aula 4 disfunÇÕes hemodinÂmicas ii - alterações circulatórias

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7 - INFARTO 7.1 - INTRODUÇÃO Um infarto é uma área de necrose isquêmica* contida em um tecido ou órgão e produzida pela oclusão de sua irrigação arterial ou de sua drenagem venosa . * ISQUEMIA : ( ischo: reter + haima: sangue ) redução parcial ou total do fluxo sanguíneo para um tecido ou órgão . ETIOLOGIA : Quase 99 % dos infartos são causados por eventos tromboembólicos (oclusões trombóticas ou embólicas) e quase todos eles decorrem de oclusões arteriais. Outras causas raras incluem a torção de vasos ovarianos ou de uma alça intestinal, a compressão da irrigação sangüínea por uma alça intestinal em um saco herniário ou compressões vasculares por neoplasias ou abscessos. 7.2 - TIPOS DE INFARTO Os infartos são grosseiramente divididos com base em sua coloração e na presença ou ausência de infecção bacteriana na região de necrose. Anêmico ( brancos ) Hemorrágico ( vermelhos ) Sépticos ( presença ) 1

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Page 1: AULA 4 DISFUNÇÕES  HEMODINÂMICAS II - alterações circulatórias

7 - INFARTO

7.1 - INTRODUÇÃO

Um infarto é uma área de necrose isquêmica* contida em um tecido ou órgão e

produzida pela oclusão de sua irrigação arterial ou de sua drenagem venosa .

* ISQUEMIA : ( ischo: reter + haima: sangue ) redução parcial ou total do

fluxo sanguíneo para um tecido ou órgão .

ETIOLOGIA : Quase 99 % dos infartos são causados por eventos

tromboembólicos (oclusões trombóticas ou embólicas) e quase todos eles

decorrem de oclusões arteriais. Outras causas raras incluem a torção de vasos

ovarianos ou de uma alça intestinal, a compressão da irrigação sangüínea por

uma alça intestinal em um saco herniário ou compressões vasculares por

neoplasias ou abscessos.

7.2 - TIPOS DE INFARTO

Os infartos são grosseiramente divididos com base em sua coloração e na

presença ou ausência de infecção bacteriana na região de necrose.

Anêmico ( brancos )

Hemorrágico ( vermelhos )

Sépticos ( presença )

Assépticos ( ausência )

INFARTOS ANÊMICOS : encontrados em casos de oclusão arterial e em

tecidos sólidos ( coração, baço e rins ).

No momento da oclusão vascular, o sangue dos vasos periféricos anastomóticos

flui para o foco de lesão e produz um aspecto inicial hemorrágico. Após o

extravasamento inicial, as hemácias sofrem lise e o pigmento de hemoglobina

liberado difunde-se para fora do tecido ou é convertido em hemossiderina.

Portanto, o infarto arterial logo ( em 24 a 48 horas ) torna-se pálido.

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INFARTOS HEMORRÁGICOS : encontrados em (1)oclusões venosas,

(2)tecidos frouxos, (3)tecidos com dupla circulação e (4)tecidos previamente

congestos.

O tecido frouxo do pulmão, em formato de favo de mel, constitui um

exemplo de infarto hemorrágico secundário à obstrução arterial.No momento

do infarto, uma grande quantidade de sangue fica retida no parênquima

pulmonar esponjoso, de tal forma que o infarto arterial permanece vermelho.

O intestino delgado é uma região tipicamente acometida pelos infartos

hemorrágicos, devido as ricas anastomoses arteriais entre muitos ramos da

artéria mesentérica superior, que permite o fluxo arterial para o segmento

lesado.

INFARTOS SÉPTICOS : envolvem a infecção bacteriana

a) presença do microrganismo no tecido antes do desenvolvimento da necrose

isquêmica ( infarto pulmonar após pneumonias).

b) Microrganismo trazido por coágulo sangüíneo contaminado embolização

de fragmentos de vegetações bacterianas de válvulas cardíacas.

7.3 - MORFOLOGIA DOS INFARTOS

Todos os infartos, sejam eles anêmicos ou hemorrágicos, tendem a ter formato

em cunha, com o ápice da cunha apontando na direção do foco da oclusão

vascular e todo o tecido dependente até a periferia do órgão, constitui a base da

cunha ( Figura 34 ).

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Page 3: AULA 4 DISFUNÇÕES  HEMODINÂMICAS II - alterações circulatórias

Algumas horas após sua instalação, todos os infartos ficam mal definidos,

apresentam colorações discretamente mais escuras do que a de tecidos normais

e uma consistência mais firme do que as dos tecidos circundantes. Durante as 24

horas seguintes, a demarcação fica mais bem definida e a alteração da coloração

torna-se mais intensa.

Ao longo de vários dias, os infartos brancos tornam-se amarelos-esbranquiçados

e nitidamente demarcados, ao passo que o aspecto dos infartos pulmonares

hemorrágicos muda relativamente pouco.

A alteração citológica característica de todos os infartos, salvo os cerebrais, é

a necrose de coagulação isquêmica de todas as células afetadas.

A exsudação inflamatória inicia-se nas margens do tecido e é seguida por uma

resposta reparadora fibroblástica. Na maioria dos casos, o foco necrótico é

substituído por tecido cicatricial.

O cérebro é uma exceção, sofre necrose isquêmica, mas a região afetada é alvo

de uma necrose de liquefação ( não preserva a arquitetura tecidual ).

Nos infartos sépticos, a lesões são convertidas em abscessos e, quando

observadas em fases mais tardias, podem não ser reconhecidas como um infarto.

7.4 – FATORES QUE CONDICIONAM O DESENVOLVIMENTO DE UM

INFARTO

A oclusão de uma artéria ou de uma veia pode ter pouco ou nenhum efeito sobre

o tecido envolvido ou pode levar à morte tecidual e, até mesmo, do indivíduo.

Os principais determinantes incluem:

(1) a natureza da irrigação vascular ;

(2) a velocidade de desenvolvimento da oclusão e;

(3) a vulnerabilidade do tecido à hipóxia.

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Page 4: AULA 4 DISFUNÇÕES  HEMODINÂMICAS II - alterações circulatórias

A disponibilidade de uma fonte alternativa ou recém-adquirida de irrigação

sangüínea é, provavelmente, o fator mais importante na definição do potencial

lesivo de uma oclusão vascular.

Pulmão: irrigação sangüínea dupla artérias pulmonares e brônquicas.

Fígado : irrigação sangüínea dupla artéria hepática e veia porta.

Mão : irrigação arterial dupla artérias radial e ulnar.

Por outro lado, as artérias renal e esplênica, constituem artérias terminais, e por

conseguinte, o infarto quase sempre segue-se à oclusão arterial .

As oclusões que se desenvolvem lentamente têm uma menor probabilidade de

causar infarto, uma vez que proporcionam oportunidades para o

desenvolvimento de vias alternativas de fluxo de canais de anastomose de

derivação.

A vulnerabilidade do tecido à hipóxia influencia a probabilidade de infarto:

enquanto os neurônios sofrem danos irreversíveis em 3 a 4 minutos após a

isquemia e as células miocárdicas são extremamente sensíveis à anóxia, os

fibroblastos no interior do miocárdio não são afetados e são bastante resistentes

à hipóxia.

7.5 – REPERCUSSÕES CLÍNICAS DO INFARTO

E.U.A. : mais de 50 % óbitos por doença cardiovascular : infartos miocárdicos ou

cerebrais.

Infarto do miocárdio cardiopatia coronariana : 30 % mortalidade

OO

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A trombose, a embolia, e o infarto podem acometer o indivíduo

sem que exista nenhum sinal anterior de doença e, pior ainda,

correspondem a grandes predadores que atacam pacientes enfermos,

idosos e restritos ao leito, que são menos capazes de lidar com eles.

Page 5: AULA 4 DISFUNÇÕES  HEMODINÂMICAS II - alterações circulatórias

8 – CHOQUE

8.1 - INTRODUÇÃO

O choque, comumente denominado de colapso circulatório, pode desenvolver-

se após qualquer agressão grave sobre a homeostasia corporal.

Corresponde a uma hipoperfusão disseminada dos tecidos, secundária à

redução do volume sangüíneo ou do débito cardíaco ou à redistribuição do

sangue decorrente de um volume circulante eficaz inadequado.

Conseqüentemente, o aporte de oxigênio e de nutrientes às células e tecidos é

insuficiente e a depuração de metabólitos é inadequada.

No início, os distúrbios hemodinâmicos e metabólicos são passíveis de correção e

induzem apenas lesões celulares reversíveis. No entanto, a persistência ou o

agravamento do estado de choque conduzem a lesão irreversível e morte celular,

podendo chegar até ao óbito do paciente.

8.2 – ETIOLOGIA E TIPOS DE CHOQUE

Vários fatores são capazes de gerar uma agressão grave à homeostasia corporal,

como por exemplo, uma hemorragia profusa, um traumatismo grave, uma

queimadura extensa, um infarto amplo do miocárdio, uma embolia pulmonar

maciça ou uma sepse bacteriana.

O choque é comumente dividido em três tipos principais ( Quadro 3 ):

(1) Choque cardiogênico, causado pela falência da bomba miocárdica devido

à lesão miocárdica intrínseca (infarto do miocárdio), arritmias ou

obstrução ao fluxo de saída ( embolia pulmonar).

(2) Choque hipovolêmico ou hemorrágico, devido à um volume sangüíneo

ou plasmático inadequado causado por hemorragia, perda de líquidos a

partir de queimaduras graves ou traumatismo ( choque traumático).

(3) Choque séptico, causado por infecções bacterianas graves, geralmente por

bactérias Gram-negativas (choque endotóxico) ou Gram-positivas.

* Choque neurogênico e choque anafilático (hipersensibilidade I )

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8.3 – ETIOPATOGENIA

As causas de choque, como insuficiência ventricular esquerda aguda,

traumatismos graves, hemorragias acentuadas, desidratação intensa, reações

anafiláticas sistêmicas e septicemia, produzem choque ( Figura 35 ) por levar à

estimulação neurogênica acentuada (choque neurogênico), redução da volemia

(choque hipovolêmico), falência do miocárdio (choque cardiogênico) ou

ativação excessiva de mediadores que agem na microciculação (choque séptico

e anafilático).

No choque neurogênico, há estímulo excessivo do sistema nervoso central,

gerando assim vasodilatação arteriolar, abertura de todo o leito capilar e

seqüestro de sangue no território vascular periférico. Há diminuição do retorno

venoso e do débito cardíaco e queda rápida da pressão arterial.

No choque hipovolêmico, há diminuição do retorno venoso e queda do débito

cardíaco. Conseqüentemente, a vasoconstricção determina hipóxia dos tecidos e

as lesões celulares agravam-se, determinando a irreversibilidade do processo.

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Page 7: AULA 4 DISFUNÇÕES  HEMODINÂMICAS II - alterações circulatórias

No choque cardiogênico, a falência do ventrículo esquerdo induz queda rápida

no volume/minuto e na pressão arterial, havendo vasoconstricção arteriolar na

microcirculação, o que induz hipoperfusão tecidual.

No choque séptico, o processo inicia-se com a liberação de mediadores químicos

na microcirculação. Produtos das bactérias ( LPS da parede) ativam o

complemento, produzindo anafilatoxinas (C3a e C5a) que liberam histamina de

mastócitos e ativam PMN e macrófagos. Alguns mediadores produzem

vasodilatação e abrem o leito capilar, o que leva ao seqüestro de sangue no

território vascular periférico; há ainda uma discreta vasoconstricção o que reduz

mais ainda a velocidade circulatória na microcirculação. Desse modo, a perfusão

fica diminuída, os tecidos tornam-se hipóxicos e há ainda o efeito citotóxico dos

mediadores (Figura 36).

8.4 - LESÕES TECIDUAIS NO CHOQUE

As lesões ocorrem em todos os órgãos, com intensidade variável de acordo com a

sensibilidade das diferentes células à hipóxia. As lesões compreendem desde

degeneração hidrópica até necrose.

No cérebro, os neurônios apresentam citoplasma acidófilo e núcleo com

cromatina picnótica ( neurônios vermelhos ).

No coração, observa-se necrose de cardiócitos isolados ou em pequenos grupos.

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Page 8: AULA 4 DISFUNÇÕES  HEMODINÂMICAS II - alterações circulatórias

No pulmão, ocorre edema intersticial e alveolar, principalmente no choque

séptico.

Nos rins, ocorrem necrose tubular aguda e edema intersticial acentuado.

Na mucosa do tubo digestivo, há necrose e hemorragias superficiais.

No fígado, há degeneração hidrópica e esteatose discreta nos hepatócitos

centrolobulares e, nos casos mais graves, necrose e hemorragia.

As lesões teciduais podem ser reversíveis, no entanto em pacientes retirados do

estado inicial de colapso circulatório e mantidos em unidades de tratamento

intensivo, o choque se estabiliza e ocorre gravamento progressivo das lesões

teciduais, e em dias ou semanas instalam-se lesões graves no encéfalo, rins e

fígado, levando ao quadro que se conhece com o nome de Síndrome da

Falência de Múltiplos Órgãos (SFMO).

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A instalação da SFMO é indicada pelo agravamento do coma,

anúria, icterícia, estado hipercatabólico e perda rápida da massa

muscular. As lesões observadas nos pacientes falecidos com SFMO são

as mesmas descritas para o choque, porém mais graves e

freqüentemente acompanhadas de coagulação intravascular

disseminada.

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ROTEIRO DE ESTUDO

1. Que forças estão envolvidas na manutenção do volume normal de líquido

intersticial ?

2. Cite as quatro condições onde ocorre o edema.

3. Em que condições ocorre o edema localizado e generalizado ?

4. Cite as conseqüências do ponto de vista clínico, para um paciente com edema.

5. Diferencie hiperemia ativa de hiperemia passiva.

6. Em que situações pode ocorrer a congestão ?

7. O que são células do vício cardíaco ?

8. O que é fígado em noz-moscada ?

9. O que caracteriza a necrose hemorrágica central no fígado ?

10. Defina hemorragia e cite sua etiologia baseada na classificação.

11. Defina trombose e cite os principais componentes envolvidos em seu

desenvolvimento.

12. Cite asvantagens e desvantagens da trombose.

13. Cite os fatores predisponentes à trombose.

14. Como ocorre a formação de um trombo após a injúria endotelial dos vasos ?

15. Como uma queimadura grave pode predispor à formação de um trombo ?

16. Cite as principais diferenças entre trombos e coágulos.

17. Qual o destino dos trombos no organismo, após sua formação ?

18. Defina êmbolo, embolia e cite os constituintes de um êmbolo.

19. Quais as conseqüências para um paciente com embolia pulmonar ?

20. Defina infarto e isquemia.

21. Cite a etiologia e classificação dos infartos.

22. Em que situações são encontrados infartos anêmicos e infartos hemorrágicos ?

23. Que alterações macro e microscópicas podem ser verificadas em um rim

infartado ?

24. Quais fatores condicionam o desenvolvimento de um infarto ?

25. Defina choque e cite sua etiologia.

26. Como o choque pode ser classificado ? Porquê ?

27. Qual o papel dos mediadores químicos na patogenia do choque séptico ?

28. Qual a conseqüência final das lesões teciduais do choque para um paciente

debilitado ?

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