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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO 1 ESQUEMA DE AULAS INTRODUÇÃO 1 1. O que se entende por Escatologia? 2. Relação entre criação, história e escatologia 3. As perguntas fundamentais: quem sou e para onde vou? O que se entende por escatologia? Eschaton/a + logos: discurso racional sobre o eschaton ou eschata Eschatos/a/on: origem incerta Ex (sufixo) + katos = Egkaton (en + katon): intestino/ interior Egkaton: o que está dentro Eschaton: o que vai para fora; extremo, último, confim, limite, íntimo, afastado, limite externo Termo “Eschaton” aparece 54 vezes no NT Sentidos: salvação definitiva de Cristo; últimos dias e condenação no último dia (Jo 12,48) A palavra aparece em 1677 na obra Eschatologia Sacra do teólogo luterano A. Calon referindo sobre morte, juízo, última realidade 1805: Bretschneider: novíssimos Senhor e juiz dos homens Teólogo católico Oberthür Escatologia: coisas últimas do homem, humanidade e mundo O que estuda a Escatologia? Objeto da Escatologia A) Escatologia: discurso sobre as realidades últimas Realidades últimas posteriores à vida terrena do homem ou da história da humanidade ou intervenção de Deus no tempo; atual estado de coisas que cessam realidade nova entre Deus e a criação Esta visão corresponde aos novíssimos (tà eschata) o que acontece depois/ aquilo que é absolutamente novo Eclo 7,36 “em tudo o que fazes, lembra-te de teu fim e jamais pecarás” concepção: realidade que se encontra no fim da vida do ser humano e do Cosmos. Realidade última cronológica: concluem a existência humana. B) Escatologia como discurso sobre o futuro (J.L. Peña) Escatologia: reflexão crente sobre o futuro da promessa a partir da esperança 1 Cf. NITROLA, A. Trattato di escatologia. Spunti per um pensare teológico. Cinisello Balsamo (Milano): Paulus, 2001, p. 19-28.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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ESQUEMA DE AULAS

INTRODUÇÃO1

1. O que se entende por Escatologia?

2. Relação entre criação, história e escatologia

3. As perguntas fundamentais: quem sou e para onde vou?

O que se entende por escatologia?

Eschaton/a + logos: discurso racional sobre o eschaton ou eschata

Eschatos/a/on: origem incerta

Ex (sufixo) + katos = Egkaton (en + katon): intestino/ interior

Egkaton: o que está dentro

Eschaton: o que vai para fora; extremo, último, confim, limite, íntimo, afastado, limite

externo

Termo “Eschaton” aparece 54 vezes no NT

Sentidos: salvação definitiva de Cristo; últimos dias e condenação no último dia (Jo

12,48)

A palavra aparece em 1677 na obra Eschatologia Sacra do teólogo luterano A. Calon

referindo sobre morte, juízo, última realidade

1805: Bretschneider: novíssimos Senhor e juiz dos homens

Teólogo católico Oberthür Escatologia: coisas últimas do homem, humanidade e

mundo

O que estuda a Escatologia?

Objeto da Escatologia

A) Escatologia: discurso sobre as realidades últimas

Realidades últimas posteriores à vida terrena do homem ou da história da

humanidade ou intervenção de Deus no tempo; atual estado de coisas que cessam

realidade nova entre Deus e a criação

Esta visão corresponde aos novíssimos (tà eschata) o que acontece depois/ aquilo

que é absolutamente novo

Eclo 7,36 “em tudo o que fazes, lembra-te de teu fim e jamais pecarás” concepção:

realidade que se encontra no fim da vida do ser humano e do Cosmos. Realidade

última cronológica: concluem a existência humana.

B) Escatologia como discurso sobre o futuro (J.L. Peña)

Escatologia: reflexão crente sobre o futuro da promessa a partir da esperança

1Cf. NITROLA, A. Trattato di escatologia. Spunti per um pensare teológico. Cinisello Balsamo (Milano): Paulus, 2001, p. 19-28.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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História aberta do homem a Deus no “já” na imitação de Cristo

Possibilidade definitiva de liberdade

Futuro: ligado à história da Salvação

C) Escatologia como discurso sobre o definitivo

Diz respeito aquilo que é último: não somente o extremo, mas também o inteiro

Fé e Teologia diz respeito do inteiro

Inteiro decisivo e incondicionado

Teologia reconhece-se limitada: discurso sobre o definitivo será sempre discurso

provisório

Discurso humano é falível/ o humano não pode abarcar o definitivo

D) Escatologia como perspectiva de toda a Teologia

Escatologia é ao fim a teologia mesma

É perspectiva de toda a teologia

Moltmann reduz a teologia a escatologia

Rahner: Teologia vista com outros tratados

Pergunta definitiva: Deus é o futuro que se manifesta na visão beatífica e vida eterna

Panemberg: centro é Deus mesmo e seu Reino. Não é só um capítulo da Dogmática

Escatologia não é somente um tratado perspectiva de ler ou reler a inteira teologia

Perspectiva: do cumprimento/ do definitivo. Da realidade última que é o evento Cristo

Relação entre criação, história e Escatologia

Criação – ex nihilo/ cria do nada

Deus como origem sem origem cria/ a ação de Deus produz vitalidade

Criação significa início da História/ temporalidade

Temporalidade – ligado à escatologia/ ao último, ao definitivo do ser humano

Nossa escatologia

Escatologia humana momento em que nos vemos como definitivos

É quando se unirá o alfa e o ômega da existência humana.

Para o CRENTE isso se dá em Deus

A HISTÓRIA HUMANA/ PESSOAL história de salvação

Ninguém se salvará fora da sua história

Perguntas

O que será/terá depois dessa existência?

Há algo depois da morte?

Para onde vamos?

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Afrontar essas questões: inquietação, dúvida, medo, fé

Escatologia Escaton trata das coisas últimas/ aquilo que vem no fim

Escathon do indivíduo e do mundo

Escatologia da pessoa última coisa do ser humano = morte

Como compreender a morte depois da ressurreição de Jesus?

O que acontece depois da morte?

Escatologia do mundo qual o fim (finalidade) deste mundo? Desta história?

Qual é essa finalidade?

Realidade contemporânea morte = temida/ indiferença

Crença em Deus vida após a morte/ Ressurreição (questionamentos)

No passado os novíssimos juízo, purgatório, inferno, paraíso que linguagem usar

ao homem pós-moderno?

Há que se buscar a linguagem – manter-se fiel ao “Creio na Ressurreição”

Escatologia buscar responder a pergunta sobre o mistério humano

É quando o alfa e o ômega da existência humana se encontram

Momento em que o ser humano saberá realmente quem é

O SER HUMANO QUE SE CONFRONTA COM MORTE

„Eis que faço novas todas as coisas" (Ap 21.5). A esperança de que Deus irá fazer tudo novo e

de que a humanidade e o cosmos estão a caminho de „novos céus e nova terra‟ (cf. Ap 21 e

22) faz parte do centro da confissão da fé cristã. Essa esperança faz parte do agir estritamente

salvador do Deus Triuno em relação à sua criação que, embora caída, é por ele

incondicionalmente amada (cf. Jo 3.16) e mantida, com vistas à sua derradeira consumação e

redenção. Deus consumará cabalmente todas as suas obras. Na teologia cristã, este agir

estritamente redentor do Deus Triuno tem sido denominado de „escatologia‟”.2

2 SCHWAMBACH, C. Escatologia como categoria sistemático-teológica. Um ensaio em perspectiva. Vox Scripturae 14:2, p. 134

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CAPÍTULO I

O SER HUMANO DIANTE DO ENIGMA DA MORTE. O CONFRONTO COM THANATOS3

1. A morte na sociedade ocidental

2. O que é a morte humana?

3. A morte do organismo e as funções cerebrais

4. A aceitabilidade da morte cerebral

5. O que há após a morte

A MORTE NA SOCIEDADE OCIDENTAL

Manualística antiga não tocava na dimensão existencial da morte

Tratava da separação da alma do corpo após a morte

1930: estudos da morte como evento drama existencial

Morte como aspecto interdisciplinar várias dimensões Social, psicológica, jurídica,

afetiva...

Questões suscitadas sentido da vida

estranha inimiga

face indiferente, amiga ENIGMA

Atualmente censura da realidade da morte

redescoberta do tema

MORTE COMO QUESTÃO DE SENTIDO DA VIDA

Pergunta sobre o sentido da vida humana

Dupla fratura SUBJETIVA = cisão entre intelecto e vontade

OBJETIVA = desaparecimento do corpo

incomunicabilidade com outro mundo

Perguntas fundamentais quem sou? Para onde vou? O que há após a morte?

BREVE RELATO DA SAGA DE GILGAMESH4

A mais remota história narrada pelo Homem é de origem suméria, um épico conhecido como A Epopéia de Gilgamesh. Esta narrativa está inserida no modelo literário mesopotâmico, uma antologia de lendas e poesias das quais não se pode precisar a procedência, o início e a realidade. Ela foi transmitida, ao longo do tempo, de geração para geração, através da práxis típica da literatura oral.

3 Cf CASTELLUCCI. La vita trasformata. Saggio di escatologia. Città di Castello: Cittadella Editrice, 2010, p.

101-177; BLANK, R.. Escatologia da Pessoa. Vida, morte e ressurreição. São Paulo: Paulus, 2000. 4 SANTANA, A.L. Gilgamesh. Disponível em: http://www.infoescola.com/mitologia/gilgamesh/. Acesso em: 18 agosto 2010.

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Gilgamesh ou Gilgamexe foi um importante rei da Suméria, que reinou no período pós-diluviano. Sua história, segundo relatos lendários, lembra muito a de Hércules, conhecido personagem da mitologia grega, pois ele era considerado robusto e poderoso, o mais forte do Planeta. Estudiosos comparam sua saga com a de Noé, um dos protagonistas das Sagradas Escrituras. O elo entre os dois textos seria Ninrode, supostamente um dos descendentes do construtor da Arca Sagrada.

Quando se estuda o Gênesis, um dos principais livros da Bíblia, encontra-se logo na introdução deste texto similaridades entre os dois épicos, especialmente no trecho que descreve como é gerado o Homem. Na epopéia suméria os súditos, insatisfeitos com o orgulho e a lascívia do soberano Gilgamesh, clamam aos deuses pela gestação de um ser que fosse a cópia exata do rei, detentor de tanta autoridade quanto ele, para assim ser capaz de lutar contra ele e de resgatá-lo dos seus vícios.

Um dos deuses, Anu, atende aos pedidos do povo e transmite a Aruru, deusa que preside a criação, a ordem de que produza o ser conhecido como Enkidu. Ela elaborou sua obra-prima através do barro e da água, com sua natureza preenchida pela mesma substância que constitui Anu, o Senhor dos céus, assim como o Homem, segundo o Gênesis, foi criado à imagem e semelhança de Deus, também constituído do elemento terra.

Há ainda várias outras passagens semelhantes entre as duas obras mais antigas da Humanidade, como, por exemplo, a idéia de que tanto Enkidu quanto Adão foram situados pela Divindade no seio da Natureza, sobrevivendo através de sua coexistência pacífica com o meio, dispondo de todos os recursos apropriados para a vida humana. Além disso, nas duas epopéias o papel da sedução, do pecado e da luxúria cabe à mulher – uma prostituta em Gilgamesh, e Eva, a serpente ou o fruto proibido no Gênesis.

O herói sumério tem um objetivo fundamental em sua vida, a procura da imortalidade. O mito tem como principal função, portanto, narrar sua jornada em busca da eternidade, da qual se viu privado pelos deuses assim que nasceu. Ele passa toda a existência, assim, perseguindo sem sucesso esta meta inatingível.

Vários fragmentos desse épico são encontrados aqui e ali, em variantes narradas por outros povos, com certeza influenciados pelo texto original, o qual possivelmente se tornou grande sucesso de público na época em que surgiu. As primeiras versões encontradas provêm do Período Babilônico Antigo (2000-1600 a.C.), mas podem pertencer a um momento anterior. Afirma-se isto porque o protagonista desta narrativa foi historicamente o quinto rei da primeira dinastia de Uruk surgida na era pós-Dilúvio, a qual teria deixado suas marcas na cultura suméria no período protodinástico II (2750-2600 a.C.). Dizem alguns pesquisadores que esta ancestral epopéia pode ter influenciado inclusive clássicos gregos como a Odisséia e a Ilíada, ambos de Homero, escritos entre os séculos VIII e VII a.C.

SAGA DE GILGAMESH

Coloca a questão do fim da vida humana

Experiência de Gilgamesh morte anula a experiência feita

anula tudo o que o seres humanos realizam

Gilgamesh busca do segredo da imortalidade ir às vísceras da terra, até a Utamapishtim

(ancião)

Possibilidade PROVA não dormir

Segredo dos deuses dilúvio universal

Dilúvio deuses decretaram morte para todos os humanos

Prêmio de consolação planta espinhosa no fundo do mar // serpente que a rouba

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Morte do amigo Enkidu coloca em crise o rei

Questões suscitadas sobre o enigma da morte

Dificuldade de compreendê-lo

Mistério reservado aos deuses

Realidade que está diante do ser humano

Coloca pergunta: que sentido há a vida humana?

MORTE COMO EXPERIÊNCIA DA INTEIRA EXISTÊNCIA

Prisma filosófico

Morte põe em questão sentido da vida a inteira existência humana

Epicuro a morte que acompanha a vida de todos do início ao fim

Cícero certeza da morte, é incerta, a não ser no próprio dia, mas nos acompanha a cada

momento

Morte experiência que qualifica todos os momentos da vida

HEIDEGGER SER E TEMPO

Significado da morte para a vida humana

Morte é incomunicável e imparticipável

Realidade que dada um assume pessoalmente “É essencialmente minha”

Nossa companheira de viagem

Angústia tensão entre certeza que vem e o quando chegará

Homem é ser-para-morte Sein zum Tode é essencialmente angústia

LAMDBERT MORTE NOSSA COMPANHEIRA DE VIAGEM

Nossa morte enquanto finitude

Experiência que fazemos perdas que temos (amigos, decisões) e se espera um

além

MORTE COMO EXPERIÊNCIA DA INTEIRA EXISTÊNCIA

Prisma teológico

Problema platônico alma e corpo. Novo Testamento (não)

Antropologia cristã princípio corpóreo visível e um espiritual invisível

CORPO TODO o homem nas suas relações cosmo-históricas

ALMA TODO o ser humano na tensão a Deus e à plenitude do ser

MORTE envolve não somente o corpo, MAS também a alma

A HISTÓRIA DA MORTE NO OCIDENTE5

5 Cf. ARIÉS, Ph. Historia Da Morte No Ocidente Da Idade Media Aos Nossos Dias. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003; ARIÉS, Ph. O homem diante da morte. Vol. II. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1990.

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A morte no mundo ocidental, segundo Philipe Ariès:

QUATRO ETAPAS:

1) A morte domesticada

2) A morte de si – a própria morte

3) A morte do outro

4) A morte proibida

1. A morte domesticada

A morte era inserida na vida cotidiana

Havia um sentimento que a morte era próxima

Adeus do moribundo aos que o rodeavam

Súplica de perdão por aquilo que se cometeu

Recepção dos sacramentos

Adoção de uma postura do moribundo face para o céu

Havia a convivência dos vivos com os moribundos

Morria sempre em público com os ritos familiares

Profissão de fé

Confissão dos pecados

Recomendação da alma a Deus

2. A morte de si – a própria morte

A partir do séc. XII

Significado de destino em relação ao indivíduo

Representações iconográficas do juízo final

Balança de Deus

Aparição de cadáver e da decomposição na arte e na literatura

Individualização das sepulturas

Anjos que tocam as trombetas JUSTOS e CONDENADOS

Entra o MEDO da morte medo do inferno = ETERNIDADE INFELIZ

Homem descobre a morte de si mesmo

Ocultamento de cadáveres e uso do testamento

3. A morte do outro

Séc. XVI a XVIII – associação erótica entre morte e vivente

Começa a aparecer a vida de morte do outro

4. A morte proibida

Séc. XIX sociedade burguesa começa a esconder o sofrimento

Fazer uma proteção da realidade horrenda da morte. Utiliza-se a mentira

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Ocultamento da morte == PROIBIDO MORRER

Atualmente... A morte e o morrer

A atual evolução antropológico-cultural em relação à morte, verifica-se:

1) Tabu da morte

2) Privatização

3) Desritualização

4) Medicalização

5) Objetivação

6) Esquecimento da morte

1. Tabuização da morte

Aquilo que a um tempo era tabu sobre sexo, agora é sobre a morte

Evita-se o nome da morte, mascara-se

Sociedade que mata guerras, morte, dores, desilusões

Triunfo do corpo belo e jovem MASS MEDIA

Busca-se proteger o moribundo ou doente grave contra as próprias emoções

“Mente-se” por amor, para não ver o sofrimento

2. A Privação da morte

No passado a morte era socializada

As crianças não têm contato com a morte dos parentes

Hoje o agonizante, o moribundo é concebido como aquele que atrapalha

A pessoa sai da casa para o hospital

Marginalização e abandono do doente por parte dos familiares

A morte: evento particular

3. Desritualização da morte

Simplificação dos ritos fúnebres

Morre-se solitário na UTI e a morte passa a ser um evento profano

4. A medicalização da morte

Medicina = contribuição valiosíssima

Medicalização da morte no hospital desumaniza a morte

Perigo = “futilidade médica” (medical futility)

5. Objetivação da morte

A morte não é algo que envolve somente a subjetividade profunda de um indivíduo

Precisão

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Indagada pela medicina intensiva, avaliada (morte cardíaca, morte cerebral)

Definida clínica, natural

6. Esquecimento da morte

Descarta-se a presença da morte

Morte hoje = fato individual, acidental e inesperado

Dificuldade atual de acompanhar os agonizantes e moribundos

A MORTE COMO REALIDADE AMARGA DA CONDIÇÃO HUMANA

Todas as culturas morte é realidade que afeta o ser humano

Inevitável presença e assumida na vida humana

Sabedoria bíblica o homem é como a erva

Sl 102, 15 os dias do homem como erva do campo

Sl 38,6-7 sopro/ sombra que passa

Sl 88, 48 brevidade da vida

PONTO CENTRAL A VIDA HUMANA É FRÁGIL, EXPOSTA À MORTE

Gregos morte é “moira” destino

MORTE PREMATURA FACE HOSTIL

Idade avançada “natural” AT é bênção

Morte prematura maldição

Problema na elaboração de luto desaparecidos e jovens com morte brutal/ doença

É sempre evento inesperado, mesmo se natural

MORTE REVELA A VAIDADE DAS PAIXÕES HUMANAS

Morte: iguala todos relativiza poderes

Vertente utilitarista e niilista gozar da vida

Própria morte com espera e destaco (desapego)

Relação apática com a morte racionalização. Para alguns destacar-se

A morte do outro desapego

MORTE COMO PASSAGEM A OUTRA CONDIÇÃO MELHOR

Morte como libertação desejada situação insuportável suicídio

Afeta não somente os que não crêem

Libertação sofrimento, miséria, humilhação, luto

Não é necessário acreditar na vida eterna

Sofrimento morte como saída para a dor

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MORTE DESEJADA COMO PASSAGEM PARA ETERNIDADE

Platão alma fragmento divino preso no corpo

Sócrates filosofia é um exercício de morte busca liberar-se do corpo

Cícero velhice como alegria aproximação da morte como liberação

Desejo porque se crê na mortalidade da alma (Cícero. A

velhice, XIX, 66-67)

A morte prematura visão positiva

AT visão negativa, mas Sab 4, 8-14 significado positivo

A MORTE COMO SELO DO AMOR

Eros-Tanatos literatura/ filosofia

Virgílio (Bucólicas) lado trágico do amor = destruidor, feroz, cruel

Amor não é trágico trágico é a ausência do amor situação insuportável

Morte como selo do amor // prova suprema de fidelidade em relação à pessoa amada

Sinal mais alto do valor do amado

Shakespeare Otelo amor e morte

CENSURA E ACOLHIDA DA MORTE

Panorâmica condição social

Relação interior mente e espírito

Relação positiva e negativa

Amiga ou detestável

Insuficiente

Percepção social hodierna AMBIVALÊNCIA censura = marginalização e cinismo

Na colhida no confronto com a

morte

MORTE CENSURADA

Ocidente censura pensar sobre a morte não é estar em paz

Sinais de censura esconder a morte// não falar sobre o tema

Há eufemismos... espetáculos

Morte TABU/ sexo

Raniero Catalamessa morte foi banida da pregação cristã e da cultura secular laica

Morte contraste saúde física e mito da eterna juventude

Prazer

Tecnologia

Dificuldade de aceitar a condição mortal do ser humano

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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CONTRASTE Sociedade que tem medo da morte sociedade que mata = fome, guerra,

preconceitos

MORTE ACOLHIDA

Com ou sem fé criação de um espaço interior resignificação das coisas

A morte é um fenômeno humano

A grande interrogação do ser humano? Qual será a minha hora ou como irei morrer?

Lugar, hora, causa não sabemos Certo: MORREREMOS

EVOLUÇÃO DOS ESTÁGIOS DA MORTE

Cuidados paliativos

Cinco estágios de Kübler-Ross

REJEIÇÃO shock, isolamento “não é verdade, não é possível, não eu!”

Mecanismo de defesa

CÓLERA da incredulidade, da negação à raiva, à rebeldia

“Não é justo, por que eu?”

Doente se torna difícil. Relaciona-se brutamente

Difícil de tratar pelos médicos e parentes

Objeto da sua ira Deus ou outras pessoas (amigos, parentes...)

Mecanismo para não ser esquecido, deixado de lado

PACTO faz acordo com Deus para obter prorrogação

Ex: “deixa eu ver o meu neto nascer...”

DEPRESSÃO depressão radical

Abandono das pessoas caras, os bens, renuncia a tudo

Depressão prepara para a última fase.

ACEITAÇÃO doente não é deprimido, nem raivoso aceita o seu destino

Parentes/ amigos PRESENÇA consolação, conforto

O ACERTAMENTO DA MORTE6

O que é a morte?

Como acertá-la

Como compreender morte do corpo e morte da pessoa?

A morte

A morte é vista pelo ser humano como evento violento e dramático

É a expressão da intrínseca finitude do homem

6 Cf. FAGGIONI, M.P. La vita nelle nostre mani. Manuale di Bioetica teológica. 2ª ed.Torino. Camilliane, 2008, p. 209-217.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Causa medo:

Privação da vida terrena

Desliga-se do mundo das relações

Ideia de decomposição

Corrupção do corpo

Óptica materialista e reducionista

A morte é a dissolução da unidade corporal que coincide com o fim da pessoa

Morte humana

Não é a simples desagregação do organismo

Ser humano é realidade pluriestratificada e não pode ser reduzida a estruturas

somáticas

A degradação das estruturas somáticas não esgota a complexidade da morte humana

A morte física

A morte física é uma realidade

Papel da medicina dar uma definição de morte ou acertamento

Acertamento da morte

Ao longo da história os critérios evoluíram:

1) critério respiratório

2) critério cardio-circulatório

3) critério neurológico

Um sujeito pode ser declarado morto quando se pode demonstrar a perda irreversível de todas

as funções encefálicas.

Critério respiratório

Antigos: elemento essencial da vida física era a respiração

Morte era identificada com o cessar da respiração

Usava-se: espelho, vela

William Harvey

Sec. XVII – William Harvey faz estudos sobre a circulação e verifica-se a função

cardiorespiratória

Século XVIII introduziu-se junto ao critério respiratório a parada cardíaca

critério cardio-circulatório

Interrogação

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Fins dos anos 50 novas técnicas de reanimação e de respiração artificial coloca

algumas questões:

Pacientes com danos irreversíveis sobre o encéfalo era possível manter a respiração e

os batimentos cardíacos

Coma Depassé e coma irreversível

1959 Molaret e Garlon descrevem a condição de sujeito de sujeitos privados de

funções cerebrais e mantidos por equipamentos

Condição entre vida e morte coma depassé

Em 1968 a Harvard Medical School identificava o coma irreversível como um estado

de morte

Características – Coma irreversível

Falta de recepção e de respostas ao ambiente e a estímulos dolorosos

Ausência de movimentos respiratórios espontâneos

Ausência de reflexos tronco-encefálicos e de encefalograma

Caso: brain death

1981: morte cerebral total (Whole brain death)

Portanto,

Para saber se um indivíduo é morto não é necessário a necrose

A morte biológica total – processo evolutivo

Comitê Nacional de Bioética italiana

“na prática, pode-se dizer que a morte vem quando o organismo cessa de ser um todo,

enquanto o processo de morrer termina quando todo o organismo atinge a completa necrose”

(1991, p.13)

A FUNÇÃO DO ENCÉFALO

O que é o encéfalo?

Conjunto dos diversos segmentos do sistema nervoso central (SNC) – ou seja, o cérebro

(porção do SNC)

Composição

Caixa crânica

Compreende telencéfalo (hemisférios cerebrais)

Diencefalo (talamo e hipotálamo)

Troncoencefalo ou tronco cerebral que se estende até a região occiptal, compreende

mesoencefalo, ponte e bulbo

Funções

Cérebro funções superiores = consciência

Page 14: Aulas de escatologia. esquema

ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Tronco cerebral centro de controle de funções vegetativas essenciais (respiração,

pressão) e de reflexos (pupilar, da faringe) e estruturas para funções de manter o

cérebro mantendo-o em vigília

Morte clínica

Quando se pode demonstrar que encéfalo e tronco encefálico perderam totalmente

suas atividades o organismo cessa de existir passagem de vida à morte

Morte cardíaca

Implica morte do encéfalo falta de irrigação provoca profundas alterações nas

membranas nervosas

10-15 minutos necrose

Nos testes clínicos

O acertamento da morte

Não se prevê ausência de batimentos cardíacos. Pode-se declarar morto alguém com

batimentos cardíacos

Modernos aparelhos podem manter certas funções animadas

Oxigenar o sangue

Manter o coração batendo

Processo

Parada respiratória 5 minutos de batimento cardíaco

Parada cardíaca 1 minuto de respiração = parada respiratória

Quando há interrupção da circulação sanguínea. Alguns segundos inconsciência

45 segundos depois pupilas abertas e fixas (duração de 3-4 minutos)

Possível reanimação já com certas lesões cerebrais

4-6 minutos início de lesões cerebrais

20 minutos cérebro é morto

Fígado 1 hora após a parada cardíaca

Glóbulos vermelhos 6 a 8 horas

A agonia da morte

Resultado:

FORÇA VITAL + DEFINHAMENTO BIO-FÍSICO

De um lado = DESEJO DE CONTINUAR VIVENDO...

Do outro lado = CORPO QUE NÃO RESPONDE

Conclusão

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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1) O morrer se apresenta como um processo que passa por várias fases e já inicia com a

vida da pessoa

2) A morte clínica também é um processo

3) Cada órgão tem sua própria morte

4) Após três semanas se pode, geralmente, declarar morte total

Entre morte clínica e vital

Morte clínica morte vital

Intervalo (NDE)

Na morte finda uma experiência, a de que jamais podemos experimentar mais a

nossa vida aqui

Sobre a fé...

No processo de despedir-se da vida as experiências são ambíguas:

Fé ----------------- perda

Não crer --------- crer/ resignifica a vida

Fé profunda diminui a angústia e muitos casos no processo de aceitação da morte

O que alguns captaram...

Quando chega o inverno, sem que ninguém os instrua, os pássaros erguem-se espontaneamente aos céus em incrível aventura. Conduzidos por um misterioso legado de sua espécie, seguindo apenas os pulsos magnéticos da terra, eles voam, pelas trilhas do sol, milhares de quilômetros, noite e dia, à busca apenas de permanecer na vida. Assim há de ser também conosco, quando, no crepúsculo de todos os outonos, cair sobre nós o frio do inverno. Carregados, então, pelo fascinante destino de nossa espécie, nós voaremos, seguindo apenas os acenos da eternidade, rumo à morada da luz, o coração de Deus. E aí saberemos o que, agora, apenas intuímos e, ouvindo Jesus Cristo, o Caminho, a Verdade, a Vida, cremos: Não existem dois reinos, o reino dos mortos e o reino dos vivos, o reino da terra e o reino dos céus, mas apenas o Reino de Deus, que quis que fôssemos eternos.

Frei Prudente Nery

O que acontece com a pessoa humana na morte

Relatos de pessoas reanimadas foram agrupadas estágio conhecidos como Near Death

Experiences (NDE)

Cinco estágios de NDE

1) Experiência de flutuar em um espaço desconhecido

2) Impressão de estar fora do próprio corpo e observando o próprio corpo

3) Experiência de atravessar uma zona de escuridão (túnel)

4) Experiência de uma intensa luz, apesar disso agradável

5) Experiência de penetrar nesta luz que se revela amor total

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

16

Como interpretar esse fenômeno?

Duas tendências:

1) Dizer que há o encontro com Deus

2) Processo fisiológico causada pelas últimas descargas bioelétricas no cérebro humano

Tendência: dizer que é um processo fisiológico. Isso é sustentado pela possibilidade de fazer

certas experiências laboratoriais

Levar em consideração

Nesse processo é preciso levar ainda em consideração três aspectos:

Reanimação médico reanima

Revitalização a pessoa morta volta a vida e continua vivendo e depois morre. Ex:

relatos de processo de beatificação e caso de Lázaro

Ressurreição ação de Deus que transforma o ser humano de modo que ele nunca

mais morre

O QUE HÁ DEPOIS DA MORTE?

Três respostas

Nada ateísmo. Cada vez mais questionado pela ciência. A própria ciência afirma

ter algo depois

A física quântica afirma que após a morte há algo

Reencarnação

Depois da morte há a reencarnação

A pessoa morre e reencarna em outro corpo

Antecedentes na metepsicose metá: transformação/ mudança + em: em + psichè =

alma

Cristianismo

Ressurreição Deus ressuscitou Jesus, logo vai nos ressuscitar

Modelo tradicional de morte e ressurreição

O modelo tradicional

O corpo separa da alma

O corpo acaba e a alma não morre

O corpo desaparece, mas será ressuscitada no final dos tempos

A alma, na morte, já entra na eternidade para o julgamento

SUGESTÃO DE LEITURA: BLANK, R. Escatologia da Pessoa. Vida, morte e ressurreição. São

Paulo: Paulus, 2000, p. 07-41.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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CAPÍTULO II

ELEMENTOS BÍBLICO-ANTROPOLÓGICOS E TEOLÓGICOS

1. Aspectos bíblicos de uma vida pós-morte

2. A doutrina dos Padres

3. Algumas chaves de leitura históricas

Depois da morte...

Há três tentativas de responder o que há depois da morte:

Nada – ateus

Reencarnação – espíritas, budistas...

Ressurreição – cristãos

Temporalidade morte

TEMPORALIDADE MORTE

VIDA

Nível

cronológico

MORTEESPAÇO / TEMPOETERNIDADE

Não há mais tempo

kairológico

Interrogação

Como compreender que há vida após a morte se, realmente defrontamos com um corpo

realmente morto?

A explicação dualista

A antropologia grega explica a realidade a partir da imortalidade da alma

SER HUMANO CORPO E ALMA

mortal imortal

MORTE diástase alma vai para a eternidade espera o final dos tempos

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Modelo dualista

A essência do homem é a alma espiritual = realidade imortal

A filosofia grega conhece a imortalidade da alma mas não pode imaginar a

ressurreição

A absorção conceitual no cristianismo

O cristianismo absorve a visão grega devido ao processo de inculturação

Agostinho intensifica este modelo

Nesta concepção:

1) A alma separa-se do corpo e é imortal

2) Depois da morte – separada do corpo – é julgada por Deus

3) Goza – SE JUSTA – da presença de Deus até o fim do mundo

4) No fim do mundo será re-unida novamente ao corpo

5) Corpo será ressuscitado para gozar eternamente com a alma eternamente a comunhão

com Deus

Problemas derivantes

1) Como pensar essa espera para a futura ressurreição dos mortos?

2) Como a alma na eternidade pode esperar algo futuro, se não há tempo?

3) A alma pode realmente separar-se do corpo

4) Se a alma é feliz sozinha, por que precisa de uma ressurreição do corpo

5) A morte atinge apenas o corpo do ser humano. Ela não é total, porque só atinge uma

parte

6) A ressurreição atinge só o corpo. Conceito incompleto de ressurreição

7) O conceito de ressurreição é entendido como revivificação

O modelo hebraico

A antropologia bíblia concebe o ser humano como uma unidade indissolúvel

Para o homem bíblico: Deus cria a vida, mas uma obscura problemática domina o seu

fim

A morte não é algo extraordinário, é fim para todos

No AT

O AT vê no conjunto a morte como certo horror

A morte é descida ao Xeol lugar da sombra e de subvida ou vida imperfeita

Na concepção bíblica

Vida significa estar em relação com... sobretudo relação com Deus

A morte, ao contrário, é ausência de relação

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Desse modo...

Antropologia grega

Homem é composto de duas substâncias

• Antropologia bíblica

Ser humano é unidade psicofísica indivisível

É unidade multidimensional

Verifica-se que...

O modelo escatológico tradicional não se baseia em uma antropologia bíblica

Trata-se muito mais de um modelo filosófico do que uma antropologia revelada

Mas...

Se a concepção bíblica é integral, a concepção de vida pós-morte não é unâmime

Israel antigo não havia crença de vida após a morte. Memória/ filhos/

descendência

Concepção tardia Dn 12, 2s; Sl 16, 9-11; 2Mc 7

Dn 12,2

Muitos dos que dormem na terra poeirenta, despertarão; uns para a vida eterna e outros para

vergonha para abominação eterna

O resgate do modelo bíblico

Para compreender a ressurreição é necessário uma antropologia integral

A antropologia bíblica não é dualista

O termo alma perspectiva integradora

O ser humano é totalidade nefesh + basar + ruah

Nefesh

Ser humano inteiro como ser vivente, consciente. Não se opõe ao corpo, mas está a ele

ligado. Ambos formam totalidade como expressão do ser humano todo

Basar

Ser humano vivo no seu aspecto biológico corpo/ carne, na existência terrestre

Possuidor de órgãos do sentido e contato com a terra

Gerado a partir de uma carne

É ser frágil, sujeito ao sofrimento à finitude

É também pessoa toda inteira em comunhão com os demais

Ruah

Ser humano vivo em relação com Deus

É homem-corpo-alma enquanto abertura para Deus e para valores absolutos e se

entende a partir deles.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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O homem carne (em hebraico basar, em grego sarx): é o homem em sua existência terrestre

empírica, gerada em contacto com duas carnes que se fazem uma (Gn 2,240). homem-carne é

o homem biológico dos órgãos e dos sentidos que está em contacto com a terra. É um ser-

carência, sujeito aos sofrimentos e à morte, às tentações e ao pecado (Cf. Rom 7). Fala-se em

homem-carne quando o homem quiser se realizar só nessa dimensão terrestre, sem sair de si

para os outros e para o Grande Outro. É o homem fechado sobre si mesmo em seu orgulho e

autocontemplação. Uma existência carnal é para a Bíblia uma existência inautêntica. „Tudo

isso é carne‟ (Cf. Gal 5,18-21; 1Cor 1,26; 2Cor 10,5; Rom 8,6ss; 10,3)7

O homem-corpo (em hebraico basar, em grego soma): designa o homem todo inteiro

enquanto é pessoa-em-comunhão-com-outros (cf. Rm 12,1; 1Cor 7,4;9,27;13,1; Flp 1,20).

Em muitas passagens „corpo‟ pode ser traduzido simplesmente por „eu‟ (1Cor 13,3; 9,27; Flp

1,30; Rom 12,1)(...). Pertence à pessoa o ser para outra pessoa; por isso homem-corpo

designa o homem em seu relacionamento social e político. Porque significa a pessoa humana

em sua totalidade não se pode pensar em sobrevivência do homem se incluir o corpo. Não há

igualmente ressurreição sem corpo8.

O homem alma (em hebraico nefesh, em grego psiqué): aqui não se pensa em alma enquanto

se distingue do corpo. Mas no homem todo inteiro como ser vivente. Alma para a Escritura é

sinônimo de vida. Por isso o texto de Mc 8,36 deve ser entendido assim: „que aproveita ao

homem ganhar o mundo se vier a perder sua vida (alma)? Pois que dará o homem em troca

de sua vida (alma)?‟ O homem não tem vida. É vida. Por isso após a diluição da vida (alma)

biológica, permanece ainda o homem-vida, embora sob outra forma. Homem-alma pode

significar ainda a pessoa em sua vida consciente como eu. (...) daí que homem-alma e

homem-corpo são equivalentes. Corpo e alma não se opõem mas exprimem o homem

inteiro9.

O homem-espírito (em hebraico ruah, em grego pneuma): designa o homem-corpo-alma

enquanto sua existência se abre para Deus, para valores absolutos e se entende a partir deles.

Como o espírito o homem extrapola os limites de sua existência com carne-corpo-alma para

se comunicar com a esfera divina. Para o Novo Testamento viver no espírito é viver uma

existência humana nova no horizonte das possibilidades reveladas pela Ressurreição de

Jesus, o Senhor. Pela Ressurreição o Senhor é o Espírito (2Cor 3,17; Cf. At 2,32s), isto é,

Jesus Ressuscitado vive uma existência humana (por isso totalmente corporal) totalmente

determinada e repleta de Deus e em total comunhão com a realidade. Daí que Paulo chama o

ressuscitado de homem-corpo espiritual (1Cor 15,44). Pela Ressurreição o homem carne

(indigente e inautêntico) é transfigurado em homem-corpo espiritual. Por ela o homem-corpo

é totalmente atualizado em suas possibilidades de comunicação não só para com os outros

mas com toda a realidade10

.

Na antropologia Paulina

Paulo não recorre ao modelo grego. Ele compreende que o ser humano é inteiro

Para explicar a ressurreição ele recorre à metáfora da semente (1Cor 15,35s)

7BOFF, L. A ressurreição de Cristo. A nossa ressurreição na morte. Petrópolis: Vozes, 1972, p. 87. 8BOFF, L. A ressurreição de Cristo. A nossa ressurreição na morte. Petrópolis: Vozes, 1972, p. 87. 9BOFF, L. A ressurreição de Cristo. A nossa ressurreição na morte. Petrópolis: Vozes, 1972, p. 87s.

10 BOFF, L. A ressurreição de Cristo. A nossa ressurreição na morte Petrópolis: Vozes, 1972, p. 88.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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A morte da semente não significa que ela exista, mas ela foi transformada

A ressurreição é passagem de uma maneira de ser para outra

NA ANTROPOLOGIA PAULINA

PNEUMA TRANSCENDÊNCIA/

ABERTURA PARA DEUS

SARX = BIOLÓGICO HUMANO INTEIRO

SOMA SOCIAL/ RELAÇÕES

PSICHÉ PERSONALIDADE

Assim...

Paulo concebe o ser humano numa totalidade

O ser humano é uma única substância, um todo, um ser complexo

Na ressurreição Deus transforma e a pessoa muda, mas a identidade, o ser da pessoa

permanecem

DESSE MODO...

O ser humano é uma unidade global com várias dimensões

Na antropologia contemporânea, o dualismo antropológico é irreversivelmente

superado

Algumas conclusões

Todos os conhecimentos antropológicos e psicológicos a alma nunca pode se

separar do corpo para existir sozinha

Numa eternidade sem tempo, não pode passar tempo entre a morte da pessoa e sua

ressurreição

A ressurreição acontece na morte

Dificuldades

A ressurreição sempre foi explicada que os túmulos abririam e os corpos sairiam

Gerou-se grande confusão entre ressurreição e revitalização

A Biologia demonstrou que isso é impossível (revitalização)

Ressurreição dinâmica da fé

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Na experiência da morte11

Ser humano ser total, indivísível não possui princípio opostos = corpo e alma

Ser humano é complexo, muldimensioanal

É encarnado na história

Todos os acontecimentos dizem respeito ao ser humano como um todo

Tradicionalmente

Alma

Esfera espiritual

Pré-existente ao corpo

Possui origem divina

Portanto é eterna

Corpo

Realidade material

É imanente

Não possui valor

É fugaz

É mortal

A teologia sobre a morte de Karl Rahner

KARL RAHNER E SUA CRÍTICA DA MORTE COMO SEPARAÇÃO DE ALMA E CORPO12

TESE PANCOSMICIDADE DA ALMA

NA MORTE:

A alma não assume uma situação a-cósmica

MAS na relação com a matéria se alarga,

Ao ponto que não é mais limitada ao corpo,

MAS se abre ao mundo inteiro em uma relação cósmica universal

Portanto, atinge uma comunhão com o centro do universo

Comunhão que na vida humana é preclusa, limitada por causa de um específico corpo

A morte não se refere só ao corpo, também a alma. É a experiência do homem todo.

Alma envolvida entra na relação diferente com o cosmo

MORTE homem-alma não perde a sua corporeidade. Ela é essencial

Adquire um outro tipo de corporeidade mais perfeito/ mais universal

Há um nó de relações com a totalidade do universo

BOROS: MORTE COMO SELO DA VIDA

Decisão, opção ou iluminação final

Morte possibilita ao homem do seu primeiro ato plenamente pessoal

11 Cf. BLANK, R. Escatologia da Pessoa. Vida, morte e ressurreição. São Paulo: Paulus, 2000, p. 101-128. 12 Cf. RAHNER, K. Sulla teologia della morte. Com uma digressione sul martírio. Brescia: Morcelliana, 1972; CASTELLUCCI. La vita trasformata. Saggio di escatologia. Città di Castello: Cittadella Editrice, 2010, p. 110-

118.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Lugar de tomada plena de consciência,

Da liberdade, do encontro com Deus

Decisão sobre o destino eterno13

Morte é realização da vontade e do conhecer

Para Boros o primeiro ato de conhecimento total se vem com a morte

Abertura da alma ao cosmos na morte última decisão que o homem toma de frente ao

Senhor do Cosmos

A alma humana decide de frente a Deus

Decisão final salvação, limbo, purgatório, ressurreição

Crítica decisão final? Conjunto de decisões durante a vida? O que o homem fez?

MORTE COMO SELO QUE TORNA DEFINITIVA A ESCOLHA DA VIDA

Morte sela a vida

Idéia da piedade popular “fazer tudo” e no último momento arrepender-se

Ressurreição final é toda a história humana que vem definida da morte e entregue nas

mãos de Deus, não só o último instante

A FACE ESTRANHA DE MEDUSA

Medusa criatura bela monstro horrível que no mundo antigo simboliza o aspecto mais

terrível da morte

Hostilidade está na concepção de que o ser humano foi feito para a vida e não para a morte

O que se observa?

Há uma mudança de concepção teológica

Na experiência humana da morte, é levada em consideração a pessoa como totalidade,

com toda a sua experiência de vida

Confronto consigo e com Deus

Gaudium et spes

O homem, ser uno, composto de corpo e alma, sintetiza em si mesmo, pela sua natureza

corporal, os elementos do mundo material, os quais, por meio dele, atingem a sua máxima

elevação e louvam livremente o Criador (5). Não pode, portanto, desprezar a vida corporal;

deve, pelo contrário, considerar o seu corpo como bom e digno de respeito, pois foi criado por

Deus e há-de ressuscitar no último dia. (GS 14)

O que ocorre com o ser humano na morte?

Com a superação do dualismo:

A alma não se separa do corpo

A ressurreição é da pessoa inteira e ocorre no momento da morte

13 Cf. BOROS, L. Mysterium mortis. L’uomo nella decisione ultima. Brescia: Queriniana, 1979, p. 30.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Tudo é simultaneidade não há mais tempo

Como há vida se há cadáver

A questão que se coloca é: como falar de uma vida após a morte se há diante dos nossos olhos

um cadáver, frio, que depois de algumas horas começa a se decompor?

FIM DOS

TEMPOS

MORTE

PESSOA

HUMANA

Vida

vivida

“É aceitável a ideia de que a única e

total plenificação do homem em corpo e

alma se realize diretamente na morte...“

cf.:K.Rahner:,Ueber den

Zwischenzustand,em:Schriften zur Theologie

XII,(1975),p.455-469

O NOVO MODELO DE UMA

“RESSURREIÇÃO NA MORTE”

Abertura por dentro de novasdimensões,chamadas deETERNIDADE

RESSUR

REIÇÃO

DA

PESSOA

TODA

No fundo, não éconcepção novana tradiçãocristã.

14

Portanto,

A ressurreição acontece na morte

A alma não se separa a pessoa é única

Ao morrer outra dimensão de tempo

O tempo cessa de existir como dimensão existencial da pessoa

Morte é o fim dos tempos para a pessoa

Final dos tempos = eternidade

O ser humano é totalidade e não só um corpo físico

A pessoa é transformada

Na morte Deus transforma a pessoa por inteira

Pessoa mantém a sua identidade, o seu ser

É o momento em que o ser humano sabe quem realmente é

Momento em que o alfa e o ômega da existência humana se encontra

A experiência de totalidade

A vida, a morte e a ressurreição são experiências humanas de totalidade

Vive-se como ser global

Morre como ser global

Ressuscita-se como ser global

O ser humano é inteiramente transformado

14 Cf. BLANK, R. Escatologia da Pessoa. Vida, morte e ressurreição. São Paulo: Paulus, 2000, p. 108.

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

25

Morte como transformação do ser

A transformação que se dá na morte é a ressurreição

Questão crucial

Salto da FENOMENOLOGIA para a FÉ

(Exterior) (Interior)

Portanto,

Fenomenologia

Morte cadáver, sepultamento,

decomposição

Identificável pela medicina

Cultural/social...

Vai além do humano

Aborda questões de sentido

Teologia

O que diz as ciências?

Segundo as leis da termodinâmica a energia não é destruída, mas transformada

Energia é um continuum no universo

Argumento frágil

A dimensão de fé

Como nos faltam provas científicas

Os evangelhos respondem a partir de parábolas

Não sabemos nada dos que morreram e se foram

Resta-nos o ARGUMENTO DA FÉ

A nossa convicção

A partir de que pressupostos podemos intuir uma resposta de uma vida após morte a partir de

nossa fé?

Algumas evidências

Na história da salvação Deus se revelou como o Deus da vida

O Deus manifestado em Jesus por Jesus sempre gritou contra a morte

Deus se revela na morte de Jesus, libertador da realidade da morte

Em linguagem paulina: esse Deus que ressuscitou Jesus também nos ressuscitará

(1Cor 6,14, Rm 8,11)

Se Deus nos ressuscita, ele nos transformará em todas as nossas dimensões

A transformação será realizada pela graça de Deus

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ESCATOLOGIA: A REFLEXÃO CRISTÃ ACERCA DO DESTINO HUMANO

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Totalidade natureza e graça15

Natureza ser como criatura de Deus, imanente, com potencialidades, aberto ao

trasncendente

Graça situação do ser humano inserido no amor e Deus

Encontra a sua resposta de comunhão com Deus

Em total liberdade e gratuidade

Assim,

«A Escatologia não é isolada da vida e projetada em um futuro distante. Mas é um evento de

cada instante da vida mortal: a morte acontece continuamente e cada instante pode ser o

último».16

SUGESTÃO DE LEITURA:

BOFF, L. A ressurreição de Cristo. A nossa ressurreição na morte. Petrópolis: Vozes, 1972,

p. 65-109.

BLANK, R. Escatologia da Pessoa. Vida, morte e ressurreição. São Paulo: Paulus, 2000, p.

73-164.

15

Cf. BOFF, L. A ressurreição de Cristo. A nossa ressurreição na morte. Petrópolis: Vozes, 1972, p. 90. 16 BOFF, L. A ressurreição de Cristo. A nossa ressurreição na morte. Petrópolis: Vozes, 1972, p. 93.