axidioma - sintaxe em grãos -"o caso dos feijões mágicos"

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Monografia apresentada como conclusão de curso, Artes plásticas, UFES (Universidade Federal do Espírito Santo).

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Ivo Azeredo Rizzoli Godoy

Axidioma- Sintaxe em grãos –

(O caso dos feijões Mágicos)

Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção de grau em Artes Plásticas, sob orienta-ção do Professor Doutor Ricardo Maurício Gonzaga e banca exa-minadora composta por Valdelino dos Santos Filho e Rogério Câ-mara, no período letivo de 2007/2.

UFES2007

Ivo Azeredo Rizzoli Godoy

Axidioma- Sintaxe em grãos –

(O caso dos feijões Mágicos)

UFES2007

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Resumo

GODOY, Ivo e. Axidioma - Sintaxe em Grãos (O caso dos fei-jões mágicos). Vitória, 2007. 30 f. TCC curso de graduação em ar-tes plásticas, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2007.

Pesquisa na área de poéticas vi-suais. Obra comentada. Propõe uma discussão sobre a obra Axi-

dioma - Sintaxe em Grãos (O caso dos feijões mágicos), discorrendo sobre o pro-cesso de transfiguração na obra de arte, cruzando três sistemas: Arte, literatura e jogo (Lotomania). Debate-se a viabi-lidade da validação do objeto como arte por meio do valor constitutivo do objeto em “si” e por meio do sujeito praticante.

Termos de indexação: Transfigura-ção, Texto, Poética, Poesia Visu-al, Prática artística, Signo, Lugar.

Banca Examinadora

Presidente e Orientador Prof. Dr. Ricardo Maurício___________________________1º Examinador Prof. Dr. Valdelino Gonçalves dos Santos Filho_________________2º Examinador Prof. Dr. Rogério José Câmara_______________________________

Vitória, ___ de Dezembro de 2007

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Índice

1 - INTRODUÇÂO.....................................................................................................072 - AXIDIOMA – SINTAXE EM GRÃOS....................................................................093 - O CASO DOS FEIJÔES MÁGICOS – GRÃO.......................................................13

4 - TRANSFIGURAÇÃO COMO RE-SIGNIFICAÇÃO INTERPRETATIVA= PRÁTICA ARTÍSTICA...............................................................................................................175 - TRANSFIGURAÇÃO COMO RECODIFICAÇÃO DO SIGNO LUGAR-OBJETO VEICULAR................................................................................................................22 5.1 - A Recodificação do Signo-lugar e do Signo-letra.......................256 - CONCLUSÃO......................................................................................................277 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS....................................................................29 7.1 - Midias Digitais.........................................................................................30

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Ivo godoy2005

reflexão que levaria a assumir, também como formador da obra, uma próxi-ma categoria de texto: o metatexto. Esta quarta categoria seria a interpreta-ção do praticante que acontece simultaneamente ao outros três textos. Por isso a importância do sujeito formador do Axidioma, que o pratica efetivamente. Desde já fica em aberto como se apropriar dos conteúdos apresentados aqui, e o que fazer diante de um trabalho que se transforma e que convida para lhe acompa-nhar tantas argumentações já existentes em sistemas plurais. Como conviver com

um trabalho que assume o discurso como matéria prima de sua constru-ção. Fica a escolha do nível de apro-ximação e que tipo de relação será estabelecido neste lugar de prática artística. O quão convincente é este Axidioma, se é que isso o define.

1 - Introdução

A obra aqui proposta argumenta uma experiência, originada no autor, com o in-tuito de ser objeto de experimentação fundamentada por outro sujeito. É como descrever sobre um assunto com a intenção de gerar reflexões, independen-

temente do posicionamento diante dele, com o objetivo de potencializar a questão ou assunto proposto. É um convite de compromisso para com o diálogo; no caso deste trabalho, o diálogo com ele mesmo, em “si”, esse que visa à consciência de ser algo: o que é? Onde é? Como e quando ele é? Ou quando ele passa a ser? Esta é a proposta do Axidioma, ele é algo que se constrói com a prática, ele habita uma ver-dade em si e a revela quando é praticado.

O Axidioma é uma contrapartida ao com-portamento de auto-afirmação da arte, ele não visa julgar o que é, visa manifestar-se no que é. Manifesta-se como uma po-ética que oscila entre arte, teoria e filoso-fia. Dessa forma ele procura estabelecer pontos reflexivos que o legitimam como arte. O Axidioma é o idioma-axioma, cujo entendimento só é possível em “si” mes-mo, que é verdade em “si” mesmo; é o idioma formado por grãos encontrados nos sistemas comunicativos cotidianos.

A primeira proposta do Axidioma é a Sintaxe em grãos ( O caso dos feijões mágicos), nesta proposta são reunidos, em um debate, diversos campos de reflexão, um apanhado de assuntos tratados como grãos formadores dele. Por meio de uma série de transfigurações, o Axidio-ma desloca estes assuntos para sua estrutura formadora. A sintaxe em grãos é a formatação metodológica construída para este caso específico. Os diálogos entre arte, jogo (lotomania) e literatura, são estabelecidos de forma particular, apontando os pontos de ligação destes campos com a base de argumentação do Axidioma.

Nesta proposição o Axidioma se apresenta por meio de diferentes catego-rias de texto como o dissertativo, o poético e o descritivo. Por meio des-tes são apresentados alguns conteúdos, de forma a encaminhar uma

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contextos, transportadas para outros espaços de forma a levar o seu usuário a pensar sobre o lugar da palavra, pensar sobre suas múltiplas leituras, múltiplas interpretações, e inúmeras representações. A palavra é praticada de forma a acompanhar o pensamento, as descobertas, reflexões e transformações do ambiente de convívio da raça humana. Pela palavra o homem expressa sentido, pela palavra o homem interpreta significado, pela palavra o homem percebe que não pensa sozinho por veicular o pensamento por um meio que outros utilizam. Pela palavra o homem procura objetivar as coisas para con-densar sentido como também subjetivar para ampliar sentido. Como o jurista e o poeta

antónimos praticantes da mesma palavra.

Há uma contribuição do poeta de forma in-direta, subjetiva e, por que não, sugestiva, no que diz respeito ao sentido da palavra. O poeta é um agente elocutor metafísico da palavra, ele sugere na poesia uma proposta aberta a novas experiências, estas que não são resumidas a formalidade imposta pela comunicação. O termo, poética do informal 2, trabalhado por Umberto Eco, represen-ta bem a ação desse poeta. A subversão de certas regras de linguagem permite ao poeta transportar a palavra para diversas “distâncias” de sua apresentação formal, tradicional, ou mesmo a separar de uma ob-jetividade cristalizada pela cultura, deixando que a palavra vibre, reverbere do seu esta-do, retroceda em direção próxima à origem de sua criação, e vá até os orbitais mais distantes ampliando seu campo de ação.

Penso na “subversão” de regras tradicionais do texto na poesia. Acredito que desta forma é possível encontrar todos os ingredientes necessários para exercer este papel de elocutor informal da palavra dado ao artista ou poeta, ou artista-poeta. No ambiente de restrições flutuantes, o artista limita uma coisa sem ter que necessariamente limitar seu sentido; provo-ca a interpretação, a inspiração, provoca inquietação, angústia, apreciação, confusão...

A poesia visual é um campo muito rico em experimentações, tanto para as que já aconteceram quanto para as que estão para acontecer. A poesia

2 - ECO, Umberto. Obra Aberta: formas e inderteminações nas poéticas contemporâneas; [tradução de Giovanni Cutolo]. – São Paulo: Perspectiva, 2005. Pag . 149

2 - Axidioma-Sintaxe em grãos “A linguagem é poesia fóssil” 1

O texto é tradição, digo isso pela prática que se faz necessária a comunica-ção humana, de onde surge a linguagem textual como um produto da tra-dição. Dessa necessidade humana imediata de se comunicar cria-se uma

metodologia prática de emissão e recepção textual, uma linguagem de signos ob-jetivos, de modo a facilitar a troca de mensagens por meio da conjugação sistemática e padronizada do texto. No exercício dessa tradição surge uma ou-tra necessidade agora não tão imediata, e mesmo sem determinação sobre sua utilidade, mas que pretende preencher as lacunas de uma comunicação subje-tiva, que vive em um embate inquietante com a linguagem cotidiana. Destas duas comunicações surge um movimento de reciclagem do texto. Um movimento re-cíproco de troca entre o texto tradicional e da poesia com sua poética. A poesia é tradição em metamorfose e a poética é o seu produto essencial. A tradição leva ao aprimoramento técnico da prática textual e a poética recria o texto aprimo-rando a tradição. O texto cita palavras, a poética as reinventa. São estágios de mutação do texto: texto tradicional como estágio estável, a poesia/poética como instável. A palavra segue o ritmo de cada um destes. A individualização existe nos dois casos, entretanto há uma diferenciação, o que não impõe uma impermeabili-dade entre os dois. A possibilidade da convivência entre texto e poética pode es-tar na intenção objetiva ou subjetiva de modo que a poética possibilite ler o tradi-cional dentro de uma subjetividade. A poética revela desconhecidas possibilidades. A poética recria o sentido, possibilita que as palavras migrem para outros ní-veis dinâmicos retirando-as do uso tradicional. Pela história da escrita pode-mos visualizar o processo de criação da letra, da palavra passando por uma mutação representativa tomando outras proporções e dimensões. Com o de-correr deste processo histórico, as palavras foram inseridas em novos

1- EMERSON, Ralph Waldo. Ensaios. Trad. José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 1976. p. 133. Apud CAMPOS, Haroldo de. Ideograma: lógica, poesia, linguagem. 2. ed. - São Paulo: Cultrix, 1986. pag. 34

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se encontra. O Axidioma é o idioma-axioma, cujo entendimento só é possível em “si” mesmo, que é verdade em “si” mesmo; é o idioma formado por grãos encon-trados nos sistemas comunicativos cotidianos. O caso dos feijões mágicos é uma proposição entre três sistemas comunicativos, melhor explicados no próxi-mo capítulo. Na formação destes sistemas é inserida uma reflexão sobre a pos-sibilidade de revelar textos a partir da sua mínima parte: a sintaxe em grãos. Esta pesquisa pretende uma investigação sobre as configurações dos sistemas co-municativos tendo como base a linguagem escrita e sua relação com outras estru-

turas cotidianas, usando a produção do trabalho de arte que explore as diversas possibilidades de subversão desses sis-temas. Esta proposição está relacionada com regras de anotação, apresentação e transcodificação de um texto para um jogo específico (Lotomania), onde nas trocas entre emissor e receptor da-se a transfiguração de sentidos transformados por esta relação. A sintaxe aqui será re-fletida a partir do desmembrar dos discur-sos, palavras e letras a fim de inseri-las em outras significações, outros discur-sos possíveis, de leituras simultâneas 5 .

Enfim, que este texto dissertativo, em con-flito com o texto das cédulas de loto possa servir de porta de acesso à simultaneida-de de leituras, estejam elas comentadas nesta dissertação, intrínsecas nas cédulas de loto, ou na interpretação do leitor pen-sante. Em suma, nos grãos desta obra.

5 - Este próprio texto, por exemplo, diagramado e apresentado simultâneo a as letras fragmentadas

nas cédulas de loto.

-

concreta é um exemplo dentre tantas pesquisas feitas no campo artístico e que rendem propostas relevantes até a produção atual. E é influenciado pelo conta-giante compromisso e prontidão com a recriação e apresentação da forma tex-tual que teve no movimento da Poesia Concreta, que procuro estabelecer uma participação nesta discussão, como bem colocada por Augusto de Campos:

Concretas no sentido de que, postas de

lado as pretensões figurativas da expres-

são ( o que não quer dizer: posto à mar-

gem o significado), as palavras nessa po-

esia atuam como objetos autônomos...os

poemas concretos caracterizar-se-iam por

uma estruturação ótico-sonora irreversí-

vel e funcional, e, por assim dizer gerado-

ra da idéia, criando uma entidade todo-di-

nâmica, “verbivocovisual” – é o termo de

Joyce – de palavras dúcteis, moldáveis,

amalgamáveis, à disposição do poema. 3

Na verdade o que proponho nesta obra, é promover sujeitos transformadores da própria obra. Emitir mensagem através de energia pensante, energia transfor-madora para alimentar esses sujeitos. O pensamento como matéria (figuração), “enquanto organização de energia que se faz se desfaz e se refaz sem ces-sar” 4. Pensar assim almejando realizar a transfiguração do texto por esta trian-gulação: fazer, desfazer e refazer. Visto que o pensamento humano é formado por uma edição de fragmentos da matéria pensante, um inestimável aglomerado de grãos formadores de um eterno e mutá-vel metatexto. Um texto que tem uma edição, formatação e reflexão de formas e dimensões imprecisas, o que facilita a ação autônoma do sujeito transformador, de modo a organizar o sentido da forma que se encaixe em seu entendimento. É pensando na forma, na produção, no lugar, na edição, na leitura, no senti-do, no significado, na conjugação e na subversão do texto, que proponho nos trabalhos uma consciência do objeto trabalhado e do contexto em que ele

3- CAMPOS, Augusto; PIGNATARI,Décio; CAMPOS, Haroldo; Teoria da Poesia Concreta: Textos

Críticos e manifestos !950-1960; São Paulo : ed. Brasiliense, 1987. Pag 40

4 -LYOTARD, Jean-François. O inumano: considerações sobre o tempo. Lisboa: Estampa, 1989.

pag. 18

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Há uma referência literária direta entre: a história de João e o pé de feijão, a aplica-ção do texto nas cédulas de loteria e o sistema de validação da arte. Na literatura do folclore inglês o protagonista da história vive uma situação onde troca sua única propriedade valiosa, uma vaca magra, por feijões oferecidos por um estranho que, segundo este, seriam mágicos. No decorrer da história, fica o protagonista em dúvida sobre a validade da afirmação do estranho. Ele, no descrédito da suposta mágica, arremessa os feijões pela janela, e da noite para o dia os grãos germinam na terra e crescem exageradamente, para além das nuvens. O pé de feijão é o caminho que

leva ao castelo de um gigante que guarda objetos valiosos, uma harpa mágica e um ganso que põe ovos de ouro. O desfecho da história conta o sucesso da troca feita por João, de uma coisa de pequeno valor por riquezas de valores exorbitantes. Aqui, esta história é comparada a prática do sis-tema de apostas existente na Lotomania, a aposta que tem um valor muito menor ao prêmio, exatamente a troca extremamente lucrativa. Há também uma referência ao sis-tema de validação da obra de arte, o que a valida e a que nível de valor ela correspon-de. O valor desta terceira referência pode estar em sentidos diversos que vão desde o reconhecimento da obra como arte até ao valor financeiro de algumas obras no mer-cado de arte. Analisando a obra por uma ótica financeira podemos observar que al-gumas têm um custo de produção muito pe-queno comparado ao seu valor de mercado e também obras com o custeio de produção grande visando um reconhecimento como

arte. Exemplificando os dois casos temos os objetos ready-mades de Marcel Du-champ, objetos de valor usual antes de serem usados como arte e que hoje tem um valor alto tanto de reconhecimento quanto de mercado. Para o segundo caso, temos as dispendiosas intervenções nas paisagens de diversos lugares no mun-do, realizadas Cristo, e seu reconhecimento na história da arte contemporânea.

Um ciclo de referências pode ser traçado no momento que remetemos mais uma vez ao texto, agora não a uma literatura de conto mais a uma li-teratura crítica, citando o texto de Kant depois de Duchamp, de Thierry de

3 - O caso dos feijões mágicos – grão

O caso dos feijões mágicos trabalha uma transfiguração aplicada a três siste-mas cotidianos: o sistema de leitura de texto, o sistema da Lotomania (jogo) e o sistema da arte. Trata de apropriar-se dos três sistemas, reunindo frag-

mentos dos seus sentidos e transformá-los em um Axidioma. Alguns aspectos destes três sistemas são destacados no decorrer do capítulo de acordo com a importância de sua participação na construção do entendimento desta própria obra. Criam-se a partir destas importâncias questionamen-tos reflexivos que problematizarão a vali-dação dos três sistemas aqui trabalhados.

Os aspectos que serão destacados têm a finalidade de dar força ao processo de transfiguração. Tais aspectos trabalham como uma espécie de grãos formadores da transfiguração, como provas concretas da existência do Axidioma no caso. A partir das provas pode-se julgar a validade, ao negar, afirmar, comparar uma em condi-ção a outra, entendendo que cada siste-ma tem a sua particularidade, porem es-tes estão aplicados num mesmo contexto, são partes integrantes de um só sentido.

A metáfora do enunciado “feijões má-gicos”, trata o grão como uma figuração de especial. Estes “grãos mágicos”, esta espe-cialidade encontra-se em cada um dos três textos: o texto dissertativo (literário), o texto das cédulas e um terceiro texto resultante do entendimento do outro. Este terceiro texto não é colocado de forma objetiva nesta obra, exatamente pelo fato de ser a construção de entendimento que o leitor faz deste Axidioma. Este terceiro texto é o que possibilita a comunicação do Axidioma. É uma questão de conteúdo da obra e do participante dela, o leitor. É o resultado da soma entre os conteúdos. Como são os resultados: para o tex-to a interpretação; para o jogo, os números sorteados e, para a arte, a sua validação.

O caso dos feijões mágicos remete a literatura na for-ma de ler, apresentar e interpretar uma história ou um caso.

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de números condicionados a força da gravidade e outras leis da física. Ou mesmo as subjetivas interpretações de teorias, textos, críticas. A imprevisibilidade existe nos dois casos. No caso do jogo todas as cédulas são jogos, mas somente um pré-deter-minado número delas será premiado. No caso da arte, das obras que são validadas como arte, somente a algumas será conferido valor de modo a serem reconhecidas pelo circuito da arte - e neste reconhecimento o gosto é um dos fatores determinantes. Esta sentença não quer dizer que o circuito da arte é um sorteio, mas que ele reage a um conjunto infinito de forças e manifestações de idéias, opiniões e conceitos, que

se vistas por uma ótica racional existe certa imprevisão. Somente dentro de uma tendência ou de um estilo pode-ria haver algum tipo de previsão, vis-to que estes determinam aspectos a serem trabalhados, se considerarmos que na arte contemporânea cada vez mais surgem propostas híbridas, a previsão de um estilo é anulado pelo cruzamento de vários estilos ou ten-dências. Esta hibridização da arte altera a leitura do gosto, por um só estilo ou tendência, para uma leitura aberta a uma variável determinante de diversos gostos em uma só proposta.

É aproveitando essa variável sub-jetiva que proponho a ampliação da discussão para a transfigura-ção dada pelo conteúdo do outro: a Transfiguração pela Ressignifi-cação Interpretativa do leitor-autor (que cria interpretação), e a Trans-

figuração pela Recodificação do Signo (recodificação do lugar-ob-jeto; leitura da máquina espelho da loto. Vide cédulas espelhos).

Os feijões mágicos são informações valiosas dentre tantas já existen-tes. Refere-se aos grãos que, quando plantados, cultivados, se desenvol-vem de forma a adquirir seu próprio valor, seu sentido próprio. Nos capí-tulos a seguir alguns outros aspectos e grãos importantes dos sistemas mostrados neste capitulo serão destacados para melhor leitura deste Axidioma.

Duve 6 , que trata da questão de validação da Arte ao revisar conceitos kantianos através de conceitos colocados por Duchamp que se tornaram paradigmas da arte contemporânea. Neste texto de Duve faz um movimento de transfiguração do “isto é belo” para “isto é arte”, como conceito ou juízo afirmativo que valida a arte antes e de-pois de Duchamp. Partindo da leitura de Thierry de Duve há uma percepção tomada a partir deste texto sobre questões pertinentes ao gosto, : a percepção que se tem é que ele exerce um fator determinante e não definitivo da obra da arte, da sua validação. Para debater melhor essa percepção, discorrerei sobre a referencia entre arte e jogo.

Há uma intenção de causar um encontro com possíveis comparações referenciais sobre sistemas de arte e o jogo da Lo-tomania. Trata-se de uma transfiguração do jogo para a inserção: “isto é arte” , que se realiza por meio de diálogos entre a Arte e o Jogo neste Axidioma. Os jogos de lotomania são apresentados aqui como arte. Este diálogo se faz presente pela aplicação regular do texto fragmen-tado em grãos que preenchem os núme-ros do jogo de acordo com suas regras, enquanto o conteúdo do texto escrito nas cédulas faz referência direta a questões sobre a validação da arte (vide cédulas). Neste movimento de transfiguração (re-gra passa a ser conjunção poética) é feita aqui uma referência comparativa entre sorteio de jogos lotéricos e os salões e outros circuitos de arte onde se selecio-nam, consumem-se, premiam-se e até validam a obra de arte. A validação da obra no circuito da arte cai num sistema de grande complexidade e com inimagi-náveis questionamentos determinantes deste processo. Temos toda uma carga de cultura, de estudos, conhecimentos, relações estabelecidas com este sistema. São inúmeras considerações para a validação, imaginemos a relação estabelecida para validação desde a formação do artista até a formação do curador e do espectador. Só por isso já se pode imaginar uma quantidade infinita de informações cruzadas para que haja a inserção de uma obra no circuito. Por exemplo: Seria possível pensar que inserções como estas possam anular a questão do gosto? O gosto é uma variável, ele é tão imprevisível quanto o giro de uma roleta ou um globo cheio

6 - DE DUVE, Thierry. Kant depois de Duchamp. In: FERREIRA, Glória, VENÂNCIO FILHO, Paulo.

(ed.). Arte & Ensaios, n. 5. Rio de Janeiro: Mestrado em História da Arte/Escola de Belas Artes, UFRJ,

1998.

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A pretensão deste trabalho não é conquistar o prêmio da Lotomania, o que talvez pudes-se ser encarado como uma habilidade do jogo, o interesse maior está em identificar pos-sibilidades de subversão na comunicação entre vida, arte e jogo, por meio da subjetivi-dade de suas leituras, possibilidade da arte contemporânea. Este seria o grande prêmio.

Na vivência que tive em diversas casas lotéricas e no contato com outros joga-dores, me interessou a forma individual como cada um buscava marcar os números na cédula. Em muitos casos eles jogavam números relacionados com seu cotidiano: nú-

meros de placas de carro; data de nascimento ou óbito de uma pessoa, código de barras de embalagens de produto, número da camisa de um jogador de futebol, números que surgiram supostamente em sonhos ou mesmo números aleatórios; há casos ainda de jogadores que contratam serviços de sites 8 que oferecem fórmulas-cálculos para se ganhar na Loteria.

É interessante ver como os jogadores pro-curam participar de uma proposta que exige ser interpretada e respondida: as regras do jogo. Mais interessante ainda é visualizar como eles se propõem a organizar seus jo-gos. Há casos em que o jogador lança uma mesma seqüência de números marcada ano após ano; e casos com diferentes seqüên-cias jogadas a cada sorteio, regras criadas por eles que também fazem parte do jogo, mas que não são impostas pelo jogo. Isso in-dica uma das frestas para subversão o jogo.

Neste capitulo do trabalho, propõe-se uma troca entre conteúdos do artista e do espectador, embora possam parecer ora muito dispersos, subjetivos, ora muito didáticos, contudo acredito que estes são alguns dos possíveis caminhos para interação artística.

Para melhor participarmos dessa interação, devemos começar por pen-sar a importância de se relevar a aplicação do texto, a ação sobre a

8 - www.sortefacil.com

4 - Transfiguração como re-significação interpretativa = Prática artística

Cildo Meireles disse sobre seu trabalho “Inserção em Circuitos Ideológicos”: (...) “o trabalho só existe na medida em que outras pessoas o pratiquem”.

(...) “Enquanto o museu, a galeria, a tela, forem um espaço sagrado da

representação, tornam-se um triângulo das Bermudas: qualquer coisa,

qualquer idéia que você

colo¬car lá vai ser automa-

ticamente neutralizada”. 7

Na verdade, a questão da interatividade fica em aberto em O caso dos feijões mágicos, no que se refere a dependência de um público praticante no fazer da obra, no processo de reproduzi-la. Digo isso pela forma como este trabalho foi pensado estar diretamente ligada a um contexto relacional e reflexivo. Não propo-nho uma fórmula a ser aplicada pelo outro. Na verdade, do ponto de vista do jogo Lotomania, eu e outros jogadores já praticamos o ato de jogar, mas o trabalho que proponho está expli-citado em formatações plurais como neste li-vro-obra e na transformação do objeto (texto). Penso que esta transformação também é pas-sível de acontecer no pensamento, visto que o texto é suporte para o pensamento. O pensa-mento é universal, a prática de pensar e a per-cepção são os condutores originais da arte. A habilidade é apenas uma forma de im-pulsionar o pensamento. A habilidade de pensar é a proposição prática deste trabalho. Duchamp por meio de seus readymades mostrou-se despido de uma prática es-pecífica relativo a um métier, ele esvazia o espectador de qualquer interpretação técnica a partir da habilidade do artista, a idéia do artista detentor de uma habili-dade excepcional perante o espectador, com isso a proposta da obra de arte tor-na-se mais interativa por não ser hierárquica. Como se Duchamp falasse:

- Olhemos esse mictório!

7 - Extraído do depoimento de CM registrado na pesquisa Ondas do corpo, de Antônio Manuel Copy-

desk e montagem do texto: Eudoro Augusto Macieira. Publicado no Livro “Cildo Meireles” da FUNAR-

TE. Rio de Janeiro, 1981.

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Agora olhemos para o segundo caso, o das cédulas. Nelas temos partículas de in-formação distintas do primeiro caso. A leitura é feita por um movimento de páginas sobrepostas. A letra é fragmentada em pequenos esboços de retângulos que preen-chem os espaços dos números já impressos na cédula. Há, também, impressa nas cédulas, a explicação de algumas regras do jogo, o logotipo da instituição e - muito interessante - acima do logotipo da CAIXA está a inscrição: Confira o bilhete impresso pelo terminal. Ele é o único comprovante da sua aposta. É exatamente o bilhete espe-lho do texto cédula (paginação à direita) que veremos com maior detalhe no capítulo

seguinte. Esta segunda diagramação inse-re o enunciado no sistema de validação do jogo da instituição CAIXA. As cédulas da direita contêm informações que validam o jogo, autenticadas com código de barras, data, hora e local (terminal 000000). As duas situações de interpretação estão in-seridas em um mesmo contexto-conjunto, o Axidioma. Ambas buscam o questiona-mento sobre o sujeito, agente que valida arte, e também são validadas em seus contextos particulares: o acadêmico, o ar-tístico e o jogo institucional. Além do fato de que as cédulas do jogo não se apresen-tam aqui no seu estado original, ou seja, são reproduções, cópias das originais. Mas fica ainda a questão em aberto so-bre o contexto da arte: Quem valida arte? Essa transfiguração acontece em nossas mentes nos acompa-nha em raciocínios e intuições: nós

achamos significados e os ressignificamos. O homem enquanto doador de sen-tido a si próprio e ao mundo 10. O trabalho acontece na soma en-tre obra e sujeito. A obra passa a ser o resultado da soma dos conteúdos, ou seja, do conteúdo com que ela se relaciona, e o resultado é sempre cumulativo.

Esta transfiguração acaba por abstrair a forma e o signo (concretos) para o pen-samento. Abstração dada pela interpretação. Retornando à citação do ini-cio deste capitulo quando Cildo Meireles fala: (...) ”o trabalho só existe na

10 - FLUSSER, Vilém. “Texto / imagem enquanto dinâmica do Ocidente”. In Cadernos Rioarte, Rio de

Janeiro, ano II, n.5, jan., 1996.

semântica das palavras como parte motriz da transfiguração proposta. Interpretar o texto gradativamente independente do ponto de partida, pensar que aqui existe uma triangulação entre textos: o dissertativo, o texto das cédulas e o pensamento constante e simultâneo.

Interpretemos dois casos. Primeiro a frase: Quem valida arte? Depois as 15 cédulas de Lotomania (as da esquerda e da direita) inseridas nesta obra. Consideraremos a forma com que elas foram aplicadas e encontraremos diversas interpretações. As duas aplicações são acompanhadas por informações de significativa relevância que as permeiam e que servem de partículas inter-pretativas. Estas partículas existem em um nível de questionamento múltiplo, passan-do por percepções instantâneas e exigindo outros níveis de atenção, sensibilidade e reflexão redobrada. Desta forma constitui-se parte do processo de transfiguração que faz parte de uma rede de ressignificação, o hipertexto 9 . (Fica a dica: que anotem sobre as folhas deste livro-obra, reflexões, ques-tionamentos e qualquer outro texto que ve-nha a contribuir com o sentido desta obra).

Para exemplificar algumas destas partículas interpretativas, podemos começar a atentar para o que as permeia. A frase que propus no parágrafo acima, está inserida no contex-to de reflexão dissertativa deste trabalho, na intenção de comunicar um raciocínio acom-panhado. Ela participa de uma ordenação padronizada pela leitura de texto ocidental, da esquerda para direita. Sem deixar de apontar para a tipografia e o formato itálico que destaca o enunciado da questão (Quem valida arte?), podemos relacioná-los ao uni-verso de dissertações que se utiliza de tipografias como estas, ou mesmo semelhantes, inserindo o enunciado na esfera de discussões acadêmicas com inúmeros autores que tratam sobre o assunto. Também outras questões podem ser levantadas pelo leitor.

9 - http://pt.wikipedia.org/wiki/Hipertexto - O Hipertexto é um texto suporte que acopla outros textos

em sua superfície cujo acesso se dá através dos links que têm a função de conectar a construção de

sentido, estendendo ou complementando o texto principal. Um conceito de Hipertexto precisa abran-

ger o campo lingüístico, já que se trata de textos.

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5 - Transfiguração como recodificação do signo–Objeto veicular

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Ferdinand de Saussure descreveu um signo como a combinação de um conceito com uma imagem sonora, ou seja, algo mental 11 . Isto, por si só, é suficiente para definir-se como um tipo de transfiguração. A utilização constante da repetição

do signo, ligado a uma imagem, dá-se por um código de associação entre a imagem e a sua representação. Entendo o signo como uma idéia latente, que neste estado é de ágil captação e quase que instantaneamente processado. O signo, portanto, é a transfigu-ração em si, pelo fato de sofrer constantes alterações na interpretação assim como na representação. Visando uma simplificação, o signo sofre um processo de mutação. A le-tra, por exemplo passou por estágios de re-presentação em pictogramas, ideogramas e, finalmente, letras 12. Penso não ser neces-sário me estender na história do signo-letra, somente citada aqui, pelo fato deste capítulo dar ênfase a formação de um signo de lugar.

A tipografia atual procura fornecer ao usu-ário uma possibilidade de trabalhar a men-sagem textual dentro de uma formalidade associada à noção de transparência que re-

tira certas características pessoais da letra e a insere num contexto generalizante. Uma diversidade tipográfica foi criada para que o usuário possa adequar a forma lingüística e gráfica à sua mensagem. Podendo afirmar a utilização destas apresen-tações tipográficas num cenário internacional, fica claro que este sistema de signo procura estabelecer uma universalidade de representação do texto escrito. Não só a tipografia como também as normas de formatação são produzidas de forma à uni-versalizar o pensamento intelectual, estabelecendo certas equivalências de leitura num cenário de inteligibilidade comunicativa. O meio acadêmico é uma prova disso.

11 - SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral, Editorial D.Quixote, 7ª Edição, Janeiro de

1995

12 - CAMPOS, Haroldo de. Ideograma: lógica, poesia, linguagem. 2. ed. - São Paulo: Cultrix, 1986.

medida em que outras pessoas o pratiquem”. A prática artística aqui é o exer-cício do pensamento sobre o enunciado. É um exercício de expressão recí-proca, infinita e cumulativa. A prática é a síntese que possibilita a soma en-tre tese e antítese. A prática artística talvez seja o intuito maior da arte.

A arte acontece neste praticar da obra esteja ela onde ela esti-ver. Retomando a frase de Cildo:

(...) “Enquanto o museu, a galeria, a tela, forem um espaço sagrado da repre-sentação, tornam-se um triângulo das Bermudas: qualquer coisa, qualquer idéia que você colo¬car lá vai ser automatica-mente neutralizada”.

O museu, a galeria, a tela, todos eles são es-paços sacralizados de proposição para a prá-tica artística que se tornaram signos crista-lizados destes espaços representativos. Por isso experimentamos espaços e situações distintas a estes, construindo a transfiguração conceitual destes espaços de representação.

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escultura, instalação, espaço de performação, ; passa a ser também lugar-objeto que se define como signo de lugar que tem equivalência em qualquer lugar do mundo, pro-põe assim a universalização da arte. Porém, esta configuração não sustenta muitas outras questões que nescessitam ser trabalhadas pela arte. O próprio lugar da pintura, escultura, instalação e performance é repensado em outros espaços de proposição. A moldura é transfigurada para outras definições de lugar. As séries de intervenções urbanas, por exemplo, são vivenciadas pela arte atualmente, podendo ser também identificadas como um lugar de proposição, um novo signo de lugar para arte. Pode-

mos perceber que neste espaço urbano, encontram-se equivalências referenciais de forma a inserir certas discussões no âmbito internacional. Estas equivalên-cias são evidenciadas nas configurações destes espaços. Por exemplo: as ruas, avenidas, asfaltos, muros, postes de ilu-minação, sinalização de transito, prédios, casas e outros componentes urbanos são passíveis de serem encontrados em qual-quer grande concentração urbana pelo mundo. Por exemplo: os grafites feitos em São Paulo, Tokio, Berlim, Londres, e outras metrópoles, intervêm em muros, paredes, becos, calçadas, lixeiras, ga-leria de esgotos e outros componentes urbanos presentes nestas localizações. Logo, isso passa a ser outra forma de universalizar a discussão artística. En-fim o signo de lugar da arte, toma pro-porções múltiplas, o lugar, a moldura da arte, sempre que inserida em outros con-

textos e conceitos, passa por um processo de transfiguração do signo lugar. O con-ceito deste signo é tão abrangente que já se chegou ao nível de conceituar o mundo como espaço- exposição. Robert Smithson disse: - O mundo é um museu 14. E Hélio Oiticica como se conjugasse a sentença de Smithson disse: - O museu é o mundo 15.

O que esta reflexão pretende em questão ao lugar do texto é discutir a impor-tância de se procurar novas formas de apresentação. Não é o caso de se ne-gar aqui, as normas de apresentação regulamentadas pela academia, mas

14 - FERREIRA, Glória, COTRIM, cecilia (org.). Escritos de Artistas Anos 60/70. Rio de Janeiro, Jorge

Zahar Editor, 2006. pag 280

15 - OITICICA, Hélio. Doc. 0235/66 p.4. Rio de Janeiro, Julho de 1966. Projeto Hélio Oiticica. Rio

de Janeiro, 2007.

Uma, das questões suscitadas sobre normas de apresentação é que iniciativas como estas vêm transformando o cenário da produção da pesquisa intelectual, com a inten-ção de possibilitar maior acessibilidade. Cria-se com essas normas um lugar espe-cífico para uma certa espécie de texto, lugar que se configura em um signo, no que diz respeito à forma da sua apresentação. O que se torna um problema ao confundir o lugar do texto, como o da pesquisa intelectual, com um lugar comum a qualquer espécie de pesquisa, como se o conteúdo de apresentação desta não tivesse impor-tância. Este conteúdo de apresentação é exatamente o que deveria ditar o aspec-to deste lugar do texto. O conteúdo de apresentação tem sua particularidade perante o conteúdo do objeto estuda-do, contudo ele trabalha de forma a po-tencializar a especificidade do assunto.

Para exemplificar melhor esta problemá-tica proponho uma reflexão no campo da arte. Como o signo de lugar da arte sofre constantes mutações. O espaço da tela foi e ainda é um espaço de re-flexão para o lugar da pintura, da arte, porem a pintura acontecia ali naquele es-paço proposto. A moldura é o que deter-mina o lugar da arte, moldura aqui que se configura como definição de lugar de proposição artística. Esta definição de lugar, este signo, esta moldura, se des-dobra, reconfigura-se, em um novo lu-gar, o espaço do cubo branco 13 , isso acontece a partir do momento que o es-paço expositivo adere um formato espe-cifico de galeria: paredes brancas, onde mantem o mínimo de informações possíveis e uma iluminação adequada. Ele ainda é o formato mais utilizado nas exposições de arte, no ambito internacional, desde o modernismo. Este lugar foi criado de for-ma que, quando nele inserida, a obra de arte não seria contaminada por outras in-formações. Este espaço se tornou um novo signo de lugar: ele, independente da localização no globo terrestre, poderia preservar o aspecto formal e conceitual da obra. Tal configuração espacial viria a provocar uma série de inquietações na pro-dução da arte, promovendo assim novas reflexões sobre as maneiras de utilização do lugar e suas limitações. A contribuição que este lugar proporcionou foi, e ainda é, de extrema importância; numerosas obras foram produzidas na problemática pro-posta pela configuração do espaço do cubo branco. Ele passa a ser lugar de pintura,

13 - O´DOHERTY, Brian. No interior do cubo branco: a ideologia do Espaço da Arte. São Paulo,

Martins Fontes, 200223 24

Uma outra recodificação de lugar acontece no momento em que letras são reconfi-guradas, em forma de fragmentos nas cédulas de Lotomania. O texto é inserido no lugar do jogo, assim o jogo passa a ser o lugar do texto, possibilitando também a recodificação do signo-letra, não esquecendo de outra etapa feita pela leitura dos bilhetes pela máquina e da reorganização dos signos em grãos numéricos. Os frag-mentos de textos são reconfigurados em números e posicionados em ordem cres-cente nas cédulas espelho (à direita). Isso se dá pela leitura da máquina, dos termi-

nais lotéricos. Junto a esta leitura estão os registros de hora, data e local, o que torna esta recodificação do texto da cédula um texto documental. Outro deslocamento....

Enfim, esta recodificação é feita sempre de forma presencial. Ela se faz presente na in-teligibilidade, do sentido da leitura e do fato. Quando ela expõe a definição, a forma e a consciência, manifesta sua mutação sem-pre acompanhada do leitor. O deslocamen-to configura-se em ser, estar, presenciar e reconhecer. Deslocamento de consciência.

sim buscar experimentar, refletir e subverter os parâmetros de criação do lugar que abriga o conteúdo textual apresentado. Contribuir com pesquisas similares a definições como o livro-de-artista ou o livro-objeto, levantadas por tantos estudiosos e artistas.

Trata-se de um lugar-objeto, um signo de lugar, que se transfigura em outros lu-gares. Um objeto-lugar-veicular que se locomove por meio de lampejos de cons-ciência de localização. O transporte é feito pela transformação do sentido do obje-to-lugar, a partir do momento em que é conscientizada uma transfiguração do espaço de proposição: há um desloca-mento de lugar. Antes aquilo agora isto.

A recodificação do signo é um desloca-mento que este trabalho propõe. A reco-dificação do signo-lugar e a recodificação do signo-letra são dois deslocamentos que serão descritos no subcapítulo a seguir.

5.1 - A recodificação do signo-lugar e do signo letra

Dando continuidade a questão sobre o lugar do texto, é necessário estabe-

lecer um reconhecimento da localização atual do mesmo. Penso ser suficiente so-mente apontar algumas características e deixar que o desenvolvimento do conceito deste deslocamento aconteça de forma es-pontânea. Este texto procura estabelecer-se no lugar da pesquisa intelectual, mono-grafia, ao mesmo tempo em que propõe um lugar de prática artistica: um trabalho de arte. A credibilidade dada ao conceito desenvolvido nesta obra oferece uma condição para que estes dois lugares se assumam efetivamente como endereços acessíveis. Daí a consciência do lugar. Uma troca recíproca é feita por estes dois lugares, de forma que no momento em que a prática artística acontece, a pesquisa se efetiva no campo da pesquisa intelectual, e vice-versa. Independente dos con-ceitos aqui trabalhados serem reconhecidos ou não pelo participante, há um deslo-camento do lugar da prática artistica, uma vez que, pensar a arte, mesmo que para negá-la, já é uma prática artística. (Um axidioma, que é verdade em “si” mesmo) .

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referência que representa bem a relação estabelecida do Axidioma com o sujeito que o pratica:

O DEUS MAL INFORMADO

No caminho onde pisou um deushá tanto tempo que o tempo não lembraresta o sonho dos péssem pesosem desenho.

Quem por ali passe, na fração de segun-do,em deus se erige, insciente, deus famin-to,saudoso de existência.

Vai seguindo em demanda de seu ras-tro,é um tremor radioso, uma opulênciade impossíveis, casulos do possível.

Mas a estrada se parte, se milparte,a seta não apontadestino algum, e o traço ausenteao homem torna homem, novamente.

(Carlos Drummond de Andrade)

6 - Conclusão

Dos argumentos apresentados podem-se apontar uma série de conclusões, ao lon-go do desenvolvimento, que são fundamentadas em informações comprometidas com uma formatação determinada a alcançar sua autenticidade perante o conceito do Axidioma: a verdade em “si”. As argumentações podem ser interpretadas como argumentações de uso acadêmico, de cunho pragmático. Ou mesmo podem ser vistas como uma proposta poética, o texto como matéria prima formadora da obra, embora as duas óticas fossem simul-taneamente propostas. É interessante ver como dois campos de proposição (dissertação e texto poético) podem conviver dando um recíproco suporte para efetivação no mundo das idéias.

Todo o conteúdo é aqui apresentado apartir de reflexões originádas [no] au-tor-propositor, e estas são revestidas por uma aura poética [oriundas] da in-tenção artística presente no Axidioma. Talvez seja muito mais do que uma “li-cença poética”, entendo essa intenção mais próxima de um “respaldo poético” do que de um campo de conhecimen-to: a arte mostra cada vez mais que exerce grande autonomia por seus ob-jetos trabalhados. E, visto que a pró-pria definição da palavra dissertação aponta para caminhos como estes:

do Lat. dissertationes. f., exposição desenvolvida de matéria doutrinária, científica ou artística; 16

E fica evidente que este Axidioma procura estabelecer conexões com dados referenciais, embora o formato aqui adotado de acordo com as nor-mas de apresentação não possibilite proporcionar referências ímpares, diver-sas das exigidas, como uma conversa de bar, uma sensação a partir de uma obra, orientações, anotações, exposições sem registro. Enfim, toda e qual-quer informação que contribui para a formação da obra. Fica aqui uma ultima

16 - http://www.priberam.pt/dlpo/definir_resultados.aspx

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• Extraído do depoimento de CM registrado na pesquisa Ondas do corpo, de Antônio Manuel Copy-desk e montagem do texto: Eudoro Augusto Macieira. Publica-do no Livro “Cildo Meireles” da FUNARTE. Rio de Janeiro, 1981.

7.1 - Mídias Digitais

• www.sortefacil.com• http://pt.wikipedia.org/wiki/Hipertexto - O Hipertexto é um texto suporte que acopla outros textos em sua superfície cujo acesso se dá através dos links que têm a função de conectar a construção de sentido, estenden-do ou complementando o texto principal. Um conceito de Hipertexto precisa abranger o campo lingüístico, já que se trata de textos.• http://www.priberam.pt/dlpo/definir_re-sultados.aspx

7- Referências Bibliográficas

• EMERSON, Ralph Waldo. Ensaios. Trad. José Paulo Paes. São Paulo: Cul-trix, 1976. p. 133. Apud CAMPOS, Haroldo de. Ideograma: lógica, poesia, lingua-gem. 2. ed. - São Paulo: Cultrix, 1986. pag. 34• ECO, Umberto. Obra Aberta: formas e inderteminações nas poéticas contem-porâneas/; [tradução de Giovanni Cutolo]. – São Paulo: Perspectiva, 2005. – (Deba-tes; 4 / dirigida por J. Guisburg). Pag . 149• CAMPOS, Augusto; PIGNATARI,Décio; CAMPOS, Haroldo; Teoria da Poesia Concreta: Textos Críticos e manifestos !950-1960; São Paulo : ed. Brasiliense, 1987. Pag 40• LYOTARD, Jean-François. O inu-mano: considerações sobre o tempo. Lisboa: Estampa, 1989.pag. 18• FLUSSER, Vilém. “Texto / imagem enquanto dinâmica do Ocidente”. In Ca-dernos Rioarte, Rio de Janeiro, ano II, n.5, jan., 1996.• SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral, Editorial D.Quixote, 7ª Edição, Janeiro de 1995• CAMPOS, Haroldo de. Ideograma: lógica, poesia, linguagem. 2. ed. - São Paulo: Cultrix, 1986.• O´DOHERTY, Brian. No interior do cubo branco: a ideologia do Espaço da Arte. São Paulo, Martins Fontes, 2002• FERREIRA, Glória, COTRIM, Cecilia (org.). Escritos de Artistas Anos 60/70. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2006. pag 280• DE DUVE, Thierry. Kant depois de Duchamp. In: FERREIRA, Glória, VENÂN-CIO FILHO, Paulo. (ed.). Arte & Ensaios, n. 5. Rio de Janeiro: Mestrado em História da Arte/Escola de Belas Artes, UFRJ, 1998.• OITICICA, Hélio. Catálogo raisonné. Rio de Janeiro: Projeto Hélio Oiticica, 2007

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