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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ CURSO DE DIREITO AS ENTIDADES FAMILIARES EXPLÍCITAS E IMPLICITAMENTES CONTIDAS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 RODRIGO VIEIRA DA SILVA São José, 21 de maio de 2007

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ

CURSO DE DIREITO

AS ENTIDADES FAMILIARES EXPLÍCITAS E IMPLICITAMENTES

CONTIDAS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

RODRIGO VIEIRA DA SILVA

São José, 21 de maio de 2007

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ

CURSO DE DIREITO

AS ENTIDADES FAMILIARES EXPLÍCITAS E IMPLICITAMENTES

CONTIDAS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

RODRIGO VIEIRA DA SILVA

Monografia submetida à Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientadora: Profa. Luciana Faísca Nahas, MSc.

São José, 21 de maio de 2007

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II

AGRADECIMENTO

Agradeço à minha orientadora, Luciana Faísca

Nahas, pelo incentivo ao tema estudado e por toda a

ajuda durante a monografia.

Aos meus pais, base sólida da minha vida, pelo

carinho e amor que me passaram e pela educação

que puderam me proporcionar.

Aos meus quatro grandes amigos, que sabem quem

são, pela amizade maravilhosa que cultivamos e

pelo apoio dado nos momentos mais difíceis.

E a todas as outras pessoas que estiveram

presentes durante todo o percurso da graduação, ou

em parte dele, e que, de alguma forma, foram e são

importantes para mim.

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III

DEDICATÓRIA

À Maria Zenair da Siva (in memorian), minha querida

e estimada Vó Noca. Muitas saudades.

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IV

“O Direito, ideologicamente, vai incluindo ou

excluindo pessoas do laço social. Não podemos

permitir que a história das exclusões se repita, ou

resista”.

Rodrigo da Cunha Pereira

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V

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a Orientadora de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

São José, 21 de maio de 2007

Rodrigo Vieira da Silva Graduando

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VI

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Rodrigo Vieira da Silva, sob o título As

entidades familiares explícitas e implicitamentes contidas na Constituição de 1988,

foi submetida em [Data] à banca examinadora composta pelos seguintes

professores: [Nome dos professores] ([Função]), e aprovada com a nota [Nota].

São José, 21 de maio de 2007

[Professor Título Nome] Orientador e Presidente da Banca

[Professor Título Nome] Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica

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VII

ROL DE ABREVIATURAS OU DE SIGLAS

Art. – Artigo

AC – Apelação Cível

CC – Código Civil

CF – Constituição Federal

Des. – Desembargador

EC – Emenda Constitucional

J – Julgado

Min. – Ministro

Rel. – Relator

STJ – Superior Tribunal de Justiça

TJRS – Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

TJSC – Tribunal de Justiça de Santa Catarina

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VIII SUMÁRIO

RESUMO.................................................................................................IX

INTRODUÇÃO..........................................................................................1

CAPÍTULO 1.............................................................................................3

HISTÓRICO E EVOLUÇÃO DAS ENTIDADES FAMILIARES SOB A ÉGIDE DAS CONSTITUIÇÕES DO BRASIL...........................................3 1.1 FAMÍLIA.................................................................................................................3 1.1.1 Família na Constituição de 1824......................................................................5 1.1.2 Família na Constituição de 1891......................................................................6 1.1.3 Família nas Constituições de 1934, 1937 e 1946............................................9 1.1.4 Família na Constituição de 1967 e Emenda Constitucional 1 de 1969.......14 1.2 O PROCESSO CONSTITUINTE – CONSTITUIÇÃO DE 1988...........................16 CAPÍTULO 2...........................................................................................19 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E AS FORMAS EXPLÍCITAS DAS ENTIDADES FAMILIARES CONTIDAS NA MESMA...................19 2.1 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.................................................................19 2.2 CASAMENTO......................................................................................................23 2.2.1 Natureza Jurídica do Casamento...................................................................26 2.2.2 Impedimentos..................................................................................................27 2.2.3 Nulidades do Casamento................................................................................29 2.3 UNIÃO ESTÁVEL................................................................................................30 2.4 FAMÍLIA MONOPARENTAL...............................................................................34 CAPÍTULO 3...........................................................................................37 O ART. 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E AS FORMAS IMPLÍCITAS DAS ENTIDADES FAMILIARES CONTIDAS NA MESMA...................................................................................................37 3.1 A INTERPRETAÇÃO DO ART. 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL................37 3.2 A FAMÍLIA COM BASE NO AFETO...................................................................42 3.3 AS ENTIDADES FAMILIARES IMPLÍCITAS CONTIDAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988....................................................................................................45 3.3.1 Filiação Socioafetiva.......................................................................................48 3.3.2 As Uniões Homossexuais...............................................................................50 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................55 REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS.............................................57

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RESUMO

Existem apenas as entidades familiares contidas na parte

constitucional que trata de família ou podem existir outras formas aceitas pelo

legislador constitucional, mas que não estão explicitamente enumeradas? Até a

Constituição de 1988, a família jurídico-constitucional não poderia ser dissociada

daquela, formada unicamente através do casamento. Com a promulgação da Carta

Magna atual, instituíram-se princípios e garantias fundamentais pautadas na

dignidade da pessoa humana, de forma a consolidar o Estado Democrático e a não

exclusão de direitos a quem quer que seja. O objetivo dessa pesquisa é esclarecer

que o art. 26 da Carta Magna deve ser visto como enunciativo, ou seja, de

exemplificação das entidades familiares aos quais o legislador quis proteger, sem,

entretanto, afastar a existência ou reconhecimento de outras relações que ao Estado

cabe beneficiar. Naturalmente, para que outras formas de família sejam

reconhecidas, é mister a presença de alguns requisitos, tais como, afetividade,

estabilidade e ostensibilidade.

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1

INTRODUÇÃO

Este trabalho monográfico pretende, por meio do método

dedutivo, expor os aspectos legais e doutrinários acerca das entidades familiares

explícitas contidas na Constituição de 1988 e discutir a existência ou

reconhecimento de outras relações não previstas no ordenamento jurídico, mas que

cabe ao Estado proteger.

Tem por objetivo institucional, a confecção de monografia para

a obtenção de Título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI.

Sabe-se que a família, como primeiro grupo de inserção do ser

humano, sugestiona, de sobremaneira, suas concepções e inter-relações futuras.

No Capítulo 1, examinar-se-á as bases evolutivas do conceito

de família através da História do Brasil e seus reflexos nos diversos textos

constitucionais, demonstrando como a lei geralmente vem atrasada com relação ao

que acontece na sociedade.

O advento da Constituição da República Federativa do Brasil,

promulgada em 05.10.1998, determinou novos preceitos constitucionais,

especialmente no que se reporta à família, rompendo com paradigmas de uma

sociedade patriarcal já ultrapassados.

No Capítulo 2, analisar-se-á as inovações trazidas com a Carta

Magna, em especial o Artigo 226, que trata como família não mais apenas o

casamento, reconhecendo também como entidades familiares a união estável e a

família monoparental, para efeito da proteção do Estado.

Porém, ao mesmo tempo que inovou, trazendo

constitucionalmente novas concepções de entidades familiares, terminou por omitir

outras relações que existem na sociedade, restando a dúvida se o art. 226 da Carta

Magna pode ser visto como enunciativo ou taxativo, objetivo principal do estudo e

tema do Capítulo 3.

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Quando tratou dos princípios fundamentais, a Constituição

atual ratificou como cláusula pétrea e fundamento do Estado de Direito, a dignidade

da pessoa humana (artigo 1º., inciso III) e mais adiante, com o Título dos Direitos e

Garantias Fundamentais, colocou a igualdade entre homens e mulheres (inciso I), a

uma garantia individual de tratamento igualitário, o que afasta a possibilidade de

qualquer exclusão, mesmo em se tratando de entidade familiar.

Contudo, é importante esclarecer, o intuito deste trabalho não é

exaurir o tema, apontando uma solução única como correta e justa, visto que, o

mesmo continuará, por algum tempo ainda, sendo objeto de controvérsias no

ordenamento jurídico pátrio.

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CAPÍTULO 1

HISTÓRICO E EVOLUÇÃO DAS ENTIDADES FAMILIARES SOB A

ÉGIDE DAS CONSTITUIÇÕES DO BRASIL

O presente capítulo vem apresentar, inicialmente, um conceito

de família. Em seguida, é feito um histórico e evolução da proteção à família e

entidades familiares sob a égide das Constituições do Brasil, desde a primeira, de

1824, até a atual.

O objetivo do trabalho, nesse primeiro momento, é analisar

como a família veio se moldando ao longo desses anos, e de como a lei geralmente

vem atrasada com relação ao que acontece na sociedade.

1.1 FAMÍLIA

Ao se falar em família, logo se pensa nos laços mais estreitos

que existem entre os indivíduos (NAHAS, 2006, p. 61). É o primeiro agente

socializador do ser humano, por isso é considerada a célula mater da sociedade. É

cantada e decantada como base da sociedade e, por essa razão, tem especial

proteção do Estado (Constituição Federal, artigo 226).

A família situa-se numa posição intermediária entre a

sociedade e o indivíduo, portanto a sua caracterização depende da conjunção do

seu lado social e individual (NAHAS, 2006, p. 61).

Não importa a posição que o indivíduo ocupa na família, ou

qual a espécie de grupamento familiar a que ele pertence – o que importa é

pertencer ao seu âmago, é estar naquele idealizado lugar onde é possível integrar

sentimentos, valores e se sentir, por isso, a caminho da realização de seu projeto de

felicidade (HIRONAKA, 1999, p. 08).

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A palavra família, no entanto, contém diversos significados1.

Apesar de não existir uma explicação estanque, é possível identificar critérios,

variáveis, conforme a cultura e a época de cada sociedade2, para delimitação de sua

constituição.

É inegável que a multiplicidade e a variedade de fatores (de

diversos matizes) não permitem fixar um modelo familiar uniforme, sendo mister

entender a família de acordo com os movimentos que constituem as relações sociais

ao longo do tempo (FARIAS, 2004, p. 58).

Segundo Dias (2006, p. 27), “o legislador não consegue

acompanhar a realidade social e nem contemplar as inquietações da família

contemporânea. A sociedade evolui, transforma-se, rompe com tradições e amarras,

o que implica a necessidade de constante oxigenação das leis”. A tendência é

simplesmente proceder à atualização normativa, sem absorver o espírito das

silenciosas mudanças alcançadas no seio social, o que fortalece a manutenção da

conduta de apego à tradição, legalista, moralista e opressora da lei. (COLARES,

2000, p.47).

Analisando as Constituições brasileiras, é possível verificar a

evolução da forma como foi abordada a proteção à família e as entidades familiares.

Através de uma breve visão histórica, é possível ser exibido como as transformações

sociais e políticas, que influenciaram a CF atual, espelharam-se na abordagem do

tema nas Constituições pátrias.

1 Conforme o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa “Família. [Do lat. Família] S. f. 1. Pessoas aparentadas, que vivem, em geral, na mesma casa, particularmente o pai, a mãe e os filhos. 2. Pessoas do mesmo sangue. 3. Ascendência, linhagem, estirpe. 4. Hist. Nat. Unidade sistemática ou categoria taxionômica constituída pela reunião de gêneros afins [Em botânica as famílias se caracterizam, em geral, pela terminação – áceas, como, p. ex., em acantáceas; em zoologia pela terminação – ídeos, como em formicarídeos.] 5. P. ext. Grupo de indivíduos que professam o mesmo credo, têm os mesmos interesses, a mesma profissão, são do mesmo lugar de origem, etc.: a família católica; a família paulista. 6. Fig. Categoria, classe: O novo material para acondicionamento é da família dos plásticos. 7. Gram. Conjunto de vocábulos que têm a mesma raiz. 8. Genét. Conjunto de gêneros afins. 9. Sociol. Comunidade Constituída por um homem e uma mulher, unidos por laço matrimonial, e pelos filhos nascidos dessa união. 10. Sociol. Unidade espiritual constituída pelas gerações descendentes de um mesmo tronco, e fundada, pois, na consagüinidade. 11. Sociol. Grupo formado por indivíduos que são ou se consideram consangüíneos uns dos outros, ou por descendentes dum tronco ancestral comum e estranhos admitidos por adoção. 12. Tip. Designação tradicional de conjunto de tipos que apresentam as mesmas características básicas. 13. Bras., MG, MT e RS. Filho ou filha: “falei-lhe em casamento ... porque os pais devem tomar isso a si para bem de suas famílias; não acha?” (TAUNAY, Visconde de. Inocência, p. 52). 2 Para o presente estudo, apenas importa a busca pela Família ocidental do final do século XIX até o momento atual.

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1.1.1 Família na Constituição de 1824

Examina-se a Constituição de 1824, como primeiro texto de

nossa história constitucional, conforme afirma Nogueira (2001, p. 17):

Não podemos esquecer de que ela é fruto da dissolução da Constituinte de 1823, que não apenas começou a gerar o divórcio entre a Coroa e a opinião pública, mas manchou de sangue o governo de D. Pedro I, com a reação pernambucana de 1824, vincando de forma indelével a vocação autoritária do Monarca.

A Constituição de 1824, outorgada por Dom Pedro I, foi

fortemente influenciada pelo liberalismo3. Bastos (2002, p. 53) destaca que não há

como compreender a Constituição imperial de 1824 senão à luz das idéias liberais

da época, que colocavam o homem, individualmente considerado, como alicerce de

todo sistema social.

Acerca do tema se pronuncia Bonavides (2004, p. 102-104):

O Constitucionalismo do Império introduziu no País uma forma política de organização do poder que se inspirava em grande parte nos princípios fundamentais da ideologia liberal. [...] A Constituição do Império, objeto agora de consideração, não foi na história do País a Constituição-modelo do nosso liberalismo. Com efeito, em matéria de texto só houve liberalismo, na plenitude, com o advento da República.

A representação política brasileira na Carta de 1824 era

dividida em duas Câmaras: a dos Deputados, temporária e eletiva, e a dos

Senadores, igualmente eletiva, mas vitalícia (NOGUEIRA, 2001, p. 57).

Havia também a garantia dos direitos civis e políticos dos

cidadãos brasileiros, nos arts. 173 à 179. Essa garantia era característica marcante

das Constituições liberais, pois era a forma de limitação do poder do Estado em

frente aos cidadãos (NAHAS, 2006, p. 65).

Nahas (2006, p. 65) prossegue:

A única menção que a Constituição de 1824 faz à família diz respeito exclusivamente à Família Imperial, e, ainda, assim somente o fez pois importava na organização da forma de governo do país, que era monárquico hereditário. Nos moldes do pensamento liberal dominante na

3 No seu sentido original, o termo “liberal” refere-se a uma filosofia política, fundada nos princípios do Iluminismo, que tenta circunscrever os limites do poder político e definir e apoiar os direitos individuais.

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época, não se admitia tamanha intervenção do Estado nestes aspectos do indivíduo.

A respeito do assunto, comenta Oliveira (2002, p. 32):

Logo, esta Constituição, por seu caráter não-intervencionista, não destinou normas específicas sobre a família brasileira, sua forma de constituição ou mesmo sua proteção, fatos que não deixam nenhuma dúvida de que se harmonizava com o pensamento individualista predominante da época, enquadrando-se perfeitamente no modelo do liberalismo clássico.

Porém, isso não quer dizer que não existia regulamentação

jurídica a respeito da família e das entidades familiares. Deve-se lembrar que a

religião católica era a religião oficial do Brasil. Assim sendo, era encarregado ao

Direito Canônico regulamentar as questões referentes ao casamento e suas

conseqüências, única forma de entidade familiar existente.

Acerca dessa matéria, se manifesta Gomes (1993, p. 320):

No âmbito do Direito Canônico, é a família considerada pelas Escrituras como entidade de direito divino. Para a Igreja, a família tem origem exclusivamente no casamento, instituição criada por Deus e elevada à categoria de sacramento, com a finalidade de santificar a união indissolúvel do homem e da mulher, visando não à satisfação da concupiscência pelo congresso sexual, mas também, e principalmente, à procriação e educação da prole.

Dessa forma, era predominantemente a Igreja quem ditava as

regras sobre o casamento, sobre o que era considerado família e o que era moral ou

não nesse sentido.

1.1.2 Família na Constituição de 1891

A Constituição de 1891 foi a primeira do Brasil República.

Houve a necessidade de substituição da anterior, ideologicamente discordante da

nova situação política do Brasil, já que as regras do Império já não serviam para a

nova ordem (NAHAS, 2006, p. 66).

Segundo Castro (1996, p. 24-25), “ela fora modelada, em seus

princípios fundamentais, pela constituição norte-americana”.

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Entre as principais alterações é possível destacar a

implantação do federalismo no Estado republicano, sob a forma presidencialista de

governo. Adota o sistema de tripartição dos poderes, abandonando a divisão

quádrupla anterior (NAHAS, 2006, p. 66).

Sobre essa nova Constituição, comenta Oliveira (2002, p. 35):

Essa constituição republicana também não trouxe um capítulo específico dedicado à família. Apenas tomou o cuidado de inserir no parágrafo quarto do artigo 72 a afirmativa de que “A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita”. O conteúdo de tal dispositivo foi uma forma de continuar marcando posição firme e definitiva diante do direito canônico, retirando da Igreja Católica o direito ao controle do ato jurídico válido do casamento e continuando a dar clara conotação de ilegalidade à cerimônia religiosa do casamento celebrada perante o credo religioso, até então considerado como religião oficial pelo direito constitucional imperial. Por ser pomposa a cerimônia do casamento, ela constituía um dos mais fortes instrumentos de influência do credo católico sobre a vida privada dos brasileiros.

O fato de a Constituição ter eliminado do mundo do direito o

casamento religioso católico, num país em que a maioria esmagadora da população

era formada por católicos, acabou causando uma divisão de duas opiniões, onde

uns acreditavam que as pessoas deveriam ao menos se casar perante a autoridade

do Estado, haja vista que esse era o único modo legal para casar-se e constituir

família regular em nosso país após a chegada da vigência da primeira constituição

republicana, e outros defendiam, com o apoio do clero, que a população deveria

continuar apenas se casando na Igreja. (MILTON, 1998).

Sob a regência desta Constituição, foi elaborado o Código Civil

de 19164, Lei 3.701 de 01.01.1916, que regulava a família do início do século

passado, constituída unicamente pelo matrimônio civil.

O casamento é acto solemne pelo qual duas pessoas de sexo diferente se unem para sempre, sob a promessa recíproca de fidelidade no amor e da mais estreita comunhão da vida. Legitimar a procreação da prole, envolvendo no véo do direito a relação physica dos dous sexos, é certo, um dos principais intuitos do casamento; mas o fim capital, a razão de ser dessa instituição, está nessa admirável identificação de duas existências, que confundindo-se uma na outra, correm os mesmos destinos, sofrem das mesmas dores e compartem, com egualdade, do quinhão de felicidade que a cada um cabe nas vicissitudes da vida (PEREIRA, 2004, p. 29-30).

4 O Direito de Família regulava o casamento (arts. 180 a 329), as relações de parentesco (arts. 330 a 405), a tutela, a curatela e a ausência (arts. 406 a 484).

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Sobre este Código Civil, Dias (2005, p.28) comenta: “trazia uma

estreita e discriminatória visão da família, limitando-a ao grupo originário do

casamento”. Impedia sua dissolução, fazia distinções entre seus membros e trazia

qualificações discriminatórias às pessoas unidas sem casamento e aos filhos

havidos dessas relações (OLIVEIRA; HIRONAKA, 2003, p. 03).

O CC de 1916 era essencialmente patrimonialista, mesmo ao

tratar das relações de Família. Não havia igualdade entre os cônjuges, cabendo ao

varão a administração da sociedade conjugal, fosse em relação ao patrimônio, bem

como em relação às próprias decisões que envolviam a família (NAHAS, 2006, p.

68).

As referências feitas aos vínculos extramatrimoniais e aos

filhos ilegítimos eram punitivas e serviam exclusivamente para excluir direitos (DIAS,

2005, p. 28).

Conforme Gomes (1996, p. 41):

Partindo deste breve esboço sócio-político-jurídico do Brasil no início do século XX, depreende-se que a elaboração do Código Civil (Lei 3.701, de 1.1.1916), editado na vigência da Constituição de 1891, na parte dedicada à família (Livro I da Parte Especial), assenta-se na concepção de um tipo de família (família “legítima”), segundo alguns princípios basilares: I- valorização da liberdade, no sentido de o homem livre-proprietário ter o poder de aquisição, domínio e transferência da propriedade, significando a patrimonialização das relações familiares; II- preponderância do homem sobre a mulher na sociedade conjugal e afirmação de seu poder marital e paterno, como fortalecimento do modelo hierarquizante da família patriarcal; III- exclusão da ordem jurídica dos filhos “ilegítimos”, ou seja, os não provenientes de um anterior casamento regular entre os pais (legítimos), ou mesmo posterior à filiação (legitimados); IV- não reconhecimento a nenhuma forma de organização familiar, não constituída pelo casamento civil (matrimonialização da família).

Sobre o assunto, também se pronuncia Cambi (1999, p. 44):

Nosso Código Civil, seguindo o modelo do Código Civil de Napoleão Bonaparte de 1804, adotou o casamento civil como sendo a única forma de Constituição da família legítima. Só a família constituída, a partir do casamento, gozou da tutela do Estado, sendo que as demais formas de convivência afetiva foram taxadas como ilegais [...] A legislação liberal, dentro desse sentido patriarcal, calcou o eixo do direito civil, inclusive do direito de família, na proteção econômica da propriedade e dos interesses patrimoniais. Sob o viés religioso, a família do Código Civil tinha função procriativa, a qual coaduna-se como o modelo de família rural, onde os filhos deveriam auxiliar na produção.

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Percebe-se então que, mesmo que formalmente houvesse um

rompimento com o catolicismo, foram mantidos os mesmos princípios e fundamentos

do Direito Canônico em relação ao casamento no Direito Civil legislado (NAHAS,

2006, p. 71).

1.1.3 Família nas Constituições de 1934, 1937 e 1946

O constitucionalismo liberal foi perdendo sua força ao longo do

tempo, até mesmo em razão da decadência do liberalismo. O Estado passou a

modificar-se e intervir nas relações entre os particulares, quando que entendesse

necessários. Era o nascimento do Estado Social5 (NAHAS, 2005, p. 72).

Os primeiros anos da década de trinta anunciam o início de

uma convulsão ideológica, de graves conseqüências para a nossa ordem

constitucional, marcando, por assim dizer, um tempo de contradições e

complexidade, que se fazem presentes nas constituições que se seguiram à de

1934, até a atual (GOMES, 1996, p. 64).

Historia Bonavides (1994, p. 332):

Com a promulgação da nova Constituição de 16 de julho de 1934, inaugurou no Brasil a terceira grande época constitucional de sua história; época marcada por crises, golpes de Estado, insurreição, impedimentos, renúncia, suicídio de presidentes, bem como queda de governos, repúblicas e constituições. [...] Com a Constituição de 1934 chega-se a fase que mais de perto nos interessa, porquanto nela se insere a penetração de uma nova corrente de princípios, até então ignorados do direito constitucional positivo vigente no país. Esses princípios consagravam um pensamento diferente em matéria de direitos fundamentais da pessoa humana, a saber: faziam ressaltar o aspecto social, sem dúvida grandemente descurado pelas constituições precedentes. O social aí assinalava a presença e a influência do modelo de Weimar numa variação substancial de orientação e de rumos para o constitucionalismo brasileiro.

A Constituição de 1934 dedica quatro artigos à família (arts.

144 à 147), nos seguintes termos: 5 O Estado Social nasceu de uma inspiração de justiça, igualdade e liberdade; é a criação mais sugestiva do século constitucional, o princípio governativo mais rico em gestação no universo político do Ocidente. O Estado Social representa efetivamente uma transformação superestrutural por que passou o antigo Estado liberal. Seus matizes são riquíssimos e diversos. Mas algo, no Ocidente, o distingue, desde as bases, do Estado proletário, que o socialismo marxista intenta implantar: é que ele conserva sua adesão à ordem capitalista, princípio cardeal a que não renuncia. (BONAVIDES, 1996, p. 183-184).

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Da Família

Art. 144. A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Parágrafo único. A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação do casamento, havendo sempre recurso ex offício, com efeito suspensivo. Art. 145. A lei regulará a apresentação pelos nubentes de provas de sanidade física e mental, tendo em atenção as condições regionais do país. Art. 146. O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento perante ministro de qualquer confissão religiosa, cujo rito não contrarie a ordem púbica ou os bons costumes, produzirá, todavia, os mesmos efeitos que o casamento civil, desde que, perante a autoridade civil, na habilitação dos nubentes, na verificação dos impedimentos e no processo da oposição sejam observadas as disposições da lei civil e seja ele inscrito no Registro Civil. O Registro será gratuito e obrigatório. A lei estabelecerá penalidade para a transgressão dos preceitos legais atinentes à celebração do casamento. Parágrafo único. Será também gratuita a habilitação para o casamento, inclusive os documentos necessários, quando o requisitarem os juízes criminais ou de menores, nos casos de sua competência, em favor de pessoas necessitadas.

Art. 147. O reconhecimento dos filhos naturais será isento de quaisquer selos ou emolumentos e a herança que lhes caiba, ficará sujeita a impostos iguais aos que recaiam sobre a dos filhos legítimos.

Da análise do texto constitucional, observa-se o

reconhecimento exclusivo da família “legítima”, isto é, a constituída pelo casamento

indissolúvel, merecedora de especial proteção do Estado.

Para Nahas (2006, p. 74), “manteve-se o modelo familiar

adotado pelo Código Civil de 1916, com a elevação da proteção jurídica ao patamar

constitucional. A família, reconhecida e amparada pelo direito, era a entidade

constituída através do casamento e os filhos oriundos deste”.

Extrai-se do texto, porém, um avanço com relação ao estatuto

da filiação, na medida em que permite o reconhecimento de filhos naturais (não

adulterinos, nem incestuosos). (GOMES, 1996, p. 65).

Percebe-se que o legislador não se preocupou em apresentar

um conceito substancial do que seria uma família, apenas especificou o ato pelo

qual se constituía, e que era indissolúvel. (OLIVEIRA, 2002, p. 48).

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Destaca-se no período desta Constituição, a conquista gradual

da igualdade pelas mulheres, que se consolidou de forma considerável com a

concessão de direitos políticos a elas. (NAHAS, 2006, p. 74).

A Constituição de 1934, porém, teve pouco tempo de vida.

Após um golpe de Estado de Getúlio Vargas, foi instituído o Estado novo e

outorgada a Constituição de 1937, sendo a quarta Constituição do Brasil e a terceira

da República.

Segundo Gomes (1996, p. 65), a nova Constituição “restringe-

se à família legítima. Pela primeira vez surge um “pátrio dever”, ou seja, considera-

se a educação como um dever dos pais”.

O direito de proteção à família foi mantido, com poucas

alterações, nos termos a seguir:

Da Família

Art. 124. A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Às famílias numerosas serão atribuídas compensações na proporção dos seus encargos. Art. 125. A educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a este dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua execução ou suprir as deficiências e lacunas da educação particular. Art. 126. Aos filhos naturais, facilitando-lhes o reconhecimento, a lei assegurará igualdade com os legítimos, extensivos àqueles os direitos e deveres que em relação a estes incumbem aos pais. Art. 127. A infância e a juventude devem ser objeto de cuidados e garantias especiais por parte do Estado, que tomará todas as medidas destinadas a assegurar-lhes condições físicas e morais de vida sã e de harmonioso desenvolvimento das suas faculdades. O abandono moral, intelectual ou físico da infância e da juventude importará falta grave dos responsáveis por sua guarda e educação, e cria ao Estado o dever de provê-las de conforto e dos cuidados indispensáveis à sua preservação física e moral. Aos pais miseráveis assiste o direito de invocar o auxílio e proteção do Estado para a subsistência e educação de sua prole.

Acerca do encargo, se manifesta Oliveira (2002, p. 52-53):

Poucas foram as alterações no texto da Constituição anterior, já que ambas foram apresentadas durante o governo de Getúlio Vargas, em que pese a de 1937 ter sido imposta. Não havia a intenção de retrocesso constitucional no campo social. Porém, houve a retirada da possibilidade de efeitos civis aos casamentos religiosos. [...] Da mesma forma que a anterior, a Constituição de 1937 também não apresentou um conceito de Família,

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apesar de impor algumas alterações ao tratar da colaboração estatal para as famílias necessitadas, e a igualdade entre os filhos naturais e legítimos.

Ou seja, apesar de novamente não trazer uma definição de

família, esta Constituição, pelo menos, manteve o reconhecimento de filhos naturais

(não adulterinos nem incestuosos), considerando a educação como obrigação dos

pais.

Em 1946, foi gestada a nova Constituição em seguida do

período pós-guerra, com o declínio dos regimes totalitários. Era o momento em que

os Estados, entre eles o brasileiro, visavam à consolidação e ao resgate da

democracia, abalada pelos regimes anteriores, através da ampliação da garantia dos

direitos individuais, sem esquecer da manutenção dos direitos sociais. (NAHAS,

2006, p. 76).

O Brasil, sujeito a um regime totalitário desde o golpe de 1937, sem partidos políticos, sem imprensa livre, estava tão fechado quanto as ditaduras que combateu no além-mar. A legitimidade da Carta de 1937 passou a ser questionada, e em 1946 foi instaurada a terceira Constituinte republicana (BONAVIDES, 2004, p. 75).

Bastos (2002, p. 200) ressalta:

A Constituição de 1946 se insere entre as melhores, senão a melhor, de todas que tivemos. Tecnicamente é muito correta e do ponto de vista ideológico traçava nitidamente uma linha de pensamento libertária no campo político, sem descurar da abertura para o campo social que foi recuperada da Constituição de 1934.

Foi dedicado um capítulo inteiro à família:

CAPÍTULO I

Da Família

Art. 163. A família é constituída pelo casamento de vínculo indissolúvel e terá direito à proteção especial do Estado. § 1º O casamento será civil, e gratuita a sua celebração. O casamento religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições de lei, assim o requerer o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no registro público. § 2º O casamento religioso, celebrado sem as formalidades deste artigo, terá efeitos civis se, a requerimento do casal, for inscrito no registro público, mediante prévia habilitação perante a autoridade competente.

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Art. 164. É obrigatória, em todo o território nacional, a assistência à maternidade, à infância e à adolescência. A lei instituirá o amparo das famílias de prole numerosa.

Art. 165. A vocação para suceder em bens de estrangeiro existentes no Brasil será regulada pela lei brasileira e em benefício do cônjuge ou de filhos brasileiros, sempre que lhes não seja mais favorável a lei nacional do de cujus.

Não existiram mudanças significativas no tratamento da família

na Constituição de 1946 em relação às anteriores. Manteve-se a restrição de

proteção somente à família legítima, realçando a indissolubilidade do casamento,

além de não existir nenhuma prescrição no sentido de igualização de tratamento

entre os filhos ou cônjuges.

Sob a regência desta Constituição, em 27.08.1962, foi editada

a Lei 4.121, conhecida como Estatuto da Mulher Casada.

Foram corrigidos vários erros, como a capacidade relativa da mulher e a amplitude do pátrio poder. Também houve avanço ao dar à mulher o direito de ficar com a guarda dos filhos menores, (...) e de tornar desnecessária a autorização marital para o exercício do trabalho pela mulher. Mas o Estatuto ainda mostrou a influência do Código de Napoleão, ao manter o conceito de autoridade do marido, embora tenha havido avanço ao estabelecer que ele deve ser exercido no estrito benefício da família. (CUNHA, 1990, p. 57).

Em outras palavras, conforme Dias (2006, p. 28), a Lei 4.121

de 1962 “devolveu a plena capacidade à mulher casada e deferiu-lhe bens

reservados que asseguravam a ela a propriedade exclusiva dos bens adquiridos

com o fruto de seu trabalho”.

Porém, os “avanços” atingidos pelo Estatuto da Mulher Casada

mostravam-se incapazes para adequar novo ritmo às relações e entidades

familiares, uma vez que, seu conteúdo dizia respeito à mudanças superficiais,

enquanto a dinâmica social prosseguia a clamar por alterações estruturais.

(GOMES, 1996).

Outra questão em que as mudanças sociais entravam em atrito

com as disposições legais e dogmas da Igreja se relaciona com a Família de fato,

constituída sem a celebração do casamento, apenas no plano fático. Por culpa da

expressa menção constitucional ao matrimônio, aquela união informal não poderia

ser considerada como família pelo ordenamento jurídico. (NAHAS, 2006, p. 78).

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Nahas (2006, p. 78) conclui: “Tratava-se de uma realidade, mas

o legislador insistia em ignorar, na tentativa de desestimular este tipo de conduta,

contrária aos ‘bons costumes”.

Estes fatos, somados aos outros que veremos ainda neste

capítulo, fazem perceber que os pilares da organização legal da família começam a

ruir, mesmo que lentamente, determinando sua gradual ineficácia em responder aos

conflitos sociais emergentes, fruto da transformação política, econômica, cultural e

jurídica da sociedade.

1.1.4 Família na Constituição de 1967 e Emenda Constitucional 1 de 1969

Em 1964 houve um golpe de Estado no país, de cunho

predominantemente militar. Auto-intitulou-se de “revolução” com o intuito de assumir

um Poder Constituinte Originário, e não precisar buscar legitimação no Congresso.

(NAHAS, 2006, p. 79).

Porém, o Movimento de 1964 não estava legitimado a mudar a

ordem constitucional da época. Para a Carta de 1967, o governo utilizou-se do

inexistente Poder Constituinte Congressual, aproveitando-se da mutilação do

Legislativo que as cassações deformaram e aviltaram. (BONAVIDES, 2004, p. 436).

Sobre a nova Constituição, Bonavides (2004, p. 436) comenta

que “os direitos e garantias individuais foram mantidos, mas houve a imposição de

limites ao seu exercício. Mesmo que formalmente o retrocesso parecesse pequeno,

foi suficiente para reforçar a ditadura”.

Não há qualquer acréscimo na Constituição de 1967 (incluindo

qualquer mudança no Direito de Família ou nas entidades familiares), que sustenta,

com insignificantes alterações de texto, o que dispunha a anterior.

Algum tempo depois, em 17.10.1969, houve a promulgação da

Emenda Constitucional I. Porém, a Emenda Constitucional I, de 1969, tornou-se de

fato a nova Carta, adaptando-se os vários atos institucionais e complementares.

(BONAVIDES, 2004, p. 447).

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Em relação à Família, a ordem constitucional manteve a

tradição consagrada anteriormente de dedicar um artigo a sua proteção. O art. 167,

na redação original da Constituição de 1967, alterou-se para 175, na redação da

Emenda. (NAHAS, 2006, p. 80-81).

Art. 167. A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos Poderes Públicos. § 1º O casamento é indissolúvel. § 2º O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições de lei, o ato for inscrito no registro público, a requerimento do celebrante ou de qualquer interessado. § 3º O casamento religioso celebrado sem as formalidades do parágrafo anterior terá efeitos civis, se, a requerimento do casal, for inscrito no registro público, mediante prévia habilitação perante a autoridade competente. § 4º Lei especial disporá sobre a assistência à maternidade, à infância e à adolescência e sobre a educação de excepcionais.

A Constituição de 1969 manteve o estigma obscurantista e

preconceituoso, ao proclamar que “a família é constituída pelo casamento”,

subestimando assim a “família natural”, constituída pela “união livre”. (SOARES,

2002, p. 728).

Porém, a indissolubilidade do vínculo conjugal não mais

correspondia aos anseios da sociedade. Era evidente a força do catolicismo na

Constituinte, uma vez que o Brasil era um dos últimos países que ainda não admitia

o divórcio. (FERREIRA FILHO, 1973).

O tipo moderno de família e casamento entrou em crise porque foram abalados seus fundamentos: a divisão sexual do trabalho e a dicotomia público e privado atribuída conforme o gênero. Em vários lugares do mundo industrializado, como parte da própria dinâmica da modernização que inicialmente as exclui do mundo público, as mulheres foram aumentando sua participação no ensino superior, nas atividades profissionais, políticas, sindicais, artísticas e culturais a partir das últimas décadas, redefinindo as fronteiras entre o público e o privado segundo o gênero. Desempenhando múltiplos papéis na esfera pública em suas vidas cotidianas, muitas mulheres deixaram de restringir suas aspirações ao casamento e aos filhos. Desafiaram a dicotomia entre público e privado, conquistaram direitos como cidadãs, constituíram-se como indivíduos. O individualismo patriarcal6 foi abalado, e a igualdade entre homens e mulheres colocou-se como possibilidade social. Com isto, explodiu o conflito entre o individual e o coletivo no casamento e na família. (VAITSMAN, 1994, p. 35-36).

6 Aquele que toma como modelo o indivíduo-proprietário.

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O passo seguinte, e muito significativo, foi a aprovação do

divórcio, rompendo uma resistência secular capitaneada pela Igreja Católica. (LÔBO,

1999, p. 09). Foi preciso a mudança da própria Constituição Federal, uma vez que a

indissolubilidade do casamento era consagrada constitucionalmente.

A instituição do divórcio, através da Emenda Constitucional 9,

de 1977 e Lei nº 6.515, de 1977 terminou com a indissolubilidade do casamento,

suprimindo a idéia da família como instituição sacralizada. Outra alteração

importante foi a mudança do regime legal de bens: no silêncio dos nubentes, em vez

da comunhão universal passou a vigorar o regime da comunhão parcial de bens.

Mesmo deixando de lado a indissolubilidade, o procedimento e as causas de rompimento do vínculo matrimonial demonstravam a tentativa do legislador em manter o casamento, em proteger o ente familiar por ele gerado. A dimensão da proteção pode ser demonstrada através da análise dos dispositivos legais, incumbindo o juiz de buscar a reconciliação do casal, e concedendo a possibilidade de negar a dissolução se não houvesse fundamento. Os prazos, não tão curtos, também demonstram a proteção do casamento, evitando decisões precipitadas. (NAHAS, 2006, p. 83).

Porém, o surgimento de novos paradigmas, quer pela invenção

dos métodos contraceptivos, quer pela emancipação da mulher, separaram os

conceitos de casamento, reprodução e sexo. O novo enfoque que o direito começa

dar à família é voltado muito mais à identificação do vínculo afetivo que enlaça seus

integrantes. (DIAS, 2005, p. 28).

Como bem explica Gomes (1996, p. 66), “a família reestrutura

seus parâmetros às transformações contemporâneas, e o direito vê-se compelido a

buscar legitimidade em novos modelos legais, sob pena de enclausurar-se nas

amarras do século passado, em descompasso com o devenir da civilização”.

1.2 O PROCESSO CONSTITUINTE – CONSTITUIÇÃO DE 1988

Uma Constituição é o encontro essencial num dado momento e

deve ser suficientemente flexível para se adaptar às exigências do mundo

contemporâneo. (GÉLARD, 1996, p. 25).

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No final dos anos 70 começaram os clamores populares pela

redemocratização do país por toda a sociedade civil. Os principais anseios eram a

realização de eleições diretas para Presidente e uma nova Constituição. (NAHAS,

2006, p. 84).

Em março de 1974, quando tomou posse, pela via indireta,

indicado pelo Comando da Revolução, o novo presidente, o general Ernesto Geisel,

apresentou a proposta de um “gradual, mas seguro, aperfeiçoamento democrático”,

para o seu governo. (OLIVEIRA, 2002, p. 72).

Durante este governo, relevantes acontecimentos se

sucederam, como o gradativo desaparecimento da censura, a restauração do Poder

Judiciário e a revogação dos atos institucionais.

O governo seguinte foi o do presidente João Batista Figueiredo,

que tomou posse em 15 de março de 1979 e encerrou seu mandato em 14 de março

de 1984. Conforme Caldeira (1984, p. 345), “o fato político de maior expressão deste

governo foi a campanha pelas “Diretas Já”, que recebeu o apoio de toda a

sociedade civil e tomou as ruas do país”.

Desde então, inumeráveis organizações civis, entidades populares, órgãos de imprensa, estudantes, advogados, professores, trabalhadores e políticos de oposição, atuando já no clima da distensão, não cessaram de requerer a volta a um regime marcado pela confiança e credibilidade nos poderes de governo e na investidura legítima de seus titulares. (BONAVIDES, 2004, p. 456).

Houve eleições presidenciais em 1985, porém, o voto ainda

não foi direto. Finalmente teve início uma nova fase para a vida política do Brasil,

depois de 21 anos de autoridade militar. No entanto, o maior mérito desse governo

efetivamente residiu em cumprir uma das principais promessas de campanha de

Tancredo Neves, que era possibilitar uma nova ordem constitucional para o povo

brasileiro. (OLIVEIRA, 2002, p. 75).

Iniciados os trabalhos, a Assembléia constituinte preferiu não

partir de um projeto já elaborado. (BONAVIDES, 2004, p. 456). Conforme observa

Oliveira (2002, p. 76), “houve a instalação da Assembléia na data aprazada, tendo

sido eleito seu presidente o deputado federal Ulisses Guimarães, iniciando-se,

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assim, os trabalhos da Assembléia Constituinte, tendo o término ocorrido após 19

meses de intensos debates”.

Várias questões sobre o tema família e entidades familiares

foram iniciados. Os pontos mais discutidos referiam-se à imposição pela legislação

de dogmas discriminatórios e excludentes, como a desigualdade entre os filhos, a

diferença entre homem e mulher na direção da sociedade conjugal, a falta de

reconhecimento como família das uniões livres e inclusive a mudança dos prazos do

divórcio, já identificado no ordenamento jurídico. (NAHAS, 2006).

Na nova sociedade, não existe mais a clara divisão de funções

na família: homem e mulher, comprometidos em geral no trabalho, ampliam suas

aptidões em todos os setores possíveis; os filhos, cada vez mais livres de

condicionamento, também expandem suas possibilidades. (BITTAR, 1989).

A falta de afetividade não poderia mais sustentar – leia-se

impor – casamentos meramente formais, mas sem substrato psicoafetivo. [...] Enfim,

o único modelo de família previsto no Código Civil – formado somente pelo

casamento – não atendia mais aos desejos de nossa sociedade, que não

encontrava apoio no direito positivo. (OLIVEIRA, 2002).

Assim, casamento, reprodução e sexo, elementos em que

sempre esteve apoiado o Direito de Família, libertaram-se. Ficou evidente que uma

coisa poderia ser possível sem outra. (PEREIRA, 2001).

A família centrada no matrimônio, a existência e diferença entre

filhos legítimos e ilegítimos, a desigualdade entre homens e mulheres, todas essas

questões foram deixadas para trás, em busca de uma nova concepção de família.

Como reflexo dessas mudanças paradigmáticas, foi

promulgada a Constituição da República de 1988, que fez uma verdadeira revolução

no Direito de Família, conforme será visto no capítulo seguinte e durante toda a

pesquisa bibliográfica.

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CAPÍTULO 2

A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E AS FORMAS EXPLÍCITAS

DAS ENTIDADES FAMILIARES CONTIDAS NA MESMA

2.1 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A Constituição de 1988, segundo Veloso (1997, p. 03), “num

único dispositivo, espancou séculos de hipocrisia e preconceito”.

O dispositivo que é citado será analisado ao longo do capítulo,

mas a frase do autor é colocada, logo no início do texto, para demonstrar como as

coisas mudaram com a nova Constituição. Tanto, a ponto de torná-la conhecida

como “Constituição Cidadã”.

A Constituição de 1988 efetivamente alterou a concepção do

Estado brasileiro nos mais diversos aspectos, mudando paradigmas da ordem

jurídica que a antecedeu, e não foi diferente em relação à família. (NAHAS, 2006, p.

88).

Na efetiva Constituição Federal, inicialmente são firmados os

direitos e garantias fundamentais para apenas depois serem colocadas as estruturas

básicas do Estado, dando amostra evidente de que este é um instrumento para

concretização de uma ordem democrática a serviço da sociedade. (REALE, 1990, p.

04).

No que se refere à família, um ponto que deve ser observado

na análise da nova Constituição, é que ela só assegurou uma evolução que já vinha

ocorrendo na sociedade brasileira, ou seja, não foi por ela que a mudança na família

brasileira ocorreu.

Constitucionalizaram-se valores que estavam impregnados e disseminados no seio da sociedade. Dos fatos e valores caminhou-se para as normas, tardiamente, é verdade. O texto constitucional de 1988 contemplou e abrigou uma evolução fática anterior da família e do Direito de Família que estava represado na doutrina e na jurisprudência. A Constituição de 1988, estimulada pela emenda Nelson Carneiro, mostrou que esses novos valores

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já conhecidos da sociedade não iriam causar trauma algum à nação. Albergou-se no plano constitucional o que já se tinha desenvolvido no plano sociológico da família. (OLIVEIRA, 2002, p. 91).

A Constituição Federal vigente, promulgada em 5 de outubro

de 1988, prescreve em seu art. 5.º, caput, e inc. I, in verbis:

Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes; I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.

Não nem preciso qualquer comentário acerca do artigo

supracitado, ficando evidente os direitos e garantias fundamentais que a nova

Constituição trouxe. Destaca-se a igualdade plena entre todos, especialmente entre

homens e mulheres.

Porém, a real norma inovadora, o tal dispositivo inicialmente

citado, é o art. 226, à medida que as anteriores já haviam reprisado o teor das

disposições retrocitadas7.

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e gratuita a sua celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento.

7 Constituição de 1824, art. 178, XII: “A lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue e recompensará em proporção dos merecimentos de cada um”; Constituição de 1891, art. 72, parágrafo 2º: “Todos são iguais perante a lei. A República não admite privilégios de nascimento, desconhece foros de nobreza e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho”; Constituição de 1934, art. 113, 1: “Todos são iguais perante a lei. Não haverá privilégios, nem distinções, por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões próprias ou do país, classe social, riqueza, crenças religiosas ou idéias políticas”; Constituição de 1937, art. 122, 1º: “Todos são iguais perante a lei (...)”; Constituição de 1946, art. 141, parágrafo 1º: “Todos são iguais perante a lei”; Constituição de 1967, art. 153: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. O preconceito de raça será punido pela lei”; Emenda Constitucional n. 1/69, art. 153, parágrafo 1º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. Será punido pela lei o preconceito de raça”. Pela análise dos dispositivos constitucionais retro citados, observa-se que somente a partir da Constituição de 1934 é que se demonstrou atenção pela igualdade entre homens e mulheres. A Constituição de 1937, claramente autoritária, supriu a referência à igualdade de “sexos”, o que foi repetido na Constituição de 1946, para só em 1967 a Constituição voltar a reconhecer a igualdade entre homens e mulheres, cujo texto foi, posteriormente, reproduzido pela EC n. 1/69.

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§ 4º Entende-se também como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada a separação de fato por mais de dois anos.

§ 7º Fundado nos princípios da dignidade humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

A ordem constitucional, enfim, alargou o conceito de família,

estabelecendo a igualdade entre o homem e a mulher, passando a amparar de

forma igualitária todos os seus membros. Estirou mesma proteção à família

constituída pelo casamento, assim como à união estável entre o homem e a mulher

e à comunidade disposta por qualquer dos pais e seus descendentes, que atendeu o

nome de família monoparental. (DIAS, 2006).

Em outras palavras, “tanto a união estável entre homem e

mulher como as relações entre ascendentes e sua filiação, chamadas de família

monoparental, passaram a ser consideradas entidades familiares”. (FUGIE, 2002, p.

131).

Desse modo, a entidade familiar deve, efetivamente, promover

a dignidade e a realização da personalidade de seus membros, integrando

sentimentos, esperanças e valores, servindo como alicerce fundamental para o

alcance da felicidade. (FARIAS, 2004, p. 10).

Pereira (1988 apud OLIVEIRA, 2002, p. 88) bem ressalta as

qualidades das novas famílias: “A importância do amor, do afeto, da convivência

mútua, da alegria da companhia, do ângulo emocional, sempre em prejuízo da união

compelida, hipócrita, doentia, conflitada, destruidora; eis um parâmetro

indispensável, fundamental de quase todas as mudanças na família e em sua

normatização jurídica. Objetiva-se veracidade nas relações. Repele-se a falsidade”.

Dessa forma, é identificada sob três formas a família

constitucionalmente prevista no texto de 1988: casamento, união estável e famílias

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monoparentais, ou seja, as entidades familiares explícitas as quais trata essa

pesquisa.

A Constituição de 1988, então, estabeleceu uma nova ordem

em relação à família, extraindo a eficácia das normas que se opusessem aos

preceitos constitucionais. O Código Civil [de 1916] perdeu o papel de lei fundamental

do direito de família. (FACHIN, 1996, p. 83).

E o doutrinador Fachin (2003, p. 81) ainda assinala:

Nem sentido amplo, contextualizado, a família se define juridicamente, nesse momento contemporâneo, na passagem do Código à Constituição. Com a vigência da Constituição de 1988, ela chamou para si o papel de lei fundamental da família até então ocupado pelo Código Civil de 1916 e leis esparsas. Enfim, simbolicamente, o século XIX terminou formalmente.

O atual CC entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003 e

pretendeu modernizar os aspectos essenciais do direito de família. Incorporou as

mudanças legislativas que haviam ocorrido por meio de legislação esparsa, apesar

de ter preservado a estrutura do Código anterior. (DIAS, 2006, p. 29).

Mas não deu o passo mais ousado, nem mesmo em direção

aos temas constitucionalmente consagrados, ou seja, operar a subsunção, à

moldura da norma civil, de construções familiares existentes desde sempre, embora

ignorados pelo legislador constitucional. (OLIVEIRA; HIRONAKA, 2003 apud DIAS,

2006, p. 29).

O ponto principal da questão sobre entidades familiares e do

estudo dessa pesquisa está na enumeração do art. 226. Seria ela exemplificativa

(numerus apertus) ou se trata de rol limitativo (numerus clausus)?

Parte-se, então, do preâmbulo da Carta Magna, que se destina

a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, o bem-estar, a

igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade, pluralista, fraterna

e sem preconceitos. Importante ressaltar ainda que a interpretação de todo o Texto

Constitucional deve ser fixada nos princípios da liberdade e igualdade, além do

princípio da dignidade da pessoa humana, assegurado logo pelo art. 1º, III, como

princípio fundamental da República. (FARIAS, 2004).

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E o doutrinador Farias (2004, p. 10) ainda conclui:

Sem dúvida, então, a única conclusão que atende aos reclamos constitucionais é no sentido de que o rol não é – e não pode ser nunca! – taxativo, por deixar sem proteção inúmeros agrupamentos familiares não previstos no Texto Constitucional, até mesmo por absoluta impossibilidade.

Essa questão será estudada a fundo no próximo capítulo. Este

será focado no que se encontra na lei. Inicialmente será feito um estudo do

casamento, suas considerações preliminares, natureza jurídica, capacidade, enfim,

como é visto e normatizado a partir da Constituição e do Código Civil vigentes. Em

seguida será analisado a união estável e finalmente, mas não menos importante, as

famílias monoparentais.

2.2 CASAMENTO

Uma das instituições mais antigas do mundo civilizado é o

matrimônio, e sua celebração tem as mesmas características há mais de dois mil

anos. Os modelos conservadores, pela grande influência religiosa, imaginam o

exercício da sexualidade dentro do parâmetro sacro do laço do casamento, com o

nítido proveito na capacidade procriativa. (FUGIE, 2002).

Porém, nessa pesquisa estudar-se-á o casamento longe desse

prisma, e mais próximo da realidade vigente.

Claro que o livro do Código Civil que trata do direito das

famílias só pode começar pelo casamento, evidenciado a enorme preocupação do

legislador com a família matrimonializada, tanto que lhe dedica nada menos do que

110 artigos. (DIAS, 2006, p. 128).

Primeiramente, a lei civil expõe no art. 1.565 que, através do

casamento, homem e mulher passam a ser cônjuges, companheiros e responsáveis

pelas obrigações da família, fortificando o que se considera o primordial efeito e

objetivo do casamento, previsto no art. 1.511, que refere à comunhão plena de vida,

baseada na uniformidade de direitos e deveres entre os consortes, surgindo-se daí a

criação da família e dos filhos originados do casamento. (BORGHI, 2003, p. 34).

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Sobre o tema, anota-se também a lição de Gomes (1996, p.

69): “O casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a mulher que visa o auxílio

mútuo material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a

constituição de uma família legítima”.

Casamento tanto expressa o ato da celebração do matrimônio

assim como a relação jurídica que dele se origina: a relação matrimonial. É de se

estudar que dela surgem inúmeras obrigações, direitos e deveres. Dias (2006, p.

129) oportunamente salienta que: “A sacralização do casamento faz parecer que

seja essa a única forma de constituir a família. Mas é a família, e não ao casamento,

que a Constituição chama de base da sociedade, merecedora da especial atenção

do Estado (CF 226)”.

A sociedade conjugal que nasce com o casamento é um

organismo complexo, e os seus efeitos jurídicos irradiam-se não só aos

descendentes, como também aos demais parentes de ambos os lados, quer no

campo pessoal, quer no patrimonial. (MAGALHÃES, 2003, p. 01).

Conforme o art. 1595 do CC, cada cônjuge ou companheiro (no

caso da União Estável) é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade,

limitando-se aos ascendentes, descendentes e aos irmãos do cônjuge ou

companheiro. Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do

casamento ou da união estável.

Para harmonização dessa completa vivência igualitária,

determina o § 1º do art. 1.565 que qualquer dos nubentes poderá acrescer aos seus

o sobrenome familiar do outro, o que era reservado antigamente somente à mulher

que se casava. (BORGHI, 2003, p. 34).

Sobre o aspecto patrimonial dos efeitos jurídicos do

casamento, Diniz (2006, p. 129-130) tece importante observação:

Fixa o dever de sustento da família, a obrigação alimentar e o termo inicial da vigência do regime de bens, pois este começa a vigorar desde a data do casamento e é alterável (CC, art. 1.639, §§ 1º e 2º): dispõe, com o intuito de preservar o patrimônio da entidade familiar, sobre a instituição do bem de família (CC, arts. 1711 a 1722), sobre os atos que não podem ser praticados por um dos cônjuges sem a anuência do outro (CC, art. 1.647) e, ainda, confere direito legitimatário e sucessório ao cônjuge sobrevivente, além de

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algumas prerrogativas na sucessão aberta (CC, arts. 1.829, I, II e III, 1.830, 1.831, 1.832 e 1.838) etc.

Como se pode perceber, o matrimônio cria para os consortes,

portanto, ao lado das relações pessoais, vínculos econômicos objetivados nos

regimes matrimoniais de bens, nas doações recíprocas, no direito sucessório etc.

O regime de bens é uma das conseqüências jurídicas do

casamento. Por isso, é impositivo que exista alguma espécie de regramento de

ordem patrimonial. (DIAS, 2006, p. 191).

E Dias (2006, p. 191) continua: “Abstendo-se os nubentes de

decidir sobre tais questões, o Estado faz a opção por eles e impõe o regime da

comunhão parcial. Aos noivos basta pronunciar o ‘sim’ na solenidade do

matrimônio”.

Logo, a escolha do regime de bens rege a situação patrimonial

do casal durante a vigência do casamento e, especialmente, quando de sua

dissolução.

O regime da comunhão parcial de bens é, segundo Diniz

(2006, p. 168), “aquele que, basicamente, exclui da comunhão os bens que os

consortes possuem ao casar ou que venham a adquirir por causa anterior e alheia

ao casamento, e que inclui na comunhão os bens adquiridos posteriormente”.

Ainda estão previstos pelo CC o regime de comunhão universal

(arts. 1.667 à 1.671), do regime de participação final nos aqüestros (arts. 1.672 à

1.686) e do regime de separação de bens (arts. 1.687 e 1.688), cada qual com

características próprias.

Com relação ao aspecto do equilíbrio entre os poderes do

homem e da mulher no casamento, Borghi (2003, p. 35-36) prossegue:

O art. 1.567 do Código Civil determina que a direção da sociedade conjugal deve ser exercida em sistema colaborativo por ambos os cônjuges, na mais plena igualdade de condições, sempre visando o interesse da família nuclear, ou seja, do casal e dos filhos, diferentemente do que rezava a legislação civil antiga, que determinava que o marido era o chefe da sociedade conjugal, função essa que exercia com a colaboração da mulher, no interesse da família; assim, acabou a hegemonia masculina, com o

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disposto no art. 226, § 5º, da Constituição da República ao par do dispositivo amplo constante do inciso I do art. 5º, da Carta.

Finalmente, a legislação constitucional conferiu igualdade de

tratamento entre homens e mulheres, deixando para trás o pensamento patriarcal e

machista das Constituições pátrias antigas.

2.2.1 Natureza Jurídica do Casamento

Muito se tem discutido sobre a natureza jurídica do casamento.

É contrato? É Instituição? Ou uma mescla de contrato e instituição? A discussão é

antiga e conta com renomados argumentos de parte a parte. (MAGALHÃES, 2003,

p. 17).

Existem algumas teorias que esclarecem a natureza jurídica do

casamento, podendo-se citar, como principais: Teoria contratualista (influenciada

pelo direito canônico), Concepção institucionalista e Doutrina eclética ou mista.

Conforme esclarece Dias (2006, p. 130), a teoria contratualista

ou também chamada de “doutrina individualista, influenciada pelo direito canônico,

que vê o casamento com um contrato de vontades convergentes para a obtenção de

fins jurídicos”.

Na teoria institucionalista, o casamento é uma instituição social,

refletindo uma situação que surge da vontade dos contraentes, mas cujas normas,

efeitos e forma encontram-se preestabelecidos em lei. (DINIZ, 1989, p. 30).

Sobre a terceira teoria, doutrina eclética ou mista, ou ainda

contrato-instituição, se manifesta Magalhães (2003, p. 18): “entende ser o

casamento um negócio jurídico complexo que conjuga a manifestação de vontade

dos contraentes e a obrigatória intervenção do Estado”.

A discussão, ainda que tradicional, se revela estéril e inútil. As

pessoas são livres para casar, mas, no que diz com os deveres e direitos, sujeitam-

se aos efeitos do casamento que ocorrem independentemente da vontade dos

cônjuges. (DIAS, 2006, p. 130).

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Segundo Alvarenga (2003, p. 24): “defende-se a teoria eclética

ou mista, por entender-se o casamento um instituto misto, regido por duas

legislações: a canônica e a civil, pois a teoria contratualista é de origem canônica,

enquanto a teoria institucionalista se origina do Direito Civil”.

Muitos consideram o casamento um contrato sui generis, isto é,

um contrato diferente, com características especiais, ao qual não se aplicam as

disposições legais dos negócios patrimoniais. (GOMES, 1987 apud DIAS, 2006, p.

131).

Venosa (2004, p. 41) conclui: “Daí afirmar-se que o casamento-

ato é um negócio jurídico e o casamento-estado é uma instituição”.

2.2.2 Impedimentos

A Parte Especial do Código Civil, no seu Livro IV, Título I,

Capítulos III e IV, subordina o matrimônio a certos requisitos, prevendo quem poderá

ou não contrair núpcias. O impedimento matrimonial é a falta de requisitos para o

casamento (Art. 1.521 e 1.522 do Código Civil).

Da leitura dessa parte do Código Civil conclui-se que o foco do

legislador foi impedir uniões que afetem a prole, a ordem moral ou pública, por

significarem um agravo ao direito dos nubentes, ou aos interesses de terceiros, tal a

influência que desempenha o matrimônio nas relações familiares e em toda esfera

social. (DINIZ, 2006, p. 69).

Diniz (2006, p. 70) ainda assinala:

Importante não confundir incapacidade para o casamento com impedimento matrimonial, pois o impedido de casar não é impossibilitado de contrair núpcias. A incapacidade forma pressuposto material da realização do casamento, sendo, dessa forma, relativa à vontade e à idade núbil (arts. 1.517 a 1.520 do Código Civil).

No CC de 2002, em seu art. 1.521, estão enumeradas as

cláusulas impeditivas de se contrair matrimônio, que são elas:

I – os ascendentes com descendentes, seja parentesco natural ou civil;

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II – os afins em linha reta; III – o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem foi cônjuge do adotante; IV – os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive; V – o adotado com o filho do adotante; VI – as pessoas casadas;

VII – o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra seu consorte.

Da análise deste artigo, observa-se que os incisos dizem

respeito às causas relativas ao parentesco, afinidade na linha reta, adoção, bigamia

e crime de homicídio ou tentativa de homicídio contra um dos consortes.

Relativamente ao impedimento por parentesco, razões morais

e eugênicas justificam a vedação do casamento entre ascendentes e descendentes,

bem como entre irmãos unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais até o terceiro

grau inclusive. (FONTANELLA, 2004, p. 53).

Sobre o assunto, comenta Magalhães (2003, p. 45):

Se observarmos os incisos I a V, do art. 1.521, do Código Civil, perceberemos que o legislador teve a preocupação de preservar o forte conteúdo moral que deve informar as relações familiares, evitando a possível ocorrência de uniões incestuosas ou sexualmente inconvenientes. A idéia do incesto sempre repugnou a consciência do homem mediano, e mesmo considerando-se que o tema constitui um tabu sobre o qual raramente se fala no seio familiar, a impressão que se tem é a de que, ao nascer, ele já traz nos seus registros biológico e biográfico o conhecimento dessa proibição.

A seguir, o Código Civil proíbe o casamento de pessoas já

casadas. Esse impedimento deriva da proibição da bigamia, por ter a família base

monogâmica. Logo, ninguém poderá contrair matrimônio se já se encontra ligado a

outro vínculo conjugal anterior. (ALVARENGA, 2002, p. 59).

O homicídio consumado ou tentado é a última causa

impeditiva, que proíbe o casamento do cônjuge sobrevivente com o condenado

como delinqüente no homicídio ou tentativa deste, contra o seu consorte.

(MAGALHÃES, 2003, p. 47).

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Os impedimentos podem ser suscitados por qualquer pessoa

até o momento da celebração do casamento. Devem ser opostos por declaração

escrita e assinada e com a indicação das provas (art. 1.529 do Código Civil). (DIAS,

2006, p. 138).

E Dias (2006, p. 138) ainda conclui: “Celebrado o matrimônio,

mesmo que seja nulo (art. 1.548, inciso II do Código Civil), somente os interessados

ou o Ministério Público podem, a qualquer tempo, buscar sua anulação”.

2.2.3 Nulidades do Casamento

O sistema de nulidades do casamento contém normas próprias

que o tornam uma especialização da teoria geral das nulidades. (DINIZ, 2006, p.

257).

E Diniz (2006, p. 257) prossegue:

Os atos nulos ou de nulidade absoluta (CC, arts. 166 e 167) são os que, inquinados por algum vício essencial, não podem ter eficácia jurídica, ou seja, são aqueles em que falta elemento essencial (consentimento, objeto lícito, sujeito capaz, forma prescrita em lei) à sua formação ou aqueles que, apesar de possuírem os elementos essenciais, foram praticados com simulação, infração à lei, à ordem pública e aos bons costumes.

Para casar é necessário que os nubentes tenham capacidade,

isto é, higidez psíquica. A ausência de capacidade faz nulo o casamento contraído

por enfermo mental cuja doença lhe retire o discernimento para os atos da vida civil

(CC 1.548, I). (DIAS, 2006, p. 238).

O artigo 1.550 do CC trata dos casos de matrimônio anulável

ao dispor que existe nulidade relativa de casamento contraído por quem não

completou a idade mínima para casar; pelo menor em idade núbil, não autorizado

pelo seu representante legal, por vício de vontade; pelo incapaz de consentir ou

manifestar, de modo inequívoco, o consentimento; pelo mandatário, não sobrevindo

coabitação entre os cônjuges, pois esta ratificaria o casamento; e por incompetência

da autoridade celebrante.

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Pelo art. 1.523, I, do CC, não podem casar, sob pena de

nulidade relativa (CC, art. 1.550, I), as mulheres e os homens menores de 16 anos.

(DINIZ, 2006, p. 265). Porém, algumas exceções são previstas, tal como o art. 1.520

do referido Código.

2.3 UNIÃO ESTÁVEL

Uma das maiores conquistas alcançadas com a nova

Constituição foi a constitucionalização de outra espécie de família que não só a

constituída pelo casamento. (OLIVEIRA, 2002, p. 142).

Com efeito, estabelece o art. 226, § 3.º da Constituição

Federal: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o

homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em

casamento”.

Gomes (1996, p. 72) tece a seguinte manifestação acerca do

tema:

O parágrafo terceiro do artigo 226 representa um dos maiores avanços na democratização da família brasileira, pois, ainda que tardiamente, o direito oficial reconhece e destina proteção a uma prática social corriqueira e muito antiga. As demais constituições pátrias pautavam a formação da família, estruturando-a obrigatoriamente pelo casamento civil, ao passo que a legislação infraconstitucional, nos dispositivos do Código Civil, ocupava-se das uniões de fato, ou das chamadas uniões concubinárias, somente no intuito de discriminá-las ou reprimi-las (arts. 248, IV e 1719, III, CC).

A Constituição acabou por reconhecer juridicidade ao afeto, ao

elevar as uniões constituídas pelo vínculo de afetividade à categoria de entidade

familiar. (DIAS, 2006, p. 146).

Segundo sua etimologia, o vocábulo “entidade” se refere àquilo

que “constitui a essência de uma coisa; existência”. Afigura-se a terminologia mero

eufemismo para designar “família”, que deixou de trazer em sua essência a idéia de

casamento. (GOMES, 1996, p. 72).

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O termo “entidade familiar” deve ser entendido como sinônimo

de família. Família e entidade familiar são expressões que, pela Constituição

Federal, se equivalem. (OLIVEIRA, 2002, p. 148).

E Oliveira (2002, p. 143) ainda conclui: “Pode-se entender

então que a união estável, reconhecida expressamente pelo nosso texto maior como

forma de família, é uma espécie de união que reúne todos os atributos afetivos do

casamento”.

A propósito, a essência moderna da família, implicitamente

destacada pela Constituição Federal de 1988, é apoiada, basicamente, na

afetividade e na solidariedade entre seus membros. Conseqüentemente, o referido

preceito constitucional destina a união estável como fonte capaz de criar, ao lado do

casamento civil, a família destinatária da proteção do Estado. (GOMES, 1996, p. 73).

Porém, a regulamentação do concubinato só veio a ser

realizada em 1994, com o advento da lei 8.971. Antes disso, ficava a cargo da

legislação infraconstitucional o dever de regulamentar a união estável. Então, na

vigência da Carta Maior de 1988, manteve-se a súmula 3808 que continuou a ser

aplicada. (FERRAZ, 2004, p. 61).

A Lei 8.971/94 normatiza:

Art. 1º - A companheira comprovada de homem solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei n. 5478, de 25 de julho de 1960, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade.

Entende-se do artigo primeiro da Lei o objetivo de firmar o

direito a alimentos entre os companheiros9, e da mesma forma os direitos

patrimoniais no fim da união, no que se refere à sucessão e à partilha (arts. 2º e 3º,

8 A Súmula nº 380 do STF estabelece: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.” Esta Súmula foi uma formulação construída pela doutrina e pela jurisprudência, durante a vigência da Constituição de 1946, consolidada no início da década de sessenta, para tangenciar a vedação de tutela das famílias constituídas sem casamento, de modo a encontrar-se alguma proteção patrimonial a, freqüentemente, mulheres abandonadas por seus companheiros, após anos de convivência afetiva. 9 O mesmo artigo primeiro, em seu parágrafo único da Lei 8.971/94 esclarece que o companheiro, a exemplo da companheira, tem igual direito, o que se mostra redundante, na medida em que a igualdade jurídica entre os sexos é norma constitucional, relativa a direitos fundamentais.

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respectivamente). Porém, a Lei condiciona o exercício de tais direitos a condições

objetivas (prazo mínimo de cinco anos ou filhos), originando-se tal limitação na

prática, a uma forma de “conceituação” de união estável não pretendida pelo

constituinte. (GOMES, 1996).

Sobre esta Lei, também se pronuncia Dias (2006, p. 146):

A lei 8.971/1994 assegurou direito a alimentos e à sucessão do companheiro. No entanto, conservava, ainda, um certo ranço preconceituoso, ao reconhecer como união estável a relação entre pessoas solteiras, judicialmente separadas, divorciadas ou viúvas, deixando fora, injustificadamente, os separados de fato. Também a lei fixou condições outras, só reconhecendo como estáveis as relações existentes há mais de cinco anos ou das quais houvesse nascido prole, como se tais requisitos purificassem a relação. Assegurou ao companheiro sobrevivente o usufruto sobre parte dos bens deixados pelo de cujus. No caso de inexistirem descendentes ou ascendentes, o companheiro (tal como o cônjuge sobrevivente) foi incluído na ordem de vocação hereditária como herdeiro legítimo.

A lei 9.278 de 1996 alterou esse conceito, não mais fixando

aqueles requisitos pessoais ou tempo ou existência de prole para que se

configurasse a união estável protegida pelo Estado. O art. 1º da referida lei

modificou a denominação de companheiro para conviventes. (FERRAZ, 2004, p. 62).

Houve necessidade da a Lei nº 9.278/96 dizer o óbvio, a saber,

as questões relativas à união estável deveriam ser decididas nas varas de família,

pois tratavam-se de relações de família. (LÔBO, 2002, p. 49).

A jurisprudência desempenhou importantíssima função nas

sucessivas conquistas que se seguiram ao longo do tempo, desde a luta pela

simples indenização por serviços prestados até o reconhecimento expresso de uma

nova entidade familiar. (OLIVEIRA, 2002, p. 168-169).

Finalmente, o CC regulamentou a união estável em seus

artigos 1.723 a 1727, reconhecendo-a como entidade familiar da qual advêm direitos

e deveres para ambas as partes, contudo vigem ainda as disposições previstas nas

leis anteriores citadas, tendo o Código Civil de 2002 revogado apenas as previsões

que forem contrárias. (FERRAZ, 2004, p. 62).

Magalhães (2003, p. 290) se pronuncia: “A condição principal

da união estável baseia-se na diversidade de sexo dos conviventes. O art. 1.723, do

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CC, destaca a necessidade da união do homem e da mulher, separando a

possibilidade de ser reconhecida como entidade familiar as uniões homossexuais,

também conhecidas por sociedades homoafetivas10“.

O CC limitou-se a reproduzir a legislação que existia,

reconhecendo como estável a convivência duradoura, pública e contínua de um

homem e de uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família.

(DIAS, 2006, p. 148).

Conforme Ferraz (2004, p. 63):

Ao impor como requisito a continuidade da relação, o legislador pretendeu diferenciar a união estável das uniões que ocorrem transitoriamente, sem compromisso algum, sem o desejo de serem companheiros ou de praticarem em conjunto atos essenciais a vida. O ordenamento jurídico não mais estabelece prazo mínimo para que se configure a união estável, há ainda uma corrente doutrinária que entende poder ser caracterizada a união estável não só pelo tempo mas também por um ato que configure o início da união, por exemplo o casamento religioso.

Embora a lei tenha extinto a previsão de um tempo mínimo de

convivência para caracterização da união estável, ela não se cumpriu totalmente

alheia a essa questão, tanto que um dos seus pressupostos é o da durabilidade da

convivência. O que o legislador teve como objetivo foi separar a possibilidade de

aventuras, levando efêmeras uniões a confluir no reconhecimento da estabilidade

para caracterização da união estável. (MAGALHÃES, 2003, p. 290-291).

As relações entre os companheiros devem obedecer também

aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação

dos filhos, conforme art. 1724 do CC.

O CC regula a união estável à imagem e semelhança do

casamento: estabelece requisitos para seu reconhecimento (CC 1.723), gera direitos

e impõe deveres entre os conviventes (CC 1.724) e, da mesma forma, com relação

aos impedimentos (CC 1.723 § 1º.).

Não poderá existir então, segundo Ferraz (2004, p. 62),

“qualquer dos impedimentos elencados no art. 1.521 do CC, ou seja, qualquer dos

impedimentos matrimoniais (concubinato puro), porque do contrário, ter-se-á o 10 Tema que será estudado no capítulo seguinte.

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chamado concubinato impuro (art. 1727 do CC), o qual não será protegido na seara

do Direito de Família”.

No que se refere aos direitos advindos aos companheiros,

similares com os direitos que advêm do casamento, Ferraz (2004, p. 64) ainda

assinala:

De um dos companheiros acrescer o sobrenome do outro, de um dos companheiros receber pensão alimentícia do outro companheiro, de tornar o companheiro beneficiário dos favores da legislação social e previdenciária. Com o novo estatuto civil, restou dirimida a controvérsia sobre a disposição patrimonial entre os conviventes, regendo-se então a união estável pelo regime da comunhão parcial salvo, disposição em contrário acordada pelos cônjuges mediante contrato (art. 1.725 do NCC).

No mais, é importante ressaltar sobre a união estável que, o

texto constitucional, reconhecendo a necessidade de seguir a evolução social

implacável, rompeu com as amarras que atrelavam o Direito de Família a uma

ordem jurídica desejada, mas nem sempre vivida no cotidiano e alçou à categoria

jurídica instituições tradicionalmente fadadas ao abandono do mundo normativo.

(LEITE, 1994, p. 45).

2.4 FAMÍLIA MONOPARENTAL

Os avanços trazidos pela Carta Magna não se limitaram a dar

uma nova visão da família formada pelo casamento, nem tampouco pelo

reconhecimento das uniões estáveis. Verifica-se uma nova espécie de entidade

familiar, qual seja a família monoparental. (OLIVEIRA, 2002, p. 214).

Com efeito, estabelece o art. 226, § 4º da Constituição Federal:

“Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer

dos pais e seus descendentes”.

Uma família é considerada monoparental quando a pessoa

considerada (homem ou mulher) encontra-se sem cônjuge, ou companheiro, e vive

com uma ou várias crianças. (LEITE, 1997, p. 22).

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Como fator inicial responsável pelo fenômeno monoparental

pode-se mencionar a liberdade com que as pessoas podem se unir e se desunir,

seja através de formalidades cogentemente estabelecidas, como acontece no

casamento, seja de maneira completamente informal, como ocorre na união estável.

(OLIVEIRA, 2002, p. 215).

Sobre a previsão constitucional da família monoparental,

Gomes (1996, p. 79) também se manifesta:

Dá-se em face da proliferação do fenômeno da desagregação familiar, observada pelo número crescente de divórcios e separações, por um lado, e, por outro, o significativo aumento, do que se pode chamar de segmentação da família, consistente na escolha consciente de assumir um filho, independente da existência de parceria (seja casamento ou união estável).

Segundo Dias (2006, p. 184), “com a decadência do

patriarcalismo e a introdução da mulher no mercado de trabalho, as famílias

formadas por um dos pais e sua prole passaram a possuir maior visibilidade. Seu

número expressivo, com maciça predominância feminina, é um forte obstáculo ao

modelo dominante da bipolaridade”.

Certamente, para este estado de liberdade contribuiu,

decisivamente, a emancipação econômica da mulher. Tendo ela conquistado o

mesmo patamar de igualdade com o homem, não está mais presa a uniões mantidas

à custa do seu sacrifício pessoal. (OLIVEIRA, 2002, p. 216).

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), em seu

art. 42, admite a adoção por apenas uma pessoa. Dessa forma, pode uma pessoa,

por opção própria, adotar uma criança como seu filho, constituindo também uma

família monoparental.

Porém, um problema que surge com a monoparentalização diz

respeito à sobrecarga, tolerada pelo pai ou pela mãe (que mantém exclusividade de

vínculo com o filho), dos encargos referentes ao sustento da criança sob sua guarda,

que na família unilinear lhe é privativa. (GOMES, 1996, p. 80).

De qualquer forma, as pessoas são livres para optar por aquele

“modelo” de família que melhor atenda às suas carências. Muitas vezes não se trata

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de uma escolha, mas de uma necessidade, premida pelas circunstâncias, como é o

caso do fim de uniões. (OLIVEIRA, 2002, p. 217).

Sorte das pessoas que optam por um molde de família, seja

por escolha ou necessidade e tem resguardado esse direito na Constituição. Em

alguns casos, como no das uniões homoafetivas, as pessoas que vivem nesse tipo

de relação não possuem o mesmo respaldo normativo, originando-se as lides e a

eterna busca de que a Legislação atenda aos anseios sociais plenamente.

No próximo capítulo, analisar-se-á essas relações que ainda

não possuem a devida normatização, estudando-se a possível abertura do art. 226

da CF, desde que essas outras formas de família possuam os mesmos requisitos

que as entidades familiares já explícitas na Carta Magna.

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CAPÍTULO 3

O ART. 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E AS FORMAS

IMPLÍCITAS DAS ENTIDADES FAMILIARES CONTIDAS NA MESMA

3.1 A INTERPRETAÇÃO DO ART. 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

No primeiro capítulo deste trabalho foi analisada a evolução

constitucional, fazendo o exame da família nos textos constitucionais do Brasil

Império e do Brasil República, demonstrando como o direito positivado, quase

sempre, não estava de acordo com a realidade social vigente.

O Direito, ideologicamente, vai incluindo ou excluindo pessoas

do laço social. Não podemos permitir que a história das exclusões se repita, ou

resista. (PEREIRA, 2003, p. 06).

Nas constituições anteriores, havia significativo formalismo

social e jurídico. A liberdade era formal, as relações sociais e interpessoais eram

formais, a própria Constituição e sua interpretação eram formais. (NAHAS, 2006, p.

126).

Acerca do tema, Nahas (2006, p. 126-127) prossegue:

[Porém], as constituições e o próprio Estado deixaram de lado a postura formal e pretensamente isenta em relação à esfera privada dos cidadãos, e iniciou-se a busca por uma igualdade material, através do reconhecimento e proteção dos desiguais. Os direitos fundamentais foram aumentando e deixaram de ser meramente direitos de proteção, para se tornarem garantias de igualdade social, econômica, e até mesmo transindividual. A Constituição deixou de ser somente uma carta político-organizacional do Estado para se tornar instrumento de garantia dos anseios sociais e individuais, em conexão com a realidade do povo que representa. Assim, a sua interpretação deixou de ser formal-legal e passou a ser concretista, diretamente conectada à realidade que a circunda e embasa.

Entre as incontáveis mudanças que se dão no mundo

contemporâneo, nenhuma é mais importante, nem sentida de forma tão intensa,

quanto aquelas que se desenvolvem nas vidas pessoais dos seres humanos (na

sexualidade, no casamento, etc). (FARIAS, 2004, p. 07).

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Nunca antes as coisas haviam mudado tão rapidamente para

uma parte tão grande da humanidade. Tudo é afetado: ciência, religião, moralidade,

educação, política, economia, vida familiar, até mesmo os aspectos mais íntimos da

vida – nada escapa. (ZAMBERLAM, 2001, p. 11).

A multiplicidade, a dinâmica e a dificuldade dos movimentos

sociais atuais trazem consigo, por óbvio, a necessidade de restauração dos modelos

familiares até então existentes. Os matrimônios, os divórcios, as adoções, as

inseminações artificiais, a clonagem, etc. impõem especulações sobre o nascimento

de novos moldes familiares, novos papéis, novas relações sociais, afetivas e

jurídicas. (FARIAS, 2004, p. 07-08).

A alteração do perfil do casamento, e dos relacionamentos em

geral, acarretou um novo enfoque da comunidade familiar, antes voltado para a

aceitação externa e conveniência social, para uma busca interna e conveniência

individual. (NAHAS, 2006, p. 103).

Nesse sentido, entende-se que a família não é apenas uma

instituição de origem biológica, mas, sobretudo, um organismo com nítidos

caracteres culturais e sociais. (ALVES, 2006, p. 133).

Desse modo, a entidade familiar deve, efetivamente, promover

a dignidade e a realização da personalidade de seus membros, integrando

sentimentos, esperanças e valores, servindo como alicerce fundamental para o

alcance da felicidade. (FARIAS, 2004, p. 10).

Farias (2004, p. 10) continua:

[Logo], o legislador constituinte apenas normatizou o que já representava a realidade de milhares de famílias brasileiras, reconhecendo que a família é um ato natural e o casamento uma solenidade, uma convenção social, adaptando, assim, o Direito aos anseios e necessidades da sociedade. Assim, passou a receber proteção estatal, como reza o art. 226 da Constituição Federal, a família originada através do casamento, bem como a decorrente de união estável e, ainda, a família monoparental, isto é, a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

Foi a partir da desvinculação do casamento e da sua entrega

pela ciência ao poder das mães (por meio do controle da procriação) que o modelo

familiar tornou-se acessível aos que dele eram excluídos. (CARLOS, 2006, p. 37).

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Visto isso, surge o ponto nodal da questão sobre entidades

familiares, tema principal desse estudo e analisado rapidamente no capítulo anterior.

A questão é: a enumeração do art. 226 da Constituição Federal seria exemplificativa

ou se trata de rol taxativo?

O preâmbulo da Constituição de 1988 é o primeiro ponto de

partida para uma análise unitária do texto constitucional, pois demonstra os

princípios que direcionam a leitura de cada artigo. (NAHAS, 2006, p. 127).

E Nahas (2006, p. 127) prossegue:

Através do preâmbulo é possível identificar que a Constituição deve ser o fundamento de um Estado democrático, garantidor de direitos sociais e individuais, da liberdade, da segurança, do bem-estar, do desenvolvimento e da justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. Uma sociedade fraterna busca a convivência harmoniosa entre seus integrantes, de forma a respeitar e cooperar com os demais cidadãos. A sociedade fraterna é inclusiva e não excludente. A fraternidade entre os integrantes de uma sociedade implica a colaboração com os necessitados, com os excluídos e proteção às minorias.

Furtar direitos de alguns e criar o enriquecimento sem

justificativa de outros confronta o mais sagrado princípio constitucional: o da

dignidade, e se a palavra de ordem é a cidadania e a inclusão dos excluídos, uma

sociedade que se deseja aberta, justa, solidária e democrática não pode conviver

com tal discriminação. (DIAS, 2000).

Nesse sentido, é fundamental se reconhecer que a

Constituição Federal estabeleceu como tábua axiológica, como norte de todo o

ordenamento jurídico, a dignidade da pessoa humana. (GAMA; GUERRA, 2006, p.

163).

A dignidade da pessoa humana é o princípio maior, fundante

do Estado Democrático de Direito, sendo afirmado já no primeiro artigo da

Constituição Federal. (DIAS, 2006, p. 52).

O referido princípio também é preâmbulo de inúmeras cartas

constitucionais modernas (Constituição de Portugal, art. 1º; Lei Fundamental da

República Federal Alemã, art. 1º; Constituição Russa, art. 21, etc.). Consolida-se na

afirmação kantiana de que o homem existe como um fim em si mesmo e não como

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mero meio (imperativo categórico). É um valor superior, e segue o homem até sua

morte, por ser da essência da natureza humana. (GIORGIS, 2001, p. 151).

E é a pessoa humana, o crescimento de sua personalidade, o

elemento finalístico da proteção estatal, para cuja realização devem dirigir todas as

normas de direito positivo, em especial aquelas que disciplinam o direito de família,

regulando as relações mais íntimas e intensas do indivíduo no social. (TEPEDINO,

1999, p. 328).

A dignidade da pessoa humana encontra na família o solo

apropriado para florescer. A ordem constitucional dá-lhe especial proteção,

independentemente de sua origem. (DIAS, 2006, p. 53).

Lôbo (2002, p. 46) ressalta:

A proteção da família é proteção mediata, ou seja, no interesse da realização existencial e afetiva das pessoas. Não é a família per se que é constitucionalmente protegida, mas o lócus indispensável de realização e desenvolvimento da pessoa humana. Sob o ponto de vista do melhor interesse da pessoa, não podem ser protegidas algumas entidades familiares e desprotegidas outras, pois a exclusão refletiria nas pessoas que as integram por opção ou por circunstâncias da vida, comprometendo a realização do princípio da dignidade humana.

Sem dúvida, então, a única conclusão que atende aos

reclamos constitucionais é no sentido de que o rol não é – e não pode ser nunca! –

taxativo, por deixar sem proteção inúmeros agrupamentos familiares não previstos

no Texto Constitucional. (FARIAS, 2004, p. 10).

Segundo Lôbo (2002, p. 44), “a exclusão não está na

Constituição, mas na interpretação”. Senão vejamos:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e gratuita a sua celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento. § 4º Entende-se também como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

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§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada a separação de fato por mais de dois anos.

§ 7º Fundado nos princípios da dignidade humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

O conceito trazido no caput do art. 226 é plural e

indeterminado, firmando verdadeira cláusula geral de inclusão. (FARIAS, 2004, p.

11).

O começo da interpretação se dá reconhecendo o sentido

literal das palavras. A primeira dificuldade encontrada são os limites da palavra

“família”, constituindo-se um conceito aberto, e em razão dessa abertura que surge a

possibilidade de inclusão. (NAHAS, 2006, p. 130).

Acerca do tema, Lôbo (2002, p. 44-45) ratifica os autores

anteriores:

No caput do art. 226 operou-se a mais radical transformação, no tocante ao âmbito de vigência da tutela constitucional à família. Não há qualquer referência a determinado tipo de família, como ocorreu com as constituições brasileiras anteriores. Ao suprimir a locução “constituída pelo casamento” (art. 175 da Constituição de 1967-69), sem substituí-la por qualquer outra, pôs sob a tutela constitucional “a família”, ou seja, qualquer família. A cláusula de exclusão desapareceu. [...] o caput do art. 226 é, conseqüentemente, cláusula geral de inclusão, não sendo admissível excluir qualquer entidade que preencha os requisitos de afetividade, estabilidade e ostensibilidade.

E prossegue:

[Com relação] a regra do § 4º do art. 226 integra-se à cláusula geral de inclusão, sendo esse o sentido do termo “também” nela contido. “Também” tem o significado de igualmente, da mesma forma, outrossim, de inclusão de fato sem exclusão de outros. Se dois forem os sentidos possíveis (inclusão ou exclusão), deve ser prestigiado o que melhor responda à realização da dignidade da pessoa humana, sem desconsideração das entidades familiares reais não explicitadas no texto.

Percebe-se, então, que a norma constitucional deve ser

interpretada de forma que se consiga a maior eficácia possível. Nesse sentido,

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sendo possível tirar sentidos diversos da leitura de determinado dispositivo

constitucional, deve preponderar o que determine maior alcance social, comparando

efetividade e eficácia ao princípio da dignidade de cada um dos que fazem parte do

núcleo familiar. (FARIAS, 2004, p. 23).

A busca de uma interpretação emancipatória da Constituição

revela-se a verdadeira base para a construção de uma sociedade democrática,

aparelhada para o amanhã. (GOMES, 1996, p. 86).

Porém, novas dúvidas surgem. Qual seria o elemento

individualizador dessas novas entidades familiares, que caracterizaria também a

família já consagrada e assinalada explicitamente pela Constituição.

3.2 A FAMÍLIA COM BASE NO AFETO

A Família do século XXI é plural e multifacetária, opondo-se ao

modelo familiar ocidental admitido até início do século XX. Uma das razões desta

mudança foi a procura pela realização do indivíduo. A Família renuncia a ter apenas

como objetivo a procriação e a transmissão de patrimônio, para se transformar no

lugar de busca pela realização individual de cada pessoa. Ocorre uma revalorização

do ponto de vista civil-familiar. (NAHAS, 2006, p. 106).

As pessoas que fazem parte das famílias, apesar da forte

liberdade com que mantêm seus relacionamentos, procuram cada vez mais o

robustecimento da reciprocidade dos seus sentimentos. Esse amálgama dos laços

familiares é representado pela afetividade. E essa explicação não surge de nenhuma

estrutura legislativa codificada. (OLIVEIRA, 2002, p. 233).

De forma mais ampla, estuda-se por parte do Estado, uma

inclinação ao amparo de cada um dos componentes do círculo familiar em particular,

significando uma espécie de repersonalização de seus integrantes e das relações

familiares, sendo a única forma capaz de abonar a realização da afetividade no seio

da família. (GOMES, 1996, p. 69).

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Isso nada mais é do que o compromisso de assegurar afeto: o

primeiro obrigado a assegurar o afeto por seus cidadãos é o próprio Estado. (DIAS,

2006, p. 59).

E Dias (2006, p. 60) continua:

Mesmo que a Constituição tenha enlaçado o afeto no âmbito de sua proteção, a palavra afeto não está no texto constitucional. Ao serem reconhecidas como entidade familiar merecedora da tutela jurídica as uniões estáveis, que se constituem sem o selo do casamento, tal significa que o afeto, que une e enlaça duas pessoas, adquiriu reconhecimento e inserção no sistema jurídico.

Realmente, o Direito não tem o poder de criar afetividade.

Sentimentos naturais não decorrem de legislações, mas da vivência cotidiana

informada pelo respeito, diálogo e compreensão. (OLIVEIRA, 2002, p. 233).

Dessa forma, conforme ensina Farias (2004, p. 12), “nossos

pretórios têm reconhecido que a presença do caráter afetivo como mola propulsora

de algumas relações as caracteriza como entidade familiar (independente da

previsão constitucional), merecendo a proteção do direito de família”.

Assim, o novo paradigma familiar está centrado no afeto e na

solidariedade como forma de constituição. (NAHAS, 2006, p. 110).

A não-admissibilidade de comunidades afetivas como

entidades familiares, albergadas e tuteladas no direito de família, sob o frágil

argumento de não estarem explicitamente previstas no art. 226 da CF/88, viola

frontalmente o princípio da dignidade da pessoa humana. (FARIAS, 2004, p. 13).

A respeito do assunto, se pronuncia Lôbo (2002, p. 46-47):

Projetou-se, no campo jurídico-constitucional, a afirmação da natureza da família como grupo social fundado essencialmente nos laços de afetividade, tendo em vista que consagra a família como unidade de relações de afeto, após o desaparecimento da família patriarcal, que desempenhava funções procracionais, econômicas, religiosas e políticas. A Constituição abriga princípios implícitos que decorrem naturalmente de seu sistema, incluindo-se no controle da constitucionalidade da lei. Encontram-se na Constituição Federal brasileira algumas referências, cuja interpretação sistemática conduz ao princípio da afetividade, constitutivo dessa aguda evolução social da família, especialmente: a) todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem (art. 227, § 6º);

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b) a adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da igualdade de direitos (art. 227, §§ 5º e 6º); c) a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos, e a união estável têm a mesma dignidade de família constitucionalmente protegida (art. 226, §§ 3º e 4º);

d) o casal é livre para extinguir o casamento ou a união estável, sempre que a afetividade desapareça (art. 226, §§ 3º e 6º).

Se a Constituição renunciou ao casamento como única forma

de família tutelada, o motivo se deve ao abandono dos valores que demonstravam a

norma de exclusão, visando considerar o novo fundamento comum a todas as

entidades, a afetividade.

O mesmo ocorreu com o que se refere aos filhos, todos iguais

perante a lei, realçando novamente a comunhão de amor, dos laços afetivos, entre

pai e filho, sem distinção entre filhos biológicos e adotivos, e rejeitando qualquer

proveito ou valor que não seja o anteriormente citado. (LÔBO, 2002, p. 47).

Conclui então, segundo Giorgis (2001, p. 157), que

“comprovada a existência de um relacionamento em que haja vida em comum,

coabitação e laços afetivos, está-se à frente de uma entidade familiar, forma de

convívio que goza da proteção constitucional”.

Oliveira (2002, p. 240) faz uma interessante observação acerca

da matéria:

Nem mesmo a Igreja – entendida aqui a expressão abrangendo todas as formas de manifestação de religiosidade – é forte, atualmente, o bastante para imprimir comportamentos ou regras capazes de pôr em xeque a estrutura familiar. A indissolubilidade do casamento, pregada por vários séculos pela Igreja Católica, acabou não conseguindo mais explicar para uma sociedade desgastada por tantas uniões infelizes por que é que se deveria ostentar uma família meramente formal, que, de fato (e verdadeiramente), já não existia.

Hoje a noção de família não se atrela exclusivamente à noção

do matrimônio. É possível reprodução sem sexo, sexo sem matrimônio e também é

comum matrimônio sem reprodução. (FUNGIE, 2002, p. 134).

A família está voltada para realização afetiva individual de seus

membros, como forma de realização da sua dignidade. (NAHAS, 2006, p. 110).

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A afetividade é construção cultural, que se dá no cotidiano,

sem vantagem material, que apenas depois aparecem quando ela se cessa.

Manifesta-se em ambiente de responsabilidade e solidariedade. Como em qualquer

princípio, revela fraca densidade semântica, que se define pela mediação

concretizadora do intérprete, ante cada situação real. Em outras palavras: onde

existir uma relação ou comunidade formadas por laços de afetividade, sendo estes

seus princípios originário e final, existirá família. (LÔBO, 2002).

Farias (2004, p. 15) conclui:

A entidade familiar deve ser entendida, hoje, como grupo social fundando, essencialmente, em laços de afetividade, pois a outra conclusão não se pode chegar à luz do Texto Constitucional, especialmente do art. 1º, III, que preconiza a dignidade da pessoa humana como princípio vetor da República Federativa do Brasil.

Não havendo mais afetividade, não existe razão para

manutenção, aos olhos da sociedade, de uma estrutura meramente formal e vazia

de fundamento. (OLIVEIRA, 2002, p. 243).

Uma vez estudado o art. 226 da Constituição Federal,

concluído que o mesmo é uma norma aberta e que abriga não apenas as entidades

familiares expressamente contidas na mesma, será analisado a seguir as entidades

familiares implícitas, ou seja, que tem como base o afeto, assim como todas as

outras famílias atualmente.

3.3 AS ENTIDADES FAMILIARES IMPLÍCITAS CONTIDAS NA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL DE 1988

Como analisado anteriormente, o art. 226 da Constituição

Federal não deixa dúvidas a respeito da abertura pluralista da mesma, ao

simplesmente referir “família”, sem limites ou contenções.

E ainda, segundo Nahas (2006, p. 133), “os próprios

parágrafos do texto constitucional estão exemplificando, especialmente no § 4º, que

dispõe: ‘entende-se, também, como entidade familiar’, não deixando dúvidas de que

são dispositivos inclusivos e exemplificativos”.

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A CF/88 igualou todos os filhos, independentemente de sua

origem, sejam eles biológicos ou adotivos, privilegiando, indubitavelmente, o afeto. E

o mais importante: o casamento deixou de ser o modelo oficial de família, havendo

clara opção pelo amor. (FARIAS, 2004, p. 19).

Dessa forma, e tendo como base o afeto, não se pode negar

que existam outras entidades familiares que não as previstas na Carta Magna.

Assim sendo, existe algo de novo no direito de família: a gana

de vencer as restrições ridículas da adaptação intelectual. Porém, tudo será à toa

sem a elevação pela sociedade – enquanto Estado, organizações não

governamentais, comunidade acadêmica – de uma atitude responsável em relação à

família – lato sensu. Modificando o texto da Constituição Federal em letra viva.

(COLARES, 2000, p. 46).

Acerca do tema, Lôbo (2002, p. 41-42) cita algumas entidades

familiares que não tem o devido respaldo legal constitucional, mas que são unidades

de vivência encontradas na experiência brasileira atual11, estando contidas

implicitamente na Carta Magna, conforme o presente estudo:

a) união de parentes e pessoas que convivem em interdependência afetiva, sem pai ou mãe que a chefie, como no caso de grupos de irmãos, após falecimento ou abandono dos pais; b) pessoas sem laços de parentesco que passam a conviver em caráter permanente, com laços de afetividade e de ajuda mútua, sem finalidade sexual ou econômica; c) uniões homossexuais, de caráter afetivo e sexual; d) uniões concubinárias, quando houver impedimento para casar de um ou de ambos companheiros, com ou sem filhos;

e) comunidade afetiva formada com “filhos de criação”, segundo generosa e solidária tradição brasileira, sem laços de filiação natural ou adotiva regular.

E continua:

Em todos os tipos há características comuns, sem as quais não configuram entidades familiares, a saber:

11 Segundo dados do IBGE, que, no campo da demografia e da estatística, as unidades de vivência dos brasileiros são objeto de pesquisa anual e regular do mesmo. É intitulada de Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD).

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a) afetividade, como fundamento e finalidade da entidade, com desconsideração do móvel econômico; b) estabilidade, excluindo-se os relacionamentos casuais, episódicos ou descomprometidos, sem comunhão de vida; c) ostensibilidade, o que pressupõe uma unidade familiar que se apresente assim publicamente.

A coexistência sob o mesmo teto, durante longos anos, por

exemplo, de dois irmãos (sem qualquer conotação de ordem sexual) que juntam

esforços para a formação do acervo patrimonial caracteriza uma entidade familiar.

Na suposição de morte de um deles, descabe dividir os bens igualmente entre todos

os irmãos, como herdeiros colaterais, em nome da ordem de vocação hereditária.

(DIAS, 2006, p. 42).

O mais justo seria conceder ao irmão, com que o falecido

convivia diariamente, a integralidade do patrimônio, pois ele, por motivo da

sociedade de vidas, antecede aos demais irmãos na ordem de vocação hereditária.

Este tipo de entidade familiar é uma das que não tem previsão

constitucional, porém, a convivência identifica comunhão de esforços, podendo

aplicar, por analogia, as disposições que caracterizam o casamento e a união

estável. (DIAS, 2006, p. 42).

O direito também atribui a certos grupos sociais a qualidade de entidades familiares para determinados fins legais, a exemplo da Lei nº 8.009, de 29.03.1990, sobre a impenhorabilidade do bem de família; da Lei nº 8.425, de 18.10.1991, sobre locação de imóveis urbanos, relativamente à proteção da família, que inclui todos os residentes que vivam na dependência econômica do locatário; dos arts. 183 e 191 da Constituição, sobre a usucapião especial, em benefício do grupo familiar que possua o imóvel urbano e rural como moradia. (LÔBO, 2002, p. 42).

O Superior Tribunal de Justiça tem afirmado o conceito

ampliado e inclusivo de entidade familiar. Mesmo em caso controvertido sobre

situação da família decorrente de união concubinária, em caso de seguro de vida

feito em favor da concubina, por homem casado:

HOMEM CASADO – SITUAÇÃO PECULIAR DE COEXISTÊNCIA CONCOMITANTE ADVINDA DE AMBAS AS RELAÇÕES – INDICAÇÃO DA CONCUBINA COMO BENEFICIÁRIA DO BENEFÍCIO. (...) II – Inobstante a regra protetora da família, consubstanciada nos arts. 1.474, 1.177 e 248, IV, da lei substantiva civil, impedindo a concubina de ser instituída como beneficiária de seguro de vida, porque casado o de cujus, a

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particular situação dos autos, que demonstra espécie de ‘bigamia’, em que o extinto mantinha-se ligado à família legítima e concubinária, tendo prole concomitante com ambas, demanda solução isonômica, atendendo-se à melhor aplicação do direito. III – Recurso conhecido e provido em parte, para determinar o fracionamento, por igual, da indenização securitária. (REsp 100.888/BA, DJ 12.03.2001).

A seguir, estudar-se-á duas das formas de entidades familiares

citadas anteriormente, a filiação socioafetiva e as uniões homossexuais que, embora

não possuam a normatização constitucional, estão cada vez mais presentes no

cotidiano da sociedade.

3.3.1 Filiação Socioafetiva

A posse do estado de filho constituiu modalidade de

parentesco civil de origem afetiva (CC 1.593).

A filiação socioafetiva corresponde à verdade aparente e

decorrente do direito à filiação. A necessidade de manter a estabilidade da família,

que cumpre a sua função social, faz com que se atribua um papel secundário à

verdade biológica. (DIAS, 2006, p. 307).

Revela a constância social da relação entre pais e filhos,

caracterizando uma paternidade que existe não pelo simples fato biológico ou por

força de presunção legal, mas em decorrência de uma convivência afetiva.

(BOEIRA, 1999 apud DIAS, 2006, p. 307).

Enquanto a família biológica navega na cavidade sangüínea, a

família afetiva transcende os mares do sangue, conectando o ideal da paternidade e

da maternidade responsável, hasteando o véu impenetrável que encobre as

relações sociológicas. (WELTER, 2003).

E Welter ainda assinala:

A filiação socioafetiva compreende a relação jurídica de afeto, como o filho de criação, quando comprovado o estado de filho afetivo (posse de estado de filho), a adoção judicial, o reconhecimento voluntário ou judicial da paternidade ou maternidade e a conhecida “adoção à brasileira”.

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O reconhecimento da chamada adoção à “brasileira” visa a

impedir o locupletamento de quem procedeu em desconformidade com a lei e a

verdade. (DIAS, 2006, p. 307).

A filiação afetiva também acontece naqueles casos em que,

mesmo não existindo nenhum vínculo biológico ou jurídico (adoção), os pais criam

uma criança ou adolescente por mera escolha, denominado filho de criação,

(des)velando-lhe todo o amor, cuidado, enfim, uma família. (WELTER, 2003, p. 149).

Dessa forma, os Tribunais Pátrios foram aos pouco dirimindo a

controversa gerada, resultando-se em várias jurisprudências sobre o assunto, como

se pode observar nas ementas dos seguintes julgados, sendo demonstrado,

primeiramente, a do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E MATERNIDADE. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. PROVA DO VÍNCULO BIOLÓGICO. PARENTALIDADE SOCIOAFETIVA. O direito de conhecer a descendência genética é imprescritível. Caso em que, ao registrarem a investigante os pais registrais fizeram uma "adoção à brasileira". Ao depois, os pais registrais foram os pais socioafetivos da investigante. Verdade socioafetiva que prevalece sobre a verdade genética. NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO. DERAM PROVIMENTO AO APELO. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70010973402, Oitava Câmara Cível, TJRS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 04/08/2005).

Nesse caso, está-se diante de hipótese que se convencionou

chamar de adoção à brasileira. Os pais registrais registraram a apelada como se

filha deles fosse, mesmo sabendo que isso não era verdade. A paternidade

socioafetiva é inquestionável e fica clara pela simples leitura da inicial.

E ainda, segundo julgado do Tribunal de Justiça de Santa

Catarina:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE C/C ANULAÇÃO DE REGISTRO C/C GUARDA - MENOR ENTREGUE PELA MÃE BIOLÓGICA A SUPOSTO PAI - REGISTRO EM NOME DE AMBOS - AUTOR QUE AVOCA PARA SI A PATERNIDADE - EXAME DE DNA CONCLUSIVO ACERCA DE SUA PATERNIDADE - CASO PECULIAR - MENOR QUE JÁ CONTA COM MAIS DE TRÊS ANOS - INÉRCIA DO PAI BIOLÓGICO NA TOMADA DE MEDIDAS DE URGÊNCIA PARA TOMADA DA CRIANÇA - CONTRIBUIÇÃO DECISIVA PARA CONSOLIDAÇÃO DOS LAÇOS AFETIVOS - ESTUDO SOCIAL INDICANDO AS DIFICULDADES QUE A MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO ACARRETARÁ À MENOR - PATERNIDADE SOCIOAFETIVA - PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE - MANTENÇA DA GUARDA COM O CASAL QUE VEM CRIANDO A MENOR - ARTIGOS 6º E

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33 DO ECA - PEDIDO INICIAL PARCIALMENTE PROCEDENTE - ÔNUS SUCUMBENCIAIS MODIFICADOS - RECURSO PROVIDO. Tendo como foco a paternidade socioafetiva, bem como os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e do melhor interesse do menor, cabe inquirir qual bem jurídico merece ser protegido em detrimento do outro: o direito do pai biológico que pugna pela guarda da filha, cuja conduta, durante mais de três anos, foi de inércia, ou a integridade psicológica da menor, para quem a retirada do seio de seu lar, dos cuidados de quem ela considera pais, equivaleria à morte dos mesmos. Não se busca legitimar a reprovável conduta daqueles que, mesmo justificados por sentimentos nobres como o amor, perpetram inverdades, nem se quer menosprezar a vontade do pai biológico em ver sob sua guarda criança cujo sangue é composto também do seu. Mas, tendo como prisma a integridade psicológica da menor, não se pode entender como justa e razoável sua retirada de lugar que considera seu lar e com pessoas que considera seus pais, lá criada desde os primeiros dias de vida, como medida protetiva ao direito daquele que, nada obstante tenha emprestado à criança seu dados genéticos, contribuiu decisivamente para a consolidação dos laços afetivos supra-referidos. (Apelação Cível nº 20050420661, TJSC, Relator: Des. Subst. Sérgio Izidoro Heil, Julgado em 01/06/2006).

Nessa decisão, fica evidente a tendência a filiação socioafetiva,

em detrimento de uma paternidade simplesmente biológica, cuja conduta, durante

mais de três anos, foi de inércia.

3.3.2 As Uniões Homossexuais

A origem da homossexualidade ainda se desconhece. De

qualquer forma, nem interessa, pois, quando se procuram causas, parece que se

está buscando um remédio para a cura de algum mal. Não é o caso. Tanto que o

termo “homossexualismo” foi substituído por homossexualidade, pois o sufixo “ismo”

significa doença, enquanto o sufixo “dade” quer dizer modo de ser. (DIAS, 2006, p.

174).

Dias (2006, p. 174-175) prossegue:

A Igreja fez do casamento forma de propagar a fé cristã: crescei e multiplicai-vos. A infertilidade dos vínculos homossexuais levou a Igreja a repudiá-los, acabando por serem relegados à margem da sociedade. Claro que a forma de demonstrar reprovação a tudo que desagrada à maioria conservadora é condenar à invisibilidade. O legislador, com medo da reprovação de seu eleitorado, prefere não aprovar leis que concedam direitos às minorias alvo da discriminação. Assim, restam as uniões homossexuais marginalizadas e excluídas do sistema jurídico. No entanto, a ausência de lei não significa inexistência de direito. Tal omissão não quer dizer que são relações que não merecem a tutela jurídica.

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As uniões homossexuais são uniões fundadas no afeto entre

seus integrantes. Deixando de lado qualquer preconceito existente, não há como se

negar a existência de afeto e solidariedade entre o casal formado por pessoas do

mesmo sexo. (NAHAS, 2006, p. 136).

Conforme observa Giorgis (2001, p. 143), “não é negando

direitos à união homossexual que se fará desaparecer a homossexualidade, pois os

fundamentos destas uniões se assemelham ao casamento e à união estável, sendo

o afeto o vínculo que une os parceiros”.

Não se pode, simplesmente, ignorar a condição pessoal do

indivíduo (na qual, sem sombra de dúvida, inclui-se a orientação sexual), como se tal

aspecto não tivesse relação com a dignidade humana. (DIAS, 2006, p. 175-176).

Conforme visto anteriormente, o princípio norteador da

Constituição é o que consagra o respeito à dignidade humana, onde todos são

iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (CF 5.º), vedando

discriminação e preconceitos por motivo de origem, raça, sexo ou idade.

Daí se segue que a igualdade entre os homens representa

obrigação imposta aos poderes públicos, tanto na elaboração da regra de Direito

quanto em relação à sua aplicação. (GIORGIS, 2001, p. 153).

Acerca desta matéria, Rios (2002, p. 134) faz importante

ponderação:

A Constituição não só possibilita, como requer que o legislador e o juiz, no procedimento hermenêutico, resultante da interação entre o programa da norma (texto) e seu âmbito (realidade) concretize o direito vigente, de molde a considerar os princípios democráticos e a inegável pluralidade de formas de vida amorosa, abrindo espaço para caracterização das uniões homossexuais como comunidades familiares, que não se caracterizam pelo vínculo matrimonial.

Interessa-nos, enquanto profissionais do Direito, pensar e

repensar melhor a liberdade dos sujeitos acima dos conceitos estigmatizantes e

moralizantes que servem de instrumento de expropriação da cidadania. (PEREIRA,

2001, p. 109).

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Assim, é reconhecida a possibilidade de inclusão constitucional

das uniões homossexuais ou homoafetivas, dentro da proteção constitucional à

Família, através de uma interpretação concretizadora da Constituição. (NAHAS,

2006, p. 137).

A omissão legal gera resistência nos juízes de reconhecer

juridicidade às uniões homossexuais. Interpretam a falta de lei como

correspondendo à vontade do Estado em não querer lhes conceder direitos, quando

a motivação é bem outra: o preconceito. (DIAS, 2006, p. 176).

A jurisprudência, então, tende a reconhecer a existência de

mera sociedade de fato. Conforme o art. 981 do Código Civil: “Celebram contrato de

sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou

serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos

resultados”.

Conclui-se, assim, que os tribunais, em especial do STJ,

devem iniciar uma construção jurisprudencial, assim como feito outrora com o

concubinato (o que gerou a Súmula 380/STF12), no sentido de aceitar as Sociedades

de fato entre pessoas do mesmo sexo. (NOGUEIRA, 1998, p. 33).

Dias (2006, p. 177) ressalta:

Visualiza-se exclusivamente vínculo negocial, negando-se a relação afetiva que existe com as características de uma família. Nitidamente preconceituosa a analogia feita. Procura-se mudar a origem do vínculo, que é um elo de afetividade e não uma obrigação negocial de bens e serviços para o exercício de atividade econômica. As conseqüências são desastrosas. Chamar as uniões de pessoas do mesmo sexo de sociedade de fato, e não de união estável, leva à sua inserção no direito obrigacional, com conseqüente alijamento do manto protetivo do direito das famílias, o que, em conseqüência, enseja o afastamento de direitos sucessórios.

Este posicionamento, no entanto, não satisfaz os anseios

pessoais dos integrantes dos relacionamentos homoafetivos. Tratar a questão no

campo do direito das obrigações é uma ofensa e uma forma de discriminação.

(NAHAS, 2006, p. 118).

12 Sumula 380/STF: “comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido com esforço comum”.

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Porém, não se pode aceitar tratamento distinto a relações de

afeto, que se desenrolam de forma idêntica, em relação à postura do parceiro, sendo

a única diferença a diversidade ou não do sexo entre eles. Assim sendo, a

conclusão oportuna para a resolução desta desigualdade de tratamento se dá

através da adaptação analógica das regras da união estável, em razão da similitude

entre os relacionamentos, conforme permissivo do art. 4º da Lei de Introdução ao

Código Civil. (DIAS, 2000, p. 99).

Os tribunais, atentos à evolução social, vêm rompendo de vez

por todas com as barreiras do preconceito e têm reconhecido a união homossexual,

tutelando, como conseqüência, os efeitos jurídicos daí decorrentes. (MATOS, 2006,

p. 92).

Alguns casos relativos às uniões homossexuais foram levados

à apreciação do Poder Judiciário, resultando nas mais diferentes decisões. Mesmo

em sede do Supremo Tribunal Federal, afirmou-se:

Não obstante as razões de ordem estritamente formal, que tornam insuscetível de conhecimento a presente ação direta, mas considerando a extrema importância jurídico-social da matéria – cuja apreciação talvez pudesse viabilizar-se em sede de argüição de descumprimento de preceito fundamental –, cumpre registrar, quanto à tese sustentada pelas entidades autoras, que o magistério da doutrina, apoiando-se em valiosa hermenêutica construtiva, utilizando-se da analogia e invocando princípios fundamentais (como os da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da autodeterminação, da igualdade, do pluralismo, da intimidade, da não discriminação e da busca da felicidade), tem revelado admirável percepção do alto significado de que se revestem tanto o reconhecimento do direito personalíssimo à orientação sexual, de um lado, quanto a proclamação da legitimidade ético-jurídica da união homoafetiva como entidade familiar, de outro, em ordem a permitir que se extraiam, em favor de parceiros homossexuais, relevantes conseqüências no plano do Direito e na esfera das relações sociais. (ADIn 3300 MC/DF, Relator: Min. Celso Mello, 03.02.2006).

Nesse sentido, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul,

pioneiro nesse tipo de decisão, reconheceu efeitos de união estável a

relacionamento afetivo entre dois homens, através de Ação Declaratória:

AÇÃO DECLARATÓRIA. RECONHECIMENTO. UNIÃO ESTÁVEL. CASAL HOMOSSEXUAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. A ação declaratória é o instrumento jurídico adequado para reconhecimento da existência de união estável entre parceria homoerótica, desde que afirmados e provados os pressupostos próprios daquela entidade familiar. A sociedade moderna, mercê da evolução dos costumes e apanágio das decisões judiciais, sintoniza com a intenção dos casais homoafetivos em

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abandonar os nichos da segregação e repúdio, em busca da normalização de seu estado e igualdade às parelhas matrimoniadas. EMBARGOS INFRINGENTES ACOLHIDOS, POR MAIORIA. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Embargos Infringentes nº 70011120573, Quarto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Rel.: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 10.06.2005).

O reconhecimento como entidade familiar, regulada pelas

normas da união estável, gera importante reflexo nas questões patrimoniais do

casal. (NAHAS, 2006, p. 121).

E ainda:

PROCESSO CIVIL E CIVIL – PREQUESTIONAMENTO – AUSÊNCIA – SÚMULA 282/STF – UNIÃO HOMOAFETIVA – INSCRIÇÃO DE PARCEIRO EM PLANO DE ASSISTÊNCIA MÉDICA – POSSIBILIDADE – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA. A relação homoafetiva gera direitos e, analogicamente à união estável, permite a inclusão do companheiro dependente em plano de assistência médica. O homossexual não é cidadão de segunda categoria. A opção ou condição sexual não diminui direitos e, muito menos, a dignidade da pessoa humana. (Recurso Especial nº 238.715/RS, (1999/0104282-8), Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 07.03.2006).

Ainda não existe uniformidade jurisprudencial sobre o assunto,

porém, a tendência, mesmo que em passos lentos, é de considerar as uniões

homoafetivas como entidades familiares que possuem os mesmos direitos que as

outras expressamente previstas na Constituição Federal. Da mesma forma que

poderá acontecer com as demais entidades familiares implicitamente contidas na

Carta Magna, que foram citadas nesse estudo.

Ou seja, conforme estudado ao longo de todo o trabalho, a

Constituição pluralista, e muito menos esta pesquisa, não pretende esgotar todas as

formas de entidades familiares, sendo a mesma aceita e saudável.

Considerando-se uma série de fatores em comum, e a principal

delas, o afeto, é possível que o art. 226 possa incluir outras formas de família que

não as previstas pela Constituição. Basta que o legislador concretize o direito

vigente, examinando os princípios democráticos e a evidente variedade de tipos de

vida amorosa.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo apresentou-se a analisar os limites e capacidades

interpretativas do art. 226 da Constituição da República Federativa do Brasil, ou

seja, esclarecer que o referido artigo deve ser visto como exemplificativo, podendo

albergar outras formas de entidades familiares que não as expressamente previstas.

Para alcançar esse ponto, foi necessário, inicialmente, fazer

uma análise da família em todas as Constituições pátrias, desde a primeira, liberal,

em 1824, passando pelo Constitucionalismo social das de 1934, 1937 e 1946, até

chegar a atual. O propósito dessa primeira parte foi entender que a Constituição

dever corresponder à realidade social, porém, não deve submeter-se totalmente a

ela.

Percebe-se, então, que a discussão da família proporciona sua

adequação temporal ao respectivo contexto histórico e que, muitas vezes, o fim de

um modelo familiar significa senão o surgimento de outro mais flexível e

correspondente aos novos anseios sociais.

A Carta Magna de 1988 mudou os paradigmas da família

brasileira, extinguindo a exclusividade do matrimônio como forma de constituição de

família, considerando como entidade familiar também as uniões estáveis e as

famílias monoparentais, além de outorgar igualdade entre homens e mulheres e

retirar quaisquer discriminações sobre os filhos.

Porém, algumas questões familiares permaneceram excluídas

e/ou omitidas, como exemplo as filiações socioafetivas e as uniões homossexuais,

entre outras citadas na pesquisa, que não receberam respaldo normativo.

Nesse sentido, busca-se analisar o princípio maior da

dignidade da pessoa humana, fundante do Estado Democrático de Direito, sendo

afirmado já no primeiro artigo da Constituição Federal e que serve de norte para

todas as questões contidas na mesma.

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Dessa forma, atualmente, existe um respeito à pluralidade

familiar, desde que presentes alguns requisitos essenciais, sendo o afeto um dos

principais.

Assim, e voltando ao cerne do trabalho, fica demonstrado que

o art. 226 da CF é aberto, aceitando a interpretação concretizadora, em detrimento a

qualquer exclusão discriminatória no que concerne a entidades familiares.

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