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AS PARTICIPAÇÕES GOVERNAMENTAIS E O IMPACTO DOS ROYALTIES SOBRE A ECONOMIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO * Aislan de Souza Coelho *Advogado e Pós-Graduado em Direito Ambiental com Ênfase em Petróleo UCAM-Campos SUMÁRIO: Introdução. Capítulo I Dos Contratos de Concessão. 1 Panorama Histórico. 1.1 No Brasil. 1.2 Natureza Jurídica dos Contratos de Concessão. Capítulo II Das Participações Governamentais. 2 Noções Gerais. 2.1 As Participações Governamentais. 2.1.1 Bônus de Assinatura. 2.1.2 Pagamento pela Ocupação ou Retenção de Área. 2.1.3 Participação Especial. 2.1.4 Royalties. 2.1.4.1 Cálculo e Distribuição dos Royalties. 2.1.4.2 Natureza jurídica. Capítulo III A Aplicação das Participações Governamentais. 3 Das Participações Governamentais. 3.1 Bônus de Assinatura. 3.2 Pagamento pela Ocupação ou Retenção de Área. 3.3 Participação Especial. 3.4 Royalties. 3.4.1 Panorama Internacional. 3.4.2 Legislação brasileira. 3.4.3 Função Social dos Royalties. Capítulo IV O Impacto dos Royalties na Economia do Estado do Rio de Janeiro. 4 Noções Gerais. 4.1 Propostas de mudanças na legislação. 4.2 A Influência dos Royalties na Economia de algumas cidades do Estado do Rio de Janeiro. 4.2.1 OMPETRO. 4.2.1.1 Campos dos Goytacazes. 4.2.1.2 Macaé. 4.2.1.3 São João da Barra. Conclusão. RESUMO Um dos setores produtivos que mais se expande no país é o petrolífero. Isto ocorre principalmente em virtude do desenvolvimento tecnológico que faz com que a produção mantenha um crescimento contínuo e pelas mudanças promovidas nas leis pátrias; principalmente com a advinda da Lei n° 9.478/97 a Lei do Petróleo, que abriu as portas do setor para o mercado internacional ao dar fim à fase monopolística da Petrobrás. Esse crescimento do setor interfere diretamente nos Estados e Municípios brasileiros em razão dos recursos do petróleo, ou seja, as participações governamentais que são repassadas a estes a título de compensação pelo uso do bem público, para fins de promoção da sustentabilidade e melhoria na qualidade de vida dos indivíduos. Neste estudo será apontado de que forma são aplicadas essas cifras, pois na prática não se vê efetivamente a conversão destes valores em melhoria na qualidade de vida das pessoas. Diante deste cenário, torna-se indispensável que haja um planejamento por parte dos gestores públicos para tornar as cidades sustentáveis, tendo em vista que esta era do petróleo é passageira visto que trata-se de recurso não-renovável, caso contrário estas estarão condenadas ao fracasso e seus habitantes verão apenas nos textos legais a presença do princípio da dignidade da pessoa humana, pois na prática não deixará de ser uma mera utopia. Palavras-chave: petróleo participações governamentais royalties - sustentabilidade

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AS PARTICIPAES GOVERNAMENTAIS E O IMPACTO DOS

ROYALTIES SOBRE A ECONOMIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

* Aislan de Souza Coelho *Advogado e Ps-Graduado em Direito Ambiental com nfase em Petrleo UCAM-Campos

SUMRIO: Introduo. Captulo I

Dos Contratos de Concesso. 1

Panorama Histrico. 1.1

No Brasil. 1.2

Natureza Jurdica dos Contratos de Concesso. Captulo II Das Participaes Governamentais. 2 Noes Gerais. 2.1 As Participaes Governamentais. 2.1.1 Bnus de Assinatura. 2.1.2

Pagamento pela Ocupao ou Reteno de rea. 2.1.3

Participao Especial. 2.1.4

Royalties. 2.1.4.1

Clculo e Distribuio dos Royalties. 2.1.4.2

Natureza jurdica. Captulo III

A Aplicao das Participaes Governamentais. 3

Das Participaes Governamentais. 3.1

Bnus de Assinatura. 3.2

Pagamento pela Ocupao ou Reteno de rea. 3.3

Participao Especial. 3.4

Royalties. 3.4.1

Panorama Internacional. 3.4.2

Legislao brasileira. 3.4.3

Funo Social dos Royalties. Captulo IV

O Impacto dos Royalties na Economia do Estado do Rio de Janeiro. 4

Noes Gerais. 4.1

Propostas de mudanas na legislao. 4.2

A Influncia dos Royalties na Economia de algumas cidades do Estado do Rio de Janeiro. 4.2.1 OMPETRO. 4.2.1.1 Campos dos Goytacazes. 4.2.1.2

Maca. 4.2.1.3 So Joo da Barra. Concluso.

RESUMO

Um dos setores produtivos que mais se expande no pas o petrolfero. Isto ocorre principalmente em virtude do desenvolvimento tecnolgico que faz com que a produo mantenha um crescimento contnuo e pelas mudanas promovidas nas leis ptrias; principalmente com a advinda da Lei n 9.478/97

a Lei do Petrleo, que abriu as portas do setor para o mercado internacional ao dar fim fase monopolstica da Petrobrs. Esse crescimento do setor interfere diretamente nos Estados e Municpios brasileiros em razo dos recursos do petrleo, ou seja, as participaes governamentais que so repassadas a estes a ttulo de compensao pelo uso do bem pblico, para fins de promoo da sustentabilidade e melhoria na qualidade de vida dos indivduos. Neste estudo ser apontado de que forma so aplicadas essas cifras, pois na prtica no se v efetivamente a converso destes valores em melhoria na qualidade de vida das pessoas. Diante deste cenrio, torna-se indispensvel que haja um planejamento por parte dos gestores pblicos para tornar as cidades sustentveis, tendo em vista que esta era do petrleo passageira visto que trata-se de recurso no-renovvel, caso contrrio estas estaro condenadas ao fracasso e seus habitantes vero apenas nos textos legais a presena do princpio da dignidade da pessoa humana, pois na prtica no deixar de ser uma mera utopia.

Palavras-chave: petrleo participaes governamentais

royalties - sustentabilidade

INTRODUO

Nas ltimas dcadas a indstria do petrleo no Brasil vem ganhando cada vez mais

importncia para o desenvolvimento nacional. Isto se d em virtude do crescimento acelerado

do setor, que a todo instante vem se desenvolvendo em busca de alcanar novos meios de

maximizar a produo no menor tempo possvel.

Essa busca incessante pelo aumento na produo traz consigo diversos elementos que

influenciam no dinamismo do pas, especialmente no campo scio-econmico. Essa

influncia social causada pelo setor petrolfero no pode ser analisada com a omisso dos

aspectos econmicos, afetados diretamente pelo mesmo.

No presente estudo ser analisado o impacto econmico no tocante aos recursos

financeiros gerados pela indstria do petrleo, ou seja, as participaes governamentais

recebidas pelo Poder Pblico como forma de compensao pelos reflexos negativos causados

pela explorao e produo desses recursos naturais no-renovveis.

Sendo assim, este trabalho monogrfico ter como objetivo apontar o tratamento

jurdico dado a esses recursos segundo as leis ptrias, e de que forma os royalties,

especialmente, influenciam na economia do Estado do Rio de Janeiro e nos municpios de

Campos, Maca e So Joo da Barra. Para isto, ser realizada anlise doutrinria, legislativa e

documental, dentre outras.

No Captulo I ser feito o estudo sobre os contratos de concesso no Brasil,

apresentando seu histrico, sua natureza jurdica e seus procedimentos, de forma a possibilitar

a compreenso de como so firmados os negcios jurdicos para explorao e produo entre

a Unio, por meio da Agncia Nacional do Petrleo ANP e os concessionrios.

Ser tratado minuciosamente no Captulo II a forma como so denominados estes

recursos financeiros advindos da indstria petrolfera e quais os fatos geradores para as suas

incidncias. Alm disto, sero apontados os critrios que determinam a quantificao e a

distribuio destes valores entre os entes da Federao.

Posteriormente, no Captulo III, ser explorado o tratamento legal no tocante

aplicao das participaes governamentais e de que maneira efetivamente so aplicadas,

tendo em vista que os municpios tm se tornado cada vez mais dependentes destes recursos.

Finalmente, no ltimo Captulo do presente estudo sero abordados os impactos dos

recursos dos royalties sobre a economia do Estado do Rio de Janeiro e de que maneira estes

recursos influenciam os municpios de Campos, Maca e So Joo da Barra, diante das

potencialidades locais.

Desta forma poder-se- detectar se os recursos oriundos do setor do petrleo esto

sendo aplicados de maneira racional pelos gestores pblicos, no sentido de promover a

melhoria na qualidade de vida da coletividade, alcanando-se a sustentabilidade local, visto

estar-se tratando de recursos no-renovveis e sendo assim planejar e investir no futuro

assumem papis fundamentais para o futuro destas cidades.

CAPTULO I DOS CONTRATOS DE CONCESSO

1- PANORAMA HISTRICO

Primeiramente, para que seja possvel compreender o cenrio atual no que concerne

aos contratos de concesso na indstria do petrleo faz-se indispensvel a observao dos

acontecimentos histricos que acarretaram no modelo atual que encontramos.

Segundo relatos do autor Alfredo Ruy Barbosa1, os primeiros esboos acerca do

contrato de concesso so datados de 1920, especificamente na Prsia antiga (atual Ir), onde,

foi concedido o direito de explorao e produo de petrleo ao ingls William Knox D Arcy;

que ficou conhecido na indstria petrolfera como Concesso D Arcy .

Este modelo de concesso, aponta o autor, ficou caracterizado pela concesso de

amplas reas, sem direito de desistncia, de parte a parte; pela longa durao do contrato, sem

possibilidade de reviso; pelos direitos exclusivos sobre todas as operaes referentes ao

petrleo extrado na rea concedida (alguns contratos previam, inclusive, direitos sobre as

operaes de downstream); direito de propriedade sobre as reservas de petrleo em favor das

companhias petrolferas estrangeiras; iseno de todos os impostos e taxas aduaneiras; pelo

pagamento de um reduzido valor de royalty sobre o volume total de petrleo produzido;

transferncia para o governo local da rea concedida e dos equipamentos remanescentes ao

final da concesso; e pela fixao arbitrria e unilateral do preo do petrleo extrado sem

qualquer participao do governo local.

Neste cenrio, evidencia-se que a participao estatal era nfima comparando-se com

os interesses das companhias privadas.

Esta primazia do interesse privado ficou ainda mais reforada pela existncia do

modelo monopolista norte-americano do Standard Oil, que em 1879, presidido por John

Rockfeller detinha o controle de aproximadamente 95% do refino de hidrocarbonetos

americanos e de ainda 115 empresas do setor.

Diante disto, em 1911, buscando restabelecer as regras do mercado capitalista, a

justia americana ordenou a dissoluo da Standard Oil, para coibir o abuso do poder

econmico e equilibrar as relaes empresariais integrantes da indstria do petrleo.

Apesar desta medida, os governos dos pases produtores de petrleo buscaram ainda

criar um modelo capaz de impedir as aes abusivas e unilaterais das companhias

exploradoras do petrleo, equilibrando seus interesses com os dos governos. Com esta

finalidade, na segunda metade do sculo XIX, o modelo tradicional de concesso comeou a

perder fora, dando espao novos ajustes contratuais, originando desta forma os modernos

contratos de concesso.

Isto posto, vale salientar ainda, os regimes jurdicos existentes ao longo da histria que

tratam dos recursos minerais, quando aos direitos concedidos aos particulares e quanto s

modalidades contratuais existentes nos pases produtores de petrleo.

Quanto aos direitos concedidos aos particulares, estes podem ser divididos em trs

categorias, destaca a professora Liliane Andra Ferreira Tavares2:

a) Acesso: tpico de pases anglo-saxes; aplica-se a blocos em terra, sendo concedido s companhias de petrleo de explorar, extrair e dispor dos recursos minerais, mediante o pagamento de bnus, aluguel de rea e royalties. b) Dominial: a propriedade do sub-solo e das reservas minerais do Estado, que concede s companhias de petrleo o direito de explorar e extrair recursos minerais, sendo a produo propriedade do Estado, bem como as instalaes, tendo a operadora o direito a uma parte da produo. Em geral, se materializa em um contrato de partilha de produo (Production Sharing Agreement) c) Regaliano: tpico de pases de tradio monrquica, como o Reino Unido e a Noruega. tambm adotado em reas offshore do Golfo do Mxico e Canad. Neste regime, o Estado atribui direitos minerais e particulares, concedendo s Companhias de petrleo o direito de explorar e extrair recursos minerais, com livre disposio da produo e das instalaes .

Quanto a modalidade contratual, no que tange ao aspecto formal, este depender do

regime adotado pelo pas, que ser determinante na espcie contratual aplicvel dentre as

seguintes, conforme doutrina a Dra. Marilda Rosado de S Ribeiro3: concesso tradicional, as

joint ventures, os contratos de associao, os contratos de partilha de produo (producting

sharing agreement), os contratos de servio, os contratos de prestao de servio com

clusula de risco e as modernas licenas, bem como os leases norte-americanos.

Na concesso tradicional, grandes reas so reservadas companhias estrangeiras que

a exploraro por longos perodos, entre 65 e 70 anos, arcando apenas com o nus de cumprir

as obrigaes quanto ao pagamento de royalties ou taxa anual, sem que haja interferncia do

pas concedente, tanto no aspecto tributrio quanto no decorrer da produo.

As joint ventures constituem a modalidade de associao, a qual permitido ao pas

hospedeiro a participao nos riscos e resultados das atividades do petrleo. Esse modelo

contratual caracteriza-se principalmente pelo acordo entre os scios, em especial, nos

aspectos atinentes a poltica financeira e funcionamento, participao da estatal na

administrao e decises, treinamento de mo-de-obra, transferncia de tecnologia, entre

outros.

Nos contratos de associao, da mesma forma das joint ventures evidencia-se a efetiva

participao da empresa do pas hospedeiro nas relaes gerenciais do contrato, nos royalties

crescentes em razo do aumento de produo, financiamento das despesas de explorao

correspondentes ao percentual de participao da empresa estatal com posterior reembolso,

em caso de sucesso na explorao, equacionamento dos riscos nas fases de desenvolvimento e

produo e finalmente a partilha dos resultados, deduzidos os royalties.

Nos contratos de partilha de produo, o Estado o proprietrio da produo e dos

equipamentos, tendo a estatal do pas hospedeiro participao na administrao; aps

recuperao dos custos, a produo partilhada entre esta e o investidor, o qual recebe ento,

uma parte da produo. A Venezuela foi o primeiro pas a adotar este modelo, que estabelece

a participao igualitria do Estado, por intermdio da companhia estatal e a estrangeira .

Nos contratos de servio, o Estado o proprietrio da produo e dos equipamentos,

percebendo o investidor uma remunerao em leo ou em dinheiro. a modalidade menos

empregada. At 1995, representava apenas 6% do volume da produo mundial, tendo sido

adotado pela Venezuela e pelo Ir.

As licenas surgem como modelos contratuais regidos de acordo com a legislao de

cada pas hospedeiro, que suprem as disposies mais simplificadas do contrato firmado entre

as partes, afirma a autora Marilda do Rosado que, o pas hospedeiro atravs de sua estatal ou

de rgo ministerial de superviso tem forte ingerncia sobre o mecanismo decisrio, prazos,

especificaes dos programas mnimos e obrigaes financeiras .

Finalmente, encontramos dentre as modalidades contratuais os leases, que o regime

norte-americano, similar s licenas, tendo como peculiaridade a influncia do Direito

Minerrio e Petrolfero, pois, neste regime o proprietrio da terra tambm proprietrio dos

direitos de explorao dos recursos minerais do subsolo, tendo autonomia para a livre

negociao entre os proprietrios da terra e as empresas petrolferas. Este modelo acarretou

inclusive, na expanso do modelo em submodalidades, da legislao e o conseqente

surgimento de jurisprudncias sobre a matria.

Diante das modalidades contratuais anteriormente abordadas surgem os inovadores

posicionamentos dos autores Thomas Waelde4 e Marilda do Rosado5 ao lecionarem sobre a

forma hbrida dos contratos petrolferos, respectivamente: os vrios tipos de contratos podem

ser usados para atingir os mesmos resultados econmicos, financeiros, de risco e de controle

e;

com base na anlise funcional, fica mais fcil detectar a tendncia de aglutinao de traos bsicos das formas clssicas dos contratos petrolferos, j que os pases hospedeiros passaram a intercambiar experincias e importar aspectos considerados mais favorveis de um e de outro contrato .

1.1 - NO BRASIL

O Brasil, apesar de no possuir em seu histrico uma ampla relao contratual com

companhias petrolferas internacionais, vivenciou no decorrer de sua histria no setor do

petrleo quatro perodos distintos no que refere aos contratos de concesso: o perodo de

concesses; perodo de monoplio estatal; perodo dos contratos de risco e o novo perodo de

concesso.

O perodo de concesso ficou marcado pelos extensos prazos de concesso oferecidos.

Como em 1864, quando atravs do Decreto Imperial n 3.352, foi concedido ao ingls Tomas

Denny o direito de extrair durante 90 anos turfa, petrleo, ferro, cobre e quaisquer outros

minerais em Camamu e Ilhus (provncias da Bahia). J em 1869, por exemplo, outro Decreto

Imperial outorgou ao ingls Eduard Pellew Wilson o direito de explorar por 30 anos carvo

mineral, turfa e petrleo s margens do Rio Mara, sendo este prazo dilatado para 90 anos em

virtude do decreto n 4.457.

O segundo perodo dos contratos de concesso, e talvez, o mais marcante teve incio

em 1948, durante o governo do ento presidente Getlio Vargas. Este, aps grande debate e

mobilizao pblica enviou ao Congresso Nacional os Projetos n. 1.516 e 1.517 que

determinavam: a constituio de uma sociedade por aes intitulada Petrleo Brasileiro S/A;

o provimento de recursos para o programa nacional do petrleo e; o Plano Rodovirio

Nacional.

A partir disto, deu-se incio a um longo perodo de debates, que culminou na Lei

2.004/53, que deu origem a Petrobrs, alm de dispor sobre a Poltica Nacional do Petrleo e

sobre as atribuies do Conselho Nacional do Petrleo.

Com a promulgao da supracitada lei, teve incio a fase monopolista no Brasil,

quando a Unio era detentora do monoplio da pesquisa e a lavra das jazidas de petrleo, da

refinao do petrleo, do transporte martimo e por meio de dutos do petrleo bruto e de seus

derivados.

O entusiasmo perante a nova fase no pas era visvel, tanto que, este perodo ficou

marcado pelo slogan O petrleo nosso!

Conforme aponta Alfredo Ruy Barbosa, a terceira fase ficou caracterizada por ter sido

o perodo dos contratos de riscos.

Segundo o autor6:

foi uma tentativa de atrair investimentos estrangeiros para o setor de petrleo durante o perodo do regime militar implantado no pas, em 1964, por intermdio dos chamados contratos de risco. Com base nesses instrumentos contratuais, o concessionrio assumia todos os riscos do empreendimento, sendo reembolsado, sem juros, dos custos da explorao e do desenvolvimento dos campos pesquisados e tendo ainda, o direito de adquirir uma certa quantidade do petrleo ou do gs descoberto, a preos internacionais, ale o limite correspondente ao valor da remunerao. Na havia o pagamento de royalties e os impostos brasileiros no podiam ultrapassar uma taxa de 25%, calculada sobre a remunerao do concessionrio. Em fevereiro de 1976, a Petrobrs divulgou um edital de pr-qualificao para selecionar as empresas estrangeiras porventura interessadas na celebrao dos contratos de risco. Em 9 de novembro do mesmo ano, foi, ento assinado o primeiro contrato de risco entre a Petrobrs e a BP Petroleum Development Brazil Limited, uma subsidiria da British Petroleum Co. Em 22 de novembro, um consrcio, constitudo pelas empresas Shell Exploration Services, Pecten Brazil Company e Enserch Amricas Inc., celebrou um contrato para a explorao de uma rea de 6.150 km, situada na Foz do Rio Amazonas. Em 28 de janeiro de 1977, a Petrobrs assinou com a Elf Aquitaine Brsil e a Agip outro contrato para a explorao de uma rea de 3.050 km na mesma regio. Finalmente, no dia 26 de abril de 1977, foi celebrado um contrato com a Cia. Esso Prospeco do Brasil para pesquisa e lavra na Bacia de Santos. Todavia, os contratos de risco no surtiram os efeitos esperados e foram, assim, banidos pela nova Constituio votada, em 1988, pela Assemblia Constituinte.

Finalmente, a ltima fase dos contratos na indstria do petrleo no Brasil culminou no

novo contrato de concesso, marcada por ser um regime atrativo aos investidores, que teriam

uma razovel compensao pelos riscos assumidos, sendo ainda proprietrio da produo,

ressalvados os impostos incidentes7.

Este regime adveio em razo da Emenda Constitucional n 9/95, que acenou para a

possibilidade de a Unio contratar empresas estatais ou privadas para exercer atividades

econmicas na indstria do petrleo.

Apesar de ainda recente, a EC n 9 representa um divisor na histria da indstria do

petrleo nacional, pois a partir dela encerrou-se o perodo monopolista, at ento vlido no

pas, a qual era reservada Petrobrs o exerccio das atividades previstas no artigo 177,

incisos I a IV da Constituio Federal de 1988.8

A partir desta emenda, outros dispositivos legais advieram, repletos de inovaes

procedimentais e regras para a indstria do petrleo no Brasil.

Dentre esses diplomas legais, pode-se destacar a Lei n 9.478/97

batizada como a

Lei do Petrleo

que em seu artigo 79 instituiu uma agncia reguladora, como organismo

estatal competente para intermediar as contrataes e atividades realizadas pela Unio e

elaborao dos editais e promoo das solicitaes para a concesso de explorao,

desenvolvimento e produo, celebrando os contratos delas decorrentes e fiscalizando a sua

execuo .

A Agncia Nacional do Petrleo, surge ento como exercente do poder de polcia

efetivo, a fim de assegurar a primazia do interesse pblico, de forma realizar o controle estatal

preventiva ou repressivamente, por meio da regulao e da aplicao de sanes

administrativas decorrentes da legislao.

Alm disto, cabe ANP promover as etapas preliminares contratao por meio da

promoo dos certames licitatrios, fiscalizar, regular todas as etapas na indstria do petrleo,

com exceo dos servios de distribuio de gs canalizado.

Por fim, vale definir a classificao quanto ao sistema minerrio do Brasil, que

iniciou-se com o regime regaliano da Coroa do Imprio, passando, na primeira Repblica,

para o regime fundirio e, por fim, para o regime dominial, a serem explorados no sistema de

autorizao e concesso, primeiramente com direito de preferncia do proprietrio do solo

(Constituio de 1946) e finalmente, at os dias atuais, com direito de participao no

resultado da lavra.

1.2 NATUREZA JURDICA DOS CONTRATOS DE CONCESSO

Preliminarmente, faz-se de grande relevncia destacar os conceitos apresentados pelos

diversos doutrinadores, tanto nas esferas cvel e administrativa a respeito de contrato.

Segundo o civilista Clvis Bevilqua 10:

"pode-se considerar o contrato como um conciliador dos interesses, colidentes, como um pacificador dos egosmos em luta. certamente esta a primeira e mais elevada funo social do contrato. E, para avaliar-se de sua importncia, basta dizer que debaixo deste ponto de vista, o contrato corresponde ao direito, substitui a lei no campo restrito do negcio por ele regulado".

J o ilustro Orlando Gomes 11 conceitua contrato como:

espcie de negcio jurdico, de natureza bilateral ou plurilateral, dependente, para sua formao, do encontro da vontade de pelo menos duas partes, que criam, entre si, uma norma jurdica individual reguladora de interesses privados. Nesse contexto, o contrato tem por fundamento o concurso da vontade humana, limitada pela ordem jurdica, capaz de estabelecer direitos e obrigaes, em regra, entre as partes contratantes .

Segundo o administrativista Jos dos Santos Carvalho Filho 12: o substrato bsico dos

contratos o acordo de vontade com objetivo determinado, pelo qual as pessoas se

comprometem a honrar as obrigaes ajustadas . J o saudoso autor Hely Lopes Meirelles 13

entende que: contrato todo acordo de vontades, firmado livremente pelas partes, para criar

obrigaes e direitos recprocos .

Diante de tais definies, explcito o consenso sobre o aspecto conceitual. As

controvrsias surgem na definio da natureza jurdica do contrato de concesso, a partir da

distino entre contrato de direito pblico e privado, em que encontram-se os contratos

administrativos, e os acordos internacionais de um lado e os contratos celebrados por entes

privados, de natureza civil e comercial de outro.

Segundo o autor Hely Lopes Meirelles 14:

No direito privado, a liberdade de contratar ampla e informal, salvo as condies da lei e as exigncias especiais de forma para certos ajustes, ao passo que no Direito Pblico a Administrao est sujeita a limitaes de contedo e a requisitos formais rgidos, mas em contrapartida, dispe sempre

dos privilgios administrativos para a fixao e alterao das clusulas de interesse pblico e at mesmo para pr fim ao contrato em meio de sua execuo .

Apesar de apresentar fins diversos, o contrato de concesso, seja ele de servio pblico

ou de uso de bem pblico, configuram uma mesma modalidade contratual, ou seja, so

contratos administrativos.

Tal afirmao encontra respaldo no conceito doutrinrio de Hely Lopes Meirelles 15:

Contrato Administrativo o ajuste que a Administrao Pblica, agindo nessa qualidade,

firma com particular ou outra entidade administrativa para a consecuo de objetivos de

interesse pblico, nas condies estabelecidas pela prpria Administrao .

Porm, quando a concesso envolve explorao de uma atividade econmica, em que,

dentre os contratantes encontra-se o Poder Pblico, representado por uma autarquia especial,

neste caso a ANP, e companhias de petrleo, este entendimento relativiza-se, pois no h de

se falar em um contrato administrativo tpico.

De acordo com o entendimento do STF e da doutrina admissvel a contratao pelo

Poder Pblico sob as normas predominantes do direito privado, mesmo que em igualdade de

condies ao entre privado, ou mesmo que preservados os privilgios em prol da primazia do

interesse pblico. Nestes casos, apontam como pressupostos contratuais o interesse e a

finalidade pblica, sendo o primeiro de natureza semipblico (em razo da isonomia entre

contratantes) e o segundo de natureza administrativa.

importante destacar que, o entendimento do STF no absoluto na doutrina.

Analisando os conceitos de concesso apresentados pelos autores Hely Lopes

Meirelles e Maria Slvia Zanella di Pietro16 de que: concesso a transferncia da execuo

de servio do Poder Pblico ao particular, mediante delegao contratual e;

a concesso o contrato administrativo pelo qual a Administrao confere ao particular a execuo remunerada de servio pblico ou de obra pblica, ou lhe cede o uso de bem pblico para que o explore por sua conta e risco, pelo prazo e nas condies regulamentares e contratuais ;

no configuraria uma aberrao o entendimento de que trata-se de um contrato administrativo

de uso de bem pblico.

Por outro lado, o fim econmico justifica o entendimento dos doutrinadores quanto a

natureza privada dos contratos de concesso.

Neste sentido, surgem Celso Antnio Bandeira de Mello 17 e Toshio Mukai 18 ao

afirmarem respectivamente que: embora o Estado possa, em certos casos previstos na

Constituio, atuar personalizadamente na esfera econmica, as atividades econmicas, que

destarte, desempenha, no so qualificveis como servios pblicos e;

o contrato de concesso de explorao, desenvolvimento e produo de petrleo e gs natural impropriamente denominado de contrato de concesso, mas no , jurdica e constitucionalmente, aquele contrato de concesso prprio do servio pblico (administrativo), sendo, ao revs, contrato de direito privado, como asseverou Celso Antnio Bandeira de Mello. A Lei 9.478, de 06.08.97 apenas tomou de emprstimo o termo concesso , mas de concesso efetiva no se trata .

Nesta determinao quanto a natureza jurdica do contrato de concesso na atividade

da indstria do petrleo, no podemos deixar em segundo plano o fato de ANP atuar como

longa manus do Estado e como tal sempre contar com os benefcios inerentes proteo da

primazia do interesse pblico, dentre eles podemos incluir o interesse pblico econmico.

Apesar de contar com o objeto jurdico pblico e contar com mecanismos prprios dos

contratos de direito privado, creio que a natureza jurdica mais apropriada a apontada por

Tomas Waelde 19 , que indica o carter hbrido deste contrato.

Neste aspecto, certo que, tratando-se a priori de um bem pblico, o Estado sempre

ter como aliado os benefcios protetores do interesse pblico o que jamais deixar os

contratantes privados estejam em absoluta igualdade de condies, frente ao Poder Pblico.

CAPTULO II - DAS PARTICIPAES GOVERNAMENTAIS

2. NOES GERAIS

Tendo em vista os contratos de concesso na indstria do petrleo nacional, conforme

visto no captulo anterior, inegvel que a Emenda Constitucional n 09/95 representa um

marco para que se fosse alcanado o atual modelo dos contratos de concesso, posto que, este

encerrou o perodo monopolista da Petrobrs, dando a Unio, a faculdade de pactuar

concesses para explorao e produo de petrleo e gs natural, junto a empresas nacionais

ou estrangeiras, sejam elas pblicas ou privadas.

Alm desta mudana no cenrio produtivo e exploratrio, o modelo atual de contrato

de concesso no Brasil, promoveu profundas transformaes econmicas no pas em razo

das vultosas cifras envolvidas.

Este ser o enfoque do presente captulo: identificar de que forma se constituem tais

valores e como estes so abordados nos textos legais ptrios.

No que tange s alteraes econmicas promovidas pela indstria do petrleo, vale

salientar a importncia da Lei n 9.478/97

a Lei do Petrleo , que na redao de seu artigo

45 e incisos prev as participaes governamentais como encargos que os concessionrios

devem pagar em razo da produo e explorao petrolfera, dando origem a novas fontes de

receita para os cofres pblicos.

Quanto aos encargos devidos, a lei prev a possibilidade de pagamento das seguintes

participaes: bnus de assinatura, participao especial, pagamento pela ocupao ou

reteno da rea e os royalties, que sero recebidos pela Unio; atravs de sua agncia

reguladora

ANP (Agncia Nacional do Petrleo) que, tambm ser a responsvel pelo

repasse e fiscalizao da aplicao desses recursos.

2.1 AS PARTICIPAES GOVERNAMENTAIS

Considerando os liames histricos inerentes a indstria do petrleo e de seus aspectos

financeiros, pode-se entender, baseado nos relatos dos autores Andra Campos Reis, Paulo

Srgio Vieira e James Silva Santos 20 que, as compensaes financeiras decorrentes das

atividades desenvolvidas na indstria do petrleo no algo novo. Segundo os autores, este

modelo compensatrio originrio de 1921, quando foi editado o Cdigo de Minas

Decreto

Lei n 4.265/21 que, estabelecia o pagamento de taxa fixa anual para autorizao para

pesquisa e concesso, pagamento de taxa anual por ocupao da rea E&P e imposto sobre a

produo anual.

Comparando-se ao modelo atual de compensaes, pode-se identificar importantes

alteraes, no s na nomenclatura das modalidades de compensao, mas, principalmente na

frmula de arrecadao desses recursos.

Sobre o aspecto nominal, as participaes antes denominadas taxa fixa anual para

autorizao para pesquisa e concesso e pagamento de taxa anual receberam as

denominaes bnus de assinatura e royalty respectivamente.

Quanto a arrecadao das participaes, as principais transformaes advieram em

virtude da Lei n 2004/53, que modificou o exerccio das atividades do petrleo, propriamente

dita e as porcentagens de incidncia das participaes, reduzindo por exemplo, o pagamento

anual sobre a produo de 10% para 5%.

Na legislao hodierna, as participaes governamentais so previstas na seo IV do

Captulo V da Lei do Petrleo, que dispe dos artigos 45 a 51, sobre as participaes

governamentais, tratando-as como uma remunerao do concedente pela concesso

contratadas, subdivididas em quatro modalidades: bnus de assinatura, participao especial,

pagamento pela ocupao ou reteno rea e royalties; que sero abordadas detalhadamente

nos tpicos a seguir.

2.1.1 BNUS DE ASSINATURA

Segundo os analistas Rafael Schechtman, Dcio Hamilton Barbosa, Jos Gutman e

Carlos A. J. Gallier 21, a primeira apario legal desta espcie de participao governamental

se deu com a edio da Lei do Petrleo, a qual em seu artigo 46 22 estabeleceu que o encargo

oriundo da conquista da licitao promovida pela ANP, para a produo e explorao de

petrleo e gs natural, que dever ser pago no ato da assinatura do contrato de concesso.

Os analistas relatam ainda que o bnus de assinatura no Brasil, foi pago pela primeira

vez no dia 23 de setembro de 1999, na 1a rodada de licitaes, quando 11 empresas 23,

incluindo a Petrobrs deram lances vencedores, que somaram R$ 321,7 milhes.

Na segunda rodada de licitaes, realizadas em 7 de junho de 2000, foram arrecadados

R$ 468,3 milhes com a venda de 21 dos 23 blocos colocados em licitao. Ressalta-se, alm

do alto ndice de aproveitamento, tambm a significativa participao de empresas brasileiras

com lances vencedores (Petrobrs, com 8 blocos; Martima, com 4 blocos, alm da Odebrecht,

Queiroz Galvo e Ipiranga).

Quanto ao pagamento do bnus de assinatura importante enfatizar que, seu valor

certo e definido no edital e uma parcela de seu pagamento ir compor a receita prpria da

ANP, com a finalidade de financiar a realizao de suas atividades operacionais, conforme

previsto no artigo 10 do Decreto 2.705 de 3.8.98.24

Em suma, conclui o economista Carlos Augusto Ges Pacheco 25:

O bnus de assinatura um pagamento feito anteriormente ao incio da explorao, com forte impacto econmico (reduo na taxa interna de retorno), sendo o montante ofertado pela empresa vencedora da licitao para obteno da concesso. O bnus tem o seu valor mnimo estabelecido no edital de licitao do bloco e destina-se, em parte, ANP para custeio de suas necessidades operacionais, determinadas em seu oramento aprovado. O valor ofertado na 4a rodada de licitaes (julho de 2002) foi de R$ 92,3 milhes, sendo de aproximadamente R$ 1,5 bilhes o total arrecadado com as quatro rodadas realizadas (ANP, 2003) .

Ainda sobre o pagamento do encargo afirma a autora Maria D Assuno Costa

Menezello 26:

[...] independentemente de xito ou malogro na explorao ou produo. um pagamento inicial, devido pelo vencedor do certame licitatrio, para garantir a obteno da concesso, e que dever ser efetuado integralmente no ato da assinatura do respectivo contrato. Assim, os bnus de assinatura so devidos quando da assinatura de um contrato ou da outorga de uma concesso ou licena . Seu principal objetivo recuperar os custos governamentais decorrentes do processo . Dessa maneira, sua forma de avaliao deve fundamentar-se nos princpios da razoabilidade, proporcionalidade, finalidade e eficincia, para que os valores propostos no Edital no sejam um impedimento participao dos agentes econmicos .

2.1.2 PAGAMENTO PELA OCUPAO OU RETENO DE REA

A necessidade do pagamento pela ocupao ou reteno da rea foi mais uma

inovao trazida pela Lei n 9.478/97

Lei do Petrleo. De acordo com o artigo 5127 da

citada lei, seu pagamento dever ser previsto no edital de licitao e no contrato, sendo que,

este pagamento ser anual e fixado por quilmetro quadrado ou fraca da superfcie do bloco.

Os valores unitrios, em reais por quilmetro quadrado ou frao variam dependendo

da fase ou perodo em que se encontra a concesso e o tempo que o concessionrio

permanecer na rea, conforme estabelece o artigo 51 da Lei n 8.478/97 e o artigo 28 2 do

Decreto n 2.705/98 28.

Em janeiro de 1999, por exemplo, foram arrecadados R$ 28.957.315,07, referente ao

pagamento pela ocupao ou reteno de rea do ano de 1998.

J em janeiro de 2000, foram arrecadados R$ 68.477.508,53, referente ao ano de 1999,

quando observou-se a presena de novas operadoras, constituindo-se um marco histrico aps

44 anos de regime de monoplio da Unio executado exclusivamente pela Petrobrs. Em

maro de 2000 houve um pagamento complementar de R$ 3.623.557,25, (trs bilhes

seiscentos e vinte e trs milhes quinhentos e cinqenta e sete mil reais e vinte e cinco

centavos) referente aos 28 blocos exploratrios devolvidos pela Petrobrs em 11 de maio de

1999.

Finalmente, a respeito do pagamento deste encargo, oportunas so as palavras do

economista Carlos Augusto Gis Pacheco 29 :

O pagamento pela ocupao ou reteno de rea o valor a ser pago anualmente pelos concessionrios,a partir da data de assinatura do contrato, disposto no edital de licitao e nas clusulas contratuais. As faixas de valores por quilmetro quadrado e por fase de processo de E&P, adotadas para fins de clculo desta participao, esto definidas no Decreto n 2.705/98. Para fixao destes valores, dentro de cada faixa, a ANP levar em conta as caractersticas geolgicas, a localizao da Bacia Sedimentar em que o bloco, objeto da concesso, se situar, bem como outros fatores pertinentes. Os recursos provenientes desta participao governamental, que atingiriam o valor de R% 146.523.482,00 em 2002, destinam-se ao financiamento das despesas da ANP para o exerccios das atividades que lhe so conferidas por lei .

2.1.3 PARTICIPAO ESPECIAL

Apesar de no datarem, os analistas Rafael Schechtman30 et al afirmam que as

primeiras incidncias de pagamento das participaes especiais ocorreram nos Estados

Unidos e no Reino Unido, onde eram pagos quando havia grandes lucros (Wind fall profit e

Petroleum Revenew Tax). Nos dias hodiernos outros pases, alm do Brasil, adotam o

pagamento do encargo, dentre eles Austrlia (Petroleum Resource Rent Tax

PRRT) e

Noruega (Special Tax).

Segundo os analistas: trata-se de uma participao adicional aos royalties para

aqueles campos com grandes volumes de produo ou grande rentabilidade .

De acordo com os ensinamentos de Maria D Assuno Costa Menezello31:

[...] constitui uma compensao financeira devida pelos concessionrios ao Poder Pblico nos casos de obteno de grandes volume de produo ou de grande rentabilidade, conforme os critrios definidos no Decreto Federal n 2.705/98 ... ao contrrio dos royalties, que so pagos mensalmente, a participao especial apurada trimestralmente por concessionrio, e paga at o ltimo dia til do ms subseqente a cada trimestre do ano civil, conforme dispe o artigo 25 do mesmo Decreto .

Segundo os especialistas D. Barbosa e A. C. Barros:32

trata-se de um pagamento a que esto sujeitos os campos com grande volume de produo ou grande rentabilidade, permitindo que sejam repassados sociedade parte da renda oriunda das atividades petrolferas nestes casos. Os conceitos de grande volume e de grande rentabilidade esto previstos no Decreto n 2.705/98 e variam de acordo com o nmero de anos de produo, a localizao da rea e o volume de produo .

Quanto a incidncia da participao especial, esta se d sobre os lucros da concesso,

sendo dedutveis as razes previstas nas portarias da ANP n 10/99 e 102/99. 33

Sobre a incidncia da participao, afirmam Barbosa e Bastos ao serem citados por

Carlos Augusto Ges Pacheco34:

Esto sujeitos participao especial os campos em terra com produo acima de 10 mil bpd, os campos martimos com profundidade batimtrica mdia de 400 metros e produo acima de 20 mil bpd e os campos martimos com profundidade batimtrica mdia maior de 400 metros e produo acima de 31 mil bpd. O primeiro pagamento de PE, apesar de ter sido criada em 1997, (com a Lei do Petrleo), s foi realizado em fevereiro de 2000 (referente produo do 4 trimestre de 1999), quando se apurou lucro nos campos de Marlim (400 mil bpd) e Albacora (180 mil bpd) .

Outra aspecto marcante no que tange as participaes especiais, se localiza na

caracterstica essencial das atividades petrolferas, que justamente o risco, pois, para que

haja o fato gerador da Participao Especial faz-se necessrio que ocorra grande produo ou

grande rentabilidade, salientando que, para evitar possveis fraudes para eximir-se do

pagamento do encargo, a ANP poder requerer ao concessionrio documentos que

comprovem a veracidade das informaes apresentadas.

Quanto a distribuio das Participaes Especiais, de acordo com o artigo 50 2 da

Lei n 9.478/97 estas so distribudas nas seguintes propores:

Art. 50

O edital e o contrato estabelecero que, nos casos de grande

volume de produo, ou de grande rentabilidade, haver o pagamento de uma participao de uma participao especial, a ser regulamentada em decreto do Presidente da Repblica. [...] 2 - Os recursos da participao especial sero distribudos na seguinte proporo: I

quarenta e cinco por cento ao Ministrio de Minas e Energia, para o financiamento de estudos e servios de geologia e geofsica aplicados prospeco de petrleo e gs natural, a serem promovidos pela ANP, nos termos dos incisos II e III do artigo 8; II

dez por cento ao Ministrio do Meio Ambiente, dos Recursos Hdricos e da Amaznia Legal, destinados ao desenvolvimento de estudos e projetos relacionados com a preservao do meio ambiente e recuperao de danos ambientais causados pelas atividades da indstria do petrleo; III

quarenta por cento para o Estado onde ocorrer a produo em terra, ou confrontante com a plataforma continental onde se realizar a produo ; IV

dez por cento para o Municpio onde ocorrer a produo em terra, ou confrontante com a plataforma continental onde se realizar a produo .

Quanto a arrecadao, segundo dados da ANP, somente no ano de 2002, as Unidades

da Federao arredaram 1.004 bilho de reais, enquanto que de royalties foram recebidos

1.021 bilhes; desde 2000 essa diferena vem sendo reduzida, e tudo leva a crer que

considerando os investimentos e tecnologias desenvolvidas para majorar a produo, em

poucos anos as participaes especiais superaro os valores obtidos atravs dos royalties.

2.1.4

ROYALTIES

Historicamente, o pagamento desta participao governamental surge como a forma

mais antiga de pagamento de direitos. Sua origem epistemolgica, decorre do termo royal,

que significa da realeza ou relativo ao rei ; assim sendo, os royalties consistiam no

recebimento que os reis faziam jus em razo da extrao de minerais em suas propriedades.

Nos dias hodiernos, especificamente, de acordo com o modelo de produo e

explorao de petrleo, em especial no Brasil, os royalties surgem arrolados no artigo 45,

inciso II da Lei do Petrleo35, como uma forma de compensao financeira, cujo pagamento

obrigatrio, decorrente da extrao de petrleo ou gs natural no territrio nacional..

De acordo com o que fora apresentado nos itens anteriores, importante salientar que,

no modelo de explorao e produo de petrleo e derivados, o real proprietrio das reservas

nacionais a Unio, conforme disposto na Carta Magna de 1988, em seu artigo 177, I36, assim

sendo, em razo da titularidade destes bens, a receita dos royalties decorrentes da produo

ser paga diretamente ao Governo Federal, que posteriormente, atravs de seu agncia

reguladora

ANP

ser responsvel pelo repasse dos valores aos rgo de destino, seguindo

os ditames legais.

Quanto ao fato gerador dos royalties, seu referencial ser o total da produo mensal,

por esta razo, pode-se concluir que, estamos diante de uma obrigao de resultado, assim,

caber ao concessionrio a obrigao de pagar o encargo independentemente da sua

lucratividade, pois, trata-se de um segmento a qual o risco iminente e no seria razovel

vincular o pagamento desta compensao financeira necessidade do lucro do

concessionrio, pois, se assim o fosse, estaramos diante de uma aberrao jurdica, em que, o

interesse privado prevaleceria sobre o pblico37.

No que concerne a produo, afirma a autora Maria D Assuno Costa Menezello38:

Entendemos aqui como produo um conjunto de operaes coordenadas de extrao de petrleo ou de gs natural. A primeira medio ocorrer no respectivo ponto de entrega local, onde o concessionrio assumir a propriedade do volume de produo fiscalizado, conforme estabelece o decreto regulamentados. Alm disso, o valor dos royalties ser apurado mensalmente, em cada campo, por seu concessionrio, e pago at o ltimo dia til do ms subseqente .

Quanto a obrigatoriedade do pagamento dos royalties a autora conclui:

a origem dos pagamentos baseados na produo reside na convico de que eles so decorrentes do privilgio de usar ou desenvolver um recurso natural no renovvel. Na maioria dos pases, o domnio dos recursos e reservas petrolferas do Estado, e o royalty a forma mais comum de pagamento baseado nos direitos de produo . (grifo nosso)

Alm desta obrigao contratual, outro fator de suma importncia tratando-se das

participaes governamentais, em especial dos royalties, se d quanto ao critrio para o

clculo e distribuio de seu valor, que ser melhor analisado no item subseqente.

2.1.4.1 CLCULO E DISTRIBUIO DOS ROYALTIES

Desde o incio das atividades petrolferas no pas, o critrio para estabelecer o valor

dos royalties j sofreu diversas modificaes.

Conforme citado alhures, as compensaes financeiras

atuais participaes

governamentais

surgiram em 1921, em razo do Decreto n 4.265. Neste texto legal, os

atuais royalties eram denominados de pagamento anual sobre a produo , e de acordo com

a norma, o valor a ser pago consistia em 10% sobre a produo.

Em 1953, quando foi criada a Petrobrs; com a advinda da Lei n 2004 de 3 de

outubro; o valor dos royalties foi reduzido para 5% da produo. Deste percentual 4% seriam

destinados aos Estados e 1% aos Municpios que realizassem a lavra de petrleo e gs natural.

Anos mais tarde, em 1985, a Lei n 7.453, de 27 de dezembro, manteve o percentual

de 5% sobre o petrleo e gs produzidos. As alteraes legais atingiram a distribuio deste

percentual 1,5% caberiam aos Estados confrontantes com os poos produtores; 1,5% aos

Municpios tambm confrontantes com os poos produtores e suas respectivas reas

geoeconmicas; 1% ao Ministrio da Marinha, para atender aos encargos de fiscalizao e

proteo das atividades econmicas das reas martimas produtoras, e 1% constituiria um

Fundo Especial distribudo entre todos os Estados e Municpios da Federao.

A Lei n 7.990, de 28 de dezembro de 1989, alterou a distribuio, ao incluir como

beneficirios dos royalties os Municpios onde se localizavam as instalaes de embarque ou

desembarque de petrleo ou de gs natural. Esta foi regulamentada pelo Decreto n 01 de

1991.

Por fim, em 1997, a nova lei do petrleo

Lei n9.478/97, de 6 de agosto; alterou a

porcentagem que servia como referencial e sua distribuio.

Segundo o novo texto legal, a alquota foi acrescida para 10% da produo de petrleo

ou gs natural, no entanto, vale ressaltar que, este valor varivel, visto que, o artigo 47,

139 admite a possibilidade de reduo desta porcentagem em at 5%, desde que a ANP

preveja tal possibilidade no edital de licitao, considerando os riscos geolgicos e as

expectativas de produo na atividade.

Sobre esta possibilidade de reduo, afirma a autora Maria D Assuno Costa

Menezello40:

Existe a possibilidade de reduzir o valor dos royalties para compatibilizar os interesses pblicos e privados, em face dos riscos geolgicos que circundam determinadas exploraes, criando maior atratividade para os agentes econmicos .

O 2 do artigo 47 prev ainda que, os valores monetrios relativos ao pagamento das

parcelas dos royalties sero calculadas em relao aos preos praticados no mercado

internacional e s especificaes do produto e da localizao do campo em que est sendo

produzido.

Diante desta previso no que tange aos recursos dos royalties, torna-se imprescindvel

que sejam analisados mesmo que de forma sucinta, os fatores incidentes na determinao dos

valores do petrleo e do gs natural.

Em relao ao valor do petrleo, seu preo referencial mensal ser igual mdia

ponderada de seus preos de venda praticados pelo concessionrio, ou, ao seu preo mnimo,

que estabelecido pela ANP; prevalecendo nessas hipteses o maior valor. Vale citar ainda

que, o preo mnimo o referencial na valorao do petrleo transferidos para as refinarias do

produtor.

O Decreto n 2.705/98 estabelece que:

Artigo 7 5 - O preo de referncia a ser aplicado a cada ms ao petrleo produzido em cada campo durante o referido ms, em reais por metro cbico, na condio padro de medio, ser igual mdia ponderada dos seus preos de venda praticados pelo concessionrio, em condies normais de mercado, ou ao seu preo mnimo estabelecido pela ANP, aplicando o que for maior. [...] 5 - O preo mnimo do petrleo extrado de cada campo ser fixado pela ANP com base no valor mdio mensal de uma cesta-padro composta de at quatro tipos de petrleo similares cotados no mercado internacional, nos termos deste artigo .

Quanto a valorao do gs natural, seu preo baseado na mdia ponderada dos

preos de venda acordado nos contratos de fornecimento entre concessionrios e

compradores, deduzindo-se as tarifas provenientes do transporte do gs at os pontos de

entrega.

O economista Carlos Augusto Gis Pacheco41 ressalta que:

importante, nesse contexto, que se destaque o papel da Portaria ANP n 155, de 21 de outubro de 1998, que estabeleceu um novo padro para a fixao do preo mnimo do petrleo, produzido mensalmente em cada campo, para o clculo dos royalties e participaes especiais. Esta metodologia estabelece valore para o petrleo brasileiro baseando-se no mercado internacional e adotando a cotao do petrleo Brent Dated como referncia, o que no ocorria com a legislao vigente anteriormente Lei n 9.478/97 e do Decreto n 2.705/98 .

Aps a portaria ANP n 155/98, os preos do petrleo nacional, para fins de

indenizao dos royalties e participaes especiais passaram a acompanhar os preos do

petrleo internacional.

Segundo Barbosa et al42, a razo entre o preo mdio do petrleo nacional e do

petrleo Brent Dated oscilou entre 45% e 60%, at que, em 1999, com a nova metodologia de

clculo adotada, a razo manteve-se entre 80% e 90%. Esta mudana aumentou a arrecadao

e, ao se tornar as razes mdias entre o preo do petrleo brasileiro e o Brent Dated, de 1997

a 1999, observa-se que esta modificao representa um crescimento de quase 50%, mantido

os demais fatores que afetam os royalties.

Sobre a valorao do petrleo e gs natural os especialistas concluem:

Desta maneira, a apurao do valor dos royalties recolhidos a partir de agosto de 1998, indica a influncia da nova metodologia no total repassado aos beneficirios, principalmente quando comparada evoluo dos preos internacionais do petrleo tipo Brent e taxa de cmbio em relao moeda norte-americana [...] importante destacar tambm que, em janeiro de 1999, o regime de cmbio fixo, que mantinha a paridade R$/dlar prxima a R$ 1 por U$ 1, foi descartada pelo Governo Federal. Desde ento, o dlar vem apresentando uma significativa valorizao em relao ao real, atingindo patamares superiores a R$ 3 por U$ 1, sendo um dos fatores responsveis pelo incremento nos repasses .

Quanto a distribuio dos royalties nos liames dos artigos 48 e 49 da Lei n 9.478/97,

pode-se detectar que, ao aumentar o valor da alquota para at 10% foi mantida a distribuio

do valor mnimo43 dos royalties, ou seja, os 5% previstos no artigo 48 da Lei do Petrleo so

distribudos segundo os critrios estabelecidos pelo artigo 7 da Lei n 7.990/89, desta forma:

70% aos Estados produtores; 20% aos Municpios produtores e 10% aos Municpios onde se

localizarem instalaes martimas ou terrestres de embarque ou desembarque de leo bruto

e/ou gs natural. E, os royalties oriundos de explorao na plataforma continental da seguinte

maneira: a) 1,5% ao estados e Distrito Federal; b) 0,5% aos Municpios onde se localizarem

instalaes martimas ou terrestres de embarque ou desembarque de leo bruto ou gs natural

operadas pela Petrobrs; c) 1,5% aos Municpios confrontantes e suas respectivas reas

geoeconmicas; d) 1,0% ao Ministrio da Marinha, para atender aos encargos de fiscalizao

e proteo das atividades econmicas das referidas reas; e) 0,5% para constituir um Fundo

Especial, a ser distribudo entre todos os Estados e Municpios.

J a parcela excedente aos 5% da produo ser distribudo de acordo com o disposto

no artigo 49 da Lei do Petrleo, assim, o percentual ser distribudo na seguinte proporo:

I - Quando a lavra ocorrer em terra ou em lagos, rios, ilhas fluviais e lacustres: 52,5%

aos Estados produtores; 25% ao Ministrio de Cincia e Tecnologia (para financiar programas

de amparo pesquisa cientfica e ao desenvolvimento tecnolgico aplicados na indstria

petrolfera); 15% aos Municpios produtores e 7,5% aos Municpios que sejam afetados por

operaes nas instalaes de embarque e desembarque de petrleo e gs natural, na forma e

critrios estabelecidos pela ANP;

II

Quando a lavra ocorrer na plataforma continental44: 22,5% aos Estados

confrontantes com campos; 22,5% aos Municpios confrontantes com campos; 25% ao

Ministrio de Cincia e Tecnologia; 15% ao Comando da Marinha; 7,5% aos Municpios

afetados por operaes de embarque e desembarque de petrleo e gs natural e 7,5% para o

Fundo Especial (estados e municpios).

Finalmente, quando ao clculo dos royalties, importantes so as palavras do

especialista D. Barbosa:45

Os royalties devido aos Municpios sero calculados com base na produo do Estado do qual fazem parte, sendo que o rateio dos royalties devido aos Municpios pertencentes uma mesma zona de produo ser efetuado na razo direta de suas respectivas populaes .

2.1.4.2 NATUREZA JURDICA

Temtica ainda bastante controvertida, a natureza jurdica dos royalties gera dvidas

no que tange a sua incidncia, se esta configura uma receita oriunda de tributao ou uma

receita patrimonial.

A discusso inicia-se a partir da leitura do 1 artigo 20 da Constituio Federal de

198846, que, determina o pagamento por parte do concessionrio pela explorao dos recursos

minerais pertencentes Unio.

Os consultores Renato Friedman e Edmundo Montalvo47 destacam que:

Na prtica, esse mecanismo similar incidncia de um imposto indireto, que distorce o preo, onerando a produo, incentivando a importao e inibindo a exportao. Essa distoro to mais intensa quando maior a alquota cobrada. Um dos meios para incentivar a produo seria eliminar os royalties .

Perante este entendimento, vale ressaltar que, os royalties assim como as taxas,

impostos, contribuio, entre outros, constituem uma modalidade de receita arrecadvel pelo

poder pblico.

Assim sendo, para melhor determinar a natureza jurdica dos royalties, faz-se

importante distinguir que, os tributos so incidentes em atividades econmicas do Estado,

enquanto que, os royalties consistem na remunerao decorrente da utilizao de propriedade

estatal, para fins econmicos.

Considerando que, o petrleo, assim como outros recursos minerais, constitui um bem

dominial e disponvel da Unio, tornam-se oportunas as palavras do saudoso Hely Lopes

Meirelles48, ao tratar desses bens:

so aqueles que, embora integrando o domnio pblico como os demais, deles diferem pela possibilidade sempre presente de serem utilizados em qualquer fim ou, mesmo, alienados pela Administrao, se assim o desejar. Da porque recebem tambm a denominao de bens patrimoniais disponveis ou de bens do patrimnio fiscal. Tais bens integram o patrimnio do Estado como objeto de direito pessoal ou real, isto , sobre eles a administrao exerce poderes de proprietrio segundo os preceitos de Direitos Constitucional e Administrativo ...

Diante de tal observao possvel afirmar que, quando um concessionrio est

produzindo petrleo e gs natural, estes bens esto deixando de ser da Unio que em

conseqncia, est sendo prejudicada com a diminuio do seu patrimnio e, em

contrapartida, esses mesmos bens passam a compor o patrimnio do concessionrio que,

assim, crescem gradativamente.

Ento, esses argumentos corroboram o entendimento do eminente professor Thadeu

Andrade da Cunha49, que entende serem os royalties do petrleo uma compensao

financeira.

Alis, este o entendimento de vrios outros autores, dentre os quais se encontram o

douto professor Srgio Honorato dos Santos50 e o conselheiro do Tribunal de Contas do

Estado do Rio de Janeiro, o Dr. Srgio F. Quintella51.

O que nos faz crer que qualquer discusso em relao natureza jurdica dos royalties

do petrleo e gs natural, sobre se os mesmos so tributos ou obrigaes contratuais, no

mais oportuna, pois est por demais pacificada a idia de que se trata de uma compensao

financeira pelo uso de um bem e no de um tributo.

Os consultores concluem citando ainda que apesar do entendimento do carter

compensatrio dos royalties essa discusso j foi alvo de demanda judicial, a qual uma

empresa mineradora (cujo nome foi mantido em sigilo), contestou o pagamento dos royalties,

sob a alegao de que estes constituam impostos diretos disfarados . Neste caso concreto, a

Corte decidiu pela leitura do artigo 20 no sentido de que a incidncia dos royalties constitui

uma receita patrimonial do Estado, o que em minha tica, deve ser a interpretao mais

adequada.

CAPTULO III A APLICAO DAS PARTICIPAES GOVERNAMENTAIS

Tendo em vista as alteraes proporcionadas pela Lei n 9.478/97 no tocante s novas

formas de participaes governamentais, o presente captulo tero como objetivo apontar de

que forma devem ser e como efetivamente so aplicadas as receitas advindas da produo de

petrleo e gs natural, principalmente no que se refere aos royalties.

Alm disto sero apontados ainda os setores as quais devem ser priorizadas as

aplicaes destes recursos, tendo em vista a melhoria da qualidade de vida da coletividade.

Para isto, ser analisada a funo social dos royalties, e de que maneira pode-se detectar se a

aplicaes destes est ou no proporcionando melhoria na qualidade de vida da populao.

3 DAS PARTICIPAES GOVERNAMENTAIS

3.1 BNUS DE ASSINATURA

Conforme apresentado no item 2.1.1 do captulo anterior, trata-se de uma receita

previamente estabelecida no edital de licitao para concesso para explorao e produo de

petrleo, a qual, o concessionrio vencedor da licitao deve efetuar o pagamento pelo xito

no certame licitatrio.

De acordo com o disposto no artigo 10 do Decreto Federal n 2.705 de 03 de agosto de

1998, o valor recebido constitui receita prpria da Agncia Nacional do Petrleo e Gs

Natural

ANP, e sero destinados, de acordo com o oramento aprovado, para o custeio das

necessidades operacionais da agncia.

3.2 PAGAMENTO PELA OCUPAO OU RETENO DE REA

Visto que, o pagamento anual desta participao governamental tambm previsto no

edital de licitao e tem como referencial o valor de cada quilmetro quadrado licitado

segundo as caractersticas geolgicas e a localizao da rea, vale salientar que sua aplicao,

segundo estabelecido pela Lei do Petrleo em seu artigo 16, ser destinada ao financiamento

das despesas da Agncia Nacional do Petrleo e Gs Natural para o exerccio das atividades

que lhe so atribudas por lei (vide artigo 8 da Lei n 9.478/97 a seguir).

Artigo 8 da Lei n 9.478/97

A ANP ter como finalidade promover a

regulao, a contratao e a fiscalizao das atividades econmicas integrantes da indstria do petrleo, cabendo-lhe: I

implementar, em sua esfera de atribuies, a poltica nacional de petrleo e gs natural, contida na poltica energtica nacional, nos termos do Captulo I desta lei, com nfase na garantia do suprimento de derivados de petrleo em todo Territrio Nacional e na proteo dos interesses dos consumidores quanto a preo, qualidade e oferta dos produtos; II

promover estudos visando delimitao de blocos, para efeito de concesso das atividades de explorao, desenvolvimento e produo; III

regular a execuo de servios de geologia e geofsica aplicados prospeco petrolfera, visando ao levantamento de dados tcnicos, destinados comercializao, em bases no exclusivas; IV

elaborar os editais e promover as licitaes para a concesso de explorao, desenvolvimento e produo, celebrando os contratos delas decorrentes e fiscalizando a sua execuo; V

autorizar a prtica das atividades de refinao, processamento, transporte, importao e exportao, na forma estabelecida nesta Lei e sua regulamentao; VI

estabelecer critrios para o clculo de tarifas de transporte dutovirio e arbitrar seus valores, nos casos e da forma previstos nesta lei; VII

fiscalizar diretamente, ou mediante convnios com rgos dos Estados e do Distrito Federal, as atividades integrantes da indstria do Petrleo, bem como aplicar as sanes administrativas e pecunirias previstas em lei, regulamento ou contrato; VIII

instruir processo com vistas declarao de utilidade pblica, para fins de desapropriao e instituio de servido administrativa, das reas necessrias explorao, desenvolvimento e produo de petrleo e gs natural, construo de refinarias, de dutos e de terminais; IX

fazer cumprir as boas prticas de conservao e uso racional do petrleo, dos derivados e do gs natural e de preservao do meio ambiente; X

estimular a pesquisa e a adoo de novas tecnologias na explorao, produo, transporte, refino e processamento; XI

organizar e manter o acervo das informaes e dados tcnicos relativos s atividades da indstria do petrleo; XII

consolidar anualmente as informaes sobre as reservas nacionais de petrleo e gs natural transmitidas pelas empresas, responsabilizando-se por sua divulgao; XIII

fiscalizar o adequado funcionamento do Sistema Nacional de Estoques de Combustveis e o cumprimento do Plano Anual de Estoques Estratgicos de Combustveis, de que trata o artigo 4, da Lei n 8.176, de 8 de fevereiro de 1991; XIV

articular-se com os outros rgos reguladores do setor energtico sobre matrias de interesse comum, inclusive para efeito de apoio tcnico ao CNPE; XV

regular e autorizar as atividades relacionadas com o abastecimento nacional de combustveis, fiscalizando-as diretamente ou mediante convnios com outros rgos da Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios .

3.3 PARTICIPAO ESPECIAL

Salientando o apresentado no tpico 2.1.3 do captulo anterior, as participaes

especiais so recursos decorrentes do grande volume de produo ou rentabilidade de alguns

campos.

A respeito destes recursos, sua destinao ficou assim determinada pelo artigo 50 da

Lei do Petrleo: 40% ao Ministrio de Minas e Energia; 10% ao Ministrio do Meio

Ambiente e, finalmente, 40% para o Estado e 10% para o Municpio onde ocorrer a produo

em terra ou confrontante com a plataforma continental onde se realizar a produo.

O primeiro deve destinar os recursos para o financiamento de estudos e servios de

geologia e geofsica aplicados prospeco de petrleo e gs natural, a serem promovidos

pela ANP com o objetivo de regular a execuo de servios de geologia e geofsica aplicados

prospeco petrolfera, visando ao levantamento de dados tcnicos, destinados

comercializao, em bases no exclusivas, bem como instruir processo com vistas

declarao de utilidade pblica, para fins de desapropriao e instituio de servido

administrativa, das reas necessrias explorao, desenvolvimento e produo de petrleo e

gs natural, construo de refinarias, de dutos e de terminais.

J o Ministrio do Meio Ambiente, deve destinar os recursos ao desenvolvimento de

estudos e projetos relacionados com a preservao do meio ambiente e recuperao de danos

ambientais causados pelas atividade da indstria do petrleo, com apoio tcnico da ANP, para

fazer cumprir as boas prticas de conservao e uso racional do petrleo, dos derivados e do

gs natural e de preservao do meio ambiente.52

J os 50% restantes, destinados aos Estados (40%) e Municpios (10%),

injustificadamente, no foram recepcionados pela legislao no tocante determinao de sua

efetiva aplicao.

3.4

ROYALTIES

3.4.1 PANORAMA INTERNACIONAL

Para que seja analisado o tratamento jurdico recebido pelos royalties no Brasil,

principalmente no que concerne a sua aplicabilidade, faz-se de grande relevncia a

apresentao de alguns exemplos internacionais, para que assim, se torne possvel concluir se

o modelo brasileiro segue ou no alguns traos desses paradigmas.

Segundo o American Petroleum Institute (API), nos Estados Unidos, as participaes

governamentais sobre a explorao e produo de petrleo nos Estados Unidos da Amrica,

so distribudas a trs rgos na seguinte proporo53: cerca de 50% para o tesouro dos EUA,

aproximadamente 20% para o Fundo de Conservao da Terra e das guas, que tem por

finalidade adquirir e desenvolver terras para projetos federais, e o restante dos royalties

distribudo aos Estados que abriguem ou confrontem campos de produo em terras da Unio.

J a aplicao dos royalties na Gr-Bretanha54, afirma a API, traz um exemplo notvel

de investimento voltado para o futuro; Aberdeen, na Esccia, uma das cidades confrontantes

aos campos off-shore do Mar do Norte que, at a dcada de 60, era uma comunidade

basicamente voltada para a pesca e, nos anos 90, optou por investir seus royalties em

biotecnologia criando o Centro de Pesquisas Mdicas de Aberdeen, hoje um dos centros de

referncia mundial na rea biotecnolgica.

A Noruega, terceiro maior exportador mundial de petrleo, com um dos mais altos

ndices de desenvolvimento humano, tem buscado manter o desenvolvimento de setores j

consolidados, como a pesca de bacalhau e do salmo, a indstria de papel e celulose, e

atualmente, vem investindo em novas tecnologias para aumentar a vida til de suas reservas

de petrleo. Pesquisas biotecnolgicas com bactrias que, injetadas nos poos de produo de

petrleo, produzem gs carbnico, modificam a fluidez e elevam a presso do leo no interior

dos poos, aumentando a sua vida til e produtividade55.

Contrapondo aos exemplos acima, observa-se que nem todos os pases grandes

produtores de petrleo proporcionam riqueza e bem estar a seus habitantes. O Ir um

exemplo extremo pois, apesar de contar com 9% das reservas mundiais de petrleo, seu PIB

per capita o 111 no mundo. Na Arbia Saudita, maior produtora mundial de petrleo, a

renda per capita em 2000 estava na 61 posio56.

3.4.2 LEGISLAO BRASILEIRA

Desde a edio da Lei n 2.004/53, que em seu artigo 27 tratava da aplicao e

pagamento dos royalties, todo sistema normativo que dispunha sobre a matria sofreu

diversas alteraes. Dentre os textos legais que modificaram o texto legal de 1953, pode-se

destacar as Leis: 7.525/86, 7.990/89, 9.478/97 e 10.195/00.

A Lei n 7.525 de 27 de julho de 1986, modificou o 3 do artigo 27 da Lei n

2.004/53, e segundo a nova previso legal, os royalties do petrleo s poderiam ser aplicados

pelos Estados, Territrios e Municpios exclusivamente, em energia, pavimentao de

rodovias, abastecimento e tratamento de gua, irrigao, proteo ao meio ambiente e em

saneamento bsico.

Trs anos mais tarde, a Lei n 7.990/89 restringiu a aplicao dos royalties,

estabelecendo em seu artigo 8 a vedao da aplicao dos recursos dos royalties em

pagamento de dvidas no quadro permanente de pessoal; no entanto, esta foi alterada pela Lei

n 10.195 de 14 de fevereiro de 2001, ao introduzir o pargrafo 1 ao artigo, e desta forma

relativizou a vedao no tocante ao pagamento de dvidas. De acordo com a nova disposio

legal, os royalties poderiam ser utilizados tambm no pagamento de dvidas, desde que, estas

fossem junto Unio e suas entidades.

Ainda sobre a evoluo das normas ptrias, no que tange a aplicao dos royalties do

petrleo, faz-se importante salientar a mudana estabelecida pela Emenda Constitucional n 9

e a Lei n 9.478/97 (esta ltima revogou expressamente a Lei n 2.004/53). Esses dispositivos

fizeram com que a destinao dos royalties dos Estados e Municpios no permanecessem

restritos a: energia, pavimentao de rodovias, abastecimento e tratamento de guas, irrigao,

proteo ao meio ambiente e saneamento bsico.

No entanto, observando estas normas pode-se detectar que ao mesmo tempo em que

flexibilizou a aplicao por parte dos Estados e Municpios, estabeleceu que as receitas dos

royalties e participaes especiais por parte da administrao pblica federal devero ser

destinadas a alguns Ministrios e ao Comando da Marinha pra fins de desenvolvimento de

projetos tecnolgicos e cientficos.

De acordo com a Lei do Petrleo o valor dos royalties que exceder a cinco por cento

da produo, quando a lavra ocorrer em terra ou em lagos, rios, ilhas fluviais e lacustres, vinte

e cinco por cento pertence ao Ministrio da Cincia e Tecnologia para financiar programas de

amparo pesquisa cientfica e ao desenvolvimento tecnolgico aplicados indstria do

petrleo. Ainda dentro dos cinco por cento quando a lavra ocorrer na plataforma continental,

quinze por cento reservado ao Ministrio, hoje Comando da Marinha, para atender aos

encargos de fiscalizao e proteo das reas de produo; e outros vinte e cinco por cento

sero destinados ao Ministrio da Cincia e Tecnologia, tambm para os fins j mencionados.

Do total de recursos destinados a este ltimo, quarenta por cento, no mnimo, tm que ser

aplicados em programas de fomento capacitao e ao desenvolvimento cientfico e

tecnolgico nas regies Norte e Nordeste, que sero administrados com o apoio da Agncia

Nacional do Petrleo, qual compete estimular a pesquisa e a adoo de novas tecnologias na

explorao, produo, transporte, refino e processamento do petrleo.

Assim sendo, pode-se detectar que, os administradores estadual e municipal tm

excessiva liberdade para destinar esses recursos, que devem ser aplicados segundo os

princpios previstos no artigo 37 da Constituio Federal de 1988.

Artigo 37 da Constituio Federal de 1988

A administrao pblica direta e indireta de qualquer dos Poderes da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios obedecer aos princpios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficincia

e, tambm ao seguinte: [...] (grifo meu)

No tocante ao pagamento de pessoal, segundo o especialista em polticas pblicas e de

governo, Srgio Honorato dos Santos57, uma nova interpretao sobre esta restrio comea a

surgir, a partir da considerao do que exatamente quadro permanente de pessoal . Para

ele:

Em se tratando de administrao pblica e em se tratando de permanente , tem-se ento que a restrio a que faz referncia a legislao acerca dos royalties diz respeito aos servidores nomeados para cargo de provimento efetivo, em virtude de concurso pblico, sendo-lhes somente assegurada a estabilidade no emprego quando ultrapassada a fase do estgio probatrio de trs anos previstos no art. 21 da Constituio de 1998 .

Um municpio poderia utilizar recursos dos royalties para o pagamento de empregados que no se enquadram na definio de quadro permanente de pessoa como o caso de nomeados para cargo de confiana .

Ele defende a tese de que os royalties podem ser usados para o pagamento das pessoas

estranhas aos quadros da Administrao Pblica. Seria o caso, por exemplo, daquelas pessoas

nomeadas para exercer uma parcela de cargos em comisso. Seria o caso tambm daquelas

admitidas na forma do art. 37, inciso IX, da Constituio da Repblica Federativa do Brasil,

cujos vnculos empregatcios tm sempre um carter provisrio, visto que jamais adquirem

estabilidade, no podem ser classificados pessoal do quadro permanente .

Outro especialista no tema, Ccio Oliveira Manoel58, que mestrando em Energia pelo

Instituto de Eletrotcnica e Energia da Universidade de So Paulo e bacharel em Direito,

tambm admite a possibilidade de utilizao dos royalties para pagamento de pessoal.

Segundo o mesmo existem receitas vinculadas e desvinculadas na estrutura jurdica dos

royalties destinados aos rgos da Administrao Direta da Unio , afirma Ccio Oliveira.

Para ele, portanto, pode-se afirmar que as receitas dos royalties distribudas aos

estados e municpios e rgos da Unio podem ser utilizadas para o pagamento de pessoal, j

que trata-se no seu entendimento de receitas no vinculadas, podendo ser utilizadas pelos

critrios que orientam a discricionariedade da Administrao Pblica 59.

Apesar destes entendimentos, o tema ainda bastante discutvel. bem verdade que a

lei no prev o pagamento de pessoal em quadro permanente, segundo entendimento do TCE-

ES, trata-se dos cargos efetivos ou comissionados. bem verdade tambm que a lei confere

maior liberdade aos administradores pblicos estadual e municipal no que tange aplicao

dos royalties. No entanto, discordo no tocante a total discricionariedade nesta aplicao,

conforme defendido pelos especialistas, pois, a partir do instante em que se permite o

pagamento de pessoal contratado, nomeado ou de cargos de confiana com recursos dos

royalties, torna-se evidente que estamos diante de violao aos princpios da impessoalidade e

da moralidade, previstos no caput do artigo 37 da Constituio da Repblica de 1988, e

estaremos diante ainda, de um desvio de finalidade.

Sobre os princpios supracitados indispensveis so as observaes realizadas pelo

administrativista Jos dos Santos Carvalho Filho60.

[...] para que haja verdadeira impessoalidade, deve a Administrao voltar-se exclusivamente para o interesse pblico, e no para o privado, vedando-se, em conseqncia, sejam favorecidos alguns indivduos em detrimento de outros. Aqui reflete a aplicao do conhecido princpio da finalidade, sempre estampado na obra dos tratadistas da matria, segundo o qual o alvo a ser alcanado pela Administrao somente o interesse pblico, e no se alcana o interesse pblico se for perseguido o interesse particular, porquanto haver nesse caso sempre uma atuao discriminatria .

O art. 37 da Constituio Federal tambm a ele se referiu expressamente, e pode-se dizer, sem receio de errar, que foi bem aceito no seio da coletividade, j sufocada pela obrigao de ter assistido aos desmandos de maus administradores, freqentemente na busca de seus prprios interesses ou de interesses inconfessveis, relegando para ltimo plano os preceitos morais de que no deveriam se afastar. O que pretendeu o Constituinte foi exatamente coibir essa imoralidade no mbito da Administrao. Pensamos, todavia que somente quando os administradores estiverem realmente imbudos de esprito pblico que o princpio ser efetivamente observado.

A Constituio referiu-se expressamente ao princpio da moralidade no art. 37, caput. Embora o contedo da moralidade seja diverso do da legalidade, o fato que aquele est normalmente associado a este. Em algumas ocasies, a imoralidade consistir na ofensa da lei e a violar, ipso facto, o princpio da legalidade. Em outras, residir no tratamento discriminatrio, positivo ou negativo, dispensado ao administrado; nesse caso, vulnerado estar tambm o princpio da impessoalidade, requisito, em ltima anlise, da legalidade da conduta administrativa .

Outro princpio mencionado na Constituio o da publicidade. Indica que os atos da Administrao devem merecer a mais ampla divulgao possvel entre os administrados, e isso porque constitui fundamento do princpio propiciar-lhes a possibilidade de controlar a legitimidade da conduta dos agentes administrativos. S com transparncia dessa conduta que podero os indivduos aquilatar a legalidade ou no dos atos e o grau de eficincia que se revestem.

Sobre a finalidade e a moralidade dos atos administrativos conclui o saudoso Hely

Lopes Meirelles61:

O princpio da impessoalidade referido na Constituio de 1988 (art. 37 caput), nada mais que o clssico princpio da finalidade, o qual impe ao administrador pblico que s pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal unicamente aquele eu a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal. Esse princpio deve ser entendido para excluir a promoo pessoal de autoridades ou servidores pblicos sobre suas realizaes administrativas [...] E a finalidade ter sempre um objetivo certo e inafastvel de qualquer ato administrativo: o interesse pblico. [...] Desde que o princpio da finalidade exige que o ato seja praticado sempre com finalidade pblica, o administrador fica impedido de buscar outro objetivo ou de pratic-lo no interesse prprio ou de terceiros. [...] O que o princpio da finalidade veda a prtica de ato administrativo sem interesse pblico [...] visando unicamente a satisfazer interesses privados, por favoritismo ou perseguio dos agentes governamentais, sob a forma de desvio de finalidade.

A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de todo ato da Administrao Pblica. No se trata

diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito

da moral comum, mas sim de uma moral jurdica, entendida como o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administrao . Desenvolvendo sua doutrina, explica o mesmo autor que o agente administrativo, como ser humano dotado da capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, no poder desprezar o elemento tico de sua conduta. Assim, no ter que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e inoportuno, mas tambm entre o honesto e o desonesto. Por consideraes de Direito e de Moral, o ato administrativo no ter que obedecer somente a lei jurdica, mas tambm lei tica da prpria instituio, porque nem tudo que legal

honesto, conforme j proclamavam os romanos: non omne quot licet honestum est . A moral comum, remata Hauriou, imposta ao homem para sua conduta externa; a moral administrativa imposta ao agente pblico para sua conduta interna, segundo as exigncia a que serve e a finalidade de sua ao: o bem comum .62

Apesar dos royalties no constiturem receitas vinculadas, o mais razovel e esperado

que, estes sejam aplicados para promover o bem-estar e o desenvolvimento scio-

econmico-educacional da coletividade, de tal forma que permito-me questionar:

razovel a alegao do Poder Pblico sobre a no realizao, implantao e

desenvolvimento de determinados servios de utilidade pblica por falta de recursos?

aceitvel o argumento de muitas administraes pblicas municipais de que

inexistem verbas oramentrias para promover a melhoria na qualidade do ambiente de

trabalho dos funcionrios pblicos concursados, seja com o investimento em proteo e

segurana do trabalhador, pagamento de direitos trabalhistas, ou razovel aumento salarial;

e por outro lado utilizar-se dos royalties de acordo com sua discricionariedade para

engordar as folhas de pagamento com amigos, parentes, entre outros (que no se enquadram

ao previsto no artigo 37, IX da Carta Magna de 1988) que de uma forma ou de outra

conseguiram servio pblico?

Considerando os entendimentos doutrinrios sobre Administrao Pblica citados,

todo histrico legislativo sobre a aplicabilidade desses recursos e, apesar da existncia de

lacuna na lei, deve-se atentar para que, a discricionariedade peculiar a administrao pblica

no se transforme em arbitrariedade, violando princpios constitucionais e que seja desviada

sua finalidade; pois, conforme afirmado alhures, os recursos dos royalties devem ser

aplicados de forma transparente em prol da coletividade, e no de pessoas determinadas.

Afinal, promover melhorias para o Estado/Municpio mais importante do que meramente

engordar as folhas de pagamento.

Pode-se perceber que, deve ser preenchida esta lacuna legal no sentido de vedar a

possibilidade de pagamento de qualquer espcie de servidor com recursos dos royalties, para

que sejam priorizadas as necessidades sociais da populao e deve o administrador pblico

melhor utilizar-se do princpio da publicidade de seus atos, pois ainda muito obscura a

aplicao destes recursos e dificilmente a populao consegue ter acesso aos valores

recebidos pelo seu municpio e de que forma seus administradores o aplicaro.

Neste mesmo sentido, surgem os entendimentos do Ministro-Relator tila lvares da

Silva e do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, respectivamente:

Ora, a Lei n 9.478/97, que disps sobre a nova poltica energtica nacional

e as atividades relativas ao monoplio do petrleo, no faz nenhuma meno acerca de setores em que os recursos dos royalties do petrleo devam ser aplicados. Foroso reconhecer, pois, que houve significativa ampliao do leque de possibilidades de utilizao, pelos administradores pblicos, dos recursos dos royalties. Entendemos, contudo, que permanecem vigentes as restries impostas pelo artigo 8 da Lei n 7.990/89. Conclui-se que foi conferida aos gestores, maior liberdade no uso destas receitas, remanescendo as limitaes atinentes ao atendimento do interesse pblico

e observncia das normas de direito financeiro e dos demais princpios gerais do direito pblico, sendo vedada a aplicao dos recursos em pagamento de dvidas e no quadro permanente de pessoal. (grifo meu)

No obstante as alteraes referentes legislao sobre os royalties do petrleo, implementadas pela Lei 9.0478/97, tal dispositivo legal no faz meno aos setores em que os recursos devam ser aplicados.Pela prpria natureza indenizatria dos royalties, porm, do entendimento do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro que estes recursos devam ser direcionados para investimentos em reas de maior cunho social. 63 (grifo meu)

Em suma, devem os administradores pblicos utilizar os recursos dos royalties do

petrleo primando pelo desenvolvimento econmico e social, tendo em vista a melhoria na

qualidade dos servios relacionados sade e educao pblica, lazer, meio ambiente e

fortalecimento dos setores produtivos de cada regio, ocasionando assim a gerao de

empregos, o que acarretar no aquecimento da economia local.

3.4.3 FUNO SOCIAL DOS ROYALTIES

Para se determinar a funo scio-econmica dos royalties do petrleo em

determinado municpio, necessrio que se considerem dimenses econmicas, os aspectos

sociais, culturais e ambientais, que serviro de indicadores scio-econmicos que sinalizaro

as melhorias de qualidade em razo da aplicao dos royalties.

Desta forma, surge a necessidade de se criar instrumentos hbeis para quantificar as

reais condies de vida da populao.

Por algum tempo os especialistas fizeram uso do nvel de renda como referencial para

quantificar essas condies, no entanto, com a prtica, concluram que, este no o mtodo

mais adequado, pois, considerar que as famlias que no possuam determinada renda so

pobres, no significa que todas enfrentam os mesmos problemas, quer seja habitacional,

nutricional, de sade ou educao.

Outro referencial utilizado foi a considerao do Produto Interno Bruto

PIB, no

entanto, com a constante migrao dos indivduos em busca de emprego, este referencial

passou a ser insuficiente para quantificar as condies de vida da populao local, visto que a

maior parte da renda de certas localidades destinava-se ao pagamento de indivduos de outros

locais, e a renda no permanecia na regio pesquisada e distorcia os resultados quanto as

condies scio-econmica e a evoluo do bem-estar da populao.

Por fim, os especialistas apontam para a adoo do ndice de Desenvolvimento

Humano

IDH / ndice de Pobreza Humana Municipal

IPH-M; este ndice, explicam os

doutores Gustavo Henrique Naves Givisiez e Elzira Lcia de Oliveira64, se difere das

medidas de pobreza que consideram apenas a dimenso da renda, uma vez que reflete a

privao a trs dimenses da pobreza: carncia relacionada sobrevivncia, carncia

relacionada ao conhecimento e carncia relacionada ao padro de vida. Assim,

conceitualmente, o IPH-M pressupe que ter um padro de vida adequado no o mesmo que

ter acesso a algum nvel de renda e sim ter acesso a bens e servios econmicos como: gua

potvel, alfabetizao e alimentao adequada para crianas.

CAPTULO IV O IMPACTO DOS ROYALTIES NA ECONOMIA DO ESTADO DO

RIO DE JANEIRO

4- NOES GERAIS

Analisando os impactos dos royalties no pas desde o ano de 1953, quando foi criada a

PETROBRAS at os dias atuais, pode-se detectar que o Estado do Rio de Janeiro sempre foi o

estado brasileiro mais beneficiado no que concerne ao recebimento dos recursos provenientes

da explorao e produo de petrleo e seus derivados.

Este privilgio se d principalmente em virtude da favorvel localizao geogrfica do

Estado, que possui as maiores reservas nacionais do produto, e em especial a Bacia de

Campos, que uma rea sedimentar com aproximadamente 100.000 quilmetros quadrados,

que se estende do Estado do Esprito Santo ao litoral da cidade de Cabo Frio, no Estado do

Rio de Janeiro65; e, segundo critrios da Society of Petroleum Engineers66, o volume de sua

produo corresponde a 80% das reservas nacionais.

Assim sendo, diante desta incontestvel potencialidade, possvel

compreender o porqu do Produto Interno Bruto - PIB do Estado do Rio de Janeiro manter um

gradativo aumento na ltima dcada, perodo no qual foram descobertas as maiores reservas e

houve considervel aumento de investimentos por parte da PETROBRAS no Estado

fluminense. De acordo com os dados disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatstica

IBGE somente em 2002, a participao do Estado representou 15,7% do PIB

nacional.

Quanto a produtividade, a indstria petrolfera no Estado entre os anos de 1986 e 2001

cresceu quase 300%.

No atual cenrio da indstria do petrleo no Estado a perspectiva que seja mantido

este crescimento no setor, principalmente com a estimativa apresentada pela PETROBRAS,

que pretende investir at 2010 cerca de R$ 140 bilhes (cento e quarenta bilhes de reais) no

pas e deste total 50% ser destinado ao Rio de Janeiro, para promover o desenvolvimento da

produo na Bacia de Campos67.

Apesar dos nmeros favorecerem um amplo desenvolvimento scio-econmico

dos diversos setores produtivos, a realidade do Estado aponta para sentido diverso. Pois, o

aquecimento na economia no tem sido convertido efetivamente na melhoria da qualidade de

vida da populao e, conseqentemente, dos municpios fluminenses.

Considerando os nmeros relacionados ao ndice de Desenvolvimento Humano

IDH, em 1950, o Rio de Janeiro ocupava o primeiro lugar entre os estados brasileiros no

ranking nacional, com um ndice de Desenvolvimento Humano-IDH-2 (este ndice considera

os itens educao, sade e renda) , de 0,546 (quanto mais prximo de 1, melhor); cinqenta

anos mais tarde, houve avano do ndice fluminense para 0,786. No entanto, outros estados

brasileiros apresentaram um desenvolvimento superior ao do Estado do Rio de Janeiro que

caiu para a quarta colocao; estando atrs dos estados de So Paulo, Rio Grande do Sul e

Santa Catarina.

A partir destes dados pode-se perceber que os recursos recebidos pelo Estado do Rio

de Janeiro no esto sendo aplicados de forma eficiente em infra-estrutura, atravs de

investimentos em projetos que visem, mesmo que a longo prazo, dar sustentabilidade

econmica ao Estado, melhorando assim a qualidade de vida das pessoas fundada no

dignidade da pessoa humana.

importante destacar, conforme observa a economista Amyra El Khalili que o cerne

da aplicao dos recursos dos royalties se situa justamente na busca pela sustentabilidade,

pois sabido que o petrleo e seus derivados so recursos no-renovveis, e, em razo disto,

devem os administradores aplicar esses recursos de modo a proporcionar alternativas de

atividades produtivas. Desta forma, ser possvel elevar o IDH e conseqentemente a

qualidade de vida dos indivduos.

Finalmente, conclui a economista Amyra El Khalili68:

"os recursos seriam aplicados diretamente em projetos que tm como objetivo a sustentabilidade econmica e ambiental, isto , a gerao de empregos e renda ao mesmo tempo em que se permite a