06. os Óculos mágicos

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    OS CULOS MGICOS

    NUMA crua manh de Novembro, deixei minha casa pertodo Museu Britnico e virei na Rua Regent. Fazia frio ehavia nvoa: o ar estava como algodo desfiado. Antes dechegar ao cruzamento, a nvoa espessou-se em neblina,com a cor de gua turva, e caminhar ficou difcil. Como euno tinha nenhum objetivo em particular vista, fuiconversar com um policial e, pela sua recomendao,

    entrei na Corte de Polcia de Vine Street, para passar umaou duas horas antes do almoo. Dentro da corte, aatmosfera ficou clara em comparao a de fora, e eu fuisentar em um dos bancos de carvalho por um vagosentimento de curiosidade. Havia um caso em cursoquando entrei: um homem velho, que fingiu ser umoculista, havia sido levado pela polcia por obstruir o

    trfego vendendo culos. Sua maleta verde, com alas deombro de couro, estava na mesa do procurador. Aacusao de obstruo no pde ser sustentada, o velhomudou de lugar logo que o policial lhe disse que ele e oinspetor tinham substitudo a acusao de fraude, sobre adenncia de um trabalhador e um comerciante. O policialtinha acabado seu depoimento, quando entrei no tribunal.

    Ele deixou a guarita das testemunhas com um ar de auto-satisfao e murmurou a observao de que o culpado era"de rara maldade". Olhei para o suposto criminoso edescobri que ele estava sentado perto de mim em umassento do parlamento na custdia de um policial robusto.Ele no parecia um criminoso: ele era alto, magro e malvestido em um velho terno preto , que parecia flutuarsobre a sua pobre pessoa, sua pele estava plida, branca,como os brotos de batatas que foram mantidos a longotempo em um poro escuro, parecia ter cerca de sessenta

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    anos de idade. Mas ele no tinha nenhum dos olharesfurtivos de um criminoso, nenhuma das inquietaes: seusolhos descansaram nos meus e passaram por eles com umaindiferena calma, contemplativa e tranquila.

    Me deti no trabalhador que foi apresentado pelo policialde apoio a acusao de fraude. Ele era um homem jovem,cerca de meia altura, e vestido de veludo cotel, com uma

    jaqueta spera de jeans escuro. Ele foi uma mtestemunha: ele hesitou, parou e se corrigiu, como se nosoubesse o significado de qualquer palavra, exceto as

    frases mais comuns de uso dirio. Mas ele eraevidentemente honesto: seus olhos castanhos olhavampara o mundo de forma justa o suficiente. Sua hesitaoveio do fato de que ele era apenas um pouco articulado.Desembaraado da nvoa de palavras inadequadas, seusignificado foi suficientemente claro.

    Ele foi convidado pelo acusado, a quem insistiu em

    chamar de "velho senhor", para comprar-lhe um par deculos: eles lhe mostrariam as coisas maisverdadeiramente do que ele poderia ver; e assim que ele"levou um golpe". Questionado pelo juiz se ele podia veras coisas mais claramente atravs dos culos, ele balanoua cabea:

    "No, praticamente a mesma coisa."Ento veio a pergunta: ele tinha sido logrado?Aparentemente, ele no sabia o significado da palavra"logrado".

    "Enganado", o magistrado substituiu.

    "No", ele no tinha sido enganado.

    "Bem, desapontado ento?"

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    "No", ele no poderia dizer isso.

    "Ser que ele gastaria outro shilling em um par de culossemelhantes?"

    "No," ele no; "um prejuzo ja o suficiente."

    Quando disse que ele poderia ir, ele se arrastou para forada guarita de testemunhas, e no seu caminho at a portatentou mais uma vez acenar para o acusado.Evidentemente, no houve maldade nele.

    A segundo testemunha policial tinha fluncia eautocontrole suficiente para um advogado: um homem demeia-idade, alto, florido e inclinado a ser forte, ele era

    bem vestido, como um elegante lojista, em um sobretudo preto, cala cinza e gravata de cor clara. Ele faloufluentemente, com uma calorosa indignao que pareciacombinar com suas grandes bochechas vermelhas. Se otrabalhador foi uma testemunha indecisa e fraca, o Sr.Hallett, de High Holborn, foi uma testemunha maisconvicta e determinada. Ele havia sido induzido a compraros culos, ele declarou, por "partido do velho," que lhedisse que iria mostrar-lhe as coisas exatamente como elaseram --- a verdade de tudo. Voc s tem que olhar por elesem um homem para ver se ele estava tentando "ganhar"voc ou no. Esse foi o motivo dele os ter comprado. Eleno pediu um shilling por eles, mas um sovereign e eledeu --- vinte shillings. Quando ele colocou os culos, eleno conseguia ver nada com eles, nada, era um "vegetal",e por isso ele queria que o "velho" os pegasse de volta edevolvesse seu sovereign, o que pode ter causado aobstruo a qual o policial se ops. O "homem velho" serecusou a dar-lhe o seu dinheiro de volta, disse que no o

    tinha enganado , teve a audcia de fingir que ele (Hallett)no tinha olhos para a verdade, e, portanto, no conseguia

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    ver nada com os culos. "Uma desculpa para uma mentira,ele a chamou, e um "golpe", um "homem velho" deve ficarno mnimo seis meses por isto.

    Uma ou duas vezes, o magistrado teve de direcionar ofluxo das palavras enfticas. Mas a acusao foi formal eprecisa. A questo agora era: como o magistrado iria lidarcom o caso? primeira vista, o Sr. Brown, o magistrado,me causou uma boa impresso. Ele estava progredindo navida: o cabelo escuro estava crescendo fino no topo e um

    pouco de cinza nas laterais. A cabea estava em boa forma,

    nomeadamente a testa larga, o queixo e a mandbula firme.A nica caracterstica desagradvel no rosto era a linhadura da boca, com finos, lbios antipticos. O Sr. Browntinha a reputao de ser um grande estudioso, e foi apenaso tipo de homem que teria sido um pedante; um homem de

    bom intelecto e fina linhagem, que iria achar os livros e as palavras mais interessantes do que os homens e seusfeitos.

    No incio, Sr. Brown parecia estar do lado do acusado: eletentou amenizar a raiva do Sr. Hallett. Uma ou duas desuas perguntas, de fato, foram contundentes e sensatas:

    "Voc no ter seu lucro de volta depois que vend-los,no ter, Sr. Hallett?" Ele perguntou.

    " claro que terei", respondeu o Sr. Hallett, corajosamente:"Eu no venderia nenhuma de minhas aes a umareduo menor que vinte por cento; minhas mercadoriasso bens genunas: preos so taxados nelas honestamente.Mas ele no me daria quinze shillings de troco para meusovereign, no ele, ele iria querer ficar com tudo ".

    O juiz olhou para corte e se dirigindo ao acusado, disse:"Voc tem algo a dizer em sua defesa Sr. Henry?"

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    "Penry, vossa exelncia: Matthew Penry", corrigiu ohomem velho com uma voz baixa e tranquila, assim comoa forma como ele se ps de p. "Se que eu posso dizerisso: a acusao de fraude absurda. Sr. Hallett parece

    estar com raiva porque eu vendi um par de culos para elepor um shilling e outro por um sovereign. Mas eles noeram os mesmos culos e, se tivessem sido, estoucertamente autorizado a pedir por minha mercadoria o queeu quiser."

    "Isso verdade, interrompeu o magistrado," mas ele diz

    que voc disse que ele iria ver a verdade atravs deles.Suponho que significava que ele iria ver maisverdadeiramente com eles do que com seus prpriosolhos? "

    "Sim," respondeu o Sr. Penry, com certa hesitao.

    "Mas ele no v mais verdadeiramente por eles",

    continuou o magistrado, "ou ele no iria querer que vocos levasse de volta.

    "No," Sr. Penry reconheceu, "mas essa falha no culpados culos. Eles iriam mostrar a verdade, se ele tivessequalquer faculdade para v-la: os culos no so bons paraos cegos. "

    "Venha, venha", disse o magistrado, "agora voc estcomeando a me confundir. Voc realmente no fingiu queos seus culos iriam mostrar a verdade das coisas, arealidade, quer dizer que eles iriam melhorar a sua viso,no isso? "

    "Sim", respondeu o Sr. Penry, "V-la de verdade, arealidade."

    "Bem", retrucou o magistrado, sorrindo: "Isso parece um

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    pouco mais metafsico do que prtico, no ? Se os seusculos permitissem discernir a verdade, eu iria comprarum par a mim mesmo: eles poderiam ser teis nestetribunal algumas vezes, "e ele olhou para ele com um

    sorriso, como se esperasse aplausos.

    Com pressa ansiosa, o velho se deixou levar por suaspalavras, abriu sua maleta, selecionou um par de culos, epassou-lhes ao funcionrio, que os entregou ao Sr. Brown.

    O juiz colocou os culos, olhou em volta da corte por umminuto ou dois, e ento irrompeu:

    "Meu Deus! Meu Deus! Que coisa extraordinria! Estesculos alteram cada um no tribunal. realmentesurpreendente. Eles no melhoram a aparncia das

    pessoas, pelo contrrio, um conjunto mais vil desemblantes seria difcil de imaginar. Se esses culos soconfiveis, os homens so mais como animais selvagens

    do que seres humanos, e os piores de todos so osadvogados, realmente uma terrvel definio de suas faces.Mas esta pode ser a verdade das coisas, estes culosformam uma viso mais do que os olhos das pessoascomuns podem perceber. Meu Deus! Meu Deus! Isto muito surpreendente, e eu me sinto inclinado a aceitar adeclarao do Sr. Penry sobre eles ", e ele olhou por cima

    dos culos no tribunal."Gostaria de olhar por um culos, sua admirao?" ,

    perguntou um dos advogados secamente, levantando-se,no entanto, a seus ps com uma atitude de respeito, aomesmo tempo, "que talvez seria este o melhor teste."

    Sr. Brown parecia estar um pouco surpreso, mas

    respondeu:"Se eu tivesse um espelho eu veria de bom grado."

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    Antes que as palavras sassem de sua boca, seufuncionrio tinha tropeado em volta do banco, entrou emuma sala privada do magistrado e voltou com um pequenoespelho, que ele entregou-se sua adorao.

    Assim que o Sr. Brown olhou no espelho, o sorriso deesperana deixou o seu rosto. Em um momento ou dois,ele largou o espelho seriamente, tirou os culos e osentregou ao escrivo, que os devolveu ao Sr. Penry.Depois de uma pausa, ele disse bruscamente:

    "Est bem, talvez, deixarei todas estas questes de fato a

    um jri. Eu vou aceitar uma fiana de pequeno porte, Sr.Penry ", continuou ele," mas eu acho que voc deve estarsujeito a responder a esta acusao durante as sesses. "

    Eu captei as palavras ", $50 peas em duas fianas e suaprpria fiana em $100", e, em seguida, o Sr. Penry foiinstrudo pelo policial para ir e esperar no corpo do

    tribunal at as fianas exigidas serem pagas. Por um acaso,o velho entrou e se sentou ao meu lado e eu era capaz deexamin-lo de perto. O bigode e a barba devem ter sidoacaju em alguma poca, mas agora o tom avermelhado

    parecia apenas para descolorir o cinza. A barba era fina,comprida e despenteada, e aumentou a desordemdesesperada de sua aparncia. Ele inclinou sua cabea para

    a frente, como se o pescoo estivesse muito fraco parasuport-la. Ele parecia fraco, velho e desprezado. Ele mepegou olhando para ele, e notei que seus olhos eram de umazul claro, como se ele fosse mais jovem do que eu

    pensasse. Sua forma gentilmente acadmica e voz refinadaganharam minha simpatia, e, quando nossos olhos seencontraram, eu me apresentei e disse-lhe que eu ficariafeliz em ser um de seus fiadores, se isso fosse salv-lo detempo ou problemas. Ele me agradeceu com uma espciede destacada cortesia: ele aceitaria de bom grado a minha

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    oferta.

    "Voc declarou o seu caso," eu disse: "e ento vocconfundiu o magistrado. Voc quase disse que os culos

    so chapeis mgicos --- culos ", eu continuei, sorrindo ehesitante, porque eu no quis ofend-lo, e ainda mal sabiacomo transmitir a impresso que suas palavras tinhamdeixado em mim.

    "culos Mgicos", ele repetiu gravemente, como semedindo as palavras: "Sim, voc pode cham-los deculos mgicos."

    Dizer que fiquei surpreso d apenas uma plida idia deminha surpresa e admirao:

    "Certamente, voc no quer dizer que eles mostram ascoisas como elas so", eu perguntei: "a verdade dascoisas?"

    " isso o que eu quero dizer", ele respondeu calmamente.

    "Ento eles no so culos normais?" Comentei perplexo.

    "No", ele repetiu gravemente, "no so culos comuns."

    Eu notei que ele tinha um truque curioso, de trocar osolhos atentamente com eles bem apertados e, em seguida,

    piscar rapidamente vrias vezes sucessivamente, como sea tenso fosse grande demais para ser suportada.

    Ele fez-me extremamente curioso, e ainda assim eu nogostava de pedir abertamente a permisso para testar um

    par de culos, por isso fui com as minhas perguntas:

    "Mas, se eles mostram a verdade, como foi que o Sr.

    Hallett no conseguiu ver nada por eles?"

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    "Simplesmente porque ele no tem um senso de realidade,ele matou a faculdade inata da verdade. Foi provavelmenteem um tempo no muito distante ", continuou estecomerciante estranho, sorrindo, mas seus hbitos de

    comerciante o destruram totalmente, ele tornou-se toimpregnado em mentiras que ele agora est cego para averdade, incapaz de perceb-la. O operrio, voc lembra,

    pde ver muito bem atravs de seus culos. "

    "Sim," eu respondi rindo; "e, evidentemente, o magistradoviu-se muito mais atravs deles do que de seus cuidados

    para se reconhecer."O velho riu tambm, de uma maneira ingnua e jovem queme encantou.

    Finalmente cheguei ao Rubico.

    "Ser que voc me venderia um par de culos?" Euperguntei.

    "Eu ficarei feliz em dar-lhe um par, se voc aceit-los",respondeu ele, com cortesia e ansioso; "meu fiadorcertamente deve ter um par", e ento ele olhou para mimem sua curiosidade, como que com alguma inteno. Ummomento depois, ele virou-se e abriu sua maleta, pegouum par de culos e os entregou para mim.

    Coloquei-os com tremendo entusiasmo e vi por mim. Omagistrado tinha dito a verdade, eles alteravam tudo: as

    pessoas eram as mesmas e ainda sim no pareciam asmesmas, este cara foi grosseiro passando toda a descrio,que face afiada e o fez horrvel com a ganncia e os outros

    brutalizados com luxria. Reconhecendo, por assim dizer,a paixo dominante em cada pessoa. Alguma coisa melevou a voltar meus culos sobre o comerciante, se eu fuisurpreendido antes, eu estava perdido na pergunta: os

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    culos transfiguraram-lhe. A barba grisalha foi tingida deouro, os olhos azuis luminosos com inteligncia, todas ascaractersticas enobrecidas, o semblante irradiandosinceridade e bondade. Tirei os culos s pressas e com a

    viso acabei. Sr. Penry estava olhando para mim com umcurioso e prazeroso sorriso de antecipao:involuntariamente, eu coloquei a minha mo a ele comuma espcie de reverncia:

    "Maravilhoso", exclamei, "seu rosto maravilhoso e todosos outros grotescos e repugnantes. O que significa isso?

    Diga-me! Voc vai dizer, no vai?""Voc precisa vir comigo para o meu quarto", disse ele,"onde ns podemos falar livremente, e eu acho que vocno vai se arrepender de ter me ajudado. Gostaria deexplicar tudo para voc. H muito poucos homens,"acrescentou ele", que oferecem ajuda para outro homemem dificuldade. Gostaria de te mostrar o quanto sou

    grato."

    "No h motivo de gratido", disse apressadamente: "Euno fiz nada".

    Sua voz agora parecia-me ser curiosamente refinada eimpressionante, e recordou-me a viso de seu rosto, feito

    bonito pelos estranhos culos. ...

    Tive uma considerao especial de como o Sr. Penryapareceu pela primeira vez para mim, por te-lo vistoatravs dos culos, nunca vi ele de novo como eu o tinhavisto da primeira vez. Lembrando minhas primeirasimpresses sobre ele, eu costumava me perguntar como eu

    poderia ter sido to enganado. Seu rosto tinha requinte e

    delicadeza em cada linha, uma certa coragem, tambm,que era totalmente espiritual. Eu j estava muito

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    interessado no Sr. Penry, ansioso para saber mais sobreele, para ajud-lo, se isso fosse possvel, de toda equalquer maneira.

    Algum tempo antes de decorridas as formalidades para asua fiana ser arranjada, e o persuadi a vir comigo para oalmoo. Levantou-se calmamente, colocou as tiras decouro por cima dos ombros, enfiou a maleta grandedebaixo do brao e caminhou para a rua com perfeitodomnio de si mesmo, e eu no estava de modo algumenvergonhado de sua aparncia, como eu deveria ter

    ficado a uma hora ou duas atras: Eu estava muito animadopor sentir orgulho mesmo, eu estava simplesmente feliz ecurioso.

    E esta impresso favorvel cresceu com tudo o que o Sr.Penry disse e fez, ento no mais me contive, efinalmente, depois do almoo, eu o coloquei em um txi eo levei para o meu prprio advogado. Eu encontrei o Sr.

    Morris, dos Srs. Morris, Coote e Co., bastante disposto aassumir o seu caso durante as sesses, permitindo,tambm, acreditar que as acusao eram "inventadas" pela

    polcia e sem fundamento srio. Mas, quando eu chamei oSr. Morris no canto e tentei convenc-lo que seu clienteera um homem de poderes extraordinrios, ele sorriu,incrdulo.

    "Voc est entusiasmado, Sr. Winter", ele disse meioctico, "mas ns advogados somos obrigados a ver ascoisas sob a luz fria da razo. Por que voc deve secomprometer a defender este Sr. Penry? claro que, sevoc esta mesmo decidido," ele continuou, passando porcima da minha interrupo, "Eu farei o meu melhor paraele, mas se eu fosse voc, eu manteria meus olhos abertose no faria nada precipitadamente".

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    A fim de impression-lo, coloquei-me em um tomigualmente frio e declarei que o Sr. Penry era um amigomeu e que ele no deveria deixar pedra sobre pedra parareivindicar sua honestidade. E com isso eu voltei para o Sr.

    Penry, e samos juntos do escritrio.

    O aposento do Sr. Penry me decepcionou; minhasexpectativas, eu temo, agora estavam sintonizadas muitoacima do normal. Foi em Chelsea, no alto, em uma casavelha e frgil, com vista para uma estrada suja e barcaascobertas com viscosos e ftidos bancos de lama. E, no

    entanto, mesmo aqui, o romance estava presente para oromntico, as grinaldas de nvoa ondulavam sobre o riovestindo as casas vizinhas em um suave mistrio, como setivessem sido envoltas em um sublime azul, e atravs doar, carregado de humidade o sol brilhava rodeado evermelho como uma roda de fogo do carro de Phaeton. Oquarto era muito desprotegido, abaixo da ampla janelahavia uma mesa repleta de grandes ofertas de instrumentose culos; fortes lmpadas eltricas direita e esquerdaregistros do trabalho prolongado do oculista. O telhado dosto seguia em direo ao centro, e pelo muro havia umacama auxiliar [truckle-bed: a parte inferior de uma"bibox"], cercado por uma tela de papel japons barato. Oconjunto de paredes entre a cama e a janela estavamdecoradas com prateleiras de pinheiro, cheias de livros,

    tudo foi arrumado, mas o quarto parecia desamparado efrio no abafado e mido ar.

    L ns sentamos e conversamos juntos, at que o soldeslizou fora da vista e do nevoeiro espesso e chegou anoite: sem nosso conhecimento, to estranhamentecomeou, cresceu a amizade. Antes de sairmos para jantar,

    o velho me mostrou os retratos de suas duas filhas e umapequena miniatura de sua esposa, que morreu quinze anos

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    atrs.

    Foi a primeira de muitas conversas na sala, a primeira demuitas confidncias. Pouco a pouco, ouvi toda a histria

    do Sr. Penry. Ela me foi contada aos poucos e de formainconseqente, como um amigo fala a um amigo emcrescente intimidade, e, agora se eu deixar o Sr. Penrycontar o conto dele na seqncia regular e de uma s vez, principalmente a fim de poupar o leitor o tdio danarrao interrompida e repeties desnecessrias.

    * * * * *

    "Meu pai era um oculista", comeou a dizer Sr. Penry," eum fabricante de culos, em Chelsea. Ns vivemos emcima da loja em King's Road, e minha infncia foi feliz osuficiente, mas no de qualquer maneira peculiar. Comooutras crianas saudveis, eu gostava muito mais de

    brincar do que ir as aulas, mas meus dias de escola eram

    muito rotineiros, muito vazios de amor para serem felizes.Minha me morreu quando eu era jovem demais paraentender ou lamentar-me por ela, e meu pai era gentil,apesar de seus mtodos precisos e puritanos. Eu era onico garoto, o que talvez o fez gentil comigo, e muitomais jovem que minhas duas irms, que haviam crescidoquando eu ainda usava fraldas e que se casaram e

    deixaram a casa de meu pai antes que eu tivesse chegado aconhec-las, ou sentido muito carinho por elas.

    "Quando eu tinha uns dezesseis anos, meu pai me tirou daescola e comeou a ensinar-me o seu prprio ofcio. Eletinha sido um operrio admirvel em seu tempo, do tipoantigo Ingls --- cuidadoso e capaz, embora um poucolento. O desejo sempre esteve presente nele para esmerar e

    polir cada lente to bem quanto poderia, e essa prticadeu-lhe um certo prestgio com um crculo de bons

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    clientes. Ele me ensinou todas as partes de seu ofciocomo tinha aprendido, e, nos prximos cinco ou seis anos,imbudo-me com seu prprio desejo de fazer cada trabalhoo mais perfeitamente possvel. Mas este perodo de

    imitao no durou muito. Antes de chegar a maioridade,comecei a desenhar para alm do meu pai, para viverminha prpria vida e para mostrar o amor pela leitura ereflexo estranhos ao seu costume. Era a religio que nosseparava. Na escola eu tinha aprendido um pouco defrancs e alemo, e em ambas as lnguas me deparei comopinies cticas que cresceram lentamente em minha

    mente, e com o tempo me levaram a descartar e quase nogostar da religio de meu pai. Digo isso simplesmenteporque qualquer pequena originalidade em mim pareciabrotar da dvida e da luta mental que convulsionou portrs ou quatro anos da minha juventude. Por meses emeses, eu li com afinco para conquistar minhas dvidas, eento eu li quase to ansiosamente para confirmar meu

    ceticismo."Ainda me lembro do brilho de surpresa e esperana, queveio sobre mim a primeira vez que eu li que Spinoza, umdos heris do meu pensamento, tambm havia feito suavida por meio de polimento de lentes. Ele foi o melhorarteso de seu tempo, dizia o livro, e eu determinado a metornar o melhor arteso de meu tempo e, a partir daquele

    momento, eu levei a minha profisso a srio, tenazmente.

    "Eu aprendi tudo que podia sobre lentes, e comeei a fazero meu prprio material, depois as melhores receitas. Eu

    peguei livros sobre ptica tambm, e os estudei, e assim,pouco a pouco, dominei a cincia de meu ofcio.

    "Eu no tinha mais do que dezenove ou vinte anos, quandomeu pai descobriu que eu era um operrio muito melhordo que seu assistente Thompson. Algumas lentes tinham

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    nos sido enviadas de um grande oculista em Harley Street,com uma multiplicidade de minunciosas direes. Elastinham sido feitas por Thompson, e foram trazidas de volta

    para ns, uma tarde por um velho cavalheiro muito

    inquieto que declarou que no o ajudava em tudo. A cartaque ele mostrou de Sir William Creighton, ooftamologista, sugeriu que os culos no foram bemfeitos. Meu pai estava fora, e na sua ausncia, eu abri acarta. Logo que eu tinha olhado para as lentes, eu vi que adenncia tinha fundamento, e assim eu o disse ao velho.Ele acabou por ser o famoso orador parlamentar, Lorde B.

    Ele me disse, irritado:"Tudo bem, jovem homem, voc faz meus culoscorretamente e eu deverei ficar satisfeito, mas at entono, voc entende, at ento no."

    "Eu sorri para ele e disse-lhe que iria fazer o trabalhosozinho, e ele saiu da loja resmungando, como se apenas

    meio tranquilizado por minhas promessas. Ento, resolvimostrar o que eu podia fazer. Quando meu pai voltou, eulhe disse o que tinha acontecido, e lhe pedi para deixar otrabalho para mim. Ele consentiu, e eu sa de uma vez paraa pequena oficina que eu tinha feito no nosso quintal eacomodei-me tarefa. Eu fiz a minha lente e a poli e, emseguida projetei os culos de acordo com as instrues.

    Quando terminei, enviei ao senhor William Creighton comuma nota, e alguns dias depois tivemos uma outra visita deLorde B., que disse ao meu pai que ele nunca tinha tidotais lentes e que eu era um tesouro "perfeito. " Comomuitas pessoas cri-cri, ele era difcil de se satisfazer, massatisfeito, ele foi to prdigo em elogios como em crticas.Lorde B. fez a minha reputao como um fabricante de

    culos, e durante anos eu estava contente com estepequeno triunfo. ...

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    "Eu casei quando tinha uns vinte e dois ou trs anos, e seteou oito anos depois que meu pai morreu. O vazio causado

    por sua morte, o vazio da perda e solido, era mais do quepreenchido por meus filhos. Eu tinha duas meninas que,

    neste momento, foram uma fonte de interesse permanente para mim. Como se cresce a amar essas pequenascriaturas, com seus risos e lgrimas, suas esperanas,

    perguntas e faz de conta! E como o amor de alguem paraelas intensificado por todos os problemas que passamos

    para ter de ganhar o seu amor e por todos os planostraados para o seu futuro! Mas tudo isso experincia

    humana comum e s vai te aborrecer. A felicidade dohomem no interessante para outras pessoas, e eu no seique maior felicidade suficiente para o prprio homem,em qualquer caso, durante os dez ou quinze anos em quefui mais feliz, menos eu fiz; pelo progresso feito, querodizer, como um operrio e o mnimo avano intelectualcomo um homem. Mas quando minhas filhas comearam a

    crescer e a separar-se de casa, a minha natureza intelectualcomeou a se mexer novamente. preciso ter algunsinteresses na vida, e, se o corao est vazio, a cabea ficaocupada, penso muitas vezes.

    "Um dia eu tive uma visita notvel. Um homem veio para pegar um par de culos que foram feitos: um homemnotvel. Ele era jovem, alegre e entusiasta, com uma

    fluencia de palavras impressionante, um brilhosurpreendente de expresso e estilo. Ele parecia iluminar avelha loja suja com sua vivacidade e feliz franqueza. Elequeria os culos para corrigir uma pequena divergnciaentre o olho direito e o esquerdo, e ele tinha sidoaconselhado a vir a mim por Sir William Creighton,

    porque o culos teria que ser muito bem feito. Eu prometi

    trabalhar com eles eu mesmo, e foi quando ele explodiu:

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    "Eu estou muito curioso para ver se os olhos perfeitosajudam ou prejudicam a minha arte. Voc sabe que eu souum pintor", continuou ele, jogando o cabelo para trs datesta, "e cada um de ns pintores v a vida a seu modo, e a

    beleza com certas peculiaridades. Seria curioso, no? Se otalento viesse de uma diferena entre os olhos!"

    "Sorri para a sua nsia, e anotei o seu nome, at entototalmente desconhecido para mim, mas que logo setornou conhecido e memorvel, acima de todos os outrosnomes: Dante Gabriel Rossetti. Fiz o culos e ele estava

    entusiasmado com eles, e me trouxe uma pequena pinturade si como forma de gratido.

    "A est", disse Penry, apontando para um pequeno painelque estava pendurado a seu lado, " semelhana de umhomem extraordinrio --- um gnio, se alguma vez houveum. Eu no sei por que ele se aproximou de mim, exceto

    porque eu o admirava intensamente, a minha loja, tambm

    era perto de sua casa em Chelsea, e ele frequentementevisitava sem avisar e passava uma hora na minha sala deestar e conversvamos --- conversava, como eu nuncatinha ouvido antes e nunca ouvi desde ento. Suas palavrasforam comida e bebida para mim, e mais que isso. Ou seus

    pensamentos ou a magia de sua personalidade forneciamminha mente com a essncia do crescimento e vigor que

    at ento tinha faltado a ela, em um sentido muito real,Rossetti tornou-se meu pai espiritual. Ele me ensinoucoisas sobre a arte que eu nunca tinha imaginado, abriu-me um novo cu e uma nova terra e, acima de tudo,mostrou-me que o meu ofcio, tambm tinha

    possibilidades artsticas em que eu nunca havia sonhadoantes.

    "Jamais esquecerei o momento que ele plantou a sementeem mim que tem crescido mais e mais at que preencheu

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    minha vida. Foi na minha sala de estar por trs da loja. Eletinha falado de seu ansioso e vvido caminho, derramandoverdades e pensamentos, epigramas e poesias, como umgrande joalheiro as vezes derrama pedras de mo em mo.

    Eu tinha me sentado ouvindo de boca aberta, tentandolembrar o quanto pude, para assimilar uma pequena partede todas aquelas preciosas palavra. Ele parou de repente, efomos tragados por alguns minutos de silncio, ento elecomeou novamente:

    "'Voc sabia, meu amigo solene", ele disse abruptamente,

    "que me veio uma idia outro dia que poderia servi-lo. Euestava lendo um dos romances de Walter Scott: aquela suacoisa romntica que me diverte, voc sabe, embora noseja to profundo quanto o mar. Bem, eu descobri que,cerca de cem anos atrs, um homem como voc fez o queeles chamam de lentes-Claude. Acho que elas eram apenascor de rosa," ele riu, "mas de qualquer forma, elasdeveriam fazer todas as coisas belas ao modo de Claude.Ento agora, por que voc no faria culos assim? Elesfariam ingleses bons o suficiente para ver as coisas cor derosa por um tempo. Ento, tambm, voc pode fazerlentes-Rossetti", continuou ele, rindo, e, se esses Saxesmaantes pudessem ter uma s idia da paixo que eles

    possuem, eu sei que eles acordariam. Por que no ir aotrabalho, meu amigo, a coisa vale a pena fazer? Voc

    sabe", ele continuou sriamente," pode haver algo neles.Eu no acredito que, se eu tivesse as suas lentes no incio,eu j seria o artista que sou. Eu quero dizer", disse ele,falando meio que para si mesmo, "se os meus olhostivessem sido perfeitos desde o incio, eu talvez tivesse secontentado com o que via. Mas como os meus olhos eramimperfeitos, tentei ver as coisas como a minha alma as v,

    e assim inventei olhares e gestos que o mundo real nuncateria me dado."

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    "Eu mal entendia o que ele queria dizer", disse Penry,"mas suas palavras moravam comigo: o terreno tinha sido

    preparado para elas, ele tinha preparado, e ao mesmotempo se enraizaram em mim e comearam a crescer. Eu

    no podia tirar da minha cabea a ideia das lentes-Claudee das lentes-Rossetti, e por fim eu anunciei por um pardaquelas velhas lentes-Claude, e em mais ou menos umms um par apareceu.

    "Voc pode imaginar que enquanto eu estava esperando, pendia pesadamente o tempo em minhas mos. Eu

    desejava estar no trabalho, eu queria entender a ideia quetinha chegado a mim, enquanto Rossetti estava falando.Durante a minha convivncia com ele, eu tinha sido seuestdio uma dzia de vezes, e tinha chegado a conhecer eadmirar esse tipo de beleza da mulher que agora estligado ao seu nome, a mulher, quero dizer, com a gargantade cisne e ar lnguido e pesadas-plpebras, que transmite atodos ns, agora, algo da paixo insacivel de Rosetti.Mas, enquanto eu estava estudando o seu trabalho emergulhando fundo em sua emoo, notei um dia umameia dzia de meninas das quais Rossetti poderia tertomado como modelo. Eu tinha comeado, na verdade, aver o mundo como Rossetti via, e essa conversa sua sobrelentes-Claude ps a idia em minha cabea que eu poderia,de fato, ser capaz de fazer um par de culos que

    permitissem s pessoas ver o mundo como Rossetti via ecomo eu vi quando tive a influncia de Rossettiinteiramente sobre posse de mim. Isso seria muito maisfcil de fazer, eu disse para mim mesmo, do que fazer um

    par de lentes-Claude, pois, afinal, eu no sabia como osolhos de Claude realmente eram e eu conhecia as

    peculiaridade dos olhos de Rossetti. Consequentemente,

    comeei a estudar a qualidade dspar nos olhos de Rossettie, depois de fazer um par de culos que fez meus olhos

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    verem de forma desigual com a mesma intensidade, acheique a viso Rossettiana das coisas foi aguada eintensificada para mim. Daquele momento em diante,minha tarefa foi fcil. Eu s tinha de estudar um

    determinado par de olhos e, em seguida, alter-los paraque eles possussem a disparidade dos olhos de Rossetti eo trabalho estaria parcialmente feito. Descobri, tambm,que eu poderia aumentar essa disparidade um pouco e, medida que eu a aumentava, eu aumentava tambm a

    peculiaridade que chamei de a viso Rossettiana dascoisas, mas, se eu fizesse a disparidade muito grande, tudo

    tornaria-se turvo novamente."Minhas pesquisas tinham chegado a este ponto, quando ovelho par de culos de Claude chegou em minhas mos.Eu vi de relance que o oculista do sculo XVIII no tinhaconhecimento do meu trabalho. Ele se limitou, como tinhaadivinhado Rossetti, com a colorao dos vidros muitodelicada e em diversas tonalidades, de fato, ele tinhaestudado a peculiaridades das cores do olho como eu haviaestudado sua peculiaridades da forma. Com essa dica, euterminei o meu trabalho. Levei apenas alguns dias parasaber que a cor da viso de Rossetti era muito limitada, ou,devo dizer, muito peculiar, como a forma do seu ponto devista, e, quando eu uma vez compreendid as

    peculiaridades da cor de seus olhos, eu pude reproduzi-las

    to facilmente como eu pude reproduzir as peculiaridadesda forma de sua viso . Eu, ento, comecei a trabalhar paraconseguir estas duas peculiaridades em meia dzia dediferentes conjuntos de lentes.

    "O trabalho me custou cerca de seis ou oito meses e,quando eu tinha feito meu melhor, mandei uma pequena

    nota circular para Rossetti e aguardava sua chegada comdolorosa ansiedade, a cada vez sendo balanado pelo medo

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    e a esperana. Quando ele chegou, eu dei-lhe um par deculos e, quando ele os provou e olhou para a rua, eu oobservei. Ele ficou surpreso --- pelo que eu pude notar ---e mais, um pouco confuso. Enquanto ele estava pensando,

    eu expliquei-lhe que as velhas lentes-Claude foram comoeu tinha desenvolvido a sua sugesto para essa presentedescoberta.

    "Voc um artista, meu amigo,' ele finalmente gritou, eum novo tipo de artista. Se voc pode fazer as pessoasverem o mundo como Claude viu e como eu o vejo, voc

    pode faz-los ver como Rembrandt viu e Velasquez. Voc pode fazer os cretinos compreenderem a vida como omaior deles a compreendeu. Mas isso impossvel,'acrescentou ele, baixando a face: 'isso apenas um sonho.Voc tem meus olhos reais, portanto, voc pode forar osoutros a verem como eu vejo, mas voc no tem os olhosreais de Rembrandt ou Velzquez, ou Ticiano, voc notem a chave fsica para as almas dos grandes mestres do

    passado, e assim o seu trabalho s pode ser aplicado aopresente e ao futuro. Mas isso o suficiente, e mais do quesuficiente,' acrescentou bruscamente. 'V em frente:tambem ha olhos MIllais para obter; e Corot na Frana, emeia dzia de outros, e eu ficarei feliz em encontra-los pravc. Voc far coisas maravilhosas meu amigo, coisasmaravilhosas.'

    "Fiquei imensamente lisonjeado por seu elogio e bomcorao, tambm, minha maneira, mas resolvi, aomesmo tempo no desistir da idia de fazer lentes-Velasquez e lentes-Rembrandt; porque eu tinha chegado aconhecer e admirar estes senhores com as conversas deRossetti. Ele estava sempre se referindo a eles, citando-os,

    por assim dizer, e, tendo se passado muito tempo, eu tinhame acostumado a passar duas tardes por semana em nossa

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    Galeria Nacional, a fim de obter algum conhecimento doshomens que foram os companheiros de seu esprito.

    "Por quase um ano depois disso, passei todas as horas do

    meu tempo livre a estudar na Nacional; e, finalmente,pareceu-me que eu tinha chegado gama de cores das deTiciano exatamente como as velhas lentes-Claude tinhamcomeado. Mas foi extremamente difcil obter a forma desua viso. No entanto, eu estava determinado a vencer e,com infinita pacincia e depois de inmeras tentativas, osucesso comeou a vir para mim lentamente. Para cortar

    uma longa histria, eu era capaz, em oito ou dez anos, deconstruir quatro ou cinco diferentes tipos de culos.Lentes-Claude e lentes-Rossetti, claro, e tambm lentes-Ticiano, lentes-Velzquez e lentes-Rembrandt; enovamente minha mente ancorou no trabalho realizado.

    No que eu parei de pensar completamente, mas poralgum tempo o meu pensamento no tomou novos vos,mas pairou em crculos sobre o conhecido. Assim que eutinha feito o primeiro par de lentes-Rossetti, comecei aensinar meu assistente, Williams, como torn-lasdmelhores, a fim de coloc-las perante o pblico. Logotive uma grande venda para elas. Chelsea, voc sabe ---velha Chelsea, quero dizer --- quase povoada de artistas,e muitos deles vieram sobre mim e comearam a fazerminha loja um ponto de encontro, onde se reuniram e

    trouxeram os seus amigos, e conversamos, pois Rossettitinha alguns seguidores fiis, mesmo em vida. Mas o meuverdadeiro sucesso veio com as lentes-Ticiano. A grandeviso Veneziana de vida e beleza parecia exercer umaseduo irresistvel sobre cada um, e o comrcio de seusculos logo se tornou importante.

    "Minha vida em casa a esta hora no era to feliz comotinha sido. Nesses longos anos de experincia infinita,

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    minhas filhas cresceram e se casaram, e minha esposa, eusuponho, viva de seus filhos, queria mais do meu tempo eateno, s que quando fui tomado por meu novo trabalho,comeou a dar menos a ela. De incio ela costumava se

    queixar, mas, quando viu que as queixas no mudavamnada, ela retirou-se para si mesma, por assim dizer, e a vicada vez menos. E ento, quando meu trabalho foi feito emeu novo comrcio estabelecido, a minha loja, como eulhe disse, tornou-se o ponto de encontro de artistas, e euincentivei interessados na frana, os rostos brilhantes e avoz jovem e ansiosa, e renovei minha juventude na

    companhia de jovens pintores e escritores quecostumavam me procurar. De repente, eu acordei para ofato de que minha esposa estava doente, muito doente, e,quase antes que eu tivesse totalmente consciente de quofraca ela estava, ela morreu. A perda foi maior do que euteria acreditado ser possvel. Ela era gentil e amvel, e eusinto falta dela todos os dia e toda hora. Acho que foi o

    incio de meu desagrado para a loja, a loja que me feznegligenci-la. As associaes de que me lembravam deminha culpa, as necessidades dirias disso cresceramcansativas para mim.

    "Nessa poca, tambm comecei a perder Rossetti e asinfluncias vivificantes de sua mente e conversa. Ele foi

    para o interior muitas vezes e por longos perodos e eu no

    o via, quando finalmente nos encontramos, eu achei queele estava perdendo sua virtude: ele se tornou mauhumorado e irritvel, um neuropta. claro que, a riquezaintelectual nele no podia ser escondida completamente:agora e depois, ele iria sair e falar do antigo jeito mgico:

    E conjuro maravilhas do vazio,

    At que as coisas se tornem belas como umvestido

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    E todo o mundo era um lugar encantado.

    Mas, mais freqentemente, ele estava triste e incomodado,e muito triste e oprimido comigo quando o encontrei. Os

    jovens artistas que vieram em minha loja no preencheramo seu lugar, eles tagarelavam alegremente o suficiente,mas nenhum deles era um magista que ele tinha sido, e eucomecei a perceber que um gnio como o seu um dosraros presentes em todo o mundo .

    "Estou tentando, com toda a brevidade, lhe explicar ascausas de minha melancolia e minha insatisfao: mas eu

    no acho que tenha feito isso de maneira muitoconvincente, e ainda, sobre este tempo, eu tinhaamadurecido insatisfeito, pouco vontade, inquieto. Emais uma vez o meu corao vazio, levou-me a trabalhar e

    pensar. O prximo passo foi inevitvel a partir do ltimoque eu tinha tomado.

    "Ao estudar os grandes pintores, eu tinha comeado aperceber que havia uma certa qualidade comum a todoseles, um certo poder que todos eles possuam ao trabalharao mais alto nvel de presso: o poder de ver as coisascomo elas so --- a vital e verdadeira essncia das coisas.Eu no quero dizer que todos eles possuam essa faculdadeno mesmo grau. Longe disso. A verdade das coisas para

    Ticiano sobreposta com o romance: ele memorvel, principalmente para a sua magia de cores e beleza,enquanto Holbein to memorvel para a suacompreenso da realidade. Mas compare Ticiano comGiorgione ou Tintoretto, e voc ver que a sua apreensoda realidade das coisas muito maior do que a deles. oque o distingue dos outros grandes coloristas de Veneza. E,como minha prpria viso da vida cresceu mais triste emais clara, ela veio a mim gradualmente como um

    propsito que eu deveria tentar fazer culos que mostram

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    a realidade, a verdade essencial das coisas, como todos osgrandes mestres tinha visto, e ento eu comecei a trabalharnovamente em uma nova misso.

    "Nessa poca, descobri que, apesar de eu ter muito maisclientes em minha loja, eu no tinha feito o dinheiro demeus empreendimentos artsticos. Meu comrcio antigocomo um fabricante de culos era realmente o ramo maislucrativo de meus negcios. A venda das lentes-Rossetti edas lentes-Ticiano, que no incio foi muito grande, caiurapidamente quando a novidade passou, e foi logo

    evidente que eu tinha perdido mais do que eu tinha ganhopor minhas invenes artsticas. Mas se eu fiz 1.500[libras] por ano, ou 1.000 [libras] por ano, era umaquesto indiferente para mim. Eu tinhapassado daquelelimite de quarenta o que para mim marca o fim da

    juventude em um homem, e os meus desejos foramdiminuindo a medida que meus anos aumentaram.Enquanto eu tinha o suficiente para satisfazer meusdesejos, eu no estava vido por dinheiro.

    "Este meu desejo recm-nascidos de fazer lentes que iriammostrar a verdade fundamental das coisas logo comeou ame possuir, e, aos poucos, eu deixei a loja cuidar de simesma, deixei nas mos de meu assistente, Williams, e

    passei mais e mais tempo na oficina pequena na parte

    traseira, que tinha sido o palco de todas as minhasconquistas. Eu no poderia te dizer quanto tempo eutrabalhei com o problema, eu s sei que me custou anos eanos, e que, como eu dava mais tempo e trabalho para issoe cada vez mais da paixo de minha alma, ento eu vimam-lo mais intensamente e pensei cada vez menos nasatividades corriqueiras do dia a dia. Finalmente, eu

    comecei a viver numa espcie de sonho, possudo por umas propsito. Eu costumava ficar acordado noite e

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    continuar com o trabalho e descansar durante o dia. Porconsecutivos meses, eu mal comia, na esperana de que afome pudesse aguar minhas faculdades; em outromomento, eu vivia quase inteiramente a base de caf,

    esperando que este causaria o mesmo efeito e, por fim,pouco a pouco, e lentamente , eu eu me aproximei mais doobjetivo de meu desejo. Mas, quando cheguei perto dele,quando eu tinha construdo culos que revelariam averdade nua e crua, mostrariam as coisas como eram e oshomens e as mulheres como elas eram, eu achei que ascircunstncias haviam mudado sobre mim

    lamentavelmente."No meio do meu trabalho, eu sabia sem perceber queWilliams tinha me deixado e aberto uma loja em frente,com o objetivo de vender as lentes artsticas, das quais elese declarou o inventor, mas no prestei ateno a esteassunto a tempo, e quando, dois ou trs anos depois,acordei novamente com os fatos comuns da vida, descobrique meu negcio estava quase abandonado. Eu no tenhocerteza, mas acho que foi um aviso de pagamento dealgumas dvidas que eu no tinha o dinheiro para pagar,que comeou a me lembrar completamente da realidade davida cotidiana. Que ironia que h no mundo! Aqui estavaeu, que estava trabalhando durante anos e anos com onico objetivo de fazer os homens verem as coisas como

    elas so e como homens e mulheres so perseguidos eagora arruinado pela mesma realidade que eu estavatentando revelar.

    "Minha mais recente inveno, tambm, foi um fracassocomercial: os novos culos no venderam nada. Nove emcada dez pessoas na Inglaterra so cegas para a verdade, e

    os culos no lhe serviriam pra nada, e uma pequenaminoria, que tem o sentido real das coisas, vivia

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    reclamando que a viso de vida que lhes mostrou os meusculos, no foi agradvel: como se isso fosse tudo culpaminha. Williams, tambm, meu assistente, me causou umgrande dano. Dedicou-se apenas a vender meus culos, e

    que o comerciante foi sucedido onde o artista e pensadorpassou fome. To logo ele descobriu meus culos novos,ele comeou a me tratar com desprezo; falou de mim, svezes como uma espcie de meio-louco, cujo crebro foitransformado pela importncia dada a minhas invenes, eem outras ocasies declarou que eu nunca tinha inventadonada, pois a idia dos culos artsticos tinha sido sugerida

    por Rossetti. Os jovens pintores que freqentavam sua lojatinham prazer em espalhar essa lenda e atribuindo aRossetti o que Rossetti teria sido o primeiro a negar. Euencontrei-me abandonado, e as horas que se passaram semuma s entrada em minha loja. O pior de tudo foi que,quando o acaso me deu um cliente, logo o perdi: os novosculos no agradavam a ningum.

    "Neste ponto, suponho eu, que se eu tivesse sido dotado deuma prudncia comum, eu deveria ter comeado a refazermeus passos, em vez de ficar mais obstinado medida queenvelhecia, ou aumentar a paixo da alma pelos sacrifciosque fiz por ela. Seja qual l qual possa ter sido o motivo deminha teimosia, a decepo e a humilhao que eu passeis parecia encorajar-me para uma maior determinaao. Eu

    sabia que tinha feito um bom trabalho, e do desdm comque me dirigi a mim mesmo e a meus prprios

    pensamentos."

    * * * * *

    Tanta coisa eu aprendi com o Sr. Penry nos primeiros diasque estvamos nos conhecendo e, em seguida h semanase semanas, ele no me disse mais nada. Ele pareciaconsiderar o resto de sua histria como fantstica e

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    improvvel para a confiana, e ele estava nervoso eapreensivo para que eu no me voltasse contra ele, peloque dizia. Novamente, porm, ele insinuou novosconhecimentos, experincias mais difceis, uma busca

    mais rdua, at que minha curiosidade estava totalmenteem chamas, e eu o pressionei, talvez indevidamente, portoda a verdade.

    Nestas semanas de companhia constante, nossa amizadecresceu com quase todas as reunies. Era impossvelescapar do encanto da personalidade de Penry! Ele estava

    to absorvido em seu trabalho, de modo negligente dasvaidades comuns e avarezas dos homens, to simples egentil e simptico, que eu amadureci por am-lo. Ele tinhaseus pequenos defeitos, claro, suas pequenas

    peculiaridades, a superfcial irritabilidade detemperamento, momentos de depresso indevida, em quedesvalorizava a si mesmo e a seu trabalho, momentos deeuforia excessiva, em que ele superestimava a importnciado que ele havia feito. Ele teria atingido a maioria das

    pessoas um pouco volveis e incertas, eu acho, mas a suaapaixonada devoo ao seu trabalho elevou a alma, e suasfalhas foram, afinal, insignificantes em comparao comsuas qualidades nobres e raras. Eu nunca tinha encontradoningum na vida, que despertou os impulsos maiselevados em mim como ele fez. Parecia provvel que os

    seus ltimos experimentos seriam os mais ousados e maisinstrutivos, e, portanto, eu o pressionei para me falar sobreeles com alguma insistncia, e, depois de um tempo, eleconsentiu:

    "Eu no sei como isso aconteceu", comeou ele, "mas odesprezo dos homens por minhas pesquisas exerceu uma

    certa influncia sobre mim, e finalmente eu levei a mimmesmo seriamente a tarefa: no h qualquer razo para o

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    seu desprezo e averso? Ser que essas minhas lentesrealmente mostram as coisas como elas so, ou eu estavaoferecendo, mas uma nova caricatura da verdade, que as

    pessoas tinham o direito de rejeita-la como desagradvel?

    Eu assumi novamente meus livros sobre ptica e estudeitodo o assunto de novo desde o incio. Mesmo quando eutrabalhava, o medo tomava conta de mim: eu sentia quehavia um outro cume diante de mim a escalar, e que oltimo pedao do caminho provavelmente seria a quedamais acentuada de todas. ... Nos Evangelhos, "continuouele, em voz baixa e reverente," muitas coisas so

    simblicas e de aplicao universal, e sempre me pareceusignificativo que o monte do Calvrio viesse no fim dalonga jornada. Mas eu me desviei de outro esforo

    prolongado, eu disse a mim mesmo que eu no poderiaenfrentar outra tarefa, como a ltima. Mas, ao mesmotempo, eu tinha uma espcie de premoniodesconfortvel que a parte mais difcil do trabalho de

    minha vida estava diante de mim."Um dia, uma declarao informal mexeu comigo

    profundamente. As cores primrias, voc sabe, sovermelho, amarelo e azul. As cores mostradas no arco-risvariam do vermelho ao azul e violeta, e as vibraes, oucomprimentos de ondas de luz que nos do violetatornadas mais curtas, finalmente, nos do o vermelho.

    Essas vibraes podem ser medidas. Um dia, por acaso,me deparei com a afirmao de que haviam inmerasondas de luz mais longas do que aquelas que do a corvioleta. Certa vez surgiu questo: seriam estas outrasondas mais longas representadas por cores que no vemos,cores para as quais no temos nome, cores de que no

    podemos formar nenhuma concepo? E a mesma coisa

    era verdadeira das ondas que, se tornando cada vez maiscurtas, nos do a sensao de vermelho? H espao,

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    claro, para mirades de cores alm desta outra extremidadede nossa viso. Um pequeno estudo me convenceu de quemeu palpite estava certo, pois todas as cores que vemosso representadas ao nosso senso de sensao em graus de

    calor, ou seja, azul mostra uma leitura do termmetro e overmelho uma leitura mais elevada, e por meio desta novanorma, descobri que o alcance da viso humana no nemmesmo colocada no meio do registro de calor, mas ocupaum espao muito pequeno na direo da extremidade maisquente do mesmo. H milhares de graus de frio menoresdo que o azul e centenas de graus de calor acima do

    vermelho. Todas essas gradaes so, sem dvida,representadas por cores que nenhum olho humano podeperceber, nenhuma mente humana pode imaginar. Assimcomo com a viso com o som. Sabemos agora que hrudos ainda maiores do que um trovo que no podemosouvir o barulho que se encontra do outro lado do silncio.

    Ns, os homens somos pobres prisioneiros inquietos,

    cercados por nossos sentidos como pelas paredes de umacela, ouvindo apenas uma parte da orquestra da natureza ea parte imperfeita, vendo apenas parte de um milsimo dasmaravilhosas-cores sobre ns e vendo aquela parteinfinitesimal de forma incorreta e parcial. Aqui estavamnovos conhecimentos com uma represlia! Conhecimentoque alterou todo o meu trabalho! Como eu ia fazer lentes

    para mostrar tudo isso? Lentes que revelariam as coisascomo elas so e deveriam ser se tornarem melhores --- arealidade ltima. Ao mesmo tempo, a nova misso tornou-se a meta de minha vida e, de alguma forma ou de outra eusabia antes de comear o trabalho que as poucas migalhasde conforto ou de felicidade que eu tinha preservado at o

    presente momento, eu deveria agora dar como pagamento.Eu percebia com diminuio e medo, que esta novainvestigao me retiraria ainda mais da simpatia de meuscompanheiros.

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    "Minha previso era justificada. Eu mal comecei atrabalhar bem --- isto , eu s tinha passado um par deanos em vos e torturantes experimentos --- quando umdia eu fui preso por dvida. Eu havia prestado ateno ao

    mandado, o dia do julgamento chegou e passou sem queeu nada sabesse sobre ele, e havia um homem na posse demeus pertences pouco antes de eu entender o que estavaacontecendo. Ento eu tinha aprendido pela experinciaque dever dinheiro um pecado imperdovel, na nao delojistas. Meus bens foram vendidos e eu fui levado amisria absoluta "--- o velho fez uma pausa ---" e depois

    enviado para a priso porque eu no podia pagar. ""Mas", eu perguntei, "suas filhas no fizeram nada?Certamente, elas poderiam ter vindo seu socorro? "

    Oh! Eramais que natural ", ele respondeu simplesmente," amais velho em especial, talvez porque ela era sozinha eno tinha filhos. Liguei para ela Gabrielle ", acrescentou

    ele, detendo-se sobre o nome," ela era muito boa paramim. To logo soube da notcia, ela pagou a minha dvidae me libertou. Ela comprou as coisas tambm, e meequipou com duas agradveis salas arranjou tudo de novo,

    bastante confortavelmente, mas voc v, "ele continuoucom um tmido e depreciativo sorriso ," Eu cansei atmesmo sua pacincia: eu no poderia trabalhar em

    qualquer coisa que trouxesse dinheiro e eu estavaconstantemente a gastar dinheiro para minhas pesquisas. Oagradvel mobilirio foi o primeiro, as encantadoras mesase cadeiras e depois a cama. Eu deveria ter cansado umanjo. Novamente, Gabrielle me comprou mveis e me fez

    bem arranjado e confortvel, como ela dizia, e outra vez,como um menino prdigo, eu joguei tudo fora. Como eu

    poderia pensar em mesas e cadeiras, quando eu estavaminha vida ao meu trabalho? Alm disso, eu sempre achei

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    que quanto mais eu era atormentado e punido, mais certoeu estava a conseguir o melhor de mim:. Solido e misriaso os mentores gmeos da alma "

    "Mas voc no desejava receber qualquer reconhecimento,um elogio?" Eu o interrompi.

    "Eu sabia que a esta altura", respondeu ele, "que, naproporo em que meu trabalho atingia a excelencia, eu odeveria achar menos compreendsvel. Quantos eu tinhavisto chegar ao louvor e a honra enquanto Rossetti caia emnervosismo e loucura, e ainda o seu trabalho perdura e ir

    perdurar, enquanto os deles j estavam esquecidos. Arvore que cresce a uma grande altura vence a solido,mesmo em uma floresta: seus maiores brotos noencontram companheiros salvo os ventos e as estrelas.Tentei me consolar com metforas como esta ", continuouele, com um sorriso depreciativo, "para os anos passados eeu parecia no mais me aproximar do sucesso. Enfim, o

    caminho se abriu um pouco para mim, e, depois de oito oudez anos de experincias incessantes, achei que o sucesso

    parcial provavelmente era tudo o que eu realizaria. Escute!No h um par de olhos em um milho que poderia ver oque eu tinha ensinado a mim mesmo a ver, que a paixo daalma traz consigo sua prpria recompensa. Depois decuidar de nada alm da verdade por 20 anos, pensando em

    nada alm da verdade, e desgastar-me depois disto, pudever-la mais claramente do que outros homens: chegar maisperto dela do que eles podiam. Ento, a melhor parte demeu trabalho --- Eu quero dizer o maior resultado dele ---se tornou pessoal, inteiramente pessoal, e isso medecepcionou. Se eu no podia fazer o bem aos outros porele, o que era o meu trabalho alm de uma satisfao

    pessoal? E o que era isso para mim --- na minha idade! Eupareci perder o nimo, perder o entusiasmo. ... Talvez a

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    velhice tenha pesado sobre mim, que a totalidade originalde minha energia havia sido gasta, que minha fasca tinhaqueimado. Pode ter sido.

    . "O fato que eu perdi a vontade de continuar, e, quandoeu tinha perdido isso, eu acordei, naturalmente, para osfatos comuns da vida e mais uma vez eu no tinhadinheiro: Eu estava fraco por causa da semi-inanio elongas viglias, prematuramente velho e decrpito. Umavez mais, Gabrielle veio ao meu auxlio. Ela at montouesta sala, e depois eu sa para vender minhas lentes, como

    um mascate. Eu comprei a maleta e fiz todas as espcimesde culos que eu tinha feito, e os vendi pelas ruas. Porqueeu no deveria? Nenhum trabalho degradante para oesprito, nenhum, e eu no poderia ser um fardo para o queeu amei, agora que eu sabia que meus esforos no iriam

    beneficiar outros. Eu no me dei muito bem: o mundo meparecia estranho, e os homens um pouco speros e duros.Alm disso, a polcia parecia me odiar, eu no sei porqu.Talvez, porque eu era pobre, e ainda diferente dos pobresque eles conheciam. Eles me perseguiram, e osmagistrados, diante de quem me trouxeram sempreacreditei neles e nunca acreditaram em mim. Fui punidoinmeras vezes por obstruo, embora eu nunca tenhaincomodado ningum. A polcia nunca simulou que eutinha enganado ou roubado de qualquer um antes, mas,

    apesar de tudo, esta ltima acusao deles me levou aconhec-lo e me deu sua amizade, e assim eu sinto quetoda a vergonha tem sido mais do que compensada paramim. "

    Meu corao ardia dentro de mim enquanto ele falava comtanta delicadeza de seus sofrimentos imerecidos. Eu lhe

    disse que estava orgulhoso de ser capaz de ajud-lo. Elecolocou sua mo sobre a minha com um pequeno sorriso

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    de compreenso.

    Um ou dois dias depois, a curiosidade despertou em mimnovamente, e pedi-lhe que deixasse-me ver um par de

    culos novos, aqueles que mostram a verdade ltimal dascoisas.

    "Algum dia, talvez," ele respondeu calmamente. Acho queminha cara caiu, porque, depois de um tempo, ele ficoumeditativo: "H falhas neles, voc v, deficincias e falhasem voc, tambm, meu amigo. Acredite em mim, se eutivesse certeza de que eles iriam conforta-lo ou ajud-lo na

    vida, eu iria deixar voc us-los sem demora, mas estoucomeando a duvidar de sua eficcia. Talvez a verdade dascoisas no seja para o homem. "

    * * * * *

    Quando entramos na corte no dia do julgamento de Penry,Morris e eu fomos de opinio que o caso no iria durarmuito e que seria certamente decidido a nosso favor. Anica pessoa de todas que parecia duvidosa da questo erao prprio Penry. Ele sorriu para mim, meiocompassivamente, quando eu lhe disse que em uma hora,deveramos estar em nosso caminho para casa. A espera

    parecia interminvel, mas finalmente o caso foi chamado.O advogado de acusao se levantou e falousuperficialmente por cinco minutos, com uma espcie deindiferena descuidada que me pareceu insensvel e semsentimentos. Ento ele comeou a chamar suastestemunhas. Percebi que o operrio, no estava notribunal. Suas evidncias tinham sido um pouco a favor doacusado, e o Ministrio Pblico, por essa razo, o deixoude fora. Mas o Sr.'Allett, como ele chamava a si mesmo,

    de 'Igh 'Olborn, era ainda mais fluente e vingativo do quetinha sido a corte policial. Ele teve tempo para reforar a

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    sua evidncia, e tambm, para torn-la mais amarga e maisreveladora, e ele tinha usado seu maligno tempo livre.Pareceu-me que cada um deve ter visto o seu rancor ecompreendido a vileza de seus motivos. Mas no, uma e

    outra vez, o juiz enfatizou as partes de sua histria, que parecia dizer mais contra o acusado. O juiz tinha,evidentemente, determinado que o jri no deveria perdernenhum detalhe da acusao, e sua prpria inclinao

    pareceu para mim inqua. Mas houve uma surpresa piorreservada para ns. Aps Hallett, a acusao chamou umCanon de Westminster, um homem corpulento, com

    pesadas e soltas papada, lbios persuasivos, CanonBayton. Ele nos contou como tinha crescido interessadoem Penry e em seu trabalho, e como ele tinha compradotodos os seus culos anteriormente, as lentes-Rossetti,como ele os chamava. O Canon declarou que estas lentesartsticas lanaram uma luz muito valiosa sobre as coisas,a resgatando da grosseria e da vulgaridade da vida e feito a

    realidade bela e encantadora. Ele no exitou em dizer queele as considerava como instrumentos para o bem, mas aslentes reveladoras-da-verdade pareciam excitar seu dio eindignao maior. Ele no conseguia encontrar uma

    palavra boa para dizer para elas: s mostrou, disse ele, oque na vida era terrvel e brutal. Ao olhar atravs delas,toda a beleza desapareceu, a encantadora cobertura de

    carne caiu e voc viu a caveira sorridente em voc. Emvez de afeio paternal, voc encontrou vaidade pessoal,em vez de ternura do marido para a mulher, sensualidadecomum e vulgar. Todos os motivos elevados murcharam e,em vez das flores da vida, voc era obrigado a olhar paraas razes vermiformes e a pegajosa imundcie. Eleconcluiu a seu testemunho, assegurando ao jri que elesestariam fazendo uma coisa boa se acabassem com avenda dessas lentes. O comrcio era pior do quefraudulento, declarou ele, que era uma blasfmia contra

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    Deus e uma afronta a natureza humana. O untuoso Canonme pareceu pior do que todo o resto, mas o efeito que tevesobre o jri era inconfundvel, e nosso advogado,Symonds, recusou-se a interrog-lo. Fazer isso, disse ele,

    seria apenas reforar o caso para a acusao, e no tenhodvida de que ele estava certo, pois Morris concordou comele.

    Mas mesmo as testemunhas de acusao no nos atingirammais do que as testemunhas de defesa. Sr. Penry tinha sidoaconselhado por Sr. Morris a convocar testemunhas para a

    sua reputao, e ele tinha chamado meia dzia doscomerciantes mais respeitveis de seu conhecimento. Cadaum e todos eles lhes fizeram mais mal do que bem, todoseles falaram de t-lo conhecido a 20 anos atrs, quando eleera bem-sucedido e respeitvel. Eles insistiram sobre oque eles chamavam de "afundar em sua vida." Todos eles

    pareciam pensar que ele havia negligenciado seusnegcios e chegado runa por sua prpria culpa. Nenhumdeles tinha a menor compreenso daquele homem, ou deseu trabalho. Isto foi expresso desde o incio que essastestemunhas danificaram nosso caso, e esta foi,aparentemente, a opinio do advogado de acusao, poisele mal se deu ao trabalho de interrog-los.

    Foi com um suspiro de alvio que vi o Sr. Penry ir para a

    guarita para depor em seu prprio nome. Agora, eu pensei,a verdade vir luz. Ele disse tudo com a maior clareza epreciso, mas ningum pareceu acreditar nele. O jri eraevidentemente desprovido do desejo de entend-lo, edesde o incio, o juiz tomou partido contra ele. De vez emquando, ele o interrompia apenas para exibir o que eleconsiderava como uma bvia falsidade de seu testemunho.

    "Voc diz que esses culos mostram a verdade", disse ele."Quem quer ver a verdade?"

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    "Muito poucos", foi a resposta de Penry.

    "Por que, ento, voc fez os culos", continuou o juiz, "sevoc sabia que eles iriam decepcionar as pessoas?"

    "Eu pensei que fosse meu dever," respondeu Penry.

    "Seu dever de decepcionar e irritar as pessoas?" retrucou ojuiz, "uma viso estranha para ter de dever. E voc temdinheiro para este dever desagradvel, no ?"

    "Um pouco", foi a resposta de Penry.

    "Sim, mas ainda assim voc tem dinheiro", insistiu o juiz."Voc convenceu as pessoas a comprarem seus culos,sabendo que elas iriam se decepcionar com eles, e osinduziu a lhe dar dinheiro pela decepo. Tem maisalguma coisa a dizer em sua defesa? "

    Eu estava no limite de minha inteligncia, eu mal sabia

    como ficar quieto no meu lugar. Pareceu-me to fcil dever a verdade. Mas mesmo Penry parecia indiferente aoresultado, indiferente a um grau que eu no poderiaexplicar ou perdoar. Nesta ltima questo, no entanto, o

    juiz o despertou. Como as sperase e insolentes palavrastivessem cado sobre sua orelha, ele se inclinou para frentee, escolhendo um par de culos, os ps e olhou em volta

    do tribunal. Notei que ele estava um pouco entusiasmado.Em um momento ou dois, ele pegou os culos e voltou-separa o juiz:

    "Meu senhor," disse ele, "voc parece determinado a mecondenar, mas, se voc for condenar-me, eu quero quevoc faa isso com um pouco de compreenso dos fatos.J vos disse que h muitas poucas pessoas neste pas que

    tenham qualquer faculdade de verdade, e que os poucosque a tm, geralmente tm arruinado seu poder antes que

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    eles atinjam a idade adulta. Voc zomba e ridiculariza oque eu digo, mas ainda assim continua a ser a simplesverdade. Eu olhei em volta do tribunal agora, apenas paraver se havia qualquer um aqui jovem o suficiente, ingnuo

    o suficiente, ou bastante puro, para depor a meu favor.Acho que no h ningum no tribunal a quem eu possarecorrer com esperana de sucesso. Mas, meu senhor, nasala de trs deste tribunal h uma criana sentada, umamenina de cabelos claros, provavelmente filha de vossaSenhoria. Permita-me cham-la como testemunha,

    permitir-lhe testar os culos e dizer o que ela v atravs

    deles, e ento voc ir concluir que estes culos fazemalterar e mudar as coisas de uma forma surpreendente paraaqueles que podem us-los. "

    "Eu no sei como voc sabia disso", interrompeu o juiz,"mas minha filha est no meu quarto esperando por mim, eo que voc diz parece ter algum sentido nisso. Mas totalmente incomum chamar uma criana, e eu no sei setenho o direito de permitir isso. Ainda assim, eu no queroque voc sinta que no teve toda a oportunidade deinocentar a si mesmo; ento, se o jri consentir, sou

    bastante solcito que eles devam ouvir o que essa novatestemunha possa ter a dizer "

    "Estamos dispostos a ouvir a testemunha", disse o

    presidente dos jurados ", mas realmente, vossa senhoria,nossas opinies sobre o caso esto formadas.

    No momento seguinte, a criana entrou no tribunal --- umamenina de treze ou catorze anos, com um rosto brilhante,inteligente, uma espcie de medo tmido preocupando afranqueza de sua abordagem.

    "Eu quero que voc olhe atravs de um par de culos,minha filha", disse Penry para ela ", e diga-nos o que voc

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    v atravs deles", e, enquanto falava, ele olhou para ela emseu modo estranho, como se avaliando seus olhos.

    Ele ento escolheu um par de culos e a entregou. A

    criana os colocou e olhou em volta da corte, e, emseguida, gritou de repente:

    "Oh, que estranhas pessoas; e como todas elas so feias.Todas feias, exceto voc que me deu os culos, voc lindo ". Virando apressadamente em volta, ela olhou para o

    pai e acrescentou: "Oh, papai, voc --- Oh!" e ela tirouos culos rapidamente, enquanto uma ardente emoo

    repentina cobriu sua face.

    "Eu no gosto destes culos", disse ela, indignada, osentregando de volta. "Eles so horrveis! Meu pai no se

    parece com isso."

    "Minha filha", disse Penry, muito suavemente, "vocolhar por um outro par de culos? Voc v tanta coisa quetalvez voc possa ver o que est a ser, assim como o que .Talvez voc possa pegar algum vislumbre at mesmo dofuturo."

    Ele escolheu um outro par e entregou criana. Houve umsilncio de expectativa no tribunal, as pessoas que anteszombavam de Penry e antes riam de desprezo, agora se

    inclinaram para frente para ouvir, como se algo deextraordinrio estivesse para acontecer. Todos os olhosestavam cravados no rosto da menina, todos os ouvidos seesforavam para ouvir o que ela diria. Ao redor da corte,ela olhou atravs das estranho lentes e, em seguida,comeou a falar em uma espcie de assustada monotonia:

    "No vejo nada", disse ela. "Quero dizer que no htribunal e no h pessoas, apenas grandes blocos brancos,uma espcie de branco-azulado. gelo? No h rvores,

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    nem animais, tudo frio e branco. gelo. No hnenhuma criatura viva, sem grama, sem flores, nada semove. tudo frio, todos mortos." Com uma voz assustada,ela acrescentou: " esse o futuro?"

    Penry se inclinou em direo a ela ansiosamente:

    "Olhe para a luz, criana," ele disse: "siga a luz para cimae diga-nos o que voc v."

    Mais uma vez um estranho silncio, ouvi meu coraobater quando a criana olhou em volta. Ento, tirando os

    culos, disse irritada:"Eu no posso ver mais nada: isso machuca meus olhos."

    * * * * *

    MORTE NA PRISO.

    "Matthew Penry, cujo julgamento e condenao porfraude, provavelmente ainda ser lembrado por nossosleitores por causa da evidncia muito impressionante dada

    pelo o depoimento de Canon Bayton, de Westminster,morreu, segundo entendemos, na priso de Wandsworth namanh de ontem de sncope." --- Trecho do "Times", 03 de

    janeiro de 1900.

    FRANK HARRIS.

    Traduzido por Wagner Fernandes