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1 Avaliação de projetos sociais: estudo de caso do Projeto Caminhos de Barro 1* Elisael Pereira Barros 1** Margareth Gomes Barreto 1*** Resumo: A literatura que trata do tema da avaliação de projetos sociais apresenta metodologias diferenciadas propostas por diversos autores. Deste modo, o presente artigo, com base no estudo dessas metodologias, analisa um modelo de avaliação que possa ser aplicado ao Projeto Caminhos de Barro, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF). Este projeto tem como principal finalidade capacitar, na arte cerâmica, as comunidades excluídas do processo de produção industrial, de tijolos e telhas, nas cerâmicas da Baixada Campista. O artigo apresenta, inicialmente, os conceitos de Gerenciamento de Projetos buscando se fundamentar na utilização de uma metodologia específica para avaliação de projetos sociais, em função de sua aplicabilidade ao Projeto Caminhos de Barro. Para a coleta de dados, foi aplicado um questionário aberto, in loco, aos gestores e artesãos beneficiários do projeto. Após a avaliação, foram detectados fatores positivos e negativos, e possíveis ações a serem implementadas para a superação dos problemas e, ainda, para a reestruturação do projeto como instrumento propulsor de mudanças na realidade da comunidade envolvida. Palavras chave: avaliação, projeto social, inclusão, geração de renda, arte cerâmica. ________________________ 1 * Este artigo constitui-se no Trabalho de Conclusão de Curso da Pós-graduação Lato Sensu em Gestão, Design e Marketing do Instituto Federal Fluminense, Campus Campos-Centro, no ano de 2016, desenvolvido sob a orientação do Prof. Dr. Romeu E Silva Neto. 1 ** Graduado em Design Gráfico, no IFF- Campus Campos-Centro. E-mail [email protected]. 1 *** Graduada no Curso Normal Superior, no Instituto Superiores de Ensino do Censa- Campos. E-mail [email protected]

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Avaliação de projetos sociais: estudo de caso do Projeto

Caminhos de Barro1*

Elisael Pereira Barros1**

Margareth Gomes Barreto1***

Resumo: A literatura que trata do tema da avaliação de projetos sociais apresenta

metodologias diferenciadas propostas por diversos autores. Deste modo, o presente artigo,

com base no estudo dessas metodologias, analisa um modelo de avaliação que possa ser

aplicado ao Projeto Caminhos de Barro, da Universidade Estadual do Norte Fluminense

Darcy Ribeiro (UENF). Este projeto tem como principal finalidade capacitar, na arte

cerâmica, as comunidades excluídas do processo de produção industrial, de tijolos e telhas,

nas cerâmicas da Baixada Campista. O artigo apresenta, inicialmente, os conceitos de

Gerenciamento de Projetos buscando se fundamentar na utilização de uma metodologia

específica para avaliação de projetos sociais, em função de sua aplicabilidade ao Projeto

Caminhos de Barro. Para a coleta de dados, foi aplicado um questionário aberto, in loco, aos

gestores e artesãos beneficiários do projeto. Após a avaliação, foram detectados fatores

positivos e negativos, e possíveis ações a serem implementadas para a superação dos

problemas e, ainda, para a reestruturação do projeto como instrumento propulsor de mudanças

na realidade da comunidade envolvida.

Palavras – chave: avaliação, projeto social, inclusão, geração de renda, arte cerâmica.

________________________

1* Este artigo constitui-se no Trabalho de Conclusão de Curso da Pós-graduação Lato Sensu em Gestão, Design

e Marketing do Instituto Federal Fluminense, Campus Campos-Centro, no ano de 2016, desenvolvido sob a

orientação do Prof. Dr. Romeu E Silva Neto. 1** Graduado em Design Gráfico, no IFF- Campus Campos-Centro. E-mail [email protected].

1*** Graduada no Curso Normal Superior, no Instituto Superiores de Ensino do Censa- Campos. E-mail

[email protected]

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Abstract

The literature that approaches the subject of social projects evaluation, present different

methodologies by several authors. Therefore, the present paper, based on these methodologies

studies, analyses a social project evaluation model that can be applied in the assessment of

"Projeto Caminhos de Barro" (Clay Path Project) which is a project from the Universidade

Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF). This project has the main goal of

enabling, in artisanal ceramic art, the excluded communities from the industrial process of

brick and tile production in the region. The paper presents, initially, the concepts of Project

Management, intending to be based on an specific methodology for social projects due to its

applicability in the mentioned project. To the data collecting, an open survey was applied on-

site to the project managers and benefiting artisans. After the evaluation, positive and

negative factors, and possible actions to be implemented were detected, in search for

problems overcoming and even to the project restructuring as a propelling instrument for

reality changes in the involved community.

Key-words: evaluation, social project, social inclusion, income generation, ceramic art.

1 Introdução

A cerâmica é um material que acompanha o homem desde os tempos primitivos. A

cerca de dois mil anos, bem antes da chegada dos portugueses ao continente americano, já

existiam nas terras do novo continente diferentes grupos sociais que fabricavam cerâmicas.

Eram aldeias instaladas próximas a rios e ribeirões, vivendo da caça e da pesca, cultivando

determinadas plantas, e capazes de manipular convenientemente o barro, produzindo assim

uma gama de artefatos cerâmicos.

O que se sabe, com total rigor histórico, é que, a partir do período neolítico,

aparecem fragmentos de cerâmica a demonstrar, de forma inequívoca, a

presença humana. Poder-se-á dizer, por isso, que o homem começou a

“escrever”, no barro, a sua própria História. (COSTA, 2000, p.9)

No Brasil, apenas nos últimos 60 anos, houve avanço significativo nos processos de

fabricação industrial de peças cerâmicas, motivado pela expansão do conhecimento na ciência

dos materiais cerâmicos em laboratório e na sua aplicação. Deste modo, os produtos passaram

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a ter um padrão de qualidade necessário para serem produzidos de forma industrial, atendendo

às exigências estabelecidas pela normatização vigente.

No município de Campos dos Goytacazes/RJ, ocorreram poucas mudanças do ponto

de vista tecnológico no setor de cerâmica vermelha nos últimos anos. No entanto, a atuação

da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) através dos

Laboratórios de Engenharia Civil, de Engenharia de Materiais, e de Ciências Humanas, em

conjunto com as ações propostas pelo SEBRAE/RJ, vem motivando algumas transformações

nesse setor de produção na região Norte Fluminense, tais como a diversificação da produção

com a integração da população em atividades artísticas e artesanais, resgatando dessa forma a

tão idealizada economia solidária.

Neste sentido, as potencialidades industriais acima citadas se articulam com as

especificidades do município de Campos dos Goytacazes, que se localiza na região norte do

Estado do Rio de Janeiro, com 4.032 km2 de extensão, e se caracteriza pela abundância na

reserva de materiais argilosos, sendo uma região de grande potencial da atividade industrial

de cerâmica vermelha.

Os empregos atualmente gerados pelas indústrias cerâmicas de Campos dos

Goytacazes, concentradas na região da Baixada Campista, em função do tipo de atividades

desenvolvidas, vinculam uma determinada faixa etária de trabalhadores capazes de

desenvolver trabalhos que exigem esforço físico. Nesse contexto, como iniciativa de inclusão

social através da arte cerâmica, foi criado o Projeto Caminhos de Barro - Disseminação da

Arte–Cerâmica, implantado pela Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), no ano

de 2000, tendo como finalidade capacitar, na arte cerâmica artesanal, as comunidades

excluídas do processo industrial de produção de tijolos e telhas. Assim sendo, associado à

necessidade de se restaurar, em seu sentido amplo, a dignidade perdida no trabalho, bem

como estabelecer novas perspectivas de futuro para essa parcela da comunidade excluída da

produção tradicional das cerâmicas, inicialmente, foi implantado um polo na comunidade de

São Sebastião, distrito de Campos dos Goytacazes. A implantação deste polo objetivava criar

um espaço alternativo, privilegiando a formação artística, cultural e técnica, no sentido de

alavancar o processo de desenvolvimento econômico da atividade cerâmica na região,

fomentado pelo governo do Estado do Rio de Janeiro.

A cerâmica, tanto de uso comum como artístico, é produzida hoje por toda

parte, seja em grandes estabelecimentos ou por pequenos artesãos. Os

sistemas são fundamentalmente os mesmos, mas é inegável que a

experiência técnica adquiriu tamanha perfeição que permite resultados

extraordinários. (ANFACER1)

_________________________________________

1ANFACER - Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimentos, Louças Sanitárias e

Congêneres.

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O sucesso alcançado pelo projeto junto à comunidade, com a repercussão do trabalho

artístico produzido pela primeira geração de ceramistas em formação, e a demanda crescente

pela participação do grupo em mostras, dentro e fora do município de Campos dos

Goytacazes, exigiram a expansão da oficina e suas atividades, tanto quantitativamente quanto

qualitativamente, para consolidá-lo como um autêntico modelo inovador de gestão.

A escola sede do Projeto Caminhos de Barro que funciona no campus da UENF, com

apoio direto do Laboratório de Engenharia Civil (LECIV) da Universidade, oferece suporte

tecnológico ao projeto nos estudos e testes de matérias primas, corantes e queima do material

produzido. Segundo Ramos, et al (2008),

A arte cerâmica desenvolvida em diversas regiões brasileiras baseia-se em

formulações empíricas e regionais. Isso, de certa forma, prejudica sua

disseminação, pois as matérias-primas utilizadas são extremamente

complexas e, quase sempre aplicadas na sua forma bruta. (RAMOS, et al,

2008, p.281)

Dessa forma, as peças produzidas pelos artesãos do projeto trazem um diferencial

próprio, pois as matérias primas utilizadas na produção dos artefatos, assim como as

utilizadas para pintura ou decoração (engobes), são todas naturais e extraídas de locais

selecionados por uma equipe técnica especializada em argilas.

Com sua logomarca registrada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI),

o Projeto Caminhos de Barro, funciona como núcleo gerador de conhecimento artístico

artesanal, isto é, forma turmas de artesãos de diversos setores da comunidade, gerando

alternativas de trabalho e expansão socioeconômica e cultural para a região.

A partir dos resultados alcançados pelo projeto foi criada a Associação de Artesãos

Caminhos de Barro, no ano de 2013, com o intuito de desenvolver e apoiar ações de

empreendedorismo, de modo a fomentar a independência econômico-financeira e pessoal de

seus artesãos, assim como formar parcerias com órgãos públicos ou privados para a captação

de recursos que pudessem alavancar a expansão do projeto.

Deste modo, considerando a importância do gerenciamento de projetos como

instrumento estruturante e dinamizador das organizações, o presente artigo visa descrever e

analisar um modelo de avaliação de projetos sociais, aplicando-o ao Projeto Caminhos de

Barro, no sentido de elaborar um diagnóstico de suas ações visando promover a inclusão

social e a geração de renda para todos os atores e comunidades envolvidas.

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Este trabalho traz, em seu desenvolvimento, um caráter exploratório e descritivo.

Inicialmente, apresenta os conceitos de Gerenciamento de Projetos, bem como, uma

metodologia de avaliação de projetos sociais. Para tanto, foi desenvolvida uma pesquisa

bibliográfica em publicações especializadas sobre o tema. Por fim, o trabalho analisa e

descreve o processo de avaliação de projetos sociais, aplicando-o ao Projeto Caminhos de

Barro. De modo complementar, foi realizada uma pesquisa de campo com visitas técnicas à

sede do projeto. O instrumento de coleta de dados se configurou em um questionário aberto

aplicado in loco aos gestores e artesãos beneficiários do projeto.

2 Revisão de literatura

2.1 Gerenciamento de Projetos

Primeiramente, há que se definir o conceito de projeto publicado na literatura. De

acordo com Clemente (2002, p.21) o “termo projeto está associado à percepção de

necessidades ou oportunidades de certa organização, com o intuito de planejar algo para ser

executado no futuro”. Desta forma, projetos nascem de uma idealização estratégica das

organizações. Assim, pode ser entendido como um conjunto de informações coletadas e

processadas, simulando uma alternativa de investimento para testar sua viabilidade.

Ainda no que diz respeito ao conceito de projeto, vale destacar a proximidade

conceitual entre os termos projeto e planejamento. Nesse ponto, Clemente (2002) afirma que

embora a elaboração, análise e avaliação de projetos sejam atividades concernentes ao

planejamento, este é um termo muito mais amplo, compreendendo muitas outras atividades

além do projeto em si.

O planejamento, segundo Clemente (2002, p.21) em essência, “é a escolha de

situações futuras adequadas ao ambiente que envolve a organização e o estudo dos cursos

alternativos de ação para alcançá-las”. O projeto, por sua vez, refere-se a um tema mais

específico, requer quantidades definidas de recursos e de tempo e estabelece resultados

tipicamente quantificáveis.

As abordagens vinculadas à análise econômica de projetos foram empregadas, a

princípio, no âmbito dos negócios, com a finalidade de identificar a viabilidade de execução

dos mesmos. A viabilidade estaria associada ao resultado previsto para o empreendimento

mensurado em termos de rentabilidade, isto é, aqueles projetos que apresentassem resultado

positivo na relação entre as suas receitas e despesas estariam aptos a ser selecionados para

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efeitos de implementação. Entretanto, a viabilidade de um projeto pode ser avaliada sob

outros enfoques além do empresarial. Neste sentido, Cohen e Franco (1993) enfatizam que:

A avaliação não deve ser concebida como uma atividade isolada e auto-

suficiente. Ela faz parte do processo de planejamento da política social,

gerando uma retroalimentação que permite escolher entre diversos projetos

de acordo com a sua eficácia e eficiência. Também analisa os resultados

obtidos por esses projetos, criando possibilidade de retificar as ações e

reorientá-las em direção ao fim postulado. (COHEN e FRANCO, 1993,

p.73)

As avaliações sob a ótica de agentes de fomento e de governos, nas suas diversas

esferas de atuação, podem ser desenvolvidas com a finalidade de verificar se as intervenções

planejadas produzirão os efeitos desejados. Assim, segundo Contador (2000), aquelas

avaliações que são processadas, levando em consideração o ponto de vista da comunidade ou

da sociedade como um todo, são empreendidas sob o enfoque social. As diferenças, portanto,

entre os critérios de avaliação privada e social dizem respeito aos diferentes enfoques que são

utilizados para a valorização dos recursos e dos produtos dos projetos. A avaliação privada

enfatiza os benefícios e os custos a preços de mercado, uma vez que os recursos e os produtos

podem ser obtidos e negociados em um mercado específico. Já a avaliação social utiliza

preços sociais que expressam o valor que a sociedade estaria disposta a pagar pelos bens e

serviços proporcionados pelo projeto em questão.

Para Xavier (2008), as organizações não governamentais denominadas de Terceiro

Setor, sem fins lucrativos, ocupam um espaço cada vez maior na sociedade, contribuindo para

o seu aprimoramento e executando tarefas em que os outros dois setores, o governo e as

entidades com fins lucrativos situadas no mercado, não apresentam resultados sociais

efetivos. Sobre atuação do Terceiro Setor, Xavier (2008) esclarece que a maioria das

iniciativas desse segmento é implementada sob a forma de projetos, sendo necessário

aperfeiçoar seus processos de gerenciamento em razão da concorrência interna que o

caracteriza, face à limitação dos recursos disponíveis para financiamento e da crescente

exigência das organizações patrocinadoras por propostas e prestação de contas consistentes,

assim como melhores resultados dos projetos.

Xavier (2008) esclarece que, com relação à atividade de gerenciamento de projetos,

um dos maiores desafios do Terceiro Setor é superar a visão amplamente difundida de que

projeto é aquele documento formal que serve fundamentalmente para contratar relações de

financiamento. Nesta visão, o conteúdo de tal documento não tem necessariamente uma

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relação direta com a forma como a ação será pensada e desenvolvida. Somente com a recente

disseminação das técnicas de planejamento estratégico e dos debates sobre o impacto do

trabalho social, e as dificuldades para a sua avaliação, é que se começou a encarar o projeto

como instrumento metodológico para fazer da ação social uma intervenção organizada, com

melhores possibilidades de atingir seus objetivos.

Neste sentido, sendo o projeto um empreendimento planejado que consiste num

conjunto de atividades inter-relacionadas e coordenadas, para alcançar objetivos específicos

dentro de prazo e recursos limitados, Xavier (2008), explica que:

Um projeto é orientado para gerar resultados – bens ou benefícios – ou para

prestar serviços específicos. Portanto, necessita de metas claras – medidas de

resultados – e datas de início e término que atendam aos requisitos

negociados e explícitos pelos envolvidos ou partes interessadas. (XAVIER,

2008, p.1)

Dentre as diversas definições que permitem estabelecer as características do projeto,

Xavier (2008) considera relevante destacar os seguintes itens: o ordenamento de atividades

relacionadas que envolvem recursos e diferentes funções da organização; o empreendimento

temporário, com início e fim bem definidos; a criação de um produto ou serviço único

(mesmo que seja, por exemplo, um curso já ministrado, será para pessoas diferentes, em datas

diferentes e assim sucessivamente); a progressividade dos projetos, por serem temporários e

exclusivos; o estabelecimento claro de objetivos e o atendimento de parâmetros como de

custo, tempo, qualidade, todos previamente determinados.

Os projetos ocorrem praticamente em todas as organizações, envolvendo todas as suas

áreas e níveis, gerando produtos e/ou serviços para um público alvo que pode ser formado por

patrocinadores internos e/ou externos, ou comunidades. O autor ainda destaca, como

exemplos de projetos no Terceiro Setor, a criação de uma creche comunitária; a implantação

de um pré-vestibular comunitário; um projeto para inclusão digital de adolescentes em

condição de vulnerabilidade, dentre outros de assistência social às populações carentes.

O gerenciamento de projetos é um ramo da Administração que trata do planejamento,

da execução e do controle de projetos. Executar projetos, de maneira cada vez mais eficiente,

é uma característica essencial para a sobrevivência das organizações modernas. Isto também

se aplica ao Terceiro Setor. Na busca por uma profissionalização da gestão do Terceiro Setor,

Ruggeri (2011) afirma que:

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As organizações do Terceiro Setor veem-se envolvidas com discussões

administrativas que inevitavelmente passam pela crítica da própria

instituição, suas atitudes, métodos e ferramentas gerenciais. Nesta seara de

avaliações, as organizações do Terceiro Setor demandam evidentemente uma

visão estratégica da organização e sua relação com sua missão na sociedade.

Portanto, a gestão estratégica das OTS é, sem dúvida, a primeira necessidade

imposta a elas para a sua sustentabilidade. (RUGGERI, 2011, p.30)

Em consonância com um gerenciamento eficaz, Xavier, (2008, p.4) ressalta que “os

investidores tornam-se mais exigentes quanto aos resultados gerados e cobram maior

transparência no uso dos recursos. Há uma maior competição por patrocínios”. Esse ambiente

exige que as organizações sejam capazes de gerenciar eficientemente seus projetos. Em face

dessa exigência, o autor explica que a resposta a esse desafio passa pelo desenvolvimento de

técnicas, metodologias, tecnologias e melhores práticas de gerenciamento de projetos,

envolvendo a implementação de ações que visam planejar, executar, e controlar diversas

atividades para alcançar objetivos especificados e dentro de padrões.

2.2 Projetos Sociais

O objetivo dos projetos sociais está alicerçado, principalmente, na redução da pobreza

e das desigualdades sociais, promovendo a inserção social e produtiva de pessoas ou grupos

que vivem em condições de vulnerabilidade, à margem da sociedade, resgatando suas

potencialidades. O nascimento de um projeto social deve ser precedido de uma série de

questionamentos sobre suas intenções e seus impactos na sociedade. Estes questionamentos

resultam na elaboração de propostas que se pretende incrementar, deixando explícitas suas

razões e princípios que orientarão as ações dos atores envolvidos.

Os projetos sociais podem se constituir em oportunidades concretas de mudanças na

sociedade, se tornando um espaço de relações permanentes entre o desejo pessoal e coletivo,

com o propósito de mudar a realidade dos participantes em questão. De acordo com

Stephanou, et al:

(...) projetos sociais nascem do desejo de mudar uma realidade. Os projetos

são pontes entre o desejo e a realidade. São ações estruturantes e

intencionais, de um grupo ou organização social, que partem da reflexão e

do diagnostico sobre determinada problemática e buscam contribuir, em

alguma medida, para outro mundo possível. (STEPHANOU, et al, 2003,

p.11)

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Os projetos sociais, numa sociedade ainda marcada por profundas desigualdades,

podem se configurar em importantes alternativas para o enfrentamento de problemas que,

historicamente, ainda se fazem presentes no caso da realidade brasileira. Dentre esses

problemas citados, se destacam a crescente expansão das atividades informais no mercado de

trabalho, o baixo nível de escolaridade, a redução dos postos de trabalho, e o desemprego.

Para que um projeto social atinja seus objetivos, é necessário primeiramente ter a visão

de que ele poderá não ter 100% de aproveitamento e eficiência. Neste sentido, Xavier (2008,

p.14) ratifica que “isto se deve ao fato de que contamos sempre com fatores externos

inesperados e que trabalhamos com material humano”. Na elaboração de uma proposta de

projeto social, a meta principal é que ele chegue até o fim, alcançando suas metas sociais e

conquistando a confiança dos investidores na capacidade da organização em administrar,

tanto os recursos financeiros como o tempo que foi proposto. De modo que, o planejamento é

a base para a elaboração de uma proposta sustentável.

Previamente à elaboração de uma proposta de projeto social, um estudo de viabilidade

deve ser realizado para se conhecer a necessidade da área que será assistida e também

funcionar como base para a proposta social. A partir dos dados e informações obtidos, deve se

identificar se o projeto apresenta, ou não, condições para efetivação. Xavier (2008) afirma,

sobre esse aspecto, que:

É importante iniciar o planejamento de um projeto social identificando as

pessoas, grupos de pessoas e organizações que estarão ativamente

interessadas no projeto, determinando suas necessidades, para então

gerenciá-las e influenciá-las, a fim de assegurar um projeto bem sucedido.

(XAVIER, 2008, P.16)

2.3 Metodologia de avaliação de projetos sociais

As metodologias de avaliação de projetos e de projetos sociais, segundo autores já

citados como Cohen, Franco, Ruggeri e Xavier, se apresentam de forma diversa. No entanto,

este trabalho se fundamenta na perspectiva de uma metodologia de avaliação de projetos

sociais proposta por Marino (2003), em função de sua aplicabilidade ao objeto de estudo

desse artigo, no caso, o Projeto Caminhos de Barro.

Marino (2003, p.17), no que se refere à compreensão do conceito de avaliação,

apresenta a seguinte indagação: “quando se fala em avaliar um projeto, para onde vai o

pensamento dos que participam da conversa? Qual é a imagem que as pessoas geralmente têm

sobre este tema?”. Este questionamento se faz necessário, uma vez que no curso da vida de

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cada indivíduo, sua percepção de mundo vem sendo construída a partir de seu contexto

familiar, cultural, educacional e temporal, determinante de suas relações com o ambiente.

Dessa forma, as informações, conceitos e crenças fixados na chamada memória de longo

prazo, vão formando os “modelos mentais” que, de acordo com os teóricos cognitivistas, são

passíveis de mudança, desde que pequenas alterações sejam feitas no modo de refletir e agir

cotidianos.

No contexto organizacional ou em outros sistemas sociais, a aprendizagem do adulto

somente logrará êxito, a partir de um processo contínuo de ação e reflexão. A análise da

realidade e dos fatos, a partir da construção dos momentos reflexivos, possibilitam novas

tomadas de decisões estabelecendo um ambiente de aprendizagem contínua. Diante da

necessidade imperiosa de fazer do processo avaliativo um instrumento eficaz na construção de

um projeto, Marino (2003) explicita que:

Se quisermos melhorar as chances de atingirmos os propósitos de nossas

organizações, precisamos modificar os modelos mentais vigentes sobre

avaliação. As organizações que veem a avaliação como mecanismo de

controle transformam em objeto passivo o indivíduo que está sendo avaliado.

Correm o risco de despertar uma atitude negativa nos participantes, que

resulta em superficialidade, ocultação ou até alteração de informações

essenciais para a credibilidade do que se quer avaliar. (MARINO, 2003,

p.17)

Para que a avaliação resulte em um processo de integração entre as atividades

cotidianas das pessoas envolvidas, e à vida da organização, Marino (2003) considera, ainda,

que:

todos os envolvidos estejam imbuídos da responsabilidade de responder e

fazer boas perguntas, compartilhar respostas e explorar novas possibilidades;

todos tenham clareza de que os esforços para um bom funcionamento interno

levam a melhores resultados externos;

exista um ambiente onde as pessoas se sintam seguras para examinar juntas

algo que não vai bem, onde não se tenha medo de olhar para trás e aprender

também com as experiências malsucedidas;

se estimule uma relação de colaboração entre a organização e o público

externo: comunidade, doadores e outras organizações, compartilhando com

estes a possibilidade de aprender e de se desenvolver juntos;

a linguagem seja a mesma. Buscar palavras com o mesmo significado,

respeitando assim alguns valores incutidos na linguagem articulada dos

envolvidos;

se considere a atitude de olhar e refletir sobre fatos ocorridos como um

caminho de visualização dos processos, numa prática de ação e reflexão

contínua, aprendizagem e crescimento. (MARINO, 2003, p.19)

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Para Marino (2003), na compreensão do processo avaliativo, deve ser observado o

momento de dar início à avaliação; quais são os tipos de avaliação; o que deve ser avaliado; e

quais os passos que envolvem esse processo. Inspecionar e detectar erros, antecipadamente à

implementação de uma primeira ação do projeto constitui um princípio fundamental a ser

aplicado ao se planejar projetos de intervenções sociais relevantes. Neste sentido, o autor

destaca três tipos de avaliação que nortearão o processo: o marco zero, a avaliação de

processo e a avaliação de resultados.

O marco zero é uma avaliação preliminar, que poderia ter outras denominações, como

“diagnóstico, indicadores preliminares, avaliação ex-ante, de contexto ou outras” (MARINO,

2003, p.24). O processo por ele desencadeado representa a análise situacional da realidade

pelos diferentes atores envolvidos no início de um projeto. As informações obtidas a partir

desse momento vão orientar o planejamento das ações futuras e servir de parâmetro para as

outras fases da avaliação.

Na avaliação de processo, após a fase de planejamento, se inicia a realização das ações

na busca dos objetivos estabelecidos. A execução de um projeto social, por mais atentamente

elaborado que tenha sido seu planejamento, é um processo frequentemente instável devido a

uma série de adaptações oportunas. Essa “turbulência” exige que se criem mecanismos de

compreensão dos fatos e fenômenos sociais ocorridos e que determinam adequações ao plano

inicial, sem perder de vista a missão e os princípios valorizados no projeto. Sobre esta etapa,

Marino assim a define:

Nesta fase do projeto, a avaliação é denominada avaliação de processo, que

compreende, além do monitoramento contínuo das atividades, a reflexão

frequente sobre as dinâmicas interna e externa da equipe responsável, isto é,

as relações entre os membros da equipe e sua interação com o público-alvo.

(MARINO, 2003, p.24)

Na fase da avaliação de resultados, que é a fase intermediária, ou próxima ao final de

um projeto, ocorre a análise dos benefícios proporcionados aos participantes (público-alvo,

parceiros, equipe responsável), durante ou após a sua implementação. Assim sendo, a

avaliação de resultados requer indicadores definidos, isto é, critérios norteadores do sucesso

do projeto. Sobre esta etapa, Marino destaca que “é fundamental que todos os que

participaram, direta ou indiretamente, sejam ouvidos e que a metodologia utilize parâmetros

quantitativos e qualitativos de resultados” (MARINO, 2003, p.24).

Para os três momentos da avaliação, quais sejam o marco zero, o processo e os

resultados, Marino (2003) apresenta os sete passos da avaliação, ressaltando que cada passo é

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específico, de acordo com o foco definido para a avaliação, conforme descrito no Estudo de

Caso:

Passo 1 – Decisão sobre o foco da avaliação – dar o foco à avaliação

significa pensar e decidir sobre um conjunto de fatores que compõem o

processo. Implica fazer escolhas baseadas na análise profunda das

necessidades que levaram ao ato de avaliar. Desta decisão, virão o tipo de

avaliação a ser feita, a quem será útil, os objetivos, os responsáveis por sua

execução e suas atribuições;

Passo 2 – Formação da equipe – Neste passo serão definidas as pessoas que

assumirão o processo avaliatório diante de todos os envolvidos no projeto;

Passo 3 – Identificação dos interessados, das perguntas e dos indicadores –

Nesta etapa são envolvidas as principais pessoas e os grupos que participam

ou têm algum interesse no projeto. Esses “interessados” deverão contribuir

quanto à formulação das perguntas que vão orientar a avaliação. Formuladas

as perguntas, definem-se os indicadores de resultado do projeto;

Passo 4 – Levantamento de informações – O levantamento de informações

compreende a identificação de fontes, a escolha dos métodos e a construção

dos instrumentos de coleta de informações. Um especialista pode ser útil

para ajudar a definir o método, elaborar instrumentos e treinar a equipe para

a coleta;

Passo 5 – Análise de fatos e informações – Após a coleta das informações,

os dados levantados e os fatos observados devem ser sistematizados e

analisados, até com a ajuda de um especialista, se necessário;

Passo 6 – Elaboração do relatório e divulgação – Após a análise, a equipe de

avaliação deve apresentar suas conclusões e possíveis recomendações.

Diversas formas de apresentação dos achados da avaliação deverão ser

previstas, visando a atender as distintas necessidades de informação dos

diferentes interessados no projeto;

Passo 7 – Utilização e disseminação – A equipe deve definir a forma de

discutir, utilizar e divulgar os resultados. Jornais, seminários, reuniões de

coordenação devem servir de foro para debates e decisões. (MARINO,

2003, p.26)

3 Estudo de Caso

3.1 Histórico do Projeto Caminhos de Barro

O Projeto Caminhos de Barro - Disseminação da Arte–Cerâmica, instituído pela

Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), teve início no ano 2000, na comunidade

de São Sebastião, com o objetivo de criar um espaço que proporcionasse a formação artística

e cultural dos moradores das comunidades desfavorecidas da Baixada Campista, contribuindo

para o desenvolvimento econômico local. A partir das ações propostas, o projeto visa o

investimento numa alternativa de geração de renda e inserção na cadeia produtiva dos

familiares dos trabalhadores da indústria cerâmica. A razão para sua elaboração foi a

precariedade das condições de vida a que estão sujeitas as famílias dos oleiros, e pela

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inexistência de oportunidades para mulheres e jovens, contingentes significativos não

absorvidos pela cadeia produtiva, ou a ela incorporados de maneira precária. O alcance das

ações, na promoção da inclusão social através da arte cerâmica, impulsionou outro

investimento que foi a criação de um Núcleo de Cerâmica Artística, nas dependências da

UENF, atualmente em efetivo exercício.

No município de Campos dos Goytacazes, Alexandre (2015, p.5) destaca que

“ocorreram poucas mudanças do ponto de vista tecnológico no setor de cerâmica vermelha

nos últimos anos”. No entanto, a atuação da UENF através dos laboratórios de Engenharia

Civil, de Engenharia de Materiais e de Ciências Humanas, em conjunto com a ação do

SEBRAE-RJ, vêm motivando algumas transformações nesse setor de produção na região

Norte Fluminense, tais como a diversificação da produção com a integração da população em

atividades artísticas e artesanais, resgatando dessa forma a tão idealizada economia solidária.

Os empregos atualmente gerados pelas indústrias cerâmicas em Campos dos

Goytacazes abrangem uma determinada faixa etária de trabalhadores, ou seja, com um perfil

capaz de desenvolver trabalhos que exigem esforço físico, porém com baixo valor agregado,

condicionando em média 2,5kg de argila a R$0,60. Dessa forma, o contingente de excluídos

desse processo tradicional de produção, por não atender ao perfil exigido, foi incorporado aos

projetos complementares, como o de arte cerâmica ou artesanato. Neste sentido, independente

da idade ou grau de instrução, cuja mão de obra é de caráter extremamente diversificado e

humanizado, onde o talento, a pesquisa e as habilidades puderam ser partilhados em grupo, a

produção de peças com maior valor agregado promoveu um resgate socioeconômico e

cultural dos participantes. Em sua dissertação de mestrado intitulada Indústria Cerâmica de

Campos: um retrato em branco e preto, Coutinho (2006) enfatiza que:

Uma opção para a indústria cerâmica de Campos é a produção de materiais

que possuam maior valor agregado, e os pesquisadores da UENF já

desenvolveram trabalhos neste sentido, bastando que as argilas da região

sejam corrigidas em seus teores de fundentes. Tal opção, porém, demandaria

aportes de recursos carriados para a melhoria e capacitação da mão-de-obra,

pesquisas, "design" e novas plantas industriais. (COUTINHO, 2006, p.35)

O trabalho de capacitação dos atores envolvidos no Projeto Caminhos de Barro conta

com a participação de equipes de multiplicadores, de voluntários e agentes ligados à

Universidade, que oferecem aulas sobre as diferentes técnicas que envolvem o trabalho oleiro,

tendo capacitado, ao longo de sua existência, mais de seis mil pessoas na arte e na cultura do

barro.

14

A Associação de Artesãos Caminhos de Barro foi criada, no ano de 2013, com o

intuito de dar suporte ao projeto, no desenvolvimento e apoio às ações de empreendedorismo,

cuja finalidade era a de buscar aporte financeiro através da captação de recursos junto aos

órgãos de fomento (FAPERJ, CNPq, PETROBRAS, SEBRAE). Desta forma, a Associação,

alinhada com os objetivos do Projeto Caminhos de Barro, também passou a auxiliar na

demanda de participações em eventos e exposições do ramo. No sentido de promover a

inclusão social e a geração de renda, a Associação passou a orientar as famílias dos artesãos

na comercialização das peças produzidas, ficando com uma doação de 30% do valor das

vendas para cobrir gastos com manutenção e aquisição de matérias-primas, despesas em

eventos, locomoção, alimentação e demais atividades.

3.2 Avaliação do Projeto Caminhos de Barro

Conforme apresentado anteriormente, para os três momentos da avaliação (marco

zero, processo e resultados), procedeu-se às regras dos sete passos do processo de avaliação.

A partir de então, as dificuldades identificadas através da coleta de dados podem ser

descritas nas diferentes fases de avaliação da seguinte maneira:

Marco zero - dentre os problemas detectados, foi possível observar que os

participantes do projeto convivem com a incerteza na execução do pagamento das bolsas de

extensão (FAPERJ) e com a indisponibilidade orçamentária para participação em eventos,

além do fato da maioria dos artesãos multiplicadores do Projeto residir em São Sebastião (4º

distrito de Campos dos Goytacazes), que fica a cerca de 30 km do Centro do município, o que

dificulta o acesso à sede do projeto. Os indicadores sociais revelam comunidades carentes que

vivem às margens das olarias da região, que são responsáveis pela fabricação de telhas e

tijolos para o abastecimento de parte das edificações do estado do Rio de Janeiro. Pelo fato da

comunidade estar diretamente ligada às condições de trabalho de seus familiares, que são

funcionários destas empresas, os participantes se veem necessitados em morar no distrito de

São Sebastião, que além de possuir um transporte público ineficiente, convive com espaços

escolares precários, configurando segmentos da população com baixo grau de escolaridade.

Avaliação de processo – com relação à percepção que os participantes têm do projeto,

todos veem como uma excelente oportunidade de mudança e crescimento, pois os artesãos,

enquanto novos atores sociais vinculados à universidade por meio de bolsas que lhes

proporcionam uma renda mínima, passam a atuar como professores de artesanato, se sentindo

15

orgulhosos em poder ensinar a arte cerâmica. Um exemplo de crescimento e superação é da

artesã Euzi Licassálio, 49 anos, que ingressou no projeto no ano 2000. Após dez anos longe

do mercado de trabalho, ela teve a oportunidade de voltar a ter seu próprio dinheiro depois

que começou a trabalhar com o artesanato, tendo concluído a faculdade de Recursos

Humanos, que foi custeada com a renda do trabalho artesanal. Após anos apenas cuidando dos

filhos, Euzi afirma que “chega uma hora em que a gente não quer mais viver uma vida de

dependência”, tendo, a partir daí, decidido fazer o curso de arte cerâmica. Complementando,

Euzi enfatiza: “não foi fácil mudar a rotina, mas foi a melhor escolha que fiz”. Atualmente, a

entrevistada ministra aulas de arte cerâmica em dois núcleos do projeto.

Com relação aos fatores positivos e negativos das atividades do projeto, a geração de

renda, por possibilitar aos artesãos melhores condições de vida através da produção e

comercialização dos artefatos, foi considerada baixa pelos atores envolvidos, configurando-se,

portanto, como um ponto negativo. Neste sentido, foram identificados vários fatores que

contribuem para uma geração de renda insatisfatória, tai como: a inexistência de ponto

turístico público para comercialização das peças; a carência de equipamentos que pudessem

dinamizar a produção das peças, tanto nos núcleos do projeto, quanto em escolas públicas e

particulares; a ausência de um portfólio impresso e digital, para divulgação da produção; a

escassez de recursos provenientes de convênios com órgãos públicos ou privados e a ausência

de uma política de marketing bem estruturada.

No que se refere aos pontos fortes, no processo avaliativo, foi possível observar que a

inclusão social é considerada satisfatória, pela quantidade de núcleos nos quais o projeto atua,

e pelo expressivo número de participantes que são atendidos. Outro fator positivo do projeto é

o despertar da consciência crítica nos participantes, no trabalho cotidiano, dos valores sociais,

artísticos, pedagógicos, terapêuticos, culturais e psicológicos.

Como relação a melhorias no processo de implementação do projeto, a avaliação

observou que um dos principais fatores que podem contribuir para o desenvolvimento de

ações mais eficazes e empreendedoras, de maneira a intensificar a atuação do Projeto

Caminhos de Barro, é o fortalecimento da Associação Caminhos de Barro, através da

captação de recursos junto a órgãos públicos e privados, atuando como gestora das ações a

serem revistas ou implementadas.

Avaliação de resultados - os resultados previamente estabelecidos, conforme descrito

anteriormente, estão sendo cumpridos. Entretanto, a avaliação do processo apontou fatores

negativos, realçando a necessidade de uma autonomia financeira que possa fortalecer a

16

produção e a comercialização dos artefatos, atraindo novos atores para o projeto e,

consequentemente, aumentando o seu campo de atuação dentro dos seus objetivos.

Os indicadores de resultados são demonstrados, anualmente, na Semana de Extensão

UENF/IFF/UFF, onde são apresentados os trabalhos executados pelo projeto, com a

participação dos alunos que são atendidos nos diversos polos. Quanto à produção dos

artefatos, em todos os anos são apresentados novos modelos. Como exemplo, em 2014 foi

idealizada uma panela de barro com impressão de crochê, que já está sendo comercializada, e

no ano de 2015, foi produzido um porta-garrafas para bebidas. Todos os artefatos passam por

testes para serem inseridos na fabricação.

Para a melhoria e continuidade do Projeto Caminhos de Barro, torna-se imperioso

buscar alternativas de crescimento e fortalecimento de sua atuação, no sentido de promover a

inclusão social e a geração de renda das comunidades assistidas. Dessa forma, em conjunto

com o coordenador do projeto e sua equipe, foram definidas as seguintes ações:

Promover o fortalecimento da marca Caminhos de Barro, implementando uma

estratégia de marketing bem estruturada;

Criar um portfólio em modelo digital e impresso, para divulgação da produção;

Ampliar as parcerias com instituições, como o SEBRAE, SENAI,

PETROBRAS, e outras instituições, para reforçar a capacitação dos envolvidos

no projeto, a captação de recursos e a comercialização das peças.

Estender o projeto para as escolas públicas e/ou privadas, para disseminação do

conhecimento da arte cerâmica, no currículo escolar, incentivando a

participação de mais pessoas.

Propiciar a instalação de fornos para a queima das peças, nas unidades

escolares atendidas, como extensão do projeto.

Fortalecer a Associação Caminhos de Barro, para apoiar e desenvolver ações

de empreendedorismo, aumentando o número de associados e captação de

recursos;

Adquirir máquinas e equipamentos, como veículo, câmara fotográfica,

mobiliários e computadores.

Promover o aumento da comercialização das peças produzidas, com a

participação em eventos como exposições, feiras e bazares sociais.

Passo 1 – Decisão sobre o foco da avaliação: avaliar a geração de renda dos artesãos.

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Passo 2 – Formação da equipe: o processo de avaliação foi conduzido pela presidente

da Associação de Artesãos Caminhos de Barro. Os autores deste trabalho contribuíram

ativamente com o processo.

Passo 3 – Identificação dos interessados, das perguntas e dos indicadores: foram

entrevistados o coordenador do Projeto, a equipe administrativa, e os artesãos. A elaboração

das entrevistas e dos questionários buscou identificar os fatores que motivavam a baixa

geração de renda dos participantes do projeto.

Passo 4 – Levantamento de informações: foram realizadas as entrevistas, e aplicados

os questionários.

Passo 5 – Análise de fatos e informações: a partir das entrevistas realizadas, foi

possível observar que o Projeto Caminhos de Barro, ao longo dos seus quinze anos de

existência, tem realizado inúmeras atividades de extensão. No entanto, as dificuldades para a

efetivação dessas ações se revelaram na escassez dos recursos financeiros, na

indisponibilidade de veículos, no tempo restrito dos participantes dedicado ao projeto, e de

outros entraves eventuais que atuam sobre um projeto institucional de universidade pública.

Mesmo em face de todos os obstáculos enfrentados, foram desenvolvidas as seguintes ações:

Manutenção da oficina Núcleo/UENF com os equipamentos já existentes e

aquisição de novos, criando ambiente propício para criação e confecção da arte

cerâmica;

Oficina Núcleo/UENF ministrando curso básico de arte cerâmica gratuito, com

duração de 128h a cada semestre e emissão de certificados;

Organização de eventos culturais e exposições, incluídos no calendário cultural

da cidade, de modo a dar visibilidade e consolidar um mercado consumidor de

arte cerâmica em Campos e região;

Criação e desenvolvimento de stands para as exposições/vendas das peças em

eventos dentro e fora da UENF;

Suporte à logística para participação em eventos (feiras e exposições);

Divulgação da oficina nas escolas de Campos dos Goytacazes, com vistas à

identificação de prováveis interessados na formação para o desenvolvimento e

a docência na arte cerâmica;

Divulgação na mídia local (redes de televisão, rádio, jornais e sites) e nas redes

sociais das participações em eventos, assim como todas as ações desenvolvidas

pelo projeto;

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Atividades de inclusão social atendendo à demanda de instituições

assistenciais;

Localização e identificação de jazidas de matérias primas para produção dos

artefatos cerâmicos e dos engobes;

Caracterização de argilas através de ensaios tecnológicos, testes com corpos de

prova produzidos com diferentes argilas em laboratório;

Planejamento e o controle da logística do artesanato produzido no âmbito do

projeto/satélites, mantendo registros em arquivos, inclusive do público alvo

atendido.

No que se refere à geração de renda, o trabalho de artesanato desenvolvido pelo

Projeto Caminhos de Barro vem buscando transformar a realidade dos artesãos assistidos,

dando oportunidade de trabalho a todos, independente de idade ou condição física. Segundo

os dados da entrevista realizada com o Professor Jonas Alexandre, coordenador do projeto, a

atividade artesanal aumenta o valor agregado da matéria-prima, o barro, de R$0,60 para

R$150,00 em média, quando comparados à mesma massa utilizada para produção de um

tijolo ou telha. Assim, por exemplo, um tijolo consome aproximadamente 2,5kg de argila e é

vendido a R$0,60. Essa mesma quantidade de matéria prima produz peças de artesanato que

podem ser vendidas a R$150,00 em média, podendo alcançar valores ainda mais elevados.

As peças produzidas pelos artesãos são comercializadas na sede do projeto, que fica

situada no campus da UENF, e ocasionalmente, nos eventos em que participam. Além da

geração de renda para os artesãos, o projeto tem relevância no que concerne à inclusão social.

O Projeto Caminhos de Barro vem direcionando seu foco para o aproveitamento de uma

“vocação” da Baixada Campista, o trabalho com o barro, e vem atuando também no sentido

de modificar a realidade local facilitando e estimulando, via arte-educação para a cidadania, o

encorajamento da população excluída na busca de alternativas, criativas e solidárias, para

materializar melhorias na qualidade de vida da comunidade.

Nesse contexto, associado à necessidade de se restaurar, em seu sentido amplo, a

dignidade no trabalho, bem como estabelecer novas perspectivas de futuro para diversas

comunidades, foram criados núcleos do Projeto Caminhos de Barro em outras instituições no

município de Campos dos Goytacazes:

C. E. Leôncio Pereira Gomes – Colégio Estadual situado em São Sebastião (4° distrito

de Campos dos Goytacazes) onde além do alunado da rede pública, a comunidade

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também recebe aulas de arte cerâmica em oficina instalada pelo projeto desde 2001.

Atualmente, são atendidas 120 pessoas no colégio;

Educandário São José Operário – Instituição de Apoio a Deficientes Visuais.

Orientação, Mobilidade (OM) e relacionamento social são os principais ensinamentos

que crianças, adolescentes, adultos e idosos com deficiência visual recebem no

Educandário, além de oficinas de bateria e modelagem em argila. Atualmente, são

atendidas 20 pessoas;

Instituição de Apoio e Orientação aos Excepcionais (APOE) - O trabalho realizado

pela APOE visa o estímulo, aprendizagem e socialização dos assistidos. Atualmente a

APOE atende cerca de 400 pessoas, incluindo bebês, crianças, jovens, adultos e

idosos, onde o projeto alcança a 24 pessoas;

E. M. Francisco de Assis – Escola pública municipal situada em comunidade vizinha à

UENF, onde grupos de alunos com déficit de aprendizado têm a oportunidade de

receber aulas de arte cerâmica na oficina sede do Projeto Caminhos de Barro, instalada

no Campus da Universidade. O atendimento ocorre em 03 turmas, abrangendo 90

alunos;

Asilo Nossa Senhora do Carmo – Instituição que abriga e assiste aos idosos. A casa é

mantida com recursos da Prefeitura Municipal de Campos dos Goytacazes e através de

doações. No asilo o projeto atende a aproximadamente 15 internos;

Obra do Salvador - É uma associação, com reconhecimento de utilidade pública nas

esferas municipal, estadual e federal. A partir de 2007, o público alvo da instituição

passou a ser de jovens em situação de vulnerabilidade social. Em parceria com o

CMAS (Conselho Municipal de Assistência Social), CMPDCA (Conselho Municipal

de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente) e FIA (Fundação para a

Infância e Adolescência), desenvolve projetos de iniciação profissional, preparando

jovens para a inclusão no mercado de trabalho, através do Programa Jovem Aprendiz,

implantado pela instituição em 2007. Atualmente, o projeto atende a 30 pessoas.

Passo 6 - Após a análise das informações e dos dados levantados, a equipe da pesquisa

elaborou, para divulgação, um relatório com os principais pontos positivos e negativos do

projeto, bem como um conjunto de sugestões de ações, que será encaminhado pelo

Coordenador do projeto, para a Pró-Reitoria de Extensão da UENF. Este relatório

possibilitará que a instituição tenha conhecimento das dificuldades por que passa o projeto e

venha contribuir para o processo de reestruturação.

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Passo 7 - Sobre a utilização e disseminação do relatório, será feita uma reunião com o

coordenador do projeto e sua equipe, bem como com os artesãos, para a apreciação dos

resultados obtidos com a avaliação realizada.

4 Conclusões

Na literatura que trata do tema da avaliação de projetos sociais, inúmeros autores

apresentam estudos diferenciados, que permitem a identificação do modelo que melhor se

aplica às especificidades do projeto que se pretende avaliar. Ainda que as diversas

metodologias que tratam deste assunto primem por um mesmo fio condutor, que é o viés

social, existem múltiplas abordagens. Dentre essas abordagens, se destacam a metodologia

voltada para a avaliação de projetos sociais governamentais, bem como, estudos

metodológicos de avaliação de projetos do Terceiro Setor, que corresponde às instituições

com preocupações e práticas sociais sem fins lucrativos, e ainda, os autores que pesquisam

metodologias de avaliação de projetos sociais ligados a empresas privadas ou organizações

com fins lucrativos.

Considerando os modelos de avaliação de projetos sociais acima mencionados, este

trabalho optou por utilizar a metodologia de avaliação de projetos sociais proposta por Marino

(2003), em função de sua aplicabilidade ao Projeto Caminhos de Barro, objeto de estudo do

presente artigo. A partir do processo de avaliação realizado no estudo de caso do Projeto

Caminhos de Barro, os resultados encontrados denotam que há um grande potencial a ser

explorado, no sentido de se alavancar e fomentar mudanças na comunidade da Baixada

Campista, através da aprendizagem e da disseminação da arte cerâmica. A análise permitiu

observar que a atividade relacionada à arte cerâmica pode absorver mais participantes,

independente de sua condição social ou grau de instrução. Neste sentido, os resultados

identificaram, também, que o campo de atuação do projeto pode ser ampliado com a inserção

do ensino da arte cerâmica nas escolas públicas e/ou privadas, além dos núcleos já existentes,

formando novos artesãos, que podem atuar como multiplicadores do projeto, contribuindo,

assim, para a inclusão social e a geração de renda das populações vulneráveis.

Dentre os fatores que dificultam a ampliação do campo de atuação do projeto, se

destaca a escassez de recursos financeiros. Assim, foi criada a Associação de Artesãos

Caminhos de Barro que, alinhada com os objetivos do projeto, poderá atuar na captação e na

gestão de recursos junto a órgãos públicos ou privados, para um melhor aparelhamento das

instalações, com a aquisição de novos maquinários e equipamentos, incentivando a adesão de

novos membros e planejando ações que possam aumentar a capacitação dos envolvidos.

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Para a maioria dos participantes, em se tratando de pontos negativos, se destaca a

baixa capacidade de geração de renda. Sendo a geração de renda proveniente da

comercialização das peças produzidas, a pesquisa pode observar a necessidade de

implantação de um ponto turístico para a realização das vendas, assim como a

implementação de uma política de marketing bem estruturada que possa atrair um maior

público consumidor.

E finalmente, diante da análise realizada, este trabalho conclui que, além do apoio e

do suporte tecnológico oferecidos ao projeto pelos Laboratórios de Engenharia Civil, de

Engenharia de Materiais e de Ciências Humanas, da Universidade Estadual do Norte

Fluminense Darcy Ribeiro (UENF), a implementação de novas ações sugeridas a partir da

presente avaliação poderá servir de referência para a expansão do Projeto Caminhos de

Barro, consolidando-o como um importante instrumento de intervenção social,

contribuindo para a redução dos índices de pobreza na região, e para o desenvolvimento

socioeconômico e cultural do município de Campos dos Goytacazes.

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