assédio moral à luz do direito militar

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  • 7/24/2019 Assdio Moral Luz Do Direito Militar

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    UNIVERSIDADE CASTELO BRANCOEXRCITO BRASILEIRO

    DEPARTAMENTO DE EDUCAO E CULTURACENTRO DE ESTUDOS DE PESSOAL

    CENTRO DE ESTUDOS DE DIREITO MILITARESPECIALIZAO EM DIREITO MILITAR

    YURI DA SILVA GUIMARES

    ASSDIO MORAL LUZ DO DIREITO MILITAR:FORAS ARMADAS

    RIO DE JANEIRO-RJ2009

    http://www.exercito.gov.br/
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    YURI DA SILVA GUIMARES

    ASSDIO MORAL LUZ DO DIREITO MILITAR:FORAS ARMADAS

    Trabalho Final de Curso apresentadocomo requisito, para a obteno do graude especialista em Direito Militar pelaUniversidade Castelo Branco.

    Orientador: Professor Doutor Afranio Faustino de Paula Filho

    RIO DE JANEIRO-RJ2009

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    Guimares, Yuri Silva. Assdio Moral a Luz do Direito Militar: DireitoMilitar.Yuri da Silva Guimares. -2009.

    69fls.Orientador: Afranio Faustino de Paula Filho

    Trabalho Final de Curso Universidade Castelo Branco.

    1 dignidade.. 2. Direitos da personalidade. 3. tica, moral. 4. Terrorpsicolgico. 5. Abuso de poder. 6. Arbitrariedade. 7. Coao. 8.Humilhao. 9. Assdio moral. 10. Foras Armadas. 11. Militar. 12.Hierarquia. 13. Disciplina.

    I. Paula Filho, Afrnio Faustino de II. Exrcito Brasileiro/UniversidadeCastelo Branco. III. Ttulo.

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    YURI DA SILVA GUIMARES

    ASSDIO MORAL LUZ DO DIREITO MILITAR:FORAS ARMADAS

    Trabalho Final de Curso apresentado como requisito para a obteno do grau deespecialista em Direito Militar pela Universidade Castelo Branco.

    Obteve o grau_________ Em__________/_________/_________

    Professor .......................................................Orientador

    Professor ....................................................

    Avaliador

    Professor ....................................................Coordenador

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    Aos meus pais, Eirton e Ieda quesempre me deram apoio, a minhaesposa Alessandra pela pacincia

    e dedicao a mim prestada.

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    Foram muitos, os que me ajudaram a concluir este trabalho.Meus sinceros agradecimentos...

    ...a Deus, pois, sem sua ajuda, nada teria sido possvel;... minha famlia, pela confiana e pelo apoio;...a minha esposa, por sua fora, conhecimento e disposio,

    diante das minhas limitaes;... banca examinadora pela confiana e qualificao;

    ... direo, aos professores e aos colegas que participaram deste trabalho;...ao Prof. Dr. Porto, por aceitar a orientao deste estudo e conduzir seu

    desenvolvimento com muita sabedoria e pacincia.

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    Acordemos

    sempre fcil

    examinar as conscincias alheias,

    identificar os erros do prximo,

    opinar em questes que no nos dizem respeito,

    indicar as fraquezas dos semelhantes,

    educar os filhos dos vizinhos,

    reprovar as deficincias dos companheiros,

    corrigir os defeitos dos outros,

    aconselhar o caminho reto a quem passa,

    receitar pacincia a quem sofre

    e retificar as ms qualidades de quem segue conosco...

    (Francisco Candido Xavier)

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    RESUMO

    As arbitrariedades cometidas no intuito de depreciar a dignidade do funcionrio,

    causando-lhe danos, podem ser entendidas como assdio moral, dependendo docontexto. O escopo deste trabalho mostrar como esse fenmeno pode vir a ocorrer

    dentro da administrao militar luz de estudos baseados na doutrina,

    jurisprudncia, legislao, entre outros, bem como esclarecer as principais

    caractersticas do assdio moral e os cuidados que o intrprete deve tomar antes de

    afirmar se houve ou no a caracterizao do psicoterror, alm de demonstrar quais

    os direitos do trabalhador que so atingidos e as repercusses que o assdio moral

    causa.

    PALAVRAS-CHAVE: dignidade, direitos da personalidade, tica, moral, terror

    psicolgico, abuso de poder, arbitrariedade, coao, humilhao, assdio moral,

    Foras Armadas, militar, hierarquia, disciplina.

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    SUMRIO

    I INTRODUO..................................................................................................101.1 O Princpio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana como PrincpioFundamental ......................................................................................................121.2 Conceitos de Dignidade ...............................................................................131.3 O princpio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana e seus Reflexosno Sistema Jurdico Brasileiro............................................................................13

    II DIREITOS DA PERSONALIDADE ..................................................................152.1 Conceitos de Dignidade ...............................................................................15

    III - DIREITOS DA PERSONALIDADE ..................................................................18

    3.1 Tutelas dos direitos da personalidade..........................................................203.2 Direitos da personalidade e sua relao com o princpio constitucional dadignidade da pessoa humana ............................................................................22

    IV ASSDIO MORAL..........................................................................................254.1 Atos e Comportamentos que Podem Desencadear o Assdio Moral ..........264.2 - Caractersticas do Agressor.......................................................................284.3 Caractersticas da Vtima .............................................................................294.4 Dignidades da pessoa humana, direitos de personalidade e o assdio moral...........................................................................................................................304.5 Os diferentes nomes dados ao assdio moral .............................................304.6 Conseqncias do assdio moral ................................................................32

    4.7 Conseqncias para a vtima.......................................................................334.8 Conseqncias para o empregador .............................................................354.9 Conseqncias para o Estado .....................................................................37

    V - O ASSDIO MORAL E AS FORAS ARMADAS ............................................415.1 Limites na disciplina militar...........................................................................435.2 Assdio moral nas Foras Armadas.............................................................455.3 Crimes militares que podem caracterizar-se como processo de assdiomoral ..................................................................................................................505.4 A provocao indireta do suicdio ................................................................555.5 Maneiras de Preveno Contra os Abusos..................................................565.6 A responsabilidade civil do Estado proveniente do assdio moral nas Foras

    Armadas.............................................................................................................615.7 Competncias para examinar o assdio moral nas Foras Armadas ..........635.8 Prescrio para vtima ajuizar ao contra o Estado ...................................64

    VI CONCLUSO.................................................................................................65VII REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ..............................................................67

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    I INTRODUO

    O assdio moral , de fato, prtica muito antiga que aflige a dignidade dohomem, trazendo-lhe diversos transtornos. Contudo, s recentemente que algumas

    reas profissionais (psicologia, direito e medicina, entre outras) comearam a

    estudar o tema e dar-lhe a importncia que merece, j que engloba muitos detalhes

    sutis e complexos.

    Esta pesquisa tem a finalidade de mostrar que o assdio moral atinge a

    dignidade da pessoa humana, perturbando seriamente a integridade psicofsica da

    vtima, alm de poder abalar tambm a famlia do assediado e pessoas prximas do

    mesmo. E isso no s nas relaes de trabalho privado, mas tambm no servio

    pblico e, conseqentemente, alcanando os militares. O ambiente militar, por sua

    estrutura rigidamente hierarquizada, permite desvios de conduta por parte de uma

    minoria de superiores hierrquicos. No entanto, ao analisar um caso concreto do

    fenmeno, o intrprete tem de ter o cuidado necessrio para no cometer equvoco,

    sendo objetivo deste trabalho, tambm, mostrar as principais facetas e

    caractersticas do assdio moral. Dessa maneira, sero feitas anlises concisas

    luz da doutrina, jurisprudncia e legislao no intuito de esclarecer o tema.

    Assim, no primeiro captulo desta obra, mostrar-se- a importncia dos

    princpios fundamentais no sistema jurdico ptrio. Verificar-se- como os mesmos

    devem vincular a atuao do Estado e seus componentes de um modo geral.

    Por conseguinte, sero feitas consideraes sobre o princpio da dignidade da

    pessoa humana e como esse princpio fundamental tem sido encarado pelos

    juristas.

    No segundo captulo, discorrer-se- a respeito dos direitos da personalidade,

    de forma que ser feita uma anlise detalhada quanto personalidade civil

    mostrando seu incio e fim, alm da apreciao da questo da tutela alcanada por

    esses direitos. Verificar-se-, tambm, os laos existentes entre os direitos da

    personalidade e o princpio constitucional da dignidade da pessoa humana.

    J no terceiro captulo, estudar-se- de maneira aprofundada o assdio moral,

    com anlise dos tipos de comportamentos que podem compor o processo de

    psicoterror, bem como as principais caractersticas do sujeito passivo e ativo.

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    Posteriormente, examinar-se- como o assdio moral afeta diretamente os

    direitos da personalidade alm de ser prtica inconstitucional. Ser feita tambm

    uma anlise do fenmeno no contexto mundial. Logo aps, estudar-se-o as

    conseqncias causadas pelo psicoterror para a vtima, para o empregador e para o

    Estado, de maneira geral. Adiante, o exame da questo da legislao no estrangeiro

    e no Brasil. Mais frente, abordar-se-o as melhores formas de prevenir e amenizar

    o problema.

    E finalmente, no ltimo captulo, analisar-se-o os princpios que regem a vida

    militar e os seus limites. Em seguida, a apreciao do momento em que o assdio

    moral pode ocorrer nas Foras Armadas, assim como os crimes que podem fazer

    parte desse processo. Por conseguinte, enfocar-se- como a vtima pode prevenir-se do assdio moral na caserna.

    Posteriormente, examinar-se- a responsabilidade civil do Estado proveniente

    do assdio moral e, aps, a questo da competncia para estudar o pleito de

    assdio moral nas Foras Armadas, alm do prazo prescricional para o assediado

    ajuizar ao contra o Estado.

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    1.1 O Princpio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana como PrincpioFundamental

    Neste incio de trabalho, enfocar-se- algumas consideraes sobre oprincpio constitucional da dignidade da pessoa humana e os reflexos que o mesmo

    causa no ordenamento jurdico brasileiro

    Por primeiro, importante ressaltar o conceito de princpio, a fim de enfatizar

    melhor o princpio da dignidade da pessoa humana posteriormente. Segundo De

    Plcido e Silva, princpio significa as normas elementares ou os requisitos

    primordiais institudos como base, como alicerce de alguma coisa. [...] exprimem

    sentido mais relevante que o da prpria norma ou regra jurdica. O autor destaca

    ainda: Princpios jurdicos, sem dvida, significam os pontos bsicos, que servem

    de ponto de partida ou de elementos vitais do prprio Direito. Indicam o alicerce do

    Direito. [grifo do autor] Nesse sentido, apreende-se que os princpios so o

    fundamento e a base principais do direito, visto que toda e qualquer ao jurdica se

    nos originam mesmos.

    O reflexo no ordenamento jurdico brasileiro dos princpios constitucionais

    fundamentais Os princpios constitucionais fundamentais esto dispostos no artigo

    1 da Constituio Federal de 1988. So eles: a soberania, a cidadania, a dignidade

    da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo

    poltico. Sobre tais princpios, Manoel Messias Peixinho assim aborda: Os princpios

    constitucionais fundamentais ocupam o mais alto posto na escala normativa. [...] Os

    princpios fundamentais se identificam com os valores supremos previstos em todas

    as Constituies, expressos em valores culturais, poticos que se traduzem nas

    intenes que formam o ncleo material da Constituio.

    Esses princpios fundamentais esto, sem dvida, numa posio

    hierarquicamente superior s outras normas constitucionais [...].

    Nessa mesma direo, Manoel Jorge e Silva Neto explicam que os Princpios

    Fundamentais, na condio de postulados constitucionais vinculativos, conformam

    de modo absoluto o atuar da Administrao Pblica.

    Portanto os princpios fundamentais previstos na Constituio concebem o

    arcabouo jurdico que deve servir de norte e orientao aos operadores do direito

    em nome da prpria segurana jurdica. Eles representam a manifestao primeirados valores constitucionais, de modo que, ignor-los seria desconsiderar a

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    importncia simblica da Constituio e seu significado histrico enquanto reflexo de

    expectativas da comunidade.

    1.2 Conceitos de Dignidade

    Por dignidade, Aurlio Buarque de Holanda Ferreira entende como sendo

    Decncia, decoro. Para De Plcido e Silva dignidade consiste no seguinte: [...] em

    regra se entende a qualidade moral, que, possuda por uma pessoa, serve de base

    ao prprio respeito em que tida.

    Compreende-se tambm como o prprio procedimento da pessoa, pelo qual se faz

    merecedor do conceito pblico.

    Orlando Teixeira da Costa explana sobre o significado de dignidade da

    seguinte forma: A palavra dignidade provm do latim dignitas, dignitatis e

    significa, entre outras coisas, a qualidade moral que infunde respeito, a conscincia

    do prprio valor. Ao falar-se em dignidade da pessoa humana quer-se significar a

    excelncia que esta possui em razo da sua prpria natureza. Se for digna qualquer

    pessoa humana, tambm o o trabalhador, por ser uma pessoa humana. a

    dignidade da pessoa humana do trabalhador que faz prevalecer os seus direitos

    estigmatizando toda manobra tendente a desrespeitar ou corromper de qualquer

    forma que seja esse instrumento valioso, feito imagem de Deus.

    Logo, a dignidade atributo intrnseco, da essncia, da pessoa humana,

    sendo que todo ser humano tem dignidade s pelo fato de ser pessoa.

    Assim, percebe-se que dignidade consiste num conjunto de atribuies

    morais protegidas pelo direito e inatos ao homem para direcionar sua vida enquanto

    ser social, visando no s o prprio bem-estar como o da sociedade num todo.

    1.3 O princpio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana e seusReflexos no Sistema Jurdico Brasileiro

    luz do exposto, pode-se inferir que o motivo pelo qual a Repblica

    Federativa do Brasil adotou como um de seus fundamentos o princpio da dignidade

    da pessoa humana, conforme disposto no inciso III do artigo 1 da Carta Magna de

    1988, deve-se ao fato de os princpios serem base do ordenamento jurdico ptrio

    e a dignidade representa o valor intrnseco da pessoa e diz respeito prpria razode existir do ser humano.

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    Por essa ptica, fica claro por que o princpio da dignidade da pessoa humana

    encontra-se num patamar merecedor de respeito, visto que um princpio

    fundamental e que o mesmo deve estear as operaes jurdicas. Manoel Jorge e

    Silva Neto apontam o supracitado princpio como o fundamento de maior essncia

    do Estado brasileiro, adiante:

    A dignidade da pessoa humana o fim supremo de todo o direito; logo,

    expande os seus efeitos nos mais distintos domnios normativos para fundamentar

    toda e qualquer interpretao. o fundamento maior do Estado brasileiro.

    O autor salienta ainda:

    Sendo a dignidade da pessoa humana o valor fonte

    de todos os valores constitucionalmente postos, deve serutilizada como balizamento para eventual declarao de

    inconstitucionalidade de lei ou ato do Poder Pblico, ou

    mesmo para conformar o comportamento de quem quer que

    esteja, no caso concreto, ofendendo o Princpio Fundamental

    em questo.

    Na opinio de Eduardo Vera-Cruz, a dignidade da pessoa humana um

    superprincpio, avante:

    o valor da dignidade humana que a ordem jurdica

    encontra seu prprio sentido, sendo seu ponto de partida e

    seu ponto de chegada, na tarefa de interpretao normativa.

    Consagra-se, assim, a dignidade humana como verdadeiro

    superprincpio a orientar o Direito Internacional e Interno.

    Luiz Antnio Rizzatto Nunes faz a seguinte considerao: sem sombra de

    dvida, a luz fundamental, a estrela mxima do universo principio lgico, a

    dignidade da pessoa humana.

    Logo, conclui-se que o princpio da dignidade da pessoa humana o princpio

    fundamental mais sublime elencado pela Constituio Federal de 1988, sendo o

    mesmo o principal guia principio lgico no s para os operadores do direito como

    tambm para o Estado e seus componentes, devendo nortear o modo de atuao do

    ente pblico.

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    II DIREITOS DA PERSONALIDADE

    Neste captulo trabalhar-se- o conceito de personalidade, alm de fixar a

    definio e a tutela dos direitos da personalidade e sua ligao com o princpio da

    dignidade da pessoa humana no sistema jurdico brasileiro.

    Consoante De Plcido e Silva podem conceituar personalidade como sendo

    o conjunto de elementos, que se mostram prprios ou inerentes pessoa, formando

    ou constituindo um indivduo que, em tudo, morfolgica, fisiolgica e

    psicologicamente se diferencia de qualquer outro. [...] a qualidade de pessoa. O

    educador conclui dizendo que A personalidade, portanto, exprime o carter prprio,

    e designa a vida com independncia, a vida autnoma.

    Assim sendo, pode-se dizer, genericamente, que personalidade uma srie

    de fatores que determina a individualidade duma pessoa moral. um conjunto de

    caracteres prprios da pessoa. , portanto, objeto de direito.

    2.1 Conceitos de Dignidade

    Por dignidade, Aurlio Buarque de Holanda Ferreira entende como sendoDecncia, decoro. Para De Plcido e Silva dignidade consiste no seguinte:

    [...] em regra se entende a qualidade moral, que, possuda

    por uma pessoa, serve de base ao prprio respeito em que

    tida. Compreende-se tambm como o prprio procedimento

    da pessoa, pelo qual se faz merecedor do conceito pblico.

    Orlando Teixeira da Costa explana sobre o significado de dignidade daseguinte forma:

    A palavra dignidade provm do latim dignitas,

    dignitatis e significa, entre outras coisas, a qualidade moral

    que infunde respeito, a conscincia do prprio valor. Ao falar-

    se em dignidade da pessoa humana quer-se significar a

    excelncia que esta possui em razo da sua prpria natureza.

    Se for digna qualquer pessoa humana, tambm o o

    trabalhador, por ser uma pessoa humana. a dignidade da

    pessoa humana do trabalhador que faz prevalecer os seus

    direitos estigmatizando toda manobra tendente a desrespeitar

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    ou corromper de qualquer forma que seja esse instrumento

    valioso, feito imagem de Deus.

    Logo, a dignidade atributo intrnseco, da essncia, da pessoa humana,sendo que todo ser humano tem dignidade s pelo fato de ser pessoa. Assim,

    percebe-se que dignidade consiste num conjunto de atribuies morais protegidas

    pelo direito e inatos ao homem para direcionar sua vida enquanto ser social, visando

    no s o prprio bem-estar como o da sociedade num todo.

    luz do exposto, pode-se inferir que o motivo pelo qual a Repblica

    Federativa do Brasil adotou como um de seus fundamentos o princpio da dignidade

    da pessoa humana, conforme disposto no inciso III do artigo 1 da Carta Magna de

    1988, deve-se ao fato de os princpios serem base do ordenamento jurdico ptrio

    e a dignidade representa o valor intrnseco da pessoa e diz respeito prpria razo

    de existir do ser humano.

    Por essa ptica, fica claro por que o princpio da dignidade da pessoa humana

    encontra-se num patamar merecedor de respeito, visto que um princpio

    fundamental e que o mesmo deve estear as operaes jurdicas. Manoel Jorge e

    Silva Neto aponta o supracitado princpio como o fundamento de maior essncia do

    Estado brasileiro, adiante: A dignidade da pessoa humana o fim supremo de todo

    o direito; logo, expande os seus efeitos nos mais distintos domnios normativos para

    fundamentar toda e qualquer interpretao. o fundamento maior do Estado

    brasileiro.

    O autor salienta ainda:

    Sendo a dignidade da pessoa humana o valor fonte

    de todos os valores constitucionalmente postos, deve serutilizada como balizamento para eventual declarao de

    inconstitucionalidade de lei ou ato do Poder Pblico, ou

    mesmo para conformar o comportamento de quem quer que

    esteja, no caso concreto, ofendendo o Princpio Fundamental

    em questo.

    Na opinio de Eduardo Vera-Cruz, a dignidade da pessoa humana um

    superprincpio, avante:

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    o valor da dignidade humana que a ordem jurdica encontra seu prprio

    sentido, sendo seu ponto de partida e seu ponto de chegada, na tarefa de

    interpretao normativa. Consagra-se, assim, a dignidade humana como verdadeiro

    superprincpio a orientar o Direito Internacional e Interno.

    Luiz Antnio Rizzatto Nunes faz a seguinte considerao: sem sombra de

    dvida, a luz fundamental, a estrela mxima do universo principio lgico, a

    dignidade da pessoa humana.

    Logo, conclui-se que o princpio da dignidade da pessoa humana o princpio

    fundamental mais sublime elencado pela Constituio Federal de 1988, sendo o

    mesmo o principal guia principio lgico no s para os operadores do direito como

    tambm para o Estado e seus componentes, devendo nortear o modo de atuao doente pblico.

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    III - DIREITOS DA PERSONALIDADE

    Neste captulo trabalhar-se- o conceito de personalidade, alm de fixar a

    definio e a tutela dos direitos da personalidade e sua ligao com o princpio da

    dignidade da pessoa humana no sistema jurdico brasileiro.

    Consoante De Plcido e Silva podem conceituar personalidade como sendo

    o conjunto de elementos, que se mostram prprios ou inerentes pessoa, formando

    ou constituindo um indivduo que, em tudo, morfolgica, fisiolgica e

    psicologicamente se diferencia de qualquer outro. [...] a qualidade de pessoa. O

    educador conclui dizendo que A personalidade, portanto, exprime o carter prprio,

    e designa a vida com independncia, a vida autnoma.

    Assim sendo, pode-se dizer, genericamente, que personalidade uma srie

    de fatores que determina a individualidade duma pessoa moral. um conjunto de

    caracteres prprios da pessoa. , portanto, objeto de direito.

    A personalidade civil atribuda ao homem desde o seu nascimento com

    vida, estando intimamente ligada pessoa, pois exprime a aptido genrica para

    adquirir direitos e contrair obrigaes. Nos dizeres de Caio Mrio da Silva Pereira A

    personalidade, como atributo da pessoa humana, est a ela indissoluvelmenteligada. Sua durao a da vida. Desde que vive e enquanto vive, o homem dotado

    de personalidade. Assim, fica transparente que o simples fato do homem existir, j o

    faz ter personalidade, ou seja, a personalidade j nasce e inerente pessoa

    estando ligada a ela perpetuamente e, por isso, no um direito, mas, sim, objeto

    de direito. Com esse raciocnio, Maria Helena Diniz:

    A personalidade no um direito, de modo que seria errneo afirmar que o

    ser humano tem direito personalidade. A personalidade que apia os direitos edeveres que dela irradiam, objeto de direito, o primeiro bem da pessoa, que lhe

    pertence como primeira utilidade, para que ela possa ser o que , para sobreviver e

    se adaptar s condies do ambiente em que se encontra, servindo-lhe de critrio

    para aferir, adquirir e ordenar outros bens.

    Corroborando a idia da autora, Slvio de Salvo Venosa afirma: A

    personalidade no exatamente um direito; um conceito bsico sobre o qual se

    apiam os direitos. No mesmo sentido, Pietro Perlingieri: A personalidade ,

    portanto, no um direito, mas um valor (o valor fundamental do ordenamento) e est

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    na base de uma srie aberta de situaes existenciais, nas quais se traduz a sua

    incessantemente mutvel exigncia de tutela.

    A personalidade civil s se encerra com a morte do indivduo, sendo que

    qualquer ameaa ou leso sofrida por seu titular, passa a ser requerida por seu

    cnjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral at o quarto

    grau, conforme dispe o pargrafo nico do artigo 12 do Cdigo Civil vigente.

    Explicando sobre a definio dos direitos da personalidade, Silvio Rodrigues

    esclarece:

    [...] so inerentes pessoa humana e portanto a ela ligados

    de maneira perptua e permanente, no se podendo mesmoconceber um indivduo que no tenha direito vida,

    liberdade fsica ou intelectual, ao seu nome, ao seu corpo,

    sua imagem e quilo que ele cr ser sua honra.

    Nas anotaes feitas por Maria Helena Diniz tem-se a seguinte considerao

    sobre direitos da personalidade:

    So direitos subjetivos da pessoa de defender o que

    lhe prprio, ou seja, a sua integridade fsica (vida,alimentos, prprio corpo vivo ou morto, corpo alheio vivo ou

    morto, partes separadas do corpo vivo ou morto); a sua

    integridade intelectual (liberdade de pensamento, autoria

    cientfica, artstica e literria) e sua integridade moral (honra,

    recato, segredo pessoal, profissional e domstico, imagem,

    identidade pessoal, familiar e social).

    Os direitos da personalidade so da prpria essncia humana, e eles so

    fundamentais ao desenvolvimento do ser humano como explicita Orlando Gomes:

    Sob a denominao de direitos da personalidade, compreendem-se direitos

    considerados essenciais pessoa humana, que a doutrina moderna preconiza e

    disciplina, a fim de resguardar a sua dignidade. Seguindo essa inteligncia, Silvio

    Romero Beltro define os direitos da personalidade como categoria especial de

    direitos subjetivos que, fundados na dignidade da pessoa humana, garantem o gozo

    e o respeito ao seu prprio ser, em todas as suas manifestaes. Autor salienta

    ainda: [...] sendo a pessoa o fim do direito, a pessoa representa o valor a tutelar na

    proteo de seu interesse moral e material e no desenvolvimento de sua

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    [...] os direitos da personalidade distribuem-se em duas categorias gerais: adquiridos

    por um lado, e inatos por outro lado. Os adquiridos (como decorrncia do status

    individual) existem nos termos e na extenso de como o direito positivo os disciplina.

    Os inatos (como o direito vida, o direito integridade fsica e moral),

    sobrepostos a qualquer condio legislativa, so absolutos, irrenunciveis,

    intransmissveis, imprescritveis: absolutos, porque oponveis erga omnes;

    irrenunciveis, porque esto vinculados pessoa de seu titular. Intimamente

    vinculados pessoa, no pode esta abdicar deles, ainda que para subsistir;

    intransmissveis, porque o indivduo goza de seus atributos, sendo invlida toda

    tentativa de sua cesso a outrem, por ato gratuito como oneroso; imprescritveis,

    porque sempre poder o titular invoc-los, mesmo que por largo tempo deixe deutiliz-los.

    Desse modo, compreende-se que os direitos da personalidade tutelam a

    integridade fsica, alm da integridade intelectual e moral da pessoa humana.

    A grande gama doutrinria separa a integridade do indivduo por tipos (integridade

    fsica e moral/psquica ou ainda intelectual). Outro grupo defende que o ser humano

    tem de ser analisado como um todo, atravs de um conceito unitrio de

    personalidade. Com esse pensamento, leciona Elimar Szaniawski:

    A doutrina predominante, praticamente no adota a

    concepo unitria do direito integridade do homem,

    possuidor de um direito integridade psicofsica, preferindo

    dar tratamento separado por intermdio de duas tipificaes,

    tutelando um direito integridade fsica e um direito

    integridade psquica, possuindo, ambos os direitos, a

    natureza de um direito de personalidade.

    Parece-nos que essa dicotomia tradicional no consegue alcanar a ampla e

    verdadeira tutela que se deve outorgar pessoa humana, pois nenhum dos dois

    direitos, isoladamente, protege o direito integridade do corpo humano, o direito

    sade, de um modo geral, e um direito ao pudor, estando nesses inseridos o direito

    integridade psquica e o direito integridade fsica. J o direito integridade

    psicofsica, visto de um modo unitrio, abrange todos esses tipos e subtipos sob a

    mesma denominao, tutelando esses direitos de uma vez s, j que a psique

    pertence estrutura do indivduo, compe a pessoa, integrando-se prpria

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    personalidade e a tutela do indivduo deve-se fazer por inteiro como um todo. Por

    isso, damos preferncia ao conceito unitrio de personalidade.

    O Cdigo Civil, no captulo destinado aos direitos da personalidade, s se

    refere expressamente integridade fsica. Porm, em seu artigo 12 consolida que

    Pode-se exigir que cesse a ameaa, ou a leso, a direito da personalidade, e

    reclamar perdas e danos, sem prejuzo de outras sanes previstas em lei. Aqui o

    Cdigo no fez distino entre integridade fsica, intelectual ou psquica. Menciona

    apenas direito da personalidade, ou seja, a finalidade da tutela dos direitos da

    personalidade proteger a integridade do homem por inteiro, quer fisicamente, quer

    psicologicamente. O objetivo do citado diploma legal mostrar que

    independentemente do tipo de integridade, esse direito da personalidade e, porisso, tem de ser protegido. Ademais, uma pessoa que no tem seu direito

    integridade moral (honra pessoal, o bom nome, a boa fama, a reputao,...)

    protegido, fica reduzida a condio de animal de pequena significao, motivo pelo

    qual o respeito incolumidade moral do indivduo assume feio de direito

    fundamental.

    Para Pietro Perlingieri a tutela da integridade psquica atuvel tambm

    onde a norma se limitou a tutelar a integridade fsica.Agora se o correto utilizar um conceito unitrio de personalidade ou uma

    dicotomia, no o objetivo deste trabalho. Certo que a integridade da

    personalidade humana tem de ser preservada, seja fsica, seja moral, e a legislao

    em vigor assim o faz. Outrossim, no existe um nmero fechado de hipteses

    tuteladas: tutelado o valor da pessoa sem limites.

    3.2 Direitos da personalidade e sua relao com o princpio constitucional da

    dignidade da pessoa humana

    Segundo Renan Lotufo, os direitos da personalidade so o mnimo

    imprescindvel para o ser humano desenvolver-se dignamente. Assim, evidente

    que os direitos da personalidade esto diretamente entrelaados com o princpio da

    dignidade da pessoa humana. O valor da pessoa humana o maior em nossos

    pilares jurdicos e nesse sentimento de valor que se fundamenta o direito da

    personalidade como projeo da personalidade humana. A observncia das

    conseqncias jurdicas decorrentes dos direitos da personalidade imprescindvel

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    ao respeito da dignidade do ser humano. Carlos Henrique Bezerra Leite assim

    enfatiza:

    A Carta de 1988 consagrou a dignidade da pessoa humana

    como princpio fundamental do Estado Democrtico de Direito

    (art. 1, III), o que permitiu a positivao dos direitos de

    inviolabilidade vida, intimidade, vida privada, imagem

    e honra das pessoas, assegurando indenizao por danos

    materiais e morais decorrentes de sua violao. E conclui

    dizendo que Os direitos de personalidade so espcies de

    direitos inerentes dignidade humana que tm por objeto a

    proteo da incolumidade fsica, psquica e moral da prpria

    pessoa.

    Jos Afonso da Silva aclara que a dignidade da pessoa humana um valor

    supremo que atrai o contedo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o

    direito vida.

    Baseando-se nisso, Sandra Lia Simn conclui da seguinte maneira:

    [...] como valor supremo, no pode incidir apenas nos clssicos direitos sociais,

    imprescindveis para o desenvolvimento das potencialidades do homem. [...]Logo, como os direitos da personalidade so manifestaes concretas do princpio

    da dignidade da pessoa humana, nunca se dissociam do indivduo e o acompanham

    em todas as suas atividades.

    Nesse sentido, indiscutvel que os direitos da personalidade so um

    reconhecimento da dignidade do homem, preservando-o dos atentados que pode

    sofrer por parte do outros indivduos. Com o fito de ressaltar a relao de

    proximidade entre direitos da personalidade e a dignidade humana, segue asafirmaes de Silvio Beltro:

    No possvel compreender a pessoa simplesmente

    como um sujeito de uma relao jurdica; [...] Assim,

    essencialmente, o que destaca a categoria dos direitos da

    personalidade a sua fundamentao no respeito e na

    proteo da dignidade da pessoa humana, como elemento

    essencial prpria existncia da pessoa [...]. Assim, o direitoda personalidade est sempre diante da necessidade de uma

    valorao tica fundada na dignidade da pessoa humana [...].

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    Por conseguinte, resta de forma explcita que os direitos da personalidade so

    o reflexo claro do princpio da dignidade da pessoa humana, como vislumbra Slvio

    de Salvo Venosa: Os direitos da personalidade so os que resguardam a dignidade

    humana. Maria Helena Diniz segue esse mesmo pensamento.

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    IV ASSDIO MORAL

    Embora o assdio moral seja to antigo quanto o prprio trabalho, s

    recentemente que estudiosos passaram a se preocupar com a questo, visto que

    esse fenmeno no pode mais ser encarado com descrdito, principalmente pelas

    repercusses que causa ou pode vir a causar na atual conjuntura.

    O problema mundial. S na Unio Europia 8% dos trabalhadores, ou seja,

    12 milhes de pessoas sofrem desse drama, segundo pesquisa de 1996 da OIT

    (Organizao Internacional do Trabalho). Isso repercute no apenas na vtima,

    como tambm nas pessoas prximas a ela, nas empresas, no Estado e na

    sociedade de um modo geral.

    Para Mrcia Novaes Guedes O terror psicolgico o projeto de destruio

    individualizada da pessoa no ambiente de trabalho, que guarda estreita proximidade

    com o genocdio enquanto processo destinado a descartar seres humanos.

    Hdassa Dolores Bonilha Ferreira define assdio moral como sendo:

    [...] um processo composto por ataques repetitivos

    que se prolongam no tempo, permeado por artifciospsicolgicos que atingem a dignidade do trabalhador,

    consistindo em humilhaes verbais, psicolgicas, pblicas,

    tais como o isolamento, a no-comunicao ou a

    comunicao hostil, o que acarreta sofrimento ao trabalhador,

    refletindo-se na perda da sua sade fsica e psicolgica.

    Marie-France Hirigoyen assim entende:

    [..] o assdio moral no trabalho definido como

    qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento,

    atitude...) que atente, por sua repetio ou sistematizao,

    contra a dignidade ou integridade psquica ou fsica de uma

    pessoa, ameaando seu emprego ou degradando o clima de

    trabalho.

    Jos Roberto Dias Leite expe o conceito de assdio moral como o resultado

    da ao de uma chefia, que no uso de suas prerrogativas, literalmente, tortura osubordinado, seja no campo de trabalho privado ou pblico. Percebe-se, assim, que

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    no h um conceito comum entre os apreciadores do tema, no entanto, seguem

    certa linha de raciocnio com o mesmo norte no que se refere ao objeto atingido pelo

    assdio moral: a integridade (fsica e/ou psquica) humana. Dessa maneira

    dessume-se que o assdio moral um conjunto de ilegalidades e abusos que visam

    atingir a dignidade da pessoa causando-lhe prejuzos psicofsicos. Participam do

    processo no mnimo duas pessoas: o agressor e a vtima, sendo que aquele sempre

    age de maneira consciente e destinada a inibir esse.

    4.1 Atos e Comportamentos que Podem Desencadear o Assdio Moral

    importante frisar que no qualquer ato que pode ser considerado como

    assdio moral, da mesma maneira que no h um nmero taxativo de hipteses

    desencadeadoras desse processo. Consoante Marie-France Hirigoyen, para que o

    assdio moral exista necessita-se do acontecimento de dois fenmenos: o abuso de

    poder e a manipulao perversa. A autora esclarece que o assdio moral sempre

    precedido da dominao psicolgica do agressor e da submisso forada da vtima.

    O outro ridicularizado, a priori, por ser o que , por gnero sexual, alguma

    deficincia ou por sua posio hierrquica. Considera ainda que no assdio moral

    haja uma relao de dominante-dominado, na qual o agressor submete a vtima a

    perder a identidade e quando isso ocorre numa relao de subordinao,

    transforma-se em abuso de poder hierrquico. Com isso pode-se dizer que o poder

    exercido dentro de ditames legais e legtimos no pode ser encarado como assdio

    moral, assim como se no for vislumbrada a vontade de assediar do agressor, o ato

    no deve ser enfrentado como processo vitimizador, isto , o assediador tem de

    manifestar seu comportamento arbitrrio, ilegal e ilegtimo com a finalidade de atingir

    a dignidade da vtima. O que decisivo para a visualizao do assdio moral aconduta inconveniente e destinada a humilhar expor ao ridculo, menosprezar

    subordinado ou colega de trabalho. H necessidade de violao da dignidade do

    trabalhador por condutas abusivas desenvolvidas dentro do contexto profissional.

    Saliente-se o pensamento de Maria urea Baroni Cecato:

    O assdio moral nas relaes de trabalho subordinado ultrapassa as medidas

    sensatas e aceitveis no tratamento dispensado ao empregado: febril, excessivo,

    discriminatrio e degradante atentado contra os direitos humanos. Para, alm disso,

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    deturpa o exerccio do poder disciplinar. Altera-lhe o destino, desloca-lhe o objetivo.

    H nele um abuso da prerrogativa que o direito reconheceu ao empregador.

    A autora diz ainda:

    O assdio moral no ambiente de trabalho tem

    caractersticas especficas: dirigido pelo empregador ou

    superior hierrquico ao subordinado e costuma ser repetitivo

    e duradouro. Manifesta-se pela coao ou pela discriminao,

    provocando no assediado sentimento de humilhao,

    frustrao e inferioridade em relao aos demais integrantes

    da organizao.

    Note que a educadora aclama veementemente que Existe, necessariamente,uma relao de poder entre autor e vtima no processo de assdio moral.

    Corroborando essa idia, Jos Roberto Dias Leite assegura que o agente ativo ser

    sempre o superior hierrquico do agente passivo, vtima do dano. Porm, o assdio

    moral no trabalho no ocorre apenas verticalmente, apesar de ser a maneira mais

    comum. Ele tambm pode ser horizontal (entre colegas de trabalho

    hierarquicamente iguais) e, raramente, ascendente (violncia moral que vem de

    colegas de trabalho de escalas inferiores).

    As hipteses mais habituais de atos de assdio moral consoante alguns

    doutrinadores so: atribuir vtima problemas psicolgicos; zombar de suas

    deficincias ou aspectos fsicos (imitando-a,...); injuri-la com termos obscenos ou

    degradantes; falar com a vtima aos gritos; fragilizar, ridicularizar, inferiorizar,

    humilhar publicamente a vtima; divulgar boatos sobre sua moral; desqualificar e

    destruir a auto-estima da vtima; entre outras. No tocante destruio da auto-

    estima, segue a posio de Mrcia Novaes Guedes:

    O objetivo atingir o mago da intimidade da vtima,

    lev-la a desacreditar de si mesma. Tudo pode comear com

    brincadeiras de mau gosto, pequenas insinuaes malvolas,

    evoluindo para a difuso de um mal-entendido. Fala-se mal

    da vtima pelas costas. Quando esta aparece em meio ao

    grupo, cai em silncio fnebre. Para derrubar a imagem

    social, a vtima ridicularizada, humilhada e coberta de

    sarcasmos, at que perca toda autoconfiana. Coloca-se-lheum apelido ridculo, caoa-se de uma limitao fsica, do seu

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    modo de andar, de falar, de vestir-se. So atacadas suas

    opinies, a vida privada e a maneira de viver.

    4.2 - Caractersticas do Agressor

    Em sntese, pode-se dizer que o assdio moral comea freqentemente pela

    recusa de uma diferena, sendo que o assediador incapaz de conviver com essa

    diferena nascendo, assim, um agressor em potencial. Conforme Jorge Luiz de

    Oliveira da Silva o assediador essencialmente um indivduo destitudo de tica,

    agindo por impulsos negativos e sem nenhuma nobreza de carter, revelando seu

    lado perverso ao verificar sua vtima sucumbir aos poucos diante do

    desenvolvimento de processo de assdio moral. E o autor conclui:

    Ora, uma vez definido que o assediador um ser humano infeliz, que utiliza o

    assdio moral para suprir carncias da alma, provocadas por experincias

    traumticas, preconceitos ou ambies desmedidas, podemos concluir ainda que o

    assediador fraco, pois no utilizou as experincias negativas em sua vida como

    instrumento solidificador de seu carter, mas sim se deixou corromper e dominar por

    suas fraquezas e pela prepotncia.

    Existe um conjunto de sentimentos inconfessveis (inveja, cime, rivalidade,medo, insegurana, busca pelo poder, preconceito, discriminao,...) que surge no

    agressor na origem dos procedimentos de assdio.

    Hdassa Dolores Bonilha Ferreira, referindo-se a Marie-France Hirigoyen,

    menciona o seguinte:

    Um dos elementos que a psicloga enfatiza como

    inerente perversidade a incapacidade do agente

    assediador em considerar os outros como seres humanos.

    Tal constatao induz ao pensamento de que quando uma

    pessoa no tratada como ser humano resta somente duas

    possibilidades: ou ela tratada como coisa, uma propriedade

    de algum, ou como animal. Em ambos os casos, o agente

    assediador estaria violando o terceiro princpio fundamental

    da Repblica Federativa do Brasil elencado no art. 1 da

    Constituio Federal de 1988, a saber, a dignidade da pessoa

    humana.

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    Concordando com o tino acima, Jos Roberto Dias Leite aponta que aparentemente,

    o agressor uma pessoa que est muito satisfeita com ela mesma e raramente se

    questiona sobre suas atitudes. incapaz de sentir empatia, considerada como a

    capacidade de colocar-se no lugar do outro, porque no estar altura de sentir o

    mal que seus ataques podem fazer ao seu prximo. Mas enquanto no descoberto

    os seus meios de agir, o agressor persegue seu objetivo.

    Assim, conclui-se que as principais caractersticas do assediador que um

    ser humano inapto a superar ou, ao menos, suportar as diversidades existentes no

    convvio social e, freqentemente, algum com certo distrbio de personalidade

    que busca descarregar sua negatividade nas pessoas que, de alguma maneira,

    tornaram-se incmodas em seu meio.

    4.3 Caractersticas da Vtima

    No h uma classificao ideal daqueles que podem vir a serem vtimas de

    assdio moral. No entanto, existem estudos que mostram que tipos de pessoas so

    mais suscetveis ao terror psicolgico, como ensina Mrcia Novaes Guedes:

    A vtima do terror psicolgico no trabalho no o empregado desidioso,

    negligente. Ao contrrio, os pesquisadores encontraram como vtimas justamente os

    empregados com um senso de responsabilidade quase patolgico; so pessoas

    genunas, de boa-f, a ponto de serem consideradas ingnuas no sentido de que

    nos acreditam outros e naquilo que fazem; geralmente so pessoas bem-educadas

    e possuidoras de valiosas qualidades profissionais e morais. De um modo geral, a

    vtima escolhida justamente por ter algo mais. E esse algo mais que o perverso

    busca roubar [...].

    A maior parte das vtimas apresenta um perfil bem especfico, mostrando-secomo indivduos com elevada tica, honradez, retido e sentido de justia, alm de

    sua capacidade de autonomia e independncia, iniciativa, capacitao pela

    inteligncia e atitudes, popularidade, carisma e liderana naturais, alto sentido

    cooperativo e de trabalho em equipe. Todavia, a vtima tambm pode ser pessoa

    humilde, com problemas existenciais ou com determinadas limitaes. O assediado

    escolhido por despertar no agressor o medo, a inveja, a insegurana, enfim,

    diferenas que o assediador no suporta nem supera, podendo acontecer com

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    qualquer pessoa pelo simples fato da vtima tornar-se algum incmodo para o

    agressor.

    4.4 Dignidades da pessoa humana, direitos de personalidade e o assdio moral

    Anteriormente, discorreu-se a questo de os direitos de personalidade estar,

    definitivamente, atrelados ao princpio constitucional da dignidade da pessoa

    humana. Isso um ponto praticamente unnime entre os doutrinadores. Muitos

    chegam a considerar tal princpio como sendo o mais importante dentre os princpios

    constitucionais o que, de fato, plausvel.

    Ao examinar-se com cautela o assdio moral, fica transparente que o mesmo

    atinge de maneira explcita os direitos da personalidade, os quais esto protegidos

    constitucionalmente pelo princpio da dignidade da pessoa humana, isto , o assdio

    moral ofende diretamente a Constituio Federal. Com essa inteligncia, Jorge Luiz

    de Oliveira da Silva elucida: o assdio moral praticado no servio pblico brasileiro,

    dentre outras conotaes, prtica inconstitucional, tendo em vista os princpios

    vetores da Administrao Pblica consagrados na Carta Magna. Ora, O assdio

    moral deve ser considerado como manifesto atentado dignidade do trabalhador.

    Reforando a tese aqui defendida, segue a manifestao de Luciany Michelli Pereira

    Santos:

    Uma breve noo do conceito e caracterizao do assdio moral j

    suficiente para se chegar concluso que o assdio moral, seja nas relaes

    familiares, seja nas relaes de trabalho, se consubstancia em um autntico dano

    integridade psquica e moral da pessoa humana, e, assim o sendo, toda vez que

    esta situao ocorrer tambm estar ocorrendo um dano a um direito da

    personalidade.Em suma, inegvel que o assdio moral atinge a integridade psicofsica do

    ser humano, culminando com uma afronta aos preceitos normativos constitucionais,

    em especial no que diz respeito dignidade humana.

    4.5 Os diferentes nomes dados ao assdio moral

    O assdio moral encontra-se em todo o mundo, mas com diferentes nomes

    dependendo da cultura e do contexto;

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    O mobbing - refere-se unio de foras desferida contra um empregado, sujeitando-

    o a um assdio psicolgico, mediante reiteradas crticas ou chamadas de ateno,

    isolamento no local de trabalho, afastamento do convvio social, difuso de rumores

    e at mesmo ridiculizao da sua pessoa. Nos Estados Unidos da Amrica calcula-

    se que cerca de 3.000 suicdios anuais estejam ligados ao mobbing.

    O conceito de mobbing se difundiu durante os anos 90 essencialmente nos

    pases escandinavos e, em seguida, nos pases de lngua alem e, atualmente, nos

    pases nrdicos (Sucia, Dinamarca, Finlndia), na Sua e na Alemanha. O termo

    ainda prevalece e continua sendo estudado.

    O bullying - seria o comportamento ofensivo, consubstanciado na prtica de atos

    vingativos, cruis, maliciosos ou humilhantes, com o objetivo de detonar umindivduo ou grupo de trabalhadores por meio de ataques negativos e persistentes

    aos desempenhos profissionais e pessoais.

    O termo bullying surgiu na Inglaterra e inicialmente servia para descrever as

    humilhaes, os vexames ou ameaas que certas crianas ou grupos de crianas

    infligiam nas outras e, logo aps, a expresso se estendeu s agresses observadas

    no exrcito, nas atividades esportivas, na vida familiar (especialmente com relao a

    pessoas de idade) e, conseqentemente, no mundo do trabalho.A nomenclatura bullying um pouco mais ampla que mobbing, j que este

    mais relacionado com o ambiente de trabalho, ao passo que aquele, guarda relao

    no somente com o ambiente de trabalho, mas tambm com as relaes entre

    grupos de crianas, vida familiar, entre outras.

    O harassment - Nos Estados Unidos, essa terminologia foi introduzida em 1990 por

    um artigo de Heinz Leymann na revista americana Violence and Victims. Contudo, o

    fenmeno vem sendo estudado desde 1976, pelo americano Carroll Brodsky.Segundo ele o assdio consiste em ataques repetidos e voluntrios de uma pessoa

    a outra, para atorment-la, min-la, enfim, provoc-la; assinalando os efeitos nocivos

    sade.

    Os whistleblowers - Consoante Luciany Michelli Pereira Santos os whistleblowers

    seriam caracterizados por uma forma especial de bullying ou mobbing ou assdio

    moral, especificamente dirigida contra pessoas que tenham denunciado ou se

    rebelado contra um sistema ou microssistema, previamente imposto. Marie-France

    Hirigoyen afirma que Trata-se de uma forma especfica de assdio moral, destinada

    a silenciar quem no obedece s regras do jogo.

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    O ijime - O vocbulo ijime empregado no Japo e tambm significa assdio.

    Conforme Marie-France Hirigoyen utilizado no s para descrever as ofensas e

    humilhaes infligidas s crianas no colgio, mas tambm para descrever, nas

    empresas nipnicas, as presses de um grupo com o objetivo de formar os jovens

    recm-contratados ou reprimir os elementos perturbadores.

    O sistema educativo japons baseado em avaliaes permanentes com o

    objetivo de determinar os melhores elementos e orientar as crianas rumo s

    carreiras mais promissoras. Essa presso psicolgica transcendeu o ambiente

    escolar e o ijime nos anos 90 tornou-se uma verdadeira chaga social, fazendo com

    que vrias crianas cometessem suicdio ou abandonassem a escola.

    4.6 Conseqncias do assdio moral

    Nos dizeres de Jorge Luiz de Oliveira da Silva o assdio moral um cncer

    social, que se alastra por todas as direes, ocasionando perdas substanciais que

    transcendem pessoa da vtima, gerando danos significativos sade financeira da

    empresa e do Estado. O autor considera tambm que o assdio moral no ambiente

    de trabalho um processo altamente vitimizador, cujas conseqncias ultrapassam

    as demarcaes ticas aceitveis em uma sociedade civilizada, onde o trabalho

    considerado um dos direitos sagrados atribudos ao ser humano. O assdio moral

    uma violncia devastadora e que atinge no s a vtima, como tambm o Estado, as

    empresas e toda a sociedade. Para melhor esclarecer o reportado, Jos Carlos

    Ferreira assim apregoa:

    A violncia no local de trabalho pode ser fsica, moral ou psicolgica e,

    dependendo da gravidade, intensidade e freqncia, de efeitos traumatizantes e

    dramticos para os trabalhadores e suas famlias, as empresas onde prestamservios e para a sociedade como um todo. Ressalte-se que o autor entende como

    local de trabalho qualquer espao fsico (a prpria casa, as ruas e becos patrulhados

    por policiais, os quartis, os veculos conduzidos por taxistas, as salas de aula, os

    presdios, os hospitais,...).

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    4.7 Conseqncias para a vtima

    Incontestavelmente so poucas as agresses que causam distrbios

    psicolgicos to graves a curto prazo e conseqncias a longo prazo todesestruturantes como as causadas pelo assdio moral. Marie-France Hirigoyen

    salienta que No se morre diariamente de todas essas agresses, mas perde-se

    uma parte de si mesmo. Volta-se para casa, a cada noite, exausto, humilhado,

    deprimido.

    Os danos do assdio moral ultrapassam a esfera psquica, alcanando muitas

    vezes a vtima em sua estrutura fsica, familiar e social. Em relao famlia da

    vtima o assdio moral pode ocasionar reflexos destrutivos de grande relevncia,repercutindo na sade fsica e mental dos familiares mais prximos, principalmente

    nos filhos e inclusive no contexto do relacionamento sexual entre o casal. Nessa

    linha de pensamento, Mrcia Novaes Guedes:

    Os efeitos nefastos para o organismo submetido ao assdio moral no trabalho no

    se limitam ao aspecto psquico, mas atingem o corpo fsico, fazendo com que todo o

    organismo se ressinta das agresses. Os distrbios podem recair sobre o aparelho

    digestivo, ocasionando bulimia, problemas gstricos diversos e lcera. Sobre oaparelho respiratrio a queixa mais freqente a falta de ar e sensao de

    sufocamento. Sobre as articulaes podem ocorrer dores musculares, sensao de

    fraqueza nas pernas, sudorizao, tremores, como tambm dores nas costas e

    problemas de coluna. Sobre o crebro verificam-se nsia, ataques de pnico,

    depresso, dificuldade de concentrao, insnia, perda de memria e vertigens.

    Sobre o corao os problemas podem evoluir de simples palpitaes e taquicardias

    para o infarto do miocrdio. E o enfraquecimento do sistema imunolgico reduz as

    defesas e abre as portas para diversos tipos de infeces e viroses.

    Os danos na esfera emocional atingem em cheio a vida familiar e social da

    vtima, desencadeando crise existencial, crise de relacionamento e crise econmica.

    [...] A relao familiar arruna-se na medida em que esta a vlvula de escape da

    vtima, que passa a descarregar sua frustrao nos membros da famlia.

    Quase como uma regra, a vtima que casada acaba por ter seu

    relacionamento finalizado, devido ao processo de psicoterror. Nesse sentido,

    Hdassa Dolores Bonilha Ferreira:

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    [...] quase sempre o assdio moral acarreta a desestruturao familiar. A famlia,

    assim como a vtima, desconhece as razes do conflito, repassando ento as

    mesmas condies do assdio moral praticado no trabalho. No raro os processos

    de assdio moral culminam com o fim do casamento daqueles que foram vtimas.

    Em recente pesquisa realizada por Margarida Maria Silveira Barreto, foram

    entrevistados 2.072 trabalhadores (1.311 homens e 761 mulheres), sendo que 42%,

    870 trabalhadores (494 mulheres e 376 homens), relataram j terem sido vtimas de

    assdio moral no ambiente de trabalho. O que mais impressiona que 100% das

    vtimas masculinas tiveram sentimentos de revolta, vergonha dos filhos, indignao

    e pensamentos suicidas, sendo que 18,3% efetivamente tentaram o suicdio. Quanto

    s mulheres, 17% tiveram sentimentos de revolta, 10,7% vergonha dos filhos, 7%indignao e 16,2% pensamentos suicidas. Dessa maneira apreende-se como so

    arrasadores os reflexos ocasionados pelo assdio moral sob o ser humano.

    Infelizmente, dependendo do grau de perturbao do agredido (geralmente j

    no estgio de depresso profunda), o assdio moral pode lev-lo ao suicdio. Nessa

    inteligncia, Jos Roberto Dias Leite:

    As agresses sofridas pelas vtimas no ambiente de trabalho desencadeiam

    distrbios fsicos e psquicos e desenvolvimento de vrias patologias. Esse processopode lev-la incapacidade permanente e at mat-la durante o expediente de

    trabalho e ou lev-la ao suicdio.

    Embasando essa tese, Manoel Jorge e Silva Neto:

    O assdio moral produz efeitos extremamente danosos para quem o sofre.

    habitual que, em face da conduta assediante, o trabalhador resolva pela sada da

    empresa ou, em situao mais extrema se bem que possvel -, tente ou chegue

    at a consumar suicdio.Importante tambm mostrar a viso de Jos Carlos Ferreira:

    O trabalhador que sofre agresso moral comfreqncia tem sua auto-estima deteriorada, apresentando-sedeprimido, desestimulado e, por conseguinte, com menorrendimento no trabalho. Referidos estados de nimo acabampor afetar seus familiares, em especial o relacionamento como cnjuge e os filhos. Muitos se deixam levar, num passoseguinte, pelo consumo de lcool, tabaco e at mesmo dedrogas, na iluso de se reequilibrarem emocionalmente,

    dentro e fora do ambiente de trabalho. As alternativas que selhe apresentam, entretanto, so a demisso voluntria ou adispensa por justa causa, a dificultar-lhes a reinsero nomercado de trabalho

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    O assdio moral deixa seqelas marcantes que podem evoluir do estresse

    ps-traumtico (depois de findo o assdio moral) at uma sensao de vergonha

    recorrente ou mesmo modificaes duradouras de personalidade afirmando que

    todas as vtimas, com rarssimas excees, experimentam uma desestabilizao

    permanente. A pessoa se torna refm de uma cicatriz psicolgica que a deixa frgil,

    medrosa e descrente de tudo e de todos. Marie-France Hirigoyen enfatiza que Tal

    qual o assalto mo armada ou o estupro, o assdio moral constitui

    incontestavelmente um traumatismo. E afirma: Trata-se de uma verdadeira

    alienao, no sentido de que a pessoa perde o prprio domnio e se sente afastada

    de si mesma.

    Jorge Luiz de Oliveira da Silva menciona inclusive os danos sofridos aopatrimnio da vtima:

    No h dvidas, por todas as nuances inerentes ao assdio moral, que este um

    processo que se direciona frontalmente dignidade do trabalhador, aniquilando sua

    auto-estima, debilitando sua sade fsica e mental, degradando suas relaes

    interpessoais e atingindo seu patrimnio.

    O autor considera que os danos devem ser contabilizados conjuntamente,

    incorporando-se no s os danos sade, como tambm os danos patrimoniais;revelando, assim, a real faceta destruidora do fenmeno.

    No setor pblico os abusos de poder so mais freqentes e o assdio moral

    pode ser mais duradouro, pois, em princpio, as pessoas so protegidas e no

    podem ser demitidas, a no ser devido a uma falta grave. Por isso, os meios de

    assdio so, neste caso, mais perniciosos e produzem resultados dramticos sobre

    a sade, bem como sobre a personalidade das vtimas.

    4.8 Conseqncias para o empregador

    Os efeitos do assdio moral no se restringem apenas vtima, mas

    espraiam-se tambm para os empregadores. O atentado dignidade do trabalhador

    gera obrigaes para o empregador, oriundas da configurao de responsabilidade

    civil e trabalhista. S na Alemanha, o custo total relacionado a atos de mobbing de

    2,5 bilhes de marcos por ano.

    A pessoa que sofre assdio moral no tem a mesma capacidade laboral quedispunha antes do fenmeno iniciar-se. Com isso os impactos negativos, sejam no

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    setor pblico, sejam no setor privado, so certos. Ademais, est provado que um

    trabalhador submetido violncia psicolgica tem um rendimento inferior a 60% em

    termos de produtividade e eficincia, em relao a outros trabalhadores, e o seu

    custo para o empregador de 180% a mais.

    Por fim, Marie-France Hirigoyen, durante o I Seminrio Internacional de

    Assdio Moral no Trabalho, realizado na cidade de So Paulo, em 30 de abril de

    2002, afirmou as seguintes palavras:

    O assdio moral um pssimo negcio para as

    empresas, pois no um mtodo eficiente na medida em que

    causa perda de produtividade. Para que as pessoas

    trabalhem bem e produzam bastante elas precisam ter boas

    condies e ambiente de trabalho saudvel. As pessoas

    precisam estar bem para produzir bem. Serem respeitadas

    como seres humanos. Estamos num sistema que perdeu

    sentido, num sistema louco. Desestruturam-se as pessoas

    deixando-as totalmente desmotivadas e depois se reclama

    que no so suficientemente eficientes, que no produzem de

    forma satisfatria. Isso no tem sentido! Seria necessrio,

    pelo contrrio, melhorar sempre as condies de trabalho,

    fazer com que as pessoas tenham vontade de trabalhar,reconhecendo e respeitando seus esforos, o que

    certamente, levaria a empresa a obter melhores resultados.

    Um dos argumentos que utilizo, atualmente, para ser ouvida,

    que dei para os polticos na Frana e que agora dou para as

    empresas, para que sejam vigilantes e para que faam uma

    poltica de preveno do assdio moral, que o assdio

    moral no produtivo, pssimo, e custa caro. Custa caro

    para as vtimas porque so obrigadas a se tratar, s vezes

    perdem seus empregos, so, s vezes, obrigadas a recorrer a

    um advogado para se defender, portanto, custa caro para as

    vtimas. Isto tambm custa caro para a sociedade porque as

    pessoas ficam doentes e impedidas de trabalhar. Custa caro

    tambm para as empresas porque h efetivamente, o

    problema do absentesmo associado a uma grande

    desmotivao e perda de produtividade. [...].

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    4.9 Conseqncias para o Estado

    O processo vitimizador provocado pelo assdio moral acarreta enormes

    prejuzos s finanas do Estado, visto que os assediados so muitas vezesremetidos aos servios previdencirios e de sade, gerando um universo de

    trabalhadores que estariam na plenitude da capacidade laboral, mas que acabam

    alijados do sistema em virtude das diversas patologias acarretadas pelo psicoterror

    em seu ambiente de trabalho. O poder pblico acaba por ter que arcar com a

    recuperao da sade e a responsabilidade dos salrios das vtimas de assdio

    moral, que no raramente, tm de se aposentarem precocemente.

    Na Inglaterra, as doenas provocadas pelo assdio moral causam umprejuzo ao governo de cerca de 24 milhes de dlares por ano.

    A Legislao em alguns pases estrangeiros j possui legislao especfica para

    combater o assdio moral enquanto outros adotaram medidas com a finalidade de

    coibir o fenmeno. No Brasil j existe legislao no mbito municipal e estadual

    contra o assdio moral e, atualmente, encontram-se junto ao Congresso Nacional

    alguns projetos de lei com o objetivo de combater o assdio moral em nvel nacional.

    A Legislao no estrangeiro Na Sucia (primeiro pas a deliberar sobre o assdiomoral) o mobbing considerado crime. Alm disso, o Ministrio da Sade e

    Segurana publicou uma Resoluo que entrou em vigor a partir de 31 de maro de

    1994 semelhante a um verdadeiro cdigo de comportamento para a gesto das

    relaes sociais no local de trabalho.

    A Noruega desde 1977 j dispunha de tutela jurdica genrica contra toda e

    qualquer forma de assdio e comportamento imprprio, estendida tambm aos

    trabalhadores.

    A Alemanha ainda no possui norma especfica de proteo de vtima do

    mobbing, mas o agredido goza de proteo por meio de aplicao de normas de

    carter geral que lhe garantem a sade e segurana no trabalho.

    O direito austraco faz expressa meno ao termo mobbing num plano de

    ao interna sobre a igualdade entre homens e mulheres, aprovado em 1998. Tal

    plano tutela a dignidade no local do trabalho.

    A Espanha, por sua vez, ainda no possui uma lei especfica para coibir o

    assdio moral, mas tanto a doutrina quanto a jurisprudncia utilizam indistintamente

    os termos acoso moral e mobbing para definir o terror psicolgico no trabalho. O

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    Cdigo Penal Militar espanhol tambm apresenta normas de carter genrico, cuja

    tipicidade est plenamente adequada ao sistema de condutas que delineiam o

    psicoterror laboral. Saliente-se que a jurisprudncia penal militar espanhola est

    punindo severamente os agressores no que concerne constatao de maltrato

    psicolgico em ambiente militar.

    O direito australiano possui uma lei que dispe especificamente sobre

    bullying. Essa lei prev que o empregador deve garantir um local de trabalho sadio e

    seguro e responsvel por proteger os trabalhadores do assdio moral no ambiente

    de trabalho.

    Nos EUA no existe legislao especfica que venha a fazer previso de

    meios preventivos e repressivos em relao ao terror psicolgico. No entanto, osEstados norte-americanos desenvolvem polticas internas tendentes a combater os

    abusos e as perseguies.

    Legislao no Brasil foi o que mais produziu leis sobre assdio moral, at o

    momento. Contudo, todas as leis esto voltadas para a Administrao Pblica

    Estadual e Municipal.

    O municpio paulista de Iracempolis foi o que primeiro produziu lei especfica

    sobre assdio moral. Hoje j existem legislaes especficas nos municpios deCampinas/SP, Cascavel/PR, Sindrolndia/MS, entre outros.

    No mbito federal, h apenas projetos de lei que esto tramitando no

    Congresso, como por exemplo, o Projeto de Lei n 33/2007 do Deputado Dr.

    Rosinha e o Projeto de Lei n 2369/2003 do Deputado Mauro Passos, ambos

    dispondo sobre o assdio moral nas relaes de trabalho. H tambm o Projeto de

    Lei n 4.742/2001 do Deputado Marcos de Jesus, o qual visa fixar no Cdigo Penal a

    previso de crime para aqueles que forem sujeitos ativos do assdio moral.Maria urea Baroni Cecato analisa a questo da legislao sobre assdio

    moral de forma diferente. Consoante ela No h carncia, a priori, de lei que

    regulamente os princpios contidos no texto constitucional. Por si, eles so

    suficientes, at porque tm aplicao imediata.

    A preveno contra o assdio moral seria utpica afirmar que o assdio moral

    pode ser erradicado, porm existem instrumentos adequados que podem ser

    utilizados com o fito de abrandar o problema. Segundo Mrcia Novaes Guedes A

    melhor forma de combater o terror psicolgico no trabalho a preveno. E a

    preveno tem de ocorrer globalmente, isto , atravs de medidas adotadas pelo

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    governo, pelas empresas, pela vtima e pela sociedade. No entanto, sem o

    conhecimento prvio dos envolvidos no fenmeno, quanto ao que diz respeito s

    facetas do assdio moral, tal preveno no tem eficcia. Por isso, o primeiro passo

    a veiculao da informao daqueles ligados ao terror psicolgico, como mostra

    Jorge Luiz de Oliveira da Silva:

    [...] o implemento de campanhas elucidativas desponta como de vital importncia,

    possibilitando a disseminao da visibilidade social do assdio moral, o que

    possibilitar uma maior eficcia das polticas de preveno. Uma vez conhecendo e

    percebendo o assdio moral, suas conseqncias e suas peculiaridades, os

    trabalhadores e empregadores estaro mais suscetveis a colaborar com as polticas

    de preveno. Chegando-se a este nvel, o trabalhador vitimado poder implementaraes mais imediatas tendentes a fazer cessar o processo de psicoterror, o que

    certamente resultar na mitigao das conseqncias. J o empregador, ciente da

    magnitude das conseqncias do assdio moral, poder destinar especial ateno

    preveno da violncia no mbito interno da organizao.

    Alguns doutrinadores defendem que o governo tem de dimanar normas sobre

    o assdio moral. Mas essa corrente no unnime. Maria urea Baroni Cecato,

    citada no subcaptulo anterior, assegura que os prprios preceitos constitucionais jso suficientes, no havendo necessidade de emanao de regras sobre o

    fenmeno, a priori. Jorge Luiz de Oliveira da Silva expe da seguinte forma:

    Muito mais importante que uma lei tratando de assdio moral desenvolver a

    conscincia dos envolvidos no processo, alertando-os e demonstrando-os acerca

    das conseqncias danosas que podem advir das condutas assediadoras. A lei

    bem vinda, porm, a visualizao das conseqncias que se direcionam a todos os

    envolvidos (vtima, organizao, Estado e assediador) de suma relevncia para aconsolidao de uma poltica preventiva em relao ao assdio moral. Neste ponto,

    desenvolver o sentido tico daqueles que integram ou possa a vir integrar o

    processo passa a ser o principal instrumento para atingir os objetivos desejados.

    Portanto, o autor deixa claro que se no houver uma conscientizao tica

    acerca dos problemas que envolvem o fenmeno, o mero regramento legal no ser

    suficiente para deter a escalada da violncia silenciosa no ambiente de trabalho.

    Note que o autor no contra a difuso de normas a respeito do assdio moral. Ele

    apenas afirma que s a lei sem a conscientizao no ter a eficcia desejada. Isso

    fica evidente em sua fundamentao ora ementada:

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    Ressalte-se que no estamos afirmando que uma lei disciplinando a preveno e o

    sancionamento para o assdio moral venha a provocar injustias. No, no esta a

    abordagem. No entanto, o que se constata que a arma mais poderosa contra o

    assdio moral a conscientizao de todos sobre a iniqidade de tal prtica e suas

    conseqncias danosas.

    Existindo tal conscientizao, com o apoio de uma legislao especfica, um

    futuro mais positivo poder ser vislumbrado nas relaes interpessoais no ambiente

    de trabalho. Para isto, essencial que seja desenvolvida uma ampla poltica, tanto no

    mbito interno da organizao quanto em mbito geral, com esforos neste sentido

    por parte do empresariado, do Estado e das entidades sindicais. No entanto, para

    que o resultado destas polticas seja positivo, essencial que o fenmeno tratadotenha visibilidade, que seja conhecido por todos os envolvidos e que o mesmo no

    seja manipulado de forma oportunista, evitando, assim, prejuzos e dvidas no

    momento de se implementar as medidas punitivas devidas.

    Destarte, veicular a informao das facetas do assdio moral queles que

    fazem parte do processo de psicoterror torna a lei muito mais eficaz e eficiente,

    sendo uma tima maneira de auxiliar na preveno deste cncer social.

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    V - O ASSDIO MORAL E AS FORAS ARMADAS

    A Constituio Federal de 1988, em seu artigo 142, caput, preconiza, que as

    Foras Armadas, constitudas pela Marinha, pelo Exrcito e pela Aeronutica, so

    instituies nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia

    e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da Repblica, e destinam-

    se defesa da Ptria, garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de

    qualquer destes, da lei e da ordem.

    Logo, esto na Carta Suprema os princpios norteadores da vida militar, ou

    seja, a hierarquia e a disciplina.

    A Lei Federal n 6.880, de 09 de dezembro de 1980, publicada no Dirio

    Oficial da Unio de 11 de dezembro de 1980, que dispe sobre o Estatuto dos

    Militares, em seu artigo 14 afirma que A hierarquia e a disciplina so a base

    institucional das Foras Armadas. Tais preceitos so conceituados nos pargrafos

    desse mesmo artigo, adiante:

    1 A hierarquia militar a ordenao da autoridade, em nveis diferentes, dentro da

    estrutura das Foras Armadas. [...]. O respeito hierarquia consubstanciado no

    esprito de acatamento seqncia de autoridade. 2 Disciplina a rigorosa observncia e o acatamento integral das leis,

    regulamentos, normas e disposies que fundamentam o organismo militar e

    coordenam seu funcionamento regular e harmnico, traduzindo-se pelo perfeito

    cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes desse

    organismo.

    Nesse sentido, Jos Afonso da Silva esclarece que no se confundem

    hierarquia e disciplina, mas so termos correlatos, no entendimento de que adisciplina pressupe relao hierrquica, juridicamente falando, a quem tem poder

    hierrquico. E ainda o pargrafo 3 do artigo 14 do Estatuto dos Militares assevera

    que A disciplina e o respeito hierarquia devem ser mantidos em todas as

    circunstncias da vida entre militares da ativa, da reserva remunerada e

    reformados.

    Consoante De Plcido e Silva, podemos conceituar a disciplina militar como

    sendo a soma de preceitos que devem ser obedecidos por todos os componentes

    de uma corporao militar, em virtude dos quais todos devem respeito aos modos de

    conduta que deles decorrem

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    Segundo Clio Lobo a disciplina militar, sustentculo maior da hierarquia,

    constitui um sistema rgido de relacionamento entre os integrantes da organizao

    castrense, com a finalidade precpua de zelar pela manuteno deste segmento

    hierarquizado da estrutura social do pas.

    De modo semelhante, Elizer Rizzo de Oliveira instrui que A disciplina

    condiciona o militar a no contestar ordens, a aceit-las, a associar-se at

    efetivamente ao superior que o comanda no interior da estrutura militar.

    A respeito da hierarquia militar, De Plcido e Silva define como ordem

    disciplinar que se estabelece nas foras armadas decorrente da subordinao e

    obedincia em que se encontram em relao aos de categoria mais elevada.

    Portanto, transparece que so essenciais doutrina militar a hierarquia e adisciplina, a fim de prevalecer a ordem e o decoro na vida castrense.

    Achibaldo Nunes dos Santos contempla que A preservao da hierarquia e

    disciplina no seio das Foras Armadas brasileiras, imprescindvel e at salutar nos

    limites da lei. O autor manifesta tambm: A hierarquia no forja o carter do militar.

    A disciplina no o modela. Simplesmente, hierarquiza e disciplina a atividade

    castrense.

    Segundo Antnio Pereira Duarteos usos e costumes militares fizeram nasceroutro princpio regedor da vida castrense; o companheirismo e a camaradagem nas

    relaes de servio e nas relaes sociais dos militares.

    Trata-se, outrossim, de preceito tico-militar, necessrio para sanear a boa

    relao entre militares.

    Ressalve-se que a camaradagem est prevista no artigo 3 do Regulamento

    Disciplinar do Exrcito-RDE, aprovado pelo Decreto n 4.346, de 26 de agosto de

    2002, publicado no Dirio Oficial da Unio de 27 de agosto de 2002, assimdispondo: A camaradagem indispensvel formao e ao convvio da famlia

    militar, contribuindo para as melhores relaes sociais entre os militares.

    Ainda quanto s consideraes sobre o princpio do companheirismo o citado

    doutrinador faz o seguinte deslinde:

    Tal princpio de base costumeira de suma importncia para a boa consecuo dos

    objetivos traados pelas foras militarizadas, sendo tambm mola propulsora da

    unio em torno do sentimento magno de amor Ptria e da conscincia de defesa

    das instituies organizadas e da soberania nacional.

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    Logo, segundo o autor, o companheirismo seria mais um fundamento da vida

    militar, ou seja, as bases que regem o militarismo seriam a hierarquia, a disciplina e

    o companheirismo.

    No entanto, como se averiguar, essa indagao no to verdadeira na

    prtica e, muitas vezes, sequer h relao de companheirismo, principalmente dos

    superiores junto aos seus subordinados.

    5.1 Limites na disciplina militar

    Os militares tm por finalidade manter a ordem e a paz social e essas

    comeam, por primeiro, dentro da prpria caserna. Quando ocorre alguma

    anormalidade na vida militar dever dos prprios integrantes de cada Fora,

    geralmente os superiores hierrquicos, tomarem as medidas adequadas e cabveis

    para cada caso. Todavia, existem limites que devem ser respeitados no tocante aos

    feitos impostos aos subordinados, e quando esses infringem alguma regra, a

    autoridade competente deve julg-los com iseno de nimo, justia, sem

    condescendncia nem rigor excessivo, conforme preconiza o artigo 35 do

    Regulamento Disciplinar da Aeronutica RDAer (Decreto n 76.322, de 22 de

    setembro de 1975).

    Segundo Clio Lobo aponta ao exercitar o poder legal de punir o

    subordinado que transgridem os regulamentos militares, o superior hierrquico deve

    faz-lo com estrita observncia das normas pertinentes [...].

    Corroborando tal pensamento, Achibaldo Nunes dos Santos assinala: A

    transgresso disciplinar contingncia do servio militar, porm, saber aplicar o

    corretivo correspondente, exige imparcialidade e equilbrio do superior hierrquico.

    Outrossim, os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituio Federal de1988 devem ser resguardados por serem regras de aplicao imediata.

    Assim como mostra Paulo Tadeu Rodrigues Rosa a hierarquia e a disciplina

    devem ser preservadas por serem princpios essenciais das Corporaes Militares,

    mas os direitos e garantias fundamentais previstos no art. 5 da CF so normas de

    aplicao imediata (art. 5, 1, da CF), que devem ser asseguradas a todos os

    cidados (civis ou militares, brasileiros ou estrangeiros), sem qualquer distino, na

    busca do fortalecimento do Estado de Direito.

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    A justia elemento essencial de qualquer instituio, pois somente com a

    observncia do devido processo legal e das garantias constitucionais que se

    podem alcanar os objetivos do Estado Democrtico de Direito. O respeito lei em

    todos os seus aspectos condio essencial para a construo de uma sociedade

    justa, fraterna e livre da violncia e das desigualdades sociais.

    Portanto, ao aplicar punio e/ou dar alguma ordem, o superior hierrquico

    tem de observar o pronto atendimento aos limites permitidos na lei e aos princpios

    de justia com a finalidade de o ato administrativo militar ser vlido, ter eficcia e

    estar de acordo com o texto e o esprito das normas constitucionais, a fim de evitar o

    excesso e o arbtrio nas suas aes.

    Jos Roberto Dias Leite segue esse entendimento, chegando a certificar queo poder de chefia extingue-se na prpria ao administrativa, normatizada, que

    dosa sanes e determina limites. Assim tambm explica Elizer Rizzo de Oliveira:

    Haver limites para a obedincia? Certamente o limite a legalidade de uma ordem.

    [...] o militar s obrigado a obedecer s ordens fundadas na lei e nos regulamentos

    militares, desde que no confrontem direitos constitucionais e, no limite, padres

    ticos de sua prpria conscincia.

    Nesse sentido, Antnio Pereira Duarte, diz que a conduta moral e profissionaldo militar deve estar gizada pelo acatamento aos preceitos maiores da tica militar

    espelhados no amor verdade, na dignidade do exerccio das funes atribudas, no

    respeito dignidade da pessoa humana, no cumprimento das leis, regulamentos,

    instrues e ordens das autoridades competentes, na ao justa e imparcial para

    com os outros, no exerccio do companheirismo e da camaradagem e tantos outros

    parmetros da conduta tico-milita.

    O caput do artigo 4 do Regulamento Disciplinar do Exrcito - RDE exibe queA civilidade, sendo parte da educao militar, de interesse vital para a disciplina

    consciente. E em seu pargrafo 1 conclui: dever do superior tratar os

    subordinados em geral, e os recrutas em particular, com interesse e bondade. E

    ainda, os pargrafos do artigo 3 do aludido diploma enfocam que as demonstraes

    de camaradagem, cortesia e considerao so obrigatrias entre os militares

    brasileiros, incumbindo aos mesmos incentivar a harmonia e a amizade entre seus

    pares e subordinados.

    Destarte, a sano administrativa militar prevista e deve ser imposta

    queles que no se adequam aos preceitos tico-militares cabendo autoridade

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    observar os limites situados no direito, sob pena de cometer arbtrio. Contudo, antes

    de punir deve-se priorizar pelo pundonor militar, entendido como o dever de o militar

    pautar a sua conduta como a de um profissional correto. Exige dele, em qualquer

    ocasio, alto padro de comportamento tico que refletir no seu desempenho

    perante a Instituio a que serve e no grau de respeito que lhe devido (artigo 6,

    II, do Regulamento Disciplinar do Exrcito -RDE), pois A autoridade impe-se pela

    ascendncia, pelo tratamento enrgico, porm justo, com o respeito devido pessoa

    humana [...]. Ademais, A disciplina ser tanto mais eficiente quanto mais ela

    expressar valores e afeto.

    Segundo Paulo Tadeu Rodrigues Rosa, a construo de um Estado

    Democrtico de Direito tem como fundamento o respeito aos direitos previstos naCF, que a norma fundamental de uma nao. Desrespeitar a Constituio negar

    o prprio Estado de Direito e se afastar da Justia e do prprio conceito de

    civilizao. Os infratores devem ser punidos para se evitar o sentimento de

    impunidade, mas o exerccio do jus puniendi deve ocorrer em conformidade com a

    lei.

    Em sntese, A Constituio Federal deve ser o vade-mecum das autoridades

    militares, sendo imprescindvel sua leitura e meditao diria, devocional, se no,obrigatria.

    5.2 Assdio moral nas Foras Armadas

    De maneira j bem salientada em estudo preliminar, deve-se atentar que no

    todo comportamento e atitude que podem ser encarados como assdio moral. H

    de se ter o cuidado necessrio em cada caso, assim como expe Jorge Luiz de

    Oliveira da Silva, [...] os militares, categoria peculiar de trabalhadores pblicos, noesto imunes submisso a um processo de assdio moral [...]. Ao analisar o

    fenmeno do assdio moral aplicado aos militares, no h dvida acerca dos

    cuidados extremos que se deve adotar, tendo em vista a estrutura personalssima da

    carreira militar, fundamentada nos pilares constitucionais da hierarquia e disciplina.

    Portanto, um alerta preliminar: no devemos confundir submisso hierarquia

    e disciplina, exercidas dentro dos legtimos limites, com submisso ao processo de

    assdio moral.

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    Posio tambm adotada por Marie-France Hirigoyen ao certificar que O

    assdio moral um abuso e no pode ser confundido com decises legtimas [...].

    Por conseguinte, depreende-se que quando as decises do superior esto de

    acordo com as normas de direito e pautadas nos legtimos limites, isto , nos liames

    da lei e de forma a no causar constrangimentos e humilhaes injustificadas nos

    subordinados, no h de se falar em assdio moral.

    Outro detalhe que tambm merece ateno no concernente aos tipos de

    assdio moral. Como j analisado, existem tipos de assdio moral (ascendente,

    horizontal, misto e vertical descendente), embora essa no seja uma classificao

    universal e alguns doutrinadores chegam a considerar que s h assdio moral

    numa relao de subordinao tendo de existir, necessariamente, relao de poderentre os agentes envolvidos no processo. Este trabalho ir se ater apenas ao

    assdio moral vertical descendente, at mesmo porque no militarismo dificilmente

    verificar-se- outra forma do fenmeno. E na vida militar certamente o exemplo de

    assediador mais encontrado ser o do tirano, figura de agressor bem explicado por

    Mrcia Novaes Guedes:

    certamente o pior tipo de agressor moral. Pratica o assdio moral apenas

    pelo gosto de rebaixar, humilhar e submeter a vtima. Seus mtodos sofreqentemente muito cruis. um ditador que sente prazer em escravizar os

    outros. Geralmente um tirano sofre fraqueza, mantm distncia dos outros pelo

    autoritarismo. Acusa os outros e impede que estes possam demonstrar os erros

    dele, agressor, que ele procura to bem ocultar.

    Nesse caso, as possibilidades dos assediados serem recrutas ou praas

    especiais so maiores, em virtude da falsa alegao de se adequarem vida militar,

    conforme se demonstrar mais frente. Atente-se, como bem explica a autora, queessa caracterstica no absoluta, ou seja, dizer que algum tirano no

    necessariamente significa que essa pessoa perversa, mas indica uma

    probabilidade desse indivduo ser ou se tornar um agressor em potencial.

    E finalmente, antes de continuar esta obra monogrfica, deve-se observar a

    questo da legislao. Na esfera federal ainda no existe uma sano para aqueles

    que vierem a cometer o assdio moral, enquanto processo complexo, embora haja

    comportamentos do assediador que podem se amoldar perfeitamente aos tipos

    previstos no Cdigo Penal Militar (a exemplo dos artigos 174 a 176, 205, 207, 209,

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    213, 215 a 217, 333, entre outros), dependendo dos mtodos utilizados pelo

    assediador.

    Essas so as consideraes preliminares a serem feitas.

    O artigo 35 do Estatuto dos Militares apregoa que A subordinao no afeta,

    de modo algum, a dignidade pessoal do militar e decorre, exclusivamente, da

    estrutura hierarquizada das Foras Armadas. Ratificando esse entendimento,

    Antnio Pereira Duarte explica: A subordinao, conforme j asseverado,

    decorrente do prprio sistema hierarquizado das Foras Armadas, no sendo fator

    de violao da dignidade do subordinado.

    Todavia, segundo Ney da Silva Oliveira, o hbito de vida de caserna, onde a

    hierarquia e a disciplina so absolutas, onde no se discutem ordens e onde o usoda inteligncia crtica torna-se suprfluo, conduz ao autoritarismo [...] e essa

    estrutura militar, fortemente verticalizada e fundada no binmio constitucional

    hierarquia e disciplina, propicia ambiente prprio para o de