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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO 3ª Promotoria de Justiça Cível de Serra Av. Getúlio Vargas, 295, Centro, Serra/ES, CEP – 29176-090 – Tel. (27) 3291- 1100 – www.mpes.gov.br EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL DE SERRA/ES – COMARCA DA CAPITAL O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, por intermédio da 3ª Promotoria de Justiça Cível de Serra, presentado pelo Promotor de Justiça que abaixo subscreve, no uso de suas atribuições legais, vem à presença de Vossa Excelência, com supedâneo no art. 127, caput, art. 129, inciso III da Constituição Federal, art. 25, inc. IV, alínea ‘a’ da Lei Federal nº 8.625/93, art. 1º da Lei n.º 7.347/85 ajuizar a presente

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Page 1: Autos n - Ministerio Publico do Espirito Santo · Web view[livro eletrônico]/Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery, coordenadores, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO3ª Promotoria de Justiça Cível de SerraAv. Getúlio Vargas, 295, Centro, Serra/ES, CEP – 29176-090 – Tel. (27) 3291-1100 – www.mpes.gov.br

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL DE SERRA/ES – COMARCA DA CAPITAL

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, por intermédio da 3ª Promotoria de Justiça Cível de Serra, presentado pelo Promotor de Justiça que abaixo subscreve, no uso de suas atribuições legais, vem à presença de Vossa Excelência, com supedâneo no art. 127, caput, art. 129, inciso III da Constituição Federal, art. 25, inc. IV, alínea ‘a’ da Lei Federal nº 8.625/93, art. 1º da Lei n.º 7.347/85 ajuizar a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA(com pedido de liminar)

em face do MUNICÍPIO DE SERRA, pessoa jurídica de direito público interno, inscrito no CNPJ sob o nº 27.174.093/0001-27, sediado na Rua Maestro Antônio Cícero, n.º 111, Serra Sede, Serra/ES – CEP 29.176.439, pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir esposados.

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1. SÍNTESE FÁTICA

Em virtude de denúncia formulada na ouvidoria do MPES, registrada sob o número XXXXXX, restou instaurado perante a 3ª Promotoria de Justiça Cível de Serra o Inquérito Civil MPES N.º XXXXX, tendo como objetivo apurar a veracidade dos fatos trazidos ao conhecimento do Ministério Público do Estado do Espírito Santo, no sentido de que o Município de Serra, no imóvel que utiliza, situado na Avenida Talma Rodrigues Ribeiro, n.º 5.416, Portal de Jacaraípe, Serra/ES, conhecido como “Pró-cidadão”, vem captando água para consumo humano em fonte alternativa.

Após diligências persecutórias, constatou-se que, efetivamente, o Município de Serra/ES vem se valendo de captação de fonte alternativa de água para abastecimento à população que para lá se dirige e servidores públicos que ali desempenham suas funções, provavelmente como forma de reduzir custos com o pagamento de tarifa de consumo de água.

Em resposta ao ofício XXXXX, expedido pela 3ª Promotoria de Justiça Cível de Serra/ES, o Município de Serra informou através do ofício n. º XXXXXX que:

“A água utilizada para abastecimento do Pró-Cidadão provém de fonte alternativa (poço). ”

Descortinou-se, igualmente, que naquela localidade há regular e não intermitente fornecimento de água potável, conforme informação prestada pela concessionária de água e saneamento – CESAN, através do ofício n. º xxxxx:

“Em atendimento à solicitação desta Promotoria, sobre o Sistema de Abastecimento de água na região onde encontra o “ESPAÇO PRÓ-Cidadão”, informamos que existe rede de abastecimento em toda a região, operando com normalidade. ”

A captação por fonte alternativa, quando existente fornecimento constante de água devidamente tratada e potável por rede de abastecimento pública é vedada por nosso

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ordenamento jurídico, não sendo admissível, portanto, a prática perpetrada pelo Município de Serra, dados os riscos aos usuários que buscam atendimento público e servidores.

Isso porque a certeza do consumo da água da rede geral de distribuição permite um controle da saúde coletiva da população. Por outro lado, o consumo de água de fonte alternativa é causa de riscos intensos. Cerca de 80% das doenças do mundo estão ligadas à ausência de água tratada, consoante dados da Organização Mundial de Saúde (BRUNONI, 2003, p. 771), não sendo lógico deixar de fazer uso dos sistemas de saneamento existentes, assumindo riscos coletivos pelo uso de água potencialmente contaminável, quando em muitos lugares do planeta possuir uma rede de saneamento é privilégio.

Constatada a veracidade dos fatos trazidos ao Ministério Público do Estado do Espírito Santo, velando pelo direito difuso à saúde, alternativa não resta, senão o ajuizamento da presente ação civil pública.

2. DO DIREITO

Em novembro de 2002, o Comité de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais adotou a Observação Geral n. º 15 sobre o direito à agua. O artigo I.1 estabelece que “O direito humano a agua é indispensável para uma vida humana digna” A Observação n. º 15 também define o direito a água como o direito de cada um dispor de água suficiente, saudável, aceitável, fisicamente acessível, para uso pessoal e doméstico.

A Assembleia Geral das Nações Unidas através da Resolução n. º 64/292, em 28 de julho de 2010, declarou a água limpa e segura e o saneamento um direito humano essencial para gozar plenamente a vida e todos os outros direitos humanos

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) divulgou no segundo semestre de 2016 um relatório no qual alerta que até 323 milhões de pessoas na África, na Ásia e na América Latina estão correndo risco de contrair doenças devido à crescente contaminação da água nessas regiões do planeta2.

No plano interno o arcabouço jurídico quanto à garantia do direito à saúde como direito social é insofismável.

O art. 196 da Constituição Federal, o art. 159 da Constituição do Estado do Espírito Santo e, também, a Lei Orgânica do Município de Serra ao tratarem da saúde, direito social típico, estatuem:

1 BRUNONI, Nivaldo. A tutela das águas pelo Município. In: FREITAS, Vladimir Passos de (Org.). Águas: aspectos jurídicos e ambientais. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2003.2https://noticias.terra.com.br/ciencia/onu-afirma-que-agua-contaminada-ameaca-saude-de-300-milhoes-de-pessoas,57945184d95a24ff7e06a0e708f356a5k428a920.html

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“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”.

“Art. 159. A saúde é dever do Estado e direito de todos, assegurado mediante políticas e todos, assegurado mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, prevenção, proteção e recuperação”.

“Art. 240. A saúde é direito de todos e dever do Poder Público, assegurada mediante políticas sociais, econômicas e ambientais, que visem a eliminação do risco de doenças e de outros agravos e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação, com base no disposto nas Constituições Federal e Estadual e nesta Lei Orgânica”.

Um importante aspecto é a chamada fundamentalidade do direito à saúde. Por tal razão, a Constituição Federal alojou formalmente o direito à saúde no catálogo dos direitos fundamentais. Diante desse caráter fundamental, restou delimitado que o Estado é responsável não só por sua prestação, mas que a fruição se dê em níveis que assegurem justamente a dignidade da pessoa humana.

Com maestria, ao abordar o tema, Celso Antônio Bandeira de Mello ensina haver responsabilidade do Estado sempre que houver ofensa a “um bem jurídico cuja integridade o sistema normativo proteja, reconhecendo-o como direito do indivíduo”3.

No mesmo palmar o Pretório Excelso, no julgamento do RE 393175/RS, sedimentou que:

“O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integralidade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular – e implementar – políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. – O direito à saúde – além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas – representa consequência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional”.

Como se depreende de uma atenta leitura da Constituição, a saúde, por um lado inscreve-se no rol de responsabilidades do Estado não só como serviço a ser prestado, mas também como atividade relevante que, por si, reclama normatização, fiscalização e controle.

3 BANDEIRA DE MELLO. Celso Antônio. Curso de Direito Admistrativo. Editora Malheiros. 26ed. São Paulo: 2009, p. 1011.

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Também, a Lei Federal n. º 11.445/2007, que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico, em seu art. 45 estatuiu em relação ao uso de fontes alternativas que:

Art. 45. Ressalvadas as disposições em contrário das normas do titular, da entidade de regulação e de meio ambiente, toda edificação permanente urbana será conectada às redes públicas de abastecimento de água e de esgotamento sanitário disponíveis e sujeita ao pagamento das tarifas e de outros preços públicos decorrentes da conexão e do uso desses serviços. § 1o Na ausência de redes públicas de saneamento básico, serão admitidas soluções individuais de abastecimento de água e de afastamento e destinação final dos esgotos sanitários, observadas as normas editadas pela entidade reguladora e pelos órgãos responsáveis pelas políticas ambiental, sanitária e de recursos hídricos. § 2o A instalação hidráulica predial ligada à rede pública de abastecimento de água não poderá ser também alimentada por outras fontes. 

Da leitura do dispositivo legal supra, extrai-se cristalinamente que, em havendo redes públicas, não serão admitidas soluções individuais de captação de água em fontes alternativas. Trilhando esse entendimento, artigo de lavra do Promotor de Justiça do MPRS perfilha que4:

“A leitura a contrário sensu do § 1º do art. 45 deixa muito claro que, havendo redes públicas de saneamento básico, não serão admitidas soluções individuais de abastecimento de água e de afastamento e destinação final dos esgotos sanitários. Por interpretação sistemática com o caput, percebe-se que tal regra pode ser excepcionada por disposição do titular do serviço de saneamento, da entidade de regulação e de meio ambiente, o que inexiste em nosso Estado até o momento. ”

O TJRS, ao julgar recurso de apelação em MS, antes da vigência da Lei Federal n. º 11.445/2007, mas apoiado em legislação estadual e local, além de Portaria do Ministério da Saúde, já havia concluído pela impossibilidade de captação de água em poço, sendo válida a exigência de utilização apenas de rede pública:

MANDADO DE SEGURANÇA. VIGILÂNCIA SANITÁRIA DO MUNICÍPIO DE ERECHIM. AUTUAÇÃO DE HOTEL QUE USA ÁGUA DE POÇO ARTESIANO, SENDO HÍGIDA A EXIGÊNCIA DE UTILIZAÇÃO DA REDE PÚBLICA. O ART. 22, IV DA CARTA FEDERAL NÃO INIBE LEGISLAÇÃO SUPLEMENTAR DAS DEMAIS ENTIDADES DE DIREITO PÚBLICO. TERMO DE AJUSTAMENTO FIRMADO PELO MUNICÍPIO COM O MINISTÉRIO PÚBLICO. FISCALIZAÇÃO SANITÁRIA COMO OBRIGAÇÃO E DIREITO DOS MUNICÍPIOS, CONFORME PREVÊ A CARTA ESTADUAL, NO ART. 13, I. A ÁGUA COMO BEM PÚBLICO.

4 http://www.mprs.mp.br/atuacaomp/not_artigos/id15015.htm

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LEI FEDERAL Nº 9433/97 E CÓDIGO CIVIL, ART. 1230. O CÓDIGO DE ÁGUAS FOI RECEPCIONADO PELA CARTA MAGNA, A NÃO SER QUANDO PRIVATIZA O USO DA ÁGUA EM OPOSIÇÃO À LEI DE POLÍTICA NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS. NECESSIDADE DE OUTORGA PARA PERFURAR POÇOS PARA EXTRAÇÃO DE ÁGUA. SAÚDE PÚBLICA A SER PRESERVADA. DECRETO REGULAMENTADOR. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APELO IMPROVIDO (Apelação Cível Nº 70013041918, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vasco Della Giustina, Julgado em 07/12/2005) (grifos acrescidos)

Consta no corpo do voto condutor do Desembargador Vasco Della Giustina:

“Não vejo, ademais, qualquer ilegalidade no decreto estadual 23.470/74, quando obriga a utilização exclusiva da água servida por rede pública, porque interpretando a Constituição Federal, “com base nos objetivos fundamentais assegurados de saúde pública e saneamento básico e ambiente equilibrado, é hígida a exigência exclusiva de utilização da rede pública, uma vez que a água subterrânea é fonte de reserva e deve ser utilizada somente em casos de extrema necessidade, além de que a preservação da saúde dos consumidores da água não pode ser constatada caso a caso, mas de forma coletiva, o que somente pode ser controlado com a distribuição pública da água””. 

Finalmente, a Portaria n.º 2914/2011 do Ministério da Saúde é enfática:

Art. 12. Compete às Secretarias de Saúde dos Municípios: - exercer a vigilância da qualidade da água em sua área de competência, em articulação com os responsáveis pelo controle da qualidade da água para consumo humano;II - executar ações estabelecidas no VIGIAGUA, consideradas as peculiaridades regionais e locais, nos termos da legislação do SUS;III - inspecionar o controle da qualidade da água produzida e distribuída e as práticas operacionais adotadas no sistema ou solução alternativa coletiva de abastecimento de água, notificando seus respectivos responsáveis para sanar a(s) irregularidade(s) identificada(s);IV - manter articulação com as entidades de regulação quando detectadas falhas relativas à qualidade dos serviços de abastecimento de água, a fim de que sejam adotadas as providências concernentes a sua área de competência;V- garantir informações à população sobre a qualidade da água para consumo humano e os riscos à saúde associados, de acordo com mecanismos e os instrumentos disciplinados no Decreto nº 5.440, de 4 de maio de 2005;VI - encaminhar ao responsável pelo sistema ou solução alternativa coletiva de abastecimento de água para consumo humano informações sobre surtos e agravos à saúde relacionados à qualidade da água para consumo humano;VII - estabelecer mecanismos de comunicação e informação com os responsáveis pelo sistema ou solução alternativa coletiva de abastecimento de água sobre os resultados das ações de controle realizadas;VIII - executar as diretrizes de vigilância da qualidade da água para consumo humano definidas no âmbito nacional e estadual;

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IX - realizar, em parceria com os Estados, nas situações de surto de doença diarreica aguda ou outro agravo de transmissão fecal oral, os seguintes procedimentos:a) análise microbiológica completa, de modo a apoiar a investigação epidemiológica e a identificação, sempre que possível, do gênero ou espécie de microorganismos;b) análise para pesquisa de vírus e protozoários, quando for o caso, ou encaminhamento das amostras para laboratórios de referência nacional quando as amostras clínicas forem confirmadas para esses agentes e os dados epidemiológicos apontarem a água como via de transmissão; ec) envio das cepas de Escherichia coli aos laboratórios de referência nacional para identificação sorológica;X - cadastrar e autorizar o fornecimento de água tratada, por meio de solução alternativa coletiva, mediante avaliação e aprovação dos documentos exigidos no art. 14 desta Portaria.Parágrafo único. A autoridade municipal de saúde pública não autorizará o fornecimento de água para consumo humano, por meio de solução alternativa coletiva, quando houver rede de distribuição de água, exceto em situação de emergência e intermitência. (grifos acrescidos)

3. DOS PEDIDOS

3.1 Do pedido liminar

Colhe-se do escol de Hugo Nigro Mazzilli que “não apenas nos processos de natureza cautelar, mas sim em qualquer ação civil pública ou coletiva, em tese, será sempre possível a concessão de mandado liminar”, consistindo “na autorização ou vedação da prática de ato, ou na concessão de qualquer providência de cautela, com ou sem imposição de multa liminar diária”.

Abordando o tema, Marcos Destefenni5:

“Vale destacar que a tutela jurisdicional dos direitos transindividuais difusos, coletivos e individuais homogêneos) é regida por um microssistema, o microssistema da tutela coletiva, composto pela interação de diversos diplomas normativos. Os dois principais são o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90) e a Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85), que formam o "regramento básico do Microssistema da Tutela Coletiva."

A conjugação dos artigos 11 e 12 da LACP e art. 84 da Lei n. º 8.078/90 (CDC) possibilita idêntica conclusão, valendo a transcrição dos referidos dispositivos legais:

“Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor”.

5 DESTEFENNI. Marcos. Direitos Transindividuais em Espécie. Bahia: Juspodivm, 2015. p. 183/184.

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Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.(...)§ 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.§ 4° O juiz poderá, na hipótese do § 3° ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito.§ 5° Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial.

Considerando que o texto legislativo mestre no direito pátrio a reger o processo coletivo é a Lei n.º 7.347/85, conhecida por Lei da Ação Civil Pública, importante apreciar a adequação do referido diploma legal e sua aderência no que se refere as tutelas de urgência ao CPC/2015, incidente subsidiariamente à ação civil pública.

Não pairam dúvidas acerca da compatibilidade de dispositivos do novel CPC, operando-se verdadeiro diálogo das fontes. A respeito das tutelas provisórias, estatui o códex processual:

Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.

Art. 300.  A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.(...)§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

A respeito dos requisitos para a tutela de urgência, leciona Nelson Nery Jr6: • 3. Requisitos para a concessão da tutela de urgência: periculum in mora. Duas situações, distintas e não cumulativas entre si, ensejam a tutela de urgência. A primeira hipótese autorizadora dessa antecipação é o periculum in mora, segundo expressa disposição do CPC 300. Esse perigo, como

6 Comentários ao código de processo civil. [livro eletrônico]/Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery, coordenadores,

São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. p. 912.

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requisito para a concessão da tutela de urgência, é o mesmo elemento de risco que era exigido, no sistema do CPC/1973, para a concessão de qualquer medida cautelar ou em alguns casos de antecipação de tutela.• 4. Requisitos para a concessão da tutela de urgência: fumus boni iuris. Também é preciso que a parte comprove a existência da plausibilidade do direito por ela afirmado (fumus boni iuris). Assim, a tutela de urgência visa assegurar a eficácia do processo de conhecimento ou do processo de execução (Nery. Recursos7 , n. 3.5.2.9, p. 452).

Sobre o tema, colhe-se, ainda, o escol de Marcus Vinicius Rios Gonçalves7:

“5.3.2 Tutelas provisórias de urgência e de evidênciaEssa é a classificação que leva em conta os fundamentos pelos quais o juiz pode deferir a tutela provisória. Ao concedê-la, ele deverá fundamentar a decisão na urgência ou evidência. A tutela será de urgência quando houver "elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo" (CPC, art. 300, caput). Os requisitos são o fumus boni juris, isto é, a probabilidade do direito, e o periculum in mora, isto é, risco de que sem a medida o litigante possa sofrer perigo de prejuízo irreparável ou de difícil reparação. De que forma o perigo poderá ser arredado? Ou pela satisfação antecipada do direito, ou pelo deferimento de medida protetiva”.

Em se tratando de Ação Civil Pública, o Superior Tribunal de Justiça vem destacando, presentes os requisitos para a concessão da medida, o cabimento de liminar, sem a oitiva prévia da pessoa jurídica de direito público:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LIMINAR CONCEDIDA, EXCEPCIONALMENTE, SEM OITIVA PRÉVIA DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. ART. 2º DA LEI N. 8.437/1992. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. 1. Cinge-se a controvérsia dos autos se é possível a concessão de liminar, sem oitiva prévia do município, nos casos de ação civil pública. 2. O entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça permite, excepcionalmente, em especial para resguardar bens maiores, a possibilidade de concessão de liminar, sem prévia oitiva da pessoa jurídica de direito público, quando presentes os requisitos legais para a concessão de medida liminar em ação civil pública. Precedentes. AgRg no REsp 1.372.950/PB, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA; AgRg no Ag 1.314.453/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA; REsp 1.018.614/PR, Rel. Min. ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA; REsp 439.833/SP, Rel. Min. DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA. 3. A iterativa jurisprudência desta Corte é no sentido de que, para analisar os critérios adotados pela instância ordinária que ensejaram a concessão ou não da liminar ou da antecipação dos efeitos da tutela, é necessário o reexame dos elementos probatórios, o que não é possível em recurso especial, dado o óbice da Súmula 7 desta Corte. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 580.269/SE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/11/2014, DJe 17/11/2014) (grifos acrescidos)

7 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios Direito processual civil esquematizado/Marcus Vinicius Rios Gonçalves ; coordenador Pedro Lenza. -6. ed.- São Paulo: Saraiva, 2016.- (Coleção esquematizado'') p. 350

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Os requisitos para a concessão da tutela de urgência encontram-se

demonstrados no caso em voga. A plausibilidade do direito resta mais do que caracterizada pelos argumentos jurídicos acima alinhavados. O potencial perigo de dano à saúde da coletividade, com a utilização de água proveniente de fonte alternativa em detrimento daquela fornecida em rede pública pela concessionária CESAN de forma regular também é inequívoco, podendo a má captação da água ser fonte de transmissão de diversas doenças. Por fim, não há qualquer risco de irreversibilidade dos efeitos da medida de urgência a impedir o seu deferimento.

Ante o exposto requer-se Vossa Excelência:

1) A concessão da tutela de urgência, inaudita altera parte, consistente em obrigação de fazer, para compelir o MUNICÍPIO DE SERRA a, IMEDIATAMENTE, sob pena de multa, fazer cessar a captação e utilização de água de fonte alternativa para abastecimento do imóvel situado na Avenida Talma Rodrigues Ribeiro, n. º 5.416 – Portal de Jacaraípe, Serra/ES, conhecido por “Pró Cidadão”, determinando o juízo o desligamento e lacre dos equipamentos utilizados para tal fim;

2) A citação do MUNICÍPIO DE SERRA para, querendo, apresentar defesa no prazo legal;

3) Ao final, seja CONDENADO o MUNICÍPIO DE SERRA a obrigação de não fazer, confirmando-se a tutela de urgência a seu tempo deferida, para que se abstenha de proceder à captação e utilização de água proveniente de fonte alternativa, para abastecimento do imóvel situado na Avenida Talma Rodrigues Ribeiro, n. º 5.416 – Portal de Jacaraípe, Serra/ES, conhecido por “Pró Cidadão”;

4) A condenação do MUNICÍPIO DE SERRA ao pagamento das custas e honorários periciais;

5) Requer provar por todos os meios em direito admitido, em especial prova documental, pericial, depoimento pessoal e prova testemunhal.

Dá-se à causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Serra/ES, 1º de fevereiro de 2017.

PABLO DREWS BITTENCOURT COSTAPromotor de Justiça