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FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS ESUDA CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM NEUROPSICOLOGIA MARIANA ANGÉLICA DE ARAÚJO DOS SANTOS ASPECTOS NEUROPSICOLÓGICOS DA DISLEXIA RECIFE JUNHO - 2013

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FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS ESUDA

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM NEUROPSICOLOGIA

MARIANA ANGÉLICA DE ARAÚJO DOS SANTOS

ASPECTOS NEUROPSICOLÓGICOS DA DISLEXIA

RECIFE

JUNHO - 2013

FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS ESUDA

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM NEUROPSICOLOGIA

MARIANA ANGÉLICA DE ARAÚJO DOS SANTOS

ASPECTOS NEUROPSICOLÓGICOS DA DISLEXIA

RECIFE

JUNHO - 2013

Monografia desenvolvida pela aluna Mariana

Angélica de Araújo dos Santos, orientada pela

Profª. ES. Edna Souza e, apresentada ao Curso

de Especialização em Neuropsicologia da

Faculdade de Ciências Humanas ESUDA, como

requisito final para obtenção do grau de

Especialista.

FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS ESUDA

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM NEUROPSICOLÓGICA

ASPECTOS NEUROPSICOLÓGICOS DA DISLEXIA

MARIANA ANGÉLICA DE ARAÚJO DOS SANTOS

Monografia submetida ao Corpo Docente do Curso de Especialização

em Avaliação e Reabilitação Neuropsicológica e Neuropsicologia da

Educação da Faculdade de Ciências Humanas Esuda e

________________________ com _________________________ em

_______ de ___________ em Junho de 2013.

Banca Examinadora:

Orientador: Edna Maria de Souza, Psicóloga Clínica, Hospitalar e Domiciliar,

Especialista em Terapia Cognitvo-Comportamental e Neuropsicologia e Profª. da

Faculdade de Ciências Humanas ESUDA.

Examinador: Verônica Carrazzone, Psicóloga Clínica, Especialista em

Neuropsicologia e Profª da Faculdade de Ciências Humanas ESUDA

Dedico este trabalho ao meu querido esposo

Sérgio dos Santos. A você, meu amado, com

paciência, carinho e atenção ajudou a minha

caminhada a ser menos dura. Mesmo nas

horas em que incontáveis foram as vezes que

meu cansaço e preocupação foi partilhada com

você, numa união que me incentivou a

prosseguir. Só tenho a dizer obrigado meu

querido esposo.

AGRADECIMENTOS

Agradeço ao meu Deus, Jesus e o Espírito Santo.

Na sua palavra em Tiago 1:5, nos ensina a pedir. Mesmo que me falte

palavras que possa ser proferida de meus lábios, te louvo pela sua lealdade com

sua filha. Obrigada Senhor, por essa conquista de vida, por ter me dado força para

vencer as dificuldades e dores e ter me feito forte sem permitir que o cansaço me

dominasse. Pois, deposito toda a minha confiança em ti; Aqui fica registrada a minha

gratidão para convosco.

Aos meus filhos: Bárbara Byanca, minha primogênita, a Flávia e o Moysés

(meu caçula), aos meus genros e nora: Mailson e Henrique, minha nora querida que

me ajudou muito, Nayara, a minha irmã Sandra Maria.

A minha neta Sarah Maiany,que me fez ver que a Educação precisa de mim.

A minha orientadora Edna Souza.

Assumir este trabalho não foi uma tarefa fácil. Foram muitos os momentos

difíceis, sonhos e diversas emoções.Vivenciamos semelhanças e diferenças.

Aos meus pais ausentes... “Hoje a vitória é só minha, faz parte de tudo aquilo

que vocês me ensinaram um dia.. Queria mais tempo... Porém, sei que Deus só nos

convoca para junto de si pessoas de bom coração e, por isso só me resta o conforto

em saber de um modo ou de outro vocês também venceram. Muito obrigado por

tudo, perceba meu eterno amor e carinho.”

“Quando olho uma criança ela me inspira dois

sentimentos, ternura pelo que é, e respeito pelo

que posso ser.”

Jean Piaget

RESUMO

A presente pesquisa tem como objetivo elucidar questões neurofisiológicas sobre a

linguagem, suas afasias e sobre dislexia. Para tanto foi realizada uma revisão

literária em livros e artigos da área. Após Broca, foi à vez de Wernicke deduzir a

área relacionada ao processo de compressão da linguagem e armazenamento

auditivo das palavras. Esta foi posteriormente denominada de área de Wernicke.

Após essas descobertas foi possível distinguir três formas de afasias, ditas de

Broca, de Wernicke e frequentemente o problema é associado a uma anomalia

(incapacidade de denominar as pessoas e objetos). Na afasia de Wernicke, os

pacientes são incapazes de compreender a linguagem escrita ou falada. Já na a

afasia de condução, provocada por uma lesão das fibras do feixe arqueado que liga

as áreas de Broca e Wernicke, não atinge a fluência verbal e a compreensão é

mantida, mas se traduz por parafasias, transformações e omissões de palavras,

dificuldade de repetição de denominação, explicado pelo fato de que a comunicação

entre as áreas de Broca e Wernicke foi atingida. Portanto a dislexia é uma alteração

nesses processamentos periférico e central provocando um comprometimento de

um processo linguístico dos estímulos.

Palavras Chave: Afasias; Dislexia; Àrea de Broca; Àrea de Wernicke.

ABSTRACT

This research aims to elucidate neurophysiological questions about language, about

their aphasia and dyslexia. Therefore we conducted a literature review in books and

articles in the field. After drill, it was time to deduce the Wernicke area related to the

compression process of language and audio storage words. This was later called

Wernicke's area. After these discoveries was possible to distinguish three forms of

aphasia, called Broca's and Wernicke's often the problem is associated with an

abnormality (inability to name people and objects). In Wernicke's aphasia, patients

are unable to understand written or spoken language. Already in the conduction

aphasia caused by an injury to the fibers of the arched beam that connects the

Wernicke area and the Broca does not reach verbal fluency and understanding is

maintained, but is reflected by paraphasia, changes and omissions speech, difficulty

repeat denomination, explained by the fact that communication between Broca's and

Wernicke was reached. Porting dyslexia is a change in these peripheral and central

processes causing an impairment of a process of linguistic stimuli.

Keywords: Aphasia; Dyslexia; Broca's area; Wernicke's area.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................10

Capítulo 1: ETIOLOGIA DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM...................12

1.1. História dos Transtornos mentais...........................................................12 1.2. Diferenciando transtornos e problemas de aprendizagem.................15 1.3. Bases biológicas da linguagem..............................................................17

Capítulo 2: DISLEXIA...............................................................................................18

2.1. Problemas Emocionais.............................................................................22 2.2. Hipóteses Explicativas..............................................................................23 2.3. Classificação das Dislexias......................................................................25 2.4. Métodos de Reeducação do Disléxico.....................................................28

Capítulo 3. ASPECTOS NEUROPSICOLÓGICOS QUE CARACTERIZAM OS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM E A ATUAÇÂO DO NEUROPSICOLOGO NA DISLEXIA...................................................................................................................32

3.1. Atuação do Neuropsicólogo na Dislexia..................................................33 3.1.1. Estratégias de Intervenção na Dislexia.................................................34

CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................37

REFERÊNCIAS.........................................................................................................39

INTRODUÇÃO

A presente monografia pretende mostrar de forma simples e concisa

aspectos neuropsicológicos da dislexia, visando sistematizar alguns conhecimentos

quanto ao estudo dos distúrbios cognitivos e emocionais. No cérebro, as

informações sensoriais são recebidas e interpretadas, permitindo-nos a

comunicação com as pessoas e com o mundo à nossa volta por meio da

motricidade, do pensamento e como foco esse trabalho da linguagem. A linguagem

faz parte do aprendizado e é fundamental para o sucesso escolar.

A motivação, para o desenvolvimento da presente pesquisa, vai além da

curiosidade científica, despertada pela relevância deste tema no âmbito da

Neuropsicologia, levando em consideração, principalmente, as habilidades

fonológicas que são deficientes no disléxico. A fim de esclarecer ao tema proposto

fez-se necessário abundante pesquisa bibliográfica em livros, sites e artigos sobre a

problematização da linguagem que está relacionada com o desenvolvimento

simbólico e com a interiorização de conceitos e informações a aprendizagem. O

objetivo geral foi descrever sobre a dislexia no processo ensino aprendizagem de

aluno/criança com ou sem lesão neurológica, buscando adquirir conhecimento sobre

os modelos de desenvolvimento da linguagem escrita, bem como apresentar

estratégias de intervenção (reabilitação) nas dificuldades apresentadas na dislexia.

Foi através de estudos de casos com pacientes afásicos, ou seja, pacientes

com dificuldade ou até perda da capacidade de utilizar a linguagem, que o cientista

francês Paul Broca (1861) e o neurologista e psiquiatra Karl Wernicke (1885)

descobriram que a linguagem falada e compreendida está relacionada a diferentes

estruturas do cérebro. Ou seja, eles contribuíram para elucidar a dissociação entre

produção e compreensão da linguagem (VYGOTSKY, 1960, em FONSECA, 1995b,

p. 51).

Antes de se diagnosticar um indivíduo como dislexo, é preciso levar em conta

outros fatores que podem estar envolvidos no prejuízo da leitura e da escrita,

ocasionalmente sintomas que facilmente poderão ser confundidos com a dislexia,

como carência cultural, problemas emocionais, métodos de aprendizagem

10

defeituosos, saúde deficiente, imaturidade na iniciação da aprendizagem

(CONDEMARÍN e BLOQUEST, 1989, p. 17).

Veremos algumas diferenças entre os disléxicos e os considerados leitores

normais, bem como métodos que podem ser utilizados para melhor explicar e ajudar

o indivíduo em obter melhores resultados ou adaptação aos sintomas apresentados,

e por ultimo os aspectos neuropsicológicos e a atuação do neuropsicólogo na

dislexia.

11

CAPÍTULO 1. ETIOLOGIA DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Os distúrbios específicos da aprendizagem são aqueles relacionados ás

incapacidades escolares da criança que tenha iniciado a aprendizagem formal da

leitura, da escrita e do raciocínio lógico. Portanto, estão relacionados a uma falha no

processo de aquisição e desenvolvimento dessas atividades.

1.1. História dos Transtornos Mentais

Os transtornos mentais são alterações do funcionamento da mente que

causam danos em importantes áreas da regulação psíquica alterando o equilíbrio

emocional, o rendimento intelectual e o comportamento social adaptativo. A etiologia

dos transtornos psiquiátricos pode ser considerada multifatorial, estando vinculada a

uma ou mais alterações dos mecanismos psicológicos, sociais e biológicos, sendo

que estes estão relacionados a doenças do SNC como alterações no

neurodesenvolvimento cerebral, alterações estruturais adquiridas, neuroquímicas e

genéticas. Devido ao melhor conhecimento e descrição dos quadros clínicos, ao

longo dos anos ocorreu uma grande expansão do diagnóstico psiquiátrico.

Uma grande parte dos mecanismos fisiopatológicos da aprendizagem não

está esclarecida, buscando-se a partir de pesquisas na área da neuropsicologia e

neurofisiologia um conhecimento avançado que permita além de um tratamento mais

eficiente a prevenção dessas disfunções. Os indivíduos com deficiências, vistos

como “doentes” e incapazes, sempre estiveram em situação de maior desvantagem,

ocupando, no imaginário coletivo, a posição de alvos da caridade popular e da

assistência social, e não de sujeitos de direitos sociais, entre os quais se inclui o

direito à educação.

Inspirado nas ideias ainda hoje, constata-se a dificuldade de aceitação do

diferente no seio familiar e social, principalmente do portador de deficiências

múltiplas e graves, que na escolarização apresenta dificuldades acentuadas de

aprendizagem. Além desse grupo, determinados segmentos da comunidade

permanecem igualmente discriminados e à margem do sistema educacional.

12

Considerando-se os dois principais manuais internacionais de diagnóstico, os

transtornos de aprendizagem são assim definidos:

CID-10 Organizado pela Organização Mundial de Saúde - OMS

[...] grupos de transtornos manifestados por comprometimentos específicos e significativos no aprendizado de habilidades escolares. Estes comprometimentos no aprendizado não são resultados diretos de outros transtornos (tais como retardo mental, déficits neurológicos grosseiros, problemas visuais ou auditivos não corrigidos ou perturbações emocionais) embora eles possam ocorrer simultaneamente em tais condições... (1993, p.237).

DSM-IV Organizado pela Associação Psiquiátrica Americana

Os transtornos de aprendizagem são diagnosticados quando os resultados do indivíduo em testes padronizados e individualmente administrados de leitura, matemática ou expressão escrita estão substancialmente abaixo do esperado para sua idade, escolarização ou nível de inteligência... Os transtornos de aprendizagem podem persistir até a idade adulta (1995, p. 46).

Ambos os manuais consideram, basicamente, três tipos de transtornos, quais

sejam, da leitura (dislexia), da escrita (disgrafia e disortografia) e das habilidades

matemáticas (discalculia). Também referem que, em qualquer dos casos, deve haver

os seguintes requisitos para o diagnóstico de transtorno:

Comprometimento intelectual, neurológico evidente ou sensorial;

Inadequadas condições de escolarização;

Início situado obrigatoriamente na primeira ou segunda infância.

A partir de pesquisas, diversos autores, procuram esclarecer os pontos

divergentes na literatura em relação às alterações na aprendizagem escolar e, por

conta dos seus enfoques (pedagógico ou clínico), têm-se as variações na

conceituação e caracterização dos mesmos no processo de ensino-aprendizagem.

Para Fonseca (1995. p.64),

A criança com dificuldade de aprendizagem não deve ser “classificada” como deficiente. Trata-se de uma criança normal que aprende de uma forma diferente, a qual apresenta uma discrepância entre o potencial atual e o potencial esperado. Não pertence a nenhuma categoria de deficiência, não sendo sequer uma deficiência mental, pois possui um potencial cognitivo que não é realizado em termos de aproveitamento educacional.

13

Na mesma linha de raciocínio, Soares (2005) refere que,

Exigir de todos os alunos a mesma atuação, é um caminho improdutivo; cada um é diferente, com o seu próprio tempo lógico e psicológico, e cada um tem uma maneira específica de lidar com o conhecimento. Respeitar essa “veia”, este ritmo para o ato de aprender é preservar o cérebro de uma possível sobrecarga que contribuiria para uma desintegração total do processo ensino-aprendizagem (p. 24)

Para França (1996), a distinção feita entre os termos dificuldade e distúrbios

de aprendizagem está baseada na concepção de que o termo “dificuldade” está

relacionado a problemas de ordem pedagógica e/ou socioculturais, logo, o problema

não está centrado apenas no aluno, sendo que essa visão é mais frequentemente

utilizada em uma perspectiva preventiva; por outro lado, o termo “distúrbio” está

vinculado ao aluno que sugere a existência de comprometimento neurológico em

funções corticais específicas, sendo mais utilizado pela perspectiva clínica ou

remediativa.

Os distúrbios da aprendizagem têm se mostrado um assunto que ainda gera

discussões e dificuldades na sua conceituação. Prevenir e intervir nesses déficits

são papéis de profissionais que estão empenhados nessas dificuldades. Acerca da

conceituação e etiologia dos chamados distúrbios de aprendizagem, além de ratificar

a necessidade e importância do neuropsicólogo em compreender e assumir o seu

papel como profissional legalmente habilitado para intervir nesses distúrbios,

devendo este profissional interagir com as demais áreas apresentadas.

Atuando ativamente na minimização dos atrasos e dificuldades que poderão

se manifestar no aprendizado da leitura e da escrita, o fonoaudiólogo é o profissional

legalmente habilitado para prevenir e reabilitar estas crianças que não conseguem

ter acesso pleno à linguagem escrita.

De acordo com Bassols (2003) os termos dificuldades e distúrbios de

aprendizagem têm gerado muitas controvérsias entre os profissionais, tanto da área

da educação quanto da saúde. Isto porque, há uma sintomatologia muito ampla,

com diversidade de fatores etiológicos, quando se considera o aprendizado da

leitura, escrita e matemática. Por outro lado muitas crianças podem não apresentar

nenhum fator externo a ela e mesmo assim não conseguir desenvolver plenamente

suas habilidades pedagógicas.

14

Entretanto, é necessária uma adequação nestas terminologias a fim de

possibilitar uma homogeneização quando estes casos são discutidos pelos

profissionais das áreas afins.

1.1.1. Diferenciando Transtornos e Problemas de Aprendizagem.

A atribuição multifatorial para as causas dos problemas psiquiátricos,

chamado de aspecto bio-psico-social, é bastante ilustrado na questão da criança

escolar. Ela traz consigo, invariavelmente, as características de seu aspecto

biológico, psicológico e social. Sob esses aspectos será observado as Dificuldades

Escolares, considerando as alterações e os distúrbios em qualquer um destes

aspectos.

Embora haja boas tentativas de definir e especificar o que, de fato, seria uma

Dificuldade de Aprendizagem ou Escolar, não existe ainda uma definição consensual

acerca dos critérios e nem mesmo do termo. De modo acadêmico, vamos chamar

esse quadro de Dificuldades da Aprendizagem, preferível a Dificuldades Escolares,

menos específicos e não restrito, obrigatoriamente, ao aprendizado.

Parcialmente sensata a definição da Lei Pública Americana, P. L. 94 -142, diz:

“Dificuldade de aprendizagem específica significa” uma perturbação em um ou mais processos psicológicos básicos envolvidos na compreensão ou utilização da linguagem falada ou escrita, que pode manifestar-se por uma aptidão imperfeita de escutar, pensar, ler, escrever, soletrar ou fazer cálculos matemáticos.

O termo inclui condições como deficiências perceptivas, lesão cerebral, disfunção cerebral mínima, dislexia e afasia de desenvolvimento. O termo não engloba as crianças que têm problemas de aprendizagem resultantes principalmente de deficiência visual, auditiva ou motora, de deficiência mental, de perturbação emocional ou de desvantagens ambientais, culturais ou econômicas.

Existem ainda outras classificações, por exemplo, quanto à origem das

Dificuldades da Aprendizagem. Alguns autores dividem as Dificuldades da

Aprendizagem em Primárias e Secundárias, de acordo com sua origem (FONSECA,

1995, ELLIS, 1995). As Dificuldades da Aprendizagem consideradas Primárias

seriam aquelas cuja causa não pode ainda ser atribuída a elementos psico-

neurológicos bem estabelecidos ou esclarecidos. Esses casos englobam,

principalmente, as chamadas disfunções cerebrais e, dentro dessas disfunções,

15

teríamos o Transtorno da Leitura, Transtorno da Matemática e Transtorno da

Expressão Escrita, bem como os transtornos da linguagem falada, os quais

englobam o Transtorno da Linguagem Expressiva e o Transtorno Misto da

Linguagem Receptivo-Expressiva. (GREGOIRE,1997).

As Dificuldades da Aprendizagem consideradas secundárias seriam aquelas

consequentes à alterações biológicas específicas e bem estabelecidas e alterações

comportamentais e emocionais bem esclarecidas. Em relação às alterações

biológicas (neurológicas) teríamos as Lesões Cerebrais, Paralisia Cerebral,

Epilepsia e Deficiência Mental. Envolvem também os sistemas sensoriais, através da

deficiência auditiva, hipoacusia, deficiência visual e amblíope.

Teríamos ainda, dentro das causas biológicas, as situações de Dificuldades

da Aprendizagem consequentes a outros problemas perceptivos que afetam a

discriminação, síntese, memória e relação espacial e visualização. Em relação aos

problemas de comportamento, um dos fatores mais marcantes para

desenvolvimento de Dificuldades da Aprendizagem são os quadros classificados

como Comportamento Disruptivo e, dentro deles, o Transtorno de Déficit de Atenção

e Hiperatividade e o Transtorno Desafiado e Opositivo.

Quanto aos problemas emocionais que favorecem as Dificuldades Da

Aprendizagem, (DA), principal itens são a Depressão Infantil e a Ansiedade (de

Separação) na Infância. A importância do diagnóstico dos problemas emocionais

que levam a criança a apresentar um baixo rendimento escolar se justifica por:

I. Dentre as principais razões para as DA, as emocionais são,

atualmente, uma daquelas com melhores possibilidades de

tratamento;

II. Importantíssimo para fazer diagnóstico diferencial com a Deficiência

Mental, quadro muito traumático para familiares e com mau

prognóstico;

III. Proporcionar um desenvolvimento satisfatório o mais rapidamente

possível.

16

1.2. Bases biológicas da linguagem

O processo da linguagem é bastante complexo e envolve uma rede de

neurônios distribuída entre diferentes regiões cerebrais. Em contato com os sons do

ambiente, a fala engloba múltiplos sons que ocorrem simultaneamente, em várias

frequências e com rápidas transições entre estas. O ouvido tem de sintonizar este

sinal auditivo complexo, decodificá-lo e transformá-lo em impulsos elétricos, os quais

são conduzidos por células nervosas à área auditiva do córtex cerebral, no lobo

temporal.

A área de Werneck, situada no lobo temporal, reconhece o padrão de sinais

auditivos e interpreta-os até obter conceitos ou pensamentos, ativando um grupo

distinto de neurônios para diferentes sinais. Ao mesmo tempo, são ativados

neurônios na porção inferior do lobo temporal, os quais formam uma imagem do que

se ouviu, e outros no lobo parietal, que armazenam conceitos relacionados. De

acordo com este modelo, a rede neuronal envolvida forma uma complexa central de

processamento.

Para verbalizar um pensamento, acontece o inverso. Inicialmente, é ativada

uma representação interna do assunto, que é canalizada para a área de Broca, na

porção inferior do lobo frontal, e convertida nos padrões de ativação neuronal

necessários à produção da fala. Também estão envolvidas na linguagem áreas de

controle motor e as responsáveis pela memória. O cérebro é um órgão dinâmico que

se adapta constantemente a novas informações.

Como resultado, as áreas envolvidas na linguagem de um adulto podem não

ser as mesmas envolvidas na criança, e é possível que algumas zonas do cérebro

sejam usadas apenas durante o período de desenvolvimento da linguagem.

Acredita-se que o hemisfério esquerdo seja dominante para a linguagem em cerca

de 90% da população; contudo, o hemisfério direito participa do processamento,

principalmente nos aspectos da pragmática.

17

CAPÍTULO 2. DISLEXIA

Embora estudiosos da área concordem que a dislexia se trata de uma

insuficiência do domínio da leitura, podem ser consideradas duas acepções para

esse termo:

1. A dislexia corresponde às dificuldades no aprendizado da leitura e escrita,

originadas por fatores psicopedagógicos, deficiências sensoriais ou mentais ou

fatores socioculturais;

2. A dislexia se refere às dificuldades de leitura e escrita observadas em

indivíduos perfeitamente normais, sem problemas quaisquer de natureza

pedagógica, neuropsicológica ou social.

A dislexia corresponde a uma dificuldade na aprendizagem da leitura,

embora o aprendiz disponha de QI normal, certa instrução e condições

socioculturais. Tal definição exclui, portanto, os indivíduos que apresentam

problemas sensoriais ou psicológicos e que provêm de classes sociais

desfavorecidas.

Há autores que fazem menção à dislexia-agrafia, a qual corresponde à

capacidade que têm algumas crianças de operar e de memorizar, com erros, a união

fonema-grafema. Conforme afirma Bouvard (1990), a dislexia é um atraso em leitura

e/ou ortografia, de três anos ou mais, após os dez anos de idade mental: dois ou

mais abaixo da mesma idade e os casos caracterizados por inversão de letras e

sílabas (BOUVARD apud AJURIAGUERRA, 1990, p.100).

Observou-se ativação cerebral de pessoas normais durante a leitura de

pseudopalavras nas seguintes regiões: região frontal inferior esquerda; região

parieto temporal, envolvendo os giros angular, supramarginal. E a porção posterior

de giro temporal superior; e regiões occipitotemporais, envolvendo porções mesiais

e inferiores do giro temporal e giro occipital. O mesmo estudo foi realizado em

18

disléxicos, sendo constatado um aumento de ativação no giro frontal inferior e pouca

ativação em regiões posteriores.

Pesquisadores relatam que, em relação aos mecanismos neurológicos das

dificuldades de leitura, alterações referentes à assimetria hemisférica geram uma

organização atípica do hemisfério direito em crianças e adolescentes com dislexia.

Disléxicos apresentam uma desconexão temporo-parieto-occipital e uma

desconexão com o córtex frontal esquerdo, assim como anormalidades do córtex

têmporo-parietal e do cerebelo em relação a outras regiões do cérebro.

Sob um mesmo prisma, Vallet (1986, p. 63-64) considera “a dislexia uma

falta de organização dos símbolos preceptivo-linguísticos, em decorrência de

imaturidade ou de disfunção neuropsicológica”. Em seu trabalho, o autor apresenta

seis manifestações de comportamento característico da dislexia, resumidas por

alguns pesquisadores: desorganização, inversões e “torções” de símbolos; disfunção

da memória auditivo/visual sequencial; problemas na padronização rítmica de sons,

rimas, palavras e sentenças; dificuldade de atenção focalizada; desordens de

organização corporal, coordenação e integração sensorial distorções associadas na

cópia, na escrita e no desenho.

Dificuldades de aprendizagem da linguagem escrita na infância referem-se a

alterações no processo de desenvolvimento do aprendizado da leitura, escrita e

raciocínio lógico-matemático, podendo estar associadas a comprometimento da

linguagem oral. Ao se estudar alterações no processo de aprendizagem da

linguagem oral, frequentemente verifica-se a ocorrência de posteriores dificuldades

de aprendizagem da leitura e escrita.

Da mesma forma, ao se investigar os fatores que antecedem as dificuldades

de leitura e escrita, surgem questionamentos a respeito das dificuldades de

aprendizado da linguagem. Ressalta-se que, entre as alterações de linguagem oral

existentes na infância, são as dificuldades fonológicas, e não as articulatórias, que

podem ocasionar prejuízos no aprendizado posterior da leitura e da escrita.

19

De acordo com Schirmer, Fontoura e Nunes (2004, pp. 95-103) a leitura e a

escrita envolvem habilidades cognitivas complexas, além de capacidade de reflexão

sobre a linguagem no que se refere aos aspectos fonológicos, sintáticos, semânticos

e pragmáticos. As crianças, ao iniciar a alfabetização, já dominam a linguagem oral,

sendo capazes de iniciar o aprendizado da escrita.

Sabe-se que existem regras mais específicas e próprias da escrita, havendo,

então, maiores dificuldades no seu aprendizado, que se um aluno com dificuldades

de aprendizagem for bem conduzido pelos profissionais de saúde e educação, em

conjunto com a família, poderá obter êxito nos resultados escolares. É importante

ressaltar que existe uma combinação dos fenômenos biológicos e ambientais no

aprendizado da linguagem escrita, envolvendo a integridade motora, a integridade

sensório-perceptual e a integridade sócio emocional (possibilidades reais que o meio

oferece em termos de quantidade, qualidade e frequência de estímulos). Além disso,

o domínio da linguagem e a capacidade de simbolização também são princípios

importantes no desenvolvimento do aprendizado da leitura e da escrita.

Sendo considerada uma alteração de aprendizagem, a dislexia caracteriza-se

por dificuldades específicas na realização da leitura e da escrita, havendo, de

maneira geral, dois tipos de dislexia: a dislexia de desenvolvimento e a dislexia

adquirida. A primeira refere-se a alterações no aprendizado da leitura e escrita com

origem institucional, ou seja, ambiental, referente à forma de aprendizado escolar.

Nesses casos, ocorre diminuição da capacidade de leitura associada a disfunção

cerebral, havendo uma alteração específica na aquisição das habilidades de leitura e

consequente dificuldade no aprendizado da leitura.

Os autores consideram fatores genéticos como uma das causas de dislexia

de desenvolvimento. Já na dislexia adquirida, o aprendizado da leitura e da escrita,

que foi adquirido normalmente, é perdido como resultado de uma lesão cerebral.

Vários são os fatores ainda em estudo que descrevem as causas da dislexia de

desenvolvimento. Entre eles, déficits cognitivos, fatores neurológicos

(neuroanatômicos e neurofisiológicos), prematuridade e baixo peso ao nascimento,

influências genéticas e ambientais. E de conhecimento que fatores externos

(ambientais) não podem ser separados de problemas neurológicos, visto que

20

aspectos tais como instrução inadequada, distúrbios emocionais e pobreza de

estímulos na infância podem causar diferenças no desenvolvimento neurológico e

cognitivo que precedem dificuldades severas de leitura.

As dislexias podem ser divididas em dois tipos: central e periférica. Na

primeira, ocorre o comprometimento do processamento linguístico dos estímulos, ou

seja, alterações no processo de conversão da ortografia para fonologia. Na segunda,

ocorre o comprometimento do sistema de análise vísuo-perceptiva para leitura,

havendo prejuízos na compreensão do material lido. Entre as dislexias centrais,

ressaltam-se a fonológica, a de superfície e a profunda; já as dislexias periféricas

incluem a dislexia atencional, a por negligência e a literal (pura).

Em relação às dislexias de desenvolvimento, temos:

Dislexia fonológica: Incapacidade de decodificação fonológica. Sabe-se

muito pouco sobre as áreas. Danos na via de conversão grafema-fonema.

Neuroanatômicas essenciais para dificuldades em tarefas de memória

fonológica. o funcionamento adequado do desempenho muito ruim na leitura

de estímulos processamento perilexical, não familiares e pseudopalavras

havendo evidências de disfunções (palavras não-reais). Neuroanatômicas

específicas.

Dislexia de superfície: Comprometimento da via lexical. Evidências de

disfunção na região os estímulos são lidos através do processo temporal

média e póstero-superior fonológico (ex. tóxico é lido tóchico.), do hemisfério

esquerdo. Havendo uma incapacidade no tratamento ortográfico da

informação.

Dislexia profunda: Bloqueio na via não lexical. Alguns autores relatam a

ocorrência Ausência de leitura de não-palavras; de lesões múltiplas no

hemisfério maior facilidade para leitura de esquerdo, e outros sugerem que

existem palavras concretas e frequentes; habilidades de leitura residuais no

hemisfério direito devido à extensa lesão em hemisfério dominante.

Dislexia Atencional: Preservação da leitura de palavras isoladas;lesões no

lobo parietal esquerdo; dificuldades na leitura de vários itens quando

apresentados simultaneamente.

21

Dislexia por negligência: Dificuldades na leitura no campo visual do lado

esquerdo; lesão na região da artéria cerebral contralateral ao da lesão

cerebral média do hemisfério direito envolvendo lobos frontal, temporal e

parietal.

Dislexia literal: (pura) Leitura letra por letra preservada; lesões occipitais

inferiores extensas à esquerda.

2.1. Problemas Emocionais.

Ao longo da pesquisa vem constando a dislexia como distúrbio e depende de

causas intelectuais, culturais, Pode apresentar também alterações emocionais. Essa

evidência é dita por Klein (1950, p. 369)

As experiências escolares são as primeiras experiências importantes fora de circulo familiar, envolvendo uma reparação sistemática do lar e onde a criação é confrontada com a necessidade de se ajustar a adultos e crianças estranhos e ao mesmo tempo, deve desempenhar tarefas das quais dificilmente poderá eximir-se. As atitudes com o professor, com os colegas e com o trabalho escolar constituem numa ponte importante entre as atitudes primitivas com os pais, irmãos e consigo próprio e sua expressão posterior na vida adulta.

É na escola que a criança tem oportunidade de mostrar o seu modelo de

relacionamento familiar. Ao vivenciar o fracasso escolar as crianças com dificuldades

em aprender, que de certa forma apresentam problemas emocionais, desenvolvem

situações desagradáveis que podem variar de intensidade de acordo com as

condições do ego da criança e a dinâmica familiar.

Torna-se muito difícil para uma criança que apresenta dificuldade de

aprendizagem e que possui bom potencial intelectual e adequadas condições

sensoriais, compreender o motivo de suas dificuldades, principalmente quando

verificamos que outras crianças, muitas vezes menos dotadas aprendem com

facilidade.

E este quadro se agrava quando estas crianças são chamadas com

frequência “preguiçosas”, “sem capricho”, e pouco inteligentes. Isto é provada

através do desinteresse pelo estudo, e recusa em executar as tarefas, faltando as

aulas, agressividade, e diminuição da autoestima.

22

Essas reações podem desencadear mais dificuldade de aprendizagem à

medida que afeta a atenção, concentração, interesse e memória. Analisamos

algumas características de crianças com dificuldade de aprendizagem que na

maioria das vezes são de origem emocional, o professor deverá ter cuidado para

estimular a não competição dentro de sala de aula, seja inclusiva ou não, referente a

este fator competição.

Mesmo quando o professor não enfatiza a competição entre alunos e encoraja cada um a seguir seu próprio ritmo, muitas crianças reagem mal a comparações que eles mesmo fazem entre o seu trabalho e os daqueles que o superam (KLEIN, 1958, p.370)

2.2. Hipóteses explicativas

Formada por neurologistas e neuropsicólogos, a corrente organicista tem

como representantes Boder (1973), Marshall e Newcombe (1966). A ela se deve a

descoberta dos distúrbios de leitura, o desenvolvimento de diversos modelos

explicativos e de metodologias de exames conforme esses modelos. Sobre a

etiologia, essa corrente promove três tipos de explicações teóricas: a das lesões

cerebrais, a da origem hereditária e a do atraso de maturação cerebral.

De acordo com a primeira explicação teórica, o distúrbio resulta de uma ou

mais deficiências na atenção, na memória e nos processos cognitivos, as quais

teriam sua origem durante a vida uterina ou durante o aprendizado da leitura. Assim,

desenvolvem-se, para o diagnóstico, baterias neuropediátricas, pesquisando a vida

da criança nos períodos pré-natal, neonatal e perinatal.

A segunda explicação distingue três tipos de dislexia, de acordo com a

relação entre a idade léxica e a idade real do disléxico: dislexia maior, dislexia média

e dislexia menor. Para o diagnóstico, realizam-se exames nos disléxicos, seus

ascendentes e colaterais, a fim de distinguir os portadores dos distúrbios daqueles

não portadores. A teoria do retardo de maturação cerebral se baseia na coleta de

dados comportamentais, através de testes vísuo-espaciais. Os distúrbios se

originam, de acordo com essa teoria, de um atraso de lateralização cerebral,

23

resultando num atraso na função de reconhecimento visual e auditivo dos símbolos

linguísticos.

AJURIAGUERRA (1984, p. 49) de acordo com esta visão, as percepções

visual e auditiva desempenham papel primordial na gênese da dislexia. Assim, ela

propõe três critérios para o diagnóstico da dislexia: nível de leitura oral e ortografia

da criança; presença de erros característicos da dislexia-disortografia e resultados

dos testes instrumentais. Fragmentando o conceito de dislexia, essa corrente propõe

também os modelos genéticos da leitura, apresentando alguns princípios e

suposições:

(a) O desenvolvimento da leitura se produz obedecendo a certa ordem;

(b) As mudanças observadas no curso desse desenvolvimento são mais

quantitativas;

(c) A leitura e a escrita se apoiam mutuamente;

(d) As dislexias do desenvolvimento não podem ser comparadas às dislexias

adquiridas do adulto num contexto de acidente cerebral, visto que, naquelas,

as perturbações seletivas de certas modalidades de tratamento não são

observáveis.

De acordo com Frith (1984), esses estágios são: o lalográfico, em que o

indivíduo pode realizar a leitura, baseando-se em indícios visuais marcantes,

comprimento e regularidade das palavras e seus contextos figurado e sintático; o

alfabético, em que os fatores fonéticos são primordiais, pois é nele que indivíduo

torna-se capaz de ler palavras desconhecidas, descobrindo a possibilidade de

segmentação destas em unidades menores que a sílaba: os fonemas; o ortográfico,

no qual se dá aos morfemas um tratamento analítico e sistemático, havendo uma

interação entre as atividades de leitura-escrita e as capacidades que o indivíduo tem

de abstração, construindo, assim, estratégias da leitura adulta.

Diversos modelos genéticos e comparativos surgiram simultaneamente, a

partir da fragmentação do conceito de dislexia. De acordo com eles, existem três

facetas consideradas, atualmente, imprescindíveis para que o indivíduo aprenda a

ler: “a consciência fonética e a aptidão para segmentar o material verbal em

24

unidades menores que a sílaba; a rapidez de denominação e de acesso ao léxico

mental; a manutenção da informação fonética na memória de trabalho” (GRÉGOIRE;

PÉRIART, 1997, p. 31).

Dessa forma, esses três fatores desempenham papel relevante nos distúrbios

da leitura, visto que há uma forte ligação causal entre as capacidades fonológicas e

o desempenho em leitura, ligação esta em que a consciência fonológica é de

extrema importância para a aprendizagem da leitura em fase inicial:

A dislexia está estritamente ligada à relação do indivíduo com a cultura. Para demonstrar esse caráter cultural desse distúrbio, o autor aponta três categorias de fatos: a) a dislexia se manifesta frequentemente em meios culturais mais baixos, onde as pessoas geralmente têm atitudes desfavoráveis em relação à criança; b) geralmente a dislexia está relacionada às línguas de combinação, as quais possuem um sistema audiovisual em que os elementos gráficos representam, de maneira isolada, os fonemas, bem como um sistema ideovisual em que os grafemas significam as ideias e realidades; c) embora não seja a causa direta da dislexia, uma pedagogia inadequada pode levar um indivíduo com QI inferior a adquirir esse distúrbio com mais facilidade (AJURIAGUERRA, 1990, p. 100).

A dislexia é um distúrbio que pode atingir qualquer indivíduo, entretanto,

segundo Jorm (1985), “sua incidência tem sido maior em certos tipos de

comunidade, geralmente aquelas em que o indivíduo apresenta problemas sociais e

escolares, e cujas famílias são numerosas e não possuem status social”.

2.3. Classificações das dislexias

As dificuldades em leitura e ortografia podem afetar o indivíduo de diferentes

formas, visto que estes são processos muito complexos. Por isso os especialistas

distinguem categoricamente dois tipos de dislexia: a dislexia adquirida e a dislexia

do desenvolvimento. A primeira, geralmente mais observada em adultos do que em

criança, é a perda da capacidade de ler e escrever através de dano cerebral; a

segunda, mais observada em crianças, é a dificuldade na aquisição da leitura e

escrita durante o processo de alfabetização. (JORM, 1985, p.12).

As dislexias adquiridas resultam de lesões cerebrais e correspondem a

diferentes prejuízos no processo de leitura e ortografia. Ellis (1985), baseando-se em

uma distinção proposta por Shallice (1980), aponta dois tipos de dislexias

25

adquiridas: as dislexias periféricas e as dislexias centrais. De acordo com ele, os

prejuízos na percepção das letras nas palavras, ocasionados por transtornos em que

o sistema de análise visual está afetado, são denominados dislexias periféricas. As

dislexias centrais, por outro lado, correspondem às dificuldades de compreensão de

material gráfico, oriundas de danos no processo e no sistema de análise visual.

Ellis (1985) propõe uma subdivisão para as dislexias periféricas: dislexia por

negligência, dislexia por atenção e leitura letra por letra. A dislexia por negligência é

a incapacidade para identificar as letras iniciais das palavras, embora o indivíduo

afetado tenha consciência da sua presença. Assim ele lê “lima” ao invés de “clima”,

“falar” como “calar”, etc. A dislexia da atenção é característica do indivíduo que, ao

encontrar várias letras em uma sequência ou diferentes palavras numa frase,

comete erros, fazendo com que as letras migrem de uma palavra para outra. Dessa

forma, ao ver as palavras “bandido” e “carteira”, o indivíduo lê “bandeira”. Outra

variedade da dislexia periférica é a leitura letra por letra, em que o disléxico, para ler

uma palavra, necessita da identificação das letras isoladamente, convertendo-as em

seus nomes ao invés de convertê-los em seus sons. Uma palavra como “você” será

lida por ele da seguinte forma: “vê” “ô” “cê” “ê”, ao invés de [vo’se]. Por isso sua

leitura é lente, monótona e sujeita a erros.

As variedades de dislexias centrais são agrupadas em quatro tipos:

(a) A leitura não semântica corresponde a um prejuízo no sistema semântico,

apesar da preservação do sistema de análise visual e do nível do fonema.

O indivíduo com esse problema apresenta incapacidade de compreensão

do significado das palavras, embora apresente capacidade para converter

as letras em sons, demonstrando, inclusive, a capacidade de fazer leitura

de não palavras.

(b) De acordo com Grégoire e Pérairt, (1997, p. 27-28) a dislexia de superfície

corresponde a um distúrbio em que o indivíduo tende a tratar palavras

conhecidas como se fossem novas, devido a uma má aplicação das regras

de correspondência entre grafema-fonema. Entende-se por isso que o

sujeito converte cada palavra em fonema e pronuncia a sequência de sons

resultante. Para tanto, ele faz uso da via que liga o sistema de análise

visual ao nível do fonema.

26

(c) A dislexia fonológica refere-se à incapacidade de ler palavras que não

fazem parte do vocabulário do indivíduo ou de não palavras em voz alta.

Geralmente o disléxico fonológico apresenta danos no procedimento de

leitura sublexical e, portanto, tem dificuldade de fazer uso do mesmo.

(d) A dislexia profunda é um tipo de distúrbio em que o indivíduo

comete erros visuais, semânticos e de derivação. O indivíduo que

apresenta tal distúrbio tem mais dificuldades para ler palavras abstratas

como “dor”, “vida” do que palavras concretas como “bola” e “casa”. Além

disso, ele também demonstra incapacidade de ler palavras não familiares

e palavras inventadas.

Com base nos dados de Border (1973, apud PINHEIRO, 1994) existem três

tipos de dislexias:

1. Dislexia disfonética ou fonológica: Caracterizada por uma dificuldade

oral de palavras poucas familiares. A dificuldade encontra-se na

conversão letra-som. Normalmente associadas a uma disfunção no

Lóbulo Temporal.

2. Dislexia Diseidética: É uma dificuldade na leitura caracterizada por um

problema de ordem visão, ou seja, o processo visual é deficiente. Para

Ellis (1995), este leitor, lê por um meio de um processo estritamente

elaborado de analise e síntese fonética que está associada a disfunção

do Lóbulo Occipital.

3. Dislexia Mista: Caracterizada por leitores que apresentam problemas

dos dois subtipos desfonéticos e diseidéticos, sendo. Associadas as

disfunções dos Lóbulos Pré-frontal, frontal, occiptal e temporal

(CIASCA, 2000)

Nos estudos de Ellis (1995), é apresentado outro tipo de dislexia:denominada

a dislexia profunda que assemelha-se a dislexia fonológica com igual bloqueio para

leitura de não palavra,mas a diferença é que nessa dislexia,há presença de

paralexia semânticas e maior facilidade em leituras de palavras concretas e

frequente. O autor acredita que nesta dislexia, existam lesões múltiplas no

hemisfério esquerdo.

27

2.4. Métodos de Reeducação do Disléxico

A dislexia pode cursar em um conjunto com a mesma serie de outras

disfunções cognitivas,necessitando de uma reeducação,afim de superar os diversos

quesitos diagnósticos. Enfocamos a reeducação no sentido de:

Consiste, pois, em uma atividade pedagógica planejada que se vale de técnicas e recursos organizados com o fim de ajudar certo tipo de leitor inábil a tornar-se hábil, quer reformando seus conhecimentos léxicos defeituosos,quer dando-lhes os que não conseguiu adquirir em razão das características que o definem como disléxico. (SANTOS, 1984, p.89).

O autor que dizer que a criança disléxica deve ser alfabetizada através de um

método mais fonético ou analítico-sintético, em que se priorize a correspondência

grafema-fonema. Sobre esse aspecto, Ellis (1985) salienta que “os métodos de

ensino usados com os disléxicos tendem a colocar grande ênfase sobre a fonética.

Isto é, eles dirigem ao que é, para muitos disléxicos, a maior área de dificuldades”. E

afirma:

Um leitor que adquire uma compreensão razoável da fonética em uma melhor posição para fazer progresso, porque terá uma chance de identificar palavras encontradas por escrito pela primeira vez. O leitor que não possui um entendimento fonético apenas pode adivinhar ou indagar. (ELLIS, 1985, p.123)

Pode ser que existam alguns disléxicos cujos déficits fonológicos são tão

severos que nenhuma quantidade de instrução poderá permitir que desenvolvam e

usem as correspondências sublexicais de letras-sons.

Os métodos de reeducação mais conhecidos na concepção de Santos (1984)

são:

O método Gillingham, o alfabético, baseia-se na associação da visão, audição

e do movimento. Partindo do nome da letra, a criança deverá chegar ao som

representado por esta. Inicialmente o reeducador apresenta, à criança, a letra

tipo script e diz o nome desta letra, o qual deverá ser repetido pela criança.

Em seguida, o reeducado pronuncia o fonema e a criança repete. Após a

aprendizagem do nome, do som e da grafia das letras, a criança aprende a

associar as letras em sílabas e palavras. Posteriormente, a criança inicia a

28

fase de soletração, em que deverá analisar palavras, decompondo-as em

fonemas.

Criado pela fonoaudióloga Edith Norrie, o método dinamarquês ganhou

caráter estritamente fonético com a finalidade de servir para o treino da fala e

para exercícios de leitura e de ortografia. Ele parte da composição de

palavras e sentenças através de letras móveis, impressas em cores: as

vogais, em vermelho; as consoantes sonoras e surdas, respectivamente, em

cinza e preto. À medida que a criança pronuncia o som correspondente a

cada letra, ela pode observar, através de um espelho, o movimento de seus

lábios e da sua língua. De acordo com esse método, o processo de

reeducação envolve ditado, gramática e leitura, priorizando sempre o aspecto

que se constitui a maior dificuldade do disléxico.

Criado por Borel-Maisonny, o método combinado apresenta como

característica peculiar a associação som-gesto simbólico. Inicialmente são

desenvolvidos exercícios de representação especial e noções de número,

além da correção de qualquer defeito articulatório. Posteriormente o

reeducador ensina o som das letras, o qual deverá ser pronunciado mediante

gesto que simbolize a letra ou o som. Depois que a criança aprende a

associar o som à letra que o representa, a simbolização gestual é

abandonada.

De acordo com o método Kocher, o ensino das letras deve ser iniciado pelas

vogais, as quais devem ser distinguidas das consoantes por uma cor

diferente. Propõe, então, que se ensine, posteriormente, as consoantes

fricativas e líquidas e, depois, as oclusivas, evitando-se trabalhar as

consoantes “b” e “d” junto com as consoantes “q” e “p”, devido à semelhança

gráfica, a qual poderá gerar confusões. Inicialmente o reeducador pronuncia

o som da letra e depois apresenta a sua forma gráfica. O aluno deve observar

as características gerais da pronúncia da letra, como pontos de articulação,

presença ou ausência de sonoridade, nível em que as vibrações são

percebidas. Posteriormente, para que a criança perceba a diferença entre as

consoantes sonoras e as surdas, o reeducador deverá um quadro com a

disposição das consoantes em duas fileiras horizontais, formando pares

opostos.

29

De acordo com Ariette Bourcier, criadora do método Bourcier, a reeducação

do disléxico deve partir da análise de estruturas mais simples para a análise

de estruturas mais complexas, ou seja, do estudo de fonemas para o estudo

de silabas, palavras, orações e estórias. Para tanto, o reeducador deve

utilizar fichas de leitura para casa, com exercícios de permutação que servem

para prevenir as inversões de letras. A criança, inicialmente, deverá fazer o

reconhecimento das letras, uma a uma, ou a diferenciação entre duas letras

ou fonemas que lhe geravam confusão. Posteriormente a criança deverá

fazer o estudo de letras com diferentes modos de pronúncia, bem como de

sons e sílabas mais complexas.

O processo de reeducação, de acordo com o método de Chassagny,

desenvolve-se em duas etapas, a sessão com o reeducador e o

desenvolvimento de atividades em casa. No primeiro momento do processo

de reeducação, são desenvolvidos exercícios psicomotores no quadro-negro,

no caderno e no livro, tendo por finalidade desenvolver a orientação espacial.

No segundo momento, são aplicados exercícios de permutação de

consoantes e vogais, com três e duas letras, a fim de desenvolver a

habilidade de leitura e escrita. As consoantes oclusivas são apresentadas

simultaneamente, através de sílabas como dra, bro, qui, bri. As fricativas

também são apresentadas simultaneamente através de combinações como

fa, vra, etc. As palavras constituídas por tais sílabas são apresentadas em

seguida, para que o disléxico perceba as diferenças entre elas. Depois que o

aluno apresenta domínio de vocabulário, dá-se início à conversação, em que

se utilizam trechos de leitura e resumos orais de estórias. Para os casos mais

graves de dislexia, é necessário recorrer a técnicas especiais, como os

métodos vísuo-audiocenestésicos, em que, além do emprego da visão e da

audição, empregam-se os movimentos; e os métodos vísuo-

audiocenestésicos-táteis, em que o contato do dedo com o material a ser lido

é fundamental.

A escolha deste ou daquele método depende da gravidade da dislexia e das

características peculiares do disléxico, podendo, inclusive, haver variações de

métodos. Dessa forma, cabe ao reeducador analisar as possibilidades de

combinações e variações de métodos, de acordo com as deficiências do disléxico.

30

Os problemas de leitura que o disléxico apresenta correspondem ao resultado

final de uma série de desorganizações que já se apresentavam em todas as funções

básicas necessárias para o desenvolvimento da recepção, expressão e integração,

subjacentes à função simbólica. O disléxico apresenta problemas que refletem no

seu “mau desempenho” em leitura, a qual é lenta e difícil de progredir, devido à

incapacidade de traduzir sons em símbolos gráficos.

A leitura, assim, caracteriza-se por inversões de letras e sílabas, falta de

pronúncia e ensurdecimento de consoantes, confusões entre letras cujas formas se

assemelham e erros de transcodificação grafema-fonema. Vários métodos e

técnicas foram propostos para a solução desses problemas, pois o disléxico

necessita de tratamento especializado tanto quanto qualquer outro deficiente em

linguagem. Para tanto, faz-se necessário o apoio dos pais e professores, aos quais

devem encaminhá-lo ao tratamento, bem como colaborar nesse tratamento, a partir

da escolha e aplicação do método mais adequado às deficiências do disléxico.

31

CAPÍTULO 3. ASPECTOS NEUROPSICOLÓGICOS QUE CARACTERIZAM OS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM E ATUAÇÃO DO NEUROPSICÓLOGICO NA DISLEXIA

Considerando a interface dos conhecimentos da psicologia cognitiva com as

neurociências, é função de a neuropsicologia procurar relacioná-lo, revelando a

fisiopatologia dos transtornos nessa base, escolhendo racionalmente a estratégia

com base cientifica. Portanto o modelo neuropsicológico aplicado ao transtorno à

aprendizagem assume que estas constituem a expressão de uma disfunção cerebral

especifica causada por fatores genéticos ou ambientais que altera o

neurodesenvolvimento.

Entende-se como neuropsicologia, como explica Tabaquim (2003) o estudo

dos distúrbios das funções superiores produzidos por alterações cerebrais,

investigando, especificamente, os distúrbios dos comportamentos adquiridos, pelos

quais cada homem mantém relações adaptadas com o meio. Somente há pouco

mais de cem anos é que se passou a conhecer o funcionamento ao nível do córtex

cerebral, por meio do estudo das lesões espontâneas localizadas e ressecções

parciais do cérebro, que permitiram demonstrar que as diversas partes hemisféricas

não possuem a mesma função e que existe uma organização cerebral semelhante

em todos os indivíduos.

Para Costa, Azambuja e Portugues (2004), a neuropsicologia entende a

participação do cérebro como um todo, no qual as áreas são interdependentes e

inter-relacionadas, funcionando comparativamente a uma orquestra, que depende

da integração de seus componentes para realizar um concerto. Isso se denomina

sistema funcional. Dessa maneira, sabe-se que, a partir do conhecimento do

desenvolvimento e funcionamento normal do cérebro, pode-se compreender

alterações cerebrais, como no caso de disfunções cognitivas e do comportamento

resultante de lesões, doenças ou desenvolvimento anormal do cérebro.

Para Tabaquim (2003), o processo de aprendizagem exige certo nível de

ativação e atenção, de vigilância e seleção das informações. A ativação, por meio da

32

vigilância, conecta-se com a atenção no sentido da capacidade de focalização da

atividade. São elementos fundamentais de toda atividade neuropsicológica,

essenciais para manter as atividades cognitivas, inibindo o efeito de muitos

neurônios que não interessam à situação. Sem uma organização cerebral integrada,

intra e interneurossensorial não são possíveis uma aprendizagem normal.

Ainda segundo o autor, os processos de codificação e decodificação são de

extrema importância, quando se abordam problemas de aprendizagem. A

linguagem, oral e escrita, receptiva ou expressiva, faz parte com toda sua

especificidade, do sistema cognitivo. Distinguindo a dimensão de percepção e

gnose, como sendo o reconhecimento modal específico por meio de analisadores

visuais, auditivos e somestésicos do processamento conceptual e ação, como

pensamento e resposta (verbal ou não verbal), a linguagem é um dos componentes

fundamentais na organização cognitiva e nos processos complexos da

aprendizagem. Os componentes cognitivos e as regiões cerebrais, que os

processam, constituem um todo interconexo.

Moretti e Martins (1997) alegam que as disfunções cerebrais, bem como as

lesões, interferem no processamento das informações: recepção (ocasiona

problemas perceptuais); integração (surgem dificuldades na retenção-memória e

elaboração); e expressão (surgirão distúrbios na ordenação, sequêncialização,

planificação e execução), sendo essas informações envolvidas pelo aprendizado.

3.1. Atuação do Neuropsicólogo na Dislexia

Muitas crianças passam por dificuldades quando estão aprendendo a ler, e

um diagnóstico precipitado pode levar esta criança ao rótulo de distúrbios de

aprendizagem, inclusive portadora de dislexia. É preciso cuidado, tanto por parte da

escola quanto do profissional, responsável pelo diagnóstico, a fim de não julgarem

precipitadamente as dificuldades de aprendizagem de uma criança.

Nesse momento a figura do neuropsicólogo se faz importante, onde através

da reabilitação enfoca o retreinamento cognitivo da criança, através da estimulação

e prática de exercícios, como vimos anteriormente à aprendizagem se expande,

33

envolvendo o uso de diferentes circuitos cerebrais, que dependerão por sua vez de

algumas formas de linguagem e sistemas de símbolos.

Tanto na visão neurológica como nas diversas correntes psicológicas, Gagné

(1981) explica que a aprendizagem, enquanto construto teórico apresenta pontos

comuns e com significados intrínsecos, que convergem para o fato de que tudo

aquilo que se sabe o homem deve aprendê-lo, ou seja, a criança nasce em um

mundo com passado, em um grupo social que irá transmitir-lhe seus costumes, sua

linguagem e todo o conhecimento deverá, portanto, ser adquirido, fragmento por

fragmento, misturados a outras experiências pessoais que se desenvolverão

progressivamente, envolvendo suas relações com o mundo que a cerca.

Como neuropsicólogos, podemos inferir que é na escola, ou mais

precisamente no processo educativo, que vemos melhor essa relação biunívoca da

aprendizagem enquanto vínculo integrativo da sociedade, cuja principal forma de

ação é sobre o indivíduo em seu desenvolvimento global, direta e abrangentemente,

visando a maior possibilidade de renovação de liberdade.

3.1.1. Estratégias de Intervenção na Dislexia

Assim como houve avanço significativos no processo de diagnóstico, o

mesmo vem ocorrendo com os procedimentos interventivos dos distúrbios de

aprendizagem. Hoje sabemos que cada aluno/criança com diagnóstico de distúrbios

de aprendizagem com ou sem lesão cerebral representa um caso específico,

portanto necessitando de um programa próprio de intervenção.

Para Abrisqueta-Gomez e Santos (2006), iniciar qualquer programa de

intervenção com um aluno com problema neurológico específico, causado por

trauma ou lesão e que tenha como consequência um diagnóstico de distúrbio de

aprendizagem, é necessário:

a) Saber a localização, extensão e comprometimento da lesão/trauma.

b) Conhecer o sistema de escrita do português.

34

c) Investigar, por meio da prática clínica, o nível de conhecimento acadêmico

da criança antes e depois da lesão, principalmente relacionados à leitura,

escrita e raciocínio matemático.

d) Planejar programas individuais de intervenção.

e) Identificar as potencialidades e necessidades de cada criança.

Acreditamos que para a ocorrência desses fatores, o diagnóstico servirá de

base para o trabalho realizado com as manifestações dos problemas apresentados.

E, seguindo as orientações de Maia (2011, pp. 122-126), as estratégias de

intervenção com alunos/crianças com dislexia podem ser divididas em três etapas:

1. A estimulação consiste e atividades que promovam enriquecimento

linguístico, prática das habilidades fonológicas que são deficientes no disléxico e

instrução de habilidades metafonológicas (pensar e manipular os sons das palavras,

tomando consciência da maneira como estes sons – fonemas – se associam). O

enriquecimento linguístico deve ser promovido por meio do estímulo precoce à

leitura (rodas de leitura, livros para casa, atividades lúdicas a partir do livro), o que

promoverá o aumento do vocabulário, tornando mais fácil a identificação das

mesmas quando escritas, bem como promovendo o entendimento da estrutura da

linguagem escrita.

2. A remediação consiste em modificações na metodologia de ensino da

leitura e escrita a fim de alcançar um melhor desempenho do aluno/ criança com

dislexia. Para um aluno/criança com dislexia, conseguir se manter no nível dos

demais, ele terá de estudar mais, ter mais assistência individualizada e mais apoio

familiar. O primeiro objetivo do neuropsicólogo é fazer com que a aluno/criança

aprenda a ler as palavras acuradamente, para que depois se passe da acurácia para

a fluência. Deverá haver instruções sistemática e direta de consciência fonológica,

instrução fônica (soletrar e leitura de palavras isoladas), trabalhar vocabulário,

conceitos e estratégias de compreensão da leitura. O computador pode ser um

instrumento valioso no apoio ao aluno/criança com dislexia, mas não substitui o

esforço próprio. Dessa forma, o computador por si só não o “ajuda” a escrever,

sendo pouco útil nas fases iniciais do distúrbio.

35

3. A acomodação corresponde a modificações nas estratégias de avaliação

do aluno/criança a fim de possibilitar que este mostre seu potencial e conhecimento.

A acomodação por si só não é uma ponte direta para o sucesso do aluno/criança

disléxico. Para isso, há necessidade de ensino adequado, estudo e motivação. A

acomodação não significa exigir menos e sim exigir de forma diferente para que se

chegue ao mesmo resultado: a comprovação do conhecimento e da competência.

36

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entre os muitos problemas neurológicos com os quais nos deparamos na

prática profissional, sem dúvida as dificuldades de linguagem correspondem a um

dos desafios mais marcantes e que requer um aprofundamento da teoria para uma

prática profissional mais eficiente. A linguagem é um dos processos mais complexos

do ser humano e envolve uma rede de processos distribuídos pelo sistema nervoso,

em que estímulos e ações se interligam formando esse processo tão dinâmico. O

estudo e a compreensão da linguagem, bem como de suas alterações é de suma

importância não só para neuropsicólogos, mas como para toda a equipe, uma vez

que é através da linguagem que se dá o multi e interdisciplina processo terapêutico,

é através dela que se dá esse caminho entre o pensar e o agir.

Salientamos que, para uma melhor compreensão do assunto, se fez

necessário classificar as etiologias das dificuldades de aprendizagem, destacando

as principais causas que poderiam levar as crianças a uma deficiência, ou até

mesmo a dificuldade de aprendizagem. Coube à neuropsicologia, com suporte na

neuroeducação explicar, ampliar a matriz teoria da cognição, aprendizagem,

pensamento e como foco desta monografia a linguagem e em sua arquitetura a

dislexia.

Se, efetivamente, surge um problema ou uma dificuldade, por lesão ou por

outra razão, não quer dizer que o sistema funcional esteja bloqueado. Pelo contrário,

vimos que se existe alguma dificuldade, poderemos mudar a natureza da tarefa

(condições externas), ou então mudar a composição sistema funcional, mudando a

localização onde a informação é processada (condições internas) alterando,

consequentemente, a modalidade de input ou de output, modificando o conteúdo

verbal ou promovendo, através de métodos, as funções cognitivas de

processamento de informações (input, elaboração e output), etc.

É importante ressaltamos que o incentivo da estimulação de atividades que

promovam o conhecimento linguístico, contribuirá para a motivação e o gosto da

leitura no disléxico. A instrução metafonológica em nosso conhecimento consistirá

37

no estímulo das habilidades, já vistas como consciência fonológica. Logo, é um

trabalho árduo que exigirá paciência, não só para o neuropsicólogo, mas todos os

envolvidos. As orientações encontradas neste trabalho são gerais e não pretendem

esgotar o assunto. Inúmeros outros poderão fatores influenciar a maneira como o

neuropsicólogo atuará com um aluno/criança com dislexia. As experiências

sucessivas irão determinar um esquema básico que se adapte a cada caso.

Finalizando queremos destacar que diante do exposto, considera-se que é

necessário e fundamental, a realização de um trabalho de conscientização, o

envolvimento e compromisso dos educadores, do neuropsicólogo e demais

profissionais e principalmente a participação das famílias e nesse esforço conjunto

concluir que nos aspectos neuropsicológicos da dislexia, o sucesso é possível.

38

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