atividade sancionatória ou disciplinar da administração pública

14
Superior Tribunal de Justiça RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA 24.559 - PR (2007/0165377-1) RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO RECORRENTE : FERNANDO FURLANETTO ADVOGADO : VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE E OUTRO(S) RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ PROCURADOR : DÉBORA FRANCO DE GODOY ANDREIS E OUTRO(S) EMENTA DIREITO ADMINISTRATIVO. ATIVIDADE SANCIONATÓRIA OU DISCIPLINAR DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO PENAL COMUM. ARTS. 615, § 1o. E 664, PARÁG. ÚNICO DO CPP. NULIDADE DE DECISÃO PUNITIVA EM RAZÃO DE VOTO DÚPLICE DE COMPONENTE DE COLEGIADO. RECURSO PROVIDO. 1. Consoante precisas lições de eminentes doutrinadores e processualistas modernos, à atividade sancionatória ou disciplinar da Administração Pública se aplicam os princípios, garantias e normas que regem o Processo Penal comum, em respeito aos valores de proteção e defesa das liberdades individuais e da dignidade da pessoa humana, que se plasmaram no campo daquela disciplina. 2. A teor dos arts. 615, § 1o. e 664, parág. único do CPP, somente se admite o voto de qualidade - voto de Minerva ou voto de desempate - nos julgamentos recursais e mandamentais colegiados em que o Presidente do órgão plural não tenha proferido voto quantitativo; em caso contrário, na ocorrência de empate nos votos do julgamento, tem-se como adotada a decisão mais favorável ao acusado. 3. Os regimentos internos dos órgãos administrativos colegiados sancionadores, qual o Conselho da Polícia Civil do Paraná, devem obediência aos postulados do Processo Penal comum; prevalece, por ser mais benéfico ao indiciado, o resultado de julgamento que, ainda que por empate, cominou-lhe a sanção de suspensão por 90 dias, excluindo-se o voto presidencial de desempate que lhe atribuiu a pena de demissão, porquanto o voto desempatador é de ser desconsiderado. 4. Recurso a que se dá provimento, para considerar aplicada ao Servidor Policial Civil, no âmbito administrativo, a sanção suspensiva de 90 dias, por aplicação analógica dos arts. 615, § 1o. e 664, parág. único do CPP, inobstante o douto parecer ministerial em sentido contrário. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Laurita Vaz e Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 1 de 14

Upload: allaymer

Post on 28-Nov-2014

173 views

Category:

Law


0 download

DESCRIPTION

Consoante precisas lições de eminentes doutrinadores e processualistas modernos, à atividade sancionatória ou disciplinar da Administração Pública se aplicam os princípios, garantias e normas que regem o Processo Penal comum, em respeito aos valores de proteção e defesa das liberdades individuais e da dignidade da pessoa humana, que se plasmaram no campo daquela disciplina.

TRANSCRIPT

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 24.559 - PR (2007/0165377-1)

RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHORECORRENTE : FERNANDO FURLANETTO ADVOGADO : VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE E OUTRO(S)RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ PROCURADOR : DÉBORA FRANCO DE GODOY ANDREIS E OUTRO(S)

EMENTA

DIREITO ADMINISTRATIVO. ATIVIDADE SANCIONATÓRIA OU DISCIPLINAR DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO PENAL COMUM. ARTS. 615, § 1o. E 664, PARÁG. ÚNICO DO CPP. NULIDADE DE DECISÃO PUNITIVA EM RAZÃO DE VOTO DÚPLICE DE COMPONENTE DE COLEGIADO. RECURSO PROVIDO.

1. Consoante precisas lições de eminentes doutrinadores e processualistas modernos, à atividade sancionatória ou disciplinar da Administração Pública se aplicam os princípios, garantias e normas que regem o Processo Penal comum, em respeito aos valores de proteção e defesa das liberdades individuais e da dignidade da pessoa humana, que se plasmaram no campo daquela disciplina.

2. A teor dos arts. 615, § 1o. e 664, parág. único do CPP, somente se admite o voto de qualidade - voto de Minerva ou voto de desempate - nos julgamentos recursais e mandamentais colegiados em que o Presidente do órgão plural não tenha proferido voto quantitativo; em caso contrário, na ocorrência de empate nos votos do julgamento, tem-se como adotada a decisão mais favorável ao acusado.

3. Os regimentos internos dos órgãos administrativos colegiados sancionadores, qual o Conselho da Polícia Civil do Paraná, devem obediência aos postulados do Processo Penal comum; prevalece, por ser mais benéfico ao indiciado, o resultado de julgamento que, ainda que por empate, cominou-lhe a sanção de suspensão por 90 dias, excluindo-se o voto presidencial de desempate que lhe atribuiu a pena de demissão, porquanto o voto desempatador é de ser desconsiderado.

4. Recurso a que se dá provimento, para considerar aplicada ao Servidor Policial Civil, no âmbito administrativo, a sanção suspensiva de 90 dias, por aplicação analógica dos arts. 615, § 1o. e 664, parág. único do CPP, inobstante o douto parecer ministerial em sentido contrário.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Laurita Vaz e

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 1 de 14

Superior Tribunal de Justiça

Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Sustentou oralmente na sessão de 01/12/2009: Dra. Vivian Cristina Lima López Valle (p/ recte).

Brasília/DF, 03 de dezembro de 2009 (Data do Julgamento).

NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

MINISTRO RELATOR

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 2 de 14

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 24.559 - PR (2007/0165377-1)

RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHORECORRENTE : FERNANDO FURLANETTO ADVOGADO : VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE E OUTRO(S)RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ PROCURADOR : DÉBORA FRANCO DE GODOY ANDREIS E OUTRO(S)

RELATÓRIO

1. Trata-se de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança

interposto por FERNANDO FURLANETTO contra acórdão do Tribunal de Justiça do

Paraná, que denegou a ordem ali impetrada, em aresto cuja ementa restou assim

redigida:

MANDADO DE SEGURANÇA - PROCEDIMENTO

ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - DELEGADO DE POLÍCIA - DELITO DE

CONCUSSÃO - DEMISSÃO - ALEGADA MOTIVAÇÃO EQUIVOCADA À

DECISÃO INDEFERITÓRIA DO RECURSO ADMINISTRATIVO -

IRREGULARIDADES INEXISTENTES - ABUSO DE DIREITO NÃO

CONFIGURADO - DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA.

Ao Judiciário não é dado adentrar no mérito da decisão

administrativa, cabendo-lhe, apenas, o controle de sua legalidade, mormente

no que diz respeito ao contraditório e ao direito de defesa (fls. 892).

2. Contra referido decisum, foram opostos Embargos de

Declaração, igualmente rejeitados.

3. O remédio constitucional foi impetrado contra ato do

Governador do Estado do Paraná, que demitiu o recorrente do cargo de Delegado

de Polícia Civil de 4a. Classe do Estado do Paraná, por infringência aos arts. 211,

inciso IV (exigir propina em razão do cargo) e 213, incisos XII (prática de ato que

compromete a instituição ou função policial), XIV (exigir vantagem em razão das

atribuições do cargo que exerce) e XXVI (deixar de levar ao conhecimento da

autoridade competente a ocorrência de falta funcional praticada por servidor que lhe

seja subordinado), todos do Estatuto da Polícia Civil do Paraná vigente à época (LC

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 3 de 14

Superior Tribunal de Justiça

14/1982).

4. No presente recurso, alega-se violação:

(I) ao princípio da impessoalidade no julgamento do Processo

Administrativo Disciplinar pelo Conselho da Polícia Civil, porquanto

dois votos pela demissão foram emitidos pela mesma pessoa, Sr.

Adauto Abreu de Oliveira, um na qualidade de membro do colegiado e

outro como Conselheiro do CPC;

(II) ao princípio da motivação e da inobservância da teoria dos

motivos determinantes, em face da equivocada motivação do ato,

tendo em vista que a Secretaria de Estado da Segurança não teria

ratificado a proposta constante na Deliberação 226/2003, que, por

maioria, teria sugerido a aplicação da pena de demissão; fato este

ignorado pelo Governador do Estado que, contraditoriamente, apontou

como fundamento de sua decisão justamente a ratificação da

proposta;

(III) ao princípio do in dubio pro reu, vez que teria sido demitido

sem base probatória, além de possuir fortes evidências de sua

inocência. Afirmou que a autoridade coatora teria ignorado os

posicionamentos da Secretaria de Segurança Pública, da Casa Civil e

da Procuradoria Geral do Estado, todos contrários à demissão e

reconhecendo a prescrição da sanção disciplinar de suspensão;

(IV) aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e

finalidade, tendo em vista a ausência de ponderação de valores como

boa-fé, inexperiência no exercício da função pública e ausência de

vontade de agir ilicitamente.

(V) ao princípio do non bis in idem, em razão da punição de

destituição de função ou remoção compulsória ter sido cumulada com

a penalidade de demissão.

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 4 de 14

Superior Tribunal de Justiça

5. Citam-se, ainda, outras irregularidades no julgamento

realizado pelo Conselho da Polícia Civil, tais como motivação do relator em

conjecturas e prova ilícita (quebra de sigilo bancário sem autorização judicial) e voto

do Presidente antes dos demais Conselheiros, ferindo assim a imparcialidade.

6. Em contrarrazões de fls. 981/989, o Estado do Paraná afirma

que o Processo Administrativo Disciplinar obedeceu todos os princípios a ele

aplicados, além de que a prática do ato restou comprovada não apenas na

investigação preliminar realizada pela Corregedoria, mas também na ação penal

que culminou com a condenação do paciente à pena de 2 anos e 6 meses de

reclusão, em regime aberto, e 15 dias-multa, posteriormente substituída por pena

restritiva de direito, prestação de serviços à comunidade e perda do cargo de

Delegado de Polícia.

7. O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do ilustre

Subprocurador-Geral da República SÉRGIO LUÍZ KUKINA, manifestou-se pelo

desprovimento do recurso.

8. É, em suma, o relatório.

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 5 de 14

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 24.559 - PR (2007/0165377-1)

RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHORECORRENTE : FERNANDO FURLANETTO ADVOGADO : VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE E OUTRO(S)RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ PROCURADOR : DÉBORA FRANCO DE GODOY ANDREIS E OUTRO(S)

VOTO

DIREITO ADMINISTRATIVO. ATIVIDADE SANCIONATÓRIA OU

DISCIPLINAR DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. APLICAÇÃO DOS

PRINCÍPIOS DO PROCESSO PENAL COMUM. ARTS. 615, § 1o. E 664,

PARÁG. ÚNICO DO CPP. NULIDADE DE DECISÃO PUNITIVA EM RAZÃO

DE VOTO DÚPLICE DE COMPONENTE DE COLEGIADO. RECURSO

PROVIDO.

1. Consoante precisas lições de eminentes doutrinadores e

processualistas modernos, à atividade sancionatória ou disciplinar da

Administração Pública se aplicam os princípios, garantias e normas que

regem o Processo Penal comum, em respeito aos valores de proteção e

defesa das liberdades individuais e da dignidade da pessoa humana, que se

plasmaram no campo daquela disciplina.

2. A teor dos arts. 615, § 1o. e 664, parág. único do CPP,

somente se admite o voto de qualidade - voto de Minerva ou voto de

desempate - nos julgamentos recursais e mandamentais colegiados em que

o Presidente do órgão plural não tenha proferido voto quantitativo; em caso

contrário, na ocorrência de empate nos votos do julgamento, tem-se como

adotada a decisão mais favorável ao acusado.

3. Os regimentos internos dos órgãos administrativos

colegiados sancionadores, qual o Conselho da Polícia Civil do Paraná, devem

obediência aos postulados do Processo Penal comum; prevalece, por ser

mais benéfico ao indiciado, o resultado de julgamento que, ainda que por

empate, cominou-lhe a sanção de suspensão por 90 dias, excluindo-se o voto

presidencial de desempate que lhe atribuiu a pena de demissão, porquanto o

voto desempatador é de ser desconsiderado.

4. Recurso a que se dá provimento, para considerar aplicada

ao Servidor Policial Civil, no âmbito administrativo, a sanção suspensiva de

90 dias, por aplicação analógica dos arts. 615, § 1o. e 664, parág. único do

CPP, inobstante o douto parecer ministerial em sentido contrário.

1. Os fundamentos que dão suporte a esta impetração

revestem-se de inquestionável plausibilidade jurídica, porquanto o caso põe em

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 6 de 14

Superior Tribunal de Justiça

evidência controvérsia impregnada de relevância jurídico-constitucional,

consideradas as graves implicações que a submissão a Processo Administrativo

Disciplinar impõe na esfera moral do Servidor, mormente quando resulta em

demissão do serviço público.

2. No caso, o impetrante aponta diversas nulidades no

julgamento colegiado do Processo Administrativo Disciplinar que culminou com sua

demissão do cargo de Delegado de Polícia Civil de 4a. Classe do Estado do Paraná,

dentre elas uma que se destaca por ter como suporte o reconhecimento de que

assiste ao acusado, no decorrer do Processo Disciplinar, as mesmas garantias e

direitos aplicáveis ao réu no âmbito penal.

3. Consoante precisas lições de eminentes doutrinadores e

processualistas modernos, à atividade sancionatória ou disciplinar da Administração

Pública se aplicam os princípios, garantias e normas que regem o Processo Penal

comum, em respeito aos valores de proteção e defesa das liberdades individuais e

da dignidade da pessoa humana, que se plasmaram no campo daquela disciplina.

4. Realmente não é nova a tendência dos autores de Direito

Administrativo em vindicar para o ramo sancionador dessa disciplina jurídica as

mesmas exigências que se aplicam ao Direito Penal, como pertinentemente aponta

o eminente Professor THEMISTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI, nominando os

preclaros mestres estrangeiros que sustentam essa mesma posição; diz o saudoso

e sempre lembrado Ministro:

Com o Direito Penal também tem o Direito Disciplinar relações muito

íntimas, porque o Direito Disciplinar é constituído essencialmente por um

regime de sanções e, por isso mesmo, sofre influência direta, imediata, do

Direito Penal.

Este capítulo das relações entre o Direito Disciplinar e o Direito

Penal é bastante interessante pela multiplicidade das doutrinas que se

entrechocam.

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 7 de 14

Superior Tribunal de Justiça

(...).

O Direito Penal procura absorver com seus princípios, sob a

influência, aliás, de idéias autoritórias, outras disciplinas jurídicas,

especialmente o Direito Administrativo e o Disciplinar, procurando uniformizar

o regime de sanções e penetrando na vida administrativa, no campo das

contravenções e das infrações administrativas, de um modo geral (Tratado de

Direito Administrativo, Freitas Bastos, São Paulo, 1960, vol. I, p. 107/110).

5. Estou em que essa tendência mereça e deva mesmo ser

maximamente prestigiada, para se criar a mentalidade de preservação dos direitos,

liberdades e garantias individuais, que são, em última análise, as características e

os fundamentos do Estado Democrático. Neste ponto, é de se ter claro que nem

todos os princípios originariamente compreendidos no Direito Penal são aplicáveis

ao Direito Sancionador de modo mecânico e automático, mas com adaptações a

suas peculiaridades.

6. In casu, afirma o recorrente que, diante do empate de votos no

julgamento do PAD instaurado contra si pelo Conselho da Polícia Civil, com dois

votos a favor da aplicação de suspensão por 90 dias e dois pela pena de demissão,

o Conselheiro ADAUTO DE OLIVEIRA, que já havia votado nesta primeira fase pela

aplicação da sanção de demissão, na qualidade de membro do Colegiado, emitiu

voto de minerva, agora como Presidente do Conselho da Polícia Civil, pronunciando

pela segunda vez pela demissão do recorrente.

7. Vê-se, portanto, que o Conselho da Polícia Civil, órgão

colegiado competente para julgamento do PAD instaurado contra os membros da

corporação, impôs a pena de demissão ao ora recorrente, por maioria de votos,

sendo que dois deles foram proferidos pela mesma pessoa, que participou

primeiramente como membro do Colegiado e, após sua nomeação, na qualidade de

Presidente do Conselho.

8. Neste ponto, é de se ter claro que, em matéria criminal, a teor

dos arts. 615, § 1o. e 664, parág. único do CPP, somente se admite o voto de

qualidade - voto de Minerva ou voto de desempate - nos julgamentos recursais e

mandamentais colegiados em que o Presidente do órgão plural não tenha proferido

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 8 de 14

Superior Tribunal de Justiça

voto quantitativo; em caso contrário, na ocorrência de empate nos votos do

julgamento, tem-se como adotada a decisão mais favorável ao acusado. Eis o teor

dos dispositivos:

Art. 615 - O tribunal decidirá por maioria de votos.

§ 1o. - Havendo empate de votos no julgamento de recursos, se o

presidente do tribunal, câmara ou turma, não tiver tomado parte na votação,

proferirá o voto de desempate; no caso contrário, prevalecerá a decisão mais

favorável ao réu.

(...).

Art. 664 - Recebidas as informações, ou dispensadas, o habeas

corpus será julgado na primeira sessão, podendo, entretanto, adiar-se o

julgamento para a sessão seguinte.

Parágrafo único. A decisão será tomada por maioria de votos.

Havendo empate, se o presidente não tiver tomado parte na votação,

proferirá voto de desempate; no caso contrário, prevalecerá a decisão mais

favorável ao paciente.

9. A previsão normativa tem por suporte a assertiva de que, o

direito penal reclama, em qualquer sede, respeito ao princípio da não culpabilidade

inscrito no art. 5o., LVII da CF/88, que dá suporte jurídico-constitucional à regra

decisória processual penal do in dubio pro reo, de sorte que, nos casos em que não

seja possível uma hermenêutica unívoca, mas se conclua pela possibilidade de

duas interpretações divergentes de uma norma legal, a obrigação é de se escolher a

mais favorável ao réu. Em outras palavras, a dúvida sempre deve beneficiar o

acusado.

10. Esse entendimento, que se revela atento e fiel ao princípio do

favor rei ou favor libertatis, adverte corretamente, com apoio na jurisprudência do

Pretório Excelso, que não se admite sequer a convocação de membro de outra

Turma ou Câmara para integrar o Colegiado e proferir o voto desempate, devendo

sempre prevalecer a solução jurídica mais favorável ao processado. A propósito,

confira-se o seguinte precedente do STF:

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 9 de 14

Superior Tribunal de Justiça

Recurso. Especial. Matéria criminal. Interposição contra acórdão

denegatório de pedido de habeas corpus. Julgamento pelo Tribunal Superior

de Justiça. Empate na votação. Convocação de Ministro de outra Turma para

voto de desempate. Inadmissibilidade. Previsão regimental, ademais, de

decisão favorável ao réu em sede de habeas corpus. Art. 41-A, § único, da

Lei n. 8.038/90. Aplicação analógica ao caso. Presunção constitucional de

não culpabilidade. Regra decisória do in dubio pro reo. HC concedido para

proclamar a decisão favorável ao réu. Precedentes. Inteligência do art. 5º,

LVII, da CF. Verificando-se empate no julgamento de recurso interposto pelo

réu em habeas corpus, proclama-se-lhe como resultado a decisão mais

favorável ao paciente. (HC 89.974, Rel. Min. CEZAR PELUSO, DJU

05.12.08).

11. Penso, então, que os regimentos internos dos órgãos

administrativos colegiados sancionadores, qual o Conselho da Polícia Civil do

Paraná, devem obediência a garantia processual em evidência, da mesma forma

como aplicado no âmbito penal.

12. Prevalece, por ser mais benéfico ao indiciado, o resultado de

julgamento que, ainda que por empate, cominou-lhe a sanção de suspensão por 90

dias, excluindo-se o voto presidencial de desempate que lhe atribuiu a pena de

demissão, porquanto o voto desempatador é de ser desconsiderado.

13. Como visto, o empate na votação não autoriza o chamado voto

Minerva nos procedimentos que tutelem o poder punitivo do Estado, em face do

princípio do in dubio pro reu que se irradia tanto no ordenamento penal quanto no

administrativo sancionador. Ainda que assim não fosse, admitir-se a validade de

dois votos proferidos pela mesma pessoa na mesma causa, ainda que no exercício

de funções diferentes, ofende o bom senso e a lógica jurídica do julgamento por

Colegiado.

14. Dest'arte, a norma infraconstitucional que estabeleça critério de

desempate para decisão colegiada, mormente quando já proferido voto pelo

Presidente do órgão julgador, ainda que não tenha sido na qualidade de dirigente

dos trabalhos, deve ser interpretada em harmonia com o texto constitucional.

15. Penso, portanto, presentes as razões expostas, que o ato ora

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 1 0 de 14

Superior Tribunal de Justiça

impugnado não se legitima em face da presunção constitucional de

não-culpabilidade dos réus, inscrita no art. 5o., LVII da Carta Política, que

fundamenta e justifica a garantia de aplicação da decisão mais favorável ao

acusado em caso de empate na votação pelo Colegiado.

16. Frise-se, por oportuno, que o ato do Governador se baseou na

deliberação do Conselho da Polícia Civil pela aplicação da pena de demissão, como

se verifica do teor da decisão governamental no Recurso Administrativo interposto

pelo recorrente:

Desta forma, INDEFIRO o presente recurso administrativo, aplicando

a penalidade de demissão sugerida pelo Conselho da Polícia Civil,

obedecidas todas as formalidades legais, uma vez que foi observado o

disposto no art. 5o., inciso LV, da Carta Magna, bem como todos os trâmites

legais contidos na Lei Complementar 14/82, com suas posteriores alterações

diante dos fatos constantes dos autos (fls. 745).

17. Em face do exposto, dá-se provimento ao presente Recurso,

para considerar aplicada ao Servidor Policial Civil, no âmbito administrativo, a

sanção suspensiva de 90 dias, por aplicação analógica dos arts. 615, § 1o. e 664,

parág. único do CPP, inobstante o douto parecer ministerial em sentido contrário.

18. É como voto.

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 1 1 de 14

Superior Tribunal de Justiça

CERTIDÃO DE JULGAMENTOQUINTA TURMA

Número Registro: 2007/0165377-1 RMS 24559 / PR

Números Origem: 200700059000 3398621

PAUTA: 01/12/2009 JULGADO: 01/12/2009

RelatorExmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Presidente da SessãoExmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Subprocurador-Geral da RepúblicaExmo. Sr. Dr. FRANCISCO XAVIER PINHEIRO FILHO

SecretárioBel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : FERNANDO FURLANETTOADVOGADO : VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE E OUTRO(S)RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁPROCURADOR : DÉBORA FRANCO DE GODOY ANDREIS E OUTRO(S)

ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Servidor Público Civil - Processo Administrativo Disciplinar ou Sindicância - Demissão ou Exoneração

SUSTENTAÇÃO ORAL

SUSTENTOU ORALMENTE: DRA. VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE (P/ RECTE)

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Após o voto do Sr. Ministro Relator dando provimento ao recurso, no que foi aocmpanhado pelos votos dos Srs. Ministros Jorge Mussi e Laurita Vaz, pediu vista o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima."

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília, 01 de dezembro de 2009

LAURO ROCHA REISSecretário

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 1 2 de 14

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 24.559 - PR (2007/0165377-1)

RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHORECORRENTE : FERNANDO FURLANETTO ADVOGADO : VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE E OUTRO(S)RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ PROCURADOR : DÉBORA FRANCO DE GODOY ANDREIS E OUTRO(S)

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA: Examinei aquela hipótese do julgamento pelo Conselho em que houve empate,

e o Presidente proferiu o voto de minerva. Acompanho o voto de V. Exa., seja por essa

motivação, que nem levei muito em conta, seja pelo próprio mérito, em si, realmente não

tinha fundamento para a demissão.

O Tribunal adotou, no acórdão, aquele entendimento antigo que está superado,

tanto na doutrina, quanto na jurisprudência, segundo o qual o Judiciário não poderia apreciar

o mérito e, por isso mesmo, não avaliou as questões propriamente por entender que não

podia, que aquilo era privativo do Executivo. Mas verificando o mérito, como é cabível,

realmente não tinha fundamento para a demissão do Delegado.

Assim, dou provimento ao recurso em mandado de segurança.

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 1 3 de 14

Superior Tribunal de Justiça

CERTIDÃO DE JULGAMENTOQUINTA TURMA

Número Registro: 2007/0165377-1 RMS 24559 / PR

Números Origem: 200700059000 3398621

PAUTA: 01/12/2009 JULGADO: 03/12/2009

RelatorExmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Presidente da SessãoExmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Subprocuradora-Geral da RepúblicaExma. Sra. Dra. ÁUREA M. E. N. LUSTOSA PIERRE

SecretárioBel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : FERNANDO FURLANETTOADVOGADO : VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE E OUTRO(S)RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁPROCURADOR : DÉBORA FRANCO DE GODOY ANDREIS E OUTRO(S)

ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Servidor Público Civil - Processo Administrativo Disciplinar ou Sindicância - Demissão ou Exoneração

SUSTENTAÇÃO ORAL

SUSTENTOU ORALMENTE NA SESSÃO DE 01/12/2009: DRA. VIVIAN CRISTINA LIMA LÓPEZ VALLE (P/ RECTE)

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Prosseguindo no julgamento, a Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília, 03 de dezembro de 2009

LAURO ROCHA REISSecretário

Documento: 933506 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 01/02/2010 Página 1 4 de 14