contrastam com a dinâmica do mercado internacional.

Taíla Lemos, diretora executiva da Gentros, acredita que a questão chave para as empresas de base tecnológica manterem a competitividade está na sustentabilidade do modelo de negócios. Segundo ela, para oferecer serviços tecnológicos de alta complexidade, as empresas precisam aprender a contornar a baixa demanda da indústria nacional e oferecer serviços mais simples para pagar o custo da infraestrutura, além de buscar clientes fora do território brasileiro. “É preciso tentar explorar o mercado inter-nacional, como China e Índia fizeram. Eles se desenvolveram prestando serviços para os Estados Unidos. E é isso que temos tentado fazer na Gentros, realizan-do serviços no Brasil, mas atendendo outros mercados, pois só o mercado interno não sustenta”, avalia.

A falta de fornecedores no País é outro ponto que afeta a competitividade das empresas. Taíla explica que para cada estudo é preciso encomendar uma linhagem celular no exterior, pois por ser

um serviço muito específico a indústria de biotecnologia não consegue ter todas na empresa. Esse processo demora entre 30 e 90 dias e impacta diretamente no tempo de desenvolvimento do pro-duto. “Mesmo testes mais simples, que envolvam parte de linhagem celular, não têm nenhum fornece-dor no Brasil e, por isso, é preciso importar”, esclarece.

Fernando Tunes, diretor de Novos Negócios da Bionovis, conta que a escassez de serviços tec-nológicos no País se reflete no custo de desenvolvimento dos medicamentos, principalmente na etapa mais dispendiosa da pro-dução de biológicos e biossimilares que são os ensaios clínicos. “O

É preciso tentar explorar

o mercado internacional, como China e Índia fizeram

Taíla Lemos,

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custo do desenvolvimento fica mais elevado uma vez que, de partida, tem-se que arcar com despesas de logística mais complexas, taxas e impostos, que podem ultrapassar 30% sobre o valor contratado, e que não ocorreriam em um desenvolvi-mento local”, aponta.

O diretor acredita que a ampliação dos prestadores de serviços da cadeia pro-dutiva de biotecnologia é a saída para tonar o setor mais competitivo. “A pre-sença local e a concorrência entre esses prestadores de serviços tende a fazer com que a contratação no País se torne mais vantajosa, não apenas pela redução do custo de desenvolvimento, mas também pela elevação dos padrões de qualidade e atenção ao ambiente regulatório interna-cional”, sinaliza.

Recursos humanos

A lenta estruturação da indústria de biotecnologia no País também pode ser associada a outro problema da cadeia produtiva: a formação de recursos huma-nos qualificados. Os projetos de biotecnolo-gia exigem competências e profissionais alinhados à realidade do mercado bio-farmacêutico mundial, recursos que mui-tas empresas não possuem. Por isso, hoje diversas indústrias farmacêuticas estão investindo em programas de capacitação para os funcionários.

A Orygen, joint venture criada para a produção de medicamentos biológicos, é uma dessas empresas. A farmacêutica tem a expectativa de investir no treina-Fo

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A cooperação entre governo, indústria, centros de pesquisa e universidades é um fator determinante para o desenvolvimento da biotecnologia nos países. É o que diz o estudo “Construindo a Bioeconomia: Examinando Estratégias de Desenvolvimento da Biotecnologia Industrial Nacional”, realizado pela consultoria norte-americana Pugatch.

Infelizmente no Brasil o cenário ainda está distante do ideal. Ao contrário de outros países, a cultura de formação de parcerias no País ainda é inexistente, principalmente, porque as atividades da indústria nacional estão concentradas no desenvolvi-mento de biossimilares e não em medicamentos inovadores. Por isso, poucas empresas realizam parcerias com universidades e centros de pesquisa para realizar novas descobertas.

Para Francisco Tavares, presidente da Fundação Ezequiel Dias (Funed), a principal dificuldade para a produção nacional de biológicos está no isolamento

dos atores da cadeia produtiva que possuem capacidade técnica e know-how necessários para acelerar o desenvolvimento dos produtos.

“No momento, a biotecnologia ainda é, sem dúvida, a principal oportunidade no campo da indústria farmacêutica. Para aproveitar esta oportunidade, o maior desafio é fazer com que governo, universidade e empresas trabalhem cada vez mais próximos e invistam de forma substancial nesta área”, destaca.

Segundo o presidente, a cadeia produtiva precisa dialogar para desenvolver a capacidade de trabalhar em redes de cooperação e assim avançar na construção de competências, instalações e capacitação de mão de obra.

“As políticas de desenvolvimento produtivo precisam ser mais exploradas e a construção das parcerias entre os Institutos de Ciência e Tecnologia e as empresas de base tecnológica necessita de mais estímulos”, defende.

Cooperação tecnológica

mento de cerca de 150 pessoas para atuar na produção de biossimilares. De acordo com o presidente da empresa, Andrew Simpson, o Brasil possui excelen-tes profissionais na área de biologia e de tecnologia molecular, entretanto o campo da biotecnologia ainda é deficiente.

Para suprir a demanda, Simpson acredita que as empresas precisam se mobilizar para identificar talentos e implementar seus planos. “Existem brasileiros no exterior com bastante experiência e também temos jovens talentosos aqui, inclusive em outros setores industriais bem parecidos que podemos aproveitar”, conta.

O presidente ressalta que a falta de recursos humanos no setor não deve ser considerada um grande obstáculo já que o País possui muitos profissionais talen-tosos disponíveis. “Nós vamos treinar pessoas, mas não acho que isso será o nosso maior problema”, afirma.

Na opinião de Camille Silva, diretora médica da Zodiac, a falta de profissionais qualificados faz os projetos avançarem lentamente já que só agora as indústrias estão se organizando para capacitar pessoas na área. “Isso vai demorar um pouco. As indústrias acharam que já iriam começar fazendo e tiveram que dar um

passo atrás e se reorganizar”, analisa.Segundo a diretora, as empresas

nacionais não fizeram um bom dimensio-namento dos recursos humanos necessári-os para realizar a produção de biossimila-res. “Acredito que essas empresas tinham

uma expectativa que desenvolver biossimi-lares seria mais ou menos repetir o advento da criação dos genéricos, que ocorreu há aproximadamente uma década. Mas, elas têm se surpreendido, porque os biossimila-res são muito mais complexos”, critica.

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Como o mercado farmacêutico nacional tem se apresentado nos últimos anos?

Pedro Palmeira: O cenário para o mercado farmacêutico segue bastante positivo, com a sustentação das taxas de crescimento acima de 10% ao ano. Essa visão é compartilhada pelos principais analistas da indústria. Nas projeções internacionais da consultoria IMS Health para os próximos anos, o mercado farmacêutico brasileiro cresce a taxas superiores a da China, devendo atingir a quarta posição entre os maiores mercados do mundo.

Quais são os principais desafios do Complexo Industrial da Saúde?

Palmeira: Destacamos dois desafios principais. O primeiro é a construção da indústria de biotecnologia moderna no País. Os próximos anos serão decisivos para a consolidação da estratégia desenhada nos últimos anos, com o desenvolvimento e registro dos produtos e o início das atividades industriais. Nossa carteira de projetos contratados reflete bem esse desafio. Nos últimos dois anos, o BNDES contratou 11 projetos relacionados à biotecnologia, totalizando R$ 1,3 bilhão, frente a R$ 150 milhões da última década. Na medida em que os projetos são executados, realizaremos o acompanha-mento e o desembolso dos recursos.

O segundo desafio diz respeito à sustenta-bilidade do modelo de negócios das empresas farmacêuticas brasileiras. Apesar do crescimento do mercado, é possível que haja uma redução das margens, em função de pressões de preço e portfólio. Nossa equipe publicou em março um estudo que trata justamente desse novo cenário de concorrência, na

revista BNDES Setorial nº 39. O desafio para as empresas é a diferenciação de seus produtos e as estratégias principais para isso caminham em direção à inovação incremental e à maior inserção das companhias no mercado internacional.

Como o Profarma PD&I tem ajudado a desenvolver o setor na última década? Quais os principais resultados?

Palmeira: Esse ano, o BNDES Profarma completou 10 anos. Em 2003, antes de o programa ser lançado, a indústr ia farmacêutica investiu apenas 0,5% da sua receita em P&D, mesmo patamar das demais indústrias no Brasil. Na última Pintec, em 2011, a farmacêutica elevou o índice para 2,4%, enquanto a média brasileira ficou estagnada em 0,7%. Mais do que apenas esforço, há um processo cumulativo de construção de competênci-as para a inovação nas empresas brasilei-ras, que tornaram o desenvolvimento de novos genéricos uma rotina e já são capazes de realizar inovações incrementa-is, como a combinação de princípios ativos e a mudança na via de administração.

É claro que outros fatores podem ter também contribuído, mas é inegável o papel do BNDES como indutor desses avanços. Acredito que a experiência bem sucedida até o momento se deve a continuidade das políticas públicas e a busca constante por melhorias de acordo com a trajetória particular do setor. Há uma década atrás, os desafios eram a adequa-ção das plantas produtivas às Boas Práticas de Fabricação e o desenvolvimen-to de genéricos. Hoje, discutimos projetos de biotecnologia moderna, de inovações incrementais e, no nosso entendimento, é

o momento de ampliar o debate de uma maior inserção internacional das empresas farmacêuticas brasileiras.

Hoje uma das principais reclamações das pequenas empresas do setor é a falta de garantias para obter financiamento. Como o BNDES tem conduzido a questão?

Palmeira: A constituição de garantias é sempre uma questão relevante no debate. No BNDES Profarma, existe a possiblidade de reduzir o índice de cobertura das garantias reais ou mesmo dispensá-las. Entretanto, temos que ser cuidadosos para que o financiamento, ao invés de alavancar a pequena empresa, não a sufoque e a leve à inadimplência.

O senhor tem participado ativamente dos debates desenvolvidos durante as diversas edições do ENIFarMed. Em sua opinião, qual é a importância do encontro para o setor produtivo?

Palmeira: O ENIFarMed é um dos prin-cipais eventos do calendário da indústria farmacêutica. Estou à frente das ações do Banco na indústria farmacêutica há 11 anos e participo do encontro desde a sua primeira edição. O encontro tem contribuí-do para uma maior articulação das necessidades da indústria e no aperfeiçoa-mento na forma de endereçá-las. Além disso, teve um papel importante para melhorar a coesão das políticas públicas, em particular na necessária articulação entre a política industrial e as necessida-des de saúde. Tradicionalmente a delegação do BNDES no evento é significa-tiva. Esse ano, como demonstração da relevância do evento, deveremos contar com o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, na abertura do Encontro.

indústria farmacêutica nacional vive um momento A de transição e oportunidades. Esta é a análise de Pedro Palmeira, chefe do Departamento de

Produtos Intermediários Químicos e Farmacêuticos (Defarma) do BNDES. Em entrevista, ele fala sobre as principais ações do Banco para incentivar a inovação no setor e avalia os desafios provocados pela mudança na dinâmica do mercado farmacêutico global, que agora se volta para a produção de alta tecnologia com os medicamentos biológicos.

Novo cenário da indústria farmacêutica brasileiraPedro Palmeira

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Falta de um ambiente regulatório favorável desestimula os investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos

Reforma regulatória pode facilitar a inovação no País

Em muitas áreas do

desenvolvimento da droga, exigências

e regulamentos brasileiros não

atendem às normas globais dos países mais desenvolvidos

Jurij Petrin, especialista em regulação

para o desenvolvimento de produtos farmacêuticos

falta de um ambiente regulatório A favorável à inovação é uma das principais reclamações da indús-

tria brasileira. Ao mesmo tempo em que garantem a segurança e eficácia dos fármacos e medicamentos, as normas que regulam o setor podem atrasar a comerciali-zação de novos produtos, seja pelo excesso de burocracia ou pela falta de regras bem definidas. Para debater como tornar o ambiente regulatório mais favorável à pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novos produtos no País, o especialista em regulação para o desenvolvimento de produtos farmacêuticos locais, Jurij Petrin, vai participar do 8º Encontro Nacional de Fármacos e Medicamentos (ENIFarMed).

Segundo o especialista, o principal problema regulatório do Brasil é a falta de sinergia entre as normas brasileiras e o resto do mundo. “Em muitas áreas do desenvolvimento da droga, exigências e regulamentos brasileiros não atendem às normas globais dos países mais desenvol-vidos”, explica.

Petrin acredita que isso ocorre porque a indústria nacional é formada, principalmen-te, por fabricantes de genéricos, ou seja, drogas conhecidas e produzidas por mais

de uma marca. Como consequência, a legis-lação não tem avançado para acompanhar as regras que normatizam o desen-volvimento de produtos inovadores no mundo, tornando esse processo muito difícil para as empresas interessadas em inovar, especialmente para as pequenas e médias.

O especialista explica que o acesso a um novo medicamento enfrenta uma barreira regulatória que torna a entrada de empresas estrangeiras com produtos inovadores muito difícil. “Por esta razão, muitas empresas estrangeiras simplesmen-te evitam o Brasil, e o resultado é que muitos produtos inovadores de alta qualidade não

estão disponíveis para pacientes brasileiros, apesar de suas ne-cessidades médicas não atendi-das”, justifica.

Os entraves regulatórios deses-timulam os investimentos em P&D no Brasil por afetar, principalmente, etapas fundamentais da pesquisa como os estudos pré-clínicos e clínicos. Para criar um ambiente re-gulatório saudável que minimize a burocracia e maximize o retorno das

empresas pelos invest imentos em inovação, Petrin avalia que é preciso um diálogo permanente entre todos os envolvidos para adequar a legislação farmacêutica brasileira às necessidades do País. “Tais problemas complexos exigem um esforço coordenado de todos os interessados. A legislação farmacêutica é apenas uma peça desse esforço”, defende.

Ele acredita que uma reforma re-gulatória no País poderia melhorar a experiência local, e permitir que as empresas farmacêuticas brasileiras e centros de pesquisa participem ativamen-te no desenvolvimento de novas drogas. “Um ambiente regulatório melhorado certamente poderia melhorar a disponibili-dade mais rápida de produtos inovadores produzidos por empresas nacionais e estrangeiras no Brasil”, afirma.

Desarmonia

De acordo com Jadir Proença, diretor do programa PRÓ-REG da Casa Civil, a regulação brasileira evoluiu bastante nos últimos anos. Porém, ele admite que o País ainda enfrenta alguns desafios como a excessiva quantidade de regras e normas.

Segundo Proença, as dificuldades regulatórias da indústria farmacêutica são as mesmas enfrentadas por outras áreas já que o marco regulatório setorial é derivado das leis de cada agência ou unidade do governo responsável pela área. A pluralida-de de entidades que criam novas normas sem atuar especificamente na regulação do setor e a falta de um marco unificado que oriente as atividades gera uma desar-monia no sistema regulatório. “São regras, na sua maioria, bastante complexas, que muitas vezes levam a mais perguntas, confusão e violações potenciais, ao invés de tornar as coisas mais claras”, explica.

Para mudar este cenário, o diretor conta que o governo tem trabalhado para simplificar a regulação no País por meio de novas metodologias de trabalho e fer-ramentas que estão sendo implantadas para reduzir as dificuldades do ambiente regulatório. Entres as ações estão a análise dos impactos regulatórios e os mecanis-mos de pré-consultas dirigidas aos grupos afetados, além da cooperação com órgãos reguladores de outros países.

“As consultas e audiências públicas, como a Anvisa e outras agências estão adotando, têm facilitado bastante para alcançar uma regulação como nós mais insistimos, que é aquela feita com base em evidências e uma menor discricionarieda-de no momento em que essas normas estão sendo elaboradas”, conta.Fo

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Substituição do uso de animais de laboratório em testes para a pesquisa e desenvolvimento de novos produtos entra na pauta da sociedade

A difícil tarefa de fazer pesquisa pré-clínica no Brasil

s ensaios pré-clínicos são fun-O damentais para a pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novos

medicamentos e, consequentemente, o acesso da população a novas terapias. Os testes avaliam os parâmetros de segurança e eficácia dos fármacos, através de estudos de toxicidade e de atividade in vitro e in vivo (animais de laboratório). Entretanto, o uso de animais em pesquisas científicas tem gerado uma dicotomia no Brasil. Membros da sociedade civil que atuam em defesa dos animais consideram que os testes causam sofrimento, ferimentos e transtor-nos psicológicos e, por isso, defendem a utilização de métodos alternativos e a proibição dos estudos em território na-cional. Do outro lado, a comunidade cien-tífica defende que os testes em animais de laboratório são a alternativa mais segura para verificar o comportamento dos me-

dicamentos antes da aplicação em seres humanos. As alternativas ao uso de animais no desenvolvimento de novos pro-dutos serão apresentadas no 8º Encontro Nacional de Fármacos e Medicamentos (ENIFarMed).

Panorama

Os testes pré-clinicos são realizados tradicionalmente em animais, mas tam-bém podem ser feitos nos chamados modelos alternativos – testes em células ou em tecidos cultivados em laboratório. No entanto, o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Luiz Carlos Sá-Rocha, explica que apesar de serem utilizados no desenvolvi-mento de cosméticos, hoje não existem alternativas suficientes para avaliar plenamente a segurança de um medica-mento apenas por testes in vitro.

Segundo o professor, a prática de testes in vitro em substituição aos animais, mais difundida no exterior, acontece apenas no setor cosmético, pois a co-munidade científica mundial ainda não conseguiu comprovar a segurança dos testes para a saúde humana. “Quando tivermos métodos alternativos suficientes para administrar pela primeira vez um me-dicamento nos seres humanos, sabendo que você tem uma segurança, aí podere-mos parar de usar os animais”, defende.

Apesar disso, a falta de informação sobre o tema leva muitas pessoas a condenar o uso de animais em qualquer prática científica, o que vem prejudicando o desenvolvimento de novos medicamen-tos no País. O ambiente de insegurança quanto à prática das atividades causou o fechamento de algumas das poucas empresas que oferecem os serviços no

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Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento de Fármacos e Produtos Farmacêuticos

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Para o desenvolvimento de um medicamento você ainda precisa

dos testes em animais, mas a

tendência é que em um curto prazo de tempo você possa

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uso de animais

Luiz Carlos Sá-Rocha, USP

Sem financiamento, e

sem uma educação afinada às críticas

mais atuais, continuaremos

dependendo de um modelo caro, ineficiente e com sérios

comprometimentos de ordem moral

Thales Tréz, Unifal

Brasil. Em consequência, o número de empresas que realizam estudos pré-clínicos não chega a dez, o que faz a indústria nacional aumentar a dependên-cia estrangeira.

Para Rocha, o episódio que levou à falência do Instituto Royal e outras em-presas do setor, mostra que o Brasil está na contramão da história. Ele conta que em todo mundo os serviços de ensaios pré-clínicos estão crescendo. A expansão dos serviços ocorre porque para que um me-dicamento chegue ao mercado é necessá-rio passar por essa fase antes de chegar na etapa de pesquisa clínica, que são os testes em seres humanos.

“O Brasil, que tem uma política para desenvolver novos fármacos e medicamen-tos, já tinha um certo gargalo quanto à restrição de laboratórios nacionais capa-citados para desenvolver testes pré-clínicos, seja em animais ou in vitro. E acho que depois desse episódio, o País se enfraque-ceu e a cadeia de desenvolvimento de fármacos aqui ficou ainda mais comprome-tida”, analisa.

O professor acredita que o momento é de transição e, por isso, a questão não deve ser polarizada. Para ele, a sociedade deve investir no desenvolvimento de novos métodos alternativos para incorporá-los ao setor farmacêutico, da mesma forma como foi feito com os cosméticos. “Para o desenvolvimento de um medicamento você ainda precisa dos testes em animais, mas a tendência é que em um curto prazo de

tempo você possa fazer uma avaliação com segurança do seu produto sem o uso de animais”, ressalta.

Apesar disso, Thales Tréz, biólogo e professor do Instituto de Ciência e Tec-nologia da Universidade Federal de Alfenas (Unifal), acredita que existam alternativas válidas para o uso de animais no desenvol-vimento de novos medicamentos. Ele conta que diversos métodos alternativos vêm sendo desenvolvidos e empregados em muitos países, principalmente, onde existem comitês de validação, como no Canadá, Japão, Estados Unidos, e países da comunidade europeia.

Segundo Tréz, os testes se baseiam em dados obtidos a partir de material humano, o que é mais relevante do ponto de vista biológico já que os modelos animais não possuem validade e apresentam uma alta taxa de variação com relação aos experi-mentos. “A proibição de testes em animais só impediria o avanço de pesquisas para o desenvolvimento de novos fármacos e medicamentos se a comprovação de que a modelagem animal contribui para a pes-quisa existisse”, destaca.

No entanto, o biólogo compartilha a visão de que a solução para a substituição dos animais está na descoberta de novas alternativas através do lançamento de editais específicos e na formação dos futuros pesquisadores. “Sem financiamen-to, e sem uma educação afinada às críticas mais atuais, continuaremos dependendo de um modelo caro, ineficiente e com sérios comprometimentos de ordem moral”, critica.

Alternativas

Os modelos alternativos, em substitui-ção aos ensaios em animais, começaram a ser utilizados na Europa, a partir de 1990. No Brasil, os investimentos para utilização desses métodos só foram iniciados em 2012 com a criação da Rede Nacional de Métodos Alternativos (Renama). Mesmo com o atraso em relação ao resto do mundo, Simone Fanan, diretora executiva da Sociedade Brasileira de Métodos Alternativos à Experimentação Animal (SBMAlt), conta que o País já avançou no tema e hoje tem praticamente todos os testes necessários para colocar um produto cosmético seguro no mercado sem a utilização de animais.

Porém, a diretora alerta que ainda não é possível saber somente com a aplicação dos métodos quais serão os efeitos de um novo medicamento no ser humano. “Não se tem um conhecimento técnico de como um organismo funciona como um todo. Nós não sabemos, a partir do momento em que

a droga entra na corrente sanguínea, como ela é metabolizada”, explica.

Simone destaca que apesar dos mé-todos não terem a segurança comprovada para que a etapa de testes em modelos animais seja superada, a indústria far-macêutica tem avançado no aprimoramen-to dos métodos para fases anteriores aos estudos pré-clínicos. “Existe um aumento no uso de testes in vitro a fim de entender a eficácia de um novo medicamento e prevenir o que vai acontecer no animal ou em humanos”, comenta.

Na opinião da diretora há um des-conhecimento por parte da sociedade brasileira sobre a complexidade do de-senvolvimento de um novo medicamento. A solução para acabar com a utilização de animais em testes estaria no investimen-to em pesquisas. Ela explica que hoje a comunidade científica ainda está se desenvolvendo e, como exemplo, cita a possibilidade de utilização, no futuro, de programas de computadores que ava-liem, segundo um banco de dados, o histórico de toxicidade de uma determina-da molécula.

“Existe uma série de questões cien-tíficas e técnicas que a população normal não consegue entender. Mas, essa pressão da população é muito boa, porque só assim conseguiremos ter investimentos na validação de métodos alternativos. Sem isso é impossível conseguir substituir os testes em animais. Precisamos de inves-timentos na comunidade científica para estudar, entender e validar os métodos para substituição”, aponta.

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“Inovação no Complexo Industrial da Saúde”

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Entraves para a pesquisa e desenvolvimento de novos produtos oriundos da fauna e flora brasileira podem ser superados em breve

Novo marco regulatório promete facilitar o acesso ao patrimônio genético

á mais de uma década a indústria farmacêutica tem H discutido sobre como modernizar a regulamentação de acesso ao patrimônio genético para solucionar os

entraves que desestimulam as atividades de pesquisa e desenvolvimento de produtos a partir da biodiversidade brasileira. Finalmente essa discussão poderá ser encerrada se o Projeto de Lei (PL) nº 7735 for aprovado no Congresso Nacional. A proposta está em análise sob o regime de urgência e deve ser votada até novembro. O projeto pretende simplificar a dinâmica de autorização, acesso ao conhecimen-to tradicional associado e repartição de benefícios, temas que se tornaram um dos principais gargalos da inovação farma-cêutica no País. O assunto será tema da plenária “Regulação de fito e toxinoterápicos e o uso da biodiversidade brasileira”, que acontecerá durante o 8º Encontro Nacional de Fármacos e Medicamentos (ENIFarMed).

O objetivo da proposta é modernizar a regulamentação de acesso à biodiversidade, que hoje é orientada pela Medida Provisória 2.186-16, de 2001. O documento é fruto de sugestões encaminhadas por diversos setores da sociedade civil – indústria, academia e comunidades tradicionais – para o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Entre as entidades que participaram da construção do projeto está a Coalizão pela Biodiversidade, que reúne empresas e associações do setor farmacêutico. O grupo propôs mecanismos que facilitem o acesso do setor produtivo ao patrimônio genético para estimular a geração de novos medicamentos.

O que muda

Algumas sugestões fundamentais para a indústria, encaminhadas pela Coalizão, figuram no texto final do projeto. Entre elas está a substituição de autorização prévia para o início da pesquisa no Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN).

De acordo com Adriana Diaféria, vice-presidente executiva do Grupo FarmaBrasil e membro da Coalizão, a proposta traz uma importante modernização para o sistema já que passa a utilizar o modelo de autodeclaração via cadastro eletrônico para autorizar as atividades de pesquisa. O cadastro será feito para rastrear as informações relativas ao acesso à biodiversidade ou ao conhecimento tradicional associado.

“A partir do momento em que a empresa ou pesquisador acessar o conhecimento tradicional ou uma planta, uma amostra do patrimônio genético brasileiro, vai ter que fazer o preenchimento desse cadastro que ainda vai ser regulamen-tado pelo Ministério do Meio Ambiente”, explica.

Outro ponto da proposta é a mudança nas regras de acesso ao conhecimento tradicional associado, que são os saberes empíricos e costumes das comunidades indígenas ou locais quanto ao uso de vegetais, microorganismos ou animais. O tema tem sido motivo de polêmica e insegurança jurídica para as empresas, pois de acordo com a legislação atual o valor pago às comunidades deve ser definido antes do início da pesquisa. Ou seja, as indústrias se comprometem a repartir os benefícios sem mesmo saber se conseguirão desenvolver

Novo marco regulatório promete facilitar o acesso ao patrimônio genético

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Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento de Fármacos e Produtos Farmacêuticos

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Estamos muito perto de ter uma

nova realidade nesse setor

no Brasil

Adriana Diaféria, Grupo FarmaBrasil

algum produto a partir da amostra.Segundo Adriana, o nível de subjetivi-

dade para a negociação de um contrato de repartição de benefícios é muito grande e, por isso, muitas empresas se sentem inseguras em acessar a biodiversidade brasileira. “Hoje, para a empresa começar a fazer a pesquisa, ela tem que ter autorização prévia do CGEN e um contrato indicando um percentual ou valor a título de repartição de benefícios, sem saber se o acesso àquela pesquisa vai chegar a algum resultado”, critica.

Caso o projeto seja aprovado, as empresas e pesquisadores terão mais segurança jurídica para acessar os conhecimentos tradicionais, o que deve estimular o desenvolvimento de novos produtos, principalmente os fitoterápicos. O PL prevê que o responsável pelo pa-gamento da repartição de benefícios seja o gerador do produto final, ou seja, a empresa que irá disponibilizar o medica-mento no mercado.

Para Adriana, a partir da aprovação do projeto os critérios para repartição de benefícios ficarão mais claros e adequados à realidade das atividades de pesquisa e desenvolvimento. “A versão nova traz muito mais segurança jurídica porque você já tem os critérios pré-estabelecidos na lei para orientar sua negociação na repartição de benefícios”, afirma.

A proposta também traz um capítulo específico sobre a regularização de atividades passadas. O PL irá permitir que empresas em situação irregular, de acordo com a legislação atual, possam regularizar

suas atividades conforme o novo marco legal. As empresas poderão ter as multas abatidas em até 90% do valor total e realizar o pagamento retroativo da repartição de benefícios.

Na opinião de Adriana, a nova legislação deve causar uma grande abertura para o mercado farmacêutico, que está ainda bastante retido no País por conta da dificuldade de operacionalizar a Lei. “Estamos muito perto de ter uma nova realidade nesse setor no Brasil”, acredita.

Repartição dos benefícios

Hoje não existe um critério pré-estabelecido em lei para definir o valor a ser pago na repartição dos benefícios. A falta de um parâmetro gera contratos que vão de 0,1% a 5% da receita anual obtida com a comercialização dos produtos, o que tem onerado excessivamente as empre-sas, especialmente as pequenas e médias.

Segundo Ana Cláudia Oliveira, gerente técnica e de Propriedade Intelectual da Associação Brasileira da Indústria de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (Abifina), a partir da aprovação do projeto a repartição dos benefícios terá um teto máximo de 1% da receita líquida anual obtida com a exploração econômica do produto. O valor será repartido com a União ou, no caso de conhecimento tradicional associado, com a comunidade.

O PL também abre a possibili-dade de realização de acordos setoriais para o pagamento dos benefícios. “O Poder Executivo coloca a opção de acordos setoriais que poderão diminuir o percentual de 1% para a faixa de 0,1 a 1%”, esclarece.

Para Ana Cláudia, após quase dez anos de discussão acerca da legislação, finalmente o texto atende às necessidades da in-

dústria e dos pesquisadores em quase todos os pontos. “Mesmo que as emendas não sejam incluídas, ainda assim já teremos um grande avanço que possibilita-rá a PD&I de produtos a partir da biodiversi-dade nacional”, comenta.

Proteção ambientalO PL nº 7735 propõe ainda uma

iniciativa inédita para a proteção da biodiversidade brasileira: a criação do Fundo Nacional de Repartição de Benefícios (FNRB). O objetivo do Fundo é promover o uso sustentável do patrimônio genético e valorizar os conhecimentos tradicionais associados, além de subsidiar as ações de proteção e fiscalização de atividades que envolvam o acesso à biodiversidade.

A proposta prevê que a arre-cadação do Fundo seja proveniente de doações, multas administrativas e da repartição de benefícios com a União, que ocorre a partir do acesso ao patrimônio genético não vin-culado ao conhecimento tradicional das comunidades. Já a gestão do FNRB ficará a cargo do Ministério do Meio Ambiente (MMA), que irá regulamentar por meio de decreto os detalhes operacionais.

Jair Schmitt, coordenador-geral de Fiscalização Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Am-biente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), explica que finalmente a legislação irá possibili-tar a repartição dos benefícios com a União. “Na atual legislação, que vai ser substituída, há um problema em relação aos benefícios, porque às vezes acabava-se repartindo benefícios com o próprio empreen-dedor que está explorando a área, o dono dela. Então agora será pos-sível permitir de fato que o benefício seja repartido com quem é de direito, o detentor do recurso na-tural”, conta.

De acordo com Schmitt, a criação do FNRB representa um importante avanço para a proteção ambiental, principalmente no apoio às ações do Ibama. “A facilitação permite que as instituições de controle, no caso o Ibama, possam garantir ou direcionar maior esforço para a fiscalização. Esse Projeto de Lei contribui muito para esse esforço de controle ambiental”, destaca.

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“Inovação no Complexo Industrial da Saúde”

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Indústria veterinária cresce em ritmo acelerado no BrasilMercado farmacêutico de saúde animal vive momento de expansão no País e atrai o interesse de empresas de outros setores

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mercado farmacêutico veterinário O mundial tem apresentado um cenário de grande desenvolvimen-

to devido ao expressivo aumento da demanda por medicamentos especializa-dos. O setor atingiu US$ 22,5 bilhões em 2012, com o registro de um crescimento médio de 8% ao ano. Formada por dois segmentos – animais de produção e de companhia – a farmacêutica veterinária vem atraindo amplos investimentos da indústria, inclusive de empresas da área de saúde humana. No Brasil, o segmento de animais de companhia como cães e gatos é considerado o segundo maior mercado consumidor de produtos e serviços pet do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. O panorama e oportunidades do setor serão tema da sessão “Inovação Farmacêutica Veterinária”, que acontecerá durante o 8º Encontro Nacional de Fármacos e Medi-camentos (ENIFarMed).

Mercado

A indústria de medicamentos para animais de estimação é caracterizada pelo desenvolvimento de terapias individuais com foco na praticidade de administração e no bem-estar animal. A principal tendên-cia do segmento é o desenvolvimento de medicamentos mastigáveis, que sejam prazerosos e façam com que o animal não os rejeite. Já no segmento de animais destinados à alimentação humana como aves, bovinos e suínos, as atividades da indústria estão concentradas no desenvol-vimento de tecnologias que favoreçam a prevenção em massa como, por exemplo, a produção de vacinas.

De acordo com Rubens Alves Pereira, pesquisador em Inovação Farmacêutica Veterinária do NUPEEC/UFPel, a expectati-va de crescimento a longo prazo do segmento pet no País está acima da média

mundial. “Essa tendência se deve ao aumento da renda disponível dos consumidores, a mudanças no estilo de vida das pessoas e percepção dos animais como membros da família”, explica Pereira.

Apesar disso, o pesquisa-dor ressalta que o aumento da demanda por alimentos de origem animal no mundo, associado à preocupação com a segurança alimentar, tornam o segmento de animais de pro-dução um grande nicho de oportunidades para o desenvolvimento de produtos inovadores e biosustentáveis. “O Brasil também é um dos maiores exportadores de carnes do mundo, o que faz com que o País seja um dos mercados mais deseja-dos pelas empresas multinacionais em razão das oportunidades de exploração ainda existentes”, afirma o pesquisador.

P&D

A cadeia produtiva farmacêutica veterinária é muito similar à humana quanto à incorporação de novas tecnologi-as, principalmente nas fases iniciais de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Por isso, no Brasil, algumas grandes empresas farmacêuticas vêm ampliando sua atua-ção para o segmento de saúde animal.

Segundo Eder Brandeburgo, médico veterinário da Flowkern, o desenvolvimen-to de medicamentos no setor está voltado para a fabricação de produtos de biotecno-logia, especialmente os antiparasitários, biológicos e hormonais. “Este é um setor que pouco se renova, assim há a necessi-dade de inovar em veículos, combinações ativas, fármacos recombinantes, entre outros”, conta.

Outra questão importante é a regu-

lação sanitária no setor. Hoje as exigênci-as e boas práticas de fabricação são muito semelhantes para as duas in-dústrias, o que pode facilitar a entrada de empresas no setor veterinário.

Marcelo Oliveira, diretor de Assuntos Regulatórios para a América Latina da Elanco, explica que diferentemente da indústria de fármacos e medicamentos para uso humano, a regulação do setor farmacêutico veterinário é menos buro-crática. “No Brasil a regra básica é a mesma, a diferença é que a Anvisa tem normas muito mais detalhadas para estudo e fabricação. No Ministério da Agricultura as normas são mais gerais, o que tem um lado positivo pela liberdade para trabalhar e negativo por gerar uma subjetividade, não há especificidade do que deve ser feito”, aponta o diretor.

Mesmo com a falta de regras claras no processo regulatório, Marcelo destaca que o mercado farmacêutico veterinário tem muitas oportunidades para as empresas que desejam investir no setor. “É um mercado que está totalmente aberto e facil-mente, ao meu entender, uma empresa que já possui o know-how em humana consegue se adaptar e entrar nesse mercado de medicina veterinária”, sinaliza o diretor.

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