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ATORES PERIFÉRICOS NA SOCIEDADE CIVIL Redes e centralidades de organizações em São Paulo Adrián Gurza Lavalle Graziela Castello Renata Mirandola Bichir Introdução A existência de heterogeneidade ornou-se aos poucos esclarecimento distintivo dos balanços da literatura sobre a sociedade civil. 1 O esclarecimento, cada vez mais comum no debate dos anos recentes, visa às compreensões demasiadamente estilizadas e normativamente sobrecarregadas de sociedade civil que se alastraram vertiginosamente ao longo dos anos de 1990 no Brasil e pelo mundo afora. 2 Se considerado o pano de fundo contra o qual se projeta o reparo, firmar a heterogeneidade dos atores coletivos englobados na rubrica “sociedade civil” traz consigo conseqüências cognitivas não triviais, pois coloca em xeque o pressuposto de um princípio de unificação simbolicamente com- partilhado por uma miríade de entidades de perfis assaz diversos. Entretanto, a noção de hete- rogeneidade carece de estatuto analítico em si e, na verdade, constitui ponto de partida útil se, e apenas se, animar caracterizações capazes de mostrar e ela- borar analiticamente as formas em que essa hete- rogeneidade se ordena e opera. Assim, filões com- pletos de questões sociologicamente ricas e passíveis de problematização sob pressuposto da heteroge- neidade aguardam tratamento sistemático. Pouco sabemos, por exemplo, das hierarquias internas e da capacidade de ação desiguais das organizações civis, da sua diferenciação funcional e das clivagens políticas e conflitos internos, em suma, do modus operandi da sociedade civil. As lacunas no conhecimento das dinâmicas internas do universo das organizações civis não passaram despercebidas sequer entre aqueles que mais decisivamente contribuíram para alimentar a variante enfática da sociedade civil – para dizê-lo com fórmula cunhada por Sergio Costa. 3 Antes, RBCS Vol. 23 n. o 68 outubro/2008 Artigo recebido em março/2008 Aprovado em setembro/2008

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ATORES PERIFÉRICOS NA SOCIEDADE CIVILRedes e centralidades de organizações em São Paulo

Adrián Gurza LavalleGraziela CastelloRenata Mirandola Bichir

Introdução

A existência de heterogeneidade ornou-se aospoucos esclarecimento distintivo dos balanços daliteratura sobre a sociedade civil.1 O esclarecimento,cada vez mais comum no debate dos anos recentes,visa às compreensões demasiadamente estilizadase normativamente sobrecarregadas de sociedadecivil que se alastraram vertiginosamente ao longodos anos de 1990 no Brasil e pelo mundo afora.2Se considerado o pano de fundo contra o qual seprojeta o reparo, firmar a heterogeneidade dosatores coletivos englobados na rubrica “sociedadecivil” traz consigo conseqüências cognitivas nãotriviais, pois coloca em xeque o pressuposto deum princípio de unificação simbolicamente com-partilhado por uma miríade de entidades de

perfis assaz diversos. Entretanto, a noção de hete-rogeneidade carece de estatuto analítico em si e, naverdade, constitui ponto de partida útil se, e apenasse, animar caracterizações capazes de mostrar e ela-borar analiticamente as formas em que essa hete-rogeneidade se ordena e opera. Assim, filões com-pletos de questões sociologicamente ricas e passíveisde problematização sob pressuposto da heteroge-neidade aguardam tratamento sistemático. Poucosabemos, por exemplo, das hierarquias internas eda capacidade de ação desiguais das organizaçõescivis, da sua diferenciação funcional e das clivagenspolíticas e conflitos internos, em suma, do modusoperandi da sociedade civil.

As lacunas no conhecimento das dinâmicasinternas do universo das organizações civis nãopassaram despercebidas sequer entre aqueles quemais decisivamente contribuíram para alimentar avariante enfática da sociedade civil – para dizê-locom fórmula cunhada por Sergio Costa.3 Antes,

RBCS Vol. 23 n.o 68 outubro/2008

Artigo recebido em março/2008Aprovado em setembro/2008

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seus autores mais lúcidos reagiram, não sem certoestranhamento, contra os excessos simplificadorese maniqueístas dos usos da categoria sociedade ci-vil (Walzer, 1992), bem como assinalaram as ambi-güidades analíticas que a sua própria redefiniçãoconceitual tinha deixado em pé. De modo emble-mático, Andrew Arato (1995), em texto apenas doisanos posterior à sua influente obra publicada comJean Cohen, atentou para os efeitos de escure-cimento da categoria “sociedade civil” sobre a va-riedade de grupos e movimentos por ela engloba-dos. Mais: reconfirmou de modo incisivo aquiloque sua alentada atualização teórica da categoria“sociedade civil” tinha processado e construído demodo profuso, a saber, “a unidade da sociedadecivil só é óbvia quando considerada de uma pers-pectiva normativa” (Arato, 1995, p. 21; ver Cohene Arato, 1992, pp. 395-475). Não raro, tal pers-pectiva normativa foi projetada como diagnósticoda ação coletiva existente em diferentes contextossem mediações analíticas nem re-especificaçõesconceituais sensíveis às exigências da pesquisaempírica.

Este artigo inscreve-se nos esforços da litera-tura dos últimos anos no sentido de avançar simul-taneamente na produção de conhecimento empíri-co acerca dos alcances, dos fatores condicionantese das lógicas que orientam a ação dos diferentestipos de atores da sociedade civil, bem como nadecantação de distinções analíticas capazes de ali-mentar a reflexão no plano da teoria positiva, com-plementando os resultados e a análise apresentadosem Gurza Lavalle, Castello e Bichir (2007). Assume-se que teorias positivas são passíveis de diversosusos normativos e, nesse sentido, não excluem nemsubstituem a teoria normativa, mas informam-nade modo a torná-la menos ingênua e a favorecersua aderência às questões trazidas pela sistematizaçãoe acumulação de conhecimento empírico do mun-do. Hoje na literatura ensejam-se interpretações epesquisas que, em flancos diversos, revelam ele-mentos da ordenação e da operação dos atoresenglobados na categoria sociedade civil sob idéiascomo, entre outras, “projeto político”, “trajetóriasde lideranças”, “desenho institucional” de instân-cias de participação, accountability interna, “repre-sentação presuntiva”, “ecologia associativa” e “re-des de atores sociais”.4 Especificamente, o uso daidéia de “redes” deslocou-se progressivamente deum registro pioneiro de índole metafórica – no

qual se atentava ora para a porosidade e a fluidezdas fronteiras dos movimentos sociais, ora paraestratégias de atuação distintivas de determinadosatores; notadamente das ONGs – para a análise deredes como estratégia de abordagem munidade metodologia e pressupostos analíticos pró-prios. Os resultados aqui apresentados fazem partedesse deslocamento (ver Gurza Lavalle, Castello eBichir, 2004).

As vantagens de se utilizar, strictu senso, umaabordagem relacional para lidar com ação coletivaorganizada são bem conhecidas (Diani e McAdam,2003). Há, todavia, algumas vantagens adicionaisquando a análise de redes é introduzida no terrenodo estudo empírico de organizações civis. Tal comoobservado por Bebbington (2002), em exame dosvieses metodológicos que solapam a construção deconhecimento sobre as ONGs na América Latina,as análises empíricas nesta área não apenas costu-mam privilegiar o próprio ator como unidade deanálise, mas não raro elevam-no ao estatuto de prin-cipal produtor de conhecimento sobre si próprio esobre o campo em que se encontra inserido. Abor-dagens relacionais, como a empregada neste artigo,permitem interpretações estruturais das capacida-des e das ações dos atores, ou seja, não são basea-das na autocompreensão e racionalização de si pró-prios, mas na sua posição (objetivada) dentro deredes de relações que condensam e condicionam alógica e os alcances da sua atuação.

Em trabalho de recente publicação (GurzaLavalle, Castello e Bichir, 2007) foram identificadosempiricamente e examinados, mediante análise deredes, os atores mais centrais no universo das or-ganizações civis paulistanas, ou seja, os grandesprotagonistas com maior capacidade de ação e es-colha na rede. Nestas páginas, focamos a atençãonos atores menos centrais e naqueles marginais oufrancamente periféricos desse universo; por conse-guinte, atores situados em posições desfavoráveis ecujo tratamento na literatura tem sido igualmentesecundário. Exploram-se os resultados de surveyrealizado durantes seis meses de trabalho de campona cidade de São Paulo, no ano de 2002, no qualforam entrevistadas mais de duzentas organizaçõescivis, gerando um banco de dados com mais desetecentos atores diferentes, e milhares de relações.5

Sabemos que o universo das organizações ci-vis paulistanas apresenta uma notável conectivida-de difusa. Ademais, as relações entre seus atores

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são acentuadamente hierarquizadas, e aqueles commaior protagonismo – a saber, organizações popu-lares, articuladoras e ONGs – acumulam vantagensestruturais de modo sistemático (Gurza Lavalle,Castello e Bichir, 2007). Isso gera desigualdadesfortes quanto às capacidades de atuação e escolhados diferentes tipos de organizações civis. Também,foi mostrada a existência de padrões relacionaisdiferenciados entre os atores centrais e o restanteda rede, apontando para uma diferenciação funcio-nal clara. Não cabe aqui descrever tal diferenciaçãonem os principais achados dessa análise acerca dasespecificidades dos três tipos de atores examina-dos. Atenta-se apenas para a ausência de caracteri-zação complementar para os atores menos rele-vantes ou francamente marginais: quais são os atoresperiféricos no universo das organizações civis?Como lidam com sua condição periférica? Ou,melhor: desenvolvem estratégias de ação de modoa compensá-la? Que atores desempenham funçõesde intermediação entre os nichos periféricos e cen-trais da rede? Enfim, qual a diferenciação funcionalentre atores marcados pela limitação de recursosrelacionais e, em princípio – apenas em princípio –, condenados à invisibilidade e incapacidade de fa-zer ouvir sua voz?

Tais perguntas encontram respostas – porvezes, contra-intuitivas – nas páginas que se seguem.Os resultados da análise de redes mostram queassociações comunitárias e associações de bairroguardam as posições mais periféricas, antecedidaspor entidades assistenciais e fóruns, cuja centralida-de é intermediária. Cumpre frisar desde já que adesigualdade posicional ou a presença de organiza-ções relegadas a nichos marginais não decorre daanálise de redes em si, mas constitui achado empí-rico da pesquisa.6 Se os grandes protagonistas douniverso das organizações civis caracterizam-se pelasobreposição de vantagens estruturais, achado in-verso era esperável para as entidades não-centrais,e foi confirmado.

Porém, entidades ocupam posições periféri-cas e intermediárias equivalentes por motivos dis-tintos e no cumprimento de vocações funcionaisdiferentes. Assim, a interpretação integrada dos re-sultados permite avançar para além da mera cons-tatação das hierarquias posicionais, alimentando ela-borações nuançadas do modo de operação dessasentidades. A seção maior deste artigo dedica-se àelaboração de tal interpretação integrada e à extra-

ção de conclusões em relação ao estado atual doconhecimento sobre as organizações civis emquestão. Em traços gerais, cabe apontar que mal-grado sua posição relacional desprivilegiada, asassociações de bairro não permanecem confinadasà microterritorialidade, mas atingem com certa fa-cilidade os locais mais centrais da rede e as opor-tunidades de ação e escolha a eles associados; nadasemelhante ocorre, todavia, com as associações co-munitárias. Enquanto as primeiras beneficiam-se dosrecursos canalizados pelas entidades assistenciais e,a um só tempo, da possibilidade de incidir na defi-nição de prioridades e recursos públicos mediantesuas relações com atores altamente centrais, as as-sociações comunitárias permanecem isoladas e pre-sas a um universo de relações que tende a se esgo-tar nos seus próprios membros. Por sua vez, asorganizações civis intermediárias (fóruns e entida-des assistenciais), quando examinadas do ponto devista dos seus padrões relacionais, permitem esbo-çar os traços de uma divisão do trabalho ou dife-renciação funcional no universo das organizaçõescivis não-centrais, na qual elas desempenham o pa-pel de atores-ponte (denominação aqui preferida emrelação a termos comuns na literatura como brokere gatekeeper).7 A despeito das diferenças entre enti-dades assistenciais e fóruns, ambos os tipos de en-tidades não apenas conectam entidades centrais eperiféricas em mão dupla – sendo que as entidadescentrais inclusive são intermediadas por elas –, comotambém apresentam padrões de relacionamentomarcadamente heterófilos, quer dizer, encontram-se entre os atores que menos investem na constru-ção de vínculos com organizações civis do seumesmo tipo.

Os diversos tipos de atores e o conhecimen-to estabelecido na literatura sobre eles serão abor-dados nas próximas seções e, em seguida, serãotratadas brevemente a estratégia de análise relacio-nal aqui utilizada e a metodologia correspondente.A síntese geral dos resultados em termos de posi-ções periféricas e intermediárias ocupadas pelosdiferentes tipos de organizações civis ocupa a ante-penúltima seção. A interpretação das especificida-des funcionais e das estratégias relacionais dos qua-tro tipos de organizações incorpora a representaçãovisual das redes em sociogramas e a combina coma leitura integrada das medidas de centralidade ecoesão sumarizadas na seção anterior. O artigo en-cerra com breve comentário final.

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Atores periféricos e atores-ponte

O estudo das organizações civis impõe o de-safio de desenvolver caracterizações capazes deorganizar de modo coerente a complexidade e adiversidade inerentes a esses atores. Conforme apre-sentado em Gurza Lavalle, Castello e Bichir (2007),as organizações civis não foram classificadas combase em suas autodefinições, senão conforme cri-térios objetivos de duas ordens: a relação com seusbeneficiários e o perfil das atividades normalmenterealizadas. No primeiro caso, (i) o conjunto dosbeneficiários encarna uma unidade restrita e con-creta ou geral e abstrata (por exemplo, os morado-res do bairro ou os cidadãos, respectivamente), (ii)cujos componentes são indivíduos, organizações eatores coletivos, ou segmentos da população (iii)concebidos como membros ou sócios, como pú-blico alvo, ou como a comunidade. No segundocaso, a cada tipo de associação corresponde (i) umaestratégia de atuação distintiva e (ii) combinaçõesexcludentes de atividades orientadas para a reivin-dicação e a mobilização, para o fornecimento deserviços, para a organização popular, ou para a in-termediação entre o governo e os beneficiários. Oproblema contornado mediante a adoção de parâ-metros formais, é claro, não diz respeito à criaçãode novas denominações ou classificações imagina-tivas, mas à definição e à introdução de critérios de

objetivação capazes de equacionar as dificuldadesinerentes à autoclassificação.

Os atores que constam do Quadro 1 foramqualificados como periféricos ou ponte em termosrelacionais a partir dos resultados da pesquisa, evi-tando intencionalmente a qualificação dedutiva ouapriorística da sua posição no universo das organi-zações civis. Nesse quadro é possível apreciar acomposição da amostra, bem como a sistematiza-ção da tipologia no caso do atores analisados e al-guns exemplos das organizações civis paulistanasclassificadas em cada tipo. Os critérios adotadospara colher a amostra serão brevemente analisadosem seção específica mais adiante. As associaçõesde bairro e as entidades assistenciais apresentammaior peso na amostra dos tipos analisados, cons-tituindo 17% em cada caso. Por sua vez, fóruns eassociações comunitárias registram menos da me-tade do peso das primeiras. A categoria “DemaisAtores” não é residual: de um lado, adiciona osresultados, separadamente calculados, de três tiposde organizações civis definidos empiricamente con-forme os mesmos critérios, e cujas posições na redesão, em contraponto, as mais centrais; de outro, osresultados agregados de organizações populares,ONGs e articuladoras – os três grandes tipos deorganizações civis protagonistas na rede – funcio-narão como categoria de referência na ordenaçãode parte dos dados a serem examinados.8

Quadro 1Tipologia dos Atores Periféricos e Ponte

Categoria

Associaçõesde Bairro

AssociaçõesComunitárias

EntidadesAssistenciais

Fóruns

Demaisatores

Freqüência

34

17

34

13

%

17

8

17

6

Beneficiários

(i) Unidade Real(ii) Indivíduos(iii) Membros ou Comuni-dade

(i) Unidade Real(ii) Indivíduos(iii) Membros

(i) Unidade Real ou Abstrata(ii) Indivíduos(iii) Público Alvo

(i) Unidade Real ou Abstrata(ii) Organizações e AtoresColetivos(iii) Membros ou Comunidade

Atividades

(i) Projeção de demandas locais e aju-da mútua(ii) Organização popular; reivindicação/mobilização; fornecimento de serviços

(i) Ajuda mútua(ii) Fornecimento de serviços

(i) Prestar assistência definida por vul-nerabilidades(ii) Fornecimento de serviços

i) Tematizar publicamente problemas;articular atores e iniciativas sociais.ii) Reivindicação/ mobilização; inter-mediação

Exemplos

Sociedades de Amigos de Vila Sa-brina; Sociedade Amigos de Vila Al-pinas; União dos Moradores do Par-que Bristol

Clubes de Mães Coração do Amor;Espaço Cultural São Mateus; Assis-tência de Deficientes Físicos deSapopemba

Lar Altair Martins; Centro SocialLeão XIII; Serviço Social Perseve-rança

Fórum Municipal de Saúde, FórumDCA; Fórum Lixo e Cidadania daCd. De SP

Articuladoras, ONGs, OrganizaçõesPopulares

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Por fim, e visto que toda tipologia leva à rea-grupação de resultados em subconjuntos, caberiaperguntar se eventuais agrupações seguindo outroscritérios autorizariam leituras como aquela que seráapresentada nestas páginas. A redução de casos(organizações civis) a clusters (tipologia) costumaobedecer a dois critérios básicos: ou há boas ra-zões analíticas para optar por uma forma específi-ca de agrupação ou análises empíricas mediantetécnicas de cluster mostram padrões empíricos con-sistentes – independentemente de eles correspon-derem ou não a expectativas analíticas claramenteformuladas. Neste caso, a agrupação responde aambos os critérios. De um lado, a tipologia de orga-nizações civis constitui uma síntese do conhecimentoacumulado sobre esse universo de atores e agiliza ainterlocução com atores e autores interessados nasquestões aqui analisadas; de outro, testes empíri-cos não revelaram outras formas de agrupaçãoconsistentes.

A caracterização dos atores na literatura

Diversos elementos têm animado o reconhe-cimento da heterogeneidade da sociedade civil.Primeiro, as assimilações locais do debate teóricointernacional acabaram por ceder passo à multipli-cação de anomalias e insuficiências em contextosnacionais como na Índia (Tandon e Mohanty, 2003;Oommen, 2004) ou em diversos países da Améri-ca Latina (Dagnino, Olvera e Panfichi, 2006; Olve-ra, 2003; Avritzer, 2004). No Brasil, a intensa ino-vação em experiências participativas para o desenhoe a supervisão de políticas públicas exigiu uma re-formulação dos termos do debate no sentido dese pensar a relação entre o Estado e a chamadasociedade civil (por exemplo, Perissinoto, 2004;Dagnino, 2002; Texeira, 2002; Gurza Lavalle, Acha-rya e Houtzager, 2005). Segundo, outras agendasde pesquisa, por certo menos influentes, debruça-ram-se sobre o estudo das organizações civis emregistro teoricamente menos sobredeterminado.Algumas das reconstruções mais ricas e nuançadasda difícil sedimentação de identidades no interior douniverso das organizações civis foram elaboradassob a agenda de pesquisa do terceiro setor (porexemplo, Landim, 1998; Fernandes, 2002). Isso semesquecer a produção de conhecimento e documen-tação sobre as transformações internas das organiza-

ções civis elaboradas pelos próprios atores sociais,céticos perante um mundo acadêmico que, nos anosde 1980, cultivou exíguo interesse pelos fenôme-nos de invenção e renovação organizacional emer-gentes no plano da ação coletiva institucionalizada– notadamente as ONGs (Landim, 2002).

O trabalho desenvolvido nas últimas décadaspor essas e outras perspectivas para apreender aprofusão de “projetos parcelares” e “microdiscur-sos” (Carvalho, 1998, p. 85), o pragmatismo e aspráticas diversas da miríade de entidades que com-põem o universo das organizações civis constitui oconhecimento disponível para caracterizar os dife-rentes tipos de organizações aqui estudadas. Nessesentido, a caracterização dos tipos de organizaçõescivis, nos parágrafos que se seguem, espelha commaior ou menor fidelidade o estado da literatura.

As associações de bairro exercem atividades rela-cionadas com demandas urbanas específicas con-forme um princípio de identidade territorial e, nes-se sentido, trabalham em e para uma comunidade.Na literatura dos anos de 1980, elas foram pensa-das no registro dos movimentos sociais, especifi-camente como movimentos de bairro (Singer eBrant, 1980, pp. 83-107), alinhados dentro do cam-po dos movimentos populares (Fernandes, 2002,pp. 45-46), isto é, distintos, pela sua origem socio-econômica, das associações de amigos de bairroou das associações de moradores de classes médias,que também passaram por processos de ampliaçãoe politização das suas atividades no contexto daslutas pela transição (Boschi, 1987; Singer e Brant,1980, pp. 85-93). Autoconstrução, conquista decreches e postos de saúde, ocupação e legalizaçãode terrenos, ampliação e aprimoramento do trans-porte público, bem como um leque de reivindica-ções de infra-estrutura urbana básica, definiram econtinuam a definir, embora de modo menos dra-mático, a pauta de reivindicações das associaçõesde bairro; pauta impulsionada mediante a mobili-zação e a pressão da população sobre as instânciasgovernamentais de tomada de decisões. Essas as-sociações perderam centralidade no debate acadê-mico dos anos de 1990, pois suas reivindicaçõeseminentemente materiais ou distributivas, sua baixavisibilidade e suas capacidades mínimas para dis-putar a agenda pública tornaram-nas pouco pala-táveis às exigências normativas da perspectiva da“nova sociedade civil” que definiu o teor do deba-te nos anos de 1990 (Gurza Lavalle, 2003).

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Por motivos semelhantes, as associações co-munitárias tampouco foram objeto de análise daperspectiva da nova sociedade civil. Mais: pelo seucaráter extremamente diverso e localizado, sequerconstaram entre os atores privilegiados pelos estu-dos de caso da literatura sobre movimentos sociais.Há, é claro, uma exceção notável na literatura, asaber, as comunidades eclesiais de bases (CEBs);no entanto, o retraimento da intervenção social daIgreja a partir do final dos anos de 1980 trouxeconsigo uma perda acentuada do protagonismo dasCEBs (Doimo, 1995). Ainda hoje, parte das asso-ciações comunitárias – notadamente, Centros daJuventude (CJs), grupos de terceira idade ou gru-pos culturais – mantém uma conexão direta ou in-direta com o trabalho paroquial e pastoral da Igre-ja Católica (Doimo, 2004). Em termos muito gerais,as associações comunitárias respondem ao velhoconceito de sociedades mutualistas ou de ajudamútua (Fernandes, 2002). Nesse sentido, seus mem-bros são simultaneamente os beneficiários e os agen-tes do trabalho desenvolvido pela entidade; elesconstituem uma comunidade ou encontram-se in-seridos numa comunidade maior, cuja lógica podeser ou não de índole territorial. Embora de modopouco freqüente, é possível encontrar caracteriza-ções mais específicas na literatura para além domutualismo: microterritorialidade ou microlocali-zação associadas a espaços comunicativos primários,pouca visibilidade e trabalho voluntário (Carvalho,1998, pp. 86-87).

Bastante conhecidas e até há pouco tempoincontroversas, as entidades assistenciais exercemfundamentalmente trabalhos de prestação de servi-ços e assistência direta ao público para o qual traba-lham. Suas feições distintivas são pacíficas na litera-tura, em que costumam aparecer sob combinaçõescom ênfases diferenciadas de quatro elementos re-correntes: ethos cristão, prestação de serviços de ín-dole assistencial, atendimento dos segmentos maisvulneráveis da população e financiamento provin-do do setor privado – não raro mediante a figurada fundação empresarial (Carvalho, 1998, p. 87;Landim, 2002). Herdeiras da tradição filantrópicacentenária para lidar com a questão social, as enti-dades de assistência estiveram na origem das pri-meiras fórmulas de previdência pública adotadasno Brasil e na América Latina (Fleury, 1994) e tam-bém definiram parte importante do repertório deopções associativas disponíveis no século XIX e

primeiro terço do XX, ordenado pela força de gra-vitação da igreja católica (Avritzer, 1997). O perfilmais tradicional das entidades filantrópicas, embo-ra caracterizado em parte nada desprezível da lite-ratura sob a suspeição de um halo pré-moderno econservador, é consensual. Contudo, a história re-cente do Brasil teria animado deslocamentos polê-micos no sentido de uma espécie de “onguização”das entidades assistenciais, levando-as a abandonarprogressivamente sua tônica caritativa e apolíticapara assumir uma maior politização e publicitaçãode seus trabalhos e demandas, bem como à ado-ção de discursos cifrados no registro dos direitos eda cidadania (Landim, 2002, pp. 32-36; Landim,1998; Coelho, 2000, p. 64; Paz, 2005, pp. 18-19).

Os fóruns são instâncias de coordenação daação e de agregação de interesses de organizaçõesda sociedade civil agrupadas por afinidades temá-ticas ou, de modo mais preciso, funcionam comoespaços de encontro e coordenação periódica quepermitem adensar agendas e pautar a atuação doatores que neles participam. Duas considerações per-mitem classificar os fóruns como organizações ci-vis: primeiro, em que pese seu caráter periódico,possuem um grau de institucionalização suficientepara impedir que seu funcionamento se torneesporádico; segundo, constituem uma peça impor-tante da construção institucional das próprias orga-nizações civis – peça especialmente adequada parao desenvolvimento e a sustentação do trabalho emredes temáticas. Dada sua orientação temática, fó-runs desempenham papel relevante na definição ena coordenação de prioridades para os chamadosconselheiros da sociedade civil que atuam nos con-selhos gestores de políticas que, por sua vez, cons-tituem de longe o arranjo institucional deliberativoprivilegiado na literatura – junto com o orçamentoparticipativo. Contudo, salvo raras exceções (porexemplo, Reis e Freire, 2002) os fóruns não têmsido objeto de estudo com dignidade própria.

Análise relacional e survey

Para analisar os padrões de relacionamentodas organizações civis acima apresentadas, utilizamosa metodologia de análise de redes sociais, seguindoa discussão apresentada em maior detalhe em ou-tros trabalhos (Gurza Lavalle, Castello e Bichir, 2007,e 2008). Aqui, serão apenas explicitados alguns ele-

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mentos da análise relacional e do survey indispensá-veis para o acompanhamento da análise e da argu-mentação desenvolvidas nas próximas seções.

A análise de redes sociais assume como pre-missa a importância dos laços sociais como ele-mentos que estruturam a vida social, Nesse sentido,a unidade de análise utilizada são as relações esta-belecidas entre pessoas e entre entidades, e não osindivíduos ou organizações em si e sequer seus atri-butos. Como estratégia analítica, situa-se em planocognitivo intermediário, trazendo consigo mudan-ças de perspectiva tanto na compreensão do planomacro (isto é, sociedade/sociedade civil) como domicro (isto é indivíduos/organizações civis) (Emir-bayer, 1997). É importante destacar que, a rigor, aanálise de redes sociais não constitui uma teoria etampouco um conjunto de técnicas estatísticas com-plexas, mas uma estratégia analítica passível de uti-lização à luz de diferentes perspectivas conceituaise teóricas.

Em termos gerais, um ator periférico no interiorde uma determinada rede é aquele que: conta commenor densidade de relacionamentos, sendo quemuitas dessas relações são locais e homofílicas –ou seja, tendem a ocorrer entre atores de caracte-rísticas similares –; dispõe de baixa capacidade demobilização e coordenação da ação de outras or-ganizações civis; apresenta relevância marginal nasestratégias relacionais de outros atores e, não raro,guarda relações muito assimétricas com as organi-zações civis mais centrais, das quais depende parater seus interesses representados e suas demandasescaladas a instâncias de deliberação e/ou decisãosupralocais. Em suma, os atores periféricos no uni-verso das organizações civis ocupam nichos espe-cíficos, tendem a desenvolver uma atuação bastan-te localizada e são fortemente dependentes dasrelações que estabelecem com os demais atores –especialmente os mais centrais –, objetivando al-cançar outros espaços na rede para ter acesso a in-formações, fontes de financiamento, incidência natomada de decisões públicas etc. Assim como ocor-re no caso das organizações com papel protagôni-co, os modos de inserção das organizações civisperiféricas em um universo maior de relações mol-dam suas possibilidades de ação, pois os padrõesde vinculação estabelecidos por cada tipo de orga-nização civil com os demais e entre si estruturamcomplexas redes que, simultaneamente, abrem pos-sibilidades de interação e constrangem alternativas.

A caracterização do perfil geral dos tipos deatores periféricos foi obtida por meio da utilizaçãode medidas de centralidade e coesão,9 seguindo osmesmos procedimentos empregados no entendi-mento dos padrões de relacionamento das organi-zações civis centrais (Gurza Lavalle, Castello e Bi-chir, 2007). Grosso modo, as medidas de centralidade foramutilizadas para destacar a posição relativa de cadaum dos atores considerados, identificando formasde hierarquização relacional das organizações civisde modo a examinar entidades não-centrais ou semprotagonismo no universo das organizações civiscomo um todo. Na análise, procurou-se identificaras organizações da sociedade civil que funcionamcomo referências no conjunto das organizações(número de vínculos recebidos – indegree) e aquelas ca-racterizadas por citar muitos parceiros (número devínculos enviados – outdegree);10 as capacidades de inter-mediação (betweeness) e articulação de diferentes sub-redes; o grau de proximidade entre tipos de organi-zações civis (closenness) e a assimetria das relaçõesexistentes entre eles, aferindo a dependência pro-duzida por certas entidades sobre outras (power).Procurou-se diferenciar, ainda, as organizações quelançam mais vínculos daquelas que são preponde-rantemente receptoras de vínculos, apresentandodiferentes tipos de influência (influence); bem como,destacar as organizações com maior acesso à infor-mação (information) no interior da rede, isto é, ao con-trole de certos fluxos preferenciais entre o conjun-to de relações disponíveis. Além dessas medidas decentralidade, foram calculadas algumas medidas decoesão, visando a incorporar à análise as distânciasexistentes entre cada um dos atores (geodesic distan-ce), o número de atores que podem ser alcançadosno interior da rede (reachability) e a disponibilidadede caminhos curtos para alcançá-los (count geodesic).

Considerando a complexidade estatística dealgumas das medidas utilizadas e seu valor compa-rativo, optou-se por apresentar resultados simplifi-cados, reportando apenas a hierarquia observadaentre as organizações civis quanto à sua centralida-de. As denominações técnicas das medidas tam-bém foram simplificadas. Além disso, para facilitara compreensão dos resultados, são incorporadasas representações gráficas (sociogramas) das redesinternas de cada tipo de organização civil aqui abor-dado. É importante ressaltar que os padrões estru-turais de inserção dos diferentes tipos de organiza-ções civis na rede foram construídos após a análise

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integrada de todas as medidas geradas, e não combase em medidas isoladas – as quais carecem desentido se consideradas de modo independente.Cumpre advertir que os valores apresentados sãorelativos, ou seja, seu parâmetro é comparativo ereside nos diferentes valores internos das redes ana-lisadas, não correspondendo a quaisquer valoresabsolutos ou externos.

A análise de redes aqui apresentada baseia-seem informações obtidas por meio de entrevistasrealizadas com 202 organizações civis, em pesquisarealizada no município de São Paulo em 2002.11

Ao todo, as entrevistas geraram um total de 741atores diferentes citados e 1.293 relações diretas le-vantadas. Como cada entidade entrevistada pôdecitar até cinco relações em ordem de importânciaou as mais próximas para diferentes tipos de enti-dades, as redes examinadas nestas páginas repre-sentam a malha mais densa de relações existentesentre as organizações civis paulistanas pesquisadas,e não a totalidade de vínculos existentes. O universodas entidades pesquisadas não foi definido a priori,mas empiricamente como base nas cadeias de re-ferências fornecidas a partir de dezesseis pontos deentrada pelos atores entrevistados; referências co-lhidas em campo por meio da técnica bola de neve(snowball) – bastante utilizada em análises de redessociais (Scott, 1992).

Padrões de relacionamentodas organizações civis periféricas

Esta seção apresenta de modo sintético osprincipais resultados encontrados na análise dos pa-drões de relações entre as diversas organizações ci-vis. As relações foram examinadas a partir de trêsângulos ou recortes analíticos: i) identificação dopapel desempenhado pelos tipos de entidades narede como um todo ou no conjunto das organiza-ções civis; ii) análise das formas de relacionamentoque as organizações civis de cada tipo estabelecementre si; iii) detecção de vínculos preferenciais entreos diferentes tipos de organizações civis. Cada re-corte apresenta contribuições específicas para oentendimento das dinâmicas de funcionamento dasorganizações civis. A descrição geral aqui apresen-tada é seguida, na próxima seção, por interpreta-ção do significado das posições estruturais de cadatipo de organização civil.

Com base em análises anteriores (Gurza La-valle, Castello e Bichir, 2007), sabemos que o uni-verso das organizações civis paulistanas é bastanteestratificado, isto é, que as organizações estabele-cem entre si relações hierárquicas, sujeitas a umadiferenciação funcional clara, sendo que organiza-ções populares, articuladoras e ONGs desempe-nham papéis de protagonistas. Cabe agora analisarcomo as organizações civis periféricas e intermediá-rias inserem-se nesse universo.

Os resultados são sintetizados em três tabelas,uma para cada recorte analítico. Nas duas primei-ras, os dados são porcentagens que exprimem asposições relativas de cada tipo de entidade em cadauma das medidas.12 As porcentagens foram calcu-ladas em relação aos resultados dos três tipos maiscentrais de entidades – organizações populares,ONGs e articuladoras –, agrupadas na categoria“demais autores”. A média desses três tipos serve,assim, como parâmetro de comparação.13 Valorespositivos indicam que, nessa medida, a entidade emquestão tem um resultado melhor do que a médiadas entidades mais centrais. Valores negativos, pelocontrário, indicam resultados inferiores aos apre-sentados pelas organizações civis centrais. Os valo-res não possuem significado em si, mas permitemexaminar as posições relativas das entidades estu-dadas. A maior parte dos dados tem valores ne-gativos, isto é, os resultados apontam quão pioressão os resultados desses atores. A lógica dessas ta-belas é simples, mas seu significado, numa primeiraleitura, pode parecer contra-intuitivo: valores nega-tivos elevados são piores que valores negativos bai-xos, pois indicam que uma entidade é mais periféri-ca. Na terceira tabela trata-se de um ranking simples,e os números exprimem apenas uma relação deordem para cada ator nas medidas calculadas.Como são seis os tipos de atores analisados, oranking de cada medida posiciona o respectivo atorentre um e seis.

Na Tabela 1 nota-se que todas as entidadesaqui consideradas apresentam, via de regra, posi-ções relativas inferiores às das organizações civiscentrais em termos de centralidade e, quase sem-pre, de coesão. Por isso a caracterização de “atoresperiféricos”, peculiarmente no caso das associaçõescomunitárias, cujas posições são as piores em qua-se todas as medidas contempladas. Na “periferia”do campo societário estão localizadas não apenasas associações comunitárias, mas também as asso-

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ciações de bairro devido à sua relativa irrelevânciapara os outros atores – conforme mostrado naTabela 3. Ambos os tipos de entidades mostram-se fortemente dependentes dos vínculos estabeleci-dos com atores mais centrais. Em um segundo pla-

no há entidades com posições intermediárias: osfóruns e as entidades assistenciais, que também pos-suem baixa centralidade, mas se destacam por se-rem procuradas e, conforme será visto, por atua-rem como atores-ponte.

O segundo recorte analítico foca as relaçõesinternas entre as organizações civis de cada tipo. ATabela 2 apresenta os dados referentes ao modocomo os diversos atores estabelecem relações decentralidade, intermediação, dependência etc., em suasredes internas; quer dizer, as medidas foram calcula-das para sub-redes definidas por tipo de organizaçãocivil, retirando-se as conexões com os outros tiposde entidade. De maneira geral, os resultados indicamque os tipos de organizações com redes internasmenos densas e mais fragmentadas coincidem comaquelas que tendem a ocupar posições periféricas na

rede como um todo. Esse resultado parece apontarpara uma estreita relação entre os modos de organi-zação interna dos diferentes tipos de entidades –padrões de relação, grau de coesão e hierarquizaçãointerna – e os papéis por eles desempenhados nouniverso das organizações civis. No caso das entida-des periféricas, cabe destacar a assimetria nas rela-ções internas às redes das associações comunitárias,bem como a eficiência no contato entre elas (muitoscaminhos curtos disponíveis); no caso dos atores-ponte, cabe assinalar a grande influência exercida poralgumas entidades assistenciais em suas redes internas.

Tabela 1Centralidade e Coesão da Rede Segundo Tipos de Organizações Civis*

Associações deBairroAssociaçõesComunitáriasEntidadesAssistenciaisFórunsDemais Atoresc

Vínc

ulos

Env

iado

sa

Vínc

ulos

Rec

ebid

osb

Inte

rmed

iaçã

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Prox

imid

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os R

efe-

ridos

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Prox

imid

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ueR

efer

emb

Info

rmaç

ãoa

Pode

ra

Influ

ênci

aa

Dist

ânci

a méd

iaen

tre at

ores

Nº d

e Cam

inho

s mai

scu

rtosa

Ator

es A

lcan

çáve

isb

Centralidade (%) Coesão (%)

-23,4

-30,6

-39,5-29,4**

-58,5

-66,0

-55,2-47,1**

-35,6

-72,2

-63,8-67,3**

-12,9

-19,5

- 2,7-10,2**

-2,7

-7,1

-7,0-0,6**

-18,6

-22,4

- 9,6-16,9**

-39,8

49,3

105,6-11,2**

-58,7

-99,3

-34,7-75,8**

-14,4

-20,4

- 7,6-14,3**

- 4,7

-18,3

- 8,0-11,2**

- 6,2

-31,0

-10,9-19,5**

* Para o cálculo das medidas foi considerada a direção das relações.a Médias calculadas apenas para as entidades entrevistadas (n=202).b Médias calculadas para toda amostra (n=829).c Valor de Referência: média de médias, calculada a partir da adição das medidas para três tipos de organizações civis –organizações populares, articuladoras e ONGs.Fonte: Projeto de pesquisa “Rights, representation and the poor: comparing large developing countries – Brazil, India,Mexico”.

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O terceiro recorte ilumina os vínculos prefe-renciais das organizações civis ao atentar para asrelações estabelecidas não entre as entidades na redecomo um todo, nem nas redes internas, mas entretipos diferentes de organizações. A Tabela 3 suma-riza a lógica dos vínculos preferenciais na forma deum ranking simples, apresentando, em primeiro lu-gar, o número de vínculos novos que surgiram nasredes para cada combinação em pares por tiposde organizações civis – sem considerar os vínculosque existiam previamente nas redes internas14 –; em segundo lugar, o incremento na capacidade deintermediação oriunda das relações entre dois ti-pos de entidades, ou seja, os ganhos de intermediação –também excluindo as possibilidades de interme-diação próprias à rede interna de cada tipo deorganização civil; e, em terceiro lugar, o aproveita-

mento real dos vínculos que potencialmente pode-riam existir entre dois tipos de organizações civis(integração).

A grandes traços, observou-se que as orga-nizações civis mais centrais são procuradas comovínculos preferenciais, especialmente por parte deentidades de base ou periféricas, as quais privile-giam claramente atores centrais na construção e namanutenção de relações. Desse modo, as entidadesperiféricas quase não contemplam nas suas estra-tégias relacionais outras organizações civis em po-sições semelhantes; antes, preferem vincular-se àsentidades centrais. Esse é o caso, por exemplo, dasassociações de bairro, que mantêm relações privi-legiadas com as articuladoras, ou das associaçõescomunitárias, que mantêm preferencialmente rela-ções com organizações populares.

Tabela 2Centralidade e Coesão das Redes Internas de Cada Tipos de Organização Civil*

Associações deBairro (n=195)AssociaçõesComunitárias (n=64)EntidadesAssistenciais (n=70)Fóruns (n=115)Demais Atoresc (n=297)

No de

Vín

culo

s

Inte

rmed

iaçã

o

Prox

imid

ade

Info

rmaç

ão

Pode

r

Influ

ênci

a

Dist

ânci

a méd

iaen

tre at

ores

Nº d

e Cam

inho

s mai

scu

rtos

N o d

e Ato

res

Alca

nçáv

eis

Centralidade (%) Coesão (%)

-72,2

-67,2

-73,2-73,9**

-72,5

-96,4

-98,4-96,4**

-83,3

-54,6

-58,5-74,4**

-17,1

-30,1

-29,4-44,8**

0,9

3,0

2,5-0,1**

2,8

- 63,5

-235,7- 44,6

**

6,5

-76,1

-72,3-59,6**

-20,3

-25,7

-23,5-25,7**

-64,9

-92,8

-92,8-89,3**

* Para o cálculo das medidas foi considerada a direção das relações.a Para o cálculo das médias foram consideradas todas as entidades presentes na amostra. Contudo, o tamanho das redesvaria de acordo com o tipo de organização civil analisado.b Valor de referência: média de médias, calculada a partir da adição das medidas para três tipos diferentes de organizaçõescivis – organizações populares, articuladoras, ONGs.Fonte: Projeto de pesquisa “Rights, representation and the poor: comparing large developing country democracies –Brazil, India, Mexico”.

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ATORES PERIFÉRICOS NA SOCIEDADE CIVIL 83

* Em todos os casos considerou-se a direção das relações.a Ranking simples dos ganhos de interseção na rede estabelecida entre tipos de organizações civis.Fonte: Projeto de pesquisa “Rights, representation and the poor: comparing large developing country democracies – Brazil, India,Mexico”.

Tabela 3Redes de Vínculos Preferenciais*

Fóruns

1

453

441

35

ONGs

2

414

214

233

52

Tipologiade entidades

Fóruns

EntidadesAssistenciais

Associaçõesde Bairro

AssociaçõesComunitárias

Ganhos daIntersecção

Vínculos novosGanhos de In-termediaçãoIntegraçãoVínculos novosGanhos de In-termediaçãoIntegraçãoVínculos novosGanhos de In-termediaçãoIntegraçãoVínculos novosGanhos de In-termediaçãoIntegração

OrganizaçõesPopulares

4

136

126

665

11

Articula-doras

3

222

233

116

23

EntidadesAssistenciais

1

34

2

324

64

Assistênciade Bairro

5

553

54

2

46

AssistênciaComunitária

6

665

665

55

Organizações com as quais se estabelecem as relaçõesa

Os papéis dos atores periféricos e ponte

Embora posições periféricas e, em menormedida, intermediárias, estejam associadas a deter-minadas desvantagens estruturais, uma organizaçãocivil pode ocupá-las por diversos motivos, isto é,dois atores podem apresentar feições estruturais se-melhantes, mas com significados muito diferentes.Os motivos são iluminados pela posição relativade um ator na rede e não são passíveis de interpreta-ção de forma isolada a partir de uma única medida,sendo necessária a compreensão integrada dos trêsângulos analíticos expostos na seção anterior. Oexame integrado dos resultados desses três recortes,informado pelos sociogramas das redes internasde cada tipo de organização civil, permitirá mostraras especificidades funcionais dos atores estudados.

As associações de bairro

A microterritorialidade das associações debairro ajuda a entender sua condição periférica, pois

elas conjugam a um só tempo ativismo e presençalocais com posições marginais na rede como umtodo. As medidas que dependem da sua atuaçãona construção de vínculos registram resultados supe-riores aos das medidas derivadas das estratégias deoutros tipos de organizações civis à procura de víncu-los com elas. Assim, as associações de bairro enviammais vínculos do que recebem, apresentam relaçõesmarcadamente simétricas15 e são, na rede como umtodo (inclusive entidades centrais), os atores commaior número de caminhos mais curtos e mais pró-ximos das entidades com as quais mantêm víncu-los – enquanto os atores que cultivam relações comelas são, em contraste, distantes (Tabela 1).

A análise das suas conexões internas torna maisclaras as implicações do caráter territorial das asso-ciações de bairro. A julgar pelas medidas (Tabela2), a estratégia de construir relações com seus paresé de relevância moderada, embora seja mais im-portante para as associações em questão do quepara os fóruns e as entidades assistenciais. A espe-cificidade, neste caso, reside no fato de elas se

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conectarem uma a uma, formando uma rede hori-zontal que “passo a passo” acaba por alcançar di-ferentes subconjuntos de atores. O Sociograma 1mostra apenas a estrutura da rede interna das asso-ciações de bairro e permite perceber facilmente alinearidade ou o modo horizontal de extensão darede. As associações destacadas com os quadra-dos, por exemplo, conseguem alcançar o extremooposto da rede percorrendo um longo caminho.16

A lógica interna das sub-redes está pautada pelacontigüidade territorial. O Sociograma 217 mostra,por exemplo, que entidades da Zona Leste de SãoPaulo alcançam nicho de entidades sediadas na ZonaSul através das relações que estabelecem com en-tidades da Zona Norte. Um padrão relacional(fraco) animado por contigüidade territorial facili-ta a fragmentação, pois cada associação localizadaao longo da “linha” é importante – e boa partedelas indispensável – para a conexão com outrossegmentos da rede. De fato, as relações entre as-sociações de bairro agrupam-se em seis compo-nentes. Por exemplo, todas as entidades de He-liópolis formam um componente à parte, semrelações com as demais entidades da zona Sul. Há,cumpre notar, um número considerável de asso-ciações de bairro isoladas (64%) ou sem quais-quer vínculos diretos com outras associações debairro, corroborando a correlação entre a condi-ção central de um tipo de entidade e a construçãode vínculos interpares ou com entidades do mes-mo tipo.18

Mais duas feições do perfil das associaçõesde bairro merecem destaque. O ativismo realizadoem locais periféricos da rede vem associado a umacapacidade de intermediação razoável, bem comoa uma capacidade notável de alcançar outros ato-res na rede (Tabela 1). Isso não constitui propria-mente paradoxo; todavia, em se tratando de asso-ciações que não constroem muitos vínculos, chamaa atenção sua capacidade de alcançar outras orga-nizações e de efetuar intermediação a despeito dasua condição periférica. Tal intermediação e alcan-ce obedecem ao padrão de vínculos preferenciaisencontrado: associações de bairro privilegiam cla-ramente as articuladoras, seguidas em patamar in-ferior pelas entidades assistenciais (Tabela 3); porsua vez, e malgrado essas associações não sejamvínculo preferencial de nenhum tipo de organiza-ção civil, as articuladoras mantêm certa reciproci-

dade com as associações de bairro, sendo, entre osatores mais centrais, aqueles que mais cultivam rela-ções com associações (Gurza Lavalle, Castello eBichir, 2007). A relação privilegiada com as articu-ladoras – acompanhada de certa reciprocidade – écontra-intuitiva, na medida em que pareceria razoá-vel esperar que tais vínculos preferenciais aconte-cessem com as organizações populares, a maioriadas quais trabalha de longa data com temas urbanoslançando mão de expedientes de mobilização epressão. Mais: as organizações populares represen-tam o repertório de vínculos menos importante paraas associações de bairro e vice-versa, e não há outrocaso de relação entre dois tipos de organizaçõescivis em que os piores vínculos possíveis sejam re-ciprocamente idênticos.19

Microcentralidade territorial ativa,20 com im-portância mínima como vinculo preferencial paraoutros atores, sumariza parcialmente o papel desem-penhado pelas associações de bairro da sua condi-ção periférica. Dois aspectos espantam no perfildas associações de bairro. Primeiro, sua origem lo-cal e a orientação do seu trabalho para beneficiáriosde camadas populares consubstanciam-se, também,nos seus vínculos preferenciais com entidades as-sistenciais. Entretanto, sua capacidade de interme-diação, bem como a possibilidade de alcançar ni-chos distantes da rede decorrem das suas relaçõescom atores altamente centrais como as articulado-ras. Em outras palavras, a posição periférica dasassociações de bairro é compensada por um pa-drão relacional misto, em que comparecem, de umlado, atores-ponte – entidades assistenciais –, pre-sumivelmente no acesso a determinados recursosprivados para seus beneficiários, e, de outro, atorescentrais – articuladoras – notabilizados por suaincidência na formulação de políticas públicas,provavelmente na tentativa de disputar prioridadese recursos públicos. Segundo, o fato de atorestradicionais próprios de camadas mal-aquinhoadasda população, como as associações de bairro,manterem relações privilegiadas não com as orga-nizações populares, mas com um tipo de organiza-ção civil de recente aparição – as articuladoras,criadas fundamentalmente por ONGs –, apontatanto para transformações relevantes ocorridas nosúltimos anos no plano da ação coletiva dessas ca-madas como para a plasticidade da própria açãocoletiva.

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ATORES PERIFÉRICOS NA SOCIEDADE CIVIL 85

* Não estão explicitadas no sociograma as entidades que não mantêm relações com outras organizações de mesmo tipo(isoladas). Encontramos 125 associações de bairro nesta situação, ou seja, 64% do total de associações de bairro analisadas.

Sociograma 1Estrutura da Rede Interna das Associações de Bairro

Sociograma 2Rede Interna Associações de Bairro*

avalmulher mpmzn sarsiHeliópolis Sacomã

amai

Sapobembaarcavc

savema

Z.Leste

asunisapo

savdarli

sabvindust

SãoLucas

umvasa

sajtulipas

avalheliop

sabsaomate

sajasapo

sasapopem

sajacol

savalp

sajagrim

sava

sacresjau

cdm

avidanova

asmjlucel

sabajideal

CidadeAdemar/S. Amaro

amjideal

samorheliunas

asscmheli

Sacomãumpbrijssa

acomucelii

acomnovama

cslartreze

sajauverde

amvnasce

pcleitonzl

E.M/ZL

sajindep

sajacana

sajbrasil

amem

saemabelc

sovisabri

cecomvilacrambrcavlmi savclamor

amomvirgem

sapsamsfra apedrasped

abastatereumocjulia

amvmissio

abcocaia

Grajaúabjsaobern

abjelianaunimorsete

abmontever

amtiete

soravi

sapeduchav

Vila Maria/Zona Norte avnotiete

acachoeir

avnovacurusajapao

cencidnova

avnosjoao

achabelavi

acingapsjoamvpedrei

ampnovomun

samvarpqfo

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REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 23 No. 6886

As associações comunitárias

As associações comunitárias são amostra em-blemática da heterogeneidade do universo das or-ganizações civis. De dimensões modestas, inseridasem nichos muito localizados e normalmente orien-tadas para a ajuda mútua, tendem a desenvolveratividades restritas e, não raro, exclusivas ao grupode indivíduos participantes da entidade. Semelhan-te perfil torna-se mais nítido mediante a análise deredes, pois o traço distintivo das entidades em ques-tão é a ausência de relações. De fato, apresentam ospiores resultados em praticamente todas as medi-das, excetuando a presença de “caminhos mais cur-tos” para alcançar outras entidades e a disposiçãode relações algo assimétricas (Tabela 1). Ambas asexceções acusam os efeitos do número particu-larmente limitado de vínculos à disposição das as-sociações comunitárias e da existência e relações in-diretas, embora limitadas, com entidades maiscentrais.

As relações internas entre associações comu-nitárias são próximas, notavelmente assimétricas ede relevância moderada para seus protagonistas(Tabela 2).21 O Sociograma 322 mostra que a pro-ximidade deriva da fragmentação ou da existênciade sub-redes pequenas – basicamente díades e tría-des –, animadas por lógicas internas exclusivas, querdizer, lógicas que não parecem estimular a criaçãode pontes com associações pares guiadas por ou-tras preocupações. Por exemplo, os grupos de mãese as organizações civis de hip-hop apresentam rela-ções entre si e nenhum contato com outra associaçãocomunitária. Inclusive o nicho com o maior númerode entidades – organizações representantes da po-lícia militar – obedece a uma lógica interna exclusi-va. Neste caso, todas as relações são direcionadas apartir de um único ator. Assim, os raros vínculosestabelecidos pelas entidades em questão costumamser pontuais e não-diversificados, tornando assimé-trica a posição dos atores na sua própria rede. Demodo consoante como os achados das associaçõesde bairro, 63% dessas associações são isoladas, ouseja, não possuem vínculos com seus pares.

O perfil exclusivista das associações comuni-tárias as torna a tal ponto desinteressantes para aslógicas de atuação do outros atores que, salvo aexceção da indiferença recíproca entre organizaçõespopulares e associações de bairro, as entidades emquestão situam-se na última posição nas estratégias

relacionais dos outros atores do universo de orga-nizações civis estudado (Tabela 3). Por sua vez,embora as associações comunitárias privilegiem osvínculos com organizações populares, não apresen-tam uma hierarquia clara de relacionamento no quediz respeito às outras entidades – centrais ou não.

Associações comunitárias, de longe as maisperiféricas no universo de atores estudado, são cons-truídas por e para os integrantes de cada entidade,e isso guarda estreita conexão com o caráter exclu-sivo do seu padrão de relações ou com ausênciadelas como sua feição mais distintiva. De um lado,parecem alimentar propósitos muito restritos deexpansão do seu trabalho; de outro, suas funçõesde ajuda mútua situam-nas em plano verdadeira-mente secundário para as demais organizações. Éclaro que mantêm relações, mas são pontuais e ani-madas por afinidades exclusivas. A esse respeitocumpre lembrar como contraponto que, apesar dasua condição periférica, as associações de bairro sedestacam por constituir vínculos para além do pla-no local e por sustentar redes relativamente exten-sas nesse plano.

As entidades assistenciais

Entidades assistenciais caracterizam-se, juntocom os fóruns, por acusarem centralidades inter-mediárias, situando-se, do ponto de vista das me-didas analisadas, entre as entidades periféricas e osgrandes protagonistas da rede de organizações ci-vis. Sua centralidade intermediária obedece ao exer-cício de uma forma de intermediação restrita, de-rivada das suas funções de prestação de serviçosde assistência a segmentos da população ou públi-cos alvo definidos conforme critérios de vulnera-bilidade. Elas são as entidades mais passivas douniverso das organizações civis paulistanas, poisregistram o pior resultado no estabelecimento devínculos; por outro lado, apresentam posições mé-dias quanto à proximidade com outros atores e àsua capacidade de alcance e intermediação (Tabela1). Contudo, e não obstante sua inexpressividadena construção de relações, os vínculos por elas es-tabelecidos são os mais assimétricos da rede (inclu-sive entidades centrais), tendendo a se tornar indis-pensáveis para boa parte das entidades dependentescom as quais se relacionam.23

O fato de sustentarem o repertório de rela-ções mais assimétricas da amostra pode ser com

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preendido pelo seu papel como entidades-ponteentre associações mal-providas de relações comentidades densamente articuladas. De fato, as rela-ções por elas estabelecidas tendem a ser pontuais everticais, com ramificações limitadas. Nesse senti-do, as conexões com seus pares não apenas sãopouco importantes para as entidades assistenciais –apenas os fóruns constroem menos vínculos entresi, e elas são as entidades que menos alcançam seuspares e com menor capacidade de intermediaçãona rede interna –, mas também preservam o cará-ter assimétrico que caracteriza suas relações com osoutros tipos de organizações civis (Tabela 2). OSociograma 424 mostra o padrão das conexões en-tre entidades assistenciais. Além da fragmentaçãoem oito componentes ou sub-redes, a estrutura departe desses componentes revela-se assimétrica ebaseada no fluxo de recursos orçamentários: a As-sociação Evangélica Beneficente (AEB), a Associa-ção Brasileira de Resgate e Ação Social (Abras), oInstituto Teu Sonho Meu Sonho (Inteusonho) e aAção Comunitária Brasil (Acaocomun), atores cen-trais das respectivas sub-redes, são coincidentemen

te entidades assistenciais que assumem entre suasfunções principais a transferência de recursos paraoutras entidades assistenciais. A lógica interna dassub-redes é diversa, obedecendo ora às semelhan-ças quanto aos públicos ou beneficiários (por exemplo, crianças), ora a alinhamentos sob fortes afini-dades ideológico-institucionais, como acontece comos nichos de caráter religioso, ou ainda à proximi-dade territorial – como ocorre com as entidadeslocalizadas na Zona Sul de São Paulo, no bairro deGrajaú. A despeito de ocuparem posições inter-mediárias, o número de entidades isoladas ou quenão mantêm qualquer vínculo direto com seus pa-res é (60%) semelhante ao das organizações civisperiféricas.

Entidades assistenciais não constituem um vin-culo privilegiado para nenhum tipo de organizaçãocentral ou periférica, mas, de modo paralelo aosfóruns, são procuradas por todas as organizaçõescivis – confirmando sua posição de centralidadeintermediária – e, em particular, pelas associaçõesde bairro (Tabela 3). Os vínculos preferenciais cul-tivados pelas entidades em questão respeitam o

* Não estão explicitadas no sociograma as entidades que não mantêm relações com outras organizações de mesmo tipo(isoladas). Encontramos quarenta associações comunitárias nesta situação, ou seja, 63% do total de associações comunitá-rias analisadas.

Sociograma 3Rede Interna Associações Comunitárias*

VilaAlpina casp

afemvalpina

proquilurb

asmaestalu

gpferdiasdozeescsam

grcs

asatlbarc

adiabetico

fcd

astrabitaq

mocut

Hi-Hop alineposse

outposses

adefesapm asubsarpm

clubemaecaClube deMães

clumaeunvi

PolíciaMilitar

acabsolpmenclapolmi

apmdefesp

apolmievan

aoficipmuniporvis

NNNNNooooo Isolados: 125 (64%) Isolados: 125 (64%) Isolados: 125 (64%) Isolados: 125 (64%) Isolados: 125 (64%)

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padrão mais geral, ou seja, privilegiam as organiza-ções civis mais centrais; e entre associações periféri-cas, optam pelas associações de bairro em vez dascomunitárias.

As medidas de centralidade conferem às en-tidades assistenciais lugar intermediário dentro deum ranking relacional, mas o exame integrado dasmesmas revela um perfil funcional em que essasentidades desempenham o papel de atores-ponteentre conjuntos de atores posicional e hierarquica-mente separados na rede. É pertinente frisar que aobtenção de resultados próximos da mediana –daí a denominação de entidade de centralidade in-termediária – não guarda qualquer relação necessá-ria com o exercício de funções de intermediação.A primeira é um resultado aritmético, enquanto assegundas são produto de uma interpretação socio-lógica do conjunto integrado das medidas visandoa caracterizar o modo de operação do tipo de orga-nização sob exame. Assim, o fato de as entidades

assistenciais operarem como atores-ponte remeteao seu perfil como mediadoras entre captação ecanalização de recursos destinados à assistência e àbenemerência, conectando organizações financiado-ras, sustentadoras ou doadoras, bem aparelhadasrelacionalmente, com atores periféricos, como asassociações de bairro, próximas dos públicos visa-dos como alvo da assistência. Trata-se de um tipoe mediação restrito e vertical, o que explica seu desin-teresse na construção ativa de vínculos ou de redes(networking) com outros tipos de organizações civise entre elas próprias. Tal caracterização, cumpre sa-lientar, sugere certo aprimoramento para as leiturassobre o processo de “onguização” das entidadesassistenciais, pois, a despeito de tal diagnóstico, ospadrões encontrados semelham a uma espécie deimpressão digital relacional que identifica e distingueclaramente ONGs de entidades assistenciais. Se aeventual mudança estiver a acontecer, parece conve-niente procurá-la no plano discursivo e simbólico.

Sociograma 4Rede Interna Entidades Assistenciais*

* Não estão explicitadas no sociograma as entidades que não mantêm relações com outras organizações de mesmo tipo(isoladas). Encontramos 42 entidades assistenciais nesta situação, ou seja, 60% do total de entidades assistenciais anali-sadas.

Vila Maria/Igreja Católica

casadomaca

cesepcrechesper

csleaoxiiikoinomiacasataig

largiras

inteusonho

larjemajo

abras IgrejaBaptista

abiah

Evangélicos

aebedra

aeb

fucriscria

arco

aguainumbiGrajaú /Zona Sul

pcreconcil

cpsaocthi

funsauxi

cpsborore

cencovsdor

comkolparc

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cpsclbiasi

asbenprovi

aacd

acaocomun

cphnsajped

crianças

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Os Fóruns

Os resultados dos fóruns são plenamente con-dizentes com seu papel de atores-ponte, e permi-tem especificar seu perfil relacional como instânci-as de encontro, definição e orientação programáticade atores com vocações temáticas e preocupaçõesafins. Seu padrão de centralidade intermediária apre-senta um papel ativo na construção de vínculos que,no entanto, é desbalanceado devido à enorme quan-tidade de vínculos recebidos25 Fóruns recebem con-sideravelmente mais do que enviam vínculos, en-contram-se próximos das entidades que osprocuram, mas distantes daquelas com as quais elesconstroem relações, e possuem baixa capacidadede intermediação (Tabela 1).26 Quando observa-dos em comparação às entidades assistenciais, sur-ge contraste interessante, pois os fóruns sustentamrelações bem menos assimétricas – a despeito deambos os tipos de organizações civis compartilha-rem posições de centralidade intermediária.

Justamente por serem instâncias temáticas deencontro que abrigam outros tipos de organiza-ções civis, os fóruns distinguem-se pela acessibi-lidade e não apresentam inclinação a estabelecervínculos entre si, a não ser no caso raro de sobre-posições nos temas trabalhados. Nesse sentido, opadrão de conexões internas do tipo de ator emquestão é o mais desconexo e menos centralizadode todas as redes entre pares no universo de orga-nizações civis paulistanas aqui analisado (Tabela 2).O Sociograma 527 ilustra nitidamente a magnitudeda desconexão: além de tenderem a ser pontuais,ordenando a rede em cinco componentes – trêsdíades, uma tríade e um componente maior, as re-lações internas dos fóruns são raras, visto que 83%são isolados ou não possuem qualquer relação di-reta com outros fóruns. Trata-se, de longe, do tipode organização civil que menos mantém vínculosentre si. O sociograma também permite apreciar ocaso raro de sobreposições temáticas parciais queanimam a construção de pequenas sub-redes: oFórum “ONGs Aids”, por exemplo, mantém re-

lação com o Fórum de Patologias; o Fórum doIdoso, por sua vez, sustenta vínculos com os deAssistência Social e de Saúde.

Os fóruns constituem vínculo cultivado pelamaior parte das organizações estudadas, emboranunca em posição privilegiada e, é claro, nunca an-tecedendo as entidades mais centrais – organiza-ções populares, articuladoras e ONGs. Embora aafirmação recíproca também seja verdadeira – fó-runs também privilegiam vínculos com organiza-ções civis centrais –, um olhar cuidadoso sugeremaior afinidade com entidades centrais de perfiltemático, ou seja, com articuladoras e ONGs (Ta-bela 3). Por sua vez, organizações populares e enti-dades assistenciais encontram-se em patamar infe-rior com importância semelhante para os fóruns, eassociações de bairro e comunitárias são irrelevan-tes nos termos relativos do ranking utilizado.

Fóruns abrigam inquietações e problemas dasorganizações civis, e brindam um espaço para ela-boração de consensos a seu respeito. Entretanto,não constituem o canal para transmissão ou difusãode tais consensos, pois, uma vez adensados, elessão divulgados e, na medida do possível, imple-mentados e/ou disputados na prática pelas organi-zações civis que participam do respectivo fórum.Seu papel de instâncias de adensamento dos dis-cursos, programas de ação e interações de outrasorganizações civis afastam-nos de estratégias ativasna construção de relações, mas na medida em quesão freqüentados em igual medida por organiza-ções civis centrais e periféricas representam umainstância de aproximação entre entidades desiguaisem termos da sua capacidade de ação. Assim, o pa-pel de ator-ponte vem marcado pela acessibilida-de, diferentemente das entidades assistenciais, quetambém permitem o contato entre conjuntos hie-rarquicamente afastados de organizações civis, masde modo restrito e vertical. Em ambos os casos,todavia, parece plausível afirmar a coincidência en-tre funções de intermediação e a presença de pa-drões de relacionamento heterófilos ou preferencial-mente orientados para outros tipos de atores.

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Comentário Final

Um dos deslocamentos mais perceptíveis daliteratura recente é afirmar a idéia da heteroge-neidade da sociedade civil. Contudo, cabe ao es-forço da pesquisa sistemática desvendar os modosem que tal heterogeneidade se organiza. Se o univer-so das organizações civis não se ordena nem seusatores comportam como prescrito pela teoria –guiados por uma lógica unificadora e por com-promissos normativos passíveis de universalização–, há sem dúvida terreno fértil para a elaboraçãode distinções analíticas positivas e empiricamentealicerçadas, capazes de contribuir para a compre-ensão das lógicas que animam o modus operandi dasorganizações civis. Aqui, o funcionamento do uni-verso das organizações civis, particularmente dosseus atores com menor protagonismo, foi recons-truído relacionalmente a partir de três recortes ana-líticos já comentados. Afortunadamente, monismosmetodológicos não mais parecem em voga hoje e,

* Não estão explicitadas no sociograma as entidades que não mantêm relações com outras organizações de mesmo tipo.Encontramos 95 fóruns nesta situação, ou seja, 83% do total de fóruns analisados.

Sociograma 5Rede Interna dos Fóruns

por certo, a análise de redes é uma estratégia deabordagem entre outras possíveis para lidar comatores coletivos. No entanto, a magnitude numérica,a diversidade e a pulverização do universo das or-ganizações civis tornam-na peculiarmente adequadapara contornar as limitações de perspectivas cen-tradas no ator como instância privilegiada de análisee como fonte de (auto)produção de conhecimento.

No universo das organizações civis paulista-nas operam hierarquias acentuadas quanto às capa-cidades de ação e escolha dos diferentes tipos deatores, acompanhadas de clivagens de especializa-ção ou diferenciação funcional. Os dados alinhamclaramente entidades marcadas por sua condiçãoperiférica – associações comunitárias e de bairro –e entidades com uma condição de centralidade in-termediária – assistenciais e fóruns. Não cabe aquirepetir as sínteses analíticas formuladas, mas é per-tinente frisar que as posições ocupadas pelas orga-nizações civis nessas divisões impõem constrangi-mentos, mas não constituem uma condenação à

formoradia

foreduc

confnaci

confreg

congsaude

fosaude

confest

foidosoforumdca

fodefic

fassocial

forongaids

forpatologfonalutas

marmunmu

fopaupapop

fonarefurb

foeconsoli

focenvivo

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impotência. Antes, é possível desenvolver estraté-gias compensatórias bem-sucedidas, visando a fran-quear o acesso das entidades periféricas a recursosmateriais e simbólicos que fluem pelos locais maiscentrais da rede. A análise revelou o papel que enti-dades assistenciais e fóruns desempenham comoatores-ponte – intermediando diferentes tipos e re-cursos, materiais no primeiro caso, simbólicos epolíticos no segundo –, mas também mostrou apresença de conexões diretas ou não-mediadas en-tre nichos periféricos de atores e entidades centrais,como é o caso dos vínculos preferenciais entre as-sociações de bairro e articuladoras.

A existência de organizações civis dedicadasa propósitos distintos e empenhadas na realizaçãode atividades diferentes remete ao plano do plura-lismo societário ou da heterogeneidade da açãocoletiva, mas a presença de funções complemen-tares implica algo mais: processos intencionais dediferenciação funcional ou divisão do trabalho, cujacristalização poderia atestar o grau de complexi-dade e a capacidade de atuação de atores situadosdentro do universo das organizações civis. Entre-mentes, não há conhecimento acumulado que per-mita examinar sistematicamente as implicações maisamplas dos padrões relacionais documentados me-diante comparações intertemporais ou com outrosuniversos de organizações civis. Seria desejável queessa lacuna fosse sanada, permitindo a re-especifi-cação e, eventualmente, a refutação desses padrõesgraças ao acúmulo de evidências oriundas de ou-tros contextos no Brasil e no exterior.

No plano da teoria de redes, os achados dasentidades periféricas e intermediárias confirmamque a centralidade de um ator pode obedecer ainserções passivas ou ativas na rede. A diferençaentre centralidades passivas e ativas, observada tam-bém no caso das organizações protagonistas (Gur-za Lavalle, Castello e Bichir, 2007), parece associada,no primeiro caso, a prestigio e assimetria relacional,isto é, a desigualdades acentuadas de recursos; jáno segundo, a associação parece ser com relaçõeshomofílicas – entre entidades do mesmo tipo – ecom outros atores munidos de recursos relativa-mente semelhantes. Além disso, o exame dos ato-res-ponte sugere que a especialização funcional de-sempenhando papéis de bridging está associada apadrões relacionais heterófilos. Em princípio, se es-ses achados se revelarem consistentes, seria possí-vel avançar especificando conceitualmente os signi-

ficados de modalidades de centralidade quando asredes são compostas por organizações civis, de-tectando coincidências e eventuais especificidadesem face de formulações mais abstratas, caracterís-ticas da teoria de redes.

Notas

Para a afirmação idéia de heterogeneidade da socie-dade civil na literatura, ver Olvera (2003), Encarna-ción (2006), Dagnino, Olvera e Panfichi (2006).Para balanços críticos no Brasil e na América Latina,ver Dagnino, Olvera e Panfichi (2006) e Gurza La-valle (2003); para balanços mais gerais, ver a coletâ-nea de trabalhos organizada por Alexander (1998) eEncarnación (2006).Trata-se de autores do debate teórico internacionalque, nos anos de 1990, apostaram no fortalecimen-to da sociedade civil como “nódulo normativo deum projeto radical democrático”, como “um desi-derato político-emancipatório” (Costa, 1997, p. 9).Os autores são bem conhecidos pela sua obra einfluência: Andrew Arato, Jean Cohen, CharlesTaylor, John Keane, Michel Walzer.Para distinções analíticas, ver “projeto”, em Dagni-no, Olvera e Panfichi (2006); “trajetórias”, em Dela-maza e Ochsenius (2006), Feltran (2005); “desenhoinstitucional”, em Fung (2004) e Fung e Wright(2003); accountability, em Fox (2006), Alnoor e Weis-band (2007); “representação presuntiva” e “formu-lações equivalentes”, em Mansbridge (2003), Casti-glione e Warren (2005), Peruzzotti (2005), Urbinati(2000), Gurza Lavalle, Houtzager e Castello (2006a,2006b); “ecologia associativa”, em Warren (2004);“redes de atores”, em Alvarez, Dagnino e Escobar(1998), no sentido metafórico e pioneiro apontadono texto, em Diani e McAdam (2003).No trabalho de campo foram entrevistadas 229 or-ganizações civis, mas devido a critérios metodoló-gicos foram contempladas apenas 202 na análise deredes.A análise de redes apenas pressupõe que o mundoé relacional, mas a desigualdade de relações dispo-níveis na rede para seus diferentes atores é umacaracterística empírica da rede. Por outro lado, a pro-babilidade de concentração de poder aumenta con-formem o tamanho da rede – conforme Hanne-man (2001) –, mas o grau de desigualdade e as

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posições relativas dos atores analisados também sãode índole empírica.

A metáfora da “ponte” salienta a função de cone-xão entre dois territórios – por extensão, realidadesou mundos – e nesse sentido se omite de especifi-car os benefícios dos atores, enquanto idéias broke-rage e gate-keeping enfatizam os custos da intermedi-ação a serem pagos por quem dela precisa. Conformeserá mostrado na análise das entidades assistênciase dos fóruns, as funções de conexão obedecem alógicas mais diversas do que aquelas próprias deuma economia da intermediação. Para as definiçõesde broker ou gatekeeper, ver Scott (1992, p. 90) e Wa-sserman e Faust (1994, pp. 188-191).

Organizações populares são atores específicos volta-dos para a mobilização coletiva a propósito de de-mandas populares. Articuladoras são atores funda-dos por outras organizações civis para representarseus interesses e coordenar a ação dos seus funda-dores e membros, isto é, trabalham para entidadese não para segmentos específicos da população.ONGs são entidades de advocacy, dedicadas a reivin-dicar demandas de terceiros e a tematizar publica-mente problemas visando à construção de consen-sos sociais. Para uma exposição detalhada datipologia expandida, ver Gurza Lavalle, Castello eBichir (2008).

Para uma discussão conceitual a respeito das medi-das de centralidade e coesão utilizadas usualmentenas análises de redes sociais, bem como das vanta-gens a elas associadas, ver Hanneman (2001).

Optou-se por diferenciar a origem e o destino dosvínculos entre as organizações. Entretanto, pormotivos técnicos, as relações presentes na rede fo-ram consideradas de modo simétrico no caso dealgumas medidas.Os resultados apresentados neste artigo fazem par-te do projeto “Rights, Representation and the Poor:Comparing Large Developing Country Democraci-es – Brazil, India and Mexico”. As informações me-todológicas, bem como o questionário (Houtza-ger, Gurza Lavalle e Acharya 2003), encontram-sedisponíveis para consulta na página do projeto, sitehttp://www.ids.ac.uk/gdr/cfs/research/Collective%20Actors.html.Todas as medidas a serem apresentadas foram esti-madas mediante a aplicação de diferentes ponde-radores (normalização) para controlar os efeitos

decorrentes do peso dos distintos tipos de organi-zação civil na amostra.Trata-se de uma média de médias; os resultadosdos três tipos de entidades centrais foram calcula-dos separadamente.Para tanto, foram considerados apenas os ganhosobtidos em cada um dos cruzamentos entre doistipos de organizações civis, cancelando os resulta-dos oriundos das redes internas. Em outras pala-vras, consideram-se apenas os saldos da interseçãoentre duas redes.Apresentam os resultados mais baixos na medida“poder”, que afere assimetria relacional.Não é fortuito o fato de possuírem a maior distân-cia geodésica (ver Tabela 1).Atores: Abastatere – Associação do Bairro Amigosde Santa Terezinha; Abcocaia – Associação do Bair-ro Cocaia; Abelc – União de Projetos Assistenciais àComunidade; Abjeliana – Associação do Bairro Jar-dim Eliana; Abjsaobern – Associação do Bairro Jar-dim São Bernardo; Abmontever – Associação doBairro Monte Verde; Acachoeir – Associação Ca-choeirinha; Achabelavi – Associação Chácara BelaVista; Acingapsjo – Associação Cingapura ParqueSão João; Acomnovama – Associação ComunitáriaNova Marilda; Acomucelii – Associação de Cons-trução por Mutirão Jd. Celeste II; Amai – Associa-ção dos Moradores de Vila Arco Íris; AMBRCAVL-MI – Associação de Moradores do Bairro RitaCavernaqui e Vl. Missionária; Amem – Associaçãodos Moradores de Ermilíno Matarazzo; Amjideal– Associação de Moradores do Jardim Ideal;Amomvirgem – Associação de Moradores de MataVirgem; Ampnovomun – Associação de Morado-res de Parque Novo Mundo; Amtiete – Associaçãode Moradores do Tietê; Amvmissio – Associaçãode Moradores da Vila Missionária; Amvnasce – As-sociação de Moradores de Vila Nascente; Amvpe-drei – Associação dos Moradores da Vila Pedreira;Apedrasped – Associação Pedra sobre Pedra; AR-CAVC – Associação Recreativa Comunitária Ami-gos de Vila Carmem; ASMJLUCEL – Associaçãodos Moradores do Jardim Lucélia; ASSCMHELI –Associação Central dos Moradores de Heliópolis;Asunisapo – Associação Unidas Beneficente de Sa-popemba e Vilas Adjacentes; Avalheliop – Associa-ção pela Valorização de Heliópolis; Avalmulher –Associação de Valores da Mulher; Avidanova – As-sociação Vida Nova; Avnosjoao – Associação Vila

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Nova São João; Avnotiete – Associação Vila NovaTiête; Avnovacuru – Associação Vila Nova Curuça;CDM – Vila Darli; CECOMVILACR – Centro Co-munitário da Vila Cristália; Cencidnova – CentroSocial Cidade Nova; CSLARTREZE – Centro So-cial Largo Treze; MPMZN – Movimento Popularde Moradia Zona Norte; PCLEITONZL – Peque-no Cleiton da Zona Leste; Sabajideal – SociedadeAmigos do Bairro Jardim Ideal; Sabsaomate – So-ciedades Amigos do Bairro de São Mateus; Sabvin-dust – Sociedade Amigos de Bairro Vila Industrial;Sacresjau – Sociedade Amigos Conj. Residencial Jaú;Saem – Sociedade Amigos de Ermilíno Matarazzo;Sajacana – Sociedade Amigos de Jaçana; Sajacol –Sociedade Amigos do Jardim Colorado; Sajagrim –Sociedade Amigos do Jardim Grimaldi; Sajapao –Sociedade Amigos do Jardim Japão; Sajasapo –Sociedade Amigos do Jardim Sapopemba; Sajau-verde – Sociedade Amigos do Jd. Aury Verde eAdjacências; Sajbrasil – Sociedade Amigos do Jar-dim Brasil; Sajindep – Sociedade Amigos do Jar-dim Independência; Sajtulipas – Sociedade Ami-gos Jardim das Tulipas; Samorheli – SociedadeAmigos Moradores de Heliópolis; SAMVARPQFO– Sociedade Amigos da Vila Arapuá e Parque Fon-gar; Sapeduchav – Sociedade Amigos do Parque EduChaves; Sapsamsfra – Sociedade Amigos do Par-que Santa Amélia e Balneário São Francisco; Sarsi –Sociedade Amigos de Bairro da Região de SantaInês; Sasapopem – Sociedade Amigos de Sapopem-ba; Sava – Sociedade Amigos de Vila Alpina; Savalp– Sociedade Amigos de Vila Alpina; Savclamor –Sociedade Amigos de Vila Cristália, Vila Lalá e Jd.Morgado ; Savdarli – Sociedade Amigos de VilaDarli; Savema – Sociedade Amigos de Vila Ema;Soravi – Sociedade Amigos de Vila Medeiros; Sovi-sabri – Sociedade Vila Sabrina; Umocjulia – Uniãodos Moradores da Cidade Júlia; UMPBRIJSSA –União dos Moradores do Parque Bristol e JardimSão Savério; Umvasa – União de Moradores deAntonio dos Santos e Adjacentes; Unas – União deNúcleos, Associações e Sociedades dos Moradoresde Heliópolis; Unimorsete – União dos Moradoresda Comunidade de Sete de Setembro.A rede interna de ONGs apresenta 33% de isoladasna amostra aqui analisada; as organizações popula-res, 47%, e articuladoras, 54% (Gurza Lavalle, Cas-tello e Bichir, 2007).Para as três formas de aferir os ganhos da interseção,organizações populares e associações de bairro apa-

recem reciprocamente em 6º lugar. Os resultadosdas organizações populares podem ser consulta-dos em Gurza Lavalle, Castello e Bichir (2007).Por oposição a centralidades passivas derivadas darecepção de vínculos.Próximas conforme as medidas “proximidade” e“caminhos mais curtos”, e assimétricas conforme amedida “poder” (Tabela 2).Atores: ACABSOLPM – Associação de Cabos eSoldados da Polícia Militar; ADEFESAPM – As-sociação de Defesa do Policial Militar; Adiabetico –Associação dos Diabéticos; Afemvalpina – Associ-ação Feminina de Vila Alpina; Alineposse – AliançaNegra Posse; AOFICIPM – Associação de Oficiaisda Polícia Militar; APMDEFESP – Associação daPolícia Militar dos Deficientes do Estado de SãoPaulo; Apolmievan – Associação de Policiais Mili-tares Evangélicos; ASATLBARC – Associação Atlé-tica Barcelona; Asmaestalu – Associação de Mães deSanta Luzia; Astrabitaq – Associação dos Trabalha-dores de Itaquera; ASUBSARPM – Associação deSubtenentes e Sargentos da Polícia Militar; Casp –Centro de Ação Social de Vila Alpina; Clubemaeca –Clube de Mães Coração do Amor; Clumaeunvi –Clube das Mães Unidas para a Vitória; DOZEESC-SAM – 12 Escolas de Samba do Grupo Especial;Enclapolmi – Entidades de classe da Polícia Militar;FCD – Fraternidade Cristã de Doentes e Deficien-tes; GPFERDIAS – Grupo de Senhoras UnidasFernão Dias; GRCS – Grupo Recreativo Cultural eSocial Escola de Samba Acadêmicos do Tucuruvi;Mocut – Movimento Cultural da Cidade Tiraden-tes; Outposses – Outras Posses (organizações deHip Hop); Proquilurb – Projeto Quilombos Urba-nos; Uniporvis – União dos Portadores de Deficiên-cia Visual do Estado de São Paulo.Conforme o resultado da medida “poder” na Ta-bela 1.Atores: AACD – Ação Comunitária do Brasil; Abi-ah – Associação Batista de Incentivo e Apoio aoHomem; Abras – Associação Brasileira de Resgate eAção Social; Acaocomun – Ação Comunitária; AEB– Associação Evangelista Beneficiente; Aebedra –Associação Evangélica Beneficiente e EducacionalDiácono Renato Araújo; Aguainumbi – Associa-ção Guainumbi; Arco – Associação BeneficienteArco; Asbenprovi – Associação Beneficiente Provi-são; Casadomaca – Casa Dom Macária; Casataig –Casa Taiguara; CENCOVSDOR – Centro de Con-

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vivência Santa Dorotéia; Cesep – Centro Educacio-nal São Paulo Apóstolo; Comkolparc – Comuni-dade Kolping Arco-Íris; CPHNSAJPED – Centrode Promoção Humana Nossa Senhora Aparecidado Jd. Pedreira; CPSAOCTHI – Centro de Promo-ção Social São Caetano Thiene; CPSBORORE –Centro de Promoção Social Bororê; CPSCLBIASI– Centro de Promoção Social Cônego Luis Biasi;Crechesper – Creche Esperança; CSLEAOXIII –Centro Social Leão XIII; Fucriscria – Fundo Cristãopara Criança; Funsauxi – Fundação Nossa SenhoraAuxiliadora; Inteusonho – Instituto Teu SonhoMeu Sonho; Koinomia; Largiras – Lar Girassol;Larjemajo – Lar Jesus Maria José; OBKOLPING –Obra Kolping do Brasil; PCRECONCIL – Progra-ma Comunitário Reconciliação.Ver as medidas “vínculos recebidos” e, sobretudo,“influência”.Proximidade em relação aos atores que citam osfóruns, mas não só. Note-se o grande número de“caminhos mais curtos” e “balanço favorável” en-tre vínculos enviados e recebidos (influência) (Tabe-la 1).Atores: Confest – Conferências Estaduais; Conf-naci – Conferências Nacionais; Confreg – Confe-rências Regionais; Congsaude – Congresso da Saú-de; Fassocial – Fórum de Assistência Social;Focenvivo – Fórum Centro Vivo; Fodefic – Fórumde Deficientes; Foeconsoli – Fórum da EconomiaSolidária; Foidoso – Fórum do Idoso; Fonalutas –Fórum Nacional de Lutas; Fonarefurb – FórumNacional de Reforma Urbana; Fopaupapop – Fó-rum Paulista de Participação Popular; Foreduc –Fórum de Educação; Formoradia – Fórum deMoradia; Forongaids – Fórum Ongs Aids; Forpa-tolog – Fórum de Patologia; Forumdca – Fórumdos Direitos da Criança e do Adolescente; Fosaude– Fórum de Saúde; FSM – Fórum Social Mundial;Marmunmu – Marcha Mundial de Mulheres

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RESUMOS / ABSTRACTS / RESUMÉS 193

ATORES PERIFÉRICOSNA SOCIEDADE CIVIL:REDES E CENTRALIDADES DEORGANIZAÇÕES EM SÃO PAULO

Adrián Gurza Lavalle, GrazielaCastello e Renata Mirandola Bichir

Palavras-chave: Análise de redes; So-ciedade civil; São Paulo; Organizaçõescivis periféricas.

A partir de análise de redes este artigoidentifica os atores que ocupam posiçõesperiféricas na sociedade civil paulistanae analisa suas lógicas de atuação e suasestratégias relacionais ou de interaçãocom outros atores. Os resultados, oriun-dos de survey aplicado a 202 organiza-ções civis no município de São Paulo,mostram que associações comunitárias eassociações de bairro guardam as posi-ções mais periféricas, antecedidas porentidades assistenciais e fóruns, cujacentralidade é intermediária. Esses ato-res caracterizam-se pela sobreposição dedesvantagens estruturais. Contudo, a aná-lise revela que as entidades ocupam posi-ções periféricas e intermediárias por mo-tivos distintos e no cumprimento de vo-cações funcionais diferentes, bem comoque elas lidam com sua condição perifé-rica e intermediária de modo diferencia-do, inclusive atenuando consideravel-mente as limitações relacionais à sua ca-pacidade atuação e decisão graças à cons-trução seletiva de vínculos com entida-des que ocupam posições altamente cen-trais. Assim, o artigo avança para alémda mera constatação das hierarquiasposicionais, alimentando elaboraçõesnuançadas do modo de operação das en-tidades examinadas.

PERIPHERAL ACTORS IN THECIVIL SOCIETY: NETWORKSAND CENTRALITIES OFORGANIZATIONS IN SÃO PAULO

Adrián Gurza Lavalle, GrazielaCastello and Renata MirandolaBichir

Keywords: Network analysis; Civilsociety; São Paulo; Peripheral civilorganizations.

Based on network analysis, this articleidentifies the actors in peripheral positionswithin São Paulo civil society and exa-mines their different logics of perfor-mance and their relational or intera-ctional strategies towards other actors.Findings of a survey with 202 civilorganizations in the city of São Pauloshow that community and neighborhoodassociations keep the most peripheralpositions, preceded by service non-profitsand forums, of middle centrality. Thoseactors are characterized by the super-position of structural disadvantages.However, this article shows that organi-zations occupy peripheral and middlecentrality positions for distinct reasonsand fulfill different functional vocations.It also shows that civil organizations dealwith their peripheral and intermediatecondition in different ways, even reduc-ing considerably the relational constraintsto their capacity for action and decisionby establishing selective ties with organi-zations in highly central positions. There-fore, the article goes beyond the mereidentification of positional hierarchies,developing nuanced formulations aboutthe modus operandi of the organizationsexamined.

ACTEURS PÉRIPHÉRIQUESDANS LA SOCIÉTÉ: RÉSEAUXET CENTRALITÉSD’ORGANISATIONS À SÃOPAULO

Adrián Gurza Lavalle, GrazielaCastello et Renata Mirandola Bichir

Mots-clés: Analyse de réseaux; Sociétécivile; São Paulo; Organisations civilespériphériques.

Cet article identifie, à partir de l’analysedes réseaux, les acteurs qui occupent despositions périphériques dans la sociétécivile de la ville de São Paulo et étudieses logiques d’action et ses stratégiesrelationnelles ou d’interaction avec d’au-tres acteurs. Les résultats, issus de dusondage réalisé auprès de 202 organisa-tions civiles dans la commune de SãoPaulo, ont démontré que les associationscommunautaires et les associations dequartier recèlent les points de vue lesplus périphériques, précédés par desentités assistantielles et des forums dontla centralité est intermédiaire. Ces acteursse caractérisent par la superposition dedésavantages structuraux. Néanmoins,notre analyse révèle que les entitésoccupent des positions périphériques etintermédiaires par des motifs distincts etpour l’accomplissement de vocationsfonctionnelles différentes. Elles tra-vaillent avec leur condition périphériqueet intermédiaire de façon différenciée, ycompris en atténuant considérablementles limitations relationnelles à leur capa-cité d’action et de décision, grâce à uneconstruction sélective de liens avec desentités qui occupent des positions haute-ment centrales. Cet article avance, ainsi,au-delà de la simple constatation deshiérarchies positionnelles, en alimentantdes élaborations nuancées du moded’opération des entités examinées.